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OA LI T ERAT URA
Ensaios de Lingüística
Cadernos de Lingüística e Teoria da Literatura
PREFACIO 7
A ordem VS em Português
Euhice:Souza Lima Pontes (U FMG) 90
Conceitos de Estilistica
Anna Maria Viegas (UFMG) 165
MARIA CRISTINA MAGRO
Universidade Federal de Minas Gerais
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a: Todo mundo que te viu aí pela Faculdade sabe que você
faz malabarismo na sala e carrega bolas nesta sacola. Por que
você faz malabarismos e por que ensina isto pra gente?
H: No ano passado, de março até maio, eu estive em Berkeley,
onde encontrei uma estudante de Lingüística que era também mala-
barista profissional, Nancy Levidow. Uma forma muito pouco elucl-
dativa de falar sobre o que aconteceu seria dizer que eu aprendi a
fazer malabarísmos. Eu descobri que era um malabarista, ou seja,
foi quase uma experiência de 'déjà vu', Então, o que o malabarismo
tem a ver com a minha vida? Por que ele estava dormindo dentro
de mim por tanto tempo? A mesma sensação de 'reconhecimento'
eu tive quando, em 1956, fiz meu primeiro curso de l.lngüística. Li no
catálogo de graduação da Vale sobre o único curso de Lingüística
quaotereclam, .onde a. estrutura da linguagem seria pesquisada e, no
segundo semestre, uma lingua. desconhecida pelos alunos seria
estudada. Fascinante! Decidi, depoís deste curso que fiz com Bernard
Block.. um professor fabuloso, ser lingüista. Mas. na Yal~ não. havía
graduação em. Llngüistlca, entãp. eu tive. que. cursar. Matemátic~,
pen~ando em fazer. pós-graduação .•. ~mLingüís~ica. Fui um •• péssimo
estudante naYale, . rnas.rn~divertiat~,jogando pôquer, . futebol...
(rislls).J::u . tí.nha•• urna8ert~ .h.~l)lIid~<:Iéforrnal, ..mas. não o.. suficiente
para ser um maternático'l\t~q\j~euir0<:l~l em Matemática, e fui
pr~por ao Bernard~I()ckf~zerUnlPrOgramaespecial em Lingüística
para mim. Fuí o prímeiroe único Iingüísta da Vale, porque durante
deianosélesriãOsêarriscarallláteróutros alunos como eu (risos).
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que praticamos contra os índios, o genocídio que estávamos praticando
contra o povo do Vietnam era o pior que já tínhamos feito. Nesta
época também começava uma controvérsia no campo da Gramática
Gerativa. Minha visão bastante simplista de ciência, segundo a qual
há uma só verdade que todos lutamos juntos para descobrir, começou
a ser substituída por uma visão pluralista do trabalho científico, onde
duas teorias são duas maneiras de se ver o mundo, podendo ambas
ser corretas, e além disto necessárias. Eu nunca tinha pensado nisto
até esta controvérsia que ocorreu na Lingülstica.
Logo que acabei minha tese, Chomsky estava dando uns cursos
no M.I.T. sobre o que ele chama hoje de lexicalismo ou teoria de X,
apresentando um artigo chamado «Remarks on Nominalizations». Nestes
cursos eu discuti com ele passional mente, desesperadamente, porque
eu via um homem genial, magnifico, que me ensinou a pensar, e
a quem psicólogos e filósofos devem rnultísslrno, uma pessoa qlleeu
reverenciava e tentava transformar em meu pai intelectual, falando
coisas que para mim eram terrivelmente erradas, pouco intultivas.
O que eu hoje diria é que Chomsky tem um senso de estéticadifer~~te,
que ele vê a beleza com olhos de um matemático, de um filósofo
formal, de um lógico. Sua formação foi toda técnica, analítica. Um
de seus professores foi, Nelson Goodman, um homem brilhante, extre-
mamente lógico, preciso; ele sofreu, também influências, de Carnap,
Bar-Hillel.r.todos eles pessoas que trabalharam prlrnordlalmente com
linguagens formais como a Aritmética ou a Lógica Formal. Nestas
linguagens faz sentido separar claramente a Sintaxe da' Semântica e
da Pragmática. Muitos de nós, hoje, não achamos que tem tanto
sentido assim fazer esta separação com línguas naturais, onde estes
slstemas estão lntrlnsecarnente-ccneétadós.
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você olhar bem, vai achar nos pés- de-página montes de digressões,
coisas de quem entrou numa área pouco conhecida e ficou fascinado,
como um naturalista jogado nas Galápagos que fica fascinado com os
novos tipos de borboletas, aves ou cobras que encontra lá. Tinha
mais. ou menos um interesse 'botânico' pela Sintaxe. Uma amiga
minha, uma das pessoas mais geniais que trabalham no campo do
que. podemos chamar de 'a estética da Llngülstlca', ou a psicologia
profunda do campo da Lingüística, Anneliese Krarner, me chamou a
atenção para algo muito interessante a respeito da minha tese. Quando
tento definir áreas da estrutura sintática que resistem à mudança
de elementos de dentro dela para fora e vice-versa, chamo estas
áreas de ilhas, e não de domínios, ou qualquer coisa assim. Porque
eu uso esta metáfora? Ela sugeriu que o que eu gosto mesmo de
fazer é estar numa ilha, longe do resto do mundo, como se estivesse
descobrindo um novo planeta ou Galápagos. Eu gosto de quebrar o
que eu vejo como 'paredes' das pesquisas acadêmicas anteriores.
Eu sou um péssimo estudante do trabalho dos outros. Eu detesto ter
que ler as pilhas de livros e artigos que os outros escrevem, mas
gosto de caminhar por mim mesmo, de tentar encontrar, em seus
próprios termos, este ser magnifico que eu adoro profundamente, a
linguagem.
a: Você uma vez falou que a linguagem era uma mulher.
H: É... talvez isto esteja relacionado com um livro que estive
lendo chamado Wornan and Nature, de Susan Griffin.Em duas palavras,
a tese central do livro éo que se passou na mente de Descartes que,
corna ajuda de Galileu e Bacon e outras pessoas, estabeleceu o
curso da ciência moderna.. por volta de 1600. Para Descartes, o
universo em si seria dividido em duas partes, essencialmente corpo
e. mente-- 'res-cogítans', a coisa pensante, agressiva, macho, centro-
ladora, exploradora, e 'res-extensa', a extensão, que é a natureza,
meio passiva, receptiva, e fêmea. Não é à toa que falamos em
Mãe-Natureza. Susan Griffin levanta neste livro uma série de metáforas
usadas pelos primeiros cientistas como Bacon, por exemplo, que usou
a palavra tortura falando sobre a relação entre o cientista e a natureza.
Ele dizia que a Natureza deveria ser posta num cavalete e torturada
para nos revelar. seus segredos. Vemos hoje, como conseqüência deste
tipo de pensamento sobre o desenvolvimento da tecnologia e ciência, o
desequilíbrio em. que se encontra o mundo atual. Carolyn Merchant
chama atenção para o mesmo fato em seu livro .The, Death of Nature,
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citado por Fritjof Capra no incrlvel The Turning Point. De qualquer
forma, seja lá, por que razões, vejo a linguagem como uma mulher,e
para mim ela tem sido uma professora, um ser, depois' que eu
passei pelo que chamo de 'rituais de purificação', submetido a uma
disciplina intelectual rigorosa, tendo que aprender a Gramática de
Montague, a Gramática Gerativa, ou Fonologia, por exemplO,'· que
não são coisas fáceis de se manejar de maneira criativa. Esta não é
uma tarefa fácil que se tem exigido dos lingüistas.
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H: Eu não vejo meu trabalho em arte desconectado do. meu
trabalho em Lingüística. Meu trabalho em Sintaxe é uma manifestação
de minha 'necessidade' artística de criar coisas bonitas. Tem uns
dez anos que eu tenho sido um artista de contornos muito pouco
definidos, graduais. Não é à toa que gosto dos impressionistas, muito
mais do que dos pintores realistas do século XVIII que os precederam.
Acho que poderíamos dizer que eu sou um sintaticista impressionista.
Voltando à minha tese, ela é uma mistura engraçada de Lingüística
Formal, teórica, técnica, de contornos definidos, e subjacente a ela
está uma sintaxe gradual, selvagem, anárquica, incontrolável, irnpresslo-
nlsta e botânica. E muito profética. Acho que ela é mais importante
pelas questões que coloca após uma vivência disciplinar rígida do
que por seus próprios resultados. O último capítulo termina com a
citação de uma introdução ao livro de poemas de e. e. cummings:
«Olha, como Blake põde fazer para que as quebras das sílabas
resultassem numa série de substantivos, em número idêntico ao
de verbos, de 'fs' aqui e de 'ns' e 'ds'? .. Como ele conseguiu
manter todas estas bolas no ar - para usar a metáfora dó
malabarismo--?»
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G: É interessante você ter mencionado isto porque nossos
alunos, ou às vezes colegas, costumam dizer: "por que fazer isto com
um poema? Você acha que o poeta fez isto mesmo?" As pessoas
criticam muito o trabalho dos críticos sobre os poemas.
H:. Hoje eu tenho um sentimento bem mais radical a esse respeito
do que tinha naquela época. Minha visão é ade que a arte ~ão é
criada conscientemente pelo artista. Vejo isto pelo meu próprio trabalho
em pintura, música e poesia, amador como ele é. É necessário.entr~r
num estado mistico de consciência, de que os poetas falam usando. a
metáfora das Musas que são invocadas. Até onde eu posso ver, o espaço
necessário para se fazer qualquer criação artistica é o mesmo espaço
que se tenta atingir com práticas de meditação no Budismo, Ta~ísmo,
Hinduísmo, onde a gente deixa de se enxergar como sendo separado e
distinto do universo..É um espaço onde o tempo não é mais .uma
seqüência linear. de momentos, onde as oposições e polaridades .são
transcendidas. É. um espaço onde. a diferença entre res-cogitans. e
rés-extensa de Descartes deixa de existir. Aí o Universo fala através
do arti~ta. O Universo, eu acho, é o verdadeiro autor, o verdadeiro
artista, é uma inteligência vasta e inacreditável da qual nossa cons-
ciência limitada pode às vezes apenas experimentar um cantinho.
Como cientistas, eu acho, usamos nossa ciência como um veículo,
como uma forma de sermos levados para dentro deste esp~ço_É
nossa maneira de contactarmos Musas, e quando estamos lá é que a
Ciência nasce. De fato, muitos cientistas foram bastante explícitos ao
falar de suas 'peak experiences', no dizer de Abraham Maslow.. Falam
de ter trabalhado corn um problema por muito, muito tempo, sem
suces~o nenhum, até que a. solução. da equação é vista, num instante
atemPoral, c~rn}bsolutaGlareza_ Mozart.contater visto uma sinfonía
inteiran.yrrt dEl~t~srn?rn~ntos, algo .co uma .:estrutura abstrata,
l11o
uma. escu'tura,umaf~rl11~ gElométri?a~tud(). o que el.e fez foi. passar
para o papel. Estas s~o~xperiên?i~sqye todos buscamos. Pena que
não possamos permanecer reste espaço de 'satori', no espaço de
'nirvana' .-
•.- para usar os termos. budistas - porque temos que dar
continuidade a esta disciplina da gramática de Montague, da Fonêmica
Estruturalista, ou qualquer outro aspecto do nosso papel na ciência.
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H: Bom, poesia é uma transação muito engraçada. Em geral
acredita-se queo poeta rabisca uns traços na folha de papel e o que o
leitor ou o crítico fazem é retirar destes rabiscos o que o poeta pôs
neles. Esta idéia está bem de acordo com o pensamento descrito num
artigo incrível de Michael Reddy chamado «The. Conduit Metaphor»,
que. está num livro organizado por Andrew Ortony, Metáphor and
Thought. Ele mostra que usamos, em inglês, frases como 'That woman
packs a lot of meaning into her words', ou 'why don't you put this
thought earlier in the paragraph?'. Segundo esta metáfora, idéias
seriam 'coisas' como balas de goma, por exemplo, e comunicar-se
seria mover as balas de goma de um lado a outro de um tubo.
Assim poderíamos dizer que um poema é uma. representação física
ou visual de idéias do poeta. Mas eu não acredito que seja isto
mesmo; porque cada um de nós vem para o poema com uma história
completamente diferente e única. Uma imagem que funciona para
uma pessoa não funciona para outra. Por isto eu penso que a relação
entre poeta, poema .B leitor é triádica e que, num certo sentido, o
poema surge porque o poeta trabalhou seu contato com a Musa.
Para penetrar nesse espaço atemporal de criação, o espaço-fonte dos
'lnsights', o leitor tem que praticar um certo tipo de disciplina. Há
certas coisas nos poemas que se repetem, como. a distribuição dos
versos e rimas, há certos tiposde estruturaque você provavelmente
já terá visto antes. Por outrolad.o, haxerá c?isas que você ~unca
encontrou. ou encontrará .emqualqueroutro poema, uma. estrutura
própria queirásend.ocorystruícjaà medida. que ele avança. Então,
se você aborda ~111 poe assímcornuma visão pesada, prescritivista,
l11a
controladora sobre ? q~~.o po~ma pode te mostrar, tudo o que ele
irá te mostrar será? que você tem em seus próprios olhos. Acredito
que você tem que chegar até um poema com o máximo de conheci-
mento possível sopr~ .a .teoria da rima, do ritmo, de figuras como
metáfora, metonímia,. sinédoque etc, mas também e principalmente,
você deve chegar co a determinação de abandonar tudo isto e deixar
I11
que o poema se mostre a você como uma flor nova numa ilha que
um naturalista esteja explorando, algo que nunca existiu antes.
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H: Exatamente. Corretíssimo. É por isto que eu acho que não
podemos superestimar a idéia de Reddy do.. artigo« The Conduit
Metaphor», apesar de ela casar bem com o sem-número de expressões
do inglês sobre comunicação. Segundo esta visão, comunicação é bem
fácil. É facílimo eu pegar uma caixa, enchê-Ia de balas de goma,
entregar-lhe esta caixa e você retirar dela as balas. Isto não exige
nenhum esforço. Há, por outro lado, uma analogia interessantíssima
feita por Peter Elbow no apêndice do livro Writing without Teachers,
chamado «The Doubting Game and the Believing Game - An Analysis
of the Intellectual Enterprise». Ele compara a comunicação com a
transferência de um filme: na cabeça do emissor há imagens de um
filme e uma trilha sonora. O que o emissor transfere para o receptor
é só a trilha sonora. O que o receptor tem que fazer é imaginar que
imagens estariam na cabeça do emissor correspondendo à trilha sonora
recebida. Seria construir um filme tão rapidamente quanto possível
a partir dos dados que temos, Pensa quanta imaginação e ingenuidade
seriam necessárias neste processo! Imagine se te dessem a trilha
sonora do 2001 e você tivesse que construir todas aquelas imagens
fantástícas! Seria uma aventura criativa, imperfeita, corajosa e cheía
de riscos. A metáfora de Reddy só é válida para certos tipos de
comunicação, triviais, desinteressantes. A analogia de Elbow, no entan-
to,parece válida para todos os tipos, porque além do conteúdo
denotativo de, por exemplo, uma informação que você dê sobre como
ir ao Correio da Savassi, há todo tipo de informações paralingüísticas
na velocidade de sua fala, na melodia de sua voz, nos seus gestos,
nas suas atitudes, se, por exemplo, você está próximo ou não da
pessoa com quem fala. Todas estas coisas comunicam demais! Se
eu estou dando informações objetivas ou escrevendo um poema, tudo
estará mecomunic~ndo da forma mais profunda possível. A Lingüística
tem centrado seu. interesse na parte da mensagem que diz 'primeira
rua à direita, segunda rua à esquerda e depois cinquenta metros à
direita. está o correio'çique a. meu ver é a porção maís trivial e
desinteressante.
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H: Vários fatos foram cruciais neste processo. Primeiro, como
falei antes, as controvérsias em torno da Lingülstica Gerativa: além
disto, as dificuldades inerentes à passagem dos 30 anos _. quando
você se vê frente à sua própria mortalidade - e ainda algumas
leituras que fiz sobre Zen, os livros de Castaüeda, todo tipo de coisas
sobre pensamento não-ocidental: Taoísmo, Filosofia, Budismo, Hinduís-
mo etc. É Impressionante como todos estes ensinamentos possuem
uma certa constância. Eles dizem que o mundo em que vivemos tem
um certo tipo de realidade, que é essencialmente a realidade que
sonhamos: se você chuta uma pedra no sonho. seu pé dói. Mas está
também disponível para nós um outro tipo de percepção da realidade:
quando você acorda, você descobre que a pedra que você chutou
era apenas criação da sua mente. Todos estes ensinamentos concordam
com que haja uma maneira de se acordar. O que nós tomamos como
sendo o mundo real possui uma realidade condicional em si mesmo,
e você pode se perder nesta empreitada. A grande questão da vida
seria acordar. Comecei a pensar no que significaria acordar e me
dediquei a aprender um pouco de yoga, meditação, e outras coisas.
Todos estes ensinamentos nos mostram que quando estamos acor-
dados nós não vemos o mundo todo repartido, separado, sendo Haj
diferente de Cristina e de Perini. É uma ilusão considerar-me diferente.
Da mesma forma, meu trabalho em Lingüistica deveria ser: uma
tentativa de entender a estrutura do universo: Medicina, Arte Grega,
tudo como sendo a mesma coisa.
A ciência atual vê o mundo corno uma maquina. Há uma certa
percepção do. universô. côrrt0úmrnonte de p~rtículà~. independentes
uma das outras e do próprio observador. Esta visão nos permite
falar de dois elétrons,. pensar • em.súasihterâC;Õesem· termos de
atração magnética, gravitação. A Física Moderna, no entanto, nos
mostra que esta perspectiva é falsa, . ou seja,· que nossa decisão
sobre que propriedade do elétron· decidimos medir •influehcia esta
propriedade, ou seja, ele não tem certasproprledadés pôr si mesmo,
independente do observador. O elétron e o observador constituem,
juntos, um sistema. Isto foi descoberto na Alemanha há 50 anos
atrás. O sucesso obtido pela possibilidade de se reduzir fenômenos
complexos em termos de unidades menores levou-nos a encarar como
sendo objetlvo, completamente neutro, este procedimento. Por Isto
achamos que é étimo poder partir qualquer fenômeno complexo, estudar
suas partes isoladamente e que um dia conseguiremos juntar nova-
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mente estas partes. Há, no entanto, muitos casos que nos mostram
que este procedimento não funciona. Acho que é o caso da água
do mar, por exemplo, que pode ser quimicamente decomposta e
analisada em detalhe, mas quando tentarmos sintetizá-Ia ajuntando
todos os seus ingredientes, e pusermos dentro dela um peixe, ele
não viverá. Há muitos casos no estudo do mundo em que o todo é
mais do que a soma de suas partes, assim como, eu diria, um poema
não é a soma de seus versos... Se olharmos a estrutura atual das
universidades, achamos inteiramente plausível termos universidades
que separam a ciência das humanidades, e que separam as ciências
sociais das exatas etc. Impede-se assim que os estudantes tenham
uma visão global do universo.
Em Lingüística, o que seria necessário seria juntar prosa e poesia,
vê-Ias como o mesmo tipo de coisa, provavelmente vista sob duas
perspectivas distintas. Juntar ai o que chamamos de para-lingüística.
Transcender as fronteiras entre Filosofia e Psicologia, Filosofia e
Flsica, ver um trabalho que eu tenha feito sobre um poema como sendo
idêntico ao trabalho de Einstein etc, etc. O próprio Fritjof Capra fala
no The Turning Point que o mundo está em total desequilíbrio. Nós
idolatramos a ciência a ponto de acharmos que a ciência é o único
caminho válido para o conhecimento, e ainda nós jogamos fora tudo o
que seria o 'espirita' - valores espirituais, religiosos, morais e éticos,
que poderiam refrear, por assim dizer, a ciência.
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R: Você falou uma vez que não consegue mais fazer Sintaxe
como antes. Você acha que ao fazer Sintaxe - se voltar a
fazê-lo ~ seria possível quebrar com esta distância entre Lingüística
e Química, por exemplo, ou. .. talvez no seu trabalho com poemas
isto seria mais fâcil . . .
H: Quando eu trabalhava com Sintaxe, eu estava fazendo 'ciência'.
Eu estava partindo o mundo em pedaços e eu queria parar de fazer
isto, porque comecei a acreditar, a ter opinião de que isto era ruim,
e não queria contribuir mais com esta visão de ciência. Uma vez uma
amiga, Ellen Zweig, que é uma poetisa incrível, disse que eu tinha uma
compreensão muito limitada da arte. Acho que ela estava certa. Primeiro,
porque não conheço muitas formas de arte. Segundo, porque na verdade
eu devia ver meu trabalho em Sintaxe como uma manifestação artística.
Aárte não precisa se parecer com pintura, escultura, uma sinfonia
ou algo assim. Acho também que as pessoas valorizaram meu trabalho
em. Sintaxe porque ele era divertido, 'insíghttut', bastante criativo.
Mas oque eu detesto mesmo é ficar díscutindo com os outros, entrar
em polêmicas como as que costumam ocorrer entre 'cientistas'.
R: BJ você tem que se ver envolvido em polémicas se. você
faz Sintaxe?
H: A primeira coisa que eu acho é que a gente não precisa
ficar atacando o trabalhados outros -- •• se. ele te parece pouco criativo,
nãÓprecísa dizer.. ~uponh~entãoq~e eu escreva um artigo em
Sintaxe.e usedia~~arJl~s~rnáry?re.ouuse nódulos como SN ou O.
qrJl~utreinarJle~to~que.seráo~Yído,eentão as pessoas que sempre
foram excluídas da Gramática Geratíva, que se opuseram a ela e foram
criticadas por ela, vão cair de pau em cima de mim. Eles acham que
só por eu> ter. usado O, ou setas, outer mencionado a palavra trans-
formação,ewas estou atacando diretamente. Hoje você tem que ler
tudo o que escreveram sobre determinado assunto na semana passada,
mesmo sem. entendernada, Todo mundo é fascinado com a linguagem,
mas acaba desencantado pela Lingüística. É quase que um milagre
termos os três aqui sobrevivido ao incrível monte de coisas aborrecidas
que. tivemos que. estudar sobre a linguagem. O que eu adoraria
fazer é escrever algo sobre a estrutura da linguagem que todo mundo
pudesse ler.
R: Você sempre fala de sua preocupação em desanimar. pes-
soas com um certo tipo de Sintaxe. Mas eu tenho certeza que você
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também está desagradando muita gente com o trabalho que está
fazendo agora. Fica parecendo que você está arranjando desculpa
para não fazer Sintaxe.
H: Uma vez eu escrevi um artigo sobre performativos, isto foi
em 1968. Foi publicado em centenas de cópias que circularam por aí, e
gerou este tipo de indústria de gente que é a favor da análise de
performativos, ou contra a análise. Quilos e quilos e quilos de papel
e livros foram escritos. O que me incomoda é que eu gastaria a minha
vida criativa inteira pra saber, disto tudo, o que há de verdadeiro a
favor ou contra a análise. Se eu tivesse que fazer isto me acharia
preso, sem liberdade. É por isto também que a Siritaxe foi interessante
para mim e pode ser por isto que ela não é mais. Eu detesto ter que
ficar lendo milhares de páginas, anotando coisas. Talvez seja isto a
ciência, séria, real - percorrer milhares de páginas e fazer este tipo
de trabalho. Neste sentido, eu duvido então que eu seja um cien-
tista sério.
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ser um cidadão do mundo, saber quantas línguas fosse possível e
conhecer quantas culturas houvesse para transcender a estreiteza de
sermos cidadãos de um único país, seria bom que um Iíngüista teórico
fosse versado em várias metalínguagens. Quando se é cidadão de um
só pais, a gente tem a impressão de que nosso país é melhor do que
todos os outros. Se a gente tem a habilidade de um malabarista, de
manter uma série de bolas no ar, de manter uma série de bolas
teóricas no ar, isto não previne você contra se sentir mais em casa
numa perspectiva teórica que noutra. A gente tem que lutar contra o
não Se sentir em casa em todas as teorias exceto uma. Esta é a
dlcotomização inimiga. O que eu gostaria é de ter todo um conjunto de
perspectivas teóricas dentre as quais eu escolhesse uma e que qualquer
uma delas me ajudasse a iluminar e enriquecer um conjunto de dados
lingüisticos. Nós não temos que ver cada perspectiva como compe-
tindo com outra, de forma a termos então só uma correta. Suponhamos
-- vamos deixar serem todas corretas. Vamos deixam serem todas
parciais, cada uma delas nos dizer um pouco, o que puder, sobre o
objeto. Podemos fazer um paralelo entre o que acabo de dizer e o
trabalho de Lakoff and Johnson, Metaphors We Live By. Eles mostram
que o sistema metafórico de uma língua tem também um certo tipo
de pluralismo, ou são mais ou menos como fatos poli-culturais. Ou
seja, se você fala de uma coisa em termos de uma outra coisa - que
é o que chamamos de metãfora ---- você está tentando ganhar algum
entendimento sobre umaidéla abstrata, Usando vocabulário apropriado
a áreas mais concretas do conhecimento. Não há, neste sentido, uma
só metáfora correta. Elas serão sempre parciais, ressaltando algumas
das características de um conceito e abafando outras. Assim, se
tivermos uma variedade de metáforas disponíveis sobre um mesmo
conceito, este conceito terá uma riqueza incrivel, impossível de ser
atingida de outra forma. O mesmo acontecerá com um trabalho
em que se possam considerar várias perspectivas teóricas.
O: Vocête'llt dito que é importante para você.fazer'lltalaba-
,.isrnos. Por que você acha que isto é importante pros ouiros também?
H: Eu acho que o malabarismo é a minha dança. Se alguma
coisa é categorizada. como sendo arte, ela amedronta. Muita gente
diz: eu não sou artista, eu não sei cantar, eu não sei dançar, eu não
sei ler poesia. Para mim, o malabarismo é uma forma não convencional
de arte, que não é categorizada como arte. Então eu estou tentando
ensinar pessoas que 'não são artistas', que se acham 'não artistas',
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que não podem cantar, ler poesia, dançar, pintar e coisas assim,
esta forma particular de arte. Outra coisa boa sobre o malabarismo
é o equilíbrio que a gente precisa ter, precisa restaurar no mundo em
que vivemos. Além disto, o malabarismo nos envolve sempre em
'acidentes', e você tem que improvisar, tem que jogar com seus
próprios meios. Ser um malabarista, para mim, está diretamente
relacionado com uma atitude frente à vida, a de ser um malabarista
real, sem pensar que você é o maior. É não pensar que existam
acidentes. É saber que qualquer coisa que te acontecer você precisa
conviver com ela, manter as coisas indo da melhor maneira possível.
Eu acho que fazer malabarismos é uma metáfora excelente tanto para
aprender quanto para viver.
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chegando a um novo mapa do mundo e da vida, no qual elas não são
fronteiriças mas centrais, e aquelas com as quais gastamos todo nosso
tempo não só estão nas fronteiras como ainda estas fronteiras são
muito perigosas. Elas nos levam aos muitos problemas a que Capra...
se refere no The Turning Point como sendo problemas sistêmicos: a
poluição, a inflação, a superprodução etc. Talvez ele esteja certo em
pensar que estes problemas derivam do velho paradigma do pensa-
mento, e que só ficaremos livres deles se desenharmos nossos mapas
outra vez, de outro jeito. Este trabalho amedrontador, a gente fica
é
«Here I stand
I can do nothing else
God help rne,»
- 24-
YONNE DE FREITAS LEITE (2)
Museu Nacional CU. F. R. .L)
-25-
Entre as linguas Indrqenas faladas no Brasil, as do grupo Tupi têm, sem
dúvida alguma, merecido maior atenção por parte dos estudiosos brasileiros.
Do ponto de vista classlftcatórlo conta este grupo com os trabalhos de A.D.
Rodrigues e M. Lemle. O trabalho de Rodrigues é o mais extensivo em termos das
línguas consideradas e de nível das relações estabelecidas, chegando ao tronco
Tupi composto pelas seguintes Iarnrlias: Tupi-Guarani, Juruna, Arikém, Tupari,
Hamarama, Mondé e Puruborá. O método adotado é o da léxico-estatística, sendo
a relação entre as lfnguas, famrllas e dialetos determinada pela percentagem de
cognatos do vocabulário básico retida pelas l(nguas examinadas. Lemle detém-se
na subclasslficaçâo da família Tupi-Guarani, adotando o método comparativo.
Segundo esse método a hipótese para o agrupamento é a de que uma inovação
compartilhada por um grupo de hnquas implica numa separação e desenvolvirnen-
to comum das !fnguas, cuja história passa a ser independente da das lfnguas em
que aquela mudança não ocorreu. Lemle considera o Tupinambá (Tp), Guarani
(Gn), Guarayo (Gy), Sirionó (Si), Kokama (Ko}, Parintintin (Pt}, Urubu (Ub),
l<amayurá (Km), Asurini (As) e Guajajara (Gj}, e chega à seguinte classificação:
Proto Tupi-Guarani
py > c
*c >~
v> v *c >r/J
~.,
As Gj Pt Km Ub
~
Gn Gy Si Ko Tb
-26-
Nenhuma das duas classificações, pois, põe em dúvida que o Tapirapé é uma
Iíngua da família Tupi-Guarani. O problema reside em seu grau de relacionamento
com as demais lrnquas dessa famrlla. O método léxico-estatístico é de pouca utili-
dade para resolver casos como esse, uma vez que a relação lI'ngua-famnia é deter-
minada pelo percentual de cognatos retidos, que será, portanto, o mesmo (cerca
de 80%) para todas as Iínguas componentes da tarmlla. E a dificuldade de Lemle
em incluir o Tapirapé, embora sua maior relação com o Asurini pareça evidente,
mostra a inadequação também do mecanismo de classificação genética por diagra-
ma em árvore. Por esse mecanismo cada inovação significa uma história em
comum das h'nquas que a compartilham e a ruptura de relacionamento entre
aquele grupo e as demais I(nquas em que 'l mudança não ocorreu. Assim pelo dia-
grama em árvore apresentado acima a primeira subdivisão que separa o Asurini, o
Guajajara, o Parintintin, o Kamayurá e o Urubu do Guarani, Guarayo, Sirlonó,
Kokama e Tupinambá são as mudanças idênticas ocorridas nas Iínguas do primeiro
grupo em relação à proto-seqüência ÍJy e ao proto-tonerna ~. Enquanto que nas
línguas do segundo grupo encontramos a seqüência Ipyl e o fonema lcl, nas
Hnquas do primeiro grupo, à seqüência "pv corresponde uma africada ou fricativa
e ao preto-fonema *c corresponde Ihl ou cp. O Tapirapé (Tap) compartilha das
mudanças do primeiro grupo. Deste modo temos as correspondências *py : c e
"c : h ~.
Ex.: epvak:* As. e~a!J' Gj e Km e~ak, Ub usak, Tap e~ãk, enquanto que
Tp epyak, Gy epia e Si ea.
vact: As. Gj. Pa. Ub. yah+, Km. yai- e Tap. yah+ ou vai-, enquanto
que Ko. GY. vaeí-. Gn, ya~+, Si. ~as+ e Tp. vasto
-27 -
MUDANÇAS NO SISTEMA VOCÁLICO
ASURINI TAPIRAPÉ
GUAJAJARA
[;J
e .
[~. [?J
a . o.
-28-
ças podem, em primeiro lugar, ser formuladas como regras adicionadas às gramáti-
cas dessas Iínguas e não às gramáticas das demais. Em segundo lugar a gradualidade
da mudança nos permite supor que a passaqem de "a para /+1 em Asurini e Tapira-
pé se deu em etapas, isto é, "a > a >+. Do mesmo modo na evolução do ;ã para
101 teríamos as seguintes passagens gradativas: ã > ã õ > >
o (5r.
v
+ rec
+ baixa ~
_ _ _- - - l. . [- baixa] _I_ r C] I em As.Tap.Gj.
arr Lnas
nas
REGRA 3
v
+ rec
alta ---~~ ~ alta] I em Gj. exceto no ambiente - (Co).
baixa
nas
passa a .y em Guajajara exceto quando em sílaba final
Q
ou em penúltima sílaba precedento sílaba com o.
REGRA 4
v
+ rec
alta
baixa ---I~~[+ alta] I em As. e Tap.
arr
nas
-29-
REGRA 5
V
+ ree
alta
baixa ~
{ [+
r- arr J
alta]
I em As. }
I em Tap.
arr
+ nas
REGRA 6
[
+ rec
V
+ baixa
- arr
J~ [ - baixal
+ nas J
I em Tap.
a passaa ã em Tapirapé.
REGRA 7
V
+ rec
alta ~[+ baixJ I - - (Ca) em As.
baixa - arr J - - em Tap.
+ arr
nas
REGRA 8
REGRA 9
[+ nV
as ]_.[-nas] I em As. e G].
-30-
JUSTIFICATIVA DO ORDENAMENTO
Com relação ao Guajajara que só participa das regras 1,2,3 e 9 não há rnoti-
vação para o ordenamento das regras 1, 2 e 9. A regra 3 porém tem que preceder
a regra 9 senão Q passaria aJ!o Já com relação ao Tapirapé e Asurini o ordenamen-
to é imprescindível. A regra 1 tem que preceder a regra 4, a regra 2 a regra 5, a
regra 1 a regra 6, porque estão numa relação de "teedinq". A regra 6 tem que pre-
ceder a regra 7, caso contrário todos os-ª. se nasalizariam em Taplrepé. A regra 7
tem que preceder a regra 8 e 9; caso contrário todos os 2. passariam a 2.. Pelo
mesmo motivo a regra 5 tem que preceder a regra 9.
-i- u
'\
)/"
,a
J
8
e ar • 7 o
6
i + o
"'Zã 8
ãY J
õ
CONCLUSÃO
~31 -
NOTAS
BIBLIOGRAFIA CITADA
-32-
ELEONORA ALBANO DA MOTTA MAIA (2)
PUC - SP
--33 -
A literatura sobre naturalidade fonológica contém referências abundantes
à pronúncia infantil. Elas ocorrem quase sempre em argumentos sobre a simplici-
dade relativa de distinções ou de processos fonológicos. No primeiro caso, o
exemplo clássico é a previsão de Jakobson (1968 [1941]) de que as labiais e as
dentais devem contrastar entre si antes de contrastar com as velares. No segundo
caso, são representativas as afirmações de Stampe (1969) sobre o caráter inato
de fenômenos tais como ensurdecimento das obstruentes finais ou a redução de
ditongos, em contradistinção com o caráter aprendido das alternâncias encontra-
das em pares do tipo elétrico/eletricidade,
Os argumentos fonológicos que envolvem recurso à ontogénese tipicamente
utilizam a ordem de emergência na infância para justificar escalas de complexi-
dade ou naturalidade pertinentes à medida de avaliação de uma determinada teoria
fonológica. Embora aparentemente razoável, esse procedimento assenta-se sobre
um pressuposto falso que, segundo o meu conhecimento, nunca foi discutido ou
explicitado na literatura. Trata-se da suposição de que os fatos do desenvolvimen-
to fonológico podem ser isolados da totalidade do desenvolvimento comunicativo,
ou seja, de que são interpretáveis sem o concurso de informações sobre o
desenvolvimento Iingül'stico como um todo.
Tal pressuposto não se origina apenas na leitura seletiva da bibliografia do
desenvolvimento por teóricos da fonologia. Ele subjaz também à literatura especi'-
fica da fonologia infantil, que tem, até agora, resistido às fortes tendências intra-
getoras manifestadas nos demais setores do estudo do desenvolvimento da lingua-
gem. Embora seja hoje inconcebível investigar a aquisição de recursos sintéticos
sem considerar os seus correlatas cognitivos e o seu uso na interaçâo social, os
estudos fonológicos permanecem preocupados em descrever a evolução interna
dos sistemas sonoros, só se referindo a parâmetros-externos ocasionalmente.
Um avançorec~n!e érepresentadopel?strabalh?s de Davidlngram (1974,
1976), Lise Menn (1976, 1977) edogrupo liderado por Ferguson (Ferguson
e Farwell 1975, _Ferguson~~arnka19?~).De~tre as contribuições desses autores
destacam-se: (f l a consldéraçâoríoseteltos de parâmetros lexicais sobre a ordem
de aquisição; (2) a discussão das motivações subjacentes às restrições fonotáticas
que operam na fala infantil; e (3) a descoberta de que há importantes diferenças
individuais na ordeme no modo de aquisição de contrastes fonológicos. Tem-se,
assim, uma visão atenta à singularidade da criança e, portanto, menos propensa a
extrapolar do sistema adulto que a da tradição jakobsoniana, Tal visão inegavel-
mente abre um espaço para a discussão da questão das relações entre a competên-
cia fonológica e a competência comunicativa geral. Não obstante, um tratamento
sistemático dessa questão ainda está por surgir na literatura.
Meu objetivo neste artigo é demonstrar a dificuldade de interpretar os dados
do desenvolvimento fonológico fora do contexto do desenvolvimento comunicati-
vo e, a partir daí, apontar maneiras mais frutíferas de conceber a relação entre
fonologia infantil e fonologia adulta. Meu foco de ataque será o pressuposto,
aceito pela maioria dos fonólogos, de que a pronúncia da criança nos primeiros
estágios reflete tendências universais à simplificação fonética. Tentarei demons-
trar que a noção de simplificação como um fenômeno funcionalmente unitário,
irnpl (cita nesse pressuposto, torna-se incompatível com os dados ontogenéticos
quando se examinam as interdependências entre desenvolvimento fonológico e
desenvolvimento comunicativo.
~34-
Minha tese é de que há uma tipologia funcional de processos fonológicos
na infância que envolve uma interação complexa entre o desenvolvimento per-
cepto-rnotor e o desenvolvimento cognitivo e social. Processos diferentes iniciam-
se, caracteristicamente, em etapas diferentes do desenvolvimento comunicativo,
embora possam, subseqüentemente, coexistir por muito tempo. Um exame da
evidência a favor dessa tipologia deixará claro que o emprego do termo simplifi-
cação nos argumentos ontogenéticos em fonologia é vazio, pois obscurece dife-
renças importantes do ponto de vista do desenvolvimento.
Em primeiro lugar, é preciso definir algumas noções que servirão de base à
argumentação que se segue. Entende-se por processo uma estratégia de conversão
de uma representação perceptual em uma representação que sirva de entrada a um
programa motor. Nos primeiros estágios da aquisição, a tarefa de realizar essa con-
versão impõe uma sobrecarga ao mecanismo de processamento, uma vez que
envolve a reconstrução de esquemas articulatórios ao nível simbólico (no sentido
aproximado de Piaget 1954). A esse respeito, cabe lembrar que a construção do
vocabulário exige a representação fonológica se associe estavelmente a uma repre-
sentação sintático-semântica e pragmática. É, pois, razoável supor que os elemen-
tos fonológicos da expressão vocabular, isto é, a representação perceptual e a
representação pré-motora tendam a ser extremamente conservadores e econâmicos
nessa fase. Assim, espera-se que a criança encaixe as suas primeiras palavras nos
programas articulatórios mais automáticos e repetitivos que já possui. Essa previ-
são parece confirmada pelo fato, bastante conhecido, de que o período final do
balbucio é articulatoriamente mais rico (i.e., apresenta maior variedade de sons)
do que o das primeiras palavras (Oller 1981). Pelo mesmo raclocmio, espera-se
que a representação fonológica seja, ao mesmo tempo, suficientemente informati-
va para veicular distinções lexicais importantes e suficientemente simples para
facilitar tanto a sua utilização em operações simbólicas como a sua conversão em
programas motores relativamente automáticos.
Essa perspectiva opõe-se à visão, adotada por muitos fonólogos (e.g., Stampe
1973, Kiparsky e Menn1977) de que a representação fonológica da criança é idên-
tica à representação fonética do adulto. Contra tal visão, é possível apontar, pelo
menos, três argumentos. O primeiro recapitula as objeções de Bloom (1973) e
Dare (1975) contra a interpretação holofréstica do estágio de uma só palavra.
Especificamente; parece um contra-senso que o crescimento acarrete na diminui-
ção (e nãonoaurnento) da complexidade das derivações - sejam elas sintéticas ou
fonológicas.,A.ssifTl,paraderivara forma infantil da forma adulta é preciso um
grande númerode pro~essos de supressão, que, mesmo se inatos, como que
Stampe {1973),impUcari~n1.nun1aenormecomplexidade da derivação total. O
segundo argumentodeve-se.a Waterson (1971), que, através de um estudo minu-
cioso do vocabuláriodeu fTlacriançade18meses, demonstrou que a relação entre
as formas infantis e as formas adultas correspondentes é melhor capturada supon-
do-se que a criança depreende os traços comuns mais proeminentes de grupos
de palavras adultas semelhanteseos rearranJesegundo os seus próprios padrões
silábicos e acentuais. O segundo argumento provêm de estudos meus (Maia 1981),
que demonstram que a acuidade da pronúncia da criança é inversamente propor-
cionaI à complexidade do contextosemântico·pragmático, sendo os contextos
simples e familiares proprcios à realização da pronúncia intentada. Assim, oacom-
panhamento longitudinal de tais aproximações da pronúncia intentada revela
-35-
mudanças significativas que dificilmente se poderiam explicar sob a hipótese de
que a representação fonológica seja, desde início, idêntica à realização fonética
adulta.
No que concerne à forma da representação fonológica, adotarei aqui a
posição de McCarthy (1979). tomando certas liberdades no sentido de lhe atri-
buir realidade psicológica. De acordo com essa visão, a representação fcnolóqlca
é constitu (da de uma ou mais camadas auto-segmentais de traços fonéticos > no
sentido de Goldsmith (1976) - e de um esqueleto rítmico, que codifica informa-
ções tais como a divisão silábica e o padrão acentual. Essa aparente pluralidade
resolve-se através de processos associativos que estabelecem elos sistemáticos entre
as camadas autosegmentais e o esqueleto rítmico. Veja-se, por exemplo, a seguinte
representação da reduplicação 'papa', onde o esqueleto rítmico está incompleta-
mente especificado devido às limitações da representação no plano:
-36-
ser entendidos fora desse contexto. Examinemos agora a evidência a favor dessa
afirmação.
Nosso ponto de partida será o primeiro grupo de processos, que compreende
muitos dos fenômenos típicos da linguagem infantil, tais como a reduplicação, a
harmonia consonantal e vocálica e as chamadas "conspirações fonotáticas" Ii.e.,
reduções a estruturas canônicas silábicas oU acentuais). Descrever tais processos
como meras manifestações de tendências inatas à simplificação, além de ser vago,
implica na perda de generalizações importantes sobre a continuidade entre o
balbucio e a fala propriamente dita. Já foi mencionado acima que as primeiras
palavras fazem uso simbólico de esquemas motores já exercitados durante o
balbucio. Além disso, há entre o balbucio e a fala referencial um período transicio-
nal em que vocalizações mais ou menos reconhecrveis se associam a intenções,
gestos ou ações, Tais vocalizações também se encaixam em esquemas motores
bem automatizados, mas diferem das primeiras palavras por não serem rigorosa-
mente referenciais e por apresentarem maior variação na ordem linear dos seus
componentes fonéticos (e.g., [s'e bwJ e [bugw], usado por Nigel Halliday (O; 10)
para pedir talco; V. Halliday 1975, pp. 148-149). Sob a visão aqui defendida, a
principal conquista fonológica do estágio das primeiras palavras seria o agrupa-
mento dos traços fonéticos da representação perceptual em camadas auto-seçrnen-
tais com uma organização interna linear. Em outras palavras, a representação
fonológica já consistiria de um esqueleto ntmlco e de um conjunto de, traços foné-
ticos, mas esses últimos se associariam ao primeiro somente de acordo com as res-
trições impostas pelos programas motores disponfveis. Posteriormente, princípios
inerentes à organização do próprio sistema fonológico teriam um papel cada vez
maior em determinar essa associação, sendo responsáveis pela crescente estabili-
dade do vocabulário a partir do infcio da fala referencial.
Cabe, neste ponto, observar que a suposição de que, para fins de armazena-
gem lexical, a criança filtre os traços mais salientes da forma fonética adulta é
inteiramente companvet com os resultados recentes da área dapercepçãoda fala,
que demonstram que o, recém-nascido já é capaz de realizar certas discriminações
categóricas (Eimas et aI. 1971). Assim, o fato de que o sistema auditivo-percen-
tual impõe divisões discretas a contfnuos ffsicos tais como o ponto de articulação
e o VOT (3) facilita enormemente a extração de traços fonéticos da entrada lin-
gül'stica, mas não implica-de m.aneira nenhuma, a computaçâo. a nível simbólico,
de todos ostraços detectáveis.nessa entrada.
Retomell1os<sg()réiadiscussãodas vantagens. de uma representação. fonoló-
gica seletiva e cepazde.crescimentovComofoi sugerido acima, a associação de um
traço ou conjunto de traços amais de uma posição no esqueleto n'tmico é um
recurso amplamente empreqado novocabulário inicial. Se atribuirmos à criança,
nessa fase, a capacidade de representar todos os traços de forma fonética adulta
ausentes na SUa própria pronúncia, não teremos como explicar uma interessante
evolução que se observa na aplicação dos processos reduplicativos e harmônicos.
Num determinado ponto do desenvolvimento, certas crianças praticamente aban-
donam o uso desses processos na formação de palavras e passam a aplicá-l asa
unidades maiores do que a palavra, apresentando, assim, uma diferença marcada
entre a pronúncia num contexto sintético. Por exemplo, aos dezenove meses,
Verônica,a criança estudada por Maia (1975), já apresentava realizações isoladas
de 'quer' como ['k€], 'sentar' como [sê'ta.] e aqui como la'ki]. Entretanto,
-37-
numa sessão desse período, combinou essas palavras da seguinte maneira:
-38-
Estendendo o raclocmlo de Bates, é possrvel levantar hipóteses sobre os
correlatas cognitivos do segundo tipo de processo mencionado acima. Trata-se
da utilização sistemática de certos segmentos onde ocorrem outros na fala
adulta. Tais segmentos podem funcionar como marcadores de posição, como cos-
tuma ocorrer com as semivogais (e.g., ['boje] 'bola' ['awa] 'água') ou podem ter
uma relação mais estreita com o segmento adulto correspondente (e.g, [z] por
[~] em [bezu] 'beijo' l'zãnte] 'janta'), Para realizar tais substituições é preciso
que a criança seja capaz de computar o esqueleto rítmlco das formas adultas,
ao invés de tomé-lo de empréstimo ao seu próprio repertório. Além disso, para
realizar substituições foneticamente relacionadas ao modelo adulto é preciso
ser capaz de isolar partes da representação fonológica e operar sobre elas. Assim,
a criança não só opera separadamente sobre as duas partes da representação
fonológica - o esqueleto rr'tmico e aís) camadats) auto-seqmentalíaisl - como
também depreende relações de fiqura-e-fundo nelas. Há aqui um paralelo fasci-
nante com o desenvolvimento sintático e morfológico. A capacidade de operar
sobre dois objetos ou sobre parte e todo também subjaz à emergência da sintaxe
e da morfologia. Isso torna ainda mais interessante a observação acima mencio-
nada de que a emergência de processos efetivamente substltutivos coincide com
um aumento da estabilidade fonológica do léxico, concomitante a uma recapitu-
lação de padrões prévios da instabilidade fonológica em combinações de palavras.
Consideremos agora os desenvolvimentos sociais concomitantes aos dois
tipos de processos até agora examinados. No estágio de uma só palavra, em que a
criança reinventa o vocabulário adulto através de processos do primeiro tipo, há
inúmeros lndrcios de preocupação em usar a palavra para reinventar o diálogo,
já exercitado através do gesto e da vocalização. É notório o número de repetições
do turno do interlocutor, que, conforme aponta Lemos (1981), parecem marcar
o reconhecimento e a interiorização do papel daquele. Em contrapartida, após a
emergência da sintaxe, observa-se uma mudança gradativa no padrão de repeti-
ção. A criança passa a repetir mais a si própria e a produzir reparos cada vez mais
freqüentes, indicando uma capacidade nascente de atentar para o próprio turno
e operar sobre ele. Não é, pois, surpreendente que as substituições fonológicas e a
redução gradativa da homonímia, que exigem operações sobre a representação
fonológica, surjam aproximadamente no mesmo perrodo. A todos esses desenvol-
virnentos-subjaz uma capacidade geral de atentar para a própria linguagem e de
reconheceracóopera.tivid~d~c:omo constitutiva do diáloqo.
A discussãoacírnapréparouQiterre~O para o exame do terceiro e último
tipo .de.processoaser~~nsideradoaqui.Se·~sÚltimos marcos do desenvolvimento
comunicativo. acil11aexarni~~~?s~bed~elTla?.imperativo 'atentar para si para
cooperar', os que consideraremos a seguir também podem ser descritos como
manifestações de outro ifTlpératiVÚÓntogeneticamente mais tardio, mais igualmen-
te importante, a saberr tatentar.pareooutro para se identificar'. Muitos investi-
gadores, notavelmente Susan Ervln-Trtpp (1974) e Catherine Garvey (19751,
observaram que, por volta dos34ahos{acriança começa a evidenciar uma pro-
gressiva capacidade computara perspectiva do outro, através do uso cada vez
mais adequado de rotinas sociais e fórmulas de polidez. Bates (1976) notou
também que o crescimento de tal capacidade coincide com o aparecimento dos
atos da fala indiretos e dos condicionais contrafactuais. Na fonologia, o correlato
mais claro desse desenvolvimento é o surgimento de controle sobre detalhes
-39-
fonéticos da lfnqua de exposição, bem como de suas variações socioletais e diale-
tais.~ importante notar que a fala da criança, muitas vezes, já apresenta tais
detalhes sob forma idiomatizada (no sentido de Moskowitz 1970). A novidade
desse período consiste na sua sistematização e incorporação ao sistema São exem-
pios típicos de tentativas de sistematização a supergeneralização do contexto de
regras fonológicas e a exageração de variações fonéticas sutís observadas no mode-
lo adulto. Uma ilustração do primeiro caso é oferecida por uma criança de 3 anos
edois meses, que tive ocasião de observar recentemente. Depois de ter apresenta-
do. formas tais como [kü'eli] 'com ele' e (kü'isu] 'com isso', ela passou a dizer
[küj'eli] e. [küj'isu], respectivamente. Provavelmente, essas inovações refle-
tema tentativa de dar conta da regra de inserção do [n aqui generalizada para
ambientes onde uma vogal nasal qualquer é seguida de vogal anterior. O segundo
Caso é ilustrado por uma criança de quatro anos que freqüentemente, mesmo em
situações em que a velocidade de fala é normal, pronuncia ['bowwa] por ['bowa],
'boa'; com geminação clara da semivogal. Parece que, aqui, há uma tentativa de
incorporar ao sistema a regra de inserção do [w], embora essa última seja quase
sempre muito breve na pronúncia adulta.
Dando continuidade às nossas especulações sobre as relações entre o desen-
volvimento fonológico e o desenvolvimento cognitivo e social, podemos dizer que
oque caracteriza o período em discussão é a capacidade de notar e levantarhipó-
teses sobre regularidades locais do ambiente físico e social. Inicialmente, tal
capacidade dá lugar a muitas das perguntas embaraçosas das crianças de 3-4 anos,
taiscornorPor que a sua cara tem bolinha?' (Janaína, 3;2). 'Pra que tem que
d9"Tlir de noite?' (Augusto 4;3). A longo prazo, porém, ela é exercitada e mode-
ladana interaçâo com o adulto e com o grupo etário, permitindo que a criança
desenvolva uma sensibilidade social e se. identifique com os vários grupos a que
pertence;
Se o ponto de vista acima exposto é correto, ainda que haja muitos erros de
d~talhe,pode-se afirmar que não é válido nem instrutivo estudar os fatos do desen-
vqlyill1entofonológico em isolamento. Os abusos da evidência ontogenética em
fO;l"l()logiatêmdado lugar a absurdos tais como a derivação proposta por Stampe
(1973) para a realização [kaêj] da palavra 'candy', por seu filho de dois anos.
I;ssa~l1vollJe .•. . nada menos que seis processos ; nasalização, assimilação, degemina-
ção,fq\ll1açãode flape, supressão de flape e semlvccalizaçâo. Segundo Stampe,
t()~9~qspr()cessos fonológicos seriam inatos e o papel do desenvolvimento residi-
rj~7rllil1ibir~maboa parte deles. Deve ter ficado claro, pelo acima exposto, que
essapo~iç~oenVolve pressupostos falsos sobre a natureza do desenvolvimento em
gera" < •
Espero ter conseguido justificar convincentemente o. meu cetlcismo sobre
ouso:cied~d9s<dacriança para sustentar teorias sobre a h'ngua adulta; Como pro-
c~reiHustraracillla;.~. .·•·.contribuição dos estudos do desenvolvimento à . fonologia
podeedeve'virded~ntro.~. possível testar a utilidade de construtos fonológicos
para a descrição de Jenômenos do desenvolvimento. ~.,poss(vel também clarificar
as·relaç?es entre.fonética e fonologia, rastreando as interdependências entre. desen-
volvirnento fonético e fonológico. Conforme demonstrou Menn (1976);·.anecessi-
dade de alcançar .controle. fonético sobre certas articulações muitas vezes leva a
criança a criar processos fonológicos que acabam por afetar todo o padrão de con-
trastes subjacentes. Épossl'vel que a observação de tais processos venha, num
~40-
futuro próximo, a reverter a ênfase das discussões fonológicas centradas sobre o
desenvolvimento. Ao invés de se falar em critérios puramente fonéticos e naturali-
dade, falar-se-é cada vez mais em critérios fonológicos para a solução de problemas
fonéticos.
A teoria do desenvolvimento fonológico ainda está por construir; Não obs-
tanta, já há suficientes pistas e sugestões de outras áreas de estudo para encorajar
esforços integradores. Seguindo o exemplo de Slobin (1980). tenho esperança de
que, num futuro próximo, também os estudiosos dessa área estejam em condições
de saldar maisesse débito da Psicoltnçürstlca para com a Lingü(stica.
NOTAS
REFER~NCIAS
-41-
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GOLDSMITH, J. Autosegmental phonology. Tese de doutoramento inédita, MIT,
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-42-
MÔNICA G. R. ALKMIM
CHRISTINA A. GOMES
Universidade Federal de Minas Gerais
-43-
1. INTRODUÇÃO
2.1. O fenômeno
[saw'dads] 'saudades'
[vari'íi ts] 'variantes'
['b3~s] 'bobes'
['grips] ,gripes'
Para estabelecer a forma subjacente destas palavras são propostas duas hipó-
teses:
-44-
HIPÓTESE A: A vogal está presente na forma subjacente,
ex.: I saw'dadis/.
Nessecaso, a mesmaseriaeliminada por processos fonológicos.
Tem-se lul, lal e Iii como ocorrências prováveis de vogais átonas em final
de palavra ou frase no ambiente C_C#-
Dados:
[Tatus] 'fatos'
['kazas] 'casas'
L'I€kis] 'leques'
L'Kegis] 'chegues' (verbo chegar)
45-
[saw'd~iJ "[saw'dad]
[vari'í\ci) "[vari'Kt)
Com base nos mesmos dados, observou-se ainda que comosegundá consoan-
te ocorre apenas o/s/.
Y·. C
Ossegmentos [q), [g), [g). JV), [~), apesar de ensurdecidos, não se toro
nam idênticos a [pI, [t), [k), [f1, [sI. Os elementos do segundo grupo. além de
[- son.], são ainda [+ tensos). enquanto os do primeiro grupo são [- ten.]. A opo-
sição de .tensão se mantémlTlesmoqUandó8stes·segmentos são ensurdecidos
(Pontes, 1972,págs. 16'17).
Para descrever o fenômeno sugere-se a seguinte regra:
(2) C
[- soante) o l- son] / __ l- son.]
As duas regras até aqui apresentadas, regra (1) de supressão da vogal átona
e regra (2) de ensurdecimento; terão que ser ordenadas. Em primeiro lugar apli-
car-se-á a de supressão e, posteriormente, a de ensurdecimento. Uma não obediên-
cia a tal ordenação resultaria em uma dificuldade para explicar o ensurdecimento
de uma consoante precedendo uma vogal.
Torna-se aqui necessária a abordagem de uma questão importante: a palata-
Iização obrigatória do Itl e Idl seguidos de Ii/, anteriormente mencionada. No
caso de:
v
[saw'daji)
[vari'ii~i)
com a queda da vogal IiI no ambiente C_C #, fica impedida a ocorrência do fenô-
meno mencionado e tem-se então:
[saw'dac;ls)
[vari'iits)
Assim sendo, uma nova proposta de ordenação para es regras torna-se neces-
sária, a saber:
-47-
2P - palatalização do /t/ e/d/;
3P - ensurdecimento.
3.1. Introduça'o
(2) [li'mi~iiipa'lavra ]
['leyMi'koku]
['Iey~itepe'radu]
[fakuw'dalili'letras]
['kawduYi'kiína]
['kwiítutra'ba Àu]
[si'dalida'~ina ]
-48-
3.3. Especificação das consoantes
mas antes:
-49-
sílaba em limite de palavra, nos casos considerados como haploloqia:
conto -acento
11+#[+- conto
nasal J - nasal - nasal
2 3 4 5
r/Jr/J ##3(4)5
NOTAS
BIBLIOGRAFIA
PERINI, Mário A. (em preparação), "Nota sobre o uso das velocidades de enun-
ciação na descrição de fenômenos fonolôçicos'"
-51 -
MARIA DO CARMO VIEGAS
E
ROSA MARIA ASSIS VEADO
UniversIdade Federal de Minas Gerais
- 53-
1. INTRODUÇAO
[ :retraído
arredondado ] [ ++ acento
alto
'J
oe retraído ]
Condições: (1) todas as vogais contidas em Q são [ d d d
ex: arre on a o
- 54-
2. FATORES ESTRUTURAIS
(17) brevidade
(18) deteriorar
(19) pr~p~sital
(20) ~p~sição
- 55-
Entretanto, podemos afirmar que a elevação da vogal não se
restringe à influência do traço [+ acento]; há ocorrências alçadas
em nossos dados contendo uma vogal alta não-acentuada:
(25) ~stadista
(26) incaminha
(27) ~xpandiu.
(28) tumati
(29) d~staqui
(30) lnlouquéceram
(31) discarregar
(32) cunversa,
=
- 56-
onde a vogal alta não está presente, o que comprova a necessidade
de se expandir a regra de Lemle, se se quiser dar conta dos ambientes
que influenciam favoravelmente o alçamento.
Concomitantemente, os dados demonstram que não é apenas a
presença da vogal lal que atua no sentido de desfavorecer o alça-
mento. Há ocorrências não-alçadas como:
(33) venceu
(34) pergunto
(35) comodismo
(36) grosseiro,
onde a vogal lal não está presente. Assim, da mesma maneira que há
necessidade de se expandir os ambientes que atuam favoravelmente,
há necessidade de se expandir aqueles que atuam no sentido inverso,
ou seja, desfavorecendo o alçamento.
Outra questão problemática na regra de Lemle é a obrigatoriedade
de aplicação da regra em todas as vogais médias pré-tónicas dentro
de um mesmo item léxico. Desta forma, a regra só pode gerar
ocorrências do tipo:
(37) dimulido
(38) vilucípede
(39) iguísta
(40) dirituria,
o que contraria nossos dados que têm, na maioria das vezes, uma só
das vogais pretônicas alçadas. quando co-ocorrern no mesmo item
léxico:
(41) demulidó
(42) direturia
(43) eguista
- 57-
Com os dados de (1) a (43), já fica evidenciado que o alçamento
é uma questão complexa e não se fecha numa regra fonológica
categorial. Das duas condições estabelecidas por Lemle, ou seja:
I. A VARIAVEL /e/
Exemplos:
Alçados Não·Alçados
- 58-
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
-59 -
Na verdade, parece-nos que este ambiente pode ser removido
da lista dos am?ientes que atuam favoravelmente ao alçamento, já
que, com exceção de 'milhar', todos os demais casos alçados podem
ser explicados por possuírem outros ambientes já mencionados como
altamente propiciadores (em termos percentuais) da elevação da vogal
lei, ou seja:
Exemplos:
Alçados Não·Alçados
(77) dispensa
(81) dispesa
- 60-
Se isolarmos os ambientes descritos em (a), (b) e (c) e o item
léxico 'piqueno', encontramos um resultado de 0/114~O% de alça-
mento quando o (e) pré-tônico é seguido de sílaba contendo outra
vogal lei. Parece-nos que, mais uma vez, estamos diante de um
ambiente que pode ser desconsiderado do rol dos ambientes que
influenciam favoravelmente o alçamento.
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
-.61 -
Neste ambiente, todas as ocorrências alçadas contém vogal alta
(8) (e) alternando-se com uma realização tônica com timbre aberto
/E/, sendo que esta oposição não implica em valor distintivo
(Mattoso, 1971: 22): 55/170 = 32.3%
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
-62 -
Isolando o ambiente favorecedor [ V
+ alta
1 i o resultado passa
+ acento
a ser 0% de alçamento. Justifica-se, portanto, a eliminação do
ambiente CCV da lista dos que atuam favoravelmente no alçamento,
já que o ambiente
[++ V ]
alta
acento
é que favorece os casos alçados.
(107) istalo
=
(108) intalado
=
(109) inrolado
=
Enfim, os ambientes descritos de (1) a (3) parecem atuar de
modo favorável ao alçamento e os descritos de (4) a (9) parecem
oferecer dificuldade na elevação da vogal pré-tõníca /ej.
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
- 64-
(4) (o) seguido de /a/ acentuado: 19/106 = 17.9%.
Exemplos:
Alçados Nâo-Alçados
(5) (o) alternando-se com uma realização tônica com timbre aberto:
16/98 = 16.3%
Exemplos:
Não·Alçados
- 65-
(6) (o) em sílabaCCV: ·1/60 = 1.6%
Exemplos:
Não-Alçados
(142) pr~mover
(143) pr~blema
(144) pr~posta
Exemplos:
Alçados Não-Alçados
(149) durmia
- 66-
(8) (o) seguido de outra sílaba contendo /0/: 0/12 = 0%
(153) economia
(154) horrorizada
(155) comodismo
2. 2 Ambientes Morfológicos:
(156) bunitinho
-
(157) pi.9ui~ininho
(158) qui..ridíssimo
(159) pi_qui~ino
(160) piludo
(161) ispecialista
(162) ispecífíco
-67 -
(b) Exemplos de. nomes e verbos não alçados em ambiente com
vogal alta acentuada, que a regra de Lemle só prevê alçados:
(163) Sociologla
(164) economia
(165) comodísmo
(166) verdura
(167) atenderia
(168) teria
(169) opina
(170) Cumeçamos
(171) d~scarregar
(172) pess~al
(173) compriJnsão
- 68-
III. CONCLUSÃO
NOTAS
- 69-
BIBLIOGRAFIA
-70 -
MARCO ANTÔNIO DE
Universidade Federal de Minas Gerais
-71-
1. INTRODUÇAO
10a
--- - <,
-
o CLASSE SOCIAL
~ ~
BAIXA . . . . . . . • . . . . . • . . . • . . • . . . . . . • • ALTA
FIGURA 1
FIGURA 1: Padrão Curvilíneo
Já 110 caso das variáveis estáveis
mudança em progresso), uma variante nâo-urestielosa
freqüências de ocorrência nas classes mais oarxas, dred'f";,~Âi1
classes mais altas, numa distribuição nos moldes
o CLASSE SOCIAL
* •••••••• "
BAIXA *
•••••••••••...••.•. ALTA
FIGURA 2
100
o '-....",!-....,!--,.--i--+........,.....-I-.,....--!---,--,! IDADE
FIGURA 3
o que indicaria que não há nenhuma relação entre faixa etária e a
variável em questão.
lt is worth noting that this is also the only change (em Filadélfia)
where men are in the lead, For most of the Iinguistic changes
-75 -
that have been traced so far, we find that women are about one
generation ahead of men - at least in the early stages of the
processo This is true in Philadelphia as well, except in the case
of (ayv). There may be a connection between the normal curvilinear
class pattern and the dominance of women in the advacement of
sound change, but this direction of inquiry would carry us beyond
the scope of the present reporto
enquanto que realizações como vendê por vender, cantá por cantar e
qué por quer não são resultantes de uma regra de canceiamento. A
evidência para esta separação foi dada em termos estruturais e estilís-
ticos. As· questões a que me proponho agora são:
-76 -
As freqüências de cancelamento do (r), em termos de idade,
sexo e classe social podem ser vistas na Tabela 1, para o (r) final
em nominais, e na Tabela 2, para o (r) interno. Os resultados proba-
bilísticos para os dois casos podem ser vistos na Tabela 3.
TABELA 1
553 1.627
TABELA 2
646 5404
77 -
TABELA 3
Idade - 20 46 60
21 - 30 50 53
31 - 40 43 42
41 ~ 60 46
Sexo Masculino 58 55
Feminino 42 45
Classe Baixa 56 65
Trabalhadora 51 55
Média Baixa 51 46
Média Alta 42 35
-78 -
no caso do cancelamento do (r) interno não temos a
tempo aparente para falarmos de mudança em progresso. Neste
probabilidade mais alta de cancelamento não está associada
informantes mais jovens, e sim aos mais velhos (41 anos ou mais).
Note-se também que em nenhum dos dois casos de cancelamento,
final ou interno, encontramos o padrão curvilíneo no que se refere às
classes sociais. O que encontramos é o padrão usualmente associado
às variáveis estáveis, com as probabilidades mais altas de aplicação
de regra associadas aos grupos sociais mais baixos, e vlce-versa,
Seriam estes resultados uma evidência contrária à caracterização do
cancelamento de (r) como um caso de mudança em progresso? Penso
que não. Considere-se, por exemplo, o trabalho de Labov (1972: 42-69)
sobre a variável (r) em Nova Iorque. Em Nova Iorque há uma variação
entre (r)'s não realizados foneticamente, ou (r-0), e (r)'s realizados
foneticamente, ou (r-1). Numa comunidade que era caracteristicamente
'r-Iess', como Nova Iorque, (r-1) se constitui numa inovação. O trabalho
de Labov mostra que na fala casual somente os falantes da classe
média alta apresentam uma proporção substancial de (r-1). Mas seu
trabalho mostra também que a grande maioria de (r-I r's nesta classe
social é fornecida pelos informantes mais jovens, com menos de 40
anos de idade. Os falantes mais velhos (+ de 40 anos), de qualquer
classe, apresentam um comportamento bastante semelhante. A situação
é basicamente a mesma na fala cuidada, muito embora haja aqui um
aumento significativo de íreqüências de (r-1) entre irlformantesentre
40 e 49 anos de idade, especialmente nos dois grupos mais altos da
escala social. Em outras palavras, no trabalho de Labov, somente
na classe média alta é que se pode encontrar evidência segura, em
termos de tempo aparente, para se falar de mudança em progresso.
O caso da variável (r) em Belo Horizonte ebastante semelhante ao
caso da variável (r) em Nova Iorque. Considerem-se as Figuras 4 e 5.
-79 -
100
90
Linha solida: 30 anos ou menos
Linha quebrada: 31 anos ou mais
FIGURA 4
- 80-
Linha sólida: 30 anos ou menos.
Linha quebrada: 31 anos ou mais.
%
20
19
"
17
"
. /
16-
15 / //
-:
14
13,
12
-=--
.h,,,,,,/'"
/ --- -----
11
10
•
---
7' ,
.
,.
.i->
,
C
4
3.
2
1
, I , I 1 , I
:ClASSE SOCIAL.
FIGURA 5
- 81-
aproximação de freqüências entre os informantes mais velhos (exce-
tuando-se novamente aqueles da classe baixa). Ou seja, como no caso
de Nova Iorque, somente os informantes mais jovens apresentam uma
estratificação social acentuada. Eu proporia então que, em vez de se
considerar apenas a evidência do tempo aparente, consideremos também
a estratificação social entre os informantes mais jovens como fator
decisivo para se caracterizar um fenômeno lingülstico variável como
um caso de mudança em progresso. A razão para isto é a seguinte:
vamos supor que temos em mãos um caso para o qual, por algum
motivo, não haja evidência de tempo real para mudança em progresso,
mas somente diferenças etárias. Evidentemente isto não nos garante
que tenhamos um caso de mudança em progresso. Mas caso seja
mudança em progresso podemos esperar que certas caracteristicas
ocorram. Consideremos o mecanismo da mudança sonora proposto
por Labov (1972: 178-80): a mudança tem sua origem num subgrupo
da comunidade de fala, espalhando-se a todos os membros deste
subgrupo. Neste estágio somente o subgrupo onde a mudança se
originou irá apresentar um número significante de ocorrências da
inovação. Posteriormente a inovação irá atingir outros subgrupos da
comunidade de fala, sendo levada adiante por gerações sucessivas de
falantes. Somente neste ponto é que podemos observar a estratificação
social, Além disso. os falantes mais velhos, excetuando-se aqueles do
subgrupo que originou a mudança, podem não apresentar nenhuma
estratificação significativa, simplesmente porque já estão velhos demais
para incorporar uma nova regra variável - que somente agora faz
parte das normas de fala da comunidade como um todo - em seus
hábitos de fala. Na Figura 4 temos o seguinte: os informantes mais
velhos,exceto aqueles da classe social mais baixa, estão muito próximos
uns. dos. outros, mas os informantes mais jovens apresentam uma
estratificação social acentuada. Isto quer dizer que, exceto pelo grupo
mais alto, os informantes mais jovens levaram a mudança adiante,
além do modelo estabelecido por seus pais. Na. Figura 5, onde encon-
trames as freqüências para o aspecto mais recente do cancelamento
de (r), a situação é muito parecida com a da Figura 4, a não ser pelo
fato de Os informantes mais jovens das duas classes mais altas estarem
aquém dos informantes mais velhos. Assim sendo, a aproximação das
freqüências para os informantes mais velhos em ambas as figuras
indica que houve um ponto no qual o cancelamento de (r) não era
socialmente estratificado na comunidade de fala de Belo Horizonte.
- 82-
Além disso, o comportamento diferencial, em ambas as
informantes da classe baixa não é um problema, e sim uma p.viirlÂ,nr.i~
forte para se mostrar que o subgrupo que adotou o cancelamento
de (r) como um indicador, que depois se propagou para outros grupos
sociais, foi o grupo social mais baixo. Ou seja, as Figuras 4 e 5
sustentam a idéia de que as mudanças podem se originar nos grupos
mais baixos da sociedade, i.e., a falta de um padrão éurvilineo, quando
todos os informantes são considerados conjuntamente, não Indica
ausência de mudança em progresso. Voltarei a este ponto na seção 2.
TABELA 4
CLASSE
~
BAIXA TRABALHADORA M. BAIXA M. ALTA
- 83-
TABELA 5
CLASSE
~
BAIXA TRABALHADORA M. BAIXA M. ALTA
- 84
A) A mudança se originou nos grupos centrais, de onde se propagou
para os grupos mais baixos. As mulheres da classe média baixa,
por sua vez, apresentam hipercorreção, sendo este o motivo do
grande distanciamento de freqüências entre homens e mulheres
neste grupo social.
- 85-
proportion of their acquaintances outside the neighborhood. Thus
we have a portrait of individuais with the highest local prestige
who are responsive to a somewhat broader form of prestige at
the next larger levei of social communication.
Assim, as. inovações de prestigio teriam seu pico nos grupos mais
altos da sociedade, enquanto que as mudanças comuns, que são as
que nos interessam aqui, terão seu pico noutro ponto da escala social.
O que se deve. notar aqui é que as explicações de Labov se
apóiam, basicamente, na noção de prestígio, i.e., independentemente
do ponto na sociedade onde uma mudança se origina, ela será assirni-
- 86-
lada por falantes que consideram o grupo que incorpora a mudança
como seu modelo social. Kroch (1978) propõe uma explicação alter-
nativa para as mudanças fonológicas comuns, baseada na noção de
ideologia. Na abordagem de Kroch, as mudanças fonológicas comuns,
que são processos foneticamente motivados, surgem no sistema como
um todo. A estratificação social irá surgir porque o grupo de elite
His (Labov's) theory still gives one no reason to expect the speech
of the common people to be more open to phonetic conditioning
than that of the elite. ln fact, his pluralistic conception of prestige
leads one to expect change to originate equally at ali social leveis
and social dialect variation to be, therefore, Iinguistically random
(23).
- 87-
uma vez que este é um processo do qual a rnarona das pessoas não
está consciente. Por outro lado, não encontramos o padrão curvilíneo
em nenhum dos dois aspectos do cancelamento do (r). A questão
é a seguinte: são realmente necessárias as noções de prestigio e/ou
ideologia para se explicar a estratificação social do cancelamento do
(r)? Penso que não, e proponho o seguinte: a estratificação social é
um resultado direto da maneira pela qual a sociedade se organiza.
Uma vez que sociedades diferentes se estruturam de modos diferentes,
é de se esperar que diferentes padrões de estratificação social da
linguagem sejam encontrados. As novas mudanças serão levadas
adiante, nos centros urbanos, por aqueles grupos cujas características
sociais determinam as caracteristicas sociais gerais da comunidade.
o padrão curvilineo foi encontrado em centros industrializados no
hemisfério norte, como Nova Iorque (Labov, 1966), Norwich (Trudgíll,
1974) e Filadélfia (Labov, 1980). Foi encontrado também na cidade do
Panamá (Cedergren, 1973). O impacto das classes trabalhadoras, por
exemplo, não é o mesmo em paises industrializados e não industriali·
zados. Nos Estados Unidos e Grã-Bretanha a maior parte da população
não/se localiza nem nos grupos mais altos nem nos mais baixos da
sociedade. Estes países têm uma classe trabalhadora e uma classe
média bastante populosas, com suas subdivisões internas. Nos países
não industrializados, ou naqueles onde o processo de industrialização
é recente, estes grupos intermediários não constituem o grosso da
população. Desconheço a situação do Panamá, mas o Brasil foi, até
aS~~unda Guerra Mundial, um país essencialmente agrícola, com uma
economia baseada no café. Evidentemente havia uma classe trabalha-
dorá.iMas esta era pequena e não influente. Com a migração em
massadas áreas rurais para os centros urbanos a classe baixa cresceu
numericamente, enquanto que a classe trabalhadora está surgindo como
classe de peso com a industrialização do pais. O fato é que nos
centros/urbanos brasileiros o. espectro social pode ser representado
por uma pirâmide, com o grupo mais alto situado em seu vértice.
Assim, o padrão da estratificação social do cancelamento do (r) não
é nada mais que um reflexo direto da estruturação da sociedade na
cidade de Belo Horizonte.
Evidentemente serão necessárias pesquisas adicionais em contexto
sociais semelhantes ao de Belo Horizonte, dentro e fora do Brasil,
para que possamos. refinar e entender melhor os aspectos sociais
da mudança llngüística. O caso apresentado aqui não irá, é claro,
88 -
jogar por terra as hipóteses interessantes que já foram levantadas
até agora. E nem é essa a intenção do artigo. Antes, ele pretende
sugerir um reexame do assunto.
NOTAS
BIBLIOGRAFIA
89-
EUNICE PONTES
Universidade Federal de Minas Gerais
A Ordem VS em Português
- 90-
Se considerarmos preferentemente as
rativas com verbo transitivo, diremos que em
normal, não-marcada, dos elementos da oração é SVO
objeto). Assim, a seguinte é uma sentença típica do
«Debatem os lazaristas
O grave dilema» (C.D.A. 22)
- 91
Já a anteposição do objeto indireto é possivel nesta outra S
porque a preposição o distingue do sujeito (ambos são animados):
- 92-
esta estatística é diferente: a ocorrência de VS é mais significativa.
Mattoso Câmara Jr observou que a inversão do sujeito se dá «quando
não há um objeto direto para opor, pela colocação, ao sujeíto ou
quando mesmo com objeto direto, o mecanismo da concordância pode
entrar em ação. Dai, a freqüente posposição do sujeito - a) com
verbos intransitivos, b) com verbos transitivos desde que o sujeito e o
objeto direto são de número nominal diferente. Ex.: Chegaram os
viajantes; Viram os meninos um lobo». Ainda observa a ocorrência
de VS «desde que a compreensão geral do contexto o indica implici-
tamente: Comeu o lobo o menino» (1976: 253).
- 93-
o PROBLEMA DA COLOCAÇAO DO SUJEITO NAS GRAMÁTICAS
AS GRAMÁTICAS DO PORTUGUES
- 94-
2) Aos verbos de sentido passivo» (p. 310).
e
Segundo Epiphanio, esta regra do Português moderno; «anterior-
mente o sujeito antepunha-se ou pospunha-se indiferentemente».
-95 -
Sousa da Silveira é mais preciso quanto às ar. interrogativas:
«Idem nas orações interrogativas em que a interrogação é feita pelos
pronomes, adjetivos ou advérbios que, qual, quem, quanto, como,
quando, porque, onde etc.: Que caraminhola é essa? Quanto tinha
ele?» (251).
-·96-
Não é possível deixar de notar que, embora seja bastante atraente
a teoria de que as inversões tenham por finalidade realçar o elemento
deslocado, ela se torna bastante implausivel no momento em que se
verifica que na mesma frase, ao mesmo tempo que o sujeito foi
posposto, o predicativo foi anteposto, como acontece nos dois exemplos
acima. Parece-me que, se a finalidade é realçar um elemento, não se
pode realçar o outro também ao mesmo tempo. E como decidir,
nesses casos, qual foi o elemento realçado? Cunha arbitrariamente
considera o 1Q exemplo como de realce de sujeito e o 2' como realce
do predicativo. Mas poderíamos trocá-los, pois os exemplos são idên-
ticos. Não vejo como sustentar, portanto, esta idéia, aliás muito vaga,
de realce.
Há ainda um outro problema com o l ' exemplo de Cunha: é
que ele sublinhou a frase intercalada bradei eu, lavando-nos a pensar
que esta é uma inversão estilistica. No entanto, mais adiante ele cita
as orações intercaladas entre os casos de inversão gramatical. Parece-
me um pequeno lapso. No mais, Cunha apresenta' um resumo das
regras que Epiphanío e outros já haviam estabelecido. Apenas uma é
novidade, em relação à que já examinamos: «nas orações subordinadas
adverbiais condicionais construídas sem conjunção: Aprendêssemos nós
essa mensagem...» (p. 171).
- 97-
«Na casa de Aristarco reinava o maior silêncio» (R. Pornpéla,
A, 266).
é) com infinitivo perfeito: «Foi ótirno ter seu filho ganho uma
bolsa».
- 98-
A maiona dos verbos expressa uma afirmação ou
de existência: existir, faltar, sobrar, ficar (restar),
surgir, sumir» (p. 5).
- 99-
Outra observação interessante, de Thomas a respeito das inter-
rogativas: «~ mais provável o sujeito seguir o verbo se ele é um
nome, especialmente se é modificado: Quantos comprou o tarrna-
cêutico?» (p. 309).
Com um advérbio interrogativo ele acha que há «de algum
modo maior probabilidade de colocar o sujeito depois do verbo:
«Para onde vai você?» (id.).
Por outro lado, para ênfase do sujeito, ele pode ser colocado
antes da palavra interrogativa: «Você o .que acha?».
OBRIGATORIEDADE DA ORDEM VS
- 100-
No entanto, sabemos que verbos como existir podem vir com
sujeito anteposto. Talvez ele queira dizer que no caso de sujeito
anteposto a verbos como existir haveria ênfase, pois ele afirma que
com estes verbos pospõe-se «não havendo emphase». É uma hipótese
interessante, pois então ele estaria considerando normal a ordem
posposta neste caso.
- 101-
DADOS DE líNGUA ESCRITA CONTEMPORÂNEA
-102 -
Parece-me que este tipo de interrogativa em que o futuro composto
exprime dúvida, tem mais probabilidade de desencadear a VS. Esse
evidentemente não é um caso de «interrogativa sim ou não», ou
seja, não é uma pergunta comum. Equivale às interrogativas iniciadas
por «será que», muito comuns na língua coloquial.
·-··103 -
«Depois da morte da escritora em BH, surgem ( ... ) poemas e
crõnicas ...» (I É 10).
«. .. próximo existe pequeno belvedere» (PN 16).
«e some o México, somem seus amantes, suas cores» (PN 39).
... Casas que vão morrer e que em breve não existirão mais
(PN 25).
Os doces mineiros que teimam em existir no caos e no tráfico»
(C.D.A. 20).
«A questão é que ele existiu e...» (PN 10).
- 104-
Quanto à terceira oração com existir, parece me que o fator
que intervém aí é o pronome ele como sujeito. Quando o sujeito é
pronome, é mais difícil ele vir posposto. Isto já foi constatado para
o Português por Vanda Bittencourt (1979: 80) e para o Hebreu por
Givón (1977: 211).
enquanto vida
ou memória de vida se consente
neste planeta enfermo» (C.D.A. 10).
- 105-
Quanto à regra d) de Epiphanio: não encontrei nenhum exemplo
com pronome anteposto. Mas o fenômeno a que ele se refere nesta
regra é o de uma topicalização (do objeto). E tenho observado que a
inversão do sujeito é muito freqüente em orações topicalizadas, Isto
pode ser verificado nas orações que alisto como exemplos de VS:
há cc-ocorrência de sujeito posposto com a anteposição (topicalizacão)
de outros elementos da oração: adjuntos adverbiais de lugar, de
procedência, objetos indiretos, e até orações inteiras.
Parece bastante claro também que não se trata de simples
posposição do sujeito ao verbo, mas sim de colocação do sujeito na
posição final da oração. Este fato é importante de ressaltar. São
dois fatos simultâneos: um é a topicalização de um ou mais elementos
da oração e outro é a colocação do sujeito no fim da oração. Segundo
a Escola de Praga, a posição final da oração é a mais importante
do ponto de vista da informação, porque é onde se encontra a tntor-
mação nova. Mattoso Câmara Jr. (1972) endossa essa posição,
ensinando que «nos padrões frasais portugueses, é o último termo
da oração que dá em princípio, a informação nova da comunicação
feita» (p. 145).
A regra e) também se refere a topicalizacão: do predicativo.
Exemplos encontrados:
«Marcadas ficarão
as casas coloniais da praça da Matriz» (C.D.A. 9).
- 106-
Encontrei também este exemplo em Pedro
comum no Português do Brasil( mas ocorre em Portugal):
- 107-
Há outros exemplos como esses em que parece que houve
omissão de um pronome anafórico que se referiria a fatos narrados
no discurso antecedente. Só que não houve nenhum pronome antes,
mas a S se refere ao discurso anterior:
«Para isso não basta estar a seu lado a contar vitória ...» (I I': 20).
«é impossível criticar a inclusão de » (I I': 8).
«é bem verdade que, antes GI. R » (I É 9).
- 108-
«Seria conveniente que as imagens de T. e V.
1 É 13).
«Mas convém atentar para os riscos incrustados em
ção» (I É 13).
- 109-
Interessantes esses exs., porque o sujeito posposto na verdade é
o objeto direto da oração ativa correspondente. São orações passivas
sem agente expresso. Ora, o efeito normal da passiva sobre a ativa
é antepor o objeto e pospor o agente (que corresponde ao sujeito
da ativa). Vamos explicar melhor: a frase ativa correspondente à
primeira oração seria a seguinte:
. «[proibido a entrada».
- 110-
Note-se que na Passiva completa, o agente se' distingue
paciente não apenas pela posição final quanto pela preposição: por.
Então, a ordem pode ser mudada, porque se assegura a comunicação
pela prep. Sem o agente, o objeto fica na sua posição final e não se
sabe mais se ele é sujeito ou objeto (a não ser pela concordância,
mas esta é violada freqüentemente na fala e na escrita).
Um caso que nâo foi apontado por nenhum dos gramáticos
citados, mas que impressiona pela freqüência é o das orações subor-
dinadas iniciadas por onde, que, em (entre) cujos, por que (relativas):
altíssima freqüência, uma vez que só encontrei uma oração iniciada
por onde com ordem SVO -- mas esta era com verbo transitivo.
Pode-se dizer que a freqüência foi absoluta nesse caso.
- 111-
Encontrou-se VS até com verbo transitivo:
«de onde, na escuridão, desfere o pássaro
- surpresa -
melodia jamais ouvida antes» (C,D,A. 29).
- 112-
«Agora já não me obseda a morta»
«Aqui outrora retumbaram hinos" (PN
«Nas lajes desse adro pisaram ( ... ) os personagens
de M.A.» (PN 23).
- 113-
«Numa noite apenas,
o verdor perece,
já no chão vencido
a vagem fenece» (C.D.A. 25).
- 114-
que é tão semelhante a existir semântica e sintaticamente, a dúvida
se instala: o que distingue o SN que vem depois de existir do que
vem depois de haver?
Por que considerar o SN de haver como objeto e o de existir como
sujeito? Parece-me que a justificativa sintática para dizer que o SN
de existir é sujeito é o fato de ele poder ocorrer anteposto, como
acontece com os SNs que acompanham outros verbos intranstivos
(cair. subir, etc). Já com o verbo haver isto não acontece. A outra
justificativa é a concordância: o verbo existir vai para o plural se o
SN for plural, mas o verbo haver não. No mais, parece-me que os
SNs que seguem ambos os verbos têm caracteristicas semelhantes:
não-agentes, com tendência a serem indefinidos e inanimados. Há
uma tendência para os SNs pospostos a existir, como a outros verbos,
serem indefinidos e inanimados.
As características prototipicas principais do sujeito em Português
(aqueles casos claros, de oração transitiva com verbo de ação) são:
ser agente, vír antes do verbo e este com ele concordar. Quando
se pospõe o SN, e ele não é animado (os agentes costumam ser
animados) resta a concordância, Para a língua escrita, a concordância
pode ser usada como critério, mas este critério, como se sabe,é
bastante fluido. Escritores menos cultos, ou revisores menos tensos
podem deixar passar, e o deixam cada vez mais freqüentemente,
orações em que o verbo haver vem no plural, como se pode constatar
em jornais e revistas conceituadas.
Tanto se encontra haver com SN plural como existir com SN
singular. Ouvi em aula de concurso para professor na FALE:
115 -
«Fazem muitos anos...»
E COITI ter na língua oral se ouve: «Vieram doze. mas já tinham
dezessete pessoas lá».
Ela arrola como orações sem sujeito •.em Hebraicov todas as orações
existenciais (enquanto apenas as com haver são assim consideradas
em nossas gramáticas), as relativas a fenômenos atmosféricos e
comentários relativos .• ao clima. as com predicados afetivos (tipo
é óbvio que ..•) as com predicados modais (é possível que.... é neces-
sário que...) as passivas impessoais (é sabido que...) e oraçôes
- 116-
impessoais de 3a. pessoa plural que podem funcionar no lugar de
passivas sem agente, além de orações possessivas e experienciais
(que não existem em português).
- 117
LINGUAGEM COLOQUIAL
«Diz o médico que não tem nada a ver uma coisa com a outra».
(av.).
«Disse ela que o Carlos André guardou a nota». (av.).
São tipicas do estilo narrativo.
Interrogativas - Apresentam VS mesmo com é que:
- 118-
Interrogativas com palavras gramaticais ou sem elas. (perguntas
sim/não) ocorrem com ordem VS em Português. Contrariamente ao
que diz Thomas, mesmo com é que ocorreu a ordem VS. Todos os
exemplos encontrados são intransitivos.
Verbos existenciais
- 119-
«Tritura (se) o vidro e mistura (se) com pó de pedra.., porque
o vidro triturado é prá dar brilho».
Tópicalízação de predicativo
- 120-
Com verbos diversos:
«Acumula muita água, vem a ferrugem e aí também costuma
sempre ficar um pouco de mosquito, sabe disso?»
Subordinadas em geral:
- 121-
«Caiu terra aqui» (av.).
«Veio uma bola mais de dois palmos do nosso lado».
«Cai o preço do petróleo no O.M.» (TV Globo, Jornal Nacional,
23-2-82).
«Todo dia caia uma garota na minha sopa. Agora não: todo dia
caem duas» (TV Globo: 26-3-82).
«Já deve ter descido muita terra aí» (av.),
Exclamativas:
«lh, vai cair uma chuva!» (av.),
«o, germinou alguma coisa aqui na areia!» (av.),
Em «afterthought»:
«Começou a fazer efeito mesmo, os remédios» (av.),
Oração subjetiva:
«porque parece que vi em quadros, em peças...».
Optativa:
«Tomara que faça bom tempo amanhã» (av.).
- 122
«o preço da gasolina baixou nos Estados Unidos» (estava-se
falando do carro a álcool no Brasil - Fantástico, 14·3·82 -
TV Globo).
«Com vara cê fica só no barranco»
«Cês num foram aquele dia à noite, pescar, não?»
«... prá que lado que nós vamos, e, no final do passeio, onde
é que nós vamos almoçar».
«Aonde é que nós vamos?»
«Aí, ocê ficando com o dedo aí, quando a bala entra, a agulha
funciona».
«Camarada aparece lá... daqui que desembrulhe tudo...».
«E como é que tem esses acidentes que a arma caiu e disparou?».
«Em vez da bala cair quem cai é a T...».
Com o verbo dar acontece a mesma coisa que com faltar e outros:
é possível ocorrer um SN a ele anteposto, mas neste caso o SN tem
uma conotação contrastiva, o que indica uma topicalização:
«Marlmbondo dá muito lá» (= o que dá muito lá é marimbondo).
- 123-
o que se observa a respeito da língua oral é que há uma
incidência de certos verbos que ocorrem mais em posição inicial. Em
todos os tipos de oração, tanto afirmativas, como negativas, como
exclamativas, etc., os verbos que aparecem são daqueles que Ephiphanio
Dias coloca na regra c): existir, ocorrer, aparecer e seus sinónimos.
Contreras (1976) diz que verbos que denotam começo, surgimento,
existência, etc., parecem ter a função apresentacional e Givón (1979)
chama-os de «exístenctals-apresentatívos»: «be, exist, stand-sit-lie down,
Iive, appear, often remain, be left and sometimes verbs ofentrance
into the scene such as come ar enter» (p. 28). Segundo Givón, esta
tendência para estes verbos aparecerem em posição inicial é universal
nas línguas SVO. No Português oral coloquial, os casosdeVã mais
íreqüentes são, de longe, aqueles em que um verbo deste tipo aparece:
vir, entrar, chegar, passar, estar, existir, aparecer, sumir, sobrar, faltar,
cair, são verbos que ocorrem a todo momento, em todo tipo de frase.
Pode-se dizer que, do ponto de vista da freqüência de ocorrência, os
casos de VS em Português coloquial mais significativos se resumem
àqueles em que um destes verbos ocorre.
- 124-
o resultado, portanto, foi de 7 para 100 .. Não incluí nestas 100
frases contadas casos de oração sem verbo, evidentemente .• Houve
um caso duvidoso, que se for incluido como de ordem VS, aumenta
para 8 os. exemplos deste tipo:
«... o grande sucesso que vem fazendo sua peça...» (p. 9).
«onde o esperam dois meses de seminários na Universidade
de Vale...» (p, 9).
- 125-
Vê-se que a proporção é praticamente a mesma, nas duas
amostras examinadas. Esta estatística demonstra a percentagem de
ocorrência de VS nas estruturas com verbo expresso.
Para se ter uma idéia mais completa do quadro em que se
inserem estes exemplos, é interessante notar que se encontrou uma
alta percentagem, em texto escrito, de verbos sem sujeito expresso,
por causa da possibilidade de elidir o sujeito quando ele é cc-referente.
Encontrei nas primeiras 100 estruturas estudadas, 39 casos de elipse
do sujeito, em que o verbo estava na 3a. pessoa, concordando com.
o sujeito expresso em outra oração.
Segundo Givón (1981) este é o caso mais alto numa escala
de estratégias para manter a continuidade do tópico no discurso..
Em seguida, vêm os pronomes anafóricos, que neste texto são 3
pronomes pessoais de 3a. pessoa e 6 pronomes chamados indefinidos
em nossa gramática (todos e outros). Este texto também apresenta.
urna alta percentagem de pronomes relativos sujeitos: 13. Todos
contribuem para a coesão do texto e para manter a continuidade do
discurso, uma vez que são anafóricos. Sintagmas nominais definidos
também, segundo Givón (1981) contribuem para a continuidade dO\
tópico. Neste texto, há 29 SNs plenos, todos ou definidos e anafóricos
ou nomes próprios, todos referentes aos titulas de filme, personagens,
atares, alguns repetidos mais de uma vez. Todos também contrl-
buindo para a continuidade do discurso, uma vez que o tópico aí
é cinema, crítica de filmes. Não há nem um sujeito anteposto com
SN indefinido. Há ainda dois casos de elipse pragmática (já exernpll-
ficados) e um verbo considerado impessoal: haver. O quadro do
resultado é o seguinte:
VS 7
Sujeito SNs dei. 29
expres- rei. 13
50 SV
51
Pro. anafo
(22) { peso
outros
3
6
Sujeito
não-ex-
I Elipse pragrn. 2
Elipse p/concordo 39.
presso
Verbo impes. 1
42
Total
I 100
- 126
Por este resultado, vê-se como predominam, no texto, as estra-
tégias que favorecem a continuidade do discurso: são 93 casos de
continuidade. Sobraram 7 exemplos que, segundo Givón (1979-1981),
são estratégias de descontinuidade: construções~~ ordem VS e ~!.s
tenciais. Examinando esses exemplos, vemos ~ que eles se destacam
d=tros por não serem anafóricos, e portanto apresentarem alguma
coisa pela primeira vez no texto, ou seja, são «novos» de algum
modo. Assim são «as eleições», que ocorre na capa, e portanto pela
la. vez na revista, assim também com «haver duas cinematografias»,
«a cama da prostituta Penélope», «grandes cenas eróticas», «a graça,
etc.». Nenhum desses SNs havia ocorrido antes no texto, todos são
novos. O único que foge a essa classificação é o pronome tudo, que é
anafórico e ocorre na posição pós-verbal. Dependeria de uma análise
estilística discutir esse exemplo, o que eu deixo para outra ocasião.
Parece-me que a afirmação de Givón, de que a ordem VS é uma
estratégia de descontinuidade, se evidencia nesse texto, contrastada
Com o pano de fundo das estratégias de continuidade (93 versus 7).
Vê-se também o caráter marcado da ordem VS, que aparece em
minoria no discurso.
Em virtude da alta incidência de orações sem sujeito explícito,
por causa da anáfora. por elipse, não se tem uma idéia, por essas
estatísticas, da relação existente entre ordem VS e SV, uma vez
que quando o sujeito está elitico, não podemos saber se ele viria
antes ou depois de V_ Para ter idéia desta correlação é necessário
contar os casos de sujeito expresso e ver a percentagem de ocorrência
de sujeito antes e depois do verbo. Por esse motivo, contei 100
estruturas em que overbo aparecia com sujeito expresso e encontrei
o seguinte resultado: 85 sujeitúsantepostos para 15. pospostos. (I.E.
10-3-82, p. 3-9). Acho que isso conJ1IJJJJLa..superioridade de anteposição
do sujeito sobreã posposição e o caráter não-marcado da primeira
em relaçãO ã-se~---~~·_·_--
L1NGUA ORAL
- 127-
Encontrei apenas dois casos claros de VS:
- 128-
considerado como uma estratégia de continuidade.. Em Português
muitas vezes o pronome pessoal é redundante, porque a. flexão do
verbo já indica o sujeito. Esta é a razão porque na língua escrita
ele não ocorre. Sua alta freqüência no discurso oral deve ser devida
às condições de ruido típicas da conversação, em que a redundâncía
é necessária, provavelmente, para assegurar a comunicaçâo (um fator
pode ser que o fim das palavras costuma ser surdo em Português, e a
terminação dos verbos fica pouco audível). Outro fato diferente na
língua oral é a ocorrência de elipses pragmáticas da la., 2a. e 3a.
pessoas do tipo:
- 129-
construção impessoal com (se) na língua escrita. Ocorreram 9 casos
como esse, de 3a. p. sing, sem sujeito expresso. Na língua oral,
quando não se quer determinar o sujeito, basta colocar o verbo
na 3a. p.s. e não colocar sujeito nenhum. Isso acontece tanto com
verbo transitivo como intranstivo:
- 130-
o pronome, porque se vê a terminação do verbo e também se pode
voltar atrás, sempre que necessário, para procurar o referente. Além
disso, faz parte do processo de educação da língua escrita aprender
a eliminar os pronomes quando considerados redundantes. Quem já
ensinou crianças a escrever sabe que elas têm tendência a escrever
os pronomes que usam na língua oral e a professora tem que insistir
durante muito tempo para que elas aprendam a evitá-los nas redações.
No Brasil, é considerado elegante suprimir os pronomes na escrita,
dai não ser surpreendente que eles não apareçam no texto escrito.
A elipse que ocorre na língua oral mais vezes é a pragmática:
14 casos foram contados neste texto, sendo os mais freqüentes os
casos de imperativo e de la. p.s. do presente do indicativo, em que a
flexão do verbo já indica sujeito (já exemplificado).
Sujo
VS
I 2
I 2
expresso
SV
Pro. Peso 47 I 59
I SNs 12
I
Sujo elítiCO./ Elípse prag. 14 22
(anafórico) ~lípse por concordo a I
Sem V.···impes. 6
sujeito 3a.l'.s.ind. 9 17
3a. p. pl. indo 2
Total
I I 100
- 131-
Os SNs antepostos (12) foram, em sua maioria, nomes
r
próprios, às vezes repetidos.
-132 -
«Veio uma bola mais de dois palmos do nosso lado».
NOTAS
_. 133-
deste ponto). Em trabalho anterior (1973) observei que com o infinitivo
dependente de verbos ceusatívos o sujeito de verbos intransitivos vem posposto
quando é inanimado ou quando não é agente: «Manda vir a cerveja», «Faz entrar
o cliente». Os argumentos que Perlmutter (1976) alista em favor da tese de
«sujeito rebaixado» são todos válidos para considerar os SNs objetos.
2. Veja-se o que digo, mais no final deste trabalho, sobre o verbo existir.
Acredito que a posição não-marcada com este verbo é aquela em que SNs
indefinidos aparecem pospostos. Parece-me que Q autor colocou um responsável
antes de existir porque, neste caso, não se trata de indefinido. Se ele tivesse
escrito: «Se existe um responsável ...) o SN seria indefinido, e poderia haver
ou não algum responsável. Colocando antes, ele parece estar se referindo a uma
pessoa determinada. É a diferença que existe, a meu ver, entre: Ele acredita
que Papai Noel existe x Ele acredita que existe Papai Noel, No 19 caso, é
um Papai Noel determinado, no segundo não.
3. Mais adiante, esclareço que não vou considerar esses casos como
de posposição, mas sim de V inicial.
- 134-
Trata-se de tcpicallzação, mas nem sempre é possível distinguir sujeito de
outro elemento topicalizado, como discuto em outra parte (casos como «o
relógio estragou o ponteiro» ver Pontes, 1982).
BIBLIOGRAFIA
NAVA, Pedro. Galo das Trevas. Rio: José Olympio, 1981 (p. 5·57).
Revista ISTO É, n' 272. São Paulo: Ed. Caminho, 10·03·1982 (até p. 23).
OBRAS CONSULTADAS
BERMAN, Arlene. «On the VSO hypothesis». Linguistic Inquiry, 5:1. 1-38.
Cambridge, Mass. MIT. 1974. Citado de: Nápoli, D.J. e Rando, E. Syntactic
Argurnentation.Washington, D.C.: Georgefown Unlverslty Press, 1979.
DIAS,> Epiphanio da Silva. Syntaxe Histórica Portuguesa. 4a, ed. Lisboa: Livr.
Clássica. 1959.
- 135-
~----, «Verbal· Agreement differences ln spoken and written Brazilian
Portuguese and thelr -consequences for the teaching of composition» ln:
Ensaios de Lingüística 5. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas
Gerais. 1981.
MATTOSO CAMARA JR. J. «Um caso de colocação». ln: Dispersos. Rio: Fundação
Getúlio Vargas. 1972.
- - - - - . História e Estrutura da língua Portuguesa. 2a. ed. Rio: Padrão.
1976.
- 136
- - - - - . «Tópicos em língua Escrita». ln: Ensaios de Llngülstlca 5. Belo
Horizonte: UFMG. 1981.
SAIO ALI, M. Dificuldades da Língua Portuguesa. sa. ed. Rio: Acadêmica. 1957.
SOUSA DA SILVEIRA. Lições de Português. 6a. ed. Rio: Livros de Portugal, 1960.
- 137-
EUNICE PONTES
Universidade Federal de Minas Gerais
- 138-
Li & Thompson (1976), describing topic-cornment sentences in
topic-praminent languages, refer to «double subject» constructions
as «the c1earest cases of topic-cornrnent structures». They say that
«ali Tp languages have sentences of this type, while no pure Sp
languages do as far as we know» (p. 468).
(2) And the lunch, 1'11 come back earlier. «E o almoço, eu volto
mais cedo».
Tina. you may put the china in the dishwasher. And the lunch,
I'lr come back earlier.
Shêrnêant that, as for the lunch, she would come back earller
trornwork and she would prepare it. Out of context, S (2) could bê
uriderstoodras: if the speaker was coming back to havê her lunch
-139 -
aarlier. But, in the context of situation this does not make sense, and
the maid understood it as it should be. This shows how a S has to be
understood in the context of situation as well as of the discourse.
(4) «The mo-the modern art the twentieth century art, there's about
eight bcoks».
- 140-
Portuguese Grammarians as «putting in the beginning 01 a elause,
without a grammatieal link to the rest 01 the sentenee, the objeet's
name alter whieh an assertion follows».
- 141-
lt is interesting to notice that, although the Anacoluthon is also
found in written language, it is not well accepted in formal wriUen
language. ln this register, what corresponde to Anacoluthon is a
construction exactly equal to (2), but beginning with an expression as
«quanto 8», «in relation to», as far as X is concerned», etc. If we
want to transform (2) in a construction well accepted in wriUen formal
languaga, it is sufficient to add «quanto a», before 2:
- 142-
B. Humrn-hum,
A. enquanto que especialidade, a gente limita muito o
while in specialization, we narrow down knowledge too much.
conhecimento.
- 143-
Keenan-Schieffelin (1976-246) considered that referents like
«speaker» or «hearer» «are less likely to be foregrounded or «tópica-
lized» through constructions like LD. We found some exarnples of ana-
coluthon with «speaker» foregrounded:
- 144-
The distinction Morgan (1982:200) shows between: «Peter burned
the look because he didn't like it x Peter burned the look. He didn't
like it» - does not hold lor anacoluthons. Morgan says that in the
lirst there is a syntactic relation, in the second a discourse relation,
since these are independent sentences. But in Anacoluthons there are
no independent sentences, and, nevertheless, the relation is one of
díscourse. As in the second case, the mechanism involved is «our
ability to make common sense inlerence» and «it can be cancelled
by contextuai lactors, in the manner 01 Grice's (1975) conversational
implicatures» (Morgan, 1982: 200).
- 145-
REFERENCES
LI, C,.. 8< THOMPSON, S. "Subject and Topic: A New Typology of Language". ln:
LI. C. ed. 5ubject and Topic. New Vork: Acadernic Press, 1976.
- 146-
DILZA DANT AS RODRIGUES ANTUNES
(Fono audióloga)
-147-
A DYSARlHRIA:
- 148·-
The bilateral lesion of the precentral gyms or the mn'~n,irl~1
or the basal ganglia cause dysarthria. As articulation depends
side movements, when there is an unilateral lesion, dysarthria
accur, lent it is not as sereve as in case of bilateral dysarthria.
case of bilateral pyramidal lesions related to articulatory muscles,
the tongue may appear firmer and shorter than the normal, the palatal
and pharyngeal reflexes are exagerated, the articulation of the censo-
nants, especially the labiais and dentais are affected.
Lesion of the extra-pyramidal tract may cause muscular rigldity,
immobílity of lips and tongue and intelfigibility. The pitch of the voice
may be rnonotonous.
When the cerebellum or the basal ganglia are damaged, the
speech is explosive, with separate syllables, irregular pitch (excessively
low or high) and incoordinated respiratory movements may occur.
Lesion of the cranial or the cartico-spinal nerves or af the muscles
cause weakness of the muscles of the articulators, affecting the move-
ment of the lips (labial sounds), of the tongue (affecting dentais and
gutturals), of the velum or /and the pharynx (bringing nasality) or of
the larynx,
Lehiste (1965) described ali speech deviations observed ln dy-
sarthria individuais and divided them in different features which
characterize the speech of these individuais. He classified those features
into three parts:
- Dysarthric deviations due «to lack of control over the activity
ofthe velurn», such as denasalization of initial or/ano final consonants,
nasalization of the syllabe nuclei or of non nasal consonants;
Dysarthric deviations due to misartlculations such as, pala-
talization.: retroflexion of no retroflex sounds, or vice-versa, devoicing
ofInítlàlplostves, misplacernents, distortions ln manner of articulation,
dlstortionsInsyllability and others;
<i Rysa~hric deviations due to insufficient control of activity
6ft~ev~~~lfolds; such as laryngealization of consonants or syllable
nucl.ei,b~eat~ys~gments, voiceless transitions, devoicing of initial
or/an? • fi.~.~.lreson~nts.
Those deviations mal' be due to one or more lesions.
B. APRAXIA:
- 150-
Apraxia is also related to.lesion. órlesions ín
Difterent types of apraxia exlst, according to the location lesion.
j always lirnited to one side of the body or one limb and may occur in
case of precentral lesions;
- Ideational apraxia is a result of lesion of the parietal lobe
of the dominant hemisphere. The individual can not perform a cornplex
movement because he does not have an «ldea of the body parts to be
used, the speed, rythm and sequence of movements». (Brown, 1972);
- ldearnotor apraxla, the individual can not organize the move-
ments in space and time. He may perform automatic acts but not the
voluntary ones, This type of apraxia may be present on both sides of
the body, on the right side only or on the left side only. This type may
occur when the parietal lobe of the dominant hemisphere is damaged,
«If the lesion is somewhat further forward lt may produce ipsilateral
apraxia and contralateral hemiplegia» (Lord Brain, 1965).
-151 -
REFERENCES
- 152-
RICHARD -JACKSON HARRIS
Universidade Federal de Minas Gerais
e Kansas State University
- 153-
1. INTRODUCTION
- 154-
same formo On the contrary, memory interprets everything, constructing
representations of these interpretations in order to store them in
permanent memory. It is these stored interpretations that we remember.
This phenomenon has been demonstrated to be very general across a
wide variety of tasks with both Iinguistic and nonlinguistic materiais
(see Harris, 1981, and Harris & Monaco, 1978, for detailed discussions
of these issues).
- 155-
youhave known and forgetting the smart ones, because they do not
fit the scherna as wel!. This example is, or course, greatly oversimplified
ter explanatory purposes, but it serves to illustrate the principies.
(1) correctly but rather, because, upon hearing, (1) they inter-
preted it according to their schemas about prisons and prisoners that
had been retrieved to aid ln comprehension. lhe final memory repre-
sentation of this sentence is thus a constructed interpretation, which
often includes the inference that, since the prisoner was able to escape
from jail, he must have done soo Although this consequence may be
highly llkey, depending on the context, it is no! certain; it is possible,
fórexample, thot the prisoner did not know that he had the opportunity
to escape or that he was too stupid to take advantage of it,
- 156-
Our laboratory, and obthers as well, havêshólllhthàtpêóplérriake
such inferences in a wide variety ot situationswithà widevarlety of
linguistic materiais (Harris, 1981). Moreover, theyrem~~bêrthatthese
inferences had been directly stated as facts inthe original utterance
(Brewer, 1977). They often seem to have no realization that this
Information was constructed by themselves, not spoken by the speaker
Dr written by the writer. This ability to construct inferences is typically
very useful and necessary in normal language comprehension. There
are times, however, when it becomes important to distinguish informa-
tion that was stated directly from that which was constructed upon
hearing Dr reading the language. Some such cases involve important
questions ot linguistics. We will now examine two examples ot research
using the concepts and methods ot cognitive psychology to study
such problems ot applied linguistics.
(3) These jeans will make you fly off into the sunset into the
arms of your sweetheart.
-157 -
On the other hand, an ad can mislead without being literally
false; it is this type of ad that is discussed below. Although truth
may be a linguistic, and sometimes legal, question, misleadingness, or
deception, is a psychological question, specifically one dealing with
the processing of the information in the ad, because what is important
is the interpretation constructed by the consumer, regardless of the
semantic and syntactic properties of the language of the ad itself.
(5) does not say that the beer is the tastiest, only that it may be.
not be false if the deleted c1ause were «than washing with coai dust
will» or «than washing with no detergent will». Whenthe hearer hears
a cornparatíve adjective or adverb with no baslaotcomparlson given,
ha/she uses relevant knowledge schemas to lnfer à' probable basis
(e.g., «than using any other brand») and uses that ínferred information
to understand the ado
that the pills will prevent colds. It is merely two imperatives spoken
sequentially. Our minds infer the causal relationship.
.- 158-
A negative question can imply an affirmative response, which
may or may not be true, e.g., (8).
(8) lsn't fine quality leather important for your family's shoes?
if only-tour people were questioned and ali Were related to the manu-
facturer!
ln our psychological laboratory at Kansas State University (USA)
we have studied such advertisements, in order to determine if they
areln fact misleading, and also to develop ways of teaching people to
avold making unwarranted inferences beyond what is directly stated.
Method
- 159-
(la) Asserted-claim Version: Aren't you tired of the sniffles and runny
noses ai winter1 Tlred of always feeling less then your best1
Taking Eradicold Pills as directed wiil get you through a whole
winter wíthout colds.
(11) lrnplied-clairn Version: Aren't you tired of the sniffles and runny
noses ali winter1 Tired of always feeling less then your best1
Get through a whole winter colds. Take Eradicold Pills as
directed.
The fírst result of these studies was that subjects índeed made
the expected inferences trom the lrnplied claims in the ads and
subsequently remembered these inferences as facts (Harris, 1977).
Frequently they were not able to discriminate whether they had heard
the claim implied ordirectly asserted. This it is possible to imply
some information about a product without stating it directly and
- 160-
produce the same ellect on the consumer's perception that would
have occurred ii the inlormation had been asserted as a facto
- 161-
trated that even very small changes in the wording of the questíon
can influence the slJbject's memory for the evento For example, uslng
a definite article (15) rather than an indefinite article (14) caused more
subjects to respond that they saw a broken headlight, even .though
in fact
none had existed in the film. ln this case they retrievedsome knowledge
scherTlas about automobile accidents; a broken headlight is very com-
patible with such a schema. For this reason, and because the use of
the definite article generally presupposes the existence of a particular
referent readily know to speaker and hearer, the. hearer inferred,
without realizing the error, that there was a broken headlight.
(16) About how fast was the car going when it smashed into the
other car?
(17) About how fast was the car going when it hlt the other car?
to falsely rernernber one week later thatfhere was broken glass (in
fact there was none). Thus the schematic knowledge brought to bear
in comprehension of the question differed somewhat in the «smashed»
and «hit» cases and thus altered the mernory representation being
constructed and stored in a way that affected information retrieved
one week later,
-162 -
5. FINAL COMMENTS
NOTES
This article was written while the.. author was a Vísiting Lecturer in the
Departamento de Lingüistica e Teoria da Literatura da Universidade Federal
de Minas Gerais. Support af the Comissão Fulbrlght and CAPES is gratefully
acknowledged; Ccrrespondence should be sent to the authar at the Department
ot-Psychclogy, Bluemont Hall, Kansas State uníversty, Manhattan, KS 66506 USA.
REFERENCES
- 163-
LOFTUS, E. F. Eyewitness Memory. Cambridge: HarvardHnlverstty Press, 1979.
- - - - - , . & PALMER, J. C. «Reconstruction of Automobile Destruction: An
-164-
ANNA MARIA VIEGAS
Univérsldade Federal de Minas Gerais
Conceitos de Estilística
- 165-
Pluralizando a palavra conceito, o tema da reflexão poderia
talvez sugerir uma temática de controvérsia. Mas não é este o nosso
objetlvo, menos ainda a nossa proposta. Não pretendemos também
esgotar nenhum inventário de opiniões ou de esforços. Se parece
realmente dificil delimitar o papel da Estilistica, nosso trabalho é um
estudo. E, como todo estudo, confinado a possibilidades circunstanciais
de observação, anotação e questionamento.
•
•*
Até certo ponto longe das idiossincrasias estilisticas, Platão nos
propicia a idéia da Beleza. Sendo tudo e cada coisa uma idéia, será
bela essa idéia, como «íabricaçãox de reflexo da Idéia, Beleza imutável,
absoluta e eterna. O estilista seria um artesão, inclusive de si próprio,
e também o artesão seria estilista, tanto quanto o escritor ou o poeta.
«Suas criações se dariam em conseqüência, não do saber, mas de
um dom natural, inspiração divina semelhante à dos profetas e dos
magos». Também estes criam beleza, «só que não têm ciência
do que fazem». (1)
-166 -
Como então explicar o mau estilo nesse gênero de artesanato
poético? - Para Platão, o autor do «mal» se identifica nesse ponto
como o autor do «feio». É aquele que voluntariamente vai optar pela
ignorância. Se assim acontece, o «feio» também existe, e seu artesão,
respondendo pela própria ignorância, será um artesão culpado.
*
* *
Só muito recentemente teremos atitudes mais explícitas no que
se refere tanto ao conceito de estilo como ao papel da Estilística.
2. PLATON, Phêdre, 261, texte établi et traduit par Léon ROBIN, Les
- 167
Estes meios de expressão, traduziriam eles as «tendências
universais do espirita humano, tais como se refletem na linguagem
articulada»? Seriam meios específicos, fornecidos por um idioma deter-
minado? Ou, por outro lado, traduziriam os traços de uma persona-
lidade, deixados no falar característico de cada um dos individuas? (6)
Atender às três interrogativas equivaleria, para Bally a hipótese inviável:
uma estilística geral do procedimento da expressão humana; outra
estilística voltada para o estudo do grupo Iingüístico; e uma terceira
que se ocupasse apenas da expressão individual. Individual, por sua
vez, carece de delimitação. Pode rsterir-se, tanto ao falante do
cotidiano, como ao falante da obra literária.
- 168-
caracterizado pela escolha individual. Haveria, então, para Sally.
também uma «competência estilística». muito embora não a mencione
ou defina nesses termos. Sugere, sim. a noção de d e s v i o. explicitada
por Cressot em termos mais fortes. pensamos. na medida em que o
«desvio» é provocado pelo sentimento do indivíduo perante a língua
e definido como «deformação» suscitada pelo eu da expressão. Estilís-
tica, assim considerada. acaba por tornar-se verdadeira p a t o I o g i a
da linguagem articulada.
169-
chamar de psico-semiologia, em correlação à psíco-sistemátlca. da
linguagem. A lei da psico-sistemática é a regirosa lei da «coerência»;
a lei da psico-semiologia é a flexível lei da «conveniência expressiva».(14)
Perspectiva saussuriana? Sim, mas apenas tanto quanto a noção
de «desvio» nos propõe referência imediata à norma. O estudo dos
efeitos de estilo, em contraposição à virtualidade da norma (e, para
Riffaterre, a obra, ou o texto inteiro, é efeito), seria a função proprla-
mente estilistica. Em Guillaume, esse etudo levaria em consideração,
além do mais, os pressupostos da chamada «conveniência expressiva».
Por original que seja o enfoque de cada uma dessas concepções,
duas tônicas vêm sendo sempre aqui reforçadas: o primeiro deno-
minador comum da «individualidade» (já, pelo menos parcialmente,
questionada por Sally), e o fator «escolha», como fundamento de
realizações estilísticas.
•
• •
Nãopretendfarnos cair no idealismo alemão. O fator e s c o I h a,
entretanto, nos leva a questionar também o objeto concreto dessa
escolha. A impressão é de que permaneceria de pé ainda Sally, na
eleição da linguagem oral. Quando muito, Cressot se lhe interpõe.
Estamos, contudo, nos defrontando agora com o texto chamado. «lite-
rárlo», quer para Spitzer ou para Vossler, para os Alonso, Hatzfeld
ou Kayser.
Croce, voluntária ou involuntariamente a alma desse idealismo,
se eleva contra o positivismo da época. (16)
Sally teria sido mais saussuriano que Saussure? Na sua engenhosa
e laboriosa proposta estilística, sincronia assume tamanha relevância,
queadi~ot~rnia saussuriana praticamente desaparece. Teremos entâo
a acronia da linguagem escrita, em oposição à pancronia da linguagem
oral (tida como vulgar), mas existente «a serviço da Vida» e como
«função blológlca e social».11')
- 170-
A negativa é o que se supõe da equipe idealista. A linguagem
humana se caracteriza essencialmente pela sua intencionalidade. E
só a fala literária realiza explicitamente esse ato voluntário. Só o texto
literário poderá ser então objeto da Estilística. No dizer de Spitzer,
associando-se a Hatzfeld, Vossler e Kayser, é esse texto que sugere
«a unidade essencial entre lingüistica e história literária» (17).
•
• •
Sem diferente a posição de Jakobson que, sem minimizar a
il1Ípo~ância desse esforço de estruturação epistemológica, vai preo-
9~p~r-se com o estatuto científico daquele estudo. Mostrará a neces-
sldàdàde delimitação do objeto da Estilística (tornando-a desse modo
autõnornacomo disciplina), mas levantará também problemas teóricos
dácaráter' intrinsecamente metodológicos.(lll) Aspecto interessante da
- 171-
perspectiva jakobsoniana é a preocupação com a leitura (o que aparece
igualmente em Kristeva) dos caracteres estilísticos, atribuindo à estio
Iística, de um lado a definição de uma função poética, de outro a
identificação das reações do leitor atingido pelos efeitos daquela função.
Em outras palavras, a Estilística teria a tarefa de analisar uma poiesis,
mas também o feed-back produzido por essa mesma poiesis sobre o
real (20).
- 172-
unidades de língua, institucionalizadas sob a forma de oposições, seriam
referência de observação prévia; as unidades de fala, nível dos contras-
tes, caminhariam na mensagem para o lance do estudo estilístico.
Essas unidades do texto (tomadas como unidades de conteúdo, nas
palavras do próprio Hjelmslev), diferentemente dos sinais, se caracte
rizariam por sua natureza de conotações.(22)
Ao distinguir os níveis de estudo para a abordagem das unidades
de conteúdo, Hjelmslev vai-se colocar diante de pelo menos três
perspectivas semiológicas distintas: a da meta-semiótica; a da semiótica
denotativa e a da semiótica conotativa. A primeira se definiria como
ciência semiótica propriamente dita, cujas semióticas-objeto se con-
fundiriam com as diversas serniologias, no sentido saussuriano da
expressão. A segunda seria a própria teoria lingüistica, no estudo
da linguagem natural como produto de organização sistematizável.
Restam-nos agora os aspectos conotativos da mensagem, conseqüsn-
temente a cargo da terceira semiótica.
Em outros termos, e como já vimos, terminada a análise semiótica
denotativa, a semiótica conotativa iniciaria sua tarefa, para isso
utilizando-se do mesmo tipo de procedimento metodológico. Necessário,
portanto, distinguir primeiro um «sistema», para em seguida se chegar
ao. delineamento de um «uso» semiótico. Embora atuando no plano
da expressão, Hjelmslev aqui se empenha em frisar o objeto desta
semiótica conotativa, desvencilhando-a de qualquer preocupação de
carát~rsocial, como «dialeto», «língua comum», «forma vernácula»
e até certo conceito de «estilo» (2.'). Se a primeira etapa de estudo
se propõe a esquematização dos fatos expressivos do ponto de vista
de.seus indicadores unívocos, ou sinais, a segunda etapa abordará os
indicadores equívocos, ou conotações.
Novo embaraço: de um lado, a equivocídade agora do próprio
termoconotação; de outro, e conseqüentemente, a delimitação episte-
molôgica dOi campo de trabalho estilístico, em Hjelmslev, e do campo
de trabalho semântico.
SE\~~n~~ção se opõe a denotação, caberia ao estudo lingüístico
e~t~seg~gdo.campo,.c~ncentrando.se o estudo estilístico nos aspectos
conotativos da linguagem? Trabalhando na esfera das «unidades de
- 173-
conteúdo», não acabamos por finalmente delinear, e bem longe da
Estilística, uma astuciosa especulação semântica, ao encontro de
verdadeira teoria da significação?
•
• •
De acordo com um dos mais importantes postulados da lingüística
moderna, aquelas unidades, como qualquer outro fato Iingüístico, só
poderiam ser examinadas e delimitadas a partir de sua natureza de
r e I a ç ã o, e no interior do sistema de r e I a ç õ e s em que se
inserem. Manifestam uma «categoria nova do objeto», traduzindo
assim nem «o real» nem «o racional», mas o funcional, como produto
de atividade essencialmente poética. (:14) Nesse sentido, a oposição
denotação I conotação acaba por perder sua operecionalldade.
Exemplificando:
Comi um peixão.
Ele pescou um peixão.
Ele é um peixão.
Consegui um peixão.
- 174-
qüentemente, será cada vez traduzida por unidades de conteúdo dife-
rentes, o que nos leva a admitir a hipótese de quatro palavras, ou
quatro valor e s Iingüísticos nos enunciados distintos.
- 175-
Iheríamos mutton no primeiro caso, ao lado de sheep na segunda
enunciação. A diferença de valor entre piêce (francês) e moeda (por-
tuguês), bem como entre sheep (inglês) e mouton (francês), deve-se
ao fato de terem os primeiros termos das duas comparações a
possibilidade de se afirmarem cada um deles como significado, por
oposição, e oposição esta inexistente no caso dos outros termos
moeda e mouton.
- 176-
à . Estilística? - É, no entanto, uma questão de natureza também
semãntica.
•
* *
- 177-
Não se refere, portanto, a um só código. É «ponto de cruzamento»
de vários códigos inter-relacionados e em oposição, num «espaço
textual» múltiplo. Dessa forma, a percepção estilística supõe verdadeiro
diálogo entre discursos na reconstrução do texto poético, podendo
então ser aqui entendida como espécie de «estilistica comparada».
Tal comparação nos leva ao conceito de tradução, neste Caso intra-lin-
güística, sem excluir a possibilidade de extrapolar-se para o nivel
inter-semiótico.
Enfim:
- 178-
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
IMPRENSA UNIVERSITÁRIA
Caixa Postal 1.621;..;.,,;,; 30.000 Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil