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O abandono do ensino da geometria no Brasi O gradual abandono do ensino da geometria, veriticado nestas ultimas décadas, no Brasil, 6 um fato que tem Ppreocupado bastante os educadores matemiaticos brasileiros e que, embora reflita uma tendéncia geral, é mais evi- dente nas escolas publicas, principal- mente apés a promulgagao da Lei 5692/71. Aliberdade que essa lei concedia as escolas quanto 4 decisdo sobre os Programas das diferentes disciplinas possibilitou que muitos professores de matematica, sentindo-se inseguros para trabalharcom a geometria, deixas- sem de inclui-la em sua programagao. Por outro lado, mesmo dentre aqueles que continuaram a ensina-la, muitos reservaram o final do ano letivo para sua abordagem em sala de aula - talvez numa tentativa, ainda que inconsciente, de utilizar a falta de tempo como des- culpa pela nao realizagdo do trabalho programado com o tépico em questao. Se 6 visivel 0 abandono do en- sino da geometria, observa-se, todavia, entre os professores de matematica, uma grande intranquilidade em relagao aele. Evidéncia disso 6 a procura pelos cursos de geometria oferecidos pelas Universidades, em convénio ou nao com as Secretarias da Educagao, ou causas e consequéncias Regina Maria Pavanello por aqueles oferecidos por outras en- tidades e instituigées, gratuitos ou pagos, cuja eticacia, nao obstante mereca uma discussao, escapa, porém, aos objetivos deste artigo. A inquietagao com o abandano da geometria - abandono este que é, na verdade, um fenémeno mundial - parece estar ligada a questoes de ordem educacional. O estudo da geometria nao foi considerado, durante séculos, como indispensavel a ftormagao intelectual dos individuos e ao desenvolvimento da capacidade de habitos de raciocinio? Privar os individuos deste estudo nao acarretaria Prejuizos a sua formagao? A auséencia de um trabalho com a geametria nao prejudicaria uma visdo integrada da matamatica? Ha, entre os matematicos, opini6es divergentes quanto ao papel da geometria hoje, tanto na educagdo como na pesquisa matematica. Alguns acreditam que ela deve ceder espaco a outros ramos mais em evidéncia no campo da pesquisa matematica contemporanea. Outros, entretanto, as sumem a posi¢ao contraria e entatizam exatamente as relagées que a geometria mantém com estes mesmos Projessora Assistenta do Departamento de Teona e Pratica da Educagdo da Universidade Estadual de Mannga - PA. Doutoranda em Educagao pela Universidade Estadual de Campinas UNICAMP. Ano i -n® 1/1993 Revista Zetetike - 7 ramos’, bem como sua contribuigao valiosa para a construgdo do co- nhecimento matematico ao longo do processo da escolarizagao* Esta ditima é a posigao compar- tilhada por educadores matematicos em todo o mundo, os quais, preocupados com os rumos do ensino da geometria, tém concedido destaque ao tema em seus congressos. Em varios paises, inumeras. pesquisas estado sendo realizadas, procurando determinar o “que” ensinar de geometria e "como" tazé-lo. Grandes esforgos tém sido empreendidos na capacitacao de docentes, visando a permitir-Ihes realizar um trabalho de qualidade em relagao a esse tema. Em suma, 0 abandono do ensino da geometria ndo se deveu ao desen- volvimento da matematica, que o teria supostamente tornado desnecess: ou a.conclusao de que sua contribuigdo para a formacao do aluno nao é impor- tante Como e por que, entao, isto acon- teceu? Para responder essa questao, sera necessdrio analisar o desenvo!- vimento do ensino da matemiatica e da geometria no Brasil? neste século. Essa analise sera realizada tendo em vista as moditicagdes sdcio-politico-econémicas produzidas na sociedade brasileira no periodo e a influéncia exercida por elas e pela difusdo de novas idéias peda- Qdgicas - provenientes da Franca e dos Estados Unidos, Principalmente - sobre a educagao brasileira No inicio do século XX, o Brasil é ainda um pais essencialmente agricola, que vive da comercializagdo e expor- tagdo de seus produtos para os paises &- Revista Zetetike industrializados. S40 poucas ainda as industrias aqui existentes e seus produtos sofrem a concorréncia dos produtos fabricados nos paises mais desenvolvidos. A maioria da populagao é anal- fabeta, sem acesso a educagao, nem mesmo a elementar. Apenas uma minoria consegue chegar aos demais. niveis de escolarizagao. Somente os fi- Ihos e parentes dos latifundiarios 6 que tém acesso aos cursos de nivel supe- rior. Dentre estes, o preferido 6 o juridico, que facilitao acesso aoscargos burocraticos ¢ politicos do governo. Ha, portanto, pouco interesse pelos estudos cientificos. © ensino da matematica na es- cola primaria ¢ essencialmente ulilitario busca-se o dominio das técnicas operatérias necessdrias a vida pratica e as atividades comerciais. Com a mesma orientagdo trabalham-se al- gumas nagées de geometria. Por sua vez, 0 ensino secundaria é, em geral, pago e destina-se, pois, as elites e a preparagdo para os cursos superiores. Os conteddos de mate- Matica (aritmética, algebra, geometria, etc.) sao ensinados separadamente e por professores diferentes. O tratamen- to dado a eles 6 puramente abstrato. sem qualquer preocupagdo com as aplicagoes praticas. Os livros utilizados também desenvolvem cada assunto Progressiva e sistematicamente como um todo, sem procurar estabelecer qualquer relagdo entre os diferentes ramos da matematica Os professores desta e das demais disciplinas desse nivel de en- sino séo quase sempre autodidatas ou Ano f= n® 1/1993 criundos das profiss6es liberais*. Uns Poucos $40 engenheiros civis ou militares. Se existe, alias, algum desen- valvimento da matemdtica neste periodo, ele se dana Escola Militar ena Politécnica do Rio de Janeiro. A partir da 1* Guerra Mundial, processam-se modificagées nos se- tores econdmica, social € politico do pais. O grupo industrial urbano tor- talece-se, ampliam-se os setores médios e do operariado, surge o Macionalismo como decorréncia da- quele conflito @ cresce a pressao pela recomposi¢ao do poder politico. Estes acontecimentos vdo reper- cutir no campo educacional, iniciando- se, entao, um periodo de intensos debates eé reivindicagdes relativos a educagao”. A pregagao nacionalista dirige-se principalmente ao combate ao analfabetismo - apresentado como um dos principais problemas nacionais - @ a difusdo da escola primaria. Aintengao é ampliar as bases de representagao eleitoral - a Constituigao nao concede direito de vota ao analfabeto - para pos- sibilitar a recomposigao do poder politico. A extensdo do ensino elementar a maioria da populagdo encontra, porém, muitas dificuldades. Antes mesmo que tada a populacao em idade escolar tenha acesso a ele, comeca a preocupagdo com a sua qualidade. Assim, a divulgagao de obras didatico- metodolégicas e de teorias psicologicas na década de 20 acaba entatizando os aspectos puramente metodoldgicos da educagdo e minimizando seus compo- nentes social e politico. De qualquer torma, veriticam-se Ann ben? 1/1009 algumas mudancas em relagao a escola elementar: procura-se, embora timida- mente, expandi-la, organiza-la e melho- rar a formagdo dos profissionais que nela atuam. O mesmo nao acontece, porém, aos demais cursos e niveis de ensino. A crise de 1929 tem conse: qUéncias importantes para a economia brasileira. A queda na exportacao de caté impossibilita a importagao de bens de consumo. A necessidade de suprir 0 mercado interno e de proporcionar emprego a mao-de-obra liberada do Selor agricola provoca um avango no processo de industrializagdo. No periodo que se segue a crise de 29 ea Revolugdo de 30, observa-se um aumento significative na producao in- dustrial brasileira. Aeclosdo da 2? Guer- ra Mundial impulsiona ainda mais o processo de industrializagao, possibi- litando que as industrias se expandam se diversifiquem. Em 1930, no rastro dessas mudangas, 0 governo federal provisorio toma sua primeira medida relativa a educagao: cria o Ministério da Educagao e Saude, indicando Francis- co Campos para chefid-lo. Seguem-se Qutras medidas, no ano seguinte Decretos do Ministro estabelecem a reestruturagao do ensino superior, adotando-se para ele o regime universitario, e a reorganizagao do en- sino comercial (médio e superior) e do secundario, buscando transformar este ultimo em um curso predominante- mente formativo, Medidas de mérito e que aten diam antigas reivindicagédes dos educadores brasileiros, elas eram, no entanto, fragmentarias pois nao se in- Rlavisita Zatatiké - 9 seriam em uma politica educacional global. Demonstravam, além disso, o alheamento do governo federal em relagao ao ensino popular. Tornava-se necessdrio portanto, pressionar o governo federal, impelindo-o a adotar uma politica mais abrangente em relagdo aos problemas educacionais. Comessatinalidade, educadores brasileiros elaboram um documento que expressa suas aspiragOes efixa as diretrizes que deveriam nortear essa politica educacional global. Esse documento, conhecide como o Manifes- 10 dos Pioneiros da Educacao Nova, 6 divulgado em 1932. Ele afirma, entre outras coisas. a necessidade da construcdo de um sistema unificada de ensino, suficientemente democratico para garantir aos educandos a ascensdo a qualquer de seus niveis, de acardo com sua capacidade. aptidées e aspiragdes e independentemente de sua situagao econémica. Assinala, também. a necessidade da tormagao de professores de todos os graus de en- sino em cursos superiores® © documento influencia a Constitui¢ao de 34, que fixa as bases de uma politica nacional de educagao e que estabelece nao sé a competéncia dos governos federal, estadual e municipal em relagao a educa¢ao como também os recursos minimos que nela deverdo ser investidos. Todavia, néo sdo tomadas, in- felizmente. providéncias concretas no sentido de cumprir os dispasitivos legais. A organizagao escolar brasileira continua altamente seletiva. A tendéncia 4 dualidade persiste no en- sino pés-elementar. Ela caracteriza-se pela existéncia de dois sistemas rigidos 10 - Revista Zetetike e fechades em si mesmos: as escolas para o “povo” (as profissionais) e as destinadas a “elite” (as secundarias). Essa estrutura acentua-se apds.ogolpe de 37. que instala o Estado Novo. A Constituigao de 37 deixa de considerar a educacao como um dever do Estado, conferindo 4 agdo estatal um cardter meramente supletiva. Dois fatos ocorridos no periodo exercerao influéncia no curso secun- dario e no ensino da matematica e da geometria. O primeiro deles é a criagao das Universidades de Sao Paulo e do Rio de Janeiro, em 1934 e 1935 respec- tivamente, pois nelas se instalam os primeiros cursos destinados a fermagao dos professores das diversas disci- plinas do ensino secundario, O outro é a organizagdo imposta por Francisco Campos a esse ensino, Além de dividir Q curso em dois ciclos - 0 fundamental (de cinco anos de duragao) e o com- plememtar (de 2 anos) - estabelece. também, os programas referentes as diferentes disciplinas e oferece “instrugdes pedagégicas” No que se refere ao ensino da matematica, observa-se a tentativa de estabelecer a unidade entre os varios ramos da matematica, entregando o en- sino da disciplina a um s6 professor. Este devera desenvolver. em cada série, 0 ensino dos varios assuntos, procurando integra-los. Em relagdo ao ensino da geo- metria, propée que ele se inicie pelas exploragées intuitivas, a partir das quais se estabelecerdo os conhecimentos indispensdveis a construgdo de uma sistematizagao, que devera atingir a ‘exposigao formal’ Ana i -n® 1/1993 € diticil avaliar a repercussao dessas instrugdes no dia-a-dia da sala de aula, principalmente quando se leva em conta a tormagao dos docentes. O exame dos livros didaticos da época mostra que os temas (aritmética, algebra e geometria) $40 programados em cada série, sem que exista a Preocupacao em trabalhd-los integra- damente. Nos ultimos anes do Estado Novo, novas retormas sao empreen- didas pelo entao Ministro da Educagao, Gustavo Gapanema. A primeira das reformas, em 1942, 6 a do ensino profissional, em especial seu ramo industrial. As raz6es Para essa priorizagao sao tanto de ordem politica quanto econémica. Politicamente, a qualificagdo do traba- Ihador urbano faz parte de uma estratégia do governo destinada.a resol- ver o problema das agitacdes sociais. nas cidades, cada vez mais populosas em virtude da aceleragao dos proces- sos de urbanizagao e industrializagao. Do ponto de vista econémico, essa qualificagdo é necessdria ao desenvol- vimento industrial, principalmente por- que as leis de imigragao da década de 30 e, depois, a eclosdo da 2* Guerra Mundial, impedem o emprego de técnicos e especialistas estrangeiros nas industrias brasileiras. Embora o ensino protissional tenha se expandido consideravelmente, € o curso secundario o mais procurado pelas camadas que véem na educagdo um instrumento de ascensdo social. Sendo o Unico que possibilita o acesso a qualquer ramo do ensino superior, ¢0 que apresenta maior crescimento. Apesar disso, 0 ensino nele ministrado Ano l-n® 1/1993 € criticado pelo seu excessivo tormalis- mo. A Lei Organica do Ensino Secundario, de abril de 1942, da uma nova estrutura ao curso. Seu primeiro ciclo, agora denominado curso ginasial, temagora 4 anos de duragao e o segun- do, subdividido em classico e cientifico, 3 anos. Os programas de matematica de 1942 apresentam algumas diferengas em relagao aos de 1931. Nao mais se insiste em que os trés assuntos (aritmética, algebra e geometria) sejam abordados em cada uma das séries do curso ginasial. A geometria, no entanto, 6 abordada nas quatro séries, intuitiva- mente mas duas séries iniciais e dedutivamente nas Uullimas. Ela é também bastante priorizada no sequn- do ciclo, constando da programagao de todas as séries. Inclui-se ainda trigonometria no 2° ano e geometria analitica no 3° Os programas propostos pela reforma Capanema para as diferentes disciplinas, em especial a de matematica, nao sao recebidos sem critica. Eles séo acusados, como os anteriores, de serem excessivamente langos em rela¢ao ao tempo reservado para seu desenvolvimento, tornando meramente formal o ensino ministrado nas escolas®. As diretrizes para a estruturagdo do ensino primario e do ensino normal sao estabelecidas em legislagao promulgada em 1946, quando Vargas ja havia sido deposto. Elas causam. porém, pouco impacto, pois sao tradicionalmente os Estados que se ocupam destes ramos do ensino. A Constituigao de 46 reatirma, RAlevista Zetetike - it em muitos pontos, os principios relativos 4 educagdo enunciados na de 34, embora ofereca gratuidade apenas no ensina primario e, nos demais niveis, somente aos desprovidos de recursos, Estabelece, também, a competéncia da Uniao em legislar sobre as diretrizes e bases da educagao. Neste mesmo ano, constitui-se uma comissao para elaborar um projeto de lei, visando a reforma da educagao - o qual. porém. sé se transformara em lei em 1961 O descontentamento em relagdo. aa ensino ministrado nos cursos secundarios leva, em 1951, 0 entao Ministro da Educagao, Simdes Filho, a incumbir a congregagao do Colégio Pedro Il da elaboragdo de novos programas. Estes deveriam adaptar a extensdo dos programas ao tempo reservado para seu desenvolvimento € permitir seu ajustamento as diferen- ciagdes regionais. Esses programas nao diferem substancialmente dos anteriores, anao ser na distribuigao dos conteudos pelas séries. A geametria, por exemplo. nao consta do programa da 2! série ginasial €,n0 2° ciclo, concentra-se no I ano. A geometria analitica é programada para 03° ano. Também as instrugdes metodo- logicas nao apresentam novidades. Recomenda-se, para as primeiras séries do curso ginasial, um ensino es- sencialmente pratico e intuitivo. O método dedutivo deve ser introduzido ainda no curso ginasial, paulatina- mente, 4 medida que o aluno va per- cebendo ser necessdrio justificar, provar e demonstrar certas afirmagées. 12 - Revista Zetetiké Recomenda-se que se apele a intuigao endo se exagere a idéia de rigor? Emtins da década de 50 e inicios dade 60, odesenvalvimento econémico @ a urbanizacdo acelerada dele decor- rente geram um grande numero de novas ocupagdes nas industrias, no setor estatal e na infra-estrutura de transportes, comunicagado e energia. A repercussdo no campo educacional é imediata: a rede escolar expande-se, sem, contudo, atender 4 demanda. Nao existem professores em numero suti- ciente para preencher os cargos criados. por essa expansdo. O desenvolvimento econdmico intluencia até as diretrizes que norteiam o ensino das diferentes disciplinas. Um estudo do Conselho Federal de Educagaéo, de 1963, sabre o ensino de Matematica no curso secundario, tendo em vista a Lei 4024/61 das Diretrizes e Bases da Educagao Nacional, con- sidera que ele "sera, nas trés primeiras séries, fundamentaimente de natureza instrumental", propiciando aos educan- dos os “conhecimentos de ordem utilitaria, exigidos pelas atividades cotidianas". Nas séries finais, esse en- sino devera ressaltar "nao s6 a unidade da matematica, mas também as suas relagdes com as demais disciplinas de formagado geral, |...) assim comoas (que interessam) as técnicas modernas”. Na 4" série deverd ser iniciado o estudo da geometria plana dedutiva, que devera ser “limitada, porém, 4 demonstragao dos teoremas mais importantes & sempre com vistas as aplicagdes de ordem utilftaria™ E no inicio da década de 60 que se generaliza, também no Brasil, a intluéncia do movimento da Matematica Ano I~ n° 1/1993 Moderna, cuja idéia central é adaptar 0 ensino da matematica as novas concepgées surgidas com a evolugao deste ramo do conhecimento. Sao langados os primeiros livros didaticos de matematica escritos de acordo com @ nova orientagao. Neles, como nos demais que serao publicados a partir dai, esté presente a preocupagdo com as estruturas algébricas e com a utilizagao da linguagem simbolica da teoria dos conjuntos. Quanto @ geometria, opta-se, num primeiro momento, por acentuar nesses livros as nogées de figura geométrica e de interseccao de figuras como conjuntos de pontos do plano, adotando-se, para sua representagao, a linguagem da teoria dos conjuntos. Procura-se trabalha-la segundo uma abordagem “intuitiva” que se con- cretiza, nos livros didaticos, pela utilizagao dos teoremas como pos- tulados, mediante os quais pode-se resolver alguns problemas. Nao existe qualquer preocupagao com a construgdo de uma sistematizagao a partir das nogées primilivas e empirica- mente elaboradas. A coeréncia do movimento exige @ proposi¢ao de um trabalho com a geometria sob o enfoque das transtormagées. Ora, o ensino da geometria na abordagem tradicional ja enfrentava grandes problemas em relagao ao conhecimento do protessor, aos métodos utilizados, 4 dificuldade em se estabelecer uma ponte entre a geometria pratica indicada para a es- cola elementar @ a abordagem axiomatica introduzida no secundario. Problemas ainda maiores sur- gem com a proposig¢do de programas nos quais a geometria é desenvolvida sob o enfoque das transformagées. A maioria dos protessores de matematica nao domina esse assunto, o que acaba por fazer com que muitos deles deixem de ensinar geometria sob qualquer en- foque. Em vez de geometria - ou ao lado dessa geometria algébrica que, como diz Not'®, nao privilegia o desenvol vimento do raciocinio hipotético- dedutivo -, enfatiza-se a algebra. A “Lei de Diretrizes e Bases do Ensino de 1* @ 2" Graus’, a 5692/71, facilita, por sua vez, esse procedimento ao permitir que cada professor monte seu programa “de acordocom as neces- sidades. da clientela". A maioria dos alunos do 1° grau deixa, assim, de aprender geometria, pois os profes- sores das quatro séries iniciais do 1° grau limitam-se, em geral, a trabalhar somente a aritmética e as nogées de conjunto. O estudo da geometria passa a ser feito - quando nao é eliminado - apenas no 2° grau, como agravante de que os alunos apresentam uma dificul- dade ainda maior em lidar com as figuras geométricas e sua repre- sentagao porque o Desenho Geométrico € substituido, nos dois graus do ensino, pela Educagao Artistica. A reformulagao do ensino supe- rior, fixada pela Lei 5540/68, e a reorganizagao dos ensinos primario médio (o ginasial e o colegial), deter- minada pela Lei 5692/71, fazem parte de uma série de alos oficiais editados pelos governos militares que se ins- talam no poder a partir de marco de 1964. Tais atos visam a estabelecer uma politica educacional condizente Ravista Zetetike ~ 12 com 0 Nove modelo econémico adotado no pais apds 0 galpe de margo'! A justificativa para a intervengdo do Estadio no ensino superior é aneces- sidade de solucionar a crise que este atravessa e que se agrava no periodo de 64 a 68. A expansdo desse nivel de ensino mostra-se insuficiente para ab sorver a grande massa dos que 0 procuram: a cada ano aumenta o numero de excedentes aos cursos su- periores''. Por outro lado, professores e alunos criticam as mas condigées de trabalho e ensino oferecidas nas diferentes instituigoes do ensino supe- rior. A Reforma Universitaria modifica a estrutura interna das universidades, visando a conciliar a expansdo exigida com a utilizagao minimade recursos. As principais medidas adotadas sao: a departamentalizagao, a matricula por disciplina (agora semestrais), a criagao do curso basico e a institucionalizagao da pds-graduagao, além da unificagao do vestibular (agora somente classificatério) e da criagdo das licen- ciaturas curtas, Qualquer discordancia em relag4o as medidas torna-se impossivel, porque estas sao intro- duzidas durante a vigéncia do Decreto- Lei 477/69. © Estado consegue. assim. o controle sobre a expansao e a orientagao da demanda ao ensino supe- rior através do planejamento da distribuigéo de vagas. Desobriga-se, por outro lado, de investir maiores recur: ‘sos na expansdo desse ensino, liberan do a criagdo de indmeros cursos superiores particulares. A iniciativa privada caber4, dal pordiante, a respon- td. Revista Zatetha sabilidade pelo aumento de vagas nos diferentes cursos. A ampliag’o das redes publicas de ensino de 1" e 2° graus, acentuadaa partir de 68, impée a necessidade da preparagao de um maior contingente de protissionais para suprir este mercado. A maioria dos cursos superiores par- liculares criados neste periodo volta-se, entao, para a formagao de protessores para o magistério de 1° e 2° graus. Os cursos de licenciatura até entdo existentes ja eram bastante criticados, especialmente quanto a falta de "unidade” entre as disciplinas de contetido e as pedagégicas. Os novos cursos criados a partir dai, além de in- correrem nas mesmas falhas. dao mar- gem a outras criticas: estabelecem critérios pouco rigorosos de ingresso e, principalmente, séo organizados, em ‘sua maioria, come “licenciaturas curtas” em determinadas areas de estudo, seguidas de especializagao em uma das disciplinas dessa area. Essa organizagao nao garante, em geral, 0 dominio dos contetidos, nem mesmo os da disciplina sobre a qual incide a especializagao. Ademais, a maioria dos professores de matematica que atuam na rede publica provém destas instituigdes, 0 que determina a neces- sidade da realizagao de cursos de treinamento e reciclagem para com- plementar sua formagao. A implantagao da Lei 5692/71 provocard sérias conseqiéncias em relagdo ao ensino proporcionado nas escolas publicas. Ainstituigao de uma escola de 1° grau de 8 anos, coma fusao dos cursos primario e ginasial, vai eliminar, do Ano j-n® 1/1993 Ponto de vista legal, a tradicional bar- reira existente entre esses cursos @ acarretar um enorme crescimento de matriculas nas escolas oficiais, a superlotagao das classes e a multplicagao dos periodos concomitan- temente a diminuigdo de sua duragao. Qs professores dessas escolas passam a trabalhar sob novas (2 piores) condigées de trabalho: tém sua remuneragdo cada vez mais rebaixada, © que Os obriga a assumir uma carga maior de trabalho; sao pressionados pelo Estado, que lembra a todo momen- to 0 custo, em termos econémicos, da manutengao de cada aluno por ano es- colar; defrontam-se, ainda, com o desatio de trabalhar com uma populagao diferente daquela com a qual estavam acostumados a lidar e ndo.con- lam com qualquer tipo de apoio pedagégico ou tempo e espago para debates ou retlexdo sobre seu trabalho. E instituida, por outro lado, uma escola de 2° grau cujo objelivo é a profissionalizagao, a “qualificagao para 0 trabalho". Essa retormulagao, ditada pelas necessidades do novo modelo econdémico, tem ainda o objetivo de des- viar, pela formagdo protissional neste grau de ensino, parte da demanda ao superior. © 2° grau é oferecido, nas es- colas oficiais, geralmente no periodo notumo. As modificagoes introduzidas nas disciplinas que compoéem seu curriculo impedem que ele cumpra sua antiga fungdo de preparagao para o en- sino superior. Sua nova lungao proftis- sionalizante é impossibilitada pela inexisténcia dos recursos humanos e materiais necessdarios a realizagao dessa tarela. As escolas particulares de Ann f.n9 1/1997 2° grau, interpretando a legislagao con- forme sua conveniéncia, continuam oferecendo um ensino basicamente preparatério ao ensino superior. A tao propalada democratizagao da educagao brasileira, portanto, nao se concretiza de fato, pois a verdadeira democratizagao consiste em propor. cionar iguais oportunidades - e con- digdes - de acesso aos diversos niveis de ensino a todos, independentemente de sua situagao econémica. Se houve ampliagao da rede oficial de ensino em todos os niveis, ela foi acompanhada de um processo de deterioragao - fisica e cognitiva - da escola publica, a unica acessivel as camadas menos favore- cidas dapopulagao, Persiste, assim, até hoje, a dualidade histérica do ensino brasileiro (escola da elite x escola do povo) traduzida, agora, em termos de escola particular x escola publica. Do ponto de vista da educagao mateméatica, 6 necessdrio acrescentar que o ensino da geometria continua ocorrendo nas escolas particulares (como, também, nas academias militares). Trabalhada sob orientagées diversas, integrada ou ndo aos demais ramos da matematica, a geometria con- tinua presente na programagao destas escolas, @ os protessores de matematica nao podem deixar de aborda-la, mesmo se sua formagao for de tal modo deticiente que os impeca de efetuar um trabalho de melhor qualidade. A dualidade tradicional de nossa ensino poderia, entao, ser retormulada como “escola onde se ensina a geometria” (escola da elite) x “escola onde nao se ensina a geometria” (es- cola do povo). Revista Zetatike - 15 Existem fortes motives para a inquietagdo dos professores com o abandono da geometria e sua insisténcia em melhorar seus conhe- ‘cimentos com relagao a ela. A auséncia do ensino da geometria ¢ a éntase no da dlgebra pode estar prejudicando a formagao dos alunos por priva-los da possibilidade do desenvolvimento in- tegral dos processos de pensamento necessarios a Tosokigio de problemas matematicos. Atiyah'’ salienta a neces- sidade de cultivar e desenvolver tanto o pensamento visual, dominante na geometria, quanto o seqiencial, preponderante na algebra, pois ambos sao essenciais aos problemas matemiaticos auténticos. E isto nao é tudo. O trabalho com algebra pode conduzir, como observa Not'*, a execugéo mecdnica de operagées, pois as transformagées algébricas s40 determinadas somente por um sistema de leis formais que in- dicam o que se pode fazer em deter- minada situagao. © realizado com a geometria, no entanto, pode favorecera andlise de fatos e de relacdes, o es- tabelecimento de ligagdes entre eles a dedugao, a partir dai, de novos fatos @ novas relagdes. Consequentemente, 0 trabalho com a algebra pode acostumar o individuo a operar sem questionamento sobre regras pré-estabelecidas, a fazer isto ou aquilo, sem questionar o que jaz'5. O efetuado com a geometria, por $ua vez, pode proporcionar o desenval- vimento de um pensamento critico e auténomo. Ofato de que nem todo ensino de geometria produz os resultados acima mencionados nao justifica seu aban- 16 - Revista Zotetikd dono. Implica, isto sim, a necessidade de investimentos em pesquisas sobre metodologias mais apropriadas para a abordagem desse conteudo e emagées destinadas a proporcionar aos protes- sores condigdes para a melhoria da qualidade desse ensino. © abandono do ensino de geometria deve, portanto, ser carac- terizado como uma decis4o equivalente as medidas governamentais, em seus varios niveis, com relagada a educagado. Pode-se questionar as verdadeiras intengdes @ compromissos que elas revelam em relacao ao oferecimento de condigoes que impliquem em reais oportunidades educacionais a todos os segmentos da populagao brasileira. Notas ATIYAH, M. Whai is geometry? The Mathematical Gazetti, 66 (437): oct, 1982, (pp. 150 @ 153) 2. THOM, R "Modern" Mathematics: an educational and philosophic error? American Scientist (59) ; 695-699: novidec, 1971, (p. 698). Aandlise do abandono da geometria em outros paises 6 discutida em Pavanello, R.M. O abandono do ensino de geometria: uma visdo histérica. Cam- pinas, UNICAMP, 1989. Dissertacao de Mestrado, AZEVEDO, F. de. A transmissdo da cul- tura: parte terceira da 5* ed, de A cultura brasileira. S30 Paulo, Melhoramentas, INL, 1976, (p. 135) 5, PAIVA, Vanilda P. Educagao popular e educacao de adullos. S40 Paulo, Loyola. 1985, p. 85. LEMME, P. © Manifesto dos Pioneiros da Educagao Nova e suas Reper o = Ano tn? 1/1997 cussdes na Realidade Educacional Brasileira. Revista Brasileira de Estudos Pedagégicos. Brasilia, 65 (150): 255- 272: maia/ag, 1984, (p. 263). BICUDO, J. de C. O ensino secundario no Brasil @ sua atual legislagao. 1931 a 1941. 580 Paulo, s. ed., 1942, pp. 156- 163. . RIBEIRO, P. de A. Evalugdo do ensina ‘secundario no Brasil, In: PEIXOTO, H.A. Um grande problema nacional, Rio de Janeiro, Irmaos Pongetti, s.d. 9. Poraria 1045, de 14/12/51, pp. 33-41 10. NOT, L. As pedagogias do conhecimen- to, Trad. Américo E. Bandaira. Sao Paulo, DIFEL, 1981, p. 307. 11, ROMANELLI, O. de O. Histéria da Educacao no Brasil (1930-1973), 8% ed, Ana i-n® 1/1993 Petropolis, Vozes, 1986. No Cap. 5 analisa detalhada- mente a reforma im- posta 4 educagao brasilsira apds 64 @ 0 significado das mudangas introduzidas. Examina © papel assumido pelos Es- tadas Unidos através da USAID (United ‘States Agency far International Develop- ment), 12, Eram considerados excedentas os can- didatos. aprovados nos exames ves- tibulares aos cursos superiores, impossibilitados de neles se matri- cularam em decorréncia do nimero limitado de vagas oferecidas, 13, ATIYAH, M. op. cit., p. 183. 14, NOT, L. op. cit., p. 312, 15. 1d. ibid, Ravista Zetetixa - 17

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