Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
Industrial, por seu lado, com a alteração dramática da paisagem urbana e a introdução de processos
mecanizados, quebra a continuidade temporal com o passado e apela à “consagração do monumento
histórico”. Por fim, actualmente, segundo Poulot, verifica-se uma dissociação entre os conceitos de
identidade e património, não sendo a simples existência do tal passado material garantia da sua
assunção automática como património. Daí o sucesso da teoria que sustenta que o nosso
relacionamento futuro com o património será tão-somente o da apreciação da sua antiguidade,
enquanto uma outra perspectiva filosófica invoca um relacionamento governado pela ética, num
processo de aprendizagem colectiva.1
Mas entre o património e a urbe que o rodeia impõe-se uma relação de equilíbrio, que permita
uma coexistência pacífica, evitando assim o afastamento dos habitantes para a periferia. Há também
que reduzir o impacto duma cultura de massas, cujo expoente é o turismo cultural, que acaba por
pôr em causa o próprio património histórico, num processo lento de destruição e vulgarização.
A história, a memória e o tempo são parcelas da mesma equação que as une aos conceitos de
monumento e património, quais “lieux de mémoire” de Nora. Para Lowenthal, os vestígios
materiais são uma garantia de que houve um passado; apesar de mudos e carecerem de
interpretação, apesar de corrompidos pelo tempo ou pela reconstrução sucessiva, são sempre uma
ponte entre o presente e o passado. Reagimos a estas relíquias pela sua beleza, pelo seu valor
histórico mas sobretudo pelo seu papel de talismãs da continuidade do tempo (Lowental, 2003).
Loew diz-nos que, para Choay, a evolução do conceito de património “resultou em novas
atitudes de conservação, melhoria, modernização e conservação dos edifícios; ela questiona se as
futuras gerações olharão para o seu património como inspiração para a criatividade ou se o
transformarão numa atitude narcisista sobre um passado desejado” (Loew, 1998, p. 4, minha
tradução).
Borges vivia, através da sua escrita, entre espelhos e labirintos, usando estas metáforas como
portas de passagem para uma nova realidade2. Choay utiliza as mesmas metáforas, criando uma
alegoria do património que mais não é que uma verdadeira alegoria do Homem. É recorrente na
arquitectura a comparação do edifício (e por extensão, da cidade) ao corpo humano e Choay não
escapa a essa tradição -“o seu labirinto é o edifício humano por excelência”. O património histórico
é assim o espelho onde o Homem se reflecte, qual “imagem da identidade humana” construída com
os vestígios materiais do passado. É uma atitude narcisista e passiva, de contemplação e “culto de
uma identidade genérica”.
O século XX, em particular a partir dos anos sessenta, assiste ao nascimento do culto e da
inflação do património histórico edificado. Confunde-se a arquitectura pré-industrial com a mais
1
Poulot Dominique, “Le sens du patrimoine : hier et aujourd'hui (note critique)”, in Annales. Économies, Sociétés, Civilisations, 48e
année, N. 6, 1993. pp. 1601-1613. http://www.persee.fr/web/revues/home/prescript/article/ahess_0395-
2649_1993_num_48_6_279233
2
http://www.hispanista.com.br/revista/Borges%20%20fant%C3%A1stico.pdf
Cresceê ncio Ferreira Patrimoó nio Histoó rico e Artíóstico
Aluno nº 1000692 E-Foó lio A
Património Histórico – o tema de uma alegoria
recente, numa amálgama “que nos leva também a confundir história e memória”, num autêntico
“complexo de Noé”. Nesta “sociedade protética” das novas tecnologias, que retira ao Homem a
necessidade do contacto directo com o mundo natural que o rodeia, perde-se a “competência de
edificar” que lhe é inata, privação oculta pela “cultura do património”. É necessário partir o espelho
do património, para que este perca a sua “memória afectiva” e com ela esmoreça a actual indústria
cultural. Temos de reconciliar-nos com a nossa competência de edificar, com o objectivo, já não da
conservação do património mas antes da “conservação da nossa capacidade de lhe dar continuação e
de o substituir”.
Há que fazer a Viagem através desse labirinto dedáleo que é a nossa competência de edificar
até chegarmos ao espelho do património que iremos então partir e atravessar em direcção a novos
caminhos, onde o Homem, enfim livre das referências de memória e tempo, se encontre de novo a si
mesmo.
Bibliografia
BRANDI, Cesare, Teoria da restauração, São Paulo, Ateliê Editorial, 2004 http://books.google.com/books?id=BzAlcZ-
fbFcC&printsec=frontcover&dq=cesare+brandi&hl=pt-
PT&ei=bhKJTaCzIMvHswa4qdi5DA&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=1&ved=0CCsQ6AEwAA#v=onepage&q&f=
false
CHOAY, Françoise, Alegoria do Património, Lisboa, Edições 70, Lda., 2008
JOKILEHTO, Jukka, A history of architectural conservation, Oxford, Butterworth-Heinemann, 2002
http://books.google.com/books?id=whK2u1IeHbEC&printsec=frontcover&hl=pt-
PT&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false~
KERN, Maria L.B., Imagem e conhecimento, São Paulo, EdUSP, 2006 http://books.google.com/books?id=S9ip-
jtpX2UC&printsec=frontcover&hl=pt-PT&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false
LOEW, Sebastian, Modern architecture in historic cities, London, Routledge, 1998 http://books.google.com/books?
id=F49xwthBQskC&printsec=frontcover&hl=pt-PT&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false
LOWENTHAL, David, The past is a foreign country, Cambridge, Cambridge University Press, 2003
http://books.google.com/books?id=jMqsAQZmv5IC&printsec=frontcover&dq=the+past+is+a+foreign+country&hl=pt-
PT&ei=yBGJTYTUIMjcsgaD28W3DA&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=1&ved=0CCkQ6AEwAA#v=onepage&q
&f=false
MURPHY, Kevin D., VIOLLET-LE-DUC, Eugène-Emmanuel, Memory and modernity: Viollet-le-Duc at Vézelay,
Pennsylvania, Penn State Press, 2000 http://books.google.com/books?id=UIvih1eNJ4sC&printsec=frontcover&hl=pt-
PT&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false
SERAGELDIN, Ismail, SHLUGER, Ephim, MARTIN-BROWN, Joan, Historic cities and sacred sites, Washington, World
Bank Publications, 2001 http://books.google.com/books?id=HU3d8sQH1JgC&printsec=frontcover&hl=pt-
PT&source=gbs_ge_summary_r&cad=0#v=onepage&q&f=false
Webigrafia
http://www.cm-guimaraes.pt/files/1/documentos/470419.pdf
http://www.persee.fr/web/revues/home/prescript/article/colan_0336-1500_2006_num_147_1_4582?
_Prescripts_Search_tabs1=standard&
http://www.apai.ch/articles/projet.pdf
http://www.nec.ro/fundatia/nec/publications/a_nec1998-1999.pdf
http://www.nitnet.com.br/~rodcury/dissertacao_rparaizo.pdf
http://www.literatura.us/borges/inmortal.html
http://www.oprurb.org/noticias.php?id=10&lg=pt
http://www.estacaoliberdade.com.br/releases/alegoria.htm
http://aeaerestaurateur.fr/IMG/pdf/F._Choay_allegorie_du_patrimoine.pdf