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HEMISPHERIC INSTITUTE E-MISFERICA

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E
E-MISFÉRICA 11.1 GESTO DECOLONIAL TODAS AS EDIÇÕES EXPEDIENTE PARTICIPE

GESTO
DECOLONIAL
— Prólogo Editorial —

VOLUME 11 | NÚMERO 1  |  2014

ENSAIOS
The Potosí Principle:
Another View of Totality
Silvia Rivera Cusicanqui

A universidade e os undercommons
STEFANO HARNEY E FRED MOTEN The Pose as Interventionist Gesture:
Erica Lord and Decolonizing the
Proper Subject of Memory
Colleen Kim Daniher

read preface by Osmundo Pinho

Epilogue to ¡...Escucha winka...!


A filosofia, portanto, tradicionalmente pratica uma crítica do Pablo Marimán, Sergio Caniuqueo, José Millalén, and
Rodrigo Levil
conhecimento que é simultaneamente uma negação do conhecimento
(por exemplo, das lutas de classe). Sua posição pode ser descrita como
Looking for the Meaning of 'Decolonial
uma ironia em relação ao conhecimento, o qual ela questiona sem Gesture'
Walter Mignolo
nunca tocar suas fundações. O questionamento do conhecimento na
filosofia sempre termina na sua restauração: um movimento que
grandes filósofos consistentemente apontam uns nos outros. Regarding 'the Mother of Anchor-
Children': Towards an Ethical Practice
of the Flesh
Jacques Rancière, On the Theory of Ideology – Althusser’s Politics Gretel Vera-Rosas

Número um, eu sou um homem negro, porque sou contra o que eles Interferencias transfeministas y
fizeram e ainda estão fazendo conosco; e número dois, eu tenho algo a pospornográficas a la colonialidad del
ver
dizer sobre a nova sociedade a ser construída, porque eu sou parte Sayak Valencia

importante daquilo que eles têm buscado desacreditar.


A Universidade e os Undercommons
Stefano Harney and Fred Moten
C. L. R. James, C. L. R. James: His Life and Work

A única relação possível com a universidade hoje é


criminal DOSSIER
“Para ir à universidade eu roubarei, e lá eu roubarei," para tomar Pedagogical Notes from the Decolonial
Cracks
emprestado o texto de Pistol, no final de Henrique V, como ele Catherine Walsh

certamente tomaria emprestado de nós. Esta é a única relação


possível com a universidade americana hoje. Pode ser verdade
Decolonizing the Gesture of Friendship
para as universidades em toda parte. Talvez tenha que ser Between Indigenous Nations
Dot Tuer
verdade para a universidade em geral. Mas, certamente, isto é
certo ao menos nos Estados Unidos: não se pode negar que a
universidade é um lugar de refúgio e não se pode aceitar que a Exhibiting the Decolonial Option:
Museum Interventions
universidade seja um lugar de esclarecimento. Diante dessas Jennifer Reynolds Kaye

condições, só se pode entrar furtivamente na universidade e


roubar o que for possível. Abusar da sua hospitalidade, maldizer
sua missão, juntar-se às suas colônias de refugiados, ao seu
Dissidência e Feminismo Comunitário

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acampamento cigano, estar dentro, mas não ser dela – este é o Julieta Paredes

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caminho do intelectual subversivo na universidade moderna.

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Desobediencia visual: Entrevista con
Preocupe-se com a universidade. Este é o comando hoje nos Benvenuto Chavajay y Kency Cornejo
Marcial Godoy-Anativia
Estados Unidos, que tem uma longa história. Clame pela sua
restauração, como Harold Bloom, ou Stanley Fish, ou Gerald
Graff. Clame pela sua reforma, como Derek Bok, ou Bill Readings, Hawaiian Sovereignty and Island
Knowledge: Interview with Dr.
ou Cary Nelson. Chame por ela como ela chama por você. Mas, Haunani-kay Trask
Rebekah Garrison
para o intelectual subversivo, tudo isso ocorre no andar de cima,
com companhias educadas, entre os homens racionais. Afinal de
contas, o intelectual subversivo veio sob falsos pretextos, com Arte Nuevo Interactiva and A New
Generation of Decolonial Thinkers,
documentos ruins, por amor. O seu trabalho é tão necessário Makers And Doers
quanto é mal recebido. A universidade precisa do que sustenta, Brittany Chávez

mas não pode sustentar o que ela traz. E, acima de tudo isso, ela
desaparece. Desaparece na clandestinidade, na comunidade O. Feray's Quibble
Gina Athena Ulysse
underground de fugitivos da universidade, até chegar aos
undercommons of enlightenment, onde o trabalho é subvertido,
onde a revolução ainda é negra, ainda é forte. La Chica Boom's Failed, Decolonial
Spictacles
Alpesh Kantilal Patel

Qual é esse trabalho e qual é a sua capacidade social, tanto para


reproduzir a universidade como para produzir a fuga? Se alguém
Constitución política feminista del
dissesse lecionar, estaria desenvolvendo o trabalho da Estado: el país imposible que
universidade. Lecionar é meramente uma profissão e uma construímos las mujeres
María Galindo
operação daquele círculo onto/auto-enciclopédico do estado que
Jacques Derrida chama de Universitas. Mas vale à pena evocar esta
operação, para espiar pelo buraco na cerca onde o trabalho entra,
MULTIMEDIOS
para espiar a sua sala de contratações, os seus alojamentos
noturnos. A universidade precisa de força de trabalho de ensino, Julie Mehretu's Undercommons
Macarena Gómez Barris
apesar de si mesma, ou como ela mesma, auto-idêntica com e,
portanto, apagado por ela. Não é lecionar que mantém essa
Tomás Ochoa: Indios Medievales
capacidade social, mas algo que produz outro lado não visível do Joaquín Barriendos

lecionar, um pensamento que passa pelo cerne do ensino, rumo a


uma orientação coletiva para o objeto do conhecimento como um
projeto futuro e um compromisso com o que nós queremos
ENSAIOS BIBLIOGRÁFICOS
chamar de organização profética. Mas é o lecionar que nos
conduz a isso. Antes de existirem os financiamentos, a pesquisa, Globalectics: Theory and The Politics of
Knowing and in the name of the
as conferências, os livros e periódicos, havia a experiência de ser mother: writers and empire por Ngugi
ensinado e de ensinar. Antes do posto de pesquisa sem a Wa Thiong'o
Magalí Armillas-Tiseyra
docência, antes dos alunos de pós-graduação para corrigir os
exames, antes da série de sabáticos, antes da redução
permanente da carga de ensino, a indicação para coordenar um Lisandro Guarcax and the Dance of the
Nawales: In Memoriam (1978-2010)
centro, a transferência da pedagogia para uma disciplina Czarina Aggabao Thelen

chamada educação, antes do curso concebido para ser um novo


livro, o lecionar acontecia.
RESENHAS DE LIVROS
O momento de lecionar para a subsistência é com frequência
Listening In Detail: Performances Of
erroneamente considerado um estágio, como se eventualmente Cuban Music por Alexandra T. Vázquez
não se devesse dar aulas para viver. Se esse estágio persiste, há Iván A. Ramos

uma patologia social na universidade. Mas se o ensino é passado


adiante de forma bem sucedida, esse estágio fica superado e o Brown Boys And Rice Queens:
lecionar é transferido àqueles que sabemos que vão permanecer Spellbinding Performance In The Asias
 por Eng-beng Lim
nesse estágio, a força de trabalho sócio-patológica da Jack Halberstam

universidade. Kant interessantemente chama esse estágio de


“minoria auto-incorrida." Ele tenta contrastar isso com ter “a Our Lady Of Controversy: Alma López's
determinação e a coragem de usar sua inteligência sem ser Irreverent Apparition editado por
guiado por outra pessoa." “Ter a coragem de usar sua própria Alicia Gaspar De Alba y Alma López
Michelle Martin-Baron

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inteligência." Mas o que significaria se lecionar, ou melhor,

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aquilo que poderíamos chamar de “ir além de lecionar” fosse

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Escenas y obscenas del consumo: arte,
precisamente aquilo que se pede que alguém vá além, que deixe mercancía y visibilidad en el Cono Sur
de ser um sustento? E o que seria daquelas minorias que se por Cesar Barros A.
Elizabeth Osborne
recusam, a tribo dos infiltrados que se negam a voltar do além
(aquele que está além do “além de lecionar”), como se eles não
fossem sujeitos, como se eles quisessem pensar como objetos, Postcolonial Witnessing: Trauma Out
Of Bounds por Stef Craps
como minoria? Certamente, os sujeitos perfeitos da Enmanuel Martínez

comunicação, aqueles bem sucedidos no além de lecionar, os


considerarão um desperdício. Mas o trabalho coletivo deles vai La inflexión decolonial por Eduardo
sempre gerar o questionamento sobre quem está Restrepo y Axel Rojas
Felipe Martínez Pinzón
verdadeiramente seguindo as ordens do esclarecimento. As vidas
desperdiçadas por aqueles momentos que vão além de lecionar,
quando você fala a frase inesperada e linda – inesperada, Performance In The Borderlands
editado por Ramón Rivera-Servera y
ninguém perguntou; linda, nunca mais vai voltar. Será que ser o Harvey Young
Candice Amich
biopoder do esclarecimento é verdadeiramente melhor que isso?

Talvez o biopoder do esclarecimento saiba disso, ou talvez esteja Los muertos indóciles por Cristina
Rivera Garza
apenas reagindo à condição de objeto desse trabalho, como deve Joanna Jablonska Bayro

ser. Mas apesar de depender desses infiltrados, desses


refugiados, ele vai chamá-los de não acadêmicos, não práticos,
ingênuos, não profissionais. E ainda pode-se dar uma última RESENHAS DE PERFORMANCE
chance de ser pragmático – por que roubar se pode-se ter tudo, E ARTES VISUAIS
eles perguntarão. Mas se alguém se esquiva dessa interpelação,
Fuck My Life (fml) por Xandra Ibarra
não concorda nem discorda, mas vai de cabeça aos submundos Ángeles Donoso Macaya

da universidade, para os undercommons – isso será considerado


um roubo, um ato criminal. E essa é, ao mesmo tempo, a única Bordando Afectos, Deshilando
ação possível. Archivos: Leo Chiachio y Daniel
Giannone 
Cynthia Francica

Nos undercommons da universidade, pode-se ver que não é uma


questão de lecionar versus pesquisar, ou mesmo ir além de
Sujeto Transnacional por Marcela
lecionar versus a individualização da pesquisa. Entrar nesse Fuentes
María Emilia Franchignoni
espaço é habitar a revelação rompida e arrebatada dos comuns
que o esclarecimento fugidio encena, criminosa, matricida,
queer, na cisterna, na crista da vida roubada, a vida roubada pelo Teatro Nacional por Alejandro Moreno,
Trinidad Piriz, y Daniel Marabolí
esclarecimento e depois roubada de volta, onde os comuns Horacio Pérez

oferecem refúgio, onde o refúgio alcança os comuns. O ir além de


lecionar trata-se, na verdade, de não se autoterminar, não
The Hyperwomen por Takumã Kuikuro,
passar, não completar; de permitir que a subjetividade seja Carlos Fausto, y Leonardo Sette
Alessandra Santos
ilegalmente dominada por outros, uma paixão radical e uma
passividade tal que faz com que a pessoa torne-se imprópria
para a subjugação, porque não possui o tipo de apoio que possa The Idea Of Freedom por Gita Hashemi
Haleh Niazmand
manter as forças regulamentares da subjetividade, e não se pode
iniciar o torque autointerpelativo que a subjugação ao biopoder
requer e premia. Não é tanto o lecionar quanto o ato de
E - M I S F É R I CA 1 1 . 1 G E S TO
profetizar na organização sobre o ato de lecionar. A profecia que
DECOLONIAL
prediz a sua própria organização e que por isso passou, como os
comuns, e a profecia que excede a sua própria organização e que,
portanto, até o momento só pode ser organizada. Contra a
organização profética dos undercommons está empenhado o seu
próprio trabalho sufocante para a universidade e, além disso, a
negligência da profissionalização e a profissionalização do
acadêmico crítico. Os undercommons formam, portanto, uma
vizinhança sempre insegura.
Como nos lembra Fredric Jameson, a universidade depende da

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“crítica do tipo esclarecedor e das desmistificações das crenças e

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das ideologias comprometidas, a fim de limpar o terreno para

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um planejamento desobstruído e para o ‘desenvolvimento’."
Essa é a fraqueza da universidade, o lapso na sua segurança
interna. Ela precisa do poder do trabalho para alcançar essa
“crítica do tipo esclarecedor," mas de alguma forma o trabalho
sempre escapa.

Os sujeitos prematuros dos undercommons levaram o chamado a


sério, ou tiveram que ser sérios em relação ao chamado. Eles não
eram claros quanto ao planejamento, muito místicos, muito
cheios de crenças. E mesmo assim essa força de trabalho não
pode se reproduzir a si mesma, ela precisa ser reproduzida. A
universidade trabalha para chegar ao dia em que ela vai poder
livrar-se, como o capital em geral, do problema do trabalho. Ela
então será capaz de reproduzir a força de trabalho que se
entende não só como desnecessária, mas perigosa ao
desenvolvimento do capitalismo. Muita pedagogia e estudos já
são voltados para essa direção. Os estudantes devem chegar a ver
a si próprios como o problema – o que, ao contrário das
reclamações das críticas restauracionistas da universidade, é
precisamente o que significa ser um cliente, assumir o ônus da
realização e, necessariamente, ser sempre inadequado a ela. Mais
tarde, esses estudantes poderão ver a si mesmos adequadamente
como obstáculos para a sociedade ou, talvez, com o aprendizado
de uma vida, os estudantes já tenham obtido sucesso em
autodiagnosticar-se como sendo o problema.

Ainda assim, o sonho de um trabalho não diferenciado que se


sabe supérfluo é interrompido precisamente pelo trabalho de
remover as barreiras abrasadoras da ideologia. Apesar de ser
melhor que essa função policiadora esteja nas mãos de poucos,
ela ainda trata o trabalho como diferença, trabalho como o
desenvolvimento de outro trabalho e, portanto, trabalho como
uma fonte de riqueza. Apesar de a crítica do tipo esclarecedor,
como sugerimos abaixo, informar, bajular, dar beijinhos em
qualquer desenvolvimento autônomo como resultado dessa
diferença de trabalho, há um buraco na parede aqui, um lugar
raso no rio ali, um lugar para pousar sob as pedras acolá. A
universidade ainda precisa desse trabalho clandestino para
preparar essa força não diferenciada de trabalho, cuja
especialização crescente e tendências administrativas, mais uma
vez contra os restauracionistas, representam precisamente a
integração bem-sucedida da divisão do trabalho com o universo
de troca que comanda a lealdade restauracionista.

Introduzir esse trabalho sobre o trabalho, e prover o espaço para


o seu desenvolvimento, gera riscos. Como a força policial colonial
involuntariamente recrutada das vizinhanças guerrilheiras, o
trabalho universitário pode abrigar refugiados, fugitivos,
renegados e náufragos. Mas há boas razões para a universidade
estar confiante de que tais elementos serão expostos ou forçados
à clandestinidade. Precauções foram tomadas, listas de livros
foram elaboradas, observações pedagógicas foram conduzidas,
convites para contribuições foram feitos. No entanto, contra
essas precauções ergue-se a imanência de transcendência, o

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desregramento necessário e as possibilidades de criminalidade e

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de fuga que o trabalho sobre o trabalho requer. Comunidades de

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fugitivos, de professores de composição, estudantes de pós-
graduação sem mentores, historiadores marxistas adjuntos,
professores de administração saídos do armário ou queer,
departamentos de estudos étnicos nas faculdades estaduais,
programas de cinema encerrados, estudantes do Iêmen, com
vistos vencidos, atuando como editores de jornal, sociólogos de
faculdades e engenheiros feministas historicamente negros. E o
que dirá a universidade deles? Dirá que eles não são
profissionais. Isso não é um ataque arbitrário. É um ataque
contra os mais que profissionais. Como é que aqueles que
excedem a profissão, que excedem e que por excederem
escapam, como esses fugitivos se problematizam,
problematizam a universidade, forçam a universidade a
considerá-los um problema, um perigo? Os undercommons não
são, em resumo, o tipo de comunidade extravagante e fantasiosa
invocada por Bill Readings ao final do seu livro. Os
undercommons, seus fugitivos, estão sempre em guerra, sempre
escondidos.

Não há distinção entre a universidade americana e a


profissionalização.
Mas seguramente, se alguém pode escrever algo sobre a
superfície da universidade; se alguém pode escrever, por
exemplo, na universidade sobre singularidades – aqueles
eventos que recusam tanto a categoria abstrata quanto individual
da temática burguesa – então não se pode dizer que não há
espaço na própria universidade? Seguramente há algum espaço
aqui para uma teoria, uma conferência, um livro, uma escola de
pensamento? Certamente a universidade também torna o
pensamento possível? O propósito da universidade, como
Universitas, como artes liberais, não é fazer dos comuns, fazer do
público, fazer da nação uma cidadania democrática? Não é então
importante proteger essa Universitas, apesar de suas impurezas,
da profissionalização na universidade? Mas nós perguntaríamos
o que já não é mais possível nesta conversa nos corredores, entre
os edifícios, em salas da universidade, sobre possibilidades?
Como é que o pensamento do exterior, como Gayatri Spivak
define, já não é mais possível nessa reclamação?

Os fugitivos sabem alguma coisa sobre possibilidades. Eles são a


condição de possibilidade da produção de conhecimento na
universidade – as singularidades contra os escritores de
singularidades, os escritores que escrevem, publicam, viajam e
falam. Não é apenas uma questão do trabalho secreto sobre o
qual esse espaço surge, apesar de que, logicamente, esse espaço
surge e é sustentado a partir do e pelo trabalho coletivo. Ou
melhor, ser um acadêmico crítico na universidade é estar contra
a universidade; e estar contra a universidade sempre é
reconhecê-la e ser reconhecido por ela, e institucionalizar a
negligência daquele exterior internalizado, daquela
clandestinidade não assimilada, e instituir uma negligência disto
que é precisamente, temos que insistir, a base das profissões. E
este ato de estar sempre contra já exclui os modos não

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reconhecidos de política, o além da política já em andamento, a

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para-organização criminal desacreditada, a que Robin Kelley

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poderia referir-se como campo infrapolítico (e sua música). Não
é só o trabalho dos fugitivos, mas a sua organização profética
que é negada pela ideia do espaço intelectualizado em uma
organização chamada universidade. É por isso que a negligência
do acadêmico crítico é sempre, ao mesmo tempo, uma afirmação
do individualismo burguês.

Tal negligência é a essência da profissionalização, onde afinal de


contas a profissionalização não é o oposto de negligência, mas
seu modo de política nos Estados Unidos. Ela assume a forma de
uma escolha que exclui a organização profética dos
undercommons – ser contra, questionar o objeto do
conhecimento, digamos neste caso a universidade, não tanto sem
tocar sua fundação, mas sem tocar a própria condição de
possibilidade de alguém, sem admitir os undercommons ou ser
admitido neles. A partir disto, uma negligência geral de condição
é a única posição coerente. Não tanto um antifundacionalismo ou
fundacionalismo, já que ambos são usados um contra o outro
para evitar contato com os undercommons. Este ato, sempre
negligente, é o que nos leva a dizer que não há qualquer
distinção entre a universidade nos Estados Unidos e a
profissionalização. Não faz sentido tentar culpar a universidade
pela sua profissionalização. Elas são a mesma coisa. Ainda assim,
os fugitivos recusam-se a recusar a profissionalização, quer
dizer, a ser contra a universidade. A universidade não
reconhecerá esta indecisão e, portanto, a profissionalização é
moldada precisamente pelo que não se pode reconhecer, seu
antagonismo interno, seu trabalho voluntarioso, seu excesso.
Contra esse trabalho voluntarioso manda o crítico, manda sua
reivindicação de que o que sobra além do crítico é desperdício.

Mas, na verdade, a educação crítica somente tenta aperfeiçoar a


educação profissional. As profissões se constituem em oposição
ao que não está regulamentado e ao ignorante, sem reconhecer o
trabalho não regulamentado, ignorante, não profissional que é
feito – não em oposição a eles, mas dentro deles. Mas se a
educação profissional alguma vez desliza em seu trabalho,
alguma vez revela sua condição de possibilidade às profissões
que apoia e reconstitui, a educação crítica está lá para apoiá-la e
para dizer-lhe não esquenta: foi só um sonho ruim, os delírios,
os desenhos de um louco. Porque a educação crítica existe
precisamente para dizer à educação profissional que repense sua
relação com o seu oposto – pelo qual educação crítica significa
tanto ela mesma quanto a não regulamentada, contra a qual a
educação profissional é empregada. Em outras palavras, a
educação crítica chega para apoiar qualquer negligência
vacilante, para ser vigilante na sua negligência, para estar
criticamente engajada na sua negligência. É mais que um aliado
da educação profissional, é uma tentativa de concluí-la.

Uma educação profissional tornou-se uma educação crítica. Mas


não se deveria aplaudir este fato. Deveria ser aceito pelo que é,
não progredir nas escolas profissionais, não coabitar com a
Universitas, mas ser contra-insurgente, refundar o terrorismo da

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lei, acolhendo os que estão desacreditados, acolhendo aqueles

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que se recusam a descartar ou a levar em conta os undercommons.

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A Universitas sempre é uma estratégia de estado/Estado. Talvez
seja surpreendente dizer que profissionalização – aquilo que
reproduz as profissões – seja uma estratégia estatal. Certamente,
profissionais acadêmicos críticos tendem a ser considerados hoje
como intelectuais inofensivos, maleáveis, talvez capazes de
alguma intervenção modesta na chamada esfera pública. Mas
para ver como isto subestima a presença do estado, podemos
voltar-nos para uma má leitura da consideração de Derrida sobre
o Relatório de Hegel de 1822 ao ministro da educação prussiano.
Derrida nota o modo como Hegel rivaliza com o estado na sua
ambição pela educação, querendo pôr em prática uma pedagogia
progressiva de filosofia projetada para apoiar a forma de ver o
mundo de Hegel, enciclopédica. Esta ambição tanto reflete a
ambição do estado, porque ele também quer controlar a
educação e impor uma forma de ver o mundo, como o ameaça,
porque o Estado de Hegel excede e assim localiza o estado
prussiano, expondo sua pretensão de ser enciclopédico. Derrida
tira a seguinte lição da sua leitura: a Universitas, como ele
generaliza a universidade (mas também a especifica como
devidamente intelectual e não profissional), sempre tem o
impulso de Estado, ou do esclarecimento, e o impulso de estado,
ou suas condições específicas de produção e reprodução. Ambos
têm a ambição de ser, como diz Derrida, onto e auto-
enciclopédico. Segue daí que ser contra ou a favor da Universitas
apresenta problemas. Ser a favor da Universitas é apoiar esse
projeto onto e auto-enciclopédico do Estado como
esclarecimento, ou o esclarecimento como totalidade, para usar
uma palavra antiquada. Ser demasiadamente contra a Universitas,
porém, cria o perigo de que elementos específicos do estado
tomem medidas para livrar-se da contradição do projeto onto e
auto-enciclopédico da Universitas e substituí-lo por alguma outra
forma de reprodução social, o anti-esclarecimento – a posição,
por exemplo, do New Labour na Inglaterra e dos estados de Nova
Iorque e Califórnia, com as suas “instituições pedagógicas." Mas
uma má leitura de Derrida também vai provocar novamente a
nossa pergunta: o que é que se perde com essa indecisão? Qual é
o preço que se paga por recusar-se a ser tanto pró-Universitas
quanto pela profissionalização, por ser crítico de ambos; e quem
paga esse preço? Quem torna possível alcançar a aporia dessa
leitura? Quem trabalha no excesso prematuro da totalidade, no
não não-pronto da negligência?

O meio de profissionalização que é a universidade americana


dedica-se precisamente à promoção dessa escolha consensual:
uma crítica anti-fundacional da universidade ou uma crítica
fundacional da universidade. Consideradas como escolhas, ou
restritas a apostas, uma coisa misturada com a outra, elas são,
no entanto, sempre negligentes. A profissionalização é
construída com base nessa escolha. Atinge a ética e a eficiência, a
responsabilidade e a ciência, e diversas outras escolhas, todas
construídas sobre o roubo, a conquista, a negligência da
intelectualidade de massa marginal dos undercommons.
É, portanto, insensato pensar na profissionalização como um

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estreitamento e é melhor pensar nisso como um círculo, um

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círculo de vagões de guerra em torno do último acampamento de

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mulheres e crianças indígenas. Pense no modo como o médico ou
o advogado americano consideram-se educados, fechados no
círculo da enciclopédia estatal, apesar de talvez não conhecerem
nada de filosofia ou história. O que estaria fora desse ato do
círculo de conquista, que tipo de mundo fantasmagoricamente
trabalhado escapa desse ato circular, um ato que é como um tipo
de fenomenologia partida, onde os resultados nunca saem e o
que é experimentado como conhecimento é o horizonte absoluto
do conhecimento, cujo nome é banido pelo banimento do
absoluto. Simplesmente é um horizonte que não se esforça em
tornar-se possível. Não surpreende que, independentemente de
suas origens ou possibilidades, são as teorias do pragmatismo
nos Estados Unidos e o realismo crítico na Inglaterra que
comandam a lealdade dos intelectuais críticos. Nunca tendo que
confrontar a fundação, nunca tendo que confrontar a
antifundação, pela fé na fundação inconfrontável, os intelectuais
críticos podem flutuar na gama mediana. Essas lealdades banem
dialéticas, com o seu interesse inconveniente em promover o
material e o abstrato, a mesa e seu cérebro, até onde podem, um
comportamento que não poderia ser mais obviamente não
profissional.

A profissionalização é a privatização do indivíduo


social através da negligência
Seguramente a profissionalização traz com ela os benefícios da
competência. O círculo onto/auto-enciclopédico da universidade
pode ser uma particularidade do estado americano, mas não
seria possível recuperar algo desse conhecimento para avanços
práticos? Ou, de fato, não seria possível embarcar em projetos
críticos dentro desse campo, projetos que direcionariam suas
competências para fins mais radicais? Não, nós diríamos, não
seria. E, ao dizer isso, nos preparamos para afastar-nos dos
acadêmicos críticos americanos, para nos tornarmos não
confiáveis, sermos desleais para com a esfera pública, sermos
obstrutivos e indolentes, tolos insolentes em face ao convite ao
pensamento crítico.

Vamos, por exemplo, agir de forma desleal no campo da


administração pública e especialmente nos programas de
mestrado em administração pública, incluindo programas
correlatos em saúde pública, administração ambiental,
administração de artes e sem fins lucrativos e a grande seleção
de cursos, certificados, diplomas e graduações em serviços
humanos, que sustentam esse agrupamento disciplinar. É difícil
não perceber que esses programas existem contra eles mesmos,
que eles se menosprezam. (Embora posteriormente seja possível
ver isso em toda a profissionalização, é a negligência subjacente
que instabiliza a superfície do poder do trabalho.) Uma
conferência comum, na Escola de Serviço Público Robert F.
Wagner, da NYU, por exemplo, pode ser mais antiestatal, mais
cética no governo, mais modesta em suas metas de políticas
sociais do que uma conferência comum nos departamentos
declaradamente neoclássicos de economia ou de ciências

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políticas da nova direita da mesma universidade. Não seria muito

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diferente na Syracuse University ou em uma dúzia de outras

AT
E
escolas de administração pública proeminentes. Pode-se dizer
que o ceticismo é uma parte importante do ensino superior, mas
este ceticismo em particular não está baseado em estudos
aprofundados do objeto em questão. Na verdade, não há qualquer
teoria estatal nos programas de administração pública nos
Estados Unidos. Ao invés disso, o estado é considerado como o
proverbial diabo que conhecemos. E se ele é compreendido na
administração pública como um mal necessário, ou como um
bem que tem utilidade e disponibilidade limitadas, é sempre
completamente reconhecível como um objeto. Então não é tanto
que esses programas sejam posicionados contra eles mesmos. Na
realidade, eles se posicionam contra alguns alunos, e
particularmente contra aqueles que vêm para a administração
pública com um sentimento que Derrida chama de dever além do
dever, ou uma paixão.

Ser cético sobre o que alguém já sabe é claramente uma posição


absurda. Se a pessoa é cética em relação a um objeto, então ela já
está em posição de não conhecer aquele objeto; e se a pessoa
alega conhecer o objeto, ela não pode também alegar ser cética
em relação àquele objeto, o que equivaleria a ser cética em
relação à própria alegação da pessoa. Mas esta é a posição da
profissionalização, e é esta a posição que confronta aquele
estudante, ainda que raro, que vem para a administração pública
com uma paixão. Qualquer tentativa passional, de pisar fora
desse ceticismo do conhecido rumo a um confronto inadequado
com o que excede o ceticismo e consigo mesmo, deve ser
suprimido por essa profissionalização. Não é somente uma
questão de administrar o mundo, mas de administrar o mundo
para fora (e, com isso, as profecias). Qualquer outra disposição é
não apenas não profissional, mas incompetente, antiética e
irresponsável, beirando a criminalidade. Novamente, a disciplina
da administração pública é particularmente, apesar de não
unicamente, instrutiva, tanto na sua pedagogia quanto no seu
academicismo, e oferece a chance de ser desleal, de esmagar e
agarrar o que nela se encerra.

A administração pública prende-se à ideia, tanto nas salas de


conferências como nos periódicos profissionais, de que suas
categorias são reconhecíveis. O estado, a economia e a sociedade
civil podem mudar de tamanho ou formato, o trabalho pode
entrar ou sair e a consideração ética pode variar, mas esses
objetos são tanto positivistas quanto normativos, permanecendo
em arranjo discreto e espacial um para com o outro. A
profissionalização começa por aceitar essas categorias,
precisamente para que a competência possa ser invocada, uma
competência que, ao mesmo tempo, vigia a sua própria fundação
(como Michael Dukakis dando voltas em um tanque,
fantasmagoricamente patrulhando o seu bairro vazio). Essa
responsabilidade pela preservação de objetos torna-se
precisamente aquela ética de locais específicos proposta por
Weber, que tem o efeito, como reconheceu Theodor Adorno, de
naturalizar a produção de locais capitalistas. Questioná-los
torna-se então não somente uma atitude incompetente e

DO
antiética, mas constitui uma falha de segurança.

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Por exemplo, se alguém quisesse explorar a possibilidade de que
a administração pública poderia ser mais bem definida como o
trabalho da privatização inexorável da sociedade capitalista, essa
pessoa poderia receber vários pontos de vista não profissionais.
Isso ajudaria a explicar a inadequação das três principais estirpes
nos estudos de administração pública nos Estados Unidos. A
estirpe da ethos pública, representada por projetos como a
reformulação da administração pública e o periódico
Administration and Society; a estirpe da competência pública,
representada no debate entre a administração pública e a nova
administração pública e pelo periódico Public Administration
Review; e a estirpe crítica, representada pela PAT-Net, pela
Public Administration Theory Network e por seu periódico
Administrative Theory & Praxis. Se a administração pública é a
competência para confrontar a socialização continuamente
criada pelo capitalismo e pegar o máximo possível dessa
socialização e reduzí-la a algo chamado de público ou a algo
chamado de privado, então imediatamente todas as três posições
tornam-se inválidas. Não é possível falar-se em um trabalho que
é dedicado à reprodução da desapropriação social como tendo
uma dimensão ética. Não é possível determinar a eficiência ou
extensão de tal trabalho após o seu desgaste nessa operação,
olhando-se para ele depois que ele reproduziu algo chamado de
público ou algo chamado de privado. E não é possível ser crítico e
ao mesmo tempo aceitar sem críticas a fundação do pensamento
da administração pública nessas esferas do público e do privado,
e negar o trabalho que está por trás dessas categorias, nos
undercommons, por exemplo, da república de mulheres que
administra o Brooklyn.

Mas este é um exemplo não profissional. Preserva as regras e


respeita os termos do debate, entra no discurso da comunidade,
pois conhece e reside nos seus (inacessíveis) objetos de fundação.
Também é um exemplo incompetente. Não se permite medir,
aplicar e melhorar, exceto permanecer querendo. E é um
exemplo antiético. Sugerir o domínio absoluto de uma categoria
sobre a outra – isso não é fascismo ou comunismo? Finalmente,
é um exemplo passional, cheio de profecias e não de provas, um
mau exemplo de um argumento fraco, que não faz qualquer
tentativa de defender-se, entregue a algum tipo de sacrifício da
comunidade profissional que emana dos undercommons. Esta é a
opinião negligente dos profissionais acadêmicos da
administração pública.

O que mais é então a conexão entre essa profissionalização como


a onto/auto-enciclopédia do estado americano e a expansão da
profissionalização além da universidade, ou talvez a expansão da
universidade para além da universidade, e as colônias dos
undercommons? Uma certa revolta na qual a profissionalização
tropeça – quando o cuidado com o social é confrontado com sua
reação, uma negligência forçada – uma revolta irrompe e o
profissional parece absurdo, como uma seção de recrutamento
no meio de um carnaval, serviços profissionais, serviços
profissionais pessoais, tornar-se profissional para pagar a

DO
universidade. É nesse momento de revolta que a

N
profissionalização mostra o seu negócio desesperado, nada

AT
E
menos do que converter o indivíduo social. Com exceção, talvez,
de uma coisa mais, o objetivo final de uma contra-rebelião em
todas as partes: transformar os insurgentes em agentes estatais.

Os acadêmicos críticos são os profissionais par


excellence
O acadêmico crítico questiona a universidade, questiona o
estado, questiona a arte, a política, a cultura. Mas nos
undercommons é assim: “sem perguntas." É incondicional – as
portas se abrem para refugiar mesmo quando pode ser que entre
algum agente policial ou a destruição. As perguntas são
supérfluas nos undercommons. Se você não sabe, por que
perguntar? A única pergunta que fica na superfície é o que pode
significar ser crítico quando o profissional se define como
alguém que é crítico da negligência, enquanto a negligência
define a profissionalização? Isso não significaria que ser crítico
da universidade faria de alguém o profissional par excellence,
mais negligente que qualquer outro? Distanciar-se
profissionalmente através da crítica; não é esse o consentimento
mais ativo para a privatização do indivíduo social? Os
undercommons podem, ao contrário, ser entendidos como
cautelosos com relação à crítica, cansados dela e, ao mesmo
tempo, dedicados à coletividade do seu futuro, à coletividade que
pode vir a ser o seu futuro. Os undercommons, de certa forma,
tentam escapar à crítica e da sua degradação como consciência
universitária e autoconsciência sobre a consciência universitária,
retirando-se, como diz Adrian Piper, para o mundo externo.

Esta comunidade de fugitivos, se ela existe, então também busca


escapar ao decreto do fim dos homens. O exército soberano do
anti-humanismo acadêmico vai perseguir essa comunidade
negativa nos undercommons, buscando recrutá-la, precisando
recrutá-la. No entanto, por mais sedutora que seja essa crítica,
por mais provocada que seja, nos undercommons eles sabem que
não é amor. Entre o decreto do fim e a ética do recomeço, os
undercommons aguardam – e alguns encontram conforto nisso.
Conforto para os emigrantes da conscrição, não para estar
prontos para a humanidade e quem tiver que, de qualquer modo,
suportar o retorno da humanidade, como pode ser suportado por
aqueles que vão ou têm que suportar isso, como certamente
aqueles dos undercommons suportam, sempre no limite, sempre o
suplemento do intelecto geral e da sua fonte. Quando o
acadêmico crítico que vive por decreto (dos outros) não consegue
nenhuma resposta, nenhum comprometimento dos
undercommons, então certamente a conclusão virá: eles não são
práticos, não são sérios em relação à mudança, não são
rigorosos, não são produtivos.

Enquanto isso, aquele acadêmico crítico na universidade, no


círculo do estado americano, questiona a universidade. Ele alega
ser crítico da negligência da universidade. Mas não é ele o
profissional mais bem-sucedido na sua negligência estudada? Se
o trabalho sobre o trabalho, o trabalho entre o trabalho dos não

DO
profissionais na universidade causa revolta, retração, liberação, o

N
trabalho do acadêmico crítico não envolve um escárnio desse

AT
E
primeiro trabalho, um desempenho que está finalmente na sua
falta de preocupação pelo que parodia, negligente? O
questionamento do acadêmico crítico não se torna uma
pacificação? Ou, para expor claramente, o acadêmico crítico não
ensina como negar precisamente o que uma pessoa produz com
outros, e esta não é a lição que as profissões retornam para a
universidade para aprender mais e mais uma vez? Então o
acadêmico crítico não se dedica ao que Michael E. Brown
classificou como empobrecimento, miserabilidade dos
prospectos cooperativos da sociedade? Este é o plano de ação
profissional. Esta charada do tipo esclaredor é totalmente
negligente em sua crítica, uma negligência que nega a
possibilidade de um pensamento sobre um exterior, um não-
lugar chamado de undercommons – o não-lugar que deve ser
pensado fora para ser sentido dentro, do qual a charada do tipo
escarecedor roubou tudo para usar em seu jogo.

Mas se o acadêmico crítico é apenas um profissional, por que


gastar tanto tempo com ele? Por que não simplesmente roubar
seus livros uma certa manhã e doá-los a estudantes não inscritos
em um boteco meio caído e com cheiro de cerveja, onde o
seminário sobre os esconderijos e os empréstimos acontecem?
Ainda assim, devemos falar sobre esses acadêmicos críticos
porque a negligência, afinal, é um grande crime de estado.

O encarceramento é a privatização do indivíduo social


através da guerra
Se fosse para insistir, o oposto de profissionalização seria aquele
impulso fugidio de confiar nos undercommons para proteção, de
confiar na honra e de insistir na honra da comunidade fugidia; se
fosse para insistir, o oposto de profissionalização seria aquele
impulso criminoso de roubar das profissões, da universidade,
sem desculpas nem malícia, de roubar o esclarecimento para
outros, roubar a si mesmo com uma música triste, um certo
otimismo trágico, para roubar com uma intelectualidade de
massa; se fosse para fazer isso, não seria colocar a criminalidade
e a negligência uma contra a outra? Isso não colocaria a
profissionalização, não colocaria a universidade, contra a honra?
E o que então poderia ser dito sobre a criminalidade?

Talvez então seja preciso dizer que o vendedor de crack, o


terrorista e o preso político compartilham um compromisso para
com a guerra e que a sociedade responde em espécie com guerras
ao crime, ao terror, às drogas, ao comunismo. Mas “esta guerra
contra o compromisso para com a guerra” marcha como uma
guerra contra o antissocial, quer dizer, aqueles que vivem “sem
uma preocupação pela sociabilidade." Mas isso não pode assim.
Afinal de contas, é a própria profissionalização que se dedica aos
antissociais, a própria universidade reproduz o conhecimento de
como negligenciar a sociabilidade, com a sua preocupação com
aquilo que chama de antissociabilidade. Não, esta guerra contra o
compromomisso para com a guerra reage ao compromisso para
com a guerra como a ameaça que é – não mera negligência ou

DO
destruição descuidada, mas um compromisso contra a ideia da

N
sociedade em si, ou seja, contra o que Foucault chamou de

AT
E
conquista; a guerra não falada que fundou e que, com força de
lei, refunda a sociedade. Não antissocial, mas contra o social,
este é o compromisso para com a guerra e é isso que perturba e,
ao mesmo tempo, forma os undercommons contra a universidade.

Não é este o caminho para se entender o encarceramento nos


Estados Unidos hoje? E, ao entendê-lo, não podemos dizer que é
precisamente o medo de que o criminoso venha a desafiar a
negligência que leva à necessidade, no contexto do estado
americano e do seu círculo Universitas particularmente violento,
de se concentrar sempre na negação da conquista?

A universidade é o local de reprodução social da


negação da conquista
Aqui a pessoa se vê cara a cara com as raízes do compromisso
crítico e profissional para com a negligência, as profundezas do
impulso de negar o pensamento do exterior interno entre os
intelectuais críticos e a necessidade de profissionais que
questionem sem questionar. Independente do que façam, os
intelectuais críticos que encontraram espaço na universidade
estão sempre já executando a negação da nova sociedade quando
eles negam os undercommons, quando eles encontram aquele
espaço na superfície da universidade e quando eles juntam-se à
negação da conquista, aprimorando aquele espaço. Antes de eles
criticarem a estética e a Estética, o estado e o Estado, a história e
a História, eles já tinham praticado a operação de negar o que
torna essas categorias possíveis no subtrabalho do seu ser social
enquanto acadêmicos críticos.

O slogan na Esquerda, então, “universidades, não prisões,"


marca uma escolha que pode não ser possível. Em outras
palavras, talvez mais universidades promovam mais prisões.
Talvez seja finalmente necessário ver que a universidade produz
encarceramento como o produto da sua negligência. Talvez haja
outra relação entre a Universidade e a Prisão – além da mera
oposição ou semelhança familiar – que os undercommons
reservam como o objeto e a moradia de outro abolicionismo. O
que poderia aparecer como a profissionalização da universidade
americana, nosso ponto de partida, agora poderia ser mais bem
entendido como uma certa intensificação de método na
Universitas, um fechamento do círculo. A profissionalização não
pode dominar a universidade americana – é a abordagem crítica
da universidade, a Universitas. E, realmente, parece agora que
esse estado, com sua hegemonia violenta peculiar, deve negar o
que Foucault chamou, nas suas conferências de 1975-76, de
guerra das raças.

A guerra contra o compromisso para com a guerra invoca a


memória da conquista. Os novos estudos americanos deveriam
fazer isso também, se for para ser não somente a história do
mesmo país, mas um movimento contra a possibilidade de um
país, ou de qualquer outro; não somente propriedade distribuída
justamente na fronteira, mas propriedades desconhecidas. E há

DO
outros espaços situados entre a Universitas e os undercommons,

N
espaços que são caracterizados precisamente por não ter espaço.

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E
Assim, o foco recaiu sobre estudos sobre o negro por todos,
desde William Bennett até Henry Louis Gates Jr., e a proliferação
de centros sem afiliação com a memória da conquista, com seus
guardiões vivos, com a proteção da sua honra, com as noites de
trabalho, nos undercommons.

A universidade, então, não é o oposto de prisão, já que ambas


estão envolvidas a seu modo na redução e no comando do
indivíduo social. E, realmente, dadas as circunstâncias, temos
que concluir que mais universidades e menos prisões
significariam que a memória da guerra estava sendo perdida e,
vivendo sem ser conquistado, o trabalho conquistado é
abandonado ao seu próprio destino. Ao contrário, os
undercommons pensam na prisão como um segredo sobre a
conquista, mas um segredo, como diz Sara Ahmed, cujo segredo
crescente é o seu poder, sua habilidade de manter distância entre
ele e sua revelação, um segredo que clama pelo profético, um
segredo guardado em comum, organizado como um segredo,
nomeado como uma organização profética.

Os Undercommons da Universidade SÃO um não-lugar


de abolição
Ruth Wilson Gilmore: “O racismo é a produção e exploração,
sancionada pelo estado e/ou extralegal, de vulnerabilidades
diferenciadas por grupos para a morte (civil, social e corporal)
prematura." Qual a diferença entre isso e a escravidão? Qual é,
por assim dizer, o objeto da abolição? Não tanto a abolição das
prisões, mas a abolição de uma sociedade que poderia ter
prisões, que poderia ter escravidão, que poderia ter salários e,
portanto, não a abolição como a eliminação de qualquer coisa,
mas a abolição como a fundação de uma nova sociedade. O objeto
da abolição teria então uma semelhança com o comunismo, que
seria, para retornar a Spivak, misterioso. O misterioso que
perturba a crítica que o perpassa, o profissional que segue sem
ele, o misterioso que se pode perceber na profecia, o momento
estranhamente conhecido, o conteúdo que agrega, de uma
cadência, e o misterioso que se pode sentir na cooperação, o
segredo que uma vez se chamou solidariedade. O sentimento
misterioso que fica em nós é o de que há alguma coisa a mais no
undercommons. É a organização profética que trabalha para a
abolição vermelha e negra!

Stefano Harney é Professor de Educação de Gerenciamiento Estratégico na Singapore Management University. É o


autor de State Work: Public Administra on and Mass Intellectuality (2002) e The Ends of Management
(próximamente).

Fred Moten é Professor na University of California, Riverside. É o autor de In the Break: The Aesthe cs of the Black
Radical Tradi on (2003) e de B Jenkins (2010).

Osmundo Pinho é professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

Obras citadas no prefácio


Garvey, Marcus. 2004. Selected Writings and Speeches of Marcus Garvey. Edição de
Blaisdell, Bob. New York. Dover Publications.
Hartman, Saidiya. 1997. Scenes of Subjection: Terror, Slavery, and Self-Making in
Nineteenth-Century America. New York/Oxford. Oxford University Press.

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N
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Jesus, Carolina Maria de. 1960. Quarto de Despejo: Diário de uma favelada. São

E
Paulo. Livraria F. Alves.

Madame Satã. Grandes Entrevistas Históricas.


http://www.tirodeletra.com.br/entrevistas/MadameSata.htm

Wilderson, III, Frank B. 2011. The Vengeance of Vertigo: Aphasia and Abjection in the
Political Trials of Black Insurgents. InTensions Journal. Toronto. New York University.

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