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OBRAS COMPLETAS

DE

RUI BARBOSA
VOL. XXVII. 1900
T O M O li

TRABALHOS JURÍDICOS

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E SAÚDE


RIO DE JANEIRO
OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA
VOLUME XXVII TOMO II
Foram tirados cem exemplares cm papel bouffant
especial, e dois mil e novecentos em papel vergé,
do presente volume das Obras Completas de Rui
Barbosa, mandadas publicar, sob os auspícios do
Governo Federal, pelo Ministro Gustavo Capancma,
dentro do plano aprovado pelo decreto-lei n. 3.668,
de 30 de setembro de 1941, baixado pelo Presidente
Gttúlio Vargas, e de acordo c com o decreto n,"21.182,
de 27 de maio de 1946, promulgado pelo Presidente
Eurico Gaspar Dulra c referendado pelo Ministro
Ernesto de Sousa Campos
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Rui BARBOSA
Desenho de Amara — publicado no jornal Saudades, de Buenos Aires. — (Número único
de 7 de novembro. 1900)
1

OBRAS COMPLETAS
DE

RUI BARBOSA
VOL. XXVII. 1900
T O M O II

TRABALHOS JURÍDICOS

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E SAÚDE


RIO DE JANEIRO — 1950
I <

PREFÁCIO E REVISÃO

DE

JOSÉ CÂMARA
Advogado no Distr.to Federal
PREFÁCIO

Enfeixam-se no presente tomo. o segundo na série dos


Trabalhos Jurídicos do ano de 1900, parte integrante do Vo-
lume XXVII. alguns estudos de pura indagação, circuns-
tância, aliás, rara na vida intelectual de Rui Barbosa, ao lado
de outros de caráter eminentemente prático, sendo consultivos
os demais. A pequena extensão a que se limita o Autor não
exclui decerto a repercussão que assumiram ou que teriam de
assumir várias das produções ora reunidas em livro, das
quais algumas inteiramente inéditas.
Forçoso é aqui assinalar o estudo crítico acerca da insti-
tuição do júri. problema cuja atualidade constitui então, como
hoje, a vex ata quaestio em que se agrupam as duas opiniões
dos doutos : apologistas, uns; intransigentes adversários do
sistema, outros.
O conjunto ora impresso traduz um aspecto curioso para
quem estude a vida do jurisconsulto. Ê que, até então, con-
sistindo sua atuação profissional num gênero de atividades
mais apropriado ao advogado militante, qual fosse o seu exer-
cício no próprio foro cm defesa de causas que se tornariam
célebres, teses que passariam ao domínio da legislação posi-
tiva ou da jurisprudência pacífica, como um legado à posteri-
dade, daqui em diante cada vez mais restrita se torna a sua
participação nos embates cujo cenário é o pretório. o tribunal.
Em verdade, a partir dessa quadra, o jurisconsulto vai assu-
mindo o lugar que lhe estava reservado, até então exercido
cumulativamente com o do advogado. Ê certo que a sua com-
batividade no campo juvídico-doutrinúrio somente o abando-
nará à véspera da morte, mas é evidente que dia a dia mais
X

distanciada vai sendo a sua interferência nos trabalhos dos


auditórios do forum, ao ponto de limitar-se quase exclusiva-
mente às [amosas questões de habeas-corpus em favor de *
presos políticos, para em seguida deixar ao cultor da juris-
prudência o trabalho do jurisconsulto no estrito sentido da
expressão.
* * *

Em prosseguimento dos trabalhos já estampados no


tomo anterior, referente ao ano de 1900, e de acordo com o
que dispõe o decreto-lei 3.668, de 30 de setembro de 1941,
saem aqui publicados doze opúsculos, distribuídos na série,
sem prejuízo da unidade técnica que os caracteriza.
No concernente às fontes que forneceram os textos ora
impressos, são análogos as circunstâncias a assinalar, em re-
lação aos demais já preparados ou impressos.
Duas são as ordens de procedência dos escritos repro-
duzidos : inéditos, uns; já divulgados, outros. No primeiro
grupo, temos a salientar o estudo crítico acerca do tribunal
do júri. Tudo indica que se tratava de matéria destinada a
sair em A Imprensa, ou até mesmo em avulso, visto como ha-
via certo encadeamento no trabalho interrompido, sem au-
sência da unidade adequada ao material destinado a um livro
com feição própria. Fortalece-nos a suposição, a circunstância
de não serem estampados no matutino carioca os capítulos in-
tegrantes do estudo, à proporção que iam sendo definitiva-
mente redigidos pelo Autor, como sempre ocorria com arti-
gos publicados em série, quando pertinentes a um gênero,
tema, ou assunto. Como quer que seja, o estudo ficara ina-
cabado, e perdeu-se assim um ensejo de possuir a ciência do
direito mais essa jóia com que teria de ficar enriquecido o
nosso patrimônio cultural.
Outro opúsculo possivelmente inédito é de número III,
concernente a uma concessão feita pelo governo do Estado
do Amazonas a certa empresa de navegação, e posteriormente
revogada pelo chefe do poder executivo. Serviu de base o
XI

manuscrito de próprio punho do Conselheiro Rui Barbosa,


conservado no seu arquivo.
O opúsculo II foi copiado de um avulso pertencente à
coleção do Prof. Homero Pires — Recurso Extraordinário
n9 406 (Rio, 1906). Abandonamos a idéia de conservar o tí-
tulo do folheto originário no opúsculo. em virtude de não se
referir o parecer de Rui Barbosa àquele remédio judiciário,
mas tão somente a oufro aspecto da espécie, não traduzindo,
assim, o conjunto de idéias de seu conteúdo a noção de tal
recurso.
O parecer a respeito de interpretação de cláusula con-
tratual, contida no contrato celebrado entre a Prefeitura do
Distrito Federal e uma firma desta Capital para fornecimento
de carnes verdes, suscitado por uma consulta do advogado
Ulisses Viana, constitui o opúsculo de número IV. Serviu
para a presente edição a cópia do parecer conservada no ar-
quivo da Casa de Rui Barbosa.
Nos a pedidos do Jornal do Comércio de 19 de feve-
reiro de 1900. saiu o parecer referente à ineficácia dos atos
praticados por sócio, após sua exclusão da sociedade comer-
cial; esse texto serviu de fonte do opúsculo V.
O de número VI, concernente à Companhia Luz Esteá-
rica, foi igualmente copiado de trabalho já publicado, incluído
num avulso impresso na Tipografia do Jornal do Comércio
da Capital Federal, onde foi inserido nas páginas 28 a 32.
inclusive.
O parecer a respeito de letra falsa (opúsculo VII) ha-
via sido impresso com um trabalho do advogado Alfredo
Pujol (S. Pauto, 1901), (1) reportando-se ao litígio em que
era autor o Banco de São Paulo, e réu, Antônio de Barros
Poyares. Foi incluído entre as alegações do réu pelo advogado
Pujol, seu patrono.
Outro parecer acerca de uma questão da Comandita Ro-
bertson, havia sido igualmente editado em S. Paulo, com uma

{1 ) Transcrito na Gazeta Jurídica, de S. Paulo, Vol. XXV,


págs. 29ó a 311.
XII

série de documentos atinentes ao conflito em que era parte


essa sociedade, no qual ocupava as páginas 68 a 74, (Opús­
culo VIII) sendo esse o texto utilizado (2).
As razões de apelação motivadas pelo recurso que ori­
ginou no Supremo Tribunal Federal a Apelação Cível 570,
tiveram uma única edição, na época em que era discutida a
lide. O texto ora reproduzido, teve como fonte o avulso im­
presso na Tipografia do Jornal do Comércio (Rio. 1903),
sendo acrescido, na atual edição, do título e subtítulo indica­
dos pelo conteúdo da matéria debatida. Constitui o opúsculo
IX. trasladado do exemplar da Casa de Rui Barbosa.
O trabalho concernente à responsabilidade civil do Es­
tado foi extraído do fac­simile saído na Revista dos Tribu­
nais de São Paulo. (Vol. 133. págs. 438 a 458); excetuada
essa publicação, ao que pressupomos, sai pela primeira vez
impresso. Apuramos referir­se ao caso do empastelamento
do O Comércio de São Paulo, órgão da imprensa bandeirante
dirigido por Afonso Arinos e Eduardo Prado, empasteiado
de 7 para 8 de março de 1897, e a que se aludiu no Vol. XXV,
tomo V, opúsculo V, das OBRAS COMPLETAS, pertinente a
1898.
Com referência à mudança da sede constitucional da
Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro ■— ma­
téria do opúsculo XI — foi o parecer que o constitui copiado
de original do próprio punho do Autor. Peça. ao que se pre­
sume, inteiramente inédita, pertence hoje ao arquivo do emi­
nente sociólogo Alberto Torres, tendo sido gentilmente ce­'
dido pela sua digna família cópia fotostática à Casa de Rui
Barbosa.
Finalmente, sai estampada, pela primeira vez em im­
presso, o opúsculo contendo os arrazoados atinentes à ação
ordinária intentada pelo Almirante Elisiário José Barbosa e
outros, todos ministros do Supremo Tribunal M ilitar. Tese

(2) Também estampado na Gazeta Jurídica, vol. XXIII, págs. 20


e segs.
XIII

ainda não suficientemente ventilada entre nós, qual fosse a


da irrcdutibilidadc de vencimentos dos magistrados, conser-
vou-se, não obstante, inédita até hoje. Dos autos da apelação
cível n" 1.063, hoje arquivados no Supremo Tribunal Federal,
foram copiados os escritos incluídos entre suas peças, sendo
os fragmentos destinados a um provável memorial endere-
çado à 1* instância, conservados no arquivo da Casa de Rui
Barbosa, cujo texto serviu de fonte ao que ora vai repro-
duzido.
• * *

Inserimos, como documentação, algumas peças que sus-


citaram os escritos aqui reunidos, a fim de que se tenha, tanto
quanto possível, uma visão mais nítida dos motivos que oca-
sionaram a sua redação. A variedade de assuntos discutidos,
u natureza sui generis de cada um, não permitiria um critério
generalizado em tal sentido, nem uma completa simetria no
seu tratamento, pois, como já em outros pontos se tem assina-
lado, um dos traços distintivos da produção intelectual do
Autor, cm grande parte, c o seu caráter fragmentário, dis-
perso .
Assim sendo, tentamos preceder a maioria dos opúsculos
de breves notas que de algum modo elucidem a sua razão de
ser. os móveis que os originaram. Nem sempre é praticável
esse proceder, visto como a ausência de informes precisos, a
falta de roteiros seguros, é muitas vezes questão das mais
problemáticas no Brasil, mormente atendendo-se a que a in-
diferença e a má vontade de alguns arquivos, cartórios e bi-
bliotecas de nosso País, assumindo dia a dia um feito clás-
sico, por assim dizer, são mais nocivas que a hostilidade ma-
nifesta. Estes, afora duas ou três exceções — aliás brilhan-
tes nesse particular — constituem um refúgio impenetrável a
quantos desejem pesquisar a verdade na sua fonte pura e
genuína. Em muitos deles jazem comodamente inúmeros au-
tos de processos em que funcionou o Conselheiro Rui Bar-
XIV

bosa, sem que seja possível compulsá-los, nem muito menos


manter com estes qualquer espécie de contacto, direta ou in-
diretamente.

* * *

Na bibliografia organizada, não nos afastamos do mé-


todo anteriormente seguido, agrupando-se tão somente os
verbetes concernentes às obras ou monumentos legislativos
utilizados.
Os opúsculos cujos nomes não constam do levanta-
mento da bibliografia, dispensaram providência dessa ordem,
visto como sua redação não exigiu qualquer subsidio doutri-
nário arrimado nesse gênero de orientação.

* * *

Não podemos assegurar que se ache completa a seqüên-


cia dos trabalhos jurídicos referentes ao ano de 1900 ( 3 ) ,
pois muitos outros ainda poderão surgir, tendo, entretanto,
sido reunidos neste e no tomo anterior, o primeiro, todos os
que até hoje foi possível localizar, produzidos naquela
quadra.
* * #

Esperamos do público de nossa Pátria, daqui em diante,


não a costumeira indulgência a que sem dúvida não faremos
jus. mas uma prova de mais dedicação, zelo e carinho dignos
do pensamento do cultor de eternos princípios que norteiam a

(3) Recentemente, nos autos do processo intentado por Joaquim


da Silva Tavares, barão de S. Tecla, contra a Fazenda Nacional, encon-
tramos um instrumento de mandato outorgado ao Conselheiro Rui Bar-
bosa, lavrado em Pelotas a 16 de junho de 1900 (ap. cível n. 632). Não
há vestígio de sua atuação no feito, sendo os arrazoados nele contidos,
quando na suprema instância a lide (fis. 142 a 153). de autoria do
advogado Ulisses de Carvalho Soares Brandão.
XV

Sociedade, no sentido de colaborar na realização de empre-


endimento cultural, que é sem dúvida um dos mais significa'
tivos monumentos dos modernos tempos.
As notas precedidas de asterisco são do autor deste Pre-
fácio.
Rio de Janeiro, 30 de novembro de 1946.
JOSÉ CÂMARA
I

A REFORMA DO JÚRI
ESTUDO CRITICO
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<
Manuscrito do trabalho ora publicado (p. 9)
(Arquivo da Casa de Rui Barbosa)
N O T A DO REVISOR

A Constituição de 24 de fevereiro de 1891 conferia im-


plicitamente aos Estados atribuições para decretar as leis
processuais, e bem assim legislar acerca da respectiva orga-
nização judiciária.
A lei n9 10, de 16 de dezembro de 1895, promulgada
pelo Presidente Júlio Prates de Castilhos, chefe do executivo
do Estado do Rio Grande do Sul, regulando a organização
judiciária local, estatuiu princípios que, no entender de al-
guns juristas, feriam claramente a Constituição Federal.
Além de subordinar praticamente o poder judiciário ao exe-
cutivo, abolindo a irremovibilidade dos magistrados e criando
outros casos modernamente incompatíveis com a estrutura da-
quele poder, introduziu sensíveis inovações na constituição e
funcionamento do Tribunal do júri. O número de juizes de
fato foi reduzido a 5 (art. 54); extinguiu-se o sigilo do voto,
prescrevendo-se no art. 65 que as sentenças haviam de ser
proferidas pelo voto a descoberto da maioria; no art. 66, ve-
dou-se a qualquer das partes recusar jurados, facultando-se,
porém, opor suspeição motivada, cuja decisão cabia ao juiz
presidente.
* * *

Na ação penal contra o juiz da comarca do Rio Grande,


bacharel Alcides de Mendonça Lima, e que resultou na sua
condenação pelo Tribunal Superior do Esta,do, à pena de
9 meses de suspensão, assumiu o Conselheiro Rui Barbosa o
patrocínio do réu, quando, em grau de revisão, dependia o
feito do pronunciamento do Supremo Tribunal Federal.
6 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Na defesa de seu constituinte, produziu o Conselheiro


Rui Barbosa um vigoroso estudo (Cfr. O Júri e a Responsa-
bilidade Penal dos Juizes, Rio. 1896; Vol. XXIII. das O. C ) .
tendo a monografia intensa repercussão nos meios forenses e
culturais do País.
Por acórdão de 10 de fevereiro de 1897, resolveu o Su-
premo Tribunal Federal dar provimento ao recurso, para o
fim de absolver o recorrente (Jurisprudência, 1897, págs. 300-
304; O Direito, vol. 73 págs. 140-146). sem, contudo, ter se
manifestado a respeito da inconstitucionalidade da lei n9 10,
vício argüido pelo impetrante (Rev. Crim. n 9 215).
Permanecendo a questão no statu quo ante, ficou ao re-
corrente a liberdade de entender que era inconstitucional o
ato do governo estadual, podendo, assim, deixar de aplicá-lo
aos casos ocorrentes. Sem embargo de expôr-se a um perma-
nente conflito com o Superior Tribunal do Estado, valeu-se
dessa circunstância o magistrado riograndense, fundamen-
tando suas sentenças e despachos nas leis imperiais de 1832
e 1871, sem atender ao disposto no Código Judiciário do
Estado, na parte por êle impugnada. Este comportamento
trouxe ao Bacharel Mendonça Lima outros nove meses de
suspensão, imposta pelo Tribunal local, sob o pretenso funda-
mesto de haver o acusado incorrido no crime de desobediên-
cia (Cód. Penal, art. 226). Daí, novos pedidos de revisão (*)
para que, primeiramente (Revisão crime n. 405), fosse revo-
gada a pena imposta, e, depois (Revisão Crime n. 406), a fim
de que se pronunciasse o Supremo acerca da inconstitucio-
nalidade argüída. Foi esta julgada a 7 de outubro de 1899,
depois de vivo debate, sendo designado o ministro Macedo
Soares relator ad hoc para redigir o acórdão, de acordo com
o vencido. Decidiu a suprema corte reformar o acórdão do
tribunal a quo, para absolver o recorrente, como de fato o

(*) Nâo conseguimos localizar os autos da Rev. cr. 405. Quanto


à de número 406. encontram-se arquivados no Supremo Tribunal Fe-
deral. O pedido foi formulado pelo próprio suplicante, escrito com sua
íetra, e por êle assinado, nesta Capital, a 5 de abril de 1899 (fis. 2 a
5v.).
TRABALHOS JURÍDICOS 7

absolveu, desprezando, todavia, a questão da inconstituciona-


lidade, contra os votos dos ministros Pisa e Almeida, Pereira
Franco e Gonçalves de Carvalho, que a declaravam como
tal.
O ministro Macedo Soares, em longo voto aditivo, adu-
ziu suas convicções próprias, concernentes à instituição do
júri (Jurisp., 1899, págs. 353-58), as quais iam além das ra-
zões do «acórdão que foi obrigado a lavrar, não conforme o
seu modo de ver, mas de acordo com os votos emitidos pela
maioria do Tribunal».
* * *

Na sessão da Câmara dos Deputados de 26 de junho de


1900, apresentou o deputado Pinto da Rocha com outros
uma proposição legislativa, que, julgada objeto de delibera-
ção, foi convertida no projeto 42 de 1900, sendo encaminhado
à Comissão de Constituição, Legislação e Justiça. Mantinha
o projeto a instituição do júri com a competência a que então
lhe cabia para julgamento dos crimes sujeitos à jurisdição
federal e à justiça local do Distrito Federal, modificando sua
composição e funcionamento. O texto era uma reprodução
^uase literal do diploma de 1895, e da lei estadual n9 24, de
15 de agosto de 1898, que a consolidara no seu contexto. A
27 de julho foi lido e mandado a imprimir o parecer da Co-
missão, não passando dessa fase o seu andamento.
Os artigos de Rui Barbosa, agora pela primeira vez im-
pressos, destinavam-se a combater o projeto, tendo ficado
inacabado o trabalho de crítica a que se entregara o Autor.
Tudo indica que o congelamento a que foi predestinada
a proposição, tenha contribuído para que fosse interrompido
o trabalho de indagação jurídico-sociológica a que se dedi-
cara o Conselheiro Rui Barbosa a propósito da secular ins-
tituição.


I
A O R I G E M DA R E F O R M A

A abolição completa da liberdade, que, por sin-


tomas cada vez mais graves, parece, já agora defini-
tivamente, destinada a ser o último termo da repú-
blica entre nós, vai dar um passo decisivo com o pro-
jeto eliminativo do júri. A adesão do parecer da co-
missão competente na câmara dos deputados, em
cujas conclusões radicais fraternizam membros dos
vários matizes políticos naquela assembléia, prejulga
o êxito da tentativa iliberal no próximo debate. Den-
tre nove membros, filiados a tendências diversas na-
quela casa, não houve um, que ousasse opor decidi-
damente o seu veto à reação rio-grandense. triun-
fante nessa medida. Nem mesmo o dr. J. SEABRA,
cujo braço estávamos habituados a ver erguer-se cla-
reando com a almenara vigilante às ameias da velha
fortaleza ameaçada por moiros à costa. Até ele, em
vez de assinalar com um não desenganado o abismo,
que. até há pouco, dividia, neste regimen o campo
constitucional do campo reacionário, se limitou, num
simples "com restrições", a ressalvar apenas uma di-
vergência acidental.
Entretanto se as origens caracterizam os fatos
sociais nenhum produto político dos nossos tempos
estava previamente mais bem definido que esse fruta
da madureza da evolução na influência rio-grandense.
Uma constituição modelada pelo exemplar da que.
10 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

em 1793, nasceu e morreu na Convenção Francesa,


condenada no berço pela sua impraticabilidade, pu-
sera, desde o começo do reinado castilhista. aquele
Estado moralmente fora da comunhão republicana
pela mais óbvia incompatibilidade entre as institui-
ções desta e as dele. Ao menos assim se entendia,
não há muitos anos, antes que o período atual con-
graçasse esses antagonismos, na alta imprensa flu-
minense, representada pelo Jornal do Comércio, e,
se nos não enganamos, pela Gazeta, acordes em
denunciar editorialmente na organização constitucio-
nal do Rio Grande do Sul uma enxertia heterogênea
no organismo republicano e com êle em guerra aberta.
Amanhado o terreno por essa magna carta de
ditadura, que, "garantindo aos habitantes do Es-
tado o culto dos mortos", o tem banhado no sangue
•dos vivos, muito antes de o dotar com um código do
processo penal, hoje estabelecido na lei de 15 de
agosto de 1898, compreenderam os donatários da-
quela capitania a urgência, para a sua consolidação
no governo, de varrer, por uma transformação or-
gânica do júri. o obstáculo oposto pelo caráter desse
tribunal às perseguições, de que o absolutismo, au-
tocrático, ou demagógico, se alimenta. Gente de
-ação, desempenada e testa, deu-se pressa em acudir
à necessidade com a lei n.° 10, de 16 de dezembro de
1895, projetada, discutida, votada e promulgada pelo
governador no exercício das funções, ao mesmo
tempo legislativas e executivas, que nele absorve a
constituição Castilhos. a despeito disso constitucio-
nalíssima e republicaníssima, no soberano sentir do
Supremo Tribunal Federal.
Pois bem : desse manancial é que os oito depu-
tados rio-grandenses. signatários do projeto de 21
de junho deste ano, foram beber, copiando, com fi-
lial amor pelo modelo, as inovações opressivas, cuja
TRABALHOS JURÍDICOS 11

inconstitucionalidade comparecia, há três anos.


acusada, perante os areopagitas da república, em
risco de cair. a um sopro deles, no próprio Estado
onde se implantara, e hoje está na iminência de se
estender vitoriosa ao país todo.
Três são os golpes mortais desfechados por
essa revolução judiciária na entidade tradicional do
júri.
Amesquinha-se de doze a cinco o número dos
j-urados.
Abolem-se as recusações peremptórias.
Substitui-se, no voto do conselho, o sigilo abso-
luto pela absoluta publicidade.
Mutilado, abastardado, sitiado assim, o velho
íribunal da consciência dos povos livres, abre por
todos os lados as suas portas ao poder. A concepção
rio-grandense não podia ser mais sábia no seu
terrível ponto de vista. Mas, se o congresso nacional
abraçar a transplantação, que ora se lhe propõe, desse
expediente criminoso, cumpre que tenha a coragem
de render ao vencedor as honras do triunfo, assina-
lar a filiação política dessa mudança fundamental nas
garantias da liberdade, e consagrar, por uma candi-
datura que francamente a exprima, a submissão geral
do Brasil ao castilhismo. Êle tem o direito de reivin-
dicar essas conseqüências lógicas de uma conquista,
cuja rapidez há de abismar os próprios triunfadores.
Ü seu a seu dono. O país não deve ser enga-
nado quanto às simpatias, a que obedecerem os seus
legisladores. Nenhuma nacionalidade livre, ne-
nhuma, nos três continentes, conhece esse tribunal,
que uma dissimulação reprovada lhe pretende em-
butir sob o nome de júri. A criatura é filha legitima
do ditador rio-grandense. Ninguém lhe pode roubar
12 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

a paternidade, que deve ficar solenemente registrada


para identificação da prole e ciência dos interessa-
dos. Dos tímidos copistas, sob cuja capa a novidade
nos surde agora em nome da justiça enxovalhada
por fórmulas caducas, as duas leis castilhistas estão
reclamando os direitos da patente violada, na comis-
são, por um silêncio fraudulento.
N a lei rio-grandense n.° 10, de 16 de dezem-
bro de 1895, teve a sua nascença a originalidade
agora para aqui aforçuradamente importada.
Foi ela quem decretou, no art. 54 :
" O tribunal do júri compor-se-á de cinco juizes
de fato".
Foi ela quem prescreveu, no art. 65, § 1.° :
"As sentenças do júri serão proferidas, pelo
voto a descoberta da maioria".
Foi ela quem estatuiu, no art. 66 :
"Os jurados não podem ser recusados; à me-
dida, porém, que forem sorteados, poderão as partes
opor-lhes suspeiçao motivada, que será decidida pelo
presidente do tribunal".
Foi ela quem à resultante desses três aleijoes no
antigo sistema descobriu traças possíveis de im-
por o ( * )
Veio depois a lei n.° 24 de 15 de agosto de
1898, e* consolidando as provisões da lei especial,
que a precedera, mandou, nos arts. 71, 72, 73, 417,
418 e 440, o seguinte :
"As partes podem opor suspeiçao motivada, à
medida que os jurados forem sendo sorteados".
"A suspeiçao oposta deve fundar-se em qual'
quer espécie de prova, uma vez que possa ser de
pronto apreciada".
(*) O período ficou inacabado. Dcixamo-Io conforme está no
manuscrito. — N. R.
TRABALHOS JURÍDICOS 13

" O presidente do júri decide de plano a sus-


peição oposta, depois de ouvir sumariamente as ra-
zões do récusante e do recusado".
"Recolhidas as testemunhas, procede-se à uni-
ficação das cédulas dos quinze jurados.
"Concluído o exame, tem lugar o sorteio dos
cinco juizes de fato, extraindo um menor as cédulas
da urna".
"A medida que os jurados são sorteados, po-
dem as partes opor-lhes suspeição motivada, na
forma dos arts. 71 e seguintes".
"Os juizes de fato emitem seus votos orais pelo
modo estatuído no art. 65 da lei de organização ju-
diciária". (A lei da organização judiciária vem a ser
a lei n.° 10, de 16 de dezembro de 1895, com que já
nos ocupamos, ficando acima transcrito o seu art. 65,
o qual adota para o júri o escrutínio a descoberto.)
Desses textos se extraíram fielmente os arts. 3.°,
4.°, e 5.° do projeto, que formam a sua estrutura, res-
tando apenas o primeiro, onde se consigna a falsa
declaração de manter-se o júri, extinto nos seguintes,
e o segundo, onde a servil reprodução do original
rio-grandense, ainda nas partes accessórias da re-
forma, se evidenciará por este cotejo :

PROJ. N? 4 2 , DE 1900 L. RIO-GR., DE 1898

Para composição do tri- £rt 394 p a r a 0 s o r t e io


bunal do júri serão transcri- ,
1
transcrevem-se os nomes da
tos da lista geral dos jura-
j « j . t .„ „A lista geral dos jurados em
a
dos os nomes destes em ce- '
dulas que, depois de confe- pequenas cédulas de igual ta-
ridas pelo juiz a quem com- manho. as quais, depois de
pete a presidência do tribu- conferidas, são lançadas em
M OBRAS C O M P L E T A S DE RU! BARBOSA

nal, serão lançadas em uma uma urna. Desta são extraí-


urna. Desta deverão ser ex- das por um menor 15 cédu-
traídas. por um menor 15 l a s , que. depois de lidas, são
cédulas, que, depois de lidas,
. tA_ * depositadas em urna sepa-
serao depositadas em outra
rada c fechada
urna própria. '
Art 395 Do
sortcio la
Parágrafo único. Deste ' ' '
sorteio lavrar-se-á um termo, vrar-se-á termo com a desig-
com a designação dos quinze nação dos nomes dos quinze
jurados sorteados, no mesmo jurados sorteados no mesmo
livro de lançamento da lista livro de lançamento da lista
geral. geral dos jurados.

Já ninguém, portanto, se iludirá com a fábrica,


ainda que a veniaga timidamente oculte, no rótulo, a
marca, de que se devia ensoberbecer. Quem poderia
desconhecer o valor desta consideração preliminar ?
Há muito pouco tempo ainda, a república via no es-
pírito das instituições rio-grandenses o mais pro-
fundo antagonismo com o do nosso direito constitu-
cional, e, sobre o ter de olho, para que dali se não
propagasse, ali mesmo estudava os meios de coarc-
tá-lo, invocando a prerrogativa federal da interven-
ção. Hoje a seita filosófica organizada naquele Es-
tado em governo regular transborda as fronteiras lo-
cais, invade a União, e, apoderando-se do congresso
nacional, encontra desbravadas ao seu ingressa
franco as resistências antigas.
II

O PARECER
Corruptissimu republico, plurimac Icges

Quanto mais corrompida a república, mais leis.


Já vistes quadro mais solene dessa verdade que o
Brasil dos nossos dias ? A nação abandonou os co-
mícios. As galerias desertas das duas casas do con-
gresso atestam o desprezo em que o tem a própria ca-
pital, onde funciona. As bancadas quase ermas nas
duas câmaras entremostram, de dia em dia mais cla-
ramente, a consciência, nele crescente, da sua inuti-
lidade. Proposto pelos governadores ao presidente
da república, mediante as atas eleitorais, apurado
pelo presidente da república na verificação de po-
deres, ao presidente da república humildemente sub-
misso nas mínimas a cobrir o presidente da república
simplesmente como um pobre guarda-chuva em bar-
batanas, abnegou nas mãos do executivo até às apa-
rências do poder. Não goza, nem no seu próprio re-
cinto, do respeito dos seus membros. Da tribuna um
dia um dêles, à mão tente, os argui de "papa-subsí-
dios" e "dependentes da comiseração dos ministros".
Acrescenta : "Esta é a verdade, que está na cons-
ciência de todos, e eu sou, neste momento, o eco da
câmara, que não tem a coragem de dizer, mas não
deixa de me aprovar, incapaz de protestar contra as
minhas proposições aqui". E a câmara não protesta,
não tem um não apoiado ao baldão, antes o subs-
f

16 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

creve. envolvendo, no fim da oração, em muito bens


o orador. Outro, d o u t r a vez, por ocasião dos escân-
dalos de servilismo notórios nas depurações orde-
nadas pelo governo, caindo sobre os colegas confor-
mados numa aluvião de lava impetuosa, qualificava
a política reinante como um destroço de hospital em
supuração por todos os poros. E, esmagados pela
torrente da indignação, os ofendidos ou emudecem,
ou aplaudem.
Não era natural que uma instituição moralmente
arruinada assim tivesse, ao menos, o critério de não
se aventurar a grandes cavaladas pelo domínio das
tradições brasileiras ? que, legisladora por um man-
dato nas próprias mensagens presidenciais indigi-
tado como falso, não agravasse a usurpação, em-
preendendo reformas sobre reformas ? que, cons-
ciente da sua usurpação, de sua impopularidade e
da sua desonra, se fosse limitando à tarefa ordinária,
sem se meter a regeneradora de alheias mazelas an-
tes de encetada a regeneração de si mesma ? que,
reduzida a um zero à esquerda do poder administra-
tivo, se contentasse de servi-lo, abstendo-se de le-
var, nas horas vagas do seu cativeiro, a assolação às
velhas garantias da nossa liberdade ?
É uma instituição septuagenária no Brasil. Pas-
sando por modificações mais ou menos acidentadas
em 1841, 1842, 1850. 1871 e 1890. atravessou todas
as crises, todas as revoluções, todas as reações do
império ilesa nessas três condições de força, inde-
pendência e moralidade : o número, a recusação pe-
remptória e o sigilo do voto, sem as quais não houve,
não há, não pode haver júri. A subversão da monar-
quia respeitou-o. A ditadura de 1889 respeitou-o, e
tributou-lhe altas homenagens. A ditadura militar
não lhe ousou tocar. Mas apenas raiou o governo
civil, aclamado ao nascer como a aurora das reivin-
TRABALHOS JURÍDICOS 17

dicações constitucionais, o despotismo dos casacas,


verdadeira invasão geral do cupim na fábrica secular
desta nacionalidade, começou a descobrir, nesse par-
ticular, a sua antipatia às venerandas formas de um
passado incomensuràvelmente superior aos medío-
cres, estéreis e corruptos dias de hoje. A golpes su-
cessivos foram cerceando a competência ao velho
tribunal popular; até que. verificado o seu abandono
pelos guardas que a constituição lhe pusera, asso-
ciado na cumplicidade o supremo tribunal federal,
ablaqueada a árvore de redor no solo da sua autori-
dade, lhe levam agora ao tronco o machado reacio-
nário.
Noutros tempos as reformas, que entendiam
com o travamento protetor do direito individual, com
o regimen da justiça, com a ordem dos tribunais, en-
travam no parlamento sob a responsabilidade dos
governos, estribadas em grandes partidos, aparelha-
das em longas campanhas intelectuais, envolvidas
no prestígio dos grandes movimentos da opinião.
Eram semeadas, cultivadas, maturadas, reclamadas,
esperadas, conquistadas. Hoje surdem como cogu-
melos no terrão insalubre. Basta que entre a disper-
são geral das vontades e das crenças o grupo dos
projetistas se apoie em um núcleo de coragens edu-
cadas no espírito de seita. Do projeto ao parecer não
vai distância grande. O da supressão indireta do
júri não necessitou de mais de um mês, para captar
unanimemente a comissão da câmara dos deputados.
Nunca houve catecúmenos mais extremados no
culto do novo batismo. Juram pelos novos altares
como os únicos sagrados ao deus verdadeiro. Não
há meios termos, dúvidas, ou questões, aos seus
olhos. Falam como iluminados. Cada uma de suas
18 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

proposições é um oráculo. Cada uma das suas idéias,


um dogma. Cada um dos seus achados, um artigo
de fé.
Há por aí quem veja no invento rio-grandense
um atentado à constituição ? Há. Desse número so-
mos nós, que até hoje temos encontrado quem. por
isso, nos descomponha, ou menospreze, mas ainda
não achamos quem nos refutasse. Pois, senhores, é
necessário tresler, para irrogar ao projeto calúnia tão
odiosa : êle "não fere a constituição da república
nem de leve". Isso nem se debate, nem se contesta,
nem tem que examinar : é questão [ora de dúvida".
Se há quem o contrário diga, anathema sit. Ê
porque "tem o [etichismo das formas". Não há nada
como atordoar assim, de uma esmechada, os fósseis
da nossa laia. Compõe-se o júri de doze membros.
Redú-lo o projeto a menos de metade. Simples mu-
dança de formas. É um tribunal constituído segundo
o princípio da confiança do réu nos seus juizes. Fi-
cará sendo um tribunal de juizes irrecusáveis. Mera
variação de formas. Vota irresponsavelmente, em se-
gredo. Terá de votar publicamente, sob o constran-
gimento das responsabilidades. E é apenas a forma o
que se altera.
A cada período, nesse parecer, tomba decepada
uma estultície dos caducos idolatras do júri no seu
tipo universal. Se de doze o projeto baixa o número
dos jurados a cinco, facilitando por esse modo o
acesso à corrupção e ao medo, na maneira ordinária
de encarar as fraquezas humanas, o projeto nessa
alteração não vê senão vantagens : não só a de
apressar as reuniões do tribunal, como a de o tor-
nar "mais isento de paixões". Era um capítulo de
psicologia, que desejáramos ver desenvolvido. Mas
a comissão fala por máximas do marquês de Maricá-
TRABALHOS JURÍDICOS 19

Acaba o projeto com as recusações peremptó-


rias. Ora em todos os países do mundo as recusa-
ções peremptórias estão associadas ao júri, e todos
os autores que dessa instituição escreveram com au-
toridade, sustentam que esse elemento é da essência,
é da substância dela. Pois contra o mundo inteiro
quem tem razão, é o castilhismo. Nem a comissão
havia mister outro evanqelho, para deixar cair esta
bula : "Não resta dúvida que deste modo a forma-
ção do tribunal dá-se em condições de muito mais
elevada e nobre compreensão dos seus dever es".
Claro, claro como a luz meridiana. Quem duvidará,
com efeito, de que nos sintamos muito mais escuda-
dos contra a injustiça nesse tribunal, quando, com-
posto de inimigos nossos, instantaneamente designa-
dos pela sorte, não os poderemos recusar sem prova
imediata e concludente ? Há nada mais fácil que do-
cumentar esses antagonismos pessoais, e trazer, para
todos os sorteados possíveis, na algibeira, o do-
cumento comprobante ?
Já se vê que do sigilo no voto não podia a co-
missão falar com menos desprezo e ênfase menos
soberano. Para ela "as vantagens do escrutínio se-
creto são desconhecidas". Por excesso de condescen-
dência, admitirá que sejam "muito duvidosas". Mas.
como seria vergonha titubear em matéria desta sim-
plicidade, aí vai o cânon da santa igreja : " O pro-
jeto, estabelecendo a mais completa publicidade, in-
questionàvelmente dá outra importância e valor às
decisões do tribunal". Mandemos imprimir este syl-
labus em todas as línguas, para que as várias gentes
da terra em comércio com essa instituição fiquem
certas agora de que indubitavelmente até hoje se es-
picharam. Se há uma noção atualmente rudimentar,
inconcussa, axiomática, assim em matéria judiciária,
como em matéria eleitoral, é a superioridade do es-
20 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

crutínio secreto. O escrutínio público teve o seu


tempo. Mas presentemente as idéias, que o susten-
tavam, rescendem a mofo. Todo o universo liberal,
em nossos dias, reconhece no voto a descoberto um
instrumento de compressão e imoralidade. Mas totus
orbs stultizat. Onde está a lei e os profetas é com o
papa de Porto Alegre.
Sólidas são as premissas : a conclusão com elas
se devia parecer. Abracem esse melhoramento, e três
votos de facção, insuscetíveis da prova de inimizade
e sujeitos pelo escrutínio descoberto à inspeção do
poder, serão bastantes para celar com os sacramen-
tos da justiça as mais atrozes perseguições dos par-
tidos. Esse, na opinião dos senhores comissários da-
quela câmara legislativa, o júri nobilitado e reabili'
tado. Por quê desonrar assim o nome a uma institui-
ção venerável ? Não seria melhor terem a coragem
do seu crime, e francamente declararem incompatí-
vel essa honrada forma liberal com o temperamento
de uma república envenenada pela demagogia e pela
ditadura ?
Ill
O ARESTO

Na doutrina de onde emana o projeto reforma-


tório do júri trabalham por se acomodar, como gatos
e cães no mesmo saco, duas aspirações irreconciliá-
veis e diametralmente opostas : a que arma à rege-
neração do júri e a que propugna a sua extinção. De
mãos dadas os dois ideais contraditórios tem cada
qual os seus órgãos solenes : um no sr. JÚLIO DE C A S -
TILHOS; outro, em GAROFALO e FERRI, por êle mesmo
invocados. Defendendo nessa parte a organização
judiciária do seu Estado contra as emendas a ela
propostas, atribui o presidente leqislador à sua re-
forma o intuito de "corrigir os defeitos do júri. para
melhor o conservar". Não o animam "preocupações
escolásticas". O que o está o ditador rio-grandense,
é "imbuído unicamente no pensamento de concorrer
para a regeneração de uma instituição decadente".
Rebatendo a suspeita dos que lhe assacam "o pen-
samento velado de ferir de morte o júri", atesta que
"soerguê-lo do seu abatimento atual é o único obie-
tivo" da medida vencedora no Rio Grande. Mas,
justos céus ! bem se diz que o demo tem uma capa e
um chocalho. A apologia do júri CASTILHOS. nas
próprias razões oficiais do seu criador, tem explicita-
mente a sua base científica na sobreexcelência da
"nova escola penal": e esta (é êle mesmo quem o
escreve, citando a GAROFALO) esta escola, "apli-
22 OBRAS COMPLETAS DE RUI BAREOSA

cando o método positivo às investigações criminais,


tem chegado à conclusão de que é necessária a elimi-
nação do júri, em nome da defesa social, já que, em
vez de ser um fator de repressão, tem sido um ele-
mento protetor do crime". (Lei n.° 10. de 16 de de-
zembro de 1895. Organização judiciária. Estado do
R. G. do Sul. Ed. ofic. 1895. Pág. 47) Ao que acres-
centa o estadista do positivismo brasileiro as pala-
vras de FERRI : " O júri é uma instituição regressiva,
segundo os dados da história e da sociologia; por-
que representa a fase medieva e instintiva da justiça
penal".
Na sentença do supremo tribunal federal, a cujo
abrigo vão encontrar abicheiro agora os promotores
do novo atentado à constituição republicana, lado a
lado se acamam igualmente pés contra cabeça, en
tête-bêche, as duas opiniões em antagonismo : uma
com a maioria, desvelada pela estabilidade do júri,
para o qual, na sua estimativa, as alterações de pro-
veniência castiihista "são melhoramentos, com que o
legislador estadual do Rio Grande do Sul entendeu
minorar os males da instituição criticada"; outra com
o sr. MACEDO SOARES, em cujo sentir, ali expresso,
"o júri deve ser abolido : reclamam-no a justiça, a
sociedade, o bom senso, a gravidade das instituições
nacionais".
Como esta espécie de xipofagia pode caber num
julgado e numa reforma, não sabemos. Entre os dois
lados do monstro, porém, o que nos parece indubi-
tável, é tocar a vantagem da franqueza ao represen-
tado no acórdão por esse voto radical. Como é que
amigos leais do júri, empenhados na reconstituição
do seu crédito, na avigoração das suas forças, na
consolidação de sua saúde, na dilatação da sua exis-
tência, podem abraçar confiantes como a terapêutica
TRABALHOS JURÍDICOS 23

eficaz para esse desideratum ( * ) um gênero de me-


dicina acolhido, ao mesmo tempo, com ardor pelos
apologistas confessos do extermínio dessa institui-
ção ? Não percebemos. Como é que entusiastas pro-
fessos da abolição do júri admitem e subscrevem ex-
pedientes gabados e perfilhados entre espíritos que
se supõem seus amigos ? Isso entendamos melhor.
Todos os radicalismos inteligentes aceitam com re-
conhecimento as concessões parciais obtidas em sa-
crifício gradual de uma instituição à imprevidência,
ou à insinceridade dos seus adeptos, uns assustadi-
ços. outros desleais. Na sentença bifronte do su-
premo tribunal federal, redigida por um apóstolo ( * * )
da extinção do júri, a face da verdade, é a que o seu
voto nos apresenta. A mão do relator escolhido ad
hoc, depois de preconizar na transmutação rio-gran-
dense do júri uma providência benfazeja à sua dura-
bilidade, não se contém, e, desafogando a consciên-
cia, registra, em adendo à sua assinatura, a veemên-
cia do seu empenho na eliminação imediata dessa
decrépita velharia. Pode haver dúvida ainda que esta
reforma não é um ato conservatório da instituição,
mas a propedêutica do sistema eliminativo ? que o
gume do aço está de veras no raizame da velha
planta, substituído apenas, contra o risco do escân-
dalo, o machado pela enxó, o serrote violento pelo
desbaste cauteloso ?
Não nos deteremos agora com os erros mate-
riais de fato contidos nas alegações do respeitável
magistrado, cujo horror ao júri fêz daquele ato um
libelo contra uma das instituições constitucionais mais
solenemente consagradas. Ao que pretende o hon-
rado julgador "na Itália o júri está desde muito con-
(*) O grifo c do revisor.
( • * ) Macedo Soares.
24 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

denado" e "destinado a desaparecer em breve tempo"


Hoje "nem mesmo para os crimes políticos, nos quais
o admitiam alguns penologistas, mais timoratos em
romper com as tradições, e como meio de transação,
nem ainda aí o suportam hoje os espíritos mais re-
fletidos, os escritores mais conscienciosos". Verda-
deira só poderia ser a última destas duas proposi-
ções, se. na estimativa desse jurista, a penologia mo-
derna tem por confins a chamada nova escola de an-
tropologia criminal, e se fora do redil onde FERRI,
GAROFALO e LOMBROSO pastoreiam, não há escrito-
res consciendosos. não há espíritos reflexivos, não
há criminalistas de autoridade na ciência moderna.
Quanto à outra sentença, fulminada com a mesma
ênfase, de que o júri deu o cacho na Italia, e ali está
enchendo os últimos dias. não seria difícil mostrar o
contrário com os mais eminentes documentos da lite-
ratura iurídica e judiciária daquele país. com as opi-
niões do magistério, da magistratura e do periodismo
técnico nesta especialidade. Isso terá, porém, a sua
vez em ensejo apropriado, no curso destes estudos.
Por enquanto nos limitaremos a consignar, como
o mais eloqüente elemento na apreciação do espírito
que anima este movimento a respeito do júri. defi-
nindo-o como um movimento contra êle, as palavras
de morte onde o relator do acórdão rasgou os véus
à teoria nele embuçada. As atitudes estremes de re-
folho são sempre dignas de aplauso. Dessa virtude o
erudito julgador soube ser, na espécie, verdadeiro
modelo. Aos seus olhos, o n.° 31 do art. 72. que no
pacto da União, mantém o júri. "fed ob e subrepticia-
mente enxertada na constituição federal". Duvida,
pois. s. exa. da sua força obrigativa. De modo aue,
com alguns empurrões ma's, quando a sua idéia
crescer no areópago republicano como nódoa de
azeite em velho pergaminho, estarão lançados os ali-
TRABALHOS JURÍDICOS 25

cerces judiciais para a reforma vindoira. que acabar


com os derradeiros restos do júri em nome da nossa
lei constitucional, onde o trambolho monárquico en-
trou a furto, de contrabando, por um crime da assem-
bléia constituinte.
Por ora a iniciativa formulada no tabernáculo
da Constituição por um dos seus levitas mais emi-
nentes apenas nos entreabre uma porta. Mas ela fica
apenas entrefechada, e amanhã ninguém sabe até
onde se escancarará, quando nós. quando outros,
quando todos, no desenvolvimento dessas investiga-
ções políticas, nos sentimos atraídos por uma curio-
sidade. Agora autorizada com o mais alto dos exem-
plos a examinar, por um critério semelhante, a com-
petência de certas ousadias ali aventuradas contra a
soberania nacional, de certas temeridades literal-
mente dolosas, como a que despiu do patrimônio das
suas terras a nação brasileira. Mas fique daqui lan-
çado em notas nue não foi o revisionismo quem se
abriu essa estrada.
Mas por entre as surpresas dessa decisão con-
dimentada com especiarias das mais raras não foi
para nós a de menor sabor essa caricatura do anoso
tribunal popular, dantes augusto, e agora exposto
nesta charge judiciária ao riso dos garotos como o
vil escurra dos soberanos da justiça. BORDALO P I -
NHEIRO vestiu a garnacha, para fiqurar em quatro
traços esse bobo constitucional. Vêde-os aos tombos
do desprezo da grande magistratura brasileira o his-
trião judicial na miséria da sua boçalidade : "um tri-
bunal de inconscientes, completamente ignorantes",
que "nem entendem os debates", "nem prestam aten-
ção à leitura" dos autos, e "com uma pravidade cô-
mica resolvem as mais graves questões".
LOMBROSO dirá que o calunga é magistral. M a s
não caberia o retrato, ao menos nalguma das suas
26 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

feições principais, a outras instituições do regimen,


que o lápis do caricaturista não ousaria escorçar com
essa liberdade ? Não são ao que parece idiopatias ex-
clusivamente do júri, aboquejado no acórdão, aquela
desatenção, aquela indiferença aos debates, aquele
julgar, sem saber do que se julga, aquele votar por
conta alheia, à fiúsa uns dos outros, entre os mem-
bros do mesmo corpo délibérante.
Certifica o testemunho de insuspeitas autori-
dades, até, que, em assembléias da mais egrégia ma-
jestade, se vai muito além daquele indecoro : que
juizes e legisladores ora desertam as cadeiras, ora
dormitam, para, afinal, resolver, ou sentencear do
que nem ouviram, nem ao menos acompanharam com
a presença, extremo impossível no júri, ora, pela au-
sência nas votações, ou nos julgamentos, desfalcando
o quorum das assentadas, ocasionam decisões e leis
que o concurso de todos evitaria. "É verdadeiramente
penoso o que se observa ", dizia este ano um depu-
tado à câmara trienal, sem que um aparte o atalhasse.
"Já não digo que os Deputados prestem atenção às
discussões, não peço para mim que não pretendo ilu-
minar nenhum espírito, a audiência do Congresso.
Outros oradores, como o Sr. Barbosa Lima, não têm
conseguido prender a Câmara no seu posto. Sucede
que nas votações a massa mal sabe o que vai votar,
guiando-se pelos que são chefes de bancada. No en-
tanto, quanto aproveitaria o país se as discussões
merecessem a atenção que se lhes recusa. Isto não é
nada ainda diante da deserção nas votações".
Destarte exprime-se o congresso acerca de si
mesmo. Veja agora o implacável justiceiro das ma-
zelas do júri como a mesma tribuna parlamentar,
entre aplausos do parlamento, se enuncia em relação
aos tribunais togados, não excetuando o supremo. É
um dos mais moderados, considerados e reportados

TRABALHOS J URÍDICOS 27

membros daquela câmara, o dr. FREITAS quem fala,


apoiado pelos seus colegas. "Quero­me afastar da
crítica à magistratura desta capital, em cujo seio
conto os melhores amigos, e aos quais, todos, tributo
o maior respeito. Mas no livre exercício do direito
que me cabe como legislador, quando tenho de pro­
ferir um voto, nem o afeto nem o respeito modificam
as minhas convicções. A honrada comissão, eu o
disse, quer adotar o sistema seguido no supremo
tribunal, o mais desastroso de todos os sistemas de
julgamento. Senhores, não é só aqui, no seio desta
câmara, pasto quotidiano à crítica, que as bancadas
se entregam à palestra, quando os oradores, na tri­
buna defendem as suas idéias. Nos tribunais, muitas
vezes, mal se sabe o assunto que se relata ! Há neles
uma forma semi­oficial de votar que absolve de todo
a responsabilidade perante Deus e perante a socie­
dade. "Com o sr. relator" é a fórmula singela e cô­
moda com que se sufocam as legítimas esperanças
dos que litigam! (Apoiados). Eis, sr. presidente, o
modo por que se tratam os direitos e interesses dos
cidadãos." {Apoiados, muito bem.)
De modo que os legisladores são eminentemente
sábios, excelsamente doutos os magistrados; mas
quer, nos tribunais, quer no congresso, "a massa mal
sabe o que vai votar", a voz dos oradores se perde
"na palestra", entre os juizes "mal se sabe o que se
relata", e uma referência convencional ao voto do
primeiro revisor exonera a maioria de saber os di­
reitos, que reconhece, cria, ou nulifica em quatro pa­
lavras : "Com o sr. relator".
Aí está como a representação nacional, depois
de se julgar a si própria, julga os tribunais letrados,
tão severos julgadores do júri. Doutos e justos, de
que vale o justo ausente, ou descuidado, o douto
abstrato, ou sonolento ? As pedras tiradas à vene­
28 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

randa justiça popular já começaram a se volver con-


tra os apedrejadores. Ela cairá talvez, mas não sem
que os últimos espíritos liberais se reúnam em torno
dela. não sem que esgotemos os seus amigos todas as
fortunas da guerra, não sem que falemos, rompendo
por todas as conveniências, às outras instituições
contra esta revoltadas na linguagem do CRISTO aos
escribas e fariseus : Qui sine peccato est vestrum,
primus in illam lapidem mittat ( * ) .
Felizmente nesse acórdão, que. arrimando-se a
paradoxos de uma inanidade previamente eviden-
ciada nas razões àquele tribunal submetidas pelo au-
tor destas linhas em defesa do júri. o entregou, des-
pido da sua inviolabilidade constitucional, aos so-
fistas da reação, há um tríplice raio de luz : a dis-
crepância do sr. PISA E ALMEIDA, acompanhado pelos
ministros PEREIRA FRANCO e GONÇALVES DE C A R -
VALHO.
Quando a política invade essas plagas sagradas
PISA E ALMEIDA é sempre o cimo da justiça, que as
maretas nunca assoberbaram. Tem agora dois com-
panheiros. Não tinha nenhum PIT 27 de abril de 1892.
Outra seria hoje a república, se o espírito daquele
varão se tivesse comunicado ao tribunal, de que é
sobre todos a honra. Dissemos dele então, e redire-
mos hoje : " O grande brasileiro já não é. para nós,
urra opinião : é uma escola- já não é uma individua-
lidade : é a própria justiça. Sua presença embal-
sama o tribunal, a que pertence, e redime as nódoas
do seu tempo. No meio dos verdadeiros republica-
nos, a sua imagem entrará na família de Iodos, de
cada lar se evolará por êle uma bênção, e cada um
de nossos filhos o apontará como um patriarca" ( * * ) .
( * ) Evangeüum Secundum Joannem. VIII. 7.
(**) Vid-: Rui Barbosa. O Estndn de Sitio Sua Natureza. Seus
Efeitos, Seus Limites, pág. 227. Capital Federal. 1892. — N . R.

»
IV

O ARESTO

Antes que, estudando sentença por sentença,


erro por erro. sofisma por sofisma a demolição do
júri, intentada no projeto rio-grandense, e, pro-
vando-lhe a inconstitucionalídade. examinemos o
aresto do supremo tribunal com o rigor ditado pela
gravidade do assunto, renderemos a devida home-
nagem ao primeiro protesto, que contra êle se levan-
tou, honrando estas colunas com a transcrição, para
que pedimos licença, da crítica oposta a esse funesto
julgado pela Revista de Jurisprudência ( * ).
Louvores sejam dados ao grupo de profissionais,
que o redige, pela resolução, que adotaram, de não
registrar silenciosamente os deslises da justiça brasi-
leira, e pela coragem, que em casos COUTO este sabem
ter, de contrariar os progressos da anarquia.
Eis a opinião dessa eminente revista s*bre o
acórdão de 7 de outubro do ano passado :
"A Constituição da República dos Es.ados Uni-
dos do Brasil, em seu art. 72. subordinado à epí-
grafe Declaração de direitos, nos assegura termi-
nantemente, no § 31, É MANTIDA A INSTITUIÇÃO DO
JÚRI.
" O verbo — manter —, na sua significação pró-
pria e qual o compreendem quantos falam a nossa
(*) Vol. IX. págs. 262-264.
30 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

língua, corresponde a — conservar no mesmo estado,


sustentar, continuar —. Neste sentido é êle uniforme,
geral e freqüentissimamente empregado. Quando,
pois, se diz — é mantida tal instituição — se quer di-
zer, no consenso de todos, que a instituição é con-
servada no mesmo estado, é sustentada, continua.
Mas, disvirtuar a acepção própria de um termo, como
pretende o A c , sob o pretexto de que a instituição
mandada permanecer tem tido forte oposição entre
nós e entre escritores estrangeiros maxime italianos,
é um absurdo que admira tenha sido fundamento de
decidir. Não é menos extranhável que o A c , depois
de afirmar que o verbo — manter —, por uma evo-
lução ainda não confirmada, perdeu a significação
vulgar e própria, no entanto omita esclarecer qual a
que agora tem ! E não é isto de somenos importân-
cia, porque, além de se tratar da interpretação de
capital disposição da nossa lei fundamental, era de-
ver da egrégia maioria do Tribunal evidenciar que
manter é quase. . . não manter !
"Desde que a Constituição decretou clara e po-
sitivamente a continuação da instituição do júri, pa-
rece-nos que, como faz o A c , era essencial a deter-
minação de seus característicos. Mas, se atendermos
a que só se mantém ou conserva o que já existe, e se
entre nós já existia uma instituição do júri, a dita
constituição, emanada de uma Constituinte brasi-
leira e para vigorar no Brasil, certo teve em vista a
instituição do júri que entre nós funcionava, com
uma organização e fins próprios, ao tempo em que
houve a promulgação dela. Ao Supremo Tribunal,
portanto, cumpria mostrar-nos os característicos do
nosso júri. não segundo o código do processo crimi-
nal, mas segundo esse mesmo cód. e as leis e decre-
tos posteriores e respectivos, isto é. devia indicar os
•.

TRABALHOS JURÍDICOS 31

característicos da instituição então vigente. Nem


outra coisa visou a Constituinte.
"Sem dúvida, como entende o A c , o que im-
prime a uma instituição a sua feição própria, é o con-
junto de seus elementos essenciais. Assim, é óbvio
que a Constituição, mantendo a instituição do júri,
manteve também, implicitamente, todos esses elemen-
tos. Respeitem-se estes : e pouco importará que se
modifiquem os outros. Mas, os característicos pro-
clamados pelo Ac. serão os únicos ? Antes de tudo.
escapa-nos o critério pelo qual o Supremo Tribunal
se julgou autorizado a declarar que os característi-
cos constantes das ementas são os essenciais : houve,
sim, o repreensível ~- sic volumus, sic jubemus. Por
outro lado, se a ilustre maioria do Tribunal nos im-
pôs a sua autoridade em assunto tão melindroso,
igualmente por autoridade resolveu que entre nós
nunca foi elemento essencial da instituição do júri o
número de juizes de fato presentes, para poder fun-
cionar o Tribunal, nem o número de jurados para
poder o conselho de julgamento responder ao ques~
tionário, nem as recusações peremptórias em certo
número nem a deliberação em sa!a secreta, etc. T ã o
pouco se preocupou com o fim da instituição. E por-
que não nos alistamos entre os que aceitam as con-
clusões das sentenças sem o exame de seus funda-
mentos, havemos de demonstrar oportunamente que
o Ac. é, neste ponto, deficiente. Nem será preciso,
como insinua asperamente o ministro sr. dr. Macedo
Soares, recorrer ao celebérrimo Formulário Oficial
do Crime, esse acervo de calinadas, esse leito de Pro~
custo, onde famoso aviso de não menos célebre mi"
nistro de Estado ordenou se deitassem juizes e es-
crivães, sob pena de responsabilidade.
"Felizmente o voto vencedor não adotou a sin-
gular doutrina do sr. dr. Macedo Soares, a cujo ver
32 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

o parágrafo 31 do art. 72 da Constituição não é. . .


constitucional ! Para o ilustre jurista esse § foi en-
xertado na Constituição. . . por deliberação dos de-
legados à Constituinte. . . contra o REGIMENTO DO
CONGRESSO !. . . Logo, conclui o sr. ministro, não
obriga a ninguém !! Destarte, caso prevalecesse tal
doutrina : 1.° o Regimento do Congresso seria su-
perior à própria Constituição; 2.° o Supremo Tribunal
Federal, criação desta, se arrogaria a faculdade, aliás
não conferida expressamente, de guarda do mencio-
nado Regimento; 3.° poderia o mesmo Tribunal, con-
tra todos os publicistas, até italianos, examinar se
uma lei regularmente promulgada e publicada é obri-
gatória por ter sido aprovada pelo Poder Legislativo,
nos termos de seu Regimento.
"Apesar do § 31 estar sob a epígrafe — Decla-
ração de direitos — e o princípio do art. 72, a que
êle está subordinado, confirmar a epígrafe, acredita
esse sr. ministro que não obriga aos Estados. O con-
trário, diz, seria a antinomia entre esse § e o art. 34
n. 23. Mas, assim não nos parece. Basta, para desa-
parecer a antinomia, que o sr. dr. Macedo Soares
combine o art. 72 § 31 com o art. 65 n.° 2.° e arts. 34
n. 34 e 35 n. 1 e se lembre de que o Supremo Tribu-
nal tem firmado em casos semelhantes jurisprudência
contrária ao seu parecer.
"Por esses motivos, seguimos a doutrina dos
ilustres ministros vencidos srs. drs. Pisa e Almeida,
Pereira Franco e G. de Carvalho".
APENSO

PROJETO N* 42-1900 (CÂMARA DOS DEPUTADOS)

Mantêm a instituição do júri com a competência que ora lhe cabe para
o julgamento dos crimes sujeitos à jurisdição federal e à justiça
local do Distrito Federal e modifica a composição e o funcio-
namento do mesmo tribunal.

O Congresso Nacional decreta :

Art. I o É mantida a instituição do júri, com a compe-


tência que ora lhe cabe, para o julgamento dos crimes sujeitos
à jurisdição federal c à justiça local do Distrito Federal.
Art. 2 ' Para composição do tribunal do júri serão
transcritos da lista geral dos jurados os nomes destes em cé-
dulas que, depois de conferidas pelo juiz a quem competir a
presidência do tribunal, serão lançadas em uma urna. Desta
deverão ser extraídas por um menor, 15 cédulas que, depois
de lidas, serão depositadas em outra urna própria.
Parágrafo único. Deste sorteio lavrar-se-á um termo,
com a designação dos 15 jurados sorteados, no mesmo livro
de lançamento da lista geral.
Art. 3V No dia designado para a reunião do júri, o
presidente do tribunal procederá à verificação das cédulas
dos 15 jurados. Concluído o exame e recolhidas as cédulas
à urna respectiva, terá lugar pela forma estatuída no artigo
anterior o sorteio dos juizes de fato em número de cinco.
Art. 49 A medida que os jurados forem sorteados, po-
derão as partes opor-lhes suspeição motivada.
34 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

§ 1" A suspeição oposta deve fundar-se em qualquer


espécie de prova, uma vez que possa ser de pronto apreciada.
§ 2 9 O presidente do tribunal do júri decidirá da sus-
peição oposta, depois de ouvir sumariamente as razões do ré-
cusante e do recusado.
§ 3 ? Não são admitidas as recusações peremptórias.
Art. 5" Será observada a mais completa publicidade
em todos os atos do processo no plenário, sendo vedadas as
votações em escrutínio secreto. Os juizes de fato emitirão os
seus votos orais, podendo justificá-los em presença das par-
tes no recinto do tribunal à medida que forem lidos os quesi-
tos pelo presidente do júri, que interrogará a cada um dos
juizes de fato separadamente.
§ l 9 Antes de se proceder à votação do júri e logo que
tenham sido feitos o resumo de debates e a leitura dos quesi-
tos pelo presidente do tribunal, este facultará aos juizes de
fato a reunião em sala reservada, de modo que possam entre
si acordar sobre o que houverem de deliberar, sarvo se estes
a julgarem desnecessária.
§ 2 ' Sempre que a maioria dos jurados reclamar a
assistência do presidente do tribunal, tomará êle parte na
reunião pelo tempo suficiente à elucidação das questões pro-
postas.
Art. 6* Revogam-se as disposições em contrário.
S. R. Sala das sessões, 21 de junho de 1900. — Pinto
da Rocha. — Soares dos Santos. —• Cassiano do Nascimento.
— Alfredo Varela. — Manuel de Campos Cartier. — Ves-
pasiano de Albuquerque. — Barbosa Lima. — Victorino
Monteiro.
PARECER

NM2 A — 1900

A Comissão de Constituição, Legislação e Justiça, to-


mando conhecimento do projeto do Sr. Deputado Pinto da
Rocha, que modifica a composição e funcionamento do Tri-
bunal do Júri, para julgamento dos crimes sujeitos à jurisdi-
ção federal e à justiça local do Distrito Federal, e estudan-
do-o devidamente, é de parecer que o mesmo projeto seja
adotado para ser sujeito às discussões regimentais da Câ-
mara.
O projeto, respeitando a instituição do júri, em sua
essência, tal como na parte relativa à declaração de direitos
dispôs a Constituição Federal, art. 72, § 31, propõe medidas
tendentes a elevar essa instituição do abatimento em que la-
mentavelmente tem caído, tornando-a menos complicada em
sua formação e dando ao seu funcionamento normas mais
severas de imparcialidade e justiça.
Que o projeto, visando simplesmente os fins expostos,
não fere de leve a Constituição da República, é questão fora
de dúvida, menos para quem tiver o fetichismo das formas,
julgando os princípios inamoldáveis, insuscetíveis de desen-
volvimentos mais aperfeiçoados, adaptáveis ao tempo e ao
meio social.
No uso do direito inconcusso de fazer e organizar as
leis do processo, os Estados têm legislado largamente, sem
contestação, e com proveito indubitável a comunhão de cada
um deles.
36 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Em relação, particularmente, à instituição do júri, é sa-


bido que Pernambuco, Espírito Santo. Minas e Rio Grande
do Sul modificaram a velha organização desse Tribunal,
simplificando-a e amoldando-a mais hábil e sabiamente a seu
objetivo.
É o que também tem cm vista o projeto.
Êle não atenta contra o preceito constitucional da ma-
nutenção da instituição do júri: este. que em substância não
é mais do que o julgamento do cidadão pelos seus pares,
permanece em sua integridade; apenas se o liberta de pesa-
das e antigas formalidades, que a prática e a experiência
têm demonstrado serem desnecessárias e servirem somente
de obstáculo ao funcionamento regular da mesma instituição.
Assim, manifesto embaraço muita vez à formação desse
Tribunal é, sem dúvida, o número excessivo de cidadãos que
o devem compor. 48 jurados, dentre os quais são sorteados
12 juizes de fato.
Ora, reduzir esse número é facilitar a composição do
Tribunal do Júri, senão mesmo concorrer para que suas deli-
berações se tomem de modo mais pronto e mais isento de
paixões, sem, de forma alguma, deturpar a instituição.
O projeto providencia a este respeito, determinando que
da lista geral dos jurados serão sorteados 15, destes — 5
juizes de fato. que decidirão sobre as questões sujeitas a seu
julgamento.
Esse número, que parecerá muito suficiente e acertado
para o júri das comarcas do interior, onde é quase sempre
limitado o pessoal idôneo e habilitado, talvez seja demais
reduzido para o Distrito Federal e para as capitais dos Es-
tados, em que deve reunir-se o Júri Federal.
A Câmara o elevará conforme entender em sua sabe-
doria, não sendo, entretanto, nossa opinião que o maior nú-
mero signifique maior justeza e acerto nos julgamentos.
O projeto acaba com as recusações peremptórias, ins-
tituindo o direito das partes de oporem suspeições motivadas,
desde que estas possam de pronto ser apreciadas.
TRABALHOS JURÍDICOS 37

Não resta dúvida que deste modo a formação no Tri-


bunal dá-se em condições de muito mais elevada e nobre
compreensão de seus deveres.
As recusações estão reduzidas desde muito tempo, entre
nós, a meros favores para isentarem o jurado de algumas
horas de trabalho, quando na realidade elas só deveriam se
fundar em motivos justos e procedentes; porquanto, incon-
testável é que, sob o ponto de vista geral, elas são depri-
mentes do caráter e da consciência do cidadão; e desde que
isso passe a ser consagrado na lei, suprimido estará o abuso
das recusações sem motivos declarados, que dão lugar à ex-
clusão dos mais competentes.
O projeto bane esta anomalia, instituindo em seu lugar
um tribunal superior a toda exceção.
Estabelece o projeto, finalmente, a mais completa publi-
cidade, para todos os atos do processo no plenário, até mesmo
no julgamento das questões de fato, o que inquestionavel-
mente dá outra importância e valor às decisões do tribunal.
Convém ainda notar que, além de desconhecidas, ou
pelo menos muito duvidosas, as vantagens do escrutínio se-
creto, não raro se torna êle ilusório, como nas absolvições ou
condenações unânimes.
Dado o julgamento com a mais ampla publicidade, e
facultado o voto justificado, o júri nobilita-se, revestindo-se
suas decisões do cunho da mais firme franqueza e sinceri-
dade.
São, pois, dignas de apreciação as idéias constantes do
projeto do Sr. Deputado Pinto da Rocha; e, nesta conformi-
dade, a Comissão pensa dever o mesmo projeto ser subme-
tido à discussão da Câmara, para esta resolver afinal como
melhor entender em sua sabedoria.
Sala das Comissões, 23 de julho 1900. — /. /. Seabra.
presidente, com restrições. — Frederico Borges, relator. —
Rivadavia Correia. ~ Azevedo Marques, vencido cm parte
38 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

e com restrições. — F. Tolentino, com restrições. — Alfredo


Pinto, com restrições. — Luís Domingucs, pela aprovação dos
arts. 1', 2 ? e 3 ' e do § 217 do art. 5' do projeto. Não é que eu
tenha como condição sine qua non do júri a recusa peremp­
tória, abolida pelo art. 4 ? nem tão pouco o sigilo das votações,
abolido pelo art. 5" in princ. porquanto os tenho apenas como
garantias de imparcialidade e independência dos jurados e
como tais dependentes da cultura moral ■— ainda não atin­
gida entre nós — das classes sociais de que eles são sortea­
dos. A matéria do projeto pode­se dizer perfeitamente expla­
nada entre nós no processo e julgamento do juiz de direito
da comarca do Rio G rande, no Estado do Rio G rande do
Sul (Dir. vol. 73, págs. 15 e seguintes), acusado de haver
negado aplicação, por inconstitucional, à lei de organização
do júri nesse Estado, exatamente por abolir a recusa peremp­
tória e o sigilo das votações. Entendo que a Constituição na
expressão — é mantida a instituição do júri — não impôs o
júri tal qual era organizado ao tempo de sua promulgação,
mas a instituição nos seus elementos essenciais, dados os
quais se não pode contestar que ela é mantida, conforman­
do­me a este respeito com o voto proferido naquele julga­
mento pelo juiz Vieira da Cunha, que enumera como esses
caracteres os dous seguintes : a) o julgamento do cidadão
pelo cidadão, saído de um sorteio; e b) a decisão da causa
pela convicção íntima dos jurados, sem regras preestabeleci­
das. — Anísio de Abreu, com restrições. — Teixeira de Sá.
com restrições somente à conferência dos jurados com o pre­
sidente do tribunal.
II
RESILIÇAO DE CONTRATO
PELO GOVERNO ESTADUAL

COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO PODER JUDICIÁRIO PARA


DECRETÁ-LA

PARECER

N O T A D O REVISOR

Autorizado pelo congresso estadual, ex-vi do que se


continha na lei n. 279, de 22 de setembro de 1899, contra-
tou o governador do Amazonas a criação de um banco, com
sede em Manaus, fixando-se, nesse ato bilateral, os limites
da concessão e demais obrigações recíprocas.
Foi a concessão, nesse ato, outorgada ao cidadão Ma-
nuel Floriano Correia de Brito, sendo os estatutos do banco
aprovados por ato do poder executivo.
Por decreto de 11 de agosto de 1900, do chefe do poder
executivo local, foi declarado caduco o contrato celebrado
com Manuel Floriano, quando já havia este recebido parte
do capital efetivo do banco a instalar-se.
Ouvido, então, emitiu Rui Barbosa o parecer adiante
publicado.
Intentada ação contra o Estado, por sentença de 18 de
setembro de 1902, do juiz Caetano Estelita C. Pessoa, na
qual. entre outras, era invocada a opinião de Rui Barbosa
em seu parecer, foi julgada procedente a ação, condenando-se
a ré, fazenda estadual, a pagar ao autor, não o que pedia este
na inicial, mas uma justa e razoável indenização, a que tivesse
incontestável direito pelo dano sofrido, lucros cessantes e
mais despesas judiciais, em conformidade com o que se li-
quidasse na execução. Julgando-se improcedente a recon-
venção da ré.
Apelaram ambas as partes, havendo o Superior Tri-
bunal de Justiça do Estado, por acórdão de 22 de abril de
1903, dado provimento ao recurso da fazenda e negado pro-
vimento ao do autor, para o fim de reformar a sentença re-
42 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

corrida e julgar o autor carecedor da ação. Embargou o au-


tor, sendo os embargos desprezados por decisão de 13 de
agosto de 1903.
Interposto recurso extraordinário (n. 406), dele não
conheceu o Supremo Tribunal Federal, em julgamento pro-
ferido a 3 de novembro de 1906, contra o voto do ministro
André Cavalcanti.
Opostos embargos da decisão, foram estes desprezados
por acórdão de 23 de agosto de 1908.
EXPOSIÇÃO
[CONSULTA]

O Congresso do Estado do Amazonas, por sua resolu-


ção n. 279, de 22 de setembro de 1899, autorizou o Governo
a contratar com quem conviesse a organização de um Banco
Hipotecário e de Descontos, com sede em Manaus, sob a de-
nominação de Banco do Estado do Amazonas (art. I 9 ) e
com o capital de Rs. 10.000:000$000, dividido em 50.000
ações de Rs. 200$000, podendo ser elevado a 30.000:000$000
(cit. art. letra a ) .
Para auxiliar a fundação desse Banco o Estado subscre-
veria um terço do capital efetivo (sic), art. 4 9 , e nomearia
um fiscal para acompanhar as operações bancárias, podendo
assistir às reuniões da Diretoria e Membros do Conselho Fis-
cal e às eleições para os cargos de Diretores e membros do
Conselho Fiscal, e faculdade para praticar outros atos de fis-
calização.
O Governo do Estado, no sentido de dar execução a
esta lei, contratou com o cidadão Manuel Floriano Correia
de Brito a função desse Banco, e o respectivo contrato foi
devidamente lavrado na Repartição do Contencioso do
Estado.
No intuito de desobrigar-se o Estado do compromisso
assumido na cláusula 13', de acordo com o art. 4 ' da lei cit.
n. 279, de 22 de setembro, o Governador de então. Coronel
José Cardoso Ramalho Júnior, pelo decr. n. 413, de 30 de
março de 1900, abriu o crédito necessário para pagamento da
terça parte do capital, como auxílio prestado pelo Estado ao
Banco que ia se organizar, auxilio considerado como -— en-
trada antecipada, e pelo oficio de 3 de abril do dito ano, o
citado Governador ordenou ao Secretário da Fazenda, que
mandasse entregar, ao incorporador Manuel Floriano Cor-
reia de Brito a quantia correspondente àquele terço. Reco-
mendando mais, caso o Tesouro não tivesse numerário sufi-
ciente, fosse efetuado aquele adiantamento em títulos da dí-
44 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

vida do Estado, vencíveis no prazo de quatro meses e recebí­


veis em pagamento de imposto até 50% do valor depois de
60 dias de sua expedição, etc., etc.
Em virtude do contrato celebrado, e já aludido, o con­
cessionário Manuel Floriano Correia de Brito organizou sin­
dicatos na Europa e nesta Capital, e levantou o capital ne­
cessário para instalação e funcionamento do Banco, chegando
até a depositar, como prova do levantamento desse capital,
dez por cento dele em um Banco nesta Capital. Fêz mais.
Pronto o capital, antes de convocar a assembléia geral dos
subscritores, confeccionou os respectivos Estatutos do Banco,
e os sujeitou à aprovação do G overno, e este não só os apro­
vou, como mandou publicá­los no Diário Oficial do Estado,
em 1» de abril de 1900.
O G overno, tendo conhecimento de todos os fatos ocor­
ridos para a fundação do Banco, e já se tendo pedido per­
missão para dar inicio às operações das carteiras que não
dependiam de licença especial do G overno Federal, não cum­
priu as cláusulas do contrato.
l p ■— não pagando na época do vencimento os títulos
emitidos como terço do capital;
2* — declarando nulos estes títulos e intimando o con­
tratante a fazê­los recolher ao Tesouro;
3* —* declarando caduco o contrato.

PERGUNTA­SE :

1?

O G overno podia, sem acordo com a parte, mandar sus­


tar o pagamento dos títulos, que constituíam o terço do capi­
tal do Banco ?

2<
A rescisão ou caducidade do contrato por infração de
qualquer cláusula pode ser decretada por ato do G overno ?
3"
O contratante tem direito a pedir indenização dos pre­
juízos causados ?
Parecer
Tendo examinado.
l.° a exposição assinada, em forma de reque-
rimento ao governo do Amazonas, pelo Sr. Manuel
Floriano Correia de Brito;
2." os atos do governo daquele Estado outor-
gando ao consultante a fundação de um Banco de
Crédito Real e Descontos;
3.° o contrato celebrado entre as duas partes,
para se levar a efeito essa concessão;
4.° o ato do governo que o rescindiu;
5.° o protesto judicial do prejudicado;
6.° a opinião de alguns doutos jurisperitos, fa-
vorável ao seu direito;
7.° as cartas, devidamente autenticadas pelas
autoridades competentes, dos capitalistas
Bard,
Francis Driou,
Ch. Huot,
Jamet,
pude fazer juízo cabal sobre os fatos em questão e
as conseqüências jurídicas deles resultantes.
A lei amazonense n. 279. de 22 de setembro de
1899, autorizou, no seu 1." artigo, o governo "a con-
tratar a organização de um Banco Hipotecário e de
Descontos, denominado Banco do Estado do Ama-
46 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

zonas", com sede na capital, fixando-lhe o capital de


dez mil contos, assinando-lhe a duração de trinta
anos, e determinando, no art. 4.°, que, do capital
prescrito, o governo do Estado, "para auxiliar a fun-
dação do Banco, subscreveria um terço".
Para esse fim celebrou o governador do Estado,
que sancionara a lei, aos 29 de setembro de 1899,
com o consultante uma escritura legal de contrato,
outorgando-lhe a concessão, que o ato legislativo
lhe dava poderes, para fazer. A cláusula 12." dessa
escritura literalmente reproduz o art. 4.u da lei, que
se transcreve igualmente no art. 6.° dos estatutos,
aprovados pelo decreto administrativo n.Q 410, de 21
de março de 1900 e publicados no Diário Oficial do
1.° do mês imediato. Em que sentido se empregaram,
nesses textos, as expressões, a frase "subscreverá
um terço do capital ?" Não houve, a tal respeito, di-
vergência entre os contratantes. Tendo expedido o
decreto n.° 1.113, de 30 de março do corrente ano.
que abriu, "no orçamento vigente, o crédito neces-
sário, para ocorrer ao pagamento autorizado pelo
art. 4.° da lei n.° 279. de 22 de setembro do ano pas-
sado", o governador, por ato de 3 do mês imediato,
resolveu que se fizesse ao concessionário, de uma
vez, a entrega total da importância correspondente
ao terço do capital do estabelecimento projetado,
isto é, mandou embolsar-lhe 3.333:333$333 réis.
imediatamente, em dinheiro de contado, ou, faltando
essa espécie, em títulos da dívida do Estado, vencí-
veis no prazo de quatro meses e admissíveis no T e -
souro estadual em satisfação dos tributos por êle co-
brados.
Evidentemente estava assim liquidada, para o
concessionário, a questão da entrada, com que para
o futuro estabelecimento concorreria o Estado, seu
valor, sua espécie, sua realização. Embolsados os
TRABALHOS JURÍDICOS 47

títulos, que designara o governador, em razão de não


haver numerário no Tesouro, estava a contribuição
do Amazonas ultimada, e era daí em diante um dos
elementos fundamentais (senão o mais importante
deles), com que devia contar o organizador para as
diligências financeiras, que ia encetar na Europa. O s
títulos emitidos em 4 de abril desse ano, teriam de
converter-se em espécie no dia 4 de agosto. Era uma
base de operação líquida, certa, definitivamente
adquirida. Não o podia entender por diverso modo
a outra parte, que, possuindo esses valores uma re-
presentação quase monetária do terço do capital, o
obteve dos capitalistas europeus unicamente nesse
pressuposto, como condição irretratàvelmente verifi-
cada. Em todas as cartas, com efeito, que me foram
exibidas, se encontra essa declaração, em termos
como estes :

"15 janvier.
"Il est entendu que le gouvernement des
Amazones, suivant son contract avec vous,
versera le tiers du capital, 3.333:333$000".
"16 avril,
"Il est bien spécifié que, d'après votre
contract, le gouvernement s'engage à verser,
le 4 août 1900, la somme de trois mille contos
de réis, plus, trois cent trentre trois mille réis,
comme tiers du capital de la banque. Si le
versement n'est pas effectué à la date cides-
sur, nous nous considérons comme absolu-
ment dégagés du syndicat, qui sera dissous".
Sob essa condição, pois, se negociou, acordou e
fundou, na Europa, mediante os esforços do conces-
sionário, um sindicato, que assumia o compromisso de
48 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

perfazer o capital estipulado, contribuindo com os


dois terços : 6.666:666$666. É o que certificam vá-
rias cartas apresentadas. Mas sobreveio a caduci-
dade, inopinadamente fulminada pelo novo gover-
nador, com o dec. n.° 441 de 11 de agosto, que o
Diário Oficial estampou três dias depois; e desse
fato, comunicado aos membros da associação qui-
tada, resultou para logo a distratação de negócio
concluído.
A prova está nesses documentos, um dos quais
reza :
"Suivant votre demande et nos conven-
tions, du 15 janvier passé, je me suis occupé,
sous mon initiative particulière, de former a
Paris un syndicat, pour réaliser le capital de
6.666:666$666, nécessaire pour fonder à Ma-
náos une banque avec avantages du gou-
vernement.
"Il avait été entendu, entre autres cho-
ses, que le gouvernement des Amazones ver-
serait le 4 août le tiers du capital. Comme
vous savez, le syndicat se trouvait prêt à fonc-
tioner. Vous me faites savoir ce jour que le
gouvernement des Amazones ne peut opérer
son versement, que vous ne savez pas quand
il sera en mesure de le faire.
"Dans ces conditions, j'ai le regret de
vous avertir que le syndicat se dissout, et je
vous prie de me faire verser, pour frais et de-
mandes, la somme de trois cents mille francs".
Destes dados, evidentemente se segue :
1.° Que estava constituído, com os capitais
precisos, o sindicato, para efetuar o banco conce-
dido;
TRABALHOS JURÍDICOS 49

2.° Que a realização desses capitais e a fun-


dação do banco dependiam unicamente de que o
governo executasse o compromisso, pelo qual se
obrigara, em 3 de abril, resgatar, em 4 de agosto, os
títulos entregues no valor de sua quota;
3.° Que anulando, pelo de 11 de agosto, os
atos de 21 de março, 30 de março e 3 de abril, o go-
verno faltou à obrigação contraída.
4.° Que, faltando a essa obrigação, destruiu
a expectativa, sobre a qual se ia fundar o banco, e
dissolveu o sindicato para esse fim organizado;
5." Que, operando esses resultados, infligiu ao
concessionário dano considerável, envolvendo-o em
altas responsabilidades pecuniárias, deixando-o no
desembolso das expensas feitas para a consecução
do seu desideratum, e privando-o das vantagens ul-
teriores, que lhe êle assegurava.
Obrando assim, obrou legitimamente o governo
do Amazonas ?
Parece fácil demonstrar que não.
Primeiramente, os estatutos do banco, onde se
assentou que as entradas se fariam, a primeira com
50%, as demais de 10%, a trinta dias de intervalo
umas das outras, são, como não podiam deixar de
ser, posteriores à lei, que autorizou a fundação desse
estabelecimento. O que na lei, anterior aos estatutos,
portanto, se quis prescrever, não se pode subordinar
ao que nos estatutos depois se determinou. A lei es-
tatuiu, simplesmente, que "o governo do Estado, para
auxiliar a fundação do banco, subscreveria um terço
do capital". Ora, na autorização para subscrever se
abrange a autorização para realizar o capital subs-
crito. Nada obstava a que a sociedade, ao fundar-se,
convencionasse a resolução de entrarem imediata-
mente com todo o capital, que subscrevessem. Para
50 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

isso estava habilitado o executivo estadual pela au-


torização legislativa, que o habilitava a subscrever
aquela soma. E a prova está no próprio texto da lei,
art. 6.°, que supôs a realização desse contingente
numa prestação só, dizendo :
" O governo do Estado abrirá o crédito
necessário à execução da presente lei."
Não diz os créditos. Diz o crédito. Logo não
supõe a realização da parte, que o governo assumia,
por entradas. Supõe uma só entrada, e com esta só
entrada figura consumada pelo governo "a execução
da lei". Logo, o seu pensamento que o governo en-
traria de uma só vez com a totalidade do capital, que
assinava.
Essa inteligência, ademais, é a que se harmo-
niza com a redação do art. 4.°. onde se consigna que
a contribuição do terço do capital do banco pelo go-
verno, era "para lhe auxiliar a fundação".
N ã o auxiliava a subsistência, não auxiliava o
desenvolvimento, não auxiliava a sustentação do es-
tabelecimento, para o que servem às entradas presta-
das sucessivamente. Auxiliava a fundação, a saber,
o ato inicial da existência do banco. Era, por conse-
guinte, uma dotação, que se completava num só ato.
N a d a importa que os direitos, daí promanentes
para este subscritor, se houvessem de traduzir, como
os direitos aos demais subscritores, na forma de
ações. À assembléia geral deles competia harmoni-
zar depois, segundo a proporção estabelecida para
as entradas, a situação desse acionista com a dos
outros.
T ã o pouco faz ao caso a consideração, invocada
no decreto anulatório, de que, em face do decr.
n.° 474, de 4 de julho de 1891, os sócios são respon-
TRABALHOS JURÍDICOS 51

sáveis somente pela quota do capital, que subscre-


vem, e de que. portanto, só se obrigam a fazer as en-
tradas estipuladas nos estatutos, à proporção das
chamadas, que se forem anunciando. Ninguém diz
que, por lei, na condição de acionista, o governo se
achasse adstrito a mais. Mas também, nada, na lei,
obsta a que, em proteção e benefício de uma so-
ciedade cuja organização se ajusta, um dos seus fun-
dadores assuma outros, além dos seus compromissos
estritamente legais. Se um acionista espontanea-
mente se oferece a entregar a importância das suas
ações, renunciando ao benefício de fazê-lo parcela-
damente por entradas, nada se opõe a que êle re-
nuncie, assim, ao seu direito, favorecendo, por uma
antecipação de capitais, a constituição da entidade
social, a que liga particular apreço.
Devia ser esse (é, ao menos, o que da lei e das
circunstâncias se depreende) o intuito da legislatura
estadual, bem como o do governo do Amazonas, o
primeiro qualificando, caracterizando e regulando a
quota, que prometia, como auxílio de fundação, ao
banco, o segundo executando a autorização, de con-
formidade com esses termos, mediante a entrega do
capital subscrito numa só prestação. Provavelmente,
consultando a depressão geral do mercado, as pés-
simas condições financeiras do país, a retração, en-
fim, dos capitais, nacionais, ou estrangeiros, em re-
lação a negócios intentados no Brasil, acreditavam
os poderes estaduais que só com essa coadjuvação
extraordinária poderia lograr bom êxito a tentativa.
Não calcularam mal; tanto assim que só com o apoio
desse elemento surtiram efeito as diligências pela
reunião do sindicato, e, malograda essa expectativa,
no mesmo ponto se dissolveu, malogrando a funda-
ção do estabelecimento.
52 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Mas, como quer que entendamos os termos da


autorização legislativa, o certo é que ela foi inter­
pretada por quem tinha a competência de a inter­
pretar : pelo governador, a quem a lei encarregara
a celebração do contrato, a quem, para isso. dera
poderes, e que. por conseguinte, ao celebrar o con­
trato, obrou como mandatário da legislatura. Os
atos do mandatário são atos do mandante. Deles re­
sultam, para o outro contraente, os mesmos direitos,
que se pelo mandante fosse pessoalmente firmada a
convenção. O mesmo procurador, que contratou, ou
o que lhe sucede, se para isso lhe falecem poderes es­
peciais, não pode retratar­se do ajustado, a pretexto
de que no ajuste se ultrapassaram os termos do man­
dato. Se, com efeito, se deu excesso, ao mandante,
que, na hipótese, era o congresso estadual, cabe pri­
vativamente a iniciativa de argüí­lo; e, se não o ar­
güiu, a inferência é que excesso não houve, ou que
deliberadamente o ratifica.
O ato de 3 de abril deste ano, pelo qual o go­
verno do Estado mandou entregar ao concessioná­
rio a soma total da quota por êle subscrita em vales
do Tesouro a prazo de quatro meses, é, de mais a
mais, não só um ato de interpretação, mas ainda um
ato de execução do contrato de 29 de setembro de
1899. A tal respeito absolutamente não pode haver
duas opiniões.
Títulos de vencimento pronto e circulação rá­
pida, que nem de endosso dependem, são equivalen­
c e s da moeda. Logo, o subscritor, que os entrega,
em desempenho de um compromisso firmado numa
subscrição, executou o compromisso assumido.
"Eseguisce Ia obligazione chi adempie Ia
pcestazione, paga. consegna, /a cio che pro~

_ «k. • «* ♦ « » - - . - .
TRABALHOS JURÍDICOS 53

mise". (GiORGi, Obbligazioni, vol. VIII,


n. 194, pág. 287).
Ora, evidentemente, não pode haver interpre-
tação mais categórica e decisiva de um contrato pelo
contraente, que a execução por este dada às estipu-
lações. A execução do contrato pela parte interes-
sada ê a suprema interpretação dele, a sua interpre-
tação definitiva. E a melhor das interpretações é a
que o contraente deu ao que tinha contratado :
"C'est l'interprétation par les parties,
elles mêmes, qui parait bien être la plus na-
turelle et la meilleure, puis qu'elle émane de
celui même qui l'a provoquée par l'obscurité
ou l'insuffisance de son expression : ejus est
interpretare legem: cujus est condere".
(GANGUIER : De l'interprétation des actes
juridiques, pág. 66).
Pelo contrato os contraentes firmam a lei das
relações que ali criaram, e, dada à lei a interpreta-
ção por quem a fêz, está irrecusàvelmente interpre-
tada. Desde então não lhes é mais lícito mudar, senão
por acordo entre as duas partes. Na espécie vertente,
com poderes para subscrever, pelo art. 4.° da lei, o
governo igualmente os tinha, para pagar, pelo art 6.°.
Para um, como para outro efeito, era legítimo pro-
curador. E, nesse caráter, a tal ponto executou o
contrato, que parte dos vales entregues, passando às
mãos de terceiro, por negociação do concessionário,
em desempenho do compromisso contraído a benefí-
cio da concessão, foram apresentados pelo adqui-
rente ao Tesouro do Amazonas e por êle pagos.
Esses títulos, por conseguinte, eram irrescindí-
veis. Quando, porém, contra eles fosse ainda lícito
ao Estado articular a increpação de nulidade, não
54 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

era função, que êle mesmo, parte contratante, pu-


desse exercer. Procedendo, como fêz, usurpou a al-
çada judicial.

"Le contract annulable peut succomber à


la suite de l'exercice de l'action d'annulation".
( P I Z E , De l'inexistence et de l'annulabilité
des contrats, pág. 245).
"Il peut se trouver que les parties ne rec-
tifient pas, d'elles mêmes, l'obscurité, qui a
pu naître de leur expression.
"Dès lors, une première autorité se pré-
sente, pour la faire disparaître : c'esr le
juge. . . O n peut dire que c'est toujours le
juge qui sera saisi de ces questions, c'est tou-
jours lui que prononcera". (GANGUIER, Op.
cit., pág. 6 7 ) .
"L'azione de nullità o rescissione è il
mezzo giuridico concesso al contraente, che
se obbligò invalidamente, o fu leso dal con-
tratto, di liberarsi dagli effetti pregiudicevoli,
ottenendone 1'annullamento, o rescissione che
dir si voglia". (GIORGI, Obbligaz., vol. VIII,
n. 146, pág. 221 ).

Não há, pois, outro meio legítimo, para a parte


se desobrigar de um contrato lesivo, ou inválido, que
a ação de nulidade ou rescisão. O outro, o de que
lançou mão o governo do Amazonas, é o dos países,
onde cada um pelas próprias mãos se faz justiça a
si mesmo. Que se diria do comerciante, de qualquer
indivíduo, que, tendo dado letras suas em pagamento,
um belo dia as declarasse nulas, intimando o porta-
dor a restituí-las ? Que êle se constituía juiz na sua
própria causa, esquecia a existência dos tribunais, e
burlava por um ato de violência a sua palavra solene.
TRABALHOS JURÍDICOS 55

O abuso não varia de caráter, por ser obra do


Estado; visto que o princípio universal, admitido hoje
ainda pelos mais extremados regalistas, é que o Es-
tado, quando contrata, utitur jure privatorum, a sa-
ber, que
o Estado, nos seus contratos, é pessoa de di-
reito civil, sujeita às regras de direito civil.
Ninguém, presentemente, contesta o princípio
da igualdade nos contratos entre o Estado e os par-
ticulares.
"II giudice estraneo ed indipendente
deve vedere, senza riguardo a bene pubblico
o private se infatti quel diritto che s'invoca
sussiste, in quali confini va guarentito, se una
violazione veramente ebbe luogo, se un danno
dev'essere riparato. Deve dare il suum egual-
mente, cosi aliamministrazione come ai pri-
vato, rendere giustizia. In questo suum si pa~
rificano le parti". (PÉRSICO, Principii di di-
ritto aministrat., vol. II, pág. 234).
"E* sotto altra forma, in altra funzione,
che 1 amministrazione sovrasta e comanda :
ma in quello che scende a combattere col pri-
vato intorno ad un diritto che costui pretenda
gli appartenga, mentre quella sostiene di no,
le armi debbono essere eguali come in ogni
altro duello giudiziario". (PÉRSICO, Ibid.)
"E* il potere giudiziario il naturale giu-
dice di tutte le questioni appartenenti ai di-
ritto civile contrattuale, siano in esse interes-
sati privati, siano pubblice enti". ( R O M A -
NELLi, Questioni di diritto civ. e commerc,
pág. 61, n. 9 ) .
56 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

"Cio l'abbiam Io detto fin datto principio:


Io Stato, se contratta, é una persona giuri-
dica". Ib., pág. 63, n.° 11).
No mesmo sentido : ORLANDO, Tratt.
compl. di Dir. amministr.. vol. I, pág. 104.
M E U C C I , Istituz. di Dir. aminimistr.,
pág. 69.
MANTELLINI, LO Stato e il Códice civile,
vol. I. pág. 54.
GRECO, // nuovo dir. ammininistratt. Hal.
pág. 247.
Não continuarei; porque teria de enumerar quan-
tos sobre o assunto discorrem. Bastará para resu-
mir o jus receptum no assunto, reproduzir a lição de
um dos mestres na escola francesa, que, como se sabe.
pende exageradamente para a desigualdade em fa-
vor do Estado :
"L'interprétation d'un acte administratif
doit être donnée par l'autorité de qui émane
cet acte, ou, s'il s'agit d'actes anciens, par
l'autorité qui a remplacé celle dont l'acte
émanait. Il en est ainsi du moins pour les actes
administratifs autres que les contrats; car,
pour les contrats, il n'est pas possible qu'une
des parties en cause vienne seule déclarer quel
est le sens d'un acte, qui n'a été complet que
par l'accord des deux parties. Dans ce der-
nier cas, c'est au juge appelé à statuer sur
les difficultés relatives à l'exécution du con-
trat qu'il appartient de prononcer". (Aucoc,
Droit administr. vol. I, pág. 505, n. 293).

Isto posto, aqui terminarei, respondendo aos


três quesitos :
TRABALHOS JURÍDICOS 57

1.° Absolutamente não era lícito ao governo


do Amazonas, sem aquiescência do outro contra-
tante, sobrestar no pagamento dos títulos emitidos
em satisfação do compromisso, que assumira, subs-
crevendo um terço do capital na fundação do Banco.
2.° Só por sentença judicial, em ação de res-
cisão do contrato, provando-se lesão, ou nulidade, se
poderia ele resilir.
3.° Ao contratante prejudicado cabe indubi-
tavelmente direito às perdas e danos, não havendo
hoje quem ponha em dúvida que o Estado responde
deste modo pela culpa de inobservância nos seus
contratos.
Este o meu parecer.
Rio, 26 de dezembro de 1900.
Rui BARBOSA
Ill
CONCESSÃO DE SERVIÇO
PÚBLICO
RATIFICAÇÃO TÁCITA DO LEGISLATIVO. EXORBITÂNCIA.
VÍCIO DE FORMA E PODER COMPETENTE PARA
DECLARÁ-LO

PARECER
N O T A DO REVISOR

O Congresso do Estado do Amazonas, por uma reso-


lução de 1898. autorizou o Poder Executivo local a contra-
tar com uma empresa que mais vantagens oferecesse, uma
linha de navegação entre Manaus e a Capital Federal. Con-
vertida a proposição na lei n" 242, de outubro de 1898. foi
esse ato posto em execução meses depois, celebrando o go-
vernador um contrato com a firma Antônio Luculo de Sousa
e Silva, assinado a 11 de agosto de 1899.
Alegando-se não ter sido precedido o ato da necessária
concorrência administrativa, e reputado esse requisito legal
como uma formalidade intrínseca, foi a concessão anulada
pelo novo governador do Estado.
Ocorre, entretanto, que o Congresso estadual, na vota-
ção da lei de meios para o exercício de 1899, havia consig-
nado a verba destinada a satisfazer a prestação a que se
obrigara o chefe do executivo local. Essa deliberação do le-
gislativo implicava, sem dúvida, numa ratificação tácita, num
assentimento ao ato do governador, autoridade executora
da resolução do poder légiférante. É evidente que, sem essa
forma de anuência, seria anulável o ato inquinado de vício
originário, qual fosse a ausência da concorrência que haveria
de preceder à celebração do convênio.
Consistindo a autorização numa espécie de mandato,
uma delegação, não havia como o mandatário exceder os
poderes conferidos, e como tal se considerava a prática de
ato não revestido das condições prescritas. Essa exorbitân-
cia foi. contudo, implicitamente homologada pelo Congresso,
62 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

mediante a sua aquiescência tácita manifestada na lei orça-


mentária.
Aqui. mais uma vez. foi ventilada a tese da igualdade
do Estado quando tem de pactuar com pessoas de direito
privado, doutrina até então não inteiramente assimilada pelos
tribunais, que preferiam inclinar-se pela opinião de Mantellini,
e de outros autores concordes com a tese regalista.
Propôs mais tarde, em 1904, Antônio Luculo de Sousa
e Silva uma ação ordinária contra o Estado do Amazonas,
em que reclamava a indenização de 3.648:000$, pela inexe-
cução do contrato, sendo a lide julgada procedente, para o
fim de ser condenada a fazenda estadual a pagar o que se
liquidasse na execução, conforme sentença do juiz José Maria
Correia de Araújo.
Interposta apelação para o Supremo Tribunal Federal
(ap. cív. 1.955), foi dado provimento ao recurso para. re-
formando-se a sentença recorrida, julgar-se improcedente a
ação (*)•
Opostos embargos, foram estes desprezados ( * * ).

(•) Acórdão de 17 de abril de 1915 (Hs. 271-273 v . ) .


(**) Acórdão de 12 de dezembro de 1919. Veja-se. para mais
informes atinentes ao pleito, o Volume X X X I X , Tomo II (Trabalhos
Jurídicos de 1912), das OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOS A.

J
CONSULTA

A lei n' 242, de outubro de 1898 autorizou o Governa-


dor do Estado do Amazonas a contratar com quem mais van-
tagens oferecesse uma linha de navegação a vapor de Ma-
naus à Capital Federal, determinando que na concorrência
que se fizesse não fossem recebidas e aceitas propostas, por-
ventura, apresentadas por Companhias já subvencionadas
pelo Estado, ou pela União.
O Governador, servindo-se da autorização que lhe foi
conferida, contratou em 11 de agosto de 1899 com Antônio
Luculo de Sousa e Silva o aludido serviço, sem que tivesse
precedido ao contrato a concorrência recomendada pela lei.
Publicado o contrato no Diário Oficial de 19 do re-
ferido mês de agosto o Congresso Legislativo, que então se
achava reunido, consignou na lei orçamentária vigente a
verba correspondente à subvenção por trinta e seis viagens,
que tantas são as determinadas pelo contrato no seu pri-
meiro ano de execução.
Posta assim a questão, pergunta-se :
O ato do Congresso Legislativo consistente na consig-
nação da verba exigida pelo primeiro ano de execução do
contrato não importará uma aprovação do mesmo contrato
a despeito da falta de concurrência estabelecida na lei ?
Na hipótese afirmativa, poderá o contrato ser anulado
por força da falta de concorrência ?
Na negativa, poderá o Poder Executivo decretar a anu-
lação do contrato, ou somente o Poder Judiciário, em virtude
da ação competente ?
Vai a resposta em separado, nesta data. Rio, 6
de novembro, 1900.
Rui BARBOSA
Parecer
i

Mediante a lei n.° 242, de 13 de outubro de 1898,


o poder competente, no Estado do Amazonas, auto-
rizou o executivo a contratar, com quem mais vanta-
gens oferecesse, uma linha de navegação entre o
porto de Manaus e o do Rio de Janeiro. Na concor-
rência que se fizesse, acrescentava esse ato legisla-
tivo, no art. 2.°, não se aceitariam propostas de em-
presas ou companhias já subvencionadas pelo go-
verno da União, ou pelo daquele Estado.
Eram duas restrições, que destarte ali se esta-
beleciam à faculdade outorgada : a condição da con-
corrência e a exclusão de pretendentes já favoreci-
dos pelos cofres estaduais, ou federais.
Contratando, porém, esse serviço com Antônio
Luculo de Sousa e Silva, em 11 de agosto de 1899, o
governador não observou a primeira dessas duas
cláusulas, e parece que violou também a outra.
Mudada a administração, o sucessor daquele
que celebrara o contrato, anulou-o, por ato de 9 de
agosto deste ano, estribando-se nessas duas faltas.
Entre as duas datas, porém, medeara uma cir-
cunstância digna de nota, para que na consulta se
nos chama a atenção. Estava reunido o congresso,
quando se firmou o contrato; e, publicado este no
Diário Oficial de 19 de agosto, a lei orçamentária em
vigor (n.° 266, de 6 de outubro de 1899) consignou,
no art. 1.°, sob o n.° 137, para a navegação entre o
66 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Amazonas e a capital federal a quantia de Rs. . . .


7?0.000:000$000. "verba", diz a proposta, "cor-
respondente à subvenção por trinta e seis viagens,
tantas quantas as determinadas pelo contrato no pri-
meiro ano da sua execução".
Não obstava, pergunta-se, esse ato do congresso
ao poder executivo a deliberação, que adotou, de
rescindir o contrato ?
Parece-me evidente que obstava.
N o contrato feito com Antônio Luculo o go-
verno do Estado obrara por uma autorização, a sa-
ber, por uma delegação legislativa. "La délégation
législative", escreve um dos mestres em matéria
administrativa, "a toujours le caractère d'un mandat
donné par le législateur, qui communique à son man-
dataire une partie de la puissance législative". ( L A -
FERRIÈRE : Traité de la juridiction administrative.
Ed. de 1896. Vol. II, pág. 11.)
Ora o mandatário tem obrigação de ser fiel ao
mandato. Diligenter mandati fines custodiendi sunt,
nam qui excessit, aliud quid fecisse videtur. (L. 4 D.,
Mandat.) N o caso não houve desvio quanto ao que
os jurisconsultes denominam as qualidades intrínse-
cas do mandato. Executando-o, o governador não
substituiu o seu objeto por outro. Contratou a nave-
gação prescrita : fêz idêntica, exclusiva e totalmente
a coisa determinada. Nas qualidades extrtnsecas, na
maneira por que o comitente o mandou executar, na
forma, em suma, do mandato, é que não houve con-
formidade perfeita entre êle e o seu desempenho. A
forma mandati non est recedendum, sive respiciat
res, sive personas, sive locum, sive tempus. ( BALDUS,
in leg., 1, D. de exercit. act.). Mas tanto basta, para
viciar o ato praticado; pois não menos na forma que
na substância a execução da incumbência recebida
TRABALHOS JURÍDICOS 67

havia de manter-se intra fines praepositionis. "Non


essendo adempita la forma dei mandato, non è te~
nuto il mandante a osservare e ratificare cio che uien
fatto dal mandatário". (CASAREGIS, Disc. 119, n.° 9 ) .
Desde que o mandatário exorbitou dos seus po-
deres, cessa de obrigar aquele, que lhos deu; porque
o princípio da representação limita estritamente pelos
termos do instrumento de outorga a presença do
mandante no contrato. O mandante não contratou,
não foi parte no convênio, permaneceu fora dele,
desde que o seu representante ultrapassou os con-
fins do mandato. "É um terceiro o mandante quanto
às convenções, que o mandatário pactuou fora da
procuração".
(LAURENT : Princip. de Dr. Civ., vol. X X V I I I ,
n.° 64.)
Mas, se o ato perpetrado pelo mandatário não
excedia os legítimos limites da ação do mandante,
isto é, se o mandante podia ter licitamente autorizado
o seu representante a consumá-lo, a saber, se podia
consumá-lo êle mesmo, por si, ou por outrem, de
modo que apenas lhe faleceu, para ser jurídico e efi-
caz, a existência, no mandato, de poderes suficien-
tes, a lacuna desaparece, a nulidade se repara com
o assentimento ulterior do mandante ao acordo em
seu nome concluído.
"A lei permite ao mandante ratificar o
que o mandatário fêz além dos seus poderes.
Ratificar o mesmo quer dizer que consentir
aprovando o ato, que o mandatário praticou
sem autorização. O consenso dado após o ato
eqüivale ao poder conferido antes do ato.
Neste sentido se sói dizer que a ratificação
eqüivale ao mandato. A ratificação não emana
68 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

de um dos contraentes : emana de um ter-


ceiro, isto é, do mandante. Entre as partes, o
mandatário e o outro contratante, válido é o
contrato; mas o mandante é estranho a êle.
que lhe não aproveita, nem dana. Está, po-
rém, nas suas mãos ratificar o ajuste, apro-
vando o que o mandatário concluiu sem man-
dato. Supõe a ratificação, pois, a existência
de um mandato, que o mandatário transpôs.
Ela supre o que ao poder do mandatário min-
guava. Dado depois do ato do mandatário,
presume-se que o assentimento se deu antes
desse ato. E esse consenso revalida tudo".
— LAURENT : Op. cit., v. XXVIII,
n.° 65. —
Alguns períodos adiante observa ainda o mesmo
autor :
"A analogia existente entre a confirma-
ção e a ratificação dá origem a uma dificul-
dade. É de princípio que se não podem con-
firmar atos inexistentes; porquanto não se
valida o nada. Será o mesmo a respeito da
ratificação ? O ato, que o mandante ratifica,
tem existência, desde que reúne as condições
requeridas para as convenções entre o man-
datário e terceiros. Não existe, porém, com re-
lação ao mandante, por não se ter este re-
presentado, supondo-se que o mandatário ex-
cedeu as raias do mandato. Mas, se o man-
dante aquiesce depois de estipulado o acordo,
essa aquiescência convalida tudo".
— Ib. n.° 68. —
Tal a doutrina de todos os expositores e de to-
das as legislações, já muito antes de estatuir o có-
TRABALHOS JURÍDICOS 69

digo civil francês : "Le mandant est tenu d'exécuter


les engagements contractés par le mandataire, con-
formément au pouvoir qui lui a été donné. Il n'est
tenu de ce qui a pu être fait au delà, qu'autant qu'il
l'a ratifié expressément ou tacitement". (Art. 1.998.)
No mesmo sentido :
o cód. civ. italiano, art. 1.752;
o cód. civ. belga, art. 1.998;
o cód. civ. hoi., art. 1.844;
o cód. civ. esp., art. 1.727;
o cód. civ. portug., art. 1.351;
o cód. civ. alem., art. 144;
o cód. civ. chil., art. 2.160;
o cód. civ. arg., arts. 1.093-4.

C O E L H O RODRIGUES : Proj. de cód. civ., art.


1.082;
BEVILÁQUA : Proj. de cód. civ., a. 1.457;
C. DE CARVALHO : Nova ConsoL, a. 1.358;
Cód. comerc. brasil., art. 163;
TROPLONG : Mandat, n.° 601;
DURANTON : Cours, v. XVIII, n.° 260 e segs.;
T H I R Y : Cours, v. IV, n.° 231, pág. 210;
H u e : Comment., v. XII, n.° 87, pág. 113.
AUBRY ET R A U , § 415;
RICCI : Corso, vol. IX, págs. 161 e segs.;
A R N T Z : Cours, vol. IV, pág. 162, n.° 1.482;
LOMONACO : Istituzioni, vol. V I , pág. 444;
PACIFICI-MAZZONI : Istituz.. vol. V, pág. 365;
D E FILIPPIS : Corso, vol. VII, pág. 209, n.° 432.

Ninguém, portanto, poderia hoje pôr seriamente


em dúvida a regra, formulada há muito e adotada
em tôda a parte, de que rati-habitio mandato equi-
paratur, isto é, de que os poderes correspondentes
70 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

ao cometido excesso de mandato se consideram re-


troativamente nele inseridos pela ratificação. Figu-
ra-se, por uma indução natural, que o mandante va-
riou de intento, que, esclarecido pelo ato do manda-
tário, ou induzido por circunstâncias posteriores ao
mandato, acolheu como favorável aos seus interesses
o arbítrio assumido pelo seu representante.
"La ratifica ha suo fondamento nella mu-
tata volontà dei mandante, imperocchè ciò che
da esso non si voleva allorchè conferiva il
mandato, può volersi dopo 1'operato dei man-
datário, in quanto quello che ha fatto costui
può apparirgli opportuno e conveniente".
— RICCI, loc. cit.—
Só num caso seria impossível a ratificação : se
o ato praticado pelo mandatário, ou o compromisso
por êle tomado em nome do mandante fosse ilícito a
este, ou por não estar na órbita dos seus direitos, ou
por ser em absoluto contrário à lei. Nessa hipótese,
porém, a convenção não seria anulável por exorbi-
tância do procurador no exercício da comissão : se-
ria inexistente por uma nulidade intrínseca ao objeto
do excesso por êle cometido. Dado isso, a ratifica-
ção seria impossível; porque ninguém pode ratificar
o que não poderia fazer, ninguém pode aprovar o
que não poderia autorizar. A ratificação é uma dele-
gação póstuma, retroativa; e não se delegam pode-
res, que se não têm. "Se a nulidade fôr perpétua ',
diz LAURENT, "ipso facto é irreparável. A razão é
simples e evidente : subsistindo sempre o vício, a
confirmação estaria tão viciada, quanto o convênio
que se trata de confirmar". (Princip. de dr. civ., v.
XVIII, pág. 549, n.° 599).
TRABALHOS JURÍDICOS 71

Mas é óbvio que tal não sucede na espécie ver-


tente. Nada obstava a que o congresso do Amazo-
nas, na lei de 13 de outubro de 1898, que autorizou a
subvenção a uma linha de vapores entre a capital da-
quele Estado e a do país, se abstivesse das duas
cláusulas, cujo descumprimento serviu de base, mais
tarde, ao ato rescisório do poder executivo. Se a
constituição do Amazonas não limita, a esse respeito,
a ação da legislatura estadual, como certamente não
o faz. se não obriga o congresso do Estado a sub-
meter a concorrência essas concessões, nem as ads-
creve à condição de se não darem a empresas ou
companhias já subvencionadas, claro está que o con-
gresso amazonense poderia não ter estipulado essas
duas ressalvas, no ato que ordenou aquela despesa.
Logo, estava indubitavelmente no seu direito, ratifi-
cando o arbítrio da concessão administrativa, que as
desprezara. Podia estar por elas em agosto de 1898.
e variar de resolução no ano seguinte. A precaução,
ordinariamente salutar, da concorrência nem sempre
satisfaz melhor os interesses gerais. Tal fosse a es-
colha, tais as condições do contrato, que os legisla-
dores do Estado tivessem motivos, para o adotar, re-
levando ao executar o desvio, em que incorrera.
Quanto à exigência de não recair a concessão em
empresa já contemplada com subsídios gerais ou es-
taduais, manifestamente arbitrária como é, não admi-
raria se lhe reconhecesse a inconveniência, e se lhe
dispensasse a execução por inútil, ou daninha.
Que o congresso podia, pois, ratificar o ato de
11 de agosto de 1899, pelo qual se fêz a concessão a
Antônio Luculo, não padece dúvida nenhuma. Tudo
está em saber se de feito o ratificou.
72 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Quais as condições jurídicas da ratificação ?


Há mister, por ventura, de ser expressa ?
Não : pode ser tácita.
É o que estabelecem, assim no tocante à ratifi-
cação propriamente dita, como no que respeita à con-
firmação, todos os códigos e todos os jurisconsultos.
Quanto à primeira, basta reportarmo-nos às leis
e autores acima citados. Quanto à segunda, equipa-
rada neste particular à primeira. (LAURENT, Princip.
de dr. civ. v. X X V I I I , pág. 59, n.° 70), indicaremos
as fontes e autoridades seguintes :
Cód. civ. fr., art. 1.338;
Cód. civ. ital., a. 1.309-1.311;
C. civ. esp., a. 1.309-1.313;
C. civ. chil., a 1.693-7;
C. civ. arg., art. 1.093-9;
T . DE FREITAS : Consol., n.° 31 ao art. 26,
pág. 23;
C . DE CARVALHO : N. Consolida págs. 95-6;
Pandectes Françaises, v.° Obligat., ns. 6.440.
6.628;
LOMONACO : Obbligaz., vol. II, pág. 581 s.;
GIORGI : Obblig.. v. VIII. págs. 275, 285;
BARASSI : Delia ratifica, págs. 320, 322, 325-35;
BARTOLI : La ratifica, p. 183.
PiZE : De l'inexistence et de Vannulabil. des
contrats, pág. 252.
D U R A N T O N : Cours, vol. XIII. pág. 278;
LAROMBIÈRE : Obligations, vol. V I , pág. 350;
H u e : Cours, vol. VIII, págs. 343 segs.;
PLANIOL : Tr, élém., vol. II, n.° 1 .354;
BUFNOIR : Propriété et contrat, págs. 714-17;
TRABALHOS JURÍDICOS 73

ZACHARIAE, éd. MASSÉ e V E R G É , V. III, pág. 485;


CHIRONI: Istituzioni, v. I, § 75, pág. 123;
WINDSCHEID : Pandekt., § 74.

Como se verifica a ratificação, ou a confirmação


tácita ? "Mandatorem habentem certam scientiam de
excessu sui mandati", dizia CASAREGIS (Disc. 30,
ns. 61 e 62), "eique neque facto, neque verbis con-
tradicentem, haberi pro approbante, dummodò cum
scientiâ concurrat aliquis actus". Se o mandante,
ciente do excesso aventurado pelo mandatário, não
só o não repudia, mas convém nele por algum ato ex-
terior, tem-se por anuente.
A ratificação pelo mandante "não se acha ads-
trita a nenhuma forma determinada", e, sendo tá-
cita, "pode resultar de quaisquer circunstâncias, fa-
tos, ou atos, que manifestem, da parte do mandante,
a vontade certa de ratificar". ( H u e , vol. XII,
pág. 114, n.° 88).
O mais significativo desses fatos é o indicado
no art. 1.338 do código civil francês e no art. 1.309
do código civil italiano, ambos concernentes à con-
firmação, mas ambos aplicáveis, nesta parte, à rari-
ficação igualmente : a execução voluntária, ainda
que parcial, do contrato anulável por aquele, a quem
assistia o direito de invocar-lhe a nulidade, isto é,
pelo mandante.
Não sendo esse o único meio de operar a ratifi-
cação (Pandectes franc., loc. cit., n.° 6.628; D U R A N -
TON, vol. XIII, n.° 267; LAURENT, vol. XVIII, n.° 620;
BAUDRY-LACANTINERIE, vol. II, n.° 1.241), é, toda-
via, o mais expressivo, o mais concludente.
E, na hipótese, é o que se realiza.
Senão, vejamos.
74 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

O contrato argüido pelo governador atual de


inválido teve a sua celebração em 11 de agosto de
1899.
Oito dias depois era estampado no Diário Ofi-
cial n.° 1.651, pág. 16.822.
Funcionava então o congresso estadual, de que
aquela publicação é igualmente órgão.
Estava deste modo, pois, estabelecida, com to-
dos os seus requisitos solenes, a publicidade legal a
respeito do contrato, em que o governo do Estado
acabava de dar execução à lei estadual.
Se essa execução desaprovasse ao legislador,
estavam-lhe à mão os meios de repudiá-la; e para
isso bastava um fato negativo : omitir, no orçamento
que se elaborava, os recursos pecuniários para a sub-
venção, que esse contrato ajustava.
Pois bem : foi precisamente o contrário o que
fêz o congresso.
O contrato de 11 de agosto, publicado no Diá-
rio Oficial de 19 desse mês, avençava, na cláusula
XXIII, que o concessionário, durante o primeiro de-
cênio, perceberia de subvenção 20:000$ (*) por via-
gem, assim como, pela cláusula XI, que nos primeiros
seis meses se fariam duas viagens mensais, e daí em
diante quatro mensalmente. De acordo, pois, com a
cláusula XI, haveria, no primeiro ano, trinta e seis
viagens, correspondendo, segundo a cláusula XXIII,
a uma subvenção de 720 contos.
E que fêz o congresso estadual ?
Ciente do contrato, que se firmara estando a le-
gislatura reunida, e se publicara logo depois na sua
folha oficial, votou para essa navegação, exatamente
(*) No original (manuscrito) está: 20.000:000$. [Vinte mil
contos).

TRABALHOS J URÍDICOS 75

no decurso daquele ano, os 720 contos, que aquela


convenção estipulava.
Logo executou, por sua parte, o contrato; visto
que, por parte do poder legislativo, executar aquele
contrato era decretar a verba para a subvenção, a que
ê/e obrigava os cofres estaduais.
Logo. operou assim a ratificação tácita pelo
modo mais solene, que o direito lhe conhece : a exe­
cução do contrato.
Daí em diante nem o próprio poder legislativo,
que já o aprovara com essa notoriedade e essa pre­
cisão, podia rescindi­lo, quanto mais o executivo, au­
tor da irregularidade que a ratificação legislativa
sanara.
A situação era a que um grande pandetista ale­
mão definira nestas palavras :
"Se alguém concluiu um negócio jurídico
em nome de outrem, sem estar autorizado, re­
leva saber se o negócio jurídico foi, ou não,
ratificado pela pessoa, em cujo nome se obrou.
Não havendo resolução, o negócio jurídico
está pendente; não se lhe nega a eficácia ju­
rídica : apenas se suspende. . . Mas, ocor­
rendo a ratificação, com ela se repara a defi­
ciência originária de faculdades no represen­
tante, e o negócio jurídico adquire, para o ra­
tificante, a mesma eficácia que se houvesse
ultimado por incumbência sua".
~ WINDSCHEID : Pandekt., § 74.
A consignação da verba orçamentária para a
subvenção, portanto, importando na execução legis­
lativa da concessão feita pelo governo, transforma o
ato deste como representante da legislatura em ato
76 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

direto dela mesma; que tal é o alcance da ratificação


consumada por fatos de expressão indubitável.
Logo, o ato administrativo de 9 de agosto de
1900, declarando sem efeito, a pretexto de exorbi-
tante das cláusulas da autorização legislativa, a con-
cessão dada, no ano anterior, a Antônio Luculo, não
é mais que um excesso de poder, contra o qual cabe
ao prejudicado incontestável direito à reintegração
no seu contrato, ou à indenização das perdas e da-
nos, que lhe causar o esbulho.
II
Quer sob o antigo regimen, quer sob o atual, e,
sob o atual, assim nos tribunais dos Estados, como
nos da União, a nossa jurisprudência sempre consi-
derou as concessões outorgadas pelo governo a par-
ticulares e solenizadas por escrituras formais de con-
tratos como sujeitas aos princípios de direito privado
quanto às obrigações e deveres entre os contraentes,
negando ao mais poderoso dos dois o direito, que
êle freqüentemente se arroga, de romper a seu sa-
bor essas convenções, e submetendo-o, nesses casos,
às leis da responsabilidade civil.
Mas ainda entre os advogados mais estremes os
da autoridade do Estado, ainda entre os mais aves-
sos a equipará-lo nas relações com os particulares,
em matéria de interesses, às pessoas de direito pri-
vado, não se contesta que às normas deste fica o
Estado adstrito, quando contrata. Ninguém mais
suspeito nisto que MANTELLINI; e, todavia, êle aber-
tamente o reconhece :

"Lice al privato 1'agire cwilmente con


Io Stato, quando il privato agisce di privata
ragione o come singolo, e per rapporti dove Io
Stato assuma veste civile; o, se ed in quanto
TRABALHOS JURÍDICOS 77

lo Stato possega, contratti o litighi. Persona


giuridica, o di diritto, lo Stato ente politico
nell'impero e nella giurisdizione, aggiunge
ueste civile nella gestione, se ed in quanto
possiede, se ed in quanto contratta, se ed in
quanto piatisce".
— Lo Stato e il Códice Civile, vol. I,
pág. 54.
Eis aí : o Estado, se e enquanto contrata, é pes~
soa civil.
Oiça-se a autoridade, mais recente e não menos
valiosa, do grande tratado de direito administrativo
editado por ORLANDO com a colaboração dos primei-
ros especialistas italianos, e ver-se-á reproduzida a
mesma teoria, a teoria inegável, de que o Estado,
em contratando, entra ipso facto na ordem comum das
pessoas particulares.

"Quando lo Stato emana um regula-


mento orgânico, riscuote un tributo, elimina
un assembramento periculoso, destituisce un
impiegato infedele. ordina Ia chiusura di uno
stabilimento insalubre, autorizza 1'apertura di
un pubblico esercizio, e via dicendo, esso es-
plica una attività ben distinta da quella per Ia
quale lo Stato medesimo contrae un obbliga-
Avwc di iiiuLuo, compra e vende, conduce
1'opera altrue, riceve a deposito, da in afflito
ecc. Nel primo ordine di attribuzioni il potere
esecutivo manifesta in tutta la sua efficacia
il carattere di potere sovrano; nel secondo,
per converso, mira, come le pecsone privata,
ai raggiungimento di scopi patrimoniali".
78 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

— Primo trattato completo di Diritto


Amnistrativo Italiano, vol. I, pág. 1.004.
Não há dúvida nenhuma que a concessão prin-
cipia por um ato de autoridade, por um ato de impé-
rio : esse o seu caráter no tocante à seleção do con-
cessionário e à deliberação das vantagens, dos favo-
res, dos privilégios, que se lhe outorgam. Mas, desde
que assume regularmente a forma ordinária de uma
convenção escrita, com direitos e deveres mútuos, a
figura administrativa da concessão desaparece na fi-
gura civil do contrato.
"La concessione pura non è più conos-
ciuta nella nostra pratica odierna; e 1'atto so-
vrano e governativo suole essere accompag-
nato da un contratto, che, imponendo obbli-
ghi e diritti reciproci, imunuta lindole giuri-
dica delia concessione, la quale diventa por-
tanto una figura mista chiamata da molti
Concessione-contratto, o ad instar contractus,
che tiene un luogo medio fra 1'atto autori-
tário e il contratto, e présenta il doppio ele-
mento delia concessione e dei contratto riu-
niti insieme e convergente ai medesimo in-
tento. Logicamente portanto, 1'atto di auto-
rité precede il contratto, ed investe il conces-
sionário dei diritti regali necessari per il com-
pimento e 1'esercizio deli'opera : Ia figura
contrattuale sussegue, e ridure Ia concessione
ai critério delia giustizia commutativa, per
quanto è conciliabile con l'intéresse pubblico.
modificando quella révocabilité e insindaca-
bilità assoluta, che altrimenti avrebbe Ia con-
cessione pura".
— GIORGI : La dottrina delle persone
giuridiche, vol. II, pág. 461-2. —
TRABALHOS JURÍDICOS 79

"Sia una legge spéciale, sia un decreto


reale quello que sanziona Ia concessione,
ogruno di questi atti sovrani suol essere ac-
compagnato da un contratto, e da uno o più
capitolati, i quali determianano compitamente
gli obblighi e i diritti reciproci".
— lb„ pág. 463. —
Celebrado, pois, o contrato, que ultima a con-
cessão, não há, daí em diante, nas relações prove-
nientes daquele fato, senão duas partes, cujos deve-
res e direitos recíprocos são os que o instrumento do
acordo individual. A todos esses direitos, a todos
esses deveres, precede e domina, como garantia co-
mum, de lado a lado, a renúncia, por parte de ambos
os contraentes, à sua liberdade, no que for incompa-
tível com a observância do pactuado. Ambos eles.
em conseqüência, implicitamente se obrigam a sub-
meter aos tribunais as questões suscitadas pelo con-
trato, e a não se libertar deles por ato de sua própria
vontade. Ora com estas prenoções rudimentares está
em conflito aberto o arbítrio, revindicado por alguns
atos oficiais, como este, de pronunciarem a caduci-
dade, ou a nulidade das convenções em que o go-
verno é parte sujeita às mesmas regras de direito que
a outra.
Ainda quando, portanto, na espécie, existisse,
contra ?. cotio?*são HP que se trata, a tacha alegada,
só os tribunais regulares a poderiam declarar.
" O ponto de saber se o mandatário excedeu os
limites do mandato", ensina T H I R Y , "é uma questão
de fato, cometida à apreciação dos juizes". (Cours
de Droit Civil, vol. IV, n.° 231. pág. 210). P I Z E . do
mesmo modo, discutindo, na sua monografia já ci-
tada, a sanabilidade, pela confirmação, ou pela ra-
80 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

tificação, dos contratos defeituosos por ausência ou


insuficiência de poderes no procurador, ou no gestor,
observa :
" O contrato anulável existe legalmente, e, desde
que se forma, entra a gerar provisoriamente os efei-
tos do contrato válido. Sua existência, porém, é pre-
cária e como que suspensa. O contrato anulável pode,
com efeito, sucumbir à ação de anulação, que o
ameaça". (Pág. 245) BARASSI, no seu tratado espe-
cial Da ratificação, não é menos explícito : "Lannu-
lamento a luogo per via di azione", (Pág. 322,
n.° 163). E, noutro lugar : "Quando un vizio inde-
bolisce uno dei requisiti essenziali dei negozio giuri-
dico, rendendolo annulabile. Ia parte in favore delia
quale è concessa Vazione di annulamento, potrà in
vece ratificare". (Ib., pág. 197.)
Ainda quando, portanto, o vício do contrato de
11 de agosto de 1899 (*) já se não achasse reme-
diado com o disposto na lei do orçamento, absoluta-
mente não cabia ao poder executivo decretar-lhe a
nulidade sob esse pretexto. Fazê-lo, como fêz, eqüi-
valia a se constituir juiz, numa questão em que era
parte.
Mas esta resposta não damos senão por figurar,
como o último quesito da consulta, uma hipótese já
eliminada : a de subsistir, a despeito da lei n.° 296,
art. 1.°, n.° 137, a anulabilidade da concessão.
Com esse texto já evidenciamos que o congresso
deu execução legislativa ao contrato. E, de todas as
maneiras de ratificação possíveis, a execução volun-
tária pela parte competente para alegar a nulidade
é a mais decisiva.

(*) No original: 1900. Evidente engano. — N. do Rev.


TRABALHOS JURÍDICOS 81

"À défaut d'acte de confirmation ou de


ratification expresse, il suffit que l'obligation
ait été exécutée volontairement après l'épo-
que à lequelle elle pouvait être valablement
confirmée ou ratifiée. Art. 1 .338 du Code
civil.
"Une pareille exécution est aussi con-
cluante que la ratification expresse : Taciturn
quod facto demonstratur, quidem dicitur esse
taciturn quia verbis non est expressum, sed
expressum dicitur quia facto magis quam ver~
bis voluntas declaratur. Celui, en effet, qui
exécute volontairement une convention qui
l'obligeait à faire ou à délivrer quelque chose,
ne peut manifester d'une manière plus cer-
taine l'intention de faire ce à quoi il était
obligé. Les écrits peuvent être infidèles, les
paroles peuvent être trompeuses; mais les
actes d'exécution ne le sont point car il est
impossible de supposer que celui qui exécute
volontairement l'obligation qu'il a souscrite,
ne veuille pas s'y soumettre".
— (SOLON : Théorie sur la nullité,
vol. II, pág. 368-9).
Tal. ante os fatos e documentos que nos foram
submetidos, o nosso parecer.
Rio. 6 de novembro, 1900.
Rui BARBOSA
IV
FORNECIMENTO DE CARNES
VERDES
INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL

PARECER
N O T A DO REVISOR

Por um contrato assinado a 10 de novembro de 1899,


entre partes Conselheiro Rui Barbosa e a firma Salgado,
Cardoso, Lemos & Cia., comprometeu-se o primeiro dos con-
tratantes a prestar seus conselhos à empresa, na qualidade
de advogado. Prescrevia uma das cláusulas que tais serviços
consistiriam em atividades concernentes a «matérias jurídi-
cas, sem dar passo ou ter intervenção alguma [o contratante]
perante as autoridades administrativas» do País.
Restrito ao expediente normal ou ordinário da indústria
o trabalho do Conselheiro Rui, cabia-lhe, pela prestação deste,
a remuneração mensal de 2:000$000 (dois contos de réis).
O parecer que se segue, embora referente a interesses
da empresa, como tudo indica, foi suscitado por uma consulta
formulada pelo advogado Ulisses Viana.
Aqui, como em outras passagens, cabe-nos advertir não
se tratar, no caso, de célebre contenda, entre cujos prota-
gonistas se incluia a firma acima aludida, concessionária do
fornecimento de carnes verdes, à população do Distrito Fe-
deral. O incidente, que tão lamentáveis comentários teria de
suscitar, dar-se-á a 14 de janeiro de 1901, quando será res-
cindindo o contrato entre Salgado, Cardoso & Cia. e o Con-
selheiro Rui Barbosa, seu consultor jurídico.
CONSULTA

O § 99 do art. 1* do decreto municipal n. 119 de 19 de


novembro de 1894, que autorizou o prefeito a contratar com
M. Gomes de Oliveira o fornecimento de carnes verdes à
população do Distrito Federal, dispõe :
O contratante incorrerá na multa de 100$ por cabeça de gado, que
faltar para o consumo diário c habitualmente requisitado, servindo de
base a média do trimestre anterior.

Essa disposição legal constitui a cláusula 9* do contrato


com Manuel Gomes de Oliveira em data de 21 de julho de
1897.
No termo de cessão assinado, em 3 de novembro de
1899. pela firma Salgado, Cardoso, Lemos & O , cessionária
do contrato, foi dito o seguinte :
E pelos concessionários foi dito que aceitavam a presente cessão,
obrigando-se a dar ao contrato plena e inteira execução e sujeitando-se
a todos os ônus e penalidades no mesmo estipulados, e bem assim obri-
gam-se, de acordo com os contratos, a mandar cortar o número de ca-
beças de gado requisitado diàTiamentc para o consumo, tomando como
base a média do trimestre anterior ao desses contratos, pagando ã mu-
nicipalidade o imposto relativo ã dita média, e a cumprir as providên-
cias ordenadas pela diretoria de higiene c com relação ao gado destinado
ao corte.
Era tempo se declara que a média do trimestre anterior acima men-
cionada refere-se à do trimestre anterior à data em que foi lavrado o
contrato com Manuel Gomes de Oliveira, isto é, em 21 de julho de
1897.

O processo seguido para a requisição do gado a ser aba-


tido diariamente tem sido o seguinte :
88 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARiiOSA

O s açougueiros ou retalhistas. conhecendo as necessi-


dades dos açougues. que dirigem, fazem por escrito ao admi-
nistrador do entreposto de S . Diogo, empregado da prefei-
tura, o pedido do número de reses, de que carecera.
O administrador do entreposto soma o número das reses
requisitadas e faz o pedido ao diretor do matadouro, repre-
sentante da prefeitura em Santa Cruz, que por escrito requi-
sita por sua vez, dos contratantes o número de reses pedidas.
O s contratantes entregam as reses requisitadas, que
ficam sob a guarda do diretor de Santa Cruz, que as faz
abater no dia seguinte ao da requisição por pessoal da pró-
pria prefeitura.
E assim tem sido cumprido o contrato desde o início de
sua execução, isto é, fevereiro de 1898.
Expostos os elementos da questão, e juntando-se os de-
cretos citados e os termos dos contratos para a verificação.

PERGUNTA-SE

À vista do decreto citado e dos contratos de 21 de ju-


lho e de 14 de outubro de 1897. que apenas modificou a ta-
bela de preços, e do termo de cessão em data de 3 de novem-
bro de 1899. é facultado aos contratantes do fornecimento de
carnes verdes reduzir a matança diária do gado. a menos de
que a média tomada como base pelos § 9 9 do art. 1° do de-
creto n 9 119 e cláusula 9 ' do contrato de 21 de julho de 1897.
ou essa média é apenas um regulador para as requisições
diárias, além da qual os contratantes não são obrigados a
abater gado ?
N o caso de ser um regulador, a fixação do trimestre,
que devia servir de base às requisições diárias e que foi feita
no termo de cessão, isto é. o trimestre anterior à data em que
foi lavrado o contrato com Manuel Gomes de Oliveira —
alterou a situação estabelecida pelo § 9 9 da lei n 9 119, ou
TRABALHOS JURÍDICOS 89

somente pode ser considerada como a fixação do espaço de


tempo constitutivo do trimestre a que se referia o texto
lega! ?
Rio, 9 de março de 1900.
O advogado,
Ulisses Viana.
Parecer
Não percebemos que dúvida pode haver em
boa fé quanto à natureza e aos limites da obrigação
imposta aos cessionários do fornecimento de carnes
verdes pela cláusula 3." do seu contrato, reprodução
literal do art. 1.° § 9.° do decreto municipal n.° 119,
de 19 de novembro de 1894.
Reza esse texto que :
O contratante incorrerá na multa de 100$ por cabeça de
gado que faltar para o consumo diário e habitualmente re-
quisitado, servindo de base a média do trimestre anterior.
Neste período, evidentemente, a idéia domi-
nante, a que lhe contém a substância, é a contida na
oração principal : na multa de 100$ incorrerá o con-
tratante por cabeça de gado que [altar para o con-
sumo diário.
Quando se dá, logo, a falta, condição da multa ?
Quando ao consumo diário minguar alguma das
cabeças de gado por êle reclamadas, e tantas vezes
quantas forem essas cabeças.
Com essa inteligência está de acordo a prática
do contrato durante dois anos; e não pode haver me-
lhor comentário de uma convenção que a hermenêu-
tica traduzida na sua observância diuturna com o
concurso de ambas as partes contratantes. Diaria-
mente pedem os açougueiros o número de reses de
92 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

que necessitam ao administrador do entreposto de


S. Diogo, empregado municipal.
Somadas por este as requisições parciais e por
êle comunicadas ao diretor do matadouro, órgão da
prefeitura em Santa Cruz, requisita este outro fun-
cionário municipal dos contratantes o número de
reses que hão de fornecer. Esta operação, quotidia-
namente reiterada, fixa, dia por dia, o consumo diá-
rio a que eles têm de acudir.
Como, porém, são muito sérios os encargos
assumidos pelos concessionários para não deixar o
seu direito à mercê da outra parte contratante, e
demarcar-lhes um limite à aplicação da pena con-
vencional, estipulou o contrato a restritiva contida
nas palavras onde se diz que "servirá de base a mé-
dia do trimestre anterior" — servindo de base a ava-
liação do consumo diário habitual, a média do tri-
mestre indicado — precisa o máximo dentro do qual
os fornecedores se sujeitam à multa de 100$, por
cada vez que se recusarem ou não puderem suprir.
De outra sorte, por meio de requisições malè-
volamente excessivas, o outro contratante poderia
submetê-los a prejuízos incalculáveis, nulificando a
seu arbítrio o contrato, quando lhe conviesse.
Até a base estabelecida pelo consumo do tri-
mestre anterior ao contrato, que se reputa o melhor
critério do máximo consumo atingível no decurso
dele, fornecem os abastecedores contratados o gado
que a autoridade municipal reclamar; pena de 100$
por cabeça que faltar.
Se, por exceção, por caso inesperado, o consumo
transpuser aquele máximo, cessa a multa, que daí em
.
TRABALHOS JURÍDICOS 93

diante não seria equitativa, ficando a garantia redu-


zida ao interesse natural dos concessionários em sa-
tisfazer a procura crescente da sua mercadoria.
Não é bem empregada, pois, a frase adotada no
primeiro quesito, quando ali se pergunta : "Se é fa-
cultado aos contratantes de carnes verdes reduzir a
matança diária a menos do que a média aludida".
Não é a firma concessionária que reduz a ma-
tança : o consumo é que se reduz. A requisição mu-
nicipal é que se reduziu, não podendo ir além das
exigências do consumo, calculadas pelas solicitações
dos retalhadores.
Seria despropósito admitir que se pudesse re-
quisitar do fornecedor quantidade maior de reses
que a determinada pela procura dos cortadores nos
seus pedidos à repartição municipal.
Se eles somam 250 ou 300 reses, fora absurdo
matar 350 ou 400. E, quando não se requisite senão
para matar, claro está que nem a requisição pode ir
além da matança, nem a obrigação dos fornecedores
além da requisição.
Em suma : os pedidos limitam a requisição. A
requisição limita a responsabilidade dos fornecedo-
res.
Nem a prefeitura pode requisitar mais do que os
retalhadores requerem.
Nem os concessionários estão adstritos a for-
necer mais do que os pedidos arbitram.
A média é a garantia da máxima responsabili-
dade penal dos contratantes do fornecimento. Não
os obriga a entregar diariamente o número de cabe-
ças nela estipulado.
94 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Obriga-os a ministrar até esse limite a soma


que o comércio de carne verde reclamar à prefeitura,
Isso, a nosso vêr, é inegável.

O tópico a que se alude no termo de cessão é


meramente declaratório. Êle próprio formalmente o
diz nas expressões : "Em tempo se declara".
E que declara êle ?
Que "a média do trimestre anterior acima men-
cionada refere-se à do trimestre anterior à data em
que foi lavrado o contrato com Manuel Gomes de
Oliveira ( * ) . isto é, em 21 de julho de 1897".

( * ) O contrato celebrado entre a Prefeitura do Distrito Federal e


Manuel Gomes de Oliveira, para fornecimento de carnes verdes, foi au-
torizado pelo decreto municipal p.* 119. de 19 de novembro de 1894. Fir-
mado aos 21 de julho de 1897, teve, posteriormente, modificadas algumas
de suas cláusulas, na conformidade das autorizações conferidas nos de-
cretos 439 e 475. respectivamente de 14 de outubro e de 20 de novem-
bro, ambos de 1897. A duração do contrato seria de três anos. devendo
assim expirar a sua eficácia em igual data de 1900.
Alegando-se contrariar os seus termos o sistema da Constituição de
24 de fevereiro de 1891. intentou o cidadão Custódio Ramos da Silva a
sua nulidade. sem que. entretanto, tenha obtido êxito na sua pretensão. A
respeito da matéria, e por solicitação do advogado Cândido Mendes de *
Almeida, emitiu Rui Barbosa um parecer, em 9 de fevereiro de 1898, já
publicado no volume X X V , Tomo I V de suas OBRAS COMPLETAS
(págs. 87-98).
Impossibilitada de dar execução ao contrato, transferiu Manuel Go-
mes de Oliveira a concessão que lhe fora outorgada ã firma Carmo &
Cia., havendo esta última cessionária, por sua vez, também por impos-
sibilidade, deixado de cumprir o pactuado. Organizou-se, aos 12 de ja-
TRABALHOS JURÍDICOS 95

Por essa cláusula, pois, de natureza meramente


interpretativa, segundo ali convém às duas partes
contratantes, ficou assentado que o trimestre, a cuja
média ali se alude, é o anterior a julho daquele ano.

Friburgo, 11 de março de 1900.


Rui BARBOSA

nciro de 1898, a sociedade Mates, Guimarães 6 Cia. com o objetive de


por em execução o contrato, o que igualmente não conseguiu.
Constituiu-se, então, a sociedade Matos, Guimarães, Honold £> Cia.,
que falia tempos depois.
Em face de tais sucessos, originou-se momentosa demanda no foro
do Distrito Federal, conforme é possível verificar-se do processo que se
converteu no recurso extraordinário nv 375 e da série de publicações sur-
gida no curso da lide.
V
SOCIEDADE COMERCIAL
INEFICÁCIA DOS ATOS PRATICADOS POR SÓCIO APÓS
SUA EXCLUSÃO — REMÉDIO JURÍDICO

PARECER
N O T A D O REVISOR

A firma Salgado, Cardoso, Lemos & Cia., sociedade co-


mercial comanditada, explorava, na qualidade de concessio-
nária por transferência de contrato celebrado originàriamente
entre M. Gomes de Oliveira e a Prefeitura, o fornecimento
de carnes verdes ao Distrito Federal.
Em reunião de sua diretoria, e de acordo com o que es-
tipulava uma das cláusulas do ato constitutivo, resolveu a
sociedade excluir o sócio Horácio José de Lemos. Não re-
conhecendo este a eficácia do ato, continuou as atividades
próprias de sua condição de sócio, em nome da firma pra-
ticando tudo o que até então lhe competia.
Em tais circunstâncias, formulou a firma uma consulta
aos Conselheiros Rui Barbosa e Lafayette Rodrigues Pereira,
coincidindo as conclusões deste com as de Rui. Emitiu o pri-
meiro o parecer que ora sai estampado pela segunda vez. co-
piado do exemplar conservado na Casa de Rui Barbosa.
Cumpre, aqui, advertir que, muito embora evidencie o
escrito certa afinidade com momentoso caso ocorrido na
época, nada tem êle de comum com o mesmo, do qual se
trata noutro local do volume seguinte, o de número XXVIII.
CONSULTA

No contrato de sociedade de A. B. C. & C. há as se-


guintes estipulações :
CLÁUSULA V

«A gestão geral da sociedade compete aos sócios soli-


dários coletivamente, que deliberam, mediante convite pré-
vio, estando presentes quatro sócios, por maioria de votos,
sobre as operações sociais, lavrando-se ata das deliberações,
que será assinada pelos que nelas tiverem tomado parte. Não
tendo lugar a primeira reunião por falta de número, a se-
gunda funcionará com três sócios solidários. Os convites
para as reuniões serão feitos pelo sócio Gerente ou por qual-
quer sócio solidário.
Os sócios solidários distribuíram entre si os serviços
permanentes ou temporários, de que cada um deles deva ser
exclusiva e particularmente incumbido e determinaram a es-
fera de ação do sócio em cada um dos mesmos serviços, bem
como nomearam um Gerente e um seu substituto para o caso
de falta ou impedimento do mesmo Gerente, de que de tudo
será lavrada uma ata.
O Gerente e seu substituto, que será denominado Sub-
Gerente, podem ser substituídos, bem como os sócios, aos
quais tiver sido distribuído qualquer ramo de serviço, tem-
porário ou permanente, pela maioria dos sócios solidários.
A nomeação do Gerente e a do Sub-Gerente, bem como
o exercício deste, serão publicados na imprensa para o co-
nhecimento de terceiros.
A representação da sociedade em Juízo e fora dele, e a
execução das deliberações tomadas pelos sócios, é incum-
102 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

bida ao sócio Gerente, e, na sua falta ou impedimento, ao


Sub-Gerente.
A firma social em escrituras, procurações, letras de câm-
bio ou de terra, cheques sobre bancos, e em quaisquer outros
instrumentos ou documentos de obrigações ou de exercício de
direitos da sociedade, será usada pelo sócio Gerente com a
assinatura da mesma firma por outro sócio solidário.
Na execução dos atos de gestão dado qualquer desa-
cordo entre o sócio Gerente e qualquer dos sócios solidários,
será o ponto de desacordo decidido pela maioria dos sócios
solidários. Não se verificando maioria dos sócios solidários
para a decisão, será o ponto definitivamente decidido pela
maioria, em reunião de todos os sócios presentes, solidários
e comanditários.
Das divergências entre os sócios e das decisões dadas
serão lavradas atas no livro destinado às deliberações des
sócios solidários».
CLÁUSULA XIII

«A infração de qualquer das cláusulas do presente ins-


trumento ou dos encargos conferidos aos sócios nos termos
da cláusula V, determinará a exclusão do sócio infrator, in-
dependentemente da dissolução da sociedade, devendo o ca-
pital, lucro e quota do fundo de reserva (que serão nesse caso
reconstituídos), ser-lhe pagos em letras de aceite da firma,
a prazo nunca excedente de seis, nem inferior de três meses.
A deliberação sobre a exclusão do sócio será tomada
por maioria em reunião dos sócios presentes, solidários e co-
manditários, para esse fim convocada, devendo achar-se pre-
sente o sócio a ser excluído, salvo o seu não comparecimento,
apesar de ter sido convidado para a mesma reunião.
Além da exclusão, serão apuradas as responsabilidades
civis ou criminais a que a infração argüida tiver dado lugar.
No caso de prejuízos à sociedade resultantes da infração,
a sociedade reterá, como indenização, a parte do capital, lu-
TRABALHOS JURÍDICOS 103

•cros e quota do fundo de reserva correspondentes nos mes-


mos prejuízos».
* * *

O sócio C.F encarregado do serviço determinado, foi


destituído, e nomeado um outro sócio para substituí-lo.
O sócio O , destituído, que anteriormente já havia pra-
ticado atos prejudiciais à sociedade, tais como organização
de greve com seus parentes e amigos, compra de gêneros
além da autorização que fôra-lhe conferida, e por preço su-
perior ao do mercado, recusou a entrega dos sociais sob sua
guarda ao sócio nomeado para substituí-lo, requereu man-
dado de manutenção na posse dos bens sociais sob sua guarda,
pretendeu substituir-se à sociedade na execução do objeto da
mesma sociedade, usou indevidamente da firma social, con-
traindo obrigações em nome da sociedade, continua a man-
ter os bens sociais em sua guarda, apesar de destituído das
funções, e em oposição às deliberações da maioria dos sócios
« propôs uma ação e dissolução judicial da sociedade.
Sendo verdadeiros e provados estes fatos, pergunta-se :

I*
A sociedade A. B. C. 6 C , usando da faculdade esta-
tuída na cláusula XIII, c preenchidas as formalidades esta-
belecidas na mesma cláusula, tem o direito de excluir o sócio
C. da sociedade, independentemente da dissolução da so-
ciedade ?
2"
Dada a exclusão, pode C. continuar na ação de disso-
lução judicial da sociedade, proposta na qualidade de sócio,
quando perdeu essa qualidade pela exclusão ?

3'
Que recurso tem C. da deliberação de exclusão tomada
com o preenchimento de todos os requisitos da cláusula XIII ?
CARNES VERDES

ACTA DA REUNIÃO,
DO»

Sócios solidários e commandilarios da firma


, salgado, Cardoso, Lemos & C.
na qual loi excluído o socio Snp. Horacio
José de Lemos

PARECERES DOS ADVOGADOS

Exms. Srs. Conselheiros Lafayette


Rodrigues Pereira e
Ruy Barboza

RIO l)E JANEIRO


TTC DO "JOHHAL DO C I U H H M M » " Dl ftOO»IOU«» • *•
'

Facsimile do frontespício do folheto onde se contém o parecer de Rui


ora publicado. (Cópia fotostática obtida pelo Sr. Gontijo de Carvalho
do exemplar existente na Biblioteca Municipal de S. Paulo)
Parecer
"Le contrat de société se règle par le droit civil,
par les lois particulières du commerce et par les con-
ventions des parties", estatui o Cód. do Comércio
francês, art. 18, reproduzindo a disposição firmada
no Código Civil, art. 1.873.
A cláusula desse texto relativa à força obriga-
tiva das convenções das partes nas sociedades co-
merciais, mera aplicação a elas do princípio corrente
de que a convenção constitui lei entre partes, asse-
gura-lhes a liberdade ampla de regular, como lhes
convenha, as relações entre os associados, os seus
deveres e direitos, salvos os limites postos pela na-
tureza especial das sociedades, pelas determinações
expressas da lei, ou pelos cânones gerais que o nosso
Código Comercial estabelece nos arts. 129 e 287 a
293. Em nenhuma destas restrições incorre o dis-
posto na cláusula 13 do contrato a que se refere a
consulta, cláusula cuja linguagem assim se exprime :
"A infração de qualquer das cláusulas do pre-
sente instrumento, ou dos encargos conferidos aos
sócios, nos termos da cláusula V, determinará a ex~
clusâo do sócio infrator, independentemente de dis-
solução da sociedade, devendo o capital, lucros e
quota do fundo de reserva (que serão nesse caso re-
constituídos) ser-lhes pagos em letras de aceite da
firma, a prazo nunca excedente de seis, nem inferior
de três meses.
108 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

"A deliberação sobre exclusão de sócio será to-


mada por maioria em reunião dos sócios presentes,
solidários e comanditários, para esse fim convocada,
devendo achar-se presente o sócio a ser excluído,
salvo o seu não comparecimento, apesar de ter sido
convidado para a mesma reunião".
Nesta parte do acordo social nada há que a in-
quine de ilícita e reprovada (Ord. IV, 44, 3.°, Con~
solid, das Leis Civ., art. 744, Cód. Comercial, arts.
121, 129 a 287).
Também nada se oferece nela que contravenha a
prescrições explícitas do nosso direito mercantil.
Antes, pelo contrário, o Código Comercial, no
art. 339, figura a hipótese em que, sem dissolução da
sociedade, um sócio
"se despedir, ou fôr despedido com causa justi-
ficada".
E, não precisando qual a autoridade competente
para deliberar a eliminação, evidentemente franqueou
aos sócios o arbítrio de se reservarem, no pacto de
sociedade, essa competência a si mesmo.
Não havendo, pois, a esta solução adotada d o
contrato cuja execução se pretende, obstáculo de es-
pécie alguma na letra dos nossos atos legislativos,
só não seria permitido o alvitre, se ferisse em sua
substância os caracteres inerentes à sociedade mer-
cantil ou em especial, ao tipo das sociedades em nome
coletivo e em comandita, a cuja classe pertence a de
que se trata.
Longe, porém, disso, tão de harmonia está o tó-
pico do contrato social em questão com os princípios
gerais de direito comercial, que o Cód. do Comércio
italiano, determinando ao art. 186 os casos de ex-
clusão de um sócio nas sociedades em comandita, ou
TRABALHOS JURÍDICOS 109

em nome coletivo, comete essa providência, no art. 96,


independentemente d e cláusula no pacto social, à
deliberação dos associados :
La mutazione, il recesso o 1'esclusione dei soei, e com-
biamente d'ella razione sociale, d'ella sede, o d'elle oggetto
d'ella società, o dei soei che hanno Ia firma sociale, la redu-
zione, 1'aumento o Ia reintegrazione dei capitale, Io sciogli-
mento anteriore ai termino stabilito nel contrato, Ia fusione
con altit SOCîeld e \<* pioiuydzione aicre, li termine suddetto,
devue resultare per le società in nome colectivo, ed in accom-
mandicta simplice, da expressa dichiarazione o deliberazione
dei soei.

Nem essa enumeração de casos, em que a so-


ciedade tem o direito de excluir o sócio transgressor,
é taxativa. •— Antes a jurisprudência italiana esta-
belece que, como quer que seja violada gravemente a
lei social, os sócios fiéis aos seus deveres têm a fa-
culdade legal de excluir o infrator.
"Come il contratto sociale può essere violato per
soariate manière, naturalmente non tutte prevedibili
dei Códice, ogni qual volta una sifata violazione
debba essere imputata alia colpa d'un socio é giusto
che gli altre soci abbia.no il diritto di escludere cos-
teri dal vincolo sociale, senza che, per questo, tal vin-
culo si apezzi anche nei loro rapporti".
MAIGHIERE : // Cod. di Comm. Ital. comm.
(BRUCKER, T E D E S C H I ) vol. II, pág. 404 ns. 605-6.

Mais não fêz o art. X I I I do contrato celebrado


entre A. B. C. & C , que abraça como regra social um
princípio de justiça formalmente consagrado em ou-
tras legislações e em nada antagônico às idéias da
nossa.
110 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Por conseqüência :
Se o sócio C. postergou os seus deveres na so-
ciedade, se faltou aos seus compromissos com ela
pactuados, está no seu direito a maioria dos sócios
em pronunciar-lhe a exclusão, preenchidas as for-
malidades e observadas condições da cláusula XIII,
que lho confere positivamente.

II
Não.
Dada a exclusão, deixa de ser sócio o sócio ex-
cluído.
Logo, não pode continuar, desde então, a pro-
mover a dissolução judicial da sociedade, a que já
não pertence exercendo um direito que, em face do
Código Comercial, art. 336, não pode exercer senão
como associado.
III
Da exclusão deliberada na hipótese e com a
observância fiel de todos os requisitos prescritos na
cláusula XIII, não cabe ao que se supuser agravado
recurso algum a não ser o da ação ordinária, para a
rescisão desse ato social, provando-se que não res-
peitou os termos dessa cláusula, ou, sempre nesse
caso, para a indenização de perdas e danos, se o pre-
judicado preferir este alvitre ao outro.
Rio, 21 de janeiro de 1900.
Rui BARBOSA
V
MARCAS FRAUDULENTAS
(Companhia Luz Esteárica)

FACULDADE ATRIBUÍDA AOS PREJUDICADOS

PARECER
NOTA DO REVISOR

Desde 1854 possuía a Companhia Luz Esteàrica registro


de marca de indústria de velas de sua produção, com ex-
clusiva propriedade desta.
Disciplinava, então, isto é. em 1900. a matéria o impe
tia! decreto [legislativo] n 9 3.346. de 14 de outubro de 1887;
por outro lado, cominava o Código Penal de 1890. em seu
art. 353. a pena de multa de 500$000 a 2:000$000, em favor
da Fazenda Nacional, e de 10 a 5 0 % do valor do objeto
sobre que versasse a infração, em benefício da parte le-
sada ( " ), para as infrações consistentes na reprodução, no
todo ou em parte, sem prévia autorização do proprietário, das
marcas de indústria e comércio.
Havendo a firma Fonseca. Irmão & Cia., domiciliada
em Pernambuco, adotado, para produto semelhante ao da
Companhia Luz Esteàrica análoga designação, opor-se esta
última ao uso, que considerava indevido, ilegal e criminoso.
Por intermédio de seu patrono, advogado Júlio Bene-
dito Ottoni, foi pedido a opinião de Rui Barbosa, que o ma-
nifestou com o parecer adiante reproduzido. N ã o consegui-
mos, sem embargo de fatigantes tentativas, obter a íntegra
da consulta formulada, no seu texto original. Contudo, atra-
vés de elementos dispersos, podemos assegurar que eram os
seguintes os pontos essenciais nela versados :

a) estando a Companhia Luz Esteàrica na posse


desta marca desde 1854, e a tendo registrado, a firma

( ' ) O Cód. Penal de 1940. art. 192, comina para a infração, pena
de detenção de três meses a um ano. e multa de 1 a 15 contos de réis
{um a quinze mil cruzeiros!.
114 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Fonseca, Irmão & Cia. teria usurpado esta, segundo


a consulente, o nome comercial, servindo-se da de-
nominação Fábrica Luz Esteárica, para designar os
seus produtos, aliás congêneres;
b) se. registrada pela Companhia Luz Esteárica
como sua marca de fábrica para certo número de ve-
las a denominação •— Velas Superiores — era lícito
à firma Fonseca, Irmão & Cia. assinalar com idêntica
marca produto de sua fabricação;
c) se a Companhia Luz Esteárica tinha ação
contra Fonseca, Irmão õ Cia. para desta exigir a proi-
bição do uso de marca e da denominação comercial, e
se lhe cabia indenização por perdas e danos, além da
ação criminal, cabível, nos termos do art. 353, do Có-
digo Penal da República.

Segundo tudo indica, se. porventura ajuizada foi a ma-


téria que suscitara a consulta, teve a espécie solução na jus-
tiça local, não chegando, assim, a sobre ela pronunciar-se o
egrégio Supremo Tribunal Federal, cuja orientação, máxime
no acórdão proferido em 23 de junho de 1900. no recurso
extraordinário n ? 187, originário do Pará, recorrentes Mo-
reira dos Santos & Cia. e recorridos Joaquim Martins Mon-
teiro, tendo aqueles como patrono o advogado Samuel W .
Mac-Dowell, era de molde a repelir o acolhimento da tese
de Rui Barbosa, aliás em consonância cora os pareceres de
José Higino. Oliveira Fonseca e outros.
O texto do parecer é o que se contém na publicação feita
na época pelo Jornal do Comércio da Capital Federal, di-
vulgada também em folheto (*).

( ' ) Sabemos de um único exemplar, em virtude de cópia fotostá-


tica oferecida à Casa de Rui Barbosa.
Parecer
Decreto legislativo n. 3.346, de 14 de outubro
de 1887, art. 2.°, êoiciUw que "as marcas de indústria
e comércio podem consistir em tudo que esta lei não
proíbe (art. 8.°), e faça diferençar os objetos de
outros idênticos ou semelhantes de proveniência di-
versa", e em seguida expressamente inclui entre os
dizeres ou sinais, que para esse fim poderão servir,
um nome qualquer a firma ou razão social, reves-
tindo forma distintiva.
No art. 8.°, a que especialmente alude o art. 2.°,
declara "proibido o registro da marca que contiver
ou consistir em imitação total ou parcial da marca já
registrada para produto da mesma espécie, que possa
induzir em erro ou confusão o comprador".
Na hipótese, os dois fatos que a constituem são :
uma casa existente desde 1854, a qual registrou em
data antiga, para os seus artefatos, a denominação
social "Companhia Luz Esteárica", imprimindo-lhe
na estampa feição discriminativa pelas imagens e ca-
racteres gráficos do debuxo;
outra, que mais tarde adotou para produtos da
mesma natureza, em volumes semelhantes, a desig-
nação de "Fábrica Luz Esteárica".
A expressão Luz Esteárica não é apelido neces-
sário, nem vulgar. Aplicada a uma fábrica de velas,
deixa de referir-se ao objeto produzido (velas), para
aludir ao seu resultado, ou utilidade, a luz que elas
116 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

produzem. Por outro lado. na indicação da luz, não


a faz sob um nome trivial, antes vai buscar um qua-
lificativo técnico, de uso menos comum e que mais
aproximadamente cabe à substância da vela do que
ao fenômeno da luz. Nesse processo de adaptação
claramente se percebe, da parte do industrial, a es-
colha, o capricho e o artifício de evitar a locução co-
mezinha e a linguagem usual, para discernir dos ou-
tros os artigos de seu fabrico mediante uma inscrição
pouco acessível ao trabalho dos imitadores.
Na adoção posterior, pois, por outro fabricante
congênere, do mesmo título, insensivelmente modi-
ficado por um acréscimo quase imperceptível, não
pode haver dúvida nenhuma que houve o propósito,
o estudo, o esforço de explorar por um arremedo ca-
prichoso a marca anterior.
Nas duas denominações "Companhia Luz Es-
teárica" e "Fábrica Luz Esteárica", as palavras ca-
racterísticas, as que detêm a atenção do leitor, e na
memória se lhes registram, são as que compõem o
nome da casa produtora Luz Esteárica.
No apêndice que as precede, companhia ou fá-
brica, nomes comezinhos, sem cunho, nem relevo, nin-
guém adverte. O realce, a expressão, o tipo da eti-
queta está na Luz Esteárica, por onde ambos os fa-
bricantes timbraram em que ficassem recomendados
os seus produtos, o primeiro com o fito de assinalar a
sua originalidade, o segundo com o de usufruir o
equívoco da semelhança no mercado.
Assim que "a possibilidade de erro ou confusão",
que a cláusula proibitiva do art. 8.°, n.° 6.°, procura
acautelar, é, na espécie, inegável. O freguês habi-
tuou-se às velas Luz Esteárica, e pede as velas Luz
Esteárica. sem notar, nem recordar se são de fábrica
ou companhia. É indubitavelmente a hipótese, que o
TRABALHOS JURÍDICOS 117

legislador previu, dizendo : "Considerar-se-á verifi-


cada a possibilidade do êrro ou confusão, sempre que
as diferenças das duas marcas não possam ser reco-
nhecidas, sem exame atento, ou confrontação".
Com efeito, só pondo lado a lado os dois pro-
dutos se lhes pode reconhecer diferenças.
O artigo é o mesmo.
É idêntico o volume.
Idêntica a forma.
A côr, idêntica.
Dos nomes sem cotejo não se perceberia a leve
dessemelhança.
E, por último, o mesmo acontece com o aspecto
de que esses nomes se revestem : analogia nas di-
mensões, na disposição mútua das partes : um con-
junto de medalhas, brazões. efígies e ramos, entre as
quais se esbatem e perdem as diferenças. Só a juxta-
posição dos dois pacotes as revelará ao comprador
prevenido e atento.
É por isso que se tem julgado :
— Haver intimação fraudulenta na marca café
des gourmets nos rótulos moka des gourmets, café
des gourmeurs, café des fins gourmands, café des
colonies supérieur à tous pour les gourmet, café des
connaisseurs. (Paris. 26 ag. 1874 Trib. con. Sena,
27 Jan. 1858.)
— Havê-la igualmente da marca bougie de
l'Etoile no uso desta outra <—* bougie de l'Etoile
belge. (Trib. con. Epernay, 30 ab. 1872.)
Existir o mesmo abuso contra a marca Société
Hygiénique no emprego do dístico Parfumerie hygié-
nique. (Trib. civ. Sena. 14 de ag. 1878.)
Há, em suma, imitação "sentido da lei, logo que
se reproduza a denominação, que constitui essencial-
mente a marca, se as outras indicações, que a seguem,
118 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

ou antecedem, deixam subsistir a impressão imita-


tiva, e não lhe mudam a parecença. de modo que,
comparadas as duas marcas, se verifique ser fácil o
confundi-las". (Bordeaux, 30 jun. 1864. POUILLET,
4.* éd., 1898, págs. 235-44).
A minha conclusão, pois, é que a indicada firma
do Recife não se pode servir do título — Fábrica
Luz Esteárica nos seus produtos.

II
Discutindo o critério possível aos Tribunais em
relação ao uso exclusivo de uma denominação vulgar.
ou alusiva às propriedades e aplicações naturais do
produto, diz o expositor, cuja autoridade acabamos
de invocar.
Lorsqu'il s'agit d u n e denomination tirée des qualités
ou de la nature même de la chose, les tribunaux doivent ap-
porter la plus grande circonspection, et ne pas en conceder
trop facilement l'usage exclusif. . .
Nous trouvons à cet égard, dans un jugement du Tri-
bunal de Seine, une règle, qui nous parait excellente et qui
dans nombre de cas permettra de résoudre la difficulté : ce
jugement decide, en principe, qu'une denomination inexacte
non saurait jamais être considérée comme nécessaire; et il est
juste, en effect, d'admettre que la désignation est arbitraire,
toute de fantaisie, quand elle désigne autre classe que l'objet
auquel elle s'applique, ou du moins ne s'y rapporte pas d'une
façon exacte.
Comment serait elle nécessaire, quand elle est de nature
à tromper sur le caractère même de l'objet qu'elle désigne ?
(POUILLET, pág. 74).

Esta regra, a de que a denominação não é ne-


cessária, logo que for inexata, e iludir o comprador
TRABALHOS JURÍDICOS 119

sobre o caráter do objeto, nos conduz logicamente a


outra : a de que, usada uma denominação necessária,
correta e veridicamente, por um produtor, não se
pode escusar com a acessibilidade geral dessa es-
pécie de denominação ao uso de todos aqueles que a
reproduzirem falsamente em artefatos, cuja natureza
lhe não corresponda.
A aplicação à hipótese é manifesta.
A Companhia Luz Esteárica, produzindo ve-
las visivelmente de boa qualidade, as especifica sob
a marca, para isso registrada, de Velas Superiores.
Naturalmente porque as suas o eram, como de-
monstra o espécimen submetido à nossa inspeção
ocular, e por não estar em uso, para outras, no mer-
cado, esse designativo.
Agora a outra fábrica, além. de lhe imitar o nome
da entidade comercial, apelidando-se como esta, pelo
de Luz Esteárica, inculca, do mesmo modo que ela,
sob o dístico de Velas Superiores, um produto, que,
segundo amostra autêntica, anexa à consulta, é sen-
sivelmente, no seu gênero, da pior qualidade.
Não se poderia alegar, pois, que escolheu a
marca de Velas Superiores, para designar, pela ex-
pressão adequada e comum, artigos realmente tais.
É óbvia, logo, a dupla fraude simultânea contra o
consumidor e contra o produtor, com o intuito de ila-
quear, pelo crédito deste, a boa fé daquele.
Temos assim manifesto, da mesma maneira que
no primeiro caso, dolo punível. Usa-se em prejuízo
do produtor leal uma marca acreditada, para gran-
gear circulação e clientela a artefatos inferiores.
Por conseguinte não posso deixar de respon-
der negativamente ao 2." quesito.
120 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

III
Feita a apreensão, os direitos da companhia pre-
judicada vêm a ser :
1.°) A destruição das marcas fraudulentas nos
volumes onde se acharem. (Lei n.° 3.845, art. 21,
ns. 2 e 3; Regulamento n. 9.828, art. 32, ns. 2 e 3.)
2.°) Depósito dos produtos apreendidos. (Lei
art. 21, n.° 4; Regulamento, art. 32, n. 4.)
3.°) Ação, para se declarar a nulidade do re-
gistro feito, caso hajam sido registradas as marcas
criminais. (Lei, art. 11. § 4.°; Regulamento, art. 26.)
4.°) Ação criminal para a imposição aos de-
linqüentes das penas da lei, art. 14, ns. 4, 5 e 6, e Re-
gulamento art. 36, ns. 4, 5 e 6.
5.°) Ação cível para satisfação do dano cau-
sado. (Lei, art. 19; Regulamento, art. 40.)
Rio, 17 de março de 1900.
Rui BARBOSA
ï

VII
LETRA FALSA
(Causa Poyares)

VÍNCULO JURÍDICO ENTRE O ACEITANTE E O PORTADOR


DE BOA FÉ

PARECER
ALFREDO PUJ OL

A LET RA FALSA ♦«-

Autor — 0 Banco de S. Paulo


Réo — Antonio de Barros Poyares

A L L E G A Ç Õ E S DO R É O
COM UM PARECER

DO

CONSELHEIRO RUY BARBOSA

SIo Paulo
Typographic Brazil de Carlos Gerka A Cia.
47 — Bua de S. B«oto — 47
1901
Frontcspîcio da edição do folheto publicado cm 1901. (Tamanho natu-
ral. (Biblioteca Municipal de S. Paulo)
N O T A DO REVISOR

Como patrono de Antônio de Barros Poyares, na con-


tenda em que eram partes este e o Banco de São Paulo, so-
licitou o advogado Alfredo Pujol o parecer de Rui Barbosa,
expondo a espécie na conformidade da consulta que vem a
seguir.
T u d o indica ter sido o conflito composto em primeira
instância, ou até mesmo solucionado amigavelmente. É o que,
pelo menos, se infere da ausência de referências à espécie
nos repertórios da época, tais como a Gazeta Jurídica e, um
pouco mais tarde, o São Paulo Judiciário, este último, na sua
fase inicial, dirigido pelo advogado Eugênio Egas, compa-
nheiro de escritório de Alfredo Pujol, juntamente com Júlio
de Mesquita.
O pouco interesse que parece ter assumido a espécie
objeto do parecer de Rui Barbosa, quer nos meios forenses,
quer por parte do próprio constituinte do advogado Pujol,
admite a possibilidade de uma composição favorável à sua
pretensão. Fortalece a assertiva a correspondência de Al-
fredo Pujol, e também uma carta de Rui Barbosa a este en-
dereçada, de 16 de abril de 1900.
A tese no parecer sustentada em face do Código de
1850 e da doutrina, sobretudo estrangeira, tornou-se maté-
ria pacifica posteriormente, ex-vi do art. 43 do decreto [le-
gislativo] n" 2.044. de 31 de dezembro de 1908 (Lei Cam-
bial), e também em face do que reza o art. 68 da Convenção
de Haia.
O s fatos que engendraram a controvérsia, tal é a cla-
reza com que se acham articulados na consulta, que nos
eximem de outros pormenores.
CONSULTA (*)

A. propos ao banco D. o desconto de uma letra da


terra, sacada por B . , aceita por C . e endossada em branco
pelo sacador B. Na proposta escrita, com a indicação do
valor da letra, da época de vencimento e dos nomes dos co-
obrigados, A. deixou sua assinatura como — apresentante do
título.
A . , não conhecendo as firmas dos co-obrigados, com
quem jamais tiveram transações (a letra pertencia a terceiro)
não quis endossar o título, propondo o desconto sem a sua
responsabilidade, mas recomendando com insistência ao
banco D., que verificasse cuidadosamente a autenticidade
das firmas. O banco, depois dos exames, a que procedeu, de-
clarou serem boas as ditas firmas, que eram de clientes seus,
e decidiu-se a fazer o desconto, sem o endosso do apresen-
tante A.
Verifica-se, logo depois, que a assinatura do sacador
endossante é falsa, sendo verdadeira, aliás, a assinatura do
aceitante.
Pergunta-se :
l 9 — Aquela operação de desconto entre A. e D. repu-
ta-se uma cessão a titulo oneroso, equiparável ao contrato
de compra e venda ?
(') A consulta que originou o opúsculo. ora transcrita, foi co-
piada do texto estampado na Gazeta Jurídica, de S . Paulo, Vol. X X V .
pág. 295. Emitiram ainda pareceres acerca da espécie os conselheiros
Visconde de Ouro Preto. Lafayette Rodrigues Pereira. Ferreira Viana e
o Prof. João Monteiro, que enunciou ponto de vista contrário ao do
Conselheiro Rui Barbosa, sendo transcritos no lugar citado, encimados
pela ementa : Lefra — Questão de Falsidade — Ação redibitória, —
N. do Rev.
128 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

2 9 — Tem o banco D. ação contra A . , para enjeitar a


letra descontada, por vícios redibitórios, e haver dele a im­
portância, que dera pela letra ?
3 9 — Sendo verdadeira a firma do aceitante, vale o tí­
tulo, como letra regular, na conformidade do disposto no
art. 354. VI. última parte, do Código Comercial ?
4" ■— No caso afirmativo ao 3" quesito, pode o banco
D . exercitar qualquer ação contra A . , antes de acionado o
aceitante C. ?
Parecer
Atendendo à ordem lógica de dedução das
idéias, na opinião que vamos emitir, alteraremos a
posição dos quesitos na consulta, principiando pelo
terceiro, respondendo em seguida ao primeiro, de-
pois ao segundo e afinal ao quarto.

I
Reza o art. 354, VI, última parte, do cód. co-
mercial, a que se refere a pergunta : "Se uma letra
de câmbio tiver nomes supostos de pessoas, ou de
lugares, onde e por quem deva ser paga, só valerá
como simples crédito : todavia os que nela intervie-
rem, e tiverem conhecimento da suposição da pessoa
ou do lugar, não poderão alegar este defeito contra
terceiros, e valerá como letra regular".
Esse texto, como se vê, cogitando na suposi-
ção de nomes em uma letra, tão somente se refere
aos de "pessoas por quem deva ser paga". Ora, esta
fórmula, verbalmente idêntica à do § anterior no
mesmo artigo, está por êle definida e limitada. Pres-
creve, com efeito, o art. 354, V : "A letra de câmbio
deve ser datada, e declarar : . . . O nome da pessoa
que deve pagá-la e a quem, e se é exigivel à ordem e
de quem". Esta linguagem reproduz a do cód. do co-
mércio francês, onde se inspirou, e que diz. no
art. 110 : "La lettre de change. . . énonce. . . le nom
de celui qui doit payer".
130 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Qual é o nome da pessoa, que deve pagar ? Ê


o do indivíduo, contra quem se saca. " O sacado", diz
T H A L L E R , é aquele, contra quem se cria o título,
aquele de quem o sacador dispõe. Êle representa a
pessoa chamada a pagar a letra de câmbio. {Traité
él. de droit comerc, pág. 635, n.° 1.111). A letra de
câmbio constitui um mandato do sacador ao sacado,
a fim de que este pague uma soma precisa em data
determinada. (Ib., pág. 634, n.° 1 .106). O sacado é.
portanto, parte necessária na letra de câmbio, desde
que esta representa um mandato, e nâo há mandato
sem mandatário. Faltando o sacado, falta quem tenha
o mandato de pagar. Logo. falta o mandato cambia-
do. Logo, falta a letra de câmbio. Mas. sendo su-
posto o nome do sacado, não há sacado. Logo, não
há o mandatário do pagamento. Logo, não há man-
dato. Logo, não há letra. E aqui está porque o
art. 354, VI do nosso código, moldado no art. 110
do francês, resolve "em simples crédito" a letra de
câmbio, onde forem supostos os nomes das pessoas,
"por quem deva ser paga".
A suposição, de que ali se trata, pois, é a do
nome do sacado. (BÉDARRTDE : Lettre de change,
v. I, pág. 88. n.° 68 e seg. — LYON-CAEN et RE-
NAULT : Precis, v. I, pág. 552, n.° 1 .031 ). Tão certo
é isto que muitos comentadores substituem, na expo-
sição da matéria, a versão do texto legislativo. "La
lettre de change énonce le nom de celui qui doit
payer", (côd. de com. fr.. art. 110) por estroutra :
"La lettre de change doit énoncer" (ou indiquer) "le
nom de celui sur qui elle est tirée" (PARDESSUS :
Cours, v. I, pág. 424, n.° 335. ~- G O U J E T , MERGER
et R. DE COUDER : Dictionn., v. V. pág. 113, n.° 51 ).
As Pandectas Francesas são ainda mais explícitas :

TRABALHOS JURÍDICOS 131

Nom de celui qui doit payer. — Un des caractères es-


sentiels de la lettre de change est de faire connaître, par une
énonciation précise, le nom du tiré, c'est-à-dire, de celui qui
doit payer.
V" Eff. de commetc, n« 155. v. XXVIII, pág. 544.)
Nenhuma dúvida pode haver, por conseguinte,
sobre a equivalência entre as duas expressões.
Quando o nosso código, no art. 354, V I . fala nas
pessoas, por quem as letras devam ser pagas, tem em
mira unicamente os sacados. Quer dizer que, se o
sacador saca sobre uma pessoa suposta, não emite
uma letra de câmbio : contrai apenas para com os
terceiros, iludidos por esse artifício, uma promessa
de pagar, na expressão do cód. argentino. (Art. 601.)
Não se abrange, por conseqüência, nesse enunciado
a hipótese de suposição nas firmas, que depois inter-
vierem no documento.
A contraprova disso, temo-la no nosso próprio
código comercial, art. 394. Aí se determina que, "nos
casos de aceite falso, o portador tem recurso contra
o sacador e endossadores". Ora, o aceitante é uma
daquelas pessoas, que após a emissão da letra se
constituem na obrigação de a pagar. Logo, se a dis-
posição do art. 354, VI, fosse genérica, se não dis-
sesse respeito exclusivamente àqueles, contra quem a
letra se saca. esta, simulado o aceite, não valeria
como letra, subsistindo apenas como crédito contra o
sacador. Entretanto, o art. 394. figurando o caso de
suposição do aceite, considera subsistente o contrato
cambial contra os outros nomes que nele partici-
param.
O art. 112 do código do comércio francês, mo-
dificado pela lei de 7 de junho de 1894, é muito mais
amplo que o art. 354. VI. do nosso; porquanto, ao
132 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

passo que este fala somente em nomes de pessoas


por quem a letra deva ser paga, aquele reduz a me-
ras promessas as letras onde haja suposição de
nome, qualquer que êle fôr : "Son réputées simples
promesses toutes lettres de change contenant sup-
position, soit de nom, soit de qualité".
Dir-se-ia que o caráter absoluto deste preceito
não permitiria distinção nenhuma. E, contudo, os
direitos da boa fé obrigaram a jurisprudência fran-
cesa a admitir unanimemente uma distinção funda-
mental, estabelecendo que, a despeito das suposi-
ções de nome, a letra continuaria a produzir todos os
efeitos de letra em benefício dos terceiros inocentes
contra os indivíduos cuja firma no documento não
fôr simulada. Eis como se exprimem duas das mais
altas autoridades :
A l'égard de quelles personnes se produisent les con-
séquences de la supposition? L'art. 112 est très général, et
cependant la nature des choses exige une distinction. Il n'y
aurait aucune sécurité, si ceux auxquels on présente un titre
parfaitement régulier en apparence pouvaient ensuite être
arrêtés dans l'exercice de leurs droits, parce qu'on prouverait
la fausseté de telle ou telle énonciation; la lettre de change
n e serait plus un effet de circulation. Il est donc admis uni-
versellement que les tiers de bonne foi ont le droit de [aire
produire à la lettre ses effets ordinaires, quelque supposition
qui soit alléguée.
(LYON-CAEN et RENAULT : Précis, v. I, pág. 568,
n* 1.056).

A êsse respeito, dizem os dois famosos escrito-


res, "a jurisprudência e a doutrina são unânimes".
(Ibid., n.° 2 ) .
No mesmo sentido se manifestam GoujET,
M E R G E R et COUDER :
TRABALHOS JURÍDICOS 133

En général, ni les suppositions de lieu, de qualité, etc.,


ni la simulation ne peuvent être opposées au tiers porteur de
bonne foi; et la présomption de bonne foi existe en sa faveur
par cela seul que la lettre est régulière dans sa forme.
(Diet, de dr. corn., v. V, pág. 131. n» 179.)

BOISTEL frisa o ponto em breves palavras :


Les suppositions different des omissions en ce qu'elles
ne peuvent pas être invoquées contre toute personne; contre
un tiers porteur de bonne foi, parce qu'elles ne sont pas ap-
parentes comme les omissions.
(Cours de dr. com., pág. 492, n" 729.)

Já era essa a doutrina corrente desde os mais


antigos comentadores. Ainda no terceiro lustro do
século publicava PARDESSUS o seu Curso de dit. com-
mère., onde se ensina :
On ne peut opposer la même exception (a de suposi-
ção numa letra de câmbio) au tiers porteur, ou à des endos-
seurs exerçant leurs droits de garantie; il serait injuste de
décider contre eux, sur des preuves prises de l'acte même, et
d'après une supposition à laquelle ils n'ont participé, que la
lettre dont ils sont porteurs n'est qu'une simples promesse.
(Cours, v. I, 6» éd.. 1856. pág. 552, n* 460.)

Estuda-se ali em particular a emergência, que é


a vertente, de uma letra [alsa na assinatura do saca-
dor e verdadeira na do aceitante. para inquirir se o,
contrato cambiado vigora contra este, ou não, em
todos os seus efeitos, a favor do possuidor honesto
desse título mercantil. E a solução é categórica : o
aceitante não se pode evadir ao pagamento :
Le tiré, à qui une lettre de change est présentée, doit,
s'assurer qu'elle porte véritablement la signature de celui
134 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

qu'elle indique pour tireur; et c'est pour lui donner les moyens
de se garantir contre les faussaires qu'a été introduit l'usage
des lettres d'avis, dont nous avons parlé n' 323 et 357. Une
fois qu'il a accepté, quelque preuve qu'il pût avoir par la
suite que la lettre est fausse» il ne serait point admissible dans
son refus de la payer. Vainement prétenderait-il qu'il ne peut
être présumé avoir entendu accepter autre chose qu'une let-
tre véritable; qu'en conséquence, il n'a contracté aucune obli-
gation, puisque celui pour qui il croyait accepter n'était réel-
lement pas tireur.
Quelque favorable que soit sa position, elle l'est moins
encore que celle du porteur : quelque prudence qu'il ait pu
mettre dans sa conduite, il avait plus de moyens de décou-
vrir le faux que celui-ci, qui est rarement à portée de vérifier
la signature du tireur, et qui, après avoir obtenu celle de l'ac-
cepteur, n'a point senti la nécessité, ni faite usage du droit
d'exercer les poursuites expliquées n9 381 et suivants.
(76., o«4*8. pág. 544.)

Pergunta M A S S É : se o aceitante pode opor ao


portador de boa fé, que não participou no dolo, e foi
vítima da sua confiança, a exceção fundada nos ví-
cios do título cambial ? A resposta, mediante larga
exploração do assunto, é esta : "Je persiste à penser
que l'exception d'erreur, de violence, ou de dol, n'est
jamais opposable au tiers porteur de bonne foi, par
le débiteur d'un effet de commerce, qui s'est engagé
p a r erreur, ou qui a été victime du dol, ou de la vio-
lence".
(Le dr. commerc. v. III. n.° 1.526, págs.108-
12.)
BRAVARD e DÉMANGEÂTencaram e elucidam a
questão com a luminosa nitidez que os caracteriza.
Depois de expor que a suposição nos elementos
essenciais d a letra gera os mesmos efeitos da omis-
TRABALHOS JURÍDICOS 135

são contra os autores, coniventes e cientes no vício,


a saber que, nesses casos, o título cambial degenera
em simples promessa, advertem os dois mestres :
En scra-t-il de même à l'égard des tiers, porteurs de
bonne foi ? Ce serait souverainement inique et irrationnel :
car les tiers ne peuvent juger de la valeur du titre que d'après
sa forme. Pour eux donc l'apparence tiendra bien lieu de la
réalité, et le titre vaudra comme lettre de change, la forme
emportera le fond, parce que les tiers n'ont pu juger du fond
que par le forme. Etc.
(Traité de dr. commcrc. vol. III, pâgs. 114-16.)

BÉDARRIDE, registrando uma sentença da corte


de Bruxelas, que, em 7 de outubro de 1811, admi-
tiu contra o terceiro portador de boa fé a invalidade
da letra por efeito de menções falsas ou assinaturas
supositícias. diz que esse mesmo tribunal, logo no
ano subseqüente, reconsiderou o seu erro, acrescen-
tando que semelhante jurisprudência "foi rejeitada
pela doutrina", e que M E R L I N , P A R D E S S U S , N O U -
GUIER, H O R S O N , D A L L O Z , F O U R N É a uma voz o con-
denam. Já ouvimos a PARDESSUS. Podem-se ver
ainda :
DALLOZ : v.° Eff. de comm., n.° 141 e segs.
N O U G U I E R : La lettre de change, v. I, n.° 292.
A L A U Z E T : Comment, du Code de Comm.r v. I V ,
n.° 1.261.
A s conclusões de BÉDARRIDE são estas :
Ainsi le tiers porteur de bonne foi est à l'abri de Vexep-
tion autorisée par l'art. 112, de la même manière qu'il le se-
rait à l'endroit de celle fondée sur le dol, la fraude, la vio-
lence, la complaisance. En matière de lettre de change, le
porteur ne transmet pas seulement les droits qu'il a lui même :
il confère en outre la propriété pleine, entière, absolue de la
136 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

créance, qui ne peut être altérée que par des actes personnels
imputables au porteur. C'est ce qui a été jugé pour le cas de
dol, de fraude, etc. . . C'est ce qu'on doit également admet-
tre en cas de supposition.
Ainsi le tiers porteur ne peut être passible de l'applica-
tion de l'art. 112, que s'il a connu la supposition dont on ex-
ciperait.

O Suplemento ao repertório de DALLOZ, no


vol. VII, estampado em 1891 (pág. 11, n.° 52) mos-
tra que os arestos da justiça continuam a persistir
nessa jurisprudência, tão antiga, por assim dizer,
como o próprio código francês; e as Pandectas Fran-
cesas, nos vols. X X V I I I e X X I X . publicados em
1898, nos dão a ver que esse é ainda o estado do
direito naquele país. Eis o que a tal respeito se diz
nesse grande repositório :
Le tiré accepteur ne peut, vis-à-vis du porteur de bonne
foi, retracter l'obligation résultant de son acceptation, sous
le prétexte qu'elle aurait été déterminée par le dol du tireur.
(Vol. XXVIII, pág. 638. n* 1.467.)
Le tiré auquel une lettre de change est présentée, soit
pour l'acceptation, soit pour le payement, doit examiner soig-
neusement le litre et vérifier si la signature du tireur est réelle
et émane véritablement de ce dernier. . .
Mais conformémnt à ce qui a été dit supra, n. 1.467,
s'il a accepté un titre [aux, il est tenu du payment vis-avis du
tireur. . .
(Vol. XXIX, pág. 48. ns. 4.404 e 4.405.)
Ora, se apesar de estatuir o cód. francês, no
art. 112, que a suposição de um nome qualquer des-
natura a letra de câmbio, reduzindo-a a mera pro-
messa, a força das noções tutelares da boa fé im-
plantou o princípio de que essa exceção não apro-
veita aos aceitantes e endossadores contra o terceiro
TRABALHOS JURÍDICOS 137

portador, alheio à fraude, com maioria de razão há


de preponderar essa tese em face do código brasi-
leiro, onde o art. 354, VI, não atribui tal efeito à si-
mulação de nomes, senão quando estes forem os dos
sacados. Mas, na hipótese, o nome do sacado, a pes-
soa por quem devia ser paga a letra, não era suposi-
tício; e tanto o não era, que a firmou, aceitando o
saque.
Uma vez prestado, o aceite é irretratável. Suas
conseqüências são fatais contra o aceitante. que não
pode alegar as exceções de erro, ou dolo, senão con-
tra os envolvidos em má fé. É a regra consagrada em
França. A fortiori há de sê-lo entre nós.
Le tiré qui a accepté une lettre de change qu'il croyait
véritable, ne peut pas être admis á rétirer son acceptation, en
se fondant sur ce que la signature du tireur est fausse. L'ac-
ceptation peut avoir été démandée par un tireur de bonne foi,
et le tiré a commis une imprudence en la consentant sans
avoir reçu l'avis que la traite était émise. L'accepteur est tenu
du payement par suite de l'obligation personnelle résultant de
son acceptation.
(Pandect, /r. v. XXIX. pág. 52. n» 4.435.)

Êsse canon da inevitabilidade da obrigação con-


traída pelo aceitante está implicitamente no cód. com.
brasileiro. Não somos nós quem o afirma sob a in-
fluência de um juízo de ocasião. Ê uma autoridade
tão alta como a de VIDARI, cujo sentir a êsse propó-
sito se exprime nestes termos :
Le odierne leggi, o espressamente, o tacitamente, ma
con pari certeza, non ammettono che 1'accettante possa mai
liberar si dallobbligo di pagar e.
(Corso. vol. VII. pág. 476. n* 6.729.)

E entre essas leis hodiernas. onde o eminente


comercialista vê firmada com a maior evidência essa
138 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

regra, a segunda indigitada é o cód. comercial brasi-


leiro, art. 394.
Esse vínculo de irretratabilidade tem a sua ori-
gem na própria natureza especial da letra de câmbio.
Por ela o aceitante contrai para com o portador do
título um laço de obrigação direta. É o que òtima-
mente assinala MARGHIERI na sua monografia da
cambial :
Restituito il titolo accettato, il trattario é imprescindi-
bilmente obbligato. La sua accettazione vale come riconos-
cimento delia delegazione dei traente e come sua obbliga-
zione diretta in via cambiaria. Egli ha cosi senzaltro con-
chiuso un contratto cambiario col portatore dei titolo. . .
L'acccttante è indipendente da qualsiasi altro coobligato;
egli è tenuto ancorché il traente sia fallito prima dellaccet-
tazione, ed egli Ia ignorasse; il contratto di accettazione non
essendo rescindibile neanche a causa di errore. Il dolo non
può essere opposto ai terzo portatore di buona fede : esso
accorda un'azione rescissoria soltanto contro chi é 1'autore
diretto dei fatto doloso. Lo stesso dicasi delia violenza.
{La cambiale, pág. 50.)

Esse princípio, que, em diversos países, tem a


sua base positiva no concurso geral dos arestos e no
consenso unânime da doutrina, já se encontra for-
malmente enunciado em códigos comerciais posterio-
res ao francês e ao nosso.
N a Bélgica, a lei de 26 de maio de 1872, que
regula especialmente a matéria, prescreve no art. 47 :
"S'il (le tiré) a accepté la lettre, il est tenu de payer
au porteur de bonne [oi, sauf son recours contre qui
de droit".
Na Suíça, o cód. federal de 1881, art. 823, dis-
põe : "Lorsqu'une lettre de change porte des sig-
TRABALHOS JURÍDICOS 139

natures fausses ou falsifiées, les signatures véritables


n'en produissent pas moins les effets spéciaux atta-
chés aux titres de cette nature".
N a Itália, o cód. comercial de 1882, art. 327,
depois de estabelecer que a letra de câmbio, onde
houver firmas de incapazes, vale a respeito das pes-
soas capazes que a subscrevem, preceitua : "La stessa
regola si applica nel caso in cui la cambiale contenga
firme false e firme vere". Ao que ajunta, no art. 328 :
"Coloro che hanno girato, avallato, o accettato una
cambiale falsa sono obbligati verso il possessore
come si avessero girato. avallato, o accettato una
cambiale vera".
Ver no mesmo sentido :
W A E L B R O E C H : Lettre de change, págs. 212-14.
RosSEL : Droit fédéral des obligat., pág. 859.
n.° 1.023.
SCEVOLA : Delia camb., págs. 247-250.
CALAMANDREI : La cambiale, págs. 182-85.
SUPINO : La Cambiale, pág. 334-5. n.° 579.
GALAVRESI : La Cambiale, pág. 182-85.
SORANI : Delia cambiale, éd. de 1900. pág. 370.
Digesto Italiano, v. V I , parte I, pág. 170,
ns. 183-5.
Enciclopédia Giurid. Italiana, v. Cambiale.
( C O N T U Z Z I ) , v. III, parte I, pág. 929 e segs.
Mas muito antes dessas legislações a lei geral
do câmbio, promulgada, em 1848, na Alemanha, e
ainda em vigor, determinava (art. 75) que, "ainda
sendo falsa, ou falsificada, a assinatura do sacador,
o aceite e os endossos sinceros não são menos váli-
dos perante o direito cambial". ( E N D E M A N N : Diritt.
commcrc, trad, ital., vol. V, pág. 378).
HO OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Tanto essa verdade jurídica estava, porém, na


essência das instituições cambiais, que à França, não
possuindo textos expressos neste sentido, bastou a
ação do ensino e dos tribunais, para firmar a mesma
regra, estabelecendo-se, em relação ao portador, a
responsabilidade cambial assim do aceitante. como
dos endossadores, nas letras onde for supositícia ou
contrafeita a assinatura do sacador. {Pandect, fr..
vol. X X I X , p. 49, ns. 4.401 e 4.404.)
Semelhantemente na República Argentina,
onde o art. 601 do cód. do comércio traslada o
art. 354, VI, última parte, do código comercial brasi-
leiro, a doutrina preconiza a mesma norma de julgar :
"Los que hayan endosado, aceptado ó afianzado una
letra falsa, quedarán obligados hácia ei tenedor de
buena fede, como si hubieran endosado, aceptado ó
afianzado una letra verdadera". (SEGOVIA, Explic.
y crit. del nuevo cod. de com. de la Rep. Arg., v. II,
pág. 150, n. 2 . 0 3 9 ) . É, como se vê, ponto por ponto,
o princípio do código italiano, art. 328, estabelecido
por evolução da consciência jurídica, independente-
mente de promulgação legislativa, apenas sobre o
fundamento de um regimen legal análogo ao nosso.
Não procederemos, logo, arbitrariamente, con-
cluindo que também no direito brasileiro a simulação
na assinatura do sacador não priva o possuidor es-
tranho ao dolo das vantagens, cujo gozo lhe asse-
gura contra o aceitante e os endossadores. cujas fir-
mas forem autênticas, a natureza do contrato cam-
bial. "Os endossadores, que, iludidos pela assina-
tura forjada no documento, participaram na sua cir-
culação, assumiram um verdadeiro compromisso, que
os torna solidàriamente garantes do pagamento".
(Pand. [r.f v. X X I X , n.° 4.401.) Pelo que toca ao
aceitante, esse "obrigou-se cambiàriamente para
TRABALHOS JURÍDICOS 141

com o possuidor". ( S U P I N O , op. cit., n. 579, pág.


334) (*), importando o aceite "uma promessa cam-
biaria ao detentor da cambial". E N D E M A N N : Ma-
nuale, v. V, p. 224.)
Ao terceiro quesito responderei, pois. que, em-
bora supositícia a firma de B., sacador e endossante,
sendo verdadeira a assinatura do aceitante O , o tí-
tulo cambial existe, e como título cambial vale con-
tra C , a favor do banco D, adquirente em boa fé da
letra impugnada.
E, se o aceitante fôr de veras o autor da simu-
lação criminosa acusada nas assinaturas do sacador
endossante, tanto mais indisputável será o seu com-
promisso para com o possuidor ilaqueado. Nemo au-
ditor turpitudinem suam allegans.
Em apoio da minha conclusão e da teoria onde
ela estriba, temos entre nós precedentes e autoridades
do maior valor. " O sacado", diz ORLANDO, "não
pode opor ao terceiro portador de boa fé a alegação
de lhe haver sido o aceite surpreendido com dolo; os
sacadores, como o aceitante, não podem opor a ex-
ceção de dolo contra o portador de boa fé nos títulos
à ordem, transferíveis por endosso. Etc." (Cód. com.
an., ed. de 1896, p. 199, n. 522). No mesmo sentido :
Ac. da rei. da Corte. 8 de fev. 1872. — Rev. n.° 8.901.
de 23 jun. 1876. — Gaz. ]uv., vol. I, pág. 76. vol. XII,
pág. 684.
II
"Lo sconto", opina o professor C O N T U Z Z I na
sua magnífica monografia da cambial, Enciclop. Giu~
rid. It., vol. Ill, parte I, pág. 653), "é una vera forma
di prestito ad interesse". Do mesmo sentir que o des-
(*) SUPINO. David. — Diritto Commerciale. Firenze, 1892. —
.
N. R.
142 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

conto não passa realmente de uma forma de emprés-


timo a juro é T H A L L E R (77. élém. págs. 614-5,
ns. 1 .077-78), e, como êle, outros ( * ) .
Entre nós, porém, geralmente a doutrina se tem
pronunciado noutra direção. Segundo ela, "o des-
conto de letras de câmbio não é simplesmente o con-
trato de mútuo, mas uma outra espécie de convenção,
que envolve seguros e riscos, sendo os descontadores
não mutuantes, mais compradores de letras, e como
tais considerados pelos escritores da jurisprudência
cambial, e sendo, em conseqüência, aplicáveis ao dito
negócio, quando nela há lesada alguma das partes,
não as leis que dizem respeito ao mútuo, mas as que
tratam da compra e venda". (ORLANDO, pág. 123,
n. 337).
Pode-se defender certamente com plausibilidade
a opinião expressa nesse tópico, de que no desconto
não há verdadeiro mútuo, mas, a alienação do título
descontado. Mas. nesse caso, não é propriamente
uma compra e venda o que se realiza, mas uma cessão
ou transporte de crédito, bem que os dois contratos
estejam assimilados um ao outro a quase todos res-
peitos.
Ora, por essa espécie de convenção só em casos
especiais, não verificados na hipótese da consulta,
responde o cedente pela solidez do crédito alienado.
bonitatem nominis pracstat. Fora daí, prevalece a re-
gra geral de que o cedente só afiança a realidade do
crédito transferido : non aliud tcnetur quam quod
nomen cessum sit vemm, non tamen quod sit exigi-
bile. ( O L E A : De cessione jurium et action., quaest.
Ill, n. 10-11. — LACERDA, Obrigações, pág. 62 e
n. 17 ao § 13.° - Digesto Ital. vol. VII, parte I,
pág. 790. — LAURENT, Ptincip. de dv. civ., vol.
(*) Deve ser: c THALLER quem sustenta [ou afirma].
TRABALHOS JURÍDICOS 143

XXIV, ns. 539-542. — CUTURI. Del vend., del cess.


e del permuta, n. 215, págs.509-511 ). O cód. civ.
francês é claro : "Celui qui vend une créance ou au-
tre droit incorporel, doit en garantir l'existence au
temps du transport, quoiqu'il soit fait sans garantie".
(Art. 1.693). Não menos o italiano : "Quegli che
cede un credito o altro diritto deve garantirne la sus-
sistenza ai tempo de Ia cessione, quantunque questa
si faccia senza garantia". (Art. 1 .544)
Quanto à solvência do crédito cedido, o contrato
é aleatório. ( C U T U R I , pág. 514, n. 218). O cedente
não responde pela solvência atual ou futura dos de-
vedores cedidos. ( M O U R L O N , vol. II. n. 270. Pan-
dectes fr., vol. X V , pág. 472. n. 964). O que êle
assegura é a existência ou subsistência do crédito no
momento da transação, a saber, que esse crédito te-
nha realidade e legitimidade, que não seja nulo, ou
não se ache extinto. (Ib., 468, ns. 926 e segs.)
Ora. na espécie, o crédito é a letra, e a letra
existe de fato e de direito, perfeitamente válida na
sua função capital, a responsabilidade do aceitante
para com o portador, que a adquiriu pelo desconto.
Pelo aceite, escreve THALLER, O aceitante fica
sendo "o principal devedor do título". (Traite,
pág. 676, n. 1.185). "L'accettazione" diz M A R -
GHIERI, "è una promessa di somma da parte dei trat-
tario accettante. ed è Ia promessa principale". (La
cambiale, pág. 50). "Per mezzo delia accettazione",
ensina CONTUZZI, "1'accettante diventa ti principale
obligato ai pagamento delia lettera di cambio, men-
tre gli altri non rispondono che in via di regresso".
(Cambiale, Dig. Ital., vol. Ill, parte I. p. 764). E.
como esses, VIDARI, "II massimo dei quali" (degli
effetti della accettazione) "come abbiamo awertito
giá parecchie volte, si è che principale obligato a pa-

.

144 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

gare la cambiale diventa l'accettante, mentre il ira-


ente si tramuta in un debitore di sussidio, ai pare di
un girante qualunque". {Corso, vol. VII, pág. 472,
n. 6.724. — Cód. de Com. fr., art. 121. — L. alem.,
art. 23. — Lei belga, art. 11. — Cód. feder, suíç.,
art. 742.)
No aceite se contém não só o reconhecimento de
uma dívida para com o sacador. senão também o com-
promisso, contraído para com o portador, de saldá-la,
"ainda quando ela não existisse". ( T H A L L E R , Op.
cit., pág. 677, n. 1.185).
Neste laço jurídico do aceitante para com o pos-
suidor, a letra subsiste na integridade da sua natu-
reza e eficácia cambial.
Logo, não há fundamento para se rescindir a
cessão, que só seria anulável, para se restabelecer, a
responsabilidade imediata do cedente, se o título ce-
dido fosse inexistente, ou nulo.

III

Está resolvido assim, ao mesmo tempo, com o


primeiro, o segundo quesito.
A doutrina contrária, que reputa nula, pela fal-
sidade da firma do sacador, a letra cedida, e, em
conseqüência, atribui ao cessionário a ação de garan-
tia contra o cedente, já encontrou adeptos. Mas os
tribunais e os mestres de direito a repelem :
Mais, s'il découvrait (le porteur d*une lettre de chan-
ge) «que l'effet qu'il détient est l'oeuvre d'un faussaire, ne
pourrait-il pas exercer contre son cédant un recours en ga-
rantie, basé sur l'art. 1.693, cod. civ., qui exige que celui que
cède une créance en garantisse l'existence au temps du trans-
port ? On l'a soutenu. Dès qu'il est reconnu que la signature
*

TRABALHOS JURÍDICOS 145

du tireur est fausse, dit-on dans ce système, la lettre de


change ne contient aucune obligation. C'est un acte informe,
radicalement nul, qui n'existait pas au moment de la cession.
Le cédant doit donc la garantie prévue par l'art. 1.693 c. civ.,
sauf a lui à exercer un recours semblable contre son propre
cédant. Cette doctrine est repoussée avec raison par les au-
teurs et la jurisprudence.
(Pandectes franc, vol. XXIX, pág. 49, ns. 1.402 e
1.403.)

M a s a favor da solução por que me pronuncio


há ainda elementos de jurisprudência mais estritos.
Ei-los :
La cour de Montpellier avait jugé, spécialement, que
le banquier qui cède par la simple tradition manuelle et sans
y apposer sa signature des billets à ordre revêtus de divers
endossements, et dont la propriété lui a été transmise par un
simple endossement en blanc, est garant de la vérité des sig-
natures apposés sur ces billets, ou, en d'autres termes, de
l'existence de la créance.
La cour suprême a cassé cette décision, et il a été jugé
que le banquier n'était tenu, en l'espèce, à d'autre garantie
qu'à celle de la sincérité de son cédant immédiat.
(Pand. franc, vol. XV, pág. 472, ns. 967 e 968.)

N a hipótese desse julgado, é o banqueiro quem


cede a outrem a letra por simples tradição manual,
sem lhe pôr a sua firma.
E a côrte de cassação decide que êle não res-
ponde ao cessionário, senão pela sinceridade da úl-
tima assinatura.
N o caso da consulta a última assinatura é a do
aceitante, cuja sinceridade não se contesta, e a letra
(ao que da consulta depreendo) foi cedida por A.
146 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

ao banco D. também por mera tradição manual, sem


a firma do cedente.
Logo, pela doutrina daquele aresto, o apresen-
tante da letra (A.) não responde ao cessionário D.
senão pela autenticidade da firma do aceitante C.
E, sendo esta real, está satisfeita a garantia do
contrato.
Como quer que se encare, pois, o assunto, não
tem motivo o banco D. para enjeitar a letra descon-
tada.
IV
Para dar ao quesito resposta cabal, cumpre con-
siderá-lo dos dois pontos de vista possíveis, conforme
a maneira de encarar a natureza jurídica do desconto.
É um mútuo ?
É uma cessão de crédito ?
Na primeira hipótese, não cabe a ação contra o
mutuário A., com quem o banco D. negociou a letra,
senão depois de verificada a insolvência do aceitante
C. ( T H A L L E R , op. cit.; pág. 614, n. 1.078). Pela
transação assim considerada realmente, o banco D.
adiantou a A., mediante desconto, o valor da letra,
para o haver oportunamente do sacado aceitante
(Ibid.) Logo, só depois de averiguada a impossibi-
lidade real do pagamento por este é que contra o mu-
tuário A. caberia a ação para reaver a quantia em-
prestada.
Na segunda hipótese, por diferente motivo, a
solução vem a ser a mesma.
Pela cessão tem direito o cessionário, não só à
realidade do crédito no momento do contrato, como
à dos seus accessórios, legais, ou convencionais, o
primeiro dos quais é a caução (GUILLOUARD : Vente,
TRABALHOS JURÍDICOS 147

v. II, pág. 365, n. 830). que na espécie era o com-


promisso do sacador. Mas, como a insubsístência da
garantia não importa a inexistência do crédito ce-
dido, apenas lhe subtrai um meio de liquidação sub-
sidiário, existindo, como existe, o crédito na sua obri-
gação principal, a do aceitante, só depois de verifi-
cada, pela insolvência deste, a necessidade da ga-
rantia, supressa. na hipótese, pela falsificação da
assinatura do sacador, é que procederá contra o
apresentante da letra descontada a ação de garantia.
Este o meu parecer.
Rio de Janeiro. 29 de janeiro de 1900.
Rui BARBOSA
VIII
SOCIEDADE EM COMANDITA
(Robertson A Cia.)
RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS COMANDITARIOS

PARECER
Tribunal de Justiça de S. Paulo

COMMANDITA ROBERT SON


■ <h MX­!.., tir re»pon­>at<iliiU.lc limitada drvi­ri..
•fjrvfnihrr a» quota» com que >c nbri(jaram a contri­
buir, qti.ioqurr que «e)am as iti*posic;<>t il» contract"
social.
Art 7* do Over. n. <)I7 de 2i dt Outubro de isnrj

Àllegações, documentos e pareceres


offeri.'ciilos
por occasiào dos embargos oppostos aos accordams que
absolveram os commanditarios de completar a* quotas sociaes
que subscreveram

Sâo Paulo
T y p o p a p h l » BraiU «le Carlo* G«fke * Cla.
«7 ­ Roi à» 8­ — *• «
1901
f

t
Facsimile de fôlha de rosto do avulso publicado em 1901
(Biblioteca Municipal de S. Paulo)
N O T A D O REVISOR

Conforme se verifica da consulta adiante transcrita, aos


9 de fevereiro de 1894, constituiu-se em Santos, Estado de
São Paulo, uma sociedade em comandita, sob o nome comer-
cial de Sociedade Bancária Roberstson & Cia.
O capital social era inicialmente de 1.800:000$000, di-
vidido em 18 quotas de 100:000$000 cada uma. Tinha a so-
ciedade, ao constituir-se. dois sócios solidários e quinze co-
manditários. Os sócios solidários comprometeram-se a en-
trar com 1.500:000$000, ficando o restante a cargo dos só-
cios solidários, ou seja a importância de 300:000$000.
Ficou estipulado no ato constitutivo que 50% do capi-
tal seria imediatamente realizado, perfazendo-se o restante
com a metade dos lucros que viessem a tocar anualmente a
cada sócio.
A 17 de janeiro de 1899 foi declarada a falência da so-
ciedade, verificando-se, então, que o seu ativo era insuficiente
para pagar a massa quirografaria.
Surgiu relevante controvérsia doutrinária, com repercus-
são no foro, para o fim de saber-se se, em virtude da falên-
cia, que impossibilitou fossem completadas as quotas subscri-
tas para formação do capital social, os comanditários esta-
vam obrigados a preenchê-las em dinheiro, destinado ao pa-
gamento da massa.
Decidida a espécie em primeira instância, foi interposto
recurso de apelação para o Tribunal local. Conhecendo do
feito, decidiu o Tribunal de Justiça do Estado, por maioria
de votos, reconhecer que a responsabilidade dos sócios fi-
154 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

cara limitada a 50:000$000, absolvendo-os ipso facto, do pre-


tendido ônus, isto é, para o fim de declarar que ao capital efe-
tivamente realizado, quando constituída a sociedade, res-
tringiam-se as obrigações assumidas, visto como a entrada
dos restantes 50% ficara condicionada aos lucros eventual-
mente apurados em cada exercício.
Inconformada, embargou a massa falida o acórdão,
sendo embargados os sócios Malta & Cerquinho. sócios co-
manditários ( * ). Outros recursos surgiram. Subscreveu os
embargos opostos, bem como a sua sustentação, o advogado
José Xavier Carvalho de Mendonça, na qualidade de pa-
trono da Massa Falida Robertson 6 Cia.
Por acórdão de 23 de setembro de 1901, proferido em
grau de embargos pelo Tribunal de Justiça de S. Paulo na
apelação n* 2.443, em que era embargante a Massa Falida
Robertson & Cia., e embargado Antônio Carlos da Silva,
foram desprezados os embargos opostos. Idênticas decisões
foram proferidas em nove outros feitos em que era embar-
gante a Massa, abrangendo-se nestes a espécie objeto da
consulta. ( Vide : Gaz. Jurtd. vol. cit.. pág. 170 e segs.)

(*) Cf. Gazeta Jurídida (S. Paulo], vol. XXVIII. págs. 34-82.
CONSULTA

Por contrato de 9 de fevereiro de 1894 constituiu-se, na


praça de Santos, a Sociedade Bancária Robertson & Cia.,
com dois sócios solidários e quinze comanditários.
O capital social, declarava o contrato, seria de . . . .
1.800:000$000 dividido em 18 quinhões de 100:000$000
cada um.
Treze sócios comanditários obrigavam-se a entrar, cada
qual com um quinhão, no valor de 100:000$000; um a entrar
com dois quinhões; e os sócios solidários tomaram a si os dois
quinhões restantes.
Nessa conformidade fêz-se o lançamento na primeira
página do Diário, da casa bancária Robertson ô Cia.
Em 18 de março de 1896 foi rescindida a sociedade a
respeito do sócio comanditário Dr. Martim Francisco, que
se tornou remisso (final do art. 289, do Cód. Com.).
Estipulou-se mais naquele contrato de 1894 que «do ca-
pital comanditário seriam realizados até 50%, devendo os
outros 50% restantes ser realizados com a metade dos lucros
que tocassem anualmente a cada um dos sócios».
Os comanditários entraram com 50% do quinhão subs-
crito.
A sociedade distribuiu aos comanditários lucros ou di-
videndos nos anos de 1894 e 1895, dividendos estes que fo-
ram embolsados integralmente; ou melhor, os comanditários
não cumpriram a cláusula do contrato que mandava comple-
tar com a metade dos lucros os respectivos quinhões subs-
-critos.
156 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Em 17 de janeiro de 1899 foi declarada falida a socie-


dade Robertson & Cia. e realizado o seu ativo, verificou-se
que não havia com que pagar a massa quirografaria. O di-
nheiro apurado aplicou-se ao pagamento dos credores rei-
vindicantes e privilegiados.
Pergunta-se :
Em virtude da falência, que tornou impossível comple-
tar com lucros as quotas subscritas para a formação do ca-
pital social de Robertson & Cia., os comanditários são obri-
gados a preencher aquelas quotas em dinheiro para paga-
mento dos credores da falência ?
Junta-se à consulta, para melhor exame :
a) o contrato de sociedade;
6) o lançamento feito na primeira página do Diário^
Parecer
No contrato sob o qual se constituiu "a socie-
dade em comandita e em nome coletivo" estabelecida
em Santos com a razão social de Robertson ô Cia.,
estipula o art. 2.° que "o capital social é de
1.800:000$000, dividido em dezoito quinhões de
100:000$ cada um, distribuídos" entre dezessete
associados, quinze dos quais comanditários, e soli-
dários os outros dois.
Essa cláusula designa uma por uma, em enume-
ração individuada, as dezessete pessoas, que por
aquele instrumento se associam, cada qual com a sua
quota indicada por sua vez, consignando a partici-
pação efetiva de cada uma das unidades sociais com
a expressão "entra" ou "entram", nestes termos :
"Os sócios comanditários F . F . . . . O s sócios soli-
dários F . F . . . . entram com. . . tomam a si um qui-
nhão no valor de. . . os quinhões no valor de. .
Entretanto, nesse mesmo artigo, o § 1,° se enun-
cia assim : "Do capital comanditário serão realiza-
dos até 50%, devendo os outros 50% ser realizados
com a metade dos lucros que tocarem anualmente a
cada um dos sócios, deduzido previamente o juro, a
que se refere o § seguinte", o qual o taxa à razão de
9%.
Relata, porém, a consulta, na exposição pream-
bular, que essa sociedade, organizada em 1894 com
158 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

a duração convencional de cinco anos, distribuiu lu-


cros ou dividendos no ano inicial de sua existência e
no seguinte, mas sem que a esses benefícios se aba-
tesse a metade reservada pelo contrato ao paga-
mento da segunda metade do capital social.
Falida mais tarde essa casa bancária (em 1899)
quer-se saber se, não dando o ativo para saldar as
dívidas sociais, são para o seu pagamento, os coman-
ditários obrigados a realizar do seu bolso os 50%, a
cuja efetuação estavam empenhados os lucros so-
ciais.
Princípio corrente é entre autores e códigos que
o associado responde à sociedade e aos seus credores
até à importância da quota social, a que se obrigou
(Cód. Com. art. 289).

"Chaque associé est débiteur envers la


société, de tout ce quit a promis d'y appor-
ter".
Cod. civ. ft., art. 1.845.
"Il socio accomandante è tenuto sino al
limite delia sua quota a rispondere delle per-
dite e dei debiti sociali".
Cod. di comm. ital., art. 117.
" O comanditário não responde pelos
compromissos da sociedade senão até o va-
lor da sua quota, e, enquanto esta não fôr
paga, até a importância da soma por efetuar' .
Cód. de com. ai. art. 165.
"El fondo social se compone de los apor-
tes que cada uno de los sócios entrega o pro-
mete entregar a Ia sociedad."
TRABALHOS JURÍDICOS 159

Cod. de com. chil., art. 375.


" O associado, que não entrar na época
ajustada com a sua quota em dinheiro. . . há
de pagar-lhe os juros à sociedade desde a
data em que devia realizá-la".
Cód. do com. húng., art. 73.
(Trad, de LA GRASSERIE, pág. 9 8 ) .
"Il (l'associé commanditaire) n'est tenu
que jusqu'à la concurrence des fonds qu'il a
mis ou dû mettre dans la société".
TROPLONG : Sociét., n. 828.
Assim que, pela simples obrigação que a êsse
respeito contrai o sócio para com a sociedade, o qui-
nhão com que para ela prometeu concorrer, passa a
fazer parte do patrimônio social. Devedores são. pois,
da sociedade os associados pelo valor da quota cujo
encargo assumiram, e por êsse valor respondem não
só para a reparação dos prejuízos sociais, como para
o pagamento dos credores da associação. "Estes" (é
VIVANTE quem fala, no seu Trattato, vol. I, pág. 369,
n. 329) "estes podem reclamar, em solução dos seus
créditos, a quota prometida e não embolsada pelos
sócios, a qual deve reputar-se parte do patrimônio
social retida nas mãos dêíes".

PARDESSUS, vol. IV, n. 1.034.


MALPEYRE et JOURDAIN, n. 256.
TROPLONG, n. 831 e segs.
CALAMANDREI : Società. vol. I, n. 280 e segs.
MARGHIERI : // Cod. di Corn. ital. comm. (éd.
DRUCKER & TEDESCHI, v. II. págs. 207-213.
VIVANTE, loc. cit., págs. 385, 386 e 387, n. 32.
160 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

THALLER : 77. élém. de dr. comrn., n. 325.


L Y O N - C A E N et R E N A U L T : Traité, v. II, pág.
308. n. 473.
"Aos credores sociais", dizem ali estes dois co-
mercialistas, "concedemos ação direta contra os co-
manditários : é a opinião que na jurisprudência aca-
bou por triunfar".
Mas, na hipótese, em que limites gira o direito a
esta ação ? Circunscreve-se êle aos cinqüenta por
cento realizados em dinheiro, ou abrange a metade
complementar, a que devia prover a parte de cada
sócio nos lucros sociais ?
Estatui o nosso código comercial, art. 287, ser
"da essência das sociedades comerciais", que "cada
um dos sócios contribua para o seu capital com al-
guma quota, ou esta consista em dinheiro, ou em
efeitos e qualquer sorte de bens, ou em trabalho ou
indústria".
Deve, pois, o contingente social de cada um dos
membros consistir cm matéria, que caiba numa destas
categorias :
Trabalho,
Indústria,
Dinheiro,
Efeitos,
Bens de qualquer sorte.
Em qual aêsses capítulos entrarão os lucros so-
ciais, de que, segundo o contrato em questão, se tinha
de formar cinqüenta por cento do capital ?
Só no último, que se enuncia sob a fórmula vaga
e ampla de "qualquer sorte de bens". Não importa
que tenham apenas uma existência futura; porquanto
as cousas futuras podem também ser objeto da con-
TRABALHOS JURÍDICOS 161

tribuição dos associados. (VAVASSEUR : Sociétés,


vol. I, p. 51» n. 77).
Estudando análoga disposição do código civil
francês onde no art. 1.833 se diz que cada sócio há
de entrar "com dinheiro, outros bens ou sua indús-
tria," observam NYSSENS e CORBIAU : "Conclui-se
destes termos gerais que se pode pôr em sociedade
tudo o que pode constituir objeto de uma obrigação,
quer se trate de haveres móveis ou imóveis, corpó-
reos ou incorporées, quer de outra qualquer cousa,
contanto que seja bem no sentido amplo da palavra,
isto é, apreciável em dinheiro" {Traité des sociétés
comcrcialcs, v. I, pág. 57, n. 67).
Não há dúvida nenhuma que os lucros futuros
de um sócio numa associação vêm a ser bens, ele-
mentos do patrimônio da pessoa a quem tocam. Eles
constituem objeto de obrigações da sociedade para
com os seus membros, e podem constituí-lo destes
para com terceiros. Mas, consistindo tais bens ape-
nas em uma expectativa absolutamente aleatória,
como seja o bom êxito das operações sociais, me
parece contestável que estejam no caso de constituir
matéria do capital de uma sociedade mercantil. Admi-
tida a prática de compor a quota dos sócios para o
capital coletivo com os próprios benefícios da socie-
dade no curso das suas transações, o patrimônio so-
cial perderia a sua realidade, a sua segurança, a sua
consistência, reduzindo-se a eventualidades mais ou
menos incertas; o que me não parece compatível com
a necessidade do capital concretizado em valores
apreciáveis nas sociedades comerciais.
Por esse artifício, sociedades de grande capital
aparente nos algarismos para êle convencionados,
poderiam de fato não o ter nenhum ou quase nenhum.
N a espécie, por exemplo, o contrato anuncia um ca-
162 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

pitai de 1 .800:000$000, e cada um dos associados


solenemente declara que enfra com uma parte de cem
ou duzentos contos.
O capital é a garantia dos credores. Não pede
prejudicá-los, pois, a forma especial por que os só-
cios entre si convieram em o realizar, se essa forma
tende a burlar o compromisso da sociedade para com
o público. É por isto que o Código das Obrigações,
na Suíça, dispõe :
Le comanditaire est obligé enver les tiers
jusqu'à concurrence de la somme inscrite sur
le registre du commerce. (Art. 602.)
Da soma assim Fixada, isto é, da soma que se
estipula na declaração do capital social, é devedor o
sócio, desde que a sociedade se institui. "Cominciata
la vita legale delia società commerciale (arts. 1.707
e 1709 cód. civ.), ogni socio è debitore di ciô che si
è obbligato di versare, e che va a formare il capitale
sociale". — (BIONDI — Manuale di Dirit. Comm. de
ENDEMANN. Trad. ital. vol. I. pág. 363.)
Certamente a sociedade, crquanto existir, não
lhes pode exigir a realização do capital ajustado se-
não pela forma, em que uns com os outros associa-
dos convieram. É o que se colige do estabelecido no
Cód. Comercial, art. 289 : "Os sócios devem entrar
para o fundo social com as quotas e contingentes, a
que se obrigarem, nos prazos e pela forma que se
estipular no contrato". Mas essa forma não constitui
lei absoluta senão entre os membros da sociedade,
para a economia interior da qual se pactuou. É o que
resulta do mesmo texto, onde, nas palavras subse-
qüentes às supra-transcritas acrescenta o legislador :
" O que o deixar de o fazer, responderá à sociedade
ou companhia pelo dano etc. . ." O que o art. 289
TRABALHOS JURÍDICOS 163

regula, quando se refere a forma de realização do


capital, é, por conseguinte a responsabilidade para
com a sociedade.
Mas, esta cessou de existir, a responsabilidade
dos comanditários para com a praça, para com os
credores sociais, deve ter por critério a soma estipu-
lada na declaração do capital social, no valor dos
contingentes com que para êle os sócios afirmaram
solenemente entrar.
Em minha opinião, pois, a resposta jurídica ao
quesito há de ser afirmativa : os comanditários são
obrigados a preencher a? quotas para pagamento das
dívidas sociais.
Rio de Janeiro, 22 de janeiro de 1900.
Rui BARBOSA

Em adendo ao que acabo de expor, sustentando


a obrigação, para os ».omanditários, de inteirarem o
capital estipulado cumpre lembrar o determinado na
lei de falências em vinor (dec. n. 917 de 1890), cujo
art. 74 reza : Os sócios de responsabilidade limitada
deverão preencher av quotas, com que se obrigaram
a contribuir, quaisquer que sejam as disposições do
contrato social.
Este texto é, r meu ver, decisivo para o caso.
Era ut supra.
Rui BARBOSA
IX

AÇÃO DE MANUTENÇÃO DE
POSSE
NULIDADE DO FEITO POR INCOMPETÊNCIA DO J U Í Z O ,
IMPROPRIEDADE DA AÇÃO E ILEGITIMIDADE DA AUTORA

Associação Nacional de Mineração do Brasil. A.


versus
Companhia de Mineração de São João D'E1-Rei, Ré
RAZÕES DE APELAÇÃO
SUPREMO TRIBUNAL F E D E R A L

Appellação N. 570
APPELLANTS

A Companhia de Mineração de S.João d'Elrey


APPELLADA

A Associação Nacional de 'Mineração do Brasil

RAZÕES DE APPELLAÇÃO
ADVOGADOS

x\tttj Barbosa. *
E

TJlysses Braaàâo

mm

RIO DE JANEIRO
Typ. do Jornal do Commotio de Rodrigues & C

1908
/

Facsimile do frontespicio da edição deste opiisculo feita cm 1903. (Ta-


manho natural). (Exemplar da Casa d; Rui Barbosa)
N O T A D O REVISOR

Por escritura pública, lavrada a 30 de março de 1829, o


Capitão-Mor João Batista Ferreira de Sousa Coutinho (de-
pois barão de Catas Altas) e sua mulher, puseram à dispo-
sição dos cidadãos ingleses Douglas Kinnaisd, João Roberto
Hard, Guilherme Morgan e Eduardo Oxenford, os três pri-
meiros residentes em Londres, e o último no Império, várias
fazendas e terras situadas em Minas Gerais, com respectivos
acessórios, destinados à exploração de minérios existentes no
local ou imediações, a cujo fim. entre outro*;, se destinava a
sociedade de que faziam parte os outorgados.
A sociedade teria a duração de 50 anos. podendo os
sócios respectivos, caso morressem nesse período, ser subs-
tituídos por seus filhos ou herdeiros; dispunha-se ainda que,
na hipótese de ser dissolvida ou extinta a sociedade, os
terrenos e bens móveis ou imóveis, ficariam pertencendo ex-
clusivamente aos sócios de Londres, os três primeiros men-
cionados.
O prazo previsto nos estatutos da sociedade terminou,
conforme foi estabelecido, em 1879, tendo esta, segundo se
alega, no ano anterior, se apossado de certa parte do terri-
tório objeto do litígio.
A Associação Nacional de Mineração do Brasil ( The
National Braziliam Mining Association), propôs no foro fe-
deral (Seção de Minas Gerais), uma ação de manutenção
de posse, contra a Companhia de Mineração S. João d'El
Rei, atribuindo-se aquela a qualidade de sucessora do primi-
tivo consórcio.

« .
170 OBRAS C O M P L E T A S DE RUI BARBOSA

Quando tinha curso a lide em primeira instância, foi


suscitada a questão de incompetência do juízo para decidir o
teito, resolvendo o titular, in limite, rejeitar a exceptio. In­
terpôs a Companhia Inglesa de Mineração do Morro Velho
agravo para o Supremo Tribunal Federal (agr. n. 369). Não
sendo o recurso preparado no prazo legal, foi julgado deserto
por acórdão de 19 de setembro de 1900, relatado pelo Mi­
nistro Pisa e Almeida, vencido o Ministro Macedo òoares.
Foi a ação julgada procedente, não se conformando a
r é (*)■.
Decidida a causa em primeira instância, toi interposto
recurso para o Supremo Tribunal, recebendo os autos, como
apelação eivei, o número 570. Assumiu então seu patrocínio
o Conselheiro Rui Barbosa, produzindo o arrazoado que in­
tegra a presente publicação, tendo igualmente atuado o
advogado Ulisses de Carvalho Soares Brandão, seu compa­
nheiro de escritório, como representantes da ré. Companhia
de Mineração S. João d El Rei [S. John d'El Rey Gold M i­
ning Company.]
Designado relator o Ministro Américo Lobo. foi depois
substituído (25 de janeiro de 1902) pelo Ministro Alberto
Torres.
A 21 de outubro de 1905 procedeu o Tribunal ao jul­
gamento da espécie, sendo, preliminarmente, anulado o pro­
cesso sob o fundamento de incompetência da justiça federal
para conhecer do caso proposto, vencido o Ministro Pisa e
Almeida. Declararam­se impedidos os Ministros Lúcio de
Mendonça e Ribeiro de Almeida, funcionando no julgamento
o Juiz federal da 2* Vara do Distrito Federal.
Os autos do processo, remetidos ao juízo a quo, não
foram localizados, sem embargo de reiteradas providências
intentadas.

(*) Veja­se carta de Mr. G . Chalmers, Superintendente da


St. John del Rey Mining Company Limited, de 8 de janeiro de 1900. en­
dereçada a Rui Barbosa, em seu arquivo.
Razões de Apelação
i

PRELIMINAR

Declarando o secretário do Tribunal, a fis. 281,


haver recebido estes autos em 27 de outubro do ano
passado, uma cota à margem recomenda que se veja
a fis. 257.
Fosse quem fosse que ali pôs essa nota. seu in-
tuito evidentemente é suscitar uma prejudicial, de
cuio exame nos não podemos abster, sendo esta a só
oportunidade, que se nos oferecerá, de intervir no
feito antes da sentença.
À fis. 257 o que se encontra, é o despacho de
recebimento da apelação pelo juiz seccional, em 26
de abril de 1899, marcando o prazo de seis meses
para a apresentação dela na instância superior; e aí
outra emenda à margem, da mesma letra, remete o
leitor para a fis. 281. Não pode haver dúvida, pois,
que o que nesses dois apontamentos marginais se pre-
tende, é confrontar as duas datas, a fim de mostrar
que a entrega dos autos no Supremo Tribunal exce-
deu, ainda que em sós vinte e quatro horas, o se-
mestre atermado.
inegável é o excesso de tempo; mas não apro-
veita à apelada.
Foi esta quem, tratando-se de proceder a exame
judicial num documento dos autos, requereu que se
172 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

procedesse a essa diligência na capital de Minas, d e -


pois de trasladada :
"Descontando~se, no prazo para fazer
subir a apelação, o tempo, que correr desta
data" (21 de julho) "até à do referido
exame (fl. 2 7 2 ) " .

Deferiu o juiz, por "estar a secção judiciária cm


vésperas de mudança para a nova capital", e já se
achar ali o procurador da república na secção
( ils. 272 v. ).
Já a fis. 264, a apelante. observando que o exame
solicitado ia desfalcar o prazo da apelação, e ne-
nhuma razão tinha a apelada, para insistir nele pe-
rante a instância inferior, quando o podia promover
na outra, reclamara do juízo "providenciasse com
energia para a remessa dos autos à instância supe-
rior". (Fis. 264 v.)
N ã o anuiu o juiz seccional; mas ressalvou so-
lenemente os direitos da apelante, dizendo no des-
pacho a fl. 274 v. :
Diga o dr. procurador sobre a matéria daquele requeri-
mento. Antes disso não podem subir os autos, pena de pare-
cer que este juízo acoberta um possível crime, preterindo a
audiência do imediato fiscal da justiça pública.
Quanto à delonga resultante, está o desconto previsto
em lei. e até com assentimento expresso da apelada, fl. 272.
N o termo de audiência a fl. 278, enfim, se con-
signa a mesma ressalva em expressões peremptórias :
Pelo juiz foi dito que o despacho final no incidente fi-
cou dependente de vista e audiência do dr. procurador, e pela
razão, externada já. de poder envolver um crime. Assim dê-se
vista com toda a prontidão ao dr. procurador, e depois resol-


TRABALHOS JURÍDICOS 173

verá o juízo o que fôr de direito. Para ressalvar direitos da


parte, declara que esteve licenciado o dr. procurador durante
cêrca de dois meses mais ou menos e, nesse intervalo, per-
turbada a ação da justiça pela mudança da seção para esta
capital, acrescendo mais que não se encontrou em Ouro Preto
um bacharel em direito, que se prestasse a aceitar interina-
mente o lugar de procurador; razão por que ficaram os fei-
tos parados e nomeadamente o que dá matéria ao requeri-
mento, ocorrendo assim verdadeiro impedimento do juizo,

Esse impedimento, reconhecido, e proclamado


tantas vezes pelo juízo, não cessou senão aos 10 de
outubro, segundo a certidão exarada a fl. 279 v.
Daí até à apresentação dos autos neste juízo de-
correram apenas dezessete dias, sendo que a ape-
lante, logo na audiência imediata àquela data, isto é»
em 14 desse mês, instou pela remessa do feito à ins-
tância superior (fl. 280), o que se levou a efeito oito
dias depois (fl. 280 v . ) .
De sorte que até 10 de outubro (fl. 279 v.), e
isso pelo menos desde 21 de julho, quando a apelada,
no requerimento a fl. 272, fêz questão do exame, a
saber, durante perto de três meses, se interceptou,
por embaraço do juízo, o curso do semestre atempado.
Ora, o excesso dado foi apenas de um dia. Logo,
está imensamente longe de cobrir a extensão do des-
conto irrecusável à apelação.
Que esse desconto não se lhe pode, coiu efeito,
recusar, é incontestável :
1.° porque a diligência, que reduziu a metade o
semestre assinado, não era do interesse, nem da ini-
ciativa da apelante, mas do interesse e iniciativa da
apelada e da justiça (fis. 268 v., 270 v., 272, 274 v.,
277, 278. 279);
174 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

2.° porque a apelante representou sempre contra


essa interrupção, como se vê nos requerimentos de
fis. 261, 264, 266 e 276;
3.° porque, podendo o exame, que serviu de
obstáculo, estar concluído antes de 10 de julho, não
se concluiu táo somente por culpa da apelada, como
certifica o despacho de fis. 264 e 265. nas palavras :
" É também certo que a parte requerente não com-
pareceu nem por si, nem por seu advogado, razão
por que não pôde ter lugar o exame";
4." porque a apelada mesma reconheceu expli-
citamente (fl. 272) o direito da apelante a lhe ser
abatido nos seis meses da apelação o tempo absorvido
pela exigência do exame;
5.° porque esse direito lhe foi categoricamente
assegurado pela justiça federal (fis. 274 v., 278 e
264 v. ) ;
b.° porque ela mesma confessa nos autos (fis.
268 e 269. 276, 277 e 278) haver sido a cessação
das suas funções, ligadas à mudança da capital e ã
falta de representante do ministério público, a causa
do retardamento;
7.° poro.ue. à vista destas considerações, preva-
lece o principio, invocado pela própria justiça federal
no 3eu despacho a fl. 265, nestes termos :
O caso está previsto na lei :
os impedimentos judiciais e até os de incidentes levantados
peta parte contrária, descontam-se no prazo fixado para a
apresentação da apelação.

O regulamento n. 737, de 25 de novembro de


1850, art. 658, declarou que "só poderá obstar o
lapso do tempo para o seguimento da apelação,
doença grave e prolongada do apelante, peste ou
TRABALHOS JURÍDICOS 175

guerra, que impeçam as funções dos juizes ou rela-


ções respectivas, ou algum impedimento legal*'.
O dec. n.° 5.467, de 12 de novembro de 1873,
art. 25, prescreve que "se consideram impedimentos
atendíveis, para ser relevado o apelante da deserção
da apelação, os de casos fortuitos, doença grave,
prisão do apelante, embaraço do juízo, ou obstáculo
judicial oposto pela parte contrária". Nessa regra
estão de acordo todos os praxistas. (T. DE FREITAS :
Prim. Lin. sob o proc. civ., tomo II. pág. 40, n. 658.
— RIBAS : Consolid., v. II, pág. 472, art. 1.558.)
No art. 346 do decreto legislativo n.° 848, de
1890, reproduzido no decreto regulamentar (conso-
lidação) n. 3.084, de 5 de novembro de 1898, part.
Ill, t. VIII, art. 710, se diz que "só poderá obstai o
lapso de tempo para o seyuimento da apelação mo-
léstia grave e prolongada do apelante, peste ou
guerra, que impeçam as funções dos juizes e tribu-
nais".
Manifesto é que a enumeração de "moléstia,
peste, ou guerra" não se há de tomar como taxativa.
Esses três casos exemplificam os impedimentos de
caráter irresistível, definidos na cláusula "que im-
peçam as funções dos juizes c tribunais". Nestas pa-
lavras é que se acha a fórmula dos impedimentos re-
levantes.
Desde que tolherem de funcionar os juizes e tri-
bunais, suspendem o curso do prazo da apelação. O
contrário nos levaria a absurdos insensatíssimos. N ã o
fala esse texto senão em peste e guerra. Devem-se
excluir todos os demais casos ?
Suponhamos então uma subtração de autos, a
destruirão dos cartórios do juízo, o estado vacante
dos cargos do ministério público no lugar, um in-
176 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

cêndio assolador, uma inundação, um terremoto. Por


qualquer desses motivos os juizes e tribunais podem
ser obriqados a não funcionar. E. se a enumeração
do art. 346, no dec. n.° 848, é taxativa, não serão im-
pedimentos procedentes ao seguimento da apelação,
n a v e r á quem aceite esse dislate ?
Certo que não. Logo, o legislador, no decreto de
1890, e o consolidador, no decreto de 1898, não pro-
cederam taxativa, mas demonstrativamente. Não se
indicam a peste e a guerra, por serem guerra, ou
peste, senão porque, peste ou guerra tem a mesma
conseqüência de turbar ou cortar a ação da justiça.
Toda a situação, pois, que tiver o mesmo efeito,
isto é, "que impedir as funções dos juizes e tribunais",
obstará o lapso de tempo ao seguimento da apelação.
Ora, na hipótese, foi o juízo seccional quem de-
terminou que antes do exame "não podiam seguir os
autos" (fl. 274 v.), por não haver procurador sec-
cional (fl. 278). estar o foro em mudança de Ouro
Preto para Belo Horizonte (fis. 276 v. e 277), não
haver sala de audiências, ter partido o arquivo
{ibid.), e "achar-se" em suma, "desorganizado o
serviço" da justiça. ( Fl. 276. )
Mas, se a mesma justiça federal atesta que o
empeço ao andamento da apelação foi devido a estar
a justiça desorganizada, a estar vacante o ministério
público, a estar sem audiência o juízo federal, certi-
ticado está por ele próprio que as suas funções se
achavam, não só embaraçadas, mas ainda suspensas.
A apelação não seguia, por lhe ser jurídica e material-
mente impossível seguir, estando parado o curso da
justiça.
E contra non volentem agere nulla currit praeS'
criptio.
TRABALHOS JURÍDICOS 177

Já aos 10 de julho de 1899 declarava o juiz fe-


deral que os trâmites do pleito estavam suspensos,
em razão de se achar impedido o juízo. (Despacho
défis. 264-5.)
E só se desimpediu em 10 de outubro, quando,
por fim, se consumou o exame requerido pela ape-
lada.
Foi mais, por conseguinte, do que a princípio di-
zíamos : foram três meses, quando menos, de impe-
dimento judicial. São, logo, três meses inteiros de
desconto no semestre fixado em 26 de abril (fl. 157),
se, como declarou a apelada, a fl. 272, e é inquestio-
nável, o tempo decorrido até à realização do exame
se desconta no semestre fixado para a apresentação
do recurso no tribunal ad quem.
Portanto, se esse semestre findava em 26 de ou-
tubro, — feita essa dedução, terminaria em 23 de ja-
neiro de 1900. Tendo, pois, sido apresentados os au-
tos em 27 de outubro de 1899, chegaram ao T r i -
bunal Superior ainda três meses menos um dia antes
da ultimação do termo.
Esta conclusão é indisputável.
II

I N C O M P E T Ê N C I A D O JUÍZO

Da petição inicial a fl. 2 se vê que a autora,


The National Brazilian Mining Association, é uma
companhia estrangeira, com sede em Londres. N a
mesma cidade tem a sua sede a ré, a " S . John d'El-
Rey Gold Mining Company", associação anônima
igualmente inglesa.
O objeto do pleito, ali exposto, vem a ser um
conflito possessório entre essas duas entidades jurí-
dicas, ambas estranhas, mas da mesma nacionalidade
ambas, em território nacional.
A competência das justiças da União está de-
finida na constituição de 24 de fevereiro, art. 60,
pr. letras a e /. Não sendo o assunto criminal, ou civil
internacional, (letras h e i), há de caber numa das
primeiras sete averbações da série, para se compre-
ender na esfera desta jurisdição.
Ora vejamos.
Trata-se da causa, "onde alguma das partes
funde a ação, ou a defesa, em disposições da cons-
tituição federal" ?
Não. Logo não entra na letra a.
De causa proposta "contra o governo da União,
ou a fazenda nacional, fundando-se em disposições
da constituição, leis e regulamentos do poder exe-
cutivo, ou em contratos celebrados com o mesmo
governo ?"
180 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Também não. Logo, não cai sob a letra b.


De causas "propostas pelo governo da União
contra particulares, ou vice-versa" ?
Ainda não. Logo, não se aninha na letra c.
De "litígios entre um Estado e cidadãos de
outro, ou entre cidadãos de Estados diversos" ?
Igualmente não. Logo, não se ajusta à letra d.
De "pleitos entre estrangeiros e cidadãos brasi-
leiros" ?
Evidentemente não. Logo. não se acoberta com
a letra e.
De "questões de direito marítimo e navegação" ?
Não, indubitavelmente. Logo, não se classifica
na letra g.
De ações enfim, "'movidas por estrangeiros e
fundadas, quer em contratos com o governo da União.
quer em convenções ou tratados da União com outras
nações"?
Não, sem dúvida nenhuma. No texto, com efeito,
para se firmar a competência sob a letra /, se reque-
rem duas condições associadas pela conjunção e :
Í.°) que as ações sejam movidas por estran-
geiros, isto é, que o autor no pleito não seja brasi-
leiro.
Esta condição já não se verifica, se o réu, como
na hipótese, também fôr estrangeiro. É o mesmo prin-
cípio de jurisprudência americana formulada por
BLACKE : Quando ambas as partes são forasteiras,
os tribunais federais não têm jurisdição.
The federal jurisdiction attaches to a case when one
of the parties is a foreign state or one of its subjects or citi-
zens and the other is a state of the Union or one o/ its citi-
TRABALHOS JURÍDICOS 181

zens. Where both parties are aliens, the federal courts have
no jurisdiction. (American Constit. Law. p. 126.)

2.°) que sejam fundadas em contratos com o


governo da união, ou em convenções e tratados com
outras nações.
Exige a constituição que êsses dois elementos se
reúnam e concorram no caso.
Mas o primeiro nele não se dá, porque ambas
as partes na lide são estrangeiras.
Não é só o autor, como o texto reclama, inspi-
rando-se nos arestos americanos.
Dando, porém, que se não admita essa herme-
nêutica, isto é, que seja indiferente a qualidade, na-
cional ou estrangeira, do réu, não se atendendo se-
não à do autor, falta, na espécie, o segundo elemento
de competência federal : o estribar o litígio em "con-
fraro ' com o governo da União, ou tratado com país
estranho.
Não assenta em tratado internacional, coisa de
que. nestes autos, nunca se falou.
Tão pouco se baseia em contrato, de qualquer
gênero, com o governo federal.
Sua base é a posse alegada; e nenhum dos tí-
tulos invocados pela autora em seu apoio tem o menor
viso de contrato com o governo nacional.
Logo, também não se pode capitular a pretensa
competência da justiça federal na letra / do art. 60.
E. não cabendo em nenhuma das especificações
do art. 60 da Constituição, nem sendo matéria das
que entendem com o art. 59, ou com o art. 61, como
obviamente não é, está fora de toda a dúvida que
182 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

não toca à esfera da justiça federal. A incompetên-


cia desta no litígio, é por conseguinte, palmar.
Cra.
" A sentença é nula :
a) sendo d a d a por juiz incompetente".
( D e c . n. 3 . 0 8 4 . de 5 de novembro de
1898, Dar. III. art. 99. — Reg. n. 737, de 25
de novembro de 1850. art. 679. — O r d . 1. III.
t. 75. pr.. e t. 87. § 1.° T . DE F R E I T A S E P E -
REIRA E S O U S A : Prim. Lin., n. 599 ao § 2 9 7 ) .

M a s aqui não se trata só de nulidade na sen-


tença, senão de nulidade no processo inteiro, visto
que a causa foi movida no fôro da União, devendo
sê-lo no do E s t a d o .
O r a . a lei n. 2 2 1 . de 20 de novembro de 1894.
art. 47. § 1.°, declara :
" A lei só considera insupriveis as nuli-
dades seguintes :

"3.° Falta de competência do juiz, que


houver julgado a ação, se a jurisdição não
fôr suscetível de prorrogação".
E o dec. n. 3.084. de 1898, art. 92 reproduz esse
preceito.
Ninguém dirá que haja prorrogabilidade possí-
vel da jurisdição federal para a estadual, nos casos
que a constituição entrega à justiça da União, ou da
jurisdição estadual para a federal nas lides que a
constituição comete à magistratura dos Estados.
O s textos discernem com a maior nitidez a nu-
lidade simplesmente d a sentença, quando proferida
TRABALHOS JURÍDICOS 183

por juiz a quem não compete (dec. n. 3.084, de 1898,


par. Ill, arts. 99 a 102), da nulidade extensiva aos
demais termos do processo, onde "julga", isto è,
exerce ofício de juiz, o magistrado incompetente.
(lb., art. 92.)
Poderia a ré ter alegado essa nulidade por ex-
ceção de incompetência (Decr. n. 848, de 1890,
art. 122. ~ Dec. n. 3.084. de 1898, parte III,
art. 170).
Mas era seu direito deixar de alegá-la então,
pp.ra a alegar agora, ou ainda mais tarde; porquanto
1.") esta nulidade é insuprível (1. n. 221, art. 47
§ l.°, 3."; dec. n. 3.084, art. 92 c ) , e só as nulidades
supríveis se reputarão supridas, se as partes não as
argüirem no momento, em que ocorrerem, ou quando
lhes competir contestar, alegar afinal, ou embargar a
sentença" (dec. n. 3.084, de 1898. art. 93; 1. n. 221,
de 1894. art. 47, pr.; reg. n. 737, de 1850, art. 675):
2°) os textos são ainda formais e peremptórios,
estatuindo qup
"as nulidades insupríveis podem ser ale-
gadas em qualquer tempo e instância, e anu-
lam o processo desde o termo, em que se de-
ram." (dec. n. 3.084. de 1898, art. 91; reg.
n. 737, de 1850. art. 674):
3.°) no tocante, com especialidade, às nulidades
da sentença, ]ei e doutrina são terminantes :
"A sentença nula nunca passa em jul-
gado". (Dec. n. 3.084, de 1898, art. 102,
reg. n. 737. art. 681. Ord. III, 75 pr.)
"As sentenças nulas por direito nunca
em tempo algum passam em cousa julgada;
184 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

mas em todo tempo se pode opor contra elas,


que são nenhumas e de nenhum efeito". ( P .
E SOUSA e T . FREITAS : Pr. lin., n. 599 ao §
297, pág. 300).
Sendo, pois, esta ainda ocasião legal de arti-
cular essa nulidade, e recaindo ela sobre o processo
todo, que é nulo, não somente anulável (PEREIRA E
SOUSA e T . FREITAS loc. cit., pág. 299), requeremos
que tal se declare desde o seu começo, no julgamento
da apelação, como processado em foro constitucio-
nalmente incompetente.
Ill

INCOMPETÊNCIA DA AÇÃO

Não tendo a autora, na petição inicial, desig-


nado a ação que intentava, o caráter ordinário, ou
sumário, sumária declarou-a o juiz a quo pela inter-
locutória de fl. 79. invocando, entre outras, a auto-
ridade de CORREIA T E L E S , Doutr. das ^Acões, e
RIBAS, Ações possessórias, pág. 200. onde se dis-
corre "da ação de manutenção ou de força nova tui-
bativa".
Ora bem. No feito se discute a existência da
força turbativa quanto a dois pontos : o que res-
peita ao córrego do Comboeiro, e o que toca ao cór-
rego do Luís Pinto.
No tocante àquele a vistoria a fl. 175 declara
nova a turbação : "A ré está construindo o rego, a
que se refere este quesito".
Que quesito ? O terceiro da autora. Ora, o que
esse quesito, a fl. 173 v. perguntava, é. "A ré está
abrindo um outro rego, ou o concluiu recentemente
em terras da autora, derivando igualmente as águas
do córrego do Comboeiro para o seu estabeleci-
mento" ?
A esse respeito, pois, a força era recente.
Mas, no que se refere ao outro córrego, os lou-
vados respondem opostamente.
186 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Perguntava a ré, no seu terceiro quesito, a


fl. 87 : " O rego, que tira as águas do córrego do
Luís Pinto para o estabelecimento de mineração da
ré no Cuiabá, é feito de muito próxima data, ou ante-
riormente" ?
E os peritos obtemperam :
" O rego, de que trata este quesito, é an-
tigo; mas existem vestígios de que foi limpo e
consertado recentemente".
(Fl. 175 v.)
Logo, aqui declaram mui nitidamente os louva-
dos que
"o rego, que tira as águas do córrego do
Luís Pinto para o estabelecimento da ré"
(termos da interrogação desta a fl. 87), "é
antigo". (Expressão da resposta a fl. 175 v.)
Liquidado está destarte que a ré tinha posse
antiga no rego, pelo qual derivavam para o seu esta-
belecimento as águas do córrego do Luís Pinto.
Admitido isto, não altera o caráter do seu direito a
circunstância de haver "limpado ou consertado" esse
rego em tempos recentes; porquanto, confessada ou
verificada a posse da ré no tal rego, limpando-o. ou
consertando-o, usava da sua posse mesma, não tur-
bava a alheia.
Em face, pois, dos resultados da vistoria, que
representam neste particular, a derradeira palavra
da prova, há. nestes autos, duas .questões :
uma, de força nova; a outra, de força
velha.
Mas sempre foi, entre nós, axioma de direito
judiciário que.
[1

TRABALHOS JURÍDICOS 187

"tendo sido cometido o esbulho há me-


nos de ano e dia, compete ao esbulhado a
ação de força nova, que será sumária.
Depois de passado o ano e dia a ação é
de força velha, sendo ordinário o seu curso".
Ord. II. 1, § 2.°.
Ord. III, 30, § 2."; 48.
CORREIA T E L E S : Dout. das aç., pág. 196,
n. 410 Ad.
Consol. das leis civ. art. 814. RIBAS :
Aç. possess., pág. 274.
E às ações de força nova turbativa competem,
além das que lhes são peculiares, "as defesas da
ação de força" diz CORREIA T E L E S {Dout. das ações,
§ 86, pág. 199), o qual, sob o nome de ações de força,
designa as de força espoliativa. como se pode ver no
§ 85. (Ed. de T. DE FREITAS, 1880, pág. 192-97.)
Esses princípios estão consignados na Consoli-
dação das leis refer, à justiça federal (dec. n. 3.084,
de 1898). Aí, no art. 409, se estatui :
"Compete a ação de força espoliativa ao
possuidor, que foi esbulhado da posse de
coisa móvel, ou imóvel.. .
"Se a ação fôr intentada dentro de ano
e dia. contados daauele em que o esbulho foi
cometido, será processada sumariamente, se-
gundo as disposições do cap. I do tít. V ; no
caso contrário, seguirá o curso ordinário".
E o art. 412 amplia, fundando-se na Ord. L. III.
t. 48, esse preceito à ação de manutenção, ou força
turbativa :
188 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

"Compete a ação de manutenção ao pos-


suidor, que é perturbado na sua posse mansa
e pacífica, contra o autor da turbação, para
que dela desista, e indenize o dano causado,
cominando-se-lhe pena para o caso de nova
violência.
Tem aplicação a esta ação o disposto no
1.° eno 2.° alínea do art. 409".
Logo. desde que. na espécie, de envolta com a
questão de força nova, existia uma questão de [orça
velha, só lhe cabia a ação ordinária, que, como mais
ampla, oferecia, de mais a mais, quanto à outra ques-
tão, garantias mais completas.
Ou então se debatessem as duas turbações ale-
gadas cada qual na ação que lhe competia. Porquanto,
se era legítimo reunir uma e outra, como se fêz, num
só litígio, indubitavelmente a forma ordinária, como
mais favorável à defesa e à averiguação da verdade,
havia de prevalecer à sumária; nunca esta àquela.
Procedendo-se como se procedeu, o que se fêz.
em última análise, foi usar do processo especial, em
caso no qual a lei (dec. n.° 3.084. arts. 409 e 412)
terminantemente o rejeita; com o que incorreu a lide
no preceito da lei n.° 221, de 20 de novembro de
1894. art. 47, § 1.°, 4.°, consolidado no dec. n.° 3.084.
de 1898, art. 92, d (parte III), que determina :
"Consideram-se somente insupriveis as
seguintes nulidades :

" O emprego de processo para o caso em


que a lei o não admita".
Ora, sendo, certo que "as nulidades insupriveis
podem ser alegadas, em qualquer tempo e instância e
TRABALHOS JURÍDICOS 189

anulam o processo desde o termo cm que se deram"


(Reg. n. 737. de 1850. art. 674, e dec. n. 3.084, de
1898, art. 91 ), esta, que interessa à natureza da ação
proposta, e lhe é congênita, necessariamente vicia o
processo de nasccnça, e o nulifica desde o seu termo
inaugural.
A própria autora, ora apelada, estava persua-
dida de que a ação devia ser ordinária, e neste sen-
tido quis orientá-lo: fato de que a sentença a fl. 79
contém menção especial :
A autora não empregou a expressão — ação ordinária
•— ao iniciar o processo; mas pretende imprimir-lhe esse curso
no requerimento de audiência a fl. 78, e a ré mostrou-se
condescendente, sem que, entretanto, se completasse a tran-
sação por aquiescência expressa.
Podia realmente haver acordo entre os litigan-
tes em admitirem o processo ordinário, onde a lei su-
põe o especial. É o que está na lei n.° 221, de 1894,
art. 47, § 1.°, e no dec. n. 3.084. de 1898, art. 92,
membro final. Para isso não se havia mister da aqui*
escência expressa figurada pelo juiz a quo. Bastava,
segundo se estatui nesse texto, que, movida a lide
sob forma ordinária, a ré a não impugnasse na con*
testação. Desde esse momento "a substituição do pro*
cesso ordinário ao sumário" deixava de ser nulidade
"que possa ser invocada pela parte".
Mas, quando o ocorrido é precisamente o con-
trário, isto é, quando se substitui o processo sumário
ao ordinário, diz peremptòriamente a lei n.° 221. de
1894, art. 47, § 1.°, n.° 3. e o dec. n.° 3.084, de 1898,
parte III, art. 92 d, que a nulidade é insuprivel.
Ora, só as nulidades supríveis se consideram su-
pridas, "se as partes não as argüirem, no momento
em que ocorrerem, ou quando lhes competir con-
190 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

testar, alegar afinal, ou embargar sentença". (Lei


n . ° 2 2 l . a r t . 47, pr. — Dec. n.° 3.084, parte III.
art. 93.)
Logo só essas podem ser supridas por assenti-
mento, expresso, ou tácito, do interessado. As de-
mais não se podem suprir nem por assentimento da
parte, como se acaba de ver, nem por autoridade do
juiz, que só a tem sobre as nulidades supríveis. (Dec.
n.° 3.084, parte III, arts. 91. 92, 93, 94 e 95, § 2.°.
96, 97. )
Aqui está porque, sendo insuprível a nulidade,
como esta é, pouco importa que a sua culpa toque ao
magistrado.
Este não pode legitimar, cometendo-o, o erro.
que não poderia sanar, cometido pela parte.
Embora, pois, resulte de ato do juiz, na hipótese.
a nulidade insuprível da lei n.° 221, art. 47. § 1.°.
n. 4. seu efeito é o mesmo : nulificar o processo (Dec.
n.° 3.084. parte III. art. 9 1 ) .
Tendo levado assim à evidência a nulidade ori-
ginal do feito,
1.°) pela incompetência do foro federal, onde
corre.
2.°) pela ilegitimidade da ação sumária que se
move,
poderíamos cerrar-nos por aqui, sem necessi-
dade nenhuma de ir além.
Todavia, ainda que por demais, adicionaremos
algumas considerações, que a matéria dos autos nos
sugere.
Encaramos a autoridade do juízo, e achamo-la
incompetente.

TRABALHOS J URÍDICOS 191

Estudamos a natureza da ação, e verificamos


ser injurídica, descabida, ilegal.
Se atentarmos agora na pessoa da autora (ora
apelada), veremos que o seu título carece igual­
mente de base, como o da ação e o do juízo.
IV

I N C O M P E T Ê N C I A DA A U T O R A

Como título da posse, contra cuja turbação re-


clama, exibiu a autora a escritura de fl. 12.
Por esse ato, celebrado aos 30 de março de
1829, o capitão mór João Batista Ferreira de Sousa
Coitinho e sua mulher, sendo senhores, em Minas
Gerais, de várias fazendas abundantes em terrenos
mineiros, puseram esses bens, assim como os mó-
veis e semoventes a eles anexos, em sociedade, para
a indústria de mineração, com os ingleses Douglas
Kinnaisd, João Roberto Hard, Guilherme Morgan,
ausentes em Londres, onde residiam, e Eduardo
Oxen ford, representante dos seus três compatriotas.
(Fl. 12 v.)
A cláusula 8.* desse contrato, a fl. 15 v., estipula
que,
"durando a sociedade cinqüenta anos,
poderiam, neste prazo, substituir as pessoas
dos sócios, que morressem, as dos seus filhos
ou herdeiros".
E a cláusula 9.a {ibidem) acrescenta, em se-
guida, que :
"no caso da dissolução ou extinção da
sociedade, ficariam todos os terrenos e bens
móveis e imóveis da sociedade pertencendo
exclusivamente aos sócios de Londres".
194 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Ora. por força da condição 8." que se acaba de


1er, a associação, contraída em 1829, expirou em
1879.
Em vez dessa, porém, temos agora como pos-
suidora daquelas terras, onde se alega ter ocorrido a
turbação, a autora, a saber, uma sociedade anônima,
a "National Brazilian Mining Association".
A que título ?
Não consta que nenhum dos membros da so-
ciedade atual seja filho ou herdeiro dos que compu-
nham a anterior.
Não consta que algum dos membros da pre-
sente sociedade o fosse da outra, entrando para a
atual como sucessor nos bens da primeira.
Mas a escritura de constituição desta não pre-
via senão somente essas duas espécies de sucessão :
durante a existência da sociedade primitiva, a su-
cessão dos filhos dos associados na parte de seus
pais; extinta a sociedade, a sucessão dos sócios es-
trangeiros na totalidade dos bens sociais.
Não constando, pois, dos autos que a "Natio-
nal Brazilian Mining Association" recebesse por al-
guma dessas vias a posse da sociedade entre o ca-
pitão-mor e os quatro ingleses sobre esses terrenos,
seria mister haver-se provado, ao menos, que das
mãos da sociedade primitiva, ou das dos seus su-
cessores convencionais (os sócios estrangeiros), a
posse desses haveres se transmitira, por alienação
regular, à autora, ou alguém de quem esta os adqui-
risse.
Ora, também dos autos não consta escritura de
transmissão legal de tais propriedades.
Claro está que não supre esta lacuna funda-
mental o documento, exibido pela autora, da inseri-
TRABALHOS JURÍDICOS 195

ção das terras, a que alude, no registro paroquial.


Bem se sabe que essa espécie de cadastro rudimen-
tar, suprido exclusivamente pelos interessados e des-
tinado a fins de estatística administrativa, não tem
caráter jurídico absolutamente nenhum, para firmar
ou transferir direitos. (Dec. n. 1.318, de 1854,
art. 94.)
Pelo que toca às concessões de datas minerais,
já está de sobra elucidado o ponto nas alegações fi-
nais, produzidas a fl. 236.
Nenhum título admissível, portanto, apresentou
a autora da posse, onde pretende estribar a ação in-
tentada.
O único aproveitável em direito é o de fl. 12.
Mas esse só valeria à autora, se ela fosse a socie-
dade, de quem se trata naquela escritura, ou a su-
cessora, por qualquer título, dessa sociedade; o que
dos autos não se mostra.
Logo, sem título da posse que inculca, a autora
não é parte competente numa ação possessória. Para
estar habilitada a movê-la, necessário era dispor de
algum, pro emptore, ou pro suo. (RIBAS. Posse,
pág. 57 e seg.)
V

DE MERITIS

Numa ação crassamente nula por mais de um


motivo irrefragável, ocioso seria discutir o mereci-
mento da causa.
Limitar-nos-emos. pois, a considerar a prova na
sua síntese, tocando-lhe os relevos capitais.
Se há, nos autos, depoimentos favoráveis à
posse da autora apelada, nesses mesmos não deixa de
haver elementos, que a desmintam.
As testemunhas pela autora produzidas são as
que lhe sufragam, em geral, a pretensão. (Fis. 186-
-202.)
Mas, no que elas disseram, mais de um assêrto
encontramos, que colide com a intenção da apelada.
Assim a 3." testemunha, a fl. 201 v.,
Ouviu de José Maria Pinto que êle e outras plantam
ali (nas terras de cuja posse se contende), mas não pa-
gam arrendamento, isto é, ainda não pagaram, porque já
consideram aquilo seu, mas que não comprou, nem herdou
de ninguém, dizendo-lhe o mesmo José Maria que o consi-
derava, por estar lá há muitos anos.

A testemunha imediata (a fl. 202 v.) confirma


de ciência própria a asserção de José Maria Pinto à
terceira testemunha :
198 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Emílio Pinto e outros moradores do Cuiabá, têm plan-


tado roças e feito pasto fechado nas terras de Luís Pinto,
Comboieiro, Goiabeiras e outras.

Por outro lado as três testemunhas da ré, ora


apelante (fis. 185 a 191) depondo muito mais am-
plamente que as da sua antagonista, lhe contestam
unânimes a posse nos terrenos em questão.
Dentre esses juramentos sobressai o de Emílio
Domingos Pinto, testemunha na vistoria :
Desde que se entende, tem morado nas terras de Luis
Pinto e Comboieiro, tendo nascido em Cuiabá, e tem pos-
suído as ditas terras mansa e pacificamente, há mais de qua-
renta anos. Diziam que essas terras eram da companhia de
Cocais, mas nunca foram embargadas nem a seu pai, nem à
testemunha, nem aos outros.
A s águas do Comboeiro e do Luís Pinto corriam para
o açude, que as levava p a r a a mineração da r é era Cuiabá.
Depois, há vinte anos mais ou menos, a companhia
do Morro Velho (a ré) tirou as águas do Luís Pinto por
um rego para o engenho, e delas tem estado na posse mansa
e pacificamente, correndo pelo dito rego desde então.
A s águas da Goiabeira, onde a companhia do Morro
Velho tem parte, receberam as do Luís Pinto, e vem juntas
para o engenho da companhia, para os serviços do engenho;
das quais toda a companhia (a ré apelante) tem estado de
posse mansa e pacificamente. (Fl. 185 v. )

Mas o que pela raiz corta a questão, são os do-


cumentos oficiais de fl. 74 a fl. 76.
Em fevereiro de 1877 o superintendente da
companhia de S. João d'El-Rei (a ré apelante) re-
presenta ao guarda-mor do lugar que, sendo insufi-
cientes para o movimento das suas máquinas as
águas do rio Sabará, das quais está de posse, e
TRABALHOS J URÍDICOS 199

cexistindo ociosas e desocupadas as águas dos córregos de­


nominados do Comboeiro, do Luís Pinto e das G oiabeiras.
que desaguam no mesmo rio Sabará, requer se lhe concedam
as águas dos referidos córregos, passando­se provisão, e mar­
cando­se dia e hora para a posse».

O escrivão da guarda­moria do M o r r o V e r ­
melho, "dirigindo­se aos lugares", viu, diz êle, que
todos esses córregos
«■estão sem ocupação alguma, chegando as águas ao rio Sa­
bará, sem serem ocupados de maneira alguma e que nem
existe vestígio de serem ocupados senão há muitos anos».
(Fl. 74 v.)

Em presença dessa informação, contra a qual


não se pode articular, nem se articulou suspeita, o
guarda­mor. "como pela informação se evidencia a
ociosidade das referidas águas, e sendo justo e legal
o pedido da peticionária" (fl. 75 v . ) , concedeu, em
nome do imperador,
«à companhia inglesa de mineração, estabelecida no Morro
Velho, do município da cidade de Sabará, as águas dos cór­
regos denominados do Comboeiro, do Luís Pinto e das G oia­
beiras, que vertem para o rio Sabará, para as empregar em
serviço de mineração». (Fl. 75 v.)
E, aos 26 de fevereiro de 1878, presentes essa
autoridade, o escrivão e as testemunhas da lei,
tf oi dada posse à referida companhia inglesa das águas dos
córregos do Comboeiro. Luís Pinto e G oiabeiras, na pessoa
do superintendente acima referido», (fl. 76).

H á , logo, mais de vinte anos que a ré apelante


foi, em nome de sua majestade o imperador, solene­
mente metida na posse das águas do Comboeiro e
Luís Pinto.

»
200 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

E que dela se utilizava efetivamente desde então,


demonstra-o, além da testemunha cujas palavras
transcrevemos há pouco, as duas a fl. 188 v. e
fl. 189 v.
A primeira
«nasceu no Cuiabá, e há quinze anos está zelando as águaa
do estabelecimento do Morro Velho: pelo que sabe que as
do Luís Pinto e Comboieiro desaguam no açude, que a com-
panhia reformou no mesmo rio, e as conduz para o seu esta-
belecimento de mineração ali.
«Quando começou a trabalhar para companhia, já ela
tinha um rego. que. tirando às águas do Luís Pinto, as le-
vava para as Goiabeiras: e dali seguiam as águas do Luís
Pinto e Goiabeiras por um rego maior, que, atravessando o
rio Cuiabá em tubos, iam servir ao mesmo estabelecimento,
para tocar o ralador. e que tem estado de posse dessas águas
mansa e pacificamente há mais de quinze anos».

A outra
«sabe, por ver, que as águas do córrego do Luís Pinto, to-
madas em um rego, vão desaguar no das Goiabeiras, e dali
seguem, com estas, por outro rego, que, atravessando o rio
Cuiabá em tubos, t>ão servir no ralador do engenho da com-
panhia de Morro Velho, há quatorze para quinze anos, mansa
e pacificamente».

Por último, quanto ao córrego do Luís Pinto,


não se esqueça que até os louvados, no laudo a
fl. 175 v., respondendo ao terceiro quesito de fl. 87.
certificam a antigüidade da posse d a ré apelante :
«O rego, de que trata esse quesito é antigo; mas existem
vestígios de que foi limpo e consertado recentemente».
N a d a importa que fosse consertado e limpo re-
centemente, se era antigo; pois o que estabelece o
TRABALHOS JURÍDICOS 20!

fato da posse pela ré apelante, é a existência do rêgo,


servindo ao seu estabelecimento. Se essa existência é
antiga, segundo se confessa no laudo, consertando
ou limpando recentemente esse rêgo, a sua possui-
dora não turbava a posse de ninguém : usava da sua.
Há, portanto, um travamento perfeito entre a
verificação ocular (essa ao menos no tocante ao cór-
rego do Luís Pinto), as três testemunhas designadas
e os documentos solenes de fl. 7 A a fl. 76 em com-
provarem a longa posse da apelante sobre as águas,
cuja apropriação a apelante indiretamente quer obter
por este meio.
Nem cabia no verossímil que a apelante reque-
resse a posse desses córregos, e nela se fizesse imi-
tir, com todos os requisitos oficiais, em fevereiro de
1878, por necessitar desse recurso adicional para os
trabalhos do seu estabelecimento, como então decla-
rou ( fl. 74), e só tratasse de utilizá-lo vinte anos mais
tarde.
Em vez de ser, logo, a posse da autora, foi, pelo
contrário, a posse da ré o que ficou demonstrado.
Para legitimar, portanto, a ação de manutenção,
falta-lhe a primeira das suas condições elementares :
a prova da atualidade da posse, isto é, da detenção
atual da coisa, com ânimo de a possuir. LOBÃO : /n-
terdit. possessor, § 178. ~- RIBAS : Posse, parte II,
t. II, § 2.°; t. II e VI,p. 261. — LAFAYETTE : Dit.
das cois., § 48, n. 1. — C. T E L E S : Dout. das ações,
§ 86. — MATTIROLO : Tratt. dir. gui. diz. civ. itaL,
v. I, §§ 253, 254, pág. 235 segs. — BARATONO : Delle
azioni possessorie, v. I, n.° 32, pág. 69. — BOURCART :
Actions Posscssoires, pág. 210 e segts.)
Não tendo tornado indubitável da sua parte a
posse jurídica, a apelada evidentemente carece da
ação proposta, e dela deveria decair, ainda que a ação
202 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

proposta coubesse no caso, e o foro, onde se inten-


tou, fosse legal.
Mas, como se viu, se discutimos a questão da
prova, foi tão somente por não deixar de considerar
no seu valor intrínseco a sentença apelada.
Feito isto simplesmente por desencargo, torna-
remos à nossa posição jurídica, a que se impõe ine-
vitavelmente ao Venerando Tribunal : a da incom-
petência do foro, a da impropriedade da ação, a da
conseqüente nulidade radical c insanável do feito.
Esta a tese preliminar do recurso e o eixo em
torno do qual força é que gire a sua solução.
Rio de Janeiro, 21 de janeiro de 1900.
Rui BARBOSA
SOBRE O S D O C U M E N T O S DA APELADA

Se valesse a pena de retorquir ironias inúteis no


debate jurídico, teríamos que dar aqui o seu a seu
dono, recambiando o epíteto de "atiladas", com que,
no último arrazoado, a fl. 332, a amabilidade da au-
tora obsequiou as razões da apelante.
A êle realmente parece assegurar-lhe direito a
sua confiança nos documentos, cuja exibição acaba
de engrossar os autos com o reforço volumoso de
fl. 347 a fl. 378.
Deixando para tratar por último do primeiro,
cujo exame então virá mais a seu tempo, começare-
mos por dizer daquele que imediatamente se lhe
segue.
É uma escritura de "declaração", celebrada, em
1830, entre o barão de Catas Altas e Eduardo Oxen-
ford, em relação a um contrato de sociedade que
entre as mesmas partes se firmara no ano anterior.
Favorece esse documento a intenção da ape-
lada ?
Longe disso, não serve senão aos interesses
da apelante.
Nele, com efeito, se nos depara, a fl. 353 v., o
seguinte :
Pelos mesmos outorgantes. os excelentíssimos barão e
baroneza de Catas Altas, me foi dito que, havendo os her-
204 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

deiros e viúva do falecido capitão Antônio Dias da Silva sus-


citado dúvidas sobre certa porção de terreno, que eles presu-
mem possuir no centro da fazenda de Macaúbas, e não sendo
da intenção deles outorgantes nutrir demandas, ficavam essas
terras como divididas, e em compensação delas, faziam nova
entrada para a companhia com todas as terras minerais,
casas e mais pertences, que houveram por compra feita aos
herdeiros do falecido capitão Manuel Ferreira Torres.

O que com esse documento, logo, veio provar a


apelada, é que para o patrimônio da companhia de
que se diz sucessora, NÃO entraram justamente essas
terras da fazenda de Macaúbas, onde, como dos au-
tos consta reiteradamente. se acham os córregos,
sobre cuja posse versa o objeto do pleito.
Ora, dessas terras, segundo também se paten-
teia dos autos, é condômina a apelante, por compra
feita aos herdeiros do mesmo Antônio Dias. cuja in-
tervenção obrigara o Barão de Catas Altas a retirar
da companhia, que fundara, os terrenos de Macaú-
bas, a que se alude no instrumento de fl. 352.
Passemos ao documento de fl. 355. Que valor
tem ele ?
Destina-se essa certidão a mostrar que a ape-
lante em socorro da sua pretensão se utilizara, nos
autos, de um papel falso. Mas o processo, mediante
o qual se quer provar tal imputação. não merece, em
direito, senão o título de grosseiro abuso contra a
justiça e as normas da lei judiciária.
Pela exposição que fizemos nos autos, de fl. 185
a fl. 195, recorrendo-se aos lugares ali indicados, se
verificará que o exame no documento argüido, pela
autora, de falsidade foi ordenado pelo juiz seccional
depois de recebida a apelação.
TRABALHOS JURÍDICOS 205

Ora a Ord. 1. III, t. 73, pr., determina :


Tanto que a apelação é interposta, assim de sentença
interlocutória de que se pode apelar, como da definitiva,
logo a jurisdição do juiz, de que é apelado, é suspensa e não
poderá jamais inovar coisa alguma, nem atentar, até que a
instância da apelação seja finalmente determinada.

Esta disposição reproduz-se no dec. n.° 3.084,


de 5 de novembro de 1898, p. Ill, art. 707, que acres-
:enta :
Todo ato em contrário é atentado, e deve ser revogado
na instância superior.

Neste caso, pois, se acha a diligência, a que


mandou proceder, no doc. a fl. 195 dos autos, a jus-
tiça federal de Minas Gerais. Sua competência ex-
pirara. Os atos, pois, que praticou, são nulos; acres-
cendo, ainda em cima, para lhes agravar a invalidade
substancial, a circunstância, que importa nova nuli-
dade, de não haver sido intimada, para assistir ao
exame, a apelante.
Os does. de fl. 362 e fl. 368 são firmados por
Eduardo Oxenford, como representantes dos três
ingleses, que, com o capitão-mor Sousa Coutinho,
formaram, em 1829, pela escritura de sociedade a
fl. 12. uma companhia, para explorar a indústria de
mineração.
Mas nada adiantam contra o que alegamos de
fl. 315 a fl. 320, quando, provando a incompetência
da autora, evidenciamos não ter ela justificado tí-
tulo algum à sucessão daquela sociedade, extinta,
por força do seu contrato, em 1879.
O doe. a fl. 373 é igualmente inútil para o es-
clarecimento desse ponto essencial, a cujo respeito
206 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

fica, por conseguinte, subsistindo a impugnação da


apelante.
Resta assim unicamente o doc. a fl. 347, cujo
estudo reservamos para a derradeira parte destas
considerações feitas em obediência ao respeitável
despacho de fl. 379.
Demonstrou a apelante, nas reflexões de fl. 295
a fl. 305, a incompetência do juízo federal para a
ação. que litiga nestes autos, por não caber em ne-
nhuma das espécies, que a constituição lhe taxou no
artigo 60, pr., letras a a i.
Redarguindo a esta proposição, manifestamente
exata, pretendeu a apelada acomodar o caso às hipó-
teses daquele artigo, letras d e [.
Quanto à primeira, expraiou-se em mostrar que
a palavra cidadãos, nesse texto, corresponde a resi~
dentes, e abrange assim as pessoas morais como as
físicas, assim as associações, como os indivíduos. É
essa a tese, que desenvolve de fis. 332 a 337. Não a
impugnamos.
Mas a própria autora, na petição inicial, a fl. 2.
reconhece que a sua sede se acha em Londres, onde
tem igualmente a sua sede a apelante. Não se trata,
logo. de um pleito entre cidadãos ou pessoas domi-
ciliadas em Estados diversos.
Querendo, porém, segurar-se a duas amarras,
buscou apoio, ao mesmo tempo, a autora na letra /,
do art. 60. onde se comete à justiça federal processar
e julgar "as ações movidas por estrangeiros e fun-
dadas cm contratos com o governo da União".
É a isso que traz o documento a fl. 347; com o
qual se mostra haver este venerando tribunal se con-
siderado competente, para julgar uma questão de
TRABALHOS JURÍDICOS 207

posse, "fundado no direito exclusivo que a autora


alega ter de um sistema de iluminação". (Fl. 349.)
Ora, evidentemente nenhuma paridade há entre
as duas espécies; visto como, na do aresto invocado,
onde se trata apenas da quase posse de um direito
pessoal, este emana direta e exclusivamente do ato
do governo, da patente, do privilégio por êle conce-
dido, — ao passo que, na hipótese vertente, a con-
cessão do Estado não passa de um acessório, que
poderia desaparecer, sem que a apelada por isso de-
caísse da posse no uso das águas dos dois córregos,
se ela efetivamente se achasse demonstrada pelas
circunstâncias, que julgou demonstrar com as teste-
munhas e documentos produzidos.
No caso da iluminação, o contrato com o go-
verno é que criara a quase posse.
Ela se fundava, portanto, no ato do governo, e
estava assim na letra da competência constitucional
firmada por aquele texto. (Const, art. 60, fl.) N a
espécie atual a posse resultaria dos atos materiais,
dos fatos particulares de ocupação e gozo das duas
correntes dágua, cuja posse não perderia o seu ca-
ráter de posse, ainda que a autora não tivesse título
oficial para explorar minas.
A posse aqui, portanto, não se funda nesse tí-
tulo, nessa espécie de contrato com o governo, mas
nos elementos, alegados c não provados, em que tem
a sua base, no direito privado, a posse comum das
coisas.
A incompetência da ação é. por conseguinte,
irrefutável, e o aresto, a cuja sombra se quis abrigar
a autora, de nada lhe vale.
Rio. 17 de maio de 1900.
Rui BARBOSA
X
RESPONSABILIDADE CIVIL
DO ESTADO
POR ATOS DE SEUS AGENTES

CABIMENTO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO DAS


DECISÕES DA JUSTIÇA LOCAL ATÏNENTES À MATÉRIA

PARECER
N O T A DO REVISOR

Os acontecimentos de Canudos, de 3 para 4 de março


de 1897. quando foi dispersada a 3» Expedição comandada
pelo Coronel Antônio Moreira César, em conseqüência da
morte deste, exaltaram os ânimos em algumas capitais do
País.
Conforme tivemos ensejo de acentuar em notas ao Vo-
lume XXV, tomo IV, naqueles dias, decerto sombrios para
a Nação, alguns jornais foram empastelados. Entre estes,
O Comércio de São Paulo, órgão da imprensa paulista, di-
rigido por Afonso Arinos. e de propriedade de Eduardo
Paulo da Silva Prado, que a 7 daquele mês e ano teve des-
truídas suas oficinas e demais instalações.
Alegando-se ter havido culpa do Estado, cujo preposto
— no caso o Chefe de Polícia local — teria deixado de to-
mar a seu tempo as providências suficientes a impedir os da-
nos causados, intentou o proprietário do jornal uma ação de
perdas e danos contra o Estado de S. Paulo. Foi, nessa fase,
ouvido o Conselheiro Rui Barbosa, cujo parecer, datado de
14 de março de 1898, integra o tomo IV dos Trabalhos Jurí-
dicos de 1898 (Opúsculo V ) .
Julgada improcedente a ação em primeira instância, por
sentença de 12 de agosto de 1898. do juiz Juvenal Malheiros
de Sousa Almeida, interpôs o autor apelação para o Tribunal
local. A 29 de junho de 1899 decidiu a corte ad quem negar
provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida. Foi
voto vencido o do Desembargador M. César, que expendeu
longas considerações a respeito da hipótese ventilada, e de
212 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

seu exame à luz das doutrinas e da jurisprudência mo-


dernas ( 1 ) .
Opostos embargos foram estes rejeitados por acórdão
de 7 de abril de 1900. funcionando como relator designado
para lavrar a decisão o Desembargador F. Saldanha. Foram
vencidos os Desembargadores Marcondes César, Pinheiro
Lima e Canuto Saraiva, que admitia os argumentos do De-
sembargador M . César justificativos de seu voto vencido, pro-
ferido no l ç acórdão ( 2 ) .
Examinando a hipótese do cabimento de recurso extra-
ordinário na espécie então discutida, emitiu o Conselheiro
Rui Barbosa o parecer ora publicado.
Manifestado o remédio jurídico de que se cogitava, foi
recebido este pela instância a quo, vindo a converter-se no
recurso extraordinário n. 205. Distribuído e relatado, foi jul-
g a d o pelo Supremo Tribunal Federal em sessão de 26 de
dezembro de 1900, funcionando como relator o Ministro Joa-
quim Antônio de Macedo Soares. Decidiu o Tribunal não
conhecer do recurso interposto, contra os votos dos Ministros
Barão de Pereira Franco e Joaquim de Toledo Pisa e Almeida,
que dele conheciam, em face do art. 59 da Constituição, visto
como não podia o juiz de primeira instância, nem a corte
local, julgar improcedente a ação sob o fundamento de omis-
são na legislação pátria, quando estava em pleno vigor a lei
de 9 de setembro de 1826 ( 3 ) .

(1) Cfr. Gazeta Jurídica, vol. XXIII. págs. 107 a 114.


(2) Revista de Jurisprudência, vol. IX. págs. 367 a 377.
(3) Jurisprudência. — Supremo Tribunal Federal. — Acórdãos
proferidos em 1900. Págs. 151-52. Rio de Janeiro, 1903. Imp. Nacional.
Parecer
i
Contra o princípio da responsabilidade civil do
Estado pela culpa dos seus agentes absolutamente
não procedem as objeções, opostas nos tribunais
paulistas, de que :
1.°) o direito romano a não consagra;
2.°) a lei brasileira é omissa;
3.°) a irresponsabilidade do Estado é a dou-
trina mais coadunável aos nossos costumes e leis.
Diremos rapidamente desses três pretextos do
regalismo republicano contra a verdade jurídica e o
direito de propriedade.
i (*)
Não procede o antagonismo do direito romano
por vários motivos, qual a qual mais terminante.
1.° O Estado, em Roma, não podia responder
pela culpa dos funcionários; porque a tal se opunha
a natureza do Estado romano, cuja soberania não to-
lerava limites. O Estado era o príncipe, e quod prin~
cipi plaçait, le gis habct vigorem. ( GAIUS ( * * ), I, § 5 ).
(* ) Repetido o n* I no original.
(*•) Houve aqui um pequeno equivoco, que talver cm outras cir-
cunstâncias fosse possível levar a conta de erro de composição. O ori-
ginal, entretanto, desmente a assertiva. O fragmento citado pertence a
UI.PIANO (Fr. 1. pr.. D. I. 4 ) . muito embora a pas-agem de GAIUS, no
lugar mencionado, contenha proposição análoga, ainda que longe de tra-
duzir o sentido despótico que encerra a frase do primeiro distes juris-
con c ultos. Ei-la : constitutio principis est, quod imperator decreto vel
edicto vel epistula constituit.
214 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

A o s atos abusivos cometidos pelos órgãos, mais ou


menos remotos, do soberano falecia o caráter essen-
cial ao dano jurídico : a injúria, isto é, a lesão do
direito, que não podia ser ferido por quem, como lei
viva, o criava.
2.° A ação dos particulares contra o E s t a d o
pressupõe a divisão do poder político em poderes dis-
tintos e independentes : Cogens et coactus requi~
runt distinctas personas. ( G R O T I O : De jure belli ac
p a c , 1. II, c. H , n. 2 ) . E o direito público romano
n ã o conhecia essa noção. O poder judiciário, o exe-
cutivo e o legislativo fundiam-se todos nas mãos do
soberano, superior a toda lei. Princeps a legibis so-
lutus est. Daqui a impossibilidade de uma ação con-
tra o Estado, isto é, contra o príncipe, encarnação viva
e absoluta da soberania. "Sic igitur princeps dicitur
solutus a lege, quia nullus in ipsum potest judicium
condemnationis [erre, si contra legem agat. . . nullus
enim propriè cogitur a se ipso: lex autem non habet
vim coactivam, nisi ex principis potestate". (TOMÁS
DE A Q U I N O : Summa, Quaest. X C X V I , art. 5 ) .

3.° E m conseqüência, não havia, no direito pro-


cessual d e Roma, ação contra o Estado, fosse por
d a n o dele oriundo aos particulares, fosse por débito
d e qualquer outra natureza. É a maior das autorida-
des quem nô-lo ensina.
Les dettes de l'Etat peuvent, lorsque elles ont été trans-
portée sur la tête d'un particulier de la façon indiquée plus
haut, comme par exemple la dête de solde sur la tête du débi-
teur d'impôt, faire contre lui, comme on l'a vu, l'objet d'une
réclamation forcée. Mais l'exécution forcée est impossible,
quand il ne peut y avoir ou il n'y a pas eu de tal transport...
il n'y a pas contre l'Etat d'action proprement dite, indépen-
dante du gré du défendeur. Le magistrat ne peut en cette
qualité être placé dans la position du défendeur que suc-
I

TRABALHOS JURÍDICOS 215

combe dans la procédure prétorienne privée; et il est complè-


tement impossible de suivre l'exécution contre l'État lui-même.
Un procès est un appelé à une puissance supérieure, à la-
quelle les parties se subordonnent; en agissant ainsi, l'État
abriquerait. L'idée grande et profonde de mettre un organe
de l'Etat, la justice civile, au dessus des autres organes de
l'État, dans les procès qui concernent la fortune publique, est
étrangère à la constitution romaine.
(THÉOD. MOMMSEN : Dr. public romain, trad. GIRARD,
v. I, págs. 200-201).

4.° A tal ponto chegava entre os romanos a


irresponsabilidade do Estado, que até em matéria de
desapropriação por utilidade pública, não se conhe-
cia princípio legal, que refreasse o arbítrio d o so-
berano. ( B E L L A V I T E : Delia respons. dello Stato pei
danni avenu attenenza civile causale dit. od. ind.
con esso, págs. 2 1 - 5 ) .
5.° Se valesse, pois, o exemplo romano, a au-
toridade do Corpus Juris Civilis, seria para excluir,
não só a responsabilidade do E s t a d o pelo dano de
que forem autores os seus representantes, como o di-
reito à indenização da propriedade expropriada e a
possibilidade, em qualquer hipótese, de ação alguma
contra o governo.
Entretanto, segundo o próprio direito romano
se chegou a reconhecer a injustiça do cânon, que re-
duzia a responsabilidade ao funcionário culpado, e
veio a se admitir a dos empregados superiores pela
culpa dos inferiores ( BELLAVITE, op. cit., págs. 23-4 ),
ampliando-se a ação do prejudicado contra os no~
minatores seu creatores, id est qui aliquem ad duum-
viratum vel aliquot munus publicum nominant, id est
créant suo periculo, sua [ide. ( C U J A C . gloss, ad. leg.
2, § 7 D de adm. res. ad. civ. pert.), — "princípio fe-
216 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

cundo, que logicamente nos conduz à responsabili-


dade da administração mesma". (Acchiuio Giucidico,
v. XXI, pág. 379). ( • )

II
As idéias sobre as quais assenta a responsabili-
dade civil do Estado são meras aplicações do direito
comum, dos princípios universais de direito civil,
como esplendidamente demonstrou CHIRONI {Colpa
extracontr., ns. 210-212, págs. 470-90). A jurispru-
dência, em toda a parte, as deduz das noções funda-
mentais, que regem a responsabilidade extracontra-
tual do comitente pelos atos do preposto. (Ib.,
págs. 495. 519.)
No direito francês a matriz da teoria, que res-
ponsabiliza o Estado pelos abusos dos seus funcio-
nários, está no art. 1 .384 do cód. civil, cujos ter-
mos são estes : "Les maîtres et les commettants sont
cesponsables du dommage causé pac leucs domesti-
ques et préposés dans les fonctions auxquelles ils
les sont employés". N o direito italiano a base da dou-
trina está igualmente em artigos do código civil, os
arts. 1 .152 e 1 .153, onde se determina a responsabi-
lidade geral de toda entidade romana, "non solo pel
danno che cagiona pec fatto próprio, ma anche per
que.lo che uiene arrecato col fatto dclle persone delle
quale deve respondere". O funcionário, raciocina-se
juridicamente, representa o Estado. O ato do repre-
sentante é ato do representado. Logo. a culpa do
funcionário cai sob o princípio de direito comum, a
responsabilidade do comitente, a menos que uma lei
especial derrogue, em relação ao Estado, essa dis-
posição geral. ( P R O V . PALAZZO : Delia respons. civ.

(*) MEUCCI, Delia Responsabilité indiretta delle Amministcazionc


Pubbliche.
TRABALHOS JURÍDICOS 217

dello Stato, págs. 23, 67-8. Rui BARBOSA : A culpa


civ. das administr. públicas ( * ), págs. 44-7 ).
Ora, esses princípios de direito privado, que já
tinham nas relações particulares, muitas aplicações
entre os romanos, são correntes no direito pátrio,
onde nunca se pôs em dúvida a responsabilidade
geral do comitente pelos atos de quem o representa.
E são esses princípios de direito privado simples-
mente que se trata de aplicar, embora numa espécie
de relações onde entra o Estado. "Cumpre", diz
GIERKE» "declarar o Estado, as comunas e as ou-
tras corporações de direito público responsáveis se-
gando as regras do direito privado pelo dano que dé-
rivante da culpa dos seus órgãos no exercício do po-
der público [dutch schuldhafte Verwendung oder
nicht Verwendung õffentlichen Machtmittel) ; pois
aqui absolutamente se não trata, como pretendem re-
centes escritores, de uma responsabilidade especial,
que tenha no direito público a sua regra. Trata-se.
pelo contrário, de uma responsabilidade, que emana
dos princípios de direito privado, indubitavelmente
aplicáveis a essas pessoas morais, e só existe no caso
de lesão ilegítima de um interesse particular, dentro
nos limites em que a esfera do direito privado fôr
ofendida por um ato ou omissão resultante da vida
pública, mas contrária ao direito público". (Die Ge-
nosscnschaftstheorie und die deutsche Rechtspre-
chung, pág. 794.)
Dessas mesmas premissas têm extraído a res-
ponsabilidade civil do Estado pelos atos culposos
dos seus funcionários todos os que a sustentam :
DEMOLOMBE (V. X X X I , n.° 637); LAURENT (Pr.
de dr. civ., ns. 319 segs.); MARCADÉ (V. V, sob. o
»
(*) Vide: Vol. X X V . Tomo V. das OBRAS COMPIFTAS DE RUI
BARBOSA \Trabalhos Jurídicos — 1898], págs. 1 e segs., anotado pelo
autor destas notas.
218 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

art. 1 . 3 8 4 ) ; B A U D R Y - L A C A N T I N E R I E (Précis, v. II,


pág. 928, n. 1 . 2 9 2 ) ; S O U R D A T (Responsab., v. II.
págs. 454, 455. 457-9. 509-11. 519-22); A U B R Y et
RAU (V. IV, § 447); M A S S É e V E R G É a ZACHARIAE
(v. I V , § 628, n.° 6, págs. 2 3 - 4 ) ; SANLAVILLE (Res-
pons. civ. de l'Et. en mat. de postes et télegr.,
págs. 7 3 - 8 4 ) ; D E F I L I P P I S (Filangieri, v. II, Giu-
cisprud., p á g . 3 n. ); BORSARI (Comment.,
v. III, P . II, p á g . 3 5 0 ) ; RICCI (Obblig.. págs. 533-
- 8 1 ) ; P A L A Z Z O (Op. cit.); BELLAVITE (Op. cit.,
págs. 5 0 - 5 1 ) ; S A B B A T I N I (L'amministraz. secondo la
legge, págs. 132-47); Z A C H A R I A E e D E STOSSER
(Archivio Giuridico, v. I, pág. 3 4 9 ) ; S T O B B E (Deu-
tsches Privatcechts, v. III, n.° 2 1 ) ; M E Y E R (Deuts-
ches Staatsrechts, pág. 4 3 6 ) ; M E U C C I (Diritto am-
ministr., p á g s . 2 7 1 - 9 0 ) .
N ã o fizeram êsses intérpretes mais que aplicar
à administração pública os cânones de direito usual
quanto à relação instintiva, à responsabilidade indi-
reta dos entes morais, ao mandato, à representação,
a o quase-delito. "La dottrina da noi preferita", diz
SABBATINI (op. cit., pág. 137), "si risolva nell'appli-
cazione pura e semplice dei principi sanciti dal códice
civile neliarticolo 1.153 ai rappocti dello Stato verso
i funzionari, per gli effetti delia sua responsabilité
come committente"'. E por êsses fundamentos chega-
ram à conclusão, que resumiremos com as palavras
de M E U C C I :

Conclusionc : Io Stato o qualunque amministrazione


pubblica in qualunque modo e per qualunque fine opérante, se
leda i diritti altrui per opera di persone alie quali sono affi-
dati gli incarichi che esso deve compiere per próprio inte-
resse, trauasi sotto il principio de! rapporto istitorio, e o
deve risponderne.
(Op. cit., pág. 274.)
■ >

TRABALHOS J URÍDICOS 219

Ora, notório é que todas essas regras elemen­


tares acerca da culpa civil e sua aplicabilidade às
pessoas jurídicas têm entre nós o mesmo curso e o
mesmo foro de cidade. Dadas, pois, assim as mes­
mas premissas, irresistïvelmente se impõe a mesma
conseqüência de que o Estado, pessoa jurídica, res­
ponde pelo dano dos seus prepostos ao direito indi­
vidual.
Não é, logo, para firmar essa obrigação geral,
ê para a excluir, que se haveria mister de lei expressa.
Depois a objeção provaria demais : se a au­
sência de lei formal a esse respeito exonerasse a
administração pública da responsabilidade civil, essa
responsabilidade também não teria o Estado nos
casos de culpa contratual e nos de culpa aquiliana
ocorrida, por obra ou omissão dos funcionários, em
fatos de mera gestão, quando aliás, numa e noutra
hipótese, não obstante o silêncio da lei, não há quem
desconheça a aplicação do princípio da responsabili­
dade indireta.
Concluamos, pois, com um jurisconsulte ita­
liano, que, na falta de textos onde se assegure ao
Estado, em termos gerais, o arbítrio de lesar impu­
nemente o direito particular, estamos simplesmente,
ante o fato de um dano causado, que a lei não de­
clara imune a responsabilidade, e cujas conseqüên­
cias jurídicas temos que determinar.

III

Afirmar que na irresponsabilidade civil do Es­


tado consiste a doutrina mais sufragada pelos nos­
sos costumes e leis é desmentir rosto a rosto a juris­
prudência do supremo tribunal federal, do governo
da União e do congresso brasileiro.
•«

220 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Do sentir predominante no congresso temos o


testemunho solene na lei n.° 425, de 5 de dezembro
de 1896, por êle votada, abrindo à administração
federal um crédito de quatro mil contos, que, por de-
creto executivo de 7 de dezembro desse ano, n.° 2.397,
efetivamente se desembolsaram dois dias depois, em
ressarcimento do dano causado a italianos, domici-
liados no país, por atos ou omissões de funcionários
do Estado. {Relat. do minist. das relaç. exter., 1896,
1897, págs. 110, 114, 2 2 ) .
Do princípio adotado pelo governo da União
temos documentos : na indenização de 100:000$000,
paga a Domeneck, Balverdie & Cia., por fatos de
depredação, saqueio e violências pessoais, que a po-
lícia praticara, ou não evitara; na de 250:000$000,
embolsada a Pierre Dénis & Ca., em reparação de
prejuízos causados por agentes oficiais; na de . . .
50:000$000, entregue pela alfândega de Porto Ale-
gre a Léon Bastide em satisfação de violências per-
petradas contra êle e sua mulher por agentes de po-
lícia e oficiais de justiça na execução de um arres-
to ( 1 ) ; na mensagem endereçada pelo chefe da na-
ção ao congresso nacional, em 12 de julho de 1897,
solicitando o crédito de £ 1.098. a fim de pagar o
dano infligido aos proprietários do vapor Stamnore
por um erro da polícia de higiene no porto de Santos.
Da parte do Supremo tribunal federal não são
poucos os arestos, que direta ou indireta, implícita
ou explicitamente formam a aplicação dos princípios
da culpa civil ao Estado.
Tais :
o acórdão n.° 148, de 29 de fev. de 1896, ne-
gando a indenização reclamada à fazenda nacional

(1) Relat. do minist. das relaç. cxt. 1895. págs. 222. 226. 229.
TRABALHOS JURÍDICOS 221

por danos causados pela tropa à propriedade parti-


cular no Paraná, em razão de se não terem verifi~
cado os prejuízos alegados. (Jurispr., 1896, págs.
158-9);
o acórdão n.° 218. de 6 de março de 1897 con-
tra o Estado de Pernambuco, mantendo a sentença,
que o condenava a satisfação de perdas e danos, em
benefício de uma associação prejudicada por um ato
do governador {Jurisprud. do Supr. Trib. Feder.,
1897, págs. 162-3);
o acórdão n.° 289, de 7 de julho de 1897, que
reformou a sentença de perdas e danos proferida
contra a União, a favor de J. da S. Melo, por se não
ter dado a prova dos prejuízos imputados (ib.,
págs. 227-8);
o acórdão n.° 235. de 28 de agosto de 1897,
que condenou a fazenda nacional ao pagamento de
perdas e danos em virtude do extravio de um carre-
gamento de armas "por atos de representantes do
governo da União" {ib., págs. 248-9);
o acórdão n.° 240, de 25 de setembro de 1897,
que confirmou em parte a sentença contrária à União,
na questão de perdas e danos causados aos proprie-
tários do vapor Paraíba (ib., págs. 262-3);
o acórdão n.° 15, de 24 de novembro de 1897,
que, no pleito movido ao governo federal por Do-
mingos Gomes, exigindo indenização pelas deterio-
rações de um prédio seu em conseqüência da explo-
são da Mortona, devida à incúria de soldados que
por ali carregavam barris de explosivos, absolveu a
fazenda, por se não demonstrar que a danificação
proviesse de tal origem (ibid., págs. 284-5);
o acórdão n.° 259, de 4 de dezembro de 1897,
que julgou improcedente a ação proposta contra a
222 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

fazenda nacional, reclamando indenização por da-


nos provenientes de atos arbitrários e violentos de
representantes do governo no Rio G r a n d e do Sul,
por se haver provado que os abusos tinham sido pra-
ticados pela [orça do Estado, não pela do governo
federal (ib., págs. 2 8 9 - 9 2 ) ;
enfim, o acórdão de 27 de julho de 1898, no
pleito entre J. C. Nepomuceno da Silva e a fazenda,
e o acórdão de 31 de dezembro do mesmo ano entre
ela e Procópio José dos Reis.
N a primeira destas duas últimas sentenças pe-
remptòriamente declara o tribunal que
indisputável é a responsabilidade civil do Estado pelos
danos causados aos particulares pelos funcionários públicos,
órgãos da sua ação, ficando-lhe salvo o direito regressivo
contra estes, para haver o que houver pago pelos seus abusos
e omissões.
{Direito, v. LXX. p. 496).

N ã o é menos categórica a segunda, que remata


assim :

Pelo que, e o mais dos autos, sendo o Estado respon-


sável civilmente pelos atos dos seus agentes no exercício de
suas funções, quando causam danos a terceiro, princípio fun-
dado no que prescreve a lei de 9 de setembro de 1826, art. 8°,
e a de 12 de julho de 1845, assim como a constituição no
art. 72, § 17, o que está de acordo com a jurisprudência deste
tribunal, expressa nas sentenças n' 197, de 7 de novembro de
1896, n« 134 de 27 de abril do mesmo ano, n' 243 de 20
de abril de 1897 e ns. 259 e 317, além de outras, julgam pro-
cedente e provada a ação, para condenar a fazenda nacio-
nal a pagar aos autores, segundo apelante, o que fôr liqui-
dado na execução.
{Direito, v. LXXIX. p. 432.)
TRABALHOS JURÍDICOS 223

De modo que às nove decisões por nós enume-


radas temos que adicionar as cinco aludidas no der-
radeiro acórdão, onde, corroborando o "é indubitá-
vel", do anterior, se proclama definitivamente assen-
tada, quanto à responsabilidade civil do Estado pela
culpa dos seus agentes, a jurisprudência do tribunal.
Por essa jurisprudência o supremo tribunal fe-
deral declarou sobre a matéria a lei federal.
Em matéria de direito substantivo a lei, neste
regimen, é una.
Desta unidade criou a constituição dois órgãos :
o congresso e o supremo tribunal federal.
O congresso, assegurando-lhe, pelo art. 34,
n.° 23, a competência privativa de "legislar sobre o
direito civil, comercial e criminal".
O supremo tribunal federal, submetendo as jus-
tiças dos Estados, "quando houverem de interpretar
leis da União", "à jurisprudência dos tribunais fe-
derais". (Const, art. 59, § 2.°.)
Definida, pois, a lei pela jurisprudência do su-
premo tribunal federal, os tribunais locais são obri-
gados a respeitá-la.
Se desrespeitam essa jurisprudência, negam a
lei federal, enunciada pelo seu órgão supremo.
Logo, das sentenças da magistratura dos Esta-
dos incursas nesse desvio, cabe indubitavelmente o
recurso do art. 59, § 1.°, letra a por
"se questionar sobre a aplicação de lei
federal e a decisão do tribunal do Estado ser
contra ela".
A não se admitir, em tais hipóteses, esse remé-
dio constitucional, teremos, de ora avante, um di-
224 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

reito civil para cada Estado. Não é só a respeito do


processo que os Estados serão autônomos. No que
respeitar ao direito civil, desfrutarão a mesma auto-
nomia.
Aqui, portanto, não podem hesitar nem mesmo
os que, no tocante à questão do recurso extraordiná-
rio, professam o sistema restritivo, que o congresso
jurídico americano, felizmente acaba de condenar
por tamanha maioria. Trata-se, com efeito, da vio-
lação positiva da constituição republicana, art. 59,
§ 2.°, pelo tribunal de última instância no Estado,
contra cuja magistratura se recorre; e, para o caso
dessa rebeldia das justiças locais contra a suprema
lei da União, não se pode negar o corretivo do
art. 59. § 1.°, a, sem outorgar de fato, em matéria de
direito substantivo, aos Estados a mesma indepen-
dência que em matéria de direito processual.
Rio de Janeiro, 18 de maio 1900.
Rui BARBOSA
XI

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA
DO ESTADO
MUDANÇA DE SUA SEDE CONSTITUCIONAL. COMPE-
TÊNCIA PARA DECRETÁ-LA E SEUS LIMITES

PARECER
N O T A D O REVISOR

Deliberando a Mesa da Assembléia Legislativa do Es-


tado do Rio de Janeiro, pela Resolução de 13 de novembro
de 1899, transferir a sede de suas reuniões da cidade de Pe-
trópolis para a de Niterói, dúvidas foram suscitadas quanto
ao limite temporário de sua vigência.
Ante a forma imprecisa do art. 99 e seus parágrafos, da
Constituição estadual de 1892, foi ventilada a hipótese de
possuir caráter definitivo a deliberação, enquanto a muitos
parecia tratar-se de ato transitório. Vitorioso o primeiro ponto
de vista, indagava-se se, sendo a Capital do Estado a sede
constitucional da Assembléia, e cessados os motivos que ins-
piraram a sua decisão exigidos pelo art. 99, era necessário
ato oficial que o declarasse, e se, neste caso, também seria
competente o Presidente do Estado para expedi-lo.
Prevaleceu, na espécie, o ponto de vista do Conselheiro
Rui Barbosa, contido no parecer emitido a respeito, conti-
nuando, destarte, a cidade de Petrópolis Capital do Estado.
A reforma da Constituição do Estado, promulgada pela
Assembléia, ex vi da lei n 9 600, de 18 de setembro de 1903,
art. 52, veio, finalmente, dirimir a controvérsia, declarando,
peremptória mente Niterói Capital constitucional do Estado
do Rio de Janeiro.
CONSULTA

A Mesa da Assembléia Legislativa, «usando da atribui-


ção que lhe confere o art. 9* da Const, do Estado e de con-
formidade com o mesmo, resolveu transferir a sede das de-
liberações da referida Assembléia para a Cidade de Niterói".
Este ato foi aprovado pela Resol. da Assembléia de 13 de
novembro último nos mesmos termos em que foi expedido.
Por ocasião da discussão do ato da Mesa, os seus par-
tidários declararam que o haviam motivado o estado de exa-
cerbação dos espíritos na Capital do Estado e a falta de ga-
rantias para os deputados.
Encerrada a sessão da Assembléia, e sendo a Capital do
Estado a sua sede constitucional, deverá ela voltar a funcio-
nar na Capital, independente de qualquer ato oficial que o
declare, ou sendo preciso este ato, é nos termos do art. 99,
§ único da Constituição, competente também o Presidente do
Estado para expedi-lo ?
N . B . — A Assembléia foi convocada pelo Presidente
para o dia 15 do corrente a fim de tomar conhecimento das
razões pelas quais não sancionou o orçamento ultimamente
votado.
I

Parecer
A constituição do estado do Rio de Janeiro,
art. 9.°. dispõe :
"Por motivo de conveniência pública,
poderá a assembléia legislativa funcionar em
outro qualquer lugar que não seja a capital,
se assim o resolver o presidente do Estado,
a maioria dos membros da mesa. no inter-
valo das sessões, ou a própria assembléia
quando reunida".
"Parágrafo único. A mudança da sede
da assembléia, feita pela mesa, ou pelo presi-
dente do Estado, será sujeita à aprovação da
assembléia depois de reunida".

Daqui se segue :
1.° Que a sede constitucional da assembléia
legislativa é a capital do Estado.
2.° Que por motivo de conveniência geral pode
a assembléia legislativa excepcionalmente funcionar
noutro sitio.
3." Que, para determinar essa mudança, a
competência toca à própria assembléia, se estiver
reunida, se não estiver, à sua mesa, ou à presidência
do Estado.
4.° Que, deliberada por qualquer dessas au-
toridades a mudança, a que ali se alude, continua.
232 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

não obstante, essa corporação a ter a sua sede legal


na capital do Estado.
5.° Que a mudança em questão é, portanto,
essencialmente transitória, e não deve perdurar além
da conveniência, que lhe deu motivo.
6.° Que, conseguintemente, o ato de traslada-
ção da assembléia legislativa para outro lugar se
subentende limitado à sessão, durante a qual, ou
para a qual se adotou, salvo se a conveniência pú-
blica, onde teve fundamento, subsistir manifesta-
mente além desse termo.
7.° Que, excetuada essa hipótese, para se es-
tender a mudança a outra sessão legislativa, será
mister nova deliberação da autoridade competente.
Isto posto, me parece óbvio que a assembléia le-
gislativa daquele Estado tem de volver, na próxima
vindoira sessão, à sua sede permanente, indepen-
dentemente de novo ato oficial neste sentido; e isso
tanto mais quanto, segundo o exposto na consulta,
os debates, que precederam à mudança, lhe deram
por causa "a exacerbação dos espíritos na capital e a
falta de garantias para os deputados".
Que o presidente do Estado fosse competente,
para determinar a volta da assembléia à sua sede or-
dinária, me parece contestável; porquanto :
L* â competência, que se lhe atribui no art. 9.°
supratranscrito, é para resolver a mudança daquele a
outro lugar, não de outro lugar àquele;
2.° porque a mudança por êle determinada está
sujeita à aprovação da assembléia depois de reunida.
Assim que a volta da assembléia à sua sede
constitucional, dever constitucional dessa corporação,
não lhe pode ser ditada por outro poder. Tem de
TRABALHOS JURÍDICOS 233

operar-se pelo simples respeito dela aos seus deveres


constitucionais, que, se, na espécie, forem desrespei-
tados, não encontram na lei garantias positivas de
execução.
Tijuca, 7 de janeiro, 1900.
Rui BARBOSA
I

XII
IRREDUTIBILIDADE DE VENCI-
MENTOS
DOS
, MAGISTRADOS MILITARES

INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 4.°, NS.° 4, E 5


N.° 2, DA LEI 360, DE 30 DE JANEIRO DE 1895

Ação Ordinária
Almirante Elisiârio José Barbosa e Outros, AA.
versus
Fazenda Nacional, Ré
N O T A D O REVISOR

A Constituição de 24 de fevereiro de 1891, em seu


art. 57, § 1', entre as garantias asseguradas aos juizes fe-
derais, conferia a da irredutibilidade de vencimentos. Além
do Supremo Tribunal Federal, expressamente mencionado
como órgão do Poder Judiciário, deixava à legislação ordi-
nária a instituição de tantos tribunais e juízos federais quan-
tos o congresso assim deliberasse.
O decreto legislativo a? 149, de 18 de julho de 1893,
instituiu o Supremo Tribunal Militar, como última instância
do foro especial, com sede na Capital da República e juris-
dição em todo o território nacional. Por um ato de 29 desse
mesmo mês e ano, foi atribuída aos juizes militares nomeados
para o Supremo Tribunal Militar a gratificação anual de
12:000$000, correspondente à dos altos comandos do Exército
exercida por oficiais generais.
Tendo a lei orçamentária n 9 360, de 30 de janeiro de
1895 fixado em 7:200$000 a gratificação anual dos coman-
dos e chefias de serviço privativos de oficiais generais, tive-
ram também reduzidas tais vantagens os magistrados mili-
tares. Argumentava-se que a redução resultava de equipara-
ção cuja base eram as vantagens conferidas aos comandantes
nas condições supra.
Inconformados com essa situação, o Almirante Elisiário
José Barbosa e outros intentaram uma ação ordinária contra
a União Federal, para o fim de haver a diferença de venci-
mentos, lato sensu, e anular os efeitos dos arts. 4 9 n9 2, e 5 9 ,
n9 2, da lei 360. Assumiu o patrocínio da causa o Conse-
238 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

iheiro Rui Barbosa, com Ulisses Brandão, sendo, porém, de


exclusiva autoria do primeiro desses advogados as peças ora
estampadas em seu nome.
O órgão do ministério público federal levantou a hipó-
tese de não constituir o Supremo Tribunal Militar órgão do
Poder Judiciário da União, recebendo a tréplica que seria de
presumir.
Por sentença de 5 de dezembro de 1903, o Juiz M. Cle-
men ti no do Monte julgou procedente a ação, para o fim de
condenar a Fazenda Nacional ao pagamento da diferença de
vencimentos reclamada, e anular os arts, impugnados como
inconstitucionais pelos Autores.
Interposta apelação, foi esta julgada a 24 de janeiro de
1912, decidindo o Supremo Tribunal Federal confirmar a
sentença recorrida.
Opostos embargos, foram estes rejeitados por acórdão
de 11 de junho de 1913, ficando a Fazenda Nacional con-
denada a pagar aos herdeiros do primeiro dos Autores e aos
demais o pedido na inicial e mais as custas do processo.
Aos dois acórdãos pertinentes ao feito, que reputamos
inéditos, acrescentamos as ementas com que vêm encimados,
para este fim redigidas, visto não conterem os originais ma-
nuscritos tais complementos.
A matéria de que se trata, foi pela primeira vez vencida
na espécie, o que, entretanto, não impediu de que outras con-
trovérsias surgissem posteriormente, embora sob diversos
aspectos ( * ) .

(*) A propósito do assunto aqui ventilado, veja-se também o pa-


recer de Rui Barbosa contido no Volume XXXI, Tomo II de suas OBRAS
COMPLETAS [TraoíiJ/iQS Jurídicos — 1904 — opusc. III], proferido a res-
peito do caso em que era interessado o Bacharel Horácio Lucatelli Dória,
Juiz de Direito da Comarca de Maragogipe, Bahia.
1 - Petição Inicial
Os almirantes Elisiário José Barbosa, Francisco
José Coelho Neto e os marechais Bernardo Vasques
e Francisco Antônio de Moura, querem propor con-
tra a Fazenda Nacional uma ação ordinária, pelos
seguintes fundamentos :
Io
Os sup. u ' são ministros do Supremo Tribunal
Militar que faz parte do Poder Judiciário da União.
2.°
Os vencimentos dos juizes federais são deter-
minados por lei e não podem ser diminuídos.
3.°
Os membros militares do Tribunal devem ter
vencimentos correspondentes às suas patentes e mais
vantagens em efetivo serviço do exército.
4.°
Aos almirantes e aos marechais, ministros do
Supremo Tribunal Militar foi fixada a gratificação
anual de 12:000$000 de réis, correspondente à de
comando de exército, por ato do Poder Executivo,
por duas leis do Congresso.
5.°
A gratificação assim determinada foi paga
desde 18 de julho de 1893, data da organização do
240 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Tribunal, até 31 de dezembro de 1895, votando o


Congresso a verba necessária.
6.°
Foi, porém, reduzida a 7:200$000 réis anuais,
correspondente à de comando de corpo pela lei do
parlamento n.° 360 de 30 de janeiro de 1895, arts. 4.°
ns. 4 e 5, n.° 2, e assim reduzida tem sido paga desde
1 de janeiro de 1896.
7.°
A gratificação de exercício faz parte dos venci-
mentos dos ministros e não pode ser diminuída desde
que fixada por lei.
Nestes termos
Pedem os Sup.te" a V, Ex. c " se digne
mandar citar ao Sr. Procurador Seccional
para na 1.' audiência deste juízo ver se pro-
por a presente ação ordinária, na qual, afi-
nal, deve a Fazenda Nacional ser condenada
a pagar-lhes mais 400$000 réis mensais a
cada um de gratificação desde 1.° de janeiro
de 1896 até agora, isto é, os seus vencimen-
tos integrais à razão de 12:000$000 desde a
época em que deixaram de recebê-los, juros
da mora e custas, anulados por inconstitucio-
nais os arts. 4.° n.° 4 e 5.° n.° 2 da cit. lei or-
çamentária de 1895.
Protesta-se por todo o gênero de pro-
vas.
Rio, 23 de janeiro de 1899.
Como advogado
(a) Ulisses de Carvalho Soares Brandão (*).
(*) Embora assinada pelo advogado Ulisses Brandão, redigiu a
inicial o Conselheiro Rui Barbosa.
2 - Razões Finais
Precisamente no litígio a que se refere a con-
testação de fl. 8, firmou o juízo, em cuja presença
estamos, a jurisprudência de que os membros do Su-
premo Tribunal Militar são juizes federais na acep-
ção estrita da carta republicana e, como tais, abran-
gidos no privilégio constitucional da irredutibilidade
dos vencimentos.
Contra esse precedente, indubitavelmente da
maior valia no tribunal que o estabeleceu, não corta a
questão o acórdão invocado; porque, para ser deci-
sivo, lhe falece a condição adotada pela jurispru-
dência americana, para que as decisões do Supremo
Tribunal Federal constituam aresto em matéria de
interpretação da lei fundamental : a condição de se-
rem votadas em tribunal pleno. (CARSON : The Su-
preme Court o[ the United States, v. II, p. 453.) Esse
critério de prudência judicial, admitido especialmente
com o fim de proteger os atos legislativos contra de-
clarações de inconstitucionalidade pronunciadas por
maiorias de ocasião num tribunal incompleto, não
tem menor cabida, quando quer que se trate de fir-
mar a inteligência do pacto federal, sobretudo em
pontos graves, como os que entendem com a natu-
reza dos poderes constitucionais, a definição dos seus
órgãos, a limitação dos seus privilégios e imunidades.
Ora, neste caso indubitavelmente se acha o
pleito vertente, onde se pretende apurar se um alto
242 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

tribunal de justiça, instituído como a sumidade culmi-


nante no foro que se outorgou como garantia privi-
legiada às forças de terra e mar, designadas parti-
cularmente, na constituição de 24 de fevereiro
(art. 14), como "instituições nacionais", caráter que
noutros países se lhes controverte, participa do po-
der judiciário, ou, não sabemos por que singulari-
dade, representa, fora dele, uma excrescência des-
classificada.
Ao proferir, na apelação n.° 373, a sentença de
9 de novembro de 1898, à sombra de cuja teoria se
abriga o laconismo da Ré no seu articulado, a isso
circunscrito (fl. 8 ) , contava presentes o Supremo
Tribunal Federal tão somente nove julgadores, den-
tre cujos sufrágios a opinião predominante colheu
apenas os sufrágios estritamente precisos para lhe
dar maioria no momento, vingando por cinco votos
contra quatro. Achavam-se ausentes da assentada
os ministros Américo Lobo, Pindaíba de Matos, Ber-
nardino Ferreira e Bel fort ( * ).
Não haverá temeridade, portanto, em dizer que
o verdadeiro sentir daquela corporação ainda está
por verificar; tanto mais quanto a solução prepon-
derante foi disputada com energia pelos quatro jui-
zes vencidos, três dos quais, os Srs. João Barbalho.
Gonçalves de Carvalho e Pereira Franco, justifica-
ram com largas considerações a sua dissidência, res-
pondendo com a maior vantagem ao paralogismo da
maioria.

(*) Apelação cível n' 373. entre partes Marechal Conrado Jacob
Niemeyer e outros, AA., e União federal, Ré. Embora vencedores em
primeira instância, foi a sentença reformada, para o fim de serem jul-
gados os AA. carecedores da ação. Intentada rescisória do acórdão pelos
herdeiros do primeiro dos AA, foram estes vencidos, conforme acórdão
proferido nos autos da ação rescisória n° 28. funcionando como patrono
da causa o advogado Ulisses Brandão.
TRABALHOS JURÍDICOS 243

U m a vez, pois, q u e n a d a a b s o l u t a m e n t e a d u z i u
em s e n t i d o o p o s t o o ministério público, n o s s e u s sin-
gelos a r t i g o s d e fl. 8, além d o a r g u m e n t o d e a u t o -
r i d a d e , r e d u z i d o à maioria m o m e n t â n e a d e um voto
num tribunal a q u e faltavam q u a t r o , l i m i t a r - n o s - e m o s
a c o r r o b o r a r a jurisprudência d e s t e juízo com a t r a n s -
crição d e a l g u n s dos raciocínios, q u e , n o p r ó p r i o
a c ó r d ã o citado, o pulverizaram.
F a l e o Sr. J o ã o B a r b a l h o :
«O Supremo Tribunal Militar», diz esse eminente ma-
gistrado, é um dos órgãos da justiça federal; o que se evi-
dencia :
« 1ç pela sua natureza e objeto : faz parte do poder pu-
nitivo da União;
«29 pela natureza dos fatos, de que conhece : crimes
contra a União e interesses nacionais;
«3 9 pela qualidade das pessoas sujeitas à sua jurisdição :
funcionários da União, que exercem autoridade nela, e indi-
víduos a seu serviço;
«49 pela sua origem constitucional. Não se pode desco-
nhecer o caráter federal das instituições, que para os fins da
União foram criadas pela constituição;
«59 pela extensão territorial da sua jurisdição, que não
se restringe a tal ou qual circunscríção do país, mas abrange
todo o território nacional;
«69 por ser objeto reservado à competência legislativa e
administrativa da União (art. 77, § 2Ç, combinado com os
arts. 14, 34. § 18, e 48. §§ 4 e 5 da constituição); e
€7^ em vista da lei que o organizou, e lhe regula o ser-
viço (lei federal n° 149, de 18 de julho de 1893).
«É-lhe aplicável o art. 57 da constituição, quanto à irre-
dutibilidade dos vencimentos :
244 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

« l 9 pelo seu caráter federal, acima demonstrado.


«2Ç por inegável identidade de razão. O fundamento e
propósito da irredutibilidade dos vencimentos é assegurar,
por mais este meio, a independência do juiz; e não há mo-
tivo especial, para se garantir mais a dos juizes seccionais,
amparada pelo art. 57, § l 9 , da constituição, do que a dos
ministros do Supremo Tribunal Militar, que lhes não são
inferiores nem pela categoria, nem pela importância das fun-
ções.
«3° E, se como tribunal revisor lhe é superior o Supremo
Tribunal Federal, nem por isso fica sem alta importância,
nem deixa de ser também «supremo» o tribunal da mais alta
categoria na justiça federal militar, precisando, para com-
pleta isenção no exercício de suas funções, e para melhor-
mente resistir à influência oficial, ou qualquer outra, não me-
nos garantias que o Supremo Tribunal Federal;
«4<í pelo absurdo de assim garantir-se mais o juiz de ju-
risdição apelável, como é o juiz federal de seção (const.,
art. 59, n" I I ) . e cujos atos facilmente se podem reformar,
do que os membros de superior tribunal, que julgam defini-
tivamente, e de cujas decisões só, e cm restritos casos, há o
excepcional recurso de revisão;
«5 o porque a constituição não distingue, para o efeito de
que se trata, a justiça comum da militar : o art. 57. § I o , em
sua generalidade, e considerado em seus intuitos, abrange
ambas as jurisdições.»

Esta argumentação recebe desenvolvimentos


muito mais amplos nos votos dos ministros Pereira
Franco e Gonçalves de Carvalho, que não reprodu-
ziremos, já por ser facilmente acessível a sua leitura
ao tribunal perante quem arrazoamos, já por estar
vigorosamente condensada, no excerto que acabamos
de fazer, a suma jurídica e dialética da mais vitoriosa
impugnação ao acórdão, cujo erro o interesse da Ré
subscreve sem aditamento de espécie alguma.
TRABALHOS JURÍDICOS 245

Não havendo, logo, nada que refutar, além do


que nesse tópico se encontra valentemente refutado,
reserva r-nos-emos, para redarguir ao ministério pú-
blico, depois que êle tiver acrescentado algum ele-
mento seu ao fraco cabedal jurídico destruído pela
opugnação dos quatro juizes opostos à solução do
acórdão. Então poderá ultimar-se a lide com um
aresto decisivo, se o Supremo Tribunal Federal de-
liberar na plenitude da sua assembléia.
Antes disso o julgado representa um fato aci-
dental, que nem moralmente obriga o juízo desta
seção a se retratar da opinião separada na causa onde
a Ré foi buscar o acórdão aludido.
Ciascun magistrate nel grado rispettivo di giurisdi-
zione è interprete sovrano delia legge; sicchè, propriamente
parlando, non può dirsi neppure che nell ' ordine giudiziario
vi sia gerarchia. II giudice superiore infatti può seguire una
interpretazione diversa da quella adottata dal giudice infe-
riore. ma non può preventivamente inculcargli la propria opi-
nione. nè redarguirlo o punirlo di quella che ha preferita,
ed anzi all' indomani, ripresentandosi I'identica specie in altro
giudizio, il magistrato inferiore può, e deve anzi, se quella è
la sua convinzione, cibadire il precedente pronunziato.
(ADEOD. BONASI : La magistratura in Italia, § 10.
pág. 20.)

Devemos esperar, por conseguinte, que a justiça


federal de primeira instância, a quem cabe a primeira
palavra no feito, manter-se-á na jurisprudência, que
iniciou, e da qual ainda se não desdisse.
Rio de Janeiro, 22 de julho, 1899.
Rui BARBOSA
Ulisses de C. Soares Brandão.
c£cuyCj£oc.<xjcCfe AWAJLC coce». Vu-fcu

c£.0-f C/V1ÂOT , 4X. OVAAVU. <À^yLrt.Wwòv O UJUVX/VO «£*»

A-«rw.cC>- tua - « U A . CJMTCJÜUO.. cücs. O V I A O . A_.OLA.tc_ V0VC*.

O U A i /CJUU7 0 * * ^ f ' Ca - O «^ **-,,*A-, Mfasfe «A/vc£Cvr\.'cjGji.«*.£ . S a f


I

Primeira folha do manuscrito a propósito da questão aqui debatida


(Do arquivo da Casa de Rui Barbcsa)
[FRAGMENTOS]
IRREDUTIBILIDADE DOS VENCIMENTOS DOS JUIZES
MILITARES ( * )

Não podemos acreditar que vingue definitiva-


mente entre os supremos intérpretes da constituição
a doutrina, com tão pobres argumentos sustentada
no aviso do ministério da justiça de 8 de novembro
de 1900, que exclui do benefício constitucional da
irredutibilidade dos vencimentos, assegurado pelo
nosso direito público aos "juizes federais", os mem-
bros do supremo tribunal militar.
Nem sequer nesse papel, indevidamente classi-
ficado pela sua rubrica na categoria dos avisos, se
ousou imprimir o cunho da autoridade do ramo da
(*) As notas e fragmentos que se seguem, como tudo indica, refe-
rem-se à tese cujas origens remontam ao ano de 1895. quando entrou
em vigor a lei n* 360. de 30 de janeiro daquele ano. Dizem respeito à
aç5o ordinária intentada em 1899 pelo Almirante Elisiário ]osé Barbosa
e outros, todos juizes do Supremo Tribunal Militar, a que se reporta o
opúsculo entre cujas peças as incluimos.
Encontrados em laudas de próprio punho do Conselheiro Rui Bar-
bosa entre os papéis que lhe pertenciam, os apontamentos, notas e frag-
mentos ora publicados constituem uma seqüência da causa cujo patro-
cínio assumiu o Conselheiro, justificada mais por incidente surgidos à
margem do processo, do que no curso regular de sua marcha.
Quando escritos, ainda pendia de sentença final a lide ajuizada, mo-
tivo por que foram inseridos nos Trabalhos Jurídicos de 1900. Aten-
deu-se, de preferência, à circunstância de constituírem, como peça rele-
vante, a última produzida cm atinência ao feito, naquele ano.
Trata-se. sem dúvida, de um memorial, que não chegou a ser ane-
xado aos autos, nem a receber a sua forma definitiva, muito embora lhe
faltassem apenas os retoques finais.
250 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

administração, em cujo nome se deveria crer expe-


dido. Em vez do ministério é o ministro quem res-
ponde ao seu colega da outra pasta com o seu juízo
declaradamente individual. São formais as palavras
do secretário dos negócios interiores : "Como soli-
citais o parecer deste ministério, a respeito da ma-
téria do referido requerimento ( * ), devo declarar-
vos que, em minha opinião, não se aplica aos mem-
bros do supremo tribunal militar o disposto no art. 57,
§ IA da constituição, visto não poder esse tribunal
ser considerado como parte integrante do poder ju-
diciário da União, no seu caráter especial de órgão
da soberania nacional".
Se os vocábulos já não perderam também o seu
sentido, no caos contemporâneo, a cláusula "em
minha opinião", inserida no texto desse ato, desclas-
sifica-o da espécie administrativa dos avisos, cujo
caráter essencial está em serem expedidos pelas di-
ferentes secretarias de Estado explícita ou implicita-
mente em nome do chefe do poder executivo. ( R I B A S :
Die. civ. bras., v. I, p. 123-4).
Felizmente a essa excentricidade do ministro da
justiça opôs o governo, quatro meses depois, corre-
tivo cabal, mediante a secretaria da guerra, em aviso
realmente tal, onde o secretário de Estado se enuncia
impessoalmente como órgão do poder, que repre-
senta, e a solução formulada, em vez de pairar nas
regiões da teoria, assume a forma imperativa de uma
ordem intimada à administração pelo seu primeiro
magistrado.

*) Do bacharel Antônio Augusto Cardoso de Castro reclamando


ao ministério da guerra contra a cobrança do imposto sobre os seus ven-
cimentos.
TRABALHOS JURÍDICOS 251

, Eis os seus termos :


"Ministério da guerra. — n.° 21. — Rio
de Janeiro, 5 de março de 1900.
"Sr. Diretor da contadoria geral da
guerra. — Sendo extensiva aos ministros do
supremo tribunal militar a decisão do minis-
tério da fazenda, de 25 de março do ano pró-
ximo passado, que isentou os juizes federais,
civis, do imposto sobre vencimentos, e depois
mandou restituir-lhes o que lhes fora co-
brado sob esse título, visto que os ministros
daquele tribunal são também juizes federais,
e conseqüentemente estão compreendidos na
disposição do art. 57, § 1.°, da constituição
federal, providenciai, para que os bacharéis
Antônio Augusto Cardoso de Castro e José
Novais de Sousa Carvalho, ministros togados
do referido tribunal, que reclamam contra a
redução dos seus vencimentos por meio desse
imposto, sejam isentos dele, de conformidade
com o disposto no art. 1.°. n.° 30, da lei n.° 640,
de 14 de novembro de 1899, restituindo-se-
Ihes o que a igual titulo se lhes tem descontado
nos respectivos vencimentos; para o que se
fará o cálculo desta despesa, a fim de ser tudo
presente ao tribunal de contas para o compe-
tente registro. S. e F . — /. N. Medeiros
Mallet".
"Comunicou-se ao ministério da fa-
zenda".
{Diário Oficial, 14 de março de 1900,
pág. 1.034).
Decisão e preceito a um tempo, esse ato re-
veste solenidade tanto maior, quanto parte do mesmo
252 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

ministério, o da guerra, que, por aviso de 21 de ou-


tubro do ano transato, solicitara ao da justiça que o
habilitasse a resolver, com o parecer da sua secre-
taria, justamente a petição do bacharel A. A. Car-
doso de Castro. De onde resulta que, ouvido esse
parecer, o poder executivo o rejeitou, mandando pe-
remptòriamente

declarar que os membros do supremo tribunal


militar "são também juizes federais", como
tais "conseguintemente compreendidos na
disposição do art. 57. § 1.°, da constituição",
e ordenar às repartições fiscais da guerra,
não só que aos vencimentos desse magistrado
não se cobrasse tributo, como que se lhes de-
volvesse o já cobrado.
Não precisaríamos de outros elementos, para
evidenciar o direito dos autores, tornando palpável
que o ministério público, na contestação de fl. 8, se
acha em material antagonismo com o governo, cujo
procurador é, cujo mandato desempenha.
[NOTAS1

Tribunal pleno; para resolver as questões de


constitucionalidade :
BLACK, p. 56. COOLEY, p. 195.
CARSON : The supr. courf, II, p. 453.

JUSTIÇA

— A atrib. de declarar a inconstitucionalidade das leis


perante a constit. federal compete assim às justiças dos es-
tados como às da União :
Pol. Sc. Quart. V , p. 253.
BRYCE I. p. 336-7.
DILLON : Law and jurisprud.. p. 214, n. 2, 200 n.
M A R S H A L L ' S W R I T I N G S , p. 25.
BLACK, p. 56.

— compete a todos os tribunais :


BLACK, p. 55.
—i A irredutibilidade do salar. dos juizes nos Est. Unid.
M I L L E R , p. 340 n. 1.
B O U T W E L L , p. 53.

— A irredutibilidade dos vencimentos dos juizes, con-


dição essencial da sua independência :
DILLON : Laws and jurisprud.. p. 120.
W A L K E R , p. 113. Federalist, p. 491.
W O L S E Y : Polit. Science II, p. 344.
Story II. p. 424-6, 311-12.
K E N T : Comment., v. I. p. 307-9.
254 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

(Cooleys Blackstone I. p. 266. FRANQUEVILLE : Syst.


Jud., I, p. 399.
LIEBER : Const, lib., p. 204.
BoNASi : Magistrat, in Ital., p. 14.
— Não se garante a independ. dos juizes só por causa
da atribuiç. de declarar a inconst. das leis.
Federalist., p. 488.
— Poder judiciário, quid ?
AÍ/7/er. p. 313-14.
— O juiz não deve sentir a menor dúvida sobre a sua
independência, v. Miller, p. 342, n. 1.
Da redundância na redação das leis :
BLACK, Interprétât., p. 83.
MAXWELL : Interprétât., p. 379, 385.
HARDEASTLE : Construction, p. 121-4.
Expressivo unius. exclusio alterius :
BLACK : Interpret., p. 146 s.

Art. 33 — Attribuiç. judie, exercida pelo senado.


Disposição q. parecem completas numa disposição e só
se completam noutra : arts. 71, § 2, e 72, § 29.
Redundâncias :
Arts. 37 e 48 n* 1. 34 n* 11 e 48. n* 7.
Arts. 48. n' 5 e 12 e 13. Art. 34. n* 21 e 48, n ' 15 c 80.
§ K
Art. 48, § 4 e art. 82. Art. 81. pr. e § 2*.
Art. 82 pr. e art. 52, § 1*. Arts. 52. § 2* e 59 I a.
Art. 33 e 53. Arts. 53 e 59 I a. § 3 ' e 28 no art. 72.
Art. 34. n" 18 e 87. § 1".
Just, federal :
Const., arts. 34, n' 26.
Rev. dos proc. militares pelo S . T . F . Const, art. 81.
§ 3" e art. 59 III.
SENTENÇA

Vistos e examinados estes autos de ação ordinária, em


que são Autores os almirantes Elisiário José Barbosa e Fran-
cisco José Coelho Neto e os marechais Bernardo Vasques e
Francisco Antônio de Moura, e Ré a Fazenda Nacional.
Alegam os Autores : — que sendo ministros do Su-
premo Tribunal Militar, lhes foi fixada a gratificação anual
de 12:000$000. correspondente à de comando de exército,
por ato do Poder Executivo e por duas leis do Congresso;
— que essa gratificação lhes foi paga desde 18 de julho de
1893. data da organização do Tribunal, até 31 de dezembro
de 1895. tendo o Congresso votado a verba necessária: -—
que a lei de orçamento para o exercício de 1896, sob n" 360
de 30 de dezembro de 1895, arts. 4* n. 4 e 5 n. 2, reduziu
essa gratificação a 7:200$000 mensais, correspondentes à de
comando de corpo, e assim reduzida a dita gratificação lhes
tem sido paga desde 1 de janeiro de 1896; — que os mem-
bros militares do dito Tribunal devem ter os vencimentos
correspondentes às suas patentes e mais vantagens em efe-
tivo serviço do Exército; — que sendo eles, como são, mi-
nistros do Supremo Tribunal Militar, que faz parte do Po-
der Jurídico da União, os seus vencimentos, determinados
que foram por lei, não podiam ser diminuídos. E, por esses
motivos, concluem pedindo a condenação da Fazenda Na-
cional a pagar-lhes mais 400$000 mensais a cada um de gra-
tificação desde 1 de janeiro de 1896 em diante, isto é. os seus
vencimentos integrais à razão de 12:000$000 desde a época
em que deixaram de recebê-los. juros da mora e custas, anu-
256 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

lados por inconstitucionais os cits. arts. 4° ns. 4 e 5 n° 2 da


cit. lei orçamentária n° 360 de 1895.
Citada a Ré na pessoa de seu representante legal, opôs
contestação, em que articulou : — que o Supremo Tribunal
Militar não pode ser considerado como fazendo parte do
Poder Judiciário da União, para o fim de lhes serem aplicá-
veis as disposições da Seç. III, Tít. I o da Const. Fed.: —
que. assim sendo, os Autores não podem pretender o privi-
légio do art. 57 § lw da Const. Fed., como já decidiu o egré-
gio Supremo Tribunal Federal na ap.*»° cív. n* 373. ac. de 9
de novembro de 1898: — que, portanto, devem os Autores
serem julgados carecedores da ação proposta e condenados
nas custas.
Aberta a dilação probatória, foi ela encerrada, sem que
nenhuma das partes produzisse prova alguma. Arrazoando.
afinal, desenvolveram ambas as partes os princípios jurídi-
cos que, a seu ver. sufragam a doutrina que cada uma sus-
tenta quanto a ser ou não considerado o Supremo Tribunal
Militar como fazendo parte do Poder Judiciário da União e
aos seus membros ser ou não aplicável a disposição do art. 57
§ I o da Const. Fed., que proíbe a diminuição de vencimentos
determinados por lei. E
Considerando :
Que a Constituição Federal, outorgando no art. 77 aos
militares de terra e mar foro especial nos delitos militares,
instituiu no § l 9 o Supremo Tribunal Militar, cujos mem-
bros declarou vitalícios e cuja organização e atribuições se-
riam regulados por lei (§ 2 ' ) ;
Que ex-vi desse preceito constitucional, o Deer. Leg.
n" 149 de 18 de julho de 1893 deu organização ao Supremo
Tribunal Militar, com sede na Capital Federal, compondo-se
de 15 membros vitalícios, sendo 8 do Exército, 4 da Armada
e 3 juizes togados (art. I o ). e marcou aos membros militares
os vencimentos correspondentes às suas patentes e mais van-
tagens em efetivo serviço do exército (art. 16);
TRABALHOS JURÍDICOS 257

Que por ato do Governo, de 29 de julho de 1893, foi


fixada para os marechais e almirantes, ministros do Supremo
Tribunal Militar, a gratificação na importância de 12:000$000
anuais, correspondente à de comando do exército, tendo o
Poder Legislativo votado os necessários créditos para os
exercícios de 1894 e 1895, gratificação que pela lei orçamen-
tária para o exercício de 1896 foi reduzida a 7:200$000;
Que o Supremo Tribunal Militar, assim instituído «como
garantia privilegiada às forças de terra e mar», às quais o
art. 14 da Const. Fed. deu o caráter de «instituições nacio-
nais», é, por sua origem, por sua natureza e seu fim, pela
elevada missão que a Constituição lhe cometeu, órgão da Jus-
tiça Federal, o que eqüivale dizer do Poder Judiciário da
União, porquanto :
a) «colocado na culminância da Justiça Militar da
Nação, tem poder jurisdicional sobre todo o seu território:
b) adotado por disposições expressas da lei fundamen-
tal da República, foi organizado e é regulado por leis fede-
rais;
c) investido de uma dupla competência especial ra-
tione personae e ratione materiae, só julga membros das
classes militares, que são «instituições nacionais», e só co-
nhece de fatos que são infrações da disciplina ou atentados
contra as leis orgânicas dessas classes e contra interesses na-
cionais; e
d) finalmente, sujeito em tudo à ação exclusiva e ime-
diata das leis federais, é constituído por funcionários que são
de nomeação do Executivo Federal, remunerada, já na ati-
vidade do serviço, já no período da inatividade, pelos cofres
da União, e sujeitos a leis e processos desta nos delitos de
que forem acusados»;
Que, assim sendo, é aplicável aos seus membros o
art. 57 § l 9 da Const. Fed. quanto à irredutibilidade de seus
vencimentos, porquanto :
258 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

a) «como ficou demonstrado, é essencialmente federal


o caráter do Supremo Tribunal Militar;
b) a irredutibilidade dos vencimentos é, como a vitali-
ciedade. uma condição essencial à independência de seus
membros, não havendo motivo algum para lhes recusar essa
garantia de que gozam os membros da Justiça Federal co-
mum ou civil, pois ubi eadem ratio, ibi eadem juris dispositio
esse debet, tendo inteira aplicação ao caso a douta lição de
Story, de que «sem a irredutibilidade de vencimentos dos
juizes teria sido inútil e quase redícula a disposição que con-
sagra-lhes a vitaliciedade:
c) a Constituição, como bem acentuou o exímio cons*
titucionalista — Sr. ministro João Barbalho, no seu luminoso
voto vencido no acórdão do egrégio Supremo Tribunal Fe-
deral invocado pela Ré na contestação de fl. 8, não distingue,
para o efeito de que se trata, a Justiça comum da militar; o
art. 57 § l9 em sua generalidade e considerado em seus in-
tuitos, abrange ambas as jurisdições. O Poder Judiciário da
União é um só, servido por vários órgãos e um destes é o
Supremo Tribunal Militar, que por motivo algum deverá ter
menos garantia que os outros»;
Que nesta conformidade já decidiu o Governo em rela-
ção aos juizes togados do Supremo Tribunal Militar, aos
quais tornou extensiva a decisão do Ministério da Fazenda
de 25 de março de 1899 que isentou os juizes federais civis
do imposto sobre vencimentos e mandou restituir-lhes o que
lhes fora cobrado por esse titulo, sob o fundamento de que
«os ministros daquele Tribunal são também juizes federais e
conseqüentemente estão compreendidos na disposição do
art. 57 § l 9 da Const. Fed.», como se vê dos termos do Av.
do Ministério da Guerra ao da Fazenda, sob n9 138 de 5 de
março de 1900;
Que reconhecido esse direito da irredutibilidade de ven-
cimentos aos juizes togados do Supremo Tribunal Militar,
desconhecê-lo e negá-lo aos juizes militares, membros do
TRABALHOS JURÍDICOS 259

mesmo Tribunal, pares daqueles, seria estabelecer um regi-


men de desgiualdade. que não se compadece com os princí-
pios de direito e justiça:
Que sendo certo que o egrégio Supremo Tribunal Fe-
deral pelo venerando acórdão de 9 de novembro de 1898,
tendo julgado os membros do Supremo Tribunal Militar
juizes federais, recusou-lhes, entretanto, a garantia estatuída
no art. 57 § 1" da Const. Fed., não é menos certo que essa
respeitável decisão, da maior relevância, pois que dá inter-
pretações a texto importante da Lei fundamental, não foi
proferida em tribunal pleno, nela tendo tomado parte apenas
nove juizes, quatro dos quais não se conformaram, antes
impugnaram com as mais valiosas e jurídicas razões a dou-
trina contida na decisão, que assim foi vencedora por dimi-
nuta maioria de um voto, maioria que pode muito bem ter
sido ocasional e que em outras circunstâncias poderia ter
desaparecido, como aliás é comum nos corpos coletivos; e no
egrégio Supremo Tribunal Federal, é exemplo entre outras
questões que ainda não alcançaram uniformidade de julga-
mento, as relativas à marca de fábrica, à arrecadação de
espólio de estrangeiro, sobre competência jurisdicional;
Que na espécie de que se trata, sendo, como é, o vene-
rando acórdão invocado pela Ré uma decisão isolada, única
proferida nas condições expostas, que ao demais e principal-
mente não consta ter passado em julgado, não pode ela. em
vigor de direito, constituir jurisprudência, de modo a servir
de norma absoluta e invariável para o julgamento de ques-
tões idênticas :
Por estes motivos, portanto, e o mais que dos autos
consta — julgo procedente a ação intentada, para o fim de,
anulando, como anulado tenho, por inconstitucionais os
arts. 4 9 ns. 4 e 5 n" 2 da lei orçamentária n" 360 de 30 de
dezembro de 1895, assegurar aos Autores a percepção de
seus vencimentos integrais e condenar, como condeno, a Ré
a pagar-lhes a diferença que têm deixado de receber, da gra-
260 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

tificação mensal de 1:000$000. na razão de 400$000 mensais


a cada um deles, desde 1 de janeiro de 1896. nos juros da
mora e nas custas.
Publique-se e façam-se as intimações necessárias.
Distrito Federal, 5 de dezembro de 1903.
M. Clementino do Monte.
3 - Petição
Exm.° Sr. Dr. Juiz Seccional da 2.* Vara.
Os almirantes Elisiário José Barbosa e Fran-
cisco Coelho Neto e outro na ação ordinária, que
movem contra a União Federal e ora em apelação,
requerem a V. Ex.oU a designação de um dos pro-
curadores e com quem terá a ação de prosseguir.
Nestes termos
P . P . deferimento
Rio de Janeiro, 2 de julho, 1904.
Rui BARBOSA
APELAÇÃO CÍVEL N* 1.063

Estabelecendo a Constituição da República a irredutibilidade de venci-


mentos dos juizes federais, visou à Independência do Poder Ju-
diciário, abrangendo, assim, todos os juizes vitalícios, entre os
quais os do Supremo Tribunal Militar. Decisão confirmada.

ACÓRDÃO

N" 1063 — Vistos, relatados e discutidos estes autos de


apelação cível em que é ap. le a União Federal e são ap. dos o
almirante Elisiário José Barbosa e outros, acordam confirmar
a sentença ap.,Ia por alguns de seus fundamentos, mas prin-
cipalmente porque a Const, da Rep. no art. 57 § 1' estabele-
cendo a irredutibilidade dos vencimentos dos juizes federais
teve em mira a independência do Poder Judiciário como in-
térprete da Constituição e das Leis Federais em face do
Poder Legislativo e tal motivo prepondera a respeito de todos
os juizes vitalícios da República como são os ministros do
Supremo Tribunal Militar, conforme já tem resolvido este
Supremo Tribunal em casos semelhantes e até a respeito de
juizes locais. — E pague a ap. u ' as custas.

Rio, 24 de janeiro de 1912.


H. do Espírito Santo, P. — Oliveira Ribeiro, relator. —
André Cavalcanti, vencido. — Oliveira Figueiredo. — M.
Espínola, vencido. — Canuto Saraiva. — Leoni Ramos. —
Amaro Cavalcanti. — M. Murtinho, vencido. — Ribeiro de
Almeida, vencido. — Pedro Lessa. — Godofredo Cunha.
*

264 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Juizes federais, em face da lei constitucional, são unica-


mente aqueles que processam e julgam as causas enumeradas
no art. 60, da Constituição. Neguei provimento para confir-
mar a sentença, de acordo com o fundamento do acórdão.
Fui presente :
E. Muniz Barreto, Procurador Geral da República.
APELAÇÃO CÍVEL N* 1.063

(EMBARGOS)

A irredutibilidade de vencimentos dos juizes federais, ou locais, constitui


condlçSo essencial à independência do Poder Judiciário, como
corolário do preceito constitucional. Sem a sua adoção, ilusórias
seriam as garantias de vitaliciedade e inamovibilidade assegu­
radas. Sendo os membros do Supremo Tribunal Militar juizes
vitalícios, não podiam estes, direta ou indiretamente, ter redu­
zidos seus vencimentos: nenhuma relevância, na espécie, tem a
questão de indagar­se se eram ou não magistrados federais os
embargados. Desprezam­se os embargos da Fazenda, mantida
a decisão recorrida.

ACÓRDÃO

N 9 1063. — Vistos, relatados e discutidos estes autos de


apelação cível, em recurso de embargos, em que são partes­
embargante a Fazenda Nacional, por seu representante lega!
o Sr. Ministro Procurador G eral da República, e embargados
os herdeiros do almirante Elisiário José Barbosa, o herdeiro
do almirante Francisco José Coelho Neto, — habilitados a
fis. 99 v., os herdeiros dos marechais Bernardo Vasques e
Francisco Antônio de Moura ■— habilitados a fis. 145 v., al­
mirantes e marechais que eram autores originários na ação,
e também embargado o herdeiro e inventariante do finado
marechal Rufino Enéias G ustavo G alvão — admitido como
assistente e habilitado nos termos do julgado a fis. 120 :
Acordam rejeitar os embargos de fis. 104 e confirmar,
como confirmam, o acórdão de fis. 75 v.. que mantém a sen­
tença de fis. 33 v. por alguns de seus fundamentos; ficando,
assim, a Fazenda Nacional [condenada] a pagar aos embar­
gados o pedido na petição inicial; porquanto :
266 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Em seus últimos arestos, mencionados no arrazoado de


fis. 147, firmou este Tribunal a doutrina de irredutibilidade
de vencimentos dos juizes, sejam federais, estaduais ou lo-
cais, condição substancial à independência assegurada aos
órgãos do Poder Judiciário e sem a qual ilusórias seriam as
concessões de vitaliciedade e inamovibilidade de que gozarem;
doutrina que assenta quanto aos juizes federais no art. 57,
§ 1°, da Constituição Federal, e quanto aos outros é conse-
qüência do mesmo preceito constitucional, atenta às funções
dos órgãos do Poder Judiciário. Os autores originários, ora
representados por seus sucessores habilitados, eram juizes
vitalícios do Supremo Tribunal Militar, os seus vencimentos
não podiam, pois. ser reduzidos nem direta e nem indireta^-
mente. sem necessidade de apurar-se se eram ou não juizes
federais; e fazendo-o a lei ordinária nv 360, de 30 de dezem-
bro de 1895, arts. 49, ns. 4 e 5, n' 2, ofendeu o preceito cons-
titucional, como deve e tem sido entendido por este Tribunal
nos arestos referidos.
E assim julgam, condenando a embargante nas custas.
Supremo Tribunal Federal, 11 de junho de 1913.
H. do Espírito Santo, P. — Canuto Saraiva, relator. —
Sebastião de Lacerda. <— Pedro Lessa. — Pedro Mibieüi,
vencido em relação aos assistentes. A paridade em semelhança
de relações jurídicas entre os titulares de direitos e obriga-
ções não autoriza à assistência. A intervenção de terceiro
no processo ou é coacta como no caso do chamamento a au-
toria, ou voluntária como na hipótese do opoente ou assis-
tente. A doutrina e a jurisprudência têm assentado, e a lei
consagrado que o assistente intervém sempre não com direito
autônomo para ser apurado conjuntamente com o direito de
algum dos litigantes, mas com a função limitada de auxiliar
o autor ou o réu, porque a decisão final lhe pode indiretamente
prejudicar. Daí a necessidade de previamente provar o «inte-
resse aparente que tem na causa» (MORTARA, vol. Ill n ' 453,
TEIXEIRA DE FREITAS a PEREIRA E SOUSA, Prim. Linhas, nota
135 in fine).
TRABALHOS J URÍDICOS 267

A comunhão de interesse é que legitima a intervenção do


assistente, e por esse motivo jurídico o Rg.10 737 de 1850 em
seu art. 124 exemplificativãmente dispõe que o assistente de­
s'erá alegar e provar que é fiador, senão de alguma das par­
tes, vendedor, legatário em condomínio da causa demandada.
Na espécie essa comunhão de interesses não está demons­
trada, e os assistentes nesta instância apenas pretendem que
o Ac. de fl. 75 que reconheceu os direitos dos autores ape­
lados lhe seja extensivo, compreenda na vantagem dêles
decorrentes em seu benefício, pois que só intervieram no feito
depois da decisão de 2* instância em grau de embargos, aliás
quando não mais era oportuna a defesa de seus direitos con­
juntamente com os dos autores, porquanto os direitos destes
já haviam sido solenemente reconhecidos por dois decretos
judiciários. O que se pretende portanto é a subversão da or­
dem processual, a supressão de uma instância em prejuízo
da Ré — a fazenda nacional ■— em detrimento do princípio
corrente que nas relações de direito privado nos decretos ju­
diciários só adquirem autoridade de cousa julgada entre as
partes litigantes. Com fundamento no art. 46 da Lei n9 221
de 1894, porque as assinadas obrigações dos assistidos e
assistentes é a mesma, apenas lhes é facultado acumular os
pedidos, uma vez que a fazenda nacional é devedora comum.
A situação concreta dos assistidos e assistentes, na es­
pécie, pode não ser a mesma, porquanto em relação a um
poderá a prescrição extintiva se ter operado, e a fazenda na­
cional impossibilitada de alegar a prescrição, visto ter sur­
gido a assistência depois de oferecidos os embargos ao A c , e
é corrente que sendo os embargos uma forma de impedir e
não meio de pedir eles não podem inovar o pedido inicial.
Amaro Cavalcanti. — Oliveira Ribeiro. — Ribeiro de
Almeida, vencido. — M . M urtinho, vencido. — A. Pires e
Albuquerque.
Fui presente :
M. Barreto, Procurador G eral da República.
*

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gentina]. Buenos Aires, 1889.
Código Civil de la República de Chile. Santiago de Chile, 1889, Im-
prenta Nacional.
Código Civil [de Espana]. Edición oficial reformada. Madrid, 1889.
Código Civil Português. Aprovado por Carta de Lei de 1 de julho 1867.
Porto. 1871.
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Brasil. Lei 556, de 25 de junho de 1850.
COELHO RODRIGUES, Antônio. — Projeto de Código Civil Brasileiro.
Rio de Janeiro, 1893. Imp. Nacional.
TRABALHOS JURÍDICOS 271

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DURANTON, M . — Cours de Droit Français suivant le Code Civil. Pa-
ris, 1844.
DE. «— Francesco. •— Corso Completo di Diritto Civile
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Comparato. Napoli, 1878-1891.
GiORGi, Giorgio. — La Dottrina dellc Persone Giuridiche o Corpi Mo~
rali. Firenze, 1894.
GIORGI, Giorgio. — Teoria délie Obligazioni nel Diritto Moderno Ita-
liano. Firenze, 1890-92.
Hue, Théophile ^— Commentaire Théorique et Pratique du Code Civil.
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cours Contentieux. Vol. II. Paris, 1896.
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LAURENT, F . — Principii di Diritto Civile. Prima Trad, italiana.
Vol. XXVIII. Milano, 1885.
LOMONACO, Giovane. — Istituzioni di Diritto Civile Italiano. Ed. de
1894.
LOMONACO, Giovane. — Délie Obligazioni c dei Contratti in Génère.
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MANTELLINI, Giuseppe. — Lo Stato il Códice Civile. Firenze, 1883.
ORLANDO, V . E . — Primo Trattato di Diritto Amministrativo. Con
coUaborazione di altri giuresconsuiti italiani. Milano, 1900-1902.
PACIFICI-MAZZONI, Emidio. — Istituzioni di Diritto Civile Italiano. 3*
éd. Firenze, 1880-1894.
Pandectes Françaises. Réqueil Mensuel de Jurisprudence et de Législa*
tion. Paris, 1886-96.
PJZE, Jérôme. — Essai d'une Théorie sur la Distinction de l'inexistence
et de VAnnulabilité des Contracts. Paris, 1898.
PLANIOL, Marcel. — Traité Elémentaire de Droit Civil. 2me. Édition.
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Ricci, Francesco. — Corso Teorico-Prático di Diritto Civile. Torino,
1881.
SOLON, V . H . — Théorie sur la Nullité des Conventions et des Actes
de tout Genre en Matière Civile. Vol. II. Paris, 1835.
272 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

[TEIXEIRA DE FREITAS, Augusto]. — Consolidação das Leis Civis. 3*


edição. Rio de Janeiro, 1896.
THIRY, Victor. — Cours de Droit Civil. Professé à l'Université de Liège.
Vol. IV. Paris, 1892-95.
TROPLONG. — Du Mandat. Commentaire du Titre III, du Code Civil [Le
Droit Civil Expliqué]. Paris, s/d.
WINDSCHEID, Bernhard. — Lehrbuch des Pandektenrechts.
ZACHARIAE, K. S . «— Le Droit Civil Français [Handbuch des franzo'
sischen civil Rechts]. Trad, de l'allemand par G. Massé et Ch.
Verggé. Paris. 1854-1860.

VII

LETRA FALSA

Vínculo Jurídico Entre o Aceitante e o Portador de Boa Fé


PARECER

ALAUZET, Isidore. ^- Commentaire du Code de Commerce. Tomo IV.


BÉDARRIDE, J. — Lettre de Change, des Billets à Ordre et de ta Pres-
cription {Droit Commercial, Livre I ) . Paris, 1891.
BRAVARD-VEYRIÈRES, P. *— Traité de Droit Commercial. Cours professé
à la Faculté de Droit de Paris. Publié, annoté et complété par Ch,
DÉMANGEÂT. Paris, 1891.

CALAMANDREI, Rodolfo. — Cambiale, IN Digesto Italiano, Vol. VI,


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cap. I, del nuovo Códice di Commercio Italiano. Torino, 1886.
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Códice di Commercio del Regno d'ltalia.
Código de Comércio de la República Argentina. Buenos Aires, s/d.
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Brasil. Lei 556. de 25 de junho de 1850.
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COSTA, Salustiano Orlando de Araújo. — Código Comercial do Brasil.
6* edição. Rio de Janeiro, 1896.
TRABALHOS JURÍDICOS 273

COUDER, J. Ruben de. — Dictionnaire de Droit Commercial, Industriel


et Maritime. Paris, 1877-81.
CUTURI. •— Delia Vcndita e de la Cessione e délia Permuta.
DALLOZ. ^- Repertoire Méthodique et Alphabétique de Législation, de
Doctrine et de Jurisprudence. V o EFFECTS DE COMMERCE.
ENDEMANN, Giuglielmo. *—* Diritto Commerciale, Marítimo, Cambiario
[Handbuch des deutschen Handcls-See-und Wechselrechts]. Trad.
Betochi e Veghi.
Gazeta Jurídica [ S . P a u l o ] . — Vols. I e X I I .
G o t i J E T . ^- Vide : COUDER, J. Ruben de, op. cit.

GUILLOUARD, L. ^- Traité de la Vente & de l'Echange. — Livres V I


et V I I du Code Civil. Paris, 1890.
LACERDA DE ALMEIDA, Francisco de Paula. — Obrigações. Exposição
Sistemática desta Parte no Direito Civil Pátrio em Seguimento aos
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Rodrigues Pereira. Rio de Janeiro, 1897.
LAURENT, F . »— Principii di Diritto Civile. Prima Traduzione italiana.
Vol. X X I V . Milano, 1885.
LYON-CAEN, Ch. & R E N A U L T , C. — Précis de Droit Commercial. Vide :
SuPiNO, Davide IN Enciclopédia Giuridica Italiana. V 9 CAMBIALE.
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MARGHIERI, Alberto. — La Cambiale. Napoli, 1883.
MASSÉ, G . — Droit Commercial dans ses Rapports avec le Droit des
Gens et le Droit Civil. Paris, 1844-47.
MERGET. — Vide : COUDER, J. Ruben de, op. cit.
MOURLON. — Répétitions Écrites sur le Premier Examen du Code Na-
poléon. Paris, 1863-64.
NOUGUIER. — Des Lettres de Change et des E[[ects de Commerce.
Vol. L Paris, 1839-1851.
OLEA. — De Cessione Jurium et Actionum.
ORLANDO. — Vide : COSTA, Salustiano Orlando de Araújo, op. cit.
PAGANI, Cesare. — Cambiale. IN Enciclopédia Giuridica Italiana, Vol. III,
Parte I, págs. 592-958. Vide : S U P I N O , Davide.
Pandects Françaises. Recueil Mensuel de Jurisprudente et de Législa-
tion. Vols. X V I , X X V I I I e X X I X . Paris, 1886-1896.
274 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

PARDESSUS, J. M . — Cours de Droit Commercial. Paris, 1856-57.


RENAULT, C . & LYON-CAEN, Ch. .— Précis de Droit Commercial. Vide :
9
SUPINO, Davide, IN Enciclopédia Giurídica Italiana. V CAMBIALE.
Vol. III. Parte I.
ROSSEL, Virgile. — Manuel du Droit Fédéral des Obligations. Paris,
1892.
SCEVOLA, Antônio. — Delia Cambiale e dellAssegno Cambiario. Cora-
mento. Torino, 1889.
SEGOVIA, Lisandro. ^- Explicación Critica del Nuevo Código de Co"
mércio de la República Argentina. Buenos Aires, 1892.
SORANI, Ugo. — Delia Cambiale e dell'Assegno Bancário. Commenta
Teórico-Pratico al Tit. X. del Códice di Commercio Italiano. Roma,
1896.
SUPINO, Davide. *— Cambiale, IN Enciclopédia Giurídica Italiana,
Vol. Ill, Parte I. págs. 592-958. Vide : PAGANI, Cesare.
SUPINO, Davide. — Diritto Commerciale. Firenze, 1892.
THALLER, E. ~ Traité Elémentaire de Droit Commercial. Paris, 1898.
VIDARI, Ercolo. — Corso di Diritto Commerciale. 3* edizione.
WAELBROECK, Ernest. — Commentaire Législatif et Doctrinal de la Loi
du 20 Mai 1872... Relatif à la Lettre de Change et au Billet 4
Ordre. Bruxelles, 1873.

VIII

SOCIEDADE EM COMANDITA

PARECER

BiONDi. — Vide : ENDEMANN, op. cit.


CALAMANDREI, Rodolfo. —' Délie Société e délie Associazioni Commer-
ciali. Torino, 1884.
COBRIAU, Jean. — Vide : NYSSENS, Albert, op. cit.
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delsgesetzsbuch]. Trad, par Paul Gide et Ch. Lyon-Rénault. Paris,.
1881.
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TRABALHOS JURÍDICOS 275

Code Federal des Obligations [du 14 juin 1881].


Códice di Commercio del Regno d'Italia.
Código de Comércio del Chile.
Código Comercial do Império [Da República] do Brasil. ~- Lei 556,
de 25 de junho de 1850.
ENDEMANN, Giuglielmo. — Diritto Commerciale, Marítimo, Cambiario
[Handbuch des deutschen Handels-See-und Wechselrechts]. Trad.
Betochi e Vighi.
JOURDAIN, — Vide : MALPEYRE, op. cit.
LYON-CAEN, Ch. e RENAULT, C. — Traité de Droit Commercial. Paris,
1890-97.
MALPEYRE, — Traité des Sociétés Commerciale. Ed. de 1836.
MARGHIERI, Alberto. — // Diritto Commerciale Italiano esposto siste*
maticamente. Napoli, 1886-93.
NYSSENS, Albert. & CORBIAU, Jean. —- Traité des Sociétés Commercia-
les. Ouvrage enrichi de notes de M. Eudore Pirmez. Paris, 1895.
PARDESSUS, J. M . — Cours de Droit Commercial. Paris, 1856-57.
RENAULT, C. — Vide : LYON-CAEN, Ch.f op. cit.
THALLER, E . — Traité Élémentaire de Droit Commercial. Paris, 1898.
TROPLONG. [Droit Civil Explique] — Du Contract de Société Civile et
et Commerciale. Paris, 1845.
VAVASSEUR. — Traité des Sociétés Civiles et de Commerce. Vol. L
Ed. de 1892.

VIVANTE, Cesare. — Trattato di Diritto Commerciale. 1* éd. Torino.

IX

AÇAO DE M A N U T E N Ç Ã O DE P O S S E

RAZÕES DE APELAÇÃO

ALMEIDA E SOUSA, Manuel de. — Tratado Enciclopédico Compendiário,


Prático e Sistemático dos Interditos Possessórios Gerais e Especiais.
Nova edição. Lisboa, 1896.
BARATONO, P. — Delle Azioni Possessore e delle Azioni di Denuncia di
nuova opera e di danno demuto. Ivrea, 1882-83.
BLACK, Henry Campbell, MA. — Handbook o/ American Constitution
Law. St. Paul. 1895.
276 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

CORREIA José Homem — Doutrina das Ações. Acomodada ao


TELES,
Foro do Brasil por Augusto Teixeira de Freitas. Rio de Janeiro,
1880.
LAFAYETTE. ~- Vide : PEREIRA, Lafayette Rodrigues, op. cit.
LOBÃO. — Vide : ALMEIDA E SOUSA, Manuel, IN op. cit.
MATTIROLO, Luigi. — Trattato di Diritto Giudiziario Civile Italiano.
Torino, 1892-98.
PEREIRA, Lafayette Rodrigues. — Direito das Cotisas. 2* edição. Rio
de Janeiro, s/d.
PEREIRA E SOUSA, Joaquim José Caetano. — Primeiras Linhas sobre o
Processo Civil. Acomodado ao Foro do Brasil por Augusto Teixeira
de Freitas. Rio de Janeiro, 1879-80.
RIBAS, Antônio Joaquim. — Consolidação das Leis do Processo Civil.
Comentada, com a colaboração de seu filho Dr. Júlio A . Ribas,
Rio de Janeiro, 1879.
RIBAS, Antônio Joaquim. — Da Posse e das Ações Possessórias. Segundo
o Direito pátrio comparado com o romano e canônico. Rio de Ja-
neiro, 1883.
TEIXEIRA DE FREITAS,Augusto. — Vide : PEREIRA E SOUSA, Joaquim
José Caetano, IN op. cit.

RESPONSABILIDADE CIVIL D O E S T A D O POR A T O S DE


AGENTES

PARECER

AQUINATIS, Divi Thomae. ~- Summa Totitis Theologiae. 2a. 2ae. Quaes-


tio 96, Art. 5.
Archivio Giuridico. Diretto de Filippo Serafini. Vols. I e X X I .
AUBRY, C . & R A U , C. — Vide: ZACHARIAE, K. S . , op. cit.
BARBOSA, Rui. — A Culpa Civil das Administrações Públicas. Rio de
Janeiro, 1898. [Cf. OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA, Vol. X X V ,
T o m o V, págs. 1 e segs.]
BAUDRY-LACANTINÉRIE, — Précis de Droit Civil. Vol. IL Paris, 1882.
BELLA VITE, — Delia Responsabilité dello S tato pei danni aventi attinenza
diretta od indiretta con esso. Ed. de 1894.
TRABALHOS JURÍDICOS 277

BORSARI, Luigi. — Commentario dei Códice Civile Italiano. Vol. III.


Torino, 1871-81.
CHIRONI G. — La Colpa nel Diritto Civile Italiano. Torino, 1897.
Code Civil [Napoléon]. Texto.
Códice Civile del Regno d'Italia.
Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Ja-
neiro, 1891.
Corpus Juris Civilis. Editio Stereotypa septima. Recognovit Paulus
Krueger [et] Theodorus Mommsen. Berolini, 1895.
CujACii, Jacobi. — Opera. Tomus IX. Prati, 1839.
DEMOLOMBE, C. — Cours du Code Napoléon. Vol. XXXI. Paris, s/d.
Direito, O. Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Re-
curso Extraordinário 242, entre partes Bernardino Marinho de Car-
valho e Prefeitura do Distrito Federal. Vol. 89, págs. 235 e segs.
FILIPPII, De. Francesco. — // Filangieri, An. II (1877).
GIERKE, Otto. — Die Genosscnscha[tsthcorie und die Deutsche Rechts*
sprechung. Berlin, 1887.
GROTIUS, Hugo. — De lure Belli et Pads Libri Très. Cambridge at the
University Press, s/d.
Jurisprudência. — Acórdãos anexos ao Relatório apresentado pelo Pre-
sidente do Tribunal [Supremo Tribunal Federal] e proferidos
em 1896. Rio de Janeiro, 1897.
Idem, idem. Rio de Janeiro, 1898.
LAURENT, F. — Principii di Diritto Civile. Prima traduzione italiana.
Milano.
MARCADÉ, V. —• Explication Théorique et Pratique du Code Civil.
Vol. V. Paris, 1874-84.
MASSÉ, G. — Vide: ZACHARIAE, K. S. — Droit Civil.
MEUCCI, Lorenzo. ^- Delia Responsabilité indiretta délie Amministrazione
Publiche. IN Archivio Giuridico, vol. XXI (1878), págs. 341-406.
MEUCCI, Lorenzo. — Istituzioni di Diritto Amministrativo. Bocca, 1892.
MEYER, Georg. — Deutschen Staatsrecht.
MOMMSEN, Theodore. — Le Droit Public Romain [Abciss des rõmschen
Staatsrechts]. Trad, par Paul Frédéric Girard. Paris,
278 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

PROVENZANO P A L A Z Z O . — Teoria delia Responsabilité Civile dello Stato


per gli atti legali dei Esteri. Ed. de 1889.
RAU, C — Vide: ZACHARIAE, K. S . — Droit Civil
Relatório Apresentado ao Presidente da República dos Estados Unidos
do Brasil pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores CARLOS
A U G U S T O DE CARVALHO em 30 de abril de 1896. Rio de Janeiro,
1896.
Relatório Apresentado ao Presidente da República dos Estados Unidos
do Brasil pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores General
de Brigada DIONÍSIO E . DE CASTRO CERQUEIRA em 14 de maio de
1897. Rio de Janeiro, 1897.
RICCI, Francesco. -^ índole e Fonti delle Obligazione e dei Contratti.
Torino, 1892.
SABBATINI, Pio. — L'Amministrazione secondo la Legge. Modena, 1891.
SANLAVILLE, Ferdinand. — D e la Responsabilité Civile de l'Etat en Ma-
tière de Postes et de Télégraphes. Paris, 1886.
SOURDAT, A. *— Traité Général de la Responsabilité ou de l'Action en
Dommage-intérêts en dehors des Contrats. 4me. édition. Paris, 1887.
STOBBE, Otto. — Handbuch des Deutschen Privatrechts. Berlin, 1893.
STÕNER, De. — Verhandlungen des Sechsten Deutschen Juristentages,
Vol. III, Berlim. 1868.
Arquivio Giuridico, Vol. I, pág. 249.
VERGÉ, Ch. — Vide : ZACHARIAE, K. S . — Droit Civil.
ZACHARIAE, K . S . — Le Droit Civil Français [Handbuch des Franzo-
sischen civil Rechts], T r a d , de l'allemand par G . Massé et Ch.
Vergé. Paris, 1854-60.

ZACHARIAE, K. S . — Verhandlungen des sechsten Deutschen Juristenta*


ges. Vol. III, Berlim, 1868. IN Arch. Giurid., I, 349.
»

ÍNDICE ONOMÁSTICO

ABREU, Anísio de, p. 38.


ALAUZET, Isidore, p. 135.
ALBUQUERQUE, André Cavalcanti de, ps. 42, 263.
ALBUQUERQUE, Vespasiano de, p. 34.
ALMEIDA, Cândido Mendes de, p. 94.
ALMEIDA, Juvenal Malheiros de Sousa, p. 211.
AQUINO, Santo Tomás de, p. 214.
ARINOS, Afonso, ps. XII, 211.
AUBRY, G., ps. 69, 218.
Aucoc, p. 56.
ARAÚJO, José Maria Correia de, p. 62.
ARNTZ, E . R. N., p. 69.
BALDUS, p. 66.
BARASSI, ps. 73, 80.
BARATO NO, p. 201.
BARB AL HO, vide : CAVALCANTI, João B. Uchoa.
BARBOSA, Elisiário José, ps. XII, 235, 237, 239, 249, 255, 261, 263, 265.
BARBOSA, Rui. ps. IX, XI, XII, XIII, XIV, 5. 6, 7, 28, 41, 57, 62, 63,
81, 85, 94, 95, 99, 106, 110, 113. 120, 125, 127, 147. 163, 170, 202,
207, 211, 217, 224, 233, 237, 238, 240, 245, 249, 261.
BARBOSA LIMA, Alexandre José, ps. 26, 34.
BARD, p. 45.
BARTOLI, p. 73.
BASTIDE, Léon, p. 220.
BAUDRY-LACANTINÉRIE, G., p. 218.
BEDARRIDE, J., ps. 130, 135.
BELLAVITE, ps. 215, 218.
BEVILÁQUA, Clóvis, p. 69.
BIONDI, p. 162.
BLACK. Henry Campbell, ps. 180, 253, 254.
BOISTEL, p. 133.
BONASI, Adeodato, ps. 245, 254.
BORGES, Frederico Augusto, p. 37.
280 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

BORSARI, Luigi, p. 218.


BOURCART, p. 201.
BOUTWELL, p. 253.
BRANDÃO, Ulisses de Carvalho Soares, ps. XIV, 170, 238, 240, 242. 245.
BRAVARD, p. 134.
BRUCKER, p. 109.
BRYCE, James, p. 253.
BUFKOIR, Charles, p. 73.
CALAMANDREI, Rodolphe, p. 159.
CARDOSO DE CASTRO, Antônio Augusto, ps. 249, 251.
CARSON, Hampton L.t ps. 241, 253.
CARTIER, Manuel de Campos, p. 34.
CARVALHO, Carlos Augusto de, ps. 69, 73.
CARVALHO, José Novais de Sousa, p. 251.
CARVALHO DE MENDONÇA, José Xavier, p. 154.
CASAREGIS, Josephinus Laurentius Maria de. ps. 67, 74.
CASTILHOS, Júlio Prates de, ps. 5, 10, 21.
CATAS ALTAS, Barão de, ps. 169, 203, 204.
CAVALCANTI, Amaro, p. 267.
CAVALCANTI, João Barbalho Uchoa, ps. 242, 243, 258.
CÉSAR, Marcondes, ps. 211, 212.
CHALMERS, G., p. 170.
CHIRONI, G., ps. 74, 216.
COELHO N E T O , Francisco José, ps. 239, 255, 261, 265.
COELHO RODRIGUES, Antônio, p. 69.
CONTUZZI, Francesco, ps. 139, 141, 143.
COOLEY, Thomas M., p. 253.
CORREIA, Rivadávia da Cunha, p. 37.
CORREIA DE BRITO, Manuel Floriano, ps. 41, 43, 45.
CORREIA TELES, José Homem, ps. 185, 187, 201.
COUDER, Ruben de, ps. 130, 132.
CouTiNHO, João Batista Ferreira de Sousa, ps. 169, 193, 205.
CUJÁCIO, Jacob, p. 215.
C U N H A , Godofredo Xavier da, p. 263.
C U N H A , Vieira da, p. 38.
CUTURI, ps. 142, 143.
DALLOZ, Desire, ps. 135, 136.
DÉMANGEÂT, p. 134.
DEMOLOMBE, C , p. 217.
DIAS,Antônio, p. 204.
DILLON, John F., p. 253.
DOMENECK DÉNIS & CIA., p. 220.
TRABALHOS JURÍDICOS 28Í

DOMINGUES, Luís, p. 38.


DÓRIA, Horácio Lucatelli. p. 238.
DRIOU, Francis, p. 45.
DUARTE PEREIRA, José Higino, p. 114.
DRUCKER & TEDESCHI, p. 160.
DURANTON, M., ps. 69, 73, 74.
EGAS.. Eugênio, p. 125.
ENDEMANN, Wilhelm, ps. 139, 141, 162.
ESPÍNOLA, Manuel José, p. 263.
ESPÍRITO SANTO, Hermínio Francisco do, ps. 263, 266.
FERREIRA VIANA, Antônio, p. 127.
FERRI, Enrico, ps. 21, 24.
FILIPPIS, Francesco de, ps. 69, 218.
FONSECA, IRMÃO & CIA., ps. 113, 114.
FOURNÉ, p. 135.
FRANCISCO. Martim, p. 155.
FREITAS, O. 27.
GAIUS, p. 213.
GALAVRESI, p. 139.
GALVÃO, Rufino Enéias Gustavo, p. 265.
GANGUIER, ps. 53, 54.
GAROFALO, Rafael, ps. 21, 24.
GIORGI, Giorgio, ps. 53, 54, 73, 79.
GIRARD, Paul Frederic, p. 215.
GOMES, Domingos, p. 221.
GONÇALVES DE CARVALHO, Antônio, ps. 7, 23, 32, 242, 244.
GONTIJO DE CARVALHO. Antônio, p. 106.
GOUJET, ps. 130. 133.
GRASSERIE, Raoul de Ia, p. 159.
GRECO, p. 56.
GROTIUS, Hugo, p. 214.
GUILLOUARD, p. 146.
HARD, João Roberto, ps. 169, 193.
HARDEASTLE, p. 254.
HIGINO, José. Vide : DUARTE PEREIRA, J. H .
HORSON, p. 135.
Hue, Théophile, ps. 69, 73, 74.
HUOT, Ch., p. 45.
JAMET, p. 45.
JOURDAIN, p. 159.
KENT, James, p. 253.
KINNAISD, Douglas, ps. 169, 193.
282 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

LACERDA DE ALMEIDA, Francisco de Paula, p. 142.


LACERDA, Sebastião Eurico Gonçalves de, p. 266.
LAFERRIÈRE, p. 66.
LAROMBIÈRE, p. 73.
LAURENT, François, ps. 67, 68, 70, 73, 74, 142, 217.
LEMOS, Horácio José de, p. 99.
LESSA, Pedro Augusto Carneiro, ps. 263, 266.
LIEBER, Francis, p. 254.
LIMA, Pinheiro, p. 212.
LOMBROSO, Cesare, ps. 24, 25.
LOMONACO, Giovanne, ps. 69, 73.
LYON-CAEN, Ch., ps. 130, 132, 160.
MAC-DOWELL, Samuel W . , p. 114.
MACEDO SOARES, Antônio Joaquim de, ps. 7, 22, 23, 31, 212.
MALLET, João Nepomuceno de Medeiros, p. 251.
MALPEYRE, p. 159.
MALTA & CERQUINHO, p. 154.
MANTELLINI, Giuseppe, ps. 56, 62, 77.
MARCADÉ, p. 217.
MARCHIERI,Alberto, ps. 109, 138, 143, 159.
MARQUES. Azevedo, p. 37.
MARSHALL, John, p. 253.
MASSÉ, G., ps. 134, 218.
MATIROLLO. Giuseppe, p. 201.
MAXWELL, p. 254.
M E L O , J. da S., p. 221.
MENDONÇA, Lúcio de, p. 170.
MENDONÇA LIMA, Alcides, ps. 5, 6.
MERGER, ps. 130, 133.
MERLIN [de Douai], Philippe Antoine, p. 135.
MESQUITA, Júlio de, p. 125.
MEUCCI, Lorenzo, ps. 56, 216, 218.
MIBIELLI, Pedro Afonso, p. 266.
MILLER, ps. 253, 254.
MOMMSEN, Theodor, p. 215.
MONTE, Manuel Clementino do, ps. 238, 260.
MONTEIRO, João, p. 127.
MONTEIRO, Joaquim Martins, p. 114.
MONTEIRO, Victorino, p. 34.
MOREIRA CÉSAR, Antônio, p. 211.
MORGAN, Guilherme, ps. 169, 193.
MORTARA, Ludovico, p. 266.
TRABALHOS JURÍDICOS 283

MOURA, Francisco Antônio de, ps. 239, 255.


MOURLON, p. 143.
M U N I S BARRETO, Edmundo, ps. 263, 267.
M U R T I N H O , Manuel José, ps. 263, 267.
NASCIMENTO, Cassiano do, p. 34.
NIEMEYER, Conrado Jacob de, p. 242.
NOUGUIER, p. 135.
O L E A , p. 142.
OLIVEIRA, Manuel Gomes de, ps. 87, 88, 94, 99.
OLIVEIRA FIGUEIREDO, Carlos Augusto de, p. 263.
OLIVEIRA FONSECA, Joaquim José de, p. 114.
OLIVEIRA RIBEIRO, Pedro Antônio de, ps. 263, 267.
ORLANDO, Vittorio, ps. 56, 77, 141, 142.
O T T O N I , Júlio Benedito, p. 113.
O U R O PRETO. Afonso Celso de Assis Figueiredo, visconde de Ouro Preto,
p. 127.
OXENFORD, Eduardo, ps. 169, 193, 203, 205.
PACIFICI-MAZZONI, Emídio, p. 69.
PALAZZO, Provenrano, p. 216.
PARDESSUS, J. M., ps. 133, 135, 159.
PEREIRA, Américo Lobo Leite, ps. 170, 242.
PEREIRA, Lafayette Rodrigues, ps. 99, 127, 201.
PEREIRA FRANCO, Luís Antônio, barão de Pereira Franco, ps. 7, 28, 32,
212, 242. 244.
PEREIRA E SOUSA, Joaquim José Caetano, ps. 182, 184.
PÉRSICO, p. 55.
PESSOA, Caetano Estelita Ç., p. 41.
PIERRE, Dénis & G , p. 220.
PINDAÍBA DE M A T O S , Eduardo, p. 242.
PINHEIRO, Bordalo, p. 25.
P I N T O , Alfredo, p. 38.
P I N T O , José Maria, p. 197.
P I N T O DA ROCHA, ps. 7, 34.
PIRES,[Homero Pires de Oliveira c Silva], p. XI.
PIRES E ALBUQUERQUE. [Antônio Joaquim Pires de Carvalho e Albu-
querque], p. 267.
PISA E ALMEIDA, Joaquim de Toledo, ps. 7, 28, 32, 170, 212.
P I Z E , Jérôme, ps. 54, 73, 79.
PLANIOL, Marcel, p. 73.
POUILLET, p . 118.
POYARES, Antônio de Barros, ps. XI, 125.
PRADO, Eduardo Paulo da Silva, ps. XI, XII, 211.
284 OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

PUJOL, Alfredo, ps. XI, 125.


RAM ALHO JÚNIOR, José Cardoso, p. 43.
RAMOS, Alindo Leoni. p. 263.
RAU, C . p. 69.
R E I S , Procópio José dos. p. 222.
R E N A U L T , V. L Y O N - C A E N .
RIBAS, Antônio Joaquim, ps. 175, 187, 195, 201, 250.
RIBEIRO DE ALMEIDA, Antônio Augusto, ps. 170, 263, 267.
RICCI, Francesco, ps. 69, 70, 218.
ROBERTSON & C I A . , ps. XI. 153, 154, 155, 156. 157.
ROMANELLI, p . 55.
ROSSLL, p. 139.
SÁ, Teixeira de, p. 38.
SABBATINE, Giunio. p. 218.
SALDANHA, F.. p. 212.
SALGADO, Cardoso, Lemos & Cia., ps. 85, 87. 99.
SANLAVILLE, Ferdinand, p. 218.
SANTOS» Moreira dos. p. 114.
SANTOS, Soares dos, p. 34.
SARAIVA, Canuto José, ps. 212. 263.
SCEVOLA, Antonio, p. 139.
SEABRA, José Joaquim, ps. 9, 37.
SEGOVIA, Lisandro, p. 140.
SILVA, Antônio Carlos da, p.
SILVA. Antônio Dias da. p. 203.
SILVA, Antônio Luculo de Sousa c. ps. 62, 63, 65, 66, 71, 72, 77.
SILVA, Bernardino Ferreira da, p. 242.
SILVA, Custódio Barros da. p. 94.
SILVA, J. C . Nepomuceno da, p. 222.
SILVA, Joaquim da Silva, barão de S. Tecla, p. X I V .
SOLON, V . H., p. 81.
SoRANi, Ugo, p. 139.
SOURDART, A., p. 218.
STOBBE, Otto, p. 218.
STORY, Joseph, p. 253.
SupiNO, Davide. ps. 139. 141.
TEDESCHI, p. 109.
TEIXEIRA DE FREITAS. Augusto, ps. 73. 175, 182, 184. 187, 266.
T H A L L E R , ps. 130, 142. 143, 144, 146. 160.
THIRY, Victor, ps. 69, 79.
TOLENTINO, F . , p. 38.
TORRES, Alberto de Seixas Martins, ps. XII, 170.
TRABALHOS JURÍDICOS

TORRES,Manuel Ferreira, p. 204.


TROPLONG, Raymond Théophile, ps. 69, 159.
ULPIANO, p. 213.
VARELA, Alfredo, p. 34.
VASQUES, Bernardino, ps. 239, 255, 265.
VAVASSEUR, A., p. 161.
VIANA, Ulisses, ps. XI, 89, 94.
VIDARI, Ercolo, ps. 137, 143.
VIEIRA, João Pedro Belfort, p. 242.
VIVANTE, Cesare, p. 159.
WAELBROECK, p. 139.
WALKER, p. 253.
WiNDSCHEiD, Bernhard, ps. 74, 76.
WOLSEY, p. 253.
ZACHARIAE, Karolo Salomo, ps. 74, 218.
ÍNDICE
PREFACIO IX
I. A REFORMA D O JÚRI. Estudo Crítico 1
Nota do Revisor 5
I — A ORIGEM DA REFORMA 9
II — O PARECER 15
III *— O ARESTO . . 21
IV — O ARESTO 29
Apenso ~ Projeto n° 42-1900 (Câmara dos Deputados) . 33
Parecer - N* 42-1900 35
II. RESILIÇAO D E C O N T R A T O PELO G O V E R N O E S -
TADUAL. Competência Privativa do Poder Judiciário
para Decretá-la. Parecer 39
Nota do Revisor 41
Exposição [Consulta] 43
PARECER 45
III. CONCESSÃO D E SERVIÇO PÚBLICO. Ratificação
Tácita do Legislativo. Exorbitância. Vício de Forma e Po-
der Competente para Declará-lo. Parecer 59
Nota do Revisor 61
Consulta 63
PARECER 65

IV. F O R N E C I M E N T O D E CARNES V E R D E S . Interpre-


tação de Cláusula Contratual. Parecer 83
Nota do Revisor 85
Consulta 87
PARECER 91

V. SOCIEDADE COMERCIAL. Ineficácia dos Atos Pra-


ticados por Sócio após sua Exclusão — Remédio Jurídico.
Parecer 97
Nota do Revisor 99
OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA

Consulta 101
PARECER 107

MARCAS F R A U D U L E N T A S (Companhia Luz Esteâ-


rica) Faculdade Atribuída aos Prejudicados. Parecer . . . 111
Nota do Revisor 113
PARECER 115

LETRA FALSA (Causa Poyares). Vínculo Jurídico


Entre o Aceitante e o Portador de Boa Fé. Parecer 121
Nota do Revisor 125
Consulta 127
PARECER 129

S O C I E D A D E E M C O M A N D I T A (Robertson & Cia.).


Responsabilidade dos Sócios Comanditários. Parecer . . . . 149
Nota do Revisor 153
Consulta 155
PARECER 157

AÇÃO DE M A N U T E N Ç Ã O DE POSSE. Nulidade do


Feito por Incompetência do Juízo, Impropriedade da Ação
e Ilegitimidade da Autora. Associação Nacional de Mine-
ração do Brasil, A. versus Companhia de Mineração de
São João d'El-Rei, Ré. Razões de Apelação 165
Nota do Revisor 169
RAZÕES DE APELAÇÃO. I — Preliminar 171
II — Incompetência do Juízo 179
III — Incompetência da Ação 185
IV — Incompetência da Autora 193
V — De Meritis 197
Sobre os Documentos da Apelada 203
RESPONSABILIDADE CIVIL D O E S T A D O POR
A T O S D E SEUS A G E N T E S . Cabimento de Recurso
Extraordinário das Decisões da Justiça Local Atinentes à
Matéria. Parecer 209
Nota do Revisor 211
PARECER 213

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA D O E S T A D O . Mu-


dança de sua Sede Constitucional. Competência para De-
cretá-la e seus Limites. Parecer 225
Nota do Revisor 227
TRABALHOS JURÍDICOS 289

Consulta 229
PARECER 231

XII. IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS DOS


MAGISTRADOS MILITARES. Inconstitucionalidade
dos Arts. 49 ns. 4, e 5 n9 2, da Lei 360 de 30 de janeiro
de 1895. Ação Ordinária. Almirante Elisiário José Bar-
bosa e Outros, AA. versus Fazenda Nacional, Ré 235
Nota do Revisor 237
1 — PETIÇÃO INICIAL 239
2 — RAZÕES FINAIS 241
[Fragmentos]. Irredutibilidade dos Vencimentos dos Jui-
zes Militares 249
[Notas] 253
Sentença 255
3 — PETIÇÃO 261
Apelação Cível n* 1.063. Acórdão 263
Apelação Cível n9 1.063 (Embargos). Acórdão 265
BIBLIOGRAFIA 269
ÍNDICE ONOMÁSTICO 279
AOS 2 5 DIAS DO MÊS DE JULHO DO ANO DE
1 9 5 2 , ACABOU-SE DE IMPRIMIR NAS OFICINAS
GRÁFICAS DO DEP. DE IMPRENSA NACIONAL,
NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, ESTE TOMO,
O l.o DO VOLUME XXVII
DAS

OBRAS COMPLETAS DE RUI BARBOSA


MANDADAS PUBLICAR PELO GOVERNO DA
REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL.
Departamento de Imprensa Naclcnal
Rio de Janeiro - Brasil - 1952

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DEPART. DE IMP. NACIONAL ­ 1952

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