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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Juliana Miranda Filgueiras

Os processos de avaliação de livros didáticos no Brasil

(1938-1984)

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: HISTÓRIA, POLÍTICA, SOCIEDADE

SÃO PAULO

2011
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP

Juliana Miranda Filgueiras

Os processos de avaliação de livros didáticos no Brasil


(1938-1984)

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: HISTÓRIA, POLÍTICA, SOCIEDADE

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia


Universidade Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de Doutora em
Educação: História, Política, Sociedade sob a
orientação do Prof. Doutor Kazumi Munakata.

SÃO PAULO

2011
BANCA EXAMINADORA

___________________________________________

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___________________________________________

___________________________________________
AGRADECIMENTOS
_______________________________________________________________________

O fim do doutorado é o momento de encerramento de mais uma etapa da vida.


Confesso que estou feliz mas, também, triste. Durante esses anos aprendi muito e fiz
novas amizades. Me apaixonei pelo trabalho de pesquisa ao conhecer um novo arquivo e
descobrir um documento. Muitas pessoas colaboraram nesse processo. Quero, aqui,
agradecer a todos que me possibilitaram vivênciar essas experiências.
Em primeiro lugar, agradeço ao meu orientador Professor Dr. Kazumi
Munakata, pela orientação durante todo o percurso no doutorado. Agradeço pelas aulas
que despertaram a vontade de conhecer, pelo incentivo, paciência e confiança no meu
trabalho. Agradeço, sobretudo, por participar desde o mestrado no meu processo de
formação.
À Professora Dra. Maria Rita de Almeida Toledo pelas estimulantes aulas, por
me indicar os documentos da Companhia Editora Nacional e pelas importantes
contribuições no exame de qualificação.
Agradeço à Professora Dra. Circe Bittencourt por participar do meu exame de
qualificação e pelas contribuições para melhorar a pesquisa. Agradeço, ainda, pelas
conversas e pela amizade fora do universo acadêmico.
Aos professores do EHPS pelas aulas que me ajudaram a compreender os
diferentes modos de investigar. Um abraço ao Professor Dr. Bruno Bomtempi Júnior que
não faz mais parte do Programa.
À Elisabete Adania, pela amizade e apoio nesses anos!
Agradeço a Leonardo Ruas Correira, arquivista do Inep, que me forneceu a
documentação histórica do Instituto. Agradeço, também, a Mari Freitas, funcionária do
Arquivo do MEC, a Tânia Andrade Silva, funcionária da Companhia Editora
Nacional/IBEP, a Elizabeth Monteiro da Silva, do Núcleo de Documentação e Memória
do Colégio Pedro II (NUDOM), a Katia do Programa de Estudos e Documentação
Educação e Sociedade (Proedes/UFRJ), por facilitarem o contato com a documentação
da pesquisa.
Aos amigos de longa data, pelas utopias e momentos de descontração: Tatiana
Albertina Lemos Barbosa, Virgínia Bessa, Maíra Bittencourt, Lilian Kelian, Pablo
Ortellado, Cristiane Checchia, Gil Geribola Moreno, Helena Freire, Júlio Gonçalves,
Ana Karícia Machado Dourado, Luis Felipe, Diana Mendes Machado Silva, Daniel
Helene e André Araújo.
Agradeço, em especial, a Vivien Tie Hanashiro e Lee Chia Tsun pela amizade
de tantos anos. Obrigada!
À Cláudia Maluhy pela amizade sincera e aberta, pela calma nos momentos
tumultuados e pela ajuda na leitura do texto final.
Aos colegas do EHPS, pelas conversas e trocas de idéias: Katya Braghini,
Bianca Zucchi, Maria Elena Vercesi, Carla Cazelato, Francisco Tomás Vieira, Yvan
Dourado, Jeová Santana, Márcia Takeuchi, Márcia Ristow, Elizangela Tremea, Ellen
Rozante, Paula Assis, Cássio Másculo, Tainã Pinheiro, Joana Borges de Faria, Sandra
Frankfurt, Silvia Asan Fonseca, Luiz Fernando Lourdes e Marcos Roberto Faria.
Agradeço, também, aos colegas do grupo LIVRES, especialmente à Rozélia Bezerra.
À Célia Cristina de Figueiredo Cassiano pelas muitas gentilezas durante a
pesquisa.
Agradeço à Cristina Figueira, Vera Jardim e Cida Satto, pela amizade que
construímos.
À minha mãe Moema, meu pai Otto, meus irmãos Renata, Vicente e Jair, meus
avós Jacy e Nemo, mes tios Marcos, Milton, Bete e Regina, meus primos Fernanda,
Fabiana, Kauê e Maíra, meus sogros Mara e Marcos e minha cunhada Carol, pela força,
pelo carinho e por compreenderem minhas ausências.
Agradeço a minha prima Fernanda que traduziu meu resumo.
Agradeço principalmente, ao Fernando, meu companheiro, pela força durante
essa caminhada, pelos sonhos que sonhamos juntos, pelo carinho e por todos os
momentos que compartilhamos. Obrigada!
Agradeço à Capes e ao CNPq pelo financiamento desta pesquisa.
RESUMO

Este estudo tem como objetivo analisar os processos de avaliação de livros didáticos no
Brasil, pela perspectiva histórica, desde os anos 1930, quando foi estabelecida a
primeira avaliação organizada em âmbito federal. Durante a pesquisa foram encontrados
quatro grandes períodos relacionados a políticas nacionais para o livro didático, com
processos de avaliação distintos. O primeiro processo foi instituído por meio do
Decreto-Lei n° 1.006, de 1938, que criou a Comissão Nacional do Livro Didático
(CNLD). O segundo processo ocorreu durante os anos 1950 com a criação da
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme). O terceiro momento deu-
se no início da Ditadura Militar, em 1966, com a criação da Comissão do Livro Técnico
e do Livro Didático (Colted). O último momento iniciou-se em 1971, quando a Colted
foi extinta e suas funções passaram para o Instituto Nacional do Livro (INL), que
iniciou o Programa do Livro Didático e os processos de co-edição dos manuais, até
1976, quando o Programa do Livro Didático foi transferido para a Fundação Nacional
do Material Escolar (Fename). A pesquisa é encerrada com o fim do sistema de co-
edição nos anos 1980. Com esta tese, buscou-se compreender quem eram os sujeitos
envolvidos no campo de disputa sobre o manual escolar, qual a atuação e interesse
desses sujeitos, evidenciando, também, os conflitos e lutas que se estabeleceram nesse
campo. Baseada em autores como Chervel, Goodson e Choppin, a análise permitiu
verificar a importância dos manuais didáticos no processo de escolarização, na relação
de ensino e aprendizagem das disciplinas escolares. O exame dos diferentes processos
de avaliação mostrou a intenção dos diferentes grupos sociais de controlar o conteúdo
que seria veiculado pelo livro didático, demonstrando o valor desse instrumento na
escola, como ferramenta de uniformização e unificação cultural.

Palavras-chave: Livro Didático; Políticas Públicas; Avaliação; História da Educação


ABSTRACT
_______________________________________________________________________

This study aims to analyze the textbook evaluation processes in Brazil, by their
historical perspective since the 1930’s, when the first nationally organized evaluation
process was established. During this research four major periods related to the textbook
national policies were identified, as well as different evaluation processes. The first
process was established by law no. 1.006 of 1983, which created the Comissão
Nacional do Livro Didático, the CNLD (Brazilian Textbook Commission). The second
process happened during the 1950´s, when the Campanha do Livro Didático e Manuais
de Ensino, the Caldeme (Textbooks and Teaching Manuals Campaign), was created.
The third moment took place during the military dictatorship in 1966 with the creation
of the Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático, the Colted (Technical Book and
Textbook Commission). The last moment started in 1971, when the Colted was
extinguished and its functions were transferred to the Instituto Nacional do Livro, the
INL (National Book Institute), which started the Programa do Livro Didático (Textbook
Program) and the manuals co-edition processes until 1976. After that the Programa do
Livro Didático (Textbook Program) was transferred to the Fundação Nacional do
Material Escolar, the Fename (School Material National Foundation). The research is
concluded with the extinction of the co-edition system in the 1980’s. The objective of
this thesis was to identify those involved in the dispute field over the school manuals,
what were the activities and interests of these agents, also highlighting the conflicts and
struggles over this field. Based in authors as Chervel, Goodson and Choppin, the
analysis allowed the verification of the importance of didactic manuals in the schooling
process, in the school subjects teaching and learning relation. The exam of different
evaluation processes showed the intention of different social groups to control the
content disclosed by textbooks, showing the value of this instrument in education as a
tool for standardizing and harmonizing culture.

Key words: Textbook; Public Policies; Evaluation; Education History


SUMÁRIO
_______________________________________________________________________

Introdução ......................................................................................................................1

Capítulo 1
A Comissão Nacional do Livro Didático e as avaliações dos manuais escolares ... 17
A criação da Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) e sua organização ......... 19
Os membros da Comissão Nacional do Livro Didático ................................................ 25
A instalação da CNLD................................................................................................... 36
Os trabalhos ................................................................................................................... 39
A orientação para avaliação........................................................................................... 43
As avaliações ................................................................................................................. 46
Repercussões das avaliações ......................................................................................... 68
Reestruturação da CNLD............................................................................................... 74

Capítulo 2
A Campanha do livro didático e Manuais de Ensino e o problema da educação
secundária..................................................................................................................... 80
O problema do livro didático......................................................................................... 84
Outros lugares de atuação: o Inep e a organização da Caldeme.................................... 89
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino – Caldeme.................................... 93
Formação da Biblioteca Pedagógica................................................................. 96
Programas de ensino de outros países............................................................... 98
Publicação e Tradução de livros....................................................................... 100
Elaboração de material didático para ciências.................................................. 103
Produção de guias para os professores do ensino secundário.......................... 103
Análise crítica de livros didáticos e programas do ensino secundário ......................... 114
A análise dos programas e livros didáticos de Geografia............................................. 118
A análise dos programas e livros didáticos de História................................................ 128
O significado da Caldeme nas discussões sobre o ensino nos anos 1950 .................... 140
Capítulo 3
A Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático e a expansão do ensino ........... 145
Os projetos para o livro didático................................................................................... 148
O mercado dos livros didáticos e a criação da Colted.................................................. 153
A Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático – Colted....................................... 157
O Plano Inicial.................................................................................................. 163
A seleção das obras para bibliotecas................................................................ 167
A II Semana de Estudos da Colted................................................................... 171
A seleção dos livros didáticos para alunos do ensino primário – Projeto Piloto.......... 176
A orientação para avaliação..............................................................................178
As avaliações por áreas.................................................................................... 184
As repercussões do processo de avaliação dos livros didáticos pela Colted ................ 193
A Colted em 1969 até sua extinção em 1971 ............................................................... 196
Algumas considerações ................................................................................................ 198

Capítulo 4
Os processos de co-edição de livros didáticos e a reforma educacional ................. 201
A ficha e as avaliações..................................................................................... 210
A participação dos estados ........................................................................................... 217
Algumas repercussões das avaliações .......................................................................... 220
A Fundação Nacional de Material Escolar (Fename)................................................... 222
PLIDEM 1977/78 ......................................................................................................... 223
A ficha de avaliação......................................................................................... 224
A extinção da avaliação federal.................................................................................... 225
Algumas considerações ................................................................................................ 228

Considerações finais .................................................................................................... 230

Referências bibliográficas........................................................................................... 238


Lista de Quadros
Quadro 1.1 – Composição das Seções........................................................................... 37
Quadro 1.2 – Ficha: Elementos a considerar no julgamento do livro didático ............. 45
Quadro 2.1 – Professores encarregados de elaborar os guias de ensino....................... 105

Lista de Tabelas
Tabela 1.1 – Avaliações dos livros didáticos por editoras ............................................ 47
Tabela 1.2 – Quantidade de avaliação por Seção .......................................................... 48
Tabela 1.3 – Relação entre avaliador e livros didáticos avaliados entre 1941 e 1942 .. 49

Lista de Figuras
Figura 2.1 – Livro Didático Luisinha aos oito anos...................................................... 87
Figura 2.2 – Livro Didático Seleta Escolar................................................................... 87
Figura 4.1 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 1......................................................... 211
Figura 4.2 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 2......................................................... 211
Figura 4.3 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 3......................................................... 212
Figura 4.4 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 4......................................................... 212
Figura 4.5 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 5......................................................... 212
Figura 4.6 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 6......................................................... 212
Figura 4.7 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 7......................................................... 213
Figura 4.8 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 8......................................................... 213
Figura 4.9 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 1....................................... 218
Figura 4.10 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 2..................................... 218
Figura 4.11 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 3..................................... 219
Figura 4.12 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 4..................................... 219

Lista de Siglas.............................................................................................................. 251


Escrever é traduzir. Sempre o será. Mesmo quando
estivermos a utilizar a nossa própria língua.
Transportamos o que vemos e o que sentimos (…)
para um código convencional de signos, a escrita, e
deixamos às circunstâncias e aos acasos da
comunicação a responsabilidade de fazer chegar à
inteligência do leitor, não a integridade da
experiência que nos propusemos transmitir (...), mas
ao menos uma sombra do que no fundo do nosso
espírito sabemos ser intraduzível, por exemplo, a
emoção pura de um encontro, o deslumbramento de
uma descoberta, esse instante fugaz de silêncio
anterior à palavra que vai ficar na memória como o
resto de um sonho que o tempo não apagará por
completo.

José Saramago (O Caderno de Saramago, 2 de julho


de 2009)
1

INTRODUÇÃO

Este estudo tem como objetivo analisar os processos de avaliação de livros


didáticos no Brasil, pela perspectiva histórica, de 1938 - quando foi estabelecida a
primeira avaliação organizada em âmbito federal, com a criação da Comissão Nacional
do Livro Didático (CNLD) - até o fim da Ditadura Militar nos anos 1980, com a
Fename, órgão responsável pelo Programa do Livro Didático (PLD), que organizava o
processo de co-edição dos livros escolares com as editoras nacionais.
O programa de co-edição foi cancelado em 1984 e, com o fim da Ditadura em
1985, o Programa do Livro Didático para o Ensino Fundamental foi substituído pelo
Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), que existe até os dias atuais e se
consolidou como política de Estado para o livro didático.
A idéia de estudar a história dos processos centralizados de avaliação dos livros
didáticos no Brasil surgiu das discussões realizadas no projeto de pesquisa História das
disciplinas escolares e do livro didático, do Programa de Estudos Pós-graduados em
Educação: História, Política, Sociedade, da Pontíficia Universidade Católica de São
Paulo, coordenado pelo Professor Dr. Kazumi Munakata e dos debates realizados no
âmbito do projeto temático: Educação e Memória: Organização de acervos de livros
didáticos, do Centro de Memória da Educação Escolar, da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo, coordenado pela Professora Dra. Circe Bittencourt.
Baseado em autores como André Chervel (1990), Ivor Goodson (1990) e Alain
Choppin (2004, 2002, 2000, 1998), discutia-se nesses grupos a relação intríncesa entre
história das disciplinas escolares e a história dos livros didáticos. Para compreender
“por que a escola ensina o que ensina?”1, era preciso historicizar as disciplinas e o
processo de seleção e organização de determinados saberes no contexto da escola, nos
diferentes momentos históricos. Os livros didáticos são considerados o suporte, os
principais divulgadores dos saberes, dos conteúdos (e muitas vezes métodos), que se
consolidaram em uma determinada época, como legítimos a serem ensinados pelas
disciplinas escolares. Por ter esse caráter de divulgador dos conhecimentos das
diciplinas escolares, a história dos livros didáticos relaciona-se, ainda, com a história

1
“Por que a escola ensina o que ensina?”, é o início da ementa do projeto de pesquisa História das
disciplinas escolares e do livro didático, do Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: História,
Política, Sociedade, da Pontíficia Universidade Católica de São Paulo.
2

das políticas públicas educacionais e a contínua preocupação em se regular a sua


produção, o seu conteúdo e, até mesmo, a sua distribuição.
O livro didático é compreendido, assim, como parte da Cultura Escolar (Julia,
2001), como instrumento de socialização, que colabora na divulgação dos conteúdos de
ensino das disciplinas escolares, na transmissão desses conhecimetos, muitas vezes
estabelecidos por programas oficiais.
É importante compreender que o livro didático esteve ligado à criação da escola
pública desde o início da formação do Estado Moderno. Segundo Carbone (2003) o
crescimento do consumo do livro didático se associava a política educativa da Europa e
América do fim do século XIX, com a formação dos sistemas nacionais de educação
pública e seus princípios da universalização da educação – a obrigatoriedade, a
gratuidade e a neutralidade religiosa -, que se concretizavam por meio das leis,
acompanhadas da preocupação de profissionalizar a docência e criar condições de infra-
estrutura física e cultural. Os livros textos formavam parte dessas condições (Carbone,
2003, p. 14). Com a obrigatoriedade escolar e a estruturação de um ensino popular, os
programas estabeleciam um rol de conhecimentos mínimos que deveriam ser ensinados
aos alunos, de modo coletivo e simultâneo. Neste sentido, o papel do manual era
significativo, pois oferecia uma proposta uniforme, “especificamente dedicada à
instrução, como uma resposta a essa realidade massificada que se impunha” (Carbone,
2003, p. 15).
Entre suas funções, a escola moderna deveria nacionalizar o povo e formar sua
identidade. O manual didático, integrante da tradição escolar e importante ferramenta
pedagógica de ensino e aprendizagem, era um instrumento privilegiado de construção
da identidade e tornava-se responsável por apresentar os conteúdos que permitissem a
formação cívica da população. O livro didático difundia a língua, a cultura e os valores
da classe dirigente. O manual era elevado, desse modo, a símbolo da soberania nacional,
assumindo tanta importância quanto a moeda e a bandeira (Carbone, 2003, p. 16).
Compreende-se desse modo, como afirma Carbone, que o manual escolar, em
uma determinada época da história do currículo e da escola, é utilizado para “modelar a
sociedade do futuro através de seu público: os leitores jovens” (Carbone, 2003, p. 30).
Ele contribui com sua característica uniforme para a coesão cultural da sociedade. O
manual participa da construção de imagens associadas a elementos fundantes da nossa
cultura como nação e participa, ainda, junto as práticas de estudo escolar, da construção
de uma representação sobre o saber, sua produção e apropriação. Os livros didáticos são
3

concebidos, assim, “segundo as épocas, com a intenção de servir de apoio escrito ao


ensino de uma disciplina no seio de uma instituição escolar” (Carbone, 2003, p. 32). O
manual escolar apresenta o conteúdo de uma disciplina, para um determinado nível de
ensino, de acordo com um programa oficial. Para Carbone, “a emergência dos livros de
texto, a diferenciação de seus modelos e suas variantes estão associados à história da
escola, as políticas educativas, as do currículo e as formas peculiares de traduzi-lo que
se dão nos livros e nas escolas” (2003, p. 61).
Segundo, Choppin (2000), a função dos livros didáticos é transmitir às novas
gerações “os saberes, as destrezas (...), cuja aquisição é julgada, em um campo e em um
momento dado, como indispensáveis para a perpetuação da sociedade” (2000, p. 16). Os
livros didáticos transmitem, “de maneira mais ou menos sutil, mais ou menos
implícita”, um sistema de valores “morais, religiosos, políticos; uma ideologia que
remete ao grupo social de que emana, participando assim de maneira direta no processo
de socialização e aculturação da juventude” (Choppin, 2000, p. 16).
Os livros didáticos são compreendidos, portanto, como instrumentos de poder,
pois orientam os espíritos ainda pouco críticos e manipuláveis dos jovens e constituem
“poderosas ferramentas de unificação – até de uniformização – nacional, lingüística,
cultural e ideológica” (Choppin, 1998, p. 169). O livro didático é, além disso, um
instrumento pedagógico, que propõe métodos e técnicas de aprendizagem, que “as
instruções oficiais ou os prefácio não poderiam fornecer senão os objetivos ou os
princípios orientadores” (Choppin, 2002, p. 14). Eles se constituem em “canais de
propagação das idéias e as vias de circulação dos capitais” (Choppin, 2002, p. 16).
Por ser distinto de outros tipos de publicações, os livros escolares recebem uma
regulamentação específica, que controla a sua forma e uso. Desse modo, Choppin
enfatiza que o livro didático se constitui em “um precioso indicador das relações de
força que estabelecem, em um momento dado e em uma sociedade determinada, os
diversos atores do sistema educativo, pois o grau de liberdade que gozam seus redatores
e quem os utiliza pode variar consideravelmente” (Choppin, 1998, p. 170).
De tal modo, para Choppin (2004), é necessário estudar a regulamentação
“aplicada às produções escolares” (p. 560), pois o “o contexto legislativo e regulador,
que condiciona não somente a existência e a estrutura, mas também a produção do livro
didático, é condição preliminar indispensável a qualquer estudo sobre a edição escolar”
(Choppin, 2004, p. 561). É necessário reconstituir a política pública para o livro
4

didático, analisando as regras que o Estado impôs à sua produção nos diferentes
contextos históricos.
O projeto desta tese se iniciou assim, com o questionamento de porque é preciso
avaliar o livro didático. Por que o Estado torna-se responsável pelo controle dos
manuais e, em especial, como se dá esse controle, na prática? Quem são os avaliadores,
qual o objetivo das avaliações e o que procuram avaliar?
A presente tese segue nesse caminho, ao procurar compreender a história da
política nacional para o livro didático no Brasil nos diferentes contextos históricos e,
mais detalhadamente, os processos de avaliação desses manuais, buscando evidenciar
quem eram os sujeitos envolvidos no campo de disputa sobre o manual escolar, qual a
atuação e interesse desses sujeitos evidenciando, também, os conflitos e lutas que se
estabeleceram nesse campo. Ao avaliar e selecionar os manuais escolares que poderiam
ser utilizados nas escolas brasileiras, as comissões de avaliação procuraram determinar
o que era legítimo e o que poderia ser estudado pelos alunos.
Atualmente, os livros didáticos utilizados nas escolas públicas brasileiras, nos
ensinos Fundamental, Médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA), passam por um
processo de avaliação e seleção que integram o Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD). As escolas recebem os livros, que são utilizados por três anos. Esses
programas têm grande importância, pois possibilitam o acesso do livro didático a todos
os estudantes do país, implicam impressionantes gastos públicos em educação e, por
meio do processo da avaliação, estabelecem o que deve ser lido pelos alunos brasileiros,
determinando o conhecimento aceito como legítimo. Segundo Cassiano (2007), a
política do livro didático instituída com o PNLD, “revolucionou o mercado desses
livros no Brasil, culminando numa distribuição gratuita sem precedentes, desses
manuais na história do país” (p. 21).
O PNLD foi criado pelo Ministério da Educação, por meio do Decreto n°
91.542, de 19 de agosto de 1985. Em um momento de redemocratização do país com o
fim da ditadura militar, o Programa Nacional do Livro Didático objetivava adquirir e
distribuir livros didáticos, gratuitamente, para os alunos de primeira a oitava séries do
ensino fundamental das escolas públicas brasileiras. A execução do PNLD estava,
inicialmente, sob responsabilidade da Fundação de Assistência ao Estudante (FAE), que
deveria articular-se com as Secretarias de Educação dos estados, Distrito Federal e
territórios, órgãos municipais e associações comunitárias, sob a supervisão da Secretaria
5

de Ensino de 1º e 2º graus (SEPS), do MEC. As diretrizes do PNLD baseavam-se em


cinco pontos principais:

centralização das ações de planejamento, compra e distribuição; utilização


exclusiva dos recursos federais; atuação restrita à compra de livros, sem
participação na produção editorial, ficando, esta, a cargo da iniciativa privada;
escolha do livro pela comunidade escolar e distribuição gratuita dos livros a
alunos e docentes (Cassiano, 2003, p. 7).

Cassiano (2007, p. 15) afirma, de tal modo, que o PNLD foi constituído por dois
marcos estruturais. O primeiro era a própria implementação do Programa em 1985, com
a redemocratização do país. O segundo, em 1995, no governo de Fernando Henrique
Cardoso, com a legitimação do PNLD, que passou a ter destinação assegurada de
recursos e sofreu três alterações significativas que deram consistência ao Programa: “a
efetiva universalização da distribuição dos livros ao alunado do ensino fundamental, a
implementação de uma avaliação governamental dos livros comprados e distribuídos
pelo Estado e a ampliação significativa desse programa” (Cassiano, 2007, p. 15).
Até o início dos anos 1990, o Ministério da Educação, no contexto da política do
livro didático, exercia a função de ser o “mediador entre os professores e o campo da
produção editorial” (Batista, 2001, p. 16). O MEC somente comprava os livros didáticos
escolhidos pelos docentes. Essa posição fazia com que o MEC tivesse pouca atuação em
relação aos padrões de qualidade dos livros escolares. Tal preocupação, com a
qualidade dos livros comprados pelo Estado, surgiu mais efetivamente no fim dos anos
1980. De acordo com relatório da FAE, no ano de 1987 diversos encontros e debates
foram organizados para discutir a qualidade dos livros didáticos. Em 1993, o MEC
divulgou o Plano Decenal de Educação para todos que discutiu, entre outros assuntos,
o problema da qualidade dos livros didáticos que eram comprados pelo governo federal.
Assim, em 1993 foi instituído um grupo de trabalho para avaliar os manuais
escolares. Por meio da Portaria n° 1.130 formou-se uma comissão para analisar a
qualidade dos conteúdos programáticos, dos aspectos pedagógicos e metodológicos dos
livros didáticos que estavam sendo comprados pelo MEC, para as séries iniciais do
ensino fundamental. Os Grupos de Trabalho (GT) dessa Comissão foram compostos por
professores universitários, técnicos de Secretarias de Educação de alguns estados e por
6

professores do ensino básico2. Com essa primeira avaliação, o MEC publicou junto à
Unesco, em 1994, a Definição de critérios para avaliação de livros didáticos.
A avaliação de 1993 analisou os livros didáticos em seus aspectos conceituais,
pedagógico-metodológicos, quanto a recepção e produção dos textos e, quanto ao
projeto visual – nos fatores de legibilidade tipográfica (caracteres, capa, miolo, parte
textual e pós-textual) -, nos princípios para visualização das hierarquias; no formato do
livro; nos recursos gráficos e nas ilustrações.
A análise final das obras encontrou “problemas graves”, presentes nos manuais,
destacando-se os seguintes aspectos: a uniformização dos livros didáticos, muito
parecidos uns com os outros; textos com erros de conteúdo e conceituais; textos que
induziam a preconceitos e estereótipos; assuntos estanques, sem relação ao longo dos
capítulos e das unidades; exercícios mecânicos que conduziam à simples memorização;
distância entre os conteúdos e a realidade da criança; despreparo dos autores,
desqualificados, sem formação nas áreas específicas; má qualidade do manual do
professor; não existência de um projeto real de livro não-consumível; defasagem entre a
produção acadêmica e o conteúdo dos livros didáticos (Exemplo: gramática tradicional,
movimento da Matemática moderna, etc.).
As conclusões gerais da análise de 1993 destacaram que os livros didáticos
analisados expressavam a visão da escola e do papel do professor como:

repassador de informações estratificadas, obsoletas e errôneas, imune à


concepção de que um mundo em mudanças vertiginosas de valores, da ciência
e da tecnologia exige, acima de tudo, indivíduos com capacidade de resolver

2
Participaram da avaliação de 1993 os seguintes professores, de acordo com as áreas: Português, Antenor
Antônio Gonçalves Filho – Doutor em História e Filosofia da Educação, professor da UNESP de Marília;
Heliane Gramiscelli Ferreira de Mello – Doutora em Psicologia Escolar, professora da UFMG; Jaqueline
Moll – Mestra em Educação, professora da UFRGS; Luiz Percival Leme Brito – Mestre em Lingüística,
professor da Unicamp; Leonor Scliar-Cabral – Doutora em Psicolingüística Aplicada, professora da
UFSC; Magda Becker Soares – Doutora e Livre Docente em Educação, professora da UFMG; Nadja da
Costa Ribeiro Moreira – Doutora em Lingüística Aplicada, professora da UFCe. Matemática, Anna
Franchi – Mestra em Psicologia da Educação, professora da PUC/SP; Iara Augusta da Silva – Técnica do
Setor de Supervisão de Avaliação e Capacitação da Secretaria de Estado de Educação do Mato Grosso do
Sul; João Bosco Pitombeira – Doutor em Matemática, professor da PUC/RJ; Martha Maria de Souza
Dantas – Professora da UFBa; Tânia Mara Mendonça Campos – Doutora em Matemática, professora da
PUC/SP. Estudos Sociais, Edna Maria Santos – Mestre em Educação, professora da UERJ e USU; Elza
Nadai – Doutora em História Social e Livre-Docente em Educação, professora da USP; Léo Stampacchio
– Mestre em História do Brasil, membro da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas da
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo; Selva Guimarães Fonseca – Mestre em História do
Brasil, professora da UFU; Valéria Trevizani Burla de Aguiar – Professora da UFJF. Ciências, Catarina
Fernandes de O. Fraga – Professora da UFPe; Demétrio Delizoicov Neto – Doutor em Didática do Ensino
de Ciência, professor da Unicamp; Miguel Castilho Júnior – Professor da Escola Nova Lourenço
Castanho/SP; Ronaldo Mancuso – Mestre em Educação, professor lotado no Centro de Ciências da
Secretaria de Estado da Educação do Rio Grande do Sul.
7

problemas novos para sobreviver, portanto, de pensá-los (Brasil, 1994, p.


103).

Segundo os avaliadores, os produtores dos livros didáticos se utilizavam de


tecnologias avançadas de marketing para encobrir conteúdos retrógrados.
A avaliação de 1993 teve grande repercussão na imprensa que, segundo
Munakata (1997, p. 63), endossou a opinião dos avaliadores, divulgando intensamente
os erros contidos nos manuais escolares sem levar em consideração o teor das críticas e
o envolvimento de outras autoridades no assunto, como os autores dos manuais.
Diante do resultado da avaliação de 1993, o Ministério da Educação instituiu a
avaliação oficial dos livros didáticos. A partir de 1996 iniciou-se oficialmente o
processo de avaliação pedagógica dos livros inscritos para o PNLD 1997, relativo aos
manuais de 1ª a 4ª séries. Com a avaliação, o MEC passou a atuar na discussão da
qualidade e das incorreções dos livros didáticos. As obras inscritas pelas editoras que
não fossem aprovadas seriam excluídas da compra pelo PNLD3. Os resultados da
avaliação dos livros começaram e ser divulgados nos Guias de Livros Didáticos4,
distribuídos para as escolas públicas de todo o país com o objetivo de orientar os
professores na escolha dos manuais escolares.
A avaliação de 1996 gerou, novamente, intensa repercussão na mídia e acarretou
forte reação do mercado editorial de didáticos e dos autores, de acordo com Munakata
(1997). Autores e editores pronunciaram-se questionando os critérios da avaliação, a
infalibilidade da comissão, exigiram a publicação da lista com os livros não aprovados e
o acesso aos pareceres dos avaliadores (Munakata, 1997, pp. 64-68). Segundo Cassiano,
“o que causou grande desconforto em relação à avaliação dos livros didáticos, em 1996,
foi a extensa lista de livros inscritos e excluídos, principalmente por erros conceituais”
(2003, p. 27).
O processo de avaliação dos livros didáticos gerou impacto no campo editorial.
No mercado editorial, autores e editores passaram a se preocupar com os critérios de
avaliação e se adequar a eles, procurando inscrever livros reformulados ou títulos

3
De acordo com o documento do Ministério da Educação: “[No PNLD/97] Com base no Guia, os
professores puderam ter condições mais adequadas para a escolha do livro que julgavam mais apropriado
a seus pressupostos, às características de seus alunos, às diretrizes do projeto político-pedagógico de sua
escola (...) Só não puderam escolher livros que – em razão de apresentarem preconceito, discriminação,
erro conceitual grave – foram excluídos do Programa Nacional do Livro Didático” (BATISTA, 2001, p.
14).
4
Os Guias de Livros Didáticos contém as resenhas das obras aprovadas. O guia apresenta ainda as obras
organizadas por disciplinas.
8

novos. Junto a esse fenômeno, começaram a integrar o processo de avaliação, novas


editoras, que não participavam anteriormente. De acordo com Cassiano (2007, p. 59), a
implementação da avaliação dos livros didáticos assegurou a “ausência de erros
conceituais, de preconceitos e de inconsistências metodológicas”, mas também difundiu
a reforma curricular, pois apesar de os Parâmetros Curriculares Nacionais5 não terem
caráter de obrigatoriedade para as diversas disciplinas e para o currículo escolar, são
parâmetros norteadores da avaliação dos livros didáticos.
Em 26 anos de existência o PNLD se tornou uma política de Estado e o processo
de avaliação dos livros didáticos se consolidou. Contudo, as avaliações do PNLD vem
sofrendo questionamentos ao longo dos anos. No segundo semestre de 2007, diversas
matérias foram publicadas na imprensa brasileira sobre a qualidade dos livros didáticos.
Jornais e revistas recomeçaram um intenso debate sobre a ideologia contida nos
manuais, a atuação dos avaliadores do PNLD e o mercado milionário do livro escolar6.
Em novembro do mesmo ano, o seminário realizado na USP - Simpósio Internacional
Livro Didático: Educação e História -, mostrou a preocupação da Associação Brasileira
dos Editores de Livros (Abrelivros) e da Associação Brasileira de Autores de Livros
Educativos (Abrale) com a avaliação e os avaliadores do PNLD. Representantes das
duas entidades solicitaram melhora nas regras da avaliação e no modo de avaliar.
Argumentaram que a avaliação deveria ter critérios extremamente objetivos, de modo a
eliminar, dentro do possível, a carga de subjetividade do processo. Questionaram, ainda,
sobre quem avaliava o trabalho dos avaliadores do PNLD. As discussões mostraram que
a avaliação dos livros didáticos é o grande “problema” para as editoras.
A repercussão das avaliações de 1993 e de 1996, os debates realizados em 2007,
tanto pela imprensa nacional, como no Simpósio Internacional Livro Didático,
evidenciaram o fato de que o controle do Estado sobre a produção dos livros didáticos,
por meio do processo de avaliação dos manuais, não é visto de forma tranqüila e gera
inúmeros conflitos. Esses episódios, junto com a complexidade do PNLD e das
avaliações dos livros didáticos me levaram a questionar se esse programa era único ou
se existiram processos de avaliação dos manuais escolares em outros momentos da
história brasileira.

5
Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram implementados em 1996, como orientação para as
disciplinas escolares do ensino fundamental e médio.
6
Algumas matérias: O que ensinam às nossas crianças, de Ali Kamel, jornal O Globo, de 18/09/2007; O
que estão ensinando a nossas crianças, Revista Época n° 492, de 22/10/2007; Livros didáticos: cifrões e
ideologia, Carta Capital n° 464, de 3/10/2007.
9

Em busca de pistas que possibilitassem encontrar outros contextos na história


brasileira com relação as avaliações de livros didáticos, foram realizadas leituras de
bibliografias sobre o tema e encontradas duas pesquisas que procuraram elaborar uma
história do livro didático no Brasil: A política do livro didático, de Oliveira et al. (1984)
e O estado da arte do livro didático no Brasil, de Freitag et al. (1987).
O estudo de Oliveira et al. (1984) procurou organizar o “campo de estudo” dos
livros didáticos, pouco pesquisado nos anos 1980. Para isso, analisaram o conceito de
livro didático e a literatura sobre o tema; estabeleceram uma periodização a partir do
estudo da legislação; discutiram sua produção e aspectos econômicos; apresentaram o
funcionamento do Programa do Livro Didático (em vigor naquele momento);
analisaram o uso dos livros didáticos; e finalizaram, com um balanço da política do
livro didático na época e com sugestões para melhorar tais políticas. O livro de Oliveira
et al. (1984) é referencial, pois caracteriza-se como um dos primeiros estudos que
procuraram abordar os livros didáticos em seus diferentes aspectos – sua produção,
economia, uso e a história das políticas públicas para o livro escolar.
Com o intuito de elaborar o estado da arte do livro didático, a pesquisa de
Freitag et al. (1987) buscou organizar a bibliografia produzida sobre o tema, encontrada
em revistas especializadas, acervos das bibliotecas de universidades, em órgãos
públicos e em catálogos de associações de pesquisa, com resumos de mestrados e
doutorados. A partir da bibliografia analisada, os autores apresentaram as perspectivas
possíveis de análise do manual escolar – sua história, a política do livro didático, sua
economia, seu conteúdo, seu uso e sua atuação no contexto da educação nacional. Do
mesmo modo como foi utilizado o estudo de Oliveira et al. (1984), as indicações sobre a
política do livro didático apresentadas por Freitag et al. (1987), serviram para identificar
algumas das comissões criadas pelos diferentes governos no Brasil.
A presente tese partiu da periodização das políticas públicas organizada por
esses autores para identificar os possíveis momentos em que foram instaladas comissões
nacionais de avaliações dos manuais escolares. A partir das indicações das duas obras,
aprofundou-se na pesquisa sobre as políticas públicas para o livro didático sob duas
perspectivas: ao buscar outros períodos em que o Estado organizou políticas para o livro
escolar e constituiu comissões de controle dessas políticas; e ao analisar, mais
detalhadamente, a estrutura, a atuação dos sujeitos envolvidos e a especificidade dos
diversos órgãos que foram criados pelo Estado nos diferentes contextos da história do
país.
10

Outro tipo de pesquisa encontrada foram os estudos que analisaram as comissões


responsáveis pela política do livro didático a partir de um período específico da história
brasileira: a dissertação de mestrado de Gonçalves (2005), Comissão de Seleção dos
livros didáticos (1935- 1951): guardiã e censora da produção didática; o mestrado de
Ferreira (2008), A Comissão Nacional do Livro Didático durante o Estado Novo (1937-
1945); e a dissertação de Krafzik (2006), Acordo MEC/USAID – A Comissão do Livro
Técnico e do Livro Didático – COLTED (1966-1971).
Gonçalves (2005) analisou as prescrições oficiais que regularam a produção,
seleção e uso dos livros de leitura e as cartilhas para o ensino primário no estado de São
Paulo, de 1935 a 1951. Em seu estudo, observou a legislação do livro didático, as
comissões responsáveis pelo controle da produção e seleção dos manuais, os critérios de
exame dos livros didáticos e os pareceres dos avaliadores. Na sua pesquisa, Gonçalves
observou que, apesar de a política do livro didático ter sido centralizada em âmbito
federal a partir de 1938, com a criação da Comissão Nacional do Livro Didático
(CNLD), o estado de São Paulo continuou a possuir uma legislação específica para
avaliação das cartilhas e livros de leitura que seriam utilizadas nas escolas daquele
estado.
Esta tese verificou que, de fato, a CNLD existiu e atuou concomitantemente à
existência de comissões estaduais. Ao observar os manuais escolares para o ensino
primário, dos anos 1940 e 19507, constatou-se que eles apresentavam na sua capa, a
autorização da CNLD e, ao mesmo tempo, a autorização da Secretaria de Educação do
estado de São Paulo e do Distrito Federal (na época Rio de Janeiro). No entanto,
diferentemente de Gonçalves que considerou ineficaz a atuação da CNLD, a presente
tese verificou que a CNLD atuou e avaliou livros didáticos durante a sua existência. De
acordo com as analises contidas neste estudo, a função da CNLD se efetivou, ao
conseguir conformar os livros didáticos, por meio da uniformização e padronização de
seus conteúdos e métodos.
O estudo de Ferreira (2008) procurou analisar a política para o livro didático do
Estado Novo, com a formação da Comissão Nacional do Livro Didático. Para esse
estudo, a autora utilizou os documentos encontrados no arquivo Gustavo Capanema, do
CPDOC/FGV. A autora percorreu esses documentos mapeando como Capanema e os
diversos setores sociais atuaram nas políticas para os manuais escolares durante o

7
Foram analisados os livros didáticos da Biblioteca do Livro Didático (BLD), da Faculdade de Educação,
da USP.
11

Estado Novo. Ela observou os discursos oficiais e a elaboração das normas de regulação
da produção e autorização dos livros didáticos. Por restringir-se aos documentos do
CPDOC, a autora não conseguiu verificar como se deu, na prática, a atuação dos
membros da CNLD no processo de avaliação dos manuais. Para a autora, a CNLD não
funcionou e, conseqüentemente, não concretizou os seus objetivos.
O mestrado de Ferreira (2008) trouxe grande contribuição, contudo, no presente
estudo, com o aprofundamento da pesquisa e a análise de outros documentos, além dos
do CPDOC, foi possível constatar que a CNLD avaliou os livros didáticos. Foram
encontrados documentos em outros arquivos, dentre eles as avaliações dos livros
didáticos, que possibilitaram examinar outros aspectos da CNLD, principalmente,
compreender como se deu o processo de análise dos livros didáticos e a influência
dessas análises na constituição das disciplinas escolares. Os documentos permitiram,
ainda, observar os conflitos internos da Comissão e a sua relação com os autores e
editoras.
Krafzik (2006) investigou a organização e funcionamento da Comissão do Livro
Técnico e do Livro Didático (Colted) e sua atuação no convênio MEC/SNEL/USAID. A
autora apresentou os programas da Colted, que compreendiam a distribuição de livros
para as bibliotecas escolares nos três níveis de ensino, para os alunos do ensino primário
e os cursos de treinamento para professores primários. Para a pesquisa a autora utilizou
os documentos localizados no Centro de Informações e Biblioteca em Educação
(Cibec), do Inep, os livros produzidos pela Colted e a legislação do período. O estudo
de Krafzik (2006) centrou-se na descrição da estrutura da Colted, sem o detalhamento
dos sujeitos envolvidos com o processo. Dessa forma a autora não analisou os debates e
conflitos internos da Comissão e não examinou as avaliações dos livros didáticos.
O presente estudo discutiu a estrutura da Colted, procurando detalhar quem fez
parte da Comissão, além de compreender as relações que se estabeleceram entre esses
sujeitos, buscando entender o significado de sua participação para o andamento dos
trabalhos. A localização das avaliações dos livros didáticos para o ensino primário
permitiu apresentar novas análises sobre a Comissão, ao observar como foram
constituídas as comissões de avaliação dos livros didáticos, quem eram os seus
membros, seu lugar de fala e a sua atuação na avaliação dos manuais.
Por fim, cabe ressaltar as pesquisas de Munakata (2002, 2004, 2006), sobre a
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme). O autor desenvolveu os
primeiros estudos sobre a Campanha, com os documentos localizados no Arquivo
12

Central e Histórico do Inep. Munakata procurou compreender os objetivos da criação da


Campanha e centrou sua análise nos documentos que tratavam da produção de guias
para professores do ensino secundário. Esta tese segue seus estudos, ao descrever as
principais atividades realizadas pela Campanha, com base em outros documentos da
Caldeme, também localizados no Arquivo Central e Histórico do Inep. A presente tese
aprofundou a compreensão do processo de análise crítica dos manuais escolares e
programas de ensino secundário, realizados pela Campanha.
A leitura da bibliografia apresentada contribuiu na delimitação do objeto
estudado. Desse modo, durante a pesquisa foram encontrados quatro grandes períodos
relacionados às políticas nacionais para o livro didático, com processos de avaliação
distintos. O primeiro processo centralizado foi instituído durante o Estado Novo, a partir
de 1938, com a Lei n° 1.006/38, que regulamentou a produção, importação e utilização
dos manuais escolares e criou a Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD),
responsável pela avaliação e autorização de uso dos livros. O segundo processo ocorreu
durante os anos 1950, com a criação da Campanha do Livro Didático e Manuais de
Ensino (Caldeme), que buscou analisar os livros didáticos que estavam em circulação
no país e propor a elaboração de novos guias e manuais de ensino para os professores.
O terceiro momento deu-se no início da Ditadura Militar, em 1966, com a
criação da Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático (Colted), que tinha o
objetivo de incentivar, coordenar, orientar e executar as atividades do Ministério da
Educação na política do livro técnico e didático. O último período iniciou-se em 1971,
quando a Colted foi extinta e suas funções passaram para o Instituto Nacional do Livro
(INL), que se tornou responsável pelo Programa do Livro Didático e pelos processos de
co-edição dos manuais, até 1976, momento em que o Programa do Livro Didático foi
transferido para a Fundação Nacional do Material Escolar (Fename). A pesquisa se
encerra, com o fim dos sistema de co-edição, nos anos 1980.
Nesses diferentes períodos, as políticas públicas para o livro didático e a criação
de órgãos responsáveis por essas políticas apresentaram objetivos distintos e as
avaliações foram específicas. A análise da documentação encontrada permitiu
compreender algumas questões sobre o objetivo das avaliações, quem eram os sujeitos
escolhidos para participar das comissões, suas experiências e atuações no âmbito da
educação, como eram realizadas as avaliações e o que pretendiam avaliar, quais as
particularidades de cada processo de avaliação, quais foram as principais mudanças
13

ocorridas ao longo da existência das avaliações, qual a função dos processos de


avaliação no contexto da política educacional.
Compreender a especificidade das políticas para o livro didático que existiram
nos diferentes momentos da história do Brasil, nos deu subsídios para entender a função
dos processos de avaliação nos contextos das políticas educacionais e sociais mais
gerais. Nesse sentido, analisar a história das avaliações dos livros didáticos permitiu
observar as mudanças nos objetivos, conteúdos e métodos de ensino nos distintos
momentos da história da educação no Brasil, e permitiu constatar que as avaliações
legitimavam a inserção nos livros didáticos de determinadas “inovações pedagógicas”,
que refletiam as mudanças ocorridas na sociedade. A análise possibilitou compreender
porque determinados conteúdos e métodos eram retirados dos livros didáticos e quais
eram os novos conteúdos e métodos considerados legítimos.

Acervos e fontes

A documentação do Ministério da Educação está bastante dispersa. Apesar de


possuir um grande arquivo em Brasília, o MEC não tem a política de organizar um
acervo histórico do Ministério. Hoje instalado em Brasília, o MEC já esteve sediado no
Rio de Janeiro, até o os primeiros anos da década de 1960. Por tal motivo, parte da
documentação encontrava-se em arquivos desse estado. Os documentos foram
localizados nos mais diversos arquivos, tanto públicos como particulares. Grande parte
dos documentos estavam em Instituições que se relacionaram com o Ministério da
Educação ao longo da história brasileira. Para contribuir com futuras pesquisas
apresentar-se-á, a seguir, os documentos encontrados em cada arquivo.
A legislação sobre o livro didático e sobre as reformas curriculares foram
encontradas nas revistas Lex e Documenta, todavia, algumas leis e normas anteriores à
existência do Conselho Federal de Educação foram encontradas nos acervos do CPDOC
da Fundação Getúlio Vargas, no Arquivo Central e Histórico do Inep e no Acervo
Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP.
O corpus documental sobre as políticas de avaliação dos livros didáticos no
Estado Novo, foi encontrado nos seguintes acervos:
- Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro: livros sobre o caso Postch - Mello
Leitão;
14

- Acervos do CPDOC/FGV: documentos do Ministério da Educação sobre a


criação da CNLD. Documentos da CNLD até 1945, memorandos, ofícios, cartas;
- Biblioteca do Livro Didático (BLD), da Faculdade de Educação da USP: livro
sobre o caso Postch - Mello Leitão e livros didáticos avaliados pela CNLD;
- Núcleo de Documentação e Memória (NUDOM) - do Colégio Pedro II: quatro
volumes sobre o caso Postch – Mello Leitão e atas da Congregação do colégio
com discussões sobre a CNLD;
- Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro: ofícios da CNLD
encaminhados para o professor Américo Jacobina Lacombe, com lista de livros
didáticos para avaliação em 1947 e 1952;
- Acervo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP: as avaliações dos
livros didáticos da Companhia Editora Nacional;

A documentação da Caldeme foi localizada no Arquivo Central e Histórico do


Inep, em Brasília e no acervo do Centro de Apoio à Pesquisa “Escola e Cultura”8, do
Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: História, Política, Sociedade
(EHPS), da PUC/SP. São ofícios, correspondências, memorandos, anotações, etc. Os
livros publicados pela Caldeme com as análises dos livros didáticos e programas de
ensino de História e Geografia foram encontrados na biblioteca da Faculdade de
Educação da USP e na Biblioteca do Livro Didático (BLD), da Faculdade de Educação
da USP.
Foram analisadas, ainda, duas revistas com publicações de membros do Inep e
da Caldeme, a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) e a revista Escola
Secundária, da Campanha de Difusão e Aperfeiçoamento do Ensino Secundário
(Cades). A biblioteca da PUC/SP possui praticamente todos os números das duas
revistas.
Sobre a Colted e o convênio MEC/SNEL/USAID, os documentos foram
localizados nos seguintes acervos:
- CPDOC/FGV: livro com a legislação sobre a Colted e com os documentos do
convênio com a USAID;
- Arquivo Central e Histórico do Inep, em Brasília: as avaliações dos livros
didáticos, memorandos, ofícios da Diretoria e Presidência do órgão;

8
O Centro de Apoio à Pesquisa “Escola e Cultura” foi despejado em fevereiro de 2009 pela Pró-Reitoria
de Pós-graduação da PUC/SP.
15

- Centro de Memória da Faculdade de Educação, da USP: publicações do


CRPE/SP e matérias de jornais sobre a Colted.
- Programa de Estudos e Documentação Educação Sociedade (Proedes), da
Universidade Federal do Rio de janeiro: publicações da Aliança para o
Progresso e do convênio MEC/SNEL/USAID.

A documentação sobre o INL e a Fename foi encontrada no Acervo Histórico da


Companhia Editora Nacional/IBEP: a “Norma de análise dos livros didáticos do 1o
grau”; as fichas de avaliação dos livros didáticos; as avaliações dos livros da
Companhia Editora Nacional e do IBEP. No Arquivo do MEC, em Brasília foi
localizada parte da legislação sobre a Fename.
As publicações da FAE referentes a política do livro didático foram localizadas
no Centro de Informação e Biblioteca em Educação (Cibec), do Inep, em Brasília.

A estrutura do trabalho

Este estudo foi dividido em quatro capítulos. O primeiro analisa a Comissão


Nacional do Livro Didático (CNLD), criada em 1938, e o processo de avaliação dos
livros didáticos durante o Estado Novo, momento em que se procurava consolidar uma
educação nacional, com a centralização do ensino, a uniformização dos programas
curriculares e a padronização da ortografia oficial. Nesse capítulo se observa que os
avaliadores estavam inseridos nos debates da época, sobre a constituição dos
conhecimentos das disciplinas escolares.
O segundo capítulo discute o papel do livro didático após o Estado Novo, em
um momento de redemocratização política e de crítica ao período anterior, de
centralização. Nesse momento, discutia-se a regionalização e descentralização da
educação, e de divulgação de diferentes propostas para o ensino secundário brasileiro,
que se expandia. Nesse contexto foi criada a Campanha do Livro Didático e Manuais de
Ensino (Caldeme), vinculada ao Inep. A Campanha organizou análises críticas dos
livros didáticos em uso nas escolas e dos programas para o ensino secundário. Procurou,
ainda, elaborar guias para os professores, buscando divulgar novas propostas
educacionais, com ênfase em novas metodologias.
O terceiro capítulo analisa a Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático
(Colted), criada em 1966, para incentivar e regular o mercado de livros didáticos, que
16

cresceu nos anos 1960, em virtude da acelerada expansão da escolarização, tanto


primária como secundária. Com a Colted foi firmado o convênio MEC/USAID/SNEL,
para o financiamento da produção didática. Para avaliar os livros didáticos que seriam
adquiridos no Plano Piloto, de distribuição de livros didáticos aos alunos dos
municípios das capitais, a Colted organizou uma comissão de avaliação composta por
técnicos do Inep e professores dos Institutos de Educação, que analisaram os manuais
de acordo com debates pedagógicos da época.
O quarto capítulo analisa os processos de co-edição de livros didáticos sob
responsabilidade do Instituto Nacional do Livro (INL) e, posteriormente, pela Fundação
Nacional de Material Escolar (Fename). O programa de co-edição começou em 1971,
após a extinção da Colted, em um momento de reforma da educação nacional, com a lei
n. 5.692/71, que modificou a estrutura do ensino básico existente até então. A comissão
de avaliação dos livros didáticos, organizada pelo Departamento de Ensino
Fundamental (DEF) do Ministério da Educação e Cultura, precisava conformar os livros
didáticos à nova organização do ensino e aos novos programas oficiais.
A conclusão da pesquisa faz um balanço dos processos de avaliação dos livros
didáticos nos distintos contextos da história da educação brasileira, sendo duas ditaduras
(Estado Novo e 1964) e um período democrático, nos anos 1950 e início dos anos 1960.
Apresenta, ainda, algumas considerações sobre a atual política do livro didático, o
PNLD.
17

CAPÍTULO I

A COMISSÃO NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO E AS AVALIAÇÕES DOS


MANUAIS ESCOLARES

O presente capítulo analisa o processo de avaliação dos livros didáticos na


Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD), órgão criado em 1938, pelo Ministério
da Educação e Saúde. A Comissão tornou-se responsável pela primeira estrutura oficial
de avaliação nacional e controle dos livros escolares brasileiros9.
A necessidade de elaboração de uma legislação federal para organizar e
controlar os livros didáticos brasileiros e a criação da Comissão Nacional do Livro
Didático inseria-se em um momento de centralização e reorganização política. Com a
nova conjuntura formada a partir da Revolução de 1930, a administração pública foi
reorganizada e a proposta de uma educação nacional começou a ser estruturada. Nesse
sentido, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, em 14 de novembro 1930,
pelo decreto n° 19.402, com a intenção de organizar e centralizar as decisões referentes
à área educacional e da saúde. Em 1931, o Ministro da Educação, Francisco Campos,
promulgou o Decreto n° 19.890, que organizou o ensino secundário brasileiro10, com a
divulgação de novos programas de ensino e instruções metodológicas para todo o país.

9
Diversos arquivos foram consultados em busca de informações sobre a CNLD. Dentre os documentos
relevantes, memorandos, ofícios, cartas e as avaliações dos livros didáticos, destacaram-se os seguintes
acervos: 1. Biblioteca Nacional, livros sobre o caso Postch - Mello Leitão; 2. Arquivo do Centro de
Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC/FGV), material sobre a criação
e atuação da CNLD até 1945; 3. Arquivo Central e Histórico do Inep, material sobre a CNLD após 1945;
4. Biblioteca do Livro Didático (BLD), da FEUSP, livro sobre o caso Postch - Mello Leitão e livros
didáticos avaliados pela CNLD; 5. Núcleo de Documentação e Memória (NUDOM) do Colégio Pedro II,
quatro volumes sobre o caso Postch – Mello Leitão e atas da Congregação com discussões sobre a
CNLD; 6. Fundação Casa de Rui Barbosa, encaminhamento de livros didáticos para avaliação em 1947 e
1952; 7. Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP, avaliações da CNLD nos anos 1940.
Esses documentos foram produzidos pela CNLD, pelo Inep, MES e pelo Sindicato Nacional de Editores
de Livros (SNEL). A legislação do período também foi analisada. Para compreender o pensamento
pedagógico dos avaliadores da CNLD, foram examinados os livros de sua autoria, principalmente
didáticos ou que tratavam da educação.
10
O Decreto n° 19.890 estabeleceu a divisão do secundário em dois ciclos, fundamental e complementar,
organizado por séries. Estabeleceu os estudos regulares, com a freqüência obrigatória das aulas, a
aprovação em todas as disciplinas para promoção à próxima série e organizou um sistema de inspeção
federal dos estabelecimentos de ensino. Foram organizados, ainda, programas de ensino (com os
conteúdos e métodos das disciplinas) para todo o país. A Reforma Francisco Campos pretendia acabar
com a antiga estrutura do secundário, entendida como irregular e sem seriação, e principalmente os cursos
preparatórios para os exames parcelados, em busca de certificados para ingresso nos cursos superiores.
18

A reforma do ensino secundário, pretendia padronizar e regular as escolas oficiais e


particulares11, procurando concretizar a ordenação de um sistema de ensino nacional.
Ampliando a estruturação e centralização da política educacional, a Constituição
de 1934 estabeleceu que a União era responsável por fixar o Plano Nacional de
Educação, bem como coordenar e fiscalizar sua execução (Constituição da República,
16/7/1934. Art. 150, item a). O Plano Nacional deveria ser elaborado pelo Conselho
Nacional de Educação (CNE). A Constituição estabeleceu, ainda, que o ensino primário
integral seria gratuito, com freqüência obrigatória e que o ensino nos estabelecimentos
particulares deveria ser ministrado em idioma pátrio. Pretendia-se uniformizar a
ortografia nacional, baseada no acordo ortográfico entre a Academia Brasileira de
Letras (ABL) e a Academia de Ciências de Lisboa (ACL), aprovado em 11 de junho de
1931. O Decreto n° 20.108, de 15 de junho de 1931, determinava que os
estabelecimentos de ensino deveriam adotar a nova ortografia.
A partir de 1937, com o Estado Novo, a centralização da educação se
intensificou12, buscando efetivar a construção do Estado Nacional13. As escolas
estrangeiras foram definitivamente fechadas e o ensino ministrado em língua portuguesa
tornou-se obrigatório em todos os estabelecimentos de ensino do país. A Constituição
de 10 de novembro de 1937, manteve a centralização da organização do ensino, ao
definir que à União caberia “fixar as bases e determinar os quadros da educação
nacional, traçando as diretrizes a que deve obedecer a formação física, intelectual e
moral da infância e da juventude” (Constituição da República, 10/11/1937. Art. 15, item
IX.). Manteve o ensino primário obrigatório e gratuito, com a ressalva de que seria
exigida uma contribuição mensal, para a caixa escolar, aos menos necessitados.
Com a ampliação e obrigatoriedade do ensino primário, a reforma do ensino
secundário - sua seriação e os novos programas das disciplinas (seus conteúdos e
métodos) -, a obrigatoriedade da ortografia oficial e a o aumento do número de crianças
e jovens nas escolas, a questão do controle dos livros didáticos e de seu mercado passou

11
Na década de 1930, os estabelecimentos particulares eram responsáveis por mais de 75% das
matrículas do ensino secundário (Souza, 2008, p. 151).
12
Em outubro de 1937, foi criada a Seção de Segurança Nacional no Ministério da Educação e Saúde,
pelo Decreto n° 2.036. A Seção deveria articular a relação entre o Ministério da Educação e Saúde, a
Secretaria Geral de Segurança Nacional e os outros Ministério, nos assuntos referentes à educação e
saúde.
13
A educação colaboraria para a construção do Estado Nacional, na organização de uma cultura nacional.
O projeto educacional contribuiria para formação do novo cidadão, nacionalizando a população, por meio
da organização de uma escolarização uniforme, com um conteúdo escolar único a ser transmitido em
todas as escolas, e tornando obrigatória a Língua Portuguesa como idioma pátrio.
19

a ser destacado. As reformas educacionais beneficiaram o mercado editorial de


didáticos, que se expandiu. Entre a segunda metade dos anos 1930 e os anos 1940, o
número de editoras em atividade nos Brasil cresceu 50% (Ática, 1998, p. 80)14. Era
preciso regulamentar e padronizar esse instrumento didático.

A criação da Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) e sua organização15

Em um documento denominado “Livros Escolares: projeto de exposição de


motivos”16, endereçado ao presidente Getúlio Vargas, que acompanhava o primeiro
projeto de decreto-lei regulando a seleção de compêndios para o ensino elementar, o
Ministro da Educação e Saúde Gustavo Capanema discutia a necessidade de se
regulamentar os livros didáticos utilizados nas escolas brasileiras. Segundo o
documento, o livro escolar era o instrumento de maior alcance da educação, pois seguia
o aluno da escola ao lar e exercia função inspiradora e reguladora do trabalho docente
ao interferir na ordem e seriação das lições. Para o ministro, a falta de regulamentação
nacional dos livros escolares fazia com que cada estado estabelecesse o seu critério17.
Essa situação facilitava o uso de maus livros e permitia abusos que deveriam ser

14
As editoras que se destacavam na produção de livros didáticos nos anos 1930 e 1940 eram: a
Companhia Editora Nacional (criada em 1925); a Editora do Brasil (criada em 1943); a Coleção FTD
(criada em 1902); a Companhia Melhoramentos (adquirida pela Weiszflog Irmãos & Cia nos anos 1920);
a Saraiva (antiga Livraria Acadêmica, criada em 1914); e a Francisco Alves (que atuava desde o século
XIX).
15
Em pesquisa de mestrado de Ferreira (2008) analisou os documentos sobre a CNLD arquivados no
Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC). As fontes
apresentadas pela autora também foram citadas e analisadas neste trabalho. Porém, a presente tese buscou
aprofundar a pesquisa sobre a CNLD ao trabalhar não somente com os documentos do CPDOC, mas com
documentos encontrados em outros arquivos, conforme foi indicado no início deste capítulo.
16
O documento “Livros Escolares: projeto de exposição de motivos”, encontrado no arquivo Gustavo
Capanema do CPDOC não apresenta data.
17
Antes da criação da Comissão Nacional do Livro Didático e da centralização da avaliação dos manuais
em âmbito federal, os livros para o ensino primário eram controlados pelos estados. De acordo com
Razzini (2007, p. 24), no estado de São Paulo, que foi pioneiro em expandir o ensino primário para todo o
estado, com programas graduados de ensino e a introdução do método simultâneo, o consumo de livros
didáticos se ampliou e intensificou o crescimento do mercado de livros escolares. Para controlar esse
material, em 1918, o decreto que organizou o programa de ensino de São Paulo, estabeleceu, também, a
criação de uma Comissão Revisora para fiscalizar os manuais didáticos, composta por Américo de
Moura, Antônio Sampaio Dória e Plínio Barreto (Bittencourt, 1990, p. 124). Gonçalves (2005, p. 30)
ressalta que em 1929, o Diretor Geral da Instrução Pública de São Paulo, Amadeu Mendes, teve a
iniciativa de criar novas normas para a aprovação e adoção de livros didáticos para o ensino primário. Em
1933, nova comissão de avaliação do estado foi organizada, composta por Theodoro de Moraes, Antônio
de Almeida Jr., João Batista D. Penna, Noemy M. da Silveira e José Ribeiro Escobar. A comissão atuou
até 1935. Nesse ano, Antônio de Almeida Jr., ao assumir a Diretoria Geral do Departamento de Educação
de São Paulo, criou a seção de livros didáticos, “responsável pela organização de uma comissão de
revisão da literatura didática” (Gonçalves, 2005, p. 2). As cartilhas e livros de leitura continuaram a ser
avaliados pelo governo do estado de São Paulo e por Diretorias de Instrução Pública de outros estados até
1938, quando a avaliação dos manuais foi centralizada pelo governo federal.
20

reprimidos, como a propaganda subversiva, presente nos textos preparados para uso nas
escolas. Ainda, segundo Capanema, o projeto de Decreto-lei era contrário ao livro
único, defendendo a livre iniciativa na produção dos manuais e a livre escolha dos
professores e diretores de escola (Projeto de Exposição de motivos, s/d).
O projeto de decreto-lei possuía apenas sete artigos e pretendia fiscalizar os
manuais de ensino elementar. De acordo com o documento, cada estado formaria uma
comissão para selecionar os livros que seriam adotados nos estabelecimentos de ensino
públicos e particulares. Os compêndios escolhidos seriam submetidos à aprovação de
uma comissão do Ministério da Educação. Em janeiro de 1939 nenhum compêndio
poderia ser adotado nas escolas primárias sem a aprovação do Ministério.
Durante o mês de janeiro de 1938, a Divisão do Ensino Primário e a Divisão de
Ensino Superior do Ministério da Educação encaminharam documentos com sugestões
ao Projeto de Decreto-lei. As sugestões versavam sobre: substituição da palavra classe
por curso, que designaria um nível de ensino (curso primário, curso secundário, etc.),
aos quais se assegurariam compêndios correspondentes; a organização de comissões
para o estudo rápido dos compêndios; prazo suficiente para as editoras e autores
adequarem os livros as novas exigências; normas de encaminhamento das obras para
exame da Comissão; seleção dos livros adotados por meio de lista dos Departamentos
de Educação; observar os compromissos estabelecidos entre o Brasil e outros países
relativos à revisão de livros de História e Geografia18; estender a avaliações para
manuais do ensino secundário; e organização de concursos para incentivar a produção
de novos livros didáticos (Ferreira, 2008, pp. 40-41).
As sugestões das duas Divisões de Ensino foram anexadas a um novo projeto,
que descartava as comissões especiais dos Departamentos de Educação dos estados,
“recorrendo-se a elas apenas quando a comissão do Ministério achasse conveniente o
parecer de técnicos e professores para estudo de pontos considerados obscuros”
(Ferreira, 2008, p. 41). O Ministério da Educação e Saúde tornar-se-ia responsável pela
análise dos manuais escolares, por meio da Comissão do Livro Didático Nacional. O
novo projeto evidenciava quais eram as questões centrais na política do livro didático
18
Em 1933, o Brasil assinou dois convênios para a análise dos manuais de ensino de História e Geografia
com a Argentina e com o México, respectivamente em 10 de outubro de 1933 e 28 de dezembro de 1933.
Os convênios eram fruto das discussões do período sobre a necessidade de cooperação internacional entre
as nações. Ambos decorrem da participação desses países no I Congresso de História Nacional, realizado
em Montevidéu, no ano de 1928. As comissões de revisão dos manuais adotados para o ensino de
História Nacional e Geografia dos três países deveriam expurgar dos livros os tópicos que servissem para
excitar nos jovens a aversão a qualquer povo americano, além de atualizar os manuais sobre as riquezas e
capacidade de produção dos Estados americanos.
21

elaborada por Capanema: “a livre iniciativa de produção e escolha dos materiais pelos
professores, o controle ideológico e metodológico das matérias e as penalidades da lei
sobre autores, editores e escolas que não cumprissem os dispositivos estabelecidos pelo
Decreto” (Ferreira, 2008, p. 42).
O Decreto-lei foi promulgado oficialmente em 30 de dezembro de 1938, sob n°
1.006, estabelecendo as condições de produção, importação e utilização do livro
didático. Segundo o decreto-lei, livros didáticos eram os compêndios e os livros de
leituras de classe. Os compêndios eram os livros que expunham total ou parcialmente a
matéria das disciplinas constantes dos programas escolares. Os livros de leitura de
classe eram os livros usados para leitura dos alunos em aula.
O Decreto-lei criou a Comissão Nacional do Livro Didático, vinculada ao
Ministério de Educação e Saúde, encarregada, entre outras funções, de autorizar o uso
dos livros didáticos que deveriam ser adotados no ensino das escolas pré-primárias,
primárias, normais, profissionais e secundárias de toda a República (escolas públicas e
privadas). A CNLD deveria:

a) examinar os livros didáticos que lhe forem apresentados, e proferir


julgamento favorável ou contrário à autorização de seu uso;
b) estimular a produção e orientar a importação de livros didáticos;
c) indicar os livros didáticos estrangeiros de notável valor, que mereçam ser
traduzidos e editados pelos poderes públicos, bem como sugerir-lhes a
abertura de concurso para a produção de determinadas espécies de livros
didáticos de sensível necessidade e ainda não existentes no país;
d) promover, periodicamente, a organização de exposições nacionais dos
livros didáticos cujo uso tenha sido autorizado na forma desta lei (Decreto-lei
n° 1006/38).

A CNLD deveria ser integrada por sete membros, designados pelo Presidente da
República, escolhidos dentre “pessoas de notório preparo pedagógico e reconhecimento
moral” (Decreto-Lei n° 1.006/38), divididos em especializações: duas especializadas em
metodologia das línguas, três em metodologia das ciências e duas em metodologia das
técnicas. Os membros da comissão não poderiam ter nenhuma ligação de caráter
comercial com qualquer casa editorial do país ou estrangeira. Em 1939, devido ao
grande volume de livros inscritos pelas editoras, o número de membros da Comissão
aumentou para dezesseis, por meio do decreto-lei n° 1.177. A CNLD possuiria,
também, uma secretaria encarregada do expediente administrativo.
Segundo o Decreto-Lei n° 1.006/38, a CNLD somente avaliaria os livros
didáticos, ficando a cargo dos professores e diretores das escolas a escolha dos livros
22

para uso dos alunos, contanto que constassem da relação oficial das obras autorizadas.
Após a seleção, o professor estaria livre para escolher o processo de utilização do livro
adotado, observando a orientação didática dos programas curriculares.
Os autores e as editoras interessados na autorização de seus livros didáticos
deveriam encaminhar uma petição ao Ministro da Educação, juntamente com três
exemplares da obra, impressos ou datilografados. Se fossem enviados exemplares
datilografados, deveriam ser acompanhados de via com desenhos, mapas, etc.
De acordo com o decreto-lei n° 1.006/38, os membros da CNLD não poderiam
requerer autorização para uso de obras de sua própria autoria. Esse artigo foi
modificado logo em seguida, em julho de 1939, com o decreto-lei n° 1.417, que
revogou tal item e permitiu a autorização de livros didáticos cuja autoria fosse de algum
membro da CNLD:

Art. 2°. A autorização para uso do livro didático, cuja autoria seja no todo ou
em parte de algum membro da Comissão Nacional do Livro Didático, será
requerida ao Ministro da Educação, com observância do disposto no art. 12
do Decreto-lei n° 1.006, de 30 de dezembro de 1938. Recebido o livro,
submetê-lo-á o Ministro da Educação ao exame de uma comissão especial de
três ou cinco membros, por ele escolhidos dentre especialistas estranhos à
Comissão Nacional do Livro Didático (Decreto/lei n° 1.417/39).19

De acordo com o decreto-lei n° 1.006/38, a CNLD realizaria o julgamento da


obra, “mencionando os motivos precisos da decisão e concluindo pela ourtoga ou recusa
da autorização de seu uso”. A Comissão poderia indicar modificações a serem feitas nos
textos dos livros examinados, para que fosse possível sua autorização. A obra, depois de
modificada, deveria ser novamente submetida a exame da CNLD, para decisão final.
Para análise mais detalhada de manuais de determinadas matérias, a CNLD poderia
solicitar o parecer de especialistas. As obras com pareceres não unânimes seriam

19
As comissões especiais foram indicadas em fevereiro de 1941 e estavam compostas por:
Línguas e Literatura – José Lourenço dos Santos (Instituto de Educação), Geyza Calaza (Diretora da
Escola Paulo Frontin), Floriano Ribeiro de Queiroz (professor do município do Rio de Janeiro);
Matemática e Desenho – Antonio Pereira Caldas (Instituto de Educação), Roberto Peixoto (Instituto de
Educação), Arsilio Papini (Externato Santo Inácio);
Ciências Físicas e Naturais – Djalma Régis Bittencourt (Colégio Militar), Maria Luiza Hussak (Instituto
de Educação), Fernando da Silveira (Instituto de Educação);
Geografia – Vitor Ribeiro Leuzinger (Faculdade Nacional de Filosofia), Joel Marques Braga, Oscar
Tenório (Faculdade de Direito do Distrito Federal);
História da Civilização e do Brasil – Roberto Bandeira Acióli (Colégio Pedro II), Américo Jacobina
Lacombe (Casa Rui Barbosa), Eugênio Vilhena de Morais (Arquivo Nacional);
Filosofia, Sociologia e Pedagogia – Vitor Ribeiro Leuzinger (Faculdade Nacional de Filosofia), Américo
Jacobina Lacombe e Ersílio Papini (Fonte: Arquivo Gustavo Capanema do CPDOC/FGV).
23

encaminhadas ao Ministro da Educação, que tomaria sua decisão após ouvir o Conselho
Nacional de Educação (CNE).
Os livros didáticos autorizados receberiam um número de registro, que
apareceria na capa, juntamente com a frase: “livro de uso autorizado pelo Ministério da
Educação”. A reedição de livros didáticos autorizados que não possuíssem grandes
alterações não precisava passar por nova avaliação, mas a reedição deveria ser
comunicada à CNLD. Em janeiro de cada ano, o Ministério da Educação publicaria no
Diário Oficial a relação de livros didáticos de uso autorizado.
Os critérios de eliminação dos livros didáticos estavam divididos em duas partes.
A primeira, sobre as preocupações político-ideológicas, visando à construção de uma
identidade nacional, compreendia os seguintes itens:

Art. 20. Não poderá ser autorizado o uso do livro didático:


a) que atente, de qualquer forma, contra a unidade, a independência ou a
honra nacional;
b) que contenha, de modo explícito, ou implícito, pregação ideológica ou
indicação da violência contra o regime político adotado pela Nação;
c) que envolva qualquer ofensa ao Chefe da Nação, ou às autoridades
constituídas, ao Exército, à Marinha, ou às demais instituições nacionais;
d) que despreze ou escureça as tradições nacionais, ou tente deslustrar as
figuras dos que se bateram ou se sacrificaram pela pátria;
e) que encerre qualquer afirmação ou sugestão, que induza o pessimismo
quanto ao poder e ao destino da raça brasileira;
f) que inspire o sentimento da superioridade ou inferioridade do homem de
uma região do país, com relação ao das demais regiões;
g) que incite ódio contra as raças e as nações estrangeiras;
h) que desperte ou alimente a oposição e a luta entre as classes sociais;
i) que procure negar ou destruir o sentimento religioso, ou envolve combate
a qualquer confissão religiosa;
j) que atente contra a família, ou pregue ou insinue contra a
indissolubilidade dos vínculos conjugais;
k) que inspire o desamor à virtude, induza o sentimento da inutilidade ou
desnecessidade do esforço individual, ou combata as legítimas
prerrogativas a personalidade humana. (Decreto-Lei n° 1.006/38, p. 4).

Os critérios de eliminação procuravam estabelecer regras que fortalecessem a


idéia de unidade – do Estado e da Nação -, com a defesa das tradições nacionais, da
família, da religião e contra a luta das classes sociais. Tais orientações expõem a
influência das idéias defendidas na época, em especial pelas Forças Armadas20 e pela
Igreja Católica21, na política do livro escolar.

20
A participação das Forças Armadas nas discussões educacionais reforçava o projeto da escola para
formação cívica dos jovens. De acordo com Baía Horta (1994), o conceito de segurança nacional,
colocado a partir de 1934, introduziu como temas centrais a preparação moral e a preparação militar dos
24

A segunda parte envolvia questões pedagógicas, didáticas e metodológicas,


conceituais - relacionadas às áreas do conhecimento -, além de questões gráficas e
mercadológicas:

Art. 21. Será ainda negada autorização de uso ao livro didático:


a) que esteja escrito em linguagem defeituosa, quer pela incorreção
gramatical, quer pelo inconveniente ou abusivo emprego de termos ou
expressões regionais ou da gíria, quer pela obscuridade do estilo;
b) que apresente o assunto com erros da natureza científica ou técnica;
c) que esteja redigido de maneira inadequada, pela violação dos preceitos
fundamentais da pedagogia ou pela inobservância das normas didáticas
oficialmente adotadas, ou que esteja impresso em desacordo com os
preceitos essenciais da higiene da visão;
d) que não traga por extenso o nome do autor ou autores;
e) que não contenha a declaração do preço de venda, o qual não poderá ser
excessivo em face do seu custo.
Art. 22. Não se concederá autorização, para uso no ensino primário, de
livros didáticos que não estejam escritos na língua nacional.
Art. 23. Não será autorizado uso do livro didático que, escrito em língua
nacional, não adote a ortografia estabelecida pela lei (Decreto-Lei n°
1.006/38, pp. 4-5).

Os critérios pedagógicos procuravam regulamentar e padronizar os conteúdos e


métodos dos livros didáticos, ao exigir que seguissem “as normas didáticas oficialmente
adotadas”, que eram os Programas de Ensino e as instruções metodológicas publicados
em 30 de junho de 1931, em complemento ao Decreto n° 19.890/31, que regulamentou
a organização do ensino secundário. Buscavam, ainda, uniformizar a ortografia nacional
segundo o acordo ortográfico de 1931. Em 23 de fevereiro de 1938, o Decreto-lei n°

cidadãos. Com a implantação do Estado Novo a atuação das Forças Armadas se intensificou. O
fortalecimento da raça, a formação para o trabalho, a preocupação com a segurança nacional e a defesa
dos valores nacionais, segundo o autor, eram argumentos utilizados pelos defensores do regime
autoritário (Baía Horta, 1994, p. 52).
21
A Igreja esteve presente nas discussões educacionais durante o Estado Novo, visando “trabalhar para
que ‘os princípios básicos da ordem social cristã’ voltassem a orientar a constituição política do país”
(Baía Horta, 1994, p. 98). Até 1932, católicos participavam das discussões educacionais na Associação
Brasileira de Educação (ABE). As discordâncias entre católicos e os reformadores do ensino, adeptos do
movimento da Escola Nova, tornaram-se explícitas na IV Conferência Nacional de Educação, em 1931.
Em 1932, após a divulgação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que defendia a escola
pública, gratuita, laica, obrigatória, comum e única para todas as crianças de 7 a 15 anos, o grupo católico
saiu definitivamente da ABE. Com saída do grupo católico da ABE, o Centro Dom Vital e a
Confederação Católica Brasileira de Educação (criada em 1934), tornaram-se importantes espaços de
discussão dos intelectuais vinculados à Igreja. A Igreja Católica passou a se posicionar de modo mais
agressivo a partir de 1935, após os levantes comunistas organizados pela Aliança Nacional Libertadora
(organizada pelo PCB e tenentes de esquerda). Em 1936, Alceu Amoroso Lima foi indicado pelo
Ministério da Educação para fazer parte, em conjunto com a Comissão Executora do Estado de Guerra, da
Comissão Nacional de Repressão ao Comunismo, que segundo Baía Horta, havia solicitado a prisão de
Anísio Teixeira (então diretor do Departamento Municipal de Educação do Distrito Federal) e o
afastamento de professores da Universidade do Distrito Federal (Baía Horta, 1994, p. 39).
25

292, regulamentou o uso da ortografia nacional, tornando obrigatório o seu uso “no
expediente das repartições públicas oficiais de todo o país, bem como em todos os
estabelecimentos de ensino, mantidos pelos poderes públicos ou por eles fiscalizados”
(Decreto-lei n° 292/38). Não seria permitido, a partir de 1 de janeiro de 1941, livros
didáticos escritos em ortografia diferente da nacional22.

Os membros da Comissão Nacional do Livro Didático

Para compreender a escolha dos membros que fariam parte da CNLD é preciso
entender, o ambiente e a rede de sociabilidades que se estabeleceu em torno do Ministro
da Educação e Saúde Gustavo Capanema, que permaneceu no cargo por onze anos – de
1934 a 194523 -, e que congregou um importante grupo de intelectuais de diferentes
posicionamentos: “Gustavo Capanema cercou-se de um ampla rede de relações oriundas
de sua trajetória intelectual e política para compor o quadro de colaboradores e
funcionários do Ministério” (Ferreira, 2008, p. 47). Participavam das discussões
educacionais pessoas vinculadas a diferentes grupos da sociedade. Desse modo,
Gustavo Capanema reuniu no Ministério da Educação e Saúde, membros das Forças
Armadas, da Igreja e um importante grupo de intelectuais e educadores que
participaram dos debates políticos e educacionais e das reformas de ensino dos anos
192024. Educadores que participavam da Associação Brasileira de Educação (ABE)25,

22
A discussão sobre a ortografia nacional não se encerrou em 1938, pois o novo vocabulário ortográfico
não seria publicado nos anos seguintes. Em 1943, o Decreto-Lei n. 5.186 regulou sobre o uso da
ortografia em todo o país. Como o vocabulário oficial estava em elaboração pela ABL e pela ACL,
deveria ser utilizado, até sua efetivação, o “Vocabulário Ortográfico e Ortoépico da Língua Portuguesa”,
publicado em 1932. A Convenção Ortográfica entre o Brasil e Portugal foi promulgada em 18/1/1944,
pelo Decreto n. 14.533.
23
Durante sua gestão, Capanema organizou reformas administrativas no Ministério ampliando sua
atuação. Dentre outras medidas, colocou o Serviço de Radiodifusão Educativa e o Instituto Nacional de
Cinema Educativo sob responsabilidade do MES, reestruturou o Conselho Nacional de Educação, criou o
Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep), a Universidade do Brasil, a Faculdade Nacional de
Filosofia e a Escola Nacional de Educação Física e Desportos. Criou, ainda, o Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o Serviço Nacional do Teatro, a Comissão Nacional do Livro
Infantil e o Instituto Nacional do Livro (INL) (Baía Horta, 2002, p. 426).
24
Na década de 1920, muitos estados e o Distrito Federal promulgaram reformas educacionais com
ênfase no ensino primário A reforma do Distrito Federal (1929) foi realizada por Fernando de Azevedo.
Outros estados que realizaram reformas foram: São Paulo (1920), por Sampaio Doria; Bahia (1925), por
Anísio Teixeira; Ceará (1923), por Lourenço Filho; Minhas Gerais (1927), por Francisco Campos;
Pernambuco (1929), por Carneiro Leão, etc. Essas reformas ficaram conhecidas por se orientar pelo
movimento da Escola Nova e da pedagogia moderna, que vinha sendo debatida pelos educadores na ABE
e que propunha a reformulação das instituições escolares, com novas discussões sobre os objetivos da
educação escolar. O ensino das escolas primárias deveria ultrapassar o básico - ler, escrever, contar -, e
formar o novo cidadão, “construtor de um ‘novo’ país” (Bittencourt, 1990, p. 95).
26

professores do Colégio Pedro II e dos Institutos de Educação, tiveram importantes


participações nesse momento, como Carlos Delgado de Carvalho, Antônio Carneiro
Leão, Cândido de Mello Leitão, Jonathas Serrano, Euclides Roxo, entre outros.
Para a escolha dos membros da CNLD, Capanema elaborou uma lista de
candidatos, com 65 nomes de intelectuais da área educacional, de acordo com a
instituição de origem e as disciplinas que ministravam: Português, Literatura, Latim,
Francês, Inglês, Filosofia, História do Brasil, História da Civilização, Sociologia,
Psicologia, Lógica, Geografia, Desenho, Matemática, Física, Química, História Natural,
Ensino Industrial, Ensino Comercial e Música. É interessante observar nas anotações de
Capanema, a descrição da atuação dos candidatos: se eram autores de manuais
didáticos, se eram professores em exercício ou aposentados, o estado de saúde, a vida
política do candidato26, etc. A lista apresentava nomes de importantes intelectuais da
época, principalmente professores do Colégio Pedro II27, que era a escola modelo de
ensino secundário. Apresentava, também, professores de outras escolas tradicionais,
como a Escola Nacional de Engenharia, o Instituto de Educação do Distrito Federal, o
Colégio Militar e a Escola Naval.
Um segundo momento de seleção dos candidatos foi a elaboração por Capanema
de três listas – de primeira a terceira opções -, com os nomes de sua preferência. Para
Ferreira (2008, p. 58), a observação dos vários rascunhos escritos pelo Ministro, com
nomes de possíveis membros da CNLD, evidenciava sua dificuldade para compor a
Comissão com o número indicado pelo Decreto-Lei n° 1006/38. O processo de escolha
perdurou todo o ano de 1939. Durante esse ano, setores militares corresponderam-se
com Capanema, indicando nomes para compor a CNLD, como foi o caso do Coronel
Waldemar Pereira Cotta e do Comandante Armando Pinna.
Entre 1939 e 1940, tomaram posse os membros da CNLD:

25
A Associação Brasileira de Educação (ABE) foi criada em 1924. Segundo Carvalho, em seu estatuto, a
ABE apresentava os seguintes objetivos pedagógicos: “promover no Brasil a difusão e o aperfeiçoamento
da educação em todos os ramos e cooperar em todas as iniciativas que tendam, direta ou indiretamente, a
esse objetivo” (1998, pp. 54-55). Contudo, Carvalho enfatiza que os propósitos educacionais da ABE
vinculavam-se a “um programa de reordenação político-jurídica do país” (1998, p. 55). Mais detalhes
sobre a ABE ver: Carvalho, 1998.
26
Um exemplo que estava presente na lista é o nome de José Oiticica. Capanema observava que a polícia
considerava-o anarquista.
27
O Colégio Pedro II, criado em 1837, foi o primeiro colégio oficial de instrução secundária do Brasil.
Era público, federal e considerada a escola modelo do Ensino Secundário, a principal referência desse
nível de ensino
27

» Abgar Renault
» Euclides de Medeiros Guimarães Roxo
» Coronel Waldemar Pereira Cotta
» Padre Leonel Franca
» Álvaro Ferdinando de Souza da Silveira
» Coronel Alonso de Oliveira
» Comandante Armando Pinna
» Jonathas Archanjo da Silveira Serrano
» Maria Junqueira Schmidt
» Carlos Delgado de Carvalho
» Antônio Carneiro Leão
» Rodolfo Fuchs
» Hahnemann Guimarães
» Cândido Firmino de Mello Leitão
» João Batista Pecegueiro do Amaral
» Adalberto Menezes de Oliveira (Marinha)
» José de Melo Moraes28
(Fonte: arquivo do CPDOC/FGV).

E quem eram esses especialistas indicados para a avaliação?29

Abgar Renault era Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Minas


Gerais. Na época estudou com Gustavo Capanema. Era escritor, poeta, tradutor e
participou do movimento modernista mineiro30. Foi professor de Inglês e Literatura no
Ginásio Mineiro e de Português na Escola Normal Modelo de Belo Horizonte. Foi para
o Rio de Janeiro em 1930 ser secretário do Ministério da Educação e Saúde. Em 1935
tornou-se assistente do Secretário de Educação do Distrito Federal. Era professor
Catedrático do Colégio Pedro II, professor de Literatura Inglesa na Universidade do
Distrito Federal, na Faculdade de Filosofia do Instituto Lafayette e na Faculdade de
Filosofia Santa Úrsula. Em 1938, foi nomeado diretor do Departamento Nacional de
Educação (DNE) e, organizou e dirigiu o Colégio Universitário da Universidade do
Brasil (Peixoto, 2002, pp. 27-29). Em 1942, colaboraria na elaboração dos programas
para o curso ginasial na Reforma Capanema.

28
Não chegou a tomar posse, sendo substituído por Rui da Cruz Almeida.
29
As informações referentes aos membros da CNLD foram encontradas em mídias digitais, tais como:
CPDOC - http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx, acesso em 20/11/2010; e
ABE - http://www.abe1924.org.br, acesso em 20/11/2010. Foram utilizadas informações de livros dos
próprios educadores, pertencentes a CNLD, e outras obras que trouxeram esse educadores como objeto.
Ferreira (2008); Freitas (2010); Peixoto (2002); Sório (2004); Guerra (2008); Mendonça (2002); Carvalho
(1998).
30
De acordo com Peixoto (2002), Abgar Renault, participou do movimento modernista mineiro ao lado
de “Carlos Drummond de Andrade, Emílio Moura, Mário Casasanta, Milton Campos, Cyro dos Anjos,
Aníbal Machado, Alphonsus de Guimarães Filho, Murilo Mendes e outros” (p. 28).
28

Álvaro Ferdinando de Souza da Silveira era Engenheiro Geógrafo e Civil, e


bacharel em Letras pelo Colégio Pedro II. Foi professor de Português na Escola Normal
e no ensino secundário oficial. Em 1935, tornou-se professor da Universidade do
Distrito Federal e, em 1939, tornou-se Catedrático de Língua Portuguesa na Faculdade
Nacional de Filosofia, da Universidade do Brasil. Em 1942, seria um dos elaboradores
do Programa de Português para o curso ginasial, da Reforma Capanema.
Adalberto Menezes de Oliveira (Oficial da Marinha Brasileira) era Engenheiro
Eletricista formado na Bélgica, com atuação na área de Ciências Físico-Químicas
(Ferreira, 2008, p. 64). Em 1929, tornou-se diretor da revista Sciencia e Educação. Foi
um dos fundadores e presidente (em 1937) da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e
tornou-se diretor da ABE, em 1933. Era professor catedrático de Eletricidade da Escola
Naval e professor da Escola Normal do Distrito Federal. Publicou os livros Licções de
Eletricidade, pela Escola Naval, de 1915 e Manual de Trabalhos de Física, pela F.
Briguiet, de 1933.
Antônio Carneiro Leão era Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela
Faculdade de Direito do Recife. Foi professor de Filosofia na Universidade do Recife e
Diretor de Instrução Pública no Rio de Janeiro, entre 1922 e 1926. Atuou intensamente
nas discussões educacionais dos anos 1920, como membro da ABE e realizou, em 1928,
a reforma da educação em Pernambuco, baseada no movimento da Escola Nova. Foi
professor de Francês do Colégio Pedro II, de 1932 a 1937. Em 1934, tornou-se diretor
do Instituto de Pesquisas Educacionais. Foi professor de Sociologia na Universidade do
Distrito Federal. Era professor de Administração Escolar e Educação Comparada na
Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil e de Administração Escolar
no Instituto de Educação do Distrito Federal. Como autor, possuía grande número de
livros para formação de professores. Dentre suas obras destacavam-se: O Brasil e a
educação popular, pelo Jornal do Commercio, de 1918; Problemas de Educação, pela
A. J. Castilho, de 1919; O Ensino das Línguas Vivas, de 1935, pela Série Atualidades
Pedagógicas da Cia. Nacional; Tendências e diretrizes da Escola Secundária, de 1935,
pelo Jornal do Commercio; Introdução à Administração Escolar, pela Série Atualidades
Pedagógicas da Cia. Nacional, de 1939.
Cândido Firmino de Mello Leitão era Médico formado pela Faculdade de
Medicina do Distrito Federal. Em 1913, tornou-se professor de Zoologia na Escola
Superior de Agricultura e Medicina Veterinária em Piraí, no Rio de Janeiro. Participou
da fundação e foi um dos presidentes da ABE e membro da Academia Brasileira de
29

Ciências. Em 1931, tornou-se Diretor de Zoologia no Museu Nacional. Era Autor de


diversos livros para cursos de faculdade e de livros didáticos da área das Ciências
Naturais, como Zoologia e Biologia. Em 1941, faria parte do corpo docente da
Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. Iria participar, em 1942, da
elaboração dos programas de Ciências Físicas e Naturais para o curso ginasial, na
Reforma Capanema. Algumas de suas publicações eram: Elementos de Zoologia, pela
Francisco Alves, de 1917; Noções de Biologia Geral, pela Francisco Alves, de 1930;
Compêndio de Zoologia e Compêndio de Botânica, pela Francisco Alves, de 1924;
Curso Elementar de História Natural, volumes I e II, de 1933, pela série Livros
Didáticos da Coleção Biblioteca Pedagógica Brasileira, da Cia. Nacional; Visitantes do
Império, de 1934; A Biologia no Brasil, O Brasil visto pelos Ingleses e Zoogeografia do
Brasil, de 1937, todos pela série Brasiliana, da Coleção Biblioteca Pedagógica
Brasileira, da Cia. Nacional. A partir dos anos 1940 continuaria a publicar livros
didáticos pela Cia. Nacional, como a obra Compêndio Brasileiro de Biologia, de 1942.
Carlos Delgado de Carvalho cursou Direito pela Universidade de Lausanne,
obteve o diploma de Enseignement Secondaire Classique pelo Colégio dos
Dominicanos São Tomás de Aquino, em Lyon e tornou-se Doutor em Ciências Políticas
pela École de Sciences Politiques de Paris (Guerra, 2008, p. 1). Era catedrático de
Inglês no Colégio Pedro II e, posteriormente, das cadeiras de Geografia e Sociologia.
Em 1931, tornou-se vice-diretor do Colégio Pedro II. Foi um dos fundadores, presidente
e membro ativo da ABE nos anos 1920. Foi um dos signatários do Manifesto de 193231.
Em 1923 tornou-se professor de Sociologia do Instituto de Educação do Distrito
Federal. Era professor de História Moderna e Contemporânea na Universidade do
Distrito Federal e era membro do CNE. A partir de 1939, foi nomeado professor da
Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade do Brasil. Fazia parte, desde o início,
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 1942, participaria da

31
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova foi lançado em 1932 e assinado por educadores que
participaram das discussões educacionais e das reformas de ensino dos anos 1920. Dentre os signatários
destacavam-se Anísio Teixeira, Delgado de Carvalho, Fernando de Azevedo, Afrânio Peixoto, A. de
Sampaio Doria, Lourenço Filho, Mario Casasanta, A. Ferreira de Almeida Jr., entre outros. O Manifesto
explicitava questões debatidas por esses educadores, em busca de um movimento de renovação
educacional, que situava a Escola Nova como uma reação contra a velha estrutura do serviço educacional,
considerado artificial e verbalista. O Manifesto propunha uma educação com “espírito filosófico e
científico”, com métodos baseados na investigação científica. Dentre suas propostas, o Manifesto rompia
com os educadores católicos, ao propor uma escola pública, gratuita, laica, obrigatória, comum e única
para todas as crianças de 7 a 15 anos. Estabelecia a necessidade de descentralização da educação
brasileira e uma nova proposta pedagógica, em que o eixo da escola seria a criança e o respeito pela sua
personalidade.
30

preparação dos programas de ensino do curso ginasial na reforma Capanema. Era autor
de manuais didáticos de Geografia e História e manuais para professores. Alguns de
seus livros didáticos eram: Geographia do Brasil, pela Francisco Alves, de 1913;
Chorographia do Districto Federal, pela Francisco Alves, de 1926; Geografia Humana,
Política e Econômica, pela Cia. Nacional, de 1934; E livros para formação de
professores: Sociologia Educacional, pela Série Atualidades Pedagógicas da Cia.
Nacional, de 1933; Sociologia e Educação, pela Editora Guanabara, de 1934. A partir
dos anos 1940 passaria a publicar livros didáticos pela Cia. Nacional, tais como:
Geografia Física e Humana, de 1940; Geografia Regional do Brasil, de 1943; História
Antiga e Medieval, de 1945; História Moderna e Contemporânea, de 1946; Súmulas de
História Colegial, de 1947; Súmulas de História ginasial, de 1949.
Euclides Guimarães Roxo era Bacharel pelo Colégio Pedro II e formado em
Engenharia Civil pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Tornou-se professor do
Colégio Pedro II, em 1915. Foi membro do Conselho Diretor da ABE, de 1929 a 1931 e
fez parte da comissão de ensino secundário da Associação (Sório, 2004, p. 39). Entre
1925 e 1935 foi diretor do Colégio Pedro II. Era professor do Instituto de Educação do
Distrito Federal. Organizou a reforma do programa de Matemáticas do Colégio Pedro
II32 e participou da elaboração do programa de ensino de Matemática e suas orientações
didáticas na Reforma do Ensino Secundário, de 1931. Em 1937, tornou-se diretor do
Departamento de Ensino Secundário do Ministério da Educação e Saúde. Participaria,
em 1942, da comissão de elaboração dos programas para o curso ginasial, na reforma do
ensino Secundário. Roxo era, ainda, autor de livros didáticos de Matemática para o
ensino básico e manuais para formação de professores. Alguns de seus livros eram:
Lições de Arithmetica, Livraria Francisco Alves, de 1922; coleção – Curso de
matemática, com os profs. Mello e Souza e Cecil Thiré, pela Francisco Alves, de 1923;
Mathematica Elementar, pela Livraria Francisco Alves, de 1929; Curso de Matemática
Elementar, pela Livraria Francisco Alves, de 1929; A Matemática na Educação
Secundária, pela Série Atualidades Pedagógicas, da Cia. Nacional, de 1937.
Hahnemann Guimarães formou-se Bacharel em Direito pela Faculdade de
Direito do Distrito Federal. Era professor Catedrático de Latim no Colégio Pedro II e

32
De acordo com Valente (2003) Euclides Roxo fez parte do movimento modernizador do ensino de
Matemática nos anos 1920. Tendo como base esse movimento, participou da organização do programa de
ensino do 1o ano do Colégio Pedro II, que unificou os conteúdos de aritmética, álgebra e geometria, em
uma única disciplina com o título de “Matemática” (p. 242). Seu livro didático Curso de Matemática, de
1929, foi muito elogiado e divulgado, considerado um grande empreendimento para efetivar a proposta de
renovação do ensino de Matemática no Brasil (Valente, 2003, p. 243).
31

professor Catedrático de Direito Romano e Civil na Universidade do Brasil. Foi


representante do Brasil, em 1937, na Conferência Internacional de Ensino Superior, em
Paris. Entre 1941 e 1945 seria Consultor Geral da República;
João Batista Pecegueiro do Amaral era médico, professor da Faculdade
Fluminense de Medicina. Foi professor do Instituto de Educação do Distrito Federal e
seu diretor interino em 1938. Era autor de livros didáticos de Ciências Físicas e
Naturais. Em 1942, faria parte da comissão para elaboração dos programas do curso
ginasial, de acordo com a Lei Orgânica do Ensino Secundário. Produziu o livro
Química, pela Francisco Alves. A partir de 1941, publicaria os seguintes livros
didáticos: Compêndio de Química, de 1941; Noções de Ciências Naturais, com Mello
Leitão, de 1942, ambos pela Cia. Nacional.
Jonathas Serrano era Bacharel pelo Colégio Pedro II e Bacharel em Direito pela
Faculdade de Direito do Distrito Federal. Era professor da Cadeira de História Universal
do Colégio Pedro II, membro do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro (IHGB), da
ABE e do CNE. Participou do movimento da Escola Nova nos anos 1920, mas era,
também, militante católico. Foi sub-diretor de Instrução Pública e diretor do Instituto de
Educação do Distrito Federal. Participaria da reforma do ensino de História na
elaboração da lei Orgânica do Ensino Secundário, de 1942. Era um importante autor de
livros didáticos de História para o ensino secundário, referência para outros autores, e
escrevia manuais para cursos de formação de professores. Os principais livros didáticos
eram: Epítome de História Universal, pela Francisco Alves, de 1912; História do
Brasil, pela Briguiet, de 1929; Epítome de História do Brasil, pela Briguiet, de 1933;
História da Civilização, pela Briguiet, de 1935. Dentre suas obras para professores
destacavam-se: Metodologia da História na aula primária, pela Francisco Alves, de
1917; Cinema e educação, pela Melhoramentos, de 1931; A Escola Nova, pela Schmidt,
de 1932; Como se ensina História, pela Melhoramentos, de 1935.
Padre Leonel Franca era jesuíta e um destacado educador católico. Foi professor
do Colégio Santo Inácio no Rio de Janeiro e no Colégio Anchieta em Nova Friburgo.
Era um membro influente do Centro Dom Vital, exercendo a função de assistente
Eclesiástico. Era assistente eclesiástico, ainda, da Associação dos Professores Católicos
do Distrito Federal. Segundo Mendonça (2002, p. 696), o Padre Leonel Franca teve
atuação determinante na defesa da obrigatoriedade do ensino religioso nas escolas
públicas, “tendo colaborado decisivamente para a aprovação do Decreto n. 19.941, de
30 de abril de 1931”. A partir de 1934, passou a atuar na Confederação Católica
32

Brasileira de Educação. Era membro do Conselho Nacional de Educação (CNE). Foi


conselheiro de Dom Sebastião Leme na organização da Liga Eleitoral Católica e
redigiu, junto com Alceu Amoroso Lima, o memorial “Reivindicações Católicas”, que
tornaram-se o programa de ação da Liga (Mendonça, 2002, p. 697). Colaboraria na
elaboração da proposta de criação da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de
Janeiro e tornar-se-ia seu primeiro Reitor. Sua principal obra na área da educação
religiosa foi o livro Ensino Leigo, Ensino Religioso, publicado em 1931, que defendia o
ensino religioso, relacionando-o diretamente à educação.
Maria Junqueira Schmidt era professora e pedagoga católica. Tornou-se sócia da
ABE em 1927. Era uma educadora conhecida no estudo de métodos para o ensino da
língua francesa, tendo iniciado o ensino dessa língua pelo método direto. Ministrava
aulas de francês no ensino secundário do Rio de Janeiro. Participava das discussões
sobre ensino primário e secundário, sobre a educação moral e cívica e a educação
religiosa. Em 1942, faria parte da comissão de elaboração dos programas para o curso
ginasial da reforma Capanema. Tornar-se-ia importante referência sobre a Orientação
Vocacional nos anos 1950. Era autora de livros didáticos e livros para professores. Para
professores de línguas estrangeiras destacava-se o livro O ensino científico das Línguas
Modernas, de 1935, pela F. Briguiet & Cia. Dos livros didáticos destacavam-se: Mon
Petit Univers, de 1934, La France, de 1937, La Littérature Française, de 1944, todos
pela Cia. Nacional.
Rodolpho Fuchs era Inspetor de Educação Industrial e Ensino Técnico do
Ministério de Educação e Saúde, sendo assessor direto de Capanema. Participaria da
comissão que organizou o anteprojeto da Lei orgânica de Ensino Industrial. Foi
representante do Brasil em congresso realizado em Berlim, apresentando, em 1941, o
artigo – “O ensino industrial na Alemanha” (Ferreira, 2008, p. 66).
Os Coronéis Waldemar Pereira Cotta e Alonso de Oliveira eram professores da
Escola Militar. O Comandante Armando Pinna era estudioso de Oceanografia.
Participou da IV Semana Nacional de Educação da ABE, em 1931, tendo apresentado
no Seminário A Escola Regional, a conferência intitulada A Escola marítima e fluvial e
seus cursos de pesca. Aparelhamento necessário a esses estabelecimentos de educação
e futuro imenso dessa indústria.
O Tenente Coronel Rui de Cruz Almeida formou-se pela Faculdade Nacional de
Arquitetura, do Distrito Federal. Especializou-se em desenho técnico e em literatura
portuguesa e brasileira. Era professor de português do Colégio Militar do Rio de Janeiro
33

e de desenho do Curso Técnico da Prefeitura do Distrito Federal. Era correspondente do


IHGB.
Dentre as pessoas de “notório preparo pedagógico e reconhecimento moral”
encontravam-se professores do ensino secundário, do Colégio Pedro II e da Escola
Normal/Instituto de Educação33, professores da Universidade do Brasil e do Recife,
arquitetos, engenheiros, literatos, bacharéis em Direito, médicos, autores de livros
didáticos, educadores do Colégio Militar, da Escola Naval e educadores da Igreja.
Participavam da CNLD, assim, pessoas ligadas as Forças Armadas, a Igreja e
intelectuais que buscavam a modernização do ensino, com idéias vinculadas ao
movimento da Escola Nova, que tinham participado dos debates nos anos 192034. Os
integrantes da CNLD eram, sobretudo, pessoas ligadas à política educacional da época,
com diferentes atuações e projetos para a educação nacional.
A CNLD foi constituída, dessa forma, por pessoas de diversos grupos que
discutiam a educação desde os anos 1920. Vinculados à Igreja estavam o padre Leonel
Franca e Maria Junqueira Schmidt. Jonathas Serrano era católico, mas também
participava das discussões do movimento da Escola Nova35. Os membros das Forças
Armadas não foram escolhidos somente por suas patentes, eram pessoas envolvidas
com a educação, professores das escolas da Marinha e do Exército. O Comandante
Armando Pinna participou das discussões educacionais dos anos 1930, como foi
possível verificar no seu trabalho apresentado na IV Semana de Educação da ABE e, o
Comandante Adalberto Menezes de Oliveira era membro da ABE e da ABC. Carneiro
Leão, Carlos Delgado de Carvalho, Euclides Roxo e o próprio Jonathas Serrano eram
educadores que discutiam desde a década anterior projetos de renovação pedagógica, na

33
A Escola Normal (1889-1932) foi transformada, na gestão de Anísio Teixeira na Secretaria de
Instrução Pública do Distrito Federal, em Instituto de Educação, em 1932, pelo Decreto municipal nº
3.810.
34
Carneiro Leão era um dos mais radicais pensadores da renovação e modernização da educação, como
destaca Souza (2008). Ele defendia a democratização da educação, que deveria atender as necessidades
do povo, “ultrapassando a dualidade entre educação acadêmica para uma classe e educação manual ou
mecânica para outra” (2008, p. 170).
35
O movimento da Escola Nova e da pedagogia moderna ficaram conhecidos por propor a reformulação
das instituições escolares, com novas discussões sobre os objetivos da educação escolar. No Brasil eram
discutidas, principalmente na ABE, propostas de renovação pedagógicas e metodológicas trazidas dos
Estados Unidos da América e da Europa, tendo como referências John Dewey e Claparède. A divulgação
do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, 1932, explicitou as propostas dos defensores da
pedagogia moderna, baseada no estudo do fator “psicobiológico do interesse”, na natureza e no
funcionamento do “espírito infantil”. A escola moderna teria um conceito dinâmico do ensino,
estimulando a atividade criadora do aluno, com a aplicação de métodos de “aquisição ativa de
conhecimentos”, precisava articular o ensino primário ao secundário, dentro de uma “unidade do fim
geral da educação”, com novos métodos, de investigação científica, de observação, pesquisa e
experiência.
34

ABE e no Colégio Pedro II. Um outro grupo, constituído por Mello Leitão, Adalberto
Menezes de Oliveira e Pecegueiro do Amaral, buscavam consolidar o conhecimento
científico na área das Ciências.
Outra característica importante eram os espaços de atuação, os lugares
institucionais desses educadores e a autoridade que representavam:
* Abgar Renault, Álvaro Ferdinando de Souza da Silveira, Comandante
Adalberto Menezes de Oliveira, Antônio Carneiro Leão, Carlos Delgado de Carvalho,
Euclides Roxo, Hahnemann Guimarães, Jonathas Serrano, João Batista Pecegueiro do
Amaral atuavam em pelo menos uma importante instituição de formação na época: o
Colégio Pedro II, a Escola Normal/Instituto de Educação do Distrito Federal, a
Universidade do Distrito Federal36 e, posteriormente, a Universidade do Brasil37.
* Jonathas Serrano, Euclides Roxo, Antônio Carneiro Leão, Carlos Delgado de
Carvalho, participaram das reformas de ensino dos anos 1920 e da Reforma de ensino
secundário de 1931.
* Abgar Renault era diretor do Departamento Nacional de Educação, Euclides
Roxo era diretor do Departamento de Ensino Secundário do Ministério da Educação e
Rodolpho Fuchs era Inspetor de Educação Industrial e Ensino Técnico do Ministério de
Educação.
* Carlos Delgado de Carvalho, Jonathas Serrano e Padre Leonel Franca eram
membros do Conselho Nacional de Educação (CNE).
* Antônio Carneiro Leão, Cândido de Mello Leitão, Carlos Delgado de
Carvalho, Euclides Roxo, Jonathas Serrano, Maria Junqueira Schmidt e o Comandante
Adalberto Menezes de Oliveira eram membros da ABE.
* Comandante Adalberto Menezes de Oliveira e Cândido de Mello Leitão eram
membros da Academia Brasileira de Ciências (ABC).

36
A Universidade do Distrito Federal (UDF) foi criada pelo Decreto n. 5.513, de 1935, por iniciativa de
Anísio Teixeira a frente da Secretaria de Instrução Pública do Distrito Federal. Sua criação integrava todo
um projeto de Anísio Teixeira de reforma do sistema público de ensino do Distrito Federal. A UDF era
composta por cinco escolas: Escolas de Ciências, Educação, Economia, Filosofia e Instituto de Artes.
Segundo Mendonça (2000), todas as escolas pretendiam “desenvolver de forma integrada o ensino, a
pesquisa e a extensão universitária” (p. 139). Em 1939, por meio do Decreto-lei n. 1.063, a UDF foi
extinta e parte de seus estabelecimentos de ensino foram transferidos para a Universidade do Brasil.
Alguns de seus professores foram incorporados à Faculdade Nacional de Filosofia (FNF), criada no
mesmo ano.
37
A Universidade do Brasil (UB) foi criada em 1937, pelo Ministro da Educação Gustavo Capanema. A
Faculdade Nacional de Filosofia, que integrava a UB, foi criada em 1939, por meio do Decreto-lei n.
1.190. Desde o início apresentou a característica de formar técnicos e professores para o ensino
secundário. Como destaca Mendonça (2000), a FNF priorizava “formar trabalhadores intelectuais para os
quadros técnicos da burocracia estatal, nas áreas de educação e cultura, e, particularmente, professores
para o ensino secundário” (p. 141).
35

* Antônio Carneiro Leão, Cândido de Mello Leitão, Carlos Delgado de


Carvalho, Euclides Roxo, João Batista Pecegueiro do Amaral, Maria Junqueira Schmidt
eram autores de livros didáticos para primário, secundário e para formação de
professores. Muitos publicados pela Companhia Editora Nacional.
* Coronel Waldemar Pereira Cotta, Coronel Alonso de Oliveira, Tenente
Coronel Rui de Cruz Almeida e Comandante Adalberto Menezes de Oliveira atuavam
em Colégios das Forças Armadas.

Esses intelectuais participavam, concomitantemente, de diferentes espaços de


decisão e discussão sobre a educação brasileira: em faculdades de formação de
professores; em colégios de ensino secundário; participaram de reformas de ensino
oficiais; participavam de associações que discutiam a educação e a produção do
conhecimento nas diversas áreas; e produziam livros didáticos para alunos de primário,
secundário, para futuros professores destes níveis de ensino e para os professores que
estavam em sala de aula. Eram pessoas que participavam de diversos círculos de
sociabilidades, que pensavam e propunham projetos para a Educação nacional.
Cabe destacar, ainda, a relação dos membros da CNLD com a Companhia
Editora Nacional. De acordo com Hallewell (1985, pp. 288-289), o crescimento da
Companhia Editora Nacional ocorreu em paralelo ao crescimento do ensino secundário,
nos anos 1930 e 1940. Octalles Marcondes Ferreira, dono da Companhia Editora
Nacional, orientou o trabalho editorial de livros didáticos para esse nível de ensino.
Segundo Toledo (2001), Monteiro Lobato e Octalles Ferreira integraram um importante
grupo de intelectuais em torno de um projeto político e editorial da Companhia Editora
Nacional. A coleção Biblioteca Pedagógica Brasileira (BPB), organizada por Fernando
de Azevedo, apresentava todo um projeto de renovação da literatura educacional, como
uma “ofensiva contra a literatura escolar tradicional” (Toledo, 2001, p. 54). Ao produzir
o projeto da Biblioteca Pedagógica Brasileira, a Companhia Editora Nacional
participava “ativamente dos embates estabelecidos na década de 30 em torno da reforma
da cultura pela reforma da escola” (Toledo, 2001, p. 59). Os livros da BPB pretendiam
formar e aperfeiçoar, cultural e profissionalmente o professor (Toledo, 2001, p. 71). É
significativa, assim, a participação na CNLD de autores de livros da coleção Biblioteca
36

Pedagógica Brasileira, nas séries Livros Didáticos, Atualidades Pedagógicas e


Brasiliana38.
Por outro lado, ao analisar a intensa participação desses professores em vários
espaços que discutiam e decidiam sobre a educação brasileira, é possível entender
porque, para esses intelectuais, fosse estratégico publicar livros didáticos. Os manuais
eram os principais recursos do professor. Os manuais tornava-se, portanto, divulgador
das novas propostas pedagógicas e das novas metodologias de ensino, para os
professores que estavam em sala de aula. Nos cursos de formação de professores os
membros da CNLD preparavam os futuros educadores e para os professores que já
estavam em sala de aula era necessário outro tipo de formação, que era realizado por
meio do manual escolar.

A instalação da CNLD

A reunião de instalação da CNLD no Ministério da Educação deu-se em 19 de


julho de 1940 e foi presidida por Gustavo Capanema. Proferindo algumas palavras, o
Ministro discursou sobre os objetivos da criação da Comissão: fiscalizar a literatura
didática usada nas escolas do país. Ainda de acordo com o Ministro:

Essa fiscalização não visa à diminuição da liberdade que deve existir na


elaboração de toda obra de cultura. Nem pretende o Governo exercer esse
controle excessivo. Exercerá, no entanto, um controle suficiente para que
possa conseguir dois objetivos. O primeiro, excluir das escolas brasileiras
qualquer livro que contenha, clara ou sub-repticiamente, qualquer influência
antipatriótica, qualquer ofensa à honra nacional, qualquer atentado ao
patrimônio espiritual da Nação. O segundo é o que diz respeito à parte técnica
ou científica da obra didática, bem como a sua linguagem. Todos os erros,
sob esse ponto de vista, devem ser expurgados dos livros didáticos (Notícia n.
848, 19/7/1940).

38
A participação de Maria Junqueira Schmidt, representante católica, destoava dos demais autores, que
faziam parte do grupo dos renovadores dos anos 1930. A presença de livros de sua autoria talvez possa
ser justificada por uma informação de Toledo (2001), que observa, na segunda fase da gestão de Fernando
de Azevedo na Cia. Nacional, de 1940 a 1946, “um refluxo do movimento de renovação educacional”,
com o estabelecimento do Estado Novo e o “crescimento da influência dos católicos junto ao governo
Vargas” (pp. 93-94). Por conta da diminuição da produção, da censura e da pressão do governo, a editora
começou a publicar livros de educadores católicos, como era o caso das obras de Theobaldo Miranda
Santos (Superintendente da Educação Geral e Técnica e de Ensino e Extensão, professor da Faculdade
Católica de Filosofia do Rio de Janeiro e do Instituto de Educação) e da própria Maria Junqueira Schmidt,
membro da CNLD.
37

Sobre o processo de escolha dos membros da CNLD, Capanema afirmava que


havia obedecido ao “critério da especialidade, das qualidades morais e capacidade geral
de cada um na compreensão do problema educativo” (Notícia n. 848, 19/7/1940). Com
o pronunciamento, o Ministro enfatizava a liberdade de produção dos manuais escolares
pelas empresas privadas, mas reforçava os dois principais objetivos da avaliação dos
livros didáticos: o controle político-ideológico e o técnico-científico.
A CNLD foi estruturada de modo mais efetivo por meio da portaria ministerial
n° 253, de 24 de dezembro de 1940, que estabelecia suas normas de organização e
funcionamento. De acordo com a portaria, a comissão dividia-se em nove seções, com
três a cinco membros cada. Cada seção estava responsável por examinar os livros de sua
especialidade, com exceção da seção de Redação que deveria examinar todos os livros
didáticos submetidos à Comissão de Avaliação. Os membros da CNLD podiam atuar
em mais de uma seção. Inicialmente, as seções foram assim constituídas:

Quadro 1.1
Composição das Seções

Seções Professores
Línguas e Literatura (A) - Hahnemann Guimarães39 (substituído em agosto de
1941 por Arduino Bolívar40),
- Maria Junqueira Schmidt,
- Abgar Renault,
- Ruy da Cruz Almeida;
Matemática e Desenho (B) - Euclides Roxo,
-Waldemar Pereira Cotta,
- Alonso de Oliveira41 (substituído em julho de 1941
por Joaquim Rufino Ramos Jubé Jr.42);
Ciências Físicas e Naturais (C) - Cândido F. de Mello Leitão43 (substituído em
agosto de 1941 por Gustavo Mendes de Oliveira
Castro44),
- Adalberto Menezes de Oliveira,
- João Batista Pecegueiro do Amaral;

39
Exonerou-se por ser nomeado Consultor Geral da República.
40
Arduíno Bolívar era jurista, tradutor, professor em Minas Gerais, foi professor da Faculdade de
Filosofia, da Faculdade de Ciências Econômicas, da Faculdade de Direito da Universidade de Minas
Gerais foi oficial de gabinete, diretor do Arquivo Público Mineiro e membro da Academia Mineira de
Letras.
41
Exonerou-se por ser removido para São Paulo.
42
Joaquim Rufino Ramos Jubé Jr. era Bacharel em Direito e professor. Foi deputado estadual por Goiás
diversas vezes.
43
Solicitou exoneração.
44
Gustavo Mendes de Oliveira Castro era formado em medicina, professor de Zoologia Geral e
Parasitologia da Faculdade de Farmácia do Distrito Federal. Foi pesquisador do Instituto Biológico de
São Paulo e era pesquisador no Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Foi professor Assistente de
Zoologia da Escola de Ciências da Universidade do Distrito Federal. Era membro da Academia Brasileira
de Ciências.
38

Geografia (D) - Carlos Delgado de Carvalho,


- Comandante Armando Pina,
- Alonso de Oliveira;

História (E) - Jonathas Serrano,


- Carlos Delgado de Carvalho,
- Padre Leonel Franca
Filosofia, Sociologia e Pedagogia (F) - Padre Leonel Franca,
- Antônio Carneiro Leão,
- Jonathas Serrano
Metodologia das técnicas (G) - Comandante Armando Pina,
- José de Melo Moraes,
- Rodolfo Fuchs
Matérias do Ensino Primário (H) - Maria Junqueira Schmidt,
- Antônio Carneiro Leão,
- Abgar Renault, Adalberto
- Menezes de Oliveira,
- Waldemar Pereira Cota.
Redação (I) - Álvaro Ferdinando Souza da Silveira,
- Hahnemann Guimarães,
- Jonathas Serrano

Para a análise dos livros didáticos, o presidente da CNLD designaria um relator


e dois revisores. O relator teria um mês de prazo para elaboração do parecer de cada
livro. Os revisores tinham prazo de quinze dias. Depois de examinado nas seções
específicas, o livro didático seria encaminhado para exame da seção de Redação. As
decisões das seções seriam tomadas por maioria de votos e ratificadas por escrito,
“mencionando-se discriminadamente os motivos por que se propunha negar ou
conceder a autorização de uso do livro didático examinado, ou indicando-se as
modificações que se considerem necessárias a essa autorização” (Portaria Ministerial n°
253/40). Os pareceres seriam, finalmente, apresentados ao plenário da Comissão, que os
discutiriam e aprovariam. A CNLD funcionaria em sessões plenárias, com a maioria de
seus componentes e as deliberações seriam tomadas pela maioria dos membros
presentes.
A secretaria da CNLD teria como responsabilidade: guardar os livros didáticos
submetidos à censura oficial para realização de sua autorização; fazer a distribuição dos
livros aos relatores e revisores; organizar e manter em ordem o arquivo e executar os
expedientes de funcionamento do serviço (Portaria Ministerial n° 253/40). José Augusto
de Lima e Moysés Xavier de Araújo foram os primeiros secretários da Comissão.
Fernando de Souza Castro foi designado substituto eventual.
39

Os trabalhos

Durante os anos de 1939 e 1940 somente foram selecionados os membros da


CNLD, mas sua instalação não foi efetivada. Nesse período, questões foram colocadas
por alguns estados que organizaram suas próprias comissões de avaliação dos livros
para o ensino primário. Em abril de 1939, Henrique Dodsworth, interventor do Distrito
Federal, instituiu uma comissão para tratar dos livros escolares. Em São Paulo,
Gonçalves (2005) afirma que a comissão de avaliação das cartilhas, criada em 1935,
existiu durante toda a década de 1940. O Inep, em fins de 1939, solicitou ao Ministro
Capanema que acelerasse a instalação da CNLD, para que fosse efetivada a legislação
federal.
A primeira sessão ordinária da Comissão realizou-se, de fato, em 14 de janeiro
de 1941, tendo sido eleitos para presidente e vice-presidente, respectivamente, o
professor Euclides Roxo e Padre Leonel Franca.
Segundo informação do presidente da CNLD, Euclides Roxo, até 13 de junho de
1941, dos 1.986 livros didáticos encaminhados para avaliação da Comissão, 140 livros
foram avaliados e 44 estavam com os trabalhos em andamento. Roxo solicitava ao
Ministro Capanema a contratação de mais pareceristas, pois a CNLD avaliava somente
40 livros por mês. Para que os trabalhos fossem terminados até o fim do ano de 1941,
fazia-se necessária a contratação de 41 examinadores extras. Roxo pedia ainda, a
simplificação do processo de julgamento dos manuais. A determinação do Decreto-Lei
n° 1006/38, de que nenhum livro didático que não estivesse autorizado pelo Ministério
da Educação poderia ser utilizado em qualquer estabelecimento de ensino do país a
partir de 1º de janeiro de 1940 foi prorrogado duas vezes – para janeiro de 1941 e
janeiro de 1942.
Em atendimento ao pedido de Euclides Roxo, Capanema escreveu, em 22 de
agosto de 1941, carta ao presidente Getúlio Vargas para sugerir mudanças no processo
de avaliação dos manuais escolares. Encaminhou, assim, um projeto de decreto-lei,
organizado em conjunto com o Departamento Administrativo do Serviço Público
(DASP), que propunha as seguintes medidas: conceder aos relatores, por parecer
emitido sobre qualquer livro sujeito ao seu julgamento, “a gratificação de cem mil réis
além da gratificação por comparecimento às sessões”45; permitir que o livro didático,

45
Pelo Decreto-Lei n° 1.006/38, os membros da CNLD recebiam cem mil réis por sessão a que
comparecessem.
40

“autorizado sob a condição de nele serem feitas modificações e correções, pudesse


circular sem novo exame da Comissão”; extinguir o recurso, para o Ministro, das
decisões não unânimes da Comissão; proibir a importação de livros didáticos escritos
total ou parcialmente em língua estrangeira destinados ao ensino primário (Projeto de
decreto-lei, 22/8/1941).
Após análise do presidente Vargas, que modificou um pouco a proposta original,
foi aprovado o novo Decreto-lei n° 3.580, em 3 de setembro de 1941, com as seguintes
prescrições:

Art. 1º. Os membros da Comissão Nacional do Livro Didático perceberão, a


título de gratificação, cinqüenta mil réis por sessão a que comparecerem,
limitado o pagamento ao máximo de dez sessões por mês (...)
§ 2º Por parecer emitido sobre o valor das obras sujeitas ao seu julgamento,
perceberá o relator trinta mil réis, cinqüenta mil réis ou cem mil réis,
conforme se tratar de livro destinado ao ensino pré-primário, ao ensino
primário ou ao ensino secundário, normal e profissional de qualquer ramo.
§ 3º Ao pagamento das mesmas gratificações terão direito os membros das
comissões especiais que forem designadas de conformidade com o disposto
no artigo 2º do decreto-lei n. 1417, de 13 de julho de 1939.
Art. 2º O § 2º do artigo 13 do decreto-lei n. 1006, de 30 de dezembro de
1938, passa a ter a seguinte redação:
“§ 2º. A Comissão Nacional do Livro Didático poderá, na sua decisão, indicar
modificações ou correções a serem feitas no texto da obra examinada, para
que se torne possível a autorização de seu uso. Nesta hipótese, poderá a obra,
depois de modificada ou corrigida, ser usada, cabendo, todavia, à Comissão
Nacional do Livro Didático, em qualquer tempo, declarar cassada a
autorização, se as modificações ou correções recomendadas não tiverem sido
devidamente realizadas”.
Art. 3º. Fica revogado o § 3º do artigo 13 do decreto-lei n. 1006, de 30 de
dezembro de 1938.
Art. 4º. Fica proibida a importação de livros didáticos, escritos total ou
parcialmente em língua estrangeira, se destinados ao uso de alunos do ensino
primário, bem como a sua produção em território nacional (Decreto-lei n°
3.580, de 03/9/1941).

As diferentes gradações da remuneração de acordo com o nível de ensino do


livro didático foi questionado pelos membros da CNLD, que solicitaram, em 3 de
setembro de 1941, supressão dos parágrafos que tratavam da hierarquia das
gratificações. Segundo Ferreira (2008, p. 85), o DASP considerou desnecessário o
pedido de supressão, que não foi aceito.
É importante destacar, ainda, no Decreto-lei n° 3.580/41, o artigo relativo à
importação dos livros didáticos escritos em língua estrangeira. A aprovação do artigo
citado dava solução a uma discussão travada entre julho e agosto de 1940 - sobre a
41

política de segurança nacional -, entre o Conselho de Imigração e Colonização, o


Conselho de Segurança Nacional, o Ministro da Educação e Saúde e o Inep. Segundo
Ferreira (2008), o Conselho de Imigração e Colonização denunciou ao Conselho de
Segurança Nacional que em 9 de julho de 1940, havia sido desembarcado no porto de
Santos, sessenta caixas com livros pedagógicos impressos em língua japonesa. Os livros
não poderiam ser apreendidos, pois não se destinavam à venda. Para o Conselho de
Segurança Nacional, em ofício ao Ministro da Educação, os japoneses, com tal ato,
estavam tentando burlar a política nacionalizadora do Brasil. O Conselho solicitava,
assim, providências ao Ministro. Lourenço Filho, então diretor do Inep, elaborou
algumas sugestões de modificações ao Decreto-lei n° 1.006/38, procurando regular a
entrada de livros escritos em língua estrangeira no país (Ferreira, 2008, pp. 67-68).
Essas modificações foram introduzidas, como se examinou, no art. 4º do Decreto-lei n°
3.580/41.
A ata da 112ª sessão plenária, de 11 de dezembro de 1941, explicitava a
preocupação da CNLD com o atraso no processo de avaliação dos livros didáticos.
Após ouvir a exposição de Euclides Roxo sobre a situação da Comissão, o Ministro da
Educação enfatizou a necessidade de se tomar medidas em caráter de urgência. Entre as
medidas, Capanema estabeleceu a supressão da secção de redação. De acordo com a ata:

os livros cujo uso foi autorizado pelas diversas secções e ainda estão
pendentes de parecer da secção de redação serão registrados para efeito de
autorização de uso didático, reservando-se a CNLD, o direito de, em qualquer
época, formular recomendações ou exigências a autores ou editores no que
diz respeito à redação, sob pena de ser cassada a autorização concedida (Ata
da 112ª sessão plenária, 11/12/1941).

Ainda nessa sessão plenária, Capanema examinou certos pontos do Regimento


da Comissão que precisavam ser alterados. Os principais pontos discutidos foram: a
conveniência de se admitir o pedido de reconsideração no caso de parecer contrário ao
uso dos livros, ou no caso de parecer favorável com restrições; prorrogação por mais um
ano do prazo fixado na legislação para a exigência de autorização da CNLD para uso
dos livros didáticos, devendo, porém ser publicada a relação dos livros não autorizados,
visando orientar os professores; necessidade de modificar o texto concernente à adoção
pelos professores dos livros de sua autoria; possibilidade de os livros autorizados com
restrições não precisarem ser novamente avaliados.
42

Sobre o item que discutia a adoção pelos professores dos livros de sua própria
autoria, Jonathas Serrano foi um de seus principais defensores. O membro da CNLD era
professor do Colégio Pedro II e autor de diversos livros didáticos de História. De acordo
com Serrano, o Decreto-lei n° 1.006/38, constituía desapreço à função docente.
Afirmava que o número de classes de um professor não constituía mercado suficiente
para a edição de um livro. Capanema concordou com os argumentos de Serrano e
acrescentou que o professor trabalhava melhor e com mais eficiência, com o livro
didático de sua autoria (112ª Sessão plenária, 11/12/1941). Na 114ª sessão plenária, de
17 de dezembro de 1941, Serrano reforçou seu ponto de vista ao argumentar que:

não lhe parece deva ser mantida a proibição, ainda em vigor, de adotarem os
professores em suas aulas compêndios de sua própria autoria. Se o professor é
competente, o seu compêndio parece o mais adequado ao ensino que ele
próprio ministra em suas aulas. Do ponto de vista moral, aliás, não deve
pairar dúvida quanto à idoneidade de professores de estabelecimentos oficiais
ou fiscalizados (114ª Sessão plenária, 17/12/1941).

Em janeiro de 1942, a lista completa de livros autorizados para uso nas escolas
não saiu, pois a CNLD não havia terminado seus trabalhos. Sua publicação foi
prorrogada novamente, para janeiro de 1943. Com dúvidas sobre a adoção dos manuais,
o diretor geral do Departamento de Educação do Estado de São Paulo, Anísio Novais,
escreveu em 12 de janeiro de 1942, ao Inep e ao Departamento Nacional de Educação
(DNE), solicitando esclarecimento sobre a data de publicação da lista dos livros
autorizados e sobre a interpretação do art. 5º do Decreto-lei n° 1006/38, em relação ao
modo como cada escola do estado selecionaria seus livros escolares. Após consulta ao
Ministro Capanema, Lourenço Filho escreveu um projeto de ofício para São Paulo. De
acordo com o diretor do Inep, como a lista de livros autorizados só sairia em janeiro de
1943, cada estado deveria regular o critério de escolha dos manuais no ano de 1942,
respeitando os outros dispositivos do Decreto-lei n° 1.006/38.
Segundo documento encaminhado ao Ministro Capanema em 1º de março de
1944, por Fernando de Souza Castro – encarregado do acervo da CNLD -, no ano de
1942, a Comissão recebeu 66 requerimentos solicitando registro de livros didáticos e,
no ano de 1943, recebeu apenas três solicitações.
43

A orientação para avaliação

Para a análise dos livros didáticos havia um roteiro padrão para a avaliação e a
ficha de julgamento, contendo a orientação para atribuição de notas aos itens indicados.
As normas recomendavam os detalhes a serem verificados em cada item da ficha de
julgamento. Parte das orientações tratava de aspectos gráficos:
• A altura do livro padrão poderia ser de 20 a 24 cm; com largura de 14 a 16 cm.
A capa seria cartonada ou de material flexível, mas deveria ser resistente. O
papel seria branco. E não seria permitido que se visse a impressão no verso da
página. A cor no texto deveria ser preta.
• O tipo de letra utilizado seria o redondo simples, com corpo 16 ou 18, para
livros destinados ao jardim de infância e primeiros anos do curso primário;
corpo 10 ou 12 para as séries seguintes.
• Eram inadmissíveis os erros de revisão, truncamentos, transposições ou
inversões de linhas ou palavras, “pastéis”, etc. Deveriam ser evitadas as
“quebras” de linhas ou palavras e “recortes” que dificultassem a leitura.
• Nos livros de 1º grau todas as páginas deveriam conter ilustrações, sempre em
perfeita correlação com a matéria descrita (Normas para apreciação dos
elementos considerados na ficha, localizado no CPDOC/FGV. Resumido pela
autora).
Outras orientações tratavam de questões da linguagem (seguir a ortografia
oficial), de conteúdos e questões metodológicas. Todos os manuais deveriam estar de
acordo com os programas oficiais:
• Seria negada autorização aos livros que apresentassem assuntos com erros de
natureza científica.
• Ajustamento ao programa de ensino – a matéria não deveria ficar aquém das
exigências do programa de ensino, mas também não deveria ultrapassar os
conhecimentos exigidos. Seriam inadmissíveis exemplos que exigissem
conhecimentos superiores ao grau de ensino.
• Os livros escritos em linguagem defeituosa teriam autorização negada.
• Expor com clareza o que se propunha a transmitir. Vocabulário simples, dando
preferência para expressões de uso mais correntes. Eram condenáveis expressões
regionais ou gírias. Concisão – evitar a prolixidade, as digressões inúteis, a
ostentação de recursos verbais.
44

• Sobre a matéria - dois assuntos diferentes pediam dois estilos diversos. A


matéria de cada livro deveria ser tratada de acordo com as exigências próprias,
sem prejuízo da clareza e concisão.
• Nos livros de Ciências Naturais ou de Geografia a variedade de gravuras deveria
ser maior, pois a ilustração era o grande veículo do conhecimento.
• Necessária exatidão da gravura quando se propusesse a transmitir,
objetivamente, uma noção (órgãos do corpo, sistema planetário, etc.).
• A função da gravura era ilustrar o texto. Não deveria aparecer em página que
não houvesse uma explicação plena. As legendas deveriam ser claras e precisas,
pois interpretariam as gravuras e serviriam de ligação entre estas e o texto
(Normas para apreciação dos elementos considerados na ficha, localizado no
CPDOC/FGV. Resumido pela autora).

Dois aspectos eram considerados importantes: primeiro, a preocupação com a


adequação ao grau de ensino, cada nível escolar exigia uma linguagem própria, com
vocabulário e estilo adequados ao nível intelectual dos alunos. Exigia, ainda, como já
foi indicado, tipos de letras diferenciados. Segundo, as imagens eram enfatizadas, pois
eram recursos para a aprendizagem. Desse modo, era preciso relacioná-las com o
conteúdo dos textos.
O quadro a seguir exemplifica a ficha de julgamento:
45

Quadro 1.2
Ficha: Elementos a considerar no julgamento do livro didático

I - Formato
1. Dimensões a) altura,
b) largura e grossura
II - Material
2. Capa a) resistência,
b) gosto

3. Papel a) cor,
b) qualidade

4. Tinta a) cor,
b) qualidade

III - Feição Gráfica


5. Composição a) tipo e corpo,
b) variedade,
c) entrelinhas,
d) comprimento,
e) correção

6. Paginação a) facilidade de leitura,


b) distribuição das gravuras

7. Impressão a) da capa,
b) do texto e das legendas,
c) das gravuras

IV - Valor Didático
8. Noções científicas a) exatidão,
b) ajustamento ao programa de ensino,
c) método de exposição,
d) propriedade dos exemplos,
e) emprego de citações,
f) uso de termos técnicos

9. Linguagem a) correção geral,


b) clareza,
c) concisão,
d) propriedade em relação à matéria,
e) propriedade em relação ao grau de ensino,
f) propriedade em relação ao nível intelectual correspondente à série ou
à classe

10. Gravura
a) variedade,
b) propriedade,
c) exatidão,
d) ajustamento ao texto,
e) precisão das legendas

Total de pontos obtido pelo livro


Porcentagem atingida no conjunto das Divisões I, II, III e IV
46

A cada um dos itens da ficha, a CNLD deveria atribuir as seguintes notas:

0 - quando o elemento fosse julgado deficiente;


5 - quando o elemento fosse considerado satisfatório;
10 - quando o elemento superasse as exigências, ou se tornasse dispensável.

Em seguida seriam somadas as notas dos itens, formando uma única nota em
cada divisão (Formato, Material, Feição Gráfica e Valor Didático). O total de pontos a
serem atribuídos era 350. Não poderiam ser autorizados os livros que obtivessem nota 0
em qualquer elemento da divisão IV - Valor Didático (Noções científicas, Linguagem,
Gravura), ou menos de 50% do total de pontos atribuídos, em conjunto, nas divisões
Formato, Material e Feição Gráfica.

As avaliações

Os pareceres da CNLD foram localizados, em sua maioria, no arquivo histórico


da Companhia Editora Nacional/IBEP. Os documentos apresentaram 150 pareceres de
autorização ou reprovação de livros didáticos. Parte dos pareceres eram notas indicando
somente a aprovação ou reprovação dos livros, outros pareceres detalharam as críticas
aos manuais. Algumas avaliações continham o nome dos pareceristas, mas a grande
maioria não indicou seus nomes46. Foi analisado, também, o artigo de Freitas (2010),
que examinou os pareceres de Jonathas Serrano, para os livros didáticos de História.
O arquivo da Companhia Editora Nacional/IBEP possuía pareceres completos de
livros didáticos da própria editora, mas também notas sobre a avaliação de manuais de
outras editoras. Em outros acervos,47 foram encontrados, ainda, os pareceres completos
dos livros do prof. Waldemiro Potsch, da Livraria Francisco Alves. O quadro, a seguir,
indica as editoras que participaram do processo de autorização dos manuais escolares e
a quantidade de livros aprovados e reprovados:

46
Sobre a avaliação dos livros dos membros da CNLD somente foram encontradas solicitações de
avaliação de dez livros didáticos ao professor Américo Jacobina Lacombe, entre os anos de 1947 e 1952,
no arquivo da Casa de Rui Barbosa.
47
Biblioteca Nacional, Biblioteca do Livro Didático (BLD) da FEUSP, Núcleo de Documentação e
Memória (NUDOM) do Colégio Pedro II.
47

Tabela 1.1
Avaliações dos livros didáticos por editoras

Editoras Livros Aprovados/autorizados Reprovados/não


avaliados com correção avaliados
Cia. Nacional 30 25 5
Cia. Melhoramentos 27 3 24
Francisco Alves 22 4 18
Edições Brasil 4 4
Coleção F. T. D. 2 2
Livraria Salesiano 1 1
Edições Maranus 1 1
Livraria Atlântica - Coimbra 3 1 2
Editora Freitas Bastos 1 1
J. R. de Oliveira e Cia. 2 1 1
F. Briguiet 2 2
Irmãos Pongetti 1 1
Livraria Acadêmica 4 1 3
Livraria Central - Coimbra 3 3
Livraria Imperial - RJ 1 1
Livraria João Amendola 2 2
Livraria Lele - Porto 1 1
Livraria Paulo Azevedo 4 1 3
Livraria Sá da Costa - Lisboa 2 2
Livraria Selbach 1 1
Livraria Universal - Recife 2 1 1
Saraiva & Cia. 5 1 4
Tipografia Oliveira da Costa 1 1
Não descreveu editora 28 10 18
total 150 50 100

A tabela permite observar que a Companhia Editora Nacional foi a editora que
mais encaminhou livros para a CNLD e a que mais teve livros aprovados. As duas
outras editoras que encaminharam grande quantidade de livros – a Melhoramentos e a
Francisco Alves -, tiveram poucos livros aprovados. Algumas questões podem ser
pensadas sobre esse fato: Primeiro, que muito dos membros da CNLD eram autores da
Cia. Nacional ou participavam da política educacional do período, o que pode ter
antecipado a correção e adequação dos manuais da editora a nova ortografia oficial e
aos novos Programas de Ensino. Segundo, que os avaliadores podem ter favorecido a
aprovação de autores que publicavam pela Companhia Editora Nacional, pois faziam
parte de um projeto político educacional comum. Na análise dos manuais reprovados da
Cia. Nacional, quatro dos livros ou não foram considerados livros didáticos ou não
estavam de acordo com a ortografia oficial. Somente um livro, Ciências Física e
48

Naturais, de Luiz Cavalheiro e Nicolau Angelino foi reprovado por apresentar


conteúdos incorretos e linguagem inadequada, além de não seguir os programas oficiais.
Dos 150 pareceres, 30 autorizaram o uso, 93 reprovaram, três não consideraram
os livros como didáticos, quatro não julgaram os livros por não estarem escritos de
acordo com a ortografia oficial e vinte somente autorizariam o uso dos manuais após
correção dos senões indicados. O quadro a seguir permite observar as avaliações por
seção:

Tabela 1.2
Quantidade de avaliação por Seção

Seção Quantidade Autorizados Reprovados Autorização Não


de pareceres após correção avaliados
Línguas e Literatura 11 3 7 1
Matemática e 17 4 11 2
Desenho
Ciências Físicas e 61 7 41 12 1
Naturais
Geografia 13 2 8 3
História 06 3 3
Filosofia, Sociologia 18 1 11 6
e Pedagogia.
Metodologia das 03 3
Técnicas
Matérias do Ensino 12 6 5 1
Primário
Redação 04 3 1
Livros sem 05 01 04
indicação da
disciplina
Total 150 30 93 20 7

A tabela 1.2, permite observar que a Seção de Ciências Físicas e Naturais foi a
que mais emitiu pareceres, seguida das Seções de Filosofia, Sociologia e Pedagogia,
Seção de Matemática, Seção de Geografia e Seção de Matérias do Ensino Primário.
Poucos dos pareceres e notas encontrados na Companhia Editora Nacional/IBEP e no
CPDOC/FGV possuíam o nome dos avaliadores. Ao analisar os pareceres que
apresentaram nome do relator e dos revisores verificou-se quais os membros da CNLD
que mais atuavam no processo de autorização dos livros didáticos.
O quadro a seguir detalha o nome dos pareceristas e a quantidade de pareceres
emitidos:
49

Tabela 1.3
Relação entre avaliador e livros didáticos avaliados entre 1941 e 1942

Parecerista Livros analisados – Livros analisados –


como relator principal como revisor
Álvaro Ferdinando de Souza da Silveira 2 3
Abgar Renault 6
Antônio Carneiro Leão 7 5
Adalberto Menezes de Oliveira 5 6
Alonso de Oliveira 1
Comandante Armando Pinna 1 2
Carlos Delgado de Carvalho 2 4
Cândido de Mello Leitão 4 4
Hanhemann Guimarães 1
Gustavo Mendes de Oliveira Castro 3
João Pecegueiro do Amaral 2 9
Joaquim Rufino Ramos Jubé Jr. 1 1
Jonathas Serrano 1 5
Maria Junqueira Schmidt 5 3
Padre Leonel Franca 6 3
Ruy da Cruz Almeida 4 1

A tabela 1.3 demonstra quem foram os principais avaliadores dos pareceres


encontrados. Carneiro Leão e Padre Leonel Franca são os principais avaliadores,
seguidos de Adalberto Menezes de Oliveira, João Pecegueiro do Amaral, Cândido de
Mello Leitão e Maria Junqueira Schmidt. Esses avaliadores participavam das seções de
Ciências Físicas e Naturais, Filosofia, Sociologia e Pedagogia, Línguas e Literatura e
Matérias do Ensino Primário. A seção de Matemática e Desenho avaliou uma grande
quantidade de livros didáticos, mas, infelizmente, os pareceres encontrados não
apresentaram os nomes dos pareceristas.
A análise das avaliações elaboradas nos anos 1940 pela CNLD, encontradas nos
diversos acervos, permitiram constatar algumas características específicas, como será
descrito a seguir.

Pareceres de aprovação

Poucos foram os livros didáticos autorizados sem necessidade de nenhuma


correção. Dentre eles, encontravam-se as obras Geografia – para 4ª série secundária, de
Aroldo de Azevedo, Noções de Cosmografia e Geografia, de Artur de Campos
Gonçalves, Idioma Pátrio – 1ª série, de Modesto de Abreu, Elementos de Anatomia e
Fisiologia Humanas, de Antonio de Almeida Junior, Física, iniciação ao estudo da
50

Física experimental para 3a série, de Oscar Bergstron Lourenço. Todos da Cia.


Nacional:

Geografia - Aroldo de Azevedo


O livro faz parte de uma série de geografias secundárias escritas de acordo
com o programa oficial e contém leituras geográficas de autores escolhidos.
Em 389 páginas, o autor cobre satisfatoriamente a matéria toda contida no
programa da 4ª série, relativo aos principais países e a geografia regional do
Brasil.
O autor segue, para a apresentação dos assuntos, os métodos mais correntes
entre nós, sem insistir todavia demasiadamente na nomenclatura.
As gravuras, apesar de bem escolhidas, nem sempre conseguiram boa
reprodução.
Os mapas e gráficos a traço, embora acertados e úteis, deixam muitíssimo a
desejar quanto ao desenho.
Na nossa opinião, nada se opões a ser autorizado nos colégios secundários da
referida obra (Parecer n° D-2/41, de Carlos Delgado de Carvalho, de
17/2/1941).

O livro registrado sob esse processo está em linguagem apropriada e com


relativo desenvolvimento satisfazendo as exigências de ensino, para os cursos
primário, preparatório à [sic] Ginásio.
Está provido de boas gravuras e mapas que muito esclarecem o ensino,
devendo corrigir na página 68, o pico da Pedra-Assú pelo pico da Bandeira, o
ponto mais culminante do Brasil.
Conclusão: A Seção D é de parecer que o livro pode ter o seu uso autorizado
(Parecer n. D-43/41, de Armando Pinna, de 27/11/1941).

Idioma Pátrio - Modesto de Abreu


O livro observa as instruções pedagógicas baixadas com a portaria do
Ministério da Educação e Saúde de 30-6-1931 e segue o programa da 1ª série
do curso de português. Os trechos destinados à leitura são acompanhados do
estudo gramatical, com pequenos exercícios de análise léxico lógica e
sintática e exame do vocabulário. A não ser, talvez, o trecho intitulado “A
bela madame Vargas”, de Paulo Barreto, na pág. 102, foram bem escolhidos
os excertos da nossa literatura.
Entendemos que pode ser autorizado o uso do livro aqui referido, porque não
infringe as proibições mencionadas do Dec. n° 1006, de 31 de dezembro de
1938, cap. IV (Parecer n° A-4/41, de Hahnemann Guimarães, de 11/3/1941).

Elementos de Anatomia e Fisiologia Humanas - Antonio de Almeida Junior


O livro a que se refere o processo n° 4.061/41 não incide em nenhuma das
proibições do capítulo IV do Decreto Lei n° 1.006. Entende a seção C que, no
que diz respeito ao seu conteúdo científico o referido livro pode ter o seu uso
autorizado (Parecer n° C-84/41, de Cândido de Mello Leitão, de 3/6/1941).

Física, iniciação ao estudo da Física experimental para 3a série - Oscar


Bergstron Lourenço
O livro que não incide em nenhum dos artigos eliminatórios do Decreto 1006
satisfaz ao objetivo visado pelo autor, apresentando, sob um ponto de vista
simples e experimental, os assuntos constantes do programa de física da 3a
série do Curso Secundário.
51

Alguns pequenos senões, constantes da lista anexa ao presente, poderão ser


corrigidos em uma nova edição do livro. (...)
A Seção C é assim de parecer que pode ser autorizado o uso do livro a que se
refere o Processo n. 35.075/40, devendo o autor, em nova edição, corrigir os
pequenos senões nele existente. (Parecer n. C-96/41, de Adalberto Menezes
de Oliveira, de 3/7/1941).

A Seção de Ciências Físicas e Naturais foi uma das que mais reprovou livros
didáticos, contudo, como foi possível observar, alguns manuais foram considerados
suficientemente adequados para serem utilizados nas escolas. É interessante enfatizar
quem eram os dois professores que tiveram livros aprovados: Antonio de Almeida
Junior, educador que participava, desde a década de 1920, dos debates educacionais,
signatário do Manifesto de 1932 e professor de Medicina Legal da Faculdade de Direito
da USP; e Oscar Bergstrom Lourenço professor da Escola Politécnica da USP.
Dos pareceres da Secção de História encontrados, observou-se que os únicos
livros didáticos aprovados foram os de Joaquim Silva, renomado autor de manuais
escolares do período:

História da Civilização - 5a série - Cia. Nacional.


O livro protocolado sob n° 33.740/41, Joaquim Silva, História da Civilização
– 5º ano ginasial, 8ª edição, São Paulo – C.E.N., in 12º - p. 260 – não incide
em nenhum dos itens dos artigos 20 a 23 do Dec. 1.006 de 30-12-38.
A CNLD é, portanto, de parecer que o seu uso pode ser autorizado (Parecer
n° E-21/41, de Padre Leonel Franca e Carlos Delgado de Carvalho, de
8/7/41).

História da Civilização - 1o ano. Cia. Nacional.


Aprovado. (Parecer de Jonathas Serrano, s/d.).

A obra correspondente ao processo n° 33.733/40 – História da Civilização –


para o terceiro ano ginasial, de autoria do professor Joaquim Silva, 15ª
edição, legislação vigente, devendo, porém o autor, em edições posteriores,
tomar em consideração as observações constantes de folha anexa a este
parecer (Parecer n° E-23/41, de Jonathas Serrano, de 4/11/1941).

Pareceres de reprovação e de livros didáticos que precisavam de correção

De modo geral, dois critérios de exclusão eram centrais nos pareceres que
negavam a autorização de uso de livros didáticos. Grande parte dos livros eram
excluídos por incidirem nos artigos 21 e 23 do Decreto-lei n° 1.006/38. O artigo 21
negava autorização de uso aos livros didáticos que: estivessem escritos em linguagem
52

defeituosa, por incorreção gramatical, inconveniente ou abusivo emprego de termos ou


expressões regionais ou gírias; que apresentassem os assuntos com erros de natureza
científica ou técnica; que estivessem redigidos de maneira inadequada, em relação às
normas didáticas oficialmente adotadas, ou que estivessem impressos em desacordo
com os preceitos essenciais da higiene da visão; que não trouxessem por extenso o
nome do autor; que não apresentassem a declaração do preço de venda. O artigo 23
negava autorização para os livros didáticos que, escritos em língua nacional, não
adotassem a ortografia estabelecida pela lei (Decreto-Lei n° 1.006/38, pp. 4-5). Foi
encontrada somente uma avaliação que parece restringir o uso do livro didático por
infringir o artigo 20, relacionado as questões político-ideológicas.
Na análise dos pareceres, observou-se que o roteiro de avaliação não era seguido
de forma rígida. Os relatórios de avaliação dos livros didáticos eram diferentes uns dos
outros. Alguns seguiam o roteiro, outros apenas indicavam quais artigos do Decreto-lei
n° 1.006/38 o livro didático infringia, sem maiores esclarecimentos. Por último,
existiam os pareceres que apresentavam detalhadamente, página por página, as
informações incorretas (de redação, tipográficos, de conteúdos, etc.) dos manuais
escolares e, se o livro fosse aprovado, as modificações que deveriam ser feitas.
Poucos pareceres chegaram a descrever especificamente quais eram os erros nos
livros didáticos. A maioria somente negava a autorização e apontava que os manuais
infringiam o artigo 21, sem, contudo, dar maiores esclarecimentos sobre quais eram as
infrações. Quando infringiam o artigo 23, os pareceres descreviam:

Não julgado por não se achar escrito na ortografia oficial (Parecer do Pe.
Leonel Franca, para o livro História da Philosophia, de D. Ludgero Jaspers
O. S. B., Melhoramentos. Aprovado por unanimidade na sessão de
27/03/1941).

Não pode ser usado, pois incide no art. 23. (Parecer do livro Lusíadas, de
Luiz de Camões, Melhoramentos, s/d).

Negado por falta de ortografia oficial (Parecer de Álvaro Ferdinando de


Souza da Silveira, para o livro Princípios de Sociologia, de Fernando de
Azevedo. Aprovado por unanimidade na sessão de 19/08/1941).

Os exemplos citados mostraram duas situações sobre as avaliações da CNLD:


alguns livros de autores estrangeiros com ortografia não-oficial não eram julgados pela
Comissão; manuais de autores utilizados nas escolas, como a obra de Camões e, de
autores renomados, como Fernando de Azevedo, eram negados quando não estavam de
53

acordo com o artigo 23. Observa-se desse modo, a forte ênfase em se implantar a
ortografia oficial.
Os pareceres com descrição mais detalhada do relator apresentavam algumas das
argumentações utilizadas para a exclusão dos livros didáticos, que abrangiam: métodos
e conhecimentos considerados ultrapassados, linguagem incorreta, conteúdos que não
seguiam os programas do ensino secundário, erros de natureza científica, iconografia
mal utilizada, etc.
A seguir, os pareceres foram organizados de acordo com as Seções da CNLD.
Alguns casos foram analisados de modo mais detalhado, pois evidenciaram os embates
do período, as divergências entre os membros da CNLD, a discussão sobre a introdução
de novas metodologias, a atualização dos conteúdos em relação as novas pesquisas nas
diferentes áreas e as mudanças dos livros em face dos Programas oficiais das diferentes
áreas do conhecimentos escolar para o ensino secundário.

Os pareceres da Seção de Línguas e Literatura - A

O uso do método indireto era um dos principais motivos para a reprovação dos
livros didáticos de ensino de línguas estrangeiras, como se verifica nos exemplos a
seguir:

Incide na alínea c do art. 21. Em grande parte as lições empregam o método


indireto. Não foi autorizado (Parecer do livro Les Premiers pas, de Julien
Fauvel, Melhoramentos. s/d).

O livro incide na alínea c do art. 21; não emprega o método direto, pois
estabelece como ponto de partida da aula um vocabulário com a respectiva
tradução. (...) Não pode ser autorizado o seus uso (Parecer do livro Quelques
Histoires, de Eugenio Pinto da Fonseca, Melhoramentos. s/d).

O uso do método direto fazia parte do Programa de Francês para o curso


fundamental do ensino secundário expedido em junho de 1931. Em dezembro do
mesmo ano, o Decreto n. 20.8333, instituiu o método direto como método oficial de
ensino das línguas vivas estrangeiras. Esse era o método apresentado por Maria
Junqueira Schmidt, no livro O ensino científico das Línguas Modernas, de 1935 e por
Carneiro Leão no livro O ensino das línguas vivas, também de 193548.

48
No livro O ensino das línguas vivas, de 1935, Carneiro Leão descrevia sua experiência com o método
direto utilizado nas aulas do Colégio Pedro II.
54

Schmidt enfatizava no prefácio de seu livro, que na década de 1920, pesquisas


estadunidenses e alemãs buscavam “imprimir um cunho científico ao ensino das
línguas” (1958, p. 5). O novo método científico utilizaria recursos audiovisuais na
aprendizagem e aplicaria a “teoria do apelo a todos os sentidos” (Schmidt, 1958, p. 6).
As aulas seguiriam o princípio da escola ativa, com a “instrução pela atividade própria”
(Schmidt, 1958, p. 7). Desse modo, o ensino deveria ser baseado nas leis da
aprendizagem, que atenderiam, “desde as primeiras aulas, os três tipos de memória:
visual, auditiva, e motor” (Schmidt, 1958, p. 9). O ensino de línguas seria, assim,
hierarquizado da seguinte forma: 1o ler, 2o entender a língua falada e falar, 3o escrever
(Schmidt, 1958, p. 9).
Segundo Paiva (2005, p. 127), o método direto propunha o ensino de línguas
estrangeiras sem interferência da língua materna. O aluno aprenderia a associar os
significados diretamente com a língua estrangeira. Nesse método a gramática seria
aprendida de forma indutiva, por meio do uso da língua, com o aprendizado de
vocabulário e frases de uso no cotidiano. O método direto se contrapunha ao método de
“gramática e tradução”, em que se estudava as línguas estrangeiras por meio da análise
de “estruturas sintáticas, da memorização de regras gramaticais e de exercícios de
tradução” (Paiva, 2005, p. 127).
Portanto, os pareceres criticavam a utilização de traduções em livros de ensino
de línguas e criticavam, também, o ensino da gramática muito sistematizado, como foi
destacado no parecer de Maria Junqueira Schmidt:

O livro protocolado sob o n. 35.063/40 destina-se ao 2o ano do ensino do


Frances. Embora adote o método direto, apresenta, muitas vezes, como uma
das várias formas de exercícios, a tradução (...).
Emprega, ainda, tradução nas “Petites Remarques”, - observações a respeito
do fenômeno lingüístico -, ora em relação a palavras que não necessitam em
absoluto do auxílio da língua materna para serem bem compreendidas, como
sejam Le buvard - la cloche (...).
De modo geral, o livro abusa de traduções. A tradução, no método direto, é
permitida acidentalmente, quando a explicação em língua estrangeira seria
demasiado longo ou incapaz de dar a idéia precisa do vocábulo ou expressão
(...).
O ensino de gramática é, às vezes, por demais sistemático para o 2o ano e
não meramente funcional, como o exigem as instruções. (...)
Conclusão: A Seção A é de parecer que o livro protocolado sob o n. 35.063/40
só pode ter o uso autorizado depois de corrigidos os erros de método e os
senões apontados. (Parecer n. A-48/1941, do livro Français, 2 éme année, de
Louise Jaquier, Cia. Nacional, aprovado em sessão de 10/10/1941. Grifos
nossos).
55

Os pareceres da Seção de Matemática e Desenho - B

Os pareceres da Seção de Matemática excluíam, principalmente, manuais que


não estavam de acordo com os programas oficiais, que apresentavam aspectos didáticos
e de conteúdo científicos deficientes, conforme se observa nos pareceres a seguir:

O aspecto didático apresenta quer quanto a sistematização da matéria, quer


quanto a amplitude e maneira pratica de expor, graves defeitos que
passaremos a apontar. Considerando os erros de método e científicos, a secção
B é de parecer, conforme as letras b e c do art. 21, que o livro não seja
autorizado. Não pode ser usado. (Parecer do livro Matemática comercial e
financeira, de Luiz Cavalheiro, Irmãos Pongetti, s/d).

Este livro só poderá ter seu uso autorizado depois de refundido de modo que
se adapte às normas didáticas estabelecidas no Dec. 19.890, de 1931 e que
nele se corrijam os erros e defeitos exemplificados nos itens acima (Parecer
do livro Noções de Álgebra, de Isidro Dumont, Livraria Francisco Alves, s/d).

Não foi possível detalhar quais eram os erros de natureza didática e científicos
presentes nos manuais, pois não foram encontrados pareceres da Seção de Matemática
mais elaborados. De todo modo é importante enfatizar a participação de Euclides
Roxo na CNLD. Como já foi mencionado, o professor foi o renovador do ensino de
Matemática no Colégio Pedro II, em 1929, quando reestruturou os conteúdos de
aritmética, álgebra e geometria em uma única disciplina: a Matemática. Seu livro
Curso de Matemática, publicado no mesmo ano, se tornou referência da nova proposta
de ensino para todo o país. Roxo participou, ainda, da elaboração dos programas de
ensino da reforma do secundário, de 1931. Segundo Valente (2003, p. 245), a reforma
de Francisco Campos na parte do ensino de Matemática, teve como base as propostas
modernizadoras realizadas no Colégio Pedro II. Roxo, reforçava ainda mais sua
intenção de consolidar uma Didática da Matemática, com a publicação, em 1937, do
livro A matemática na educação secundária.

Os pareceres da Seção de Ciências Físicas e Naturais - C

As principais críticas dos pareceres da Seção C tratavam de erros de linguagem,


manuais que não seguiam (ou não compreendiam) os programas oficiais de 1931 e
erros de conteúdo científico. A avaliação do livro Ciências Físicas e Naturais, de Luiz
Cavalheiro e Nicolau Angelino, da Companhia Editora Nacional, cujo parecer foi
56

redigido por Adalberto Menezes de Oliveira, tendo como revisores João B. Pecegueiro
do Amaral e Candido de Mello Leitão, foi elaborado de acordo com a ficha de
julgamento da CNLD. O parecer, com seis páginas que esmiuçavam todos os aspectos
negativos do manual (material, noções científicas, linguagem, inadequação ao grau de
ensino), negou a aprovação do livro didático, em 31 de janeiro de 1941. Os trechos, a
seguir, apresentam o que era considerado erro de natureza científica e erro de
linguagem:

D – Análise de conteúdo:
Exatidão
Contém vários enganos, impropriedades de linguagem e incorreções de
natureza científica, dentre os quais assinalaremos os seguintes:
1. A vela não se apaga alimentada pelo ar existente sob acampânula [sic]
(legenda da fig. 2). É sabido que a vela se apaga no fim de poucos minutos.
2. “Os miasmas dos lugares pantanosos empregam [sic] o ar, provocando
doenças” (pág. 29). Hipótese científica não mais aceita (...)
4. “Estado do céu” (pág. 58), em vez de estado de atmosfera (...)
8. “Tiróide” (pág. 61), em vez de tireóide (...)
11) Explicação errônea dos fenômenos que justificam o funcionamento
das garrafas térmicas (pág. 85). (...)
20) Definição incorreta de densidade de um corpo pelo peso de um
centímetro cúbico desse corpo. (...)
26) “Stygomia fasciata” (no texto da página 158, bem como na leganda da
figura 11, (em vez de “Stogonya aegypti”). (...)
37) “O sulfureto de cobre é uma combinação” em vez de o “sulfato de
cobre é um composto”. (...)
E – Linguagem:
A linguagem nem sempre é precisa, como se pode verificar nalguns trechos
mencionados na análise do conteúdo (...)
Achamos por exemplo, inadequado o adjetivo “formidável” aplicado a
potência de um motor de explosão e aos aparelhos voadores (págs. 76 e 77).
(...) (Parecer n° C-3/1941, de Adalberto Menezes de Oliveira. Aprovado por
unanimidade em sessão de 14/02/1941. Grifos nossos).

Os erros apontados indicam que os pareceristas criticavam a falta de atualização


dos autores em relação aos conhecimentos da ciência de referência. Apontavam
conceitos descritos errados e termos científicos escritos incorretamente. O parecer
finalizava com a observação de que os autores não haviam compreendido o significado
da “disciplina de Ciências Físicas e Naturais, no plano de estudos do ensino
secundário”. Não obedeciam, ainda, as instruções pedagógicas que acompanhavam os
programas de junho de 1931, em complemento ao Decreto n. 19.890/31.
Outro livro que apresentou parecer completo negando sua autorização foi
Zoologia, do professor do Colégio Pedro II, Waldemiro Potsch, da Livraria Francisco
57

Alves. O relator foi Cândido de Mello Leitão e os revisores foram Adalberto Menezes
de Oliveira e João Pecegueiro do Amaral. Destacam-se, a seguir, alguns trechos do
parecer de oito páginas:

O livro a que se refere o processo n° 37.413/40 não corresponde ao seu título,


pois de suas 628 páginas 325 se referem ao homem, tratando propriamente da
Anatomia e Fisiologia humanas. Nessa parte da Anatomia e Fisiologia
humana apresenta apenas leves senões, que não seriam de modo a impedir a
autorização de seu uso.
Na parte, porém, que trata da Zoologia há senões mais graves e muitos erros
que passamos a referir:
Pág. 6 – Definição errônea da Zoogeografia.
Pág. 7 – Definição errada da nomenclatura binária.
Pág. 8 – Dá protoplasma e citoplasma como sinônimos.
Pág. 9 – Diz que a hemoglobina é amarelo-esverdeada (...)
Pág. 48 – Fórmula leucocitária antiquada
Pág. 51 – Esquema escrito em ortografia não oficial (...)
Pág. 87 – Descrição errada da coluna vertebral dos Ciclóstomos e dos
peixes (...)
Pág. 227 – Escreve cecun (sic!) (...)
Pág. 252 – Descrição imperfeita do aparelho circulatório dos Moluscos (...)
Pág. 380 – Escreve Holoturoides por Holoturioides (...)
Pág. 501 – Classificação menos feliz das escamas (...)
Pág. 542 – Descrição pouco exata das patas das aves. (...)
Pág. 592 – Referência inexata aos nossos negros e caracterização de uma raça
ameríndia.
Pág. 595 – Diz que caraíba é o homem branco. É lamentável que tratando do
nosso homem não cite os trabalhos de Roquete Pinto, que propositadamente
parece ignorar. (...)
(Parecer n° C-48/1941, de Cândido Firmino de Mello Leitão. Aprovado por
unanimidade na sessão de 15 de abril de 1941. Grifos nossos).

Novamente os pareceristas criticavam erros nas definições de conceitos, erros de


conteúdo, descrições pouco pormenorizadas e falta de atualização na área de
conhecimento. Nesse sentido é importante destacar que Mello Leitão era um dos
pesquisadores brasileiros da época que desenvolvia estudos na área das Ciências
Naturais e procurava estabelecer quais conhecimentos eram considerados legítimos. A
crítica a “definição errônea da Zoogeografia”, ilustra esse fato, pois Mello Leitão
possuía o livro Zoogeografia do Brasil, de 1937, que tratava do tema. É interessante
enfatizar, ainda, a atuação de Adalberto Menezes de Oliveira. O professor era membro
58

da ABC e um dos intelectuais que nos anos 1920 criticou o positivismo de Comte e
debateu novas teorias, como a Teoria da Relatividade de Albert Einstein49.
O professor Potsch recorreu ao resultado da avaliação de seu livro, processando
a CNLD, na pessoa do professor Mello Leitão. O processo durou anos, como se
constatou nos quatro volumes publicados sobre o assunto. O último volume do processo
data de 194650.
De modo geral, os pareceres que autorizavam os livros acrescentavam que
deveriam ser feitas correções nos manuais:

O livro, cuja apresentação material é satisfatória, contém grande número de


erros e enganos, especialmente de ponto de vista científico, conforme
passamos a mostrar (...)
Na pág. 24 declara que “é com peso que se comparam as forças para medi-
las”.
Na mesma página dá uma definição incorreta de direção de uma força.
Ainda na p. 24 dá uma definição incorreta do quilograma-força asseverando
pertencer esta unidade ao sistema métrico decimal (...)
Em vez de usar simplesmente a palavra “peso” usa a expressão “peso
absoluto” não mais aceita (p. 130, 131, 162 e 164) (...)
Faz o A. confusão entre o peso e massa, chamando as mesmas aferidas de
“pesos” (p. 152, 153) (...)
As hipóteses da existência do hidrogênio e do geocorônio na alta atmosfera
não são mais aceitas – p. 241 e 242 (...)
Conclusão
Tendo em vista as alíneas a, b, c, do Art. 21 do Dec. 1006, é a Secção C de
parecer que o uso do livro a que se refere o p. 35.076/40 só pode ser
autorizado depois que forem corrigidos os enganos e senões nele existentes e,
especialmente os acima assinalados (Parecer n° C-57/41, Física - 4ª série, de
Hipepides Zanelle, Cia. Nacional. Relator: Adalberto Menezes de Oliveira.
Aprovado em 6/5/1941).

(...) O livro está escrito em linguagem acessível, e com clareza, tratando dos
assuntos de modo rudimentar, como convém ao grau de ensino a que se
destina.
Em alguns pontos, escaparam deslizes na forma e no conteúdo que merecem
ser corrigidos, tais como:
(...) pág. 249 – Imprecisão quanto ao valor da pressão atmosférica. (...)
pág. 251 – Referência a densidade sem explicação do que seja. (...)
pág. 282 – A explicação da nomenclatura do pólo Norte do íman, como sendo
o que se volta para o pólo Norte não está precisa. (...)
pág. 297 – A definição de raiz não está certa.A Seção C é de opinião que a
CNLD pode autorizar o uso da presente edição do livro do processo

49
Albert Einstein veio ao Brasil em 1925. Nesse momento houve um importante debate em torno da
teoria da relatividade entre Adalberto menzes de Oliveira e o professor da Escola Politécnica Licínio
Cardoso. (Paim, 1982).
50
A discussão sobre o processo Potsch-Mello Leitão será analisada na parte sobre as repercussões das
avaliações. Os volumes foram encontrados na FEUSP, na Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro e no
Colégio Pedro II.
59

36.094/40, exigindo, entretanto que sejam atendidas, em novas edições as


observações deste parecer (Parecer n. C-129/41, Preparatórios ao alcance de
todos, de Antônio Gonçalves, Geraldo Rodrigues e Marcelo Mesquita, Cia.
Nacional. Relator: João B. Pecegueiro do Amaral, de 26/11/1941).

As análises dos pareceres da Seção de Ciências Físicas e Naturais evidenciaram,


principalmente, o empenho dos avaliadores em normatizar e padronizar um tipo de
conhecimento científico. Os pareceres enfatizavam, acima de tudo, os conhecimentos
considerados errados, para estabelecer quais os conhecimentos seriam os corretos que,
para os membros da CNLD, deveriam ser os conhecimentos atualizados. O programa de
Ciências Físicas e Naturais para o curso fundamental do ensino secundário da Reforma
Campos, dividia os conteúdos a serem ministrados detalhadamente, série por série. A
maior preocupação do programa era determinar qual tema seria ministrado, em qual
série, e os conteúdos desenvolvidos nos temas. Procurava conformar um conteúdo
único51.

Os pareceres da Seção de Geografia - D

Os pareceres encontrados da Seção D criticavam os livros que não


compreendiam os programas oficias, com metodologias inadequadas sem, contudo,
detalhar os problemas. O exemplo a seguir mostra um dos tipos de parecer:

Trata-se de um livro que contém elementos que o tornam pouco aceitável ao


ensino secundário. É um trabalho executado por um autor esforçado e bem
intencionado, mas limitado em seus conhecimentos. Não tem método de
apresentação, não sabe dosar nem discriminar os seus ensinamentos. Este, por
sua vez, são vagos, imprecisos. O autor procura seguir conscienciosamente o
programa, mas revela incompreensão de seu espírito. Nestas condições,
somos de opinião que o livro não pode ser indicado para uso nas escolas
secundárias (Parecer do livro Geografia, de Luiz Gonzaga Lez, Saraiva, s/d).

51
De acordo com os programas para o curso fundamental do ensino secundário de 1931, os conteúdos de
Ciências Físicas e Naturais para a 1a série eram: Atmosfera; Calor e Luz; A água; Oxidação e Redução; A
vida. 2a série: A terra; Magnetismo e Eletricidade; Os seres vivos; Som; As sociedades.
A partir da 3a série os conteúdos de Ciências eram separados em conhecimentos específicos de:
* Física: 3a série – Introdução no estudo dos fenômenos físicos; 4a série – I. Mecânica, II. Líquidos e
Gases, III. Calor; 5a série – IV. Som, V. Luz, VI. Magnetismo e Eletricidade.
* Química: 3a série – Iniciação no estudo dos fenômenos químicos; 4a série – I. Química geral, II.
Metalóides; 5a série – I. Química geral, II. Metais, III. Química Orgânica.
* História Natural: 3a série – I. Botânica, II. Zoologia, III. Mineralogia, IV. Geologia; 4a série – I.
Botânica, II. Zoologia, III. Mineralogia, IV. Geologia; 5a série – I. Botânica, II. Zoologia, III.
Mineralogia, IV. Geologia, V. A História da Terra.
60

Os pareceres da Seção de História – E

Somente foi encontrado um parecer detalhado da Seção E, assinado por Jonathas


Serrano, que aprovava a obra História da Civilização, 3o ano ginasial, de Joaquim
Silva, mas indicava que deveriam ser consideradas, em futuras edições, as observações
descritas pelo relator do parecer. Os principais questionamentos de Jonathas Serrano
diziam respeito as correções de informações históricas, necessidade de atualização
quanto as novas pesquisas da área, a forma correta de escrever palavras em outras
línguas e palavras que derivavam do Latim:

(...) Herzog é duque e não propriamente rei (pág. 13). O plural de Zwerg não é
Zwerges (pág. 15).
Civitas, no singular, não pode equivaler a cidades, no plural (pág. 16, 4a
linha).
Os efetivos bárbaros, enormemente exagerados na quasi totalidade de autores
de compêndios, já é tempo que se reduzem às justas proporções, de acordo
com a erudita lição de mestres qual Ferdinand Lot (19 e 21, por exemplo). A
batalha travada em 451 é hoje localizada entre Orleans e Troyes e denominada
de Campus Mauriaque (pág. 21).
Pitas não é boa forma para indicar Pietos (latim Picti) (pág. 24). (...)
Hennin, palavra francesa, com nn, não deve ser arbitrariamente simplificada
em Henin, com um só n (pág. 82). (...)
A data da batalha de Crécy é de 1346 e não de 1347 (pág. 227) (...).
(Parecer n. E-23/1941, relator: Jonathas Serrano, de 4/11/1941).

Freitas (2010), que analisou mais pareceres de Jonathas Serrano, indica que o
membro da CNLD considerava, prioritariamente, forma e conteúdo em suas avaliações.
Serrano apontava em seus pareceres erros de linguagem, omissões, exageros e
equívocos em termos de conteúdos históricos, problemas metodológicos e didáticos,
estilo inadequado e deficiências materiais e tipográficas. Segundo Freitas (2010), a
crítica de Serrano quanto aos nomes corretos de autores e personagens históricos,
relacionava-se ao “seu empenho em normatizar esse tipo de escrita” (p. 189). No livro
Como se ensina História, de 1935, Serrano procurava padronizar a grafia dos nomes
históricos. Outro aspecto que Serrano considerava determinante para a reprovação de
uma obra era a falta da História contemporânea do Brasil, de 1920 a 1940 (Freitas,
2010, p. 192).
No aspecto didático e metodológico, os manuais analisados por Serrano eram
criticados quanto a falta de um estilo didático, com linguagem adequada a faixa etária
dos alunos. Os manuais precisavam, ainda, ter letras com tamanho correto, papel de boa
61

qualidade, precisavam conter iconografias, como gravuras, mapas, retratos, etc. (Freitas,
2010, p. 191). Os manuais deveriam obedecer as instruções metodológicas da Reforma
Campos, de 1931, que tratavam da “Didática aplicada ao ensino de História da
Civilização” (Freitas, 2010, p. 192). Para Serrano a maioria dos autores somente
elaborava resumos da matéria a ser ensinada, sem contudo, observar as recomendações
de “caráter metodológico e didático” (Freitas, 2010, p. 193).
De acordo com Schmidt (2005), Serrano tinha preocupação central com a
metodologia do ensino da História e defendia uma didática renovada para o ensino da
disciplina, baseada na obra de John Dewey (p. 217). O ensino da história deveria ser
ativo, “com a participação viva da inteligência do discípulo” (Serrano, 1943, p. 9).
Desse modo, Serrano destacava a necessidade de se aplicar “ao ensino da História todas
as conquistas reais da psico-pegadogia e da didática renovada” (Serrano, 1943, p. 13).
Serrano valorizava o ensino pelos “olhos” e não somente pelos “ouvidos”, com as
“monótonas e indigestas preleções” (Schmidt, 2005, p. 222). O novo método de ensino
utilizaria diversos recursos didáticos: o cinematógrafo, mapas, globos, quadros
coloridos, coleções, gabinetes e museus escolares (Schmidt, 2005, p. 224). Para o
professor, era importante que os alunos “visualizassem” os fatos para que se
interessassem pelo estudo da História.

Os pareceres da Seção de Filosofia, Sociologia e pedagogia - F

Os pareceres da Seção F recusaram livros que não apresentavam organização


metodológica satisfatória e com falta de conteúdos essenciais, como foi possível notar
nos trechos a seguir:

Não pode ser autorizado em virtude:


a) da ausência de apreciação de fenômenos sociológicos capitais.
b) Da ausência de método na organização e na distribuição da matéria.
c) Da determinação da alínea b do artigo 21 do Decreto-lei 1006, de 30-12-
1938, que nega autorização de uso do livro didático “regido de maneira
inadequada pela violação dos preceitos fundamentais da pedagogia...”
(Parecer de Antônio Carneiro Leão, para o livro Elementos de Sociologia, de
Nelson Omegna. Aprovado por unanimidade na sessão de 19/08/1941).

Sobre os pareceres da Seção F, um caso em especial mereceu atenção, pois


evidenciou a divergência entre os membros da CNLD. O livro Noções de História da
Educação, de Afrânio Peixoto, não foi autorizado pela Seção de Redação (cujos
62

membros eram Álvaro Ferdinando S. da Silveira, Hahnemann Guimarães e Jonathas


Serrano), por apresentar “expressões pouco felizes” no capítulo “A educação na
America Latina”. Por não concordar com o parecer, a Seção F solicitou vistas ao
processo e apresentou novo parecer em 7 de outubro de 1941. No novo parecer, escrito
por Carneiro Leão, o livro foi autorizado com os seguintes argumentos:

(...) No tocante às observações da Seção I referentes às expressões pouco


felizes, sobretudo do pequeno capítulo – “A educação na América Latina” –
está a Seção F de pleno acordo, não acontecendo o mesmo, entretanto, quanto
às conclusões.
Pensa a Seção F (e submete seu parecer ao julgamento da CNLD) que as
referidas expressões não inutilizam a parte são do livro (aliás mais de 90%) e
na qual a matéria está superiormente apresentada, não só quanto ao método de
exposição, a forma e a orientação didática. (...)
Conclusão – Em face do exposto é a Seção F de parecer que o livro em apreço
e constante do processo n. 37.321/40 pode ter seu uso autorizado logo que seu
autor elimine as expressões assinaladas pela Seção I (...). (Parecer de Carneiro
Leão, para o livro Noções de História da Educação, de Afrânio Peixoto, da
Cia. Nacional, de 7/10/1941).

A solicitação de aprovação do livro pode ter relação com a importância do autor


– Afrânio Peixoto -, tanto academicamente (foi professor da Faculdade de Medicina, do
Instituto de Educação do Distrito Federal, além de Reitor da Universidade do Distrito
Federal, em 1935), como pela sua atuação política (foi diretor da Instrução Pública do
Distrito Federal e signatário do Manifesto de 1932) ao longo dos anos 1920 e 1930.
Pode-se considerar, ainda, o lugar da obra de Afrânio Peixoto, um livro para formação
de professores de grande sucesso52, publicado pela coleção Biblioteca Pedagógica
Brasileira, na Série Atualidades Pedagógicas, da Companhia Editora Nacional, da qual
Carneiro Leão fazia parte e que propunha uma “constituição do campo da educação”,
como afirma Toledo:

autores como Anísio Teixeira, Celso Kelly, Almeida Jr. Carneiro Leão,
Venâncio Filho articulam, sob a perspectiva específica dos temas e objetos
tratados em seus textos, análises da sociedade brasileira em relação à cultura e
à educação e procuram estabelecer os seus fins para chegar ao que consideram
ser o progresso social (2001, p. 85).

52
De acordo com Toledo (2001, p. 98), o livro de Afrânio Peixoto, Noções de História da Educação, era
um dos títulos da Cia. Nacional de grande tiragem, com 5000 exemplares.
63

Fazia-se necessário, assim, a aprovação do livro de Afrânio Peixoto, que era


utilizado nas instituições de formação de professores e procurava difundir determinado
conhecimento sobre a História da Educação, como sendo um novo “campo do saber”
(Toledo, 2001, p. 91).

Os pareceres da Seção Matérias do ensino Primário – H

Um caso se destacou nas avaliações da Seção H, o processo de avaliação do


livro Nosso Brasil – 3º ano primário, de Hildebrando de Lima. O livro Nosso Brasil,
para 1o ano primário foi aprovado sem nenhuma observação por Carneiro Leão, na
sessão de 24 de setembro de 1941. Apesar de ter o uso autorizado para o volume do 1o
ano, a aprovação do volume da mesma coleção para o 3o ano passou por um processo
que se desenrolou de modo mais complicado.
O livro Nosso Brasil – 3º ano primário obteve autorização de uso da Seção de
Ensino Primário, em 30 de maio de 1941, cujo parecerista foi Carneiro Leão. Contudo,
a professora Maria Junqueira Schmidt – da mesma Seção Primária - solicitou vistas ao
processo. Em 3 de outubro de 1941, dois pareceres foram expedidos sobre o livro. O
primeiro, da Seção de Ciências Físicas e Naturais, com parecer de Adalberto Menezes
de Oliveira autorizou o uso do manual do ponto de vista dos assuntos científicos. O
segundo, da própria Maria Junqueira Schmidt, que acentuou, entre outros
questionamentos, que fossem retirados do manual as indicações e recomendações dos
livros O poço do Visconde, História do Mundo e O Saci, todos de Monteiro Lobato. O
livro não poderia ser autorizado enquanto não fossem corrigidos os senões apontados
por Schmidt.
A respeito de Monteiro Lobato é importante destacar que o autor entrou em
diversos conflitos durante o Estado Novo. Criticou o governo de Getúlio Vargas, na
campanha pelo petróleo, em que defendia a necessidade de exploração do petróleo
brasileiro. Entrou em embate com o governo, ainda, ao criticar a política nacional dos
minérios, chegando a ser preso em março de 1941. Segundo Alcanfor (2010), as
discordâncias de Monteiro Lobato com o Estado Novo “lhe custou, parcialmente, a
censura de suas obras infantis” (p. 92). Suas obras também foram criticadas pela Igreja
Católica, que se mobilizou para proibir seus livros infantis. Alcanfor (2010) observa que
quanto mais Lobato se voltava para a literatura infantil, mais acentuava os “elementos
críticos, ateus e irreverentes” em suas obras, que provocaram “crescente resistência à
64

difusão de seus livros entre certos mediadores culturais da época, desde os censores
católicos e autoridades estadonovistas e certas figuras representativas do movimento
escolanovista” (pp. 94-95).
Por já ter editado uma grande quantidade de livros – baseado no parecer de 30
de maio de 1941 – o autor, Hildebrando de Lima, entrou em contato com a CNLD para
discutir o assunto. Em carta à Octalles Marcondes Ferreira, editor e dono da Companhia
Editora Nacional, de 7 de outubro de 1941, Hildebrando afirmava que, em 5 de outubro,
havia conversado com a professora Schmidt para questionar o parecer e argumentar que
a Companhia Editora Nacional teria feito uma grande edição de seu livro. Solicitou
então à parecerista que os livros já editados pudessem ser utilizados em 1942. Ao
mesmo tempo, afirmava já ter reformulado o livro para futuras edições, seguindo as
emendas indicadas. Para o autor, as críticas feitas por Schmidt quanto às obras de
Monteiro Lobato tinham motivos religiosos. Nas palavras de Hildebrando:

Junto aqui o parecer número 2, de autoria da D. Maria. Como o senhor vê, a


preocupação foi dar no crânio do nosso caro Monteiro Lobato. Creio que há
nisto dedo de padre (Carta de Hildebrando de Lima para Octalles Marcondes
Ferreira, de 7/10/1941).

Em nova carta, de 8 de outubro de 1941, Hildebrando afirmava que o problema


não tinha sido solucionado e que a CNLD havia deixado para 10 de outubro a discussão
do caso. Por fim solicitava que Octalles escrevesse uma carta pessoalmente à CNLD.
Atendendo a solicitação de Hildebrando, Octalles escreveu ao Presidente da CNLD,
requerendo que o Livro Nosso Brasil – 3, não fosse proibido no ano de 1942, com a
argumentação da quantidade de edições no estoque. O editor se comprometeu em
atender todos os senões do parecer de Schmidt para as próximas edições.
Em carta de 11 de outubro de 1941, endereçada à Octalles, o representante da
Companhia Editora Nacional no Rio de Janeiro argumentava que o impasse sobre o
livro Nosso Brasil - 3º ano fora criado por Adalberto Menezes de Oliveira que
considerava os livros de leitura de Monteiro Lobato antinacionalista53. Avisava, ainda,
que já havia solicitado a substituição do exemplar entregue à CNLD em 1940, pelo
exemplar da nova edição com as correções indicadas no parecer de Schmidt.

53
Não ficou claro se a informação dada pelo representante da Companhia Editora Nacional estava
correta, em relação ao membro da CNLD que questionou o livro Nosso Brasil. O representante do Rio de
Janeiro pode ter confundido o nome dos pareceristas. Escreveu Menezes de Oliveira, mas quem solicitou
vistas ao processo e exigiu a retirada dos textos de Monteiro Lobato foi Maria Junqueira Schmidt.
65

O caso em apreço ilustra o único processo encontrado de avaliação de livro


didático pela CNLD que fazia referência explícita a questões ideológicas nos manuais
escolares. O caso evidencia que a Comissão não funcionava em plena harmonia e que
embates internos aconteciam. O posicionamento político dos pareceristas tornaram-se
evidentes com a posição favorável ao livro, do ponto de vista didático e científico, de
Carneiro Leão e Menezes de Oliveira e a posição contrária de Maria Junqueira Schimdt,
do ponto de vista católico.
Apesar de não terem sido encontrados documentos que elucidassem o desenrolar
dos acontecimentos, verificou-se que, em agosto de 1944, o livro foi indicado na relação
de obras aprovadas pela CNLD encaminhada ao Inep.

Pareceres da Seção de Redação - I

Os pareceres da Seção de Redação procuravam conformar os manuais escolares


à nova ortografia estabelecida, segundo o Decreto-lei n. 292/38. Assim, indicavam a
substituição de expressões consideradas “chulas”, sugeriam modificações na redação
dos livros, indicavam conteúdos gramaticais que deveriam ser incluídos nos livros, além
das correções de erros tipográficos. O parecer do livro Idioma Pátrio, de Modesto de
Abreu apresentava todos os tipos de correções feitas pela Seção I:

A Secção I é de parecer que o livro “Idioma Pátrio” (1a série), do prof.


Modesto de Abreu, poderá ser aprovado, desde que o autor, em futuras
edições, faça os seguintes reparos:
I – Revisão geral da obra na parte relativa às notações léxicas, para que seja
observado o que determina o Decreto-lei n. 292, de 23 de fevereiro de 1938.
II – Substituir o excerto – “A ceia do Rocha”- afim de evitar que o aluno da 1a
série, sem mentalidade formada, entre em contato com expressões chulas,
como “Cá dê nhô Henrique”, que se encontra na pág. 15, 1. 16a.
III – Modificar a redação:
1o) – pág. 17, 1. 13a: “modos infinitos ou formas nominais do verbo” (...)
V – Acrescentar:
1o – Pág. 24, 1. 12a: Definição de sufixo.
2o – pág. 27, b: Definição de prefixo (...)
VI – Corrigir os seguintes erros tipográficos:
1o) Pág. 60, 1. 1a: “Nobre”
2o) Pág. 101, Exercs., 6: “Formas”(...)
(Parecer no I-5/1941, Relator: Ruy da Cruz Almeida. Revisores: Álvaro
Ferdinando da Silveira e Jonathas Serrano, 11/7/1941. Grifos nossos).

Sobre o livro Geografia para a 4a série secundária de Aroldo de Azevedo,


aprovado pela Seção D – Geografia, a Seção I fez algumas considerações sobre erros
66

tipográficos, de pontuação, forma correta de escrever abreviaturas, mudanças na


redação de frases e outras questões gramaticais:

a) em futuras reedições, diminuir o grande número de erros tipográficos ou de


omissões de acentos gráficos (como em “britânicos” pág. 24, em árabes pág.
26, em “próprio pág. 26”, celebre, adj., pág. 41 etc, etc.), e concertar [sic] a
pontuação onde ela se mostra defeituosa, como na pág. 213 linha 8 e na pág.
249, 1. 12 contando de baixo.
b) adotar, para as unidades de medidas não expressas por extenso as
abreviaturas indicadas no regulamento expedido pelo Decreto n. 4257 de 16
de junho de 1939.
c) Na pág. 49, 5a linha, contando de baixo, substituir “de ESTRANGEIRO” por
“DE ESTRANGEIROS”; na pág. 53, 1a linha, “A industria”por “As
industrias” (...).
(Parecer n. I-2/1941, Relator Álvaro Ferdinando Souza da Silveira,
27/5/1941).

O parecer do livro História do Brasil para curso comercial e 2o ano


propedêutico, sem autor, da Companhia Editora Nacional, indicou correções de erros
tipográficos, de pontuação, mudanças na redação de frases, como já foi indicado no
exemplo anterior e acrescentou correções de erros ortográficos e de galicismo, como se
observa no trecho a seguir:

(...)
III – Deverá o autor evitar os seguintes galicismos:
1o pág. 48, cap. V 18, 1. 1a – “Insucesso”
2o pág. 68, cap. VII, 33, i. 2a. “Fracassados”
3o pág. 80, 38,1. 5a....... “Deu logar”
(...)
VIII – Corrigir os seguintes erros ortográficos:
1o pág. 41, 1. 2a. “atrazado”
2o pág. 96, 1. 1a. “atrazo”
3o Ibd. 1. 5a. “Rey”
4o pág. 131, 1. 3a. “orgam” (...)
(Parecer n. I-3/1941, relator Ruy da Cruz Almeida, 14/6/1941).

O significado das avaliações

Os pareceres permitiram identificar que um dos principais objetivos do


Ministério da Educação e da CNLD com a avaliação era conformar uma ortografia
oficial, visando criar uma língua nacional e valorizar uma identidade brasileira. Buscou-
se acabar com as expressões regionais e particularidades estrangeiras. Um segundo
objetivo foi padronizar e uniformizar os livros de acordo com os programas de ensino
67

para as disciplinas do curso secundário, conforme promulgava o Decreto n° 19.890/31.


Com a avaliação dos manuais escolares, procurava-se efetivar a nacionalização do
ensino, na atualização dos métodos de ensino e aprendizagem, expurgando os
conhecimentos considerados ultrapassados e os erros de natureza científica.
Durante o processo de avaliação dos livros didáticos pela CNLD, após o parecer,
os livros podiam ser corrigidos e reapresentados para aprovação no mesmo ano da
primeira avaliação da Comissão. Esta era uma característica específica da política do
livro didático iniciada nos anos 1940. Posteriormente, em 1944, os livros aprovados
com necessidades de correções não precisavam ser reapresentados à CNLD, podendo
ser publicados, contanto que corrigissem os erros apontados. Caso os erros não fossem
expurgados, o Ministério da Educação poderia apreender todos os exemplares do
manual em circulação.
As novas diretrizes pedagógicas e mudanças metodológicas discutidas nos anos
1920 e 1930, deveriam ser divulgadas de diferentes formas: na formação inicial, nos
cursos das Faculdades de Filosofia e Institutos de Educação; e por meio do livro
didático, para os professores que atuavam nas escolas. Os novos manuais escolares
formariam esse corpo de docentes, ensinaria as novas propostas didático-pedagógicas.
A análise das avaliações permitiu identificar as divergências entre os membros
da CNLD, que era constituída por pessoas que pensavam a educação de modo distinto,
como no caso dos pareceres do livro Nosso Brasil – 3º ano primário, de Hildebrando de
Lima e a discussão sobre a retirada dos textos de Monteiro Lobato - momento em que
Maria Junqueira Schmidt questionou o parecer de Carneiro Leão e evidenciou no debate
o posicionamento católico de Schmidt, e o (possível) posicionamento nacionalista do
Comandante Menezes de Oliveira.
Os membros da CNLD atuavam em diversos lugares que debatiam a política
educacional. Pareciam estar em todos os lugares relacionados à educação: eram
professores nas Faculdades e cursos de formação de professores; eram docentes do
Colégio Pedro II e outros colégios secundários; participaram das reformas de ensino
(dos anos 1920, de 1931 e de 1942); estavam em diversas comissões e órgãos estatais de
regulação da educação (CNE, DNE, Secretarias de Educação, Departamento de Ensino
Secundário do MES, Inspetoria de Educação Industrial e Ensino Técnico do MES, etc.);
eram membros de Institutos e Associações que discutiam a educação e que pensavam as
renovações das diferentes áreas do conhecimento (ABC, ABE, IHGB, IBGE, etc.);
publicavam livros didáticos e manuais para professores; e por fim, participavam da
68

CNLD para regular e padronizar o manual escolar. É interessante observar como esses
sujeitos pretendiam, na prática, conformar um novo projeto educacional.

Repercussões das avaliações

O processo de avaliação dos livros didáticos gerou reações de autores e da


Associação Profissional das Empresas Editoras de Livros e Publicações Culturais54.
Devido a demora dos trabalhos da CNLD, em 20 de agosto de 1941, Themístocles
Marcondes Ferreira55 - presidente da Associação - escreveu ao Ministro da Educação
para sugerir medidas que auxiliariam o trabalho das editoras: 1) que o governo
permitisse a circulação, em caráter transitório, durante o ano de 1942, dos livros que não
fossem aprovados por incorrerem apenas nos art. 21 do dec. 1.006/38 (sobre a ortografia
oficial); 2) que a CNLD fornecesse aos interessados as informações sobre os termos
dos pareceres relativos aos livros aprovados com restrições, para que os editores
pudessem providenciar em tempo a correção e melhora das obras didáticas; 3) que as
editoras tivessem a liberdade de alteração de preços dos livros didáticos, sem consulta
prévia ao governo, alegando que o custo da impressão das obras (do papel) haviam
aumentado56; 4) determinar a aplicação gradual e progressiva dos novos programas -
como foi feita na reforma Francisco Campos -, o que permitiria aos editores atender às
necessidades criadas pelos novos programas de estudos, com a publicação gradual dos
livros didáticos, à medida que a reforma fosse executada.
O professor Euclides Roxo, em 25 de setembro, escreveu a Capanema, dando
parecer sobre as propostas da Associação. Roxo afirmava ser totalmente impossível que
a CNLD conseguisse avaliar todos os livros didáticos inscritos até o fim do ano de
1941. Assim, a lista dos manuais aprovados não iria sair em janeiro de 1942. Por esse
motivo, sugeria a publicação de duas listas: uma de livros de uso definitivo autorizado;
a outra, com autorização provisória para o ano de 1942, de livros ainda não examinados
pela CNLD. Sobre o pedido dos pareceres dos exames dos livros, Roxo afirmava ser

54
A Associação foi criada em 18 de novembro de 1940. Em 22 de novembro de 1941 a Associação foi
reconhecida pelo Ministério do Trabalho como um Sindicato, tornando-se o Sindicato Nacional das
Empresas Editoras de Livros e Publicações Culturais. Posteriormente, em 6 de julho de 1959, passou a ser
denominado SNEL - Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Informações encontradas no site do
SNEL: http://www.snel.org.br, em 31/3/2009).
55
Themístocles Marcondes Ferreira era irmão de Octalles Marcondes Ferreira e, também, diretor-
presidente da Companhia Editora Nacional (Hallewell, 1985, p. 268).
56
De acordo com Ferreira (2008, p. 89), os editores reclamavam do aumento de preço do papel, que teria
ultrapassado mais de 100% do ano de 1939 a 1941.
69

“perfeitamente justo” o pedido. Em relação ao aumento de preços dos livros,


considerava que a sugestão deveria ser estudada. Já sobre a aplicação gradual das
reformas de ensino, caberia ao ministro decidir, lembrando que a CNLD já havia
solicitado reforma dos atuais programas.
A lista dos livros didáticos que deveria ser publicada em janeiro de 1942
preocupava outros órgãos, além da Associação das Empresas Editoras. Em novembro de
1941, a Comissão de Ensino Primário da Câmara dos Deputados sugeriu ao Ministro da
Educação, que se prorrogasse o prazo para exigência de autorização de uso dos livros
didáticos nas escolas, para janeiro de 1943.
Em 16 de dezembro de 1941 - após receber informações sobre a decisão da 112ª
Sessão plenária da CNLD, de 11/12/1941, em que fora discutido a necessidade de
divulgação de lista de livros didáticos reprovados -, o presidente do Sindicato Nacional
das Empresas Editoras de Livros e Publicações Culturais, enviou carta ao Ministro da
Educação, solicitando que fosse publicada em Diário Oficial somente a relação dos
manuais escolares aprovados pela CNLD. De acordo com o Sindicato, a divulgação de
uma lista detalhada com as obras não aprovadas não beneficiaria em nada a defesa do
ensino, mas “acarretaria inúteis vexames, senão prejuízos irreparáveis, a numerosos
autores e editores”. Para o Sindicato, deveria ser mantida a publicação da lista com os
livros didáticos aprovados e somente a relação com o número dos processos relativos
aos livros recusados, para que os interessados pudessem tomar conhecimento da recusa.
Outra solicitação do Sindicato era a participação do autor ou editor do livro didático em
sessão plenária da CNLD, para prestar esclarecimentos quando houvessem solicitado
recurso ao parecer da Comissão. Pedia, por fim, que o relator do recurso solicitado não
fosse o mesmo membro do parecer recorrido.
A resposta da CNLD foi assinada pelo Padre Leonel Franca, por Adalberto de
Meneses de Oliveira e Rodolfo Fuchs. A solicitação do Sindicato, de não divulgação da
lista de livros recusados, foi acatada pela Comissão. No entanto, a segunda solicitação –
de comparecimento do autor ou editor do livro didático em sessão plenária, quando
estes houvessem requerido recurso ao parecer da Comissão foi negada, sob a
justificativa de que a presença do interessado para esclarecimentos seria um
inconveniente grave. O recorrente deveria apresentar por escrito as razões que
justificassem o seu recurso à CNLD. A resposta esclarecia, ainda, que já era praxe da
Comissão solicitar outro membro como relator de obras com pedidos de reconsideração
(Sessão da CNLD, em 23/12/1941).
70

O caso Potsch - Mello Leitão

Alguns dos membros da CNLD eram autores de livros didáticos, como já foi
destacado anteriormente. Alguns deles eram Carlos Delgado de Carvalho, Jonathas
Serrano, Carneiro Leão e Cândido de Mello Leitão. Pelo fato de membros da Comissão
serem autores de manuais escolares, alguns questionamentos foram levantados sobre a
idoneidade do processo de avaliação. De acordo com os documentos encontrados,
existiam dúvidas sobre a avaliação, que poderia ter privilegiado a aprovação de
determinados livros didáticos em detrimento de outros, somente por uma questão de
reserva de mercado.
Em 1942, o professor do Colégio Pedro II, Waldemiro Potsch, autor de livro
didático de Zoologia reprovado pela CNLD e de livro de História Natural aprovado
com restrições, entrou com processo contra a Comissão, na pessoa do professor
Cândido de Mello Leitão. O processo gerou intensas discussões. Potsch publicou livro,
em 1942, que questionou o parecer da Seção de Ciências Físicas e Naturais e defendeu a
importância do seu livro. Na introdução do livro, o professor colocava em dúvida a
idoneidade dos avaliadores, com o argumento de que a reprovação de seu compêndio
tinha motivos mercadológicos, pois um dos avaliadores, o professor Mello Leitão
também era autor de livro didático de Zoologia. Nas palavras do professor Potsch:

(...) A simples leitura do parecer mostra, porém, a quem o vir, ainda que
jejuno em assuntos de História Natural, a deslealdade com que foi examinado
e julgado o compêndio de Zoologia.
O parecer apresenta a crítica mais vaga que se possa imaginar: não diz onde
está o erro, não aponta qual a noção incorreta que achou, não assinala qual a
imperfeição a que se refere, nem porque é “pouco feliz”, o que está no
compêndio, nem mostra porque considera incompleta a descrição que
condena.
A palavra do relator vale como verdade evangélica, mas o seu propósito é
apenas denegrir, desmoralizar a obra e afastar um concorrente do mercado
dos livros!
(...) imaginou a Seção de Ciências Físicas e Naturais que poderia ficar
senhora do mercado nacional de livros didáticos, desde que afastados fossem
os autores mais favorecidos pela preferência dos professores e alunos. (...) A
condenação da grande maioria, 72%, das obras submetidas ao julgamento,
não ofereceu a menor dificuldade à Secção de Ciências Físicas e Naturais.
(...) Em nome dos altos e superiores interesses do ensino, os professores
Cândido de Mello Leitão, João Pecegueiro do Amaral e Adalberto Meneses
de Oliveira condenaram a grande maioria dos compêndios que examinaram,
fechando-lhes as portas dos colégios, e limparam o mercado, proscrevendo as
obras tão cheias de “erros” e tão “perniciosas” à cultura brasileira (1942, pp.
6-9).
71

Potsch apelava ao governo federal, para que não permitisse o monopólio do


mercado do livro didático, pela Secção de Ciências Físicas e Naturais. Segundo o autor,
Mello Leitão possuía um livro de Zoologia com 1ª edição de 1924, um compêndio de
Botânica do mesmo ano e três volumes de História Natural, publicados a partir de 1933.
Os livros somente teriam recebido novas edições a partir de 1941, momento em que
Mello Leitão já era membro da CNLD. Para Potsch, foi nesta ocasião que os manuais de
Mello Leitão tornaram-se, “como por encanto”, modelos de livros didáticos de História
Natural. Destacava ainda, que após condenarem quase todos os livros de Ciências
Físicas e Naturais para 1ª e 2ª séries ginasiais, Mello Leitão e Pecegueiro do Amaral
publicaram compêndios da matéria para as duas séries.
A crítica em tom irônico centrava-se em Mello Leitão, pois Potsch havia
solicitado em 1936 - ano da primeira edição do seu livro de Zoologia -, que o professor
lesse seu compêndio e fizesse uma crítica autorizada, de modo que fosse possível
corrigir os erros apontados. Nesse ano, Mello Leitão era chefe da Seção de Zoologia do
Museu Nacional. O livro de Potsch foi doado por Mello Leitão à biblioteca do Museu,
sem nenhum tipo de anotação ou correção. Para Potsch, por ter sido o seu livro
oferecido à biblioteca, concluía-se que Mello Leitão considerava-o “digno da leitura dos
que procuram a biblioteca do Museu Nacional” (1942, p. 23). Mesmo depois de novo
pedido de Potsch, Mello Leitão não fez a leitura crítica do livro de Zoologia. Somente
analisou o livro em 1941, para o parecer da CNLD.
Potsch denunciava a atitude de Mello Leitão ao proferir uma aula pelo rádio para
a Universidade do Ar, em 19 de novembro de 1941. Na aula, o membro da CNLD teria
feito críticas veementes aos livros reprovados pela Comissão. Potsch enfatizava:

Haverá maior e mais clara demonstração pública de que não foi um juiz que
julgou o compêndio de Zoologia e outros compêndios de História Natural,
mas um autor despeitado que se vinga e procura conquistar o mercado dos
livros, aproveitando-se das funções oficiais num cargo de confiança do
Governo da República? (1942, p. 27).

No livro de 1942, Potsch respondeu a cada uma das críticas feitas pelos
pareceres, sobretudo do ponto de vista científico. Para se defender, o autor comparou
seus livros didáticos com os manuais de Mello Leitão e utilizou a definição de autores
renomados, para justificar seus argumentos.
72

Potsch criticou os pareceres por serem abstratos e vagos, por não dizerem em
que consistiam os erros e não indicarem onde eles se encontravam. Baseado em
consultas feitas a zoólogos brasileiros e utilizando bibliografias internacionais, tanto
didáticas como científicas, Potsch rebateu os questionamentos de Mello Leitão. Potsch
demonstrou que autores renomados em outros países (Alemanha, França, Dinamarca,
etc.) utilizavam as mesmas definições e os mesmos conceitos que os seus. Apontou
definições nos manuais didáticos do próprio Mello Leitão, para mostrar que o autor
apresentava explicações parecidas ou iguais as suas. Explicitou nos manuais de Mello
Leitão erros gramaticais, de ortografia e conceituais/científicos.
Potsch discutiu o julgamento de outros compêndios analisados pela Secção de
Ciências Físicas e Naturais, como o Compêndio de Química, 4ª série, de 1936, do
professor Arlindo Fróes57, o livro Exercícios práticos de Química, de George Summer e
Ricardo Vieira58, ambos avaliados por Pecegueiro do Amaral, e os manuais publicados
pelos irmãos Maristas, avaliados por Pecegueiro do Amaral e Adalberto Menezes de
Oliveira. É interessante observar que, na análise do parecer sobre o livro de Arlindo
Fróes, Potsch destacou que a definição de átomo-grama, considerada errada por
Pecegueiro do Amaral era descrita de modo idêntico no Compêndio de Química, 4ª
série, de autoria do relator. Nos livros dos Irmãos Maristas foram criticados os excessos
de conceitos religiosos presentes nas obras (Potsch, 1942, p. 58).
Em 1944, Potsch publicou novo livro sobre o andamento de seu processo contra
a CNLD e Mello Leitão. O livro continha a petição ao juiz de Direito da Vara Cível –
encaminhado por Jorge Dyott Fontenelle -, citando o professor Mello Leitão e
descrevendo os fatos que levaram ao processo. Pelo processo, Mello Leitão deveria
reparar os prejuízos e indenizar Potsch, não somente por danos morais, como por danos
materiais. Potsch encaminhara também uma representação ao Departamento
Administrativo do Serviço Público (DASP), contra Mello Leitão, pedindo o seu
afastamento do cargo na CNLD, caso não ficasse comprovada a resolução tomada pelo
relator do parecer (1944, p. 577).
O livro de 1944 descrevia a contestação de Mello Leitão contra Waldemiro
Potsch, com 45 itens que consideravam a ação do professor do Pedro II improcedente.
Em seguida detalhava a resposta de Potsch à contestação, incluindo alguns
questionamentos feitos à CNLD. Potsch denunciava, ainda, que Mello Leitão teria

57
Professor do Colégio Pedro II.
58
Professores do Colégio Pedro II.
73

cometido plágio, ao traduzir e copiar trechos do livro Text-Book of Zoology, de Parker e


Haswell. O caso Potsch-Mello Leitão repercutiu na imprensa. Em abril de 1944, o jornal
O Globo publicou duas entrevistas: primeiramente com Waldemiro Potsch, seguida da
entrevista com Mello Leitão.
Em 1945, o professor e biólogo do Instituto Oswaldo Cruz, Herman Lent
publicou novo livro sobre o andamento do processo Potsch-Mello Leitão, com os
pareceres da perícia técnica e sua impugnação. Lent foi convidado para ser assistente-
técnico de Potsch na ação. Em um primeiro momento o parecer da perícia foi favorável
à CNLD. Contudo, o professor Lent contestou o laudo do perito Dr. Olympio da
Fonseca Filho e solicitou sua impugnação. Na impugnação, Lent questionou um a um
os quesitos discutidos pelo laudo e a resposta do perito, concluindo que o Dr. Olympio
da Fonseca Filho foi parcial na perícia que realizou (Lent, 1945). O último volume
sobre o caso Potsch-Mello Leitão foi publicado em 1946. Após a impugnação de Lent,
nova perícia foi feita, em 1945. Segundo Lent, o perito no novo laudo somente
preocupou-se em investir contra ele. O laudo da perícia foi novamente impugnado por
Lent em novembro de 1945, que o considerou parcial em favor de Mello Leitão (Lent,
1946). Não foi encontrado nenhum outro volume que descrevesse o desenrolar do caso.
Ao longo do processo movido por Potsch, a Congregação do Colégio Pedro II
expressou algumas manifestações de apoio ao professor. Na sessão de 10 de abril de
1944, a Congregação aprovou por unanimidade um voto de louvor pela publicação da
defesa do professor Potsch. Na sessão de 20 de novembro de 1944, a Congregação
votou uma moção de apoio a defesa do professor e de seus manuais. Na sessão de 28 de
novembro de 1947, Potsch se manifestou contrário a adoção do livro didático de Mello
Leitão para o ano de 1948 e solicitou a formação de uma comissão para avaliar os livros
do professor pela acusação de plágio. A comissão estava constituída pelos professores
José Oiticica, Ciro Romano Farina e Roberto Accioli. Na sessão de 7 de janeiro de
1948, a Congregação decidiu por não adotar os manuais de Mello Leitão, ao confirmar
o princípio de plágio cometido pelo autor.
As discussões realizadas pela Congregação do Colégio Pedro II não esclarecem
se o professor Potsch ganhou o processo contra Mello Leitão, mas demonstram que,
provavelmente, seu livro permaneceu sem a autorização da CNLD, pois em 1947, a
Congregação discutiu sobre a necessidade de adoção de outro manual escolar para a
disciplina de Ciências Físicas e Naturais.
74

O caso do professor Pecegueiro do Amaral

Pecegueiro do Amaral escreveu em 27 de agosto de 1945 para o Ministro


Gustavo Capanema, afirmando sua saída da CNLD, em razão de uma moção destinada a
ele referente ao recurso solicitado por um autor/editor de livro didático avaliado, e que
não obteve autorização de uso. Segundo Amaral, o recurso questionava o resultado do
processo n° 59.377/42 e acusava “gravemente sua pessoa” como relator do parecer. O
recurso permaneceu em discussão na CNLD, no Inep e no Ministério da Educação,
desde 1942. De acordo com a carta de Amaral, a CNLD resolveu solicitar ao Ministro
Capanema que nomeasse uma comissão estranha a ela para reexaminar o livro avaliado
por ele e não autorizado. No entanto, a própria Comissão havia aprovado por
unanimidade o parecer de recusa do livro didático. Por tal resolução, Pecegueiro do
Amaral sentiu-se atacado pela própria CNLD, o que motivou seu pedido de exoneração.
Gustavo Capanema, em 14 de setembro de 1945, encaminhou pedido a Pecegueiro do
Amaral para que reconsiderasse sua decisão e continuasse como membro da Comissão.
Pela falta de documentação, duas informações necessárias ficaram em aberto: não se
sabe qual o livro avaliado e recusado e se Amaral permaneceu ou não na CNLD.

Reestruturação da CNLD

Segundo documento encaminhado ao Ministro Gustavo Capanema em 1 de


março de 1944, por Fernando de Souza Castro, em junho de 1942, por meio da Portaria
n° 145, os membros da CNLD não foram reconduzidos aos cargos. Somente
permaneceu em funcionamento a secretaria da Comissão. O documento apresentava,
ainda, lista com a distribuição dos livros na CNLD, até dezembro de 1941. Dos 1.818
manuais inscritos para avaliação da Comissão, 19 foram autorizados, 248 negados, 139
dependiam da avaliação da Seção de Redação e 90 dependiam de votação em sessão
plenária. Ainda restavam 1.312 livros a examinar. Para Ferreira (2008, p. 106), um dos
motivos que paralisaram os trabalhos da CNLD foram as aplicações das Leis Orgânicas
de Ensino59, especialmente, a Lei Orgânica do Ensino Secundário.

59
As Leis Orgânicas foram: Ensino Técnico e Industrial, pelo Decreto-lei n. 4.073 (30/1/1942); Ensino
Secundário, pelo Decreto-lei n. 4.244 (9/4/1942); Ensino Comercial, pelo Decreto-lei n. 6.141
(28/12/1943); Ensino Primário, pelo Decreto-lei n. 8.529 (2/1/1946); Ensino Normal, pelo Decreto-lei n.
8. 530 (2/1/1946); e Ensino Agrícola, pelo Decreto-lei n. 9.613 (20/8/1946).
75

Pela Lei Orgânica do Ensino Secundário n. 4.244/42, o ensino secundário seria


ministrado em dois ciclos: o ginásio e o colégio. O ginásio ministraria o curso de
primeiro ciclo com duração de quatro anos e destinava-se a “dar aos adolescentes os
elementos fundamentais do ensino secundário”. O colégio era responsável pelos cursos
do segundo ciclo e dividia-se em clássico e científico. O curso clássico e o curso
científico, cada qual com três anos de duração, teriam por objetivo “consolidar a
educação ministrada no curso ginasial”, “desenvolvê-la e aprofundá-la”. O curso
clássico priorizaria a formação intelectual, com maior conhecimento de filosofia e
“acentuado estudo das letras antigas”. No curso científico, essa formação seria marcada
por “um estudo maior de ciências”. Após conclusão do colégio (clássico ou científico),
os alunos, “mediante a prestação dos exames de licença” poderiam ingressar em um
curso de ensino superior. A Reforma do Secundário manteve os exames de admissão e
intensificou o controle e fiscalização federal sobre as escolas, consideradas equiparadas
ou reconhecidas60.
A Lei Orgânica do Ensino Secundário n. 4.244/42, estabelecia que novos
programas deveriam ser elaborados para as disciplinas. Na organização do currículo, a
reforma priorizou a formação humanística, privilegiando, de acordo com Souza (2008,
p. 172), “a formação geral desinteressada, atendendo aos interesses dos grupos
conservadores”. Nesse sentido, o Latim, que era obrigatório no curso Clássico, passou a
ser ministrado, também, nas quatro séries do ginásio, o que implicou um relativo
aumento de sua carga horária. Sobre o idioma pátrio, conforme Razzini (2000, p. 104), a
Reforma Capanema concretizou o Português como língua oficial, que seria ministrado
em todo o curso secundário, com o aumento de sua carga horária de 16 para 23 aulas
semanais. Segundo Souza, o estudo da língua portuguesa cumpria desse modo, “um
objetivo político como elemento promotor da identidade e da integração nacional”
(2008, p. 177).
Em 27 de abril, Capanema baixou a Portaria n. 101, que constituiu uma
comissão geral para a elaboração dos programas para os cursos ginasiais. A Comissão
foi composta pelo diretor geral do Departamento Nacional de Educação, os diretores da
Divisão de Ensino Secundário e da Divisão de Educação Física e pelos professores,
coronel Pedro Mariani Serra, Álvaro Ferdinando de Souza da Silveira, Ernesto de Faria,
Maria Junqueira Schmidt, Osvaldo Serpa, Euclides Roxo, Costa Ribeiro, João

60
Segundo Souza (2008, p 173), os estabelecimentos equiparados eram os mantidos pelos estados ou
Distrito Federal, os reconhecidos eram mantidos pelos municípios ou eram instituições particulares.
76

Pecegueiro do Amaral, Cândido de Mello Leitão, Jonathas Serrano, Carlos Delgado de


Carvalho, Nereu Sampaio, Rocha Lima, Heitor Villa-Lobos e Germaine Marsaud.
Verifica-se, portanto, que alguns membros da CNLD atuaram diretamente na
elaboração dos novos programas. Em julho de 1942 os programas das disciplinas do
curso ginasial foram divulgados pela Portaria n. 170.
Em 4 de março de 1944, o ministro Capanema escreveu ao presidente Getúlio
Vargas para explicar a necessidade da re-instalação e funcionamento da CNLD.
Justificava tal necessidade ao enfatizar que, com a renovação e ampliação da legislação
pedagógica do país (as leis orgânicas), era imprescindível a revisão da literatura
didática. Encaminhava desse modo novo projeto de decreto-lei que regularia o
funcionamento da Comissão. O decreto-lei foi promulgado em 11 de março de 1944,
sob n° 6.339, reestruturando a CNLD, que passou a ser composta por quinze membros e
a funcionar por meio de subcomissões especializadas, que se reuniriam e decidiriam
separadamente e de forma independente. O presidente da Comissão seria designado
pelo Ministro da Educação. A publicação oficial dos livros didáticos autorizados para
uso nas escolas passaria a ser atribuição do INL.
Em duas portarias ministeriais, n° 468 e 469, ambas de 13 de outubro de 1944,
Capanema determinava quais seriam as subcomissões e seus membros:

Língua Portuguesa e Línguas Antigas – Arduino Bolívar, Álvaro


Ferdinando de Sousa Silveira, Padre Leonel Franca;
Línguas Vivas Estrangeiras – Maria Junqueira Schmidt, Joaquim Rufino
Ramos Jubé Jr., Arduino Bolívar;
Matemática – Euclides de Medeiros G. Roxo, Pedro Mariani Serra,
Adalberto Menezes de Oliveira;
Ciências Físicas e Naturais – João Batista Pecegueiro do Amaral, Cândido
Firmino de Mello Leitão, Adalberto Menezes de Oliveira;
Filosofia e Ciências Sociais - Padre Leonel Franca, Jonathas A. da Silveira
Serrano, Theobaldo de Miranda Santos, Carlos Delgado de Carvalho,
Joaquim Rufino Ramos Jubé Jr. (Portaria Ministerial n° 469, de 13/10/1944).

A lista incluiu novos nomes - os professores Pedro Mariani Serra61 e Theobaldo


de Miranda Santos62 - e trouxe de volta o prof. Cândido de Mello Leitão que havia

61
Pedro Mariani Serra participou, como já foi apresentado, da elaboração dos programas para o ensino
secundário de 1942.
62
Theobaldo de Miranda Santos era professor do Instituto de Educação do Distrito Federal, de Filosofia
da Educação da Universidade Católica e da Faculdade de Filosofia de Santa Ursula. Foi professor de
Prática do Ensino Primário na Universidade do Distrito Federal. Autor de diversos livros de História,
Psicologia, Sociologia e Filosofia da Educação. Autor de livros didáticos.
77

solicitado exoneração do cargo em 194163. A CNLD foi instalada em 26 de outubro de


1944.
Para exame de cada livro, o presidente da CNLD designaria um relator e um
revisor. O relator deveria apresentar seu parecer no prazo de vinte dias, contando da
data do recebimento do livro. O revisor teria o prazo de cinco dias para exame do
manual. A partir de abril de 1942, somente seriam aprovados os livros que estivessem
de acordo com a Lei Orgânica do Ensino Secundário. Os manuais anteriores a essa data
somente seriam avaliados quando o requerente manifestasse, por escrito, o desejo de
que os manuais fossem examinados.
Essa era uma tentativa de agilizar o processo de avaliação e autorização dos
livros didáticos, pois, desde o início dos trabalhos, a CNLD não conseguia analisar
todas as obras encaminhadas pelas editoras. Em agosto de 1944, uma relação de livros
didáticos avaliados pela CNLD foi encaminhada ao Inep, constando de 303 obras
julgadas. A primeira lista apresentava 74 livros aprovados, sem ser ouvida, no entanto, a
Secção de Redação. A segunda lista apresentava 225 livros não aprovados. Em outubro
do mesmo ano, o Ministro Capanema baixou uma portaria determinando que somente
fossem avaliados os livros didáticos para o Ensino Secundário.
Em fins de 1944, Euclides Roxo encaminhou a Capanema o Relatório sobre as
atividades da CNLD no ano de 1944. Segundo o relatório, nesse ano, 89 livros didáticos
foram avaliados de um total de 384 livros inscritos pelas editoras. Em um primeiro
momento, os trabalhos da CNLD priorizaram os livros encaminhados depois da
promulgação da Lei Orgânica do Ensino Secundário. Roxo manifestava preocupação no
modo como proceder em relação aos livros encaminhados antes da decretação da Lei
Orgânica. Ainda de acordo com o relatório, as subcomissões que estavam mais
adiantadas em seus trabalhos eram as de Ciências Físicas e Naturais, Matemática e
Línguas Vivas. Roxo afirmava que, se as demais subcomissões seguissem o ritmo das
anteriormente citadas, até o fim de 1945 todos os livros seriam avaliados, podendo ser
fixada para 1º de março de 1946, a data a partir da qual não se permitiria a adoção de
livros didáticos que não obtivessem autorização do Ministério da Educação. Por fim,
Roxo argumentava que a falta das instruções metodológicas e programas de ensino de
várias disciplinas do ensino secundário, dificultava o trabalho dos membros da CNLD.

63
Carneiro Leão, Gustavo Mendes de Oliveira Castro, Abgar Renault, Ruy da Cruz Almeida, os oficiais
Waldemar Pereira Cotta, Alonso de Oliveira e os membros da Seção de Metodologia das técnicas -
Comandante Armando Pina, José de Melo Moraes, Rodolfo Fuchs – não foram reconduzidos à CNLD.
78

Alguns programas, como os de Desenho para o curso ginasial, Geografia, História Geral
e do Brasil e Filosofia para curso colegial, somente seriam publicados a partir de 1945.
Em documento de 28 de agosto de 1945, o presidente da CNLD informava ao
Ministro Capanema que até o fim do ano todos os livros didáticos para o ensino
secundário seriam avaliados, podendo, assim, ser fixada para 1º de março de 1946 a
data de proibição de uso dos livros didáticos não autorizados. A lista com os livros
autorizados deveria ser publicada em janeiro de 1946. Com o adiantado dos trabalhos da
CNLD, em relação aos livros para ensino secundário, Roxo afirmava poder ser iniciada
a avaliação dos manuais para ensino primário. Contudo, faltava ser indicada a comissão
especial para avaliar os manuais dos membros da CNLD e designar a subcomissão de
ensino de Leitura e Linguagem, que seria constituída pelos professores Theobaldo de
Miranda Santos, Ismael de Lima Coutinho e Otelo de Souza Reis (substituindo a
professora Maria Junqueira Schmidt). Roxo solicitava, além disso, que fossem criadas
subcomissões especiais para a avaliação de livros didáticos de Música e Desenho, pois
existia grande número de manuais dessas disciplinas aguardando julgamento.
Em novembro de 1945, com o fim do Estado Novo, a reabertura política e a
saída de Gustavo Capanema do Ministério da Educação, dois novos decretos-lei sobre a
autorização de livros didáticos foram sancionados pelo Ministro provisório Raul Leitão
da Cunha. O decreto-lei n° 8.222, de 26 de novembro de 1945, que modificou o
processo de autorização de livros didáticos de membros da CNLD e o decreto-lei n°
8.460, de 26 de dezembro, que reestruturou a legislação sobre o livro didático.
De acordo com o decreto-lei n° 8.222/45, os livros didáticos de membros da
CNLD submetidos à avaliação receberiam parecer de dois catedráticos da especialidade
ou de disciplinas congêneres, que exercessem funções em escolas superiores oficiais ou
reconhecidas. Os pareceristas - que não poderiam ter livro didático de sua autoria
avaliado por nenhum membro do CNLD -, seriam escolhidos dentre uma lista
organizada pelo CNE. O decreto-lei n° 8.460/45 adequou a legislação sobre o livro
didático, sua produção, importação e utilização. De modo geral o decreto reafirmou as
funções da CNLD estabelecidas pelo decreto-lei n° 1.006/38, e incorporou as mudanças
que foram sendo sancionadas por diversos decretos nos anos anteriores. Os critérios de
eliminação dos livros didáticos sofreram poucas modificações. Alguns termos foram
alterados, mas de modo geral os itens mantiveram-se os mesmos. As mudanças
significativas relacionaram-se à produção e importação de livros didáticos escritos em
língua estrangeira e destinados as escolas primárias, e à escolha dos manuais pelos
79

professores. Enquanto no decreto-lei n° 1.006/38, professores e diretores poderiam


escolher os livros, o decreto-lei n° 8.460/45, retirou a menção aos diretores e
estabeleceu a liberdade de escolha dos professores:

Art. 1º. É livre, no país, a produção ou importação de livros didáticos, salvo


daqueles total ou parcialmente escritos em língua estrangeira, quando
destinados a uso de alunos nas escolas primárias (...);
Art. 5º. Os poderes públicos não poderão determinar a obrigatoriedade de
adoção de um só livro ou de certos e determinados livros para cada grau ou
ramos de ensino nem estabelecer preferência entre os livros didáticos de uso
autorizado, sendo livre aos professores de ensino primário, secundário,
normal e profissional a escolha de livros para uso dos alunos, uma vez que
constem da relação oficial das obras de uso autorizado (Decreto-lei n° 8.460,
de 26/12/1945).

A CNLD permaneceria com quinze membros, funcionando por meio das


subcomissões especializadas que decidiriam de modo independente. O Ministério da
Educação passaria a divulgar semestralmente, no Diário Oficial, a relação completa dos
livros de uso autorizado.
Com o fim do Estado Novo e o período de redemocratização, a Comissão
Nacional do Livro Didático continuou a existir. Até o início dos anos 1960, os livros
avaliados apresentavam em sua capa ou página de rosto, o número de aprovação da obra
na Comissão ou no Ministério da Educação. Contudo, ao longo dos anos 1950, as
avaliações da CNLD começaram a ser questionadas por grupos vinculados as
Faculdades de Filosofia das Universidades, que se articulavam em outros órgãos do
aparato Estatal, como o Inep. Novos projetos começaram a ser pensados para a
educação brasileira, com destaque para o ensino secundário que se expandia
aceleradamente, e para o livro didático. A uniformização e padronização dos conteúdos
dos livros didáticos passaram a ser questionadas. Dentre os projetos destacavam-se a
Campanha de Inquérito e Levantamento do Ensino Médio e Elementar (Cileme), a
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme) e, posteriormente, o
Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE) e os Centros Regionais de
Pesquisas Educacionais (CRPEs). No próximo capítulo será analisado o lugar do livro
didático nesse novo contexto político e educacional.
80

CAPÍTULO 2

A CAMPANHA DO LIVRO DIDÁTICO E MANUAIS DE ENSINO E O


PROBLEMA DA EDUCAÇÃO SECUNDÁRIA

_____________________________________________________________________

Com o fim do Estado Novo, iniciaram-se discussões no Brasil para a elaboração


de uma nova Constituição (promulgada em 1946), que estabelecia a criação de uma Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Em 1948, o Ministro da Educação
Clemente Mariani apresentou ao Congresso Nacional o primeiro projeto da LDB. Na
exposição de motivos do projeto, o Ministro destacava algumas questões: a necessidade
da descentralização do ensino; a articulação da educação, desde o ensino infantil até o
superior; a democratização do ensino secundário; a flexibilização do currículo; entre
outros assuntos. Tais questões eram parte dos debates que começavam a se intensificar
no fim dos anos 1940. O projeto passou por um longo processo de discussões no
Congresso e na sociedade civil, até ser aprovado em 1961.
A questão educacional passou a ser discutida, nesse período, por diferentes
setores sociais, que afirmavam ser preciso erradicar o analfabetismo, expandir a rede de
ensino, organizar o ensino técnico profissional, adequar os currículos às peculiaridades
regionais, etc. Nesse contexto, a luta popular pela democratização e expansão da escola
pública secundária se intensificou e forçou a ampliação da educação escolar, gerando
um aumento significativo de crianças nas escolas. De acordo com Spósito (1992), as
classes populares, principalmente urbanas, pressionavam para ter acesso à escola
secundária, que se expandia nos anos 195064. Um público que não tinha acesso à
educação agora estava em sala de aula.
De acordo com Braghini (2005), população brasileira cresceu significativamente
nos anos 1950 e aumentou o número de adolescentes. Esse aumento era um dos fatores
que impulsionava necessidade da reforma e reestruturação do ensino secundário (2005,
p. 63). Segundo a autora, para parte dos intelectuais e educadores da época, o ensino
secundário, sua estrutura acadêmica, seu currículo, métodos de trabalho, “a didática
empregada, a formação dos professores, os conteúdos de ensino, tudo, absolutamente
64
Lourenço Filho, então diretor do Departamento Nacional de Educação, apresentou, em 1950, um
panorama do ensino secundário brasileiro para o Conselho Nacional de Educação. De acordo com seu
estudo, as matrículas no ensino médio tiveram um grande crescimento entre os anos de 1933 a 1946. O
ensino comercial teve aumento de 320%, o artístico 137%, o industrial 50% e o ensino secundário 330%
(Lourenço Filho, 1950, p.79).
81

tudo poderia, na verdade, deveria, ser melhor distribuído, ser modificado” (2005, p. 64).
Precisava-se de uma nova escola, que atenderia a necessidade dos adolescentes que
pediam por acesso ao secundário e, ao mesmo tempo, ampliaria sua função normativa,
ao abandonar o ensino verbalista e colocar em prática “um ensino mais ágil, mais
convenientemente adaptado ao novo tempo histórico” (Braghini, 2005, p. 64).
A ampliação do ensino secundário aumentou a premência por contratação de
professores e expôs a necessidade de uma nova concepção de educação para esse nível
de ensino, com características elitistas e com o objetivo de preparar para o vestibular.
Segundo Braghini (2005), para os intelectuais que escreviam na Revista Brasileira de
Estudos Pedagógicos (RBEP)65, publicada pelo Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (Inep), o currículo do ensino secundário, ainda de acordo com a Lei
Orgânica de 1942, entrava em choque com as novas demandas da época. Esse
intelectuais criavam um discurso que opunha o “velho e o novo”, as “reminiscências do
período Vargas/Capanema e o desenvolvimentismo do JK” (Braghini, 2005, p. 9). Esse
discurso de oposições criticava a educação das elites, a Lei Orgânica, e afirmava a
necessidade de uma educação pragmática, que oferecesse possibilidades para todos os
jovens e que desenvolvesse as aptidões pessoais. Debates começaram e ser travados
sobre a finalidade do ensino secundário, a necessidade de articulação do primário e o
ensino técnico-profissional e a necessidade de “renovação didática em conformidade
com o pensamento pedagógico em circulação” (Souza, 2008, p. 146).
A Lei Orgânica de 194266 orientou a educação secundária até 1961, com a
promulgação da LDB n. 4.024. Contudo, como afirma Fonseca (2004), essa lei foi
alterada e descaracterizada ao longo dos anos pela prática do ministério que promulgava
decretos, decretos-lei, portarias e circulares, “pelo Congresso Nacional (leis), bem como
pelos demais agentes da educação nacional tais como proprietários de estabelecimentos
de ensino, professores, governos estaduais, dentre outros” (p. 27). A partir dos anos
1950, o MEC intensificou sua atuação em relação ao ensino secundário. Criou o Fundo

65
A RBEP começou a ser publicada pelo Inep em 1944. De acordo com Braghini (2005), a RBEP foi
criada com o objetivo de divulgar “princípios fundamentais e ‘mais modernos’ da educação para a criação
de uma ‘consciência pública esclarecida’” (p. 17). A RBEP divulgava os métodos de aplicar os princípios
educacionais. Nos anos 1950, a revista publicava as pesquisas realizadas pelo Inep e seus colaboradores.
A revista era destinada a docentes de cursos de formação de professores, estudantes de escolas normais e
das faculdades de educação, administradores de ensino, professores primários, etc.
66
Vale lembrar que, pela Lei Orgânica n. 4.244 de 1942, o ensino secundário era dividido em ginásio e
colégio. O ginásio destinava-se a ministrar o curso de primeiro ciclo e teria quatro anos de duração. O
colégio abarcava os dois cursos do segundo ciclo: o clássico e o científico, com três anos de duração cada.
O colegial tinha o objetivo de consolidar a educação ministrada no curso ginasial. O curso clássico
priorizava uma formação humanística; no curso científico a formação dava ênfase ao estudo das ciências.
82

Nacional do Ensino Médio67, a Campanha de Difusão e Aperfeiçoamento do Ensino


Secundário (Cades)68, reforçou o papel do Inep e criou as Inspetorias Seccionais69 para
fiscalizar os estabelecimentos de ensino secundário.
Nessa mesma época surgiram revistas que discutiam a educação brasileira, seus
objetivos, a situação dos estabelecimentos, o problema do ensino secundário,
propunham novas metodologias e técnicas de ensino para as diferentes disciplinas
escolares, divulgavam a legislação educacional e difundiam o pensamento pedagógico
nacional e internacional. Tais revistas eram destinadas a pesquisadores, alunos das
escolas normais, dos cursos de Pedagogia, das Faculdades de Filosofia e aos
profissionais do ensino secundário70.
Os objetivos e métodos didáticos começaram a ser questionados nos anos 1940 e
1950, por um novo corpo de professores, formados pelos cursos das Faculdades de
Filosofia Ciências e Letras, criados a partir de 1934. Esse momento foi determinado,
além disso, pela crítica ao ensino literário e a formação baseada nas humanidades
clássicas, com a concretização do currículo científico. Bittencourt afirma que:

os anos 50 foram marcados pela consolidação do currículo científico,


fornecendo novo status às áreas de conhecimento das ciências exatas. Os
métodos e conteúdos de ensino das disciplinas correspondentes provinham de
projetos norte-americanos e estavam visivelmente direcionados para a
formação de elites voltadas para a produção tecnológica, as quais deveriam

67
O Fundo Nacional do Ensino Médio, foi criado em 1954, pela Lei n. 2.432, tinha o objetivo de auxiliar
para a manutenção, aperfeiçoamento, difusão e acessibilidade do ensino de grau médio, contribuindo
financeiramente, de acordo com as necessidades dos aluno, professores e dos estabelecimentos, visando
aumentar as oportunidades educacionais, sem afetar a qualidade do ensino e a remuneração dos docentes
(Fonseca, 2004, p. 86).
68
A Cades foi criada pelo Decreto n. 34.638, de 17/11/1953, e era organizada pela Diretoria do Ensino
Secundário do Ministério da Educação, sob coordenação de Gildásio Amado. Tinha o objetivo de
organizar “uma série de atividades voltadas para a melhoria do ensino secundário” (Fonseca, 2004, p. 96).
Dentre suas funções organizaria cursos de aperfeiçoamento e elaboraria os exames de suficiência para
professores.
Em 1957, a Cades começou a publicar a revista Escola Secundária, com o objetivo de divulgar as
atividades da Campanha. A revista publicava artigos sobre temas importantes do ensino secundário do
período, “artigos com modelos de planejamento, de avaliações e de aulas por disciplina bem como
discussões sobre os objetivos e as dificuldades de cada disciplina do segmento” (Fonseca, 2004, p. 96).
Segundo Fonseca, a revista era destinada aos professores do ensino secundário, principalmente os
professores de escolas particulares e municipais, que freqüentavam os cursos oferecidos pelo MEC (2004,
p. 55).
69
As Inspetorias Seccionais foram criadas pela Portaria n. 501, de 1952.
70
Das revistas de instituições públicas destacavam-se: a RBEP – do Inep, a revista Escola Secundária –
da Cades, a Revista de Pedagogia - da USP, a revista Educação e Ciências Sociais – do CBPE, revista da
Campanha Nacional de Educação Rural – MEC.
As editoras também começaram a publicar revistas em que divulgavam suas obras e discutiam questões
educacionais. Dentre elas destacavam-se: Revista do Magistério – da Livraria Francisco Alves, Revista
Atualidades pedagógicas – da Companhia Editora Nacional e a EBSA – Revista da Editora do Brasil.
83

estar submissas aos interesses do capitalismo assim como aos valores


propugnados pela Guerra Fria (2005, p. 89).

Entre 1945, com o fim do Estado Novo, e meados dos anos 1960, durante a
Ditadura Militar, o Ministério da Educação ampliou o diálogo, principalmente por meio
do Inep, com Ministérios e instituições relacionadas à educação de outros países, com
destaque para as parcerias com os Estados Unidos da América e a Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Em meio ao debate sobre a urgência de se reformular o ensino, cresceram os
questionamentos sobre o papel dos livros didáticos na educação. O “problema do livro
didático” estava em discussão no Ministério da Educação, nos meios acadêmicos e no
Congresso Nacional. Nos espaços internacionais, em meio à Guerra Fria, a Unesco
organizava debates sobre a necessidade de se regular e controlar os livros didáticos.
Segundo documento da Organização, publicado em 1951, no pós-guerra, uma das metas
daquele órgão era indicar a revisão dos manuais escolares, sobretudo os livros de
História e Geografia, procurando eliminar conteúdos que apresentassem estereótipos e
preconceitos contra os diferentes grupos e povos (Unesco, 1951). A Unesco pretendia
realizar exames de livros escolares dos Estados que dela faziam parte, dentro do quadro
dos acordos bilaterais ou multinacionais, estimulando a ação das organizações
internacionais. Algumas das resoluções da quinta Conferência Geral da Unesco
estabeleciam os seguintes pontos:

Solicitar aos Estados membros a empreender ou a prosseguir o exame critico


de seus manuais escolares, tendo particularmente em conta os trabalhos dos
seminários de 1950, sobre o melhoramento dos manuais escolares,
assinaladamente os de história, e sobre o ensino da geografia a serviço da
71
compreensão internacional (Unesco, 1951, p. 55).

É dentro desse contexto, sobre a necessidade de renovação dos métodos de


ensino e atualização dos livros didáticos, que Anísio Teixeira, então diretor do Inep,
criou a Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme), visando analisar
os livros didáticos que estavam em circulação no país e propor a elaboração de novos
guias e manuais de ensino para os professores. Esse foi um dos principais espaços em
que se realizou a política de estudo e produção de material didático nos anos 1950 e que

71
No original: “Se invita a los Estados miembros a empreender o a prosseguir el examen critico de sus
manuales escolares, teniendo particularmente en cuenta los trabajos de los seminários de 1950, sobre el
mejoramiento de los manuales escolares, señaladamente los de historia, y sobre la enseñanza de la
geografia al servicio de la comprensión internacional”.
84

influenciou os debates relacionados às novas propostas didático-pedagógicas. O


presente capítulo abordará as análises e discussões sobre os livros didáticos realizados
pela Caldeme.72
Criada em 1952, a Caldeme foi organizada pelo Inep e passou, a partir de 1956,
à responsabilidade do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), instituição
pertencente ao Inep, que existiu até 1976. Entender essa Campanha e a atuação
vinculada ao CBPE/Inep é esclarecedor para se compreender a importância que o livro
didático teve nos debates dos anos 1950 e 1960, e sua relação com as discussões sobre o
ensino nos diversos níveis: primário, secundário, profissional e o ensino superior.
Compreender os debates travados nesse momento ajudam, ainda, a esclarecer questões
do período seguinte, durante a Ditadura Militar, com a criação da Comissão do Livro
Técnico e Didático (Colted).

O problema do livro didático

Com o período de redemocratização, a existência da CNLD dividiu opiniões.


Em alguns momentos foi questionada, em outros, foi defendida. Em 1947, durante a
gestão de Clemente Mariani como Ministro da Educação, foi solicitado um parecer
jurídico a respeito da legalidade ou não da CNLD, “tendo em vista a vigência da nova
Carta Constitucional de 1946” (Oliveira et al. 1984, p. 43).
Em abril de 1951, durante o segundo governo de Vargas, declarações do novo
Ministro da Educação, Ernesto Simões Filho, ao jornal A Noite, afirmando que o
governo iria controlar a utilização e escolha dos livros escolares incitaram a Câmara
Brasileira do Livro (CBL)73 a divulgar um memorial discutindo a política do livro
didático no Brasil.

72
O professor Dr. Kazumi Munakata desenvolveu as primeiras pesquisas sobre a Caldeme, organizadas
em dois projetos financiados pelo CNPq: “A produção de livros Didáticos e materiais de ensino pelas
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino/(Caldeme)/Campanha Nacional de Material de Ensino
(CNME), do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep)” e, “A política de livro didático no regime
militar: da Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme)/Campanha Nacional de Material
de Ensino (CNME) à Comissão do Livro Técnico e Didático (Colted) e à Fundação Nacional de Material
Escolar (Fename)”. Boa parte da bibliografia utilizada neste capítulo são resultado de suas pesquisas.
73
Segundo informações do site da CBL, a Câmara foi criada em 1946, em são Paulo, com o objetivo de
discutir os problemas do setor livreiro e editorial de forma conjunta e organizada. De acordo com seu
estatuto a CBL tinha o objetivo de defender e difundir o livro, representar seus associados junto a outras
instituições, órgãos governamentais e a sociedade em geral, procurando defender os interesses da
indústria editorial e livreira e seu desenvolvimento. Teve como primeiro presidente Jorge Saraiva. A
partir de 1948, passou a organizar os Congressos de Editores e Livreiros do Brasil. Site:
http://www.cbl.org.br/telas/cbl/historia.aspx, acesso em 20/12/2010.
85

O memorial fazia um breve histórico da política nacional do livro didático,


desde o Decreto-lei n° 1.006/38 até os anos 1950. Afirmava que sempre existira
liberdade de produção e de escolha dos manuais, ficando o governo responsável pelo
controle da qualidade e do preço dos livros, por meio da CNLD. De acordo com a CBL,
o princípio da liberdade de produção elevava a qualidade dos manuais tanto em seu
conteúdo, como no aspecto material. Enfatizava que a qualidade dos livros didáticos
estava melhorando, pois os autores e editores seguiam todas as emendas e sugestões
indicadas pela CNLD. Segundo o documento, não existia no Brasil “o problema do
livro didático”, nem em relação à quantidade de livros produzidos, nem quanto ao preço
e à qualidade.
A CBL questionava, desse modo, a entrevista do Ministro da Educação, e
afirmava estar surpresa com a declaração. Para justificar os argumentos contrários a ao
controle do Estado, citava as resoluções do Seminário Interamericano de Educação
Primária, realizado em Montevidéu, de 25 a 30 de outubro de 1950. As resoluções
concernentes aos textos e materiais didáticos orientavam a criação de mercados livres
para os livros escolares, sugeriam que os órgãos governamentais não centralizassem a
produção e edição dos livros didáticos e que os órgãos centralizadores do governo,
como o Ministério da Educação, somente controlassem a produção de livros no sentido
de proibir a publicação de material considerado imoral e de mal gosto (Memorial, CBL,
1951).
Por fim a CBL expressava a preocupação das editoras de livros didáticos quanto
à reforma dos programas dos cursos ginasial e colegial, promulgadas em outubro de
1951, que seria colocada em execução no ano de 1952 e causaria um grande prejuízo às
editoras – que precisariam publicar aceleradamente novos livros adequados aos
programas -, e às famílias, que teriam de comprar os livros. A Câmara solicitava ao
Ministro que os novos programas fossem aplicados de modo progressivo.
Nos meios parlamentares, foram apresentados projetos sobre o problema do
livro didático. Entre eles a discussão do projeto do deputado Aurélio Vianna, que
propunha a permanência dos livros didáticos nas escolas por quatro anos. No final de
1951, foi promulgada no estado de São Paulo a lei n° 1.536, que criou a Comissão
Estadual do Livro Didático, “com a função de declarar quais as obras didáticas
recomendadas pelo governo do estado para futura adoção nas escolas” (Oliveira et al.,
1984, p. 45). A criação de uma comissão estadual para legislar sobre o livro didático
entrou em choque com a CNLD e intensificou as discussões sobre a questão das
86

políticas centralizadoras em contraposição à autonomia dos estados na definição de suas


políticas educacionais.
Segundo Franco (1980), o professor Lourenço Filho consultou em 1952, o
Conselho Nacional de Educação (CNE) sobre a legitimidade de uma comissão estadual
que julgasse livros didáticos, se já existia uma legislação federal, com a CNLD
encarregada de avaliar e autorizar as obras destinadas ao ensino (p. 34). Em outra
esfera, observou-se que a CBL foi uma das entidades que mais atuou contra a lei n°
1.536 de São Paulo, considerando-a inconstitucional por violar a liberdade de cátedra,
ao determinar que a Comissão Estadual do Livro Didático deveria escolher as
“melhores obras didáticas a serem recomendadas pelo Governo do Estado” (Carta da
Câmara Brasileira do Livro ao governador do Estado de São Paulo, julho de 1952), para
serem usadas nas escolas oficiais. Pela segunda vez a CBL argumentava que a CNLD
era o órgão responsável pela avaliação dos livros didáticos e que, pelo Decreto-lei n°
8.460/45, os professores eram livres para escolher os manuais que considerassem mais
apropriados.
Contudo, Gonçalves (2005, p. 48), que analisou as comissões de avaliação de
São Paulo, desde 1933 até a criada pela lei n° 1.536, verificou que essa comissão
estadual existiu e atuou nos anos 1950 concomitantemente à existência da CNLD. De
fato, ao analisar os livros didáticos da Biblioteca do Livro Didático (BLD) da Faculdade
de Educação da Universidade de São Paulo (USP), foi possível verificar que os livros
para o ensino primário passaram a conter na capa ou página de rosto o registro de
aprovação dos departamentos de educação de São Paulo e do Distrito Federal (Rio de
Janeiro). Alguns apresentavam o registro da aprovação tanto do estado quanto da
CNLD. As imagens a seguir apresentam livros com os dois registros de aprovação:
87
88

Apesar de ter suas funções reduzidas e questionadas a CNLD continuou a existir


até 1969, sob a presidência do professor Gildásio Amado (de 1945 a 1955)74. Ela
deveria aprovar os manuais didáticos de ensino primário e secundário75.
Para verificar se os manuais escolares aprovados pela CNLD apresentaram
alterações em seu conteúdo e aspecto gráfico, foi feita uma busca nos livros didáticos da
BLD/USP. Na análise dos livros, foi possível observar pequenas mudanças nos manuais
escolares nos anos 1950. Foram observados manuais publicados antes da avaliação e os
mesmos manuais após receberem o registro da Comissão e do Ministério da Educação.
A comparação desses manuais, das diferentes disciplinas escolares, indicaram que as
avaliações não modificaram substancialmente os livros didáticos. Foram encontrados
livros que tiveram parte de seu conteúdo retirado após a avaliação da CNLD, contudo, a
maioria dos manuais apenas se adequaram à reforma curricular de 195176.
Os exemplos a seguir descrevem algumas das alterações encontradas nos livros:

* Livro Português Colegial, 3a série do ciclo colegial, de Antônio Sales Campos,


editora Melhoramentos. Dois exemplares - de 1951, sem autorização e o de
1960, com registro no MEC n. 2302. Fisicamente os livros eram iguais, com 18
por 13 cm. O conteúdo dos dois livros permaneceram inalterados, as mudanças
corresponderam a exclusão de alguns capítulos no livro de 1960. Foram retiradas
as duas introduções do livro de 1951: Língua Portuguesa no Brasil: influência
indígena e, africana e Influência portuguesa, indígena e africana na literatura
popular brasileira.

74
Gildásio Amado era professor no Colégio Pedro II e seu diretor (de 1947 a 1956 e professor da
Faculdade Nacional de Filosofia. Era, também, diretor da Diretoria do Ensino Secundário do MEC (de
1956 até 1968) e coordenador da Campanha de Difusão e Aperfeiçoamento do Ensino Secundário
(Cades) (Pinto, 2002, p. 414).
75
Ao longo de 1947, o professor Américo Jacobina Lacombe recebeu da secretaria da CNLD, cinco
cartas encaminhando livros didáticos de membros da Comissão para serem avaliados. As cartas
permitiram verificar o nome de alguns dos membros da Comissão, entre eles os professores Hélio Vianna,
Otelo S. Reis e Carlos Delgado de Carvalho (Documentação encontrada no arquivo histórico - Américo
Jacobina Lacombe -, da Fundação Casa de Rui Barbosa). A técnica de educação Delma da Conceição
Carchedi enviou ao INEP, em fevereiro de 1949, uma lista de livros aprovados pela CNLD para o Ensino
Primário. No ano de 1952, o professor Lacombe recebeu nova carta da CNLD solicitando parecer de
livros de Hélio Vianna. Em abril de 1953, o Conselho de Imigração e Colonização solicitava ao
presidente da CNLD, Gildasio Amado, o fornecimento de livros didáticos de ensino de língua portuguesa
e de conhecimentos da realidade nacional para um convênio firmado entre o governo do Brasil e da Itália
(Documento encontrado no arquivo histórico do Inep).
76
A portaria n. 966 de 02 de outubro de 1951 aprovou os programas mínimos para as disciplinas dos
cursos ginasial e colegial. A portaria n. 1.045 de 14 de dezembro de 1951 expediu os planos de
desenvolvimento dos programas mínimos do ensino secundário e suas instruções metodológicas.
89

* História do Brasil, 1a série ginasial, de Joaquim Silva, Companhia Editora


Nacional. O livro de 1955, sem a autorização da CNLD tinha 19,5 por 13,5 cm e
apresentava pequenas ilustrações. O livro de 1961, aprovado na CNLD, com
registro n. 2.568, era pouca coisa maior, com 19 por 15 cm, e apresentava mais
ilustrações, principalmente com desenhos. O manual de 1961 foi atualizado,
contendo um capítulo a mais – O Brasil Contemporâneo, em que analisava o
país após o Estado Novo. Os capítulos restantes dos dois livros eram idênticos.

* Curso de Matemática, 4a série ginasial, de Algacyr Munhoz Maeder, Edições


Melhoramentos. O formato dos livros de 1947 e de 1958 eram iguais: 21 por 14
cm. Contudo, o livros de 1958, aprovado pela CNLD excluiu os cinco primeiros
capítulo que existiam no livro de 1947 – cap. 1. Coordenadas cartesianas no
plano Representações gráficas; cap. 2. Resolução e discussão de um sistema de
duas equações com duas incógnitas; cap. 3. Resolução de desigualdades de 1o
grau com uma ou duas incógnita; cap. 4. Problemas do 1o grau; cap. 5. Números
irracionais, radicais, frações irracionais. Os demais capítulos permaneceram
idênticos nos dois livros. A reforma de 1951, alterou os programas curriculares,
que foram reorganizados pelo livro de 1958.

Como se verifica, ao mesmo tempo em que a eficiência e legitimidade da CNLD


era questionada nos meios parlamentares e no próprio Ministério da Educação, a CBL,
vinculada às editoras, defendia continuamente a existência da CNLD, pois ela não
interferia na produção, tampouco na escolha dos livros didáticos pelos professores.
Diante da inoperância da CNLD e da intensificação dos debates sobre a reformulação
do ensino e o papel dos manuais escolares, novos espaços dentro do aparato estatal
começaram a pensar “o problema dos livros didáticos”.

Outros lugares de atuação: o Inep e a organização da Caldeme

Durante os anos 1950, outro órgão vinculado ao Ministério da Educação passou


a centralizar as discussões sobre a atualização dos livros didáticos e a necessidade de
reformulação dos objetivos, métodos e conteúdos de ensino, o Inep, principalmente a
partir de 1952, sob a direção de Anísio Teixeira. Nesse mesmo ano, Anísio Teixeira
criou a Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme) e a Campanha de
90

Inquérito e Levantamento do Ensino Médio e Elementar (Cileme), ambas vinculadas ao


órgão.
O Inep foi criado em 1937, com o nome de Instituto Nacional de Pedagogia. Em
1938, iniciou seus trabalhos por meio do Decreto-Lei nº 580 e passou a se chamar
Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos. O primeiro diretor-geral do órgão foi o
professor Lourenço Filho. De acordo com Decreto-Lei nº 580, o Inep deveria:

a) organizar documentação relativa à história e ao estudo atual das doutrinas e


das técnicas pedagógicas, bem como das diferentes espécies de instituições
educativas;
b) manter intercâmbio, em matéria de pedagogia, com as instituições
educacionais do país e do estrangeiro;
c) promover inquéritos e pesquisas sobre todos os problemas atinentes à
organização do ensino, bem como sobre os vários métodos e processos
pedagógicos;
d) promover investigações no terreno da psicologia aplicada à educação, bem
como relativamente ao problema da orientação e seleção profissional;
e) prestar assistência técnica aos serviços estaduais, municipais e particulares
de educação, ministrando-lhes, mediante consulta ou independentemente
desta, esclarecimentos e soluções sobre os problemas pedagógicos;
f) divulgar, pelos diferentes processos de difusão, os conhecimentos relativos
à, teoria e à prática pedagógicas.

O órgão surgiu com duas atribuições distintas, deveria desenvolver estudos e


pesquisas na área da educação para subsidiar as políticas do Ministério da Educação e,
teria funções de caráter executivo, ao “prestar assistência técnica aos sistemas estaduais,
municipais e particulares” (Mendonça, 2005, p. 5).
Anísio Teixeira assumiu a direção do Inep, em 1952 (sua gestão duraria até
1964), propondo “dinamizar o órgão, com vistas a transformá-lo num centro de
referência para o magistério nacional e constituí-lo em um pólo de articulação e
renovação do Sistema Nacional de Educação” (Mendonça, 2005, p. 1). Segundo
Mendonça (2005), Anísio Teixeira conseguiu fazer com que o Inep tivesse papel central
no âmbito do MEC, transformando este órgão em um “mini-ministério no interior do
próprio Ministério” (2005, p. 8). Para Anísio, o Inep tornar-se-ia um “centro de
inspiração do magistério nacional, buscando formar a consciência educacional comum
que para ele seria absolutamente indispensável para o processo de reconstrução da
escola” (Mendonça, 2005, p. 9).
Defensor do pragmatismo de Dewey, Anísio Teixeira difundiu pelo Inep tal
ideário, tornando o órgão um centro de estudos sobre os problemas educacionais do
91

Brasil (Mendonça, 2005, p. 9). O Inep realizaria pesquisas para subsidiar as políticas
públicas, publicaria obras de referência, inclusive didáticas, e organizaria escolas
experimentais, que seriam, também, centros de treinamento de professores. Segundo
Mendonça, o pragmatismo de Dewey foi apropriado no Inep em três perspectivas: como
método científico, como modo de vida democrático e como “experimentalismo” na
escola (2005, p. 10). Nas duas primeiras perspectivas:

o pragmatismo informou as tentativas de racionalização do sistema escolar,


através de uma concepção peculiar de planejamento, que se fundamentava nos
estudos de comunidade e que supunha o esclarecimento da população
atingida, a fim de garantir a sua aceitação e continuidade (Mendonça, 2005, p.
10).

Mendonça (2005, pp. 10-11) destaca, ainda, que o ideal desenvolvimentista dos
anos 1950 aproximou-se do pragmatismo, ao propor a transformação da escola às novas
condições de desenvolvimento nacional, principalmente com a industrialização, e para
consolidar a democracia liberal. A escola seria agente de mudança cultural.
Munakata (2000, p. 129), ao analisar o projeto de Anísio Teixeira no Inep,
observa que o livro didático ocupava um papel importante no pensamento desse
educador. As escolas não existiriam sem professores e livros. De acordo com Munakata
(2000), Anísio Teixeira pretendia, após diagnosticar a situação do ensino, elaborar
métodos de tratamento para os problemas encontrados. Uma das formas de divulgar
sugestões e recomendações para os professores era por meio da literatura didática.
Para Anísio Teixeira, como observa Munakata (2000, p. 133), a escola estava
em transformação. A antiga educação livresca não era mais útil para o novo grupo
social que chegava à sala de aula. A nova escola para todos tinha o objetivo de preparar
o homem comum para o trabalho. Na sociedade moderna em que a escola tradicional de
educação livresca não mais se encaixava, os livros tomavam nova definição: “não
simplesmente como leitura, mas como utilização” (Munakata, 2000, p. 134). E o livro
indicado para essa utilização era o didático.
A expansão do ensino era considerada por Anísio Teixeira “descompassada”
(Munakata, 2000, p, 135) pois, ao aliar a extensão do ensino para todos com o
treinamento para o trabalho, gerou um maior número de alunos nas escolas com menor
educação. A democratização do ensino fez surgir a necessidade de mais professores,
que acabavam tendo uma formação curta e deficiente. Somava-se a esses fatos o
92

pensamento de Anísio Teixeira de que a escola brasileira era artificial, desligada da


realidade e da cultura regional, com currículos e programas oficiais padronizados para
todo o país. Para o educador, a escola precisava deixar de ter padrões “legais”, para ter
padrões “reais”. Munakata destaca que Anísio Teixeira propunha para melhorar a
educação escolar, a eliminação dos programas oficiais, o currículo uniforme e os livros
didáticos aprovados (2000, p. 137). Nas palavras do educador:

Eliminar todos os modelos e imposições oficiais que estão a produzir efeitos


opostos aos previstos, servindo até como justificativa para o mau ensino –
como é o caso dos programas oficias, dos livros didáticos aprovados e do
currículo rígido e uniforme (Teixeira, 1953, p. 37).

Os programas oficiais homogeneizavam os livros didáticos e os próprios alunos,


“desconsiderando as peculiaridades locais, de cada escola ou mesmo de cada aluno”
(Munakata, 2006, p. 4).
Anísio Teixeira criticava, desse modo, a CNLD que, ao aprovar somente livros
didáticos que estavam de acordo com os programas oficiais, impossibilitava a
elaboração de manuais escolares diferenciados. Todos os compêndios tornavam-se
iguais. Por tais motivos, Anísio Teixeira pretendia com o Inep:

construir um eficaz e ágil instrumento diagnóstico da situação do ensino no


Brasil, levando em conta as especificidades e singularidades regionais (e
municipais), a fim de nela intervir – incluindo-se nessa intervenção a
produção de livros didáticos (Munakata, 2000, p. 138).

Assim, para Anísio Teixeira, uma das soluções para a situação educacional
brasileira era a “elaboração de ‘guias e manuais de ensino para os professores e
diretores de escolas’ e, também, ‘o livro didático, compreendendo o livro de texto e o
livro de fontes, buscando integrar nestes instrumentos de trabalho o espírito e as
conclusões dos inquéritos procedidos’” (Munakata, 2002, p. 1). A melhoria dos livros
didáticos, com a produção de manuais diferentes e que teriam novas formas de
utilização seria realizada pela Caldeme, que produziria guias de ensino para professores
e analisaria os programas e manuais escolares existentes no país.
A Caldeme deveria, assim, contribuir para a “renovação da literatura pedagógica
mediante a revisão de livros de leitura e a análise dos livros didáticos em uso nas
93

escolas” (Xavier, 2000, p. 7), pretendendo produzir e distribuir guias de ensino, livros
texto e manuais de boa qualidade para professores da rede pública.
Esse era um novo espaço em que se realizava a política de produção de material
didático e que influenciaria os debates relacionados às novas propostas didático-
pedagógicas. Anísio Teixeira e outros intelectuais, ao longo dos anos 1950, com a
Caldeme, a Cileme e, posteriormente, com o Centro Brasileiro de Pesquisas
Educacionais (CBPE) e os Centro Regional de Pesquisas Educacionais (CRPEs),
propuseram, portanto, uma renovação no ensino escolar.

Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino - Caldeme 77

A Caldeme e a Cileme foram criadas por iniciativa do grupo vinculado a Anísio


Teixeira, no Inep. A Cileme não será objeto de estudo deste trabalho, mas é importante
esclarecer que elas se relacionavam. De acordo com relatório do CBPE, enquanto a
Cileme deveria “medir e avaliar a situação real do ensino médio e do ensino elementar
em todo o país, com a profundidade e generalidade suficientes para analisar o papel que
representam no quadro geral das instituições sociais brasileiras”, a Caldeme realizaria
“assistência técnica ao professorado, fazendo chegar às suas mãos guias ou manuais
escritos especialmente para sua orientação” (CBPE/Inep, s/d, p. 1).
Segundo a exposição de motivos n. 833, de 21 de julho de 1952, a Cileme
realizaria “levantamentos e inquéritos em cada um dos Estados da Federação”, sobre o
ensino primário, secundário, industrial, comercial, normal, de estabelecimentos públicos
e particulares. A Campanha realizaria inquéritos objetivos, que avaliariam o
funcionamento e a qualidade das instituições escolares, por meio do estudo dos aspectos
internos das escolas, “em seus processos, métodos, práticas, conteúdo e resultados reais
obtidos” (Documentos iniciais da Cileme, escrito por Jayme Abreu78 e Tobias Neto,
fevereiro de 1953).

77
Os documentos selecionados para este trabalho foram produzidos pela Caldeme, Inep e CBPE.
Buscando contar a história da Caldeme foram utilizados ofícios, memorandos e correspondências internas
da Campanha. A documentação foi localizada no Arquivo Central e Histórico do Inep, em Brasília e no
acervo do Centro de Apoio à Pesquisa “Escola e Cultura” do Programa de Estudos Pós-graduados em
Educação: História, Política, Sociedade (EHPS), da PUC/SP. Além desse material, foram utilizados como
documentos centrais os livros dos professores James B. da Fonseca e Guy de Hollanda.
78
Jayme Abreu era o diretor executivo da Cileme.
94

Em um breve histórico, Mário Paula de Brito79, diretor executivo da Caldeme,


afirmava que a Campanha fora idealizada por Gustavo Lessa, que chamou à atenção do
então Ministro da Educação Simões Filho para o problema dos livros didáticos
nacionais, considerados precários, prejudiciais e errados nos métodos adotados para a
exposição das matérias escolares. No projeto de Lessa, a Campanha seria estruturada
em comissões e sub-comissões, que estudariam a fundo o problema do livro didático.
No entanto, sob a orientação de Anísio Teixeira, a Caldeme já iniciou seus trabalhos de
modo mais prático, com a elaboração de manuais de ensino para uso dos professores.
De acordo com o histórico, Anísio considerava urgente encontrar remédio para o mal,
“já tão evidenciado, independentemente de quaisquer inquéritos especiais” (Histórico da
Caldeme, de 9/7/1954). A Campanha foi efetivamente iniciada em 14 de julho de 1952,
pela Exposição de Motivos n. 795 do Ministro Simões Filho, sob responsabilidade do
Inep.
De acordo com a Exposição de Motivos de Simões Filho para o Presidente
Getúlio Vargas, a assistência técnica ao professorado era uma das funções mais
importantes dos serviços educacionais. Dois seriam os métodos de prestar a assistência,
por meio de cursos de aperfeiçoamento ou na produção de guias escritos para as
orientações dos professores. Ambos os métodos deveriam ser usados simultaneamente,
mas as deficiências qualitativas do ensino brasileiro exigiam providências urgentes.
Desse modo, a solução seria a elaboração de guias para orientação dos professores do
ensino primário e médio. Os guias deveriam, ainda, influenciar a elaboração dos livros
didáticos pois, para Simões Filho, os manuais existentes somente objetivavam ensinar a
decorar classificações. Assim, o Inep, como órgão de pesquisa, estaria responsável por
meio da Caldeme de:

a) proceder a um estudo comparativo da literatura educacional existente no


país e no estrangeiro [...]; b) elaborar, na base desse estudo e dos princípios
pedagógicos, os guias para professores das diferentes matérias do ensino
primário e médio; c) publicar desses guias a quantidade necessária para
despertar o interesse pelo problema dos diferentes círculos educacionais do
país; d) instituir prêmios para as obras didáticas que seguirem melhor a
orientação traçada nesses guias (Ofício n. 76.046/52, Ministério da Educação
e Saúde).

79
Mário P. Brito foi diretor da Caldeme de 1953 a 1955. O histórico da Caldeme data de 9 de julho de
1954.
95

Um dos principais objetivos da Campanha tornou-se, portanto, a elaboração de


guias de ensino destinados aos professores da escola secundária!".
A primeira ação de Gustavo de Sá Lessa!#, primeiro diretor executivo da
Caldeme, foi proceder a escolha dos autores dos manuais. Para tal, realizou uma série de
entrevistas com educadores de centros culturais e acadêmicos do país (São Paulo,
Curitiba, Porto Alegre e Belo Horizonte), com professores de ensino secundário e de
faculdades de filosofia, sobre a necessidade da publicação dos manuais. A consulta
revelou que os professores aprovavam os guias.
Em seguida foi realizada consulta para decidir quem seriam os melhores
professores para elaborar os planos dos manuais de ensino e escrevê-los. Após as
entrevistas ficou decidido que os autores dos guias seriam professores das universidades
brasileiras e especialistas nas diferentes áreas do conhecimento.
Além dos guias de ensino, a Caldeme estava encarregada de livros de grande
importância para a educação, publicar livros inéditos de autores brasileiros, realizar
estudos sobre materiais didáticos destinados ao ensino de Ciências, adquirir coleções de
livros nacionais e estrangeiros considerados valiosos para as discussões sobre educação
e avaliar os livros didáticos e programas das disciplinas do ensino secundário.
A partir de 1955, por meio do decreto n. 38.460, Anísio Teixeira criou no Inep o
Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), com o apoio da Unesco82. O
CBPE tinha o objetivo de organizar e publicar pesquisas sobre questões culturais e
escolares, visando subsidiar as políticas públicas para a educação brasileira. Vinculados
ao CBPE, foram criados os Centros Regionais de Pesquisa Educacionais (CRPE),
localizados em Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador, Recife e São Paulo. Todos estes
Centros buscavam articular a atuação da universidade pública com as Secretarias de
Educação dos estados, mas teriam, ao mesmo tempo, relativa autonomia em relação à
80
É importante destacar o crescimento do ensino superior, de formação de professores nesse período. De
acordo com Mendonça (2000, pp. 141-142), de 1945 a 1964, as universidades brasileiras aumentaram de
cinco para trinta e sete. Os estabelecimentos isolados aumentaram de 293 para 564, na mesma época.
Esse aumento de cursos superior acelerou a formação de professores secundários.
!# Gustavo Lessa era médio e sanitarista. Foi membro da ABE e professor da Universidade do Distrito

Federal. De acordo com Munakata (2004), “assumiu cargos na administração publica, quase sempre ao
lado de Anísio Teixeira” (p. 516). Tinha cargo na Fundação Getúlio Vargas. Em 1952 tornou-se diretor
executivo da Caldeme, até agosto de 1953, quando foi substituído por Mário Paulo de Brito (Munakata,
2004, p. 516). Mário P. de Brito era professor de Química na Escola Nacional de Engenharia. Participou
da fundação da ABE e foi membro da Academia Brasileira de Ciência (Munakata, 2004, p. 521). Mário P.
de Brito permaneceu na direção da Caldeme até dezembro de 1955, quando foi substituído por Jayme
Abreu que coordenava a DEPE – Departamento de Estudos e Pesquisas Educacionais, do CBPE.
82
Segundo Mendonça, o CBPE foi criado com verba da Unesco que seria destinada para programa de
formação de agentes para educação rural. “Anísio Teixeira redireciona essa verba e é com ela que acaba
conseguindo viabilizar a criação do centro” (2005, p. 13).
96

“burocracia estatal” (Mendonça, 2005, p. 1). De acordo com Mendonça, a criação do


CBPE e dos CRPEs, completava o projeto de Anistio Teixeira, de reconstruir a
educação no Brasil por bases científicas, de reorganizar a escola “com base no
conhecimento científico disponível, para que se tornasse um instrumento efetivo de
reorganização da sociedade” (1997, p. 31). A rede organizada pelo CBPE e pelos
CRPEs permitia ao Inep atuar para transformar a educação em todo o país.
Com a criação do CBPE, as atividades da Caldeme e Cileme foram incorporadas
a esse Centro. Seus estudos e pesquisas passaram a ser organizados pela Divisão de
Estudos e Pesquisas Educacionais (DEPE), responsável por realizar as pesquisas sobre o
funcionamento do sistema oficial de ensino. A DEPE estava sob a direção de Jayme
Abreu. Um dos objetivos fundamentais do CBPE era publicar os estudos e pesquisas
realizados pelos Centros para os professores de todo o país. Os trabalhos realizados
eram publicados, desse modo, em séries temáticas. Quatro séries divulgavam as
pesquisas produzidas pela Caldeme: Escola Secundária; Guias de ensino; Livros de
Texto; Série Currículo, Programas e Métodos.
Para melhor compreender de que modo atuava a Caldeme, foram resumidos a
seguir, as principais atividades realizadas pela Campanha. Convém destacar que o
processo de avaliação dos manuais escolares e programas de ensino secundário, central
para a presente pesquisa, recebeu análise detalhada.

Formação da Biblioteca Pedagógica

Desde 1952, ao assumir a direção do Inep, Anísio Teixeira passou a se


corresponder com editoras estrangeiras solicitando o envio de livros relacionados à
educação primária e secundária e às diferentes disciplinas escolares83. A proposta inicial
era produzir uma biblioteca pedagógica, que permitisse o estudo desses livros, visando a
melhoria dos métodos de ensino no Brasil.
Em carta enviada à Companhia Mac Millian, de Nova Iorque, em 4 de abril de
1952, Anísio solicitava a aquisição dos melhores livros da editora sobre educação
secundária - de Linguagem, Matemática, Ciências, Estudos Sociais, Geografia e
História -, acompanhados dos livros do professor, das respostas de questões e exercícios
de laboratório. De acordo com a carta, Teixeira recebeu do Ministro da Educação

83
Foram encontradas correspondências de Anísio Teixeira para editoras dos EUA, Inglaterra e França.
97

brasileiro a incumbência de elaborar um relatório com a comparação dos livros


didáticos utilizados no ensino médio no Brasil e os livros didáticos de países
considerados mais avançados:

O comitê da qual faço parte e sou presidente recebeu de seu Ministro da


Educação um pedido de relatório de um estudo preliminar comparativo de
livros didáticos para o ensino médio usados no Brasil e em países com um
sistema educacional mais avançado.
Pela urgência do pedido, a decisão foi tomada antes da atribuição de verbas
governamentais. Assim, por sugestão do Diretor da Escola Americana no Rio,
Mr. Victor L. Moore, escrevo para pedir sua cooperação e assistência para
resolver nossos problemas de conseguir os livros. (...) (Carta de Anísio
84
Teixeira à Co. Mac Millian, de 4/4/1952) .

A pesquisa visava aperfeiçoar o material didático brasileiro. O estudo realizado


por Teixeira procurava comparar os manuais do Brasil com os da Inglaterra, França e
Estados Unidos. De acordo com a documentação analisada, as editoras atenderam ao
pedido e enviaram exemplares de seus livros. Para adquirir os livros didáticos
nacionais, Anísio Teixeira solicitou às editoras brasileiras que também enviassem suas
publicações, das diferentes disciplinas escolares do ensino secundário.
Com a oficialização da Caldeme, a compra de livros se intensificou. Passaram e
ser adquiridas obras de consulta, nacionais e estrangeiras, de nível de ensino de grau
médio e de ensino superior, buscando a formação de uma biblioteca pedagógica. Além
das solicitações para editoras estrangeiras e nacionais, começaram a ser endereçadas
cartas aos Departamentos de Ensino de outros países, aos representantes das
Embaixadas e aos responsáveis por instituições estrangeiras no Brasil, como o Conselho
Britânico no Brasil e a Escola Americana do Rio de Janeiro. Uma das soluções do Inep
para a compra de livros estrangeiros era encomendar às editoras nacionais as suas
importações. Para comprar livros franceses, Gustavo Lessa solicitou à editora Ao Livro
Técnico que fizesse as encomendas:

Sr. Gerente de “Ao Livro Técnico Ltda.”:

84
No original: “A commttes (Sic) of whitch I am President has received from the Ministry of Education
the assignment of undertaking a preliminar comparative study of textbooks for high schools used in Brasil
and in countries educationally more advanced.
Due to the urgence of the matter, the decision was taken prior to the allocation of governmental
appropriation. So, upon suggestion of the Director of the American School in Rio, Mr. Voctor L. Moore, I
am writing for asking your cooperation and assistance in solving our problem of getting the books. (...)”.
Além da Editora Mac Millian, foi enviada a mesma solicitação para as editoras: Scott, Foresman and
Company e Ginn and Company.
98

1. Quando em julho passado, entreguei ao empregado dessa casa, Sr. João,


uma lista de livros a ser encomendados em França, ficou assentado que o
preço cobrado pela vossa casa seria na base de 10 centavos do franco (Carta
de Gustavo Lessa ao Gerente da editora Ao Livro Técnico, 4/10/1952).

Com a divulgação de que o Inep estava adquirindo livros, diversas editoras


brasileiras passaram e enviar seus catálogos de publicações, autores mandavam
exemplares de seus livros e órgãos oficiais, encaminhavam as obras que publicavam85.
Parte das assinaturas de revistas adquiridas pelo Inep vinham dos EUA,
conforme se observa em ofício de Anísio Teixeira ao Diretor da Carteira de Cambio do
Banco do Brasil, Dr. Fernando Drumond Cadaval, de 29 de agosto de 1952. No ofício, o
diretor do Inep solicitava uma quota mensal para aquisição de periódicos daquele país.
De acordo com relatório da Caldeme, em agosto de 1953, a Biblioteca contava
com 1.490 volumes publicados no Brasil e em outros países, relativos ao ensino
primário e secundário. No relatório de atividades de junho de 1954, Mário P. de Brito
informava que a Biblioteca Pedagógica estava dividida em três seções: livros nacionais
didáticos; livros didáticos estrangeiros e; obras auxiliares de natureza didática ou
pedagógica.
Por intermédio do professor Alarich Schultz, em novembro de 1954, a Caldeme
encomendou com a professora Aenne Dopp-Wossler, livros alemães de Ciências Físicas
e Naturais, Geografia, História e Matemática. O professor Schultz utilizou os livros para
elaborar manual de Botânica.
Em agosto de 1955, a Biblioteca Pedagógica foi transferida para a Divisão de
Documentação e Informação Pedagógica (DDIP) do CBPE, que se torno responsável,
como já foi mencionado, por todas as atividades realizadas pela Caldeme e Cileme.

Programas de ensino de outros países

Além dos livros didáticos estrangeiros, a Caldeme passou a organizar um acervo


de programas de ensino de outros países. A partir de agosto de 1952, Gustavo Lessa
começou a solicitar a diferentes Departamentos de Educação de estados estadunidenses,
a relação dos Programas de Estudos de ensino elementar e secundário, das diferentes
diciplinas escolares produzidos pelos órgãos. A proposta era elaborar um estudo
comparado desses programas com os programas curriculares brasileiros. Foram

85
Como o Dicionário de Grego, editado em 1955, pelo Instituto Nacional do Livro (INL).
99

encontradas correspondências trocadas com os departamentos de educação de Detroit,


Michigan (Lansing), cidade de Nova Iorque, Albany (Nova Iorque), Los Angeles
(Califórnia) e Brokline (Massachusetts). De modo geral os departamentos enviaram os
programas de Estudos, principalmente de Inglês, Matemática, Ciências (Física, Química
e Biologia) e Estudos Sociais.
É importante destacar que Gustavo Lessa enfatizava a solicitação de programas
e livros didáticos de Estudos Sociais. O ensino de Estudos Sociais nas propostas
educacionais dos Estados Unidos já vinha sendo estudado por educadores brasileiros
desde as primeiras décadas do século XX. Segundo Fernandes (2008), em 1934, Carlos
Delgado de Carvalho organizou o Programa de Ciências Sociais, do Departamento de
Educação do Distrito Federal, dirigido à época por Anísio Teixeira. Pelo Programa, o
ensino de Estudos Sociais seria ministrado para as primeiras séries da escola elementar.
Ainda nos anos 1930, os Estudos Sociais “apareceu também como ‘Matéria Escolar’ da
Escola de Professores do Instituto de Educação, destinada a habilitar professores
primários” (Fernandes, 2008, p. 10). Tanto Anísio Teixeira, como Carlos Delgado de
Carvalho conheciam as propostas educacionais estadunidenses:

Anísio Teixeira realizou estudos de pós-graduação no Teacher’s College da


Universidade de Columbia, em Nova York; e, entre 1929-30, Delgado de
Carvalho chefiou uma delegação brasileira, de onze professores, que visitou a
América do Norte, dentro de uma proposta de intercâmbios internacional no
campo da educação (Fernandes, 2008, p. 2).

As idéias de Dewey sobre os Estudos Sociais, o ensino baseado na realidade e na


experiência, foram referência importante para Anísio Teixeira, Delgado de Carvalho e
outros educadores do período. Fernandes (2008) observa que Dewey pensava uma
escola em que “as crianças aprendessem a partir das experiências vividas na
convivência social” (p. 3). Para a autora, era importante “repensar as tendências de
dissociar os conhecimentos científicos na formação de disciplinas independentes,
propondo superar essas separações para garantir o reconhecimento das ciências naturais
nos assuntos humanos” (2008, p. 3). Ao longo dos anos 1950, a Caldeme e a Cileme
realizaram estudos sobre as Ciências Sociais, o ensino de Estudos Sociais, por meio de
pesquisas como as de Delgado de Carvalho.
Em 1956, Delgado de Carvalho apresentou o plano de elaboração do livro
Introdução Metodológica aos Estudos Sociais, que foi publicado em 1957, pela série
Currículo, Programas e Métodos, do CBPE. Segundo o documento de Delgado de
100

Carvalho, os Estudos Sociais, seriam um “conjunto das matérias de ensino cujo


conteúdo científico é proporcionado aos educandos de grau secundário pelas ‘Ciências
Sociais’ propriamente dita, isto é, a Geografia, a História, a Política, a Sociologia e a
Economia” (Notas Coligidas sobre os Estudos Sociais no Curso Secundário, s/d, p. 1).
Como a vida em sociedade era interdependente, em que os conhecimentos interagiam
entre si, era necessário que os educandos apreendessem sua complexidade. Caberia aos
Estudos Sociais restituir aos alunos a complexidade da realidade da vida social. O
objetivo da educação era apresentar uma visão global dos fenômenos (Notas Coligidas
sobre os Estudos Sociais no Curso Secundário, s/d, p. 3).
Além dos programas norte-americanos, a Caldeme recebeu programas de ensino
da França. Para ter acesso ao programas, em carta de 6 de agosto de 1952, Gustavo
Lessa solicitou ao Prof. Lucien Pouessel, do Serviço Cultural da Embaixada da França,
os programas daquele país:

(...) 1 - “Instruction du 30 septembre 1938 relatives à l`application des arrêtés


du 30 aout 1937 et du il avril 1938 fixant les programmes de l`enseignement
du second degré.” – Deuxième edition, Librairie Vuibert, 1951.
2 – “Nouveaux horaires et programmes de l`enseignement du second degré”-
Treizième edition – Librairie Vuibert, 1949.
(...) Como o nosso estudo irá ser feito por grupos de profissionais, seria de
grande conveniência obtermos vários exemplares dessas publicações. Assim
temos necessidade de:
a) seis exemplares do vol. referido em 1
b) “ “ “ “ “ “ 2
c) seis exemplares dos programas vigentes para o ensino de primeiro grau.
d) seis exemplares das instruções ministeriais vigente para o ensino do
primeiro grau
e) um exemplar da lei ou leis que regulam o ensino em França (Carta de
Gustavo Lessa ao prof. Lucien Pouessel, 6/8/1952).

Publicação e Tradução de livros

Alguns livros estrangeiros considerados essenciais para a área das Ciências


Físicas e Naturais, de países qualificados como mais “adiantados”, eram indicados para
tradução. Em 1954 foram assinados dois acordos de tradução: o primeiro com os
professores José Reis, para tradução e, João Batista Pecegueiro do Amaral, para revisão
da obra An Introduction to Science (traduzido como Iniciação à Ciência), de E. N. da C.
Andrade e J. Huxley. Esse livro faria parte das publicações da Caldeme, inicialmente,
101

com cinco mil exemplares. O livro, de autores ingleses, divulgava noções básicas das
ciências físicas e naturais.
O segundo acordo foi efetudo com os professores José Leite Lopes e Jayme
Tiomno para a tradução do livro High School Physics (traduzido como Física na Escola
Secundária), de C. H. Blackwood, W. B. Herron e W. C. Kelly, da editora Ginn and
Company, considerado uma importante obra para estudantes e professores do ensino
secundário. Segundo ofício de Mário P. de Brito, de 5 de janeiro de 1955, para a Ginn
and Co., a tradução de um livro que não estava de acordo com os programas oficiais
brasileiros visava promover a aplicação de novos métodos no ensino de Física nas
escolas secundárias do país86. Em julho de 1956, os originais dos dois guias foram
entregues para a Companhia Editora Nacional, que editaria e publicaria as obras.
Os motivos das traduções dos livros Iniciação à Ciência e Física na Escola
Secundária, tornam-se explícitos nas notas prévias que iniciavam ambos os livros. Na
Nota Prévia do livro Iniciação à Ciência, Mário P. de Brito esclarecia que os
professores de Ciências Físicas e Naturais encontrariam na obra “uma visão nova para
encarar o entrelaçamentos dos fenômenos físicos, químicos e biológicos”. Na segunda
Nota Prévia, o diretor da Caldeme esclarecia que a tradução do livro Física na Escola
Secundária, havia sido realizada pela impossibilidade de a Caldeme conseguir
estabelecer com um professor brasileiro acordo para a produção de um manual de
ensino de Física. O livro visava auxiliar os professores com um “método essencialmente
prático de captar a atenção dos alunos para as maravilhosas descobertas da física
moderna”.
A Caldeme também patrocinou a publicação de trabalho original sobre o ensino
de Matemática no curso secundário, Álgebra Elementar e Trigonometria, elaborado
pelo professor Francis D. Murnagham do Instituto Tecnólogico da Aeronáutica de São
José dos Campos.
A Companhia Editora Nacional/Civilização Brasileira87 tornou-se a responsável
pela edição e publicação dos três livros, de Matemática de Murnagham, An Introduction
to Science/Iniciação à Ciência, e por discutir a aquisição dos direitos autorais da

86
Vale destacar o seguinte trecho do original: “(...) It is very likedy that only a limited number of copies
of the translation will be sold, for the “High School Physics” was not written accordingly to the rigid plan
of studies laid down by our federal regulations. But those copies will promote, I hope, the application of
new methods of teaching physics in our secondary schools. (...)” (Ofício de Mário P. de Brito para a Ginn
and Co., de 5/1/1955).
87
A Editora Civilização Brasileira foi comprada pela Companhia Editora Nacional em 1932. Na década
de 1950 seu diretor era Ênio Silveira.
102

tradução do livro High School Physic/Física na Escola Secundária, com a Ginn and
Company88.
O livro de Murnagham não foi o único a ser publicado sobre o ensino de
Matemática. Com base na documentação do CBPE, foi possível verificar que o Centro
solicitou à Unesco, em 1955, a colaboração de um especialista em currículo escolar para
as áreas de Ciências e Matemática do ensino secundário. O especialista deveria analisar
e criticar os programas de ensino adotados no Brasil e propor novas matérias e métodos
de ensino!$. Em 1956 a Unesco enviou ao país o técnico em educação professor Lucas
Bunt, que iria estudar os programas, livros didáticos e práticas de ensino de Matemática
e produzir livro didático para a disciplina. Em ofício de 1957, Jayme Abreu relatou que
o professor Lucas Bunt tinha terminado o relatório sobre o ensino de Matemática no
Brasil e o livro sobre geometria, que seria publicado em 1963$".
Para o ensino primário, a Caldeme produziu estudos sobre Linguagem na Escola
Elementar (1955), Ciências na Escola Elementar (1955), Ciências Sociais na Escola
Elementar (1955), Matemática na Escola Elementar (1955), Jogos Infantis na Escola
Elementar (1955), Música para a Escola Elementar (1955) (Relatório de Mário P. de
Brito para Anísio Teixeira, de 21/6/1955).
A partir de 1957, Anísio Teixeira começou a discutir com o Adido Cultural da
Embaixada Americana, Laurence Morris, a possibilidade de tradução de livro sobre
Geografia Geral91. Em 1959, Jayme Abreu ficou encarregado de elaborar um livro sobre
currículo na escola secundária, destinado a administradores escolares e professores de
ensino secundário. Em 20 de março de 1961, por conta da nova LDB, foi efetuado um
aditamento ao projeto, que deveria ser entregue até dezembro de 1962.

88
É importante lembrar a relação entre Anísio Teixeira com a Companhia Editora Nacional. Segundo
Toledo, a Nacional - com Monteiro Lobato e Octalles Marcondes Fernandes -, articulava desde os anos
1920, um seleto grupo de intelectuais em torno da editora (2001, p. 54). Nos anos 1930, a Cia. Nacional
caracteriza-se por “fazer circular os nomes ligados ao grupo conhecido por ‘pioneiro’” (Toledo, 2001, p.
61). Anísio Teixeira era o editor responsável pela coleção Biblioteca do Espírito Moderno (Toledo, 2001,
p. 52).
89
Correspondência de Anísio Teixeira à Orlando Calaza, chefe de Gabinete do Ministro da Educação e
Cultura, em 6/10/1955.
90
O relatório sobre o ensino de Matemática não foi encontrado. No entanto, o livro de Lucas Bunt foi
publicado pelo CBPE/Inep com o titulo: Introdução ao curso de geometria plana, 1963.
91
Carta de Anísio Teixeira para Laurence Morris, de 9/4/1957.
103

Elaboração de material didático para Ciências

Em 29 de abril de 1955, Mário P. de Brito solicitou à Alberto Ribeiro Lamego,


diretor da Divisão de Geologia e Mineralogia do Departamento Nacional de Produção
Mineral, o fornecimento de uma coleção de minerais que a Divisão preparava para uso
escolar. Brito justificava a solicitação afirmando que a Caldeme estava interessada no
aspecto didático da Coleção, que seria apreciada pelas pessoas que visitassem a
Campanha. Em julho desse ano a coleção de minerais foi disponibilizada para a
Caldeme.
Ainda em 1955, foi estudado a conveniência e viabilidade de elaboração de
materiais audiovisuais, tomando como referência os materiais produzidos nos EUA. Em
relatório de 21 de junho de 1955, Mário P. de Brito afirmava que o material didático
destinado ao ensino de Ciências Naturais para o grau elementar produzido pela
Campanha estava completo e seria experimentado. Contudo, não especificava que
material seria esse.

Produção de Guias para os professores do Ensino Secundário

Em fins de 1952, Gustavo Lessa solicitou a especialistas das áreas de Ciências


Físicas e Naturais, sugestões para os projetos de produção de manuais para professores
do ensino secundário. Para organizar os projetos foram realizadas reuniões com esses
professores, que debateram sobre o modo de preparo dos manuais, a disposição do
conteúdo nos livros, as indicações metodológicas e possíveis exercícios práticos.
Alguns professores não participaram das reuniões mas responderam por carta a
solicitação de Lessa, como foi o caso do professor Djalma Guimarães92. Em dezembro
de 1952, o professor Guimarães enviou uma exposição sobre como deveria ser
constituído um curso de Geologia. Outro professor que elaborou parecer foi José Leite
Lopes93, em 17 de dezembro do mesmo ano, sobre manuais de ensino de Física para
professores. Lopes apresentou sugestões para a melhoria do ensino, discutiu a finalidade
do ensino de Física no secundário, indicou como deveria ser um bom livro de texto,

92
Djalma Guimarães era um importante geólogo de Minas Gerais, diretor do Instituto de Tecnologia
Industrial de Minas Gerais. Foi professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Unifersidade Federal de Ouro Preto (Ufop).
93
José Leite Lopes era professor da Faculdade Nacional de Filosofia e membro do Centro Brasileiro de
Pesquisas Físicas.
104

criticou os atuais livros didáticos dessa disciplina escolar e sugeriu a tradução e adoção
para orientação dos professores, do livro High-School Physics, de Blackwood, Herron e
Kelly94.
Com base nas discussões e sugestões, os planos dos manuais das Ciências
Físicas e Naturais deveriam ser elaborados por professores considerados unanimidade
em suas áreas de estudo. Para as demais áreas do conhecimento, não foram realizadas
consultas e reuniões tão pormenorizadas, mas foram indicados professores especialistas
para elaborarem os anteprojetos dos guias.
Elaborados os planos, estes passariam por análise de um grupo de especialistas -
autoridades nos assuntos -, que pertencessem a diversas escolas de pensamento,
delineados em cada disciplina. De modo geral, eram organizados encontros com os
autores dos planos e professores convidados a dar sugestões, discutir os métodos e
conteúdos de ensino. Um dos encontros realizados versou sobre o plano do manual de
Francês, elaborado pelo professor Raymond Van de Haegen, no dia 24 de setembro de
1953. Foram convidados para essa reunião os professores Roberto Alvim Corrêa, Hestia
Barroso, Louise Jacquier, Maria Junqueira Schmidt e Marcela Mortara.
Realizados os exames dos planos, era acordado com o professor a elaboração do
manual, que depois de pronto seria novamente encaminhado para análise de autoridades
das áreas. Durante o segundo semestre de 1952, Anísio Teixeira e Gustavo Lessa
começaram a convidar os professores para escrever os planos dos guias. Contudo, não
obtiveram sucesso imediatamente. Alguns professores não aceitaram o convite, como
foi o caso de Hilgard O’Reilly Sternberg95 e José Honório Rodrigues96.
Após troca de algumas correspondências foram definidos os primeiros
professores encarregados de elaborar os manuais. Os acordos começaram a ser
assinados em 1953, e seguiram até o fim dos anos 1950. O quadro a seguir indica os
professores que assinaram os acordos, a Universidade a que pertenciam, a disciplina
escolar e o ano dos acordos:

94
O livro foi traduzido pelo próprio José Leite Lopes, como já foi discutido anteriormente.
95
Hilgard O’Reilly Sternberg era professor de Geografia da Faculdade Nacional de Filosofia.
96
José Honório Rodrigues era historiador. Foi diretor da Sessão de Publicações e Obras Raras da
Biblioteca Nacional, diretor do Arquivo Nacional, membro do IHGB e da ABL. Foi professor e diretor do
Instituto Rio Branco e de inumeras Universidades, como a Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, do Ensino Superior do Estado da Guanabara, da Pós-Graduação na Universidade Federal
Fluminense e do Doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro. (Fonte: www.academia.org.br,
acesso em: 20/10/2010).
105

Quadro 2.1
Professores encarregados de elaborar os guias de ensino

Professor Instituição de ensino/experiência Disciplina escolar Ano do


profissional acordo
97
1. Karl Arens 1. professor da Faculdade Nacional Manual de Botânica 1. 1953
2. Alarich de Filosofia, do Instituto da Baviera
Schultz e da FFCL da USP. 2. 2/1/1956
2. Professor da Universidade do Rio
Grande do Sul.
Oswaldo Frota Professor da Faculdade Nacional de Manual de Biologia 23/06/1953
Pessoa Filosofia e de Ciências Naturais na Geral
Escola Rivadavia Corrêa.

Carlos Delgado Catedrático de História Moderna e Manual de História 30/11/1953


de Carvalho Contemporânea da Faculdade Geral
Nacional de Filosofia e membro do
Conselho Nacional de Geografia.
Paulo Sawaya Catedrático de fisiologia geral e Manual de Zoologia 1953
animal da FFCL da USP, lecionou Geral
por 10 anos no Ginásio Estadual e
cinco no Colégio Universitário

Raymond Van Diretor do Instituto Francês da Manual de Francês 08/12/1953


der Haegen Universidade da Bahia. Professor
aggregé em França.

Mário Pereira de Catedrático de Literatura Brasileira Manual de Português 14/11/1953


Souza Lima da FFCL da USP. Lecionou e literatura
português no ginásio estadual.
Américo Catedrático da Faculdade de Manual de História 16/12/1953
Jacobina Filosofia da PUC/RJ, professor do do Brasil
Lacombe Colégio Pedro II e Diretor da Casa
de Rui Barbosa.
John Francis Diretor da Sociedade Brasileira de Manual de Inglês 1953
Tuohy Cultura Inglesa em São Paulo e
professor da FFCL da USP
Werner Gustav Catedrático da Faculdade Nacional Manual de Química 23/12/1953
Krauledat de Filosofia, da Faculdade de
Filosofia do Instituto La-Fayette e
professor no Colégio Batista
Vandick Londres Catedrático do Colégio Pedro II Manual de Latim 13/12/1956
da Nóbrega
Afrânio Professor do Colégio Pedro II Manual de Literatura 1957
Coutinho

97
Em ofício de 9 de julho de 1954, Mário P. de Brito informou que o contrato com o professor Karl
Arens seria recindido, pois o mesmo não poderia terminá-lo. Em seu lugar foi acertado com o professor
Alarich Schultz.
106

A principal característica dos autores que elaborariam os manuais de ensino era


o fato de serem professores e pesquisadores vinculados a Universidades, principalmente
da USP e da Faculdade Nacional de Filosofia. Muitos deles também possuíam
experiência no ensino secundário e alguns pertenciam ao quadro docente do Colégio
Pedro II. A análise do corpo docente encarregado de produzir os guias de ensino
permitiu observar que era ressaltada a relação e familiaridade dos autores com o ensino
básico e com a Universidade.
No projeto da Caldeme os manuais deveriam ser inovadores, pois não
precisavam seguir nenhum programa oficial. Em carta ao professor Mário de Souza
Lima, Gustavo Lessa esclarecia que os autores teriam “plena liberdade para expor a
matéria como melhor entendessem”. Desse modo, os autores poderiam “abrir novos
caminhos para o melhor tratamento dos respectivos assuntos” (Carta de 11/12/1952).
Lessa destacava, em carta para Amério Jacobina Lacombe, que os autores dos livros
estariam contribuindo para a “causa do ensino nacional”:

Esta é uma confirmação oficial do pedido que vos fiz verbalmente para
colaboração com o INEP no preparo do projeto de manuais destinados a
professores secundários.
(...)
Em nome do Diretor do INEP, faço-vos um apelo no sentido de prestardes à
causa do ensino nacional a contribuição ora solicitada (Carta de Gustavo
Lessa, para Américo Jacobina Lacombe, 23/03/1953).

Para produção dos guias foi estabelecido, inicialmente, um critério geral para
todos os manuais quanto a extensão do conteúdo e a ênfase nos conhecimentos
necessários aos alunos. Os acordos descreviam o objetivo da elaboração dos manuais e
os detalhes de como deveriam ser feitos. Como exemplo, é possível examinar o acordo
para produção do Guia de Biologia Geral, sob responsabilidade do professor Oswaldo
Frota Pessoa. As clausulas III e V indicavam as diretrizes gerais para a produção dos
manuais:

Clausula III. O manual de cada matéria deverá conter: a) uma descrição inicial
dos objetivos de ensino da matéria e do aparelhamento didático necessários; b)
uma justificativa da orientação traçada para o manual pelo prof. Oswaldo
Frota Pessoa, relativa à matéria a ser ensinada e ao método de ensiná-la; c) o
texto a ser ensinado distribuído por unidades e capítulos, e acompanhado do
texto para uso exclusivo dos professores, e de indicações bibliográficas; d)
descrição, em cada capítulo, dos meios de ser realizado o ensino teórico e
prático respectivos.
[...]
107

Clausula V. O texto obedecerá as seguintes normas: a) será exposto


metodicamente e conterá, além da parte expositiva, um suficiente número de
exercícios e problemas destinados a estimular a reflexão e a fixar melhor os
conhecimentos; b) será escrito em linguagem simples e correta, devendo haver
a necessária cautela na introdução da terminologia científica, cujo significado
ficará bem claro no próprio texto ou apêndice; c) conterá ilustrações
numerosas e adequadas (Acordo para elaboração de Manual de Biologia
Geral, 23/06/1953).

A clausula IV do acordo explicitava qual o objetivo do Inep ao organizar a


elaboração dos manuais de ensino. Eles teriam o objetivo de “promover, entre os
professores secundários do país, um movimento de renovação no tocante à matéria a ser
ensinada e aos métodos de ensiná-la, a fim de tornar matéria e método mais adequados
aos interesses do adolescente e ao ambiente em que vive” (Acordo para elaboração de
Manual de Biologia Geral, 23/06/1953).
Em carta ao professor José Leite Lopes, Gustavo Lessa esclarecia porque era
necessário auxiliar os professores secundários:

O referido projeto visa contribuir para a melhoria do preparo dos professores


secundários, sobretudo dos que não puderam se preparar em Faculdades de
Filosofia, Ciências e Letras, nem receber nelas cursos de aperfeiçoamento
(Carta de Gustavo Lessa para José Leite Lopes, 5/11/1953)

Com grande parte dos seus membros e colaboradores vinculados às


universidades brasileiras, a preocupação do Inep era orientar a massa de professores que
não possuíam formação nas Faculdades de Filosofia e eram considerados
despreparados. Essa era uma das discussões centrais do período – questionava-se
desqualificação profissional dos professores que já atuavam antes da criação das
Faculdades de Filosofia e os novos professores que eram contratados em caráter de
emergência, sem formação específica.
Dois problemas se sobressaiam nessa discussão: observava-se, de acordo com
Spósito (1992) e Beisegel (1984), a maior quantidade de jovens que começavam a
buscar o secundário e forçar os governos a ampliar esse nível de ensino. Segundo, e em
conseqüência direta da ampliação do secundário, verificava-se o crescimento do corpo
docente.
Em Educação não é privilégio, de 1953, Anísio Teixeira expunha a deficiência
da formação docente, ao apresentar o crescimento do ensino secundário no período:
108

Apenas 16% dos seus professores são licenciados das escolas de filosofia,
embora estas tenham já mais de 20 anos de existência. As demais escolas
superiores forneceram 24% do corpo docente. Com diplomas de escolas
médias – metade normalistas – há 41% dos professores. Os restantes 19% não
tem diploma algum (1977, p. 31)

As Faculdades de Filosofia não davam conta de formar o número suficiente de


professores para ocupar os novas vagas que surgiam com a ampliação do ensino
secundário no Brasil. De acordo com Fonseca (2004), que analisou a expansão do
ensino secundário paulista e o debate sobre a qualidade desse ensino, a Lei Orgânica de
1942 não exigia o curso de licenciatura como norma para autorização de professores no
secundário. Segundo a pesquisadora, tal fato apontava para um problema significativo
na constituição do corpo docente - a falta de professores com nível superior (2004, p.
34). A lei exigia somente o registro do professor no Ministério da Educação, que
possibilitava aos profissionais não formados nas licenciaturas a ministrarem aulas:
“havia um grande numero de advogados, médicos e outros profissionais que exerciam o
magistério secundário e cuja presença era imprescindível para o funcionamento de
ensino secundário” (Fonseca, 2004, p. 34).
Segundo Fonseca (2004), a expansão do ensino secundário não foi acompanhada
pela formação de professores habilitados. As Faculdades de Filosofia não supriam a
carência de professores. Desse modo, o MEC passou a permitir, em “caráter provisório,
o exercício do magistério a profissionais não habilitados” (Fonseca, 2004, p. 97).
Fonseca afirma que:

para minimizar esse quadro de despreparo dos professores desse grau de


ensino, o MEC organiza treinamentos, cursos e exames de suficiência para
habilitar profissionais de outras áreas ao magistério secundário. Desse
processo, surge a Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino
Secundário (CADES) que publica a revista Escola Secundária como parte dos
esforços da diretoria do Ensino Secundário do MEC e da CADES para
divulgar suas atividades, conhecimentos técnicos e cursos de preparação para
os exames de suficiência (2004, p. 97).

O registro dos professores no Ministério da Educação poderia ser feito por exames de
suficiência, de acordo com a Portaria n. 501/52.
Nesse contexto escolar, de novos docentes e discentes, a preocupação centrava-
se no que deveria ser ensinado e como deveria ser ensinado. Procurava-se definir qual
seria o objetivo do ensino secundário para esse novo público escolar. O Inep pretendia
109

participar diretamente do debate, ao estudar a situação das escolas nas diferentes regiões
brasileiras com a Cileme e, propor novos conteúdos e métodos de ensino com a
Caldeme. Em carta à Anísio Teixeira de 6 de janeiro de 1954, Mário P. de Brito
destacava qual era a dificuldade na escolha dos autores dos manuais:

A dificuldade inicial maior foi encontrar pessoas que aliassem à reconhecida


competência dois outros indispensáveis qualificativos: a) uma convicção
segura dos males provindos entre nós do ensino verbalista; b) um entusiasmo
tal pelas vantagens de uma mudança radical nesse ensino que as levasse a se
dedicarem a penosa tarefa da elaboração dos manuais, com sacrifício, parcial
embora, de outras atividades profissionais (Carta de Mário P. Brito para
Anísio Teixeira, 6/1/1954).

A passagem permite compreender dois pontos importantes: produzir os manuais


seriam uma “penosa tarefa”, pois os professores se sacrificariam pela causa
educacional; e a necessidade de acabar com o ensino verbalista, ligado às antigas
humanidades clássicas, que não tinham mais função para a realidade daquele momento.
Munakata (2000, pp. 134-137) afirma que essa era uma das grandes críticas de Anísio
Teixeira ao ensino secundário, de caráter acadêmico e desligado da realidade.
Em A escola secundária em transformação98, de 1954, Anísio Teixeira refletia
sobre a importância do ensino secundário no novo contexto brasileiro, pois o antigo
ensino, que preparava as “elites”, com caráter “intelectualista”, estava inadequado para
a sociedade da época, em acelerada mudança social, que modificava a clientela da
escola secundária:

que já não é especificamente a de pessoas que se destinem ao ensino superior.


Já agora a clientela é mais de pessoas que, julgando o ensino primário
insuficiente para a sua formação, desejam de qualquer modo continuar,
prolongar a sua educação. Buscam, então, a secundária, porque esta educação
secundária, dentre os diversos ramos da educação media, é a de mais prestígio
e, além disto, a única que até pouco tempo atrás permitia a continuação
indefinida da educação, até os níveis mais altos (Teixeira, 1954, p. 9).

Segundo Teixeira (1954, pp. 9-10), as novas gerações, oriundas das camada
populares, procuravam a escola secundária para adquirir uma educação melhor e
também para melhorar socialmente. Assim, a escola secundária educaria a todos, de
acordo com suas aptidões (Teixeira, 1954, p. 11). Ela seria uma escola popular,

98
A escola secundária em transformação foi uma palestra proferida no seminário de inspetores de ensino
secundário. Foi reproduzida na revista RBEP, v. 21, n. 53, de jan.-mar./1954.
110

continuação da escola primária. A proposta de Teixeira era modificar o currículo da


escola secundária, que daria uma formação comum ao adolescente, uma educação
técnica, utilizando os conhecimentos humanistas e científicos.
Desse modo, os autores não precisavam seguir os programas oficiais, pois não
seria obrigatória a adoção dos manuais, eles eram somente sugestões. Tinham, assim,
liberdade para criar manuais inovadores. E essa era a idéia de Anísio Teixeira, como já
foi afirmado anteriormente. Anísio Teixeira criticava os programas oficiais por
homogeneizar os livros didáticos e os alunos (Munakata, 2006, p. 5). A partir das
leituras de Dewey, Anísio compreendia o aluno como o centro do ensino, “a educação
deveria ter como ponto de partida os interesses do aluno” (Munakata, 2006, p. 5). Por
conseguinte, os autores elaborariam manuais sem obrigação de seguir os programas
oficiais, mas pensando em um “ensino ideal” (Munakata, 2006, p. 5).
O prazo de entrega dos manuais eram, em geral, de 12 meses99 a partir da data
da assinatura dos acordos. Segundo Munakata, que analisou os acordos da Caldeme
com alguns dos professores, a elaboração dos manuais sofreram diversas prorrogações
ao longo dos anos. Muitos dos guias não chegaram a ser finalizados. Dentre as suas
pesquisas destaca-se o estudo do extenso processo de elaboração do manual de ensino
de Português e Literatura, que seria escrito por Mario de Souza Lima (Munakata,
2002). O acordo inicial foi assinado em 8/12/1952, para elaboração do plano do manual.
Após discussão e aprovação do plano, foi assinado o acordo final para produção do
guia, em 14/12/1953. O prazo para entrega dos originais foi prorrogado inúmeras vezes.
Após muitas argumentações de Mário de Souza Lima para justificar a impossibilidade
de elaboração do livro (ao longo de mais de 10 anos), foi acordado o prazo de
31/12/1965. Esse acordo foi o último documento encontrado sobre o assunto que, para
Munakata (2002, p. 11), provavelmente não teve continuidade.
Munakata (2004) acompanhou, do mesmo modo, o processo de produção do
manual de História do Brasil, sob responsabilidade de Américo Jacobina Lacombe e, o
manual de História Geral, elaborado por Carlos Delgado de Carvalho. O pesquisador
examinou a política de produção dos livros e “as discussões didático-pedagógicas que a
acompanharam” (Munakata, 2004, p. 515). Um dos dados iniciais e de importância era
o fato de Delgado de Carvalho fazer parte do grupo de intelectuais vinculado a Anísio
Teixeira e Lacombe ser vinculado ao grupo dos católicos, seus opositores (p. 517).

99
Para elaboração do manual de Biologia Geral, Oswaldo Frota Pessoa fez um acordo de 18 meses.
111

Lacombe foi a segunda opção de autor, pois o professor José Honório Rodrigues havia
recusado o convite.
Ambos os planos dos guias foram debatidos, antes de serem aprovados. Nos
debates, Munakata enfatiza a discussão entre Lacombe e José Honório, em que este
último teceu diversas críticas ao plano do manual de História do Brasil, como a ressalva
ao uso da literatura, a advertência sobre a predominância dos aspectos políticos no
manual e a necessidade de se inserir os precedentes históricos dos temas estudados
(2004, p. 519). Segundo Munakata, José Honório Rodrigues discutia a partir de “um
padrão de fazer - histórico que recusa a supremacia do político e busca estabelecer
relações de causalidade entre os ‘fatores (econômicos)’ e os ‘fatos históricos’” (2004, p.
519).
Após várias prorrogações Lacombe entregou, em 1957, a primeira parte do
manual de História do Brasil, que passou por leitura crítica de Guy de Hollanda e
Gustavo Lessa. A leitura deste último expôs a divergência na concepção de Lessa e
Lacombe sobre como deveria ser um manual para professores:

Para Gustavo Lessa, que tinha pressuposto um perfil de professorado


secundário mal preparado, esse manual deveria ser uma espécie de livro
didático (para aluno) comentado.
(...)
O pedagógico confrontava-se com o erudito. Para Lessa, o que importava não
era trazer à baila as derradeiras conquistas da pesquisa histórica, mas a
utilidade que um manual teria para o professor “real”, de uma escola
secundária em rápida expansão e que se estendia pelos rincões do Brasil
(Munakata, 2004, pp. 522-523).

Após mais prorrogações, Munakata observa que não foram encontrados


documentos que explicassem o desenrolar da história. Contudo, em 1974, Lacombe
publicou um livro pela Companhia Editora Nacional em co-edição com a USP, que
apresentava exatamente o capítulo 1 (preliminares), dos originais entregues à Caldeme.
A elaboração do manual de História Geral também sofreu prorrogações. O
volume de História Antiga foi publicado em 1956 e o volume de História Medieval
publicado em 1959. Munakata destaca, no debate sobre o plano do manual de Delgado
de Carvalho, a polêmica com Eurípedes Simões de Paula, professor da USP. De acordo
com o pesquisador, a polêmica revelava a diferença de concepção historiográfica de São
Paulo e Rio de Janeiro. Nas considerações sobre o plano de Delgado de Carvalho,
Simões de Paula apresentou questões que se voltavam a discussões sobre teoria e
112

método de pesquisa (Munakata, 2004, pp. 526-527). Delgado de Carvalho respondeu ao


professor da USP com argumentos de preocupação didática.
Na análise da produção dos dois manuais de História, do Brasil e Geral,
Munakata (2004) expõe um interessante conflito que se estabelecia naquele momento, e
que ultrapassava a questão dos diferentes modos de se fazer história entre os “paulista e
cariocas”, mas revelava dois modo de se pensar a História:

De um lado, aqueles que privilegiam a pesquisa e a discussão acadêmicas e


procuram “libertar-se” das preocupações com “aspectos didáticos”, preferindo
“tratar do assunto em nível mais elevado”, chegando ao requinte de
preciosismo conceitual em relação a termos como “palavra-chaves”. De outro,
os que mantêm certa incompreensão a respeito de novas proposições teóricas e
metodológicas, pois preferem preocupar-se mais com os “aspectos didáticos”
(2004, p. 528).

Munakata (2006) acompanhou, ainda, a produção do manual e Botânica,


elaborado por Alarich Schultz, que substituiu o professor Karl Arens. Diferentemente
dos outros manuais estudados, os originais do guia elaborado pelo professor Schultz foi
entregue praticamente dentro do prazo estabelecido. O acordo foi assinado em janeiro
de 1956 e, em janeiro de 1957, o guia estava pronto. Em 1959, a obra foi publicada. O
manual de Schultz seguia as indicações da Caldeme quanto a preocupação de propor um
novo método, pois enfatizava a parte prática do ensino de Botânica, que deveria partir
do real para a abstração (2006, p. 69). Schultz se propôs a escrever um manual que não
estivesse de acordo com os programas oficiais, estando em sintonia com a proposta da
Caldeme. Segundo Munakata, o autor adotou o “método baseado na indução a partir da
observação e manipulação das espécies a ser estudadas” (2006, p. 72), que tornou a
prática o centro das atividades didáticas. O conteúdo da matéria estaria, portanto,
“subordinado ao método” (Munakata, 2006, p. 73). A discussão sobre a elaboração do
manual de Botânica revela a rejeição ao estudo “verbalista” e a ênfase na experiência,
tão defendido por Anísio Teixeira e expôs, principalmente, que certos educadores
estavam pensando, de fato, em novas metodologias de ensino.
Sobre os demais manuais em elaboração, a documentação da Caldeme permitiu
constatar que também sofreram prorrogações. Em novembro de 1954, de acordo com
carta de Mário P. de Brito para Oswaldo Frota Pessoa, o prazo já com prorrogação do
professor Sawaya tinha se esgotado e ele não havia entregue os originais. O próprio
113

professor Oswaldo Frota Pessoa solicitou várias prorrogações, até entregar os originais
em fevereiro de 1958.
Outro professor que não terminou o manual de Química foi Gustav Kraudelat.
Em 7 de novembro de 1956, Mário P. de Brito encaminhou uma circular para vários
professores encerrando todas as novas prorrogações de prazo e solicitando a entrega dos
originais. No entanto, a pressão não surtiu efeito. O relatório que descrevia o
andamento dos projetos de elaboração dos manuais de ensino, de março de 1957,
afirmava que os professores Paulo Sawaya (Zoologia) e Werner Gustav Krauledat
(Química) eram os únicos que não haviam entregue nada até aquele ano.
Em relatório de 4 de novembro de 1958, Jayme Abreu informava que o
professor Paulo Sawaya entregaria os originais do livro de Zoologia até 30 de abril de
1959. O acordo foi novamente prorrogado para 31 de dezembro de 1959100. Em 21 de
janeiro de 1961, Jayme Abreu elaborou novo adendo prorrogando o prazo de entrega do
manual de Francês escrito pelo professor R. Van der Haegen.
De todos os acordos firmados desde 1953, somente foram publicados os
seguintes livros, pela série Guias de Ensino, CBPE/Inep:

- História Geral I: Antiguidade – Carlos Delgado de Carvalho, 1956


- História Geral: Idade Média – Carlos Delgado de Carvalho, 1959
- Botânica na Escola Secundária – Alarich Schultz, 1959
- Biologia na escola Secundária – Oswaldo Frota Pessoa, 1960
- A presença do Latim – Vandick Londres Nóbrega, 1962
- Método Ativo de Francês Prático – Raymond Van der Heagen, 1962
- História Geral: Idade Contemporânea – Carlos Delgado de Carvalho,
1966
- História Geral: Idade Moderna – Carlos Delgado de Carvalho, 1970 (foi
publicado pela editora Record)

Os livros não eram editados pelo Ministério da Educação. Segundo relatório de


Mário P. de Brito de junho de 1955, por não ter caráter oficial, o governo auxiliaria as
empresas particulares que aceitassem editar os livros, “comprando-lhes certo número de
exemplares, com descontos sobre os preços comuns de venda ao público, fixados estes

100
Relatório de viagem à São Paulo de Jayme Abreu para Anísio Teixeira, em 17/8/1959.
114

nos acordos efetuados, de modo a facilitar a acessibilidade do professorado à aquisição


desse livro” (Relatório entregue a Anísio Teixeira em 21/6/1955). Assim, a principal
editora responsável pelas edições e publicações dos livros foi a Companhia Editora
Nacional/Civilização Brasileira. Os guias eram publicados em “edições mistas”101, em
que o governo encomendava um certo número de exemplares do livro subsidiando a
edição. Os livros adquiridos seriam distribuídos gratuitamente para bibliotecas e pessoas
“chaves”102. A distribuição dos livros estava sob a responsabilidade da Divisão de
Documentação e Informação Pedagógica (DDIP) do CBPE.

Análise crítica de livros didáticos e programas do ensino secundário

Analisar os manuais e programas das disciplinas do ensino secundário era uma


das metas da Caldeme, junto com a produção dos guias de ensino. Para realizar as
análises, o critério de escolha dos professores seguiu o mesmo critério dos autores dos
guias didáticos: eram professores das universidades brasileiras.
A partir de 1954 começaram a ser assinados os acordos para estudo crítico de
livros didáticos e programas de ensino, com os seguintes professores: Jesus Belo
Galvão (Português) - assinado em 13/04/1954; Sérgio Mascarenhas Oliveira (Física) -
assinado em 19/04/1954; Amilcar Salles#"% (Química) - assinado em 07/1954; James
Braga Vieira da Fonseca (Geografia) – assinado em 8/09/1954; Guy de Hollanda
(História) – assinado em 1956.
Sérgio Mascarenhas Oliveira possuía graduação em Química e Física pela
Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil e era professor da
Universidade Católica do Rio de Janeiro. Colaborou na fundação e, tornou-se professor
catedrático, do Instituto de Física da USP, no campus de São Carlos, a partir de 1955.
Era membro titular da Academia Brasileira de Ciências#"&. Publicou artigo na RBEP,
em 1954, sobre os objetivos do ensino de Física no curso secundário#"’.

101
As edições mistas, a partir dos anos 1960 passou a ser denominada “co-edição”.
102
Informação obtida de texto sem autoria, denominado Notas sobre edição de livros diferentes,
encaminhado ao Secretário Geral do CBPE, em 22/3/1959. Pelas explicações do texto pode-se supor que
foi escrito por Jayme Abreu.
103
Após pesquisa em bibliotecas, sites e outros meios, não foi possível encontrar informações sobre o
professor Amilcar Salles.
104
Informações obtidas no Currículo Lattes do professor Sérgio Mascarenhas Oliveira:
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.jsp?id=K4787604T1, acesso em 20/10/2010.
105
Os objetivos do ensino de Física no curso secundário. RBEP. Vol. 22. n. 55, jul.-set./1954. pp. 73-115.
115

James Braga Vieira da Fonseca era professor de Didática Geral, na Faculdade de


Filosofia da Universidade Católica do Rio de Janeiro e assistente de Didática de
Geografia e História, na Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. Era
especialista em ensino de História e Geografia e lecionava no Educandário Rui Barbosa.
Era um assíduo colaborador da revista Escola Secundária da Cades. Escrevia artigos
sobre o ensino de História e Geografia#"(.
Jesus Bello Galvão era graduado em Filosofia pela Faculdade Nacional de
Filosofia da Universidade do Brasil, com doutorado em Letras. Era professor do
Colégio Pedro II, professor da Escola Técnica do Estado da Guanabara e professor de
Letras da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro#"). Foi membro da
Academia Brasileira de Filologia e da ABE.
Guy de Hollanda era professor de História na Faculdade Nacional de Filosofia
da Universidade do Brasil e técnico de educação do Ministério da Educação e Cultura.
Escreveu artigo sobre os programas de ensino de História na revista Escola Secundária
da Cades, em 1958#"!.
Cada professor foi convidado para elaborar análises dos programas de ensino e
dos livros didáticos utilizados nas escola secundárias. Segundo o acordo - padrão para
todas as disciplinas escolares, mudando apenas o nome da disciplina e do professor -, o
objetivo da análise era “promover uma crítica construtiva que revele as qualidades e
defeitos do programa e dos compêndios de geografia e contribua para seu
aperfeiçoamento” (Acordo assinado em 8/09/1954 entre a Caldeme e James B. da
Fonseca. Grifos nossos).
O professor deveria analisar o maior número possível de compêndios que
estivessem em circulação, destacando-se os cinco mais vendidos. O acordo descrevia os
principais aspectos a serem observados nos compêndios:

aspectos materiais, tais como papel, a apresentação tipográfica, a ilustração e


o preço, bem como os aspectos essenciais do conteúdo, tais como

106
Foram encontrados os seguintes artigos de James Braga da Fonseca na revista Escola Secundária:
1957 - O ensino da História do Brasil no curso ginasial (Diferentes processos para a 1a e 4a séries), n. 1,
pp. 55-57; O historiador e o professor de História, n. 2, pp. 83-85; Problemas do Ensino de História, n. 3,
pp. 66-69.
1958 - Como ensinar Geografia?, n. 4, pp. 94-97
1960 - A Geografia humana e a escola secundária. n. 14, pp. 99-102.
107
A Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (posteriormente denominada UFF), foi criada
oficialmente em 1960, incorporando diversas faculdades já existentes, dentre elas uma faculdade
particular de Filosofia.
108
Os programas e o ensino da História. Revista Escola Secundária, 1958. n. 5. pp. 83-86.
116

vocabulário, clareza de redação, correção dos conceitos ou teorias


apresentadas e, muito especialmente, os aspectos propriamente pedagógicos,
como a seleção dos tópicos e importância relativa que lhes é atribuída, sua
apresentação e encadeamento lógico, propriedade dos exercícios e
problemas propostos, e a adequação do livro às finalidades do ensino e ao
nível mental dos estudantes (Projeto Caldeme - Geografia, 8/09/1954,
assinado por Mário P. de Brito e aprovado por Anísio Teixeira).

Os livros avaliados não seriam citados nominalmente, de modo a não expor os


autores e editores dos manuais. O documento enfatizava que, na análise dos livros
didáticos, deveriam ser levados em consideração os programas vigentes, os vícios dos
métodos de ensino utilizados, o preparo deficiente de grande parte dos professores, a
extensão dos currículos e as condições econômicas do comércio de livros didáticos. Os
critérios indicados para análise dos compêndios eram padronizados para todas as
disciplinas escolares. Por fim, a análise era justificada como necessária para orientar
autores e editores para futuras publicações e influir na melhoria dos programas oficiais.
O texto do acordo reforçava a importância dos manuais escolares para o projeto
do Inep, sob coordenação de Anísio Teixeira. Como já foi apresentado anteriormente,
Munakata (2002, p. 1) destaca a preocupação de Anísio Teixeira com o livro didático,
compreendido como um objeto que ajudaria a resolver a questão da “multiplicação
desenfreada da escola secundária, com professores improvisados”. Integrando esse
projeto, as análises da Caldeme buscavam conhecer os padrões e processos didáticos
adotados pelos manuais escolares e apresentavam soluções, sugestões e recomendações.
Tanto as análises críticas como a elaboração dos novos manuais ficaram sob
responsabilidade de intelectuais, professores universitários considerados autoridades em
suas áreas de estudo.
Para esses intelectuais a realidade da educação brasileira apresentava problemas,
como a má organização pedagógica da escola secundária, com um currículo
considerado tradicional. Parte da responsabilidade por essa educação estava no uso de
métodos pedagógicos antiquados e em conteúdos sem significado para os alunos. Como
principal ferramenta utilizada na escola, que expunha métodos e conteúdos, o livro
didático precisava ser reformulado para fornecer subsídios aos professores e alunos. Na
prática de análise dos manuais escolares, os sujeitos envolvidos com a Caldeme e o Inep
procuraram difundir para as escolas e seus sujeitos novos modelos pedagógicos,
baseados na racionalização e na cultura científica.
117

De acordo com balanço de Mário P. de Brito, de 18 de outubro de 1954, o


primeiro professor a entregar a análise dos livros didáticos e programas de ensino foi
Sérgio Mascarenhas de Oliveira. Sobre a análise dos manuais e programas de Química,
foi possível verificar que o professor Almicar Salles não conseguiu terminar no prazo
estabelecido de 3 meses, solicitando em 1 de novembro de 1954 mais um mês de prazo.
Em 3 de dezembro do mesmo ano fez nova solicitação de prorrogação, afirmando que o
trabalho seria entregue em janeiro de 1955. O professor James B. da Fonseca também
solicitou, em carta a Mário P. de Brito, de 17 de dezembro de 1954, prorrogação de um
mês para a entrega do estudo dos manuais e programas de Geografia.
Em relatório para Anísio Teixeira, de 21 de junho de 1955, Mário P. de Brito
afirmou que as análises dos programas de ensino e livros didáticos de Química e
Geografia haviam sido entregues e a análise de Português estava em andamento.
Contudo, as análises de Física, Química e Português não foram localizadas na
documentação da Caldeme. Foram encontradas as análises de Geografia e História, que
chegaram a ser publicadas. Desse modo, para compreender a avaliação dos livros
didáticos empreendida pela Caldeme, foram analisados os textos de James B. Vieira da
Fonseca, sobre Geografia, e de Guy de Hollanda, sobre História.
Os trabalhos de Fonseca e Hollanda foram publicados quando a Caldeme já
estava incorporada à DEPE. A publicação das análises somente dos livros didáticos de
História e Geografia, estava em consonância com as diretrizes da Unesco, que indicava
a necessidade internacional de reestruturação dos livros dessas disciplinas escolares109.
Tal fato indica que o Inep e Anísio Teixeira estavam em diálogo constante com os
organismos internacionais.
Os livros publicados pelo CBPE/Inep eram distribuídos gratuitamente para as
bibliotecas dos cursos de formação de professores e para os profissionais vinculados ao
Ministério da Educação. As obras dos professores Jaime B. da Fonseca, Programas e
Livros Didáticos de Geografia para a escola Secundária (1931-1956), e de Guy de
Hollanda, Um quarto de século de Programas e Compêndios de História para o Ensino
Secundário Brasileiro (1931-1956), foram publicado na série IV – Currículo,
Programas e Métodos.

109
UNESCO. 1951. La reforma de los manuales escolares y Del material de enseñanza. Paris: Imprenta
Lahure.
118

A análise dos programas e livros didáticos de Geografia

O professor James B. Vieira da Fonseca entregou sua análise dos programas e


livros didáticos de Geografia em 1954. Contudo, seu estudo foi publicado somente em
1957, momento em que a Caldeme já estava inserida no CBPE.
A análise de Fonseca, publicada com o título de Programas e Livros Didáticos
de Geografia para a Escola Secundária (1931-1956), seguia as orientações
estabelecidas pelo acordo com a Caldeme – observar os aspectos materiais, de
conteúdo, vocabulário e aspectos pedagógicos. A obra dividia-se em onze capítulos:
Noções preliminares; O conceito de livro didático; Os compêndios e programas; A
linguagem do compêndio; A apresentação dos temas ou unidades; As ilustrações dos
compêndios; Os exercícios; O vocabulário técnico; As leituras complementares; As
indicações bibliográficas; Conclusões.
Os onze capítulos de Fonseca podem ser divididos em duas partes distintas. O
capítulo introdutório apresentava um diagnóstico do ensino da Geografia na escola
secundária e discutia os programas oficiais para as diferentes séries. Os demais
capítulos expunham a análise dos manuais escolares, indicavam sugestões
metodológicas aos professores e sugestões para os autores e editores.

O ensino da Geografia na escola secundária

No início do seu livro, nas Noções Preliminares, Fonseca informava que sua
obra pretendia colaborar com o estudo da situação do ensino de geografia na escola
secundária. O estudo apresentaria impressões com o intuito de colaborar para a melhoria
desse ensino. Dirigindo-se ao professor, Fonseca afirmava que os alunos não
apresentavam, no fim dos anos de estudo do secundário, resultado compensador para o
tempo, os gastos e esforços empreendidos pelos mestres, família e sociedade. Apesar de
reconhecer que as causas do resultado insatisfatório não eram responsabilidade somente
do professor, o autor afirmava que abordaria os problemas que pudessem ser resolvidos
pelos docentes. Fonseca apelava ao professor para que, diante das questões apresentadas
pelo livro, examinasse sua situação particular.
Para Fonseca, existiam dois tipos de falhas em relação ao ensino de Geografia:
falhas que exigiam a simples mudança de atitude do docente e falhas que exigiam
mudanças materiais. A mudança de atitude do docente seria condição básica para a
119

melhoria do ensino. Grande parte dos professores teriam se deixado levar pela rotina e
estavam acomodados. Esses professores jogavam a responsabilidade das falhas do
ensino para os programas, para os estudantes, para as famílias e não observavam sua
parcela de culpa nesse processo. Faltava aos professores uma “autocrítica de sua
conduta”. Segundo o autor:

Há um comodismo generalizado que satisfaz a vaidade pessoal do professor,


pois toda a responsabilidade das falhas é lançada aos programas, à vadiação
dos estudantes, às famílias que só querem saber das notícias de aprovações,
aos diretores da escola que não querem perder os fregueses, a mil outras
razões, todas elas com maior ou menor dose de verdade, mas que
absolutamente não afastam do professor sua parcela de culpa (1957, p. 8).

Observa-se, de tal modo, na introdução de Fonseca, que o professor era chamado


a resolver o problema do ensino e era responsabilizado por parte das falhas desse
ensino. Para a realização da autocrítica, Fonseca formulava cinco questões que os
professores deveriam responder:

1. Quais os objetivos gerais que devo atingir com uma turma de determinada
série? Para que vou ensinar tais assuntos?
2. Quantas aulas realmente poderei dar durante o ano letivo?
3. Quais os métodos empregados durante as diferentes partes do programa?
4. São os meus exercícios interessantes para os alunos?
5. Serei eu um amigo de meus alunos? (Fonseca, 1957, pp. 8-12).

As questões descritas apresentavam respostas e considerações do autor que


recomendava como os professores poderiam agir:
1. Os objetivos do ensino precisavam ser organizados tendo em vista as necessidades
dos alunos. Somente depois desse trabalho seria possível selecionar os elementos
geográficos que seriam explorados durante o ano letivo. Os professores não deveriam
seguir cegamente a seqüência dos programas oficiais. A seleção do conteúdo seria
realizada em função dos objetivos do ensino.
2. O número efetivo de aulas precisavam ser contadas, descontando feriados, provas,
exames, etc. Os professores não deviam deixar assuntos importantes do final dos
programas abandonados. O professor precisava planejar suas aulas coordenando o
tempo com os temas a serem ensinados.
3. O principal vício do ensino secundário era a tendência às aulas expositivas
sistematicamente, aulas apenas baseadas na audição. Era necessário variar o sistema
120

de trabalho durante cada aula para manter o interesse da classe, planejar técnicas a
serem empregadas variando atitudes docentes e discentes.
4. O exercício era considerado indispensável para a aprendizagem. O aluno precisava
utilizar com naturalidade os novos conhecimentos e necessitava fixar a
aprendizagem. O professor procuraria arranjar meios de apresentar os exercícios sob
uma forma que despertasse o interesse nos estudantes, correlacionando o exercício
com fatos da vida real. Relacionaria os trabalhos com a vida prática.
5. Era necessário reforçar o sentimento de amizade entre alunos e professor, buscando
diminuir as dificuldades diárias. A amizade possibilitaria ao professor o desempenho
de sua ação educativa em maior profundidade.
As considerações de Fonseca revelam uma representação sobre os professores e
suas práticas no ensino secundário: professores que não planejavam suas aulas;
reproduziam os conteúdos dos programas oficiais sem pensar no objetivo do ensino;
ministravam aulas expositivas, com exercícios desinteressantes e sem conexão com a
vida dos alunos. A imagem dos estudantes também era representada no documento, eles
não viam interesse nos assuntos tratados pela escola, pois não tinham relação com a
realidade. As afirmações de Fonseca sobre os professores ressaltam algumas discussões
do período, como destaca Souza (2008, p. 185), que relacionavam as práticas docentes
com o sistema de avaliação da época, que cobrava o extenso conteúdo dos programas
curriculares, incentivando um ensino baseado na memorização. Para mudar a prática de
aula era necessário modificar o sistema de avaliação.
Fonseca finalizava as Notas Preliminares resumindo e analisando o conteúdo
dos programas oficiais para as diferentes séries:
* Na primeira série ginasial o ensino da geografia visava fazer com que o estudante
tomasse contato com os fatos e fenômenos geográficos, além de ter as primeiras noções
da técnica de estudá-los dentro dos princípios fundamentais da Geografia. A prática da
memorização teria de ser utilizada, pois os alunos precisavam gravar as características
geográficas. Contudo, a memorização precisava ser usada de modo adequado, conforme
a escola moderna. Para a interpretação dos fatos e fenômenos geográficos seriam
escolhidos os fenômenos de regiões conhecidas dos estudantes. Os alunos também
deveriam aprender a trabalhar na prática com instrumentos de uso da Geografia, como
os mapas.
* A Geografia na segunda série era a interpretação das relações do homem com o meio,
nas diferentes regiões da Terra. Contudo, a segunda série ginasial era a que mais
121

apresentava problemas, na opinião do autor. A causa dessa dificuldade era o fato de o


objetivo da Geografia para esta série – dar aos alunos uma visão global do mundo -, não
ser correspondida pelo professor, que lecionava apenas algumas partes do mundo. Os
alunos não compreendiam o todo, pois conheciam apenas uma parte. O professor
deveria dividir as partes do mundo em grandes regiões, que seriam articulados com os
fatos e fenômenos geográficos mais importantes. Deste modo, os alunos
compreenderiam as razões de semelhança e diferença de soluções encontradas pelos
diferentes povos para seus problemas.
* Na terceira série ginasial o aluno teria contato com os elementos, fatos e fenômenos
da Geografia do Brasil. O treino já adquirido de interpretação permitiria aos estudantes
relacionar os grandes traços marcantes da Geografia nacional, aqueles que
determinariam a unidade do Brasil, tanto de natureza física, como de natureza biológica.
* A quarta série ginasial ensinaria a interpretação dos problemas que os brasileiros
encontravam nas diferentes regiões. Observar o homem agindo, tendo por objetivo o
aproveitamento inteligente do espaço. Compreender as diferenças para as soluções de
problemas aparentemente semelhantes nas diversas regiões do Brasil. Este estudo
mostraria aos alunos o valor de seus esforços.
* A primeira série do colegial desenvolveria a idéia do método dos “círculos
concêntricos”. Nesta série seria realizada a ampliação científica do conteúdo da
primeira série ginasial.
* A segunda série do colegial ampliaria a segunda do ginásio, destacando as influências
que determinados povos exerciam no conjunto dos demais. Os países seriam encarados
pela sua repercussão no mundo moderno, tanto pelos problemas físicos, econômicos
como políticos. Nesta série, a articulação com a História precisava ser constante.
* A terceira série do colegial ampliaria as duas últimas do ginásio, procurando dar ao
estudante a consciência dos problemas nacionais e a sua responsabilidade nas soluções
futuras, como elemento atuante da sociedade que, em breve, iria ser.
Segundo os programas oficiais, a Geografia precisava ser ensinada a partir das
regiões conhecidas pelos alunos. Eles deveriam aprender os conceitos da Geografia,
interpretar fatos e fenômenos geográficos, trabalhar com instrumentos da área e
compreender os problemas econômicos e políticos do Brasil e do mundo. Tal ensino
pretendia, no fim do colegial, que os alunos tivessem autonomia intelectual para discutir
os problemas brasileiros e se responsabilizar por suas soluções como cidadãos. Segundo
Gomes, nos anos 1930, consolidava-se no Brasil, uma concepção de Geografia de cunho
122

científico, considerada moderna, que propunha “um estudo geográfico dividindo o


espaço em regiões naturais do território brasileiro” (2010, p. 28). A nova proposta se
opunha ao modelo considerado tradicional da Geografia que se baseava no estudo do
espaço a partir das unidades da federação, “tendo como critério de classificação a ordem
alfabética das províncias e cidades” (Gomes, 2010, p. 30).
A discussão de Fonseca sobre os programas oficiais expunha algumas questões
do período. De acordo com Souza, os programas das disciplinas escolares, desde 1942,
já indicavam orientações metodológicas que priorizavam os processos ativos, o sistema
de projetos, a prioridade da compreensão e não da memorização, utilização de técnicas
de ensino variadas, etc., propugnados pela pedagogia moderna (2008, p. 185).
Após analisar e sugerir como deveria ser o ensino de Geografia, Fonseca fazia
uma breve discussão sobre o uso do livro didático. Para o autor, os compêndios
utilizados nas escolas eram obstáculo para os professores, pois muitos docentes
orientavam seus cursos pelos manuais, seguindo a ordem de interpretação dos livros.
Como os compêndios eram feitos somente com uma orientação, o ensino da Geografia
tornava-se homogeneizado. Fonseca considerava o livro didático indispensável para o
aluno, como auxiliar imediato do professor. Porém, não se justificava a inversão dos
valores que tornava o professor servo do livro escolar: “Em muitos casos anula-se o
professor ao papel de repetidor dos textos e tomador de lições” (1957, p. 17).
Para encerrar a primeira parte, Fonseca ressaltava a falta de preocupação
didática dos manuais:

Como os livros didáticos, em grande maioria, cuidam apenas dos elementos


geográfico, nada contribuindo no setor didático, aos poucos os professores
tendem a concentrar todo seu interesse em não errar na geografia, o que
facilmente conseguem, mas com o esquecimento de princípios pedagógicos
elementares, o que os torna responsáveis pelo pequeno rendimento dos alunos
(1957, p. 17).

Os livros para a escola precisavam ser didáticos, com orientações pedagógicas, e


não apenas resumos dos livros de Geografia acadêmicos.

Os livros didáticos de Geografia

A segunda parte da obra analisava os livros didáticos que estavam em circulação


desde a década de 1930. O primeiro problema verificado por Fonseca estava no fato de
123

os autores dos compêndios não compreenderem o conceito de livro didático. Segundo o


autor:

Colocando nos livros todos os ensinamentos geográficos exatos, pensam os


autores haver cumprido sua missão, como se os adolescentes da Escola
Secundária fossem miniaturas de geógrafos, que deveriam aprender toda a
Geografia de forma reduzida (1957, p. 18).

Em tal passagem, Fonseca enfatizava que a escola não era somente receptáculo
dos conhecimentos da ciência de referência. A escola possuía especificidades e uma
dinâmica própria. Os autores dos compêndios não compreendiam o objetivo da escola
secundária e não obedeciam aos princípios pedagógicos na elaboração dos livros,
apenas seguiam os fundamentos científicos da Geografia. Logo, Fonseca pretendia
elaborar a crítica aos manuais, abordando suas deficiências didáticas e de caráter
geográfico, apresentando, por fim, sugestões para a melhoria dos livros.
Relação dos compêndios com os programas - Fonseca explicava que todos os
manuais analisados seguiam perfeitamente a seqüência do programa oficial. Contudo, o
autor lembrava que os programas somente estabeleciam os temas a serem estudados e
que as interpretações geográficas e didáticas ficavam a critério do professor. Para
Fonseca, cada autor de manual escolar precisava organizar seu plano de apresentação da
matéria de acordo com razões pedagógicas bem definidas. O autor advertia que, para os
alunos da primeira série ginasial, os estudos precisavam partir dos fatos concretos mais
próximos para os mais distantes.
Vocabulário técnico e da Linguagem - A dificuldade no uso do vocabulário
técnico e da linguagem era destacada por Fonseca. Muitas vezes o manual era redigido
em termos abaixo ou acima da compreensão do estudante, o que causava desmotivação.
Duas seriam as soluções para o problema: 1. as autoridades ministeriais deveriam
levantar os vocabulários conhecidos e de uso dos adolescente, para que os mestres e
autores usassem linguagem compreensível e, aos poucos, ampliassem o vocabulário; 2.
os autores dos livros didáticos deveriam redigir com a preocupação de despertar
interesse no leitor. Seria preciso redigir com a dupla preocupação de expor com
exatidão científica e de modo a prender o aluno, introduzindo elementos motivadores,
que despertassem o desejo da aprendizagem. Para realizar tal objetivo, o livro precisava
articular o fato estudado com as realidades da vida do estudante.
124

O autor enfatizava que as disciplinas na escola secundária não constituíam fim


em si mesmas, mas meios para educar os adolescentes. Deste modo, propunha duas
soluções para os termos técnicos nos manuais: 1. levantar a nomenclatura especializada,
para exame das possibilidade de substituição dos vocábulos que não fossem
indispensáveis; 2. modificar o sistema adotado pelos autores dos manuais, de colocarem
a explicação dos termos técnicos no final da lição. A solução seria explicar o termo
técnico no próprio corpo do texto, de modo a não fragmentar a continuidade do
pensamento do aluno.
Sumários - com a descrição dos temas de estudo. Fonseca observava que eram
todos muito parecidos, sem criatividade. Em dois exemplos analisados, os sumários
eram cópia do programa oficial. Para Fonseca tal fato mostrava o pouco interesse dos
autores em fazer mais do que o estritamente obrigatório. Mesmo os sumários que
especificavam os assuntos a serem desenvolvidos, deixavam a desejar, pois faltavam
elementos que gerassem interesse. Para Fonseca, o aluno do secundário ainda não tinha
o gosto pelos estudos e, deste modo, o compêndio precisava atrair os alunos para os
problemas culturais. O sumário deveria “criar ligações entre o texto e o desejo de
satisfação da curiosidade do aluno” (1957, p. 31). É importante destacar que a todo o
momento Fonseca reforçava a necessidade de se provocar a curiosidade, incentivar o
gosto pela leitura, gerar interesse dos alunos, etc., e criticava a CNLD, ao considerar os
manuais cópias dos programas oficiais.
Ilustrações - As ilustrações dos compêndios não estavam sendo bem
exploradas, eram tratadas com descaso. Fonseca estabelecia três modos de se usar uma
ilustração: 1. Para auxiliar a aprendizagem dos elementos contidos no texto, como uma
espécie de confirmação ou prova do que estava no texto; 2. Para motivar a
aprendizagem. Poderia ser um ponto de partida para conduzir ao texto e à
aprendizagem; 3. Para fixar a aprendizagem, com a participação da ilustração nos
exercícios. Fonseca afirmava que essas três funções apareciam nos compêndios de
Geografia, mas que a maioria dos autores encaravam a ilustração apenas como auxiliar
da aprendizagem dos elementos contidos no texto e para confirmar o que estava escrito.
Fonseca verificava nos compêndios, exemplos de ilustrações com legendas
erradas ou desajustadas com os textos. Ainda existiam ilustrações bastante motivadoras
que não eram exploradas pelos manuais. Para o autor, faltava nos compêndios a redação
de informações bem elaboradas acompanhando as ilustrações e a relação maior entre
textos e ilustrações. Para uma boa utilização da ilustração os autores deveriam orientar o
125

aluno a como observar as imagens, pois seria por meio delas que se daria o aprendizado
geográfico da observação. Os alunos precisavam aprender a relacionar as ilustrações
com os fatos geográficos.
Exercícios - Colaborariam para a fixação da aprendizagem, pois eram
considerados indispensáveis e teriam finalidades bem definidas:

fixar termos técnicos indispensáveis, gravar princípios, leis ou definições


básicas; provocar atitudes reflexivas ante fatos apresentados; correlacionar o
tema em estudo com outros já aprendidos; articular o estudo da Geografia com
os das demais disciplinas da Escola Secundária; desenvolver habilidades
específicas, o espírito inventivo, a prática de procurar a melhor solução entre
as que se oferecem, evitando o medo às decisões, mas coibindo a ação
irrefletida; dar oportunidades ao afloramento das tendências individuais; criar
situações que exijam o trabalho em cooperação pelos alunos, visando a
melhoria do convívio social, etc. (Fonseca, 1957, pp. 40-41).

Segundo Fonseca, os compêndios analisados não possuíam exercícios com as


finalidades descritas acima. Os manuais apresentavam cinco tipos de exercícios:
1. Tipo questionário, em que os alunos copiavam do texto a resposta. Esses exercícios
eram utilizados pelos professores nas provas, o que fazia com que os alunos apenas
decorassem os conteúdos sem articular as idéias. Tais conhecimentos logo seriam
esquecidos.
2. Exercícios de tipo teste de lacuna ou simples escolha. Do mesmo modo que os
questionários visavam a memorização.
3. Exercícios cartográficos, também priorizavam a memorização, pois na maioria dos
casos o estudante limitava-se a desenhar um mapa de uma região qualquer. Para
Fonseca, não bastava que o aluno soubesse localizar um fato geográfico, ele precisava
aprender a justificar esse fato, relacionar com outros, destacando as semelhanças e
divergências.
4. Exercícios de esquematização das idéias do texto. A capacidade de esquematizar os
conhecimentos era considerada importante. Contudo, seria preciso orientar os alunos
sobre como organizar esquematizações. Esse tipo de exercício desenvolveria a
capacidade de observação e atenção do aluno.
5. Exercícios “fazer um estudo sobre um tema”. Este trabalho precisava ser orientado
desde os primeiros passos, pois, muitas vezes, os alunos se dispersavam. A orientação
do professor seria central para os alunos. Todavia, por causa da má formação dos
126

docentes, os autores de livros didáticos deveriam empregar todos os recursos possíveis


para auxiliá-los.
A análise de Fonseca, ao criticar os exercícios baseados na memorização
mecânica, reforçava a discussão do período sobre as novas propostas pedagógicas e
conceitos de aprendizagem, com ênfase nos métodos ativos e na pedagogia moderna. O
autor reforçava os objetivos de formar alunos autônomos, que refletissem sobre sua
realidade e com espírito inventivo. Destacava, ainda, que o livro didático era objeto
auxiliar de grande importância para professores mal formados.
Leituras complementares - Eram consideradas importantes. No entanto, para
melhorar a iniciativa dos autores dos manuais, Fonseca elencava algumas sugestões.
Segundo o autor, as leituras não despertavam o entusiasmo dos alunos pois, em muitos
casos, sua terminologia estava acima da compreensão dos estudantes. A leitura deveria
mostrar ao aluno casos de aplicação prática dos conhecimentos da lição. O aluno
precisava perceber a importância do conhecimento, o que facilitava a aprendizagem. No
manual, a leitura complementar não poderia ser somente um apêndice, mas precisava
estar correlacionada ao texto.
Indicações bibliográficas - Fonseca observava que as indicações bibliográficas
eram interessantes como sugestões para os alunos. Contudo, existiam livros didáticos
que não faziam referência a qualquer obra em que os alunos pudessem encontrar
conhecimentos mais ampliados. Para Fonseca essa era uma falha injustificada, visto que
o manual didático teria por finalidade auxiliar o professor na orientação dos jovens. A
grande maioria dos autores apresentava bibliografia no fim dos livros como prova de
veracidade dos textos. Para Fonseca, as referências deviam ser indicadas para esclarecer
e motivar o estudante nas leituras, ajudando a despertar o desejo de procurar os livros.
Na busca por tais leituras, os alunos estariam aprendendo a aprender.
Fonseca concluiu a pesquisa afirmando que procurou priorizar, ao longo de seu
estudo, a análise dos aspectos considerados mais importantes do ponto de vista
pedagógico. Com a resolução das questões indicadas, Fonseca acreditava que os demais
problemas seriam corrigidos automaticamente, pois os autores iriam abandonar o tipo
padronizado de livro, homogeneizado, produzido pelo comércio. Fonseca buscou
apresentar opiniões capazes de ser empregadas imediatamente para o ensino da
Geografia, dentro da situação geral do ensino no Brasil.
127

Algumas constatações
A análise do estudo de Fonseca revelou a participação do educador, nos debates
dos anos 1950, sobre a reformulação do ensino secundário, a função da Geografia nesse
ensino, a atuação docente e o papel dos livros didáticos, como divulgadores de
propostas didático-pedagógicas.
Em um primeiro momento Fonseca propôs uma orientação para os professores,
que indicava, desde a necessidade de preparação da aulas de modo racional, de acordo
com o objetivo do ensino, até os critérios de seleção dos conteúdos que melhor se
adequassem aos objetivos estabelecidos.
Para Fonseca as aulas – com seus conteúdos e atividades -, precisavam despertar
o interesse dos alunos. Para o desenvolvimento desse interesse, o ensino deveria tratar
de fatos reais e estar relacionado à vida prática. Diante dos programas de ensino
oficiais, Fonseca propôs possibilidades para o professor.
Fonseca ressaltava que o ensino precisava ser baseado na escola moderna, em
que a Geografia seria estudada pelas regiões naturais mais próximas dos alunos,
chegando às mais distantes. Os estudantes precisavam compreender a relação do
homem com o meio, nas várias regiões da Terra. O alunos era chamado a participar do
ensino, a ser ativo. Precisava conhecer os problemas nacionais e se responsibilizar pela
sua solução, como cidadãos.
Na análise dos livros didáticos, Fonseca reconhecia a importância dos manuais
como auxiliares do professor, e por tal fato, criticava a homogeinização dos livros pelos
programas oficiais, que não se preocupavam com as diferenças regionais. Na defesa da
Didática do Ensino, o autor questionava os livros escolares que pareciam apenas
reproduções resumidas dos livros de Geografia científica, sem preocupação com os
princípios pedagógicos. Para Fonseca, os autores de manuais precisavam elaborar os
livros tendo vista “razões pedagógicas” bem definidas.
As preocupações pedagógicas nos livros didáticos diziam respeito a: adaptação
da linguagem científica para a compreensão dos alunos; redação que despertasse
interesse com elementos motivadores articulados à realidade dos jovens; ilustrações que
auxiliassem e motivassem a aprendizagem dos textos; exercícios que não objetivassem
somente a memorização, mas que colaborassem com a fixação da aprendizagem e
128

provocassem atitudes reflexivas. As atividades deveriam estimular a curiosidade e


autonomia dos alunos, de modo que “aprendessem a aprender”110.
O estudo de Fonseca expunha as discussões que eram realizadas na Faculdade
Nacional de Filosofia, sobre a importância da Didática. Ensinar Geografia e fazer
Geografia eram duas coisas diferentes. Na escola, a Geografia era utilizada para
colaborar na formação dos estudantes. Caberia à Didática adaptar os conhecimentos e
elaborar metodologias para melhor ensinar os conteúdos selecionados. Como os livros
didáticos eram os principais divulgadores dos conhecimentos e métodos, precisavam
estar alinhados ao novo “espírito” educacional.

A análise dos programas e livros didáticos de História

O estudo de Hollanda (1957), Um quarto de século de Programas e Compêndios


de História para o Ensino Secundário Brasileiro (1931-1956), foi entregue em fins de
1956, e publicado em 1957.
Para elaborar a análise dos programas e compêndios de História para o ensino
secundário no Brasil no fim dos anos 1950, Hollanda retornou ao início dos anos 1930,
logo após a “Revolução de 1930” e às mudanças realizadas no sistema educacional. O
autor analisou as reformas educacionais do ensino secundário e sua repercussão nos
programas para a disciplina História de 1931 a 1956. O estudo de Hollanda foi mais
pormenorizado do que a análise de Fonseca, como foi possível observar nas 292 paginas
de seu estudo. Fonseca elaborou sua pesquisa em 62 páginas.
Hollanda (1957) dividiu seu livro em três grandes partes. Os cinco primeiros
capítulos formaram a primeira parte, em que foram descritas as características dos
programas elaborados com as reformas Campos e Capanema, finalizando com os

110
É importante reforçar que a participação de James Braga da Fonseca nas discussões sobre o ensino não
se restringiram a produção da Caldeme e as aulas nas universidades. O professor divulgava sua concepção
de ensino de Geografia e de História, na revista Escola Secundária, como já foi mencionado. Seus artigos
ressaltavam a necessidade de uma renovação do ensino no ginásio, com o fim das aulas expositivas, de
simples memorização e a implementação de um ensino prático, objetivo, baseado na realidade dos jovens
e que estimulasse a busca pelo conhecimento científico. O objetivo do ensino era formar cidadãos com
espírito observador, críticos, conscientes e ativos. Em Como ensinar Geografia, Fonseca criticava o
aspecto livresco e escolar do ensino, como ponto prejudicial para a Geografia. Propunha que a geografia
fosse levada para fora da sala de aula, “fazendo com que os alunos criem o hábito de identificar sempre os
elementos aprendidos” (1958, p. 96). O professor precisava conhecer o ambiente de vida dos alunos para
poder planejar a correlação dos fatos geográficos, visando atender ao programa elaborado. Para realizar o
trabalho o professor precisava despertar no aluno a prática da observação da natureza e em aula discutir o
fato observado buscando suas razões científicas. O segundo momento do ensino seria estudar os fatos em
classe para depois os alunos procurá-los na natureza. Desse modo, a escola tornar-se-ia “um elemento
comum da vida” (1958, p. 96).
129

programas de 1951. Na segunda parte, o autor abordou as peculiaridades dos


compêndios de História anteriores às reformas Campos e Capanema e as mudanças nos
manuais produzidos a partir das orientações oficiais. Na terceira parte, o autor
apresentou questões que estavam em debate nos anos 1950, como: a veiculação de
preconceitos e estereótipos nos manuais escolares; a proposta de novos instrumentos
para atualizar o ensino da disciplina; o debate sobre a integração da História nos
Estudos Sociais; a função da Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) na
avaliação dos compêndios e; o papel dos professores e alunos em relação aos programas
e compêndios de História.
Na Introdução de seu livro, Hollanda apresentou os objetivos e conteúdos do
ensino da História no curso secundário, destacando o debate da época, entre educadores
e especialistas, sobre as finalidades da educação e o papel que o ensino de História teria
para a efetivação de tais finalidades. Para o autor, o objetivo do ensino de História na
escola média era fazer com que o aluno adquirisse uma vivência do passado da
Humanidade, para que pudesse compreender o presente, “com todas as suas sombras e
luzes, tragédias e esperanças” (1957, p. 7). Os programas de História deveriam enfatizar
as experiências das diferentes civilizações que coexistiram, para que os alunos
conhecessem a diversidade das formas de cultura.
Primeira parte do estudo - Hollanda analisou as reformas do ensino secundário
e as mudanças por que passou a disciplina História nesse processo. Às vésperas da
reforma Francisco Campos, os programas de ensino eram formulados pelos professores
do Colégio Pedro II e pelos estabelecimentos de ensino secundário oficiais. Com a
reforma Campos, os programas e as instruções sobre os métodos de ensino passaram a
ser elaborados pelo recém criado Ministério da Educação e Saúde Pública. Tal mudança
fazia com que tanto os estabelecimentos de ensino secundários oficiais quanto os
particulares se submetessem à esfera federal, perdendo a possibilidade de elaborar seus
próprios programas, que atenderiam às particularidades regionais.
De acordo com Hollanda, ao transferir para o Ministério da Educação a
expedição dos programas, a reforma Campos acentuava a “centralização uniformizadora
do ensino secundário” (1957, p. 15). Para efetivar o controle dos programas foi
organizado um sistema de inspeção federal. Este sistema, ao lado das provas e exames
escritos, fazia com que os diretores e professores seguissem prioritariamente o
programa oficial.
130

Em relação ao ensino da História, as cadeiras de História do Brasil e Universal


foram substituídas pela História da Civilização, com o propósito de articular o estudo do
passado nacional e americano com o da Humanidade. Os objetivos da disciplina
visavam à formação humana do aluno e sua educação política, contribuindo para que o
adolescente tomasse consciência de seus deveres para com a comunidade e o país. Para
Hollanda as instruções metodológicas da reforma Campos eram inovadoras, ao
estabelecer que o professor deveria “estimular nos alunos os dons de observação,
despertar-lhes o poder crítico e oferecer-lhes sempre ensejo ao trabalho autônomo”
(1957, p. 20). As instruções recomendavam que houvesse preocupação em não forçar o
aluno a memorizar toda a matéria em detrimento do poder crítico do ensino.
Contudo, Hollanda enfatizava que, dificilmente as instruções para o ensino de
História se efetivaram, pois estavam em contradição com a regulamentação das provas
parciais e exames de segunda época. Tendo que estudar para os exames, professores
passavam somente os pontos que cairiam na prova e os alunos apenas memorizavam-
nos. Para o autor, as renovações propostas nas instruções metodológicas, de 1931,
haviam fracassado.
Rompendo definitivamente com o programa da reforma Campos, em 1940, por
meio de uma portaria ministerial, a cadeira de História do Brasil retornou como ensino
autônomo, com programa e horário próprios, em “contradição a lei do ensino
secundário vigente” (1957, p. 32), passando a ser ministrado paralelamente à História
Geral e da América. Em 1942, a Lei Orgânica do Ensino Secundário modificou o
ensino e alterou os programas de História. De acordo com Hollanda, a reforma
Capanema efetivou a portaria de 1940, ao restabelecer a História do Brasil como
disciplina autônoma tanto no ginásio como no colégio.
Segundo a Lei Orgânica, os programas seriam elaborados por uma comissão
designada pelo Ministro da Educação. Para a elaboração dos programas de História,
destacava-se a participação de Jonathas Serrano, professor do Colégio Pedro II e autor
de compêndios de História. Cada programa deveria ser marcado por sentido patriótico e
pela preocupação moral, “sendo a formação da personalidade integral dos adolescentes
a primeira finalidade da educação secundária” (1957, p. 44). Tal passagem demonstrava
a preocupação durante o Estado Novo, com a educação moral e cívica dos alunos.
O programa de cada disciplina continha o sumário, expresso em unidades
didáticas e as finalidades educativas. As unidades didáticas eram compreendidas como
um método pedagógico, que agrupavam conhecimentos correlacionados, formando um
131

problema que seria estudado em conjunto. Todavia, de acordo com Hollanda, “nos
programas brasileiros de História do curso ginasial, tais unidades didáticas não
passaram de subdivisões lógicas da matéria neles contidas” (1957, p. 46). Como as
instruções metodológicas dos programas de História Geral e do Brasil para o Ginásio
demoraram a ser publicadas, Hollanda analisou as indicações presentes nos livros
didáticos de Serrano, que serviam de modelo para outros autores.
Em 1951, com o descontentamento de alguns professores em relação à reforma
Capanema, nova lei foi promulgada (n° 1.359), reorganizando a seriação do estudo da
História e, incluindo a História da América como disciplina autônoma. Os programas de
ensino seriam elaborados pelo CNE e aprovados pelo Ministério da Educação. Ainda
em 1951, o Colégio Pedro II voltou a ser responsável pela elaboração dos seus próprios
programas de História. Estes programas acabaram sendo expedidos para os demais
estabelecimentos oficiais e particulares do país. O Colégio Pedro II elaborou, assim,
programas mínimos de História e, posteriormente, programas de desenvolvimento e
instruções metodológicas.
Nos programas mínimos das séries ginasiais predominavam os assuntos de
história política, enquanto no colégio, acrescentavam-se os aspectos econômicos,
sociais e culturais. Hollanda criticava os programas, ao afirmar que somente os
programas mínimos deveriam ser obrigatórios. Para o autor, a proposta de se observar
as diferenças regionais não seria efetivada enquanto cada estabelecimento de ensino não
elaborasse o seu próprio programa de desenvolvimento. Do modo como estavam
estabelecidos, os programas de desenvolvimento tornavam-se uniformes para todo o
Brasil.
Hollanda concluiu a primeira parte de seu trabalho observando que o estudo da
História a partir de 1931, recebeu uma extensão muito maior do que em todos os
currículos anteriores. Comparando os programas, observou que os de 1931 tentaram
renovar “as anteriores listas de ‘pontos’, cujo conteúdo, há muito, requeria atualização”
(1957, p. 102). Os programas fracassaram, pois previam um corpo docente de alta
qualidade, o que não havia no Brasil, com raras exceções e, eram modificados em
função das provas e exames. Os programas da reforma Capanema alcançaram o
equilíbrio entre o saber do professor e o que deveria ser ensinado, pois eram “mínimos”.
Para o autor, tal iniciativa não surtiu efeito, “porque foi desvirtuada pela expedição
oficial de programas de desenvolvimento, uniformes para todo o país” (1957, p. 102).
132

Segunda parte do estudo - Hollanda analisou os manuais escolares produzidos


às vésperas das reformas de ensino e as características principais dos livros didáticos
publicados após as reformas Campos e Capanema. Inicialmente, os manuais nacionais
seguiam os programas do Colégio Pedro II. Três livros didáticos de História Universal
se destacaram antes da reforma Campos: o Epítome de História Universal, de Jonathas
Serrano, publicado em 1918, o manual História da Civilização de Oliveira Lima, de
1921 e, História Universal, de João Ribeiro, publicado em 1928.
Sobre os livros de História do Brasil, publicados antes da reforma de 1931,
Hollanda destacava os manuais de Ribeiro e Serrano. Hollanda considerava o livro de
Ribeiro, um compêndio que “incluía bom número de páginas, que versavam sobre
aspectos do nosso passado, desconhecidos pelos ‘pontos’ oficiais” (1957, p. 121).
Observava, ainda, que Ribeiro havia realizado uma nova interpretação da história
brasileira, com novas visões, por exemplo, da Inconfidência Mineira e da política do rio
da Prata. Já o manual História do Brasil, de Serrano, “deixava transparecer uma atitude
nacionalista mais acentuada do que a de João Ribeiro” (1957, p. 122). Hollanda
destacava, no manual de Serrano, uma lista com indicações bibliográficas e as
ilustrações, que completavam o texto. Serrano propunha metodologias que incluíam
mais trabalhos pessoais dos alunos com pesquisa bibliográfica, desenhos e trabalhos
manuais. Para Hollanda, a obra de Serrano era excelente didaticamente e tinha bela
apresentação material.
Segundo Hollanda, com a reforma Campos, em 1931, e a publicação dos
programas de História da Civilização, foram produzidos novos compêndios. Hollanda
afirmava que os primeiros autores eram “pioneiros”, professores do Colégio Pedro II, da
Escola Normal, do Colégio Militar, de Ginásios Estaduais. Ainda não eram os
licenciados das Faculdades de Filosofia. Contudo, de acordo com Hollanda, mesmo
depois da criação das Faculdades de Filosofia, poucos eram os compêndios de autoria
de licenciados.
Hollanda analisou os compêndios de História que tiveram maior difusão. Para a
análise dos manuais seguiu as recomendações da Caldeme e descreveu a estrutura e
organização interna dos compêndios – a organização dos capítulos, o lugar das
ilustrações, resumos, exercícios, vocabulário e possíveis bibliografias. Para Hollanda,
como diversos autores de compêndios tinham se inspirado na História da Civilização,
de Serrano, tal obra deveria ser examinada com mais detalhes.
133

Cada volume de História da Civilização, de Serrano, era precedido de uma


“Explicação Necessária”, que destacava observações sobre os programas oficiais,
conselhos pedagógicos e indicava as características didáticas de cada tomo. Cada
capítulo do volume da 1ª série continha: vista geral do assunto, sumários, biografias,
quadros cronológicos, leituras, vocabulário (p. 130). De acordo com Hollanda, Serrano
inaugurou em seu compêndio a tentativa de uniformizar “em bases científicas”, a grafia
dos nomes históricos. Em relação aos programas oficiais, Serrano somente “adotou para
títulos dos respectivos capítulos os do programa quando lhe pareciam adequados”
(1957, p. 132). Modificou títulos que considerava inconvenientes e acrescentou alguns
capítulos que não apareciam no programas. As ilustrações estavam reunidas no fim do
livro. Os exercícios eram de explicação, “insistindo nas questões de causas e efeitos, no
papel dos grandes vultos e na significação dos fatos mais importantes” (1957, p. 133).
Para análise dos demais livros publicados de acordo com os programas de 1931,
Hollanda não citou o nome dos autores, mas retratou-os com a letra “N”, seguindo de
número: N1, N2, N3, etc. De acordo com o autor, tal estratégia foi utilizada, pois sua
análise não se referia aos autores, mas somente aos compêndios.
Neste sentido, Hollanda destaca os compêndios de N4 e N5 que se inspiraram
nas idéias da “educação progressiva” (1957, p. 137), que incentivava a curiosidade, o
espírito critico e o senso histórico, na ênfase nos processos e não em nomes e datas -
idéias da Escola Nova. Em seguida o autor descrevia a estrutura dos capítulos do
manual de N4 e N5 e explicava resumidamente as características de cada ponto dos
capítulos: exposição sumária, leituras, exercícios, tópicos a estudar, testes, carta
histórica, biografia, bibliografia e documentação gráfica (1957, pp. 137-138). Para
Hollanda, o manual de N4 e N5 fazia propostas difíceis de serem realizadas, pois a
maioria das escolas secundárias era incapaz de “proporcionar aos discentes algo mais do
que aulas, por professores, quase sempre, mal preparados e pagos” (1957, p. 142). Para
Hollanda o livro de N4 e N5 apresentava aspectos tipográficos elogiáveis e era um
“intento original no Brasil” (1957, p. 144), que incluía capítulos interessantes sobre
Portugal, Espanha, Europa Oriental, Extremo Oriente, etc. Finalizando, Hollanda fazia
diversas críticas ao formato dos demais livros, aos corpos tipográficos, às biografias, e
apontava os erros históricos presentes nos manuais.
As mudanças nos programas de História, introduzidas pela Reforma Capanema,
em 1942, determinaram a publicação de compêndios adequados aos novos programas.
Os manuais de História passaram a ser divididos em História Geral e do Brasil. Os
134

autores adequaram os antigos compêndios de História da Civilização separando os


capítulos que tratavam da História Geral e os da História do Brasil. No entanto, uma das
novidades do período, eram os autores de compêndios formados pelas Faculdades de
Filosofia, que competiam com os seus predecessores.
Primeiramente, Hollanda analisou os compêndios de História Geral para o
ginásio. O manual mais vendido, de N1, seguia fielmente o programa oficial. “O texto
era precedido de breves sínteses e acompanhado de ‘sumários’, ‘questionários’,
assuntos ‘para exercícios escritos’, ‘leituras’” (1957, p. 149). Destacavam-se os mapas,
pela nitidez “e as numerosas estampas se beneficiavam, freqüentemente, de comentários
descritivos, o que é um requisito didático indispensável” (1957, p. 149).
Em seguida, analisou detalhadamente a História Geral, do professor Serrano,
por ele ter sido autor dos programas de História do curso ginasial. Os prefácios dos
manuais de Serrano continham indicações metodológicas que supriam as instruções
oficiais não publicadas. Segundo Hollanda a redação do texto baseava-se no nível de
cada série. Os manuais não possuíam mapas, sendo considerado por Hollanda, uma
falha pedagógica. Como em seus compêndios anteriores, o modelo didático da História
Geral, foi copiado por diversos autores.
Ao analisar as obras dos professores licenciados nas Faculdades de Filosofia,
Hollanda observava que nem sempre seus livros revelavam-se melhores em
informações históricas. Sobre os livros de História do Brasil para o ginásio, Hollanda
verificava que eram, de modo geral, melhores que os de História Geral.
Os livros de História Geral para o colegial eram iguais aos do ginásio com
alguns “pontos ampliados e com maior número de citações de obras históricas, no texto
ou nas notas ao pé da página” (1957, p. 157). Destacando um autor em especial, N4, por
ser professor do magistério universitário de História Moderna e Contemporânea,
Hollanda observava que o 2º volume de suas Súmulas apresentavam uma síntese “bem
informada de uma época histórica, que a maioria dos alunos secundários pouco
conhecem” (1957, p. 160). De acordo com Hollanda, poucos autores estabeleceram
relação entre os compêndios para o ginásio com os do colegial, como fizera N4.
No último capítulo da segunda parte da obra, Hollanda analisava os compêndios
que estavam em uso, elaborados a partir dos programas de 1951. Os autores dos livros
didáticos adaptaram os manuais de acordo com a Lei n° 1.353. Segundo Hollanda,
somente pequenas alterações foram feitas, como a mudança nos nomes dos capítulos.
Muitos compêndios seguiam os programas de desenvolvimento de 1951 e se
135

beneficiavam com as correções indicadas pela CNLD. Deste modo, os novos livros
didáticos corrigiram os erros mais gritantes, apontados pelos pareceres da comissão. Os
autores dos manuais eram os mesmos das edições anteriores.
Hollanda apresentava as características dos livros didáticos de História Geral, da
América e do Brasil, para o ginásio, destacando as ilustrações, a linguagem dos
manuais, a organização das unidades, dos capítulos e, principalmente, os erros
históricos presentes em cada compêndio. Nesta parte da pesquisa, Hollanda ressaltava
todos os aspectos didáticos, pedagógicos e materiais, positivos e negativos, que os
manuais apresentavam. Com tal diagnóstico, o autor pretendia colaborar para a melhoria
da qualidade dos manuais.
Em relação aos livros de História da América, Hollanda fez o seguinte balanço:
praticamente todos os livros tratavam somente dos assuntos que constavam no programa
oficial; os autores repetiam identicamente os itens dos programas; os episódios da
História do Brasil recebiam desenvolvimento excessivo; as civilizações pré-
colombianas e a América Espanhola eram as partes mais falhas e que apresentavam
maior quantidade de erros graves nos manuais; as poucas páginas dos manuais tornava-
os “magras resenhas” (1957, pp. 179-180). Alguns dos erros citados por Hollanda eram:

A “História da America” de N1 (...) continua repetindo erros antigos, como


atribui às missões “repartimientos” (sic) de índios, ou que os “criollos” “só
(sic) podiam fazer parte dos “cabildos” ou exercer funções municipais”.
Na “História das Américas” de N10 são mais numerosos e graves os erros
históricos, tais os “repartimientos” que estavam sob direção dos padres (sic),
quase sempre (sic) jesuítas chamavam-se reduções”. (...) Nem tampouco “o
Paraguai já se havia tornado uma República independente, desde junho (sic)
de 1811”, antes de que Manuel Belgrano fora “enviado a Assunção” (1957, p.
174).

Sobre os compêndios de História do Brasil, Hollanda observava que, de modo


geral, os livros de 1ª e 4ª séries não diferiam entre si sob o ponto de vista pedagógico.
Sobre as informações históricas, a “maioria dos compêndios apresentam sensíveis
falhas, particularmente, no tocante à parte etnográfica e aos temas econômico-sociais”
(1957, p. 181). Os manuais omitiam, em menor ou maior grau, assuntos que pouco
constavam nos programas oficiais. O Brasil contemporâneo costumava ser o assunto
menos estudado, ao fim dos manuais.
Em relação aos livros de História Geral e do Brasil para o colégio, Hollanda
destacava que grande parte dos autores ainda estava terminando os manuais. Poucos
136

haviam publicado os primeiros volumes. Diversos erros históricos foram destacados por
Hollanda, acrescentando-se, ainda, o fato de a maioria das bibliografias apresentadas
pelos manuais estarem desatualizadas:

[Livro de N16] (...) Com efeito, não vemos porque destacar definições
escolares dadas por Oliveira Lima e Jonathas Serrano, nem tampouco como
discípulo de Braudel omite as idéias de Lucien Febvre, Marc Bloch e do
próprio mestre sobre a História, limitando-se a expor o pensamento, por estes
combatido, de Ch. V. Langlois e Ch. Seignobos. Sobre os conceitos de cultura
e civilização desconhece a bibliografia contemporânea, citando dos autores do
século atual, apenas, Spengler e Ralph Turner (1957, p. 186).

Os manuais de História do Brasil para o curso colegial eram, em grande parte,


novas edições modificadas dos volumes destinados às séries ginasiais (1957, p. 192).
Para o autor, somente cinco livros estavam aptos, em relação aos aspectos históricos e
pedagógicos, a serem utilizados no ensino colegial, os livros de N6, N7, N9, N17 e
N18.
Para encerrar a segunda parte de sua obra, Hollanda concluiu que os compêndios
para o curso secundário, produzidos de 1931 a 1956, melhoraram a apresentação
material, em conseqüência da expansão do mercado editorial no Brasil. De todo modo,
as ilustrações ainda eram pouco nítidas e as encadernações deixavam a desejar. Os
manuais de História escritos por brasileiros mostravam-se ligeiramente superiores, “sob
ponto de vista de informação histórica, aos publicados antes do funcionamento dos
cursos universitários destinados à formação de professores da matéria para o ensino
secundário” (1957, p. 195). Os manuais seguiam estritamente os programas oficiais e
eram excessivamente resumidos, fazendo com que os alunos apenas memorizassem os
conteúdos para as provas e exames. A linguagem nos compêndios estava tornando-se
empobrecida, com o objetivo de facilitar a leitura pelos alunos e as ilustrações, de modo
geral, careciam de legendas explicativas.
Os compêndios em uso no ano de 1956, eram apenas reedições modificadas dos
livros escritos de acordo com os programas de 1942 que, por sua vez, eram adaptações
dos volumes destinados ao ensino da História da Civilização. Para Hollanda os livros
estavam piores, principalmente pela influência dos editores, que pressionavam os
autores para que reduzissem ao máximo as páginas dos livros, procurando baixar o
preço da venda. Com isso, os livros sofreram reduções de textos, com supressão de
partes importantes (1957, p. 198).
137

Terceira parte do estudo – Nessa parte, Hollanda se inseria nas discussões que
estavam na pauta dos debates realizados nos anos 1950. Sobre os estereótipos e valores
presentes nos compêndios de História, Hollanda dialogava com a Unesco e o estudo
publicado em 1951, que discutia as tensões internacionais e modo de evitar os
estereótipos entre os povos, para que se estabelecesse a compreensão internacional.
Essas questões apareciam no pós-guerra, com o recrudescimento da guerra fria. Uma de
suas metas da Unesco, como já foi descrito no início do capítulo, era a revisão dos
manuais escolares e de seus conteúdos, sobretudo os livros de História e Geografia,
procurando modificar a forma como as “outras” nações eram retratadas, para que se
evitassem novos conflitos internacionais. O documento da criação da Unesco, de 1945,
já apresentava os objetivos de cooperação internacional:

1. O propósito da Organização é contribuir para a paz e para a segurança,


promovendo colaboração entre as nações através da educação, da ciência e da
cultura, para fortalecer o respeito universal pela justiça, pelo estado de direito,
e pelos direitos humanos e liberdades fundamentais, que são afirmados para os
povos do mundo pela Carta das Nações Unidas, sem distinção de raça, sexo,
idioma ou religião (Unesco, 2002, p. 2).

Nos capítulos seguintes, Hollanda apresentava sugestões de leituras


complementares, como o uso de documentos e atlas histórico. Discutia a possibilidade
de utilização de meios audiovisuais no ensino da disciplina111 e propunha mudança nas
avaliações de História. Apresentava a discussão referente à proposta de o ensino da
História estar integrado aos Estudos Sociais, dialogando com discussões realizadas nos
EUA. Sobre tal discussão é importante reforçar, como já foi apresentado, que o Inep
estava em diálogo constante com diferentes instituições e órgãos de ensino dos EUA.
Carlos Delgado de Carvalho chegou a escrever material sobre os Estudos Sociais.
Hollanda descreveu, ainda, a legislação sobre o livro didático e o funcionamento
da CNLD. Para o autor, a Comissão deveria ser um órgão apenas consultivo, que
organizaria resenhas críticas dos compêndios publicados, recomendando os melhores.
Hollanda explicitava a crítica a CNLD, considerada um órgão ineficaz, incrustado no
Estado, que ao avaliar os livros didáticos, somente influenciava autores e editores a
seguirem fielmente os programas oficiais. Hollanda afirmava a necessidade de produção

111
Nos anos 1960, o CRPE-SP, por meio do Serviço de Recursos Audiovisuais, vai organizar cursos para
professores, com o objetivo de “divulgar filmes educativos e apresentar novas formas de utilização de
recursos audiovisuais aos professores, diretores e encarregados de treinamentos” (Ferreira, 2001, p. 48).
138

de novos manuais de boa qualidade, como propunha a Caldeme. A criação da


Campanha era uma tentativa de burlar a CNLD utilizando-se do próprio aparato do
Estado, para propor novas soluções para os manuais escolares.
Por último, Hollanda localizava o papel do aluno e do professor no ensino
secundário, que para o autor, eram “meros acessórios da única realidade existente para a
legislação oficial do ensino: as provas e os exames” (1957, p. 253). Retomando
discussão já apresentada, Hollanda fez sugestões visando a melhoria do ensino. Para o
autor, os programas oficiais deveriam ser realmente “mínimos”, para que o professor
tivesse autonomia de elaborar seus próprios programas de desenvolvimento e para que
tivesse autonomia pedagógica. A autonomia se efetivaria de fato, com o fim do regime
de provas e exames, e do sistema de inspeção federal “de caráter meramente
administrativo, ou melhor dito, burocrático” (1957, p. 255).

Algumas observações
Hollanda elaborou um estudo propondo-se a analisar o ensino de História na
escola média, a partir do momento em que seu conteúdo passou a ser centralizado em
âmbito federal, elucidando as diversas mudanças por que passou a disciplina. Em um
primeiro momento a História do Brasil e Geral deveriam estar unidas - na História da
Civilização -, pois se completariam. Em outro momento a História do Brasil possuiu
horário e programa de ensino específico, separada da História da América e Geral. Ao
longo das mudanças, os autores adaptaram os manuais escolares.
Holanda expôs, do mesmo modo que Fonseca, o debate travado nos anos 1950
entre educadores, dos cursos de Pedagogia, e os especialistas, dos cursos de História,
sobre o papel da História para a efetivação das finalidades gerais da educação. Para o
autor, o ensino de História na escola secundária tinha a função de colocar o alunos em
contado as vivências do passado da humanidade, buscando compreender o presente, a
realidade atual. O ensino de História deveria, ainda, expor as diferentes experiências das
civilizações do passado, procurando demonstrar a diversas formas possíveis de cultura.
O autor destacou as inovações metodológicas nos programas da reforma Campos
– no incentivo a prática da observação, do pensamento critico e do trabalho autônomo -,
e da reforma Capanema – com as unidades didáticas. Aprovou, ainda, os programas
mínimos expedidos pela reforma de 1951. Questionou, no entanto, os programas de
desenvolvimento de 1951, que segundo Hollanda, padronizavam e uniformizam o
ensino em todo o país. O autor criticou a centralização do ensino nos diversos âmbitos:
139

nos programas de ensino, nos exames e provas, e no sistema de inspeção federal. Para
melhorar o ensino, sugeriu o fim de toda essa “burocracia” do Estado.
Na análise dos livros didáticos, Hollanda tomou como referência os manuais de
Jonathas Serrano, dado a sua importância como historiador, famoso autor de manuais
escolares – que procurou uniformizar em bases científicas o ensino da História -,
referência para outros autores e elaborador dos programas de ensino. O autor observou,
nos demais compêndios, que muitos seguiam os programas oficiais, sem maiores
inovações. Verificou as propostas metodológicas, os assuntos que eram tratados nos
manuais, a forma de utilização das ilustrações e as referências bibliográficas.
Hollanda encontrou poucos autores que se basearam em “idéias da educação
progressiva”, com métodos que incentivavam a curiosidade e o espírito critico. Poucos
autores estabeleceram relações entre os manuais para o ginásio e o colégio.
Observa-se que Hollanda responsabilizava as editoras pela má qualidade dos
livros didáticos. Para abaixar o preço dos manuais, elas pressionavam os autores a
reduzirem o conteúdo dos livros112.
É importante ressaltar, ainda, o debate que Hollanda travou com dois órgãos
atuantes nos anos 1950 – a Unesco e a CNLD. O autor se solidarizou com as propostas
de modificação dos conteúdos de ensino de História sugeridas pela Unesco, que
procurava modificar a forma como as “outras” nações eram retratadas nos manuais
didáticos, para que se evitassem novos conflitos internacionais. Todavia, Hollanda
questionou a atuação e a própria existência da CNLD, posicionando-se contrário à
forma como a Comissão analisava e aprovava os livros didáticos naquele período. Para
o autor, a comissão deveria ser um órgão consultivo, que organizaria periodicamente,
“listas críticas dos compêndios publicados, no Brasil, para as escolas médias, com o fim
de orientar os professores na sua escolha” (Hollanda, 1957, p. 197)113.

112
No artigo Os programas e o ensino da História, de 1958, publicado na revista Escola Secundária,
Hollanda ressaltou a pressão da editoras para que existisse um programa único nacional, de modo a
facilitar a publicação de compêndios iguais para todo o país. São Paulo dominava o mercado editorial do
país, seguido pelo Rio de Janeiro. Para o autor, a uniformização dos compêndios deixava de lado os
aspectos regionais.
113
Guy de Hollanda participou ativamente dos debates sobre o ensino de História nos anos 1950 e propôs
mudanças nos programas oficiais. No artigo já citado, Os programas e o ensino da História, de 1958,
Hollanda elaborou sugestão de programa de ensino para a 1a série do ginásio. O programa estaria
estruturado da seguinte forma: estudar-se-ia os aspectos da civilização brasileira, do período colonial aos
dias atuais, que pudessem despertar o interesse dos alunos; o estudo da História política seria reduzido ao
mínimo necessário; os acontecimentos da história brasileira seriam, sempre que possível, relacionados aos
acontecimentos da Europa, América e outras partes do mundo; em cada comunidade a história local seria
integrada à história regional e do Brasil; a história contemporânea seria tratada menos em aspectos de
governos presidenciais (políticos) e mais em relação ao desenvolvimento industrial e suas transformações
140

O significado da Caldeme nas discussões sobre o ensino nos anos 1950

A Caldeme e as análises dos programas e livros didáticos do ensino secundário


inserem-se em um contexto de redemocratização com o fim do Estado Novo e de
questionamento sobre a centralização da educação. Em diferentes meios discutia-se a
necessidade de uma nova legislação educacional. A existência da CNLD representava a
permanência dessa centralização, característica do período autoritário.
Nos anos 1950, os debates sobre a democratização e reorganização do ensino
secundário intensificaram-se. Diante do crescimento urbano e do desenvolvimento
industrial brasileiro, a escola secundária passou a ser mais procurada pelas camadas
médias e populares, que buscavam melhoria da qualidade de vida. Para o novo público
escolar, essa escola - considerada das elites - deveria proporcionar uma formação
diferente da existente, livresca, humanística e propedêutica. Nos meios educacionais
discutia-se a proposta de uma educação comum aos jovens, que preparasse para o
trabalho e para a realidade. Consolidava-se, nessa época, o currículo científico e, nas
interlocuções com o pensamento estadunidense – principalmente de Dewey -, fortalecia-
se a proposta de modelos pedagógicos baseados no planejamento, racionalidade e na
cultura científica.
Nesse contexto a Caldeme é criada por Anísio Teixeira, com o objetivo de
avaliar os programas e os compêndios do ensino secundário e elaborar guias didáticos
com metodologias “inovadoras” para orientar os professores secundários, considerados
mal preparados, por não possuírem, entre outros motivos, formação adequada nas
Faculdades de Filosofia. Evidenciava-se, assim, a importância atribuída aos livros
didáticos, como divulgadores de conteúdos e metodologias, considerados ferramentas
fundamentais para auxilio do professor, principalmente para sua formação.
Apesar do vínculo da Caldeme com o Estado por meio do Inep e do CBPE, seus
estudos criticavam as políticas do próprio Estado, ao questionar os programas oficiais,
os exames e provas, a fiscalização federal e a avaliação dos livros didáticos pela CNLD.
Essa constatação permite compreender a afirmação de Mendonça, da relação dos
“reformadores da educação” (referindo-se aos intelectuais vinculados à Anísio
Teixeira) com o Estado:

na vida de todos no país (econômicos). Quanto aos recursos utilizados, Hollanda destacava os meio
audiovisuais, as visitas a arquivos e museus locais, a arte, a literatura, a colaboração da Geografia.
Afirmava que esses recursos colaborariam com os métodos ativos (1958, p. 86).
141

Estes educadores cobram do Estado um papel de protagonista na


reorganização do sistema de ensino, mas, ao mesmo tempo, de guardião da
autonomia das instituições educativas, e, mesmo no interior do aparelho do
Estado, mantêm um distanciamento crítico das políticas oficiais que lhes
permite, inclusive, discordar publicamente de algumas delas (1997, p. 43).

Os documentos da Caldeme e, principalmente, os livros de Fonseca e Hollanda


revelaram informações que permitiram pensar algumas considerações sobre a educação
e a escola nos anos 1950. Os discursos sobre a educação produzidos pelos sujeitos
envolvidos com o Inep e a Caldeme constituíram práticas concretas, que visavam
interferir no funcionamento da escola. Deste modo, percebeu-se que analisar e avaliar
os livros didáticos influiria objetivamente na produção, circulação e uso dos manuais,
pois era uma forma de controlar o objeto que seria utilizado nas escolas brasileiras.
Especialistas do ensino superior foram convidados a elaborar análises dos
manuais utilizados nas escolas secundárias e escrever novos manuais de ensino. A
intenção era contribuir para a elaboração de guias com novas propostas pedagógicas e
conteúdos diferenciados. A Caldeme expressava o pensamento de Anísio Teixeira, que
acreditava que o problema da educação deveria ser pensado e resolvido por intelectuais
vinculados às universidades, com estatuto científico. Estabelecia-se, portanto, nos anos
1950, uma percepção de que esses especialistas – professores e, ao mesmo tempo,
pesquisadores -, por analisar cientificamente a educação e a escola, tinham autoridade
para produzir as críticas e os novos livros didáticos para o ensino secundário.
Ajustando-se ao objetivo da Caldeme, como especialistas universitários –
Hollanda, da Universidade do Brasil e Fonseca, da Universidade Católica do Rio de
Janeiro e, também, da Universidade do Brasil – as análises desses professores
apresentaram um balanço da situação do ensino e dos livros didáticos de Geografia e
História para a escola secundária. Emitiram opiniões, criticas, fizeram correções e
sugestões pedagógicas. Como a Campanha pretendia, a partir do diagnóstico das
situações escolares, elaborar propostas para a melhoria do ensino nacional, Hollanda e
Fonseca cumpriram sua função. Os professores questionaram a eficácia dos programas
federais, criticaram os métodos e conteúdos de ensino e explicitaram as propostas que já
vinham sendo debatidas sobre a reformulação da escola secundária para o novo público
escolar. As obras avaliaram detalhadamente os livros didáticos: as ilustrações, sumários,
conteúdos, bibliografias e exercícios. Fizeram sugestões para a elaboração de novos
142

manuais, com metodologias diferentes das que eram utilizadas pelos autores dos
manuais.
A análise das pesquisas de Fonseca e Hollanda permitiu verificar que os autores
participavam dos debates de seu tempo. Os dois professores eram vinculados à
Faculdade Nacional de Filosofia, instituição que tinha preocupação central com a
formação de professores##&. Ambos publicaram, além disso, artigos na revista Escola
Secundária. Procuravam, portanto, difundir suas pesquisas aos professores das escolas
públicas e particulares.
Os estudos elaborados por esses professores e publicados em forma de livros,
produzidos pela Caldeme e distribuídos gratuitamente pelo CBPE para as bibliotecas
dos cursos de formação de professores, foram produzidos para serem guias, para
divulgar idéias, com a função de orientar futuros professores, autores e editores na
escolha e elaboração dos manuais escolares, baseados em nova concepção da educação.
Ao optar por analisar os compêndios a partir de 1930, os autores estavam
analisando os mesmos livros didáticos que haviam sido aprovados pela CNLD,
desacreditando, desse modo, a Comissão e questionando sua avaliação. A análise
mostrou que os livros didáticos que seguiam os programas oficiais não sofreram
significativas alterações com a aprovação da CNLD, apenas incluíam ou retiravam
conteúdos, de acordo com as mudanças nos programas. A função da CNLD era apenas a
de assegurar que os livros didáticos seguissem os programas oficiais. Para Hollanda e
Fonseca, o trabalho da CNLD engessava a criatividade dos autores e editores de
manuais escolares, pois, ao seguir a risca os programas oficiais, ficavam amarrados à
elaboração de um tipo padronizado de livro didático. Tal análise reforçava a crítica de
Anísio Teixeira à Comissão, cuja atuação era considerada prejudicial para a
possibilidade de inovação da produção didática e da educação de modo geral.
Fonseca e Hollanda estabeleceram em suas análises questionamentos de um tipo
de livro didático, que refletia um modelo pedagógico considerado tradicional, livresco e
baseado na memorização. As suas sugestões para elaboração de manuais evidenciavam
uma nova proposta pedagógica. Suas considerações expunham as mudanças que
ocorriam no período, com o declínio do ensino baseado nas humanidades clássicas e a
ascensão das ciências, dos métodos científicos. O ensino deixaria de ser expositivo

114
Pereira (2010), que analisou os debates do curso de História da Faculdade Nacional de Filosofia
(FNFi) nos fim dos anos 1950, ressalta que a FNFi caracterizava-se mais como uma faculdade com
preocupação de ensino, para formação de professores de qualidade para o ensino Médio, do que uma
instituição voltada para a pesquisa (p. 52).
143

baseado na audição, para tornar-se ativo, incentivando a capacidade de reflexão dos


alunos. Pelos novos métodos, o ensino deveria partir da realidade cotidiana dos jovens,
para assuntos mais abstratos. Eram os círculos concêntricos.
As análises de Hollanda e Fonseca e os seus artigos publicados na revista Escola
Secundária revelam o fortalecimento de um movimento pela Didática, vinculado aos
cursos de Pedagogia. Esse movimento defendia a mudança de foco no ensino. O centro
do estudo deixava de estar no conteúdo e no modo de ensinar do professor e passava a
ter o aluno, seu interesse e as metodologias de aprendizagem como objetivos centrais da
escola. Era a pedagogia moderna e os métodos ativos. Para estruturar essa mudança de
perspectiva, entrava em cena a Psicologia, seus diversos estudos e a sua apropriação
pela Pedagogia. As duas áreas entravam, com a sociologia, para colaborar na
reformulação do ensino, como observa Braghini na análise dos artigos da RBEP:

[a Sociologia, Psicologia e Pedagogia] (...) se fizeram presentes de várias


formas nos artigos: seja endossando idéias, dando força científica a um
pensamento qualquer, seja organizando, racionalmente, as necessidades físico-
estruturais ou intelectual-filosóficas da escola moderna; ou, ainda,
demonstrando os benefícios da metodologia de tais ciências para o
assessoramento funcional da educação num plano geral (2005, pp. 66-67).

Rozante (2008) enfatiza, na análise da Revista de Pedagogia da USP que, nos


anos 1950, o curso de formação de professores da USP buscava uma renovação
pedagógica com a mudança dos métodos de ensino. Os professores da Cadeira de
Didática Geral e Especial da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP
encabeçavam a proposta de mudança ao procurar “dar visibilidade à didática de ensino
como prática docente no ensino secundário” (Rozante, 2008, p. 57). Por tal motivo, os
métodos, as experiências e a psicologia se tornaram importante para a “conceituação de
escola moderna” (Rozante, 2008, p. 57). Desse modo, a Didática e a Pedagogia se
relacionavam, pois a psicologia seria utilizada no “momento de aplicação dos métodos
de ensino” e esses métodos, “só seriam adquiridos por meio da Didática e do
treinamento” (Rozante, 2008, p. 72). O currículo dos cursos de formação de professores
secundários deveriam incluir, além da Didática e da Psicologia, a Prática de Ensino, a
Administração Escolar, a Filosofia da Educação e a Sociologia Educacional (Rozante,
2008, p. 82).
144

A mudança do método pedagógico, que buscaria o interesse do alunos como


eixo do ensino, transformaria a própria instituição escolar. Como observa Rozante, em
análise de texto de Claparède:

As questões pedagógicas estariam sujeitas à experimentação e a educação


seria um ato da criança, ou seja, diferentemente da escola tradicional, a escola
moderna é uma escola para a criança, com um programa adequado à sua idade
e o conhecimento apresentado dentro do contexto vivido pela criança (2008, p
64).

Essa mudança de perspectiva, do ensino do professor para a aprendizagem dos


estudantes, apontava a transformação significativa por que passava a escola secundária,
seus objetivos e métodos. Uma escola que deixava de ser pensada para formar as elites e
que deveria formar a grande massa de jovens das camadas populares. Esses jovens
precisavam ser atuantes, reflexivos, precisavam aprender a pensar, para entrar de modo
ativo num país em crescente mudança, com a acelerada industrialização e crescimento
urbano. A escola colaboraria para inculcar novas concepções culturais. Como destaca
Rozante (2008): “o processo de aprendizagem começava com a atividade do aluno no
ato de aprender e resultava na interiorização plena e definitiva dos valores culturais na
mente e na personalidade do aluno, internalizando algo que lhe era externo” (p. 62).
A análise da Caldeme e das obras de Fonseca e Hollanda, possibilitou
compreender as relações estabelecidas entre educadores e intelectuais de diferentes
instituições - da USP, da Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade Católica do
Rio de Janeiro, da Universidade do Rio Grande do Sul, do Colégio Pedro II, etc. - e
órgãos nacionais e internacionais, como o Inep, o CBPE e a Unesco, em torno da
organização de uma nova educação escolar, moderna, baseada na cientificidade e na
racionalidade, pontos chave para toda a década de 1950.
O pensamento desses intelectuais apresentava diferenças, como foi constatado
por Munakata, no difícil processo de elaboração dos guias de ensino. Contudo, pareciam
estar sintonizados no que diz respeito às propostas de renovação do ensino secundário,
como se verificou nas críticas dos livros didáticos e na produção dos manuais que
chegaram a ser publicados. Essas relações evidenciaram uma ambiência de debates
intelectuais que permitiu a intensa circulação de idéias na época. As reflexões e
questões debatidas por esses agentes nos anos 1950 permaneceram no período seguinte,
que compreendeu os anos da Ditadura Militar, como veremos no próximo capítulo.
145

CAPÍTULO III

A COMISSÃO DO LIVRO TÉCNICO E DO LIVRO DIDÁTICO E A


EXPANSÃO DO ENSINO

O “problema do livro didático”, como foi apresentado no capítulo anterior, fez


parte dos debates parlamentares durante os anos 1940 e 1950. Na primeira metade dos
anos 1960, outros projetos sobre os livros didáticos foram debatidos pela Câmara dos
deputados, pelo Senado, pelo Conselho Federal de Educação (CFE) e pelo MEC.
Todavia, nenhum projeto obteve aprovação. A necessidade de se regular os manuais
escolares, sua produção, circulação e utilização, fazia parte cada vez mais dos debates
da época, em um momento de acelerado crescimento da educação escolar, que
impulsionava a ampliação do mercado didático, tanto no aumento da produção, como
no surgimento de novas editoras.
O tema sobre o livro didático e seu controle estava inserido em um ambiente de
debates sobre a educação nacional. Dentre as discussões que se intensificaram no fim
dos anos 1950 destacavam-se a necessidade de organizar a expansão do ensino
secundário, as críticas aos exames de admissão, a necessidade de reformulação dos
currículos e programas de ensino, o problema da formação dos professores, a pressão
por acesso ao ensino superior e por reforma desse nível de ensino e, após treze anos, a
aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que tramitava no
Congresso Nacional desde 1948.
No início dos anos 1960, com a crescente ampliação da rede escolar, o número
de crianças nas escolas aumentou. Tal fato levou à contratação em caráter de
emergência de novos professores, recrutados de modo menos seletivo. Segundo Souza,
dos anos 1930 a 1960, a institucionalização da escola secundária expôs o “problema da
formação dos professores” (2008, p. 211)115. Ao analisar a expansão do ensino ginasial
em São Paulo, Souza (2008) destaca que o número de escolas aumentou
significativamente nos anos 1960, contudo, “as políticas de abertura do ensino ginasial
às camadas populares privilegiaram o acesso sem a garantia de medidas asseguradoras

115
Entre 1950 e 1960 o número de faculdades de Filosofia particulares cresceu significativamente.
Segundo Toledo (2001, p. 38), além dos licenciados nas faculdades particulares houve um aumento de
professores formados em outros cursos superiores.
146

da qualidade do ensino” (p. 265). Os professores das escolas deixaram de ser


concursados (passaram a ser contratados) e muitos não haviam concluído a licenciatura.
Nessa época, fim dos anos 1950 e início dos anos 1960, um intenso embate foi
travado em torno do projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que
envolveu diversos setores da sociedade. Nesse período as posições se polarizaram entre
os que defendiam a escola pública e os defensores do “livre ensino contra o monopólio
do Estado”, donos de escolas particulares e católicas. Segundo Carvalho (2003), a
oposição entre os defensores das escolas particulares e defensores da escola pública
permeou todo o processo de tramitação da lei e marcou questões como: “a centralização
e descentralização dos sistemas de ensino, o papel do Estado em relação à educação, a
destinação de verbas públicas à educação, a composição dos Conselhos de educação, o
ensino religioso, etc.” (p. 40).
Em meio a discussão do projeto da LDB, dois acontecimentos destacaram-se:
em 1959, Fernando de Azevedo116 e outros intelectuais publicaram o Manifesto Mais
uma vez convocados117, em que se posicionavam em defesa da escola pública e
contrários aos substitutivos de Carlos Lacerda118 ao projeto da LDB; entre 1960 e 1961,
iniciou-se em São Paulo, a Campanha em Defesa da Escola Pública119, por iniciativa de
intelectuais, de educadores, do movimento estudantil, de sindicatos operários e do jornal
O Estado de S. Paulo. A Campanha em defesa da escola pública também se posicionava
contrária ao projeto da LDB com os substitutivos de Lacerda.
Após intensa discussão, a LDB n. 4.024 foi aprovada em 20 de dezembro de
1961, pelo novo presidente João Goulart120. Segundo Souza (2008), a LDB/61 atendeu
às reivindicações pela “descentralização e flexibilidade na educação, conferindo aos

116
Dentre as pessoas que assinaram o Manifesto Mais uma vez convocados, é importante enfatizar
intelectuais que participavam da política educacional brasileira desde a década de 1920. Desses
intelectuais, alguns tinham participado da CNLD nos anos 1940, e outros participaram dos projetos da
Caldeme e da Cileme. Eram eles: Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Carneiro Leão, Abgar Renault,
Delgado de Carvalho, Mário de Brito, Adalberto Menezes de Oliveira, Jayme Abreu, José Leite Lopes,
Afrânio Coutinho, Carlos Corrêa Mascaro, Oswaldo Frota Pessoa, Celso Kelly e Guy de Hollanda.
117
O Manifesto Mais uma vez convocados, foi publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo, Boletim do
CRPE/SP, pela RBEP, pelo jornal do Comércio e pelo Diário de Notícias.
118
O Substitutivo de Carlos Lacerda ao projeto da LDB situava a educação como um direito da família e
considerava a escola uma prorrogação dela. Defendia a iniciativa privada contra o monopólio do Estado.
O Estado não poderia ter o monopólio do ensino, mas teria a responsabilidade de oferecer recursos
financeiros e técnicos para manutenção das escolas (Filgueiras, 2006, p. 31).
119
Entre os participantes da Campanha em Defesa da Escola Pública destacavam-se Fernando de
Azevedo, Florestan Fernandes, Antônio Almeida Júnior, Anísio Teixeira, Carlos Corrêa Mascaro,
Carneiro Leão, Abgar Renault e Jayme Abreu.
120
Em 1961, João Goulart tornou-se presidente da República, após a renúncia de Jânio Quadros, em
regime parlamentarista. Seu governo iniciou, de fato, em 1963, com o retorno do regime presidencialista
e permaneceu até março de 1964, quando ocorreu o golpe militar.
147

Estados competência para a organização de seus sistemas de ensino” (p. 231). Contudo,
também diminuiu o controle das escolas privadas, “facultando a subvenção da União às
escola particulares para compra, construção ou reforma de prédios, compra de
equipamentos e concessão de bolsas de estudos” (Souza, 2008, p. 231).
Dentre as resoluções da LDB/61 estavam: a criação do Conselho Federal de
Educação (CFE); o ensino primário teria por finalidade “o desenvolvimento do
raciocínio e das atividades de expressão da criança, e a sua integração no meio físico e
social”, deveria ser obrigatório a partir dos sete anos, ministrado em língua nacional e
poderia se estender até seis anos; o ensino médio destinava-se à formação do
adolescente, deveria ser ministrado em dois ciclos, o ginasial (com quatro anos) e o
colegial (com ao menos três anos), abrangendo os cursos secundários, técnicos
(industrial, agrícola e comercial) e de formação de professores. A terceira série do ciclo
colegial seria organizada visando o preparo para os cursos superiores. A LDB/61
efetivou a equivalência entre os cursos técnicos e o curso secundário, ao permitir a
qualquer aluno que terminasse um dos cursos do ensino médio prestar concurso de
habilitação para o ensino superior. A LDB/61 conservou, ainda, o exame de admissão à
1a série do 1o ciclo dos cursos de ensino médio.
Os primeiros anos da década de 1960 caracterizaram-se como um período de
intensa ebulição política, cultural e social. Segundo Toledo, o período de 1961 a 1964
foi interpretado pelos setores da esquerda como “um momento em que a luta de classes
no Brasil alcançou um de seus momentos mais intensos, dinâmicos e significativos”
(2004, p. 14). As principais ações do governo Goulart foram o Plano Trienal de
desenvolvimento econômico-social e, posteriormente, as reformas de base121. Para os
setores da esquerda nacionalista, as reformas eram “condição indispensável à ampliação
e fortalecimento da democracia política no país” (Toledo, 2004. p. 17)122.
Com o Golpe de 1964, o contexto político e social brasileiro se alterou e pôs fim
aos debates realizados pelos diversos setores da sociedade e no Congresso Nacional. A
democracia foi interrompida e as reformas sociais e políticas que estavam em curso
foram alteradas. As organizações políticas de oposição aos militares foram perseguidas
e o sistema partidário modificado. As imunidades parlamentares foram suspensas, as
121
As principais reformas foram: reforma agrária, da educação, da saúde, fiscal e administrativa.
122
Durante a primeira metade dos anos 1960, o debate político, ideológico e cultural acontecia nos mais
diversos espaços: nos órgãos do governo, nos sindicatos dos trabalhadores, nos partidos políticos, no
movimento estudantil - com a UNE e as UEE -, na luta dos trabalhadores do campo - com as Ligas
Camponesas e a Reforma Agrária -, na imprensa, no Movimento de Educação de Base, etc.
148

eleições tornaram-se indiretas, os partidos foram extintos e em seu lugar estabeleceram-


se dois partidos oficiais, o MDB e a Arena. Os movimentos sociais foram duramente
reprimidos, dentre eles a organização dos trabalhadores no campo e na cidade e o
movimento estudantil. O Serviço Nacional de Informações foi criado, a lei de
Segurança Nacional se intensificou. A liberdade de expressão foi suprimida, com o
decreto da Lei de Imprensa e a instalação de organismos de censura. Nesse contexto, a
burocracia estatal se expandiu. De acordo com Martins (2002, p. 60), ao mesmo tempo
em que o Estado aumentou a centralização autoritária, ampliou sua complexa máquina
burocrática e administrativa. Inúmeros órgãos colegiados foram criados, fragmentando
o aparelho burocrático do Estado.

Os projetos para o livro didático

Nos anos 1950, como já se observou, inúmeras propostas para o livro didático –
sua produção, fiscalização e uso – foram encaminhadas pelo Congresso Nacional e
debatidas pelo Inep, por meio da Caldeme. Em 1956, visando incentivar e melhorar a
qualidade do material didático foi promulgado o Decreto n° 38.556 instituindo no
Departamento Nacional de Educação (DNE), a Campanha Nacional de Material de
Ensino (CNME). A Campanha desenvolveria medidas referentes à produção e
distribuição de material didático com a finalidade de “contribuir para a melhoria de sua
qualidade, do seu emprego, bem como para a sua progressiva padronização” (Decreto
n° 38.556/56). A Campanha produziria coleções, aparelhos para estudo de Ciências
Naturais, Matemática, Desenho, Geografia, História, material de ensino áudio-visual,
dicionários, atlas e outras obras de consulta.
A indústria gráfica brasileira recebeu inúmeros incentivos durante a presidência
de Juscelino Kubitschek. O custo do papel e da impressão foram reduzidos, por meio da
liberação de licenças de importação para o setor gráfico. Novos equipamentos
renovaram e modernizaram o parque gráfico nacional. O governo isentou o setor
livreiro e a indústria de papel de grande parte dos impostos e reduziu as tarifas postais
para os livros. Segundo Hallewell (1985, p. 443), a indústria gráfica brasileira cresceu
143% entre os anos 1950 e 1960.
Em 1959 foi criado o Grupo de Estudos da Indústria do Livro (GEILPE), que
deveria estudar os problemas da indústria editorial, do comércio do livro e sugerir
medidas para o aumento da produção de livros nacionais e buscar elevar a qualidade
149

gráfica dos livros editados. O GEILPE era composto pelo Ministro da Educação e por
representantes da Associação Brasileira do Livro (ABL), da União Brasileira de
Escritores, do INL, do SNEL, da CBL, do Departamento Nacional de Educação, do
Sindicato Nacional das Indústrias Gráficas, do Ministério da Fazenda e do Ministério da
Viação.
Ainda em 1959, o Brasil participou da XXII Conferência Internacional de
Instrução Pública, em Genebra, organizada pela Unesco. No relatório final, as
Recomendações n. 48, tratavam da elaboração, escolha e utilização de manuais nas
escolas primárias e estavam divididas em seis itens, que mereceram destaque:
1. Elaboração dos manuais - recomendava que as autoridades públicas dessem
maior atenção à elaboração das obras didáticas do ensino primário, pelo seu valor na
instrução desse nível de ensino; os Estados deveriam se certificar de que as obras
produzidas pela iniciativa privada e utilizadas nas classes fossem de “valor científico,
pedagógico e estético incontestável”; deveriam ser organizados concursos entre autores
ou grupos de autores procurando contribuir para aperfeiçoar a qualidade dos manuais
escolares.
2. Edição dos manuais – recomendava a organização de concursos entre os
editores para aperfeiçoar a qualidade dos livros e reduzir o preço de fabricação;
observar na produção dos manuais os progressos em relação a tipografia, ilustrações e
encadernação; tomar medidas urgentes para aumentar a produção de livros didáticos;
racionalizar a produção para reduzir o preço da fabricação e venda sem diminuir a sua
qualidade; observar a apresentação do livro, que deveria ser legível, sobretudo nos
livros de leitura destinados aos principiantes; aumentar e melhorar as ilustrações, pois
estas ajudam na compreensão da matéria; a apresentação artística dos manuais deveria
inspirar-se “nos progressos realizados nos domínios do livro recreativo e do livro
instrutivo”.
3. Escolha dos manuais – recomendava a organização de lista dos manuais
selecionados para escolha das escolas; as comissões que organizassem as listas
deveriam agir com objetividade, observando o valor pedagógico e científico das obras,
sua apresentação e o valor de venda, as comissões deveriam possuir representantes do
magistério primário.
4. Distribuição e aquisição dos manuais – priorizar a distribuição gratuita dos
manuais escolares para todos os alunos da escola primária; na falta de recursos
financeiros do Estado, procurar distribuir gratuitamente manuais para pelo menos as
150

crianças que encontrassem dificuldade de obtê-los; regular o preço de venda do manual


para que não constituísse despesa excessiva quando fossem adquiridos pelos pais;
5. Questões de ordem didática – os manuais deveriam refletir o progresso
realizado pelas ciências da educação, com o emprego de métodos adaptados à
psicologia da criança; observar-se-ia a apresentação lógica da matéria em relação aos
interesses e capacidades mentais dos alunos; os manuais deveriam oferecer conjuntos de
fatos, idéias e sugestões (textos, documentos, ilustrações, mapas, gráficos, perguntas,
etc.), empregar métodos que favorecessem a troca de idéias entre o mestre e seus
alunos, e incentivassem a prática do trabalho pessoal; os dados dos manuais deveriam
corresponder a realidade dos fatos; deveriam conter somente as noções dos programas
aplicados às classes a que eram destinados; cada lição ou capítulo deveria apresentar
perguntas e assuntos ativos ou trabalhos práticos que garantissem a “consolidação dos
conhecimentos adquiridos” e contribuíssem para a “formação do espírito infantil e para
o desenvolvimento de suas aptidões”; o manual não deveria servir somente para a
memorização de noções, mas deveria favorecer a aquisição pessoal do saber e abrir ao
“espírito horizontes mais amplos”; precisariam ter cuidado com o vocabulário e o estilo;
colocariam à disposição dos alunos obras de consulta e de referência; deveriam ser
generalizados os livros dos mestres.
6. Os manuais e a colaboração internacional – os manuais deveriam contribuir
para a compreensão internacional, visando desenvolver a fraternidade universal e
cooperação entre os povos.
As recomendações da XXII Conferência Internacional de Instrução Pública,
tornar-se-iam fundamentais para as políticas do livro didático durante a Ditadura
Militar.
No estado de São Paulo, em setembro de 1960, o Grupo de Trabalho sobre o
Livro Didático (GTLD), composto por Aroldo Azevedo, Francisco Marins, Heitor
Ferreira Lima, Nelson Marcondes do Amaral e Ofélia Fonseca, encaminhava ao
Secretário de Educação do estado, Vasconcellos de Carvalho, um extenso relatório
sobre o livro didático, sua missão, produção, custo, qualidade, fiscalização, a função da
CNLD e atuação do professor. Nas recomendações finais, o Grupo de Trabalho indicava
a criação da Fundação para o Livro Escolar -, que seria a responsável pela política do
livro didático naquele estado.
Buscando diminuir os custos de produção dos livros didáticos, foi promulgado o
Decreto n. 50.489, de 25 de abril de 1961, em que o Banco do Brasil passaria a financiar
151

a produção de livros didáticos, “visando estimular seu aperfeiçoamento e reduzir seu


preço de venda”. Para serem financiadas, as obras precisavam ter preço de venda
estabelecido em acordo com o Banco do Brasil, receber parecer favorável sobre a obra
emitido por uma comissão de três professores indicados pelo MEC, tiragem mínima que
garantisse a redução do custo e, publicação em um só volume de toda a matéria do
programa oficial da disciplina. Após adotado o livro didático na escola, ele deveria ser
utilizado nos dois anos seguintes.
Em 1963, um parecer do Conselho Federal de Educação (CFE), n° 145/63, cujo
relator foi Almeida Jr., respondia à consulta de Lúcia Magalhães – então presidenta da
CNLD -, sobre a situação e atribuições da Comissão em face da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB) n° 4.024/61. Para Almeida Jr., o Decreto-lei n° 8.460/45 e a
existência de um órgão censor de âmbito nacional eram incompatíveis com a
Constituição Federal de 1946 e com a LDB/61 – pois ambos restabeleciam e ampliavam
a autonomia das unidades federadas. O relator questionava a legislação centralizadora
do livro didático, justificando a necessidade de uma política descentralizada que
possibilitasse a autonomia dos estados na definição de suas políticas para a educação.
Argumentava que cada estado deveria ter poder para aprovar ou recusar os manuais
oferecidos às suas escolas e concluía afirmando que caberia aos estados e não ao poder
Federal, legislar sobre os livros didáticos.
No mesmo ano, a Portaria n. 373 do MEC determinou que os livros didáticos
para o Ensino Médio, editados a partir de 1964, deveriam desenvolver os programas das
disciplinas para todo o primeiro ou segundo ciclo do curso a que se destinaria, baseados
nos critérios de amplitude e desenvolvimento definidos pelo CFE ou pelos Conselhos
Estaduais de Educação. A Portaria determinava, ainda, os critérios de escolha dos
manuais nas escolas do sistema federal: os livros escolares deveriam ser escolhidos em
comum acordo entre as “famílias e os educadores por ocasião das reuniões dos Círculos
de Pais ou das Associações de Pais e Mestres, promovidas pelas direções dos
estabelecimentos de ensino no início de cada ano letivo” (Portaria n. 373, de
17/10/1963).
Às vésperas do Golpe Militar, em março de 1964, foi promulgado o Decreto n°
53.583, de 21 de fevereiro, determinando que o Ministério da Educação passaria a editar
livros didáticos de todos os níveis e graus de ensino, para distribuição gratuita e venda a
preço de custo em todo o país. Os livros editados seriam obrigatoriamente incluídos
pelos estabelecimentos de ensino, públicos e particulares, entre os que fossem
152

selecionados para as diferentes disciplinas e séries. O decreto refletia os debates


políticos do período e teve grande repercussão. A CBL, o SNEL e o Sindicato dos
Professores de Ensino Secundário de São Paulo assinaram uma carta em 05 de março de
1964, manifestando-se contrários ao decreto.
De acordo com a carta, o governo federal, por meio do Decreto n° 53.583,
estaria indiretamente impondo o livro único oficial às escolas. Com o livro único, se
instituiria no país “a promessa mais ou menos velada da instituição no Brasil da
orientação ideológica da nossa juventude, prática abominável que todos nós temos
obrigação de repudiar com veemência”. Para justificar tal denúncia, a carta afirmava
que o governo já teria impresso os primeiros volumes do livro História Nova do Brasil,
de Nelson Werneck Sodré123, que distorcia a história e oficializava uma “interpretação
marxista da história do Brasil”. Conclamava o povo, os pais e os alunos a reagirem
como “democratas e cristãos”, contra o Decreto n° 53.583. Finalizava advertindo que
estaria começando um “processo de dirigismo estatal do ensino no país por processos
dissimulados que procuram encobrir suas verdadeiras intenções” (CBL, SNEL e
Sindicato dos Professores de Ensino Secundário e Primário de São Paulo, 5/3/1964).
Esse episódio explicita a tensão nos meses que antecederam o Golpe Militar, nas
polarizações entre os movimentos da esquerda brasileira, em apoio a Goulart, e os
movimentos conservadores, contrários às ações do governo, que denunciavam o perigo
comunista ligado ao presidente124. De todo modo, o Decreto n° 53.583 não permaneceu
por muito tempo, sendo revogado logo após o Golpe, em 14 de abril de 1964, por meio
do Decreto n° 53.887.
Em 1965, já durante a Ditadura Militar, o governo de São Paulo instituiu nova
legislação sobre o livro didático, baseada nas conclusões e recomendações do GTLD.
Desse modo, criou pelo Decreto n° 44.703 a Fundação para o Livro Escolar. A

123
Segundo Assunção (2009), a Coleção História Nova do Brasil, de Nelson Werneck Sodré, era um
convênio entre o MEC e os intelectuais do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). Os autores e
pesquisadores da Coleção eram alunos da Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi) e membros do PCB
(pp. 39-40). Os autores dos livros eram: Pedro Alcântara Figueira, Joel Rufino dos Santos, Maurício
Martins, Pedro Celso de Uchoa e Rubem César Fernandes (Hallewell, 1985, p. 461). A proposta da
coleção era servir de apoio didático e teórico para os professores. Assunção enfatiza que a coleção foi
censurada em 1965 e os livros já editados foram retirados das livrarias em 1966 (2009, p. 246).
124
Agravando as tensões, em março de 1964, no “Comício da Central”, Goulart anunciou as Reformas de
Base. Nesse momento, os jornais intensificaram os boatos de que Goulart, “com o apoio do PCB, do CGT
e das forças políticas nacionalistas – preparava um golpe de Estado” (Toledo, 2004, p. 23). O crescimento
do perigo comunista era noticiado pela imprensa. Nas manifestações contrárias às ações do governo
destacou-se a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, realizada em março de 1964, em São
Paulo. No Paraná, foi organizada a “Marcha a favor do Ensino Livre”, em oposição ao Decreto n°
53.583/64 e contra o “livro único” (Codato, Oliveira, 2004, p. 273-287).
153

Fundação tinha, entre outras funções, o dever de selecionar e julgar os livros didáticos a
serem adotados pelos estabelecimentos de ensino do estado (Hallewell, 1985, p. 466).
Nesse mesmo ano, o senador Vasconcellos Torres apresentou o projeto de Lei n°
6, que regulava a escolha e a mudança dos livros didáticos nos estabelecimentos de
ensino da União e nos estabelecimentos de ensino secundário e técnico particulares. O
projeto estabelecia que o livro escolhido pelo professor deveria ser utilizado por quatro
anos. Previa ainda, a criação de uma Comissão Especial do Livro Didático. A resposta
do CFE, por meio do parecer n° 253/65, de Farias Góis, foi contrário ao projeto de lei,
argumentando que congelar o livro didático por quatro anos seria frear o avanço
pedagógico que buscava aprimorar os manuais continuamente. Os alunos seriam
condenados a aprender conhecimentos e interpretações ultrapassadas. O parecer
enfatizava que não era necessária a criação de um órgão federal para regular sobre o
livro didático, pois os estados já possuíam órgãos para isso. Finalizava afirmando que a
existência de uma Comissão do Livro Didático já tinha representado uma experiência
infrutífera e negativa no passado.
Ao longo de 1965, outros projetos sobre os livros didáticos foram debatidos pelo
Congresso nacional e pelo CFE. Todavia, nenhum foi aprovado. Nesse tempo, a CNLD
continuou a existir de modo pouco significativo até ser extinta pela Portaria Ministerial
n° 594, em 1969. Contudo, era imperativo e urgente regular os livros didáticos. A
tentativa de solução para o problema do livro didático seria estabelecida pelo governo
da Ditadura Militar, em 1966, com a criação da Comissão do Livro Técnico e do Livro
Didático (Colted).

O mercado dos livros didáticos e a criação da Colted

Após o golpe militar o tema do livro didático tornou-se importante nos debates
sobre a necessidade de fornecimento de materiais para os alunos carentes e na questão
do incentivo e regulamentação de seu mercado editorial. Quatro foram os órgãos
responsáveis pelas políticas públicas do livro didático nesse período: a Comissão do
Livro Técnico e do Livro Didático (Colted), o Instituto Nacional de Livro (INL), a
Fundação Nacional do Material Escolar (Fename) e a Fundação de Assistência ao
Estudante (FAE). Os três primeiros - a Colted, o INL e a Fename - possuíram processos
de avaliação dos manuais escolares.
154

Segundo Batista (2002), a política econômica posterior ao golpe militar de 1964,


estimulou a produção editorial brasileira e incentivou mudanças, em especial, na
produção de livros escolares:

Os níveis inflacionários e a recessão econômica dos anos posteriores ao golpe


diminuem e tornam, a partir dos anos 70, a produção editorial menos difícil e
onerosa. Todos os estágios da produção e venda do livro passam a ser, a
partir de 1967, isentos de impostos. A produção de celulose e a fabricação de
papel são estimuladas. São criados órgãos para estudo e o planejamento do
desenvolvimento do setor gráfico e editorial e, por meio de suas sugestões,
desenvolvem-se uma extensa renovação e uma significativa modernização
dos equipamentos gráficos e um correspondente aumento da capacidade de
produção do impresso e de sua versatilidade (p. 556).

Batista ressalta que foram várias as mudanças específicas da produção didática.


A forma física dos livros foi modificada e sua leitura e utilização foram alteradas, pois
os manuais passaram a ter as funções de compêndio e de caderno de exercícios e
atividades, “assumindo um alto grau de dependência do contexto da sala de aula e
realizando uma mediação entre o aluno e o professor, que atribui a este um papel
subordinado em relação às atividades propostas pelo livro didático” (Batista, 2002, p.
554). O modo de elaboração e produção editorial do livro foi modificado, ocorreram
alterações na sua comercialização e o tempo de vida do manual didático diminuiu, pois
ele passou a ser consumível125 (Batista, 2002, p. 555).
Somavam-se a esses fatos as mudanças educacionais dos anos 1960. A expansão
quantitativa do ensino secundário, com o aumento de alunos e professores, expunha a
necessidade de uma nova concepção de educação nesse nível de ensino. Esse novo
público escolar precisava de outro tipo de educação, menos elaborada, e os novos
professores, menos preparados, precisavam de maiores suportes didáticos. As propostas
de inovação apareciam, principalmente, por meio de medidas técnico-pedagógicas e o
livro didático entrava como parte dessas medidas. Másculo (2008), que analisou a
coleção didática de Sérgio Buarque de Hollanda, da Companhia Editora Nacional,
enfatiza as mudanças na qualidade material e nos conteúdos dos livros didáticos a partir
dos anos 1970. No caso dos livros da Companhia Editora Nacional, o projeto gráfico
dos livros começou a ser reformulado, com formatos maiores e muitas ilustrações. A
introdução de livros de exercícios e os livros do professor foram novidades para a época
(Másculo, 2008, p. 26).

125
O livro didático consumível possuía exercícios e atividades para serem respondidos pelos alunos no
próprio livro. Deste modo, os livros consumíveis não poderiam ser reaproveitados.
155

O mercado editorial de didáticos cresceu durante o regime militar e aumentou a


dependência já existente entre a indústria do livro, a escola e o setor didático. Até 1965,
com o aumento dos três graus de ensino, as vendas no Brasil de livros didáticos tiveram
um enorme crescimento: em meados de 1968 já estavam à venda, “cerca de 2.500
títulos didáticos distribuídos entre os três níveis, publicados por cerca de sessenta
editoras” (Ática, 1998, p. 157). Em 1979, segundo dados do SNEL, os livros didáticos
representavam 36,2% do mercado editorial, chegando a se tornar o seu principal
segmento nos anos 1980 (Ática, 1998, p. 158).
De acordo com Cassiano (2003), as editoras tiveram um salto quantitativo de
vendas de livros didáticos com as reformas na educação iniciadas em 1960, com a
LDB/61, mas, principalmente, com a promulgação da Lei n° 5.692/71 e a expansão da
rede de ensino. Outro fator que estimulava o crescimento do mercado editorial didático
nos anos 1960 eram as ações governamentais, que incentivavam a modernização da
produção (de seu parque gráfico), com o financiamento dos livros escolares.
As principais editoras de livros didáticos para ensino primário no fim dos anos
1960 eram a Melhoramentos, Agir e Francisco Alves e, para o ensino secundário, a Cia.
Editora Nacional e Editora do Brasil. A partir dos anos 1970 novas editoras de didáticos
ascenderam no mercado, muitas favorecidas pelos subsídios do governo: Moderna,
Saraiva, FTD, Ática, IBEP, Ao Livro Técnico e Scipione. Dessa forma, com a expansão
da escolarização e o crescimento do mercado editorial de didáticos, o Estado começou a
intervir mais efetivamente com políticas públicas para os livros escolares.
Baseado na LDB/61, que instituía a assistência social escolar e em diversas
Conferências Internacionais sobre a Instrução Pública, em março de 1966, foi
apresentado ao CFE e à Câmara de Ensino Primário e Médio (CEPM), o projeto de lei
do deputado Carlos de Souza Neves, que propunha a criação do Fundo Nacional de
Assistência aos Escolares. O Fundo teria a atribuição de fornecer gratuitamente, entre
outras coisas, alimentação, vestuário, assistência médica-dentária, material escolar e
livros didáticos, aos alunos de nível elementar e médio de instituições oficiais e
particulares gratuitas. De acordo com Projeto de Lei, deveriam ser mais atendidas as
zonas rurais e as de “baixo nível econômico e social”. O projeto demonstrava a
preocupação parlamentar com a nova comunidade escolar – com menor poder aquisitivo
-, que necessitava de maiores suportes governamentais. O fornecimento de livros
didáticos era essencial em tais propostas.
156

Freitag observa que durante o governo militar a política do livro didático


assumiu cada vez mais a conotação de uma “política assistencialista para a criança
carente” (1987, p. 31). A LDB/61 efetivou a obrigatoriedade do ensino primário e,
posteriormente, a Constituição de 1967 ampliou a obrigatoriedade até os 14 anos. O
livro didático, nesse contexto, era considerado o instrumento emergencial de instrução
de alunos e professores. O Estado passou a intervir no mercado editorial didático,
incentivando financeiramente seu crescimento e buscou suprir assistencialmente as
novas famílias menos favorecidas, que possuíam filhos nas escolas públicas. Com as
políticas do livro didático, o Estado pretendia barateá-los e distribuí-los gratuitamente
aos alunos carentes das escolas brasileiras.
Nesse sentido, em julho de 1966, o governo militar criou o Conselho do Livro
Técnico e do Livro Didático (Colted), com a atribuição de “gerir e aplicar recursos
destinados ao financiamento e à realização de programas e projetos de expansão do
livro escolar e do livro técnico, em colaboração com a Aliança para o Progresso”
(Decreto n° 58.653/66). Em 4 de outubro do mesmo ano, o Ministro da Educação
Raymundo Moniz de Aragão promulgou novo Decreto n° 59.355/66 modificando o
Colted, que passou a ser Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático. Ela teria a
finalidade de “incentivar, orientar, coordenar e executar as atividades do Ministério da
Educação e Cultura relacionadas com a produção, a edição, o aprimoramento e a
distribuição de livros técnicos e de livros didáticos” (Decreto n° 59.355/66). Segundo o
novo decreto, o anterior não atendia integralmente às finalidades da Colted126.
Em 2 de outubro de 1967, por meio da Lei n° 5.327, foi criada a Fundação
Nacional do Material Escolar (Fename), vinculada ao MEC, que deveria produzir e
distribuir materiais didáticos para as escolas, “de modo a contribuir para a melhoria de
sua qualidade, preço e utilização” (Lei n° 5.327/67). A Fundação não visava fins
lucrativos e o material produzido por ela seria distribuído a preço de custo127. Com a
criação da Fename, o acervo e produções da Campanha Nacional de Material de Ensino
foi incorporado ao patrimônio da Fundação. Dentre suas publicações destacavam-se os

126
No ofício n° 828, de 29/7/1966, ao Ministro da Educação Raimundo Moniz de Aragão, o diretor do
Inep, Carlos Corrêa Mascaro, fez um relatório com críticas ao Conselho do Livro Técnico e do Livro
Didático. Ao discutir o problema da política para os livros escolares, Mascaro retomou a experiência do
Inep com a Caldeme e a publicação de manuais para professores, considerada uma experiência negativa,
que “não atingiu um número sequer razoável de manuais”. Segundo Mascaro, o Inep após a experiência
da Caldeme modificou sua orientação e passou a estimular edições privadas de livros e manuais para
professores.
127
De acordo com Cassiano, com baixo orçamento, a partir de 1970, a Fename passou a produzir livros
em co-edição com o “empresariado nacional” (2003, p. 39).
157

Cadernos MEC128, que eram cadernos de atividades das diferentes disciplinas


escolares129.

A Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático - Colted130

A Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático foi criada com base nas
recomendações da XXII Conferência Internacional de Instrução Pública, realizada em
Genebra, em 1959. Como apresentado anteriormente, as recomendações indicavam a
importância dos livros e outros materiais didáticos para o ensino, enfatizava a
necessidade de organizar a elaboração dos manuais, incentivar o aumento da produção,
a qualidade editorial dos livros didáticos, observar as questões didáticas, das áreas de

128
Os Cadernos MEC apresentavam os conteúdos de ensino de modo diferenciado, por meio de
atividades e exercícios que compunham todo o material e deveriam ser respondidos no próprio caderno.
Os cadernos possuíam uma apresentação direcionada para os alunos, com toda orientação de como o
material deveria ser utilizado, os momentos de trabalhos individuais e em grupo, indicações de técnicas
de estudo e indicações bibliográficas. Os cadernos partiam do princípio do auto-aprendizado, a
orientações dos professores aos estudantes deveria diminuir de acordo com o desenvolvimento das
atividades em relação a maturidades e independência intelectual dos alunos. Além dos cadernos para os
alunos, foram publicados Guias Metodológicos das diferentes disciplinas escolares para orientar os
professores em como utilizar o material.
129
A CNME e, posteriormente, a Fename publicaram os seguintes Cadernos MEC:
Estudos Sociais – Cadernos MEC Estudos Sociais 1;
História - Cadernos MEC de História do Brasil, 1o 2o e 3o cadernos; Cadernos MEC de História Geral, 1o
e 2o cadernos;
Geografia - Cadernos MEC de Cartografia, através dos mapas; Cadernos MEC Iniciação Geográfica;
Cadernos MEC Geografia 3 Continentes;
Desenho - Cadernos MEC de Introdução ao Desenho Técnico; Cadernos MEC Desenho Plano espaço;
Cadernos MEC Desenho Decorativo Morfológico;
Ciências - Cadernos MEC de Iniciação à Ciência,
Matemática - Cadernos MEC Álgebra, 1 e 2; Cadernos MEC Aritmética; Cadernos MEC Introdução à
Análise Matemática; Cadernos MEC Geometria, 1, 2;
Física - Cadernos MEC Física 1 Ótica Geométrica e Termologia; Cadernos MEC Física 2 Mecânica;
Português - Cadernos MEC Português, 1, 2, 3;
Línguas estrangeiras - Cadernos MEC Frances
Química - Cadernos MEC Química Mineral; Cadernos MEC Química Orgânica;
Contabilidade - Cadernos MEC Iniciação à Contabilidade Geral;.
130
A documentação localizada sobre a Colted possui informações relativas aos acordos entre o MEC,
SNEL e United States Agency for International Development (USAID); atas das reuniões do colegiado da
Comissão; relatórios da I e II Semanas de Estudo da Colted; os Boletins da Colted; relatório do processo
de seleção de livros para as bibliotecas primárias e normais; relatório do processo de avaliação e seleção
de livros didáticos para o Plano Piloto – de distribuição de livros aos alunos das escolas primárias das
capitais -; ofícios da Direção Executiva e da Presidência da Colted.
O material selecionado permitiu a análise da atuação desse órgão e das discussões internas que
envolveram o Ministério da Educação e seus técnicos, as diversas Secretarias de Ensino, o Departamento
Nacional de Educação, a USAID, o INL, o Inep, o SNEL, os técnicos dos Centros Regionais de Pesquisas
Educacionais (CRPEs) e professores dos Institutos de Ensino do Rio de Janeiro.
Além da documentação encontrada, a presente pesquisa utilizou o artigo do professor Kazumi Munakata
(2006), O gigantismo da Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático, produzido como parte do
relatório final do projeto “A política de livro didático no regime militar: da Campanha do Livro Didático
e Manuais de Ensino (Caldeme)/Campanha Nacional de Material de Ensino (CNME) à Comissão do
Livro Técnico e Didático (Colted) e à Fundação Nacional de Material Escolar (Fename)”.
158

conhecimento e das Ciências da Educação, melhorar sua distribuição, que deveria ser
preferencialmente gratuita para o máximo possível de alunos.
A exposição de motivos de criação da Colted, (Apud Krafzik, 2006, p. 58)
justificava o investimento nos livros técnicos e didáticos como um instrumento de
aperfeiçoamento do ensino, em especial o primário, devido ao aumento da população
estudantil em todo o país. Pretendia-se levar o livro até as localidades mais distantes,
“considerando que a produção e a distribuição do livro técnico e do livro didático
interessam, sobretudo, aos poderes públicos pela importância de sua influência na
política de educação e de desenvolvimento econômico e social do país” (Exposição de
motivos ao art. 1º, Diário Oficial, 5/10/1966, p. 1.1468, apud Krafzik, 2006, p. 58). O
discurso do presidente da Colted, Edson Franco, explicitava os dois objetivos da
Comissão: montar bibliotecas nas escolas, com obras que permitissem alterar a
mentalidade pelo uso dos livros escolares; e estimular a expansão da indústria do livro,
por meio de grandes tiragens de obras técnicas, didáticas e recreativas (Apud Krafzik,
2006, p. 59).
Munakata (2006) observa que as considerações iniciais do Decreto n. 59.355/66,
enfatizavam a necessidade de o Estado manter “atitude atuante e vigilante”, podendo
“participar diretamente, quando necessário, da produção e distribuição” dos livros
técnicos e didáticos. No entanto, a intervenção do Estado não asfixiaria a iniciativa
privada, mas procuraria “orientar e incentivar a livre concorrência” procurando
“intensificar a produção e a melhorar a qualidade do livro técnico e do livro didático”,
baixar “os preços de custo e de venda” e assegurar a distribuição (Munakata, 2006, p.
77). O MEC assumia, assim, as responsabilidades pela política do livro técnico e
didático, por meio da Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático. De acordo com o
artigo 2º, do Decreto n° 59.355/66, a Colted deveria:

I – Definir, quanto ao Livro Técnico e ao Livro Didático, as diretrizes para a


formulação de programa editorial e planos de ação do Ministério da Educação
e Cultura;
II – Elaborar seu plano anual de trabalho e o de aplicação de recursos;
III – Autorizar a celebração de contratos, convênios e ajustes com entidades
públicas e particulares e com autores, tradutores, editores, gráficos,
distribuidores e livreiros;
IV – Autorizar a concessão de auxílios e a prestação de assistência-técnica,
aprovando os relatórios sobre sua aplicação ou desenvolvimento;
V – promover estudos e prestar a assistência que lhe for solicitada, tendo em
vista as finalidades previstas neste decreto;
159

VI – Colaborar com outros órgãos públicos ou particulares de objetivos


idênticos, equivalentes ou correlatos, em particular com o Grupo Executivo
da Indústria do Livro – GEIL;
VII – Examinar e aprovar projetos específicos de trabalho que lhe sejam
submetidos;
VIII – Elaborar sua proposta orçamentária anual;
IX – Autorizar a efetivação de despesas até o limite de meio por cento dos
recursos da COLTED para custeio de sua operação;
X – Traçar normas para melhor execução deste decreto, inclusive elaborar
seu regimento;
XI – Requisitar os servidores civis necessários ao seu funcionamento
(Decreto n° 59.355/66).

A estrutura da Colted estava dividida do seguinte modo: Colegiado; Direção


Executiva; Assessoria Técnica; Assessoria de Avaliação; Serviço Administrativo
(composto das Seções - Secretaria, Contratos, Contabilidade) e; Serviço de
Coordenação Executiva (com as Seções – Organização de Bibliotecas Escolares,
Coordenação de Cursos e Seminários, Distribuição)131. O colegiado da Colted, espaço
de deliberação máxima do órgão, seria constituído de nove membros:

Dr. Edson Franco – Diretor Geral do Departamento Nacional de Educação,


Presidente do Colegiado;
Dr. Carlos Corrêa Mascaro - Diretor do Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos(Inep);
Dr. Augusto Meyer – Diretor do Instituto Nacional do Livro;
Dr. Gildásio Amado – Diretor do Ensino Secundário;
Dr. Lafayette Belfort Garcia – Diretor do Ensino Comercial;
Dr. Armando Hildebrand – Diretor do Ensino Industrial;
Profa. Esther de Figueiredo Ferraz – Diretora do Ensino Superior;
Dr. Walter Saur - Superintendentes do Ensino Agrícola do Ministério da
Agricultura;
Dr. Cândido Guile de Paula Machado132 - Presidente do Sindicato Nacional
dos Editores

Dos nomes indicados, destacavam-se três educadores que participaram dos


debates educacionais dos anos 1950: Armando Hildebrand tinha sido diretor da
Diretoria de Ensino Secundário do MEC, nos anos 1950 e, presidente do Conselho de
Educação do Distrito Federal, em 1962; Carlos Corrêa Mascaro foi professor primário,

131
O pessoal em exercício era composto por: Chefe do Serviço Administrativo – Ary Leonardo Pereira;
Chefe do Serviço de Coordenação – Reginaldo Carpenter Ferreira; Contabilidade – Thereza Christina
Villela Spinelli e Geraldo Martuchelli; Secretaria – Jane Fernandes, Lindalva Tenório Fraga, Irene
Hildebrand, Antonio Fagundes e Laércio Ferreira de Albuquerque; Contratos – Ubirajara Barroso
Magalhães; Biblioteca – Anamaria Barros Evangelista; Distribuição – Sonia Maria, Augusto Souza
Meyer e Arsindo Gonçalves Baptista; Cursos e Seminários – Jandira Bastos Cintra de Oliveira e Lenita
Soares Bastos.
132
Cândido Guile de Paula Machado era diretor da Editora Agir.
160

de várias escolas normais de São Paulo133 e era professor da USP. Participou das
atividades do Inep, junto com Anísio Teixeira, sendo diretor do CRPE/SP. Foi
signatário do Manifesto Mais uma vez convocados, de 1959 e da Campanha em Defesa
da Escola Pública; Gildásio Amado participava dos debates educacionais desde os anos
1940, como foi apresentado no capítulo anterior. Foi professor no Colégio Pedro II, da
Faculdade Nacional de Filosofia, coordenador da Campanha de Difusão e
Aperfeiçoamento do Ensino Secundário (Cades) e presidente da CNLD. Verifica-se,
portanto, que o colegiado da Colted foi composto por educadores que atuaram nos
projetos educacionais anteriores à Ditadura Militar.
Além dos membros citados, participavam das reuniões do Colegiado da Colted
Miss Alice Palmer e seu assessor Sr. Campbell, da United States Agency for
International Development (USAID), o professor Décio Guimarães de Abreu e General
Propício Alves134 – assessores do Presidente da SNEL.
A reunião de instalação da Colted aconteceu em 27 de setembro de 1966, no
gabinete do Ministro da Educação. Nessa reunião foi escolhido como presidente da
Colted o professor Edson Franco. A segunda reunião do Colegiado, realizada em 26 de
outubro de 1966, indicou o professor Leostenes Cristino para Diretor Executivo da
Comissão. Constituíram-se, ainda, duas subcomissões - de Planejamento e Execução135.
Na terceira reunião da Comissão, de 22 de novembro de 1966, foi lida uma carta
de 10 de novembro de 1966, firmada pelos Ministros da Educação Muniz de Aragão, do
Planejamento Roberto Campos e da Fazenda Gouvêa de Bulhões, endereçada ao
Ministro Van Dyke, diretor da USAID no Brasil, que solicitava “a liberação de quinze
bilhões de cruzeiros” para ser iniciada a atividade da Colted. Nessa reunião foi decidido
que as subcomissões de Planejamento e Distribuição deveriam elaborar um Plano Inicial
de Aplicação que organizaria a constituição de “cerca de oito mil bibliotecas escolares
para os três níveis, programa de cursos e seminários, grandes tiragens de livros para uso
em classe e outras providências”. Na quarta reunião, de 12 de dezembro de 1966, foi
submetida ao Colegiado a minuta do Convênio a ser assinado entre o MEC, a SNEL e a

133
Carlos Corrêa Mascaro foi professor nas escolas normais de Casa Branca, Cruzeiro e Rio Claro. Foi,
ainda, diretor da escola Normal de Araçatuba, Catanduva e professor de Administração da Educação, no
Instituto de Educação Caetano de Campos. Era professor de Administração Escolar e Educação
Comparada da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP (Dias, 2002, p. 217).
134
Propício Machado Alves, era diretor da Editora Ao Livro Técnico. Décio Guimarães de Abreu era
diretor da Editora Record.
135
A subcomissão de Planejamento foi constituída por Carlos Mascaro, Décio de Abreu e Edson Franco.
A subcomissão de Execução foi constituída por Augusto Meyer, Lafayete Garcia e Cândido Machado.
161

USAID e o Plano Nacional de Livros Técnicos e Didáticos, elaborado pelas


subcomissões de Planejamento e Execução.
Como se verifica, com a criação da Colted iniciaram-se os acordos
internacionais entre o MEC, a USAID e a SNEL para o financiamento da produção
didática, com investimentos de cerca de US$ 9 milhões (Ática, 1998, p. 158). Com o
convênio MEC/SNEL/USAID136, os livros didáticos seriam financiados pelo governo a
partir de verbas públicas e distribuídos gratuitamente pelo MEC. O acordo pretendia, ao
mesmo tempo, estimular o fortalecimento e a expansão da indústria editorial de livros
técnicos e didáticos.
A USAID foi criada pelos Estados Unidos, no quadro da Aliança para o
Progresso137, no contexto da Guerra Fria, “para prover assistência ao desenvolvimento
no Terceiro Mundo” (Fonseca, 1996, p. 230). Segundo Munakata (2006, p. 77), a
USAID foi criada para gerenciar as atividades da Aliança para o Progresso. Cunha e
Góes, ao apresentarem os diversos acordos firmados entre a USAID e o MEC desde
1964, afirmam que “os acordos MEC-USAID cobriram todo o espectro da educação
nacional, isto é, o ensino primário, médio e superior, a articulação entre os diversos
níveis, o treinamento de professores e a produção e veiculação de livros didáticos”
(2002, p. 32). Para realizar a reestruturação da educação, o governo se alinhava à
Aliança para o Progresso e abria espaço para os técnicos da USAID.
O acordo MEC/SNEL/USAID de cooperação para publicações técnicas,
científicas e educacionais, visava disponibilizar cerca de 51 milhões de livros em três
anos, que seriam distribuídos gratuitamente às escolas, para uso dos alunos. Novas
bibliotecas escolares seriam criadas e as já existentes seriam supridas. Com o aumento
da produção, pretendia-se baratear o preço dos manuais. O acordo pretendia promover
contratos com as editoras buscando aumentar o número de livros disponíveis nos níveis
de ensinos primário, médio e superior e sua distribuição pela rede comercial. Era
responsabilidade do MEC, via Colted, elaborar um levantamento, com a colaboração da
SNEL, dos livros disponíveis nos diversos níveis educacionais, buscando-se analisar

136
O Convênio foi assinado em 6 de janeiro de 1967, por: Raymundo Moniz de Aragão – Ministro da
Educação e Cultura; Cândido de Paula Machado – Presidente do SNEL; Stuart H. Van Dyke – Diretor da
USAID/Brasil; Joaquim Faria Góis – Representante do Governo Brasileiro para a Comissão
Coordenadora da Aliança para o Progresso e Francisco de Assis Grieco – do Escritório do Governo
Brasileiro para Cooperação Técnica. O convênio vigoraria até 31 de dezembro de 1969.
137
Criada oficialmente no Encontro Extraordinário do Conselho Econômico e Social Interamericano,
realizado em Punta del Este, em 1961, a Aliança para o Progresso tinha por objetivo acelerar o
desenvolvimento econômico mediante a colaboração financeira e técnica na América Latina.
162

suas deficiências e carências. Quando houvesse necessidade seriam indicadas


publicações de novos títulos.
O acordo tinha o objetivo, ainda, de promover a edição de livros didáticos das
matérias em que não houvesse publicações em Português, aperfeiçoar as técnicas da
indústria editorial e gráfica, estimular os autores, ilustradores e aperfeiçoar os sistemas
de distribuições de livros. Pretendia-se, por fim, nos três níveis de ensino, difundir os
meios de aperfeiçoar técnicas didáticas, para melhorar o uso dos livros didáticos e
materiais científicos. Munakata (2006, p. 78) enfatiza que o convênio partilhava da
“concepção que vinculava a educação ao projeto desenvolvimentista”, ao considerar o
livro para o ensino um instrumento para o “progresso sócio-econômico” importante
para o “desenvolvimento do país”.
A USAID deveria prestar assessoria e assistência técnica de especialistas que
trabalhariam com os editores e com o MEC na execução do programa. Os especialistas
atuariam em diferentes setores: “distribuição, impressão, encadernação, fabricação de
papel, diagramação, elaboração e ilustração de livros, editoração, biblioteconomia, etc.,
de livros técnico, didáticos e de referência”, além de assessorar “de comum acordo com
a COLTED, os editores brasileiros no processo de compra de direitos autorais de outras
editoras” (Convênio MEC/SNEL/USAID). A SNEL colaboraria com os técnicos da
USAID na utilização da assistência técnica, “para o aperfeiçoamento da elaboração,
ilustração e diagramação, impressão e encadernação de livros educacionais” (Convênio
MEC/SNEL/USAID).
O regimento da Colted foi instituído pelo MEC por meio da Portaria n° 69, de 13
de março de 1967 e pelo Decreto n. 60.833/67. De acordo com o regimento, o colegiado
estava responsável por:

I. Deliberar sobre assuntos atribuídos à COLTED;


II. Aprovar proposições, emitir pareceres e baixar resoluções que forem
necessárias à formalização de suas decisões, nos termos do citado Decreto n.
59.355;
III. Examinar e aprovar relatórios e prestações de contas encaminhados pela
Direção Executiva;
IV. Propor ao Ministro da Educação e Cultura a alteração deste regimento
toda a vez que houver conveniência administrativa ou técnica (Portaria n° 69,
13/3/1967).

A partir de setembro de 1967, a Comissão passou a ter como Diretor Executivo


o professor Ruy Baldaque Guimarães. A direção executiva deveria realizar os planos,
163

programas, projetos e normas de trabalho, de acordo com as deliberações tomadas pelo


Colegiado. Dentre suas funções destacavam-se:

(...) III – Levantamento da capacidade editorial e indústria gráfica para


atendimento dos programas da COLTED, em colaboração com as entidades
representativas de editores e industriais gráficos:
IV – Elaboração de planos que visem possibilitar o crescimento da
capacidade editorial e da indústria gráfica nacionais de livros didáticos e
técnicos para atendimento do programa da COLTED;
V – Formulação e execução de planos de organização de bibliotecas escolares
em estreita colaboração com órgão federais, estaduais e municipais, dentro do
programa aprovada pelo Colegiado;
VI – Promoção de cursos, seminários e conferências para autores e
ilustradores de livros didáticos e técnicos, bem como para editores
distribuidores, livreiros, técnicos em artes gráficas, professores e diretores de
estabelecimentos de ensino;
VII – Publicação de bibliografia de livros didáticos e técnicos, assim como
boletins informativos e listas de publicações de títulos novos e material de
ensino; (...)
IX – Organização de projetos de assistências técnica a editoração e
industrialização do livro técnico e didático; (...)
XII – Proceder ao levantamento de mão–de-obra qualificada na indústria do
livro didático e propor planos para sua melhoria, em colaboração com
entidades especializadas públicas ou privadas (Portaria n° 69, 13/3/1967).

Segundo Munakata (2006) as atividades da Colted causaram um “alvoroço” nos


meios editoriais, que pretendiam ter seus títulos adquiridos pelos programas. No
primeiro semestre de 1967, a Comissão recebeu uma grande quantidade de
correspondências das editoras e de autores, “oferecendo seus títulos para avaliação”
(Munakata, 2006, p. 80). Algumas das correspondências eram “acompanhadas de
recomendação ou parecer de personalidades, como Alceu Amoroso Lima, Raquel de
Queiroz e até mesmo de pessoas ligadas a órgãos do governo” (Munakata, 2006, p. 80).

O Plano Inicial

O Plano de Aplicação Inicial do acordo MEC/SNEL/USAID, para a verba de


quinze bilhões de cruzeiros, previa três projetos. O primeiro projeto pretendia adquirir
2.456 exemplares de títulos didáticos já disponíveis nas editoras, para os níveis
primário, médio e superior, visando à formação das bibliotecas escolares. Os acervos
seriam compostos por: livros para alunos, textos para as diferentes matérias e séries,
obras de literatura infantil e juvenil; livros para professores sobre didática e
metodologia; obras de referência – dicionários, enciclopédias -, etc. A seleção dos
164

títulos para os acervos ficaria sob responsabilidade dos seguintes órgãos: ensino
primário – DNE e Inep; ensino secundário – Diretoria de Ensino Secundário; ensino
técnico industrial - Diretoria de Ensino Industrial; ensino técnico agrícola –
Superintendência do Ensino Agrícola; ensino superior – Diretoria do Ensino Superior;
Ensino militar – os respectivos Ministérios militares e; ensino técnico comercial –
Diretoria do Ensino Comercial. O segundo projeto selecionaria os títulos em processo
de publicação nas editoras e, o terceiro projeto, procuraria incentivar a publicação de
novos títulos.
Para organizar as discussões sobre o livro didático, a Colted realizou duas
Semanas de Estudo. A primeira aconteceu de 2 a 6 de maio de 1967, com a finalidade
de trocar experiências entre “professores, autores, editores, livreiros, técnicos de
educação e autoridades”, visando organizar as “diretrizes de uma política do livro
técnico e do livro didático, relacionada com sua produção, edição, aprimoramento e
distribuição” (Regimento interno da I Semana de Estudos da Colted). Participaram,
assim, representantes das Secretarias Estaduais de Educação, pessoas ligadas as
editoras, professores de ensino básico e de Universidades. A semana produziu relatórios
organizados por seis Comissões de Trabalho: Títulos Novos; Livro de Nível Primário;
Livro de Nível Médio; Livro de Nível Superior; Bibliotecas; Distribuição.
O relatório final da Comissão do Livro de Nível Médio138 cujo relator foi
Roberto Accioli, sob coordenação de Lafayette Belfort Garcia, indicou diretrizes para a
melhoria da qualidade dos livros de texto. Dentre elas, destacavam que deveriam ser
seguidas as recomendações do Conselho Federal de Educação, que continham as
diretrizes para o ensino das disciplinas de grau médio e as normas dos Conselhos
Estaduais e dos diversos órgãos do MEC, das Secretarias de Educação, das
Congregações Oficiais e das Associações de Educação e Ensino. Sugeriam, ainda:

O livro didático, não poderia ter omissões, nem ser amplo em excesso, o resumo
exagerado e a noção ultrapassada deixavam de satisfazer à inquietude do adolescente.
O livro de texto deveria facilitar a aquisição de conhecimentos, sua fixação e revisão.
O livro texto deveria oferecer os elementos que permitissem responder, de imediato, às
naturais indagações dos jovens.
Impõe-se ao livro didático contribuir para o melhor desenvolvimento dos hábitos de
estudo, procurando interessar o estudante no que diz respeito à sua curiosidade
intelectual.

138
Participaram da da Comissão do Livro de Nível Médio os seguintes professores: Maria Junqueira
Schmidt (membro da CNLD), Thomaz Aquino de Queiroz, Lydmea Gasman, Vicente Tapajós, Amaury
Pereira Muniz, Padre José Vasconcellos, Armando Hildebrand, Gildásio Amado, Jorge Furtado, Isaías
Raw e Julio Barros Assunção.
165

Estudos sintéticos, relativos às grandes questões pertinentes às disciplinas seriam


expostos de modo claro, arejado e com uma bibliografia sumária dos assuntos
cogitados.
Textos apresentados como comentário ou como questionário, deveriam constituir
material de exercícios práticos. Pequenas dissertações referentes ao desenvolvimento de
aspectos de utilidade imediata incumbiriam ser expostas.
Ilustração documentária apropriada e croquis, desenhos, fotografias acompanhadas do
respectivo comentário, quando, requeresse e permitisse o assunto tratado. Quadros,
cartas e esquemas estatísticos de valor demonstrativo.
A exposição desenvolvida refletiria em sua estrutura o valor do assunto tratado tendo
em vista a capacidade receptiva de seus leitores, levada em conta a possibilidade deles
próprios poderem apurar os resultados desejados.
O estilo poderia e deveria contribuir para criar psicologicamente um laço entre o que
escreve e os que lêem, utilizada linguagem animada, viva e concisa.
Falando ao coração dos alunos de modo que lhes inspirassem o respeito e admiração
pelos bons, e lhes tirassem até a idéia de louvarem e imitarem os maus, a exposição
deveria se fazer sentir com a crítica e a imparcialidade imprescindível.
O livro didático não deveria obedecer a um planejamento rígido levando o professor a
padronizar as técnicas de aula, a natureza e a seqüência dos assuntos, bem como o modo
de abordar alguns deles.
Ele deveria ser planejado e executado com espírito renovador, sem ser radicalmente
revolucionário, afim de que a mensagem nele contida pudesse ser aceita e compreendida
pela maioria dos professores.
Deve ser eliminado tudo que estimulasse a simples memorização.
Na feitura dos textos prevaleceria o princípio de que é útil a todos os estudantes
compreender o mundo no qual iriam viver, por ele se interessando e preparados para
nele agir, lembrada a importância dos estudos desenvolvidos.
O texto deveria permitir ao discípulo o exercício da crítica para habituar-se a não
acreditar sem exame, a aguardar de onde provinha uma referência, afim de adquirir a
aptidão para poder duvidar, isto é, o rudimento da dúvida metódica.
( Relatório da Comissão do Livro de Nível Médio, na I Semana de Estudos da Colted, 2
a 6 de maio de 1967. A passagem foi resumida pela autora).

As recomendações orientavam para questões de produção dos manuais, os


aspectos materiais e gráficos – como as ilustrações, quadros e outras imagens -,
enfatizavam o papel do CFE na elaboração das diretrizes das disciplinas, orientavam
sobre a distribuição dos conteúdos nos livros, afirmavam que os manuais deveriam ser
colaboradores do ensino, incentivadores de hábitos de estudo, deveriam eliminar o
hábito da memorização e estimular a compreensão do mundo e a ação crítica sobre ele,
por meio do exercício da “dúvida metódica”, mas não poderiam padronizar a aula e
engessar o professor. Os livros deveriam ter linguagem clara e concisa, mas não
poderiam ser muito renovadores, para que os professores compreendessem sua
mensagem. As recomendações da Comissão evidenciavam a preocupação com os novos
professores considerados menos preparados, com os professores antigos, que não
conheciam as novas tecnologias de ensino, e com o novo público escolar.
166

No item critérios de seleção, a Comissão apresentava sugestões quanto ao


conteúdo e quanto aos elementos gráficos (mecânicos). Quanto ao conteúdo, as
principais indicações eram:

- conteúdo que reflita o que de melhor o especialista ache que deva ser
ensinado sobre o assunto; tendo em conta a evolução deste setor do
conhecimento, introduzindo inovações compatíveis com esta evolução e
vivificar o ensino e aprendizagem;
- empregar método que reflitam as modernas diretrizes para uma
aprendizagem dinâmica. Apresentar a matéria sob a forma de problemas.
Estimular a atividade de pesquisa;
- adequado à faixa etária em relação ao conteúdo e vocabulário; ajustado à
realidade brasileira;
- matéria deve possibilitar aos estudante a aquisição de conhecimentos que o
habilitem a utilizá-los na vida diária;
- promover leitura reflexiva, estimular atitude científica e objetiva; estimular
interesse pelo prosseguimento nos estudos;
- estimular a utilização de obras de referência, recurso audiovisuais, literatura,
conter sugestões de pesquisas diretas;
- estabelecer condições para que o professor atue como orientador do trabalho
do aluno e não como repetidor ;
- oferecer condições para se observar as diferenças individuais, com exercícios
e atividades opcionais;
- as atividades de natureza científica, como laboratório devem ser orientações
sem instruções que eliminem a atitude científica e criadora do aluno;
(Trechos resumidos do relatório da Comissão do Livro de Nível Médio, na I
Semana de Estudos da Colted, 2 a 6 de maio de 1967).

As recomendações apresentam discussões que foram debatidas nos anos 1950. A


preocupação com a metodologia de ensino, para a “aprendizagem dinâmica”, a
adequação à faixa etária, ensino de conhecimentos que fossem utilizados na vida diária,
necessidade da atitude científica, da investigação, da reflexão, foram temas
intensamente debatidos pelos colaboradores da Caldeme.
Quanto aos elementos “mecânicos” o relatório observava questões sobre a
durabilidade do livro, qualidade do papel, clareza do tipo de impressão, espaços
marginais adequados, ilustrações adequadas, objetivas, funcionais, colocadas com
relação ao texto e com legendas. A matéria deveria ser apresentada de forma simples,
objetiva, com linguagem adequada, sem preconceitos, com exatidão e funcionalidade.
167

A seleção das obras para bibliotecas

Em abril de 1967, o Inep realizou a primeira seleção de livros para escolas de


ensino primário, de acordo com o Primeiro Projeto de aquisição de títulos didáticos já
disponíveis pelas editoras para distribuição imediata da Colted. Os livros comporiam as
primeiras bibliotecas do Plano de Aplicação Inicial. Na relação de livros selecionados
estavam incluídos: livros para alunos - textos para as diferentes matérias e séries,
literatura infanto-juvenil; livros para professores, administradores e supervisores –
didática, metodologia e conteúdo -; obras de referência para as diferentes matérias,
destinados aos alunos e professores.
A comissão de Seleção vinculada ao Inep/DNE foi composta por: Elza
Nascimento Alves (coordenadora); Íris Fádel; Teresinha Casasanta; Maria Yvonne A.
de Araújo; Helena Lopes; Maria Onelita Peixoto; Maria José Berutti; Generice A.
Vieira; Nair F. Tulha; América de Freitas Lima; Maria Olindina Pereira Trindade139.
A professora Elza Nascimento Alves, coordenadora da Comissão, era professora
primária e de ensino normal na “Escola Normal Santos Anjos” em Minas Gerais. Era
técnica do MEC, chefe da Seção de Orientação Educacional e Profissional, do Inep, e
chefe da Seção de Organização Escolar, também do Inep. A professora tinha
participado, ainda, de todo o processo de discussão e gestação do CBPE nos anos 1950,
dos debates sobre a necessidade de transformação da educação brasileira e da relação
das pesquisas educacionais com as Ciências Sociais (Mariani, 1982, p. 170).

139
*Íris Fádel era professora normalista e diretora do Grupo Escolar Prof. “Honório Miranda”, em Santa
Catarina. Era técnica do DNE;
*Teresinha Casasanta era autora de livros de leitura. Professora de Didática do Curso Colegial Normal do
Instituto de Educação de Belo Horizonte. Era técnica do CRPE/MG e havia participado do PABAEE,
como uma das professora escolhidas para fazer o treinamento na Universidade Indiana.
*Maria Yvonne A. de Araújo era educadora formada em Minas Gerais, autora de livros de leitura e
cartilhas e membro da equipe de Assistência Técnica ao Ensino Primário;
*Helena Lopes era professora e técnica do CRPE/MG;
*Maria Onelita Peixoto era técnica do MEC e professora de Didática de Estudos Sociais do CRPE/MG,
também havia participado do PABAEE e do curso de treinamento na Universidade de Indiana.
* Nair Ferreira Tulha era técnica do CBPE, professora de Matemática do Instituto de Educação da
Guanabara;
*Maria José Berutti era professora de Didática de Ciências Naturais da Divisão de Aperfeiçoamento de
Professores do CRPE/MG;
*Generice A. Vieira era técnica do CBPE;
*América de Freitas Lima era técnica do DNE;
*Maria Olindina Pereira Trindade era técnica do DNE.
168

A Comissão de Seleção do Inep/DNE140 foi composta por professoras de escolas


normais, especialistas em educação que estavam vinculadas diretamente ao MEC, DNE,
CBPE e ao Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Minas Gerais (CRPE/MG),
que desenvolvia o Programa de Assistência Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar
(PABAEE). Pelo menos duas professoras, Teresinha Casasanta e Maria Onelita Peixoto,
participaram do curso promovido pelo PABAEE na Universidade de Indiana.
O PABAEE141 foi criado, em 1956, como parte do programa de cooperação
educacional entre Brasil e Estados Unidos142. O Inep era o órgão responsável por
executar o Programa143. Segundo Paiva e Paixão144, o acordo foi firmado após a análise
da situação do ensino primário brasileiro, com altos índices de evasão e repetência, a
grande quantidade de professores leigos e o material didático que não favorecia o
aprendizado. A formação do professor era considerada fundamental para melhorar a
escolarização primária.
Desse modo, em 1957, o Instituto de Educação de Belo Horizonte tornou-se o
Centro Piloto do PABAEE. O Instituto de Educação deveria ser um centro de
demonstração para o programa de qualificação do professor primário, com cursos de
aperfeiçoamento de professores145. O PABAEE procurava atuar na formação dos
professores e na produção de material didático para as disciplinas do ensino primário.
Assim, técnicos estadunidenses vieram para o Brasil ministrar cursos que
apresentavam novos métodos e técnicas de ensino para os professores. As novas

140
É interessante observar a grande participação de mulheres na Comissão de Seleção. Até a década de
1950 existia uma predominância de homens que participavam da política educacional, principalmente em
cargos administrativos. A partir dos nos 1960, a feminização do magistério se acentua, como enfatiza
Batista (2002, p. 560) E, desse modo, as mulheres começam a ocupar espaço no cenário governamental.
141
De acordo com Paixão e Paiva (2002, p, 58), o PABAEE integrava o Programa Ponto IV, que era a
primeira proposta de assistência técnica bilateral dos EUA para países subdesenvolvidos. Segundo as
autoras: para acompanhar os projetos de assistência técnica nos países, os técnicos se organizavam em
uma "missão de operação". No Brasil a USOM-B (Missão de Operação dos EUA no Brasil) começou a
atuar no programa de educação para o ensino industrial (Comissão Brasileira para o Ensino Industrial -
CBAI). Em 1956, foi assinado o (PABAEE) e foi encaminhado pelo MEC a solicitação de um programa
visando o ensino secundário (PABAES). O Programa do Ensino Secundário foi assinado em junho de
1957 (Paixão e Paiva, 2002, pp. 61-62).
142
O acordo foi assinado pelo Ministro da Educação Clóvis Salgado, pelo governador de Minas Gerais
José Francisco Bias Fortes e pelo diretor da United States Operation Mission/Brasil (USOM/B) William
E. Warne.
143
Em 1963 José Nilo Tavares, pesquisador do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Minas
Gerais (CRPE/MG) tornou-se o coordenador do PABAEE.
144
O texto das professoras foi encontrado no site:
http://crv.educacao.mg.gov.br/sistema_crv/index.asp?id_projeto=27&ID_OBJETO=29842&tipo=ob&cp
=000000&cb=, acesso em 04/01/2011.
145
Os co-diretores do PABAEE eram Abgar Renault, Secretário de Estado de Educação e Thomas A.
Hart, Diretor da Divisão de Educação da USOM-B. A administração do Programa estava sob a
responsabilidade de Mário Casasanta, Diretor do Instituto de Educação e Charles M. Long, dos Estados
unidos. Mais informações sobre o PABAEE ver: PAIXÃO e PAIVA (2002).
169

propostas técnicas e metodológicas baseavam-se nos elementos da psicologia da


aprendizagem. Ao mesmo tempo, um grupo de quatorze professores brasileiros foi para
a Universidade de Indiana fazer um curso de treinamento em métodos modernos146. O
relatório de atividades do PABAEE, de 1957, descrevia quais eram os métodos trazidos
pelos técnicos estadunidenses: trabalho em equipe; pensamento independente exigido de
cada membro do grupo; trabalho coletivo aplicado à solução de problemas. A ênfase era
dada aos trabalhos práticos e à utilização de recursos áudios-visuais. É interessante de
tal modo, notar que algumas dessas técnicas do CRPE/MG, foram convocadas para
fazer parte da Comissão de Seleção.
Em abril de 1967, a Comissão de Seleção apresentou seu relatório, com os
critérios que nortearam os trabalhos de seleção:

- Colocar ao alcance do professor primário uma coleção de obras com as


seguintes características: livros de metodologia e didática de reconhecido
valor instrumental, livros de conteúdo adequados à média do professorado e
textos para as diferentes matérias e séries tanto quanto possível
diversificados. De modo a constituírem uma amostra significativa do
mercado atual, em nível de qualidade considerada ótima, boa ou, pelo menos,
aceitável;
- Incluir na coleção apenas obras que não estejam acima do nível de
preparação da maioria dos professores, tendo em vista a impossibilidade de
conhecer previamente os tipos de escolas primárias que serão beneficiadas;
- Adotando como percentuais básicos aproximadamente 22% dos títulos para
professores (66 títulos) e 66,6% de títulos para alunos (280 títulos), e 11,3%
para obras de referência (Relatório da Comissão, 28/4/1967).

A relação das obras de literatura infanto-juvenil seguiu os seguintes critérios:

- faixas de escolaridade onde há maior concentração de crianças;


- períodos em que a criança desenvolve maior esforço para completo domínio
da técnica de ler e começa a firmar bases para desenvolver o gosto e o
interesse pela leitura e pela literatura;
- tendência da criança para o mais simples e o mais fácil nas horas de lazer;
- importância da ilustração como mensagem de novas idéias e como estímulo
ao desejo de ler
- fascínio que os livros de Literatura Infantil bem ilustrados exercem sobre
crianças do Interior nem sempre habituadas ao seu manuseio (Relatório da
Comissão, 28/4/1967).

146
Os professores escolhidos para estudar na Universidade de Indiana foram: Terezinha Casasanta,
Marília Guimarães, Magdala Bacha, Nazira Abi-Jaber, Maria Luiza Ferreira, Wellington Armanelli,
Rizza Araujo Porto, Terezinha Nardelli, Maria Azeredo passos, Nelson Hortmann, Onolita Peixoto,
Marina Couto, Beatriz Costa e Wilson Chaves.
170

Essa primeira seleção de livros para as bibliotecas das escolas primárias causou
certo desconforto entre os professores, autores e editores. Em agosto de 1967, a
Comissão do Inep/DNE escreveu um longo relatório em resposta à carta do professor
Theobaldo Miranda Santos, que manifestou restrições aos livros de leitura selecionados
pela Comissão de Seleção, que considerou influenciada pela “missão pedagógica norte-
americana” em alusão aos membros que participaram do PABAEE. Em 13 de dezembro
desse ano, os editores da série Alegria de Ler, da Abril Cultural, solicitaram um novo
estudo crítico de seus três volumes que foram excluídos da seleção.
Em 14 de setembro de 1967, o Colegiado da Colted criou a Assessoria da
Avaliação, procurando centralizar o processo de avaliação dos livros didáticos.
Vinculada a Assessoria da Avaliação seriam constituídos três grupos de trabalhos, com
técnicos indicados pelos órgãos do MEC, dos diferentes níveis de ensino (elementar,
médio, superior). Essa medida visava agilizar o processo de seleção de títulos e dar
uniformidade ao acervo. Por solicitação do Diretor Executivo Ruy Baldaque, a
Comissão de Seleção do Inep/DNE reexaminou, em outubro de 1967, a relação de
títulos selecionados para as bibliotecas das escolas primárias em abril daquele ano. O
novo exame visava à formação e distribuição de mais dez mil bibliotecas. Em 6 de
outubro de 1967, o resultado final da revisão foi encaminhado à Colted.
O próximo passo da Comissão foi selecionar livros para a composição de mil
bibliotecas para escolas normais. Em 31 de outubro de 1967, Elza Nascimento Alves
encaminhou ao Diretor da Colted, os nomes dos especialistas147 que participaram da

147
Os novos especialistas eram:
* Cândida Luiza Cerne de Carvalho – Técnica de Educação do Inep e professora de História e Filosofia
da Educação da Escola Normal Carmela Dutra;
* Eunice da Conceição Macedo Rosa – Professora de Português, integrante da equipe de assistência ao
ensino primário MEC-USAID;
* Heloisa Feital dos Reis – Orientadora de Recreação no Setor de Ensino Primário do Estado da
Guanabara, professora de Educação Física e Recreação no Curso Normal do Instituto de Educação;
* Leny Werneck Dornelles – Professora de Teoria e Prática da Escola Primária na Cadeira de Prática de
Ensino do Curso de Formação de Professores para o Ensino Normal do Instituto de Educação da
Guanabara;
* Maria Augusta Joppert – Professora de Educação Musical e Artística, chefe do Serviço de Educação
Musical da Secretaria e Cultura da Guanabara de 1955 a 1967;
* Maria Helena Novais – Psicóloga do Instituto Superior de Estudos e Pesquisas Sociais da Fundação
Getúlio Vargas, professora de psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro;
* Maria José Penna Firme – Técnica de Educação do Inep, professora de psicologia do Colégio Estadual
Camilo Castelo Branco;
* Maria Luiza de Almeida Cunha Ferreira – Professora de Psicologia Educacional do CRPE/MG,
professora do Instituto Central de Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais;
* Maria Vicentina de Campos Carvalho – Chefe do Setor Técnico da Campanha Nacional de Educação
Alimentar em Minas Gerais, professora da cadeira “Educação Alimentar” do curso para supervisores do
programa de educação e assistência alimentar de Minas Gerais;
171

avaliação, os critérios de seleção e a relação de obras indicadas. Foram chamados para


participar da Comissão alguns dos especialistas do CRPE/MG que tinham avaliado os
livros para as escolas primárias e foram convocados novos especialistas, docentes das
escolas normais e de faculdades de formação de professores, técnicos do Inep e MEC.
Para compor as bibliotecas das escolas normais foram selecionados livros das
seguintes áreas: Obras de referência; História e Filosofia da Educação; Psicologia;
Sociologia; Didática Geral; Prática de Ensino; Didática da Linguagem; Ciências
Naturais (Didática, Conteúdo, Biologia Educacional); Estudos Sociais (Didática,
Conteúdo); Matemática (Didática, Conteúdo); Português (Didática, Conteúdo);
Literatura Infantil e Folclore; Música; Recreação e pré-primário.
De acordo com o presidente do colegiado da Colted, Edson Franco, em Ofício
circular n. 2, de 8 de janeiro de 1968, a Colted havia cumprido a sua primeira “missão”
de adquirir e distribuir livros para pequenas bibliotecas dos três níveis de ensino148.

A II Semana de Estudos da Colted

A II Semana de Estudos foi realizada de 4 a 9 de março de 1968. Nessa semana


foram discutidas as metas já realizadas pela Colted e as metas a serem efetivadas. Os
debates centraram-se na discussão sobre a avaliação e o uso correto dos livros didáticos
em classe e sobre a utilização das bibliotecas-Colted. Nessa semana, a II Comissão que
discutiu o tema “Avaliação e utilização do livro-texto na escola primária”, teve como

* Newton Dias dos Santos – ex-professor de Ciências do Colégio Pedro II, professor Catedrático de
Metodologia de Ciências do Instituto de Educação da Guanabara, professor de Zoologia e Metodologia de
História Natural e Ciências da Faculdade de Filosofia da Universidade Gama Filho, professor de Biologia
e Metodologia das Ciências da Escola Normal Carmela Dutra, professor de Zoologia e Didática Especial
de História Natural e Ciências da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade do Distrito
Federal, professor de metodologia das Ciências em cursos de aperfeiçoamento do Inep, professor em
cursos de aperfeiçoamento de Metodologia das Ciências da Secretaria de Educação de Minas Gerais;
* Norma Cunha Osório – Professora da Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Guanabara,
integrante da equipe MEC/USAID de assistência ao ensino primário;
* Lidinéia Gasman – professora do Colégio Pedro II, professora de Didática de História da Faculdade
Nacional de Filosofia;
Permaneceram os especialistas da Comissão Inep/DNE: Terezinha de Jesus Casasanta, Maria Onolita
Peixoto, Nair Ferreira Tulha e Maria José Berutti (Fonte: Arquivo histórico do Inep).
148
Para escolas de nível primário foram distribuídas 5 mil bibliotecas; mil bibliotecas para escolas
supervisionadas pelo Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário; 100 bibliotecas para escolas
técnicas de ensino médio; mil bibliotecas para escolas de nível médio; 300 bibliotecas para escolas
técnicas de ensino comercial; 100 bibliotecas para escolas técnicas agrícolas; 530 bibliotecas para escolas
de nível superior (Ofício circular n. 2, de 8/1/1968).
172

coordenadora Lúcia Marques Pinheiro149, como relatora Maria Yvone A. de Araújo e as


assessoras - Anamira Barros Evangelista e Marília Vellozo150. Participaram, também,
delegados dos estados e observadores151.
O documento final apresentou recomendações gerais e específicas, por áreas do
currículo, em relação à seleção e uso do livro no ensino primário. Em um primeiro
momento a II Comissão definiu o conceito de livro-texto: “todo o livro que constituísse
suporte para o trabalho de educação escolar dentro de cada área do currículo”. Segundo
o documento, na seleção de livros deveriam ser levados em consideração:

a) Os resultados obtidos com o material enviado, do ponto de vista de


melhoria do rendimento escolar, controladas outras causas que influam nesse
rendimento.
b) As condições do aluno e do meio de onde provem, urbano ou rural, e
culturalmente desfavorecido ou não.
c) Adequação do material quanto à forma de apresentação ao professor leigo
ou diplomado e menos ou mais progressista.
d) A necessidade de harmonização das exigências técnicas a que deve
atender o livro e da adequação deste ao professor de maneira a elevar
gradualmente o nível do mestre, partindo da situação em que se encontra e
respeitando sua linha de interesse, mas não favorecendo a valorização do
livro pouco satisfatório (Documento final da II Comissão, 7/3/1968).

O documento demonstrava a preocupação com o novo público escolar, tanto


docente como discente, e a necessidade de aperfeiçoamento do professor. Sugeria,
ainda, que não fossem selecionados os livros únicos (que contém várias matérias
juntas), que os livros didáticos possuíssem manual do professor e a organização de uma
ficha de avaliação de livros-texto, exemplificando cada critério sugerido, baseada nas
recomendações indicadas na II Semana de Estudos, para uso da Comissão Nacional, das
comissões estaduais e dos professores. Sugeria, por fim, que a Colted organizasse
material que orientasse os professores quanto a utilização dos livros em classe.
A II Comissão apresentou recomendações específicas para as áreas de ensino,
compostas pelos seguintes delegados dos estados: Linguagem - Leonor Lezan, Jair
Simão da Silva, Jandira Ávila, Flávia Marcos Pimentel, Ivone Atalaécio, Yeda Dias da
Silva, Cecília Bueno dos R. Amoroso, Maria Mirna Souto Maior Sarah e Moema

149
A professora Lúcia Marques Pinheiro era coordenadora da Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério
(DAM) do CBPE e técnica do Inep/MEC, foi uma das signatárias do Manifesto Mais uma vez
convocados, de 1959.
150
Maria Yvone A. de Araújo, Anamira Barros Evangelista, Marília Vellozo eram técnicas do Inep e
MEC.
151
Os observadores foram: Edith Berner (USAID), Olimpio C. de A. Tabajara (Rio Grande do Sul) e
Magaly Suano (São Paulo)
173

Brasileiro; Matemática - Irene de Albuquerque, Norma Osório, Regina Almeida, Maria


Mercedes da Costa e Dinah Matos; Estudos Sociais - Maria Onolita Peixoto, Maria de
Nazaré, Terezinha Acioli Gama e Leda Cabral e; Ciências - Terezinha Nardelli
Cambraia e Diva Diniz Costa152.
De acordo com as recomendações, o objetivo da Linguagem na escola primária
era ajudar a criança a usar a língua em situações naturais de comunicação. A
comunicação eficiente era considerada fundamental para o sucesso profissional e a
integração do indivíduo ao meio. A tendência moderna buscava tratar a linguagem
como um todo, que seria desenvolvida pela vivência – ouvindo, falando, lendo e
escrevendo. No aspecto formativo o ensino da linguagem visava: enriquecimento de
experiências; formação de atitudes sociais; desenvolvimento da expressão. No aspecto
informativo visava a aquisição da mecânica da expressão oral e escrita. O livro-texto
serviria para desenvolver a leitura e ajudar na aquisição de habilidades básicas de
vocabulário e compreensão.
Os livros-texto de Estudos Sociais deveriam ter conteúdo que propiciasse o
desenvolvimento de valores (cidadania, honestidade, cooperação, gosto pelo estudo) e
habilidades de estudo (organização de esquemas, resumos, anotações). O conteúdo
permitiria a formação de novos conceitos, com informações precisas, apresentadas de
modo objetivo, sem estereótipos e preconceitos. Os textos não deveriam enfatizar
somente os aspectos descritivos, com nomes, datas classificações, etc. Deveria
apresentar às crianças o processo de interdependência do homem ao meio físico e
social. Deveria apresentar situações que levassem a estabelecer relações, desenvolver o
pensamento crítico, criador e a solução de problemas, principalmente aplicados a
situações da vida real. Era aconselhável a reunião dos textos em unidades, com
seqüências, conexões e de acordo com os programas oficiais. As histórias deveriam ser
interessantes e apresentados numa graduação de dificuldades que permitissem o
crescimento das habilidades da leitura. As ilustrações deveriam ser atraentes e

152
Os membros eram delegados dos seguintes estados:
Yeda Dias da Silva – Minas Gerais; Leonor Lezan – Curitiba/Paraná; Jair Simão da Silva – Santa
Catarina; Jandira Ávila – Santa Catarina; Flávia Marcos Pimentel – Secretaria de Educação do Acre;
Maria Ivone Atalécio de Araújo – técnica do Inep/MEC; Cecília Bueno dos R. Amoroso – São Paulo;
Irene de Albuquerque – Rio de Janeiro; Norma Osório – Rio de Janeiro; Regina Almeida – Minas Gerais;
Maria Mercedes da Costa – Piauí; Maria Onolita Peixoto – técnica do CRPE/MG; Maria de Nazaré –
Macapá; Terezinha Acioli Gama – Alagoas; Leda Cabral – Sergipe; Maria Mirna Souto Maior Sarah –
Roraima; Terezinha Nardelli Cambraia – Minas Gerais. Não foi Possível identificar de qual estado faziam
parte os professores Moema Brasileiro, Dinah Matos e Diva Diniz Costa.
174

adequadas, visando completar o texto. Os mapas deveriam ser atualizados. O livro


deveria orientar no sentido de valores democráticos, contribuindo para a formação do
cidadão nacional e internacional.
Em Matemática as recomendações indicavam que os livros-texto deveriam ter:
conteúdo atualizado, baseado nas melhores pesquisas e estudos; informações exatas que
levariam em conta as exigências sócio-culturais; conteúdo que atendesse a seqüência da
matéria; preocupação com a formação e desenvolvimento de conceitos matemáticos e
com o desenvolvimento de habilidades; vocabulário adequado ao nível da criança;
ênfase na aprendizagem por meio da compreensão, procurando despertar o espírito de
investigação, análise e comprovação; organização de atividades por meio de situações-
problemas; exercícios e problemas adequados ao nível da criança, que encorajassem o
pensamento; exercícios com dificuldades variadas e que sugerissem a aplicação dos
conhecimentos da matemática nas situações da vida. As ilustrações deveriam ajudar o
desenvolvimento de conceitos.
Segundo as recomendações de Ciências, o seu ensino visava levar a criança a
compreender conceitos científicos e generalizações que pudessem ser usadas na
interpretação do meio-ambiente; compreender e apreciar o progresso do mundo e
desenvolver o interesse pelos fenômenos científicos. Para alcançar os objetivos
indicados, os livros-texto deveriam: estar organizados em unidades bem desenvolvidas,
partindo do nível de da criança para conhecimentos mais elaborados; apresentar
informação atualizada; incentivar a auto-descoberta, o desenvolvimento da atitude
científica e da capacidade de solucionar problemas; levar a criança a raciocinar,
concluir, fazer associações e generalizar; explorar outras bibliografias; incluir a área da
saúde; apresentar ilustrações realistas e atraentes; evitar artifícios de atribuir a plantas,
animais ou coisas, personalidade e características humanas; estimular a atividade
criadora da criança; conteúdo apresentado em linguagem simples e direta, com
vocabulário adequado às crianças. O livro texto deveria ser acompanhado de guia de
orientação para o professor.
É interessante observar que as recomendações conferiam especial atenção à
estrutura dos livros didáticos, que deveriam estar organizados em Unidades, indicação
que vinha dos anos 1940, com a Reforma Capanema. Dava atenção, também, a forma
como as ilustrações seriam utilizadas e com o manual do professor.
175

A III Comissão discutiu o tema “Avaliação e uso dos livros em classe – nível
médio” e estava composto pelo coordenador Osvaldo Sangiorgi153, Nair Fortes Abu-
Merhy, relatora, Maria José de Oliveira, Cora Bastos de F. Rachid e Margarida F. da
Costa, assessoras, além dos delegados dos estados e observadores154. Em seu
documento final fez sugestões de normas para avaliação de livros-texto, dividindo-os
em uma ficha com dois itens - conteúdo e aspecto material:

Conteúdo
1. Atendimento aos princípios filosóficos preconizados na LDB.
2. Valor formativo.
3. Adequação aos objetivos visados, ao nível e interesse dos alunos.
4. Exatidão e atualização científica.
5. Organicidade
6. Apresentação didática da matéria.
7. Oportunidade de participação dos alunos no estabelecimento de sínteses,
esquemas e conclusões.
8. Apresentação de exercícios (jogos, testes, questionários) estimuladores do
raciocínio e da criatividade.
9. Atendimento a problemas de interesse regional, nacional e universal.
10. Sugestões de leituras, pesquisas e outras atividades.
11. Propriedade, clareza, objetividade e correção de linguagem.
12. Qualificação do autor, natureza do prefácio, sumário e/ou índice,
bibliografia.
13. Vocabulário das expressões técnico-científicas utilizadas.
Aspecto material
1. Formato, de preferência no alto e não ao largo, com espelho de leitura
adequado às técnicas tipográficas.
2. Acabamento: de preferência, brochurado e refilado.
3. Composição: tinta preta uniforme, tipos claros de fácil leitura e não muito
pequenos; títulos e sub-títulos em versal (caixa alta) ou redonda em negrito;
adequadas ao bom entendimento; espacejamento entre uma matéria e outra.
4. Impressão uniforme e nítida.
5. Boa disposição da matéria e capítulos bem proporcionados.
6. Papel branco e fosco de boa qualidade
7. Ilustrações funcionais pertinentes ao tema, sempre sobre assuntos pouco
conhecidos do leitor (Documento final da III Comissão, 7/03/1968).

153
O professor Osvaldo Sangiorgi foi um dos pioneiros nas discussões do “Movimento da Matemática
Moderna” no Brasil. Participou intensamente dos Congressos do Ensino de Matemática no Brasil,
realizados nos anos 1950 e, segundo Valente (2008, p. 596), consolidou sua posição a favor da
Matemática Moderna depois de participar de um estágio, em 1960, nos Estados Unidos. Foi um dos
idealizadores do Grupo de Estudos do Ensino de Matemática (GEEM), criado em 1961, em São Paulo e
que teve intensa atuação nas discussões sobre o ensino da Matemática no Brasil.
154
Os delegados dos estados eram: Martha Maria de Souza Dantas (Bahia); Judith Paiva e Souza (Rio de
Janeiro), Marcionilo Lins (Pernambuco), e Diva Vasconcellos da Rocha (Guanabara), Carlos Goldenberg
(Guanabara), Agostinho Minicucci (São Paulo)., Raul Cordula (Paraíba), Nelly Catunda da Cruz (Acre),
Dinamérico pereira Pombo (Guanabara), Gildete Santos Lisboa (Guanabara), Marliria Ferreira de Melo
(Rio Grando do Norte), Itália Zácaro Faraco (Rio Grande do Sul), Ruth Teixeira Vieira (Bahia), José
Antônio Tobias (São Paulo) e Isolda Bezerra de Meneses (Fortaleza).
Os observadores foram: Emerson Brown (USAID), Marilda I. Dias Alves (Rio de Janeiro), Eleide R. de
Lima (Rondônia), Alaíde Lisboa de Oliveira (Minas Gerais)
176

Novamente observava-se a preocupação detalhada aos aspectos materiais dos


livros didáticos.
A ficha de avaliação deveria ser acompanhada por um guia e adaptada às
diferentes disciplinas. Para cada item da ficha de avaliação seriam atribuídos valores
diferentes, em função de sua importância para a disciplina. A III Comissão sugeria
também, a elaboração de guia do professor com recomendações para melhor utilização
do manual. As orientações para avaliação e seleção de livros didáticos da II Semana de
Estudos, serviram como referência para um novo processo de avaliação dos manuais
escolares.

A seleção dos livros didáticos para alunos do ensino primário – Projeto Piloto

Para dinamizar a ação da Colted, em julho de 1968, Ruy Baldaque encaminhou


ao Ministro da Educação e aos membros da Comissão um relatório com as atividades
realizadas até aquela data e sugestões para melhorar os trabalhos do órgão. Terminada a
primeira etapa – de distribuição de livros para as bibliotecas -, a Colted centrava-se
agora na segunda etapa: distribuir livros didáticos para uso dos alunos nos três níveis de
ensino. A segunda etapa abrangia, ainda, cursos de treinamento para instrutores e
professores primários, que forneceriam subsídios para a melhor utilização do livro
didático em classe, buscando aumentar o “rendimento pedagógico das aulas e resultados
mais eficazes na aprendizagem do aluno” (Krafzik, 2006, p. 92). Segundo Krafzik
(2006), o curso funcionava também “como uma rede de divulgação ao fornecer
informações aos docentes sobre o programa da Colted” (p. 92).
Procurando agilizar as atividades, Baldaque apresentou um anteprojeto do novo
organograma da Comissão. Em relação à seleção de livros, a Assessoria Técnica de
Avaliação seria responsável por acompanhar os trabalhos e estabelecer normas e
critérios de avaliação de livros didáticos. A assessoria funcionaria em conjunto com a
Comissão Nacional de Avaliação (Conac), que seria a responsável pela avaliação final
dos manuais. Deveriam fazer parte da Conac, segundo o relatório, “nomes dos mais
qualificados nos vários campos”, que poderiam ser “recrutados nas várias localidades
do país” (Relatório da Direção Executiva da Colted, 7/1968).
177

Para realizar as avaliações, as diretorias de ensino dos estados deveriam criar


Comissões Estaduais de Avaliação (Ceac)155, que encaminhariam à Comissão Nacional
de Avaliação (Conac), as listas de livros selecionados pelos estados. A Conac realizaria
a seleção final das obras. Cada estado da Federação deveria ter, também, uma comissão
técnica relativa aos livros didáticos, as Comissões Estaduais do Livro Técnico e do
Livro Didático (Celteds)156.
Na impossibilidade de fornecer manuais para todos os alunos do país, a Colted
organizou um plano piloto, de caráter experimental, para o ano de 1968, com uma verba
de treze milhões de cruzeiros para aquisição e distribuição de livros didáticos aos alunos
dos municípios das capitais.
Em resposta ao anteprojeto, Cândido G. Paula Machado, presidente do SNEL,
elaborou documento questionando os itens considerados problemáticos e propondo
adequações. O documento foi lido na reunião do colegiado de 5 de agosto de 1968.
Sobre a avaliação, Machado questionou se a Colted atenderia realmente aos pedidos dos
professores ou se ela determinaria os livros que as escolas receberiam. Em 9 de agosto,
em reunião do Colegiado, os representantes ligados ao Inep e às secretarias de ensino,
encaminharam documento com suas conclusões em relação aos questionamentos da
SNEL. Nas conclusões, afirmaram que seria feita uma consulta prévia aos professores
sobre os livros que considerassem melhores. A lista com as indicações dos professores
seria encaminhada à Comissão Nacional de Avaliação, que elaboraria uma revisão dos
livros indicados.
Em outubro de 1968, Ary Leonardo Pereira157 encaminhou à Elza Nascimento
Alves, coordenadora do Grupo de Trabalho de Avaliação, recomendações sobre o
processo de avaliação dos manuais escolares:

1. Eliminar os livros de exercícios por se tratarem de material consumível,


sem possibilidade de aproveitamento no futuro e que não podem ser
considerados livro-texto, pois atendem apenas a aspectos do processo de
aprendizagem.
2. Eliminar os livros que, no cômputo Nacional, não atingiram 1.000 alunos,
pois até o presente momento não há condições que recomendem a sua
aquisição.

155
Em 25 de janeiro de 1968, a Colted encaminhou ao Ministro da Educação a proposta de Regimento
das Comissões Estaduais de Avaliação (Ceac).
156
Em 14 de maio de 1968, foi discutido no Colegiado da Colted o regimento das Celteds, que
começaram a ser criadas efetivamente a partir de 1969.
157
Diretor Executivo substituto da Colted.
178

3. Relacionar nos livros adequados os que possuem qualidades e conteúdo


técnico pedagógico especificado nas recomendações da II Semana de Estudos
COLTED.
4. Os livros que não atingirem 1.000 alunos, no cômputo Nacional, serão
estudados posteriormente a avaliação dos demais, tendo em vista o prazo para
o término dos trabalhos de avaliação que deverão ser encerrados em 29 de
outubro/1968.
5. Considerar as informações e considerações dos técnicos dos estados,
territórios e Distrito Federal, cujos pareceres, por escrito, deverão
acompanhar o Relatório Final do Grupo de Trabalho de Avaliação.
6. Cada técnico, representante do Secretário de Educação deverá estudar o
resultado da apuração da respectiva unidade da Federação, podendo também,
fazer a análise das indicações da região.
7. Seria de toda conveniência que o Grupo de trabalho elaborasse um
documento contendo as observações e estudos realizados durante o período
de avaliação. O presente relatório deverá se fundamentar nas recomendações
da II Semana de Estudos COLTED (Ofício de 18/10/1968).

A orientação para avaliação

Em fins de 1968 foi realizada a seleção e avaliação dos livros didáticos para os
alunos do ensino primário, sob responsabilidade do Grupo de Trabalho de Avaliação,
com técnicos de educação diretamente ligados à Colted. Para a avaliação dos livros
didáticos das escolas primárias a Colted organizou cursos de treinamento para os
técnicos estaduais, que orientaram, por sua vez, os professores do ensino primário a
selecionarem os livros-textos. O questionário para exame dos livros-textos pelos
professores foi enviado em agosto de 1968 para as Secretarias de Educação dos estados,
que deveriam encaminhá-lo aos estabelecimentos de ensino primário. Segundo
documento encontrado no Arquivo Histórico do Inep, o guia era constituído dos
seguintes itens:

I. Autenticidade
- O livro á autêntico, isto é:
A) Apresenta informações e fatos corretos e exatos?
B) É atualizado?
C) O autor e/ou editor são bem qualificados?
II. Adequação
- O livro é adequado, isto é:
A) Concorre para a realização dos fins da educação e dos objetivos do
currículo?
B) É apropriado a série a que se destina?
III. Apresentação
- O conteúdo do livro é bem apresentado?
A) Os princípios de aprendizagem foram observados no desenvolvimento do
material?
B) O conteúdo de cada capítulo é apresentado lógica e claramente?
179

C) O conteúdo é claramente resumido no índice?


D) Os apêndices são proveitosos?
E) Há inclusão de elementos auxiliares?
F) O índice é adequado aos alunos da série ou nível a que se destina o aluno?
G) Os auxílios visuais, como por exemplo ilustrações, quadros, mapas,
gráficos e tabelas, contribuem para esclarecimento do texto?
H) Apresenta uma seqüência e objetivos lógicos?
I) Pode o conteúdo ser reorganizado para ajustar-se aos planos do professor?
IV. Qualidade Material
- A qualidade do livro é aceitável?
A) As dimensões do livro são adequadas às crianças da série a que se destina?
B) A encadernação é forte e durável?
C) A encadernação é costurada?
D) A capa é atraente?
E) O papel é durável e opaco?
F) Os tipos são claros e de fácil leitura?
G) O tamanho das letras é apropriado à série?
H) A distribuição do conteúdo pelo livro foi bem planejada em cada página?
I) O espaço entre as linhas é apropriado?
V. Informações suplementares
A) Os recursos auxiliares para o professor são apresentados como parte da
edição do professor?
B) São fornecidos separadamente?
C) As atividades sugeridas são práticas e estimulantes?
D) O manual do professor reforça a apresentação do material do texto?
E) Fornece uma bibliografia útil para professores?
F) São fornecidos programas de avaliação?
(Ficha para avaliação do livro-texto, s/d.)

O guia de avaliação dos livros para os professores priorizava a análise da


estrutura dos livros didáticos, na apresentação - que deveria enquadrar conteúdos e
outros elementos auxiliares - e, na qualidade material, com os aspectos gráficos.
Seguindo os critérios, os livros foram inicialmente indicados pelos professores
primários, que responderam os questionários. As indicações dos professores foram
organizadas pelos técnicos estaduais que encaminharam ao MEC a relação de livros
didáticos considerados mais adequados aos estados. Em seguida, o Grupo de Trabalho
da Colted analisou tecnicamente os livros e forneceu um relatório sobre a avaliação,
seus critérios, a lista dos livros aprovados e recomendados para compra da Colted e a
lista dos não recomendados. O relatório final foi encaminhado ao Diretor Executivo
Ruy Baldaque, em 13 de novembro de 1968. Até aquele ano, 443 livros didáticos
haviam sido avaliados na soma total das áreas.
O Grupo de Trabalho da Colted estava dividido pelas áreas de ensino, sob
coordenação da professora Elza Nascimento Alves, do Inep, do professor Marcílio
180

Augusto Dias Velloso, técnico do DNE158 e da professora Lúcia Marques Pinheiro159.


As áreas foram compostas pelos seguintes professores:

Linguagem - Maria Lúcia de Freitas Kohn, professora de educação primária do


Instituto de Educação da Guanabara e da Cadeira de Pedagogia da Faculdade de
Filosofia da Universidade Estadual da Guanabara (UEG)160, ex-coordenadora de curso
da Campanha Nacional da Criança161 e ex-professora da Fundação João Batista do
Amaral162.
- Marina de Souza Lima Campelo, formada no curso Normal do Instituto de Educação
da Guanabara. Era professora primária, auxiliar de técnico de Educação da Secretaria da
Educação da Guanabara, coordenadora das Cadeiras de Didática de Linguagem e
Prática de Ensino, professora de Português e coordenadora geral na Escola Normal Júlia
Kubitschek. No Inep era professora de Didática da Linguagem e de Português do curso
de Formação de Supervisores. Era professora em cursos de Extensão e Aperfeiçoamento
do Instituto de Educação da Guanabara.
- Eunice da Conceição Macedo Rosa, formada no curso Normal do Instituto de
Educação de Belo Horizonte e no curso de Letras Neoclássicas da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de Minas Gerais, professora primária e de
Português no ensino médio.
Estudos Sociais - Ignes da Silva Oliveira, formada no curso Normal, no curso
de Administração Escolar e no curso de Formação de Orientadores Pedagógicos do
Instituto de Educação da Guanabara. Era professora primária, coordenadora de série
primária, técnica de Educação primária do MEC.
- Leny Werneck Dornelles, formada no curso Normal e no curso para Diretores de
Estabelecimentos de nível Médio do Instituto de Educação da Guanabara. Era
professora primária, professora do curso Normal de Metodologia de História e
158
Marcílio Augusto Dias Velloso era bacharel em Sociologia e Política. Era técnico de educação do
MEC, coordenador do Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário do DNE e coordenador do
Setor de treinamento de professores da Colted.
159
A professora Lúcia Marques não chegou a participar dos trabalhos da Colted por ter sido designada
para coordenação da “Operação Escola”.
160
Em 1975 a UEG tornou-se a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
161
A Campanha Nacional da Criança foi criada em 1953, com o objetivo de conscientizar o povo para “a
importância da saúde e educação da criança no Brasil e cooperar com os governos da União, dos Estados
e Territórios e com as instituições particulares de amparo à maternidade e à infância que mantêm obras
especificamente ligadas ao combate à mortalidade infantil e à infância” (Objetivos imediatos da
Campanha Nacional da Criança, 1953). A Campanha foi organizada no âmbito do Departamento
Nacional da Criança.
162
A Fundação João Batista do Amaral foi fundada em 1961 com o objetivo de ministrar curso de
alfabetização de adultos e de aperfeiçoamento de professores primários por meio da televisão.
181

Geografia, do Instituto de Educação da Guanabara, coordenadora Geral da Cadeira de


Prática de Ensino do Instituto de Educação da Guanabara e professora do curso de
formação de professores e supervisores do Inep.
- Maria da Glória Correa Lemos, formada no curso Normal do Instituto de Educação
da Guanabara e no curso de Pedagogia da Faculdade de Filosofia da Universidade do
Estado da Guanabara. Era professora da escola experimental Guatemala163 - do Inep,
diretora de escola primária estadual, professora de ensino médio no estado da
Guanabara, foi colaboradora no livro Estudos Sociais na Escola Primária, de 1962, do
Inep/CBPE;
Matemática - Madalena Pinho del Valle, licenciada em Pedagogia e advogada.
Era professora da Escola Normal Carmela Dutra164, do ginásio Estadual Orsina da
Fonseca, da Faculdade de Filosofia Santa Ursula e da Sociedade Pestalozzi. Foi
colaboradora do livro Ensinando Matemática a Crianças, de 1961, do Inep/CBPE.
- Maria Luiza Barbosa, formada no curso Normal do Instituto de Educação da
Guanabara e no curso de Pedagogia da Faculdade de Filosofia da Universidade do
Estado da Guanabara. Era professora de Didática da Matemática do Instituto de
Educação da Guanabara, coordenadora do Curso Normal do Colégio Imaculada
Conceição, professora do Ensino Supletivo da Guanabara.
- Elvira Pinho del Valle, licenciada em Pedagogia. Era professora do Instituto de
Educação, da Escola Normal Carmela Dutra e do curso de Formação de professores de
Prática de Ensino do CBPE/Inep.
Ciências - Newton Dias dos Santos formado pela antiga Escola de Ciências da
Universidade do Distrito Federal e Doutor em História Natural pela Faculdade Nacional
de Filosofia. Estudou com Oswaldo Frota Pessoa e participou com esse professor da
publicação do suplemento Ciência para todos, do jornal A Manhã, de 1948 a 1953.
Escrevia na seção Como ensinar Ciências, que oferecia sugestões práticas para
professores. Era professor de História Natural, ex-professor de Ciências do Colégio
Pedro II, professor de Biologia e Metodologia das Ciências da Escola Normal Carmela
Dutra, professor de Metodologia das Ciências em cursos de aperfeiçoamento do Inep e
163
Segundo Xavier (1999, pp. 83-84), a Escola Experimental Guatemala, criada em 1954, foi uma escola
laboratório de experimentação pedagógica, vinculada ao Departamento de Aperfeiçoamento do
Magistério (DAM), do CBPE. Xavier afirma que a Escola Guatemala foi “um celeiro de onde se
escolheram inúmeros profissionais para, por exemplo, lecionar no curso de formação de professores –
antigo curso normal – do Instituto de Educação, bem como para exercer funções de destaque em órgãos
da Secretaria de Educação” (1999, p. 84).
164
A Escola Normal Carmela Dutra foi criada em 1946. Era escola anexa do Instituto de Educação da
Guanabara.
182

da Secretaria de Educação de Minas Gerais. Autor de livros sobre prática da Ciências


para o ensino elementar. Foi um dos criadores do Centro de Ciências da Guanabara
(CECIGUA)165. Foi diretor do Museu Nacional de 1961 a 1963.
- Edna Ricake de Souza, formada pelo Instituto de Educação da Guanabara e em
História pela Universidade do Estado da Guanabara (1964). Era professora primária,
professora de Ensino Supletivo do Estado da Guanabara, professora de Ciências e
Biologia da Secretaria da Educação, professora do Centro de Ciências da Guanabara
(CECIGUA).
- Yvonne Fernandes Tempone, formada pela Escola Normal Carmela Dutra e pela
Faculdade Nacional de Filosofia (1964). Era professora primária da Guanabara,
professora de História Natural, ex-professora da Escola Experimental Guatemala - do
Inep, professora de Metodologia das Ciências da Escola Normal Heitor Lira, professora
de Ciências do Instituto de Educação da Guanabara.

Os avaliadores eram professores primários, professores de escolas normais e


faculdades de formação de professores, técnicos do MEC, Inep/CBPE ou da Secretaria
de Educação da Guanabara.
Os representantes das Secretarias de Educação dos estados colaboraram com a
Colted, na análise dos questionários apurados, indicando os livros recomendados e não
adequados ao estado, e fornecendo sugestões para solucionar os casos das escolas que
encaminharam os questionários sem a indicação de livros didáticos.
O relatório final apresentou as avaliações individuais dos manuais, mas também
uma apreciação global dos livros nas diversas áreas, com o objetivo de identificar as
deficiências mais freqüentes e indicar medidas para o aperfeiçoamento dos livros-texto.
A avaliação dos manuais foi feita por meio de uma ficha padrão que serviu para todas as
áreas. Os livros foram enquadrados em três categorias: insuficiente, regular e bom.
A ficha de avaliação dos livros-texto compreendia os seguintes itens:

165
O Centro de Ciências da Guanabara (CECIGUA) foi criado no Rio de Janeiro, em 1965, por Fritz de
Lauro, Newton Dias dos Santos, Oswaldo Frota-Pessoa e Ayrton Gonçalves da Silva. Segundo Silva
(2007, p. 14), na década de 1960, buscando melhorar o ensino de Ciências, a Diretoria de Ensino
Secundário do MEC promoveu a instalação de Centros de Treinamentos para Professores de Ciências em
vários estados. Além do CECIGUA, foram criados Centros em “São Paulo (CECISP), Minas Gerais
CECIMIG), Rio Grande do Sul (CECIRS), Bahia (PROTAP) e do Nordestes (CECINE)” (Silva, 2007, p.
14).
183

I – Linguagem – peso 3
1) Estilo
2) Estrutura
3) Vocabulário

II – Apresentação Material – peso 2

III – Conteúdo – peso 3


1) Filosofia básica
2) Organização
3) Autenticidade
4) Desenvolvimento
5) Atividades
6) Elementos auxiliares

IV – Manual do professor – peso 2

Cada item da ficha de avaliação deveria ser preenchido com pontos de 1 a 10. O
máximo de pontos alcançados por um livro seria 100. De acordo com o número total de
pontos obtidos, o livro didático era enquadrado em uma das três categorias:

Escalas:
1. mais baixo ou pior; 0 a 29 – categoria 1
2. media; 30 a 69 – categoria 2
3. mais elevada ou melhor 70 a 100 – categoria 3

Para o livro se enquadrar na categoria 2, o total de pontos obtidos deveria ser, no


mínimo de doze na área de Linguagem, doze na área de Conteúdo e seis na
Apresentação Material. Para se obter um “perfil” do livro, dentro de cada aspecto
haveria um enquadramento:

Linguagem e Conteúdo
Pontos Categoria
0 e 11 1
12 a 23 2
24 a 30 3

Apresentação Material e Manual para Professor


Pontos Categoria
0a5 1
6 a 14 2
15 a 20 3

A inclusão do manual do professor no processo de avaliação deve ser destacada,


pois era uma novidade no período. A necessidade do manual foi destacada em vários
momentos, nas recomendações da XXII Conferência Internacional de Instrução Pública,
184

na Primeira e Segunda Semanas de Estudos da Colted. Até então, a inserção do manual


do professor nos livros didáticos não era obrigatória.

As avaliações por áreas

Cada área do conhecimento elaborou uma apreciação geral dos livros didáticos
avaliados. Somente foram encontradas as avaliações detalhadas nas áreas de
Matemática, Linguagem e Ciências, dos livros da Editora do Brasil. Ao que tudo indica,
após divulgação do relatório do Grupo de Avaliação da Colted, essa editora, em janeiro
de 1969, solicitou o acesso aos pareceres específicos dos seus manuais, para que
pudesse corrigi-los.

Matemática
Nas apreciações gerais, os avaliadores dos livros de Matemática destacaram que,
apesar de os recentes livros publicados se preocuparem em fazer uma abordagem mais
moderna da matemática, a maioria dos autores não conseguiu atingir os objetivos.
Grande parte dos autores desconhecia o verdadeiro sentido da Matemática Moderna. No
entanto, consideraram a apresentação dos livros melhores, pois despertavam na criança
maior interesse pela Matemática e pela realização das atividades.
Nos aspectos positivos, os avaliadores apontaram a diminuição do livro único
com todas as matérias e o surgimento de livros específicos para o ensino da Matemática,
que ultrapassavam a informação e preocupavam-se em formar conceitos e desenvolver
hábitos, habilidades e valores. Nos aspectos negativos, encontraram deficiências em
relação ao conteúdo, linguagem e adequação (Apreciação final sobre os livros avaliados
de Matemática, 4/11/1968).
No relatório de avaliação dos livros da Editora do Brasil, alguns argumentos
contrários à aprovação foram:

Brasil, 2º livro – João Barbosa de Moraes.


O autor, embora se aproveite de situações, às vezes, interessantes, baseadas
na vida, não disfarça sua orientação de simplesmente informar, apresentando
regras prontas ao aluno, e que não permite o desenvolvimento de conceitos e
impede que a criança cresça na matéria. Isto pode ser observado nas páginas
126 e 127 onde o autor, ao apresentar as dezenas até 90 e ainda a centena, já
na pág. 128, se confunde e não alcança seu objetivo.
Os exercícios são em número insuficiente e pouco significativos.
185

O vocabulário matemático é impreciso. Por exemplo, na pág. 139 confunde


adição, que é operação, com soma, que é resultado da operação adição. Na
pág. 143 usa “casa” em vez de ordem.
As definições apresentadas são muitas vezes incompletas, como por exemplo
a definição de multiplicação na pág. 145, divisão, pág. 151, etc.

Nordeste, 1º, 2º, 3º, 4º anos – Maria Cecília R. A. Pessoa.


A coleção Nordeste foi rejeitada pela Comissão de Matemática pelos
seguintes aspectos negativos, em grau que a inutiliza:
- vocabulário matemático impreciso, como por exemplo: conta por operação,
soma por adição, etc.
- não permite o desenvolvimento de hábitos e habilidades de estudo,
iniciativa da criança ou criatividade, uma vez que oferece regras prontas e
definições;
- além da orientação deixar a desejar, o conteúdo apresentado sacrifica alguns
conceitos importantes que são sugeridos, às vezes isolados, como por
exemplo o conceito de múltiplo de um número na pág. 28, livro 4, onde a
autora se refere a número múltiplo ao invés de múltiplo de um número. Outro
exemplo é a definição de multiplicação na pág. 25 do livro 3: “multiplicar é
repetir um número quantas vezes o outro indica”;
- os recursos visuais apresentados não alcançam os objetivos visados (...).

Infância Brasileira, 2º livro – Olga P. Metting, etc.


Vocabulário inadequado para as crianças a que se destina. Apresentação de
conceitos errados (págs. 107, 110, 111).
Não há preocupação em conduzir a criança a tirar conclusões e formar
conceitos.
Vocabulário matemático falho (págs. 107, 109, 100).

Em geral os avaliadores criticavam os textos informativos, que apresentavam


regras prontas e definições incompletas, sem a preocupação com o desenvolvimento e
formação de conceitos; o vocabulário matemático impreciso; a falta de atividades para o
desenvolvimento de hábitos e habilidades de estudo e criatividade; falta de exercícios
variados e significativos; má distribuição dos conteúdos; má qualidade dos recursos
visuais.
A avaliação permite observar algumas questões que vinham sendo debatidas
desde os anos 1950 em outros países (principalmente Estados Unidos)166 e a partir de
1960, no Brasil, sobre a necessidade da renovação da metodologia do ensino da
Matemática, que ficou conhecido como Movimento da Matemática Moderna (MMM).
Segundo Valente, essa nova matemática era considerada uma “matemática para os
tempos da nova era tecnológica” (2003, p. 249), em período de desenvolvimento
industrial, que não iria mais priorizar o exagerado ensino de cálculos e de problemas.

166
Nos Estados Unidos da América o movimento de renovação do ensino da matemática foi
impulsionado pela preocupação dos estadunidenses com o avanço tecnológico russo, após o lançamento
do Sputnik, em 1957. Em 1958 foi fundado o School Mathematics Study Group (SMSG), que produziu
textos que tiveram aceitação em grande parte da América Latina (França, 2007, p. 37).
186

Esse movimento buscava fundamentação em novas áreas da educação, como a


psicologia da aprendizagem e a didática (França, 2007, pp. 35-38). Segundo França, os
defensores do MMM pretendiam “unificar o ensino da matemática por meio da Teoria
de Conjuntos, das Estruturas Fundamentais e a introdução de novos conteúdos” (2007,
p. 39). Propunham um ensino da matemática por métodos ativos e adequados as fases
de desenvolvimento da criança.
Vale lembrar que Osvaldo Sangiorgi, um dos grandes defensores da Matemática
Moderna no Brasil, que lançou em 1964 o livro Matemática: curso moderno, pela
Companhia Editora Nacional, foi um dos educadores que discutiu a avaliação e o uso de
livros didáticos no ensino médio, na II Semana de Estudos da Colted.

Ciências
Na área de Ciências, a avaliação buscou analisar se os livros consideravam os
aspectos metodológicos modernos do ensino de ciências, abordando os temas de modo a
estimular os alunos a “refletir, analisar, criticar, concluir, participar, tomar iniciativas,
realizar experiências, observações, etc.” Observaram-se a linguagem, a apresentação, a
natureza do conteúdo, a correção científica e a presença ou ausência de orientação ou
instrução para alunos e professores.
A primeira crítica do relatório dizia respeito aos livros de todas as matérias,
considerados deficientes. Os avaliadores destacaram que apenas dois livros
acompanhavam manual do professor. De modo geral, afirmavam que a maioria dos
livros mantinha um estilo usado “há vinte anos”, com excesso de matéria, exagero de
nomes técnicos, tipo “pontos”, úteis somente para a memorização, sem contribuir com a
construção da idéia de conhecimento científico. Apontavam que os autores tinham
pouco conhecimento de metodologia das ciências e da escassa bibliografia sobre o
assunto. Ressaltavam, por fim, que os autores de Minas Gerais “revelaram-se dotados
do espírito apropriado ao ensino das ciências e a escrever livros da matéria”
(Apreciação final sobre os livros avaliados de Ciências, 5/11/1968).
Em relação à avaliação específica dos livros da Editora do Brasil, os argumentos
de exclusão foram:

Ciências Naturais, 3º ano – Olga P. Metting, etc.


No caso do presente livro não foram atendidas as condições do item a),
incluindo-se o mesmo no item b), embora com menos exageros que outros do
mesmo estilo.
187

Na parte de botânica, por exemplo, constata-se maior número de minúcias


desnecessárias que nas demais partes, com exagero de noções morfológicas
tais como tipos de caules, posição de folhas no caule, partes do fruto, etc.,
sem nenhum sentido formativo. As ilustrações são apenas regulares e há
repetições de figuras seculares como a da página 34, polinização direta, de
planta inteiramente desconhecida entre nós. O livro deve levar o aluno a
participar na aquisição do conhecimento científico e do método de trabalho;
se o assunto é polinização, ele deve conduzir a criança à descoberta do pólen,
do seu papel e dos agentes polinizadores mediante contato com a natureza,
observações e experiências. Não há em todo o livro uma sugestão de
experiências ou observação a ser realizada. Há também algumas
impropriedades cientificas. Nada deixa entrever que seus autores tenham sido
bafejados por conhecimentos modernos de didática das ciências e os tenham
aplicado na feitura do livro.

Ciências Naturais. 4º ano – Lucília Paixão Passos.


Livro que não atende as condições do item a). Em estilo antiquado, sem
nenhuma orientação moderna, sem experiências ou observações, pouca
ilustração, exclusivamente expositivo, conteúdo inadequado.

Páginas Brasileiras, 3º e 4º livros – Ester Nunes Ribas.


Livros de conjunto de todas as matérias, com muita redução em ciências, o 4º
livro apenas com uma figura. Estilo superado, tipo “pontos” próprios para
decoração.

Na análise dos manuais percebeu-se que os avaliadores destacaram a presença de


minúcias desnecessárias, sem sentido para a formação dos alunos; ilustrações pouco
atraentes; falta de desenvolvimento para aquisição do conhecimento cientifico; livros
somente descritivos, para memorização; falta de sugestões de experiências e
observações; impropriedades científicas; utilização de didática e estilo ultrapassados;
excesso de nomes técnicos, conteúdo muito reduzido e, principalmente, não conheciam
as metodologias modernas do ensino de Ciências.
Para compreender o significado das críticas aos livros didáticos de Ciências é
preciso prestar atenção ao fato de que participavam da Comissão de Avaliação,
professores que estavam vinculados aos centros de formação de professores e a dois
projetos, o CECIGUA e a Escola Guatemala do Inep, que pensavam propostas de
renovação do ensino no Brasil. Além disso, o professor Newton Dias dos Santos, autor
do livro Práticas de Ciências (Guia de Ensino Elementar), pela Gráfica Olímpica,
discutia o ensino de Ciências com outros professores importantes da área desde o fim da
década de 1940, como Oswaldo Frota-Pessoa que escreveu um livro pela Caldeme,
como verificou-se no capítulo anterior, adotando novas propostas metodológicas para o
ensino de Biologia, com o ensino baseado na indução, na observação e nas experiências.
188

O ensino partiria do real, com as experimentações, para o abstrato; desse modo, os


alunos construiriam seu conhecimento.

Linguagem
Em Linguagem, a avaliação diferenciou as cartilhas e os livros dos demais
níveis. O manual do professor era praticamente inexistente, os que existiam eram pobres
de sugestões. A maioria era apenas a repetição do livro do aluno com as respostas dos
exercícios. Os manuais para professores dos livros destinados à alfabetização continham
falhas, com motivos para “incentivação completamente absurdos”.
Os avaliadores enfatizaram que as cartilhas apresentavam material gráfico de
baixa qualidade e não havia preocupação de usar tipos adequados às primeiras séries. O
processo silábico era pobremente apresentado, sem a possibilidade de criar e
desenvolver o hábito da leitura. O vocabulário era forçado, com nomes inventados para
satisfazer o trabalho fonético. A alfabetização tornava-se, de tal modo, irreal, lenta e
desinteressante. Os textos eram difíceis, com estruturas de linguagem que as crianças
não usavam, sem graduação das dificuldades de compreensão e longos. Alguns livros
continham erros de construção gramatical.
Segundo os avaliadores, os livros dos demais níveis apresentavam textos acima
do nível de compreensão a que se destinavam. Os textos eram baseados em Estudos
Sociais e Ciências, a moral não aparecia implícita, mas de forma opressiva, forçada. Os
textos que procuravam desenvolver valores de honestidade, cooperação, civismo eram
desinteressantes. Continham histórias trágicas, com mortes e desgraça, contrárias às
pesquisas no campo da psicologia. Os textos informativos eram enfadonhos, com
informações desatualizadas. Havia textos com erros de concordância, regência,
pontuação, etc.
Os textos extraídos de autores consagrados eram escolhidos sem critérios ou
objetivos. Em alguns livros os textos não eram transcritos integralmente, mas em partes,
o que lhes tirava o sentido e autenticidade. Por outro lado, certos livros transcreviam
textos muito grandes, com três a quatro páginas. Os exercícios eram ruins, dissociados
dos textos e levavam somente à memorização. O vocabulário era difícil, não usual,
dificultando a compreensão e interesse da idade, da realidade, o que levava o aluno a
não gostar do manual. Alguns livros não estavam atualizados em relação à ortografia
(Apreciação final sobre os livros avaliados de Linguagem, s/d).
Na avaliação dos livros da Editora do Brasil destacavam:
189

Nordeste (pré-cartilha) – Maria Cecília R. A. Pessoa.


(...) b. Orações sem verbo, depois de um parágrafo. Erro de estrutura, tanto
mais grave quanto mais baixo for o nível de ensino a que se destina, pois a
criança, ainda na fase inicial de aprendizagem da leitura e da escrita, vai fazê-
lo com mais dificuldade e de modo errado (págs. 15, 23, 24).
c. texto tolo e truncado. Palavras forçadas para introduzir o fonema desejado.
d. Textos sem elaboração adequada, como por exemplo os das págs. 20 e 21:
O rato aí roeu a rede?
Aí, onde?
Aqui, ele roeu o queijo.
Aqui, onde?
(...) f. Frase errada à pág. 18 (2x) e bolinha de gude muito grande mas
desaparecida no colorido da ilustração.
Pode-se dizer, concluindo, que o livro é muito pobre de vocabulário, com
erros e pouco interesse para a criança. Além disso, como adota o processo de
silabação, torna-se necessário que explore todos os sons de nossa língua, sem
o que o aluno não estará lendo.
Trabalha, por exemplo, com ga, go, gu, mas não faz referência a gue e gui.

Paulo e Dalila – Carmen Oliveira etc.


a. Processo em desuso, por apresentar inúmeros inconvenientes, entre os
quais: a semelhança gráfica pelo uso de fonemas exclusivos; a pobreza de
vocabulário; invenção de palavras e textos forçados para apresentar fonemas
...vê o ovo
Viva o ..., frases repetidas em quase todas as cartilhas a partir de 1902.
b. Ilustração desadequada em várias páginas (exs. Págs. 7 e 9).
c. Frases desconexas inseridas e repetidas de outras cartilhas (ex. pág. 13)

Minha Terra – Cartilha – Maria Antônia Andrade. Editora do Brasil.


Esta cartilha apresenta grande número de frases absurdas, completamente
desprovidas de sentido, como, por exemplo:
Pág. 11 – É de dia que o papai vê o veado.
Pág. 12 – Papai poupava a uva do povo.
- Ida não viu o papo do pai da Edi.
Pág. 28 – Vovó que não adula a Paula lavou o dedo do Adi. (...)

Terra dos Pinheirais. 2º livro. I. Ramos Azevedo, etc. Editora do Brasil.


Textos com erros sérios de regência, tratamento, plural, pontuação. Exemplo:
Pág. 11 – “Arredem-se pedras e paus, senão vos quebrarei”.
Pág. 14 – Florsinhas
Pág. 31 – Pintem a esfera (referindo-se ao círculo da Bandeira Nacional).
Os exercícios para avaliar compreensão seguem a costumeira rotina de
questionários que apelam apenas para a memória.

As críticas aos livros didáticos referiam-se a método de ensino ultrapassado


(silabação), preocupação excessiva com o ensino da gramática, ilustrações incoerentes;
exercícios sem conexão com o texto, inadequados e difíceis para o nível do aluno;
vocabulário inadequado; textos pobres, pouco criativos, pouco estimulantes; frases
absurdas e palavras forçadas para reproduzir o fonema desejado; frases desconexas;
190

textos acima do nível a que se destina; definição de conceitos errados; erros gramaticais;
erros de pontuação, acentuação e concordância.
As avaliações demonstraram que existia uma preocupação com os métodos de
alfabetização, o método silábico foi criticado e o exagero do ensino da gramática. A
preocupação com desenvolvimento do hábito da leitura era enfatizado, assim como a
crítica à memorização e o incentivo à interpretação. Segundo Lauria (2004, p. 156), a
partir da segunda metade dos anos 1950, críticas ao ensino da língua baseado na ênfase
da gramática, para o aprendizado e manejo da língua portuguesa se fortaleceram nos
meios educacionais. A língua começava a ser vista como “veículo de comunicação”. O
ensino da língua portuguesa passou, assim, a priorizar a prática da leitura e da produção
de textos. Essa era uma das orientações da II Semana de Estudos da Colted, em que
criança deveria usar a língua em “situações de comunicação”167.

Estudos Sociais
Na área de Estudos Sociais, poucos livros se encaixaram em boa classificação. A
crítica inicial era o predomínio do livro único com todas as matérias. Os livros não se
caracterizavam como sendo de Estudos Sociais, mas eram livros de “pontos”, com
respostas a questionários, que não possuíam leitura informativa, consistindo-se apenas
em textos para exercícios de linguagem e vocabulário. Alguns livros eram
exclusivamente glossários com definições, apresentavam textos estereotipados e
factuais. O conteúdo estava inadequado para o nível da criança. Os livros não seguiam o
método concêntrico – do próximo ao geral -, não atendiam aos interesses das crianças.
A linguagem era árida e pouco atraente, desestimulando a leitura.
Segundo os avaliadores, os livros enfatizavam a informação sobre a formação.
Os exercícios não levavam à reflexão, ao pensamento crítico e criador. Não
incentivavam a formação correta de conceitos, ao desenvolvimento de habilidades
básicas e atitudes positivas de iniciativa, interesse e participação. Os exercícios levavam
apenas à memorização, com a repetição do trecho lido. As ilustrações não auxiliavam a
compreensão do texto. A organização geral dos livros e sua apresentação material não
eram satisfatórias. Praticamente nenhum livro possuía manual do professor.

167
A ênfase na compreensão da língua como veículo de comunicação se estabeleceu definitivamente com
a Lei n. 5.692/71. Na organização do núcleo comum para o 1º e 2º graus a matéria responsável pelo
ensino da Língua Portuguesa é denominada Comunicação e Expressão.
191

A avaliação de Estudos Sociais finalizava com um item de sugestões, para


aprimoramento dos livros que apresentaram bons textos e conteúdos de informação
razoáveis. As sugestões indicavam a separação das áreas do currículo em livros
distintos; organização de cadernos de exercícios à parte; reestruturação dos exercícios –
eliminar os que fossem somente repetição do texto para memorização, as frases com
lacunas, as questões de outras áreas misturadas com questões de Estudos Sociais, -;
fazer revisão cuidadosa do texto; aumentar as dimensões das páginas dos livros; incluir
fotografias e maior número de ilustrações significativas; usar tamanho de letra e
espaçamento de linhas adequadas à idade e ao nível de escolaridade das crianças;
elaborar manual para o professor que orientasse quanto ao aproveitamento dos textos,
ilustrações, exercícios, sugestões de atividades extra-classe. Também sugeria incluir no
manual, metodologia, bibliografia para cada assunto, sugestões de atividades
globalizadoras e de materiais didáticos de fácil aquisição ou preparo a baixo custo
(Apreciação final sobre os livros avaliados de Estudos Sociais, 4/11/1968).

Na leitura das avaliações por área, foi possível destacar alguns pontos em
comum. As justificativas apresentadas permitiram elucidar os critérios adotados pelos
avaliadores. Métodos de ensino antiquados, falta de ilustrações adequadas, conteúdos
“pontuados”, sem desenvolvimento, conteúdos inadequados ao nível de ensino, falta de
incentivo ao raciocínio das crianças, exercícios de memorização, a predominância da
informação sobre a formação de conceitos, erros conceituais e de vocabulário, material
gráfico de baixa qualidade, eram os principais problemas descritos. As avaliações
criticaram o fato de os livros didáticos não desenvolverem hábitos, habilidades e
valores. Todos os relatórios condenaram o livro único e incentivaram a inclusão de um
manual do professor mais elaborado.
Os relatórios demonstraram que os avaliadores seguiam as renovações
pedagógicas, principalmente quanto aos métodos de ensino. A “Matemática Moderna”;
“os aspectos metodológicos modernos do ensino de ciências”, com a realização de
experiências e observações; “o método concêntrico – do próximo ao geral”, em Estudos
Sociais, o fim do “método silábico” de alfabetização, a compreensão da língua como
veículo de comunicação faziam parte dessas inovações.
Como foi possível observar, os avaliadores eram pessoas que pensavam a
educação nas suas áreas de ensino. Grande parte dos avaliadores formaram-se pelos
Institutos de Educação ou pela Faculdade Nacional e Filosofia. Praticamente todos os
192

membros da Comissão de Avaliação tinham participado dos projetos educacionais dos


anos 1950 e início dos anos 1960, dos trabalhos realizados no Inep, pelo CBPE e pelo
CRPE/MG, com ênfase nas discussões sobre o currículo e metodologias de ensino168.
Com base em debates sobre a necessidade de renovação pedagógica do ensino primário,
como o Programa de Assistência Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar
(PABAEE), elaboraram propostas metodológicas e orientações curriculares que
introduziam “o método global de alfabetização, a introdução da matemática moderna, a
integração de matérias como Estudos Sociais e Iniciação a Ciências com base no
método científico” (Souza, 2008, p. 246). Souza afirma que o PABAEE teve um
importante papel na difusão do campo do currículo no Brasil, “pela ênfase dada ao
planejamento e ao desenvolvimento de currículos” (2008, p. 248). Além do PABAEE,
participaram do CECIGUA, de escolas experimentais, como a Guatemala, que eram
laboratório de experimentações pedagógicas. Os educadores que participaram da Colted
eram técnicos do Inep e trabalhavam em meio a essas discussões. Desse modo é
possível compreender porque os critérios que nortearam a avaliação seguiram parte do
“pensamento pedagógico renovador” (Souza, 2008, p. 248).
É significativo verificar que os técnicos do Inep vinculados ao CBPE, ao
CRPE/MG e professores dos Institutos de Educação e faculdades de formação de
professores, especialistas em metodologia e didática de ensino, foram convocados para
organizar todos os projetos da Colted que se relacionavam com modelos educacionais –
esses educadores e técnicos eram considerados os especialistas em educação -,
participaram das Semanas de Estudo, das avaliações da Colted (desde as avaliações de
livros para as bibliotecas até a avaliação de livros para alunos) e dos cursos de
treinamento para os professores primários169.

168
Vale lembrar que a Caldeme e, posteriormente, a Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais
(DEPE) do CBPE, produziu manuais sobre o ensino primário e as diversas áreas do conhecimento, dentre
eles: Introdução ao Estudo do Currículo da Escola Primária, de João Roberto Moreira, publicado em
1955; Linguagem na Escola Elementar (1955), Ciências na Escola Elementar (1955), Ciências Sociais
na Escola Elementar (1955), Matemática na Escola Elementar (1955), Jogos Infantis na Escola
Elementar (1955), Música para a Escola Elementar (1955).
169
Em 30 de agosto de 1968, Carlos Corrêa Mascaro, Diretor do Inep autorizou a participação de técnicos
daquele órgão no seminário que a Colted promoveria com o objetivo de traçar as diretrizes para os cursos
de treinamento dos professores primários sobre a avaliação e utilização do livro-texto. Participaram do
seminário: Lúcia Marques Pinheiro, Elza Nascimento Alves, Maria Yvone Atalécio de Araújo, Norma
Dias da Silva, Maria Onolita Peixoto, Regina Almeida e Terezinha Nardelli. Participaram, ainda, as
professoras Jacira Calazans de Campos, Diretora da Escola de Demonstração e Clarisse Mariano,
Orientadora Pedagógica do CRPE/SP.
193

As repercussões do processo de avaliação dos livros didáticos pela Colted

Tendo em mãos os resultados da avaliação dos livros didáticos, Ruy Baldaque


encaminhou ao Presidente da Colted um relatório sobre a execução do plano piloto.
Segundo o relatório, na análise dos questionários respondidos pelos professores
primários verificou-se que eles eram despreparados para a escolha do livro didático: “as
indicações dos professores (das capitais!) basearam-se, muitas delas, em catálogos de
publicidade, sem obedecer a qualquer critério de qualidade ou até mesmo de simples
atualização – pois várias das obras sugeridas deixaram de ser editadas há mais de vinte
anos!” (Relatório de 28/11/1968).
Na avaliação dos livros, os resultados mostraram a má qualidade da grande
maioria das obras adotadas. Diante da análise realizada, Baldaque estabeleceu três
princípios fundamentais para a aquisição de bons livros:

1. A exemplo do que ocorre em todos os países do mundo ocidental, deverá a


COLTED adquirir, tanto no presente Plano Piloto, como no futuro, só os
livros que forem previamente aprovados por equipes de avaliação
devidamente constituídas, em âmbito estadual e o nacional. Assim torna-se
imprescindível uma comissão permanente de avaliação para dar continuidade
aos estudos iniciados. O trabalho de análise dos títulos terá por objetivo
fornecer elementos para que os próprios autores e editores, alertados para o
problema, tenham a preocupação de rever e aprimorar as edições dos livros
didáticos.
2. A partir do Plano Piloto, todos os livros didáticos adquiridos deverão,
obrigatoriamente, ser acompanhados dos respectivos manuais do professor.
3. Qualquer programa de distribuição de livros deverá ser acompanhado de
cursos de treinamento para professores, a fim de fornecer a estes orientação
indispensável à boa utilização dos livros didáticos nas diversas séries e áreas,
respeitando-se as características de cada Região ou Estado (Relatório de
28/11/1968).

Um fato importante destacado pelo relatório de Baldaque era a recusa da


Secretaria de Educação do estado de São Paulo em participar do plano piloto. Os
questionários do estado de São Paulo não foram reenviados para a Colted de modo
organizado e correto e não foi indicado um representante do estado para o curso de
treinamento de instrutores.
No Diário Oficial de São Paulo, de 21 de setembro de 1968, o Deputado estadual
Salim Sedeh fez pesadas críticas à forma como a escolha dos livros para alunos das
escolas primárias seria efetuada pela Colted. Segundo o deputado, a Comissão
desrespeitava o direito de os professores fazerem livremente a escolha de seus livros
194

escolares, que constariam de uma lista publicada pela Comissão do Livro Escolar.
Contudo, a Colted, por meio de delegados dos estados organizou uma lista dos livros
que poderiam ser escolhidos e caso o livro que o professor indicasse não constasse
dessa lista, a Colted indicaria um outro livro escolhido por ela. O deputado questionava,
ainda, o fato de que nenhuma editora pode comparecer às reuniões de seleção dos livros
para apresentar suas obras, com exceção da IBEP, que esteve em todas as reuniões
apresentando seus manuais. Para o deputado, a editora IBEP foi privilegiada no
processo em detrimento de outras editoras.
A Colted escreveu carta ao Secretário de Educação de São Paulo, procurando
esclarecer os questionamentos do deputado Salim Sedeh, que não surtiram o efeito
desejado, pois em 25 de outubro de 1968, o Secretário de Educação de São Paulo,
Antônio Barros de Ulhôa Cintra170 informou à Direção Executiva da Colted que São
Paulo não participaria da seleção dos livros didáticos, pois aquele estado iria estudar
“até que ponto iniciativa como a da Colted (...), em nome de uma política eventual,
oferece contribuição válida à filosofia e à política de educação definida pelo Estado de
São Paulo”. O estado de São Paulo pretendia, ainda, em acordo com o MEC, centralizar
no próprio estado as tarefas de avaliar, selecionar e distribuir os livros didáticos da
Colted.
Em 5 de novembro de 1968, a Colted recebeu um ofício do Secretário de
Educação de São Paulo, solicitando que não fossem adquiridos os livros indicados pelos
professores daquele estado. Somente participaram do plano piloto as escolas municipais
e particulares da cidade. A atitude da Secretaria de Educação de São Paulo estava
relacionada com a recusa daquele estado em se submeter a uma seleção centralizada em
âmbito federal. É importante observar, ainda, que nessa época estava ocorrendo a
reforma do ensino primário paulista, implementada na gestão de José Mário Pires
Azanha como Diretor Geral do Departamento de Educação e visava, segundo Souza
(2008), “a democratização do ensino elementar e ginasial” (p. 246).
O relatório do Grupo de Avaliação desencadeou, também, discussões internas no
colegiado da Colted. Na reunião do Colegiado de 6 de dezembro de 1968, o Presidente
da SNEL questionou a profundidade da avaliação. Ele não se posicionou contrário à
avaliação, mas destacou que 284 títulos haviam sido rejeitados, causando grande
impacto para as editoras. Segundo ele, o colegiado da Colted não havia decidido a

170
Antônio Barros de Ulhôa Cintra era reitor da USP e foi um dos criadores da FAPESP.
195

realização de uma avaliação dos aspectos pedagógicos dos livros didáticos, mas
somente dos aspectos ideológicos e materiais. Argumentou ainda, que os critérios e
procedimentos adotados na avaliação deviam ter sido previamente discutidos e
aprovados pelo colegiado.
Em resposta ao SNEL, a professora Elza Nascimento destacou que o Grupo de
Avaliação tinha autonomia para elaborar os critérios e que o relatório não era
conclusivo, mas estava aberto para considerações. Esclareceu que os aspectos
ideológicos, “filosóficos constitucionais-democráticos” foram focalizados na análise
filosófica dos livros, tanto quanto os aspectos econômicos e materiais. Explicou ainda
que os critérios adotados para a avaliação dos manuais escolares correspondiam a
“moderna didática das matérias de ensino primário”. Os avaliadores não poderiam
aprovar manuais elaborados segundo uma didática “obsoleta”. Por fim, enfatizou que os
aspectos ideológicos não eram os únicos a serem considerados. Existia toda uma
filosofia da educação recomendando o que se pretendia obter com o processo educativo,
com a qual os livros deveriam ser coerentes. Após os esclarecimentos, o Colegiado
aprovou os critérios e a avaliação feita.
As editoras que teriam livros adquiridos pela Colted eram:

1. J. Ozon, Editor 14. IBEP


2. Editora do Brasil 15. Editora do Mestre
3. Série “Cadernos Didáticos” 16. Gráfica Editora Aurora
4. F. Briguiet & Cia 17. Livraria São José
5. Editora Minerva 18. Conquista – Emp. Publicações
6. Editora Elyas Ltda 19. Editora e Distribuidora de Livros Escolares
7. Casa Mattos 20. Editora Bernardo Álvares
8. AGIR S. A. 21. Companhia Editora Nacional
9. Editora Vozes 22. Editora Paulo de Azevedo
10. Tecnoprint Gráfica S. A 23. Livraria José Olympio Editora
11. Ao Livro Técnico 24. Companhia Melhoramentos de São Paulo
12. Editora Globo 25. Companhia FTD Editora
13. Bruno Buccini Editor
(Ata da 18ª reunião do Colegiado da Colted, 13/12/1968).

Segundo relatório do Diretor Executivo de 3 de junho de 1969, a Colted adquiriu


no Plano Piloto de distribuição de livros didáticos, para alunos da escola primária,
5.952.426 volumes de livros didáticos, com gasto de dez milhões de cruzeiros,
atendendo a todas as escolas dos municípios das capitais e a cerca de 3.011.532 alunos.
196

A Colted em 1969 até sua extinção em 1971

Em fins de 1968, a Colted começou a realizar o Programa de Treinamento de


Professores Primários – Plano Piloto, que pretendia melhorar a seleção e utilização dos
livros didáticos. As diretrizes do programa foram elaboradas por um grupo de trabalho
formado por professores catedráticos do Instituto de Educação do Estado da Guanabara,
técnicos da Colted e do Inep. Baseando-se nas conclusões desse Grupo de Trabalho
foram organizados os cursos de instrutores. Os cursos tinham a finalidade de fornecer
ao professor “elementos para melhor utilização do livro didático em classe,
proporcionando maior rendimento pedagógico das aulas e resultados mais eficazes na
aprendizagem do aluno”171.
O curso inicial foi realizado em novembro de 1968. Os cursos seguintes seriam
realizados em janeiro, fevereiro, março e abril de 1969. Os instrutores formados no
primeiro e segundo cursos deveriam expandir o programa, e realizar novos cursos de
treinamento nos municípios das capitais. De acordo com Munakata (2006, p. 83), dois
manuais foram produzidos para os cursos: Como utilizar o livro didático, elaborado por
Samuel Pfromm Netto, Nelson Rosamilha e Cláudio Zaki Dib, sob a forma de instrução
programada, e O livro didático: sua utilização em classe, elaborado por um grupo de
“especialistas nas diversas áreas do ensino primário”, que apresentava “modernas
técnicas didáticas-pedagógicas [sic] para a utilização do livro-texto”.
Em janeiro de 1969, foi nomeado pelo então Ministro da Educação Tarso Dutra,
um novo Diretor Executivo para a Colted, o Coronel Ary Leonardo Pereira. A pauta da
reunião de 28 de maio do Colegiado da Colted destacava a continuação na distribuição
dos livros para alunos dos municípios mais importantes de cada estado, o andamento
dos cursos de treinamento de professores nas capitais e o ante-projeto do manual de
serviços da Colted. Este último tratava da falta de organização do pessoal técnico e
administrativo da Comissão e propunha uma reestruturação da Colted que desse maior
organicidade e estabelecesse melhor o entrosamento dos órgãos e atividades realizadas,
“levando a uma frutífera e tranqüila cooperação entre todos os seus elementos”.
Munakata (2006) relata um episódio ocorrido em 1969, sobre uma denúncia
anônima contra o livro O livro didático: sua utilização em classe, afirmando que a obra
“pregaria ‘a educação em base socialista-radical, materialista’, o que ‘contraria

171
Relatório do Direor Executivo da Colted para o Presidente do Colegiado da Colted, de 28/11/1968.
197

frontalmente os fundamentos filosóficos da Constituição do Brasil’” (p. 83). Segundo o


pesquisador, o acontecimento “não teria sido mais que um episódio bizarro, não fosse a
época sombria de regime militar em que ocorrera” e pelo fato de o novo Diretor
Executivo da Colted, Ary Leonardo Pereira, ser coronel do Exército. Elza Nascimento
Alves, organizadora do livro, foi intimada a informar os “princípios filosóficos adotados
na elaboração do trabalho” e enviar à Direção Executiva “outros trabalhos de V.Sa., ou
dos demais colaboradores da obra em questão, que contenham princípios filosóficos”
(Munakata, 2006, p. 83). A resposta da professora, contendo dez páginas, foi
encaminhada em 27 de junho de 1969.
A resposta de Elza Nascimento Alves foi contundente e demonstrou sua
indignação com a atitude do Diretor Executivo de ter aceitado as acusações:

Só decidimos elaborar esta resposta em consideração ao pedido de V. Sa. que,


por motivos que ignoramos, resolveu tomar em consideração uma acusação
anônima, feita evidentemente de má fé, como poderia V. Sa. concluir pela
simples confrontação com nosso trabalho.
Quanto à segunda parte do pedido, esclarecemos que não temos nenhum outro
trabalho abordando temas de Filosofia da Educação (...) (Carta de Elza
Nascimento Alves para o Diretor Executivo da Colted, Cel. Ary Leonardo
Pereira, 27/6/1969).

Esse episódio, somado ao fato de o novo Diretor Executivo da Colted deixar de


ser um civil para ser um militar, evidenciava o recrudescimento do Regime Militar.
Em outubro e dezembro de 1969, o SNEL e a CBL enviaram documentos ao
novo Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, solicitando que o governo definisse sua
política em relação ao livro didático e a produção pelas editoras privadas. Solicitavam,
ainda, que o governo definisse sua política educacional sobre a gratuidade do ensino,
estabelecendo a distribuição de livros aos alunos. Com tais definições a Colted poderia
planejar e executar melhor suas atividades. O documento questionava, por fim, o
Decreto-lei n° 979, de 20 de outubro, que modificou as atribuições da Fename,
encarregando-a de editar livros didáticos. Para o SNEL e a CBL o decreto-lei revelava a
intenção de se criar uma “Editora do Estado”, que competiria de modo desigual com as
empresas privadas. Solicitavam, assim, esclarecimentos sobre o decreto-lei. Não foram
encontrados documentos de resposta à solicitação.
No ano de 1970 os trabalhos da Colted continuaram, como se verificou no ofício
de 24 de julho, encaminhado à Companhia Editora Nacional, que continha uma lista de
livros que seriam adquiridos referentes ao Programa do Livro para o Aluno, ao
198

Programa de Expansão de Bibliotecas - Colted (3ª etapa) e ao Programa de


Complementação de Biblioteca - Colted.
Oliveira et al. (1984), afirma que em 1971, a Colted passou por um processo de
“escândalos”, relacionados às transportadoras, editoras e fabricantes das caixas que
montariam as bibliotecas. Os autores dão exemplos de operações ilícitas, como o caso
de caixas de livros didáticos que continham catálogos de telefone para justificar o peso
e o número de material que seria distribuído, beneficiando as transportadoras (Oliveira
et al. 1984, p. 56). Krafzik (2006, p. 118), em entrevista com o vice-presidente da
SNEL, General Propício Alves, afirma que para Alves, a dificuldade na distribuição dos
livros didáticos foi um dos grandes problemas da Colted.
Em 5 de março, o Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, constituiu uma
Comissão de Inquérito, por meio da Portaria n° 6, encarregada de “apurar
irregularidades ocorridas na Colted” (Oliveira et al. 1984, p. 57). Em 5 de abril do
mesmo ano, o Ministro Jarbas Passarinho criou, por meio da Portaria n° 178, um grupo-
tarefa encarregado de apresentar um projeto de reestruturação dos órgãos responsáveis
pela formulação de políticas do livro, sua confecção, distribuição, assistência à
biblioteca e elaboração de material escolar. O trabalho do grupo deveria indicar, quanto
ao INL, Colted e Fename, a necessidade de permanência desses órgãos de modos
distintos ou a absorção integral ou parcial de atribuições de um por outro, visando
alcançar melhor produtividade e baixar os gastos públicos. O grupo era integrado por:
Ivan Pontes, secretário da Campanha Nacional do Livro; Maria Arruda Baccarat,
assessora técnica da Fename; Benedito Carlos Gouvêa de Medeiros, representante da
Colted e Maria Helena Rangel Geordane, assessora do INL.
A portaria n° 178 do Ministro da Educação indicava a preocupação do governo
em reduzir e controlar os órgãos responsáveis pela política do livro. A Colted foi
extinta, de tal modo, em 9 de junho de 1971, por meio do Decreto n° 68.728, e suas
funções foram incorporadas ao Instituto Nacional do Livro.

Algumas considerações

A análise da Colted, sua estrutura interna, seus debates, a avaliação dos livros
didáticos e a relação com o SNEL, suscitaram algumas reflexões. O órgão foi criado
para responder a algumas questões que estavam em pauta no fim dos anos 1950 e início
dos anos 1960, como a obrigatoriedade do ensino primário, que ampliava o número de
199

alunos e professores nas salas de aula. Evidenciava-se a preocupação com as camadas


populares, os novos alunos que não possuíam uma cultura letrada e eram carentes
financeiramente. Além disso, era preciso incentivar e regular o mercado didático
brasileiro em acentuada expansão.
Para efetivar os projetos da Colted, foram recrutados especialistas em educação
que se dedicavam à educação no período anterior à Ditadura Militar. Esses sujeitos
encaminharam as discussões na Comissão, de acordo com questões que traziam de suas
participações no cenário educacional brasileiro. A Colted foi criada na Ditadura Militar,
mas em um momento que ainda possibilitava o debate de projetos para a educação,
antes do recrudescimento do regime com a imposição do Ato Institucional n. 5. Nesse
contexto, os projetos para os livros didáticos foram debatidos e defendidos pelos
membros da Colted, principalmente pelos que faziam parte do Inep, dos cursos normais
e faculdades de formação de professores. Esses sujeitos levaram para o debate duas
questões: propostas de novos livros, com modelos pedagógicos pensados nos anos
1950; e a adequação desses livros ao novo público escolar - originário das camadas
populares, que não tinham acesso à escola – e aos novos professores172, que precisavam
dar conta desses alunos.
A Colted correspondeu em parte ao que era esperado pelo mercado de didáticos,
pois os avaliadores dos livros para as bibliotecas e dos livros para os alunos, analisaram
as obras à luz dos debates pedagógicos da época e barraram grande quantidade de
livros, considerados “defeituosos”. A Colted tornar-se-ia a grande impulsionadora do
mercado de livros escolares, mas exigia, em contra partida, a qualidade dos livros
didáticos. E isso não agradou a SNEL e as editoras, que precisariam reformular seus
manuais. Somava-se, ainda, o fato de as editoras receberem verba pública, que
estimulava a atividade editorial, mas não reduzirem os preços dos livros, como era
esperado pelo Programa – o objetivo do “livro bom e barato” não foi alcançado
(Relatório de 8/1968, do Diretor Executivo da Colted para o Ministro da Educação).
O processo de avaliação da Colted pretendia começar a estabelecer um padrão
de qualidade para o livro didático, seja em relação aos modelos pedagógicos em debate

172
Segundo Batista (2002, p. 559), o grupo profissional docente nos anos 1960 também estava em
processo de expansão. Em 1959, os professores de nível médio eram cerca de 67 mil, em 1963,
ultrapassavam os 100 mil. Esses novos professores, consumidores dos livros didáticos, eram, “em sua
maior parte, jovens adultos, formados por uma Faculdade de Filosofia ou uma Escola Normal”.
Decorriam, “predominantemente, das frações inferiores e intermediárias das classes médias”, seus pais
eram “médios e pequenos comerciantes, funcionários públicos, empregados de escritório” (Batista, 2002,
p. 559).
200

no período, ou nos aspectos materiais e gráficos. A avaliação da Colted propunha


mudanças físicas e de modelos pedagógicos dos manuais. Contudo, muitas editoras não
conseguiam responder as novas exigências, pois não possuíam, ainda, obras com as
inovações de conteúdo e mesmo às inovações gráficas. As editoras mantinham livros
didáticos com modelos pedagógicos considerados antiquados pelos avaliadores.
Por outro lado, observou-se que a desorganização e a falta de pessoal qualificado
na Comissão fizeram com que os processos demorassem a ser realizados. Tudo era
muito grande e demorado. A Colted foi extinta porque não correspondeu à expectativa.
Tornou-se muito criteriosa na seleção dos livros escolares e, ao mesmo tempo, lenta e
desorganizada no encaminhamento das atividades. Não era um órgão “racionalizado e
eficiente”. O mercado cresceu com a Colted, mas não se expandiu como era esperado,
pois as pequenas editoras precisavam de maiores auxílios financeiros para competir com
as grandes editoras (Relatório de 8/1968 do Diretor Executivo da Colted para o Ministro
da Educação).
Com o fim da Colted iniciou-se a política de co-edição de livros didáticos do
Estado com o mercado de didáticos, expandindo-se definitivamente. Contudo, o
crescimento do mercado de livros escolares e a co-edição com o governo se
desenvolveu sem um controle rigoroso da qualidade das obras que seriam editadas e
adquiridas, como será observado no próximo capítulo.
201

CAPÍTULO IV

OS PROCESSOS DE CO-EDIÇÃO DE LIVROS DIDÁTICOS E A REFORMA


EDUCACIONAL

Como já foi apresentado no primeiro capítulo desta tese, o INL foi criado em 21
de dezembro de 1937, pelo governo Vargas, por iniciativa do Ministro da Educação
Gustavo Capanema, por meio do Decreto-lei n° 93. Inicialmente, tinha o objetivo de
editar obras literárias raras que contribuíssem para o desenvolvimento cultural da
população, elaborar uma enciclopédia e um dicionário nacionais, baratear e melhorar a
edição de livros no país e incentivar a organização e manutenção de bibliotecas públicas
em todo o território nacional (INL, 1987, p. 5).
Com o Decreto n° 68.728/71, o INL se tornou responsável pela produção,
edição, aprimoramento e distribuição de livros técnicos e livros didáticos,
encarregando-se de definir as diretrizes do programa editorial e os planos de ação do
MEC. O órgão, desde maio de 1971, por meio da Portaria n° 307-BSB173 do Ministério
da Educação, já era responsável pelo sistema de co-edição de livros com as editoras
nacionais. A partir do Decreto n° 68.728, o livro didático estava incluído no programa
de co-edição com as editoras. Nesse momento a direção do INL estava sob
responsabilidade de Maria Alice Barroso.
Com a co-edição, o INL passou a desenvolver o Programa do Livro Didático
(PLD) e seus desdobramentos, dentre eles o Programa do Livro Didático para Ensino
Fundamental (PLIDEF) e o Programa do Livro Didático para Ensino Médio (PLIDEM).
De acordo com Oliveira et al. (1984, p. 58), o PLIDEF estabelecia com mais detalhes os
seus objetivos: co-editar livros didáticos para as matérias do núcleo comum do ensino
de 1º grau; distribuir os livros co-editados para as escolas públicas, por meio do
convênio com as Secretarias de Educação dos estados; proporcionar o barateamento dos
livros; colaborar no aperfeiçoamento do padrão técnico-pedagógico do professor
brasileiro, com a distribuição do manual do professor; implantar o Banco do Livro,
buscando prolongar a vida útil dos manuais. Os objetivos do PLIDEF determinavam,
também, a seleção e avaliação dos livros didáticos, visando estimular suas qualidades.

173
As instruções da Portaria n° 307-BSB, estabeleciam que o INL adquiriria pelo menos um quinto da
edição de um livro, que não poderia ser inferior a cinco mil exemplares.
202

Com o PLD sob responsabilidade do INL, pretendia-se fazer prevalecer, na seleção dos
títulos a serem co-editados, critérios técnicos e pedagógicos (Oliveira et al., 1984, p.
58).
Com o término do convênio MEC/SNEL/USAID, a contrapartida dos estados
tornou-se necessária. Para isso foi implantado o sistema de contribuição financeira das
unidades federadas para o Fundo Nacional do Livro Didático, com a intenção de manter
o fornecimento de livros para os alunos carentes. Com o sistema de co-edição, segundo
Höfling, “de censor oficial dos livros didáticos usados nas escolas brasileiras, o Estado
foi assumindo também o papel de financiador dos mesmos livros” (1993, p. 20).
Contudo, o sistema de co-edição não conseguiu resolver a questão do preço dos
livros didáticos, que continuou elevado. As editoras não vendiam os livros co-editados a
preço de custo, como era esperado pelo Programa (Oliveira et al. 1984, p. 60). Oliveira
et al. (1984) afirmam que durante toda a década de 1970, várias propostas foram
elaboradas para tentar contornar os problemas advindos da política do livro didático.
Nos meios parlamentares, vários projetos foram apresentados ao Congresso Nacional. A
maioria dos pronunciamentos e sugestões dizia respeito à necessidade de “padronizar o
livro didático, estabelecer um tempo fixo para sua utilização ou padronizar seus preços”
(Oliveira et al. 1984, p. 60).
As obras inscritas pelas editoras no INL para co-edição com o PLIDEF eram
encaminhadas ao Departamento de Ensino Fundamental (DEF) do MEC para avaliação
técnico-pedagógica. Ao inscrever as obras, as editoras pagavam uma taxa de avaliação
para cada exemplar enviado ao INL. No entanto, com a promulgação da Lei n° 5.692
em 11 de agosto de 1971 - que reestruturou o sistema educacional do país, fixando as
diretrizes para o ensino de 1º e 2º graus -, o DEF divulgou, em dezembro de 1971, as
Normas para análise e seleção de livro-texto para o ensino de 1º grau174.
É importante ressaltar que a implantação da lei n. 5.692/71, consolidava alguns
pontos da Constituição de 1967, em relação a obrigatoriedade do ensino e a
descentralização dos sistemas de ensino. A Constituição de 1967 também pretendia
responder a questões colocadas no fim dos anos 1950 e início dos anos 1960, sobre a
necessidade de popularização do ensino secundário. Ela estabeleceu que o ensino dos
sete aos quatorze anos seria obrigatório para todos e gratuito nos estabelecimentos
primários oficiais (Art. 168, § 3º, item II). Determinou, ainda, que os estados e o

174
Os documentos analisados neste capítulo foram localizados no Arquivo Histórico da Companhia
Editora Nacional/IBEP.
203

Distrito Federal organizariam os seus sistemas de ensino (Constituição de 1967, Art.


169).
Desse modo, por meio da Lei n° 5.692, o ensino primário e o ensino ginasial
foram unificados, sob a denominação de 1º grau, com duração de oito anos e obrigatório
para crianças e adolescentes dos sete aos quatorze anos. A nova legislação acabou com
o exame de admissão, que era considerada uma das maiores barreiras para o acesso ao
ensino secundário e que contribuía para a elitização desse nível de ensino. Com a
criação do 1o grau e a obrigatoriedade desse nível de ensino, instituía-se definitivamente
a expansão do ensino. O novo público escolar, que já vinha aumentando desde o fim
dos anos 1950 cresceria enormemente a partir da década de 1970175.
Pela nova lei, o ensino colegial tornou-se o 2º grau, com três ou quatro anos de
duração, com características profissionalizantes. Com a profissionalização e a
habilitação técnica, pretendia-se dar um caráter de terminalidade a esse nível de ensino.
De todo modo, para ingresso no ensino superior, após o término do 2o grau, o jovens
deveriam prestar o exame vestibular, que tornou-se classificatório176.
Segundo Martins, a lei n° 5.692/71 e a lei n° 5.540/68, que estabeleceu a reforma
do ensino superior, integravam a reforma educacional da Ditadura Militar, que
reestruturou todo o sistema educativo brasileiro, alterando as finalidades da educação e
as características “institucionais das escolas e universidades” (2003, p. 143). As duas
reformas foram planejadas simultaneamente e faziam parte de um mesmo processo de
reorganização da educação que, em conjunto com a implantação da Educação Moral e
Cívica como disciplina escolar, buscava conformar o novo público que estaria nas sala
de aula (Filgueiras, 2006).
As medidas para reestruturação da educação, regulamentadas a partir de 1968,
foram efetivadas em um momento marcado por intensa mobilização social,

175
Para se ter uma idéia do aumento das matrículas, Másculo (2002, p. 26) ressalta que no estado de são
Paulo o número de alunos matriculados no ginásio era de 360.000 em 1966 e aumentou para 977.000 em
1971. Em 1976 o número de matriculados no 1o e 2o grau na rede pública do estado aproximava-se de 4
milhões de alunos.
176
Até a década de 1960, o exame vestibular era eliminatório mas não classificatório, poderia ter acesso
ao ensino superior o candidato que alcançasse a nota mínima de aprovação na carreira. Contudo, como
enfatiza Celeste Filho (2006, p. 122), as universidades não possuíam vagas suficientes para todos os
candidatos aprovados. Os candidatos que eram aprovados mas não conseguiam se matricular eram
considerados excedentes. No final da década de 1960, o número de aprovados no vestibular era maior do
que as vagas nas universidades públicas. A solução para o problema do vestibular e dos alunos
excedentes era uma das reivindicações do movimento estudantil nessa época (Toledo, 2001, p. 249). A
Reforma Universitária de 1968, implantada com a lei n° 5.540, modificou o exame vestibular, que passou
a ser classificatório, seriam selecionados os alunos de acordo com as notas, até o preenchimento da
quantidade de vagas existentes. Desse modo a reforma eliminou os excedentes.
204

destacadamente da juventude no Brasil e no mundo177. Em conseqüência à ebulição


social, foi decretado, em dezembro de 1968, o AI-5 e o recesso do Congresso Nacional.
As reformas do ensino vinham no bojo das discussões sobre a necessidade de moralizar
a sociedade e a juventude brasileira e atualizar o currículo de acordo com as novas
exigências da sociedade.
Com a nova legislação, o ensino passaria a ter um currículo mínimo nacional,
em torno de um núcleo comum de matérias para os currículos de 1º e 2º graus, definido
pelo Conselho Federal de Educação que era o órgão responsável pela reforma178. Ele
estabeleceria indicações e pareceres sobre a doutrina do currículo na lei n° 5.692/71
(Martins, 2002, p. 54). O CFE deveria, além disso, interpretar a lei e normatizar as
definições da reforma.
Segundo Martins, o CFE teve destacada atuação no processo da reforma
educacional por ser um órgão “incrustado no Estado”, que utilizou a máquina legal para
agir e estabelecer um discurso sobre a educação, “definindo em grande medida, por
meio dos currículos prescritos, uma cultura escolar” (2002, p. 54). A doutrina do
currículo elaborada pelo CFE, tornou-se o elemento mais importante da reforma do
ensino de 1º e 2º grau. O núcleo comum para o 1º e 2º graus foi composto das seguintes
matérias: Comunicação e Expressão (Língua Portuguesa), Estudos Sociais179
(Geografia, História e OSPB) e Ciências (Matemática, Física e Biologia). Tornou-se
obrigatória, ainda, a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação
Artística e Programas de Saúde nos currículos de 1o e 2o graus
O Parecer n. 853/71 estabeleceu a doutrina do currículo e os objetivos das
matérias do núcleo comum, que foram diferenciadas em atividades, área de estudo e

177
O ano de 1968 caracterizou-se pelo “maio de 1968”, na França, a “primavera de Praga”, na
Tchecoslováquia, as manifestações contra a guerra do Vietnã, nos EUA. No Brasil destacaram-se as
manifestações “dos estudantes do restaurante Calabouço” e a passeata dos 100 mil, no Rio de Janeiro; as
manifestações em São Paulo no primeiro semestre de 1968, a “batalha” entre os estudantes do Mackenzie
e da FFCL da USP, em outubro desse ano, a realização clandestina do 30º Congresso da UNE, em Ibiúna,
etc.
178
O CFE era o órgão mais importante do Ministério da Educação. Dentre suas atribuições estavam:
decidir sobre o funcionamento dos estabelecimentos isolados de ensino superior, federais e particulares;
decidir sobre o reconhecimento das universidades; indicar as disciplinas obrigatórias para o ensino médio,
definir a amplitude e o desenvolvimento dos seus programas e estabelecer a duração e o currículo mínimo
dos cursos de ensino superior; adotar ou propor modificações e medidas que visem à expansão e ao
aperfeiçoamento do ensino; estimular a assistência social escolar, etc.
179
A proposta da criação da matéria Estudos Sociais era antiga, como foi destacado no capítulo 2 desta
tese. Carlos Delgado de Carvalho já discutia o ensino de Estudos Sociais desde os anos 1930. Durante os
anos 1950, esse tema foi debatido na Cileme e na Caldeme.
205

disciplinas180. Em Comunicação e Expressão, objetivava-se o cultivo da linguagem que


possibilitasse ao aluno o contato com diferentes tipos de comunicação, ressaltava-se,
igualmente, a importância da Língua Portuguesa como “expressão da cultura brasileira”.
A Língua Portuguesa era considerada o instrumento principal de comunicação, no
“duplo sentido de transmissão e compreensão de idéias, fatos e sentimentos”, sob a
forma de leitura, escrita e comunicação oral. Ciências pretendia desenvolver o
pensamento lógico e a “vivência do método científico”, com destaque às tecnologias e
suas aplicações. A Matemáticas e as Ciências Físicas e Biológicas teriam a finalidade de
“tornar o educando capaz de explicar o meio próximo e remoto que o cerca e atuar
sobre ele”, por meio do desenvolvimento do espírito de “investigação, invenção e
iniciativa, o pensamento lógico e a noção da universalidade das leis científicas e
matemáticas”.
Estudos Sociais procuraria ajustar o educando ao meio, “cada vez mais amplo e
complexo, em que não deve apenas viver como conviver” e seria atribuída ênfase ao
conhecimento do Brasil, “na perspectiva atual do seu desenvolvimento”. A Geografia
focalizaria a Terra e os fenômenos naturais “referidos à experiência humana”e, a
História focalizaria o “desenrolar dessa experiência através do tempo”. OSPB prepararia
para o “exercício consciente da cidadania”. Na prática, os Estudos Sociais unificou a
Geografia e História e passaram a ser ministrados como disciplina escolar em todo o 1o
grau, da 1a a 8a série. Somente no 2o grau a Geografia e História voltavam a ser
disciplinas autônomas, ensinadas separadamente181.
Martins (2003) enfatiza, que a definição de conteúdo escolar da reforma
5.692/71 apresentou uma nova concepção, que relacionava as informações das ciências
e suas operações lógicas: “nos programas das disciplinas escolares deveriam ser levados
em conta, além das indicações dos tópicos do conteúdo, as habilidades e as operações
mentais que favoreciam o ensino da matéria” (p. 150). Segundo a autora, o campo da
psicologia da aprendizagem foi utilizado para justificar a organização e gradação dos

180
Segundo o Parecer n. 853/71, “na seqüência de atividades, áreas de estudo e disciplinas”, partir-se-ia
do “mais para o menos amplo e do menos para o mais específico”. Nas atividades a aprendizagem se
desenvolveria sobre “experiências colhidas em situações concretas”; nas áreas de estudo “formadas pela
integração de conteúdos afins”, as experiências deveriam se “equilibrar com os conhecimentos
sistemáticos”; nas disciplinas, as aprendizagens se dariam “predominantemente sobre conhecimentos
sistemáticos”.
181
É importante assinalar que cursos superiores em Estudos Sociais foram criados, sob o modelo de
licenciaturas curtas, que possibilitava aos formados por esses cursos a habilitação para lecionar nas
escolas de 1o grau. Esse novos professores concorriam com os professores formados nas licenciaturas
específicas de História e Geografia.
206

conteúdos para a aprendizagem em relação ao “desenvolvimento das capacidades de


aprendizagem dos alunos” (Martins, 2002, p. 114).
Segundo Souza (2008), o currículo seguiu as orientações da abordagem
tecnicista em voga no campo, “dando ênfase aos objetivos gerais e específicos,
discriminando os conteúdos programáticos e sugerindo atividades” (p. 278). A
importância dada aos objetivos seguia a linguagem da Tecnologia Educacional que
valorizava a eficácia e a eficiência. A reforma n° 5.692/71 foi crucial para a mudança da
cultura escolar dos anos 1970, com a ascensão definitiva da cultura científica sobre a
cultura das humanidades, que já vinha perdendo espaço desde a LDB/61. Nas palavras
de Souza: “eram outros, os valores da sociedade cientifica e tecnológica no final do
século XX – a eficiência, a racionalidade, o pragmatismo, a rapidez, a aplicação
imediata, a objetividade e a funcionalidade do pensamento e das coisas (objetos e
produtos industriais)” (2008, p. 290).
As Normas para a análise dos livros didáticos de 1º grau procuravam adequar
os livros didáticos à reforma do ensino e às novas matérias. Seu conteúdo apresentava:
normas gerais; normas específicas segundo a LDB n° 4.024/61; normas segundo a lei n°
5.692/71 e normas para o manual do professor. De acordo com o texto, as normas foram
escritas para orientar a avaliação dos livros-texto naquele momento de implantação da
Lei n° 5.692/71, ao lado do Parecer 853/71, do CFE, que fixava as matérias do núcleo
comum para os currículos do ensino de 1º e 2º grau. Como a implantação seria gradual,
com a existência, por algum tempo, de dois sistemas de ensino, precisavam ser
avaliados livros destinados ao primário e livros para o 1º grau.
Os currículos escolares passavam por revisões, de acordo com os novos
objetivos da escolarização. Essas mudanças envolveram os livros didáticos, que
precisaram sofrer alterações para ajustar-se à nova orientação educacional. O núcleo
comum obrigatório modificava nomes e conceitos, que deveriam ser incorporados nos
livros. Desse modo, as normas de avaliação eram “específicas e bem definidas para os
livros do regime anterior” e “gerais e flexíveis para os livros do novo regime” (Normas
para análise e seleção de livro-texto para o ensino de 1º grau. DEF/MEC, dez. 1971).
A análise e avaliação dos livros-texto seriam feitas por uma comissão
denominada “Comissão de Análise e Seleção de Livro-Texto”, composta por dois
especialistas de cada disciplina, nomeados pelo Ministro da Educação. Os membros da
Comissão seriam indicados “dentre professores de reconhecida capacidade profissional
nas matérias de que tratam os livros, bem como reconhecida idoneidade moral no trato
207

de questões dessa importância” (Normas para análise e seleção de livro-texto para o


ensino de 1º grau. DEF/MEC, dez. 1971)182.
O INL estava responsável por: estabelecer os prazos de entrega dos exemplares
dos livros sujeitos à análise e apresentar o relatório final da avaliação. A comissão
avaliaria todos os livros encaminhados para apreciação do DEF. As disciplinas que
teriam livros avaliados e selecionados eram: Linguagem, Matemática, Estudos Sociais,
Ciências Físicas e Naturais e Educação Moral e Cívica. O manual do professor também
seria avaliado.
Na análise dos livros seriam considerados os aspectos de conteúdo e método de
ensino e os aspectos físicos, a tipologia das letras de acordo com as séries, a existência
de título, índice, prefácio, auxílios visuais, glossário, bibliografia atualizada e
indicações identificadoras do manual (editora, local de edição e data da edição).
As normas específicas, de acordo com a Lei n° 4.024/61, estavam divididas
pelas matérias. Os principais objetivos eram:

Linguagem:
Objetivos do ensino de leitura através dos livros de leitura – 1ª a 4ª série;
- levar o aluno ao domínio gradativo da mecânica de leitura e das habilidades
de compreensão;
- propiciar, ao aluno, interesse contínuo e crescente pela leitura através de
material rico, quer do ponto de vista artístico – literário, quer do ponto de vista
lingüístico e psicológico;
- levar o aluno a se realizar como leitor efetivo, capaz de buscar o livro pelo
prazer de ler;
- formar habilidades indispensáveis ao uso eficiente da língua, à expressão de
idéias, sentimentos e emoções.

Matemática:
Verificar-se-á se o livro texto de Matemática atende:
- à efetiva participação do leitor, na formação de conceitos, estabelecimento
de relações e descobertas das propriedades matemáticas;
- à aquisição das noções, processos operatórios e estruturas básicas,
fundamentadas na compreensão e seguida de automatismo;
- ao desenvolvimento do raciocínio;
- ao desenvolvimento das habilidades de computação;
- ao desenvolvimento do gosto pelo estudo da matemática;
- à habilidade de aplicação do conhecimento às situações novas;
- à habilidades de precisão.

Estudos Sociais
Entre os objetivos concernentes, verificar-se-á se o livro texto de Estudos
Sociais inicia o aluno no conhecimento:
- de como as pessoas vivem, trabalham e se relacionam;

182
Não foram encontrados mais documentos sobre os avaliadores.
208

- dos grupos humanos, sua estrutura e seus problemas;


- dos direitos e deveres de todo homem em relação aos outros homens e à
comunidade;
- das semelhanças e diferenças entre os diversos povos e das causas
determinantes dessas diferenças, levando o aluno a compreender que: todos
nós temos necessidades básicas; para suprir essas necessidades precisamos uns
dos outros;
- de relacionamento das pessoas e povos entre si e que da troca de serviços e
idéias dependem a paz e o progresso;
- o futuro da humanidade será conseqüência da contribuição das gerações
anteriores somada aos esforços da geração atual.

Ciências
Verificar-se-á se o livro texto de Ciências conduz o aluno a:
- adquirir conhecimentos científicos básicos;
- interpretar o meio ambiente;
- selecionar problemas;
- adquirir atitudes científicas;
- interessar-se pelo mundo em que vive;
- compreender o valor das ciências naturais dos cientistas e técnicos;
- aplicar os conhecimentos adquiridos em novas situações;
- desenvolver o pensamento crítico, reflexivo e criativo;
- redescobrir conhecimentos científicos;
- aplicar o método científico de investigação;
- valorizar a natureza sobre múltiplos aspectos.
(Normas para análise e seleção de livro-texto para o ensino de 1º grau.
DEF/MEC, dez. 1971).

Depois de esclarecidos os objetivos de cada matéria, eram especificados as


normas de cada série, divididas em: organização do conteúdo, ilustração, exercícios,
verificação, fixação e avaliação. O exemplo, a seguir, ilustra as normas específicas para
análise dos livros de Matemática na 2a série:

2a série
Quanto à organização:
- o livro texto da 2a série deverá apresentar pequenos textos relativos às
informações básicas contidas nos exercícios;
- dominar as informações básicas através de uma seqüência graduada do
conteúdo e das ilustrações;
- representar operações sempre acompanhadas de seu inverso.
-Quanto a ilustração:
- a seqüência e graduação deverão facilitar as conclusões;
- serão completadas por frases simples e de fácil compreensão;
- deverão sugerir elaboração, pelas crianças, de idéias matemáticas;
Quanto aos exercícios, verificação e avaliação:
- seguirão as normas da 1a série;
Quanto à fixação:
- cada informação básica deverá ser fixada com exercícios bem variados,
buscando a participação ativa do aluno na sua execução.
209

As normas específicas para avaliação dos novos livros de 1ª a 4ª série segundo a


Lei n° 5.692/71 utilizariam as indicações já estabelecidas pelas normas da LDB n°
4.024/61. Os novos livros compreenderiam, para cada área do currículo, uma série
abrangendo todo o curso de 1ª a 8ª série. A nova nomenclatura adotada para o núcleo
comum do 1º grau passou a ser:

• Comunicação e Expressão; Integração Social; Iniciação às Ciências;


Matemática – 1ª a 4ª série ou 5ª serie;
• Comunicação em Língua Portuguesa; Estudos Sociais; Ciências e
Matemática – 5ª ou 6ª à 8ª séries.

Os livros de todas as matérias deveriam estimular nos alunos o desenvolvimento


das capacidades de observação, reflexão, criação, discriminação de valores, julgamento,
comunicação, convívio, cooperação, decisão e ação. Cada série de livros deveria ser
acompanhada pelo plano do autor em relação a: filosofia da educação, teoria da
aprendizagem, concepção de estruturas da personalidade - níveis de dificuldade das
lições -, continuidade dos conteúdos, desenvolvimento psicológico do aluno, etc. Para
cada disciplina, de acordo com a lei n° 5.692/71, foram acrescidos alguns objetivos:

Comunicação e Expressão – [os livros] deverão favorecer o cultivo de


linguagem que possibilitem ao aluno o contato coerente com seus
semelhantes e a manifestação harmônica de sua personalidade nos aspectos
físicos, psíquico e espiritual.
- os livros de comunicação em Língua Portuguesa deverão revestir um
sentido também de “expressão da Cultura Brasileira”, sem conduzir a
exclusivismos.
Estudos Sociais – [os livros] deverão favorecer o ajustamento crescente do
educando ao meio, cada vez mais amplo e complexo, em que deve, não
apenas viver como conviver, e deverão enfatizar o conhecimento do Brasil,
na perspectiva atual de seu desenvolvimento.
Ciências e Matemática – [os livros] deverão favorecer o desenvolvimento
do pensamento lógico, à vivência do método científico e suas aplicações.
(Normas para análise e seleção de livro-texto para o ensino de 1º grau.
DEF/MEC, dez. 1971).

Os objetivos das matérias seguiam as recomendações da nova legislação escolar,


de acordo com o Parecer n. 853/71.
O manual do professor de qualquer matéria ou série deveria apresentar, entre
outras coisas: a compatibilidade entre os objetivos do livro texto, os conteúdos e o
método de ensino; conceitos básicos a serem alcançados; relacionamento das diferentes
disciplinas; sugestões de atividades, de trabalhos independentes e em grupos – em
210

classe e fora dela -; previsão de atividades relacionadas às diferentes fases do ciclo


didático, incluindo a avaliação; indicação de recursos suplementares; bibliografia para o
professor; textos de instruções metodológicas; orientação para avaliação. A presença de
um item exclusivo para a orientação do manual do professor, nas normas para análise
dos livros didáticos, demonstra que foram atendidas as sugestões apresentadas nos
debates da II Semana de Estudos da Colted e na própria avaliação dos livros didáticos
daquela Comissão, sobre a necessidade desse guia.
As normas para avaliação dos livros de 1º grau reforçavam a discussão sobre a
redefinição do currículo escolar, com ênfase nos objetivos gerais e específicos. As
matérias eram meio para que os alunos adquirissem habilidades e atitudes, capacidades
e comportamentos: de “desenvolver o raciocínio crítico”; de “apreciação, respeito e
valorização da pessoas”; ter “contato coerente com seus semelhantes”; de “favorecer o
ajustamento crescente do educando ao meio”; “em que deve, não apenas viver como
conviver”, etc. Segundo Souza (2008), essa mudança curricular retirava a centralidade
do ensino da aquisição do conhecimento, que “deixa de ser um fim da atividade escolar
e passa a ser definido como um meio” (p. 278). A seleção dos conteúdos dependia dos
objetivos estabelecidos para a formação das crianças e adolescentes.

A ficha e as avaliações

A ficha de análise dos livros didáticos para co-edição do PLIDEF era objetiva e
única para todas as matérias, constituída de partes distintas. No cabeçalho das fichas era
descrito o nome do livro, do autor, a editora e a série a que se destinava. Os critérios
estavam descritos e os pareceristas deveriam pontuar os livros de acordo com o
cumprimento ou não de cada critério. A ficha de análise para livros da 2ª a 8ª série era
dividida em quatro grupos (Produção Editorial, Produção Gráfica, Produção Didática,
Manual do Professor), que possuíam subitens:

!Produção Editorial (9% do total de pontos):


- Elementos de identificação (5% do total de pontos) – título, autor, edição,
ilustrador, ficha catalográfica. (1 ponto cada item);
- Elementos de enriquecimento da obra (4% do total de pontos) – prefácio,
sumário, glossário, bibliografia. (1 ponto cada item);

!Produção Gráfica (14% do total de pontos):


- Elementos de forma – corpo de letra (2 pontos), formato (1 ponto),
ilustrações (8 pontos), acabamento (1 ponto), papel (2 pontos).
211

! Produção Didática (52% do total de pontos):


- Elementos gerais de conteúdo (36% do total de pontos) – objetivos de
ensino (8 pontos), texto (14 pontos), recursos complementares ao texto: os
exercícios (10 pontos), recursos auxiliares (4 pontos);
- Elementos metodológicos (16% do total de pontos) – coerência
metodológica.

!Manual do Professor (25% do total de pontos):


1) Produção gráfica (3% do total de pontos) – corpo de letra, índice,
correspondência com as lições do livro do aluno (1 ponto cada item);
2) Produção metodológica (22% do total de pontos) – plano geral da obra (3
ponto), objetivos de ensino (3 pontos), sugestões de atividades (9 pontos),
conteúdo (4 pontos), recursos auxiliares (3 pontos).
(Fonte: Arquivo Histórico da IBEP/Nacional).

A ficha para as cartilhas, pré-livros, leitura intermediária e livros da 1ª série, não


possuía na parte da Produção Editorial a análise de glossário e bibliografia. As figuras,
a seguir, apresentam um exemplo de avaliação do DEF/MEC:
212
213

Um destaque da ficha de avaliação do INL era o item Produção Gráfica, que


estabelecia os novos tamanhos de livros que seriam aceitos: os formatos antigos de 14 X
21 (eram os livros existentes até o começo da década de 1960) e os novos formatos, de
16 X 23, 18 X 25 e 21 X 28 cm. Os livros com formato inferiores a 14 X 21 seriam
excluídos. Estabelecia, ainda, os tipos de letras por série: 2o livros (tipo 16), 3o livro
(tipo 14), 4o livro (tipo 12), 5o a 8o livro (qualquer tipo, resguardados os requisitos de
legibilidade). As ilustrações também eram consideradas importantes, recebendo oito
pontos na avaliação. Seria considera a adequação da ilustração ao conteúdo, sua
qualidade gráfica, distribuição equilibrada ao longo do texto e, se eram comunicativas.
Em relação ao Manual do Professor, a ficha detalhava os itens: explicitação da
orientação adotada, coerência com a legislação, com os objetivos de ensino e finalidade
da educação; coerência com o próprio desenvolvimento da obra; os objetivos gerais do
livro do aluno, os objetivos específicos por série, correspondência dos objetivos das
lições com o seu desenvolvimento; as sugestões de atividades deveriam ser coerentes
com os objetivos; graduadas, variadas, para fixação, para enriquecimento, para sanar
deficiências, para avaliação e, que apelasse para a criatividade do professor.
214

A pontuação das obras avaliadas seguia os seguintes critérios:

1. Produção editorial – 9 pontos


2. Produção gráfica – 14 pontos
3. Produção didática – 52 pontos
4. Manual do Professor – 25 pontos
Total geral – 100 pontos
(Fonte: Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP).

Cada livro poderia obter até 100 pontos. Para serem aprovados, os livros
precisavam obter ao menos 70 pontos no total geral, 53 pontos no livro do aluno e 10
pontos no manual do professor. No arquivo histórico da Companhia Editora Nacional
foram encontradas 35 fichas com avaliações de livros didáticos da editora. A relação, a
seguir, descreve as pontuações alcançadas pelos livros da Companhia Editora Nacional:

Livros recusados
19 obras fizeram menos de 69 pontos

Livros aprovados
8 obras fizeram de 70 a 79 pontos
5 obras fizeram de 80 a 89 pontos
2 obras fizeram de 90 a 100 pontos

Na análise das fichas da Companhia Editora Nacional, verificou-se que um dos


principais fatores de reprovação dos manuais era a má qualidade ou mesmo falta do
manual do professor. Outro fator de reprovação era a baixa pontuação no item
Produção Didática, que analisava o conteúdo, objetivo e método de ensino dos livros
didáticos. Na Produção Didática, os subitens que os livros didáticos menos cumpriam
eram: em Recursos complementares ao texto (atividades do aluno, exercícios e outros
trabalhos) - a) apelo a diferentes formas de atividades dos alunos; b) apelo à criatividade
do aluno; em Elementos metodológicos - c) coerência metodológica do processo
didático com: os objetivos de ensino, com conteúdo da obra, com a metodologia própria
da disciplina e com a ciência a que se vincula.
Como a ficha de avaliação não possuía nenhuma justificativa das notas aplicadas
aos diversos aspectos dos livros didáticos, não foi possível identificar quais eram,
exatamente, os problemas quanto aos aspectos metodológicos. A ficha de avaliação
possibilitou constatar, somente, que os avaliadores questionavam nas obras analisadas a
falta de relação entre os objetivos e conteúdos de ensino com a metodologia proposta.
Apesar disso, no subitem Recursos complementares identificou-se que foram
215

questionados os livros didáticos que não possuíam atividades e exercícios diferenciados


e que desenvolvessem a criatividade dos estudantes.
As avaliações do INL permitiram identificar algumas preocupação da época
quanto a produção dos livros didáticos. De acordo com Másculo (2008) e Batista
(2002), a partir da década de 1970 o formato dos livros escolares se modificou. Na
análise feita por Másculo (2008, p. 47), dos livros da coleção Sérgio Buarque de
Hollanda, de 1971, da Cia. Nacional, verificou-se o formato de 19 X 26 cm, com um
número significativo de imagens ao longo do livro183. Segundo Másculo, o novo
formato da Coleção Sérgio Buarque de Hollanda apresentava diagramação semelhante
as revistas da época, que “conferia aos livros didáticos um aspecto moderno e familiar
para seus leitores” (2008, p. 99). A qualidade da capa, imagens e o formato conferiam
ao livro uma “expressão de qualidade e de ‘luxo’” (2008, p. 99) e a diagramação da
coleção utilizava “os recursos mais elaborados da época” (Másculo, 2008, p. 103).
Másculo ressalta, ainda, que a editora pretendia, com o “novo formato e o acréscimo de
imagens, ‘aulas mais dinâmicas e motivadoras’” (2008, p. 88).
Sobre o manual do professor, Cassiano (2007, p. 159) destaca que a Ática foi a
primeira editora a criar esse tipo de livro, com orientações didático-pedagógicas para os
docentes e com as respostas das atividades do livro do aluno. Na Coleção de Sérgio
Buarque de Hollanda o livro do professor se preocupava com as orientações
metodológicas e os subsídios para as aulas de História (Másculo, 2008, p. 143).
Filgueiras (2006, p. 104), ao analisar os guias do professor dos livros de Educação
Moral e Cívica produzidos nos anos 1970, observou que apresentavam, de modo geral,
os objetivos da disciplina e o funcionamento do livro didático - as orientações para uso
do livro -, com a proposta metodológica do autor, sugestões de atividades para serem
realizadas em aula e exemplos de avaliação. Constata-se, assim, que o manual do
professor passou a ser preocupação real das editoras.
Ao analisar livros didáticos de História na década de 1970, Másculo (2008, p.
155) verificou a predominância de exercícios do tipo “testes” e questionários184. Nesse

183
Outros analisados por Másculo tinham os seguintes formatos: da Companhia Editora Nacional,
História do Brasil e História Geral, de Julierme de Abreu e Castro (1970), com 20 X 27 cm; da Saraiva,
História do Brasil para Estudos Sociais, de Esaú & Gonzaga (1974), com 16 X 23 cm; da Livraria Lê
Editora, História do Brasil, de Paulo Miranda Gomes, com 16 X 23 cm, etc. (2008, p. 67-72).
184
Segundo Másculo (2008, pp. 163-164) as questões objetivas, denominadas “testes”, baseavam-se nas
idéias de Ralph Tyler, que chegou no Brasil na década de 1970, por meio da difusão das obras de
Benjamim Bloom, seguidor de Tyler. Pra Tyler, os testes mais do que medir o conhecimento, verificava
“se os objetivos curriculares estavam sendo atingidos” (Másculo, 2008, p. 163). Com a proposta de
taxonomia dos objetivos educacionais, Bloom classificava os objetivos em “ordem crescente de
216

período, muitos livros apresentavam seqüências de atividades denominadas Estudo


Dirigido e Instruções Programadas185. Livros de praticamente todas as disciplinas
escolares propunham esses tipos de técnicas (Filgueiras, 2006, pp. 106-107)186. Segundo
Másculo, existia nos anos 1970 “quase um modelo editorial estabelecendo um conjunto
mais ou menos diversificado de exercícios sobre os capítulos estudados nos livros
didáticos”, que era seguido pela maioria dos livros didáticos (2008, p. 157). O livro de
atividades tornou-se um material praticamente obrigatório nos manuais escolares.
Segundo Cassiano (2007, p. 159), esse novo tipo de livro, com o caderno de exercícios,
o livro do aluno e o manual do professor, generalizou-se nessa época.
É possível entender, de tal modo, que a avaliação do DEF/MEC colaborava para
estabelecer um padrão mínimo para os novos manuais que surgiam, com definições do
formato dos livros, das ilustrações, atividades, exercícios e, com a presença obrigatória
do manual do professor, que deveria conter alguns itens específicos, como os objetivos
do ensino, o método utilizado, sugestões de atividades e respostas dos exercícios.
A avaliação do DEF/MEC seguia e procurava instituir, assim, as Normas para a
análise dos livros didáticos de 1º grau, de 1971, ao reprovar livros que não
apresentassem o manual do professor com as características descritas. Pretendia
modificar os exercícios (predominantemente de fixação e verificação), para exercícios
de reflexão e criatividade, fortalecendo a idéia das “habilidades e atitudes, capacidades
e comportamentos” e buscava dar maior ênfase à relação dos objetivos do ensino com a
proposta metodológica dos manuais.

complexidade (conhecimento, compreensão, aplicação, análise, síntese e avaliação)”. Com essa


classificação os professores elaborariam seus planejamentos de ensino, “considerando os objetivos que
mais tarde pudessem ser efetivamente avaliados e reformados” (Másculo, 2008, p. 164). No Brasil, os
teste padronizados começaram a ser usados nos vestibulares e concursos a partir da década de 1960. A
reforma do ensino superior, de 1968, que tornou o vestibular classificatório, reflete essa mudança do
modelo de avaliação, que precisava ser objetivo (Másculo, 2008, pp. 164-165).
185
As propostas de técnicas de ensino de Instrução Programada e Estudos Dirigidos se difundiram na
década de 1970. Segundo Prado (2004), existia uma confusão entre as propostas. O Estudo Dirigido,
prática que tinha origem na experiência das “classes novas” na França, criadas após a 2a Guerra Mundial,
a partir do projeto da reforma Langevin-Wallon, chegou ao Brasil nos anos 1970 (Prado, 2004, pp. 165-
166). A autora afirma que, no Brasil, a técnica do Estudo Dirigido baseava-se em organizar todo o
procedimento de aula do professor, com objetivos a serem alcançados, que difundiam hábitos, modos de
utilizar o material didático, etc. (2004, p. 166). A Instrução Programada, baseada nas pesquisas de
Skinner, era uma técnica em que os alunos realizavam atividades sem o acompanhamento do professor,
com o objetivo de organizar a assimilação individual e gradativa dos conhecimentos (Prado, 2004, p.
169).
186
No Banco de Dados LIVRES, foram encontrados livros didáticos de Estudos Dirigidos de Geografia,
Física, Português, Química, História do Brasil, História Geral, Matemática e Ciências. Em sua maioria,
datam dos anos 1970 e início dos anos 1980. Somente um livro, Estudo dirigido através de métodos
ativos: Geografia do Brasil, de Celso Antunes, é de 1968. Ao todo, o LIVRES possui 81 registros de
livros que apresentam em alguma parte do seu título a denominação “Estudo Dirigido”. Com o titulo
“Instrução Programada” foram encontrados três registros, todos de manuais de Português, dos anos 1970.
217

Após a avaliação, os livros poderiam corrigir as alterações indicadas pelos


avaliadores do DEF, devendo, contudo, serem re-encaminhados ao INL para análise
final. Somente depois da aprovação final os livros entrariam na Lista Oficial do
Ministério da Educação.

A participação dos estados

A Lista Oficial dos livros didáticos aprovados pelo DEF/MEC para co-edição
era enviada para as Comissões de Avaliação das Secretarias de Educação dos estados,
que selecionavam os que melhor se adaptavam ao trabalho educativo das suas escolas
(Portaria n° 518, de 10/9/1973). Como cada estado formulava seu próprio guia
curricular e programas de ensino, os livros precisavam atender às especificidades
estaduais. As editoras encaminhavam aos coordenadores do PLIDEF nas unidades
federadas cinco exemplares de cada título aprovado pela Lista Oficial do MEC, para as
avaliações estaduais. As comissões dos estados eram, além disso, responsáveis pela
supervisão e avaliação do Programa do Livro Didático. Posteriormente, as secretarias
enviavam ao INL a lista dos livros escolhidos para serem co-editados e distribuídos.
As obras publicadas em co-edição deveriam apresentar na primeira capa o nome
da editora, seguido da sigla MEC. A folha de rosto possuiriam a seguinte frase: “Em
convênio com o Instituto Nacional do Livro – Ministério da Educação e Cultura”. Na 4ª
capa apareceria o preço de venda ao público e a frase: “O preço deste livro só se tornou
possível devido à participação do INL-MEC que, em regime de co-edição, permitiu o
aumento da tiragem e conseqüente redução do custo industrial” (Portaria n° 518, de
10/9/1973).
Na documentação encontrada, foi possível conferir que em Minas Gerais, a
avaliação estadual dos livros didáticos era realizada pelo Departamento de Educação de
Estudos Pedagógicos, da Secretaria da Educação. Em São Paulo o Programa do Livro
Didático era coordenado pela Fundação para o Livro Escolar, órgão vinculado ao
Departamento de Ensino Secundário e Normal da Secretaria de Educação. A avaliação
dos livros didáticos desse estado era realizada pela Equipe Técnica do Livro e Material
Didático.
A ficha de avaliação dos livros didáticos de São Paulo era composta por itens
que detalhava a obra analisada, finalizando com um parecer geral de recomendação ou
exclusão. A ficha continha os seguintes itens:
218

Ficha de identificação – com número de processo, nome do livro, autor,


série, edição, data de edição, local de edição, editora;

I. Livro do aluno
A – Afeiçoamento Físico: Impressão, Encadernação, Marginação, Cor e
Ilustrações, Papel, Tipologia, Espaçamento;
B – Forma de Linguagem: Correção, Atualização, Adequação;
C – Conteúdo: Correção, Atualização, Adequação;
D – Metodologia;
E – Planejamento Pedagógico: Organização Vertical, Organização
Horizontal;
F – Filosofia de Educação;
G – Outros aspectos: Título, Índice, Prefácio, Glossário, Bibliografia;
H – Outras observações.

II. Manual do professor.


III. Recursos auxiliares.
Parecer geral
(Fonte: Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP).

Diferentemente da ficha de avaliação do DEF/MEC, a ficha do estado de São


Paulo era descritiva, cada item possuía espaço para se preenchido, como se observa, nas
figuras, a seguir:
219

Nas avaliações de São Paulo, encontradas no arquivo histórico da Companhia


Editora Nacional/IBEP foi possível identificar o nome de alguns pareceristas: Jocely
Soares187, Dalva Cunha Monteiro, Lucia Queiroz Telles, Rosa Maria Mesquita de
Raposo Medeiros, Hermas Gonçalves Arana188 e Hely Loureiro Paschoalick189
(supervisora da Equipe Técnica do Livro e Material Didático).
Das sete avaliações encontradas do estado de são Paulo, somente uma não
autorizava o livro didático, porque a obra encaminhada para avaliação estava no
“boneco” e não possuía manual do professor. Todas as outras avaliações aprovaram os
livros didáticos e indicavam “pequenas correções” em relação a aspectos gráficos (como
encadernação que deveria ser melhorada, tamanho da letra, etc.) e didáticos (livro do

187
Jocely Soares era professora e fez parte da criação da Associação Regional de Professores, de São José
de Rio Preto, em outubro de 1963.
188
Hermas Gonçalves Arana era pedagogo e professor de Filosofia. Foi membro da Equipe Técnica do
Livro e Material Didático de 1972 a 1975. Era professor da PUC de Campinas.
189
Hely Loureiro Paschoalick era professora e, atualmente, é autora de livros didáticos de Matemática
para o Ensino Fundamental I, pela editora IBEP.
220

professor mais eficiente, melhores recursos audiovisuais, frases incompletas,


explicações que deveriam ser melhor apresentadas, corrigir informações erradas, etc.).
Para o PLIDEF 1973/1974, foram aprovados livros didáticos das seguintes
editoras: Abril, AGIR, Alfa-Sigma, Ao Livro Técnico, Bloch, Editora do Brasil,
Caminho Suave, Conquista, EDART, FORMAR, FTD, Globo, IBEP, José Olympio,
Lemi, MESTRE, Companhia Editora Nacional, Primor, Record, Saraiva, Série
Cadernos Didáticos, Tabajara, Vigília, Ática, Bernardo Álvares, EDDAL, Liceu, LISA,
Vega e Vozes (Fonte: Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP).
Cada novo PLIDEF iniciava com a inscrição das obras e o pagamento da taxa de
avaliação, a análise dos manuais pelo DEF/MEC, lista encaminhada aos estados para
avaliação dos livros didáticos aprovados, e reenvio de lista para o INL com a relação
das obras que seriam co-editadas.
A partir do PLIDEF 1974/75 somente seriam aceitos livros didáticos
acompanhados de manual do professor. Os critérios para seleção dos livros
determinavam as novas regras do PLIDEF 74/75: não seriam aceitos isoladamente
cadernos de exercícios e atividades; não seriam aceitos livros de leitura complementar e
material áudio-visual; os livros deveriam englobar o conteúdo integral da disciplina para
a série determinada; não seriam aceitos livros para alfabetização de adultos e para o
período de pré-escolarização.

Algumas repercussões das avaliações

Em relação às avaliações dos livros escolares elaboradas pelo DEF/MEC,


durante a coordenação do INL, dois casos interessantes foram registrados e permitiram
observar que os resultados das avaliações não eram aceitos unanimemente e, em
algumas situações, eram questionados e modificados.
As obras Método misto do ensino da leitura e escrita: Estudando São Paulo,
Minha Abelhinha e Aventuras da Abelhinha e outras aventuras foram reprovadas na
avaliação do INL/DEF, de acordo com relação recebida em 8 de junho de 1973.
Recorrendo ao resultado da avaliação, a Companhia Editora Nacional, que editava as
obras, encaminhou ao INL um pedido de verificação dos instrumentos de avaliação dos
livros citados. A resposta do INL, de 20 de junho do mesmo ano, reforçou a reprovação
das obras e disponibilizou os resultados da avaliação. Sem concordar com a avaliação,
as autoras de Aventuras da Abelhinha e outras aventuras elaboraram uma contestação à
221

Comissão de Exame do INL, que foi encaminhada ao órgão em 13 de setembro de 1973.


Contudo, os documentos encontrados não permitiram compreender os motivos da
reprovação dos manuais e o resultado do questionamento das autoras.

Em 5 de dezembro de 1973, Lindolfo Marcondes Ferreira, Diretor Presidente da


Companhia Editora Nacional enviou ofício ao INL questionando o processo de
indicação final dos livros didáticos que compuseram o programa de 1973/74, na área de
História do Brasil. Segundo Ferreira, o livro didático escolhido pelo estado de Minas
Gerais - História do Brasil, de Sérgio Buarque de Hollanda190 -, que já estava com as
condições contratuais acertadas, foi excluído do programa de co-edição na última hora,
por questões econômicas e substituído por um livro não-avaliado pela Comissão de
Avaliação do MEC, indicado pela Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul. O INL
ficou responsável de co-editar tal livro. O Diretor afirmava que o ocorrido era
surpreendentemente injusto, dado que o INL não havia sequer aceitado material
complementar da editora, encaminhado oito dias depois de encerrado o prazo fixado
pelo cronograma oficial. Indagava sobre como um livro que estava fora do programa,
poderia ter sido aceito na fase final das contratações.
Respondendo ao questionamento, sobre o porque da co-edição de um livro
didático não-avaliado, a diretora adjunta do INL, Maria Helena Rangel Geordane,
enviou carta à Companhia Nacional, em 27 de março de 1974. Geordane esclareceu que
a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul não havia encontrado livro didático
adequado ao currículo de seu estado na relação de livros para co-edição indicados pelo
DEF. Por esse motivo, um livro que não estava na lista oficial foi co-editado, pois era o
único que se adaptava ao currículo adotado pelo estado. Se o livro didático não fosse
co-editado, o Rio Grande do Sul seria excluído do PLIDEF. Como os recursos
financeiros não possibilitavam a compra a mais desses livros, o INL retirou alguns
livros mais caros, como os de Sergio Buarque de Hollanda, para acrescentar o manual
necessário ao Rio Grande do Sul.
O episódio do livro de Sérgio Buarque de Hollanda expõe alguns conflitos que
ocorriam entre as editoras, o governo federal e as secretarias estaduais. A Lista Oficial
do DEF/MEC nem sempre possuía livros que correspondiam às particularidades dos

190
Segundo Másculo (2008, p. 207), a coleção de Sérgio Buarque de Hollanda era uma das mais
solicitadas pelos professores das cidades de Minas Gerais em 1972.
222

programas curriculares dos estados (até porque as editoras se concentravam quase que
exclusivamente em São Paulo e Rio de Janeiro). Outro aspecto, relacionava-se com
questões financeiras. Do modo como os acontecimentos foram relatados, o livro
didático de Sérgio Buarque de Hollanda não foi adquirido porque era mais caro, dessa
forma foi retirado da compra do governo.

A Fundação Nacional de Material Escolar (Fename)

Em fevereiro de 1976, por meio do Decreto nº. 77.107, as atribuições do INL


quanto ao Programa do Livro Didático foram transferidas para a Fundação Nacional de
Material Escolar (Fename). Inicialmente, de acordo com seu estatuto, a Fename deveria
produzir: cadernos escolares e blocos de papel diversos; cadernos de exercícios; peças,
coleções e aparelhos para estudo das diversas disciplinas dos currículos escolares; guias
metodológicos e manuais sobre matérias ou disciplinas consideradas de maior interesse;
dicionários, atlas, enciclopédias e outras obras de consulta; material para ensino áudio-
visual de disciplinas de cursos de grau elementar, médio e superior; material em geral,
de uso frequente por alunos e professores (Decreto n° 62.411, de 15/3/1968). A partir de
1976, a Fename passou a também ser responsável por co-editar e distribuir os livros
didáticos para 1º e 2º grau. Nesse ano o diretor executivo da Fename era Augusto Luiz
Duarte Lopes Sampaio.
O processo de transferência das responsabilidades do INL quanto à política do
livro didático para a Fename não foi totalmente esclarecida. Segundo Oliveira et al.
(1984), o motivo da mudança “parece ter sido a questão do ‘livro integrado’” (p. 63).
Internamente ao INL discutia-se a proposta do livro integrado, “por disciplina para as
quatro séries” ou, “as quatro disciplinas de uma série”, visando baratear o preço do livro
escolar. Oliveira et al. (1984, p. 64) afirma que as editoras fizeram pressão contra a
proposta e, de tal modo, em 1976, o diretor do INL Heberto Salles, assinou um parecer
em que o Instituto deixaria de ser o responsável pelo PLD, por não ter condições de
infra-estrutura.
Com a coordenação do PLD, a Fename firmou convênio com as Secretarias
Estaduais de Educação, estabelecendo que o governo federal distribuísse “um
determinado montante de livros ao alunado carente da rede oficial de 1º grau, cabendo
aos estados participarem com contrapartida financeira e material” (Oliveira et al., 1984,
p. 64). Os recursos para o programa provinham das contribuições das unidades
223

federadas e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)191. Com o


convênio, o governo passou a comprar grande quantidade de livros para distribuí-los em
determinado número de escolas.
Para o PLIDEF 1976/77, a Fename manteve a mesma estrutura organizada pelo
INL: inscrição das obras; pagamento da taxa de avaliação; análise dos manuais pelo
DEF/MEC; lista dos livros aprovados encaminhada aos estados para estudo e; reenvio
de lista para a Fename com a relação das obras para co-edição. A partir de 1976, para
cada título co-editado pela Fename seria exigida uma tiragem complementar mínima
para comercialização pela Editora.
Para o PLIDEF 78/79 e 79/80 os critérios para a seleção dos livros didáticos que
comporiam a lista do MEC foram modificados. Pelos novos critérios, o número máximo
de pontos obtidos por um livro era 160 (livro do aluno + manual do professor). Cada
título deveria obter no mínimo 70 pontos no livro do aluno e 35 pontos no manual do
professor. Não foram encontradas, todavia, as avaliações dos livros didáticos realizadas
pela Fename.

PLIDEM 1977/78

No arquivo da Companhia Editora Nacional/IBEP, foi encontrada documentação


sobre o Programa do Livro Didático de Ensino Médio (PLIDEM)192, de 1977/1978, que
selecionaria livros didáticos para o 2º grau de Agricultura, Zootecnia, Petroquímica,
Saúde Pública, Topografia e Desenho. Para a seleção, a Fename divulgou novas
orientações. De acordo com documento da Fundação, o PLIDEM estava norteado pelo
II Plano Setorial de Educação e Cultura (1975-1979) – II PSEC.
De acordo com o II PSEC, até 1973, o número de matrículas no ensino
profissionalizante era de 30% em relação ao total de matrículas no 2o grau. O
documento considerava a falta de escolas com cursos profissionalizantes o motivo do

191
Em 21 de novembro de 1968, por meio da Lei n° 5.537 foi criado o Instituto Nacional de
Desenvolvimento da Educação e Pesquisa (Indep). Em 15 de setembro de 1969, foi promulgado o
Decreto-Lei n° 872 que complementava a Lei n° 5.537. O decreto-lei alterou a denominação do Indep que
passou a se chamar Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE). O FNDE tinha por
finalidade “captar recursos financeiros e canalizá-los para o financiamento de projetos de ensino e
pesquisa, inclusive alimentação escolar e bolsas de estudo, observadas as diretrizes do planejamento
nacional da educação” (Art. 2º, Lei n° 5.537/68).

192
Segundo a documentação encontrada, o PLIDEM tinha iniciado suas atividades em 1972, mas por
falta de recursos financeiros, o programa de co-edição diminuía a cada ano.
224

baixo número de matrículas. Segundo o documento, uma das grandes dificuldades na


implantação dos cursos era a falta de recursos financeiros estaduais, a escassez de
instalações apropriadas e a falta de pessoal docente qualificado. O documento indicava,
ainda, a escassez de equipamentos e materiais de ensino, a inadequação de livros,
textos, materiais de uso individual e a falta de bibliotecas. Dessa forma, para o 2o grau,
o plano de metas pretendia co-editar 1,8 milhão de livros e distribuí-los para 90 mil
escolas. Quanto à Ação Programada, o II PSEC previa para o ensino de 2º grau, a
ampliação do desenvolvimento de métodos, materiais e equipamentos de ensino, em
especial para a educação científica.
De acordo com as orientações, em um primeiro momento as editoras
encaminhariam à Fename os livros para análise e triagem. Em seguida os livros seriam
encaminhados ao Departamento de Ensino Médio (DEM) do MEC para exame. Para
cada volume inscrito no PLIDEM, as editoras deveriam pagar uma taxa de avaliação
(Cr$ 500,00). As comissões de avaliação do DEM realizariam os exames dos livros,
levando em consideração os objetivos indicados pela lei n. 5.692/71. Após a avaliação
seria elaborada uma “Relação dos livros didáticos indicados para co-edição – PLIDEM
77/78”. A relação seria encaminhada às Coordenações do Livro Didático das Secretarias
de Educação das unidades federadas para análise e seleção dos títulos constantes dessa
lista. As Comissões das Secretarias de Educação avaliariam e selecionariam os livros
que melhor atendessem a proposta curricular adotada pelo estado. Por último, as
editoras deveriam encaminhar à Fename a proposta orçamentária das obras escolhidas,
para serem analisadas pela Assessoria de Co-edição da Fundação. Depois de escolhidas
as obras pelas Secretarias de Educação a Fename organizaria com as editoras a
assinatura do contrato de co-edição e estipularia a data de impressão e distribuição.

A ficha de avaliação

Cada item da ficha de avaliação do PLIDEM deveria ser respondido com “sim”
ou “não”, sendo finalizada com um relato escrito do avaliador. A ficha contava com as
seguintes partes:

1. Produção Editorial
1.1. Elementos de identificação da obra: Autor, Colaborador, Ilustrador,
Tradutor, Título, Edição, Ficha catalográfica, Colofon.

2. Produção Gráfica
225

2.1. Elementos de forma: Acabamento, Corpo de letras e espaçamento, papel,


Impressão, Distribuição do Texto, Capa, Ilustração.
2.2. Elementos de enriquecimento da obra: Prefácio, Sumário, Glossário,
Bibliografia
2.2.5. Resumo e/ou conclusões e/ou leituras complementares

3. Produção didática
3.1. Elementos de conteúdo:
*Objetivos - expressos e claramente perceptíveis; coerentes com o conteúdo
da obra; adaptado ao nível do aluno; adequados aos objetivos propostos para
o ensino de 2º grau; adequados aos objetivos da habilitação a que se destina;
* Texto
Linguagem - Correta; Adequada ao nível do aluno; Qualidade da tradução (se
houver);
Ilustração - contribui para a compreensão do texto; adequada ao conteúdo;
adequada ao nível do aluno;
Conteúdo - correção técnico-científica; atualização; adequação ao nível do
aluno; proposição de trabalho de elaboração intelectual do aluno; atendimento
aos interesses do aluno; seqüência lógica; gradação; correlacionamento dos
temas; integração dos conhecimentos apresentados com outros componentes
curriculares; exemplificação relacionada com problemas ou experiências de
realidade, do interesse e da vida do aluno;
3.2. Elementos metodológicos
*Adequação do processo didático - com os objetivos do ensino; com o
conteúdo da obra;
* Existência de recursos complementares ao texto - exercícios de fixação, ou
recuperação ou de diagnose, ou avaliação; recursos de enriquecimento e
aprofundamento do texto (experiências, gráficos, mapas, tabelas, quadros,
desenhos, esquemas, temas para discussão em grupos, outros);
* Adequação dos recursos ao conteúdo da obra - coerentes com o texto;
variados; estimuladores da criatividade do aluno; fornecedores dos diferentes
processos de aprendizagem; permitem aplicação do aprendido.

Relatório Final
O livro – deve ser co-editado
Não deve ser co-editado
(Fonte: Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP).

Essa foi a única documentação localizada sobre avaliação de livros para o 2º


grau profissionalizante. Como se verifica, a ficha de avaliação para livros de ensino
médio não era muito diferente das outras fichas utilizadas no período. Não foram
encontradas, todavia, as avaliações realizadas pelo Departamento de Ensino Médio
(DEM).

A extinção da avaliação federal

Em junho de 1980, por meio da Portaria n° 409 do então Ministro da Educação


Eduardo Portella, a avaliação federal dos livros didáticos foi extinta e passou a ser de
226

inteira responsabilidade dos estados, com a justificativa de que seriam elaborados


critérios que melhor atendessem as peculiaridades locais e regionais (Oliveira et al.,
1984, p. 65). As comissões estaduais de avaliação deveriam ser compostas por:
representante do Conselho Estadual de Educação; equipe de currículo e supervisão do
estado; professores regentes de 1º grau e professores de ensino superior. Os livros
selecionados deveriam ser adotados por pelo menos dois anos. Em janeiro de 1982, a
Portaria n° 02, do então Ministro da Educação Rubem Ludwig, revogou a Portaria n°
409/80 e determinou que as Secretarias de Educação das unidades federadas passariam
a analisar, selecionar e indicar os livros didáticos destinados especificamente ao
PLIDEF.
Ainda nos anos 1980, momento de crise da Ditadura Militar, as discussões
políticas davam um novo enfoque à questão educacional. O III Plano Setorial de
Educação, Cultura e Desporto, para o período de 1980-1985, traçava as “linhas
prioritárias nacionais” para a área educacional, propondo, entre outras medidas de apoio
ao estudante, a necessidade de ampliar a distribuição de material escolar, “com
prioridade para as populações carentes” (Höfling, 1993, p. 76-77). Nesse sentido, em 18
de abril de 1983, por meio da Lei n° 7.091, a Fename foi transformada em Fundação de
Assistência ao Estudante (FAE), que incorporou, entre outros programas, o PLD. A
FAE deveria executar a Política Nacional de Assistência ao Estudante nos níveis da
educação pré-escolar e de 1º e 2º graus, tendo como diretriz institucional a
descentralização e regionalização de suas ações. No Programa do Livro Didático, a FAE
estava encarregada de doar os manuais para as escolas de 1º grau e fornecer livros para
as bibliotecas escolares por meio do sistema de co-edição com as editoras (Höfling,
1993, p. 45).
Voltando a debater sobre o problema do livro didático, em maio de 1983, por
meio da Portaria n. 206, a então Ministra Esther de Figueiredo Ferraz instituiu um grupo
de estudo para promover exames sobre o livro didático e os programas em execução no
MEC. O grupo era composto por: Ruy Mendes Gonçalves193, Maria Alice Barroso194,
Luiz Pasquale Filho, Madalena Rodrigues dos Santos, Armando Hildebrand195 e Anna

193
Ruy Mendes Gonçalves era vice diretor da editora Saraiva.
194
Maria Alice Barroso foi diretora do INL e presidente da Biblioteca Nacional.
195
Como foi apresentado anteriormente, Armando Hildebrand foi diretor da Diretoria de Ensino
Secundário do MEC e foi, ainda, membro e presidente Conselho de Educação do Distrito Federal.
227

Bernardes da Silveira Rocha196. O relatório do grupo de estudos foi divulgado em 15 de


julho do mesmo ano e apresentou recomendações sobre a política do livro didático.
Dentre as recomendações indicava: a escolha do manual escolar pelo professor;
elaboração pelo MEC, de material procurando orientar e auxiliar o professor na
avaliação, escolha e utilização do livro didático; a FAE deveria estabelecer
especificações mínimas visando a qualidade dos livros; a produção de livros didáticos
deveria ser de responsabilidade do setor empresarial privado; atendimento aos alunos
carentes; que o PLIDEF não aceitasse livros consumíveis a partir da 3ª série do 1º grau;
que estendesse a distribuição de livros didáticos para os alunos até a 8a série; que o
PLIDEF incorporasse o Banco de Livros, para ampliar a quantidade de livros didáticos
aos alunos carentes e prolongar a vida útil do livro. As recomendações do relatório do
grupo de estudos serviram de subsídios para a legislação que viria a instituir o Programa
Nacional do Livro Didático.
Segundo Höfling, em 1984, o MEC encerrou o sistema de co-edição e passou a
comprar os livros produzidos pelas editoras que participavam do Programa do Livro
Didático (1993, p. 21).
A partir de 1985, no contexto de redemocratização do país, a orientação
educacional passou por mudanças. A escola de 1o grau tinha se expandido, com 80% da
população em idade escolar matriculada, contudo, a taxa de repetência e evasão era
elevada (Brasil, 1990, pp. 33-34). Nesse ano, o Ministério da Educação divulgou a
proposta Educação para todos: caminhos para a mudança, que segundo Cassiano
(2007, p. 23), era parte da “política social do novo governo democrático”, e apresentava
as seguintes metas para a Educação: universalização do ensino de 1º grau e permanência
das crianças na escola, luta contra o analfabetismo e necessidade de uma educação de
qualidade (Cassiano, 2007, p. 24).
Como parte dos instrumentos que possibilitariam melhorar a qualidade da
educação, em 19 de agosto de 1985, por meio do Decreto n° 91.542, o Programa do
Livro Didático para o Ensino Fundamental (PLIDEF) foi incorporado ao Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD), sob responsabilidade da FAE, com os objetivos
básicos de adquirir e distribuir, universal e gratuitamente, livros didáticos para todos os
estudantes matriculados nas escolas públicas de 1o grau.

196
Anna Bernardes da Silveira Rocha foi Diretora-Geral do Departamento de Ensino Fundamental, era
membro do CFE e do Conselho de Educação do Distrito Federal.
228

Algumas considerações

O presente capítulo permitiu compreender a atuação do Estado Militar na


política do livro didático com os processos de co-edição, em um momento de
reestruturação da educação nacional, tanto no ensino básico, como no ensino superior.
O governo militar agiu em duas frentes: com a expansão do ensino, buscou atender o
novo público escolar, considerado carente e sem recursos financeiros e, procurou
incentivar e regular o mercado editorial brasileiro, destacadamente o setor de livros
escolares. A política do livro didático a partir de 1971 garantiu um mercado
razoavelmente estável para essas editoras. Com o fim da Colted e o início do sistema de
co-edição, o mercado editorial se expandiu ainda mais. Com as co-edições o Estado
pretendia baratear o livro escolar, entretanto, esse barateamento não se efetuou.
As avaliações do DEF/MEC, a partir de 1971, buscou conformar os manuais
escolares aos novos objetivos e conteúdos das disciplinas, redefinidos pela reforma do
ensino efetivada pela lei n° 5.692. Priorizava-se o fortalecimento das habilidades,
atitudes, capacidades e comportamentos e, nesse sentido, as avaliações procuraram dar
maior ênfase à relação dos objetivos do ensino com a proposta metodológica dos
manuais. As avaliações tinham como objetivo, também, estabelecer um padrão mínimo
para os manuais escolares, dando ênfase ao aspecto material dos livros e sua produção
gráfica (visual, diagramação, tipologias, papel, qualidade de impressão, formato, etc.).
Analisaram os aspectos didáticos e metodológicos, principalmente as atividades e
exercícios, baseados nas novas técnicas que foram introduzidas no ensino. Os estudos
dirigidos e as instruções programadas foram utilizados em livros didáticos de
praticamente todas as disciplinas escolares.
As avaliações demonstraram preocupação com os novos professores e
apresentaram essa preocupação em suas diretrizes. A necessidade do manual do
professor, que colaboraria no aperfeiçoamento dos professores e facilitaria a
organização de suas aulas, foi uma questão bastante debatida pela Colted e
implementada pelo INL. A obrigatoriedade do manual do professor, uma estratégia das
editoras, tornou-se uma forma de tentar minimizar as dificuldades relacionadas à
formação do novo quadro docente e colaborar com o seu trabalho, sua prática cotidiana,
na preparação das aulas, provas e atividades.
Quando a política do livro didático passou para a responsabilidade do INL e,
posteriormente, da Fename, observou-se que o processo de seleção e avaliação dos
229

manuais manteve uma estrutura padrão. O Departamento de Ensino Fundamental fazia


uma avaliação prévia dos livros didáticos que era mais simplificadas, baseadas em
fichas objetivas a serem preenchidas. Em seguida era divulgada a lista de livros
aprovados. A partir da lista do MEC os estados selecionavam os livros que seriam
adquiridos. Sendo assim, os processos de avaliação dos livros didáticos combinaram
ação federal e estadual. Contudo, no processo de co-edição dos livros didáticos, as
etapas se atropelavam. Eram muitas etapas, muitas comissões, muitas pessoas. Na
tentativa de estabelecer a descentralização da política do livro didático, o processo de
avaliação da qualidade dos manuais escolares acabou deixando de ser o aspecto
principal. No momento da negociação do valor para a co-edição com as editoras,
priorizava-se o preço em detrimento ao manual escolhido pelos estados.
No fim da Ditadura, explicitou-se a necessidade de organizar o sistema escolar
que tinha definitivamente se expandido, mas que apresentava intensas desigualdades de
acordo com as regiões. A criação do Programa Nacional do Livro Didático, em 1985,
procurou responder algumas das preocupações que vinham sendo debatidas desde o
anos 1950, e que se intensificaram nos anos 1960 e 1970, quanto a distribuição gratuita
dos manuais para os alunos e sobre a questão da substituição e tempo de uso do livro
didático. O PNLD definiu a distribuição gratuita dos livros didáticos para todos os
alunos do ensino público do 1o grau e estabeleceu a reutilização dos manuais, ao fixar
seu tempo de uso acabando, assim, com o livro consumível.
230

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nas conclusões deste trabalho, retomarei algumas discussões apresentadas ao


longo da tese que permitiram levantar considerações sobre os diferentes processos de
avaliação dos livros escolares na história da educação no Brasil.
Conforme observou-se, o livro didático faz parte da cultura escolar e seu
conteúdo, o que é veiculado por ele, sempre precisou ser controlado. O Estado
Nacional, logo que começou a se responsabilizar pela educação do povo, passou a se
preocupar, também, com o controle do livro didático. O manual escolar, como
transmissor de um conhecimento considerado oficial, precisava ser avaliado para se
estabelecer qual “saber” era permitido a ele veicular. Os livros didáticos divulgavam
diferentes modelos pedagógicos determinados pelos contextos históricos a que
pertenciam.
No Brasil, em uma análise mais detalhada dos diferentes períodos que
apresentaram avaliações governamentais ou análises críticas de órgãos vinculado ao
Estado (o Inep e a Caldeme) dos manuais escolares, identificaram-se objetivos diversos
nos processos de controle do livro didático e alguns objetivos que, em um primeiro
olhar, poderiam parecer semelhantes.
Durante o Estado Novo, na década de 1940, a Comissão Nacional do Livro
Didático tinha como objetivo regulamentar os livros didáticos utilizados nas escolas
brasileiras, sua produção, importação e uso. As avaliações da CNLD visavam
padronizar o livro didático, seu conteúdo, método de ensino e ortografia. A política do
livro didático se inseria em um projeto de educação nacional. Era preciso estabelecer
novas metodologias, uniformizar e padronizar o ensino primário, mas principalmente,
estruturar o ensino secundário, que estava em processo de organização. As avaliações
dos manuais escolares procuravam verificar se eram seguidos os programas oficiais,
buscando-se estruturar novos modelos pedagógicos com padrões de cientificidade, nas
diferentes disciplinas escolares. A análise das avaliações dos anos 1940, mostrou que as
áreas do conhecimento escolar estavam se conformando. Pretendia-se definir os
conhecimentos considerados legítimos e que deveriam ser transmitidos.
Com a CNLD, almejando melhorar a qualidade dos manuais, o que se pretendia
era instituir uma padronização pedagógica e científica dos livros escolares, com
introdução de novas metodologias de ensino e a atualização dos conteúdos em relação
231

às pesquisas das diferentes áreas. A ação movida pelo professor Waldemiro Potsch
contra Cândido de Mello Leitão foi o exemplo mais ilustrativo das polêmicas em torno
do posicionamento dos membros da CNLD na configuração da área das Ciências.
A CNLD precisava, ainda, regrar o mercado de didáticos, padronizando o preço
e o modelo dos manuais. Nesse sentido, foi possível observar que o processo de
avaliação dos livros didáticos gerou reações de autores e da Associação Profissional das
Empresas Editoras de Livros e Publicações Culturais. Com o argumento do custo da
impressão das obras, a Associação solicitou a liberação do aumento dos preços dos
manuais e, por outro lado, solicitou que não fosse divulgada a lista dos livros recusados.
Pelo que foi analisado, essa lista nunca foi divulgada.
Com o fim do Estado Novo, iniciou-se um movimento de crítica ao modelo
uniformizado e centralizado da educação brasileira, crítica vinda, principalmente, do
grupo vinculado a Anísio Teixeira e à Faculdade Nacional de Filosofia. Propunha-se a
descentralização e reestruturação do ensino secundário e, nesse sentido, os livros
didáticos precisavam ser modificados, pois seus conteúdos estavam padronizados.
Assim, Anísio Teixeira e outros educadores organizaram a Campanha do Livro Didático
e Manuais de Ensino (Caldeme) com o objetivo de analisar os manuais escolares em uso
nas escolas e elaborar novos guias de ensino com metodologias “inovadoras”. A
Caldeme realizou um processo diferenciado de avaliação dos livros didáticos, pois a
Campanha não regulava e controlava os livros didáticos. Com as análises pretendia-se
fazer um balanço e indicar sugestões para melhoria dos manuais. As análises foram
escritas e publicadas para estudo dos professores, de estudantes dos cursos normais e de
Faculdades de formação de professores.
Guy de Hollanda e James Braga da Fonseca, docentes e ex-alunos da Faculdade
Nacional de Filosofia, instituição que tinha preocupação com a formação de professores
para o ensino secundário, analisaram os livros didáticos de História e Geografia das
décadas de 1930 e 1940, e recriminaram veementemente a padronização imposta pela
CNLD. Tal crítica refletia o questionamento ao modelo do Estado Novo, com os
programas únicos, a fiscalização das escolas, as avaliações federais e o processo de
centralização do ensino de modo geral. Suas análises questionavam um tipo de livro
didático, com um modelo pedagógico considerado tradicional, livresco e baseado na
memorização.
O ensino secundário estava em expansão nos anos 1950 e, desse modo, buscava-
se um novo significado para esse nível de ensino. Discutia-se a necessidade de se
232

observarem os aspectos regionais e flexibilizar o currículo. O currículo científico vinha


propor mudança ao modelo pedagógico tradicional, com a proposta de uma educação
para a prática, que fortalecia a aprendizagem centrada no aluno e em seu interesse – a
pedagogia moderna. As novas concepções pedagógicas propunham o desenvolvimento
das aptidões pessoais dos alunos. Nesse momento, a Didática entrava com força,
reorientando os processos de ensino e aprendizagem, baseados em aspectos
psicológicos, na adequação do conhecimento à idade e na compreensão das crianças e
jovens. O livro didático precisava dar conta dessas mudanças, pois não seria mais
direcionado somente para o professor, mas também deveria servir ao aluno.
Em meio à necessidade de se repensar os objetivos do ensino secundário,
surgiam as novas demandas com o fim da Segunda Guerra Mundial e o advento da
Guerra Fria. Os manuais escolares precisavam ser reformulados quanto aos seus
conteúdos, pois deveriam ser eliminados os estereótipos e preconceitos.
Nos anos 1960 a expansão do ensino se acelerou. O novo público escolar
apresentava características bem diferentes dos alunos dos anos 1940 - um público que
pressionou para ter acesso à educação secundária e que não possuía uma cultura letrada.
Ao mesmo tempo, intensificava-se cada vez mais a ascensão da cultura científica na
escola, com a proposta de um aprendizado que servisse para a vida cotidiana, o
aprendizado baseado na experiência, para a prática.
No fim dos anos 1960 e na década de 1970, as políticas para o livro didático,
com suas comissões de avaliação, procuraram conformar o novo público de alunos que
estava em sala de aula. Precisavam, além disso, organizar o mercado de livros escolares
em expansão. Era necessário incentivá-lo e regulá-lo. Desse modo, foi criada a Colted,
com o objetivo de fornecer livros didáticos para alunos carentes e incentivar, organizar
e regular o mercado editorial didático.
Sobretudo com a Colted, as avaliações tiveram como base as idéias de
renovação pedagógica e modernização do ensino, que propunham novas técnicas e
metodologias de ensino e aprendizagem. Os avaliadores da Colted participaram dos
projetos educacionais dos anos 1950 e início dos anos 1960, em especial dos trabalhos
realizados pelo Inep e CBPE. As avaliações dos livros didático para os alunos do ensino
primário procuravam responder aos problemas discutidos nos anos 1950. As avaliações
pretendiam, ainda, auxiliar o novo quadro docente, considerado menos preparado. A
exigência da obrigatoriedade do manual do professor evidenciou essa preocupação.
233

A partir de 1971, a avaliação buscou configurar os manuais escolares aos novos


objetivos, conteúdos e métodos das disciplinas, redefinidos pela reforma do ensino com
a Lei n° 5.692, que reorganizou a cultura escolar. O livro didático passou a ser
considerado fundamental para o processo de ensino, como auxiliar do professor, com
ênfase para as sugestões metodológicas e para colaborar na organização das aulas. A
política do livro escolar na década de 1970 priorizou a expansão do mercado editorial
didático com os processos de co-edição, com a pretensão de fornecer manuais escolares
a baixo custo para o máximo possível de alunos.
As avaliações dos manuais elaboradas pelo INL e pela Fename procuraram
estabelecer um padrão mínimo para os livros didáticos, que enfatizava a análise dos
aspectos gráficos dos livros, a produção didática - aspectos metodológicos, as atividades
e exercícios – e o manual do professor. Ao procurar manter o princípio de
descentralização da educação, o Programa do Livro Didático articulou ação federal e
estadual, com duas avaliações - a do INL ou da Fename - e a avaliação das Comissões
de Avaliação das Secretarias de Educação dos estados, que indicavam os livros
escolhidos e que deveriam ser co-editados. Contudo, no momento de negociação do
Governo com as editoras, a prioridade não era co-editar os manuais escolhidos pelos
estados, mas os que tivessem o melhor preços na negociação.
Nas análises apresentadas observou-se que as políticas para o livro didático e as
avaliações dos manuais, criadas no Estado Novo, durante os anos 1950, e na Ditadura
Militar com a Colted, o INL e a Fename, respondiam a questões do seu tempo. Elas
foram específicas, de acordo com os problemas e demandas da época. No entanto,
alguns argumentos para a necessidade da avaliação dos livros escolares foram
parecidos: em todos os momentos a avaliação do livro didático foi estabelecida porque
era preciso analisar seu conteúdo e métodos, o que estava sendo transmitido pelos
manuais. Todas as avaliações foram justificadas com o argumento de se atualizar e
melhorar a qualidade dos livros escolares. O interessante foi identificar as diferentes
concepções do que era considerado um manual escolar de qualidade em cada contexto
histórico.
As análises das Comissões e suas avaliações evidenciaram as tensões que se
estabeleceram entre os sujeitos que participaram do processo, em alguns momentos
entre os próprios avaliadores (como na CNLD) ou entre os demais atores diretamente
envolvidos com os livros didáticos, como os autores dos manuais, as editoras, o SNEL,
234

a CBL, outros órgãos do próprio governo federal e das Secretarias de Educação dos
estados.
Ao analisar a história dos processos de avaliação dos livros didáticos no Brasil
foi importante identificar a importância atribuída ao livro didático para a educação
escolar. Dessa forma observa-se o significado da atual política do livro didático. O
PNLD foi criado em 1985, para coroar a importância do livro escolar e, também, para
estabelecer a nova política de universalização da educação, da escola para todos, com
uma proposta de fornecer o livro didático para todos os alunos do ensino de 1o grau. Ao
longo dos anos o PNLD se expandiu, passou a fornecer livros para o Ensino Médio e,
recentemente, para alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Como foi destacado anteriormente, a implantação da avaliação dos livros
didáticos no PNLD não ocorreu de modo tranquilo. A primeira avaliação, de 1993,
constatou que os livros didáticos comprados pelo MEC apresentavam “problemas
graves”, “erros de natureza científica”, “preconceitos e estereótipos”, entre outros
problemas. Esses eram os livros didáticos produzidos entre o fim da Ditadura Militar e
o início da democratização brasileira. Qual o significado dessa constatação?
O que se pode considerar, baseado nas análises aqui descritas, é que durante o
Regime Militar a preocupação centrou-se mais no mercado editorial didático do que na
qualidade dos livros. Contudo, Munakata (1997, p. 68) observa que não eram todos os
livros que apresentavam “erros”; na avaliação de 1993, 63 % dos livros analisados
apresentavam “inadequações em relação aos critérios do PNLD, muitas delas óbvias, o
que revela certa dose de má-fé das editoras, que tentaram ludibriar a FAE com
expedientes até mesmo simplórios, como a entrega de livros em fotocópia ou obras sem
acabamento”.
Desse modo, verifica-se que para instituir a avaliação oficial dos livros
didáticos, a partir de 1996, o governo utilizou os argumentos indicados pelo Grupo de
Trabalho de 1993, sobre a má qualidade dos manuais escolares. Assim, a justificativa
para esse novo momento de avaliação dos livros didáticos foi estabelecer (novamente)
um padrão de qualidade para os manuais comprados pelo Estado.
No entanto, desde o início da avaliação oficial do PNLD, autores e editores
questionam o processo da avaliação, seus critérios e a infalibilidade das comissões. Em
uma busca no site da Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos (Abrale), é
possível encontrar inúmeros textos que discutem problemas nas avaliações dos livros
didáticos do PNLD. Esses textos nos possibilitaram verificar que as polêmicas
235

continuam. Em 2002, a Abrale e a Associação Brasileira de Editores de Livros


(Abrelivros) publicaram o documento Para formar um país de leitores: contribuições
para a política do livro escolar, em que discutiam, entre outros assuntos, o sistema de
avaliação dos livros didáticos. Nesse documento, as duas Associações afirmavam que:

se o sistema de avaliação de livros didáticos instituído pelo MEC, nos últimos


anos, está longe de reproduzir os desvarios de governos totalitários, é preciso
reconhecer que instala o princípio nefasto de que o Estado tem direito de veto
sobre as visões do conhecimento e de seu ensino construídas pelos autores a
partir de concepções presentes na sociedade. Segundo esse sistema vigente,
comissões nomeadas pelo MEC julgam a qualidade didática e pedagógica de
livros, classificam os "aprovados" em diversos níveis e excluem os
"reprovados". Pior ainda, esse julgamento não está sujeito a exame ou recurso,
negando aos autores o direito constitucional de defesa197.

Em outro documento, enviado ao Ministério da Educação em 2004, Avaliação


de livros didáticos de Ciências: compromisso com o quê?, a Abrale questionou as
avaliações do PNLD da área de Ciências. O documento analisa alguns dos pareceres de
reprovação dos livros didáticos de Ciências, identificando diversos problemas nos
pareceres: erros conceituais cometidos pelos avaliadores; críticas a afirmativas
inexistentes nos livros didáticos; exemplos de falsos erros conceituais; interpretação
distorcida dos textos, etc.
Em novembro de 2009, o Boletim da Abrale apresentou os resultados de um
encontro dos diretores da Instituição, José de Nicola e Marcelo Lellis, com o Diretor de
Políticas de Formação, Materiais Didáticos e de Tecnologia para a Educação Básica.
Dentre os itens discutidos, apresentaram trechos de pareceres de exclusão de livros
didáticos contendo, segundo os diretores da Abrale, “críticas inadequadas, critérios
confusos, erros evidentes e descuidos inaceitáveis” (Informativo n. 34, Nov./09, p. 3).
Em 2010, os autores de livros didáticos para 1a a 4a série do ensino fundamental,
Francisco Azevedo de Arruda Sampaio e Aloma Fernandes de Carvalho, publicaram um
livro questionando as avaliações do PNLD 2010 que reprovaram quatro coleções de
livros didáticos de sua editora, a Sarandi. Uma dessas coleções, a Caminhos da Ciência,
havia sido aprovada nos PNLDs 2001, 2004 e 2007. Segundo os autores da Sarandi, os
relatórios de reprovação apresentavam “uma miríade de erros” (2010, p. 15). Diante das
reprovações, os autores resolveram tomar providências e elaboraram um documento,

197
O documento Para formar um país de leitores: contribuições para a política do livro escolar, foi
encontrado em http://www.abrale.com.br/frameset.htm, acesso em 20/01/2001.
236

encaminhado ao MEC, refutando os argumentos presentes nos relatórios de reprovação.


Como o documento não surtiu efeito, os autores da Sarandi resolveram escrever o livro
para “rechaçar” as argumentações dos relatórios de reprovação, com a refutação de
“alegação por alegação, parágrafo por parágrafo, exemplo por exemplo” (2010, p. 57).
Os relatos apresentados e a publicação do livro da Sarandi, são
interessantíssimos, quando observamos, pela perspectiva histórica, que os processos de
avaliação de livros didáticos no Brasil sempre foram questionados por autores e
editoras. No caso específico do livro da Sarandi, os autores - Sampaio e Carvalho –
fazem, hoje, o que Waldemiro Postch fez nos anos 1940, quando também publicou um
livro, questionando “parte por parte”, “ponto por ponto”, os pareceres de reprovação da
CNLD de livros didáticos de sua autoria. Por coincidência (ou não), eram da área das
Ciências Naturais, como são duas das coleções reprovadas da Sarandi.
Postch (1942), baseado em critérios científicos, refutou todos os conceitos e
métodos valorizados pelos avaliadores da CNLD. Os autores da Sarandi (2010) fizeram
o mesmo. Afirmaram que os avaliadores erraram na avaliação, apresentando conceitos
errados. Para Postch (1942), seus livros foram reprovados porque os avaliadores
queriam controlar o mercado de didáticos naquela época, já que possuíam livros de suas
autorias, das mesmas disciplinas.
E os atuais avaliadores? O que devem querer?
Os critérios das avaliações do PNLD até podem se tornar cada vez mais
objetivos, contudo, elas são realizadas por pessoas, que possuem toda uma experiência
profissional, acadêmica, de vida, enfim, que fazem com que a avaliação torne-se
subjetiva, dependente do “olhar”, da crítica, ou mesmo do preciosismo de cada
avaliador.
Outro aspecto importante a se pensar, que já foi discutido por Cassiano (2007), e
que retomo neste trabalho, diz respeito ao crescimento do número de municípios que
estão deixando de utilizar os livros do PNLD para adotar sistemas apostilados, que não
passam por nenhum tipo de avaliação de sua qualidade, tanto gráfica quanto didático-
pedagógica.
Tem-se, ainda, mais um caso, especificamente no estado de São Paulo. Como
relata Boim (2010), em 2007 a Secretaria de Educação do estado de São Paulo
organizou uma proposta curricular para as escolas estaduais paulistas, do ensino
Fundamental e Médio. A proposta consiste em um currículo uniforme com materiais
237

didáticos elaborados para todos os níveis de ensino. A proposta curricular é executada


por meio do projeto pedagógico São Paulo faz Escola (Boim, 2010, p. 22).
O material didático criado pela Secretaria de Educação desde 2008, contém
apostilas para os alunos e para os professores (chamados Cadernos), organizados por
bimestre e por disciplina escolar. Os Cadernos apresentam “situações de aprendizagem
para orientar o trabalho do professor” (Boim, 2010, p. 28). Essas “situações de
aprendizagem” são orientações para as aulas, com conteúdos mínimos obrigatórios,
orientação para avaliação e para a recuperação, com sugestões de método e atividades
de trabalho em sala de aula. Esse material também não passa por nenhum critério de
avaliação, e em seu curto período de existência já sofreu denúncias, pois foram
encontrados erros nas apostilas (Boim, 2010, p. 51).
Como se constata, as polêmicas permanecem. Com a instituição da avaliação do
PNLD pretendia-se controlar a qualidade dos livros didáticos. Contudo, o próprio
processo de avaliação organizado pelo PNLD vem sendo questionado ano a ano e
criticado pelos equívocos dos avaliadores. Será que é possível pensar uma outra forma
de se fiscalizar a qualidade dos manuais escolares que não seja por meio de um controle
estatal que barra o manual escolar no início do processo? Será que os avaliadores dos
manuais escolares compreendem que o livro didático é, na verdade, um auxiliar do
professor? E os professores? Não têm mesmo competência para escolher um livro
didático minimamente correto? E os novos materiais de ensino, os sistemas apostilados
que não são avaliados por instituição nenhuma? Como resolver essas questões?
A presente pesquisa não pretende responder essas questões, mas possibilitar a
reflexão para futuros debates.
238

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Legislação

Decreto n. 19.890, de 18 de abril de 1931. Dispõe sobre a organização do ensino


secundário.
Decreto n. 20.108, de 15 de junho de 1931. Dispõe sobre o uso da ortografia
simplificada do idioma nacional nas repartições públicas e nos estabelecimentos de
ensino.
Decreto-lei n. 292, de 23 de fevereiro de 1938. Regula o uso da ortografia nacional.
247

Decreto-Lei n° 1.006, de 30 de dezembro de 1938. Estabelece as condições de


produção, importação e utilização do livro didático.
Decreto-Lei nº 580, de 30 de julho de 1938. Dispõe sobre a organização do Instituto
Nacional de Estudos pedagógicos.
Decreto-lei n° 1.177, de 29 de março de 1939. Dispõe sobre o funcionamento da
Comissão Nacional do Livro Didático no ano de 1939.
Decreto-lei n° 1.417, de 13 julho de 1939. Dispõe sobre o regime do livro didático.
MES. Portaria ministerial n° 253, de 24 de dezembro de 1940. Instruções para
funcionamento da Comissão Nacional do Livro Didático.
Decreto-lei n° 3.580, de 3 de setembro de 1941. Dispõe sobre a Comissão Nacional do
Livro Didático e dá outras providências.
Decreto-lei n. 4.244, de 9 de abril de 1942. Lei Orgânica do Ensino Secundário.
Decreto-lei n. 5.186, de 13 de janeiro de 1943. Regula o uso da ortografia em todo o
país.
Decreto-lei n. 6.339, de 11 de março de 1944. Dispõe sobre o livro didático.
Portaria Ministerial, n° 468, de 13 de outubro de 1944. Dispõe sobre o livro didático.
Portaria Ministerial, n° 469, de 13 de outubro de 1944. Designa sub-comissões na
Comissão Nacional do Livro Didático.
Decreto-lei n° 8.222, de 26 de novembro de 1945. Dá nova redação aos artigos 2o e 3o
do Decreto-lei n. 1.417, de 13 de junho de 1939.
Decreto-lei n. 8.460, de 26 de dezembro de 1945. Consolida a legislação sobre as
condições de produção, importação e utilização do livro didático.
Lei n. 1.359, de 25 de abril de 1951. Midifica a seriação de disciplinas do cursos
secundário estabelecida no Decreto-lei n. 4.244, de 9 de abril de 1942.
Decreto nº 38.460, de 28 de dezembro de 1955. Institui o Centro Brasileiro de Pesquisas
Educacionais e Centros Regionais no âmbito do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais, do Ministério da Educação e Cultura.
Decreto n° 38.556, de 12 de janeiro de 1956. Institui a Campanha Nacional de Material
de Ensino.
Decreto n. 50.489, de 25 de abril de 1961. Dispõe sobre o financiamento e a redução
dos custos de obras Didáticas e dá outras providências.
Lei n. 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação
Nacional.
248

BRASIL. Documenta. 1963. Parecer do Conselho Federal de Educação (CFE), n°


145/63, sobre a situação da Comissão Nacional do Livro Didático em face da LDB.
Portaria n. 373, de 17 de outubro de 1963, do MEC. Livros Didáticos para o Ensino
Médio.
Decreto n° 53.583, de 21 de fevereiro de 1964. Dispõe sobre a edição de livros
didáticos, dando outras providências.
Decreto n° 53.887, de 14 de abril de 1964. Dispõe sobre a edição de livros didáticos e
revoga o Decreto n. 53.583, de 21 de fevereiro de 1964.
São Paulo. Acta. Decreto n. 44.703, de 7 de abril de 1965. Institui a Fundação para o
Livro Escolar.
Portaria n° 178, de 5 de abril de 1965, do MEC.
Decreto n. 58.653, de 16 de junho de 1966. Institui No Ministério da Educação e
Cultura o Conselho do Livro Técnico e Didático
Decreto n. 59.355, de 4 de outubro de 1966. Institui No Ministério da Educação e
Cultura a Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático (Colted) e Revoga o
Decreto 58.653-66.
Portaria n° 69, de 13 de março de 1967. Regimento da Comissão do Livro Técnico e do
Livro Didático
Lei n° 5.327, de 2 de outubro de 1967. Autoriza o Poder Executivo a instituir a
Fundação Nacional do Material Escolar.
Decreto n° 62.411, de 15 de março1968. Aprova o estatuto da Fundação Nacional do
Material Escolar (FENAME) e dá outras providências..
Decreto-lei n° 979, de 20 de outubro de 1969. Altera dispositivos da Lei n. 5. 327, de 2
de outubro de 1967.
MEC. Portaria Ministerial n° 594, de 27 de outubro de 1969. Extingui a Comissão
Nacional do Livro Didático.
Lei n° 5.540/68, de 28 de novembro de 1968. Fixa normas de organização e
funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola media, e dá outras
providências.
Decreto n. 68.728, de 9 de junho de 1971. Provê sobre a política do livro técnico e do
livro didático e dá outras providências.
Lei nº. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa as diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º
graus, e dá outras providências.
249

BRASIL. Documenta. Parecer do CFE nº. 853/71, aprovado em 12 de novembro de


1971 – Fixa o núcleo comum para os currículos do ensino de 1º e 2º grau, definindo-
lhes os objetivos e a amplitude.
MEC. Portaria n° 518, de 10 de setembro de 1973.
Decreto n. 77,107, de 4 de fevereiro de 1976. Dispõe sobre a distribuição de livros
textos e dá outras providências.
MEC. Portaria n° 02, de 5 de janeiro de 1982. Confere às Secretarias de Educação e
Cultura das Unidades Federadas as atribuições de análise, seleção e indicação dos
livros didáticos do PLIDEF, executados sob a responsabilidade da FENAME.
Lei n° 7.091, de 18 de abril de 1983. Altera a denominação da Fundação nacional de
Material Escolar, a que se refere a Lei n. 5.327, de 2 de outubro de 1967, amplia suas
finalidades e dá outras providências.
MEC. Portaria n. 206, de 12 de maio de 1983. Institui o grupo de estudos sobre o livro
didático.
Decreto n. 91.542, de 19 de agosto de 1985. Institui o Programa Nacional do Livro
Didático e dá outras providências.
BRASIL. Revista LEX. Decretos-leis, decretos e portarias: de 1938 a 1985. São Paulo.
BRASIL. Revista Documenta. Decretos-leis, decretos e portarias: de 1962 a 1985. São
Paulo.

Instituições e acervos consultados

Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP. Documentação sobre a


CNLD, INL, Fename e FAE.
Arquivo Central e Histórico do Inep, Brasília. Documentação sobre a CNLD, Caldeme,
Cileme e Colted.
Arquivo do MEC, Brasília. Legislação sobre Fename.
Arquivos do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil
CPDOC/FGV, Rio de Janeiro. Documentação sobre a CNLD e Colted.
Acervos da Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro. Documentação sobre
CNLD.
Arquivos do NUDOM – Núcleo de Documentação e Memória do Colégio Pedro II, Rio
de Janeiro. Documentação sobre CNLD.
250

Acervo da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Documentação sobre CNLD e FAE.


Acervo do Centro de Apoio à Pesquisa “Escola e Cultura”, do Programa de Estudos
Pós-graduados em Educação: História, Política, Sociedade (EHPS), da PUC/SP.
Documentação sobre a Caldeme e Cileme.
Acervo do Centro de Informação e Biblioteca em Educação – Cibec/Inep.
Documentação sobre a FAE e PNLD.
Acervo do Centro de Memória da Faculdade de Educação, da USP. Documentação
sobre CRPE/SP e textos de jornais sobre Colted.
Acervo do Programa de Estudos e Documentação Educação Sociedade (Proedes), da
Universidade Federal do Rio de janeiro. Documentação da Aliança para o Progresso e
sobre convênio MEC/SNEL/USAID.
Biblioteca do Livro Didático (BLD), da Faculdade de Educação da USP. Livro sobre o
caso Postch - Mello Leitão e livros didáticos avaliados pela CNLD.
251

Lista de Siglas

Abrale - Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos


Abrelivros - Associação Brasileira dos Editores de Livros
ABE – Associação Brasileira de Educação
ABL - Academia Brasileira de Letras
ABL - Associação Brasileira do Livro
ABC - Academia Brasileira de Ciências
ACL - Academia de Ciências de Lisboa
BLD - Biblioteca do Livro Didático
BNDE - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
CECIGUA - Centro de Ciências da Guanabara
Cades - Campanha de Difusão e Aperfeiçoamento do Ensino Secundário
Caldeme - Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino
Cileme - Campanha de Inquérito e Levantamento do Ensino Médio e Elementar
CBL - Câmara Brasileira do Livro
CBPE – Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais
Celted - Comissão Estadual do Livro Técnico e do Livro Didático
CEPM - Câmara de Ensino Primário e Médio
CFE - Conselho Federal de Educação
Colted – Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático
CNE - Conselho Nacional de Educação
CNLD - Comissão Nacional do Livro Didático
CNME - Campanha Nacional de Material de Ensino
CRPE - Centro Regional de Pesquisas Educacionais
DADP – Diretoria de Apoio Didático Pedagógico
DASP - Departamento Administrativo do Serviço Público
DEF - Departamento de Ensino Fundamental
DEM - Departamento de Ensino Médio
DDIP - Divisão de Documentação e Informação Pedagógica do CBPE
DNE - Departamento Nacional de Educação
FAE – Fundação de Assistência ao Estudante
Fename – Fundação Nacional do Material Escolar
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
252

GEILPE - Grupo de Estudos da Indústria do Livro


GTLD - Grupo de Trabalho sobre o Livro Didático
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IHGB - Instituto Histórico Geográfico Brasileiro
Inep – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
INL – Instituto Nacional do Livro
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MES – Ministério da Educação e Saúde
PABAEE - Programa de Assistência Brasileira-Americana ao Ensino Elementar
PCB – Partido Comunista Brasileiro
PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais
PLD - Programa do Livro Didático
PLIDEF - Programa do Livro Didático para Ensino Fundamental
PLIDEM - Programa do Livro Didático para Ensino Médio
PNLD - Programa Nacional do Livro Didático
PUC/RJ – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
RBEP – Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos
SEEs – Secretarias de Educação dos Estados
SNEL – Sindicato Nacional dos Editores de Livros
UNE – União Nacional dos Estudantes
UEE – União Estadual dos Estudantes
Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
USAID - United States Agency for International Development
USP – Universidade de São Paulo

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