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H E IN Z
organizador .
* Publicado originalm ente sob o título “Regional elites" (C onniff e M cCann, 1991).
1 Os estudos originais são: W irth (1977), I.evine (1978) e Love (1980). Para um a discussão
dos três m étodos de definição de elites políticas, ver o clássico artigo de Dahl (1958). Gos
taríam os ainda de agradecer aos professores Levine e W irth o suprim ento de informações
adicionais relativas à ocupação dos pais.
2 Utilizaremos doravante a expressão “elite am pliada” para designar o conjunto das três
am ostras regionais (composite elite, no original). (N. do T.)
78 Por outra história das elites
estados e da elite nacional. Esses estados não podem ser considerados “típicos” — se
algum o é — nem sua seleção é aleatória. Foram escolhidos estados cujas elites exerce
ram p o d er real d u ra n te u m período em que os partidos estaduais se constituíam na
única u n id ad e coesa de o rganizarão política. São Paulo e M inas Gerais, com as m aiores
populações e econom ias, dom inavam a política federal. Pernam buco, o m ais im p o rta n
te estado do N ordeste, talvez seja o que m elhor representa os dilem as políticos, sociais e
econôm icos que sua região, assim com o hoje, colocava para o resto do país. Os estudos
originais foram além da sim ples com paração biográfica de idade, educação e ocupação,
no in tu ito de d escobrir com o esses políticos atu aram com o elites. O u tras variáveis fo
ram acrescentadas, incluindo a participação em eventos políticos-chave, os atributos
sociais, os vínculos com o exterior, laços com outros estados, as ligações familiares, as
características intra-estaduais (com o origens urbanas e rurais ou procedência sub-regio-
nal) e os aspectos relativos à geração. Variáveis com binadas expandiram de tal form a a
análise que cerca de 100 variáveis foram codificadas ou derivadas.3
P opulações de 263 (São Paulo), 276 (P ernam buco) e 214 (M inas G erais) pessoas
p odem parecer p eq u en as em com p aração com alguns o u tro s estudos sobre elites, mas
os três estu d o s ex p lo raram d im ensões que estudos de g ru p o s m aiores haviam ig n o ra
d o .4 Por exem plo, os tra b a lh o s tra ta ra m de fam ília e vínculos com o exterior, am bos os
aspectos exigindo rigorosa análise contextual. Esse m aio r ap ro fu n d am e n to talvez co m
pense u m a m e n o r extensão do estudo, possibilitando um a visão de relações que um a
ab o rd ag em m ais inclusiva — em term os de n ú m e ro — possivelm ente deixaria passar.
A análise de Love sobre a elite de São Paulo, p o r exem plo, fez surgir um a in trin cad a
rede de laços de fam ília e negócios, m o stran d o com o 97 dos 263 m em bros do c o n ju n
to estavam interlig ad o s (ver figura).
O s c o n t o r n o s da elite ampliada
Após esta breve introdução, voltam o-nos para o com portam ento da elite e as caracte
rísticas de sua origem . Um im portante exemplo de com portam ento é a proporção em que
os m em bros da elite se m antêm fiéis ao partido no poder (situação) ou rom pem suas
fileiras. Este tópico foi tratado após se ter determ inado com o m em bros das três elites atua-
*ram em m om entos críticos. Prim eiro, com o as lideranças políticas se posicionavam qu an
to à escravidão um ano e m eio antes da Abolição? Apenas 15% da coorte de idade relevante
(N = 322) tin h am facilitado a libertação de escravos, com pequena variação regional. Se
gundo, quais eram as filiações políticas dos m em bros da elite antes do golpe que pôs fim à
m onarquia, em 1889? Apenas 42% eram republicanos “históricos”, isto é, aqueles que eram
S i _ t gf ...a i
José Silva Vicente Carvalho Júlio Mesquita
Gordo Paulo Morais Barros
f F. Glicério J . Sampaio
Rocha Az<ivedo Gastão Vidigal
Vidal
Julio Prestes
9
A. Pádua Sales Herculano Freitas
E. Pacheco Chaves J. Paulino Nogueira R. Sampaio
Vidal
Armando C. Altenfelder Silva
J. Cardoso
Prado A.C. Sales Jr.
Almeida
Antônio Prado Martinho Paulo Nogueira Filho
Prado Jr.
| Paulo Prado |— j —^
J. M. Whitaker Firmino Whitaker
A. Prado Jr. V. Rodrigues Alves
Fábio Prado
f
A. Ulhoa Cintra
A. Meireles Reis J. M. Rodrigues Alves
Jorge Tibiriçá <— c ----- > Adalberto Queiroz
Teles_______
A . A rrudo Botclho
t 9 J. M. Martins
A.M. Reis
Afrodísio Coelho
Filho
4------ 1 \ Siqueira
Carlos F. Morais
Luis Toledo Piza F Fonseca Teles U. sm —£| F. Rodrigues Alves
Botelho Pinto M a rc o n d e s ]-
t ' °U
1S Í | J. R. Alves Sobrinho [■
B. Pereira
| j . Toledo Piza| s Antônio Queiroz
O. Rodrigues Alves
u
Bueno
L. T. Piza Sobrinho
J Teles Cardoso
Melo Neto
A. Carvalho
A. M. Alves Lima
F. Carvalho
J. B. Melo c —H Alfredo Ellis
Alfredo Maia Luís Silveira Oliveira
Cesário Coimbra
M. L. Oliveira Sobrinho Arnolfo Alfredo F. Cunha
sm Azevedo Guedes Junqueira Laerte Assunção A. C. Assunção
sLi
J . G. Monteiro
Legenda
c cunhado pm p rim o p o r m a tr im o m o
f f ilh o s s o b r in h o
g g e n r'o sm s o b r in h o p o r m a t r im ô n io
i ir m ã o sn s o b r in h o - n e t o
n n e to
A s lin h a s p o n tilh a d a s re p r e s e n t a r
P p rim o
d ir e t o r e s da m esm a firm a .
82 Por outra história das elites
7 Seguindo o texto original, utilizaremos “proprietário” para designar o conjunto daqueles in
divíduos que detêm propriedade privada, correspondendo esta a diferentes setores da atividade
econômica, rural ou urbana, como definido no corpo do texto; quando se tratar de designar
fazendeiros, por exemplo, utilizaremos sempre a categoria adjetivada “proprietário rural”; ain
da, para traduzir a categoria businessmen, utilizaremos o termo “homens de negócio”. Preferi
mos, neste caso, não utilizar o termo mais comum de “empresário”, ao qual recorreremos pos
teriormente apenas em duas situações, para traduzir entrepreneur. (N. do T.)
Elites regionais 83
pessoas cuja o cu p ação dos pais pôde ser identificada (46% do to ta l), a esm agadora
m aio ria era co m p o sta de profissionais liberais ou de p ro p rietário s de algum tipo, ou
de am bos. Nove o u m en o s (3% ) tin h am pais cuja ocupação p o d e o u não ter sido de
classe in fe rio r (tropeiro e “o u tra ”). Assim, com o esperado n u m a sociedade ru ral tra d i
cional, os m em b ro s da elite política derivam em larga escala dos estratos su p e rio r e
m édio su p e rio r da sociedade.
T a b e la 1
O c u p a ç ã o do p a i: São P a u lo , M in as G e r a is ,
P e rn a m b u co e e lite a m p lia d a
P o s iç õ e s s o c ia is
O fic ia l da G u a rd a
N a c io n a l 7 5 ,4 42 4 5 ,2 — — 49 1 4 ,2
M e m b ro da
e lit e im p e ria l 17 1 3,1 8 8 ,6 • 10 8 ,3 35 4 ,6
Total 130 93 121 344
O b s .: Todos os percentuais foram arredondados. O cupações foram m ultico dificad as. Ver as
definições em Love (1980:285), exceto para as seguintes: burocrata de baixo escalão (funcionário
público local ou provincial); burocrata de alto escalão (alto funcionário im perial) e tro peiro. O
teste qui-quadrado de ajustam ento indica que esta amostra não é influenciada pelas características
dos m em bros da e lite mais bem -sucedidos.
84 Por outra história das elites
T a b e la 2
M e m b ro s da e lite com a m esm a o c u p a çã o de se u s p a is
O cup ação P e r c e n t u a l (% ) Q u i- q u a d r a d o *
F a z e n d e iro 7 9 ,0 0 ,0 0 0 0
O fic ia l do E x é r c it o 3 3 ,3 0 ,0 1 0 6
C o m e r c ia n t e 2 7 ,7 0 ,0 0 0 0
M é d ic o 2 0 ,0 0 ,0 0 0 1
In d u s tria l 8 ,9 0 ,0 0 1 8
E n g e n h e iro 7 ,5 0 ,0 2 3 8
tido origem m estiça, mas tais assuntos eram raram ente evocados em público e não apare
cem na m aior p arte das biografias. O m esm o era verdade para a religião, já que pratica
m ente to d o m u n d o assum ia ser católico ou de tradição católica, ainda que um certo n ú
m ero fosse de não-praticantes. Encontram os apenas um núm ero insignificante de não-
católicos (incluído u m declarado ateísta), mas nenhum protestante.
U m a classificação das bases políticas entre ru ral e u rb a n o m ostra que três qu in to s
do to tal desenvolviam atividades nas cidades, n o rm alm e n te na capital estadual. A va
riação era c o n tu d o am pla, de 44% em M inas Gerais a 67% em São Paulo e 71% em
P ern am b u co (visto que Belo H o rizonte, capital de M inas Gerais, foi co n stru íd a na
década de 1890, in clu ím o s Juiz de Fora na categoria “u rb a n o ”). Em geral, a p ro b ab ili
dade de u m m em b ro da elite residir em cidades era oito vezes su p erio r à de u m cida
dão co m u m dos três estados: 61% da elite, co m parados com apenas 8% da população
em geral, viviam nas capitais (ou em Juiz de Fora) em 1920.
M o v im en tação geográfica foi um a característica de pelo m enos duas das elites
estaduais e stu d ad as (as inform ações sobre P ernam buco não estão disponíveis). Das
elites m in eiras e p aulistas, 70% tin h a m bases políticas em m unicípios diferentes d a
queles o n d e haviam nascido. Esse m ov im en to não era, co n tudo, sem pre d irecionado
às cidades: em São Paulo, 63% da elite vivendo ainda no in terio r (n = 71) não m ais
residiam em seu m u n ic íp io de origem .
Para as elites, diferentem ente das massas, a dicotom ia ru ra l-u rb a n o era talvez pouco
significativa. Em São Paulo, p o r exem plo, m etade daqueles m em bros da elite que eram
fazendeiros (n = 89) possuía suas bases políticas na capital estadual. Jorge Tibiriçá, o
pai do esquem a de valorização do café, duas vezes governador de São Paulo, e o ateísta
a n te rio rm e n te m en cio n ad o , não era m enos fazendeiro p o r ter nascido em Paris. M as a
conexão u rb a n a g a ra n tiu às elites o acesso às inform ações e o p o rtu n id a d e s negadas às
m assas rurais.
A idade m édia com a q ual os m em bros da elite ingressavam na política era de 44,2
anos, com p o u ca variação nos três casos. Isso parece su rp reen d en te se co n sid erarm o s
que a g ran d e m aio ria p rim e iro ocupava postos no âm b ito estadual e que 44 anos era a
idade m édia com a qual m in istro s do gabinete assum iram suas funções d u ra n te o
Im p ério (1822-89), isto é, em âm b ito n a c io n a l." Para a elite republicana aqui consi
d erada, 35% do g ru p o am p liad o , d istrib u íd o entre os três estados, o cu p a ram seu p ri
m eiro p o sto p o lítico antes dos 40 anos. Q u aren ta p o r cento de m in eiro s e p e rn a m b u
canos o c u p a ra m p o sto s antes dos 40 anos, com p arad o s a apenas 25% dos paulistas. O
ú ltim o caso p o d e ser em p a rte explicado pela n atureza m ais fo rm alm ente buro crática
do processo p o lítico n aq u ele estad o .12
11 Carvalho, 1974.
12 Ver Love (1980:162-163, 165).
Elites regionais
T a b e la 3
C ru z a m e n to d as g e ra ç õ e s da e lite com v a riá v e is s e le c io n a d a s (%)
G e ra ç ã o E x p e r iê n c ia p o lít ic a
1 3 2 ,5 5 ,8 1 3 ,3 7 1 ,7 2 5 ,6
2 2 9 ,2 1 7 ,7 2 5 ,5 6 0 ,0 2 9 ,3
3 8 ,5 3 3 ,3 4 8 ,6 5 2 ,6 6 9 ,0
X 2 0 ,0 0 0 0 ,0 0 0 0 ,0 0 0 0 ,0 0 1 0 ,0 0 0
O cupação V ín c u lo s P ro fis s ã o
com e x t e rio r
N e g ó c io s E x p o rta ç ã o J u iz Eoucad or E n g e n h e iro
1 3 2 ,5 2 7 ,2 2 7 ,2 3 1 ,9 2 4 ,8 7,1
2 4 1 ,9 3 4 ,7 4 6 ,6 1 0 ,9 2 6 ,6 1 2 ,5
3 2 5 ,9 2 1 ,9 3 2 ,5 6 ,0 3 7 ,1 1 5 ,5
X 2 0 ,0 1 1 0 ,0 4 4 0 ,0 0 0 0 ,0 0 0 0 ,0 4 1 0 ,0 2 1
O b s.: Vínculos com o e xte rio r, N egócios e Exp o rtação são variáveis am pliadas (ver definições
acim a).
S u c e s s o na elite
17 Para um a análise do m ovim ento de uma posição a outra, ver Love (1982:59-64).
Elites regionais 91
Nas co nsiderações finais deste texto, explorarem os as form as pelas quais as elites
regionais brasileiras eram sim ilares ou diferentes de o u tra s elites políticas. Este exercí
cio é u m a ten tativ a, pois to d o s &s estudos aqui levados em conta definem elite d iferen
tem ente. A m aio ria das elites é nacional (em bora algum as incluam q u ad ro s executivos
estaduais o u pro v in ciais). A m aioria é de elites p arlam entares, em b o ra algum as p o u
cas se co n stitu a m em m esclas de m em bros do Executivo, do Legislativo e de o u tros
g ru p o s .19 Estas co m p araçõ es irão realçar o que parecem ser os c o n to rn o s distintivos
da elite p o lítica brasileira, que é com o nos irem os referir, daqui em diante, ao grupo
am p liad o das três elites estaduais.
C om respeito à o cu p ação dos pais, o p adrão brasileiro revela pais de classe m édia
alta e de classe alta (95% ), co n trasta n d o com as elites políticas em três regim es ale
m ães (W eim ar, regim e nazista e República Federal), on d e os pais dos m em bros da
elite política p o ssu íam o cupações de classe m édia baixa e de classe baixa nas seguintes
pro p o rçõ es: 47% em 1925, 59% em 1940 e 54% em 19 5 5.20 M esm o no M éxico de
Porfírio D iaz (1900-11), 11% dos m em bros da elite política tin h am pais com o c u p a
ções de classe baixa, com o “o p e rário ” e “cam p o n ês”. A p a rte de m em bros com pais de
classe baixa cresce para 17% no M éxico revolucionário (1917-40) e para 24% na era
p ó s-rev o lu cio n ária (19 4 6 -7 1 ).21 Levando em conta o nascim ento no exterior, a elite
b rasileira p ode ser tam b ém co n trastad a com dep u tad o s e senadores arg entinos em
três m o m e n to s de tran sição estu dados p o r D arío C an tó n (1889, 1916 e 1946). No es
tu d o de C a n tó n , n os três c o n ju n to s de senadores e dep u tad o s, os nascidos no exterior
cresceram de 10% a 53% , a tin g in d o este percentual em 1946. Em co n traste, apenas
0,6% da elite brasileira se c o m p u n h a de pessoas nascidas fora do país e m enos de 4%
p o ssu íam pelo m enos u m pai estrangeiro. A m bos os países tiveram a experiência de
im igração de m assa, m as os im igrantes na A rgentina foram m ais b em -sucedidos na
política, talvez em p a rte devido à m en o r base pop u lacio n al naquele país.
Legisladores a rg en tin o s chegaram a altos postos m ais cedo que seus pares b rasi
leiros. Em 1889, 85% dos ú ltim o s haviam ingressado no P arlam ento nacional antes
dos 40 anos e 4% tin h a m o cu p ad o postos provinciais antes dos 35 anos. No estudo de
C a n tó n sobre a elite arg en tin a, em 1889, 89% haviam ocupado postos regionais ou
19 Estes estudos são: C antón (1966); Campo, Tezanos e Santín (1982); Daalder e Van Den
Berg (1982); Lasswell, Lerner e Rothwell (1952); Frey (1965); Higonnet e H igonnet (1969);
Imaz (1970); Putnam (1976); Sm ith (1979); Zapf (1965).
20 O cupações de classe baixa eram , sozinhas, 14,5% e 16%, respectivam ente (Zapf,
1965:182).
21 Sm ith, 1979:77.
Elites regionais 93
federais antes dos 40 anos, co m parados com 35% entre a elite brasileira. No entanto,
en tre os congressistas arg en tin o s de 1916 e 1946, a particip ação daqueles que ingressa
ram na p o lítica an te s dos 40 anos caiu de 69% para 41% . A inda assim , o ú ltim o
p ercen tu al era su p e rio r ao da elite brasileira.22
Os estu d o s de o u tra s elites latin o -am erican as citados na no ta 19 não oferecem
d ad o s sobre parentesco, m as as elites brasileiras não eram provavelm ente as únicas a
p o ssu ir extensas redes de relações. R obert P u tn am observou que “43% dos m inistros
dos gabinetes que governaram a H o landa entre 1848 e 1935 eram ligados p o r p a re n
tesco a o u tro s m in istro s; (...) ap ro x im adam ente um sétim o dos d e p u tad o s da Terceira
República francesa (1870-1940) possuía relações en tre si; e (...) cerca de u m décim o
de tod o s os congressistas n o rte -a m erican o s entre 1790 e 1960 possuía parentes que
tam b ém haviam sido congressistas”.23 Suspeitam os que parentesco perm aneça com o
um a variável im erecid am en te negligenciada na m aioria dos estudos de elites políticas.
Se os líderes políticos latino -am ericanos fossem tam bém proprietários de fábricas, plan
tações o u fazendas (co m o no caso de São Paulo), este fato não alteraria drasticam ente
nossa visão sobre os conflitos setoriais?24
Assim com o se dá no tocante ao passado escolar, as diversas elites políticas para as
quais com param os inform ações m ostravam um a sobre-representação de graduados u n i
versitários em face da população em geral, num a proporção de 8 por 1 nos Estados Unidos
para mais de 100 p o r 1 para os países subdesenvolvidos.25 A elite brasileira situa-se próxi
m a ao final deste espectro, já que 93% de seus m em bros possuíam título universitário.
A com paração de ocupações é com plicada, visto que nem to dos os autores utiliza
ram m últipla codificação e que as definições eram diferentes. De qualquer form a, p ro
fissionais u n iv ersitários26 pred om inam em toda parte. A elite brasileira sobressai-se em
razão da alta p ro p o rção de seus m em bros que eram proprietários rurais ou hom ens de
negócios de algum tipo. O contraste é especialm ente acentuado com relação à elite m e
xicana, o n d e os p ro p rietário s rurais não constituíram m ais que 4% e hom ens de negó
cios alcançaram 6% , respectivam ente 25% e 34% no caso do Brasil (Sm ith dedica de
fato u m capítulo inteiro de seu livro à ausência de integração entre as elites econôm ica e
22 C antón, 1966:46, 77. Recalculamos os percentuais para elim inar não-respostas e obter
um valor único para cada coorte, ponderando deputados e senadores pelo núm ero em
cada câm ara p o r ano em questão.
23 Putnam , 19/6:61. %
24 Ver “Topical review: the theory o f sectoral clashes" (Latin American Research Review, v. 4,
n. 3, p. 1-114, 1969).
25 Putnam , 1976:27.
26 Professionals, no original. (N. do T.)
94 Por outra história das elites
n an tes” que, p resum ivelm ente, incluem tam bém os p ro p rietário s de terra. E m presários
c o n stitu íra m en tre 8% e 16% das equipes de 1936, 1941 e 1946, caíram em 1951 e
su b iram , en tão , p ara 24% e 32% nas equipes de 1956 e 1961.31
Assim, a elite política brasileira parece ter sido m ais am plam ente penetrada pelos
p ro p rietário s do que foram o u tras elites. Ainda que não haja tendência de predom ínio
de p ro p rietário s nas elites políticas ocidentais, as pesquisas não provaram definitiva
m ente sua não-representatividade. A literatura m ostra que as elites políticas tendem igual
m ente a ser form adas p o r profissionais de origem relativam ente privilegiada, ligados a
p ro p rietário s através de laços econôm icos e sociais, ou ser form adas (em m en o r n ú m e
ro) pelos p ro p rietário s eles m esm os.32 C om o afirm a Ralph M ilib an d ,“a razão para a tri
b u ir im p o rtân cia considerável à com posição social da elite do Estado em países capita
listas avançados reside na forte suposição de que esta influencia seus pontos de vista,
suas disposições ideológicas e suas tendências políticas”.33 Esta afirm ação parece em p rin
cípio válida para a elite brasileira, que m anifestam ente não se sentia m uito pressionada
para representar os interesses das classes trabalhadoras do cam po e da cidade, isso para
não citar o u tro s g ru p o s excluídos — não-brancos, m ulheres e im igrantes.
Para ser claro, nossa descoberta sobre a relativam ente elevada particip ação de p ro
p rietário s n o Brasil deve ser percebida com o aproxim ada. A codificação profissional
m ú ltip la no caso de algum as elites (in clu in d o a brasileira) ap o n ta para percentuais
m aiores que a codificação sim ples. Os dados de P u tn am , para os Estados U nidos, e de
Sm ith, p ara o M éxico, eram , q u a n to à ocupação, codificados apenas no m o m en to de
e n tra r na elite, e as definições ocupacionais não eram idênticas. A elite brasileira pos
sui m aio r p ro p o rç ã o de paulistas do que realm ente haveria em u m estudo nacional,
ain d a q u e M inas G erais e m esm o P ernam buco apresentem um a p articip ação relativa
m en te am p la de p ro p rie tá rio s. Paulistas e m ineiros pesaram m ais no processo político
do que indica o seu n ú m e ro de m inistros e presidentes. N ão o b stan te, d en tro destes
lim ites, o fato de o Brasil sobressair-se em relação ao grau de ocup ação de posições
políticas pelos p ro p rietário s tende a levantar dúvidas — ao m enos no que é concernente
aos anos estu d ad o s — q u a n to à tão propalada hipótese da “relativa a u to n o m ia ” do
E stado brasileiro em face dos interesses econôm icos.34
31 Imaz, 1970:27.
32 Nagle (1977:233, 248-49); M iliband (1969:66).
33 M ilib a n d , 1 9 6 9:6 8 .
34 Sobre a idéia da “relativa autonom ia” no Brasil, ver Faoro (1975). Sobre o período em
análise, conferir Pont (1987). Para a literatura sobre a “relativa autonom ia” em outros
períodos da história brasileira e o argum ento de que as políticas do Estado favoreceram
interesses econôm icos representados no governo, ver Love e Barickman (1986), e a réplica
de Joseph Love a M aurício Font (Love, 1989).
96 Por outra história das elites
Re fe rê n c i a s bi bl io g ráf ica s
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