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stituciona
iscursiv
LUÍS AFONSO HECK
Organizador/Tradutor
3 a edigáo
revista
livrary
DO AD O GADO
editora
Este trabalho tenta configurar a
ideia do constitucionalismo discur-
sivo. Dela fazem parte: os direitos
fundamentais, a ponderagao, o
discurso, a jurisdicao constitucio-
nal e a representacao. A existencia
disso requer, tambem, a existencia
de pessoas racionais, que sao capa-
zes e dispostas a aceitar argumentos
validos ou corretos. Em conjunto,
assim, o constitucionalismo discur-
sivo tern a sua base lido s6 em insti-
tuicOes e argumentos, mas, essen-
cialmente, tambem em pessoas que
o apoiam.
livraria
DO AD OGADO
editora
Rua Riachuelo, 1338
90010-273 - Porto Alegre - RS
Fone/Fax: 0800-5 1 -7522
editora@livrariadoadvogado.com.br
441 ISBN 978-85 7348-728-2
1 1 11
9 788573 487282
wu imnP'
CONSTITUCIONALISMO
DISCURSIVO
1312
A384c Alexy, Robert
Constitucionalismo discursivo / Robert Alexy; org./trad. Luis
Afonso Heck. — 3. ed. rev. Porto Alegre: Livraria do Advogado
Editora, 2011.
168 p.; 23 cm.
ISBN 978-85-7348-728-2
CDU - 342
CONSTITUCIONALISMO
DISCURSIVO
edicao
revista
livraria
DO AD OGADO
editora
Organiza0o/Traductío/Revisáo
Luís Afonso Heck
Constitucionalismo discursivo 9
intermediario entre teorias puramente objetivistas e puramente subjetivis-
tas, inclui, corn isso, necessariamente, um problema do conhecimento.
Rigorosamente nesse ponto e posto o pe no terceiro grau do argument°
para o constitucionalismo discursivo. 0 problema do conhecimento pode
ser resolvido somente por procedimentos regulados juridicamente, que ga-
rantem uma decisao. Já isso fundamenta a necessidade do direito. Essa
necessidade e intensificada alem pelo problema da imposicao e pelo pro-
blema da organizacao.
A necessidade do direito nao significa a despedida da racionalidade
discursiva. A pretensao, necessariamente unida corn o direito, de correcao
exige, ao contrario, que o positivo e o correto ou, para formular em outras
palavras, o institucional e o ideal se complementem, penetrem e intensifi-
quern mutuamente. Por esse complemento, penetracao e intensificacao nas-
ce o estado constitucional democratic°. Isso sera desenvolvido no quarto
grau.
0 estado constitucional democratic° deixa fundamentar-se nao so corn
auxilio da teoria do discurso, ele proprio 6, tambem, dependente de discur-
sos como meio da formacao da vontade racional em todos os pianos. Ele
fundamenta-se, por conseguinte, nao so teoricamente sobre discursos, mas
vive tambem praticamente por eles. Esse e o fundamento por que esse vo-
lume leva o atulo "constitucionalismo discursivo".2
10 Robert Alexy
A positivagáo no anula a validez moral dos direitos do homem. Ela acres-
centa-lhe somente urna validez jurídica. Com isso esto, no conceito de
direitos fundamentais, necessariamente, unidos direito e moral.
Em vez da positivagáo dos direitos do homem, pode falar-se, também,
de sua institucionalizagáo. Os problemas principais de sua institucionaliza-
gáo resultam de sua abstratividade. A abstratividade leva a uma medida
máxima de necessidade de interpretagáo e de ponderagáo. Sobre a interpre-
tagáo e ponderagáo dos direitos fundamentais, porém, decide em última
instancia — independente de como organizado — o tribunal constitucional e
no o dador de leis parlamentar. Com isso, nasce, necessariamente, urna
relagáo de tenso entre direitos fundamentais e jurisdicáo constitucional,
de um lado, e democracia e parlamentarismo, do outro.
Essa relnáo de tenso deixa afilar-se no paradoxo que direitos funda-
mentais tanto so democráticos como no democráticos. Direitos funda-
mentais so democráticos, porque eles, com as garantias como as da vida,
da liberdade, da formagáo e da propriedade, bem genericamente, asseguram
a existéncia e o desenvolvimento de pessoas que, no fundo, sáo capazes de
pór em marcha e manter com vida o processo democrático e porque eles,
com a garantia da liberdade de opiniáo, de meios de comunicagáo, de reu-
nido e de associagáo, assim como do direito eleitoral, garantem as condigóes
funcionais do processo político. As avessas, direitos fundamentais sáo no
democráticos, porque eles, ao eles também vincularem o dador de leis par-
lamentar, expressam urna desconfianga perante o processo democrático. O
que os direitos fundamentais exigem está subtraído ás decisoks do parla-
mento. O tribunal constitucional, como guarda dos direitos fundamentais,
é, com isso, posto acima do processo democrático. Isso, porém, pode em
urna democracia somente entáo, primeiro, ser legítimo e, segundo, exitoso
se no só o parlamento, mas também o tribunal constitucional representa o
po y o. A representagáo do po y o por um tribunal constitucional, porém, so-
mente pode ser urna representagáo argumentativa. Como, porém, urna tal é
possível?
Constitucionalismo discursivo 11
mente diferentes. 0 terceiro artigo "Colisdo de direitos fundamentais e
realizacao de direitos fundamentais no estado de direito social" 4 que, como
o segundo, foi publicado, pela primeira vez, em portugues, em 1999,
segue a questa° de uma solucao racional do problema de colisao. Propostas
como a de uma atenuacao da forca vinculativa dos direitos fundamentais
ou de uma formulacilo estreita de seu ambito de protecao sao rejeitadas. Em
seu lugar é posta a teoria dos princfpios, na qual o princfpio da proporcio-
nalidade desempenha o papel decisivo. 0 princfpio da proporcionalidade
pede que colisoes de direitos fundamentais sejam solucionadas por ponde-
rag -do. A teoria dos princfpios pode mostrar que se trata, na ponderacao, de
uma estrutura racional de argumentar jurfdico-constitucional. Mas ela tam-
bem toma claro que a ponderacao deve ser encaixada em uma teoria geral
do discurso jurfdico racional e em uma teoria da jurisdicao constitucional,
se a ponderacao deve desenvolver plenamente o seu potencial de raciona-
lidade.
IV.
No centro da teoria da jurisdicao constitucional esta a relacao entre
jurisdicao constitucional e dacao de leis. 0 quarto artigo "Direito constitu-
cional e direito ordinario — jurisdicao constitucional e jurisdicao especiali-
zada", 5 no qual se trata de uma exposicao, feita no ano de 2001, diante da
associacao de professores de direito do estado alemaes, tenta determinar
essa relacao de modo que tanto uma sobreconstitucionalizacao como uma
subconstitucionalizacao é evitada. Ambas podem ser evitadas se se deixa
mostrar que uma constituicao, simultaneamente, é capaz de ser uma orde-
nag do
-
fundamental e uma ordenacao-quadro. Rigorosamente isso é possfvel
em uma teoria dos espacos do dador de leis. A distincao fundamental dessa
teoria e a distincao entre espacos estruturais ou substanciais, de urn lado, e
espacos episternicos, do outro. Nos espacos estruturais do dador de leis cai
tudo o que as normas da constituicao nem ordenam nem profbem. No ambito
dos direitos fundamentais deixam distinguir-se tres espacos estruturais: o
espaco de determinacao da finalidade, o espaco de escolha medio e o espaco
de ponderacao. 0 espaco de ponderacao tern importancia particular, porque
ele enlaca a teoria dos espacos corn a teoria da ponderacao. Urn caso reside
no espaco de ponderacao quando existe um empate de ponderacao. Urn
empate de ponderacao existe quando o cumprimento dos princfpios coli-
dentes, em ambos os lados, tern o mesmo peso. A natureza do direito cons-
titucional permite somente escalaciies relativamente rudes dos pesos que se
encontram em jogo na ponderacao. Isso leva a numerosos empates de pon-
4
Entre aspas no original.
5
Entre aspas no original.
12 Robert Alexy
deragáo e, com isso, a numerosos espagos de ponderagáo. O equivalente dos
espagos estruturais ou substanciais sáo os espagos epistémicos. Um espago
epistémico compóe-se da competéncia do dador de leis de, em casos de
incerteza do conhecimento, determinar o que as normas da constituigáo
ordenam ou proíbem e o que elas liberam. Nos casos da incerteza epistémi-
ca, os espagos epistémicos so relativamente no problemáticos. Se o dador
de leis somente em virtude de suposigóes empíricas absolutamente certas
pudesse atuar, ele, em vista da incerteza da maioria das prognoses empíri-
cas, de modo algum mais poderia atuar. Isso contradiria tanto o princípio
democrático como o da diviso de poderes. De longe, mais problemático é,
pelo contrário, o espago epistémico normativo. Até aonde um tal alcanga,
decidem vinculados sobre sua vinculagáo. É estabelecida a tese que o pro-
blema deixa solucionar-se por urna ponderagáo de princípios materiais e
formais no quadro de urna teoria adequada dos espagos. A teoria dos espa-
gos converte-se, com tudo isso, em um pilar importante na construgáo do
constitucionalismo discursivo.
V.
Os direitos fundamentais, como direitos do homem transformados em
direito positivo, descansam sobre urna base filosófica, no núcleo, intempo-
ral e universal. S imultaneamente, porém, sua institucionalizagáo somente
no história é possível e, lá, eles so objetos de lutas políticas. O quinto
amigo, publicado no ano de 2002, "Sobre o desenvolvimento dos direitos
do homem e fundamentais na Alemanha", 6 dedica-se a essa relagáo de iden-
tidade e historicidade com vista á Alemanha que, no século passado, expe-
rimentou desenvolvimentos jurídico-fundamentals dramáticos. Se se quer
descrever a história dos direitos fundamentais e do homem, na Alemanha,
no século 20, com urna curva, entáo se pode, no ano de 1900, no império
wilhelminiano, iniciar em um nível relativamente baixo, mas, de modo ne-
nhum, no observável, que foi criado, sobretudo, por urna ciéncia do direito
administrativo e jurisdigáo administrativa obrigadas á estatalidade jurídica.
Esse nível sobe suavemente até a primeira guerra mundial. De 1919, o
início, até 1933, o fim da república de Weimar, deveria apontar-se um bater
para cá e para lá vibrante, com grandes oscilagóes para cima e para baixo
e, no total, com leve subir. 1933, no ano da tomada do poder de Hitler, a
curva cai abruptamente para baixo, para lá desaparecer completamente.
Após a ruína do "terceiro Reich", 7 no ano de 1945, ela deixa ver-se nova-
mente para, desde 1949, o ano da fundagáo da república federal da Alema-
nha, subir algo lentamente, mas continuamente e com oscilagóes,
6
Entre aspas no original.
7
Entre aspas no original.
Constitucionalismo discursivo 13
relativamente reduzidas, ate aos nossos dias a urn nivel realmente alto. Ter
obtido um nivel alto certamente nao significa estar em urn estado sem pro-
blemas. Existe nao so o perigo de um demasiado pouco em direitos funda-
mentais, mas tambem o de urn em demasia e, como institucionalizacao da
razdo, eles estao, como a razdo, bem genericamente, sempre ameacados
pelos demonios da irracionalidade.
VI.
Nada enformou o desenvolvimento dos direitos fundamentais na
Alemanha tanto como sua interpretacao como normas de principio ou
principios suscetiveis de ponderacao e carentes de ponderacao. Esse desen-
volvimento, que na sentenca-LUth, do ano de 1958, uma das sentencas mais
i mportantes do tribunal constitucional federal, pela primeira vez, chegou
ao desdobramento pleno, foi, certamente, desde o inicio, acompanhado de
criticas. Criticos antigos proeminentes foram Carl Schmitt e Ernst Forst-
hoff. Urn dos criticos atuais mais importantes e Jurgen Habermas. Sua ob-
jecao principal diz que tido existem medidas racionais para o ponderar. 0
sexto artigo "Direitos fundamentais, ponderacao e racionalidade - , 8 que foi
publicado, pela primeira vez, em 2002, opoe a ele que existe uma conexdo
interna entre ponderacao, argumentacdo e correcao. Essa conexao faz cair
a, iantas vezes feita, objecao de irracionalismo.
VII.
A ideia, que entre ponderacao e argumentacao existe uma uniao ne-
cessaria, perpassa, como urn fio vermelho, numerosos artigos, aqui reuni-
dos. Argumentos no so individuos isolados, mas formam sempre urn
sistema, tambem quando isso, em passos de argumentacao particulares, nao
ou mal se expressa. Isso, porem, significa que a qualidade de urn argumento
depende, essencialmente, da qualidade da conexao sistematica no qual ele
esta, explicita ou implicitamente. Existem dois criterios formais da
dade de urn sistema argumentativo: a consistencia e a coerencia. A consis-
tencia e urn criterio negativo. Ele esta cumprido quando o sistema nao
mostra nenhuma contradicao. A coerencia e um criterio positivo. Ele exige
conexales positivas tao fortes quanto possivel entre os elementos do sistema.
0 setimo artigo, publicado, pela primeira vez, em 1990, "Fundamentacao
juridica, sistema e coerencia", 9 investiga os criterios de coerencia. Nisso,
mostra-se que a fixacao de relaciies de primazia condicionadas concretas
entre principios colidentes na producao de um sistema coerente desempe-
8
Entre aspas no original.
9
Entre aspas no original.
14 Robert Alexy
nha um papel importante. A teoria dos princípios mostra-se, com isso, como
um elemento necessario de urna teoria da coeréncia. Mas, também, fica
claro que o ideal da coeréncia, como ideal de um sistema de ideias táo
perfeito quanto possível, por si só, náo basta. Como mera construgáo de
ideias, o sistema no pode viver. Para viver, ele precisa apoiar-se no dis-
curso de pessoas reais. Com isso, certifica-se a viso que somente um sis-
tema complexo, que enlaga ideal e real, pode realizar razáo.
VIII.
O papel da ponderagáo, na argumentagáo jurídica, deixa, somente en-
táo, compreender-se totalmente, guando sua estrutura é revelada completa-
mente. Isso é o objetivo do oitavo artigo "A fórmula do peso", I ° do ano de
2003. A fórmula do peso é urna precisagáo da lei da ponderagáo, que já se
encontra na "Teoria dos direitos fundamentais"," do ano de 1985 (S. 146,
verso espanhola: página 160 e seguinte). A lei da ponderagáo diz: "quanto
mais alto é o grau do no cumprimento ou prejuízo de 1l M princípio, tanto
maior deve ser a importancia do cumprimento do outro". 12 Na lei da pon-
deragao, o no cumprimento ou prejuízo de um princípio Pi e a importancia
do cumprimento do outro princípio colidente Pj esto face a face. A fórmula
do peso precisa a lei da ponderagáo pelo fato de ela distinguir. em cada lado,
trés fatores. Do lado de Pi, s o isso: (1) a intensidade da intervengo (Ji)
em Pi, (2) o peso abstrato ( Gi) de Pi e (3) a certeza das suposigóes empíricas
sobre isto, o que a medida a ser apreciada significa para a realizagáo de Pi
(Si). Do lado de Pj, so isso: (1) a intensidade da intervengo em Pj por
omissáo da intervengo cm P (.1j), (2) o peso abstrato de P (G1) e (3) a
certeza das suposigóes empíricas sobre isto, o que a medida a ser apreciada
significa para a realizagáo de Pj(S1). Esses seis fatores somente se deixam
pór em relagáo com os meios da matemática. Desse modo, nasce urna fór-
mula do peso que expressa o peso concreto de Pi (Gi,j). O peso concreto de
Pié o peso que P. no caso a ser decidido, tem relativamente a Pj. Na "teoria
dos direitos fundamentais", somente a primazia concreta de Pi perante Pj e
a primazia concreta de Pj perante Pi foi tratada sistematicamente (S. 82,
página 92). 13 Agora, é acrescentado o empate ou a hierarquia igual que, para
os espagos do dador de leis, tem importáncia decisiva. Tudo isso somente
é possível sob o fundamento de urna teoría da escalagáo, que é conveniente
para a natureza discursiva do direito constitucional. Desse modo, é assegu-
rado que náo a matemática apresenta-se como senhora do direito constitu-
10
Entre aspas no original.
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Entre aspas no original.
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Entre aspas no original.
13
Em itálico e entre aspas no original.
Constitucionalismo discursivo 15
cional, mas o direito constitucional serve-se da matematica como criada. 0
argumento nao é substituido por contas, mas, por relacoes maternaticas,
trazido em uma forma na qual, e somente nela, ele pode obter a sua consu-
maga° extrema.
IX.
0 nono e ultimo artigo, no ano de 2005 pela primeira vez publicado,
em inglés, "Ponderacao. jurisdicao constitucional e representacao"," coloca
a estrutura da ponderacao, expressada pela formula do peso, na conexao do
constitucionalismo discursivo. Ponderacao e discursiva, porque na ponde-
raga° sentencas 15 sobre intensidades de intervencao, pesos abstratos e graus
de seguranca sao enlacados um com os outros corn a pretensao de correcao.
Discursos praticos sao tao pouco possiveis sem ponderacao como constitu-
cionalismo sem direitos fundamentais e jurisdicao constitucional. Corn
isso, o problema, discutido nos pri meiros artigos, da relacao de direitos
fundamentais e democracia, aparece, de novo, no final da colecionacao. Ele
6, agora, formulado na questa°, porque a sentenca do tribunal constitucional
"A lei G é anticonstitucional" deve — em geral, so implicitamente — ser
preferida a sentenca do parlament° "A lei G e de acordo corn a constitui-
cao". 16 A resposta reside no conceito da representacao argumentativa. A
representacao do povo por urn tribunal constitucional distingue-se daquela
pelo parlamento pelo fato de a representacao por urn tribunal constitucional
ser puramcnte argumentativa ou discursiva, enquanto aquela pelo parla-
mento ter um carater tanto argumentativo ou discursivo como volitivo ou
decisionista." Sob esse aspecto, a representacao pelo tribunal constitucio-
nal tern um carater mais ideal que aquela pelo parlamento e, isso, é o fun-
damento para a primazia da sentenca do tribunal constitucional diante
daquela do parlamento. 0 carater mais ideal da representacao pelo tribunal
constitucional deve-se, certamente, confirmar na realidade. Isso somente
pode dar born resultado quando as condicties de representacao argumenta-
tiva autentica estao dadas. Pertencem a elas, ao lado da existencia de argu-
mentos validos ou corretos, a existencia de pessoas racionais, que sao
capazes e dispostas a aceitar argumentos validos ou corretos, porque eles
sao validos ou corretos. Isso mostra que o constitucionalismo discursivo
tern sua base nao so em instituicoes e argumentos, mas, essencialmente,
tambem ern pessoas que o apoiam.
14
Entre aspas no original.
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Em italic° no original.
16
Entre aspas no original.
17
Nota do tradutor: ver infra, 1, nota 14.
16 Robert Alexy
Os nove artigos desse volume foram reunidos e traduzidos por Luís
Afonso Heck. Eu agradelo-lhe de coraláo pela ideia de tal volume, pela
traduqáo, cuidadosa e experta, dos artigos e pela sugestáo para escrever esta
apresentaláo. Eu estou multo contente por té-lo encontrado como tradutor
dos nove trabalhos aqui juntados.
Kiel, majo de 2006.
Robert Alexy
Constitucionalismo discursivo 17
— 1—
Constitucionalismo discursivo 19
ao conteúdo cm vez da decretagáo de acordo com a ordem e eficácia social
deve definir o direito, mas antes esta, se ela deve fazer isso ao lado delas.
O decretado e o eficaz formarn o lado fático e institucional do direito,
o correto, a sua dimensáo ideal ou discursiva. Minha tese é que um conceito
de direito adequado, somente entáo, pode nascer, guando ambos os lados
s o enlagados. Esse enlace pode somente dar bom resultado em urna teoria
ampla do sistema jurídico. Urna tal teoria é a teoria do discurso do estado
constitucional democrático. Eu irei tentar desenvolver essa teoria cm quatro
passos. No primeiro passo, trata-se do fundamento de todo o edifício, da
pretensáo de corregáo. Deve ser mostrado que essa pretensáo está unida,
necessariamente, com o direito. Se isso dá bom resultado, está achado o
germe que leva ao rompimento do conceito de direito positivista. O conteú-
do da pretensáo de corregáo permanece nisso, todavia, ainda aberto. Urna
primeira precisagáo resulta primeiro no segundo passo, no qual se trata da
teoria do discurso como teoria da corregáo prática. Nisso, devem ficar claras
náo só as possibilidades, mas também os limites da racionalidade discursi-
va. Estes levam, no terceiro passo, á necessidade do direito. A necessidade
do direito no significa a despedida da racionalidade discursiva. Isso deve
ser exposto no quarto passo, no qual se trata da uniáo do fático ou institu-
cional como ideal ou discursivo nos distintos planos do sistema jurídico.
I. A pretensáo de correláo
Minha teoria depende da tese que o direito promove, necessariamente,
urna pretensáo de corregáo. Essa tese é formulada muito genericamente. Se
se quer precisá-la, entáo trés questóes devem ser respondidas: (1) o que
significa que o direito promove urna pretensáo? (2) 0 que deve ser enten-
dido sob a necessidade da pretensáo? (3) Em que consiste o conteúdo da
pretensáo, a corregáo?
I. 0 promover
Pretensóes podem, tomado ao pé da letra, somente ser promovidas por
sujeitos capazes de atuar. Que o direito promove urna pretensáo de correqáo,
pode, por isso, somente significar que a promovem aqueles que atuam no e
para o direito ao eles o criar, interpretar, aplicar e impor. Casos paradigmá-
ticos so o dador de leis e o juiz. Que eles promovem 3 aquela pretensáo,
significa, primeiro, que com os seus atos institucionais, portanto, com as
decisóes de lei e sentengas judiciais, o ato no institucional da afirmaffio4
está unido, que o ato jurídico é correto quanto ao conteúdo e procedimen-
3
Em itálico no original.
4
EM itálico no original.
20 Robert Alexy
talmente. Correcao implica fundamentabilidade. A pretensao de correcao
5
abarca, por conseguinte, segundo, uma garantia da fundamentabilidade.
6
Como terceiro elemento. acresce a afirmacao e a garantia a esperanga que
cada urn. que se peie no ponto de vista do sistema juridic° respectivo e
racional, reconhece o ato juridico como correto. 0 promover da pretensao
de correcao consiste, portant°, da triade de (1) afirmacao da correcao, (2)
garantia da fundamentabilidade e (3) esperanca do reconhecimento da cor-
recao. 7 Essa triade nao esta vinculada apenas corn atos institucionais como
deciseies de lei e sentencas judiciais. Cada urn que, como participante de
urn sistema juridic°, por exemplo, como advogado diante do tribunal ou
como cidadao na discussao publica, alega argumentos a favor ou contra
determinados conteudos do sistema juridic°, promove a pretensao compos-
ta da afirmacao da correcao, da garantia da fundamentabilidade e da espe-
ranca do reconhecimento.
2. A necessidade
A pretensao de correcao 6, somente entao, de interesse para o conceito
de direito, quando ela, necessariamente, esta unida corn o direito. Pudesse
o direito tanto promover como nao promover essa pretensao, tratar-se-ia
nela somente de uma das numerosas qualidades contingentes do direito, que
nao tern importancia definidora de direito. A necessidade pode, corn base
em dois exemplos, ser demonstrada e explicitada.
Constitucionalismo discursivo 21
por exemplo, também extremamente inabitual ou no convencional, porém,
ele no teria, apesar de sua náo conformidade á finalidade, que acresce á
inabitualidade, o absolutamente absurdo da cláusula de injustiga. Análogo
vale para a viciosidade moral. Do ponto de vista da moral, no existiria
diferenga se tivessem sido retidos explicitamente direitos da maioria opri-
mida, mas sob o ponto de vista da viciosidade, sim. A cláusula de injustiga
é no só imoral, mas também, de alguma maneira, louca. Foi feito valer que
a cláusula de injustiga apresenta somente um vício político, porque ela é
"politicamente no conforme a finalidade". 1 ° Isso ela é, seguramente, po-
rém, também isso no explica completamente o vício. Muita coisa pode, em
urna constituigáo, ser politicamente no conforme a finalidade e, nesse sen-
tido, tecnicamente vicioso, sem que isso atue táo particularmente como
nosso primeiro artigo. 11 Nema viciosidade convencional, nem a moral, nem
a técnica explicam a absurdidade da cláusula de injustiga. Ela resulta, como
táo frequentemente no absurdo, de urna contradigo. Urna tal nasce pelo
fato de com o ato da dagáo da constituigáo ser promovida urna pretensáo de
corregáo que, nesse caso, é, essencialmente, urna pretensáo de justiga. Pre-
tensóes abarcam, como exposto, afirmagóes. Na pretensáo, aqui promovida,
de justiga, é a afirmagáo que a república constituída é justa. A contradigo
consiste, portanto, nisto, que com o ato da dagáo da constituigao, implici-
tamente, é estabelecida urna afirmagáo que contradiz o conteúdo explícito
do ato dador de constituigáo, da cláusula de injustiga.
22 Robert Alexy
da proposicao explica-se, tambern nesse caso, somente por uma contradi-
cao. Corn uma sentenca judicial sempre é promovida a pretensao, que o
direito seja aplicado corretamente, por mais que essa pretensao tambem,
ainda, nao muito seja cumprida. A classificacao da sentenca, unida corn a
sentenca, contradiz essa pretensao de correcao, promovida corn a efetivacao
do ato institucional da condenacao, como falsa. Que uma pretensao de cor-
recao é promovida significa, entre outras coisas, que implicitamente é es-
tabelecida a afirmacao que a sentenca é correta. A afirmacao, unida
explicita e publicamente corn a sentenca, contradiz essa afirmacao implicita
que a sentenca é falsa. Essa contradicao entre o implicit° e o explicit°
explica a absurdidade.
c) A alternativa
Poderia ser objetado, que tudo isso ainda nao mostra a necessidade da
pretensao de correcao. A absurdidade é evitavel em ambos os casos. Deve-
-se somente modificar exaustivamente a pratica, ate agora, e a autocons-
ciencia, ate agora, do direito. Se constituicOes, uma vez, primeiro, fossem
interpretadas por todos exclusivamente como expressao de poder, vontade
e fortidao e sentencas judiciais como uma mistura de emocao, decisao i4 e
14
Alexy emprega aqui a palavra Decision. Ao lado dela estao, no ambito idiomatic° alemao, as palavras
Dezisionismus e dezisionistisch. Eu decidi-me pela traducao seguinte respectiva: decisao, decisionismo
e decisionista. Essas palavras, no ambito idiomatic° portugues, todavia, ate onde se pode ver, ainda
nao foram registradas corn o significado que elas tern naquele ambito. Parece, por conseguinte, justi-
ficada a referencia seguinte: "Dezision, Dezisionismus designa decisOes ou procedimentos de deciseles
para as quais 6 caracteristico que elas nao sao fundamentadas ou fundamentaveis corn referenda a
padreies de racionalidade gerais. Isso vale para contextos concernentes a uma determinada situacao,
nos quais, por exemplo, em virtude de informacao limitada ou tempo limitado, os fundamentos ou
relacaes-meio-finalidade, relevantes para uma decisao, nao podem ser clarificados suficientemente.
Em seguimento ao criterio de sentido empiric° do empirismo logic° 6 sustentada a tese que uma
fundamentacao, no sentido rigoroso, somente pode haver no ambito de declaraciies capazes de verdade,
que dizem respeito a fatos empiricos. A posicao metaetica do emotivismo tira disso a consequencia,
quando ela sustenta essa tese, que manifestaciies morais somente expressam colocaVies e sentimentos
subjetivos, que mesmos, mais alem, nao sao fundamentaveis. Nas exposicoes sobre a liberdade dos
valores das ciencias M. Weber, na questa° da fundamentabilidade de proposicOes de valores, ocupa a
posicao que valoracoes nao podem ser objeto de conhecimento cientifico. Normas e sentencas de valor
estao sujeitas a uma outra logica da fundamentacao que declaracOes empiricas. Disso foi derivada a
tese — nao coberta pela argumentacao weberiana — que ultimas valoracOes sao um assunto da decisao
pessoal. A posicao, exposta por H. Albert, do racionalismo critico remete a isto, que uma fundamen-
tacao Ultima valida de normas ou proposiciies morais rid° 6 possivel, uma vez que cada exigencia por
fundamentacao Ultima deve levar ou a urn regresso infinito ou a urn circulo logic° ou a demolicao do
procedimento de fundamentacao por referencia a urn dogma (trilema de Miinchhausen). A pretenslio
de fundamentacao racional pode, por conseguinte, ser sustentada so convenientemente corn referencia
revisao das consequencias de proposigOes morais, corn referenda a sua realizabilidade e liberdade
da contradicao. A proposicOes morais pode somente ser conferido o status de normas aceitas hipoteti-
camente, uma vez que a revisabilidade dessas normas nao pode ser excluida fundamentalmente. A
reserva do decisionismo leva em Albert a posicao de uma racionalidade pratica limitada. Se justificacao
equiparada corn deducao e racionalidade 6 limitada ao metodo cientifico de presuncao e refutacao
(por referenda a fatos), entao tambem nao 6 possivel justificar mesmo essa colocacao critica. Resta,
como Unica possibilidade, a escolha subjetiva entre modelos de conhecimento e de atuacao concorren-
Constitucionalismo discursivo 23
ordem desapareceria, dos nossos exemplos, com a pretensáo de corregáo,
simultaneamente, também, a contradigo e, com isso, a absurdidade. A pre-
tensáo de corregáo iria ser substituída por algo como urna pretensáo de
poder.
O significado dessa objegáo torna-se particularmente claro guando se
a amplia ou generaliza. Pretensóes de corregáo existem, de modo nenhum,
somente no direito. Elas também so promovidas com sentengas de valor e
de obrigagáo morais e sua forma mais geral é enlagada com o ato de falar
da afirmagáo. Tomadas de posigáo morais, que no promovem essa preten-
sao, no so sentengas morais, mas somente a expressáo de emogóes, requi-
sigóes, de sentir semelhantemente, ou relatórios sobre sentimentos e
colocagóes.' 5 Quem desiste da pretensáo de corregáo perde, bem generica-
mente, a possibilidade de estabelecer afirmagóes, seja qual for o tipo, por-
que afirmagóes so somente tais atos de falar, com os quais é promovida
urna pretensáo de verdade ou corregáo. 16 A eliminagáo da possibilidade de
afirmagóes iria alterar, fundamentalmente, nosso idioma e, com isso, nossa
autoconsciéncia e vida. Em vez de sentengas e afirmagóes existiriam, somente
ainda, sentimentos e opinióes, fundamentagóes transformar-se-iam cm persua-
slies, e no lugar de corregáo e verdade por-se-iam manipulagóes exitosas e
convicgóes que esto bem fixas. Tudo seria subjetivo, nada objetivo.
Com isso, está claro cm que sentido a pretensáo de corregáo é neces-
sária. Ela é necessária relativamente a urna prática, que, essencialmente, é
definida pela distingo entre verdade ou corregáo e falsidade. 17 Essa prática
é, todavía, urna prática de um tipo particular. Nós podemos tentar despedir
tes, que nem podem ser justificados dedutivamente nem certificados cientificamente. — No ámbito da
argumentagáo jurídica foi alegado por C. Schmidt, contra a pretensáo de auséncia de lacunas do orde-
namento jurídico (da parte do positivismo jurídico), a reserva, que com os meios de conhecimento
jurídicos náo se pode derivar cada decisáo jurídica necessária do material jurídico. Ao contrário,
permanece sempre um elemento de decisáo que náo é derivável mais além. Do mesmo modo, o caso
excepcional contém — guando por meio de decisáo soberana primeiro deve criar a situagáo, na qual
preceitos jurídicos (novos) devem valer — um tal elemento de decisáo voluntário." (Metzler-Philoso-
phie-Lexikon: Begriffe und Definitionen/Hrsg. von Peter Prechtl und Franz-Peter-Burkard. 2. Aufl.,
Stuttgart; Weimar: Metzler, 1999, S. 106 f. [Artikel Dezison. Dezisionismus.] Pontuagáo no original.)
15
Comparar para isso R. Alexy, Theorie der juristischen Argumentation, 3. Aufl., Frankfurt a. M. 1996,
S. 60 ff.
16 Mais pormenorizadamente R. Alexy, Recht, Vernunft, Diskurs, Frankfurt a. M. 1995, S. 134 ft
17
Essa relativizagáo da necessidade de pretensáo de corregáo a uma determinada prática corresponde,
cm sua estrutura, á tese de Grice e Strawson. que urna coisa é conceder que náo existe urna necessidade
absoluta de aceitar ou de usar algum esquema conceitual ou sistema conceitual, e urna bem outra,
afirmar que náo existe necessidade dentro de algum esquema conceitual ou sistema conceitual que nós
aceitamos ou usamos. Isto náo resulta daquilo (H. P. Grice/P. F. Strawson, In Defense of a Dogma, in:
Philosophical Review 65 (1956), S. 157 f.). A necessidade dentro de um determinado esquema concei-
tual ou sistema conceitual e também dentro de urna determinada prática é, de outra forma como a
necessidade de um determinado esquema conceitual ou sistema conceitual como tal ou de urna deter-
minada prática como tal, sem mais, compatível com a tese de Quine, que nenhuma proposigáo e ne-
nhuma regra é imune diante de urna revisáo (W. V. O Quine, Two Dogmas of Empiricism, in: ders.,
From a Logical Point of View, 2. Aufl., Cambridge, Mass. 1961, S. 43).
24 Robert Alexy
as categorias de verdade, de correcao e de objetividade. Se isso desse-nos
born resultado, nosso falar e atuar, porem, seriam algo essencialmente di-
ferente como 6 agora. 0 preco nao so seria alto. Ele compor-se-ia, em urn
certo sentido, de nos mesmos.
3. 0 conteado
Corn a tese, que uma pretensao de correcao é promovida, ainda nao
está dito nada sobre o conteddo dessa pretensao. Isso nao é uma desvanta-
gem, mas uma vantagem, porque, em caso contrario, essa pretensao nao
poderia ser promovida em toda parte. Os criterios de correcao dependem
do contexto. Assim, para uma reuniao dadora da constituicao valem outros
criterios que para o trabalho cotidiano do dador de leis parlamentar e, outra
vez, outros criterios sao correspondentes para sentencas judiciais. Uma coi-
sa, porem, caracteriza a pretensao de correcao em todos os contextos: ela
abarca uma pretensao de fundamentabilidade." No direito, trata-se, nisso,
sempre imediata ou mediatamente da fundamentacao de normas gerais ou
individuais, 19 portanto, de questoes normativas ou praticas. Antes de ser
exposto a quais conteddos a pretensao de correcao leva nos contextos ins-
titucionais distintos do direito, deve, por conseguinte, primeiro ser pergun-
tado como, bem genericamente, portanto, independente do direito,
possivel uma fundamentacao de normas. A resposta dá a teoria do discurso
pratico geral.
Constitucionalismo discursivo 25
O procedimento P da teoria do discurso deixa definir-se por um siste-
ma de regras do discursa' : que expressam as condigóes do argumentar
prático racional. Urna parte dessas regras formula exigéncias de racionali-
dade gerais, que também valem independentemente da teoria do discurso.
Delas fazem parte a liberdade da contradigo, a universalidade no sentido
de um uso consistente dos predicados empregados, a clareza conceitual-
-idiomática, a verdade empírica, a consideragáo das consequéncias, o pon-
derar, a troca de papéis e a análise do nascimento de convicgóes morais.
Todas essas regras valem também para monólogos. Já isso torna claro que
a teoria do discurso, de modo nenhum, como a ela foi objetado, 23 substitui
o fundamentar pela mera produgáo de consensos. Ela abarca completamente
as regras do argumentar racional aplicáveis ás fundamentagóes monológi-
cas. Sua particularidade consiste, exclusivamente, nisto, que ela acrescenta
a esse plano um segundo plano, ou seja, aquele das regras relacionadas com
o procedimento do discurso. Essas tém um caráter no monológico. Seu
objetivo é a imparcialidade do discurso. Esse objetivo deve ser obtido pelo
asseguramento da liberdade e igualdade da argumentagáo. As mais impor-
tantes dessas regras dizem:
1. Cada um que pode falar tem permissáo de participar em dis-
cursos.
2. (a) Cada um tem permissáo de pór em questáo cada afirmag-áo.
(b) Cada um tem permissáo de introduzir cada afirmagáo no
discurso.
(c) Cada um tem permissáo de manifestar suas colocagóes, de-
sejos e caréncias.
3. Nenhum falante pode, pela coergáo dominante dentro ou fora
do discurso ser impedido nisto, de salvaguardar seus direitos de-
terminados em (1) e (2).24
Essas regras expressam, no plano da argumentagáo, as ideias da liber-
dade e igualdade universal. Se elas valem, portanto, cada um pode decidir
livre e igualmente sobre aquilo que ele aceita, entáo, vale, necessariamente,
a condigo seguinte de aprovagáo universal:
Urna norma pode, em um discurso, somente entao, encontrar
aprovagáo universal, guando as consequéncias de seu cumpri-
mento geral para a satisfago dos interesses de cada um particular
podem ser aceitas por todos.
22
Para urna tentativa de formular um tal sistema com auxílio de 28 regras do discurso, comparar R.
Alexy (nota 15), S. 234 ff. Em itálico no original.
23
Comparar O. Weinberger. Grundlagenprobleme des Institutionalistischen Rechtspositivismus und
der Gerechtigkeitstheorie, in: Rechtstheorie, Beiheft 14 (1994), S. 258 f.
24
R. Alexy (nota 15), S. 240.
26 Robert Alexy
uma suposicao central da teoria do discurso, que a aprovacao no
discurso, primeiro, pode depender de argumentos e que, segundo, entre a
aprovacao universal sob condicoes ideais e os conceitos de correcao e de
validez moral existe uma relacao necessaria. Essa conexao deixa formular-
-se como segue:
Corretas e, corn isso, validas, sao, rigorosamente, as normas que, em
urn discurso ideal, por cada um, iriam ser apreciadas como corretas.
Se se faz certas atenuagOes, resulta disso o principio do discurso abs-
trato de Habermas:
"Validas sao, rigorosamente, as normas de atuacao que poderiam
ser aprovadas por todos os possIveis afetados como participantes
em discursos racionais".25
Isso corresponde, em todo o caso, na intencao fundamental, ao prin-
cipio de Kant do poder dador de leis:
"Portant°, pode somente a vontade, concordante e unida, de to-
dos, contanto que cada um decida sobre todos e todos sobre cada
um o mesmo, portanto, somente a vontade popular, universal-
mente unida, ser dadora de lei".26
Isso mostra que a teoria do discurso situa-se na tradicao kantiana.
Constitucionalismo discursivo 27
a) Discursos reais e ideais
Sob o ponto de vista da aplicabilidade, a fraqueza principal da teoria
do discurso consiste nisto, que seu sistema de regras no oferece um pro-
cedimento que permite, cm um número finito de operagóes, sempre chegar,
rigorosamente, a um resultado. Isso tem trés fundamentos. As regras do
discurso no contém, primeiro, nenhuma determinagáo com respeito aos
pontos de partida do procedimento. Pontos de partida so as, cada vez,
existentes convicgóes normativas e interpretagóes dos interesses dos parti-
cipantes. Segundo, as regras do discurso no determinam todos os passos
da argumentagáo. Terceiro, uma série de regras do discurso tem caráter
ideal e, por conseguinte, só aproximativamente é cumprível.
O último leva á distingo, fundamental para a teoria do discurso, entre
discursos ideais e reais. O discurso prático ideal cm todos os sentidos é
definido pelo fato de, sob as condigóes de tempo ilimitado, participagáo
ili mitada e auséncia de coergáo perfeita no caminho da produgáo de clareza
conceitual-idiomática perfeita, do ser informado empírico perfeito, da ca-
pacidade e da disposigáo perfeita para a troca de papéis e da liberdade de
pré-juízos perfeita, ser procurada a resposta a urna questáo prática. O con-
ceito de discurso ideal causa uma série de problemas 32 e é objeto de intensa
crítica. 33 Nunca, ainda, uma pessoa participou de um discurso ideal cm
todos os sentidos e nunca um mortal fará isso. Sobre os resultados de dis-
cursos ideais, por conseguinte, nunca pode haver certeza, mas sempre, so-
mente, suposiqóes. Nem, sequer, é certo se o discurso ideal, cm todos os
sentidos, iria levar a um consenso cm cada questáo prática ou se existem
diversidades resistentes ao discurso das pessoas, que também sob as condi-
góes mais ideais excluem consensos.
Tudo isso, contudo, no é capaz de desvalorizar o conceito do discurso
ideal. A ideia do discurso ideal é uma ideia regulativa sempre presente cm
discursos reais. 34 Como ideia regulativa, ela expressa seu objetivo ou ponto
final. Discursos práticos reais so definidos pelo fato de neles, sob as con-
digóes de tempo limitado, de participagáo limitada e auséncia de coergáo
limitada com clareza conceitual-idiomática limitada, ser informado empí-
rico limitado, capacidade limitada para a troca de papéis e liberdade de
pré-juízos limitada, ser procurada a resposta a urna questáo prática. Apesar
dessas limitagóes, o discurso real está enlagado conceitualmente com o
ideal. Quem tenta convencer um oponente com argumentos, pressupóe que
esse, sob condigóes ideais, deveria aprovar. O discurso ideal, como ideia
32
Comparar R. Alexy (nota 16), S. 113 ff.
33
Comparar O. Weinberger (nota 23), S. 259 ff.
34
Para o conceito de ideia regulativa, comparar I. Kant, Kritik der reinen Vernunft. A. 509, 644; B
537, 672.
28 Robert Alexy
regulativa, e a pretensao de correcao sao, desse modo, dois lados de uma
materia.
Contra isso, poderia ser objetado que o discurso ideal, como ideia
regulativa, 6 sem sentido. Ele seria isso, se uma aproximacao a ele ou fosse
i mpossivel ou irrelevante para a correcao. Que uma aproximacao de discur-
sos reais é possivel a discursos ideais, é facil de reconhecer. Assim, existem
discursos limitados e abertos, indistintos e claros, teimosos e criticos e tudo
isso, e mais, existe em diferentes graus. A questa() pode, por conseguinte,
somente dizer se existe uma_uniao interna entre a aproximacao a discursos
ideais e a correcao pratica. E uma suposicao central da teoria do discurso,
que isso é o caso. Em discursos praticos nao se trata somente da compro-
vac do
-
de interesses comuns, mas, essencialmente, tambem da solucao cor-
reta de conflito de interesses. Uma solueao correta de conflito de interesses
no nuclei:), uma materia da determinacao correta dos pesos relativos dos
interesses que se encontram em jogo. Seja somente aceito que a norma Ni,35
que soluciona um conflito de interesses, encontra aprovacao geral segundo
um discurso do qual foram excluidos oponentes nao dispostos a aprovacao
e no qual dominava um grupo, retorica emocional dominava o campo, fatos
falsos ate ao fim foram tratados como verdadeiros e os vencedores somente
quiseram salvaguardar exclusivamente seus proprios interesses e daqueles
dos outros nada quiseram ouvir. Seja comparado esse cendrio corn a solucao
do mesmo contlito de interesses pela norma N2, 36 que encontra aprovacao
geral segundo urn discurso do qual ninguem foi excluido e no qual ninguem
dominava, foi argumentado clara e precisamente, foram realizadas suposi-
goes somente acertadas ou provaveis sobre as circunstancias Micas e todos
se puseram, ate aonde eles puderam, na situacao dos outros e com eles
discutiram suas interpretacOes de interesses. 0 segundo caso esti, sem chi-
vida, mais proximo ao discurso ideal do que o primeiro, e por conseguinte,
em todo o caso, ceteris paribus, 37 N2 esta mais pr6ximo da correcao do que
Ni . 38 Isso basta para aquilo que se trata aqui: a aproximacao do discurso
real ao ideal nao é irrelevante para a coffee-do.
b) As modalidades discursivas
0 enlace do discurso real corn o ideal e capaz de eliminar, certamente,
so extremamente limitado a indefinidade do resultado. Existem certas coi-
sas que, ern aproximacao suficiente e, em geral, praticamente possivel ao
discurso ideal, como resultado, nao entram em questao. Um exemplo 6 a
35
Em italic° no original.
36
Em italic° no original.
37
Nota do tradutor: ceteris paribus: sob, em outras ocasiOes, as mesmas circunstancias.
38
Em italico, a cada vez, no original.
Constitucionalismo discursivo 29
escravidáo. Ela pode ser designada como "impossível discursivamente".39
Outra coisa pode, com seguranga suficiente, ser classificada como resultado
do discurso e deve, por conseguinte, ser denominada de "necessária di scur-
sivamente". 4 ° A democracia é um exemplo. 4 ' Ao lado do impossível discur-
sivamente e do necessário discursivamente, porém, existe um amplo espago
do meramente possível discursivamente, no qual se pode, de modo racional
em discursos, chegar a resultados diferentes. A teoria do discurso bate, aqui,
em um limite, que ela própria no pode exceder.
30 Robert Alexy
que numerosas exigencias morais e objetivos dignos de esforco, somente
por atuacao individual e cooperacao espontanea, nao podem ser cumpri-
dos suficientemente ou obtidos. Seja pensado no apoio a desempregados
ou no auxilio para urn pals necessitado. A organizacAo necessaria pressu-
poe direito. Isso tambem vale para a propria administracao do direito. Di-
reito deve ser organizado por direito. Para o conceito de direito, isso
significa uma intensificacao do peso, tanto da decretacao de acordo corn a
ordem como tambern da eficacia social por conta da correcao quanto ao
conteddo.
I. 0 da antijuridicidade extrema
Se os melhores argumentos falassem a favor de uma primazia rigorosa
do decretado de acordo corn a ordem e da eficacia social sobre a correcao
quanto ao contend°, a famosa proposicao de Kelsen "por isso, cada conted-
do qualquer pode ser direito" 46 seria exata em sua totalidade. Radbruch
objetou contra isso, apos 1945, que o conflito entre a justica, portanto, a
45
Nesse sentido C. Braun, Diskurstheoretische Normenbegriindung in der Rechtswissenschaft. Rechts-
theorie 19 (1988), S. 259 f.
46
H. Kelsen (nota 2), S. 201.
Constitucionalismo discursivo 31
correQáo quanto ao conteúdo, e a seguranga jurídica, sem dúvida, funda-
mentalmente, deve ser solucionado a favor da seguranga jurídica. mas isso
no vale ilimitadamente. A primazia do decretado e do eficaz sobre o cor-
reto bate em um limite, guando a contradigo de urna lei positiva com a
justiga obtém urna "medida insuportável . Isso deixa trazer-se á formula
- 47
47 G. Radbruch, Gesetzliches Unrecht und übergesetzliches Recht (1946), in: ders., Gesamtausgabe.
Bd. 3, Heidelberg 1990, S. 89. Entre aspas no original.
48
R. Alexy, Mauerschützen, Hamburg 1993, S. 4.
49 BGHZ 3,94 (107); BGHSt 2, 173 (177); 2, 234 (237 ff.); 1 357 (362 f.); BVerfGE 3. 58 (119); 3,
225 (232); 6, 132 (198); 6, 389 (414); 23,98 (106); 54,53 (68).
50 BGHSt 39, 1 (16); 40, 218 (232); 40, 241 (244); 41, 101 (106 ff.). Comparar para isso R. Alexy (nota
48), S. 7 ff.
51 Em vez de muitos. seja, nesse ponto, somente mencionado o antípoda mais importante de Radbruch,
ou seja, H.L.A. Hart, Positivism and the Separation of Law and Morals, in: Harvard Law Review 71
(1957/58), S. 615 ff.
52 Comparar R. Alexy (nota 11), S. 51 ft., 70 ff.
53 Para urna fundamentnáo mais pormenorizada em virtude da análise de oito argumentos pró e contra,
32 Robert Alexy
acordo corn a ordem e da eficacia social, urn peso autonomo. 55 Isso ja basta
para classificar o conceito de direito como "nao positivista".56
a) Direitos fundamentals
Para a teoria do discurso, a liberdade e a igualdade sao constitutivas
no discurso. As regras do discurso expressam isso claramente. Isso sugere
concluir da liberdade e igualdade no discurso pela liberdade e igualdade em
todos os ambitos da atuacao. Uma tal conclusao imediata de regras do falar
sobre regras juridicas, contudo, nao e possivel. Para isso, sao necessarias
outras premissas. Para fundamentar a liberdade juridica precisa-se da pre-
missa, que aquele, que faz discursos corn o interesse de solucionar proble-
mas politicos por consensos criados e controlados discursivamente, deve
reconhecer a liberdade dos outros tambem fora de discursos. 58 Quem faz
discursos sem essa motivacao deve, pelo menos, hipocrisar aquele interes-
55
Os maiores problemas causa a formula de Radbruch no ambito do direito penal. Aqui se trata,
sobretudo, da questa°, se a eliminacao de fundamentos de justificacao de um regime antijuridico
infringe o principio "Nullum cri men, nulla poena sine lege" que, na maioria dos estados, tern hierarquia
constitucional. Porem, isso nao 6 urn problema que acerta a fOrmula de Radbruch como tal. Ele diz
respeito somente a sua aplicabilidade no direito penal. Comparar para isso R. Alexy, Der BeschluB des
Bundesverfassungsgerichts zu den TOtungen an der innerdeutschen Grenze vom 24.10.1996, Hamburg
1997. S. 26 ff. Entre aspas no original, nota 39.
56
Entre aspas no original.
57
Direitos fundamentals sao direitos que sao tao importantes que sua concessao ou nao concessao nao
pode ser deixada a cargo da simples maioria parlamentar (comparar R. Alexy, Theorie der Grundrechte,
2. Aufl., Frankfurt a.M. 1994, S. 406). Eles limitam, como direitos constitucionais. os poderes de
decisao do parlament°. Direitos do homem sac' direitos que competem a todas as pessoas, independente
disto, se eles sao reconhecidos por direito positivo. Todos os direitos do homem deveriam ser acolhidos
em cada constituicao como direitos fundamentais. Ao lado dos direitos do homem, constituicifies podem
comer outros direitos como direitos fundamentais.
58
Comparar R. Alexy (nota 16), S. 149 f.
Constitucionalismo discursivo 33
se, se ele quer obter legitimagáo por argumentos. Isso leva a um dilema de
tiranos teórico-discursivo: por um lado, terror coberto com véu de argumen-
tos é mais barato e estável que poder nu, por outro, o argumentar e mentir
provoca crítica e desmascaramento.59
O interesse em urna solugáo discursiva de problemas políticos desem-
penha o seu papel principal na fundamentagáo da liberdade. Do lado da
igualdade, o consenso hipotético desempenha um papel correspondente cm
um discurso ideal. Sobre os resultados de discursos ideais so possíveis,
fundamentalmente, só especulaOes. Em alguns casos elementares pode,
porém, ser dito, com seguranga suficiente, o que é necessário ou impossível
discursivamente. A igualdade dos direitos do homem faz parte desses casos
elementares. Direitos do homem ou fundamentais desiguais no se deixam
justificar cm um discurso ideal, porque nele, devido á liberdade, igualdade
e racionalidade da argumentagáo lá dominantes, argumentos para urna dis-
tribui0o desigual dos direitos do homem náo tém existéncia."
Com o direito á liberdade e o á igualdade está fundamentado o núcleo
dos direitos fundamentais. Todos os outros direitos fundamentais so ou
casos especiais de ambos esses direitos ou meios necessários para a produ-
gáo e asseguramento de urna medida suficiente de liberdade e igualdade
fática. O último vale, por exemplo, para o direito a um mínimo existencia1.61
O uso de liberdade é autonomia. É de importancia fundamental para a
teoria do estado constitucional democrática, que os direitos fundamentais
assegurem tanto a autonomia privada como a pública. Isso ocorre por um
espectro amplo de direitos, que se estende da liberdade de opiniáo, sobre a
liberdade de reuniáo e de imprensa até o direito de eleigáo geral, livre, igual
e secreta. Desse modo, nasce urna uniáo necessária entre direitos fundamen-
tais e democracia.62
59
R. Alexy (nota 16), S. 153.
60
Pormenorizadamente para isso R. Alexy (nota 16), S. 155 ff.
61
R. Alexy (nota 16), S. 154; o mesmo (nota 57), S. 458 ff.
62
0 fato que direitos fundamentais deixam justificar-se teórico-discursivamente significa que urna
reuniáo dadora da constitui0o, na questáo, se a constitui0o deve garantir direitos fundamentais ou
náo, náo é livre. Urna constituiQáo cumpre, somente entáo, a pretensáo de corregáo e é, somente entáo,
legítima, guando ela garante os direitos como direitos fundamentais, que sáo exigidos pela teoria do
discurso. ySe se parte de um conceito decisionista [ver supra, nota 14] de soberania popular, segundo o
qual o po o é soberano se ele pode decidir o que sempre ele quiser, entáo a necessidade discursiva de
direitos fundamentais significa urna limitaláo da soberania popular de fora. Se se emprega, pelo con-
trário, um conceito deliberativo ou discursivo da soberania popular, segundo o qual um po y o é soberano
se ele forma sua vontade em discursos livres, entáo os direitos fundatnentais estáo, em todo o caso, sob
pressupostos ideais, contidos necessariamente em sua vontade. Um processo ideal de daQáo de consti-
tuirjáo os direitos fundamentais nAo podem limitar, porque eles estáo contidos em sua definillio. De
outra forma parece a materia, todavia, cm um processo real de dnáo de constitu4o. Discursos reais
podem malograr o correto e, com isso, também os direitos fundamentais. Os direitos fundamentais
li mitam, entáo, sem dúvida, o processo real, mas essa limitaláo é algo diferente daquela que se obtém
em um conceito decisionista I ver supra, nota 141 de soberania popular. Os direitos fundamentais náo
póem sobre a soberania popular, compreendida discursivamente, nada de alheio, mas formulam aquilo
que o po y o, representado pela reuniáo dadora da consrituiyáo, queda como o seu mais próprio sob
34 Robert Alexy
b ) Democracia
Existem ideias extremamente diferentes de democracia. 0 principio
do discurso exige a democracia deliberativa. A democracia deliberativa
mais do que urn procedimento para a producao de uma compensacao de
interesses otima abaixo do limite de ditadura ou guerra civil. Nela, o piano
dos interesses e do poder é coberto por urn piano dos argumentos, no qual
todos os participantes lutam por uma solucdo politica correta. A democracia
deliberativa pressup6e, desse modo, a possibilidade de racionalidade dis-
cursiva. Se a ideia de racionalidade discursiva fosse uma imagem enganosa,
entdo a democracia deliberativa seria uma ilusão. Uma proposicdo como
aquela do tribunal constitucional alemdo: "A discussdo livre e o verdadeiro
fundament° da sociedade liberal e democratica" 63 seria, entdo, ndo mais
que expressdo de uma mera ideologia.
Que a democracia deliberativa, somente entdo, e possivel, quando
existe algo como discursos praticos racionais, é somente urn lado da mate-
ria. 0 outro, e que a ideia do discurso somente pode ser realizada pela
institucionalizacao da democracia deliberativa ate o ponto onde ela é rea-
lizavel. Quem quer correcdo, deve querer discursos; quem quer discursos,
deve querer democracia.
A formacdo das instituiceles democraticas é materia do process° demo-
cratic°. Democracia 6, sob esse aspecto, reflexiva. Algumas linhas fundamen-
tais deixam, todavia, ja se fixar somente na base da teoria do discurso. Assim
deve, para mencionar dois exemplos, nos meios eletronicos, ser assegurado
um jogo de argumentos livre suficiente, que rid° deve ser desfigurado ou
oprimido por dinheiro e poder, e o financiamento dos partidos politicos
deve ser regulado de modo que a retrovinculacdo do processo politico seja
assegurada e conservada na raid° e responsabilidade do cidadao.64
c) Jurisdicdo constitucional
Se o processo de formacdo de vontade politica da born resultado, a
maioria parlamentar ira regar exigencias da democracia deliberativa, como
as duas antes mencionadas, em forma de leis. As leis irdo, entdo, tambem
condicOes mais ideais. Se se projeta isso sobre o conceito de direito, entao se pode dizer que na
concepcao decisionista [ver supra, nota 14] da soberania popular o decretado de acordo corn a ordem
e o eficaz social sao limitados per algo completamente diferente, pela correcao quanto ao contend°,
enquanto na concepcao discursiva, o decretado de acordo coin a ordem e o eficaz social no case ideal
sempre 6, simultaneamente, o correto quanto ao contend° e no caso real, pelo menos, visa a isso ou
tenta acerta-lo, o que funda uma uniao interna entre o lado institucional e o ideal. que corresponde
aquela entre o direito e a pretensao de correcao.
63
BVerfGE 90, 1(20 f.).
Comparar R. Alexy, Grundgesetz und Diskurstheorie, in: W. Brugger (Hg.), Legitimation des Grund-
gesetzes aus Sicht von Rechtsphilosophie und Gesellschaftstheorie, Baden-Baden 1996, S. 355 ff.
Constitucionalismo discursivo 35
respeitar e concretizar os direitos fundamentais. Mas o que é, guando leis
sáo aprovadas, que violam direitos fundamentais ou destroem a democracia
deliberativa? Pode-se, entáo, ou confiar na foro de cura espontánea da
democracia ou entáo receitar o medicamento da jurisdi0o constitucional.
A favor do último fala que, em caso contrário, deficits crónicos podem
ameaor e crises levar a um final mortal, embora isso devesse ter sido
impedido. Assim, maiorias sáo propensas a isto, perseverar cm privilégios
e costumes agradáveis, também guando elas violam direitos de minorias, e
nunca pode ser excluído que foros obtenham a maioria, que querem elimi-
nar a democracia deliberativa. A jurisdiOo constitucional, todavia, no é
um remédio universal. Se no mais existe o suficiente que quer a democra-
cia, entáo ninguém pode salvá-la. Além disso, a democracia também pode
desenvolver efeitos negativos. Cada jurisdiQáo constitucional contém o pe-
rigo do paternalismo. 65 Esse, somente entáo, pode ser conjurado, se a juris-
diOo constitucional, como urna representaláo argumentativa dos cidadáos,
primeiro, está claramente mais próxima de ideais discursivos que o proces-
so político, que levou á lei anulada, e se, segundo, no processo político
posterior, a decisáo do tribunal constitucional é reconhecida pelos cidadáos
cm discussáo e reflexáo crítica corno sua própria.66
3. Argumentaffio jurídica
Nenhum dador de leis pode criar um sistema de normas que é táo
perfeito que cada caso somente cm virtude de urna simples subsurwáo da
descriláo do fato sob o tipo de urna regra pode ser solucionado. Para isso
existem vários fundamentos. De importáncia fundamental sáo a vagueza da
linguagem do direito, a possibilidade de contradiOes normativas, a falta de
normas, sobre as quais a decisáo deixa apoiar-se, e a possibilidade de, cm
casos especiais, também decidir contra o texto de urna norma. 67 Existe, sob
esse aspecto, urna abertura necessária do direito.68
No ámbito da abertura do direito positivo, náo pode, conforme a defi-
niláo, ser decidido cm virar& do direito positivo, porque se isso fosse
possível, no se se encontraria no ámbito da abertura. Positivistas como
Kelsen e Hart sáo, por conseguinte, somente consequentes, guando eles
dizem que o juiz, no ámbito de abertura, está autorizado, semelhantemente
como um dador de leis, a decidir cm virtude de critérios extrajurídicos. 69 A
65
Comparar J. Habermas (nota 25), S. 323.
66 Comparar R. Alexy. Grundrechte und Demokratie in Jürgen Habermas' prozeduralem Rechtspara-
digma, in: O. Behrends/R. Dreier (Hg.), Gerechtigkeit und Geschichte. Beitráge emes Symposions zum
65. Geburtstag von Malte DieBelhorst, Gdttigen,1996, S. 85 f.
67
Comparar R. Alexy (nota 15). S. 17 f.
68 Comparar H. L. A. Hart, The Concept of Law, 2nd ed., Oxford 1994, S. 128.
69
H. Kelsen (nota 2), S. 350; H. L. A. Hart (nota 68), S. 126. 135. 204 f.
36 Robert Alexy
pretensao de correcao leva, pelo contrario, a uma interpretacao nao positi-
vista. Esta deixa desenvolver-se de dois modos: (1) pelo argumento de
principio e (2) pela tese do caso especial.
a) Argument° de principio
A base do argumento de principio forma a distincao entre regras e
principios. Regras sao normas que ordenam, proibem ou permitem algo
definitivamente ou autorizam a algo definitivamente. Elas contem urn dever
definitivo. Quando os seus pressupostos estao cumpridos, produz-se a con-
sequencia juridica. Se nao se quer aceitar esta, deve ou declarar-se a regra
como invalida e, corn isso, despedi-la do ordenamento juridic°, ou, entao,
inserir-se uma excecao na regra e, nesse sentido. criar uma nova regra. A
forma de aplicacao de regras 6 a subsuncao. Principios contem, pelo con-
trario, urn dever idea1. 7 ° Eles sao mandamentos a serem otimizados. Como
tais, eles nao contem um dever definitivo, mas somente urn dever-prima-
-facie. Eles exigem que algo seja realizado em medida tao alta quanto pos-
sive' relativamente as possibilidades faticas e juridicas. 7 ' Pode expressar-se
isso abreviadamente, embora urn pouco inexatamente, 72 pelo fato de se
designar principios como "mandamentos de otimizacao". 73 Como manda-
mentos ideais, principios exigem mais do que é possivel realmente. Eles
colidem corn outros principios. A forma de aplicacao para eles tipica 6, por
isso, a ponderacao. Somente a ponderacao leva do dever-prima-facie ideal
ao dever real e definitivo.
7()
R. Alexy (nota 16), S. 203 f.
71
R. Alexy (nota 57). S. 75.
72
A inexatidao resulta da mistura de dois pianos: de urn piano do objeto e de um metaplano. No piano
do objeto, encontram-se os principios como mandamentos ideals e, por conseguinte, a serem otimiza-
dos. Como tais des sao, diferentes que regras, que sempre somente ou podem ser cumpridas ou nao
cumpridas, cumpriveis em graus diferentes (R. Alexy (nota 16), S. 202 f.). Principios, como manda-
mentos ideals, sao os objetos de ponderaceles. Os mandamentos de otimizacao sao, pelo contrario,
estabelecidos em urn metaplano, no qual 6 dito o que deve ser feito corn aquilo que se encontra no piano
do objeto. Mandamentos de otimizacao exigem que seus objetos, os mandamentos a serem otimizados,
sejam realizados tao amplamente quanto possivel. Eles mesmos, porem, nao devem, outra vez, ser
otimizados, mas sempre ou cumpridos ou nao cumpridos. Mandamentos de otimizacao como tais tem,
por conseguinte, come foi observado, repetida e acertadamente. a estrutura de regras (A. Aarnio, Taking
Rules Seriously, in: Archl y far Rechts- und Sozialphilosophie. Beiheft 42 (1990), S. 187; J. Sieckmann,
Regelmodelle und Prinzipienmodelle des Rechtssystems, Baden-Baden 1990, S. 63 ff.). Contudo, o
assunto de mandamentos de otimizacao permanece cheio de sentido. Esse conceito expressa, de modo
particularmente simples. do que se trata, no micleo. em principios. Alem disso, existe uma relacao
necessaria entre o dever ideal. portanto, o verdadeiro principio, e o mandamento de otimizacao como
regra: o dever ideal implica o mandamento de otimizacao e as avessas. Trata-se de dois lados de uma
inateria. A questa° levantada por Peczenik, se o mandamento de otimizacao esta estabelecido dentro
ou fora do significado do principio, que ele necessariamente acompanha (A. Peczenik, On Law and
Reason. Dordrecht/Boston/London, 1989, S. 77 f.), deve, por conseguinte. ser respondida no sentido
de que ele 6 compreendido pelo significado de um principle, porque sua eliminacao, simultaneamente,
iria tomar do principio correspondente o seu carater de principle.
73
Entre aspas no original.
Constitucionalismo discursivo 37
O ponto de partida do argumento de princípios é que a pretensáo de
corregáo, entáo, guando urna ponderagáo é possível, pede urna ponderagáo.
Os objetos de ponderagáo unicamente possíveis, porém, so princípios.
Como a pretensáo de corregáo necessariamente faz parte do direito, também
a ponderagáo, exigida por ela, faz parte necessariamente do direito. Mas se
as ponderagóes fazem parte necessariamente do direito, entáo também os
objetos de ponderagáo. A pretensáo de corregáo leva, portanto, a isto, que
os princípios, que formam os fundamentos para as regras antigas, como
também para as novas a serem criadas, devem ser incluídos no conceito de
direito. Desse modo, os fundamentos ideais convertem-se para aquilo que
é definitivamente devido cm componente do direito.
Entre os fundamentos ideais para aquilo que é definitivamente devido
juridicamente, porém, contam sempre, também. princípios morais. Se se
une isso, novamente, com a pretensáo de corregáo, entáo resultam duas
consequéncias. A pretensáo de corregáo exige, primeiro, que os princípios
morais, que devem ser considerados no direito, sejam corretos. A corregáo
jurídica abarca, assim, elementos de corrqáo moral. É a corregáo substan-
cial de princípios morais que a torna considerável juridicamente, e nada
mais. Isso concerne ao conteúdo dos princípios morais incorporados ao
direito pela pretensáo de corregáo. A segunda consequéncia concerne á
aplicaqáo dos princípios morais, portanto, á sua ponderagáo contra outros
princípios morais e contra princípios jurídicos específicos, por exemplo,
contra tais que tém como objeto a seguranga jurídica, o procedimento e a
efetividade do direito. A participagáo de princípios morais cm urna ponde-
ragáo significa que também argumentos morais desempenham um papel na
fundamentagáo da decisáo de ponderagáo. Se a pretensáo de corregáo deve
ser cumprida, entáo isso deve ser urna argumentagáo moral racional. Isso
leva de volta á ideia do discurso.
Poderia objetar-se contra o último, que a teoria dos princípios leva a
urna ideia completamente diferente, que substitui aquela do discurso: á
ideia da coeréncia. 74 Isso é, cm parte, correto, cm parte, falso. Correto é que
a teoria dos princípios implica a ideia da coeréncia. A ponderagáo é urna
das operagóes mais importantes para a produgáo e asseguramento da coe-
réncia e, com isso, da unidade do sistema jurídico. Também, mal pode ser
sobreestimado o significado da coeréncia para a corregáo do direito. 75 Falso
seria, contudo, considerar a coeréncia como o critério supremo ou único
para a corregáo de urna interpretagáo do direito, para o que, cm alguns
autores, certas tendéncias devem ser observadas. 76 A ideia de coeréncia no
74
Nota do tradutor: ver sobre isso, infra, 7.
75
Comparar R. Alexy/A. Peczenik, The Concept of Coherence and Its Significance for Discursive
Rationality, in: Ratio Juris 3 (1990), S. 130 ff.
76
0 exemplo historicamente mais significativo oferece a teoria de Friedrich Carl von Savigny do "todo
orgánico" e da 'conexo interna ou do parentesco, pelo que os conceitos de direito e regras jurídicas
38 Robert Alexy
pode substituir a ideia do discurso, mas somente cotnplementar e intensifi-
car. Seu dominio exclusivo iria terminar em urn holism° juridic°, segundo
o qual, todas as premissas ja estao contidas ou escondidas no sistema juri-
dic° e, ainda, somente precisann ser descobertas. Contra isso fala que nor-
mas, se agora regras ou principios, nao mesmas formam urn sistema e urn
sistema de normas nao mesmo pode produzir e assegurar sua coerencia.
Para isso, sao necessarios pessoas e procedimentos. Nesse ponto, entra em
jogo a tese do caso especial.
Constitucionalismo discursivo 39
der somente do material fundado cm autoridade dado. Se a pretensáo de
corregáo deve ser satisfeita, essas premissas adicionais devem ser funda-
mentadas. Mas isso é, se o fundado em autoridade ou institucional sozinho
no dá resposta, possível somente no caminho da argumentagáo prática
geral. Em seu quadro, reflexñes de conformidade com a finalidade e ideias
daquilo que é bom para a comunidade tém, sem dúvida, o seu lugar legítimo.
Isso, porém, nada modifica nisto, que a questáo diretiva do decidir judicial
no ámbito da abertura é a questáo sobre a compensagáo correta e a distri-
buigáo correta. Questóes sobre a distribuigáo correta e a compensagáo cor-
reta so questóes de justiga. Questóes de justiga, porém, sáo questóes
morais. Assim, a pretensáo de corregáo funda, também, no plano da aplica-
gáo do direito, urna unido necessária de direito e moral."
80
Contra a tese do caso especial foram feitas numerosas objegóes. Assim, Jürgen Habermas fez valer
que o discurso jurídico náo deveria ser entendido como caso especial do discurso moral, porque no
direito, ao lado de fundamentos morais, também éticos e pragmáticos desempenham um papel legítimo
(Habermas (nota 25), S. 282 f.). Como "morais-, Habermas designa argumentos que visam a isto, o
que para todas as pessoas igualmente é bom. Para Habermas, isso é a questáo sobre a justiga (o mesmo
(nota 25), S. 191 f., 343 f.). De discursos político-éticos deve, pelo contrário, tratar-se, guando questóes
da "autoconsciéncia coletiva" figuram na ordem do dia, o que abarca a discussáo de tradigóes e formas
de vida comuns (o mesmo (nota 25), S. 139), assim como objetivos e bens coletivos (o mesmo (nota
25), S. 191). 0 uso pragmático da razáo prática deve, finalmente, ser exigido, guando se trata da
"compensagáo de interesses" (ibid.), que deve ser produzida pela "negociagáo de compromissos". cm
que devem ser consideradas "condigóes de negociagáo corretas" (o mesmo (nota 25). S. 139). Se se
toma por base essa distingáo, entáo Habermas tem com sua tese, que o discurso jurídico náo é um caso
especial do discurso moral, sem dúvida, razáo, porque o discurso jurídico está aberto náo só para
fundamentos morais, mas também para éticos e morais (o mesmo (nota 25), S. 345). Isso, contudo, náo
acerta a tese do caso especial. Sob um "discurso prático geral" deve ser entendido um discurso prático,
no qual questóes e fundamentos morais, éticos e pragmáticos estáo unidos um com os outros. A forma-
gáo de um tal conceito do discurso prático é cheia de sentido e necessária, porque entre os trés tipos
de fundamentos existe nao só uma relagáo de complemento, mas também urna tal da penetragáo. Se se
pressupi5e esse conceito do discurso prático geral, entáo é exata a tese do caso especial (R. Alexy (nota
16), S. 172 ff.). Klaus Günther objetou que a tese do caso especial ignora que no discurso jurídico náo
se trata de um discurso de fundamentagáo, mas de um discurso de aplicagáo (K. Günther, Critica]
Remarks on Robert Alexy' s "Special-Case Thesis", in: Ratio Juris 6(1993), S. 143 ff.). A ele deve ser
objetado que a jurisprudencia deve, na aplicagáo do direito, desenvolver um sistema de regras de
precedentes, se ela quer satisfazer os postulados da igualdade e da seguranga jurídica. Mas essas regras
sáo suscetíveis e carentes de fundamentagáo (R. Alexy, (nota 16). S. 52 ff.). Dos críticos da tese do
caso especial devem aqui, ademais, ser mencionados A. Kaufmann, Grundprobleme der Rechtsphilo-
sophie, München 1994, S. 79 e U. Neumann (nota 12, S. 86 ff.). Uma defesa pormenorizada da tese do
caso especial encontra-se cm I. Dwars, Application Discourse and the Special Case-Thesis, in: Ratio
Juris 5 (1992), S. 67 ff. (Em itálico e entre aspas, a cada vez, no original, nota 61.)
40 Robert Alexy
Direitos fundamentals no estado
constitucional democratic°
Para a relacao entre direitos do homem, direitos fundamentals,
democracia e jurisdicao constitucional*
Constitucionalismo discursivo 41
I. Os trés problemas dos direitos do homem
Urna apresentagáo táo cheia de pretensóes como um ideal universal
deve, com certeza, forgosamente, levantar numerosas questóes e a literatu-
ra, ilimitada para os direitos do homem, mostra que isso, de modo nenhum,
é somente urna suposiqáo. Os problemas que estáo unidos com os direitos
do homem deixam dividir-se cm trés grupos.
I. Os problemas epistémicos
Do primeiro grupo fazem parte os problemas epistémicos. 2 Neles, tra-
ta-se da questáo, se e como os direitos do homem podem ser reconhecidos
ou fundamentados. Podem os direitos do homem, no fundo, ser reconheci-
dos objetivamente ou o consenso de 10 de dezembro de 1948 foi somente
urna concordancia contingente, condicionada pelos horrores de ambas as
guerras mundiais, de colocagóes subjetivas, o que iria significar que aquele
consenso, com a modificagáo dessas colocagóes, perderla cada significado?
Esse é o lugar da objegáo de Alasdair MacIntyres, muito citada: "nao exis-
tem tais direitos e a crenga neles é urna com crengas cm bruxas e unicór-
nios". 3 Com isso, o primeiro problema está diante dos olhos: podem, no
fundo, alguns direitos do homem ser justificados ou fundamentados racio-
nalmente? Apesar de seu caráter filosófico, esse problema tem, de todo,
significado prático. Assim que o consenso cm questóes de direitos do ho-
mem vacila, obtém a possibilidade de alegar fundamentos para elas impor-
tancia. Enquanto todos acreditam firmemente nos direitos do homem, a sua
fundamentagáo é um problema meramente teórico; ele torna-se tanto mais
prático, quanto mais forte cresce a dúvida fundamental.
2. Os problemas substanciais
Os problemas do segundo grupo nascem assim que se acordou sobre
isto. que direitos do homem devem ser reconhecidos. Aparece, entáo, a
questa°, que direitos so direitos do homem. Esse é o problema substancial
dos direitos do homem. 4 A declaragáo dos direitos do homem universal
contém, nos artigos 1 até 20, os direitos de liberdade e igualdade clássicos
como eles, no Virginia Bill of Rights, de 12 de junho de 1776, no primeiro
catálogo de direitos fundamentais amplo, sao indicados. Artigo 21 regula
o ter parte na formagáo da vontade política. Também isso está na tradigáo
liberal e democrática do Virginia Bill of Rights. Mas, entáo, inicia um novo
2
Em itálico no original.
3
Alasdair MacIntyre, After Virtue, 2. Aufl., London 1985, S. 69.
4
Em itálico no original.
42 Robert Alexy
capitulo. Artigo 22 promete "seguranca social" e "direitos econOmicos,
sociais e culturais", artigo 23 normaliza um direito ao trabalho, a "condi-
goes de trabalho convenientes e satisfatorias, assim como a protecao contra
desemprego", artigo 24 concede uma pretensao de "descanso e tempo li-
vre", artigo 25 da a cada homem uma "pretensao de urn custo de vida que
garante satide e bem-estar seu e de sua familia, inclusive nutricao, vestuario,
habitacao, a assistencia medica e as prestacOes necessarias da assistencia
social", artigo 26 determina o direito a formacao e artigo 27 coroa tudo isso
corn o direito "de participar livremente na vida cultural da comunidade, de
alegrar-se corn as artes e de ter parte no progresso cientifico e do seu bene-
ficio". Corn isso, os direitos do homem sociais — muitas vezes, tambem,
denominados direitos do homem de segunda geracao — encontraram aceita-
cao em sua totalidade na declaracao dos direitos do homem universal. Mas
eles tambem estao fundamentados em igual medida como os direitos libe-
rais da primeira geracao? Tern eles a mesma force Sobre isso domina
discussao. Muito mais discussao domina sobre a questa° se aos direitos de
primeira e segunda deve ainda uma familia de direitos de terceira geracao
ser acrescentada. Como tais sao considerados, sobretudo, direitos de esta-
dos, povos ou grupos ao fomento do desenvolvimento. 5 Finalmente, existe
a possibilidade de pot- em jogo aspectos ecolOgicos. Poderia assim, se nao
se quer embrulhar-se todo o novo sem classificar, chegar a uma quarta
geracao ou dimensao. A discussao, alem disso, nao so trata do que deve ser
incluido na lista dos direitos do homem. Ela brame, sobretudo, em volta da
questa°, como devem ser ponderadas as distintas geracOes ou dimensOes.
Um exemplo para uma tal discussao e a disputa, durante toda a guerra fria,
entre o oeste e o leste sobre isto, se o primado é devido aos direitos do
homem liberais ou sociais. As linhas de frente removeram-se hoje, mas a
estrutura logica da disputa permaneceu igual.
3. Os problemas institucionais
0 terceiro problema principal dos direitos do homem é o da sua insti-
tucionalizaccio. 6 Tambem aqui vale a pena uma leitura da declaracao dos
direitos do homem universal. Artigo 28 6, a primeira vista, uma prescricao
peculiar. Ele diz que todo homem tern uma pretensao "de uma ordem social
e internacional, na qual os direitos e liberdades, citados na presente decla-
raga°, podem ser realizados plenamente". Isso pode ser entendido como
direito a institucionalizacao. Como mera declaracao, um catalog° de direi-
5
Comparar K. J. Partsch, Das Recht auf "internationale Solidarit5t" — ein neues "Menchenrecht der
dritten Generation"?, in: Europaische Grundrechte-Zeitschrift 1980, S. 511 f.; E. Riedel, Menchenrech-
te der dritten Generation, in: Europische Grundrechte-Zeitschrift 1989, S. 12 ff.
6
Em italic° no original.
Constitucionalismo discursivo 43
tos do homem permanece sem efeito. Os direitos do homem devem ser
transformados cm direito positivo para que seu cumprimento esteja garan-
tido. O preámbulo expressa isso claramente guando ele diz que "é essencial
proteger os direitos do homem pelo domínio do direito". Existem dois pla-
nos principais da institucionalizagáo, o nacional e o internacional. Ambos
podem, dentro de si, outra vez, ser estruturados multiplamente. Assim, exis-
tem, em um sistema nacional federal, dois planos. Além disso, o plano
nacional e o internacional esto hoje estreitamente enlagados um com o
outro, o que se mostra, por exemplo, no fato que o pacto internacional sobre
direitos civis e políticos, de 19 de dezembro de 1966, foi transformado cm
direito intra-estatal por numerosos estados.
É impossível atravessar todos os trés círculos de problemas, aquí, tam-
bém, somente cm amplo pedago. Eu irei concentrar-me, por isso, no pro-
blema institucional e, nisso, limitar-me ao quadro nacional. O
-
significado da proteg áo dos direitos do homem internacional náo pode,
sem dúvida, ser sobrestimado. Sem a imposigáo dos direitos do homem
pelos estados particulares, o ideal, do qual fala o preámbulo, contudo,
jamais se pode tornar realidade. Também sob esse aspecto vale o princípio
da subsidiariedade.
A concentragáo sobre a institucionalizagáo cm estados particulares é,
certamente, no mais do que o fazer possível ou facilitagáo de um primeiro
passo. É indiferente onde se inicia nos direitos do homem, realmente se
chega a todos os problemas. Assim, a solugáo da questáo institucional está
unida estreitamente com a da substancial. Quem reconhece catálogos am-
plos com direitos de todas as geragóes será muito aplaudido cm algumas
discussóes. Para isso, ele precisa aceitar problemas na institucionalizagáo,
porque vale a proposigáo que os direitos do homem so táo mais difíceis de
impor. quanto mais eles prometem. Mesmo entre o plano epistémico e o
institucional existem conexóes muito estreitas. Quanto melhor direitos do
homem sito fundamentados, tanto mais legítima é a sua imposigáo interna-
cional por meio de coergáo. Os direitos do homem formam, assim, com
todos os seus problemas, um sistema.
Para chegar a esse sistema, do lado institucional, deve ser efetuada,
primeiro, urna determinagáo do conceito de direito do homem. Nisso, a
necessidade de sua transformagáo cm direitos fundamentais jurídico-posi-
tivamentevigentes irá resultar, de certo modo, como que espontaneamente.
Em um segundo passo, eu quero, entáo, mostrar quais problemas nascem
disso para o principio democrático. No final, eu espero poder mostrar urna
solugáo que impede urna autodestruigáo da ideia dos direitos do homem por
urna contradigo interna.
44 Robert Alexy
II. O conceito de direito do hornern
Os direitos do homem distinguem-se de outros direitos 7 pela combi-
nnáo de cinco marcas. Eles so direitos (1) universais, (2) morais, (3)
fundamentais, (4) preferenciais e (5) abstratos.
I. Direitos universais
Da universalidade já se tratava na caracterizalao dos direitos do ho-
mem como ideal universal. Agora, este conceito deve ser determinado mais
de perto. Um primeiro aspecto da universalidade é a universalidade dos
titulares e destinatarios. Aqui, somente deve ser dada urna olhada nos titu-
lares.8
A universalidade da titularidade consiste nisto, que direitos do homem
s o direitos que competem a todos os homens. A determinnao do círculo
dos titulares causa varios problemas, dos quais dois devem, aqui. interessar.
O primeiro resulta do emprego do conceito de homem. A delimitnáo mais
clara ganha-se guando se define esse conceito biologicamente. Contra isso,
é objetado que isso é um especiesismo que se aproxima do racismo. 9 Essa
obje0o ignora, contudo, que no emprego do conceito biológico do homem,
para a delimitnáo do círculo de titulares, trata-se somente do conceito de
direito do homem, nao, porém, de suafundamentaffio.'" Se os fundamentos
rnelhores falassem cm favor disto, de conceder determinados direitos, por
exemplo, o á vida, a animais em igual proporOo como aos homens, entáo
o direito á vida, como direito do homem,' ' estaria caduco e deveria ser
criado de novo, por exemplo, como -direito das criaturas", com círculo de
titulares ampliado.
O segundo problema nasce disto, que entáo, guando se direciona para
o conceito biológico do homem, somente homens como indivíduos podem
ser titulares de direitos do homem. Contra isso, poderia objetar-se que,
mesmo assim, existem bons fundamentos para isto, conferir também a gru-
pos, comunidades e estados determinados direitos, por exemplo, direitos á
existéncia, identidade ou desenvolvimento. Outra vez, deve ser acentuado
que, aqui, no se trata da fundamentagao de alguns direitos, mas somente
de urna formnao de conceito adequada. Grupos, comunidades e estados
compó'em-se, sem dúvida, de homens, mas no so homens. No que concer-
7
Para o conceito do direito (subjetivo), comparar R. Alexy, Theorie der Grundrechte, 3. Aufl., Frank-
furt a.M. 1996, S. 171 ff.
8
Para a universalidade dos destinatários, comparar R. Alexy, Die Institutionztlisierung der Menschen-
rechte im demokratischen Verfassungsstaat, in: Stefan Gesepath/Georg Lohmann (Hg.), Philosophie
der Menschenrechte, Frankfurt a.M. 1998, S. 248.
9
Comparar C. S. Nino, The Ethics of Human Rights, Oxford 1991, S. 35.
10
Em itálico no original.
II Ein itálico no original.
Constitucionalismo discursivo 45
ne ao conceito de direito do homem, assim, nao causa problemas, falar de
urn direito do homem do particular, a seguir, que seu grupo, sua comunidade
ou seu estado é protegido na existencia, na identidade ou no desenvolvi-
mento. 0 titular de tais direitos, que tern a integracao do individuo em sua
comunidade como objeto e como fundamento, permanece o homem parti-
cular. Trata-se, em tais direitos, de uma ampliacao dos direitos individuais
a existencia e desenvolvimento da personalidade na dimensao da comuni-
dade. As coisas, porem, modificam-se quando, como titular desses direitos,
apresentam-se o grupo, a comunidade ou o estado. Podem existir bons fun-
damentos para tais direitos, mas se deveria, porem, designar eles como
aquilo que eles sao, ou seja, como "direitos grupais", "comunitarios" ou
"estatais". Isso tern, sem duvida, a desvantagem que para os defensores de
tais direitos perde-se o som belo da expressao "direitos do homem". Mas,
para isso, nasce clareza. Alern disso, permanece possivel fundamentar di-
reitos de coletividades como meio para a realizacao de direitos do homem.'2
Tudo isso aguca a vista para isto, que direitos coletivos nao degenerem em
direitos de funcionario. Em Ultimo lugar, trata-se disto, corn todo "o estar
relacionado a comunidade e o estar vinculado a comunidade",' 3 perseverar
na protecao do individuo como intencao original dos direitos do homem.
Isso nao exclui ancorar direitos coletivos — como, por exemplo, tambern
a protecao de bens coletivos — na constituicao. Todos os direitos do homem
merecem, como ainda devera ser mostrado, protecao juddico-constitucio-
nal, mas nao tudo que merece protecao juridico-constitucional precisa ser
urn direito do homem. Basta que ele, para falar como Rawls, faca parte do
"constitutional essentials". 14 Corn auxclio desse conceito pode o uso infla-
cionario da expressao "direito do homem" ser reprimido, que nao faz bem
a materia dos direitos do homem.15
2. Direitos morais
A segunda qualidade essencial para os direitos do homem é que eles
sao direitos morais. 0 conceito de direito moral e ambiguo. Aqui, ele deve
ser empregado como conceito contrario ao conceito de direito jurldico-po-
sitivo. Direitos juridico-positivos nascem – como todas as normas do direito
positivo – por atos de fixacao, por exemplo, por contrato, dacao de consti-
tuicao, decisao de lei ou uma pratica judicial ou social e dependem em sua
existencia – outra vez, como todas as normas do direito positivo – disto, se
eles obtem e conservam urn minim° de eficacia ou oportunidade de eficacia
12
Em italico no original.
13
BVerfGE 4.7 (15 f.).
14 Comparar J. Rawls, Political Liberalism, New York 1993, S. 227 ff. Entre aspas no original.
15
Entre aspas no original.
46 Robert Alexy
social.' 6 Direitos morais podem, simultaneamente, ser direitos jurídico-po-
sitivos, sua validez, porém, nao pressuplie urna positivagáo. Para a validez
ou existéncia de um direito moral basta que a norma, que está na sua base,
vale moralmente. Urna norma vale moralmente guando ela, perante cada
um que aceita uma fundamentagáo racional, pode ser justificada. 17 Direitos
do homem existem, com isso, rigorosamente entáo, guando eles, no sentido
apresentado, perante cada um, podem ser justificados. Á universalidade da
estrutura dos direitos do homem, que consiste nisto, que eles sao, funda-
mentalmente, direitos de todos contra todos, acresce, com isso, urna uni-
versalidade de validez, que é definida por sua fundamentabilidade perante
cada um que aceita urna fundamentagáo racional.'8
3. Direitos preferenciais
Apesar de seu caráter moral, direitos do homem estáo cm urna relagáo
íntima com o direito. Se existe um direito moral, portanto, fundamentável
perante cada um, por exemplo, á vida, entáo também deve existir um direito,
fundamentável perante cada um, á imposigáo desse direito. Se se quer evitar
guerra civil entra, como instancia de imposigáo, somente o estado cm ques-
tao. O direito moral á vida implica, portanto, um direito moral á protegáo
por direito estatal positivo. Nesse sentido, existe um direito do homem ao
estado, mais concisamente, um direito moral ao direito positivo. A decla-
ragáo dos direitos do homem universal expressa isso, como já observado,
acertadamente, cm seu preámbulo e no artigo 28.
O direito do homem ao direito positivo náo é um direito do homem ao
direito positivo de qualquer conteúdo, mas a um direito positivo que res-
peita, protege e fomenta os direitos do homem, porque é justamente o as-
seguramento dos direitos do homem que fundamenta o direito do homem
ao direito positivo. A observáncia dos direitos do homem é urna condiga()
necessária para a legitimidade do direito positivo. Nisto, que o direito po-
sitivo deve respeitar, proteger e fomentar os direitos do homem para ser
legítimo, portanto, para satisfazer sua pretensáo de corregáo, expressa-se a
prioridade dos direitos do homem. Direitos do homem estáo, com isso, em
urna relagáo necessária para com o direito positivo, que está caracterizada
pela prioridade dos direitos do homem. Essa prioridade necessária é a ter-
ceira marca definidora dos direitos do homem.
16
Comparar para isso, R. Alexy, Begriff und Geltung des Rechts, 2. Aufl., Freiburg/München 1994,
S. 147 f.
17
Comparar para isso, R. Alexy, Diskurstheorie und Menchenrechte, in: ders., Recht, Vernunft, Dis-
kurs. Studien zur Rechtsphilosophie. Frankfurt a.M. 1995. S. 127 ff.
18
Em itálico no original.
Constitucionalismo discursivo 47
4. Direitos fundamentals
A relacao interna, definida pela prioridade necessaria, entre direitos
do homem como direitos morais e o direito positivo desempenha na questa°,
quais conteUdos direitos do homem tern, urn papel decisivo. Nos objetos
dos direitos do homem deve tratar-se de interesses e carencias para os quais
valem duas coisas distintas. Deve tratar-se, em primeiro lugar, de interesses
e carencias que, no fundo, podem e devem ser protegidos e fomentados por
direito. Assim, muitos homens tern uma carencia fundamental de amor. Nao
deveria ter poucos, aos quais é mais importante ser amado do que participar
em demonstracoes politicas. Contudo, nao existe um direito do homem ao
amor, porque amor nao se deixa coagir por direito. A segunda condicao
que o interesse ou a carencia seja tao fundamental que a necessidade de seu
respeito, sua protecao ou seu fomento deixe fundamentar-se pelo direito.19
A fundamentabilidade fundamenta, assim, a prioridade em todos os graus do
sistema juridic°, portanto, tambem perante o dador de leis. Um interesse ou
uma carencia 6, nesse sentido, fundamental quando sua violacao ou nao satis-
facao ou significa a morte ou padecimento grave ou acerta o ambito nuclear
da autonomia. Disso sao compreendidos nao so os direitos de defesa liberais
classicos, mas. por exemplo, tambem direitos sociais que visam ao assegu-
ramento de urn minim° existencial. Nao sao direitos do homem, segundo
esse criterio da fundamentabilidade, pelo contrario, por exemplo, o clireito
garantido no artigo 7, VIII, da constituicao brasileira, a um decimo terceiro
salario mensal ou a garantia, la minutada no artigo 230, paragrafo 2, do uso
livre dos meios de circulacao pUblicos urbanos para os maiores de 65 anos.
5. Direitos abstratos
A quinta marca caracteristica para direitos do homem e que neles tra-
ta-se de direitos abstratos. Isso mostra-se mais claramente na necessidade
de sua limitacao ou restricao que, por direitos de outros e pelo mandamento
da conservacao e fomento de bens coletivos como, por exemplo, da protecao
do meio ambiente, é exigida. Qual limitacao 6 admissivel pode, em Ultimo
lugar, ser determinado somente por ponderacao. A aplicacao dos direitos
do homem em casos concretos pressupOe, corn isso, ponderacoes. Sobre
ponderacOes, porem, pode discutir-se longamente. Se a discussao nao deve
durar eternamente, o que iria pôr em perigo a realizacao dos direitos do
homem, devem ser criadas instancias que estao autorizadas a decisOes de
ponderacao juridicamente vinculativas. 0 estado 6, portanto, necessario
nao sa como instancia de imposicao, mas tambern como instancia de decisao
para a realizacao dos direitos do homem. Acresce a isso, que a realizacao
de numerosos direitos do homem nao e possivel sem organizacao. Nem a
19
Em italico no original.
48 Robert Alexy
protegáo diante de atos de violéncia de outros cidadáos nem o cuidado para
o mínimo existencial podem ficar a cargo de agáo espontánea, se se deve
tratar de urna garantia. Os direitos do homem levam, portant°, por trés
fundamentos para a necessidade do estado e do direito: por causa da neces-
sidade de sua imposigáo, em caso de necessidade também por coergáo, da
necessidade de náo só discutir sobre questóes de interpretagáo e pondera-
gáo, mas também decidi-las e por causa da necessidade de organizar o cum-
primento de direitos do homem. A travessia dos direitos do homem, como
direitos morais, para o direito positivo, certamente, no significa sua des-
pedida. O contrário é exato, porque a parte nuclear dessa travessia é a trans-
formagáo dos direitos do homem cm direitos fundamentais de conteúdo
igual. Os direitos do homem náo perdem, nessa transformagáo, nada cm
validez moral, obtém, porém, adicionalmente, urna jurídico-positiva. A es-
pada torna-se cortante. Primeiro, com isso, é efetivado definitivamente o
passo do reino das ideias para o reino da história.
1. Quatro extremos
As fontes das dificuldades, que se manifestam com a institucionaliza-
gáo, so quatro extremos que caracterizam direitos fundamentais plenamen-
te formados. O primeiro extremo é o grau de hiera rquia extremo na ordem
graduada do direito intra-estata1. 2 ° Isso resulta do mero fato que direitos
fundamentais so direitos com hierarquia constitucional. O grau de hierar-
quia extremo seria de pouco interesse se no acrescesse o segundo, a foroa
de imposiffio extrema. 21 Dela dispóem direitos fundamentais guando eles,
primeiro, vinculam todos os trés poderes, portant°, também o dador de leis,
e guando essa vinculagáo é controlada judicialmente, portanto, é justiciável.
Se se excetuasse o dador de leis dessa vinculagáo ou se se qualificasse
alguns direitos fundamentais de no justiciáveis, entáo desapareceriam,
sem dúvida, muitos problemas. O prego para isso seria, contudo, alto. Ele
Em itálico no original.
21
Em itálico no original.
Constitucionalismo discursivo 49
consistiria em uma rentincia a uma institucionalizacao plena ou autentica.
Uma tal rentincia, porem, seria uma infracao contra direitos do homem.
ConstituicOes modernas Tao aos direitos fundamentais em geral, por
isso, a forca de imposicao extrema e quando elas nao o fazem, elas ou
deveriam ser interpretadas nesse sentido ou, se isso nao é possfvel, modi-
ficadas.
Tambem a uniao entre grau de hierarquia extrema e forca de imposicao
extrema iriam significar pouco se os direitos fundamentais regulassem
questOes especiais insignificantes. Rigorosamente o contrario 6, porem, o
caso. Corn a garantia da propriedade, da liberdade de profissao e da liber-
dade contratual, a decisao cai para uma economia de mercado. A garantia
da liberdade de opiniao, da de imprensa e da de radiodifusao e de televisao
fixa os pilares de fundamento de urn sistema de comunicacao social. Outros
direitos fundamentals precisam somente ser mencionados para reconhecer
seu significado fundamental, assim, a garantia do matrimonio e familia e a
do direito de heranca, a liberdade de religiao e a protecao da vida e integri-
dade corporal.
Convertem-se em urn problema real os tres extremos tratados ate ago-
ra, o gran de hierarquia extremo, a forca de imposicao extrema e os objetos
extremamente importantes, primeiro, pelo enlace corn urn quarto problema,
a medida maxima de necessidade de interpretacao. Na maioria das consti-
tuic.Oes isso ja resulta da formulacao concisa e lapidar de seu catalog° de
direitos fundamentals. Mas tambem la, onde uma formulacao mais rigorosa
dos direitos fundamentais é tentada, nao muito diferente as coisas situam-
-se. Assim, os direitos de liberdade e igualdade classicos sao regulados no
artigo 5 da constituicao brasileira em 74 ntimeros e os direitos sociais no
artigo 7 em 34 mimeros, assim como em muitas outras prescricOes do tftulo
oitavo sobre a ordem social. Os problemas de interpretacao jurfdico-funda-
mentais, que se apresentam em toda a parte, sao, por meio dessa regulacao
relativamente pormenorizada, contidos em amplo pedaco, mas nao elimi-
nados; em alguns casos, nascem ate novos. Assim, o artigo 5, IV, declara a
manifestacao das ideias como livre. Isso quer dizer que todas as manifes-
tacoes de opiniao sao permitidas, tambem tais que violam a honra de outros
e tais com contetido racista? Isso iria ajustar-se mat ao artigo 5, X, que
protege a honra, e ao artigo 5, XLII, que poe sob pena praticas racistas. Em
contrapartida, nao pode cada manifestacao de opiniao, que de alguma ma-
neira molesta um concidaddo ou membro de uma determinada raga, ser
proibida se a liberdade de manifestacao de opinido nao deve atrofiar. Isso
mostra que uma fixacao de barreira corn auxilio de uma ponderacao é ne-
cessaria. A ponderacao como parte de um exame de proporcionalidade,
porem, e o problema nuclear da dogmatica dos direitos fundamentals e o
fundamento principal para a abertura dos catalogos de direitos fundamen-
50 Robert Alexy
tais. Em alguns casos, esse problema salta aos olhos abertamente, por exem-
plo, guando o artigo 5, XXII, garante a propriedade e entáo, de imediato,
no inciso XXIII é acrescentado que a propriedade deve servir á sua fungáo
social. Em outros casos, a necessidade de um exame de proporcionalidade
primeiro cm olhar circunstanciado fica clara, por exemplo, guando o artigo
5, XI, admite o entrar na habitagáo de dia em virtude de ordenagáo judicial.
Isso no quer dizer que tribunais, por qualquer fundamento, devem admitir
um adentrar na habitagáo. O adentrar deve ser proporcional. Análogo vale
para os direitos fundamentais de igualdade. Quando o artigo 5, caput, de-
termina a fórmula clássica, que todos os homens diante da lei so iguais,
para o Brasil, entáo isso no significa que no pode ser diferenciado. Essa
prescrigáo náo prescreve, por exemplo, que pobres e ricos devam pagar
i mpostos no mesmo montante. Isso mostra que diferenciagóes sáo permiti-
das se para elas existem fundamentos razoáveis. Discussáo particular do-
mina cm vários estados sobre a fórmula que se encontra no artigo 5, I, que
homens e mulheres tém os mesmos direitos. Isso exclui discriminagáo con-
trária em favor de mulheres, ela a admite ou ela é até exigida? Problemas
correspondentes existem cm muitos direitos fundamentais sociais. Tome-se
somente o direito á saúde, regulado no artigo 196. Ele deve ser garantido
por medidas de política social e económica. Sem ponderagáo náo pode ser
comprovado o conteúdo rigoroso desse direito.
Interpretado deve ser cm muitas áreas. A forga explosiva da interpre-
tagáo constitucional resulta dos trés extremos primeiro mencionados, do
grau de hierarquia extremo, da forga de imposigáo extrema e do conteúdo
extremamente importante. Quem consegue, o tribunal, que decide, ao fim
e ao cabo, sobre a constitucionalidade e com isso — independente de sua
designagáo — cumpre a tarefa de um tribunal constitucional, convencer de
sua concepgáo sobre a interpretagáo dos direitos fundamentais obteve o que,
no processo político ordinário, é no obtenível: ele transformou sua con-
cepgáo sobre coisas sociais e políticas, extremamente importantes, pratica-
mente, cm componentes da constituigáo e, com isso, tomou da ordem do
dia política. Urna maioria parlamentar simples, entáo, nada mais pode con-
seguir. Somente o próprio tribunal constitucional ou a maioria qualificada,
cada vez exigida para modificagóes da constituigáo, podem, entáo, ainda
modificar a situagáo. Tudo isso explica porque em todos os estados, dotados
com catálogo de direitos fundamentais e jurisdigáo constitucional, sobre a
interpretagáo dos direitos fundamentais, náo só é refletido com calma, mas
também litigado na arena política. Pode falar-se de urna luta pela interpre-
tagáo dos direitos fundamentais. Juiz arbitral nessa luta, porém, náo é o
po y o, mas o tribunal constitucional respectivo. Isso é compatível com o
princípio democrático, cujo núcleo, no artigo 1, parágrafo único, da cons-
Constitucionalismo discursivo 51
tituicao brasileira, assim como no artigo 20, alinea 2, proposicao 1, 22 da lei
fundamental, e expresso corn a formulacao classica: "Todo o poder estatal
provem do povo"? 23 Os direitos do homem parecem converter-se em um
problema para a democracia quando eles sao levados a seri° e_de urn mero
ideal transformados, por institucionalizacao, em algo real. E exata essa
impressao? E o ideal, do qual se trata no preambulo da declaracao dos
direitos do homem universal, uma quimera que leva ao arrebentamento uma
contradicao entre direitos fundamentais e democracia?
2. Tres modelos
Para responder a essa questa°, devem ser distinguidos tres modos de
ver da relacao entre direitos fundamentais e democracia: urn ingenuo, um
idealista e urn realista. Segundo o modo de ver ingenuo, entre direitos fun-
damentais e democracia ja por isso nao pode existir conflito, porque tanto
direitos fundamentais como democracia sac) algo bom. 24 Como devem co-
lidir duas coisas boas? A concepcao ingenua acha, por conseguinte, que
ambos pode ter-se ilimitadamente. Essa perspectiva de mundo é muito bo-
nita para ser verdadeira. Seu pont° de partida, que somente existem contli-
tos entre o born e o mau, nao, porem, no interior do born, e falso. Quem
quer impugnar que prosperidade e pleno emprego, que se baseiam sobre
crescimento economic°, em si sao algo born e quem quer negar que seja
certo que a protecao e a conservacao do meio ambiente é algo born? Con-
tudo, existe entre esses bens, de fundamentos bem conhecidos, no nosso
mundo caracterizado por finitude e escassez, urn conflito. 0 modo de ver
ideulista concede isso. 25 Sua reconciliacao entre direitos fundamentais e
democracia, por conseguinte — dito exageradamente tern lugar, tambern
de modo algum, primeiro, neste mundo, mas no ideal de uma sociedade
politicamente perfeita. Nela, o povo e seus representantes politicos, de
modo algum, estao interessados nisto, de violar os direitos fundamentais de
algum cidadao por decisoes de maioria parlamentares, portanto, leis, ao
contrario. A salvaguarda dos direitos fundamentais e urn motivo politico
eficaz para todos. 0 catalog° de direitos fundamentais tern, nesse modelo
rousseauniano, somente ainda um significado simbolico. Ele formula so-
mente ainda aquilo que todos, alias, acreditam e querem. Como ideal, que
pode ser oposto a realidade politica e ao qual se deveria aproximar, esse
model° tern, sem mais, seu valor. Mesmo assim, pode saber-se que esse
22
Nota do tradutor: artigo 20, alinea 2, da lei fundamental: todo o poder estatal provem do povo. Ele
6 exercido pelo povo nas eleicdes e nas votacbes e por meio de &gabs especiais do legislativo, do poder
executivo e da jurisdicao.
23
Entre aspas no original.
24
Em italic° no original.
25
Em italico no original.
52 Robert Alexy
ideal é no obtenível. Por conseguinte, para aquele que quer institucionali-
zar os direitos do homem no mundo como ele é, somente o modo de ver
realista é correto. 26 Segundo ele, a relagáo entre direitos fundamentais e
democracia é caracterizada por duas vises cm sentido contrário e, com
isso, na realidade, por urna contradigo. A primeira diz: (1) Direitos funda-
mentais so democráticos; a segunda: (2) Direitos fundamentais so no
democráticos.
Direitos fundamentais so democráticos porque eles, com a garantia
dos direitos de liberdade e de igualdade, asseguram o desenvolvimento e
existéncia de pessoas que. no fundo, so capazes de manter o processo
democrático com vida e porque eles, com a garantia daliberdade de opiniáo,
i mprensa, radiodifusáo, reuniáo e associagáo, assim como com o direito
eleitoral e as outras liberdades políticas asseguram as condigóes funcionais
do processo democrático. No democráticos so os direitos fundamentais,
pelo contrário, porque eles desconfiam do processo democrático. Com a
vinculagáo, também do dador de leis, eles subtraem da maioria parlamen-
tarmente legitimada poderes de decisáo. Em muitos estados, este jogo deve
ser observado: a oposigáo perde primeiro no processo democrático e obtém,
entáo, diante do tribunal constitucional. Também a constituigáo brasileira
conhece essa possibilidade ao ela, no artigo 103. VII, conceder aos partidos
políticos, representados no congresso, o direito a urna demanda por causa
de anticonstitucionalidade diante do tribunal constitucional.
Esse caráter duplo dos direitos fundamentais deve ser antipático a
defensores de urna doutrina pura. Esses espreitam em ambos os lados do
problema. Existem tanto partidários de um processo democrático ilimitado
quanto ao conteúdo (em geral, eles so idealistas rousseaunianos, escondi-
dos ou abertos) corno céticos sobre democracia, para os quais existe urna
ordem dada das coisas que, pelo processo democrático, somente é posta cm
desordem e, por conseguinte, ainda, de longe mais fortemente, por direitos
fundamentais e outros princípios constitucionais, deveria ser protegida do
que isso hoje, cm geral, ocorre. Nem um nem outro pode aqui ser seguido.
A questáo deve, ao contrário, dizer se a contradigo pode ser dissolvida pelo
fato de ser encontrado um caminho entre essas posigóes extremas.
Constitucionalismo discursivo 53
politicamente, o tribunal constitucional, argumentativamente. Corn isso,
de‘e ser dito que a representacao do povo pelo tribunal constitucional tern
urn carater mais idealistic° do que aquela pelo parlamento. 0 cotidiano da
exploracao parlamentar contem o perigo que maiorias imponham-se des-
consideradamente, emocoes determinem o ocorrer, dinheiro e relacOes de
poder dominem e simplesmente sejam cometidos erros graves. Urn tribunal
constitucional que se dirige contra tal nao se dirige contra o povo, mas, em
nome do povo, contra seus representantes politicos. Ele nao so faz valer
negativamente que o processo politico, segundo criterios juridico-humanos
e juridico-fundamentais, fracassou, mas requer tambem positivamente que
os cidadaos iriam aprovar os argumentos do tribunal se eles aceitassem urn
discurso juridico-constitucional racional. 27 A representacao argumentativa
da born resultado quando o tribunal constitucional é aceito como instancia
de reflexao do processo politico. Isso é o caso, quando os argumentos do
tribunal encontram uma repercussao no public() e nas instituicOes politicas,
que levam a reflexOes e discussOes, que resultam em convencimentos revi-
sados. Se um processo de reflexao entre public°, dador de leis e tribunal
constitucional estabiliza-se duradouramente, pode ser falado de uma insti-
tucionalizacao, que deu born resultado, dos direitos do homem no estado
constitucional democratic°. Direitos fundamentais e democracia estao, en-
tao, reconciliados. Corn isso, esta fixado, como resultado, que o ideal, do
qual fala a declaracao dos direitos do homem universal, pode ser realizado
e nao precisa fracassar ern uma contradicao interna entre direitos funda-
mentais e democracia.
27
Em italico no original.
54 Robert Alexy
—3-
Constitucionalismo discursivo 55
i mposicao muito menor. Ao lado deles e de outros pactos postos mundial-
mente colocam-se convencOes regionais. Tudo isso cria comunidades subs-
tanciais.
As substanciais acrescem as comunidades sistematicas. Em toda a par-
te, onde direitos fundamentals existem, colocam-se os mesmos ou seme-
lhantes problemas. Apenas para mencionar alguns: que diferencas
estruturais existem entre direitos de defesa liberais, direitos a protecao,
direitos fundamentais sociais e direitos de cooperacao politica? Quem é o
destinatario, quem o titular de direitos fundamentais? Sob quais pressupos-
tos formals e materiais direitos fundamentais podem ser limitados? Corn
que intensidade pode urn tribunal constitucional controlar o dador de leis
sem que sejam violados o principio democratic° e o principio da divisao de
poderes? A comunidade de semelhantes questOes sobre a estrutura de direi-
tos fundamentais e jurisdicao constitucional abre, diante do fundo das co-
munidades substanciais, a possibilidade de uma ciencia dos direitos
fundamentais transcendente aos ordenamentos juridicos particulares, a qual
muito mais que uma mera comparacao de direito. 2 E a ciencia dos direitos
fundamentais ampla. 3 0 objetivo da ciencia dos direitos fundamentais am-
pla nao 6, de modo nenhum, a nivelacao das ordenacOes dos direitos funda-
mentals particulares. Ao contrario, as diferencas lhe dao sugestoes e tarefas.
Sua aspiracao vale, ao contrario, ao revelar das estruturas dogmaticas e ao
destacamento dos principios e valores que estao situados atrás das codifi-
cacoes e da jurisprudencia. 0 confuso e pouco claro pode, assim, conver-
ter-se em uma multiplicidade sistematicamente penetrada e, corn isso,
entendida no melhor sentido, que desse modo, simultaneamente, compreen-
de-se como unidade.
56 Robert Alexy
tos fundamentais cm sentido restrito. Em urna formulagáo ampla sao, pelo
contrário, também colisóes de direitos fundamentais com algumas normas
ou princípios, que tém como objeto bens coletivos, colisóes de direitos
fundamentais. Isso é o conceito de colisáo de direitos fundamentais em
sentido amplo. Ambos os tipos de colisáo so temas centrais da dogmática
dos direitos fundamentais. Sua análise leva a quase todos os problemas dessa
disciplina. Porém, antes de iniciar essa análise, deve, primeiro, o fenómeno
a ser analisado ser tomado cm consideragáo circunstanciadamente.
No existe catálogo de direitos fundamentais sem colisáo de direitos
fundamentais e também um tal no pode existir. Isso vale tanto para colisóes
de direitos fundamentais cm sentido restrito como para tais cm sentido amplo.
Constitucionalismo discursivo 57
fazer nada que possa dar atrativos a outras tomadas de refens. 0 objeto
i mediato desse dever de protecao e urn bem coletivo: a seguranca
Isso torna claro que muitas colisoes sao complexas. Justamente para corn-
preender adequadamente colisoes complexas, porem, é necessario identifi-
car claramente os elementos fundamentais dos quais elas sao compostas. 0
terceiro tipo de colisao de direitos fundamentais iguais resulta disto, que
muitos direitos fundamentais tern urn lado negativo e urn positivo. 7 Isso
especialmente claro na liberdade de crenca. Ela abrange tanto o direito de
ter e de praticar uma crenca, como o direito de nao ter uma crenca e de ficar
livre da pratica de uma crenca. Quais problemas podem resultar disso, mos-
tra a resolucao-crucifixo, uma das decisoes mais debatidas do tribunal cons-
titucional federal alemao, 8 corn toda a clareza. Nessa decisao trata-se da
questa°, se o estado pode ordenar que nas salas de aula de escolas ptiblicas
deve ser colocada uma cruz. Aqui col ide a liberdade de crenca negativa dos
nao cristaos que, assim o tribunal constitucional federal, "durante a licao,
em virtude do estado e sem possibilidades de evitacao, sao confrontados
corn esse simbolo e sao coagidos a aprender 'sob a cruz'", 9 corn a liberdade
de crenca positiva dos cristaos, "de atuar sua convicao de crenca no quadro
das instituicoes estatais".'° 0 tribunal soluciona essa "relacao de tensao
entre liberdade religiosa negativa e positiva'" ao ele interditar a colocacao
de cruzes ou crucifixos em espacos escolares publicos, em que. para a fun-
damentacao, outros pontos de vista sao citados, especialmente aquele da
neutralidade de concepcao de mundo religiosa. 12 A quarta variante de co-
lisOes dos mesmos direitos fundamentais de titulares distintos resulta quan-
do se acrescenta ao lado juridic° de urn direito fundamental, urn fatico.13
Como exemplo, seja considerada a jurisprudencia do tribunal constitucional
federal alemao sobre auxilio de custas processuais. Se se parte da igualdade
juridica, entao pobres e ricos sao tratados igualmente quando nenhum deles
recebe apoio estatal para o financiamento de custas judiciais e custas de
adn ogado. Sob o ponto de vista da igualdade Mica, porem, isso é um tra-
tamento desigual, porque do pobre, corn isso, as oportunidades de impor
seu direito sao tomadas ou estreitadasi 4 Se se fomenta, porem, o pobre,
entao se trata o rico juridicamente de outra forma como o pobre, portanto,
desigualmente, porque: "Fomentar grupos particulares sign i fica ja" tratar
7
Em italic° no original.
8
Comparar, para isso, Winfried Brugger/Stefan Huster (Hg.), Der Streit urn das Kreuz in der Schule,
Baden-Baden 1998.
9
BVerfGE 93, 1(18).
I
° BVerfGE 93,1 (24).
11
BVerfGE 93, 1(22).
12
Ebd.
13
Em italic° no original.
14
liVerfGE 56, 139 (144).
58 Robert Alexy
outros desigualmente." 15 Se se estende o princípio da igualdade tanto á
igualdade jurídica como á fática, entáo se encontra irrecusavelmente esse
paradoxo da igualdade. O paradoxo da igualdade é urna colisáo que se apre-
senta tanto mais fortemente quanto mais é realizado em estado social. No
é, por conseguinte, nenhum acaso que o tribunal constitucional federal ale-
máo enlaga a ideia da igualdade fática com o princípio do estado socia1.16
Constitucionalismo discursivo 59
Colisfies de direitos fundamentais distintos de titulares de direitos funda-
mentals distintos existem nao so no ambito dos direitos de liberdade. Elas
sao possiveis entre direitos fundamentais de qualquer tipo. Particularmente
i mportante é aquela entre direitos de liberdade e igualdade. Se se relaciona
a proibicao de discriminacao corn o ordenamento juridico todo, portanto,
tambem corn o direito privado, entao colisoes entre a autonomia privada do
empregador e o direito ao tratamento igual do empregado sao inevitaveis.
60 Robert Alexy
de direito ecológico. Visto historicamente, no meio disso está situado o
estado de direito social. O cumprimento dos postulados do estado de direito
social causa poucos problemas guando um equilibrio económico cuida dis-
to, que todos os cidadáos mesmos ou por sua familia estejam dotados sufi-
cientemente. Quanto menos isso é o caso, tanto mais os direitos
fundamentais sociais pedem redistribuigáo. Disso existem duas formas fun-
damentais. A primeira existe guando o estado, por impostos ou outros tri-
butos, proporciona-se o dinheiro que é necessário para cuidar do mínimo
existencial dos carecidos. O dever de pagar impostos, porém, intervém em
direitos fundamentais. Duvidoso é somente quais so eles: o direito de pro-
priedade ou a liberdade de atuagáo gera1. 25 Como o estado nunca cobra
i mpostos somente para a finalidade do cumprimento de postulados estatal-
-sociais, no é oportuno citar imediatamente os direitos fundamentais sociais
para a justificagáo dessa intervengo. Ao contrário. a cobranga de impostos
serve imediatamente só á produgáo da capacidade de atuar financeira do
estado. A capacidade de atuar financeira do estado é, bem genericamente,
um pressuposto de sua capacidade de atuar. O estado social pede que ela
seja consideravelmente ampliada.
A segunda forma da redistribuigáo estatal-social no sucede por tesou-
ros públicos, que antes por impostos ou outros tributos foram enchidos, mas
diretamente de um para outro cidadáo. Assim, trata-se de urna redistribui-
gáo direta de um cidadáo para outro cidadáo guando o dador de leis, para a
protegáo do inquilino, promulga prescrigóes que dificultam a rescisáo ou
li mitam as possibilidades da elevagáo do alugue1. 26 O artigo 7 da constitui-
gáo brasileira, de 5 de outubro de 1988, faz uso fortemente de urna tal
redistribuigáo direta ao, por exemplo, o inciso I prescrever urna protegáo
de rescisáo, o inciso IV um salário mínimo, o inciso XIII um horário de
trabalho máximo e o inciso XVII férias anuais pagas. O problema de tais
direitos fundamentais sociais á custa de terceiros, ou seja, do empregador,
é que, em último lugar, o mercado decide sobre isto, se eles so efetivos.
Para aquele que no encontra emprego, esses direitos andam no vazio. Aqui,
deve interessar somente que nesses direitos trata-se de uma situagáo de
colisáo complexa. Do lado do empregador, o assunto ainda é simples. Sua
liberdade empresarial é limitada. Defronte disso no está imediatamente
um direito do lado do empregado, mas somente um direito a isto, que ele
entáo, guando ele encontra um empregador que o emprega, receba um sa-
lário mínimo. Isso é um direito social condicionado. Imediatamente pelo
artigo 7 somente é criado um bem coletivo, ou seja, um estado da economia,
no qual — se essa prescrigáo for observada — existem somente postos de
25
BVerfGE 93, 121 (137 f.).
26 Comparar BVerfGE 68, 361 (367); 89, 1(5 ff.).
Constitucionalismo discursivo 61
trabalho corn salario minim°, em que a questa° sobre sua distribuicao ainda
fica completamente aberta.
62 Robert Alexy
ser transitável, porque o artigo 5, parágrafo 1, declara, pelo menos, as pres-
crigóes de direitos fundamentais desse artigo como imediatamente aplicá-
veis. 29 Mas também independente de tais ordenagóes de vinculagáo
jurídico-positivas a justiciabilidade dos direitos fundamentais deve ser exi-
gida. Direitos fundamentais so essencialmente direitos do homem trans-
formados em direito positivo." Direitos do homem insistem cm sua
institucionalizagáo. Assim, existe no somente um direito do homem á vida,
mas também um direito do homem a isto, que exista um estado que impóe tais
direitos. 31 A institucionalizagáo abarca, necessariamente, justicializagáo.
Poderia achar-se agora que a justiciabilidade no precisa ser completa
ou ampla. Assim, por exemplo, a cláusula de vinculagáo do artigo 5, pará-
grafo 1, da constitui0o brasileira, está nos direitos de defesa clássicos e
no nos direitos fundamentais sociais. Tal poderia ser entendido como con-
vite a isto, declarar os direitos fundamentais sociais como no justiciáveis.
A náo justiciabilidade, nisso, poderia estender-se a todos os direitos funda-
mentais sociais ou a alguns da respectiva constituigáo. O problema da co-
lisáo, com isso, sem dúvida, no estaria completamente solucionado,
porque existem, como mostrado, numerosas colisóes entre direitos funda-
mentais de tradigáo liberal, mas ele seria suavizado consideravelmente.
Colisóes estatal-sociais permaneceriam, conforme o objeto, sem dúvida,
mais além, possíveis se maioria parlamentar por si, portanto, sem estar
obrigado a isso pela constituigáo, torna-se ativa no campo da redistribu 4o
estatal-social. O social, porém, teria perante o liberal pouca forga, porque
ele náo se poderia apoiar cm princípios de direito. Além disso, colisóes
estatal-sociais no teriam lugar completamente se o dador de leis renun-
ciasse totalmente a atividades sociais. Onde no existe dever jurídico nada
pode colidir juridicamente. Análogo vale para o lado ecológico da consti-
tuigáo.
A todas as tentativas de suavizar o problema da colisáo pela elimina-
gáo da justiciabilidade deve opor-se com énfase. Elas so nada mais que a
solugáo de problemas jurídico-constitucionais pela aboligáo de direito
constitucional. Se algumas normas da constituigáo no so levadas a sério,
é dificil fundamentar por que outras normas também entáo devem ser leva-
das a sério se isso urna vez causa dificuldades. Ameaga a dissolugáo da
constituigáo. A primeira decisáo fundamental para os direitos fundamentais
é, por conseguinte, aquela para a sua forga vinculativa jurídica ampla em
forma de justiciabilidade.
29
Em itálico-no original.
30
R. Alexy, Grundrechte, in: Enzyklopádie Philosophie, hg. v. Hans Jürg Sandkühler, Hamburg 1999,
S. 526.
31
Ders., Die Institutionalizierung der Menchenrechte im demokratischen Verfassungsstaat, in: Stefan
Gosepath/Georg Lohmamm (Hg.), Philosophie der Menschenrechte, Frankfurt a.M. 1998, S. 254 ff.
Constitucionalismo discursivo 63
2. Regras e princiPios
A segunda decisao fundamental 6 se direitos fundamentais tern o
rater de regras ou o de principios. Na primeira decisdo fundamental trata-
va-se disto, se direitos fundamentais sao direitos; objeto da segunda é o que
eles sao como direito. Nao so a solucao do problema da colisao, mas tarn-
bem as respostas a quase todas as questoes da dogmatica dos direitos fun-
damentais geral dependem desta decisdo fundamental. Isso esclarece a
intensidade e a amplitude do litigio. Aqui, devem bastar algumas observa-
cOes a tese que a teoria dos principios dos direitos fundamentais oferece a
melhor solucao do problema da colisao.
a) A distincao
Segundo a definicao padrao da teoria dos principios, 32 principios sac)
normas que ordenam que algo seja realizado em uma medida tao alta quanto
possivel relativamente a possibilidades faticas ou juridicas. Principios sao,
33
por conseguinte, mandamentos de otimizaceio. Como tais, eles podem ser
preenchidos em graus diferentes. A medida ordenada do cumprimento de-
pende nao so das possibilidades faticas, mas tambem das juridicas. Estas
s5o, alem de regras, determinadas essencialmente por principios em sentido
contrario. As colisoes de direitos fundamentais supra descritas devem, se-
gundo a teoria dos principios, ser designadas como colisOes de principios.
0 procedimento para a solucao de colisOes de principios 6 a ponderacao.
Principios e ponderacoes sao dois lados do mesmo objeto. Urn 6 do tipo
teorico-normativo, o outro, metodologico. Quem efetua ponderacOes no
direito pressupOe que as normas, entre as quais é ponderado, tern a estrutura
de principios e quern classifica normas como principios deve chegar a pon-
deracOes. 0 litigio sobre a teoria dos principios 6, corn isso, essencialmente,
urn litigio sobre a ponderacao.
Completamente de outra forma sao as coisas nas reuas. Regras sao
normas que, sempre, so ou podem ser cumpridas ou nao cumpridas. Se uma
regra vale, 6 ordenado fazer rigorosamente aquilo que ela pede, nao mais e
nao menos. Regras contem, corn isso, fixacoes no espaco do Mica e juridi- 34
camente possivel. Elas sao, por conseguinte, mandamentos definitivos. A
forma de aplicacao de regras nao 6 a ponderacao, mas a subsuncao.
A teoria dos principios nao diz que catalogos de direitos fundamentais,
no fundo. nao contem regras, portanto, no fundo, fixacoes. Ela acentua nao
32
R. Alexy, Theorie der Grundrechte, 3. Aufl., Frankfurt a.M. 1996, S. 75 f.
33
Uma refinacao, que responde a criticos, dessa definicao corn auxilio do conceito do mandamento a
ser otimizado encontra-se em R. Alexy, Zur Struktur der Rechtsprinzipien, in: B. Schilcher/P. Kol-
ler/B.-C. Funk (Hg.), Regel. Prinzipien und Elemente im System des Rechts. Wien 2000, S. 38 f. Em
italic° no original.
34
Em italic° no original.
64 Robert Alexy
só que catálogos de direitos fundamentais, á medida que efetuam fixagóes
definitivas, tém urna estrutura de regras, mas realga também que o plano
das regras precede prima facie o plano dos princípios. 35 Seu ponto decisivo
é que atrás e ao lado das regras esto princípios. O contrário de tuna teoria
dos princípios é, por conseguinte, no urna teoria que aceita que catálogos
de direitos fundamentais também contém regras, mas urna teoria que afirma
que catálogos de direitos fundamentais compóem-se somente de regras.36
Exclusivamente tais teorias devem aqui ser designadas como "teoria das
regras".37
Constitucionalismo discursivo 65
favor de uma classificacao como manifestacao de opinido. 0 pacifista efe-
tua uma tomada de posicao valorativa para corn a profissao de soldado e
todos — sobretudo os soldados — sentem isso assim. Poderia dizer-se, quando
muito, que uma manifestacao de opiniao protegida juridico-fundamental-
mente nao existe, porque a manifestacao é uma ofensa. Porem, corn isso, a
colisao entra, outra vez, em jogo. A protecao da honra é citada como fun-
damento a isto, que nao seja concedida nenhuma protecao juridico-funda-
mental definitiva. Isso, porem, deveria ser construido sobre uma
ponderacao aberta e nao por uma formul acao estreita do ambito de protecao.
Isso vale para todas as tentativas de iludir colisOes por construcOes de am-
bitos de protecao estreitas.40
A terceira opcao da teoria das regras dos direitos fundamentais con-
siste no encaixe, livre de ponderacao, de uma excecao no direito fundamen-
tal. 4 ' Tome-se, por exemplo, o caso, supra mencionado, das advertencias
sobre prejuizos a sarlde nas embalagens de produtos de tabaco. Poderia ser
dito que a melhor solucao consiste nisto, de dotar a liberdade do exercicio
da profissao corn uma excecao, o que, aproximadamente, deixa formular-se
como segue: cada urn tern o direito de determinar livremente o modo de seu
exercicio da profissao, a nao ser que se trate de advertencias sobre prejulzos
saude nas embalagens de produtos de tabaco. Isso é uma ideia, algo bi-
zarra, de uma excecao, porque se se classifica tal como excecao, cada direito
fundamental é cercado de urn enxame quase infinito de exceciies. A isso
ajusta-se mal o conceito de excecao. Disso, aqui, porem, nao se deve tratar.
A questa° 6, ao contrario, se a "excecao", agora mesmo mencionada, pode
ser fundamentada livre de ponderacao. 42 0 texto da parte da formulacao do
direito fundamental, que concede ao cidaddo a liberdade do exercicio da
profissao, para isso nada dd. Isso vale tanto para o artigo 12, alinea 1,
proposicao 2, 43 da lei fundamental, como para o artigo 5, inciso XIII, da
constituicao brasileira. Poderia, porem, achar-se que o caso deixa subsu-
mir-se livre de ponderacao sob a clausula de barreira. Seja considerado,
aqui, somente o artigo 12, allnea I, proposicao 2, da lei fundamental. La
diz que o exercicio da profissao pode "ser regulado por lei ou corn base em
uma lei". 44 Se se subsume sob esta formulacao, entao se pode, de fato,
rapidamente e sem qualquer problema, cornprovar livre de ponderacao que
o clever de colocacao de advertencias em produtos de tabaco é uma regula-
40 Comparar, para isso, R. Alexy, Theorie der Grundrechte (nota 32), S. 278 ff.
41
Em italic° o
42
Entre aspas no original.
43
Nota do tradutor: artigo 12, alinea I, da lei fundamental: todos os alemdes t8m o direito de escolher
livremente profissao, posto de trabalho e centros de formacao. 0 exercicio da profissdo pode ser
regulado por lei ou corn base em uma lei.
" Entre aspas no original.
66 Robert Alexy
gáo com base em urna lei. 45 Com isso o problema da colisáo está solucio-
nado? A teoria das regras venceu?
Precisa olhar-se somente sobre as consequéncias de um tal proceder
para reconhecer que isso no é o caso. Doces, cucas e tortas sao, segundo
convicgáo propagada, menos sadios para os dentes que pdo. Suponha-se que
um partido de fanáticos de saúde obtém a maioria no parlamento. Ele proíbe
aos padeiros e a todos os outros a produgáo de doces, cucas e tortas. Poste-
riormente, também é proibido o páo de trigo e somente ainda admitido páo
de centeio. Isso é, sem dúvida, urna intervengo na liberdade do exercício
da profissáo dos padeiros. É, porém, também, sem dúvida, urna intervengo
que resulta "por lei". Se isso devesse bastar para a justificagáo da interven-
go, o direito fundamental perderia, perante o dador de leis. qualquer forga.
O direito fundamental, sob esse aspecto, andana no vazio. O dever do páo
de centeio seria de acordo com a constituigáo.
Constitucionalismo discursivo 67
Quanto mais intensiva e uma intervencao em urn direito fundamen-
tal, tanto mais graves devem pesar os fundamentos que a justificam.
Segundo a lei da ponderacao, a ponderacao deve realizar-se em tres
graus. No primeiro grau deve ser determinada a intensidade da intervencao.
No segundo grau trata-se, entao, da importancia dos fundamentos que jus-
tificam a intervencao. Somente no terceiro grau realiza-se, entao, a ponde-
raga° no sentido restrito e verdadeiro.
Muitos acham que a ponderacao nao e urn procedimento racional. A
possibilidade do exame de tres graus mostra que o ceticismo da ponderacao
e nao autorizado. Seja, para isso, outra vez, dada uma olhada no caso-tabaco
e no caso-padeiro. No caso-tabaco, a intervencao na liberdade de profissao
tern somente uma intensidade muito reduzida. A inch:Istria de tabacos pode,
ademais, tambem por propaganda, ser ativa. Ao fumante e, como o tribunal
acertadamente diz, tornado "consciente somente um fundamento de consi-
deracao que, segundo o estado de conhecimento medico atual, deveria ser
universalmente consciente"." Os fundamentos que justificam a interven-
cao, a repressao dos danos sanitarios provocados pelo fumo que, muitas
vezes, tern como consequencia a morte, pelo contrail°, pesam gravemente.
A ponderacao leva, portanto, quase coercitivamente a solucao da colisao:
a intervencao na liberdade da profissao e de acordo corn a constituicao. No
caso-padeiro, as coisas estao situadas ao contrario. A proibicao de produzir
doces, cucas e tortas intervem muito intensivamente na liberdade de pro-
fissao do padeiro. Isso ainda e intensificado quando acresce a proibicao do
p5o de trigo. A sairde e, como mostra o caso-tabaco, sem thivida, um bem
de alta hierarquia, mas deve ser diferenciado. Aqui, trata-se, sobretudo, de
en ferm idades dos dentes pelo consumo de comidas doces e macias. I mpedir
isso nao e insignificante, contudo, no maxim°, de peso mediano. Corn isso,
tambem no caso-padeiro o resultado esta fixado: a regulacao que esta em
questa° seria anticonstitucional. Pois bem, ambos os casos sao muito sim-
ples. Existem numerosas colisoes, cuja solucao nao 6 tao simples, mas causa
grandes dificuldades. Tais casos existem, por exemplo, entao, quando tanto
a intervencao e muito intensiva como os fundamentos que a justificam pe-
sam muito gravemente. 0 supra mencionado caso-tomada de refem e desse
tipo. Tornam-se entao necessarios outros argumentos e e bem possivel que nao
se pode acordar sobre a solucao. Isso, contudo, nao e uma objecao contra a
ponderacao, mas uma qualidade geral de problemas praticos ou normativos.
d) Vinculacao e flexibilidade
A teoria dos principios e capaz nao so de estruturar racionalmente a
solucao de colisOes de direitos fundamentais. Ela tern, ainda, uma outra
48
BVerfGE 95, 173 (187).
68 Robert Alexy
qualidade que, para os problemas teórico-constitucionais a ser tomados em
consideragáo aqui, tem grande importáncia. Ela possibilita um caminho
intermediário entre vinculagáo e flexibilidade. A teoria das regras conhece
somente a alternativa: validez ou no validez. Em urna constituigáo como
a brasileira, que conhece direitos fundamentais numerosos, sociais genero-
samente formulados, nasce sobre esse fundamento uma forte pressáo de
declarar todas as normas no plenamente cumpríveis, simplesmente, como
no vinculativas, portanto, como meras proposigóes programáticas. A teo-
ria dos princípios pode, pelo contrário, levar a sério a constituigáo sem
exigir o impossível. Ela declara as normas no plenamente cumpríveis
como princípios que, contra outros princípios, devem ser ponderados e,
assim, esto sob ultra "reserva do possível no sentido daquilo que o indiví-
duo pode requerer de modo razoável da sociedade". 49 Com isso, a teori a dos
princípios oferece no só urna solugáo do problema da colisáo, mas também
urna do problema da vinculagáo.
49
BVerfGE 33, 303 (333).
Constitucionalismo discursivo 69
—4 —
I. Problemas e programa
1. Forca de validez formal e densidade de
normalizacclo material
A proposicao. que tipo e extensao dos problemas da relacao entre
direito constitucional e direito ordinario, assim como entre jurisdicao cons-
titucional e jurisdicao especializada sao determinados, essencialmente, por
dois fatores, que podem ser designados coma forca de validez formal e
densidade de normalizacao material da constituicao, pode ser considerada
coma acertada a todas as constituicOes. A lei fundamental 6, por suas orde-
nacoes de vinculacao, que expressam a primazia da constituicdo, no artigo
20, alinea 3,' e artigo 1, alinea 3, 2 da lei fundamental, assim como por sua
* Esta palestra foi proferida em Wiirzburg, na quinta-feira, dia 4 de outubro de 2001, na Jornada dos
Professores de Direito do Estado. Ela vai sair nas Publicacoes da Associacao dos Professores de Direito
do Estado Alemaes (VVDStRL), v. 61, p. 7 et seq., em 2002. Sua traducao foi autorizada pela propria
editora Walter de Gruyter. Ela tambem se encontra impressa em: revista dos tribunais, v. 799, p. 33 et
seq., maio 2002; revista dos tribunals, v. 809, P. 54 et seq., marco 2003. A presente versa) foi revisada.
Titulo no original: Verfassungsrecht und einfaches Recht — Verfassungsgerichtsbarkeit und Fachge-
richtsbarkeit.
I
Nota do tradutor: artigo 20, althea 3, da lei fundamental: a dacao de leis esti vinculada a ordem
constitucional. o poder executivo e a jurisdicao, A lei e ao direito.
2
Nota do tradutor: artigo I, alinea 3, da lei fundamental: os direitos fundamentals que seguem vinculam
dacao de leis, poder executivo e jurisdicao como direito imediatamente vigente.
Constitucionalismo discursivo 71
autorizagáo e obrigagáo ampla do tribunal constitucional federal para o
controle dessas vinculagóes, urna constituigáo de validade extremamente
formal. Urna tal medida máxima é relativamente náo problemática, enquan-
to a densidade de norinalizagáo material é li mitada e essa limitagáo é cla-
ramente determinável. Problemas sérios nascem, porém, guando a
densidade de normalizagáo é indeterminável ou é liberada dos limites.3Essa
conexáo é desde há muito conhecida. Assim Hans Kelsen, no congresso de
Viena de nossa associagáo, no ano de 1928, vinculou seu discurso de defesa
de um tribunal constitucional 4 náo só com a exigéncia que a constituigáo
deve determinar, "táo precisamente quanto possível, os preceitos, linhas
diretivas, barreiras..." materiais a serem controlados pelo tribunal consti-
tuciona1, 5 mas também com a adverténcia sobre um "papel extremamente
perigoso - , que "valores" ou "princípios" como, por exemplo, "liberdade"
e "igualdade", "por falta de urna determinagáo mais circunstanciada", "jus-
tamente no ámbito da jurisdigáo constitucional", podem desempenhar. 6 Ao
tribunal constitucional pode, por meio deles, "(ser) concedida urna plenitu-
de de poderes, que absolutamente deve ser sentida como insuportável".7
Forga de validez formal extrema é, assim diz a mensagem de Kelsen, so-
mente suportável sob a condigáo de densidade de normalizagáo material
suficientemente limitada e determinável.
72 Robert Alexy
equivocadamente, designou como valores e normas objetivas, 1 ° mais tarde,
entao, dotou-as de descricOes tao amplas como "funcao juridico-objetiva
como norma de principio decididora de valores'"," mas tambern, simples-
mente, titulou como "principios", 12 o que tambem deve suceder aqui." Corn
isso, o postulado de Kelsen da forca de validez formal foi, com a interpre-
tacao de Smend do catalogo de direitos fundamentais como expressao de
urn "sistema de valores ou de bens, um sistema de cultura", 14 unido. 15 A
segunda ideia entende-se quase por si mesma em vista do artigo 1, alinea
3, 16 da lei fundamental. Se os direitos fundamentais vinculam todos os tres
poderes e tambem sao principios, entOo des vinculam tambem todos os tres
poderes como principios. Mas, como principios ou valores, eles podem ser
correspondentes em toda a parte. Produz-se a ubiquidade dos direitos fun-
damentais que, corn o conceito de irradiacao em "todos os ambitos do
direito", I7 sem drivida, é descrito algo plasticamente, mas o micleo acerta-
damente. A terceira ideia resulta da estrutura daquilo que o tribunal cons-
titucional federal, naquele tempo, designou como "valor". Valores ou
principios tern o costume de colidir. A proposicao central para o cotidiano
juridico da sentenca-Liith, por isso, diz: "Torna-se necessaria, por conse-
guinte, uma `ponderacao de bens — . 18 Isso tem, como o tribunal constatou
corn nitidez, consequencias: "Uma ponderacao incorreta pode violar o di-
reito fundamental e, assim, fundamentar o recurso constitucional para o
tribunal constitucional federal". 19 A ideia smendiana sac, implantados, as-
sim, dentes kelsenianos.
A triade de valor ou principio, irradiacao e ponderacao fora introdu-
zida para contribuir a validez dos direitos fundamentais no direito civil.
Hoje, isso é formulado, mais precisamente, corn auxilio da figura, empregada
em todos os campos do direito, do direito A protecao. 2 ° Direito A organizacao
10
BVerfGE 7, 198, 205.
11
BVerfGE 77, 170, 214.
12
BVerfGE 81, 242, 254.
13
Comparar Alexy Theorie der Grundrechte, 3. Aufl., 1996, 71 ff.
14
Smend Verfassung und Verfassungsrecht (1928), in: ders., Staatsrechtliche Abhandlungen, 3. Aufl.,
1994, 264.
15
Smend emprega, ao lado do conceito de valor, tambem o conceito de principio; comparar dens. Das
Recht der freien MeinungsauBerung. VVDSIRL 4 (1928), 47: "principios de direitos fundamentais."
16
Nota do tradutor: ver nota 2, supra.
17
BVerfGE 7, 198, 205.
18
BVerfGE 7. 198, 210.
19
BVerfGE 7. 198. 212.
20
Comparar BVerfGE 39, 1, 42; 46, 160, 164 f.; 88, 203, 251 ff.; 89, 214, 231 f.; 97, 169, 176, assim
como Isensee Das Grundrecht auf Sicherheit. 1983; Hermes Das Grundrecht auf Schutz von Leben und
Gesundheit, 1987; Robbers Sicherheit als Menchenrecht, 1987; Dietlein Die Lehre von den grundrech-
tlichen Schutzpflichten, 1992; Unruh Zur Dogmatik der grundrechtlichen Schutzpflichten. 1996; Ca-
!Innis Grundrechte und Privatrecht, 1999.
Constitucionalismo discursivo 73
e procedimento 2 ' e prestagóes positivas fáticas 22 associaram-se e a intensi-
ficagáo do princípio da igualdade geral para o critério de um, orientado
pelos "requisitos de proporcionalidade", "exame rigoroso" 23 fez mais do
que o necessario.
21 Comparar BVerfGE 35, 79, 116; 52, 380. 389 f.; 53, 30, 65 f.; 73, 280, 296; 90, 60. 96, assim como
Haberle Grundrechte im Leistungsstaat. VVDStRL 30 (1971), 80 ff.; Nesse Bestand und Bedeutung
der Grundrechte in der Bundesrepublik Deutschland, EuGRZ 1978, 434 ff.; Goerlich Grundrechte als
Verfassungsgarantien, 1981; Denninger Staatliche Hilfe zur Grundrechtsausübung durch Verfahren,
Organization und Finanzierung, HStR V. § 113 Rn. 1 ff.
22 Comparar BVerfGE 33, 303, 333; 40. 121, 133; 45, 187, 228; 74, 40, 62 f.; 82. 60, 85; 87, 153, 171;
90, 107. 115, assim como Murswiek Grundrechte als Teilhaberechte, soziale Grundrechte, HStR V, §
112 Rn. 86 ff.; Borowski Grundrechte als Prinzipien, 1998, 289 ff.
23
BVerfGE 88, 87, 96 f.; comparar, além disso, BVerfGE 55, 72, 88; 84, 197, 199; 99, 129. 139, assim
como Kirchhof Der allgemeine Gleichheitssatz, HStR V, § 108 Rn. 215 ff.; Nesse Der allgemeine
Gleichheitssatz in der neueren Rechtsprechung des Bundesverfassungsgerichts zur Rechtsetzungs-
gleichheit, FS Lerche, 1993, 121 ff.; Huster Rechte und Ziele, 1993; Sachs Die MaBstabe des allge-
meinen Gleichheitssatzes - Wilkürverbot und sogenannte neue Formel. JuS 1997. 124 ff.
24
Comparar Schuppert/Bumke Die Konstitutionalizierung der Rechtsordnung. 2000.
25
Aos conceitos de constitucionalizaQáo direta e indireta correspondem os conceitos da anticonstitu-
cionalidade direta e indireta; comparar Kelsen (Fn. 4), 39 f., que, ao lado de "direto" e "indireto",
também emprega as express6es "imediato - e "mediato", e Papier "Spezifisches Verfassungsrecht"
und "Einfaches Recht" als Argumentationsformel des Bundesverfassungsgerichts, FG Bundesverfas-
sungsgericht, Bd. 1, 1976, 435.
Ao lado disso, entram cm considernao infracóes contra reservas de lei jurídico-fundamentais e
contra a proibilao de arbitrariedade do artigo 3, alínea 1, da lei fundamental [Todas as pessoas sao,
diante da lei, iguais.]; comparar Voflkithle, in: v. Mangolt/Klein/Starck. GG III. Art. 39 Rdnr. 55;
Jestaedt Verfassungsrecht und einfaches Recht - Verfassungsgerichtsbarkeit und Fachgerichtsbarkeit,
DVBI. 2001, 1310.
27
Ver supra, nota 1.
28
H.-J. Koch Bundesverfassungsgericht und Fachgerichte, OS Jeand'Heur, 1999, 136.
29
BVerfGE 6, 32.
30
Comparar Schumann Verfassungs- und Menchenrechtsbeschwerde gegen richterliche Entscheidun-
gen, 1963, 196 f.; Papier (F. 25), 434; Ossenbühl Verfassungsgerichtsbarkeit und Fachgerichtsbarkeit,
FS Ipsen. 1977, 137 f.
74 Robert Alexy
Os problemas que a constitucionalizacao indireta ou formal prepara
na relacdo jurisdicao constitucional e jurisdicao especializada devem ficar
fora de consideracao. Minhas exposicoes irao limitar-se completamente
constitucionalizacao material ou direta. Essa leva, na relacao entre jurisdi-
cao constitucional e jurisdicao especializada, fundamentalmente, As mes-
mas questoes como na relacao entre tribunal constitucional e dador de leis,
o que tern o seu fundamento na ideia nuclear acertada da formula de Schu-
mann, 3 ' que nenhum tribunal deve tomar por base para a sua decisao uma
regra que -nem sequer o dador de leis poderia ordenar". 32 Somente esse
aspecto deve, aqui, interessar.
4. Constitucionalizacao, sobreconstitucionalizacdo,
subconstitucionalizacdo
A constitucionalizacao material foi sempre acompanhada de objecoes.
Seja somente lembrada a critica mordaz de Carl Schmitt 33 e Ernst Forst-
hoff. 34 Em tempo mais recente, Bockenforde continuou a fiar esse fio. Pela
transformacao dos direitos fundamentais "de principios e garantias na re-
lacao cidadao-estado em principios supremos do ordenamento juridic° no
total" 35 perde a constituicao o carater de uma ordenacao-quadro e conver-
te-se em "ordenacao fundamental juridica da coletividade", 36 que "ja
contern o ordenamento juridic° no total ... - no piano das normas-principios
corn tendencia de otimizacao". 37 0 tribunal constitucional esta obrigado a
i mpor isso por decisOes de ponderacao. 38 0 processo politico democratic°
perde em significado, 39 e a "passagem do estado-dador de leis parlamentar
para o estado-jurisdicao judicial-constitucional" nao pode mais ser deti-
da."
A diagnose de Bockenforde de uma sobreconstitucionalizacao deixa
transferir-se facilmente A relacao entre jurisdicao constitucional e jurisdi-
31
Schumann (Fn. 30), 334, circunstanciado 206 f.; comparar para isso Berkemann Das Bundesverfas-
sungsgericht und "seine" Fachgerichtsbarkeiten. DVBI. 1996, 1032 f.; Starck Verfassungsgerichtsbar-
keit und Fachgerichte, JZ 1996. 1039; Robbers Hi- ein neues Verhaltnis zwischen
Bundesverfassungsgericht und Fachgerichtsbarkeit. NJW 1998, 936; Koch (Fn. 28), 139, 146 ff.; Je-
staedt (Fn. 26), 1321; Diewel Kontrollbefugnisse des Bundesverfassungsgerichts bei Verfassungsbe-
schwerden gegen gerichtliche Entscheidungen, 2000, 65 ff., 264 f.
32
BVerfGE 89, 28, 36; comparar, ademais. BVerfGE 79, 283, 290; 81, 29.31 f.; 82, 6, 15 f.; 84, 197.
199; 84. 372, 379.
33
C. Schmitt Die Tyrannei der Werte. ES Forsthoff, 1967, 60 ff.
34
Forsthoff Zur heutigen Situation einer Verfassungslehre, FG C. Schmitt. 1968, 185 ff.
35
Bockenforde (Fn. 8), 188.
36
Ders. (Fn. 8), 198.
37
Ders. (Fn. 8), 189.
38
Ders. (Fn. 8), 196.
39
Ders. (Fn. 8), 197.
40 Ders. (Fn. 8), 190.
Constitucionalismo discursivo 75
gáo especializada. Se a constituigáo realmente já contivesse em si todo o
ordenamento jurídico, isso seria, portanto, o que Forsthoff sarcasticamente
denominou de "ovo do mundo jurídico - , 4 ' entáo ela determinaria comple-
tamente o lado normativo de cada decisao judicial especializada. O tribunal
constitucional entáo mal poderia escapar do papel de urna instáncia de su-
per-reviso e precisaria, entre outras coisas, como Diederichsen o formula
em crítica rude, converter-se em um "tribunal civil supremo". 42 Seria um
Moloc devorador de duas vítimas: os outros poderes e o proprio.
É exata a diagnose da sobreconstitucionalizagao? O desenvolvimento
dos últimos 50 anos foi um desenvolvimento defeituoso, que carece de
corregáo fundamental? Minha resposta diz: nao.
A linha-Lüth está, em geral, correta. Naturalmente, erros foram come-
tidos e espreitam sempre em toda parte perigos. Estes, porém, podem ser
combatidos com meios que sao imanentes á estrutura dos princípios cons-
titucionais e, com isso, á estrutura da constituigáo que os abarca. Algá-los
á luz é tarefa de lima dogmática dos espagos. Ela no pode ser substituída
pelas grandes fórmulas do debate da constitucionalizagao. Se é direcionado
para a diferenga entre lei e política, 43 entre defesa e protegao, 44 entre normas
de atuagáo e normas de controle, 45 entre critérios materiais e jurídico-fun-
cionais" ou entre intervengo e formagao 47 ou se é recomendada a limitagáo
a posigóes mínimas" ou a métodos económicos," em toda a parte algo ou
alguma coisa parece ser verdade, porém, nada basta. A forga de condugáo
41
Forsthoff Der Staat der Industriegesellschaft, 2. Aufl., 1971, 144.
42
Diederichsen Das Bundesverfassungsgericht als oberstes Zivilgericht — ein Lehrstück der juristi-
schen Methodenlehre. in: AcP 198 (1998), 171 ff.
43
Comparar E. Kaufmann Die Grenzen der Verfassungsgerichtsbarkeit. VVDStRL 9 (1952). 3 ff.;
Leibholz Der Status des Bundesverfassungsgerichts, JOB 6 (1957), 120 ff.
" Comparar Bückenfürde (Fn. 8), 183 f, 194.
45
Comparar Forsthoff über MaBnahmegesetze, in: ders. Rechtsstaat im Wandel, 2. Autl., 1976, 117
f.; Bryde Verfassungsentwicklung 1982, 335 ff.; Krebs Kontrolle in staatlichen Entscheidungsprozes-
sen, 1984, 102.
46
Comparar Ehmke Prinzipien der Verfassungsinterpretation. VVDStRL 20 (1963), 73; Schuppert
Funktionell-rechtliche Grenzen der Verfassungsinterpretation, 1980; Hesse Funktionelle Grenzen der
Verfassungsgerichtsbarkeit, FS Huber, 1981. 261 ff.; Heun Funktionell-rechtliche Schranken der Ver-
fassungsgerichtsbarkeit, 1992, 49 ff.
47
Comparar Gellermann Grundrechte in einfachrechtlichem Gewande, 2000, 57 ff., 350 ff.
48
Deve ser diferenciado entre teorias das posigóes mínimas absolutas e relativas. Urna teoria da posigáo
mínima absoluta sustenta quem determina a posigáo mínima sem recurso ao princípio da proporciona-
lidade cm sentido restrito, portanto, livre de ponderagáo; comparar, por exemplo, Schlink Abwágung
im Verfassungsrecht, 1976, 78 f.; 193 f. O problema é como isso deve ser possfvel. Teorias relativas
determinam a posigáo mínima, pelo contrário, rigorosamente, por aquilo que a teoria absoluta quer
evitar: por urna ponderagáo; comparar, por exemplo, Hain Die Grundsátze des Grundgesetzes, 1999,
193 ff. A figura da posigáo mínima perde, com isso, o caráter de urna alternativa auténtica para a
ponderagáo. lsso mostra que coisa extremamente diferente apresenta-se sob a etiqueta "posigáo míni-
49
Comparar Forsthoff Zur Problematik der Verfassungsauslegung, 1961, 34 ff.; Jestaedt Grundrechts-
entfaltung im Gesetz, 1999, 329 ff.
76 Robert Alexy
dos criterios oferecidos é ou muito difusa. de forma que demais fica aberto,
ou ela vai demais em direcao a uma subconstitucionalizacao, que do mesmo
modo deve ser evitada como uma sobreconstitucionalizacao. 5 ° Uma cons-
titucionalizacao adequada somente é possivel obter sobre o caminho, pe-
dregoso e rico em manhas, de uma dogmatica do espaco. Ela estende-se,
como o problema da constitucionalizacao, no fundo, alem do ambito dos
direitos fundamentais. Mas ela tern, aqui. o seu ponto essencial e de partida.
Eu irei, por isso, limitar-me a esse campo.
I. Ordenagio-quadro
Uma constituicao fixa ao dador de leis, rigorosamente. entao, urn qua-
dro, quando eta the profile alguma coisa — por exemplo, por direitos de
defesa ordena alguma coisa — por exemplo, por direitos de protecao — e
alguma coisa nem proibe nem ordena, portanto, libera. 0 proibido pode
designar-se juridico-constitucionalmente como impossivel. o ordenado ju-
ridico-constitucionalmente como necessario e o liberado juridico-constitu-
cionalmente como possivel. 0 liberado ou possIvel reside no quadro, o
proibido ou impossivel forma, juntamente corn o ordenado ou necessario,
o quadro. 0 conceito de espaco define-se sob este fundamento como que
por si: tudo e somente isto que esta liberado reside no espaco.
2. Ordenaccio fundamental
Nao e necessario realcar que isso 6 um conceit° de espaco e de quadro
completamente formal. Isso fica claro quando se o poe em relacao corn o
conceit° de ordenacao fundamental. 0 conceito de ordenacao fundamental
50 Trata-se de urn "caminho intermediario" ; comparar H. H. Klein Der demokratische Grundrechts-
staat, Bitburger Gesprache. Jahrbuch 1995/1. 85.
51
Comparar Wahl (Fn. 3). 507; Bockenforde (Fn. 8), S. 198; Starck (Fn. 31), 1038 f.
52
Backenforde Verfassungsgerichtsbarkeit: Strukturfragen, Organization, Legitimation, NJW 1999, 13.
Constitucionalismo discursivo 77
pode ser formulado quantitativa ou qualitativamente. Urna constituigáo é
urna ordenagáo fundamental no sentido quantitativo, guando ela no libera
nada, portanto, para tudo tem á disposigáo ou um mandamento ou urna
proibigáo. Isso é o ovo do mundo de Forsthoff. Tal coisa Lerche tem em
vista, guando ele, cm um jogo de ideias, constrói o extremo do "caso con-
trário rigoroso" da ordenagáo-quadro. 53 Nenhum conceito contrário para
com a ordenagáo-quadro é, pelo contrário, o conceito de ordenagáo funda-
mental qualitativo. Urna constituigáo é urna ordenagáo fundamental quali-
tativa, guando ela decide aquelas questóes fundamentais da comunidade,
que so suscetíveis e carecidas de decisáo por urna constituigáo. Esse con-
ceito de ordenagáo fundamental é compatível com aquele da ordenagáo-
-quadro. Urna constituigáo pode decidir questóes fundamentais e, sob esse
aspecto, ser urna ordenagáo fundamental e, contudo, deixar muitas coisas
cm aberto e, sob esse aspecto, ser urna ordenagáo-quadro.
Com tudo isso ainda nada está dito sobre isto, que questóes, como
que stóes fundamentais, podem e devem ser decididas por urna constituicáo
e quais, como tais questóes, esto decididas pela lei fundamental. Isso so
problemas da teoria da constituigáo material, assim como da dogmática
dos direitos fundamentais geral e especial, para a qual, aqui, no tem
espago. Pelo menos, porém, também sua resposta depende, essencial-
mente, da questáo, a ser aqui somente perseguida, se urna compreensáo
fundamental da constituigáo, que segue a linha-Lüth, pode, no fundo, con-
seguir um equilibrio correto entre ordenagáo fundamental e ordenagáo-qua-
dro. Isso determina-se segundo sua capacidade para a solugáo de problema
de espago.
III. Espagos
O tribunal constitucional federal fala muito de espagos. A terminolo-
gia é rica. Ao lado da simples palavra "espago" 54 encontram-se as expres-
sóes "espago de estimativa, de valoragáo e de configuragáo", 55 "espago de
apreciagáo", 56 "espago de atuagáo", 57 "espago de decisáo", 58 "espago de
prognose", 59 "espago de experiéncia e de adaptagáo", 6 ° "espago de interpre-
53
Lerche Die Verfassung in der Hand der Verfassungsgerichtsbarkeit?, in: Macke (Hrsg.). Verfassung
und Verfassungsgerichtsbarkeit auf Landesebene, 1998, 216.
54
Comparar BVerfGE 89, 214, 234.
55
Comparar BVerfGE 88, 203, 262.
56
Comparar BVerfGE 90, 145, 173.
57
Comparar BVerfGE 39, 210, 225.
58
Comparar BVerfGE 95, 335, 350.
59
Comparar BVerfGE 50, 290. 332.
6
° Comparar BVerfGE 56, 54, 82.
78 Robert Alexy
tacao", 61 "espaco de avaliacao" 62 e "espaco de ponderacao". 63 Acresce a
isso um flamer° nao estimavel de enlaces que, sem dtivida, nab empregam
o conceito de espaco, contudo, designam o mesmo ou analog°, como "zona
de configuracao", 64 "espaco livre de configuracao", 65 "poder de configura-
c a e " , 66 e "liberdade de configuracao", 67 "primazia de prognose"" e "prer-
rogativa de decisao".69
I. Espacos estruturais
Se se olha mais rigorosamente, entao se encontra rapid° a dicotomia
decisiva. E a diferenca entre espacos estruturais e espacos epistemicos ou
de conhecimento.
0 espaco estrutural é definido por nada mais que pela ausencia de
mandamentos e probklies definitivos. 7 ° 0 que a constituicao nem ordena
nem proibe, ela libera. 71 Ao espaco estrutural, corn isso, pertence tudo que
a constituicao libera ou deixa livre definitivamente. Espacos estruturais
iniciam, portanto, rigorosamente au i onde termina a normatividade material
definitiva da constituicao. Como o controle judicial-constitucional é exclu-
sivamente controle no criterio da constitukao, segue forcosamente que la,
onde irlicia o espaco estrutural, cada controle judicial-constitucional ter-
mina.
0 espaco epistemico ou de conhecimento e" de tipo completamente
diferente. Ele nao nasce dos limites daquilo que a constitukao ordena e
prolbe, mas dos limites da capacidade de reconhecer do que a constituicao,
por urn lado, ordena e profbe e, por outro, nem ordena nem profbe, portanto,
libera. Se se quer afilar as coisas, pode dizer-se que o espaco epistemico
nasce dos limites da capacidade de reconhecer dos limites da constitukao.
No espaco estrutural, consideraciies juridico-funcionais ou principios for-
61
Comparar BVerfGE 95, 28. 38.
62 Comparar BVerfGE 99, 341, 353.
63
Comparar BVerfGE 96, 56, 66.
64 Comparar BVerfGE 81, 242, 255.
Comparar BVerfGE 97, 169. 176.
66 Comparar BVerfGE 64, 72, 85.
67
Comparar BVerfGE 77, 170, 215.
Comparar BVerfGE 87, 363, 383.
Comparar BVerfGE 90, 145, 183.
70 A ausencia de mandamentos-prima facie e proibicoes-prima facie ndo 6 necessaria para a existencia
de urn espaco estrutural. Au dador de leis ja prima facie e proibido intervir no ambito de protecdo de
um direito fundamental. Se a intervened°. porem, 6 de acordo corn a constituicao, formal e material-
mente, entao eta esta definitivamente permitida. Trata-se disso, e somente disso, na questa() sobre a
existencia de um espaco estrutural. Para a distilled° entre proibicoes definitivas e prima facie e man-
damentos, comparar Alexy (Fn. 13). 87 ff.
71
Alexy (Fn. 13). 185.
Constitucionalismo discursivo 79
mais náo desempenham nenhum papel. Os problemas dos espagos episté-
micos, pelo contrário, sem eles no podem ser solucionados. Existem trés
espagos estruturais: o espago de determinagáo da finalidade, o espago de
escolha médio e o espago de ponderagáo.
72
A proibiláo abstrata de urna finalidade tem caráter de regra; para o conceito de regra. comparar
Alexy (Fn. 13), 76 ff.
73
Comparar. por exemplo, BVerfGE 46. 160, 164 f.
74
Alexy (Fn. 13), 422 f.
75
Comparar. por exemplo, BVerfGE 97, 169, 176.
76
Comparar para isso Borowski (Fn. 22), 1998, 140 ff.
80 Robert Alexy
c) Espaco de ponderacao
0 espaco de ponderacao e a parte nuclear da dogmatica-quadro. Como
o problema da constitucionalizacao deve ser solucionado, depende, essen-
cialmente, da solucao do problema da ponderacao. Nao é, por conseguinte,
nenhum exagero, quando Ossenbiihl diz que a "questa° sobre a ponderacao
no direito constitucional ..." contem "questoes fundamentais e de existen-
cia da jurisprudencia constitucional e do ordenamento juridico no total".77
0 mandamento de ponderacao é identico ao terceiro prinapio parcial do
principio da proporcionalidade. No problema do espaco de ponderacao tra-
ta-se, por isso, do papel da proporcionalidade na dogmatica-quadro.
facil de reconhecer que ambos os primeiros principios parciais sao
criterios-quadro genuinos. Isso é o mais claro no principio da idoneidade.
Se uma prova de conhecimento especializado comercial, como pressuposto
para a autorizacao do estabelecimento de urn automatic° de cigarros, viola
o artigo 12, 78 da lei fundamental, porque ele nao é idoneo para proteger os
consumidores, 79 entao ao dador de leis é tracado negativamente um limite.
Analog° vale para o princlpio da necessidade. Quando o tribunal constitu-
cional federal declara anticonstitucionais os §§ 2232, 80 2233, 8 ' do codigo
civil alemao, e o § 31, 82 da lei de autenticacao, a medida que eles vedam a
pessoas capazes de testar, que nem podem escrever nem falar, a possibili-
dade de redacao do testamento, e isso fundamenta corn isto, que uma ex-
clusao de urn mudo. incapaz de escrever, de toda possibilidade de testar nao
necessaria para obter os objetivos, perseguidos pelas prescricOes juridi-
co-civis mencionadas, da seguranca juridica e da protecao de pessoas nao ca-
77
Ossenbahl, Abwagung im Verfassungsrecht. DVBI. 1995, 911.
78
Nota do tradutor: artigo 12 da lei fundamental: ( I) Todos os alemaes tern o direito de escolher
livremente profissao, posto de trabalho e centros de formacao. 0 exercicio da profissao pode ser
regulado por lei ou corn base em uma lei. (2) Ninguem pode ser coagido a urn determinado trabalho,
exceto no quadro de urn dever de prestacao de servico usual, geral, publico para todos igual. (3)
Trabalho forcado somente C admissfvel em uma retirada da liberdade judicialmente ordenada.
79
BVerfGE 19, 330, 338 f.
80
Nota do tradutor: § 2232 do codigo civil: [Testamento ptiblico] Pela minuta de urn notario urn
testamento C estabelecido, ao o testador declarar oralmente sua Ultima vontade ao notario ou !he entre-
gar uma escritura corn a declaracao que a escritura contem sua Ultima vontade. 0 testador pode entregar
a escritura aberta ou fechada; ela nao precisa ser escrita por ele.
81
Nota do tradutor: § 2233 do cOdigo civil: [Casos especiais de estabelecimento] (1) Se o testador
menor. entao ele pode estabelecer o testamento somente por declaracao oral ou por entrega de uma
escritura aberta. (2) Se o testador, segundo seus dados ou segundo o convencimento do notario, nao
esta em condiceies de ler documentos, entao ele pode estabelecer o testamento somente por declaracao
oral. (3) Se o testador, segundo seus dados ou segundo o convencimento do notario. nao C capaz de
falar suficientemente, entao ele pode estabelecer o testament° somente por entrega de uma escritura.
82
Nota do tradutor: § 31 da lei de autenticacao: [Entrega de uma escritura por um mudol Urn testador,
que segundo seus dados ou segundo o convencimento do notdrio no 6 capaz de falar suficientemente
(§ 2233, alfnea 1, cOdigo civil) deve, na negociacao, escrever de proprio punho na minuta ou em urn
papel especial, que deve ser juntado a minuta, a declaracao que a escritura entregue contem sua Ultima
vontade. 0 minutar de prOprio punho da declaracao deve ser comprovado na minuta. A rninuta nao
precisa ser particularmente autorizada pelo part icipante aleijado.
Constitucionalismo discursivo 81
pazes de autodeterminagáo, porque no caso de mudos incapazes de escrever,
guando eles sao capazes de autodeterminacao, so imagináveis, como meio
mais atenuado, procedimentos de autenticagáo que obtém aqueles objetivos
também, mas limitam menos a liberdade de testar, 83 entao o tribunal limita
o espago do dador de leis civil em urna forma negativa, sem o determinar
positivamente. Isso é fixagáo-quadro. Simultaneamente, trata-se de otimiza-
gáo, urna vez que os princípios da idoneidade e da necessidade pedem aqui,
como noutra parte, nada mais que urna realizagáo táo ampla quanto possível
dos princípios correspondentes, cada vez, relativamente ás possibilidades
reais, 84 portant°, otimidade-Pareto. 85 Se, o que ocorre frequentemente, a oti-
mizagáo é posta em contato com uma perda do caráter-quadro, 86 entao aquele
aspecto da otimizagáo, que reside no melhoramento de um lado sem pioramen-
to do outro, no pode estar intencionado. Urna ordenagáo-quadro que admitisse
sacrifícios de direitos fundamentais desnecessários no seria urna ordenagáo-
-quadro razoável.
Sério fica primeiro no princípio da proporcionalidade em sentido res-
trito. Dissolve o mandamento de ponderagáo nele contido a estrutura-qua-
dro? Essa questa° deveria ser afirmada se a ponderagáo, em virtude da
constituigáo, ou tudo admitisse ou tudo determinasse. Se a ponderagáo de-
terminasse tudo, a constituigáo seria um ovo do mundo de Forstlioff e o
tribunal constitucional no só se poderia intrometer em toda a parte. mas
deveria isso também. Se a ponderagáo, ás avessas, admitisse tudo, signifi-
caria a obrigagáo do tribunal constitucional para o controle de ponderagáo
nada mais que autorizagáo de, sem vinculagáo material á constituicao, de-
cidir tudo o que chegar em suas máos como ele quer. A adverténcia de
Kelsen seria exata em sua totalidade. Em ambos os casos, o caráter-quadro
se perderia, em que, isso, no segundo caso, poderia suceder por um enlace
de liberdade de vinculagáo real com pretensáo de estar vinculado.
A compatibilidade entre ponderagáo e quadro depende, portanto, dis-
to, se pela ponderagáo alguma coisa é determinada e alguma coisa nao. Se
isso é o caso, somente urna olhada na estrutura da ponderagáo pode mostrar.
Urna reina° forma o núcleo da ponderagao, a qual, guando se trata de
direitos fundamentais como direitos de defesa, pode ser descrita como re-
i na() "entre a gravidade da intervengo e o peso dos fundamentos que a
justificam". 87 Uma primeira viso na qualidade dessa relagáo permite urna
fórmula quanto-tanto, que se encontra com frequéncia, que pode ser desig-
nada como "lei de ponderagáo", e, que abrange igualmente defesa como
83
BVerfGE 99, 341, 353 f.
84
Alexy (Fn. 13), 75 f.
85
Schlink (Fn. 48), 181 f.
86
Bóckenfórde (Fn. 8), 196 ff.; Starck (Fn. 31), 1035, 1039.
87
BVerfGE 101, 331, 350.
82 Robert Alexy
protecao, formulada coma segue: quanta mais alto e o grau de nao cumpri-
mento ou prejuizo de um principio, tanto major deve ser a importancia do
cumprimento do outro.88
Essa formula deixa reconhecer que a ponderacao compOe-se de tres
passos. Em urn primeiro passo, deve ser comprovado o grau do nao cum-
primento ou prejuizo de urn principio. Isto 6, quando se trata da dimensao
de defesa, a intensidade da intervencao. A isso tern de seguir, em urn se-
gundo passo, a comprovacao da importancia do cumprimento do principio
em sentido contrail°. Em urn terceiro passo, finalmente, deve ser compro-
vado se a importancia do cumprimento do principio em sentido contrario
justifica o prejuizo ou nao cumprimento do outro.
Essa estrutura elementar mostra o que ceticos da ponderacao radicais
como, par exemplo, Schlink, devem impugnar, quando eles dizem que nos
"exames da proporcionalidade em sentido restrito por fim somente a
subjetividade do examinador" faz-se "valer" e que as "operacCies de valo-
racao e ponderacao do exame da proporcionalidade em sentido restrito
por fim devem" ser "prestadas so decisionisticamente". 89 Eles devem im-
pugnar que sentencas racionais sobre intensidades de intervencao e graus
de importancia sao possiveis. Pois bem, mas facilmente se deixarn encontrar
exemplos, nos quais tais sentencas, sem mais, podem ser feitas. Assim,
dever dos produtores de produtos de tabaco colocar em seus produtos alu-
skies a perigos a saude, uma intervencao relativamente leve na liberdade de
profissao. Uma intervencao grave seria, pelo contrail°, uma proibicao corn-
pieta de todos os produtos de tabacaria. No meio disso deixam classificar-se
casos de intensidade de intervencao mediana. Desse modo, nasce uma es-
cala corn as graus "leve", "medio" e "grave". 0 exemplo mostra que asso-
ciacoes validas a esses graus sao possiveis.
Analog° vale para os fundamentos em sentido contrario. Os perigos
sadde unidos corn o fumo sao altos. Os fundamentos da intervencao pesam,
par conseguinte, gravemente. Se, desse modo, primeiro, uma vez, esta fi-
xacla a intensidade da intervencao coma leve e o grau de importancia do
fundament° de intervencao como alto, entao o resultado da ponderacao,
como o tribunal constitucional federal, em sua decisao sobre alusOes a ad-
vertencia, observa, é "manifesto"." 0 fundamento de intervencao grave
justifica a intervencao leve.
Poderia agora se achar que o exemplo nao diz Inuit°. De urn lado,
trata-se de atividades economicas, do outro, de fatos empiricamente inves-
88 Comparar Alexy (Fn. 13), 146.
Schlink Freiheit durch Eingriffsabwehr — Rekonstruktion der klassischen Grundrechtsfunktion.
EuGRZ 1984, 462; Pieroth/Schlink Grundrecht. 17. Aufl., 2001, Rdnr. 293. Nota do tradutor: ver supra,
1, nota 14.
90
BVerfGE95, 173. 187.
Constitucionalismo discursivo 83
tigáveis. A escalagáo deve-se ás possibilidades da quantificagáo sob pontos
de vista de custas e de probabilidades. Isso no é, contudo, nenhuma obje-
gáo. Escalagóes rudes como a de trés graus também so possíveis lá onde
o escalado, como tal, no pode ser medido com números. Tome-se a
decisáo-Titanic. O tribunal constitucional federal classificou a designagáo
de um oficial da reserva hemiplégico, que praticou exitosamente sua con-
vocagáo para um exercício militar, como "nascido assassino", por causa do
contexto satírico, no como grave violagáo da personalidade. 9I Pode discu-
tir-se sobre isto, o que leva ao problema dos espagos epistémicos. Aqui,
deve tratar-se somente disto, que mal se pode discutir sobre isto, que a
designagáo posterior, mal ainda adornada satiricamente como "aleijado",
acerta gravemente o oficial da reserva hemiplégico cm sua personalidade,92
o que basta para justificar a intervengáo, residente na indenizagáo em di-
nheiro por dano imaterial sofrido no total de 12.000 marcos alemáes, "com
efeito forte e duradouro"," portanto, bastante grave, na liberdade de opi-
niáo.
A decisáo-tabaco e a decisáo-Titanic, ás quais se deixariam adicionar
numerosas, mostram que existem casos nos quais, com o auxilio da ponde-
ragáo, deixa determinar-se de modo racional o que, em virtude da consti-
tuigáo, é ordenado, proibido e permitido definitivamente. Com isso,
contudo, simplesmente, está refutada a tese, que mediante urna ponderagáo
sempre tudo é possível. Isso é um passo importante para a solugáo do pro-
blema do espago de ponderagáo estrutural, mas ainda náo a solugáo mesma.
Para chegar-se a ela, deve ser tomado cm consideragáo o sistema que está
situado atrás das classificagóes observadas até agora. Todas as classifica-
góes consideradas até agora tiveram lugar cm um modelo de trés graus ou
triádico. Seus trés graus deixam caracterizar-se pelas expressóes
"médio" e "grave"." Tais escalagóes chamam, de certo modo, automati-
camente, a objegáo, que as passagens so de forma móvel e os graus, por
conseguinte, artificiais. Naturalmente, as passagens sao, em realidade, de
qualquer modo, de forma móvel. Mas compreender conceitual reside, pois,
urna vez, na construgáo de limites. Além disso, a tripla gradualidade encer-
ra, cm si, absolutamente nada. A classificagao pode iniciar guando se tem
dois graus: leve e grave. Somente um modelo de um grau, no qual tudo seria
igual, destruiria a ideia do ponderar. Para cima, o número de graus está, cm
principio, aberto. A isso deverá voltar-se. Seja aqui, a favor da tripla gra-
91
BVerfGE 86, 1, 12.
92
BVerfGE 86, 1, 13.
93
BVerfGE 86, 1, 10.
94
Naturalmente, podem, também, outras palavras ser empregadas, cm vez de "leve", por exemplo,
"reduzido" ou "fraco" e, em vez de "grave", por exemplo, "alto" ou "forte".
84 Robert Alexy
dualidade, somente exposto, que ela satisfaz bem as intiticOes cotidianas do
mesmo modo como a pratica juridica.95
0 ponto decisivo para o espaco de ponderacao estrutural 6, pois, que
as classificaVies podem determinar o que a constituicao ordena ou proibe,
isso, porem, nao precisam. Elas levam a uma determinacao, quando elas sao
desiguais. De outra forma situam-se as coisas no caso de uma paridade ou
empate. Aqui, a constituic5o nao decide a colisao. 0 que, porem, a consti-
tuicao nao decide 6, por ela, liberada. 96 No caso de empate de ponderacao
existe, corn isso, urn espaco de ponderacao estrutural.
95
A escalacao triadica tern, corn a teoria de tres grans, desenvolvida pelo tribunal constitucional federal
pars o artigo 12, alinea 1, da lei fundamental [ver nota 78, supra] (BVerfGE 7, 377, 404 ff.), a tripla
gradualidade em comum. Poderia achar-se que a escalacao triadica, por conseguinte, tambern deveria
comparulhar das fraquezas da teoria dos tres graus. Isso, contudo, sem prejuizo da ampliacao, entre-
mentes realizada, para a teoria de qualm graus (BVerfGE 86, 28, 39), nao é o caso. 0 mais tardar, desde
a sentencarmedico conveniado (BVerfGE II, 30,44 f.) esta claro que a classificacao de uma interven-
ea° come regulacao da escolha da profissao ou do exercicio da profissao nao ja corresponde uma
diferenca relevante na intensidade da intervened°, o que 6 o principio da construcao da teoria de tres
graus. Uma regulacao do exercicio da profissao pode-se aproximar ou equivaler. na intensidade da
intervencao, a uma regulacao da escolha da profissao. Analog() vale para a distincao entre pressupostos
objetivos e subjetivos; comparar Rupp Das Grundrecht der Berufsfreiheit in der Rechtsprechung des
Bundesverfassungsgerichts, AOR 92 (1967), 234 f. Isso significa, contudo, somente que os criterios
"objetivo" e "subjetivo", assim como "escolha" e "exercicio" nao permitem compreender todos os
casos corretamente. o que, por causa de sua abstratividade, tambem seria surpreendente. Eles sao, por
conseguinte, somente utilizaveis como formula rude. Que pelos criterios da teoria dos graus nao todos
os casos sao compreendidos corretamente. quer dizer que existem casos nos quais a intensidade da
intervencao deve ser classificada de outra forma como isso seria ordenado segundo seus criterios.
Assim, segundo eles, na sentenca-medico conveniado. a intervened°, como regulacao do exercicio da
profissao, em si, deveria ter sido classificada como intervencao de grau de intensidade reduzida, por-
tanto, como leve. Se, pois. contra a teoria de tres graus 6 feito valer que essa classificacao seria falsa,
entao 6 pressuposto que uma outra classificacao, aqui, uma classificaeao como grave, 6 correta. Essa
classificaeao desviante das divisoes abstratas da teoria dos graus, porem, somente 6 possivel, quando,
no fundo, classificacoes sao possfveis. Isso mostra que a critica a teoria de tres grans 6 uma critica a
utilidade de determinados criterios de graus abstratos e nao uma critica a tripla gradualidade como tal.
A possibilidade da teoria de tres graus 6, ao contrario, condicao da possibilidade da critica da teoria
de tres graus. A critica a teoria de tres graus nao pode, por conseguinte, ser transferida a escalacao
triadica. Pelo contrario, ela pressupOe uma tal ou uma escalacao semelhante. 0 que, na primeira vista,
parece apoiar uma objecao contra o modelo triadic°, mostra-se, assim, na segunda vista, sua certifica-
ea°.
Que a constituicao pode deixar algo nao decidido nao significa que no direito constitucional a ideia
regulativa da resposta unicamente correta (comparar Alexv Recht, Vernunft, Diskurs, 1995, 122) deva
ser abandonada. Quando a constituicao nao decide algo e, corn isso, libera, a resposta unicamente
correta a questa°, o que em virtude da constituicao vale, 6 que a constituicao libera a materia, portanto,
deixa urn espaeo. Se se quisesse afilar isso, poderia dizer-se que a resposta unicamente correta diz que
nao existe uma resposta unicamente correta. 0 espaco pode, da parte do legislador, ser enchido por
consideracOes politicas e, da parte da jurisdicao especializada, por consideracOes juriclico-ordinarias.
Afirmacaes sobre a existencia de espacos podem, como todas as afirmacides, ser corretas ou falsas. Sua
negacdo 6 a afirmacao da firmeza. no espaco de ponderacao, portanto, a afirmacdo de uma diferenea
de peso. Por conseguinte. pode discutir-se sobre afirmacoes de espaco. Isso mostra a resolucao do
tribunal constitucional federal sobre o direito de filhos ilegitimos perante a mae a informacao sobre a
identidade de todos os homens que entram em questa° como pais biologicos, porque eles coabitavam
corn a mar e durante o period° de concepedo legal. 0 tribunal de segunda instancia de Mtinster reconhe-
ceu um tal direito corn a fundamentacao que os interesses do filho, protegidos juridico-fundamental-
mente. precedem, em tais casos, aqueles da Mae, porque ela tern de sustentar o embate urn corn o outro
dos interesses distintos. Corn isso. 6 concedido ao direito de personalidade, alimenticio e de heranca
Constitucionalismo discursivo 85
O espno de pondernáo estrutural tem duas dimensóes. Isso mostra-
-se, com particular clareza, na decisáo do tribunal constitucional federal
sobre o § 353d, número 3, 97 do código penal. A "stern" ilustrada citou, em
seus relatórios sobre a investignáo da advocacia do estado de Bonn, no
chamado "caso donativo-Flick", antes da primeira negociaQáo pública, li-
teralmente dos autos de averigualáo. Isso é punível, segundo o § 353d,
número 3, do código penal. O tribunal de primeira instancia de Hamburg
considerou essa prescri0o anticonstitucional porque ela no é suficiente-
mente idónea para obter as finalidades, com ela perseguidas, e apresentou-a
do filho ilegítimo, juntamente com o mandamento de equiparacáo do artigo 6, alínea 5 [Aos filhos
ilegítimos devem, por dacáo de lei, ser criadas as mesmas condicóes para o seu desenvolvimento
corporal e espiritual e para a sua posicáo na sociedade, como para os filhos legítimosi, da lei funda-
mental, urna importáncia superior do que ao direito de personalidade da máe. O tribunal constitucional
federal vé nisso um desconhecimento "do espaco para uma ponderagáo", que compete ao tribunal de
segunda instáncia. Náo pode "ser excluído, que o tribunal de segunda instáncia, no esgotamento de seu
espaco de ponderacáo", teria "chegado a um outro resultado" (BVerfGE 96, 56, 65 f.). O direito de
personalidade da máe do artigo 2, alínea 1 [Cada um tem o direito ao livre desenvolvimento de sua
personalidade, á medida que ele náo viola os direitos de outros e no infringe a ordem constitucional
ou a lei cm uniáo com o artigo 1, alínea 1 [A dignidade da pessoa é intangível. Considerá-la
e protegé-la é obrignáo de todo o poder estatal.], da lei fundamental, é violado por esse desconheci-
mento de espaco. Pois bem, um espaco somente entáo pode ser desconhecido, guando ele existe. Um
espaco de ponderagáo existe somente entáo, guando há um empate de ponderagáo. A resolucáo baseia-
se, portanto, na tese que no caso concreto existe, no plano da constituicáo, um empate de ponderacáo,
que deixa espaco a argumentos jurídicos subconstitucionais, que atrihuem ao interesse da mrie, de no
precisar denominar os homens com os quais ela coabitou dentro do período de concepcáo legal, um
peso superior do que áqueles do filho ilegítimo, de modo que cm virtude da constituicáo urna decisáo
favorável á máe náo está excluída.
Contra essa afirmacáo da existéncia de um empate de ponderacáo deixam apresentar-se objegóes con-
sideráveis. Assim, Eidenmüller realcou, com razáo, que a desvalorizagáo "faticamente completa" das
pretensóes alimentícia e de heranca do filho ilegítimo pela retengáo da informacáo apresenta urna
"intervengáo agravante" em seus direitos do artigo 14, alínea 1 [A propriedade e o direito de heranca
seráo garantidos. Conteúdo e barreiras seráo determinados pelas leis.], e artigo 6, alínea 5, da lei
fundamental (Eidenmüller Der Auskunftsanspruch des Kindes gegen seine Mutter auf Benennung des
leiblichen Vaters — BVerfGE 96, 56, JuS 1998, 791). Se se acrescenta a esse lado material o aspecto
imaterial do significado do conhecimento da descendéncia para a personalidade, protegida pelo artigo
2, al ínea 1, cm uniáo com o artigo 1, alínea 1, da lei fundamental, entáo se torna muito duvidoso se cm
casos como no presente. a cuja particularidade somente é alegado o "estar afetado junto de vários
homens, dos quais somente um pode ser o psi" (BVerfGE 96, 56, 60), realmente existe, cm virtude da
constituicáo, um empate de ponderacáo. No estar afetado de vários homens o direito de personalidade
da máe tema, sem dúvida, um peso superior que no estar afetado de somente um homem. Mas deve ser
posto cm dúvida que a evitagáo das penosidades no estar afetado múltiplo é, cm virtude da constituicáo,
precisamente assim importante como o sáo as pretensóes alimentícia e de heranca, assim como o
conhecimento da descendéncia. Quando Canaria aprova Ilimitadamente" a decisáo (Canaria (Fn. 20),
63), entáo somente pode ser aderido a isso á medida que a figura do espago de ponderacao, na decisáo,
é desenvolvida da melhor maneira. O emprego dessa figura, pelo contrário, náo pode ser aprovado, o
que mostra que se pode sobre aquilo que a constituicio náo deeidiu discutir do mesmo modo como
sobre aquilo que ela decidiu.
97
Nota do tradutor: § 353d, número 3, do código penal: [Comunicacóes proibidas sobre negociacóes
judiciais] É apenado com pena privativa de liberdade de até um ano ou com pena pecuniária quem, (3)
textualmente comunica publicamente, completamente ou cm partes essenciais, o escrito de acusacáo
ou outros escritos oficiais de um procedimento penal, de um procedimento de multa ou de um proce-
dimento disciplinar, antes de eles terem sido discutidos cm ne g ociacáo pública ou estar concluído o
procedimento.
86 Robert Alexy
ao tribunal constitucional federal. 0 tribunal constitucional federal chegou
ao resultado que a mera proibiedo da literalidade da reproducdo so "insufi-
cientemente" e em medida "reduzida" protege a personalidade do afetado,
cada vez, como tambern a imparcialidade dos participantes no procedimen-
to." Para isso, porem, tambern, a liberdade de opinido e de imprensa
"limitada somente em dimensdo reduzida". 99 Isso 6 a comprovaedo de urn
empate. Defronte de uma intervenedo leve esta urn fundamento de interven-
ed° de peso leve. Isso basta para isto, que a intervened°, como, acertada-
mente, 6 formulado, "ndo" esta "fora de proporedo" para corn a protecdo
alcancada. m 0 dador de leis pode, em uma paridade, intervir, mas ele rid°
esta obrigado a isso.
Pois bem, no espaco cai, porem, ndo so a intervened° leve liberada. 0
tribunal observa que é assunto do dador de leis decidir se ele quer conceder
mais protecao. 101 Essa seria possIvel somente as custas de i ntervencoes
mais intensivas na liberdade de imprensa. Caso uma tal intervenedo tenha
intensidade mediana, deveria o grau de importancia da protecao, corn isso
efetuada, igualmente, pelo menos, obter o grau mediano. Mesmo uma in-
tervenedo grave poderia estar justificada, quando defronte dela esta urn grau
de importancia, correspondentemente alto, da protecdo efetuada. Isso mos-
tra que na linha do empate transcorre urn espaco estrutural. A ideia do
espaco de ponderacdo, corn isso, compoe-se de dois pensamentos: do da
igualdade no empate e do da igualdade entre os empates. Esse cardter duplo
do espaco de ponderacdo tern importancia, sobretudo, para a relacdo entre
defesa e protecdo.1°2
A exigencia por realizacdo tdo ampla quanto possivel de princlpios
jurldico-fundamentais, que tambem pode ser designada como producdo de
concordancia pratica 103 ou como otimizacdo normativa, 1 °4 significa, portan-
98
BVerfGE 71. 206, 219.
BVerfGE 71. 206, 220.
1013
BVerfGE 71, 206. 221.
101
BVerfGE 71, 206. 218.
102
Quando se trata de defesa e protecdo, entdo a escolha entre empates distintos 6 uma escolha entre
niveis distintos de protecdo e de intervened°. Pode considerar-se tanto a aspiracao por protecdo como
o empenho de evitar intervencoes como perseguiedo de finalidades. A escolha entre empates distintos
6, por conseguinte, ao mesmo tempo. uma decisdo sobre a extensdo da perseguicao de finalidades. Se
se deixa cair ndo somente a decisdo sobre isto, quais finalidades sera° perseguidas, mas tambem a
decisao sobre isto, em qual medida ou extensdo elas sera° realizadas, no espaco de determinacao da
finalidade. entao a decisao na linha do empate 6, por conseguinte, nao so uma decisao no espaco de
ponderacao, mas tambem uma decisao no espaco de determinacao da finalidade. Dutra vez, mostra-se
o fenomeno do enlace de espacos.
103
Hesse Grundziige des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland, 20. Aufl., 1995, Rdnr.
72. 317 ff. (Nota do tradutor: esse livro foi traduzido para o portugues sob o titulo: "Elementos de
direito constitucional da reptiblica federal da Alemanha", Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris editor,
1998. Traducdo: Luis Afonso Heck.)
104 Comparar BVerfGE 81. 278. 292; 83, 130, 143; 83, 238, 321.
Constitucionalismo discursivo 87
to, tildo menos o mandamento de aspirar a um ponto máximo." Sem dúvi-
da, cada principio quer para si tanto quanto possível muito. Otimizar prin-
cípios colidentes, porém, no significa ceder a isso, mas pede, ao lado da
exclusáo de sacrificios desnecessários, somente a justificagáo do sacrificio
necessário por, pelo menos, igual importáncia do cumprimento do princi-
pio, cada vez, em sentido contrário. Isso é um critério negativo, o que mos-
tra que também a otimizagáo no quadro da ponderagáo é compatível com o
caráter-quadro da constituigáo.
Os espagos de ponderagáo estruturais agradecem sua existéncia, es-
sencialmente, á escalagáo rude. Quanto mais fina fica a escala, tanto menos
empates nascem. Isso sugere a objegáo que o direito constitucional, na ver-
dade, tem urna estrutura mais fina, que leva a isto, que quase sempre há
alguma pequena diferenga, que motiva a constituigáo a trazer a balanga para
a oscilagáo. Essa objegáo leva a problemas profundos da natureza do direito
constitucional. Ele parece-se com o mundo dos objetos perceptíveis nisto,
que a intensidade de urna intervengo deixa, como o desenvolvimento de
urna forga ou o transcorrer de um movimento, reproduzir-se sobre linhas
com infinitamente muitos pontos, o que, sem dúvida, náo excluiria empates
teoricamente, contudo, praticamente, ou a matéria do direito constitucional
é mais rude. cheia de nós e buracos? Muito parece falar em favor do último.
Muitas vezes, sem dúvida, so possíveis escalagóes mais finas que de trés
graus. Basta olhar somente para o caso-Titanic. Se o estado no sancionasse
a difamagáo pública de um hemiplégico como "aleijado", ele iria admitir
no só violagóes graves, mas muito graves á personalidade. Isso pode ser
compreendido pelo fato de a tríade leve/médio/grave ser aplicada outra vez
em cada grau. Os nove graus de um tal modelo triádico duplo permitem
distinguir intervengóes muito graves de graves médias e, justamente, agora
ainda, de graves. Tais refinagóes, que aliás no so convenientes em toda
a parte — ás vezes, já se está contente poder escalar de dois graus porém,
tém limites. Se se quisesse ir mais além, entáo se deveria falar cm um
terceiro grau de coisas, como intervengóes graves muito leves. Quem po-
deria ainda entender isso? Aqui fala, como, bem genericamente, no ámbito
do prático, tudo em favor disto, de manter-se na alusáo de Aristóteles, que
nós "nao (devemos) aspirar á exatidáo de modo igual em todos os objetos,
mas em cada caso somente assim corno a matéria dada o permite"." O
direito constitucional náo é urna matéria que é estruturada táo finamente
que ela exclua empates auténticos e, com isso, espagos de ponderagáo es-
105
Assim, porém, Lerche Die Verfassung als Quelle von Optimierungsgebote?, FS Stern, 1997, 205
f.; ders. Facetten der "Konkretizierung" von Verfassungsrecht, in: Koller/Hager/Junker/Singer/Neu-
ner (Hrsg.), Einheit und Folgerichtigkeit im juristischen Denken, 1998, 21; comparar. ademais, Wahl
(Fn. 3), 504; Scherzberg Grundrechtsschutz und -Eingriffsintensitát", 1989, 174.
106
A ristoteles, Nikomachische Ethik 1098a.
88 Robert Alexy
truturais. Ponderacao e ordenacao-quadro mostram-se, assim, compati-
veis.'°7
Ate agora se tratou somente de espacos estruturais. Os espacos epis-
temicos ou de conhecimento nao estao atras deles em significado para o
tema-quadro. 0 tempo restante permite somente observacoes concisas.
2. Espacos epistemicos
A questao sobre a existencia de espacos epistemicos aparece quando
o conhecimento daquilo que, em virtude da constituicao, esta ordenado,
proibido ou liberado, é incerto. A incerteza pode ter a sua causa na incerteza
de premissas empiricas ou normativas.
Constitucionalismo discursivo 89
bém no empírico, coloca-se, inevitavelmente, o problema da divergéncia."
Quem admite intervengóes em virtude de premissas incertas, guando essas
premissas so somente sustentáveis ou plausíveis ou, o que ainda é menos,
no evidentemente falsas, deve aceitar a possibilidade de violagóes de di-
reitos fundamentais no comprováveis. Á extensáo dos espagos de conhe-
cimento corresponde a extenso de possíveis divergéncias entre aquilo que
realmente é ordenado, proibido e liberado e aquilo que é comprovável como
ordenado, proibido e liberado. Com essa divergéncia aparece o problema
geral da diferenga entre o óntico e o epistémico no direito constitucional.
Que urna premissa é incerta, significa que no somente ela entra cm
questáo. Como princípios materiais, os direitos fundamentais exigem urna
realizagáo cm medida táo alta quanto possível. Se se toma em consideragáo
somente isso, entáo urna solugáo simples parece ser indicada: em incerteza
deve ser escolhida, cada vez, a premissa mais favorável para o direito fun-
damental. Corno essa é aquela, sob cuja base a intervengo no seria justi-
ficável, isso teria a consequéncia que o dador de leis somente ainda pode
intervir em direitos fundamentais em virtude de, com certeza, premissas
verdadeiras. É fácil de reconhecer que uma tal solugáo náo entra cm ques-
táo."° A exigéncia que o dador de leis, ainda que ele intervenha só, pelo
menos, na liberdade de atuagáo geral, somente cm virtude de, com certeza,
premissas verdadeiras deve atuar, iria levar a quase incapacidade de atuar
completa do legislativo. Isso, urna constituigáo, que primeiro, no fundo,
quer um legislador e, segundo. um democraticamente legitimado, no
pode querer. Por conseguinte, o princípio da diviso de poderes e demo-
crático," como princípios formais,' I2 exigem um espago de conhecimento
empírico.113
109
Comparar Raabe Grundrecht und Erkenntnis, 1998, 147 ff.
110 Comparar BVerfGE 50, 290, 332.
111
BVerfGE 56, 54, 81.
112
Comparar Alexy (Fn. 13), 120, 267, 384, 427.
113
Na relaQáo entre tribunal constitucional e jurisdigáo especializada tem, guando se trata de liberdade
de manifestagáo de opiniáo e liberdade de arte, a questáo da interpretagáo de manifestagóes e obras,
importáncia especial. Na decisáo sobre a censura, feita á sociedade alemá para a morte humana em urna
folha volante, da falsificagáo da história da vida de gravemente doentes, aos quais a sociedade alemá
para a morte humana prestou a chamada eutanásia, trata-se disto, se a censura de falsificagáo deve ser
apreciada como afirmagáo de fato ou como sentenga de valor. Disso depende a intensidade da inter-
vengáo na liberdade de manifestagáo de opiniáo e, com isso, o resultado da ponderagáo. A proibigáo
de urna afirmagáo de fato depreciativamente falsa intervém só relativamente leve na liberdade de
manifestagáo de opiniáo, a de urna sentenga de valor, pelo contrário, relativamente grave (BVerfGE
94, 1, 8). 0 tribunal de segunda instáncia de Hamburg classificou essa manifestagáo de sentenga de
valor e denegou a agáo de omissáo, o tribunal de terceira instáncia hanseático classificou-a como
afirmagáo de fato náo demonstrável verdadeira e a acolheu. O tribunal constitucional federal chegou
ao resultado que a "explicagáo do tribunal de terceira instáncia táo pouco deve (ser) objetada jurí-
dico-constitucionalmente como aquela do tribunal de segunda instáncia" (BVerfGE 94, 1, 10). Ne-
nhurn dos tribunais "atribuiu" á manifestagáo um "sentido que ela, segundo o seo texto, náo pode ter
objetivamente". Por conseguinte, ambas as explicagóes sáo "sustentáveis" (BVerfGE 94, 1, 10 f.). Isso
é a concessáo de um espago. Na explicagáo ou interpretagáo de urna manifestaqáo trata-se da questio,
90 Robert Alexy
Nenhum espaco é ilimitado. A limitaedo pode, em Ultimo lugar, so-
mente resultar pelo proprio direito fundamental. Isso encontra sua expres-
sao nisto, que ao lado da lei de ponderacao material, que esta na base do
espaco de ponderacdo estrutural, vale uma lei de ponderacao epistemica,
que se deixa formular como segue: quanto mais grave pesa uma intervened°
em um direito fundamental, tanto mais alta deve ser a certeza das premissas
apoiadoras da intervened°.
Constitucionalismo discursivo 91
é o terceiro elemento da resposta, é aceitável, enquanto a retratagáo de
controle judicial-constitucional permanece limitada por atribuigáo de espa-
gos de conhecimento normativos. Os limites somente sáo determináveis por
ponderagáo de princípios materiais e formais. Nisso resulta, conforme se
trate do que e de quem, urna imagem diferente. Os espagos de conhecimento
normativos da jurisdigáo especializada baseiam-se, sobretudo, nisto, que
eles compartilham como tribunal constitucional federal o caráter judicial.
Até aonde alcangam os espagos de conhecimento, mas também só até rigo-
rosamente ah, existe uma relagáo de cooperagáo autIntica" 4 entre jurisdi-
gáo constitucional e jurisdigáo especializada, porque no espago de
con hecimento normativo os tribunais especializados exercem jurisdigáo
constitucional material. Eles sáo, nesse aspecto, pequenos tribunais cons-
titucionais. Sobre isto, até aonde esse espago alcanga, vela. todavia, ade-
mais, o tribunal constitucional federal. A cooperagáo permanece, assim,
náo só limitada, mas também hierarquicamente abobadada.
IV. Resultado
Eu sintetizo. Os problemas da constitucionalizagáo deixam solucio-
nar-se em urna dogmática de espagos. Essa descansa sobre duas colunas. A
primeira, fornnam os espagos estruturais que expressam a limitagáo do con-
teúdo material da constituigáo, a segunda, os espagos epistémicos, pelos
quais é transferida, em extensáo limitada, jurisdigáo constitucional material
aos tribunais especializados. Por tudo vela o tribunal constitucional federal
com vista dupla. Urna é dirigida ao conteúdo constitucional material, a outra
aos seus limites e incertezas.
114
Robbers (Fn. 31), 938.
92 Robert Alexy
— 5—
Constitucionalismo discursive 93
tro lógico da dogmática dos direitos fundannentais. Eu quero somente citar
alguns exemplos: titular dos direitos fundamentais so somente nascidos
ou também no nascidos, somente privados ou também o estado, somente
pessoas ou também animais? Destinatário dos direitos fundamentais é so-
mente o estado ou também privados so destinatários, portanto, obrigados,
de modo que os direitos fundamentais desenvolvem o seu efeito também na
vida do trabalho e da economia? Finalmente: objeto dos direitos fundamen-
tais é somente a omissáo de intervengóes na vida, liberdade e propriedade
e a omissáo de tratamentos desiguais, ou o seu objeto compreende também
atuagóes positivas do estado? Um primeiro exemplo de um direito funda-
mental a atuagóes positivas do estado é o direito clássico do cidadáo contra
o estado a isto, que este lhe proteja diante de ataques de outros cidadáos.
Tais direitos so direitos de protegáo ou direitos á seguranga. Um segundo
exemplo é o direito á organizagáo e ao procedimento. O espectro estende-se,
aqui, do direito de procedimentos de autorizagáo transparentes para proje-
tos grandes, sobre direitos a determinadas paridades em grémios universi-
tarios, até ao direito á formagáo de acordo com a constituigáo do direito do
casamento e família. A maior atengo, no ámbito dos direitos a atuagóes po-
sitivas, chamam os direitos sociais e os culturais. Existem direitos fundamen-
tais ao mínimo existencial, ao trabalho e ao fomento da identidade cultural?
Nossa pequena olhada na multiplicidade daquilo que pode achar, e
pede para achar, seu lugar na relagáo-direitos de trés variáveis torna claro
porque o litígio sobre os direitos do homem e fundamentais nunca é somente
de natureza teórica, mas sempre também tem significado prático. No existe
nenhum problema de direito fundamental que também no se deixa formu-
lar como problema de justiga. As avessas, sem dúvida, náo vale rigorosa-
mente o mesmo, contudo, bem amplamente. A marcha dos direitos
fundamentais pelos séculos espelha, por conseguinte, também a marcha das
lutas moral-políticas reais. Contudo, antes de dar urna olhada sobre isso,
deve primeiro ser perguntado o que transforma direitos em direitos do ho-
mem e fundamentais. Porque, sem dúvida, tudo aquilo que é um direito do
homem ou fundamental auténtico, é direito. Mas no tudo aquilo que é um
direito é também um direito fundamental. Pense-se somente no direito do
vendedor contra o comprador ao pagamento do prego de compra.
1. Direitos do homem
Direitos do homem so definidos por cinco características.' A primei-
ra é a sua itniversalidade. 4 Titular dos direitos do homem é cada pessoa
3
Mais pormenorizado, para isso, R. Alexy, Die Institutionalisierung der Menschenrechte im demo-
kratischen Verfassungsstaat. in: ders., Recht, Vernunft, Diskurs, Frankfurt a. M. 1995. S. 246 ff.
4
Em itálico no original.
94 Robert Alexy
como pessoa. A universalidade do lado do destinatario é mais complicada.
Alguns direitos do homem, como o a vida, dirigem-se contra todos que
podem ser destinatarios de deveres, portanto, contra todas as pessoas, mas
tambem contra todos os estados e organizacoes. Outros direitos do homem,
como o direito eleitoral, dirigem-se somente contra o estado ao qual per-
tence o particular ou no qual ele vive. A segunda caracteristica dos direitos
do homem e a fundamentalidade de seu objeto. 5 Direitos do homem nao
protegem todas as fontes do bem-estar imaginaveis, mas somente interesses
e carencias fundamentais. Como tambem a compensacao e a distribuicao,
no ambito de interesses nao fundamentais, é urn problema de justica, existe
urn discurso de direitos fundamentais fora do discurso dos direitos do ho-
mem. Tambern a terceira caracterfstica concerne ao objeto dos direitos do
homem. E a sua abstratividade.° Pode rapidamente se acordar sobre isto,
que cada urn tern urn direito a saride, sobre isto, o que isso significa no caso
concreto, pode, porem, rebentar-se urn litigio prolongado. A quarta e a
quinta caracteristica nao concernem nem aos titulares, nem aos destinata-
rios, nem aos objetos dos direitos do homem, mas a sua validez. Direitos
do homem como tais tern somente uma validez moral. Pode, sob esse as-
pecto, falar-se da moralidade dos direitos do homem: Urn direito vale
moralmente quando perante cada um. que aceita uma fundamentacao racio-
nal, pode ser justificado. A existencia dos direitos do homem consiste,
portanto, em sua fundamentabilidade e em nada mais. Aqui espreitam abis-
mos. A quinta e Ultima caracteristica dos direitos do homem resulta de sua
moralidade, portanto, de sua validez moral. Direitos do homem, como di-
reitos moralmente vigentes, nao podem por direito positivo, portanto, no
por leis, regulamentos, contratos ou sentencas judiciais, ser deixados sem
vigencia. Leis, regulamentos, contratos e decisOes judiciais, que se opOem
a eles, sao sempre juridicamente viciosos e, em cases extremos, ate juridi-
camente nulos. Sua imposicao 6, entao, o exercicio de pura for-ca. Direitos
do homem tern, nesse sentido, uma prioridade perante o direito positivo.8
Corn isso, as cinco caracteristicas, que caracterizam os direitos do homem,
sobretudo, de outros direitos, estao juntas: direitos do homem sao direitos
(1) universais, (2) fundamentais, (3) abstratos, (4) morais e (5) prioritarios.
2. Direitos fundamentais
0 problema principal dos direitos do homem, come meros direitos
morais, e a sua imposicao. No ambito intra-estatal existe o passo decisivo
5
Em italic° no original.
6
Em italico no original.
7
Em italic° no original.
8
Em italico no original.
Constitucionalismo discursivo 95
para a imposigáo dos direitos do homem cm sua positivagáo como direitos
fundamentais, o que, cm regra, ocorre com a sua admissáo no catálogo de
direitos fundamentais da constituigáo. Com isso, eles ganham, ao lado de
sua validez moral, urna positiva jurídica. A validez moral dos direitos do
homem exclui. sem dúvida, que eles sejam anulados por direito positivo.
Ela, porém, no exclui que lhe seja acrescentada urna validez positiva jurí-
dica. Ao contrário, a validez moral dos direitos do homem exige, como um
dos meios mais eficazes de sua imposigáo, sua positivagáo. Essa é a conexo
fundamental entre direitos do homem e fundamentais. Direitos fundamen-
tais sao, portanto, direitos do homem transformados em direito constitucio-
nal positivo. O conceito do direito fundamental é, com isso. sem dúvida,
ainda no determinado em todos os sentidos, contudo, no ponto centra1.9
A positivagáo dos direitos fundamentais pode ser formada diferente-
mente. Urna positivagáo perfeita, sob aspectos de imposigáo. existe guando
os direitos fundamentais, como se diz no artigo 1, alínea 3, da lei funda-
mental») vinculam todos os tras poderes, portanto, também a dagáo de leis,
"como direito imediatamente vigente" e essa vinculagáo é submetida a um
controle amplo por um tribunal constitucional. Entáo, contudo, aparece um
novo problema: a relagáo de tensáo entre direitos fundamentais e democra-
cia. Direitos fundamentais regulam, como normas de grau de hierarquia
extremo, com forga vinculativa extrema, objetos extremamente importantes
cm — e nisso é culpado o caráter abstrato, que eles partem com os direitos
do homem — urna medida máxima de abertura. Um tribunal constitucional
precisa, nesse ámbito de abertura, pór-se forgosamente cm concorréncia
com o dador de leis legitimado parlamentariamente. Porém, com isso, nós
nao estamos mais no conceito de direito fundamental, mas já em seus pro-
blemas. Olhemos, contudo, primeiro no passado.
96 Robert Alexy
libertatum medieval, do anode 1215, produziram-se primeiras positivacOes
de certos elementos juridico-fundamentais na Inglaterra revolucionaria do
seculo 17. Eu menciono somente os atos-habeas-corpus, do ano de 1679.
Seu primeiro desenvolvimento pleno, a ideia dos direitos do homem e fun-
damentais experimentou na revolucao americana e na francesa. Em 12 de
junho de 1776 produziu-se corn o Virginia Bill of Rights a primeira positi-
vacao ampla dos direitos do homem. Em 26 de agosto de 1789 seguiu a
declaracao dos direitos do homem e do cidadao francesa.
Na Alemanha, o desenvolvimento transcorreu muito mais hesitante.
Ap6s passos relativamente tlmidos no period° arcaico do constitucionalis-
mo alemao — as constituicoes de Sachen-Weimar-Eisenach, do ano de 1816,
e da Baviera, do ano de 1818, sao exemplos para isso — foi, apos o ano
revolucionario de 1848, incluido urn catalog° de direitos fundamentais am-
plo na constituicao do imperio, de 28 de marco de 1849, a constituicao da
igreja de Sao Paulo. A constituicao da igreja de Sao Paulo, contudo, fracas-
sou e, corn ela, o primeiro catalog° de direitos fundamentais alemao real-
mente amplo. 0 que nos poderia ter ficado poupado sem esse fracasso! Ap6s
a guerra franco-alema e da fundacao do 2. imperio alemao, foi prom ulgada,
em 16 de abril de 1871, a constituicao do imperio. E caracteristico para essa
constituicao que ela nao continha direitos fundamentais. Assim, a Alema-
nha, no plano estatal total, pos-se no seculo 20 sem urn catalog° de direitos
fundamentais. Esse resultado diz, sem thivida, alguma coisa, a ele, certa-
mente, tambem nao deve ser atribuido urn peso muito grande. Encontra-
vam-se nas constituicOes dos estados particulares, em parte, titulos de
direitos fundamentais consideraveis. Como exemplo, pode servir a consti-
tuicao prussiana, de 31 de janeiro de 1850, que em urn titulo, que abrange
40 artigos, regulava os "direitos dos prussianos". Todavia, esse catalog°
continha uma multiplicidade de reservas de limitacao, muitas vezes, Inuit°
amplas. Foi, sobretudo, uma ciencia do direito administrativo e jurispru-
dencia administrativa, no total, habil, que cuidaram disto, que existisse uma
medida consideravel em estatalidade juridica. Pode trazer-se a situacao
formula que o imperio era caracterizado antes por estatalidade jurldica do
que por juridicidade fundamental. Anschtitz formulou isso em 1912 no sen-
tido que o "significado juridico-subjetivo dos direitos dos prussianos" es-
gotava-se nisto, que "a pretensao de omissao de atividades administrativas,
que intervem na liberdade pessoal sem fundamento legal, é reconhecida em
alguns casos de aplicacao". 11 Os direitos fundamentais contem, segundo
isso, nao mais que uma apresentacao, casuisticamente formulada, do prin-
cipio da legalidade da administracao.
II
G. Anschtitz, Die Verfassungskunde fill den PreuBischen Staat, Bd. I. Berlin 1912, S. 97.
Constitucionalismo discursivo 97
A constituigáo de Weimar, de 11 de agosto de 1919, deixou inclinar o
péndulo para o outro lado, o que, como tantas vezes em golpes cm sentido
contrário, no teve consequéncias afortunadas. Na segunda parte principal
sao, sob o título "direitos fundamentais e deveres fundamentais dos alemáes",
em 66 artigos, adotadas regulagóes jurídico-fundamentais e semelhantes a
direitos fundamentais. O caráter do todo fica reconhecível guando se dá
urna olhada nos encabqamentos dos cinco títulos. Eles dizem: "A pessoa
particular", "A vida comunitaria", "Religiáo e sociedades religiosas", "For-
magáo e escola" e "A vida económica". Com isso, é abandonada a tradigáo
liberal burguesa, segundo a qual direitos fundamentais, só ou, pelo menos,
cm primeiro lugar, sáo direitos de defesa do cidadáo contra o estado. Para
o asseguramento da liberdade individual associam-se a participagáo políti-
ca e social e o asseguramento social. O sistema dos direitos fundamentais
é ampliado cm um sistema amplo de urna ordem social justa. Característico
para isso é o artigo 151, alinea 1, da constituigáo do império de Weimar,12
que abre o título "A vida económica". Ele diz: "A ordem da vida económica
deve corresponder ao princípio da justiga com o objetivo da garantia de urna
existéncia digna de um ser humano para todos. Nesses limites, de ve ser
assegurada a liberdade económica do particular." Isso é liberdade econó-
mica somente no quadro de urna justiga no definida por liberdade econó-
mica.
O problema principal dos direitos fundamentais de Weimar era o de
sua forga de validez. A constituigáo de Weimar previa, sem dúvicla, um
tribunal estatal (artigo 108 da constituigáo do império de Weimar). ' 3 Mas
esse era, no essencial, competente somente para litígios entre órgáos no
interior dos estados e para litígios federativos entre o império e os estados.
Na literatura bramia um litígio sobre isto, se e cm qual proporgao as normas
de direitos fundamentais, do título de direitos fundamentais, eram meras
proposigóes programáticas sem forga vinculativa jurídica. Teve importan-
cia particular nisso a questáo, se aos tribunais, particularmente ao tribunal
i mperial, cabia urna competéncia de controle judicial perante a dag.ao de
leis imperial. Nesses litígios apareceram, cm forma primitiva mais viva,
muitas ideias, que na segunda metade do século 20 foram elaboradas, na
tranquilidade académica, até nos detalhes. Também a prática empreendeu
tragos audazes. Assim, o tribunal imperial requereu o controle judicial da
daga() de leis no critério da constituigáo. Sua reviso da lei de revalorizagáo,
do ano de 1925, no critério da garantia da propriedade do artigo 153, da
12
Nota do tradutor: artigo 151. alínea 1, da constituigáo do império de Weimar: a ordem da vida
económica deve corresponder aos princípios da justiga com o objetivo da garantia de urna existéncia
digna de um ser humano para todos. Nesses limites deve ser assegurada a liberdade económica do
particular.
13
Nota do tradutor: artigo 108 da constitulgáo do império de Weimar: cm conformidade com urna lei
imperial será estabelecido um tribunal estatal para o império alemáo.
98 Robert Alexy
constituicao do imperio de Weimar, 14 6, para isso, urn exemplo expressi-
vo. 15 Essa decisao mostra paralelos claros para corn a celebre decisao Mar-
bury v. Madison, do ano de 1803, corn a qual a suprema corte americana
abriu o controle do legislativo.' 6 A essa marcha vigorosa, no que concerne
potencia espiritual, as circunstancias politicas recusaram a maturacao. Em
1933 resultou a caida no nada juridico-fundamental. A historia é conhecida.
Eu gostaria, aqui, somente, de mencionar o regulamento de necessidade,
promulgado segundo o artigo 48, alinea 2, da constituicao do imperio de
Weimar, 17 do presidente imperial, de 28 de janeiro de 1933, pelo qual os
direitos fundamentais importantes para o processo politico, explicitamente,
foram deixados sem vigencia." Em 24 de marco de 1933 seguiu a lei de
autorizacao, pela qual o parlamento imperial, corn maioria que modifica a
constituicao, transferiu ao governo imperial e, corn isso, Adolf Hitler, nao
so o poder para a dacao de leis, mas tambem os autorizou a desviar da
constituicao, a medida que nao foram tocados a instalacao do parlamento
imperial e do conselho imperial ou os direitos do presidente imperial.'" Corn
isso, estava eliminada, expressa e completamente, a vinculacao do poder
politico aos direitos fundamentais. A ciencia do direito nacional-socialista,
logo dominante, festejou isso. Em vez de muitos, seja citado Ernst Rudolf
Huber, em cujo "direito constitucional do imperio da grande Alemanha" diz-
-se: "Somente a ruptura politica da concepcao de mundo nacional p6de real-
mente vencer os direitos fundamentais liberais. Particularmente, os direitos de
liberdade do individuo perante o poder estatal precisaram desaparecer; eles
nao sao compativeis corn o principio do imperio nacional". 2 ° No lugar dos
direitos fundamentais colocou-se "posicao juridica do consorte popular".2'
14
Nota do tradutor: artigo 153 da constituicao do imperio de Weimar: 1) A propriedade é garantida
pela constituicao. Seu contetido e suas barreiras resultam das leis; 2) uma desapropriacao pode ser feita
somente para o bem-estar da comunidade e sobre fundament° legal. Ela realiza-se mediante indeniza-
cao conveniente, a medida que uma lei imperial nao determina outra coisa. Por causa do montante da
indenizacao deve, em casos litigiosos, ser mantida aberta a via juridica nos tribunals ordinarios, a
medida que leis imperiais nao determinam outra coisa. Desapropriacao pelo imperio perante estados,
municfpios e gremios de utilidade ptiblica pode realizar-se somente mediante indenizacao; 3) proprie-
dade obriga. Seu uso deve, simultaneamente, ser servico para o bem-estar comum.
15
RGZ Ill, 320 (320 ff.).
16
U. S. 137 (1803); comparar para isso G. R. Stone/L. M. Seidman/C. R. Sunstein/M. V. Tushnet,
Constitutional Law, 4. Aufl., Gaithersburg/New York 2001, S. 22 ff.
17
Nota do tradutor: artigo 48, alfnea 2, da constituicao do imperio de Weimar: o presidente imperial
pode, quando no imperio alemao a seguranca e ordem ptiblica é perturbada ou posta em perigo consi-
deravelmente, tomar as medidas necessarias para o reestabelecimento da seguranca e ordem ptiblica.
em caso necessario, intervir corn o auxflio do poder armado. Para essa finalidade ele pode, tempora-
riamente, deixar sem vigencia, completamente ou em parse, os direitos fundamentais fixados nos artigos
114, 115, 117, 118, 123, 124 e 153.
18
RGB1. I S. 83.
19
RGBI. I S. 141.
20 E. R. Huber, Verfassungsrecht des GroBdeutschen Reiches, 2. Aufl., Hamburg 1939, S. 361.
21
Ders., S. 363 ff.
Constitucionalismo discursivo 99
Com isso, o universalismo, que, como nós vimos, define essencialmente os
direitos do homem, é eliminado. Karl Larenz expressa isso com categoria-
lidade rude: "Consorte jurídico é somente quem é consorte popular; con-
sorte popular é quem é de sangue alemáo".22
Depois de 1945 foi, primeiro nos estados, entáo, com a lei fundamental
de Bonn, também no plano da república federal, feito um início novo. Desde
a reunificagáo, no ano de 1989, vale a lei fundamental, de 23 de maio de
1949, em toda a Alemanha. O afastamento do nacional-socialismo é náo
apreciável. O artigo 1, alínea 1, da lei fundamenta1, 23 declara a dignidade
humana como o valor constitucional supremo, e o artigo 1, alínea 2, da lei
fundamenta1, 24 com a profissáo do po y o alemáo por "direitos do homem
invioláveis e inalienáveis", produz urna unido expressa entre direitos fun-
damentais e do homem. Mas também é claro um distanciamento para com
constituigóes socialistas, que jogam os direitos fundamentais sociais, so-
bretudo, o direito ao trabalho, contra os liberais, como isso, por exemplo,
ocorreu na constituigáo da unido das repúblicas socialistas soviéticas, de 5
de dezembro de 1936, e nas constituigóes da república democrática alemá,
de 7 de outubro de 1949 e de 6 de abril de 1968. Encontra-se somente um
único direito fundamental social escrito na lei fundamental, o direito da me
á protegáo e á assisténcia da comunidade (artigo 6, alínea 4, da lei funda-
mental). 25 O catálogo de direitos fundamentais da lei fundamental, com
isso, está na tradigáo liberal-burguesa.
O que direitos fundamentais realmente sao, de nenhum modo decide
somente o texto constitucional. Decisivo so a vontade política do po y o, a
situagáo económica e a prática jurídica e ciéncia do direito. O clima político
e o económico foram favoráveis ao desenvolvimento dos direitos funda-
mentais na Alemanha na segunda metade do século 20. A prática jurídica
recebeu, pelo tribunal constitucional federal, dotado com fortes competén-
cias, todos os instrumentos necessários para a imposigáo de direitos funda-
mentais. Nessa situagáo póde, em 50 anos, nos quais nasceram 100 volumes
de jurisprudéncia do tribunal constitucional federal e trabalhos científicos
inumeráveis, ser desenvolvido um sistema de direitos fundamentais sem
precedentes. Se se quer descrever a história dos direitos fundamentais e do
homern do século 20 na Alemanha com urna curva, entáo se pode, no ano
de 1900, iniciar com um nível relativamente baixo, mas no náo-observá-
22
K. Larenz, Rechtsperson und subjektives Recht. in: G. Dahm/E. R. Huber/K. Larenz/K. Michaelis/F.
Schaffstein/W. Siebert, Grundfragen der neuen Rechtswissenschaft, Berlin 1935, S. 241.
23
Nota do tradutor: ver nota 10, supra.
24
Nota do tradutor: artigo I, alínea 2, da lei fundamental: o po y o alemáo professa-se, por isso, por
direitos do homem invioláveis e inalienáveis como fundamento de cada comunidade humana, da paz e
da justiga no mundo.
25
Nota do tradutor: artigo 6, alínea 4, da lei fundamental: cada máe tem a pretensáo de protegáo e
assisténcia da comunidade.
8
Entre aspas no original.
9
BVerfGE 7, 198,211 f.
I
° Entre aspas no original.
I I Comparar BVerfGE 7. 198. 201.
12
BVerfGE 7, 198, 207.
13
Entre aspas no original
3. A estrutura da ponderaláo
No direito constitucional alemáo, a ponderagáo é urna parte daquilo
que é exigido por um principio mais amplo. Esse principio mais amplo é o
princípio da proporcionalidade. O principio da proporcionalidade compóe-
-se de trés principios parciais: dos principios da idoneidade, da necessidade
e da proporcionalidade em sentido restrito. Todos os trés principios expres-
sam a ideia da otimizagáo. Direitos fundamentais, como princípios, so
mandamentos de otimizagáo. Como mandamentos de otimizagáo, princi-
pios sáo normas que ordenam que algo seja realizado cm medida táo alta
quanto possível relativamente ás possibilidades fáticas e jurídicas.27
Nos princípios da idoneidade e da necessidade trata-se da otimizagáo
relativamente ás possibilidades fáticas. O princípio da idoneidade exclui o
emprego de meios que prejudiquem a realizagáo de, pelo menos, um prin-
cípio, sem, pelo menos, fomentar um dos princípios ou objetivos, cuja rea-
lizagáo eles devem servir. Se um meio M, que é empregado para fomentar
a realizagáo do princípio P 1, para isso no é idóneo, certamente, porém,
prejudica a realizagáo do principio P2, entáo no nascem custos nem para
Pj nem para P2, se M é deixado cair, certamente, porém, custos para P2 se
M é empregado. Pj e P2 podem, entáo, juntados, relativamente ás possibi-
lidades fáticas, ser realizados em urna medida superior, se M é deixado cair.
Pj e P2, juntados, proíbem, com isso, o emprego de M. 28 Isso mostra que o
princípio da idoneidade é nada mais que a expressáo da ideia da otimida-
de-Pareto: urna posigáo pode ser melhorada sem que nasgam desvantagens
para outras.
O mesmo vale para o princípio da necessidade. Esse principio pede,
de dois meios, que, em geral, fomentam igualmente bem Pj, escolher aquele
que menos intensamente intervém cm P2. Se existe um meio menos inten-
sivamente interveniente e igualmente bem idóneo, entáo urna posigáo pode
ser melhorada, sem que nasgam custos para a outra. A aplicabilidade do
princípio da necessidade pressupóe, todavia, que náo existe um terceiro
principio P3 que, pelo emprego do meio menos intensivamente intervenien-
te em P2, é afetado negativamente. 29 Nessa conjuntura, o caso no mais
pode ser solucionado em virtude de reflexóes, que se apoiam na ideia da
27
Comparar Alexy, Theorie der Grundrechte, cit., S. 75.
28
Em itálico, a cada vez, no original.
29
Em itálico, a cada vez, no original.
61
Alexy, Theorie der Grundrechte, cit., S. 147.
62
Entre aspas no original.
Fundamentacao juridica,
sistema e coerencia*
2. Criterios de coeréncia
Os critérios de coeréncia so caracterizados no só pelo fato de seren
cumpridos em graus diferentes, mas também pelo fato de eles poderenr
colidir. Urna colisáo de critérios de coeréncia existe, guando segundo
critério Ki, o sistema Si, segundo K2, porém, S2 é mais coerente e pode
decidir-se somente ou a favor de Si ou de S2. 16 Com isso, está claro que ol
critérios de coeréncia deixam formular-se como princípios no sentido de
mandamentos de otimizagáo. 17 Urna explicagáo essencial para as dificulda-
des que o conceito de coeréncia causa poderia ser que coeréncia é náo
um assunto de grau, mas também urna questáo de ponderagáo.
Os critérios de coeréncia deixam dividir-se cm trés grupos: a) em tais
que dizem respeito imediatamente a propriedades da estrutura da funda-
mentagáo de um sistema de declaragóes, b) cm tais, que valem as proprie-
dades dos conceitos que encontram emprego cm um sistema de declaragóes
e c) cm tais, que concernem a propriedades do ámbito do objeto de urn
sistema. Os critérios do segundo e do terceiro grupo dizem respeito, sem
dúl ida, no imediatamente, contudo, mediatamente, a propriedades da es-
trutura da fundamentagáo.
39
Comparar R. Alexy (nota 38), S. 234 fr., 273 ff.
A formula peso*
29
Comparar para isso R. Alexy Theorie der juristischen Argumentation, 4. Aufl., Frankfurt a. M. 2001.
S. 53 ff.
IV. A fórmula
Oferecem-se duas possibil idades, fundamentalmente diferentes, de
ptir em relagáo 1i e 1i. A primeira escolhe quem trabalha com consequéncias
aritméticas, a segunda, quem trabalha com consequéncias geométricas
Existem muitas possibilidades de apresentar a tríade 1, m, s como conse-
quéncia aritmética. Urna especialmente simples é a consequéncia 1, 2, 3
Com seu auxílio pode estabelecer-se urna fórmula que expressa o peso de
um princípio sob as circunstáncias do caso a ser decidido, concisamente
seu peso concreto, como segue:
"GPi, iC'."
Ji
Gi, j=
Ji
Essa fórmula forma o núcleo de urna fórmula mais ampla, que deve
ser designada como "fórmula peso". Em sua formulagáo completa, a fór-
mula peso contém, ao lado das intensidades de intervengo, os pesos abs-
tratos dos princípios colidentes e os graus de seguranga das suposigóes
empíricas sobre a realizagáo e a no realizagáo dos princípios colidentes
pelas medidas que esto cm questáo. Isso significa que cm urna colisáo de
dois princípios o peso concreto ou relativo de ambos os princípios depende
de tras pares de fatores, portanto, no total, de seis fatores. Esses devem,
todavia, somente entáo ser citados, guando os pares de fatores respectivos
s o desiguais. Se eles so iguais, entáo eles neutralizam-se reciprocamente.
A fórmula antes apresentada pode, por conseguinte, ser assim interpretada,
que os pesos abstratos e os graus de seguranga foram reduzidos por causa
dos seus pesos respectivos. A fórmula limitada ás intensidades de interven-
go no é, entáo, nenhuma outra fórmula que a fórmula completa, ou seja,
a mesma após a realizagáo da redugáo. Isso é considerado guando a fórmula
cociente, no que segue, é designada como "fórmula peso".
Também na formulagáo completa, que se compóe de tras pares de
fatores, trata-se da colisáo de somente dois princípios. A complexidade
cresce guando entram cm jogo mais do que dois princípios. Pode tentar
compreender-se isso cm urna fórmula que ultrapassa a fórmula completa
com vista a dois princípios. Essa fórmula será designada, cm vez de sim-
plesmente de "fórmula peso", como "fórmula peso ampliada". Porém, antes
de, no fundo, ser feito algum complemento da fórmula peso simples, que
direciona exclusivamente para intensidades de intervengo, deve essa, pri-
ineiro, urna vez, ser tomada cm consideragáo mais rigorosamente.
A fórmula peso é somente entáo aceitável, guando os valores que
Gi, obtém nas diferentes conjunturas reconstroem adequadamente o pon-
derár. Seja, cm primeiro lugar, considerada a escalagáo triádica simples.
Nos casos nos quais Pi prevalece sobre Pj, G, j obtém um valor que é maior
que 1:
38
Comparar R. Alexy (nota 1). S. 147.
(5) m, s = 2/4 = --
(6) /, m = 1/2 =
2
• Gi
GI , j
Ij Gj
Se essa formula é exata, entao sobre sua base pode ser feito urn outro
esclarecimento conceitual. Os produtos I, Gi e i Gj expressam algo que,
nao raramente, d designado ao lado ou em vez de G i ,j, G i e Gj, como "peso".
A expressao "peso" entra, assim, em urn triplo sentido. Varios sentidos nao
danificam quando o contexto, cada vez, permite decidir claramente o que
considerado. 0 610 mo nem sempre d o caso na discussao sobre a pondera-
ea°. Por conseguinte, determinacoes terminologicas sao necessarias. Ofe-
recem-se duas possibilidades. Pode denominar-se o produto I Gi tanto o
"peso concreto nao relativo" como a "importancia" de Pi. 0 primeiro
complicado, mas claro. Ele poe o peso concreto nao relativo (Ii • GO clara-
mente entre o peso concreto relativo ( Gi, j) e o peso abstrato ( GO. A desig-
naedo como "importancia" 6, pelo contrario, mais elegante e, sem mais,
proxima do uso do idioma. Deveria por causa da clareza, porem, entao,
renunciar-se a isto, de designar Ijcomo "importancia", sem esclarecimento,
como ocorre na formulacao, acima apresentada, da lei da ponderacao, quan-
do se a le de modo que ela nao diz respeito explicitamente a pesos abstratos,
porque esses neutralizam-se por causa de igualdade de peso. Se se escolhe
esse caminho, entao se pode definir o peso concreto ndo relativo como
importancia (Wi, Wj) como segue:
= /i Gi
Wj = I; • G.;
Desse modo, o triplo sent ido da expressao "peso" pode ser dissolvido
completamente.
recomendavel relacionar tambem Gi e Gj coin escalas triadicas que
sao representadas por consequencias geometricas. Corn isso, vale todo o
dito para os valores de i e /i tambem para aqueles de Gi e Gj. Isso nao
evidente, mas expressao da suposicao, que ao peso abstrato e a intensidade
da intervened°. cabe urn peso igual — esse conceit° vago entra em uso agora
• Gi • Si
• Gi • Sj
41
Gi, j — =2
4 1/2
V. A fórmula ampliada
Até agora, tratou-se sempre somente de colisóes entre dois princípios.
Esses podem ser compreendidos completamente pela fórmula peso. Fre-
quentemente, porém — de um lado ou de ambos —, vários princípios esto
cm jogo. Como também cm tais casos, no total, somente urna decisáo pode
ser tomada, todos os princípios correspondentes devem, de algum modo,
ser postos em relagáo um com os outros. A questáo é, se isso pode ocorrer
pelo encaixe de efeitos cumulativos na fórmula peso. A verso mais simples
seria urna cumulagáo aditiva simples. Aqui. deve ser considerado somente
o lado da barreira." Se se admite, aqui, a cumulagáo aditiva, entáo se obtém
a seguinte fórmula:
Gi, j_n =
Ij Gj • Si + I Gn Sn
Essa fórmula pode ser designada como "fórmula peso ampliada-.
46
Se se toma cm considernáo também o lado do direito fundamental, cuja violaQáo é examinada (P,),
entáo a cumulaqáo conduz inevitavelmente para o holismo dos direitos fundamentais. Do lado de Pi
deveriam ser pastos todos os direitos fundamentais que, por aquilo, que intervém em P,, igualmente
estáo afetados negativamente. O esquema tradicional, segundo o qual, cada vez, uma intervenláo cm
um direito fundamental deve ser examinada, dissolver-se-ia. O mais radical seria essa dissolugáo se se
estendesse a possibilidade da cumulaQáo a todos os outros princípios constitucionais. Todos os princí-
pios que falam contra a medida a ser examinada lutariam, entao, cm comum, contra todos os princípios
que falam cm favor dela. O direito fundamental, cuja violagáo é examinada, entáo náo seria mais
nenhum combatente individual, mas somente ainda o comandante de urna tropa, mais ou menos ampla.
O peso concreto do direito fundamental, cuja violagáo é examinada, seria o peso concreto desse prin-
cípio no sistema total da constituiQáo. laso deixa apresentar-se pela seguinte fórmula:
I, • Gi Si + In, • G., • Sm
j.n =
• Gi • Si + I,, • Ga • Sn
Essa fórmula deve ser denominada "fórmula peso completamente ampliada".
47
Comparar R. Alexy 1ndividuelle Rechte und kollektive GI.act-, in: ders., Recht. Vernunft, Diskurs,
Frankfurt a. M. 1995, S. 232.
Sumario: I. Ponderacao; II. Duas objecoes; III. A estrutura da ponderacao; IV. Juris-
dicao constitucional; V. Representacao; 1. Representacao argumentativa; 2. Condi-
cOes de representacao argumentative autentica.
* Este artigo foi publicado originalmente na ICON, Volume 3, Number 4, p. 572 et seq. Titulo no
original: Balancing, constitutional review, and representation. Na Alemanha, ele sera publicado por
Michael Becker/Ruth Zimmerling (Hg), Politik und Recht. Sonderheft der Politischen Vierteljahres-
schrift, 2006, p. 1 et seq. Titulo no original: Abwagung, Verfassungsgerichtsbarkeit und Reprasenta-
tion.
1 Entre aspas no original. Nota do tradutor: ver supra, 8, o artigo referente a essa f6rmula.
V. Representnáo
Jurisdigáo constitucional é exercício de poder estatal. Em um estado
democrático, no qual — como está dito no artigo 20, alínea 1, proposigáo 1,
da lei fundamental, — "todo poder estatal ... provém do po y o"," jurisdigáo
constitucional somente entáo pode ser legítima se ela é compatível com a
18 Entre aspas e cm itálico no original.
19
Entre aspas e cm itálico no original.
20
Entre aspas e pontuagáo no original.
I. Representaccio argumentativa
A chave para a solucao desse problema e, corn isso, do problema geral
da jurisdicao constitucional é o conceito da representacao argumentativa.
Representacao é uma relacao de duas vriaveis entre urn repraesentandum
e urn repraesentans. No caso da dacao de leis parlamentar, a relacao entre
o rep raesentandum — o povo — e o repraesentans — o parlamento — 6 deter-
21
minada, essencialmente, por eleicoes. Agora, 6 possivel esbocar uma ima-
gem da democracia, que contem nada mais que urn procedimento de decisdo
centrado nos conceitos de eleicao e de regra da maioria. Isso seria um mo-
delo puramente decisionista 22 de democracia. Urn conceito adequado de
democracia, contudo, lido se deve apoiar somente no conceito de decisao.
Ele precisa tambem abarcar o de argumento. 0 abarcamento da argumen-
tacao no conceito de democracia torna a democracia deliberativa. A demo-
cracia deliberativa é a tentativa de institucionalizar o discurso, tao
amplamente quanto possivel, como meio da tomada de decisdo pUblica.
Desse fundamento, a unido entre o povo e o parlamento precisa ser deter-
minada nao somente por decisiies, que encontram expressao em eleicOes e
votacoes, mas tambem por argumentos. Desse modo, a representacao do
povo pelo parlamento 6, simultaneamente, volicional ou decisionista 23 e
argumentativa ou discursiva.
A representacao do povo por urn tribunal constitucional 6, pelo con-
trario, puramente argumentativa. 0 fato que a representacao pelo parlamen-
21
Em itálico, a cada vez, no original.
22
Nota do tradutor: ver supra, 1, nota 14.
23
Nota do tradutor: ver supra, 1, nota 14.
29
Entre aspas no original.
168
Robert Alexy