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A Escola Portátil de Música

Por Luciana Rabello

Ensaio elaborado especialmente para o projeto Músicos do Brasil: Uma Enciclopédia,


patrocinado pela Petrobras através da Lei Rouanet

O Choro é a mais rica e antiga música instrumental do Brasil. Sua riqueza rítmica, melódica e
harmônica - que exige um alto nível técnico de seus executantes - sempre fez desse gênero musical brasileiro
a nossa mais eficiente escola de músicos populares. Impossível relacionar grandes músicos, instrumentistas e
compositores da música brasileira sem constatar que muitos vieram da escola do choro ou fizeram longa
inserção por ela, aprimorando sua técnica: Villa-Lobos, Guerra Peixe, Francisco Mignone, Pixinguinha, Tom
Jobim, Baden Powell são alguns dos nomes que ilustram bem esse caminho.

Sem ter ainda essa noção sistematizada sobre o gênero, eu e meu irmão Raphael Rabello começamos
no choro muito cedo e de forma absolutamente apaixonada. Todas as manhãs de domingo pegávamos o
ônibus 498 – Cosme Velho/Penha, que ligava a nossa casa a casa de Joel Nascimento. Íamos rumo às rodas de
choro do minúsculo bar Santa Terezinha, na Rua Francisco Enes, bem perto da casa do bandolinista. A roda
começava por volta das 10 horas, antes do almoço domingueiro do subúrbio. Encontrávamos ali Joel, Joir (seu
irmão violonista), Abel Ferreira, Zé da Velha, Índio do Cavaquinho e outros chorões menos conhecidos, como
Seu Berredo, Motinha, Petrônio e Caciporé. As rodas sempre acabavam na casa do Abel ou do Joel.
Almoçávamos por lá e só voltávamos para casa bem tarde. Esses encontros musicais no bar Santa Terezinha
duraram mais ou menos dois anos, tempo produtivo e inesquecível, quando aprendemos muito. Como a
freqüência começou a aumentar, as reuniões foram transferidas para um armazém na outra esquina e, dali em
diante, a qualidade daquele encontro musical já não pôde se dar da mesma forma. O apelido Sovaco de Cobra
- que Abel Ferreira tinha dado ao bar Santa Terezinha - foi patenteado pelo novo endereço. Lá as rodas
começaram a encher tanto que ficaram barulhentas, os músicos passando a tocar sempre alto demais. Sem
espaço para dinâmica, perdeu-se a sutileza tão cara ao choro. Repórteres de diversos jornais, revistas e até de
emissoras de televisão queriam fazer matérias sobre aquele evento que passou a ser visto como programa cult.
Para quem queria tocar e escutar de verdade, não restou outra opção senão sair de fininho em busca de lugar
melhor.

Na zona norte carioca, ali por perto da Mangueira, ficava a casa de Jayme Florence, o célebre Meira,
professor de Baden Powell, Raphael Rabello, Mauricio Carrilho, João de Aquino e tantos outros grandes
violonistas. Fui algumas vezes junto com Raphael àquelas aulas. Meira me dava um cavaquinho com cordas
de nylon para que o som metálico das cordas de aço não encobrisse o solo de violão. O que ele queria mesmo
era que eu mudasse de instrumento. Me ensinou a solar no violão, meu primeiro instrumento, o choro
Magoado, do Dilermando Reis. Tocávamos muito e o mestre ia aparando as arestas, ensinando os caminhos,
ampliando os horizontes. As aulas duravam tardes inteiras e tinha muito papo, ouvíamos histórias que nos
traziam ensinamentos ainda mais importantes. Começávamos a entender que tocar implicava muito mais do
que dominar a técnica de um instrumento. Tínhamos entre 13 e 14 anos e Meira 60 e poucos. Foi numa dessas
tardes que Raphael conheceu Mauricio Carrilho, logo trazendo o novo amigo para integrar Os Carioquinhas,
nosso primeiro conjunto.

Havia uma dezena de outras rodas que freqüentávamos quando meninos, ávidos por aprender a tocar.
Além do Sovaco e do clube Jequiá na Ilha do Governador (onde mulher não entrava!), aconteciam rodas na
casa do Afonso Machado em Botafogo, do Déo Rian em Jacarepaguá, do Seu Álvaro Carrilho e da Tia Zélia
na Penha, do Jonas do Cavaquinho em Niterói, na casa do S. Elpídio com Dino, Jorginho do Pandeiro,
Ronaldo, Rogério Souza e seus irmãos. Tocávamos com mestres como Dino, Meira, Canhoto, Altamiro
Carrilho, Abel Ferreira, Copinha, Rossini Ferreira, Canhoto da Paraíba. Costumo dizer que aprendi nessas
rodas mais que aprenderia em qualquer academia.
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Era nítida a alegria dos músicos veteranos nessas rodas de choro e, anos depois, pude entender a
razão. O choro era a música que lhes dava prazer, que propiciava o eterno e desafiador aprendizado, sendo as
rodas, assim, o seu grande lazer dos finais de semana. Muitos deles eram instrumentistas profissionais que
passavam a semana acompanhando cantores e tocando outros gêneros musicais, o que, por mais que também
lhes desse prazer, não lhes satisfazia plenamente. Tocar choro era como estar na casa materna, mas naquela
época ainda não era possível sobreviver apenas tocando essa música. Acredito que a nossa geração foi a
primeira que pôde encarar, ainda que com muita luta, o desafio de fazer do choro a sua profissão exclusiva.

No final da década de 70, estávamos na iminência de fazer vestibular. O oficio já estava escolhido,
mas a família queria que fizéssemos um curso superior. Que fosse música mesmo, mas na universidade.
Então, me inscrevi para tentar vaga no curso específico oferecido pela UFRJ que, naquela época, preparava os
aspirantes ao vestibular de música e ao ingresso na escola da Orquestra Sinfônica Brasileira, e logo me
deparei com um sério entrave. Apesar de passar no teste teórico, fui reprovada na entrevista no exato
momento em que respondi que meu instrumento era o cavaquinho. Bem cedo tive que entender que só havia
dois caminhos para aprender música nas universidades: ou pela escola erudita tradicional ou, na área popular,
através do jazz, em Berkeley. Não havia a alternativa que eu procurava para formação em música brasileira.
Não existia caminho para nossa turma.

Na época conversei muito com Raphael e Joel sobre isso. Muitos outros músicos sentiram e pensaram
a mesma coisa que nós e alguns, como Roberto Gnattali, até iniciaram trabalhos visando preencher essa
imensa lacuna. Começamos a alimentar o sonho da criação de uma universidade de música brasileira, onde o
cavaquinho e outros instrumentos populares pudessem entrar pela porta da frente, e onde o ensino do choro,
do samba, do maracatu, do baião, do frevo, do samba de roda, do caboclinho, da congada e de tantos outros
gêneros musicais próprios de nosso país fosse ministrado em toda a sua riqueza e complexidade. É mesmo
inacreditável que ainda hoje as universidades de música no Brasil formem músicos sem esse aprendizado.

Dali em diante, fomos seguindo o caminho dos nossos mestres, aprendendo enquanto fazíamos e já
nos profissionalizando. No início do ano 2000, Raphael já havia nos deixado e eram passados 25 anos do
início da nossa vida profissional. Aparece um menino, aprendiz de violão com a seguinte pergunta: - Vocês
não vão a rodas de choro nunca? Como é que a gente pode aprender se vocês, que aprenderam com os mais
velhos, não vêm tocar junto com a rapaziada? Vocês vivem dizendo que aprenderam em rodas de choro. E
nós, como fazemos? Eu tinha dois filhos na mesma situação. Esses meninos ficam sem ambiente e ainda sem
alternativa de aprendizado. Poucas pessoas dessa idade que tiveram acesso a essa música e se interessaram por
ela, tinham oportunidade de conhecer seus semelhantes. E sem rodas de choro, como fazer? Lembrei da
alegria que eu e Raphael tivemos quando conhecemos Mauricio, Afonso Machado, Paulinho do Bandolim,
Celsinho Silva, Pedro Amorim e Ronaldo Souza. Nossos pares.

Dias depois de ter recebido a reclamação do menino do violão, Cirley de Hollanda comenta, numa
conversa de botequim, que sua filha, estudante de flauta, passa pelo mesmo problema que os meus: não tem
ambiente, não tem como aprender. Gosta de choro, de samba e fica parecendo um extra-terrestre diante dos
colegas da sua idade. Cirley era diretora da Sala Funarte e lançou a proposta de criar uma oficina de choro lá,
no segundo semestre daquele ano, de agosto a novembro, aos sábados pela manhã. Não tinha verba,
remuneração zero. Era mesmo para atender às solicitações e necessidades dos garotos, fazendo rodas de choro
como aquelas em que aprendemos a tocar. Muitas oficinas de música já aconteciam em diversas cidades,
sendo aquele um formato que agradava e atraía público. Mauricio Carrilho, que também estava na mesa, se
animou e topou de cara. Chamamos seu pai, Álvaro Carrilho, o Pedro Amorim e o Celsinho Silva. Dessa
forma, tínhamos um regional completo – cavaquinho, violão, flauta, bandolim e pandeiro. Sem nenhuma
divulgação, apenas pelo boca-a-boca, apareceram quase 60 meninos para se inscrever. Maurício tinha muito
mais experiência didática que todos nós, talento nato para lecionar, além de ser herdeiro direto da escola do
Meira. Eu mesma não tinha nenhuma idéia organizada sobre como fazer para ensinar didaticamente o que
tinha aprendido apenas por observação e prática.

As oficinas começaram. Formamos vários conjuntos regionais e a garotada estava muito estimulada.
As rodas eram boas. Novembro chegou e a Cirley, que estava deixando a direção da Sala Funarte, tratou de

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pensar em opções para que pudéssemos continuar o trabalho. Fez contato com João Guilherme Ripper, diretor
da Escola de Música da UFRJ, que nos convidou para continuar a ministrar a oficina naquela escola. Por
ironia, a mesma onde não pude ingressar no inicio dos anos 80. Maurício se empolgou e começou a organizar
o pensamento dinamizando a oficina, criando material didático e chamando outros músicos amigos para dar
aulas de novos instrumentos e de leitura musical. Na Sala Funarte, éramos 5 músicos e cerca de 60 alunos. No
primeiro ano na UFRJ, passamos a ser 8 músicos e mais de 120 alunos. No segundo, 12 e 200. Hermínio Bello
de Carvalho, que nos visitava nas manhãs de sábado desde a Sala Funarte, começa a nos instigar a fazer
crescer aquela oficina, a profissionalizar o trabalho, ampliando o número de garotos e até mesmo de cidades
atendidos. Hermínio tem longa folha de serviços prestados à música brasileira e já havia desenvolvido o
projeto Apostilas Sonoras, que nada mais era que material didático para aprendizes de música. Por fim, batiza
a nossa oficina de Escola Portátil de Música, depois de já ter feito com que inscrevessem o projeto nas Leis de
Incentivo Fiscal. Como ação combinada, uma empresa passa a nos oferecer patrocínio.

Desse ponto em diante, as salas disponibilizadas pela UFRJ já não comportavam o nosso contingente
de alunos e professores. Alugamos uma casa na Glória, onde passamos a ser 18 músicos e 400 alunos.
Diversos desses novos músicos-professores, quase todos da geração posterior à dos fundadores da oficina,
haviam sido graduados na UniRio em Regência, Licenciatura, Composição etc. Por fazerem parte de uma
geração mais nova, tiveram a sorte de encontrar um ensino acadêmico mais arejado e menos conservador. Isso
enriqueceu nossa atividade, gerando uma troca muito produtiva e respeitosa de experiências e conhecimentos
entre os professores da Escola Portátil de Música (EPM).

Ainda na casa da Glória, passamos a receber a visita de vários músicos amigos, entre eles Luiz Otávio
Braga, Roberto Gnattali e Ricardo Ventura, todos professores da UniRio – hoje a mais importante
universidade de música do Rio. Luiz já havia feito diversas oficinas pelo Brasil; Roberto organizou o
Conservatório Brasileiro de Música em Curitiba e trabalhou muito pela entrada da música popular na
universidade; Ricardo é professor de violão e sempre batalhou pela mesma causa, lutando para tirar o ranço
conservador do ensino acadêmico. Em agosto de 2005, a convite desses amigos, levamos a EPM para as
instalações da UniRio. Recebemos o patrocínio da Petrobras, que nos possibilitou crescer e atender um
número maior de alunos. Divulgamos as datas de inscrição e tivemos mais de 1.300 candidatos a vagas.
Selecionamos 600 e aumentamos o número de professores para 23.

Criamos o Instituto Casa do Choro que passou a ser o representante legal da Escola Portátil de
Música. Ampliamos as ações da EPM fazendo as oficinas volantes em diversas cidades, justificando o
“portátil” semeado por Hermínio no batismo da escola. Começamos, também, a fazer o Festival Nacional de
Choro que reúne, desde 2004, cerca de 250 alunos em cursos intensivos com duração de 8 dias, oferecendo
ainda shows, palestras e, claro, muitas rodas de choro. O número de músicos profissionais estrangeiros
interessados em estudar o choro tem crescido cada vez mais nesses festivais, comprovando que a riqueza
dessa música tem grande contribuição a dar, dentro e fora das nossas fronteiras.

No núcleo fixo, como chamamos o trabalho desenvolvido na sede da UniRio, oferecemos as oficinas
de violão (Maurício Carrilho, Luis Flávio Alcofra, Anna Paes e Paulo Aragão), flauta (Álvaro Carrilho,
Antonio Rocha e Naomi Kumamoto), cavaquinho (Luciana Rabello e Jayme Vignoli), bandolim (Pedro
Amorim), pandeiro (Celsinho Silva e Jorginho do Pandeiro), percussão e bateria (Oscar Bolão), piano e
acordeon (Cristóvão Bastos), saxofone (Rui Alvim), clarinete (Pedro Paes), tuba e trombone (Thiago Osório),
trompete (Nailson Simões) e canto (Amélia Rabello). Aulas teóricas de leitura (Pedro Aragão), harmonia (Bia
Paes Leme e Marcílio Lopes), digitalização de partituras (Ricardo Gilly) e composição (Mauricio Carrilho),
além das aulas de prática de conjunto ministradas por diversos dos professores relacionados acima. Criamos
ainda a midiateca Hermínio Bello de Carvalho – onde disponibilizamos vasto acervo de gravações e vídeos,
com intuito de dar aos alunos o acesso à riquíssima produção da música brasileira que os meios de
comunicação e o mercado fonográfico têm deixado de lado.

Foram criadas também duas pequenas orquestras: a Camerata Portátil – formada basicamente de
instrumentos de cordas, flautas e madeiras, com característica camerística - e a Furiosa Portátil, formada por
instrumentos de metal, piano, contrabaixo e bateria, com sonoridade que remete às orquestras de gafieira.

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Ambas são constituídas por uma média de 30 músicos, entre alunos e professores, e têm seu repertório
formado por composições e arranjos originais de mestres como Radamés Gnattali, Guerra-Peixe, chegando
aos contemporâneos Mauricio Carrilho, Cristóvão Bastos, Pedro Aragão, Jayme Vignoli, Paulo Aragão. Todos
os sábados, das 12 às 13 horas, acontece no pátio externo da UniRio o ensaio do Bandão – grupo formado
pelo conjunto total dos alunos da escola. Esse ensaio é aberto ao público e vem se tornando um acontecimento
musical importante na cidade.

Em 2006, foi firmado um convênio entre o nosso Instituto e a UniRio, através do qual a EPM passou a
ser um curso de extensão da graduação de música daquela universidade. O mais importante diferencial do
trabalho realizado na EPM consiste no fato dos alunos terem oportunidade de aprender com músicos
profissionais, inseridos no mercado de trabalho há 25 anos, em média, aprendendo o ofício na prática e hoje
com respaldo também teórico.

Sem alarde e ao nosso modo, contribuímos para realização do antigo sonho da criação da
Universidade de Música do Brasil. Acredito que nosso maior desafio hoje seja organizar e sistematizar o
ensino de música popular, agregando valores, somando o conhecimento acadêmico aos fundamentos
adquiridos em nossa vivência musical, sem perder de vista os fatores que fizeram com que o choro formasse
tantos músicos de qualidade ao longo da sua história centenária, transformando-se na verdadeira escola da
música do Brasil.

Rio de Janeiro, 2007

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