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O ESPIRITUAL NA ARTE: um dialogo inadvertido entre o

informal e o formal na educação.


Prof. Dr. Carlos Velázquez Rueda
Universidade de Fortaleza – Unifor
caveru@unifor.br

Na antiguidade e na Idade Média, o conceito de arte dificilmente nos aproximaria de


uma perspectiva educativa integral, dada a imprecisão epistemológica suposta na
mera intervenção técnica sobre qualquer disposição natural. Toda produção técnica
era arte. Propostas como a platônica, que faziam descansar sua filosofia educativa
nas “artes”, referiam-se a práticas bem precisas, no caso, à mousiké, que consistia
num conjunto de disciplinas de cunho espiritual. Foi Plotino quem, respeitando o
entendimento aristotélico que distinguia as ciências (esfera do necessário) das artes
(esfera do possível), derivou do segundo grupo as Artes Práticas, “que tendem a agir
sobre os homens, tornando-os melhores ou piores”. Cabe assinalar que nem a
mousiké, nem as Artes Práticas incluíam o que a partir da Renascença entendemos
por Artes Plásticas. O destaque que concedo às artes plásticas justifica-se na
constatação de que tais práticas não somente passaram a ser legitimadas como
espirituais, mais ou menos ao tempo do apogeu comercial hanseático e florentino,
mas tornaram-se referência quase absoluta na compreensão que ainda vigora em
assuntos de arte. Foram as vanguardas plásticas europeias as que, importadas pelos
Estados Unidos após a segunda guerra mundial, fundamentaram a Arte
Contemporânea ou “Arte em estado gasoso”, segundo as recentres observações de
Yves Michaud. E é a experimentalidade dessas tendências as que sobrepujam
correntes atuais na música, nas artes cênicas e nas artes literárias. Trata-se de uma
arte impopular e imprecisa, até para os próprios artistas. Em grande parte, outras
formas de arte, gozantes de melhor popularidade, são inexoravelmente assimiladas
pela indústria cultural, sofrendo o deterioro qualitativo que a escola de Frankfurt e
seus simpatizantes mas atuais têm exaustivamente denunciado. Mediante observação
empírica, aunada à indução analítica de base bibliográfica e documental, proponho-
me a evidenciar a grande incorrespondência entre os currículos formais de educação
pela arte, ou inclusiva das artes no Brasil, e os estímulos informais recebidos pelo
educando no seu meio. Estímulos estes que com frequência se mostram muito mais
significativos que os formais, mas que não necessariamente conduzem ao
desenvolvimento espiritual tão almejado desde a antiguidade. Concluo que a arte
pode fazer inestimáveis aportes à educação, desde que suas propostas constituam um
dialogo consistente entre o vivencial e suas racionalizações formais.
Palavras chave: Mousiké, Arte, Educação.

1
Segundo Nicola Abbagnano (2000, p.81), “Em seu significado mais geral,” arte
designa, “todo conjunto de regras capazes de dirigir uma atividade humana qualquer”,
donde seu termo grego equivalente é te&xnh, em português, técnica. O vocábulo latino
ars, não contradiz esta noção, dado que, de acordo com Gómez de Silva (2009, p.81),
este designa “habilidade, destreza, ofício.”
Para Platão, tudo aquilo que não se encontrava no seu estado natural bruto,
sendo que havia sido transformado por uma operação técnica, era arte. Arte era o
conhecimento humano e a filosofia, como arte era a carpintaria ou a jardinaria.
Aristóteles (2004) separou o conhecimento puro, contemplativo, do
conhecimento aplicado, entendendo o primeiro como a esfera do necessário, enquanto
que o segundo definia a esfera do possível. Isto é, o que pertence à produção. E foi em
observância da classificação aristotélica que Plotino (1924) procedeu à subdivisão das
artes da produção, classificando-as com base em sua relação com a natureza. Plotino
distinguiu as Artes Análogas: voltadas à fabricação de objetos materiais, das Artes que
ajudam a natureza, como a agricultura ou a medicina e, estas duas, das Artes Práticas:
“que tendem a agir sobre os homens tornando-os melhores ou piores.” (p. 31)
Na atualidade, quase animados pelo senso comum, aceitamos a premissa de
que o projeto platônico da República, claramente um projeto educativo, considerava a
arte como um de seus pilares. Ora, resulta evidente que nossa moção não faria sentido
para Platão. O filósofo considerava importante a prática da mousikh_ (mousiké),
geralmente traduzida por música: “(...) para o corpo temos a ginástica e para a alma, a
música.” (Platão, 2000, p.64)
É importante distinguir mousikh_ te&xnh (mousiké techné) de mousikh_
(mousiké), pois a segunda não se restringe à organização de sons no tempo, como
entenderíamos hoje: “Agora, meu amigo, parece-me que acabamos com esta parte da
música que se refere aos discursos e às fábulas, porque tratamos tanto do conteúdo
quanto da forma. (…) Resta-nos tratar do caráter do canto e da melodia, concordas?”
(Op. Cit., p. 91)
No diálogo Timeu, Platão define mousiké como um “comércio inteligente com
as musas” (2002, p. 110). Se considerarmos, de acordo com Tressidier (2003, p. 232), as
nove musas da mitologia helênica, entenderemos que música para Platão designava,
além da organização de sons no tempo, o teatro trágico, cômico e pantomímico, a poesia
épica e a lírica, a dança, a astronomia e a história.
A mousiké definia um conjunto de práticas harmônico-temporais das quais,
igual que Plotino das Artes Práticas, Platão esperava uma cultura espiritual. Tratava-se
de um currículo de vivências microcósmicas que poderia conduzir o eu autocentrado
dos jovens atenienses à sua abertura para o mundo.
Aliás, esta ideia de sair de si para o mundo, além de estar em perfeita
correspondência com a etimologia do verbo educar 1, encontra ideal ilustração na
Alegoria da Caverna, figurante no livro VII da República de Platão. (2000) Se, como
diz Kerenyi, Platão era um “grande narrador de mitos,” (Jung & Kerényi, 2011, p. 15)
uma caverna nos remeteria a um refúgio uterino materno, ctoniano, iluminado por uma
parca fogueira. Um fogo enterrado em oposição ao fogo celeste: A faísca roubada por
Prometeu e entregue à humanidade. Isto é, a consciência humana em estado primitivo,
cuja consigna é a ascensão ao reencontro com a grande luz que ilumina o mundo.
Vastidão intuível em estado contemplativo. O socrático “só sei que nada sei”.
1
Do latim ex, fora, com o indo-europeu duk-a, de duk, de deuk, levar, conduzir. A rigor, educar significa
“conduzir para fora”. (Gomes de Silva, 2009, p. 241)

2
Na extensão desta perspectiva talvez poderíamos, a partir de Plotino, declarar a
importância das artes (práticas) para a educação, mas não sem reservas: Ao falarmos
sobre arte na contemporaneidade, o senso comum, e muitas vezes o científico e o
filosófico também, interpretam Artes plásticas e/ou Visuais. Categoricamente, a História
da Arte reconhece como campos diferenciados as Histórias da Música, da Dança, do
Teatro ou da Literatura. No entanto, na mousiké platônica não há musa alusiva às
disciplinas visuais, assim como na teoria plotínica a pintura, a escultura ou a arquitetura,
por exemplo, seriam classificadas como Artes Análogas, que produzem objetos
materiais, e não como Artes Práticas, que têm cunho educativo.
Vale destacar que as Artes Liberais da Idade Média comportaram, além de
gramática, retórica, lógica, aritmética, geometria, astronomia e música, a arquitetura e a
medicina, até a reforma praticada no século V por Marciano Capela, quem retirou-as do
conjunto por considerá-las desnecessárias “a um ser puramente espiritual”. (Abbagnano,
2000, p. 82)

E fez-se a plástica...
Por volta do século XII, a marcha dos exércitos cruzados havia facilitado a
comunicação entre feudos europeus e Ásia e, com ela, impulsionado fortemente o
comércio. Em pouco tempo, renasceram e desenvolveram-se as vilas sob a dinâmica
econômica dos polos Italiano e Hanseático. Mercadores imensamente ricos, infiltrados
na nobreza e influentes perante o clero e as monarquias, exerceram também grande
impacto sobre as tradições culturais de seu meio. Não que a alta burguesia proto-
renascentista abrigasse alguma preocupação quanto à educação dos jovens em prol de
sua liberação espiritual, as escolas laicas burguesas focavam seus esforços naquilo que
consideravam noções indispensáveis ao futuro ofício comerciário de seus discípulos. A
saber: a alfabetização, a aritmética, a geografia e as línguas em voga no cenário
comercial. (cf. Le Goff, 2011, p. 106)
Evidentemente, as artes, perante à nova ordem, perderam importância e só
tiveram atenção renovada quando, salvo exceções, a nova classe dominante reconheceu
nelas um excelente meio de influência popular: Construção da imagem pública e
mascaramento de manobras políticas mediante divertimento, uma autentica política de
panem et circenses. (cf. Op. Cit., p. 115)
Nessa conjuntura, a pintura, a escultura e a arquitetura ganharam particular
interesse, dado que, além de persuasivas, constituem objetos materiais passíveis de trato
mercadológico. A humanização da religião nos afrescos de Giotto, o desenho em
perspectiva e a procura por realismo na retomada da pintura a óleo, certamente
respondem aos anelos de uma cultura pragmática e prepotente, ávida de posse, controle
e expansão do seu espaço ativo, cujos membros, em constante concorrência, “observam-
se, espiam-se, denigram-se.” (Idem, 2011, p. 126) “É este ávido e ambicioso desejo de
tomar posse do objeto em benefício do proprietário ou mesmo do espectador que me
parece constituir um dos traços originais mais evidentes da arte da civilização
ocidental.” (Lévi-Strauss como citado por Berguer, 1999, p. 86)
Devo declarar minha admiração por obras plásticas e visuais de várias épocas e
culturas, a partir das quais acredito no valor educativo dessas formas de arte. A história
da humanidade transborda de exceções à situação que aqui descrevo. No entanto, a
crise educativa mundial é uma realidade 2 e a contribuição da arte para seu saneamento é

2
Ver, por exemplo, Coombs, P. H. (1986) A crise mundial da educação. (2ª ed.) São Paulo: Perspectiva.

3
dúbia. Há diferenças entre as artes plásticas e visuais e as artes musicais ou práticas, às
quais me referi anteriormente, de que tratarei mais adiante; interessa-me aqui firmar
minha convicção de que a primeira etapa na solução de um problema consiste no seu
reconhecimento, em sua maior integridade possível, e desconhecer as condições em que
as artes plásticas e visuais lideram a configuração ocidental das artes modernas e
contemporâneas seria faltar a esta convicção.
Falo em liderança das artes plásticas e visuais porque, embora a partir da
renascença a dança, a música e o teatro tenham também ganhado em sistematização
científica e sofisticação técnica, é nas artes do retrato e do luxo que a alta burguesia
afirmou-se. Não é surpreendente que nessa mesma época tenha prosperado a literatura
biográfica e autobiográfica. Mas acredito, sobretudo, que a característica definitória da
preferência burguesa pelas artes plásticas resida precisamente naquilo que havia levado
Platão, Plotino ou Capela à sua exclusão nos respectivos projetos educativos: seu
estatismo temporal. O dinamismo retórico da música, da dança, da literatura e do teatro
nasce, consuma-se e consome-se no tempo, seu transcurso é sua existência, antes e
depois de sua execução essas artes podem ser referência ou registro, mas não são elas
enquanto experiências. A plástica e a arquitetura produzem objetos estáticos, imutáveis
para percepções superficiais, objetos de desejo e de posse, isto é, objetos passíveis de
capitalização.
Não é objeto deste trabalho o esmiuçamento histórico do rol de liderança que
aponto como exercido pelas artes visuais, notavelmente a pintura, na história da arte
ocidental. Limitar-me-ei, em respeito aos objetivos aqui traçados, a referir momentos
que me parecem particularmente significativos para ilustrar, primeiramente, a crise das
artes na cultura burguesa, que daria lugar às vanguardas do século XX e, seguidamente,
a assimilação e recondução dessa crise pelos Estados Unidos da América, na conjuntura
dos conflitos mundiais.
A modernidade definida nas revoluções industriais dos séculos XVIII e XIX
trouxe de nascença o gérmen que provocaria suas frequentes e sucessivas crísis. As
promessas de liberdade, fraternidade e igualdade com base nas formas de economia
burguesa nunca foram eloquentes em suficiência para silenciar seus questionadores. Na
arte, o romantismo apresenta-se, em algumas de suas faces, como um desmascaramento
público do modo de vida burguês; no entanto, em outras, duvida temerosamente da
ciência e da tecnologia, anela o retorno do misticismo gótico, abandona-se à natureza
bruta, condena a exploração de outrem ou desfalece em atitude niilista. Paira no
ambiente um clima de complacência mal comportada, de rebeldia dissimulada perante à
nova ordem:
Para o homem de negócios bem-sucedido, o artista era apenas pouco melhor do que
um impostor que exigia preços absurdos para algo que dificilmente se poderia chamar
trabalho honesto. Entre os artistas, por outro lado, tornou-se um reconhecido
passatempo “chocar o burguês”, obrigá-lo a sair de sua complacência e deixá-lo
boquiaberto e bestificado. (Gombrich, 2009, p. 502)
O advento fotográfico colocou em crise o mercado pictórico figurativo e os
esforços impressionistas acabaram por revelar uma tradição de olhares e realizações
dependentes dos modos capitalistas. Revelação esta que descambaria na violenta reação
pós-impressionista que abriria as portas aos movimentos de vanguarda do século XX.
Há, na arte moderna, “um desejo de escapar a todo custo do complacente esteticismo
sensual da época impressionista.” Diz Hauser. (2000, p. 961)

4
Insisto, a ruptura da tradição figurativa e sua projeção vanguardista são
assuntos que incidem diretamente sobre a plástica e a visualidade, provocando
movimentos aos quais confluem posteriormente outras formas de arte, como confirma
Paul Griffiths:
Este termo ( expressionismo) esta principalmente ligado ao grupo de pintores <<Blaue
Reiter>>, integrado por Vassili Kandinsky e Franz Marc, os quais trabalhavam em
Munich durante os anos que precederam à Primeira Guerra Mundial, mas seu sentido
estendeu-se notavelmente à poesia de Georg Trakl e a uma parte da música de
Schoemberg (…) (1988, p. 759)
Com intensa criatividade, diante da revelação de um passado servil,
mobilizaram-se os artistas, principalmente os pintores, em vanguardas à procura de
liberdade artística, da obra autêntica e emancipada da vulgaridade sensual burguesa. As
formulas são as mais variadas, uma ampla gama que se estende de vulgaridades outras,
a elaboradas cientificidades e visões metafísicas. “(...) e diz-se corretamente de Picasso
que pintava cada uma de suas telas como se estivesse sempre tentando descobrir a arte
de pintar.” (Hauser, 2000, p. 962)
A turbulência dessa histeria reivindicativa gerou a vingatividade de Marcel
Duchamp. Marcel vinga-se, sob estandarte de cinismo e ironia, do excesso de técnica,
talvez a mesma que fundamentou sua rejeição na escola de artes. Vinga-se da sua
marginalidade na procura vanguardista, vinga-se do amor mal sucedido e sua paradoxal
celebração pública, vinga-se do hermetismo de um tabuleiro de xadrez, vinga-se da
assepsia cultural norte-americana, vinga-se da Normandia abandonada, vinga-se da
guerra; vinga-se, em soma, de si, do tempo, do seu transcurso. Vingança regressiva,
consumada em consciência primitiva, autocentrada, ego que afirma seu absoluto interior
no balanço de um cavalo de madeira, sob o obsessivo bissílabo mântrico Dadá.
Autossuficiência triunfante que o comparsa Picabia consagra no manifesto “Dadá, por
sua vez, não quer nada, nada, nada.” (como citado por Alvares Lopera et al, 1997, p.
16)
Duchamp quer o nada mesmo, sua antiarte: “É uma obra voltada sobre si
mesma, empenhada em destruir aquilo mesmo que cria.” (Paz, 2008, p. 50) O cinismo
consiste na transparência de Duchamp. Certo de sua suficiência destrutiva não se
esconde, não dissimula sob a capa suas estocadas: “Tinha tido êxito em 1913 no
Armory Show (…) tinha sido um sucesso de escândalo. E isso foi muito útil para eu
aproveitar a situação...” (Duchamp in Collin, 2012) “Joguei o urinol na cara deles como
um desafio e agora eles o admiram como um objeto de arte por sua beleza” (Duchamp,
2009)
Mas Marcel desafia a acomodação do artista por trás da máscara da obra de
arte, sua atitude é crítica. “(…) como todos os pouquíssimos homens que se atrevem a
ser livres, Duchamp é um clown.” (Paz, 2008, p. 63) É a sombra que o espelho do
grotesco devolve à frivolidade e ao puritanismo burgueses. Destrói tudo, quebra tudo.
Esta situação não deve prolongar-se!
Esta hipótese interpretativa da Lua Negra que tudo consome no fim do mundo,
além de plausível, oferece uma depuração catártica. Mas toda catarse supõe um novo
investimento após a descarga. No fundo da lua negra dos olhos do unicórnio brilha a
centelha da nova criação. Era este, talvez, o destino da saga duchampiana. O fim do
mundo burguês anunciava-se também no colapso do capitalismo liberal de 1929. Mas
Leviatã não morreu, negociou, blefou, bradou e recolheu na aposta da Segunda Guerra
Mundial o prolongamento de sua agonia neoliberal e globalizada.

5
Foi a vez dos Estados Unidos da América encabeçar a nova tentativa. “A este
cambio de equilíbrio econômico corresponde um transtorno do equilíbrio cultural: a
segunda metade do século XX corresponderá não apenas ao triunfo da arte
estadunidense, mas ao maremoto da cultura estadunidense em todas suas formas”.
(Michaud, 2007, p. 69) A questão é se um país quase sem passado encontra-se em
medida de conceber um novo ciclo cultural de proporções globalizadas. O pseudo
Kantismo de Greenberg e o intelectualismo de Danto atestam o contrário: “Nova York
roubou a ideia da arte moderna”, denuncia Guilbaut (1988), e isto significa o
prolongamento artificial de uma vida que clama por morte e ressurreição. Poder-se-ia
dizer que a dinâmica da moda, sustento da cultura de consumo, acolheu e legitimou essa
morte embalsamada, dado que ela encarna um princípio que lhe é caro: essa arte
autodestrutiva é a própria celebração da obsolescência que mantém a vertigem da oferta
e da procura.

Sim mas, e a educação?


Em perspectiva etimológica defini anteriormente a educação como um
conduzir para fora. Dir-se-ia que o sujeito, em dependência cultural para sua afirmação,
por condição ultrapassa sua individualidade. No entanto, a cultura3, enquanto lugar de
refinamento artificial da natureza, constitui-se realidade parcial em oposição ao entorno
selvagem.
A função da educação como promotora da evolução da realidade individual e social,
inscreve-se num processo permanente e ao longo da vida. Por isso, e cada vez mais, o
ser humano não pode acomodar-se passivamente à realidade tal como ela lhe é
apresentada. (Barbosa, 2011, p. 49)
A realidade que nos é apresentada, à qual não podemos acomodar-nos, é
cultural, portanto, para transcendê-la, a educação deve conduzir-nos à articulação do
cultural com a natureza. E é justamente na oposição cultura e natureza onde se revela o
valor educativo das artes. É certo que a ciência nos aproxima da natureza, mas esta
aproximação é abstrata. A ciência observa, e suas conclusões expressam-se em “signos
ou símbolos que não possuem uma qualidade própria intrínseca, mas que substituem
coisas que podem, em outra experiência, ser experimentadas qualitativamente.”(Dewey,
1980, p. 91) Diferentemente, com intuito simbiótico, a arte parte de premissas culturais
ao encontro com a natureza.
(…) a música opera por meio de duas grades. Uma é fisiológica e, portanto, natural;
sua existência se deve ao fato de que a música explora os ritmos orgânicos, e torna
assim pertinentes certas descontinuidades que de outro modo permaneceriam em
estado latente, como que afogadas na duração. A outra é cultural; consiste numa escala
de sons musicais, cujo número e intervalos variam segundo as culturas. (Lévi-Strauss,
2010, p. 36)
Como simbiose, esta aproximação cultural com a natureza é experiencial,
portanto, participante e não apenas observada. Por isso, a arte não representa, mas
apresenta-se ela própria. Como diz Jung: “Talvez a arte nada 'signifique' e não tenha
nenhum 'sentido', pelo menos não como falamos aqui sobre sentido. Talvez ela seja
como a natureza que simplesmente é e não 'significa'.” (1987, p. 66)
É também aqui que ressurgem os motivos da antiga exclusão das artes
plásticas: Enquanto que escalas de sons, palavras e movimentos cenográficos são
3
Do latim cultivare, promover, refinar, mais ura, ação, resultado de. (Gómes de Silva, 2009, p.200)

6
compromissos culturais levados a sinergia de planos múltiplos, as formas e as cores são
extraídas da natureza para reapresentá-la, resignificá-la ou negá-la, mas sempre em
relação a seu substrato.
Não estou querendo dizer que as artes plásticas e visuais são dispensáveis na
educação. Diferente da abstratividade da ciência, a plástica e a visualidade podem
“participar da significação dos seres e as coisas incorporando-se a eles” (Lévi-Straus,
2010, p. 39) O que oferece a possibilidade de experiências significadoras.

Conclusão
Parece-me que o caráter experiencial da aprendizagem é ponto passivo nos
estudos sobre educação. A coleta sensorial de dados qualitativos do ambiente requer a
presencia efetiva do sujeito. E são essas qualidades vivenciadas que, organizadas
intuitivamente, haverão de subsidiar a reflexão crítica. Resulta evidente que nosso elo
primário com o mundo é sensorial. E digo primário porque é o primeiro, condição sine
qua non para que outras operações físicas e espirituais se tornem possíveis. Ora, essa
sensorialidade pode ser exercitada mediante estímulos qualitativos não lineares, mas em
sinergia de planos múltiplos. É assim que trabalham nossa mente e nosso corpo e é
assim que transcorre o mundo.
As matérias-primas da arte são qualidades químicas, sonoras, cinestésicas,
formais, táteis e cromáticas e o móbil do artista consiste na procura criativa de
possibilidades de coexistência harmônica entre essas qualidades e seu meio. A educação
é vocação da arte, desde que, dada sua natureza, esta se mostra insubstituível recurso de
refinamento sensorial; ou, ao menos, poderia ser, se a visualidade contemporânea não
procurasse legitimidade num trabalho intelectual autocentrado e outras formas de arte
tivessem o bom senso de avaliar os próprios recursos antes de aderir a uma luta que não
lhes pertence.
A arte volatilizou, paira na ambiência uma tagarelice desvinculada de seu
substrato. É “arte em estado gasoso” (Michaud, 2007), linguagem de evidente
impopularidade, nominalmente instigante para aqueles que de alguma maneira inserem-
se em seu circuito.
Outras formas de arte, ditas menores, para targets outros que os das formas
elitistas, também foram absorvidas pela vertigem do consumo. Artes que com a mesma
facilidade com que são aceitas e reverenciadas, são também descartadas para dar lugar a
novas futilidades. Um marcapasso no peito neoliberal. Em todo caso, a sempre
crescente velocidade de aceitação e descarte desses produtos carece de espaço para
progresso, cada estímulo devera ser mais evidente e elementar que o anterior sob pena
de colocar em risco seu sucesso. Impossível ignorar as posturas e previsões da escola de
Frankfurt.
No Brasil, o ensino de artes na educação básica e média é obrigatório desde
1996 (Brasil, 2010) e não faltam esforços institucionais, prévios e posteriores, de
envergadura e ambição louváveis. No entanto, talvez hoje mais que nunca, a questão
permanece: Que se ensina na aula de artes? Como conduzir à convicção de que o
homem de terno que deglute os próprios excrementos na galeria de artes é um agente
refinador dos sentidos? Como negar ou justificar que a ausência de técnica e talento da
vedete midiática é compensada pelo oferecimento de suas intimidades siliconadas? Em
soma, como articular uma educação formal com uma ambiência informal
autodestrutiva?

7
A economia liberal está em crise e com ela suas formas culturais. O clown, a
sombra grotesca, só faz sentido enquanto a personalidade não se reconhece. Talento há
de sobra e o frescor informal tem tudo para surpreender-nos sempre, mas ele precisa ser
liberado das amarras do intelectualismo e do cinismo mercantil e isso, ao meu ver, só é
possível numa crítica formal sincera. A reemergência do espiritual na arte depende do
diálogo, por um tempo inadvertido, entre o informal e o formal na educação.

Referências
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