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Paulo Nazareth

e Moises Patricio
What is the color of
my skin? / Qual é
a cor da minha pele?

PRESENÇAS:
A PERFORMANCE NEGRA
COMO CORPO POLÍTICO
O CORPO NEGRO INVADE ESPAÇOS SIMBOLICAMENTE INTERDITADOS

por ALEXANDRE ARAÚJO BISPO e FABIANA LOPES

PENSADA pelos artistas Peter de Brito e Moisés Patrício a étnico-espacial e questiona, de maneira não verbalizada, o sta-
ação performática A presença negra (2014) surgiu em repos- tus quo da nossa sociedade, bem como o discurso corrente de
ta à “desproporção na representação demográfica de afrodes- que artistas brasileiros negros não existem.
cendentes em certos espaços sociais, e mais precisamente no Existem, sim, e são muitos. Historicamente, sua presença
contexto das artes visuais”, como afirmam no manifesto de remonta pelo menos ao século XVIII, com Antônio Francis-
fevereiro de 2015 (publicado na revista OMenelick2o.Ato, co Lisboa (1738-1814), Mestre Valentim (1745-1813); José
número 15). Essa ação, a um só tempo política, poética e es- Teófilo de Jesus (1758-1847), Estevão Silva (1844-1981), os
tética, aberta à participação de artistas e intelectuais negros, irmãos Arthur Timóteo da Costa (1882-1922) e João Timó-
acontece durante a inauguração de exposições em galerias es- teo da Costa (1839-1932) durante o século XIX. No século
colhidas pelo duo e é encenada em corpos negros coletiva- XX Heitor dos Prazeres (1898-1966), Mestre Didi (1917-
mente arranjados. Nesse caso a presença é a performance e a 2013), Antonio Bandeira (1922-1967), Wilson Tibério
FOTOS: CORTESIA DA GALERIA MENDES WOOD

circulação dos participantes a reverberação do manifesto. Não (1923-2005), Agnaldo Manoel dos Santos (1926-1962), Ieda
existe qualquer ação especificamente plástica além do encon- Maria (1932), Emanuel Araújo (1940), Jorge dos Anjos
tro, da fruição e das formas de socialização em espaços sim- (1957), e os contemporâneos Rosana Paulino (1967),Ayrson
bólicamente interditados. Como em qualquer performance, Heráclito (1968), Sonia Gomes (1948), Lidia Lisboa (1970),
também aqui os corpos atuam pela presença, porém sem in- Sidney Amaral (1973), Jaime Lauriano (1985) são nomes re-
tenção panfletária. O objetivo é refletir acerca do corpo ne- levantes. Um aspecto importante da performance A presença
gro e suas potencialidades expressivas nos espaços de compar- negra é que ela põe em diálogo artistas, produtores e intelec-
tilhamento cultural. Nas ações que promove, A presença negra tuais negros mobilizados em torno de causas comuns em es-
redefine, ainda que brevemente, os territórios de segregação paços de exibição da produção plástica contemporânea.

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Michelle Mattiuzz,
Merci Beaucoup,

A PRESENÇA é a performance e a circulação dos participantes a reverberação do manifesto


Blanco! (2012)

A ideia de estar presente nos espaços de arte e fazer dessa Art Gallery, Nova York (2013) e no Studio Museum in
presença uma ação performática aparece no trabalho da ar- Harlem, Nova York (2014). O lugar do corpo no trabalho
tista conceitual norte- americana Lorraine O’Grady (1934), de O’Grady revela discussões semelhantes às que, sobretudo
que, no decorrer dos anos 1980, invadia o circuito de arte a partir da década de 2000, vêm acontecendo entre artistas
em Nova York com suas performances protagonizadas pela negros brasileiros, incluindo-se nesse rol Michelle Mattiu-
personagem Mlle. Bourgeoise Noire. Mlle. Bourgeoise zzi, Paulo Nazareth (1977), Priscila Rezende (1985) e Re-
Noire se apresentava em lugares como o New Museum of nata Felinto (1978), artistas que elegem espaços coletivos,
Contemporary Art e a galeria Just Above Midtown vestin- não apenas galerias, para realizar seus trabalhos.
do um traje formal feito de 180 pares de luvas brancas e Para Michelle Mattiuzzi, o corpo se apresenta como o ve-
uma capa do mesmo material. Durante as performances – ículo que informa suas práticas artísticas, como meio expres-
ou “invasões-guerrilha”, como a artista prefere chamá-las –, sivo e máquina de guerra. “Há pelo menos três décadas car-
ela geralmente recitava poemas-manifesto criticando a rego o meu corpo pelo mundo. Vivo com humor,
marcada segregação racial no universo artístico nova-ior- mau-humor, desamor, alegria, tristeza, felicidade, dor, amor,
quino no começo daquela década. Como parte de sua es- paixão, cores e muitas outras coisas que não cabem nas pala-
tratégia, O’Grady utilizava a participação do público para vras”, afirma a artista. Na performance Merci beaucoup blanco!
por em cheque questões de representação em contextos es- / Muito obrigada, branco! (2012), Mattiuzzi desafia a coleção de
pecíficos. Por sua relevância histórica, o vestido usado nas estereótipos ainda fortemente atrelados ao corpo negro no
performances de O’Grady foi mostrado em recentes e im- imaginário brasileiro. Nesse trabalho, ela se cobre ritualistica-
portantes exposições como “Wack! Art and Feminist Re- mente com tinta branca e cria imagens de seu corpo em mo-
volution”, no Museum of Contemporary Art, Los Angeles vimento. A obra, uma resposta à provocação feita pelos artis-
(2007) e no MoMA PS1, NovaYork (2008) e “Radical Pre- tas Sara Panamby e Felipe Espíndola, foi ressignificada
sence: Black Performance in Contemporary Art”, na Grey quando Paulo Nazareth a presenteou com o panfleto-obra

FOTOS: CORTESIA DO ARTISTA

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O informa
CORPO SE APRESENTA como o veículo que
suas práticas artísticas, como meio expressivo e máquina de guerra

Priscila Rezende, Bombril (2010)

FOTOS: GUTO MUNIZ

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A artista confronta o DISCURSO RACIAL discriminador que permeia suas interações
pessoais e compartilha com o observador o desconforto gerado por esse discurso.

Qué ficar bunitu?. O folheto é ilustrado com o retrato de um física e moralmente desconfortáveis, transformando-se ele
homem negro e um texto descrevendo os serviços que um mesmo em objeto útil – “o cabelo que lava e esfrega uten-
salão imaginário oferece para embelezar seus clientes: alisa- sílios domésticos, o corpo que serve aos demais objetos, ao
mento de cabelo, clareamento de pele, estreitamento de nariz espectador”, afirma a artista. Neste trabalho, o espaço da
etc., todos representando ações para desfazer as características domesticidade – por excelência a casa colonial e posterior-
que definem as singularidades do corpo negro. Com essa mente burguesa no Brasil – é revisitado como campo de re-
obra, Nazareth discute a ideia (e o ideal) de beleza comparti- flexão, como território de resistência. O tema da coisifica-
lhada e difundida com especial empenho pela imprensa na ção do corpo negro feminino, geralmente evitado ou
sociedade brasileira. No diálogo com a obra do artista, Mat- completamente ignorado, entra para a pauta de discussão
tiuzzi confronta com seu corpo esse sistema social hegemô- sem deixar margem a esquivas ou subterfúgios. Através do
nico que inviabiliza todas as outras possibilidades de beleza corpo, a artista confronta o discurso racial discriminador
ou expressão corporal que fogem aos padrões estabelecidos. que permeia suas interações pessoais e compartilha com o
Sua máquina de guerra ataca as expectativas sociais, artísticas observador o desconforto gerado por esse discurso.
e políticas que investem sobre seu corpo negro. Em White Face and Blonde Hair (2012), performance que faz
Em Paulo Nazareth a performance é o trânsito contínuo do parte da serie Também quero ser sexy (2012), Renata Felinto
artista que articula deambulação e noção de lugar, origem e se autorrepresenta como uma loura com ostensiva capacidade
pertencimento. Nazareth problematiza experiências de mi- de consumo do luxo oferecido na Rua Oscar Freire em São
gração recortadas por temáticas raciais. Do processo de sua Paulo. Espaço de forte segregação social, a rua escolhida pela
movimentação geográfica resultam vídeos com imagens des- artista para apresentar a performance permite pensar na rela-
focadas e imprecisas, panfletos-instruções, fotografias e toda ção entre corpo negro e espaço público. Se para Nazareth a
sorte de objetos impensáveis (rótulos de embalagens, sacolas identidade racial é ambígua, para as três artistas negras aqui
de estopa, cartazes de propaganda antigos, peças de roupas usa- mencionadas não há margem de manobra para negociá-la. Jo-
das etc.). Resultam também registros fotográficos nos quais o gando com essa impossibilidade, Renata Felinto cria uma pla-
artista posa, ora sozinho, ora acompanhado, segurando placas taforma de representação de si mesma como outra, estabele-
de papelão com inscrições do tipo:“Vendo minha imagem de cendo uma alteridade com as louras. Usando a estratégia do
homem exótico”, fazendo referência à construção antropoló- travestismo corporal ela articula noções como classe e raça,
gica do outro não ocidental, o diferente daquilo que é tomado trocando suas referências corporais. No lugar nos dreadlocks
por padrão, por correto; ou “Llevo recado a los EUA”, como que a caracterizam, usa uma peruca de cabelos compridos e
se a frase assim escrita lhe franqueasse uma entrada diplomáti- louros, a pele branqueada por maquiagem pesada, caricata e
ca naquele país; ou ainda “Qual é a cor da minha pele?”. Nes- ostensiva.Ao caminhar pela Oscar Freire desconcertando pas-
sa imagem, Nazareth, que tem a pele clara, posa ao lado de santes, balconistas e seguranças, observa vitrines, analisa produ-
Moisés Patrício, um homem de pele escura, ambos segurando tos, toma café, sempre sorridente e extravagante. Se Priscila
o cartaz com a pergunta escrita em inglês e em português. Rezende usa o cabelo crespo para remeter ao mundo do tra-
Empenhado em borrar os limites entre as noções de centro e balho doméstico e da coisificação do corpo, Felinto, ao con-
periferia, de estratificação social e de relações raciais, Paulo trário, prende seus cabelos sob a peruca loura, fazendo suspen-
Nazareth nos faz repensar sobre as certezas que sustentam as se de sua verdadeira aparência.
identidades que construímos no plano das subjetividades As obras desses quatro artistas, em diálogo com a A pre- Renata Felinto,
(corpo) e no plano da cultura (territórios políticos).Ao se co- sença negra, revelam pelo menos dois desdobramentos im- White Face, Blond
Hair (2013)
locar fisicamente nos espaços, sugere, com sua imagem ambí- portantes para compreendermos o papel das performances
gua, mestiça de branco, índio e negro, outras possibilidades na produção social de sentidos compartilhados. Em primei-
que emergem do contato cultural. ro lugar, apontam para a naturalização da presença, usos e
Na perfomance Bombril (2010), a artista Priscila Rezende práticas de certos grupos sociais no âmbito da arte contem-
FOTO: CORTESIA DO ARTISTA

esfrega com o cabelo a superfície de utensílios metálicos porânea, ela mesma colonizada e produtora de preconcei-
domésticos usados na cozinha. O título, extraído da conhe- tos. Em segundo, tanto esses artistas quanto o coletivo A
cida esponja de aço homônima, serve, com frequência, Presença Negra nos permitem refletir acerca da importância
como adjetivo pejorativo ao cabelo de mulheres negras. do corpo como forma de estar, problematizar e usar os es-
Durante a performance, seu corpo se contorce em posições paços tidos por culturalmente legítimos.

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