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Assistência ao surdo
na área de saúde
como fator de
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Linguagem de sinais. Delivery of health care. Lenguaje de signos.
Prestação de cuidados de saúde. Prestación de atención de salud.
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plo de valorização das diversidades.
ções para sua divulgação e ensino, para o aces-
O valor fundamental da linguagem está na rela- so bilíngüe à informação em ambientes
ção em que as pessoas se fazem entender umas às institucionais e para a capacitação dos profissi-
Rev Esc Enferm USP onais que trabalham com os surdos(9).
2005; 39(4):417-22. outras. Quando compartilha-se experiências de for-
Cabe agora às instituições públicas e à socieda- OBJETIVOS
Assistência ao surdo
de de modo geral proporcionar meios para que a na área de saúde
inclusão social possa verdadeiramente acontecer. como fator de
- Discutir a assistência ao surdo na área de saú- inclusão social
Ressalta-se, aqui, a importância do Art. 3º da Lei de como fator de inclusão social;
Federal nº 10.436/02, descrito a seguir:
- Investigar, junto aos surdos, como se estabe-
As instituições públicas e empresas concessio- lece o vínculo com os profissionais quando neces-
nárias de serviços públicos de assistência à saú- sitam de atendimento na área de saúde;
de devem garantir atendimento e tratamento ade-
quado aos portadores de deficiência auditiva, de - Verificar percepções dos surdos quanto à pre-
acordo com as normas legais em vigor(9). sença de intérpretes de Língua de Sinais, quando
A linguagem é um instrumento de poder e aos recebe assistência à saúde.
surdos não pode ser negado o direito de usufruir os
benefícios de uma língua, portanto, aceitar a dife- MÉTODO
rença do surdo e conviver com a diversidade huma-
na é um desafio proposto à sociedade, incluindo o Este estudo de natureza descritivo-analítica, com
adequado atendimento na área da saúde para os abordagem qualitativa, foi desenvolvido na Escola
surdos, diante de suas necessidades. Especial Elysio Campos, que mantêm convênio com
a Associação de Surdos de Goiânia.
A barreira de comunicação é verificada na
interação entre surdos - profissionais de saúde, A pesquisa foi desenvolvida no início de 2004.
portanto, torna-se indispensável que ambos encon- A amostra estudada constou de 20 alunos surdos,
trem formas de interagirem-se para garantir uma as- com idade acima de 18 anos. O instrumento utiliza-
sistência de melhor qualidade(4). do para a coleta de dados foi uma entrevista, con-
tendo questões que abordavam aspectos do aten-
A jornalista Claúdia Werneck ressalta que a vio- dimento ao surdo na área de saúde, como: o vínculo
lação dos direitos de pessoas com deficiência é estabelecido com profissionais; as dificuldades de
maior do que podemos imaginar. Ao receber um gru- comunicação; fatos positivos e negativos relativos
po de alunos de medicina para entrevista sobre in- à assistência à saúde; a presença do intérprete de
clusão, um dos universitários relatou o seguinte fato: LIBRAS no atendimento, explicitando suas dúvi-
Havia, na ala de queimados do hospital público
das e percepções.
em que ele atuava, um homem bastante machu-
As questões foram explicadas e traduzidas em
cado, que praticamente não se queixava de dor,
LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais - a cada indi-
o que chamava a atenção de médicos, enfermei-
ros e atendentes. Ele não recebia visitas de fami-
víduo, e no decorrer da coleta surgiram outros da-
liares, amigos, era muito solitário. As anotações dos. Vale ressaltar que estes dados surgiram do pró-
em seu prontuário no que se referia a analgési- prio interesse dos surdos entrevistados, sem inter-
cos eram raríssimas, fato não compatível com ferência das autoras.
seu estado. Até que um médico resolveu escla-
recer este mistério e descobriu que este pacien- A técnica utilizada para análise de dados foi
te era surdo, não-oralizado, e sentia muita dor, análise de conteúdos, tipo análise temática, que
sim, só não conseguia expressar isso, por que,
consiste em descobrir os ‘núcleos de sentido’
imobilizado por causa das queimaduras, não
que compõem a comunicação e cuja presença
mexia as mãos nem outras partes de seu
corpo(10). ou freqüência de aparição podem significar algu-
ma coisa para o objetivo analítico escolhido(11).
Ser cidadão brasileiro, vivenciar a mesma cultu-
ra das pessoas ouvintes não garante aos surdos O trabalho foi desenvolvido posteriormente à
atendimento igualitário na área da saúde, uma bar- aprovação de seu projeto no Comitê de Ética em
reira é imposta aos surdos e profissionais por não Pesquisa Médica Humana e Animal do Hospital das
compartilharem uma mesma linguagem. Clínicas da Universidade Federal de Goiás, atenden-
do à resolução 196/96 da Comissão Nacional de Éti-
Uma proposta de atendimento inclusivo na área ca em Pesquisa – CONEP.
da saúde envolve, portanto, um sistema que identi-
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fique-se com princípios humanistas e cujos profis-
sionais tenham um perfil que seja compatível com
esses princípios.
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2005; 39(4):417-22.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Os profissionais da saúde precisam aprender
Neuma Chaveiro
LIBRAS nos seus cursos de graduação. S18
Maria Alves Barbosa
Os resultados obtidos pela pesquisa promove- Se souberem LIBRAS como a ginecologista e os
ram uma série de conhecimentos sobre a assistên- enfermeiros tudo será mais fácil. S2
cia ao surdo na área da saúde, na visão dos própri-
os surdos. Por que, então, não se preparar? Para aceitar-
mos o surdo precisamos aceitar sua língua, sua
No intuito de não alterar e desfigurar o discurso forma de comunicar e entrosar-se com o mundo.
dos surdos optou-se por reproduzi-los na ínte- Cabe aos profissionais da saúde, às faculdades o
gra, traçando paralelamente análise e discussão importantíssimo papel de prepararem-se para essa
dos resultados, estabelecendo comentários e realidade.
considerações.
Não foram encontradas referências mostrando
Fala-se, cada vez mais, em inclusão das pessoas a existência, na grade curricular dos cursos superi-
com deficiência na sociedade. Percebeu-se que elas or de enfermagem, de disciplina que contemple as
não precisam “preparar-se” para a escola, o traba- condições de saúde dos deficientes, seus direitos e
lho ou o lazer, mas a sociedade deve adaptar-se para necessidades, o que possibilitaria um atendimento
atender às suas necessidades, trazer para dentro do humanizado aos surdos(13).
sistema os grupos de “excluídos” e, paralelamente,
melhorar a qualidade de vida de todos. Pelo fato dos surdos muitas vezes não terem
problema visual, a escrita poderia ser uma alternati-
No presente estudo, em relação à assistência ao va, mas a realidade não é assim, para eles o portu-
surdo na área de saúde como fator de inclusão soci- guês é a segunda língua, e como qualquer língua
al os resultados foram: estrangeira, é difícil seu aprendizado. Deste modo,
um dos grandes desafios na área de educação é a
Agora está tudo melhor, uma surda minha amiga sua alfabetização. Portanto, a escrita como aponta-
deu-me um cartão de uma médica ginecologista
da por alguns surdos na pesquisa não é o caminho
que sabe LIBRAS, tudo ficou mais fácil e muito
ideal para eficácia do atendimento.
melhor, a comunicação foi estabelecida, não te-
nho mais dúvidas. (S2) Escrever apenas não resolve os problemas, é
necessário que eles expliquem. (S4)
Temos hoje um grande desafio: como cada indi-
víduo e profissional pode contribuir para a imple- Pensam que sabemos bem o português, e que só
mentação de uma sociedade inclusiva que saiba pela escrita revolveria tudo, mas não é assim. (S3)
conviver com as diversidades? Não importa que ati-
vidade profissional uma pessoa irá exercer, em dife- O direito à saúde é um bem fundamental, no
rentes situações ela deverá lidar com pessoas que entanto, para os surdos, esse direito parece não
têm deficiência: pacientes, alunos, leitores, funcio- estar sendo resguardado. Os depoimentos eviden-
nários, amigos, professores(12). ciam dificuldades de comunicação com os profissi-
onais da saúde, relatadas em 100% dos entrevista-
A necessidade dos surdos serem compreendi- dos (20 sujeitos).
dos pelos profissionais de saúde, torna-se visível
nos seus relatos: Em relação ao vínculo estabelecido com os pro-
fissionais da saúde os resultados foram:
Tive dengue e o médico não explicou. Sei que
Eu já estive doente e não fui ao médico, porque
tive porquê aqui na escola a professora falou
tive medo de não ser compreendida, tive que
que dengue dá febre, dor, mas eu não sabia que
esperar mais ou menos cinco dias para minha
doença era. (S17)
mãe chegar e ir comigo. (S4)
Tenho dificuldades. É muito difícil a comunicação
Quando precisava ir ao médico pedia para minha
com os profissionais da saúde. (S10)
irmã escrever o que eu estava sentindo, mostra-
va para o médico e ele me dava a receita. O
As pesquisas que abordam o uso da LIBRAS médico não explicava nada, eu ficava com mui-
pelos profissionais da saúde são poucas. Observa- tas duvidas, eles não entendem nossa vida. (S10)
se que o comportamento não verbal impede um vín-
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culo efetivo entre cliente e profissional, portanto,
em sua formação é essencial o aprendizado da LI-
BRAS(4) como sugerem também os surdos neste
O bloqueio de comunicação entre surdos e pro-
fissionais da saúde instaura-se como um dos gran-
des obstáculos da comunidade surda, quando pro-
2005; 39(4):417-22. estudo. cura serviços de saúde. O indivíduo surdo precisa
ser assistido de forma global, respeitadas suas cren- Na hora de fazer a ficha é difícil, quando a secre-
Assistência ao surdo
ças, seus valores e diferenças(13). tária chama pelo nome é difícil. Bom é quando na área de saúde
chama pelo “placar” com números. (S1) como fator de
O profissional que norteia seu trabalho com uma inclusão social
práxis na assistência que valoriza a qualidade do As dificuldades começam com a secretária, não
consigo explicar porque estou ali. (S9)
cuidado em saúde, foi explicitado também nos de-
poimentos dos surdos. A falta de intérpretes de LIBRAS constitui-se
Encontrei uma médica ginecologista que não sabe
uma barreira nas instituições de saúde do Brasil, o
LIBRAS, mas tem paciência, explica, escreve, que torna ainda mais complicada a vida das pesso-
mostra figuras, ela é muito boa. (S14) as com surdez que procuram atendimento ou que
solicitam ajuda nestas instituições(12).
Quando era criança, o médico não deixava fazer
sinais, mandava ficar com a mão parada, tinha Não se concebe instituições que não ofereçam
que falar. Mas, agora melhorou muito, no consul- ao surdo, intérpretes e profissionais capazes de co-
tório posso usar LIBRAS. (S16) municarem-se com eles, da mesma forma que não se
concebe instituições que não tenham rampas ou ele-
As dificuldades de comunicação podem se tor- vadores. Não adaptar às necessidades dos grupos
nar uma barreira ao sucesso do atendimento. Mui- minoritários é um fator de exclusão social.
tas vezes com grandes dificuldades, os surdos con-
seguem apenas descrever seus sintomas, caracteri- Em relação a percepção dos surdos quanto a
zados então como objeto da prática de saúde(4). presença dos intérpretes de LIBRAS os resultados
foram:
Refletir sobre os entraves causados por um diá-
logo ineficiente poderá evitar desordens mais com- Com ele fica mais fácil, mas é preciso ter confi-
plexas como o fato ocorrido com um dos sujeitos. ança no intérprete. (S10)
Tive apendicite (...). Meu esposo também é sur- Precisa de mais intérpretes, que possam acom-
do, (...). No primeiro hospital que fui deram-me panhar os surdos, mas não por piedade. (S14)
remédio e falaram que podia voltar para casa
que não era nada sério. A dor só aumentava, Na coleta de dados observou-se que os surdos
procuramos outro hospital, não conseguiram nos valorizam a presença do intérprete, mas com algu-
entender, aplicaram uma injeção (...). Já não su- mas ressalvas: a confiança, o tempo disponível, o
portava de tanta dor, foi quando chegou em casa constrangimento de se expor frente ao intérprete,
nossos amigos, um casal de surdos, eles tinham sentimentos de piedade, enfim...
carro, fomos buscar uma sobrinha minha, ouvin-
te, para ir junto ao hospital, só assim recebi aten- É difícil depender da boa vontade e do tempo dos
dimento. Fui operada, o apêndice supurou. Fiquei intérpretes, por isso vou sozinho. (S13)
internada 9 dias, ninguém pôde ficar comigo, es-
Tinha vergonha de expor algumas coisas na fren-
tava sozinha, os profissionais do hospital não
te do intérprete. (S5)
sabiam conversar comigo, passei mal, chorei,
tudo sozinha. (S3)
Observamos a dificuldade de encontrar intérprete
Este relato mostra que ainda vivenciamos a ex- para uma assistência em saúde, ficando a responsa-
clusão na assistência à saúde oferecida aos surdos, bilidade sobre a família do surdo.
uma “sociedade para todos” que valorize a diversi- Preciso ir sempre com um parente, irmão ou mãe,
dade, está a desejar. mas eles não sabem LIBRAS. É difícil. (S1)
A força da legislação não tem sido suficiente Eu tenho uma filha que hoje é intérprete, mas
para atingir a sociedade brasileira no que se refere à antes tudo foi muito difícil. Para os outros surdos
inclusão. Avançamos, mas ainda continuamos pen- que não têm a mesma sorte que eu é difícil. (S19)
sando e agindo no âmbito do conceito da integração,
as pessoas precisam estar prontas para conviver A presença do intérprete de LIBRAS para sur-
nos sistemas sociais(1). dos é essencial, mas não prepara o profissional para
uma inclusão efetiva. No dia em que o tradutor falta,
A boa ou má interação é claramente percebida não está disponível para acompanhar os surdos, ou
quando os surdos procuram atendimento à saúde,
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mesmo até quando se faz presente, pode dificultar a
as imposições para adaptarem-se ao sistema são interação: paciente-profissional da saúde, embora a
grandes, e, não conseguindo, estão absolutamente contratação do profissional intérprete seja correta,
exclusos. As dificuldades têm início na sala de ressente-se a ausência de uma reflexão mais apro- Rev Esc Enferm USP
espera. fundada sobre a diversidade, porque reduz o seu 2005; 39(4):417-22.
alcance ao limite de providência pontual, des- dar em saúde. O bloqueio de comunicação prejudi-
Neuma Chaveiro
Maria Alves Barbosa contextualizada de uma verdadeira perspectiva da ca o vinculo entre profissionais da saúde e surdos,
inclusão(12). comprometendo o atendimento.
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