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Fábio Pessoa∗∗
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Texto produzido para fins estritamente didáticos na disciplina Teoria da Linguística I.
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Doutor em Linguística. Professor do Departamento de Letras do Centro de Ciências Aplicadas e Educação da
Universidade Federal da Paraíba – DL/CCAE/UFPB. E-mail: professorfabiopessoa@hotmail.com
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discute, pioneiramente, a relação entre a palavra e o seu significado; natural e necessária para
uns, convencional e acidental para outros.
Os gregos antigos foram os responsáveis por transformar o alfabeto silábico
consonântico em alfabeto capaz de representar todos os sons da língua, com consoantes e
vogais. Com isso, fizeram avançar consideravelmente o conhecimento do que se convencionou
chamar a posteriori de segunda articulação da língua, ou análise fonológica. Foram os gregos
também, segundo Ducrot e Todorov (1982), os precursores da Linguística ocidental, sobretudo,
em função dos seus postulados filosóficos acerca do funcionamento da língua/linguagem.
Apesar de um posicionando essencialmente especulativo sobre os fenômenos da linguagem,
tratando-a como mero instrumento de raciocínio e de persuasão, os filósofos gregos, Platão e
Aristóteles, contribuíram significativamente para os estudos da língua(gem) ao refletirem,
conforme já havia feito Panini em sua gramática hindu, sobre a problemática de que se a língua
era uma expressão natural e direta do mundo, fonte de conhecimento e espelho da realidade, ou
simples meio de comunicação, com o sentido das palavras dado pelo convencional, arbitrário.
Entre os pensadores gregos, aqueles que defendiam a primeira tese eram chamados de
anomalistas; os que defendiam a segunda, analogistas. O Crátilo, de Platão, é um texto
justamente dedicado a discutir se a relação entre as palavras e seus referentes seria natural ou
convencional (CARBONI, 2008). Além disso, foram os gregos quem, inicialmente, elaborou
uma classificação gramatical, a qual vigora basicamente até hoje (CÂMARA JR., 1975).
As diversas gramáticas elaboradas pelos Alexandrinos, a partir dos esboços de Platão e
de Aristóteles acerca dos casos, da estrutura das frases e das partes dos discursos eram de
orientação analogista e ressaltavam as regularidades do sistema morfológico, dividindo a
diversidade dos elementos da linguagem em oito partes, conforme o primeiro tratado gramatical
de Dionísio de Trácia: artigo, nome, verbo, princípio, pronome, advérbio e conjunção. Do outro
lado, os estoicos contestavam os analogistas e, defendendo o caráter natural da língua, por isso
anomalistas, propuseram uma classificação das palavras em classes - nome, verbo, conjunção,
artigo, verbos passivos, transitivos e intransitivos. Como se vê, essas nomenclaturas da
classificação gramatical ainda hoje utilizadas remontam aos antigos gregos.
No século II d. C., os gramáticos romanos retomaram e prosseguiram os trabalhos dos
gregos. Dentre eles, Varrão se destaca como autor de uma volumosa descrição da língua latina.
No século V, Donato e Prisciano codificaram a gramatica latina para a posteridade,
determinando em grande parte os conteúdos dos manuais para o ensino de língua.
A partir do século X, os gramáticos medievais preocuparam-se unicamente em
descrever o funcionamento do latim, língua oficial da igreja, para facilitar o seu ensino e a
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leitura dos textos bíblicos/sagrados da época. Até o século XV, a língua latina foi privilegiada
como objeto de análise. Todavia, nesse período, a fim de estabelecer uma teoria da linguagem,
os chamados modistas foram os mais conhecidos adeptos de uma gramática universal. Tratava-
se de uma interpretação lógico-formalista baseada na visão de que todas as línguas obedecem
a princípios gerais e lógicos, como queriam os anomalistas gregos. Tal concepção serviu de
base para a elaboração da gramática geral e raciocinada de Port-Royal (1660), na França, por
Antonie Arnould e Claude Lancelot, com o intuito de enunciar certos princípios a que todas as
línguas obedecem (DUCROT; TODOROV, 1982).
A importância da Gramática de Port-Royal consistiu em pôr fim ao privilegio da
gramática latina como modelo de análise, já que outras línguas passaram a ser observadas, na
tentativa de explicar usos particulares mediante regras gerais deduzidas. Isso, segundo Carboni
(2008), contribuiu para o avanço dos estudos linguísticos, ao pensar a linguagem em sua
generalidade.
É importante notar que subjaz à concepção de gramática universal/geral a noção de
língua como expressão do pensamento, vinculado ao que os gregos anomalistas já defendiam
na Antiguidade, isto é, a palavra é imitação do pensamento e permite aos homens significarem-
se, darem a conhecer uns aos outros os seus pensamentos.
Portanto, pelo menos do século XIII ao século XVIII, prevaleceu a visão lógico-
universalista aristotélica e racionalista da gramática de Port-Royal, embora já houvesse
manifestações de estudos descritivos das línguas faladas, sobretudo, por parte dos missionários
e viajantes (CARBONI, 2008).
Linguístico de Praga, com destaque para Jakobson e Martinet. Tais teses, todas elas decorrentes
do CLG, podem ser assim sumarizadas:
− A Linguística Estruturalista se caracteriza pela sua abstratização e pela sua
generalização, opondo-se à busca do concreto e do particular;
− O signo linguístico é arbitrário e a relação entre as suas partes – significante e
significado – é puramente convencional;
− A língua é um arranjo sistemático de partes, e está composta de elementos formais
articulados entre si em combinações variáveis, conforme determinados princípios de
estrutura;
− A língua deve ser estudada em si e por si mesma, segundo o princípio da imanência
linguística, ou seja, os fatos na estrutura da língua são condicionados só e apenas
por fatos e/ou elementos dessa mesma estrutura;
− A língua deve ser tratada exclusivamente como uma forma, livre das suas
substâncias e, sobretudo, deve-se buscar descrever como essa forma se constitui, isto
é, por um jogo sistêmico de relações de oposição.
Assim, com apogeu das ideias do CLG, especialmente na Europa e na América do Norte,
surgiram outros personagens que igualmente figuraram no Estruturalismo pós-Saussure, todos,
certamente, unidos pelo entendimento da língua enquanto sistema, enquanto estrutura abstrata.
Destaco, neste caso, Noam Chomsky, por ele ter investido em uma proposta de análise que se
transformou em uma corrente de investigação no interior da Linguística Estruturalista da
segunda metade do século XX, a Gramática Gerativa (WEEDWOOD, 2002).
Todavia, antes de apresentar os postulados centrais do Gerativismo, de origem norte-
americana, é importante ressaltar que, na Europa, uma das principais ramificações do
estruturalismo pós-saussuriano foi o Círculo Linguístico de Praga, formado por pesquisadores
como Roman Jakobson e André Martinet que, embora discordassem de algumas das ideias
contidas no CLG, beberam nessa fonte e propuseram reformulações e/ou ampliações, a exemplo
da noção de sistema funcional, para descrever e explicar os fatos da língua. Também vale
destacar a figura de Leonard Bloomfield, do Estruturalismo norte-americano pré-Chomsky, o
qual defendeu a Linguística Distribucionalista, proposta de investigação que antecedeu o
Gerativismo e nasceu da necessidade de descrever e descobrir a estrutura de línguas nativas
americanas até então desconhecidas.
Voltando a Chomsky, a fim de sanar as fragilidades da Linguística Distribucionalista
quanto à impossibilidade de resolver algumas ambiguidades semânticas, esse linguista recorreu
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posteridade as considerações mais acabadas sobre o que chamamos hoje de Enunciação, o que
inclui noções como a de Dialogismo e de Gêneros do Discurso (BAKHTIN, 2003).
O linguista francês Émile Benveniste também se destacou nessa “virada
epistemológica” ao tratar do tema da subjetividade na linguagem. De formação estruturalista,
como a maioria dos linguistas do século XX, Benveniste introduziu pioneiramente a noção de
sujeito no discurso, este entendido como manifestação viva da língua. Segundo tal autor, o
sujeito se constitui na e pela linguagem e se expressa na relação Eu-Tu. Benveniste foi o criador
da chamada Linguística da Enunciação, uma área dos estudos linguísticos que trata dos modos
de significação da linguagem olhando para o sujeito que dela se utiliza em diferentes
enunciações.
A Pragmática também constitui uma corrente linguística relevante para os estudos da
linguagem no século XX. Seu foco é estudar o uso dos signos e os efeitos que esse uso produz
nos falantes/ouvintes que os utilizam. Os filósofos Austin e Searle são os principais expoentes
da Pragmática, pois sistematizaram estudos em torno do que fazem os falantes quando falam.
Na perspectiva da Pragmática, a linguagem verbal é muito mais do que uma mera representação
da realidade. Trata-se de uma instituição que comporta atos de linguagem socialmente fixados
que correspondem a papéis convencionais e que existem apenas nessa e através dessa
instituição: ordenar, prometer, insultar, criticar etc. Esses atos de linguagem são submetidos a
certas regras, distintas em cada sociedade.
A Análise do Discurso é outra corrente de estudos que emergiu na segunda metade do
século passado. Surgiu na França, em fins de 1960, e desenvolveu-se a partir da aplicação das
teses althusserianas (de Louis Althusser) à análise da linguagem e do sentido, especialmente
por Michel Pêcheux, para quem a Linguística Estruturalista, ao excluir sistematicamente
qualquer teorização sobre o texto e sobre a produção de sentidos, deixou espaço para que as
ideologias (re)invadissem o campo do sentido, do discurso.
A escola francesa de Análise do Discurso apoia-se em três grandes áreas do
conhecimento: a Linguística, a Psicanálise lacaniana e o Materialismo histórico, sobretudo, na
visão de Althusser. Um pressuposto básico da AD é o de que a linguagem não é transparente,
logo, a relação língua/pensamento/mundo real não é unívoca, pois o ser humano pertence
sempre a uma formação social e ideológica e a reflete, vivendo e fazendo sua história, mesmo
que não tenha plena consciência disso. O objeto da AD não é o sentido ou o discurso em si, mas
o processo de sua produção. Diferente da Linguística da Enunciação, a AD não separa forma e
conteúdo. Para ela, a língua não é mais vista como estrutura, mas como acontecimento, como
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REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes,
2003.
BENTES, Anna C. Linguística Textual. In: MUSSALIM, Fernanda e BENTES, Anna Christina
(Orgs.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
FISCHER, Steven R. História da escrita. Trad. Mirna Pinsky. São Paulo: Editora da UNESP,
2009.