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INTRODUÇÃO
Para Fernando de Azevedo (1948, p. 198) na escola tradicional o livro utilizado nas
atividades escolares era chamado de “livro de texto”, e dentro das novas concepções da
escola nova passou a ser chamado de “livro escolar”, onde sua função consiste em “obter
dados e informações, esclarecer dúvidas, recolher material de estudos e reflexão, e ‘por
simples prazer’[...]. (AZEVEDO, 1948, p. 197)
Então, a visão sobre leitura, e principalmente o uso dos livros transforma-se e passa
a ser visto não mais como um instrumento de atitude não dinâmica, mas como uma “obra
aberta” , pois as leituras eram ativas no sentido que o saber encontrado nos livros não se
ofereciam mais a memorização, todavia emulavam a produção de novos saberes. (Vidal,
1999, p. 339).
Dessa forma, o livro de vilão da Escola Nova passou a assumir, juntamente com a
leitura, um papel de destaque na formação dos alunos.
Segundo Azevedo (1948, p. 201) a ofensiva contra o livro de leitura ou de texto não
era uma investida contra o livro e a cultura, mas dando-lhe nova função, tornando-o
instrumento de trabalho, um “elemento de cultura”, desfazendo qualquer equivoco,
completa: “Bem vindos sejam, pois, à escola nova os livros de literatura, de ciência e de
arte, [...]” (Fernando de Azevedo, 1948, p. 202).
O NACIONALISMO E O RURALISMO
Com as novas mudanças ocorrendo no âmbito escolar advindo dos pressupostos de
uma nova concepção de ensino aparece o fenômeno do nacionalismo e do ruralismo no
âmbito social, que são refletidos no campo educacional.
O fenômeno do nacionalismo que se estruturava sob a forma de uma corrente de
idéias sistematizada num amplo movimento político-social e que se baseava no fenômeno
de exaltação do homem e das coisas brasileiras, também penetrou no pensamento sobre
educação, mas não com tanta intensidade, o fenômeno do ruralismo, que influenciou
parcialmente a legislação e as práticas escolares, e que se constituía numa ideologia de
desenvolvimento. (NAGLE, 1976, p. 231)
Muitos aspectos do fenômeno ruralismo e do nacionalismo cruzaram-se, ocorrendo
principalmente quando o nacionalismo tratava da exaltação da “terra” e da gente
brasileira. Assim “terra” se traduziu em “ produtos da terra” e tornou-se sinônimo de
“agricultura”.
No estado de São Paulo, o livro Saudade, que sendo uma obra didática para o
ensino da leitura, estava comprometido com o processo de ruralização de ensino.
Esta obra de Tales [sic] de Andrade, na verdade, em que pesem suas excelentes
qualidades literárias, inaugurava, na área escolar, um esforço concentrado,
aplaudido pelo Governo, de retorno ao campo, à mentalidade de país
essencialmente agrícola [...] (ARROYO, 1988, p.188)
O LIVRO SAUDADE
Saudade (1919), escrito por Thales Castanho de Andrade, nasceu em um pequeno
artigo com o título de “Instrução e Agricultura” publicado em 1911 no Jornal O Monitor da
Escola Complementar de Piracicaba.
Thales Castanho de Andrade esteve ligado com as questões que envolviam a vida
rural e agrícola, assim quando foi professor de uma escola rural pode ter mais contato
contribuindo com observações e elementos para o surgimento do seu livro Saudade.
Segundo Arroyo (1988), em um depoimento, Thales Castanho de Andrade conta que
Saudade (1919) foi escrito em 40 manhãs.
O livro Saudade (1919) teve sua primeira edição impressa em Pocai, estado de São
Paulo, no ano de 1919, sendo que para Lajolo e Zilberman (1999, p. 30) com este romance,
Thales Castanho de Andrade encerra esse primeiro período da literatura infantil brasileira.
A 1º edição de Saudade foi feita pelo Governo do Estado de São Paulo através da
Secretaria da Agricultura, totalizando 15 mil exemplares. A 2º edição foi feita, alguns
meses depois, pelo Jornal de Piracicaba, totalizando uma tiragem de 20 mil exemplares, e
da 3º à 13º edição, os livros saíram com uma chancela da Gráfica Editora Monteiro Lobato,
e depois sob a égide da Companhia Editora Nacional. (ARROYO, 1988, p. 191).
Saudade (1919) foi um livro que na sua época foi utilizada na atividade didática-
escolar e possibilitava uma leitura real da situação das pessoas daquela época, contrariando
outros livros que traziam visões ilusórias sobre o cotidiano e a vida das pessoas.
Thales Castanho de Andrade escreveu livros utilizados no momento da literatura
escolar: Ler Brincando; Espelho; Alegria; Vida na Roça; Milho; Trabalho; Na Oficina; O
Irmão Café e Saudade. Também escreveu vários contos e pequenas novelas infantis: A
filha da Floresta; El-Rei Dom Sapo; Bem- te- vi feiticeiro; Dona Içá Rainha; Bela, a
Verdureira; Árvores Milagrosas; O Pequeno Mágico; Fim do Mundo; Totó Judeu;
Caminho do Céu; O Sono do Monstro; A Rainha dos Reis; Praga e Feitiço; Capitão Feliz;
A Fonte Maravilhosa; A Bruxa Branca; O Grito Milagroso; O Gigante das Ondas; Morto e
Vivo; A Cadeira Encantada; o Mistério das Cores; A Estrela Mágica; O Melhor Presente;
Como Nasceu a Cidade Maravilhosa; Flor de Ipê.
Dentre o livros que Thales Castanho de Andrade escreveu nenhum alcançou o
mesmo êxito de Saudade, que continha histórias interessantes com senso de comunicação e
simplicidade, e gerou muitas críticas a seu favor. (ARROYO, 1988, p. 191)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando o exposto, até o momento posso concluir que o livro Saudade (1919)
de Thales Castanho de Andrade marcou e delimitou a fase de transição da literatura escolar
para a literatura infantil, enfatizando a vida rural do país à sua época e sendo utilizado na
atividade didática-escolar.
O livro Saudade, publicado em 1919, e escrito por um autor nacional de literatura
infantil, revelou tendências regionalistas, nacionalistas e rurais com ênfase na tradição oral
e popular, indicando uma integração entre a escola e a literatura.
A utilização de livros-texto na atividade didática possibilitou o surgimento de uma
“literatura escolar”, que era constituída de livros traduzidos e/ou produzidos por
brasileiros, dedicados à infância, para o uso vinculado apenas à escola, com finalidade de
ensinar valores morais e sociais, de forma agradável, e dessa “literatura escolar” que se
origina a literatura infantil brasileira.
ANDRADE, Tales de. Saudade . 63º ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1974.
AZEVEDO, Fernando de. A Educação e seus Problemas. 4 ed. São Paulo: Melhoramentos,
1948.
CARVALHO, Marta Maria Chagas de. Por uma história cultural dos saberes
pedagógicos. In: SOUSA, Cynthia Pereira de; CATANI, Denice Barbara. Práticas
educativas, Culturas Escolares, Profissão Docente. São Paulo: Editora Escrituras, 1998. p.
31 – 40
MEIRELES, Cecília. Problemas da literatura infantil. 2. ed. São Paulo: Summus Editorial.
1979.
MENEZES, Raimundo de. Dicionário literário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1969. v.
1
______. Bibliografia brasileira básica sobre literatura infantil e juvenil. Marília, 2000b.
(digitado)
SILVA, Vivian Batista da. Uma história das leituras para professores: análise da produção
e circulação de saberes especializados nos manuais pedagógicos (1930 – 1971). In: 25º
Reunião Anual da Anped, 2002 .
TAMBARA, Elomar. Livros de leitura nas escolas de ensino primário no século XIX no
Brasil. In: Reunião Anual da Anped, 2003.
Trabalho realizado com o apoio do CNPq – Brasil, sob orientação da Dra Ana Clara Bortoleto Nery.
Mestranda em Educação pela Universidade Estadual Paulista / Câmpus de Marília.
Lourenço Filho (1943), Leonardo Arroyo (1968), Lajolo e Zilberman (1999), Mortatti (2000a).
Informações extraídas de MENEZES (1969, vol. 1).
Neste trabalho optei por escrever o primeiro nome do autor da seguinte forma: “THALES”, exceto nas
citações onde preservarei o texto do autor da referência, uma vez que na escola, em Piracicaba, que leva seu
nome a grafia é com H.