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Direitos Fundamentais – Blog

A Gênese da Katchanga: uma resposta a Lênio Streck

By George Marmelstein Lima


Recentemente, Lênio Streck escreveu um longo e interessante texto
(h p://www.leniostreck.com.br/site/2012/02/10/a-estoria-da-katchanga-real-por-lenio-streck/)
comentando meu post sobre a teoria da Katchanga
(h ps://direitosfundamentais.net/2008/09/18/alexy-a-brasileira-ou-a-teoria-da-katchanga/), que
publiquei aqui no blog em 2008. Seu propósito central foi informar que a anedota e a sua vinculação
com a dogmática jurídica foram obra de Luiz Alberto Warat, ainda nos anos 1980. Warat havia
desenvolvido a metáfora do “jogo da Cachangá” com um objetivo diferente daquele que usei no post.
A intenção original era criticar a dogmática jurídica pela sua capacidade de se adaptar às
circunstâncias, criando “coringas” (a Katchanga Real) para salvar as teorias em situações
problemáticas. Assim, a dogmática seria “um jogo de cartas marcadas. E quando alguém consegue
entender ‘as regras’, ela mesma, a própria dogmática, tem sempre um modo de superar os paradoxos
e decidir a ‘coisa’ ao seu modo…”. (A propósito, essa crítica lembra muito a chamada “tese Duhem-
Quine”, na sua versão popularizada, segundo a qual dificilmente um cientista abandona uma teoria
na qual investiu seu tempo e seu talento, além de ter depositado sua credibilidade perante seus pares.
A tendência, quando o cientista se depara com uma prova empírica que possa refutar a sua teoria, é
sempre reformular a proposta inicial, por meios de emendas “ad hoc”, mantendo o núcleo da
hipótese inalterado, de modo a permitir que ela seja reconciliada com os fatos observados). Assim, a
intenção original de Warat, ao formular a metáfora da Katchanga, era denunciar tanto essa
maleabilidade utilizada pelos juristas para salvar as aparências teóricas quanto a natureza
decisionista da própria dogmática.

Obviamente, não pretendo questionar a veracidade da referida estória, que me parece bastante
plausível e interessante, até porque nunca reivindiquei a autoria da anedota, nem da metáfora. Deixei
claro logo no início do post que ouvi a piada da boca de um juiz federal de Santa Catarina depois de
uma aula que dei sobre a teoria dos direitos fundamentais na Escola da Magistratura Federal da 4ª
Região. É provável que este juiz, por sua vez, tenha ouvido a piada do Warat ou do próprio Streck.
Portanto, para mim, é uma alegria conhecer melhor a origem mais remota da anedota que ajudei a
divulgar, ainda que, por ignorância da proposta original, eu tenha involuntariamente alterado a sua
vocação primitiva. (Apesar de essa alteração ter sido involuntária, considero que a metáfora no
sentido que explicitei é mais atual e mais divertida do que a proposta excessivamente acadêmico-
intelectual formulada por Warat – mas sou suspeito para fazer esse julgamento).

O que desejo discutir aqui e agora não é o pedigree da brincadeira, mas a alfinetada que Streck lança
contra os argumentos de fundo que defendi no post. Ele concorda que o jogo da Katchanga pode ser
adaptado como metáfora para criticar a “ponderação à brasileira” e o baixo déficit de qualidade da
argumentação jurídica adotada no Brasil, tal como sugeri. (Ressalto desde já que, até mesmo nesse
ponto, não reivindico nenhuma pretensão de originalidade, tanto que citei no texto as críticas de
Daniel Sarmento e de Virgílio Afonso da Silva no mesmo sentido. Aliás, já que o tema é originalidade,
vale ressaltar que uma crítica semelhante pode ser encontrada em uma obra do século XVI, quando
François Rabelais, no seu “Gargantua e Pantagruel”, invocou a figura do pitoresco Juiz Bridoye, cujo
método de decisão baseava-se em um jogo de dados. Trata-se, na verdade, de uma crítica milenar
presente não apenas em obras de autores “sérios”, como Stuart Mill, David Hume, Nie sche, Carl
Schmidt, Hans Kelsen, Hart, Jerome Frank etc., mas também em conversas de bastidores que
abundam no meio forense, bastando lembrar a comparação da cabeça do juiz com um órgão do
aparelho digestivo das crianças. Às vezes, a sabedoria dos botequins pode ser mais profunda do que
muitas teses de doutorado).

Apesar de concordar com a utilização da metáfora da Katchanga para criticar o “pan-principialismo


brasileiro”, Streck acredita que o post incorreu no mesmo erro denunciado por Warat na versão
original da anedota. Ou seja, ao recomendar que os juízes fossem mais cuidados com a utilização das
ferramentas dogmáticas desenvolvidas pela teoria da argumentação e pela teoria dos direitos
fundamentais, eu estaria apenas fazendo uma “Katchanga Real” para salvar a técnica da ponderação
que seria, irremediavelmente, decisionista. Segundo Streck, se eu fosse coerente, deveria criticar toda
a obra de Alexy e não apenas o uso distorcido que os juristas brasileiros fazem dela.

A crítica é apenas parcialmente procedente. Meu intuito ao escrever o post, obviamente, não era
desenvolver nenhuma teoria abrangente do método jurídico, nem mesmo apontar todas nuances da
teoria dos princípios. Tentei apenas denunciar um aspecto do problema, que é o mais visivelmente
equivocado: o uso dos princípios como placebos argumentativos. Querer extrair daquele singelo post
mais do que isto é procurar chifre em cabeça de cavalo.

Mas também já tive a oportunidade de desenvolver críticas mais profundas à ponderação como um
todo. Fiz isso, por exemplo, em um texto acadêmico intitulado “A Difícil Arte de Ponderar o
Imponderável”, que publiquei no ano passado durante o IX Congresso Internacional de Direito
Constitucional (EBEC). Naquela ocasião, após explicar a fórmula-peso de Alexy, assinalei, entre
várias outras coisas, o seguinte:
“Por mais engenhosa que seja essa formulação (que, na verdade, é muito mais simples do que
parece à primeira vista), ela não consegue atingir sua principal finalidade, que é demonstrar a
possível racionalidade da técnica da ponderação. Com ou sem a fórmula alexyana, a ponderação
continua com o mesmo grau de subjetividade de sempre. O mais complicado, dentro da atividade
ponderativa, é atribuição dos pesos que cada fator envolvido terá. A fórmula em nada ajuda
quanto a isso. Através dela, qualquer solução pode ser encontrada, bastando que o jurista
“manipule”, conforme seus interesses e ideologia, o peso de cada variável. Se o jurista for contra o
aborto, basta que ele atribua um valor bem elevado para a vida do feto e um valor irrisório para a
liberdade de escolha da mulher. E o inverso também é verdadeiro. Se o resultado não agradar,
eleva-se a pontuação dos critérios que o julgador considera que deva prevalecer até chegar à
solução de sua preferência (pode-se aqui invocar a máxima do humorista Groucho Marx: “those
are my principles, and if you don’t like them… well, I have others”). A fórmula, portanto, será como um
caderno de colorir que o jurista poderá preencher com as suas cores favoritas. Assim, o processo
decisório continuará tão arbitrário quanto antes, com a única diferença de ser escrito com uma
linguagem mais fria, impessoal e supostamente lógico-racional.

Um defensor de Alexy poderia argumentar que a fórmula parte do pressuposto de que o julgador
é sincero e não irá manipular o resultado. Mesmo assim, ainda restam algumas dúvidas: como
descobrir que os valores que fundamentam e orientam nossas escolhas e ações resultam de uma
racionalidade ética sincera ou, pelo contrário, decorrem dos nossos preconceitos e tradições nem
sempre compatíveis com a um padrão axiológico válido? Se até mesmo pessoas virtuosas e sábias,
como Aristóteles e Platão, por exemplo, foram capazes de defender atos que hoje reputamos
abomináveis, como a escravidão e o infanticídio, quem pode garantir que também os nossos juízos
morais não serão censurados pelas gerações que virão? Como podemos ter certeza de que as
nossas crenças morais sobre, por exemplo, o status ético dos animais ou dos estrangeiros ou sobre
o valor da vida humana ou sobre a sexualidade etc., decorre de uma profunda reflexão ética ou,
pelo contrário, de uma doutrinação cultural a que fomos submetidos desde a infância e não somos
capazes de enxergar suas fraquezas (ou não fazemos questão de enxergá-las)? Sabendo que temos
a tendência natural de dar mais valor àquilo que nos agrada, como não usar a fórmula como um
mero espelho de nossas próprias preferências ainda que inconscientemente? Como saber que
estamos levando mesmo em consideração, com a importância devida, os interesses daqueles que
seguem valores que não são compartilhados por nós, já que não estamos acostumados com o
pensamento divergente? Tendo consciência de que somos facilmente influenciados por teorias que
apelam para o nosso sentido moral e, infelizmente, não somos suficientemente críticos para
questioná-las, como podemos saber que o nosso raciocínio ético está mesmo nos levando à direção
correta?”

Apesar disso, mesmo reconhecendo todos os defeitos e riscos desta técnica, acredito que a
ponderação de valores é uma parte indissociável do ato de decidir. Toda decisão envolve uma
escolha, isso é óbvio. O decisor compara alternativas, argumentos, valores e critérios e tenta realizar
aproximações e afastamentos em relação a escolhas realizadas no passado para tentar obter a melhor
solução para o problema atual à luz das informações disponíveis. Em qualquer situação envolvendo
incerteza, é preciso ponderar. A questão não é saber se essa ponderação é boa ou ruim, se tem
vantagens ou desvantagens, pois não há como fugir dela. A ponderação é inevitável.

Até mesmo a opção de escolher ou não a técnica da ponderação já é, em si, uma ponderação. Um juiz
que faz a opção de seguir incondicionalmente o critério legal em todos os casos, ainda que isso possa
resultar em injustiças flagrantes, também está fazendo uma ponderação em que dá um peso maior ao
respeito à lei do que à busca da solução justa. É uma escolha comparativa entre duas alternativas
possíveis a ser solucionada com base em fatores que transcendem a mera legalidade, pois a lei não
tem o poder de obrigar o juiz a ser legalista, já que é a própria autoridade da lei que está em questão.
Sendo a ponderação inevitável, a dúvida é saber se o juízo de ponderação pode ser bem
fundamentado. Segundo Streck, a discricionariedade judicial sempre será decisionista e qualquer um
que critique o ato de katchangar também deveria criticar qualquer forma de liberdade decisória.
Discordo. A discricionariedade judicial, entendida como uma margem de manobra para o julgador,
não leva, necessariamente, a uma katchanga. É possível ter liberdade para decidir sem ser arbitrário,
desde que haja um compromisso deliberado em buscar uma solução conforme ao direito (leia-se: aos
princípios fundantes do direito) e um cuidado em apresentar razões convincentes que possam
justificar o julgado com base em parâmetros de validade aceitos pela comunidade. Obviamente, nesse
processo há sempre uma margem de subjetividade, que é inerente a qualquer juízo decisório. Mas
isso não significa dizer que essa escolha não possa ser principiologicamente guiada. (Sim, acho útil a
distinção entre regra e princípio, desde que entendida no sentido de critério-fundamento contido na
norma e não pela vaguidade semântica do texto). Adoto aqui o modelo metafórico segundo o qual os
princípios podem ser considerados como bússolas e as regras como mapas, tal como sugeriu Aroso
Linhares. Como bússolas, os princípios não podem ser usados como mapas. O erro prático dos
juristas brasileiros é tratar os princípios como se fossem capazes, por si só, de indicar o caminho exato
a ser seguido, tal como um mapa detalhado. Na verdade, os princípios não fornecem critérios para a
decisão, mas apenas os fundamentos da decisão. Para que a decisão seja principiologicamente guiada,
é preciso que o julgador assuma alguns compromissos prévios, indique quais são os valores que ele
pretende promover com a sua decisão e desenvolva uma argumentação convincente capaz de
demonstrar que a decisão adotada, de fato, promove aqueles valores, nunca perdendo de vista as
peculiaridades do caso decidendo. Dito de outro modo: os critérios fundamentados nos princípios
devem ser desenvolvidos pelo julgador a partir do problema jurídico concreto, não sendo suficiente
simplesmente invocar um princípio e concluir, a partir daí, que a decisão está fundamentada.

Sei que o tipo de saída que proponho acima é exatamente aquilo que Warat chamaria de “Katchanga
Real”. Mas é uma Katchanga Real que tenta se justificar, ainda que talvez não consiga em todas as
situações. Por isso, é uma Katchanga Real metodologicamente melhor do que outras Katchangas
Reais que, no fundo, apenas criam subterfúgios para mascarar o decisionismo e jogar o problema real
para debaixo do tapete ou então transferem os critérios decisórios para uma cômoda instância política
que não está encarando “face a face” as partes do conflito.

O ponto central da minha divergência com Lênio Streck é essencialmente metodológico (se bem que
eu precisaria conhecer melhor a obra dele para ter certeza disso. Baseio-me apenas em alguns artigos
e palestras dele que tive a oportunidade de assistir). Não acredito que o raciocínio jurídico deva ser
guiado por uma racionalidade hermenêutica, muito menos acredito que a hermenêutica seja capaz de
evitar as katchangas. Até os limites semânticos do texto são estabelecidos por interpretação de modo
que não estão livres de voluntarismos katchangueiros. Eu precisaria de mais espaço para aprofundar
minhas ideias e terei o maior prazer de apresentá-las se o debate frutificar. Apenas gostaria de deixar
consignado que me parece bastante irracional distinguir o correto do errado, o justo do injusto, o
lícito do ilícito com base apenas na interpretação de um punhado de palavras contidas em códigos
escritos por pessoas que nem sequer conhecemos e que, provavelmente, tinham menos informações,
já que não conheciam as peculiaridades do caso concreto a ser decidido. Também me parece um
desperdício de inteligência sacrificar a busca de uma solução justa para o problema específico para se
guiar por caminhos meramente semânticos de duvidosa validade axiológica. Do mesmo modo, não
me parece razoável eliminar toda a riqueza argumentativa que um debate amplo pode proporcionar
para fixar-se apenas em minúcias linguísticas, ainda que complementadas com uma salvadora
(Katchanga!) valorização do contexto. Por mais que se amplie o “horizonte hermenêutico”, aceitando
a influência de fatores extratextuais no processo interpretativo, ele nunca será suficientemente aberto
se continuar a focar meros textos como locus central da atividade decisória.

Um último ponto para concluir (que não deve ser lido como uma crítica a Lênio Streck, mas como um
esclarecimento acerca do meu estilo de escrita). Escrevi o post da Katchanga durante um vôo Floripa-
Fortaleza, sem nenhuma grande pretensão acadêmica. Quem conhece meus textos, sobretudo aqueles
g p q
escritos para o blog, sabe que não estou muito preocupado com o academicismo, pois encaro o blog
como um espaço de libertação intelectual (h ps://direitosfundamentais.net/2009/06/09/libertacao-
intelectual-contra-o-metodo-que-oprime/) muito mais estimulante, do ponto de vista criativo, do que
uma obra escrita em papel, com todas as conhecidas exigências metodológicas e estilísticas. Sou um
acadêmico por acidente e não por vocação. Fiz o doutorado não para conseguir um ticket de entrada
para a universidade, mas para ampliar meus horizontes e tentar encontrar respostas para algumas
dúvidas fundamentais que me incomodavam (e ainda me incomodam). Sou, antes de tudo, um juiz
que pensa os problemas práticos do direito sob um olhar crítico-reflexivo e tenta transmitir as idéias
do modo mais claro possível. Nas escassas horas vagas, sou blogueiro e, nessa qualidade, dirijo-me a
um público vastíssimo: o post da Katchanga já foi lido por mais de um milhão de pessoas
diretamente do meu site pessoal, sem contar as replicações e enlaces. Por isso, esforço-me para
respeitar esse público leitor. Não fico enchendo meus textos com expressões alemãs ou latinas, muito
menos fico citando filósofos obscuros para causar um efeito de deslumbramento. Não tenho
pretensão de ser reconhecido como um ser iluminado que está acima da humanidade e que é capaz
de insights únicos e originais, nem me sinto habilitado a romper paradigmas sem ser afetado pelos
modismos do momento. Nunca pretendi me legitimar pela erudição, nem fico procurando muletas
filosóficas para sustentar minhas opiniões (que provavelmente são mesmo capengas). E o post da
Katchanga é uma clara ilustração disso, tanto que foi inserido na série “Filosofia Barata do Direito”.
Seu grande mérito, a meu ver, não é a originalidade ou a profundidade dos argumentos
(confessadamente superficiais, como bem apontou Streck), mas a capacidade de transmitir em uma
linguagem compreensível para qualquer pessoa um problema jurídico complexo e sempre atual, que
é o déficit de argumentação causado pela incorporação torta da teoria dos princípios no meio forense
brasileiro. Se tenho orgulho de tê-lo escrito e faço questão de continuar divulgando depois de tanto
tempo, é para demonstrar que o pensamento jurídico não precisa ser necessariamente hermético,
como se os artigos doutrinários tivessem que ter uma placa de “propriedade privada” acessível
apenas para um punhado de iniciados. Acredito que a mensagem que todo ser pensante tem a
transmitir não precisa ser ornamentada com obscuridades desnecessárias. Foi o que tentei fazer
quando escrevi aquele post, a meu ver com sucesso. Afinal, até mesmo meu filho de 7 anos conseguiu
compreender bem a teoria da Katchanga. Certa feita, mandei-o desligar o computador e ir dormir.
Como é típico de qualquer criança, ele me perguntou: “Mas por quê, painho?”. Respondi que ele
deveria dormir porque eu estava mandando. De imediato, ele saiu-se com esta: “mas, painho, isto é
uma Katchanga!”. Só pude lhe dizer tentando controlar o riso: “é verdade, mas é uma Katchanga
Real! Já pra cama!”.

Escrito da minha casa, na Precabura, com um monte de crianças fazendo barulho e brincando ao meu
redor de um jogo desconhecido, cujas regras ainda não consegui entender. Em 11 de fevereiro de
2012.
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This entry was posted on Fevereiro 13, 2012 at 12:23 am and is filed under Filosofia do Direito. You
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89 Respostas to “A Gênese da Katchanga: uma resposta a


Lênio Streck”

Jonas Says:
Fevereiro 13, 2012 às 3:18 am
Parabéns pelo post, George. O texto do Lenio Streck é de uma arrogância e prepotência sem
precedentes. Com muita humildade você conseguiu demonstrar que as críticas dele são
totalmente improcedentes e impertinentes. O estilo de crítica ácida dele tem extrapolado a
cordialidade mínima entre debatentes educados. Típico de acadêmicos encastelados em suas
salas, limitados ao seus próprios mundos teóricos, que creêm que o outro é o errado, responsável
pela degradação ou estagnação da teoria do direito. E ainda dizem que ele é um dos mais cotados
a ministro do Supremo.

Evandro Says:
Fevereiro 13, 2012 às 3:29 am
Criticar a teoria de Alexy não implica necessariamente ter que abandonar a teoria dos princípios.
O que deve haver é um rigor metodológico.
A abertura que ocorreu com a Constituição de 1988 acarretou, de certo modo, um
deslumbramento com as possibilidades interpretativas que os princípios podem trazer, levando a
situações em que os interpretes eram seduzidos pela possibilidade de dar um sentido a norma que
fosse mais compatível com a sua consciência e uma vontade de garantir efetividade a Constituição
e justiça para o direito.

Essa possibilidade interpretativa, em virtude de vários fatores, passou a ser exercida sem que
houvesse necessariamente uma maior fundamentação, com uma ausência de clara fundamentação
por uma ou outra opção, o que com certeza é um problema. Mas não o maior.

O problema, ao meu ver, é a utilização indiscriminada dessa ferramenta que é a


proporcionalidade. Ela deveria ser utilizada nos momentos em que a legislação não fosse clara
sobre o sentido que deveria tomar o curso do processo e não a qualquer momento em que se
fizesse necessária uma decisão qualquer. Deveria ser uma válvula de escape para as decisões onde
a lei fosse omissa e que juízo de valor diferentes entrassem em conflito. Mas ao invés disso,
situações onde a legislação dá uma solução clara e constitucional ao caso estão sendo afastadas
por uma questão de ”razoabilidade” e ”proporcionalidade”. Essa situações não deveriam ocorrer
com uma frequência indiscriminada.

Não estou falando em submeter a lei a Constituição. De forma alguma. Sabe-se que a Constituição
é a norma suprema e ela deve ser respeitada, mas, não deve ser utilizada a vageza constitucional
em certas situações para afastar a aplicação da lei sem que haja uma violação clara da constituição
e que se for o caso de afastar a aplicação da lei, que o faça de forma muito bem fundamentada.

Esse é um tema muito interessante e com certeza pode e será discutido de forma saudável.

Só queria deixar registrado que sempre tive muita admiração pela forma didática e simples que o
senhor sempre escreveu, mas sem deixar a desejar em relação a profundidade dos temas. O
conhecimento jurídico não deve ficar na clausura de poucos privilegiados, mas deve ser acessível
a todos e escrito de uma forma que as pessoas possam realmente compreender o que está sendo
dito, só assim teremos uma sociedade democrática.

V. Says:
Fevereiro 13, 2012 às 5:28 am
Ser cotado para assumir do STF só demonstra que ainda existem pessoas que se deixam levar por
argumentos descontextualizados seguidos por um rótulo estrangeiro que pouca gente conhece. É
o famoso: “Não entendo o que você está falando, mas se você conhece toda essa literatura, deve
ser verdade”.
O que fez o George ter tanto sucesso neste blog e consequentemente em seu livro foi justamente a
humildade intelectual, não no sentido facilitar o entendimento aos operadores do direito – coisa
que o Streck odeia tanto -, mas da desnecessidade de rebuscar uma coisa que é possível entender
na simplicidade do dia-a-dia, até em meio a seus familiares.

Richard Says:
Fevereiro 13, 2012 às 11:15 am
Parabéns pela excelente e adequadíssima resposta, George.
A percepção do seu filho sintetiza e esclarece toda a discussão: o seu propósito foi alcançado e, de
fato, todos esperamos que o blog continue sendo um blog.
Não espero no blog um Tratado sobre a Teoria da Katchanga, em 80 volumes, com todas as visões
da doutrina mundial, especialmente o entendimento germânico etc. Penso que seus seguidores
também entendem assim.

Clarissa Says:
Fevereiro 13, 2012 às 2:43 pm
p
Não tenho dúvidas: blogs, twi ers, páginas no facebook, sites, textos de jornais constituem
espaços de caráter mais informal. Mas nem por isso desoneram quem para eles escrevem. Por
mais informal que seja um blog, ao fazer uma postagem, o professor continua sendo professor, o
advogado continua sendo advogado e o juiz continua sendo juiz. Ou seja: um blog não retira a
responsabilidade daquele escreve. É possível, sim, como fala George, que acadêmicos escrevam
textos sem pretensões acadêmicas. Mas acontece que um texto que fale sobre Alexy, ponderação,
decisão judicial e concretização de direitos jamais ficará imune à crítica acadêmica. Mesmo que lhe
falte rigor ou que seja feito com intuito de “libertação”, seu conteúdo possui evidente cunho
acadêmico. Quem escreve, assim, fica mais responsabilizado ainda, por contribuir na formação do
imaginário jurídico. Mesmo que, por trás do texto, esteja a estorinha da Katchanga. Um texto sem
pretensão acadêmica é narrativa, poesia, conto, roteiro de teatro etc. Nunca se ouviu dizer que
rigor acadêmico fosse pejorativo (ou alguém discorda disso?). E também nunca se ouviu falar que
conhecimento, erudição fosse defeito. Afinal, o que fizemos nas universidades? Para quê servem
as instituições de ensino? Por que compramos (e alguns escrevem) livros? Não entendo a crítica
que George e os comentaristas acima fazem a Lenio Streck. Assim como também não entendo
como se pode criticar um autor confessando que não leu a obra dele, como faz George. A partir de
que critério é feita esta crítica? Acredito que, em um contexto que proliferam milhares de teses
jurídicas, é mais do que necessário que haja um comprometimento teórico daqueles que escrevem.
Nem que para isso seja necessário escrever 80 volumes sobre a estória da Katchanga, porque o
direito brasileiro não pode fazer um pacto com a mediocridade (e com isso não quero dizer que o
texto de George seja medíocre, mas tão-somente que não podemos fomentar imaginários que
dispensem aprofundamentos teóricos). Abraços a todos.

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 3:30 pm
Clarissa, concordo com você de que o rigor acadêmico, a erudição etc. também possuem seus
méritos. O problema é que Streck desvalorizou o texto da katchanga por faltar esses elementos,
quando nunca foi minha intenção escrever um tratado sobre o tema. O que tentei demonstrar é
que um texto pode passar uma mensagem relevante sem precisar ser obscuro.
Quanto a minha crítica de fundo a Streck, afirmei que me baseei em artigos e palestras que
assisti. Aliás, quando o assisti em Coimbra, tive uma boa impressão geral de sua exposição,
tanto citei o evento aqui no blog: h ps://direitosfundamentais.net/2009/06/11/existe-doutrina-
juridica-no-brasil/
Não li seus livros principais, mas compreendi suas principais premissas metodológicas,
fundadas na Hermenêutica. Como tenho sofrido alguma influência da escola jusfilosófica de
Coimbra, acredito ter condições de conhecer e criticar a Hermenêutica, baseado na obra de
Castanheira Neves. Mas é óbvio que isso não significa nada, pois o importante é avaliar o
conteúdo da proposta dele, o que, de fato, não tenho condições de fazer agora, pois ainda não
li seus livros.

Julio Meirelles Says:


Fevereiro 13, 2012 às 5:11 pm
Desculpe, mas a crítica à escola hermenêutica que se alinha o Lenio Streck foi a boa
demonstração de uma crítica primária, como se fosse possível reduzir a hermenêutica
filosófica a um problema de compreensão de texto. Até porque tudo é texto, para extrapolar
uma boa frase do Millor Fernandes, de que a ideia de uma imagem vale mais do que mil
palavras, desde que fosse possível prescindir de palavras para comunicar o que a imagem
expressa, significa ou constitui.

E é justamente esse tipo de afirmação criteriosa que o Streck estava criticando, pois tudo
que dizemos tem significados alem dos desejados e imaginados. Daí que dizer que seu
texto tinha tal ou qual pretensão e não outra, lida e interpretada, sempre tem um que de
imprecisão.
p
Aceitar as críticas e responde-las com mais critério é uma boa forma de diminuir as
Katchangadas, inclusive as Reais.

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 10:03 pm
Júlio, foi precisamente por isso que falei que “precisaria de mais espaço para explicar
minhas idéias e terei o maior prazer de fazê-lo se o debate frutificar”.

Fabrício Andrade Says:


Fevereiro 13, 2012 às 2:53 pm
Marmelstein, bela discussão. Mas é difícil aguentar o Streck. Difícil mesmo é ler o texto dele –
truncado e cheio de “aspas” e (parênteses). O cara sequer citou o seu nome no texto dele.
Lamentável. A sua resposta é esclarecedora, sem deixar de dar uma belíssima alfinetada nele.
Você já tem 35 anos? Se não tem, faz esse ano, né? A minha campanha será George Marmelstein
lima para o STF!!!

Rafael Santos Says:


Fevereiro 13, 2012 às 4:05 pm
Discordo. A crítica inicialmente é feita em relação ao positivismo exegético: o desafiado acredita
poder responder à situação com uma resposta pronta, por antecipação. É o problema que ocorre
quando se tenta “acoplar” um texto, como fosse uma capa de sentido, dando respostas antes do
fato ocorrer. A “Catchanga real” representaria aí a imprevisibilidade dos fatos ocorridos na
sociedade, e que nunca podem ser respondidos por antecipação.

Não existem conflitos entre princípios, eles estão sempre presentes, não sendo apenas uma
ferramenta quando o texto não prevê um fato (ou quando o intérprete não concorda com o que
um texto diz). Textos não existe sem princípios. Discordar disso é assumir que os princípios só “se
apresentam” quando o texto não cobre a realidade (kelsen já afirmava em sua Teoria Pura do
Direito que, não havendo texto, o juiz decidiria de acordo com a sua vontade). A teoria da
argumentação não conseguiu superar o positivismo, só trocou a roupagem dele. O assim chamado
“conflito entre princípios” não passa de uma forma de justificar a arbitrariedade (altamente
prejudicial em uma democracia). Em suma, decidir levando em conta um princípio, como se ele
sozinho fosse uma norma, é o mesmo que gritar Catchanga Real. Basta ver como o princípio da
dignidade da pessoa humana é utilizado para justificar toda sorte de decisões sem o mínimo de
fundamentação. O problema é não saber a diferença entre texto, princípio e norma. Não é certo
desmerecer anos de luta pela democracia para deixar um juiz decidir conforme sua “ponderação”.
A teoria de Alexy é falha por creditar a decisão à vontade do juiz, da mesma forma que Kelsen.
Como se pode perceber, o positivismo se adapta e segue vivo e forte como nunca…

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 10:19 pm
Rafael,

perfeita a sua colocação: “decidir levando em conta um princípio, como se ele sozinho fosse
uma norma, é o mesmo que gritar Catchanga Real”.

É exatamente o que penso: “os critérios fundamentados nos princípios devem ser
desenvolvidos pelo julgador a partir do problema jurídico concreto, não sendo suficiente
simplesmente invocar um princípio e concluir, a partir daí, que a decisão está fundamentada”.

Kelsen creditava a decisão ao juiz, mas lhe dava uma liberdade decisória quase sem limites. A
integração dos princípios no sistema normativo teve justamente a função de diminuir a
discricionariedade judicial, impondo uma exigência de conformidade aos princípios como
parte integrante da atividade jurídica.
p g j
Há pelo menos duas conseqüências benéficas em se reconhecer a juridicidade dos princípios,
uma psicológica e outra epistemológica. Psicologicamente, ao se atribuir aos princípios um
status jurídico, os juristas passam a se sentir obrigados a levá-los em conta, além de gerar, na
população, uma sensação de que os juízes, quando julgam com base nos princípios, não estão
criando algo novo, mas agindo conforme o direito. A vantagem epistemológica é dirigida à
comunidade dos juristas. Se os princípios são partes integrantes da realização prática do
direito, então nenhum estudo jurídico sério pode deixar de levar em conta essa realidade.

celsinhobarros Says:
Fevereiro 13, 2012 às 4:50 pm
Se todo juiz sentenciasse adequadamente, fato que não ocorre, tendo em vista, as qualidades das
sentenças nos “mutirões”, e as sentenças normais, ao meu ver uma vergonha para o judiciário e
para os juízes que nem lêem sentenças, apenas assinam o que foi feito sem qualidade.
Daria a razão a vc se o mundo real fosse o seu, porém, acredito que o Lenio Streck fez bem
alfinetando vc, que, logicamente, defendeu o teu reduto, sinais de corporativismo talvez, mas, é
certo que faz muito tempo que se espera um JUDICIÁRIO LIMPO E CORRETO, longe das
sentenças politizadas, e muito tempo continuaremos esperando por isso. UMA PENA PARA A
DEMOCRACIA. Até mesmo Heidegger ou Ernildo Stein tenham influenciado bastante Lênio
Streck, no sentido da resposta adequada. Mas uma coisa é certa, um juiz decidir conforme a sua
consciência é algo estranho num meio cada vez mais político que jurídico. UM GRANDE
PARADOXO. Mas com a devida venia, fico com o pensamento do Lênio Streck.
UNTERMASSBERBOT ou UBERMASSVERBOT?

celsinhobarros Says:
Fevereiro 13, 2012 às 5:00 pm
UNTERMASSAVERBOT, corrigindo
B e V um ao lado no teclado!!

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 5:57 pm
Celsinho,
a minha visão é totalmente anticorporativista nessa seara, pois sou um crítico ferrenho das
práticas institucionais-argumentativas dos nossos tribunais. Aliás, o objetivo do texto da
katchanga foi justamente denunciar isso.
Se você quiser, posso mandar um texto sobre a “juristocracia verde e amarela”, onde não
demonstro nenhum romantismo acerca das virtudes do poder judiciário brasileiro.
A minha crítica é precisamente esta: mesmo que sigam uma metodologia hermenêutica
(centrada em textos), os juízes continuarão fazendo katchangadas. A única forma de
minimizar isso é tornar os fundamentos e motivos dos juízos decisórios mais transparentes
e não os camuflandos com encenações interpertativas.
Por isso, considero o jurisprudencialismo de Castanheira Neves uma proposta muito mais
promissora do que a hermenêutica. Mas este não é o espaço para aprofundar isto.

celsinhobarros Says:
Fevereiro 13, 2012 às 6:44 pm
quase la´…risos…UNTERMASSVERBOT…ufa

Anónimo Says:
Fevereiro 13, 2012 às 5:31 pm
Por que ler Streck se na livraria há Gadamer e Habermas? Por que ler juristas que falam de
filosofia, se tenho filósofos falando de filosofia? Mais uma pergunta: o que o Wara trouxe de
novo para o Direito? Apenas um bom professor, PONTO FINAL! Miguel Reale é outro… vai falar
que a teoria tridimensional é obra do gênio dele?
Voltando:

Ler livros de Filosofia escrito por JURISTAS é como:

…pedir pizza numa churrascaria que fica ao lado de uma pizzaria…

Há quem conteste isso, afirmando que:

um jurista tem mais conhecimento sobre o DIREITO… Portanto, pode falar mais sobre Filosofia…
Isso é falso!

A Filosofia é mais complexa que o Direito. Portanto, melhor ler um livro de Filósofo cujo objeto
seja o Direito do que o contrário.
O Direito é uma ciência mais fácil, pois está baseada em códigos simples, como o “se e entao”. A
dificuldade no estudo da matéria está em buscar normas que se completam a partir de outras…
Daí ter Bobbio ter gastado pena com estudo sobre ordenamento jurídico e forma de solução de
conflitos…

Ora, isso é irrelevante para a solução do problema da ponderação de princípios… Basta que o
filósofo tenha consciência de que o princípio não é uma norma jurídica baseada no codigo “se e
entao”… não é um mapa, e sim uma bússola, como afirmado no texto. Todo o conhecimento
restante para resolver o enigma (PODERES DO JUIZ e sua relação com a SEPARAÇÃO DOS
PODERES) PERTENCE À FILOSOFIA OU À CIÊNCIA POLÍTICA… E são, diga-se de passagem,
o mais complexo na solução do problema….

O Direito está em crise, como afirmou Castanheira Neves… A sociedade complexa é uma
sociedade de riscos… A norma jurídica trabalha com previsibilidade, já que, antes de cominar
uma sanção, prescreve um ato contrário ao Direito que pertence ao mundo do ser…. Ora, sem
previsibilidade, NÃO HÁ COMO FAZER NORMAS, mas princípios…. Não roteiros para solução
dos conflitos, mas balizas…

Por isso o estudo dos valores estã tão em voga… e também as técnicas de argumentação…. temas
que são objetos de estudo da FILOSOFIA….Indaga-se: quem melhor pra detectar um discurso
falso que um filósofo de carteirinha? quem melhor para explicar sobre técnica de argumentação
que um filósofo? O mesmo vale par a sociologia: quem melhor pra falar de habermas do que o
próprio Habermas? É simples: cada macaco no seu galho… É lição de botequim: pedreiro que faz
tudo não presta!

A Filosofia parece muito séria pra SER ENSINADA POR QUEM ESTUDA FILÓSOFOS DE A A Z
em manuais de bolso….
Lá como no Direito há um método, há uma ciência que não pode ser desprezada… Ainda mais
quando um livro de um FILÓSOFO DE VERDADE É DE GRAÇA, JÁ caiu no domínio público, e
de um jurista-filósofo custa 100, 200 reais…

Fica a dica,
Um abraço a todos,
confiram meu blog: trambicagem.blogspot.com…
joão paulo

Anónimo Says:
Fevereiro 13, 2012 às 6:50 pm
Anómino, no que se baseia para dizer que “a filosofia é mais complexa que o direito”, para
além de sua dúplice ignorância: em direito e em filosofia?!
Rafael Says:
Fevereiro 13, 2012 às 6:43 pm
Interessante… mas, permaneço inquieto: é possível afirmar algo complexo através de palavras
simples? Vamos então fazer uma ode à simplificação. No modo como estamos posicionando o
debate aqui me parece que vale o argumento que, de forma mais simples, conseguir abarcar um
fenômeno complexo. Mas há questões intrigantes: citar Aroso Linhares é válido quando se
pretende construir um argumento simples? Isso é certamente curioso, já que este mesmo Aroso
Linhares possui uma obra sobre teoria narrativa da prova que margeia as milhares de páginas;
cada uma dessas milhares de páginas possui notas de rodapé mastodônticas recheadas de citações
desses filósofos “herméticos” que compõem a tradição filosófica predominante na Europa
continental.
Mas, então, é para ser simples? Ser simples é sinônimo de ser mais ajustado ao fenômeno que se
pretende abordar?
Não sei… se isso é algo próprio da “blogesfera”, está aí mais um motivo para, a rigor,
permanecermos vigilantes ao tipo de informação que se produz nesses espaços virtuais. Afinal,
com maiores ou menores formalidades, através deles também circula a informação. Daí, me
pergunto: quem escreve nesses espaços tem uma espécie de salvo conduto para produzir
informações que sejam equívocas ou mal-compostas (que não reconstruam toda a cadeia
histórico-conceitual da qual derivam) desde que sejam simples?
Realmente, me parece simples afirmações tais quais: “decisão é um ato de escolha”, ou que a
“ponderação é um ato de escolha”. Todavia, não consigo deixar de perguntar (talvez por um vício
academicista): será que é mesmo? Qual tipo de reconstrução histórico-conceitual autoriza tal
afirmação? Será que isso seja mesmo possível, dizer que decidir significa escolher? Se a resposta
for positiva, então, já que as palavras podem ser afrouxadas pelo intérprete sem que isso cause
maiores problemas teóricos, vamos logo sugerir que, ao invés de decisão judicial, sejam escritas
teses e teorias sobre a escolha judicial. Às vezes as afirmações simples acarretam grandes
problemas.
Se a decisão deve comportar uma dimensão de ajuste e justificação; se esse ajuste passa por
construção de argumentos próprios ao “sistema jurídico” e essa justificação se projeta a partir da
moralidade da comunidade política (como descreve Dworkin, jusfilósofo citado pelo blogueiro
George em outras oportunidades), como é possível entender a decisão judicial como um ato de
escolha? O julgador pode escolher o que? Qual o melhor ajuste com relação ao “sistema”? Qual é a
moralidade da comunidade política? Quais são os valores subjacentes ao direito em disputa?
Dworkin diz que quem interpreta o direito tem o dever de apresentá-lo em sua melhor luz,
segundo a moralidade da comunidade política. Ou seja, seu argumento deve ser construído de
forma responsável, a partir de uma leitura moral do direito (que pressupõe uma tese,
absolutamente complexa, que é a tese da unidade do valor). Me parece que tal construção não é
um ato de “escolha soberana” do interprete. Há um dever aqui de apresentar o argumento
jurídico num contexto bem determinado e avaliações que dependem de uma justificação
interssubjetiva. Diante disso, me pergunto: a tese de Dworkin é arrogante, pedante, hermética etc.,
porque se baseia em conceitos complexos como esse, por exemplo, da unidade do valor? Enfim, é
absolutamente complicado aceitar um argumento – por mais simples e bom que ele seja – que
apresente a decisão como um ato de escolha. Interessante é que Streck oferece esse argumento –
de que decidir não é sinônimo de escolher – em várias de suas obras.
Vê-se, portanto, que é um tanto complicado certo tipo de crítica genérica que não se preocupa em
realizar um confronto pormenorizado com a obra do autor criticado. Talvez isso explique também
a discórdia de George para com a “racionalidade hermenêutica” que, no modo como ele dá
indícios de articular, não representa aquilo que Streck desenvolve em termos de uma “teoria
hermenêutica do direito”. Na verdade, quando se afirma que o direito sempre está envolvido com
um problema interpretativo, já se está a tocar no problema de uma “racionalidade hermenêutica”
(sem embargo dos problemas que o termo “racionalidade” aqui pode gerar).
Enfim, um argumento não é bom porque é simples; ele é bom porque se ajusta melhor ao
fenômeno que pretende descrever. Parece-me que, neste sentido, o texto de Lenio apresenta de
maneira mais adequada o âmbito no qual a Katchanga ou o “Cachangá” waratiano pode ser
articulado: o ambiente da dogmática jurídica. A ponderação, neste caso, é um capítulo dessa
dogmática. É sabido que ela se alinha – como afirma o próprio Alexy – nos trilhos do método
analítico construído pela Jurisprudência dos Conceitos e esta, por sua vez, se atrela à tradição que
Karl Larenz chama de “ciência dogmática do direito”. Sou um acadêmico. Também não me agrada
o uso aleatório dos conceitos jurídicos. Muito menos me interessa qualquer tipo de simplificação.
Lenio tem carradas de razão: as palavras têm valor… E, como dizia o velho e bom Ernildo Stein
(será que estou citando um autor hermético demais?!), “não é possível dizer a mesma coisa com
outras palavras”.

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 7:58 pm
Rafael,
a questão não é desvalorizar o erudito, mas valorizar o simples. O que Streck considerou como
defeito do post (a simplicidade ou superficialidade), eu considero a sua principal qualidade,
sobretudo porque foi dirigido a um publico não-acadêmico. Isso não é obstáculo para
aprofundar a abordagem, impondo uma linguagem mais rigorosa e mobilizando o maior
número de autores que trouxeram contribuições ao tema. Aliás, minha tese de doutorado já
deve ter mais de quinhentas notas de rodapé, algo que jamais faria num texto escrito para o
blog.
Quanto ao Aroso Linhaires, invoquei-o por ele ser o autor da metáfora “bússola-mapa”, que
me parece bastante ilustrativa (e simples!) da distinção entre princípios e regras. Sei mais do
que ninguém da dificuldade que é compreender seus textos, pois ele é meu orientador. Porém,
na sua imensa humildade intelectual, ele foi enfático ao sugerir que eu mantivesse o meu estilo
de linguagem, o que, de certo modo, viola a tradição de Coimbra.
Com relação à hermenêutica, tenho plena noção dos avanços dessa perpectiva filosófica depois
de Gadamer. Apesar disso, não consigo achar razoável transformar a atividade judicial em um
exercício exclusivamente hermenêutico, ainda que a hermenêutica, inegavelmente, faça parte
da atividade judicial.
Se você quiser, posso enviar o capítulo da minha tese de doutorado em que explico melhor o
meu pensamento. Mais já adianto que segue, em linhas gerais, algumas premissas
metodológicas de Dworkin e de Castanheira Neves.
George

Santiago Artur Says:


Fevereiro 13, 2012 às 7:02 pm
Os inteligentes argumentos manejados pelo prof. Georges, em parte, reconhecem as colocações
acerca do sentido da Katchanga, em relação à Teoria da Argumentação, de Robert Alexy, feitas
pelo Prof. Streck. Discorro, assim, sobre a parte remanescente. Refere, o magistrado, que “a
questão não é saber se a ponderação é boa ou ruim, se tem vantagens ou desvantagens, pois não
há como fugir dela. A ponderação é inevitável.” Essa visão acerca da inexorabilidade da
ponderação como metodologia da decisão revela um aprisionamento do pensamento no
paradigma da filosofia da consciência, ignorando os avanços realizados pela filosofia da
linguagem.
Isso porque a (suposta) opção de “escolher” algo em detrimento de algo diz que o magistrado
pretende fazer (ou na verdade, como se tem visto, efetivamente faz) um manejo acerca do sentido
das coisas, para que elas signifiquem aquilo que ele discursivamente quer que elas signifiquem.
Um “achismo” fundamental subjaz neste procedimento, permitindo que A seja compreendido
como B, porque assim se ponderou. Mas A nunca será B. Nem mesmo se convencionarmos isso!
Esse nível (apofântico) ignora a sedimentação que linguagem da tradição opera. O que o
magistrado fez, foi “ler o topo do sentido”, sem revolver o chão que esconde as verdadeiras
nuanças da questão, fatos que envidam a tese contra a própria Teoria da Argumentação em si, e
não contra a simples ausência de argumentação adequada.
Desta forma, verifica-se que a subjetividade não pode assumir foros de discricionariedade. Referir,
por exemplo, que “(…) o juiz que faz a opção de seguir incondicionalmente o critério legal em
todos os casos, ainda que isso possa resultar em injustiças flagrantes, também está fazendo uma
ponderação (…)” soa problemático. Primeiramente, é possível deixar de adotar padrões legais?
Sabe-se que sim, mas a questão é: qual contexto autoriza isso? Veja-se que o mandamento
constitucional não autoriza uma “opção”, um “escolher”, absolutamente subjetivo. Como costuma
dizer o Prof. Streck: “entre o que eu penso e o que a Constituição aponta, devemos ficar com a
Constituição!” Se a estória (da “Katchanga”) surgiu para problematizar o objetivismo, no Brasil
Alexy significou lançar-se ao subjetivismo. De um extremo ao outro. Sem escalas!
Se é verdade que os sentidos nos antecedem, em um nível de pré-compreensão, para alinhar-nos
ao ensinamento gadameriano, então não se faz uma “opção”. Seja lá o que o for decidido depois,
isso está impregnado de pré-juízos. O problema hermenêutico está aí: é preciso investigar os pré-
juízos, para separar o autêntico e o inautêntico. É preciso ter a ciência de que somos reféns deste
acontecimento anterior. Não há como recortar a vivência humana no mundo, quiçá da história. A
ponderação ignora essa fase anterior, e faz parecer que o que se coloca no mundo é fruto de uma
opção. Decidir é muito mais que escolher.
Logo, a “Katchanga Real” de Warat, realmente abarca o que o magistrado referiu como
“argumentação convincente”. Pois essa busca de uma “metodologia melhor” revela que ele ainda
acredita na Katchanga Real como meio de fundamentação da decisão. Não nos parece convincente
acreditar na Katchanga Real como meio de fundamentação, mesmo que ela “engane a torcida”.
Veja-se que acreditar na Katchanga revela um problema de nível secundário, pois a
fundamentação da decisão baseada em ponderação sempre será irrelevante. Mesmo que se decida
adequadamente, ou conforme a Constituição, se fará por acidente (Dworkin). A Katchanga, do
magistrado, neste ponto, é irrelevante, pois o caminho hermenêutico não foi percorrido. O que
precisa ficar claro é que a Katchanga Real é o metaproblema, por assim dizer, o “pulo do gato” do
dogmatismo.
O professor Lenio refere-se exatamente a isso quando fala em “darwinismo dogmático”. É como
se o sistema desenvolve-se, hic ex nunc, uma solução para quando a crítica lhe atinge o coração. O
croupier não é tão estúpido, pois. Nesta quadra da história, quando o cerimonial fúnebre do juiz
“bouche de la loi” encerrou-se, o juiz dos princípios-como-mandados-de-otimização assume o
trono da teoria da decisão.
Por fim, e da mesma forma que encerrou seu percuciente contributo, parece importante dizer que
não se criticou (ao menos não nos soou desta forma) seu estilo, sua linguagem, seus trejeitos, sua
“libertação intelectual”. Acontece que o direito não pode ser um jogo de Katchanga, pois é
ricamente complexo e não pertence a ninguém, isoladamente. A hermenêutica prega uma
interpretação correta do jogo, e não a dominação das regras por A, B ou C. Ela não pertence a
“acadêmicos encastelados”, nem ao Supremo Tribunal Federal (mesmo que suas decisões sejam
“erga omnes” ou “ex tunc”), muito menos a qualquer professor-juiz-promotor, em grupos ou
isoladamente. O direito é um fenômeno muito sério para ser levado na brincadeira. E dessa forma
tem que ser encarado: ou mantemos o pacto de mediocridade, ou lançamo-nos no combate ao
reducionismo. Apesar dos “ous”, à toda evidência, não há opção.

Fausto Says:
Fevereiro 13, 2012 às 7:03 pm
Como fazer Ciência no Direito? Grande parte das tentativas acabam se conformando à velha
divisão entre razão prática e teórica. Às questões teóricas, temos métodos que definem o conhecer.
Com base nos métodos, existe, ainda hoje, a crença de que a subsunção é o método capaz de
garantir a correta aplicação do Direito. O problema é: quando a subsunção não for possível? Alexy
chega a afirmar que a subsunção é algo singelo, devendo a Ciência do Direito se preocupar com
questões mais complexas. Como por exemplo, a colisão entre princípios. A ponderação. Essa
colisão se verifica quando a “letra da lei/Constituição” for indeterminada. A linguagem surge,
também, como grande problema. Nesses casos, parece que a razão prática é convocada à colação.
Ao meu ver, Streck se preocupa com duas questões principais que também me preocupam,
rebatidas por George Marmeistein Lima: o método e os valores. A filosofia hermenêutica se coloca
contra o método. Método, produto da tendência científica moderna, tem como consequência
esconder a participação do sujeito no conhecer. Gadamer, por todos, denuncia essa questão.
Quando se diz, por exemplo, que a ponderação de valores serve a resolução dos casos difíceis,
esconde-se o fato de que o intérprete participa dessa decisão. A segunda questão é: decidir não é
escolher. A razão prática também pode ser “controlada”. Prática e teoria estão juntas. Quer dizer,
é possível teorizar sobre a prática, ou melhor, o conhecer teórico tem sua raiz prática. Decidir,
para o Direito, deve estar além de valorar. Está em se comprometer. Parece-me que a metáfora do
romance em cadeia presta, aqui, os seus serviços. Não é possível que o intérprete valore e esqueça
a tradição. Quer-se, atualmente, efetividade dos Direitos Fundamentais. Parece-me que tal
efetividade deve estar condicionada a direitos intangíveis. Não tem como contornar o intangível,
nem ponderá-lo. Por isso, quando se fala em valorar, não se pode colocar de lado aquilo que o
possibilita. Entendo que Direito não se trata de escolhas por valores. Mas compromisso.
Vinculação. Intersubjetividade. Nesse sentido, a produção teórica, representada pela dogmática
jurídica, não pode se conformar que a resolução dos problemas jurídicos esteja restrita às escolhas
de valores individuais. Deve requerer que o intérprete decida e não valore. Especulo que a
catchanga real serve de metáfora para valorações individuais. As normas do jogo, contudo, não
podem ser deixadas de lado. Isso porque, o jogo deixaria de ser “catchanga” se aquele que tivesse
o poder pudesse valorar, por suas convicções individuais, elegendo aquilo que ele acredita ser o
melhor para si. Tenho medo de catchanga’s, principalmente, quando elas representam
posicionamentos ad hoc, descomprometidos com a intersubjetividade. Uma vez, meu pai me
disse: “Meu filho, não prometa aquilo que não pode cumprir!”. Perguntei: “Por que pai?”. Poderia
ele ter dito: “Por que eu estou dizendo! Catchanga Real!!”. Mas ele disse: “Sempre que fizer uma
promessa, as pessoas esperarão que você irá cumprí-la”. Não foi necessário o recurso à catchanga
para que eu soubesse da importância de cumprir o prometido. Daquela forma, acredito, fui
inserido na comunidade. Conheci uma norma que representava o melhor possível de uma prática.
Por fim, acho que vale a pena discutir sobre o “juízo de valor”, principalmente, quando o
interlocutor tem conhecimento de causa’s. O que não concordo é valorar por valorar. Creio,
portanto, ser necessário o engajamento teórico na decisão, reclame este, necessário quando as
valorações conhecidas denunciam prevalência de preferencias pessoais daqueles investidos no
poder. Nesse sentido, parece que valorar não é o mesmo que decidir.

Anónimo Says:
Fevereiro 13, 2012 às 7:21 pm
Caro Marmelstein,
Em primeiro lugar, parabenizo-o pelo blog. Chamou-me atenção pelo fato de eu ter utilizado a
metáfora da “Kathanga” em minha tese de doutoramento, fazendo referência ao seu blog,
inclusive. Mas, já deixando de lado a questão da “autoria”, até porque em nenhum momento a
avocou, gostaria de tocar no pano de fundo desta questão. Seja por algumas reflexões suas, seja
por algumas coisas que li nos “comentários”.
1) Sabemos que um blog, de fato, não é um local para reflexões “academicistas”, mas como bem
disse alguém “aí acima”, não podemos acreditar que um conhecimento despretensioso supere as
possibilidades do saber acadêmico. Se eventualmente o superar sem os rigores da academia, a
aplicação dos modelos acadêmicos a este mesmo pensamento faria com que ele fosse ainda mais
além. Creio que concorde com isso, já que sua resposta chama a atenção para a não percepção da
“intenção do texto” e não para uma suposta “superioridade” do texto. Todavia, pelo que percebi
nas críticas a Lenio, muito mais em razão daquelas presentes nos comentários, não tem sido essa a
tônica do debate. Uma “filosofia no direito” é densa, complexa. Deixemos Lenio de lado e
pensemos em Castanheira Neves, muito bem lembrado por você. Ou então o também citado
Aroso Linhares: já tentou ler a tese de doutorado dele? Teses de doutorado não podem ser feitas
em blogs, embora essa ferramenta tenha o seu espaço e a sua importância. Mas, jamais substituirá
o saber acadêmico. Tudo o que foi dito neste debate dependeu da academia, inclusive as suas
ponderações.
2) Um outro ponto que me chamou atenção é o fato de que, embora muitos aqui tenham
defendido a leveza e o descompromisso do blog – características com as quais eu concordo – todos
querem debater questões acadêmicas (sic!). Queremos falar de Teoria do Direito, de sua
perspectiva estrutural (regra, princípio), de questões metodológicas (ponderação,
impossibilidades da hermenêutica filosófica, etc), da inautenticidade das leituras sobre Alexy…
Essas questões não podem ser discutidas sem compromisso acadêmico. Para tanto, a leveza do
blog tem que sair de cena e “demandar” um debate mais profundo e orientado
paradigmaticamente. O que não vejo como algo coerente é, de um lado, ser possível criticar
compreensões que exigem acordos de base extremamente complexos e obtidos “no” saber
acadêmico (como, por exemplo, a diferença entre Lenio e Gadamer, entre Hermenêutica Filosófica
e Hermenêutica Jurídica de Cariz Filosófico, etc) e, ao mesmo tempo, defender-se das críticas sob
a proteção da superficialidade desse tipo de relato. E acho, sinceramente, que você reúne todas as
condições para transitar nesse “jogo de linguagem”.
3) Já adentrando no mérito (acadêmico, grife-se), gostaria de comentar a questão relacionada à
inexorabilidade da criação judicial. Aqueles que acreditam em respostas corretas, como Lenio e
Dworkin, são minoria. Inúmeros autores e modelos teóricos sérios defendem, no mínimo, uma
zona de discricionariedade. E eles estão corretos se pensados dentro de seus próprios paradigmas.
Seria, por exemplo, muito mais “interessante” para Alexy que ele defendesse a existência de
respostas corretas, mas ele foi coerente ao negá-las. Portanto, defender zonas de
discricionariedade para juízes – principalmente sendo juiz (rs) – não é nenhum absurdo, ao
contrário. Até mesmo autores adeptos a uma hermenêutica filosófica negam essa possibilidade.
Todavia, há um abismo – que só debates acadêmicos poderão suplantar – entre a ausência de
respostas corretas nos modelos discursivos e a visão, muitas vezes ingênua, daquilo que é
defendido por Lenio a partir da Hermenêutica Filosófica. Já ouvi, por exemplo, se dizer que as
respostas corretas defendidas por Lenio não são possíveis porque há “diversas interpretações para
um texto normativo”. Ora bolas… é claro que há milhares, milhões. É claro que as respostas são
ponderadas desde Aristóteles; é claro que há criatividade hermenêutica nos juízes e em qualquer
ato de compreensão humana. Distinguir essas constatações (da própria hermenêutica) da ideia de
uma “resposta correta” só foi possível na proposta de Lenio em razão de duas aproximações:
primeiro, uma releitura de Gadamer a partir de uma visão de linguagem que não está explícita em
Verdade e método e que exige uma religação entre a fenomenologia de Heidegger e a
Hermenêutica Filosófica de Gadamer, intentos guiados pelo pensamento de Ernildo Stein. Em
segundo lugar, a utilização desse modelo teórico como filtro da ideia de integridade e coerência de
Dworkin. A metáfora da resposta correta não se contrapõe à criatividade, mas a subjetivismos
como sinônimos de arbítrio e impossibilidade de referências ontológicas.
Saudações,
Wálber Araujo Carneiro

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 10:32 pm
Wálber,
perfeitas suas colocações 1 e 2. Mas o item 3 parece ser uma contradição performativa
(hehehehe).

George

Anónimo Says:
Fevereiro 14, 2012 às 10:10 pm
George,
g
Essa aparente contradição performativa já é enfrentada pela Hermenêutica desde Ser e
tempo! Veja como esses dois trechos de minha tese de doutorado não parecem ser uma
resposta pronta para sua pergunta:

I – Mas, se a nossa compreensão estará sempre condicionada às nossas pré-compreensões,


mesmo quando nos colocamos vigilantes na constante revisão do projeto
antecipado, como seria possível falar em “cientificidade”? Não seria mais coerente falarmos
em subjetividade e arbítrio? Definitivamente, não. Aqui encontramos um dos grandes
“nós” do correto entendimento da matriz hermenêutica e que, muitas vezes, leva críticos
apressados
a condená-la ao rol das visões subjetivistas. Não podemos esquecer que Heidegger, embora
tenha o sujeito como imprescindível, não mais o reconhece como o sujeito solipsista da
modernidade. E Gadamer estará atento a esse fato quando afirma que não é a história que
nos pertence, mas nós que pertencemos a ela. Desse modo, a “auto-reflexão do indivíduo
não passa de uma luz tênue na corrente cerrada da vida histórica. Por isso, os preconceitos
de um indivíduo, muito mais do que seus juízos, constituem a realidade histórica do seu
ser (Gadamer)”.

II – Devido ao fato de o acontecer da verdade se dar na diferença ontológica e, portanto,


não ser “objetivo”, poderíamos crer que esse acontecer seria “subjetivo” e, portanto,
arbitrário. Mas, não podemos esquecer que o paradigma heideggeriano aposta em uma
terceira possibilidade. De fato, o que acontece não é o ente objetivamente, embora seja ele
quem está sendo
desvelado em seu ser. Mas também não é um sentido subjetivo que implique a
arbitrariedade do intérprete e que coloque a compreensão à “disposição” do sujeito. O que
acontece é um ser que não nos pertence, na medida em que somos nós quem pertecemos a
ele. Esse ser acontece
como hermenêutico, em um projeto que não dominamos e que se antecipa independente
das nossas possibilidades, o que nos permite concluir que todo acontecer antecipado é,
necessariamente, um acontecer verdadeiro. Mas, como jamais será um acontecer da
totalidade, implicará, também, no velamento, isto é, na não-verdade.
“Toda verdade é relativa ao ser da presença na medida em que seu modo de ser possui
essencialmente o caráter de pre-sença. Será que essa relatividade significa que toda verdade
é “subjetiva”? Caso se interprete “subjetivo” como o que “está no arbítrio do sujeito,
certamente não. (Heidegger)”
O fato de o acontecer do ser na compreensão depender do sujeito não torna a compreensão
“subjetiva” no sentido de “arbitrária”.

Nós não ignoramos esse “risco”. Mas, essa aposta paradigmática só pode ser compreendida
se inserida no giro copernicano promovido por Heidegger. Isso é condição de possibilidade
para entender a diferença entre subjetividade e arbítrio, ou entre criatividade do juiz e a
ausência de respostas corretas.

Sds, Wálber

FABRÍCIO FOGAÇA Says:


Fevereiro 13, 2012 às 8:18 pm
Antes de mais nada, necessário sentar bases sólidas para o debate. Veja que, não deve ser outro o
objetivo que não (re)criar uma teoria do direito à altura da Democracia moderna, à altura do que
deve ser o Estado Democrático de Direito.
Tendo isso como norte estratégico, está o voluntarismo, o solipsismo no rol de nossas
possibilidades? Não, não está. E, em que pese grande parte do “universo” jurídico brasileiro ainda
apostar na discricionariedade, temos de (re)pensar o Direito, e aí me parece que há o único ponto
de convergência entre Streck e Marmelstein.

Porém, cada um deles procura uma resposta diferente e nisso não há equívoco. O equívoco
começa quando procuramos – de maneira análoga exatamente como citado por Marmelstein no
texto acima – respostas diversas, contraditórias e incongruentes apenas para justificar
determinada atitude e ou ação, mesmo que possivelmente em um outro plano. Assim – ainda que
não reivindique Alexy – continuamos a fazer da dogmática o espelho que nos reflete, pois é isso
que faz a dogmática afinal. É como um giro que vai, volta, faz, concebe e cria, mas num quadro
ínfimo, onde a maior curva à esquerda continua sendo muito à direita.

Para não me estender, o que procuro dizer (ainda no campo teórico) é que não devemos explicar a
dogmática com argumentos dogmáticos. Abrir o leque é necessário, e reivindicar os grandes é
preciso, isso sempre com um olhar crítico, ou então voltaríamos a dar curvas na mesma quadra
Marmelstein.

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 10:38 pm
Acho que é por aí mesmo, Fabrício. Apenas gostaria de dizer que não sou seguidor de Alexy.
Tento ser indepedente (pensar com minha própria cabeça), mas se há uma influência que tem
me servido de “referencial teórico” é o jurisprudencialismo de Castanheira Neves, que tem
muitos pontos em comum com o pensamento de Ronald Dworkin. (Apesar disso, confesso que
sou mais “antilegislação” do que os dois, embora também não seja “projurisdição ’tout court'”.
Sigo mais a linha do “Independente Futebol Clube”).

Anónimo Says:
Fevereiro 13, 2012 às 8:24 pm
Dêem uma olhada no que o Iluminado Streck escreveu no post “existe doutrina jurídica no
brasil?”:

Clarissa Diz:
Julho 10, 2011 ás 1:05 pm | Comentar
Prezado George,

Aqui quem lhe escreve é a Clarissa. Pesquiso e estudo com o Prof. Lenio Streck na Unisinos. Tive
contato com o teu blog e comentei com com ele toda a polêmica gerada a partir da frase que vc
menciona. Então, ele pediu para que eu postasse o comentário abaixo.

Clarissa: na condição de coordenadora da equipe do DASEIN – Núcleo de Estudos


Hermenêuticos, peço-te que postes um pequeno comentario no blog do Prof. Dr. George
Malmenstein, porque fiquei incomodado por alguns comentários que os seguidores daquele blog
fizeram a um artigo de autoria dele (Prof. George), que, por não contextualizar melhor o meu
comentario feito em Coimbra, pode ter provocado equívocos na interpretação:

Vamos esclarecer alguns fatos. O caro Dr. George Malmenstein, de fato, encontrou-me em
Coimbra, onde proferi conferência. Ou seja, essa conferencia existiu. Lá disse, em bom tom, que “a
doutrina, no Brasil, já não doutrina mais”. O papel da doutrina é doutrinar. Não disse que não
havia doutrina no Brasil. Meu objetivo, em longa conferência sobre ativismo e discricionariedade
judicial, foi o de mostrar o grau de atrelamento da doutrina – a mais utilizada – àquilo que dizem
os Tribunais. Disse também que, mesmo alguns juristas conhecidos como críticos, não têm a
coragem de fazer críticas às decisões dos Tribunais. Para mim, o papel da doutrina é o de
provocar “constrangimentos epistemológicos”, isto é, forçar, a partir disso, uma cultura em que
p g p g p q
esteja presente uma verdadeira accoutability hermenêutica. Isso tenho escrito em inúmeros textos
(cito apenas o meus livros Verdade e Consenso, agora em sua 4a. edição pela Saraiva; o
Hermenêutica Jurídica e(m) Crise, já em sua 10a. edição; O que é isto – decido conforme minha
consciência?; Jurisdição Constitucional e Hermenêutica – Uma Nova Critica do Direito; o livro
Verdade e Consenso já está traduzido para o espanhol; além de vários textos vertidos para o
inglês, castelhano e alemão). Estão todos à disposição. Além disso, sou um dos doutrinadores
mais citados nas dissertações e teses de doutorado no Brasil, circunstância que pode ser atestada
pelos mecanismos próprios. Por tudo isso, sempre é necessário contextualizar o que é dito. Falo
isso porque alguns comentários acostados ao texto escrito pelo Dr. George (e por ele não
contestados) são patéticos e entristecedores. Jovens com carreira ainda por fazer alçando-se ao
patamar de fazer críticas – em meia dúzia de linhas (algo tipo twi er) – a quem possui um dos 6
maiores curriculuns de terrae brasilis. Desculpe, Dr. George, pelo desabafo. Mas quem faz um
Blog fica responsável, inclusive, pelos comentários e pelas ofensas nele referidos a minha pessoa.
Saludos, Lenio Streck.

EU HEIN…

Lucas Says:
Fevereiro 13, 2012 às 8:58 pm
Primeiro: Não é possível dizer – e quem o faz é tolo ou cego – que não gostamos de Cancún, se
para lá nunca fomos. Sequer uma criança diz que não gosta de palmito se não chegou a prová-lo.
A menos que – no caso da criança – nossos pais, irmãos, amigos, também não gostem de palmito,
pois aí seríamos influenciados diretamente pela experiência de outros. Nesse ponto, está o
primeiro erro de Marmelstein. Como podemos excelência, como o senhor pode?

Segundo: Não há de ser subterfúgio suficiente, o fato de se tratar de um blog. Os novos veículos
de comunicação trouxeram uma possibilidade incrível, nunca antes imaginada: o acesso e o
alcance – quase – infinito. Mas trouxe também aberrações! Produziu – e isso está inserido não só
na dogmática mas principalmente na crise do ensino jurídico brasileiro – juízes, promotores,
professores, etc uma verdadeira cabanha do imediatismo e do próprio reducionismo.

Terceiro: Ser coerente conosco e com a tradição teórica a que nos filiamos é ser conseqüente com o
próprio Direito. Acordar num dia com a bandeira do Che e noutro com o terno de Bush irá nos
levar a demência. Em termos menores, o texto de Marmelstein faria até o alemão de Oldenburg
ficar em delírio por ter sido invocado.

Quarto e mais importante:


A tartaruga, vez que outra, quando está assutada, põe a cabeça pra dentro do casco. Ali, ela não
enxerga e não sente nada e passa como que a não se mexer. Fica ali, à espera, na defesa. Até que
uma hora se sente confiante o suficiente para tirar a cabeça pra fora e dar uma olhada em volta.
Depois, ela trava uma batalha hercúlea: ela precisa se virar, e veja que trágico: a tartaruga
consegue se virar mas aí a sua visão até piora, ela só enxerga o chão. E o que é pior, ela anda
devagar, devagar,…

Assim como uma tartaruga, muitos são os que travam uma batalha digna de Hércules para ao fim,
avançar muito pouco. Sinale-se que aqui não estou a invocar uma expécie de neonazismo,
acreditando que uns não são capazes por natureza. Não. O que acontece é que muitos são presos
pela tartaruga, e a tartaruga acaba por se transformar neles. E aí acontece a tragédia final: não
sabemos que estamos na tartaruga, continuamos a condená-la, a propor alternativas para ela. Mas
aí é tarde, nós e a tartaruga estamos tão juntos, que nos complementamos.

Precisamos romper em definitivo com esse casco, ou levaremos a democria brasileira à ruína.
Achar que não somos responsáveis é subestimar a nós mesmos.
Essa tartaruga tem sobrenome: dogma.

George Marmelstein Says:


Fevereiro 13, 2012 às 10:53 pm
Lucas,
o primeiro ponto é de convergência: não critiquei a obra de Lênio Streck diretamente, até
porque deixei bastante claro que não a li, exceto alguns artigos. Critiquei a perspectiva
hermenêutica, pelo menos a mais estreita. Vale ressaltar que Streck também me chamou de
incoerente sem ler toda a minha obra, especialmente a minha produção mais recente que ainda
não foi publicada (hehehe).
Segundo, não acho que os blogs sejam responsáveis pela péssima qualidade do ensino jurídico
no Brasil. Talvez as obras mais herméticas consigam afastar ainda mais o interesse dos alunos
pelos problemas práticos que nos afetam. Mas prefiro não firmar posicionamento aqui, pois
não creio que deva haver uma disputa por espaço entre a internet e a academia. Cada qual tem
seu papel.
Quarto, não creio que sou incoerente por defender a inevitabilidade da ponderação, defender a
teoria da argumentação de Alexy e, ao mesmo tempo, criticar a sua fórmula-peso. Tenho que
concordar com tudo que ele escreve? É isso?
Quinto, também é de convergência: sou totalmente antidogmático, inclusive contra o dogma
de que a lei é um dogma.

Johnny Alves Says:


Junho 6, 2012 às 3:09 pm
Eu concordo plenamente com a segunda e quarta colocação.
Uai?! Os outros são indecorosos e o George é o culpado?
Nos outros pontos não vou nem meter…
1 abraço a todos.

Anónimo Says:
Fevereiro 13, 2012 às 9:37 pm
6 maiores currículos na terra brasilis? País que ficou além da centésima colocação no ranking
mundial de universidades?

Lênio não estudou em Harvard, tampouco dá aula lá… pelo que eu saiba ele leciona na
UNISINOS ( quem estuda lá, o papai noel?)

Já tive o desprazer de ver algo desse autor. Seguem os comentários:

1)jurisdição constitucional: não é manual, porque peca ao tratar sobre assuntos essencias da lei
sobre adin e adecon, tampouco é doutrina de peso….o Gilmar poe ele no chinelo…

2)hermeneutica juridica em crise:


Sobre a parte filosófica da hermenêutica, parece que o autor cai na cilada dos sociólogos da elite…
tão criticados por Nicklas Luhman… APONTAM UM PROBLEMA, MAS não sabem o que fazer
com ele…
No caso dos sociólogos… FALAM de uma tal sociedade de risco… mas não apontam critérios
para solução… o que não acontece com a teoria dos sistemas de Luhman, que busca teorizar
solução, Jah o Streck fala da tal virada gadameriana … e dai? ficamos com Kelsen e reconhecemos
arbitrio na interpretacao ou reconhemos a liberdade semantica e ficamos aquem da teoria
proposta por Kelsen?

3)o programa na tv justiça… o autor tenta lincar direito com literatura…


isso não tem nada de original… é pra lá de comum nos Estados Unidos… mas o que me
incomodou foi o seguinte…

por que ler tolstoi?

Porque sim… ele é indispensável….

Ficou parecendo que ler TOLSTOI tem a mesma serventia da leitura da Biblia para os JURISTAS:

CITAR numa peça processual, indicando erudição….

Por que o TERCIO é tão menos famoso que Ele? Por que NÃO HÁ NO BRASIL LIVRO
TRADUZIDOS DE NICKLAS LUHMAN, o maior sociólogo do mundo?

Pesquisa no Brasil não merece crédito…

Vejam essa tese de doutorado defendida na USP, sob a orientação de Ministro do Supremo
Tribunal Federal… Vejam se não parece uma redação de graduação ou um manualeco desses
quaisquer:
Teve até publicação por editora>>> o autor querer mostrar a influencia do executivo no
parlamento… isso o BORYS CASOY fala no Jornal da Band… Lembrando dele, é bom que se diga:
isso é uma vergonha!

h p://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2134/tde-30042010-083530/pt-br.php

Anónimo Says:
Fevereiro 13, 2012 às 9:46 pm
post anterior
joão paulo (trambicagem.blogspot.com)

Thiago Neves Says:


Fevereiro 13, 2012 às 9:49 pm
Olá.

Acredito que o tema abordado no texto do Dr. George Marmelstein merece ser discutido, embora
eu não concorde que a ponderação entre princípios seja necessária. A pergunta é: existe texto sem
princípio? Existe norma sem texto?

Mudando de assunto…

Pelo que eu já li nos trabalhos do Dr. Streck, duvido muito que a anedota tenha sido utilizada no
mesmo sentido que na postagem deste blog. Creio que ele esteja no seu direito de “corrigir” o
sentido da metáfora, até para que quem a utilize não dê um tiro no próprio pé, afinal, não
podemos mais ter decisões sem fundamentação, “a lá katchanga real” em nosso país.

Abraço a todos!

Marcelo Mo a Says:
Fevereiro 13, 2012 às 10:07 pm
Da próxima vez que algum juiz decidir contrariamente aos interesses de meus clientes, vou gritar
katchanga! Torcendo pra que ele não grite katchanga real, ou pior, princípio da
proporcionalidade!

Emanuel de Melo Says:


Fevereiro 14, 2012 às 1:38 am
Tenho sonho de um dia fazer doutorado e publicar livros com alguma relevância acadêmica para
o Direito. No entanto, se o preço disso for me tornar uma pessoa pedante, a qual, ao se deparar
com críticas vai logo citando seu curriculo, numa clara atitude anti acadêmica e falaciosa, porque
não rebate a crítica com argumento, eu desisto.

Anónimo Says:
Junho 8, 2012 às 7:30 pm
Meu amigo, sou Procurador da Administração Indireta e estou hoje lotado em uma
Universidade. Quando contrariamos algum professor a primeira coisa que jogam na nossa cara
é: “Eu sou doutor”. Não importa em que seja o doutorado.
O que parece é que as pessoas de maior grau de instrução são as mais arrogantes, infelizmente.
Portanto, não me surpreende a menção ao currículo do Pós-doutor.

Anónimo Says:
Fevereiro 14, 2012 às 3:56 am
A DISCUSSAO ENTRE STRECK e GEORGE tem resposta lah em KELSEN…

regras e principios: uma leitura atenta de kelsen desautoriza considerar principios normas
juridicas… jah que os principios nao sao reduziveis a uma proposicao do tipo “se… entao”…

Alexy tenta transformar principios em regras COM BASE NESSAS PREMISSAS


KATCHANGADAS…

se os juizes usam os principios em suas decisoes, eh porque os principios tambem devem ser
normas…
Se um principio nao pode ser escolhido em detrimento de outro com base em arbitrio…. eh
PORQUE UM PRINCIPIO DETERMINA A SI MESMO SUA APLICACAO NA MAIOR
EXTENSAO POSSIVEL… eis o mandado de otimizacao….

Transformar principios em normas IMPLICA NAO DISCUTIR SUA APLICACAO PELOS


JUIZES… se os principios sao normas… aos juizes cabem aplica-las… A KATCHANGA, NESSE
CASO, EH UTILIZADA PARA AFASTAR DISCUSSAO SOBRE O PRINCIPIO DA SEPARACAO
DOS PODERES….

O “principio da proporcionalidade” eh alcado COMO CRITERIO UNICO PARA RESOLVER


CONFLITO ENTRE PRINCIPIOS… O CRITERIO EH RACIONAL…. mas, como afirmado pelo
pro Alexy, eh arbitrario jah na escolha do principio prevalecente ( 1 fase da aplicacao da
proporcionalidade)

O que eh katchaga em ALEXY SEGUNDO KELSEN:

1) O FATO de os juizes utilizarem os principios em suas decisoes nao autorizada considera-los


NORMAS JURIDICAS… Os juizes utilizam varios argumentos em suas decisoes que escapam do
juridico… HA PALAVRAS QUE SAO VAGAS… que sao encontradas em outros ramos do
conhecimento… Outras estao no sentido vulgar…o qual deve ser preferido pelo interprete, como
determina o manual legal de redacao das leis (lc 95)

2)O fato de um principio nao poder ser escolhido em detrimento do outro… nao IMPLICA QUE
AMBOS DEVEM SER APLICADOS EM SUA MAXIMA EXTENSAO…. O

FATO DE O JUIZ nao poder desprezar simplesmente um principio por outro EH MERA
SUBSUNCAO A REGRA QUE DETERMINA SER AS DECISOES JUDICIAIS
FUNDAMENTADAS…
A DISCUSSAO ENTRE GEORGE E STRECK… NAO SERIA STRECK TAMBEM UM
KATCHANGADOR?

George acusa a doutrina de usar O ALEXY A BRASILEIRA…. esquecendo-se de que ALEXY JAH
EH UMA KATCHANGA….

Por isso George teria distorcido a estoria… CRIOU UMA KATCHANGA CONTRA UM
KATCHANGADOR. o JOGO SOH FAZ SENTIDO CONTRA QUEM nao conhece a katchanga…
ALEXY JAMAIS ENTRARIA NUMA FRIA DESSAS….

Alem disso, a estoria soh faz sentido no ambito da TEORIA, jamais no ambito de aplicacao do
direito…. afinal, se a norma oferece mais de uma solucao, o aplicador TEM TODA A
LIBERDADE… nao precisa utilizar katchanga nenhuma… (George se recusa a TIRAR FORA A
APLICACAO DO DIREITO DA TEORIA DO DIREITO, como sistematicamente fez Kelsen e segue
Streck)

A LIBERDADE DO JUDICIAL em CASO DE NORMA COM DUPLO SENTIDO ou ausencia de


normas para a solucao do caso

Essa eh a REALIDADE CONTRA A QUAL TEM havido KATCHANGADAS DE TODO O TIPO…


ora incluindo discursos praticos no ambito da teoria do direito, ora PARINDO VALORES QUE
VINCULARIAM DETERMINADA DECISAO JUDICIAL!

E o tal consenso? NAO SERIA UMA KATCHANGA? Nao para mascarar o fato de que nao ha
verdade, o que eh pressuposto da proprio tese de Streck, mas para FORCAR A IDEIA DE QUE AS
DECISOES NAO SAO ARBITRARIAS…

FICO COM KELSEN… TUDO QUE NEGAR O ARBITRIO QUANDO HA MAIS DE UMA
POSSIBILIDADE NORMATIVA… todo jurista que avance AO SINAO DE APONTAR
SIMPLESMENTE AS SOLUCOES DE APLICACAO DO DIREITO FRENTE A UM VAZIO
NORMATIVO ESTAH KATCHANGANDO!!!

Joao Paulo,
asssistindo o Big Brother Brasil, prova do nao, em Brasilia-df, sem galinhada!

paulo Says:
Fevereiro 14, 2012 às 2:59 pm
O Lênio não precisava ter escrevido de forma tão ácida, como já foi dito. Peguei alguns trechos,
que podem ser vistos:
– “outro dia tomei conhecimento que um importante professor de um Curso de alcance nacional
recomendou vivamente a leitura da estorinha – pretendem deduzir os efeitos da “Katchanga” à
circunstância da “ponderação à brasileira”.”
– “A versão da Katchanga que circula por aí é impertinente (no sentido de que não pertine)”
– “Mas, no caso da estorinha contada na Internet e que, de certo modo, “fez fama”,”.

Acredito que, por conta disso, o George foi provocado a dar uma resposta, que deu. Não houve
outra opção.

Por outro lado, vejo o lado positivo de toda essa discussão: serviu para deixar o tema ainda mais
famoso, hehe, e transparente também. O que é muito bom.

at

Ricardo K. Says:
Fevereiro 14, 2012 às 3:25 pm
p
A crítica do Streck parece ter sido direcionada ao fato de que o problema reside na ponderação
lato sensu, não somente á prática jurídica brasileira. Parece que a metáfora não bate com a
ideia exposta pelo George. De qualquer forma,é sempre importante levantar esse tema da
ponderação e como ela é um pretexto para arbitrariedades.

Renan Says:
Fevereiro 14, 2012 às 4:29 pm
eu acho que nao obstante a discussão o lenio manja mais que o George. Querendo ou não, ele tem
mais bagagem intelectual e no direito isso é sim importante.
Abs

Renan

João Paulo Says:


Fevereiro 14, 2012 às 4:32 pm
George,

A teoria de Carl Schimidt também é katchanga: a tal unidade política como critério de decisão no
vazio normativo está baseada numa idéia falsa de homogeneidade da nação.

Aliás, Hitller teria se apropriado da idéia de unidade política, de Carl Schimidt, para ascender ao
poder na Alemanha…

Veja o perigo de povoar o vazio normativo com ideologias vazias, com “decisionismos”, tais como
UNIDADE POLÍTICA DA NAÇÃO OU, EM TEMPOS MAIS RECENTES, com uma certa
concepção de ética universal (by George Marmelstein)

O engraçado é que os JURISTAS alçaram OS PRINCÍPIOS, SÍMBOLO DO VAZIO, à condição de


artífices do NEOCONSTITUCIONALISMO. Expressão, aliás, muiito criticada por Manoel Ferreira
Filho… em seu duro ataque ao jurista da modinha… de sobrenome BARROSO… ele é carioca…
esqueci o nome completo dele…

Daí o endeusamento de Kelsen para os que realmente leram sua obra: KELSEN JÁ PREVENIA OS
JURISTAS CONTRA KATCHANGADAS na teoria do Direito… Alexy, consciente disso, utiliza
Kelsen como aliado… basta ver o tal mandado de otimização… a transformação do princípio em
norma jurídica…trata-se da katchanga para trazer os princípios para a Teoria do Direito…

O George caiu nessa direitinho. Basta ver a sua obra, direitos fundamentais, em que o autor gasta
60 páginas demonstrando que princípios são normas jurídicas, mostrando que caiu numa
katchanga…

Viva Kelsen!

Roberto Bolanos Says:


Fevereiro 14, 2012 às 4:35 pm
O corte epistemologico de Kelsen é uma prevenção contra katchangas….

Quem não entender isso não entendeu a crítica de Streck!

O George não entendeu…

Mauricio Ramires Says:


Fevereiro 14, 2012 às 5:12 pm
Caro George,
Do que posso depreender do teu blog, temos muito em comum, eu e tu. Somos ambos juízes,
temos aproximadamente a mesma idade e cursamos o doutorado em Portugal (eu, em Lisboa).
Até acho que estivemos na mesma palestra do Lenio em Coimbra. Mais que isso, parece que
também partilhamos uma visão não-corporativista e não-romântica (como dizes) a respeito da
atividade jurisdicional atual no Brasil.
Mas não é para dizer de nossas semelhanças que te escrevo, e sim de nossas discordâncias. Em tua
resposta ao Lenio, tu dizes que a ponderação é “inevitável”, porque na própria “opção” do
intérprete entre usar ou não a técnica da ponderação (ou qualquer outra, como “seguir
incondicionalmente o critério legal”) já há uma ponderação.
Já discuti isso várias vezes com colegas, amigos e alunos, e esta parece ser uma boa oportunidade
para fazê-lo de novo. Um dos argumentos esgrimidos contra qualquer concepção não-relativista e
não-discricionária da teoria da decisão é a suposta existência desse “momento original” em que
nós juízes “escolhemos” qual a “chave” com que vamos “ler” o mundo e o direito. Trocando em
miúdos, neste “momento” – como decorrência de nossa independência judicial em um mundo
pluralista –, tu poderias optar por ser um “alexyano” e eu por ser um “dworkiano” (assim como
um juiz “opta” por ser “alternativo” ou “conservador”, “garantista” ou “linha-dura” etc.), e todas
as nossas “escolhas” posteriores estariam condicionadas por esta primeira definição fundamental.
No meu ver, George, este “momento” é puro cartesianismo. Ou seja, é uma auto-colocação
artificial do sujeito em uma posição de dúvida completa, um “grau zero de sentido”, em que ele
toma consciência de seu “pensar” desde o seu princípio, e tudo o mais decorre daí, inclusive a
cognição dos objetos por esse sujeito cognoscente. Quem pensa assim não escapa de admitir um
“espaço da subjetividade” no ato de decidir (como o fazes expressamente), porque esse espaço
está na estrutura do seu pensamento.
Não que seja ilícito ser cartesiano: o pensamento filosófico da modernidade é uma tradição séria
etc.. Mas não é “inevitável” reconhecer a existência dessa “escolha” primordial. Há na filosofia um
rompimento radical com essa subjetividade, que é a viragem linguístico-ontológica. A reviravolta,
como preconizada por Heidegger, inverte (ou desvira) a artificialidade da atitude em que o sujeito
se “descola” do mundo e encara a dúvida primordial. Esse momento fundante da subjetividade
não existe porque estamos desde sempre jogados no mundo; não perguntamos por que
compreendemos, porque já compreendemos. A importância dessa virada é tanta que muitos
dizem ser uma verdadeira revolução copernicana no pensamento ocidental. Assim, a diferença
entre a nossa maneira de pensar e a sua é uma diferença de estrutura de pensamento (ou de
paradigma), da qual a divergência da discricionariedade etc. não é mais do que uma franja.
Sei que o espaço para discutir o esquema sujeito-objeto e sua refutação não é o comentário de um
blog. Meu ponto, na verdade, é outro. Estou na academia há tempo suficiente para saber que há,
sim, pedantismo e arrogância intelectual entre acadêmicos, e também muita impostura no uso de
jargões ilegíveis e “paralelepípedos verbais” que só servem para impressionar e não fazem sentido
algum (a propósito, sempre recomendo o livro “Imposturas Intelectuais”, de Alan Sokal e Jean
Bricmont, que trata precisamente disso).
Agora, tem uma coisa. Não há maneira simples e pedestre de se explicar algo como a filosofia que
vai em questões como as que estamos tratando. A melhor forma de ilustrar o Heidegger foi feita
pelo próprio, em exemplos como o da cátedra e o do giz (em que ele expõe a inautenticidade da
atitude do sujeito que contempla a cátedra ou o giz como objetos). Não tem versão em quadrinhos
para isso; “Ser e Tempo” não tem adaptação em filme. “Viragem linguístico-ontológica” é algo que
eu não posso expressar senão recorrendo ao jargão filosófico, mesmo correndo o risco de que
alguém por aqui vá me achar também pedante.
Como eu dizia, eu também rejeito a “pompa balofa” nos discursos acadêmicos e também busco a
coloquialidade. E minha principal inspiração nisso é… Lenio Streck. Tu assististe a palestras dele e
sabes que ele não tem nada do formalismo bacharelesco e professoral de nossos conferencistas
habituais. Ao contrário, o estilo do Lenio é mais próximo do tom satírico e informal de um Paulo
Francis ou (por que não?) de um Bernard Shaw do que da retórica adornada de um Rui Barbosa
ou de um Conselheiro Acácio. Mas as referências tidas por eruditas são necessárias. Estamos
discutindo coisa séria e temos uma tradição para respeitar e com a qual devemos dialogar. E,
nesse sentido, Lenio escreve para iniciados. Termos em alemão ou em qualquer língua estrangeira
são corriqueiros no meio em que transitamos e denotam o pensamento de quem tem intimidade
com os textos originais e sabe que eles nem sempre podem ser traduzidos a contento, ou, ainda,
que as expressões traduzidas podem esconder um sentido importante e que deve ser expresso
(como a ideia de que a “Abwägung” de Alexy já constava dos escritos de Heck mais de meio
século antes).
Lenio Streck tem uma obra de décadas, que tem o seu ápice no “Verdade e Consenso”. No texto
aqui em causa, ele nos remete diversas vezes ao livro que, por sua vez, traz em suas citações a
herança da tradição em que ele se insere. Tudo isso NÃO é vaidade, e é mesmo imprescindível.
Fui orientando do Lenio, sou ainda seu interlocutor menor nas questões acadêmicas e sei bem do
que falo. Mas acredito que não preciso provar o que digo, porque os livros estão aí para quem
quiser ver por si.
Enfim, George, o que quero te dizer (e acredita que o faço “sine ira et studio”, porque percebo tua
boa-fé e tua incomodação sincera com a dogmática jurídica brasileira) é o seguinte: não dá para
querer discutir algo como a teoria da decisão e, ao ser confrontado com os argumentos e com as
referências à estrutura do pensamento necessária para compreendê-los, sair gritando
“Pedantismo!”, “Obscuridade!”, “Academicismo!”. Isso é, na minha opinião, uma espécie de
populismo, que, à moda chavista, deixa de lado o assunto em discussão (i.e, o debate
institucionalizado e mediado pela tradição) e apela a uma ligação direta com o “povo” ou, no
caso, o “público leitor”. Como efeito colateral necessário, essa atitude acaba atiçando o “bas-fond”
aqui da Internet, ao incentivar que gente – que claramente nem sabe do que se trata – saia
atacando pessoas e instituições que produzem, a muito custo, debate jurídico sério neste país.
Há mais para ser dito (sempre há, não é?), mas me despeço porque já me alongo demais. De resto,
parabéns pelo blog, uma vez que obter um milhão de acessos para um só post e atrair este tipo de
discussão não é pouca coisa.
Com sincero respeito,
Maurício Ramires

Danilo Freirea Says:


Fevereiro 16, 2012 às 5:26 am
Ocorre que o Lenio FOI pedante. E tanto o Heidegger quanto o Gadamer SÃO obscuros.
Talvez enunciar isso tenha um efeito populista, é possível, mas são verdades, ora.

O fato de, entre outras coisas, não citar o George diretamente, referir-se a ele com um irônico
“juris-nauta” em tom condescendente e não linkar o texto, não demonstra isso?

Faltou a ele o que te sobrou: sincero respeito.

Po Says:
Julho 1, 2012 às 3:48 am
Obscuros? Obscuro é Hegel, Heidegger é um louco, isso sim. Os caras inventam palavras
para explicar o que não entendem. Não é à toa que abominam a dita “filosofia continental”
em qualquer lugar que não seja Alemanha, França e Brasil.

João Paulo Says:


Fevereiro 14, 2012 às 5:45 pm
Maurício Ramires,

vou dar o seu currículo aqui para o pessoal, caso não se importe:
um artigo publicado de sua autoria em 2011. E a publicação foi na revista da Ajuris, de valor
imprestável à comunidade acadêmica internacional.
Quanta produção academica!

vou dar uma informação a respeito da UNISINOS, onde leciona o notável professor Lênio:

“A Unisinos é a terceira melhor Faculdade de Direito do Brasil, país que está além da centésima
posição no ranking mundial ”

aos fatos:

Lênio Streck foi pedante e grosseiro. Primeiro ao nao citar o nome do George em relação à crítica,
como se o professor não merecesse citação. Segundo ao afirmar que está com saudade do tempo
que lia ROSS embaixo do sol. Schopenhauer, em “a arte de escrever”, já pressagia o futuro de
Lênio: quem muito lê, pouco será lido… quando lemos, não pensamos; apenas repetimos o que já
foi pensado…

Pergunto ao respeitoso Ramires: o que há em Lênio que não seja cópia de algum jurista anterior? o
que há de novo em Lênio? Não há uma super valorização de Gadamer para a Ciência Jurídica?

Esse seu “há mais para ser dito” pareceu esconder o fato de que não sabe mais para ser dito…

Sou antimachadiano e shoperaniano,


escrevo sempre na ordem direta, indentificando o interlocutor,
João Paulo.

Roberto Bolanos Says:


Fevereiro 14, 2012 às 5:49 pm
Informação errrada: a UNISINOS é realmente a terceira melhor Faculdade de Direito do Brasil…
mas é a terceira melhor da rede privada…

grato,
bolanos

George Marmelstein Says:


Fevereiro 14, 2012 às 6:13 pm
Maurício,

não creio que eu tenha gritado “pedantismo”, “academicismo”, “obscuridade” para fugir do
debate. O que tento demonstrar é precisamente o contrário: foge do debate aquele que diz que um
texto escrito numa linguagem simples e sem pompas acadêmicas não pode ser levado a sério.
Impressiona-me essa nossa capacidade de não valorizar o conhecimento escrito numa linguagem
simples. Parece que só merece crédito um texto que tenha citações alemãs e latinas. É justamente
isso que critico. Não pretendi desvalorizar o conhecimento acadêmico, mas valorizar o
conhecimento não-acadêmico.
E critico essa nossa mania de só valorizar o complicado porque conheço o debate filosófico anglo-
saxão e vejo como a clareza da linguagem fomenta – ao invés de empobrecer – o debate. Qualquer
pessoa – seja ou não filósofo, seja ou não jurista – consegue acompanhar o debate Hart-Dworkin,
ou Dworkin-Posner, ou Posner-Nussbaum, Rawls-Sen, poque esses pensadores se esforçam para
serem claros. Não é à toa que a filosofia do direito contemporânea avançou muito mais nos países
“não-continentais”.
Quanto ao mérito da discussão, minha visão é muito pragmática (não no sentido filosófico):
encaro os juristas como solucionadores de problemas reais. Estamos a toda hora desenvolvendo
soluções para casos concretos que merecem de nós a melhor resposta. Como devemos solucionar
esses problemas é uma questão de método (ainda que não exclusivamente de método). É aqui que,
a meu ver, distancio-me de Streck (baseando-me apenas naquele texto em que ele discorre sobre
as hipóteses que os juízes podem deixar de cumprir uma lei). Por isso, disse que a minha
divergência é essencialmente metodológica.
De qualquer modo, assim que conseguir um tempinho vou tentar ler os livros principais de
Streck. Estou na fase final da tese, mas o debate me animou a conhecer melhor a sua obra por
inteiro.

Gostaria apenas de dizer que não foi minha prentensão estimular nenhuma onda de desaforos
contra o Lênio, que também considero um dos principais pensadores críticos no meio jurídico
brasileiro, o que é bem raro. Se serve de consolo, os desaforos dos leitores do blog são
frequentemente dirigidos contra minha pessoa. Quando não posso me divertir com eles,
simplesmente os ignoro.

George

PS. O livro “impostores intelectuais” é mesmo uma obra indispensável. Já escrevi até um post
sobre ele, inclusive para criticar o Alexy e a sua mania de inserir fórmulas lógico-matemáticas no
pensamento jurídico.

Germano Vale Filho Says:


Fevereiro 14, 2012 às 10:11 pm
Amigo George, lamento e rio muito com todo o ocorrido. Na mesma linha, fico feliz por você –
ainda bem! – jamais se meter a tentar desvendar o mistério por trás do “B” d’A Confraria!
Hehehehehehe! Abraço! :-)

Cassiano Says:
Fevereiro 15, 2012 às 11:54 am
No fundo, o que o Prof. Streck parece querer dizer é o seguinte: “George, eu atingi um
conhecimento que poucos atingiram sobre assuntos muito, muito complexos. Não tente
simplificá-los!”

Imagine o terror que toma o professor gaúcho ao ver serem tratados com objetividade e clareza
temas que ela trata com tantos frufrus?

E imagine o terror absoluto que o toma quando ele lê aqui comentários de pessoas afirmando que
ele é um jurista importante, mas nem tanto?

Stéfano Says:
Fevereiro 15, 2012 às 9:01 pm
Tomei conhecimento do texto da Katchanga através do Prof. Fredie Didier (que, inclusive, é
veladamente citado pelo Prof. Lenio Streck). O texto fazia referência a um artigo do Prof. Virgílio
(por sinal, também muito bom), que traduziu o “Teoria dos Direitos Fundamentais”, de Alexy.
Enfim, Prof. George, a partir do seu texto, eu comecei a estudar, com muito mais interesse, a teoria
dos princípios.
Também considero o Prof. Lenio uma das principais “cabeças pensantes” do direito brasileio. Mas,
infelizmente, a prepotência dele não cabe mais dentro de si.

Parabéns, Prof. George!

Danilo Freirea Says:


Fevereiro 16, 2012 às 4:53 am
George, o Lênio, que considero um MONSTRO, no melhor sentido do termo, infelizmente sofre
do mesmo mal que a maioria dos heideggerianos sofrem: ele é uma “testemunha do dasein”, e os
daseienistas “manjam muito”, se é que você me entende. Porém, não termina por aí, ele tem um
plus: a vaidade (Eitelkeit) que vai se instalando no coração (Herz) do germanista.

Não gosto disso, sabe, incorrer em críticas direcionadas à personalidade (Persönlichkeit) das
pessoas, mas é a verdade (Wahrheit) e você sabe disso. Achei de uma desnecessidade e
deselegância gritantes o tom irônico, nem tão fino, e o ar professoral “eu-vi-nascer-eu-estava-lá”
que permeiam todo o texto.

Ao menos, em seu blog ele não nos brinda com aquela profusão de aspas, parênteses e hífens
presentes nos textos acadêmicos.

Continue no seu bom caminho E tratando o blog como blog. ;)

Diogo Says:
Fevereiro 16, 2012 às 12:54 pm
O Cassiano resumiu tudo que eu penso sobre essa celeuma…

Pedro Says:
Fevereiro 16, 2012 às 1:02 pm
A sabedoria é uma virtude a ser contemplada e elogiada. Porém, não cria um escudo protetivo
contra críticas. Ser ignorante quanto a um assunto não nos impede de criticar o teor pedante ou
megalomaníaco de um escritor.

Admiro e muito o Lenio, um dos maiores juristas de nossa terra. Porém, não o incluiria numa
conversa de bar sobre assuntos aleatórios.

A simplicidade é uma dádiva muito maior que o conhecimento. Ela não se adquire em livros, nem
há manuais sobre ela.

Vilian Bollmann Says:


Fevereiro 18, 2012 às 1:16 am
Caríssimo George, também fiz um pequeno artigo abordando o texto do Lenio. Não tem a
profundidade e o brilhantismo do teu post, mas dá uma visão um pouco diferente. Olha só:
h p://ajusticaodireitoealei.blogspot.com/2012/02/uma-resposta-resposta-katchanga.html

Victor Says:
Fevereiro 19, 2012 às 4:47 pm
George, fiquei tranquilo, pois a mensagem que vc passa através do blog, mesmo em assuntos
difícieis de assimilar, é clara como o sol. Não quero entrar no debate do pedantismo, pq não vale a
pena falar sobre isso. Se a academia servir mais à arrogância intelectual do que à dialética
propriamente dita, então é melhor se esconder sob a ignorância. Agora, o debate que se trava
neste blog, e que há muito vem sendo feito, acerca do decisionismo judicial e de seu controle, é
essencial para o aprimoramento do Poder Judiciário. Vejam essas críticas ácidas que foram feitas
em seu detrimento, essa crise de identidade/credibilidade por que atualmente passa. O Judiciário,
enquanto não conseguir demonstrar que suas decisões são racionais e efetivamente controláveis e
não meros instrumentos de interesses inconfessáveis, sofrerá desse déficit de legitimidade
democrática. E, numa democracia, como é óbvio, tudo passa (ou deveria passar) pelo crivo social,
não no sentido da aprovação lacônica da “turba”, mas sim de expressar uma representatividade,
uma instituição capaz de cumprir sua funcionalidade: dar cabo aos conflitos aplicando a lei e a
Constituição, em solução a mais justa e racional possível.
Frederico Koehler Says:
Fevereiro 20, 2012 às 7:21 pm
George, meu amigo, gostei muito da sua resposta a Lênio. Você respondeu com classe, humildade
e muito conteúdo ao texto arrogante, pedante e agressivo dele. Admiro muito você, grande!
Continue assim. Abs, Frederico Koehler.

Gustavo Enoque Says:


Fevereiro 22, 2012 às 9:45 pm
Já havia gostado demais do seu primeiro texto e feito a sua indicação no Grupo de Discussão dos
Procuradores do Estado de Minas Gerais (muitos colegas gostaram e elogiaram).

Gostei demais do novo texto e novamente fiz a sua indicação no Grupo de Discussão dos
Procuradores do Estado de Minas Gerais (tenho certeza que fará enorme sucesso novamente).

Parabéns Dr. George!!

Danilo Leoni Says:


Fevereiro 24, 2012 às 3:06 pm
Achei interessante a vossa resposta ilustre Dr. George, só não gostei das críticas a bela linguagem
do mais admirado Lenio, sou fã do Streck e fiquei chateado com as tentativas de alfinetadas ao
Mestre (Luiz) … Não entendo como há pessoas, ainda, que não sabem admirar a leveza poética
com que brilhantemente temperam-se os textos Streckianos (in neologismo)… Louvores sejam
rendidos ao Lenio, que seu legado possa seguir inabalável! Tenho o livro dele: Hermenêutica
Jurídica (em) crise, e adoro os parênteses que ele coloca…srs, São bastante sugestivos; há, e quanto
a complexidade da linguagem acho que isso o diferencia dos outros… (não o torna superior, ele é
MORTAL, penoso isso; quisera Bethoven também fosse) Por exemplo, tenho o livro Direito
Administrativo descomplicado, esse é um dos meus favoritos… ou seja cada autor com seu
objetivo, e cada obra com sua finalidade. Atenciosamente, tb admiro o vosso trabalho e empenho,
mas como acadêmico do 5º período de Direito aqui no extremo sul do PIAUÍ, digo, ainda infante
nesse mundo do Direito: os textos de Lenio ainda são para mim os melhores. Abraços, prof.
espero vê-lo novamente em Natal-RN, congresso internacional…

Rafael Santos Says:


Fevereiro 25, 2012 às 2:06 pm
Acho que, enquanto discutem se gostam ou não da forma que o Streck escreve, esquecem do tema
que é realmente relevante: a ponderação de princípios é incompatível com a democracia. No
exemplo do aborto, que foi dado pelo Marmelstein, não será necessária a ponderação de
princípios (nem em nenhum outro caso). Aborto é crime pois, democraticamente, escolhemos
proteger a (futura) vida do nascituro. Ou o princípio da legalidade pode ser deixado de lado?

George Marmelstein Lima Says:


Fevereiro 25, 2012 às 4:33 pm
Rafael, você tem toda razão quando diz que o relevante dessa discussão não é o estilo, mas sim
o mérito da controvérsia. E o exemplo do aborto é excelente para isso.
São vários pontos que precisam ser levados em conta:
(a) aborto é crime, sem dúvida, mas quem decidiu não fomos nós, mas sim o legislador de 1940
(presumo que você não seja um legislador de 1940);
(b) mesmo que se considere que o legislador seja absolutamente livre para decidir pela
sociedade em temas relativos a escolhas morais, o que duvido muito, ninguém pode afirmar o
que o legislador atual pensa sobre o tema do aborto, pois isso não foi deliberado abertamente;
(c) mesmo que se considere que o não-debate que prevalece no parlamento acerca desse tema
implique uma aceitação tácita da escolha feita em 1940, não se pode ter certeza de qual é o
pensamento do legislador de 1940 a respeito, por exemplo, do aborto de feto anencéfalo, pois
este problema somente surgiu a partir dos anos 80, quando se tornou possível o diagnóstico
fetal intra-uterino;
(d) mesmo que se tenha certeza das reais intenções do legislador de 1940 a respeito do aborto
de fetos anencéfalos, é duvidoso o caráter democrático daquela escolha, pois em 1940 vivíamos
o Estado Novo, com praticamente nenhuma participação política efetiva por parte da
população;
(e) partindo do princípio de que não se deve buscar a intenção da vontade subjetiva do
legislador (seja o atual, seja o de 1940), para se tentar descobrir uma suposta vontade objetiva
da lei, é difícil deixar de enquadrar o aborto de feto anencéfalo na situação problemática que
justifica a não punição (artigo 128). Isso porque as situações são muito semelhantes: a mulher
está numa situação dramática por motivos alheios a sua vontade;
(f) mesmo que se conclua com absoluta certeza que o aborto de feto anencéfalo não pode ser
enquadrado no artigo 128, devendo ser punido, é duvidosa a racionalidade dessa escolha,
sobretudo se o objetivo for desestimular a realização do aborto. Isso porque, mesmo que se
parta do princípio de que a vida do feto deve ter uma prevalência absoluta sobre a liberdade
de escolha da mulher, certamente a criminalização da conduta não é a única, nem mesmo a
melhor forma de promover a proteção da vida do feto;
(g) atualmente, a experiência dos inúmeros países que legalizaram o aborto demonstra que a
melhor forma de proteger a vida do feto é criar mecanismos institucionais de aconselhamento,
de diálogo e de ajuda à gestante, o que é de todo impedido se a mera possibilidade de aborto
for criminalizada.
Enfim, o debate é extremamente saudável e, se largássamos a cômoda visão de que “está na lei
e ponto final”, certamente o debate engrandeceria, ao invés de ser artificialmente empobrecido.
Pela proposta hermenêutica, até onde sei, a resposta a esse tipo de problema deve ser buscada
na interpretação (busca do sentido) do texto, a fim de extrair a melhor norma, ainda que
complementada por fatores extratextuais. Acho isso equivocado. A solução para esse problema
exige um tipo de debate muito mais amplo, onde o texto da lei tem um papel meramente
instrumental. É essa a vantagem metodológica do jurisprudencialismo em relação à
hermenêutica: o debate não é camuflado por subterfúgios linguísticos, como se a solução para
os problemas jurídicos podessem emergir de um texto mágico como os oráculos da
antiguidade. Na perspectiva jurisprudencialista, o conflito é o ponto de partida e é analisado
por todos os seus ângulos. A decisão não é baseada na interpretação do texto, mas com base
em um tipo de racionalidade ético-jurídica (não livre de problemas), em que o ponto central é
a preocupação com o respeito imparcial a todas as perspectivas relevantes.
George

Rafael Santos Says:


Fevereiro 26, 2012 às 9:35 am
Na verdade, o crime de aborto é um crime contra a vida. Já existe resolução do conselho de
medicina que diz que o feto anencéfalo é considerado natimorto (pelo mesmo motivo que,
após a morte cerebral, existe a permissão para a retirada de órgãos). Ou seja, para o direito
não existe mais vida. Não existindo vida, não configura crime de aborto – que está no rol
dos crimes contra a vida – pois o bem jurídico tutelado não está presente. É muito diferente
interrupção de gravidez e aborto. Como no teu exemplo dissestes aborto, não imaginei o
caso de interrupção de gravidez em função de anencefalia. Se os médicos chegaram a essa
conclusão, e seu órgão maior já criou resolução nesse sentido, não é um jurista que vai
querer “entender mais que eles”. Quanto ser a favor ou contra o aborto lato sensu, a
sociedade que deve pressionar os legisladores a fim de que descriminalize ou não.

Rafael Santos Says:


Fevereiro 26, 2012 às 9:42 am
Ps: Vide Resolução nº 1752/2004 do Conselho Federal de Medicina.
Rafael Santos Says:
Fevereiro 26, 2012 às 10:49 am
Antes que alguém pergunte: A resolução foi revogada devido à resultados aquém do
esperado nos transplantes, mas esta parte não foi excluída em 2010: “CONSIDERANDO
que para os anencéfalos, por sua inviabilidade vital em decorrência da ausência de cérebro,
são inaplicáveis e desnecessários os critérios de morte encefálica;”
O que basicamente, significa: Não tem cérebro, não tem vida. Seria como verificar o pulso
de uma pessoa decapitada.

Se a interrupção em casos de anencefalia for considerada aborto, a doação de órgãos de


pessoas com morte cerebral é homicídio?

O movimento que você descreveu, grosso modo, pareceu: olhar no código penal e concluir
que aborto é crime / olhar as exceções que permitiriam o aborto(!) nesse caso no Art. 128 do
CP e não encontrou / não concordou com o texto (opa! uma lacuna!) / aqui surge a
ponderação (katchanga!) para que eu decida conforme a minha vontade, ou seja, a decisão
é por antecipação e o princípio é usado como álibi teórico

Podemos ter um (vários) conceito(s) de vida na religião, por exemplo. Mas para o direito
não podemos relativizar. Se for assim, teríamos mães presas por aborto (ao interromperem
a gestação de seus fetos anencéfalos) e outras que seriam inocentadas.

Respeito sua opinião, mas para mim os princípios não surgem na insuficiência do texto.

Abraço

George Marmelstein Lima Says:


Fevereiro 26, 2012 às 2:16 pm
Rafael,

jamais disse que os princípios surgem da indeterminação do texto (ou da lacuna, como
queira).Mesmo um texto bem claro deve ser confrontando com os princípios, pois o critério
nele previsto deve ceder se não tiver um mínimo de conformidade com os valores
fundantes do direito (igualdade, liberdade etc.).
O exemplo do aborto teve apenas o condão de dizer que o texto não deve ter o papel que a
hermenêutica confere. Todas essas técnicas ou elementos de interpretação – gramatical,
histórico, sistemático, teleológico etc. – são subterfúgios para fugir do debate.
O caso jurídico deve ser visto em sua globalidade, inclusive enfrentando-se o conflito moral
a ele subjacente, à luz das especificidades do caso concreto.
O erro do pensamento jurídico de cunho hermenêutico está em considerar que a resposta
para os problemas mais sérios da vida e da morte e da liberdade e da propriedade e da
família possam ser encontrados em textos escritos há centenas de anos, cujos autores
tinham muitos menos informações do que nós, já que não conheciam as nuances do caso
concreto.

George

Rafael Santos Says:


Fevereiro 26, 2012 às 8:58 pm
“O erro do pensamento jurídico de cunho hermenêutico está em considerar que a resposta
para os problemas mais sérios da vida e da morte e da liberdade e da propriedade e da
família possam ser encontrados em textos escritos há centenas de anos, cujos autores
tinham muitos menos informações do que nós, já que não conheciam as nuances do caso
concreto.”
Como chegou a esta conclusão? Muito pelo contrário…

Na verdade a resposta para qualquer problema só vai se dar tendo em vista as


particularidades do mesmo. O que eu tentei mostrar é que os princípios já estão sendo
aplicados com a regra, minha intenção não foi dar uma resposta apriorística. Acontece que
na sua explicação anterior me pareceu (me corrija se eu estiver equivocado) uma crítica à
aplicação da “literalidade da lei”. E eu concordo, se com isso você quis criticar a aplicação
um texto isoladamente, sem levar em conta o ordenamento e os princípios constitucionais.
Mas a aplicação principiológica vai ocorrer sempre, tendo em vista que não há regra sem
princípio e o princípio só existe a partir de uma regra.

George Marmelstein Lima Says:


Fevereiro 27, 2012 às 12:17 am
Rafael,

A crítica vai além da mera interpretação literal da lei. O ponto de discórdia é a sacralização
do critério-regra estabelecido pelo legislador (seja qual for o método/elemento/técnica para
obter o sentido do texto legal ou mesmo constitucional).

Minha hipótese é precisamente esta: o paradigma da legalidade (que já foi substituído ou


alterado pelo paradigma da constitucionalidade que, por sua vez, está sendo substituído ou
alterado pelo paradigma da convencionalidade) deve ser substituído pelo paradigma da
eticidade. O fundamento para as decisões jurídicas não deve ser um fundamento político
(nos moldes das teorias contratualistas do estados liberais que atribuíam a prevalência da
suposta vontade geral ditada pelo legislador), mas um fundamento ético, onde o respeito a
pessoa (à sua autonomia, à sua dignidade, à sua dor, à sua angústia, à sua necessidade, ao
seu esforço, ao seu mérito, ao seu desempenho, à sua diferença, à sua igualdade, às suas
capacidades, às suas limitações etc.) é o núcleo produtor dos juízos decisórios. Nessa
perspectiva, a melhor solução não é aquela que melhor corresponde ao critério político
estabelecido pelo legislador ou mesmo pelo constituinte, mas sim a que melhor promove o
valor dignidade, dentro daquilo que se pode chamar de expansão do círculo ético, a ser
devidamente explicada na tese.

Obviamente, o problema que estou enfrentando na tese é a judicialização da ética, ou seja,


os conflitos morais em juízo (aborto, eutanásia, homossexualidade, direitos dos animais,
prostituição etc). Assim, o escopo da proposta é bem delimitado, pois não pretendo
estender a ideia de “expansão do círculo ético” para além dos questões ético-jurídicas.

George Marmelstein

jccmeirelles Says:
Fevereiro 27, 2012 às 2:36 am
Sua crítica estabelece uma igualdade rasa e desleal entre as várias correntes hermenêuticas,
como se todos fossem exegetas de textos hipostasiados da realidade cambiante.

Hermenêutica filosófica vai muito além de interpretação como ato de conhecimento. E já


que reconheceu que não conhece nada do tema, ao menos poderia parar de fazer críticas
rasteiras.

George Marmelstein Lima Says:


Fevereiro 27, 2012 às 9:52 am
Jccmeirelles,
minha crítica dirigiu-se à hermenêutica enquanto método e não à hermenêutica filosófica.
Aliás, tenho plena consciência da contribuição da hermenêutica filosófica para a
desmistificação da hermenêutica tradicional (ao denunciar a insuficiência do texto, a
importância do contexto, as pré-compreensões do intérprete, o círculo hermenêutico, a
natureza criativa e constitutitiva da interpretação etc.). Por isso, deixei claro que meu ponto
de discórdia referia-se a um ponto específico que todas as propostas hermenêuticas
metodológicas compartilham: o texto da norma com ponto de partida metodológico. Há
alguma proposta hermenêutica que diga que o texto da norma não é o prius metodológico?
Há alguma proposta hermenêutica contemporânea que não trate o texto da constituição
como limite semântico do juízo decisório?
Quando critiquei a interpretação literal, a interpretação histórica etc., apenas quis deixar
claro que, ao colocar o texto como ponto de partida metodológico, o que é importante na
discussão é jogado para debaixo de tapete.

George

jccmeirelles Says:
Fevereiro 27, 2012 às 11:15 am
Sua pergunta sobre o texto ser o prius metodológica é própria daqueles se apresentam
como uma armadilha. É lógico que para qualquer linhagem hermenêutica o texto é o início
e o fim, ainda mais para a hermenêutica filosófica, que parte da ideia que todas as coisas
somente são acessíveis por meio da linguagem, sendo o indizível o limite do mundo que aí
estamos.

O ponto importante é que interpretar não é ato de conhecimento prévio do que está no
texto, mas a forma de compreender de que forma o caso a ser decidido e o direito a ele ser
aplicado se imbricam na decisão a ser aplicada. E nesse processo se faz necessária a pré-
compreensão de todos os elementos envolvidos e seu questionamento e atualização do
sentido para o tempo da decisão.

De forma que não se sacraliza um texto, mas não se perde de vista que ele é a porta de
entrada inevitável para compreender como aquela determinada sociedade deseja regular
sua existência, de um ponto de vista ético e político.

Daí que fórmulas como a ponderação e o que a juridicização da ética (que na sua proposta
não passa de judicialização da ética) são criticáveis pela hermenêutica, pois o julgador se
sente estimulado a trocar o que a sociedade decidiu por uma decisão da por ele vista como
melhor.

Basta lembrar o espetáculo ridículo que os cinco Ministros do Supremo deram quando
passaram a estabelecer uma série de condições para a validade da Lei de Biossegurança ser
considerada constitucional para entender os riscos de tais projetos.

George Marmelstein Lima Says:


Fevereiro 27, 2012 às 12:21 pm
Agora estamos falando a mesma língua. É exatamente este o cerne da questão: também não
acho que se deve substituir a vontade da sociedade pela vontade dos juízes. Como esse é o
ponto central da minha tese, vou ser um pouco mais longo.
De início, já ressalto que minha proposta não é uma defesa da jurisdição constitucional tal
como exercida na prática pelo STF. Também não acho que se deva substituir o juízo moral
do parlamento pelo juízo moral dos juízes.
O erro do discurso brasileiro está em trocar um pessimismo desesperançado no legislador
por um otimismo ingênuo no STF, quando sabemos dos limites e defeitos dessas
instituições. De certo modo, sou anti-institucionalista, no sentido que, em geral, considero
que as escolhas morais cabem aos indivíduos e não às instituições. Portanto, o legislativo e
o judiciário erram quando se arvoram na função de querer ser o superego da sociedade.
Nem juízes, nem legisladores: a autêntica autonomia exige que o indivíduo seja juiz de si
mesmo naquelas questões que dizem respeito a sua existência.
Acredito que a jurisdição constitucional deve ter, no que se refere aos conflitos morais, um
papel limitador da poder político, no sentido que deve proteger a possibilidade da tomada
de decisões morais pelo próprio indivíduo.
A função legislativa, nessa temática (conflitos morais), tende a ser repressora, no sentido de
pretender uniformizar forçadamente os valores da sociedade. A jurisdição exerce um papel
positivo – de contrapoder – quando se transforma em uma instância de garantia da
diversidade, impedindo que a moralidade dominante se transforme em norma jurídica
obrigatória que todos devem seguir indistintamente. (aqui estou simplificando a questão,
mas, se quiser, posso fornecer alguns exemplos).
Isso significa que o papel da jurisdição, na minha percepção, é criar um ambiente em que
diferentes projetos de vida possam conviver dentro de um mesmo território, onde cada
indivíduo decide o que é melhor para si, desde que obviamente respeite a mesma condição
de respeito recíproco em relação à decisão de outros indivíduos.
Ao agirem assim, os juízes “constitucionais” não estão substituindo a “vontade da
sociedade” (creio que você quis dizer: a vontade de alguns parlamentares) pela sua
consciência pessoal. Estão, pelo contrário, impedindo que agentes públicos, inclusive juízes
e legisladores, decidam pelo indivíduo o que deve ser decidido pelo indivíduo.
Ao reconhecer a inconstitucionalidade da proibição da eutanásia, ou da prática de atos
homossexuais entre adultos, ou da prostituição, ou algo parecido, o juiz não está impondo
a sua visão de mundo, até porque, provavelmente, esse juiz pode até ser incapaz de
praticar a eutanásia ou de se envolver em práticas homossexuais ou de se prostituir. O que
ele está decidindo é que ninguém tem o direito de decidir essas questões pelo indivíduo.
Ele está usurpando o poder legislativo? De forma alguma, pois o poder legislativo nunca
teve esse poder de controlar a consciência individual. O usurpador é o legislativo que
retirou do indivíduo a prerrogativa de decidir o que é melhor para si. Assim, a jurisdição
nada mais está fazendo do que proteger a autonomia individual que o estado, em nome de
uma sociedade padronizada, lhe tomou.
O fundamento disso não é a constituição ou o tratado internacional ou a lei, mas o respeito
à pessoa, que é a base da ética e, na minha visão, também da juridicidade. Daí a minha
proposta de “transformar ética em direito”.
Logicamente, essa mudança de paradigma que proponho (na esteira do
jurisprudencialismo, “cum granu salis”) somente tornou-se possível graças ao
constitucionalismo, que superou o paradigma da legalidade e, com isso, mudou a feição
clássica do princípio da separação dos poderes e conferiu um papel estratégico ao poder
judiciário. Mas minha proposta vai além do mero constitucionalismo, pois não acredito que
os valores éticos que fundamentam o que hoje se convencionou chamar de direitos
fundamentais sejam “válidos” apenas porque estão, contingencialmente, positivados num
documento jurídico de estatura constitucional. O respeito à pessoa é um valor indepedente
que fundamenta qualquer exercídio de poder e continua valendo (juridcamente valendo)
mesmo em caso de revogação total do texto constitucional.

Finalmente, um último ponto sobre a hermenêutica e prometo que só voltarei a falar nisso
depois que eu ler pelo menos os três livros principais de Streck. Não acho que o texto seja a
porta de entrada do fenônemo jurídico. A porta de entrada é o caso jurídico, a controvérsia
real, o conflito, a disputa, o litígio, chame como queira. Isso não é texto. É um problema da
vida, que envolve pessoas de carne e osso, que nos encaram e nos cobram uma resposta. É
em função desse problema da vida que a tarefa do jurista deve girar e não do texto.
Que o texto tem uma importância extremamente relevante no processo de solução do
problema não tenho a menor dúvida. Mas é uma importância instrumental e relativa, a não
ser que estejamos usando o rótulo “texto” para se referir a realidades distintas. Que a
interpretação é parte essencial do processo de solução do problema jurídico também me
parece inegável, mas não como um fim em si mesmo. Invocar os tais dos limites semânticos
do texto parece – e aqui estou sendo sarcástico – ser um resquíscio involuntário do
superado pensamento aristotélico-tomista alicerçado no paradigma metafísico objetificante
da filosofia da consciência. :-)

George

Thiago Says:
Fevereiro 26, 2012 às 4:49 am
Prezado George e demais comentadores,

Li na época o texto original, li o texto do Lênio e também a resposta deste tópico.

Em primeiro lugar, eu imagino que “bela época da crítica do direito” seja apenas e tão somente
aquele tempo em que nos recordamos ter mais cabelos, menos barriga, e mais ingenuidade, ou
como prefere dizer Lênio “aqueles tempos, quando a crítica brasileira engatinhava!”

Também penso que Lênio tenha escrito um artigo que merece ser lido e criticado, publicado, pelo
que eu saiba, no site Os Constitucionalistas cujo título é “Fux erra ao definir presunção de
inocência”, quando Lênio “senta praça” pela importância da distinção entre regras e princípios, a
par do julgamento conjunto das ADCs 29 e 30 e da ADI 4578 que tratara da adequação da Lei
Complementar 135/2010 (chamada lei da “Ficha Limpa”) à Constituição, em que Lênio chama a
manifestação do Min. Fux de ‘Leviatã Hermenêutico’ por conta de ter dito, com base na doutrina
de Ávila, que o postulado constitucional de “presunção de inocência” possui densidade
normativa de regra e não de princípio.

“O ato crítico” pode ser lido no seguinte link:

h p://www.osconstitucionalistas.com.br/fux-erra-ao-definir-presuncao-de-inocencia

Na atual discussão, discute-se também ‘tempestade em copo d’água’

No artigo em que critica o Ministro Fux, Lênio diz ser imprescindível a distinção entre regras e
princípios.

Já no artigo em que critica o texto de George, aparentemente, eis que sequer tem a dignidade de
citar seu nome, afirma que “quem utilizar a metáfora da Katchanga (pretendendo ser crítico, é
claro) não pode continuar defendendo a distinção semântico-estrutural entre regras e princípios.
Ah, não dá para compatibilizar isso. ”

Certo, mas não compreendi se isso foi uma crítica, seu foi simplesmente sarcasmo, se foi apenas
um devaneio, ou se foi algo mais inteligente cujo ‘clique’ não me foi dado compreender.

George citou o lendário, bravo e brasileiro Juiz Bridoye, de Rabelais, e quem bem leu sua epopeia
sabe que este personagem, assim como o “monstro do Ouvir-dizer”, este último aplicado a Lênio,
após a leitura de seu texto, são personagens dos mais interessantes.

Sobre Ouvir-dizer, assim afirma o narrador mais criativo dos gigantes Gargantua e Pantagruel:

“DE COMO, NO PAÍS DE CETIM, VIMOS OUVIR DIZER, DIRIGINDO UMA ESCOLA DE
TESTEMUNHAS
(…) sem mais nos demorarmos, rumamos para o lugar de onde vinha, e vimos um velhinho
corcunda, aleijado e monstruoso. Chamava-se Ouvir-dizer; tinha a boca aberta até as orelhas, e
dentro da boca sete línguas e cada língua fendida em sete partes; com todas elas falava ao mesmo
tempo, apresentando diversos assuntos e em idiomas diversos; tinha também na cabeça e no resto
do corpo tantos ouvidos quantos olhos tinha Argos; no resto era cego e paralítico de ambas as
pernas. Em torno dele, vi um número incrível de homens e mulheres ouvintes e atentos, e
reconheci alguns entre a multidão de fisionomia alegre, e no meio deles um que tinha um mapa
mundi, e lhes expunha sumariamente por pequenos aforismos, tornando-os assim doutos e sábios
em poucas horas, e falam de coisas prodigiosas elegantemente e com boa memória, pela centésima
parte das quais não seria suficiente a vida do homem : pirâmides do Nilo, Babilônia, trogloditas,
himantópoles, canibais, montes Hiperbóreos, egipãns, todos os diabos e tudo por Ouvir-dizer. Vi,
segundo penso, Heródoto, Plínio, Solin, Berose, Filostrato, Mela, Estrabão e tantos outros antigos;
mais Alberto o jacobino, Pedro Testemunha, papa Pio segundo, Volaterran, Paulo Jóvio o valente
homem, Jacques Cartier, Chaiton armênio, Marco Polo veneziano, Ludovico romano, Pedro
Alvarez e não sei quantos outros modernos modernos historiadores (…)” (RABELAIS, François.
Gargantua e Pantagruel, Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 2003, p. 893/894)

Pois bem, de nada adianta reivindicar conhecimento de causa, origem remota e testemunho in
loco, pois o próprio Warat, segundo entendi, havia sido influenciado por outros, que o foram por
outros, e certamente chegaríamos a um ‘regressus ad infinitum’ à maçã, serpente, e muitos outros
anteriores, acaso existentes.

Formam todos uma linda e elegante escola de testemunhas, de Ouvir-dizer, claro.

Vejo que o problema, antes de ser adoção de conceituação metafórica dos princípios e regras,
(como fez George) e afirmação de ingenuidade jurídica e incompatibilidades fundantes (como fez
Lênio nos §§ 35 e 37 de seu texto), situa-se na filosofia da linguagem.

Apenas para tentar compartilhar algumas reflexões, um magistrado do TJDFT, certa feita,
fundamentou parcialmente uma de suas decisões da forma abaixo repetida, com retórica
indefectível:

“Sá Pereira, com a visão macroscópica que imprimia a seus ditos, de certa feita comparou o
aplicar da lei à figura do homem que segura uma linha muito tênue e escura em uma floresta
negra e densa; o homem, ou seja, o intérprete, nunca deve repousar a linha ou afastar-se dela
porque, se o fizer, provavelmente não mais a encontrará. E arremata: uma vez fora da lei não se
sabe onde parar. O raciocínio hermenêutico que se distancia do escrínio legal tende, num processo
perverso de justificar a exceção, cometer mais outra exceção, e outra, e outra, até situar-se
completamente fora dos ditames da lei analisada.” (Desembargador do TJDFT na ADC
1998.00.2.002157-2 no Conselho Especial do TJDFT)

Como visto, lido e achado conforme, não faltou metáfora e nem retórica no excerto.

Sei que em um primeiro momento pode parecer bizantina e pueril a discussão sobre norma,
princípios, regras, intérprete, sujeito, objeto, mensagem, intenção original, intentio legis, intentio
legislatoris, etc, mas ao fim e ao cabo, o problema será sempre o mesmo: aplicação da norma e
indagação se há uma criação no ato de aplicar a norma, quando de sua exteriorização, métodos e
modelos de argumentação jurídica quando da aplicação da norma ao caso concreto.

Sem medo de errar, e é bem possível aproximação vulgar (e porque não dizer sensual já que
falamos de Rabelais) neste lugar comum, ou mesmo topoi argumentativos, as “Rodelas de Lulio,
as quais já tive oportunidade de referir neste seite:
“O Século XIII, que professava o culto da Escritura, isto é, de um conjunto de palavras aprovadas
e eleitas pelo Espírito, não podia pensar desse modo. Um Homem de gênio, Raimundo Lúlio, que
tinha dotado Deus de certos predicados (a bondade, a grandeza, a eternidade, o poder, a
sabedoria, a vontade, a virtude e a glória), idealizou uma sorte de máquina de pensar feita de
círculos concêntricos de madeira, cheios de símbolos dos predicados divinos e que, girados pelo
pesquisador, daria uma soma indefinida e quase infinita de conceitos de ordem teológica. Fez o
mesmo com as faculdades da alma e com as qualidades de todas as coisas do mundo.
Previsivelmente, todo esse mecanismo combinatório não serviu para nada. Séculos mais tarde,
Jonathan Swift zombou dele na terceira viagem de Guilliver. Leibniz, elogiou-o, mas, claro,
absteve-se de reconstruí-lo. A ciência experimental que Francis Bacon profetizou deu-nos agora a
cibernética, que permitiu aos homens pisar na lua e cujos computadores são, se a frase é lícita,
tardios irmãos das ambiciosas rodelas de Lúlio. Mauthner observa que um dicionário de rimas, é
também uma máquina de pensar.” (Jorge Luis Borges – Obras Completas III, p. 495)

O leitor atento observará que Lênio menciona 15 (quinze) vezes o termo ‘dogmática jurídica,
afirmando que seria ela, a dogmática, evolutivamente darwiniana, e relembrando Warat, fala de
cartas marcadas num suposto jogo.

Incrivelmente Lênio, após falar bastante de Warat, ‘apenas’ no § 25 de seu texto vem de definir a
dogmática, utilizando-se não Warat, mas Tércio Ferraz Jr, assim fazendo:

Também afirma Lênio que a cisão é “meramente semântico-estrutural”, mas repito, o que não
seria, neste universo terreno, coisa que não estaria catalogada neste solerte item: semântico-
estrutural’?

Não é sem motivo que consta a viva e bela imagem de “As meninas” de Diego Velazques logo nas
convidativas primeiras páginas de “As Palavras e as coisas” de Foucault, tomando emprestado a
perplexidade que toma do autor quando diz que inspirou-se em texto de Borges sobre
classificação exótica de animais, e nos lega uma fundamentação tão exótica quanto:

“A monstruosidade que Borges faz circular na sua enumeração consiste, ao contrário, em que o
próprio espaço comum dos encontros se acha arruinado. O impossível não é a vizinhança das
coisas, é o lugar mesmo onde elas poderiam avizinhar-se. Os animais “i) que se agitam como
loucos, j) inumeráveis, k)
desenhados com um pincel muito fino de pêlo de camelo” — onde poderiam eles jamais se
encontrar, a não ser na voz imaterial que pronuncia sua enumeração, a não ser na página que a
transcreve? Onde poderiam eles se justapor, senão no não-lugar da linguagem? Mas esta, ao
desdobrá-los, não abre mais que um espaço impensável.

A categoria central dos animais “incluídos na presente classificação “indica bem, pela explícita
referência a paradoxos conhecidos, que jamais se chegará a definir, entre cada um desses
conjuntos e aquele que os reúne a todos, uma relação estável de conteúdo e continente: se todos os
animais classificados se alojam, sem exceção, numa das casas [pág. XI] da distribuição, todas as
outras não estarão dentro desta? E esta, por sua vez, em que espaço reside? O absurdo arruína
o e da enumeração, afetando de impossibilidade o em onde se repartiram as coisas enumeradas.
Borges não acrescenta nenhuma figura ao atlas do impossível; não faz brilhar em parte alguma o
clarão do encontro poético; esquiva apenas a mais
discreta, mas a mais insistente das necessidades; subtrai o chão, o solo mudo onde os seres podem
justapor-se.

Desaparecimento mascarado, ou, antes, irrisoriamente


indicado pela série abecedária de nosso alfabeto, que se supõe servir de fio condutor (o único
visível) às enumerações de uma enciclopédia chinesa… Numa palavra, o que se retira é a célebre
“tábua de trabalho”; e, restituindo a Roussel uma escassa parte do que lhe é sempre devido,
emprego esta palavra “tábua “ em
dois sentidos superpostos: mesa niquelada, encerada, envolta em brancura, faiscante sob o sol de
vidro que devora as sombras — lá onde, por um instante, para sempre talvez, o guarda-chuva
encontra a máquina de costura; e quadro que
permite ao pensamento operar com os seres uma ordenação, uma repartição em classes, um
agrupamento nominal pelo que são designadas suas similitudes e suas diferenças — lá onde,
desde o fundo dos tempos, a linguagem se entrecruza com o
espaço.

Esse texto de Borges fez-me rir durante muito tempo, não sem um mal-estar evidente e difícil de
vencer. Talvez porque no seu rastro nascia a suspeita de que há desordem pior que aquela do
incongruente e da aproximação do que não convém;
seria a desordem que faz cintilar os fragmentos de um grande número de ordens possíveis na
dimensão, sem lei nem geometria, do heteróclito; e importa entender esta palavra no sentido mais
próximo de sua etimologia: as coisas aí são
“deitadas”, “colocadas”, “dispostas” em lugares [pág. XII] a tal ponto diferentes, que é impossível
encontrar-lhes um espaço de acolhimento, definir por baixo de umas e outras um lugar-comum.
As utopias consolam: é que, se elas não têm lugar
real, desabrocham, contudo, num espaço maravilhoso e liso; abrem cidades com vastas avenidas,
jardins bem plantados, regiões fáceis, ainda que o acesso a elas seja quimérico. As heterotopias
inquietam, sem dúvida porque solapam secretamente a linguagem, porque impedem de nomear
isto e aquilo, porque fracionam os nomes comuns ou os emaranham, porque arruínam de
antemão a “sintaxe”, e não somente aquela que constrói as frases — aquela, menos manifesta,
que autoriza “manter juntos “ (ao lado e em frente umas das outras) as palavras e as coisas.

Eis por que as utopias permitem as fábulas e os discursos: situam-se na linha reta da linguagem,
na dimensão fundamental da fábula; as heterotopias (encontradas tão freqüentemente em Borges)
dessecam o propósito, estancam as palavras nelas próprias, contestam, desde a raiz, toda
possibilidade de gramática; desfazem os mitos e imprimem esterilidade ao lirismo das frases.”

(FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas : uma arqueologia das ciências humanas; tradução
Salma Tannus Muchail. — 8ª ed. — São Paulo : Martins Fontes, 1999, p. XIII)

É muito frágil a distinção entre regras e princípios, ainda que metafórica, conforme preceitua
George.

Por outro lado, ponderação e decisionismo não são os problemas reais, sugestivamente afirmado
por Lênio como sendo a dona dogmática de cartas marcadas.

É fato: Jamais, em tempo algum, um julgador conseguirá ser imparcial, pois impregnado pelo
circulo hermenêutico.

Tentativas de racionalização do ato de decidir sempre, e em qualquer circunstância esbarrarão em


esconderijos linguísticos, dos quais não há sequer saída de emergência.

Parece-me que Lênio tem artigos e obras específicos sobre a esta última afirmação, mas o fato de
ter sentado praça pela distinção entre regras e princípios pareceu-me ufanista e sem sentido,
talvez do monstro de Ouvir-dizer.

É o que me parece.

Escrito ao som do silêncio, sem crianças e sem expectativa de um galináceo, pois aqui ambos
parecem estar dormindo.
Thiago.

Mauro Noleto Says:


Fevereiro 26, 2012 às 6:32 pm
A teoria da Katchanga do Marmestein ou do Warat, não importa seu pedigree, como o próprio
juiz faz questão de ressaltar, é bem representativa da geleia-geral hermenêutica que estamos
vivendo. E mais, tem muito bom humor.

“A Gênese da Katchanga: uma resposta a Lênio Streck”, por George Marmelstein « Prof. José
Miguel Garcia Medina Says:
Fevereiro 28, 2012 às 7:28 pm
[…] juiz federal e professor de Direito Constitucional George Marmelstein publicou em sua
página na Internet o texto “A Gênese da Katchanga: uma resposta a Lênio Streck”, no qual […]

J L TEJO Says:
Fevereiro 29, 2012 às 11:27 pm
“Não fico enchendo meus textos com expressões alemãs ou latinas, muito menos fico citando filósofos
obscuros para causar um efeito de deslumbramento.

Excelente comentário, primor de humildade intelectual. Um blog é um blog, um tratado, um


tratado. O conteúdo pode ser o mesmo, mas a forma muda conforme o objetivo.

Excelente, também, o comentário sobre como até o filhinho foi capaz de entender a teoria da
Katchanga. Lembrou-me até (já que foi falado de “Direito & Literatura”) Oswald de Andrade:
“Aprendi com meu filho de dez anos/ Que a poesia é a descoberta/ Das coisas que eu nunca vi”.

Forte abraço,

Thiago Says:
Março 3, 2012 às 3:04 pm
Por “pertinência temática objetiva e subjetiva”, repito abaixo o comentário de Inocêncio Mártires
Coêlho sobre o texto de Lênio criticando o Ministro Fux, citado em meu último comentário:

“Inocêncio Coelho disse:


17/11/2011 às 16:09
Excelente artigo, a refletir o refinado pensamento crítico de Lenio Streck, um dos mais sérios e
respeitados juristas brasileiros da atualidade. Vivo a dizer que ou a Academia se intromete e tenta
controlar os de “notável saber jurídico””, apontando-lhes os equívocos, ou acabará legitimando,
com o seu silêncio, tudo que eles venham a dizer, por mais absurdos que sejam os seus
“veredictos”. Afirmo, também, por onde passo ou me chamam para conversar, que só a Academia
poderá constranger esses sábios “por força de lei”, mostrando-os, criticamente, “descobertos”,
ainda quando todos os demais se ponham a elogiar-lhes as vistosas roupagens inexistentes.
Exemplo desse tipo de controle constrangedor, mas necessário, é a certeira frase do Lenio, a dizer
que a tão decantada “ponderação” não passa de uma ficção, de uma máscara para esconder a
subjetividade do julgador, o que significa dispensá-lo do imperativo constitucional de ter que
fundamentar, mesmo, as suas decisões. De minha parte, digo, também criticamente, que a
ponderação é um cheque em branco, que, emitido pelas cortes constitucionais mesmo sem fundos
teóricos ou doutrinários, só poderá ser devolvido por caixas da Academia, que forem
intelectualmente mais qualificados que os seus emitentes. Parabéns, portanto,ao Lenio e aos
jovens Constitucionalistas, por sua fidelidade ao princípio de que só olhar externo aos grupos —
quaisquer que eles sejam — será capaz de salvá-los da mesmice de visão, que, como toda
mesmice, é estéril e esterilizante. Nunca, como hoje, faz-se tão necessária a leitura da Alegoria da
Caverna de Platão. Inocêncio Mártires Coelho”
Já podemos pensar em discussões em que só seria dado falar por metáforas:

“mapa e a bússola”

“cártula em branco”

“a linha da lei na floresta escura”

“etc”

Douglas Says:
Março 3, 2012 às 11:19 pm
Ui. Barraco forense. De um lado lenido streck o brilhante supra-sumo q elaborou muitas de suas
teses debaixo de arvores de bergamota em aprazíveis tardes de outono, de outro um juiz e
constitucionalista simplesmente brilhante. Só li 2 artigos do juiz federal. O da tal da katchanga q
mais parece nome de letra de funk e esse q comento e ambos achei de um brilhantismo impar. Só
sei q com esses leves barracos forenses todos ganhamos pela pluralidade de idéia e pela descida
do olimpo. Bom sábado para todos katchangeiros.

José Cláudio Carneiro Filho Says:


Março 6, 2012 às 8:39 pm
Certamente, todos ganham com o debate. Talvez, inclusive, as alfinetadas grosseiras e
personalíssimas sirvam de combustível a ambos (e outros tantos discípulos ofendidos de maneira
reflexa) para que se dediquem cada vez mais a apronfundar suas teses e aparar arestas.
Espero, apenas, que se chegar a hora de recuar e abandonar a tese, qualquer deles tenha
humildade e inteligência suficiente para fazê-lo, ou entrarão para a estatística citada no texto do
Prof. George (“A tendência, quando o cientista se depara com uma prova empírica que possa
refutar a sua teoria, é sempre reformular a proposta inicial, por meios de emendas “ad hoc”,
mantendo o núcleo da hipótese inalterado, de modo a permitir que ela seja reconciliada com os
fatos observados”).

José Cláudio Carneiro Filho,


Professor de Direito Constitucional e Administrativo e mero observador do tuelo de titãs.

Anónimo Says:
Março 30, 2012 às 2:56 pm
(Eu achando que o texto do Streck era longo…)
O Bernard Williams, no fim do “Ethics and the limits of philosophy” identifica a confusão
moderna, herdada de Descartes, de confundir razão com objetividade; tendemos a crer que uma
crença só é racional se ela pode se apoiar num discurso/argumento universalizável – e que um
argumento só é válido se puder obter algo como um consenso geral ou ideal. Acho q é essa é uma
confusão quanto à crítica da ponderação: embora o juiz possa não decidir de maneira objetiva
(nesse sentido “forte” de objetividade), não significa que esteja sendo racional ou arbitrário.

ruy samuel espíndola Says:


Abril 28, 2012 às 6:03 pm
Ilustre Professor George:

Gostei demais de seu artigo, como o inicial, que suscitou a aparente controvérsia entre o seu
pensamento e o de Lenio Streck.

Rico o debate. Devendo dizer que ambos os autores são profundos, e cada qual, claros a sua
maneira.
Dos três artigos fico com o que a de explicativo, ponderativo e crítico quanto aos temas neles
versados.

O senhor é Juiz. Lenio Procurador de Justiça. Eu advogado militante, da comarca, ao STF.

Todos concordamos que é preciso contornar, superar o decisionismo judicial, o voluntarismo


desapegado das normas positivas, o espírito de se fazer justiça a qualquer preço, etc.

Esse o “locus” da bela crítica em que vejo a convergência do pensamento de ambos. A maneira de
isso fazê-lo, é que pode suscitar controvérsias.

Forte abraço, de Florianópolis, SC, Ruy Samuel Espíndola

Leonardo Wandelli Says:


Abril 28, 2012 às 6:39 pm
Apenas um comentário jornalístico-museológico sobre Warat e a anedota: na versão que ouvi da
boca de Warat, na UFSC, por volta de 1990/1991, acho, (Lênio era doutorando, na época, e eu, na
graduação) o nome do jogo era Puerca! Foi depois, do Lênio, que ouvi a versão Katchanga!
Reconheço que ficou mais impressionante.

No mais, quanto ao debate, diria apenas que Puercas ou Katchangas são inevitáveis para qualquer
teoria. O próprio positivismo, em Popper, já o reconhecera: isso decorre da ausência de uma
inteligência infinita com uma velocidade infinita. Azar da teoria, pois. O compromisso deve estar
sempre do lado do real humano, que inevitavelmente “sobra”, lacanianamente (em homenagem a
Warat) a toda teoria. Aliás, para o direito, Castanheira Neves bem demonstrou ainda em 1967,
que, sendo um campo estritamente prático-normativo, somente pode se servir de um arsenal
teórico (no sentido aristotélico) mediante o artifício de uma falsidade metodológica que depende
de muitas Katchangas-Reais-Specials-Plus-Powers para disfarçar.

Ana Cláudia Andrade Says:


Maio 25, 2012 às 6:42 pm
Katchanga ou o “Cachangá”, pefiro a segunda, versão brasileira. A citação inicial da página do
blog também poderia ser em português já que existe uma clara defesa ao entendimento, à
simplicidade. O uso da língua inglesa é um paradoxo às idéias postadas.Fica a sugestão. Bom
debate.

André Says:
Junho 29, 2012 às 8:20 am
Já li muitos do Streck.Vou ler os seus para poder debater melhor .Estudei recentemente com um
orientando do próprio R. Alexy e algumas coisas deste autor me foram passadas de forma muito
clara e objetiva, mas também pontuadas com críticas ao autor alemão .

Po Says:
Julho 1, 2012 às 3:30 am
Está falando do prof. Virgílio? Tens sorte se for, um dos poucos juristas brasileiros
contemporâneos que realmente sabem o que estão escrevendo…

Po Says:
Julho 1, 2012 às 3:25 am
O mais interessante foi a ironia do último parágrafo. Muito boa.

Tiago Bana Franco Says:


Julho 1, 2012 às 3:10 pm
O tal do Lênio é um chato, cheio de termos alemães e citações de filósofos desconhecidos, com os
quais tenta dar a seus textos algo que eles não têm: conteúdo. Lembro da crítica que ele faz às
súmulas vinculantes, colocando-as como respostas a perguntas que não foram feitas. Que genial!
E as leis também não seriam isso? Respostas a perguntas que não foram feitas, mas poderiam sê-
lo? Que se critiquem as súmulas e o que quer que seja, mas sem a burrice pretensiosa que a
academia confere a certos doutores.

Ítalo José Rebouças Says:


Julho 2, 2012 às 9:12 pm
Dr. George,
Só hoje vejo o quanto foi uma pena Mossoró ter perdido você.
Uma grande perda para a atividade judiciária e para a Academia dessa terra de Santa Luzia.
Parabéns pelo debate.

Anónimo Says:
Agosto 14, 2012 às 11:46 pm
debate, debate, debate simplesmente norte e sul, leste oeste que canseira prolixia exagerada muita
inteligencia lógica exaurindo a inteligencia relacional. Pensei dExisto…..

João Bosco Cascardo de Gouvêa Says:


Agosto 20, 2012 às 7:19 pm
Caro Dr. George Marmelstein: Suas reflexões são profundas, todas comprometidas na busca do
caminho para chegarmos à Justiça, o valor maior. Vejo, com clareza, três grandes valores: O
Direito, a Lei e a Justiça, este último o superior. A Lei não pode tornar-se uma camisa de força,
pondo-nos antolhos que nos impeçam uma visão ampla e verdadeiramente justa. Não contém
todo o Direito, mas uma boa parte dele. Nessa sua linha de pensamento ontem escrevi uma carta à
Folha de São Paulo na expectativa de vê-la publicada. Nela defendo a existência de um dilema no
STF, neste momento: o Ministro Peluso deverá votar apenas relativamente a alguns denunciados,
ou a todos?. O Procurador Geral não viu nesses crimes um “continente”, a necessidade de serem
julgados numa visão conjuntural!? O próprio Supremo não foi acorde em reunir todos os atores
num mesmo julgamento!? Um seu Ministro, o Dr. Cesar Peluso, é homem íntegro,
verdadeiramente de notável saber jurídico, encontra-se identificado com o processo, conhece-o a
fundo, não tem culpa da longevidade do seu curso etc. Por que, por um “detalhe”, o de completar
70 anos em dois de setembro sairá da cena desse processo, embora nele deixando indeléveis, as
suas votações anteriores? Teve apenas uma meia participação!?. Ora, essa seria uma regra, a da
cessação da sua função judicante quando do seu próximo aniversário natalício. Este aspecto seria
maior que qualquer outro!? Sustento o inverso. Pela magnitude do caso, por seu caráter
emblemático, pela restauração da MORAL,que tanto aguardamos, por que não vermos aí uma
sobrevida legal e implícita da jurisdição, justificadora da sua competência residual!? A quem
poderá prejudicar a sua manutenção no processo, até o fim que se avizinha!? Por isso encerrei
meu texto lembrando Camões: “Cesse tudo quanto a antiga Musa canta porque um valor mais
alto se alevanta”.

Respeitosamente, João Bosco Cascardo de Gouêa.

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