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Revista de Psicologia

O FREUDISMO E A ESCOLA DE FRANKFURT:


ENSAIO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE
METAPSICOLOGIA E TEORIA CRÍTICA
Revista FREUDIANISM AND THE FRANKFURT SCHOOL: STUDY ABOUT THE RELATIONSHIP
de Psicologia BETWEEN METAPSYCHOLOGY AND CRITICAL THEORY

Emanuel Messias Aguiar de Castro 1 Aluísio Ferreira de Lima 2

Resumo
O ensaio que segue é fruto de uma pesquisa bibliográfica onde se pretende demarcar a relação da Teoria Crítica da Escola de
Frankfurt com a Psicanálise de Freud, em específico sua metapiscologia, aqui referida como freudismo. Para tanto, foi realizada uma
minuciosa análise do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt enquanto marco epistemológico e não como produção individual de
seus colaboradores. Um dos objetivos dessa proposta é compreender o que é comum nas várias faces do movimento frankfurtiano em
relação ao saber freudiano, ou seja, identificar o freudismo da Teoria Crítica. Esse trabalho encontra-se dividido em três partes: 1)
Uma breve introdução ao tema sugerido junto de algumas explicações sobre o procedimento de pesquisa que culminou neste ensaio;
2) Uma contextualização histórica dos eventos que levaram à aproximação entre freudismo e Escola de Frankfurt e, por fim; 3) A
relação da Teoria Crítica com a psicanálise freudiana em seus aspectos filosóficos, sociocríticos e crítico cultural. Com isso, buscou-se
identificar nessas grandes áreas os movimentos de sístole e diástoles que marcam a conflituosa relação entre materialismo histórico-
dialético e freudismo, principalmente, por assumimos como premissa que a Teoria Crítica dialoga com a psicanálise de Freud tendo
a metapsicologia como instrumento mediador. O intuito final desse trabalho não é validar ou contestar o movimento de aproximação
entre o freudismo e marxismo, mas evocar a importância da Escola de Frankfurt para a Teoria Crítica e para a compreensão dos
fenômenos que envolvem as relações sujeito-sociedade.
Palavras-chave: Freudismo, Metapsicologia, Escola de Frankfurt.

Abstract
This paper is the result of a literature research which aims to demarcate the relationship of the Critical Theory of the Frankfurt School with
Freud’s psychoanalysis, in particular its metapsychology, referred here as freudianism. To archieve this, we made a detailed analysis of the
Institute for Social Research in Frankfurt while epistemological Mark, and not as an individual production of its members. This paper was
divided into three parts: 1) a brief introduction to the suggested topic and some explanations of the research procedure culminat in this
article; 2) A historical contextualization of the events that led to the rapprochement between Freudianism and the Frankfurt School; 3) The
ratio of Critical Theory with freudian psychoanalysis in its philosophical, sociological and cultural critic aspects. Thus, We tried to identify
these fields approach and displacement movements that symbolize the conflicting relationship between the historical and dialectical
materialism and the Freudianism mainly because we assume the premise that the dialogues Critical Theory with Freud’s psychoanalysis
had the metapsychology as a mediator instrument. The purpose of this work is to show the importance of the Frankfurt School for Critical
Theory and the understanding of phenomena involving the subject-society relations.

Keywords: Freudianism, Metapsychology, Frankfurt School.

1
Membro do Paralaxe: Grupo Interdisciplinar de Estudos, Pesquisas e Intervenções em Psicologia Social Crítica, Brasil. Graduado em Psicologia pela Uni-
versidade Estadual do Ceará. E-mail: emanuel_messias.adc@hotmail.com
2
Universidade Federal do Ceará (UFC). Doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). Professor do Programa
de Pós-Graduação em Psicologia da universidade Federal do Ceará (UFC). Lider do Paralaxe: Grupo Interdisciplinar de Estudos, Pesquisas e Intervenções
em Psicologia Social Crítica. E-mail: aluisiolima@hotmail.com

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O termo Escola de Frankfurt desig- ca da Escola de Frankfurt entre os anos de


na o somatório dos esforços de intelectuais 1920 e o final dos anos de 1950.
marxistas da década de 1920 que, através
Pensar, então, a proposta da inter-
de uma leitura não ortodoxa do materialis-
seção de dois saberes distintos, a psicaná-
mo histórico-dialético, encontraram nesse
lise e o marxismo, culminando na “Teoria
a possibilidade da construção de um dis-
Crítica” da Escola de Frankfurt é, antes de
curso sui generis fronteiriço entre as epis-
tudo, pensar como esses dois saberes con-
temologias de uma Filosofia Social, uma
solidados podem caminhar com consonân-
Ciência Social e uma Psicologia situada
cia em direção a um objetivo comum.
principalmente no projeto psicanalítico de
Freud (Assoun, 1991). Para isso é importante uma rápida
reflexão sobre o que estamos denominando
Segundo Matos (2005) a Escola de
como Psicanálise, uma vez que assumimos
Frankfurt foi fundada em 1924 sob o títu-
ser na intersecção desses saberes o lugar
lo provisório de “Instituto para a Pesquisa
da Teoria Crítica da Escola de Frankfurt.
Social”. Foi somente nos anos de 1950 que
Partiremos da observação de que a Psicaná-
o termo “Escola de Frankfurt” passou a ser
lise não se trata de um corpo teórico único,
adotado por um de seus mais proeminen-
mas do resultado de um processo evoluti-
tes colaboradores: Max Hokheimer. Como
vo, em termos históricos, donde sua incor-
principais membros do Instituto figuraram,
poração às diversas doxas e epistemes, ao
além daquele, Theodor W. Adorno, Herbert
longo do século XX, conformaram-na se-
Marcuse, Walter Benjamin, Leo Lowenthal,
gundo o tempo histórico do momento em
Franz Neuman, Erich Fromm, Otto Kir-
questão. Por exemplo, a noção estrutural
chkeimer, Friedrick Pollock, Karl Wittfogel
de Lacan que surge na França na década
e Jürgen Habermans (Matos, 2005; Jay,
de 1950 é radicalmente distinta da noção
2008).
funcional inglesa.
A variedade de disciplinas repre-
A noção de Psicanálise que interes-
sentadas por seus pensadores dentro da
sa aqui é a do pensamento freudiano, pois,
“Escola de Frankfurt” propiciou que seu
por uma questão de rigor epistemológico,
discurso extrapolasse as barreiras dos de-
a primeira relação teórica fundamental da
bates comuns à época de sua fundação
Psicanálise com a Teoria Crítica é eminen-
possibilitando uma maior abrangência de
temente vinculada à questão do freudismo.
temas e áreas do conhecimento aos objetos
de pesquisa do “Instituto” (Jay, 2008). Diante disso vale alguns esclareci-
mentos sobre o problema nominal suscita-
Neste ensaio abordaremos a rela-
do. O freudismo é, segundo Assoun (1991b,
ção entre o materialismo neomarxista dos
p. 7), “aquilo que impede a psicanálise de
frankfutianos e o freudismo. Relação essa
se reduzir a si mesma, a sua própria ob-
que pode, de certa forma, ser datada , se-
jetividade”. Ou seja, a teoria e a experiên-
gundo Freitag (1986), até meados da dé-
cia sui generis ligada à prática demarcada
cada de 1970 quando Jürgen Habermans
cronologicamente pela atuação do próprio
inicia um processo de revisão da Teoria Crí-
Freud, mas que não se subsume ao autor
tica deslocando o núcleo psicológico, desta,
enquanto agente histórico.
de Freud para George Mead e Wittgenstein.
Com isso, seguiremos, basicamente, o per- Não se trata, por exemplo, de um
curso proposto por Jay (2008)3 que demar- suplemento da subjetividade de Freud à
ca o primeiro momento de produção teóri- Psicanálise, porém é necessário situar que,

3
Para mais informações sobre as demarcações históricas consultar: A Imaginação dialética: História da Escola de Frankfurt e do Instituto de pesquisa social,
1923-1950

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diante da proposição da relação entre Psi- mos chave sente a necessidade de


canálise e Teoria Crítica, o termo freudis- formular uma espécie de platafor-
mo se apresenta como inexorável, donde ma epistemológica ao mesmo tempo
somente seria possível pensar a contri- explicita e excessivamente concisa.
Por outro lado teoriza essa práti-
buição da Psicanálise para o “pensamento
ca numa disciplina especifica para
crítico” diante da, talvez, forçosa redução qual produz um neologismo: o de
entre obra e ato fundador na figura do cor- metapsicologia.
po teórico de uma metapsicologia (Assoun,
1991b). É somente diante dessa “brecha
teórica” permitida pelo freudismo que se A metapsicologia será, então, a dis-
pode pensar essa relação complexa entre ciplina especifica que delimita o saber da
macrossistemas aparentemente fechados psicanálise freudiana e, com isso, a possi-
em si. Assoun (1991b, p. 41) aponta essa bilidade de introduzir, ou melhor, de arti-
dimensão ao afirmar que cular os saberes, freudiano e teórico críti-
A metapsicologia, work in process co, permitindo uma possível superação da
por excelência, deve sua fecundida- querela entre os discursos da Psicanálise e
de ao aprofundamento de uma co- de uma Teoria Crítica oriunda de uma filo-
erência que caminhou de mãos da- sofia marxista.
das com uma exploração em rede.
Daí a possibilidade, ao mesmo tem- Ao defendermos a metapsiocologia
po, de se colocar um dado momento como elemento-chave, na tentativa de ar-
em contradição com outro e captar ticular Psicanálise e Materialismo, proce-
sua diacronia. O sentido heurístico demos diferente de Politizer (1969) para
do freudismo se sustenta nessa re- quem a metapsicologia é incompatível com
tomada incessante que contém a ló- qualquer possibilidade de ser pensar con-
gica das inovações metapsicologicas cretamente uma psicologia. Sustentamos
ulteriores. a tese de Fromm (1977, p. 134) de que “a
psicanálise é uma psicologia materialista”.
Tese essa que, segundo Slater (1978) é con-
Podemos inferir, perante isso, que a
sensual entre os pensadores da Escola de
possibilidade da interseção entre Psicaná-
Frankfurt.
lise e Teoria Crítica reside exatamente na
metapsicologia freudiana. Somente diante Através de uma pesquisa bibliográ-
do trabalho sempre inacabado de constru- fica, numa certa lógica de interpretação da
ção no sentido heurístico é possível a inter- cultura, tomando como referência à obra
locução desses grandes sistemas. Logo, a de Freud e os maiores expoentes comenta-
importância de ressaltar essa questão está dores dessa temática, esse trabalho busca
ligada a própria produção do saber psica- demonstrar o que há de Freud em Frank-
nalítico datado do nascimento da “Teoria furt.
crítica”. Dessa maneira o texto está dividido
Essa antonomásia, onde aquilo que em três aspectos centrais para o campo de
dá nome a “coisa” e a própria “coisa” con- investigação dos teóricos de Frankfurt. A
fundem-se, é que marca o embrião de uma obra de Paul-Laurent Assoun denomina-
relação possível entre freudismo e Teoria da “A Escola de Frankfurt” onde esse autor
Crítica. É na metapsicologia que reside o apresenta a Teoria Crítica em três aspec-
freudismo e, por conseguinte, os usos deste tos (filosóficos, sociológicos e crítico cultu-
pela Escola de Frankfurt. Tal afirmação é rais) foi central para o desenvolvimento das
constatada por Assoun (1983, p. 11) quan- ideias aqui presentes.
do propõe que Freud Semelhante a essa proposta é a di-
[...] elabora um discurso epistemo- visão aqui adotada, porém sua radical dife-
lógico sui generis. Todavia em ter- rença está que na análise feita por Assoun

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(1991a) onde a influência do pensamento Freud, aquilo que extrapola e violenta o


freudista parece estar relegada aos aspec- dado clínico, que produz estranheza, mas
tos sociocríticos da “Escola”. Ao longo desse que, ao mesmo tempo, sem isso seria im-
texto a psicanálise de Freud será abordada possível seguir adiante, permitem a ela-
em relação aos três aspectos em questão. boração de constructos que possibilitem
a passagem de uma clínica do indivíduo a
Esse ensaio assume como premissa
uma clínica do sujeito, ou melhor, da cul-
uma Teoria Crítica já marxista. O objetivo,
tura, donde somente tal passagem possibi-
portanto, não é o desmembramento teórico-
lita a articulação dos saberes em questão.
-metodológico de todo o universo que com-
põe o materialismo-dialético, mas, partin- Segundo Mezan (1995, p. 34), Freud
do de um pressuposto que Assoun (1991a) “reconhece no aspecto figurado dos modelos
denomina como “neomarxista”, apontar às conceituais mais abstratos não um vício de
contribuições e contradições inerentes a origem, mas a própria essência do trabalho
absolvição da psicanálise por essa teoria. de pensamento”. Está demarcada, assim, a
Com isso, um breve panorama histórico própria essência do trabalho psicanalítico.
será apresentado a seguir para contextua-
É necessário estabelecer diante dis-
lização da discussão.
so que não se trata de advogar em nome
de uma filosofia culturalista da psicanálise,
ou seja, de formalizar “a coisa” freudiana
em termos lógicos, por mais que uma epis-
A HISTÓRIA COMO ELEMENTO MEDIA- temologia da psicanálise pareça seduzida a
DOR ENTRE METAPSICOLOGIA E TEO- fazê-lo (Assoun, 1983).
RIA CRÍTICA Trata-se então da sensibilidade de
Convém, então, estabelecer aquilo perceber que somente por isso, nessa que-
que Freud denominou como metapsicolo- rela de saberes onde Freud parece situar-
gia com o intuito de esclarecer como esse -se como outra coisa que não a filosofia,
termo ao mesmo tempo em que cria um uma crítica da cultura onde, freudismo e
problema é ele, também, a chave para a so- marxismo “dialetizaram-se” para a formu-
lução. Segundo Garcia-Roza (2004, p. 11) lação de uma Teoria Crítica se fez possível.
metapsicologia freudiana é: “[...] o conjunto É somente nessa passagem onde a clínica
da elaboração teórica de Freud, a produção transcende o indivíduo e lança a cultura no
de modelos conceituais afastados da expe- divã que se torna viável, mediante a formu-
riência, ficções teóricas a partir das quais lação do saber metapsicológico, pensar em
a própria experiência é transformada radi- uma Psicanálise articulada à Teoria Crítica
calmente [...]”. e com isso constatar Freud como um pen-
sador da cultura (Mezan, 1989).
Mezan (1995), diante dessa defini-
ção, atenta para um elemento importante É valido elencar, rapidamente, como
para que se possa compreender o empreen- um emaranhado de “acasos” históricos per-
dimento freudiano: a “elaboração teórica”. mitiu o tênue laço epistemológico entre “is-
Ao propor seu conjunto de postulados e mos” que culminaram na Teoria Crítica da
axiomas metapsicologicos Freud deixa sua cultura. Para Rouanet (1986) a primeira
identidade subjetiva marcada na própria questão a apontar é a de que o movimen-
teoria, de uma forma ou de outra, metapsi- to freudo-marxista, iniciado nos anos de
colgia e freudismo sustentam uma equiva- 1920, está intimamente ligado a dois fatos
lência entre si. históricos específicos: a revolução bolche-
Aqui temos a tensa aproximação da vista de outubro de 1917 e a chegada do
Psicanálise com uma produção do conhe- Hitler ao poder em 1933.
cimento que se assemelha a filosofia. Para O que os dois fatos têm em comum
Garcia-Roza (2004) as ficções teóricas de é a subjetivação da lógica histórica prega-

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da pelo sistema teórico marxista até aquela tivos inconscientes inacessíveis diante da
data. Rouanet (1986, p. 14) aponta que redução da verdade histórica unicamente a
(...) nos dois países houve um des- fatos econômicos. Não se tratava então de
compasso entre fatores objetivos negar a economia, mas de situa-la também
e subjetivos e nos dois revelou-se na categoria de economia psíquica (Roua-
a significação estratégica do polo net, 1986).
subjetivo ─ num caso impondo-se
O problema nascido em concomitân-
voluntaristicamente a uma reali-
dade histórica imatura no outro re- cia à proposição de que a psicanálise freu-
cuando diante de uma conjuntura diana tivesse a resposta para os enigmas
socioeconômica favorável. históricos que se apresentavam, aponta-
vam dois eixos centrais. Primeiro a ques-
tão da materialidade do achado de Freud.
Se por um lado a proposta de uma A possibilidade do freudismo, assim como
revolução marxista foi possível na Rússia, o marxismo, estarem incluídos dentro das
país ainda amarrado aos entraves do anti- propostas materialistas e, dessa maneira,
go regime onde as forças produtivas esta- portar uma verdade científica.
vam de posse de camponeses alheios aos A segunda questão estava no es-
embates ideológicos da luta de classes da pírito anti-freudista da ordem comunista
sociedade industrializada. vigente que via na psicanálise a manifes-
Por outro a Alemanha, país altamen- tação da Weltanschauung burguesa que
te industrializado na década de 1920, viu absolutizava a ordem capitalista através de
sua classe operária assumir posições con- um suposto pessimismo cultural de Freud
servadoras, chegando a assegurar a vitória (Rouanet, 1986).
da extrema direita, em 1925, para a presi- O que parecia mais forte do que esses
dência do Reich (Rouanet, 1986). dois entraves era a necessidade imediata
Ainda segundo Rouanet (1986, p. de um mecanismo que explicasse a eficácia
14). ideológica da propaganda nazista. Segundo
As explicações oferecidas pelo mar-
Rouanet (1986) a pergunta que sustentava
xismo vulgar eram insuficientes. A a possibilidade de uma articulação episte-
questão não estava em saber como mológica entre freudismo e marxismo era:
a social democracia tinha, ou não, qual o mecanismo de interiorização da ide-
iludido os operários, mas em saber ologia?
por que estes se tinham deixado ilu-
dir, nem em saber se a propaganda
Os defensores da apropriação freu-
burguesa era ou não eficaz, mas em diana afirmavam, segundo Rouanet (1986,
saber por que a contra propaganda p. 23), que “a ideologia vai se enraizando no
marxista era ineficaz. curso do processo de socialização através
de sucessivas privações pulsionais que a
instância familiar e posteriormente outras
Diante dessa situação, parecia in- instâncias vão impondo ao indivíduo”.
sustentável negar que a Psicanálise, na fi-
Essas privações ocorrem mediante
gura do freudismo, enquanto disciplina do
as prescrições e proscrições de imperativos
funcionamento psíquico, oferecia mecanis-
éticos e de normas que correspondem aos
mos para uma explicação que complemen-
valores sociais vigentes, atingindo o auge
tasse a história enquanto força motriz de
no conflito edipiano que supõe, em sua dis-
seu movimento.
solução, o abandono do objeto amado (a
A solução do enigma da subjetiva- mãe), a identificação com o estado (pai) e
ção da lógica histórica proposto por Rou- com os valores que esse pai carrega; valores
anet (1986), então, parecia estar nas mãos sociais que serão incorporados como obje-
de Freud e apontava para mecanismos afe- tos da identificação. Nessa medida, ocorre

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à relativização dos conflitos entre sujeito e vista, em seus detalhes, estão cor-
Estado e a ideologia se torna um fenômeno retos ou são errôneos, não posso
inconsciente. O mecanismo de recalque é dizer, naturalmente. Compreendo
fundamental para assegurar a sustentação que esse assunto não é fácil sequer
para outros mais bem instruídos
da ideologia, pois ele permite a introjeção
do que eu. Existem assertivas nas
da cultura enquanto a sublimação forma teorias de Marx que me pareceram
os ideais culturais (Rouanet, 1986). estranhas: como a afirmação de
É, objetivamente, nesse ponto que que o desenvolvimento de formas
podemos situar a apropriação da metapsi- de sociedade é um processo histó-
rico natural, que as mudanças na
cologia pela Escola de Frankfurt, ou seja,
estratificação social surgem umas
na tentativa dos frankfurtianos de articular
das outras segundo um processo
uma crítica da cultura à dimensão de uma dialético. Não estou nada seguro de
psicologia individual, esta situada na obra estar compreendendo corretamente
de Freud. Figuram neste momento teórico essas assertivas; e não me parecem
duas obras que representam ativamente ‘materialistas’ mas, antes, seme-
esse processo: “A dialética do esclarecimen- lhantes ao precipitado da obscura
to” de Theodor W. Adorno e Max Hokhei- filosofia hegeliana, em cuja escola
mer, originalmente publicada em 1947, e Marx se formou.
“Eros e Civilização” de Herbert Marcuse,
originalmente publicado em 1955.
Para Assoun (1991b) a incompatibi-
Na primeira, Adorno e Hokheimer lidade metodológica entre a proposição de
(1985) debruçam-se sobre os conceitos de: uma psicanálise freudiana e do materialis-
Esclarecimento, Indústria Cultura e Antis- mo-dialético somente pode ser harmoniza-
semitismo, marcados pela tônica do prin- da no interior de uma Teoria Crítica ainda
cipal conceito metapsicologico de Freud: o que à custa de severas torções.
Inconsciente. Este, por exemplo, elemento
central da crítica ao antissemitismo e aos O problema que surge diante das
limites do esclarecimento. A radicalidade apropriações metapsicologicas, por parte
em relação ao uso da obra de Freud, porém da Escola de Frankfurt, situa-se, exata-
aparece em “Eros e civilização”. Nesta obra, mente, na consolidação desses saberes, ou
Marcuse (1986), lança mão de um dos mais seja, como duas teorias que se propõem a
controversos conceitos metapsicológico: as desvelar o que há de universal na singu-
Pulsões, para elaborar uma sua crítica ao laridade por vias aparentemente distintas,
individuo reprimido e a civilização repres- são capazes de se complementarem?
soara. A resposta para essa pergunta em
É importante ressaltar, nesse ins- nada é simples e, certamente, não tem uma
tante, que chegamos a uma forte querela solução apriorística onde a mera combi-
entre freudismo e marxismo no interior da nação dos termos, marxismo e freudismo,
Teoria Crítica: o problema do método (As- fundaria uma nova teoria que superasse
soun, 1991b). As palavras de Freud (2006c, as contradições inerentes as suas genito-
p. 172) apontam para o problema metodo- ras como que em um efeito mágico, onde
lógico entre Psicanálise e marxismo afir- o melhor de cada uma seria metabolizado
mando que: e aquilo que se contradiz seria expurgado
As investigações de Karl Marx sobre com o intuito de formar um corpo teórico
a estrutura econômica da socieda- consistente e imune às críticas que sofrem
de e sobre a influência de diferentes ambas as teorias mãe.
sistemas econômicos em todos os
setores da vida humana adquiriram Logo, uma vez que assumimos a Te-
inegável autoridade nos dias atuais. oria Crítica como uma das mais importan-
Em que medida os seus pontos de tes escolas do pensamento nas Ciências

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Humanas e na Filosofia e que sua influên- tema a mente individual, mas, ao fazer in-
cia atinge as mais diversas disciplinas den- vestigações sobre o indivíduo não podia
tro do campo das ciências ou, mesmo, das deixar de tratar a base da relação emocio-
artes, acreditamos que buscar compreen- nal dele com a sociedade”. Está constatado
der as minúcias epistemológicas situadas o interesse do freudismo pelo fenômeno so-
no conflituoso casamento entre marxismo cial, ainda que na medida de uma psicolo-
e freudismo é também uma forma de en- gia individual.
tender o avanço do pensamento crítico ao
Assoun (1991a) indica que a solução
longo do século XX.
desse impasse, se existe ou não um subs-
trato sociológico na obra de Freud, está não
nas particularidades de cada teoria acerca
do homem, mas na maneira como essas
A RELAÇÃO ENTRE FREUDISMO E ES- tratam os fenômenos a que se propõem.
COLA DE FRANKFURT: UMA ANALISE A A psicanálise vai, pois, intervir a
PARTIR DOS ASPECTOS FILOSÓFICOS, meio caminho para fornecer um
SOCIOCRÍTICOS E CRÍTICO CULTURA decifrar apropriado dos mecanis-
DA TEORIA CRÍTICA mos abissais da consciência social,
verificando, se necessário, a lógica
fantasma para interrogar as me-
diações da consciência histórica e
Rouanet (2010) e Slater (1978) sus-
fornece-lhes uma fixação concreta
tentam a necessidade do recurso a estrutu- (ASSOUN, 1991 p. 75).
ras psicológicas por parte da “Teoria Críti-
ca”. Ainda segundo Slater (1978, p. 142),
para os frankfurtianos, “a única psicologia Raulet (1981, p. 178) afirma que
adequada que poderia ser útil à Teoria Crí- “Marx e Freud concebem, pois, a história
tica era a de Freud”. da espécie humana como dupla atividade
diante da natureza e de organização das
Nas palavras de Assoun (1991a,
relações sociais”. Materialismo e Psicanáli-
p.74),
se nesse sentido caminham em direção ao
A psicanálise intervém na Teoria mesmo horizonte por trilhas diferentes. O
crítica como um instrumento que que, de fato, é comum às duas teorias é que
em determinado momento ela tem a trama social pertence à outra cena que
que usar. O mesmo é dizer que ela não essa do dado objetivo.
tem que ser concebida como uma
das componentes da caixa de ferra- Diante dessa breve tentativa de har-
mentas crítica, nem mais – o que faz monizar, dentro da Escola de Frankfurt,
com que Freud não seja abordado esses diferentes campos epistêmicos, cabe
como o promotor de uma racionali- voltar para a relação dos três eixos centrais
dade sui generis – Nem menos [...]. da “Teoria Crítica”, anteriormente citados,
com o freudismo e sua psicanálise.
Essa afirmação parece indicar que A tese fundamental, pelo menos em
existe um reconhecimento objetivo por par- seu aspecto filosófico, da “Escola de Frank-
te da Escola de Frankfurt ao saber cunha- furt” é a da rejeição, por assim dizer ne-
do por Freud. Em um breve conjunto de gação, da “teoria da identidade” moderna
artigos, datados de 1913, intitulados “O que tem seu apogeu na filosofia hegeliana
interesse científico da psicanálise”, Freud (ASSOUN, 1991a).
aponta áreas do saber que se beneficiariam Em Hegel, explica Assoun (1991a),
de sua “descoberta” e entre elas está a So- existe uma unidade na identidade e essa
ciologia. Freud (2006b, p. 189) afirma que unidade é a base de se poder sistematizar o
“é verdade que a psicanálise tomou como conhecimento do mundo em toda a exten-

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são da riqueza de seus conteúdos. Dessa polo da antinomia, mas não muda
maneira, toda dialética hegeliana sustenta- o dualismo implacável de um pen-
-se no fato de que a identidade absoluta se samento trágico, para o qual tertios
antecipa a toda e qualquer possibilidade de non datur não é um princípio de ló-
gica formal, mas uma exigência da
sistematização do conhecimento.
dialética negativa que constitui a lei
Toda a sustentação da ideia de iden- mais íntima do destino do homem.
tidade permite, por exemplo, a separação,
na medida de externalização, entre sujeito
e objeto. Logo, existe um objeto externo ao Assoun (1991a) afirma, ainda, que
sujeito na medida em que esse, diante da “a não-identidade é telos da identificação”,
possibilidade de se autoconhecer, é capaz, logo, pode-se inferir que aqui existe, pela
também, de conhecer o objeto que lhe é ex- via da Psicanálise, a possibilidade da não-
terno. -identidade enquanto processo de identifi-
cação. Nesse princípio, a identidade perde
A semelhança entre o freudismo e a sua condição totalizante e passa a ser uma
Teoria Crítica, no que diz respeito a seu as- dinâmica, ou melhor, a obedecer a certa di-
pecto filosófico, situa-se nesse ponto. Para nâmica que constitui as lutas das contra-
a Escola de Frankfurt, não existe uma enti- dições pulsionais descritas pelo freudismo
dade metafísica capaz de conceder ao sujei- e sua psicanálise.
to a sua noção de identidade. Para Freud,
a identidade, em seu correlato direto com Freud (2006d, p. 115) diz que “a
psíquico, está no inconsciente. Portanto, identificação é conhecida pela psicanálise
esse é o efeito causado por Freud e sus- como a mais remota expressão de um laço
tentado pelos teóricos críticos, o de, no mí- social com outra pessoa”. Há, nessa sim-
nimo, pluralizar a noção identidade. As- ples expressão, todo o complexo desen-
soun (1991a) aponta que a solução para o volvimento do processo de construção da
realidade social a partir do ponto de vista
problema da identidade, segundo a Teoria
de uma alteridade necessária. Garcia-Ro-
Crítica, residiria na negação da tomada do
za (2007) indica que a constituição de um
real em sua totalidade.
“eu” verdadeiramente humano depende
Rouanet (1986, p.110) aponta que: desse ponto onde a alteridade sobrepõe-
A não-identidade, em Freud, assu- -se a noção de identidade acabada em si e
me forma mais ou menos inflexível: per si. Segundo Rouanet (2010), a identi-
a tese da reconciliação impossível ficação é, então, o mecanismo pelo qual o
entre os interesses do indivíduo e indivíduo internaliza o objeto externo, ou
o da civilização. Toda a construção seja, o social.
metapsicologica de Freud gira em
torno do conflito, jamais superável Em suma, o que a Teoria Crítica tem
a luz da realidade pulsional do ho- em comum com a Psicanálise, pelo menos
mem e das exigências da cultura, em suas relações com os aspectos filosófi-
entre desejo e realização. A própria cos, é uma recusa do positivismo da identi-
estrutura dualista do pensamen- dade, uma crítica imanente a essa enquan-
to de Freud documenta, através de
to um postulado filosófico. O que as une
todas as vicissitudes da teoria das
pulsões, existência desse antago- nesse aspecto é o princípio da não-identi-
nismo irredutível: pulsões sexuais dade em seus vários planos, individual, so-
versus pulsões de auto-conserva- cial ou mesmo teórico.
ção, na primeira teoria; libido do
ego versus libido dos objetos, na
Já em relação ao campo da socio-
segunda teoria; Eros versus Tana- crítica, a Psicanálise freudiana surge como
tos, pulsão de amor versus pulsão a possibilidade de uma psicologia social
de morte na terceira teoria ─ em materialista capaz de agregar um saber in-
cada uma dessas etapas muda-se o trapsicológico ao marxismo mantendo rela-

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tivamente conservados os fundamentos bá- mem à sociabilidade, assumida no concei-


sicos do Materialismo Histórico-Dialético. to de Pulsão de morte, que Matos (2005)
indica o pessimismo da Teoria Crítica em
A Sociopolítica Crítica, segundo As-
relação à Cultura.
soun (1991a), é a disciplina que toma o ma-
terialismo histórico-dialético e a psicanáli- Para Slater (1978, p. 151),
se como fundamentais para a elaboração (...) o pessimismo cultural e o con-
de uma crítica à sociedade. formismo social de Freud não são
Correlativamente a sociologia crítica acidentais, mas o resultado lógico
que nasce desse projeto não forma da teoria de um “impulso de des-
um bloco isolado: não se compre- truição”. Deve-se lembrar que esse
ende se não por referência as duas último é apenas a manifestação de
pedras angulares que são o marxis- um impulso de morte.
mo por um lado e a psicanálise por
outro [...] Não se trata aqui de dou-
trinas, mas de uma dupla mediação Ainda Assoun (1991a p.78) redimen-
necessária entre a teoria crítica e sionará a questão afirmando que
seu campo de investigação (socioló-
A miséria instintual é mais do que
gica). (Assoun, 1991a, p. 39).
nunca decifrada como sintoma da
sociedade repressiva: mas a luta de
Eros e Tânatos torna-se de algum
Para Rouanet (2010), na Teoria Crí- modo expressão do drama metap-
tica, é necessária uma teoria da persona- sicologico que alimenta a dialética
lidade, ou seja, uma teoria psicológica. É sócio histórica. A própria morte é ao
diante da percepção de que a elaboração mesmo tempo reconhecida (e já não
de uma metodologia social, por si, não dá exorcizada como no modelo huma-
conta do modelo compreensivo da dinâmi- nista) e positivada – pois adquiri o
ca humano-sociedade que Freud aparece poder de um protesto destruidor da
como instrumento da Escola de Frankfurt. frustração da vida [...]. Através de
um paradoxo flagrante o, o conceito
O uso do termo “instrumento”, aqui, mais controverso da metapsicologia
em nada é aleatório. A “Escola de Frank- encontrava-se rentabilizado, isto é,
furt”, em determinado momento, depara-se exaltado por uma filosofia delibe-
com a necessidade de fazer uso dos meca- radamente centrada na história –
nismos psicológicos descritos e elaborados pode ser considerada uma erótica
por Freud. Nesse ponto fica claro o abando- da história reconciliando polo in-
consciente e polo histórico no seio
no de certa ortodoxia materialista em nome
de uma emancipação coletiva. É
do recurso a metapsicologia freudiana. pela psicanálise que a crítica afirma
É através da assimilação do “mode- mais audaciosamente sua ambição
lo” metapsicológico que a sociocrítica da utópica [...].
“Escola de Frankfurt” se estabelece. Isso
acontece, acima de tudo, pela leitura no
campo do social dos conflitos psicológicos O freudismo, para os frankfurtia-
freudianos. A sociedade, nesse sentido, traz nos, contém a chave para a decifração da
a marca “em si”, do conflito entre Pulsão de cultura, decifração essa que não é análoga
vida e de Morte e entre “Isso” e “Supereu” a uma hermenêutica de produção de sen-
(MATOS, 1989). tidos, mas que é intrínseca à dialética en-
tre a cultura e o “indivíduo”. O que está
Esse posicionamento, o de assu- em jogo nessa decifração é que a “forma-
mir uma crítica do social que leva a marca ção do indivíduo através da cultura e a re-
da dualidade pulsional de Freud, lança a produção da cultura através do indivíduo
Escola de Frankfurt na crítica da cultura fazem parte do mesmo movimento” (Roua-
freudiana. É nessa certa inaptidão do ho- net, 1986 p. 120).

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Rouanet (1986, p. 118) afirma que “em um ela só acontece mediante o conceito de “In-
certo sentido a Kulturcritik frankfurteana consciente” e todos os seus desdobramen-
é uma psicanálise”. A radicalidade dessa tos (a dinâmica pulsional, por exemplo).
afirmação aponta o quão imbricada está a
Assoun (2012, p. 11), em defesa do
Escola de Frankfurt no pensamento freu-
conceito de inconsciente como elemento
diano. Não se trata, porém, de uma análise
chave para a análise da cultura afirma que
cultural, por exemplo, de um ponto de vis-
ta hermenêutico onde os símbolos de um Com efeito é no movimento, mesmo,
psiquismo coletivo estão representados na do saber do inconsciente, adquirido
sobre e por meio da clínica do sujei-
cultura esperando para serem imbuídos de
to, que o primeiro analista se torna
sentido. pesquisador em ciências sociais, ou
A psicologia social de Freud signifi- melhor que ele se revela possuidor
ca não o exame de uma “alma cole- do recurso para esclarecer o vínculo
tiva”, distinta de vários psiquismos social. É, também, em certo sentido
individuais, mas o exame dos meca- uma reinvenção da psicanálise que
nismos pelos quais certos impulsos se abre para a verdade do coletivo.
e tendências de cada indivíduo são
ativados através da interação com
outros indivíduos, no interior de É a metapsicologia do conceito de in-
um grupo, e através da relação com consciente que permite aos frankfurtianos
um líder. É dentro do mesmo espí- a apropriação das categorias psicanalíticas
rito que podemos dizer que a crítica
para formularem uma nova crítica sobre os
da cultura frankfurteana tem ana-
fenômenos culturais.
logias com a psicologia social de
Freud. Seu objetivo não é desvendar Para Rouanet (1986, p. 122)
o “inconsciente cultural” – tarefa no
Se o marxismo, enquanto “crítica a
fundo semelhante ao da crítica da
economia política” desnuda a desra-
ideologia, no sentido marxista tra-
zão objetivamente imanente a razão
dicional, em que o conteúdo latente
capitalista, a psicanálise, enquanto
de uma teoria filosófica é descober-
crítica da consciência, pode revelar
to quando se descobre o interesse
os mecanismos pelos quais o obje-
de classe a que ele corresponde,
tivamente irracional se converte ao
mas descrever os mecanismos pelos
seu contrário, e é vivido como sub-
quais se realiza a interação entre
jetivamente racional.
indivíduo e cultura (Rounaet, 1986
p. 119).

Assim chegamos ao terceiro aspec-


O homem, que, para entrar na con- to analítico aqui proposto. A cultura, para
dição de civilidade, apropria-se da cultura a Escola de Frankfurt, não pode ser anali-
pelo processo de socialização, via identifi- sada apenas de um ponto de vista econô-
cação, reproduz essa cultura em certo ní- mico. Seguindo a ideia acima, existe um
vel macro que permite a manutenção desse jogo dinâmico de mecanismos inconscien-
status de civilização. Para a Teoria Crítica, tes subjacentes aos processos culturais.
esse processo é o que permite, sem cons- A Cultura não é apenas a objetividade de
trangimentos, a linguagem sociológica ser uma produção material, mas um emara-
complementada pela linguagem particular nhado de tramas inconscientes agindo se-
do freudismo e sua psicanálise. gundo as dinâmicas desveladas por Freud,
aí, pois, reside outro recurso ao freudismo
Essa linguagem do particular, po- e sua psicanálise.
rém, manifesta-se em torno do conceito
central da Psicanálise. Se essa confluência Para Rouanet (1986), a Cultura se
dos discursos é possível, ainda que dentro assemelha à formação do sintoma na con-
dos limites conjecturais da metapsicologia, cepção freudiana, ou seja, a produção sim-

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bólica, dada na cultura, produz um verda- va, perde seu sentido no mundo moderno
deiro compromisso com os objetos culturais na medida em que, do ponto de vista ideo-
via processo de identificação. lógico, a unificação dos dois conceitos res-
pondia as novas necessidades do sistema
Dessa maneira, “no limite o sujeito
capitalista.
deve se unificar-se a cultura e transforma-
-se ele próprio, na cultura” (Rouanet, 1986 Os membros do institut nunca can-
p. 123). Ao apontar a identificação como saram de atacar a oposição entre a
o mecanismo central nesse processo, a cultura como esfera superior das
identificação com símbolos não havendo realizações humanas, e a existência
material como aspecto inferior da
distinção entre esses e a materialidade da
condição humana. Tamanha era a
civilidade, a Teoria Crítica da Escola de inter-relação entre cultura e socie-
Frankfurt lança mão dos mecanismos de dade, que a primeira nunca conse-
economia psíquica para questionar a or- guia transcender plenamente a in-
dem social em vigência. suficiência da segunda (Jay, 2008
p. 233).
O que está em jogo nesse processo é
que os símbolos que fazem a mediação en-
tre o sujeito e o social são representações,
Freitag (1986, p. 70) complementa
em grande parte, da dinâmica inconsciente
afirmando que
da identificação com a ordem.
A separação entre a produção ma-
Rouanet (1986) indica que a gran- terial (civilização) e a produção de
de marca da crítica cultural da Escola de bens espirituais (cultura) não era a
Frankfurt é a visão dessa como uma unida- forma mais adequada para dissimu-
de contraditória de dominação e liberdade. lar as estruturas do novo sistema
É pela cultura que o homem pode se liber- de produção. A fim de tornar os tra-
tar de sua relação natural com as coisas balhadores dóceis e submissos, não
do mundo, com suas imagens, mas é pela bastava recorre à dicotomia entre
civilização e cultura, entre escassez
cultura que a sociedade de classes se per-
material externa e riqueza espiri-
petua permitindo, sempre, a falsa possibili-
tual interna. Tornou-se imperioso
dade, em nível ideológico, de emancipação. mudar os padrões de organização
Essa é, por exemplo, a premissa básica que da produção cultural que foi sendo
Adorno e Hokheimer (1985) sustentam em gradativamente cooptada pela esfe-
relação aos limites do esclarecimento dian- ra da civilização, isto é, sendo ab-
te da Razão instrumental. sorvida pelo sistema de produção
de bens materiais que reestruturou
A Teoria Crítica munida das con- inteiramente as formas de circula-
cepções materialistas de cunho marxista e ção e consumo da cultura.
das dinâmicas psicológicas propostas pela
psicanálise de Freud formulou, então, sua
crítica a “cultura de massa”. Segundo Frei- A produção cultural, nesse sentido,
tag (1986, p. 65) “a teoria crítica da Escola passa a ser cooptada pela produção mate-
de Frankfurt tornou-se mais conhecida no rial, com isso o valor simbólico da produ-
mundo inteiro pela sua crítica a cultura de ção subjetiva passa a ser cotado em mesma
massa [...]”. escala que a produção industrial. É nesse
Ainda para Freitag (1986) o debate, ponto, para os frankfurteanos, que surge a
também situado por Freud, sobre a dife- necessidade da emergência do conceito de
“Industrial Cultural”.
rença entre cultura e civilização é aborda-
do pela Teoria Crítica de modo que, para os Antes de entra nas nuances do con-
frankfurtianos, essa distinção que entende ceito convém redimensionar esse debate
civilização como a produção material hu- em relação à crítica freudiana. Como já
mana e Cultura como a produção subjeti- dito, para Rouanet (1986) a industrial cul-

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tural se assemelha a formação do sintoma Freud, para quem a identificação é


na concepção freudiana, ou seja, a produ- a última etapa do processo de so-
ção simbólica, dada na cultura, produz um cialização, permitindo ao indivíduo
compromisso com os objetos da cultura via integrar-se no social, e também é a
categorial pela qual essa integração
processo de identificação.
se torna possível (Rouanet, 1986 p.
O inconsciente, nesse sentido, em 128).
seu aspecto tópico, é o lugar onde transi-
tam as representações coletivas que permi-
tem a manutenção da cultura. O Ego, par- A identificação, como instrumen-
cialmente, como a socialização. O Superego to, ganha contornos de uma “falsa identi-
nascido da introjeção da cultura, mas iden- ficação”, categoria inexistente na obra de
tificado com seus ideais de moralidade e o Freud. Essa seria a identificação com a
Id como aquilo que nega a cultura, mas que ordem vigente a serviço de sua reprodu-
ao mesmo tempo permite que o sujeito a ção. Freud (2006a) ao propor certa ten-
suporte, uma vez que se apresenta sempre dência à repetição no psiquismo antecipa
como a possibilidade de outra cena que não esse conceito da falsa identificação. Essa
a da moral civilizatória. repetição é da ordem de uma “economia
psíquica”, essa condição, quase natural,
Uma vez colocada à questão em ter- em Freud não é suportada pela Teoria Crí-
mos freudianos, o conceito de “Industrial tica de modo que, mesmo diante de certo
Cultural” para Freitag (1986) é a reorgani- pessimismo, a cultura produz subterfú-
zação dos símbolos da cultura com o in- gios a essa objetividade.
tuito de preencher lugares sociais específi-
cos, antes preenchidos pela materialidade Matos (2010) sustenta essa catego-
da ação civilizatória, ou seja, a “Indústria ria de subterfúgio, a “Imaginação estética”.
Cultura” produz os objetos a serem identifi- Categoria relacionada à arte, mas que em
cados. Por isso, para essa autora, a “Indus- um debate a nível epistêmico aparece como
trial Cultural” se caracteriza pela dimensão um caminho apontado pelos frankfurtianos
da reprodução em massa, vinculada a téc- para o redimensionamento do mal-estar na
nica, das mercadorias culturais. cultura. Tal conceito prevê a possibilidade
da autonomia frente a essa repetição, falsa
Matos (2010) aponta a “Indústria identificação com a ordem vigente. Freud
Cultural” como sendo a grande arma da (2006/1910[1909]) infere que a produção
ação civilizatória, no sentido freudiano. O do novo, aquilo que contradiz a ordem,
que ela faz é redimensionar o próprio “de-
também é um fenômeno psicológico deno-
sejo”, é tentar, em certa medida, colocar
minado “sublimação”.
rédeas na dinâmica pulsional sempre ali-
mentando a pulsão com objetos parciais e Assoun (2012) mostra, diante disso,
transitórios. Assim, o rebuscado mecanis- que a cultura é, em grande parte, produ-
mo de identificação que se contrapõe a in- to da sublimação das pulsões. Essa ambí-
trojeção direta dos valores, perde seu poder gua afirmação, onde a cultura repressora é
revolucionário e se torna central no enqua- também a possibilidade de autonomia, é o
dramento do sujeito ao modelo cultural ca- que marca a convergência do discurso do
pitalista. freudismo e da Teoria Crítica em seus as-
Entre os mecanismos psicológicos pectos crítocos-culturais.
ativados pelo poder para induzir a
identificação com o existente, figu- A cultura, então, esta situada nes-
ra, antes de mais nada, a própria se debate como o campo onde ocorrem as
identificação. Que pode ser vista, lutas e contradições de uma sociedade de
assim, não somente como objetivo, classe, porém profundamente marcada
mas como instrumento. Essa du- pela existência de sujeitos pulsionais. Essa
alidade é autorizada pelo próprio contradição entre o universal e o singular,

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essa não-identidade, que é a marca da pos- é somente através da apropriação do sa-


sibilidade de emancipação, uma vez que ber metapsicológico de Freud, sustentado
a impossibilidade ontológica de satisfação principalmente no conceito de inconscien-
pulsional sempre dá margens à emancipa- te, que a referência psicanalítica se torna
ção, é entendida pela Escola de Frankfurt possível dentro da Teoria Crítica.
como utopia ainda que negativa, pois apa-
rece como irrealizável, mas também como
inexorável.
O freudismo é a grande marca des- CONSIDERAÇÕES FINAIS
sa emancipação que se impõe sempre como A ideia desse trabalho foi demons-
possível, porém inalcançável. O freudismo trar a importância do freudismo, em seu
é, em si, utópico por uma condição que é aspecto metapsicológico, para a construção
propriamente ontológica, uma vez que em do saber cunhado pela Escola de Frank-
sua premissa básica encontra-se a sempre furt. Essa tarefa, extremamente complexa,
repetição da passagem de um caos primor- esteve sempre marcada por uma relação
dial para um estado minimante organizado íntima com a dúvida, pois as várias fontes
das pulsões. pesquisadas, por vezes, mostravam fortes
O exemplo disso é à própria passa- contradições no que tange não só a impor-
gem da organização pulsional de um poli- tância do saber cunhado por Freud, mas
morfismo a uma ordem objetal ou mesmo sua validade de uso para a Teoria Crítica.
a organização da sociedade na passagem Diante desse paradoxo foi necessário esco-
entre o reino das imagens e a relação sim- lher o caminho a ser trilhado e tomar as
bólica mediada por totens e tabus. referências opostas como contrapeso, ou
seja, como outra possibilidade de entendi-
Por fim, no que tange a convergên-
mento do dinamismo teórico da Escola de
cia dos discursos da “Escola de Frankfurt”
Frankfurt.
e da psicanálise de Freud, Rouanet (1986)
indica que tudo leva a crer que a “Teoria Algumas considerações, ainda epis-
Crítica” absorveu do freudismo muito mais temológicas, são válidas na conclusão des-
que os seus instrumentos de investigação se trabalho com o intuito de aparar pos-
psicológica das relações indivíduo-socie- síveis arestas soltas ao longo desse texto.
dade, absorveu também a metodologia do Para isso me valho aqui de uma longa cita-
pensar freudiano. Há, nesse sentindo, rela- ção de Rouanet mostrando que na Escola
ções epistemológicas que vão além da apro- de Frankfurt
priação de conceitos, mas estão no cerne [...] o freudismo é pela primeira vez
da própria obra da “Escola de Frankfurt”. pensado dialeticamente. Eles admi-
A apropriação do pensar freudiano tem, como os marxistas ortodoxos
filiados a III internacional, o enrai-
e sua psicanálise, principalmente o que se
zamento da psicanálise na socieda-
refere a metapsicologia, permeia o discurso de burguesa. E reconhecem, como
da Teoria Crítica em várias dimensões de os freudo-marxistas dos anos vin-
sua produção teórica. O que está situado te e trinta, sua eficácia enquanto
aqui é como a Freud ofereceu um instru- instrumento de desmistificação. O
mental epistêmico que possibilitou a “Te- freudismo é falso, enquanto objetifi-
oria Critica” dialogar com duas formas de cação a - histórica de um particular
saberes distintos, Marxismo e Psicanálise, gerado pela história, e verdadeiro,
porém sem sincretismos reducionistas. na medida em que recusa a disso-
lução desse particular em falsas
A crítica do social em Marx e a críti- totalizações. É falso, quando toma
ca que leva ao social em Freud são, nesse como eixo de sua reflexão um indi-
sentido, os dois pilares fundamentais do víduo visto como uma objetividade
movimento da Escola de Frankfurt, porém sem história, ignorando sua gênese

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e sua inserção nas relações de pro- monia entre esses saberes. Dor (1993) afir-
dução capitalistas, e verdadeiro, na ma que Freud foi acusado de justificar as
medida em que defende a especifici- relações sociais burguesas através de seu
dade desse individuo, contrariando fatalismo diante de uma condição humana
a práxis desindividualizante do fa-
evolutiva e nisso residiria à impossibilidade
cismo e do socialismo burocrático.
É falso, quando hipostasia sob a
dessa articulação.
forma de invariantes antropológicas Nessa lógica estrutural do pensa-
instâncias socialmente determina- mento freudiano pode não haver espaço
das, como o Id, sedimentação das para a grande revolução, mas para as pe-
frustrações impostas pela realida-
quenas sublimações cotidianas e esse seria
de, o Superego, introjeção do poder,
o lugar da clínica em relação ao social. Tal-
o Ego, ponto terminal de uma so-
cialização regida por interesses de vez, um paliativo para a inevitável neuro-
classe, e verdadeiro quando aponta se. Aqui o que estaria em jogo não é mais
para a realidade de uma ordem que a integridade epistemológica da Escola de
efetivamente da a processos históri- Frankfurt, mas a da psicanálise.
cos a rigidez de processos naturais,
Ainda Dor (1993) aponta que me
e quando denuncia, no âmago desse
aparelho psíquico objetivado a pre- muitos momentos os discursos mantidos
sença de repressão. É por isso que por Freud e Marx sobre a relação homem-
é verdadeiro mesmo quando falso, -sociedade são mutuamente excludentes.
porque essa falsidade não é índice Esse autor defende que uma leitura dialéti-
de inconsistência teórica, mas de ca da Psicanálise é reduzi-la a um discurso
falsidade objetiva do real: a verdade que lhe é completamente estranho dado a
psicanalítica não é índex veri, mas incompatibilidade, segundo ele, das noções
índex falsi (Rouanet, 1986, p. 355). de sujeito aqui em voga.
Não haveria espaço dentro do ma-
O que esteve em jogo ao longo des- terialismo marxista para o sujeito dividido
se texto, sintetizado magistralmente nessa da psicanálise como assinala Roudinesco
citação, é a relação, para colocar em termos apud Dor (1993, p. 74)
freudianos, de amor e de ódio que Escola Assim o EU está sempre no futuro
de Frankfurt mantém com a psicanálise de anterior, ele chega onde isso fala. O
Freud. Dimensão essa sempre imbricada a inconsciente é um arcaísmo presen-
uma necessidade de adaptação dos concei- te, sem história, nem origem. O EU
tos freudianos a uma crítica materialista advêm (barrado, descentrado) sem
da ordem social vigente, porém profunda- que o Ego substitua o Id. A fórmula
mente marcada pelo respeito ao modo de adaptadora da tomada de consciên-
cia ou da cura (o Ego deve expulsar
pensar freudiano.
o ID) designa uma tentação das ci-
É marca da Escola de Frankfurt a ências do homem, tornando-se efe-
construção de uma análise social interdis- tiva sobre uma filosofia da pessoa
ciplinar fortemente referenciada pela eco- cogitativa cuja intenção é o domínio
nomia política, enquanto disciplina cientí- do inconsciente; o desaparecimento
fica, por essa está em condições de mediar deste, sem cessar presumindo pela
psicologia, funda de uma denega-
às relações entre a filosofia, a história e as
ção toda teoria de um sujeito centro
ciências sociais. Porém, para evitar à mor- e origem dos conhecimentos.
te do subjetivo diante do macrocosmo da
economia, ao admitir essa como dorsal, a
psicanálise de Freud ganha titularidade É por isso que, para esses autores,
dentro desse movimento interdisciplinar. a psicanálise se diferencia tão radicalmen-
Por outro lado, muitas são as justi- te de qualquer outro saber sobre o homem
ficativas que negam a possibilidade de har- ou de qualquer outra ciência, mesmo que

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essa também seja um saber sobre as bases Para esse autor uma certeza é va-
como é o materialismo histórico-dialético. lida: que as duas perspectivas nascem de
Para eles está claro que o indivíduo ao qual uma leitura que lança o conflito homem-
se refere à dialética marxista está muito -sociedade no centro de suas investiga-
mais próximo ao sujeito centro e origem do ções. As duas apontaram caminhos que,
saber do que o sujeito dividido e impossibi- apesar de distintos, apresentaram-se como
litado estruturalmente de saber. outra possibilidade de pensar e fazer em
relação a uma ordem naturalizante das
Resgatar essa perspectiva no final
coisas. Ambas anunciam e denunciam, a
desse trabalho, mesmo que não haja um
suas maneiras, as possibilidades e os limi-
forte interesse em se deter sobre ela, tem
tes dos homens frente à sociedade e a cul-
o intuito de mostrar que ambos os lados tura. Destituem o homem de sua condição
advogam em nome de certa ortodoxia para atômica, indivisível, indestrutível e maciço,
com seus fundamentos centrais. Se o ma- para lançá-lo no universo das dinâmicas
terialismo histórico-dialético teme o a-his- psicológicas e econômicas, onde ele não é o
toricismo diante de certas categorias uni- início nem o fim, mas sempre o meio para a
versalizantes da psicanálise. transformação da sociedade.
É bem verdade que em suas aspira- Por fim, esse trabalhou não se tra-
ções clínicas alguns psicanalistas receiam tou de advogar em nome de uma Psicanáli-
a metamórfica análise econômica da socie- se materialista, historicista e dialética, mas
dade diante da questão se o sujeito é um sim de admitir essas possibilidades em Psi-
reflexo da cultura ou a cultura é um reflexo canálise e, então, afirmar o potencial crítico
do sujeito. das apropriações que a Escola de Frank-
Todavia, a harmonização entre esses furt, em sua Teoria Crítica, fez da metapsi-
dois pensamentos no seio da Teoria Crítica cologia freudiana.
só é possível uma vez negado o ecletismo do
discurso entre as teses centrais das obras
de Marx e Freud.
Nesse sentido, a Escola de Frankfurt REFERÊNCIAS
foi o primeiro movimento teórico a perceber Adorno, T. W. & Horkheimer, M. (1985).
os erros de uma tentativa de miscigenar Dialética do Esclarecimento: fragmentos fi-
os discursos aos moldes dos freudorma- losóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,.
rixtas da década de 1920. De modo que,
Assoun, P-L. (1991a). A Escola de Frank-
uma vez assumindo a inexorabilidade da
furt. São Paulo: Editora Ética.
necessidade do marxismo e do freudismo
como compassos para uma crítica da cul- Assoun, P-L. (2012). Freud e as Ciências
tura, complexa em seus aspectos sociais e Sociais: Psicanálise e Teoria da Cultura.
psicológicos, a solução viável foi manter o São Paulo: Edições Loyola Jesuítas.
paralelo entre essas duas teorias como na Assoun, P-L. (1991b). O Freudismo. Rio de
metáfora matemática em que afirma que Janeira: Jorge Zahar Editor.
duas retas paralelas se cruzam no infinito.
Assoun, P-L. & Raulet, G. (1981). Marxis-
Diante de tantas divergências en- mo e Teoria Crítica. Rio de Janeiro: Jorge
tre os autores e comentadores da Teoria Zahar Editor,.
Crítica sobre a relação entre Marx e Freud,
ou mesmo, entre materialismo histórico e Freud, S. (2006a). Além do princípio do
Psicanálise um apontamento de Althusser prazer. In Edição Standard Brasileira das
(1985) contribui para se pensar as esco- Obras Completas de Sigmund Freud. Rio
lhas epistemológicas e metodológicas da de Janeiro: Imago. (vol. XVIII).
Escola de Frankfurt frente as suas pedras Freud, S. (2006b). O interesse cientifico da
angulares. psicanálise. In Edição Standard Brasileira

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das Obras Completas de Sigmund Freud. Matos, O. C. F. (1989). Os arcanos do in-


Rio de Janeiro: Imago. (vol. XIII). teiramente outro: A Escola de Frankfurt. A
melancolia da revolução. São Paulo: Edito-
Freud, S. (2006c). Novas conferencias in-
ra Brasiliense.
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Recebido em 11 de outubro de 2014.


Aprovado para publicação em 6 de dezembro de 2014.

Revista de Psicologia, Fortaleza, v. 5 - n. 2, p. 108-123, jul./dez. 2014 123

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