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Tendo em vista que as sociedades contemporâneas são fundamentalmente

midiáticas, isto é, suas relações sociais e de poder são intermediadas pelas diversas
modalidades de mídia (FONSECA, 2011, p. 43), como os jornais impressos, sua operação
não consiste apenas no agendamento de temas, mas na seleção de aspectos e construção
ideológica das notícias. Processo que contribui para a formulação e disseminação continuada
de percepções sobre a realidade objetiva e conformação de um novo tipo de articulação
simbólica, calcada na interpenetração entre os universos jornalístico e político com impactos
sobre a própria a natureza do poder. O traço simbólico do discurso jornalístico insere-o, por
sua vez, no campo das lutas hegemônicas pelo controle do imaginário coletivo e da percepção
cultural de uma sociedade como “espaço da consciência crítica do ser social”, o que implica a
tarefa forjadora da própria liberdade humana, passando pela conquista hegemônica da
formação de consensos sociais.
Cultura e política, portanto, estão geneticamente associadas e são objeto de arguta
reflexão no pensamento do marxista italiano, Antônio Gramsci . Neste sentido, as dimensões
cultural e política estão interligadas pela hegemonia enquanto algo que opera não apenas
sobre a estrutura econômica e sobre a organização política da sociedade, mas também sobre o
modo de pensar, sobre as orientações e sobre os modos de conhecimento (SIMIONATTO,
1998, p. 47), ou seja, o forjar de sentidos sobre a própria realidade. A hegemonia, portanto,
atua sobre imaginários sociais.
Na sua relação central com o universo da comunicação, o conceito de hegemonia

desenvolvido pelo filósofo marxista italiano Antonio Gramsci ajuda-nos a


desvendar os jogos de consenso e dissenso que atravessam e condicionam a
produção simbólica nos meios de comunicação, interferindo na
conformação do imaginário social e nas disputas de sentido e de poder na
contemporaneidade (MORAES, 2010, p.54)

Deste modo, ao contrário da visão marxista tradicional, a hegemonia tem a ver com
“entrechoques de percepções”, enfatizando a produção de saberes e representações de mundo
na formulação de uma “direção cultural”, ultrapassando a esfera do econômico. Enquanto
modelo persuasivo, a hegemonia atua como controle do imaginário social, usando entre
outros meios dos Aparelhos Privados de Hegemonia (APH), como os jornais impressos, que
cumprem o papel de “caixas de ressonância” das disputas ideológicas. Ao comentar Gramsci,
Moraes ainda observa a questão central da relação entre hegemonia e comunicação “a partir
da condição privilegiada de distribuidores de conteúdo” (MORAES, 2010, p. 61). Neste
sentido, a mídia impressa tende a fixar “os conteúdos ideológicos da ordem hegemônica”.
Dentro desta lógica, a imprensa seria “a parte mais dinâmica” da estrutura ideológica do
capitalismo, organizando tais visões de mundo, produzidas pelo conjunto de forças
dominantes.
Na medida em que interferem com a “cartografia do mundo coletivo”, tais APHs
atuam sobre o conjunto de símbolos, alegorias, mitos, ritos e afetos. Os símbolos revelam o
que está por trás da organização da sociedade e da própria compreensão da história humana
(MORAES, 2002, p.1) e operam no sentido de naturalizar visões de mundo e auxiliar na
condução política de grupos sociais.

“Hegemonia pode ser definida como a capacidade de


um grupo social determinar o sentido da realidade,
exercer sua liderança intelectual e moral sobre o
conjunto da sociedade. A luta pela hegemonia – pela
organização da cultura – é, neste sentido, uma luta
pela articulação de valores e significação que
concorrem para a direção político-ideológico dos
indivíduos” (COUTINHO, 2002, p.1)

A natureza do conflito consiste no fato de que ele é travado no terreno das ideias e das
construções imaginárias coletivas, isto é, “uma luta pela sistematização de formas culturais”.
Portanto, cultura e linguagem consistem em instâncias de domínio no interior das quais e
pelas quais diferentes grupos sociais buscam impor suas próprias hegemonias em dada
sociedade. Na medida em que, em termos de domínio do imaginário, o controle das
subjetividades se coloca em primeiro plano, é fundamental a análise das narrativas tecidas
pela mídia hegemônica. “Posto que a linguagem é um dado social que estrutura a consciência,
cabe indagar sobre as narrativas e as formas de comunicação predominantes na consciência
popular na sociedade contemporânea” (COUTINHO, 2002, p.4). Tendo em vista que os
processos de domínio implicam tensão permanente entre diferentes grupos e classes sociais,
com diferentes níveis de acessos aos Aparelhos Privados de Hegemonia (APH), - como a
imprensa -, os jogos de poder se tornam permanentes na arena midiática. “Uma hegemonia
viva é um processo. Um processo de luta pela cultura” (COUTINHO, 2008, p. 77) e que
também pode se desenvolver no interior da própria mídia em virtude de potenciais diferenças
ideológicas entre seus profissionais. Pensar a cultura a partir dessa percepção dinâmica e de
conflito implica que ela pode ser compreendida como:

“uma instância de luta política, e os meios de


comunicação, como instrumentos de hegemonia por
meio dos quais uma classe ou fração de classe impõe
uma liderança intelectual e moral sobre o conjunto
da sociedade” (COUTINHO, 2008, p. 8).

Parte-se, desta forma, do reconhecimento da mídia como objeto fundamental de


análise para a compreensão do poder político no mundo contemporâneo (LIMA, 1996, p.
240) na medida em que, como o Imaginário Social, ela atua na produção de pontos de
referência dentro do amplo sistema simbólico produzido por uma sociedade. Ao se constituir
como peça efetiva de controle social, o jornalismo tende a fabricar representações globais da
vida social, entendidas não como mero reflexo da dimensão estrutural, mas como conjunto de
signos constituintes da própria realidade. Todavia, na construção de tais perspectivas
ideológicas, pode-se perceber pontos de vista dissonantes que tendem a configurar os jornais
como dispositivos ideológicos complexos – e não aparelhos monolíticos de poder. Parte-se
aqui do pressuposto de que o conflito deve ser considerado categoria analítica fundamental
para a compreensão do processo de reconstrução ideológica. Ou seja, para entender a
hegemonia propõe apreendê-la como construção ideológica perpassada por lutas simbólicas.
Ao reelaborar o conceito de hegemonia, Raymond Williams (1979) redefine-a como um
conjunto de práticas e expectativas sobre a totalidade da vida, conjunto este constituído e
constituinte de significados e valores que, uma vez vividos, parecem se confirmar junto à
realidade. Portanto, a hegemonia tende a constituir um senso de realidade sempre em
processo e que permite visões contraditórias como formas alternativas e táticas de resistência
contra-hegemônicas.

Assim, em nossa articulação conceitual, representação significa não só re-presentar a


realidade, mas também constituí-la (LIMA, 1996, p. 245) por meio de operações semióticas.
Mikhail Bakhtin (2006) contribuiu para a compreensão das relações dialéticas entre signo,
cultura e poder ao definir a correspondência decisiva entre signo e ideologia. Em outras
palavras, tudo que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia. (BAKHTIN,
2006, p. 29) de forma que o ideológico possui valor semiótico e potencializa diferentes
leituras. Para o pensador russo, a linguagem se constituiu enquanto espaço fundamental de
luta política, partindo do reconhecimento de que ‘classes sociais diferentes servem-se de uma
só e mesma língua’ e que, portanto, uma mesma palavra pode ser interpretada de maneira
diferente por distintos sujeitos históricos (COUTINHO, 2012, p. 1). Segue-se que o signo se
converte na arena da luta de classes, pois diferentes apropriações de sentido dos seus índices
de valor estão em jogo, sublimando a absoluta reversibilidade da lógica da linguagem
enquanto discurso ideológico.

Como Gramsci, Bakhtin concebe a dimensão ideológica sob a forma de disputa sobre
o sentido do mundo com sua consequente naturalização; ambos, por isso, enfatizam o
potencial de reversão de sentido e a capacidade contra-hegemônica dos diferentes grupos
sociais. Como bem observou Coutinho (2012), o confronto de interesses sociais nos limites
de uma só e mesma comunidade semiótica, em Bakhtin, encontra ressonância na percepção
da linguagem e da cultura como luta pela hegemonia político-cultural.

A despeito da ênfase na configuração monopolista da estrutura midiática e de seu


poder de emissão, parte-se deste projeto do pressuposto de que o conflito é categoria social
inerente aos processos jornalísticos – tanto entre jornais como na recepção de seus diferentes
discursos. Desta forma, acredita-se, como preconizado por Bakhtin ao indicar a plurivalência
e reversibilidade dos signos, que o receptor é capaz de contrabalançar com seus códigos
estranhos à linguagem hegemônica, seus signos escorregadios, dificilmente assimiláveis e
manipuláveis pelo discurso oficial (COUTINHO, 2008, p. 6). Pode-se, ao mesmo tempo,
observar que na emissão há potenciais jogos de conflitos expressos em diferentes visões
ideológicas de mundo, construídas a partir de diferentes enquadramentos, pois o discurso
jornalística tendem a influenciar o modo como são organizadas as imagens da realidade.

Em linhas gerais, a organização de determinados termos pode ser chamada


também de enquadramento, ou seja, o jornalista opta enquadrar um fato de
uma determinada forma e não de outra, enfocando assim uma parte da
realidade em detrimento de outra. (LEAL 2007, pg. 2)

Elaborado, a princípio, por Goffman (1974), o conceito se referia a esquemas


utilizados para compreensão de situações sociais a partir do modo como os indivíduos
organizam seu cotidiano.
I assume that definitions of a situation are built up in
accordance with principals of organization which govern events
– or at least social ones – and our subjectivity involvement in
them; frame is the word I use to refer to such f these basic
elements as I am able to identify (GOFFMAN, 1974, pgs.
10/11).
Posteriormente, no entanto, ele seria reelaborado por Gitlin (1980), sendo aplicado
nos processos comunicacionais e sua reconstrução ideológica do conflito do Vietnã como
“persistent patterns of cognition, interpretation, and presentation, of selection, emphasis, and
exclusion” (GITLIN, 1980, pgs. 6/7). O conceito permite com que se compreenda quais são,
nas palavras de Koening (2004), as “estruturas cognitivas básicas que guiam a percepção e a
representação da realidade”. Enquanto padrões de leitura do mundo, os enquadramentos
tendem a construir verdadeiras matrizes gerais de significados, definindo diferentes níveis
valorativos. Em síntese, nos estudos jornalísticos, o conceito de enquadramento deve ser
observado na sua dimensão ideológica.

To frame is to select same aspects of a perceived reality and make


them more salient in a communicating text, in such a way as to
promote a particular problem definition, casual interpretation,
moral evaluation, and\or treatment recommendation (ENTMAN,
1993, p. 52 apud SCHEUFELE, 1999, p. 107)

Portanto, o enquadramento pode ser concebido como marco que constitui os modos
através dos quais se cataloga a experiência cotidiana e, por isso, não são apenas definidores
do significado da realidade, mas estabelecem também os modos apropriados de participar
dela (GONZAGA, 2010, p. 139). Quadros de sentido e modelos acionais. Esta característica
semiótica - a de que sua ação de demarcação do acontecimento é parte deste acontecimento
e em parte o define (ibid., p. 140, grifo nosso) encontra correlação na percepção de William
(1979) de que os signos são constituídos e constituidores da própria realidade. O caráter
reflexivo do frame, portanto permite inferir que a descrição de um evento social seja parte
essencial do reconhecimento desse acontecimento enquanto unidade social descritível (ibid.
p.140, grifo nosso). Daí se conclui que a mídia não apenas agenda nossas preocupações, mas
também influi sobre como pensamos. Pode-se, desta forma, defender que frames são padrões
persistentes de cognição, seleção, ênfase e exclusão (ibid., p. 141, grifos nossos) e, portanto,
são parte integrante do processo da reportagem.
As primeiras categorias analíticas utilizadas serão, respectivamente, a eufemização,
representação de atores sociais por meio de sua agência, a agregação e a generalização.
Como já foi dito, a eufemização opera reduções da intensidade e do impacto da ação de
determinado sujeito sobre a realidade (ou sobre outros sujeitos); a representação pode
enfatizar a ação de atores sociais ou mesmo deslocar suas agências para um verbo, instituindo
mecanismo potencial de proteção. A agregação, por sua vez, contribui para a criação de dados
estatísticos ao passo que a generalização atua constituindo sujeitos coletivos. Nesta parte,
procura-se avaliar, em especial, o uso da eufemização nas manchetes da página principal de
política. Dando início à análise, a manchete da Folha de São Paulo do primeiro dia de
publicação do escândalo (FSP, dia 18/05), “Delator envolve Temer em compra de silêncio de
Cunha”, atua reduzindo o impacto político do caso a partir do uso do verbo “envolver”. Basta
observar que o referido verbo poderia ser substituído por “acusar” ou “suspeitar”, adensando
a negativização do discurso. Da possibilidade valorativa e negativa máxima - “Delator acusa
Temer...” – ou da modalidade intermediária – “Delator suspeita...” - desloca-se, por
eufemização, para “envolve”.
Ao mesmo tempo, a expressão “compra de silêncio” tende a blindar o ator social,
quando contraposta ao termo “propina”, como na possível manchete, “Delator acusa Temer
de usar propina para silêncio de Cunha”. Ainda no mesmo dia, pode-se observar mecanismo
de generalização, quando a acusação de uso ilícito de dinheiro é deslocada para o então
ministro da Fazenda das administrações de Luís Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff,
Guido Mantega. No trecho “Também o PT é atingido, com a acusação de que o ex-ministro
Guido Mantega era o contato do conglomerado junto ao partido”, a ênfase recai sobre o
sujeito coletivo e não apenas sobre o indivíduo. As realizações linguísticas anteriores, que
atuaram por nomeação, mencionaram apenas Michel Temer e Aécio Neves sem destacar suas
siglas partidárias (PMDB e PSDB). No caso em questão, deslocou-se a denúncia do ator
social para o sujeito coletivo – o partido PT – através de generalização, que potencialmente
atinge a todos os integrantes da sigla.
Na manchete do dia seguinte (FSP, 19/05), pode-se observar adensamento do
mecanismo de eufemização sobre o áudio, base da denúncia: “Temer descarta saída; áudio
sobre Cunha não é conclusivo”. O juízo de valor enfatiza o caráter inconclusivo do material,
que se tornará, nos primeiros dias de cobertura, o enquadramento primordial da cobertura,
abrindo a possibilidade de redução da crise política à dimensão jurídica. Na manchete do dia
20/05, podem-se observar o deslocamento da ênfase do ator à agência: “Procurador vê
indícios de três crimes em atuação de Temer”. No caso, a manchete atua para transferir a
suspeita de ilicitude para sua ação, contribuindo para minorar o impacto da acusação sobre a
integridade de Temer. A edição do dia 25/05 apresenta uma série de realizações linguísticas,
como pode ser visto pela manchete, “Ato tem conflito e depredação; Temer chama Forças
Armadas”. A estrutura enquadra a decisão arbritrária do presidente “chamar as Forças
Armadas”, com conotação autoritária, como resultado do “conflito e depredação”, expressões
clássicas que conotam, no imaginário social, ruptura da ordem pública. Ademais, a
intensidade do verbo “convocar” – “Temer convoca as Forças Armadas” – é diluída pelo
caráter pretensamente neutro do verbo “chamar”. O verbo, também de conotação negativa,
“decretar” será usado apenas no texto, o que permite observar que a manchete se configura
como o espaço privilegiado de inserção de verbos de sentido negativo menos intenso.
O expediente da enumeração, por sua vez, permite com que se contabilize, na visão
do jornal, a extensão dos danos – “oito ministérios depredados”, “dois incendiados” e “41
feridos”. Por outro lado, os atores sociais de esquerda que, pela primeira vez, recebem ampla
cobertura, são concebidos como antagônicos à ordem e enumerados em sequência
generalizáveis: “sindicalistas”, “professores” e “sujeitos mascarados”, estruturando a menção
de cada grupo social a partir de graus de intensificação negativa, até culminar com os
“mascarados”. Na edição (FSP, 8/06), a manchete “Temer muda versão e admite viagem em
jato particular”, o processo de eufemização se evidencia quando a expressão “mudar versão”
é contraposta ao verbo “mentir” ou a expressões similares – “Temer mente/admite mentir...”.
No corpo textual, a expressão usada é “o presidente Michel Temer mudou o
posicionamento oficial” ao passo que, mesmo nos “bastidores”, o verbo principal é
“reconhecer” (“Nos bastidores, os assessores reconhecem que o avião era do empresário
[Joesley Batista, um dos donos do JBS]”). As realizações linguísticas posteriores apontam
que para “justificar o recuo”, a “equipe do presidente disse que cometeu um erro”,
expressão que aqui tende a ocupar o lugar do provável deslize para com a verdade dos fatos.
Como resultado, Temer “prestará explicações” e não “esclarecimentos”, palavra cujo sentido
remete a escuridão, conluio e conchavo no universo da política, ou seja, o ator social que está
em condições de “explicar” se distancia daquele obrigado a “esclarecer”.
A reportagem “Arquiteto cobrou coronel por reforma para filha de Temer”
(FSP,16/06) versa sobre suspeita, deflagrada pela denúncia de Joesley Batista, de que o
coronel, João Baptista Lima Filho, seria “laranja do presidente, isto é, estaria recebendo, em
nome de Temer, dinheiro ilícito. Parte desta verba teria sido, de acordo com a cobertura da
FSP, destinada à reforma de apartamento da filha de Temer, constituindo caso semelhante à
acusação de irregularidade que pesa sobre o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, acerca
da reforma de apartamento triplex em Guarujá. Lula foi condenado em primeira instância. De
acordo com a reportagem, na casa do coronel foi encontrado email “com sinais de que ele
cuidou de pagamento da reforma de um imóvel de Maristela [filha de Temer]”. O termo
técnico do inquérito – “indícios” – foi abortado da matéria, contribuindo para dificultar
possíveis comparações de ilicitude entre os casos Lula e Temer. Na reportagem, Temer é
mencionado como suspeito de ter dado “aval para comprar silêncio de Eduardo Cunha”,
apontando para realização discursiva que tende a substituir “propina”. Finalmente, na
reportagem sobre a votação na Câmara (FSP, 3/08), a intensa distribuição de recursos de
emenda a parlamentares na compra de votos para a absolvição de Temer – marca central do
caráter antirrepublicano da cultura política brasileira - foi definida como “cenas de uso da
máquina”.
Nesta segunda parte, busca-se analisar o corpus textual a partir das categorias
intertextualidade (anexação de discurso), expurgo do inimigo, metáfora, julgamento de
valor e pressuposição. A primeira categoria permite com que se avalie a anexação de outras
vozes ao discurso do autor do texto e, fundamentalmente, a relação hegemônica que se
estabelece entre os discursos. Já o expurgo do inimigo, categoria desenvolvida por
Thompson, aponta para o processo limite de deslegitimação do antagonista ao passo que as
metáforas criam imagens que, em tese, afetariam a percepção do (a) leitor (a) do texto. O
julgamento explicita um ponto de vista; a pressuposição encarna um ponto de vista não
explicitado. Na reportagem do dia 18/02, observa-se anexação do discurso de Temer por
ordem indireta no qual o presidente, em nota, “negou que tenha participado de movimento
para impedir delação de Cunha”. A interlocutores, ele teria, no entanto, admitido que Joesley
“mencionou na conversa ajuda financeira a Cunha”. Percebe-se que a anexação do discurso
de Temer sempre vem acompanhada de expressões de eufemização, que operam para
neutralizar a denúncia da reportagem.
Na reportagem do dia seguinte (19/05), o autor estabelece juízo de valor fundamental
sobre as consequências da reportagem: “mercados desabaram e base aliada esteve perto de
cair”. Na avaliação, realização por enumeração de resultados, o discurso da FSP enfatiza,
sobretudo, a desestabilização da ordem econômico-financeira, que virá a se tornar o cerne de
sua crítica à denúncia de Joesley Batista. Na análise, o jornal reporta que a Bolsa de Valores
de São Paulo estaria enfrentando o “quinto pior pregão do século”, o que teria levado os
operadores a optarem pelo “circuit breaker”, expressão em inglês para a suspensão das
negociações por meia hora. Desta forma, a FSP atua na construção de dois pólos
informacionais, o desabamento dos mercados, inserido no primeiro parágrafo, e a crise na
Bolsa, inserida no penúltimo, definindo a lógica de cobertura de todo o período. Nas duas
últimas linhas, a sociedade civil é mencionada por generalização – “houve manifestações”.
As realizações linguísticas optaram por verbos de intensidade relacionados à reação
do presidente – “(...) Michel Temer (PMDB) prometeu em pronunciamento à nação resistir
no cargo: ‘Não renunciarei. Repito: não renunciarei’, declarou”. A seleção verbal, que
ocorre na segunda matéria do escândalo, contribui para conferir hegemonia ao discurso de
Temer e adensar sua defesa diante da “nação”. A reiteração da expressão verbal tende tanto a
positivar sua decisão de permanecer no cargo quanto a adensar sua capacidade de resistir às
adversidades. A reportagem do dia 21/05 abre espaço para a operação do expurgo do outro,
com a introdução de anexação de discurso de forma direta e indireta (com ou sem citações).
Definindo a acusação de corrupção como “pífia” Temer ainda denominou o áudio de
“fraudulento” e acusou Joesley Batista de “falso testemunho”, de perpetrar o “crime perfeito”
e de lucrar “bilhões” em operações de câmbio. Neste sentido, por meio da aproximação dos
discursos do autor do texto e das citações do presidente, a FSP tende a assumir com Temer
uma mesma posição de crítica – que se estende ao plano moral – à atitude do dono do JBS. A
coalescência discursiva permite a construção da figura do inimigo público a ser combatido.
A anexação de discurso direto, na mesma reportagem, sintetiza o ponto de vista da
FSP/Temer: “O Brasil saído da mais grave crise econômica de sua história vive agora dias
de incerteza”. Ao longo de sua cobertura, a anexação de outras vozes pelo jornal vai se
configurando como tática de consolidação da posição de Temer que, embora percebida como
crítica, pode ser superada. Assim, no dia 22/05, lê-se o conselho do ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso (FHC), orientando Temer a “resistir a momentos de instabilidade”,
discurso que contribui para conceber o panorama político como crise, isto é, como
adensamento de problemas a serem superados e enfrentados. No diálogo, por telefone, entre
FHC e Temer, o ex-presidente “lembrou de crises que enfrentou” – e que teriam sido
superadas. De forma sutil, a FSP, ao usar a voz do ex-presidente, tende a introduzir no
presente crítico de Temer a necessidade do enfrentamento e, em consequência, a
possibilidade da permanência futura no cargo.
No dia seguinte (FSP, 23/05), Temer é concebido como estrategista político. Por meio
da expressão “ao mesmo tempo em que”, o presidente é descrito como ator político que: 1)
“desiste” do processo no STJ, mas 2) “recrudesce” esforços no Congresso para aprovação de
“pacote de medidas econômicas”. Apesar do verbo “desistir” implicar, a princípio, recuo, a
seleção dos demais verbos parece operar no adensamento do capital político de Temer:
“recrudesceu o esforço”, “para tentar, no Congresso, se reerguer”, “mobilizou líderes”.
Por definição, a política é o espaço do recuo e do recrudescimento, movimentos que
compõem a estratégia do jogador, encarnado em temer. Na reportagem, há menção à esquerda
política, concebida como ator social antagonista cujas futuras ações são construídas por
pressuposição: “O governo, entretanto, vai enfrentar a resistência da oposição, que promete
barrar as votações.” A construção semiótica (e política) da imagem de esquerda como
antagonista adquire grau ainda mais negativo dois dias depois (25/05), quando sua imagem é
deslocada de oponente para inimigo público por meio da realização linguística do expurgo do
outro. Definindo a Explanada dos Ministérios como “campo de batalha”, a reportagem opta
pela narrativização do evento, apontando como estopim a chegada da manifestação: “A
confusão começou por volta das 13h30, quando a manifestação se aproximava de um
bloqueio policial a 500 metros do Congresso.” Aos “sindicalistas” e “manifestantes” foram
anexados verbos de violência física: “forçaram as grades”, “uma multidão se engajou na
tentativa de invadir o Congresso”.
A anexação da voz de um ator social de esquerda, a deputada federal, Vanessa
Grazziotin (PCdoB), se deu, ao que tudo indica, para corroborar a imagem agressiva dos
manifestantes: “Companheiros mascarados, por favor, temos mães aqui, vamos manter a
calma”. Por meio de metáforas de violência – “palco de batalha” – ou ênfase em descrições
de embate – “policiais militares deram tiros com armas letais”, “um estudante de Santa
Catarina que teve a mão decepada por um rojão” -, a cobertura operou no sentido de diluir
o conteúdo político da manifestação e blindar o arbítrio da decisão de chamamento das
Forças Armadas.
Já a reportagem do dia 5/06 opera na desconstrução de outro oponente, o procurador-
geral da República, Rodrigo Janot, como pode ser visto na manchete, “Temer faz ofensiva
contra Janot após prisão de aliado”. A defesa de Temer “desferiu ataques públicos” contra a
PGR, no intuito de “blindar” o presidente contra “impacto político”. Neste caso, pode-se
observar que o quem “desfere ataques públicos” não é Temer, mas sua defesa, cujo discurso –
e consequente ponto de vista – é anexado à reportagem, apontando para “movimentos e
iniciativas de Janot às vésperas do julgamento do TSE na tentativa de constranger o
tribunal a condenar o presidente”. O uso de palavras como “movimentos” e “iniciativas” e
do advérbio “vésperas” tem o potencial de produzir a percepção de táticas para “constranger”
o tribunal, deslegitimando o papel do procurador e questionando o republicanismo de sua
atitude. O discurso de Gustavo Guedes, advogado de Temer, não é apenas anexado por
mecanismos de ordem direta (com aspas) ou indireta (sem aspas), ele é transformado no
discurso hegemônico da reportagem e, por isso, utilizado como mecanismo simbólico de
deslegitimação de Janot. Cria-se, por meio deste expediente linguístico, a fusão dos pontos de
vista do jornal e de Guedes/Temer que antagoniza a PGR. O cerco se fecha, porém, quando –
ao preservar fontes – a FSP avalia que, “para assessores”, Janot e o relator do caso, no STF,
Edson Fachin fariam uma “dobradinha” contra Temer, expediente que tende a deslegitimar
o caráter republicano tanto do ministro do STF quando da PGR.
A manchete do dia 10/06, que publica a absolvição de Temer pelo Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) – “Aliado de Temer, Gilmar defendeu a absolvição” – demonstra a força das
alianças políticas de Temer na corte.

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