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GRANDES RELIGIÕES DO MUNDO

Sergio Ronchi

Círculo de Leitores, Lisboa


Tradução: Eduardo Saló

PREFáCIO

A meus pais

A Reforma do século XVI, mesmo nas formas variadas e diferenciadas que veio a
assumir em conformidade com as evoluções históricas e culturais e as
circunstâncias,
configura-se substancial e fundamentalmente como um movimento puramente religioso,
um verdadeiro e próprio evento espiritual:
consequente necessidade de a proclamar com rigor. E os reformadores não foram
agitadores políticos, não estavam ao serviço de causas políticas, nem eram heróis
nacionais. Não obstante, a sua actividade de homens de fé não podia, obviamente
deixar
de incidi cultural contemporâneos e
-. Por outro lado, como salienta Bainton, *a Reforma fez co-mqÜê@ -ar-e-Figiffiõ
e-,
sobretudo, a confissão religiosa em particular, se tornasse um fenómeno decisivo na
política por mais de um século e meio@>. Na sua essência mais profunda, a Reforma
não
foi nem pretendeu ser directamente uma resposta polémica às confrontações do
catolicismo romano. Ao invés, foi e quis ser o anúncio do Evangelho de Cr
a a, a reafirmarão mais intransigente (embora por vezes em termos
negativos e nem sempre compartilháveis) da centralidade da Palavra de Deus, da fé
em
Cristo crucificado e ressurgido. A posição critica da Reforma nas confrontações com
a
Igreja e nas relações entre ela e a sociedade como corpus christianum, não deriva
afirma Subilia - *de uma reacção a uma decadência de ordem moral. Nesta base, o
protesto da Reforma não teria uma justificação válida: Lutero tinha plena
consciência
disso. Estavam em . o razões de fé e não de prática histórica: a prática histórica
é
apenas o reflexo, mais ou menos adequado, de urna convicção teológica+.
Por conseguinte, os reformadores - pode facilmente deduzir-se isso dos seus
escritos -, estavam animados, na sua acção, de uma convicção de fundo: a~Reforma
da
Igreja era uma obra, não deles, mas depor,, No entanto, tratava-se sem dúvida de
uma

obra de Deus que, como qualquer operação divina - @ se inseria na História,


utilizava, por
assim dizer, o seu tecido, como de resto se observa na longa história da revelação
bíblica. E a Reforma do século XVI registou-se numa época rica de revoluções, ao
ponto
de esse período ser considerado com frequência o verdadeiro momento de transição da

Idade Média para a Idade Moderna. Já no século XV os termos *Reforma+ e


*Reforrnação+ se tornaram palavras-chave, empregadas nos âmbitos mais variados dos
mundos eclesiástico e laico. Falava-se continuamente de *reforma+ do clero e dos
laicos, do próprio papado, do clero secular e conventual e até da própria
administração
do império e das finanças, da justiça e dos direitos das cidades individuais, das
universidades e das escolas. A--*Reforma+ tornou-se uma grande esperança, E já se

preanunciava em figuras como Hus e Savonarola, constituiu o tema central dos


concílios
*reformadores+ de Constança e Basileia, da vasta literatura que os preparou,
acompanhou e seguiu. Ao longo do século, que em diversos aspectos foi
extraordinariamente
agitado, a_ exigência de uma renovação no seio da Imia tornou-se com frequência
raEc.al. Ex graças a um regresso ao
estado de primitiva pureza, a vacilante nave de Pedro, e não se hesitou por vezes
em
fazê-lo em confrontação com o próprio papado. Efectuaram-se cálculos astrológicos
que
preanunciavam a destruição total, assim como a esperada reforma se apresentava como
o
início de uma nova viragem na história global da Humanidade depois da Encarnação.
Falava-se com frequência de Anticristo como símbolo ameaçador de um fim do mundo
iminente; e a dissolução total, personificada na figura do Demónio, penetrava na
Igreja e
sentava-se no trono. Nas próprias descrições ominosas, não faltava a referência
*revolucionária+, e eram anunciadas grandes insurreições contra a autoridade. A par
do
medo, existia um grande ardor de esperança de que uma renovação da religião cristã
pudesse fazer ressurgir a Igreja graças a um *grande papa+, que, em não pouca
literatura
da época, deu origem à famosa figura de um *papa angélico+.
O termo *Reforma+ foi empregado potTu*//*@tero @a sua príme1@@@em
@DúUbb11@Ico.
como que extraindo-o do subsolo e confins da consciência geral, para seguidamente
não
o utilizar com muita frequência. Naquela ocasião, afinnou: *A Igreja necessita de
umas
Reforma que não pode ser operada por um único homem, como o papa, ou cardeais...
mas por todo o mundo cristão; ou melhor, trata-se de uma obra que pertence só a
Deus.
Mas o tempo em que esta Reforma surgirá compete apenas Aquele que criou os tempos+
(Resolutiones zu den Ablassthesen, Agosto de 1518, WA 1, 627, 66 seg.). Ess-e
*tempo+ aproximava-se historicamente a passos largos e não tardou a tornar-se, para
todos os refôrrnadores, princípio fundamental que fosse novamente encarada a sério
a
palavra viva da Bíblia, na atial está Dredicado que Cr sto exorta a uma -Inovação
perene.

E assim introduzido um novo elemento, poderoso e dinâmico, na estrutura @_bj`ectià-


e
estática da Igreja tradicional, na sua hierarquia, nos seus sacramentos e no seu
pensamento jurídico. Nas novas comunidades, o grande impulso e grande esperança de
reforma coagulam, assim, como anúncio da Escritura, mas entendido como norma
normans, ou seja, como norma fundamental, não sujeita a outras instâncias, por toda
a
Igreja, através da qual a Igreja inteira era reconduzida às suas origens puras. E é
interessante notar como uma exortação a corresponsabilidades precisas, no plano
moral,
porém, em estreita correlação com a intuição cristã primitiva, provinha de onde se
apontava o princípio dissidente da Reforma. O
Dieta de Nurelllberga, fez declarar ao seuJeQãdo Chieregatti:-_*Reconhecemos
aberta-i,
mente que Deus @ @rmíte @que is@toacon@teça na Igreja em virtude dos pecados dos
homens;l
e em, particular, dos sacerdotes e prelados. Sabemos bem que mesmo junto desta Sant
Sé se têm manifestado muitas coisas deploráveis - abusos em assuntos espirituais
transgressões aos mandamentos divinos -, pelo que tudo mudou para pior. Não deve
portanto, surpreender que a doença se transmitisse do chefe aos membros, dos papas
ao
prelados. Todos nós, prelados e eclesiásticos, abandonámos o bom caminho...
A trágica recordação de um Alexandre IV, que elevara a amoralidade à luta contra
reforma de Savonarola, de uma concepção distorcida da missão papal (*Deixemos
desfrutar o papado!+, exclamara, um dia, Leão X), achava-se por detrás desta
patética
confissão de um papa em Nuremberga. Mas era tarde: na mais concreta e difusa
realidade, as figuras e movimentos reformadores que havia apenas alguns séculos
eram
estudados e avaliados na sua incidência e capilaridade - o anúncio do Evangelho, a

cura das almas, a imitação de Cristo - constituíam valores agora distantes que
encontravam expressão quase apenas numa terminologia devocional estereotipada. E a
reacção de Lutero, para falar dele, mas como poderosa síntese das instâncias
reformadoras, perante esse malogro, era, nas suas intenções, mais profunda,
católica.
Algumas
teses sustentadas mais tarde pela Reforma não soavam, inicialmente, aos ouvidos de
um
cristão da época, como coisas *revolucíonárias+, ou melhor, tão pouco *catóficas+
que
lhe perturbavam a alma e até as tradições *eatólicas+. Quando a essa acção e
atitude
puramente exteriores foi contraposta por novos predicadores, pessoalmente
convictos, a
força espiritual da Palavra de Deus na Escritura, tornou-se fácil a muitos
substituir as
formas, embora teoricamente ainda correctas, mas agora esvaziadas de todo o
significado, por uma substância nova e espiritualmente construtiva: m ' uitos
passaram-se
definitivamente para a Reforma, porque sentiam a necessidade de
int`miam'@ e era esta ia ara a Igrda tradj@Lona1__c@

a eygenc
dificuldades tão profundas.
AssimIa-vonráde ---de re@forma, que durante longo tempo permanecera em
estagnação,
abriu finalmente caminho com facilidade, quase elementar, lançando-se nas massas e
tornando-as protagonistas da reforma, aferrando-as, por assim dizer, à consciência
*católica+ nas suas instâncias mais profundas. Muitos historiadores católicos
actuais não
hesitam em reconhecer que, se houve culpa, a mais grave foi da Igreja, que não se
esforçou, nas suas instâncias hierárquicas, o suficiente para admitir o que havia
de
católico nas doutrinas renovadas no sentido bíblico.
De tudo isto, verificasse que a Reforma, se é lida como acontecimento
histórico com
as consequências e implicações inerentes, está, todavia, mais compreendida e
aprofundada no terreno espiritual, cultural e teológico que a justifica em
profundidade
e torna
rica de significado até hoje. Por esse motivo, a estrutura interna desta nossa
apresenta
ção d4'@form@ analisa sobretudo-as b I@oçs essenciais do Knsamento
reformado, salienta ndo os momentos essenciais nunca aband ados r
e'a
--- Qn ---- pp
e risse Reforma. Na segunda parte,
procuramos estudar dentro da

F refôrmador, es que depois


dariam origem às
confissões de fé e, portanto, ao corpo da reflexão teológica protestante.
Finalmente, na

terceira parte acha-se descrita a vida concreta, mas sobretudo as tensões


teológico-espi 1 as no protestantismo, na fé, no culto, nos comportamentos
práticos,
indicando, de vez em quando, as diversas topologias ou algumas acentuações.
Por último, parece oportuno referir que a relativamente recente
constituição do
Conselho Mundial das Igrejas (com sede em Genebra e subdividido em diversas
secções
de investigação e actividades) não se apresenta como uma espécie de *Igreja
super+
protestante, nem como um meio para eliminar as acepções ou acentuações das
antigas
confissões de fé, mas, ao invés, pretende ser uma espécie de auxílio
recíproco, aceite
pelas Igrejas aderentes, para atingir, por um lado, os núcleos portadores de
qualquer
confissão protestante (note-se que fazem parte do Conselho algumas Igrejas
Ortodoxas
do Oriente) e, por outro, como instrumento para um testemuno comum do serviço
do
Evangelho no mundo contemporâneo. Neste sentido, é aceitável e esclarecedor
aquilo
que já Schleiermacher observava: a Reforma, como movimento do espírito
excitador de

multidões do século XVI, ainda não alcançou totalmente os seus objectivos; por
conseguinte, lançou-se até agora - nos sectores mais vivos e activos - no
regresso
radical ao Evangelho que constituí a descoberta e drama dos grandes
reformadores e da
primeiríssima Reforma na sua globalidade.

1. Os fundamentos
essenciais da Reforma

1. Reforma religiosa na espessura


da História

Se a Refonna do século XVI se


deve encarar substancialmente como
um evento espiritual, não se pode,
todavia, entender sem a ler e compreender no seio de uma espessura hístórica
precisa. As cargas de inquietação,
expectativa e protestos que remontavam aos movimentos católicos medievais e tinham
explodido com João
Hus, encontraram voz apaixonada e
imediata em Lutero, Calvino, os outros reformadores. Por esse motivo, a
Reforma *constitui um dos momentos
fundamentais da história moderna. Na
verdade, com a Reforma... assiste-se
sobretudo à fon-nacão de uma,atítude
mais livre das consciências e à afirmação das forças que conduziram à desagregação
da Idade Média,> (Pezzella).

O castelo de Wartburgo, perto de Eisenach, que hospedou Lutero em completa


solidão entre 4 de Maio de 1521 e 3 de
Março de 1522;ffil um período de agudo
sqj@iinewoflsico e inoral, inas tainbétn de
trabalho fteliético, tio refúgio que o seu
príncipe eleitor lhe qfèreceu simulando um
rapto, logo após a Dieta de Wornis tia
presença do imperador Carlos V, opine
Lutero não se quis retractar, e tia expectativa do edicto que proclamava a expulsão
do refórinador do território do Império: 25 de Maio de 1521.

A Igreja, na época intermédia, atravessara três fases.


De propagação (sécs. V-XI): a
Igreja estendeu a sua obra evangelizadora aos confins do mundo eslavo e
depressa se tornou uma grande instituição terrena. Nessa conformidade,
salienta Bainton, o aparelho eclesiástico converteu-se em *parte integrante
do sistema feudal. Teve início um
processo de corrupção que atingiu todos os organismos com os quais a
Igreja se achava empenhada na conquista do Ocidente: a cúria romana, o
clero secular e o regularas.
De dominação (sécs. X11-XI11): de
poder temporal, a Igreja assumiu a
dimensão de urna verdadeira e própria
teocracia. O papa Gregório VII propôs-se reformar mosteiros, Igreja e o
mundo. No entanto, para alcançar

esse objectivo, havia necessidade de


conseguir o controlo da sociedade civil, dos laicos, ou seja, que a própria
Igreja se tornasse, sem ambiguidades,
o poder dominante. Nasceu assim a
teocracia papal, que encontrou fundamento e motivação teológicos no
sistema sacramental: o único meio de
salvação era conferido ao sacramento,
exclusivamente adminístrável pela
Igreja na pessoa dos seus sacerdotes.
Criou-se então a fractura entre clero e
laicado, com a consequencia prática
do domínio clerical sobre a sociedade.
Os teóricos mais ilustres da teocracia

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

*Apenas a Palavra
de Deus e Cristo+:
assim define Lutero
a sua descoberta
como descoberta-de
;à *Deus m@@@dioso+; a relação
de Lutero com a
tradição cristã é
muito mais forte
que nos outros reformadores, e resulta comovente o
NN seu apego apaixonado a
Cristo; esta
imagem de Cristo,
existente no célebre
mosaico do século

:'_?kl 7 É

V na basílica romana dos santos


Cosme e Damião,
com o g esto do
mestre e brandindo
o rolo da Lei ou
seja, a Escri;ura,
constitui uma excelente síntese da
pesquisa e profundas intuições de
Lutero.

foram o papa lnoce"ncio 111


(1161-1216) e o ideólogo Tomás de
Aquino.
A terceira fase, de desagregação
(sécs. XIV-XV), iniciou-se com o
chamado *cativeiro de Avinhão+ da
Igreja (1305-1378). Os papas foram
todos franceses; os cofres eclesiásticos
começavam a esvaziar-se, pelo que se
apressaram a estudar expedientes que

fizessem afluir dinheiro. Entre muitos, o mais eficaz foio das__i@' cias.

Como os santos tinham méritos em


8
excesso, os que sobravam constituíam um tesouro que Deus concedia
aos papas, livres de dispor dele como
lhes aprouvesse. Pela remissão dos
pecados, o povo devia um óbolo à
Igreja, e quantos mais fossem os pecados, mais os óbolos a pagar.
Principiou assim, no seio da instituição eclesiástica, a manifestar-se um
certo descontentamento, que conduziu
a um ci~ ao longo de um largo
período (1378-1417). Tentou-se então, com êxito, recompor a unidade
interna através da convocação periódica de concílios-- No entanto, o
mesmo não se pôde dizer no tocante a
uma Reforma efectiva da Igreja.
Foram muitos os que se insurgiram
contra a sua decadência moral. Constituíram-se movimentos sectários (em
particular, na França Meridional e na
Itália Setentrional), que propugnavam
verdadeiras doutrinas subversivas na época - das ordens religiosa e
social. Encontrando-se a era presente
no final (escatologia),, _a_pró@n4 instituição eclesiástica ---era posta-em causa:
o papa era o Ant à w

ic ---to- e Roma a
Babilónia, segundo as imagens bíblicas do Apocalipse; a Igreja visível não
era a verdadeira 1
--- g@@J@de, @Cristo e a
administração dos sacramentos por
parte do clero era negada como legítima (um padre indigno não pode
exercer esse ministério). A revolução,
numa palavra, achava-se às portas.
O pressuposto histórico da Reforma

k,

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

não está tanto no episódio das noventa


e cinco teses de ILutero (31 de Outubro
de 1517), como em todos esses fermentos de Reforma religiosa extremamente sentida
na Igreja desde fins
do século XII (de Francisco de Assis
aos Valdenses) - argumento dos vários concílios reforinadores. Nos decénios
precedentes ao protesto luterano, porém, todos os referidos movimentos tinham
esgotado
a sua carga
profética de renovação radical.

2. O núcleo essencial da Reforma

Chegamos agora à mensagem deste


evento histórico: uma mensagem de
alcance incalculável para o imediato
e para os séculos seguintes.

a) Afê na *única Escritura+


A fé baseia-se na *única Escritura+:

Gravura alemã do

I"

séc. XVI: Lutero e


João Hus conduzem
as ovelhas transviadas para a Cruz
de Cristo, mas munidos apenas da
Escritura, que têm
nas mãos; João
Hus (1368-1415), o
reformador de
Praga já condenado pelo Concílio
de Constança, aqui
representado sob o
aspecto de Melâncton, indica a
continuidade no
movimento da Reforma na cristandade.

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

XUL,

Um exem 'Plar da Bíblia traduzido por

@L=1171r11 em 1565, agora conservado tia


Lutherhaus de Eisenach; se não é exacto
afirmar que Lutero foi o primeiro a dar a
Bíblia 'aos Alemães, pode dizer-se que,
com a sua Bíblia em alemão, criou uma

obra_que ecisão
e,@ressiva, @abun@,lância @ee 'cacarejaria lingt Ls@ica.

a única autoridade non-nativa para o


crente, a comunidade e a Igreja é a
palavra de Deus, como está testemunhado nos escritos bíblicos.

Nas Escrituras (Antigo e Novo


Testamentos), Deus fala ao homem---e
a sua palavra é a única com autoridade
e direito de cidadania no seio da comunidade cristã, que, por conse
10

XLI.

-7c
-4,

guinte, deve saber-se-lhe conformar.


No entanto, a Bíblia não é - sustentava Lutero com fé e paixão - um
*papa de papel+. A sua autoridade,
autorizada e não autoritária, não se
situa apenas nas suas palavras: essas
foram escritas para sempre por homens, embora inspiradas no espírito
divino, portanto, historicamente deten-ninante. A autoridade consiste
mais na sua mensagem, a qual está
resumida na pessoa e obra de Jesus
Cristo. A Sagrada Escritura representa
a norma absoluta (norma normans). E
pode ser lida de forma crítica, sujeita
ao *exame livre+.
Não se trata de reter dela o que
convém ao crente. É muito mais exactamente transmitida aos cristãos sân

w_
guiares para que a possam ler, meditar, escutar e se aperfeiçoem em face
dela. Por conseguinte, a Bíblia não é
monopólio dos eclesiásticos: cada um
pode exprimir a sua opinião em matéria doutrinal.
A relação que Deus cria entre ele e
cada crente (assim como com a comunidade no seu conjunto), através da
sua palavra, é uma r
dade. *Exame livre+ assume então a
acepção de pesquisa pessoal da verdade bíblica. Esta palavra domina a fé
e a teologia (ou seja, a fé que se
reflecte em si própria e quer ser bem

consciente de si) protestantes. E trata-se de uma palavra predicada, proclamada de


viva voz. A predicação do
Evangelho representa, na verdade, o
evento constitutivo da comunidade
crente: a Igreja Protestante é uma
*Igreja da palavra+.

b) A salvação na *única graça+


0_homçj@ ao prescindir da sua fé
religiosa,'é pecador: por outras palavras, aproxima-se menos do amor nos
seus confrontos com Deus e com o
próximo. Mas não nos confrontos
consigo próprio.
Com a rebelião nos confrontos com
Deus criador, o homem condenou-se a
uma existência na não-liberdade,
ainda que convencido do contrário.
Uma existência caracterizada pelo
amor por si próprio, que o leva a
substituir-se a Deus. E essa condição
humana não assume um novo rosto
por intermédio da religião. Pelo contrário. Procura *tratar+ a sua salvação
com Deus através da execução de
obras religiosas, que acabam, todavia,
por adquirir carácter meritório; apre
OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

senta exigências nos confrontos com


Deus. O homem nunca poderá salvar-se só por si executando obras meritórias. É
apenas Deus quem, na pessoa e obra de Cristo, lhe cancela os
pecados. E salva-o com base na
*única fé+: o homem só pode crercom
base na *única fé+: só pode crer com
base nas obras de Deus; crer que a sua
fé é a resposta adequada à fidelidade a
Deus, e deve, portanto, produzir
obras. Esta fé não quer outra coisa a
seu lado - é uma fé livre, baseada na
liberdade de Deus. E somente através
dessa fé se pode estar perante Deus, e
não pela actuação e pelas obras. Com
efeito, o homem apenas pode receber
de Deus; não tem ninguém que lhe dê
ou faça valer diante dele. Nem mesmo
a própria fé. Esta constitui, de facto,
um dom gratuito de Deus. A salvação
acontece pela @<única graça+.

c) A *eleição soberana+ de Deus


A <,predestinação@>', finalmente, desenvolve um papel de importância
fundamental. No entanto, o termo foi
deformado e adulterado nas interpretações, sobretudo fora do mundo teológico-
espiritua'l da Reforma: não se
trata de um acto arbitrário de Deus,
com base no qual ele decide antecipadamente da decisão de fé pessoal
quem é salvo ou condenado para a
eternidade. Ao invés, a predestinação
é eleição por graça: a negação radical
dos méritos humanos, a afirmação

absoluta da graça de Deus. A salvação


é obra exclusiva de Deus, de que o
homem, embora crente, não pode na
realidade dispor: não são os pecados
que perdoam ao homem, nem a sua fé
que o salva. É apenas Deus em Cristo.,-'

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

A eleição soberana de Deus (termos mais compreensíveis que a palavra


*predestinação+) verificou-se em
Cristo, para o qual os homens devem
volver o olhar.
Predestínação indica pois, vocação
activa, tornada possível pela revelação
de Deus em Jesus Cristo e, nessa
conformidade, Cristo é como que um
espelho no qual contemplamos a nossa
eleição. A universalis vocatio, para
que se converta em graça soberana,
toma-se operante em cada crente mediante a acção do Espírito Santo, P@ lo
que o homem não permanece passivo
como um autómato nas mãos de Deus,
mas plenamente responsável, que
tenta produzir na sua existência quotidiana frutos conformes com a eleição
em Cristo. Por esse motivo, a eleição
soberana de Cristo, dita predestinação, está intimamente ligada e deve
ser encarada à luz da cristologia e da
eclesiologia. Da cristologia, porque a
plena e feliz comunhão com Deus só é
possível por meio de Cristo, no qual
estão unidas a natureza humana e a
divina, e obtém-se nele ajustificação
como perdão dos pecados e a imputação da sua justiça. Da eclesiologia,
porque a Igreja é simultaneamente
invisível, por compreender em si todos os predestinados à salvação de
todas as gerações, e visível, porque
abarca todos os homens.

3. A mensagem da liberdade cristã

Afirmações desta importância não


podem deixar de ter consequências
imediatas. O homem nascido da Reforma é, acima de tudo, um homem

12

A miniatura do Codex sinopensis da Biblioteca Nacional de Paris, que representa o


milagre do cego,
conduz fortemente à concepção da única fé mediante a qua1_O_@ho@ '
mem e
iluminado e salvo, que os
reformadores
liõ-sfactos evangélicos;
com @eto, -aesê@n cia É
Reforma não consiste apenas numa renovação mo
ral, mas resume-se essenci .almente na predicação

Pa que justifica por me



Lde Cristo crucificado.

que sabe assumir a responsabilidade


da sua fé e da sua incredulidade, dos
seus desaires e dos seus êxitos.
O *exame livre+ não constitui uma
ideia @6@_tracta, mas o princípio que
informa e está na base do pensamento
moderno. Fundamento da interpretação escritural, torna possível enfrentar
com desinibição (e seriedade) todos os
problemas no seio de umaforma mentis crítica. Assim, o Protestante não se
contenta com receitas já confeccionadas e verdades atraentes e prontas,
nem propõe modelos culturais, porque

11@@

não confunde anúncio do Evangelho à


sociedade com cristianização da sociedade'.'Ajuda cada um a não aceitar
sem críticas concepções e esquemas
clomfnantes ou que se preparam para o
vir a ser. No âmbito da pesquisa
cultural, com a Reforma criou-se a
passagem da unidade ao pluralismo da
cultura, o que foi tornado possível
pelas premissas teológicas do movimento reforinador: o homem, crente
evidentemente, vive' entre cruz e ressurreição, entre a velha realidade do
seu mundo e a nova realidade de Deus

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

'lY

para o qual tende na fé e esperança.


Daí deriva que a verdade seja procurada com sofrimento: não é evidente

nem única.
A ética da Reforma é uma ética da
liberdade: vendo infringido a teoria
dos méritos, ou seja, uma teologia das
obras, o crente vive por graça e, por
conseguinte, é responsável das suas
opções e decisões. Trata-se de uma
ética que emana directamente da fé em
Cristo crucificado; por outras palavras
é uma ética do serviço e pode sê-lo
desde que constitua vocação.

13

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

Em última análise, como sustentou


em várias ocasiões o historiador Giorgio Spini, a Reforma contribuiu notavelmente
@< para o nascimento da consciência nacional em muitos países
europeus. Da Reforma religiosa do
século XVI, surgiu o estado moderno,
em que os govemantes estão ao serviço dos governados e não vice~versa+.
Os efeitos da Reforma foram extraordinariamente variados, mesmo nos
aspectos religioso e teológico. O
ponto de partida central que consiste
num empenho íntimo e pessoal perante o Deus da revelação, com base
na Sagrada Escritura, revelou uma
polivalência que produz continuamente novas formas e variantes da
profissão de fé. Por outro lado, manifestou a incrível capacidade de recolher de
novo em unidade, mesmo na
dispersão, a multiplicidade de elementos contidos nesta ou naquela
fon-na. Esta força paradoxal, que testemunha, sobretudo, o poder de coesão da
figura de um único Senhor,
conservou-se para além das diversas
formas da ortodoxia e pietismo, até
hoje.
Ainda no campo religioso-teológico
é extraordinária a acção que a Reforma exerceu na própria Igreja Católica, apesar
dos ataques ferozes a esta
última por parte da primeira e da não
menos dura réplica da Igreja Católica.
'A Reforma no seio da Igreja Católica
do século XVI (conhecida por Contra-Reforma), provocado pela Reforma
protestante, é o elemento mais significativo e encontra em parte a sua continuação
no século XVII e, de forma
diferente, na época contemporânea.

14

4. Estruturas ideais e espírito do


protestantismo

É possível definir sinteticamente os


conteúdos e o espírito que, apesar de
tantas subdivisões confessionais,
ainda hoje caracterizam o protestantismo surgido do movimento reformador? Sem
dúvida, embora seja difícil.
Lendo agora globalmente a acção e

pensamento, e as consequências imediatas, dos reformadores, para além


das simples ocasiões históricas e das
acentuações doutrinais, surge um
elemento unificador que marcou, ao
longo dos séculos, a alma profunda da
Reforma e de todo o protestantismo:
foi, sobretudo, uma explosão positiva
defé na Bíblia. Deste núcleo central e
originário é possível derivar algumas
consequências que se traduziram em
atitudes doutrinais, pragmáticas e espirituais, dentro das quais o cristianismo
resultante da Reforma continua
a mover-se.

a) Um salto radical para o Evangelho


Pode afirmar-se que o elemento decisivo da Reforma consiste no salto
para as posições evangélicas mais
simples, religiosas ou teológico-religiosas, a fim de repor tudo na consciência
conquistada pela Palavra revelada e independentemente da orga-nização eclesiástica,
do mundo e do
Estado. Ao complexo aparelho da
Igreja tradicional, a Reforma contrapõe uma imensa simplificação que se
baseia na mensagem evangélica e na
equiparação de todos os cristãos. Daqui derivam os pontos essenciais que
não são apenas convicções doutrinais,
mas também clima de pensamento,

DEUS TRINDADE
PAI-FILHO-ESPíRITO

opera
por pura rdiament

rnIsenco e mediante a
gratuita a *eleiçâo soberana+ sua palavra
do homem
(predestinação)

REVELADOS-ENCARNADOS EM JESUS CRISTO


PALAVRA VIVA EM DEUS

MANIFESTADA OPERANTES

na predicação
nas Escrituras Sagradas

do Evangelho de graça

TORNA-SE SALVADORA NO úNICO, E PERENE

CHAMA CRUZ SACRIFICIO - RESSURREIÇÃO CONVOCA


A DE JESUS CRISTO A


-EKKLESIA.

produz a resposta
de fé e arrependimento

constitui o
sacerdócio universal

na na
úNICA PALAVRA úNICA GRAÇA

vivem-se na testemunham-se
*pura fé- na ética
são ajudados
e alimentados
pelos

BAPTISMO
SANTA CEIA
imersão na comunhão com
motte-ressurre'çao Cristo salvador e com
de Cristo os irmãos na fé

cumprimento pelo homem


da -eleição soberana. de
Deus em Cristo salvador AL.

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

Um pastor evangélico da Igreja Presbiteriana despede-se dos fiéis após o culto, à


porta da igreja; para o protestantismo,
todo o fiel é *sacerdote+ em força do
*sacerdócio universais> atribuído a todos
os baptizados; no entanto, ao fiel escolhido como pastor da comunidade compete
a predicação que pressupõe uma rigorosa
preparação bíblica e teológica, e a *cura
de almas +, a que os Protestantes atribuem
muita importância.

atitude de espírito dentro dos quais se


desenvolvem a reflexão teológica e o
estilo de vida como prática quotidiana
do cristão reformado:
1. O Evangelho no texto da Sagrada
Escritura é a norma única e alimento
das almas, 1)grque nada é considerado
apenas do ponto de vista teórico;
2. Todos os crentes são pecadores,

16

sempre necessitados de misericórdia;


3. No entanto, todos se encontram na
mesma condição sacerdotal, pelo
facto de existir unicamente o sacerdócio universal dos crentes;
4. A salvação não está ligada a qualquer 1 instância interrnédia, mas apenas
ao Evangelho e aos sacramentos desejados por Cristo e, por conseguinte,
não à mediação de uma hierarquia
sacerdotal-sacramental, nem à veneração e intervenção dos santos ou às
demonstrações teológicas.
b) A liberdade interior na Cruz de
Cristo
Tudo isto não pode deixar de conduzir e exigir a liberdade interior do
pecador renascido em Cristo, que se
manifesta no risco da queda (através
da morte e Inferno) e é alcançado na fé

que repõe a sua confiança unicamente


em Cristo. Daqui deriva que a_ doutrina da Cruz é fundamental. O Evangelho é
entendido dá na Disputa de
Heidelberga de 1518) como teologia
da Cruz: perante a Cruz de Cristo, o
enigma desvenda-se - Deus reveIa-se onde na aparência está mais
profundamente oculto; a Cruz constitui a vitória do pecado sobre o único
justo e é, ao mesmo tempo, a superação do ódio através do amor. Nisto,
Cristo é o modelo do cristão: só se
chega à vida por meio da experiência
da morte, à graça mediante o arrependimento, à fé através da dúvida tormentosa. A
fé deve abrir caminho em
todos os tempos através da cegueira,
através da experiência da contradição.
Só quando esta ousa confiar no Deus
oculto se abre à fé o Deus revelado.
Apenas enfrentando esta tensão se

O momento da predicação é central


na vida da comunidade, e o sermão o
verdadeira -c-entro
do culto juntamente
com a Santa Ceia;
o grande teólogo
reformado Carlos
Barth costumava

dizer que toda a sua


obra teológica tinha como única
nalidade conduzir a
um sermão que
anunciava o evento
único da Palavra
de Deus na divers
dade das situaçã 1

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

amadurece uma fé genuína, que é tudo


o contrário de uma otiosa qualitas, um
estado de espírito tranquilo. Por esse
motivo, reveste-se de pouco valor um
conhecimento de Deus e, portanto, a
salvação, realizada por meio da Natureza e da História ou das próprias
argumentações teológicas. O conhecimento e salvação conquistam-se
somente no empenhamento existencial
com a experiência vivida, modelada
na vida, paixão e morte de Cristo.
Baseia-se na fé de que o cristão deve
seguir o caminho percorrido por
Cristo: como o Senhor alcançou a
glória humilhando-se na carne, mas
sobretudo através da paixão do Getsémani e o abandono por parte de
Deus na cruz, também o cristão obtém
a nova justiça no sofrimento da tentação e no julgamento dos seus próprios
pecados.

17

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA

@O

-é;

O aspecto negativo é constituído


pela luta contra a justificação pelas
acções, que se toma na prática uma
verdadeira luta contra as próprias acções. Com base nesta luta contra o
valor das acções, o conteúdo da mens,ageríi reformadora é determinado
pela princípio da única escritura, embora isto, apesar da acentuação parcialmente
radical de única, nunca tenha sido realizado completamente, à
excepção dos grupos mais radicais,
tanto de Lutero como de outros reformadores.

c) A <,confissão defé+, a consciência


de fé e o magistério
Todas as comunidades reformadas
apresentaram, com o tempo, uma
confessio vinculativa para os seus

18

,cwi.
O papa Paulo VIfoi o primeiro pontífice
de Roma que visitou o Conselho Mundial
das Igrejas, em Genebra, a 10 de Junho
de 1969; a Igreja Católica não faz parte
do Conselho Mundial., em que participam
cerca de trezentas Igrejas Evangélicas e
Ortodoxas Orientais; não se trata de uma
Igreja super, mas uma
com vista ao estudo da m
lica e da m no mundo.

membros. Mas como estes não reconhecem infalibilidade a qualquer autoridade do


magistério, a interpretação
toma-se incerta, sendo de vez em
quando confiada à direcção eclesiástica do momento ou aos teólogos, que,
numa dada altura, representavam mais
explicitamente a consciência de fé de
uma dada comunidade como grupo
de comunidade. Nesta tensão irresol
vida pela própria instância originária
no nascimento da Reforma, convencionou-se salientar o elemento trágico
imanente à Reforma. As Igrejas
Evangélicas e os teólogos viram, porém, neste elemento trágico uma
vantagem nas confrontações da expressão minuciosamente codificada
segundo palavras humanas da pura
fides. A falta de uma instância do
magistério conduziu necessariamente
a uma cisão crescente dos sistemas
doutrinais e por vezes até a uma dissolução daquilo que na origem se
considerava objectivamente intangível. E o processo desenrolou-se até
chegar, nos nossos dias, à exegese
existencial da Escritura, pela qual

nada nela pode ser determinado e


intangível, porém, o dado de fé é
entendido em relação ao desenvolvimento existencial, à exigência imediata da vida
concreta do homem.

É sempre mais comum, como aqui


em Genebra, o
costume da reunião
em prece de cristãos de várias confissões; este hábito
é considerado uma
necessidade baseada nos fundamentos evangélicos
comuns e uma
busca de possível
unidade na f é ba
seada não tanto nas
discussões teológicas como na experiência comum da
prece e do culto

OS FUNDAMENTOS DA REFORMA
Embora tendo fé no *princípio
subjectivos intrinsecamente essencial
à Reforma, depressa se sentiu desde
os próprios primórdios da Reforma a
necessidade de formular os dados objectivos da fé em textos denominados
Confissão de Fé ou Escritos Simbólicos (em referência aos antigos símbolos de fé
que nunca foram rejeitados).

d) A predicação da *fé que justifica+


A essência da Reforma, do ponto de
vista cristão-religioso, não consiste
apenas ou predominantemente numa
@enovação moral. Na realidade, a
Reforma exigiu e promoveu um saneamento dos abusos da Igreja tradicional, e ela
própria o iniciou. Por
outro lado, colocou a tónica em bens
morais, propugnando a sua realização
na vida cristã da família, da comunidade da aldeia, da cidade e da nação.

19

2. Os grandes reformadores

1. *Reforma+ e *protestantismo+

Já vimos como o protestantismo,


nascido da Reforina do século XVI,

não se apresentou na história religiosa


do Ocidente como uma religião nova,
nem como uma forma nova de cristianismo. Concebeu-se antes como Reforma da farejado
Ocidente, Reforma
profunda no seu chefè'e membros, em
nome do Evangelho, além do que
nenhum pensamento *cismático+ presidiu ao nascimento do protestantismo. Inseriu-se
mais numa longa
tradição de Reforma da Igreja que
remonta ao século XIII.
Entre os seus predecessores, podemos encontrar alguns que foram condenados
pela Igreja e outros não: Hussítas e Valdenses (nascidos sob a acção e doutrina de
João Flus e Pedro

Interior da Mutterhaus Kirche em Dusseldórfia-Kaíserwerth, Alemanha, durante a


predicação; o templo exprime com clareza
os elementos essenciais do culto evangé
, a. comunidade juntamente com as diaco-as,
pertencentes a comuni es tipo religioso
que surgiram em grande número no seio
do protestantismo nos dois últimos séculos, embora Lutero e, em geral, os outros
reformadores, julgassem impossível, e até
condenável, por motivos teológicos a vida'
religiosa comunitária.

lico: o púlpito e a ii
periodi`

Valdo), Savonarola e Pico de Mírândola conheceram perseguições. No


entanto, por outro lado, um São Bernardo, que apresenta semelhanças estranhas com
certas posições de Martinho Lutero, apesar dos seus ataques a
*já pesada monarquia da Santa Sé+,
como ele próprio afirmava, viveu e
trabalhou tranquilamente na Igreja. Se
a Reforma conduziu à constituição de
Igrejas separadas, o facto deveu-se
simultaneamente ao carácter global
das reformas propostas e à conjuntura
eclesiástica e política. Não se deve,
por conseguinte, encarar a Reforma
como um movimento organizado,
longamente preparado, com um plano
estratégico e teologias já construídas e
ainda menos com chefes propostos
e seguidos. Eclodiu quase de forma
espontânea, porventura anárquica, em
resposta a uma necessidade espiritual
que assolava desde longa data as camadas sociais e as consciências da
população europeia. Muitos queriam,
exigiam reformas, mas nem todos estavam decididos a avançar até às últimas
consequências envolvidas. E ninguém se considerava asmático. Sentia -se e
declarava-se
*evangélico+ no
seio da única Igreja. Por conseguinte,
por volta de 1520, tomava-se difícil
dizer quem era *protestante+ e quem
não era. Um Lefèvre d'Etaples, um
Erasmo, muitos religiosos e teólogos

21

OS GRANDES REFORMADORES

N@

acompanharam o pensamento de Lutero com simpatia, sem que viessem a


ser *protestantes+. E, por outro lado,
os sequazes dos reformadores não
exibiam outro nome senão o que a
opinião pública, e não eles, lhes atribuía: luteranos, calvinistas, biblicistas,
evangelistas, huguenotes (termo
cuja origem é obscura e contestada).
A designação protestante fez a sua
aparição muito tardiamente e devido a
causas acidentais, sendo sobretudo
criado e utilizado pelos católicos.
Na Dieta de Espira (1529), um
certo número de delegações dos esta 22
dos do Império passados para a Reforma lavrou um protesto contra o
facto de as minorias religiosas serem
oprimidas pelas decisões da maioria.
A frase essencial desse protesto foi,
redigida do seguinte modo: *Quando,
se trata da honra de Deus ou da
salvação das almas, todos se encon-@
tram perante Deus e não devem prestar contas a ninguém senão a Ele. +
Portanto, os seus defensores foram
imediatamente designados com o
apelativo de *Protestantes+, que acabou por se impor, conquanto hoje não
seja utilizado universalmente. Os

Ofresco dos apóstolos em torno de Cristo,


do séc. IV, nas Catacumbas de Ilaria, em
Roma, pela sua apologia paleocristã de
intensa conotação bíblica, constitui um
suporte deforça indiscutível às teses centrais da Reforma, segundo a qual toda afê
se baseia na única Escritura, sem qualquer intermediário; Cristo encontra-se
aqui representado com as vestes e gestos
clássicos do *retórico+, ou seja, do Mestre, enquanto os apóstolos exibem
características intensamente personalizadas,
escutando a sua Palavra.

OS GRANDES REFORMADORES

Alemães continuam a preferir o de


*Evangelistas+ e uma parte importantíssima do anglicanismo rejeita-o. Por
outro lado, algumas confissões nascidas muito depois da Reforma (Baptistas,
Metodistas) reivindicam a sua
pertença ao *protestantismo+. O
termo e conceito, mesmo quando não
é empre gado pela Igreja, tomou-se
genérico para designar todas as denominações que encontram a sua origem
espiritual na Reforma.
Prescindindo da denominação, é
possível, todavia, estabelecer, como
fez Sclileierinacher, que o protestantismo ou Reforma constitui uma das
formas do cristianismo que se distingue do catolicismo pela,relação entre
crente, Igrçja e Deus: *O protestan@.tismo faz dependem a relação do indivíduo com
a Igreja da sua relação com
beus, enquanto para o catolicismo se
verifica o contrários (Glaubenslehre,
Tar. 24). Se isto é o núcleo simplesmente religioso do qual resultaram
consequências inevitáveis, torna-se,
porém, difícil reconstituir sumariamente a história da Reforma, porque
os acontecimentos que a constituem
não são sempre e unicamente religiosos. A Reforma interferiu com movimentos
políticos e sociais: a acção dos
1 .

principes e soberanos ladeou ou


apoiou com frequência, ou, pelo contrário, hostilizou a dos reforinadores.
A revolta dos cavaleiros na Alemanha
(1522-1523) e, sobretudo, dos camponeses (1524-1525) são acontecimentos
relacionados com a Reforma.
Se a Reforma se encontra toda na
*descoberta do Evangelho ' + efectuada
por Lutero meditando na Epístola aos
Romanos 1, 17, acha-se, todavia,

23

OS GRANDES REFORMADORES

fortemente inserida e determinada


pela história sociocultural e pelas razÕ_(@s produzidas' nas consciências. E
se, post factum após a redacção das
Confissões de @é e sobretudo, do desenvolvimento da Teologia Reformada, é possível
sintetizar teoricamente a sua essência, não é possível
conhecê-la no seu profundo valor revolucionário, se não se lhe lê o acto de
nascimento no seio das vicissitudes
históricas. Os grandes temas fundamentais da Reforma, dos núcleos originais de
Lutero passando pelas experiências dos outros reformadores seus
contemporâneos até Calvino, emergem da experiência imediata, da vida

pessoal, do embate com a realidade


histórica do reformador individual.
Por conseguinte, o lugar vital em
que se toma possível ver emergir cada

24

Simão IV, de Monforte, assalta a cir dade de Tolosa,


baluarte dos Albigenses. Simão, barão de Monforte,
no regresso da expedirão cruzada à
Palestina foi nomeado chefe da
Cruzada contra os
Albigenses, nomeaçao que aceitou
com muitas hesitações, em 1208; em
1215, expulso de
Tolosa, proclamou
a necessidade de
uma nova cruzada
antialbigense e
promoveu o assédio
à cidade, durante o
qual morreu.
@,ez mais clara a consciência religiosa
da Reforma é a própria vida dos grandes reformadores. Cada um deles, em
situações diferentes embora com um
único ponto de partida, desenvolveu,
levou a consequências extremas ou
esclareceu na sua maioria, no embate
com a realidade histórico-cultural, os
elementos portadores da primeira intuição originária. Por esse motivo, a
vida dos reformadores está intimamente ligada à sua intuição religiosa,
pelo que a sua vida se pode dizer não
tanto de teólogos, mas antes, segundo
as palavras de Dietrich Bonhoeffer,
uma *vida teológicas.

2. Martinho Lutero (1483-1546)

Nos séculos XV-XVI, ao contrário


do que acontecia em França, Espanha

11 _ZL

e Inglaterra, onde o Estado sabia fazer-se respeitar pela Igreja, na Alemanha (um
conjunto de estados heterogéneos unificados no Sacro Império
Romano) florescia um próspero mercado de cargas eclesiásticas.

Gravura que representa João Wyclif


(13W-1384).
meiro sacerdote
católico e depois ao
serviço da corte,
que se dedicou mais
tarde ao estudo e
ao ensino, rediindo numerosas
9
obras que constituem toda uma
Summa teológica e
desenvolvendo as
doutrinas que i . nfluenciaram particularmente João
Hus.

OS GRANDES REFORMADORES
O mais antigo documento (datado de
1187, agora conservado nos Arquivos
Municipais de Lião) referente a Pedro
Valdo, abastado negociante daquela cidade, que renunciou a todos os bens para
pregar a pobreza evangélica, poucos anos
tes de Francisco de Assis (118

an 1-1226);
trata-se do testamento do canónico Estêvão de Anse, que deixa em herança à
Catedral de Santo Estêvão <,um forno
pertencente a Vàldo@>. Este último, nascido em Beaujolais, morreu na Boémia em
1205, e os seus seguidores, denominados
< Valdenses+ ou <,pobres de Lião+, formaram uma seita de pregadores laicos que
condenavam a riqueza do clero e reclamavam as traduções da Bíblia em línguas
vulgares; no séc. XVI, aderiram à Refio rnia, aceitando a confissão de fé
calvinista.

Foi este o clima em que o monge


agostiniano Martinho Lutero atacou o
frade dominicano Tetzel, que, nas
praças alemãs, vendia as indulgências, apesar da proibição da permanencia imposta
em vão pelo eleitor da
Saxónia. O padre Martinho, então
professor na Universidade de Vitemberga, não tardou a aperceber-se dos
maleficios que semelhante mercado
roduzia nas consciências populares.
31 de Outubro de 1517, tornou
públicas noventa e cinco proposições
ou teses sobre a questão penitencial,
convidando a uma disputa perante o
público. Um gesto de modo algum
revolucionário, pois tratava-se de uma
maneira de proceder norTnal no mundo
acadêmico da época.
A questão das indulgências não

passou de um pretexto, e o conteúdo


das noventa e cinco teses de Vitemberga prova-o amplamente. Com
efeito, tratava-se já de toda uma dou
25

OS GRANDES REFORMADORES

convento de Vitemberga, onde lhe foi


confiado o encargo de *leitura da
Bíblia+ junto da Universidade local.
Em 1510, teve de se deslocar a Roma
para uma missão da sua Ordem e ficou
profundamente escandalizado com a
relaxação dos costumes do clero. En~
tão, atinou: *Se o Inferno existe,
Roma foi construída em cima dele! +
Foi por estes anos (1509-151 1) que
o teólogo de Vitemberga começou a
ter dúvidas e sentir-se preocupado: o
Deus que lhe fora mostrado era um
Deus terrível, juiz severo, e começou
a procurar um *Deus misericordiosos
(gnadiger Gott).
O agostiniano, reflectindo um pensamento do apóstolo Paulo (*o justo
viverá por fé +, Rom. 1, 17), descobriu

trina da verdadeira contribuição,


oposta à pseudocontrição constituída
pela compra de uma indulgência, e se
toda a vida do cristão deve ser penitência, o facto deve-se a o pecado
representar um mal radicado que
afecta o homem na sua própria natureza.

a) O *Deus misericordioso+ e a *teo- w,


logia crucis+
Ingressado no Convento dos Agos
J.
tinhos de Erfurt (1505), partidário da
teologia de Occam (conciliação entre
a predestinação divina e a responsabi- kr
lidade do homem), discípulo fiel do
vigano-geral da Congregação Alemã,
Joann von Staupitz, que muito o ajudou na sua acção espiritual, Lutero
não tardou a ser transferido para o

26

o *evangelho da graça+, encontrou o


*Deus m isericordioso+ que procurava. No prefácio do primeiro volume
das suas obras em latim (1545), escreveu: *Comecei a compreender que a
justiça de Deus significa aqui a justiça
que Deus exerce, e por meio da qual o
justo vive, se tem fé... o Evangelho
revela-nos a justiça passiva-d-ê'Deus...
Senti-me assim renascer e pareceu-me

ter entrado pela porta escancarada do


Paraíso. A partir de então, toda a
Escritura assumiu um aspecto novo
aos meus olhos.+
Portanto, não interpretava - como
fizera até aí - a justiça de Deus no
sentido filosófico Justiça retributiva,
logo punitiva). Justiça passiva+ significa a justiça gratuita que recebemos

João Hus (1368-1415) predica


na Capela de Belém, em Praga:
(miniatura do códice Jensky do
séc. XV no Museu Nacional de
Praga); ao lado: a Capela de
Belém, em Praga, onde Hus
pregou até 1402, quando teve
de abandonar a cidade; apresentando-se ao Concílio de
Constança, foi excomungado e
condenado àfogueira; em cima
à direita: Jerónimo de Praga,
discípulo de Hus, prepara-se
para subir à fogueira como o
seu mestre, em Constança, a 30
de Maio de 1416 (miniaturada
Biblioteca do Clemêncio, em
Praga).

OS GRANDES REFORMADORES

de Deus, aquela que o homem não


ni@@rèèe" pelas suas obras religiosas.
Essa justiça é misericordiosa, é *justiça de Cristo+ e *justiça por fé+.
Deus manifestou a sua justiça em
Cristo e o homem que crê e se confessa perante Ele como pecador *reconhece que não
há em si próprio
qualquer justiça, mas que a sua única
possibilidade de subsistir reside na
obra redentora de Cristo... Na fé, o
homem reconhece-se incapaz de coií'istar a sal ação... O homem não é
qu v
justificado porque cre, mas por aquilo
que crê+.
Em 1518, teve de se apresentar em
Heidelberga perante o Capítulo da sua

Congregação, onde expôs a sua teologia (Teses de Heidelberga). A especulação


dogmática da tradição escolástica contrapôs a *teologia da cruz+:
a revelação divina só se verifica em
Cristo, e no Cristo crucificado.

27

SÉCS. XVI-XVII

LUTERO ZWINGLI-CALVINO

0@ELANCTON MATTIA FORMULP


i comrnunes+'@ FLACIO Formação das CONSENSU
(1521) confissões de fé HELVETIC,
(VLACIKH)
ILLIRICO das Igrejas Para combater
(1520-1575) nacionais. novidades
Adversário Conflito com as doutrinais
MARTINHO de Melâncton 1 @posições luteranas @@q participam: H.
CHEMNITZ Heidegger,
(1522-1586) Zurique e Fr
@~ra o acordo
Turettini,
Lutero e genebrino
Melâncton originário de L

BUSCA DE MEDIAÇÃO ENTRE


AS DOUTRINAS LUTERANAS E
p@AS DOUTRINAS ZWINGLIANO-CALVINISTAS

ORTODOXIA PROTESTANTE
busca de preferência através
dos *Loci communes+ de Melâncton

ESCOLASTICA REFORMADA-CALVINISTA

ESCOLA ESCOLA
'FUNDAMENTALISMO TEOLOGIA EXEGETICO-
TEOLóGICO BíBLICO SISTEMATICA -FILOLõGICA
-HISTORIOGRAFIC,
método técnico para Exegese bíblica e tem como expoentes
sobretudo com Isaac
compreender as história eclesiástica eni Basileia dois
Casaubon
Escrituras. Afirmação
fornecem à dogmática hebraístas, pai e filho: (1559-
1614), discípu

4E_Lns~_v@@aI os materiais para João Buxtorf (t 1629) de


Teodoro de Béze
defesa do ensino
e João Buxtorf David
Blondel
evangélico (t 1664) (t
1655), dedicados
investi
gações
históri
co-teológicas

@A sobre
as fontes da
antigui
dade cristã

E@@@@ PROTESTAN
ou *Dogmática da Reforma luter
CATHEDRA LUTHERI
GUSBERT JOHANNES MUISE
de Vitemberga VOETIUS COCCESUS AMYRAUT
Baluarte da ortodoxia, cria (t 1676) (1603-1669) (t 1664)
uma escola teológica fazendo defensor do desenvolve a desenvolve
convergir as várias disciplinas calvinismo teoria bíblica largamente a
na dogmática rígido mais livre das teologia da
tradições predestinação
convencionais mas em sentid
moderado

JOHANN GEORG ABRAHAM


GERHA CALIXT CALO
(1582-U. (1586-1656) (1590-1@
acentuz tentativa o mais f,
carácter p ecurnénica e polemi.,
da teole irenista ortodo3

SÉCS. XVI11-XIX

ESCOLA MíSTICA
já presente na pimeira Reforma, adquiriu

ILUMINISMO muita importância, agora com S. Franck,


RACIONALISMO C. Schwenckféld, V. Weigel, Jacob
Bõhme, Paracelso, J. Arndt e o
hinógrafo Paul Gerhardt.

CONSERVADOR RADICAL
Contrapõe à objectivi- Os maiores expoentes.
dade doutrina] da orto- são: João Sal M'
o '10
doxia o valor da expe- Sentler (1725-1791);
riéncia subjectiva, mas iniciador da teologia de
sempre baseada e con- orientação histórica,
trolada no texto bí- distingue entre teologia
blico. Com o roman- e religião, procura um
tismo, actua larga- acordo entre revelalção
mente na teologia e natural e revelação bípiedade protestantes, blica.
com influxos sobretudo Hermann Samuel Reino século XIX. marus (1694-
1768);

principal representante
da tendência mais radícal, que nega toda a

revelação positiva em
nome do naturalismo;
explica a origem do
cristianismo como engano dos discíp ulos
que roubaram o corpo
de Jesus e difundiram a
fábula da ressurreição.

ESCOLA ESCOLA
RACIONALISTA SUPERNATUsegue a Bíblia, mas RALISTA
interpretando o con- entende a religião
teúdo segundo as ca- como um conhecitegorias da razão; é mento da realidade
representante dessa invisível; limita a raorientação Emanuel zão em nome
da fé,
Kant, corri o seu es- demonstra a necessi@n_tj.-'A Religião nos dade e realidade
da
Limites da simples revelação bíblica com
Razão. motivações racionais,
mantendo-se sempre
na esfera duminista.

PIETISMO
Movimento interconfessional e internacional, que
atinge a literatura mística no século XV11;

OS MESTRES

João Arndt (t 1621), escritor místico, contrapõe a


viva experiência pessoal do Senhor e a experiência
mística de Cristo à doutrina dos teólogos.

João Labadie, ex-jesuíta francês, considerado 01


iniciador do pietismo na Alemanha.

Gijsbert Voet (Voetius) (t 1676), iniciador do pietismo nos Países Baixos, depois
difundido na
Alemanha do Norte e Ocidental.

Gerhard Tersteegen (1697-1769), compôs numerosos hinos de profundo sentido místico,


ainda hoje
cantados nas igrejas evangélicas, que serviram,
com os escritos teológicos, para tornar o pietismo
num grande movimento interconfessional.

AS ESCOLAS
Escola de Filipe Jacob Spencer (1635-1705),
funda os Colegía pietatis; com a obra Pia desider ia, promove a meditação da
Bíblia, menos disputas, mais assiduidade à prece e predicação menos
escolástica e mais prática.

Escola de Augusto Herniann Francke (1663-1727),


insiste na *conversão+; professor em Halle, imprime às lições um carácter
edificatívo e antipolémico, embora fundasse a primeira revista exegética
Observationes biblicae; muito activo, funda escoIas para os pobres, a escola
citadina, o orfanato, o
instituto bíblico, uma tipografia, uma livraria e
urna farmácia.

Escola de Godofredo Arnold (t 1714), de tendênia radical separatista das Igrejàs,


sustenta que a
verdadeira piedade não se encontraria Igreja, mas
entre os hereges de todos os tempos.

Escola de Nicolau L. Zinzendorf (1700-1760),


criador de um novo tipo de pietismo; muito mais
devoto e místico-personafista, é o restaurador da
Ordem dos Innãos Moravos.

OS GRANDES REFORMADORES

Não se chega a Deus através de uma


*analogia do ser+, entre Natureza e
Criador. *Não é digno de ser chamado
teólogo quem considera as realidades
indivisíveis de Deus compreensíveis
por meio das realidades verificáveis,

mas quem compreende as realidades


visíveis e perceptíveis de Deus na
perspectiva da Paixão e da Cruz. + Na
Cruz de Cristo, Deus revela-se de
forma oculta, contraditória (Deus absconditus sed revelatus). A teologia da
Cruz, contraposta à theologia gloriae,
não é uma teologia particular, um dos
muitos temas doutrinais, mas *a sede
da verdadeira teologia+: *A verdadeira teologia e o conhecimento de
Deus encontram-se em Cristo crucificado... Jesus crucificado faz-nos crer,,
num Deus omnipotente na sua impotência, e só assim nos apresenta Deus
como Deus. +

30

Pormenor do estudo de Erasmo de Roterdão (t 1536) na sua residência em Bruxelas;


humanista e teólogo, aderiu às
instâncias da Reforma e teve relações com
Lutero, sobretudo na controvérsia sobre o
-livre+ e *servo arbítrio+, mas em breve
se destacou; tio entanto, com a publicação
do texto grego da Bíblia (1516), Erasmo
tornou-se involuntariamente um dos principais pilares da Reforma.
b) Só a Palavra de Deus e Cristo
A situação é delicada sob qualquer.
perfil. O papa Leão X foi colocado
perante a alternativa: exigir a cabeça
do agostiniano rebelde rompendo definitivamente com a Alemanha e fazendo assim o
jogo da casa de Habsburgo ou ceder no *caso Lutero+,
apelando assim para o nacionalismo
germânico para impedir a eleição do
sobrinho de Maximiliano de Austria.

rr sa #no

Então, o papado dos Médicis, para


conquistar o eleitor da Saxónia, Frederico, o Sábio, sincero protector de
Lutero, embora já tivesse declarado
herege e convidado a apresentar-se em
Roma o teólogo agostiniano, aceitou o
seu desejo de o fazer encontrar-se na
próxima Dieta de Augusta com o cardeal delegado Tomás de Vio, dito o
Caíetano. O colóquio realizou-se no
palácio augustano dos banqueiros
OS GRANDES REFORMADORES

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V

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*e ou
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Em cima: o célebre e realista retrato de


Lutero, pintado por Lucas Cranach e conservado nos Uffizi de Florença. Em cima,
à direita: a Missa Alemã de Lutero na
edição de 1545: nota-se como ele, durante
muito tempo, embora excluindo o carácter
sacrifica da missa, conservou em grande
parte o velho rito, ainda que em língua
alemã, mas mantendo a denominação
(como, neste caso, o Agnus Dei) antiga
dos textos do Proprium. Em baixo: um
escrito de Lutero sobre São João com a
assinatura do reformador: Martinus Luther-manu propria.

Fugger, porém, o resultado foi negativo: Lutero não se retractou. Por um


tempo, estabeleceu-se silêncio sobre o
assunto: eram demasiado fortes os interesses políticos em jogo acerca de
acordos entre a sé apostólica e a corte
eleitoral saxónica. Um emissário da
primeira, Carl von Miltitz, em nome
do próprio Leão X, numa conversa
com Lutero, definiu toda a questão
num equívoco.

31

OS GRANDES REFORMADORES

à~

Por seu lado, o pontífice não perdeu


tempo: assinou acordos com o novo
imperador Carlos V e, entre eles, figurava a cabeça de agostiniano.
Este, juntamente com o colega
Carlostadt, enfrentou num debate público em Lípsia (27 de Junho-16 de

Julho de 1519) o dominicano Johannes von Eck, que o acusou de perfilhar


as teses do herege Hus, já condenado
pelo Concílio de Constança, relativas
à interpretação das Escrituras. Lutero
reconheceu a validade da acusação: se
o papa se mostrava contra a Escritura,
era, portanto, o Anticristo, porque o
único tesouro para a Igreja e o crente

Affil

32

Li

consistia na palavra de Deus, o Evangelho. Eck defendeu a imagem de


uma Igreja triunfante que se identificasse no reino de Deus e Lutero replicou com a
sua teologia da Cruz. Recordou-lhe que na Bíblia não se falava
da superioridade do pontífice, nem,
ainda menos, da Igreja, quer fosse de
Roma, quer de Jerusalém: o primado
papal era negado e rejeitado nas raízes. *Por esse motivo, a palavra de
Deus é predicada e acreditada em toda
a parte, reside aí a verdadeira fé, a
pedra irremovível, e onde está a fé
encontra-se a Igreja. Assim, apenas a
fé contém em si tudo o que se espera

A cidade de Vitemberga numa estampa do séc. XVI


(em cima); aqui, a
31 de Outubro de
1517, Lutero afixou
na porta do castelo
as teses sobre as
indulgências. Em
Vitemberga, teve
colaboradores em
personalidades
como Justus Jonas,
Melâncton e João
Bugen hagen (em
baixo, à esquerda).

dela: as chaves, os sacramentos, a


autoridade e todas as outras coisas. + E
acrescentou: *... não sei se a fé cristã
pode tolerar na Terra um chefe da
Igreja universal que não seja Cristo. +
E concluiu: *Todo o sacerdote no

momento da morte e em caso de


necessidade é bispo e papa, dispondo
de plena autoridade sobre os penitentes que se confessam, como sucede
em toda a Igreja... pelo que nem o
papa nem o bispo são superiores aos
presbíteros por direito divino.+

c) A liberdade do cristão
Este caso religioso acabou por exceder os limites germânicos, para assumir as
dimensões de uma verdadeira
questão europeia. Entretanto, o papa
Leão X, com a bula Exsurge Domine
(15 de Junho de 1520), ameaçou Lu
OS GRANDES REFORMADORES

tero com a excomunhão e este respondeu queimando-a em público.


A polémica bíblico-teológica de
Lutero com a Igreja Romana tomou-se
feroz. Foram postos em causa o conceito de sacerdócio universal do
crente, a existência de um único
Evangelho, um só baptismo e uma
única fé, a não-infalibilidade do papa
em matéria doutrinal, a negação de a

Uma minitura do séc. XVI contida na


Bíblia de Lutero, em Londres, na Bible
Society, exprime uma poderosa alegoria
contra o papado e a Igreja de Roma,
imaginados como um dragão que exibe a
tiara papal, enquanto os reformadores lhe
impedem o acesso à Igreja; é uma tradu~
ção imaginativa de uso popular das invectivas antipapais e anti-romanas que se
tornaram cada vez mais ferozes nos últímos dias da vida de Lutero.

OS GRANDES REFORMADORES

Igreja ser a única e verdadeira intérprete e guarda da Bíblia que todos


podiam interpretar: era o *exarne livre+, a *rejeição do celibato dos padres
imposto por lei, o cancelamento
das sanções do Direito Canónico - em
particular, a excomunhão -, porque
*é culpa muito mais grave calar e

descurar o serviço e a palavra de Deus


do que destruir vinte papas de uma só
vez+

d) A comunidade dos santos


Lutero afirmou rigorosamente que a
essencia da Igreja não era dada pelos
seus membros, mas pela palavra viva
de Deus que a gerara. Ela fazia dos
crentes a comunidade, ou seja, uma
*santa congregação dos fiéis+, porque, segundo o Novo Testamento, *eu
chamo santo a todo o baptizado,
mesmo correndo o risco de ser desiludido+.

34

O núcleo da questão
amplo contexto das lutas confessionais do século XVI - consistia em
reconhecer qual era a verdadeira
Igreja, individualizando-lhe as características (as notae ecclesiae). A Confissão
de Augusta (1530) - redigida
por Melâncton, Lutero e outros teólogos, confissão de fé ainda hoje de
todas as Igrejas Luteranas - define a
Igreja como *a comunidade dos santos, em que se ensina o Evangelho
puro e administram correctamente os
sacramentos+. A estes dois sinais distintivos, Lutero acrescentou, de certo
modo, outro: a disciplina, como adesão
existencial coerente à mensagem
evangélica.
No livro Sobre o Cativeiro Babilónico da Igreja, ele põe em causa todo
o sistema.sacramental, portanto, eclesiológico (concepção e estrutura da
Igreja), da teologia católica. Assim, a

no mais

missa não é um sacrifício nem uma


obra boa, mas uma promessa divina
com vista à remissão dos pecados. Os
sacramentos instituídos por Cristo não
são sete (eucaristia, baptismo, penitência, crisma, casamento, ordem e
extrema-unção), mas apenas dois:
@aptis _w, e santa ceia.-Os sacramentos
não são algo de mágico ou obras boas
a cumprir: um testemunho da atitude
carinhosa de Deus nas confrontações
dos crentes. Estes *actuam, não por
meio de poder próprio, mas pela força
da fé, sem a qual não valem nada...
Estabelece-se, portanto, que a Igreja
não pode prometer a graça, que só se
acha ao alcance de Deus, nem instituir
sacramentos+.
Na Santa Ceia, através das palavras

Os príncipes eleitores da Saxónia, Frederico, o Sábio, e João I, numa pintura de


Lucas Cranach nos Uffizi de Florença;
foram repetidamente envolvidos nos agitados acontecimentos que assinalaram a

primeira actividade de Lutero e depois nas


dificuldades de entendimento entre este e
os outros reformadores. Em baixo: a casa
de Lutero, em Eisenach, hoje em território
da República Democrática Alemã

OS GRANDES REFORMADORES

de Cristo *<o meu corpo oferecido a


vós é disperso pelo perdão dos pecados+, Mateus, 26, 26 seg.) *sornos
perdoados dos pecados, vida e salvação e é-nos dada vida e salvação+. No
entanto, o comer e o beber não conseguem isso, mas a palavra de Cristo.
*Estas palavras, juntamente com o
acto material de comer e beber, constituem uma parte principal do sacramento. +
Lutero rejeitava assim a doutrina católica da transubstanciação
(transformação material do pão e vinho no corpo e sangue de Cristo) a
favor do conceito de consubstanciação (presença real, mas espiritual de
Cristo nos elementos).

e) *Vencido pela consciência+ e prisioneiro da Palavra


Roma não tolerou mais, e da
ameaça passou aos factos. Com a bula
Decet Romanum Pontificem (3 de Janeiro de 1521), Leão X excomungou
o frade rebelde e os seus seguidores.
Frederico, o Sábio, e os outros
prin cipes favoráveis à Reforma convidarem Lutero à Dieta de Worms
(Abril de 1521), convocado por Carlos V. Todavia, ele já quebrara todos
os laços: não retractou nada.
Para Lutero, era o fim. Contudo, no
caminho de regresso, o eleitor da Saxónia salvou-o, fazendo-o raptar pelos
seus homens e encerrar no castelo de
Vartburgo, perto de Eisenach (Maio
de 1521-Março de 1522).

f) A ética do testemunho
Em toda' esta situação, Lutero mostrou-se coerente e consequente com o
que anteriormente ensinara e escrevera.

35

OS GRANDES REFORMADORES

Se o homem é, pela fé em Cristo,


uma nova criatura, a sua conduta moral quotidiana é submetida ao juízo do
Senhor. E não se trata de ser melhor
que um que não é crente, porque com
frequência sucede o contrário. Por
outras palavras, não se trata de seguir
uma ética filosófica ou natural humanista com vista à formação do homem
bom e virtuoso: isso significaria divinizá-lo, colocar a criatura no lugar do
Senhor. Importa, ao invés, obedecer

- na fé - aos mandamentos de
Deus, expressão de reconhecimento
do crente pela obra de salvação divina
em Cristo. E a acção moral não termina, pois, na salvação (Deus apenas
a opera), mas no amor para com o
próximo.
Da fé emana uma ética de liberdade
36

ILL

A esquerda: U1rich Zwingli (1484-1531),


que introduziu a Reforma na Suíça, independentemente da Reforma luterana e de
forma mais radical, introduzindo em Zurique (na página à direita, numa estampa
da época) a Reforma evangélica. Quase
simultaneamente com as Reformas luterana, zwingliana e calvinista, dífundiu-se
na Europa o *anabaptismo+: um representante típico deste amplo movimento nos
Países Baixosfoi João de Leida (em cima,
à direita).

responsável, uma ética individual ao


serviço da colectividade civil e religiosa, por se basear no primeiro mandamento
*<ama o Senhor, o teu Deus,
como tudo de ti próprio+) e dirigir ao
segundo (*ama o próximo como a ti
mesmo+).

g) A Lei e o Evangelho
A lei exige sempre alguma coisa do
homem, ao qual mostra - sem possibilidade de solução positiva - a sua
finidade após o acto de rebelião do
homem a Deus. É a lei natural da qual
fala o apóstolo Paulo (Rom. 2, 14-15)
e de que existem duas utilizações possíveis: uma civil ou política - manter
a ordem e a paz na sociedade - e
outra teológica ou espiritual - o Decálogo.

OS GRANDES REFORMADORES
,Afivelar
. ....... .

h) O *livre+ e o <,servo arbítrio+


Os anos fatídicos de 1524-1525 não
são recordados apenas pela reprovável
chacina de Franckenhausen, mas também pela disputa sobre a liberdade ou
servidão da vontade humana desenrolada entre Erasmo de Roterdão, por
um lado, e Martinho Lutero, por outro. O primeiro (1469-1536), que, por
cultura, era um cosmopolita, tornou
posição nas confrontações do reformador alemão, recorrendo agudamente como
argumento de controvérsia à questão do livre ou do servo

arbítrio e escreveu De libero arbitrio,


diatriba sive collatio (1524).
Depois de participar na Disputa de
Lípsia, Erasmo expôs uma antologia
de textos que falavam a favor do livre
arbítrio, de outros que o negavam e
acabou por indicar um *caminho intermédio+ entre as teses opostas.

Lutero, por seu turno, era um homem lutador e de ruptura. Assim,


replicou imediatamente e sem meios
termos, a Erasmo: em princípios de
1526, escreveu De servo arbitrio, que
era sobretudo um tratado de teologia
bíblica. Rejeitando a tradição dos Pais
da Igreja (que o opositor se intitulava)
e rebatendo energicamente o princípio
da *única Escritura+, discutiu e examinou os argumentos erasmianos favoráveis ao
livre arbítrio e contrários
ao servo arbítrio, chegando à refuta~
ção do primeiro.
Segundo Lutero, Deus, o Criador,
actua através e por intermédio dos
homens, que são máscaras (larvae) e
com os quais não se confunde. Em
Cristo, realiza a verdadeira e autêntica
Humanidade. Ao revoltar~se contra a
vontade divina, o homem precipita-se
numa condição de pecado, recolhen
37

OS GRANDES REFORMADORES

do-se em si e perdendo de vista tanto


Deus como o seu semelhante (amor
sui). Daí resulta que, perante o seu
Criador, a vontade do homem deixa
de ser livre; já não é dono de si
propno. É escravo de Deus ou do
Diabo: não existe uma vida intermédio
(tertium non datur). Ainda mantém o
uso da razão, das faculdades intelectuais, mas trata-se de um uso distorcido,
corrompido, e pode recuperar a
sua humanidade somente no acto justificativo de Deus em Cristo. Aí, reencontrar-se-
á a si mesmo, Deus e o
outro homem. Mas, apesar disso,
continuará a ser - até ao segundo e
definitivo regresso de Cristo à Terra
simultaneamente justo e pecador.

i) *Quem crê nele tem a vida+

38 Entre inúmeras polémicas e com


A esquerda: retrato de João Calvino e, ao
lado, de Guilherme Farei (t 1565), que
convidou o primeiro a Genebra, depois de
ele próprio ter iniciado a predicação,
obrigando Calvino a aceitar a organização da Reforma na cidade; (em baixo: o
lago Lemano ou de Genebra em 1588,

ir

numa aguarela de uma estampa de João


Villard, no Museu da Reforma de Genebra). Em cima: Teodoro de Béze
(1519-1605) teve grande importância em
Genebra no desenvolvimento e organização do calvinismo dirigindo a Academia
Teológica.

OS GRANDES REFORMADORES

vromissos, Lutero continuou a trabaihar activamente para uma renovação


real e efectiva da Igreja, mas uma
renovação cautelosa e progessiva: na
realidade,. desaprova o radicalismo
eclesiológico de Carlostadt.
Para além das Reformas deste últímo, não agradava a Lutero a Igreja
de povo, de massa. Residia precisamente aqui a polémica algo áspera mas
gradualmente temperada e menos
intransigente (1536) - nas confrontações dos Anabaptistas, que propugnavam uma
Igreja de povo, enquanto
para Lutero era fundamental a relação
do indivíduo com Deus, e chegou a
propor a criação de uma comunidade
evangelicamente autêntica no seio de
1 .

uma unica Igreja. Uma Igreja ao lado


de outra Igreja - como queriam os
Anabaptistas - não podia subsistir,
era ilegítima: uma única era a Igreja
de Cristo.
Na idade avançada, acentuou-se em
Lutero o espírito anti-romano, o qual
se traduziu em vários escritos sobre o
papado e os concílios: Acerca dos

Concílios e das Igrejas, 1539; Contra


o Papado de Roma, 1545. Entretanto,
tomando-se impossível convocar um
concílio geral, Carlos V promoveu
colóquios de religião em torno da
questão da unidade da Igreja (Worms
e Rafisbona, 1540-1541), em que tomaram parte os teólogos mais moderados de ambos
os lados. Todavia,
tanto Lutero como Roma ignoraram as
conclusões.
Em 1546, Lutero extinguiu-se. Faleceu a 18 de Fevereiro, depois de ter
pregado longamente. Os mais próximos dele ouviam-no repetir com frequência o
versículo do salmo: *Nas

39

OS GRANDES REFORMADORES

Em cima: a taça usada por Calvino, por


ele doada a Laurent da Normandia, seu
executor testamentário, e agora no Museu
da Reforma de Genebra. Em baixo: a
Catedral de São Pedro, em Genebra já
catedral católica, depois centro de predição de Calvino, que no período da
introdução da Reforma na cidade, tinha leccionado no vizinho Oratório.

010

%
40

tuas mãos, Senhor, confio o meu espírito.+ Era o que encerrava diariamente o ofício
divino na prece das
completas. Conseguiu ainda recitar o
versículo evangélico: *Deus amou
tanto o mundo, que deu o seu Filho
unigénito para que cada um que crê
nele não morra, mas tenha vida
eterna+ (João, 3, 16). Era o *Deus
misericordiosos que toda a vida procurara.

3. Carlostadt (1480 aprox,1541)

Assim chamado do nome da localidade de KarIstadt, onde nasceu


embora o verdadeiro nome fosse André
Rudolfo Bodenstein -, ainda que tivesse um papel secundário na história
da Reforma luterana, revestiu-se de
importância em virtude de algumas
posições extremistas através das quais
contribuiu para todo o movimento reformador com ideias um tanto geniais.
Criticamente independente de Lutero - com o qual não partilhava
alguns aspectos teológicos, corno a
rejeição para incluir entre os escritos

tola de Jaime (relação entre as obras e


a fé) -, ao contrário dele, quis levar
até às últimas consequências os princípios da Reforma. Acalentava, por
outro lado, a convicção de praticar a
Reforma em conformidade com as
autoridades citadinas. Por conseguinte, influenciou notavelmente o famoso
Regulamento da Cidade de Vitemberga - aprovado em Janeiro de
1522 pelo Conselho citadino -, com
o qual o movimento reformador da
cidade alemã deu importantes passos

=-M
à

A assembleia de pregadores reformados


de Antuérpia, em Abril de 1567, enquanto fala João Salinger; como a Reforma se
originou em lugares e ambientes
diversos e dado o princípio do exame livre
da Escritura e a rejeição de uma autoridade doutrinal normativa, as assembléias
dos pregadores eram frequentes e muito
importantes para confrontar as várias posições com base na interpretação da
Escritura.

em frente. Mas o seu pensamento


teológico mais original definiu-se
quando se deslocou a Orlamunde, na
Saxónia, como pastor, onde permaneceu dois anos. Acentuou o aspecto
interior da experiência da fé, depreciou todos os aspectos exteriores da
vida cultural e litúrgica, considerando
a Escritura autoridade não exterior,
negou aos elementos eucarísticos (pão

OS GRANDES REFORMADORES

e vinho) a presença real de Cristo,


conferindo a este sacramento um significado puramente simbólico; os movimentos
cultuais revestiram-se de
carácter requintadamente espiritual; a
comunidade cristã - actuando sob a
égide do Espírito divino - apresentava uma dimensão totalmente laica:
todos eram iguais, pelo que qualquer
forma de distinção era eliminada, e o
sacerdócio universal interpretado no
sentido de uma *laicidade universal+.
Carlostadt aplicou estes princípios à
localidade saxónica, estabelecendo o
alarme junto da própria corte da Saxónia. O grande eleitor, em Setembro de
1524, baniu-o e, com a sua partida,
terminou a Reforma de tipo espiritualista de Orlamunde, a mais ousada das
que até então se haviam tentado.
Simultaneamente com a sua Re
41

OS GRANDES REFORMADORES

Em cima: retrato de Henrique VIII, de


Holbein; com o Acto de Supremacia, declarou o rei chefe da Igreja de Inglaterra.
Os seus opositores foram decapitados,
como Tomás Moro. Em baixo: a Torre de
Londres, onde eram dependuradas as cabeças dos executados (quadro de C. J.
Voscher).

5-9 L42

forma em Vitemberga, desenvolveu-se no povo um furor iconoclástico, que conduziu à


destruição de
imagens e invasão de igrejas. Participaram nesses actos os chamados
*profetas de Zwickau+, expoentes de
um grupo sectário radical muito activo

naquela localidade (Lutero chamava_lhes *os profetas celestes+): Nicolau


Storch, Tomás Drechsel, Marcos
Stübner. Em Vitemberga, realizou-se
um encontro com os principais colaboradores de Lutero - Melâncton e
Nicolau Amsdorf -, que expuseram
as suas concepções bíblicas, em particular a rejeição do baptismo das crianças.
As suas concepções teológicas, solidamente fixadas ao terreno bíblico,
eram particularmente influenciadas
por categorias apolítico-escatológicas:
viviam-se agora os <@últimos tempos+.
O humanista Melâncton que se

Em cima: Tomás Cromwell, chanceler do


Reino, nomeado por Henrique VIII <, vigário-geral nas questões eclesiásticas+, foi
o
mais zeloso colaborador do rei na aplicação do Acto de Supremacia.

Quadro alegórico
que representa
A
Eduardo VI, ainda
rapaz, o qual, sob a
inspiração do pai
moribundo, Henrique VIII, teve a coragem de rejeitar
as pretensões do
papa (National
Portrait Gallery de
Londres).

comportou com sensatez na ocasião


- era demasiado jovem e inexperiente para poder sustentar uma confrontação com os
*profetas celestes+.
Após uma visita secreta a Vitemberga,
em Dezembro de 1521, Lutero voltou
à localidade, oficialmente, em Março
de 1522.

4. Tomás Müntzer (1488/


11489-1525)

Também padre, seis anos mais


novo que Lutero, era um intelectual
problemático e irrequieto. Pároco em
Zwickau, teve contactos com Storch
- um dos três *profetas+ a que já
aludimos -, por cujas ideias não

tardou a deixar-se conquistar. Convenceu-se de que os Eleitos tinham


recebido directamente de Deus o seu
Espírito, para se identificarem com o
*Cristo vivo+, *interior+ ou *espiritual+. Por esse motivo, a Escritura foi
relegada para segundo plano, porque a
palavra de Deus era transmitida ao
eleito através do Espírito. A estas

OS GRANDES REFORMADORES

fli

ideias espiritualistas, juntou-se um


acontecimento decisivo para Müntzer:
o encontro com os operários têxteis.
A partir de então, a sua predicação
assumiu tons escatológico-sociais e
começou a cansar. O Conselho citadino de Zwickau expulsou-o e ele
recolheu temporariamente à Boémia,
para depois regressar à Alemanha
como pároco de AlIsted, onde se dedicou aos estudos e escreveu uma liturgia em
língua alemã. A sua predicação
dominical era muito frequentada por
operários e mineiros. Consagrou-se a
uma actividade intensa, disposta a repetir a experiência de Praga, onde
assumira o papel de *mensageiro de
Cristo,+. Depois, fundou a Liga dos
Eleitos e, em 1524, escreveu um panfleto sobre o baptismo, contra Lutero:
distinguia entre um baptismo interior e
outro exterior, que ele rejeitava; convidou os príncipes alemães a revoltarem-se em
Roma e no Império. O
grande eleitor tomou o seu tempo:
consultou Lutero, que o aconselhou a
contemporizar, mostrar-se extremamente prudente. Não obstante, MÜnt
43

OS GRANDES REFORMADORES

Tomás Cranmer, dedicado ao rei Henrique VIII e, em 1532, eleito arcebispo de


Cantuária, declarou nulo o casamento do
monarca com Catarina de Aragão, após a
rejeição do papa Clemente VII de reconhecer a invalidada, depois de abençoar

secretamente, alguns meses antes, o novo

enlace com Ana Bolena; Cratimer redigiu


os primeiros quarenta e dois artigos de fé
da Igreja Anglicana e o primeiro Book of
Common Prayer, texto oficial de prece e
formulação dos dados de fé da própria
Igreja.

zer insistiu e, em Julho de 1524,


passou à ofensiva: declarou chegada a
hora de os tiranos serem eliminados
fisicamente, para instaurar o reino
milenário de Cristo, um reino de justiça. Pela calada da noite, deslocou-se
a Mühlhausen, cidade em desenvolvimento, mas conseguiu um séquito
reduzido e um tanto fanático. A sua
revolução armada eclodiu, todavia
não tardou a ser sufocada, e o padre
revolucionário viu-se forçado a fúgir.
Dirigiu-se a Nuremberga, onde entrou

44

em contacto com um futuro chefe


anabaptista, Gans Denck, e escreveu
dois violentos ensaios antiluteranos: a
fé de Lutero era *falsa+, porque Cristo
podia escolher os seus mesmo entre
quem não conhecia. Regressou a
Mühlhausen, arvorou-se em chefe dos
grupos de camponeses, mal armados e
desorganizados, da Turíngia, e tornou-se o seu *profeta-guerreiro+. Na
batalha de Franckenhausen foram literalmente chacinados (cerca de cinco
mil) e Tomás Müntzer - capturado
após uma tentativa de fuga - decapitado em Maio de 1525.

S. UIrich Zwingli (1484-1531)

Também na Confederação Helvética a situação religiosa era muito


tensa entre os séculos XV e XVI,
embora de maneira diferente da Alemanha. Na Suíça, existia um governo
democrático, e o poder civil nas cidades e províncias interessava-se directamente
pela vida da Igreja.
O humanismo e o Renascimento
difundiram-se no país, como em toda
a parte. Em Basileia, em particular,
onde Zwingli foi estudante universitário, cidade do Concílio que não
chegou a terminar, em que Pio 11 introduziu o pensamento humanista, e
ponto de encontro entre o Renascimento italiano e o humanismo germânico, além de
centro editorial já particulannente activo. E o reformador
suíço foi profundamente um humanista. Foi também este o motivo que o
levou a decidir-se pela Reforma, ao
contrário de Lutero, que o fez através
de um profundo trabalho interior tipicamente religioso.

Zwingli sofreu muito a influência


de Erasmo de Roterdão, por um lado
e, por outro, mostrou-se até ao fim
profundamente patriota.
Foi capelão militar das tropas suíças, a soldo dos exércitos de toda a

Europa. Viveu com pessoas que


aprendeu a conhecer. Era uma ocupação brutal e que embrutecia. Acabou
por condenar em bloco o serviço mercenário, inclinando-se para o pacifismo
erasmiano, e foi essa uma das
suas primeiras medidas de reformador.

OS GRANDES REFORMADORES

Isabel I de Inglaterra, na pintura de


Frederico Zuccari,
na Pinacoteca Nacion al de Siena;
Isabel subiu ao
trono em 1558,
após o reinado de
Maria, que tentara
uma restauração
4 católica; Isabel,

política prudente,
restabeleceu, com
um novo Acto de
Supremacia, as leis
sobre a ordenação
eclesiástica que
Maria abolira.
Culto puritano no
claustro da Catedral de São Paulo,
em Londres, numa
pintura de cerca de
1620; o puritaismo foi uma
reacção a m undanização da Igreja,
sobretudo depois
das intervenções
restauradoras de
Isabel I.

45

OS GRANDES REFORMADORES

A esquerda: o Concílio de Trento,


numa pintura de
A escola veneziana do
sec. XVI no Lou
I vre. A direita: a
destruição de está
tuas e relíquias
numa igreja cató
lica destinada a ser
transformada em
templo reformado.

Depois de desenvolver em várias


comunidades o ministério pastoral,
em 1518 tornou-se pároco da catedral
de Zurique e, no princípio do ano
seguinte, inaugurou a sua actividade.
Partiu para uma compreensão da
mensagem evangélica diferente da
católica; aboliu o celibato eclesiástico
e o jejum; declarou nula a missa e
mandou retirar das igrejas relíquias de
imagens sagradas. Estas práticas do
catolicismo seriam substituídas por
formas novas:' no centro do momento
cultual, situou-se a predicação da palavra de Deus. O Conselho citadino
declarou-se plenamente de acordo
com o reformador e, entre 1522 e
1525, Zurique tomou-se uma cidade
reformada.
A Reforma assumiu aí aspectos
mais radicais que em Lutero, com o
qual, de resto, Zwingli não estava de
acordo. Lutero, unicamente preocupado com uma mensagem religiosa e
pouco interessado nas instituições, era
um profeta e não na verdade um reformador. Zwingli, por seu turno, era
o reforinador de tipo tradicional, o
eclesiástico totalmente dedicado à de
46

Ao contrário da Alemanha e Suíça,


onde foram utilizadas as igrejas já
católicas, em países que permaneceram com maioria católica os
Evangelistas arranjaram maneira
de exprimir melhor, arquitectonicamente, os conceitos teológicos da
Reforma: aqui, por exemplo, no
templo reformado de Lião, por
volta de 1560, nota-se a centralidade da predicação no púlpito que
domina solenemente a aula redonda, em torno da qual está disposta a assembléia ou
comunidade,
e é, como tal, tema de culto único e
essencial.

OS GRANDES REFORMADORES

puração e simplificação dos órgãos


religiosos e práticas da piedade, com
ajuda da Igreja se possível ou, de
contrário, com o apoio do Estado.
O seu pensamento foi resumido na
obra fundamental Commentarius de
vera ac falsa religione (1525): a Bíblia é um testemunho em tomo de
Cristo (regula Christi) e guia tanto na
vida eclesiástica como na temporal; a
filosofia deve estar ao serviço da teologia; Deus governa o mundo com a
sua providência, com acção constante

e imediata em todas as esferas da vida;


o Espírito Santo também se pode manifestar fora da predicação evangélica,
revelando-se igualmente aos pagãos; o
sacramento da Santa Ceia tem carácter
simbólico (e isto em contraste com
Lutero); a fé é confiança absoluta na
graça justificativa de Deus. A sua
teologia é, em última análise, cristocentri cá (ou seja, centrada na pessoa e
obra de Cristo): Jesus Cristo é * guia e
capitão+ do povo de Deus, que lhe
deve obediência. Assim, a obediência
às autoridades civis não é condicionada: as que não se mostram fiéis a
Deus são destituídas.
Mas também uma teologia centrada
na acção do Espírito Santo: este é uma
das três pessoas que constituem a
Trindade, manifestou-se como Espírito *criador+ do Pai e *enviado+ pelo
Filho. Graça, fé e palavra de Deus são
sinónimos de Espírito Santo e a Igreja
criação, viva do Espírito divino.

6. João Calvino (1509-1564)

O terceiro grande centro europeu


que aderiu à Reforma foi Genebra.
47

OS GRANDES REFORMADORES

Os conflitos entre
católicos e reformados não se limitaram aos religiosos e teológicos e
assumiram formas
extremas de lutas
cruéis, em defesa
de direitos e bens,
mas também por
motivos mais directamente políticos dada a mentalidade da época, que

tença religiosa com


identificava a per
a política.

48

Em cima, à esquerda: chacina de protestantes em Ca,


hors, na casa de Cabrière,
(1561); no centro, à esquerda: execução do governador de Valença por parte
dos reformados, em Abril
de 1562; em baixo, à esquerda: execução de nobres
e burgueses reformados em
Bruxelas, em Junho de
1568; em cima, à direita:
batalha de Conhaque entre
católicos e reformados em
Janeiro de 1568; em baixo,
à direita: condenação dos
conjurados de Amboise.

OS GRANDES REFORMADORES
p;
Tereza, f@@

49

OS GRANDES REFORMADORES

Esta ainda não fazia parte da Confederação, mas era independente; uma
cidade em crise, que tentava esquivar-se à hegemonia da dinastia dos
Sabóias, assim como à francesa de
Francisco 1. Nessa conformidade, encarava Berna com uma esperança
mesclada de receio. Vivia uma situação internacional económica e politicamente
crítica. Era centro comercial
europeu de particular importância,
onde se perfilava o advento de uma
nova classe, mercantil e capitalista,
empreendedora, que superava a pequena nobreza genebrina e a çorte do
bispo-conde. Juntava-se a tudo isto
uma componente religiosa: por um
lado, artesãos e mercadores mostravam-se sensíveis ao protesto luterano
e exigiam o regresso à mensagem
evangélica na sua pureza, assim como
à sua liberdade de predicação e a
novas formas de vida religiosa; por

outro, o elemento religioso apresentava uma dimensão política que abarcava os


homens como o povo, a vida
interna da república e as relações intemacionais.

Genebra, que aderiu à Reforma em


1535, era, além disso, uma cidade
com os costumes morais sem dúvida
não dos mais irrepreensíveis da época.

Duas personagens respeitáveis iniciaram lá uma predicação evangélica:


Guilherme Farel e Pedro Viret, que
abriram o caminho a um jovem advogado francês, humanista, forte e fecundo pensador,
homem ponderado e
angustiado, que viveu a sua conversão
não de uma forina explosiva, como
Lutero, mas com maturação interior
gradual e profunda.

50

A direita: a chacina da noite de São Bartolomeu (23 de Agosto de 1572)figura entre


os
factos mais bárbaros das guerras religiosas;
mais que de motivos puramente religiosos,
tratou-se da explosão de rancores pessoais
dinásticos entre os Guisas e os Châtillon e os
Valois e os Borbons; contra a vontade de
reconciliação de Catarina de Médicis e na
sequência do assassínio de Gaspar de Colign@v (em cima), Carlos IX acedeu à organ
ização da chacina dos huguenotes, a que se
seguiram outras nas províncias.
Nas páginas seguintes: Henrique IV, rei de
França, renuncia à Reforma na Basilica de
São Dinis, a 25 de Julho de 1595; ao longo
de dez anos, esforçou-se por tomar Paris,
mas os católicos impediam-no de assumir a
sucessão em virtude da sua religião; decidiu
então obter com a mudança de religião
que não conseguira com a política: *Paris
vale bem uma missa!+, declarou.

a) *Não te pocures a ti mesmo, mas a


Cristo+
Profundo conhecedor da Escolástica, humanista e amante da filosofia,
João Calvino aproximou-se e aderiu a
convicções evangélicas em Paris,
onde se ligou com sincera amizade a
Nicolau Cop, reitor da Universidade.

Este, em 1533, inaugurou o ano acadérnico com uma profusão sobre um


tema bíblico: *Beatos e pobres de
espírito+ (Mateus, 5, 3), exprimindo
temáticas fortemente erasmianas e luteranas. Foi um escândalo, e Cop
viu-se acusado de heresia, pelo que
teve de se transferir para Basileia,
convidado por Calvino, que se lhe
reuniu após longa peregrinação
(1534-1535). Aí, este último decidou-se a estudos literários e bíblicos e,
em princípios de 1536, publicou, em

latim, Instituição Cristã, em defesa


dos evangelistas tomados objecto de
calúnias infundadas, um pouco por
toda a parte. Mas também foi obrigado a retirar-se daí e rumou a Genebra.
Farel viu em Calvino o homem
indicado, enviado por Deus à cidade
indicada, no momento indicado, e pe

%afia /@'N

OS GRANDES REFORMADORES

diu-lhe que ficasse. No entanto, Calvino não tinha o mínimo desejo de


aceder: preferia dedicar-se aos seus
estudos, não se sentia um homem de
acção, nem de luta aberta. Farel, velho e autoritário, arneaçou-o: *Em
nome de Deus todo-poderoso, garanto-te que, embora invoques o pretexto
dos teus estudos, se recusares a consagrar-te a esta obra de Deus junto de
nós, Ele amaldiçoar-te-á, pois tentas
igualar-te a Cristo. +
Nos anos de 1536-1538, Calvino
lançou as bases da sua actividade reformadora político-moral-religiosa.
O Conselho citadino aprovou o texto
- na sua maior parte redigido por ele
- dos Artigos Respeitantes à Organimação da Igreja e do Culto em Genebra, em que se
achavam traçadas as
grandes linhas da reorganização da
vida eclesiástica após a supressão do

I Ia-112

OS GRANDES REFORMADORES

Em cima: Gustavo Adolfo, da Suécia, que aceitou a Reforma tios


Países Escandinavos (à esquerda) e Wallenstein, capitão aventiuda Mo
reiro a soldo de qualquer príncipe; à direita: a batalha n
tanha Branca, perto de Praga; em baixo: o Congresso de Münster
(j644-1648), onde se reuniram os delegados dos países católicos.

catolicismo. Era introduzido no culto,


o canto dos salmos, instituía-se um

tribunal civil para as causas matrimoniais em substituição do anterior eclesiástico


e tornava obrigatória a instrução catequética dos jovens.

Começaram a surgir problemas por


parte do próprio Conselho, quando
Calvino pretendeu obrigar toda a população a subscrever uma confissão de
fé obrigatória. Sobre ele e os outros
pastores genebrinos pairou uma sombra de dúvida e descrédito. Por fim, os
Genebrinos revoltaram-se e expulsaram Calvino e Farel.

O jovem francês estabeleceu-se em


Estrasburgo, onde se tornou pastor da
comunidade reformada local dos franceses refugiados. Entretanto, a situação
deteriorava-se cada vez mais em
Genebra: motivos internos e externos,
políticos e religiosos reforçaram o
chamado Partido dos Guilherminos,
favorável aos reformadores. E, na se
54

quência da insistência contínua dos


magistrados e pressões dos amigos,
Calvino regressou à cidade helvética,
em 1541, embora tivesse uma vez
afirmado que *preferia cem mortes
àquela cruz+.
b) Uma *república de santos pela
glória de Deus+

A pedido do Conselho citadino,


ocupou-se, acima de tudo, da redacção das Ordonnances ecclésiastiques
de 1'Église de Génève (1541), que a
população reconheceu mais tarde
(1543) como Constituição da República Genebrina. Encontrava-se lá definido o
esquema jurídico-organizativo eclesiástico. Com base neotestamentária (Efésios 4.1
1;
Coríntios 12,
28; Romanos 12, 7), foram reconhecidos quatro ministérios: os pastores,
que se deviam ocupar principalmente
da predicação do Evangelho, da administração dos sacramentos e do

exercício da disciplina eclesiástica; os


doutores, aos quais competia *ensinar
aos fiéis a santa doutrina, para que a
pureza do Evangelho não fosse corrompida em virtude da ignorância ou
opiniões erradas; os anciães, que deviam vigiar a conduta dos cidadãos e
interessar-se pelas condições morais
de cada núcleo familiar; os diáconos,
que se ocupavam da assistência aos
pobres e enfermos, além da administração dos bens eclesiásticos. Calvino
instituiu igualmente o consistório e a
vénérable compagníe. O primeiro
constituído por pastores e anciães, em
número correspondente aos bairros
urbanos, envolvia funções disciplinares com a maior severidade; a segunda
formada por pastores e doutores
era uma comissão eclesiástica proposta à escolha do corpo pastoral e ao
ensino.

Para evitar equívocos - o Conselho-pretendia arrogar-se o direito de

OS GRANDES REFORMADORES

ir

excomunhão Calvíno separou rigorosamente as punições eclesiásticas


das consequencias civis. A rigorosa
disciplina não tardou a provocar entre
os Genebrinos manifestações de impaciência, e o chamado Partido dos
Libertinos reorganizou~se, coagulando à sua volta o descontentamento
geral. Iniciaram-se os grandes processos doutrinais aos seus seguidores,
55

OS GRANDES REFORMADORES

não havendo coragem suficiente para


atacar Calvino directamente: primeiro
Sebastião Castellion (1543) e a seguir
Jerónimo Bolsec (1551) foram julgados e expulsos da cidade.
Em 1553, Calvino teve uma compensação proporcionada pelo caso
Servet. Miguel Servet já se achava na
mira da Inquisição, suspeito de heresia, por acusações extremamente graves acerca
do dogma da Trindade
divina, imortalidade pessoal e sacrifício substitutivo de Cristo. Ora, ele
fazia parte dos antitrinitários. O processo alongou-se e, por fim, o Pequeno
Conselho condenou-o à fogueira.
A seguir ao trágico episódio, Genebra tornou-se teatro de tumultos manobrados
pelos Libertinos, decididos a
reconquistar as suas posições. Todavia, em 1555, as novas eleições reve
56
laram-se favoráveis aos partidários de
Calvino, que era apoiado por numerosos huguenotes provenientes da
França. Genebra voltou a tornar-se

uma cidade austera: a *cidade de João


Calvino+.
Este queria uma sociedade construída e organizada segundo a palavra
de Deus, o que comportava uma corresponsabilidade dos dois poderes:
pastor e magistrado eram ministros de
Deus.
c) Participação na obra de Deus e
serviço pelos outros
Calvino não se ficou por aí: interveio de forma determinante e notável
lucidez na vida económica da cidade
helvética. Com os fugitivos, recebeu
trabalho, ideias e capitais: pense-se
nos tipógrafos franceses e nos operários da indústria das sedas, que forneceram à
cidade novas bases para uma
economia. O Calvinista acabou por se
converter no protótipo do homem sério, activo, sóbrio, trabalhador incansável e
escrupuloso, porque - como
eleito (predestinado) de Deus - actuava em força impelido pela vocação,
atribuindo dignidade e responsabilidade sacerdotais à sua acção no
mundo, porquanto toda a profissão é
um sacerdócio. A fé e comunhão com
Cristo, na teologia calvinista, não
eram conceitos inertes ou passivos.
Ao invés, eram entendidos em sentido
Em cima à esquerda: pintura de
Adão van Breen, na
Terry Engell Gallery de Londres,
que recorda o importante momento
do embarque dos
Puritanos na baía
de Delft na caravela Mayflower;foram esses os,famosos *Pais Peregrinos@> que,
perseguidos na pátria
pela Igreja estabelecida, emigraram
para o Novo
Mundo, a América
do Norte, levando
assim aí a Reforma
europeia. Aqui, à
direita, João Wesley predica na velha igreja de Cripplegate, numa pintura anónima
da
National Portait
Gallery de Londres.

OS GRANDES REFORMADORES

dinâmico: *Agir+, escrevia Calvino,


*significa sujeitar-se em tudo à acção de
Deus. + Procedendo assim, ou seja, trabalhando, com a referência constante a
Deus através da revelação em Jesus
Cristo -, o homem reencontra-se a si
próprio, a sua plena humanidade. O
trabalho - como empenho vocacional
assume assim uma dimensão nova:
simultaneamente participação na obra
de Deus e serviço prestado aos outros no
âmbito da sua profissão, qualquer que
ela seja, porque todas se revestem de

igual dignidade.

I,

57

OS GRANDES REFORMADORES
George Whitefield (1714-1770) famoso
pregador que estimulou, na Grã-Bretanha
e, sobretudo, na América, a renovação
cultural das Igrejas presbiterianas e metodistas, aqui reproduzido, durante um
dos seus sermões em Moorfield, por João
Collet. Entre outras coisas, WhitefleldJói
o fundador das Universidades de Princeton e Pensilvânia.

d) Teologia exegética, dialéctica e


histórica
Se Calvino fez de Genebra a socie58
dade que descrevemos e conduziu ao
plano prático algumas consequências
e outras não, o facto deveu-se exclusivamente à sua teologia, que podemos
considerar, acima de tudo, . exegética,
isto é, fundada essencialmente numa
leitura atenta e análise escrupulosa dos
textos bíblicos.
Quando se fala de teologia calvinista, pensa-se imediatamente na
doutrina da predestinação, o que corresponde à verdade, mas apenas em
parte. Mais exactamente, no centro

dessa teologia encontra-se a ideia da


soberania absoluta de Deus.
O Deus de Calvino está sempre
operante na sua criação, fundamento,
garante e guardião da existência humana que d'Ele depende em sentido
absoluto. Por isso, o objectivo de toda
a criatura reside na glorificação de
Deus. É neste ponto que intervém a
conhecida teoria da predestinação, ou
melhor, da dupla predestinação (praedestinatio gemina) ou ainda eleição:
*Definimos como predestinação o decreto eterno de Deus, por meio do

qual estabeleceu o que queria fazer de


cada homem. Com efeito, não os cria
unidades na mesma condição, mas
ordena vida eterna a uns e condenação
eterna a outros. Assim, com base no
fim para que o homem foi criado,
dizemos que está predestinado para a
vida ou para a morte+ (Instituição
Cristã 111, 21, 5). Deus destina a
vocação a cada homem (universalis
vocatio), para que aceite a sua graça
soberana, a qual se toma operante pela
acção do Espírito Santo no crente
individual. O homem, por seu tumo,
não é um autómato nas mãos divinas,
mas um ser plenamente responsável.
A teoria da eleição encontra-se estreitamente ligada à cristologia: a
plena e feliz comunhão com Deus só é
possível por meio de Cristo, no qual
estão unidas as naturezas humana e
divina. Nele, tem-se a justificação
como perdão dos seus pecados e imputação da sua justiça.
Está também ligada estreitamente à
eclesiologia: a Igreja é invisível (ou
seja, compreende os predestinados à
salvação de todas as gerações) e visível (compreende todos, incluindo os

OS GRANDES REFORMADORES

não-salvados). No centro da sua vida


encontra-se o culto, entendido corno
predicação fiel da palavra de Deus.
Esta acha-se contida na Bíblia, única
fonte normativa de fé. A sua autoridade é indiscutível e testemunho
prestado à Palavra de Deus, ou seja,
Jesus Cristo. A par da predicação está
a comunhão (Santa Ceia), acto simbólico em que participa toda a comunidade e, ao
mesmo tempo, dom da
graça divina.

George Fox (1624-1691), jovem pastor e


sapateiro inglês, fundador da seita dos
Quacres, nome derivado do que ele declarou ao juiz, ou seja, que tremia ao ouvir o
nome do Senhor (to quake); em virtude
disso, passou a ser conhecido jocosamente
por The Quaker,- a seita por ele fundada
não admite outra autoridade senão o Espírito, que interpreta a Palavra contida na
Bíblia; o discípulo Guilherme Penn
(1644-1718)fundou o estado da Pensilvânia nos EUA, tendo como capital Filadélfia
(isto é: cidade do amorfraterno).

59

3. Estruturas e vida
do protestantismo

1. Tipologia eciesiológica e teológica


do protestantismo

O espírito e as riquezas da Reforma


que referimos, quer nos reformadores,
quer no desenvolvimento do corpus
reformatum, contêm em si, simultaneamente, a nutrição que alimentou
até hoje o protestantismo e também os
germes de umafragilidade institucional (tanto no plano doutrinal como no
organizativo) que, no entanto, se entende não como fraqueza intrínseca
votada à cisão e desordem, mas como
possibilidade intrínseca de expressão e
desenvolvimento ligados à força inesgotável da Palavra.

a) Pluralismo teológico e eclesiológico


Embora submetendo a tradição
doutrinar, litúrgica e disciplinar eclesiástica à única autoridade da Escri

Assembleia geral do Conselho Mundial


tias Igrejas, em Genebra; o Conselho foi
constituído em 1948 comofruto das várias
conferências mundiais eclesiásticas surgidas a partir de 1925; representa uma
Maternidade (fellowshíp) ou uma liga (covenant) de Igrejas irmãs que se auxiliam
no aprofundamento da doutrina evangélica comum e na presença comum nos
graves problemas mundiais.

tura, a Reforma conservou as confissões de fé trinitárias e cristológicas da


Igreja antiga, mantendo assim um
elemento de unidade fundamental com
a Igreja Católica Romana e com as
Igrejas Ortodoxas do Oriente. Também o pensamento teológico dos
grandes refôrmadores apresenta um
acordo substancial nos argumentos
centrais assim como *as diferenças se
podem detectar adequadamente apenas no fundo de tudo o que têm de
comum+ (G. W. locher), de contrário
corre-se o risco de exagerar as diversidades.
Por outro lado, o evento da Palavra
é a única garantia da reunião eclesial,
e nessas situações corno pode a Igreja
assegurar-se de uma continuidade na
História? Sem dúvida que as Igrejas
Protestantes têm instituições e estruturas sociológicas, mas são consideradas meios
de expressão, indispensáveis, porém, relativos. Com efeito, o
protestantismo, para ser coerente consigo próprio, não pode encontrar outra
garantia para a Igreja senão a promessa e fidelidade de Deus. Além
disso, se a Palavra deve ser escutada
sempre de novo através da Escritura,
torna-se difícil constituir um *corpo
doutrinar rígido. Sem dúvida que o
protestantismo possui doginas expressos nas suas confissões de fé, mas por

muito dignos de atenção e respeito que

61

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

sejam, a sua autoridade fica em segundo lugar em relação à Palavra, e


toma-se impossível excluir, por princípio, a reformulação dos mesmos.

b) Tipologia do pluralismo eclesiológico


A Refôrma, resultante das conversões e intuições originárias dos grandes
reformadores, propagou-se na
Europa a partir de diversos centros,
cada um deles caracterizado pelo
nome próprio do reformador. Desde os
inícios, a unidade da fé não implicava
a unidade da organização eclesiástica.
As Igrejas organizaram-se, na maioria
dos casos, dentro dos limites territoriais e nacionais com a participação
dos príncipes ou dos conselhos citadinos, dependentemente das acentuações
doutrinais, dando origem a diversos tipos de estrutura eclesiástica que
perdurou mais ou menos até hoje.

62

A. O tipo luterano
Na época da Reforma, não havia
apenas diversas expressões da confissão de fé, mas também da liturgia e da
constituição eclesiástica. O princípio
geralmente mais seguido era anti-hierárquico, à excepção da Igreja Anglicana e da
Igreja Luterana dos Países
Escandinavos que, na -Suécia, conservou a sucessão apostólica e o título de
arcebispo. O ministério de predicador
ou de pároco, conquanto despido do
carácter sacerdotal católico-romano,
era considerado o essencial à vida da
Igreja e, portanto, o mais elevado.
Algumas seitas também refutaram
isto, por princípio contrárias a todas as
formas de ministério constituído.
Para o luteranismo, ao contrário do
calvinismo (e, naturalmente, para as
Igrejas derivadas dele), a constituição
eclesiástica era indiferente para a fé:
uma adiáfora, uma coisa estranha.

Esta *indiferença+ deveria promover e


defender a liberdade da comunidade
cristã. Na realidade, favoreceu a intervenção dos príncipes no governo da
Igreja, segundo as tendências eclesiásticas nacionais e territoriais já vivas no
final da Idade Média. Um

ditado exprimia esse estado de coisas:


Dux Cliviae est papa in terrítorio suo.
Chegada a Reforma, os príncipes váleram-se dela com frequência para
levar a cabo o seu plano de submissão
das respectivas Igrejas territoriais à
sua senhoria, enquanto em Inglaterra e
nos Países Escandinavos actuaram
nesse sentido as monarquias. Nos Países Baixos, a falta de um forte poder
central permitiu uma maior liberdade.
Finalmente, nos países em que as
Igrejas Protestantes se conservavam
em minoria, organizaram-se como
*Igrejas livres+, mas tiveram frequentemente de lutar com vigor para
sobreviver aos ataques da Contra-Reforma. Lutero quisera uma comunidade cristã
livre e em condições de
instalar, julgar e eventualmente destituir os seus predicadores e doutores,

Em cima: baptismo
de uma criança
numa família metodista emigrada no
Novo Mundo (América setecentista).
As Igrejas de origem anabaptista
(à direita: um baptismo no rio numa
comunidade negra
americana) consideram necessário o
acto de fé consciente no baptizado.
ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

e procurou defender essas liberdades


escrevendo o prefácio aos artigos sobre as visitas eclesiásticas
(Visitationsartikel) de 1528. No entanto, prevaleceu o ponto de vista do principe,
que
considerou os visitadores seus empregados.
A intervenção do soberano, favorável à Reforma, na Igreja do seu Estado, era
motivada pelo facto de se
atribuir o dever da custodia utriusque
tabulam, ou seja, das duas tábuas do
Decálogo. A custódia da primeira tábua, isto é, a cura religionis, competia apenas
aos príncipes evangelistas,
coincidindo com a vigilância à pura
doutrina da Reforma. O príncipe podia intervir na vida da Igreja quando
era perturbada, como seu membro, e
membrum precipuum, e em virtude do
princípio do sacerdócio universal.
A constituição das Igrejas do tipo
luterano ainda hoje possui a estrutura
que descrevemos, sobretudo para a
constituição interna baseada nos visitadores, consistórios, sínodos e
pástores~doutores ao cuidado directo das
almas.

63

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

B. O tipo reformado-calvinista
O ordenamento eclesiástico reformado desenvolveu-se diferentemente
e de forma típica não tanto em Zurique
e Genebra como nas Igrejas que encontraram o Estado hostil e tiveram de
lutar pelo direito à existência. A posição reformada distingue-se teologicamente da
luterana, porque para os
Calvinistas a constituição eclesiástica
64
está ligada mais intimamente à confissão de fé e é, por isso, menos uma
adiáfora como para os Luteranos: a
Igreja deve ser governada unicamente
segundo o ordenamento instituído por
Cristo, que se pode deduzir do Novo
Testamento. No Sínodo Nacional das
Igrejas Reformadas da França (Paris
1559), juntamente com a Confession
offoy, foi redigida a Discipline ecclésiastique, *como está contida nos escritos
dos apóstolos+. O elemento basilar da constituição eclesiástica é a
própria comunidade dos crentes, que
lhes manifesta a plenitude da Igreja,
Os ministérios foram instituídos
para que o Senhor pudesse governar a
sua comunidade através deles. Nor@
malmente, são indicados quatro: dos
Pastores, doutores a n cjk
ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO
Baptismo de Carlos Filipe, segundo filho
dos soberanos da Suécia Carlos Gustavo e
Sílvia; embora aderindo à Reforma, a
Suécia continuou a manter a estrutura
eclesiástica de tipo episcopal, juntamente
com grande parte do estilo litúrgico romano-católico, como se pode ver aqui,
quer nos paramentos do arcebispo luterano, quer tio cuidado particular atribuído
àfonte baptisnial; de resto, o baptismo continua a ser, na Igreja Reformada
da Suécia, um dos dois sacramentos (a par
da Santa Ceia).
nos. Os dois primeiros referem-se ao
ministerium verei: predicação e ensino da Palavra de Deus (no entanto,
por vezes estão compreendidos num
único *rninistério da predicação+); os
anciães devem vigiar as comunidades
e exercer disciplina; os diáconos são
chamados à assistência dos pobres e
enfermos. Todos os ministérios têm a
mesma dignidade e não existe ordem
hierárquica entre eles, embora o ministério da predicação desfrute obviamente de
uma proeminência de função. Também as comunidades têm

todas a mesma dignidade de assembleias de eleitos (aqui, nota-se com


intensidade o influxo calvinista da
*eleição soberana+) e nenhuma pode
sobrepor-se às outras por motivo algurn, tanto de antiguidade como de
proeminência. O pastor de uma comunidade não pode predicar noutra
sem o convite ou assentimento desta.
Para o governo imediato da comunidade, é eleito um consistório (consistoire, em
França, kírksession na Escócia, kerkenraad na Holanda, Presbyterium na Alemanha),
composto por
pastores, anciães e por vezes também
" -@-w ,
âkM&
m v
s o
65

%Nem
ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO
S4

.. .......

Comunhão euca
rística na Santa
Ceia na Johannes
kirche de Dussel dórfia (em cima) e
(ao lado) distribui
Ção do pão euca ristico na Igreja da
Reconciliação da
Comunidade ecu
menica protestante
de Taizé, em
França; a Santa
Ceia é um dos doi,@
sacramentos, jun
tamente com o
baptismo, conser
vados em todas as
confissões protes
tantes (à excepção

de algumas seitas).

66

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

Comunhão euca
rística na Santa
Ceia na Johannes
kirche de Dussel dórfia (em cima) e
(ao lado) distribui
ção do pão euca ristico na Igreja da
Reconciliação da
Comunidade ecu
ménica protestante
de Taízé, em
França; a Santa
Ceia é um dos doi,@
sacramentos, jun
tamente com o
ba tísmo, conser
vados em todas as
confissões protes
tantes (à excepção
de algumas seitas).

66

consistório devem eleger os pastores e


apresentá-los à assembléia dos fiéis,
que se pode opor à nomeação efectuada, porém, compete ao consistório
ou, em último caso, ao sínodo provincial pronunciar-se sobre essa posição.

C. O tipo presbiteriano
O critério presbiteriano de organização da comunidade não foi originariamente,
ao contrário do luterano e
do reformado-calvinista, concebido
como representação democrática da
comunidade, mas em conformidade
com um critério cristocrático: ou seja,
todo o ministério deve executar as suas
funções sob a senhoria de Cristo na
Glória de Deus. O consistório, por seu
turno deve dirigir a comunidade e
exercer a disciplina sobre o conjunto
das congregações e comunidades individuais. As comunidades de uma
mesma zona estão ligadas a um sínodo, dito Colloque em França, Presbytery na
Escócia e no presbiterianismo da América, Kreissynode na
Alemanha, Classis na Holanda. Estes

sínodos elegem do seu seio os delegados a enviar aos sínodos provinciais e


depois ao sínodo nacional (General
Assembly na Escócia e América). Um
órgão que governasse a Igreja entre
um sínodo e outro era desconhecido
nos primeiros tempos da constituição
presbiteriana. Esse tipo de organização eclesiástica difunde-se entre os
Reformados da Alemanha no Baixo
Reno e na Frísia Oriental, entre os
Puritanos presbiterianos de Inglaterra
e Escócia, os Huguenotes da França e
os Valdenses do Piemonte, nos Países
Baixos, Polónia, Hungria e Transilvânia. Em Inglaterra, nomearam-se bis
ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

pos reformados para vigiar os seniorastos, correspondentes aos presbiterianos


escoceses ou aos colloques
franceses, todavia as prerrogativas
episcopais eram limitadas.
O sistema presbiteriano foi introduzido na Escócia pelo discípulo de
Calvino, João Knox (1505-1572), com
o First Book of Discipline de 1560,
depois precisado principalmente por
A. Melville (falecido em 1622), declarando de direito divino os princípios
presbiterianos que foram expressos sem compromissos no Second
Book of Discipline de 1578. A monar~
quia combateu o presbiterianismo,
tentando impor o sistema episcopal
que restava e vigorava na Igreja de
Inglaterra, mesmo depois da separação de Roma. Foi na sequência das
lutas com Cromwell que o presbiterianismo e o episcopalismo encontraram
em mais casos compromissos e soluções mistas no seio da própria confissão (um caso
típico ainda hoje vigente
é o da comunhão anglicana nos seus
diferentes ramos).

D. O tipo congregacionalista
Outra forma de constituição eclesiástica, desenvolvida desde a época
da ReforTna e depois nos séculos seguintes até constituir hoje um elemento
importante na apologia eclesiástica protestante, é a do congregacionalismo. A
semelhança
do presbiterianismo, reconhece na comunidade
local o elemento fundamental e essencial da vida da Igreja, mas confere-lhe
uma maior e mais preponderante autoridade. A congregação, isto é, a
comunidade congregado em Cristo,
não reconhece qualquer autoridade

67

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

eclesiástica ou estatal à qual se deva

submeter como comunidade de


Cristo. O próprio Senhor está presente
como juiz e redentor na assembléia
dos fiéis, pelo que toda a autoridade e
todos os poderes dados à Igreja no
mundo já se encontram presentes na
comunidade local. Por esse motivo,
não deve ser exercido nela qualquer
autoridade episcopal, sinodal ou presbiterial.
As comunidades, ditas Congregations primae, e os sínodos denominados
Congregationes ortae, acham-se
entre si numa relação de igualdade sob
68
Casamento evangélico nos EUA; embora
em nenhuma expressão do protestantismo
o casamento seja considerado como sacramento, costuma ser celebrado com frequência
no templo, pois reconhece-se que
comporta dignidades e deveres particulares, não só entre os cônjuges, como nos
confrontos da comunidade.
a senhoria de Cristo. Nenhuma comunidade tem qualquer autoridade sobre
outra e, se surgem conflitos, devem
resolver-se na busca comum da vontade do Senhor em espírito de prece
comum. A solidariedade entre as congregações deve manifestar-se, não
A
através de organismos possuidores de
autoridade, mas na contribuição que
cada uma dá, como pode e julga
melhor, no desenvolvimento de todas
as outras e toda a Igreja. O esforço
constante exigido a todas consiste em
encontrar a forma de vida e organização da Igreja Apostólica primitiva.
O sistema de constituição congregacionalista, que foi posto em prática
pelas comunidades dos exilados desde
a época da Reforma e depois pelos
independentes na Inglaterra de CromwelI, foi mais tarde seguido até hoje
pelas várias denominações dos BapESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

tistas, Congregacionalistas, Quacres,


Discípulos de Cristo e outros grupos.

c) Tipologia do pluralismo teológico


A teologia é <,doutrina de Deus+:
teologia, discurso sobre Deus; como
teologia cristã, refere-se à revelação
de Deus em Cristo e, portanto, ao
testemunho dessa revelação contida na
Bíblia e à interpretação, quer na cristandade, quer fora dela. A teologia
evangélica caracteriza-se pelo vigor
com que subpõe a tradição eclesiástica
à norma bíblica. No tocante ao desenvolvímento geral da Idade Média, o
movimento da Reforma apresenta-se,
pois, como uma luta pela liberdade da
teologia nos confrontos da filosofia: a
teologia toma-se principalmente explicação da Escritura, limitando-se no
restante à discussão dos problemas
controversos em relação à interpretação da Escritura. Isto significa que a
teologia no sentido evangélico reformado está ligada estreitamente à predicação.
Foi partindo *do pastor in

cattedra que deve predicar, desenvolver um sermão+ que Carlos Barth iniciou as suas
reflexões sobre a Palavra
de Deus que desembocaram na imensa
Kirchliche Dogmatik.
A. O estilo próprio da teologia pro testante

Assim, como para a Igreja, sobretudo na nossa época, não existe um


pensamento teológico protestante
único, e pelos motivos de fundo que
abordámos inicialmente. As distinções clássicas entre ortodoxos, liberais e
pietistas não correspondem à
diversidade das escolas: neoluteranismo, neocalvinismo, barthismo,

69

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

. . ....
bultrnannianismo, teologias da *morte
de Deus+, teologias políticas, teologias da esperança, teologias que se
esforçam por inscrever-se num universo secularizado.
Hoje todas as teologias que se inspiram na Reforma são assoladas por
uma nova problemática que, no entanto, se aproxima de certo modo dos
problemas já presentes no início. A

70

O sisma do coral
(aqui durante a cerimónia da có-nflr
luterana de Dusseldórfia) desenvolveu
uma grande tradiÇão musical; em
baixo: corais para o
culto de Eisenach,
cópia pertencente a
J. S. Bach, que,
com base em muitos
dos textos, neles
contidos, compôs as
célebres Cantatas.

grande questão que agita agora todas


as Igrejas da Reforma é: como pode a
Igreja, numa época de acentuada secularização que tende a fechar as
Igrejas num gueto marginal, furtar-se
ao perigo e à tentação da introversão?
Como pode a Igreja, segundo a expressão do grande teólogo Dietrich
Ronhoeffer, ser uma *Igreja para os
outros+, uma *Igreja para o mundo+?

E como pode a evangelização ser ou tra coisa que proselitismo?


B. O desenvolvimento e a problemá tica da teologia protestante
Tendo presente o que referimos so bre o *estilo+ do pensamento
protes~
tante que assola sempre mais ou me nos todas as épocas e todos os ciclos
de reflexão, podem indicar-se as pri meiras tentativas eficazes de
sínteses
executadas por Melâncton e Calvino,
ambos sensíveis a influências formais
do humanismo e, embora de maneiras
diferentes, interessados em receber
SU

elementos de uma teologia natural.


Com o fundamento das obras de Me lâncton e Calvino e no âmbito de uma
retomada vigorosa do aristotelismo,
surgem as obras ortodoxas da cha mada escolástica protestante, que
coincide com o período da ortodoxia
protestante.
Depois de a unidade da doutrina
cristã ter sido abalada pela divisão

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

confessional e em virtude dos motivos


profundos já mencionados, a aparição
do iluminísmo destruiu a harmonia
substancial da teologia, sob o impulso
do espírito da época acerca da concepção dos fundamentos do conhecimento. A partir
de então, desenrola-se
uma teologia adequada aos tempos,
mas apenas com a condição de perder,

em maior ou menor medida nos vários


teólogos, o que é mais peculiar à
teologia, e, por conseguinte, a alusão
directa e constante à Revelação e,
portanto, à Escritura. A forte consciência inicial da única Escritura parece
perdida. Por outro lado, uma
teologia que permanece fiel ao seu
objectivo próprio renuncia a adaptar-se ao pensamento científico da
epoca: mas essa adaptação, que pode
ser sugerida por motivos compreensíveis e plausíveis, não representa uma
conquista para a teologia e pode indicar a sua insignificância ou o fim.
Isto acontece sobretudo em
Schleierrnacher, criador da moderna
teologia protestante elaborada à sombra do idealismo e do romantismo,
que se baseia no pressuposto da autono mia do facto religioso, para tentar
proporcionar à teologia um lugar próprio e um carácter científico. Mas o
fruto consiste em introduzir textos tomados de empréstimo da filosofia
corrente. O processo desenrola-se ao
longo do século XIX, a par de
Schleiermacher e mesmo antes dele,
com uma introdução maciça de influxos hegelianos e depois do kantismo e
empirísmo da segunda metade do século.
Uma reacção a essa situação verifica-se na polaridade dos programas

71

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO


teológicos de A. RitschI e E. Troeltsch, que pretendem servir, um sobretudo, a
intensidade e o outro a
extensão da teologia. O seu trabalho
preludia, prepara e dá vigor ao desenvolvimento do chamado neoprotestantismo, que
na realidade atinge um
esplendor provisório, mas cada vez
menos a teologia parece estar segura
da sua tarefa específica e do seu objectivo próprio no âmbito das ciências:
nasce nesse clima a teologia liberal,
com grandes nomes de teólogos e
poderosos ciclos teológicos. Todavia,
o contacto com as exigências focais da
Reforma primitiva parece agora destruído.
A semelhante situação, após um
interesse inicial pela teologia liberal,
reage com um vigor invulgar e até um
certo desprezo, porventura o maior
teólogo protestante, o suíço Carlos
Barth, o qual, com o Comentário à
Epístola aos Romanos (1919) e a obra
monumental Dogmática Eclesial, assinala um poderoso regresso à doutrina da Palavra
de Deus, para depois
abordar os pontos individuais da con

72

Consagração epíscopal do arcebispo


de Cantuária, Miguel Ramsey, primaZ da Igreja Anglicana. Nos inícios, a Igreja
Anglicana, exceptuando o primado
papal, não alterou
nada da doutrina
católica, e só mais
tarde introduziu
elementos de doutrinas reformadas.

fissão de fé. Colocwn-se a seu lado e


na esteira do seu pensamento E.
Brunner, R. Bultmann, F. Gogarten e
P. Tillich.
Mas o que Barth produziu de fun~
darnental na viragem da teologia protestante, embora sem abandonar a
florescência da investigação histórico-crítica em torno de 1900, foi ter
realçado plenamente o carácter dogmático da teologia. Demonstrou energicamente a
necessidade e possibilidade de desenvolver uma teologia
dogmática, o que desde SchIeiermacher parecia definitivamente posto de
parte. Mas isso teve também a consequência de fazer reemergir com nova
vivacidade os antigos problemas, e o
acordo entre os teólogos desfez-se a
partir de 1919 sobre a questão da
aceitação dos pressupostos filosóficos
na teologia. A principal preocupação
era a de voltar a ligar a teologia à
Igreja: ,<teologia em função da Igreja+
tomou-se a palavra de ordem, em
especial durante o chamado Kirchenkampf (resistência da Igreja alemã ao
nazismo, originada pelas famosas Te
ses de Barmen elaboradas pelo próprio
Barth, que deram origem à *Igreja
confessante+, clandestina e perseguida pelo nazismo), entre 1933 e
1945. Não devemos esquecer que,
para os evangélicos, a teoria deve ser,
por princípio, independente e crítica
nos confrontos e nas suas relações
com a Igreja. Não está ligada a um
magistério doutrinal eclesiástico, mas
deve estudar a predicação e o ensinamento da Igreja, examinando-lhes a
validade em relação aos contidos na
Escritura. Essa função não significa,
porém, uma pura e simples pesquisa
exegética, mas um trabalho hermenêutico, portanto mais profundo, mais
articulado e necessitado de outros instrumentos que não são apenas os da
investigação histórica e linguística.
Para o cumprimento dessa tarefa, entendeu contribuir, e conseguiu-o me
ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

nos parcialmente, o programa teológico muito discutido por um grupo de


teólogos que fez escola no segundo
pós-guerra, recolhendo uma herança
especificamente protestante do século
XIX, fôrmado por Frederico Gogarten, Emanuel Hirsch e, sobretudo,
Rudolfo Bultinann. No centro da controvérsia resultante, situava-se a exigência
deste último de traduzir o que a

Bíblia refere numa linguagem adequada à imagem do mundo própria do

Do ponto de vista ritual, a Igreja Anglicana conservou quase todas as antigas


tradições católicas, tanto nos ritos como
nos paramentos sagrados; em baixo: o
momento da comunhão na missa anglicana da Alta Igreja.- o celebraste veste os
paramentos antigos, e as espécies eucaristicas são não-fermentadas, em conformídade
com o antigo uso católíco-romano.

73

I ÉPOCA DO LIBERALISMO TEOLóGICO - Séc. XIX

LIBERALISMO LIBERALISMO LIBERALISMO


PIETISTA IDEALISTA CRíTICO-BíBLICO

João Christoph Blumhardt


(1 805-1880). O reino de
Deus é uma realidade
operante na vida humana;
conjuga elementos do pietismo tardio com um regresso intenso à Bíblia e
aos conceitos centrais de
pecado e graça; conversão
e vida'nova; famoso pelas
curas de Mõttlingen.

Christoph Blumhardt
(1843-1919), filho do anterior, retoma a teologia e
espiritualidade do pai, mas
traduzindo-as num empenho político e anticapitalista, em ambiente totalmente laico.

Frederico SchIeiemac her


(1768-1834), influenciado
pelo romantismo berlínense e Schelling, entende
a religião como *visão e
sentimentos,, e os dogmaS
são um desvio de natureza
doutrinar; a Palavra não é a
autoridade da revelação
divina e o fundamento da
fé, mas apenas um meio
de expressão; analisa o
sentimento religioso inclinando-se para reduzir o
Evangelho a psicologia religiosa, cujo centro é o homem com a sua piedade.

Ernesto Troeitsch (1 865-1923) mestre de Barth,

Gogarten, Lukács e Marcuse; no centro da sua reflexão encontra-se a relação entre


os valores religiosos eternos e o devir
histórico: a religião, incluindo o cristianismo, está
historicamente condicíonada; isto não tira validade
ao cristianismo, porque
existe um elemento a
non, não estranho à rap
zão, que o torna possível; a
História implica Deus simultaneamente imanente e
transcendente.

Albrecht Ritschl (1 822-1889), crítico histórico no


âmbito da escola de Tubinga, orienta-se depois,
aderindo ao Kant moralista, para um cristianismo
entendido como possibilidade de realizar um ideal
prático de vida; neste sentido, reinterpreta a Bíblia,
fé cristã e a Reforma;
confiança filial do cristãs
indu-lo a uma acção profissional conscienciosa
para o avanço do reino de
Deus; o conhecimento de
Deus não é dado por juizos
teóricos, mas por meio de
*juizos de valor+.

Adolfo von Harnack


(1851-1930.), verdadeiro
mestre do protestantismo
liberal de orientação crítico-bíblica; aplica os métodos histórico-críticos para
deduzir da Bíblia o núcleo
histórico indiscutível dos
documentos bíblicos hipoteticamente reconstruidos,
estudando-a nesta recolhi,
de documentos históricos;
aplica o mesmo método à
história da Igreja e da Reforma e à história dos
dogmas.

ÉPOCA DA TEOLOGIA DIALÉCTICA - Sécs. XIX-XX

REN@OVAÇAO

ESCOLA
BIBLICA BARTHIANA

Emilio Brunner Carios Barth (1886(1889-1966), -1968), o


teólogo
opõe-se tenaz- mais sistemático,
mente à redução complexo e poliéintelectualista e drico da
época momoralizadora da derna, criador da
mensagem bíblica escola fortemente
operada pelo pro- antiliberal, reconduz
tes@antismo liberal, toda a teologia ao
;@,,,,s!i-n como da fé na seu verdadeiro

rTiís@'ca no sentido tema, que é a Palade -elação airecta vra de


Deus, porém,
com Deus; a teolo- o Deus da Bíblia, ou
gia deve ser liber- seja, *totalmente
tada de tudo o que diferente+; na históimpede uma com- ria e no
destino de
preensão fiel. Jesus Cristo, a Hu manidade é
reveFrederico Gogarten lada a si própria.
(1887-1968): a fé
Reinhold Niebuhr
em Cristo, na qual
(1892-1971), lutese manifesta a ob- rano alemão
emi_
jectividade de Deus, grado na América, é
tem uma dimensão líder americano da
existencial; o ho- teologia dialéctica e
mem, para ser au repensa-a para a
têntico, deve ser nova situação,
uma nova criação,
mas na perspectiva Renascença lutede Cristo, abrin- rana. Sob o
impulso
do-se ao ser-Deus e de Carios HolI, é um
ao mundo, mas não vasto movimento
o aceitando quase nos Países Escanreligiosamente. dinavos, com
es tudo renovado de
Lutero.
Dietrich Bonhoeffer
(1 906-1945): refle xão
fortemente teo lógica da Palavra
centrada em Cristo,
mas virada ao
mundo @maior+; se
a religião está em
fase de extinção, a
;:fé cristã nos seus
conceitos bíblico -teológicos
é refor mulada.

EPOCA
CONTEMPORANEA
Séc. XX

EXISTENCIALISMO LINGUíSTICA
TEOLOGICO TEOLóGICA

M. Fi. Ramsey, Paul

Van Buren, G. VãRudolfo Bultmann


hanian
(1884-1976): na linha da filosofia
TEOLOGIA
existencialista de DA SECULAHeidegger, introduz RIZAÇAO

o conceito de <,dêsmistificação+ do Frederico Gogarten


Novo Testamento, (1 887-1968), João

para recolher não a H. T. Robinson

sua história, mas o


(1919), Harvey Cox
valor existencial
(1929)
para o homem em
situação, ou seja, O TEOLOGIA

verdadeiro núcleo

existencial: o Ke- DA <,MORTE


DE DEUS,,
rygma; desmitificação como interpre- Herbert Braun, Dotação existencial, é
rothee Sõlle (1929),

tornar compreensí- W. Hamilton, Th. Aivel o mistério de fizer

Deus no que há de
não-conceptualista. EOLOG IA

POLITICA
Escola E DA
BuItmanniana LIBERTACÃO

sobretudo com Herbert Braun (1903) e- Dorothee Sõile, Jür


Gerhard Ebelíng
qe, MoItmann, W.
(1 912); a fé avulsa AIthaus, Harvey

na realidade é des- r,

tituída de sentido e, .,ox, B. Shaull


portanto, inexistente; a Palavra de
Deus funda e
abarca a realidadedo mundo, pelo que
o cristão deve estar

radicado no mundo,

Nova Hermenêutica

com Emesto Fuchs

(1 903) e Jaime M.

Robinson; propõe
um programa de

interpretação existencial mais radical.

J1 ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

A esquerda: uma
pastora da Igreja
Luterana da Escandinávia; como,
para o protestantismo, todos osfiéis
são nativamente
sacerdotes por
força do baptismo,
as mulheres também podem exercer
funções pastorais,
porque têm a preparação bíblica e
teológica para a
cura das almas.

WW

homem moderno, despojá-la das suas


vestes mitológicas, absorver o significado por meio do autoconhecimento
existencial do homem. Era um programa teológico, muito discutido, conhecido pela
designação de *desmitificação+ do Novo Testamento. Para
dar um exemplo derivado das vastas e
na verdade fascinantes obras teológicas de Bultmann, a objectividade histórica da
ressurreição de Jesus surgia
atrás da *fé pascal+ dos discípulos
mediante a qual eles se declaravam a
favor de uma existência escatológica

76

A direita: crianças
de uma comuni
protestante nos
EUA à saída da es cola dominical,
instituição de suma
importância edu cativa que tem ori
gem nos inícios da
Reforma e uma
longa história de
excelentes serviços
pedagógicos.

transfigurada. Nos últimos tempos,


contudo, a atenção concentrou-se na
teologia política, que retoma o antigo
tema reformador da ética do testemunho aplicada aos graves problemas
actuais da marginalizarão e da exploração. Ela corre por vezes o risco de
se deformar em justificação teológica
de opções ou pertenças políticas ou
partidárias. No entanto, também encontra altas expressões de verdadeira

teologia, conquanto atenta aos problemas dos Sudetas, assim como na já


vasta obra de Jürgen Moltmann.

2. A vida religiosa e cultual do


protestantismo

A vida concreta religiosa, tanto


pessoal como comunitária, não é deixada a uma espécie de criatividade
totalmente livre e anárquica. Embora
as *formas+ assumissem, ao longo da
História, e nas várias zonas geográficas, aspectos diversos, regem-se sempre por
pontos e exigências fundamentais derivados de princípios essenciais da Reforma.
O culto é fonna
e dever inerentes à confissão de fé,
mas no protestantismo, ainda que
mais sóbrio e austero do que no catolicismo ou nas Igrejas do Oriente, tor~
na-se mais difícil de descrever, por
não ser objecto de uma verdadeira e
própria legislação, como naquelas.

a) Conteúdos, valores, espírito e estruturas essenciais do culto


O limite fundamental imposto ao
culto entre o necessário e o supérfluo,
não está definido com exactidão, e
isto por uma razão doutrinal precisa:
evitar a reconstituição de uma *religião do mérito+; a prática cultual é
apenas um auxiliar para a fé. De um
ponto de vista sociológico, poder-se-iam aplicar ao protestantismo as categomas em
geral aplicáveis aos praticantes do catolicismo: destacados ou
indiferentes, praticantes estacionários,
regulares, devotos. Mas as delimitações no seio do protestantismo podem
revelar-se menos nítidas, porque os
actos da prática são simultaneamente
menos numerosos e menos rigorosamente definidos; a Reforma manteve
só os sacramentos atestados pela Escritura: o baptismo e a Santa Ceia.

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

Nos últimos cinquenta anos, a vida


litúrgica foi assinalada por duas tendências: a mais antiga (muito desenvolvida no
movimento alemão dito de
Bernauchen, no suíço *Igreja e Liturgia+ ou na comunidade internacional e
interconfessional de Taizé) que tende
a enriquecer a líturgia protestante, sobretudo nas Igrejas reformadas, com o
tesouro litúrgíco da Igreja antiga e
introduzir na liturgia momentos de
adoração mais evidentes e solenes,
dado que o perigo de uma *Igreja da
Palavra+ é, com efeito, o intelectualismo; a outra, mais recente, alimentada pelas
pesquisas do Conselho
Mundial das Igrejas acerca de novas
formas de culto numa época secularizada, tende, pelo contrário, a introduzir no
culto a espontaneidade, o diálogo, as formas musicais mais modernas.

77

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

b) As acções litúrgico-cultuais
O protestantismo, tanto de ascendência luterana como reformado-calvinista (e
nas suas diferentes ramificações, à excepção das seitas de constituição mais
recentes),
concorda com a
consciência da Igreja Católica e da
ortodoxia oriental, que Deus opera a
sua graça soberana de salvação no
homem mediante determinados meios
exteriores. A diferença consiste na
valorização da natureza da acção e na

78

extensão da graça operada através


desses meios.
A. A predicação da Palavra, presença
viva de Cristo
Todos os escritos confessionais
protestantes afirmam que o mais im portante dos meios de graça é a Pala
vra de Deus, estabelecendo, porém,
distinção na maneira de produzir a
graça entre as duas partes constitutivas
da Escritura Sagrada. A lei ensina e

Celebração do
Natal num templo
luterano alemão em
Dusseldórfia; observa-se sob o púlpito a mesa preparada para a Santa
Ceia, celebrada
pelo menos nas
grandes solenidades do ano litúrgico,
Julio

protestante; as
grandes árvores
decorativas, ou
<,arvores de Natal+,
foram introduzidos
como elemento de
ornamento e solenidade.

A direita: celebração da festa de

Pentecostes; juntamente com a Páscoa, é a base central do ano litúrgico nas Igrejas
Reformadas, dada
a importância de
que se reveste na
descrição dos Actos
dos Apóstolos.

pune o que é pecado, *enquanto o


Evangelho ensina aquilo que o homem, que não observou a Lei e,
portanto, é condenado, deve crer, ou
seja, que Cristo expiou e pagou todos
os pecados e obteve e conquistou sem
qualquer mérito o seu perdão, a justiça
válida perante Deus e a vida eterna+
(Formula Concordiae V, 790; Confessio Helvetica Posterior c. 13). Por
conseguinte, o protestantismo, em
confori-nidade com a doutrina da justificação mediante a fé, considera
meio de graça fundamental e principal
a Palavra de Deus, e os sacramentos
colocam-se apenas ao lado dela, ao
passo que a Igreja Católica, em particular a do Oriente, no centro da acção
eclesiástica e da vida religiosa, não
constitui por princípio o anúncio da
doutrina, mas a administração dos sacramentos. Assim, é importante a
proposição da Conferência Mundial
das Igrejas (Protestantes) de 1937: *O

ESTRUTURAS E VII) k DO PROTESTANTISMO


Espírito Santo confere à Igreja, que se
move na fé no seu Senhor ressurgido,
a capacidade de interpretar a todo o
momento a Escritura como expressão
da Palavra de Deus.+

B. A prece, presença do Espírito


Santo
*A Igreja, voltada para o mundo,
desempenha um ministério profético
mediante o testemunho da predicação.
Mas quando se volta para o seu Senhor e o seu Deus, exerce um sacrifício real,
'oferecendo incessantemente
a Deus, através de Cristo, o sacrifício
de louvor, a homenagem dos lábios
que confessam o seu Nome' (,Hebreus
13, 15). Por meio da riqueza multiforme do ofício divino, 'afluem os
tesouros de todos os povos, pelo que o
templo enche-se com a glória do Senhor' (Ageu 2, 7). Quando o ramo
reformado da cristandade tiver encontrado todo o sentido deste sacerdócio

79

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

da Igreja, os nossos santuários, com


demasiada frequência silenciosos,
voltarão a ecoar diariamente com o
louvor matutino e vespertino, como
cumprimento concreto e vivido do
Soli Deo gloria. +
Assim, o ofício divino de cada dia
do movimento reformado <4greja e
Liturgia+, hoje usado amplamente nas
Igrejas Protestantes, estabelece a relação íntima entre predicação e prece.
Tanto no seu significado teológico
como na própria estrutura do culto, a
prece nas suas várias formas (louvor,
intercessão, súplica) constitui resposta
ao anúncio da Palavra e meio para se
dispor a tomá-la viva no coração dos
fiéis e na comunidade. Por conseguinte, a prece é a maneira imediata
de viver a actualidade, o *aqui e
agora+ da Escritura no seu conjunto e
do Evangelho em particular. E já que,
como disse Paulo, *Deus enviou aos
nossos corações o Espírito do seu
Filho que grita: 'Abba, Pai!'+ (Gálatas 4, 6), a prece é uma presença real
do Espírito Santo no coração dos fiéis
que a cumprem e na comunidade que a
exprime comunitariamente. Pode assumir diversas formas: o canto dos
Salmos, os cânticos compostos de temas bíblicos, as litanias de súplica.
c) Os sacramentos e meios da graça
mediante a fé justificante
O *sacramento+ é um termo geral
que indica um conjunto de actos eclesiásticos que, segundo o testemunho
bíblico, têm um significado particular
para a salvação do homem. O sacramento primeiro e fundamental é a
encamação do Filho de Deus, em cuja
pessoa habita corporalmente toda a

80

Os funerais de Martin Luther


King, assassinado em Mênfis,
em 1968; pastor baptista líder
da luta não violenta para a
emancipação dos negros da
América, concentrou toda a sua
acção na mensagem evangélica, nunca renunciando à missão pastoral; nas Igrejas
Reformadas, os funerais têm um
rito sóbrio, baseado sobretudo
na leitura bíblica e são celebrados indiferentemente por um
pastor ou por um fiel, na casa
do extinto ou no próprio local
da sua sepultura.

plenitude da divindade (Colossenses


2, 9). Os sacramentos constituem,
pois, sinais, dados pelo Senhor ressurgido e glorificado, em que se manifesta a
presença vivificadora do Espírito Santo, sob a espécie material de
alguns gestos humanos ou elementos
da Natureza. A Igreja definiu mais
exactamente que devem ser mantidos
sacramentos apenas os actos instituídos por Jesus Cristo e nos quais o
gesto material se una a uma palavra
que o tome vinculativo e eficaz. Nesta
concepção de sacramento reconhecem-se todas as Igrejas da Reforma.
Os dois únicos ritos hoje entendidos
como *verdadeiros sinais e sinetes do
Novo Testamento+, ou seja, *sacramentos+, são denominados por todas

-41

f @i

as Igrejas que se reclamam da Reforma protestante baptismo e Santa


Ceia.

A. O baptismo
Segundo a lúcida definição de Lutero, trata-se de *uma água preciosíssima de
vida e um banho do novo
nascimento no Espírito Santo, para
que, justificados pela sua graça, sejamos herdeiros da vida eterna. O baptismo
opera o perdão dos pecados,
liberta da morte e do Demónio e
confere a beatitude eterna a todos que
crêem nele+ (Catecismo Menor e Catecismo Maior). A Apologia da Confissão de
Ausburgo aprofunda os conceitos de Lutero, explicando que *o
Santo Baptismo abarca e cancela toda

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

a culpa e o devido herdeiro do pecado


original, conquanto permaneça o elemento material do pecado +. E, logo a
seguir, inspirando-se em Agostinho,
*Mesmo após o baptismo o pecado
mantém-se em nós, embora não nos

seja imputado+. É a doutrina que perdurou até hoje, comum a todas as


Igrejas que se reclamam da Reforma.
Porventura a mais densa e difundida
teologia do baptismo hoje vigente no
protestantismo acha-se resumida em
algumas perguntas do Catecismo de
Heidelberga, que desenvolvem, com
precisão teológica, clareza didáctica e
sensibilidade profundamente religiosa, toda a doutrina do baptismo
própria do protestantismo clássico:
*Como te é recordado e assegurado no

81

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

Santo Baptismo que o único sacrifício


de Cristo na cruz tem valor para ti?
Deste modo: Cristo instituiu esta lavagem exterior de água e uniu-lhe a
promessa de que sou lavado pelo seu
sangue e pelo seu Espírito das impurezas da minha alma, ou seja, de todos
os meus pecados, tal como sou lavado
exteriormente pela água+ (Dom. 69);
*Que, significa ser lavado pelo sangue
e pelo Espírito de Cristo? - Significa
obter, pela graça de Deus, o perdão
dos pecados, pelo amor do sangue de
Cristo, que ele verteu sobre nós, e ser
renovado pelo Espírito Santo e santificado para ser membro de Cristo, para
assim aniquilar o pecado e proceder a
uma vida santa e irrepreensível+
(Dom. 70); *A lavagem dos pecados
consiste, portanto, na própria lavagem
exterior? - Decerto que não, pois só
o sangue de Cristo e o Espírito Santo
nos purificam de todo o pecado+
(Dom. 72). Trata-se de uma rica teologia ligada a Cristo e ao seu mistério
salvador e constitui igualmente a fonte
de uma densa espiritualidade baptismal protestante derivada dela.

B. A Santa Ceia
Por vezes, também se chama missa
evangélica ou comunhão, mas indevidamente e apenas para distinguir o seu
significado da missa católica. Juntamente com a predicação do Evangelho
e em continuidade dela, é o centro do
culto e o cumprimento daquilo que
teve início no Santo Baptismo; por
esse motivo, a par deste, as Igrejas
reconhecem como sacramento unicamente a Santa Ceia. Este segundo
sacramento tem origem na última ceia

82

que Jesus celebrou com os seus discípulos na Quinta-Feira Santa e durante


a qual, segundo a tradição referida por
Paulo, pronunciou sobre o pão e sobre
o vinho as palavras: *Isto é o meu

corpo que vos é dado; fazei isto em


minha memória... Este cálice é o novo
pacto no meu sangue; fazei isto, cada
vez que beberdes, em minha memória+ (Coríntios 11, 24-25).
Na Santa Ceia, sempre celebrada
sob as duas espécies do pão e do vinho
em todas as confissões protestantes, o
sacrifício que Cristo ofereceu desinteressadarnente por amor à Humanidade
proporciona benefício de forma
misteriosa àqueles que estão dispostos
a aceitar a sua acção salvadora. Mas
como acontece o mistério da presença
de Cristo na Santa Ceia não se pode
explicar racionalmente, daí a recusa
da Reforma de elaborar uma teologia
tão complexa e complicada como a
que a Escolástica católica construiu:
tanto na concepção luterana como na
reformada, há a preocupação de preservar o mistério da presença de Cristo
da interferência do homem, que pretendesse explicá-la com o seu raciocínio.
Quanto ao modo de presença de
Cristo no pão e no vinho, é certo que
desde o princípio o protestantismo
rejeitou o conceito de transubstanciação (mutação da substância do pão e
do vinho). Encontramo-lo em todos os
escritos confessionais, até nos Artigos
de Esmalcalda e na Fórmula de Concórdia; com a expressão luterana
*cum, in, et sub pane+, entende-se
que o pão e o corpo de Cristo na Santa
Ceia (e nunca fora ou depois dela) são
uma única coisa mediante unia miste
riosa união sacramental de pão terreno
e do corpo glorificado de Cristo, por
analogia com a união das duas naturezas de Cristo. Além disso, esta união
sacramental não acontece por meio de
uma consagração sacerdotal, nem em
consequência da fé do comungante,
mas com base numa disposição divina, em virtude das palavras da instituição no
conjunto da acção sacramental da Santa Ceia instituída por
Cristo, que inclui a distribuição e
recepção da Ceia sub utraque specie
(ou seja, o pão e o vinho), pelo que
não é devida à hóstia consagrada
qualquer adoração fora da acção da
Ceia, porque a hóstia ou pão consagrados são corpo de Cristo apenas *in
usu a Christo institutos.

d) Os outros ritossagrados na vida do


cristão reformado
Os únicos dois * verdadeiros sinais e
sinetes do Novo Testamento+, o baptismo e a Santa Ceia, são, portanto, os
únicos sacramentos no verdadeiro e
apropriado sentido aceito geralmente
(excepto em algumas seitas, como já

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

Alas

W.

Um exemplo característico e precioso de


arte popular dos índios do Oregão, pertencente a um catecismo ilustrado por
volta de 1845 por Eliza Spalding, esposa

W,

do missionário presbiteriano Henry Spalding; nele, é impressionante a descrição


pictórica de toda a história bíblica, interpretada com fins morais-catequéticos,
retomando a antiga tradição da Bíblia
pauperum como se encontra em numerosos exemplos da Idade Média católica.

83

IGREJAS IGREJAS REFORMADAS


EVANGÉLICO-LUTERAM ZWINGLIANO-CALVINISTAS

1 LIVRO DE CONCóRDIA: publicado a 25 de Junho de


1580 como colectânea literária das confissões e escritos doutrinais do
protestantismo luterano; com base
nele, o luteranismo reconhece as três profissões de fé
(símbolos) mais antigas e os decretos dos seis primeiros concílios ecurnénicos; no
entanto, a aprovação
dessas profissões e decretos antigos baseia-se na
sólida conformidade do seu conteúdo com a Escritura e
não na tradição apostólico-eclesiástica ou na decisão
autoritária de um magistério eclesiástico.
2 CONFISSAO DE AUSBURGO DE 1530 - reconhecida
como fundamento confessional comum dos estados do
Império da Liga de Esmalcalda, elevada a fundamento
de Direito Público pelas Igrejas Evangélicas regionais da
paz religiosa de Ausburgo (1 555) e confirmada como tal
pela Paz de Vestefália. Foi formulada por Melâncton,
que colocou na base os sete artigos confessionais
elaborados por Lutero e pelos teólogos de Vitemberga:
Artigos de Schwalbach; a Confissão consta de vinte e
oito artigos, é de espírito antibaptista e antizwingliano e
revela os contrastes com a Igreja Católica de forma
muito moderada.
3 CONFISSÃO DE ALISBURGO VARIADA: redigida por
Melâncton em 1540 para favorecer o acordo com os
reformadores suíços, mas a Igreja evangélico-luterana

reconhece sempre apenas a Confissão de Ausburgo


invariável.
4 -APOLOGIA DA CONFISSÃO DE ALISBURGO: composta por Melâncton ainda em Ausburgo
contra a
Confutatio católica; na forma modificada por Melâncton
em Abril de 1531, foi aceite como escrito confessional
pelos membros da liga de Esmalcalda; é uma confirmação da Confi@são de Ausburgo,
mas apresenta mais
claramente que esta os contrastes entre os Luteranos e
a Igreja Católica.
5 CATECISMO MAIOR: composto por Lutero em 1529,
destinado aos pregadores e catecistas, enquanto o seu
Catecismo Menor do mesmo ano se dirige ao povo e às
crianças; ambos se dividem em cinco partes: decálogo,
símbolo apostólico, pai-nosso, baptismo e Santa Ceia.
6 ARTIGOS DE ESMALCALDA: compostos por Lutero
em 1537, apresentam na primeira parte as doutrinas da
Trindade e da divindade de Cristo, que concordam com
a Igreja antiga e, na segunda, a doutrina discordante da
Igreja antiga procura a justificação; seguem-se a rejeição da doutrina da missa, do
culto dos santos, do
primado do papa; na terceira, são discutidos os argumentos acerca dos quais poderia
ser possível uma
unificação entre Lutero e católicos.
7 DE POTESTATE ET PRIMATU PAPAE: composto por
Meíáncton em 1537, contesta o primado do papa e a
jurisdição dos bispos.
8 FORMULA CONCORDIAL: tenta seguir um caminho
intermédio entre o luteranismo genuíno e as tentativas
de alargamento de Melâncton; apesar da atenuação do
pensamento originário luterano, torna-se o fundamento
da ortodoxia luterana; em 1956, é caracterizada como
*a confissão dogmaticamente mais aguda das contidas
no Livro de Concórdia+.

ML

Menos que a Igreja evangélico-luterana, a evangélico-reformista constitui uma


unidade; tem dois pais desde o
início - Zwingli e Calvino - e não tarda a dividir-se nurr
grande número de Igrejas regionais muito distante,
entre si geográfica e politicamente, cada uma das quai,,
compõe os seus escritos confessionais sem que fossem
recolhidos numa colecção oficial como o Livro d,
Concórdia luterano; existem, porém (de 1612 a 1935)
colecções não oficiais.
A - Período pré-calvinista
1 ARTIGOS 67 HULDERICO ZWINGLI: em 1523, o
Conselho Municipal de Zurique baniu oficialmente os
eclesiásticos da cidade.
2 TESES BERNENSES: defendidas na Disputa de Berna,
aceites pelo governo de Berna e impostas aos pregadores.
3 CONFISSÃO TETRAPOLITANA: confissão que as.

quatro cidades de Estrasburgo, Constança, Memmingen e Lindau apresentaram na Dieta


de Ausburgo de
1530.
4 CONFISSÃO BASILEIENSE de 1534: representa a
elaboração efectuada por Myconius de uma confissão
privada de Ecolampadio.
5 PRIMEIRA CONFISSÃO HELVÉTICA: aceite em 1536
em Basileia pelos delegados das cidades de Zurique,
Berna, Basileia, Schaffhouse, São Galo, Mulhouse e
Biel para dispor de uma confissão suíça comum no
caso de um concílio ecurnénico; foram seus autores os
teólogos Builinger, Myconius, Grynaeus e Leo Judae.
B - Período calvinista
1 CONFISSÃO HúNGARICA de 1549: entende repre@
sentar uma via intermédio entre a doutrina da Santa Ceia
zwingliana-zuriquense e a calvinisto-genebrina.
2 CONSENSO GENEBRENSE de 1552: em que Calvino
propõe a sua doutrina de predestinação, aceite por
Genebra, assim como nas outras cidades suíças, embora sem obter o consenso; o que a
Igreja reformada
suíça rejeitou foi aceite por aquela esfera, mas na sua
maior parte de forma atenuada.
C - Período das lqreias Reformadas nacionais
1 CONFISSÃO HLTNdARICA: em doze artigos, apresentada e aceite pelos reformadores
húngaros no Sínodo de Czenger de 1557.
2 CONFISSÃO GALICANA: aceite no sínodo reformador
de Paris de 1559, é o escrito confessional da Igreja
Reformada francesa, em quarenta artigos.
3 CONFISSÃO ESCOCESA: composta como escrito
confessional da Igreja reformada da Escócia em 1560
por João Knox em vinte e cinco artigos; além disso,
obtém valor simbólico no calvinismo escocês a Confissão de Westminster dos
Puritanos de 1647.
4 CONFISSAO BELGA: publicado em 1561 pelos calvinistas da Holanda, consta de trinta
e sete artigos.
5 SEGUNDA CONFISSÃO HELVÉTICA: é o mais sólido
dos escritos confessionais reformados e apresenta em
trinta capítulos a doutrina reformada de forma bem
articulada e clara e em óptima linguagem; é seu autor
Builinger de Zurique.
6 CANONES SINODAIS DE DORDRECHT de
1618-161 9-. sustentam uma rigorosa doutrina calvinista
da predestinação e foram aceites pelas Igrejas Reformadas da Holanda, França e
maior parte da Suíça.

IGREJAS DA
*COMUNHÃO ANGLICANA+

Embora em mais pontos atípica em relação às formas


protestantes mais difundidas, a Igreja Anglicana. representa, a par da Igreja
evangélico-luterana e a evangélíco-reformada, a terceira forma fundamentalmente
eclesiástica
do protestantismo; como Anglican Church, é a
Igreja de Estado inglesa, como Episcopal Church
acha-se difundida em todo o Commonwealth e nos
territórios de missão, como Prolestant Episcopal
Church na América do Norte (EUA); no entanto, estas

Igrejas-filhas não estão dependentes da Igreja de Inglaterra, pois encontram-se


unidas a esta e entre si na
Anglican Communion fundada em 1867, a que aderem
por origem, constituição e ideias teológicas fundamentais. Por seu turno, remontam,
desde algum tempo
após a cisão e prociardaçâo de Henrique VIII como
<,Protector and suprema heàd of the English Church and
Clergy+ de 3 de Nobembro de 1534, a uma composição
entre doutrinas conservadas pelo catolicismo e doutrinas reformadas introduzidos
pelo arcebispo Cranmer
(t1556), que esteve em correspondência com Calvino,
por Martinho Bucer, que passou os seus últimos anos
em Inglaterra, e pelo discípulo de Lutero, Guilherme
Tyridale (t 1536). Dada,a origem histórica da Igreja,
praticamente imposta pelo rei, e o eclectismo das
doutrinas absorvidas, tornou-se difícil para o anglicanismo redigir escritos
confessionais com o rigor dos
Luteranos e Reformados; é, todavia, possível indicar
aqueles em que se baseia a Anglican Cornmunion, que
hoje enumera mais de cinquenta milhões de fiéis.
égide de Cranmer.
2 COMMON PRAY1ER BOOK: composto por Cranrner
em 1549 e imposto como livro litúrgico único oficial,
em que o arcebispo introduz inovações de tipo reformado.
3 42 ARTIGOS: compostos por Crarimer em 1552
como fundamento dogmático oficial para a Igreja Anglicana; neles, a Bíblia é
apresentada como única regra de
fé, afirma-se a justificação mediante a única fé e
reconhecem-se como sacramentos apenas o baptismo
e a Ceia, esta última entendida no sentido de Calvino.
4 39 ARTIGOS: representam uma nova redacção, aprovada pela rainha Isabel, dos 42
artigos de 1552.
5 COMMON PRAYER BOOK: revisto nas diversas redacções, é praticamente ao mesmo tempo
o livro oficial
único do culto e da prece e dos artigos de fé; entre 1549
(ver atrás) e 1662, foi revisto em quatro ocasiões
diferentes; tentativas posteriores malograram-se perante os contrastes entre as
correntes evangélica e da
Alta Igreja; no entanto, a revisão de 1928, apesar da
rejeição por parte da Câmara dos Comuns, foi praticamente imposta; o Coromon Prayer
Book é o verdadeiro
escrito confessional que exerceu maior influência na
vida religiosa do povo inglês, trata-se de uma obra-prima de prosa inglesa e hoje
mantém unida praticamente a Anglican Communion em todo o mundo.

PERIODO DAS
PESQUISAS ECUIVIÉNICAS

Mantém-se fundamental o princípio da Reforma quanto


à igreja, não entendida como unidade no sentido
católico-romano, o excluída a pesquisa absoluta desse
gênero de unidade; por esse motivo, o próprio Conselho Mundial das Igrejas não é
encarado como uma
Igreja nem como uma -Igreja super+, mas como diz o
Estatuto *uma associação fraterna de Igrejas que aceitam Nosso Senhor Jesus Cristo
como Deus e Salvador+. Os textos que emanam das assembléias e conferências a partir
deste momento não têm valor de
confissão de fé, todavia propõem-se como declarações

com vista a formulações mais amplas e precisas para o


futuro e podem, portanto, considerar-se escritos confessionais de particular valor,
dado o número de Igrejas
que os elaboram e subscrevem.
1 CONFERENCIAECUMÉNICADE-ESTOCOLMO(1925):
também denominada a -Níceja da Ética., porque não se
ocupou de questões dogmáticas, mas dos princípios da
acção comum das Igrejas para enfrentar os problemas
sociais mais graves; emitiu, porém, a declaração fundamental: * Para todas as
Igrejas, o E@angeIho torna-se,

em todos os campos, o poder decisivo.+


2 CONFERENCIA ECUMÉINICA DE EDIMBURGO (1937):
os argumentos foram de ordem rigorosamente teológica: a graça, a Igreja de Cristo e
a Palavra de Deus, os
ministérios e os sacramentos, a unidade da Igreja na
vida e no culto. A declaração final contém: *A União
orgânica deve permanecer a ideal, Numa Igreja assim
unida, a fidelidade última dos membros deve ser
concedida a todo o corpo e não a uma parte. A nossa
tarefa consiste em encontrar em Deus e receber dele,
como um dom de sua parte, uma unidade que possa
comportar numa única comunidade de amor todos os
vários dons espirituais que Ele nos concedeu.+
3 CONFERENCIA ECUMIÉNICA DE AMSTERDÃO (1948):
a relação define numerosos e vários conceitos de Igreja
e exprime o reconhecimento comum da realidade da
Igreja como dom de Deus, fundada na acção salvadora
de Deus em Jesus Cristo.
4 CONFERENCIA ECUMÉNICA DE *FÉ E CONSTITUIÇÃO+ DE LUND (1952): decide que o método
do
confronto edesiológico deve estar integrado na pesquisa crístológica, e os motivos
de separação podem
ser superados somente por uma melhor compreensão
de Jesus Cristo, ou seja, da mensagem do Novo
Testamento.
5 SEGUNDA CONFERENCIA ECUMÉNICA DO CM1 DE
EVANSTON (1954): tema central: *Cristo esperança do
mundo.,@ A esperança cristã é entendida de maneira
diferente da Assembleia: os Luteranos acentuam a
posição escatológica, afirmando que Jesus Cristo não é
o garante da nossa civilização, do progresso e do
bem-estar na Terra; os Calvinistas exprimem-na como
esperança para esta vida, *aqui e agora+. ,
6 TERCEIRA CONFERENCIA ECUMENICA DO CM1 DE
NOVA DELI (1961): tema: *Jesus Cristo, luz do
mundo+, considerado dos pontos de vista do testemunho, do serviço e da unidade da
Igreja.
7 QUARTA CONFERENCIA ECUMÉNICA DO CM1 DE
UPSALIA (1968): tema: *Vede, eu faço todas as coisas
novas>,; solicitada particularmente pelo clima da contestaçáo juvenil,

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

referimos) pelas Igrejas da Reforma.


Existem, porém, mais ou menos
aceitos e -mais ou menos valorizados,
tanto teológica como praticamente,

outros sinais ou ritos sagrados que


marcam e ajudam as várias etapas da
vida do crente evangélico.

A. O crisma-confirmação
O crisma como sacramento é rejeitado desde o início da Reforma e
declarado *cerimónia vazia e supersticiosa+. Sobre a importância e evolução
histórico-teológica da confirmação protestante, pode consultar-se o
tratamento preciso e exaustivo de
G. Rietschel e P. Graff em Lehrbuch
der Liturgik.
A *confirmação+, introduzido nas
Igrejas Evangélicas do Povo, reveste-se de um carácter totalmente diferente de como
é entendida no catolícismo ou na ortodoxia oriental: não é
considerada sacramento, mas acção
social de culto divino, em que os
baptizados são recebidos solenemente
na comunhão da Santa Ceia e admitidos
aos seus direitos e deveres. Na Igreja
Luterana, isso acontece, na maioria
dos casos, entre os catorze e quinze
anos e no protestantismo reformado
dos catorze aos dezoito. O rito da
confirmação compreende a profissão
de fé, a promessa de fidelidade à
doutrina, à vida cristã, ao sentimento
cristão, e cumpre-se com uma bênção
especial acompanhada da imposição
das mãos e uma prece com a pronúncia de uma fórmula de confirmação. A
confirmação, segue-se, habitualmente
no domingo imediato, a primeira participação na Santa Ceia.

86

B. A penitência
Inicialmente, foi conservada no lu
teranismo como sacramentum poenitentiae, na forma de confissão e absolvição
privadas. Depois, pelo influxo do Catecismo Maior de Lutero,
de 1530, foi negado o carácter sacramental da penitência, e a absolvição
considerada apenas uma declaração de
que o pecado era perdoado com base
na fé justificativa por meio da única
graça de Deus, que continua a agir em
virtude do baptismo. Apesar disso,
conservaram-se elementos ligados à
penitência desde a Antiguidade. O
sério arrependimento que o protestantismo exige para perdão dos pecados,
na Formula concordiae, é entendido
não só como sentimento da ira e do
julgamento de Deus e desconfiança
em nós próprios, mas também como
sentimentos reais de penitência: *Uma
fé verdadeira, beatificante, não se encontra naqueles que estão sem arrependimento
e dor e têm a condenável intenção de permanecer e obstinar-se no pecado mas precede
um
arrependimento autêntico e tem fé
sincera na, ou com a verdadeira penitência. Também o amor é um

fruto que segue com necessidade


segura a verdadeira fé+ (Formula
concordiae, Decl. 111).
A confissão dos pecados tão-pouco
é abandonada nos seus traços fundamentais, e foi somente por volta de
meado do século XVI que a confissão
privada em vigor no luteranismo cedeu o lugar à confissão pública e
genérica.dos pecados. Assim, a consciência de que a comunhão na Santa
Ceia, além do reconhecimento e arrependimento dos pecados, deve ser de

algum modo precedida da sua confissão prevaleceu sempre.

C. O casamento
É reconhecido como ordenação divina pelas Igrejas Evangélicas do
Povo, Igrejas livres e seitas protestantes, mas com a rejeição do seu
valor sacramental, deixando a sua regulação ao poder civil, e na sua realização de
forma civil vê-se o sistema
de casamento que vincula e obriga os
cristãos. No Pequeno Livro para os
Cônjuges, Lutero afirma: *Como as
núpcias e o estado matrimonial são um
assunto civil, não compete a nós,
eclesiásticos e servos da Igreja, dispor
ou regular coisa alguma a seu res~
peito, pelo que deixamos isto a cuidado de cada cidade ou região, consoante os seus
usos e costumes. + Mas
como o casamento cristão, na sua
qualidade de fundação de uma família
cristã, se reveste de particular importância para a vida da comunidade
eclesiástica, o protestantismo costuma
*fazer benzer o matrimónio por meio
do ofício da palavra e da comunidade
interveniente+ e obrigar os cônjuges a
receber esta bênção eclesiástica. Segundo a doutrina protestante, o casamento é
solúvel por motivos importantes, de modo que, com base no
direito civil vigente em qualquer lugar, os esposos divorciados possam
contrair novo matrimónio válido e lícito.

D. A extrema-unção
Na sua qualidade de sacramento,
segundo a concepção no catolicismo e

ESTRUTURAS E VIDA DO PROTESTANTISMO

na ordoxia oriental, é rejeitada pelo


protestantismo. No entanto, o protestantisnio luterano sempre consagrou
particular atenção aos doentes graves
e moribundos, e, em substituição da
extrema-unção, pratica a comunhão
dos enfermos como celebração independente da Santa Ceia, precedida da
confissão e absolvição dos pecados,
quer como celebração da Santa Ceia
d . os membros da família, quer, quando
tal não é possível, no sentido da comunhão da fé.

E. A morte e o além
Nas doutrinas acerca da morte, o
julgamento particular, a ressurreição
dos defuntos e o regresso de Cristo
para o Juízo Final, as Igrejas Evangélicas do Povo concordam com a velha
doutrina católica. Ao invés, é rejeitado o conceito e a realidade de um
estado intermédio e transitório de purificação para as almas dos homens
mortos em estado de graça santificante, mas ainda imperfátos_. É aquilo
a que no catolicismo se chama *Purgatório+ e contra o qual tanto os Artigos de
Esmalcalda como, ainda mais
violentamente, Calvino se pronunciaram claramente.
Por morte do homem, as almas
entram imediatamente no céu. Como a
Segunda Confissão Helvética diz com
palavras claras, é fé comum não só
das Izreias Reformadas, mas também
da Igreja evangélico-luterana. *Nós
acreditamos que os fiéis, após a morte
do corpo, vão directamente para
Cristo e, por conseguinte, não necessitam das intercessões e preces dos
vivos. +

87

Cronologia

Nascimento de Martinho 1483 Refórmas de


Carlostadt em
Lutero. 1498 Jerónimo Savonarola é Vitemberga.
1529

condenado à fogueira.
Nascimento de João Cal- 1509 Confissão de
Ausburgo e 1530
vino e de Miguei Serveto. Confissão
Tétrapolitana.
Lutero publica as noventa 1517 Henrique VIII
proclama-se 1531
e cinco teses em Vitem- chefe da Igreja de
Inglaberga. terra.
Zwingli inicia a predicação 1518 Os Valdenses aderem
à 1532
em Zurique. Reforma e aceitam
alguromás Müntzer inicia a 1521 Lefèvre d'Etaples traduz os mas teses
dogmáticas
de
reforma e m Zwickau. Salmos do hebraico. tipo calvinista.
Melâncton redige os Loci Morte de Leão X. Calvino adere à
Reforma. 1533
communes.
Excomunhão de Lutero. Genebra aceita a
Reforma. 1535

Paulo 111 convoca


um con- 15M
cílio.

Calvino e Farei são


exila- 1538
dos de Genebra.
Excomunhão de Henri
que VIII.
Calvino é chamado a
Ge- 1540
nebra.
Ordorinances
ecclésiasti- 1541
ques de Genebra.

1545

Morte de Lutero.
1546
Votação de Interim
na 1548
Dieta de Ausburgo.

1551

Dieta de Passau; Carios V 1552


revoga o Interim.
1556
Edicto de Compienha. 1557
Convenant dos protestantes escoceses.
João Knox redige o Livro 1561
da Disciplina.
1562

Em Inglaterra, publicação 1563


dos trinta e nove artigos da
Igreja Anglicana.
Noite de São Bartolomeu. 1572
Edicto de Nantes a 13 de 1598
Abril.
1609
Assembleia dos protes- 1611
tantes franceses em Saumur.
Um grupo de puritanos, 1620
que consideram impossí
88

Tomás Moro escreve o


Diálogo sobre as Heresias.

Francisco 1 exila os doutores da Sorbona.


Acto de Concordata de Vitemberga.

Abertura do Concílio de
Trento a 13 de Dezembro.

Paulo 11 suspende o Concílio; Carios V opõe-se.


Reabertura do Concílio de
Trento a 1 de Março; Henrique 11 opõe-se-lhe.
Suspensão do Concílio a
28 de Abril.
Abdicação de Carlos V.

Reabertura do Concílio de
Trento.
Encerramento do Concílio
de Trento a 14 de Dezembro.

Reforma de Port-Royal.
Roger Bacon escreve o
Novurn Organum.

vel praticar as suas religiões em Inglaterra. desembarca na costa nordeste da


A mérica do Norte; são hoje
conhecidos como *Pais
Peregrinos+ .
George Fox funda a Socie- 1649
dade Religiosa dos Amigos, ditos Quacres.

1662

1664
1661

Colónias de emigrados 1660


quacres fundam na Amé- aprox.
rica o estado da Pensilvânia, do nome do pregador
William Penn.
Edicto de Fontainebleau: 1685
revogação do Edicto de
Nantes.
John Wesley funda o mo- 1729
vimento dos Metodistas.
No Oeste (EUA), consti- 1847

tui-se a Igreja de Jesus


Cristo dos Santos dos últimos Dias, denominados
Mórmones, do livro publicado em 1830 por Joe
Smith, O Livro de Mórmon.
Organização nos EUA, por 1874
parte de Carios Taze Russei, da Associação Internacional dos Verdadeiros
Estudiosos da Bíblia, ou
Testemunhas de JeováConferência Metodista 1881
Ecurnénica, para facilitar
as _relações federativas e
acção missionário entre as
igrejas Metodistas.

1883

As Igrejas Reformadas 1884


(calvinistas) da Alemanha
ligam-se entre si na
Aliança Reformada.
Nasce a Baptist World AI- 1905
liance, à qual aderem
muitas Igrejas Baptistas.
Nasce nos EUA o Conselho 1908
Federal das Igrejas de
Cristo, primeiro exemplo
de um conselho universal
de grupos de Igrejas.
Conferência Mundial Mis- 1910
sionária de Edimburgo, da

Cromwell torna-se *Lord

Protector+.

Conversão de Pascal. 1
Início do reinado de LuísXIV.

Pelas actividades dos professores de Oxford, Kebie,


Pusey e Newman, desenvolve-se o *Movimento de

Oxford+. Pusey, o único


que não passou ao catolicismo, prosseguiu o cha_
mado puseysmo, que teve
um forte influxo estimulador no seio da Igreja Anglicana,
Desenvolve-se na América
a tendência liberal de
*Igreja Larga+, sob o impulso do poet4 e teólogo
inglês Samuei TayIcir Coleridge.

@w

qual nasce o primeiro organismo ecurnénico protestante Faith and Order.


É fundada, em Constança,
a World Alliance for Pro- 1914
moting International
Friendship Through the
Churches, prelúdio da
constituição do Conselho
Mundial das Igrejas.

1919-1921
É constituída a Federação 1920
das Igrejas Evangélicas
Suíças. Alexandre Freytag
(18'70-1947) funda em Genebra a seita dos Amigos
do Homem, como dissidência das Testemunhas
de Jeová, conservando a
doutrina essencial, mas
insistindo fundamentalmente na caridade, reforma do carácter e sociabilidade.

1923

1933

CRONOLOGIA

Com o seu Romerbrief,


Carios Barth lança o
*grande desafici+ à teologia e ao protestantismo liberais.

Em Genebra, conferência
preliminar para constituir a
organização Life and
Work, a fim de favorecer e
aproximar as Igrejas no
campo das actividades
práticas sociais; é promo
tor o famoso arcebispo de
Upsália, Nathen Soderblom (1886-1931), primaz
da Suécia.

É fundada a Lutheran
World Federation, a mais
vasta federação das Igrejas
de tipo luterano.
Desfaz-se a associação
entre Gogarten, Bruriner,
BuItmann e Barth; este
rompe com Gogarten, o
qual sustenta que se pode
falar de Deus apenas em
relação à historicidade do
homem; com Buitmann,
que opera as restrições da
mensagem cristã em cate
89

CRONOLOGIA
gorias do existencialismo
filosófico; com Brunner,
acusado de uma recuperação da teologia natural:
definem-se quatro correntes na teologia protestante:
relação entre fé e história
(Gogarten), desmitificação
do Novo Testamento
(Bultmann), relação entre
natureza e graça no pressuposto de uma analogia
entre criatura e Criador
(Brunner), escutado da
Palavra de Deus com base
na Revelação (Barth).
3-18 de Agosto, Conferên- 1937
cia Ecurnénica de Effimburgo com 344 delegados
de 123 Igre)as de várias
denominações protestantes, entre as quais 26
Igrejas Orientais e, pela
primeira vez, observadores
da Igreja Católica.
Constituição do British 1942

Couricil of Churches (Inglaterra), a maior federação de Igrejas do mesmo


tipo e de tipo diferente até
agora existente.
1945 Morre Dietrich Bonhoeffer,
o qual passa pelo menos
por duas fases de pensa
mento, até chegar (após a
sua firme oposição ao na
zismo, que o conduziria à
forca, em Floss nburgo)
ao conceito de que a Igreja
é *Igreja-para-os-outros+;
para o último Bo ' hoeffer,
se a religião está em fase
de extinção, a fé cristã e os
conceitos bíblico-teo
lógicos a que se refere são
reformulados radical
mente.

90

Em Agosto, em Amster- 1948

dão, Primeira Conferência


Ecurnénica da qual nasce o
Conselho Mundial das
Igrejas; estão representadas trezentas Igrejasmembros, na prática a
totalidade das Igrejas prorestantes, anglicanas e
ortodoxas orientais, à excepção da Igreja Católica
Romana.
A Comissão de Faith and 1952

o
C nstitution do CM1 convoca a terceira Conferência
Ecurnénica em Lund (Suécia), com a presença de
teólogos católicos na qualidade de observadores.

Segunda Conferência 1954


Ecurnénica do CM1 em
Evanston (ilinóis).
Terceira Conferência Ecuménica do CM1 em Nova
Deli, com 1006 partici- 1961

pantes e observadores da
Igreja Católica: vinte e três
Igrejas, entre as quais a
Ortodoxa Russa, ortodoxas da Flornénia, Bulgária e
Polónia, a Igreja e a Missao Pentecostal do Chile e
onze Igrejas jovens da
Africa solicitam admissão
ao CMI.

1962 -1965

Conferência Ecurnénica de 1963


Faith and Constitution em
Montreal, com 280 representantes oficiais das
Igrejas pertencentes ao
CMI.
Nascimento da Federação 1967

das Igrejas Evangélicas na


Itália, a que aderem as
Igrejas baptista, luterana,
metodista e valdense como
membros efectivos e o Exérci1o de Salvação como
membro aderente.
Quarta Conferência Ecu- 1968
ménica do CIVII em Upsália.

1969

1982

Concílio Ecurnénico Vaticano li, com a participação


de observadores das Igrejas Protestantes. Decreto
sobre o ecumenismo, fundação do Secretariado para
Unídade dos Cristãos,
constituição de comissões
mistas teológicas com as
Igrejas Protestantes.

A 10 de Junho, visita de
Paulo Vi ao CM1 de Genebra.
Visita de João Paulo 1 a
Inglaterra, com encontros
ecurnénicos com a Igreja
Anglicana a nível doutrina
e operativo.

Glossário

Adventistas do Sétimo Dia: seita protestante de


tipo milenarista, que coloca a tónica no
segundo e definitivo *advento>@ de Cristo;
fundada na América no século XIX por
William Miller (1782-1849) e Ellen White

(1827-1915); resultantes das Igrejas Baptistas, anunciam o próximo advento de


Cristo e
observam o descanso do sábado em vez do
domingo, por ser o *sétimo dia+ a consagrar
a Deus, em conformidade com a antiga instituição liebraica do Éxodo; vinte estão
difundidas sobretudo nos EUA e actualmente
na União Soviética e países satélites comunistas, Austrália, Alemanha, e têm
numerosas missões, hospitais e publicações periódicas de larga difusão.
Anabaptistas: pertencentes a um movimento
surgido, na Alemanha, da revolta dos camponeses; ligando estreitamente o valor do
baptismo ao acto consciente de fé, negavam o
baptismo das crianças e eventualmente exigiam um novo baptismo para os adultos;
após
quinze anos de lutas sangrentas, refugiaram-se em Münster, onde, sob o pulso de
ferro de João de Leida, estabeleceram um
regime de *comunismo radical+, que incluía
a poligamia; a cidade foi reconquistada e os

anabaptistas supliciados atrozmente; Lutero


mostrou-se-lhes fortemente adverso: os so breviventes dispersaram e
ramificaram-se em
diferentes seitas, entre as quais a dos Meno nistas e Hutterianos; outros
fundiram-se com
os Presbiterianos.
Anglicanos: cristãos reformados e pertencentes
à Igreja de Inglaterra ou Comunhão Angli cana, surgida do cisma com Roma
impulsio nado por Henrique VIII em 1534 através do
Acto de Supremacia, com o qual declarava o
soberano *único e supremo chefe na Terra da
Igreja de Inglaterra+; o anglicanismo, difun dido em quase todo o
Commonwealth britâ nico, é uma forma original da Reforma do
século XVI, mais tradicionalista que o lute ranismo; conserva em
particular a hierarquia
eclesiástica, à excepção do primado do pon tífice romano.
Baptismo: do grego *imergir+, indica a partici pação do crente na morte e
ressurreição de
Cristo, e é a expressão da graça de Deus para
com o baptizado. Não se trata, pois, de um
rito purificador mágico e válido de uma vez
por todas.
Baptistas: confissão protestante surgida em
princípios do século XVII e que conta ac

9 1

ias,

GLOSSARIO

Doo

),()li TUL, G0VKR1'@'MENT (')F TUE

<ai$$ or X pril, 1 830.

W. 1
tualmente numerosas Igrejas, as mais importantes e numerosas das quais se encontram
hoje na América do Norte, conhecendo recentemente uma 4Mpja !4:kfgs@o na E,

comunista; adquiriram o nome da prática do


baptismo concedido exclusivamente aos
crentes adultos capazes de verdadeira conversão pessoal.
Bíblia: é o testemunho da revelação de Deus em
Cristo e a única fonte de que brota a palavra
de Deus, única autoridade normativa em
matéria de fé.
Casamento: embora para os crentes seja uma
simples instituição civil, eles, como tais, são
responsáveis perante Deus e a comunidade.
Catecismo: o ensino das doutrinas bíblicas.
Confirmação: praticada apenas em algumas
Igrejas Protestantes, representa a decisão de

92

'Y
N@

fé dos jovens de entrarem a fazer parte da


comunidade local. Este acontecimento é pre cedido de um período longo e
regular de
formação catequista.
Congregacionalísmo: princípio eclesiológico
protestante, segundo o qual a comunidade
local (congregação) tem uma importância
mais fundamental da Igreja como instituição
universal; o princípio é aplicado de forma
mais ou menos rigorosa pelas diversas Igreias, em particular pelas baptistas; uma
evolução recente aproximou as 1 rejas de tipo
9
congregacíonalista das Igrejas Reformadas, e
o Congresso Congregacionalista Mundial
fundiu-se com a Aliança Reformada Mun dial.
Conversão-arrependimento: é a consequência
da decisão de fé a favor de Cristo e comporta
uma mudança radical de existência e menta lidade. Também denominada,
segundo o
Evangelho de João, novo nascimento ou
nascimento do alto: como obra de Deus e do
seu Espírito criador.
Episcopalianos: membros de uma Igreja deri~
vada do anglicanismo, hoje difundidos so bretudo nos EUA; professam que a
assem bleía dos bispos e os concílios têm um poder
superior ao do papa; o episcopalismo, como
atitude doutrinal, teve precedentes na Idade
Média e inspirou a posição cesaropapista de
algumas monarquias que erguiam a Igreja
nacional (o galicanismo, por exemplo) contra
a soberania do pontífice romano; a Igreja
Episcopaliana, reunindo Igrejas anglicanas,
metodistas e presbiterianas, difundiu-se após
o termo da Segunda Guerra Mundial na índia
e Ceilão através das numerosas missões das
antigas Igrejas Presbiteríanas.
Escola dominical: lugar de formação das crian
Çâ' C jo-Ve-fis no- se- io da comunidade, de idade
compreendida entre os três anos e adolescên cia. É administrada por
voluntários, mefn bros da própria comunidade.
Evangelho: do grego lieta notizia, é o anúncio
proclamado por Jesus Cristo e, ao mesmo
tempo, o próprio Jesus como o anúncio de
Deus à Humanidade. É o único ponto de
referência para a existência e fé cristãs.
Exame livre: a comparação com base escritural
da realidade e existência da Igreja e do
crente. Num sentido mais amplo, a autono~
mia de movimento e pensamento sujeita à
única soberania de Deus.
Fé: é a resposta do homem à palavra enviada

por Deus e - como obra do próprio Deus


representa a única maneira pela qual ele pode
alcançar a salvação. Essa fé é também acto e
realidade de confiança em Deus.

Fundamentalistas: crentes cristãos pertencentes

a diversas Igrejas Protestantes que aceitam a


infalibilidade literal das Escrituras; de um
modo geral, o fundamentalismo não nega a
possibilidade de significados simbólicos, mas
mantém que é necessário acreditar, acima de
tudo, no sentido literal; segundo os livros da
Escritura em que a sua piedade se inspira, o
fundamentalismo conduz a várias doutrinas
revivalistas, milenaristas, pentecostais e ad ventistas.
Graça: não representa uma qualidade moral ou
uma maneira de ser de Deus, mas a sua acção
de salvação, embora mesclada com julga mento, nos confrontos do homem como
tal.
Huguenotes: nome dado em França aos pri meiros reformados ou protestantes:
a desig nação dever-se-ia a Hugo de Sabóia, chefe
dos patriotas hostis ao duque de Sabóia, mais
tarde alterada em contacto com o alemão
Eidgenossen, ou seja, *confederados+; pa rece que o nome foi atribuído
inicialmente a
patriotas de Genebra, por volta de 1520-1524
e depois aos Reformados, cerca de 1532.
Igreja: o conjunto dos crentes em Cristo, cujo
objectivo consiste na edificação espiritual
comunitária através da prece, intercessão e
estudo e meditação bíblicos, por um lado; por

GLOSSARIO

outro, o testemunho exterior prestado não à


sua fé, mas a Cristo crucificado e ressurgido.
O seu governo compete à assembléia e ao
conselho de igreja.
Justificação: doutrina teológica bíblica princi pal, é a expressão da
atitude de Deus nos
confrontos do homem, que lhe oferece gra tuitamente a sua graça soberana.
A justifica ção é fundada em Cristo.
Laico: é todo o crente, porque a comunidade
local individual e a Igreja como organização
não são hierárquicas nem clericais.
Menonistas: surgidos por acção do padre holan dês Menno Simonis, que, após
a repressão do
movimento anabaptista dos anos 1525-1535,
recompôs as componentes mais moderadas
do movimento; fundiram-se rapidamente na
Europa Central, e pequenos grupos atingiram
a Inglaterra, contribuindo para influenciar a
aparição do baptismo moderno; outros grupos
penetraram na Rússia e Ucrânia; nos séculos
XVIII-XIX, alimentaram uma forte emigra ção nos Estados Unidos e Canadá;
herdeiros
da tradição anabaptista, ainda conservam al guns dos seus princípios
basilares, entre os
quais a rejeição do juramento e do serviço
militar, levam uma vida austera e sempre se
bateram pela liberdade religiosa; actual mente, ascendem a cerca de meio
milhão,
revelando-se muito activos nas missões.

Metodistas: pertencentes ao metodismo, sur gido em Inglaterra no século


XVIII sob o

93

GLOSSARIO

impulso dos dois irmãos teólogos João e


Carlos Weslev; foi inicialmente um movimento de despertar no seio da Igreja de
Inglaterra e de protesto contra a Igreja estabelecida; deve o nome ao espírito de
seriedade e piedade metódicas com que os seus
seguidores actuavam; separou-se do anglicanismo em fins do século XVII1; as Igrejas
Metodistas contam actualmente cerca de
quarenta milhões de fiéis; insistem na pureza
dos costumes, caridade, confissão pública e
comunhão dominical; em Inglaterra, após um
período de cisões, o metodismo reuniu-se
numa única Igreja, em 1932.
Ministérios: as funções do crente individual no
seio da comunidade concentradas num espírito de serviço; ou seja, voltados para a
edificação da própria comunidade. Com
efeito, essas funções são *dons+: exprimem a
actividade do Espírito Santo de Deus nos
confrontos da congregação.
Moravos: a seita dos Irmãos Moravos é uma
descendência hussita (de João Hus 1368-1415 -, teólogo da Universidade de
Praga e reformador; considerado um dos
fundadores da nação e da língua checa; excomungado, foi condenado à fogueira, em
Constança), surgida em 1457 em Kunwald,
Boémia, e organizada em *União dos Irmãos+, cerca de 1470; praticavam a comunhão
dos bens, elegiam o seu clero e rejeitavam a hierarquia oficial; banidos da Boémia

94

em 1548, estes precursores da Reforma do


século XVI estabeleceram-se na Morávia e
tiveram, desde então, um papel importante na
cultura nacional checa.
Pastori fiLura central, porque exerce a tempo
inteiro @ ministério pastoral. Mas não é um

*sacerdote+: não representa qualquer intermediário entre Deus e a Igreja. A sua


tarefa
fundamental é a predicação, com @tudo @o e
e
*
Pen'tecostais: família de seitas protestantes fundamentalistas e com frequência
*curandeiros+, de origem americana: tomam à letra a
descrição dos Actos dos Apóstolos sobre a
descida do Espírito Santo e os carismas
resultantes dos seus dons - cura das doenças
(com imposição das mãos); o culto consiste
em reuniões fervorosas e entusiásticas com
cantos, predicações espontâneas sob a inspiração imediata do Espírito, profecias,
revelação de conversões e curas, imposição das
mãos e eventualmente baptismos por imersão; as seitas pentecostais são hoje
numerosas
e em expansão.
Predicação: o momento único e fundamental
fundador da comunidade, que lhe confere a
força espiritual e consciência necessárias e
indispensáveis à actividade interna e acção
exterior.
Presbiterianos: denominação de protestantes
que professam uma organização eclesial di
ferente da do episcopalismo e do congiegacionalismo; os laicos, juntamente com os
pastores, fazem parte dos sínodos, assembleias eleitas a todos os níveis da
paróquia
local desde a Aliança Mundial; inspirado
doutrinalmente no calvinismo, introduzido na
Escócia por João Knox em 1560, o presbiterianismo é, naquele país, religião de
Estado
desde 1688; está difundido em Inglaterra,
Irlanda, Suíça, Alemanha, Países Baixos e
Estados Unidos; no conjunto, as Igrejas Presbiterianas agrupam hoje no mundo perto
de
de fiéis.
geral, são termos
is; no entanto, a
designação *protestantes> pressupõe directa
mente uma al à
cu evangélicos privilegia, ao inves, imediata ao dado
bíblico, ou mesmo histórico, mas neste caso

conduzido dQ~Diefer -ia à iência das

Ue _qxpç@r
comunidades ,,j@@~Quacres: comunidade religiosa fundada por um
jovem pastor e sapateiro inglês, George Fox
(1624-1691), na sequência de uma visão que
teve em 1662; perseguido e preso, declarou
num dos seus julgamentos que tremia (to
quake) em nome do Senhor; chamaram-lhe
então, por escárnio, The Quaker; um dos
seus mais célebres discípulos foi William
Penn (1644-1718), fundador do estado da
Pensilvânia, nos EUA, tendo Filadélfia como
capital (=cidade do amor fraterno); a Bíblia é

o livro basilar da comunidade, que não reconhece outra autoridade senão o Espírito
que
interpreta a Palavra; todavia, em 1937, foi
constituída uma comissão mundial consultiva; os seus membros reúnem-se em
*assembleia de negócios+ locais e regionais,
mensais ou trimestrais, para administrar os
bens e territórios; celebram cultos regulares
numa adoração silenciosa da divindade; são
contra a guerra, escravidão e pena de morte,
assim como contra os regimes penitenciários;
hoje, são cerca de quatrocentos mil.
Remissão dos pecados: o acto gratuito de Deus
(graça significa qualquer coisa de gratuito,
que todavia não se mereceu), que permanece
fiel a si próprio e ao homem, apesar da sua
constante infidelidade. Somente Cristo está
autorizado por Deus a remir os pecados, de
vez em quando.
Revivalismo e despertar: termo aplicado a um
movimento que se desenvolveu durante o

GLOSSARIO

século XIX na Grã-Bretanha sob a égide do


metodismo e mais tarde atingiu o Continente;
os pregadores revivalistas itinerantes, como
Moody e Sanky, tentavam despertar a piedade e o zelo missionário das Igrejas nas
reuniões de massa, em que se produziam
movimentos de entusiasmo colectivo e conversões espectaculares; esta tradição
conservou-se até aos nossos dias no Exército de
Salvação e na pentecostalismo.
Sacerdócio universal: perante Deus e por Deus,
e, por conseguinte, perante os homens, todos
os crentes sem distinção são seus sacerdotes;
ou seja, seus servidores colocados no mesmo
plano de igualdade.
Santa Ceia: ou eucaristia (do grego *acção de
graças+, segundo uma palavra do Evangelho
de Mateus) funda-se na morte salvadora de
Cristo e no seu regresso. É uma refeição
(distribuição de pão e de vinho) simbólica,
através de cuja celebração toda a comunidade
se compreende como comunidade de pecado . res, que, não obstante, aguarda com
alegria, fé, esperança e amor o regresso do seu
Senhor.
Santo: não é contraposto a profano, já que a
Bíblia não conhece semelhante distinção. Do
grego *ser colocado à parte+, significa a
consagração de vida do crente a Deus no seio
da realidade. Cada crente individual sem
distinção é, portanto, santo.
Teologia: é a fé que pensa em si própria. Crente
e comunidade interrogam-se sobre a maior ou
menor fidelidade ao Evangelho dos seus pensamentos e actos. É estreitamente
funcional à
proclamação e à compreensão da palavra de
Deus, servindo-se, nisto, de instrumentos de

trabalho comuns a outros campos de investigação (história, filosofia, ética,


linguística,
etc.).
Testemunhas de Jeová: fundado em 1874 em
ambiente adventista por Carlos Taze Russel
(1852-1916), este movimento fundamentalista e milenarista rejeita a Trindade e a
imortalidade da alma, mas acredita na ressurreição dos eleitos; o reino de Jeová
foi
iniciado por mil anos em 1914, data fixada
por Russel; todas as religiões são invenções
de Satanás; em 2914, a Terra será dada em
herança eterna a cento e quarenta e quatro mil
eleitos governados directamente por Cristo.
Valdenses: do nome de Pedro Valdo, abastado
negociante lionês nascido em Beaujolais e

95

GLOSSARIO

falecido na Boémia por volta de 1205, que


renunciou a todos os seus bens e predicou a
breza evangélica; os Valdenses ou *pobres
po
de Lião+ formaram uma seita de pregadores
laicos que condenavam as riquezas do clero,
reclamavam traduções da Biffilia em linguagem vulgar e cuidavam dos pobres em nome
do Evangelho; difundiram-se no Sueste da
França, onde por vezes se confundiram com

os Cátaros, Norte de Itália, Alemaril


Boémia; no século XVI, aderiram à Refoi
cada comunidade é autónoma e respons
por si própria, dirigida por um pastor, c(
juvado por membros laicos da Igreja; o ói
executivo é a *Távola Valdense+, eleita
rectamente pelo Sínodo, que é a reu
anual em que participam pastores e deleg@
laicos das comunidades locais.

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