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FUNDAMENTOS E TRANSVERSALIDADES
Resumo
“Globalmente, as tecnologias, leves, tomam
O artigo pretende explorar a noção de rede,
das técnicas, pesadas, o poder de dar as cores
buscando algumas pistas dos seus fundamen-
mais fortes ao momento da história e a domi-
tos histórico-conceituais, suas incidências e
nação universal àqueles que as detêm. Eis um
alianças com o conceito de informação. O obje-
mapa-múndi extenso, atravessado por canais,
tivo é situar os modos de emprego do conceito
do novo universo, utópico e sombrio”.
de rede em campo de estudos com pouca den-
(SERRES, 1994, p 139).
sidade teórico-conceitual, como é o caso da
ciência da informação. Transversal como as
idéias de “informação-sistêmica” ou “informa-
ção-fluxo”, o conceito de rede convida as per-
guntas de pesquisa sobre a informação a se
associarem a um enfoque do fenômeno onde
os sujeitos coletivos são seus protagonistas
centrais, ao mobilizarem redes sociais de co-
nhecimentos. Para pensar assim, é relevante
introduzir a idéia de uma “terceridade” do co-
nhecimento, da informação e das próprias con-
figurações das redes sociais.
Palavras-Chave
Informação; conhecimento; rede; redes sociais.
razões principais. Primeiro, para não “natu- mundo e a sociedade se encontrariam atu-
res - quando uma “informação-sistema” vos para o estudo das redes sociais de
que gera memória e registro, tem perma- conhecimentos e informações.
nência no tempo e coloração local, parece
dar lugar a uma “informação-fluxo”, fluida, 2 INFORMAÇÃO E REDE – RASTROS
rizomática, enredada nos movimentos das HISTÓRICOS E CONCEITUAIS
redes, canais e dispositivos técnicos de Para iniciar as reflexões aqui apre-
comunicação e informação. sentadas sobre rede e informação, buscou-
As primeiras partes do artigo procu- se auxílio no “Dictionnaire Critique de la
ram dicionarizar os dois conceitos – rede e Communication”, dirigido por Lucien Sfez,
informação – para fundamentar suas raízes composto por dois volumes divididos em
disciplinares e questões essenciais, ressal- duas partes cada um, totalizando 13 capí-
tando a sua transversalidade quando se tulos. No primeiro volume as partes se inti-
trata de estudar fenômenos relacionados à tulam “Os dados de base” e “As teorias
produção social de sentidos. Em seguida operacionais”. No segundo, “Os grandes
buscam-se perspectivas de emprego da domínios de aplicação” e “Comunicação e
noção de rede associando-a aos conceitos Sociedade” (SFEZ, 1993).
de informação-conhecimento-saber, para o Essa fonte de inspiração inicial justifi-
equacionamento de questões caras à ciên- ca-se pelo papel que esse pensador fran-
cia da informação. Para esse fim, reto- cês tem desempenhado no debate público
mam-se alguns elementos da sociologia do e acadêmico por conta de suas pesquisas
conhecimento e da nova sociologia da ci- sobre os fenômenos contemporâneos da
ência, que miram as práticas e disputas no comunicação e outros que lhe são associ-
campo científico. ados, como a informação. Já na introdução
A noção de redes sociais apresenta da obra, Sfez afirma que “Podemos, deve-
uma “terceridade” na composição dos elos mos denunciar os perigos de uma comuni-
sociais que, vista pelos ângulos teórico e cação generalizada, uma nova religião
metodológico das perguntas de pesquisa, mundial que pretende resolver todos os
pode levar à construção teórico-prática de problemas da humanidade, sua felicidade,
um “terceiro conhecimento”, que envolve a igualdade entre os homens, a fraternida-
sujeitos coletivos nos processos de apro- de, o desenvolvimento econômico, a inte-
priação social dos sentidos e dos dispositi- ração social”. A comunicação não é ape-
vos informacionais. nas uma “religião”, uma moda ou uma for-
Nessa volumosa obra coletiva que re- teriormente apontada, pois “na hierarquia
pertoria teorias, conceitos, questões, práti- dos produtos do espírito humano, por or-
cação, em formato enciclopédico, busca- situa bem ao alto, pois ele representa algo
para extrair algumas questões de base na em relação ao recorte que ele efetua na
municação, os autores consideram a trans- faz com que ele perca uma grande porção
ção, por sua vez, não é uma ausência de limites, perdendo aparentemente ou real-
1
“Figura que consiste em reunir palavras contraditórias;
paradoxismo. Ex.: “inocente culpa” (Cecília Meireles,
Obra poética, p.487), ou “silêncio eloqüente”, “covarde
valentia” (Almeida Garret, Frei Luis de Sousa, p. 47)” In:
Ferreira, 1986, p. 1242
das disciplinas: “Ele muda as paisagens são de informação, entendida essa última
no sentido de Shannon, associada à incer-
nas quais se desloca, e ele próprio muda
com elas, sem perder, no entanto, a sua teza reduzida pela mensagem. Segundo o
Dictionnaire Critique, em rubrica assinada
identidade. Os conceitos de viagem, assim
como as pessoas de viagem, assumem por Breton (1993, p.214), deve-se distinguir
entre o “núcleo duro” da teoria matemática
uma função de junção e de superposição
do específico e do universal...” (BAREL; da informação e os múltiplos usos matemá-
ticos ou metafóricos da noção de informa-
CAUQUELIN, 1993, p.184-185).
Inf.Inf., Londrina, v. 12, n. esp., 2007.
Informação, rede e redes sociais – fundamentos e transversalidades Regina Maria Marteleto
cações “em extensão” provocasse um es- próprio ao século XX. De forma diferente, é
vaziamento “em compreensão”, ou mesmo relevante salientar que, a partir de sua lon-
sua diluição. Entretanto, os autores per- ga história até sua presente utilização, o
guntam se não se poderia concluir o con- conceito tenha guardado, desde Hipócra-
trário, ou seja, que o uso constante de uma tes, a memória da sua origem orgânica e
noção seria uma prova de sua eficácia. próxima do imaginário do corpo.
porâneos não deve deixar esquecido quan- Segundo Parrochia (1993, p.179) a
to o conceito viajou ao longo dos séculos, possibilidade de articulação de saberes
acumulando e abandonando diversos signi- num sistema de correspondências orgâni-
ficados, na medida da sua extensão e a- cas situa-se na centralidade da cultura oci-
climatação em novas ambientações disci- dental. As “artes da memória”, as primeiras
plinares e discursivas. Segundo os autores, enciclopédias, e mais tarde os sistemas
seria ingênuo considerá-lo como um aporte filosóficos, as bases de dados, parecem
Inf.Inf., Londrina, v. 12, n. esp., 2007.
Informação, rede e redes sociais – fundamentos e transversalidades Regina Maria Marteleto
Para seguir essa trilha aberta pelo au- ências da gestão e das organizações, as
tor sobre a dimensão sociológica dos pro- ciências da linguagem, as ciências cogniti-
cessos de institucionalização da ciência e vas, a filosofia do conhecimento, dentre
suas implicações para o dimensionamento outros. Pergunta:
de redes sociais de conhecimentos, é im- Em que a ciência da informação po-
portante ocupar um espaço nesse artigo de se diferenciar? O que pode mar-
car a sua especificidade? O que po-
para registrar o entendimento, e portanto o de permitir a sua distinção? A elabo-
ração e o compartilhamento passam
uso, que na língua francesa se faz das no-
essencialmente pela produção,
ções de conhecimento e saber, especial- transferência, apreensão cognitiva
de ‘objetos’, acessíveis a um ou ou-
mente no campo de estudos da informa- tro dos nossos sentidos, o que cer-
ção, uma vez que o texto se apóia forte- tos autores denominam ‘informa-
ções sensíveis’, outros ‘objetos que
mente em autores franceses. contêm informação’, ou outros ainda
‘conhecimentos explícitos’
Metzger (2002) em “Les trois pôles de (METZGER, 2002, p.19).
da ciência da informação), ao afirmar que uma materialidade que contém nela mes-
essa disciplina se interessa essencialmen- ma dimensões institucionais, contextuais,
por uma atividade mental contínua”. Co- cessos e fluxos sociais de sentidos – as
nhecimento(s), cultura, erudição, instrução, redes sociais de conhecimentos.
luz, ciência (ROBERT, 1973, p.1613).
6 “A CIÊNCIA É O PASSADO DA
Entende-se, assim, a preferência de
PESQUISA” – AS REDES SOCIAIS DE
Metzger por saber, ao invés de conheci-
CONHECIMENTOS
mento, para delinear um campo epistemo-
lógico para a ciência da informação, pois A sociologia do conhecimento e da
saber (savoir) diz respeito ao grau mais cultura (BOURDIEU, 1997; 2001) e a teoria
profundo de apreensão e sistematização ator-rede da nova sociologia da ciência
dos sentidos e aprendizados, resultando na (LATOUR; WOOGAR, 1996; CALLON,
sabedoria, enquanto forma de cognição a 1989 e outros), dentre outras vertentes,
mais elevada, presente em todos os modos inauguraram um enfoque inovador para o
e sistemas de conhecimento, aliada à ex- estudo dos saberes modernos da ciência,
periência. quando passaram a estudar as práticas e
condições da pesquisa, no lugar de consi-
Num encadeamento didático dos con-
derar a “ciência feita” como objeto do en-
ceitos de informação-conhecimento-saber,
tendimento dos processos de produção de
a informação estaria situada num primeiro
conhecimentos. Dessa vez a idéia de rede,
grau do processo de apropriação, expres-
por via conceitual ou metafórica, serve pa-
são e sistematização dos significados, en-
ra estudar os processos coletivos de pro-
quanto o conhecimento corresponde a um
dução dos conhecimentos, o sistema de
grau mais internalizado desse mesmo pro-
posições dos atores e as disputas no cam-
cesso, o de produção de sentidos sobre as
po científico, os capitais sociais, informaci-
coisas e o mundo. O saber situa-se numa
onais e simbólicos investidos nas práticas
terceira zona que reúne os cabedais soci-
e políticas da pesquisa, a interação de ato-
ais, técnicos e cognitivos de instituições,
res humanos e não-humanos e suas com-
pessoas e grupos, em grau de internaliza-
plexas mediações nas redes sócio-técnicas
ção e externalização que alia os conheci-
de conhecimentos.
mentos às práticas e às experiências, for-
mando acervos, registros e documentos Segundo P. Bourdieu, os campos so-
individuais e coletivos – a sabedoria. ciais - dentre eles o campo científico - re-
sultam de um longo processo de diferenci-
Para cada entendimento um emprego
ação e autonomização em relação aos re-
ou para cada emprego um entendimento, a
gimes de poder e de verdade prevalecen-
noção de conhecimento é geralmente utili-
tes no ordenamento das sociedades. Cada
zada quando se trata de analisar os pro-
Inf.Inf., Londrina, v. 12, n. esp., 2007.
Informação, rede e redes sociais – fundamentos e transversalidades Regina Maria Marteleto
objetos de estudo não os atributos qual ela se insere. Uma díade só tem sen-
dos indivíduos (idade, profissão, classe tido em relação ao conjunto das outras dí-
social, etc), mas as relações entre eles e ades da rede, porque a posição estrutural
as regularidades que apresentam a fim de tem necessariamente um efeito sobre a
descrevê-las, dar conta da sua formação e sua forma, seu conteúdo ou sua função”.
de suas transformações, analisar os seus
Desta feita, a posição dos indivíduos
efeitos sobre os comportamentos individu-
nas redes sociais é interdependente em
ais. Nessa perspectiva uma rede social
relação a todas as outras posições dos
pode ser definida, de um modo geral , “[...]
outros indivíduos e de seus elos. A função
como sendo constituída de um conjunto de
de uma relação depende da sua posição
unidades sociais e das relações que essas
estrutural, o que é também verdadeiro para
unidades sociais mantêm umas com as
o status e o papel de um ator, resultando
outras, direta ou indiretamente, por meio
que uma rede não se reduz a uma simples
de encadeamentos de extensões variá-
soma de relações, pois sua forma interfere
veis.” (MERCKLÉ, 2004, p. 4). Essas uni-
em cada relação.
dades, por sua vez, podem ser indivíduos,
Na prática e na teoria, a análise das
grupos informais ou estruturas mais for-
redes sociais, segundo Mercklé (2004),
mais como organizações, associações ou
necessita de uma definição preliminar das
empresas.
unidades de análise observadas, no que os
Logo, a unidade de análise quando se
estudiosos das redes em geral concordam.
estudam redes sociais é variável. O essen-
A questão é saber se uma díade (relação
cial, segundo Degenne e Forsé (1994, p.9),
entre dois indivíduos) pode ou não repre-
é que o objetivo seja a relação entre ele-
sentar essa unidade básica, remetendo a
mentos, ou elementos que estão ligados ou
uma pergunta basilar das correntes intera-
suscetíveis de estarem ligados uns aos
cionistas nas ciências sociais. Forsé (2002)
outros. Por outro lado, centrar a análise
lembra que para G. Simmel a forma socio-
sobre a relação não significa que se consi-
lógica mais simples do ponto de vista me-
dere a relação diádica de interação entre
todológico é a relação entre dois elemen-
duas pessoas como um objeto em si para o
tos, chamada “díade”, considerada por
estudo das redes sociais: “Da mesma for-
muitos autores como a unidade relacional
ma que não é possível analisar as caracte-
elementar. Entretanto, continua Forsé, a
rísticas dos indivíduos independentemente
díade apresenta um caráter específico que
das suas relações uns com os outros, não
impede que ela seja considerada o “átomo”
é possível isolar uma díade da estrutura na
da análise de redes sociais, na medida em
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Informação, rede e redes sociais – fundamentos e transversalidades Regina Maria Marteleto
que depende da “pura individualidade” de duas díades. A lógica não é mais aditiva,
cada um dos seus membros, o que resulta ela se torna combinatória, abrindo a possi-
em que, se um dos indivíduos que a com- bilidade de estudar as estratégias de coali-
põe desaparece, a relação entre eles de- são, de mediação, a transitividade das afi-
saparece. nidades, etc” (MERCKLÉ, 2004, p.9).
da trajetória das utopias sociais baseadas e realizando-o por meio de métodos unifi-
mentação”, ou seja, bem antes da defini- uma enorme distância entre as capacida-
com dois nascimentos: o de uma disciplina sua mobilização para confrontar as enor-
Keywords
Information; knowledge; network; social net-
works
Título
Información, red y redes sociales - fundamen-
tos y transversalidades
Resumen
El artículo pretende explorar la noción de red,
buscando algunas pistas de sus fundamentos
históricos conceptuales, sus incidencias y
alianzas con el concepto de información. El
objetivo es situar los modos de empleo del
concepto de red en el campo de estudios con
poca densidad teórico conceptual, como es el
caso de la ciencia de la información. Transver-
sal como las ideas de “información sistémica” o
“información flujo”, el concepto de red invita a
preguntas de investigación sobre la informa-
ción a asociarse a un enfoque del fenómeno
donde los sujetos colectivos son sus protago-
nistas centrales, al movilizar redes sociales de
conocimientos. Para pensar así, es relevante
introducir la idea de “tercerear” el conocimien-
to, de la información y de las propias configu-
raciones de las redes sociales.
Palabras Clave
Información; conocimiento; red; redes sociales.