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PUC-SP
(1938-1984)
SÃO PAULO
2011
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
SÃO PAULO
2011
BANCA EXAMINADORA
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AGRADECIMENTOS
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Este estudo tem como objetivo analisar os processos de avaliação de livros didáticos no
Brasil, pela perspectiva histórica, desde os anos 1930, quando foi estabelecida a
primeira avaliação organizada em âmbito federal. Durante a pesquisa foram encontrados
quatro grandes períodos relacionados a políticas nacionais para o livro didático, com
processos de avaliação distintos. O primeiro processo foi instituído por meio do
Decreto-Lei n° 1.006, de 1938, que criou a Comissão Nacional do Livro Didático
(CNLD). O segundo processo ocorreu durante os anos 1950 com a criação da
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme). O terceiro momento deu-
se no início da Ditadura Militar, em 1966, com a criação da Comissão do Livro Técnico
e do Livro Didático (Colted). O último momento iniciou-se em 1971, quando a Colted
foi extinta e suas funções passaram para o Instituto Nacional do Livro (INL), que
iniciou o Programa do Livro Didático e os processos de co-edição dos manuais, até
1976, quando o Programa do Livro Didático foi transferido para a Fundação Nacional
do Material Escolar (Fename). A pesquisa é encerrada com o fim do sistema de co-
edição nos anos 1980. Com esta tese, buscou-se compreender quem eram os sujeitos
envolvidos no campo de disputa sobre o manual escolar, qual a atuação e interesse
desses sujeitos, evidenciando, também, os conflitos e lutas que se estabeleceram nesse
campo. Baseada em autores como Chervel, Goodson e Choppin, a análise permitiu
verificar a importância dos manuais didáticos no processo de escolarização, na relação
de ensino e aprendizagem das disciplinas escolares. O exame dos diferentes processos
de avaliação mostrou a intenção dos diferentes grupos sociais de controlar o conteúdo
que seria veiculado pelo livro didático, demonstrando o valor desse instrumento na
escola, como ferramenta de uniformização e unificação cultural.
This study aims to analyze the textbook evaluation processes in Brazil, by their
historical perspective since the 1930’s, when the first nationally organized evaluation
process was established. During this research four major periods related to the textbook
national policies were identified, as well as different evaluation processes. The first
process was established by law no. 1.006 of 1983, which created the Comissão
Nacional do Livro Didático, the CNLD (Brazilian Textbook Commission). The second
process happened during the 1950´s, when the Campanha do Livro Didático e Manuais
de Ensino, the Caldeme (Textbooks and Teaching Manuals Campaign), was created.
The third moment took place during the military dictatorship in 1966 with the creation
of the Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático, the Colted (Technical Book and
Textbook Commission). The last moment started in 1971, when the Colted was
extinguished and its functions were transferred to the Instituto Nacional do Livro, the
INL (National Book Institute), which started the Programa do Livro Didático (Textbook
Program) and the manuals co-edition processes until 1976. After that the Programa do
Livro Didático (Textbook Program) was transferred to the Fundação Nacional do
Material Escolar, the Fename (School Material National Foundation). The research is
concluded with the extinction of the co-edition system in the 1980’s. The objective of
this thesis was to identify those involved in the dispute field over the school manuals,
what were the activities and interests of these agents, also highlighting the conflicts and
struggles over this field. Based in authors as Chervel, Goodson and Choppin, the
analysis allowed the verification of the importance of didactic manuals in the schooling
process, in the school subjects teaching and learning relation. The exam of different
evaluation processes showed the intention of different social groups to control the
content disclosed by textbooks, showing the value of this instrument in education as a
tool for standardizing and harmonizing culture.
Introdução ......................................................................................................................1
Capítulo 1
A Comissão Nacional do Livro Didático e as avaliações dos manuais escolares ... 17
A criação da Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) e sua organização ......... 19
Os membros da Comissão Nacional do Livro Didático ................................................ 25
A instalação da CNLD................................................................................................... 36
Os trabalhos ................................................................................................................... 39
A orientação para avaliação........................................................................................... 43
As avaliações ................................................................................................................. 46
Repercussões das avaliações ......................................................................................... 68
Reestruturação da CNLD............................................................................................... 74
Capítulo 2
A Campanha do livro didático e Manuais de Ensino e o problema da educação
secundária..................................................................................................................... 80
O problema do livro didático......................................................................................... 84
Outros lugares de atuação: o Inep e a organização da Caldeme.................................... 89
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino – Caldeme.................................... 93
Formação da Biblioteca Pedagógica................................................................. 96
Programas de ensino de outros países............................................................... 98
Publicação e Tradução de livros....................................................................... 100
Elaboração de material didático para ciências.................................................. 103
Produção de guias para os professores do ensino secundário.......................... 103
Análise crítica de livros didáticos e programas do ensino secundário ......................... 114
A análise dos programas e livros didáticos de Geografia............................................. 118
A análise dos programas e livros didáticos de História................................................ 128
O significado da Caldeme nas discussões sobre o ensino nos anos 1950 .................... 140
Capítulo 3
A Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático e a expansão do ensino ........... 145
Os projetos para o livro didático................................................................................... 148
O mercado dos livros didáticos e a criação da Colted.................................................. 153
A Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático – Colted....................................... 157
O Plano Inicial.................................................................................................. 163
A seleção das obras para bibliotecas................................................................ 167
A II Semana de Estudos da Colted................................................................... 171
A seleção dos livros didáticos para alunos do ensino primário – Projeto Piloto.......... 176
A orientação para avaliação..............................................................................178
As avaliações por áreas.................................................................................... 184
As repercussões do processo de avaliação dos livros didáticos pela Colted ................ 193
A Colted em 1969 até sua extinção em 1971 ............................................................... 196
Algumas considerações ................................................................................................ 198
Capítulo 4
Os processos de co-edição de livros didáticos e a reforma educacional ................. 201
A ficha e as avaliações..................................................................................... 210
A participação dos estados ........................................................................................... 217
Algumas repercussões das avaliações .......................................................................... 220
A Fundação Nacional de Material Escolar (Fename)................................................... 222
PLIDEM 1977/78 ......................................................................................................... 223
A ficha de avaliação......................................................................................... 224
A extinção da avaliação federal.................................................................................... 225
Algumas considerações ................................................................................................ 228
Lista de Tabelas
Tabela 1.1 – Avaliações dos livros didáticos por editoras ............................................ 47
Tabela 1.2 – Quantidade de avaliação por Seção .......................................................... 48
Tabela 1.3 – Relação entre avaliador e livros didáticos avaliados entre 1941 e 1942 .. 49
Lista de Figuras
Figura 2.1 – Livro Didático Luisinha aos oito anos...................................................... 87
Figura 2.2 – Livro Didático Seleta Escolar................................................................... 87
Figura 4.1 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 1......................................................... 211
Figura 4.2 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 2......................................................... 211
Figura 4.3 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 3......................................................... 212
Figura 4.4 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 4......................................................... 212
Figura 4.5 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 5......................................................... 212
Figura 4.6 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 6......................................................... 212
Figura 4.7 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 7......................................................... 213
Figura 4.8 – Ficha de Avaliação DEF/MEC, p. 8......................................................... 213
Figura 4.9 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 1....................................... 218
Figura 4.10 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 2..................................... 218
Figura 4.11 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 3..................................... 219
Figura 4.12 - Ficha de avaliação do estado de São Paulo, p. 4..................................... 219
INTRODUÇÃO
1
“Por que a escola ensina o que ensina?”, é o início da ementa do projeto de pesquisa História das
disciplinas escolares e do livro didático, do Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: História,
Política, Sociedade, da Pontíficia Universidade Católica de São Paulo.
2
didático, analisando as regras que o Estado impôs à sua produção nos diferentes
contextos históricos.
O projeto desta tese se iniciou assim, com o questionamento de porque é preciso
avaliar o livro didático. Por que o Estado torna-se responsável pelo controle dos
manuais e, em especial, como se dá esse controle, na prática? Quem são os avaliadores,
qual o objetivo das avaliações e o que procuram avaliar?
A presente tese segue nesse caminho, ao procurar compreender a história da
política nacional para o livro didático no Brasil nos diferentes contextos históricos e,
mais detalhadamente, os processos de avaliação desses manuais, buscando evidenciar
quem eram os sujeitos envolvidos no campo de disputa sobre o manual escolar, qual a
atuação e interesse desses sujeitos evidenciando, também, os conflitos e lutas que se
estabeleceram nesse campo. Ao avaliar e selecionar os manuais escolares que poderiam
ser utilizados nas escolas brasileiras, as comissões de avaliação procuraram determinar
o que era legítimo e o que poderia ser estudado pelos alunos.
Atualmente, os livros didáticos utilizados nas escolas públicas brasileiras, nos
ensinos Fundamental, Médio e Educação de Jovens e Adultos (EJA), passam por um
processo de avaliação e seleção que integram o Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD). As escolas recebem os livros, que são utilizados por três anos. Esses
programas têm grande importância, pois possibilitam o acesso do livro didático a todos
os estudantes do país, implicam impressionantes gastos públicos em educação e, por
meio do processo da avaliação, estabelecem o que deve ser lido pelos alunos brasileiros,
determinando o conhecimento aceito como legítimo. Segundo Cassiano (2007), a
política do livro didático instituída com o PNLD, “revolucionou o mercado desses
livros no Brasil, culminando numa distribuição gratuita sem precedentes, desses
manuais na história do país” (p. 21).
O PNLD foi criado pelo Ministério da Educação, por meio do Decreto n°
91.542, de 19 de agosto de 1985. Em um momento de redemocratização do país com o
fim da ditadura militar, o Programa Nacional do Livro Didático objetivava adquirir e
distribuir livros didáticos, gratuitamente, para os alunos de primeira a oitava séries do
ensino fundamental das escolas públicas brasileiras. A execução do PNLD estava,
inicialmente, sob responsabilidade da Fundação de Assistência ao Estudante (FAE), que
deveria articular-se com as Secretarias de Educação dos estados, Distrito Federal e
territórios, órgãos municipais e associações comunitárias, sob a supervisão da Secretaria
5
Cassiano (2007, p. 15) afirma, de tal modo, que o PNLD foi constituído por dois
marcos estruturais. O primeiro era a própria implementação do Programa em 1985, com
a redemocratização do país. O segundo, em 1995, no governo de Fernando Henrique
Cardoso, com a legitimação do PNLD, que passou a ter destinação assegurada de
recursos e sofreu três alterações significativas que deram consistência ao Programa: “a
efetiva universalização da distribuição dos livros ao alunado do ensino fundamental, a
implementação de uma avaliação governamental dos livros comprados e distribuídos
pelo Estado e a ampliação significativa desse programa” (Cassiano, 2007, p. 15).
Até o início dos anos 1990, o Ministério da Educação, no contexto da política do
livro didático, exercia a função de ser o “mediador entre os professores e o campo da
produção editorial” (Batista, 2001, p. 16). O MEC somente comprava os livros didáticos
escolhidos pelos docentes. Essa posição fazia com que o MEC tivesse pouca atuação em
relação aos padrões de qualidade dos livros escolares. Tal preocupação, com a
qualidade dos livros comprados pelo Estado, surgiu mais efetivamente no fim dos anos
1980. De acordo com relatório da FAE, no ano de 1987 diversos encontros e debates
foram organizados para discutir a qualidade dos livros didáticos. Em 1993, o MEC
divulgou o Plano Decenal de Educação para todos que discutiu, entre outros assuntos,
o problema da qualidade dos livros didáticos que eram comprados pelo governo federal.
Assim, em 1993 foi instituído um grupo de trabalho para avaliar os manuais
escolares. Por meio da Portaria n° 1.130 formou-se uma comissão para analisar a
qualidade dos conteúdos programáticos, dos aspectos pedagógicos e metodológicos dos
livros didáticos que estavam sendo comprados pelo MEC, para as séries iniciais do
ensino fundamental. Os Grupos de Trabalho (GT) dessa Comissão foram compostos por
professores universitários, técnicos de Secretarias de Educação de alguns estados e por
6
professores do ensino básico2. Com essa primeira avaliação, o MEC publicou junto à
Unesco, em 1994, a Definição de critérios para avaliação de livros didáticos.
A avaliação de 1993 analisou os livros didáticos em seus aspectos conceituais,
pedagógico-metodológicos, quanto a recepção e produção dos textos e, quanto ao
projeto visual – nos fatores de legibilidade tipográfica (caracteres, capa, miolo, parte
textual e pós-textual) -, nos princípios para visualização das hierarquias; no formato do
livro; nos recursos gráficos e nas ilustrações.
A análise final das obras encontrou “problemas graves”, presentes nos manuais,
destacando-se os seguintes aspectos: a uniformização dos livros didáticos, muito
parecidos uns com os outros; textos com erros de conteúdo e conceituais; textos que
induziam a preconceitos e estereótipos; assuntos estanques, sem relação ao longo dos
capítulos e das unidades; exercícios mecânicos que conduziam à simples memorização;
distância entre os conteúdos e a realidade da criança; despreparo dos autores,
desqualificados, sem formação nas áreas específicas; má qualidade do manual do
professor; não existência de um projeto real de livro não-consumível; defasagem entre a
produção acadêmica e o conteúdo dos livros didáticos (Exemplo: gramática tradicional,
movimento da Matemática moderna, etc.).
As conclusões gerais da análise de 1993 destacaram que os livros didáticos
analisados expressavam a visão da escola e do papel do professor como:
2
Participaram da avaliação de 1993 os seguintes professores, de acordo com as áreas: Português, Antenor
Antônio Gonçalves Filho – Doutor em História e Filosofia da Educação, professor da UNESP de Marília;
Heliane Gramiscelli Ferreira de Mello – Doutora em Psicologia Escolar, professora da UFMG; Jaqueline
Moll – Mestra em Educação, professora da UFRGS; Luiz Percival Leme Brito – Mestre em Lingüística,
professor da Unicamp; Leonor Scliar-Cabral – Doutora em Psicolingüística Aplicada, professora da
UFSC; Magda Becker Soares – Doutora e Livre Docente em Educação, professora da UFMG; Nadja da
Costa Ribeiro Moreira – Doutora em Lingüística Aplicada, professora da UFCe. Matemática, Anna
Franchi – Mestra em Psicologia da Educação, professora da PUC/SP; Iara Augusta da Silva – Técnica do
Setor de Supervisão de Avaliação e Capacitação da Secretaria de Estado de Educação do Mato Grosso do
Sul; João Bosco Pitombeira – Doutor em Matemática, professor da PUC/RJ; Martha Maria de Souza
Dantas – Professora da UFBa; Tânia Mara Mendonça Campos – Doutora em Matemática, professora da
PUC/SP. Estudos Sociais, Edna Maria Santos – Mestre em Educação, professora da UERJ e USU; Elza
Nadai – Doutora em História Social e Livre-Docente em Educação, professora da USP; Léo Stampacchio
– Mestre em História do Brasil, membro da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas da
Secretaria de Estado da Educação de São Paulo; Selva Guimarães Fonseca – Mestre em História do
Brasil, professora da UFU; Valéria Trevizani Burla de Aguiar – Professora da UFJF. Ciências, Catarina
Fernandes de O. Fraga – Professora da UFPe; Demétrio Delizoicov Neto – Doutor em Didática do Ensino
de Ciência, professor da Unicamp; Miguel Castilho Júnior – Professor da Escola Nova Lourenço
Castanho/SP; Ronaldo Mancuso – Mestre em Educação, professor lotado no Centro de Ciências da
Secretaria de Estado da Educação do Rio Grande do Sul.
7
3
De acordo com o documento do Ministério da Educação: “[No PNLD/97] Com base no Guia, os
professores puderam ter condições mais adequadas para a escolha do livro que julgavam mais apropriado
a seus pressupostos, às características de seus alunos, às diretrizes do projeto político-pedagógico de sua
escola (...) Só não puderam escolher livros que – em razão de apresentarem preconceito, discriminação,
erro conceitual grave – foram excluídos do Programa Nacional do Livro Didático” (BATISTA, 2001, p.
14).
4
Os Guias de Livros Didáticos contém as resenhas das obras aprovadas. O guia apresenta ainda as obras
organizadas por disciplinas.
8
5
Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram implementados em 1996, como orientação para as
disciplinas escolares do ensino fundamental e médio.
6
Algumas matérias: O que ensinam às nossas crianças, de Ali Kamel, jornal O Globo, de 18/09/2007; O
que estão ensinando a nossas crianças, Revista Época n° 492, de 22/10/2007; Livros didáticos: cifrões e
ideologia, Carta Capital n° 464, de 3/10/2007.
9
7
Foram analisados os livros didáticos da Biblioteca do Livro Didático (BLD), da Faculdade de Educação,
da USP.
11
Estado Novo. Ela observou os discursos oficiais e a elaboração das normas de regulação
da produção e autorização dos livros didáticos. Por restringir-se aos documentos do
CPDOC, a autora não conseguiu verificar como se deu, na prática, a atuação dos
membros da CNLD no processo de avaliação dos manuais. Para a autora, a CNLD não
funcionou e, conseqüentemente, não concretizou os seus objetivos.
O mestrado de Ferreira (2008) trouxe grande contribuição, contudo, no presente
estudo, com o aprofundamento da pesquisa e a análise de outros documentos, além dos
do CPDOC, foi possível constatar que a CNLD avaliou os livros didáticos. Foram
encontrados documentos em outros arquivos, dentre eles as avaliações dos livros
didáticos, que possibilitaram examinar outros aspectos da CNLD, principalmente,
compreender como se deu o processo de análise dos livros didáticos e a influência
dessas análises na constituição das disciplinas escolares. Os documentos permitiram,
ainda, observar os conflitos internos da Comissão e a sua relação com os autores e
editoras.
Krafzik (2006) investigou a organização e funcionamento da Comissão do Livro
Técnico e do Livro Didático (Colted) e sua atuação no convênio MEC/SNEL/USAID. A
autora apresentou os programas da Colted, que compreendiam a distribuição de livros
para as bibliotecas escolares nos três níveis de ensino, para os alunos do ensino primário
e os cursos de treinamento para professores primários. Para a pesquisa a autora utilizou
os documentos localizados no Centro de Informações e Biblioteca em Educação
(Cibec), do Inep, os livros produzidos pela Colted e a legislação do período. O estudo
de Krafzik (2006) centrou-se na descrição da estrutura da Colted, sem o detalhamento
dos sujeitos envolvidos com o processo. Dessa forma a autora não analisou os debates e
conflitos internos da Comissão e não examinou as avaliações dos livros didáticos.
O presente estudo discutiu a estrutura da Colted, procurando detalhar quem fez
parte da Comissão, além de compreender as relações que se estabeleceram entre esses
sujeitos, buscando entender o significado de sua participação para o andamento dos
trabalhos. A localização das avaliações dos livros didáticos para o ensino primário
permitiu apresentar novas análises sobre a Comissão, ao observar como foram
constituídas as comissões de avaliação dos livros didáticos, quem eram os seus
membros, seu lugar de fala e a sua atuação na avaliação dos manuais.
Por fim, cabe ressaltar as pesquisas de Munakata (2002, 2004, 2006), sobre a
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme). O autor desenvolveu os
primeiros estudos sobre a Campanha, com os documentos localizados no Arquivo
12
Acervos e fontes
8
O Centro de Apoio à Pesquisa “Escola e Cultura” foi despejado em fevereiro de 2009 pela Pró-Reitoria
de Pós-graduação da PUC/SP.
15
A estrutura do trabalho
CAPÍTULO I
9
Diversos arquivos foram consultados em busca de informações sobre a CNLD. Dentre os documentos
relevantes, memorandos, ofícios, cartas e as avaliações dos livros didáticos, destacaram-se os seguintes
acervos: 1. Biblioteca Nacional, livros sobre o caso Postch - Mello Leitão; 2. Arquivo do Centro de
Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC/FGV), material sobre a criação
e atuação da CNLD até 1945; 3. Arquivo Central e Histórico do Inep, material sobre a CNLD após 1945;
4. Biblioteca do Livro Didático (BLD), da FEUSP, livro sobre o caso Postch - Mello Leitão e livros
didáticos avaliados pela CNLD; 5. Núcleo de Documentação e Memória (NUDOM) do Colégio Pedro II,
quatro volumes sobre o caso Postch – Mello Leitão e atas da Congregação com discussões sobre a
CNLD; 6. Fundação Casa de Rui Barbosa, encaminhamento de livros didáticos para avaliação em 1947 e
1952; 7. Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP, avaliações da CNLD nos anos 1940.
Esses documentos foram produzidos pela CNLD, pelo Inep, MES e pelo Sindicato Nacional de Editores
de Livros (SNEL). A legislação do período também foi analisada. Para compreender o pensamento
pedagógico dos avaliadores da CNLD, foram examinados os livros de sua autoria, principalmente
didáticos ou que tratavam da educação.
10
O Decreto n° 19.890 estabeleceu a divisão do secundário em dois ciclos, fundamental e complementar,
organizado por séries. Estabeleceu os estudos regulares, com a freqüência obrigatória das aulas, a
aprovação em todas as disciplinas para promoção à próxima série e organizou um sistema de inspeção
federal dos estabelecimentos de ensino. Foram organizados, ainda, programas de ensino (com os
conteúdos e métodos das disciplinas) para todo o país. A Reforma Francisco Campos pretendia acabar
com a antiga estrutura do secundário, entendida como irregular e sem seriação, e principalmente os cursos
preparatórios para os exames parcelados, em busca de certificados para ingresso nos cursos superiores.
18
11
Na década de 1930, os estabelecimentos particulares eram responsáveis por mais de 75% das
matrículas do ensino secundário (Souza, 2008, p. 151).
12
Em outubro de 1937, foi criada a Seção de Segurança Nacional no Ministério da Educação e Saúde,
pelo Decreto n° 2.036. A Seção deveria articular a relação entre o Ministério da Educação e Saúde, a
Secretaria Geral de Segurança Nacional e os outros Ministério, nos assuntos referentes à educação e
saúde.
13
A educação colaboraria para a construção do Estado Nacional, na organização de uma cultura nacional.
O projeto educacional contribuiria para formação do novo cidadão, nacionalizando a população, por meio
da organização de uma escolarização uniforme, com um conteúdo escolar único a ser transmitido em
todas as escolas, e tornando obrigatória a Língua Portuguesa como idioma pátrio.
19
14
As editoras que se destacavam na produção de livros didáticos nos anos 1930 e 1940 eram: a
Companhia Editora Nacional (criada em 1925); a Editora do Brasil (criada em 1943); a Coleção FTD
(criada em 1902); a Companhia Melhoramentos (adquirida pela Weiszflog Irmãos & Cia nos anos 1920);
a Saraiva (antiga Livraria Acadêmica, criada em 1914); e a Francisco Alves (que atuava desde o século
XIX).
15
Em pesquisa de mestrado de Ferreira (2008) analisou os documentos sobre a CNLD arquivados no
Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC). As fontes
apresentadas pela autora também foram citadas e analisadas neste trabalho. Porém, a presente tese buscou
aprofundar a pesquisa sobre a CNLD ao trabalhar não somente com os documentos do CPDOC, mas com
documentos encontrados em outros arquivos, conforme foi indicado no início deste capítulo.
16
O documento “Livros Escolares: projeto de exposição de motivos”, encontrado no arquivo Gustavo
Capanema do CPDOC não apresenta data.
17
Antes da criação da Comissão Nacional do Livro Didático e da centralização da avaliação dos manuais
em âmbito federal, os livros para o ensino primário eram controlados pelos estados. De acordo com
Razzini (2007, p. 24), no estado de São Paulo, que foi pioneiro em expandir o ensino primário para todo o
estado, com programas graduados de ensino e a introdução do método simultâneo, o consumo de livros
didáticos se ampliou e intensificou o crescimento do mercado de livros escolares. Para controlar esse
material, em 1918, o decreto que organizou o programa de ensino de São Paulo, estabeleceu, também, a
criação de uma Comissão Revisora para fiscalizar os manuais didáticos, composta por Américo de
Moura, Antônio Sampaio Dória e Plínio Barreto (Bittencourt, 1990, p. 124). Gonçalves (2005, p. 30)
ressalta que em 1929, o Diretor Geral da Instrução Pública de São Paulo, Amadeu Mendes, teve a
iniciativa de criar novas normas para a aprovação e adoção de livros didáticos para o ensino primário. Em
1933, nova comissão de avaliação do estado foi organizada, composta por Theodoro de Moraes, Antônio
de Almeida Jr., João Batista D. Penna, Noemy M. da Silveira e José Ribeiro Escobar. A comissão atuou
até 1935. Nesse ano, Antônio de Almeida Jr., ao assumir a Diretoria Geral do Departamento de Educação
de São Paulo, criou a seção de livros didáticos, “responsável pela organização de uma comissão de
revisão da literatura didática” (Gonçalves, 2005, p. 2). As cartilhas e livros de leitura continuaram a ser
avaliados pelo governo do estado de São Paulo e por Diretorias de Instrução Pública de outros estados até
1938, quando a avaliação dos manuais foi centralizada pelo governo federal.
20
reprimidos, como a propaganda subversiva, presente nos textos preparados para uso nas
escolas. Ainda, segundo Capanema, o projeto de Decreto-lei era contrário ao livro
único, defendendo a livre iniciativa na produção dos manuais e a livre escolha dos
professores e diretores de escola (Projeto de Exposição de motivos, s/d).
O projeto de decreto-lei possuía apenas sete artigos e pretendia fiscalizar os
manuais de ensino elementar. De acordo com o documento, cada estado formaria uma
comissão para selecionar os livros que seriam adotados nos estabelecimentos de ensino
públicos e particulares. Os compêndios escolhidos seriam submetidos à aprovação de
uma comissão do Ministério da Educação. Em janeiro de 1939 nenhum compêndio
poderia ser adotado nas escolas primárias sem a aprovação do Ministério.
Durante o mês de janeiro de 1938, a Divisão do Ensino Primário e a Divisão de
Ensino Superior do Ministério da Educação encaminharam documentos com sugestões
ao Projeto de Decreto-lei. As sugestões versavam sobre: substituição da palavra classe
por curso, que designaria um nível de ensino (curso primário, curso secundário, etc.),
aos quais se assegurariam compêndios correspondentes; a organização de comissões
para o estudo rápido dos compêndios; prazo suficiente para as editoras e autores
adequarem os livros as novas exigências; normas de encaminhamento das obras para
exame da Comissão; seleção dos livros adotados por meio de lista dos Departamentos
de Educação; observar os compromissos estabelecidos entre o Brasil e outros países
relativos à revisão de livros de História e Geografia18; estender a avaliações para
manuais do ensino secundário; e organização de concursos para incentivar a produção
de novos livros didáticos (Ferreira, 2008, pp. 40-41).
As sugestões das duas Divisões de Ensino foram anexadas a um novo projeto,
que descartava as comissões especiais dos Departamentos de Educação dos estados,
“recorrendo-se a elas apenas quando a comissão do Ministério achasse conveniente o
parecer de técnicos e professores para estudo de pontos considerados obscuros”
(Ferreira, 2008, p. 41). O Ministério da Educação e Saúde tornar-se-ia responsável pela
análise dos manuais escolares, por meio da Comissão do Livro Didático Nacional. O
novo projeto evidenciava quais eram as questões centrais na política do livro didático
18
Em 1933, o Brasil assinou dois convênios para a análise dos manuais de ensino de História e Geografia
com a Argentina e com o México, respectivamente em 10 de outubro de 1933 e 28 de dezembro de 1933.
Os convênios eram fruto das discussões do período sobre a necessidade de cooperação internacional entre
as nações. Ambos decorrem da participação desses países no I Congresso de História Nacional, realizado
em Montevidéu, no ano de 1928. As comissões de revisão dos manuais adotados para o ensino de
História Nacional e Geografia dos três países deveriam expurgar dos livros os tópicos que servissem para
excitar nos jovens a aversão a qualquer povo americano, além de atualizar os manuais sobre as riquezas e
capacidade de produção dos Estados americanos.
21
elaborada por Capanema: “a livre iniciativa de produção e escolha dos materiais pelos
professores, o controle ideológico e metodológico das matérias e as penalidades da lei
sobre autores, editores e escolas que não cumprissem os dispositivos estabelecidos pelo
Decreto” (Ferreira, 2008, p. 42).
O Decreto-lei foi promulgado oficialmente em 30 de dezembro de 1938, sob n°
1.006, estabelecendo as condições de produção, importação e utilização do livro
didático. Segundo o decreto-lei, livros didáticos eram os compêndios e os livros de
leituras de classe. Os compêndios eram os livros que expunham total ou parcialmente a
matéria das disciplinas constantes dos programas escolares. Os livros de leitura de
classe eram os livros usados para leitura dos alunos em aula.
O Decreto-lei criou a Comissão Nacional do Livro Didático, vinculada ao
Ministério de Educação e Saúde, encarregada, entre outras funções, de autorizar o uso
dos livros didáticos que deveriam ser adotados no ensino das escolas pré-primárias,
primárias, normais, profissionais e secundárias de toda a República (escolas públicas e
privadas). A CNLD deveria:
A CNLD deveria ser integrada por sete membros, designados pelo Presidente da
República, escolhidos dentre “pessoas de notório preparo pedagógico e reconhecimento
moral” (Decreto-Lei n° 1.006/38), divididos em especializações: duas especializadas em
metodologia das línguas, três em metodologia das ciências e duas em metodologia das
técnicas. Os membros da comissão não poderiam ter nenhuma ligação de caráter
comercial com qualquer casa editorial do país ou estrangeira. Em 1939, devido ao
grande volume de livros inscritos pelas editoras, o número de membros da Comissão
aumentou para dezesseis, por meio do decreto-lei n° 1.177. A CNLD possuiria,
também, uma secretaria encarregada do expediente administrativo.
Segundo o Decreto-Lei n° 1.006/38, a CNLD somente avaliaria os livros
didáticos, ficando a cargo dos professores e diretores das escolas a escolha dos livros
22
para uso dos alunos, contanto que constassem da relação oficial das obras autorizadas.
Após a seleção, o professor estaria livre para escolher o processo de utilização do livro
adotado, observando a orientação didática dos programas curriculares.
Os autores e as editoras interessados na autorização de seus livros didáticos
deveriam encaminhar uma petição ao Ministro da Educação, juntamente com três
exemplares da obra, impressos ou datilografados. Se fossem enviados exemplares
datilografados, deveriam ser acompanhados de via com desenhos, mapas, etc.
De acordo com o decreto-lei n° 1.006/38, os membros da CNLD não poderiam
requerer autorização para uso de obras de sua própria autoria. Esse artigo foi
modificado logo em seguida, em julho de 1939, com o decreto-lei n° 1.417, que
revogou tal item e permitiu a autorização de livros didáticos cuja autoria fosse de algum
membro da CNLD:
Art. 2°. A autorização para uso do livro didático, cuja autoria seja no todo ou
em parte de algum membro da Comissão Nacional do Livro Didático, será
requerida ao Ministro da Educação, com observância do disposto no art. 12
do Decreto-lei n° 1.006, de 30 de dezembro de 1938. Recebido o livro,
submetê-lo-á o Ministro da Educação ao exame de uma comissão especial de
três ou cinco membros, por ele escolhidos dentre especialistas estranhos à
Comissão Nacional do Livro Didático (Decreto/lei n° 1.417/39).19
19
As comissões especiais foram indicadas em fevereiro de 1941 e estavam compostas por:
Línguas e Literatura – José Lourenço dos Santos (Instituto de Educação), Geyza Calaza (Diretora da
Escola Paulo Frontin), Floriano Ribeiro de Queiroz (professor do município do Rio de Janeiro);
Matemática e Desenho – Antonio Pereira Caldas (Instituto de Educação), Roberto Peixoto (Instituto de
Educação), Arsilio Papini (Externato Santo Inácio);
Ciências Físicas e Naturais – Djalma Régis Bittencourt (Colégio Militar), Maria Luiza Hussak (Instituto
de Educação), Fernando da Silveira (Instituto de Educação);
Geografia – Vitor Ribeiro Leuzinger (Faculdade Nacional de Filosofia), Joel Marques Braga, Oscar
Tenório (Faculdade de Direito do Distrito Federal);
História da Civilização e do Brasil – Roberto Bandeira Acióli (Colégio Pedro II), Américo Jacobina
Lacombe (Casa Rui Barbosa), Eugênio Vilhena de Morais (Arquivo Nacional);
Filosofia, Sociologia e Pedagogia – Vitor Ribeiro Leuzinger (Faculdade Nacional de Filosofia), Américo
Jacobina Lacombe e Ersílio Papini (Fonte: Arquivo Gustavo Capanema do CPDOC/FGV).
23
encaminhadas ao Ministro da Educação, que tomaria sua decisão após ouvir o Conselho
Nacional de Educação (CNE).
Os livros didáticos autorizados receberiam um número de registro, que
apareceria na capa, juntamente com a frase: “livro de uso autorizado pelo Ministério da
Educação”. A reedição de livros didáticos autorizados que não possuíssem grandes
alterações não precisava passar por nova avaliação, mas a reedição deveria ser
comunicada à CNLD. Em janeiro de cada ano, o Ministério da Educação publicaria no
Diário Oficial a relação de livros didáticos de uso autorizado.
Os critérios de eliminação dos livros didáticos estavam divididos em duas partes.
A primeira, sobre as preocupações político-ideológicas, visando à construção de uma
identidade nacional, compreendia os seguintes itens:
20
A participação das Forças Armadas nas discussões educacionais reforçava o projeto da escola para
formação cívica dos jovens. De acordo com Baía Horta (1994), o conceito de segurança nacional,
colocado a partir de 1934, introduziu como temas centrais a preparação moral e a preparação militar dos
24
cidadãos. Com a implantação do Estado Novo a atuação das Forças Armadas se intensificou. O
fortalecimento da raça, a formação para o trabalho, a preocupação com a segurança nacional e a defesa
dos valores nacionais, segundo o autor, eram argumentos utilizados pelos defensores do regime
autoritário (Baía Horta, 1994, p. 52).
21
A Igreja esteve presente nas discussões educacionais durante o Estado Novo, visando “trabalhar para
que ‘os princípios básicos da ordem social cristã’ voltassem a orientar a constituição política do país”
(Baía Horta, 1994, p. 98). Até 1932, católicos participavam das discussões educacionais na Associação
Brasileira de Educação (ABE). As discordâncias entre católicos e os reformadores do ensino, adeptos do
movimento da Escola Nova, tornaram-se explícitas na IV Conferência Nacional de Educação, em 1931.
Em 1932, após a divulgação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que defendia a escola
pública, gratuita, laica, obrigatória, comum e única para todas as crianças de 7 a 15 anos, o grupo católico
saiu definitivamente da ABE. Com saída do grupo católico da ABE, o Centro Dom Vital e a
Confederação Católica Brasileira de Educação (criada em 1934), tornaram-se importantes espaços de
discussão dos intelectuais vinculados à Igreja. A Igreja Católica passou a se posicionar de modo mais
agressivo a partir de 1935, após os levantes comunistas organizados pela Aliança Nacional Libertadora
(organizada pelo PCB e tenentes de esquerda). Em 1936, Alceu Amoroso Lima foi indicado pelo
Ministério da Educação para fazer parte, em conjunto com a Comissão Executora do Estado de Guerra, da
Comissão Nacional de Repressão ao Comunismo, que segundo Baía Horta, havia solicitado a prisão de
Anísio Teixeira (então diretor do Departamento Municipal de Educação do Distrito Federal) e o
afastamento de professores da Universidade do Distrito Federal (Baía Horta, 1994, p. 39).
25
292, regulamentou o uso da ortografia nacional, tornando obrigatório o seu uso “no
expediente das repartições públicas oficiais de todo o país, bem como em todos os
estabelecimentos de ensino, mantidos pelos poderes públicos ou por eles fiscalizados”
(Decreto-lei n° 292/38). Não seria permitido, a partir de 1 de janeiro de 1941, livros
didáticos escritos em ortografia diferente da nacional22.
Para compreender a escolha dos membros que fariam parte da CNLD é preciso
entender, o ambiente e a rede de sociabilidades que se estabeleceu em torno do Ministro
da Educação e Saúde Gustavo Capanema, que permaneceu no cargo por onze anos – de
1934 a 194523 -, e que congregou um importante grupo de intelectuais de diferentes
posicionamentos: “Gustavo Capanema cercou-se de um ampla rede de relações oriundas
de sua trajetória intelectual e política para compor o quadro de colaboradores e
funcionários do Ministério” (Ferreira, 2008, p. 47). Participavam das discussões
educacionais pessoas vinculadas a diferentes grupos da sociedade. Desse modo,
Gustavo Capanema reuniu no Ministério da Educação e Saúde, membros das Forças
Armadas, da Igreja e um importante grupo de intelectuais e educadores que
participaram dos debates políticos e educacionais e das reformas de ensino dos anos
192024. Educadores que participavam da Associação Brasileira de Educação (ABE)25,
22
A discussão sobre a ortografia nacional não se encerrou em 1938, pois o novo vocabulário ortográfico
não seria publicado nos anos seguintes. Em 1943, o Decreto-Lei n. 5.186 regulou sobre o uso da
ortografia em todo o país. Como o vocabulário oficial estava em elaboração pela ABL e pela ACL,
deveria ser utilizado, até sua efetivação, o “Vocabulário Ortográfico e Ortoépico da Língua Portuguesa”,
publicado em 1932. A Convenção Ortográfica entre o Brasil e Portugal foi promulgada em 18/1/1944,
pelo Decreto n. 14.533.
23
Durante sua gestão, Capanema organizou reformas administrativas no Ministério ampliando sua
atuação. Dentre outras medidas, colocou o Serviço de Radiodifusão Educativa e o Instituto Nacional de
Cinema Educativo sob responsabilidade do MES, reestruturou o Conselho Nacional de Educação, criou o
Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep), a Universidade do Brasil, a Faculdade Nacional de
Filosofia e a Escola Nacional de Educação Física e Desportos. Criou, ainda, o Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o Serviço Nacional do Teatro, a Comissão Nacional do Livro
Infantil e o Instituto Nacional do Livro (INL) (Baía Horta, 2002, p. 426).
24
Na década de 1920, muitos estados e o Distrito Federal promulgaram reformas educacionais com
ênfase no ensino primário A reforma do Distrito Federal (1929) foi realizada por Fernando de Azevedo.
Outros estados que realizaram reformas foram: São Paulo (1920), por Sampaio Doria; Bahia (1925), por
Anísio Teixeira; Ceará (1923), por Lourenço Filho; Minhas Gerais (1927), por Francisco Campos;
Pernambuco (1929), por Carneiro Leão, etc. Essas reformas ficaram conhecidas por se orientar pelo
movimento da Escola Nova e da pedagogia moderna, que vinha sendo debatida pelos educadores na ABE
e que propunha a reformulação das instituições escolares, com novas discussões sobre os objetivos da
educação escolar. O ensino das escolas primárias deveria ultrapassar o básico - ler, escrever, contar -, e
formar o novo cidadão, “construtor de um ‘novo’ país” (Bittencourt, 1990, p. 95).
26
25
A Associação Brasileira de Educação (ABE) foi criada em 1924. Segundo Carvalho, em seu estatuto, a
ABE apresentava os seguintes objetivos pedagógicos: “promover no Brasil a difusão e o aperfeiçoamento
da educação em todos os ramos e cooperar em todas as iniciativas que tendam, direta ou indiretamente, a
esse objetivo” (1998, pp. 54-55). Contudo, Carvalho enfatiza que os propósitos educacionais da ABE
vinculavam-se a “um programa de reordenação político-jurídica do país” (1998, p. 55). Mais detalhes
sobre a ABE ver: Carvalho, 1998.
26
Um exemplo que estava presente na lista é o nome de José Oiticica. Capanema observava que a polícia
considerava-o anarquista.
27
O Colégio Pedro II, criado em 1837, foi o primeiro colégio oficial de instrução secundária do Brasil.
Era público, federal e considerada a escola modelo do Ensino Secundário, a principal referência desse
nível de ensino
27
» Abgar Renault
» Euclides de Medeiros Guimarães Roxo
» Coronel Waldemar Pereira Cotta
» Padre Leonel Franca
» Álvaro Ferdinando de Souza da Silveira
» Coronel Alonso de Oliveira
» Comandante Armando Pinna
» Jonathas Archanjo da Silveira Serrano
» Maria Junqueira Schmidt
» Carlos Delgado de Carvalho
» Antônio Carneiro Leão
» Rodolfo Fuchs
» Hahnemann Guimarães
» Cândido Firmino de Mello Leitão
» João Batista Pecegueiro do Amaral
» Adalberto Menezes de Oliveira (Marinha)
» José de Melo Moraes28
(Fonte: arquivo do CPDOC/FGV).
28
Não chegou a tomar posse, sendo substituído por Rui da Cruz Almeida.
29
As informações referentes aos membros da CNLD foram encontradas em mídias digitais, tais como:
CPDOC - http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/Busca/BuscaConsultar.aspx, acesso em 20/11/2010; e
ABE - http://www.abe1924.org.br, acesso em 20/11/2010. Foram utilizadas informações de livros dos
próprios educadores, pertencentes a CNLD, e outras obras que trouxeram esse educadores como objeto.
Ferreira (2008); Freitas (2010); Peixoto (2002); Sório (2004); Guerra (2008); Mendonça (2002); Carvalho
(1998).
30
De acordo com Peixoto (2002), Abgar Renault, participou do movimento modernista mineiro ao lado
de “Carlos Drummond de Andrade, Emílio Moura, Mário Casasanta, Milton Campos, Cyro dos Anjos,
Aníbal Machado, Alphonsus de Guimarães Filho, Murilo Mendes e outros” (p. 28).
28
31
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova foi lançado em 1932 e assinado por educadores que
participaram das discussões educacionais e das reformas de ensino dos anos 1920. Dentre os signatários
destacavam-se Anísio Teixeira, Delgado de Carvalho, Fernando de Azevedo, Afrânio Peixoto, A. de
Sampaio Doria, Lourenço Filho, Mario Casasanta, A. Ferreira de Almeida Jr., entre outros. O Manifesto
explicitava questões debatidas por esses educadores, em busca de um movimento de renovação
educacional, que situava a Escola Nova como uma reação contra a velha estrutura do serviço educacional,
considerado artificial e verbalista. O Manifesto propunha uma educação com “espírito filosófico e
científico”, com métodos baseados na investigação científica. Dentre suas propostas, o Manifesto rompia
com os educadores católicos, ao propor uma escola pública, gratuita, laica, obrigatória, comum e única
para todas as crianças de 7 a 15 anos. Estabelecia a necessidade de descentralização da educação
brasileira e uma nova proposta pedagógica, em que o eixo da escola seria a criança e o respeito pela sua
personalidade.
30
preparação dos programas de ensino do curso ginasial na reforma Capanema. Era autor
de manuais didáticos de Geografia e História e manuais para professores. Alguns de
seus livros didáticos eram: Geographia do Brasil, pela Francisco Alves, de 1913;
Chorographia do Districto Federal, pela Francisco Alves, de 1926; Geografia Humana,
Política e Econômica, pela Cia. Nacional, de 1934; E livros para formação de
professores: Sociologia Educacional, pela Série Atualidades Pedagógicas da Cia.
Nacional, de 1933; Sociologia e Educação, pela Editora Guanabara, de 1934. A partir
dos anos 1940 passaria a publicar livros didáticos pela Cia. Nacional, tais como:
Geografia Física e Humana, de 1940; Geografia Regional do Brasil, de 1943; História
Antiga e Medieval, de 1945; História Moderna e Contemporânea, de 1946; Súmulas de
História Colegial, de 1947; Súmulas de História ginasial, de 1949.
Euclides Guimarães Roxo era Bacharel pelo Colégio Pedro II e formado em
Engenharia Civil pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Tornou-se professor do
Colégio Pedro II, em 1915. Foi membro do Conselho Diretor da ABE, de 1929 a 1931 e
fez parte da comissão de ensino secundário da Associação (Sório, 2004, p. 39). Entre
1925 e 1935 foi diretor do Colégio Pedro II. Era professor do Instituto de Educação do
Distrito Federal. Organizou a reforma do programa de Matemáticas do Colégio Pedro
II32 e participou da elaboração do programa de ensino de Matemática e suas orientações
didáticas na Reforma do Ensino Secundário, de 1931. Em 1937, tornou-se diretor do
Departamento de Ensino Secundário do Ministério da Educação e Saúde. Participaria,
em 1942, da comissão de elaboração dos programas para o curso ginasial, na reforma do
ensino Secundário. Roxo era, ainda, autor de livros didáticos de Matemática para o
ensino básico e manuais para formação de professores. Alguns de seus livros eram:
Lições de Arithmetica, Livraria Francisco Alves, de 1922; coleção – Curso de
matemática, com os profs. Mello e Souza e Cecil Thiré, pela Francisco Alves, de 1923;
Mathematica Elementar, pela Livraria Francisco Alves, de 1929; Curso de Matemática
Elementar, pela Livraria Francisco Alves, de 1929; A Matemática na Educação
Secundária, pela Série Atualidades Pedagógicas, da Cia. Nacional, de 1937.
Hahnemann Guimarães formou-se Bacharel em Direito pela Faculdade de
Direito do Distrito Federal. Era professor Catedrático de Latim no Colégio Pedro II e
32
De acordo com Valente (2003) Euclides Roxo fez parte do movimento modernizador do ensino de
Matemática nos anos 1920. Tendo como base esse movimento, participou da organização do programa de
ensino do 1o ano do Colégio Pedro II, que unificou os conteúdos de aritmética, álgebra e geometria, em
uma única disciplina com o título de “Matemática” (p. 242). Seu livro didático Curso de Matemática, de
1929, foi muito elogiado e divulgado, considerado um grande empreendimento para efetivar a proposta de
renovação do ensino de Matemática no Brasil (Valente, 2003, p. 243).
31
33
A Escola Normal (1889-1932) foi transformada, na gestão de Anísio Teixeira na Secretaria de
Instrução Pública do Distrito Federal, em Instituto de Educação, em 1932, pelo Decreto municipal nº
3.810.
34
Carneiro Leão era um dos mais radicais pensadores da renovação e modernização da educação, como
destaca Souza (2008). Ele defendia a democratização da educação, que deveria atender as necessidades
do povo, “ultrapassando a dualidade entre educação acadêmica para uma classe e educação manual ou
mecânica para outra” (2008, p. 170).
35
O movimento da Escola Nova e da pedagogia moderna ficaram conhecidos por propor a reformulação
das instituições escolares, com novas discussões sobre os objetivos da educação escolar. No Brasil eram
discutidas, principalmente na ABE, propostas de renovação pedagógicas e metodológicas trazidas dos
Estados Unidos da América e da Europa, tendo como referências John Dewey e Claparède. A divulgação
do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, 1932, explicitou as propostas dos defensores da
pedagogia moderna, baseada no estudo do fator “psicobiológico do interesse”, na natureza e no
funcionamento do “espírito infantil”. A escola moderna teria um conceito dinâmico do ensino,
estimulando a atividade criadora do aluno, com a aplicação de métodos de “aquisição ativa de
conhecimentos”, precisava articular o ensino primário ao secundário, dentro de uma “unidade do fim
geral da educação”, com novos métodos, de investigação científica, de observação, pesquisa e
experiência.
34
ABE e no Colégio Pedro II. Um outro grupo, constituído por Mello Leitão, Adalberto
Menezes de Oliveira e Pecegueiro do Amaral, buscavam consolidar o conhecimento
científico na área das Ciências.
Outra característica importante eram os espaços de atuação, os lugares
institucionais desses educadores e a autoridade que representavam:
* Abgar Renault, Álvaro Ferdinando de Souza da Silveira, Comandante
Adalberto Menezes de Oliveira, Antônio Carneiro Leão, Carlos Delgado de Carvalho,
Euclides Roxo, Hahnemann Guimarães, Jonathas Serrano, João Batista Pecegueiro do
Amaral atuavam em pelo menos uma importante instituição de formação na época: o
Colégio Pedro II, a Escola Normal/Instituto de Educação do Distrito Federal, a
Universidade do Distrito Federal36 e, posteriormente, a Universidade do Brasil37.
* Jonathas Serrano, Euclides Roxo, Antônio Carneiro Leão, Carlos Delgado de
Carvalho, participaram das reformas de ensino dos anos 1920 e da Reforma de ensino
secundário de 1931.
* Abgar Renault era diretor do Departamento Nacional de Educação, Euclides
Roxo era diretor do Departamento de Ensino Secundário do Ministério da Educação e
Rodolpho Fuchs era Inspetor de Educação Industrial e Ensino Técnico do Ministério de
Educação.
* Carlos Delgado de Carvalho, Jonathas Serrano e Padre Leonel Franca eram
membros do Conselho Nacional de Educação (CNE).
* Antônio Carneiro Leão, Cândido de Mello Leitão, Carlos Delgado de
Carvalho, Euclides Roxo, Jonathas Serrano, Maria Junqueira Schmidt e o Comandante
Adalberto Menezes de Oliveira eram membros da ABE.
* Comandante Adalberto Menezes de Oliveira e Cândido de Mello Leitão eram
membros da Academia Brasileira de Ciências (ABC).
36
A Universidade do Distrito Federal (UDF) foi criada pelo Decreto n. 5.513, de 1935, por iniciativa de
Anísio Teixeira a frente da Secretaria de Instrução Pública do Distrito Federal. Sua criação integrava todo
um projeto de Anísio Teixeira de reforma do sistema público de ensino do Distrito Federal. A UDF era
composta por cinco escolas: Escolas de Ciências, Educação, Economia, Filosofia e Instituto de Artes.
Segundo Mendonça (2000), todas as escolas pretendiam “desenvolver de forma integrada o ensino, a
pesquisa e a extensão universitária” (p. 139). Em 1939, por meio do Decreto-lei n. 1.063, a UDF foi
extinta e parte de seus estabelecimentos de ensino foram transferidos para a Universidade do Brasil.
Alguns de seus professores foram incorporados à Faculdade Nacional de Filosofia (FNF), criada no
mesmo ano.
37
A Universidade do Brasil (UB) foi criada em 1937, pelo Ministro da Educação Gustavo Capanema. A
Faculdade Nacional de Filosofia, que integrava a UB, foi criada em 1939, por meio do Decreto-lei n.
1.190. Desde o início apresentou a característica de formar técnicos e professores para o ensino
secundário. Como destaca Mendonça (2000), a FNF priorizava “formar trabalhadores intelectuais para os
quadros técnicos da burocracia estatal, nas áreas de educação e cultura, e, particularmente, professores
para o ensino secundário” (p. 141).
35
A instalação da CNLD
38
A participação de Maria Junqueira Schmidt, representante católica, destoava dos demais autores, que
faziam parte do grupo dos renovadores dos anos 1930. A presença de livros de sua autoria talvez possa
ser justificada por uma informação de Toledo (2001), que observa, na segunda fase da gestão de Fernando
de Azevedo na Cia. Nacional, de 1940 a 1946, “um refluxo do movimento de renovação educacional”,
com o estabelecimento do Estado Novo e o “crescimento da influência dos católicos junto ao governo
Vargas” (pp. 93-94). Por conta da diminuição da produção, da censura e da pressão do governo, a editora
começou a publicar livros de educadores católicos, como era o caso das obras de Theobaldo Miranda
Santos (Superintendente da Educação Geral e Técnica e de Ensino e Extensão, professor da Faculdade
Católica de Filosofia do Rio de Janeiro e do Instituto de Educação) e da própria Maria Junqueira Schmidt,
membro da CNLD.
37
Quadro 1.1
Composição das Seções
Seções Professores
Línguas e Literatura (A) - Hahnemann Guimarães39 (substituído em agosto de
1941 por Arduino Bolívar40),
- Maria Junqueira Schmidt,
- Abgar Renault,
- Ruy da Cruz Almeida;
Matemática e Desenho (B) - Euclides Roxo,
-Waldemar Pereira Cotta,
- Alonso de Oliveira41 (substituído em julho de 1941
por Joaquim Rufino Ramos Jubé Jr.42);
Ciências Físicas e Naturais (C) - Cândido F. de Mello Leitão43 (substituído em
agosto de 1941 por Gustavo Mendes de Oliveira
Castro44),
- Adalberto Menezes de Oliveira,
- João Batista Pecegueiro do Amaral;
39
Exonerou-se por ser nomeado Consultor Geral da República.
40
Arduíno Bolívar era jurista, tradutor, professor em Minas Gerais, foi professor da Faculdade de
Filosofia, da Faculdade de Ciências Econômicas, da Faculdade de Direito da Universidade de Minas
Gerais foi oficial de gabinete, diretor do Arquivo Público Mineiro e membro da Academia Mineira de
Letras.
41
Exonerou-se por ser removido para São Paulo.
42
Joaquim Rufino Ramos Jubé Jr. era Bacharel em Direito e professor. Foi deputado estadual por Goiás
diversas vezes.
43
Solicitou exoneração.
44
Gustavo Mendes de Oliveira Castro era formado em medicina, professor de Zoologia Geral e
Parasitologia da Faculdade de Farmácia do Distrito Federal. Foi pesquisador do Instituto Biológico de
São Paulo e era pesquisador no Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Foi professor Assistente de
Zoologia da Escola de Ciências da Universidade do Distrito Federal. Era membro da Academia Brasileira
de Ciências.
38
Os trabalhos
45
Pelo Decreto-Lei n° 1.006/38, os membros da CNLD recebiam cem mil réis por sessão a que
comparecessem.
40
os livros cujo uso foi autorizado pelas diversas secções e ainda estão
pendentes de parecer da secção de redação serão registrados para efeito de
autorização de uso didático, reservando-se a CNLD, o direito de, em qualquer
época, formular recomendações ou exigências a autores ou editores no que
diz respeito à redação, sob pena de ser cassada a autorização concedida (Ata
da 112ª sessão plenária, 11/12/1941).
Sobre o item que discutia a adoção pelos professores dos livros de sua própria
autoria, Jonathas Serrano foi um de seus principais defensores. O membro da CNLD era
professor do Colégio Pedro II e autor de diversos livros didáticos de História. De acordo
com Serrano, o Decreto-lei n° 1.006/38, constituía desapreço à função docente.
Afirmava que o número de classes de um professor não constituía mercado suficiente
para a edição de um livro. Capanema concordou com os argumentos de Serrano e
acrescentou que o professor trabalhava melhor e com mais eficiência, com o livro
didático de sua autoria (112ª Sessão plenária, 11/12/1941). Na 114ª sessão plenária, de
17 de dezembro de 1941, Serrano reforçou seu ponto de vista ao argumentar que:
não lhe parece deva ser mantida a proibição, ainda em vigor, de adotarem os
professores em suas aulas compêndios de sua própria autoria. Se o professor é
competente, o seu compêndio parece o mais adequado ao ensino que ele
próprio ministra em suas aulas. Do ponto de vista moral, aliás, não deve
pairar dúvida quanto à idoneidade de professores de estabelecimentos oficiais
ou fiscalizados (114ª Sessão plenária, 17/12/1941).
Em janeiro de 1942, a lista completa de livros autorizados para uso nas escolas
não saiu, pois a CNLD não havia terminado seus trabalhos. Sua publicação foi
prorrogada novamente, para janeiro de 1943. Com dúvidas sobre a adoção dos manuais,
o diretor geral do Departamento de Educação do Estado de São Paulo, Anísio Novais,
escreveu em 12 de janeiro de 1942, ao Inep e ao Departamento Nacional de Educação
(DNE), solicitando esclarecimento sobre a data de publicação da lista dos livros
autorizados e sobre a interpretação do art. 5º do Decreto-lei n° 1006/38, em relação ao
modo como cada escola do estado selecionaria seus livros escolares. Após consulta ao
Ministro Capanema, Lourenço Filho escreveu um projeto de ofício para São Paulo. De
acordo com o diretor do Inep, como a lista de livros autorizados só sairia em janeiro de
1943, cada estado deveria regular o critério de escolha dos manuais no ano de 1942,
respeitando os outros dispositivos do Decreto-lei n° 1.006/38.
Segundo documento encaminhado ao Ministro Capanema em 1º de março de
1944, por Fernando de Souza Castro – encarregado do acervo da CNLD -, no ano de
1942, a Comissão recebeu 66 requerimentos solicitando registro de livros didáticos e,
no ano de 1943, recebeu apenas três solicitações.
43
Para a análise dos livros didáticos havia um roteiro padrão para a avaliação e a
ficha de julgamento, contendo a orientação para atribuição de notas aos itens indicados.
As normas recomendavam os detalhes a serem verificados em cada item da ficha de
julgamento. Parte das orientações tratava de aspectos gráficos:
• A altura do livro padrão poderia ser de 20 a 24 cm; com largura de 14 a 16 cm.
A capa seria cartonada ou de material flexível, mas deveria ser resistente. O
papel seria branco. E não seria permitido que se visse a impressão no verso da
página. A cor no texto deveria ser preta.
• O tipo de letra utilizado seria o redondo simples, com corpo 16 ou 18, para
livros destinados ao jardim de infância e primeiros anos do curso primário;
corpo 10 ou 12 para as séries seguintes.
• Eram inadmissíveis os erros de revisão, truncamentos, transposições ou
inversões de linhas ou palavras, “pastéis”, etc. Deveriam ser evitadas as
“quebras” de linhas ou palavras e “recortes” que dificultassem a leitura.
• Nos livros de 1º grau todas as páginas deveriam conter ilustrações, sempre em
perfeita correlação com a matéria descrita (Normas para apreciação dos
elementos considerados na ficha, localizado no CPDOC/FGV. Resumido pela
autora).
Outras orientações tratavam de questões da linguagem (seguir a ortografia
oficial), de conteúdos e questões metodológicas. Todos os manuais deveriam estar de
acordo com os programas oficiais:
• Seria negada autorização aos livros que apresentassem assuntos com erros de
natureza científica.
• Ajustamento ao programa de ensino – a matéria não deveria ficar aquém das
exigências do programa de ensino, mas também não deveria ultrapassar os
conhecimentos exigidos. Seriam inadmissíveis exemplos que exigissem
conhecimentos superiores ao grau de ensino.
• Os livros escritos em linguagem defeituosa teriam autorização negada.
• Expor com clareza o que se propunha a transmitir. Vocabulário simples, dando
preferência para expressões de uso mais correntes. Eram condenáveis expressões
regionais ou gírias. Concisão – evitar a prolixidade, as digressões inúteis, a
ostentação de recursos verbais.
44
Quadro 1.2
Ficha: Elementos a considerar no julgamento do livro didático
I - Formato
1. Dimensões a) altura,
b) largura e grossura
II - Material
2. Capa a) resistência,
b) gosto
3. Papel a) cor,
b) qualidade
4. Tinta a) cor,
b) qualidade
7. Impressão a) da capa,
b) do texto e das legendas,
c) das gravuras
IV - Valor Didático
8. Noções científicas a) exatidão,
b) ajustamento ao programa de ensino,
c) método de exposição,
d) propriedade dos exemplos,
e) emprego de citações,
f) uso de termos técnicos
10. Gravura
a) variedade,
b) propriedade,
c) exatidão,
d) ajustamento ao texto,
e) precisão das legendas
Em seguida seriam somadas as notas dos itens, formando uma única nota em
cada divisão (Formato, Material, Feição Gráfica e Valor Didático). O total de pontos a
serem atribuídos era 350. Não poderiam ser autorizados os livros que obtivessem nota 0
em qualquer elemento da divisão IV - Valor Didático (Noções científicas, Linguagem,
Gravura), ou menos de 50% do total de pontos atribuídos, em conjunto, nas divisões
Formato, Material e Feição Gráfica.
As avaliações
46
Sobre a avaliação dos livros dos membros da CNLD somente foram encontradas solicitações de
avaliação de dez livros didáticos ao professor Américo Jacobina Lacombe, entre os anos de 1947 e 1952,
no arquivo da Casa de Rui Barbosa.
47
Biblioteca Nacional, Biblioteca do Livro Didático (BLD) da FEUSP, Núcleo de Documentação e
Memória (NUDOM) do Colégio Pedro II.
47
Tabela 1.1
Avaliações dos livros didáticos por editoras
A tabela permite observar que a Companhia Editora Nacional foi a editora que
mais encaminhou livros para a CNLD e a que mais teve livros aprovados. As duas
outras editoras que encaminharam grande quantidade de livros – a Melhoramentos e a
Francisco Alves -, tiveram poucos livros aprovados. Algumas questões podem ser
pensadas sobre esse fato: Primeiro, que muito dos membros da CNLD eram autores da
Cia. Nacional ou participavam da política educacional do período, o que pode ter
antecipado a correção e adequação dos manuais da editora a nova ortografia oficial e
aos novos Programas de Ensino. Segundo, que os avaliadores podem ter favorecido a
aprovação de autores que publicavam pela Companhia Editora Nacional, pois faziam
parte de um projeto político educacional comum. Na análise dos manuais reprovados da
Cia. Nacional, quatro dos livros ou não foram considerados livros didáticos ou não
estavam de acordo com a ortografia oficial. Somente um livro, Ciências Física e
48
Tabela 1.2
Quantidade de avaliação por Seção
A tabela 1.2, permite observar que a Seção de Ciências Físicas e Naturais foi a
que mais emitiu pareceres, seguida das Seções de Filosofia, Sociologia e Pedagogia,
Seção de Matemática, Seção de Geografia e Seção de Matérias do Ensino Primário.
Poucos dos pareceres e notas encontrados na Companhia Editora Nacional/IBEP e no
CPDOC/FGV possuíam o nome dos avaliadores. Ao analisar os pareceres que
apresentaram nome do relator e dos revisores verificou-se quais os membros da CNLD
que mais atuavam no processo de autorização dos livros didáticos.
O quadro a seguir detalha o nome dos pareceristas e a quantidade de pareceres
emitidos:
49
Tabela 1.3
Relação entre avaliador e livros didáticos avaliados entre 1941 e 1942
Pareceres de aprovação
A Seção de Ciências Físicas e Naturais foi uma das que mais reprovou livros
didáticos, contudo, como foi possível observar, alguns manuais foram considerados
suficientemente adequados para serem utilizados nas escolas. É interessante enfatizar
quem eram os dois professores que tiveram livros aprovados: Antonio de Almeida
Junior, educador que participava, desde a década de 1920, dos debates educacionais,
signatário do Manifesto de 1932 e professor de Medicina Legal da Faculdade de Direito
da USP; e Oscar Bergstrom Lourenço professor da Escola Politécnica da USP.
Dos pareceres da Secção de História encontrados, observou-se que os únicos
livros didáticos aprovados foram os de Joaquim Silva, renomado autor de manuais
escolares do período:
De modo geral, dois critérios de exclusão eram centrais nos pareceres que
negavam a autorização de uso de livros didáticos. Grande parte dos livros eram
excluídos por incidirem nos artigos 21 e 23 do Decreto-lei n° 1.006/38. O artigo 21
negava autorização de uso aos livros didáticos que: estivessem escritos em linguagem
52
Não julgado por não se achar escrito na ortografia oficial (Parecer do Pe.
Leonel Franca, para o livro História da Philosophia, de D. Ludgero Jaspers
O. S. B., Melhoramentos. Aprovado por unanimidade na sessão de
27/03/1941).
Não pode ser usado, pois incide no art. 23. (Parecer do livro Lusíadas, de
Luiz de Camões, Melhoramentos, s/d).
acordo com o artigo 23. Observa-se desse modo, a forte ênfase em se implantar a
ortografia oficial.
Os pareceres com descrição mais detalhada do relator apresentavam algumas das
argumentações utilizadas para a exclusão dos livros didáticos, que abrangiam: métodos
e conhecimentos considerados ultrapassados, linguagem incorreta, conteúdos que não
seguiam os programas do ensino secundário, erros de natureza científica, iconografia
mal utilizada, etc.
A seguir, os pareceres foram organizados de acordo com as Seções da CNLD.
Alguns casos foram analisados de modo mais detalhado, pois evidenciaram os embates
do período, as divergências entre os membros da CNLD, a discussão sobre a introdução
de novas metodologias, a atualização dos conteúdos em relação as novas pesquisas nas
diferentes áreas e as mudanças dos livros em face dos Programas oficiais das diferentes
áreas do conhecimentos escolar para o ensino secundário.
O uso do método indireto era um dos principais motivos para a reprovação dos
livros didáticos de ensino de línguas estrangeiras, como se verifica nos exemplos a
seguir:
O livro incide na alínea c do art. 21; não emprega o método direto, pois
estabelece como ponto de partida da aula um vocabulário com a respectiva
tradução. (...) Não pode ser autorizado o seus uso (Parecer do livro Quelques
Histoires, de Eugenio Pinto da Fonseca, Melhoramentos. s/d).
48
No livro O ensino das línguas vivas, de 1935, Carneiro Leão descrevia sua experiência com o método
direto utilizado nas aulas do Colégio Pedro II.
54
Este livro só poderá ter seu uso autorizado depois de refundido de modo que
se adapte às normas didáticas estabelecidas no Dec. 19.890, de 1931 e que
nele se corrijam os erros e defeitos exemplificados nos itens acima (Parecer
do livro Noções de Álgebra, de Isidro Dumont, Livraria Francisco Alves, s/d).
Não foi possível detalhar quais eram os erros de natureza didática e científicos
presentes nos manuais, pois não foram encontrados pareceres da Seção de Matemática
mais elaborados. De todo modo é importante enfatizar a participação de Euclides
Roxo na CNLD. Como já foi mencionado, o professor foi o renovador do ensino de
Matemática no Colégio Pedro II, em 1929, quando reestruturou os conteúdos de
aritmética, álgebra e geometria em uma única disciplina: a Matemática. Seu livro
Curso de Matemática, publicado no mesmo ano, se tornou referência da nova proposta
de ensino para todo o país. Roxo participou, ainda, da elaboração dos programas de
ensino da reforma do secundário, de 1931. Segundo Valente (2003, p. 245), a reforma
de Francisco Campos na parte do ensino de Matemática, teve como base as propostas
modernizadoras realizadas no Colégio Pedro II. Roxo, reforçava ainda mais sua
intenção de consolidar uma Didática da Matemática, com a publicação, em 1937, do
livro A matemática na educação secundária.
redigido por Adalberto Menezes de Oliveira, tendo como revisores João B. Pecegueiro
do Amaral e Candido de Mello Leitão, foi elaborado de acordo com a ficha de
julgamento da CNLD. O parecer, com seis páginas que esmiuçavam todos os aspectos
negativos do manual (material, noções científicas, linguagem, inadequação ao grau de
ensino), negou a aprovação do livro didático, em 31 de janeiro de 1941. Os trechos, a
seguir, apresentam o que era considerado erro de natureza científica e erro de
linguagem:
D – Análise de conteúdo:
Exatidão
Contém vários enganos, impropriedades de linguagem e incorreções de
natureza científica, dentre os quais assinalaremos os seguintes:
1. A vela não se apaga alimentada pelo ar existente sob acampânula [sic]
(legenda da fig. 2). É sabido que a vela se apaga no fim de poucos minutos.
2. “Os miasmas dos lugares pantanosos empregam [sic] o ar, provocando
doenças” (pág. 29). Hipótese científica não mais aceita (...)
4. “Estado do céu” (pág. 58), em vez de estado de atmosfera (...)
8. “Tiróide” (pág. 61), em vez de tireóide (...)
11) Explicação errônea dos fenômenos que justificam o funcionamento
das garrafas térmicas (pág. 85). (...)
20) Definição incorreta de densidade de um corpo pelo peso de um
centímetro cúbico desse corpo. (...)
26) “Stygomia fasciata” (no texto da página 158, bem como na leganda da
figura 11, (em vez de “Stogonya aegypti”). (...)
37) “O sulfureto de cobre é uma combinação” em vez de o “sulfato de
cobre é um composto”. (...)
E – Linguagem:
A linguagem nem sempre é precisa, como se pode verificar nalguns trechos
mencionados na análise do conteúdo (...)
Achamos por exemplo, inadequado o adjetivo “formidável” aplicado a
potência de um motor de explosão e aos aparelhos voadores (págs. 76 e 77).
(...) (Parecer n° C-3/1941, de Adalberto Menezes de Oliveira. Aprovado por
unanimidade em sessão de 14/02/1941. Grifos nossos).
Alves. O relator foi Cândido de Mello Leitão e os revisores foram Adalberto Menezes
de Oliveira e João Pecegueiro do Amaral. Destacam-se, a seguir, alguns trechos do
parecer de oito páginas:
da ABC e um dos intelectuais que nos anos 1920 criticou o positivismo de Comte e
debateu novas teorias, como a Teoria da Relatividade de Albert Einstein49.
O professor Potsch recorreu ao resultado da avaliação de seu livro, processando
a CNLD, na pessoa do professor Mello Leitão. O processo durou anos, como se
constatou nos quatro volumes publicados sobre o assunto. O último volume do processo
data de 194650.
De modo geral, os pareceres que autorizavam os livros acrescentavam que
deveriam ser feitas correções nos manuais:
(...) O livro está escrito em linguagem acessível, e com clareza, tratando dos
assuntos de modo rudimentar, como convém ao grau de ensino a que se
destina.
Em alguns pontos, escaparam deslizes na forma e no conteúdo que merecem
ser corrigidos, tais como:
(...) pág. 249 – Imprecisão quanto ao valor da pressão atmosférica. (...)
pág. 251 – Referência a densidade sem explicação do que seja. (...)
pág. 282 – A explicação da nomenclatura do pólo Norte do íman, como sendo
o que se volta para o pólo Norte não está precisa. (...)
pág. 297 – A definição de raiz não está certa.A Seção C é de opinião que a
CNLD pode autorizar o uso da presente edição do livro do processo
49
Albert Einstein veio ao Brasil em 1925. Nesse momento houve um importante debate em torno da
teoria da relatividade entre Adalberto menzes de Oliveira e o professor da Escola Politécnica Licínio
Cardoso. (Paim, 1982).
50
A discussão sobre o processo Potsch-Mello Leitão será analisada na parte sobre as repercussões das
avaliações. Os volumes foram encontrados na FEUSP, na Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro e no
Colégio Pedro II.
59
51
De acordo com os programas para o curso fundamental do ensino secundário de 1931, os conteúdos de
Ciências Físicas e Naturais para a 1a série eram: Atmosfera; Calor e Luz; A água; Oxidação e Redução; A
vida. 2a série: A terra; Magnetismo e Eletricidade; Os seres vivos; Som; As sociedades.
A partir da 3a série os conteúdos de Ciências eram separados em conhecimentos específicos de:
* Física: 3a série – Introdução no estudo dos fenômenos físicos; 4a série – I. Mecânica, II. Líquidos e
Gases, III. Calor; 5a série – IV. Som, V. Luz, VI. Magnetismo e Eletricidade.
* Química: 3a série – Iniciação no estudo dos fenômenos químicos; 4a série – I. Química geral, II.
Metalóides; 5a série – I. Química geral, II. Metais, III. Química Orgânica.
* História Natural: 3a série – I. Botânica, II. Zoologia, III. Mineralogia, IV. Geologia; 4a série – I.
Botânica, II. Zoologia, III. Mineralogia, IV. Geologia; 5a série – I. Botânica, II. Zoologia, III.
Mineralogia, IV. Geologia, V. A História da Terra.
60
(...) Herzog é duque e não propriamente rei (pág. 13). O plural de Zwerg não é
Zwerges (pág. 15).
Civitas, no singular, não pode equivaler a cidades, no plural (pág. 16, 4a
linha).
Os efetivos bárbaros, enormemente exagerados na quasi totalidade de autores
de compêndios, já é tempo que se reduzem às justas proporções, de acordo
com a erudita lição de mestres qual Ferdinand Lot (19 e 21, por exemplo). A
batalha travada em 451 é hoje localizada entre Orleans e Troyes e denominada
de Campus Mauriaque (pág. 21).
Pitas não é boa forma para indicar Pietos (latim Picti) (pág. 24). (...)
Hennin, palavra francesa, com nn, não deve ser arbitrariamente simplificada
em Henin, com um só n (pág. 82). (...)
A data da batalha de Crécy é de 1346 e não de 1347 (pág. 227) (...).
(Parecer n. E-23/1941, relator: Jonathas Serrano, de 4/11/1941).
Freitas (2010), que analisou mais pareceres de Jonathas Serrano, indica que o
membro da CNLD considerava, prioritariamente, forma e conteúdo em suas avaliações.
Serrano apontava em seus pareceres erros de linguagem, omissões, exageros e
equívocos em termos de conteúdos históricos, problemas metodológicos e didáticos,
estilo inadequado e deficiências materiais e tipográficas. Segundo Freitas (2010), a
crítica de Serrano quanto aos nomes corretos de autores e personagens históricos,
relacionava-se ao “seu empenho em normatizar esse tipo de escrita” (p. 189). No livro
Como se ensina História, de 1935, Serrano procurava padronizar a grafia dos nomes
históricos. Outro aspecto que Serrano considerava determinante para a reprovação de
uma obra era a falta da História contemporânea do Brasil, de 1920 a 1940 (Freitas,
2010, p. 192).
No aspecto didático e metodológico, os manuais analisados por Serrano eram
criticados quanto a falta de um estilo didático, com linguagem adequada a faixa etária
dos alunos. Os manuais precisavam, ainda, ter letras com tamanho correto, papel de boa
61
qualidade, precisavam conter iconografias, como gravuras, mapas, retratos, etc. (Freitas,
2010, p. 191). Os manuais deveriam obedecer as instruções metodológicas da Reforma
Campos, de 1931, que tratavam da “Didática aplicada ao ensino de História da
Civilização” (Freitas, 2010, p. 192). Para Serrano a maioria dos autores somente
elaborava resumos da matéria a ser ensinada, sem contudo, observar as recomendações
de “caráter metodológico e didático” (Freitas, 2010, p. 193).
De acordo com Schmidt (2005), Serrano tinha preocupação central com a
metodologia do ensino da História e defendia uma didática renovada para o ensino da
disciplina, baseada na obra de John Dewey (p. 217). O ensino da história deveria ser
ativo, “com a participação viva da inteligência do discípulo” (Serrano, 1943, p. 9).
Desse modo, Serrano destacava a necessidade de se aplicar “ao ensino da História todas
as conquistas reais da psico-pegadogia e da didática renovada” (Serrano, 1943, p. 13).
Serrano valorizava o ensino pelos “olhos” e não somente pelos “ouvidos”, com as
“monótonas e indigestas preleções” (Schmidt, 2005, p. 222). O novo método de ensino
utilizaria diversos recursos didáticos: o cinematógrafo, mapas, globos, quadros
coloridos, coleções, gabinetes e museus escolares (Schmidt, 2005, p. 224). Para o
professor, era importante que os alunos “visualizassem” os fatos para que se
interessassem pelo estudo da História.
autores como Anísio Teixeira, Celso Kelly, Almeida Jr. Carneiro Leão,
Venâncio Filho articulam, sob a perspectiva específica dos temas e objetos
tratados em seus textos, análises da sociedade brasileira em relação à cultura e
à educação e procuram estabelecer os seus fins para chegar ao que consideram
ser o progresso social (2001, p. 85).
52
De acordo com Toledo (2001, p. 98), o livro de Afrânio Peixoto, Noções de História da Educação, era
um dos títulos da Cia. Nacional de grande tiragem, com 5000 exemplares.
63
difusão de seus livros entre certos mediadores culturais da época, desde os censores
católicos e autoridades estadonovistas e certas figuras representativas do movimento
escolanovista” (pp. 94-95).
Por já ter editado uma grande quantidade de livros – baseado no parecer de 30
de maio de 1941 – o autor, Hildebrando de Lima, entrou em contato com a CNLD para
discutir o assunto. Em carta à Octalles Marcondes Ferreira, editor e dono da Companhia
Editora Nacional, de 7 de outubro de 1941, Hildebrando afirmava que, em 5 de outubro,
havia conversado com a professora Schmidt para questionar o parecer e argumentar que
a Companhia Editora Nacional teria feito uma grande edição de seu livro. Solicitou
então à parecerista que os livros já editados pudessem ser utilizados em 1942. Ao
mesmo tempo, afirmava já ter reformulado o livro para futuras edições, seguindo as
emendas indicadas. Para o autor, as críticas feitas por Schmidt quanto às obras de
Monteiro Lobato tinham motivos religiosos. Nas palavras de Hildebrando:
53
Não ficou claro se a informação dada pelo representante da Companhia Editora Nacional estava
correta, em relação ao membro da CNLD que questionou o livro Nosso Brasil. O representante do Rio de
Janeiro pode ter confundido o nome dos pareceristas. Escreveu Menezes de Oliveira, mas quem solicitou
vistas ao processo e exigiu a retirada dos textos de Monteiro Lobato foi Maria Junqueira Schmidt.
65
(...)
III – Deverá o autor evitar os seguintes galicismos:
1o pág. 48, cap. V 18, 1. 1a – “Insucesso”
2o pág. 68, cap. VII, 33, i. 2a. “Fracassados”
3o pág. 80, 38,1. 5a....... “Deu logar”
(...)
VIII – Corrigir os seguintes erros ortográficos:
1o pág. 41, 1. 2a. “atrazado”
2o pág. 96, 1. 1a. “atrazo”
3o Ibd. 1. 5a. “Rey”
4o pág. 131, 1. 3a. “orgam” (...)
(Parecer n. I-3/1941, relator Ruy da Cruz Almeida, 14/6/1941).
CNLD para regular e padronizar o manual escolar. É interessante observar como esses
sujeitos pretendiam, na prática, conformar um novo projeto educacional.
54
A Associação foi criada em 18 de novembro de 1940. Em 22 de novembro de 1941 a Associação foi
reconhecida pelo Ministério do Trabalho como um Sindicato, tornando-se o Sindicato Nacional das
Empresas Editoras de Livros e Publicações Culturais. Posteriormente, em 6 de julho de 1959, passou a ser
denominado SNEL - Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Informações encontradas no site do
SNEL: http://www.snel.org.br, em 31/3/2009).
55
Themístocles Marcondes Ferreira era irmão de Octalles Marcondes Ferreira e, também, diretor-
presidente da Companhia Editora Nacional (Hallewell, 1985, p. 268).
56
De acordo com Ferreira (2008, p. 89), os editores reclamavam do aumento de preço do papel, que teria
ultrapassado mais de 100% do ano de 1939 a 1941.
69
Alguns dos membros da CNLD eram autores de livros didáticos, como já foi
destacado anteriormente. Alguns deles eram Carlos Delgado de Carvalho, Jonathas
Serrano, Carneiro Leão e Cândido de Mello Leitão. Pelo fato de membros da Comissão
serem autores de manuais escolares, alguns questionamentos foram levantados sobre a
idoneidade do processo de avaliação. De acordo com os documentos encontrados,
existiam dúvidas sobre a avaliação, que poderia ter privilegiado a aprovação de
determinados livros didáticos em detrimento de outros, somente por uma questão de
reserva de mercado.
Em 1942, o professor do Colégio Pedro II, Waldemiro Potsch, autor de livro
didático de Zoologia reprovado pela CNLD e de livro de História Natural aprovado
com restrições, entrou com processo contra a Comissão, na pessoa do professor
Cândido de Mello Leitão. O processo gerou intensas discussões. Potsch publicou livro,
em 1942, que questionou o parecer da Seção de Ciências Físicas e Naturais e defendeu a
importância do seu livro. Na introdução do livro, o professor colocava em dúvida a
idoneidade dos avaliadores, com o argumento de que a reprovação de seu compêndio
tinha motivos mercadológicos, pois um dos avaliadores, o professor Mello Leitão
também era autor de livro didático de Zoologia. Nas palavras do professor Potsch:
(...) A simples leitura do parecer mostra, porém, a quem o vir, ainda que
jejuno em assuntos de História Natural, a deslealdade com que foi examinado
e julgado o compêndio de Zoologia.
O parecer apresenta a crítica mais vaga que se possa imaginar: não diz onde
está o erro, não aponta qual a noção incorreta que achou, não assinala qual a
imperfeição a que se refere, nem porque é “pouco feliz”, o que está no
compêndio, nem mostra porque considera incompleta a descrição que
condena.
A palavra do relator vale como verdade evangélica, mas o seu propósito é
apenas denegrir, desmoralizar a obra e afastar um concorrente do mercado
dos livros!
(...) imaginou a Seção de Ciências Físicas e Naturais que poderia ficar
senhora do mercado nacional de livros didáticos, desde que afastados fossem
os autores mais favorecidos pela preferência dos professores e alunos. (...) A
condenação da grande maioria, 72%, das obras submetidas ao julgamento,
não ofereceu a menor dificuldade à Secção de Ciências Físicas e Naturais.
(...) Em nome dos altos e superiores interesses do ensino, os professores
Cândido de Mello Leitão, João Pecegueiro do Amaral e Adalberto Meneses
de Oliveira condenaram a grande maioria dos compêndios que examinaram,
fechando-lhes as portas dos colégios, e limparam o mercado, proscrevendo as
obras tão cheias de “erros” e tão “perniciosas” à cultura brasileira (1942, pp.
6-9).
71
Haverá maior e mais clara demonstração pública de que não foi um juiz que
julgou o compêndio de Zoologia e outros compêndios de História Natural,
mas um autor despeitado que se vinga e procura conquistar o mercado dos
livros, aproveitando-se das funções oficiais num cargo de confiança do
Governo da República? (1942, p. 27).
No livro de 1942, Potsch respondeu a cada uma das críticas feitas pelos
pareceres, sobretudo do ponto de vista científico. Para se defender, o autor comparou
seus livros didáticos com os manuais de Mello Leitão e utilizou a definição de autores
renomados, para justificar seus argumentos.
72
Potsch criticou os pareceres por serem abstratos e vagos, por não dizerem em
que consistiam os erros e não indicarem onde eles se encontravam. Baseado em
consultas feitas a zoólogos brasileiros e utilizando bibliografias internacionais, tanto
didáticas como científicas, Potsch rebateu os questionamentos de Mello Leitão. Potsch
demonstrou que autores renomados em outros países (Alemanha, França, Dinamarca,
etc.) utilizavam as mesmas definições e os mesmos conceitos que os seus. Apontou
definições nos manuais didáticos do próprio Mello Leitão, para mostrar que o autor
apresentava explicações parecidas ou iguais as suas. Explicitou nos manuais de Mello
Leitão erros gramaticais, de ortografia e conceituais/científicos.
Potsch discutiu o julgamento de outros compêndios analisados pela Secção de
Ciências Físicas e Naturais, como o Compêndio de Química, 4ª série, de 1936, do
professor Arlindo Fróes57, o livro Exercícios práticos de Química, de George Summer e
Ricardo Vieira58, ambos avaliados por Pecegueiro do Amaral, e os manuais publicados
pelos irmãos Maristas, avaliados por Pecegueiro do Amaral e Adalberto Menezes de
Oliveira. É interessante observar que, na análise do parecer sobre o livro de Arlindo
Fróes, Potsch destacou que a definição de átomo-grama, considerada errada por
Pecegueiro do Amaral era descrita de modo idêntico no Compêndio de Química, 4ª
série, de autoria do relator. Nos livros dos Irmãos Maristas foram criticados os excessos
de conceitos religiosos presentes nas obras (Potsch, 1942, p. 58).
Em 1944, Potsch publicou novo livro sobre o andamento de seu processo contra
a CNLD e Mello Leitão. O livro continha a petição ao juiz de Direito da Vara Cível –
encaminhado por Jorge Dyott Fontenelle -, citando o professor Mello Leitão e
descrevendo os fatos que levaram ao processo. Pelo processo, Mello Leitão deveria
reparar os prejuízos e indenizar Potsch, não somente por danos morais, como por danos
materiais. Potsch encaminhara também uma representação ao Departamento
Administrativo do Serviço Público (DASP), contra Mello Leitão, pedindo o seu
afastamento do cargo na CNLD, caso não ficasse comprovada a resolução tomada pelo
relator do parecer (1944, p. 577).
O livro de 1944 descrevia a contestação de Mello Leitão contra Waldemiro
Potsch, com 45 itens que consideravam a ação do professor do Pedro II improcedente.
Em seguida detalhava a resposta de Potsch à contestação, incluindo alguns
questionamentos feitos à CNLD. Potsch denunciava, ainda, que Mello Leitão teria
57
Professor do Colégio Pedro II.
58
Professores do Colégio Pedro II.
73
Reestruturação da CNLD
59
As Leis Orgânicas foram: Ensino Técnico e Industrial, pelo Decreto-lei n. 4.073 (30/1/1942); Ensino
Secundário, pelo Decreto-lei n. 4.244 (9/4/1942); Ensino Comercial, pelo Decreto-lei n. 6.141
(28/12/1943); Ensino Primário, pelo Decreto-lei n. 8.529 (2/1/1946); Ensino Normal, pelo Decreto-lei n.
8. 530 (2/1/1946); e Ensino Agrícola, pelo Decreto-lei n. 9.613 (20/8/1946).
75
60
Segundo Souza (2008, p 173), os estabelecimentos equiparados eram os mantidos pelos estados ou
Distrito Federal, os reconhecidos eram mantidos pelos municípios ou eram instituições particulares.
76
61
Pedro Mariani Serra participou, como já foi apresentado, da elaboração dos programas para o ensino
secundário de 1942.
62
Theobaldo de Miranda Santos era professor do Instituto de Educação do Distrito Federal, de Filosofia
da Educação da Universidade Católica e da Faculdade de Filosofia de Santa Ursula. Foi professor de
Prática do Ensino Primário na Universidade do Distrito Federal. Autor de diversos livros de História,
Psicologia, Sociologia e Filosofia da Educação. Autor de livros didáticos.
77
63
Carneiro Leão, Gustavo Mendes de Oliveira Castro, Abgar Renault, Ruy da Cruz Almeida, os oficiais
Waldemar Pereira Cotta, Alonso de Oliveira e os membros da Seção de Metodologia das técnicas -
Comandante Armando Pina, José de Melo Moraes, Rodolfo Fuchs – não foram reconduzidos à CNLD.
78
Alguns programas, como os de Desenho para o curso ginasial, Geografia, História Geral
e do Brasil e Filosofia para curso colegial, somente seriam publicados a partir de 1945.
Em documento de 28 de agosto de 1945, o presidente da CNLD informava ao
Ministro Capanema que até o fim do ano todos os livros didáticos para o ensino
secundário seriam avaliados, podendo, assim, ser fixada para 1º de março de 1946 a
data de proibição de uso dos livros didáticos não autorizados. A lista com os livros
autorizados deveria ser publicada em janeiro de 1946. Com o adiantado dos trabalhos da
CNLD, em relação aos livros para ensino secundário, Roxo afirmava poder ser iniciada
a avaliação dos manuais para ensino primário. Contudo, faltava ser indicada a comissão
especial para avaliar os manuais dos membros da CNLD e designar a subcomissão de
ensino de Leitura e Linguagem, que seria constituída pelos professores Theobaldo de
Miranda Santos, Ismael de Lima Coutinho e Otelo de Souza Reis (substituindo a
professora Maria Junqueira Schmidt). Roxo solicitava, além disso, que fossem criadas
subcomissões especiais para a avaliação de livros didáticos de Música e Desenho, pois
existia grande número de manuais dessas disciplinas aguardando julgamento.
Em novembro de 1945, com o fim do Estado Novo, a reabertura política e a
saída de Gustavo Capanema do Ministério da Educação, dois novos decretos-lei sobre a
autorização de livros didáticos foram sancionados pelo Ministro provisório Raul Leitão
da Cunha. O decreto-lei n° 8.222, de 26 de novembro de 1945, que modificou o
processo de autorização de livros didáticos de membros da CNLD e o decreto-lei n°
8.460, de 26 de dezembro, que reestruturou a legislação sobre o livro didático.
De acordo com o decreto-lei n° 8.222/45, os livros didáticos de membros da
CNLD submetidos à avaliação receberiam parecer de dois catedráticos da especialidade
ou de disciplinas congêneres, que exercessem funções em escolas superiores oficiais ou
reconhecidas. Os pareceristas - que não poderiam ter livro didático de sua autoria
avaliado por nenhum membro do CNLD -, seriam escolhidos dentre uma lista
organizada pelo CNE. O decreto-lei n° 8.460/45 adequou a legislação sobre o livro
didático, sua produção, importação e utilização. De modo geral o decreto reafirmou as
funções da CNLD estabelecidas pelo decreto-lei n° 1.006/38, e incorporou as mudanças
que foram sendo sancionadas por diversos decretos nos anos anteriores. Os critérios de
eliminação dos livros didáticos sofreram poucas modificações. Alguns termos foram
alterados, mas de modo geral os itens mantiveram-se os mesmos. As mudanças
significativas relacionaram-se à produção e importação de livros didáticos escritos em
língua estrangeira e destinados as escolas primárias, e à escolha dos manuais pelos
79
CAPÍTULO 2
_____________________________________________________________________
tudo poderia, na verdade, deveria, ser melhor distribuído, ser modificado” (2005, p. 64).
Precisava-se de uma nova escola, que atenderia a necessidade dos adolescentes que
pediam por acesso ao secundário e, ao mesmo tempo, ampliaria sua função normativa,
ao abandonar o ensino verbalista e colocar em prática “um ensino mais ágil, mais
convenientemente adaptado ao novo tempo histórico” (Braghini, 2005, p. 64).
A ampliação do ensino secundário aumentou a premência por contratação de
professores e expôs a necessidade de uma nova concepção de educação para esse nível
de ensino, com características elitistas e com o objetivo de preparar para o vestibular.
Segundo Braghini (2005), para os intelectuais que escreviam na Revista Brasileira de
Estudos Pedagógicos (RBEP)65, publicada pelo Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (Inep), o currículo do ensino secundário, ainda de acordo com a Lei
Orgânica de 1942, entrava em choque com as novas demandas da época. Esse
intelectuais criavam um discurso que opunha o “velho e o novo”, as “reminiscências do
período Vargas/Capanema e o desenvolvimentismo do JK” (Braghini, 2005, p. 9). Esse
discurso de oposições criticava a educação das elites, a Lei Orgânica, e afirmava a
necessidade de uma educação pragmática, que oferecesse possibilidades para todos os
jovens e que desenvolvesse as aptidões pessoais. Debates começaram e ser travados
sobre a finalidade do ensino secundário, a necessidade de articulação do primário e o
ensino técnico-profissional e a necessidade de “renovação didática em conformidade
com o pensamento pedagógico em circulação” (Souza, 2008, p. 146).
A Lei Orgânica de 194266 orientou a educação secundária até 1961, com a
promulgação da LDB n. 4.024. Contudo, como afirma Fonseca (2004), essa lei foi
alterada e descaracterizada ao longo dos anos pela prática do ministério que promulgava
decretos, decretos-lei, portarias e circulares, “pelo Congresso Nacional (leis), bem como
pelos demais agentes da educação nacional tais como proprietários de estabelecimentos
de ensino, professores, governos estaduais, dentre outros” (p. 27). A partir dos anos
1950, o MEC intensificou sua atuação em relação ao ensino secundário. Criou o Fundo
65
A RBEP começou a ser publicada pelo Inep em 1944. De acordo com Braghini (2005), a RBEP foi
criada com o objetivo de divulgar “princípios fundamentais e ‘mais modernos’ da educação para a criação
de uma ‘consciência pública esclarecida’” (p. 17). A RBEP divulgava os métodos de aplicar os princípios
educacionais. Nos anos 1950, a revista publicava as pesquisas realizadas pelo Inep e seus colaboradores.
A revista era destinada a docentes de cursos de formação de professores, estudantes de escolas normais e
das faculdades de educação, administradores de ensino, professores primários, etc.
66
Vale lembrar que, pela Lei Orgânica n. 4.244 de 1942, o ensino secundário era dividido em ginásio e
colégio. O ginásio destinava-se a ministrar o curso de primeiro ciclo e teria quatro anos de duração. O
colégio abarcava os dois cursos do segundo ciclo: o clássico e o científico, com três anos de duração cada.
O colegial tinha o objetivo de consolidar a educação ministrada no curso ginasial. O curso clássico
priorizava uma formação humanística; no curso científico a formação dava ênfase ao estudo das ciências.
82
67
O Fundo Nacional do Ensino Médio, foi criado em 1954, pela Lei n. 2.432, tinha o objetivo de auxiliar
para a manutenção, aperfeiçoamento, difusão e acessibilidade do ensino de grau médio, contribuindo
financeiramente, de acordo com as necessidades dos aluno, professores e dos estabelecimentos, visando
aumentar as oportunidades educacionais, sem afetar a qualidade do ensino e a remuneração dos docentes
(Fonseca, 2004, p. 86).
68
A Cades foi criada pelo Decreto n. 34.638, de 17/11/1953, e era organizada pela Diretoria do Ensino
Secundário do Ministério da Educação, sob coordenação de Gildásio Amado. Tinha o objetivo de
organizar “uma série de atividades voltadas para a melhoria do ensino secundário” (Fonseca, 2004, p. 96).
Dentre suas funções organizaria cursos de aperfeiçoamento e elaboraria os exames de suficiência para
professores.
Em 1957, a Cades começou a publicar a revista Escola Secundária, com o objetivo de divulgar as
atividades da Campanha. A revista publicava artigos sobre temas importantes do ensino secundário do
período, “artigos com modelos de planejamento, de avaliações e de aulas por disciplina bem como
discussões sobre os objetivos e as dificuldades de cada disciplina do segmento” (Fonseca, 2004, p. 96).
Segundo Fonseca, a revista era destinada aos professores do ensino secundário, principalmente os
professores de escolas particulares e municipais, que freqüentavam os cursos oferecidos pelo MEC (2004,
p. 55).
69
As Inspetorias Seccionais foram criadas pela Portaria n. 501, de 1952.
70
Das revistas de instituições públicas destacavam-se: a RBEP – do Inep, a revista Escola Secundária –
da Cades, a Revista de Pedagogia - da USP, a revista Educação e Ciências Sociais – do CBPE, revista da
Campanha Nacional de Educação Rural – MEC.
As editoras também começaram a publicar revistas em que divulgavam suas obras e discutiam questões
educacionais. Dentre elas destacavam-se: Revista do Magistério – da Livraria Francisco Alves, Revista
Atualidades pedagógicas – da Companhia Editora Nacional e a EBSA – Revista da Editora do Brasil.
83
Entre 1945, com o fim do Estado Novo, e meados dos anos 1960, durante a
Ditadura Militar, o Ministério da Educação ampliou o diálogo, principalmente por meio
do Inep, com Ministérios e instituições relacionadas à educação de outros países, com
destaque para as parcerias com os Estados Unidos da América e a Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Em meio ao debate sobre a urgência de se reformular o ensino, cresceram os
questionamentos sobre o papel dos livros didáticos na educação. O “problema do livro
didático” estava em discussão no Ministério da Educação, nos meios acadêmicos e no
Congresso Nacional. Nos espaços internacionais, em meio à Guerra Fria, a Unesco
organizava debates sobre a necessidade de se regular e controlar os livros didáticos.
Segundo documento da Organização, publicado em 1951, no pós-guerra, uma das metas
daquele órgão era indicar a revisão dos manuais escolares, sobretudo os livros de
História e Geografia, procurando eliminar conteúdos que apresentassem estereótipos e
preconceitos contra os diferentes grupos e povos (Unesco, 1951). A Unesco pretendia
realizar exames de livros escolares dos Estados que dela faziam parte, dentro do quadro
dos acordos bilaterais ou multinacionais, estimulando a ação das organizações
internacionais. Algumas das resoluções da quinta Conferência Geral da Unesco
estabeleciam os seguintes pontos:
71
No original: “Se invita a los Estados miembros a empreender o a prosseguir el examen critico de sus
manuales escolares, teniendo particularmente en cuenta los trabajos de los seminários de 1950, sobre el
mejoramiento de los manuales escolares, señaladamente los de historia, y sobre la enseñanza de la
geografia al servicio de la comprensión internacional”.
84
72
O professor Dr. Kazumi Munakata desenvolveu as primeiras pesquisas sobre a Caldeme, organizadas
em dois projetos financiados pelo CNPq: “A produção de livros Didáticos e materiais de ensino pelas
Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino/(Caldeme)/Campanha Nacional de Material de Ensino
(CNME), do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep)” e, “A política de livro didático no regime
militar: da Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (Caldeme)/Campanha Nacional de Material
de Ensino (CNME) à Comissão do Livro Técnico e Didático (Colted) e à Fundação Nacional de Material
Escolar (Fename)”. Boa parte da bibliografia utilizada neste capítulo são resultado de suas pesquisas.
73
Segundo informações do site da CBL, a Câmara foi criada em 1946, em são Paulo, com o objetivo de
discutir os problemas do setor livreiro e editorial de forma conjunta e organizada. De acordo com seu
estatuto a CBL tinha o objetivo de defender e difundir o livro, representar seus associados junto a outras
instituições, órgãos governamentais e a sociedade em geral, procurando defender os interesses da
indústria editorial e livreira e seu desenvolvimento. Teve como primeiro presidente Jorge Saraiva. A
partir de 1948, passou a organizar os Congressos de Editores e Livreiros do Brasil. Site:
http://www.cbl.org.br/telas/cbl/historia.aspx, acesso em 20/12/2010.
85
74
Gildásio Amado era professor no Colégio Pedro II e seu diretor (de 1947 a 1956 e professor da
Faculdade Nacional de Filosofia. Era, também, diretor da Diretoria do Ensino Secundário do MEC (de
1956 até 1968) e coordenador da Campanha de Difusão e Aperfeiçoamento do Ensino Secundário
(Cades) (Pinto, 2002, p. 414).
75
Ao longo de 1947, o professor Américo Jacobina Lacombe recebeu da secretaria da CNLD, cinco
cartas encaminhando livros didáticos de membros da Comissão para serem avaliados. As cartas
permitiram verificar o nome de alguns dos membros da Comissão, entre eles os professores Hélio Vianna,
Otelo S. Reis e Carlos Delgado de Carvalho (Documentação encontrada no arquivo histórico - Américo
Jacobina Lacombe -, da Fundação Casa de Rui Barbosa). A técnica de educação Delma da Conceição
Carchedi enviou ao INEP, em fevereiro de 1949, uma lista de livros aprovados pela CNLD para o Ensino
Primário. No ano de 1952, o professor Lacombe recebeu nova carta da CNLD solicitando parecer de
livros de Hélio Vianna. Em abril de 1953, o Conselho de Imigração e Colonização solicitava ao
presidente da CNLD, Gildasio Amado, o fornecimento de livros didáticos de ensino de língua portuguesa
e de conhecimentos da realidade nacional para um convênio firmado entre o governo do Brasil e da Itália
(Documento encontrado no arquivo histórico do Inep).
76
A portaria n. 966 de 02 de outubro de 1951 aprovou os programas mínimos para as disciplinas dos
cursos ginasial e colegial. A portaria n. 1.045 de 14 de dezembro de 1951 expediu os planos de
desenvolvimento dos programas mínimos do ensino secundário e suas instruções metodológicas.
89
Brasil (Mendonça, 2005, p. 9). O Inep realizaria pesquisas para subsidiar as políticas
públicas, publicaria obras de referência, inclusive didáticas, e organizaria escolas
experimentais, que seriam, também, centros de treinamento de professores. Segundo
Mendonça, o pragmatismo de Dewey foi apropriado no Inep em três perspectivas: como
método científico, como modo de vida democrático e como “experimentalismo” na
escola (2005, p. 10). Nas duas primeiras perspectivas:
Mendonça (2005, pp. 10-11) destaca, ainda, que o ideal desenvolvimentista dos
anos 1950 aproximou-se do pragmatismo, ao propor a transformação da escola às novas
condições de desenvolvimento nacional, principalmente com a industrialização, e para
consolidar a democracia liberal. A escola seria agente de mudança cultural.
Munakata (2000, p. 129), ao analisar o projeto de Anísio Teixeira no Inep,
observa que o livro didático ocupava um papel importante no pensamento desse
educador. As escolas não existiriam sem professores e livros. De acordo com Munakata
(2000), Anísio Teixeira pretendia, após diagnosticar a situação do ensino, elaborar
métodos de tratamento para os problemas encontrados. Uma das formas de divulgar
sugestões e recomendações para os professores era por meio da literatura didática.
Para Anísio Teixeira, como observa Munakata (2000, p. 133), a escola estava
em transformação. A antiga educação livresca não era mais útil para o novo grupo
social que chegava à sala de aula. A nova escola para todos tinha o objetivo de preparar
o homem comum para o trabalho. Na sociedade moderna em que a escola tradicional de
educação livresca não mais se encaixava, os livros tomavam nova definição: “não
simplesmente como leitura, mas como utilização” (Munakata, 2000, p. 134). E o livro
indicado para essa utilização era o didático.
A expansão do ensino era considerada por Anísio Teixeira “descompassada”
(Munakata, 2000, p, 135) pois, ao aliar a extensão do ensino para todos com o
treinamento para o trabalho, gerou um maior número de alunos nas escolas com menor
educação. A democratização do ensino fez surgir a necessidade de mais professores,
que acabavam tendo uma formação curta e deficiente. Somava-se a esses fatos o
92
Assim, para Anísio Teixeira, uma das soluções para a situação educacional
brasileira era a “elaboração de ‘guias e manuais de ensino para os professores e
diretores de escolas’ e, também, ‘o livro didático, compreendendo o livro de texto e o
livro de fontes, buscando integrar nestes instrumentos de trabalho o espírito e as
conclusões dos inquéritos procedidos’” (Munakata, 2002, p. 1). A melhoria dos livros
didáticos, com a produção de manuais diferentes e que teriam novas formas de
utilização seria realizada pela Caldeme, que produziria guias de ensino para professores
e analisaria os programas e manuais escolares existentes no país.
A Caldeme deveria, assim, contribuir para a “renovação da literatura pedagógica
mediante a revisão de livros de leitura e a análise dos livros didáticos em uso nas
93
escolas” (Xavier, 2000, p. 7), pretendendo produzir e distribuir guias de ensino, livros
texto e manuais de boa qualidade para professores da rede pública.
Esse era um novo espaço em que se realizava a política de produção de material
didático e que influenciaria os debates relacionados às novas propostas didático-
pedagógicas. Anísio Teixeira e outros intelectuais, ao longo dos anos 1950, com a
Caldeme, a Cileme e, posteriormente, com o Centro Brasileiro de Pesquisas
Educacionais (CBPE) e os Centro Regional de Pesquisas Educacionais (CRPEs),
propuseram, portanto, uma renovação no ensino escolar.
77
Os documentos selecionados para este trabalho foram produzidos pela Caldeme, Inep e CBPE.
Buscando contar a história da Caldeme foram utilizados ofícios, memorandos e correspondências internas
da Campanha. A documentação foi localizada no Arquivo Central e Histórico do Inep, em Brasília e no
acervo do Centro de Apoio à Pesquisa “Escola e Cultura” do Programa de Estudos Pós-graduados em
Educação: História, Política, Sociedade (EHPS), da PUC/SP. Além desse material, foram utilizados como
documentos centrais os livros dos professores James B. da Fonseca e Guy de Hollanda.
78
Jayme Abreu era o diretor executivo da Cileme.
94
79
Mário P. Brito foi diretor da Caldeme de 1953 a 1955. O histórico da Caldeme data de 9 de julho de
1954.
95
Federal. De acordo com Munakata (2004), “assumiu cargos na administração publica, quase sempre ao
lado de Anísio Teixeira” (p. 516). Tinha cargo na Fundação Getúlio Vargas. Em 1952 tornou-se diretor
executivo da Caldeme, até agosto de 1953, quando foi substituído por Mário Paulo de Brito (Munakata,
2004, p. 516). Mário P. de Brito era professor de Química na Escola Nacional de Engenharia. Participou
da fundação da ABE e foi membro da Academia Brasileira de Ciência (Munakata, 2004, p. 521). Mário P.
de Brito permaneceu na direção da Caldeme até dezembro de 1955, quando foi substituído por Jayme
Abreu que coordenava a DEPE – Departamento de Estudos e Pesquisas Educacionais, do CBPE.
82
Segundo Mendonça, o CBPE foi criado com verba da Unesco que seria destinada para programa de
formação de agentes para educação rural. “Anísio Teixeira redireciona essa verba e é com ela que acaba
conseguindo viabilizar a criação do centro” (2005, p. 13).
96
83
Foram encontradas correspondências de Anísio Teixeira para editoras dos EUA, Inglaterra e França.
97
84
No original: “A commttes (Sic) of whitch I am President has received from the Ministry of Education
the assignment of undertaking a preliminar comparative study of textbooks for high schools used in Brasil
and in countries educationally more advanced.
Due to the urgence of the matter, the decision was taken prior to the allocation of governmental
appropriation. So, upon suggestion of the Director of the American School in Rio, Mr. Voctor L. Moore, I
am writing for asking your cooperation and assistance in solving our problem of getting the books. (...)”.
Além da Editora Mac Millian, foi enviada a mesma solicitação para as editoras: Scott, Foresman and
Company e Ginn and Company.
98
85
Como o Dicionário de Grego, editado em 1955, pelo Instituto Nacional do Livro (INL).
99
com cinco mil exemplares. O livro, de autores ingleses, divulgava noções básicas das
ciências físicas e naturais.
O segundo acordo foi efetudo com os professores José Leite Lopes e Jayme
Tiomno para a tradução do livro High School Physics (traduzido como Física na Escola
Secundária), de C. H. Blackwood, W. B. Herron e W. C. Kelly, da editora Ginn and
Company, considerado uma importante obra para estudantes e professores do ensino
secundário. Segundo ofício de Mário P. de Brito, de 5 de janeiro de 1955, para a Ginn
and Co., a tradução de um livro que não estava de acordo com os programas oficiais
brasileiros visava promover a aplicação de novos métodos no ensino de Física nas
escolas secundárias do país86. Em julho de 1956, os originais dos dois guias foram
entregues para a Companhia Editora Nacional, que editaria e publicaria as obras.
Os motivos das traduções dos livros Iniciação à Ciência e Física na Escola
Secundária, tornam-se explícitos nas notas prévias que iniciavam ambos os livros. Na
Nota Prévia do livro Iniciação à Ciência, Mário P. de Brito esclarecia que os
professores de Ciências Físicas e Naturais encontrariam na obra “uma visão nova para
encarar o entrelaçamentos dos fenômenos físicos, químicos e biológicos”. Na segunda
Nota Prévia, o diretor da Caldeme esclarecia que a tradução do livro Física na Escola
Secundária, havia sido realizada pela impossibilidade de a Caldeme conseguir
estabelecer com um professor brasileiro acordo para a produção de um manual de
ensino de Física. O livro visava auxiliar os professores com um “método essencialmente
prático de captar a atenção dos alunos para as maravilhosas descobertas da física
moderna”.
A Caldeme também patrocinou a publicação de trabalho original sobre o ensino
de Matemática no curso secundário, Álgebra Elementar e Trigonometria, elaborado
pelo professor Francis D. Murnagham do Instituto Tecnólogico da Aeronáutica de São
José dos Campos.
A Companhia Editora Nacional/Civilização Brasileira87 tornou-se a responsável
pela edição e publicação dos três livros, de Matemática de Murnagham, An Introduction
to Science/Iniciação à Ciência, e por discutir a aquisição dos direitos autorais da
86
Vale destacar o seguinte trecho do original: “(...) It is very likedy that only a limited number of copies
of the translation will be sold, for the “High School Physics” was not written accordingly to the rigid plan
of studies laid down by our federal regulations. But those copies will promote, I hope, the application of
new methods of teaching physics in our secondary schools. (...)” (Ofício de Mário P. de Brito para a Ginn
and Co., de 5/1/1955).
87
A Editora Civilização Brasileira foi comprada pela Companhia Editora Nacional em 1932. Na década
de 1950 seu diretor era Ênio Silveira.
102
tradução do livro High School Physic/Física na Escola Secundária, com a Ginn and
Company88.
O livro de Murnagham não foi o único a ser publicado sobre o ensino de
Matemática. Com base na documentação do CBPE, foi possível verificar que o Centro
solicitou à Unesco, em 1955, a colaboração de um especialista em currículo escolar para
as áreas de Ciências e Matemática do ensino secundário. O especialista deveria analisar
e criticar os programas de ensino adotados no Brasil e propor novas matérias e métodos
de ensino!$. Em 1956 a Unesco enviou ao país o técnico em educação professor Lucas
Bunt, que iria estudar os programas, livros didáticos e práticas de ensino de Matemática
e produzir livro didático para a disciplina. Em ofício de 1957, Jayme Abreu relatou que
o professor Lucas Bunt tinha terminado o relatório sobre o ensino de Matemática no
Brasil e o livro sobre geometria, que seria publicado em 1963$".
Para o ensino primário, a Caldeme produziu estudos sobre Linguagem na Escola
Elementar (1955), Ciências na Escola Elementar (1955), Ciências Sociais na Escola
Elementar (1955), Matemática na Escola Elementar (1955), Jogos Infantis na Escola
Elementar (1955), Música para a Escola Elementar (1955) (Relatório de Mário P. de
Brito para Anísio Teixeira, de 21/6/1955).
A partir de 1957, Anísio Teixeira começou a discutir com o Adido Cultural da
Embaixada Americana, Laurence Morris, a possibilidade de tradução de livro sobre
Geografia Geral91. Em 1959, Jayme Abreu ficou encarregado de elaborar um livro sobre
currículo na escola secundária, destinado a administradores escolares e professores de
ensino secundário. Em 20 de março de 1961, por conta da nova LDB, foi efetuado um
aditamento ao projeto, que deveria ser entregue até dezembro de 1962.
88
É importante lembrar a relação entre Anísio Teixeira com a Companhia Editora Nacional. Segundo
Toledo, a Nacional - com Monteiro Lobato e Octalles Marcondes Fernandes -, articulava desde os anos
1920, um seleto grupo de intelectuais em torno da editora (2001, p. 54). Nos anos 1930, a Cia. Nacional
caracteriza-se por “fazer circular os nomes ligados ao grupo conhecido por ‘pioneiro’” (Toledo, 2001, p.
61). Anísio Teixeira era o editor responsável pela coleção Biblioteca do Espírito Moderno (Toledo, 2001,
p. 52).
89
Correspondência de Anísio Teixeira à Orlando Calaza, chefe de Gabinete do Ministro da Educação e
Cultura, em 6/10/1955.
90
O relatório sobre o ensino de Matemática não foi encontrado. No entanto, o livro de Lucas Bunt foi
publicado pelo CBPE/Inep com o titulo: Introdução ao curso de geometria plana, 1963.
91
Carta de Anísio Teixeira para Laurence Morris, de 9/4/1957.
103
92
Djalma Guimarães era um importante geólogo de Minas Gerais, diretor do Instituto de Tecnologia
Industrial de Minas Gerais. Foi professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Unifersidade Federal de Ouro Preto (Ufop).
93
José Leite Lopes era professor da Faculdade Nacional de Filosofia e membro do Centro Brasileiro de
Pesquisas Físicas.
104
criticou os atuais livros didáticos dessa disciplina escolar e sugeriu a tradução e adoção
para orientação dos professores, do livro High-School Physics, de Blackwood, Herron e
Kelly94.
Com base nas discussões e sugestões, os planos dos manuais das Ciências
Físicas e Naturais deveriam ser elaborados por professores considerados unanimidade
em suas áreas de estudo. Para as demais áreas do conhecimento, não foram realizadas
consultas e reuniões tão pormenorizadas, mas foram indicados professores especialistas
para elaborarem os anteprojetos dos guias.
Elaborados os planos, estes passariam por análise de um grupo de especialistas -
autoridades nos assuntos -, que pertencessem a diversas escolas de pensamento,
delineados em cada disciplina. De modo geral, eram organizados encontros com os
autores dos planos e professores convidados a dar sugestões, discutir os métodos e
conteúdos de ensino. Um dos encontros realizados versou sobre o plano do manual de
Francês, elaborado pelo professor Raymond Van de Haegen, no dia 24 de setembro de
1953. Foram convidados para essa reunião os professores Roberto Alvim Corrêa, Hestia
Barroso, Louise Jacquier, Maria Junqueira Schmidt e Marcela Mortara.
Realizados os exames dos planos, era acordado com o professor a elaboração do
manual, que depois de pronto seria novamente encaminhado para análise de autoridades
das áreas. Durante o segundo semestre de 1952, Anísio Teixeira e Gustavo Lessa
começaram a convidar os professores para escrever os planos dos guias. Contudo, não
obtiveram sucesso imediatamente. Alguns professores não aceitaram o convite, como
foi o caso de Hilgard O’Reilly Sternberg95 e José Honório Rodrigues96.
Após troca de algumas correspondências foram definidos os primeiros
professores encarregados de elaborar os manuais. Os acordos começaram a ser
assinados em 1953, e seguiram até o fim dos anos 1950. O quadro a seguir indica os
professores que assinaram os acordos, a Universidade a que pertenciam, a disciplina
escolar e o ano dos acordos:
94
O livro foi traduzido pelo próprio José Leite Lopes, como já foi discutido anteriormente.
95
Hilgard O’Reilly Sternberg era professor de Geografia da Faculdade Nacional de Filosofia.
96
José Honório Rodrigues era historiador. Foi diretor da Sessão de Publicações e Obras Raras da
Biblioteca Nacional, diretor do Arquivo Nacional, membro do IHGB e da ABL. Foi professor e diretor do
Instituto Rio Branco e de inumeras Universidades, como a Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, do Ensino Superior do Estado da Guanabara, da Pós-Graduação na Universidade Federal
Fluminense e do Doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro. (Fonte: www.academia.org.br,
acesso em: 20/10/2010).
105
Quadro 2.1
Professores encarregados de elaborar os guias de ensino
97
Em ofício de 9 de julho de 1954, Mário P. de Brito informou que o contrato com o professor Karl
Arens seria recindido, pois o mesmo não poderia terminá-lo. Em seu lugar foi acertado com o professor
Alarich Schultz.
106
Esta é uma confirmação oficial do pedido que vos fiz verbalmente para
colaboração com o INEP no preparo do projeto de manuais destinados a
professores secundários.
(...)
Em nome do Diretor do INEP, faço-vos um apelo no sentido de prestardes à
causa do ensino nacional a contribuição ora solicitada (Carta de Gustavo
Lessa, para Américo Jacobina Lacombe, 23/03/1953).
Para produção dos guias foi estabelecido, inicialmente, um critério geral para
todos os manuais quanto a extensão do conteúdo e a ênfase nos conhecimentos
necessários aos alunos. Os acordos descreviam o objetivo da elaboração dos manuais e
os detalhes de como deveriam ser feitos. Como exemplo, é possível examinar o acordo
para produção do Guia de Biologia Geral, sob responsabilidade do professor Oswaldo
Frota Pessoa. As clausulas III e V indicavam as diretrizes gerais para a produção dos
manuais:
Clausula III. O manual de cada matéria deverá conter: a) uma descrição inicial
dos objetivos de ensino da matéria e do aparelhamento didático necessários; b)
uma justificativa da orientação traçada para o manual pelo prof. Oswaldo
Frota Pessoa, relativa à matéria a ser ensinada e ao método de ensiná-la; c) o
texto a ser ensinado distribuído por unidades e capítulos, e acompanhado do
texto para uso exclusivo dos professores, e de indicações bibliográficas; d)
descrição, em cada capítulo, dos meios de ser realizado o ensino teórico e
prático respectivos.
[...]
107
Apenas 16% dos seus professores são licenciados das escolas de filosofia,
embora estas tenham já mais de 20 anos de existência. As demais escolas
superiores forneceram 24% do corpo docente. Com diplomas de escolas
médias – metade normalistas – há 41% dos professores. Os restantes 19% não
tem diploma algum (1977, p. 31)
O registro dos professores no Ministério da Educação poderia ser feito por exames de
suficiência, de acordo com a Portaria n. 501/52.
Nesse contexto escolar, de novos docentes e discentes, a preocupação centrava-
se no que deveria ser ensinado e como deveria ser ensinado. Procurava-se definir qual
seria o objetivo do ensino secundário para esse novo público escolar. O Inep pretendia
109
participar diretamente do debate, ao estudar a situação das escolas nas diferentes regiões
brasileiras com a Cileme e, propor novos conteúdos e métodos de ensino com a
Caldeme. Em carta à Anísio Teixeira de 6 de janeiro de 1954, Mário P. de Brito
destacava qual era a dificuldade na escolha dos autores dos manuais:
Segundo Teixeira (1954, pp. 9-10), as novas gerações, oriundas das camada
populares, procuravam a escola secundária para adquirir uma educação melhor e
também para melhorar socialmente. Assim, a escola secundária educaria a todos, de
acordo com suas aptidões (Teixeira, 1954, p. 11). Ela seria uma escola popular,
98
A escola secundária em transformação foi uma palestra proferida no seminário de inspetores de ensino
secundário. Foi reproduzida na revista RBEP, v. 21, n. 53, de jan.-mar./1954.
110
99
Para elaboração do manual de Biologia Geral, Oswaldo Frota Pessoa fez um acordo de 18 meses.
111
Lacombe foi a segunda opção de autor, pois o professor José Honório Rodrigues havia
recusado o convite.
Ambos os planos dos guias foram debatidos, antes de serem aprovados. Nos
debates, Munakata enfatiza a discussão entre Lacombe e José Honório, em que este
último teceu diversas críticas ao plano do manual de História do Brasil, como a ressalva
ao uso da literatura, a advertência sobre a predominância dos aspectos políticos no
manual e a necessidade de se inserir os precedentes históricos dos temas estudados
(2004, p. 519). Segundo Munakata, José Honório Rodrigues discutia a partir de “um
padrão de fazer - histórico que recusa a supremacia do político e busca estabelecer
relações de causalidade entre os ‘fatores (econômicos)’ e os ‘fatos históricos’” (2004, p.
519).
Após várias prorrogações Lacombe entregou, em 1957, a primeira parte do
manual de História do Brasil, que passou por leitura crítica de Guy de Hollanda e
Gustavo Lessa. A leitura deste último expôs a divergência na concepção de Lessa e
Lacombe sobre como deveria ser um manual para professores:
professor Oswaldo Frota Pessoa solicitou várias prorrogações, até entregar os originais
em fevereiro de 1958.
Outro professor que não terminou o manual de Química foi Gustav Kraudelat.
Em 7 de novembro de 1956, Mário P. de Brito encaminhou uma circular para vários
professores encerrando todas as novas prorrogações de prazo e solicitando a entrega dos
originais. No entanto, a pressão não surtiu efeito. O relatório que descrevia o
andamento dos projetos de elaboração dos manuais de ensino, de março de 1957,
afirmava que os professores Paulo Sawaya (Zoologia) e Werner Gustav Krauledat
(Química) eram os únicos que não haviam entregue nada até aquele ano.
Em relatório de 4 de novembro de 1958, Jayme Abreu informava que o
professor Paulo Sawaya entregaria os originais do livro de Zoologia até 30 de abril de
1959. O acordo foi novamente prorrogado para 31 de dezembro de 1959100. Em 21 de
janeiro de 1961, Jayme Abreu elaborou novo adendo prorrogando o prazo de entrega do
manual de Francês escrito pelo professor R. Van der Haegen.
De todos os acordos firmados desde 1953, somente foram publicados os
seguintes livros, pela série Guias de Ensino, CBPE/Inep:
100
Relatório de viagem à São Paulo de Jayme Abreu para Anísio Teixeira, em 17/8/1959.
114
101
As edições mistas, a partir dos anos 1960 passou a ser denominada “co-edição”.
102
Informação obtida de texto sem autoria, denominado Notas sobre edição de livros diferentes,
encaminhado ao Secretário Geral do CBPE, em 22/3/1959. Pelas explicações do texto pode-se supor que
foi escrito por Jayme Abreu.
103
Após pesquisa em bibliotecas, sites e outros meios, não foi possível encontrar informações sobre o
professor Amilcar Salles.
104
Informações obtidas no Currículo Lattes do professor Sérgio Mascarenhas Oliveira:
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.jsp?id=K4787604T1, acesso em 20/10/2010.
105
Os objetivos do ensino de Física no curso secundário. RBEP. Vol. 22. n. 55, jul.-set./1954. pp. 73-115.
115
106
Foram encontrados os seguintes artigos de James Braga da Fonseca na revista Escola Secundária:
1957 - O ensino da História do Brasil no curso ginasial (Diferentes processos para a 1a e 4a séries), n. 1,
pp. 55-57; O historiador e o professor de História, n. 2, pp. 83-85; Problemas do Ensino de História, n. 3,
pp. 66-69.
1958 - Como ensinar Geografia?, n. 4, pp. 94-97
1960 - A Geografia humana e a escola secundária. n. 14, pp. 99-102.
107
A Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (posteriormente denominada UFF), foi criada
oficialmente em 1960, incorporando diversas faculdades já existentes, dentre elas uma faculdade
particular de Filosofia.
108
Os programas e o ensino da História. Revista Escola Secundária, 1958. n. 5. pp. 83-86.
116
109
UNESCO. 1951. La reforma de los manuales escolares y Del material de enseñanza. Paris: Imprenta
Lahure.
118
No início do seu livro, nas Noções Preliminares, Fonseca informava que sua
obra pretendia colaborar com o estudo da situação do ensino de geografia na escola
secundária. O estudo apresentaria impressões com o intuito de colaborar para a melhoria
desse ensino. Dirigindo-se ao professor, Fonseca afirmava que os alunos não
apresentavam, no fim dos anos de estudo do secundário, resultado compensador para o
tempo, os gastos e esforços empreendidos pelos mestres, família e sociedade. Apesar de
reconhecer que as causas do resultado insatisfatório não eram responsabilidade somente
do professor, o autor afirmava que abordaria os problemas que pudessem ser resolvidos
pelos docentes. Fonseca apelava ao professor para que, diante das questões apresentadas
pelo livro, examinasse sua situação particular.
Para Fonseca, existiam dois tipos de falhas em relação ao ensino de Geografia:
falhas que exigiam a simples mudança de atitude do docente e falhas que exigiam
mudanças materiais. A mudança de atitude do docente seria condição básica para a
119
melhoria do ensino. Grande parte dos professores teriam se deixado levar pela rotina e
estavam acomodados. Esses professores jogavam a responsabilidade das falhas do
ensino para os programas, para os estudantes, para as famílias e não observavam sua
parcela de culpa nesse processo. Faltava aos professores uma “autocrítica de sua
conduta”. Segundo o autor:
1. Quais os objetivos gerais que devo atingir com uma turma de determinada
série? Para que vou ensinar tais assuntos?
2. Quantas aulas realmente poderei dar durante o ano letivo?
3. Quais os métodos empregados durante as diferentes partes do programa?
4. São os meus exercícios interessantes para os alunos?
5. Serei eu um amigo de meus alunos? (Fonseca, 1957, pp. 8-12).
de trabalho durante cada aula para manter o interesse da classe, planejar técnicas a
serem empregadas variando atitudes docentes e discentes.
4. O exercício era considerado indispensável para a aprendizagem. O aluno precisava
utilizar com naturalidade os novos conhecimentos e necessitava fixar a
aprendizagem. O professor procuraria arranjar meios de apresentar os exercícios sob
uma forma que despertasse o interesse nos estudantes, correlacionando o exercício
com fatos da vida real. Relacionaria os trabalhos com a vida prática.
5. Era necessário reforçar o sentimento de amizade entre alunos e professor, buscando
diminuir as dificuldades diárias. A amizade possibilitaria ao professor o desempenho
de sua ação educativa em maior profundidade.
As considerações de Fonseca revelam uma representação sobre os professores e
suas práticas no ensino secundário: professores que não planejavam suas aulas;
reproduziam os conteúdos dos programas oficiais sem pensar no objetivo do ensino;
ministravam aulas expositivas, com exercícios desinteressantes e sem conexão com a
vida dos alunos. A imagem dos estudantes também era representada no documento, eles
não viam interesse nos assuntos tratados pela escola, pois não tinham relação com a
realidade. As afirmações de Fonseca sobre os professores ressaltam algumas discussões
do período, como destaca Souza (2008, p. 185), que relacionavam as práticas docentes
com o sistema de avaliação da época, que cobrava o extenso conteúdo dos programas
curriculares, incentivando um ensino baseado na memorização. Para mudar a prática de
aula era necessário modificar o sistema de avaliação.
Fonseca finalizava as Notas Preliminares resumindo e analisando o conteúdo
dos programas oficiais para as diferentes séries:
* Na primeira série ginasial o ensino da geografia visava fazer com que o estudante
tomasse contato com os fatos e fenômenos geográficos, além de ter as primeiras noções
da técnica de estudá-los dentro dos princípios fundamentais da Geografia. A prática da
memorização teria de ser utilizada, pois os alunos precisavam gravar as características
geográficas. Contudo, a memorização precisava ser usada de modo adequado, conforme
a escola moderna. Para a interpretação dos fatos e fenômenos geográficos seriam
escolhidos os fenômenos de regiões conhecidas dos estudantes. Os alunos também
deveriam aprender a trabalhar na prática com instrumentos de uso da Geografia, como
os mapas.
* A Geografia na segunda série era a interpretação das relações do homem com o meio,
nas diferentes regiões da Terra. Contudo, a segunda série ginasial era a que mais
121
Em tal passagem, Fonseca enfatizava que a escola não era somente receptáculo
dos conhecimentos da ciência de referência. A escola possuía especificidades e uma
dinâmica própria. Os autores dos compêndios não compreendiam o objetivo da escola
secundária e não obedeciam aos princípios pedagógicos na elaboração dos livros,
apenas seguiam os fundamentos científicos da Geografia. Logo, Fonseca pretendia
elaborar a crítica aos manuais, abordando suas deficiências didáticas e de caráter
geográfico, apresentando, por fim, sugestões para a melhoria dos livros.
Relação dos compêndios com os programas - Fonseca explicava que todos os
manuais analisados seguiam perfeitamente a seqüência do programa oficial. Contudo, o
autor lembrava que os programas somente estabeleciam os temas a serem estudados e
que as interpretações geográficas e didáticas ficavam a critério do professor. Para
Fonseca, cada autor de manual escolar precisava organizar seu plano de apresentação da
matéria de acordo com razões pedagógicas bem definidas. O autor advertia que, para os
alunos da primeira série ginasial, os estudos precisavam partir dos fatos concretos mais
próximos para os mais distantes.
Vocabulário técnico e da Linguagem - A dificuldade no uso do vocabulário
técnico e da linguagem era destacada por Fonseca. Muitas vezes o manual era redigido
em termos abaixo ou acima da compreensão do estudante, o que causava desmotivação.
Duas seriam as soluções para o problema: 1. as autoridades ministeriais deveriam
levantar os vocabulários conhecidos e de uso dos adolescente, para que os mestres e
autores usassem linguagem compreensível e, aos poucos, ampliassem o vocabulário; 2.
os autores dos livros didáticos deveriam redigir com a preocupação de despertar
interesse no leitor. Seria preciso redigir com a dupla preocupação de expor com
exatidão científica e de modo a prender o aluno, introduzindo elementos motivadores,
que despertassem o desejo da aprendizagem. Para realizar tal objetivo, o livro precisava
articular o fato estudado com as realidades da vida do estudante.
124
aluno a como observar as imagens, pois seria por meio delas que se daria o aprendizado
geográfico da observação. Os alunos precisavam aprender a relacionar as ilustrações
com os fatos geográficos.
Exercícios - Colaborariam para a fixação da aprendizagem, pois eram
considerados indispensáveis e teriam finalidades bem definidas:
Algumas constatações
A análise do estudo de Fonseca revelou a participação do educador, nos debates
dos anos 1950, sobre a reformulação do ensino secundário, a função da Geografia nesse
ensino, a atuação docente e o papel dos livros didáticos, como divulgadores de
propostas didático-pedagógicas.
Em um primeiro momento Fonseca propôs uma orientação para os professores,
que indicava, desde a necessidade de preparação da aulas de modo racional, de acordo
com o objetivo do ensino, até os critérios de seleção dos conteúdos que melhor se
adequassem aos objetivos estabelecidos.
Para Fonseca as aulas – com seus conteúdos e atividades -, precisavam despertar
o interesse dos alunos. Para o desenvolvimento desse interesse, o ensino deveria tratar
de fatos reais e estar relacionado à vida prática. Diante dos programas de ensino
oficiais, Fonseca propôs possibilidades para o professor.
Fonseca ressaltava que o ensino precisava ser baseado na escola moderna, em
que a Geografia seria estudada pelas regiões naturais mais próximas dos alunos,
chegando às mais distantes. Os estudantes precisavam compreender a relação do
homem com o meio, nas várias regiões da Terra. O alunos era chamado a participar do
ensino, a ser ativo. Precisava conhecer os problemas nacionais e se responsibilizar pela
sua solução, como cidadãos.
Na análise dos livros didáticos, Fonseca reconhecia a importância dos manuais
como auxiliares do professor, e por tal fato, criticava a homogeinização dos livros pelos
programas oficiais, que não se preocupavam com as diferenças regionais. Na defesa da
Didática do Ensino, o autor questionava os livros escolares que pareciam apenas
reproduções resumidas dos livros de Geografia científica, sem preocupação com os
princípios pedagógicos. Para Fonseca, os autores de manuais precisavam elaborar os
livros tendo vista “razões pedagógicas” bem definidas.
As preocupações pedagógicas nos livros didáticos diziam respeito a: adaptação
da linguagem científica para a compreensão dos alunos; redação que despertasse
interesse com elementos motivadores articulados à realidade dos jovens; ilustrações que
auxiliassem e motivassem a aprendizagem dos textos; exercícios que não objetivassem
somente a memorização, mas que colaborassem com a fixação da aprendizagem e
128
110
É importante reforçar que a participação de James Braga da Fonseca nas discussões sobre o ensino não
se restringiram a produção da Caldeme e as aulas nas universidades. O professor divulgava sua concepção
de ensino de Geografia e de História, na revista Escola Secundária, como já foi mencionado. Seus artigos
ressaltavam a necessidade de uma renovação do ensino no ginásio, com o fim das aulas expositivas, de
simples memorização e a implementação de um ensino prático, objetivo, baseado na realidade dos jovens
e que estimulasse a busca pelo conhecimento científico. O objetivo do ensino era formar cidadãos com
espírito observador, críticos, conscientes e ativos. Em Como ensinar Geografia, Fonseca criticava o
aspecto livresco e escolar do ensino, como ponto prejudicial para a Geografia. Propunha que a geografia
fosse levada para fora da sala de aula, “fazendo com que os alunos criem o hábito de identificar sempre os
elementos aprendidos” (1958, p. 96). O professor precisava conhecer o ambiente de vida dos alunos para
poder planejar a correlação dos fatos geográficos, visando atender ao programa elaborado. Para realizar o
trabalho o professor precisava despertar no aluno a prática da observação da natureza e em aula discutir o
fato observado buscando suas razões científicas. O segundo momento do ensino seria estudar os fatos em
classe para depois os alunos procurá-los na natureza. Desse modo, a escola tornar-se-ia “um elemento
comum da vida” (1958, p. 96).
129
problema que seria estudado em conjunto. Todavia, de acordo com Hollanda, “nos
programas brasileiros de História do curso ginasial, tais unidades didáticas não
passaram de subdivisões lógicas da matéria neles contidas” (1957, p. 46). Como as
instruções metodológicas dos programas de História Geral e do Brasil para o Ginásio
demoraram a ser publicadas, Hollanda analisou as indicações presentes nos livros
didáticos de Serrano, que serviam de modelo para outros autores.
Em 1951, com o descontentamento de alguns professores em relação à reforma
Capanema, nova lei foi promulgada (n° 1.359), reorganizando a seriação do estudo da
História e, incluindo a História da América como disciplina autônoma. Os programas de
ensino seriam elaborados pelo CNE e aprovados pelo Ministério da Educação. Ainda
em 1951, o Colégio Pedro II voltou a ser responsável pela elaboração dos seus próprios
programas de História. Estes programas acabaram sendo expedidos para os demais
estabelecimentos oficiais e particulares do país. O Colégio Pedro II elaborou, assim,
programas mínimos de História e, posteriormente, programas de desenvolvimento e
instruções metodológicas.
Nos programas mínimos das séries ginasiais predominavam os assuntos de
história política, enquanto no colégio, acrescentavam-se os aspectos econômicos,
sociais e culturais. Hollanda criticava os programas, ao afirmar que somente os
programas mínimos deveriam ser obrigatórios. Para o autor, a proposta de se observar
as diferenças regionais não seria efetivada enquanto cada estabelecimento de ensino não
elaborasse o seu próprio programa de desenvolvimento. Do modo como estavam
estabelecidos, os programas de desenvolvimento tornavam-se uniformes para todo o
Brasil.
Hollanda concluiu a primeira parte de seu trabalho observando que o estudo da
História a partir de 1931, recebeu uma extensão muito maior do que em todos os
currículos anteriores. Comparando os programas, observou que os de 1931 tentaram
renovar “as anteriores listas de ‘pontos’, cujo conteúdo, há muito, requeria atualização”
(1957, p. 102). Os programas fracassaram, pois previam um corpo docente de alta
qualidade, o que não havia no Brasil, com raras exceções e, eram modificados em
função das provas e exames. Os programas da reforma Capanema alcançaram o
equilíbrio entre o saber do professor e o que deveria ser ensinado, pois eram “mínimos”.
Para o autor, tal iniciativa não surtiu efeito, “porque foi desvirtuada pela expedição
oficial de programas de desenvolvimento, uniformes para todo o país” (1957, p. 102).
132
beneficiavam com as correções indicadas pela CNLD. Deste modo, os novos livros
didáticos corrigiram os erros mais gritantes, apontados pelos pareceres da comissão. Os
autores dos manuais eram os mesmos das edições anteriores.
Hollanda apresentava as características dos livros didáticos de História Geral, da
América e do Brasil, para o ginásio, destacando as ilustrações, a linguagem dos
manuais, a organização das unidades, dos capítulos e, principalmente, os erros
históricos presentes em cada compêndio. Nesta parte da pesquisa, Hollanda ressaltava
todos os aspectos didáticos, pedagógicos e materiais, positivos e negativos, que os
manuais apresentavam. Com tal diagnóstico, o autor pretendia colaborar para a melhoria
da qualidade dos manuais.
Em relação aos livros de História da América, Hollanda fez o seguinte balanço:
praticamente todos os livros tratavam somente dos assuntos que constavam no programa
oficial; os autores repetiam identicamente os itens dos programas; os episódios da
História do Brasil recebiam desenvolvimento excessivo; as civilizações pré-
colombianas e a América Espanhola eram as partes mais falhas e que apresentavam
maior quantidade de erros graves nos manuais; as poucas páginas dos manuais tornava-
os “magras resenhas” (1957, pp. 179-180). Alguns dos erros citados por Hollanda eram:
haviam publicado os primeiros volumes. Diversos erros históricos foram destacados por
Hollanda, acrescentando-se, ainda, o fato de a maioria das bibliografias apresentadas
pelos manuais estarem desatualizadas:
[Livro de N16] (...) Com efeito, não vemos porque destacar definições
escolares dadas por Oliveira Lima e Jonathas Serrano, nem tampouco como
discípulo de Braudel omite as idéias de Lucien Febvre, Marc Bloch e do
próprio mestre sobre a História, limitando-se a expor o pensamento, por estes
combatido, de Ch. V. Langlois e Ch. Seignobos. Sobre os conceitos de cultura
e civilização desconhece a bibliografia contemporânea, citando dos autores do
século atual, apenas, Spengler e Ralph Turner (1957, p. 186).
Terceira parte do estudo – Nessa parte, Hollanda se inseria nas discussões que
estavam na pauta dos debates realizados nos anos 1950. Sobre os estereótipos e valores
presentes nos compêndios de História, Hollanda dialogava com a Unesco e o estudo
publicado em 1951, que discutia as tensões internacionais e modo de evitar os
estereótipos entre os povos, para que se estabelecesse a compreensão internacional.
Essas questões apareciam no pós-guerra, com o recrudescimento da guerra fria. Uma de
suas metas da Unesco, como já foi descrito no início do capítulo, era a revisão dos
manuais escolares e de seus conteúdos, sobretudo os livros de História e Geografia,
procurando modificar a forma como as “outras” nações eram retratadas, para que se
evitassem novos conflitos internacionais. O documento da criação da Unesco, de 1945,
já apresentava os objetivos de cooperação internacional:
111
Nos anos 1960, o CRPE-SP, por meio do Serviço de Recursos Audiovisuais, vai organizar cursos para
professores, com o objetivo de “divulgar filmes educativos e apresentar novas formas de utilização de
recursos audiovisuais aos professores, diretores e encarregados de treinamentos” (Ferreira, 2001, p. 48).
138
Algumas observações
Hollanda elaborou um estudo propondo-se a analisar o ensino de História na
escola média, a partir do momento em que seu conteúdo passou a ser centralizado em
âmbito federal, elucidando as diversas mudanças por que passou a disciplina. Em um
primeiro momento a História do Brasil e Geral deveriam estar unidas - na História da
Civilização -, pois se completariam. Em outro momento a História do Brasil possuiu
horário e programa de ensino específico, separada da História da América e Geral. Ao
longo das mudanças, os autores adaptaram os manuais escolares.
Holanda expôs, do mesmo modo que Fonseca, o debate travado nos anos 1950
entre educadores, dos cursos de Pedagogia, e os especialistas, dos cursos de História,
sobre o papel da História para a efetivação das finalidades gerais da educação. Para o
autor, o ensino de História na escola secundária tinha a função de colocar o alunos em
contado as vivências do passado da humanidade, buscando compreender o presente, a
realidade atual. O ensino de História deveria, ainda, expor as diferentes experiências das
civilizações do passado, procurando demonstrar a diversas formas possíveis de cultura.
O autor destacou as inovações metodológicas nos programas da reforma Campos
– no incentivo a prática da observação, do pensamento critico e do trabalho autônomo -,
e da reforma Capanema – com as unidades didáticas. Aprovou, ainda, os programas
mínimos expedidos pela reforma de 1951. Questionou, no entanto, os programas de
desenvolvimento de 1951, que segundo Hollanda, padronizavam e uniformizam o
ensino em todo o país. O autor criticou a centralização do ensino nos diversos âmbitos:
139
nos programas de ensino, nos exames e provas, e no sistema de inspeção federal. Para
melhorar o ensino, sugeriu o fim de toda essa “burocracia” do Estado.
Na análise dos livros didáticos, Hollanda tomou como referência os manuais de
Jonathas Serrano, dado a sua importância como historiador, famoso autor de manuais
escolares – que procurou uniformizar em bases científicas o ensino da História -,
referência para outros autores e elaborador dos programas de ensino. O autor observou,
nos demais compêndios, que muitos seguiam os programas oficiais, sem maiores
inovações. Verificou as propostas metodológicas, os assuntos que eram tratados nos
manuais, a forma de utilização das ilustrações e as referências bibliográficas.
Hollanda encontrou poucos autores que se basearam em “idéias da educação
progressiva”, com métodos que incentivavam a curiosidade e o espírito critico. Poucos
autores estabeleceram relações entre os manuais para o ginásio e o colégio.
Observa-se que Hollanda responsabilizava as editoras pela má qualidade dos
livros didáticos. Para abaixar o preço dos manuais, elas pressionavam os autores a
reduzirem o conteúdo dos livros112.
É importante ressaltar, ainda, o debate que Hollanda travou com dois órgãos
atuantes nos anos 1950 – a Unesco e a CNLD. O autor se solidarizou com as propostas
de modificação dos conteúdos de ensino de História sugeridas pela Unesco, que
procurava modificar a forma como as “outras” nações eram retratadas nos manuais
didáticos, para que se evitassem novos conflitos internacionais. Todavia, Hollanda
questionou a atuação e a própria existência da CNLD, posicionando-se contrário à
forma como a Comissão analisava e aprovava os livros didáticos naquele período. Para
o autor, a comissão deveria ser um órgão consultivo, que organizaria periodicamente,
“listas críticas dos compêndios publicados, no Brasil, para as escolas médias, com o fim
de orientar os professores na sua escolha” (Hollanda, 1957, p. 197)113.
112
No artigo Os programas e o ensino da História, de 1958, publicado na revista Escola Secundária,
Hollanda ressaltou a pressão da editoras para que existisse um programa único nacional, de modo a
facilitar a publicação de compêndios iguais para todo o país. São Paulo dominava o mercado editorial do
país, seguido pelo Rio de Janeiro. Para o autor, a uniformização dos compêndios deixava de lado os
aspectos regionais.
113
Guy de Hollanda participou ativamente dos debates sobre o ensino de História nos anos 1950 e propôs
mudanças nos programas oficiais. No artigo já citado, Os programas e o ensino da História, de 1958,
Hollanda elaborou sugestão de programa de ensino para a 1a série do ginásio. O programa estaria
estruturado da seguinte forma: estudar-se-ia os aspectos da civilização brasileira, do período colonial aos
dias atuais, que pudessem despertar o interesse dos alunos; o estudo da História política seria reduzido ao
mínimo necessário; os acontecimentos da história brasileira seriam, sempre que possível, relacionados aos
acontecimentos da Europa, América e outras partes do mundo; em cada comunidade a história local seria
integrada à história regional e do Brasil; a história contemporânea seria tratada menos em aspectos de
governos presidenciais (políticos) e mais em relação ao desenvolvimento industrial e suas transformações
140
na vida de todos no país (econômicos). Quanto aos recursos utilizados, Hollanda destacava os meio
audiovisuais, as visitas a arquivos e museus locais, a arte, a literatura, a colaboração da Geografia.
Afirmava que esses recursos colaborariam com os métodos ativos (1958, p. 86).
141
manuais, com metodologias diferentes das que eram utilizadas pelos autores dos
manuais.
A análise das pesquisas de Fonseca e Hollanda permitiu verificar que os autores
participavam dos debates de seu tempo. Os dois professores eram vinculados à
Faculdade Nacional de Filosofia, instituição que tinha preocupação central com a
formação de professores##&. Ambos publicaram, além disso, artigos na revista Escola
Secundária. Procuravam, portanto, difundir suas pesquisas aos professores das escolas
públicas e particulares.
Os estudos elaborados por esses professores e publicados em forma de livros,
produzidos pela Caldeme e distribuídos gratuitamente pelo CBPE para as bibliotecas
dos cursos de formação de professores, foram produzidos para serem guias, para
divulgar idéias, com a função de orientar futuros professores, autores e editores na
escolha e elaboração dos manuais escolares, baseados em nova concepção da educação.
Ao optar por analisar os compêndios a partir de 1930, os autores estavam
analisando os mesmos livros didáticos que haviam sido aprovados pela CNLD,
desacreditando, desse modo, a Comissão e questionando sua avaliação. A análise
mostrou que os livros didáticos que seguiam os programas oficiais não sofreram
significativas alterações com a aprovação da CNLD, apenas incluíam ou retiravam
conteúdos, de acordo com as mudanças nos programas. A função da CNLD era apenas a
de assegurar que os livros didáticos seguissem os programas oficiais. Para Hollanda e
Fonseca, o trabalho da CNLD engessava a criatividade dos autores e editores de
manuais escolares, pois, ao seguir a risca os programas oficiais, ficavam amarrados à
elaboração de um tipo padronizado de livro didático. Tal análise reforçava a crítica de
Anísio Teixeira à Comissão, cuja atuação era considerada prejudicial para a
possibilidade de inovação da produção didática e da educação de modo geral.
Fonseca e Hollanda estabeleceram em suas análises questionamentos de um tipo
de livro didático, que refletia um modelo pedagógico considerado tradicional, livresco e
baseado na memorização. As suas sugestões para elaboração de manuais evidenciavam
uma nova proposta pedagógica. Suas considerações expunham as mudanças que
ocorriam no período, com o declínio do ensino baseado nas humanidades clássicas e a
ascensão das ciências, dos métodos científicos. O ensino deixaria de ser expositivo
114
Pereira (2010), que analisou os debates do curso de História da Faculdade Nacional de Filosofia
(FNFi) nos fim dos anos 1950, ressalta que a FNFi caracterizava-se mais como uma faculdade com
preocupação de ensino, para formação de professores de qualidade para o ensino Médio, do que uma
instituição voltada para a pesquisa (p. 52).
143
CAPÍTULO III
115
Entre 1950 e 1960 o número de faculdades de Filosofia particulares cresceu significativamente.
Segundo Toledo (2001, p. 38), além dos licenciados nas faculdades particulares houve um aumento de
professores formados em outros cursos superiores.
146
116
Dentre as pessoas que assinaram o Manifesto Mais uma vez convocados, é importante enfatizar
intelectuais que participavam da política educacional brasileira desde a década de 1920. Desses
intelectuais, alguns tinham participado da CNLD nos anos 1940, e outros participaram dos projetos da
Caldeme e da Cileme. Eram eles: Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Carneiro Leão, Abgar Renault,
Delgado de Carvalho, Mário de Brito, Adalberto Menezes de Oliveira, Jayme Abreu, José Leite Lopes,
Afrânio Coutinho, Carlos Corrêa Mascaro, Oswaldo Frota Pessoa, Celso Kelly e Guy de Hollanda.
117
O Manifesto Mais uma vez convocados, foi publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo, Boletim do
CRPE/SP, pela RBEP, pelo jornal do Comércio e pelo Diário de Notícias.
118
O Substitutivo de Carlos Lacerda ao projeto da LDB situava a educação como um direito da família e
considerava a escola uma prorrogação dela. Defendia a iniciativa privada contra o monopólio do Estado.
O Estado não poderia ter o monopólio do ensino, mas teria a responsabilidade de oferecer recursos
financeiros e técnicos para manutenção das escolas (Filgueiras, 2006, p. 31).
119
Entre os participantes da Campanha em Defesa da Escola Pública destacavam-se Fernando de
Azevedo, Florestan Fernandes, Antônio Almeida Júnior, Anísio Teixeira, Carlos Corrêa Mascaro,
Carneiro Leão, Abgar Renault e Jayme Abreu.
120
Em 1961, João Goulart tornou-se presidente da República, após a renúncia de Jânio Quadros, em
regime parlamentarista. Seu governo iniciou, de fato, em 1963, com o retorno do regime presidencialista
e permaneceu até março de 1964, quando ocorreu o golpe militar.
147
Estados competência para a organização de seus sistemas de ensino” (p. 231). Contudo,
também diminuiu o controle das escolas privadas, “facultando a subvenção da União às
escola particulares para compra, construção ou reforma de prédios, compra de
equipamentos e concessão de bolsas de estudos” (Souza, 2008, p. 231).
Dentre as resoluções da LDB/61 estavam: a criação do Conselho Federal de
Educação (CFE); o ensino primário teria por finalidade “o desenvolvimento do
raciocínio e das atividades de expressão da criança, e a sua integração no meio físico e
social”, deveria ser obrigatório a partir dos sete anos, ministrado em língua nacional e
poderia se estender até seis anos; o ensino médio destinava-se à formação do
adolescente, deveria ser ministrado em dois ciclos, o ginasial (com quatro anos) e o
colegial (com ao menos três anos), abrangendo os cursos secundários, técnicos
(industrial, agrícola e comercial) e de formação de professores. A terceira série do ciclo
colegial seria organizada visando o preparo para os cursos superiores. A LDB/61
efetivou a equivalência entre os cursos técnicos e o curso secundário, ao permitir a
qualquer aluno que terminasse um dos cursos do ensino médio prestar concurso de
habilitação para o ensino superior. A LDB/61 conservou, ainda, o exame de admissão à
1a série do 1o ciclo dos cursos de ensino médio.
Os primeiros anos da década de 1960 caracterizaram-se como um período de
intensa ebulição política, cultural e social. Segundo Toledo, o período de 1961 a 1964
foi interpretado pelos setores da esquerda como “um momento em que a luta de classes
no Brasil alcançou um de seus momentos mais intensos, dinâmicos e significativos”
(2004, p. 14). As principais ações do governo Goulart foram o Plano Trienal de
desenvolvimento econômico-social e, posteriormente, as reformas de base121. Para os
setores da esquerda nacionalista, as reformas eram “condição indispensável à ampliação
e fortalecimento da democracia política no país” (Toledo, 2004. p. 17)122.
Com o Golpe de 1964, o contexto político e social brasileiro se alterou e pôs fim
aos debates realizados pelos diversos setores da sociedade e no Congresso Nacional. A
democracia foi interrompida e as reformas sociais e políticas que estavam em curso
foram alteradas. As organizações políticas de oposição aos militares foram perseguidas
e o sistema partidário modificado. As imunidades parlamentares foram suspensas, as
121
As principais reformas foram: reforma agrária, da educação, da saúde, fiscal e administrativa.
122
Durante a primeira metade dos anos 1960, o debate político, ideológico e cultural acontecia nos mais
diversos espaços: nos órgãos do governo, nos sindicatos dos trabalhadores, nos partidos políticos, no
movimento estudantil - com a UNE e as UEE -, na luta dos trabalhadores do campo - com as Ligas
Camponesas e a Reforma Agrária -, na imprensa, no Movimento de Educação de Base, etc.
148
Nos anos 1950, como já se observou, inúmeras propostas para o livro didático –
sua produção, fiscalização e uso – foram encaminhadas pelo Congresso Nacional e
debatidas pelo Inep, por meio da Caldeme. Em 1956, visando incentivar e melhorar a
qualidade do material didático foi promulgado o Decreto n° 38.556 instituindo no
Departamento Nacional de Educação (DNE), a Campanha Nacional de Material de
Ensino (CNME). A Campanha desenvolveria medidas referentes à produção e
distribuição de material didático com a finalidade de “contribuir para a melhoria de sua
qualidade, do seu emprego, bem como para a sua progressiva padronização” (Decreto
n° 38.556/56). A Campanha produziria coleções, aparelhos para estudo de Ciências
Naturais, Matemática, Desenho, Geografia, História, material de ensino áudio-visual,
dicionários, atlas e outras obras de consulta.
A indústria gráfica brasileira recebeu inúmeros incentivos durante a presidência
de Juscelino Kubitschek. O custo do papel e da impressão foram reduzidos, por meio da
liberação de licenças de importação para o setor gráfico. Novos equipamentos
renovaram e modernizaram o parque gráfico nacional. O governo isentou o setor
livreiro e a indústria de papel de grande parte dos impostos e reduziu as tarifas postais
para os livros. Segundo Hallewell (1985, p. 443), a indústria gráfica brasileira cresceu
143% entre os anos 1950 e 1960.
Em 1959 foi criado o Grupo de Estudos da Indústria do Livro (GEILPE), que
deveria estudar os problemas da indústria editorial, do comércio do livro e sugerir
medidas para o aumento da produção de livros nacionais e buscar elevar a qualidade
149
gráfica dos livros editados. O GEILPE era composto pelo Ministro da Educação e por
representantes da Associação Brasileira do Livro (ABL), da União Brasileira de
Escritores, do INL, do SNEL, da CBL, do Departamento Nacional de Educação, do
Sindicato Nacional das Indústrias Gráficas, do Ministério da Fazenda e do Ministério da
Viação.
Ainda em 1959, o Brasil participou da XXII Conferência Internacional de
Instrução Pública, em Genebra, organizada pela Unesco. No relatório final, as
Recomendações n. 48, tratavam da elaboração, escolha e utilização de manuais nas
escolas primárias e estavam divididas em seis itens, que mereceram destaque:
1. Elaboração dos manuais - recomendava que as autoridades públicas dessem
maior atenção à elaboração das obras didáticas do ensino primário, pelo seu valor na
instrução desse nível de ensino; os Estados deveriam se certificar de que as obras
produzidas pela iniciativa privada e utilizadas nas classes fossem de “valor científico,
pedagógico e estético incontestável”; deveriam ser organizados concursos entre autores
ou grupos de autores procurando contribuir para aperfeiçoar a qualidade dos manuais
escolares.
2. Edição dos manuais – recomendava a organização de concursos entre os
editores para aperfeiçoar a qualidade dos livros e reduzir o preço de fabricação;
observar na produção dos manuais os progressos em relação a tipografia, ilustrações e
encadernação; tomar medidas urgentes para aumentar a produção de livros didáticos;
racionalizar a produção para reduzir o preço da fabricação e venda sem diminuir a sua
qualidade; observar a apresentação do livro, que deveria ser legível, sobretudo nos
livros de leitura destinados aos principiantes; aumentar e melhorar as ilustrações, pois
estas ajudam na compreensão da matéria; a apresentação artística dos manuais deveria
inspirar-se “nos progressos realizados nos domínios do livro recreativo e do livro
instrutivo”.
3. Escolha dos manuais – recomendava a organização de lista dos manuais
selecionados para escolha das escolas; as comissões que organizassem as listas
deveriam agir com objetividade, observando o valor pedagógico e científico das obras,
sua apresentação e o valor de venda, as comissões deveriam possuir representantes do
magistério primário.
4. Distribuição e aquisição dos manuais – priorizar a distribuição gratuita dos
manuais escolares para todos os alunos da escola primária; na falta de recursos
financeiros do Estado, procurar distribuir gratuitamente manuais para pelo menos as
150
123
Segundo Assunção (2009), a Coleção História Nova do Brasil, de Nelson Werneck Sodré, era um
convênio entre o MEC e os intelectuais do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). Os autores e
pesquisadores da Coleção eram alunos da Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi) e membros do PCB
(pp. 39-40). Os autores dos livros eram: Pedro Alcântara Figueira, Joel Rufino dos Santos, Maurício
Martins, Pedro Celso de Uchoa e Rubem César Fernandes (Hallewell, 1985, p. 461). A proposta da
coleção era servir de apoio didático e teórico para os professores. Assunção enfatiza que a coleção foi
censurada em 1965 e os livros já editados foram retirados das livrarias em 1966 (2009, p. 246).
124
Agravando as tensões, em março de 1964, no “Comício da Central”, Goulart anunciou as Reformas de
Base. Nesse momento, os jornais intensificaram os boatos de que Goulart, “com o apoio do PCB, do CGT
e das forças políticas nacionalistas – preparava um golpe de Estado” (Toledo, 2004, p. 23). O crescimento
do perigo comunista era noticiado pela imprensa. Nas manifestações contrárias às ações do governo
destacou-se a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, realizada em março de 1964, em São
Paulo. No Paraná, foi organizada a “Marcha a favor do Ensino Livre”, em oposição ao Decreto n°
53.583/64 e contra o “livro único” (Codato, Oliveira, 2004, p. 273-287).
153
Fundação tinha, entre outras funções, o dever de selecionar e julgar os livros didáticos a
serem adotados pelos estabelecimentos de ensino do estado (Hallewell, 1985, p. 466).
Nesse mesmo ano, o senador Vasconcellos Torres apresentou o projeto de Lei n°
6, que regulava a escolha e a mudança dos livros didáticos nos estabelecimentos de
ensino da União e nos estabelecimentos de ensino secundário e técnico particulares. O
projeto estabelecia que o livro escolhido pelo professor deveria ser utilizado por quatro
anos. Previa ainda, a criação de uma Comissão Especial do Livro Didático. A resposta
do CFE, por meio do parecer n° 253/65, de Farias Góis, foi contrário ao projeto de lei,
argumentando que congelar o livro didático por quatro anos seria frear o avanço
pedagógico que buscava aprimorar os manuais continuamente. Os alunos seriam
condenados a aprender conhecimentos e interpretações ultrapassadas. O parecer
enfatizava que não era necessária a criação de um órgão federal para regular sobre o
livro didático, pois os estados já possuíam órgãos para isso. Finalizava afirmando que a
existência de uma Comissão do Livro Didático já tinha representado uma experiência
infrutífera e negativa no passado.
Ao longo de 1965, outros projetos sobre os livros didáticos foram debatidos pelo
Congresso nacional e pelo CFE. Todavia, nenhum foi aprovado. Nesse tempo, a CNLD
continuou a existir de modo pouco significativo até ser extinta pela Portaria Ministerial
n° 594, em 1969. Contudo, era imperativo e urgente regular os livros didáticos. A
tentativa de solução para o problema do livro didático seria estabelecida pelo governo
da Ditadura Militar, em 1966, com a criação da Comissão do Livro Técnico e do Livro
Didático (Colted).
Após o golpe militar o tema do livro didático tornou-se importante nos debates
sobre a necessidade de fornecimento de materiais para os alunos carentes e na questão
do incentivo e regulamentação de seu mercado editorial. Quatro foram os órgãos
responsáveis pelas políticas públicas do livro didático nesse período: a Comissão do
Livro Técnico e do Livro Didático (Colted), o Instituto Nacional de Livro (INL), a
Fundação Nacional do Material Escolar (Fename) e a Fundação de Assistência ao
Estudante (FAE). Os três primeiros - a Colted, o INL e a Fename - possuíram processos
de avaliação dos manuais escolares.
154
125
O livro didático consumível possuía exercícios e atividades para serem respondidos pelos alunos no
próprio livro. Deste modo, os livros consumíveis não poderiam ser reaproveitados.
155
126
No ofício n° 828, de 29/7/1966, ao Ministro da Educação Raimundo Moniz de Aragão, o diretor do
Inep, Carlos Corrêa Mascaro, fez um relatório com críticas ao Conselho do Livro Técnico e do Livro
Didático. Ao discutir o problema da política para os livros escolares, Mascaro retomou a experiência do
Inep com a Caldeme e a publicação de manuais para professores, considerada uma experiência negativa,
que “não atingiu um número sequer razoável de manuais”. Segundo Mascaro, o Inep após a experiência
da Caldeme modificou sua orientação e passou a estimular edições privadas de livros e manuais para
professores.
127
De acordo com Cassiano, com baixo orçamento, a partir de 1970, a Fename passou a produzir livros
em co-edição com o “empresariado nacional” (2003, p. 39).
157
A Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático foi criada com base nas
recomendações da XXII Conferência Internacional de Instrução Pública, realizada em
Genebra, em 1959. Como apresentado anteriormente, as recomendações indicavam a
importância dos livros e outros materiais didáticos para o ensino, enfatizava a
necessidade de organizar a elaboração dos manuais, incentivar o aumento da produção,
a qualidade editorial dos livros didáticos, observar as questões didáticas, das áreas de
128
Os Cadernos MEC apresentavam os conteúdos de ensino de modo diferenciado, por meio de
atividades e exercícios que compunham todo o material e deveriam ser respondidos no próprio caderno.
Os cadernos possuíam uma apresentação direcionada para os alunos, com toda orientação de como o
material deveria ser utilizado, os momentos de trabalhos individuais e em grupo, indicações de técnicas
de estudo e indicações bibliográficas. Os cadernos partiam do princípio do auto-aprendizado, a
orientações dos professores aos estudantes deveria diminuir de acordo com o desenvolvimento das
atividades em relação a maturidades e independência intelectual dos alunos. Além dos cadernos para os
alunos, foram publicados Guias Metodológicos das diferentes disciplinas escolares para orientar os
professores em como utilizar o material.
129
A CNME e, posteriormente, a Fename publicaram os seguintes Cadernos MEC:
Estudos Sociais – Cadernos MEC Estudos Sociais 1;
História - Cadernos MEC de História do Brasil, 1o 2o e 3o cadernos; Cadernos MEC de História Geral, 1o
e 2o cadernos;
Geografia - Cadernos MEC de Cartografia, através dos mapas; Cadernos MEC Iniciação Geográfica;
Cadernos MEC Geografia 3 Continentes;
Desenho - Cadernos MEC de Introdução ao Desenho Técnico; Cadernos MEC Desenho Plano espaço;
Cadernos MEC Desenho Decorativo Morfológico;
Ciências - Cadernos MEC de Iniciação à Ciência,
Matemática - Cadernos MEC Álgebra, 1 e 2; Cadernos MEC Aritmética; Cadernos MEC Introdução à
Análise Matemática; Cadernos MEC Geometria, 1, 2;
Física - Cadernos MEC Física 1 Ótica Geométrica e Termologia; Cadernos MEC Física 2 Mecânica;
Português - Cadernos MEC Português, 1, 2, 3;
Línguas estrangeiras - Cadernos MEC Frances
Química - Cadernos MEC Química Mineral; Cadernos MEC Química Orgânica;
Contabilidade - Cadernos MEC Iniciação à Contabilidade Geral;.
130
A documentação localizada sobre a Colted possui informações relativas aos acordos entre o MEC,
SNEL e United States Agency for International Development (USAID); atas das reuniões do colegiado da
Comissão; relatórios da I e II Semanas de Estudo da Colted; os Boletins da Colted; relatório do processo
de seleção de livros para as bibliotecas primárias e normais; relatório do processo de avaliação e seleção
de livros didáticos para o Plano Piloto – de distribuição de livros aos alunos das escolas primárias das
capitais -; ofícios da Direção Executiva e da Presidência da Colted.
O material selecionado permitiu a análise da atuação desse órgão e das discussões internas que
envolveram o Ministério da Educação e seus técnicos, as diversas Secretarias de Ensino, o Departamento
Nacional de Educação, a USAID, o INL, o Inep, o SNEL, os técnicos dos Centros Regionais de Pesquisas
Educacionais (CRPEs) e professores dos Institutos de Ensino do Rio de Janeiro.
Além da documentação encontrada, a presente pesquisa utilizou o artigo do professor Kazumi Munakata
(2006), O gigantismo da Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático, produzido como parte do
relatório final do projeto “A política de livro didático no regime militar: da Campanha do Livro Didático
e Manuais de Ensino (Caldeme)/Campanha Nacional de Material de Ensino (CNME) à Comissão do
Livro Técnico e Didático (Colted) e à Fundação Nacional de Material Escolar (Fename)”.
158
conhecimento e das Ciências da Educação, melhorar sua distribuição, que deveria ser
preferencialmente gratuita para o máximo possível de alunos.
A exposição de motivos de criação da Colted, (Apud Krafzik, 2006, p. 58)
justificava o investimento nos livros técnicos e didáticos como um instrumento de
aperfeiçoamento do ensino, em especial o primário, devido ao aumento da população
estudantil em todo o país. Pretendia-se levar o livro até as localidades mais distantes,
“considerando que a produção e a distribuição do livro técnico e do livro didático
interessam, sobretudo, aos poderes públicos pela importância de sua influência na
política de educação e de desenvolvimento econômico e social do país” (Exposição de
motivos ao art. 1º, Diário Oficial, 5/10/1966, p. 1.1468, apud Krafzik, 2006, p. 58). O
discurso do presidente da Colted, Edson Franco, explicitava os dois objetivos da
Comissão: montar bibliotecas nas escolas, com obras que permitissem alterar a
mentalidade pelo uso dos livros escolares; e estimular a expansão da indústria do livro,
por meio de grandes tiragens de obras técnicas, didáticas e recreativas (Apud Krafzik,
2006, p. 59).
Munakata (2006) observa que as considerações iniciais do Decreto n. 59.355/66,
enfatizavam a necessidade de o Estado manter “atitude atuante e vigilante”, podendo
“participar diretamente, quando necessário, da produção e distribuição” dos livros
técnicos e didáticos. No entanto, a intervenção do Estado não asfixiaria a iniciativa
privada, mas procuraria “orientar e incentivar a livre concorrência” procurando
“intensificar a produção e a melhorar a qualidade do livro técnico e do livro didático”,
baixar “os preços de custo e de venda” e assegurar a distribuição (Munakata, 2006, p.
77). O MEC assumia, assim, as responsabilidades pela política do livro técnico e
didático, por meio da Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático. De acordo com o
artigo 2º, do Decreto n° 59.355/66, a Colted deveria:
131
O pessoal em exercício era composto por: Chefe do Serviço Administrativo – Ary Leonardo Pereira;
Chefe do Serviço de Coordenação – Reginaldo Carpenter Ferreira; Contabilidade – Thereza Christina
Villela Spinelli e Geraldo Martuchelli; Secretaria – Jane Fernandes, Lindalva Tenório Fraga, Irene
Hildebrand, Antonio Fagundes e Laércio Ferreira de Albuquerque; Contratos – Ubirajara Barroso
Magalhães; Biblioteca – Anamaria Barros Evangelista; Distribuição – Sonia Maria, Augusto Souza
Meyer e Arsindo Gonçalves Baptista; Cursos e Seminários – Jandira Bastos Cintra de Oliveira e Lenita
Soares Bastos.
132
Cândido Guile de Paula Machado era diretor da Editora Agir.
160
de várias escolas normais de São Paulo133 e era professor da USP. Participou das
atividades do Inep, junto com Anísio Teixeira, sendo diretor do CRPE/SP. Foi
signatário do Manifesto Mais uma vez convocados, de 1959 e da Campanha em Defesa
da Escola Pública; Gildásio Amado participava dos debates educacionais desde os anos
1940, como foi apresentado no capítulo anterior. Foi professor no Colégio Pedro II, da
Faculdade Nacional de Filosofia, coordenador da Campanha de Difusão e
Aperfeiçoamento do Ensino Secundário (Cades) e presidente da CNLD. Verifica-se,
portanto, que o colegiado da Colted foi composto por educadores que atuaram nos
projetos educacionais anteriores à Ditadura Militar.
Além dos membros citados, participavam das reuniões do Colegiado da Colted
Miss Alice Palmer e seu assessor Sr. Campbell, da United States Agency for
International Development (USAID), o professor Décio Guimarães de Abreu e General
Propício Alves134 – assessores do Presidente da SNEL.
A reunião de instalação da Colted aconteceu em 27 de setembro de 1966, no
gabinete do Ministro da Educação. Nessa reunião foi escolhido como presidente da
Colted o professor Edson Franco. A segunda reunião do Colegiado, realizada em 26 de
outubro de 1966, indicou o professor Leostenes Cristino para Diretor Executivo da
Comissão. Constituíram-se, ainda, duas subcomissões - de Planejamento e Execução135.
Na terceira reunião da Comissão, de 22 de novembro de 1966, foi lida uma carta
de 10 de novembro de 1966, firmada pelos Ministros da Educação Muniz de Aragão, do
Planejamento Roberto Campos e da Fazenda Gouvêa de Bulhões, endereçada ao
Ministro Van Dyke, diretor da USAID no Brasil, que solicitava “a liberação de quinze
bilhões de cruzeiros” para ser iniciada a atividade da Colted. Nessa reunião foi decidido
que as subcomissões de Planejamento e Distribuição deveriam elaborar um Plano Inicial
de Aplicação que organizaria a constituição de “cerca de oito mil bibliotecas escolares
para os três níveis, programa de cursos e seminários, grandes tiragens de livros para uso
em classe e outras providências”. Na quarta reunião, de 12 de dezembro de 1966, foi
submetida ao Colegiado a minuta do Convênio a ser assinado entre o MEC, a SNEL e a
133
Carlos Corrêa Mascaro foi professor nas escolas normais de Casa Branca, Cruzeiro e Rio Claro. Foi,
ainda, diretor da escola Normal de Araçatuba, Catanduva e professor de Administração da Educação, no
Instituto de Educação Caetano de Campos. Era professor de Administração Escolar e Educação
Comparada da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP (Dias, 2002, p. 217).
134
Propício Machado Alves, era diretor da Editora Ao Livro Técnico. Décio Guimarães de Abreu era
diretor da Editora Record.
135
A subcomissão de Planejamento foi constituída por Carlos Mascaro, Décio de Abreu e Edson Franco.
A subcomissão de Execução foi constituída por Augusto Meyer, Lafayete Garcia e Cândido Machado.
161
136
O Convênio foi assinado em 6 de janeiro de 1967, por: Raymundo Moniz de Aragão – Ministro da
Educação e Cultura; Cândido de Paula Machado – Presidente do SNEL; Stuart H. Van Dyke – Diretor da
USAID/Brasil; Joaquim Faria Góis – Representante do Governo Brasileiro para a Comissão
Coordenadora da Aliança para o Progresso e Francisco de Assis Grieco – do Escritório do Governo
Brasileiro para Cooperação Técnica. O convênio vigoraria até 31 de dezembro de 1969.
137
Criada oficialmente no Encontro Extraordinário do Conselho Econômico e Social Interamericano,
realizado em Punta del Este, em 1961, a Aliança para o Progresso tinha por objetivo acelerar o
desenvolvimento econômico mediante a colaboração financeira e técnica na América Latina.
162
O Plano Inicial
títulos para os acervos ficaria sob responsabilidade dos seguintes órgãos: ensino
primário – DNE e Inep; ensino secundário – Diretoria de Ensino Secundário; ensino
técnico industrial - Diretoria de Ensino Industrial; ensino técnico agrícola –
Superintendência do Ensino Agrícola; ensino superior – Diretoria do Ensino Superior;
Ensino militar – os respectivos Ministérios militares e; ensino técnico comercial –
Diretoria do Ensino Comercial. O segundo projeto selecionaria os títulos em processo
de publicação nas editoras e, o terceiro projeto, procuraria incentivar a publicação de
novos títulos.
Para organizar as discussões sobre o livro didático, a Colted realizou duas
Semanas de Estudo. A primeira aconteceu de 2 a 6 de maio de 1967, com a finalidade
de trocar experiências entre “professores, autores, editores, livreiros, técnicos de
educação e autoridades”, visando organizar as “diretrizes de uma política do livro
técnico e do livro didático, relacionada com sua produção, edição, aprimoramento e
distribuição” (Regimento interno da I Semana de Estudos da Colted). Participaram,
assim, representantes das Secretarias Estaduais de Educação, pessoas ligadas as
editoras, professores de ensino básico e de Universidades. A semana produziu relatórios
organizados por seis Comissões de Trabalho: Títulos Novos; Livro de Nível Primário;
Livro de Nível Médio; Livro de Nível Superior; Bibliotecas; Distribuição.
O relatório final da Comissão do Livro de Nível Médio138 cujo relator foi
Roberto Accioli, sob coordenação de Lafayette Belfort Garcia, indicou diretrizes para a
melhoria da qualidade dos livros de texto. Dentre elas, destacavam que deveriam ser
seguidas as recomendações do Conselho Federal de Educação, que continham as
diretrizes para o ensino das disciplinas de grau médio e as normas dos Conselhos
Estaduais e dos diversos órgãos do MEC, das Secretarias de Educação, das
Congregações Oficiais e das Associações de Educação e Ensino. Sugeriam, ainda:
O livro didático, não poderia ter omissões, nem ser amplo em excesso, o resumo
exagerado e a noção ultrapassada deixavam de satisfazer à inquietude do adolescente.
O livro de texto deveria facilitar a aquisição de conhecimentos, sua fixação e revisão.
O livro texto deveria oferecer os elementos que permitissem responder, de imediato, às
naturais indagações dos jovens.
Impõe-se ao livro didático contribuir para o melhor desenvolvimento dos hábitos de
estudo, procurando interessar o estudante no que diz respeito à sua curiosidade
intelectual.
138
Participaram da da Comissão do Livro de Nível Médio os seguintes professores: Maria Junqueira
Schmidt (membro da CNLD), Thomaz Aquino de Queiroz, Lydmea Gasman, Vicente Tapajós, Amaury
Pereira Muniz, Padre José Vasconcellos, Armando Hildebrand, Gildásio Amado, Jorge Furtado, Isaías
Raw e Julio Barros Assunção.
165
- conteúdo que reflita o que de melhor o especialista ache que deva ser
ensinado sobre o assunto; tendo em conta a evolução deste setor do
conhecimento, introduzindo inovações compatíveis com esta evolução e
vivificar o ensino e aprendizagem;
- empregar método que reflitam as modernas diretrizes para uma
aprendizagem dinâmica. Apresentar a matéria sob a forma de problemas.
Estimular a atividade de pesquisa;
- adequado à faixa etária em relação ao conteúdo e vocabulário; ajustado à
realidade brasileira;
- matéria deve possibilitar aos estudante a aquisição de conhecimentos que o
habilitem a utilizá-los na vida diária;
- promover leitura reflexiva, estimular atitude científica e objetiva; estimular
interesse pelo prosseguimento nos estudos;
- estimular a utilização de obras de referência, recurso audiovisuais, literatura,
conter sugestões de pesquisas diretas;
- estabelecer condições para que o professor atue como orientador do trabalho
do aluno e não como repetidor ;
- oferecer condições para se observar as diferenças individuais, com exercícios
e atividades opcionais;
- as atividades de natureza científica, como laboratório devem ser orientações
sem instruções que eliminem a atitude científica e criadora do aluno;
(Trechos resumidos do relatório da Comissão do Livro de Nível Médio, na I
Semana de Estudos da Colted, 2 a 6 de maio de 1967).
139
*Íris Fádel era professora normalista e diretora do Grupo Escolar Prof. “Honório Miranda”, em Santa
Catarina. Era técnica do DNE;
*Teresinha Casasanta era autora de livros de leitura. Professora de Didática do Curso Colegial Normal do
Instituto de Educação de Belo Horizonte. Era técnica do CRPE/MG e havia participado do PABAEE,
como uma das professora escolhidas para fazer o treinamento na Universidade Indiana.
*Maria Yvonne A. de Araújo era educadora formada em Minas Gerais, autora de livros de leitura e
cartilhas e membro da equipe de Assistência Técnica ao Ensino Primário;
*Helena Lopes era professora e técnica do CRPE/MG;
*Maria Onelita Peixoto era técnica do MEC e professora de Didática de Estudos Sociais do CRPE/MG,
também havia participado do PABAEE e do curso de treinamento na Universidade de Indiana.
* Nair Ferreira Tulha era técnica do CBPE, professora de Matemática do Instituto de Educação da
Guanabara;
*Maria José Berutti era professora de Didática de Ciências Naturais da Divisão de Aperfeiçoamento de
Professores do CRPE/MG;
*Generice A. Vieira era técnica do CBPE;
*América de Freitas Lima era técnica do DNE;
*Maria Olindina Pereira Trindade era técnica do DNE.
168
140
É interessante observar a grande participação de mulheres na Comissão de Seleção. Até a década de
1950 existia uma predominância de homens que participavam da política educacional, principalmente em
cargos administrativos. A partir dos nos 1960, a feminização do magistério se acentua, como enfatiza
Batista (2002, p. 560) E, desse modo, as mulheres começam a ocupar espaço no cenário governamental.
141
De acordo com Paixão e Paiva (2002, p, 58), o PABAEE integrava o Programa Ponto IV, que era a
primeira proposta de assistência técnica bilateral dos EUA para países subdesenvolvidos. Segundo as
autoras: para acompanhar os projetos de assistência técnica nos países, os técnicos se organizavam em
uma "missão de operação". No Brasil a USOM-B (Missão de Operação dos EUA no Brasil) começou a
atuar no programa de educação para o ensino industrial (Comissão Brasileira para o Ensino Industrial -
CBAI). Em 1956, foi assinado o (PABAEE) e foi encaminhado pelo MEC a solicitação de um programa
visando o ensino secundário (PABAES). O Programa do Ensino Secundário foi assinado em junho de
1957 (Paixão e Paiva, 2002, pp. 61-62).
142
O acordo foi assinado pelo Ministro da Educação Clóvis Salgado, pelo governador de Minas Gerais
José Francisco Bias Fortes e pelo diretor da United States Operation Mission/Brasil (USOM/B) William
E. Warne.
143
Em 1963 José Nilo Tavares, pesquisador do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Minas
Gerais (CRPE/MG) tornou-se o coordenador do PABAEE.
144
O texto das professoras foi encontrado no site:
http://crv.educacao.mg.gov.br/sistema_crv/index.asp?id_projeto=27&ID_OBJETO=29842&tipo=ob&cp
=000000&cb=, acesso em 04/01/2011.
145
Os co-diretores do PABAEE eram Abgar Renault, Secretário de Estado de Educação e Thomas A.
Hart, Diretor da Divisão de Educação da USOM-B. A administração do Programa estava sob a
responsabilidade de Mário Casasanta, Diretor do Instituto de Educação e Charles M. Long, dos Estados
unidos. Mais informações sobre o PABAEE ver: PAIXÃO e PAIVA (2002).
169
146
Os professores escolhidos para estudar na Universidade de Indiana foram: Terezinha Casasanta,
Marília Guimarães, Magdala Bacha, Nazira Abi-Jaber, Maria Luiza Ferreira, Wellington Armanelli,
Rizza Araujo Porto, Terezinha Nardelli, Maria Azeredo passos, Nelson Hortmann, Onolita Peixoto,
Marina Couto, Beatriz Costa e Wilson Chaves.
170
Essa primeira seleção de livros para as bibliotecas das escolas primárias causou
certo desconforto entre os professores, autores e editores. Em agosto de 1967, a
Comissão do Inep/DNE escreveu um longo relatório em resposta à carta do professor
Theobaldo Miranda Santos, que manifestou restrições aos livros de leitura selecionados
pela Comissão de Seleção, que considerou influenciada pela “missão pedagógica norte-
americana” em alusão aos membros que participaram do PABAEE. Em 13 de dezembro
desse ano, os editores da série Alegria de Ler, da Abril Cultural, solicitaram um novo
estudo crítico de seus três volumes que foram excluídos da seleção.
Em 14 de setembro de 1967, o Colegiado da Colted criou a Assessoria da
Avaliação, procurando centralizar o processo de avaliação dos livros didáticos.
Vinculada a Assessoria da Avaliação seriam constituídos três grupos de trabalhos, com
técnicos indicados pelos órgãos do MEC, dos diferentes níveis de ensino (elementar,
médio, superior). Essa medida visava agilizar o processo de seleção de títulos e dar
uniformidade ao acervo. Por solicitação do Diretor Executivo Ruy Baldaque, a
Comissão de Seleção do Inep/DNE reexaminou, em outubro de 1967, a relação de
títulos selecionados para as bibliotecas das escolas primárias em abril daquele ano. O
novo exame visava à formação e distribuição de mais dez mil bibliotecas. Em 6 de
outubro de 1967, o resultado final da revisão foi encaminhado à Colted.
O próximo passo da Comissão foi selecionar livros para a composição de mil
bibliotecas para escolas normais. Em 31 de outubro de 1967, Elza Nascimento Alves
encaminhou ao Diretor da Colted, os nomes dos especialistas147 que participaram da
147
Os novos especialistas eram:
* Cândida Luiza Cerne de Carvalho – Técnica de Educação do Inep e professora de História e Filosofia
da Educação da Escola Normal Carmela Dutra;
* Eunice da Conceição Macedo Rosa – Professora de Português, integrante da equipe de assistência ao
ensino primário MEC-USAID;
* Heloisa Feital dos Reis – Orientadora de Recreação no Setor de Ensino Primário do Estado da
Guanabara, professora de Educação Física e Recreação no Curso Normal do Instituto de Educação;
* Leny Werneck Dornelles – Professora de Teoria e Prática da Escola Primária na Cadeira de Prática de
Ensino do Curso de Formação de Professores para o Ensino Normal do Instituto de Educação da
Guanabara;
* Maria Augusta Joppert – Professora de Educação Musical e Artística, chefe do Serviço de Educação
Musical da Secretaria e Cultura da Guanabara de 1955 a 1967;
* Maria Helena Novais – Psicóloga do Instituto Superior de Estudos e Pesquisas Sociais da Fundação
Getúlio Vargas, professora de psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro;
* Maria José Penna Firme – Técnica de Educação do Inep, professora de psicologia do Colégio Estadual
Camilo Castelo Branco;
* Maria Luiza de Almeida Cunha Ferreira – Professora de Psicologia Educacional do CRPE/MG,
professora do Instituto Central de Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais;
* Maria Vicentina de Campos Carvalho – Chefe do Setor Técnico da Campanha Nacional de Educação
Alimentar em Minas Gerais, professora da cadeira “Educação Alimentar” do curso para supervisores do
programa de educação e assistência alimentar de Minas Gerais;
171
* Newton Dias dos Santos – ex-professor de Ciências do Colégio Pedro II, professor Catedrático de
Metodologia de Ciências do Instituto de Educação da Guanabara, professor de Zoologia e Metodologia de
História Natural e Ciências da Faculdade de Filosofia da Universidade Gama Filho, professor de Biologia
e Metodologia das Ciências da Escola Normal Carmela Dutra, professor de Zoologia e Didática Especial
de História Natural e Ciências da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade do Distrito
Federal, professor de metodologia das Ciências em cursos de aperfeiçoamento do Inep, professor em
cursos de aperfeiçoamento de Metodologia das Ciências da Secretaria de Educação de Minas Gerais;
* Norma Cunha Osório – Professora da Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Guanabara,
integrante da equipe MEC/USAID de assistência ao ensino primário;
* Lidinéia Gasman – professora do Colégio Pedro II, professora de Didática de História da Faculdade
Nacional de Filosofia;
Permaneceram os especialistas da Comissão Inep/DNE: Terezinha de Jesus Casasanta, Maria Onolita
Peixoto, Nair Ferreira Tulha e Maria José Berutti (Fonte: Arquivo histórico do Inep).
148
Para escolas de nível primário foram distribuídas 5 mil bibliotecas; mil bibliotecas para escolas
supervisionadas pelo Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário; 100 bibliotecas para escolas
técnicas de ensino médio; mil bibliotecas para escolas de nível médio; 300 bibliotecas para escolas
técnicas de ensino comercial; 100 bibliotecas para escolas técnicas agrícolas; 530 bibliotecas para escolas
de nível superior (Ofício circular n. 2, de 8/1/1968).
172
149
A professora Lúcia Marques Pinheiro era coordenadora da Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério
(DAM) do CBPE e técnica do Inep/MEC, foi uma das signatárias do Manifesto Mais uma vez
convocados, de 1959.
150
Maria Yvone A. de Araújo, Anamira Barros Evangelista, Marília Vellozo eram técnicas do Inep e
MEC.
151
Os observadores foram: Edith Berner (USAID), Olimpio C. de A. Tabajara (Rio Grande do Sul) e
Magaly Suano (São Paulo)
173
152
Os membros eram delegados dos seguintes estados:
Yeda Dias da Silva – Minas Gerais; Leonor Lezan – Curitiba/Paraná; Jair Simão da Silva – Santa
Catarina; Jandira Ávila – Santa Catarina; Flávia Marcos Pimentel – Secretaria de Educação do Acre;
Maria Ivone Atalécio de Araújo – técnica do Inep/MEC; Cecília Bueno dos R. Amoroso – São Paulo;
Irene de Albuquerque – Rio de Janeiro; Norma Osório – Rio de Janeiro; Regina Almeida – Minas Gerais;
Maria Mercedes da Costa – Piauí; Maria Onolita Peixoto – técnica do CRPE/MG; Maria de Nazaré –
Macapá; Terezinha Acioli Gama – Alagoas; Leda Cabral – Sergipe; Maria Mirna Souto Maior Sarah –
Roraima; Terezinha Nardelli Cambraia – Minas Gerais. Não foi Possível identificar de qual estado faziam
parte os professores Moema Brasileiro, Dinah Matos e Diva Diniz Costa.
174
A III Comissão discutiu o tema “Avaliação e uso dos livros em classe – nível
médio” e estava composto pelo coordenador Osvaldo Sangiorgi153, Nair Fortes Abu-
Merhy, relatora, Maria José de Oliveira, Cora Bastos de F. Rachid e Margarida F. da
Costa, assessoras, além dos delegados dos estados e observadores154. Em seu
documento final fez sugestões de normas para avaliação de livros-texto, dividindo-os
em uma ficha com dois itens - conteúdo e aspecto material:
Conteúdo
1. Atendimento aos princípios filosóficos preconizados na LDB.
2. Valor formativo.
3. Adequação aos objetivos visados, ao nível e interesse dos alunos.
4. Exatidão e atualização científica.
5. Organicidade
6. Apresentação didática da matéria.
7. Oportunidade de participação dos alunos no estabelecimento de sínteses,
esquemas e conclusões.
8. Apresentação de exercícios (jogos, testes, questionários) estimuladores do
raciocínio e da criatividade.
9. Atendimento a problemas de interesse regional, nacional e universal.
10. Sugestões de leituras, pesquisas e outras atividades.
11. Propriedade, clareza, objetividade e correção de linguagem.
12. Qualificação do autor, natureza do prefácio, sumário e/ou índice,
bibliografia.
13. Vocabulário das expressões técnico-científicas utilizadas.
Aspecto material
1. Formato, de preferência no alto e não ao largo, com espelho de leitura
adequado às técnicas tipográficas.
2. Acabamento: de preferência, brochurado e refilado.
3. Composição: tinta preta uniforme, tipos claros de fácil leitura e não muito
pequenos; títulos e sub-títulos em versal (caixa alta) ou redonda em negrito;
adequadas ao bom entendimento; espacejamento entre uma matéria e outra.
4. Impressão uniforme e nítida.
5. Boa disposição da matéria e capítulos bem proporcionados.
6. Papel branco e fosco de boa qualidade
7. Ilustrações funcionais pertinentes ao tema, sempre sobre assuntos pouco
conhecidos do leitor (Documento final da III Comissão, 7/03/1968).
153
O professor Osvaldo Sangiorgi foi um dos pioneiros nas discussões do “Movimento da Matemática
Moderna” no Brasil. Participou intensamente dos Congressos do Ensino de Matemática no Brasil,
realizados nos anos 1950 e, segundo Valente (2008, p. 596), consolidou sua posição a favor da
Matemática Moderna depois de participar de um estágio, em 1960, nos Estados Unidos. Foi um dos
idealizadores do Grupo de Estudos do Ensino de Matemática (GEEM), criado em 1961, em São Paulo e
que teve intensa atuação nas discussões sobre o ensino da Matemática no Brasil.
154
Os delegados dos estados eram: Martha Maria de Souza Dantas (Bahia); Judith Paiva e Souza (Rio de
Janeiro), Marcionilo Lins (Pernambuco), e Diva Vasconcellos da Rocha (Guanabara), Carlos Goldenberg
(Guanabara), Agostinho Minicucci (São Paulo)., Raul Cordula (Paraíba), Nelly Catunda da Cruz (Acre),
Dinamérico pereira Pombo (Guanabara), Gildete Santos Lisboa (Guanabara), Marliria Ferreira de Melo
(Rio Grando do Norte), Itália Zácaro Faraco (Rio Grande do Sul), Ruth Teixeira Vieira (Bahia), José
Antônio Tobias (São Paulo) e Isolda Bezerra de Meneses (Fortaleza).
Os observadores foram: Emerson Brown (USAID), Marilda I. Dias Alves (Rio de Janeiro), Eleide R. de
Lima (Rondônia), Alaíde Lisboa de Oliveira (Minas Gerais)
176
A seleção dos livros didáticos para alunos do ensino primário – Projeto Piloto
155
Em 25 de janeiro de 1968, a Colted encaminhou ao Ministro da Educação a proposta de Regimento
das Comissões Estaduais de Avaliação (Ceac).
156
Em 14 de maio de 1968, foi discutido no Colegiado da Colted o regimento das Celteds, que
começaram a ser criadas efetivamente a partir de 1969.
157
Diretor Executivo substituto da Colted.
178
Em fins de 1968 foi realizada a seleção e avaliação dos livros didáticos para os
alunos do ensino primário, sob responsabilidade do Grupo de Trabalho de Avaliação,
com técnicos de educação diretamente ligados à Colted. Para a avaliação dos livros
didáticos das escolas primárias a Colted organizou cursos de treinamento para os
técnicos estaduais, que orientaram, por sua vez, os professores do ensino primário a
selecionarem os livros-textos. O questionário para exame dos livros-textos pelos
professores foi enviado em agosto de 1968 para as Secretarias de Educação dos estados,
que deveriam encaminhá-lo aos estabelecimentos de ensino primário. Segundo
documento encontrado no Arquivo Histórico do Inep, o guia era constituído dos
seguintes itens:
I. Autenticidade
- O livro á autêntico, isto é:
A) Apresenta informações e fatos corretos e exatos?
B) É atualizado?
C) O autor e/ou editor são bem qualificados?
II. Adequação
- O livro é adequado, isto é:
A) Concorre para a realização dos fins da educação e dos objetivos do
currículo?
B) É apropriado a série a que se destina?
III. Apresentação
- O conteúdo do livro é bem apresentado?
A) Os princípios de aprendizagem foram observados no desenvolvimento do
material?
B) O conteúdo de cada capítulo é apresentado lógica e claramente?
179
165
O Centro de Ciências da Guanabara (CECIGUA) foi criado no Rio de Janeiro, em 1965, por Fritz de
Lauro, Newton Dias dos Santos, Oswaldo Frota-Pessoa e Ayrton Gonçalves da Silva. Segundo Silva
(2007, p. 14), na década de 1960, buscando melhorar o ensino de Ciências, a Diretoria de Ensino
Secundário do MEC promoveu a instalação de Centros de Treinamentos para Professores de Ciências em
vários estados. Além do CECIGUA, foram criados Centros em “São Paulo (CECISP), Minas Gerais
CECIMIG), Rio Grande do Sul (CECIRS), Bahia (PROTAP) e do Nordestes (CECINE)” (Silva, 2007, p.
14).
183
I – Linguagem – peso 3
1) Estilo
2) Estrutura
3) Vocabulário
Cada item da ficha de avaliação deveria ser preenchido com pontos de 1 a 10. O
máximo de pontos alcançados por um livro seria 100. De acordo com o número total de
pontos obtidos, o livro didático era enquadrado em uma das três categorias:
Escalas:
1. mais baixo ou pior; 0 a 29 – categoria 1
2. media; 30 a 69 – categoria 2
3. mais elevada ou melhor 70 a 100 – categoria 3
Linguagem e Conteúdo
Pontos Categoria
0 e 11 1
12 a 23 2
24 a 30 3
Cada área do conhecimento elaborou uma apreciação geral dos livros didáticos
avaliados. Somente foram encontradas as avaliações detalhadas nas áreas de
Matemática, Linguagem e Ciências, dos livros da Editora do Brasil. Ao que tudo indica,
após divulgação do relatório do Grupo de Avaliação da Colted, essa editora, em janeiro
de 1969, solicitou o acesso aos pareceres específicos dos seus manuais, para que
pudesse corrigi-los.
Matemática
Nas apreciações gerais, os avaliadores dos livros de Matemática destacaram que,
apesar de os recentes livros publicados se preocuparem em fazer uma abordagem mais
moderna da matemática, a maioria dos autores não conseguiu atingir os objetivos.
Grande parte dos autores desconhecia o verdadeiro sentido da Matemática Moderna. No
entanto, consideraram a apresentação dos livros melhores, pois despertavam na criança
maior interesse pela Matemática e pela realização das atividades.
Nos aspectos positivos, os avaliadores apontaram a diminuição do livro único
com todas as matérias e o surgimento de livros específicos para o ensino da Matemática,
que ultrapassavam a informação e preocupavam-se em formar conceitos e desenvolver
hábitos, habilidades e valores. Nos aspectos negativos, encontraram deficiências em
relação ao conteúdo, linguagem e adequação (Apreciação final sobre os livros avaliados
de Matemática, 4/11/1968).
No relatório de avaliação dos livros da Editora do Brasil, alguns argumentos
contrários à aprovação foram:
166
Nos Estados Unidos da América o movimento de renovação do ensino da matemática foi
impulsionado pela preocupação dos estadunidenses com o avanço tecnológico russo, após o lançamento
do Sputnik, em 1957. Em 1958 foi fundado o School Mathematics Study Group (SMSG), que produziu
textos que tiveram aceitação em grande parte da América Latina (França, 2007, p. 37).
186
Ciências
Na área de Ciências, a avaliação buscou analisar se os livros consideravam os
aspectos metodológicos modernos do ensino de ciências, abordando os temas de modo a
estimular os alunos a “refletir, analisar, criticar, concluir, participar, tomar iniciativas,
realizar experiências, observações, etc.” Observaram-se a linguagem, a apresentação, a
natureza do conteúdo, a correção científica e a presença ou ausência de orientação ou
instrução para alunos e professores.
A primeira crítica do relatório dizia respeito aos livros de todas as matérias,
considerados deficientes. Os avaliadores destacaram que apenas dois livros
acompanhavam manual do professor. De modo geral, afirmavam que a maioria dos
livros mantinha um estilo usado “há vinte anos”, com excesso de matéria, exagero de
nomes técnicos, tipo “pontos”, úteis somente para a memorização, sem contribuir com a
construção da idéia de conhecimento científico. Apontavam que os autores tinham
pouco conhecimento de metodologia das ciências e da escassa bibliografia sobre o
assunto. Ressaltavam, por fim, que os autores de Minas Gerais “revelaram-se dotados
do espírito apropriado ao ensino das ciências e a escrever livros da matéria”
(Apreciação final sobre os livros avaliados de Ciências, 5/11/1968).
Em relação à avaliação específica dos livros da Editora do Brasil, os argumentos
de exclusão foram:
Linguagem
Em Linguagem, a avaliação diferenciou as cartilhas e os livros dos demais
níveis. O manual do professor era praticamente inexistente, os que existiam eram pobres
de sugestões. A maioria era apenas a repetição do livro do aluno com as respostas dos
exercícios. Os manuais para professores dos livros destinados à alfabetização continham
falhas, com motivos para “incentivação completamente absurdos”.
Os avaliadores enfatizaram que as cartilhas apresentavam material gráfico de
baixa qualidade e não havia preocupação de usar tipos adequados às primeiras séries. O
processo silábico era pobremente apresentado, sem a possibilidade de criar e
desenvolver o hábito da leitura. O vocabulário era forçado, com nomes inventados para
satisfazer o trabalho fonético. A alfabetização tornava-se, de tal modo, irreal, lenta e
desinteressante. Os textos eram difíceis, com estruturas de linguagem que as crianças
não usavam, sem graduação das dificuldades de compreensão e longos. Alguns livros
continham erros de construção gramatical.
Segundo os avaliadores, os livros dos demais níveis apresentavam textos acima
do nível de compreensão a que se destinavam. Os textos eram baseados em Estudos
Sociais e Ciências, a moral não aparecia implícita, mas de forma opressiva, forçada. Os
textos que procuravam desenvolver valores de honestidade, cooperação, civismo eram
desinteressantes. Continham histórias trágicas, com mortes e desgraça, contrárias às
pesquisas no campo da psicologia. Os textos informativos eram enfadonhos, com
informações desatualizadas. Havia textos com erros de concordância, regência,
pontuação, etc.
Os textos extraídos de autores consagrados eram escolhidos sem critérios ou
objetivos. Em alguns livros os textos não eram transcritos integralmente, mas em partes,
o que lhes tirava o sentido e autenticidade. Por outro lado, certos livros transcreviam
textos muito grandes, com três a quatro páginas. Os exercícios eram ruins, dissociados
dos textos e levavam somente à memorização. O vocabulário era difícil, não usual,
dificultando a compreensão e interesse da idade, da realidade, o que levava o aluno a
não gostar do manual. Alguns livros não estavam atualizados em relação à ortografia
(Apreciação final sobre os livros avaliados de Linguagem, s/d).
Na avaliação dos livros da Editora do Brasil destacavam:
189
textos acima do nível a que se destina; definição de conceitos errados; erros gramaticais;
erros de pontuação, acentuação e concordância.
As avaliações demonstraram que existia uma preocupação com os métodos de
alfabetização, o método silábico foi criticado e o exagero do ensino da gramática. A
preocupação com desenvolvimento do hábito da leitura era enfatizado, assim como a
crítica à memorização e o incentivo à interpretação. Segundo Lauria (2004, p. 156), a
partir da segunda metade dos anos 1950, críticas ao ensino da língua baseado na ênfase
da gramática, para o aprendizado e manejo da língua portuguesa se fortaleceram nos
meios educacionais. A língua começava a ser vista como “veículo de comunicação”. O
ensino da língua portuguesa passou, assim, a priorizar a prática da leitura e da produção
de textos. Essa era uma das orientações da II Semana de Estudos da Colted, em que
criança deveria usar a língua em “situações de comunicação”167.
Estudos Sociais
Na área de Estudos Sociais, poucos livros se encaixaram em boa classificação. A
crítica inicial era o predomínio do livro único com todas as matérias. Os livros não se
caracterizavam como sendo de Estudos Sociais, mas eram livros de “pontos”, com
respostas a questionários, que não possuíam leitura informativa, consistindo-se apenas
em textos para exercícios de linguagem e vocabulário. Alguns livros eram
exclusivamente glossários com definições, apresentavam textos estereotipados e
factuais. O conteúdo estava inadequado para o nível da criança. Os livros não seguiam o
método concêntrico – do próximo ao geral -, não atendiam aos interesses das crianças.
A linguagem era árida e pouco atraente, desestimulando a leitura.
Segundo os avaliadores, os livros enfatizavam a informação sobre a formação.
Os exercícios não levavam à reflexão, ao pensamento crítico e criador. Não
incentivavam a formação correta de conceitos, ao desenvolvimento de habilidades
básicas e atitudes positivas de iniciativa, interesse e participação. Os exercícios levavam
apenas à memorização, com a repetição do trecho lido. As ilustrações não auxiliavam a
compreensão do texto. A organização geral dos livros e sua apresentação material não
eram satisfatórias. Praticamente nenhum livro possuía manual do professor.
167
A ênfase na compreensão da língua como veículo de comunicação se estabeleceu definitivamente com
a Lei n. 5.692/71. Na organização do núcleo comum para o 1º e 2º graus a matéria responsável pelo
ensino da Língua Portuguesa é denominada Comunicação e Expressão.
191
Na leitura das avaliações por área, foi possível destacar alguns pontos em
comum. As justificativas apresentadas permitiram elucidar os critérios adotados pelos
avaliadores. Métodos de ensino antiquados, falta de ilustrações adequadas, conteúdos
“pontuados”, sem desenvolvimento, conteúdos inadequados ao nível de ensino, falta de
incentivo ao raciocínio das crianças, exercícios de memorização, a predominância da
informação sobre a formação de conceitos, erros conceituais e de vocabulário, material
gráfico de baixa qualidade, eram os principais problemas descritos. As avaliações
criticaram o fato de os livros didáticos não desenvolverem hábitos, habilidades e
valores. Todos os relatórios condenaram o livro único e incentivaram a inclusão de um
manual do professor mais elaborado.
Os relatórios demonstraram que os avaliadores seguiam as renovações
pedagógicas, principalmente quanto aos métodos de ensino. A “Matemática Moderna”;
“os aspectos metodológicos modernos do ensino de ciências”, com a realização de
experiências e observações; “o método concêntrico – do próximo ao geral”, em Estudos
Sociais, o fim do “método silábico” de alfabetização, a compreensão da língua como
veículo de comunicação faziam parte dessas inovações.
Como foi possível observar, os avaliadores eram pessoas que pensavam a
educação nas suas áreas de ensino. Grande parte dos avaliadores formaram-se pelos
Institutos de Educação ou pela Faculdade Nacional e Filosofia. Praticamente todos os
192
168
Vale lembrar que a Caldeme e, posteriormente, a Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais
(DEPE) do CBPE, produziu manuais sobre o ensino primário e as diversas áreas do conhecimento, dentre
eles: Introdução ao Estudo do Currículo da Escola Primária, de João Roberto Moreira, publicado em
1955; Linguagem na Escola Elementar (1955), Ciências na Escola Elementar (1955), Ciências Sociais
na Escola Elementar (1955), Matemática na Escola Elementar (1955), Jogos Infantis na Escola
Elementar (1955), Música para a Escola Elementar (1955).
169
Em 30 de agosto de 1968, Carlos Corrêa Mascaro, Diretor do Inep autorizou a participação de técnicos
daquele órgão no seminário que a Colted promoveria com o objetivo de traçar as diretrizes para os cursos
de treinamento dos professores primários sobre a avaliação e utilização do livro-texto. Participaram do
seminário: Lúcia Marques Pinheiro, Elza Nascimento Alves, Maria Yvone Atalécio de Araújo, Norma
Dias da Silva, Maria Onolita Peixoto, Regina Almeida e Terezinha Nardelli. Participaram, ainda, as
professoras Jacira Calazans de Campos, Diretora da Escola de Demonstração e Clarisse Mariano,
Orientadora Pedagógica do CRPE/SP.
193
escolares, que constariam de uma lista publicada pela Comissão do Livro Escolar.
Contudo, a Colted, por meio de delegados dos estados organizou uma lista dos livros
que poderiam ser escolhidos e caso o livro que o professor indicasse não constasse
dessa lista, a Colted indicaria um outro livro escolhido por ela. O deputado questionava,
ainda, o fato de que nenhuma editora pode comparecer às reuniões de seleção dos livros
para apresentar suas obras, com exceção da IBEP, que esteve em todas as reuniões
apresentando seus manuais. Para o deputado, a editora IBEP foi privilegiada no
processo em detrimento de outras editoras.
A Colted escreveu carta ao Secretário de Educação de São Paulo, procurando
esclarecer os questionamentos do deputado Salim Sedeh, que não surtiram o efeito
desejado, pois em 25 de outubro de 1968, o Secretário de Educação de São Paulo,
Antônio Barros de Ulhôa Cintra170 informou à Direção Executiva da Colted que São
Paulo não participaria da seleção dos livros didáticos, pois aquele estado iria estudar
“até que ponto iniciativa como a da Colted (...), em nome de uma política eventual,
oferece contribuição válida à filosofia e à política de educação definida pelo Estado de
São Paulo”. O estado de São Paulo pretendia, ainda, em acordo com o MEC, centralizar
no próprio estado as tarefas de avaliar, selecionar e distribuir os livros didáticos da
Colted.
Em 5 de novembro de 1968, a Colted recebeu um ofício do Secretário de
Educação de São Paulo, solicitando que não fossem adquiridos os livros indicados pelos
professores daquele estado. Somente participaram do plano piloto as escolas municipais
e particulares da cidade. A atitude da Secretaria de Educação de São Paulo estava
relacionada com a recusa daquele estado em se submeter a uma seleção centralizada em
âmbito federal. É importante observar, ainda, que nessa época estava ocorrendo a
reforma do ensino primário paulista, implementada na gestão de José Mário Pires
Azanha como Diretor Geral do Departamento de Educação e visava, segundo Souza
(2008), “a democratização do ensino elementar e ginasial” (p. 246).
O relatório do Grupo de Avaliação desencadeou, também, discussões internas no
colegiado da Colted. Na reunião do Colegiado de 6 de dezembro de 1968, o Presidente
da SNEL questionou a profundidade da avaliação. Ele não se posicionou contrário à
avaliação, mas destacou que 284 títulos haviam sido rejeitados, causando grande
impacto para as editoras. Segundo ele, o colegiado da Colted não havia decidido a
170
Antônio Barros de Ulhôa Cintra era reitor da USP e foi um dos criadores da FAPESP.
195
realização de uma avaliação dos aspectos pedagógicos dos livros didáticos, mas
somente dos aspectos ideológicos e materiais. Argumentou ainda, que os critérios e
procedimentos adotados na avaliação deviam ter sido previamente discutidos e
aprovados pelo colegiado.
Em resposta ao SNEL, a professora Elza Nascimento destacou que o Grupo de
Avaliação tinha autonomia para elaborar os critérios e que o relatório não era
conclusivo, mas estava aberto para considerações. Esclareceu que os aspectos
ideológicos, “filosóficos constitucionais-democráticos” foram focalizados na análise
filosófica dos livros, tanto quanto os aspectos econômicos e materiais. Explicou ainda
que os critérios adotados para a avaliação dos manuais escolares correspondiam a
“moderna didática das matérias de ensino primário”. Os avaliadores não poderiam
aprovar manuais elaborados segundo uma didática “obsoleta”. Por fim, enfatizou que os
aspectos ideológicos não eram os únicos a serem considerados. Existia toda uma
filosofia da educação recomendando o que se pretendia obter com o processo educativo,
com a qual os livros deveriam ser coerentes. Após os esclarecimentos, o Colegiado
aprovou os critérios e a avaliação feita.
As editoras que teriam livros adquiridos pela Colted eram:
171
Relatório do Direor Executivo da Colted para o Presidente do Colegiado da Colted, de 28/11/1968.
197
Algumas considerações
A análise da Colted, sua estrutura interna, seus debates, a avaliação dos livros
didáticos e a relação com o SNEL, suscitaram algumas reflexões. O órgão foi criado
para responder a algumas questões que estavam em pauta no fim dos anos 1950 e início
dos anos 1960, como a obrigatoriedade do ensino primário, que ampliava o número de
199
172
Segundo Batista (2002, p. 559), o grupo profissional docente nos anos 1960 também estava em
processo de expansão. Em 1959, os professores de nível médio eram cerca de 67 mil, em 1963,
ultrapassavam os 100 mil. Esses novos professores, consumidores dos livros didáticos, eram, “em sua
maior parte, jovens adultos, formados por uma Faculdade de Filosofia ou uma Escola Normal”.
Decorriam, “predominantemente, das frações inferiores e intermediárias das classes médias”, seus pais
eram “médios e pequenos comerciantes, funcionários públicos, empregados de escritório” (Batista, 2002,
p. 559).
200
CAPÍTULO IV
Como já foi apresentado no primeiro capítulo desta tese, o INL foi criado em 21
de dezembro de 1937, pelo governo Vargas, por iniciativa do Ministro da Educação
Gustavo Capanema, por meio do Decreto-lei n° 93. Inicialmente, tinha o objetivo de
editar obras literárias raras que contribuíssem para o desenvolvimento cultural da
população, elaborar uma enciclopédia e um dicionário nacionais, baratear e melhorar a
edição de livros no país e incentivar a organização e manutenção de bibliotecas públicas
em todo o território nacional (INL, 1987, p. 5).
Com o Decreto n° 68.728/71, o INL se tornou responsável pela produção,
edição, aprimoramento e distribuição de livros técnicos e livros didáticos,
encarregando-se de definir as diretrizes do programa editorial e os planos de ação do
MEC. O órgão, desde maio de 1971, por meio da Portaria n° 307-BSB173 do Ministério
da Educação, já era responsável pelo sistema de co-edição de livros com as editoras
nacionais. A partir do Decreto n° 68.728, o livro didático estava incluído no programa
de co-edição com as editoras. Nesse momento a direção do INL estava sob
responsabilidade de Maria Alice Barroso.
Com a co-edição, o INL passou a desenvolver o Programa do Livro Didático
(PLD) e seus desdobramentos, dentre eles o Programa do Livro Didático para Ensino
Fundamental (PLIDEF) e o Programa do Livro Didático para Ensino Médio (PLIDEM).
De acordo com Oliveira et al. (1984, p. 58), o PLIDEF estabelecia com mais detalhes os
seus objetivos: co-editar livros didáticos para as matérias do núcleo comum do ensino
de 1º grau; distribuir os livros co-editados para as escolas públicas, por meio do
convênio com as Secretarias de Educação dos estados; proporcionar o barateamento dos
livros; colaborar no aperfeiçoamento do padrão técnico-pedagógico do professor
brasileiro, com a distribuição do manual do professor; implantar o Banco do Livro,
buscando prolongar a vida útil dos manuais. Os objetivos do PLIDEF determinavam,
também, a seleção e avaliação dos livros didáticos, visando estimular suas qualidades.
173
As instruções da Portaria n° 307-BSB, estabeleciam que o INL adquiriria pelo menos um quinto da
edição de um livro, que não poderia ser inferior a cinco mil exemplares.
202
Com o PLD sob responsabilidade do INL, pretendia-se fazer prevalecer, na seleção dos
títulos a serem co-editados, critérios técnicos e pedagógicos (Oliveira et al., 1984, p.
58).
Com o término do convênio MEC/SNEL/USAID, a contrapartida dos estados
tornou-se necessária. Para isso foi implantado o sistema de contribuição financeira das
unidades federadas para o Fundo Nacional do Livro Didático, com a intenção de manter
o fornecimento de livros para os alunos carentes. Com o sistema de co-edição, segundo
Höfling, “de censor oficial dos livros didáticos usados nas escolas brasileiras, o Estado
foi assumindo também o papel de financiador dos mesmos livros” (1993, p. 20).
Contudo, o sistema de co-edição não conseguiu resolver a questão do preço dos
livros didáticos, que continuou elevado. As editoras não vendiam os livros co-editados a
preço de custo, como era esperado pelo Programa (Oliveira et al. 1984, p. 60). Oliveira
et al. (1984) afirmam que durante toda a década de 1970, várias propostas foram
elaboradas para tentar contornar os problemas advindos da política do livro didático.
Nos meios parlamentares, vários projetos foram apresentados ao Congresso Nacional. A
maioria dos pronunciamentos e sugestões dizia respeito à necessidade de “padronizar o
livro didático, estabelecer um tempo fixo para sua utilização ou padronizar seus preços”
(Oliveira et al. 1984, p. 60).
As obras inscritas pelas editoras no INL para co-edição com o PLIDEF eram
encaminhadas ao Departamento de Ensino Fundamental (DEF) do MEC para avaliação
técnico-pedagógica. Ao inscrever as obras, as editoras pagavam uma taxa de avaliação
para cada exemplar enviado ao INL. No entanto, com a promulgação da Lei n° 5.692
em 11 de agosto de 1971 - que reestruturou o sistema educacional do país, fixando as
diretrizes para o ensino de 1º e 2º graus -, o DEF divulgou, em dezembro de 1971, as
Normas para análise e seleção de livro-texto para o ensino de 1º grau174.
É importante ressaltar que a implantação da lei n. 5.692/71, consolidava alguns
pontos da Constituição de 1967, em relação a obrigatoriedade do ensino e a
descentralização dos sistemas de ensino. A Constituição de 1967 também pretendia
responder a questões colocadas no fim dos anos 1950 e início dos anos 1960, sobre a
necessidade de popularização do ensino secundário. Ela estabeleceu que o ensino dos
sete aos quatorze anos seria obrigatório para todos e gratuito nos estabelecimentos
primários oficiais (Art. 168, § 3º, item II). Determinou, ainda, que os estados e o
174
Os documentos analisados neste capítulo foram localizados no Arquivo Histórico da Companhia
Editora Nacional/IBEP.
203
175
Para se ter uma idéia do aumento das matrículas, Másculo (2002, p. 26) ressalta que no estado de são
Paulo o número de alunos matriculados no ginásio era de 360.000 em 1966 e aumentou para 977.000 em
1971. Em 1976 o número de matriculados no 1o e 2o grau na rede pública do estado aproximava-se de 4
milhões de alunos.
176
Até a década de 1960, o exame vestibular era eliminatório mas não classificatório, poderia ter acesso
ao ensino superior o candidato que alcançasse a nota mínima de aprovação na carreira. Contudo, como
enfatiza Celeste Filho (2006, p. 122), as universidades não possuíam vagas suficientes para todos os
candidatos aprovados. Os candidatos que eram aprovados mas não conseguiam se matricular eram
considerados excedentes. No final da década de 1960, o número de aprovados no vestibular era maior do
que as vagas nas universidades públicas. A solução para o problema do vestibular e dos alunos
excedentes era uma das reivindicações do movimento estudantil nessa época (Toledo, 2001, p. 249). A
Reforma Universitária de 1968, implantada com a lei n° 5.540, modificou o exame vestibular, que passou
a ser classificatório, seriam selecionados os alunos de acordo com as notas, até o preenchimento da
quantidade de vagas existentes. Desse modo a reforma eliminou os excedentes.
204
177
O ano de 1968 caracterizou-se pelo “maio de 1968”, na França, a “primavera de Praga”, na
Tchecoslováquia, as manifestações contra a guerra do Vietnã, nos EUA. No Brasil destacaram-se as
manifestações “dos estudantes do restaurante Calabouço” e a passeata dos 100 mil, no Rio de Janeiro; as
manifestações em São Paulo no primeiro semestre de 1968, a “batalha” entre os estudantes do Mackenzie
e da FFCL da USP, em outubro desse ano, a realização clandestina do 30º Congresso da UNE, em Ibiúna,
etc.
178
O CFE era o órgão mais importante do Ministério da Educação. Dentre suas atribuições estavam:
decidir sobre o funcionamento dos estabelecimentos isolados de ensino superior, federais e particulares;
decidir sobre o reconhecimento das universidades; indicar as disciplinas obrigatórias para o ensino médio,
definir a amplitude e o desenvolvimento dos seus programas e estabelecer a duração e o currículo mínimo
dos cursos de ensino superior; adotar ou propor modificações e medidas que visem à expansão e ao
aperfeiçoamento do ensino; estimular a assistência social escolar, etc.
179
A proposta da criação da matéria Estudos Sociais era antiga, como foi destacado no capítulo 2 desta
tese. Carlos Delgado de Carvalho já discutia o ensino de Estudos Sociais desde os anos 1930. Durante os
anos 1950, esse tema foi debatido na Cileme e na Caldeme.
205
180
Segundo o Parecer n. 853/71, “na seqüência de atividades, áreas de estudo e disciplinas”, partir-se-ia
do “mais para o menos amplo e do menos para o mais específico”. Nas atividades a aprendizagem se
desenvolveria sobre “experiências colhidas em situações concretas”; nas áreas de estudo “formadas pela
integração de conteúdos afins”, as experiências deveriam se “equilibrar com os conhecimentos
sistemáticos”; nas disciplinas, as aprendizagens se dariam “predominantemente sobre conhecimentos
sistemáticos”.
181
É importante assinalar que cursos superiores em Estudos Sociais foram criados, sob o modelo de
licenciaturas curtas, que possibilitava aos formados por esses cursos a habilitação para lecionar nas
escolas de 1o grau. Esse novos professores concorriam com os professores formados nas licenciaturas
específicas de História e Geografia.
206
Linguagem:
Objetivos do ensino de leitura através dos livros de leitura – 1ª a 4ª série;
- levar o aluno ao domínio gradativo da mecânica de leitura e das habilidades
de compreensão;
- propiciar, ao aluno, interesse contínuo e crescente pela leitura através de
material rico, quer do ponto de vista artístico – literário, quer do ponto de vista
lingüístico e psicológico;
- levar o aluno a se realizar como leitor efetivo, capaz de buscar o livro pelo
prazer de ler;
- formar habilidades indispensáveis ao uso eficiente da língua, à expressão de
idéias, sentimentos e emoções.
Matemática:
Verificar-se-á se o livro texto de Matemática atende:
- à efetiva participação do leitor, na formação de conceitos, estabelecimento
de relações e descobertas das propriedades matemáticas;
- à aquisição das noções, processos operatórios e estruturas básicas,
fundamentadas na compreensão e seguida de automatismo;
- ao desenvolvimento do raciocínio;
- ao desenvolvimento das habilidades de computação;
- ao desenvolvimento do gosto pelo estudo da matemática;
- à habilidade de aplicação do conhecimento às situações novas;
- à habilidades de precisão.
Estudos Sociais
Entre os objetivos concernentes, verificar-se-á se o livro texto de Estudos
Sociais inicia o aluno no conhecimento:
- de como as pessoas vivem, trabalham e se relacionam;
182
Não foram encontrados mais documentos sobre os avaliadores.
208
Ciências
Verificar-se-á se o livro texto de Ciências conduz o aluno a:
- adquirir conhecimentos científicos básicos;
- interpretar o meio ambiente;
- selecionar problemas;
- adquirir atitudes científicas;
- interessar-se pelo mundo em que vive;
- compreender o valor das ciências naturais dos cientistas e técnicos;
- aplicar os conhecimentos adquiridos em novas situações;
- desenvolver o pensamento crítico, reflexivo e criativo;
- redescobrir conhecimentos científicos;
- aplicar o método científico de investigação;
- valorizar a natureza sobre múltiplos aspectos.
(Normas para análise e seleção de livro-texto para o ensino de 1º grau.
DEF/MEC, dez. 1971).
2a série
Quanto à organização:
- o livro texto da 2a série deverá apresentar pequenos textos relativos às
informações básicas contidas nos exercícios;
- dominar as informações básicas através de uma seqüência graduada do
conteúdo e das ilustrações;
- representar operações sempre acompanhadas de seu inverso.
-Quanto a ilustração:
- a seqüência e graduação deverão facilitar as conclusões;
- serão completadas por frases simples e de fácil compreensão;
- deverão sugerir elaboração, pelas crianças, de idéias matemáticas;
Quanto aos exercícios, verificação e avaliação:
- seguirão as normas da 1a série;
Quanto à fixação:
- cada informação básica deverá ser fixada com exercícios bem variados,
buscando a participação ativa do aluno na sua execução.
209
A ficha e as avaliações
A ficha de análise dos livros didáticos para co-edição do PLIDEF era objetiva e
única para todas as matérias, constituída de partes distintas. No cabeçalho das fichas era
descrito o nome do livro, do autor, a editora e a série a que se destinava. Os critérios
estavam descritos e os pareceristas deveriam pontuar os livros de acordo com o
cumprimento ou não de cada critério. A ficha de análise para livros da 2ª a 8ª série era
dividida em quatro grupos (Produção Editorial, Produção Gráfica, Produção Didática,
Manual do Professor), que possuíam subitens:
Cada livro poderia obter até 100 pontos. Para serem aprovados, os livros
precisavam obter ao menos 70 pontos no total geral, 53 pontos no livro do aluno e 10
pontos no manual do professor. No arquivo histórico da Companhia Editora Nacional
foram encontradas 35 fichas com avaliações de livros didáticos da editora. A relação, a
seguir, descreve as pontuações alcançadas pelos livros da Companhia Editora Nacional:
Livros recusados
19 obras fizeram menos de 69 pontos
Livros aprovados
8 obras fizeram de 70 a 79 pontos
5 obras fizeram de 80 a 89 pontos
2 obras fizeram de 90 a 100 pontos
183
Outros analisados por Másculo tinham os seguintes formatos: da Companhia Editora Nacional,
História do Brasil e História Geral, de Julierme de Abreu e Castro (1970), com 20 X 27 cm; da Saraiva,
História do Brasil para Estudos Sociais, de Esaú & Gonzaga (1974), com 16 X 23 cm; da Livraria Lê
Editora, História do Brasil, de Paulo Miranda Gomes, com 16 X 23 cm, etc. (2008, p. 67-72).
184
Segundo Másculo (2008, pp. 163-164) as questões objetivas, denominadas “testes”, baseavam-se nas
idéias de Ralph Tyler, que chegou no Brasil na década de 1970, por meio da difusão das obras de
Benjamim Bloom, seguidor de Tyler. Pra Tyler, os testes mais do que medir o conhecimento, verificava
“se os objetivos curriculares estavam sendo atingidos” (Másculo, 2008, p. 163). Com a proposta de
taxonomia dos objetivos educacionais, Bloom classificava os objetivos em “ordem crescente de
216
A Lista Oficial dos livros didáticos aprovados pelo DEF/MEC para co-edição
era enviada para as Comissões de Avaliação das Secretarias de Educação dos estados,
que selecionavam os que melhor se adaptavam ao trabalho educativo das suas escolas
(Portaria n° 518, de 10/9/1973). Como cada estado formulava seu próprio guia
curricular e programas de ensino, os livros precisavam atender às especificidades
estaduais. As editoras encaminhavam aos coordenadores do PLIDEF nas unidades
federadas cinco exemplares de cada título aprovado pela Lista Oficial do MEC, para as
avaliações estaduais. As comissões dos estados eram, além disso, responsáveis pela
supervisão e avaliação do Programa do Livro Didático. Posteriormente, as secretarias
enviavam ao INL a lista dos livros escolhidos para serem co-editados e distribuídos.
As obras publicadas em co-edição deveriam apresentar na primeira capa o nome
da editora, seguido da sigla MEC. A folha de rosto possuiriam a seguinte frase: “Em
convênio com o Instituto Nacional do Livro – Ministério da Educação e Cultura”. Na 4ª
capa apareceria o preço de venda ao público e a frase: “O preço deste livro só se tornou
possível devido à participação do INL-MEC que, em regime de co-edição, permitiu o
aumento da tiragem e conseqüente redução do custo industrial” (Portaria n° 518, de
10/9/1973).
Na documentação encontrada, foi possível conferir que em Minas Gerais, a
avaliação estadual dos livros didáticos era realizada pelo Departamento de Educação de
Estudos Pedagógicos, da Secretaria da Educação. Em São Paulo o Programa do Livro
Didático era coordenado pela Fundação para o Livro Escolar, órgão vinculado ao
Departamento de Ensino Secundário e Normal da Secretaria de Educação. A avaliação
dos livros didáticos desse estado era realizada pela Equipe Técnica do Livro e Material
Didático.
A ficha de avaliação dos livros didáticos de São Paulo era composta por itens
que detalhava a obra analisada, finalizando com um parecer geral de recomendação ou
exclusão. A ficha continha os seguintes itens:
218
I. Livro do aluno
A – Afeiçoamento Físico: Impressão, Encadernação, Marginação, Cor e
Ilustrações, Papel, Tipologia, Espaçamento;
B – Forma de Linguagem: Correção, Atualização, Adequação;
C – Conteúdo: Correção, Atualização, Adequação;
D – Metodologia;
E – Planejamento Pedagógico: Organização Vertical, Organização
Horizontal;
F – Filosofia de Educação;
G – Outros aspectos: Título, Índice, Prefácio, Glossário, Bibliografia;
H – Outras observações.
187
Jocely Soares era professora e fez parte da criação da Associação Regional de Professores, de São José
de Rio Preto, em outubro de 1963.
188
Hermas Gonçalves Arana era pedagogo e professor de Filosofia. Foi membro da Equipe Técnica do
Livro e Material Didático de 1972 a 1975. Era professor da PUC de Campinas.
189
Hely Loureiro Paschoalick era professora e, atualmente, é autora de livros didáticos de Matemática
para o Ensino Fundamental I, pela editora IBEP.
220
190
Segundo Másculo (2008, p. 207), a coleção de Sérgio Buarque de Hollanda era uma das mais
solicitadas pelos professores das cidades de Minas Gerais em 1972.
222
programas curriculares dos estados (até porque as editoras se concentravam quase que
exclusivamente em São Paulo e Rio de Janeiro). Outro aspecto, relacionava-se com
questões financeiras. Do modo como os acontecimentos foram relatados, o livro
didático de Sérgio Buarque de Hollanda não foi adquirido porque era mais caro, dessa
forma foi retirado da compra do governo.
PLIDEM 1977/78
191
Em 21 de novembro de 1968, por meio da Lei n° 5.537 foi criado o Instituto Nacional de
Desenvolvimento da Educação e Pesquisa (Indep). Em 15 de setembro de 1969, foi promulgado o
Decreto-Lei n° 872 que complementava a Lei n° 5.537. O decreto-lei alterou a denominação do Indep que
passou a se chamar Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE). O FNDE tinha por
finalidade “captar recursos financeiros e canalizá-los para o financiamento de projetos de ensino e
pesquisa, inclusive alimentação escolar e bolsas de estudo, observadas as diretrizes do planejamento
nacional da educação” (Art. 2º, Lei n° 5.537/68).
192
Segundo a documentação encontrada, o PLIDEM tinha iniciado suas atividades em 1972, mas por
falta de recursos financeiros, o programa de co-edição diminuía a cada ano.
224
A ficha de avaliação
Cada item da ficha de avaliação do PLIDEM deveria ser respondido com “sim”
ou “não”, sendo finalizada com um relato escrito do avaliador. A ficha contava com as
seguintes partes:
1. Produção Editorial
1.1. Elementos de identificação da obra: Autor, Colaborador, Ilustrador,
Tradutor, Título, Edição, Ficha catalográfica, Colofon.
2. Produção Gráfica
225
3. Produção didática
3.1. Elementos de conteúdo:
*Objetivos - expressos e claramente perceptíveis; coerentes com o conteúdo
da obra; adaptado ao nível do aluno; adequados aos objetivos propostos para
o ensino de 2º grau; adequados aos objetivos da habilitação a que se destina;
* Texto
Linguagem - Correta; Adequada ao nível do aluno; Qualidade da tradução (se
houver);
Ilustração - contribui para a compreensão do texto; adequada ao conteúdo;
adequada ao nível do aluno;
Conteúdo - correção técnico-científica; atualização; adequação ao nível do
aluno; proposição de trabalho de elaboração intelectual do aluno; atendimento
aos interesses do aluno; seqüência lógica; gradação; correlacionamento dos
temas; integração dos conhecimentos apresentados com outros componentes
curriculares; exemplificação relacionada com problemas ou experiências de
realidade, do interesse e da vida do aluno;
3.2. Elementos metodológicos
*Adequação do processo didático - com os objetivos do ensino; com o
conteúdo da obra;
* Existência de recursos complementares ao texto - exercícios de fixação, ou
recuperação ou de diagnose, ou avaliação; recursos de enriquecimento e
aprofundamento do texto (experiências, gráficos, mapas, tabelas, quadros,
desenhos, esquemas, temas para discussão em grupos, outros);
* Adequação dos recursos ao conteúdo da obra - coerentes com o texto;
variados; estimuladores da criatividade do aluno; fornecedores dos diferentes
processos de aprendizagem; permitem aplicação do aprendido.
Relatório Final
O livro – deve ser co-editado
Não deve ser co-editado
(Fonte: Arquivo Histórico da Companhia Editora Nacional/IBEP).
193
Ruy Mendes Gonçalves era vice diretor da editora Saraiva.
194
Maria Alice Barroso foi diretora do INL e presidente da Biblioteca Nacional.
195
Como foi apresentado anteriormente, Armando Hildebrand foi diretor da Diretoria de Ensino
Secundário do MEC e foi, ainda, membro e presidente Conselho de Educação do Distrito Federal.
227
196
Anna Bernardes da Silveira Rocha foi Diretora-Geral do Departamento de Ensino Fundamental, era
membro do CFE e do Conselho de Educação do Distrito Federal.
228
Algumas considerações
CONSIDERAÇÕES FINAIS
às pesquisas das diferentes áreas. A ação movida pelo professor Waldemiro Potsch
contra Cândido de Mello Leitão foi o exemplo mais ilustrativo das polêmicas em torno
do posicionamento dos membros da CNLD na configuração da área das Ciências.
A CNLD precisava, ainda, regrar o mercado de didáticos, padronizando o preço
e o modelo dos manuais. Nesse sentido, foi possível observar que o processo de
avaliação dos livros didáticos gerou reações de autores e da Associação Profissional das
Empresas Editoras de Livros e Publicações Culturais. Com o argumento do custo da
impressão das obras, a Associação solicitou a liberação do aumento dos preços dos
manuais e, por outro lado, solicitou que não fosse divulgada a lista dos livros recusados.
Pelo que foi analisado, essa lista nunca foi divulgada.
Com o fim do Estado Novo, iniciou-se um movimento de crítica ao modelo
uniformizado e centralizado da educação brasileira, crítica vinda, principalmente, do
grupo vinculado a Anísio Teixeira e à Faculdade Nacional de Filosofia. Propunha-se a
descentralização e reestruturação do ensino secundário e, nesse sentido, os livros
didáticos precisavam ser modificados, pois seus conteúdos estavam padronizados.
Assim, Anísio Teixeira e outros educadores organizaram a Campanha do Livro Didático
e Manuais de Ensino (Caldeme) com o objetivo de analisar os manuais escolares em uso
nas escolas e elaborar novos guias de ensino com metodologias “inovadoras”. A
Caldeme realizou um processo diferenciado de avaliação dos livros didáticos, pois a
Campanha não regulava e controlava os livros didáticos. Com as análises pretendia-se
fazer um balanço e indicar sugestões para melhoria dos manuais. As análises foram
escritas e publicadas para estudo dos professores, de estudantes dos cursos normais e de
Faculdades de formação de professores.
Guy de Hollanda e James Braga da Fonseca, docentes e ex-alunos da Faculdade
Nacional de Filosofia, instituição que tinha preocupação com a formação de professores
para o ensino secundário, analisaram os livros didáticos de História e Geografia das
décadas de 1930 e 1940, e recriminaram veementemente a padronização imposta pela
CNLD. Tal crítica refletia o questionamento ao modelo do Estado Novo, com os
programas únicos, a fiscalização das escolas, as avaliações federais e o processo de
centralização do ensino de modo geral. Suas análises questionavam um tipo de livro
didático, com um modelo pedagógico considerado tradicional, livresco e baseado na
memorização.
O ensino secundário estava em expansão nos anos 1950 e, desse modo, buscava-
se um novo significado para esse nível de ensino. Discutia-se a necessidade de se
232
a CBL, outros órgãos do próprio governo federal e das Secretarias de Educação dos
estados.
Ao analisar a história dos processos de avaliação dos livros didáticos no Brasil
foi importante identificar a importância atribuída ao livro didático para a educação
escolar. Dessa forma observa-se o significado da atual política do livro didático. O
PNLD foi criado em 1985, para coroar a importância do livro escolar e, também, para
estabelecer a nova política de universalização da educação, da escola para todos, com
uma proposta de fornecer o livro didático para todos os alunos do ensino de 1o grau. Ao
longo dos anos o PNLD se expandiu, passou a fornecer livros para o Ensino Médio e,
recentemente, para alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Como foi destacado anteriormente, a implantação da avaliação dos livros
didáticos no PNLD não ocorreu de modo tranquilo. A primeira avaliação, de 1993,
constatou que os livros didáticos comprados pelo MEC apresentavam “problemas
graves”, “erros de natureza científica”, “preconceitos e estereótipos”, entre outros
problemas. Esses eram os livros didáticos produzidos entre o fim da Ditadura Militar e
o início da democratização brasileira. Qual o significado dessa constatação?
O que se pode considerar, baseado nas análises aqui descritas, é que durante o
Regime Militar a preocupação centrou-se mais no mercado editorial didático do que na
qualidade dos livros. Contudo, Munakata (1997, p. 68) observa que não eram todos os
livros que apresentavam “erros”; na avaliação de 1993, 63 % dos livros analisados
apresentavam “inadequações em relação aos critérios do PNLD, muitas delas óbvias, o
que revela certa dose de má-fé das editoras, que tentaram ludibriar a FAE com
expedientes até mesmo simplórios, como a entrega de livros em fotocópia ou obras sem
acabamento”.
Desse modo, verifica-se que para instituir a avaliação oficial dos livros
didáticos, a partir de 1996, o governo utilizou os argumentos indicados pelo Grupo de
Trabalho de 1993, sobre a má qualidade dos manuais escolares. Assim, a justificativa
para esse novo momento de avaliação dos livros didáticos foi estabelecer (novamente)
um padrão de qualidade para os manuais comprados pelo Estado.
No entanto, desde o início da avaliação oficial do PNLD, autores e editores
questionam o processo da avaliação, seus critérios e a infalibilidade das comissões. Em
uma busca no site da Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos (Abrale), é
possível encontrar inúmeros textos que discutem problemas nas avaliações dos livros
didáticos do PNLD. Esses textos nos possibilitaram verificar que as polêmicas
235
197
O documento Para formar um país de leitores: contribuições para a política do livro escolar, foi
encontrado em http://www.abrale.com.br/frameset.htm, acesso em 20/01/2001.
236
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