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A T E R R A DOS A N C E S T R A I S 45

A EXISTÊNCIA DE ISRAEL NO CORAÇÃO DO ORIENTE MÉDIO

POLARIZA OS CONFLITOS DA REGIÃO. COMO COMPREENDER ESTE


NO ANO PRÓXIMO PROBLEMA E AS PAIXÕES QUE ELE DESPERTA, SENÃO ATRAVÉS DA

EM JERUSALÉM HISTÓRIA DA IMPLANTAÇÃO DO SIONISMO NA PALESTINA?

O Estado de Israel bem pode ser


considerado a consagração do
movimento sionista, que trabalha
pelo restabelecimento da sobera-
nia política do povo judeu e pelo
seu retorno à terra de seus antepassados. Poucas
vezes na História uma utopia voluntarista originou uma
realização de tamanha importância. O termo "sionis-
mo", que surge por volta de 1890, refere-se a Sion,
Em 1947 o Exodus, navio
que transporta mais de
4 000 refugiados do
genocídio judaico na
Europa, é impedido de
ancorar no porto de Haifa
pelas autoridades
britânicas, preocupadas em
frear a imigração judaica na
Palestina. Esse drama
colina de Jerusalém sobre a qual foi construído o pri- comove a opinião mundial,
meiro templo, e que simboliza a Terra Prometida. O sic- que passa a favorecer a
criação de Israel.
nismo ficou profundamente marcado pelo contexto em
Foto © Magnum
que surgiu: o do anti-semitismo europeu. E, na realida-
de, a construção do Estado de Israel não se fez tanto
contra os árabes da Palestina — ou apesar deles —,
mas contra um Ocidente que rejeitava os judeus.
Porém como o motivo da imigração judaica e suas refe-
rências culturais e políticas se situavam na Europa, a
ideia sionista foi considerada estrangeira à região e
vinculada ao colonialismo.
A chegada dos primeiros pioneiros judeus coincide
com o retalhamento das antigas províncias árabes do
Império Otomano e o domínio dos países europeus
sobre a região. Assim, logo de saída ela foi encarada
como uma manifestação perniciosa desse domínio
estrangeiro: em 1919 a delegação palestina no
Congresso Sírio resume este sentimento ao afirmar
que "o sionismo é mais perigoso que a ocupação fran-
cesa (na Síria), pois estes (os franceses) sabem que
são estrangeiros, ao passo que os sionistas crêem
estar em casa na Palestina"... Vemos assim que entre
os colonos judeus e os árabes da Palestina dois pon-
tos de vista com legitimidade diferente, dois destinos
O C H O Q U E DAS L E G I T I M I D A D E S 47
O TEMPLO E A MESQUITA
históricos irão se chocar e se superpor, sem nunca se
lrniplii < | < > ,l>;ilomuo, como lembrança da

O
santuários, embora encontrar, em torno de uma única terra, por uns cha-
construído no século grandeza da construção problemática, sempre foi mada de Israel, por outros de Palestina. Paradoxo trági-
X ii.C., original. Nos primeiros bastante boa. Em 1928,
co e ambivalência do sionismcyslanejaclp no Ocidente
Instomunhava o esplendor e tempos de suas profecias, porém, o Grande Mufti
o poder do antigo reino de Maomé orientava as preces decide realizar uma como libertação da opressãoyanti-semjtã^ ele se reali-
Israel. O recinto mais de seus fiéis na direção de ampliação na mesquita que zará no Oriente como uma empreitada colonialista.
Interno deste lugar sagrado Jerusalém. Foi lá que, exigiria fazer uma abertura Para além de todas as justificativas e de todos os
abrigava o Santo dos segundo o Corão, o Profeta no Muro. Diante desta erros cometidos de ambas as partes,
Santos, considerado o realizou sua misteriosa provocação, os incidentes do OrientejyiédiQ-Q-Confjj_to sejgsume_aestg_dadp_fy.r>,
centro do Universo, onde viagem noturna. No primeiro se multiplicam. Em agosto rlampntal- jajTpjipaçãn pfptiva, simbólica e política por
repousavam as Tábuas da século do calendário de 1929, uma manifestação
Lei que Deus deu a Moisés muçulmano, em 687 d.C., o de defesa organizada pela yiQJaLuJ2P_, humano de um território lá habitado jx>r
no monte Sinai. Apenas o califa omeíada Abd al-Malik Haganá deflagra uma série outro grupo humano.
Sumo Sacerdote podia construiu sobre os de revoltas e massacres.
penetrar neste recinto uma fundamentos do templo o Esta é a origem da primeira As origens do sionismo
vez por ano, no Dia do Haram al-Sharif, composto revolta árabe generalizada É no século XIX, num contexto onde aparentemente
Perdão (Yom Kippur). O pelo Domo do Rochedo e no território do mandato da Construídp_emJ>87jsobre
triunfam as exigências de justiça e de igualdade para
templo foi destruído pelos pela mesquita de al-Aksa, Palestina. Com a tomada de as fundacçe&jlq Ternplo de
Jerusalém oriental em todos os cidadãos, que nasce o ideal sionista de
Jerusalém, o Domo do
1967, a "libertação do "saída" da Europa e de reagrupamento dos judeus na Rochedo, também chamado
Muro" foi para todos os Palestina. Moisés Hess (1812-1875), Leon Pinsker Mesquita de Ornar, é um
israelenses um símbolo da (1821-1891) e Theodor Herzl (1860-1904), os pais dos três grandes lugares.
maior importância. Certos fundadores do movimento sionista, desencantaram-se sagrados_do islamismo^
religiosos esperam, três mil com a proposta de assimilação dos judeus aos países Segundo a tradição, foi aí
anos depois do reinado de que o profeta Maomé
onde residiam. Constatando o fracasso da ideia de
Salomão, testemunhar a
construção do terceiro emancipação individual, opõem a ela um contraprojeto temninou_suajnisl££iasa.
de emancipação coletiva. Aos ataques anti-semitas viagem noturna: "Louvor
templo. Pois, segundo a
~Áãuele que transportou Seu
profecia de Zacarias, contra o judeu apátrida, eles respondem com a aspira-
servo durante a noite, do
"nesse dia, os pés do ção ao retorno à pátria ancestral, a Palestina. Às acu-
Senhor pousarão no monte lufíar do culto sagrada
sações. contigLQJudeu explorador,.aviltado pelo êxíljp_e" (Medina) aojmugar do culto
das Oliveiras, que está
pelas atividades pecuniárias, eles propõem o ideal de mais longínquo (al-Aksa), de
diante de Jerusalém do lado
do oriente, e o monte das "regeneração" e de "conquista do trabalho" (físico) onde lançamos uma bênção
babilónios em 586 a.C. — no local que se supõe ser o Oliveiras se abrirá ao meio, pelo povo judeu, Eç sobre os arredores, a fim, de
M'i',1 indo a tradição, como da ascensão do Profeta. Se de leste a oeste, num afirmar-se-nos kibutzim, comunidades coletivistasjjue lhe mostrar alguns de
i. '.hi',0 ao povo judeu por o nome hebraico de imenso vale, e metade do dorsar^llmplantacao
te '.c .il.istado das leis de Jerusalém, Yerushalaim, monte recuará para o norte sionista na Pç jnarayilhosos". (Capítula
M >r.i-, o templo foi depois significa "cidade da paz", e a outra metade para o XVII do Corão, chamado
Fruto das circunstâncias, esse projeto logo encontra
n- Mii-.iniiilo por volta do em árabe Al Qods significa sul" (Zacarias, 14). Após "Filhos de Israel".)
MI u MIO .i c., reformado por "a santidade". Depois de esse cataclisma, as duas fortes resistências dentro do próprio mundo judaico.
Foto © LL-ViolIet
. i«ir volta da época Meca e Medina, Jerusalém é mesquitas desaparecerão e Por insistir mais no caráter nacional rin que religioso do
M C novfimente o terceiro lugar santo do se poderá então reconstruir judaísmo, o sionismo foii _por muito tempo um movi-
t" iiui.inir .1 rebelião islã. Como as autoridades o templo. Entretanto, mento minoritajio^ejTjjjjt^^ para os religjo-
ii.i KOIM.I no ano religiosas muçulmanas desejando acelerar a " 'ffiçn ft sacrílego,
^o i 11 n . • • • . . i ci, i AI n nas controlavam o Haram chegada da era messiânica, oieío políth
pois subordinaajdentidade i
uniu |..ni. ii.i iiiiiiii.i.ivel al-Sharif, e em certos extremistas como os
cmTpfega o retorno antes já chega-
liiiimlli ... lilxiilnl. M Muro consequência, o acesso ao "Fiéis do Monte do Templo"
tíNK l Hlli' llhll Õir,, Illl Muro das Lamentações, a ambicionam destruir o da do Messias. Sobretudo, a grande maioria dos
(JllMMCjfl «III pé | coexistência entre os dois Haram al-Sharif... • judeus continua .fiel à ideia de uma emancipação pes-
NO ANO P R Ó X I M O EM J E R U S A L É M
THEODOR HERZL E AS HESITAÇÕES DO SIONISMO
soai no contexto dos países onde moram, e acusam
(.'(«ii/v..io .s/o/MH/;) í/íi os sionistas, com seu projeto de ruptura com o Oci-
T
heodor Herzl após a morte de Herzl: o observem os seus preceitos,
/', //< v;///1,-1 w.•») defender sua dente, de fazer o jogo dos(arffserriltãs^ Foi necessário (1860-1904), "o arauto sionismo não tem sentido e os dois exílios do povo
causa perante os Aliados do Estado", é fora de Sion! judaico foram provocados
que viessem as perseguições hitleristas — e o silêncio
vitoriosos. Na delimitação do considerado o fundador do O próprio movimento pelo abandono da Aliança
luturo mandato na Palestina,
das nações — para que o sionismo aparecesse aos sionismo político; teve por sionista encontra-se dividido com Deus. Unindo-se ao
chega-se a uma solução de judeus como último recurso. Em 1945, a opinião públi- mérito estruturar o quanto aos seus objetivos movimento sionista por
compromisso: enquanto a ca mundial é abalada pela descoberta da existência movimento sionista e básicos. Assim, para Ahad razões táticas, eles esperam
França abandona parte da dos campos de concentração onde os nazistas exter- difundir suas teses. Herzl, Ha'am (1856-1927), adepto reorientã-lo para um retorno
um jornalista vienense, do sionismo "cultural", à religião. O fracasso
Alta Galiléia, a Inglaterra abre minaram milhares de judeus. Dos pogrons de Odessa provisório da via diplomática
judeu assimilado e Israel deve tornar-se um
mão do rio Litani, "a boa (1881) até Auschwitz, o sionismo adquiriu uma trágica admirador da França refúgio para o judaísmo, e é seguida por Theodor Herzl
fronteira" reivindicada pelos legitimidade. iluminista, acompanha em preciso não tanto "preparar — mas que será continuada
dirigentes sionistas. Mesmo assim, se é verdade que o anti-semitismo 1895 o caso Dreyfus, a terra para o povo mas sim por Haim Weizman, futuro
Foto © Edimedia europeu confere legitimidade à existência de Israel, os quando um capitão francês o povo para a terra". Em primeiro presidente do
judeu foi injustamente Estado de Israel — traz
degradado. Comovido, a predominância dos
publica no ano seguinte O sionistas "práticos",
Estado judeu, ensaio que decidem infiltrar-se
sobre uma solução na Palestina,
moderna do problema ilegalmente se
judaico, onde exprime sua necessário. Esses
esperança de "normalizar" pioneiros da segunda
a situação dos judeus alia, entre os quais
pela via política. Em 1897 figura David Ben
ele convoca em Basileia, Gurion, assentam as
na Suíça, o primeiro bases do futuro Estado
congresso onde se formou de Israel. Já os
a organização sionista. "revisionistas"
Herzl confia na via liderados por Zeev
diplomática para obter um Jabotinski e Menahem
"pedaço da superfície Beguin sonham
terrestre" onde se possa conquistar a terra pela
estabelecer um lar força, abrangendo toda
nacional judaico, núcleo a Palestina e a
de um futuro Estado Transjordânia. Resta
independente. Suas mencionar duas
reivindicações junto ao tendências muito
sultão otomano e ao minoritárias no
kaiser alemão fracassam. movimento sionista:
Após cogitar a Argentina e além dos
depois o Chipre, em 1903 "territorialistas", que
Londres oferece à continuam ligados ao
organização sionista a projeto da implantação
árabes recusam que isso se realize à sua custa, isto Uganda como sede de um de um país numa terra
é, permitindo ao Ocidente aplacar sua má consciência lar nacional. Grande vitória 1909 ele contribuirá para a virgem que não seja a
às expensas dos direitos nacionais dos árabes. para o sionismo, que assim fundação da Universidade Palestina, há uma extrema
obtém seu primeiro Hebraica de Jerusalém. esquerda que apela à
Ora, os novos imigrantes, marcados pela atmos- reconhecimento Em 1902, com o partido solidariedade de classe
fera ideológica da Europa de onde saíram, irão internacional... O projeto, Mizrahi, aparece o sionismo entre trabalhadores judeus e
subestimar o problema da coexistência com essa aprovado por pequena "religioso": segundo este, árabes e pede a criação de
população nativa; eles se preparam para colonizar maioria pelo Congresso os judeus são um povo um Estado binacional. •
a Palestina em nome dos ideais do progresso e da Sionista de 1903, é apenas porque lhes foi dada
rejeitado imediatamente a Tora para que eles Foto © Colação Viollet
NO ANO P R Ó X I M O EM J E R U S A L É M
A P A L E S T I N A A N T E S DE I S R A E L 51
í^;// ii A ' .) / *f v/. //./i,, i< » civilização. Ainda mais ingenuamente, eles reto-
1 ' ! / / , ./'. /)()/»(//, /fin ".
estabelecida. Quanto à presença judaica, ela sempre
mam o slogan: "Uma terra sem povo para um povo existiu ao longo da História, porém numericamente
sem terra!" e sonham, segundo a formulação do fraca e sempre minoritária. As antigas comunidades,
ttmltii n i«'íii>,içiio inglesa.
lim.i i i i , i i i i l i " , l . i ç , K i organizada dr. Haim Weizman, em construir "uma Palestina tão constituídas de judeus religiosos — e depois anti-
i •! 1 1 l. ii.n 'i 1 1 1 933 degenera judaica quanto a Inglaterra é inglesa". .^' sionistas — concentram-se em torno das cidades
cm ninlini c iiKibuem 27
\f
> • èf^ sagradas de Jerusalém, Hebron, Safed e Tiberíades.
niiiiliKi f duzentos feridos. Dois povos para uma só terra ^ ,»j* Em 1882 a comunidade judaica tinha ape-
Ni '.',/c ,-i/io, Hitler chega ao O conflito árabe-sionista, depois árabe-israelense ou nas 24 000 indivíduos numa população
poder na Alemanha: a palestino-israelense, nasce desse mal-entendido, ou a
Imigração judaica irá
total de cerca de 600 000 pessoas, entre
bem dizer dessa cegueira, pois em 1880 a Palestina já as quais 70 000 árabes cristãos. O futuro
intensificar-se ã medida que
estava povoada! Seus habitantes são herdeiros de mandato da Palestina é então dividido
aumentam as perseguições
anti-semitas...
uma cultura que se desenvolveu nessa terra há pelo entre o sul do sandjak de Beirute e o sand-
Cal. René Dazy/Foto © Edimedia
menos doze séculos! Expulsos pelo anti-semitismo jak de Jerusalém. Nessa parte do Império
europeu, decididos a resolver seu próprio problema Otomano, ao final do século XIX, a ideologia
nacional, os imigrantes sionistas irão contribuir, sem nacionalista ainda está no limbo, e se
querer, para criar um novo problema nacional: o do manifesta sobretudo como reação à ocupa-
povo palestino. ção europeia. Ora, o modo de vida ociden-
De fato, desde os tempos bíblicos, a história da tal dos pioneiros judeus vem transtornar
Palestina divergiu da do povo judaico. Essa região, pri- um quadro tradicional já existente. Sobre-
meiro romana depois bizantina, foi conquistada a par- tudo, logo aparece a dimensão política da
tir de 634 pelos exércitos muçulmanos. No centro do imigração sionista: já em 1891, um grupo
império omeíada, a população aramaica da região de árabes proeminentes de Jerusalém
será rápida e profundamente arabizada, e os reinos lança um grito de alarme num telegrama ao
francos que ali se implantam com as Cruzadas dos grão-vizir, a quem pedem para "proibir os
séculos XI ao XIII não questionarão esta situação já judeus de entrar na Palestina e de ali com-
prar terras". Nessa época o afluxo de judeus é peque-
no e o movimento sionista ainda está pouco estrutura-
do; assim mesmo, a população palestina começa a
tomar consciência dos dois problemas políticos funda-
mentais, o da imigração e o da terra.
A partir da segunda imigração, ou alia ("subida a Em 1929, o incidente do
Israel") dos pioneiros-socialistas, a oposição se refor- Muro das Lamentações (ver
ça. Em 1908 um novo jornal, Lê Carme/, aparece em quadro da p. 46) provoca uma
Haifa; seu objetivo é atacar o sionismo. No ano onda de violência em toda a
seguinte estouram violentos motins, e uma primeira Palestina: em Jerusalém,
força de autodefesa judaica, Hashomer (A Sentinela), Hebron e Safed, 133 judeus
se constitui na Galiléia. O dinamismo dos colonos são massacrados. Por uma
judeus que compram terras de proprietários ausentes trágica ironia, a maioria das
vítimas pertence às velhas
— e que muitas vezes residem em Beirute ou
comunidades religiosas
Damasco — inquieta os camponeses palestinos; ao judaicas que, alheias ao
mesmo tempo, a palavra de ordem "conquista do tra- sionismo político, coexistiam
balho pelo judaico" contribui para desalojá-los, já que até então com as populações
os sionistas pretendem basicamente trabalhar na cristãs e muçulmanas...
terra. O projeto separatista, que está na base do sio- Foto © Edimedia
NO ANO P R Ó X I M O EM J E R U S A L É M AS PRIMEIRAS IMIGRAÇÕES JUDAICAS

nismo, encontra na Palestina seu corolário e seu pro- Importância económica e estratégica aumentou
longamento; ele se aplica, desta vez, não em relação durante a Primeira Guerra — e de tomar posição
ao Ocidente anti-semita, porém num sentido inverso, diante da França, que, apoiada em seu papel tradi-
ou seja, em detrimento da população local. Sobre as cional de protetora dos cristãos do Oriente, nutre
terras desta começa a ser construída uma sociedade ambições sobre a Terra Santa. Há, por fim, a neces-
paralela, conquistadora por ser mais dinâmica. Nasce sidade de ganhar a simpatia da opinião judaica, em
então um sentimento de ser despojado de suas pos- geral pró-germânica — por ódio da Rússia dos
ses, fonte de apreensão e de rejeição. pogrons — neste ano decisivo da Primeira Guerra
Desde 1882 Eliezer Ben Yehuda (1858-1922) tinha Mundial.
se proposto a criar uma nova língua nacional a partir A Declaração Balfour, gue_promete criar na Palesti-
do património bíblico; o hebraico moderno torna-se o na um "lar nacional pajajxp£a<Q4udaisolutorna clara,
cadinho que forma uma identidade cultural comum |pa olhos dos árabes, a cumplicjdjide.entre o impe-
para os imigrantes originários de diferentes países da rjfllBmo e i o s ionismp. MIEla contradiz formalmente a
diáspora (exílio). Inversamente, a adoção dessa língua promessa da criação^dejjra reing__árabe, feita pelo
Os kibutzim dos aumentará mais ainda o fosso entre os recém-chega- nlto comissário britânicpjyicMaho^_a^xerif^dei~t^^
"pioneiros-socialistas" dos judeus e a população palestina. õm I9i5;~é~foi com base nessa promessa que os
dedicam-se a realizar o ideal contra o mandato inglese,
do coletivismo e da O mandato palestino sõSf&fLSõ^cõntrã^ imigração
nino otomano.
"conquista do trabalho pelo s]nnistã~Êm"í936. ~
Em 2 de novembro de 1917, a Declaração Balfour Depois" flD desmembramento
l u >v< i ji K /, i/co". Utilizando habitantes das aldeias
torna público o apoio que o governo inglês dá à orga- '
tiflcazmente a terra palestina,
d/1 v; .'isHiffi/.Mi) as bases do
nização sionista. Nesta questão, os interesses da
revolta pa/est/nacomslogans
liiluro l KliKlo de Israel. Aqui, Inglaterra são múltiplos: além da simpatia de vários n- -i l nrar^o^BáTfouTTintegr^ja^ags estatutosclo man-
vl'<lti i i f ' i < - , i (/(.' unia colónia dirigentes pelo ideal sionista e do desejo de encon- sobre "aTãtê^tTnã, aparece como símbolo
iiHHi:i>ln c/il/íí HíiiTa e Jafa, trar uma solução para o problema dos refugiados da «i.i rrrirn tia nacionalidade feita ao povo árabe. re/jg/ãOjdarernos svida^la
«m 1933. Europa central, trata-se de garantir a presença de um Ô mandato paestino, confiado em 1922 à Inglater- IrjdecieSeDÊÍJST"*"
t i l i n t a i l l l i i : l i , i l i < i n '.w;/n,i bastião estável próximo ao canal de Suez — cuja piiln l if,H das Nações, é o único que não prevê em Foto © Coleção Viollet

III
04 NO ANO P R Ó X I M O EM J E R U S A L É M PROMESSAS CONTRADITÓRIAS 55

seus estatutos a constituição de um governo autóno- cão era a condição essencial e a razão de ser do lar
mo que represente as diferentes populações do terri- nacional judaico. Entretanto, a garantia explícita dos
tório. Londres não tinha escolha: um tal governo teria "direitos cívicos (...) das comunidades não-judaicas da
se apressado a interromper a imigração judaica, que Palestina" — ou seja, da maioria árabe palestina —
representava para os palestinos a ameaça, a longo expressa na Declaração Balfour demonstra ser incom-
prazo, de uma maioria judaica no país. Ora, a imigra- patível com o estabelecimento e desenvolvimento do
lar nacional judaico. O
A INVENÇÃO DA TRANSJORDÂNIA caráter contraditório des-
ses compromissos pre-
nuncia muitos conflitos

F
oi em 1921 que os compensação um trono e extensão do lar nacional
ingleses decidiram uma subvenção anual de judaico. Na realidade, a futuros. Desde então, a
dividir o território do 18 000 libras. Os ingleses, criação da Jordânia irá data da Declaração Bal-
mandato e criar um emirado pue organizam as tropas do aumentar ainda mais as
hachemita a leste do rio emirado, irão ter o país em
four é comemorada nos
divisões da região e
Jordão, vasta região suas mãos e consolidar complicar os dados do países árabes como um
desértica e povoada por assim sua posição nesta conflito: ela vai justificar as dia de luto.
beduínos. O filho do xerife região de contato entre a pretensões jordanianas sobre A Inglaterra se propõe a
Hussein, Abdallah, vinha Síria, o Iraque e a Arábia de a Palestina árabe, e também
utilizando Ama como ponto Saud. Este último recorte as ambições dos sionistas
condicionar a imigração
de partida para atacar as territorial apresenta um "revisionistas" sobre a judaica "à capacidade de
posições francesas na Síria. interesse conjuntural. De um Transjordânia. Bem mais absorção económica" do
Winston Churchill, secretário lado, ele freia as ambições tarde, ela contribuirá para país. Ora, do ponto de
de Estado para as colónias de Ibn Saud, que é forçado a justificar a famosa "opção
britânicas, lhe propõe a paz, abandonar Acaba, no mar jordaniana" sustentada pelos vista estritamente econó-
oferecendo como Vermelho; de outro, limita a Estados Unidos. • mico, a Palestina lucra
globalmente com esta
chegada de homens, téc-
nicas e capitais. A partir de 1936, cada
Na realidade o problema é político. Ele coloca face a comunidade se organiza
face dois nacionalismos radicalmente diferentes, e o militarmente: aqui, voluntários
conflito, cujos fundamentos já estavam assentados na judeus aprendem a manejar
armas.
virada do século, irá se agravar à medida que se refor-
Foto © Coleção Viollet
ça o lar nacional judaico, sustentado por uma organiza-
ção sionista agora mais poderosa.
Em 1922, quando explodem as primeiras revoltas
que se seguem à instauração do mandato inglês, um
memorando de Churchill reconhece que "essa comuni-
dade (judaica), ao mesmo tempo urbana e rural, com
suas organizações políticas, religiosas e sociais, sua
própria língua, seus costumes, tem de fato caracterís-
ticas nacionais". E insiste ainda no fato de que "o
Na Conferência de Jerusalém
povo palestino não admitirá jamais que uma organiza- de 1921, Sir Herbert Samuel,
ção externa, seja qual for, se arrogue o direito de primeiro governador britânico
despojá-lo de sua terra e ameaçar sua existência eco- do mandato da Palestina, ao
nómica e política". lado do emir Abdallah e de
Assim como o sentimento nacional judaico, voltado Winston Churchill (página 54).
contra o anti-semitismo, nasceu na adversidade, um Foto © Edimedia
Nd ANO 1 ' K O X I M O LM J E R U S A L É M
O GRANDE MUFTI DE JERUSALÉM
sentimento palestino vai se forjar na luta contra o sio-

O
nismo. Criam-se algumas associações cristã-islâ- hadji Amin posição é mais ambições anexionistas do rei
micas; em 1920 surge a reivindicação de um governo al-Husseini árabe-islãmica do que da Transjordânia, ele
(1893-1974) foi a propriamente palestina. proclama em setembro de
palestino independente. Nascida num contexto desfa-
maior autoridade árabe sob Durante as revoltas de 1929 1948 o "governo árabe de
vorável, a história dessa reivindicação será também a o mandato inglês, apesar de provocadas pelo conflito do toda a Palestina", do qual
história das oportunidades perdidas. sua influência em geral ter Muro das Lamentações, ele ele próprio se torna
Enquanto os judeus constróem pedra por pedra a sido considerada nefasta à parece ter sido um inspirador presidente, eleito por uma
estrutura de seu futuro Estado, as grandes famílias de causa que pretendia servir. secreto dos ataques aos assembleia constituinte
palestinos eminentes — cuja influência tradicional Oriundo de uma das maiores judeus. A revolta de 1936 o criada para este fim.
famílias de Jerusalém, Amin obriga a fugir para o Iraque. Entretanto, já em 1952 a
al-Husseini estudou na Apoiado pela Alemanha, Liga Árabe dará um fim ao
Faculdade de Teologia de Al desempenha um importante seu "governo". Em 1958,
Azhar, no Egito. Após deixar papel no golpe de Estado Amin. al-Husseini pede a
o exército otomano para insuflado em 1941 contra os adesão da Palestina à
servir nas forças de Faissal ingleses por Rashid República Árabe Unida,
durante a guerra, tornou-se al-Kaylani. Refugiado em nascida da fusão do Egito
presidente do Clube Berlim, Amin al-Husseini com a Síria; Nasser, porém,
Nacionalista Árabe, que logo serve aos interesses da recusa-se a receber este
se distinguiu pela violência propaganda nazista: segundo presente envenenado que o
de seu ativismo consta, apoiou o obrigaria a assumir sozinho a
anti-sionista. Em 1920, recrutamento de voluntários libertação da Palestina. Em
al-Husseini participa
dos ataques
antijudaicos;
condenado pelos
ingleses a dez anos
de prisão, é forçado
a fugir mas logo
recebe anistia. No
ano seguinte é
designado Grande
Mufti de Jerusalém
pelas autoridades
mandatárias, e em
1922, presidente do
Conselho Supremo
Muçulmano. Assim,
cresceu com o fim do domínio otomano — se dividem ele se torna ao
e se lançam numa retórica suicida do "tudo ou nada". mesmo tempo o
Exigindo a anulação da Declaração Balfour como con- primeiro dignitário
dição prévia a qualquer negociação, os palestinos con- religioso da
ti 11 Viiihi.s , isprc/os, a revolta Palestina e o único muçulmanos para as forças 1959, tendo perdido todo o
denam a si mesmos à impotência. Com medo de
<*)/n/>r> /i/i/cf.v i/iii.i viTdíideira representante oficial da hitleristas nos Bálcãs... crédito no mundo árabe,
tílIPIIil l Hl l'l II:, I H I : ,
serem colocados em pé de igualdade com a Agência
população árabe. A Preso em 1945, o Mufti foge Amin al-Husseini se retira no
l ii u n. ir. 'li i r / l / . H P ( / i 1 l.il.i. Judaica, o órgão responsável pela imigração e cuja
influência do Mufti, mais uma vez e consegue Líbano, onde irá morrer
,•1:1 n / i i - , IUi'.li",i". i/i'íi'i /.l/n existência eles não aceitam, eles se recusam a criar ponta-de-lança da luta chegar ao Egito para quinze anos depois.B
uma Agência Árabe, como lhes foi proposto, e se pri- , anti-sionista, estende-se participar da criação da Liga
l,.II, l vam de; ter qualquer instituição representativa reco- além da Palestina; aliás, sua Árabe. Para enfrentar as Foto © Harlingue-Viollet
A I D E I A DA P A R T I L H A
1,11 NO ANO 1'ROXIMO EM J E R U S A L É M 59

111-,1'tiilAnCltda nhecida. O único interlocutor dos ingleses é o Grande Enquanto outros países da região ganham sua inde- Algumas horas depois do
i, mi.;/" decmtada Mufti de Jerusalém, que orienta a luta num sentido pendência formal, os palestinos se sentem abando- anúncio oficial do fim do
i.i.-f.Lr.. •-,•<'/.•;milhões nados e vêem despontar río horizonte uma maioria mandato inglês, em 15 de
pan-árabe e islamista (ver box na página 57) — orien- maio de 1948, é proclamado
i/i /i/i 'ir. i'iintiiii,ini a morte
tação objetivamente prejudicial às reivindicações judaica em seu país. Para eles não há tempo a per-
/ii/Ki.-. i li •<'\lcrminio. em Tel Aviv o Estado judaico
palestinas. Estouram revoltas; em 1929 elas se gene- der. Diante da nova recusa inglesa de instalar um
i iii.uiif ,i lembrança da da Palestina. Cinquenta anos
ralizam por todo o país. Lamentam-se 133 mortos do governo representativo, o Alto Comité Árabe, criado e
iiKiix .nisto" em depois do Congresso de
lado judaico, 87 do lado árabe. Para uns, isto é um presidido pelo mufti, conclama a greve geral e a Basileia, o sonho de Theodor
•ai n. i perseguir as
"pogrom"; para outros, "revolução nacional", e para desobediência civil. Herzl torna-se realidade;
•ncias, tomando
ii.ivel qualquer ameaça os ingleses, "insatisfação sócio-econômica"... porém já no dia seguinte os
11 n iii, i Israel, pátria dos Entre os dois pontos de vista, o sionista e o árabe, Rumo ao Estado de Israel exércitos árabes entram na
só/«(.'wventes. a incompreensão se torna total. A nova comunidade Está lançada a revolta árabe da Palestina, que dura- Palestina... Inicia-se uma
rá três anos. Forças guerrilheiras, às quais aderem longa guerra.
/ 0(0 ffi Centro de Documentação judaica se vê como uma "ilha" perdida no meio de um
"oceano" árabe em revolta. Para os árabes, o enclave voluntários dos países árabes vizinhos, atacam os
Judaica Contemporânea Foto © L'lllustration/Sygma
sionista é visto como um "abscesso", uma "mordida" judeus e o exército inglês. Do lado judaico se organiza
ocidental que faz sangrar o coração do Oriente Médio a Haganá, milícia unificada de defesa, e também o
e impede o seu progresso. Começa a aparecer um Irgun, braço armado do movimento revisionista. Em
anti-semitismo popular, que toma emprestado ao 1937, durante uma trégua
Ocidente estereótipos até então ignorados. obtida por um apelo dos
soberanos árabes, uma
comissão inglesa vem
investigar os conflitos na
Palestina. Depois de anali-
sar claramente a situa-
ção, a Comissão Peei con-
clui que há uma incompa-
tibilidade entre as aspira-
ções nacionais das duas
comunidades e, pela pri-
meira vez, propõe uma
partilha da Palestina em
dois Estados: "A Primeira
Guerra Mundial e suas
sequelas reanimaram em
todos os árabes a espe-
rança de fazer reviver,
num mundo árabe livre e
unido, sua Idade de Ouro.
Da mesma forma, os
judeus sentem-se motiva-
dos pela grandeza do seu
Nos anos 30, com o afluxo de refugiados da Europa próprio passado. Eles têm
central, entre os quais numerosas vítimas do nazis- pressa de provar ao
mo, a comunidade judaica quase dobra de tamanho: mundo do que é capaz a
em 1935 ela representa 30% da população palestina. nação judaica assim que
NU ANO P R Ó X I M O EM J E R U S A L É M A R E V I R A V O L T A INGLESA 61

01 nl Hl li l II li li-l l r ii l -.l.liln ela se reinstalar na terra de seus ancestrais. Nestas a anterior: depois de constatar a impossibilidade prá- Depois de 1945, rompem-se
-IM/II- tiiinni l//V/l//l/OS l ' l l l condições, a assimilação nacional entre judeus e ára- tica da partilha, a Inglaterra decide limitar a imigração as pontes entre o poder
í i i i l i i ; /IIH/IVS, iiinlH nu menos a 75 000 pessoas ao longo de cinco anos, a fim de mandatário inglês e a
bes é impossível".
i <i/if./jn/ií/<vjí<.'s ,) repartição liderança sionista. Esta,
Apesar da oposição de uma forte minoria, a comis- estabilizar a população judaica em cerca de um terço
i l . f , ilii.i\ i-niniiiiiiliidos. decidida a obter um Estado a
são executiva sionista aceita o plano de partilha: para da população total. Depois disso seria constituída qualquer preço, lança
M >/(",r o unclave árabe do
piiiln tio luta. ao sul de Tel os sionistas, que saíram do nada, conseguir estabele- uma assembleia representativa que estudaria uma múltiplos desafios às
Mv. Quanto a região de cer uma soberania plena e inteira sobre um pedaço eventual retomada da imigração. O que equivale a autoridades inglesas,
luiiinalóin Belém, é de terra, por menor que seja, é uma enorme vitória. dizer que a imigração seria definitivamente proibida forçando-as a encarar suas
considerada uma entidade Para os árabes, ao contrário, é fora de cogitação pela maioria árabe! contradições: como ser a
separada, colocada sob ceder a mínima parcela do seu território nacional. Desta vez são os direitos nacionais dos judeus que favor de um lar nacional
administração internacional. O A revolta reacende com maior intensidade. Para- são desprezados pela potência mandatária... Essa judaico e ao mesmo tempo
plano da partilha não passará mudança de direção é fruto de um cálculo cínico: impedir a imigração?
lelamente a uma repressão feroz, que fará mais de
de letra morta, e Jerusalém Foto © R Capa/Magnum
4000 mortos, a posição inglesa sofrerá uma mudan- com a aproximação da Segunda Guerra Mundial, o
será cortada em dois.
ça. Em 1939, o Parlamento adota uma nova política Império Britânico não pode afastar de si os países
— ou "Livro Branco" — que rompe radicalmente com árabes, agitados pela revolta da Palestina e sensíveis
à propaganda antibritânica dos nazistas.
A PARTILHA DE 1947 JERUSALÉM: 1948-1967

UB Território concedido y |
| SÍRIA
aos judeus da Palestina

J Território concedido
aos árabes Haifa

[-,_' '^| Jerusalém: controle l


internacional

A opinião judaica da Palestina e da diáspora se


mobiliza, escandalizada pela proibição da imigração
em vista das perseguições hitleristas; ela organiza a
BAQAA ~
imigração ilegal e se prepara para conquistar pelas
f—H armas sua independência contra o antigo protetor bri-
tânico. Nessas alturas a importância numérica da
comunidade judaica já lhe permite isso. Em 1942, na
Conferência de Baltmore, nos Estados Unidos, David
NO ANO 1'UOXIMO EM J E R U S A L É M A G U E R R A INEVITÁVEL 63

Ben Gurion define claramente a conquista do Estado Nesta guerra ainda não declarada, multiplicam-se Ainda antes da proclamação
da Palestina como um objetivo de guerra: "Combatere- os atos de terrorismo. O massacre da população do fim do mandato, grupos de
mos ao lado da Inglaterra como se o Livro Branco não árabe da aldeia de Deir Yassin, perpetrado pelas judeus e árabes se enfrentam
existisse, e combateremos o Livro Branco como se a tropas do Irgun, é revidado com o massacre dos pelo controle do território.
Ambos os lados ignoram o
guerra não existisse". habitantes do kibutz Kfar Etzion.
traçado tortuoso votado pela
A Haganá, o Irgun e o Grupo Stern (Leni) atuam em Até março de 1948 os combates favorecem os ONU para delimitar os dois
conjunto. Em outubro de 1945 Ben Gurion lança, em palestinos. Entretanto, o fornecimento de armas às Estados. Vêem-se aqui
nome da comunidade judaica, um apelo à luta arma- forças judaicas pelos países ocidentais — em combatentes da Haganá
da; esta será marcada por atentados espetaculares, especial a Tchecoslováquia — inverte a situação. defendendo uma ponte na
como a destruição pelo Irgun do Hotel King David de Sobretudo o trabalho de implantação territorial e de entrada de Tel Aviv.
Jerusalém, sede do estado-maior inglês. Entre organização comunitária que já vinha sendo realiza- Foto © Edimedia
judeus, árabes e ingleses, 91 vítimas serão retiradas do pelos pioneiros sionistas fazia 40 anos dá bons
dos escombros. frutos. Prova disso é a derrota dos Estados árabes,
A Inglaterra envia reforços, mas a descoberta do que entraram em guerra em 15 de maio de 1948,
genocídio dos judeus perpetrado pelos nazistas e a data oficial do fim do mandato britânico e da pro-
presença na Europa de 100 000 sobreviventes à clamação do Estado de Israel: apesar de sua supe-
espera de partirem para Israel tornam a situação rioridade numérica, as divisões libanesas, sírias,
insustentável. Criam-se canais alternativos para a iraquianas, jordanianas e egípcias em luta na
compra de armas e para a imigração clandestina. Em Palestina são derrotadas pela Tzahal, o novo exér-
julho de 1947 a opinião pública mundial se comove" cito de Israel.
"cOmj^ iframj^gg^E^ _As fronteiras dn flrnilfilMg,^^^
iãrgcTcip porto de Haífã è tendo a bordo 4500 sobrevi-
ventes dos campos de extermínio, é expulso .pelas
2_^ÍS^2JHÉ2Í£P,J?2^JrI!l-s .-q.Harto? fo fe|rriti9riQ do
mandato. Jerusalém é cortada em duas partes e
S TK
autoridades britânicas... para a Alemanha. O presiden- seu proieto de internacionalização é esquecido^ wr

te Truman toma o partido da reivindicação sionisla,


assim corno a União Soviética, que passa a apoiar
esse movimento anticolonialista.
A Inglaterra decide internacionalizar o problema; em
29 de novembro de 1947, a Assembleia Geral das
Nações Unidas vota pela partilha da Palestina entre um
Estado judaico e um Estado árabe. A cidade de
Coroado pelo prestígio da ^erysajén%_considerada uma entidade separada,"&
vitória, o jovem líder do Irgun, colocada sob autoridade internacional (na época a cida-
Menahem Beguin, recebe de' tirih"â*^mâ™população igual de judeus e de árabes).
uniu acolhida triunfal ao Erf7vrstâ'dá^slfuação real do território, a partilha propõe
t:ht>gnr a Nova York em
n»v<'nibro de 1948. A
a criação de dois Estados com fronteiras sinuosas e
li i il H ii /.HI/Í.' comunidade diversos pontos de estrangulamento. O porto de Jafa,
II II li III 't l . l l l l l 'III -.111:1.
atribuído ao Estado árabe da Palestina, fica totalmente
niifililiiiiln (/(wf/c o final do isolado do resto do Estado judaico. Este cobriria_55%
•.ri iiln \l\ /mi n'liii'j,i(ios dos do território e incluiria uma considerável minoria árabe.
Já no díá seguinte à partilha começa o primeiro con-
flito entre judeus e palestinos. Enquanto os ingleses
recuam, cada lado procura reforçar suas posições,
prevendo um conflito que parece inevitável.
UM POVO E X P U L S A O O U T R O 65
AS PRINCIPAIS ONDAS DE IMIGRAÇÃO
O drama dos refugiados Primeira sessão do governo
PERÍODO NÚMERO ORIGEM CARACTERÍSTICAS
O nacionalismo judaico venceu o nacionalismo israelense em Tel Aviv em
1882-1903 20/30 000 Rússia "Amantes de Sion"
1948, sob a égide do retraio
(1 a alia) árabe, e sobretudo o palestino: enquanto a faixa de
de Theodor Hen7l._A sessão é
1904-1923 35/40 000 Rússia, Europa oriental Pioneiros socialistas Gaza passa para a administração egípcia, Abdallah presidida por David Ben
(2°-3a alia) anexa a Cisjordânia ao seu emirado, que se torna o Giirjorí, Que cQloçvtTTrTStado
1932-1938 217 000 Alemanha, Polónia Profissionais liberais reino da Jordânia. O Estado árabe da Palestina esti- Judaico sobumadupla^
(5a alia)
pulado pelo plano da partilha não chega a nascer, fidelidade: à história do povo
1939-1948 153 000 Refugiados dos campos Imigração em grande
vítima do conflito, das ambições jordanianas e da judeu eà.,democracia
(6a alia) de concentração parte clandestina
Mundo árabe, Europa central
retórica extremista do arabismo. oc/ctenta/.
1948-1951 687 000
1952-1960 54000 Norte da África Surge então o problema dos refugiados palesti- Foto © Keystone
165 000 Egito (1956) nos: 750 000 pessoas, de um total de um milhão e
75000 Europa central meio de árabes residentes na Palestina, deixam o
1961-1964 228 000 Marrocos
território israelense. "Expulsos de suas terras",
1965-1971 81000 EUA, Europa ocidental
116 000 América Latina segundo os árabes; "instigados a partir por seus
1972-1974 143 000 URSS
1975-1989 230 000 EUA, Europa ocidental,
América Latina, Ira (1979),
Etiópia (1985-1986)

a partir de 1989 450 000 ex-URSS 1,5 milhão de judeus


soviéticos,
potenciais imigrantes

Israel foi construído com


várias ondas de imigração
(acima), que favoreciam o
crescimento constante da
população judaica na
Palestina (embaixo).
Depois de 1948 a origem
geográfica dos imigrantes
vai se diversificando. Em
1985, um acordo com a
Etiópia permite a chegada
dos falashas, as "tribos
perdidas" de Salomão que
praticam um judaísmo
pré-talmúdico.
Foto © Falla-Baitel/Gamma
líderes", segundo os israelenses. Sua fuga é até
A EVOLUÇÃO DAS PROPORÇÕES DEMOGRÁFICAS NA PALESTINA hoje motivo de polémica. Seja como for, essa parti-
1882 24 000 judeus numa população de 600 000 pessoas, ou seja, 4%. da maciça constitui uma bênção para o governo
1914 85 000 815 000 pessoas, ou seja, 10%. israelense: ela vai assegurar a maioria judaica no
1922 84 000 836 000 pessoas, ou seja, 10%.
novo Estado, que já em 1950 tem mais de um
1931 174 000 l 207 000 pessoas, ou seja, 14%.
milhão de cidadãos judeus contra apenas 600 000
1935 443 000 1843 000 pessoas, ou seja, 24%.
1947 589 341 l 908 775 pessoas, ou seja, 30%. árabes palestinos. Apesar de uma resolução da
15 de maio de 1948 650 341 2 000 000 pessoas, ou seja, 33%. ONU adotada em dezembro de 1948, o primeiro-
UMA Q U E S T Ã O EM S U S P E N S O 67
ALGUMAS DEFINIÇÕES

ministro Ben Gurion se opõe ao retorno dos refugia- Termina o êxodo do povo
obrou, hebraico. cidadãos completos num diferentes segundo os

H l •.!(•!. lermos se
referem ao povo de
Abraão e à língua do Velho
Estado cujo fundamento é o
judaísmo?
Israelita. Adepto da religião
critérios considerados
(religioso, genealógico,
cultural...). Em Israel,
dos palestinos. Ao mesmo tempo, organiza-se uma judeu, começa o exílio dos
imigração judaica em massa, incentivada pela_Lei_ palestinos. Cerca de 750 000
rlgjtetorno, que garante a qualquer judeu n direito refugiados dos combates de
1947-1948 serão instalados
Testamento. A escolha do judaica; este termo foi especialmente, o problema de instalar-se em Israel ejJejT|ce&&[_a nqcion?li'1a- em caráter provisório. Numa
hebraico como língua forjado com fins de até hoje não foi resolvido (ver delsTaelense. planície árida entre Jericó e o
nacional pelo movimento assimilação, para evitar as capítulo 4). Com frequência Os palestinos são os grandes perdedores dessa mar Morto, este campo de.
sionista realça sua filiação conotações carregadas da já se propôs uma definição nova ordem regional nascida da guerra. O drama refugiados encontra-se sob a
histórica e a legitimidade de palavra "judeu" e ressaltar o que, por ser subjetiva, talvez
dos refugiados, instalados em acampamentos na tutela da Jordânia de
suas reivindicações sobre a caráter unicamente religioso seja a melhor: seria judeu
espera incerta de uma vitória dos exércitos árabes, Abdallah, que anexou esta
terra da Bíblia. — e não nacional — do todo aquele que, por uma
Israelense. Qualquer cidadão razão ou por outra, se irá daí em diante polarizar o conflito e contribuir parte do mandato da
judaísmo.
do Estado de Israel, sem Judeu. Quem é judeu? Esta considera judeu. para perpetuá-lo. Aos olhos do mundo o Oriente Palestina, desde então
distinção de etnia ou religião. questão extremamente Sionista. Partidário do Médio parece um verdadeiro barril de pólvora. chamada Cisjordânia.
Na realidade há israelenses delicada foi debatida por retorno dos judeus à Quanto ao Estado de Israel, ele nasce sob o signo Foto © Roger-Viollet
árabes, muçulmanos e muito tempo, tanto pelos que Palestina; nem todos os da violência. Os judeus ganharam pelas armas seu
cristãos; porém os 645 000 se consideram judeus como sionistas são judeus e, direito a um Estado, porém divididos entre um
árabes israelenses podem pelos góim (não judeus). Ela sobretudo, nem todos os Ocidente que os oprime e um Oriente que os rejeita,
ser considerados como já obteve respostas judeus são sionistas. • como viver na sonhada "normalidade"?
... .

• rã
O SONHO U N I T Á R I O 69
Capítulo 4
PARA os DERROTADOS DA PRIMEIRA GUERRA ÁRABK-ISRAELENSE,
O ORIENTE MÉDIO O CAMINHO DA RECONQUISTA PASSA PELA UNIDA!)!*',. D H SUEZ À

GUERRA DOS SEIS DIAS, NASSER TORNA-SE o PALADINO DO


DE NASSER MUNDO ÁRABE, A ENCARNAÇÃO DE SUAS ESPERANÇAS E DE SUAS

DERROTAS.

A derrota da Palestina age como esto-


pim e como símbolo: Israel é dora-
vante o local do trauma. Elemento
fundador da cultura política árabe
contemporânea, arecusa_do_reço:
nhecimento de IsraejjSJjjge como^mõtoj-dalLiriidacle
árabe. O arabismo se apoia numa ideologia não tanto,
de "rejijscengaj' como de combate^ Para ps^ partida:
!JQ5JJ££S£J3acmaUsmo,_é urgente, no momento-ria,
Proclamada por Nasser em
26 de julho de 1956, a
nacionalização do canal de
Suez é um acontecimento
da maior importância na
história do Egito e do
Oriente Médio, figurando
como símbolo da
independência nacional
reconquistada pelos antigos
indepeadência^jas. colónias, mais aind^ do povos colonizados. A era de
anóa-a.1 Prime i ro ' ektejgaJ^u^ s d i vi sçies . Nasser começa
Pois estas são as causas profundas da derrota: elas verdadeiramente com este
golpe fulminante que,
trazem vantagens aos inimigos do mune aclamado pela multidão,
tificados com as grancres potênciascolonialjç anuncia o "nascimento do
èTsao^õ^slõnismo. somêrrtea união Terceiro Mundo".
permitirá à nação' libertaj-sejfô^dçmínio estran- Foto © Keystone
afiu,yafiMdo ^
^ a fundacãojda Liga Árabe respondia
obTetivQ-laasico de unifica? a árabe sobrea
. Porém a causa palestina,
mesmo retornando como uma ladainha em todos os
discursos, está relegada na ordem das prioridades:
"O caminho de Jerusalém passa pela unidade árabe".
O discurso unitário serve sobretudo para masca-
rar a impotência e a profundidade das divisões.
Estabelecem-se eixos geopolíticos. Assim, a tradi-
cional oposição entre os Saud e os Hachemitas,
reavivada pelo temor de um expansionismo iraquia-
no rumo ao golfo Pérsico, favorece a constituição
de um eixo Riad-Damasco, ao qual se somará em
breve o Cairo, contra Bagdá e Ama. Estas constan-
tes geopolíticas irão resistir às mudanças de dire-
ção e às declarações de intenção: Nasser se oporá
O MUNDO Á R A B E D E S E S T A B I L I Z A D O 71
O O R I E N T E MÉDIO DE NASSER

outro senão Gamai Abdel Nasser... No final da O destino de Jerusalém


ao regime "progressis- resume o caráter implacável
ta" iraquiano do general guerra, ele reúne um pequeno grupo clandestino
do conflito ãrabe-israelense
Kassem tanto quanto de oficiais e se prepara para tomar o poder. Ainda e os dramas da divisão do
havia se oposto ao regi- terá de esperar mais três anos. mandato da Palestina.
me de seu predecessor, A derrota estremece os regimes árabes consti- Depois dos ferozes
Nuri Said. Outro exem- tuídos. Os mais moderados devem sustentar a combates de 1948, a linha
plo chocante: nunca a fachada de sua legitimidade vacilante por meio de de armistício se estabiliza
declarações beligerantes: estamos preparando a no coração da Cidade
Síria e o Iraque foram
revanche, o direito triunfará! Os dirigentes temem, Santa. Dominando o Muro
tão rivais como depois das Lamentações, os
da chegada ao poder na verdade, sofrer a mesma sorte de Abdallah.
guardas jordanianos estão
dos partidos "irmãos" Acusado de ter se aproveitado do plano de parti-
em alerta constante em
do Baas em Damasco e lha para anexar territórios palestinos, suspeito de frente à "terra de ninguém"
em Bagdá. querer assinar uma paz em separado com Israel, que os separa da pane
Abdallah é assassinado em 1951 na entrada da israelense.
Em fevereiro de 1945, a A derrota de 1948 e suas consequências mesquita de al-Aksa, em Jerusalém; os palestinos Foto © Keystone
notícia do encontro entre o Em 1948, a unidade de fachada da Liga Árabe se condenam o soberano por tê-los incorporado à
rei da Arábia Saudita e o estilhaça. Na verdade, os objetivos dos Aliados força em seu reino, legitimando assim, por efeito
presidente americano eram muito diversos. Enquanto o Mufti de Jerusa- de simetria, as conquistas israelenses.
Franklin Delano Roosevelt Em 1949, mal concluído o armistício da guerra
lém proclamava sua vontade de "jogar os judeus no
provoca a ira de Winston da Palestina, um golpe do coronel Hosni Zaim der-
Churchill. Ele mostra que
mar", os sírios sonhavam com uma nova ordem
regional que permitiria a concretização da "Grande ruba o regime parlamentar sírio, manchado pela
depois da Segunda Guerra
Síria". Idealmente esta incluiria o Líbano, a derrota. Assim fazendo, Zaim inaugura uma longa
Mundial, o Oriente Médio já
não é um domínio privado Palestina e até mesmo a Transjordânia. Quanto ao série de golpes de Estado na região: nada menos
franco-brítânico, mas sim rei Abdallah, apoiado pelos ingleses, dispõe-se a que 35 golpes em vinte anos!
cenário da nova rivalidade aceitar a presença do Estado hebraico ao seu lado,
americano-soviética. A contanto que também ganhe sua parte nos despo-
Expedição de Suez será a jos do mandato da Palestina. O Líbano, cuja inde-
última tentativa das duas
pendência recente está mal garantida, deseja
antigas potências coloniais
de adiar seu inevitável acima de tudo afirmar sua presença e sua autono-
ocaso. mia; entretanto, a fraqueza de seus meios não lhe
Foto © Edimedia permite colocar em campo mais que 450 soldados.
Quanto aoJEgilo^esforça-se para opor-se ao sonho
hachemita do rei da Jordânia. As derrotas do seu
exército se explicam pelo despreparo das tropas e
o mau estado do equipamento. O primeiro escalão
doj£Í_Faiuk_está implicado num escândalo de cor-
rupção que teria resultado no fornecimento de fuzis
defeituosos aos soldados. Essa versão oriental da
"punhalada nas costas" contribuirá, e muito, para
o descrédito do regime e seu naufrágio, já que a
revolução virá das próprias fileiras do exército egíp-
cio. Um dos jovens oficiais aprisionados durante o
conflito, decepcionado pela incapacidade do
estado-maior do exército e da classe política não é
OS REGIMES "CORROMPIDOS E CÚMPLICES" 73
NASSER E O NASSERISMO
Nasser e os oficiais livres

Q i u.ilio i IMOS alràs,


ii(|ul mesmo,
l Fíiruk fugia do
l (,'Ho! No dia de hoje eu, em
nomo do povo, tomo posse
exército egípcio no lêmen
(1962-69)... Como dizia
perfidamente o tunisiano
Burguiba, "nunca os árabes
se mataram uns aos outros
lhe permite lançar-se a um
último combate: às vésperas
de sua morte, consegue
impor uma trégua entre a
OLP e o rei Hussein da
Em 23 de julho de 1952, em meio a uma decomposi-
ção do regime egípcio e de uma situação de quase
insurreição — o primeiro-ministro e o Guia Supremo da
Irmandade Muçulmana foram assassinados, incêndios
da Companhia; a partir desta com tanta ferocidade como Jordânia.
depois que Nasser assumiu Apesar de todos os seus abalaram o Cairo, uma guerrilha popular ataca as bases
noite, MOSSO canal egípcio
será dirigido pelos egípcios!" a missão sagrada de fracassos, Nasser continua militares inglesas no canal de Suez — os oficiais livres
Ao anunciar a nacionalização uni-los"! sendo uma referência derrubam a monarquia de Faruk e da classe política
da Companhia do Canal de A situação no interior do absoluta para os árabes: representada pelo Wafd, desacreditada por sua impo-
Suez em 26 de julho de Egito não é melhor: em seus funerais, em
1956, Gamai Abdel IMasser fracassos económicos, peso setembro de 1970, quer o tência perante a Inglaterra.
nasce para a História._A_ crescente da burocracia tenham adulado ou Com eles, vem ocupar o centro do palco a "geração
partir daí, o rãs combatido do desastre", chegada à política através da derrota da
Pgípnjfl MpnfgfP enquanto vivo,
todos se Palestina.
como um dos
Triajores ' encontram i mesma_çon- QS oficiais livres formam
personagens-dQ para chorar a denação o sionismo, ^mperialismoj os_regimes "cor- um corpo heterogéneo;
'TiMTOiroJVIundo morte daquele rompidos e cúmplices". enquanto alguns proclamam
e~dõ que soube suas simpatias pelo modelo
personificar, "Os ofíciãiinTvres formam um corpo heterogéneo;
nacFãlinhamerito, socialista, outros, como
nnm q mesma durante quinze enquanto alguns simpatizam com a Irmandade
grand,eza_Qjje anos,suas Muçulmana, outros flertam com o Partido Comunista; Anuar el-Sadat, estão
Nehru ou Titp. O esperanças e próximos da Irmandade
sem uma ideologia constituída, o "socialismo árabe"
"sTmT3oNsmõ""da suas derrotas. Muçulmana,
nacionalização Ninguém foi vai se elaborando aos poucos, centrado basicamente Une-os apenas um inquieto
do canal é capaz de no tema do reencontro da dignidade e no direito ao pro- nacionalismo (pág. 72).
enorme: pela capitalizar a gresso. Nlele está implícito o programa do não- Foto © Keystone
primeira vez uma herança de
alinhamentõTcontra o qual os Estados Unidos irão.
ex-colônia Nasser. Eis
consegue por que não levantar^ apoiados pelas antigas potências coloniais.
recuperar sua existe 'Em "breve "ã TútãnrcTTêlnTcíãrTft ÕcasiâtTserá fornecida
independência nasserismo, pela Inglaterra, que tenta formar, com o Pacto de,
económica. mas sim uma
conjunção " a QjnTãõ~s6viética:
Nasser se impõe
desde então entre um um cinturão meridional formado pelo Ira, o Iraque eu
como líder do homem, um Paquistão dej/enabjoajjear a expans
mundo árabe; povo e uma soviético em direção aos mares quentes e
decidido a falar época,
diretamente aos arrebatada Pérsico^Ora, no Oriente Médio a polarização quanto ao
povos, ignorando pelo sonho perigo soviético parece absurda, se comparada ao com-
os chefes dos unitário e pelo bate a ser travado contra as potências coloniais ainda
regimes "reacionários", "socialista", repressão por combate pela
presentes e sobretudo contra Israel. Nasser, que obtém
parece que nada lhe pode todos os lados... independência. Depois da
resistir: em 1958 seu Especialmente, a terrível morte de Nasser, Sadat sua legitimidade da recusa a qualquer domínio estran-
carisma contribui para fazer derrota de junho de 1967 abandona a orientação geiro, lança uma campanha contra o Pacto de Bagdá.
cambalear os regimes do acaba de corroer o regime e árabe e conduz seu país A partir de 1955 uma conjunção de acontecimentos
Líbano e da Jordânia, para dá o tiro de misericórdia nas para outro caminho, mais
promover a revolução aspirações unitárias que ele especificamente nacional. precipita a crise: Ben Gurion, chamado de volta ao
iraquiana e para impor a representa. Depois de travar Com os acordos de Camp governo israelense, lança em fevereiro um raide de
união com a Síria. Porém as uma guerra de atrito David, Sadat faz com que o represálias maciças contra o quartel-general das forças
consequências serão (1969-70), Nasser adere ao Egito, antes ponta-de-lança egípcias em Gaza. Morrem 38 soldados e, o que é pior,
;im;ii|.',;is: o In.icasso da Plano Rogers, que tenta do arabismo, seja banido da
Rcpublicíi Ar;ihc Unida em iniciar um processo de paz. "nação árabe". É uma outra Nasser, humilhado, percebe que seu exército não tem
1961, o atolamento do Sua autoridade internacional era que começa. • nível para fazer frente a Israel. Decide então moderni-
M O O R I E N T E MÉDIO DE N A S S E R A CORRIDA ARMAMENTISTA 75

zar seu equipamento militar. Dr.a. nor.ocasião da


Conferência de Bandung. emjabril de 1955, Nasser
cornjjto eJ^£Í liderançacIT^imento

Paçto_de_Sagdá»Assim, os países ocidentais se recu-


sam a entregar-lhe os armamentos pedidos. Iniciam-
se então negociações com os soviéticos através da
Tchecoslováquia — por ironia do destino, a mesma
rota que fora utilizada para socorrer o exército israe-
lense durante a guerra da Palestina! Em setembrQjJe
1955 o acordo, da maior importância, ejigyglada, ao
púBliCô: ele envolve 32Q milhões de dólares e prevê, m m
entre Qutra&,coisasr,o fornecimento de 120 aviões de m
combate^ Dois meses depois, o Egito e a Síria* assi-
nam um acordo de defesa que recebe o mesmo trata-
mento preferencial. Esta intrusão soviética altera a
ordem nascida da Primeira Guerra Mundial. A guerra
fria se instala na região.

Às vésperas da Expedição de A Expedição de Suez


Suez, Sir Anthony Éden, que Para Israel, esse novo fator ameaça romper o equilí- hachemitas da Jordânia e do Iraque, em Áden e nos Wo outono de 1956, o 2S
acaba de suceder a Winston
brio de forças. Desde já, Ben Gurion se mostra parti- Emirados; a Arábia Saudita, mobilizada por sua hostili- regimento de pára-quedistas
Churchill como
primeiro-ministro, é aclamado
dário de uma ação preventiva contra Nasser, antes dade contra os hachemitas, é então favorável a franceses salta sobre Port
que os armamentos entregues entrem em operaçãp: Nasser. Said. Marcado pela derrota
em sua chegada a Paris. Tal
num prelúdio estratégico à invasão do Sinai, a zona Os elementos do conflito estão assim colocados, e de Dien Bien Phu, atolado na
como o seu colega francês
neutra de Awjah é ocupada e os observadores da ONU é o próprio Nasser que fornecerá o pretexto.^ firrLde Argélia, o governo francês
Guy Mollet, ele é obcecado
quer, segundo Guy Mollet, dar
pela lembrança da são expulsos. garantir sua segurança hidráulica e alimentar, o_Egito
uma lição ao "aprendiz de
capitulação de Munique. Esta Nasser, pojjsueryg?, ÍPnpntiva ac,"^ guerrilheiras a dècjciLua&nsiojjj^^ ditador que se dirige em
analogia histórica, por mais fim de vingaTa humilhação de Gaza e, violando ^os fronteira com oSudão. Para financiar o projeto, termos insultuosos aos
discutível que seja, inflama a direitos internacionais, _ Nasser procura primeiro os Estados Unidos, já que, países democráticos da
opinião pública das duas
Acaba aos navios israelenses. apesar de considerar-se o arauto da luta contra o colo- OTAN, pois a França desfruta
antigas potências coloniais.
Para toda a região começa a corrida aos armamen- nialismo, o presidente egípcio ainda não raciocina em da compreensão destes e de
Foto © Keystone
tos. Israel se posiciona como defensor do campo oci- termos da lógica da guerra fria. Os Estados Unidos seu apoio na obra de
dental e oferece bases militares aos Estados Unidos. não são tradicionalmente uma potência antico- liberdade e de paz que ela
A França inicia um programa de cooperação nuclear lonialista? Em 19 de julho de 1956, a Casa Branca realiza na Argélia".
com Israel e torna-se seu primeiro fornecedor de participa sua recusa ao Egito em termos humilhantes: Foto © Keystone
armas. Ao autorizar o fornecimento, em parte secreto, "O Departamento de Estado estima que a instabilida-
de aviões Mystère, ela espera abrir um segundo front de do regime e o estado deplorável da economia não
contra Nasser. Com isso a França espera eliminar permitem ao país empenhar-se num tal projeto!"
aquele que ela considera — erroneamente — como o A resposta não é menos ácida. Em 26 dejulho^de^
incentivador secreto da rebelião argeliana. Quanto à 1956,. aniversário da queda do_re| FamJ^N
Inglaterra, principal arquiteta do Pacto de Bagdá, ela cia a nacionalização da Companhia Universal do Canal
teme a influência da propaganda nasserista nos reinos aritimo de Suez: a renda do canal servirá para finan-
A CERTIDÃO DE NASCIMENTO DO TERCEIRO MUNDO 77
/fí O ORIENTE MÉDIO DE NASSER

lfc"ii/c i(i/r /V.r.-.ci . / ciar a construção da barragem de Assuã. No Egito,


innli'1, ,11»•/•./«'('//v.l (/(,' ver essa decisão desperta entusiasmo. O canal, ponto
.r. (/IP/P. r, M//;/(•.••.is deixarem máximo da resistência antiinglesa, é o símbolo da
n (,1/1.i/ i/r ,'ii/i1/ inquieta
riqueza potencial do país e ao mesmo tempo de sua
!:i,ifl. i",p<-ci,ilitiente porque
<ty.iM'iiHn igipcio pretende
marginalização. Em seu discurso, Nasser lembra os
proibir o uso do canal aos milhares de trabalhadores egípcios mortos na constru-
navios de bandeira ção do canal para gerar lucro às potências tutelares e
Israelense. Iniciada em 29 de aos acionistas da Companhia. Na realidade, a conces-
outubro de 1956, a Guerra são da Companhia deveria expirar dentro de doze
do Sinai irá permitir a Israel anos. Entretanto, o acontecimento adquire um alcan-
obter garantias sobre o canal ce que vai além do país e mesmo da região. Depois
de Suez e controlar o estreito da derrota do dr. Mossadegh no Ira, derrubado em
de Tiran, porta do golfo de
1951 após nacionalizar o petróleo, é a primeira vez
Acaba.
que uma ex-colônia recupera os atributos de sua inde-
Foto © Lipnitzki/Viollet
pendência económica. Segundo q historiador Marc
Fencu_ajiaciqnalizaç_ão do canal de Suez constitui "a
certidão _de nascimento do Terceiro Mundo". Ternjnf""
cio uma dinâmica que levará, uma década depois, à
.çjjgg|g.-da-QP£Ei^
Por enquanto, na Europa também ocorre um aconte-
cimento importante, mas num sentido bem diferente:
a^iFrancá^aJngJatejraJancam uma gigantesca campa-
nha de opinião pública, comparando a nacionalização
do canal de
aimportância estratégjga_£|p
canal, pelo qual transitam doisJej5o^j±LJ2etrólgo_xlfis-
Nasser nacionalizou a Companhia, e não o car\a\ —__e_ A Expedição de Suez é
tinado ã EurÕDãT^õBrêTugo, dizia-se, o direito Jnterna-
5 nõnra"naciqnal estãjgmjggo! também uma guerra
cional fora desprezado — o que não e verdadejjjojs económica: 'dois terços do
"~^s^frãTíc^sêT7a^Ts~rnaÍs belicistas. O governo
petróleo destinado à Europa
socialista, derrotado em Dien Bien Phu e atolado transitam pelo canal, "artéria
na Argélia, está decidido a "levantar a cabeça dian- vital do Ocidente". Ao final do
te do novo Hitler" que, segundo se garante, terá conflito, as Nações Unidas
como próximo objetivo a destruição de Israel. Como supervisionam a retirada dos
prova desta determinação, um avião de carreira navios afundados que
onde viaja Ben Bella, um dos dirigentes da revolu- obstruem a passagem do
ção argeliana, é interceptado no espaço aéreo canal.
internacional. F_n_rppiç impojlgntg, a-Franca.deride Foto © Edimedia
faTpr i^ma expedição militar juntamente com a
InglãtéTr^eJsj^
expulsar Nassej,
irá e sf ace l a^se-- _ _
as aparências, confia^seãTsIrãeTó ^Fpe l de "malva-
do": o exército israelense atacará, e os europeus
intervirão para "separar os combatentes".
EUA E URSS ASSUMEM A H E G E M O N I A 79
O O R I E N T E MÉDIO DE N A S S E R

resolução das Nações Unidas, lançam seus pára-que- A aliança da União Soviética
No dia 29 de outubro de 1956 começa a Expedição com os Estados Unidos no
de SÚêzTtãmh^m nhpmãriaTZnSfã Hn Sinai r.iT7gW§' distas sobre Port Said.
Conselho de Segurança
de 1956. Os egípcios são imediatamente vencidos Apesar de uma clara vitória em terra — o exército permite à ONU realizar seu
pêTãs~cõT[rnas de tanques israelenses. Dois dias egípcio, tomado de surpresa, nem chegou a opor re- papel de manutenção da paz.
depois os governos francês e inglês lançam um ultima- sistência — a aventura vai fracassar no palco interna- Os acordos de fim das
to: os beligerantes deverão retirar-se, não de volta à cional. Os Estados Unidos retiram sua solidariedade hostilidades prevêem a
fronteira internacional, mas a quinze quilómetros de com a expedição, a qual ocorre durante a campanha presença no deserto do Sinai
cada lado da zona do canal. Ora, as forças israelenses de reeleição do presidente Eisenhower, baseada no das forças da ONU — os

ainda estão a mais de cinquenta quilómetros dessa tema da paz. Além do que, em plena competição pelo capacetes azuis, que vemos
mal aos americanos obter nesta foto de 1959. É a sua
linha! Um erro de timing que revela a diferença entre retirada, exigida em 1967 por
os objetivos almejados: para Israel, trata^ajjejtocoar, u m a_ t ó r i a Nasser ao secretário-geral
União Soviética envia uma advertência_aos_goyernos
aJs£ajieJãafflu_aIaJxaxiâ^^ das Nações Unidas, que
jJejnran,^que_controla o acesso ao golfo de Acaba. france_s___e '. . . _ precipita a Guerra dos Seis
Ã^paítJrdejTdeTJ^^rnoi-o os tranco-britãnicoTBom- l sõTadas^laJnglaterra e depois a Dias.
bardeiam aeroportos egípcios e, ignorando a primeira Foto © Edimedia
são afastados daregião e 'relegados à_catego-

BEN GURION, O LEÃO DA JUDÉIA ^Ãnthony Éden .em_brevêj3gdirã _demissão,_o_gfflffimQ

A
figura de David Ben paz aos árabes a não ser de um kibutz no Neguev,
Gurion ("filho do pela força, dá início à onde se retirara, para dirigir o
leão", segundo o doutrina da ação preventiva e governo, em que acumula as
pseudónimo que ele próprio das represálias sistemáticas funções de primeiro-ministro
escolheu) está contra as infiltrações dos e ministro da Defesa. Em
indissoluvelmente ligada ã fedayin. conjunto com os governos
luta pela criação e pela francês e inglês, prepara a
defesa do Estado de Israel. Expedição de Suez e detona
Nascido na Polónia, Ben a operação "Kadesh".
Gurion emigra para a Ao longo dos anos, o
Palestina em 1906, na sionismo intransigente de
segunda alia dos Ben Gurion o leva a privilegiar
pioneiros-socialistas. Em uma ideia quase mística do
1909 ele funda o Hashomer Estado e da nação hebraica,
(A Sentinela), a primeira em detrimento de suas
força de autodefesa judaica. primeiras convicções
Ben Gurion impõe-se por socialistas. Às vésperas da
seus talentos de orador e Guerra dos Seis Dias,
sua combatividade na participa pela última vez de
liderança do Mapai, o partido um governo de coalizão
trabalhista. Em 15 de maio nacional, condicionando sua
de 1948, é ele quem lê a entrada à de seu ex-inimigo
proclamação do Estado de jurado: o chefe dos
Israel e torna-se seu primeiro "revisionistas", Menahem
dirigente (1948-53). Beguin. Morre pouco após a
Partidário da política do fato guerra do Yom Kippur, aos GuyMollet cairá e a Quarta Rep^bHcaJrancesa irájse
consumado, ele se opõe ao 87 anos. Seu país inteiro lhe dissolver. No Oriente Médio seus lugares sej,ãojoma-
retorno dos refugiados Verdadeiro pai da pátria, sua presta homenagens em seus dos pelos Estados Unidos e peia União Soviética.
palestinos e a qualquer presença é considerada funerais. •
Ao, contrário cle_seus aliados de ocasião, Israel
concessão. Convencido de indispensável em períodos de
que Israel não pode impor a crise: em 1955 é chamado Foto © Keystone alcançou seus objetivos. Seu" éX6[Ç[lo
MO O O K I I N I I M t D I O DE N A S S E R A ERA N A S S E R 81

i. • . . . , . . . reti rar-sedg_SJnai e de Ga?a a menos que seja substi- mento árabe. Agora começa de fato a sua era. Seu
tuído pelas forças da ONU: a linha de frente com o populismo, divulgado pela "Voz dos Árabes", a rádio
p»lt Pêbitlna, Nesser ataca
Egito torna-se_neutralizada e fica assegurada a nave- do Cairo, faz tremer os regimes da região.
o nu llii::,'iinl.t luntiinia,
gação no golfo de Açaba^Porém esta semivitória, Em 1957 as eleições legislativas na Jordânia apon-
tliH> I H f t i - i i t l f HmitiU nação
i/o-, li-ii.iyiii, Hiierrilheiros mesmo garantindo a Israel uma pausa de dez anos, tam uma maioria pró-nasserista. Recusando o veredi-
;u/r.'.f//ic>.s, (.vn seu território. traz em si o germe de um novo conflito, já que o Egito to das urnas, o rei Hussein decreta estado de sítio; a
Hussoln responde que é não aceita a diferença de tratamento aplicada aos situação é de insurreição e, de acordo com a doutrina
intuiu lin-.il no Egito dar lições beligerantes. Os capacetes azuis da ONU não acam- ocidental, o exército britânico intervém em socorro do
nos outros quando ele próprio pam no território de Israel, o agressor, mas sim no do regime amigo. No Líbano, são os soldados america-
os (á protegido pelos agredido. E, sobretudo, no imaginário oriental e no do nos que, no ano seguinte, intervêm para restabelecer
capacetes azuis da ONU. A Terceiro Mundo em gestação, a "covarde e tripla a ordem. No Iraque, enfim, o regime hachemita é der-
escalada que leva à terrível rubado em 14 de julho de 1958 por uma revolução
agressão" fixa ainda mais o Estado judaico no campo
derrota de 1967 é também
do imperialismo. popular. Canta-se a Marselhesa nas ruas de Bagdá...
uma questão interárabe...
Abaixo, coluna de prisioneiros Os Estados Unidos não saberão explorar o capital Estabilizado por algum tempo o front egípcio, o con-
egípcios no Sinai. de simpatia criado no mundo árabe por sua posição flito árabe-israelense se dirige então para as fronteiras
Foto © R. Capa/Magnum na aventura do Suez. A doutrina de contenção de da Síria. Neste país as eleições levaram ao poder
Eisenhower é bem próxima da "pactomania" contra a uma coalizão governamental pró-nasserista. Salah
qual Nasser se insurgira... Essa política visa apoiar Bitar, um dos fundadores do partido Baas, assume a
qualquer regime ameaçado pelo comunismo interna- pasta das Relações Exteriores.
cional. E, sobretudo, visa combater o prestígio, agora Enquanto todos os vizinhos da Síria (Turquia, Iraque,
real, da URSS, que surgiu como o melhor apoio a Jordânia e Líbano) alinham-se com a doutrina
Nasser no Oriente Médio. Eisenhower, a tensão aumenta com Israel. Em dezem-
bro de 1955 Israel lança um raide contra a Síria para
A guerra fria interárabe dissuadi-la de continuar seus acordos militares com o
A^&çpedição--cle-Jàuez_ejgya Nasser, o homem que Egito. A CIA é suspeita de conspirar contra o governo,
desafiou vitor]ojamentep~Õcidente, ao ãpice do tirma- com a cumplicidade do Iraque. Nesse clima explosivo,
O OUII NTE MÉDIO DE NASSER
DE GAULLE E ISRAEL

aliado à euforia que segue à Expedição de Suez, o

A
pós os acordos de iniciando as hostilidades ao de vosso Estado por seus
governo sírio pede a união com o Egito.
Evlan (1962) e o fim tomar posse, pela força das vizinhos, garantias de
da guerra da Argélia, armas, de Jerusalém e de segurança de ambas as
Árabe UmdaJRAU). A união do povo árabe estará a a política de independência muitos territórios jordânios, partes em fronteiras que
caminTToT^rfrigél a RAU se desfaz, pois os sírios do general De Gaulle em egípcios e sírios, e lá poderiam ser estabelecidas
suportam cada vez menos uma união que se expres- relação aos dois blocos praticando a repressão e as por arbitragem internacional,
mundiais o leva a adotar expulsões que são a uma sorte digna e justa para
sa sobretudo pela supremacia dos burocratas nasse- uma posição de estrita consequência inevitável de os refugiados e para as
ristas em seu país. A primeira — e última — verdadei- neutralidade nos conflitos uma ocupação que, ao que minorias, a livre navegação
ra experiência unitária durou três anos. do Oriente Médio. Em 2 de tudo indica, tende a para todos no golfo de

A partir de 1962, Quanto ao Iraque, a nova equipe compartilha os


ideais de Nasser — independência quanto aos dois
junho de 1967, no auge da
crise que precede a Guerra
dos Seis Dias, ele
tornar-se anexação, ao
afirmar diante do mundo
Acaba e no canal de Suez,
seria hoje possível dentro
das Nações
grandes blocos mundiais, arabismo, modernização; resolve condenar o Unidas, solução à
o corpo porém as considerações geopolíticas não tardam a qual a França
agressor. Através
prevalecer: Nasser e Kassem vão disputar a direção do mito "Davi eventualmente se
expedicionário da frente "progressista". contra Golias", dispõe a apoiar,
denuncia Israel não só no plano
A partir de 1962 a guerra fria interárabe chega ao político mas
egípcio se atola nas lêmen, onde um golpe de Estado republicano derruba
como "um povo
seguro de si e também no
o imã Badr. Os partidários deste, apoiados pela dominador". Numa próprio local. Esta
areias do lêmen. carta a David Ben saída, que traria a
Arábia Saudita — agora alinhada ao campo americano
Gurion em paz no Oriente
— colocam em perigo o novo regime. O Egito corre em
Contra os dezembro de 1967, Médio, facilitaria
seu socorro e envia um corpo expedicionário que, em De Gaulle assim a concórdia
1967, já representa quase a metade dos efetivos de justifica sua universal e, a meu
montanheses política: ver, serviria aos
seu exército. Começa assim o Egito a atolar-se no
lêmen. "Não contesto de interesses dos
defensores do rei, forma alguma que povos envolvidos,
Apesar das rivalidades que corroem os regimes "pro- o lamentável incluindo o vosso,
Nasser também gressistas", a URSS apoia globalmente sua causa no bloqueio do golfo não satisfaria,
conflito árabe-israelense, campo predileto do confronto de Acaba foi bem o sei, todos
Leste-Oeste: as grandes potências se enfrentam atra- prejudicial ao vosso os desejos de
conhecerá seu país, e tampouco Israel. (...) E eis
vés dos judeus e dos árabes. E armando exagerada- ignoro que este que Israel, em
Vietnã. mente seus respectivos aliados, elas fornecem os tinha razão em " H. lugar de percorrer
meios para uma guerra que já parece inevitável. sèntir-se m l todo o universo
ameaçado, dada a j 2"'•'';:'••' ,t em seu exílio
tensão em que |j j| / comovente e
Rumo ã Guerra dos Seis Dias bimilenar,
mergulhou a região
CgnsicjerandO-aufi _a internacionalizacãp_de Acaba e palestina em tornou-se de fato
ojaanttoJfi.cJa.QNU sobre o Sinai infringem sua sobera- consequência da onda de que esse conflito só poderá um Estado entre os outros,
n[a,_oi .Egito decide liquidar os vestígios da campanha ameaças dirigidas contra ser resolvido com base na e cuja vida e duração,
de juez Uma vez miís_é_ff_prõblema da repartição Israel, ao mesmo tempo que aceitação das conquistas segundo a lei comum,
a lamentável sorte dos efetuadas e não sob a dependem de sua política. E
das_águas-doIrÍCL]fí^^ que fâz~ãOmBTitar"a"lêns3o; árabes refugiados na condição de que elas sejam esta — quantos povos já o
acerituada_pela subida ad""põT3êr errí Dãma'sOT™dcrfac- Jordânia ou relegados a evacuadas, Israel ultrapassa terão experimentado — de
çjo_j^s^uerdjsfa7f"clo Bãásr'partTdánõ declarado da Gaza. Porém continuo os limites da moderação nada vale a menos que se
guerra, revolucionária radical e que apoia os fedayin, convencido de que, necessária. Lamento ainda adapte à realidade". •
ignorando as advertências mais posto que, em troca do
guerrilheiros palestinos. Finalmente, a retomada das dadas, em tempo hábil, a recuo de suas forças, (em David Ben Gurion, Ou revê à
infiltrações dos guerrilheiros, inflamadós"p^'retóric£ vosso governo pelo governo parece que uma solução Ia réalité, Paris, 1986.)
guerreira dos dirigentes árabes, agrava o sentimento da República francesa, e que inclua o reconhecimento Foto © Edimedla
O ORIENTE MÉDIO DE NASSER A OFENSIVA ISRAELENSE 85

-de inseguranga-de envia seus blindados ao ataque em todos os fronts.


, Em menos de uma semana, a Síria perde as colinas
Culmjnando cinco janojd^tesão extrema^ Nasser de Golan e o Egito perde Gaza e a península do Sinai,
- até o canal de Suez. Por fim, o exército retoma da
se_e_exige que asjrogas daONU sejre^irBm_do_£gjto Jordânia todas as suas conquistas de 1948. O
-^ãfirrrardãTque basta, que~èlas "tomem posição do Estado judaico acaba de quadruplicar sua superfície!
auto lado da fronteira, em Israel... A tomada da cidade velha de Jerusalém é um aconte-
Não parece que Nasser,'consciehte da superiorida- cimento de consideráveis dimensões simbólicas.
de israelense, quisesse realmente a guerra. É mais Diante do Muro das Lamentações, Moshé Dayan
provável que imaginasse uma luta de longa duração; declara: "Esta manhã o Exército de Defesa de Israel
costumava comparar o Estado de Israel ao antigo libertou Jerusalém... Voltamos ao nosso lugar mais

Na manhã de 5 de junho de reino das Cruzadas em Jerusalém, afirmando que, tal sagrado, voltamos para jamais nos separarmos A Guerra dos Seis Dias
1967, a aviação israelense como este, Israel, "ponta-de-lança do Ocidente, seria dele". A^anexagãp de Jerusalém ocorrejmedjatameQ- provoca um novo êxodo:
destro/ o essencial do destruída ao final de duzentos anos". Esperava ape- antigos refugiados palestinos
te após o conflitõj^^
poderio militar e estratégico
egípcio. Mal começada, a
nas que a estratégia da tensão lhe permitisse obter nal, ela representai uma^onaaa3íã£U3aia^Jodo_-g de 1948 deixam a
Cisjordãnia e Gaza buscando
guerra já terminou...
concessões capazes de acalmar os ânimos. movimento sjonista,. acolhida em outras terras. Já
Impotentes, operários Seja nomn fnr, para n Fstajg_]ujej£jGj3loguej(L£[a Israel irá conservar suas conquistas. Ao contrário os drusos das colinas de
egípcios vêem o incêndio de ^Ácaba constitui um motivo de guerra. Em 5 de 1956, desta vez os EstadosUnidos tpmam, clara-- Golan, conquistadas por
uma refinaria de petróleo na eJãBT, Isrã^r^teia-lsr^otna^um^^ãijê Israel em 9 de junho de 1967
região do canal. egípcio, queixa plausível pela histeria da imprensados apesar da aceitação do
Foto ffi> B. Barbey/Magnum dias precedentes. À aviação israelense ataca, e em do estreito de Acaba, é o responsáyeLáelQ conflito. cessar-fogo pela Síria, tomam
uma manhã a guerra está ganha: pega de surpresa, a Assim, os americanos vetam urj rircjejo^yjéticQ a estrada de Damasco.
aviação de caça egípcia foi destruída no solo. Depois que exjgia_a_evacuação incondjcional j£g_terrj^órios Foto © Magnum Photos
de garantir o domínio dos ares, o exército israelense ocupados.
Mil O O K I L N T E MÉDIO DE N A S S E R O NOVO PROBLEMA T E R R I T O R I A L 87

Dn uni illn IIIILI » iHilii>, /•./,)(•/


Assegurado por suas vitórias, Israel espera forçar a de Israel. J^^aiaoeQ-da-GLierrajdos^geis Dias-á-eto- Embora Nasser,
In/1//, .1 -.11,1 ••!/!n•///(•/<• ,ii) se (|úciiU;: 10 000 soldados mortos e jriais deJ24£L demissionário em 9 de junho
porta da paz com base em seu avanço territorial.
: il n n Ir i, ii i li i Hin.ii, do Golan, ~ gue o exérci- de 1967, seja chamado de
Porém os países árabes, reunidos na Conferência de volta por enormes
i/j ('/;./(«(/.««.• i e d;ifa/xade to Judeu, que combateu
Cartum, lhe fecham a porta na cara. manifestações, o nasserismo
Gaza — é o "Grande Israel".
As grandes potências, porém^opsggueiri chegar.a apenas 30Õ"sòldadosecercade30_j^ggg ll JUm_ t não sobreviverá à derrota. O
A península do Sinai será
ilcvnlvitlii no Egito emum elaborado compromisso: e a Resolução 242 do preço povo egípcio, que em seu
Conselho de Segurança da pNjJJ_gug_condiciona_a^
consequência dos acordos de funeral lhe dá um adeus
Camp David, porém a retirada israelense ao estabelecimento de uma paz Seis Dias modifica por completoos dramático, nisso não se
colonização dos outros Alista e dados do cõnTiiroT^gB^tfã^g^^g^rggraift^a nos engana: a morte de Gamei
territórios se realiza em ritmo
base de qualquer c e r T Õ ^ ^ J s r a e l aceita a npvosJejTitójlo^congmsiMos por Israel. É através Abdel Nasser em 1970
acelerado. As colinas de palestina do con- marca de fato o fim de uma
FéSòlugãò oa poça' para tõraZ^juíd^jjQrJMassêr e
Golan e Jerusalém oriental época.
Os palestinospor outroladõTa
foram oficialmente anexadas os árabes,_e Foto © J. Burlot/Gainma
rêlgitãm,
" apõ!ãdõs"^eia Sma^juigairraoque
a Israel por votação do
..JireitoSjTacionais.^ sõbretudcT^ôs" pa'lestinõs7"se"fendem ãõs" poucos_à_
Parlamento israelense.
Ap^sâr~dêsíê^vãriçodiplomático, o impasse no ter-
reno é total. Logo em seguida ao cessar-fogo, os com-
batentes se rearmam; em
O GRANDE ISRAEL EM 1967 1969 Nasser, que enfren-
ta uma radicalização inter-
na no país, arma as milí-
MAR
cias populares e lança a
"guerra de atrito". Esta
MEDITERRÂNEO
dura um ano; com seus
bombardeios intensos de
ambas as partes no canal
de Suez, faz mais mortos
do que toda a guerra de
1967. Tudo em vão. Os
combatentes continuam
Port Sfid
fixos em suas posições e
as diversas tentativas de
mediação (Rogers,
Jarring...) não levam a
nada.
Enquanto 220 000 pa-
lestinos da Cisjordânia e
de Gaza engrossam o
fluxo de refugiados de
1948, o mundo árabe ideia d e u m a coexistência . . _ _
passa por uma nova agora c Israel que se encastela em suas
humilhação, com o nau- Com o declínio do nacionalismo árabe, o Oriente
frágio de suas certezas e Médio parte em busca de novas ideologias de comba-
esmagado por um novo te: logo chegará a hora do islamismo, que, aliado ao
mito, o da invencibilidade problema do petróleo, forma uma mistura explosiva.
UMA C A U S A S U F O C A D A 89
Capítulo 5
É NOS ANOS 60 QUE A EXPRESSÃO POLÍTICA DOS PALESTINOS SE
OS PALESTINOS AFIRMA ATRAVÉS DA OLP. ENTRE LUTA ARMADA K VIA DIPLOMÁTI-

ENTRE ISRAEL CA: A LONGA BUSCA DE UM ESTADO ÁRABE NA PALESTINA.

E OS PAÍSES ÁRABES
armistício de 1949 gerou uma A partir de dezembro de
i Palestina desmembrada; metade 1987, a insurreição nos
de sua população árabe tornou-se territórios ocupados
expressa a radicalização de
um povo de refugi ados. jíngolida.
uma juventude nascida sob
fterrnta ft ppla aviHp? rlnc- p?í-
o jugo da ocupação
ses limítrofes, o Estado palestino previsto Pplr> plann israelense. A intifada.
da partilha não chega a nascer. t Paradoxalmente, os_ ("sublevação") é assumida
palestinos são os principais esquecidos de um confli- pela população como um
to do qual eles próprios sãõ^acausa^ Durante vinte todo. Prova disso é o
longos anos, desde a proclamação qQ_bstadõ~?e sucesso das greves gerais
Israel ate a uuerra aos seis mas ^na ym naQ é ouvi- organizadas periodicamente
JJa-Jsso porque os países do "campo de batalha", a sob a palavra de ordem:
começar pelo Egito de Nasser, anexaram a causa "Abaixo a ocupação! Viva a
Palestina livre e árabe!"
dos palestinos em nome dos interesses superiores
Foto © Chip Hires/Gamma
da nação árabe. Sob ocupação israelense, jordania-
na, ou sob administração egípcia, os árabes da
Palestina são reduzidos ao silêncio. Quanto aos que
fugiram dos combates ou se recusaram a viver sob o
domínio israelense, esses formam uma massa mise-
rável, que vive nos acampamentos de refugiados sus-
tentados pela UNRWA, agência dajQNLLnriaria para
ajudá-los. Em 1950, essa agência conta 957 000
pessoas sob sua dependência; mesmo que as autori-
dades israelenses contestem esse número — que
estimam ser de apenas 600 000 — é quase a meta-
de da população árabe da Palestina que está assim
desenraizada.
Por outro lado, a população do jovem Estado de
Israel dobrou no espaço de três anos, de 1948 a
1951: prova da verdadeira aspiração ao ideal da Terra
Prometida, especialmente para os refugiados europeus
(os judeus asquenazim); mas Israel cresce também
com o afluxo dos sefardim, judeus oriundos do mundo
0(1 S I I M O S l N l H L I S R A E L E OS P A Í S E S Á R A B E S UM POVO E R R A N T E 91

A /PII/HI/.H.IIP l ; i . H ' l i ' i i ' . i - vive árabe, forçados a partir pelas ondas de anti-semitismo Nassgr dotá-la de uma aparência de_expressão pollti-
l i i i i n i " , / . n / I P i/i' rii/i.s/.Hife que se seguem à guerra de 1948 e à Expedição de caTjgmi especial num monneplQ.,j*m^que Israel desMa
l i i : t ' l ' , i i i . n i t . ; i riil/i' Í948 e Suez: é o caso, por exemplo, de 100 000 novos cida- ;is iiguas do rin Inrdãn e assim reacende 3 pensão
/ ' V i . .'.'>() 000 pessoas,
dãos originários do Iraque. Esse novo êxodo permite a com seus vizinhos.
nu M'/.i, i.-cíc;) de 10% c/a
Israel reduzir o problema dos refugiados a uma ques- A p/imeira^õnferepcia de expila árabs, realizada nn
/KI/II//.H:.I(), preteriram deixar
o país e viver no
tão de troca de populações: os imigrantes judeus com- - -- -
r.s/;,in/i<?/ro. No local da pensam os refugiados árabes. Cerca de 160 000 ára- efTcamêgã AhTnácTChukeiri. político ligado à Arábia
antiga fortaleza de bes palestinos que ficaram em Israel tornam-se, por "Saudita" (Tão Egito", "de estruturar a QLP, Organização
Massada, homens armados sua vez, cidadãos de segunda categoria. Considerados para a Ljbertagãa.da palestina. CriatjrLSQh ns ai lgPTrÍQg
seguram o dossel uma "quinta coluna" potencial — que representa cerca 3a Liga_Arabe e de Nasser, que_deseja deter a escala
tradicional na cerimónia de 15% da população — eles são submetidos, até da do Iraque, essa primeira OLP, em cujos, _obietivQs
solene da maioridade logo depois da Expedição de Suez, a uma administra- não.figura a^criação de um Estado palestino, não passa
religiosa de um jovem ção militar rigorosa. Sob diversos pretextos — os mes- de um i
(toar-mitzváj.
mos que serão usados depois de 1967 na Cisjordânia
Foto © Keystone
e em Gaza — metade das terras árabes são confisca- O nascimento da OLP
das e integradas ao "património judaico". Finalmente, _
Israel joga a cartada da lógica minoritária a fim de seg- seu combate vai se HflTmar.No final dos anos 50,
mentar o espaço palestino: apenas os drusos (10% da lasser Arafat, Abu Jihad, Abu lyad e um punhado de
população árabe) são obrigados ao serviço militar. militantes refugiados HO KUWalTTuTdSfrrõ"grupo al-
Na espera de uma hipo- Fatah7^iu "a Vitória"
tética revanche, os palesti-
nos aguentam o peso da
derrota: assirn_cgmo Israel A RESOLUÇÃO 242 DO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU
não osjjJesgia em seu tér-
ritório, os "países irmãos"
não têm a menor vontade
de integrar os refugiados.
Um"ex-diret6r do UNRWA
O Conselho de
Segurança da ONU,
expressando a
inquietude que continua a
região e pelo seu direito de
viver em paz dentro de
fronteiras seguras e
reconhecidas, protegido
de maneira muito diferente.
A OLP, porém, a condena, já
que ela não toca na questão
do direito à
causar-lhe a grave situação contra ameaças e atos de autodeterminação do povo
.ãfirmã^nlSs^^Ts^ no Oriente Médio, (...) força; palestino, reduzido a um
dos árabes queTerrT con- 1. Afirma que a obediência a 2. Afirma ainda a simples "problema de
servá-los como uma ferida sua Carta de Princípios exige necessidade: refugiados". 22 de novembro
a instauração de uma paz a. De garantir a liberdade de de 1967 •
aberta, uma afronta às justa e duradoura no Oriente navegação pelas vias
Nações Unidas e,,.uma Médio, que deverá navegáveis internacionais da A Resolução 338, votada
arma contra Israel. Que os compreender a aplicação dos região; após a Guerra do Yom
dois princípios seguintes: b. De se alcançar uma Kippur, reafirma por ocasião
refugiados vivar
" I. Retirada das forças solução justa para o desse novo conflito os
israelenses dos territórios problema dos refugiados; princípios já enunciados na
ocupados (*) no recente c. De garantir a Resolução 242.
Proibido de voltar a Israel, proibido de integrar-se aos conflito; inviolabilidade territorial e a
II. Cessação de todas as independência política de (*) A versão inglesa da
países árabes (com exceção da Jordânia), esse povo declarações de beligerância cada Estado da região, resolução estipula "from
de refugiados irá desenvolver em seu seio todas as occupied territories", o que se
e de todos os estados de através de medidas que pode traduzir como "retirada de
características de uma diáspora que contém a espe- beligerância: respeito e compreendem a criação de territórios ocupados". A
rança de uma restauração nacional. Nos anos 60 a^ reconhecimento pela zonas desmilitarizadas. (...) ambiguidade desse artigo
soberania, integridade Os países árabes e Israel (in)definido nas duas versões
peculiaridade palestina cornegaj territorial e independência aceitam a Resolução 242 — oficiais continua fazendo correr
lução das relações ir política de cada Estado da embora cada um a interprete muita tinta...
\\J OS I'A1 l S T I N O S E N T R E I S R A E L E OS PAÍSES Á R A B E S A LUTA A R M A D A 93

fui l ' H í ' i , n Dll',utota uma unjdade^árabe. o movimento deseja senjpdependente uma e s u t u r a que-flua5e_de...um Estado,, O Desde o início do ano de
l';llillfi/.',lll liHllC.nl, e se joloca à margem da OLP_ofjcia[_je_Chukeirj. Conselho Nacional 'Pgjggtincjjgjjjpue elege seu 1970, aumenta a tensão
ttitiiHill/.Hlri (.vi) sua Carta entre as organizações de
Perante a impotência dos exércitos árabes, a al-Fatah comité execuf]y5TTOfícjgÍQgjõtIlI) ]fflLParlarnento em
(/c Constituição: "6. Os fedayin e o poder
afirma sua vontade de retomar as ações dos coman- exílio: nelengstãó^epresentadas.as ^rganizações
/i/i/ci/s que residiam jordaniano. Os sequestros
dos guerrilheiros, interrompidas depois da Expedição armadas] os grupos
" de aviões no aeroporto
nwilarmente na Palestina
até o começo da invasão de Suez. Para a al-Fatah. o único meio de "libertar a 'gadês a t n s doscii r continente,s J J\ OLP, q u e "liberado" de Zarka, no
sionista são palestinos (...) Palestina^ árabe ociipada"_é a luta..amnada_. Nojprimei- ma*^^ do norte da Jordânia, são a
9. A luta armada é a única mundo árabe, torna-se uma enorme burocracia que gota cf água que faz
via para a libertação da ^ abrange numerosos departamentos, desde a Saúde transbordar o copo: os
Palestina (...) 21. O povo Sua acão. que_contrasta com o imnhili.smn (a Lua Crescente Vermelha, equivalente à Cruz Ver- terroristas carimbam no
árabe palestino (...) rejeita melha) até os Assuntos Estrangeiros. Falta-lhe ape- passaporte dos passageiros
qualquer solução que nas um território... um visto palestino e
rilheiras em Israel se_multip[icam,_j^iianJaDd^a.te_n-
pretenda substituir a desafiam abertamente a
são que ^recede^j^Qjerrajfc.s SaaJ>ias—.Aj^^ía.. autoridade do rei.
libertação total da
Palestina". Confirmando a
dos exércitos árabes nessa i O terrorismo internacional Foto © Keystone
mudança por que passou a TrSz legitimidade celebridade intrnacional
OLP desde então, essa aTFatah, que visa a construção de um Estado palesti- atravéscÍê~7irFmêTõ^o~mãTs"'qué discutível :"êm 1Ó6B,
Carta é declarada "caduca" ™* 1
^^^^•«•"«««•^•••^•««••••••••[••jHBq^aMMH»™^.^^^^^^^^^™^^^--^™™™^^^ ^"*

um avião da companhia israelense El Al é ãTe^agp no


por Arafat em 1989. A resistência palestina não consegue se implantar aeroporto de Atenas.pelQs fedayin. Nasce o terrorismo
Foto © Keystone militarmente nos territórios ocupados — exceto em intfirnaninnal. oufi cQp^a com os eficazes serviços da
Gaza, onde o exército israelense levará três anos para globalização das informações.
conseguir aniquilá-la. Entretanto, as ações conduzidas Em fevereiro de 1970 um avião da Swissair com
ao terro- destino a Tel Aviv explode em pleno voo: 47 mortos.
rismo internado^ Jflrjiam impossível, daqu[jgpjj3Ían- Na primavera de 1972 a opinião pública mundial se
te, ignorar o problema palestino. Com Chukeiri dssa:
creditado, os movimentos de_resistênc[a-iarrnadaJL
sobretudo a al-Fatah de
lasser Arafat, irão assumir
o controle da OLP, que
agora reivindica autonomia

Em 1968 a narrativa da
batalha de Karameh
aumenta a popularidade
dos fetó^^^gjj^mMTejros
palestinos: nessa peque-
na aldeia jordaniana, eles
resistiram vitoriosamente
a uma ação de represália
do exército israelense. Karameh aparece como sím-
bolo da nova direção da OLP. Seucomando central,
agora maciçamente financjaclõ pelos Estados árabes
— tíl lreSflSciãTospaíses do golfo Pérsico —, Lafio^se.-
torneTa'organização de libertação nacional mais rica e_
põcIêTòsa do mundo. Ao longo dos anos ela a*3quTre"
to
" '•• • «m» .-iin.7l.li .-^
OS PALESTINOS ENTRE ISRAEL E OS PAÍSES ÁRABES O PROBLEMA DO TERRORISMO 95

An /IKI/IO (/(is ,-i/ios a França abala com o massacre dos passageiros de um voo da o coronel Kadafi e a Líbia são "punidos" por seu supos- "A resistência está pronta a
i t n n . i só IHII dos cenários Air France por um comando do Exército Vermelho to apoio a um atentado contra uma discoteca frequen- transformar o Oriente Médio
privilegiados do terrorismo Japonês no aeroporto de Lod, em Israel. Nova ação. tada por soldados americanos em Berlim ocidental. num inferno, a atacar todos
vindo do Oriente Médio. Os os interesses colonialistas e
Mas o terrorismo é uma faca de dois gumes: em
imperialistas e todos os que
acertos de contas 1970, o rei Hussein da Jordânia o considera motivo querem destruir a esperança
palestinos ocupam durante Negro" assassina doze^tletas israelenses. A respos- necessário para lançar uma gigantesca operação de de nosso povo..." Expulsos
muito tempo o primeiro sraeTnioernenos mortífera: um bombardeio repressão contra os feday/n. O reino jordaniano, onde da Jordânia depois do
lugar, mas aos poucos são de campos de refugiados no Líbano e na Síria faz se encontram as principais bases da OLP, torna-se o Setembro Negro, os fedayin
suplantados pela luta dos mais de 200 vítimas. O Setembro Negro pedia a liber- alvo principal das acusações dos feday/n. Segundo irão refugiar-se nos países
arménios, o conflito tação de 200 prisioneiros palestinos em Israel... estes, os regimes "derrotistas" são culpados por acei- vizinhos, sobretudo no
Irã-lraque e as guerras do Outro elemento desse coqueíe) mortgM_aJmplicação tarem a Resolução 242 das Nações Unidas e, portan- Líbano.
Líbano. de vários países no terrorismo. Q Egito, o Iraque, a to, todas as derrotas contra Israel. Um slogan provoca- Foto © Sipa
Argélia dão seu apoio logístico aos comandos -palesti- dor — "Todo o poder à resistência!" — torna inevitável
nos. Nos anos 80,.estarão implicados principalmente o confronto com o rei Hussein, que deseja controlar as
o~Trã7 a Líbia e'ã'Sír|gTZ'"J atividades dos feday/n. Estes, por sua vez, pretendem
Visto como um ato de guerra, o terrorismo provoca fazer da Jordânia o santuário da revolução palestina.
uma resposta direta dos Estados atacados. Em 1a de Apoiados por uma parte da população jordaniana —
outubro de 1985 a aviação de Israel bombardeia o 60% dela de origem palestina — eles tomam o contro-
quartel-general da OLP em Túnis, após o assassinato le das cidades do norte do país, assim como de vários
de três de seus cidadãos. Em 15 de abril de 1986, bairros da capital, Ama. Em 17 de setembro de 1970.
dezoito bombardeiros americanos despejam suas bom- nrfii Hu5Sf?Ín lan^ "^n «xnrnitn mntfa os facfayfcL
bas sobre Trípoli, no Líbano, e Bengasi, na Líbia. Assim Apesar de suas promessas passadas, nem a gíria

MEMORIAL DO TERRORISMO

1972-1973. Assassinato de três dirigentes palestinos na França: Mahmud Hamchani (bomba ligada ao telefo-
ne), Bassel al-Kubeissi e Mohamed Budia (bomba no carro). • 15 de julho de 1974. Atentado no boulevard
Saint-Germain em Paris: dois mortos (por Carlos, dissidente do FPLP). • 27 de junho de 1976. Sequestro de
um avião da Air France para Entebe, em Uganda (Grupo Setembro Negro). • 1977-1978. Assassinato de três
dirigentes palestinos na França: Mahmud Uld Saleh, Ezzedin Kalak e Adnan Hammad (os dois últimos por Abu
Nidal). • 18 de julho de 1980. Tentativa de assassinato contra Shapur Baktiar, antigo ministro do xá; Anis
Naccache, chefe do atentado, recebe o perdão presidencial em julho de 1990. Shapur Baktiar é assassinado
em Paris em agosto de 1991. • 3 de outubro de 1980. Atentado contra a sinagoga da rua Copernic, em
Paris: quatro mortos, doze feridos (Abu Nidal?) • 4 de setembro de 1981. Assassinato do embaixador da
França no Líbano, Louis Delamare. • 3 de abril de 1982. Assassinato do diplomata israelense Yacov
Barsimentov (FARL: Facções Armadas Revolucionárias Libanesas). • 9 de agosto de 1982. Atentado no bairro
judaico de Paris contra o restaurante Goldenberg: seis mortos, 22 feridos (Abu Nidal). • 15 de agosto de
1983. Atentado no aeroporto francês de Orly: oito mortos (Exército Secreto de Libertação da Arménia). • 23 de
outubro de 1983. No Líbano, atentado com um caminhão suicida contra o Q.G. americano (241 marinheiros
morlos) e francês (58 pára-quedistas mortos). • 1985. Sequestro de cidadãos franceses no Líbano. • 7 de
outubro de 1985. Sequestro do navio italiano Achille Lauro: í morto (FLP). • 27 de dezembro de 1985.
Alíi(|uc simultâneo contra o balcão da companhia aérea israelense El Al em Viena (três mortos) e em Roma (16
mortos). Abu Nidal, "em represália contra o ataque israelense a Túnis em 1a de outubro". • 1986. Onda de
c«|ilns(ii". morins um HiRrires públicos de Paris, cinco sõ no mês de setembro (reivindicadas pelo Comité de
A|>"i 1'iisionciici1. Políticos Árabes). Total: 13 mortos e 141 feridos. • 19 de setembro de 1989.
l >|ilu'.,ni cm pleno voo dl? um iiviíio da companhia UTA: 171 mortos. •
OS PALESTINOS ENTRE ISRAEL E OS PAÍSES ÁRABES

nem o Iraque iníeQtêm-«m-fay^.^osjp£lestings. Os


combateSLllflfivaiiãQ-
4000 mortes, ã expulsão jaJjLPjJa Jordânia — é o
í SETEMBRO NEGRO

Não é sem dificuldade que a opção "realista" se


impõe. Os refugiados palestinos de 1948, originários
do território de Israel, não querem aceitá-la; ela é com-
97

"jjgtembro JSejgrg". Assim fracassa o "Estado dentro batida também por uma "frente de recusa" incentivada
deumEstado" almejado pelos palestinos. Alguns^anbs pela FPLP (Frente Popular de Libertação da Palestina)
maista^e^o mesmo fenõmeng_seIrgBelirá no Líbano. com o apoio do Iraque, da Líbia e do lêmen do Sul.
O èpisodiòlrágiccr^ numa Bem distantes do campo de batalha, esses países se
idança de estratégia em duas direções aparentemen- declaram fiadores de uma certa "pureza revolucioná-
te contraditórias.De um larlnr imo um reudesci- ria". Enquanto a opção defendida por lasser Arafat vai
merflo do lsraele
_ também cootra avançando, as divisões dentro da
£s traidores árabes"; e de outro, rumo à via diplomáti: Central Palestina se aprofundam.
árabe-judaico "lei Na verdade, a OLP é um conglomera-
e Bemocrático" na Palestina como um todo; este é o^ do de organizações heterogéneas, um
Georges Habache, dirigente
"sonho"" exposto praTarém^^TgjTaJribuna
^ ^ da microcosmo que reflete o mundo
do FPLP, anuncia a libertação
dos turistas detidos por sua
CJNU. Pjara isso, a OLPIuI^TcõntãrcõiTi os judeus sefar- árabe: a unidade de fachada é mantida
organização num hotel de dim, majoritários em Israel porém mal integrados ao apenas através de uma carta de princí-
Ama em 1970. Em fevereiro establishment dos fundadores do país, que são asque- pios extremista, que a Central não é
de 1992, a notícia de sua ida nazim. Porém o prqjeto de uma federação "cananéia", capaz de modificar. Pode-se compará-la
à França por motivo de saúde apresentado pelo deputado israelense Uri Avneri como a uma sociedade anónima onde cada
provoca histeria na imprensa uma alternativa ao sionismo capaz de englobar os dois país árabe tem ações: a facção Saika é
e uma crise no governo. povos semitas, judeus e árabes, não terá sucesso. É aliada à Síria, a FLA ao Iraque, etc.
Foto © Wheeler/Gamma votando na direita nacionalista de Menahem Beguin Mesmo reconhecida pelos Estados ára-
que os sefardim vão marcar sua diferença... bes, a OLP incomoda por suas ambi-
ções independentistas; daí vêm as
A opção do compromisso diversas tentativas de liquidá-la.
Optando pelo realismo, a direcão da OLP evolui. Longa é a lista dos sofrimentos
Em 1977 nela se destaca uma maioria j_fayQLde_um palestinos. Chukeiri controlado pelo
Estado soberano "emqugilguer_oejaço libertado da Egito, o Setembro Negro pela Jordâ-
ptilrW"TTStcnrícrsTrà~6r^rõcura de uma solução de nia, o interminável sítio do acampa-
compromisso histórico baseado no reconhecimento mento palestino de Tal-al-Zaatar em
do direito à autodeterminação dos palestinos, incluin- 1976 no Líbano, o cerco de Trípoli,
do o direito ao retorno e o direito a um mini-Estado também no Líbano, pelo exército sírio
soberano nos enclaves da Cisjordânia e de Gaza. em 1983, o massacre de Sabra e Chatila perpetrado Calendârio da OLP para o ano
por falangistas maronitas aliados de Israel, o apoio do de 1983. No imaginário da
A nova linhajDolítica, dinamjzada__rjela situação
revolução palestina, a pomba
nascida da guerra do Yom Kippur (veja capítulo 6), Iraque e da Líbia a Abu Nidal ou Abul Abbas, a repres-
da paz, ornada com o
são contra os "colaboradores" após a libertação do emblema nacional, não se
reconhecida peJc^ Kuwait. Eis como descreve esses sofrimentos o poeta concebe sem um fuzil, único
J o rd â n ia ) como "o ú n i c o neprê^èTrEantêclopovo palestino Mahmud Darwich: "Descobrimos o quanto já meio de fazer ouvir a voz
maciçamente pela nos tornamos árabes nas prisões israelenses; desco- desse povo sem terra.
UJ^sr^o^úTTlT^Ts^TrlTp^rtante, lasser Arafat é brimos o quanto já nos tornamos palestinos nas pri- Foto © Edimedia
ccrôidadõ por numerosos paTSês — como a França sões árabes..."
e"altãfÍ£^^2Q|^^^^^^^^s Unidas, de onde Porém a busca da unidade aparece constantemente
como uma necessidade vital, pois a Central deriva sua
ê1iê;^cãqâ!pQ[Tr"^õ!^^23E^^'l'a numa mao e um
fuzil na outra". ~"~ legitimidade apenas da sua capacidade de represen-
•Ill OS P A L E S T I N O S ENTRE I S R A E L E OS PAÍSES Á R A B E S
ITINERÁRIO DE UM COMBATENTE PALESTINO
tar o conjunto do povo palestino. Por isso, a direção

E
"pragmática" de lasser Arafat muitas vezes se vê obri- m 1948, um jovem Guerra dos Seis Dias, ao companheiros já morreram —
gada a endossar ações que ela reprova. Estig- palestino de dezenove demonstrar a incapacidade fez dele um mito. Desde seu
anos combate em dos países árabes de travar discurso histórico na tribuna
matizada pela pesada carga do seu início, a OLP conti- Jerusalém contra os soldados combate, justifica as opções das Nações Unidas em 1974,
nua sendo identificada à sua facção extremista. Para de Israel. Quarenta anos mais da al-Fatah. Apesar das lasser Arafat, usando a kefiah
muitos, OLP não rima com "nacionalismo" mas sim tarde, em janeiro de 1989, incursões clandestinas de tradicional e a eterna barba
com "terrorismo" — ignorando-se assim os esforços numa sessão extraordinária Arafat na Cisjordânia dos fedayin, simboliza aos
da ONU, lasser Arafat, ocupada, a organização não olhos do mundo, além do
reais efetuados pela chefia da organização para travar
presidente do Estado da consegue promover uma combate palestino, as
um diálogo na base do reconhecimento mútuo. Palestina, reconhece insurreição armada nos incertezas do terrorismo e os
A OLP nunca foi capaz de controlar o nebuloso con- solenemente o Estado de territórios; contudo, ela obtém perigos de uma diplomacia
junto de minúsculos grupos palestinos. Ao longo dos Israel. Entre essas duas uma ressonância cada vez tantas vezes ambígua: ele
datas, que longo caminho maior nos acampamentos de consegue a proeza de manter
anos, várias personalidades moderadas da OLP foram
percorrido! Para uns, símbolo refugiados palestinos. Em contato com os pacifistas
assassinadas pelos que fazem guerra contra os "traido- da resistência de um povo, 1969, a al-Fatah se impõe na israelenses e ao mesmo
para outros, terrorista, tempo com os radicais
lasser Arafat é um líbios, os marxistas de
personagem complexo e Áden e a Fraternidade
difícil de definir. Isso Muçulmana da Síria,
porque sua vida se com o Egito de Sadat
confunde com a do ou o de Mubarak.
combate palestino, em Perseguido pelo
todas as suas espectro de hadji
dimensões: a rota do Husseini, ele tem a
exílio é longa e obsessão de chegar a
tortuosa. Refugiado no um acordo. Entretanto,
Egito após a derrota de deve também manter o
1948, sua militância na caráter representativo
Organização dos da OLP, que é a sua
Estudantes Palestinos única fonte de
lhe vale uma breve pena legitimidade. Embora os
de prisão. No momento moderados da al-Fatah
do arabismo triunfante, sejam grande maioria
sente uma na Central Palestina
desconfiança precoce (cerca de'80%), Arafat
em relação aos foi obrigado a endossar
dirigentes árabes que, a as ações terroristas de
exemplo de Nasser, certos grupos
rés da causa". Foi esse o caso de Issam Sartaui, que subordinam a causa minoritários. O passado
Em junho de 1982, a invasão desde 1976 fez contatos com personalidades israelen- palestina a seus tão pesado de Arafat
próprios interesses. Assim, direção de uma OLP renovada, faz com que muitos pensem
do Líbano por Israel se dirige ses, e que foi executado pelo grupo de Abu Nidal — Arafat determina sua futura da qual Arafat se torna — até mesmo seus
diretamente contra a OLP. este mesmo condenado à morte pela OLP em 1973. estratégia política: para presidente. Para despistar as partidários — que no dia em
Depois de três meses de A partir de 1978, as fileiras se cerram em torno de sobreviver, o povo palestino ameaças de seus múltiplos que começarem negociações
lutas violentas em Beirute, os deve se constituir de forma inimigos, Arafat, apelidado de sérias lasser Arafat deverá se
lasser Arafat, contra a estratégia de Camp David —
combatentes palestinos são autónoma, até mesmo, se "o Velho", vive rodeado de afastar. Mas, talvez ainda
obrigados a retirar-se sob a refutada pela Central, que foi mantida à parte de um
necessário, indo contra os guarda-costas, sempre entre esteja bem longe o dia em
proteção de legionários processo que não reconhece "os direitos nacionais do países árabes e seus slogans dois aviões, duas capitais, e que o Estado da Palestina não
Imnceses. Dessa forma, são povo palestino". A OLP se reconcilia com as capitais unitários. Freado pelo regime raramente dorme mais de tenha mais necessidade
<>xt>iilr,iKí tio nua última linha síria, iraquiana e jordaniana. Na^ mesma época, ela nasserista, lasser Arafat se uma noite no mesmo lugar. desse homem, símbolo de
(/c ftrnlc roním Israel. instala no Kuwait. Em 1959 Sua longa sobrevivência sua luta e de seu exílio. •
tenta quebrar a lógica terroristaTque só prejudica, ajjyj
ele está entre os primeiros política — e também física,
causa. Daqui em diante esta causa deverá ser defendi- fundadores da al-Fatah. A quando tantos de seus Foto <D Keystone
100 OS P A L E S T I N O S ENTRE ISRAEL E OS PAÍSES ÁRABES O FIM DOS S A N T U Á R I O S 101

lasser Arafat, cercado em Trípoli, é forçado uma vez Nos territórios ocupados, a
mais a deixar o Líbano, protegido pela França, contra intifada prossegue com
a dupla ameaça da artilharia síria e da marinha de manifestações e represálias.
Em janeiro de 1988,
guerra israelense. Daqui em diante a OLP não dispõe
soldados israelenses
mais de um santuário; assim, será incapaz de reagir dispersam uma reunião de
ao ataque israelense lançado em 1985 contra seu protesto após a morte de
quartel-general em Túnis. No palco do Oriente Médio a uma mulher palestina pelo
OLP está praticamente reduzida à impotência. exército num subúrbio de
Jerusalém.
A colonização dos territórios ocupados Foto © Chip Hires/Gamma
É assim que a luta se desloca para os territórios
conquistados por Israel em 1967. Já a partir do fim
da Guerra dos Seis Dias, .ojaipislEO Igal Aloa.pjopu-
sera a colonização de uma faixa de vinte quilôme-

Cgjje Israel. A nahal, colónia agromilitar concebida


No coração de Beirute da pela luta armada contra o exército de Israel e pela sobre TTrnõdelo do kibutz, é o instrumento dessa pri-
ocupada, de 16 a 18 de acão_dipjomática:lrata-se de-gaTftrarajsii i jualia JaTSi- meira implantação. Para enfrentar as ameaças e
setembro de 1982, nião pública, e não mais de provocar seu repúdio. para realizar esta estratégia territorial, os efetivos
milicianos falangistas do exército israelense dobram entre 1967 e 1985
Entretanto, traumatizados pelos atentados sangren-
massacram, sob o olhar
tos, os governos israelenses de quaisquer tendências (de 71 000 para 140 000 homens). Ajtós_£_cJiegada
Indiferente dos militares
israelenses, quase mil
se recusam a considerar a OLP como mais que "um
pessoas nos acampamentos bando de assassinos". Em junho de 1982, a invasão zacão dos territórios *?e afifílfírgJ/js^ndíxjDrecipitar a
palestinos de Sabra e do Líbano visa diretamente a Central. A quinta guerra política dofatoconsumado. as cojonias^ constituem^
Chatila. A comissão de árabe-israelense é, sobretudo, a primeira guerra
inquérito israelense conclui palestino-israelense; na verdade ela não vai sequer
que houve responsabilidade gerar reações nas capitais árabes. Será necessária a
do primeiro-ministro mediação de uma força internacional liderada pelos
Menahem Beguin, de Itzhak Estados Unidos para cobrir a retirada de 10 000 feda-
Shamir e, sobretudo, do
yin, que deixam o Líbano sob a proteção franco-
general Ariel Sharon, artífice
da operação "Paz na
italiana, armas aos ombros e cabeça erguida: apesar
Galiléia". de um cerco impiedoso de dois meses, o general
Foto © Mingam/Gamma israelense Ariel Sharon não conseguiu seu objetivo.
De certa forma já é uma vitória.
Porém a invasãp riojjbano faz explodir a^srontradj-

nclui que é urgente encontrar uma solução negocia-


dliTuma nova frente de recusa
Arafat. Extremamente minoritária nas fileiras palesti-
niãsTessa frente radical é organizada pela Síria, que
está decidida a despejar definitivamente os palestinos
dos territórios libaneses sob seu controle. Em 1983,
102 OS P A L E S T I N O S E N T R E I S R A E L E OS PAÍSES Á R A B E S ESTRATÉGIAS TERRITORIAIS 103

A m/i«».Mí;.i" i/.i Cisjordânia os elos de um projeto geopolítico preciso: a constru- continua no front pioneiro da Alta Galiléia, onde a As colónias judaicas visam
comece Imediatamente após a
ção da Israel Hashlemá, ou Grande Israel, do qual população árabe ainda é majoritária; o objetivo é seg- estender uma rede por todo o
Kuorra de 1967. Num primeiro
faz parte integrante a Cisjordânia — chamada pelos mentar o espaço palestino, romper a homogeneidade território da "Judéia-Samaria"
momento ela atende a
seus nomes bíblicos de Judéia e Samaria. O Likud (nome bíblico da Cisjordânia).
exigências militares; logo, do habitat árabe e estabelecer, a médio prazo, uma
porém, será assumida por recusa o qualificativo pejorativo de "ocupação": Em março de 1992 o governo
nova "rede" de continuidade territorial — desta vez israelense preferiu renunciar
civis adeptos da ideia de um para ele esses territórios foram "recuperados", ou
"Grande Israel". Uma lógica feita por colónias de população judaica. A colónia de a um empréstimo americano
económica incentiva o melhor, "libertados". Isso lhe permite ignorar a Ariel, por exemplo, construída no prolongamento da de dez milhões de dólares
povoamento dos territórios: Convenção de Genebra sobre territórios^ocupã^õs" zona metropolitana de Tel Aviv, foi concebida para para não interromper a
atraídos por uma política de
^ eMi ptnEJdaT pelos a c o Fcio s~ receber 50 000 habitantes. Paralelamente, os pales- colonização dos territórios
preços baixos, mais de Camp David jrefergjse aoerias^às_GQPulaçoes; e não
100 000 judeus passam a
tinos são submetidos a uma contínua perseguição ocupados. Na foto o novo
residir em assentamentos em
à terra, de forma nenhuma. Os militantes do Gush (proibição de construir, de cavar poços...) que visa assentamento de Revana,
Jerusalém oriental e seus EmunínTr^^tDTtrdos-fiéts", são a ponta-de-lança incitá-los a partir. em abril de 1991.
arredores. dessa colonização. Para sustentar sua resistência, os palestinos dos Foto © Shlomo Arad/Sipa

AS COLÓNIAS ISRAELENSES NA CISJORDÂNIA

l.. Função de defesa contra o adversário árabe


1. Vale do Jordão 2, Mar Morto

GZ3 Função de controle das cidades


3. Shavei Shomron 4. Tirzah 5. Kadumim
6. Elon Moreth 7. Beit Et 8. Giv'on
9. Maalei Adumim 10. Etzion II.Yehudá
12. Hebron

l, .'J Função de tampão com Israel


13. Shomron Tsefoni 14. Reyhan 15. Ma'arev
16. Salt 17. Modim 18. Har Hebron 19. Yatir
A A A A A ,
LAJ Função de separação da Samaria A A A A A
20. Kamei Shomron ZLArtel 'A A A A A A
22. Shilo 23. Halamieh A A A A A A AÃ
A A A A A A A A A
A A A A A A A A
Jenina Cidade árabe A A A A A A A.A
Tel Aviv Cidade de Israel A A A A A A
A A A A ' LÚrnUlL. Hk"0*1
* Colónias israelenses LAAAAAAAAA
A A A A A A A A A
km 100 AAAAAAAA/(
lAAAAAAAA.

Para esses partidários do Grande Israel, a "recon- territórios ocupados contam apenas com sua superio-
quista" da terra, que é árabe por usurpação e judaica ridade demográfica (mais de um milhão e meio na
por promessa divina, é um dever sagrado. O neo- Cisjordânia e Gaza). Ora, as colónias são projetadas
sionismo desses pioneiros modernos, apóstolos da para acolher um milhão de colonos judeus. Em 1991,
tshuvá, ou "retorno a Deus", faz um estranho eco às mais de 200 000 judeus são recenseados na
teses defendidas pelo islamismo no campo adversá- Cisjordânia e em Gaza, 12 000 nas colinas de Golan
rio. Sinal de um esgotamento do sionismo leigo? e mais de 100000 em Jerusalém oriental. E o mais
A integração económica e também política dos terri- importante, a partir de 1989 a questão demográfica
tórios é levada a cabo de maneira metódica. O gover- se modifica por completo com o afluxo de judeus da
no israelense retoma assim a técnica de assenta- União Soviética: 100 000 imigrantes em 1990, sendo
mento de comunidades judaicas — tarefa que, aliás, esperado o dobro em 1991.
POMBAS E F A L C Õ E S : DOIS PONTOS DE V I S T A I S R A E L E N S E S

O que fazer com os


territórios ocupados?
Esta questão
fundamental divide a
"Pela partilha"
Abba Eban participou dos
debates da ONU que em
1947 levaram à partilha da
Kahan, numa doutrina
racista. (...) Vitorioso, Israel é
um Estado cujo futuro é bem
mais incerto que o de
"Não cederemos nada"
Para o secretário de Estado
americano James Baker,
iniciador da conferência de
sem volta? Qualquer retorno
é fora de questão. O governo
não cederá jamais essas
zonas. Não se deve alimentar
coração de Israel.
— E Jerusalém?
— É necessário que, daqui a
alguns anos, a Grande
sociedade israelense em Palestina. Ministro do qualquer entidade política no paz que se seguiu ã Guerra falsas esperanças, que Jerusalém tenha pelo menos
"pombas" e "falcões". Estes Exterior de Israel até 1974, mundo moderno. Se os do Golfo, as colónias geram decepções ou até um milhão de judeus. Isso
termos não definem a ele propõe o retorno ao princípios da vitória de judaicas nos territórios confrontos sangrentos. implica rodeá-la de
oposição entre leigos e "espiritada partilha". 1947-49 forem ocupados constituem o maior Digamos o que é possível e o cidades-satélites.
religiosos, nem coincidem "Quando, em novembro de abandonados, a estrutura de obstáculo no caminho da paz que não è possível. As — O senhor recomenda a
com as noções de 1947, as Nações Unidas se Israel, suas dimensões, suas árabe-israelense. "Não há colónias são parte de um expulsão ou "transferência"
"esquerda" e "direita". Eles pronunciaram a favor da fronteiras, sua composição nenhuma relação", plano a longo prazo. Elas dos palestinos?
se vinculam a uma filosofia partilha da Palestina, sua humana, seu regime político, respondem os falcões, dos devem nos garantir o controle — Não. Mas sejamos claros,
mais geral, relativa à decisão foi bem mais que sua vocação judaica e suas quais o representante estratégico dos locais já existe um Estado
natureza e aos objetivos do uma resposta de rotina às qualidades morais serão máximo é Ariel Sharon, essenciais. Seja o Likud ou o palestino: a Jordânia. O fato
sionismo. Enquanto as reivindicações de dois submetidos à dúvida e à ministro da Construção e da Partido Trabalhista, todos os de o rei Hussein reinar em
pombas desejam transformar litigantes quanto ao mesmo incerteza. (...) Se insistirmos Habitação em 1991: governos desde 1967 Ama não muda nada. É o
os territórios num trunfo para património, permitindo dizer em conservar todos os — Ao contrário. Para fazer adotaram a mesma política: único ponto de partida
uma eventual negociação que a justiça foi feita territórios e as populações avançar a paz, Israel deve ampliar a Grande Jerusalém realista. •
("os territórios em troca da cortando-se a maçã em duas que caíram sob nosso sentir-se em segurança, e manter a profundidade
paz"), os falcões, céticos partes. (...) Não há um controle em 1967, especialmente em suas estratégica, que garante a (L'Express, 30 de maio de 1991)
quanto ao estabelecimento mínimo de afinidades que perderemos nossa maioria fronteiras. Na Judéia-Samaria segurança da faixa costeira
de uma paz justa e faria com que um milhão e judaica, nossos princípios e no Golan as comunidades onde vivem dois terços de O massacre dos
duradoura, pregam sua meio de palestinos democráticos, nossa chance judaicas reforçam este nossa população. acampamentos palestinos
integração progressiva ao aceitassem viver sob a de uma paz eventual, nosso sentimento. A paz é muito — O precedente da de Sabra e Chatila
Grande Israel. • autoridade israelense. Um tratado com o Egito e a importante; mas a proteção devolução do Sinai não emocionam boa pane da
princípio aplaudido com possibilidade de evitar uma da vida dos judeus é mais enfraquece a credibilidade do opinião pública israelense:
fervor quando se tratava de outra guerra." • importante ainda. Acrescento seu argumento? atendendo ao chamado do
aplicá-lo a 600 000 judeus que a infra-estrutura — Nada a ver. O Sinai, movimento "Paz agora",
não pode tomar-se obsoleto (Lê Monde Diplomatique, "Proche construída não serve apenas situado fora da terra de 300 000 pessoas
quando ele concerne à sorte Orient, une guerre de cent ans", aos judeus. Os árabes Israel, era deserto e não manifestam sua oposição à
de um milhão e meio de março de 1991.) também se beneficiam dela. lançava ameaças terroristas política do partido
palestinos árabes, a menos — Teremos atingido um sobre nossos civis. A majoritário Likud.
que se refugie, como faz o ponto sem volta? Judéia-Samaria, ao contrário,
Gush Emunim e o rabino — Por que falar em ponto é o berço do povo judeu, o Foto © Benami Neuman/Gamma
OS P A L E S T I N O S E N T R E I S R A E L O ESTADO Á R A B E DA P A L E S T I N A 107

A revolução das pedras então um diálogo com o governo americano, chave Reconhecendo a existência
mestra de qualquer acordo. Porém, uma vez mais, a da intifada, em julho de 1988
Dezembro de 1987: depois de vinte anos de ocupa- o rei Hussein rompe os
ção e de derrotas, tanto militares quanto diplomáticas, intransigência de ambas as partes irá quebrar o
últimos laços administrativos
o desespero e a rejeição a uma situação intolerável impulso: enquanto se constitui em Jerusalém um
entre o seu país e a
aumentam na juventude palestina que cresceu sob o novo governo que inclui alguns adeptos da "transfe- Cisjordânia ocupada. Nestes
jugo israelense. Esta é a causa da intifada (em árabe: rência" de árabes residentes na Judéia-Samaria, territórios "esquecidos" pela
insurreição). Essa "revolução das pedras" começou de Abul Abbas tenta desembarcar em Tel Aviv; o diálo- lei, o ódio contra Israel é
.forma espontânea e tomou de surpresa tanto Israel go é rompido. tanto que, durante a crise do
quanto a OLP. A total ausênciai dejaerspectivas. levou a É neste contexto que estoura a crise do golfo. O golfo, os mísseis disparados
Iraque dispõe de cartas valiosas aos olhos dos por Sadam Hussein são
no^/a^j2djcjljzaçõe£^depois doshpjmens ilustres pró-
palestinos: sustentado por um exército poderoso, recebidos com
iordanianQa "
que aspira a uma paridade estratégica com Israel manifestações de alegria.
"P ra geração de líderes palestinos, cada vez menos "corh.
Foto © Chip Hires/Gamma
-fois que Sadam trolávejs". Prova disso é a expansão do movimento — armas químicas contra armas nucleares —, o
islamista Hamas, que retoma d^íscursg^regariclò' a país é um dos últimos bastiões do nacionalismo
lance seus mísseis destruição de IsrãêT^piãrEicípã" clã intifada sem seT árabe. A demagogia de Sadam Hussein encontra
reconhecer como participante datJtPT" ressonância imediata na população dos territórios
contra Israel! n^êlãreslíaôTvioTe^^ apesar da ocupados, reduzida a seus últimos cartuchos após
morte de mais de mil pessoas nas fileiras palestinas três anos de lutas infrutíferas. Pressionada pelas
Mesmo que a em três anos, nada parece deter um movimento que bases, arriscando-se a perder o controle, a OLP não
se alimenta de seus "mártires": pedras, barricadas, tem escolha. Desde 1983, o Iraque é o último país
maioria não atinja greves, boicote de produtos israelenses, manifesta- a apoiá-la... A crise do golfo mostra a urgência de
ções em que se desfralda a proibida bandeira palesti- uma solução para a questão palestina. O Estado
o alvo e caia sobre na — sucedem-se quase todos os dias. A situação se Árabe da Palestina, estipulado pelo plano da parti-
deteriora, "colaboradores" são assassinados e civis lha de 1947, será um dia realidade?
nós, pelo menos israelenses atacados a faca. Contudo, o movimento
como um todo respeita as instruções da OLP, a qual
alguns atingirão se recusa a passar para uma luta armada que sem
dúvida lhe seria fatal. As pedras são um símbolo que
Tel Aviv!" expressa, além da pobreza das vítimas, uma vontade
de manter o conflito num certo nível.
Valendo-se da intifada comjpJoriiiidJiy^Uasltumeo-
to"3ejprõpagari_da;- a 'diréção da OLP finalmente dá
um passo: em novembro de 1988 o Conselho
Nacional Palestino, reunido em Argel,. recoflhece_.o-.
conjunto das resoluções da ONU sobre. a Palestina,
TqcJjuiBdOn^l?^^g^ESÍ^ni^fazejido, ela jadmite
ofig iãJJUgJlte^LdJ.ré• i t d s rael ã exstê n c i a .Em
segyjdaA_ela_declara
proclarria_ja_cSQ^JTuTçodo Estado árabe da
^
)utro fato novo: ~ãs~õrgaTiTzãções radicais, como a
FPLP, se submetem à decisão da maioria e dão
uma chance — com a condição de sucesso rápi-
do... — à linha de ação de Arafat. A Central inicia
DE SADAT A SADAM 109
Capítulo 6
ENQUANTO o EGITO SE ENCAMINHA PARA UM ACORDO HISTÓRI-
DE CAMP DAVID CO COM ISRAEL, APARECEM os PRIMEIROS SOBRESSALTOS DA REVO-
LUÇÃO IRANIANA. COMO SINAL DOS TEMPOS, O ISLAMISMO E O
A GUERRA DO GOLFO PETRÓLEO TORNAM-SE O MOTOR DOS PRÓXIMOS CONFLITOS.

l
TV ^^L ao é verdade que os árabesEm janeiro de 1979, depois
^^k l detestam os judeus por de enormes manifestações
^^H razões pessoais, religiosas ou na rua, o regime do xá do
Ire desmorona, dando lugar
^B raciais. Eles nos vêem, e do à primeira república
•J™ ^ seu ponto de vista têm razão, islâmica da História. Depois
como ocidentais, estrangeiros, invasores que se apo- do choque do petróleo, este
deraram de um país árabe para fazer dele um Estado acontecimento deixa o
judaico... Considerando que somos obrigados a reali- mundo estupefato: o
zar nossos objetivos contra a vontade dos árabes, Oriente Médio demonstra
precisamos viver num estado de guerra permanente." ser um dos centros
Esta declaração do general Moshé Dayan (feita logo nervosos do planeta, onde
após a Guerra dos Seis Dias) mostra um ceticismo as crises repercutem com
amplamente partilhado pela opinião pública israelen- violência.
se sobre as chances de uma paz negociadaJJ2eJalal Foto © A. Mingam/Gamma
todos os esfoiÇQS de mediaslp realizadosjdepojsxia
1967 irão fracassar e a Resolução 242 da QMUj^ue
determinava a restituição dos territórios conquista-
dos, ficou letra mgrta.
É isso quê íeva os países árabes a pensar em reini-
ciar as hostilidades, com um objetivo limitado: não o
de libertar o conjunto dos territórios ocupados em
1967, mas provocar uma internacionalização do con-
flito que lhes permita escapar de um estéril confronto
com Israel e forçar as negociações. O exército egípcio
terá, portanto, a missão de atravessar o canal de
Suez e fixar-se, custe o que custar, em sua margem
oriental; já o exército sírio terá a missão de escalar
as encostas do monte Hermon.
A ofensiva é marcada para 6 de outubro de 1973;
situada em cheio no mês em que os árabes fazem o
jejum do Ramadan, esse dia corresponde também ao
Yom Kippur, o Dia do Perdão, comemoração religiosa
que paralisa a população judaica. Passado o primeiro
110 DE CAMP DAVID À GUERRA DO GOLFO EM J E R U S A L É M PELA PAZ 111

Em 6 de outubro de 1973, as momento de surpresa, em que os exércitos árabes tradicionais: já em 1971, iniciara a expulsão
tropas egípcias se lançam ao progridem nos dois fronts, instalam-se duas gigantes- dos conselheiros militares soviéticos. Aliando-se aos
assalto da margem oriental do nmoricanos, ele acredita romper a lógica da guerra fria
canal de Suez e conseguem cas pontes aéreas, uma dos Estados Unidos para
penetrar na famosa linha Israel e outra da URSS para os países árabes. Israel n hicilitar um acordo sob os auspícios da principal
Bar-Lev, considerada logo assume a iniciativa: ultrapassando as ordens pniiMicia mundial. Para tanto, ele deve quebrar o
inexpugnável. Um dos recebidas, o general Sharon dispõe seu exército na ffíilor de todos os tabus — o diálogo direto com
objetivos desta guerra foi lirael. Vem daí sua histórica viagem a Jerusalém, em
margem ocidental do canal, de onde ameaça cercar o
atingido: quebrou-se o mito da
invencibilidade israelense. III exército egípcio. MOVI M nbro de 1977, que desperta uma enorme espe-
Abaixo, tanques israelenses a / A Guerra do Yom Kippur leva a uma escalada rança no mundo/ Depois de décadas de luta, será que
caminho do front do Sinai. espetacular entre os Estados Unidos e a União . vai enfim triunfar? Logo em seguida/são assina-
Foto como os combatentes não respeitam a " acordos de Camp David, sob os auspícios do
resolução de cessar-fogo, os soviéticos parecem piiiftidcnte americano Jimmy Cárter; mas, apesar
decididos a intervir diretamente no tea-
tro de operações. Os EUA reagem, SADAT NO PARLAMENTO ISRAELENSE - 20.11.77
declarando em 25 de outubro um alerta
nuclear de terceiro grau... Depois de segurança será sem sentido

D
ecidi vir até vocês
quase um empate territorial — Israel com o espírito aberto, enquanto vocês ocuparem a
recuou apenas alguns quilómetros — o o coração aberto, terra pela força das armas.
cessar-fogo finalmente se impõe/ oom determinação, para que A paz não pode ser válida e
l«>v.,imos estabelecer uma não pode ser construída
Contudo, essa guerra pela paz é uma
!>.i/permanente fundada na enquanto houver uma
guerra por nada. Devido às rivalidades ocupação da terra de um
|ir.lic.:;i. (...) Digo aos
Leste-Oeste, a conferência se arrasta. lenhores com sinceridade outro povo. (...)
Os Estados Unidos decidem conduzir o i li K • .1 paz só será real se for Se vocês encontraram
jogo em prejuízo de um acordo global: é luiul.iila na justiça e não na justificação legal e moral
a época dos "pequenos passos" de i» ii|i,K,:,io de terras alheias. para estabelecer uma pátria
Henry Kissinger, secretário de Estado H, lu r admissível que vocês nacional num território que
de Richard Nixon. Ele obtém, é verdade, p»çnm para si próprios não era vosso, então é
alguns êxitos parciais na separação iii|uiln (|iio recusam aos melhor que compreendam a
niiliov Sinceramente, no determinação do povo
das forças no terreno, mas o cerne da
ti',|iintn que me trouxe a vir palestino de estabelecer o
questão é evitado. Em especial a OLP,
lni|c .ilr esta casa, eu lhes seu próprio Estado, uma vez
que acabava de ser convidada para a mais, na sua pátria. (...)
• iic." os senhores devem
tribuna da ONU, de saída é colocada iilinniliiiiiir de uma vez por Em consequência vos
fora do jogo. lniLi'. '.cus sonhos de sim. Viver no interior de afirmo, senhoras e
i "Miinr.i.i. Devem também suas fronteiras, protegidos senhores, que seria ilusório
Camp David: história de um fracasso nluiMiliiM.ir a ideia de que a contra qualquer agressão. A não reconhecer o povo
Com essa nova ameaça de estagnação, Anuar li n i,, i d i i melhor forma de isso eu digo sim. Obter palestino, seu direito ao
Sadat decide tomar uma atitude radical/Sucessor de II.M.II "'. ;irabes. Devem todas as garantias para estabelecimento do seu
Nasser, Sadat quer obter a paz a qualquer preço, para i "iii|iu«inUor as lições do esses dois pontos. A este próprio Estado e o seu
• ••iiin.nl" entre vocês e nós. pedido eu digo sim. (...) direito de retorno. (...)
dar uma chance ao Egito de sair da miséria e do sub-
i>.iir..i" n; 10 vos trará Qualquer negociação acerca Como já vos afirmei, não
desenvolvimento. Os motins causados pela fome, que de uma paz permanente e pode haver felicidade para
iniiii iioneflclo. (...) O
estouram no Cairo em janeiro de 1977, funcionam • i i M/ P.IIÍI Israel? justa será sem sentido, ninguém à custa da miséria
como advertência: é prioritário sanar os desequilíbrios Vivei iiii mulAo com seus qualquer medida visando de outrem. •
internos. Consciente da proeminência americana na • Intuis ,unheis em garantir a nossa vida nesta
região, Sadat realiza uma espetacular reviravolta nas .11 eu digo parte do mundo em Foto © Sipa
112 DE CAMP DAVID À G U E R R A DO GOLFO 113
A G U E R R A PELA SUCESSÃO
Em 25 de abril de 1982, os
disso, a corajosa iniciativa do presidente Sadat acaba dente que aos poucos irá frutificar. No fim dos anos 80, o
israelenses devolvem o Sinai
ao Egito. O plano de fracassando. Em seu discurso no Parlamento israelen- enfraquecimento da URSS na cena internacional modifica
desmilitarização, se, ele lembra a necessidade de se tratar o conflito o jogo: a frente da recusa é obrigada a evoluir e em 1987
consequência dos acordos de como um todo; contudo, a recusa do mundo árabe e da o Egito — apesar de ainda vinculado aos acordos de
Camp David, termina em OLP, apoiados pela URSS, assim como a intransigência Camp David — é reintegrado à Liga Árabe. Com a crise
1990, com a restituição de de Menahem Beguin, vão obrigá-lo a assinar uma paz do Kuwait de 1990, o conjunto dos protagonistas árabes
Taba, no golfo de Acaba. Este em separado, bem aquém das suas esperanças. se rende enfim à lógica do "compromisso histórico".
minúsculo território de um Os acordos de Camp David compreendem duas par- Consequência de Camp David: sem o Egito, o mundo
quilómetro quadrado jã tinha tes bem distintas. A primeira, que institui uma paz cla- árabe não tem mais centro, e a guerra pela sucessão
sido causa de um conflito
ramente formalizada, concerne à retirada dos israelen- está aberta. A Síria? O país, demasiado exposto frente a
entre o Império Otomano e os
ingleses... em 1892.
ses do Sinai e a desmilitarização parcial desse territó- Israel, comprometido no Líbano, sofre contestações inter-
Foto © A. Mingam/Gamma
rio — a mesma desmilitarização que Nasser anulara nas: até 1982 o regime está entregue a uma verdadeira
na véspera da Guerra dos Seis Dias. A segunda parte guerra civil liderada pela Fraternidade Muçulmana. A
prevê negociações a fim de dar autonomia a Gaza e à Arábia Saudita? Este país rico, subpovoado, e adminis-
Cisjordânia durante um período transitório de cinco trado como uma grande empresa pela família Saud,
anos, após o que seria adotada uma regula- não desperta grandes entusiasmos, ainda mais por-
mentação definitiva. É esta parte dos acordos que a ideologia wahabita, que ele endossa, é minori-
que suscita comoção geral: os palestinos dos tária nas terras do islã. Sobra o Iraque. Pressionado
territórios ocupados não foram consultados! pelas circunstâncias, Sadam Hussein tenta aceitar
Nos territórios ocupados, manifestações hostis o desafio: servido por um exército poderoso, seu
marcam a reaproximação egípcio-israelense. O regime aparece como um bastião contra a revolu-
mundo árabe, liderado por uma "frente de recusa" ção iraniana, que faz tremer tanto o Ocidente
(Síria, Líbia e OLP), logo irá condenar o Egito ao ostra- como as monarquias do golfo Pérsico. Estas
cismo, excluí-lo da Liga Árabe. Esse isolamento de últimas irão utilizar suas imensas reservas
Sadat faz o jogo dos anexionistas israelenses: pois, financeiras para ajudar Sadam Hussein em
apesar das suas ambiguidades, a dinâmica da paz era sua cruzada contra Khomeini. Sinal dos tem-
real. Nesse sentido, Camp David foi uma nova oportuni- pos: não é mais Israel, mas sim o islamis-
dade perdida. mo e o petróleo que serão agora o principal
Esses acordos, porém, também constituíram um prece- motor dos conflitos do Oriente Médio.
114 DE C A M P D A V I D À G U E R R A DO GOLFO UM M O V I M E N T O DE I D E N T I D A D E 115

O desafio do islamismo tos aspectos, esse movimento pode parecer uma


A repressão exercida por regimes de legitimidade das últimas expressões das lutas anticolonialistas:
duvidosa irá favorecer a emergência de uma contes- n maioria dos seguidores da Fraternidade Muçul-
tação islâmica radicalizada. Esta surge com força mana é recrutada na pequena-burguesia sunita, a
total a partir de 1979, o primeiro ano do 15a século mesma que nos anos 50 constituía a maior parte
do calendário muçulmano: aparece com a revolução dos seguidores do Baas e de Nasser.
iraniana, com o ataque a Meca por um grupo islamis- Nos espaços vazios deixados por um Estado
incapaz de satisfazer as necessidades dos
mais desfavorecidos, os islamistas, alguns dos -

quais financiados pela Arábia Saudita — embo-


ra os petrodólares não expliquem tudo —,
organizam redes de ajuda mútua, abrem esco-
las, postos de saúde, etc., aumentando em
muito seus seguidores. Este trabalho de formi-
ga ajuda a explicar por que o islamismo político
é hoje o único movimento político realmente :<**
mobilizador em todo o Oriente muçulmano:
quando, ao final dos anos 80, os regimes auto-
ritários, sacudidos por revoltas, foram forçados
a uma certa abertura política, o islamismo polí-
tico saiu vencedor de todas as eleições — na
Jordânia, a Fraternidade Muçulmana; na
Argélia, a Frente Islâmica da Salvação.
Parece então que a questão não é mais saber se
os islamistas vão tomar o poder, mas sim quando e
ta hostil aos Saud, tachados de "idólatras dos petro- como. Ao contrário do que se afirma com frequência,
dólares", e enfim, no mesmo ano, com a entrada o islamismo político sem dúvida possui os meios
das tropas soviéticas no Afeganistão lutando contra doutrinários de aceitar o desafio da democracia.
os guerrilheiros muçulmanos. Em 1980, a República Saberá ele enfrentá-lo? O que está em jogo é a rea-
Islâmica é proclamada no Ira, logo invadido pelas tro- propriação de um património cultural em grande
pas iraquianas. Por fim, em 1981, Anuar Sadat é parte identificado ao islã. O sistema regional, instá-
assassinado por um comando em nome óojihad. vel porque sempre em busca de uma fórmula de legi-
Em 6 de outubro de 1981, O islamismo contemporâneo constituiu-se contra timidade política, teria finalmente encontrado essa Faissal, filho de Ibn Saud, o
durante uma parada que os modelos políticos "importados" (liberalismo leigo, fórmula com o islamismo? Esta é, sem dúvida, uma fundador da dinastia, sobe ao
comemora o aniversário da socialismo árabe ou não, etc.) e contra seus fracas- das questões-chave da política do Oriente Médio trono da Arábia Saudita em
"vitória de outubro", Anuar sos, tanto externos (derrotas contra Israel) quanto 1964. Porém esse país, o
neste fim de milénio.
Sadat cai sob as balas de um principal exportador de
internos (falta de democracia e impotência para
comando islamista otojihad. petróleo do mundo, continua
resolver os problemas do subdesenvolvimento). É O exemplo do Ira
Tendo como fundo a crise mais do que nunca dominado
económica e as tensões entre nesse sentido que ele se opõe ao Ocidente — O caso do Ira é atípico devido às características por um tribalismo
as comunidades muçulmana incluindo a URSS ateia — condenado por suas ideo- específicas do xiismo e à figura excepcional do institucionalizado e arcaico.
e copta, a iniciativa egípcia de logias perversas e pelo excesso de modernização. .ii.ilolii Khomeini. Mas o exemplo iraniano, único Em março de 1975, Faissal é
paz com Israel sem dúvida Trata-se, antes de mais nada, de um movimento de ,iic ho|<; de um regime islamista revolucionário, assassinado por seu próprio
dou munição aos extremistas, identidade que vê na re-islamização da sociedade a l>(!rmil<! ontender melhor a dinâmica do movimento sobrinho.
luto <B Al Akhl)f>r/Gamma maneira de enfrentar os desafios do século. Em mui- isl.imisln, cm seus mecanismos políticos e suas Foto © R. Depardon/Magnum
DE REZA PAHLEVI A KHOMEINI 117
116 DE CAMP DAVID À G U E R R A DO GOLFO
ção leiga no começo dos anos 50, o clero xiita apare-
Dirigida pelo clero xiita, a relações, ambíguas e conflituosas, com o Ocidente ce como a única organização capaz de mobilizar o
revolução iraniana é atípica no modernizador.
mundo árabe, em que
povo em escala nacional.
Desde os anos 20 o trono da Pérsia foi ocupado Em 1978 o regime, desacreditado, é derrubado por
predominam os sunitas. Mas pela dinastia dos Pahlevi. Em 1936, inspirado pelo
para todos os dirigentes imensas manifestações de massa, inflamadas pelo
modelo de Kemal Ataturk na Turquia, o xá Reza sangue de milhares de mártires e pelos chamados do
leigos do mundo muçulmano,
Pahlevi decreta que as mulheres devem tirar o véu aiatolá Khomeini. Neste momento se destaca a ima-
chegou a hora dos
questionamentos.
tradicional. Para ele, o islã obscurantista contribui gem desse homem cuja história irá se confundir com
para manter seu país nas trevas da Idade Média.
Foto © Setboun/Sipa a história da revolução islâmica.
Seu filho, o xá Mohamed Reza, irá continuar o Refugiado na França, o idoso Khomeini torna-se o
mesmo grande projeto. Mas a modernização acelera- símbolo da revolução de 1978, cuja liderança ele
da imposta pelo xá acentua os desequilíbrios econó- assume ao voltar ao Ira. Passa então a aplicar um pro-
micos e sociais, a corrupção e a especulação. grama teológico-religioso inovador, elaborado no exílio
Situado às portas da URSS, o Ira torna-se para os em reação ao poder "idólatra" do xá. O velayat-e faqih,
Estados Unidos uma peça mestra, o seu "guarda da ou "soberania do doutor da lei", prega o controle da
região"; o país abriga 30 000 conselheiros militares

ALGUMAS DEFINIÇÕES

quadro de referências do volta-a contra os governos

F
undamentalista. "ímpios". Os grupos
Aquele que obtém suas islã tradicional passa a ser
contestado por outros terroristas que assumem
referências nos este termo tão distorcido
fundamentos da religião. valores, vindos do Ocidente.
Antes disso, esse adjetivo representam uma ínfima
Esta atitude pode gerar um minoria no movimento
esforço de retorno ã origem não tinha sentido: era-se
apenas "muçulmano". O islâmico.
e de renovação. Assim Muçulmano. Adepto da
ocorreu com os primeiros islamismo coloca a
referência à lei do Corão — religião islâmica; para se
reformistas muçulmanos, considerar muçulmano,
tais como Jamal ad-Din fundamento da religião —
no centro de suas basta endossar a frase
al-Afghani e Muhamad Abduh
preocupações políticas. ritual: "Só Alá é Deus e
(ver capítulo 2). Maomé é seu profeta".
Integralista. Procura aplicar Estas podem ser
extremamente variadas e a Sunismo e xiismo. Seria
a lei ao pé da letra, falso opor "revolucionários"
literalmente. A problemática própria lei é passível de
interpretações diversas. xiitas e "conservadores"
da adaptação à modernidade sunitas: enquanto o xiismo
não é teorizada em princípio Jihad. Literalmente,
"combate sagrado no desenvolve muitas
e o único modelo de tendências místicas, o
referência continua sendo a caminho de Deus". Este
esforço de purificação deve desejo de reforma sunita,
Idade de Ouro profética. expresso sobretudo pela
Nesse aspecto, o regime ser procurado primeiro por
si próprio, depois para a Fraternidade Muçulmana,
americanos. Assim, a luta contra a ditadura imperial saudita pode ser qualificado
edificação do próximo e, gerou numerosos
dos Pahlevi será associada, segundo uma visão (li: inli:j>,ralista. extremismos (como o dos
Islâmico. Relativo à religião enfim, em caso da ameaça,
maniqueísta clássica, à luta contra seu poderoso contra os inimigos do islã. assassinos de Anuar
muçulmana (a poesia Sadat). Prova de que o
aliado, os EUA, ou "Grande Satã", símbolo da domi- |MM'.l,mm:íi, a arte Nos anos 60, reagindo às
perseguições nasseristas, radicalismo islâmico é uma
nação ocidental. M.imlc.i...) expressão social e política e
(•(•mista. Esse termo Saygid Qotb, da
A temível eficiência da Savak, a cruel polícia secre- Fraternidade Muçulmana, não uma manifestação
i NI PC li'mo ,I|I;IK;I:OU no estritamente religiosa. •
ta do xá, permitirá ignorar por muito tempo as fissu- começo do século, quando o radicaliza esta noção e
ras no regime. Após o desmantelamento da oposi-
118 DE CAMP D A V I D À G U E R R A DO GOLFO O I S L A M I S M O NA P R O V A DO PODER 119

"A lei divina e a razão nos vida política pelos dignitários religiosos, os únicos tola atraem milhões de fiéis. Pois, apesar dos fra-
ordenam não aceitar que se habilitados, enquanto se espera a volta do "imã cassos e dos excessos da revolução, a figura do aia-
perpetuem as formas de tolá Khomeini continua venerada no Ira; apesar das
oculto", a decidir sobre a conformidade das leis com
governo não islâmicas ou
o conteúdo da Revelação maometana. Deve-se notar múltiplas predições em contrário, seu regime sobre-
antiislâmicas." Publicado
clandestinamente em 1971, que esta teoria do "vicariato do imã oculto" é com- viveu a ele. Porém seu herdeiro espiritual, o aiatolá
Por um governo islâmico batida por um bom número de outros aiatolás, que Khamenei, não tem a envergadura religiosa do imã
expõe o programa do a/ato/á se atêm a uma interpretação mais tradicional, quie- Khomeini. Concebida sob medida para ele, a teoria
Khomeini, na foto orando em tista, da religião; mesmo assim, as ideias de do velayat-e faqih se enfraquece, e o verdadeiro
sua residência francesa em Khomeini irão se impor na Constituição aprovada em sucessor de Khomeini parece ser, na verdade, o
Neauphle-le-Château antes de 1979. "pragmático" presidente Rafsandjani. Na crise do
voltar ao Ira. Esta tem a aparência de uma democracia: o sufrá- Kuwait, este dará um golpe de mestre ao normalizar
Foto ©Keystone gio universal determina entre os partidos os repre- suas relações ao mesmo tempo com o Iraque e a
sentantes do povo; porém as leis votadas pelo Arábia Saudita. Aliás ele já começara, desde 1988,
Parlamento e os atos do governo são submetidos a uma reaproximação com os países ocidentais, que
um conselho religioso que julga se estão de acordo se acelerou a partir de 1990. Tal como ocorreu na
com a sharía, a lei islâmica. No cume da hierarquia, Arábia Saudita, a economia "islâmica" acabou tendo
Khomeini, o Guia da Revolução, orienta as linhas que se conformar, com algumas adaptações, aos
gerais do regime. Em 1988 ele intervém contra os moldes do capitalismo liberal.
chefes do conselho religioso, cuja interpretação Seguindo um processo clássico, depois de passar
estrita da sharía bloqueava qualquer projeto de refor- por um período de terror, quando os opositores de
ma, e afirma a primazia do Executivo sobre a lei qualquer natureza — liberais, comunistas, curdos ou
corânica, no próprio interesse do islã. Submetida à combatentes do povo — foram ferozmente persegui-
prova do poder, a expe-
riência iraniana não desa- OS CURDOS, UM POVO ESQUECIDO
fia apenas o Ocidente
Depois da Guerra do Golfo e

C
mas também o islamis- om cerca de 20 Iraque (23%) e Ira (10%). Em
milhões de almas, 1947 uma efémera de uma nova insurreição
mo, e recoloca o proble-
este povo de origem república curda nasce em contra Sadam, a intensidade
ma da adaptação do islã indo-européia figura, ao lado Mahabad, no norte do Ira; e a ferocidade da repressão
à modernidade. dos arménios, entre os porém é logo desmantelada provocam, em nome do
Ainda em 1988, o aia- esquecidos do primeiro pelo exército iraniano. Muito "dever de ingerência
tolá decide "tomar o pós-guerra. Em 1920, o divididos, os curdos são humanitária", a intervenção
Tratado de Lausanne com frequência manipulados das forças da ONU: para
veneno" do cessar-fogo evitar um êxodo maciço de
estabelecera, ao lado da pelos países rivais: assim,
com o Iraque, depois de Arménia, as fronteiras de um durante a guerra Irã-lraque, novos refugiados, é criada
oito anos de uma guerra eventual Curdistão. Porém o houve curdos iranianos no norte do país uma
que fez quase um milhão projeto é enterrado pelo lutando ao lado do Iraque, estreita zona de segurança.
de mortos. Somente o despertar nacional turco e enquanto muitos curdos do Sua situação legal é incerta.
os interesses da Inglaterra: Iraque tomavam o partido do Num contexto geopolttico
Guia da Revolução tem o Ira... Vem daí uma repressão hostil e em nome da
esta deseja incluir as
carisma necessário para impor esta medida, que regiões petrolíferas de feroz que culmina em 1988 realpolitik (política realista),
durante muito tempo foi apresentada como "derrotis- Mosul no interior de um quando o exército iraniano o Curdistão decerto nunca
ta": havia anos que o Ira exigia como condição pré- Iraque estritamente aniquilou com gases verá a luz: isso porque um
controlado. Assim, os venenosos a aldeia de desmembramento do Iraque
via que fosse derrubado o governo "ímpio" de só agravaria os
curdos vão se encontrar Halabja. A comunidade
Sadam Hussein e que a comunidade internacional espalhados por três países: internacional, na época desequilíbrios e reavivaria as
reconhecesse a responsabilidade de Sadam pelo iní- Turquia (onde representam solidária com Sadam pretensões rivais da Turquia
cio da guerra. Em junho de 1989, os funerais do aia- cerca de 19% da população), Hussein, fecha os olhos... e do Ira! •
120 DE CAMP DAVID À G U E R R A DO GOLFO
A GUERRA IRÃ-IRAQUE
Em muitos aspectos, a guerra dos, o Ira revolucionário parece ter entrado no cami- Principais zonas de combate
Irã-lraque lembra a Primeira nho da normalização interna. O
Guerra Mundial. Uma vez As tentativas de exportar a revolução fracassaram. Oleocfútóe fechados
detido o avanço iraquiano, o
A arma da religião, longe de ser um trampolim em • Termina
front se estabiliza e se
resume a uma guerra de
direção ao mundo muçulmano, confinou o modelo ^ A | Populaç

trincheiras, que repetidos iraniano ao gueto das comunidades xiitas do Afega-


ataques de ambos os lados nistão, do Líbano e do Iraque.
não conseguem romper, Mesmo assim é certo que no contexto específico
(página 121). da guerra com o Iraque, a arma dojihad (ver quadro
Foto © J. Pavlovsky/Sygma da página 119) foi utilizada sem cessar pelo Ira con-
Com uma faixa na testa tra seus adversários externos. Por sua própria natu-
onde se lê "Só Deus é reza, ela assume a forma de um verdadeiro desafio
grande" (abaixo), milhares às democracias ocidentais ao tentar influir sobre a
de jovens iranianos se
política interna destas por meio da ameaça e da
lançam ao martírio em
"ondas humanas" que
chantagem.
abalam as defesas
iraquianas. Terrorismo, fatwa e ingerência
Foto © Manoocher/Sygma Denunciando o apoio unilateral de certos países a
Bagdá, os iranianos se lançam numa campanha de
terrorismo e de sequestros. A França, principal forne-
cedor de armas ao Iraque depois da URSS, está na
primeira linha das vítimas: o Ira a acusa de ser "co-
beligerante" — acusação não infundada, pois o
governo francês, atado ao Iraque por uma dívida
enorme (mais de 20 bilhões de
francos no final do conflito),
apoia solidamente seu deve-
dor. O terrorismo "islamista" é
então calculadamente utilizado
como meio de pressão: ondas
de atentados em Paris, seques-
tros de reféns franceses no
Líbano, visam punir a França, o
"Pequeno Satã". Aí também o
regime iraniano soube agir com
habilidade no jogo da competi-
ção política típico das democra-
cias. Por exemplo, três reféns
franceses serão libertados
entre os dois turnos da eleição
presidencial de 1988.
O regime de Khomeini criou também uma outra ino-
vação "diplomática": a fatwa (julgamento religioso),
emitido em 1988 pelo aiatolá Khomeini contra
122 DE CAMP D A V I D À G U E R R A DO GOLFO UM M I L H Ã O DE M O R T O S 123

Salman Rushdie, escritor inglês de origem indiana. O trabalançam. Abalando o dogma clássico da não-
autor dos Versos satânicos reutilizou elementos da ingerência nos assuntos internos de um Estado,
tradição corânica para elaborar uma alegoria roma- corolário do princípio da soberania do Estado-
nesca: Iblis, disfarçado com a aparência do arcanjo Nação, esta evolução poderia dar uma nova direção
Gabriel, teria murmurado ao Profeta versos politeís- às relações internacionais.
tas. Salman Rushdie é declarado culpado de "apos-
tasia" e condenado à morte pelo aiatolá. Para além O agravamento dos desequilíbrios
A guerra entre o Ira e o Iraque (1980-1988) revelou a
A CORRIDA AOS ARMAMENTOS importância cada vez maior do petróleo na região e os
desequilíbrios que ele causa. O conflito prolongou-se
Pais Efetivos totais Despesas com a defesa inutilmente devido à indiferença das grandes potên-
ativos em milhões em% cias. Estas, sentindo-se pouco ameaçadas por um con-
(em unidades) de dólares doPNB flito de "pouca intensidade" — ou seja, alheio à lógica
do confronto Leste-Oeste —, haviam armado exagera-
Arábia Saudita 67500 14 690 * 18,7*
damente os beligerantes. Foi apenas quando a guerra
Bahrein 6000 185* 4,7 *
Egito 450 000 (+ 623 000 rés.) 6810* 6,7* atingiu os navios petroleiros, destruindo ou danificando
Emirados Árabes Unidos 44000 1470* 5,7 * mais de quinhentos, que ela acabou alarmando os paí-
lêmen do Norte 38 500 (+ 40 000 rés.) 566** 9,7 ** ses ocidentais, temerosos por seu suprimento de
lêmen do Sul 27 500 (+ 45 000 rés.) 220** 17,3 ** petróleo. Uma marinha de guerra ocidental navegava
Iraque 1 000 000 (+ 850 000 rés.) 12 870 ** 27,9 ** então no golfo Pérsico: foi a destruição de um avião ira-
Ira 504 000 (+ 350 000 rés.) 9900 *** 2,2 *** niano de carreira com 290 passageiros a bordo, por
Israel 141 000 (+ 504 000 rés.) 6020* 15,1* um cruzador americano, em julho de 1988, que fez o
Jordânia 82 250 (+ 35 000 rés.) 441* 11,7 *
Ira decidir-se a aceitar o cessar-fogo com o Iraque.
Kuwait 20300 1540 **** 6,7 ****
Omã 29500 1360* 16,2*
Terrivelmente mortífera (um milhão de mortos nos
Catar 7500 154* 2,9* dois países), esta guerra transtornou o equilíbrio de for-
Síria 404 000 (+ 400 000 rés.) 2490* 12,3* ças entre as potências que disputam a supremacia no
Golfo. Paradoxalmente, a Arábia Saudita — que teve
*1989; **1988; ***1988-1989; ****1989-1990.
um envolvimento mínimo no conflito — foi quem saiu
O enorme peso das despesas do caso pessoal de Rushdie, Khomeini cria um peri- mais enfraquecida. A crença num contágio revolucioná- O movimento libanês
com armamentos, sem dúvida goso precedente: a pregação islâmica despreza pas- rio neste país com forte minoria xiita, especialmente Hezbolah é um dos poucos
subestimado pelas fontes saportes e fronteiras e se outorga o direito de na zona petrolífera, revelou-se infundada; mas o regi- exemplos bem-sucedidos de
oficiais, entrava o supervisionar a vida dos muçulmanos no mundo me saudita constatou a limitação da sua capacidade exportação da revolução
desenvolvimento da região e iraniana. Em 1985,119
inteiro. de defesa autónoma. O Iraque leigo e pan-árabe
multiplica os riscos de prisioneiros xiitas são
É nesse sentido que se pode falar num desafio do coloca-se como protetor dos regimes conservadores da
conflito. O Oriente Médio, libertados por Israel: é uma
sobretudo, tornou-se um lugar Islã ao Ocidente. Para este, a integração das comu- península... que lhe trazem seu apoio diplomático e das condições exigidas para a
privilegiado para a nidades muçulmanas — indo-paquistanesas na financeiro. libertação de dois reféns
proliferação das armas Inglaterra, turcas na Alemanha, norte-africanas na Desde sua criação, em 1981, o Conselho de franceses...
não-convencionais, como se França — tornou-se questão prioritária. Cooperação do Golfo (CCG), que reúne os emirados Foto © S. Nachstrand/Gamma
revelou no desmantelamento De um lado está o "dever do jihad", em nome do petrolíferos em torno da Arábia Saudita, sempre evitou
do arsenal iraquiano após a combate do islã contra os "corruptores da Terra"; aceitar o Ira (favorável a um conselho islamista) e o
Guerra do Golfo. do outro lado, o "dever da ingerência", teorizado Iraque (partidário de um conselho árabe): sinal da des-
pela primeira vez em favor dos curdos após a guerra confiança crescente da Arábia Saudita em relação aos
do Kuwait, em nome dos direitos do homem e da seus poderosos vizinhos árabes. Marginalmente, evita-
proteção das minorias. Esses dois desafios se con- va também o lêmen, com quem tem uma velha disputa
O OURO NEGRO, UM TRUNFO PARA O ANO 2000 O PETRÓLEO TRAZ PROBLEMAS 125

de fronteiras. A OPEP não conseguiu chegar a uma

F oi por ocasião da
guerra do Yom Kippur
que o Ocidente
descobriu a importância
estratégica do petróleo,
posições. O
cartel das "Sete Irmãs", as
maiores companhias de
petróleo — das quais cinco
noite para o dia
proprietárias de imensas
fortunas: entre 1964 e
1984, a receita petrolífera
política comum, o que explica seu fracasso em defi-
nir o preço de referência do petróleo; enquanto os
países de alta densidade populacional, como Ira,
são americanas — controla da Arábia Saudita
principal fonte mundial de 90% do mercado e obtém multiplicou-se por 50! Em Iraque ou Argélia, exigem um controle estrito da pro-
energia. Os produtores lucros fabulosos: os consequência, o centro do dução, única forma de manter os preços elevados,
árabes, que controlam royalties pagos aos países poder regional se inclina as monarquias do golfo Pérsico, confiantes na vasti-
quase um terço da produção produtores são, decerto, para os países do Golfo.
mundial, fazem quadruplicar mínimos. Baseados em seu novo dão de suas reservas, não hesitam em ultrapassar
o preço do petróleo bruto — Entretanto, pouco a pouco poderio, estes começam a as cotas. São duas políticas em contradição total,
que passa de 3 para 12 os produtores vão recuperar transformar em que reduzem a OPEP à impotência e açulam as ten-
dólares por barril — e uma parte dessa fortuna "mercenários" os outros
decretam um embargo impondo o princípio do regimes árabes. Para uns,
sões... especialmente entre o Kuwait e o Iraque.
contra os aliados de Israel. fifty-fifty, ou seja, a divisão os petrodólares; para
Ao tentar impor as suas dos lucros em partes iguais. outros, canhões — novos
regras do jogo, um punhado Nisso foram ajudados pela desequilíbrios em
de países irá provocar uma concorrência cerrada entre perspectiva... Apesar da
grave recessão económica. as grandes companhias. baixa de preços nos anos
Com o "choque do petróleo" Para destronar as majors, 80, a importância petrolífera
de 1973, o ouro negro as companhias menores do Oriente Médio não
torna-se uma arma. melhoram a cota destinada cessará no alvorecer do
Descoberto no início do aos países detentores de século XXI. Na verdade, a
século (a primeira maior parte das
exploração data de jazidas mundiais têm
1909, no Ira) o uma "esperança de
petróleo se torna, vida" bem pequena,
após a Primeira e sua produção deve
Guerra Mundial, o esgotar-se
alvo de todas as rapidamente: nos
cobiças — sobretudo Estados Unidos, já no
para as grandes ano 2000. Ao
potências. Menos contrário, as jazidas
bem implantada no do golfo Pérsico
terreno, a França totalizam 45% das
teve que ceder à reservas existentes,
Inglaterra a região e sua parte nessas
curda de Mosul em reservas não pára de
troca de uma participação concessões: já em 1957, a crescer, pois sua
de 25% na Irak Petroleum italiana ENI oferece pagar ao "esperança de vida" é bem É preciso lembrar que os lucros do petróleo só irri-
Company (IPC). Esta Ira 75% de seu faturamento. mais longa que a de seus garam marginalmente as economias da região. A
pretende deter o monopólio Para melhor se defender e concorrentes. Por volta do generosidade dos países do Golfo logo atingiu seus Criada em 1960, a
da exploração sobre o controlar o nível dos preços, ano 2000, elas responderão
conjunto da região, os países produtores se por mais da metade de toda
limites; a soma investida nos países árabes não Organização dos Países
delimitado por uma "linha organizam: em 1960, é a produção mundial. passa de 7% dos investimentos no exterior, e baixa- Exportadores de Petróleo
vermelha". Porém as criada a Organização dos Ainda mais do que em rá ainda mais em 1986, quando o preço do barril (OPEP) não conseguiu formular
companhias americanas, Países Exportadores de 1973, aquele que controlar uma política comum: os
sustentadas por seu Petróleo (OPEP), por a região decidirá a sorte da
desaba, retomando a cotação dos anos 60... Na ver-
países em desenvolvimento
governo, se impõem dentro iniciativa da Venezuela, economia mundial nos dade, a imensa maioria dos petrodólares são recicla-
(Ira, Iraque, Argélia...), a favor
da IPC e, sobretudo, Arábia Saudita, Ira, Iraque e próximos decénios. Isto dos nos circuitos financeiros governados pelas bol-
negociam com Ibn Saud um Kuwait. Frente ao boicote de um petróleo caro e limitado
explica, sem dúvida, a sas de Nova York e Tóquio.
monopólio concorrente nos das majors, começam as rapidez e a magnitude da por cotas rigorosas, se opõem
campos petrolíferos da nacionalizações. Com a crise reação dos Estados Unidos O petróleo favorece a inflação, provoca o êxodo aos partidários do petróleo
Arábia Saudita. de 1973, as monarquias do à invasão do Kuwait. • rural e a partida de milhões de trabalhadores (espe- abundante e barato, liderados
Depois de 1945, os golfo Pérsico, de pequena cialmente egípcios) rumo aos países do Golfo. Essas pela Arábia Saudita.
americanos reforçam suas população, se encontram da Foto ©S/pa
migrações acentuam os desequilíbrios demográficos Foto © Salhani/Sipa
126 DE CAMP DAVID A GUERRA DO GOLFO DESEQUILÍBRIOS PERIGOSOS 127

e estruturais, tanto nos países dos emigrantes como árabe. Estas desigualdades gritantes, agravadas pela
nos países que os acolhem: é eloquente o exemplo ostentação dos novos-ricos do golfo Pérsico, alimen-
do Dubai, emirado com apenas 80000 cidadãos numa tam sentimentos de frustração e injustiça.
população total de 600000 pessoas. O Iraque também é um rico país petrolífero. Porém
Assim, no espaço de vinte anos, as diferenças no esforço de guerra ele se endividou cada vez mais:
aumentaram dramaticamente. Eis duas cifras significa- devia 70 bilhões de dólares ao final do conflito. Sadam
tivas: enquanto os investimentos no exterior multi- Hussein acredita que as petromonarquias, pelas quais
plicaram-se por 30 (460 bilhões de dólares em 1988), - entre outros motivos — ele combateu, devem
as dívidas multiplicaram-se por 20 (270 bilhões de ajudá-lo a remediar a situação. Estas, porém, hesitam
dólares). Em consequência do contracheque petrolífero em continuar financiando um regime cujo poderio mili-
de 1986 e das políticas de ajuste do FMI, a renda per tar já se tornou preocupante.
capita cai perigosamente nos países pobres: 13000 Em 2 de agosto de 1990, é um Iraque superarmado
dólares por ano por habitante no Kuwait, contra ape- e superendividado que ataca seu minúsculo e riquíssi-
nas 650 no Egito. Com esse recuo, numerosos analis- mo vizinho. Desde 1969, Sadam Hussein
se impõe como o homem
tas árabes consideram que a aventura do petróleo, ini-
forte do Iraque. Em 1980 ele
ciada em 1973, mais parece uma maldição do que A invasão do Kuwait
lança seu exército contra o Ira
uma "dádiva de Deus". Ela acabou de dividir o mundo Além do contexto do petróleo, Sadam Hussein, sem-
de Khomeini; sairá deste
pre motivado por seus sonhos de poder e por suas conflito superendividado e
UM NÓMADE EM REVOLUÇÃO ambições geopolíticas, considera que o Kuwait lhe per- superarmado. Em 2 de agosto
tence "por direito": pois esse emirado "artificial", que de 1990 ele avança sobre o

N
ascido em 1942 nacionaliza a British demográfica de seu país bloqueia o acesso do Iraque ao golfo Pérsico, não foi Kuwait. Diante da coalizão
numa família beduína Petroleum Company e (4 milhões de habitantes),
da região de Syrta, separado da antiga província de Basra pelos ingleses? internacional, em 15 de
começa a arabização mas ajudado por seu
Muamar Kadafi cedo se completa do país. Partidário petróleo e por seu carisma (ver capítulo 1). Já em 1961 o general Kassam tentara agosto Sadam Hussein
entusiasma pelo Egito de ardente da unificação árabe, pessoal — mesmo que invadir essa cidade-Estado cuja integridade só foi salva reconhece os acordos de
Nasser. Saído da Real Kadafi nunca conseguiu, negativo —, Kadafi irá adotar Argel de 1975, os mesmos
por uma força árabe de dissuasão.
Academia Militar da Líbia porém, fazer alianças atitudes políticas variadas, que causaram oito anos de
em 1965, ele lidera um Com a renda das jazidas petrolíferas kuwaitianas,
duradoras: os projetos de em geral de intuito guerra. Um milhão de mortos
grupo de oficiais em luta fusão com o Egito, Sudão, desestabilizador, em relação Sadam pode agora influir sobre a sorte da economia pomada...
contra o regime monárquico Argélia ou Tunísia não têm ao Oriente Médio e à África mundial, tanto mais que, ao tentar reunificar o mundo Foto ©J. Pavlovsky/Sygma
de Idriss Senussi e a sucesso. Prejudicado pela (Chade). Acusada de árabe à força, ele ameaça diretamente a Arábia
presença ocidental na Líbia. baixa densidade fomentar atentados
Quatro anos mais
Saudita. Ora, apesar de seus armamentos sofistica-
terroristas, a Líbia é
tarde, em l de2
vítima de um dos, esta não tem um exército capaz de enfrentar a
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setembro de 1969, JAMAHIRIYA bombardeio máquina de guerra iraquiana — que aliás ela mesma
ele anuncia, em americano em contribuiu para criar, instigada pelos países ocidentais.
pessoa, pela rádio 1986. Seis anos Quanto aos países árabes, às voltas com suas divi-
de Trípoli, a queda mais tarde, o
do velho rei. O coronel Kadafi é de sões, eles são incapazes de formar um front comum
"Guia da novo acusado pelos frente ao Iraque, que se tornou — com exceção de
Revolução" tinha Estados Unidos por Israel — a principal potência militar da região.
28 anos. sua recusa em Assim, caberá aos Estados Unidos intervir, como
Imediatamente a extraditar dois
Líbia exige a guardiões do bom funcionamento da ordem económica
agentes líbios,
evacuação das suspeitos de terem mundial e conscientes da importância dos fatores em
bases explodido um avião jogo. Os americanos começam a intervir em 15 de
anglo-saxônicas, da Pan Am em agosto, dando início à operação Tempestade no Deser-
expulsa os 12 000 ^ _._ . 1988. •
Italianos que ainda i LiS i ôyis l Jii £iS\ál>£sS\ to. Em seis meses eles irão assumir a liderança de
viviam no pais, 13 th ANNIVERSARYoTíte FIRST SEPTEM8ER flWOlUTKM1982 Foto ©Edimedia uma grande coalizão internacional e colocar na região
128 DE C A M P DAVID A G U E R R A DO GOLFO A U R G Ê N C I A DE UM A C O R D O G L O B A L 129

armas de destruição maciça —, nucleares em Israel, Primeiro conflito após a


uma força de 440 000 homens (sendo 300 000 só
químicas em seus vizinhos — questão palestina, guerra fria, a Guerra do Golfo
dos Estados Unidos). Esta crise de grande enverga- mobiliza todçs os recursos da
dura, a primeira depois do desmoronamento do crise libanesa, etc.: ficou bem claro o imbricamento
tecnologia moderna. Patriots
império soviético, é também a ocasião de testar a de todos esses problemas. Mesmo contestado, o americanos contra Scuds
solidez dos novos equilíbrios e reafirmar a liderança paralelismo que Sadam Hussein tentou estabelecer iraquianos, dois sistemas se
dos Estados Unidos, não só em relação à URSS entre a ocupação do Kuwait e a da Cisjordânia, Gaza enfrentam e muitas vítimas
como também à Europa e ao Japão. Sob a cobertura e Golan impôs a ideia segundo a qual apenas uma são civis.
das Nações Unidas, quase 50 países irão unir-se na solução conjunta dos conflitos poderia garantir a Foto ©Sipa
coalizão antiiraquiana. estabilidade do Oriente Médio.
Não é difícil compreender a reação pró-iraquiana A responsabilidade recai sobre os Estados Unidos.
de grande parte do mundo árabe. Ressentimento Por ocasião da crise do Golfo eles impuseram seu
r\_ operação
popular contra os emires do petróleo, injustiça das poder hegemónico e dispõem agora de trunfos
relações Norte-Sul, recusa da presença americana, importantes — incluindo a OLP — para tentar resol-
Tempestade no
há muito tempo identificada ao imperialismo e ao ver o problema mais urgente, ou seja, o conflito
Deserto causou sionismo, fascinação pelo poderio militar iraquiano, árabe-israelense.
"argumentos" islamistas explorados por um "salva- Num Oriente Médio onde o direito internacional foi
enormes perdas aos dor do mundo árabe" que de repente descobre ter há muito tempo abandonado, é necessário agir rápi-
ascendência profética: nesse coquetel se resumem do para provar que a guerra pelo petróleo era tam-
iraquianos — mais as diversas crises que sacodem o Oriente Médio há bém uma guerra pela justiça; pois não é verdade que
40 anos. a justiça deve aplicar-se a todos, não só kuwaitianos
de cem mil mortos A guerra estoura em 16 de janeiro de 1991, 24 mas também palestinos, curdos e libaneses?
horas depois que expira o ultimato da ONU. Perante
— aos quais se soma a superioridade esmagadora da coalizão internacio-
nal, a resposta de Sadam parece bem fraca; alguns
a repressão às de seus mísseis Scud atingem Israel e os campos
petrolíferos sauditas. Ao atacar Tel Aviv, Sadam
insurreições curdas espera uma reação israelense que forçaria o envolvi-
mento dos países árabes. Mas seu cálculo está erra-
e xiitas, ainda mais do; freado pelos Estados Unidos, Israel se mantém
à distância do conflito. Com seu potencial económi-
sangrenta do que a co destruído, ameaçado de desintegração, o Iraque
ficará longo tempo entregue ao caos. Ao final de
própria guerra uma guerra fria de 40 anos entre Leste e Oeste,
este conflito é o primeiro a colocar frente a frente os
países desenvolvidos contra uma potência do
Terceiro Mundo. Estranho prelúdio de um diálogo
Norte-Sul!
Mas a guerra de libertação do Kuwait, ou Guerra
do Golfo, acelerou as recomposições em curso e
revelou as fraquezas estruturais de uma região mar-
cada pelo pecado original da partilha colonial.
Miséria, petróleo, rivalidades geopolíticas, violações
dos direitos humanos e das minorias, conflito árabe-
israelense, excesso de armamentos e ameaça de

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