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CIDADES
autor
CARLOS EDUARDO NUNES-FERREIRA
1ª edição
SESES
rio de janeiro 2017
Conselho editorial roberto paes e luciana varga
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2017.
isbn: 978-85-5548-464-3
1. O que é cidade 7
Definições de cidade 9
A cidade como fenômeno geográfico 10
A cidade como posto de troca comercial 10
A cidade como um símbolo cultural 10
A cidade como centro de poder 11
A cidade como obra de arte 12
A cidade como estado de espírito 13
A cidade como berço da civilização 14
O surgimento do urbanismo 15
Há diferentes versões para a origem da palavra urbanismo 15
Cidades medievais 55
Prezados(as) alunos(as),
Bons estudos!
5
1
O que é cidade
O que é cidade
A humanidade produz edificações isoladas para abrigar as funções primárias
de descanso, trabalho e lazer, assim como equipamentos para o culto e a cultura.
No entanto, em um sentido amplo, a vida humana é um evento coletivo. A
maior representação desta coletividade são os assentamentos humanos formados
para possibilitar a troca de produtos, serviços e ideias.
No nosso primeiro capítulo, veremos que, em determinado momento de sua
história, o ser humano reuniu tudo isso em um único lugar a que deu o nome de
cidade ou urbe, termo derivado do latim. Por isso, o estudo das cidades recebeu o
nome de urbanismo. Hoje, a maioria dos habitantes do planeta vive em cida-
des. Estamos, assim, nos transformando em seres urbanos.
A arquitetura é uma das manifestações da cultura de um povo. O urbanismo
é a expressão espacial de uma sociedade. Entre uma edificação isolada e o pla-
nejamento das cidades, o arquiteto e urbanista irá trabalhar em diferentes escalas e
diversos graus de complexidade. Portanto, é importante que você saiba a diferença
entre elas.
O ser humano produz cidades desde a Antiguidade, mas o urbanismo é uma
disciplina relativamente recente. As cidades têm sido centros de inovação e polos
de riqueza para a humanidade. Este capítulo pretende ser a porta de entrada para
este tema fascinante.
OBJETIVOS
• Conhecer definições diversas de cidade;
• Definir o conceito de urbanismo como o estudo da cidade;
• Refletir sobre a dimensão urbana da vida em sociedade;
• Identificar o urbanismo como campo de conhecimento técnico, científico, geopolítico, his-
tórico e cultural;
• Comparar as diferentes escalas do projeto de arquitetura e urbanismo.
capítulo 1 •8
Definições de cidade
capítulo 1 •9
A cidade como fenômeno geográfico
Para alguns autores, a origem do que hoje chamamos de cidade está diretamente
ligada à criação de um espaço que permitisse a troca dos bens produzidos por um in-
divíduo pelos bens ou serviços que pudessem ser fornecidos por outro indivíduo ou
instituição. Deste ponto de vista histórico, os primeiros assentamentos humanos
eram postos de troca do excedente de produção de um proprietário de terra para
outro, de uma região para a outra, de um produto por um serviço.
Por isso, as cidades de ontem e de hoje se assemelham por estarem em cruzamentos co-
merciais. Hoje esses cruzamentos de produtos e serviços não podem mais ser entendidos
apenas no seu sentido físico, como portos e aeroportos ou estradas que se cruzam, mas
também como interconexões transnacionais, propiciadas pela globalização econômica e
pelas novas tecnologias de informação e comunicação (Nunes-Ferreira, 2014, p. 37).
A cidade é a primeira e decisiva esfera cultural do ser humano. E para realçar ainda
mais seu papel está o fato de que hoje, pela primeira vez na história da humanidade,
mais da metade da população mundial vive em cidades. (Teixeira Coelho)
capítulo 1 • 10
PERCENTUAL DA POPULAÇÃO URBANA
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MUNDO BRASIL
COMENTÁRIO
A população urbana ultrapassou a população rural no mundo em 2007. Já no Brasil, a
população urbana superou a população rural em meados dos anos 1960.
capítulo 1 • 11
©© KING OF HEARTS | WIKIMEDIA.ORG
Panorama da ponta sul da ilha de Manhattan, com destaque para a Torre da Liberdade, que
substituiu as torres gêmeas após os ataques do 11 de setembro de 2001 ao World Trade
Center – ou centro mundial do comércio. Ao atingir Nova York, o intuito era ferir o poder
econômico que aquela cidade representa.
capítulo 1 • 12
e veículos. Propõe, assim, o valor estético da cidade aliado às questões funcionais,
sempre considerando a arte como princípio norteador.
Existe, ainda, a ideia de que a cidade reflete certo estado de espírito, pela re-
união de pessoas de uma cultura específica e de espaços que propiciam deter-
minado tipo de comportamento. O escritor norte-americano Ernest Hemingway
(1899-1961) escreveu em seu livro de memórias, publicado postumamente em
1964: “se você tiver a sorte de ter vivido em Paris quando jovem, não importa por
onde ande pelo resto de sua vida, leva isso junto, porque Paris é uma festa ambu-
lante” (HEMINGWAY, 2013).
capítulo 1 • 13
O estado de espírito de que fala Park pode ser fruto de uma época, de uma
atividade econômica ou mesmo de uma percepção que se tenha de uma cidade.
Afinal, tanto os edifícios quanto as experiências vividas em um determinado lu-
gar criam o que chamamos de imaginário, ou seja, um conjunto de símbolos,
conceitos, memória e imaginação de um grupo de indivíduos. De certo modo,
o imaginário de uma cidade faz aquela cidade ser o que é, pois termina por fun-
damentar uma série de representações que, por sua vez, irá inspirar as narrativas
de habitantes e visitantes. Neste sentido, a cidade é uma narrativa de diferentes
representações, assim como a representação de diferentes narrativas.
O imaginário é determinado pela ideia de fazer parte de algo. Partilha-se uma filosofia
de vida, uma linguagem, uma atmosfera, uma ideia de mundo, uma visão das coisas
(MAFFESOLI, 2001, p. 80).
CURIOSIDADE
A palavra urbanidade está ligada diretamente à civilidade, que, por sua vez, significa
cortesia e respeito mútuo. Do mesmo modo, indivíduo civilizado é aquele que é bem-edu-
cado e urbano.
Fonte: Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 2. ed.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
capítulo 1 • 14
A esta altura, você deve estar confrontando as visões de cidade apresentadas
neste capítulo com as notícias diárias de violência nos grandes centros e as cons-
tantes epidemias globais que têm tomado força com as viagens internacionais nes-
te mundo conectado. Vamos demonstrar a seguir como o próprio urbanismo sur-
giu em resposta a problemas de saúde, poluição e violência no coração de grandes
cidades europeias.
O surgimento do urbanismo
MULTIMÍDIA
Assista ao vídeo: 6 mil anos de urbanização ao redor do mundo. Disponível em:
<http://www.archdaily.com.br/br/791595/assista-quase-6-mil-anos-de
-urbanizacao-neste-vid>
capítulo 1 • 15
mediante um estudo metódico da geografia humana e da topografia urbana sem
descurar as soluções financeiras” (SILVA, 2007).
O urbanismo trata, portanto, da cidade em suas diferentes dimensões: a ocu-
pação construtiva do território, a distribuição de funções e o movimento da po-
pulação, além dos interesses sociais e econômicos dos diferentes atores urbanos.
Tudo isso deve levar em conta, ainda, os recursos financeiros existentes.
Como já vimos anteriormente, o ser humano constrói cidades desde a
Antiguidade, mas o urbanismo irá se tornar uma disciplina e um campo profis-
sional apenas no século XIX. Com o sucesso econômico da Revolução Industrial,
multiplicaram-se as oportunidades de trabalho nos grandes centros europeus. Mas
houve um momento em que um paradoxo se instalou. Embora a cidade fosse vista
como um polo de produção de riqueza e prosperidade, o que atraiu um aumento
populacional inédito com a imigração da população rural, as condições de vida da
nova classe operária deterioraram-se. O crescimento econômico de base industrial
terminou por gerar um crescimento urbano desordenado e insalubre. As taxas de
mortalidade cresceram e comprometeram a própria economia. Surgiram, então, as
primeiras operações urbanísticas no sentido de criar a infraestrutura necessária que
permitisse o abastecimento de água limpa, o saneamento e a melhor circulação de
pessoas, bens e serviços.
As grandes intervenções urbanís-
ticas do século XIX visavam a propi-
ciar tanto uma melhor qualidade de
vida quanto o embelezamento das
cidades. Os exemplos mais conhecidos
deste período são: a reforma do centro
de Paris pelo Barão Haussmann e o pla-
no de expansão de Barcelona definido
por Ildefonso Cerdá, que veremos com
mais profundidade no capítulo 3.
capítulo 1 • 16
Aspectos de Paris, antes e depois da reforma de Haussmann.
capítulo 1 • 17
CONCEITO
Tecido Urbano é um determinado tipo de urbanização de uma região urbana.
Fonte: Wikipedia.
ATENÇÃO
É importante lembrar que estes são limites flexíveis. Aqui já se pode notar uma interse-
ção entre as escalas gráficas na margem entre 1:50 e 1:100. Nos dois casos, o arquiteto
poderá produzir até desenhos em proporção ainda mais próximas dos elementos finais, no
que se convencionou chamar de projeto de detalhamento, que poderá, inclusive, chegar à
escala 1:1, ou seja, uma representação em tamanho real.
capítulo 1 • 18
De modo similar, o projeto arquitetônico completo deverá definir todas as
intervenções que acontecerão nos espaços entre a construção e os limites do ter-
reno, tais como: acessos, calçamentos, vegetação e equipamentos externos. Por se
tratar de uma interferência na paisagem, o conjunto dessas intervenções receberá
a denominação de projeto paisagístico.
A partir do limite do terreno, ou seja, quando se ultrapassa o domínio da
edificação para o domínio da cidade, começamos a falar sobre o desenho urbano.
Embora sejam conceitos distintos, poderíamos afirmar que, salvo algumas exce-
ções, o desenho urbano será aplicado em áreas de uso coletivo ou espaços públicos.
Neste sentido, o desenho urbano é o projeto dos espaços da cidade. Exatamente
por isso, ele poderá incluir o projeto de edificações e inclui necessariamente o
projeto paisagístico, mas trata principalmente do ordenamento de logradouros,
como ruas, calçadas, praças, esquinas, ciclovias e avenidas, assim como todos os
equipamentos de iluminação, sinalização e acesso às redes de infraestrutura, além
do mobiliário urbano necessário como bancos de rua, abrigos de ônibus etc. Para
o desenho urbano na escala do condomínio ou do bairro, tem-se utilizado fre-
quentemente o anglicismo masterplan.
CURIOSIDADE
A melhor tradução de masterplan para o português seria plano diretor. O problema é que,
no Brasil, nós utilizamos este termo para o projeto que irá tratar de todo o município, como
você verá mais adiante.
capítulo 1 • 19
um órgão denominado prefeitura. Um município poderá ter várias cidades ou
distritos sob uma mesma administração e terá perímetro urbano e zona rural. Pelo
artigo 182 da Constituição Federal de 1988, toda cidade com mais de vinte mil
habitantes tem a obrigação de possuir um plano diretor.
“O plano diretor (...) é o instrumento básico da política de desenvolvimento
e de expansão urbana” e, como parte da política nacional de desenvolvimento ur-
bano, “tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da
cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes” (Constituição Federal, Art. 182).
O arquiteto e urbanista poderá atuar na concepção e execução de planos diretores,
assim como poderá contribuir para o bem-estar dos habitantes de uma cidade
ao exercer sua profissão com ética e competência em todas as escalas acima apre-
sentadas. Alguns autores dirão que a complexidade da cidade dificulta qualquer
intervenção eficaz. Por outro lado, Jaime Lerner, o urbanista brasileiro consagrado
internacionalmente por suas bem-sucedidas intervenções em Curitiba, alertou aos
jovens estudantes que “a cidade não foi feita para pessimistas”.
COMENTÁRIO
Esta declaração foi feita em uma palestra conferida no dia 8 de setembro de 2016 du-
rante o evento de lançamento do documentário Jaime Lerner - Uma história de Sonhos,
de Carlos Deiró, da Pandora Filmes.
capítulo 1 • 20
• Urbanismo culturalista: visão que defende que a análise cultural de um
agrupamento humano deve ser a base para o planejamento urbano. O modelo
produzirá planos que incorporam o passado e valorizam os aspectos particulares e
originais de cada comunidade;
• Urbanismo naturalista: visão que valoriza o meio natural em oposição à
expansão das cidades, aproximando-se, assim, da ideia de um antiurbanismo. O
modelo prevê uma rede de comunidades relativamente pequenas que abriguem
todas as funções necessárias para uma vida diretamente ligada à natureza.
COMENTÁRIO
Muitos autores irão apresentar conceitos novos utilizando palavras que eles mesmos
criaram. A isso chamamos de neologismo. Neste caso, a autora construiu dois novos termos
a partir da junção de duas palavras existentes:
Tecnotopia = tecnologia (habilidade) + utopia (não-lugar)
Antrópolis = antropo [Do grego: ánthropos (homem)] + polis [Do grego: pólis (cidade)]
capítulo 1 • 21
áreas adensadas de valor histórico ou áreas degradadas em meio ao tecido urbano
consolidado.
Existe, ainda, outra característica das cidades atuais que o arquiteto e urba-
nista precisará conhecer. Além dos centros históricos, dos bairros consolidados e
das áreas de expansão, existem, hoje, em diferentes países em desenvolvimento,
comunidades erguidas sem qualquer planejamento, a que chamamos de assenta-
mentos subnormais ou cidade informal. No Brasil, o termo mais utilizado para
estas comunidades é favela.
A dicotomia entre a cidade formal e a cidade informal talvez seja o maior
desafio do urbanismo contemporâneo. Em grande parte das cidades brasileiras, a
proporção entre as construções informais e os bairros legalizados podem se igualar.
Em algumas cidades da América do Sul, a ocupação informal supera a cidade legal.
Situações semelhantes acontecem na Ásia e na África.
O desafio é grande. Neste capítulo, foram apresentados alguns conceitos ini-
ciais e modelos de cidade que serão aprofundados mais adiante. Como campo de
conhecimento e área promissora de atuação do arquiteto e urbanista, o urbanismo
deve ser compreendido em toda a sua complexidade. Pelo que já vimos até o mo-
mento, é muito importante entender o passado e o presente das cidades, porque o
futuro está em suas mãos!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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capítulo 1 • 22
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VELHO, Otávio Guilherme (org.). O fenômeno urbano. Rio de Janeiro: Zahar, 1967.
capítulo 1 • 23
capítulo 1 • 24
2
Dos primeiros
assentamentos à
cidade tradicional
Dos primeiros assentamentos à cidade
tradicional
capítulo 2 • 26
fenômeno urbano, conhecer e analisar as cidades produzidas em um tempo e lugar
que ficou conhecido como o berço da civilização ocidental.
A arquitetura e o urbanismo atuam em um sentido duplo. Se, por um lado,
refletem o sistema de valores e as aspirações existentes em uma sociedade, por ou-
tro lado, ajudam a construir uma determinada realidade que promove, corrobora e
perpetua tais valores e aspirações. Assim como é importante identificar as represen-
tações urbanas de valores que herdamos da Grécia Antiga e do Império Romano
como a democracia e o direito, respectivamente, é igualmente essencial compreen-
der por que as cidades medievais europeias construíram grandes catedrais.
As catedrais cristãs simbolizavam materialmente o poder da Igreja Católica.
Sua monumentalidade representava a onipresença, a onisciência e a onipotência
de um Deus que não podia ser visto. Ao mesmo tempo, elas abrigavam as funções
sociais de uma determinada comunidade. Isto concedia aos sacerdotes o seu do-
mínio social, reforçando o poder religioso sobre aquela população. Mais adiante,
o poder civil, ainda que com menor intensidade, também irá construir grandes
edificações como demonstração de poder e ascendência sobre a população. Como
a política, a cultura também se fará representar no espaço urbano com espaços e
edificações de certa magnitude.
Atualmente, são os grandes centros de poder econômico do mundo contem-
porâneo que empenham vultuosos investimentos em imóveis monumentais e re-
des de tecnologia da informação e comunicação. Isso lhes permite reunir grandes
grupos econômicos e concentrar dados, além de atrair profissionais de alto desem-
penho. Assim, o capital excedente é reinvestido no aperfeiçoamento dos edifícios,
espaços e serviços que terminam por gerar um ambiente de negócios mais eficaz
e sofisticado. Por conseguinte, os altos salários pagos permitem a criação de uma
rede de serviços que tornam a vida mais atraente para as classes mais altas, gerando
empregos e renda para as demais. A riqueza circula e a cidade cresce.
Por isso, torna-se fundamental estudar os elementos principais das cidades
que forjaram os valores da sociedade ocidental e verificar a herança destes edifícios
e espaços nas cidades contemporâneas. Alguns exemplos passaram a fazer parte do
nosso imaginário como uma ideia perfeita de cidade tradicional e exercem certo
fascínio nostálgico sobre um lugar em que nunca vivemos. Por outro lado, alguns
espaços vitais encontrados nas cidades dos primórdios da civilização ocidental
podem nos esclarecer muito a respeito do modo como vivemos atualmente.
capítulo 2 • 27
OBJETIVOS
• Conhecer diferentes visões sobre a fundação dos primeiros assentamentos humanos;
• Analisar a evolução destes assentamentos em cidades;
• Identificar modelos das cidades antigas das civilizações ocidental e oriental;
• Avaliar o conceito de cidade tradicional a partir das cidades europeias;
• Reconhecer o fenômeno urbano como um processo evolutivo.
A cidade permanece uma criação histórica particular; ela não existiu sempre, mas
teve início num dado momento da evolução social, e pode acabar, ou ser radicalmente
transformada, num outro momento. Não existe por uma necessidade natural, mas uma
necessidade histórica, que tem um início e pode ter um fim. (Leonardo Benévolo)
A origem das cidades tem algumas versões, entre as quais destacaremos três
principais:
• A cidade nasce como posto de troca do excedente da produção
de alimentos;
• A cidade tem origem na prestação de serviços de defesa a uma população;
capítulo 2 • 28
• A cidade surge quando tribos existentes decidem fixar-se em um
território.
©© KENNY ARNE LANG ANTONSEN | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 2 • 29
Há uma interdependência entre campo e cidade. A grande diferença é que,
no início, as distâncias eram curtas e a produção rural abastecia a população ur-
bana mais próxima. Hoje, você vai a um supermercado e encontra produtos de
diversas partes do país ou do mundo, como açaí do Pará ou café do Paraná, maçãs
argentinas, vinhos chilenos e até o trigo do seu pãozinho matinal pode ter vindo
dos campos do meio-oeste dos Estados Unidos.
Também não é difícil identificar que algumas atividades têm suas correspon-
dentes até hoje. Os mercadores são os comerciantes atuais que, além de compra-
rem e venderem mercadorias, também podem prestar serviços a uma determinada
comunidade. O comércio, aliás, foi uma das primeiras formas de integração e
disputa entre os povos. Hoje, ele pode acontecer tanto na venda da esquina da sua
casa quanto no clique de um botão no teclado de seu computador. A matéria-pri-
ma que vem do campo é transformada menos por artesãos e mais por manufaturas
e, mais recentemente, pela indústria. Na cidade, estão os estabelecimentos de en-
sino em todos os níveis. Aos mestres atuais chamamos professores e, enquanto as
escolas são os locais onde recebemos nossa educação formal, a ciência abriga-se nas
universidades. Os templos religiosos ainda permanecem como espaços de culto.
Ao conjunto da produção artística e consuetudinária dá-se o nome de cultura. Os
impostos atuais sobre tudo que produzimos ou consumimos vão em parte para o
financiamento de nossas forças de segurança. Nossos governantes, políticos e
juízes são escolhidos e selecionados para definirem e defenderem, respectivamen-
te, o conjunto de leis de nosso país.
Em resumo, a cidade reúne (de certo modo, desde cedo, em maior ou menor grau e
quantidade): serviços, comércio, indústria, estabelecimentos de ensino, templos religio-
sos, espaços de cultura, forças de segurança, o poder executivo, legislativo e judiciário.
Estas atividades estão relacionadas às três visões principais sobre a origem das
cidades, que vimos no início desta aula. Para concluir este ponto, poderíamos
utilizar a descrição sobre a origem das cidades reproduzida em um importante
documento que analisaremos com mais profundidade no capítulo 3: a Carta de
Atenas (IPHAN, 2014).
Na Carta, enquanto se admite que “os motivos que deram origem às cidades
foram de natureza diversa”, afirma-se que:
• Às vezes, era o cruzamento de duas rotas, uma cabeça de ponte ou uma
baía do litoral que determinava a localização do primeiro estabelecimento;
capítulo 2 • 30
• Por vezes, era o valor defensivo. E o alto de um rochedo ou a curva de um
rio viam nascer um pequeno burgo fortificado;
• Isolado, o homem sente-se desarmado; por isso liga-se espontaneamente a
um grupo. (...) Incorporado ao grupo, (...) pode satisfazer sua profunda necessi-
dade de vida social.
Algumas cidades disputam o título daquela que seria a mais antiga de todas, entre
elas: CatalHöyük, na atual Turquia (abaixo), e Arbela, no que hoje denominamos Iraque.
capítulo 2 • 31
Podem-se notar algumas diferenças significativas entre elas. A estrutura le-
vemente ortogonal da primeira contrasta com a configuração circular da outra.
Na simulação em computação gráfica de CatalHöyük (acima), podemos perce-
ber que o acesso às casas era feito pela cobertura. Já na foto de Arbela (abaixo),
vemos o contraste da área originalmente murada, que pode ser percorrida por
um longo eixo central, e os bairros contemporâneos que circundam a cidade an-
tiga. CatalHöyük tornou-se um sítio arqueológico, enquanto Arbela é habitada
até hoje.
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capítulo 2 • 32
©© SURONIN | SHUTTERSTOCK.COM
No Oriente, a ordenação das cidades aconteceu mil anos mais tarde e surgiu
movida por diferentes simbolismos. De acordo com Benévolo, nos assentamentos
mais antigos da China, há a representação de um eixo, cuja orientação derivava
de aspectos geográficos. “O poder deve garantir o justo equilíbrio entre o norte
e o sul, manter à distância os perigos que vêm do norte, refrear as águas que des-
cem dos altiplanos, e transformá-las em elemento de vida no sul - yin e yang”.
(BENÉVOLO, 2015, p. 55).
capítulo 2 • 33
Antiga planta da cidade de Pequim, capital da China (esquerda) em comparação à foto de
satélite da Cidade Proibida hoje (direita). Esquerda: Gravura de Erhard e Bonaparte, a partir
de baixos relevos chineses antigos. Publicado em le tour de Monde, Paris, 1864. Copyright:
Marzolino. Direita: Google Earth.
capítulo 2 • 34
©© WIKIMEDIA.ORG
capítulo 2 • 35
Foto de satélite de Veneza com a Praça São Marcos em destaque em meio ao denso tecido
urbano.
Ao analisar o caso de Veneza, na Itália, pode-se observar que a cidade foi cons-
truída inicialmente com um traçado irregular, que se estende sobre 117 ilhas. No
seu ponto de maior destaque, está a Praça de São Marcos, que recebeu de Napoleão
Bonaparte o apelido de salão mais belo da Europa. Lá encontram-se as grandes edifi-
cações que representam, respectivamente, o poder civil e o poder religioso: o Palácio
dos Doges e a Basílica de São Marcos (ambos no canto direito da foto abaixo). Antes
um modesto largo, a praça ganhou seu formato atual em 1.777.
capítulo 2 • 36
Vista aérea da Praça de São Marcos em Veneza, Itália. Observe como o ângulo inclinado
entre as edificações dramatiza a perspectiva em direção às edificações principais. Agora ima-
gine o impacto de chegar a este espaço após uma caminhada pelas ruas tortuosas da cidade.
No urbanismo, como na arquitetura, muitas vezes o percurso do observador e a sequência
dos espaços são tão importantes quanto as construções em si.
CURIOSIDADE
Bruno Zevi é o autor que irá aplicar à arquitetura o conceito da quarta dimensão. Além de
comprimento, largura (ou profundidade) e altura, Zevi define o tempo como a quarta dimen-
são do espaço. Ao contrário de um objeto ou escultura, a arquitetura e o urbanismo criam es-
paços que podem ser percorridos pelo observador em um tempo dado. Isto permite ao autor
do projeto definir a sequência de percepção de cada espaço, provocando assim sensações
determinadas. Esta característica levou Göethe, o filósofo alemão, a declarar que: “arquitetura
é música congelada”.
capítulo 2 • 37
Por outro lado, a ideia de se criar uma cidade ideal e planejada, capaz de
promover, ao máximo, o bem-estar de sua população, persiste na história do ur-
banismo. Na maioria de exemplos deste caso, traçados de geometria racional são
empregados, como se a regularidade e a simplicidade formais - e a ordem e a previ-
sibilidade dela resultantes - fossem uma garantia de civilidade e evolução humana.
Veja como a foto aérea de Palmanova, também na Itália, localizada a cerca de
100 Km de Veneza, revela este aspecto e esta intenção. O projeto da cidade foi
concebido como uma fortaleza de nove lados e três entradas que conduzem a uma
praça central em forma de hexágono. Construída no século XVI, pretendia, ao
mesmo tempo, proteger os habitantes de inovações bélicas poderosas para a época
e criar uma ambiência perfeita para o desenvolvimento dos seus cidadãos. Em
virtude de seu formato, Palmanova é conhecida como cidade estrela.
©© WIKIMEDIA.ORG
Mapa histórico (esquerda) e foto de satélite (direita) da cidade de Palmanova, construída como
cidade-estrela, forma idealizada de cidade.
capítulo 2 • 38
Place de L’Etoile, em Paris, França, com o Arco do Triunfo ao centro.
Representação da Cidade ideal (c. 1470). O quadro é atribuído tanto ao pintor italiano Piero
della Francesca quanto ao arquiteto Leon Battista Alberti.
capítulo 2 • 39
que serve de exemplo, algo que deveria ser reproduzido. Já ideal, entre outras
acepções da palavra, é aquilo que atingiu a perfeição e que dificilmente se po-
derá alcançar na realidade. Portanto o urbanismo irá produzir modelos e ideais
diferentes de acordo com a época, o lugar e a corrente de pensamento. O quadro
Cidade Ideal (acima reproduzido) retrata a visão renascentista de ordem, simetria
e proporção, fazendo uso privilegiado da perspectiva em sua representação, mas
dificilmente corresponderia a uma visão contemporânea de cidade, como veremos
nos próximos capítulos.
Françoise Choay, autora que apresentamos no primeiro capítulo, escolheu
para seu livro O urbanismo o subtítulo: utopias e realidades. Utopia é uma palavra
formada pelo prefixo grego óuque significa “não” e a palavra grega topos ou “lugar”.
De certo modo, utopia seria um lugar que ainda não existe, exposto em projetos
visionários que muitos urbanistas utilizam a fim de demonstrar para o público sua
visão do que seria uma cidade perfeita. Cabe lembrar que a própria Choay classifi-
ca tais visões, no que se refere aos séculos XIX e XX, como progressista, culturalista
e naturalista. Enquanto o urbanismo progressista buscava um padrão racional, a
visão culturalista valorizava os aspectos originais de cada comunidade e a corrente
naturalista preconizava uma relação mais estreita entre urbanismo e natureza.
capítulo 2 • 40
©© WIKIMEDIA.ORG
O urbanismo progressista da cidade contemporânea de Le Corbusier e a visão culturalista da
Cidade Jardim de Ebenezer Howard, que analisaremos nos próximos capítulos.
capítulo 2 • 41
média afluente norte-americana, dificilmente este modelo seria adequadamente
implantado em contextos sociais e culturais diferentes.
Por fim, é importante ressaltar que o urbanismo é, ao mesmo tempo, um vasto
campo de conhecimento e uma prática em constante evolução.
ATENÇÃO
Uma boa estratégia utilizada pelos arquitetos e urbanistas para analisar o traçado de
uma cidade é conhecida como Mapa Nolli ou Mapa de Nolli.GianbattistaNolli produziu um
mapa de Roma (Pianta Grande di Roma) em 1748, em que enfatizava a relação entre cheios
e vazios. Esta técnica tem sido muito utilizada pelos urbanistas mais recentes a fim de de-
monstrar as características da estrutura urbana da cidade tradicional.
capítulo 2 • 42
Veja o Mapa Nolli da região da Praça Navona em Roma.
capítulo 2 • 43
O Mar Mediterrâneo recebeu este nome, que significa “entre as terras”, exa-
tamente porque está localizado entre Europa, Ásia e África. Estes eram, afinal,
os três continentes habitados conhecidos na Antiguidade de um ponto de vista
eurocêntrico. Nesse sentido, “mediterrâneo” poderia ser interpretado simbolica-
mente como o mar que estava no centro da Terra. Repare que, em suas margens,
podemos localizar: Egito (no norte da África); Israel, Palestina e Turquia (no oeste
da Ásia); Grécia e Itália (no sul da Europa). Por isso mesmo, alguns autores irão
relacionar o Mar Mediterrâneo como o berço da civilização ocidental.
A Grécia Antiga era formada por um conjunto de cidades que tinham auto-
nomia política, mas que desfrutavam de uma cultura comum: Atenas, Esparta,
Tebas, Corinto, Rodes, entre outras. Seria impreciso delimitar o início de sua for-
mação, mas poderíamos afirmar que esse sistema vigorou nos mil anos anteriores
ao domínio do Império Romano.
CURIOSIDADE
O termo “grego” tem origem latina. No idioma grego, o país que hoje conhecemos por
Grécia é denominado Hélade ou República Helênica. Helenismo, por sua vez, significa a
expansão e difusão da cultura helênica (ou grega) no mundo ocidental.
Por sua autonomia política e militar, cada cidade da Grécia Antiga era con-
siderada uma cidade-Estado. Para este modelo de organização deu-se o nome de
polis. Repare que esta é a mesma palavra de origem grega que dará origem ao
termo política. Nesse sentido, a cidade é o espaço da cidadania e da política.
Leonardo Benévolo (BENEVOLO, 2015, pp. 75-76) comenta a relação entre
cidade, sociedade e cultura, quando se refere a um ambiente propício à formação de
“uma nova cultura, que ainda hoje permanece base da nossa tradição intelectual”:
capítulo 2 • 44
É necessário recordar sucintamente a organização da pólis, a cidade-Estado, que tor-
nou possíveis os extraordinários resultados da literatura, da ciência e da arte. A origem
é uma colina, onde se refugiam os habitantes do campo para defender-se dos inimi-
gos; mais tarde, o povoado se estende pela planície vizinha, e geralmente é fortificado
por um cinturão de muros. Distingue-se então a cidade alta (a acrópole, onde ficam os
templos dos deuses) (...) e a cidade baixa (a astu, onde se desenvolvem os comércios
e as relações civis. (Leonardo Benévolo)
©© WIKIMEDIA.ORG
Simulação da Acrópole de Atenas na pintura de Leo von Klenze (1846), acervo da Neue
Pinakothek de Munique, Alemanha.
PÓLIS OU CIDADE-ESTADO
Área sagrada Área pública Área privada
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©© SINGINGLEMON | WIKIMEDIA.ORG
Planta baixa da antiga Atenas, com destaque para a Acrópole (centro) e para a Ágora
(esquerda).
capítulo 2 • 46
que havia uma tentativa de ordenamento, orientação e articulação entre logra-
douro e edifício, ainda que não tão rígido. Afinal, as grandes construções eram
retangulares, fruto de um sistema estrutural relativamente simples. Este contraste
terminava por permitir que os edifícios ganhassem destaque na paisagem, pois
dificilmente eram vistos por um ângulo reto. Invariavelmente, a vista alcançava
mais de uma fachada, criando, por meio da perspectiva, um efeito tridimensional.
Poderíamos, ainda segundo Benévolo, estabelecer quatro princípios básicos
das cidadesda Grécia Antiga:
• Unidade;
• Articulação;
• Limite de crescimento;
• Natureza.
UNIDADE
NATUREZA ARTICULAÇÃO
LIMITE DE
CRESCIMENTO
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capítulo 2 • 48
Planta baixa de Mileto.
capítulo 2 • 49
O modelo de cidade do Império Romano
©© ANDREI NACU | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 2 • 50
territórios ocupados. O modelo da cidade romana foi sendo desenvolvido, natu-
ralmente, a partir da capital, Roma, que chegou a reunir um milhão de habitantes.
É precisamente do termo urbe (cidade em latim) que teremos a expressão urba-
nismo, o estudo das cidades. Deve-se, ainda, a esta rede viária e ao conjunto de
cidades construídas ou expandidas a partir do modelo central, a máxima: “todos
os caminhos levam a Roma”.
capítulo 2 • 51
©© WIKIMEDIA.ORG
Mapa da Roma republicana, com destaque para os montes (mons), colinas (collis) e fóruns.
A cidade romana poderia ser dividida em três áreas: cívica, pública e privada.
As colinas e montes de Roma eram reservados à área cívica, com os edifícios pú-
blicos de maior importância política, por sua visibilidade e simbolismo de poder.
O fórum era a grande área pública, o espaço urbano de maior centralidade das
cidades romanas, destinado, ao mesmo tempo, aos mercados e aos tribunais. Ali
aconteciam as grandes feiras e festas, mas também os debates políticos e os julga-
mentos dos cidadãos que houvessem cometidos crimes ou delitos. Deriva-se desta
função, portanto, a denominação contemporânea da edificação que abriga hoje o
tribunal central em diversas cidades. Deste modo, o fórum reunia, em seu entor-
no, o principal centro comercial e as construções públicas mais relevantes. A partir
dali, nascia um circuito que percorria diferentes prédios de caráter público com
diferentes funções: circos, teatros, arenas, banhos púbicos, entre outros.
Nas áreas privadas, as construções encontradas eram de dois tipos. O domus
era a habitação unifamiliar, de um único proprietário e sua família. Note que
capítulo 2 • 52
este termo gerou a expressão atual domicílio. Já os edifícios que abrigavam diver-
sas famílias eram chamados insulae, precursores dos apartamentos de hoje, pois
contavam com alguns pavimentos. As insulae eram habitadas pelas populações
mais pobres.
URBE
Área cívica Área pública Área privada
A ocupação do território pelo Império Romano vai-se dar segundo eixos prin-
cipias denominados cardo maximus e decumanus maximus. Eles delimitavam zonas
cadastrais que formavam uma quadrícula de terras cultivadas. O cruzamento des-
tes dois eixos ortogonais tornava-se, assim, um importante entroncamento viário.
Nada mais natural, então, que novas cidades surgissem nestes cruzamentos e fos-
sem estruturadas a partir destes dois eixos.
No modelo de cidade romana ideal, o cardo seria traçado na direção norte-sul
e o decumanus iria de leste a oeste. No encontro dos dois estaria localizado o fórum.
capítulo 2 • 53
Já vimos que os romanos herdaram e divulgaram a cultura grega, assim como
analisamos anteriormente o traçado de Mileto, segundo desenho de Hipódamo.
Segundo Leonardo Benévolo, “as cidades romanas traçadas com um desenho re-
gular” (...) poderiam ser consideradas “um prosseguimento, simplificado e padro-
nizado, da prática hipodâmica difundida no mundo helenístico” (BENEVOLO,
2015, p. 197).
Legados da Antiguidade
À esquerda, a ponte sobre o rio Gard, construída pelos romanos no sul da França atual com
a dupla função de estrada e aqueduto. À direita, os Arcos da Lapa, no Rio de Janeiro, cuja
forma inspira-se nos aquedutos romanos, eram responsáveis pela transmissão da água das
montanhas para o centro do Rio e hoje são utilizados como passagem de bondes e atração
turística.
capítulo 2 • 54
A cidade romana ideal segundo o tratado de Vitrúvio (à esquerda) (BENEVOLO, 2015,
p.200) e um exemplo real, a cidade de Como, no norte da Itália (à direita) como exemplo que
pode ser visitado hoje (Google Earth).
Cidades medievais
capítulo 2 • 55
Arles, sul da França atual.
capítulo 2 • 56
Estrutura básica de uma cidade medieval – Lübeck.
BURGO OU CIDADE-ESTADO
Área cívica e religiosa Área pública Área privada
capítulo 2 • 57
Veja a seguir o exemplo da famosa Siena, cidade italiana da região da Toscana:
Vista aérea de Siena em que se podem observar as três características bases da cidade me-
dieval – continuidade, complexidade e concentração – assim como a manifestação espacial
do poder religioso (esquerda), do poder civil (centro) e do poder das corporações (embaixo à
direita). A continuidade interna da estruturação urbana de Siena também se estende na sua
relação com o território rural criando uma rede de comunicação regional. Fonte: Google Earth
©© DLANGLOIS | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 2 • 58
O centro da cidade é o local mais procurado: as classes mais abastadas moram no
centro, os mais pobres na periferia; no centro se constroem algumas estruturas muito
altas – a torre do palácio municipal, e o campanário ou os zimbórios da catedral – “o
arranha-céu de Deus dominava a paisagem” (Le Corbusier) - que assinalam o ponto
culminante do perfil da cidade e unificam o seu cenário também na terceira dimensão.
(BENEVOLO, 2015, pp. 269-270)
capítulo 2 • 59
Na cidade de Florença, pode-se notar a herança do período em que a arquitetura do Re-
nascimento tenta abrir espaço em meio ao tecido da cidade medieval. Fonte: Google Earth.
©© STEVE HERVEY | WIKIMEDIA.ORG
Vista de Florença, com as torres do Duomo, ou Igreja de Santa Maria del Fiore (direita) e do
Palazzo dela Signoria (esquerda), representando o poder religioso e o poder civil respectiva-
mente. Foto: Steve Hersey.
capítulo 2 • 60
No Renascimento, a arte desenvolveu a perspectiva. A arquitetura iria privile-
giar os conceitos da razão e da proporção. No urbanismo, isso significava abrir vias
retilíneas que criassem eixos e perspectivas para o observador em meio à trama da
cidade existente, além de edificações mais regulares.
O tecido humilde e emaranhado é cortado sem hesitações para dar lugar a novas ruas
retilíneas e novos edifícios regulares (... avalia-se o contraste entre a cidade medieval
e acidade moderna, mas destrói-se o tecido medieval, sobrepondo os novos traçados
regulares aos antigos irregulares). (BENEVOLO, 2015, p. 446)
Mapa Nolli da Roma Barroca, com eixos estruturantes partindo da Praça do Povo (Piazza Del
Popolo). Fonte: <https://br.pinterest.com/pin/520095456941914438/>
capítulo 2 • 61
A atual configuração do Vaticano é fruto de intervenções superpostas que vão da Idade Mé-
dia ao Barroco. Fonte: Google Earth.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BENEVOLO, Leonardo. História da cidade. São Paulo: Perspectiva, 2015.
CHOAY, Françoise. O urbanismo. São Paulo: Perspectiva, 1979.
Google earth. Disponível em: <http://www.earth.google.com>.
IPHAN. Carta de Atenas de novembro de 1933, Assembleia CIAM. Disponível em: <http://www.iphan.
gov.br>.
ZEVI, Bruno. Saber ver a arquitetura. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
capítulo 2 • 62
3
A cidade moderna
A cidade moderna
O termo moderno traz consigo uma ambiguidade permanente. A palavra em
si remete simplesmente à atualidade, àquilo que acontece hoje. Entretanto, o adje-
tivo moderno já foi utilizado em diferentes momentos da História para qualificar
um movimento ou acontecimento que indicasse algo radicalmente novo e voltado
para o futuro. E como, necessariamente, tudo o que é novo, oportunamente, dei-
xa de sê-lo, o termo logo tornou-se anacrônico. A Idade Moderna, por exemplo,
teve início com a Queda de Constantinopla, em 1453. Mas teve seu término em
1789, com a Revolução Francesa, que deu início à Idade Contemporânea. A cida-
de europeia barroca foi considerada moderna em oposição à estrutura da cidade
medieval. E assim por diante.
Moderno tambémnos remete à ideia de moda, um estilo aceito em uma
determinada época ou um resultado comum em um certo conjunto de dados.
Além disso, refere-se, ainda, “às manifestações artísticas e literárias do século XX”
(FERREIRA, 1986,p. 1.147). Portanto, cidade moderna poderia significar o mo-
delo de cidade mais aceito durante o século XX.
Neste capítulo, analisaremos a origem e a evolução da cidade moderna.
Partiremos das transformações das cidades da Europa a partir da Revolução
Industrial do século XVIII e das inovações implantadas nas capitais do continen-
te no século XIX, para chegarmos às propostas do Movimento Moderno para o
urbanismo.
Entende-se por Movimento Moderno o conjunto de ideias que dominaram
a arquitetura e o urbanismo do século XX. Tais ideias foram divulgadas intensa
e extensivamente pelo planeta por meio de manifestos, congressos e exposições,
mas principalmente, pelos textos, projetos e obras do franco-suíço Le Corbusier
(nascido Charles-Edouard Jeanneret, 1887-1965).
Os arquitetos e urbanistas deste movimento trabalhavam invariavelmente o
tema do espaço e da construção desde a habitação até a escala urbana. Para Le
Corbusier, por exemplo, era urgente trabalhar “uma escala nova e maior no ur-
banismo”. A cidade moderna que ele propõe é a cidade da “liberdade do mo-
vimento contínuo”, “intimamente relacionada à concepção de espaço-tempo”
(NUNES-FERREIRA, 2014, p. 22)
capítulo 3 • 64
CURIOSIDADE
A origem da palavra moderno está em dois termos do latim: modus e hodiernus.
Modus: “modo”, maneira.
Hodiernus: “hodierno” tem origem em hodie, “hoje”.
Moderno seria “dos nossos dias, recente, atual, hodierno”. *
Em uma interpretação mais livre, poderíamos incluir, nesta composição, a palavra moda,
que, por sua vez, remete a dois significados:
1. “Uso, hábito ou estilo geralmente aceito”.**
2. Na matemática, “o valor que ocorre com maior frequência num conjunto de dados,
isto é, o valor mais comum”.***
Os dois significados remetem, portanto, à ideia de um valor ou modelo que está sendo
muito utilizado no tempo presente.
*Fonte: Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, (CUNHA, 2000,
p. 526)
** Fonte: Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, (FERREIRA,1986, p. 1.146)
***Fonte: Wikipedia
OBJETIVOS
• Analisar as transformações das cidades do século XIX e XX;
• Identificar os precursores da cidade moderna;
• Estudar os casos emblemáticos de Paris e Barcelona;
• Analisar o pensamento urbanístico de Le Corbusier e suas consequências para o urbanis-
mo do século XX.
capítulo 3 • 65
propostas do período foram dedicados a repensar o fenômeno urbano do ponto
de vista de uma equação entre os benefícios do crescimento, da indústria e das
máquinas e o resgate da saúde e do bem-estar da população das grandes cidades.
Afinal, “a densidade das cidades industriais havia se tornado desumana e a am-
bição do empreendedor podia agir livre das restrições legais de hoje” (KOSTOF,
1991, p. 76).
Arturo Soria y Mata foi um pensador espanhol que, como os demais autores
estudados neste capítulo, refletiu sobre a sociedade de seu tempo e, além de fazer
críticas ao sistema vigente, optou em propor o modelo de uma “nova arquitetura
das cidades”, como ele mesmo definiu seu projeto.
A proposta da Cidade Linear idealizada por Arturo Soria é, certamente, a
concepção mais simples entre aquelas apresentadas neste momento de construção
do urbanismo como campo de conhecimento teórico e prático.
Na teoria, a proposta visava:
• a diminuição da mortalidade;
• a eficácia da locomoção;
• a regularização da propriedade territorial;
capítulo 3 • 66
• a barateamento das mercadorias e serviços;
• o embelezamento da vida urbana.
Uma rua única ou principal de 40 metros de largura com via férrea dupla em seu
centro; ruas secundárias transversais perpendiculares aos trilhos, que circunscrevem
quadras de 40 a 60.000 metros quadrados de superfícies, e dentro delas, casas com-
pletamente isoladas e separadas umas das outras por uma massa de vegetação, des-
tinada aos ricos, na fachada paralela à via, às fortunas modestas, nas fachadas das vias
transversais; às demais classes da sociedade, na parte mais distante da via; ficando
reservados os grandes espaços centrais a todos os edifícios de caráter coletivo, fábri-
cas, armazéns, mercados, quartéis, igrejas, teatros, instituições de caridade, museus,
colégios etc. (SORIA, 2004, p.86)
Estes itens refletiam os grandes temas abordados pelos urbanistas deste perío-
do: saúde, mobilidade e distribuição social da propriedade, além do embeleza-
mento das cidades.
Ao iniciar a justificativa sobre o seu projeto, Arturo Soriay Mata explicou
que sua motivação principal foi a morte de um filho para a difteria. O arquiteto
atribuiu esta morte “à facilidade com que, nas grandes cidades, se propagam (...)
tantas enfermidades” (SORIA, 2004, p.9). O remédio para esta doença invariavel-
mente passava por uma estrutura urbana que privilegiasse a “luz, o sol e o ar puro”.
capítulo 3 • 67
Também a mobilidade urbana era ponto central das propostas. A cidade mo-
derna exigia velocidade. Neste caso, o urbanista espanhol privilegiou o trans-
porte sobre trilhos. Ao reunir estes dois aspectos, salubridade e movimento, Soria
definiu que “a forma mais perfeita das cidades modernas” (SORIA, 2004, p.3) (...)
“deve ser a de uma linha férrea ou bonde com casas isoladas entre si (‘com árvores,
plantas e flores’) de um lado e de outro dos trilhos” (SORIA, 2004, p.16).
O terceiro ponto que iria permear os projetos de cidades modernas, ou aqueles
que lhe seriam precursores, seria a ideia de que o interesse público deveria estar
acima do interesse privado. Por outro lado, o interesse público precisaria manifes-
tar-se pela legislação ou pelo planejamento urbano. A cidade não deveria crescer
“por instinto, e sim como produto do cálculo e da reflexão” (SORIA, 2004, p.18).
Neste sentido, o ideal seria começar uma estrutura inteiramente nova. Arturo
Soria y Mata parte de um princípio básico: “considerar em primeiro lugar as ne-
cessidades urbanas dos cidadãos para depois definir a colocação das casas – esta
será a forma da cidade” (SORIA, 2004, p.14). Havia, ainda, uma inspiração de
caráter social, pois, na proposta de Soria, “ricos e pobres viverão juntos” (SORIA,
2004, p.18).
Pela proposta apresentada, a eficácia no transporte provocaria diretamente um
menor valor dos produtos para o consumidor final. Pois, nos trilhos, circularia um
bonde rápido de passageiros durante o dia e um trem de carga para abastecimento
de mercadorias à noite.
capítulo 3 • 68
Havia, no entanto, uma peculiaridade na proposta da Cidade Linear e tam-
bém uma grande diferença. O sistema sobre trilhos tinha destaque em relação
ao caminho dos automóveis, que ocupariam vias laterais. E entre os seus pares,
Soria foi aquele que optou firmemente pela horizontalidade, com casas de dois
ou três andares, “em vez de seguir o absurdo caminho da vertical, que conduz ao
delirium tremens dos edifícios de vinte e quatro pavimentos de Londres e Nova
York”(SORIA, 2004, p.16).
Em 16 de julho de 1894, são inauguradas as obras da Cidade Linear de Madri
com a colocação da pedra fundamental da primeira casa. Hoje ela subsiste na for-
ma de um bairro periférico denominado Ciudad Lineal.
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capítulo 3 • 69
A base teórica da proposta de Cidade Jardim apresentada por Ebenezer
Howard, um ativista do movimento socialista inglês, consistiu em conciliar os
benefícios da vida no campo e as vantagens da vida na cidade. Howard utilizou-se,
para isso, da imagem de dois imãs com as características de cada modo de vida:
o imã cidade e o imã campo. A Cidade Jardim teria como inspiração um terceiro
imã: o imã cidade-campo.
A proposta de Howard consistia em uma estratégia combinada de gestão co-
munitária da propriedade e ocupação do território. Uma companhia começaria
por adquirir um terreno rural que pudesse abrigar uma comunidade de cerca de
30.000 habitantes. Para que todos tivessem fácil acesso à “beleza natural” dos
“campos e parques”, a população deveria ser mantida neste patamar. A pequena
cidade ali criada teria seu próprio comércio e indústria, além de ser circundada
por sítios e fazendas.
A Cidade Jardim distinguia-se dos subúrbios das grandes cidades exatamente
por seu grau de autonomia e “oportunidades sociais”: empregos com “salários
altos” gerados ali mesmo para seus habitantes, equipamentos culturais próprios
em que haveria “muito a fazer”, sedes administrativas e serviços completos com
“preços baixos”. O cinturão verde seria a maior garantia da preservação dos limi-
tes daquela comunidade, além de fornecer alimentos e “água e ar puros” para os
seus moradores.
Os primeiros exemplos deste modelo foram Letchworth e Welwyn, ambos
na Inglaterra. O projeto também inspirou o programa New Town, que surgiria
naquele país depois da Segunda Guerra Mundial. Mas a popularidade do modelo
como princípio de planejamento ganhou o mundo. Fundamentou estratégias de
descentralização da população de Paris, na França, nos anos 1920. Foi assimila-
do parcialmente em algumas comunidades nas proximidades de Nova York, nas
primeiras décadas do século XX. Em São Paulo, Brasil, a Companhia City foi
fundada em 1912 e aplicou alguns atributos formais resultantes do modelo em
diversos bairros de classe média alta da capital paulista, como Jardim América,
Jardim Europa e, naturalmente, Cidade Jardim, entre outros.
capítulo 3 • 70
IMÃ CIDADE IMÃ CAMPO IMÃ CIDADE-CAMPO
Afastamento da
Beleza natural Beleza natural
Natureza
Oportunidades
Pouca vida social Oportunidades Sociais
Sociais
capítulo 3
Salários altos Salários baixos Salários altos
Taxas baixas
• 71
Locais de
Falta de entretenimento Muito a fazer
entretenimento
Exército de
Desemprego
desempregados
IMÃ CIDADE IMÃ CAMPO IMÃ CIDADE-CAMPO
Distância do trabalho Terra ociosa Espaço para empreender
Fluxo de capital
Ar viciado e céu
Ruas bem iluminadas Ar fresco Água e ar puros
escuro
Abundância de água
Casas e jardins
Edifícios palacianos Casas superlotadas
esplendorosos
capítulo 3
Nevoeiros e seca Sol brilhante Ausência de poluição
• 72
Necessidade de
Favelas e cortiços Ausência de favelas
reforma
Aldeias desertas
Isolamento das
Barreiras e divisas Liberdade
multidões
capítulo 3 • 73
Cidade Industrial,1904 Tony Garnier
Panorama da proposta da Cidade Industrial de Tony Garnier. Acervo do Het Nieuwe Instituut
- Architecture Collection [No restrictions], via Wikimedia Commons.
capítulo 3 • 74
Nesta descrição parcial, encontram-se os conceitos centrais que a Cidade
Industrial inaugura para o urbanismo, compartilha com modelos anteriores ou
deixa de herança para modelos futuros.
1. A inspiração era, naturalmente, a indústria e seus requisitos básicos:
matéria-prima, energia e transporte;
2. O modo de ocupação do território era o zoneamento. Meios de produ-
ção, civilização e saúde, cada um isolado em seu setor específico. Fábricas
na planície (trabalhar) e a cidade no planalto (habitar). Já os hospitais fica-
vam no topo da composição. Afinal, no processo civilizatório de formação
da cidade moderna, a higiene e a salubridade tinham papel primordial,
assim como os espaços verdes eram exaltados;
3. A gestão social e a distribuição da terra, que seriam “entregues ao po-
der público”.
capítulo 3 • 75
Imagem da proposta de bairro residencial da Cidade Industrial. Acervo do Het Nieuwe Insti-
tuut - Architecture Collection [No restrictions], via Wikimedia Commons.
ATENÇÃO
A melhor orientação de uma construção irá depender da localização do terreno, em es-
pecial, sua latitude ou posição em relação à trajetória solar.
Embora o projeto de Tony Garnier seja uma idealização, ele utiliza como parâmetro a
região sudeste da França.
capítulo 3 • 76
concentrariam serviços administrativos como o conselho da cidade e o tribunal
de justiça, além de escritórios, consultórios, hotéis e restaurantes. Em um outro
grupo de edificações monumentais, estariam as “coleções”: museu, biblioteca, jar-
dim botânico etc. Um terceiro grupo seria destinado a esportes e espetáculos: sala
para 1.900 espectadores, anfiteatros, ginásios, casa de banhos, quadras de esporte
e pistas de corrida. O marco principal seria uma torre de relógios, que seria vista
ao longo de toda a via central.
A modernidade da cidade de Garnier estava também no material de constru-
ção previsto. As edificações utilizariam amplamente o concreto armado, enquanto
o aço seria utilizado nos grandes vãos do setor industrial. Por outro lado, o culto
ao desempenho da máquina já era um prenúncio das propostas futuras de Le
Corbusier. Na Cité Industrielle, “a estrada de ferro de longo percurso deveria ser
completamente reta, de modo a servir para trens de alta velocidade” (CHOAY,
2002, p. 169).
Segundo o crítico e historiador britânico Kenneth Frampton, o edifício de
reuniões de Garnier pretendia ser o equivalente moderno da ágora e a Cidade
Industrial “era, sobretudo, uma cidade socialista sem muros ou propriedade pri-
vada, sem igreja ou quartéis, sem delegacia de polícia ou tribunal de justiça; uma
cidade onde todas as áreas não-construídas eram parques públicos” (FRAMPTON,
1997, p.120). Já para Françoise Choay, a publicação de 1917 foi “o primeiro
manifesto do urbanismo progressista” (CHOAY, 2002, p.163). Isto se confirma
na associação entre técnica e beleza, tão cara aos modernistas, que Tony Garnier
defendia em seu texto de apresentação da Citè: “uma cidade em que todos são
conscientes de que o trabalho é a lei humana e de que há ideal bastante no culto
da beleza e da bondade para tornar a vida esplêndida” (CHOAY, 2002, p. 170).
A Cidade Industrial de Garnier não teve aplicação prática e suas ideias ficaram
registradas apenas em textos e ilustrações. No entanto, há indícios do que preten-
dia o arquiteto e urbanista francês em algumas realizações suas na cidade francesa
de Lyon, que inspirou a Citè Industrielle desde o início. O bairro residencial lionês
denominado Estados Unidos, projetado em 1924 e erguido por volta de 1935, foi
considerado uma amostra reduzida de seu pensamento urbanístico.
capítulo 3 • 77
Vista do Museu Urbano Tony Garnier, no bairro Estados Unidos, em Lyon, França.
Vista da Avenida da Ópera em Paris, exemplo do legado de Haussmann. Foto: Guilhem Vellut
capítulo 3 • 78
As propostas aqui apresentadas têm em comum a ideia de que as transforma-
ções no modo de vida e nos meios de produção haviam gerado uma necessidade de
repensar a cidade de forma estrutural. Mas enquanto a maioria dos autores tratou
de imaginar um novo modelo em uma situação ideal, seja em um terreno vazio ou
como uma expansão de cidades existentes, coube ao Barão Haussmann reformar
aquela que já era uma das grandes metrópoles do mundo: Paris.
Se considerarmos válida a metáfora da cidade doente, a reforma que o Barão
de Napoleão III empreendeu por quase duas décadas pode ser abordada como uma
grande intervenção cirúrgica. Mas o grande mérito do pensamento de Haussmann
tenha sido trabalhar simultaneamente com as diferentes escalas e significados –
que já vimos nos capítulos de abertura – daquilo que poderíamos dizer que é a
cidade.
A cidade é um sistema integrado. O alargamento das vias principais da ci-
dade combinado à criação de novos eixos em longas linhas retas propiciava a boa
ventilação e iluminação, além da melhor circulação de pessoas e mercadorias, na
superfície, enquanto, do ponto de vista da infraestrutura urbana, facilitava a im-
plantação e a melhoria de todo o sistema de águas e esgotos da cidade, o cabea-
mento de fios elétricos e toda sorte de instalações.
A cidade é uma obra de arte. As grandes vias e suas longas perspectivas abri-
ram aos olhos dos transeuntes toda a beleza dos monumentos já existentes em
Paris, além daqueles que foram construídos à época, como a Ópera. No cruza-
mento dos grandes eixos, foram localizados outros tantos pontos de interesse,
como esculturas, obeliscos, jardins e praças. Também os monumentos já existentes
foram valorizados, com a abertura de novas vias radiais, como aconteceu com o
Arco do Triunfo.
A cidade é a expressão de uma época. Tudo isso reunido representava uma
nova era de desenvolvimento da burguesia afluente, da vida urbana em espaços pú-
blicos dignificados, acompanhado de uma revolução sanitária. Paris, assim como
diversos centros urbanos densificados pela mão de obra necessária à industrializa-
ção mundo afora, havia sido acometida por diversos surtos de doenças fatais como
a cólera. Agora, a cidade renascia bela e saudável como a Capital do Século XIX.
capítulo 3 • 79
© MARK JAROSKI | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 3 • 80
Imagem de Paris em 1853, antes da Reforma de Haussmann. Autor: Charles Marville.
capítulo 3 • 81
Panorama de Paris em setembro de 2014 – Foto: Myth.
capítulo 3 • 82
CURIOSIDADE
Você sabia que o Theatro Municipal do Rio de Janeiro teve seu projeto inspirado na
Ópera de Paris? Compare.
©© HAAKON S. KROHN | WIKIMEDIA.ORG
Fachada principal do Theatro Municipal no Rio de Janeiro, que foi inaugurado em 1909.
capítulo 3 • 83
Plano de Extensão de Barcelona,1859: Ildefonso Cerdá
capítulo 3 • 84
Corte esquemático de uma via característica do Plano Cerdá.
capítulo 3 • 85
O sistema viário radial foi posicionado a 45 graus da trama ortogonal com
duas vias que se interceptam com um ângulo de 90 graus. Estas grandes vias foram
criadas com o objetivo de orientar o fluxo para as entradas da cidade, umano Vale
do Rio Llobregat (Avenida Paralela), ao sul, e a outra para o Vale do Rio Besos
(Avenida Meridiana), ao norte. Finalmente, uma terceira via oblíqua à quadrícula,
a Avenida Diagonal, como o nome revela, cruza a cidade de ponta a ponta. Esta
superposição de vias radiais sobre um sistema ortogonal reforça a ordem inicial,
mas permite um fluxo mais veloz de mobilidade regional por meio destas grandes
avenidas, que terminam por estender o plano até onde a topografia permitir. O
plano não se limita ao seu próprio tempo.
Por outro lado, na escala do quarteirão padrão do projeto, que foram proje-
tados com 113 m por 113 m, as edificações de esquina receberam chanfros com
20 m de largura, que transformaram os cruzamentos em espaços públicos octogo-
nais de grande interesse, precisamente onde há uma maior quantidade de pessoas.
capítulo 3 • 86
E a vontade deliberada de Cerdá privilegiou a densidade multifamiliar em
detrimento do modelo de residência unifamiliar. Aqui entra o aspecto social do
plano, no sentido de que a compactação diminuiria os custos de construção e
permitiria, a priori, uma maior proximidade entre as classes sociais dentro do ter-
ritório urbano. A padronização qualificada dos quarteirões do Eixample indicava
uma igualdade de oportunidades. É neste ponto que o Plano Cerdá se afastava da
proposta de Haussmann, pois esta implicava na gentrificação do centro histórico
de Paris.
CONCEITO
Gentri o quê?
Gen-tri-fi-ca-ção. Vem de gentry, uma expressão inglesa que designa pessoas ricas, liga-
das à nobreza. O termo surgiu nos anos 60, em Londres, quando vários gentriers migraram
para um bairro que, até então, abrigava a classe trabalhadora. Este movimento disparou o
preço imobiliário do lugar, acabando por “expulsar” os antigos mora-dores para acomodar
confortavelmente os novos donos do pedaço. O evento foi chamado de gentrification, que
numa tradução literal, poderia ser entendida como o processo de enobrecimento, aburgue-
samento ou elitização de uma área… Mas nós preferimos ficar com o aportuguesamento do
termo original.
Por último, pode-se dizer que a visão de Cerdá se aproximava, ainda que ape-
nas no campo abstrato, da tentativa de conciliar as benesses da vida no campo e as
facilidades da vida na cidade expressa pelos três imãs de Ebenezer Howard em seu
conceito de Cidade Jardim. Em sua Teoria Geral da Urbanização, um dos textos
fundadores do urbanismo, Cerdá descreveu a máxima de que se deve ter: “rurali-
zado aquilo que é urbano e urbanizado aquilo que é rural” (Rosa, 2014, p. 126).
Como uma espécie de síntese entre os urbanistas progressistas e culturalistas (Ver
capítulo 1), Cerdá combinou racionalismo e socialismo, visão sistêmica e contex-
tualização social, econômica, jurídica e demográfica, sendo, por isso, considerado,
por muitos, um dos fundadores do urbanismo.
capítulo 3 • 87
Cidade moderna: de Le Corbusier (1887-1965) aos últimos CIAM
(1928-1956)
capítulo 3 • 88
Kenneth Frampton, crítico britânico e professor da Universidade de Columbia, Le
Corbusier “compartilhava a fé da vanguarda soviética daquele começo do século
XX no cultivo do ‘homem novo’ que viria a transcender os limites da sociedade
burguesa” (Frampton, 2001, p.161). Nas palavras do próprio Le Corbusier, ela era
o “protótipo de uma cidade sem classes” (Le Corbusier, 2000, p. 281).
No livro Urbanismo, Le Corbusier sintetizou os princípios fundamentais do
urbanismo moderno em quatro itens (síntese que já utilizara para divulgar ao
mundo os Cinco Pontos para uma Nova Arquitetura, em 1926):
• o descongestionamento do centro das cidades;
• o aumento da densidade;
• o alargamento das vias de circulação;
• o aumento das áreas de vegetação.
capítulo 3 • 89
unidade foi projetada para abrigar de 3.000 a 20.000 pessoas e para ser autossu-
ficiente com suas próprias lojas, escolas, postos de saúde e lugares para recreação
e culto. Mas havia autonomia e integração, ao mesmo tempo. A rua comercial de
cada setor era ligada à rua comercial do setor contíguo. O parque de cada setor
estendia-se ao parque do setor seguinte.
©© AJAY TALLAM | WIKIMEDIA.ORG
Mapa de Chandigarh.
capítulo 3 • 90
No Brasil, os dois maiores exemplos são a própria capital do país, Brasília e
a Barra da Tijuca - área de expansão da antiga capital, o Rio de Janeiro - ambos
projetos de Lucio Costa, sobre os quais falaremos no próximo capítulo.
O urbanismo moderno, ainda mais do que a arquitetura moderna, foi con-
siderado algo além de um conjunto de diretrizes. A nova cidade do século XX
deveria surgir sobre novos fundamentos que, juntos, formavam, para muitos ur-
banistas, uma nova ideologia.
Esta ideologia foi construída nos congressos internacionais de arquitetura mo-
derna, conhecidos pela sigla CIAM. Foram conferências realizadas em intervalos
desiguais entre 1928 e 1953, em que representantes do Movimento Moderno de
diversos países debatiam os temas considerados mais relevantes para a profissão à
época. Na verdade, ali se construiu o arcabouço teórico que se tornaria hegemô-
nico para a prática da arquitetura e do urbanismo em grande parte do mundo.
capítulo 3 • 91
O CIAM daquele ano foi realizado a bordo do navio SS Patris I, que viajou de
Marselha, na França, a Atenas, na Grécia. O tema a ser desenvolvido era a cidade
funcional. A partir desta premissa – de que uma cidade, acima de tudo, tem que
funcionar - foram analisadas 33 cidades de diferentes países. A partir desta análise,
um extenso diagnóstico concluiu que todas as cidades estudadas testemunhavam
o mesmo fenômeno: a desordem instituída pelo maquinismo. A cidade já não cor-
respondia mais à sua função principal, que é a de bem abrigar os seres humanos.
A estrutura urbana herdada dos séculos anteriores teria sido comprometida
pelo advento da era da máquina, com suas imensas perturbações no comporta-
mento humano. “O caos entrou nas cidades”. A falta de espaço suficiente, a falta
de superfícies verdes, a ausência de sol nos setores urbanos congestionados, teriam
tornado as condições de habitação nefastas.
As construções edificadas ao longo das vias (...) são prejudiciais à habitação: barulhos,
poeiras e gases nocivos. O alinhamento tradicional das habitações à beira das ruas
só garante insolação a uma parcela mínima das moradias. (...) Deve ser proibido! O
emprego de estilos do passado é nefasto e não será tolerado de forma alguma.
Após conclusões tão alarmantes, foi construído um ideário tão consistente, que
dominou a prática do urbanismo em boa parte do planeta por algumas décadas:
• Liberdade individual e ação coletiva são os dois polos entre os quais se de-
senrola o jogo da vida;
• O dimensionamento de todas as coisas no dispositivo urbano só pode ser
regido pela escala humana;
• As chaves do urbanismo estão nas 4 funções: habitar, trabalhar, recrear-
se e circular;
• O zoneamento, levando em consideração as funções-chave, ordenará o
território urbano;
• É da mais urgente necessidade que cada cidade estabeleça seu programa,
promulgando leis que permitam sua realização;
• O número inicial do urbanismo é uma célula habitacional (uma moradia) e sua
inserção num grupo formando uma unidade habitacional de proporções adequadas;
• O interesse privado será subordinado ao interesse coletivo;
Todos estes itens constam da Carta de Atenas, que foi publicada em 1941, oito
anos depois do CIAM de 1933, sob forte influência de Le Corbusier. As cidades,
capítulo 3 • 92
de fato, estabeleceram seus programas com base nas quatros funções da urbanísti-
ca moderna. Isto levou naturalmente ao zoneamento (ou setorização) do território
urbano em áreas exclusivamente residenciais ou comerciais ou industriais ou de
lazer. E ligando todas elas, foram construídas vias expressas em que o automóvel
particular, então símbolo de emancipação do ser humano moderno, era o protago-
nista. Unidades habitacionais foram construídas em Marselha e Nova York, onde
adquiriram o apelido de projects. No Brasil, reconhecemos alguns destes conceitos
nas superquadras de Brasília ou nos inúmeros conjuntos habitacionais que foram
construídos, em especial, na segunda metade do século XX.
O último CIAM ocorreu em 1956, na cidade de Dubrovnik, na Iugoslávia.
Ali se iniciou um lento processo de revisão do excessivo funcionalismo do urba-
nismo moderno, que possibilitou o surgimento de alguns grupos dissidentes como
o Team X, que representava uma nova geração de urbanistas, e culminou com a
criação de uma nova agenda para o urbanismo, que veremos no capítulo 5.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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CREIXELL, Santiago Padrés & PARÉS Santiago Vela. O modelo teórico do Plano de Cerdá. Revista
eletrônica UPC Commons. Barcelona: Universitat Politècnica de Catalunya, 1976. Disponível em:
<https://upcommons.upc.edu/bitstream/handle/2099/5313/Article10.pdf>. Acesso em: 19 out. 2016.
CUNHA, Antônio Geraldo. Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa. 2. ed.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.
FERREIRA, Aurélio B. de H. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1986.
FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. Tradução: Jefferson Luiz Camargo.
São Paulo: Martins Fontes, 1997.
KOSTOF, Spiro. The city shaped: urban patterns and meanings through history. Londres: Thamesand
Hudson, 1991.
LE CORBUSIER. Urbanismo. Tradução: Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
NUNES-FERREIRA, Carlos Eduardo. Barra da Tijuca: o presente do futuro. Rio de Janeiro:
E-papers, 2014.
ROSA, Francisco Javier Ullán de la. Sociología urbana: de Marx y Engels a lãs escuelas pós-
modernas. Madri: Centro de Investigaciones Sociológicas, 2014.
SORIA, Arturo. Tratados de urbanismo y sociedade. Madri: Clan Editorial, 2004.
capítulo 3 • 93
capítulo 3 • 94
4
As cidades
brasileiras:
passado, presente e
perspectivas
As cidades brasileiras: passado, presente e
perspectivas
Esta visão seletiva da história pode ser aplicada ao caso do urbanismo brasi-
leiro em diferentes sentidos. Há poucos estudos, por exemplo, sobre a contribui-
ção dos nativos ameríndios para o modo como se organizaram nossas cidades.
Tampouco há disponível um conjunto robusto de estudos sobre a contribuição
negra para a construção das cidades brasileiras.
Esta dificuldade desaparece no que se refere aos elementos que constituem a
cidade tradicional brasileira, de raiz europeia adaptada ao relevo e ao clima, cujos
exemplos são comumente denominados “cidades históricas”. No sentido oposto,
analisaremos projetos de cidades planejadas, como Belo Horizonte, Goiânia e
Brasília, por meio de seus princípios teóricos como resposta ao crescimento po-
pulacional vertiginoso do país do final do século XIX até a segunda metade do
século XX.
Por último, você será apresentado à evolução da legislação urbana brasileira,
que vem tentando equacionar os desafios impostos pelo legado demográfico do
século XX, as desigualdades sociais ainda existentes no país e a dicotomia entre
cidade formal e cidade informal.
CURIOSIDADE
O termo cidade histórica é utilizado no Brasil para as cidades que conservam melhor
as edificações e espaços públicos do século XVII, XVIII e XIX. Geralmente, são cidades que
tiveram um ciclo econômico forte naquele período seguido de certa estagnação nos séculos
seguintes, como as cidades ligadas ao clico do ouro e do diamante em Minas Gerais e ao
ciclo do café no Vale do Paraíba. O termo também é associado aos assentamentos de outros
ciclos econômicos, como o ciclo da borracha no Norte ou o ciclo da cana de açúcar no Nor-
deste. Na verdade, se refletirmos melhor, toda cidade tem uma história.
capítulo 4 • 96
OBJETIVOS
• Analisar a contribuição dos povos indígenas nativos e afro-brasileiros para o urbanismo no Brasil;
• Conhecer os elementos de formação das cidades brasileiras;
• Identificar os principais projetos de cidades planejadas no Brasil;
• Conhecer a legislação urbana vigente no país.
As manifestações culturais tanto dos povos indígenas quanto dos negros trazi-
dos da África podem ser sentidas no Brasil até hoje em diversos aspectos:
• Na linguagem:
Muitos nomes de lugares conhecidos no Brasil vieram da língua tupi-guarani,
como: Ipanema e Paraíba. Já as palavras xodó e manha têm origem africana.
• Na culinária:
A tapioca, também conhecida como beiju, é um exemplo da influência da
culinária indígena no nosso dia a dia. Já a receita do acarajé, considerado bem
cultural de natureza imaterial pelo IPHAN em 2005, tem origem no Golfo de
Benim, na África Ocidental (Fonte: Portal do IPHAN).
• Na música e na dança:
O samba, o batuque, o jongo e o maracatu são ritmos de origem africana,
assim como a capoeira é uma luta criada no Brasil a partir de danças angolanas.
PERGUNTA
Mas qual foi o legado dos povos nativos e dos negros trazidos da África para a formação
das cidades brasileiras?
capítulo 4 • 97
A contribuição indígena
Entre percursos sinuosos e retilíneos, a imagem de nossas vilas litorâneas revela, an-
tes de tudo, harmonia na escala dos edifícios, na amplitude dos vazios, na densidade
de ocupação e, sobretudo, na inserção ambiental. Impossível dissociá-las das raízes
pré-coloniais. No intraurbano, o diferencial tortuoso das ruas direitas sugere o encan-
tamento das antigas trilhas, dos caminhos pelos melhores contornos, do desvio das
águas, dos morros, das serras. Por isso sua sinuosidade é reveladora. Seu traçado
reproduz a naturalidade da interação ambiental dos antigos habitantes. (...) E ficaram
estampados talvez na maioria dos desenhos das vilas e cidades do colonialismo. Re-
presentam as ocupações anteriores, expressão simbólica da vertente cultural indígena
em nossas produções urbanas. Da mesma forma, simbolizam a aceitação e a incorpo-
ração dos vetores antigos pelo colonizador. A harmonia ambiental dos seus traçados
com as determinantes geométricas da arquitetura ibérica é síntese do encontro cultu-
ral. (Gianesella, 2012).
COMENTÁRIO
Você deve ter reparado que foram utilizados parênteses e aspas nas expressões: nati-
vos (“brasileiros”) e colonizadores (“europeus”).
Neste caso, os parênteses foram utilizados para indicar que a informação é comple-men-
tar. Se os termos forem retirados, a frase pode ser entendida sem alterar o seu sentido. Por
que, então, as expressões “brasileiros” e “europeus” foram incluídas na afirmação?
Neste exemplo, as aspas indicam um destaque para provocar a sua reflexão: em que
momento podemos começar a nos referir à nossa terra como Brasil? Afinal, este foi o nome
dado pelos portugueses. O nome que os tupy-guarani utilizavam era Pindorama, ou terra das
capítulo 4 • 98
palmeiras. Assim, a descoberta do Brasil é considerada, para os povos nativos, a invasão de
Pindorama (Wikipédia, acesso em: 17 set. 2016).
Por outro lado, o autor citado fala de um processo de encontro cultural que perdurou
mais de uma geração. Neste sentido, o colonizador de cultura europeia, a partir da segunda
geração, já poderia ser chamado de brasileiro e não mais de europeu.
O encontro cultural que Gianesella descreve não parece ter sido tão pacífico
assim. Muitos embates, quase sempre vencidos pelos colonizadores devido à sua
superioridade bélica, fizeram com que os povos autóctones tivessem três destinos:
a morte, a escravidão ou o deslocamento para o interior do país. Os indígenas
brasileiros viviam da caça, da pesca e da coleta. Deslocavam-se periodicamente,
permitindo que a vegetação nativa se regenerasse constantemente. Organizavam-
se em tribos, sem um Estado ou funções político-administrativas representadas
por edificações específicas.
As tabas eram os agrupamentos dos índios, onde o espaço central era reser-
vado às cerimônias festivas e religiosas, além das reuniões comunitárias. As tabas
eram formadas por um conjunto de quatro a sete ocas.
A oca ou maloca era a habitação dos índios brasileiros. Com cobertura de
palha e estrutura de madeira, poderia ter a forma circular (tribos da Amazônia) ou
longilínea (povos do litoral). Diferentes famílias ocupavam uma mesma oca, que
poderia abrigar até duzentos indivíduos.
capítulo 4 • 99
Curiosamente, o legado dos povos nativos faz-se notar principalmente na pró-
pria denominação das cidades brasileiras. Como lembra o arquiteto e historiador
José Pessôa:
A contribuição negra
Isso significa que a população negra, composta de pretos e pardos, representa a maio-
ria da população brasileira. (Fonte: Portal Brasil, IBGE, 2016)
capítulo 4 • 100
O rastro desta presença negra se configura em vários espaços permeados por toda a
cidade desde seu centro à área periférica. Estes territórios negros vão se constituir em
uma variedade entremeada em espaços de moradia, trabalho, lazer, culto etc.
capítulo 4 • 101
©© ANDRÉ UREL | WIKIMEDIA.ORG
A matriz ibérica
capítulo 4 • 102
Em 1532, Martim Afonso de Souza fundou a vila de São Vicente a mando de
D. João III, Rei de Portugal. Começou, então, a história das cidades brasileiras, que,
segundo Bianca e Paulo Bricca, poderiam ser agrupadas por região e período históri-
co de acordo com os ciclos econômicos do período colonial (BRICCA, 2008, p.14):
Cidades da
Sudeste e Centro-oeste Do século XVII ao fim do século XVIII.
mineração
Cidades do
Sudeste Século XIX e início do século XX.
café
Por outro lado, as cidades brasileiras poderiam ser classificadas pelos papéis
que exerceram na grande rede urbana criada pelos portugueses. Segundo o Atlas
de centros históricos do Brasil, Salvador e Rio de Janeiro seriam capitais adminis-
trativas, juntamente com São Luís e Belém. Ouro Preto e Goiás seriam as cidades
da mineração, tal qual Mariana, Diamantina e Pirenópolis. Olinda e Vassouras
foram centros agrícolas de exportação, como Cachoeira e São Félix, Marechal
Deodoro e Muqui. Porto Seguro e Paraty poderiam ser consideradas cidades de
conquista e povoamento, assim como Santana de Parnaíba, João Pessoa, São
Cristovão, São Francisco do Sul, Icó e Lapa. Já Petrópolis e Corumbá são exem-
plos de cidades novas do século XIX, como Antonio Prado. (PESSÔA, 2007).
Mas nossas cidades refletem também a ordem social, política, ideológica e
cultural do país, além dos condicionantes ambientais e técnicos.
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©© PY4NF | WIKIMEDIA.ORG
Ao longo de todo este litoral leste, a ocupação por Portugal da faixa litorânea se deu
a partir de pontos definidos pela existência de baías, de ilhas com seus canais pro-
tegidos, locais onde foram fundados núcleos urbanos e construídos fortes para sua
defesa. Victor Hugo Mori (BICCA, 2008, p.30)
capítulo 4 • 104
Aspecto atual de Vila Velha – ES. Foto: Cleferson Comarela.
capítulo 4 • 105
Quadro Fundação da Cidade do Rio de Janeiro. Autor: Antonio Firmino Monteiro (1855-1888).
capítulo 4 • 106
Os logradouros, em geral, acompanhavam as curvas de nível do terreno e as
ruas direitas, em particular, conectavam os principais edifícios civis ou religiosos.
Não havia palácios privados, como nas cidades europeias, embora os governantes
morassem em casas mais ricas que o habitual.
Vista aérea de Ouro Preto-MG com a Casa de Câmara e Cadeia (atual Museu da Inconfidên-
cia) e a Igreja de N.S. do Carmo. Foto: Marcello Casal Jr.-ABr - Agência Brasil.
capítulo 4 • 107
Assim, houve no caso da cidade de Salvador, um plano prévio que foi adaptado ao sítio
natural, plano este estruturado a partir de logradouros que se dispunham segundo uma
malha ortogonal básica.
Augusto C. da Silva Telles (BICCA, 2008, p. 26)
capítulo 4 • 108
Cidades planejadas
Você já deve ter concluído que a história do Brasil simplesmente não pode ser
contada sem que se leve em conta a história das cidades brasileiras. A ocupação de
um território tão vasto contou com a fundação de vilas, no início da colonização,
e com a construção de capitais novas e planejadas, de Salvador, em meados do
século XVI, a Palmas já no final do século XX, passando por Teresina, Aracaju,
Belo Horizonte, e Goiânia. A própria mudança da capital do país de Salvador para
o Rio de Janeiro e, depois, do sudeste para o centro-oeste, com o projeto e obra
de Brasília, paradigma mundial de cidade moderna, revela que esta estratégia de
ocupação permaneceu vigente até recentemente.
capítulo 4 • 109
Em Minas Gerais, este mesmo espírito havia se manifestado, anteriormente,
na decisão de transferir a capital do Estado, da colonial Ouro Preto para uma nova
cidade planejada. Belo Horizonte foi inaugurada em 1897, para ser uma cidade
bela, saudável e monumental. Foi criada, para este fim, a Comissão Construtora
da Nova Capital, que foi comandada por Aarão Reis, depois substituído por outro
engenheiro, Francisco Bicalho. A equipe de projeto era formada por outros enge-
nheiros, egressos principalmente da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, além de
arquitetos estrangeiros ou que haviam trabalhado no exterior, como o brasileiro
José de Magalhães, o francês Paul Villon e o suíço João Morandi.
©© WIKIMEDIA.ORG
O plano elaborado para Belo Horizonte resume boa parte da cultura técnica e das
preocupações estéticas do século XIX relativas à cidade. Ele denota conhecimento do
plano de l'Enfant para Washington, da reforma realizada por Haussmann em Paris
e, sobretudo, do plano de La Plata, que lhe era contemporâneo e com o qual o plano
de Belo Horizonte divide uma mesma concepção geral. (Arquivo Público da Cidade de
Belo Horizonte)
capítulo 4 • 110
No caso do Plano de Urbanização de Goiânia (1933), a inspiração viria de
dois autores já citados em capítulos anteriores. O projeto foi iniciado por Atílio
Correa Lima, seguidor da escola francesa liderada por Alfred Agache e foi con-
cluído por Armando Augusto de Godói, discípulo do inglês Ebenezer Howard, o
fundador do conceito da Cidade Jardim.
capítulo 4 • 111
localizar no centro geográfico do país grandes forças capazes de irradiar e garantir
a nossa expansão futura” (BICCA, 2008, p.334).
capítulo 4 • 112
©© WIKIMEDIA.ORG
©© WIKIMEDIA.ORG
Versão simplificada do Plano Piloto de Brasília (esquerda) e foto de satélite da NASA: Brasí-
lia em novembro de 1990 (direita).
capítulo 4 • 113
integração nacional que, a partir dos anos 1960, substituiria a antiquada cidade
do Rio de Janeiro, antiga capital da Colônia, do Império e da República, voltada
para o litoral e localizada na porção já consolidada do país.
O Concurso Nacional do Plano Piloto da Nova Capital do Brasil, ocorrido entre setem-
bro de 1956 e março de 1957, representa um momento de grande maturidade da
produção arquitetônica no país, marcada por uma adesão quase consensual aos prin-
cípios éticos e formais da arquitetura e do urbanismo modernos. (BRAGA, 2010, p. 7)
capítulo 4 • 114
Os quatro princípios do urbanismo de Le Corbusier estavam presentes no
Plano Piloto com algumas adaptações. O descongestionamento era uma premis-
sa do plano. Em alguns setores, a densidade atingia os níveis previstos para a ville
contemporaine, mas, em geral, restringia-se à metade disso, sendo que as principais
edificações encontravam-se próximas ao cruzamento das vias de maior tráfego. O
alargamento das vias de circulação foi representado pelas avenidas expressas que
estruturavam a cidade, principalmente nos eixos cartesianos norte-sul e leste-oes-
te. O aumento de áreas verdes também era uma característica do partido urbanís-
tico. Comparada às demais capitais, Brasília seria um imenso parque.
capítulo 4 • 115
Havia, ainda, um zoneamento subjacente definido pelas tipologias arquitetô-
nicas. Em Brasília, as superquadras residenciais formariam um conjunto de blocos
horizontais multifamiliares isolados, localizadas por números ao longo do Eixão
(norte-sul). As torres comerciais localizavam-se às margens do cruzamento dos
eixos cartesianos, assim como os centros comerciais. Os palácios oficiais formaram
o tal Eixo Monumental (leste-oeste) também em edificações isoladas de caráter
monumental.
capítulo 4 • 116
A densidade da superquadra, em média, se aproximaria dos 300 hab./ha pre-
vistos por Le Corbusier para as áreas centrais da ville contemporaine. Além das su-
perquadras, foram previstas as quadras de habitação individual geminada e setores
residenciais no lado oposto do Lago Paranoá, com residências unifamiliares. Um
dos legados das superquadras foi subverter a lógica da rua tradicional, ao separar
pessoas e veículos. Como paradigma do urbanismo moderno, Brasília ficou co-
nhecida como uma cidade sem esquinas, pois o Plano Piloto criava, como queria
Le Corbusier, grandes eixos rodoviários sem cruzamentos, que eram vistos como
inimigos da velocidade. A cidade moderna era a cidade da velocidade.
Entretanto, além de uma cidade moderna, Brasília era também o projeto sin-
gular de uma cidade administrativa, que seria a nova capital de um país. Neste
sentido, Lucio Costa, segundo seu próprio relato, aproveitou os eixos cartesianos
para organizar a dupla função da cidade: civitas e urbs (COSTA, 1995, p. 203).
Assim, o Eixo Monumental, leste-oeste, reuniu os edifícios cívicos caracterís-
ticos de uma capital federal com o Congresso Nacional no seu extremo leste. Já
o chamado Eixão abrigava os setores residenciais e comerciais, nas chamadas asas
norte e sul, assim denominadas porque a forma final do Plano Piloto assemelhou-
se involuntariamente ao formato de um avião. O encontro dos dois eixos foi ocu-
pado pela rodoviária, de onde se avistam os grandes palácios e as torres comerciais
da cidade, além de tornar evidente o caráter rodoviarista do Plano.
©© URI ROSENHECK WIKIMEDIA.ORG
capítulo 4 • 117
Embora tenha mantido no Plano Piloto da Barra da Tijuca a lógica estrutural (dois
eixos principais, setorização funcional, locomoção motorizada) adotada em Brasília,
Lucio Costa não impôs um desenho preciso e rígido para os núcleos de ocupação da
Barra. (Ao contrário, ele recomenda que) as instruções para aprovação de empreendi-
mentos sejam vistas como “simples balizamento suscetível de certa margem de tole-
rância”. Lembra ainda que a região deveria ser “considerada como área experimental
(...) para que fosse capaz de absorver – sob rigoroso controle – as sucessivas inova-
ções propostas pelo espírito empreendedor das partes interessadas”. Se a conjuntura
“especialíssima” de Brasília levava ao ordenamento preciso, a proposta de Lucio Costa
para a Barra pretendia justamente promover inovação e experimentação. (NUNES-
FERREIRA, 2014, pp. 137-138)
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capítulo 4 • 118
EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO NO BRASIL
250.000,000
200.000,000
150.000,000
100.000,000
50.000,000
0
1960 1970 1980 1990 2000 2010
RURAL URBANA
A intensificação da dualidade entre cidade formal e cidade informal tem sido uma
constante na estrutura das cidades brasileiras (Maricato, 1996). O ritmo do crescimen-
to dos loteamentos irregulares, das favelas e dos cortiços nas periferias das grandes
cidades é mais intenso que a taxa média de urbanização do país. Ou seja, as grandes
cidades crescem, sobretudo, nas periferias, o que tem reforçado a função estrutural
da informalidade na composição do espaço urbano. Enquanto São Paulo contava com
apenas 1% de áreas de favelas em 1970, em 2000 elas já ocupam 20% da cidade.
A quase totalidade das grandes cidades do país tem atualmente em torno de 30% de
áreas ocupadas por favelas, chegando às vezes a 50%, como em Belém do Pará (Pro-
jeto Moradia, 2000). Em oposição às estruturas urbanas informais, a cidade formal,
por sua vez, se restringe a uma parcela do espaço urbano, e contempla apenas uma
pequena porcentagem da população. (Ferreira, 2000)
capítulo 4 • 119
©© ALICIA NIJDAM | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 4 • 120
culminou em Brasília com a participação de mais de 2.500 delegados, dos quais 70%
foram eleitos nas Conferências Estaduais e o restante indicado por entidades nacio-
nais. A primeira conferência das cidades, em 2003, abrangeu a participação de 300
mil pessoas para debater princípios, diretrizes e prioridades da Política Nacional de
Desenvolvimento Urbano. (DAVIS, 2006, p. 223 e 224)
capítulo 4 • 121
O Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo de 2014 (Lei estadual nº 16.050
de 31 de julho de 2014) incorporou diversos instrumentos do Estatuto da Cidade como a
outorga onerosa.
O Estatuto da Cidade previa (no inciso III do seu Capítulo IV) que a gestão
democrática da cidade deveria ser garantida pela realização de “conferências sobre
capítulo 4 • 122
assuntos de interesse urbano, nos níveis nacional, estadual e municipal”. Em maio
de 2003, a I Conferência Nacional das Cidades ocorreu em Brasília, como acon-
tece até hoje.
A comunidade de arquitetos e urbanistas também comemorou a criação
do Ministério das Cidades, que se deu em 2003, primeiramente pela Medida
Provisória nº 103, que foi confirmada pela Lei Federal nº 10.683 daquele mesmo
ano. Com uma população urbana consolidada, as cidades ganharam foro ministe-
rial e o termo direito à cidade consagrou-se como disciplina jurídica e urbanística.
Uma iniciativa mais recente reconheceu os limites expandidos da cidade con-
temporânea. A Lei nº 13.089, de 12 de janeiro de 2015, instituiu o Estatuto da
Metrópole para definir as diretrizes da governança interfederativa. Este termo
significa que, nos casos das regiões metropolitanas ou de aglomerações urbanas
em que haja interdependência de dois ou mais municípios limítrofes, deverá ser
desenvolvido um plano de desenvolvimento integrado que envolva mais de uma
unidade da federação (município, estado ou o Distrito Federal).
©© JONATHAN OLSSON | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 4 • 123
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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capítulo 4 • 125
capítulo 4 • 126
5
Perspectivas
do urbanismo
contemporâneo
Perspectivas do urbanismo contemporâneo
Nos capítulos anteriores, verificamos que os modelos de cidade do século XIX
até as propostas mais radicais do século XX tinham como justificativa o crescimen-
to insalubre e incontrolável das cidades, principalmente em virtude do fenômeno
da industrialização. Formou-se, por uma centena de anos, um consenso quase
generalizado de que uma nova cidade deveria surgir a partir das novas funções e
necessidades do mundo contemporâneo.
No entanto, a partir das experiências reais de cidades novas construídas de
acordo com os preceitos modernos, um processo de reação começou a tomar for-
ma. Essas realizações frustraram os teóricos do urbanismo porque trouxeram mais
segregação e fragmentação do que a cidade tradicional, quando, na verdade, o in-
tuito era criar uma cidade mais igualitária e coesa. A estrita divisão funcional, com
setores isolados para cada função urbanística (moradia, trabalho e lazer), gerou
ineficácia de custo e tempo, quando a cidade moderna deveria ter sido a cidade do
desempenho e da velocidade. Para os novos autores do urbanismo, a prioridade
deixou de ser a funcionalidade: a cidade deve ser o espaço da diversidade.
Além disso, o crescimento demográfico observado desde o fim da Segunda
Guerra Mundial, em diferentes regiões do planeta, trouxe novos desafios para a
humanidade. As megacidades se formaram, tanto em países desenvolvidos quan-
to em nações em desenvolvimento, em uma escala inédita que transformou nossa
visão de cidade, de uma unidade finita para um organismo quase intangível. A
evolução dos meios de telecomunicação e da tecnologia da informação apro-
ximou pessoas e culturas distantes, tendo influência até nos meios de produção de
riqueza e conhecimento. Novamente, os urbanistas tentaram classificar os novos
modelos de cidade do século XXI de acordo com suas características inéditas.
Por último, a previsão de esgotamento das riquezas naturais e as mudanças
climáticas demonstraram a urgência de rever o modo como a humanidade ocu-
pou o território deste incrível planeta desde o primeiro assentamento humano.
As cidades seriam responsáveis por grande parte das emissões de gases do efeito
estufa de origem humana que contribuem para o aquecimento global. Para al-
guns pesquisadores, o planeta Terra já teria entrado em uma nova época geológica
denominada antropoceno, em que a humanidade substituiu a natureza como
força ambiental dominante. Em contraponto, novos caminhos começaram a ser
traçados pelos arquitetos e urbanistas em busca do novo paradigma da cidade
sustentável.
capítulo 5 • 128
Este último capítulo será dedicado a montar um panorama dos temas, pro-
blemas e oportunidades do urbanismo pensado por arquitetos e urbanistas nas
últimas décadas. Você poderá formar sua própria visão crítica sobre a cidade con-
temporânea e estará preparado para atuar, de forma ética e profissional, no campo
do urbanismo.
OBJETIVOS
• Analisar as transformações do mundo atual;
• Conhecer diferentes teorias do urbanismo contemporâneo;
• Identificar novos modelos de cidade contemporânea;
• Estabelecer um pensamento crítico-reflexivo sobre a cidade atual;
• Refletir sobre a sustentabilidade no urbanismo.
Cidade e diversidade
capítulo 5 • 129
©© WIKIMEDIA.ORG
Vista aérea do complexo de Pruitt-Igoe, Saint Louis, nos Estados Unidos, que se tornou sím-
bolo do fracasso do planejamento urbano moderno, quando foi implodido em 1972.
No Brasil, assim como em outros países de perfil social semelhante, estes fa-
tores reunidos produziram cidades partidas pela dicotomia entre cidade formal e
cidade informal, como já vimos anteriormente.
Tampouco o “conceito cartesiano de cidade ordenada, onde tudo é estabeleci-
do com lógica, precisão e rigidez” (COSTA, 1962, p. 347), atraía os pensadores do
urbanismo contemporâneo. A própria ideia de planejar uma cidade inteiramente
nova perdeu interesse para boa parte da geração do pós-guerra, como descreveu,
em 1965, Christopher Alexander, professor emérito da Universidade da Califórnia
em Berkeleye fundador do Center for Environmental Structure (ALEXANDER,
1965):
Tem aumentado, cada vez mais, a certeza de que falta algum ingre-diente essencial às
cidades artificiais. Quando as comparamos às cidades antigas, que adquiriram a pátina
da vida, nossas tentativas modernas de criar cidades artificialmente são, de um ponto
de vista humano, inteiramente malsucedidas. (Christopher Alexander)
capítulo 5 • 130
de imóveis destinados a diferentes classes sociais em um mesmo bairro passou
a ser estimulada e virou instrumento de política urbana, em especial na França.
Diferentes tipos de edificações com funções diversas e complementares em uma
mesma área também se tornaram bem-vindas, porquanto induzem à diversidade
de usos e à ocupação diuturna dos espaços públicos.
Padronização Particularidade
Universalidade Regionalismo
capítulo 5 • 131
URBANISMO MODERNO URBANISMO PÓS-MODERNO
Hegemonia Multiculturalismo
Racionalismo Fenomenologia
Tecnologia Sociologia
Abstração Figurativismo
Originalidade Requalificação
Isolamento Contexto
Inovação História
capítulo 5 • 132
©© N. WINSLOW | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 5 • 133
• Historicismo: uma atitude de interesse pelas tradições anteriores muito
baseada nos escritos do arquiteto britânico Alan Colquhoun (COLQUHOUN,
1989).
• Regionalismo crítico: o crítico norte-americano Kenneth Frampton pro-
pôs que, assim como a arquitetura vernácula é uma resposta arquitetônica ao lugar
específico, ao clima local e ao material disponível, projetos climaticamente defi-
nidos obterão bons resultados estéticos e ecológicos e serão capazes de resistir às
pressões homogeneizadoras do capitalismo moderno (FRAMPTON, 1997);
A Capela Otaniemi (1957), dos arquitetos Heikki e Kaija Siren (esquerda), e a Capela do
Silêncio (2012), de K2S Architects, demonstram como os finlandeses conseguiram trabalhar
a modernidade com uma boa dose de regionalismo, em especial, pelo uso do material carac-
terístico da Finlândia: a madeira. Fotos: acervo pessoal do autor.
capítulo 5 • 134
Na apresentação do livro Uma nova agenda para a arquitetura: antologia teórica
(1965-1995), da professora norte-americana Kate Nesbitt, o arquiteto e crítico de
arquitetura Victor Delaqua tentou sintetizar este período:
Na Europa e nos EUA, a partir de meados dos anos 1960, as objeções à ideologia
do movimento moderno se avolumaram e proliferaram rapidamente, incitando novas
reflexões e questionamentos não apenas sobre o movimento, como também sobre a
própria disciplina arquitetônica. A crítica que se constituiu a partir daqueles anos, de-
dicada ao reexame da disciplina e da modernidade cultural em curso, foi influenciada
por paradigmas externos à arquitetura, provenientes da literatura, da filosofia e da
psicanálise e caracterizou-se pela pluralidade e inexistência de um tópico ou ponto de
vista predominante (NESBITT, 2006).
O livro Morte e vida das grandes cidades foi escrito em 1961, por Jane Jacobs,
e sintetizou a agenda do urbanismo pós-moderno, que analisamos anteriormen-
te,em uma linguagem de mais fácil compreensão para o leitor leigo. Na verdade,
capítulo 5 • 135
a autora não tinha formação específica em arquitetura, embora tenha trabalhado
como editora da revista nova-iorquina Architectural Forum.
A crítica principal da autora ao urbanismo moderno foi desenvolvida a partir
de uma análise muito simples. De acordo com Jacobs, o grande equívoco dos ur-
banistas modernos foi propor soluções de simplicidade elementar para as questões
complexas da cidade contemporânea. Por outro lado, ela alertava que o extremo
oposto tampouco era válido: imaginar a cidade como um fenômeno irracional e
desordenado levaria à imobilidade e à sensação de impotência. Entre estes dois
extremos, a autora apontava para uma nova direção metodológica: a cidade é um
problema de complexidade organizada.
A melhor maneira de intervir no espaço urbano seria, antes de tudo, ater-se ao
mundo real, prestar atenção à vida cotidiana dos habitantes do lugar e só então
propor qualquer ação. Ao invés de partir de um modelo universal pré-estabeleci-
do, melhor seria analisar as situações concretas. Para Jacobs, o principal elemento
da cidade era a calçada, que comparava a um espetáculo diário: “o balé da boa
calçada urbana nunca se repete em outro lugar, e em qualquer lugar está sempre
repleto de novas improvisações” (JACOBS, 2003, p. 52).
Após analisar exemplos de diferentes bairros nas cidades norte-americanas de
Los Angeles, Boston, Chicago e Nova York, Jane Jacobs apontou algumas necessi-
dades básicas para o bom funcionamento dos espaços urbanos:
• A necessidade do uso misto: os bairros devem ter mais de uma função, a fim
de atrair pessoas com diferentes propósitos em horas diferentes do dia e da noite;
• A necessidade de pequenos quarteirões: quadras devem ser curtas, com in-
terseções movimentadas que permitam criar oportunidades para a interação entre
os pedestres (conectividade);
• A necessidade de edifícios antigos: bairros devem mesclar construções anti-
gas e edifícios novos, com diversas formas e que abriguem classes sociais diferentes;
• A necessidade da densidade: bom bairro é aquele que tem alta concentra-
ção de pessoas e edifícios.
Além disso, a gestão das comunidades deveria contar com ações integradas,
adaptáveis à realidade específica e que contassem com a participação da população
local a fim de que se criassem espaços públicos de alta qualidade.
capítulo 5 • 136
Cena típica de um dia comum em Greenwich Village, bairro onde Jane Jacobs morava quan-
do escreveu Morte e vida das grandes cidades, e que inspirou notadamente a autora em suas
propostas. Foto: A shot in Greenwich Village, de Seth Werkheiser.
capítulo 5 • 137
MULTIMÍDIA
Você poderá se interessar por: Jane Jacobs e a disputa das cidades, de Guilherme Prado
e Simon Ducroquet, do Nexo Jornal, publicado em julho de 2016 no YouTube: <https://www.
youtube.com/watch?v=vB8aJgMsrLg>.
O legado de Jane Jacobs pode ser sentido atualmente na abordagem dos pro-
blemas de planejamento urbano, que tem tido um caráter mais local e mais hu-
mano, na revitalização dos centros históricos em diversas cidades do mundo e até
na revalorização do patrimônio histórico.
Nos Estados Unidos, alguns autores e movimentos seguiram direções bastante
diferentes a partir das diretrizes definidas por Jacobs. Robert Venturi, que seis anos
antes havia provocado uma revolução na teoria da arquitetura, ao iniciar um livro
com a expressão “Less is a bore!” – Menos é uma chatice!(VENTURI, 1995) –
aventurou-se pelo urbanismo com o trabalho intitulado Aprendendo com Las Vegas,
de 1972, fruto de uma pesquisa acadêmica realizada juntamente com os arquite-
tos e pesquisadores norte-americanos Denise Scott Brown, sua esposa, e Steven
Izenour (VENTURI, 1972). Venturi, Brown e Izenour analisaram o fenômeno da
urbanização dispersa (que veremos a seguir) a partir de Las Vegas, um “exemplo
exagerado de onde se podem tirar lições sobre o típico”. Mas veja como a premissa
básica para o trabalho poderia ter sido escrita pela própria Jacobs: “uma maneira
de o arquiteto ser revolucionário” é “aprender com a paisagem existente”.
Os herdeiros mais diretos de Jane Jacobs, porém, foram os arquitetos e ur-
banistas que formaram o movimento conhecido como New Urbanism ou novo
urbanismo norte-americano (Peter Calthorpe, Michael Corbett, Andrés Duany,
Elizabeth Moule, Elizabeth Plater-Zyberk, Stefanos Polyzoides e Daniel Solomon).
Eles estabeleceram um decálogo que listava os princípios que deveriam reger
um bom master plan (Fonte: Portal do New Urbanism):
10 Princípios do New Urbanism
capítulo 5 • 138
3. Uso misto e diversidade: na escala do bairro, da quadra e até no mesmo edifício
com o convívio de pessoas de diferentes idades, classes sociais, culturas, etnias etc;
4. Diferentes tipologias residenciais: com tipos, tamanhos e preços diversos;
5. Qualidade de projeto na arquitetura e no desenho urbano: que leve em conta
a escala humana, os usos cívicos e coletivos, além da preocupação com o conforto,
a estética e o sentido de lugar;
6. Estrutura tradicional de bairro/comunidade: com uma distinção clara entre o
centro e a borda, distantes entre si por uma caminhada de dez minutos. No centro,
estaria o grande espaço público e cívico, visível para o restante do bairro ou cidade;
7. Densidade crescente: a proximidade gera eficiência;
8. Transporte eficiente: sobre trilhos (entre bairros e cidades: VLT –Veículo
Leve sobre Trilhos / bonde, trem e metrô) e pessoal (dentro do bairro: bicicletas,
patins, scooters / vespas / motocicletas);
9. Sustentabilidade: com impacto mínimo obtido pela utilização de tecnologia
limpa aliada à eficiência energética. A ideia seria minimizar o uso de combustíveis
não-renováveis e maximizar a produção local: caminhar mais e dirigir menos;
10. Qualidade de vida: “elevar o espírito humano”.
Do pós-guerra à globalização:
capítulo 5 • 139
projeto até que a obra possa ser realizada. E estes já são momentos bem distintos:
as diferentes fases do projeto, a aprovação pelo cliente (além da legalização pelo
órgão público competente) e a etapa final, que é a da construção. Quando se trata
do urbanismo, estas etapas demoram ainda mais. O cliente de um projeto urbano
geralmente é um órgão governamental público ou uma grande empresa constru-
tora. O poder decisório, nestes casos, tende a ser mais lento, seja pelo montante de
dinheiro envolvido, seja pela quantidade de pessoas a serem consultadas.
TEORIA PROJETO
CRÍTICA OBRA
REFLEXÃO
Se há, inevitavelmente, um deslocamento temporal entre a teoria e a prática, é muito
comum haver um descolamento conceitual entre o pensamento arquitetônico e urbanístico e
a oferta ou produção de edifícios, bairros, cidades e planos diretores.
capítulo 5 • 140
Por isso, enquanto os autores citados (como Alan Colquhoun, Christopher
Alexander, Collin Rowe, Kenneth Frampton e Kevin Lynch, todos professores)
buscavam um caminho alternativo e um novo pensamento para o urbanismo do
século XX, a cidade real, movida pela lógica do capital, espraiava-se pelo território
em categorias que ficaram conhecidas como: urbanização dispersa, cidade global,
cidade genérica, entre outras.
Urbanização dispersa
O termo urbanização dispersa tem sido a tradução utilizada com mais fre-
quência para o fenômeno conhecido originalmente pelo termo em inglês urban
sprawl. Entre o fim da Segunda Guerra Mundial e o início dos anos 1970, o
aumento do preço dos terrenos nas áreas centrais das grandes cidades norte-a-
mericanas impulsionou uma procura por áreas mais distantes, com espaços mais
generosos e preços mais acessíveis.
A grande atração seriam os loteamentos com residências unifamiliares bas-
tante amplas e confortáveis. O poder público estimulou este processo com a cons-
trução de autoestradas. Os empresários do comércio viram aí uma grande opor-
tunidade para expandir as cadeias de lojas de departamento, enquanto a indústria
automobilística iria se beneficiar com o aumento das vendas de automóveis par-
ticulares. Demorou pouco para alguém tentar reunir lazer e comércio, com fácil
acesso por automóvel, em uma nova tipologia de centro comercial: os shopping
centers. Os subúrbios norte-americanos foram assim formados pela combinação
de autoestradas, loteamentos e shopping centers.
capítulo 5 • 141
comerciais climatizados e com vasta oferta de estacionamento (shopping malls ou
shopping centers). A forma residencial característica desse modo de vida seriam os
grandes condomínios fechados de residências unifamiliares com garagens e jardins
próprios, além de alguns serviços compartilhados voltados ao lazer e à segurança.
(NUNES-FERREIRA, 2014, pp. 18 e 19)
O fenômeno da dispersão urbana não ficou restrito aos Estados Unidos. Muito
ao contrário, o modelo foi reproduzido em diversas áreas de expansão de cidades
mundo afora, inclusive no Brasil. Como o poder de investimento da iniciativa
privada mostrou-se muito superior ao planejamento público, os subúrbios afluen-
tes brasileiros transformaram-se em manchas de um tecido urbano descontínuo e
fragmentado.
capítulo 5 • 142
completamente nova. Ao longo de séculos, as cidades têm estado nos cruzamentos
de grandes processos, amiúde internacionais. O que é diferente hoje são a intensida-
de, a complexidade e a abrangência global destas redes, a extensão a que porções
significativas de economias são agora desmaterializadas e digitalizadas e, portanto,
a extensão que elas podem viajar a grandes velocidades através de algumas dessas
redes, e, em terceiro lugar, o número de cidades que são parte de redes transnacionais
operando em escalas de geografia extensa.
A nova urbanidade espacial assim produzida é parcial em um duplo sentido: ela é res-
ponsável apenas por parte do que pensaríamos como as divisas espaciais administrati-
vas ou no sentido de um imaginário público da cidade. O que sobressai, entretanto, é a
extensão da qual a cidade permanece uma parte integral nestas novas configurações.
Saskia Sassen (LEGATES, 2003, p.220)
capítulo 5 • 143
A cidade genérica é a cidade livre da opressão do centro, da camisa de força da iden-
tidade. (...) É a cidade sem história, um reflexo das habilidades e das necessidades do
presente. (...) A (sua) grande originalidade (...) é simplesmente abandonar o que não
funciona. (...)
A cidade genérica é tudo que restou do que era a cidade – é a pós-cidade. (KOO-
LHAAS, 1995, pp. 1248 a 1264)
Urbanismo híbrido
As diferentes visões sobre o que é uma cidade que vimos até o momento
parecem evidenciar que cidades são sistemas complexos e variáveis, que estão
em permanente transformação. Enquanto, nos séculos XIX e XX, boa parte dos
urbanistas estava à procura de uma forma para a cidade ideal, os autores mais
contemporâneos, em sua maioria, buscam analisar a cidade real.
Você já deve ter notado que alguns conceitos apresentados aqui não são neces-
sariamente excludentes. Podemos encontrar, por exemplo, fragmentos da cidade
moderna, da cidade informal e da cidade genérica reunidos em diversas regiões
metropolitanas do Brasil. Por isso, o termo urbanismo híbrido tem sido utilizado
com frequência cada vez maior.
A expressão cidade híbrida foi utilizada por George Katodrytis, professor
da American University de Sharjah, nos Emirados Árabes Unidos, para se referir
a cidades como Dubai, onde os edifícios e os espaços urbanos reúnem símbolos
heterogêneos de diversas culturas (KATODRYTIS, 2004). Na verdade, esta defi-
nição aplica-se a diversas cidades contemporâneas, que refletem a superposição de
camadas da cultura atual: erudita e popular, local e global.
capítulo 5 • 144
©© PIXABAY.COM
capítulo 5 • 145
Os desafios das megacidades
10.000
8.000
6.000
4.000
2.000
0.000
1050
1100
1150
1200
1250
1300
1350
1400
1450
1500
1550
1600
1650
1700
1750
1800
1850
1900
1950
2000
2050
Crescimento da população mundial entre os anos de 1050 e 2050.
capítulo 5 • 146
CIDADE - POP. (MIL HAB.)
Tóquio-Yokohama 37.750
Jacarta 31.320
Déli 25.735
Seul-Incheon 23.575
Manila 22.930
Mumbai 22.885
Karachi 22.825
Xangai 22.685
Pequim 20.390
Guangzhou-Foshan 18.770
Osaka-Kobe-Kyoto 16.985
Moscou 16.570
Daca 16.235
Cairo 15.910
Bangkok 15.315
Calcutá 14.810
Teerã 13.680
Istambul 13.520
Lagos 12.830
Shenzhen 12.240
capítulo 5 • 147
CIDADE - POP. (MIL HAB.)
Rio de Janeiro 11.815
Kinshasa 11.380
Tianjin 11.260
Lima 10.950
Paris 10.870
Chengdu 10.680
Lahore 10.355
Londres 10.350
Bangalore 10.165
Nagoya 10.035
rta
li
ai
hi
ai
ork
lo
Dé
m
nil
o
mb
ng
au
rac
he
ca
ha
Y
Ma
oP
Xa
Inc
Mu
Ka
Ja
va
ko
No
Sã
Yo
ul-
io-
Se
qu
Tó
10 maiores cidades do mundo por população, com destaque para as 8 maiores, localizadas
no continente asiático.Fonte: Demographia 2016.
capítulo 5 • 148
A cidade de São Paulo, onde moram 12.038.175 pessoas, é o único municí-
pio no Brasil com população superior a dez milhões de habitantes (Fonte: IBGE,
estimativa para 2016). Já a Região Metropolitana de São Paulo ultrapassa os 20
milhões de habitantes. Por outro lado, o Grande Rio de Janeiro, com seus 21 mu-
nicípios, seria a segunda megacidade do país.
REGIÃO
POSIÇÃO METROPOLITANA UF POPULAÇÃO
1 São Paulo SP 21 242 939
capítulo 5 • 149
REGIÃO
POSIÇÃO UF POPULAÇÃO
METROPOLITANA
21 Piracicaba SP 1 452 691
Imagem de satélite da megalópole Rio de Janeiro - São Paulo à noite. Foto: NASA Earth
Observatory, 2014
capítulo 5 • 150
Deslocamento do eixo de crescimento das megacidades
Vista noturna de Mumbai, 2011. Megacidade indiana com mais de 20 milhões de habitantes.
capítulo 5 • 151
Por fim, algumas tendências também podem ser destacadas. A Europa parece
ter atingido um patamar médio de estagnação. Algumas cidades europeias crescem
pouco, enquanto outras encolhem. O único país desenvolvido em que as cidades
continuam a crescer consideravelmente são os Estados Unidos. A América do Sul
é o continente mais urbano, com 80% de sua população vivendo em cidades. A
África é o continente menos urbanizado, com 40% da população em cidades,
embora algumas de suas cidades estejam entre as que mais crescem no mundo,
como Kinshasa e Lagos. A Ásia contém o maior número de cidades que crescem
mais rapidamente.
ATENÇÃO
O Prêmio Pritzker de Arquitetura é considerado a maior honraria que um arquiteto pode
re-ceber. O prêmio tem sido concedido anualmente, desde 1979, pela Fundação Hyatt (que
é comandada pela família Pritzker), para um arquiteto “que tenha produzido contribuições
consistentes e significativas para a Humanidade e para o ambiente construído por meio da
arte da arquitetura”. (Fonte: Portal Pritzker Prize – tradução do autor)
De acordo com Aravena, um terço dos 3 bilhões de pessoas que vivem nas
cidades atualmente tem uma renda inferior à linha de pobreza. Em 2030, serão
2 em cada 5 bilhões de pessoas abaixo desta mesma faixa de renda. Ele sintetiza
a questão em uma simples equação: o mundo precisaria construir o equivalente
a uma cidade de 1 milhão de pessoas a cada semana pelos próximos 15 anos
(ARAVENA, 2014).
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MULTIMÍDIA
A apresentação de Alejandro Aravena Aravena fez parte da série TED Talks e ocorreu no
Rio de Janeiro em 2014. Disponível em ted.com ou no YouTube.
capítulo 5 • 153
O sudeste asiático merece destaque neste contexto, pois ainda guarda algu-
ma relação entre urbanização e crescimento econômico. Se a China tem hoje
200 cidades com mais de 1 milhão de habitantes, ao menos a economia chine-
sa vem crescendo fortemente nas últimas décadas. Como lembra um estudo da
Universidade de Yale:
Depois das reformas econômicas de 1978, a China tornou-se a grande economia que
mais cresceu no mundo, com taxas médias de crescimento de dois dígitos durante os
últimos 34 anos. Em 2010, a China tornou-se a segunda maior economia do mundo
em PIB nominal, atrás apenas dos Estados Unidos, e (...) poderá tornar-se a maior
economia do mundo já em 2020. (YIN, 2013)
©© J. PATRICK FISCHER | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 5 • 154
A primeira megalópole surgiu no país mais rico do mundo. Estima-se que
ela abrigue hoje 50 milhões de habitantes entre as cidades de Boston, Nova York,
Filadélfia, Baltimore e Washington D. C., no nordeste dos Estados Unidos. Já a
maior conurbação “pobre” do planeta deverá ser aquela que se desenvolve em tor-
no de Lagos, na Nigéria, que poderá alcançar, em poucos anos, um total de mais
de 60 milhões de pessoas vivendo em quatro países à beira do Golfo da Guiné
(DAVIS, 2006, p. 16).
Vista panorâmica de Lagos, na Nigéria (esquerda) e dia de mercado em uma de suas ruas.
capítulo 5 • 155
Assim, as cidades do futuro, em vez de feitas de vidro e aço, como fora previsto por ge-
rações anteriores de urbanistas, serão construídas em grande parte de tijolo aparente,
palha, plástico reciclado, blocos de cimento e restos de madeira. Em vez das cidades
de luz arrojando-se aos céus, boa parte do mundo urbano do século XXI instala-se
na miséria, cercada de poluição, excrementos e deterioração. Na verdade, o bilhão de
habitantes urbanos que moram nas favelas pós-modernas podem mesmo olhar com
inveja as ruínas das robustas casas de barro de Çatal Hüyük, na Anatólia, construídas
no alvorecer da vida urbana há 9 mil anos. (Mike Davis)
CONCEITO
Sustentabilidade é a capacidade de satisfazer as necessidades presentes, sem com-
prometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.
capítulo 5 • 156
térmica com o exterior, enquanto, nos países tropicais, a conhecida preocupação
com o conforto ambiental juntou-se ao novo conceito de eficiência energética.
©© TOM CHANCE | WIKIMEDIA.ORG
capítulo 5 • 157
A nova ética da sustentabilidade provocou um efeito paradoxal no campo do
urbanismo. Por um lado, ela vai ao encontro da agenda do urbanismo pós-mo-
derno, que analisamos anteriormente neste capítulo, no que se refere a revitalizar
bairros já consolidados da cidade existente, com toda a infraestrutura instalada, e
estimular usos mistos, o transporte público, a caminhabilidade, as ciclovias e tudo
o que represente uma menor utilização de combustíveis fósseis. A cidade compac-
ta tornou-se, assim, sinônimo de uma cidade mais sustentável.
A cidade de Nova York, com sua alta densidade, foi considerada por Le Corbusier um desas-
tre iminente. Hoje é um exemplo de cidade compacta. Além disso, diferentes medidas têm
sido tomadas para devolver algumas ruas e avenidas aos pedestres e reduzir a emissão de
gás carbônico dos veículos motorizados. Foto: acervo pessoal do autor.
Por outro lado, o projeto de uma sociedade fundamentada nas diferentes di-
mensões da sustentabilidade (ambiental e territorial, social, política, cultural e
econômica) resgatou em muitos arquitetos e urbanistas a ideia de criar novamente
uma cidade ideal. Entretanto, o projeto mais conhecido de cidade de emissão
zero vem sofrendo vários retrocessos.
Em 2006, o governo de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, contratou
o escritório do arquiteto e urbanista inglês Norman Foster para desenvolver o pro-
jeto da cidade de Masdar, um centro global para a indústria de tecnologia limpa,
com 50.000 habitantes e nenhum automóvel, que somaria 22 bilhões de investi-
mentos em dez anos. Hoje, a comunidade abriga o Instituto Masdar de Ciência e
capítulo 5 • 158
Tecnologia, onde estudam 2.000 alunos, sendo que apenas 300 moram no local
gratuitamente, e pequenas filiais de empresas de energia como a General Electric
e a Siemens, onde trabalha uma centena de funcionários. Das cem estações de
veículos autônomos previstas, foram construídas apenas duas. Estima-se que este-
jam concluídos apenas 5% do projeto, que combina os princípios da arquitetura
vernacular árabe com tecnologia de ponta. Por tudo isso, o jornal britânico The
Guardian declarou recentemente que a cidade de Masdar poderia se tornar a pri-
meira cidade verde fantasma no mundo (GOLDENBERG, 2016).
Mas o aparente insucesso de iniciativas como a cidade de Masdar não significa
que algumas iniciativas mundo afora não estejam apontando um caminho na bus-
ca de cidades mais sustentáveis. No início dos anos 1990, a cidade de Freiburg, no
sudoeste da Alemanha decidiu transformar um antigo quartel desativado em um
bairro sustentável para 5.000 moradores. O projeto de Vauban fundamentou-se
na tríade mobilidade, energia e construção social sustentável, além de promo-
ver a gestão participativa do bairro. Ligada ao centro da cidade por uma linha de
VLT (veículo leve sobre trilhos), a comunidade tem apenas duas ruas para veículos
motorizados, estacionamentos periféricos e um sistema de compartilhamento com
16 automóveis.
©© ANDREAS SCHWARZKOPF | WIKIMEDIA.ORG
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As edificações têm até quatro pavimentos e contam com telhados verdes, pai-
néis solares fotovoltaicos, aquecimento solar de água, isolamento térmico, apro-
veitamento de água pluvial para vasos sanitários e jardins, cogeração de energia
por biomassa e drenagem de esgoto a vácuo. As residências consomem 10% da
energia de uma casa convencional, produzindo, em alguns casos, mais energia do
que o próprio consumo. As lojas exibem painéis eletrônicos que indicam a energia
produzida e economizada. Calcula-se que, em 2050, as emissões de gás carbônico
em Vauban cheguem a 20% em relação a comunidades convencionais (DIAS,
2015).
No Brasil, uma tentativa similar está sendo desenvolvida no bairro da Pedra
Branca, um loteamento com 250 hectares construído no terreno de uma antiga
fazenda, localizado a dezoito quilômetros de Florianópolis, Santa Catarina.
O urbanismo verde tem transformado também as áreas centrais de cidades co-
nhecidas internacionalmente. Em Amsterdã, algumas áreas de expansão do centro
histórico têm sido construídas a partir dos preceitos do novo urbanismo susten-
tável. Com uma releitura da arquitetura dos antigos canais, o bairro de Borneo
conta com uma rede de vias estreitas que privilegiam os pedestres e as bicicletas em
uma escala humana bastante agradável.
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Diferentes aspectos da High Line, em Nova York. Fotos: acervo pessoal do autor.
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Torre mais alta da Europa, o edifício The Shard, do arquiteto italiano Renzo Piano, localizado
no centro de Londres. Foto: acervo pessoal do autor.
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