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Ayn Rand
Diante do título deste livro, A virtude do egoísmo, não falta quem pergunte o porquê do
termo “egoísmo”, com conotação positiva, ao lado de “virtude”—se todos “sabem” que
“egoísmo” é o oposto de uma qualidade virtuosa de caráter.
A ética altruísta responde que a preocupação com nosso próprio interesse é nociva; só
tem valor moral uma ação praticada em benefício dos outros. Em lugar de perguntar: “O
que são valores?”, o altruísta pergunta: “Quem deve se beneficiar dos valores?”—
tornando o beneficiário da ação o único critério de valor moral. Tem o mesmo valor, por
exemplo, o dinheiro ganho com o trabalho ou com um roubo—ambos são imorais
porque o beneficiário é um “egoísta”.
Essa ética é trágica, porque não nos fornece um código de valores morais e nos deixa
sem diretrizes morais. Essa falta de diretrizes tem levado a maioria das pessoas a
desperdiçar suas vidas entre o cinismo e a culpa—cinismo, por não praticarem a ética
altruísta; e culpa, por não se atreverem a rejeitar essa ética.
O que fazer? O primeiro passo é defender o direito do homem a uma existência moral
racional—ou seja, a um código moral que sirva para definir os interesses e valores
adequados à vida; que mostre que é moral preocupar-se com os próprios interesses; e
que afirme o direito das pessoas de se beneficiarem de seus próprios atos morais.
Na ética Objetivista, quem age é sempre o beneficiário da ação, que age de acordo com
seu próprio auto-interesse racional. A satisfação dos desejos irracionais dos demais, ou a
satisfação dos próprios desejos irracionais, não é um critério de valor moral: a
moralidade não é um concurso de caprichos. É errado achar que qualquer escolha é
moral, desde que guiada por um julgamento independente—um julgamento nada mais é
que o meio pelo qual se escolhe como agir. É isso que torna a ética Objetivista uma
moralidade do auto-interesse racional—ou do egoísmo racional.
A ética objetivista
O que é moralidade, ou ética? É um código de valores que orienta as ações das pessoas
e que determina o propósito e rumo de suas vidas. A ética, como ciência, trata da
descoberta e da definição deste código.
Para definir um código de ética objetivo, racional e científico, é necessário responder às
perguntas: Para que serve um código de valores? O conceito de valor, de ‘Bem ou Mal’,
é arbitrário, ou é metafísico, uma condição inalterável da existência humana? A ética é o
território dos caprichos ou da razão? A ética é um luxo subjetivo ou uma necessidade
objetiva?
Comecemos pelo princípio: O que são valores? Por que precisamos de valores? “Valor”
é o objetivo da ação, o que se quer obter ou se manter. O conceito de valor depende da
resposta à pergunta: Valor para quem e para o quê? O que pressupõe que há uma
entidade capaz de agir para atingir um objetivo em face de uma alternativa—onde não
há alternativas, não é possível ter objetivos e valores.
Só uma entidade viva pode ter objetivos e agir para atingi-los. Todos os organismos
vivos agem para conservar a sua vida. O que é o apropriado para conservar a vida? A
ação que leva à sobrevivência do organismo. A inação é a antítese da vida, que tem
como valor supremo uma ação constante de auto-preservação.
A sensação física de prazer informa que o organismo está no curso certo de ação. A dor,
que o organismo está em um curso errado de ação. Um organismo que só é capaz de
sentir é orientado pelo mecanismo prazer-dor de seu corpo. Seu conhecimento e seu
código de valores são automáticos.
A faculdade que dirige esse processo é a razão, que identifica e integra o material
provido pelos sentidos e o processo se denomina pensar. Pensar não é uma função
automática, decidimos pensar—ou não, já que pensar requer um estado volitivo de
consciência focalizada. Psicologicamente, “pensar ou não pensar” consiste em escolher
“focalizar ou não focalizar”. Existencialmente, “focalizar ou não focalizar” é escolher
entre “ser ou não consciente”. Metafisicamente, “ser ou não consciente” é escolher entre
a vida e a morte.
Para a ética Objetivista o critério de valor é a vida humana e o propósito ético de cada
indivíduo é sua própria vida. Os três valores fundamentais da ética Objetivista são:
Razão, Propósito e Auto-Estima, com suas três virtudes correspondentes: Racionalidade,
Produtividade e Orgulho.
O princípio social básico da ética Objetivista é que todo ser humano vivo é um fim em
si mesmo, não o meio para o bem-estar dos outros—e, portanto, que o homem deve
viver para o seu próprio proveito, não se sacrificando pelos outros, nem sacrificando os
outros para si. Viver para seu próprio proveito significa que o propósito moral mais alto
do ser humano é a realização de sua própria felicidade.
A sobrevivência do homem não confronta sua consciência como uma questão de “vida
ou morte”, mas de “felicidade ou sofrimento”. A felicidade é o estado de triunfo da vida,
o sofrimento é o de alerta da morte. O mecanismo emocional da consciência do homem
é um barômetro que registra as suas emoções básicas: felicidade ou sofrimento.
Nem a vida, nem a felicidade—o estado da consciência que provém da realização dos
próprios valores—podem ser atingidas através de caprichos irracionais. É apenas
através da aceitação da própria vida, como princípio fundamental, e da busca dos
valores racionais requeridos pela vida, que se alcança a felicidade—não tornando a
“felicidade” um princípio indefinido e irredutível e então tentando viver por essas
diretrizes.
Não tentarei aqui discutir a teoria política do Objetivismo. Direi apenas que cada
sistema político é baseado em uma teoria ética—e que a ética Objetivista é a base moral
do capitalismo. Quando digo “capitalismo”, quero dizer o capitalismo puro e
desregulamentado, do tipo laissez-faire. É claro que um sistema puro de capitalismo
jamais existiu. Mas o capitalismo não é um sistema do passado; é o sistema do futuro—
se a espécie humana tiver futuro.
Apresentei aqui os fundamentos mais simples de meu sistema, suficientes para indicar
de que maneira a ética Objetivista é a moralidade da vida e se contrapõe às três
principais escolas de teoria ética—a mística, a social e a subjetiva, que representam a
moralidade da morte.
Não é a imoralidade das pessoas que é responsável pelo colapso que ameaça destruir o
mundo civilizado, mas o tipo de moralidade que as pessoas têm sido incitadas a praticar.
É possível mudar. Quem estabelece nossos objetivos e determina nosso rumo é a
filosofia; é apenas a filosofia que pode salvar-nos agora. O mundo está enfrentando uma
escolha: se a civilização deve sobreviver, é a moralidade altruísta que os homens
precisam rejeitar.
Alguém deve arriscar sua vida para ajudar um homem que está se afogando ou está
encurralado no meio do fogo?
O altruísmo não dá uma resposta racional a essa pergunta, porque destruiu o conceito
de benevolência e a boa vontade autêntica ao elevar a ajuda aos outros à condição
central e básica da ética. Valorizar o ser humano e ter qualquer interesse pessoal pelos
outros se torna um ato de abnegação, de sacrifício próprio. Sendo assim, qualquer amor,
respeito ou admiração pelos outros não é fonte de prazer, mas uma ameaça à existência.
Voltando ao exemplo de salvar uma pessoa que está se afogando. Se ela é um estranho,
só é moralmente adequado salvá-la quando o perigo para a nossa própria vida é mínimo;
quando o perigo é grande, é imoral tentar. Somente a falta de auto-estima pode permitir
que alguém não valorize mais a sua vida do que a de um estranho qualquer.
Os que não entendem o princípio Objetivista de que “não existem conflitos de interesse
entre homens racionais” argumentam: “Suponha que dois homens se candidatam ao
mesmo emprego. Apenas um pode ser empregado. Não há um conflito de interesses, e
um deles não se beneficiará à custa do sacrifício do outro?” Para responder a essa
pergunta é preciso atentar para quatro considerações: (a) “Realidade”, (b) “Contexto”,
(c) “Responsabilidade”, (d) “Esforço”.
1. Realidade. Os “interesses” dependem das metas que uma pessoa escolhe; a escolha
de metas depende dos seus desejos; e estes, dos seus valores. O fato de alguém desejar
algo não quer dizer que o objeto do desejo seja bom, nem que satisfazê-lo é de seu
interesse.
A escolha das metas de um homem racional é sempre guiada pela razão, e não por
sentimentos ou desejos. “Porque eu quero” não é motivo para validar seus atos. Ele só
age depois que um desejo passa pelo crivo da razão e que possa dizer: “Eu quero isto
porque é certo”.
Um homem racional sabe também que não pode ter valores contraditórios ou identificá-
los com seus interesses. Só os que desprezam a razão—os místicos ou os subjetivistas—
se permitem viver em um perpétuo conflito e com seus supostos interesses em
permanente choque, entre si, e com os interesses dos outros.
2. Contexto. Um homem racional não vive apenas o momento. Ele não permite
conflitos entre seus interesses atuais e futuros, nem busca satisfazer hoje o desejo que
destruirá os valores, amanhã.
Da mesma forma, não tem desejos divorciados dos meios de atendê-los. A vida em
sociedade não isenta o homem da responsabilidade de viver por seu próprio esforço.
Mas permite minimizar esse esforço ao trocar o que produz pelo que não produz, e é
produzido pelos outros. O que determina seus ganhos? O mercado livre, isto é: a escolha
voluntária dos outros homens de trocar com ele o que produzem.
(d) Esforço. Um homem racional sabe que os benefícios da riqueza resultam dos seus
esforços e de cada um—que nada existe em quantidade limitada e fixa, à espera de
alguém que a distribua entre os homens. Se os benefícios têm de ser produzidos, o
ganho de um não implica o sacrifício de outro, mas também não implica que devamos
depender dos outros para atender nossos interesses.
Os parasitas temem os concorrentes porque não acreditam que possam ganhar a vida
por mérito próprio. Vêem-se como medíocres e descartáveis; vêem o mundo à sua volta
“estático”, e julgam que vivem pelo benefício sem causa de alguém. Um homem
racional sabe que não se vive só de “sorte” ou favores e que não há uma “única chance”
ou oportunidade e que nenhuma meta específica é insubstituível. Sabe que apenas as
pessoas que ama são insubstituíveis—e só essas.
3. Realidade. O fato de dois homens disputarem o mesmo emprego não significa que
qualquer deles esteja qualificado para a função, ou que a mereça, ou que seus interesses
sejam prejudicados, se não a preencher.
4. Contexto. Ambos devem saber que o emprego que desejam só existe porque alguém
criou o emprego. Se houvesse apenas um candidato não haveria mais emprego, já que o
negócio teria fechado suas portas. Além disso, a competição pelo emprego é de seu
interesse, muito embora um dos candidatos perca nessa ocasião específica.
1. Responsabilidade. Ninguém tem o direito moral de dizer que quer apenas um
emprego e não se importa com o resto. Quem ignora o que é necessário para que seus
desejo se materializem não tem direito a nenhum desejo.
2. Esforço. Quem obteve o emprego, o fez por seu próprio mérito, não pelo “sacrifício”
do outro candidato, que nunca teve nenhum direito adquirido sobre o emprego. O
fracasso em dar a um homem o que nunca lhe pertenceu dificilmente pode ser descrito
como “sacrificar seus interesses”.
Não pode haver nenhum compromisso com relação a princípios morais. Se você fica
tentado a perguntar: “A vida não exige um compromisso”? Traduza a pergunta para o
seu real significado: “A vida não exige a rendição daquilo que é verdadeiro e bom ante o
falso e o mau?
Vivemos sob o agnosticismo moral, o preceito de que não se deve fazer um julgamento
moral dos outros. O problema é: nada corrompe e destrói uma cultura ou o caráter de
um homem tão completamente quanto o agnosticismo moral, que leva as pessoas a
abster-se igualmente de elogiar as virtudes e condenar os vícios. Essa atitude reflete
enorme injustiça, só explicável pelo fato de que passar um julgamento moral é uma
enorme responsabilidade.
Só o cinismo amoral de nossa era permite que alguém se sinta livre para fazer um
julgamento irracional, sem arcar com as conseqüências. A realidade objetiva é a
instância superior de nossos juízos. É o medo dessa responsabilidade que leva a maioria
das pessoas à neutralidade moral indiscriminada e a dizer: “Não julgue, para não serdes
julgado”.
Não há como escapar das escolhas que devemos fazer; como temos de fazer escolhas,
não há como escapar dos valores morais; e enquanto estiverem em jogo valores morais,
nenhuma neutralidade moral é possível. O princípio moral a se adotar nesta questão é:
“Julgue e esteja preparado para ser julgado”.
Tolerância indiscriminada e condenação indiscriminada não são dois opostos: são duas
variantes do mesmo subterfúgio e uma fuga da responsabilidade do julgamento moral.
Se as pessoas não dissessem que um delinqüente juvenil “precisa de amor”, que um
criminoso “não conhece nada melhor” ou que os comunistas são simplesmente
“reformistas agrários”, a história teria sido diferente. Além disso, dizer que “ninguém
está totalmente certo ou totalmente errado” e “quem sou eu para julgar?” têm efeitos
letais. À medida que aumenta a neutralidade moral, cresce a solidariedade com o vício e
o antagonismo para com a virtude.
Uma sociedade irracional é uma sociedade de covardes morais, paralisados pela perda
de critérios, princípios e diretrizes morais. Nessa sociedade, a iniciativa só pode vir dos
que estão dispostos a assumir a responsabilidade de estabelecer valores racionais—ou
de um facínora, que não está preocupado com questões de responsabilidade.
Um dos sintomas mais eloqüentes da falência moral da cultura atual é a atitude que se
pode resumir como: “Não há preto nem branco, há apenas ‘cinzas’”, como se fosse
possível haver o cinza, sem o preto e o branco.
Há muitas razões para a maioria das pessoas serem moralmente imperfeitas, isto é,
manterem valores contraditórios e confusos. Mas é o fato da maioria das pessoas serem
moralmente “cinza” que torna mais imperiosa a necessidade do homem ter uma moral
“branca”.
Este culto é uma negação da moralidade, mas esse não é o objetivo de seus adeptos. O
que eles procuram é algo ainda mais irracional: uma moralidade não-absoluta, fluida,
elástica, de meio termo. Não se dizem “além do bem e do mal”, mas procuram preservar
as “vantagens” de ambos. Não constituem uma escola de pensamento; são o produto
típico da omissão filosófica—da falência intelectual que produziu o irracionalismo, na
epistemologia; o vácuo moral, na ética; e a economia mista, na política.
Em uma economia mista, homens de premissas mistas devem ser chamados de “cinzas”;
mas, em ambos os casos, a mescla não permanece “cinza” por muito tempo. O “cinza” é
simplesmente um prelúdio para o “preto”.
Pode haver homens “cinzas”, mas não pode haver princípios morais “cinzas”. A moral é
um código de preto e branco.
A ética coletivizada
Ouvimos com freqüência a pergunta: “O que será feito pelos pobres e deficientes numa
sociedade livre?” A premissa implícita do altruísta-coletivista é que o infortúnio de uns
é uma hipoteca a ser paga pelos outros. Observe que a pergunta não é: “Alguma coisa
deve ser feita?”, mas: “O que será feito?”, como se a premissa coletivista tivesse sido
tacitamente aceita e só restasse discutir os meios de implementá-la.
O que nos interessa discutir aqui é a premissa coletivista de considerar esta questão
como política, como um problema ou um dever da “sociedade como um todo”. Sabemos
que a natureza não garante segurança automática, sucesso e sobrevivência para
ninguém. Portanto, só a presunção ditatorial e o canibalismo moral do código altruísta-
coletivista permitem a alguém fantasiar que pode garantir esta segurança a alguns
homens à custa de outros.
Aceitar que a “sociedade” deve fazer algo pelo pobre, implica aceitar a premissa
coletivista de que a vida do pobre pertence à sociedade. Essa atitude revela um mal mais
profundo: o altruísmo corrói a compreensão dos conceitos de direitos e do valor da vida
de um indivíduo; revela uma mente da qual se apagou a realidade de um ser humano.
Um homem que está disposto a servir como meio para outros fins, necessariamente
considerará os outros como meios para seus fins. Quanto mais altruísta ele for, mais
criará esquemas “para o bem do gênero humano ou da sociedade”, “do público” ou “das
gerações futuras”, ou de qualquer coisa, exceto seres humanos reais—esquemas a serem
impostos por meios políticos, isto é, pela força, sobre um número ilimitado de seres
humanos.
Os construtores de monumentos
Há sessenta anos atrás, deve ter havido alguma desculpa (sem justificativa) para a
crença de que o socialismo é uma teoria política que aspira ao bem-estar dos homens.
Hoje essa crença não pode ser considerada um erro inocente. O socialismo foi tentado
em cada continente do globo; à luz de seus resultados, está na hora de perguntar os
motivos dos defensores do socialismo.
“Direitos” são conceitos morais que permitem a transição lógica dos princípios que
orientam as ações de um homem para os princípios que guiam o seu relacionamento
com os outros. É o conceito que preserva e protege a moralidade individual em um
contexto social; a ligação entre o código moral de um homem e o código legal da
sociedade; entre a ética e a política. Os direitos individuais são o meio de subordinar a
sociedade à lei moral.
A história foi dominada por uma variante ética da doutrina altruísta-coletivista, que
subordinava o indivíduo a alguma autoridade superior, mística ou social. A moralidade
era um código aplicável ao indivíduo, mas não à sociedade, que pairava fora da lei
moral por ser considerada como a fonte da ética.
Antes, o homem havia sido considerado como meio para os fins dos outros, e a
sociedade como um fim em si mesma. A Revolução Americana considerou o homem
como um fim em si mesmo, e a sociedade como um meio para a coexistência pacífica e
voluntária dos indivíduos. Antes, considerava-se que a vida de um homem pertencia à
sociedade e que a liberdade do homem era concessão da sociedade, revogável a
qualquer tempo. A Revolução Americana introduziu a noção de que a vida de um
homem é dele por direito (o que significa: por princípio moral e por sua natureza); que
um direito é propriedade de um indivíduo; que a sociedade, como tal, não tem direitos; e
que o único propósito moral de um governo é a proteção dos direitos individuais,
entendido “direito” como um princípio moral que nomeia e sanciona a liberdade de ação
de um indivíduo em um contexto social. Há apenas um direito fundamental (todos os
outros são conseqüências ou corolários): o direito de um homem à sua própria vida.
O conceito de “direito” se refere apenas à liberdade de ação: implica estar livre de toda
compulsão física, coerção ou interferência de outros homens. Para cada indivíduo, um
direito é a sanção moral de tipo positivo—de sua liberdade de agir por seu próprio juízo,
para seus próprios objetivos, por sua própria escolha voluntária, sem coação. Quanto
aos seus concidadãos, os direitos de um indivíduo não impõem nenhuma obrigação,
exceto de um tipo negativo: absterem-se de violar os direitos dos outros.
O ser humano é uma entidade de um tipo específico, um ser racional; ele não funciona
de maneira exitosa sob coerção, e seus direitos são uma condição necessária do seu
modo particular de sobrevivência. Violar os direitos do homem implica compeli-lo a
agir contra o seu próprio julgamento e a expropriar seus valores. Só há uma maneira de
fazer isso: pelo uso da força. Há dois violadores potenciais dos direitos do homem: os
criminosos e o governo. A grande realização dos Estados Unidos foi traçar uma
distinção entre os dois—proibindo ao segundo a versão legalizada das atividades dos
primeiros.
“Direitos” coletivizados
Quando “poder” se opõe a “direito” ocorre a substituição dos “Direitos do Homem” por
“Direitos da Massa”. Em uma sociedade livre, os “direitos” de qualquer grupo são
derivados dos direitos dos seus membros através da escolha individual e voluntária e do
acordo contratual que formalizou seu agrupamento com vistas a propósitos específicos
comuns.
Um grupo, como tal, não tem direitos. A noção de “direitos coletivos” (a noção de que
direitos pertencem a grupos, não a indivíduos) significa que “direitos” pertencem a
alguns homens, mas não a outros, e que o critério dessa posição privilegiada consiste na
superioridade numérica.
A natureza do governo
Governo é uma instituição que detém o monopólio de impor certas regras de conduta
social em determinada área geográfica. Para viver em sociedade os homens precisam
desta instituição—por quê?
O uso da força física não pode ser deixado ao arbítrio de cada cidadão: requer regras
objetivas para julgar, regras objetivas para punir e procedimentos para excluir. Só uma
multidão de linchadores tenta levar a julgamento crimes sem essas regras.
O governo é o meio de colocar o uso retaliatório da força física sob leis objetivamente
definidas. Sob um sistema social adequado, qualquer um pode fazer qualquer coisa,
exceto o que é legalmente proibido; um funcionário do governo não pode fazer nada,
exceto o que é legalmente permitido. Este é a forma de subordinar a “força” ao
“direito”, o conceito de “um governo de leis, e não de homens”.
Qual seria o método adequado de custear as despesas do governo numa sociedade livre?
Numa sociedade livre, a taxação—ou, para ser mais exato, o pagamento pelos serviços
governamentais—seria voluntária. Como os serviços inerentes a um governo—a polícia,
as forças armadas, os tribunais—são necessários para os indivíduos e afetam
diretamente os seus interesses, eles deveriam estar dispostos a pagar pelos serviços,
assim como pagam por um seguro.
Todo tipo de bônus social ou de benefício gratuito só é possível numa sociedade livre e
é adequado enquanto não implicar em sacrifício. Nesse tipo de sociedade, não haveria a
possibilidade legal de qualquer “redistribuição de riqueza”, quer para o sustento
imerecido de alguns pelo trabalho forçado e rendimento extorquido de outros, quer para
a exploração dos que estão aptos a pagar os custos e manter uma sociedade civilizada
em favor daqueles que são incapazes ou relutantes em pagar o custo de manutenção de
sua própria existência.
Segundo a história, alguns charlatões vendem roupas inexistentes ao rei, afirmando que
a beleza incomum destas torna-as invisíveis aos moralmente depravados de coração.
Compradas as roupas, o rei prefere caminhar nu pela rua, a arriscar-se a incorrer em
condenação moral por dois vigaristas. O povo, presa da mesma auto-incerteza moral,
aplaude o rei—até que uma criança grita que o Rei está nu.
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egoismo/view