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LOCKE
IDÉIAS E COISAS
SUMÁRIO
Introdução 9
Idéias e coisas 13
Qualidades primárias e secundárias, poderes e conhecimento sensível 17
Qualidades primárias e "a nova filosofia" 29
Substância, acidente e dúvidas sobre a essência 35
Mente e matéria 43
Espécies 49
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INTRODUÇÃO
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IDÉIAS E COISAS
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2 ... Logo que o entendimento é equipado com essas idéias simples, ele
tem o poder de repeti-Ias, compará-las e uni-Ias em uma variedade quase
infinita de maneiras,
e assim pode produzir à vontade novas idéias complexas. (II.ii.1-2)
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Apesar dessas explicações, a terminologia empregada na discussão
subseqüente é notoriamente escorregadia. A distinção aqui traçada entre
idéias sensoriais e as "modificações
da matéria" causalmente responsáveis por essas idéias e as idéias
produzidas, não são firmemente mantidas. Por exemplo, Locke propõe aqui
chamar certos poderes,
conforme estejam nos corpos ("conforme estejam na bola de neve"),
"qualidades"; e chamá-los, conforme sejam experimentados ("conforme sejam
sensações ou percepções
em nossos entendimentos"), "idéias". Isto faz da "idéia", efetivamente, o
modo pelo qual o objeto nos aparece, e da "qualidade" o poder do objeto
de aparecer desse
modo. Contudo, o uso tradicional das expressões "no objeto" e "na mente
(entendimento)" tornou possível dizer que a idéia é a qualidade tal como
está na (isto é,
aparece à) mente, e que a qualidade é a idéia tal como está no objeto.
Conseqüentemente, como sua próxima sentença concede, Locke usa
"qualidade" e "idéia" (ou "idéia
simples") de forma virtualmente intercambiável, deixando de seguir sua
própria proposta.
Além disso, o "poder" ou "qualidade" no objeto não é algo distinto da, ou
adicional à "modificação da matéria" (isto é, a propriedade intrínseca do
objeto material)
em virtude da qual o objeto aparece daquele modo particular. Locke
detalha isso ao discutir diretamente a própria idéia de poder. Ele
atribui a idéia de poder à
experiência de padrões regulares de mudança - experiência que dá origem,
inicialmente, a expectativas de que "mudanças semelhantes serão no futuro
realizadas nas
mesmas coisas por agentes semelhantes e de maneiras semelhantes", e, a
seguir, ao pensamento de que na primeira coisa existe a possibilidade de
ser modificada e
na segunda "a possibilidade de realizar essa mudança". E assim formamos a
idéia de poder, ativo e passivo: o poder do fogo de derreter a cera e o
poder da cera de
ser derretida são aspectos do fogo e da cera conhecidos e identificados
apenas pelo seu efeito conjunto. A idéia de um poder de produzir X é,
assim, uma
concepção
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(isto é, cuja aparência diante de meus olhos sempre causa essa idéia)
existe realmente e tem um ser fora de mim. E disso, a maior garantia que
posso ter, e que minhas
faculdades podem alcançar, é o testemunho de meus olhos, que são os
únicos juízes apropriados desse tipo de coisa...
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12 Se, então, os objetos externos não estão unidos a nossas mentes quando
ali produzem idéias; e no entanto percebemos essas qualidades originais
naqueles que são
isoladamente apreendidos
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2 ...E estamos certos [de que todas as nossas idéias simples] concordam
com a realidade das coisas. Pois se o açúcar produz em nós as idéias que
chamamos brancura
e doçura, estamos certos de que há no açúcar um poder de produzir essas
idéias em nossas mentes, caso contrário não poderiam ter sido produzidas
por ele.
E assim, como cada sensação responde ao poder que opera em qualquer de
nossos sentidos, a idéia assim produzida é uma idéia real (e não uma
ficção da mente, que
não tem o poder de produzir nenhuma idéia simples), e não pode ser senão
adequada, dado que precisa apenas responder àquele poder; e assim todas
as idéias simples
são adequadas. É verdade que só um pequeno número das coisas que produzem
em nós essas idéias simples são denominadas como se fossem simplesmente
as causas delas;
tratamo-las antes como se essas idéias nelas realmente existissem. Pois
embora o fogo seja chamado doloroso ao toque, significando-se com isso o
poder de produzir
em nós a idéia da dor, ele é também denominado luminoso e quente, como se
a luz e o calor
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Em termos gerais, essa concepção tinha sido advogada por Descartes, mas
com importantes diferenças. Descartes rejeitou o próprio conceito de
espaço vazio, sustentando
como evidente à razão que as propriedades fundamentais da matéria são
simplesmente a extensão, e, decorrentes da extensão, o movimento e o
repouso geometricamente
definidos. A lei fundamental da inércia, da qual Descartes pretendia
deduzir todas as outras leis, é preservada em um Deus imutável enquanto
Ele mantém o mundo em
existência. Do ponto de vista oposto de Locke, que é um desenvolvimento
da posição de Robert Boyle, a solidez cumpre dois papéis. Ela é,
primeiramente, uma propriedade
dos corpos que os distingue conceitualmente do espaço vazio; em segundo
lugar, é uma propriedade presente subjacente aos poderes dos corpos de
interagir mecanicamente
de acordo com leis derivadas de sua própria natureza como corpos, sem
recurso à agência divina:
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5 ...Da solidez dos corpos também depende seu impulso mútuo, resistência
e protrusão...
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ele não poderá mencionar nada senão as partes sólidas extensas, e se lhe
perguntarem em que inerem a solidez e a extensão, ele não estará em
situação muito melhor
do que a do indiano antes mencionado, que, tendo dito que o mundo era
suportado por um grande elefante, a que sua resposta foi, uma grande
tartaruga, mas sendo mais
uma vez pressionado a dizer o que dava sustentação à tartaruga de costas
largas, respondeu que era algo que ele não sabia o que. E, assim, aqui
como em todos os
outros casos nas quais usamos palavras sem ter idéias claras e distintas,
falamos como crianças que, ao serem perguntadas o que é uma coisa que
elas não sabem e
quê, dão prontamente esta satisfatória resposta, de que é algo, uma
palavra que, na verdade, significa apenas, quando assim usada por
crianças ou por homens, que
eles não sabem o que, e que a coisa que eles pretendem conhecer e da qual
falam é algo de que eles não tem absolutamente nenhuma idéia distinta, e
com relação à
qual estão, portanto, em completa ignorância e na obscuridade. Com essa
idéia que temos e à qual damos o nome geral de substância não é nada mais
que o suposto,
mas desconhecido suporte das qualidades que vemos existirem e que
imaginamos incapazes de subsistir sine re substante, sem algo que lhes dê
suporte, chamamos então
esse suporte substantia, o que, de acordo com o verdadeiro significado da
palavra, é, em linguagem comum, o que está sob, ou o que sustenta.
(II.xxiii.1-2)
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23 Se alguém diz que não sabe o que é isso que nele pensa, ele quer dizer
que não sabe qual é a substância dessa coisa pensante; não mais, eu digo,
do que sabe o
que é a substância dessa coisa sólida. Além disso, se ele diz que não
sabe como pensa, eu respondo que ele tampouco sabe como é extenso, como
as partes sólidas do
corpo estão unidas ou coerem entre si para produzir a extensão. Pois
embora a pressão das partículas de ar possa dar conta da coesão das
diversas partes da matéria
que são maiores que as partículas de ar e que têm poros menores que os
corpúsculos do ar, o peso ou pressão do ar não podem, no entanto,
explicar nem ser uma causa
da coerência das partículas de ar elas próprias. E se a pressão do éter
ou de alguma matéria mais sutil que o ar pode unir ou manter firmemente
juntas as partes
de uma partícula de ar, bem como de outros corpos, não pode contudo
produzir ligações para si mesma e manter unidas as partes que compõem
cada um dos menores corpúsculos
dessa matéria subtilis. De tal modo que essa hipótese, por mais
engenhosamente que seja explicada, ao mostrar que as partes de corpos
externos não perceptíveis,
não chega até às partes do próprio éter; e quanto mais torna evidente que
as partes de outros corpos são mantidas juntas pela pressão exterior do
éter e não podem
ter outra causa concebível de sua coesão e união, tanto mais nos deixa no
escuro a respeito da coesão das partes dos corpúsculos do próprio éter...
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Que dúvida se pode levantar quanto a isso? O mesmo ocorre, eu afirmo, com
relação ao pensamento e ao movimento voluntário: não os experimentamos a
cada instante
em nós mesmos? Como, então, manter alguma dúvida a respeito? Admito que a
questão factual é clara, mas quando desejamos examiná-la mais de perto e
considerar como
essas coisas são feitas, penso que sentimo-nos então perplexos.
(II.xxiii.23, 25)
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que é a substância, mas apenas uma noção confusa e obscura do que ela
faz. (II.xiii.19)
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uma coleção das idéias simples nelas encontradas. Temos apenas de notar
que nossas idéias complexas de substâncias, além de todas essas idéias
simples de que são
compostas, sempre contêm a confusa idéia de um algo ao qual elas
pertencem e no qual subsistem; e, portanto, quando falamos de um tipo
qualquer de substância, dizemos
que é uma coisa que tem tais ou tais propriedades, como um corpo é uma
coisa que é extensa, tem uma certa forma e é capaz de movimento; um
espírito, uma coisa capaz
de pensar; e, do mesmo modo, a dureza, a frialdade e o poder de atrair o
ferro são, dizemos, qualidades encontradas na magnetita. Essas e outras
maneiras de falar
sugerem que a substância é sempre suposta como algo além da extensão,
figura, solidez, movimento, pensamento, ou outras idéias observáveis,
embora não saibamos o
que. (II.xxiii.3)
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MENTE E MATÉRIA
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Dizer que não há espírito porque não temos nenhuma idéia clara e distinta
da substância de um espírito. (II.xxiii.5)
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pode alguém ter de que algumas percepções, como por exemplo, prazer e
dor, não possam ocorrer em alguns dos próprios corpos, modificados e
movidos de certa maneira,
tão bem quanto podem ocorrer em uma substância imaterial em função do
movimento das partes do corpo; corpo esse que, tanto quanto podemos
conceber, só é capaz de
atingir e afetar outros corpos, e movimento esse que, de acordo com o
máximo alcance de nossas idéias, não é capaz de produzir nada senão
movimento, de tal modo
que, quando admitimos que pode produzir prazer e dor, ou a idéia de cor
ou som, resignamo-nos a abandonar nossa razão, ir além de nossas idéias,
e atribuir isso
inteiramente à boa-vontade de nosso Criador. Pois como temos de admitir
que ele anexou ao movimento efeitos que de nenhum modo podemos conceber
que este seria capaz
de produzir, que razão temos para concluir que ele não poderia ordenar
sua produção igualmente em um sujeito que não podemos conceber capaz
deles, tão bem quanto
em um sujeito sobre o qual não podemos conceber de modo algum que o
movimento da matéria possa operar? Não digo isto porque queira
minimamente enfraquecer a crença
na imaterialidade da alma; não estou aqui falando de probabilidade mas de
conhecimento, e penso não apenas que convém à modéstia da filosofia não
se pronunciar autoritariamente
quando nos falta a evidência própria para produzir conhecimento, como
também que nos é útil descobrir até onde nosso conhecimento pode
alcançar... Aquele que reflete
sobre como é difícil reconciliar, em nosso pensamento, a sensação com a
matéria extensa, ou a existência com alguma coisa que não tem
absolutamente nenhuma extensão,
confessará que está muito longe de conhecer com certeza o que é a sua
alma. Este é um ponto que me parece estar fora do alcance de nosso
conhecimento, e aquele que
se permitir refletir livremente e lançar o olhar para a parte intrincada
e obscura de cada hipótese, dificilmente julgará que sua razão é capaz de
leva-lo a concluir
firmemente a favor ou contra a imaterialidade da alma. Dado que, seja
qual for o lado de que a olhe, quer como uma substância inextensa, quer
como matéria extensa
pensante, a dificuldade de conceber qualquer uma delas irá, quando esta
estiver sozinha em seu pensamento, impeli-lo para o lado contrário. Não é
um procedimento
justo o adotado por alguns homens, que, ao encontrarem algo inconcebível
em uma hipótese, lançam-se impulsivamente à hipótese contrária, embora
esta seja tão completamente
ininteligível quanto a primeira para um entendimento imparcial. Isto
serve não apenas para mostrar a fraqueza e inadequação de nosso
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materialistas (embora não Hobbes, para quem nada era misterioso) poderiam
estar prontos a admitir. O que Locke necessitava e presumivelmente tinha
em mente, era
simplesmente o anverso do argumento da segunda passagem (IV.iii.6) contra
o dualismo dogmático. Coisas pensantes continuam sendo misteriosas para
nós quer as tomemos
como inteiramente materiais ou como mentes imateriais operando em
combinação com corpos materiais.
Pode muito bem parecer, apesar de todos os apaziguamentos, que esta
continua sendo a situação atual - nem a física nem os discursos sobre as
almas tiveram sucesso
em explicar a consciência. A "inteligência artificial" surge como o passo
mais importante nessa direção, a ponto de alguns a considerarem apenas se
estivermos preparados
para acreditar que alguns computadores têm consciência e que a fisiologia
dos computadores não difere de maneira importante da fisiologia dos
cérebros e sistemas
nervosos. Contudo, por mais admiráveis e ainda relevantes que possam ser
as advertências de Locke contra as maneiras dogmáticas de pensar, o
dualismo de substâncias
é mais profundamente problemático do que o fisicalismo. O próprio Locke
aponta os problemas, nesta e noutras passagens. Se espíritos imateriais
existem no espaço,
surge não apenas a questão de como eles interagem com as coisas
materiais, mas do que é a existência espacial para algo que não ocupa
espaço como os corpos ocupam.
De fato, o que é existir no espaço para algo que não é parte da natureza
física, não é obediente às leis da física? Em que consiste, para essa
coisa, existir em
um lugar e não em outro, se ela está de tal modo desconectada do resto da
realidade? A posição alternativa, cartesiana, de que espíritos não
existem em nenhum lugar,
que são extra-espaciais (uma posição que Locke positivamente rejeitou),
deixa-nos com o intratável problema de dar sentido à individualidade dos
espíritos como "substâncias"
distintas umas das outras, de acordo com algum "princípio de
individuação" diferente daquele familiar, de que coisas substanciais
distintas ocupam distintas posições
espaço-temporais.
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ESPÉCIES
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seres humanos fluem supostamente de sua racionalidade definitória. A
"definição nominal", contudo, simplesmente provê critérios para
distinguir membros da espécie.
Em química, supunha-se que a natureza de cada substância era determinada
por uma proporção de elementos - terra, ar, fogo e água - eles próprios
definíveis pelos
"opostos" qualitativos quente e frio, úmido e seco. Se o corpuscularismo,
no entanto, expulsou a teoria das formas e dos elementos, como poderia
explicar o impressionante
aparecimento, no nível da observação ordinária, de uma hierarquia fixa de
tipos relacionados nos quais se encaixa cada uma das criaturas vivas? Ou
a divisão aparentemente
rígida entre, digamos, diferentes metais e ácidos, de cada um dos quais a
experiência revela que interage com outros e, em geral, que responde de
maneira confiável
a alterações de circunstâncias?
Locke não foi o primeiro dos novos filósofos a argumentar que a natureza
não é um lugar tão rotineiro e ordenado como assumiam os aristotélicos,
mas seu argumento
ocupa uma posição única por seu escopo e pelo seu recurso a princípios
filosóficos mais amplos. Aqui está sua concepção (algo inexata do ponto
de vista biológico)
da "grande cadeia dos seres":
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9 ...E aquele que pensa que as naturezas ou noções gerais são algo mais
que essas idéias abstratas e parciais de idéias mais complexas, tomadas
inicialmente de existências
particulares, sentir-se-á embaraçado, eu temo, ao tentar encontrá-las.
Pois que alguém reflita e depois me diga em que sua idéia de homem difere
da de Pedro, e Paulo,
ou sua idéia de cavalo, daquela de Bucéfal, a não
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Ser por deixar de fora algo que é peculiar a cada indivíduo e reter,
dessas idéias particulares complexas de diferentes existências
particulares, apenas aquilo em
que elas concordam? Das idéias complexas significadas pelos nomes homem e
cavalo, deixando de fora apenas aqueles aspectos em que diferem e retendo
apenas aqueles
em que concordam, e destes fazendo uma nova idéia complexa à qual se dá o
nome de animal, obtém-se um novo termo geral que abrange, junto com o
homem, diversas outras
criaturas. Deixe-se de fora da idéia de animal a sensação e o movimento
espontâneo, e a idéia complexa restante, formada pelas idéias simples
restantes do corpo,
vida e nutrição, torna-se uma idéia ainda mais geral, sob o termo mais
abrangente vivens [coisa viva]. E para não me estender mais sobre este
ponto tão evidente
em si mesmo, do mesmo modo a mente procede rumo a corpo, substância e por
fim a ser, coisa e termos universais como esses, que representam qualquer
uma de nossas
idéias. Para concluir, todo esse mistério de gêneros e espécies, que
produziu tanto alarido nas Escolas e é, com justiça, tão pouco levado em
conta fora deles, consiste
simplesmente em idéias abstratas, mais ou menos abrangentes, com nomes a
elas anexados. (III. iii.6, 9)
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a nada além das idéias possuídas por ele mesmo, pois isso seria fazê-las
signos de suas próprias concepções e, não obstante, aplicá-las a outras
idéias, o que seria
fazê-las, ao mesmo tempo, signos e não-signos de suas idéias e, portanto,
torná-las na prática absolutamente sem significação. Como as palavras são
signos voluntários,
elas não podem ser signos voluntários impostos por ele a coisas que
desconhece. Isso seria fazê-las signos de nada, sons sem significação. Um
homem não pode fazer
de suas palavras signos quer de qualidades de coisas, quer de concepções
na mente de outrem, das quais ele não tenha nenhuma concepção própria.
Até que tenha suas
próprias idéias, ele não pode supor que elas correspondam às concepções
de outro homem, nem pode usar para elas quaisquer signos, pois então
estes seriam signos
ele não sabe de quê, o que, na verdade, é não ser signo de nada. Mas
quando ele representa para si mesmo as idéias de outro homem por meio de
algumas de suas próprias
idéias, se ele consente em dar-lhes os mesmos nomes que outros homens
dão, trata-se ainda de suas próprias idéias, idéias que ele tem, não
idéias que ele não tem.
3 Isto é tão necessário no uso da linguagem que, a esse respeito, o
conhecedor e o ignorante, o erudito e o inculto, usam todos de modo igual
as palavras que falam
(com qualquer significado). Estas, na boca de cada homem, representam as
idéias que ele tem, e que ele expressaria por meio delas. (III.ii.2-3)
13 Não quero, aqui, que se pense que esqueci - muito menos que estou
negando -que a natureza, ao produzir as coisas, faz muitas delas
semelhantes; nada há de mais
óbvio, especialmente nas raças dos animais e em todas as coisas
propagadas por semente. Penso, contudo, que podemos dizer que a
classificação dessas coisas sob nomes
é obra do entendimento, que tira proveito da similitude
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Que entre elas observa para formar idéias gerais abstratas e dispô-las na
mente, com nomes a elas anexados, como padrões ou formas (pois nesse
sentido a palavra
forma tem uma significação muito apropriada) com os quais, à medida que
coisas particulares existentes revelam-se concordantes, elas vêm a ser
daquela espécie, têm
aquela denominação, ou são postas naquela classis. Pois quando dizemos:
isto é um homem, aquilo, um cavalo; isto, justiça, aquilo, crueldade;
isto, um relógio, aquilo,
uma alavanca, que estamos fazendo senão organizar coisas sob diferentes
nomes específicos, à medida que concordam com aquelas idéias abstratas
para as quais estabelecemos
aqueles nomes como signos? E o que são as essências dessas espécies,
arranjadas e marcadas por nomes, senão aquelas idéias abstratas na mente
que são, por assim
dizer, os liames entre coisas particulares que existem e os nomes sob os
quais devem ser classificadas? (III.iii.13)
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determinada pelo que é conhecido - que é o que seria necessário para que
o significado dos nomes fosse determinado por essências reais ocultas:
19... Pois embora alguém inclua em sua idéia complexa daquilo chamado
ouro algo que outro deixa de fora, e vice-versa, os homens não julgam
usualmente que com isso
a espécie se modifique, porque eles secretamente, em suas mentes, referem
esse nome, e o supõem anexado, a uma essência real imutável de uma coisa
existente da qual
essas propriedades dependem. Não se deve supor que aquele que acrescenta
à sua idéia complexa de ouro a idéia de estabilidade ou de solubilidade
em água-régia, que
antes nela não incluía, tenha modificado a espécie, mas apenas que
adquiriu uma idéia mais perfeita pelo acréscimo de outra idéia simples
que sempre está, de fato,
conjugada às outras das quais se compunha sua idéia complexa anterior.
Mas... por essa referência tácita à essência real daquela espécie de
corpos, a palavra ouro...
passa a não ter nenhuma significação, pois se apresenta como
representante de algo de que não temos absolutamente nenhuma idéia, e por
isso não pode significar absolutamente
nada quando o próprio corpo não está presente. Pois por mais que se possa
pensar que são a mesma coisa, uma adequada consideração revelará que há
muita diferença
entre discutir sobre ouro como nome e sobre uma porção do próprio
material, por exemplo, um pedaço de folha de ouro colocado diante de nós,
embora no discurso tenhamos
a inclinação de tomar o nome pela coisa, (III,x, 19)
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6 É verdade que mencionei muitas vezes uma essência real, distinta, nas
substâncias, das idéias abstratas delas que denominei sua
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