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DR. D. ILDEFONSO RODRIGUEZ VILLAR

PONTOS DE MEDITAÇÃO
SOBRE A

VIDA E VIRTUDES DE NOSSA SENHORA


Tradução revista polo

PADRE MANOEL VERSOS FIGUEIREDO, S. J.


II

L I V R A R I A F I G U E IR IN H A S — P O R T O
'T”. A

ï
P O D E IM P F IM IR -S E

P o rto , 11 de A g o sto de 1954.

M ons. Pereira Lopes, V ig ■ Ger.

D IR E IT O S R E S E R V A D O S
RECOM ENDAÇÃO

R ecom endam os a todos 'mas especialrnente às raparigas


da y4cpão C atólica este livro de leitura e m editação sobre a
Sa n tíssim a V irg em , que escreveu o D r. D ■ lld e fo n so R o d ri­
g u e z V illar, professor d e F ilosofia no nosso S em inário
A rquidiocesano, R eito r d o S antuário N a c io n a l d a G rande
P rom essa e A ssiste n te da U nião D iocesana da Ju ventude
F em inina da A c ç ã o Católica.
Sem inário A rquidiocesano, Santu á rio N a c io n a l da
G rande P rom essa e J u ven tu d e F em inina da A c ç ã o Católica:
que três cam pos tão e xten so s e fera ze s para trabalhar pela
im plantação e consolidação, difusão e depuração, enobre­
cim ento e d ivinização do R ein a d o d o C oração S a cra tís­
sim o d o R ei D ivin o !
'M últiplos e variadíssim os podem ser os trabalhos d este
apostolado; m as sem d úvida um m u ito principal consiste
em infiltrar nos entendim entos lu z e nos corações, fo g o
de verdadeira e cabal d evoção à R ainha e Senhora dos
céus e da terra- Para isso pode se rv ir m uito efica zm en te
este livro d e M ed ita çõ es q u e recom endam os.
Ê inegável que a árvore da A c ç ã o C atólica não dará
todos os fru to s que o R e i d ivin o quer que dê, se as rapa­
rigas da A cç ã o C atólica não lançam raízes profundas de
devo çã o sólida e am or puríssim o à V irg em Santíssim a.
A árvore poderá ter folhagem esplêndida, mas D eus não
6 RECOMENDAÇÃO

perm ita que m ereça ser am aldiçoada co m o a figueira esteril


de qüe nos fala o Sa g ra d o E v a n g e lh o ■
L ed e todos e fa ze i m editação p o r este liv ro e conhecei
cada v ez m ais a R ainha dos A p ó sto lo s e am ai-a cada v ez
loom m ais intensidade, e isto q u e digo a todos, ten d e presente,
raparigas da A cç ã o C atólica, que a v ó s principalm ente o
digo. para vo sso bem tem poral e eterno, para vossa salvação
e para a salvação d e inúm eras almas, q u e Jesus e M aria
querem salvar valendo-se de vós com o de instrum entos de
redenção e d e vida.
S e de-veras vos dais à m editação e ao estudo intelectual
e cordial, da R aríssim a V irgem ; se de-veras v o s dais a cul­
tiv a r nas vossas alm as as virtudes da M u lh e r p o r e x c e ­
lência, im itá-la-eis, e im itando v ó s a R a in h a d o s corações
apostólicos, então verdadeiram ente sereis R aparigas da
A c ç ã o Católica-
E terem os então o g o zo e a ufania d e ver milhares
e m ilhares de raparigas da A c ç ã o C atólica, que não se
deixa rã o arrastar pela corrente do espírito d o m undo, nem
pelas suas m áxim as e critérios nem pelos costum es e irrodas
antccristãs, exó tica s e ridículas. E m m ilhares e milhares
d e raparigas da A c ç ã o C atólica e tam bém naquelas que não
pertencem ã m esm a, cessará o im pério d a frivolidade, da
futilidade, d a desvergonha, e restabelecer-se-á o im pério do
espírito cristão, d o pud o r m ariano, da m odéstia, da can­
d ura ju ve n il e da castidade angélica-
T o d o s estes bens e outros m uitos p o d e p ro d u zir este
liv ro d e 'M editações, se as raparigas da A c ç ã o C atólica o
m anuseiam todos os dias, assiduam ente, para estar com a
V irg em S a ntíssim a, a M ã e dulcíssim a d o R e i D iv in o e M ã e
tam bém nossa, to d o s os dias, um espaço d e tem p o não
peq,ueno, em trato íntim o, lum inoso e afectuoso- E s te c o n ­
v ív io com tão boa M ã e ensinar-vos-á a sabedoria celestial.
A sabedoria celestial!, não é sim plesm ente saber, é sa b o ­
rear as doçuras da F é, da E sperança, da C aridade, as doçu-
RECOMENDAÇÃO 7

cas d e todas as virtudes, a am brosia da vida cristã plena


e perfeita, o néctar e o m el que distila a árvore santíssim a
d a C ruz, ao p é da qual e sob cuja som bra devem o s todos
v iv e r e, por m o tivo s m uito particulares, as raparigas da
A c ç ã o Católica.

V alhadolid, 16 d e M a rço de 1941.


II I D om ingo da Q uaresm a.

A ntónio, A rceb isp o de V alhadolid.


A MODO DE PRÓ LOG O

A s poucas pretensões do presente trabalho estão cia-


rarnente expressas no próprio título P O N T O S B R E V E S
D E M E D I T A Ç Ã O , porque isso e só isso contêm .
N ã o são m editações explanadas m as só uns P O N T O S
que se Indicam covn brevidade deixando o sen d e se n v o lv i­
m ento ao trabalho do entendim ento e da vontade do que
m edita
N ã o se d e ve esquecer que na m editação, este trabalho
pessoal de verdadeira assim ilação, é absolutam ente indis­
pen sável, já que doutro m odo, a m editação converter-se-á
em m era leitura piedosa.
E digo trab alh o porq u e julgo que é a p alavra m ais
adequada para expressar o que d e ve ser a m editação;
m uitas almas queixam -se de não saber m editar e é porque
creem que na m editação lhes hão-de chover do céu as
inspirações, luzes e consolações, sem esforço nenhum da sua
parte, e não se c onvencem de que estas graças concede-as
ordinariam ente o S e n h o r em razão directa do nosso tra ­
balho, do em psnho e fe r v o r que pusem os ao falar com E le.
E sta é pois a razão por que expressam ente não quis
dar 1um as m editações com pletas e d e sen vo lvid a s m as som ente
indicadas em breves p o n to s, que não dispensam o trabalho
fru tu o so da m editação e que só sirvam de g uia ou de norm a
d irectiva nela.
A MODO DE PRÓLOGO 9

Ê pois de notar que por este m o tiv o os pensam entos


que se propõem v ã o dum a form a cortada e separados por
travessões ou p o r reticências que não são outra coisa m ais
d o que sinais para fa ze r sobressair 'uma ideia, às v ezes um a
palavra, em que se d e v e fix a r a atenção.
E d o m esm o m odo, v isto que sã o p o n to s cortados e
raciocínios só indicados, não se h à-de passar de corrida
sobre eles, pois se é verdade que não o m uito com er senão
o digerir e assim ilar é o que alim enta, assim se há-de p ro ­
curar m ediante a consideração e a aplicação ao caso c o n ­
creto e particular de cada um , assinalar o p o n to que se
m edita dem orando-se to d o o tem p o q u e seja necessário
segundo aquela sábia norm a de S . Inácio, «no p o n to em
que achar o que quero, aí descansarei sem ter ânsia d e
passar adiante até que m e sa tisfa ça »; e assim sucederá que
um a só m editação, dará com frequência m atéria para
vários dias.
Q uanto à disposição da m atéria segue-se a ordem
lógica dos passos principais da vid a da Santíssim a V irg em ,
m as de tal m odo que podem servir ao m esm o tem po para
N o v e n a s de p re p a ra ç ã o para as suas festa s m ais im por­
tantes; e assim se distribuem , com o p o d e ver-se no índice,
para os dias das N o v e n a s da Im aculada C onceição, da
N a tiv id a d e, da V isitação, da V id a de N a za ré, d a s D ores
de N o ssa S enhora, da A ssu n ç ã o da S antíssim a V irg em e
finalm ente d a S a n ta E scravidão, que p o d e valer para a festa
da A nu n cia çã o , assim com o para todo o m ês d e 'M aio, ter­
m inando com as destinadas a considerar particularm ente as
V irtu d es de nossa M ã e Im aculada.
S ó m e resta, para concluir, fa ze r m inhas as palavras
de S . A fo n s o M aria de Ligório no p rólogo da sua m agnífica
obra A s G ló rias de M a ria. S e p o r ventura te parecer que
ao escrever estas m editações m e cansei em vão por h a v er
m uitíssim as m ais bem exp o sta s e ordenadas, responder-te-ei
com as p alavras de um célebre escritor eclesiástico. «L o u va r
10 A MODO DE PRÓLOGO

a M a ria é tarefa in ex g o tá ve l: é com o um a fo n te abundante


que qua n to m ais dela se tira m ais ela se enche e quanto
m ais se en ch e ta n to m ais se dilata»: com o se dissesse q u e a
S a n tíssim a V irg em é tão grande e tão sublim e q u e quantos
m ais louvores recebe m ais lhe ficam por receber. E S a n to
A g o stin h o abundando no m esm o sentir, diz: «que não bas­
tariam para louvá-la, com o m erece, to d a s as línguas de
to d o s os hom ens ainda q u e todos os seus m em bros se trans­
form assem em línçfuas».

V alhadolid. F esta da Im aculada C onceição do ano


de 1940.
1 PARTE

VIDA DE NOSSA SENHORA


1. Maria na mente divina

1. ° — T o d o s nós existim os desde toda a eternidade n a


m ente de D e u s .i. D eus a todos conhecia p e rfe ita m en te...
em ti p e n sa v a dum m odo p a rticu la r e ... q uando faltavam ,
a in d a m ilhões e m ilhões de anos p a ra a tua existência
neste m undo, já então ele te a m a v a ! ...
R azão tinha S. João p a ra dizer: «A m em o s a D eus por­
que E le nos am ou p rim eiro ». — Se isto se diz de to d o s em
g e ral e ,se podes dizê-lo p articu larm en te de ti, que dirás de
M a ria ? — Sem dúvida, ela o c u p a v a a m ente de D eus no
m ais alto grau. D epois da sua essência, que é o pensam ento
p rin cip al de D eus, o que prim eiro seus olhos vêem é M a ria ...
a E la ... prim eiro do que ninguém , e nela vê todos os m ortais.
Se D eus pudesse esquecer-se de todos e deixar de os conhe­
cer, o que é im possível, n ã o p oderia d eix ar de ver e con­
tem plar em sua m ente a M aria, pela p a rtic ip a ç ã o que nela
h á de D e u s... pela união em que ela está com D eus.
E nfim , M a ria é o pensam ento m áxim o de D eus a seguir
ao que E le tem de si mesmo.

2. " — /A ideia de M a ria na criação— Q u a n d o um a rtista


quer trad u z ir num a o b ra o ideal que a sua m ente concebeu,
prim eiro faz ensaios no b a rro , p a ra depois m odelar a im a­
gem com toda a p e rfe içã o ...
Assim aconteceu com a c ria ç ã o ... que foi um ensaio
M a ria na ‘M e n te D ivin a 13

que D eus fez p a ra depois form ar M a ria, a o b ra prim a das


su as m ãos. E la é p o rtan to com o que um resum o ou síntese
de toda a criação. — A s gra ça s e belezas re p artid a s pelos
o u tro s seres encontram -se acum ulados e sublim ados em
M a ria . —■E assim , ao form ar D eus a sua M ãe p arece que
se foi inspirando e,m tudo o que h a v ia feito p a ra fazê-la
m uito su p erio r a to d a s as c ria tu ra s. — Inspirou-se nos se ra ­
fins, p a ra a b ra sá -la em am or, inspirou-se nos anjos, p a ra
a sua p u re z a ... nos p a triarc a s, com o A b ra ão , p a ra fo rta ­
lecer e robustecer a su a fé ... em R uth, p a ra a sua m o d éstia...
em Judith, p a ra a sua co rag em ... m as... p a ra lhe d a r o seu
coração de M ãe, n ã o pôde in sp irar-se em n a d a ... N ã o h á
n a d a que p ossa com parar-se e assem elhar-se com o coração
d a V irgem S a n tíssim a ... foi necessário que D eus olhasse
p a ra o seu p ró p rio c o raç ão p a ra d a r-lh e um c o raç ão sem e­
lhante ao se u ... e assim com esse c o raç ão am asse a D eus
e aos hom ens, com o ele mesmo n o s am av a.
A Ig reja ap lica-lhe estas p a la v ra s m agníficas que resu ­
mem a mesma ideia: «A ntes que o S e n h o r criasse algum a
coisa, já eu e sta va com ele. Q u a n d o d ita va a lei aos astros
e aos m ares, já eu e sta va com ele ordenando tudo, regozi­
jando-m e co ntinuam ente com ele na sua presença».
P o r isso podes v e r M a ria sem pre que olhares p a ra
os seres d a c ria ç ã o ...; o azul d o céu lem brar-te-á o seu
m a n to ... as estrelas, a o rla que o a d o rn a ... o sol, a su a luz
sem som bras nem m an c h as... a lua, a sua plácid a for.mo^
s u ra ... as flores, a sua incom parável beleza e a ro m a ...
e deste m odo podes ir discorrendo com o verd ad eiro dev o to
de M a ria que em tudo v ê a su a imagem, com o ela a é
de D eus.

3.° — A ideia de M aria em ti. — D eus quis que tam bém


tu a im aginasses n isto -----E le deseja que essa ideia seja ig u al­
m ente a ideia cen tral do teu entendim ento e a que dê calor
c m ovim ento à v id a da tu a alm a. A n te s de q u alquer cria-
14 M a ria na 'M ente D iv in a

tu ra, cia foi p re d estin ad a à g ra ç a ... à g ló ria ... c à digni­


d ad e incom parável d a M ã e de D e u s... m as depois dela,
fom os n ó s tam bém p re d estin ad o s à g ra ça que ’nunca nos
fa lta ... à glória, se corresponderm os a e sta g ra ç a ... e à
dign id ad e incom parável de nos cham arm os e d e serm os
filhos d e D eus e inmãos de Jesus C risto ... M a s esta a ltís­
sim a dig n id ad e e stá intim am ente lig ad a com M a ria .-— E la
é tu a M ã e ! ... E la te d a rá o ser de filho de D eu s!
L ogo, toda a tu a d ignidade e glória h á-de v ir de D eus,
m as p o r m eio de M a ria , ■ — C om preendes a g o ra a ra zã o p e la
qual o S enhor q uer que ela seja o pen sam en to dom inante
d a tu a v id a ? .— E ... é assim n a re a lid a d e ? ... C om o realizas
tu este m agnífico plan o d iv in o ? ... P ro c u ra s d e v era s que
M a ria seja a ideia directriz e m otriz de todos os teus actos?
T r a ta s realm ente d e v iv e r pen san d o n e la ..., v e n d o -a a E la
em tudo? ..., p ro c u ra n d o acom odar-te a E la , sendo sua im a­
gem v iv a e p e rfe ita conseguida pelo exercício d a im itação?
P e d e g ra ça a o S enhor e a ju d a e p ro tec çã o a M aria,
p a ra procederes assim d a q u i p o r d ia n te ... pois sendo ela
a tu a constante obsessão, não sab erás nem p o d e rá s nunca
prescin d ir dela, com o é o desejo de D eus.
O x a lá que n a tu a lo u cu ra nunca chegues a d e stru ir o u
a inutilizar este p la n o de D eus, pelo teu am or p ró p rio ou
p o r qualquer o u tra p a ix ã o que te estorve de v e r..., conhecer
e a m a r... a tua M ã e ! ...
f

t t.;.
2. M a ria no A ntig o T estam en to

T u d o no antigo T esta m en to são profecias, sím bolos e


figuras. O objecto delas era o M essias e juntam ente com
ele su a M ãe. V ejam o s algum as brevem ente.

l.° — P ro fe cia s .— A p rofecia é a p a la v ra d e D eus


so b re coisas fu tu ra s ... só D eus pode conhecer com certeza
o fu tu ro ... a p rofecia é sinal d a divindade.
A ) A p rim eira p rofecia sobre o Santíssim a V irg e m
fê-la o p ró p rio D eus n o P a ra ís o : «um a mulher, esm agará
a tua cabeça» — disse à serp en te infernal. P ro c u ra pene­
tra r n a beleza destas p a la v r a s ; que bondade a de D e u s 1
c astig a e ao m esm o tem po p e rd o a ... no p ró p rio instante em
que nos condena à m orte, pro fetiza-n o s um M essias liber­
ta d o r e um a m ulher que p isa rá o dem ónio. — Q u e aleg ria
p e n sa r que o dem ónio e stará sem pre ao s pés de M a r ia !
Q u e se g u ran ç a sa b e r que nem a E la nem aos seu s filhos
poderá nunca p re ju d ica r! D á g ra ça s ao S enhor e p a rab é n s
a M a ria pelo seu triunfo e p ela g ra ça que n o s m ereceu.
T ira com o con clu são que q u a n to m ais a tu a alm a e stiv e r
unida a M a ria, tan to m ais o dem ónio e sta rá a teu s p é s-
Q u e d esespero lhe c au sará o sa b e r que um a m u lh e r...,
todos o s o u tro s hom ens lhe h ã o -d e esm ag ar a cabeça!
D) Igualm ente se pode c o n sid erar a gran d e p ro fecia
de Isaias que séculos antes disse que d a vara d e Jessé fero-
16 M aria no A n tig o T esta m en to

ta ria uma flor sobre a qual o S e n h o r re p o is a r ia ...— Jesus


é o fru to b e n d ito ; M exia, a flo r Im aculada. — N o u tra p a ssa ­
gem anuncia a sua v irg in d a d e: E ;s que utma virgem c o n ­
ceberá e dará à lu z um filh o que se cham ara E m m anuel.
— São as duas coroas d a Santíssim a V irgem : a sua m a te r­
n id ad e divina ju n ta com a sua v irgindade.
C ) D este m odo poderíam os p e rco rre r m uitas o u tras
p ro fe c ia s... bem com o liv ro s inteiros, com o os Salm os de
D a v id ... o L ivro dos C a n ta re s ... que encerram , profecias
m agníficas acerca de M a ria, que assim m ultiplicou D eus
as profecias acerca d ’E la, do mesmo m odo que acerca de
se u Filho.

2-" — Sím bolos. — São ainda m ais n u m e ro so s.— O P a ­


raíso terreal com a á rv o re da vida, é im agem d a Santíssim a
V irgem , verd ad eiro P a ra ís o onde C risto — á rv o re d a vida
—-habitou- — A arca d e N o é , que se salvou do naufrágio.
—- A pom ba branca que p a ra não p o isa r na lam a d a terra ,
v o lta im aculada à a rc a trazen d o no bico um ram o verde
de o liv e ira —■que lindas im agens de M a ria ! — A escada
d e Jacob que une o céu com, a te rra -----A vara de A a rã o
que floresce n a ob scu rid ad e d o tabernáculo e só na p re ­
sença de D eus. — A arca da A liança de m adeira in co rru p tí­
vel, que e n ce rrav a os g randes m istérios. — A sarça ardente
que ard ia com um fogo d ivino sem se consum ir, rodeada
d a m ajestade de D e u s---- E stes e outros santos sím bolos
que aparecem n a S a g ra d a E sc ritu ra revelam a form osura,
a dignidade, a grandeza, a excelência de M a ria ... P arece
que D eus tirou p a rtid o de to d as as coisas, p a ra a v iv a r
nos hom ens a lem brança de sua M ãe e fazer com que
vivessem e sp eran d o nela.

3.° —■A s figuras. — T o d a s as m ulheres célebres do


A ntig o T esta m en to são figuras de M a ria. — E v a , m ãe da
hum anidade, m as p a ra sua p e rd iç ã o ... M aria, a v erd ad eira
M aria n o A n tig o T esta m en to 17

M ãe que sa lv a a hum anidade perdida. — A b ig a il, que, pela


su a form osura, e n can ta e enam ora a D a v id ... é fig u ra de
M a ria que encanta ao m esm o D eus. — Jael que tresp assa
com um c ra v o a cabeça de S isara. inim igo d o p o v o de
D e u s... é a Santíssim a V irgem esm agando a cabeça do
demónio- — Judit, m atan d o a H olofernes e libertando do
tiran o o seu p o v o ... é a im agem de M a ria que nos libertou
de S atan ás. — E ster, diante do trono do Rei, intercedendo
pelo seu p o v o ... significa a Santíssim a Virgem, que sem
cessar pede e intercede p o r nós d ian te do tro n o d e D e u s...
E assim sucessivam ente podíam os p e rco rre r todas as g ra n ­
des figuras do A ntigo T estam en to e em todas reconhece­
riam os a M aria.

A bism a-te p eran te ta n to am or que D eus m anifesta a


M a ria -----V ê, como, encan tad o com E la, se com praz em
falar d ’E la incessantem ente em p ro fec ias... sím bolos... e
fig u ra s ... — P a re ce que é o pensam ento d o m in a n te... a
obsessão de D e u s... E tu, és assim com tua M ãe? — E stás
assim en ca n ta d o com E la ? -— É E la o p ensam ento central
do teu entendim ento? P en sas n 'E la ? ... falas n'E la? v ê -l’A
em toda a p a rte ... unes-te a E la ... v iv es n E la e d E la ? ...
sabes fazer algum a coisa sem E la? .u. R eflecte, exam ina e
tira a d evida consequência de a m a r assim com loucura a
tu a querida Mãe-

S
3. Im aculada C onceição de M aria. — O s seus testem unhos

C hegado o ditoso tem po fixado por D eus p a ra a sa l­


v a çã o do m undo, foi concebida a S antíssim a V irgem , não
com o os dem ais hom ens, m as sim p u ra, sem m ancha, sem
c o n tra ir o p e ca d o original. M editem os os testem unhos que
nos asseguram esta consoladora verdade.

l.° — D eus- — L em bra-te do pecado de A d ã o e E v a


e do castigo d o Senhor. — D e u s am aldiçoa a serpente com
estis p a la v ra s: P orei inim izades entre ti e a m ulher, en tre
a tua descendência e a sua. E la esm agará a tu a cabeça p ara
sémpre- — N e sta s p a la v ra s considera três coisas:
1. *, que um a m ulher prodigiosa e a sua descendên
se v in g ariam da se rp e n te ;
2. ", que entre a m ulher e a serpente h a v eria inim iza
p e rp é tu a ;
3. \ que o dem ónio ficaria vencido pelo triunfo des
mulher- — P o is bem, se M a ria não fosse im aculada e tivesse
sido atin g id a pelo pecado, não teria sido perp étu a essa
inim izade, v isto que o pecado é um acto de am izade com
o d e m ó n io ...; e além disso, não seria ela a vencedora m as
a vencida, pois no pecado, quem triunfa é o dem ónio e
quem fica derro tad o é o homem.
N o ta bem que essa v itó ria pertence à M ulher e à sua
descendência, Isto é, a Jesus C risto, seu Filho, e a nós, que
Im aculada Conceição (19

som os seus irm ã o s... e descendência de M a ria, pois E la é a


nossa M ãe. — L ogo, com E la e p o r E la , devem os lu ta r
c o n tra o dem ónio e assim im itarem os m elhor a su a p u re z a
im aculada.

2 ° — O A n jo . — N aq u ela s p a la v ra s «A v e-M aria, cheia


de graça», o anjo cham a claram ente à V irgem Santíssim a,
Im aculada, p o rq u e ... quando e com o foi M a ria cheia de
g r a ç a ? . . . —«P recisam ente n a sua Im aculada C onceição. E sta
plenitude é p ro d ig io s a ... é ú n ic a ... é de sem pre--— Se assim
n ã o fosse o an jo n ã o teria p ronunciado aquelas p a la v ras,
pois h ouve santos m uito santos e com. m uita g raça de D eus,
m as nenhum com essa plenitude, pelo m enos no m om ento
de nascer, p o r causa do p e ca d o original, não possuíam
g ra ç a nenhum a, O m esm o não se dá com M a ria, que desde
o m om ento d a sua C onceição foi sem pre cheia de g r a ç a ...;
p o rtan to nunca foi m anchada pelo pecado, nem sequer pelo
pecado original. — Logo, o an jo ao cham á-la cheia d e graça
c h am a-a Im aculada-
S ab o reia estas dulcíssim as p a la v ra s e agradece ao anjo
por ter feito este p an eg írico tão belo d a tua Im aculada M ãe-

3.° —• A Igreja. — D ezanove séculos suspirou a Ig reja


por este d o g m a .—’ C ontem pla o m agnifico desfile: E le são
os S antos P a d re s, os D outores, os escritores eclesiásticos,
os m ísticos e os ascetas, os sa n to s todos e em especial os
m ais devotos de M a ria os quais teceram todos um a coroa
de louvores à Im aculada C onceição. E le sã o as V irg en s da
S a n ta Igreja/ que, p a ra im itar a sua p u reza im aculada, se
consagraram a E la, e à sua im itação fizeram v o to d e v ir­
g in d a d e -— V ê q u an tas são e que fo rm o sas... que escol de
idnius puras não é o exército branco de M a ria Im aculada!
( ) povo cristão aclam ou-a nos seus can tare s p u ra e sem
mniu lia na su a C onceição. — N u n c a h ouve dogm a m ais
lirofim dnm ente sentido nem m ais universalm ente com preen-
20 Os seus testem unhos

d ido d o que este.— E foi e n tã o que o P a p a P io IX, recolhendo


to d o s esses anelos e louvores de dezanove séculos sucessivos
teceu com eles a c oroa im ortal d a definição d o g m ática da
Im acu lad a C onceição-----D etém -te a contem plar M a ria como
objecto dos louvores de to d a a Ig reja neste m istério e vê
como se cum prem as suas p a la v ras: «todas as gerações me
cham arão b em -aventurada»...

4. ° -—■M aria. — E la p ró p ria confirm a as p a la v ra s in


líveis do P a p a .
N o ssa S en h o ra de L ourdes a p arece a B e m a rd ette e
depois de v á ria s ap ariçõ es declara-lhe: E u sou a Imacyiladí 1
C onceição. — A s fontes m ilagrosas, os m ilhares de pere­
grinos, o s doentes inum eráveis, as o raçõ es incessantes e os
cânticos perenes de L ourdes. sã o os ecos destas p a la v ras
e um a confirm ação d a definição pontifica! R ecorda a história
d e L ourdes e em e sp irito une-te a esse coro de louvores
q u e ali sem cessar se entoam a M a ria Im aculada-

5. ” — N ós- — D eus, o A njo, o P a p a , a p ró p ria V irge


M aria, sã o os testem unhos, que proclam am este d o g m a...
e nós que farem os? A legrarm o-nos, regozijarm o-nos com
ele, n ã o b a sta ... Podem os e devem os to m ar pa rte nele...
M a ria dirige um exército que d ev e lu ta r c o n tra a serpente
infernal. T em os que nos a lista r sob a ban d eira de M aria
e lu ta r c ontra o pecad o em to d a s as suas m anifestações:
tibieza, ingratidão, am or p ró p rio ...; só assim serem os imi­
tad o re s de M a ria Im aculada.
G u erra, pois, a o pecado, por M a ria Im aculada!
4. Maria imaculada — O Mistério

M ed ita bem o que significa e re p resen ta este m istério


e p ro c u ra aprofundá-lo, pois é m uito proveitoso conhecê-lo
a fundo. 1

1.“ — E sta d o d a hum anidade. — R ecorda o que e ra e o ,


que se ria o hom em sem, o p e ca d o de A d ã o ! — M ag n ífico
plano o de D eu s! —-T erm in a d a a criação dos o u tro s seres,
o S enhor quer c ria r e nom ear um Rei daquela criação,
e pensa no hom em ... Com que carinho lhe form a o c o rp o .ic,
com as su as p ró p ria s m ão s... não ap en a s com a sua p a la v ra,
com o fez a o tira r d o n a d a as o u tras criatu ras. —- E. so b re ­
tudo, com o lhe infunde a alm a, espiritual, im ortal, im agem
e sem elhança d a su a d iv in d a d e ! Isto é pouco. R ecorda o
p a raíso terrestre, lu g ar de delícias e palácios desse hom em .....
a vida feliz, sem. penas, sem am arguras, sem dores, sem
lágrim as, e tc ...; n ã o h av ia sofrim ento, tudo era aleg ria e,
satisfação. — N a sua alm a infundiu a integ rid ad e ou sujeição
d a s paixões à ra z ã o ..., a ciência p a ra saber tudo sem tr a ­
balho nem estudo, e sobretudo, a g ra ça sa n tific an te p a ra
que fosse sem pre santo.
E ra o destino d a hum anidade: ser feliz ser sa n ta se r­
vindo e am an d o a D eus sem c e s s a r...; e depois sem p a ssa r
I* la .morte, trasla d ar-se a o céu, p a ra ali lo u v ar a D eus
rli-n im n en te ! rm M agnífico, sublime, só divino o p la n o de

*
22 M aria Im aculada

D e u s! —•D etém -te a m editá-lo, a saboreá-lo com o se fosse


re a l e efectivo-

2. —■A queda. — V eio o pecado e com ele todos os


m ales- — O a u to r da d o r e do sofrim ento n ã o foi D e u s...
E le n ã o nos criou p a ra sofrer, o pecado, obra nossa, é que
n o s fez sofrer. O m aldito pecado é que é a causa de todo
o mal- — C ontem pla as tristezas, angústias, dores e to r­
m entos do c o raç ão hum ano, desde A d ão até ao p re sen te ...
v ê a s doenças asquerosas, dolorosas e rep u g n an tes que afli­
gem o hom em , e vê sobretudo, a m orte com os seus so fri­
m entos e agonias, com as suas hum ilhações e co rru p ç ã o do
se p u lc ro ... que q u a d ro h o rrív el! — T u d o p o r cau sa daquele
pecado. — C om para o plan o de felicidade ideado p o r D eus
e o estado lastim oso do homem. São as paixões bru tais
que nos assem elham aos an im ais..., p ecados de toda a
espécie, ain d a os m ais b aixos e d e g ra d a n te s... p e rd a da
santidade, d a im ortalidade e d a visão de D e u s... e depois
a in d a o inferno, com o fim desta vida já tã o triste, pois
que o céu fechou-se com o pecado e já a ninguém é p e r ­
m itido lá en trar. M e d ita bem nisto, e tira p o r conclusão
o que será o pecado quando D eus. tão justo, assim o castiga.

3. ” — U niversalidade d este pecado. — O pio r m al deste


pecad o é se r u niversal p a ra todo o género hum ano.
A dão no P a ra is o n ã o era um a pessoa p articu lar, era
a fonte d a vida que h a v ia de se p ro p a g a r a todos os
h o m en s..., re p re se n tav a à h u m an id ad e... nele, estávam os
to d o s incluídos. T u d o q u an to D eus lhe deu, n ã o era só p a ra
ele, senão tam bém p a ra n ó s... havíam os de se r iguais a ele-
Isto não é um a injustiça nem um a crueldade, Se um pai
é rico, ricos serão os seus filh o s..., porém se esse pai dissipa
a sua fazenda e fica sem nada, seus filhos, sem terem culpa,
n a sc erã o n a p o b re za ; é n a tu r a l! ...
O mesmo se d á connosco. N inguém houve m ais rico
O M istério 23

que A d ã o ; tam bém o devíam os ser, p o r determ inação de


D e u s ...
A dão, porém , perdeu-nos tudo e por consequência, nós,
seus filhos, nascem os pobres de corpo e alm a. É p e n a ; mas
é a verdade-

4.“ — M aria Im aculada. — C ontem pla ag o ra a alm a de


M a ria ao e n tra r na V id a. E la d e v ia ser com o nós em tudo.
D eus, porém , faz um a excepção única só p a ra E la ... nasce
ta l qual se form ou nas m ãos do S e n h o r:... p u ra ... sem
m a n c h a ... im aculada- — D etém -te por algum tem po a c o n ­
tem p lar esta form osura. F e lic ita -A p o r ser Im aculada. V ê
o s anjos a co m panhando-A com p alm as e celebrando a sua
e n tra d a neste m undo que n ã o é um a d e rro ta com o acontece
connosco, senão um triunfo sobre a serpente.
C a n ta com os anjos louvores à S S ."'“ V irgem , ao vê-1 A
a p a re c e r neste m undo tão m ajestosam ente bela. — N u n ca
houve e jam ais h a v e rá flor m ais b ra n ca que a alm a de
M a ria n a sua C onceição---- Pensa, além disso, que sendo
ise n ta do pecado, não devia sofrer, nem m o rrer; D eus porém
quis que assim fosse à sem elhança de Seu F ilho que, por
a m o r se ab raç o u à C ruz. Isto é, nela, o sofrim ento não lhe
e ra d ad o p o r castigo, como acontece connosco, sen ão que
e ra aceite p o r am or a D eus, e por ser com o Jesus... e por
am or dos hom ens, p a ra nos se rv ir de consolo. — A gradece-
-lhe, pois, e anim a-te a so frer com E la e, à sua im itação,
a am ar a cruz-
i.d .i, u; . ,r„ V \ »«<iO •/.. r . ú u A .:

Í1í!>>
5. M aria im aculada — A sua nobreza

Sc bem que, por se tra ta r de um m istério, não podem os


aprofundá-lo, pois nos perderíam os n a sua im ensidade, no
e n tan to é su a v e e consolador m editar as razões que o nosso
entendim ento facilm ente alcança, p a ra nos convencerm os de
com o M a ria tinha que ser Im aculada-
I." — R ainha dos A n jo s .- M aria, como R ainha, tinha
direito a rein ar sobre os A njos, e estes honrar-se-iam e a le ­
grar-se-iam com tal S o b e ra n a ; m as como haviam de reconhe­
cer com o sua R ainha um a c ria tu ra que era m enos p u ra e
perfeita do que eles? um a c ria tu ra que, ainda que p o r pouco
tem po, tivesse sido esc ra v a do pecado, isto é, e scrav a dos
outros A njos que se tinham rebelado contra D eus? ! Isto
não era p o ssív el; a razão hum ana resiste a adm itir este
absurdo. Logo, tiram os por conclusão que M a ria tin h a de
ser pura, san ta e im aculada-
2-"— F ilha de D eus Pai. — M a ria é a F ilha predilecta
de D eus e p o r isso a destinou a um a grandeza que, afora
a sua, não haveria o u tra igual- — Em tudo quis assem e-
lhá-L a á divindade, de tal sorte que sem ch eg ar a ser D eus,
porque não era possivei, fosse a que estivesse m ais perto
de D eus. M as se D eus e o pecado são o que há de m ais
oposto, com o podia a Santíssim a V irgem ap roxim ar-se tanto
de D eus e ter ao mesmo tem po no seu c o raç ão o p e c a d o ? .,.
M aria Im aculada 25

O u tro ab su rd o que não podem os adm itir c que nos dem ons­
tra a sua C onceição Im aculada.

3. " — M ã e de D eus F ilh o . — E ra de M a ria que Jesus


tinha de tom ar a carne e sangue que. com o hóstia pura
e santa, ia oferecer n a cruz pela hum anidade. C om o p o d e ­
ria ser im aculada essa hóstia se tivesse .sido m anchada desde
a su a origem ? A lém disso, ninguém pode eleger a própria
M ã e ... todos nós tem os a que D eus nos d e stin o u ...; porém
com Jesus C risto não foi assim : E le é que elegeu e form ou
com o quis a sua M ã e ... O ra bem. P od en d o form á-la belís­
sima, p u ra e santíssim a na sua C onceição, p referi-la-ia m an­
ch ad a e escra v iza d a pelo p e c a d o ? ... Im p o ssív e l!... H avia
já muitos- séculos que o povo cristão dizia: «'Se não pode,
não é D eus; se pode e não quis, n ã o é F ilh o ; digam os, pois.
que pôde e qu is...» , isto é, não era por falta de poder, pois
D eus tudo pode, e se pôde e não quis não m ostrou um am or
digno de um bom filho a sua M ãe, pois p riv o u -a de um a
beleza e form osura que era precisam ente a que E la mais
am ava. P o rta n to tinha de a fazer Im aculada.

4. " — E sposa do E spírito S a n to . — A g ra ça santificante


é a vida do E sp írito S anto na alm a. D eus quis tan to a
M a ria que se desposou com E la. dando-lhe a plenitude da
g ra ç a ... «a cheia de g r a ç a ,. E le p ró p rio foi o que mis­
teriosam ente e com um a o p e raç ão onde resplandece o poder
e a pureza Infinita de D eus, form ou no seio de M a ria a
m orada p a ra o seu D ivino Filho. É possível que um a união
tão p erfeita e intim a entre M a ria e o E sp irito S a n to ...,
um a o p eração tão san ta e divina como foi a In c arn a çã o do
V e rb o ... tudo isso se v á o p e rar num a carne m anchada
pelo pecado? ... Seria digno de Deus? D a v id preparou,
para lev a n tar um tem plo a Deus, o que encontrou de m elhor
na te rra __ e o E sp írito S an to p a ra form ar aquela m orada
divina do V erbo, n ã o havia de escolher o que houvesse de
26- A sua nobreza

m elh o r no C éu? —- N ã o podia, po rtan to , h a v e r nem sequer


a m enor som bra de pecad o naquele tem plo viv o , v isto que
isso re p u g n aria extrem am ente no Filho de D eus.

5-° — N ó s m esm os. — Se tem os am or a M a ria não nos


reg o zijam o s a o vê»La Im aculada e não descobrim os nesse
m istério um resum o d a su a beleza? — Se D eus nos tivesse
d a d o liberdade e poder p a ra d a r a M a ria o que quiséssem os,
n ã o a teríam os feito assim ... Im ac u la d a ... p u ríssim a... e s a n ­
tíssima? ... G ostaríam os de a v e r m anchada pelo p e c a d o ? ...
— D iríam os então que a am ávam os de-v eras? P o rta n to ,
tem a certeza que nem o P ai, nem o Filho, nem o E sp írito
S a n to poderiam fazer o u tra coisa senão dar-L he a p ureza
que possui.
T erm in a d ando graças a D eus por ter feito assim a tua
Im aculada M ã e ... felicita a M a ria por este p riv ilé g io ...
e d á os p arab én s a toda a hum anidade por ter um a tal M ãe.
6. Maria Imaculada — O privilégio

D etenham o-nos hoje a co n sid erar este m agnífico pri­


vilegio que D eus concedeu a M a ria n a su a C onceição, p a ra
que com preendam os algum a coisa do seu v a lo r e do m otivo
p o r que a S antíssim a V irgem tan to o estim a.

1. ' — F o i um privilégio único . — Supõe v e r o dem ónio,


a m arcar com o selo do pecado todos os hom ens m al estes
en tram na v id a ...; a todos toca com a sua asquerosa e
im unda b aba de serpente in fe rn a l...; assim nascem os to d o s ...;
m anchados, asquerosos, repu g n an tes aos olhos de D eus. —
P e n sa be,m no que significa e sta p a la v ra « T o d o s» ! ! —
R eco rd a-te dos m aiores santos, dos m ais am antes e mais
am ados de D e u s..., repassa pela m ente os p a triarc a s, p ro ­
fetas, apóstolos, m ártires, v irg e n s..., todos têm que d izer
com D avid: «fui concebido na iniquidade e gerad o no
pecad o . ..»
Q u e p e n a ! que dor 1 que espectáculo tris te !
V è com o a g o ra m uda a c e n a .— É o c o n tra ste ... C o n ­
tem pla essa alm a puríssim a que b ro ta das m ãos de D eus,
e escarnecendo do dem ónio en tra vitoriosam ente no m undo
e nquanto os anjos a acom panham e lhe can tam : T o d a sois
form osa. M aria, c em V ó s não há m ancha. — R epete tu
tnrnbém m uitas vezes: «todos, menos V ós, M ãe p u ríssim a...
onde todo? caem , V ós não c a is... q u ando todos m orrem.
28 'Maria Im aculada

V ós v iv eis... quando todos se m ancham , Vó,s perm aneceis


p u ra e Im aculada». P rivilégio gloriosíssim o p o r ser único-

2." — P rivilég io grandioso. — P o r este privilégio a nossa


querida M ãe torna-se gran d e aos olhos de D eus, dos anjos
e dos hom ens. — Se todos nós tivéssem os nascido em graça
não en co n traríam o s neste privilégio de M aria um a das p rin ­
cipais razões de enaltecer a figura d a Santíssim a V irgem ?
Sem dúvida, E la referia-se a este privilégio, q u ando disse
que o S enhor tinha o p erad o na sua alm a g randes coisas
e que p a ra as fazer em pregara toda a força do seu braço
poderoso.
A ssim c. D iz a história que C iro pen etro u em B abilónia
desv ian d o as ág u as d o E u fra te s e e n tran d o assim pelo leito
seco do rio. Assim tem, de fazer D eus: d e sv iar a corrente
do pecado o riginal que corria pelo leito da g e raç ão hum ana,
p a ra que nele entrasse a Santíssim a V irgem sem co ntam i­
nar-se com as suas águas.
Além disso, m ostrou a sua grandeza ao fazer de M a ria
objecto de um a R edenção especial. — Fom os rem idos por
C risto, eis a nossa g ló ria ... M a ria porém se n ã o pecou, não
foi rem ida; logo, recebem os nós m ais de Jesus do que E la?
T em o s en tão um a glória su p e rio r à d Ela? — N a d a disso!
H á duas redenções; um a, liberativa. que lev a n ta os
caídos e dá vida aos que estavam m ortos pelo p e ca d o ;
deste m odo fomos nós rem idos. A o u tra é p re v en tiv a , a que
p revine p a ra que se não c a i a ; esta é a de M aria. Pela
virtude da R edenção de C risto e pelos seus m éritos divinos,
E la, M aria, alcançou a g ra ça de não c a ir... A sua R eden­
ção é pois, m ais perfeita do que a n o ssa; tam bém nisto
nos leva v a n ta g e m ... C om o é gran d io so este priv ilég io da
Santíssim a V irg e m ... assim c o n sid e ra d o !...

3-° --- P rivilégio divin o . — Só D eus pôde o p e ra r seiíie-


IhttnU* p ro d íg io dé form osura e de g ra ç a ... D eus coifto
O privilégio 29

legislador que é, está acim a de todas as leis; por isso só


E le tinha poder p a ra dispor desta lei universal. — E ste
privilégio é um a excepção que está fora do poder do homem,
não está ao seu a lc an c e ... Só D eus a pôde fazer. R ecorda-te
corno p o r meio de Josué, fez p a ra r o s o l; p o r meio de M oisés
dividiu as á g u as do mar, e por meio dos seus anjos impediu
que as cham as do forno de B abilónia causassem dano aos
três jovens h e b re u s...; esse mesmo D eus fez que as ág u as
do pecado se dividissem diante de M a ria Im aculada: é um
triunfo de D e u s... é verdadeiram ente divino este privilégio,
e um a glória divina da Im aculada Conceição.

4.“ — O nosso p riv ilé g io • —*• N ó s tam bém participam os


deste privilégio. N ascem os em pecado, porém tivem os a dita
de serm os b aptizados e as nossas alm as ficaram en tão p u ra s
e inocentes, sem elhantes à de M aria. A graça baptism al
tornou-nos form osos perante D e u s... por isso ao celebrarm os
com alegria e ao m editarm os com regozijo a C onceição Im a­
c u lad a de M aria, devem os celebrar e m editar o nosso nas­
cim ento à v id a d a g raça. P erguntem os a nós m esmos diante
deste exem plo m agnífico de M aria: « V iv o com aquela pureza
im aculada do meu baptism o? P e rd i-a ? ... N ã o a soube
a p rec ia r?» — P ede perd ão a M a ria c a sua aju d a p a ra v iv er
sem pre a vida de pureza e castid ad e do seu Puríssim o
C o ra çã o
7. M aria Im aculada — A sua form osura

M a ria em todos os seus m istérios e invocações é sem pre


a m esm a: a R ain h a da beleza e da fo rm o su ra..., m as é
dum m odo especial bela neste m istério da su a C onceição
Im aculada — todos nós consideram os nele assim . — M edi-
tem os pois n esta form osura.
P a ra a com preenderm os m elhor, aju d a p e rc o rre r as
belezas que D eus espalhou no m undo: a V irgem Santíssim a
so b re p u jará todas essas belezas criadas-

l.° — F orm osura da terra— -V ê a beleza da te rra ...


H o u v e tem po em que n a d a e x istia ... era o caos, a escuridão,
o n a d a ...
U m d ia porém disse D eus: fia t e apareceu a luz, o
firm am ento, as flores, as á rv o res, o sol p a ra o dia e a lua
p a ra a noite, os m ares com os peixes e os ares com as
aves, os bosques, os m ontes e os v ales com toda a espécie
de anim ais. D etém -te p o r algum tem po a considerar na
form osura e beleza deste conjunto da n a tu re z a ...; considera
to d a a sua variedade em flores, an im ais..., a su a ordem
adm irável, cada coisa com seu fim, com seu destino, ainda
que nós o ignorem os-
2 " —- F orm osura do P araíso Terreal. — T u d o quanto
D eus hav ia criado Lhe pareceu po u co ; e en tão se p a ro u na
mesma terra uma p arte na qual plantou um v erd ad e iro
M aria Im aculada 31

p a ra íso de d e líc ia s... m agnífico, esplên d id o ... nele reuniu


to d as as belezas da criação, os m ais belos m atizes em a n i­
m ais e p lan ta s; os m ais doces e sazonados f ru to s ...; o s rios
m ais fecundos e m ais p o é tic o s..., enfim todos os bens sem
m al a lg u m ... pois n a d a h av ia m au, n a d a h a v ia que fizesse
m al ou dano algum .
R ep resen ta este qu ad ro na im aginação o m elhor que
p uderes pois sem pre será m uito inferior àquela m agnífica
realidade-

3." — D a C riarão Insensível. — T u d o isto na criação


sensível. — M as, n a insensível que não vem os? Im agina,
se podes, o que se rá o céu. A quele p a ra íso m agnifico que
n ã o é um p a raíso te rre a l; a terra com parada com ele não
v a le n ad a. — L em bra-te daquelas p a la v ra s de S. P aulo:
nem os olhos viram , nem os o u vidos o u v ira m ...
P e n sa finalm ente que tudo o que é da terra é p a s s a ­
geiro e que tudo o que é do céu é e te rn o ... isto, terreno:
aquilo, celestial..., aqui é o cárcere e o exílio, lá a P á tria
e o lu g ar d a felicidade e da bem -aventurança. O que se rá
o c é u ! Q u a n ta s belezas não terá, m esm o prescindindo da
v isã o de iD e u s!
Q u a n ta s coisas lá h a v erá que nós nem sequer podem os
vislum brar ou im a g in a r!...

4 -"— O R ei da Criação. — E ag o ra peg u n ta: E tudo


isto p a ra que e p a ra quem é destinado? T o d a a criação
p a ra que foi destinada?
A terra foi d estinada p a ra o homem e o p a raíso terreal
p a ra o justo e inocen te..., isto é, p a ra um a c riatu ra que
bem depressa se ia rev o ltar contra E le e c o n tra as suas
o rd e n s... E o céu, a quem. era destin ad o 7 ... A os seus a n jo s...
aos seus cortesãos e m inistros entre os quais hav ia de encon-
Irar também traidores c ingratos que se revoltariam e deso­
bedeceriam a sua divina M ajestade, pretendendo na loucura.
n A sita form osura

d a sua soberba lan ç ar no S enhor fora d o seu tro n o fazen­


do-se eles deuses.
A. terra p a ra os hom ens, o céu p a ra os anjos!

5.“ — Beleza d e M aria. — C ontinua p e rg u n tan d o ã tua


alm a: se D eus p a ra d a r gosto aos hom ens e aos anjos
fez tais m aravilhas, que não faria p a ra d a r gosto a M aria
a quem am ava m ais do que a toda a criação ? Se p a ra seus
servos criou um tal palácio, com o o m undo, que faria para
hab itação e palácio de seu Filho que n ã o quis ou tro paraíso
senão o seio de M a ria? — R e p ara com o D eus trocou o céu
d e boa v ontade p a ra h a b ita r em, M a r ia .— Q u e pureza da ria
àquele san g u e que hav ia de co rrer pelas v eias de seu F ilh o ! ...
que carm im não d a ria àqueles lábios que tan ta s vezes iriam
beijar as faces de J e s u s !... que brilho n ã o com unicaria a
seus olhos que se iriam e x ta sia r contem plando os de seu
F i l h o ! ... que m ãos as que iriam su ste n tar o Rei da C riaç ão !...
Q u e pureza, que delicadeza, que ternura naquele c o raç ão ...
que excede em tern u ra o c oração de todas as m ã e s!...
C ontinua contem plando e ex tasiando-te p eran te a beleza
d e M a ria Im aculada e v erás que toda a form osura terrena
d e sa p are ce rá na p resença d e la ...
S. M a ria Im aculada — A S ua S antidade

T u d o qu an to ontem m editám os reduzia-se à beleza física


d a S antíssim a V irgem , mas, que com paração pode h a v er
com a form osura d a sua alm a?
D etenhám o-nos hoje a considerar a sua form osíssim a
alm a e tratem os de sondá-la um pouco-

1,° — A santidade na terra é a graça. — E quem a tem


em tão a lto g ra u como M aria? — D e quem se disse que
a possui na sua plenitude? U m a alm a em g ra ça é o m ais
belo espectáculo que se pode im ag in ar n a te rra ..., é a
imagem d a form osura do próprio D eus- — Q u e santidade a
de algum as g ran d es alm as que tem hav id o na Igreja de
D e u s !... a de S a n ta M ónica que soube form ar a de S anto
A g o stin h o ..., S a n ta Isabel que converteu a D eus todo o
seu reino... S a n ta T e re sa de Jesus a quem o S enhor disse
que só p o r ela cria ria o m undo com todas as suas m a ra ­
vilhas. — R ecorda o s nom es d e F ran cisco X avier, Inácio
de L oyoia, P a u lo d a C ruz, F ran cisco de Assis, S a n ta Cecília
que c o n v ersav a diariam ente com os a n jo s... S anta Inês que
não teve o u tra m ancha .mais que o san g u e que derram ou nas
aras d a v in g in d a d e ... e d esta m aneira m ilhares e m ilhares de
santos e sa n tas que perfum am todos os dias o jardim da
Igreja. Junta toda a santidade e toda a beleza e form osura
dessas a lm a s... e com para-a com. a de M aria, — E la n a sua

tàOàÍHIRQ DA SANTA CBOX


3 4 M aria Im aculada

C onceição tev e m ais santidade e g ra ça que todos os sa n to s


ju n to s ..., onde os o u tro s acabam , E la com eça. Q u e m ara ­
v ilh a será M a ria ? !

2. « — S a n tid a d e de M aria. — A ra zã o é porque to


com o diz S. jo ão , tiveram que ir la va r as suas vestes n o
sangue do C ordeiro. A h ! se tiveram que as la v a r é porque
estiveram m anchadas, pelo m enos d u ra n te algum te m p o ...
A alm a de M a ria, porém , não teve necessidade de ser lav ad a,
po rq u e nunca se m anchou nem mesmo ao de leve. — Se
tom am os um a ro sa num jardim , ainda que seja a m ais
form osa e a ro m á tic a... ao exam inarm os as su as p étalas,
vem os pó, m anchas ta lv e z ... talvez n o seu cálice se esconda
algum insecto, algum v e rm e ...
N o jardim da Ig reja acontece o mesmo. — H á m uitas
flores: açucenas de pureza, lírios de c an d u ra, rosas ru b ras
de am or divino, violetas de h u m ild ad e... etc-, m as todas
n a raiz têm o bicho, a b ab a d a serpente in fe rn a l..., sã o flores
de um jardim onde h á um a áspide que a todas in fec ta ----
M a ria é a única flor de p étalas brancas, sem p ó e sem
espinhos: ro sa d e h o rto fe ch a d o ..., m ais p u ra que o p ró p rio
sol, que tam bém tem m a n c h a s ...; p o r isso d 'E la diz a Igreja,
que « com parada com a luz é m ais p u ra e brilhante».
Q u e form osura a alm a de M a r ia !

3, ° — O am or é beleza e santidade da alma. — A


feita beleza d a alm a só no céu se pode e n co n trar. O am or
é união, é p a rticip a çã o de D eus e, quem a possui em m ais
alto g rau d o que M aria?
V ê com o os A njos, os Q u eru b in s e os S erafins se
ab rasam nesse fogo de carid ad e e am o r... C om o a m a r ã o ! ...
Q u a l será a sua form osura? ! ... D izem o.s ascetas e santos
que se víssem os a um anjo ju lgaríam os que era D eus e
m lorá-lo-íam os... que a su a v ista seria suficiente p a ra cau-
ditr-nos u m orte de a le g ria ... que poderíam os só com vê-lo-
A S u a Santidade 35

ser bem -aventurados p o r tem po ilim itado sem que nos can ­
sássem os de v e r aquele espectáculo. O que será um anjo!
—-C ontudo, isto n ã o é n a d a ... M a ria Im aculada p a rticip a
de D eus, tem m ais fogo de am or que todos eles juntos
_ porque afinal de co n ta s eles são servos e escravos de D e u s...
e M a ria é a M ãe do S en h o r e a R a in h a do céu e dos anjos
to d o s... O que será M a r ia ! ? ...
C o ntem pla-a com o a pintou M urilho depois de m uito
o ra r e com ungar. — P ro je ctad a num céu azul, envolta em
nuvens de m atiz azul tam bém , com as m ãos sobre o peito,
o o lh ar fixo e.m D eus, elevando-se p a ra o céu com o a quem
n ad a pesa o corpo, que a nós tan to nos a rra sta p a ra a terra,
pisando docem ente a lua, vestid a com a b ra n cu ra da neve
e o azul d o céu, p re g ad a s no seu m anto as estrelas, e
ro d ead a de anjos que com palm as e rosas nas m ãos con­
tem plam atónitos aquela b eleza; que re tra to tã o b e lo !...
e contudo M urilho foi o p in to r do re ra to ..., m as o p in to r
da realidade n ã o foi M urilho, nem pôde ser ou tro senão
o mesmo D e u s... e p o sto D eus com todo o seu p o d e r e
am or a p in ta r e a aform osear a alm a de M a ria, que quadro
terá fe ito ? ... O que será a Im ac u la d a ...
T o ta pulchra e s ... diz-lhe m u itas vezes com a alm a
e x tasiad a d ian te d E la ... Sois toda form osa, m inha M ã e ...
I-, D eus recreia-se todo em tão g raciosa b e le za ... C oncedei-m e
o p a rtic ip a r d essa fo rm o su ra... que me enam ore d essa beleza
de p ureza e v irg in d a d e p a ra assim im itar-v o s nalgum a
c o is a ...; e p a ra isso vos entrego desde ag o ra a m inha vida
<• o m,eu c o ra ç ã o ...
O lhai-m e com piedade, m inha M ã e ! .., e se me perm itis
que v iv a nos vossos braços, p a rticip a rei da v o ssa beleza
•• convosco irei gozar dela no c éu ...
9. Maria Imaculada — A Redenção

V ejam os hoje finalm ente com o a SS-'"’ V irg em tom ou


p a rte n a o b ra da R edenção hum ana com ]esus C risto, e
com o E la tom ou p a rte nessa obra, precisam ente p o r ser
Im ac u la d a .

1. ° — A O bra da R edenção. — A m ais im p o rta n te de


D eu s — m uito m ais que a c ria çã o -----P a ra c ria r b a sto u um a
p a la v ra ... p a ra rem ir-nos foi necessário que o F ilh o de D eus
em pessoa baixasse à te rra p a ra a realizar- — D e que m odo?
— d o m odo m ais hum ilhante p a ra D eus e m ais v a n ta jo so
p a ra nós. —• porque D eus ao hum ilhar-se n a R edenção não
só nos rem iu, com o tam bém encurtou a d istân cia que se p a ­
r a v a o hom em de D eus, e se fez igual a nós, p a ra 'que
fôssem os iguais a E le. — Q ue bondade ! Q u e am or ! Pois
bem , n esta o b ra tã o g ran d io sa e tã o v e rd ad eiram en te divina,
d e tal m odo quis o S en h o r associar a S S -,n" V irg em que
E la veio a ser a solução dos «dois conflitos divinos», com o
lhes cham a S a n to A gostinho, que pareciam insolúveis à
sa b e d o ria hum ana.

2. “ — P rim eiro c onflito divin o . — A ofensa do homem


tin h a sido, em certo m odo, infinita n a su a m alícia, porque
o ofendido era infinito e a ofensa depende d a pessoa ofen­
d id a - —-P o rta n to só um a o bra infinita podia d a r a devida
M aria Im aculada 37

sa tisfaç ão e ju sta re p a ra ç ã o a este pecado, — O b ra s infi­


n ita s ninguém as pode fazer senão D e u s ...; logo só E le
p o d ia rem ir o m undo. P orém a R edenção tinha de eíectuar-se
p o r m eio d o sacrifício que é a destru ição de um a coisa
em h o n ra de D eus, e p o rtan to , se D eus não pode sofrer,
nem m orrer, nem destruir-se, D eus não pode ser a v ítim a
o u a hóstia desse sacrifício- •— C onflito d iv in o ... Im possi­
bilidade a b so lu ta ...: p o r um a p a rte a v ítim a não- pode se r
senão D eus, p o r o u tra, D eus não pode ser v ítim a ... que
fazer? O n d e e n co n trar a solução?
— F o i necessário to d o o p oder da sab ed o ria de D e u s...,
to d a a san tid ad e e am or do E sp irito S an to — p a ra que p o r
seu m eio se levasse a cabo a m agnifica solução-
E com efeito, «nas en tra n h as puríssim as da Santíssim a
V irgem form ou o espírito S an to do puríssim o sangue desta
V irgem um corpo perfeitíssim o», e tc ... M ed ita d e v a g a r e sta s
p a la v ra s do catecism o e v e rás como a solução de tudo, foi
a Santíssim a V irgem M ãe de D eus, em cujo seio o V e rb o
se fez carne. — Já D eus tem M ã e ; já tem corpo que E la
Lhe deu, e sangue p a ra oferecer pela redenção d o m u n d o ...;
já pode efectuar-se a R edenção, g ra ça s a M aria-

3-° — S e g u n d o conflito. — E sta v ítim a porém , tinha de


ser sem pecado, po rq u e ia rem ir o m undo e p a g a r pelo
p eca d o ---- M a s se essa vitim a tom asse a carne e sangue d e
M aria, seria um a vítim a hum ana, com o nós, e nós nascem os
em pecado. Tam bém , aquela vítim a n asceria como nós em
pecado? —• N ã o p o d e ser, seria absurdo.
E n tã o com o resolver esta dificuldade? — Só há um a
so lu ç ão ... que supõe um m ilagre inaudito, um privilégio
s in g u la r...; e, com o p a ra D eus não há im possíveis... assim
<> quis e assim, fo i... E M aria Im aculada, concebida sem
pecado, é a solução que dá a D eus a carne p u ra e o sangue
lím pido que pode ser vítim a san ta do sacrifício da Cruz-
P o r C risto som os rem idos, m as C risto redim e-nos p o r
38 A R edenção

m eio de M aria Im aculada. G lória ao R ed en to r! G lória à


C o rre d e n to ra !
P o r isso, M a ria que tão grande p a rte teve na obra
d a R edenção não podia fa lta r quando se levou a o term o
n a C ruz essa R edenção divina. E se n ã o e sta v a presente
com seu Filho nas p re g aç õ es apostólicas, se n ã o foi teste­
m u n h a de todos os m ilagres nem O acom panhou nas suas
o b ra s de triunfo, não faltou n a hora do sofrim ento, e tão
u nida com Jesus C risto que, ao sofrer Jesus as dores ag u d as
dos espinhos, dos açoites, o golpe da m orte, tudo isso E la
aii presente, so fria no seu coração, bebendo com Jesus até
à s fezes o C álice d a P a ix ã o ..., unindo-se com E le na A ra
d a C ruz com o duas vítim as de um m esm o sa c rifício ...,
com o d u a s hóstias que se im olam no m esmo a lta r... H óstias
e v ítim as a g rad á v eis a D eus por serem santas, puras,
im aculadas-
D á g ra ça s à Santíssim a V irgem ao vê -la assim coope­
ra n d o tão eficazm ente na nossa sa lv a ç ã o ... e ao v e r como
a so lu ção de tudo, é a sua p ureza im aculada, am a cada
vez m ais esta p reciosa v irtu d e tanto do a g ra d o de D eus
e tão querida da Santíssim a Virgem -
10. Natividade de Maria

1 . ’ — O nosso nascim ento. — É celebrado e festejado


o dia d o nosso nascim ento com o d ia de alegria. É costume
d e fam ília o a leg rar-se com o nascim ento dum a c ria n ç a ...,
e cam m aior ra zã o se é o prim eiro filho... que a leg ria! que
felicitações não recebem seus p a is ! ... e no entanto, quantas
vezes deveriam c h o rar! Q u a n ta s vezes n ã o há mais m otivo
de pêsam es que de fe licitaç õ e s!— P e rg u n ta d iante de um
berço de um a criança recém -nascida, que futuro a espera
e tudo sã o respostas cheias de d úvidas e in ce rte z as... Lima
só coisa podes a sse g u ra r com certeza e é que terá que
so fre r---- N inguém a ensina a c h o ra r.... e é a única coisa
que ap ren d e sem m estres, e essas lágrim as jam ais se secarão
nos seus olhos e no seu coração.
E n a ordem espiritual? A contece o m esm o...: não há
razão p a ra p arab én s e felicitações. — A penas com eça a
v iv er e jái é e scrav a do d em ónio..., m anchado pelo pecado
ainda que p areça in o ce n te..., p riv ad o do c é u ...: se naquele
m om ento m orre, o céu n ã o será p a ra ele-
— R eceberá o baptism o e com ele a g ra ç a ; p o ré m ...
quanto tem po estará em g raça? P ode assegurar-se bem
quanto tem po lhe d u ra rá a in o cê n cia ...: até que lhe des­
ponte o uso d a ra zã o : logo e n tã o com eçará a pecar- —
fá notaste com o se conhece que já tem uso da razão>-----
Precisam ente porque já tem m alícia p a ra p e c a r... Q ue pena!
40 N a tiv id a d e dc 'Maria

m as é assim. — P ensando bem, não h á n ad a m ais triste que


o nascim ento de um a c ria n ç a ... A dor, as lágrim as, a incer­
teza, o p e ca d o ... a concupiscência cercam o seu b e rç o ...
O n d e está o m otivo de nos a le g ra rm o s? ...

2. ° — Com o procede a Igreja. ■— A Ig reja procede de


um m odo com pletam ente d ife re n te .— N u n c a celebra o n a s­
cim ento de seus filhos com o o m undo; pelo contrário,
quando o m undo no dia da m orte se veste de luto, ela
alegra-se. V ê com o e,m todos os santos se com em ora o
dia da sua m orte que é cham ado o dia «do nascim ento
p a ra o céu» e se estabelece nesse dia a sua festa: ao
contrário, p assa em silêncio o dia em que veio ao m undo-
—* P rin cíp io s diam etralm ente opostos. — O m undo con­
sidera as coisas cc,m olhos terrenos e celebra a e n tra d a na
vida- — A Ig reja atende sobretudo à vida celestial e não
lhe im porta o nascim ento n a terra, senão no céu- — Q uem
terá pois m ais razão? — C onvence-te de que o ponto de
v ista d a Ig reja é o v e rd a d e iro ...; o dia em que se nasce,
é dia em que com eça a dor, a enferm idade e a morte- —
N ascem os condenados a m orrer e a padecer. — N o dia da
m orte com eça a vida v e rd ad e ira que não terá m orte nem
fim ..., nem dores, nem so frim en to s..., senão um a eternidade
ditosa, feliz e bem aventurada- — E sta, a v erd ad e ira vida.
O nascim ento p a ra esta vida eterna é o único dia digno
de ser celebrado-

3. ° — ■Nascim ento da S S . ’“’ V ir g e m • — E ssa é a regra


g e ra l---- - H á porém um a excepção- — A p ró p ria Ig reja a
reconhece. E la que nunca celebra o nascim ento terrestre
de seus filhos, chega a um m om ento em que, p o r excepção
e x tra o rd in á ria, se veste de alegria, transform a-se e m ani­
festa-se em grandes efusões d e tern u ra e contentam ento,
que não pode reprim ir, e estabelece um a festa especial para
celebrar um nascim ento: o nascim ento da Santissim a V ir-
N a tiv id a d e de M aria 41

gem ! —'A m ulher p red estin ad a p a ra ser M ãe de D eus a p a ­


rece sobre a terra com. a alm a sa n ta e im a c u la d a... com a
mesma p ureza e san tid ad e com que saiu das m ãos de D e u s...
e a sua vida terre n a é vida de g ra ç a ..., n ã o é só vida
celestial, m as verdadeiram ente divina. — P o r isso, a Igreja
celcbra-a e c o n vida-nos a celebrá-la com estas p a la v ra s:
<Com grande aleg ria celebram os a n ativ id ad e da Santíssim a
V irgem M aria, pois o seu nascim ento encheu de alegria todo
o universo». A le g ra-te e corre a felicitar a tua querida
M ã e ..., a única que m erece ser felicitada em seu n a sc i­
m en to ..., a única que traz com a sua vida terren a o gérm en
da vida da g raça p a ra si e p a ra todos nós-
11. Natividade de Maria

A N a tiv id a d e d a Santíssim a V irgem constitui um


m otivo de alegria universal p a ra a terra e p a ra o céu. —
C om o seu nascim ento alegram -se D eus, os anjos, os santos
e to d a a Igreja.
1 .“— G o zo d e D eus- — É a o bra prim a das suas mãos.
— Diz; o G énese, que a o v e r D eus as coisas que tinha criado
L he p areceram m uito boas e se regozijou com e la s; como
não gozaria ao contem plar M a ria !
P e n e tra m ais a in d a neste pensam ento. — R ecorda ccino
o hom em pecou e nele toda a criação tran sto rn a n d o o plano
de D eus. — Já não podia o Senhor v e r com gosto a te rra ...,
n ã o tinha onde p o u sar seus o lh o s... P o r toda a p a rte se tinha
estendido o reino do pecado.
— A p arece então M a ria e tudo m uda. V olvidos quatro
mil anos D eus to rn a a v e r bela a criação, a terra, os
hom ens1... ; já não a p a rta a sua v ista deles com asco e
rep u g n ân cia. V ê novam ente a su a im agem perfeita e p ura
em M a ria e p o r E la contem pla a sua im agem re sta u ra d a nos
hom ens.
Q u e m otivo de gozo p a ra D eus o nascim ento de M a ria !
Q u e a le g ria ao contem plá-la tão pura, tão san ta, tã o cheia
d e g raça!
V ê o P ai E tern o regozijando-se com o nascim ento da
su a F ilh a p re d ile c ta ...; o Filho ao v e r já na terra aquela
N a tiv id a d e de M aria 43

a quem iria d a r o nom e suavíssim o de M ãe como a con­


tem plaria e se re g o zija ria n E l a l . . . O E sp írito S anto que
tan to em penho teve em que esta m enina ainda pequenina
tivesse já m ais graça, form osura, p ureza e santidade que
todos os san to s juntos, com que imenso carin h o e am or foi
colocando um a p o r um a todas as v irtudes no coração da
su a E sposa q u e rid a ! — P e rco rre-as e v erás como todas elas
a li se encontram -

2 ’ — G o ro dos anjos. — D epois de D eus e juntam ente


com Ele, alegram -se o s a n jo s-----Já n ascera a sua R ain h a
e Senhora, aquela que depois da divindade, constituirá o
espectáculo m ais belo do céu ---- C om para essa M enina com
to d as as belezas do céu e reconhece que depois de D eus
nenhum a pode c om paprar-se com E la, R ecorda a rebelião
de L úcifer no céu. P arece que foi p o r D eus lhes ter feito
v e r que um dia teriam de a d o ra r seu Filho feito homem,,
e reconhecer com o sua R ainha a M ãe desse Filho, que
a soberba de L úcifer julgou ver-se hum ilhada perante essa
m ulher a quem co n sid erav a inferior, e não quis subm eter-se
a essa prova, lançan d o o g rito de rebelião que arra sto u
tan to s o utros anjos a o inferno. R e p ara pois no dem ónio
cheio de ra iv a e desespero, vendo que M a ria é in co m p ara­
velm ente m ais form osa do que eie tinha sid o ; e nota p o r­
tan to a falta de razão que teve ao rcbelar-se daquele modo-
P o r o u tra p a rte considera os anjos bons, regozijando-se
a g o ra m ais do que nunca de terem sido fiéis a D eus, pois
em prém io não recebem nenhum a hum ilhação, m as é um a
glória p a ra eles te r M a ria com o R ainha, V ê com o estão
felizes e im pacientes, não podendo conter seu entusiasm o
e baixando em legiões junto do berço de M a ria ,.., querendo
toclos ser os prim eiros a oferecer-lhe suas hom enagens- —
A o contrário, ouve os rugidos que lança a serpente infernal
ao sentir sobre a sua cabeça o peso de um pé que a esm aga,
e ao ver que esse esm agam ento, que tan to a hum ilha será
44 N a tiv id a d e de M aria

e te rn o ; ela, com todo o seu orgulho, eternam ente esm ag ad a


pelo delicado pé de um a donzela. Q u e v e rg o n h a! Q u e
h u m ilh a ç ã o !

3-° — G ozo dos santos no Lim bo. ■ — P o b res alm as, aque­
las que estavam en cerrad as naquele desterro do Seio de
A b r a ã o ! —'A p e s a r de serem alm as ju stas e san tas, não
podiam go zar d a glória do céu- — V ê -a s ; são as alm as dos
g randes P a tria rc a s, P ro fetas e todas as figuras excelsas do
A ntigo T estam ento.
— Séculos e séculos p a ssa ram e o dia da liberdade n ã o
chegava. Q u e longas se tornam as horas, que eternos sã o
os dias quando se espera com. anseio um a coisa que n ã o
aca b a de c h eg ar! qual não seria pois a ânsia daquelas alm as!
P ois b e m ; contem pla-as no dia de hoje quando o S e n h o r
lhes com unica que já chegou à te rra a M ulher p re d e stin a d a ...
que já nasceu a M ãe do M essias prom etido e p ro fetiza d o ...
que enfim já existia aquela que com seu F ilho h a v ia d e
d ar-lh es a liberdade. Q uem po d erá explicar o gozo, o s
cânticos de agradecim ento que entoariam ao S enhor e, a o
m esm o tem po, de louvor e de b oas-vindas à Santíssim a V ir­
g e m ? !—■A g o ra sim que ia so a r a h o ra ..., m ais algum tem po
de p risã o e em seguida a liberdade e te rn a ... porém essa
liberdade trazid a p o r um a M enina en can tad o ra que a ca b av a
de nascer.
A b ra sa -te de entusiasm o ao ver este gozo tão g ra n d e
em D eus, nos anjos e nos justos, e urna vez m ais u ne-te
a eles p a ra juntam ente can tare s louvores perante o berço
form osíssim o de M aria-
12. Natividade de Maria

Se é grande a alegria de D eus e a dos anjos no n a s­


cim ento de M aria, n ã o deve ser m enor a nossa, porque
enfim é de nós que está m ais p erto a Santíssim a V irgem
p o r ser da nossa m esm a n a tu re za e p o r serm os nós os que
m ais havem os de p a rtic ip a r dos benefícios do seu ditoso
nascim ento.

l.° — A nossa alegria. — O nascim ento da SS-"'“ V irgem


é o fim d a triste n o ite ..., noite de séculos em que jaz ia sep u l­
ta d a a h u m an id a d e... Isaías dizia que e stav a nas som bras
d a m orte, pois tão triste era essa noite d o pecado, que
n ã o h á n a d a com que possa com parar-se senão com as
n eg ras e terriveis trev a s da m orte-----C ontem pla o desfilar
de toda a hum anidade, sem v e r nem um só ra io de lu z....
no meio dessa e sc u rid ã o -— Com o é triste a noite! — Q ue
seria um a noite d e m uitos dias, de m uitos anos, de sé c u lo s !...
E u l meio d essa noite brilhavam com o estrelas as alm as boas
com resplendores de sa n tid a d e..., porém toda essa luz junta,
era n a d a ... era insuficiente p a ra d issipar as trevas.
V ês o que se p assa com as estrelas num a noite escura? ...
N ã o é possível com a luz que elas dão fazer n a d a ...; não
podem os d a r um p asso s e g u ro ; tudo tem que ser a ten tear
e com m uito m edo de tro p eç ar e cair-
M as se no meio da escuridão vem os a luz da au ro ra
46 N a tiv id a d e de M aria

que se estende cada vez anais e aum enta a sua claridade


e a sua luz, ah! então sim, que sentim os a aleg ria e o gozo
que traz consigo a a p ariçã o da luz e do sol- — A ssim , assim
a p are ce u M a ria no m eio daquelas trev a s de m o rte ..., com o
a a u ro ra de D e u s..., como a su av e a lv o ra d a depois da qual
v iria logo a seguir a luz do scl divino a alum iar toda a terra .
A o v ir a luz d a a u ro ra as feras e as alim árias no ctu rn as
fogem e escondem -se nos seus covis ao p asso que as avozi­
nhas inocentes cantam e trinam , as flores p u ra s abrem os
seus botões e exalam os seus arom as e todas as coisas se
vestem de cores belas. — Assim, ao na sc er M a ria, os. dem ó­
nios fogem ..., os anjos cantam , as virtudes florescem e todo
o m undo se ilum ina e se alegra. — Q ue belo! Q u e poético!
Q u e m agnífico foi esse am anhecer!

2.“ — A ftta alegria■— E tu em p a rticu la r n ã o hás-de


p a rticip a r desta alegria? O que sucedeu no m undo não se
repete no coração de todos os homens? ... N ã o o sentes
tu no teu? — N ã o vês essas noites de p e c a d o ... essas som ­
b ras de m orte inundando o teu coração? E não v ê s a luz
que pode ilum inar-te, que pode guiar-te, que é C risto e que
te vem p o r meio de M aria?-— N ã o sentes com o é E la a
a u ro ra da tu a vida?
im a g in a um areal seco, sem flores, sem p lan tas, sem
v id a ...; m as se nele encontram os um oásis de p ressa su rg irá
um a palm eira com os seus ram os e com os seus frutos-
V ê um a vid eira estéril e agreste que não produz senão
u v a s a m a rg a s ...; m as se nela enxerta um ram o bom
p ro d u z irá frutos b o n s-----E assim a tua a lm a ..., um areal,
um sarm ento se c o ...; se pode pro d u zir algum a coisa é g raças
a e star e n x ertad a em C risto, p o r meio de M a ria. -— Sc não
6 te rra estéril, é pela Santíssim a V irgem que sem eia no teu
c o raç ão esse oásis dulcíssim o dé Jesus.
kVcordu aquela nuvenzinha de E lias, im agem de M a ria
fecundou aquela terra seca e a fez p ro d u z ir... Assim
N a tiv id a d e de M aria 47

fecundou M a ria a te rra : p o r meio dela b ro tara m açucenas


de v irg e n s..., lírios de c astid ad e ..., ro sa s de puríssim o
a m o r...; e assim b ro ta rã o tam bém no teu c o raç ão ---- M as
n ã o o esqueças: só com E la e p o r Ela- — Sem E la, te rra
se c a ..., a rea l e sté ril..., ram o p o d re ... C om o deixar de te
a leg rares neste nascim ento tão glorioso e tão benéfico p a ra
a tua alm a?!

3." — A n te s d e Jesus vem sem pre M aria. — Finalm ente


este nascim ento recorda-nos esta dulcíssim a v e rd ad e : que
M a ria vem sem pre antes de Jesus. D eus quis que na n a tu ­
reza n ã o nascesse o sol de repente m as que o precedesse
a form osa luz da a u ro ra ---- O mesmo quis na ordem da
g ra ç a ---- - N ã o quis que aparecesse no m undo o V erb o feito
carne, sem que viesse antes com o esplêndida au ro ra , a
m enina, R ain h a dos anjos, concebida sem m ancha. ■ — N ão
quer que saia e brilhe o sol de Justiça, C risto Jesus, sem
que antes nasça nas alm as espiritualm ente, a M ãe cia G raça-
— N ã o quer enfim estabelecer o seu reino neste m undo
sem que antes tenha nele o seu trono, M aria- — M aria,
po rtan to , é sem pre a a u ro ra de Jesus---- N ã o te lances a
conhecer e a am a r a Jesus sem e stu d ar bem a fundo e am ar
com carin h o filial a M a ria . — E x am in a-te pois neste ponto
tão in te ressa n te ... V ê se realm ente e pràticam en te fazes tudo
com M aria e p o r M aria p a ra d a r gosto a Jesu s... se sabes
im itar a M a ria e esvaziando-te de ti, encher-te dela, p a ra
assim poderes rev estir-te e encher-te d a m esm a vida divina,
que Jesus quer d a r à tu a alm a.
13. O nome de Maria

!■ '— Im portância d o nom e. — É um dos prim eiros actos


q u e se realiza quando nasce um a criança, o dar-lhe um nom e.
— T o d o s lem bram com carinho a festa do seu nome e
costum a celebrar-se com solenidade sem elhante, e por vezes
ain d a m aior, do que a do dia do an iv e rsá rio natalício-
É um a das festas da fam ília em que ao celebrar-se o santo
nom e do p ai ou da mãe, se m anifestam m ais as suavíssim as
expansões e alegrias p ro fu n d as dos filhos-
R ecorda estas festas e as que com m otivo do santo do
teu próprio nome terás c e le b ra d o ...; felicitações, obséquios,
presentes, v isita s... etc., tudo isto é p róprio deste d i a .—
P o is bem, hoje m editam os a festa do nom e de M a ria ....
a festa do dia do san to da Santíssim a V irg e m ... G ra n d e
dia. grande festa deve ser p a ra os seus devotos, p a ra seus
filhos am ados!
P ensa, além disso, que a im portância do nome depende
d a conform idade com a pessoa, isto é, que q u an to m elhor
a rep resen tar, m ais adequado será aquele nome. — N o mundo
m uitas vezes dão-se os nom es p o r capricho dos pais. por
lem branças de fam ília... nunca se atende a que seja digno
e represente adequadam ente a p e sso a -—■Porém cm M aria
n ã o foi assim. — N ã o era conveniente que se lhe impusesse
qualquer nome senão um que reunisse todas as gra ça s e
m aravilhas que D eus h a v ia encerrado n ’Rla- — P o r isso
O nom e de M aria 4 9

ninguém podia dar-lhe um nome com pleto e adequado senão


o p ró p rio D e u s... E esse nom e é M a ria!

2-" — G randeza deste nome. — Já se com preende qual


se rá esta g ra n d ez a se o próprio D eus é o a u to r dele----
T a n to mais. que D eus nos deu nele como que um resum o
d o que é a Santíssim aV irgem - — Q u a n d o o S enhor escolhia
a alguém p a ra algum a coisa de extrao rd in ário , o que p ri­
m eiro fazia era m udar-lhe o nom e, p a ra que esse novo nome
que E le lhe d a v a correspondesse ao altíssim o fim a que
d e stin a v a essa pessoa. — Assim m udou o nom e de A b ra ã o ...,
im pôs o nome de Isa a c ... por meio dum anjo, indica a
Z a c a ria s como se ch am ará o P re c u rso r e lhe diz que será
Jo ã o ...
O mesmo J. C risto ao fu n d ar a Ig reja e ao eleger
e n tre os A póstolos o que será sua cabeça e fundam ento,
Sim ão, tam bém lhe m uda o nome e lhe cham a P edro. —
A g o ra p e rg u n ta a ti mesmo, que vale a dignidade e im por­
tância do ofício confiado a A b raão , a Isaac, ao B aptista
e a S. Pedro, em co m p aração com a dignidade e com o
destino de M a ria ? — Q uem pode, pois, dar-L he um nome
digno desta g ran d eza senão o próprio D eus?
N ó s podem os cham ar-nos de m uitas m aneiras, e com o
a g o ra p o r v ontade de nossos p ais tem os este nom e actual,
podíam os ter o u tro m uito d iferente---- Porém com a S a n ­
tíssim a V irgem não foi assim ..., cham ou-a M aria e não
pôde ter o u tro nom e, porque o próprio D eus não encontrou
o u tro m odo m elhor de A cham ar. — V ê, pois, que .magnífico,
que sublim e não é este santíssim o e dulcíssim o n o m e !
E m certo m odo pode dizer-se que vale tanto quanto
a p rópria S S .m" V irgem , pois que a E la representa- — P o r
isso o E v an g e lh o que tã o poucas p a la v ra s diz da vida de
M aria, não om ite este porm enor de tan ta im portância e
expressam ente diz: e o nom e da V irgem era M aria. A ssim ,
afirm a S , P edro D ahiião que o nom e de M aria fo i tirado
50 O nom e de IM aria

desde toda a eternidade do s tesoiros da própria D iv in d a d e ,


quando no céu fo i decretada a R edenção m ediante a Incar­
nação do Verbo-

3 .° — U tilidade. — T ira pois p o r conclusão com o d e v e ­


m os re sp eitar e v en erar este santíssim o nom e e com o depois
do nom e de Jesus não h á o u tro nem mais santo, nem mais
doce, nem m ais útil p a ra nós que o nome de M aria.
Se o nom e de Jesus é santificador, tam bém o nom e de
M a ria nos santifica se souberm os pronunciá-lo com o res­
peito e am or que merece.
— E aqui está porque depois do nom e de D eus e do
de Jesus, o nome de M a ria é o m ais p o p u lar de todos. ■—■
A s M ães ensinam -no a seus filh o s..,, os doentes e atribu-,
lados assim A c h am am ; o s m oribundos, deste m odo A invo­
cam ... Q u a n ta s igrejas, q uantas erm idinhas lev a n tad a s em
todo o m undo em ho n ra do nome de M a r ia ! ... Q u e p e ca ­
dores convertidos só com esta in v o c a ç ã o !... Q u a n to s m ila­
gres realizados com a invo cação do nom e de M a ria !
N a d a h á m ais doce às alm as santas, nem m ais p ro ­
veitoso às pecadoras, do que ju n ta r estes dois nom es ben­
ditos de Jesus e M a ria e pronunciá-los e invocá-los m uito
a m iúdo p a ra acostum ar-se a tira r deles a im ensa utilidade
que a sua frequente repetição traz às almas-
F azes assim tu? P ro c u ra s e stu d ar a im portância e a
grandeza divina deste santíssim o nome? — D i-lo m uitas
vezes com verdadeiro fervor, especialm ente nas tentações,
dificuldades, con traried ad es e desgostos da v id a ? — P r o ­
curas sobretudo tê-lo bem g ra v ad o no fundo do teu
c oração ?...
14. O nome de Maria

Sc este nom e n ã o nos pode ser indiferente, antes deve


interessar-n o s m uito sab er conhecê-lo e pronunciá-lo com
fervor, é m uito im portante que nos detenham os a e xam inar
e a m editar o que ele significa. — É difícil a ce rta r com o
seu verd ad eiro sig n ificad o ... D ão-se mais de trezen tas signi­
ficações dele, e foi p rovidência do S enhor que significasse'
m uitas coisas e to d as m uito boas, p a ra dar-n o s a entender'
que na Santíssim a V irgem se reunem todas as excelências'
e perfeições. — D e to d as estas interpretações vejam os a s ;
m ais p ro v á v eis que são as seguintes:

1 ." — Form osa. — M elhor ainda, «a F orm osura», por


excelência, com o se quisesse significar que só E la é «a
form osura» e que qualquer o u tra fora d 'E la n ã o ex iste -
senão na aparência. — «Form osa com o a lua», can ta a Ig reja ;'
porque assim como nas trev as da noite, onde tudo é feio
e triste, aparece a luz plácida, serena e bela da lua. re a l­
çando no m eio d a s trev a s e brilhando m ais que todas as
estrelas ju n ta s... assim M a ria destaca-se e eleva-se pela'
sua bran ca form osura e com unica-a a todos os que d 'E !a '
querem participar.
A Ig reja tam bém a c h a m a — T o ta P u tc h ra .— T o d a '
form osa, pois que n ’E la não há n ada que n ã o seja form oso ; 1
seu corpo, sua alm a, seus olhos, seus sentidos, seu c o ra ç ã o ...
52 O nom e de M aria

tu d o ; porque n ’E la não há n a d a feio, o u m anchado com


a lg u m a coisa que em bacie essa form osura. — P e n sa n o que
o m undo cham a form oso e c onvencer-te-ás d e que ele nem
sequer conhece a som bra d o que é a form osura. A um a
b eleza corporal, m uitas vezes artificial, sem pre aparente, pois
a p e n a s é um a coisa e x te rio r e n a d a m ais... a isso cham a
ele fo rm o su ra ...; com essa form osura se c o n te n ta ..., não
conhece o u tra. A o co n trário , olha p a ra M a ria e a todo o
m om ento a v e rás form osíssim a, e T o d a F orm osa. Q u e bem
q u a d ra este nom e a M a ria, se o significado de M a ria
é e s te !

2 ." —. Sen h o ra e D o m in a d o ra ---- E é de facto v e rd ad e ira


S e n h o ra -----N u n c a foi e scrav a, nem se rv a do dem ónio...
d o p e c a d o ... das paixões. E sc ra v a só do S e n h o r..., e por
isso m esm o R a in h a e Senhora. — O p o v o c ristã o assim o
entende e p o r isso a cham a N o ssa S e n h o ra ■— R ecorda
com o é S en h o ra dos anjos, que se gloriam d e p o d e r ser-
v i-lA -----E les foram m uitas vezes seus se rv o s; na A n u n c ia ­
ção , n a fugida p a ra o E gipto, n a g ru ta d e B elém ... no
m esm o C alvário, anjos de d o r foram a am p ará-lA e a
c h o ra r com E la -----E dom inadora dos p ró p rio s dem ónios
que a temem só com ouvir-lhe o nom e. — A este santo
nom e ajoelham o s céus, a te rra e os abism os. — O dem ónio
tem e a Senhora, ain d a m ais do que a Jesus, pois assim
quis D eus p a ra que a hum ilhação fosse m aior e m ais adm i­
rá v e l o triunfo de M aria-
E , finalm ente, S e n h o ra dos hom ens. M as senhora e
R a in h a d e M isericó rd ia-----Jesus dividiu o seu reino e o seu
cep tro , e ficando E le com a justiça, com o Juiz que é dos
v iv o s e dos m ortos, deu a M a ria o po d er d a M isericórdia.
— A sua g ran d eza e m ajestade não ofende, n ã o a te rra ;
pelo co n trário , a rra sta am orosam ente m as com força ainda
que seja m uito su av e esta força. — V ê se n ã o sentes em, ti
isto mesmo ao p ro stra r-te aos pés d esta grande Senhora.
O nom e de M aria 53

P o r isso é R ain h a e S enhora dos corações. — N inguém sen ão


E la, tem d ireito a m an d a r nos nossos corações*
E x am in a se é E la que realm ente m anda e dispõe, com o
S enhora ab so lu ta do teu coração-

3.“ — M a r e E strela d o IM a r---- O m ar é o conjunto de


■todas as á g u a s da te rra e do céu que caiem por m eio d a
chuva e a ele v ã o p a rar.
A ssim , diz o G énesis que ao c ria r D eus a terra, reuniu
to d as as á g u a s num pon to e cham ou-as — M ar- — D o m esm o
m odo sucedeu com M a r ia ; to d as as graças que o S e n h o r
re p a rtiu pe la s criatu ras, anjos e hom ens, reuniu-as em M a ria
— e p o r isso, é o m ar de gra ça s onde se encontram to d as
as que queiram os buscar.
D o m ar se levantam as nuvens, que logo caiem em
form a de chuva a fecundar a te rra ; assim d erram a M a ria
do O cean o im enso das suas g raças, as que fazem fru tificar
as alm as em v irtu d e e san tid ad e. A s á g u as do m ar sã o
am argas, com o foram, am arg as as penas d o C o ra çã o de
M aria, v e rd ad e iro m ar de am arg u ras, pois sofreu m ais do
que todos os corações juntos, n a P a ix ã o de seu F ilh o -----
P o r isso, se cham a a R ainha dos M ártires, p o r ter padecido
m ais que todos eles.
F inalm ente, é E strela do M ar, po rq u e é a luz que guia
os nav eg an tes deste m ar do m u n d o ..., d o m a r das paixões,
que é no que m ais fàcilm ente podem os n a u fra g a r..., n o qual
navegam os geralm ente às escuras, pois que a todo o ins­
tante nos cega o am or p ró p rio te a força da p aix ão dom i­
nante. — E la é a E strela que está no alto p a ra que sem pre
a possam os v e r ..., p a ra que a possam os e ncontrar sem pre.
— P o r isso a colocou D eus tão alto, p a ra que de q u a lq u e r
p arte a v e ja m o s; m as tam bém p o r isso mesmo, n ã o a pode­
mos v e r sem levantarm os os o lh o s..., q uanto m ais os
ab aix ares p a ra veres as coisas d a terra m enos a encontrarás.
—• V ês com o fica bem à V irgem Santíssim a este nom e em
54 O nom e de M aria

todos e em cada um destes sig n ific a d o s! —- C om preendes,


po rtan to , porque só a E la convém nom e tã o excelso?— T r a ­
b a lh a p o r im itá-lA e té-lA sem pre presente, re p etin d o sem
c essar este dulcíssim o nom e, com o se gosta de re p etir o
nom e dum a pessoa que se ama.

rfi
15. Apresentação de Maria

T e rn o e delicado é este m istério d a vida da Santíssim a


V irgem , como sum am ente p rá tico pelos g ra n d es ensina­
m entos que encerra p a ra a s nossas alm as.

1.“ — P ro n tid ã o em seguir a vocação de D eus.-— E is


um dos m ais adm iráveis ensinam entos d esta passagem da
v id a da SS."’“ V irgem . — C ontem pla a V irgem Santíssim a,
criancinha, na idade de trê s anos, a d esprender-se dos braços
de seus pais, a su b ir correndo o s d e g rau s d o T em plo, sem
v o lta r sequer a v ista p a ra trás e a oferecer-se a o serviço
de D eus no S an tu ário . — Q u e cena e n c a n ta d o ra ! A os três
a n o s! — A p ro fu n d a bem isto ... Q u e pressa tem a S S .““ V ir­
gem em se c o n sa g ra r ao S enhor! P o r um m ilagre excepcio­
nal, M a ria n essa idade, tinha todo o uso d a razão, e com
essa razão, deliberadam ente, dando-se conta do que fazia,
aos três an o s! v ai a o T e m p lo .— N ã o tinha perigos em casa,
que era m ansão d e santos. — N ã o aten d e à sua tenra idade
em que são ain d a tão necessários os cuidados de um pai
e sobretudo d e um a m ãe. — N ã o pensa n a d o r que v ai c a u sa r
a seus p a is ... nem a p re o cu p a o n o v o género de v id a que
desconhece. — T u d o isso são razões da pru d ên cia h u m an a ...
E la ouv iu a voz de D eus e im ediatam ente co rre a segui-la,
qu an to antes m elhor! — T u d o lhe p arece dem asiado tard e
56 A p resen ta çã o de M aria

e p o r isso, sobe co rren d o os d egraus do san tu ário . Q u e


lição de fervor nos d á esta m enina!
C o m para-te com E la e vê se assim serves tu o Senhor.
Q u e fazes com as inspirações e cham am entos de D e u s ? ...
S egues com pro n tid ão esses cam inhos am orosos? ... L a n ­
ças-te assim às cegas, sem p en sar em n a d a, confiadam ente,
sem p reo cu p ar-te com n a d a ... como M a ria nos b raço s d o
Senhor e deixando a E le o cuidado d e todas as co isas?—
Q u a n d o chegarem os a este desprendim ento d e tu d o ... a té
de nós m esm os... do nosso m odo de v e r as c o isa s.... do
nosso p róprio p a re c e r... p a ra proceder só com o D eus
quer !...

2.° — A consagração d e 'M aria.-— P e n e tra no T em plo,


oferece-se a o S enhor e a ele se c o n sag ra p a ra se r toda
sua, e p a ra sem pre. — Com o fa ria a Santíssim a V irgem
esta c o n sa g ra ç ão e com o se a g ra d a ria d 'E la o S enhor! —
R e co rd a as vezes que tu tam bém tens dito algum a coisa
de sem elhante a D e u s... Q u a n ta s vezes te tens con sag rad o
a E le ! ... e tam bém lhe dizes que qu erias que a tua alm a
fosse to d a sua e p a ra sem pre. — Porém , que d iferença en tre
as tu as p a la v ras e as de M a ria ! — A s tu as terão c ausado
ao S en h o r m ais de um a vez grande pena, ao v e r quão
m al cum pririas o teu oferecim ento. — A o contrário, que
h o n ra p a ra D eus n ã o d e riv a ria d este oferecim ento tão p e r­
feito com o foi o d a S antíssim a V irgem — to ta l e p e rp étu o !
C onsidera como encanta a M a ria este pensam ento: se r
de D e u s!.* . Já o era desde o prim eiro in stan te d a sua con­
c eiçã o ... N u n c a deixou, nem h a v ia jam ais de d e ix a r de
o s e r..., bem o sabia E la , pois não ig n o rav a a g raça que
tin h a recebido do S e n h o r... e n ã o obstante, ain d a quer, se
é possível, ter m ais u n iã o com D e u s..., ser m ais de D eus.
— Q u e exem plo p a ra ti! — T u que tens m ais necessidade
do que Kln dessa união (porque tens .mais m iséria) quão
A presentação de M aria 57

pouco a estim as! Q u ã o pouco a pro c u ra s pràticam en te!


Q u ã o pouco trab a lh a s p o r a d q u iri-la !
S e r de Deus!!! S eja este o teu único pensam ento, o teu
único anelo. P ede-lho hoje, deste m odo a M aria.

3." — A vida de lervo r. — D a q u i deduzirás que o S enhor


n ã o se c ontenta com que o sirv a s de qualq u er m odo. senão
com o a S S .'1'“ V irgem , com f e r v o r ;— ao fe rv o r opõe-se a
tibieza, que é o estado em que insensivelm ente se cai, quando
se n ã o fazem esforços na vida e s p iritu a l.— Com fazer as
coisas só rotineiram ente, sem esp írito de abnegação, de
vencim ento, e tc ..., do descuido, do tédio passarem os facil­
m ente p a ra a tibieza. — Q u e enjoo e que rep u g n ân cia cau sa
a D eus a tibieza! D iz que ao tibio o la n ç a rá de Si com o
se lan ça cóm náuseas um. alim ento que não se tolera. -—
C h e g ar a c a u sa r náuseas a Jesus! — P ro v o c a r-L h e repug­
n â n c ia !— É p a ra tem er! Q u e san to tem or deve c au sar-te
este p e n sa m e n to !— E stás p erto deste e s ta d o ? ... V ig ias bem
o teu procedim ento p a ra te e n co n trares longe dele?
C onsidera bem o exem plo de M a ria . Em tudo p arece
p roceder sob a im pressão desse tem or. — C om o se houvesse
p a ra E la perigo, procede com energia, com decisão, com
prontidão, com fervor. — Se E la pois sem te r nenhum perigo,
assim procedeu, qual deve ser o nosso p rocedim ento?—
N ã o é tem po de dorm ir. — B asta de tan ta s gra ça s de D eus
perdidas com o se perdem e inutilizam pela m aldita tibieza.
G u e rra pois à tibieza, à frouxidão, à rotina p a ra que
chegue deveras a tu a alm a a ser toda de D eus à im itação
d a tu a q uerida M ãe.
16. Apresentação de Maria

A v id a d a SS ."'” V irgem no T em plo é m uito d igna de


ser m editada, pois é a co n tin u ação do seu oferecim ento ao
S en h o r e p o rtan to tam bém nessa v id a podem os en co n trar
g ra n d es ensinam entos p a ra nós.

1 * __V id a de oração. — O T em plo é cham ado com


ra z ã o casa de o ra çã o . — E m qualquer p a rte podemos^ o ra r
a D eus, porém , o T em p lo é o lu g ar p ró p rio da oração.
P o r isso M a ria não se c ontenta com aquela com unicação que
tin h a com D eus em sua casa, m as queria ir ao T em p lo p a ra
le v a r ali um a vida de m ais o ra çã o . C ontem pla essa joven-
zinha toda pureza, inocência, candor, p ro stra d a no T em plo,
o ra n d o e falando com D e u s... que tra to e com unicacão
in tim a e m útua de D eus com E la e d E la com D eus. — Q ue
fe rv o r de o ra ç ã o !
E x am in a perante esse exem plo as q ualidades d a oração:
hum ildade, atenção, confiança, p e rse v e ra n ç a ; e p ercorre-as
um a p o r um a, diante dessa V irg en zin h a p ro stra d a p o r terra
e v e rás que modelo a c a b a d o de o ra ç ã o en co n trará s n E la.
— D epois Dõe-te a seu lado. e com para a tu a o ra ç ã o com
a sua. —• Em que se parece? — R ep aras bem que estás na
c asa de oração e que p a ra isso é que v ais ao T em n lo ...
a orar. a tra ta r com D eus e unicam ente p a ra isso? • Sabes
A p o s e n ta ç ã o de M aria 59

o r a r em com panhia da SS-"" V irgem e tè-lA a E la por


v e rd ad e ira m estra de o ração ?
Diz S. B o a v en tu ra, que M a ria fazia o ra çã o ao Senhor
sete vezes ao d ia e que n e ssa s,o ra ç õ e s fazia sete súplicas:
!•“, am á-lo com todo o seu c o ra ç ã o ..., 2 -“, am a r a o próxim o
em D eus e p o r D e u s... 3.°, ter um ódio im placável a todo
o pecado e a toda a im perfeição... 4.", um a hum ildade p ro ­
funda, e com ela todas as virtudes, especiaLmente a p ureza
im a c u la d a ..., 5.°, a g raça de poder conhecer o M essias p ro ­
m etid o ..., 6 -°, ser m uito obediente aos sacerdotes rep resen ­
tan tes de D eus, e d eix ar-se dirigir p o r eles p a ra assim fazer
sem pre a su a divina v o n ta d e ..., 7 que o S enhor m an ­
d asse q uanto antes o R edentor p a ra a salv ação do m undo-
— N ã o te p arece que tam bém tu deves p edir com preferência
algum a coisa de sem elhante? — D em ora-te a p e n sa r nestas
petições e v erás com o em todas elas encontras algum a coisa
que p edir ao Senhor, à im itação de M a ria ...

2." — V id a de se n tiiic a ç io . — O T em p lo é tam bém casa


de santificação. — D eus levou ali M a ria p a ra p re p ará -lA
p a ra o seu altíssim o destino de ser M ãe de D eus- — M ais
tard e Jesus, antes d a sua vida pública, tam bém se re tira rá
ao d e se rto ..., d e ix a rá a sua casa e se a fa sta rá p a ra longe
do mundo, p a ra ali tra ta r m ais a sós com D eus. — Im agina
a vida de recolhim ento interior e e x te rio r ju n ta com a p r á ­
tica da m ortificação que lev a ria a S S -1"“ V irgem no T em plo,
li a imagem d a vida interior d a alm a. — Q u a n to nos a g ra d a
a vida e x te rio r!— A inda que esta seja boa, a g u ard a -n o s
m ais e julgam os que fazem os mais pela g lória de D eus
quando exteriorm ente trabalham os m ais, e nos m ovem os
m ais; e no entanto, toda a vida de ap o sto lad o que não tenha
por fundam ento a vida interior, é com pletam ente inútil- —
D eus não a abençoa e p o rta n to ela não frutifica- — É belo
trab a lh a r pelos outros, porém tem os de tra b a lh a r prim eiro
por nós mesmos.
I

60 A presentação d e M aria

P ed e a M a ria m uito am or ao retiro, à solidão, ao v e n ­


cim ento p róprio e à a b n eg ação de ti mesmo, à m o rtifica çã o ...
enfim, à v id a in te rio r d a alm a.

3. » _ V id a de trabalho. — E m D eus e p a ra D eus. Sem ­


pre assim fize ra; m as ag o ra no T em plo, dum. m odo especial
todo o seu trab alh o seria p a ra D eus.
V ê tam bém esta donzelinha entregue com afã ao tr a ­
balh o do asseio e lim peza das coisas do c u lto ; que am or
e que devoção n ã o acom panhariam o seu trabalho!
T o d a s as coisas a in d a as m ais pequenas, que se fazem
p o r D eus, têm um v a lo r im enso. — N o serviço de D eus
n a d a é pequeno. — A p re n d e a dirigir a D eus to d o o tra ­
balh o e o b ra s das tu as m ãos, p a ra que assim aum entes
em am or e em m erecim ento p eran te E le sabendo que n a d a
d isto ficará sem altíssim a recom pensa. 4

4. ° — A tua vid a na igreja. — L em bra-te da passagem


d a v id a de Jesus C risto quando expulsou o s p ro fan a d o re s
do T e m p lo ... E le era a sum a bondade e am or, e n o e n ta n to
n esta ocasião, com grande energia, até com um a sa n ta ira
e a b rasa d o zélo, a chicotadas purifica aquela m o rad a d a
o ra ç ã o que é a C asa de D eus.
A C a sa de Deus! Q u e bem o com preendeu a S S .""1 V ir­
gem! C om o soube v iv er nela d ig n am e n te !— M as tu im itas
sem pre a S S .nm V irgem quando estás na igreja? ... O u estás
im itando aqueles que tan to aborrecim ento e desgosto c a u ­
sa ram ao S e n h o r? ... N ã o tens n a d a a corrigir no teu p o rte
n a C a sa de D eus, ou no teu m odo de falar com E le ? —
F azes, algum a vez, a s tu as orações sem atenção, tra b a ­
lhando pouco p o r a fa sta r as distracções v o lu n tá rias que
te n h a s? ...
P e n sa além disso num o u tro T em plo, no dc teu c o ra ­
ção, o n d e D eus quer sob retu d o v iv e r..., fa la r contigo e se r
a d o rad o p o r ti. — Se está nos outros tem plos é precisam ente
A presentação de M acia 61

p a ra m orar nesto u tro s tem plos vivos das alm as, que é onde
E le m ais quer com unicar-se a nós. — Sabes re tirar-te à
solid ão do sa n tu ário d a tua alm a e ai c o n v ersa r com D eus?
P o rta s-te sem pre com a d ignidade d evida à m orada do
S en h o r a quem levas no teu coração? D aqui conclui que
d ev es ter um a gran d e d evoção a este sa n tu ário . — V isita
m uito a Jesus nos seus tem plos e sa c rá rio s..., porém não
te esqueças de v isitá -lO com m ais frequência no teu coração.
17. Apresentação de Maria — A sua virgindade

N ã o podem os term inar as m editações d a A p re se n ta ç ão


d a Santíssim a V irgem , sem dedicar um a em e sp e d a l à sua
v irg in d a d e, já que foi neste dia e neste m om ento que t i a
fez a o S enhor o seu v o to de V irgem .

]_«__O vo to de virgindade de M aria. — N ão é dogm a


de fé 'q u e tenha feito este voto. — O dogm a só nos diz que
M a ria foi V irgem antes do p arto, no p a rto e depois do
p a rto de seu d iv in o Filho. — N ã o obstante, a S a n ta Igreja
reconhece com os seus D o u to res e Santos P a d re s que M a ria
quis unir-se ao S en h o r com este voto. A trad ição diz-nos
que foi no tem plo quando d a sua apresentação' aos três
anos. C ontem pla a cena do m elhor m odo que p u d e re s...:
M a ria no T e m p lo ..., d iante de D e u s... e de todo o céu, que
ató n ito adm ira este e sp e c tá c u lo ! — O s anjos ignoram o que
se v a i p assar, porém adivinham algum a coisa de im portante
q u ando D eus se dem ora a contem plar aquela m en in a...
e d e repente a pequenina abre os seus lábios, expressão do
seu coração, e p ronuncia o seu v oto de virg in d ad e. Q ue
m aravilha, o v oto de M a ria ! Q u e fariam os an jo s!... Q u e c ân ­
ticos entoariam em lo u v o r daquela bendita m enina! —
E D eus, que faria D eus ao o u v ir aquele v o to ? ... T u d o o
que pensares é n a d a p a ra com preenderes as gra ça s que
o S enhor derram aria nesse instante sobre a Santíssim a V ir-
A presentação de M aria 63

gem. Q u a n to s pecados de im pureza h á n o m undo! E ela


pen sa em com o terã o ofendido a D e u s... Q u e p en a tão
p ro fu n d a n ã o terã o cau sad o n o seu c o ra ç ã o !... N o entanto,
m aior foi a aleg ria e com placência de D eus no v o to de
M a ria do que a pena c ausada pelos pecados de im pureza.
E la sozinha foi cap a z de com este acto lhe d a r um a g lória
que o com pensasse d e toda a que lhe tiram os pecadores
com os seus im undos pecados.

2 " — V a lo r da virgindade. — D aqui conclui o que


v a le rá esta m isteriosa v irtu d e p a ra D e u s e p a ra M a ria .
Sem conselho, sem incitam ento de ninguém , sem exem plo
a im itar, M a ria p arece ad iv in h ar o que é a v irg in d a d e n e ran te
D e u s; e sab en d o que é do seu a g ra d o e p a ra sua glória,
a b ra ç a -a decididam ente. — V iu que esta v irtu d e n ã o era
a p rec ia d a p o r ser desconhecida... que todas as su as com -
panheiras c a su a fam ília a considerariam com o um a desonra,
que o ser virgem lhe h a v ia de c u star g randes sofrim entos,
desgostos e talvez até desprezos, e ..., a p e sa r disso, n ã o
hesita. D eus assim, o quer e ela tam bém ... e tudo o m ais
entrega nas su a s m ãos. — Q u e exem plo de desprendim ento
e de generosidade p a ra n ó s! N ó s dam o-nos a D eus a m eias
''_ se é necessário um sacrifício custoso regateam o-lo, quando
não o re cu sa m o s!
M as o S enhor p re p a ra v a a recom pensa. — D eus nunca
é vencido em generosidade. — A generosidade corresponde
co.m nova generosidade e com novos fav o res e graças.
M a ria julgou que tinha renunciado a se r M ãe do M es­
sia s..., que isso já não era possivel nela, com o o disse
cli pois ao anjo. E n o e ntanto o prém io daquele v o to de
vingindade não foi ou tro senão o ser escolhida e designada
p a ra M ae de D eus. C om o D eus é g ra n d e ao p rem iar! so b re-
Itido quando prem eia a v irgindade e a pureza! O que será
esta virtu d e quando assim a rra sta e e n can ta o coração de
um Deus!?
66 D esposórios d e M aria

no S e n h o r... E le fora o a u to r... E le p u n h a dificuldades e a té


contradições v e rd a d e ira s... A E le to c a v a d a r a so lu ç ão ...
Q u e exem plo tão difícil d e p ra tic a r e não1 o b stan te, que
m agnífico e que a g ra d á v e l ao S e n h o r!... N ã o costum as dis­
cutir ou ju lg a r a teu m odo as disposições ou conselhos dos
teus superiores? V ê no que te pareces en tão com a S a n tís­
sim a V irgem .

2.° — A união virginal. — C ontudo D eus, a quem n ada


é im possível, p ro cu ro u a solução deste conflito m ediante a
união virginal de M a ria e de José. — M a ria não p o d ia ficar
só e m uito m enos a p a re c e r com o seu F ilho, sem e s ta r
d esposada, pois ig n o ran d o o m undo a sua conceição m ila­
g ro sa e a o b ra d o E sp írito S anto, tom á-la-iam p o r um a
ad ú ltera. — A sabedoria de D eus encontra o m odo d e sa lv a r
a h o n ra de M aria, d an d o -lh e um esposo e ao mesmo tem po
enco n tra m odo de c o n se rv a r a sua virg in d ad e com um des-
posório virg in al. — C om o D eus faz bem to d as as c o is a s!
Q u e infinita a sua sa b e d o ria ! e que so b eran a a sua P ro v i­
dência ! — Q u e tem eridade e que loucura a nossa quando
querem os que tudo nos saia n a form a, no tem po e à m edida
dos nossos desejos, e n ã o confiam os n o desenvolvim ento do
p lan o divino que ignoram os.
C ontem pla ag o ra aqueles dois esposos virgens. S. José
foi eleito pelos sacerdotes porque en tre todos os asp iran tes
ã m ão de M aria, só ele era virg em ; assim o dem onstrou
o S enhor fazendo que florescessem lírios e açucenas n a
v a ra que com este fim tinham colocado n a A rc a d a A liança.
C o n tu d o n ã o é de crer que S. José tivesse feito v o to de
v irg in d a d e ...; nem sequer o conh eceria... V ê com o a S a n ­
tíssim a V irg em no p ró p rio dia dos desposórios d á co n ta
a S. José daquele v o to que fizera ao S enhor e com o S. José
adm irando a virtu d e puríssim a da Virgem. Santíssim a n ã o
quis se r m enos e à im itação d a sua esposa con sag ro u tam ­
bém ao S enhor a sua virg in d ad e. Q u e pensam ento tão belo
D esposórios de M aria 67
crer que S. José depois de N o ssa S enhora foi o prim eiro
que fez o v o to de virg in d ad e!
D esde en tão com preendeu qual e ra o seu d e stin o ...:
ser o g u a rd a fiel d a p ureza v irg in al de M a ria. — A A rca
d a A liança tinha um véu que a o c u lta v a das v istas cu rio ­
sas..«! S. José é a im agem desse v é u que assim o cu lto u e
g u a rd o u o gran d e m istério en cerrad o n a A rc a do N o v o
T estam en to que era M aria.

3.° — C onclusão prática. — F irm a-te n a confiança do


Senhor. — Pede-lhe p e rd ã o das tu a s m uitas desconfianças.
—- N ã o duvides n u n c a p o rq u e ain d a que n ã o v e ja s o fim
das tuas p ro v açõ es e sofrim entos a que o S enhor te subm ete;
isso é o que m ais te convém . — N ã o te preocupes com
e sq u ad rin h ar o p lan o D eus sobre a tu a alm a. — D e ix a-te
g u iar ain d a que te p a reç a que tudo sai ao rev és do que d e v ia
ser. —- 'C onsidera com o S. José se to rn a m ais virgem à.
medida que se aproxim a d e M a r ia ...; e não esqueças que
o lh ar p a ra M a ria ..., a p roxim ar-se d e la ..., ab raçar-se e u nir-
-se com e la ... será tam bém p a ra ti fonte de pureza, aum ento
de castidade, am or cad a vez m aior à v irgindade. )• •
S IL À. 7

19. A Anunciação — A Virgem Santíssima em oração

1. « _ C om o ora. — Com sa n ta curiosidade o b se rv a pela


jan elin h a d a casa de N a z a ré e surpreende M a ria em oração.
— Q u e espectáculo!—! R e p ara no seu porte exterior, sem
e x ag e ro s nem posições d ra m á tic a s ...; de jo elh o s..., e p ro s­
tra d a com a face em te rra ..., as m ãos ju n ta s o u cruzadas
so b re o p e ito ..., os olhos baixos e m odestam ente recolhidos
o u lev an tad o s p a ra fixar a sua v ista no céu. P e n e tra o seu
interior e vê qual o se u fe rv o r; h a v e rá lu g ar p a ra distracções,
pensam entos im portunos, cansaço, tibieza, aborrecim ento, etc.?
.—. C ontem pla bem — é a tua m estra de o r a ç ã o ...; os anjos
extasiam -se ao assistir à o ração de M aria. — D eus com-
p ra z-se nela, com unica-se-lhe com um aum ento de graças,
d e benefcios e favores feitos ao m undo pela o ra ç ã o de
M a ria . —• E tu, não ap ren d e rás a copiar em ti algum a coisa
d e ste ferv o r de tua M ãe? 2

2. “ — Q u e pede na oração. — M ais tard e Jesus C risto


e nsina-nos o que havem os de pedir: o reino de D e u s e a sua
ju s tiç a ; isto mesmo pede M a r ia ...; que v e n h a já o S a lv a ­
d o r ..., que D eus envie já o M e ssia s..., que apresse q uanto
a n te s a h o ra da R ed en ç ão ... e tan to insta que D eus encan­
ta d o não sabe nem pode n e g a r n ad a: pela o ra ç ã o d e M aria
a p re ssa e ad ia n ta a hora. — R ecorda o que se passou nas
lx>das de C a n á .—■A li tam bém disse C risto : A in d a não

A
A A nunciação 69

chegou a m inha hora, m as p o r interv en ção de M a ria essa


h o ra é a d ia n ta d a e faz o m ilagre.
V ê com o D eus m uda o seu plan o e ad ia n ta a h o ra d e
m andar a seu F ilh o ... de m anifestar-se públicam ente em C an á
com o seu prim eiro m ilag re..., de rem ir o m undo na cruz...*
de ressu scitar logo de m anhãzinha no D om ingo da R essur­
reição, e tudo isto porque M a ria o pede na sua o ra ç ã o ...

3.“ — P orque ora. — P o rq u e a o ra ç ã o não só é útil


m as necessária. — M a ria não tinha necessidade de o ra r,
com o C risto tam bém n ã o tev e ; e no e n ta n to a o ra çã o de
Jesus e a de M a ria é inin terru p ta. — A prim eira vez que
os E v an g elh o s falam, de M a ria ap resentam -na o ra n d o ...; é na
o ração que recebe a v isita do a n jo ...; a últim a vez que os
E v an g e lista s a m encionam é p a ra dizer-nos que no C enáculo
era que e n sin av a os A póstolos a o ra r, e a p re p ara r-se pela
o ra çã o p a ra a v inda do E sp írito Santo. — M a ria com eça
e term ina a sua histó ria em o ra ç ã o ...
Q u e exem plo que D eus te dá p a ra im itares! — M ais.
P ela o ra ç ã o M a ria p re p ara -se p a ra ser M ãe do M essias
e é por isso que d urante a o ração ela recebe a v isita do
anjo. —■T o d a a o b ra da In carn ação está relacio n ad a com
a o ra çã o de M aria.

•1." —1A tua oração. — N a presença deste divino m odelo


p e n sa : u) quão n ecessária é p a ra ti a o ra ç ã o ; as paixões,
os pecados, as im perfeições e m isérias p ró p rias lem bram -te
esla.s necessidades; b ) que frutos tu po d erias conseguir se
foNse.i alm a de o ra ç ã o ...: a com unicação com D eus e o gosto
das coisas espirituais, pois da o ra ç ã o depende a perfeição
e a sa n tid a d e; c ) com o o ras e como devias o ra r se te com ­
paras com M a ria ...: falta de fervor? atenção interna e
externa? ... rotina? ... p retexto p a ra deixá-la ou pelo m enos
encurtá-la, q u ando m ais falta te f a z ? ...; d ) exam ina a tu a
70 A V irgem Sa n tíssim a em oração

o ra ç ã o vocal: com o rezas o pequeno O fício de N o ssa


S e n h o ra ..., a c o ro in h a ... o te rç o ... e as tu a s orações a
E la, etc.
P ede p a ra ti um gran d e espírito de o ra ç ã o : e p a ra o
m undo, que pelas orações das alm as boas, dê o S en h o r vida
e form e m uitos filhos de M aria.

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) J m ; / ■'< ' -.a : t

>ici . <t f,

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■ tq ?

20. A Anunciação — Retiro de Maria

12;

1 — A v id a de recolhim ento. — É a v id a que renuncia


a tudo o que é ex te rio r n ã o usando da vida ex terio r m ais
d o que o indispensável, p a ra v iv e r sobretudo interiorm ente.
Q ue desconhecim ento p rá tico h á d a v id a interior!
Q u a n ta confusão de ideias q u an d o se ju lg a que tudo c o n ­
siste em fazer e em tra b a lh a r m uito, ainda que seja com
bom fim. porém exteriorm ente, n ã o dando im portância à
v id a v erd ad e ira d a alm a que é a v id a interior!
N u n ca um a o b ra e x terior é fru tu o sa nem p a ra ti nem
p a ra os o u tro s se n ã o estiver bem fundada na v id a interior.
N inguém dá o que não tem . C om o p o d e rás d a r vida,
fervor, san tid ad e a o utros se a não tens p a ra ti?
D eus só se com unica às alm as no retiro, no recolhi-
m rnto. A sua voz, diz a S a g ra d a E sc ritu ra, é com o o sibilar
du uurora tén u e e se h á m uito ru íd o de coisas exteriores,
v o ; não se ouve. — P o r isso ninguém está m ais interes-
mulo ilo que o dem ónio em a lv o ro ta r com. a lg a z a rra a alm a
pnrn que se n ã o oiça a voz do Senhor.
Enfim , a v irtu d e n ã o cresce senão com o as p lan ta s de
Inverno, bem p ro teg id as da atm osfera e x terior que é m uito
frln e gelad a. — N u n c a a v irtu d e a tin g irá a perfeição no
I miIU I o do mundo.
72 A A nunciação

2. ° — M aria, nosso m odelo. — Q u e am or ao retiro d a


su a pequenina c a s a ! Ninguém , a v ê nem se dá conta do
que ela fa z ..., m as D eus com praz-se naquele recolhim ento
e ali a v a i p ro c u ra r. — O anjo não lhe a p arece nas ruas,
nas p ra ça s, nem mesmo no T em p lo püblicam ente, m as sim
n a soledade, no retiro de N a z a ré . — Ê ali que E la se sente
to d a d e D eus e D eus todo d 'E la . A li sem. testem unhas é
onde se d ã o a s g randes e íntim as com unicações entre D eus
e E la. — É ali que se realiza o grande m istério da In c ar­
n ação. —■O seu re tiro é perpétuo. — Se sai de casa, é p o r
caridade, com o na V isita ç ã o ... ou p o r espírito d e obediência,
com o quando v a i a Belém, ao E g ip to , ao T em p lo de Jerusa­
lém, e tc ... N u n c a em preende um a viagem, p o r p u ro recreio
ou p assatem po.
C o ntem pla-a na rua e observa o seu recolhim ento
interior, m anifestado n a m odéstia dos seus olhos e d o seu
porte. -— A ssiste às visita s que faz p o r v e rd a d e ira neces­
sidade. —• Q u e edificação nas conversas e p a la v ra s que saiem
de seus lá b io s ! P e rsu ad id a de que é tem plo de D eus não
se d eix a dissipar com o tra to so cial; pelo contrário, no meio
do m undo n ã o ab an d o n a o seu retiro interior.
F inalm ente contem pla-a nas ocupações dom ésticas,
m esmo nos dias de m aior trab a lh o . C om o o sabe santificar
com a p resença de D eus que nem um só in stan te perdia.
E deste m odo tudo n 'E la contribui p a ra aum entar mais
e m ais a intensíssi.ma v id a interior. 3

3. ° — O teu recolhim ento. — Já aprendeste a c o n v ersa r


com D eus no sa n tu ário d a tu a alm a?— 1E x am in a a tua
v id a interior e exterior e v é se esta se d erram a de tal m odo
p a ra fo ra que seja à custa d a o u tra. — i D em ora-te a con­
sid erar o teu am or e afeição à tu a casa, ao teu retiro ou
à rua. V ê que visitas e que conversas tens n e la s... S ão frí­
v o la s ? ... C o n tra a caridade? ... D issip a d a s? ... C om o v ai
o teu recolhim ento em toda a pa rte e a cad a m om ento...,
R etiro de M aria 73

nas am izad es..., diversões e passatem pos? ... V ê que im por­


tância dás ao dia do R etiro m en sal... aos E xercícios E sp i­
rituais a n u a is... D esejas que chegue esse san to tem po? ...
T ira s algum p ro v e ito que te faça crescer cada dia m ais
n a v id a interior?
P ro c u ra fom entar e aum entar em ti o que encontrares
de bom n a tu a conduta sobre esta m atéria. C orrige enér-
icam ente o que há de defeitu o so ... exam ina m uitas vezes
CP 0

aum ento ou a dim inuição da tu a v id a interior.


72 A A nunciação

2. “ — 'Maria, nosso m odelo. — Q u e am or ao retiro da


su a pequenina casa ! N in g u ém a vê nem se dá conta do
que ela fa z ..., m as D eus com praz-se naquele recolhim ento
e ali a v a i p ro c u ra r. — O anjo não lhe a p arece nas ruas,
nas p ra ça s, nem mesmo no T em p lo públicam ente, m as sim
n a soledade, no retiro de N a z a ré . -— É ali que E la se sente
to d a d e D eus e D eus todo d ’E la. A li sem testem unhas é
onde sc d ã o as grandes e intim as com unicações entre D eus
e E l a . — É ali que se realiza o grande m istério da In c ar­
n ação. —• O seu retiro é perpétuo. — Se sai de casa, é p o r
caridade, como na V isita ç ã o ... ou p o r espírito de obediência,
com o quando v ai a Belém, ao E gipto, ao T em p lo de Jerusa­
lém, e tc ... N u n c a em preende um a viage.m, por p u ro recreio
ou passatem po.
C ontem pla-a na ru a e observa o seu recolhim ento
interior, m anifestado n a m odéstia d o s seus olhos e d o seu
porte. — A ssiste às visitas que faz por v e rd ad e ira neces­
sidade. —■Q u e edificação nas conversas e p a la v ra s que saiem
de seus lábios ! P ersu ad id a de que é tem plo de D eus não
se deixa d issipar com o tra to social ; pelo contrário, no meio
do m undo n ã o ab an d o n a o seu retiro interior.
Finalm ente contem pla-a n a s ocupações dom ésticas,
mesmo nos dias de m aior trab alh o . C om o o sabe santificar
com a presença de D eus que nem um só in stan te perdia.
E deste m odo tudo n ’E la contribui p a ra aum entar mais
e m ais a intensíssi.ma vida interior. 3

3. " — O teu recolhim ento. — Já aprendeste a c o n v ersa r


com D eus no sa n tu ário da tua alm a?— 'E x a m in a a tua
v id a interior e e x terior e v é se esta se d erram a de tal m odo
p a ra fora que seja à custa d a o u tra . —' D em o ra-te a con­
sid erar o teu am or e afeição à tua casa, ao teu retiro ou
à rua. V ê que visitas e que conversas tens n e la s... São frí­
v o la s ? ... C o n tra a caridade? ... D issip a d a s? ... C om o v ai
o teu recolhim ento em toda a p arte e a cada m om ento...,
R etiro de M aria 73

nas am izad es..., diversões e passatem pos? ... V ê que im por­


tância dás ao dia do R etiro m en sal... aos E xercícios E sp i­
rituais a n u a is... D esejas que chegue esse san to tempo? ...
T ira s algum p ro v e ito que te faça crescer cada d ia m ais
n a vida interior?
P ro c u ra fom entar e aum entar em ti o que en co n trares
de bom na tu a co n d u ta sobre esta m atéria. C orrige enèr-
gicam ente o que há de defeitu o so ... exam ina m uitas vezes
o aum ento ou a dim inuição da tu a v id a interior.
21. A Anunciação — A Embaixada do anjo

l . ° — O anjo diante de M aria. — O an jo da In carn ação


é um dos espíritos m ais form osos que cercam o trono de
D eu s. — C ontem pla a sua beleza, .magnificência e esplendor,
que, no dizer de m uitos, nos p a rec ia de D e u s m esmo. •—-
É G abriel, o an jo d a A nu n ciação . É o p ró p rio D eus quem
o m anda porque assim o exige a grandeza d a m ensagem e a
d ig n id ad e de M a ria. — O S e n h o r n ã o e n ca rreg a d essa m en­
sagem um hom em , com o o fez n o u tras ocasiões, em que
foram seus em baixadores M oisés, E lias, E liseu, os profetas
e p a triarc a s, e tc ... m as é um a n jo e dos m ais elevados que
ele m anda à Santíssim a V irgem . — E c onvinha que a que
e ra m ais do que a n jo p ela sua virg in al pureza, fosse visi­
ta d a p o r um anjo do Senhor.
E de que m an eira a v isita ! — E n tra o anjo n a hab itação
d e M a ria e faz-lhe re sp eito sa s reverências — ele que nunca
se tin h a p ro stra d o senão diante do tro n o de D e u s... ag o ra
p ro stra -se aos pés de M a r i a .— Q u e v ia o anjo n 'E la ? —
A costum ado a contem plar a s belezas do céu ... que m arav ilh a
p o d ia e n co n trar n a te r r a ? ... E no e n tan to a o v e r M a ria
fica assom brado, cheio d e pasm o e de adm iração. — D epois
d a beleza d e D eus, nunca nem mesmo n o céu, tinha visto
a lgum a coisa de sem elhante como. naquela virgem escondida
no retiro de N a za ré . — E o m undo não a conhecia porque
A A nuncia çã o 75

p a ra conhecê-la é preciso ter olhos d e anjo e n ã o olhos


d a terra.

2. ° — A saudação. — A v e . cheia de graça 1 O S e n h o r


é convosco, bendita sois v ó s entre as m ulheres. ■ — É o fruto
d a sua a d m ira ç ã o ... é um a e x p an são de e n tu sia sm o ...;
c a d a frase vem a se r um a m an ifestação de c arin h o e de
am or. — C om o o an jo am a a M a ria ! T u d o q uanto lhe diz
parece-lhe p ouco p a ra a lo u v ar. — E ssa s p a la v ra s em boca
hum ana pereceriam um a a d u lação ridícula o u um exagero
m as um an jo n ã o m ente, n ã o ad u la nem ex ag e ra. O que
será, p o rtan to , M a ria ? ...

3. ° — A em baixada. — O an jo expõe o fim da sua visita:


a conceição e o nascim ento de um filho que será o M essias.
— P ede a M a ria o seu consentim ento. — T o d a a criação,
os hom ens, os a n jo s ..., o p ró p rio D eus falam ag o ra pela
boca d o anjo. — T o d o s esperam com ânsia, com im paciência,
a resposta de M a ria ... M om ento sublime, g ra n d io s o !— D essa
p a la v ra depende a re d en ç ão ... a sa lv aç ão do m u n d o .—
O anjo v a i esboçando a figura do M essias: cham ar-se-á
Jesu s..., será o s a n to dos sa n to s..., será o F ilho do A ltíssim o
e ao mesmo tem po será o F ilho de M a ria. — M a ria será
v erd ad eira M ã e de D eus! — P ela prim eira vez nesta ocasião
se ouvem o s su avíssim os nom es de Jesus e de M a ria. —
lis ta tem sido a té a g o ra a donzelinha hum ilde e escondida
de N azaré. —- D esde este m om ento se rá M a ria a M ã e de
Jesus.
N e sta em baixada do anjo e stá en cerrad a toda a fé,
todos os desejos, to d as as esperanças d a hum anidade.
K todas as g ra n d ez as e to d a a riqueza de g raças de que
N ossa S enhora se v iu cum ulada desde a sua C onceição
Im aculada tem a su a explicação n esta em baixada do anjo.
• F, p o r isso ela ficará p a ra sem pre m em orável na história
d a hum anidade.
76 A em baixada do anjo

4.° — A tua presença diante d e M aria. — A p re se n ta s-te


a E la com o entusiasm o fe rv o r e carinho do anjo?
Sabes, com o o anjo, estudar, ap reciar, e re v ere n ciar
a tu a M ã e ? — O anjo falou com E la, um a v e z ... e tu podes
c o n v e rsa r com E la, m uitas vezes. — P ro c e d es assim viv en d o
constantem ente d a sua p re se n ç a ..., fazendo tudo p o r E la
e com E la? ... P en sa nas em baixadas que D eus tam bém
de q u ando em q u ando te envia p o r m eio dos a n jo s ..., d o
teu an jo da G u a rd a ..., dos teus su p e rio res..., d a V irgem
S a n tíssim a ... e às vezes dele mesmo d irec ta m en te ... C om o
recebes estas inspirações, cham am entos, toques no coração? ...
P ed e a D eus olhos de anjo p a ra conhecer e e stu d ar
bem a tu a M ã e ..., p a ra am á-la com lo u c u ra ..., p a ra v iv er
sem pre com E la. — P ede-lhe desejos de c o o p erar com a
g raça, recebendo as suas inspirações com espírito de fé,
venham donde vierem , p ro cu ran d o segui-las em tudo. —
In v o c a o an jo da A nun ciação e o teu A njo da G u ard a.
22. A Anunciação — A Ave-Maria

1.® — A v e . — É a p a la v ra da sau d ação afectuosa, m as


0 anjo em p reg a-a no sentido de parabém . — A Ig reja diz
nos seus hinos que é o c o n trá rio de E v a p a ra indicar-nos
que assim com o p o r E v a nos veio a m orte, por M a ria nos
v irá a v id a. — N e ste sentido o parab ém do an jo deve esten­
der-se a toda a hum anidade.
D á os p a rab é n s a M a ria por este p asso da sua v id a e
regozija-te, pois p o r E la neste d ia a tua alm a foi feita
filha de D e u s...

2.” — C heia de graça. — E bem cheia: a todos os santos


e até mesmo aos anjos a g ra ça foi-lhes d a d a p o r p a rte s...
só a M a ria foi d a d a á plenitude e to talidade da g ra ç a ...
N esta plenitude é que se diferenciaria d o u tras criatu ras. —
S eria necessário com preender o que é a g raça p a ra com ­
preender estas p a la v ra s do anjo. — P e n sa o que é a graça
p a ra os o u tro s ..., é um a qualidade divina, algum a coisa
de D eus, que se com unica a o hom em p a ra divinizá-lo pois
renlm ente lhe d á o titu lo de filho de D eus e lhe confere o
direito de h e rd a r d o P a d re E te rn o ..., po rq u e se é filho de
1 >eus, é h erdeiro d o céu.
lieflete a g o ra. Se isto faz a g ra ç a nos outros e deste
m odo os santifica e d iv in isa ..., que faria n a Santíssim a V ir­
gem a o dar-lhe a plenitude total e com pleta da m esm a?—
78 A A nuncia çã o

Se E la a possui toda, a E la tem os de recorrer, se querem os


p a rtic ip a r d a graça.
M a s se e stav a já cheia com o pôde em sua vida aum en­
ta r a g ra ç a ? ...
É um m istério... U m copo cheio já n ã o pode receber
m ais á g u a, m as p a ra D eus n ã o h á im possíveis. D eus pôde
d ila ta r e aum entar a cad a m om ento esse copo preciosíssim o
d a sua alm a e assim , e stan d o sem pre cheio p ô d e sem pre
au m e n tar a g ra ç a que encerra.

3. ° — O S e n h o r é convosco. — E m ais convosco do q


com igo, d iria o a n jo ..; e m ais d o que com q u alquer o u tra
c ria tu ra . — E stá convosco possuindo-vos totaim ente. — N ã o
h á n a d a em M a ria que n ã o esteja possuído e n ã o seja
de D eus.
D eus tam bém está connosco p orém a m e ia s!— N ã o
deixam os que ele nos dom ine com pletam ente com o d e ix a v a
M a ria. A lém disso, D eus e sta v a convosco desde toda a
eternidade. E m v ó s p e n sa v a e em v ó s se d eliciav a ainda
antes d e c ria r qualquer o u tra coisa. — C onvosco p a ra sem ­
pre, e p o r isso quer unir-se tão intim am ente que sejais vós
a sua M ã e e E le o v o sso Filho.
— P e n sa em como Jesus quer tam bém isto de ti e p a ra
isso te p ro c u ra e te cham a e se une a ti pela g ra ç a e m ais
intim am ente pela com u n h ão ... 4

4. » — B endita sois v ó s en tre as m ulheres. — P o rq u e assim


com o p o r um a m ulher e n tro u no m undo o pecado, p o r V ó s
e n tra rá a g ra ça e a redenção. T o d a s as g eraçõ es se lem bra­
rã o de E v a p a ra a a m a ld iç o a r...; todos se lem b rarão d e V ó s
p a ra v o s lo u v ar. E v a foi a m ãe d e sn atu rad a, e m ad rasta
que deu a m orte a seus filhos... M a ria é a v e rd a d e ira M ãe
que nos d á com am or a vida. A hum anidade in teira con­
c en tro u c o n tra a m ulher o seu ód io ; trato u -a com desprezo
e crueldade. —<M a ria é a que reabilita e e x alta de tal m odo
A A v e -M a ria 79

a m ulher que chega a se r a c ria tu ra m ais elevada e a que


ocupa o lu g a r m ais alto no céu ...

5.° —• B en d ito o fru to d o vo sso ventre. — S ã o p a la v ra s


n ã o do an jo m as de S a n ta Isabel, porém tã o lig ad as às do
prim eiro que a Ig reja as ju n ta num a só o ração .
P a la v ra s gloriosas p a ra M a ria p o rq u e dizem o que é
e será seu filho. — R ealm ente ela se rá d ito sa e b en d ita p o r
cau sa de seu F ilho. — E nesse fruto b endito encontrarem os
todos a salv ação . — E v a p erdeu-nos d a n do-nos o fruto do
pecado. — M a ria sa lv ar-n o s-á d a n do-nos esse fruto d e sa n ­
tificação que se cham a Jesus.
R eza sem pre com m uita d e v o çã o a A v e -M a ria . — E v ita
a rotina no terço, etc. N ã o te esqueças de sa u d a r a M a ria
com o A n g elu s. —• Sem pre que o rezares lem bra-te deste
g randioso m istério d a A nunciação e pede a M a ria que te
encha de g raças, que o S enhor q ueira tam bém e star con tig o
c assim te faça p a rticip a n te d á su a ditosa bênção ete rn a ­
m ente.

t
23. A Anunciação — Atitude de Maria — A sua humildade

l . ° — A perturbação. — A s p a la v ra s do A njo M aria


responde com certa p e rtu rb a çã o . V ê como tem o rosto rubro
de p u d o r..., escuta o p a lp ita r a pressado do seu c o ra ç ã o ....
p e n etra no desgosto profundo, ín tim o ..., p arece que p e r­
g unta a si mesma, com o que a ssu stad a: a que v irá este
m en sag eiro ?— O an jo tinha-L he dito a verd ad e, porém
ferira-X n a sua hum ildade. — M ais tard e E la reconhecerá
públicam ente a certeza das p a la v ras do A njo, e ainda
re p etirá que todas as gerações a ch am arão «-Bem-aven­
tu ra d a » ..., não porém p a ra se engrandecer, senão p a ra
lo u v a r a D eus.
M as a gora é E la ... E la pró p ria, o objecto do louvor,
p o r isso n a tu ra l e espontaneam ente se assu sta e se põe de
sobreaviso como que esperando um a te n ta ç ã o ..., como se
pudesse pecar.
V a i pois tu com o A njo tranquilizá-lA e diz-L he: « N ão
tem ais. M aria, não tendes que tem er, nem de que vos
a ssu sta r perante esses lo u v o res.... no entanto, bem está
que vos perturbeis e assusteis p a ra me ensinardes a m aneira
de receber os louvores que m e dão os hom ens; ensinai-m o
pràticam ente, M ãe de toda hum ildades...
A titu d e d e M aria — A sua hum ildade SI

2. “ — G randeza desta hum ildade. — C onsidera com o é


gran d e a hum ildade d e M a ria precisam ente neste p asso da
v id a da S S .1"“ V irgem .
—• E ntende-se a hum ildade de M a ria em Belém,, re p e ­
lida por to d o s..., no E gipto, fugindo dos seus inim igos...,
em N a za ré , ig n o rad a e escondida n aquela casa de o p erário s
pobres e quase m iserá v eis..., n a cruz, sendo M ãe dum jus­
tiç a d o ...; porém a g o ra, v isita d a p o r um A n jo ! ... p ro c u ra d a
p o r D eus que pede o seu consentim ento e que fica esperando
a sua re sp o sta !... lo u v ad a e enaltecida até â m ais alta
d ig n id a d e !... Q u e inconcebível hum ildade!
A m enor h o n ra foram elev ad o s A d ão no P a ra ís o e cs
A njos m aus no C é u ... E no entanto desvaneceram -se com a
so b erb a e caíram n o abism o. — M aria porém sabe que o
que o A njo lhe diz é da pa rte de D e u s..., que um A njo não
pode m entir, e p o r isso m esm o sabe ser v erd ad e tudo o
que Lhe diz; e longe de se e n v aid ec e r..., p ertu rb a-se e hum i-
liia-se sem pre m ais. Q u ã o G rande, quão encantador, quão
a tra e n te é M a ria pela sua hum ildade!
Com o D eus sabe p o r m eio d esta profundíssim a hum il­
dade, re p a ra r bem o pecado que com eçou pelo orgulho. 3

3. " — Humildade verdadeira.— A hum ildade não é am es-


quln h am en to ; faz-nos pequenos, sim, a nossos o lh o s...,
porém grandes, m uito grandes aos olhos do Senhor. É assim ,
M aria nunca foi tão grande aos olhos de D eus como
nesta ocasião. — F inalm ente, a hum ildade não é p ró p ria
dos cobardes e dos reles, m as sim dos fortes e dos m ag n â ­
nimos.
C ontem pla M a ria ... p e rtu rb a d a, aniquilada, perante as
p a la v ras do A n jo ..., conserva porém o seu juízo sereno,
Inm qullo, c ... estuda, pensa e o p e ra com decisão. — E s ta é
a v erdadeira hum ildade: conhecer a voz de D eus, subm e­
nu- o seu juízo e p róprio pa rec er a essa v o n tad e e segui-la.
K Isto, ainda que custe como custou a M aria. E la bem
6
23. A Anunciação — Atitude de Maria — A sua humildade

1.“ — A perturbarão. — As p a la v ras do A njo M aria


responde com certa p e rtu rb a çã o . V ê como tem o ro sto rubro
d e p u d o r..., escuta o p a lp ita r a pressado do seu c o ra ç ã o ....
p e n etra no desgosto pro fu n d o , in tim o ..., p arece que p e r­
g u n ta a si mesma, com o que assustada: a que v irá este
m en sag eiro ?— O anjo tinha-L he dito a verd ad e, porém
fe rira -A na sua hum ildade. — M ais tard e E la reconhecerá
püblicam ente a certeza das p a la v ra s do A njo, e ainda
re p e tirá que todas as gerações a cham arão «B em -aven­
tu ra d a » ..., não porém p a ra se engrandecer, senão p a ra
lo u v a r a D eus.
M as a gora é E la ... E la pró p ria, o objecto do louvor,
p o r isso n a tu ra l e espontaneam ente se assusta e se põe de
sobreaviso como que esperando um a te n ta ç ã o ..., como se
pudesse pecar.
V a i pois tu com o A njo tranquilizá-lA e diz-L he: «N ão
tem ais. M aria, n ã o tendes que tem er, nem de que vos
a ssu sta r perante esses lo u v o res.... no entanto, bem está
que vos perturbeis e assusteis p a ra me ensinardes a m aneira
de receber os louvores que m e dão os hom ens; ensinai-m o
p ràticam ente, M ãe de toda hum ildade»...
A titu d e de M aria — A sita hum ildade 8 !

2. ° — G randeza desta hum ildade. — C onsidera com o é


g ra n d e a hum ildade d e M a ria precisam ente neste passo da
vida da SS.™'1 V irgem .
—’ E n ten d e-se a hum ildade de M a ria em Belém, re p e ­
lida por to d o s..., no E g ip to , fugindo dos seus inim igos...,
em N a za ré , ig n o rad a e escondida n aquela casa de o p e rário s
pobres e quase m iserá v eis..., n a cruz. sendo M ãe dum jus­
tiç a d o ...; porém a g o ra, v isita d a p o r um A n jo ! ... p ro cu rad a
p o r D eus que pede o seu consentim ento e que fica esperando
a sua re sp o sta !... lo u v ad a e enaltecida até à m ais alta
d ig n id a d e !... Q u e inconcebível hum ildade!
A m enor h o n ra foram elev ad o s A d ão no P a ra ís o e cs
A njos m aus no C é u ... E no e ntanto desvaneceram -se com a
so b e rb a e caíram no abism o. -— M a ria porém sabe que o
que o A njo lhe diz é da pa rte de D e u s..., que um A njo não
pode m entir, e p o r isso m esm o sabe ser v erd ad e tudo o
que Lhe diz; e longe d e se e n v a id e c e r..., p ertu rb a-se e hum i­
lha-se sem pre m ais. Q u ã o G rande, quão en cantador, quão
a tra e n te é M a ria pela sua hum ildade!
Com o D eus sabe p o r meio desta profundíssim a hum il­
dade, re p a ra r bem o pecado que com eçou pelo orgulho. 3

3. " — H um ildade verdadeira.— A hum ildade não é am es-


q u in h a m e n to ; faz-nos pequenos, sim, a nossos o lh o s...,
porém grandes, m uito grandes aos olhos cio Senhor. É assim ,
M aria nunca foi tão grande aos olhos de D eus como
nesta ocasião. —• Finalm ente, a hum ildade não é p ró p ria
dos cobardes e dos reles, m as sim dos fortes e dos m ag n â ­
nimo,';.
C ontem pla M a ria ... p e rtu rb a d a, aniquilada, perante as
p a la v ras d o A n jo ..., conserva porém o seu juízo sereno.
Ira n q u ilo , c ... estuda, pensa e o p e ra com decisão. — E sta é
a v erd ad eira hum ildade: conhecer a voz de D eus, subm e-
ir r o seu juízo e p róprio p arecer a essa v o n tad e e segui-la.
E isto, ainda que custe como custou a M a ria. E la bem
82 A A nunciação

sab ia os sofrim entos, as d o res e esp a d as agudíssim as que


atorm entariam o seu c o ra ç ã o ... e não o bstante decide-se a
a ce ita r a p ro p o sta do Senhor. -— H um ilde, porém m agnânim a
viril, valente. Isto é que é o fruto d a hum ildade.

4.° — A tua hum ildade. — É s sem elhante a M aria, na


hum ildade e na generosidade no sacrifício?— n ã o p ro cu ras
afagos, sorrisos, p a la v ra s hum anas? — P ro c u ras o pior, o
m ais custoso, o m ais hum ilhante?— Q u a n d o D eus to dá,
conform as-te pelo m en o s... o u p rotestas e desejas evitá-lo?
P en sa m uitas vezes no teu n a d a, pois assim como D eus tirou
do n a d a as grandezas da c ria ç ã o ..., do conhecim ento do
teu n a d a b ro ta rá a tua gran d eza. — C onhece a D eus que é
tu d o ; conhece-te a ti m esmo que és n ad a, e a conclusão
será a hum ildade.
E x erc ita -te em actos de hum ildade interior e faz m uitos
a cto s de hum ilhação exterior. A gradece e estim a a quem
te aju d a a hum ilhar-te com, desprezos, zom barias, e tc ...
24. A Anunciação — A Pureza Virginal

1. ° — O bservações de M aria. — À s p a la v ra s do A njo,


M aria responde com um a o b servação que indica tem or.
E v a no P a ra ís o teme ao com er o fruto p ro ib id o ; m as
não é o pecado que ela receia, receia m as é o castigo d a
m orte. M aria, pelo contrário, o que tem e ao o u v ir o A njo
é faltar à p a la v ra d ad a a D eus. O seu tem or é justo,
racional, santo, inspirado no am or de D eus e n a virtude.
S ão assim as tu a s o bservações quando ouves a voz de
D e u s... ou são in sp irad a s pelo am or p ró p rio que resiste a
subm eter-se a essa voz divina? 2*

2. ° — A E ncarnação peia virtude. — P e n e tra em tã o


sublime pensam ento e contem pla a D eus traç an d o os planos
da obra g randiosa da E n ca rn aç ão tendo por base a v ir­
gindade.
A R edenção d o hom em tinha duas dificuldades in v en ­
cíveis, com o já dissem os n o u tra p a r te ...; recorda o que
então m editavas — que não era hum anam ente possível a
Redenção po rq u e toda a hum anidade não po d ia sa tisfaz er
pelo p e ca d o ... era necessário que D eus o fizesse; D eus
porem não podia tam bém fazê-lo pois não era possível
sacrificar-se, im olar-se, padecer nem m orrer pelo hom em ;
dlvlniim ente era, de igual modo, irrealizável. D eus porém
p rocura a solução.
84 A A nunciação

F a z er-se hom em e ter assim um corpo p a ra so frer e


m orrer. — M as este corpo, n ã o podia form ar-se como os
ou tro s, p o rq u e n asceria m anchado como todos n ascem ; assim,
se ria um corpo concedido em pecado e a este corpo não
se p odia un ir o Filho de D eus.
A solução deste conflito é M aria Im aculada, sem m an­
cha n a su a conceição e M a ria V irg em , sendo M ã e sem
detrim ento d a sua virg in d ad e.
A ssim , Jesus virgem , sa n to e p u ro com o D eus, tam bém
o se rá com o homem, po rq u e a sua M ãe se rá igualm ente
sa n ta, p u ra e virgem . — A In c arn a çã o pela V irg in d ad e ! —
Q u e form osura e que beleza a desta virtu d e!

3. ° — P referencias d e C risto. — O Senhor teve


am or tão grande de p referên cia à v irgindade, que lhe dedi­
cou um a das suas b e m a v en tu ra n ça s... teve um discípulo
am ad o e fo i... o que era v irg em ; a ele lbe confiou na
C ru z o tesoiro de S u a M ãe, como único digno p ela sua
v irg in d a d e de g u a rd a r a V irgem das virgens. — F ico u na
E u c a ris tia e deu aos sacerdotes p o d e r sobre o seu C orpo
e S angue, porem exigiu que o seu sacerdócio fosse virgem
.—»escolheu alm as predilectas p a ra su as esposas e estas
sã o . , a s virgens. — E nfim , reserv o u um prém io especial
que consistirá em a co m p an h a r o C ordeiro p a ra onde quer
que E le vá, e em c a n ta r um cântico novo que ninguém ,
senão elas, p o d erão can tar, e estas sã o ... as alm as virgens. 4

4. ° — A tua virgindade. — P ensa m uito n a g ran d eza


g ra ça que D eus concede às alm as que cham a ao estado de
virg in d ad e.
Se tu és um a delas, im pregna-te p rofuhdam ente dessa
v irtu d e e p ro c u ra se r m uito agradecida.
T ra d u z este agradecim ento em obras, cuidando p rin ­
cipalm ente e antes de tudo da m odéstia in te rio r e exterior
que necossâriam ente h á-de acom panhá-la, e le v a r isto até
A P ureza V irginal 85

a o exagero, nos olhares, curiosidades, atitudes, v esti­


dos, e t c .. . ;
— Fom enta, depois, em ti a hum ildade, base da casti­
d a d e ...; m uitos p o r soberba, caíram em pecados im puros.
D o m esm o m odo fom entarás a m ortificação e peni­
tência, que são essenciais a esta v irtu d e ... Com o fim de
a c o n se rv a r in ta c ta e viçosa, todo o sacrifício te há-de p a re ­
cer pequeno.
— E m terceiro lu g ar, pede m uito à S S .n" V irgem que
a imites, em especial no seu am or à c astidade v irg in a l...
e finalm ente que te ajude p a ra co.m E la tra b a lh a r por
construir, estabelecer e d ila tar p o r todo o m undo, o sublime
reinado da P ureza.

k:

-, i*' !
25. A Anunciação — A escrava do Senhor

l.° — R esposta de M aria. — Im agina a cena e assiste


a ela em espírito, o m ais de perto p o ssív el...
T erm in ara já o A njo a sua e m b a ix ad a ; cum prira a
su a m issão e perm anece em silên cio ..., espera a re sp o sta de
M a ria .
— L ança um o lh ar sobre todo o universo, fixa o teu
o lh a r em D eus neste m om ento soleníssim o... Q u e em ocio­
n a n te e sp e c tá c u lo !
A proxim a-te de M a ria e pede-lhe que não dem ore a
re sp o sta ..., diz-lhe que todos os infelizes filhos de E v a,
q u e nascem os escravos do pecado, esperam os a sua p a la v ra
de red en ção e de g ra ç a ..., que todo o m undo e o p róprio
C éu, estão suspensos esp eran d o a sua resposta.
Com efeito, é quebrado o silêncio... M a ria vai fa la r...,
o A njo trem e de e m o ç ão ... M a ria p ro stro u -se p o r terra,
e do fundo da sua alm a, brotaram estas sim ples e sublim es
p a la v ra s : E is aqui a escrava do S e n h o r... A g o ra é o A njô
que se p ertu rb a: com todo o seu entendim ento angélico não
chega a com preender ta n ta hum ildade, ta n ta san tid ad e. —
A R ainha das rainhas, a S enhora do céu e da terra, a ben­
d ita entre todas as m ulheres... é um a e s c ra v a ...; assim
E la o reconhece e crê, sem disso se enverg o n h ar, e sem
o o cu ltar. E la mesma o proclam a à face de todo o m undo
A A nunciação 87

e p arece em penhar-se em que todos nós saibam os que com


toda a sua grandeza é sem pre a e scrav a do Senhor.
E n tra ag o ra no c oração do p róprio D eus: — que se n ­
tirá ao ver esta atitude, ao e sc u ta r estas p a la v ra s ? ...
Se aos hum ildes e pobres de espírito enche de seus bens.
que faria com aquela sua e sc ra v a z in h a ? ... Com que p razer
D eus lhe diria:
«T u fizeste-te e sc ra v a ? ! E eu faço-te R a in h a » ...; .man­
d a ria a todos os a n jo s do céu que naquele mesmo instante
a venerassem com o tal.
F az tu o mesmo e v en era tan ta grandeza em tã o p ro ­
funda hum ildade.

2." — A verdadeira escravidão. — M as n ã o te detenhas


n esta escravidão de p a la v ras. T u tam bém p o r p a la v ra s te
o fereceste e en treg aste a D eus, com o e sc ra v a ; m as d e p o is...
com o as tens cum prido?— Em M a ria porém não é assim ...,
diz o que sente e procede com o d iz ...; por isso acrescenta:
[aça-se em m im , segundo a vossa palavra.
M edita m uitas vezes e saboreia toda a significação
d e sta p a la v ra [aça-se que é a fórm ula da v e rd ad e ira e sc ra ­
vidão. — Sou e scrav a e p o r isso, n ã o tenho nada, nem
posso q uerer n a d a fora de D eus. — T u d o h á-de v ir do
Senhor, n a d a d a escrav a. — P o rta n to essa p a la v ra supõe
um a renúncia total, com pleta, perfeita, absoluta do seu
se r... N em v ontade, nem liberdade, nem querer nada, senão
só o que D eus queira e d isp o n h a ... Q u e escravidão!
A inda m ais. E ssa e scrav id ão não deve p a ra r an te o
sacrifício por m uito grande e doloroso que seja. — M a ria
neste passo, o p e ra conscientem ente, isto é, dando-se p e r­
feita co n ta daquilo a que se vai o b rig a r..., o pera sem p re ­
c ip ita ç ã o ..., pensa, discorre, objecta ao anjo, propõe as
su as razões e soluções, e tc ..., sinal claro de que o p e ra com
lodo o conhecim ento de c au sa; p o rtan to conhece desde então,
Indo o que há-de sofrer, se for M ãe de D e u s..., sabe que
88 A escrava do Sen h o r

a esperam torm entos que a farão R a in h a dos m ártires...»


que será um v erd ad eiro m ar de a m a rg u ras; c o n d u to ...
sabe ser essa a v o n tad e de D eus, e é quanto lhe basta.
— A té conhecer claram ente o que D eus quer, faz obser-
v a ç õ e s; porém q u ando percebe o desejo de D eus, n ã o tem
m ais que um a p a la v ra : Faça-se.
■—.R ec o rd a as p a la v ra s de C risto n a sua P a ix ã o ; tam ­
bém diz: F áça-se a tua vo n ta d e e não a m inha. N ã o é o
mesmo que o F aça-se d a V irgem S S .m"? ... Q u e p e rfe ita
coincidência entre o F ilho e a M ã e !
E s ta é a escravidão, esta é a santidade, esta é a única
solução que podes en co n trar ao teu am or próprio.
É s tu assim ?— T am bém usas o teu «F aça-sc» p rá tic o
so b retu d o q uando o teu am or p róprio se rebela? Pede a
M a ria que a im ites no cum prim ento desta p a la v ra.
26. A Anunciação — A Mãe de Deus

1. ° — O «F iat» om nipotente. — P orém este [aça-sc de


e sc ra v a de M a ria , é tam bém a e xpressão p rá tica d a sua
om nipotência. — A p en as p ronunciado, o E sp irito Santo,
com o disse o A njo, a cobriu com a sua som bra p ro te c to ra
e levou a cabo a o b ra da In c a rn a ç ã o ; naquele m om ento se
efectuou aquilo que diz S. João: «o V e r b o se [ez carne
e com eçou a h a b ita r entre nós».
Ó p a la v ra de po d er im e n so ! — P ro n u n cia-a a om ni­
potência de D eus e do n a d a b ro tara m os m undos. D i-la
M a ria no abism o da sua hum ildade e ainda o p e ra m ais
m aravilhas que o C riad o r. — A quele «[ia t» tira do n a d a
todas as coisas. — E ste, tira o p ró p rio D eus do seu C éu...»
d a sua e te rn id a d e ..., p a ra que sem d e ix a r de ser D eus,
com ece a ser homem.
C ontem pla a S antíssim a V irgem e vê como o E sp írito
S an to o rg an iza no im aculado sangue de M a ria o C orpo de
[osus C risto, p a ra que esse C orpo e esse Sangue que
recebe da V irgem S S .'”a seja a m atéria do sacrifício que
para rem ir o m undo oferecerá m ais tard e n a C ru z..— A d o ra
este augusto m istério, e por ele . dá g raças a Jesus e a
M aria. 2

2. ° — A d ivin a m aternidade. — M a ria neste instante fica


c onvertida em v e rd ad e ira M ãe de D eus. — D ignidade altís-
9 0 A A nunciação

sim a e m aravilhosa. — É infinita porque infinita é a digni­


d a d e de seu Filho. É um parentesco real e físico com o
F ilho d e Deus.
D esde este m om ento D eus, está em M a ria, não com o
im agem , n ã o com a sua graça, senão com a sua p ró p ria
pessoa d iv in a ; há entre D eus e M a ria um a v e rd ad e ira
identidade, enquanto que a carn e e san g u e de se u Filho,
sã o carne e sangue de M aria.
É a m issão .mais íntim a e sublim e que pode da r-se entre
um a c ria tu ra de D eus. — P o r ela, M aria, ao ser M ãe de
D eus. adquire a m ais alta a u to rid a d e ..., a a u to rid ad e de
m an d ar em seu F ilh o ..., a dquire o m ais elevado p riv ilé g io ...,
o de um direito especial ao am or do seu F ilh o ... e a receber
d 'E le todos os bens de g ra ça e de glória com o p o d e r de
com unicá-los aos outros.
N e sta m aternidade divina funda-se a v e rd ad e de que
E la é nossa M edianeira — e um a M edianeira om nipotente
—■porque p a rticip a p o r g ra ça da om nipotência que D eus
tem por natu reza e, além disso, é, p o r esta m aternidade,
a disper.seira de to d as as g raças, já que se vê claram ente
que D eus não quere com unicar-se aos hom ens directam ente,
senão por m eio de M aria, com o o fez na E n ca rn aç ão . —
M agnifica, sublime e divina é esta m aternidade.
N u n ca chegarem os a so n d ar toda a su a pro fu n d eza e
altíssim a m agnificência. D eus pode criar outros m undos,
o u tro s A njos, outros seres infinitam ente m ais perfeitos,
porém não pode fazer um a m ãe su p erio r à M ãe de D eus.

3.“ — A V id a da 'M ãe de D eus. — E ra um a v id a, nesse


tem po, de íntim a união com D eus — segundo o corpo e
segundo a alm a. — A vida intim a de M ãe e F ilho. — U m a
só vida, um mesmo p a lp ita r de corações.
Q u e recolhim ento tã o intenso e tã o p ro fundo p a ra
re co n c en trar toda a sua vida no seu F ilho!
T u d o o que fazia e ra com E le e p o r E le: v ia com
A M ãe d e D eus 91

o s olhos do seu F ilh o ; am ava com o seu c o raç ão ; os seus


gostos eram os dele. — D aí um a vida dos m ais íntim os,
pu ro s e perfeitos sentim entos de am or e gozo p a ra com
D eus a quem tin h a em seu seio. — Se o C éu consiste na
posse de D eus, M a ria já go zav a en tão d esta posse ainda
m ais in tim a..., ain d a mais perfeita que a de todos os A njos
e b em aventurados na glória. — E ra pois, um a vida toda
divina, toda gloriosa, toda san tificad o ra pela união com o
seu Filho.

4." — A M i e dc D eus é m inha M ãe. — T in h a ig u al­


m ente união com igo. — D eus quis que a sua M ãe fosse
tam bém m inha M ã e e am ou-m e já desde então como tal. —
E la d esejava ardentem ente que o seu F ilho já nascesse e
rem isse o m undo pensan do em. mim. E la já então queria o
mesmo que a g o ra, ter-m e a mim com o a verd ad eiro filho —•
com o ao seu Jesus — que eu me unisse com. E la, como e stav a
Jesus, p a ra que eu com o Jesu s... participasse daquela vida.
Q u e d ita a m inha —■te r um a M ãe que m ereceu ser
M ãe de D eus! — P o r E la adquirim os um parentesco com
Jesus. — Jesus e eu som os irm ãos. — P ensa m uito n isto e
a g rad ece estas m arav ilh as de am or à M ãe e ao Filho.
Im ita a M a ria n esta m aternidade d iv in a unindo-te in ti­
m am ente com o E la se uniu a Jesus. — T o rn a esta união p rá ­
tica, unindo-te antes com a Santíssim a Virgem, p a ra viveres
com pletam ente esta vida. — P ro c u ra que a tua alm a seja
filha verd ad eira, de p a la v ra e de v erd ad e de tão grande
M ãe.
u -jí o to c o );

27. A A n u n c iaç ão — A escravidão M a n a ria

l.° — C onceito d a escravidão'- — D evo p e n etrar bem


n o significado estrito d esta p a la v ra.
O escravo é um ser que depende de o u tro de tal m odo.
que tudo o que é e tudo o que tem não lhe p ertence a ele,
senão ao d o n o que o possui. — N ã o dispõe de n a d a nem de
ninguém , nem de si m esmo. — C arece de lib e rd a d e ..., n ã o
pode fazer senão o que o am o lhe ordena. — C arece d e
v o n ta d e ..., não pode q uerer o u não querer, senão acom o­
d ando os seus desejos aos do seu senhor. — C arece de p e r­
so n a lid a d e... é m ais urna coisa do que um a p e sso a ... O senhor
pode fa ze r dele o que lhe a p ro u v e r..., vendê-lo a o u tro
d o n o ..., d á -lo ..., castigá-lo, ainda que sem ra z ã o ... m atá-lo
ain d a que seja p o r c a p ric h o ..., ninguém p o d e rá pedir-lhe
contas do que fizer d e le ..., é seu escravo, pode fazer dele
o que lhe aprouver.
E s ta escravidão feita de um homem a o u tro hom em
é b rutal, indigna, d eg rad an te, pro ib id a p o r D eus, abolida
p o r C risto ... P orém se é feita a D eus e o hom em se en tre g a
com o e scrav o v oluntàriam ente a E le, é o acto m ais nobre,
m ais dig n o e m ais belo que se pode fazer. — É a p rá tic a
p erfeita d a m ais p ro fu n d a hum ildade cuja fórm ula é esta:
« T u d o é de D eus, n a d a m eu»; logo, «tudo p a ra D eus, n ad a
p a ra mim». — Assim, o m eu corpo com os seus sentidos,
a m inha alm a com as su as potências — todos os actos e
A escravidão M ariana 9 3

m ovim entos do m eu ser, sensações, pensam entos, afectos,


a m o re s... se falo, se me calo, se rio, se sofro, se ando,
se durm o, se oro, se corno... tudo p o r D eus e p a ra D eus.
—• Sublim e escravidão! — é a m ais a lta santidade.
Q u a n to m ais eu v iv e r e o p e ra r independentem ente de
D eus, m ais faltas e m ais im perfeições h a v e rá em mim. —
Q u a n to m ais v iv er D eus em mim e o p e ra r E le comigo, mais
perfeição terei.

2. ° — E scra vid ã o d e amor. — A ra z ã o de tudo isto é


que, esta e sc ra v id ão não é fo rçad a senão v o lu n tá ria e
am orosa.
S uave tira n o é o am or, porém é tira n o que escraviza.
—• P o r isso se é desordenado, a escravidão se rá às c ria ­
tu ra s e esta é a prim eira escravidão, p o ré m ... se é o rd e ­
nado e dirigido a D eus, é a segunda que nos diviniza.
N inguém m ais e scrav o do am or do que Jesus C risto.
—'Q u e divino tira n o foi p a ra E le o a m o r I Q u a n t a s coisas
c quantos sacrifícios o o brigou a fa ze r — que sublim es lou­
c u ras não está fazendo ag o ra mesmo pelos h o m en s..., p o r
mim! O am or essencial é união e im itação. — Se am o a
Jesus, hei-de im itá-lO nesta e sc ra v id ão de am or. — P o r ela
cie se deu todo a mim. — E u tenho que dar-m e todo a E le ...
senão, não am o d e v era s...
M as com o fazer isto pràticam ente? 3

3. “ — P o r M aria, com M aria, em M aria, para, 'Maria.


—• E is a solução fácil, bela, divina. — N a d a h á m ais fácil
do que am a r um a m ãe. Q u e será am ar um a tal M ã e ? —
Porém , que filho a m ará m ais sua M ã e ..., o filho m ais velho
que deixa a casa p a te rn a p a ra v iv e r livrem ente a seu c ap ri­
cho, o u o filho m ais novo que depende em tudo de sua
.mãe? D ela se alim enta, dela aprende as prim eiras p a la ­
v ra s ..., fala e pen sa no que ela lhe e n sin a ..., pela sua m ão
dii os prim eiros p a sso s..., p a ra ela v ã o os seus prim eiros
9 4 A A nunciação

sorrisos e carícias infantis, todos os seus sentim entos e todo


o seu a m o r..., a ela corre instintivam ente em q u a lq u e r perigo.
— N ã o é isto um a escravidão?
E is qual d ev e ser a m inha p a ra com M a ria. — T e n h o
que v iv er com o filho que sou, dependendo em tudo d E la
de ta l m odo que a m inha intenção seja sem pre a sua (por
M a r ia ) ..., o s m eios que em pregue em todos os m eus actos
serão sem pre os seus (com M a r ia ) ..., hei-de esconder-m e
em seu C o ra çã o p a ra v iv er com essa presen ça com o se
realm ente vivesse em M a ria ... e, por fi.m, v iv en d o deste
m odo, dirigirei tudo de tal so rte que redunde não em m inha
glória, nem em m eu p roveito, senão únicam ente p a ra sua
gló ria e serviço (p a ra M a ria ).

4 ." — O m olde divin o . — Isto quer dizer que hei-de m er­


gulhar-m e e perder-m e n 'E la , como um a gota de á g u a n o
o cea n o e com o a m assa no molde.
M a ria é o m olde de D eus. — E le quer fazer-nos sem e­
lh an tes a Jesus e p a ra isso nos dá o m olde. B asta p o rtan to
lan ç ar-n o s nele p a ra serm os pe rfe ita s im agens de C risto,
p o r serm os sem elhantes a M a ria. ■ — P a ra tal é necessário
a d a p ta r-te bem ao m olde esvaziando-te de ti p a ra te enche­
res de M a ria e fica p e rsu ad id o de que e nquanto não fizeres
assim n ã o se rás escravo, nem am arás d ev eras a M a ria.
P e n sa enfim n o prém io. — P a re ce r-te com tu a M ãe,
p a rec e-te p o u c o ? — E n c a n ta r a D eus como E la O encan ta?
— P o r ser escrav a, foi E la R ainha e M ãe de D e u s ; assim
será contigo. — D eus n ã o se deixa vencer em generosidade,
p o r isso n ã o podem os conceber que prém io d a rá ao que se
e n tre g a todo e tão perfeitam ente a E le, na sa n ta e scra­
vidão.
N ã o penses porém no prém io. — R enuncia a ele. —
N ã o queiras o u tro prém io senão am ar intim am ente a Jesus
e a M a ria e conseguir pareceste-te com ambos.
Com eça e continua sem desalentos na p rá tic a resta
A escravidão M atiana 95
escravidão. — P ede m uito a aju d a de M a ria. — E x am in a-te
d iàriam ente e p e rg u n ta a ti mesmo, com frequência, se real-
m ente v ais esvaziando-te de ti. — L em bra-te de .Maria nas
ocasiões em que se m anifestar o teu am or próprio. — T ra z
o exam e p a rtic u la r sobre isto. — R enova a p resença de
im itação, ao d a r a hora. N u n c a m ais p en sar em se te
a g ra d a ou não isto o u aquilo, senão v e r unicam ente se
tua M ãe querida o q uer ou não.
28. A Anunciação de Maria — A sua Festa

T u d o q uanto este m istério d a S S .ma V irgem tem de


in co m p aráv el e grandioso, se realiza p ela em baixada de um
A n jo ; se rá pois m uito p ro v eito so com parar esta em baixada
com a s que o S enhor nos envia a nós tão frequentem ente.

l.° — A E m b a ixa d a . — D eus envia o A njo em form a


v isível p a ra an u n ciar à S antíssim a V irgem a sua elevação
ã dignidade de M ãe de D eus. — A o que parece, o A njo
a p are ce u em form a hum ana, com o um jovem form oso e
c ercado de resplendores celestiais. — A ssim c onvinha p a ra
o fim tão excelso a que ia d e stin a d o ..., a tr a ta r do assunto
m ais im p o rtan te que jam ais se trato u entre o Céu e a terra,
en tre D eus e os hom ens.
D e u s quer tam bém tra ta r m uitas vezes connosco algum a
coisa que se relaciona com a sua glória e com o bem das
nossas alm as, e tra ta -o p o r meio dos seus anjos, a in d a que
em form a invisível. — Q u a n ta s vezes será o nosso fiel A njo
d a G u a rd a, o que em nom e de D eus nos in sp ira algum a
coisa de que não fazem os caso! — se o víssem os v isiv el­
m ente não procederíam os a ssim !— P o r que n ã o o vem os
com a fé? ...
Com olhos de fé vem os tam bém esses que rep resen tan d o
p a ra nós a D eus nos falam tam b ém ..., com o são os supe­
rio res,.,, cllivctores e sp iritu a is..., p re g a d o re s..,, as boas lei-
A A n u n cia çã o de M aria 97

tu ra s e os bons ex em p lo s..., as p ró p rias hum ilhações e tri­


b u la ç õ e s ...; tudo isso que o u tra coisa são p a ra ti se n ã o
com o que em baixadas que o S enhor te en v ia p a ra com unicar
c o n tig o ? ... Corno as recebes?— E xam ina e m edita n a
m aneira com o M a ria recebeu o A njo e com para com o teu
proceder.

2. " — A saudação do A n jo . — N a saudação do A njo


considera não só os louvores que d irige a M a ria, sen ão tam ­
bém as v erdades gloriosas e m agníficas que lhe lem bra.
D iz-L he que é cheia de graça e que D e u s está com E la,
e finalm ente que é b endita entre to d a s as m ulheres. — V ê
com o deste m odo o A njo a quer p re p a ra r p a ra que, pela
c o rrespon dência a esses fav o res do Senhor, dê o seu con­
sentim ento à su a em baixada e não p o n h a obstáculos ao plano
d e D eus.
— Assim tam bém a nós nos fala o Senhor. M uitas
vezes e de m uitas m aneiras, especialm ente com as suas
luzes interiores, nos fala ao c o ra ç ã o e nos faz sen tir as
g raças que d ’E le tem os re ce b id o ..., a o b rig aç ão que tem os
de co rresp o n d er a elas e de tra b a lh a r com elas, e nos alenta
com a esperança dos frutos riquíssim os de gra ça s e de
glória que com esta correspondência podem os conseguir.
M as, que fazem os nós? C om o recebem os estas inspi­
rações do C éu? E se algum a vez conseguim os aferv o rar-n o s
« trab a lh a r com m ais entusiasm o n a nossa santificação, não
é v erd ad e que o u tras n ã o fazem os n ad a, perdem os o tem po
porque pràticam ente desperdiçam os essas ilustrações e c h a­
m am entos do Senhor? 3

3. “ — C om o M a ria a recebe. — V ê com o a S S .mu V ir­


gem assim p re p a ra d a pelo A njo ouve claram ente a m ensa­
gem de D eus n o p o n to m ais principal: «S erás a M ã e de
I )eus porque d a rá s à luz o S a n to dos S antos». — M a ria
e sc u ta e longe de d a r logo o seu consentim ento cheia de
7
98 A sua F esta

vaid ad e, co,m grande p ru d ên cia e hum ildade, exam ina essas


p a la v ra s e considera com o podem estar conform es com a
v o n tad e do S enhor m anifestada antes no v oto da sua v ir­
gindade.
A p re n d e essa pru d ên cia da Santíssim a V irgem . — V ê
com que facilidade crem os que é um A njo e que é coisa
de D eus, q u ando se nos oferecem coisas que redundam em
nosso proveito, em nossa glória, e logo ..vamos a trá s do que
nos a g ra d a ..., e talvez não seja o A njo d a luz, senão o das
trev a s, talvez n ã o seja um a inspiração, senão um a tentação.
E x am in a, m edita e consulta, p a ra que assim acertes
em tudo e saibas im itar esta p rudência d a Santíssim a V ir­
gem,

4.° — O consentim ento. — C ontem pla ag o ra M a ria d ando


o se u consentim ento, um a vez convencida de que é coisa
de D eus.
V ê bem com o procede o Senhor. — E le p e d ia fazer
tudo isto sem c o n tar com a v o n tad e da S S ."la V irg e m ; e no
e n tan to não quer forçar a su a liberdade.
D este m odo procede connosco. •— D eus n ã o quer cora­
ções forçados, nem am or à força. — Q u e r alm as que livre,
v o lu n tá ria e generosam ente se entreguem a E le. — P a ra te
c ria r n ã o precisou de ti, porém p a ra sa lv ar-te e santificar-te,
é necessário que tu dês v oluntariam ente o teu consentim ento.
— N ã o te fa rá santo violentam ente e c o n tra tu a v o n tad e.
— E le te d a rá a su a g raça e a sua ajuda, p o ré m ..., de ti
depende o santificares-te com, ela ou o d esperdiçá-la e
rejeitá-la.
P o rta n to de ti e só de ti (convence-te disto) depende
que te santifiques o u não. N ã o te b asta este pensam ento
p a ra um a m editação m uito pro v eito sa, especialm ente ao
c o m p a rar-te com M aria, que ag o ra e sem pre deu o seu
livre c generoso consentim ento à o b ra de Deus?
C oragem e g e n ro sid a d e !— N u n ca pois, v a cilar p e ran te
A sua F esta 99

as inspirações e em baixadas que o S en h o r nos envia. —


N ã o determ o-nos p eran te a voz de D eus, senão p a ra e x a ­
m iná-la com p rudência e p a ra não a confundir com as
em boscadas do inim igo, p o ré m ... nunca determ o-nos por
m oleza e cobardia, p o r am or p róprio e so b e rb a ..., p o r m edo
da hum ilhação e do sacrifício. — M a ria não atende tan to
à c oroa de oiro que lhe oferece o A njo, com o à coroa de
espinhos. — Sabe que o ser M ãe de D eus significa ter o
seu coração sem pre a tra v essa d o com um a esp ad a de d o r...,
e com coragem e v a le n tia se decide aceitá-la: faça-se em
mim segundo a tua palavra.
Pois bem, se queres que a tua alm a seja deveras filha
de D eus e esposa de C risto e se asp iras à co ro a do Céu,
hás-de am ar a g o ra o sacrifício, a m ortificação, a crucifi­
cação d a carne e das tuas paixões. — P e ra n te o exem plo de
M aria, R ain h a dos m ártires, não duvides em seres tam bém
m ártir de a m o r..., aceita e ab raça com generosidade esse
sacrifício p o r M a ria e com M aria.
I

29. A V isitação da Santíssima Virgem

É o testem unho que D eus d á p a ra confirm ar a con­


ceição m ilagrosa de M a ria ; p o r isso é um m istério g ra n ­
dio so n a v id 3 d a SS .",a V irg em e m uito c onsolador p a ra
os seus filhos e devotos.

l .o — O M lstír io . — T erm in ad o o m istério d a E n c a rn a ­


ção tem lu g ar im ediatam ente o da V isitaç ão , porque têm
íntim a união entre si. — P a re c e que n a A nun ciação é o
C é u que p o r m eio d e um A n jo sa u d a M a ria com a m ais bela
e form osa saudação, e reconhece n 'E la a M ã e de D eus e a
R a in h a dos Céus. — O S enhor não quere que a te rra p e r­
m aneça indiferente p e ra n te este facto, e p re p a ra nela um a
sa u d a çã o que seja um testem unho do reconhecim ento da
te rra p a ra com a M ãe de D eus.
O A rcan jo falou em nom e d o C é u ... S a n ta Isabel, em
nom e d a terra. — A s su as p a la v ra s de felicitação a M aria,
o s seu s sentim entos e os seus louvores são nossos em certo
m odo. A leg ra-te com esta disposição do Senhor, que já
e n tã o quis que nós, p o r meio de S a n ta Isabel, n o s asso ­
ciássem os ao júbilo que os C éus e a te rra sentiram perante
Í.\V' a In c arn a çã o d o V e rb o e a M atern id ad e d iv in a de M aria. |
—• Supõe, pois, que és tu mesmo que falas e repetes com
todo o entusiasm o e fe rv o r os louvores da sua prim a à
S S ."'“ V irgem .
A V isitação da Santíssim a V irg em 101

2. " — A V isitação em 'M exia.-— F o i um acto de cortesia


e de delicadeza. — A V irgem S S .'"“ com preendia a felicidade
que teria S a n ta Isabel quando depois de tan to s anos de
esterilidade, pois já era de idade a v an ç ad a , D eus lhe
concedia a g ra ç a de ter um filho. — Q u e aleg ria não h a v ia
de encher aquela casa! — Q u e consolação a de S a n ta Isabel
quando viu que D eus o u v ira a o ra çã o constante que fazia
com este fim !— A SS ."1“ V irgem bem o sabia, e não hesita
em ir p a rtic ip a r desta aleg ria e m ais ain d a em aum entá-la
a pressando-se a dar-lhe pessoalm ente os parabéns.
N u n c a a cortesia, a urbanidade e m enos ainda a deli­
cadeza estão em c o n trad ição com a san tid ad e. — N em e x a ­
geros ridículos e falsos cum prim entos do m u n d o ..., nem
tam bém grosserias c .m aneiras de ser eg o ístas que n o s im pe­
çam de fazer o que devem os aos outros.
P ensa neste exem plo tã o delicado e tão cortês da
SS.""1 V irgem , e c onvencer-te-ás de que a urbanidade e
educação bem entendidas e bem p ra tica d a s, são um a grande
pa rte da santidade, e p o r vezes confundem -se com ela.
M edita bem nisto e exam ina o te u m odo de p ro c ed e r
ii face deste exem plo d a S S .ma V irgem , num p e n to tã o
p rático e tão freq u e n te... 3

3. ° — Foi ■ u m acto dc obediência. — A visita não é só


nm acto de cortesia, m uito m enos é ela feita pelo desejo
de se certificar d a v erd ad e das p a la v ra s do anjo, pois M aria
nunca duvidou nem vacilou em sua fé. — N em tam bém v ai
Ver sua prim a p a ra com unicar-lhe o m istério que n E la se
efectuou e que a elevou à dignidade de M ãe d o M essias.
■M uito pelo contrário, oculta-o e não o revela nem, mesmo
n S. José, a quem não diz nem um a só p a la v ra do segredo
que existe entre D eus e E la.
M aria, v ai pois a casa de Isabel por o b ed iên cia...
ê mu im pulso interior, um a inspiração do Senhor que a isso;
a Incita, e não h e sita ... senão que im ediatam ente segue e s s a
102 A V isita ção da Santíssim a V irgem

inspiração. — E r a ain d a m uito jo v em ... o cam inho longo


e c u sto so ..., o seu estado m uito delicado e ... n ã o obstante,
D eus o quer e sem dem oras o executa. — D iz o E van g elh o :
«levantando-se correu p re ssu ro sa» ... Q u e intenso am or à
o b e d iê n c ia !... Q u e confiança n ’E la ! — N ã o sa b ia a S a n ­
tíssim a V irgem qual o fim que D eus preten d ia com essa
v is ita ... ig n o rav a tudo o que se h a v ia de p a ssa r naquela
casa e ... n o e n ta n to o que lhe interessa é confiar-se ao
S enhor e obedecer p ro n ta e cegam ente. — D eus sa b e aonde
a guia e conduz.

4.“ —- F oi sobretudo um acto de caridade. — É a única


vez que o E v an g e lh o diz que M a ria «correu diligente.rn.ente».
E sta pressa p arece que n ã o está conform e com a calm a
e tranquilidade d o seu c a rá c te r... P o rq u e será? ... Ü nica-
m ente pela sua ardente caridade. — T em em seu seio v ir­
g in al o V erb o que é D eus, que é c a rid a d e ... e este fogo
a b ra s a -a e fá-la co rrer p a ra onde a carid ad e a cham a. —
S. P a u lo dizia que a caridade d e C risto o im pelia e o não
d e ix a v a d e sc a n sa r..., queria p e rco rre r todo o m undo p a ra
lev a r a toda a p a rte a cham a da sua c a rid a d e ... C om o seria
en tão a carid ad e de M a r ia ? — Q u e desejo o seu de que
Jesus com unicasse q uanto antes a g ra ça e com eçasse a sua
o b ra san tificad o ra nas a lm a s .— E assim, corre e v o a com
g ra n d e pressa p a ra d a r um desafogo a essa c arid ad e divina
que a a b ra sa ...
A g o ra pensa, e co m p ara as tu as visitas com esta da
S an tíssim a V irgem . — S ão sem pre de delicada cortesia, por
obediência o u inspiração de D eus, e sobretudo com espírito
d e caridade, p ro c u ra n d o fazer com elas bem ao próxim o?
Q u a n ta s visitas de passatem p o em que se perde o tem po
o u se m istura a c rític a ..., a m u rm u ra çã o ..., a dissim ulação
que nos faz dizer o que não sentim os... Q u a n ta hipocrisia
em todas essas v isitas feitas com espírito do mundo!
A V isitação da Santíssim a V irgem 103

E x am in a bem quais as tuas conversas nessas visitas


e c s seus m otivos, prom ete a M a ria edificar o teu p ró ­
ximo, desterran d o da tu a boca p a la v ra s que ofendam os
o u tro s, e tendo sem pre presente a lei da caridade p ra tica d a
dum m odo tão belo pela S S .1"“ V irgem ,
30. Visitação da SS."'" Virgem e Santa Isabel

T rê s m eses esteve a A rca d a A liança em ra s a dc


Q bededon e D eus abençoou aquela casa d erra m an d o sobre
ela grande chuva de gra ça s e prodígios. P o ”ían to não é
p a ra e stran h a r que, a casa de Z a c a ria s onde esteve c u tro s
três m eses a A rca divina cheia do M a n á do Céu. a cum u­
lasse o S en h o r de b ê n çã o s... V ejam o s como aconteceu assim
com S a n ta Isabel e com S. João.

l.° — A V isitação em S a n ta Isabel. — C om o é su a v e


p en sar que p o r m eio da Santíssim a V irgem quis Jesus le v a r
a cabo a prim eira san tificação das alm as, com o o fez com
S a n ta Isabel e seu filho! — T ira pois como conclusão que
a san tificação d a tua alm a n ã o a lev a rá o S enhor a cabo.
senão n a m edida em que te en treg ares a M aria.
C onsidera depois a recepção que faria S a n ta Isabel a
su a prim a. Q u e satisfação ! Q u e A le g ria !— N u n c a teria se n ­
tido n a d a de sem elhante. — Im agina que delicadezas não
in v en ta ria p a ra to rn ar a g ra d á v e l à SS.""1 V irgem a sua
e sta d a naquela casa. — Q u e farias tu em sem elhante oc asiã o ?
—-N ã o te fa rá san ta in v eja esta m ulher que teve a so rte
de ser a prim eira a oferecer o s seus obséquios a M a ria ?
N ã o se rá m elhor im itá-la?— A V irgem SS."’a q uer tam ­
bém v isita r o teu coração, m o rar n a tua a lm a ... lem bra-te
tam bém de a receberes com delicadeza e não a deixes só
V isitação da S S . " ' V irg em e S a n ta Isabel 105

csquecendo-te que lhe deste h o spitalidade no teu c o ra ç ã o ...


Se assim te descuidasses com eterias um a grosseria incal­
c u lá v e l.'— A tende a M a ria ..., serve a M a ria ..., acom panha
M a ria ..., serve a M a ria . — E sta r ao serv iço de M a ria !
S er útil à S S .ma V irg em !
P e n sa bem n o que isto significa e v e rás quão su a v e
e p rá tico é este pensam ento.

2.“ — F o i cheia cio E sp írito S a n to . — A p en as M a ria


sau d o u a S a n ta Isab el logo esta ficou cheia do E sp irito
S a n to .— Ó p a la v ra s fecundas de M a r i a ! ... C om o sois efi­
cazes, pois só um a sim ples saudação sua serve p 2 ra en ch e r
de g raça e san tid ad e aquela a lm a !— Com o as flores d e rra ­
m am p o r toda a p a rte o seu arom a, assim M a ria d erram a
c com unica a quem se chega a E la, a g ra ça e form osura de
que está cheia.
Pede-lhe que g u a rd e p a ra ti algum a dessas suas p a la ­
v ra s que te santifiquem ...., que não as em pregue todas com
o u tra s alm as, ainda que as m ereçam c aproveitem m elhor
do que tu ..., que precisam ente p o r tu a m iséria, necessitas
mais d 'E la que o u tras, e que confias que te não ab an d o n ará,
P ensa alem disso como hão-de ser es p a la v ra s que
salem da tu a b o c a ..., p a la v ra s de edificação e san tific aç ão
p a ra o p ró x im o ..., nunca p a la v ra s o c io sa s..., in ú te is..., p re -
ludiciais, que desedifiquem ou contribuam p a ra fazer p ecar
o u lev a r os outros a com eter faltas.

— L ouvores de S a n ta Isabel. — S a n ta Isabel, cheia


do E sp irito S anto, a prim eira coisa que fez foi conhecer a
conceição divina de M a ria pela qual era M ã e de D eus. e
depois prorrom peu em louvores a E la : B endita és tu en tre
in m ulheres, e b endito o fru to do teu ventre.
Ví- com o a grandeza de M a ria se conhece unicam ente
h luz do c é u ... unicam ente com a o ra ç ã o ...; pedindo m uito
no S enhor chegarem os a conhecer algum a coisa do que é
106 V isita çã o da S S ." " V irg em e S a n ta Isabel

M a ria . — Sem essa luz ap en as poderem os a tin g ir m uito ao


de leve a sua form osura e sa n tid a d e quase infinitas.
M edita, além disso, no m istério dessa exclam ação de
S a n ta Isabel ao v e r assim sua prim a tã o g ra n d e e tão
excelsa. — Q u e teria visto n 'E la , p a ra o E v an g e lh o dizer
que n ã o se pôde conter, e exclam ou em voz alta, ccm o quem
d á um grito de su rp resa e de gozo que n ã o é possível
reprim ir?
N o ta que as p a la v ra s que pronunciou são as m esmas
do A njo: B endita entre todas as m ulheres, e adm ira esta
coincidência de bendizer e lo u v ar sobre to d as as c ria tu ra s
a R ain h a dos C éus e d a te r r a ...; adm iráveis os juízos de
D eus que assim dispõe as c o is a s !...
Q u e se pa ssa ria no C o ra çã o de M a ria ao v e r des­
coberto por su a prim a o m istério da su a M atern id ad e, e
ao e sc u ta r da sua boca as m esm a p a la v ra s d o A njo? —
O s A njos e o s h o m en s..., a te rra e o C éu, todos unidos
num mesmo lo u v o r! É que o a u to r é o m esm o...; o que
inspirou o A njo e S a n ta Isabel, foi o E sp írito Santo,
E sp o so dilecto de M a ria, que assim se v a le de todas as
cria tu ra s p a ra A enaltecer e sublim ar.

4.“ — A sua hum ildade. — A s o u tras p a la v ra s e n ce r­


ram um afecto de p ro fu n d a e atraen te hum ildade. —• D e
onde m e veio a mim esta dita, que a M ã e do 'meu Senhor
venha ter c o m iyo l S a n ta Isabel e stav a unida a M a ria com
laços de parentesco, era m ais velha que E la e além disso,
e ra m uito sa n ta e não o b sta n te ... reconhece que não tem
m éritos p a ra receber um a v isita da S S ."'“ V irg e m ... E tu
m ere ce -la? ... T en s algum a ra z ã o p a ra p e d ir a M a ria que
n ã o te deixe e te acom panhe e te v isite ? ... S im ; tens um a
ra zã o m uito forte e é a a p o n ta d a já ..., o ser tã o p e q u en o ...,
tão ru im .... tão m iserável é m otivo p a ra confiar m ais e
m ais em M aria, pois como M ã e carinhosa, cu id a rá com
tli.il» esm ero dos filhos débeis, raquíticos, enferm iços, e será
V isitação da S S ." ” V irg em e S a n ta Isabel :07

m aior a sua glória, se conseguir dar-lhes a vida de que


necessitam .
Q u a l se rá a glória de M a ria se conseguir, a p esar das
tu as faltas. ingratidões e m isérias, la z e r de ti um a alm a
s a n t a ! — C onfia pois nela e pede-lhe que faça assim.
F inalm ente, S a n ta Isabel p ro fetiza que N o ssa S enhora
será bem -av en tu rad a porque acreditou n a s p a la v ra s do
S enhor. — E v a n ã o acred itan d o levou-nos à ru ín a ... M a ria
c r e u ; e com esta fé realizou-se a E n ca rn a ç ã o e a nossa
R edenção.
D á gra ça s à S S ."" V irgem que p ela sua fé nos salvou
e pede-L he p a ra poderes im itá-la neste mesmo espírito de
fé simples, p a ra seguires as su as p a la v ra s e creres sem pre
nas suas inspirações, pois essa fé é a hum ildade e des­
co n fian ça de si m esm o... e ao .mesmo tem po a obediência
e a e n treg a à v o n tad e do S enhor com a qual havem os de
re p a ra r a desobediência de E v a e conseguir p a rtic ip a r dos
frutos i a obediência de M a ria ...
■31. Visitação da SSr"'“ Virgem c S. João

Se o s efeitos causados em S a n ta Isabel com a v isita


de su a p rim a foram adm iráveis, e im ensos os dons e g ra ça s
que p o r E la recebeu, não o foram m enos o.s que ch egaram
a té ao filho d a s suas en tran h as. — P o r isso1 hoje h avem os
de m editar n a V isitaç ão de M a ria considerada em S. João.

l . ° — O s seus efeitos. — O prim eiro efeito cau sad o n o


P e rc u rso r ao sentir d e n tro do seio de sua m ãe a presença
d a S S .m" V irgem , foi de um a íntim a alegria, até ch eg ar a
m anifestá-la de um m odo prodigioso, m ediante aqueles sa l­
tos que su a m ãe sentiu que o m enino d a v a cheio de a le g ria
e de gozo e x trao rd in ário . — O espírito de D eus é paz,
alegria e gozo do coração. — P o d e rá s sofrer, ter d esg o sto s
e sofrim entos m uito custosos e talvez bem d o lo ro so s—
porém com Je su s..., n a sua presen ça e n a de tua M ãe que­
rid a ... tudo se su a v isa rá. — N ã o procures felicidade e ale­
gria fo ra de Jesus, nem mesmo n este m undo a p o d e rás
e n co n trar n o u tra p arte.
A lém disso, este gozo d o m enino ao o u v ir a voz de
M a ria e a o sentir p erto de Jesus, significa a aleg ria do des­
p e rta r do m undo com a v in d a do R edentor. — A noite é
sem pre tris te ..., o d e sp e rta r da n atu re za é alegria, a vida
é inefável poesia. — C ontem pla .mais um a vez c m undo
subm erso na noite etern a do p e c a d o ...; vè-o porém a des-
V isita çã o d a Sa n tíssim a V irg em e S . João 109

p e r ta r ...; já p asso u a n o ite ..., já chegou o dia, e o doce


d e sp e rta r de tã o h o rrív el sono, causa à hum anidade, um a
p ro fu n d a felicidade e alegria. — É o que significam os saltos
de gozo que deu S. João.
S ão os prim eiros salto s de um a alegria que será eterna,
p a ra todos o s hom ens que queiram ap ro v eita r-se d a vinda
de Jesus C risto.
P ensa num encarcerado que está num triste e obscuro
calaboiço, c a rre g a d o de cadeias e condenado à m o rte ...
com o receberá ele o am anhecer d o d ia da sua liberdade,
em que ,se q u e b rarã o as su as cadeias e v iv e rá v id a de luz
e a le g ria ? ...
F oi assim que S. João, rep resen tan te d a hum anidade,
recebeu o gozo de to d o s os hom ens que p o r Jesus C risto
h aviam de ch eg ar à v id a do C é u ...

2." — S antificação de S . João. — É este o fim principal


deste m istério. — D eus queria sa n tific a r o seu P re c u rso r e
com o Jesus n ã o p o d ia ir p o r si m esmo, v a i p o rta n to n o seio
puríssim o de M a ria. — N o ta os porm enores im portantíssim os
nesta m isteriosa santificação. — Só nesse cam inho as alm as
O podem e n co n trar. — Q u a n d o trab a lh a re s nesse sentido,
en tão poderás d izer que v a is com Jesus.
M ed ita um a vez m ais na p ro n tid ã o e p ressa que deve
h a v e r e.m se rv ir e entreg ar-n o s a D eus. — N em d e lo n g a s...,
nem d eix ar as coisas p a ra m ais a d ia n te ..., tudo isso é des­
leixo e frieza. — A D eus só se serve com diligência e só
se pode ir pelo seu cam inho de san tid ad e a v an ç an d o sem ­
pre e correndo sem pre. — L onge a ideia de p a ra r ou, m enos
ainda, de recuar.
— V ês o exem plo de .santidade em S. João?— Q u e
rápido anda Jesus em fazê-lo sa n to !... A inda n ã o nasceu
e já quer que seja s a n to ! — O h ! que d ita 1— Se pudéssem os
dizer o mesmo de nós! Porém já que n ã o nos foi conce­
d id a esta g ra ça de nascerm os santificados, não é este m ais
110 V isitação da S a n tíssim a V irgem e S . João

um m otivo p a ra não perderm os o tem po que p a ra isso se


nos concede?
O tem a da p reg ação do B a p tista será aquela m agnífica
exclam ação: E is o C ordeiro de D eus, q u e tira os pecados
do m undo. Com o p ro n u n ciaria estas p a la v ra s aquele que foi
o prim eiro a sen tir a v erd ad e d e stas m esm as p a la v ras, pois
que desde o seio de sua M ãe lhe tinha p e rd o ad o o seu
pecad o e o tinha santificado? ■ — B tt não sou dig n o de desa ­
tar a correia dos seus sapatos, d iria tam bém m ais ta rd e :
isto é, eu n ã o sou n a d a p e ran te E le, pois tudo o que sou.
o sou n ã o p o r mim mesmo, senão unicam ente p o r E.le.
A p lica isto a ti e ficarás convencido d esta v e rd a d e ...
F o ra d ’E!e n ã o és .mais que pod rid ão e m iséria...
Sem E le n a d a h av eria de a g ra d á v e l na tu a a lm a ... T u d o
o que som os é só p o r E le ... Se h á algum bem, algum a
coisa d e digno e grande em nós, é unicam ente p o r Ele. —
O P re c u rso r é a prim eira experiência v ito rio sa que Jesus
faz do seu p oder e bondade. — D epois repetirá isio em
to d as as o u tra s alm as...

3.° — T u d o p o r M aria. — L em bra porém um a e m uitas


vezes e p e n etra no sentido d e stas p a la v r a s : — tudo isto
fez-se no P re c u rso r e faz-se nas alm as p o r M aria. — É neste
m istério que aparece pela prim eira vez como o instrum ento
d a s m arav ilh as de D e u s..., exercendo a sua altíssim a função
de M ed ian eira de todas as g raças. A prim eira libertaçãb
d a alm a de S. João dá-se com M a ria e p o r M aria.
É ao p ro ferir as suas p a la v ras, no p ró p rio m om ento
cm que fala com sua prim a, nem antes nem depois, que se
efectua esta prim eira lib ertação de S. João do p o d e r do
dem ónio. — A s p a la v ra s d a S S .'”“ V irgem foram com o que
um a sen ten ça de p e rd ã o ... e de vitó ria sobre L ú c ife r.—
P o d ia o S enhor ter o p e rad o esta santificação de um m odo
irmln oculto e silencioso; quis porém re v e la r que M a ria
m i ti M edlnneIrn dessa g ra ça de santificação e salvação.
V isitação da Santíssim a V irg em e S . João m

Jesus pois, será sem pre o m anancial, e M aria, o canal p o r


onde corre até nós a á g u a da graça.
P o rta n to , S. João B ap tista foi o prim eiro filho de M a ria
pela g raça. — Ã su a im itação querem os e devem os sê-lo
tam bém , com o o foram todas as alm as santas. — Q u a n d o
nos convencerem os pràticam ente que só nos farem os san to s
quando adiantarm os be.m no am or e n a im itação d a S a n ­
tíssim a V irgem ? 1—'P e d e -L h e isto hoje p o r meio d e S. João
B ap tista p a ra que assim seja não só o P re c u rs o r de Jesus,
senão tam bém o p re cu rso r de M a ria ...
32. O cântico do <Magnificat

F oi a resposta que a S S .'" ' V irgem deu aos louvores


to m que a elogiara S a n ta Isab el; por isso este sublime
cântico é m uito dig n o de se r m editado e conhecido p o r
to d o s os devotos de M aria.

1. ° — E xcelência e sublim idade do M a g n ifica i. — B


ta ria sab er que tinha b ro tad o dos lábios v irginais d a nossa
M ãe, p a ra que n ã o ncs fosse in d ife ren te ..., porém m uito
m enos o h á-de ser se considerarm os as su a s circunstâncias.
—-T ra ta -s e dum cântico que M aria, cheia de E sp írito Santo
e de alegria divina de que se sentia possuída ao ver-se
M ãe de D eus, dirigiu ao Senhor, p a ra o louvar.
D isse-se que é o cântico dc lo u v o r à R e d e n ç ã o .—
Q uem p oderia c an tar a R edenção m elhor do que M aria?
— F o ra de D eus ninguém h a v ia m ais cap a z de enaltecer
e sublim ar esta o b ra ... a m ais excelsa d o S e n h o r...; nem
os m esm os A njos do C é u ... P o r isso foi a SS.""' V irgem que
d e um a m aneira pública e oficial apregoou a todas as g e ra ­
ções o poder e o am or que na R edenção hum ana o S enhor
tin h a acum ulado. 2

2. ” — Ê cântico de am or e de agradecim ento de M ar


—■C om o o seu coração p a lp itaria de profundíssim a em oção
ao ir expressando com os seus puríssim os lábios o que
O cântico do «M agnificai» 113

e n ce rrav a na sua alm a! — Com o se contem pla um a jóia


riquíssim a g u a rd a d a em cofre de im enso v a lo r..., com o se
adm iram as relíquias m ilagrosas dos santos g u a rd ad a s em
sepulcros sum ptuosos e v e n era d o s... do mesmo m odo deves
contem plar e ad m irar esta jóia, relíquia que M a ria g u a rd av a
em seu coração e que hoje descobre à hum anidade neste
cântico.
N u n ca poderem os ch eg a r a com preender toda a força
de expressão que E la soube d a r a estas p alav ras.
Q u a n to m ais m editares nelas mais tesoiros e n co n tra ­
rá s .... não julgues porém que ch eg arás a entender todo
o seu form osíssim o significado. — Seria necessário am ar
com o só M a ria sabe e pode a m a r... teríam os que conhecer
os m istérios que só E la chegou a penetrar. — V ê com
quanto fervor e d evoção deves frequentem ente re p etir este
cântico, pois bem sabes que é o desabafo do coração sa n ­
tíssimo de M a ria e a síntese do seu agradecim ento a D eus.
— E specialm ente quando tiveres de d a r graças a o Senhor
por algum a g raça ou beneficio p a rticu la r que te haja con­
cedido, poderás fazê-lo co.m o u tras p a la v ras mais expres­
siv a ' do que estas m esmas do « M ag n ificat» ?— H a v e rá
cântico que m ais a g rad e ao S enhor do que este que Lhe
recorda o am or intenso de quem o com pôs e que pela p ri­
m eira vez o p ro n u n c io u ? ...

3." — Ê o cântico que encerra a su b lln e oração de


M aria. — Q u a n ta s vezes terás desejado sa b e r como o ra ria
,i SS ."" V irg e m !... A qui tens então um exem plo m arav i­
lhoso da sua altíssim a oração. N isto não há suposições
tieni Im aginações..., são as mesmas p a la v ra s d 'E la com as
qunls nesta ocasião falou com D e u s... porém em voz alta
pura que d 'E la aprendêssem os a e x p an d ir o nosso coração
iltt presença do Senhor.
Ilm dia os A póstolos, pediram ao M estre que os ensi-
i i i i s m * a orar, e Jesus com pôs-lhes a o ra çã o do cP ater N o ste r

8
IM O cântico du «M a g n ific a t »

— P o r isso não há o ra çã o algum a que se com pare com esta,


pois foi feita pelo p ró p rio D eus. — S upõe que pedes a M a ria
algum a coisa de sem elhante ; e E la, M e stra da oração, te
ensina e te can ta o seu belíssim o «iM agnificat». — D e m aneira
que se o P ater N o ste r é a o ra ç ã o de Jesus, o M a g n ific a t
é a o ra ç ã o de M aria.
P o rtan to , depois do «P ater N o ster» e d a « A ve-M aria»
n ã o d eve h a v e r p a ra ti nenhum a o ra ç ã o m elhor do que
a m esm a o ra çã o de M a ria, a do seu cântico do «M a g n ific a t»...

-I.1' — .P a la vra s de 'Maria. — N este cântico, tem os, final-


m ente, o m aior núm ero de p a la v ra s de M aria. O E v an g e lh o
a p en as nos cita algum as so ltas; são porém tão p o u c a s... que
n ã o satisfazem os seus filhos e devotos.— M as no « M a g n ifi­
cat» tem os não um ex tra cto ou um a ideia senão as suas
m esm as p a la v ra s e além disto todas as que E la pronunciou.
N ã o foi sem profundíssim a razão que tudo isto se
fez, pois p arece que nos quis indicar deste m odo quão
p a rc a e ra em p a la v ra s quando fa la v a com os hom ens e até
com os pró p rio s A njos, não perdendo tem po em d izer
p a la v ra s ociosas, senão as necessárias e convenientes.
E ao contrário, v ê com o prolongou o tem po quando
se pôs a fa la r com D eus. — A qui não m ede o tem po, nem
as p a la v ras, senão que deixa ao c oração exp an d ir-se quanto
quiser. — M edita na re serv a e prudência que supõe a a ti­
tude tom ada no prim eiro caso e no am or e fe rv o r que supõe
a to m ad a quando fa la v a co,m D eus.
Im ita-a n a reserv a em fa la r com os hom ens, assim
com o no am or a o tra ta r com D eus, e longe de a encurtares,
p ro lo n g a a tua o ra ç ã o com E le, e aprecia m ais a sua c o n ­
v e rsaç ã o do que as d a terra. — Pede-lhe enfim , que esta
o ra çã o e este cântico, te seja infinitam ente querido por ser
d ’E la e p o r ter sido inspirado pelo E sp írito Santo, p a ra
que assim o digas tam bém com aquele ferv o r e devoção
com que E la o disse diante do S en h o r...
33. O «Magnificai»

São tão adm iráveis c cheias de sentido as p a la v ra s


do M agnificai, encerram um conjunto tão m aravilhoso de
louvores, de agradecim entos e de virtudes p rá tica s, que não
é possível passá-las po r alto e é de gran d e conveniência
determ o-nos a sa b o rea r as suas doçuras e a estudar c s
seus ensinam entos.

l.° — A m inha alm a engrandece ao Senhor. — É o fim


do hom em ... lo u v ar e e n g ran d e ce r ao Senhor. D ulcíssim a
obrigação, .mas o b rig ação . — D eus criou tudo p a ra a sua
glória, mas, propriam ente a glória n a terra só lha pode d a r
0 hom em ... A glória é um conhecim ento seguido de lo u v o r...
não podem os lo u v a r o que não conhecem os. E com o as
o u tra s cria tu ra s n ã o têm conhecim ento p arece que nos encar­
regam a nós, de nelas verm os e conhecerm os a D eus, p a ra
que em seu nom e O louvem os. — E is o nosso o fíc io ...:
recolher essas n o tas de bondade, sabedoria, poder, form o­
sura e caridade, que D eus depositou nas cria tu ra s c com
elas form ar um hino de gratid ão que devem os e n to a r em
louvor de D eus. — O ficio M agnífico e sublim e! Com o o
1 uinpres?
Nós, o m ais que fazem os m uitas vezes é engrandecer
a I Vws com a língua, porém não com todo o nosso ser. —
U u.indo pecam os, ainda que seja só venialm ente, demi-
116 O «M a g n ific a i »

nuíinos a D eus em n ó s ...; e quando pecam os m ortalm ente


com o que o fazem os d esa p are ce r da nossa alm a.
T o d o s os santos engrandeceram a D eus com as suas
obras, e cada d ia o engrandeciam m ais com a sua sa n ti­
d a d e ; m as, nem sem p re..., tam bém eles tiveram faltas e
im perfeições..., tam bém algum as vezes am .esquinharam o
S enhor em seus corações. — Só M a ria é a única, que nem
um só m om ento deixou de O engrandecer e sem pre... sem
c e s sa r... foi crescendo e engrandecendo a D eus.
Sabes lo u v ar a D e u s? — T ra b a lh a s por conhecê-lo para
m elhor o am ar? — P e n sa que quando não fazes assim faltas
ao teu d e v e r..., és um a n o ta d iscordante que d esafina h o rri­
velm ente nesse concerto de lo u v o re s ...; p o r tua culpa e
ig n o rân cia não sabes in te rp re ta r o cântico que toda a c ria ­
ção te confia. — E por tu a c u lp a ... — que v e rg o n h a!
R e p ara em M aria. — A s su as prim eiras p a la v ra s são
p a ra recolher os louvores e gran d ezas que S anta Isabel lhe
diz p a ra o s dirigir a D e u s... a E le só a glória e a h o n ra ...
Q u e belo o principio deste m agnifico cântico!
V ê além disso com o M a ria engrandece ao Senhor com
toda a sua alm a e c o r a ç ã o — • em sua puríssim a a lm a .—
P o r isso Lhe disse no tem po presente: «A m inha alm a
engrandece», n ã o disse e ngrandeceu ou e n g ran d e ce rá...
senão a g o ra e sem pre engrandece. -— P arece ser essa a sua
o cu p aç ão perpétua, o seu principal o fício ..., com o se não
tivesse o u tro ...
M erg u lh a o teu espírito neste exem plo e pensa em ti
c om parando-te com M aria. — O h ! se sem pre en g ran d ecês­
sem os ao Senhor, ou ao m enos, se nunca o de.minuíssemos
em nós, qual não seria já a nossa santidade?
P ouco podem os e pouco valem os, m as com esse pouco
e do m odo que podem os proponham os lo u v ar e en g ran ­
decer ao Senhor, corno M a ria ...
O «M agnificat» 117

2.° — E o m eu espírito se alegrou em D eu s m eu SaU


vador. — M a ria alegra-se e regozija-se, ou ar.tes, encontra-se
inundada dum gozo perene. — Com que se re g o z ija ? — N ã o
com coisas te rre n a s... nem com coisas m ateriais. — É um
gozo íntim o, espiritual que tem o p ró p rio D eus por objecto.
—-R egozija-se c alegra-se em D e u s... na posse plena e per-
íeita do Senhor.
S anta Isabel recorda-L he as grandes gra ça s e priv ilé­
gios, e ainda que sejam m otivo suficiente p a ra alegrar-se
e regozijar-se neles, no entanto p arece que não liga tan ta
im portância aos dons, como ao au to r e d a d o r dos m esmos
dons. —• S an to A g ostinho dizia ao Senhor: N â o m e dés thas
coisas, mas dá-m e a T i m esm o... isto é o que com m aior
ra zã o a Santíssim a V irgem nos indica nestas p a la v ras. —
N ão sabem os p ro c u ra r a D eus e p o r isso não conseguim os
regozijar-nos n 'E le.
Q u e doçuras não tem com unicado sem pre àqueles que
O am am ! — Q u a is com unicaria então à Santíssim a V irg em ?!
— Q u e é pois de e stra n h a r que a sua alm a santíssim a sa l­
tasse de gozo e de aleg ria divina?
R e p ara porém que não diz que o seu gozo está som ente
em D eus, senão em D eus S alv ad o r. — E sta é a raiz e
fundam ento d a alegria espiritual e do gozo eterno que espe­
ra m o s..., o facto de D eus ser o nosso S alv ad o r. — E s tá ­
vam os condenados às tristezas e eternas am arg u ras do
Inferno. — G raças ao nosso S a lv ad o r converteram -se em
alegria se m p ite rn a... Q u e alegria p a ra a alm a v e r ali o seu
C ria d o r... m as sobretudo a o v e r o seu S a lv ad o r e Santi-
flc a d o r!... Pois, que v aleria ter-nos criado se não nos tivesse
salvado e santificado?
R egozija-te com a V irgem S S ."" neste pensam ento e
a lrg ra -te por teres um tão grande e sublim e R edentor e
S alvador. — R ep ara bem que este gozo há-de ser no espírito,
M o é, um gozo puríssim o, sem m istura de coisa algum a
«am ai e portan to deves fom entá-lo por ser um gozo v e r­
ns O «M a g n ific a t »

dadeiro. A inda que o corpo so fra com a penitência e m o r­


tificação, se o espirito se regozija e se alegra, isto c o que
im porta.
F inalm ente, reflecte que o gozo de M a ria não foi em
si mesma, senão em D eus s ó ..., quer dizer, n a d a de um
gozo egoísta, que p ro cu ra a sua com odidade e com placência,
senão um gozo de a m o r..., que se ale g ra de am ar e v e r
am ad o o objecto do seu am or ainda que por este am or
so fra e padeça. — M a ria via-se a si m esm a e em si v ia a
Jesus nas suas p ró p rias e n tra n h as e esta v ista c ausava-lhe
o seu gozo em D eus.
T am bém podes v e r a D eus d entro de ti, e no teu c o ra ­
ção O deves e n c o n tra r...; q u an to m ais o v ires deste m odo,
m ais felicidade sentirás. — A plica tam bém este pensam ento
à S a g ra d a C om unhão. — N ã o tens Jesus d en tro de ti como
O tin h a M a ria ? — Sabes vê-lo como E la ? ...- — Sabes a p re ­
c ia r o gozo e a alegria d a sua presença real? ... V ê-lo assim
deste m odo m uitas vezes ao dia?
P ed e à S S .'"“ V irgem que te ensine a v e r Jesu s....
a e streitar am orosam ente a Jesus contra o teu p e ito ..., a
d e le ita r-te com as d oçuras div in as de Je su s..., em cuja
c o m p a raç ã o são am argas todas as doçuras da te rra ...
34. O «M agnificat»

3.“ — P orque olhou para a p equenez ou hum ildade da


sua serva. — É adm irável a lição p rá tica de hum ildade que
aqui nos dá a S S .'"’ V irgem . — A c ab a de sc r sau d a d a p o r
um A njo da p a rte de D e u s..., acaba de ser elevada à digni­
d a d e de sua M ã e ..., acab a de ser p roclam ada bendita entre
todas as m ulheres, com o lhe disse S a n ta Isa b el... e E la.
em penhando-se cm abism ar-se no m ais p rofundo da sua
hum ildade... reconhece que não é m ais que um a sim ples
e scrav a do Senhor.
Com isto diz-nos que tudo o que n 'E la h á é de D eus.
pois tudo provém de D eus ter posto os olhos n E l a .. . e
•rolhar» na linguagem bíblica significa o lh ar com bons olhos
e a m a r... E assim, tudo procede desse o lh ar de am or de
Deus p a ra E la ..., pois de contrário, não teria sido senão
um a de tan ta s filhas de E v a.
M edita m uito nestas p a la v ra s e im pregna-te desta v e r­
dade. que se se aplica a M aria, .muito m ais se pode ap licar
n ti. Q u e és tu? ... e sobretudo, que és diante de D e u s? ...
que tens de teu e que tens d E le ? ... Se D eus te pedisse
qu.m to te tem dado e que p o r isso lhe pertence, na ordem
du n atureza e d a g ra ç a ..., bens físicos e e sp iritu a is..., dons
interiores e e x te rio re s... que te fic a ria ? ... apenas um a coisa:
<i p e ca d o ... esse é exclusivam ente teu. — T u d o o resto é de
I teus. — P o rtan to , não podes dizer que D eus te v iu com
120 O «M a g n ifien t »

bons olhos e que p o r isso te cum ulou de bens e te deu


q uanto possuis?
V ê pois como com m aior razão que a SS.""1 V irgem ,
deves n ã o só reconhecer, senão p ra tica r a hum ildade, já que
isto é a única coisa ju sta e racional que te fica bem.
Além disso considera como M a ria nos ensina que o
fundam ento de todos os bens do S enhor e de todas as
gra ça s que d'E le recebem os, é exactam ente a hum ildade...
e p o r isso diz que louva ao S enhor e se regozija em D eus
seu S alv ad o r porque olhou p a ra a hum ildade da sua serva.
—• D e sta .maneira estarás m uito longe de te louvares a ti
mesmo, como fez o fariseu do E v an g elh o que atribuia aos
seus m éritos todas a.s suas boas o b ra s ...; pelo contrário, a
cad a instante reconhecerás a bondade e m isericórdia de
D eus, que te lev a n ta do pó e da m iséria, à a ltu ra d a sa n ­
tid a d e ..., e tan to m ais alto te lev a n tará o S enhor qu an to
tu m ais te em penhares em v iv er um a vida a b atid a e escon­
dida n a tua hum ildade.

2." — E is porque todas as gerações m e cham arão bem-


-aventurada. — É um a confirm ação das p a la v ra s anteriores.
O hum ilde e n can ta o c o ração de D eus, e D eus não rep ara
em m eios p a ra o le v a n ta r e o e x altar. — Q u a n to não e x al­
tou e sublim ou a todos os s a n to s !— M as sob retu d o a M a ria!
— Q uem m ais hum ilde do que E la? ... P o r isso mesmo, todas
as g erações A cham arão b e m -a v en tu ra d a... E la hum ilha-se
e D eus exalta-A .
C ontem pla esta divina porfia. M aria p ro c u ra n d o rebai­
xar-se diante de D e u s... e lev a n tan d o -A acim a de todos os
hom ens..., de todos os A n jo s... e a introduzi-la nos m es­
mos segredos altíssim os d a divindade. — N inguém tão
hum ilde com o M a ria ..., e ninguém m ais elevado do que E la!
P e rd e r-te -á s no exam e da su a hum ildade porque não che­
g a rás ao fundo do seu ab atim e n to ... Se m editas na sua
e x altaç ão igualm ente a não com preenderás, porque quem é
O «M agnificai '» 321

cap az de a seguir no seu voo p a ra D eus aju d a d a e elevada


pelo mesmo D eus?
O que será a h u m ild a d e? ... Q u e verá D eus nela, p a ra
que seja condição indispensável p a ra lhe a g ra d a r? — Se
M a ria se não tivesse feito escrava, não seria a gora R ainha,
Senhora, e M ãe do p róprio D eus.
P o rtan to , a soberba e a vaidade não são só contra a
ra z ã o ..., mas, sob o ponto de v ista de um santo egoísm o,
são com pletam ente inúteis e infrutuosas. O soberbo n ada
consegue... e o hum ilde tudo alcança. — C om preendes ag o ra
como, até por conveniência p rópria, deveriam os trab a lh a r
por ad q u irir esta m aravilhosa v irtu d e ... e d e sterra r todo o
assom o da asquerosa so b e rb a? — C om q u an ta razão á. B er­
nard o cham ou ao «M agnificpt» o «êxtase da hum ildade»
de M a r i a ! ..., pois dessa virtude, fez b ro tar todas as suas
grandezas e m ara v ilh a s...
V ê, finalm ente, que estas p a la v ra s encerram um a p ro ­
fe c ia ...; E la disse: que «a cham ariam b e m -a v en tu ra d a...»
F a la de um futuro que devia desconhecer e não obstante,
com toda a segurança afirm a que será assim.
Com o é su av e, p a ra nós. ver o exacto cum prim ento
destas p a la v ra s! — R eune os títulos de M a ria ..., os seus
san tu ário s e te m p lo s...; conheces algum a igreja que não
tenha um ou v á rio s altares em sua h o n ra ? ... H a v e rá p o v o a ­
ção, p o r grande o u pequena que seja, que não possua algum a
imagem da S S .m" V irgem e que não celebre a sua festa
com alegria e esplendor? ...
R ecorda o mês de M a io .... pensa no dia da Im aculada
C o n ceição ... lem bra as principais festas da S S ."la V irg e m ...
e verás que o p o v o cristão corre a ajoelhar-se aos pés de
M aria. — Sobe ao Céu e vé a todos os santos reconhecendo
a santidade d a V irgem S a n tíssim a ... e a todos os A njos,
que juntam ente com os hom ens não cessam, de a p ro clam ar
«B em -aventurada»... Q u e esplêndida confirmaçeão a desta
profecia 1...
35. O «Magnificai

I .' — P orque o T o do-P oderoso fe z em m im grandes


cc isa i e o seu santo nom e. — C om o com preendem os m al a
hum ildade 1... Julgam os que consiste exteriorm ente em dizer
m al de n ó s... em não reconhecer o bem que fazem o s... e em
não v e r as graças que o S enhor nos concede... e nada disto
é a hum ildade.
E scu ta M aria: T o d a s as gerações m e cham arão Bein-
-aveturada. — O T o d o -P cd ero so fe z em mim grandes coi­
sa s__ e no entanto, isto é hum ildade. — N ã o esqueças que
a hum ildade é a verdade, sim plicidade e sinceridade.
Reconhece pois o bem que e.m ti há, não porém p a ra
te lo u v a re s ...; então será s o b e rb a .— C om preende a g ra n ­
diosa e v a sta obra de D eus no teu c o ra ç ã o ...; que isto
porém te sirv a p a ra o lo u v ares m ais e m ais..., p a ra co rre s­
ponderes m elh o r..., p a ra cad a dia o am ares com m aior
fervor e entusiasm o, como consequência n a tu ra l do teu
agradecim ento.
A que coisas se referia a S S ."1“ V irgem ao dizer que
D eus tinha o perado n ’E la grandes m aravilhas? ... E m que
p e n sa ria quando d iria estas p alavras? — P ensa e trab alh a
por adivinhá-lo, percorrendo com o E la percorria os favores
v dons que do S enhor tinha recebido.
L em bra-te da sua pred estin ação desde a e te rn id a d e ...,
da sua existência na m ente divina gratíssim a p a ra D eus.
O «M a g n ific a t > 123

E lem bra-te a se g u ir do inefável privilégio da sua C oncei­


ção Im aculada, com todas as gra ça s inerentes a esse p riv i­
lég io ...: passariam pela sua im aginação e teria presentes
to d as as m arav ilh as que em seu c o ração quis o S enhor
acum ular, e recordar-se-ia d a sa u d a çã o do A n jo ..., do m is­
tério cia In c arn a çã o do V e rb o ... e então, ap arecer-lhe-ia
d iante dos olhos o m ilagre dos m ila g res...: que E la c ria ­
tu ra e scrav a do S e n h o r!... fosse ao mesmo tem po sua
M ã e '.. . e com o p a ra isso foi necessário fazer um a coisa
e x tra o rd in á ria e desconhecida no C éu e na terra, isto é,
o ser M ãe sem d eix ar de ser V irgem . — P o r isso. extasiada
a o ver tudo isto ..., p enetrando no v a lo r e significação de
tudo, com gran d e fe rv o r exclam a: O T o d o P oderoso te z
em m im grandes coisas.
V ês bem ? T u d o . tudo atribui ao po d er de D e u s... ao
T o d o -P o d e ro s o ! ... à santidade de D e u s ! ... ao seu santo
n o m e ! . .. — D eus, com a sua santidade, bondade e divina
m isericórdia, determ inou fazer tudo isto ... e lé-lo com o
seu p oder infinito.
Faz um a a p licação destas p a la v ra s à tua alm a. — N ã o
p o d erás tam bém d izer que fez em ti g randes coisas o poder,
e sobretudo, a bondade de D e u s? ... N ã o é um efeito da
su a lib erd ad e... (sem m érito algum da tua p a rte ...) tudo
quanto o Senhor te tem dado generosam ente?— D em ora-te
,i recordar tudo desde o teu nascim ento até ao m om ento
p re s e n te ...; recorda, sobretudo, as vezes que te tem, p e r­
doado os p e c a d o s ...; que te tem transform ado dum abism o
de m isérias que eras num abism o de g raças e form osura. —
Reconhece isto assim, que não é so b e rb a ... M as louva-o
.1 Ele lOrao M aria.
Bendiz o seu p o d e r... G lorifica a sua b o n d a d e...,
venera com o am or o seu sa n to nom e.

2.° — «E a sua m isericórdia se estenderá de geração


i"m para com todos os que o tem em ». — E is o u tra
124 O «M a g n ific a i »

faceta delicadíssim a da hum ildade. — M aria regozija-se em


estender aos outros esta m isericórdia do Senhor, que usou
p a ra com E la.
Q u a n to D eus fez de gran d e e.m sua alm a, fá-lo-á com
todos os que O te m e m ...; não quer ser a ú n ic a ...; com ­
p raz-se em p ublicar a p a rtic ip a ç ã o que todos podem ter
nesta bondade de D eus. — A h ! C om o é hum ano querer ser
dos p rim e iro s !... e m uito m ais ainda serm os os únicos! —
A v erd ad e ira hum ildade, n ã o é e x clu siv ista..., nem am bi­
c io sa ... m uito menos, invejosa do bem a lh e io ...; isso é
dem asiado h u m an o ..., e M a ria é div in a! P o r isso não é
assim , nem mesmo assim p e n sa ...
Além disso esta m isericórdia e bondade é p a ra os que
O temem. — N ã o se refere ao tem or servil, próprio dos
servos, senão ao tem or reverenciai e filial dos bons filhos.
— É aquele santo tem or de D eus, de que fala a S a g ra d a
E sc ritu ra, que é o princípio de toda a S a b e d o ria ... e p o r
isso mesmo, o princípio da san tid ad e e o fundam ento do
am or. — T em e, e a m a ! ... sã o duas coisas in sep aráv eis p a ra
D e u s... D eves pois tem er com am or, e deves am ar com
tem or. — T e m o r de ti..., dos teus pecados e re c a íd a s...,
da tu a m iséria ..., da tua pouca g ra tid ão e c o rresp o n d ên cia...
C om o D eus é bom p a ra com os que O te m e m !... Q u e será
p a ra com os que O am am ! — T em e a sua justiça, mas
sobretudo am a a sua b o n d a d e..., confia na sua m isericórdia,
e v e rás com o se cum prirão em ti as p a la v ra s de M aria.
R egozija-te de teres um D eus tão m isericordioso, que
não n e g a a sua m isericórdia a ninguém , e trab a lh a com toda
a tu a alm a p o r estender, com a tua o ra ç ã o ..., com a tua
p e n itê n cia..., com o teu am or, este reino da bondade e da
m isericórdia, não só em tua alm a, senão em todo o m undo,
com o D eus q u e r... em todos os ju sto s..., nos tíb io s... e até
nos g randes pecadores p a ra os quais não brilha ainda
esta infinita m isericórdia do Senhor.
36. O «Magnificat:

1 — C om o seu braço iier obras m agníficas. — >A qui


e x alía a SS ."“ V irgem o po d er de D eus, que se .manifesta
especialm ente nalgum as das su as obras. — S ão todas fruto
desse poder infinito de D eus, porém nalgum as m anifesta-se
mais claram ente essa om nipotência. O lh a ria a S S ."1* V irgem
p a ra o Céu e v eria nele as estrelas im ensas... lum inosís­
sim as... incalculáveis no seu n ú m ero ... com um a vida e
m ovim ento in cessan tes... no meio dum a ordem adm irável.
Q u e bela o b ra a do C éu com as su as estrelas, p a ra
se ver nela a om nipotência de D e u s !— E a te rra ? ..., com
as suas p lan ta s e a n im a is..., com os seus rios e m are s..., etc.
P e rc o rre pois tudo isto com a im aginação e p e rg u n ta
a ti mesmo: não é isto o b ra do braço poderoso de D eus?—
Q uem , senão Ele, podia conceber, ou fa ze r coisas sem e­
lhante?
Depois, v e ria tam bém o hom em ..., os a n jo s... e toda
a brilhante corte que cerca o trono de D e u s..., e sobretudo
ver-se-ia a si m esm a... O nde po d eria descobrir m elhor a
força do braço poderoso de D eus senão no seu coração e na
sua alm a puríssim a e im aculada?
P ensa bem no que isto quer dizer. — A o fazer D eus
todas as suas obras, parece que as fez sem esforço algum ...,
bastou a sua p a la v ra ..., o seu q u e re r..., porém na o b ra da
Incarnação, ao nosso m odo de entender, não é certo que
126 O « M a g n ific a i »

não a podem os explicar senão como o b ra cm cue D eus


teve que pôr toda a sua om nipotência e fazer, se assim se
pode dizer, um grande esforço.
P a ra a criação não teve nenhum a resistência a v e n c e r...,
tudo foi feito do n ad a. — O esforço é tanto m aior, q u an to
m aior é a resistência que se opõe ao nosso trabalho. —
Se pois na criação, a resistência não existia porque as coisas
jaziam no n a d a ..., na E n c a rn a ç ã o não foi assim ... T e v e p ri­
m eiro que violentar, p o r assim dizer, a d iv in d a d e ... T ev e
de fazer-se violência a Si mesmo p a ra dem inuir, to m a r
p equeno e aniquilar o p ró p rio D e u s ! ..., e assim po d er
en cerrá-lo num co rp o hum ano e no seio de M aria.
E tev e de fa ze r esta o bra única e jam ais repetida,
de escolher um a m ulher e fazê-la sua M ã e ... e to rn á-la
p o r isso receptáculo dos prodígios e m aravilhas de toda a
c ria ç ã o ... e fazê-la Im ac u la d a ... e V irgem e M ãe ao mesmo
tem po.
T u d o isto não supõe um imenso esforço do braço p o d e­
ro so de D e u s’
F o i tão grande este esforço, que chegou a esgotar,
se assim se pode dizer, todo o seu p o d e r... D eus pode criar
m ilhares de m undos... m ilhares de se res..., m ilhões de anjos
e céus m ais b e lo s..., m ais esplendorosos, que os actuais. —
Porém , n ã o pôde fazer um a o b ra de .maior grandeza que
sua M ã e ..., pois era im possível que houvesse M ãe su p e rio r
à M ãe de D eus.
N ã o podes ap licar isto mesmo à S a g ra d a C o m u n h ão ? ...
N ã o é o u tro esforço do seu b ra ç o ? ...
N ã o esgota ai tam bém a sabedoria e o po d er e ate o
am or de D e u s? ... Com se r o m n ip o ten te..., D eus p oce d a r-te
algum a coisa m aior do que a S a g ra d a C om unhão?

2.° — «C onfundiu os soberbos nos pensam entos des seus


corações» . —■E is o u tra p ro v a do po d er do seu b r a ç o .—
A sua om nipotência m anifesta-se nas o b ras da m isericórdia
•0 « M a g n ific a t >>

e da b o n d ad o ..., c tam bém nas da sua justiça. — E assim


com o v a i p a ra os hum ildes toda a sua m isericórdia, assim
a sua justiça d e sc arre g a-a sobre os soberbos. — C om o se
lem braria a S S .1"“ V irgem da diferença da sua ex altação até
ao trono de D eus, p a ra ser R ain h a e Im peratriz do Céu,
com a estrondosa queda de L úcifer das altu ras até ac m esmo
in fe rn o !— E la subiu pela hum ildade, este caiu pela sua
so b e rb a...
E nota bem que E la diz: «aos soberbos de inteligência
e de c o raç ão » ... C risto refere-se, claram ente, à soberba
interna, n ã o precisam ente à externa, que é um a falta de
tin o ... A interior é m ais re fin a d a ..., isto é, p a rec er hum ilde
no exterior, e jnteriorm ente ter en tro n izad a a soberbai n o
c o raç ão e n a m ente. — E o pio r desta soberba é que c tão
subtil e tão fina, que penetra até ao m ais íntim o sem darm os
conta.
F ix a -te n esta distinção: soberba de e sp írito ... é o p ró ­
prio p a re c e r... o n ã o querer c e d e r... o d e se ja r que nos dêem
sem pre ra z ã o ..., o n ã o so frer um a c o n tra d iç ã o ..., enfim,
é o não condescender especialm ente q u ando julgam os te r
ra z ã o ...; e depois re p ara n a soberba d e c o ra ç ã o ...; que
há-de se r esta soberba senão o terrível am or p ró p rio que
tão profundam ente se enraiza no nosso coração?
P ede à S S ."1“ V irgem te liberte d esta dupla soberba,
do espírito, e do coração, e assim, pela s u a m ediação, te
v ejas livre d a ju stiça divina, que, segundo a p rópria V ir­
gem S S .'"J, tão duram ente há-de castig ar esta soberba
in tern a...
37. O «Magnificat»

1.“ — D epôs do trono os poderosos e exaltou os hum il­


des. — Assim com o no verso an terio r expôs o que o S enhor
faz sem ore com os soberbos de espírito e de coração, assim
ag o ra nos fala da m anifestação dessa soberba p o r .meio da
v aidade, do orgulho, dn fome de m a n d a r...; estes sã o os
poderosos da te rra ... — os que m andam e não gostam de
obedecer. — E is porque a obediência é irm ã inseparável da
hum ildade. — A um a e a o u tra convém esse espírito de su b ­
m issão e de sim plicidade que tan to a g ra d a a D eus. Q u a n to s
poderosos não havia então n a te rra ? !...; com luz v inda do
C éu a S S ."11 V irgem via-os a todos gozando nos seus
p a lá cio s..., m andando em seus servos e escravos que perante
eles se p ro strav am com o se fossem d euses...
E sc u ta porém a frase enérgica de M a ria ...: a esses o
S enhor os p o rá fora dos seus tronos, e das su as cadeiras
de v aidade, e com desprezo os a b an d o n a rá. •— E sta s e x p res­
sões parecem não condizerem com a doçura e com paixão
d e M a r ia ! ... N ó s não podem os com preender quanto D eus
detesta toda essa presum ida v aidade da terra : — Nem
sequer p a ra ela olha. nem lhe tem algum a c o n sid e ra ç ã o .—
P a ra p ro c u ra r M aria, não a p ro c u ra entre os grandes da
terra, senão entre os h u m ild e ...; e quando nasce em Belém,
m anda aos anjos anunciar a grande nova aos pastorinhos
sim ples... e dos grandes e poderosos nem se lem b ra... Com o
O «.M agnificat » 129

d ev e ser terrível este desprezo de D e u s ! ... Q ue im enso


c a stig o M a ria anunciou p o r p a la v ra s tão fortes!
E x am in a se tens esse espirito m undano em qualquer
d a s su as m an ifestaçõ es..., nalgum dos seus graus, ainda
que te p areça m uito pequeno, e se queres v e r quão distante
e stá s desta presum ida soberba e v aidade, v ê em que estado
te e ncontras e em que altu ras estás qu an to à o b e d iê n cia ...,
subm issão e h u m ild a d e..., e assim com preenderás a que dis­
tância te e ncontras do grande prém io que M a ria anuncia
p a ra os hum ildes. — P a ra estes, a exaltação , o en g ran d e ­
cim en to ..., um tro n o m uito lev a n tad o no céu. — C om para
essas duas expressões d a S S ."'“ V irgem : a do castigo do
d esp rezo p a ra os p o d e ro so s..., a d a e x altaç ão gloriosa dos
hum ildes e sim ples.

2.° — «C um ulou de bens aos fa m in to s e despediu os


ricos de m ãos vazias». — M a s... ainda .mais? — N ã o aca b a
a S S .1"“ V irgem de e x a lta r a hum ildade. Q u a n to a am a!
P orque estas p a la v ra s são um a confirm ação o u repetição
d a s anteriores.
A qui fala de o u tra m anifestação da hum ildade, que é
a p o b re z a ..., e d a soberba, que é a ab u n d ân c ia e as com o­
d id a d e s .— A p o b reza real e a c tu a l..., a p obreza de espírito.
— Jesus quis nascer, v iv er e m orrer ab raç ad o a e l a . —
Se soubéssem os q u an to esta virtu d e a g ra d a a Jesus, como
a apreciaríam os!
A o menos, havem os de p ro c u ra r e d esejar a pobreza
de espírito. — N ã o a p eg a r-se a n a d a ..., não d esejar nem
Invejar n a d a ..., não querer o bem -estar e com odidades das
riq u ez as..., ter gosto em que nos falte algum a coisa, e que
nem tudo saia à m edida do nosso d e se jo ... E enfim, no
.dá de despojarm o-nos de tu d o ..., despojarm o-nos de nós
próprios.
Só um c o raç ão despojado do am or carnal, do am or de
il mesmo pode a g ra d a r a D eus. N osso S enhor quer que nos
9
130 O «M agnificat»

revestim os d ’E le, m as p a ra isto tem os de desp o jar-n o s de


nós m esmos.
Q u a n d o deitam os m assa num m olde, se quiserm os que
ela chegue a to d as a s form as e desenhos, é preciso que
o m olde e steja bem lim po de tu d o ...; quaisquer aderências
que tenha, im pedirão que se im prim am perfeitam ente todas
a s suas linhas. — P o is bem : M a ria e Jesus querem m oldar-se
no teu c o ra ç ã o ..., p a ra que este seja um a cópia exacta
d 'E le s.
P orém n ã o adm item com panhia, porque n ã o há nenhum a
d ig n a de Jesus e de M a ria ... É necessário, e a todo o custo
indispensável, que lim pes bem o c o ra ç ã o ..., que o d esprendas
e a rra n q u e s dele a in d a que seja com v io lê n c ia ... e com dor,
tu d o o que não seja Jesus e M a ria . — P e n sa nisto, em m odo
p a rtic u la r n a ocasião da com unhão e não esqueças que tu
e Jesus n ã o cabeis jun to s no c o ra ç ã o ... Se queres que E le
entre, te rá s que sair tu ... E le só é bem c ap a z de o encher.
—• E s ta é a fome de que fala M a ria. — V a i com v erd ad e ira
fom e receber a Jesus, e sen tirás a v e rd ad e destas p a la v ra s :
«aos fam intos cum ulou-os de b e n s» .'— P orem aos o u tro s ...,
a esse s..., deixa-os sem n a d a ... que é o que lhes pertence.
38. O »M agnificai?

l.° — « T ra to u ou socorreu a Israel, seu servo reco r-


Jando~se da sua m isericórdia» . — 'A q u i reco rd a a S S .ma V ir­
gem a gran d e m isericórdia u sa d a com Israel. — E ra um
povo escravizado pelos F a ra ó s, a quem o S enhor m ilagro­
sam ente tirou d aq u ela escravidão e os conduziu a tra v é s d o
d e s e rto ...; ali alim entou-os com o m aná do C é u ; depois de
os liv ra r triunfantem ente dos seus inim igos levou-os à te rra
opulen ta d a p ro m is sã o .— Enfim , tom ou-o como coisa s u a ...,
fê-lo seu p o v o esco lh id o ..., e trato u -o como a um m em bro
de fam ília, com carin h o e prov id ên cia adm iráveis.
A plica tudo isto, p o n to p o r ponto, ao que D eu s tem
feito contigo e v e rá s aí um a som bra d a realidade. — T irc u -tc
do cativeiro d o dem ónio, infinitam ente pio r que o dos
F a ra ó s..., pro teg eu -te sem cessar no deserto d esta v id a ...,
ulim enta-te com o v erd ad e iro m aná divino do seu p ró p rio
C o rp o e S a n g u e ... e conduz-te carinhosam ente pela sua
máo à te rra prom etida que é o Céu.
M as, h á m ais ainda; a Israel deu-lhe o título de seu
nervo ou dom éstico — gran d e fav o r, sem d ú v id a, se rv ir a
J V u s l — porém a ti cham a-te e d á-te o título de h o n ra s de
11IIio..., de irm ão de Jesus C risto ..., de herd eiro do seu tro n o ...
(Ju e sublime e .m agnifica realid ad e! N ã o duvides de que
iilndn que M a ria fala apenas d a m isericórdia de D eus com
M

132 O «M agnificat '

Israel, p e n sa v a tam bém n a que usaria contigo e tinha-a


bem presente.
O que não diz a SS.""‘ V irgem é a co rrespondência de
Isra e l a o S e n h o r...; bem n a sabes: d u re za de c o ra ç ã o ...
desconfiança d 'E le no d e se rto ... um to ta l esquecim ento de
D eu s n a s delícias d a te rra d a prom issão, chegando a p ro ­
c u ra r o u tro s deuses p a ra os a d o ra r... e, finalm ente, expul­
san d o a seu Filho quando veio a salv ar-n o s, dando-lhe
m orte cruel na c ru z...
E is o que D eus recebeu d a m isericórdia u sa d a para
com aquele p o v o .— M a s ... tam bém nisto será figura de ti?
— T am bém terá s im itado n este ponto a Israel, na sua negra
e enorm e in g ra tid ã o ? ...
P o d e rá tam bém dizer de ti o S en h o r que d a sua v inha
eleita, que era Israel, não tiro u m ais do que u v a s silves­
tres, azedas, a m a rg o sa s... P elo m enos nalgum as ocasiões,
reconhece com hum ildade e com sa n ta v e rg o n h a que assim
tem sid o ..., m as prom ete firm em ente que já n ã o se rá assim
p a ra o fu tu ro ...

2." — «C om o tinha prom etido a A b ra ã o e aos seus


descendentes, por todos os séculos dos séculos». — C om o
D eu s é fiel à sua p a la v r a ! — A ssim o p rom etera a A braão,
e a seus filhos, os o u tro s g randes P a tria rc a s do A ntigo
T e s ta m e n to ..., e como o prom eteu assim o cum priu. — E le
n ã o ig n o rav a o que aquele povo ia fazer dos seus b ene­
fícios, e a p esar d isso ..., não v o lta a trá s e não desfaz a
su a prom essa. — Com o o S en h o r é fiel!
M as nota, como, segundo as p a la v ra s da Santíssim a
V irgem , esta fidelidade e ex actid ão de D eus, é p o r todos
os sé c u lo s..., isto é, que com o cum priu o prom etido então,
tam bém o cum prirá no que prom eta depois.
E efectivam ente, segundo S. Paulo, esta fidelidade de
D eus m anifesta-se cm três coisas: a) em não perm itir ao
dem ónio que nos tente m ais do que nós podem os resistir,
O «M agnificai » 133

pois é bem claro que se o deixasse, ninguém o v e n c e ria ...,


tan ta é a su a a s tú c ia ! tan to o seu p o d e r e sa b e d o ria !
b ) é fiel em n ã o ab an d o n ar-n o s d u ra n te a te n ta ç ã o ...; n ã o
é com o as am izades terrenas, que nas p ro v a s e dificuldades
d a vida, em especial n a m ais terrível, a d a m orte, nos
deixam sós e nos a b an d o n a m ..., não nos servem p a ra n ad a.
— M as o S enhor n ã o ê assim ; q uanto m aior for a ten ta çã o
c a necessidade tan to m ais nos assiste com a sua a ju d a e
com a sua g ra ç a ..., de tal m odo, que nos dá esta na m edida
daquela, sem que nunca nos fa lte ..., a p esar de tantas vezes
nós o d eix arm o s; c ) enfim, é fiel em d a r-n o s um prém io
eterno, se souberm os, com a sua graça, lu ta r e v e n c e r...;
esta fidelidade de D eus, é o fundam ento d a nossa espe­
ra n ç a ..., o C é u ! ..., a posse de D e u s ! ... e isto, com certeza,
pois E le não falta à sua p a la v ra ... Q u e consolação e que
alento nos dá n a vida este o lh ar p a ra D e u s..., p a ra o C é u ...,
p a ra a c oroa que nos e s p e ra !...
V ê o que deves dizer ao S enhor perante este seu
exem plo de fidelidade que te reco rd a a SS.'"" V irgem . —
Q u e p ena e que v e rg o n h a que tenhas sido tan ta s vezes
infiel e in constante nas tu as p a la v ra s e prom essas feitas ao
S e n h o r!—■Se tivesses cum prido só m etade das coisas que
tan ta s vezes tens prom etido, qual não seria a tua santidade
a esta d a ta ? P ede a M a ria a g ra ça da e x a c tid ã o ..., da
fidelidade..., da constância no cumpri.menti das tuas
palavras.

3." — R esum o e conchisão. — Com o é sublim e o cântico


do M u g n ific a tl — Q u e form osíssim a a o ra ç ã o de M a r i a .—
Q u a n ta s coisas n ã o e n c e rra !— É o cântico da gratid ão da
■oi,i alm a a D eu s! — o cântico d a R edenção, em que publica
as m aravilhas e gran d ezas que n esta o b ra fez o braço
poderoso do S en h o r e a sua m iseric ó rd ia !— Enfim é o cân-
Ileo da h u m ild a d e!— A ssinala-nos o cam inho que tem os de
«eguir.... não há o u tro ... N em E la nem Jesus encontraram ,
134 O «M a g n ific a t »

e m enos ain d a seguiram o u tro ..., L an ça-te generosam ente


p o r e le ! ... a im itar a Jesus e a M a ria n a sua h u m ild a d e !...
P o rta n to p ro c u ra um a dev o ção tern a e ferv o ro sa a este
sublim e cântico e rep ete-o d iàriam ente n a com unhão p a ra
d a r g ra ç a s ao S e n h o r..., ao m esm o tem po, que te deves
ex am in ar d a tua fidelidade n a prom essa que hoje lhe fazes
de segui-lo na hum ildade.
39. A Expectação

A Igreja celebra a E x p e c ta ç ã o d a S S .ma V irgem com


um a festa especial que lhe d edica no sa n to tem po do
A dvento. — É um a festa genuinam ente espanhola, e stab e­
lecida, p rovavelm ente p o r S an to Ildefonso, o qual n a s m ati­
nas da m eia-noite d esta festa, m ereceu se r rev estid o pela
SS.m» V irgem de um a preciosa c asu la que o s anjos tro u ­
xeram do C éu.

l.° — A V id a da S S . m* V irg em durante este tem p o . —


C onsidera esta v id a sob dois aspectos: um interior e outro
e x te rio r... Sob o a sp ecto interior a v id a de M a ria é um a
absoluta identificação com seu F ilho. — M ã e e F ilh o não
viviam um a v id a sem elhante, m as um a única e m esm a vid a,
tuna só v id a. ■— N ã o se pode con ceb er m aior dependência
que a de Jesus no seio puríssim o de M a ria . — D E la recebia
toda a v id a ... Q u e m istério! D e u s d epender de um a cria ­
tura! ...
P en etra no m ais p ro fundo dessa intim idade divina entre
M aria e seu F ilh o e apren d e: o recolhim ento com que M a ria
co n cen trav a em Jesus, sem cessar, todo o seu s e r ...; o fervo r
<• o amor, com os quais v iv ia unicam ente p a ra Jesu s... E la
v ia m ais com os olhos de seu Filho, do que com os seus
p ró p rio s... am av a com o C o ra çã o de seu Filho e todo o
136 A E xp ecta çã o

seu gosto era dar-lhe gosto a E le. — Q u e am or tão p erfeito


c tão p u ro sentiria pelo D eus que e n ce rrav a no seu s e io !...,
a vida de g o zo e de alegria inefáveis, porque todas as coisas
div in as causam gozo e dão a felicidade e — sobretudo a
posse de D eus, como a tinha en tão a Santíssim a V irg e m ...
N a d a pois tinha que in v eja r d a glória dos bem -aventurados
do C é u ...
A prende, finalm ente dela a ter um a vida de desejos
e d e ânsia infinita, que a lev a v a a estar sem pre em oração,
fazendo violência a D eus p a ra que apressasse q uanto antes
a h o ra de revelar-se ao m undo. — A h ora da R e d en ç ão ..,
é isto sobretudo, o que m ais caracteriza este m om ento da
v id a de M a ria. — Com o é doce p e n sa r que em v irtu d e
d esta sublim e e fervorosa oração, o P a d re eterno adiantou
a h o ra d a R edenção do m undo e nos enviou o seu p ró p rio
F ilho p a ra nos s a lv a r ! ...

2 .° — A sua vida exterior. — Com o a S S ."" V irgem é


ad m irável em tu d o ! ... Com um a vida interior tão intensa
e tão d iv in a como lev a v a então, não d eix av a tran sp are ce r
n a d a no exterior. — E x terio rm en te um a doce calm a, um a
sim pática sim plicidade, um a am ável serenidade. — N inguém
su sp eitav a o que se ia p a ssan d o no seu in te rio r... ninguém ,
nem sequer S ão José...
Q u e sa n ta a v are za a de M a ria !
C om o gu ard a p a ra si o tesoiro e o não confia a nin­
g u é m !— N em a am bição, nem a soberba nem o am or p ró ­
prio, nem o desejo dos louvores, a levam a com unicar seja
a quem for o seu se g re d o ..., nem a dar-se im portância
d ian te dos demais, julgando-se superior a todos, ainda que
o era n a v e rd a d e ...
Q u e hum ildade p rá tic a ! Q u e bela sim plicidade! ... Q u a n ­
tas vezes o nosso m erecim ento se e v ap o ra , po rq u e o d e sta ­
pam os diante dos o u tro s e não sabem os g u a rd a r as nossas
A E xpectação 137

coisas só p a ra D e u s ...: pelo m enos pôm o-Io em perige, p o r­


que im prudentem ente o expom os aos olhares dos hom ens,
p ro c u ra n d o m ais ou menos directam cnte algum lo u v o r...,
algum a estim a deles...

3. " — A vida do Filho. — C ontem pla neste m om ento a


v id a de Je su s..., oculta e escondida como num sacrário ,
no seio de M a ria. — Q u e obscuridade e silêncio n esta vida
de J e s u s !... Q u e fraqueza e debilidade a de J e s u s !... T u d o
espera e tudo recebe de sua M ã e ... e contudo dali m esmo
está dirigindo o in u n d o ..., está sendo a alegria dos A n jo s
e, sobretudo, está dia a dia santificando m ais e m ais com
a sua presença, com o seu contacto, a sua querida M ãe.
Q u e m is té rio !..., que vida a ctiv a a de M a ria com o seu
F ilho e a do Filho com sua M ã e ! . .. ; contudo é vida de
actividade in te rio r... 4

4. “ — A tua vida. — E sta é que deve ser a tua v id a.


Isto é que é v iv e r... v iv er p a ra Jesus, d ando tudo a Jesus
com o M a ria lhe deu. — N isto é que está a v erd ad e ira
doçura, o encanto, a perfeição que en ce rra a vida in te rio r...
A prende e pede a Jesus e a M a ria que te dêem esta v id a.
— E x am in a com o te encontras com re la çã o a esta vida. —
V ê se gostas do silêncio d e la ..., da sua o b sc u rid ad e ...,
da su a sim plicidade exterior de que anda a co m p an h a d a ...
vê se desenvolves no teu interior o fervor, e o am or de
M aria, que v ia sem pre e tra ta v a com Jesus no m ais íntim o
d a alm a.
Principalm ente depois de com ungares, porque é que o
co ntacto com Jesus e a sua presença sem elhante à que Ele
teve no seio de sua M ãe, não produzem em ti a santidade
que p roduziram n ’E la ? P a ra o conseguires tens de v ig ia r
os sentidos, as potências, m ortificando-os sem cessar, con­
centrando-os no interior, p a ra que vejam aí a Jesus e se
138 A E xp ecta çã o

acostum em a tra ta r com E le, precisam ente no m ais íntim o


d o coração.
P o r últim o, v ê com o aqui tens um m odelo perfeitíssim o
d e escravidão M a rian a . — Jesus é o prim eiro e sc ra v o de
M a r i a . — D ’E la depende to d a a sua v id a ... A ssim deve ser
a tu a .... um a v id a ccunpletam ente entregue a M a ria sem
n a d a poderes fazer sem E la ...
40. A caminho de Belém

1 — O recenseam ento. — E ste serve de ocasião p a ra


a viagem a Belém e p a ra e x erc ita r as m ais belas e difíceis
v irtu d e s n a S antíssim a V irgem , com o são, a subm issão e a
obediência. — C ontem pla a M a ria na com panhia de S. José
n a sua pobre casa de N a z a ré ..., pobre, m as n a d a f a lt a .—
E la andou p re p a ra n d o com todo o c arin h o todos os p o rm e­
nores, p a ra o nascim ento de seu F ilh o que se a p ro x im a....
o bercinho feito p o r S. José, os p an in h o s que E la mesma
c o n fec cio n o u ...; em tudo h á p o b reza m as m uito c arin h o
e a m o r... e o am or supre e in v en ta m uitas coisas p a ra
m elhor receber ao seu querido F ilho.
D e repente ouvem um rum or, prim eiro, e pouco depois,
confirm a-se esse ru m o r...: todos têm que ir a recensear-se
no lu g ar da sua origem , e E la e José descendem de D av id
e d a real cidade d e B elém ... Q u e c o n tra te m p o !... C om o iam
eles ag o ra a fazer a viagem n aquelas circ u n stân c ias...
q uando de um d ia p a ra o o u tro N o ssa S enhora e sp erav a o
nascim ento d o M enino D e u s ? ... E tudo isto pelo capricho
e soberba de um hom em , de um tira n o que assim o o rd e n a ...
N ã o h a v eria m eio de im pedir tal d isp o sição ... ou pelo m enos
de d iferi-la ? ... P o rq u e n ã o e sp e ra r um pouco de tem po até
que passe aquele d ia ditosíssim o? ...
E, contudo a Santíssim a V irgem n ã o fala nem critica
nem p ro te s ta ... C om o c o raç ão ferido, a c a ta a divina v o n ­
ta d e ..., confia n o S e n h o r..., lança-se nos seus braços e
140 Ã cam inho de Belém

im ediatam ente obedece. — Q uem teve algum a v e ; m aior


d esculpa p a ra não obedecer do que n esta o casião a S a n ­
tíssim a V irgem ? — Se te tivesse rebelado e não tivesse
obedecido, quem a po d eria tac h ar de im perfeita? ... N ã o
d iríam os que h a v ia p rocedido m uito b em ... e que teria sido
um a im prudência o p ôr-se a cam inho naquela o c a s iã o ? ...
N ã o ob stan te isto, M a ria não atende à prudência d a c a r n e ...;
antes de tudo está o obedecer, sem p en sar em m ais n a d a ...
Q u e subm issão de v o n tad e e de ju íz o !
N o ta bem isto que é a p a rte m ais difícil da o b e d iê n cia ...
A M a ria sobravam -lhe razões p a ra não o b e d ec er..., m as
obedece antes de tudo e por cim a de tu d o ..., e é que diante
d a obediência não existe p a ra E la mais n a d a ... Q u e lição
difícil, penosa e p rá tic a nos d á M a r ia ! ...

2.° — A viagem . — É longa, um as cinco jo rn a d a s ...;


é dura, p o r causa do cam inho m au e p o r ter de p e rco rrê -lo
todo a c a v a lo ...; é incóm odo, pela é p o c a ..., em D ezem bro,
com frio, ventos d e sag rad áv eis, chuvas e até neve. — A com ­
p a n h a uns instantes a S antíssim a V irgem : vai a b rig a d a com
um m anto preto e com um v é u lançado por diante do seu
rosto. — S. José a seu lad o não se descuida um m om ento
e p ro c u ra que a jum entinha v á pela p a rte m elhor do cam i­
n h o ...; ele adivinha aquele rosto que v ai escondido sob o
v é u ..., todo ele pureza, m odéstia, recolhim ento..., beleza e
form osura celestiais e so b re tu d o ..., santidade.
O u tro s v iajan tes passam ju n to d E le s , fazendo o cam i­
nho m ais rápido e com odam ente. Q u e diferença! — T o d o s
iriam c ritica n d o e m aldizendo a ordem de C ésar. — M a ria
v a i com o que tran sfig u ra d a, com o que extasiad a, pensando
no tesoiro que lev a c o n s ig o ...; não lhe interessa a v id a
e x te rio r que a rodeia. — E m viagem e em casa vive com
Jesus e p a r a Jesus.
Q u e o ra ç ã o faria a S antíssim a V irgem neste c am in h o !
V ê com o os anjos se disputam a ho n ra de acom panhá-la
A cam inho de Detém 141

o tu tam bém dem ora-te a acom panhá-la o .melhor que p u d e ­


res nestas jo rn a d a s... A g o ra a ju d a -a a descer d a jum en-
tin h a ... coloca-a d ebaixo de q u alquer palm eira, leva-lhe
á g u a ..., qualquer coisa que E la te p e ç a ..., p õe-te ao seu
serviço, e pede-lhe que ainda que m uitas vezes o faças
m al, não te despreze, m as que te adm ita na sua com p an h ia...
N ã o lhe negues n ad a, que tudo merece.

3.11— Belém . — C h egaram p o r fim ... é h ora de d escan ­


sa r. — José v a i em busca do m elhor sitio, segundo lho p e r­
mite a sua p o b re z a ..., m as, o u tra vez a m ão do Senhor,
que os p ro v a com o sofrim ento da m ais d u ra m ortificação.
—• N em hospedarias, nem am igos, nem ninguém lhes abre
a s p o rtas. Q ue h o rrív el! D epois de cinco dias de cam inho...
e em vésp e ra s de d a r à luz a seu divino F ilh o ... n ã o há
o n d e h o sp e d a r-se... N ã o é p a ra p e rd er a paciência e p a ra
m urm urar e p a ra d a r lu g a r a todos os nervosism os a que
nós nos e n tre g a m o s? ... N ã o é isto já dem ais?
Sem dizer nem um a p a la v ra, o u tra vez se lança nos
braços de D eus e ... esp e ra r o que E le quiser. — Se final-
mente a sua v o n tad e h á-de triu n fa r sem pre, po rq u e não
■t aceitam os com m ais resignação e alegria, sob retu d o quando
nos prova com a lgum a coisa m ais d e sa g ra d á v e l? — V è como
M aria en tra naquele cu rra l de a n im a is ...; a sua d e lic ad e za ...,
o seu am or m aternal im pressionar-se-iam .
Q u e re p u g n â n c ia !... Ali ia E la p assar a n o ite ! ? ...
All ia E la d a r à luz a seu F ilh o !? ... Q u e dom ínio o s e u ! ...
íí essa a v o n tad e de Deus? ... Pois essa é tam bém a su a ...
A joelha-te aos pés desta V irgem puríssim a e pede-lhe
p erdão da tu a soberba, do teu am or próprio, com o qual
Innlas vezes te opu seste à v o n tad e de D e u s... e pede-lhe
iitu,i subm issão e obediência com o a sua, p a ra obedecer
sem réplica e subm etendo até com aleg ria não só a v o n -
Inile .mas tam bém o juízo aos teus superiores ainda quando
julgues que tens ra zã o de sobra.
140 A cam inho de Belém

im ediatam ente obedece. — Q uem teve algum a v e r m aior


d esculpa p a ra não obedecer do que n esta o casião a S a n ­
tíssim a V irgem ? — Se te tivesse rebelado e não tivesse
obedecido, quem a po d eria tac h ar de im perfeita? ... N ã o
d iríam os que h a v ia p rocedido .muito b em ... e que teria sido
um a im prudência o p ôr-se a cam inho n aq u ela o c a s iã o ? ...
N ã o o b sta n te isto, M aria não atende à p rudência d a c a rn e ...;
a n tes de tudo está o obedecer, sem p e n sa r em m ais n a d a ...
Q u e subm issão de v o n tad e e de juízo!
N o ta bem isto que é a p a rte m ais difícil da o b e d iê n cia ...
A M a ria sobravam -lhe razões p a ra não o b e d ec er..., m as
obedece a n tes de tudo e p o r cim a de tu d o ..., e é que d ian te
d a obediência n ã o existe p a ra E la mais n a d a ... Q u e lição
difícil, penosa e p rá tica nos d á M a r ia ! ...

2.° — A viagem . — É longa, um as cinco jo rn a d a s ...;


é dura, p o r causa do cam inho m au e p o r ter de p e rco rrê -lo
todo a c a v a lo ...; é incóm odo, pela é p o c a ..., em D ezem bro,
com frio, v entos d e sag rad áv eis, chuvas e até neve. — A com ­
p a n h a uns instantes a Santíssim a V irgem : v ai a b rig a d a com
um m anto p reto e com um v é u lançado por diante do seu
ro sto . — S. José a seu lad o não se descuida um m om ento
e p ro c u ra que a jum entinha v á pela p a rte m elhor do cam i­
n h o ...; ele adivinha aquele rosto que v ai escondido sob o
v é u ..., todo ele pureza, m odéstia, reco lh im en to .. ,t beleza e
form osura celestiais e so b re tu d o ..., santidade.
O u tro s v iaja n te s passam junto d'E les, fazendo o cam i­
nho m ais ráp id o e com odam ente. Q u e d ife re n ç a !— T o d o s
iriam c ritica n d o e m aldizendo a ordem de C ésar. — M a ria
vai com o que tran sfig u ra d a, com o que ex ta siad a , pensando
no tesoiro que leva c o n sig o ...; não lhe interessa a v id a
e x te rio r que a rodeia. — E m viagem e em casa vive com
Jesus e p a r a Jesus.
Q u e o ra ç ã o faria a S antíssim a V irgem neste cam inho!
V ê com o os anjos se disputam a ho n ra d e acorr.panhá-la
A cam inho de B elém 141

c tu tam bém dem ora-te a acom panhá-la o m elhor que p u d e ­


res nestas jo rn a d a s... A g o ra a ju d a -a a descer d a jum en-
tin h a ... coloca-a d ebaixo de qualq u er palm eira, leva-lhe
á g u a ..., qualquer coisa que E la te p e ç a ..., põe-te ao seu
serviço, e pede-lhe que ainda que m uitas vezes o faças
m al, não te despreze, m as que te adm ita na sua com p an h ia...
N ã o lhe negues n ad a, que tudo m erece.

3." — B elém . — C hegaram p o r fim ... é h o ra de d escan­


sa r. — José v a i em busca do m elhor sítio, segundo lho p e r­
mite a sua p o b re z a ..., m as, o u tra vez a mão do Senhor,
que os p ro v a com o sofrim ento da m ais d u ra m ortificação.
—• N em hospedarias, nem am igos, nem ninguém lhes abre
a s p o rtas. Q ue h o rrív el! D epois de cinco dias de cam inho...
c em v ésp eras de d a r à luz a seu divino F ilh o ... não há
o n d e h o sp e d a r-se... N ã o é p a ra p e rd er a paciência e p a ra
m urm urar e p a ra d a r lu g a r a todos os nervosism os a que
nós nos e n tre g a m o s? ... N ã o é isto já dem ais?
Sem dizer nem um a p a la v ra, o u tra vez se lança nos
braços de D eus e ... esp e ra r o que E le quiser. — Se fin al­
mente a sua v o n tad e h á-de triu n fa r sem pre, po rq u e não
a aceitam os com m ais resignação e alegria, sob retu d o quando
nos p ro v a com a lgum a coisa mais d e sa g ra d á v e l? — V é como
M aria en tra naquele cu rra l de a n im a is ...; a sua d e lic ad e za ...,
o seu am or m aternal im pressionar-se-iam .
Q u e re p u g n â n c ia !... Ali ia E la p a ssa r a n o ite ! ? ...
A li ia E la d a r à luz a seu F ilh o !? ... Q u e dom ínio o s e u ! ...
íl essa a v o n tad e de Deus? ... Pois essa é tam bém a su a ...
A joelha-te aos p é s desta V irgem puríssim a e pede-lhe
perdão da tua soberba, do teu am or próprio, com o qual
Im itas vezes te o puseste à v o n tad e de D e u s... e pede-lhe
lima subm issão e obediência com o a su a, p a ra obedecer
sem réplica e subm etendo até com aleg ria não só a v o n -
Irtde m as tam bém o juízo aos teus superiores ainda quando
julgues que tens razão de sobra.
41. O Nascimento do Menino Jesus

1. ° — Ingratidão dos seus. — V ê como se cum prem à


le tra aquelas p a la v ra s: «veio p a ra os seus e os seus não
o receberam ». — Q u e ig n o rân cia das coisas de D eus! Se
eles soubessem o que ia p a ssa r-se naquela n o ite ! ... M as
ai e stá o m érito d a subm issão e resignação n a s m ãos de
D e u s ..., mão p en sar no po rq u ê nem no p a ra quê dispõe
D eus as coisas deste ou d aquele m odo.
P o r o u tra p a rte aqueles puderam ter desculpa d a sua
ig n o râ n c ia ..., m as nós n ã o tem os m ilhares de p ro v a s p a ra
conhecerm os as coisas de D eus e saberm os quem c E le e
onde se encontra?
P e d ir p e rd ão ao S enhor das m uitas vezes que quis
e n tra r n o nosso c oração e nós não o a d m itim o s...: d a s m ui­
ta s vezes que E le desejou fazer algum a c o isa ... talvez
algum a coisa de gran d e connosco e nós o im pedim os. —
E nfim tem am os e trem am os, pois não sabem os a re sp o n sa ­
b ilidade que nisto tem os e a conta que havem os de d a r a
D eus p o r isso.2

2. ° — O N ascim en to . — Se o esquecim ento, o abandono


e o d esprezo foi o m odo com o os seus receberam a Jesus,
contem pla ag o ra a M a ria ..., p e n etra no interior do presépio
c ... olha com sa n ta curiosidade p a ra tudo o que ali se passa.
— Ilum inada pelo E sp írito S anto, com preendeu M a ria que
O N a scim en to do M e n in o Jesus M3

o m om ento do nascim ento de seu F ilh o tinha c h eg a d o ...


c n aturalm ente, a in d a que can sad a da pen o sa viagem , n ã o
quer descansar.
M ais do que nunca entrega-se a g o ra à o ra ç ã o ... O s seus
ard en tes anelos e fervorosos suspiros fazem um a violência
irresistível ao c o raç ão de D e u s... que se deix a v encer pela
o ra ç ã o de M a ria ; e quando esta chegou ao grau m ais
e lev ad o daquele ê x tase de am or, o E sp írito S a n to faz com
que de re p e n te ..., de um m odo m ila g ro so ..., ao a b rir M a ria
os seus olhos, se encontre entre as d o b ras do seu m a n to ...,
bran co como um floco de n e v e ..., m ais belo do que os
a n jo s ..., o F ilho de D eus e o seu filho. — M a ria V irgem
an te s do p a rto , é virgem sem, m ancha no p a rto ...: com o
0 ra io de sol sai p o r um cristal, sem o q u e b rar e sem o
m a n c h a r..., assim n asceu o F ilho de M aria.
A p roxim a-te bem, sem m edo nenhum e contem pla
aquela cena. — Jesus v a i a receber a p rim eira a d o raç ão
e com ela as prim eiras c arícias de um a m ã e ... M a ria a d o ra
ao seu Deus, v iv o a li... real e fisicam ente p re se n te ..., m as
com o m ãe ju lg a-se com direito a to m a r aquele m enino e
n im prim ir n a s suas faces delicadas os seus prim eiros bei­
jos... Q u e beijos m ais c a rin h o s o s !... Q u e abraços m ais
e fu siv o s!... Q u e caricias m ais t e r n a s ! ... D e sp e rta bem a
tua im aginação, que tudo será n ad a p a ra p in ta r esta cena.
Jesus não sente a p obreza d o e stá b u lo ..., nem o frio
<lii n o ite ..., po rq u e a prim eira coisa que viram seus olhos
no abri-los à luz deste m undo, foi o ro sto de sua M ã e .—
l.cm bra o e ncanto de um a criancinha quando sorri a o con-
liMiipInr qualquer coisa a g ra d á v e l aos seus olhitos e pensa
n o que seria o sorriso de Jesus ao v e r a sua M ãe tã o p u ra ...,
tão lx’la ..., tão form osa. — M ãe e F ilho p arece que não se
liiitnin dc contem plar-se m útu am en te... e este o lh ar de M a ria
1 consolação e alegria p a ra Je su s... e o o lh ar de Jesus é
»Miiiirnto de g raça e sa n tid a d e p a ra M aria.
Com que respeito e d evoção e ao mesmo tem po com
144 O nascim ento do 'M enino Jesus

que tern u ra a delicadeza iria a Santíssim a V irgem en v o l­


vendo aquele corpinho de seu Filho nos b ra n co s e pobres
p a n in h o s... e com que d o r e p e n a tão p rofundas, o colocaria
n a s palhas do p re sé p io ... E la foi a prim eira que m editou
n esta v e rd ad e que tinha diante dos o lh o s ...: D eus num
p re s é p io !... D eus a b raç ad o tão estreitam ente com a pobreza,
que nem casa nem h a b ita çã o tem p a ra n a s c e r ! ... Q u e será
a p o b re za quando assim a p arece tão unida ao F ilho de
D e u s ! P ede a M a ria que ta dê a conhecer, p a ra que ames
esta virtude.

3." — O F ilho P rim ogénito. — D iz o E v an g e lh o que


M a ria deu à luz o seu F ilho P rim o g én ito ... Se foi o p ri­
m ogênito, isto é, o prim eiro, é porque depois devia ter
o u tr o s ; e assim é, felizm ente p a ra nós. — Jesus é o p ri­
m eiro .... é o irm ão m ais v e lh o ..., m as logo a se g u ir vim os
nós. que tam bém som os filhos de M a ria. — A M ã e de
D eus é nossa M ã e ! ... Jesus é nosso irm ã o ... Irm ãos de
C r is to ! ... Já pensaste bem nisto? D em oras-te a considerar
o que isto significa da p a rte de D eus e d a tu a p a rte ? —
D a p a rte de D eus é o cúm ulo d a bondade e do am or p a ra
c o n tig o ..., da tu a p a rte é a m aior glória e d ignidade a que
podes a sp ira r... é o títu lo dulcíssim o que nem aos anjos
quis d a r... M a ria é a ra in h a dos anjos, m as n ã o é M ãe
deles com o o é de nós. — D este m odo, d iante d o berço
d e Jesu s..., em presença d esta M ãe, m edita e sab o reia estas
dulcíssim as verdades.

4.” —. A ntes de term in ar aproxim a-te de M a ria e pede-


-lhe que p o r uns instantes te deixe te r nos braços a seu
d iv in o F ilh o ..., recreia-te com E le ..., a b ra ç a -o e cum ula-o
de to d a a espécie de c a ríc ia s... e so b retu d o estreita-o ao
teu peito de tal m odo que o m etas no m ais pro fu n d o do
teu coração. — S uplica-lhe que troque o seu berço e o seu
p resépio pelo teu coração, que aí lhe d a rá s m ais abrigo
O N a sc im e n to do M enino Jesiis 145

e calor. — P o r fim pede ao M enino Jesus que te ensine a


a m a r a sua M ã e ... P e d e à M ãe que te ensine a am ar a Jesus.
R ep ara em que a vida de Jesus com eça olhando p a ra
M a ria e ... tam bém na cruz term ina olh an d o p a ra M a ria ...
N ã o qu ererá dizer-te com isto que E le q uer que to d a a
tu a vida se p asse tam bém sob o o lh ar de M a ria ? ... Q u e
•doce não é p e n sa r que assim vivem os alum iados e c onso­
lados com a luz dos olhos de M a r ia ! ... A prende a olhar
p a ra M a ria e a re co rd a r que E la olha p a ra ti sem c essar...

30
42. Primeiros adoradores

1. " — O s pastores. —-S ã o eles os eleitos p o r D e u s com


re p re se n tan te s d a hum anidade, p a ra fazer-lhes a prim eira
m an ifestação de Jesus. —■A su a sim plicidade foi a razão
d e serem escolhidos p a ra tal fa v o r... Jesus M enino com u­
nica-se aos co raçõ es sim ples, com o os das crian ças — A sim ­
plicidade e n co n tra a D eus pelos cam inhos m ais sim ples e
directos. —• A sim plicidade é fé que tudo crê, com o nos p a s ­
to re s ..., é obediência cega com o a deles.
O s p asto res nem sequer se desvaneceram com o p ri­
vilégio sin g u la r...: ouvem a v o z do anjo e aceitam com
sim plicidade o c o n v ite ...; é tu d o a o c o n trá rio do am or p ró ­
prio, que tudo q uer p e n sa r e calcu lar a seu m odo. -— Supõe
a do se de am or p róprio do teu coração, no c o ra ç ã o dos
pastores, e com certeza n ã o teriam ido a B elém ...: iam talvez
rir-se d e le s..., e e ra c ap a z de se r m e n tira ... etc. A ssim fala
o am or próprio. — Q u e d iferença d a fé, d a obediência e da
hum ildade p ró p rias d a sim plicidade! — C om o v a i esta v ir­
tude n o teu c o ra ç ã o ? ... 2

2. ° — A le g ria da V irg em Santíssim a. — Q u e alegria rece­


b eria a Santíssim a V irgem q u ando os v iu e ouv iu o que
lhe c o n ta ram ! — E m prém io da sua fé e da su a sim plicidade,
M a ria tom a a Jesus, m o stra-lh o ... e d á -lh o ... p a ra que se
P rim eiros adoradores M7

recreiem com o M enino. — Q u e prém io o da sim plicidade


e o d a o b e d iê n cia !— P ossuir a Jesus!
M a s n o ta que quem d á a Jesus é M aria.
É a p rim eira m an ifestação d e Jesus e q u e r que seja
p o r m eio de su a M ã e ... É a prim eira e n treg a que faz de si
mesmo aos hom ens e fá-la p o r m eio de M aria. — E v a
com eu o fruto p ro ib id o ..., m ostrou-o a A d ã o ..., d e u-lho e
p e rd eu -n o s... M a ria m ostra o fru to d o seu seio puríssim o
aos p a sto re s ... e neles a todos o s hom ens; dá-lho e sal­
va-nos.
Jesus é o S a lv ad o r, m as p o r m eio de M a ria ..., nem
o recebem os senão p o r meio de M a ria ... nem h á o u tro
cam inho p a ra c h eg a r a E le senão M a ria ... N u n c a se enco n ­
tra a Jesus sem M aria, com o diz S. B o a v en tu ra. — E p o r­
tanto, n ã o é possivel iso lar a Jesus de M a ria . A charem os a
Jesus nos b raço s de M aria, como os p a sto res e ao p ro s­
trar-nos, com o eles, aos pés d e Jesus, tam bém nos p ro stra ­
rem os ao mesmo tem po aos pés de M a ria ...

3." — O s R eis M a g o s. — U m a rev elação especial os


leva a B elém ..., um a estrela a p arece no céu e um a inspi­
ração soa n o seu c o ra ç ã o ... e dóceis a este cham am ento
pócm -se a cam inho. — V ê que docilidade e que p ro n tid ã o
na sua o b ed iên cia... L ogo deixam tu d o ...; p átria, casa,;
fainilia, com odidades, p a ra em preender um a viagem longa
e penosa. — H um anam ente, isto era um a lo u cu ra ... C o n v en ­
ce te, de um a vez, que p a ra o m undo e p a ra a p rudência da
eurne, parecem lo u cu ras as coisas de D e u s... e contudo
tu deves am ar e b u scar estas div in as lo u cu ras.-—-R ecorda
o m om ento em que se ocultou a e stre la ... Q u e d ú v id a s !...
que v a c ila ç õ e s !... T er-se-iam e n g a n a d o ? ... N ã o seria m elhor
voltar p a ra trás? P e n sa o que seria d o s M ag o s se assim
llvessem feito. Q u e p e n a ! ... E s ta r às p o rta s de conseguir
o seu destino e n o fim da sua viagem e p e rd er tudo isso
voltando a trá s ... Q u e imagem perfeita da tua in c o n s tâ n c ia !...
148 P rim eiros adoradores

N ã o te esqueças que só triu n fa quem p e rsev e ra e que


a constância é distintivo do a m o r...

4. " — C hegada a B elém . — C ontem pla-os já em Be


O triu n fo é c o m p le to ..., a estrela v o lta a a p a re c e r e guia-os
a té à m esm a cova o n d e se e n co n tra o M enino Jesus. —-
O u tra dificuldade. E les, Reis, que buscam um Rei, v ã o
a g o ra a e n tra r num a c o v a d e anim ais? ! v ã o a d o ra r a um
M en in o que n ã o tem o u tro berço sen ão um presépio? ! —
A i está o m erecim ento d a fé: n ã o se guia por aparên cias
e crê no que n ã o vê. — A tra v é s daquela p o b re za os M agos
descobrem a d ivindade e adoram -na.
C ontem pla-os no m om ento em que oferecem os seus p re ­
sentes e m edita no significado deles... A qui tudo fa la de
sacrifício e tudo nos anim a a e le... Sacrifício por am or,
re p re se n tad o no o iro ... S acrifício pela o ra çã o , sim bolizada
n o in ce n so ... S acrifício pela m ortificação e p enitência e x te ­
rio r significada p ela m irra. — S ó pelo sacrifício se enco n tra
a Jesus. — O sacrifício c o único presen te que a g ra d a a
Jesus. 5

5. “ — A M ã e com o F ilho. — D iz o E v an g e lh o : e enco


traram ao M e n in o com sua M ã e. — N ã o desprezem os este
p o rm en o r... O u tra vez o E v an g e lh o nos re co rd a : «o M enino
e stá com su a M ã e ...» M a ria aparece aqui in stru in d o aos
g e n tio s p e la prim eira v e z ... P o r E la en tram os M agos,
e com eles o m undo p a g ã o , n o cristianism o.
A E la devem os a nossa fé ... A prendam os a a d o ra r e a
a m a r a Jesus sem pre nos b ra ço s de su a M ã e e p o r meio
d e la ofereçam os hoje a o M enino Jesus os nossos dons
e o nosso coração.
R eparem os que tam bém p a ra nós h á um a e stre la ..., um a
v o c aç ão que tem os de seguir a p esar de to d as as dificul­
d a d e s ... a in d a que chegue a o cu ltar-se e n ã o v ejam os o term o
a o n d e vam os p a rar. Sejam os fiéis em seg u ir essa v ocação
P rim eiros adoradores H9

e constantes a to d a a p ro v a. N ã o resistam os a nenhum a


insp iração dos céus que tan to s bens nos pode trazer.
Finalm ente reparem os que p a ra nós há tam bém o u tra
estrela que sem pre brilha e que n u n ca se e sco n d e... e que,
se querem os, sem pre podem os seguir. E ssa estrela é M a ria,
nossa q uerida M ãe. — E la nos g u iará e nos a le n tará nos
m om entos difíceis. — N ã o ten s m ais a fazer do que le v a n ta r
os olhos e o lh a r p a ra E la e sem pre a v e rás alum iando os
passos da tu a v id a e guiando o s m ovim entos do teu co ração:
O lh a sem pre p a ra a E strela, cham a p o r M aria», diz S. B er­
nardo.
43. Purificação de Nossa Senhora

E s ta passagem d a v id a d a Santíssim a V irg em é um a


d a s m ais belas pois nela resplandece de um m odo ad m ira­
bilíssim o a h eroicidade d a s su as virtu d es.

1. ° — O recolhim ento. — A ssim m an d a v a a lei, que as


m ães estivessem recolhidas q u a ren ta d ias n a s su as casas
a n tes d a su a p u rificação le g a l... Q u e p ra z e r n ã o teria a
S a n tíssim a V irgem em c um prir e sta p a rte d a lei! — Q u e am or
o seu a o recolhim ento e à o ra ç ã o m as sobretudo a g o ra que
tin h a consigo a seu F ilh o ! ... Q u e p odia E la a p etec e r e
b u sc a r fo ra d a su a casa se nela tinha tu d o ? ... P e n sa em
que algum a coisa de sem elhante se deve p a ssa r c o n tig o ...;
tra b a lh a p o r te r a Jesus no teu coração e depois de o ter,
q u e m ais q u e res... que m ais d esejas? L ogo, se apeteces
a lg u m a o u tra coisa é sinal que n ã o tens a Jesus e que não
sab es g o z ar d a su a p re se n ç a ... 2

2. ° — A pureza. — R eco rd a que M a ria foi concebida


sem m a n c h a ..., que sem pre foi p u ra e m ais lim pa d o que
o s o l..., q u e nunca m anchou com a m ais p eq u en a im per­
feição a su a beleza e form osura im a c u la d a... e, contudo
aqui a p arece p u rifican d o -se! — Q u e exem plo p a ra t i ! . . . E la,
a que n ã o tem m ancha, que n ã o tem n a d a que purificar,
quer purificar-se. —• Isto q uer d izer que am a tan to a p u reza
P urificação de N o ssa Senhora 151

d e c o ração que p a re c e que ain d a n ã o e stá contente e deseja,


se pudesse ser, p u rificar-se cad a vez m ais. — A h ! A m a s tu
assim a sa n ta p u re z a ? ... Com esse espirito p ro c u ra s tu
freq u e n tar o sacram en to d a p enitência e os o u tro s m eios
q u e a S a n ta Ig reja te d á p a ra sa n tific ar-te e p u rific a r-te ? ...
E se E la n ã o está contente, p o r assim dizer, com a sua
p u re za , e d esejaria se r ainda m ais p u ra, estás tu c ontente
com a tu a ? ... E s ta rá contente M a ria com a tu a p u re za e
com a lim pidez d a tu a alma? ... E n c o n tra rá a i a p u re za que
E la deseja? ... M e d ita m uito nisto, en v erg o n h a-te e pede a
M a ria este am or a v irtu d e tã o d elicada e precio sa como
é a v irtu d e da pureza, até ch eg ares a a p a ix o n a r-te pela sua
beleza, como M a ria o estav a.

3.“ — A obediência. —• N ã o e sta v a o b rig a d a a e sta lei.


— E la bem o sabia. — T o d a a conceição e p a rto m ilagrosos
tinham sid o o b ra do E sp írito S a n to . — E la tin h a sido s a u ­
d a d a com o a «bendita entre to d as as m ulheres», e de si
m esm a tin h a dito que « to d as as g erações a cham ariam bem-
-a v en tu rad a » p elas m ara v ilh a s que nela o p e ra ria o T o d o -
- p o d e ro so ... e a p e s a r d e toda e sta grandeza, n ã o se c o n ­
sid e ra e x cep tu ad a d a lei. —■N ã o q uer p rivilégios quando
,se tra ta de o b e d ec er... e, obediente com o um a m ulher q u a l­
q u e r... como se nela n ã o houvesse n a d a de e x tra o rd in á rio .,.,
subm ete-se gostosam ente à lei comum , e assim , p assados os
q u a re n ta dias, com to d a a p re stez a põe-se a cam inho de
Jerusalém , p a ra se r com seu F ilh o m odelo de obediência.
V è com o este exem plo nos c o n fu n d e ... Q u e diferença
en tre este m odo de obedecer e o n o s s o ! ... Q u a n ta s vezes
sem razão nos julgam os dispensados d e obedecer e isso
m esmo quando a obediência n ã o nos exige nem hum ilha­
ções nem sa c rifício s... com o o s que exigiu a M a ria n esta
o c a s iã o .... porque o que fez h eróica esta obediência de
M aria foi o sacrifício tão hum ilde que tan to lhe custou,
com o vam os ver.
152 P urificação de N o ssa Senhora

4. " —• A hum ildade. — A qui está o principal e o m ais


incom preensível deste m istério. — M a ria é em tudo e x tra o r­
d in ária e p o r isso tam bém devia ser e x tra o rd in á ria a hum il­
dade.
L em bra o am or de M a ria à sua virg in d ad e: diante
do an jo do S enhor esteve disposta a d eix ar de ser M ãe
antes do que a d e ix a r de ser v irg e m ...; ser virgem c p a ra
E la o ideal mais precioso da sua v id a ... e contudo a gora
pela hum ildade chega a sacrificar até as a p arê n cia s da sua
v irg in d a d e ... aparecendo com o um a m u lh er m an ch ad a que
necessita de ser purificada. — P a re ce que p o r am or à hum il­
d ade se despoja de tudo, até do conceito e glória e x te rio r
d a sua v irg in d a d e ... e hum ilha-se até ao pon to de não
a p are ce r como M ãe de D eus, nem como V irg e m .... senão
com o um a m ulher m an c h ad a ... Q u e adm irável e que sublim e
n ã o é esta virtu d e em M a ria ! Q u e obediência m ais hum i­
lh an te pela E la ! e contudo, com que alegria obedece! Com
que sa tisfaç ão se h u m ilh a !
C o ntem pla-a bem : tan to m aior q uanto m ais hum ilde!
—• C on tem p la-a confundida com todas as o u tra s m ulheres
e com o um a dé ta n ta s ..., m as olha com o D eus náo a c o n ­
fu n d e... e como a distingue b e m ...: é o lírio de can d u ra
m as a o mesmo tem po a vio leta escondida da m ais sublim e
hum ild ad e... Q u a n ta glória n ã o receberia o S enhor com o
exercício destas v irtu d es! Q u a n to se deliciaria n ’E l a !
M e d ita p ro fu n d am e n te ... co m p ara-te co.m E la ... depõe
a seus pés a tu a so b e rb a ..., o teu o rg u lh o ..., o teu am or
p ró p rio ..., trab a lh a p o r im itá-la... 5

5. " — A sua pobreza. — N ã o pode lev ar a oferenda de


um cordeirinho que to d as lev av am e só às m ais p o ó res se
perm itia que levassem duas p o m b in h a s ...; a pobreza sem ­
pre é hum ilhante m as m uito m ais quando aparece diante
dos ou tro s. — M a ria não se e n v erg o n h a de ser pobre nem
de que a tenham p o r tal nem de que a desprezem cc:no se
P urificação de N o ssa Senhora 153

d espreza aos p o b re s... Q ue felizes se teriam considerado


a q u elas pom binhas se soubessem o fim a que eram d e sti­
n a d a s !... D eviam ser a oferenda do sacrifício de M a ria !
O ferece-te tu a M a ria como oferen d a do seu sacrifício.
— D iz-lhe que queres con sa g ra r-te a E la ..., m as p a ra que o
teu sacrifício v a lh a algum a coisa, hás-de ser com o E la,
im itá-la a E la . — D edica-te a copiar estas virtu d es no teu
c o ra ç ã o ... e especialm ente as que m ais c u stam ..., as m ais
h u m ih a n tes..., as de m ais sacrifício. — E x erc ita -te m uito
nelas.
44. A Apresentação do Menino Jesus no Templo

1.’ — M aria entra no T e m p lo . — Já foi p u rific ad a e já


é d igna de e n tra r no T em plo. Co.m que resp eito e dev o ção
e n tra ria nele! S abia que era o lu g a r d a o ra çã o , onde D eus
se com unica com as a lm a s..., a m orada do S en h o r ainda
que ali só e stav a em sím bolo e em fig u ra ... e, n ã o obs­
ta n te , M a ria reverenceia e adm ira aquele tem plo, o n d e resi­
d ia a m ajestade de D eus m ais do que em q u a lq u e r o u tra
p a r te ... Q u e teria feito se tivesse e n tra d o nos nossos tem 1-
p io s ’ ... Q u e lição p a ra as tu a s faltas de re sp eito tã o fre ­
quentes nas igrejas! A o E la e n tra r com seu F ilh o nos braços
sa n tific o u aquele lugar. — N ó s vam os ao T em p lo a sa n ti­
fica r-n o s... E la foi com seu F ilho a sa n tific ar o p róprio
T emolo.
Q u e recordações p a ra E la ! naquele mesmo T em p lo foi
a p re se n ta d a por seus p ais aos três anos d e id a d e ... ali
p asso u o s prim eiros anos d a sua in fân c ia ... ali fez, depois
d e longo tem po de o ra çã o , o seu v o to de v irg in d a d e ao
S e n h o r... Q u a n ta s coisas n ã o dizia aquele tem plo a N o ssa
S e n h o ra '
E a ti. n ã o te d iz nada? N ã o te lem bras das g ra ç a s ...,
dos sa c ra m e n to s.... das in sp iraç õ es..., das com unhões que
recebeste n a igreja? ... E squeceste-te que d iante d o a lta r da
S antíssim a V irgem recebeste ta n ta s m anifestações d o am or
que E ia te tem? — Am a, am a m uito a ig reja: deve se r p a ra
A A p resen ta çã o d o M en in o Jesus no T e m p lo 155

ti o lu g ar m ais d esejado de to d o s ...; em nenhum a p arte


e ncontraste a D eus com o aí. — T em sim, m uito am or à
ig reja mas ao m esm o tem po reverenceia-a. — N ã o consintas
cm ti qualquer coisa que desdiga d a sa n tid a d e d e la ...

2." — Sacrifício de M aria. — M a s o T em plo é sobre-


tudo o lu g a r p o r excelência do sacrifício e ali v a i M a ria
o ferecer ao S enhor o .mais belo e o m ais penoso dos sa c ri­
fícios ...
Segundo a lei, haviam de oferecer-se ao S enhor todos
o s filhos prim ogénitos e resg atá-lo s m ediante a esm ola de
cinco sid o s de p ra ta . — Jesus e M a ria não se julgam livres
d esta lei e c u m p re m -n a .— Jesus é ap rese n tad o a seu E te rn o
P a i e re sg ata d o por sua M ã e ... Q u e sim plicidade e que
beleza neste m istério tão su b lim e! M as m istério todo ele
de sacrifício ... N ã o te esqueças, o sacrifício é in sep aráv el
de Je su s..., o M enino Jesus oferece-se volu n tariam en te a seu
P a i como vítim a de e x p ia ç ã o ... H o je re p etiria as p a la v ras
do Salm o: e v isto que não te a g ra d a ra m os sacrifícios de
anim ais, aqui me tens a mim».
M as este sacrifício não é E le só que o fa z ..., com
E le está sua M ãe e é E la que o a p rese n ta ao E te rn o P ai
p a ra o sacrifício.
R ecorda o sacrifício de A b ra ão disposto a im olar a seu
Pilho p a ra c um prir a v o n tad e de D eus. — D izem alguns que
esta ordem se deu a o p ai e não à m ãe porque ela seria
incapaz de fazer este sa c rifício ... P ois bem, aqui é a m ãe
que conscientem ente e dando-se in teira co n ta do que fa z ia ...
com preendendo todo o significado e alcance desta cerim ó­
n ia ... oferece a seu F ilh o p a ra um sacrifício que m ais tard e
se h a v ia de consum ar. E ste é o o fe rtó rio d a q u ela prim eira
M issa que C risto disse depois n a cruz. Q u a n ta s vezes no
d ia na sua P a ix ã o e m o rte se lem braria a Santíssim a V ir ­
gem deste d ia e deste m o m e n to !...
Q u e bem aceitou o P a d re E te rn o este sofrim ento e
156 A A p resen ta çã o do M e n in o Jesus no T e m p lo

com o n ã o se contentou, com o no caso de A b raão , com a


inten ção senão que exigiu o seu cum prim ento e x acto a té
ao fim !... Q u e generosidade e que am or da p a rte de M a ria
e d e J e su s!
A gradece-lhes este oferecim ento pois a ele devem os a
n ossa sa lv aç ão . — O ferece-te tu tam bém p a ra o sacrifício,
seja ele qual fo r..., oferece-te com o v ítim a de e x p iação e
de a m o r... e a le g ra-te se o S en h o r se digna aceitar-te este
oferecim ento e quer que te consum as sacrificando-te. T em
m uita generosidade em p ro m eter e depois em cum prir o que
prom etes, com o M a ria e Jesu s...

3. “ — A M ediação de M aria. — V ê neste m istério um a


confirm ação d a m ediação u n iv ersal de M aria. — Jesus tom ou
carne hum ana n o seio de M a ria . — N a cruz será im olado
em un ião com M aria. — N a A p re se n ta ç ão há algum a coisa
m ais: Q u e r Jesus que M a ria o leve e que E la m esm a no
T em p lo o ofereça p a ra o sacrifício. — Q u e r dizer que aqui
a p arece a Santíssim a V irgem com o o sacerdote que tom a
a hóstia nas su as m ãos p a ra sacrificá-la. — E la é o a lta r
do sacrifício, onde se im ola o seu p róprio F ilh o ...; o seu
c o raç ão e os seus braços, são a a ra onde se consom e a
v ítim a ... Q u ã o grande e quão m agnifica é esta co operação
de M a ria na o b ra da R edenção! Q u a l não será a confiança
que deve insp irar-n o s pois a vem os deste m odo unida com
D eus e n a o b ra m aior de D eu s que é a R edenção
Im ita-a no sacrificio do teu c o ra ç ã o ... e nesse a lta r
im ola tudo o que lhe d esag rad e, p a ra que assim não h a ja
n a d a d esordenado n ele... 4

4. ° — O R esg a te de Jesus. — M ed ita por fim r.a últim a


p arte da cerim ónia que é o resgate. Jesus é re sg ata d o p o r
sua M ãe, não p a ra E la ..., n ã o p a ra gozar de seu F ilh o ...,
m as p a ra criá-lo e educá-lo p a ra serv o e escravo n o sso ...,
que p o r nós algum dia d a ria a v id a. — Q u e r isto dizer
A A p resen ta çã o do M en in o Jesus no T e m p lo 157

que em nenhum a o casião podem os n o ta r n a Santíssim a


V irg e m e em seu F ilh o sinal algum d e a m o r p ró p rio ...
tudo é am or p u ro e desinteressado que n ã o aten d e a si e
que só atende aos o u tro s... E la sabia m uito bem que to d o s
o s trab a lh o s que h a v ia de te r com a su a criação n ã o seriam
p a ra seu beneficio m as p a ra benefício n o sso ... e c ontudo
oferece-se ao trab a lh o p a ra d a r-n o s a nós este bem. — Q u ã o
g ra n d e não deve ser a g ra tid ão p a ra com Jesus e p a ra com
M a r i a ! e que ensinam entos n ã o deves colher p a ra o teu
egoism o, que sem pre se introm ete n a s tu as a c ç õ e s!
B uscar a D eus e ao próxim o e nunca a ti mesmo.
E ste d eve ser o teu id ea l...
45. Profecia de Simcão

1.® — Sim eão era um v a rã o justo, diz o E v an g e lh o ,


tem ente a D eus e que e sp e ra v a a consolação de Isra e l...
D este m odo com a san tid ad e d a sua v id a p re p a ra ra -se e
to m a ra -s e digno de v e r e con h ecer ao M e ssia s... O E sp írito
S a n to tinha-lhe prom etido interiorm ente no seu c o ração que
n ã o m o rreria sem que assim aco n tecesse... Só esta prom essa
foi o suficiente p a ra estim ulá-lo a ser s a n to ... N ã o te bastam
a ti as suavíssim as prom essas de Jesus p a ra o m esm o fim ? ...
N ã o sabes que com a sa n tid a d e p ossuirás a Jesus e a M a ria
n a v id a e n a m orte e n a e te rn id a d e ? ... Q u e m ais q u e re s? ...
Q u e o u tro bem m aior podes a p e te c e r? ... P o rta n to , porque
te n ã o decides a ser santo, com o fez Sim eão, só p o r m ere­
cer a d ita de v e r e ter em seus braços a Jesus e conhecer
a sua M ãe S antíssim a?

2 ° — A R evelação. — E chegou de facto o dia. —


Ilum inado Sim cão pela luz do céu, naquela m ulher, c o n ­
fundida com as outras, reconhece a M ãe do Senhor, e no
M enino que leva nos braços, o M essias v e rd ad e iro . —
R e p ara bem: por M a ria conhece a Je su s.... pela M ãe ao
F ilh o ...; sem pre, sem pre o m esm o...: nunca Jesus sem
M a ria.
E n tã o Sim eão a d ian ta-se e p ede o M enino a sua M ã e ...
Com que respeito tom aria em seus braços o M enino J e s u s !...
P rofecia de S im eão :?9

C om que fe rv o r o contem plaria e o e streitaria em seus


b ra ço s en q u an to a su a alm a se m erg u lh av a n a m ais p u ra
a le g ria e am or! V ê aquele san to velh o su ste n tan d o em
seu s b raço s aquele que com os seus su ste n ta toda a c ria ­
ç ã o ... P o r m uito bem em pregada deu to d a a sua vida d e
a u sterid ad e e sa n tid a d e, pelo p ra z e r deste m o m e n to !... só
com isto se d a v a p o r bem p a g o ... e p o r isso entusiasm ado
e n to a aquele cân tico belíssim o de agradecim ento a o Senhor:
N u n c d im ittis... «Senhor, a g o ra já podeis d isp o r do v o sso
serv o quando quiserdes»...
D epois de v e r a M a ria e de te r a Jesus, já n ã o q u e r
m ais neste m u n d o ..., está c erto que nele n ã o h á n a d a que se
assem elhe a i s to ...; já tudo o cansa, já tu d o o e n fa s tia ...;
n a d a .mais q uer v e r e só deseja m orrer.
E tu, que vês com a fé a Jesus e d iariam ente o to ca s
e te alim entas com E le po rq u e tens g o sto d o u tras coisas
que n ã o são E le? ... p o rq u e n ã o m orreste p a ra to d a s as
coisas, inclusivam ente p a ra ti mesmo, p a ra v iv e r só d 'E le
c só p a ra Ele?

3.° — A P rofecia. — E então cheio d o E sp irito S a n to ,


dirigindo-se a M a ria diz-lhe; E is que este será causa de
ruina e d e ressurreição para m uitos em Israel, e sinal de
contradição... Q u e efeito causariam estas p a la v ra s n a S an-
tlssim a V irg em ! C om o as m editaria p a ra com preender bem
o seu íntim o e m isterioso significado, pois v ia claram ente
que eram p a la v ra s d ita d a s pelo m esm o D eu s! — T r a ta de
com preender tu com o M aria, este últim o sig n ificad o ... Jesus,
cuusa de ru ina e de sa lv aç ão p a ra m u ito s !... quer dizer,
desde a g o ra ele será a única ra z ã o de sa lv a ç ã o e conde­
nação d a h u m an id a d e... T o d o o que se sa lv e será p o r
|c s u s ...; todo o que se condene será p o r ir c o n tra Jesus.
P o rta n to é sa lv a ç ã o e v id a p a ra quem o d e se ja ... Ele
diurna a to d o s..., a to d o s b u sc a ..., p o r to d o s m orre e der-
innia o seu sa n g u e ..., p a ra todos funda a sua Ig reja e nela
160 P rofecia d e Sim eão

d ep o sita os seus sacram en to s, fontes de v id a e sa lv a ç ã o ...


E le é p o r conseguinte, o único S a lv ad o r do m undo.
T o d a s as alm as que se santificaram e adq u iriram a
posse glo rio sa do c é u ..., to d as o conseguiram p o r E le ..,;
nem um a só o p oderia te r feito p o r si mesma.
M as. p o r o u tra p a rte , todo aquele que n ã o quiser a p ro ­
v e ita r-se do san g u e precio so de Jesus p erd er-se-á irrem e­
d iavelm ente ; e esta se rá a ra zã o d a p erda ete rn a d o s m aus.
P e n e tra no c o raç ão de M a ria e p ro c u ra sa b e r o que
se p a ssa ria p o r E la ao o u v ir estas p a la v r a s ...; aquele c o ra ­
ção viu d e repente tudo o que Jesus e sta v a a fa ze r e ia a
fazer p o r todos os h o m en s..., viu -o a esvair-se em sangue
n a cruz, m orrendo p o r to d o s... e ao m esmo tem po v ia a
im ensa m aioria dos hom ens sem se a p ro v eita re m desses
m éritos e gra ça s de J e s u s ...; v iu como pisav am o seu sa n ­
g u e ... e viu com o esse san g u e eternam ente clam aria v in ­
g a n ça contra eles e eternam ente p esaria sobre a s suas
cabeças.
D á gra ça s a Jesus e pede-lhe que seja sa lv aç ão e n ã o
ru ín a p a ra ti, e ao mesmo tem po p ro cu ra se n tir p e n a e dor.
com o a Santíssim a V irgem , à v ista de tan ta s alm as p a ra
as quais Jesus será a su a perdição.
4.” — S in a l cie contradição. — F inalm ente, Sim eão a cres­
cen ta: e será sinal de contradição. D ian te de Jesus n ã o há
m eios term os: o u p o r E le o u c o n tra E le. — V ê-se já isto no
seu n ascim en to ... P a sto re s e reis adoram -no, m as H erodes
b u sca-o p a ra o m a ta r...; a su a presença n ã o é n u n c a indi­
fe re n te ...: sem pre p ro v o c a o u am or a p aix o n ad o o u ódios
rancorosos.
A histó ria da Ig reja confirm a nos seus v in te séculos
esta v e rd a d e ...; sem pre houve discípulos fiéis que o seguem
a té à m orte e fariseus que o caluniam e p ro c u ra m persegui-lo
com ódio im p lacável... Q u a n ta s alm as e n am o rad as de
J e s u s ! ... E q u an tas alm as d e sg raç a d as que n ã o vivem senão
p a ra u ltra já -lo !...
Pfo/ecia de Sim eão 161

C onvence-te d esta v e rd a d e ... N ã o h á realm ente meio


term o: o que n ã o é p o r E le é c o n tra E le. — F o ra pois,
claudicações, tibiezas e in c o n s tâ n c ia s...; a b raç a-te a E le
e ju ra-lhe um am or intenso e eterno. — P e d e ã Santíssim a
V irgem que to dê assim a sen tir e ... sobretudo a p ra tica r,
p a ra que toda a tu a v id a seja um contínuo acto de am or
a ]esus.

ii
46. Profecia de Simeáo sobre Maria

1. °-— A espada de dor. — Sim eão acrescenta p a ra M a ri


estas espantosas p a la v ra s: e tam bém a ti uma espada te
trespassará a alm a... E is aqui pro fetizad a a p a rte que
corresponde a M a ria nos sofrim entos e dores de seu F ilh o ...:
U m a esp ad a de dor que constantem ente há-de a tra v e ssa r
de lad o a lado o seu c o ra ç ã o !
Já n a A n unciação a Santíssim a V irgem ao ou v ir a p ro ­
p o sta d o anjo tev e revelação dos sofrim entos terrív eis que
acom panhariam a dignidade de M ãe de D e u s... e não obs­
tan te isso, valente e g enerosa pronunciou o seu F iat com
o que aceitou tudo o que o S enhor quisesse e n v ia r-lh e ...
Q u e sentiria ao v e r quão depressa ia a realizar-se esse
F i a t \ ... A espada de d o r v ia-a não como qualquer coisa
d istan te e fu tu ra senão como um a coisa bem presente e
que já a p e n etrav a intim am ente e a com eçava a fazer sofrer.
—’ P e n e tra juntam ente com esta e sp a d a ..., por essa .mesma
fe rid a ... até ao m ais íntim o desse coração puríssim o... e
tra ta de a v erig u ar a intensidade daquela dor p ro fu n d íssim a... 2

2. " —. D o r profunda. — E considera que esta dor é


tan to m ais profunda qu an to é m ais p re v is ta ... Se D eus
tivesse o cultado a M a ria esta espada e esta d o r... e só
tivesse perm itido que ela sofresse quando chegasse o
.momento do C a lv á rio ... ao m enos teria p assad o trin ta e três
P rofecia de Sim eão sobre M aria 163

anos tranquila, g ozando sem tem or algum d a divina p re ­


sença de seu Filho. —- M as o S enhor quis que tam bém imi­
tasse nisto a seu Filho.
Jesus não h a v ia de sofrer só na cruz...,- a R edenção
com eçou já em Belém, e p o r isso desde o presépio até à
su a .morte no C alv ário , não terá um m om ento sem sofri­
m ento... A ssim devia ser tam bém com M a ria e p a ra isso
crav a-lh e a esp ad a hoje mesmo e já não d eix ará um ins­
tan te de a tra v e ssa r o seu coração.
C ontínuos iam a ser os pecados dos hom ens... Q u e
estranho que fossem contínuos e constantes os sofrim entos
de Jesus e de M aria? !... P ensa nisto m uitas v e ze s... E les
não deixam de so fre r porque os hom ens não deixam de
p e c a r...

3." — D or incessante. — U m m al p revisto e certo é


suficiente p a ra a ze d ar todas as a le g ria s... O doente desen­
ganado, ainda que seja longa a sua doença e ten h a m om en­
tos sem dores, não os tem sem sofrim en to s.,. Só o ver-se
incurável e destin ad o à m orte, já é suficiente p a ra não
go zar de nada, nem ter a m inim a alegria. — Se nós não
tem emos diante do pensam ento da nossa m orte, é porque
não nos convencem os de que tem os de m orrer depressa
e consideram os a m orte m uito distante.
M as n ã o foi assim com M a ria ... E la não se esquecia
um só instante deste d ia e deste p e n sam en to ... e por isso
)a desde agora, não te rá um único p ra z e r... (— ainda que
seja tão legítim o e tão santo como os que tinha com Jesus I...
que não seja am arg u rad o com esta re c o rd a ç ã o .— C o n ­
tem pla a M a ria em B elém ... em N a z a ré ... no E g ip to ...;
pinta no teu c o raç ão qualquer dessas cenas delicadas e
ternas entre M ãe e F ilh o ... e quando vires que a M ãe se
extasia na beleza, nos encantos e na form osura de Jesus...,-
quando mais se delicia com. E le ... de repente, um a lem ­
b ra n ç a ...; a espada e as p a la v ra s de Sim eão.
164 P rofecia de Sim eão sobre M aria

E assim , sem pre: ao a b raç á-lo contra o seu p e ito ...,


a o pen tear-lh e a sua linda c a b e le ira ..., a o sen tá-lo à m esa e
ao d ar-lh e de co m er..,, ao co n tem p lar a delicadeza daquele
ro sto form osíssim o e a luz e n ca n ta d o ra daqueles o lh o s...
e o carm im precioso d aquelas faces, que h o rro r... Com o
v e ria E la o s escarros, as b ofetadas, o s açoites, os c ra ­
vos, etc., que o feririam tã o bàrbaram ente.
E isto um dia e o u tro d ia ; e a té em sonhos de noite,
q u a n ta s v ezes a im aginação a ato rm en ta ria com estas
c e n a s ! ... C om gran d e generosidade oferece-te a sofrer re n u n ­
ciando aos m esm os p ra ze res espirituais, se Jesus assim o
quer, com o M a ria ren u n cia a eles to d a a sua v id a.

4.» — D o r sem alívio. — P e n sa p o r fim que n ã o h a v ia


n a d a que a aliviasse da dor d esta e sp a d a ..., nem o tem po
que tudo c u ra ..., nem a esp eran ça de que n ã o ch eg a ria a
realizar-se. — E ra a v o n tad e d e D eus e sabia que tinha
que cum prir-se necessàriam ente e p o r isso c a d a d ia que p a s­
s a v a , longe de cic atriza r a ferida a u m en tav a-a cad a vez
m ais, pois v ia ap roxim ar-se o m om ento d o sa c rifíc io ...
E a p esar disso, longe de a co b ard ar-se tam bém E la
generosissim am ente, de dia p a ra dia, au m en tav a o desejo
d e que chegasse esse instante, n ã o só por se r essa a v o n ­
ta d e de D eus, m as tam bém pelo nosso bem. — A su a dor
e a s su a s penas sã o m uito g ra n d es m as a in d a é m aio r a
su a c arid ad e e o seu a m o r...; q u a n to m ais sofre p o r nós
m ais nos am a!
A d o ra os juízos de D eus e as suas div in as disposições
que assim q uer com o sofrim ento p ro v a r aos se u s e às
vezes q u an d o m enos se im agina. M a ria foi a o tem plo cheia
d e gozo em seu F ilh o ...; este gozo aum enta a o v e r a reve­
lação m ag n ífica que D eus faz d 'E le p o r m eio de Sim eão,
cham ando-lhe «a luz e a sa lv a ç ã o d o s hom ens»... e quando
m ais em bebida está neste dulcíssim o p ra ze r e d iv in o con­
te n ta m e n to ..., a esp ad a de d o r p o r meio das p a la v ra s de
P rofecia de S im eão sobre M a ria 165

Sim eão, crav a -se n o seu c o ra ç ã o ... P obre M ã e ! Já n ã o


v ê em Jesus o seu filh o ... já não vê m ais do que um a
vítim a que será destinada a o sa c rifíc io ..., o cordeiro de
D eus que se rá im olado pelo m undo! — A p ro x im a-te de
M a ria ... diz-lhe p a la v ra s de consolação e prom ete-lhe n ã o
au m en tar com. os teus p ecad o s as suas d o re s... m as sim
a liv iar com o d e sa g ra v o e re p a ra ç ã o do am or a sua p ene­
tran te esp ad a de dor.
47. Os Santos Inocentes

E ste facto é a prim eira p ro v a da profecia de Sim eão.


— P a ssa m poucos dias, talvez poucas horas, e já Jesus
a p arece públicam ente com o sinal de c o n tra d iç ã o ... H erodes
b usca-o p a ra a m orte. — A esp ad a de d o r crav a -se no c o ra ­
ção de M a ria causando-lhe dores indizív eis... M editem os
neste p a sso ...

l.° — H erodes. — Q uem era? Um tirano crudelíssim o,


célebre pelas m atanças que fez... só na sua fam ília, m atou
a esposa e a dois dos seus filh o s..., dois tios se u s... c, cinco
d ias antes de m orrer, quando estaca corroído de bichos,
m anda m ata r a um seu terceiro filho. — É um exem plo claro
d o que é um a alm a vítim a de um a p a ix ã o ... H erodes era
e sc ra v o d a sua am bição... e tudo lhe parecia pouco para
c o n se rv a r a sua coroa e sustentar-se no seu trono. — A p e ­
n a s ouve que nasceu um M enino Rei, concebe logo a ideia
de m atá-lo, e ao ver-se en g an ad o pelos M agos d á a ordem
esp an to sa de m atar a todos os m eninos de m enos de
dois anos.
E sc u ta os gritos e lam entos daquelas m u lh eres..., im a­
gina as cenas de dor, de ra iv a e de desespero que se dariam
a o levar-se a cabo esta ordem pelos soldados de H e ro d e s ...;
contem pla o sangue daqueles m eninos in o ce n tes... e corre
a ver a an g ú stia e sobressalto de M aria. — Com o estreitaria
O s Sa n to s Inocentes 167

E la contra o seu c oração o seu querido Filho, como se


quisesse guard á-lo e escondê-lo nele! sob retu d o quando
ouv isse os gritos das o u tras m ães e visse que a m atança
já tinha com eçado... Q uem poderá com preender as horas
de an g ú stia que p a ssa ria o seu coração?
Pois b e m ; an te este espectáculo de sangue e de dor
pensa o que é um a p a ix ã o ..., até onde ela pode c h e g a r...,
que efeitos lam entáveis e espantosos pode p ro d u z ir.— Q u e
má é um a p aix ão que se d e s b o rd a !..., cega p o r com pleto
e a rra sta ao p re cip íc io ..., faz que se tem a aquilo que não
tem que tem er-se, e que não se tem a o que deve tem er-se.
V è como H ero d es tem e um M enino pequenino e pobre,
e não teme a crueldade e o pecado que com ete. — A p aixão
a rra sta o homem a tudo até ao crim e, e nunca se detém
nem diz jam ais basta. — Além disso, quando se satisfaz
não consegue n a d a e n ã o nos dá n a d a ... nem dita, nem feli­
c id a d e .— Q u e conseguiu H erodes com esta o rd e m ? ...
P en sa bem nisto, na infrutuosa que é sem pre a p a ix ã o ;
e contudo como nos deixam os a rra sta r fàcilm ente por ela!
— E xam ina se algum a quer desbordar-se na tua alm a e
sujeita-a bem ..., dom ina-a p a ra que ela te não dom ine
a ti...

2." — O s M eninos. — Q u e sim páticos e a traen tes a p a ­


recem estes m eninos, prim ícias dos m á rtire s ...; hum anam ente
falando são dignos de lástim a mas olhados com olhos de
fe, que ditosos são! A penas nascem e já são s a n to s .—
A Igreja canoniza-os e celebra a sua festa nos dias de
N atal. — S ão alm as inocentes que gozam no céu de todos
os prém ios concedidos à in o cê n cia ..., à v irg in d a d e... e ao
m artírio.
N um m om ento a esp ad a do tirano segou as suas vidas,
mas D eus deu-lhes o u tra m elhor que ninguém lhes poderá
tira r... e tudo, porquê? ... P orque m orreram por Jesus...,
e.m vez de Jesu s..., p o r causa de J e s u s ...; essa é a razão
168 Os S a n to s Inocentes

d a su a dita, como é a ra z ã o de toda a felicidade. — T r a ­


b a lh a r..., so fre r..., sa c rific a r-se ..., e até m orrer por Jesus
eis aí a única coisa g ra n d e ..., a única coisa que pode
fazer-n o s felizes ag o ra e sem pre.
Q u e teria sido destes m eninos se não tivessem m orrido
p o r Jesus? ... N ã o teriam sido santos nem teriam sido g lo ­
rific ad o s com coroa a lg u m a ... P ro v àv elm en te seriam o p e ­
rá rio s ..., p a sto re s..., so ld a d o s..., talvez v erd u g o s dos que
tom aram p a rte na P a ix ão de Je su s..., isso teriam s id o ...;
m as n a realidade vê o que são, só por se apaix o n arem de
Jesus e d a S antíssim a V irgem . — C om o esta os v e ria ! N ã o
g u a rd a ria no seu c o raç ão um a lem brança e um carinho e
um agradecim ento especial p a ra com aquelas v ítim as que
m orriam pelo seu Filho? ... Com o esquecer-se jam ais deles?
O u v e bem e g ra v a profundam ente n a m em ória: Se
queres que a V irgem S S .m* se lem bre de ti e nunca te
esqueça, e se queres que Jesus te p re m e ie ..., ap ro x im a-te
dele, am a-o e sofre e sacrifica-te p o r E le ...

3 .“ — O M e n in o Jesus. — Jesus ensina-nos aqui como


os p lanos dos hom ens são n a d a diante do seu poder e
sa b e d o ria ..., com o inutiliza tudo o que H ero d es concebe
e ordena.
T am bém nos ensina, ao ro d ear o seu berço de lam entos
e gritos de dor dos m eninos inocentes, que a m ortificação
é in sep aráv el da sua v id a ... e que todos, ainda os m esmos
inocentes, devem ir p o r esse c am in h o ..., de sorte que a
m esm a inocência deve ir acom panhada d a penitência.
V ê como tudo m uda num m om ento; o que era dor e
d e sg raça m uda-se em aleg ria e glória. — E le sem pre triunfa
a in d a que seja p e rseg u id o ... Q uem n ã o se anim a a segui-lo
pois vem os nas suas m ãos pequeninas o po d er p a ra jo g ar
com o destino dos hom ens ain d a que sejam perversos?
T erm in a pedindo à Santíssim a V irgem luz p a ra conhe­
cer as tuas p a ix õ e s... e forças e energias p a ra d o m in á-las...,
O s S a n to s Inocentes 169

n ã o p a ra m atá-las, que as p aixões podem ser m uito boas.


— V ê o exem plo de H c ro d e s ..., com que decisão o b ra e se
lan ç a a tu d o ..., com o não retrocede diante de n a d a ... Se
tivesse feito tudo isto pelo bem, que sa n to não teria s id o !
— N inguém m ais a p aix o n ad o do que Jesus e M a r ia ! ...
P ro c u ra dirigir p a ra E les as tu as paixões e deste m odo
am a-os com p a ix ã o ..., com lo u c u ra ..., com am b iç ão ..., com
sa n ta inveja dos o u tro s... e v erás que facilm ente vences
as dificuldades que se encontram no cam inho da sa n ti­
d a d e ...
48. A fugida para o Egipto

l.° — A ordem de partida. — D eus vale-se da cruel­


dade de H erodes p a ra p re p a ra r à S a g ra d a F am ília um a
p ro v a d o lorosíssim a... É assim que acontece sem pre, mas
n ã o o advertim os. — T u d o procede da m ão de D e u s... ou o
perm ite p a ra nosso bem, ainda que nós o não vejam os
e n tã o ... Q u e difícil é quando não se vê o fim dum a p ro v a
ou d e um a tentação resignar-se a gente a e la ! ... V ê o exem ­
plo da S a g ra d a Fam ília.
E stão no m elhor da n o ite ..., descansando das fadigas
do dia, que num a casa pobre não seriam p o u cas nem p eq u e­
n a s ... S. José tinha que tra b a lh a r todo o dia p a ra g a n h a r
o p ã o ...; a Santíssim a V irgem sem poder ter o luxo de
um a e sc ra v a zita que a ajudasse tinha de fazer tu d o por
si m e sm a ...; assim que, ao ch eg ar a noite cairiam na cam a
rendidos e cansados de tanto tra b a lh a r... T in h am ganhado
bem aquele descanso.
C ontem pla a cena e v ê como naqueles pobres leitos
colocados no chão, descansam os p ersonagens m ais em i­
nentes que houve na te rra ..., as alm as m ais sa n tas. — T a l­
vez. M a ria durm a com so b re ssalto ..., o m ais pequeno ruído
a d e sp e rta ... e ainda que confiada na providência do Senhor,
o seu c o ração vela com c u id a d o s... não pode esquecer o
que ouviu de H erodes e até em, sonhos a im aginação pin-
ta-lhe as cenas de h o rro r que já co m eçaram ... o u ao m enos
A fuga para o E g ip to 171

hão -d e com eçar no dia seguinte com a m atança dos


m eninos.
E la, é claro, n ã o deixa o se u ..., dorm e a b raç ad a a E le ;
e que confiada e tranquilam ente dorm e Jesus nos braços de
M a r i a ! ...: n ã o h á berço m ais brando nem m ais apetecido
p a ra E le ... Q u e bem se deve estar nos braços de M a ria !
P o rq u e não tratas de experim entá-lo?
M as eis que de repente um anjo vem p ertu rb a r-lh e s o
so n o ..., d esp erta a José e da p a rte de D eus dá-lhe a ordem
de p a rtir p a ra o exílio. — S. José aceita as disposições da
divina providência, .mas trem e ao ter que com unicar tudo
á Santíssim a V irgem . — E sta recebe com nova resignação
a ordem do S enhor e dando um ab raço m ais forte e um
beijo m ais carinhoso a seu divino Filho, dispõe-se a o b e ­
decer imediata.rn.ente.
P ro c u ra com preender o desgosto, a con traried ad e e a
pena que este doloroso d esp ertar p ro duziu em M a ria e ...
contudo, que d o m ín io ! n a d a de aborrecim entos nem de p ro ­
te s to s .— Q ue exem plo p a ra t i ! . .. P ensa bem nisto ...

2." — P orm enores da fugida. — A p e sa r de ser tão dura


e sta p ro v a não quer o S enhor suavizá-la, mas pelo c o n trá ­
rio, v ista nos seus porm enores ainda a p arece m ais penosa
c difícil...
L evanta-te, e ag o ra mesmo, sem esp erar que am anheça
nem que o tem po p a sse ..., e sem teres tem po p a ra p en sar
no caso ... D eus o quer, não há n a d a que esp erar ne.tn
n ada mais a fa ze r do que cum prir a sua santíssim a v o n ­
t a d e .— T om a o M en in o e sua M ã e .... a fugida é penosa
c difícil mas é-o m ais quando se tem que fugir com o u tra s
pessoas. — N ã o b asta fugir ele só, há-de ser com a M ãe
com o M enino e isto aum enta extrao rd in ariam en te as difi­
cu ld ad es... e foge, com o se fossem m alfeitores que se a p ro ­
veitam da escuridão p a ra se esconderem . — N ã o h a v ia ou tro
melo rnais do que o fu g ir? ... N ã o podia D eus ocu ltar o
172 A fu g a para o E g ip to

M enino do u tro m odo? N ã o salv o u E le a M oisés de um a


ordem sem elhante sem re co rre r à fuga?
P a re ce que D eus busca o m ais penoso e o m ais d olo­
roso p a ra os seus. V a i para o E g ip to ... H um anam ente
falando isto é um d isp a rate. — O E g ip to está m uito d istante,
u n s dez dias de c a m in h o ...; nesse tem po os soldados de
H ero d es podem m uito bem descobrir o M enino e a ca b ar
com E le ...; é tam bém um a região desconhecida e até idó­
la tra e p o rtan to ali não poderiam e sta r... N ã o h a v eria o u tra
região que reunisse circunstâncias mais favoráveis? — E , por
fim, p o r qu an to te m p o ? ... E tam bém não se lhes diz: fica
lá até que eu te avise! isto c terrív el. — Se fosse p a ra poucos
dias, levariam só o m ais necessário, m as sc vai a d u ra r
talvez anos, o que é que v ã o levar? ... Q u e d ú v id as e que
incertezas a aum entar a su a d o r ! — T alv e z M a n a não
pudesse conter as suas p u ríssim as lágrim as, m as não perde
a se ren id a d e..., a tran q u ilid a d e..., nem, m enos ainda, a con­
form idade com D eus.

3.° — A obediência. — D em ora-te a c onsiderar esta


sublim e obediência. Com que ra p id e z !— Im ediatam ente se
põem a cam inho. V ê a diligência em cum prir a v o n tad e de
D eus, e ao mesmo tem po a hum ildade, sem pôr nenhum
re p a ro ... nem fazer a m ínim a observação. — Além disso
obedecem com grande c o n stâ n c ia ...; em todos os dias
que d u ra o cam inho procedem d a mesma m a n e ira ..., não
se cansam , não se im p acien tam ... E tudo porquê? Pois
po rq u e em tudo vêem a v o n tad e de D e u s..., sabem que
é ordem sua e basta-lhes.
A P ro v id ên cia de D eus é sábia e é ju sta e é bondosa
e sabe m uito bem o que m a n d a ... Q u e adm irável lição de
hum ildade, de subm issão, e de paciência em to d as as con­
tra rie d a d e s !... Q u e sublim e exem plo de o b e d iê n c ia !... não
d ig as que não tens um anjo que te diga claram ente a v on-
A [uga para o E g ip to 173

tad e de D e u s... Sabes que não é v e rd a d e ...; esse an jo é


p a ra ti o teu su p e rio r..., o teu D ire cto r espiritual, que em
nom e de D eus te fa la ... P orquê, q u ando não te a g ra d a ...,
q u ando não vês a ra z ã o do que te dizem ... q u ando crês que
está enganado, obedeces tão m a l? ... Q u a l será de facto
o que se equivoca, ele ao m an d ar o u tu ao deixar de
obedecer? O lh a p a ra M a ria neste p asso e re sp o n d e...
-19. No Desterro

1 —• Incom odidades do cam inho. — C onsidera as in­


com odidades do cam inho... tão longe e tã o d ifíc il..., talvez,
nos prim eiros dias ao menos, não se atreveriam a v ia ja r de
dia e esperariam a noite p a ra n ã o ser vistos. — V é a S a n ­
tíssim a V irgem ab raç ad a a seu Filho de quem n ã o se sep a ra
nem um só instante, cheia de tem ores e d e sobressaltos,
ocultando-se nalgum a cova com S. José, du ran te as h o ras
de luz, e a p ro v eitan d o a escuridão da noite p a ra fu g ir...
Q u ã o pouco e quão m al descansariam nestes dias!
R ecorda a viagem a Belém cheia de incom odidades...
■mesmo assim era um a viagem em p a z ... ag o ra é um a v ia ­
gem de fu g a ... e de perseguição de m orte. — Q u a n ta s vezes
ao teres um contratem po ou um incóm odo p assaste noites
sem dorm ir! Com o te pareciam essas noites eternas! As
h o ras não p a ssa v a m ... C om para isso com as noites da S a n ­
tíssim a V irgem na sua fugida p a ra o E g ip to com tantas
incom odidades...
D em ora-te a pensar no que poderiam com er v isto que
as provisões não abundariam em casa nem se abundassem
teriam tido tem po p a ra as le v a r... Se ao m enos lhes tives­
sem dado um dia p a ra p re p a ra r a v iagem ! E onde dorm i­
ria m ? ..., no chão duro? .... debaixo de algum a árvore? ...,
d e n tro de algum a cova suja e cheia de b ich o s?...
C om para a tua m oleza com o que ag o ra sofre a San-
N o D esterro 3 75

tissim a V irg e m ..., m uito mais delicada do que tu. D ;ante


dela v ê se te a tre v es a qu eix ar-te quando te falta algum a
c o isa..., quando nem tudo te sai bem ou quando tens de
so fre r algum incóm odo...

2.° ■
— N o E g ip to .-— C hegaram finalm ente; aonde? N ão
se sabe. É de su p o r que não se instalariam ao acaso na
prim eira p o v o a ç ã o ... esperariam alguns dias p a ra se o rien ­
tarem e p a ra se inform arem acerca da g e n te ...
T alv e z D eus na o ração tivesse rev elad o a N ossa
S en h o ra o u a S. José a terra onde deveriam fic a r... ou
en tão deixou D eus à p rudência deles a escolha, como faz
m uitas vezes, p a ra que o hom em exercite esta preciosa
virtude. P o r fim instalam -se nos arredores de H eliópole,
onde hav ia algum as fam ílias de ju d eu s...
C ontem pla dem oradam ente aquele alo jam en to ... Em
Belém a p esar da pobreza, tinham a sua casa e a oficina de
S. Jo sé..., m as a g o ra, n a d a ...; tinham de m endigar t u d o .—
V ê a V irgem S antíssim a a m endigar tu d o ... carecendo de
tudo, tudo h aviam de pedir.
P ro v av elm en te contariam a sua desgraça e a perse­
guição de H ero d es de que fugiam àquelas fam ílias de
ludeus... e algum a delas, com ovida com os factos rece-
hê-los-ia, em sua casa até que encontrassem m elhor a lo ­
jam ento. — D epois a pouco e pouco conseguiriam e stab e­
lecer a sua casa e a oficina de S. José... e com eçariam a
viver d o trab alh o deste.
O ferece um a vez mais o teu c o raç ão p a ra albergue e
m orada d a Santíssim a V irg e m ... e tem inveja daquela boa
gente que assim ajudou e consolou a S a g ra d a Fam ília
naquela trib u la çã o ... P o rq u e não aspiras tu a d a r esta
consolação a Jesus, M a ria c José q u ando a gora buscam
l.unhém alm as p a ra se albergarem e não as e n c o n tra m '...
N ão vês que ao mesmo tem po isso seria a m aior felicidade
do teu coração?
176 N o D esterro

P o r fira, n o ta com o D eus com os sofrim entos lhes dá


tam bém g randes c o n so laç õ es..., trabalham , sofrem , m as com
a le g ria e confiança em D eus.
D u ro u a estada n o E g ip to v á rio s anos. — É evidente
que ali m anifestou Jesus o s prim eiros encantos d a sua in fân ­
c ia ..., ali balbuciou as prim eiras p a la v ra s ..., ali cham ou pela
prim eira vez à S antíssim a V irg em com o nom e d e M ã e ...,
ali rezou as prim eiras o raçõ es que ela lhe e n sin o u ... e como
se e x ta sia ria a S antíssim a V irg em ao v e r seu F ilh o ju n ta r
a s m ãozinhas e re za r com. fe rv o r e d e v o ç ã o !...
A li vestiu a p rim eira túnica in fan til..., ali jogou os seus
prim eiros jo g o s... ali brincou criancinha ju n to à s m argens
do N ilo ... Q u a n ta s vezes tra ria à Santíssim a V irg em flores
de loto, que ali crescem e em p a g a receberia dela um beijo
cheio de am or m a te rn a l... Q u e consolações n ã o d á o S enhor
aos que p o r ele se s a c rific a m !... Q u e M ãe sofreu m ais?
M a s tam bém quem m ais feliz d o que esta M ãe?

3.° — A volta. — E um d ia aparece o u tra vez o an jo e


m anda-os v o ltar. — M o rre u H erodes e acab o u tu d o ... P o r­
que não p e n sa r que tudo p a ssa e que tudo acaba? — S. José
p rudentem ente n ã o quer v o lta r a Belém, n ã o aconteça que
A rquelau, o filho de H erodes, seja com o seu p a i... O u tra
vez lhe aparece um a n jo e lhe diz que procedeu bem e que
fiquem em N a z a ré ...
N u n c a a p ru d ên cia é inim iga d a obediência. — E xpõe
hum ildem ente os teus desejo s e até as tu a s dificuldades
se a s te n s... e depois esp e ra com indiferença, com o S. José,
a re sp o sta. —■M as n ã o te em penhes em le v a r sem pre a
tu a p o r d ia n te ... nem te desgostes q u a n d o n ã o te dão
ra zã o . — P rudência, sim ..., m as ao mesmo tem po subm issão
e obediência.
50. Vida em Nazaré

— im portância desta vida. — É um a vida a p are n te ­


m ente o rd in á ria ..., o c u lta .... sem v a lo r nenhum . — N a d a
há nela que cham a a a ten ção da gente. — P a ssa desperce­
bida a toda a p o v o a çã o de N a za ré . — N ã o busques o que
faz b a ru lh o ..., o que cha.ma a a te n ç ã o ..., o que dá que falar.
A obscuridade, o silên cio ... o v u lg a r é a condição norm al
desta v id a ... mas fica sabendo que N a z a ré é a escola da
sa n tid a d e ... que a m odesta casa de N a z a ré é a oficina
onde se formam to d as as v irtu d e s..., e é o que há de m ais
belo na terra aos olhos de D eus. — T o d o s os santos foram
a N a za ré a a p ren d er estas lições e não é possível v iv er
vida de perfeição .sem estudá-las ou im itá-las.
P or o u tra p arte, foi nesta vida que N osso Senhor
viveu mais te.mpo. E le é o nosso m estre e o nosso M o d elo ...
Com o M estre esteve trê s a n o s... como M odelo — trinta!
Q uis ensinar m ais com a p rá tica do que com a pregação.
N a d a pois te deve ser tã o fam iliar e conhecido como
,i vida de N a z a ré ... ai deves en co n trar a solução de tudo
e para tudo. — E x am in a se é assim que fa ze s..., se te lem ­
bras m uito da vida oculta de N a z a ré ..., se conseguiste
en cantar-te d e la .... se pensas finalm ente todos os dias e
m ultas vezes no dia na vida de ferv o r que rein av a naquela
i a sa ...

2." — V ida d e ordem . — Isto é o prim eiro que se deve


<cmsiderar: a ordem que re in a v a naquela fam ília. C ontem pla
178 V id a em N a za ré

a Santíssim a V irgem m odelo de o rd e m ...; com petia a S. José


g a n h a r o pão com o su o r do seu tra b a lh o ... m as a N ossa
S enhora correspondia dirigir e o rd e n ar tu d o ... e que bem
o fazia!
A ordem consiste cm que cada coisa ocupe o seu lu g ar
e to d as as acções se achem reg u lad as e sujeitas a um fim ...
N ã o é ordem guiar-se a gente pelo gosto o u desgosto, m as
sim fazer tudo em seu devido tem po co.111 p ra ze r ou com
c a n s a ç o ... quando a g ra d a o u quando d esag rad a, atendendo
só ao que se deve fazer. — Se segues as tuas inclinações
e te guias pelas tuas im pressões, um d ia terás gran d e fer­
v o r ... c fa rá s tudo m uito b e m ... n o u tro dia, se te falta essa
sensibilidade, não terá s v o n tad e de n a d a e n a d a fa rá s...
ou fa rá s tudo m al e de m á v o n ta d e ... N ã o te acontece isto
com frequência? R e p ara no exem plo d a S antíssim a V irgem
e contem pla-a vítim a do seu d e v e r... cum prindo com p e r­
feita cxactidão em todo o m om ento, seja o que fo r...
3. " — A constância. — D aqui se deduz a necessidade da
v irtu d e da constância o u da p e rse v e ra n ç a ... A inconstância
b ro ta precisam ente d a falta de o rd e m ..., de n ã o cum prir
o o rd en ad o c regulam entado. T e n s a convicção de que a
constância é o elem ento essencial do amor? ... Um am or de
d ia s ... de tem p o ra d a s..., de só q u ando tem os g o sto ... não
é am or.
V ê pois como te e ncontras com respeito à constância
e v e rás com o te v a i o a m o r..., e com preenderás que a tua
constância d ep en d erá d a tu a ordem c do teu regulam ento,
que deves cum prir com fidelidade... 4
4. ° — A rotina. — C ontudo tem de se e v ita r um a difi­
c u ld a d e... Se a falta de ordem gera a inconstância, o p ro ­
ceder sem pre com ordem pode o rig in a r a ro tin a ..., isto é,
o fazer as coisas p o r costum e... m ecânicam ente... m aqui­
n a lm e n te ... c isto leva à in d ife ren ç a ..., à tib ie z a . espiritual,
porque fazem -se as coisas sem gosto e sem proveito.
V id a em N a z a r é 179

N ã o confundas p o rtan to a ordem cc.m a ro tin a ..., o


regulam ento com o costum e m ecânico. — Q u a n to a p ro v ei­
tarias se o que fazes segundo o teu regulam ento o fizesses
com v erd ad e iro fe rv o r! — A rotina é a traç a da vida espi­
r itu a l.— D e ita tudo a p e rd e r..., grande p a rte do v a lo r e às
vezes todo o v a lo r das tuas o b ras e v ap o ra -sc pela m aldita
rotina.
R e p ara n a V irg em Santíssim a em N a z a ré ...: ordem ,
m étodo, regulam ento, com grande exactidão, com perfeita
constância, m as sem ro tin a de nenhum a espécie. E p o rq u ê ’
Porque tudo fazia n a p resença de Jesus. — A p resença de
D e u s..., a p resença de M a ria ..., são o grande rem édio p a ra
com bater a rotina.

5.” — V a n ta g e n s. — P o n d e ra brevem ente as v a n ta g en s


da ordem . — « G u a rd a a ordem e a ordem te g u a rd ará a ti»,
dizia S. A gostinho. — P o rta n to , toda a tua vida espiritual
dependerá da ordem e do m étodo em todas as tu as coisas.
—• Além disso n a v id a de ordem exercitam -se sem. querer
as m ais form osas v irtu d es: a obediência, não fazendo a tua
vontade senão o o rdenado e d isp o sto ...; a hum ildade, p o r­
que ao am or p ró p rio repugna-lhe d o b rar-se às exigências
da o rd e m ...; a v id a de sujeição po rq u e procedes sem liber­
dade, sendo escravo do teu dever o rd e n a d o ...; e finalm ente
a .mortificação e penitência, pois é a m aio r de to d a s ...
R ecorda-te daquilo de S. João B erchm ans: A vida
com um , isto ê, a da ordem e do regulam ento, c a minha
m aior penitência», e como prém io da v id a de constância e
de p e rse v e ra n ç a ..., a vida d o v erd ad eiro am or.
P e ra n te o exem plo de M a ria v ê quanto tens a fazer
nesta m a té ria ...; pede-lhe que te dê a conhecer a sua enorm e
im portância e im plora a g raça de im itá-la nessa exactidão
o rdenada em N a za ré , que tran sfo rm a a vida ordinária e
v u lg ar em fonte de grande santidade.
51. A Casa de Nazaré

1 ." — V id a de obediência. — É um a consequência da


ordem . — Q u an d o todos .mandam e ninguém obedece não
pode h a v er n a d a o rd e n a d o ...; p o rta n to onde tem de hav er
vida v erdadeiram ente o rd en ad a e re g u la d a é n ecessária a
v id a de obediência. — N a z a ré , m odelo de ordem é-o tam bém
de obediência.
A im portância desta v id a m ostra-no-la o E v a n g e lh o ...
Q u a se não diz n a d a da vida de N a z a ré ..., foi a m aior
p a rte da vida de Jesus e toda ela se resum e em duas p a la ­
v ra s ..., m as nestas p a la v ra s põe sobretudo em relevo a
obediência. — Jesus e sta va sujeito a seus p a is... M a ria a
Jo sé... José à v ontade de D eus. — D e m odo que ali todos
obedeciam e nem um m om ento faziam a sua p ró p ria v o n ­
tad e senão a de D eus por meio d a obediência.
P e n e tra bem neste pensam ento e pede â Santíssim a
V irgem um conhecim ento p rá tico dele: que só com a obe­
diência poderem os cum prir a v o n tad e de D eus. — O nosso
fim é se rv ir a D e u s ...; o que serve deve fazer a vontade
do seu s e n h o r...; logo tem os que fazer sem pre a v ontade
de D eus.
M as esta v o n tad e de D eus à s vezes é o b sc u ra e difícil
de c o n h e c e r...; o u tras vezes é o dem ónio que se em penha
em obscurecê-la com tentações e astúcias diabólicas p a ra
assim nos a p a rta r d a fonte e causa da santidade, que é
A C asa de N a za ré 181

o cum prim ento da v ontade de D eus. — Q u e fazer então?


O nde buscar a so lu ç ã o ? ... Com o acertarem os com o que
D eus quer? Só com a obediência. — Co.m cia não se cum ­
pre a v o n tad e de um hom em senão a de D eus, que por
ele nos m anda.

2. " — O m odelo. — E a grande lição p rá tic a é N a z a ré ...


Jesus e M a ria não vêem na obediência qualquer coisa de
acidental e de efém ero m as sim de essencial e p e rm a n en te ...
e p o r isso toda a v id a de Jesus será m odelo de o b ed iên cia...
A ntes de tudo e sobretudo, o b e d e c e r...; esse era o seu
plano e o seu p ro g ram a de vida. — E no entanto quem
era ele? ... e a quem o b e d e c ia ? ... A g o ra aos seus pais, os
quais ainda que m uito santos, distavam infinitam ente da
sua sa n tid a d e ... M uito m elhor sabia ele o que h a v ia de
fazer e contudo não quer saber m ais do que o que lhe
m anda a obediência! E a Santíssim a V irgem com tal modelo
em frente, que fa ria ante os desejos e disposições de seu
e sp o so ?...
F ica um dia inteiro a v iv er naquela casa e v e rás desde
pela m anhã até à noite, um a paz in a lte rá v e l.... um a tra n ­
quilidade celestial... P ois bem, tudo isso é conseguido pela
obediência. — Q u e espectáculo p a ra os anjos do céu que
estariam extáticos e pasm ados ao ver esta subm issão dos
mais superiores aos mais in fe rio re s !... E , contudo, que
dependência m ais com pleta, total e absoluta da v o n tad e do
que rep re se n tav a a D eus ainda que fosse in fe rio r!... 3

3. " — Q ualidades desta obediência. — Com o se obedecia


nli? ... Com prontidão e xterio r e com alegria e xterio r. —
N ão esqueças estas duas partes da o b e d iê n c ia ...; não b asta
fazer exteriorm ente o que te m an d am — é indispensável o
espirito de subm issão in te rio r..., o re n d er do juízo e a
subm issão da vontade.
Além disso na nossa casa de N a z a ré obedecia-se em
182 A C asa de N a za ré A C asa de N a za ré 183

tu d o : nas coisas a g rad á v eis e nas desag rad áv eis, nas coisas 5. — A tua obediência. — E xam ina ag o ra diante de
g ran d es e im portantes e nas coisas p e q u e n a s... até nos Jesus e de M aria a tua obed iên cia... T am bém procedes
m ais pequenos porm enores. — N a obediência tudo é im p o r­ com o se a obediência fosse na tua v id a algo acessório e
ta n te ...: um único porm enor p o d e de sv irtu á -la . T e n s de p a ssa g eiro ... obedecendo às tem p o rad a s... q u ando c a lh a ...
obedecer totalm ente sem que a o obedecer ponhas algum a ou te vem a je ito ... ou te dá na v o n ta d e ... o u te a g rad a
coisa da tua p ró p ria v o n ta d e ... P e n sa nisto: q u a n ta s vezes o que te m an d a m ?... O u pelo co n trário fazes da tua o b e ­
diência o mais essencial e perm anente n a tua vida espiritual,
obedeces a teu m odo... quando tu q u e re s ...; quando a ti
obedecendo se m p re..., em tu d o ..., nos p o rm en o re s..., p ro n ­
te p a re c e ..., quando a ti te a g ra d a ? ... Q u e res obedecer, tam e n te ..., com subm issão de juízo e de v o n ta d e ..., com
m as ao m esm o tem po fazer a tua v o n ta d e ..., cum prir a espírito de fé?— O bedeces com alegria, desejando que te
v o n tad e de D eus, m as sem deixar de fazer a tu a ... Q u e m andem algum a coisa, ainda que te custe, e dando assim
p e n a ' que obediência tão p o b re ! quão pouco a g ra d a a liberdade ao teu superior p a ra que te m a n d e ? ... Com o
D eu s! O lh a p a ra Je su s..., olha p a ra M aria e aprende. se atreveriam N o ssa S enhora e S. José a m an d a r a Jesus
Finalm ente, a obediência d eve ser sobrenatural, com .se não vissem o p ra z e r e a alegria que lhe cau sav a o
esp irito de fé, vendo a D eus na pessoa que m anda e não obedecer?
a o homem. — V ê no su p erio r um a im agem de C risto e quer F ede à Santíssim a V irgem que. visto quereres ser, como
e sta im agem seja form osa q uer seja grosseira isso n ã o te ela. a e scrav a do Senhor, com preendas que este ideal se
deve im p o rta r...; não obedeças p o r sim p atias... p o r afecto realiza antes de m ais n a d a p o r meio da vida de obediência...
e p o r a m izad es..., p o r ag rad e cim en to ..., p o r n ã o desgostar não obedecendo um a ou o u tra vez m as p o r m eio da vida
ao su p erio r que te m a n d a ...; tu d o isso é m uito h u m an o ... de obediência... da obediência p o r toda a vida.
O bedece a D eus, só a D e u s... nunca aos hom ens com o tais,
senão enquanto representam a D eus e tanto qu an to re p re ­
sentam a D eus.

4.° — F rutos d a o b e d iê n c ia .— 1." A glória de D e u s...,


pois pela obediência a alm a v a i directam ente a D eus.
2." O sacrifício e a m ortificação que s u p õ e ...; n ã o h á n a d a
m ais m eritório do que este sacrifício no qual ofereces a D eus
a tu a liberdade e a tua v o n tad e. 3." A posse de D e u s ...;
assim é que D eus te possui e é teu dono e se n h o r; doutro
m odo serás tu o que te possuis e n ã o é ele que te possui.
4.“ C om a obediência vêm m uitas o u tras v irtu d e s: a hum il­
d a d e ...; o vencim ento p ró p rio ..., a v id a de fé ..., a alegria
e a paz da consciência tran q u ila são frutos da confiança
em D eus que tra z consigo a obediência.
52. Vida de Nazaré

O u tra característica da casa de N a za ré foi a sua hum il­


d a d e e a sua obscuridade e por isso se cham a a esta vida
a vida oculta de Jesus.

l.° — A soberba com todos os seus d e rivados: o o rg u ­


lho, a v aidade, o am or pró p rio , a ânsia deso rd en ad a com
que buscam os tã o facilm ente o louvor e a glória dos
hom en s... tudo isso é inato em, nós. T o d o s sofrem os d a
m esm a d o e n ça ... A quem não a g rad a ser estim ado e lo u ­
vado? ... A quem não d esag rad a, sobretudo nalguns casos, o
d e sp re z o ..., a in d ife ren ç a ..., a frieza com que é recebido
pelos o u tro s? — R ecorda casos práticos da tua vida e v erás
q u a n ta s vezes sentiste isto ... e tan to m ais q uanto m ais
direito tinhas de esp e ra r o c o n trá rio ...
É consequência do pecado o rig in a l...; a todos nos m an­
cha e a todos nos deixa feridos com a m esm a ferida. —
C om eça p o r persu ad ir-te que sabes m uito bem tudo isto
e que te encontras já b a stan te libertado da so b e rb a ... e é
en tão que te achas m ais m ergulhado na soberba e na am bi­
ção. —■D eves pois convencer-te p ràticam ente da necessi­
d ade que tens de co rrig ir e de cu rar esta doença, realm ente
ridícula.
A soberba leva-nos a buscar a estim a e o lo u v o r dos
hom ens; .mas isto que é e o que vale? — N ã o vês quantas
V ida dc N a za r é 1S5

vezes os hom ens se enganam nos seus ju íz o s..., com o julgam


com p a ix ã o ..., com preconceitos e até com h ip o c risia ? ...
Q u a n ta falsidade no coração hum ano! Q u ã o poucos dizem
com sinceridade e n obreza o que de ti s e n te m !... E é isto
o que tan to buscas e que tan to te a g ra d a ? ... Q u e louco és
em d a r im portância a esta v aid ad e que não é m ais do que
p a la v ra s ..., fum o e n a d a ! ...

2.u — O exe m p lo de N a za ré. — S o b re esta m atéria


podes receber p ro v e ito sa lição n a casa de N a za ré . C om o
nela se despreza tudo i s to ! ...
Jesus esconde-se e oculta-se em N a za ré , p o v o a çã o des­
con h ecid a..., até este m om ento nunca se falou dela n a
S a g ra d a E sc ritu ra ... Jerusalém e ra um a gran d e c id a d e...
Belém, a cidade de D a v id ..., m as N a z a ré não era n ad a:
um a aldeia de q u a tro casas, m iserável e desconhecida de
to d o s... Ali viv eu M a ria ..., ali vive ag o ra o Filho de D eus.
E escondido e oculto m ais ainda p elas condições de
seus pais que eram p o b re s..., que não cham avam a atenção
de ninguém , como hum ilde aldeões que eram e que não
tinham cargo algum em N azaré.
Jesus esconde-se tam bém p o r meio das suas ocupações
que eram as de um a casa pobre onde os filhos têm de fazer
os re c a d o s... a ju d a r os seus pais, e tc ...; já m aiorzinho. não
se dedicou a estudos ou a algum a o u tra o cupação elevada
senão aos trab alh o s de um o p e rá rio ... de um c arp in te iro ...
e de um carp in teiro que não faz coisas preciosas mas coisas
rudes e vulgares.
F ix a bem a fig u ra divina de Jesus ocultando-se e
escondendo-se... V é bem a Virgem, Santíssim a com toda a
.sua form osura e santidade, en te rrad a naquela p o v o ação zita
onde ninguém a conhecia: estim ada sem dúvida pelas v izi­
nhas e n ada m ais. C ontem pla-a o c u p ad a nas coisas mais
h,lixas e o rd in á ria s ...; é a p érola que se oculta no fundo
166 V id a de N a za ré

d o m ar. — P arece que D eus com m edo que lha roubassem


assim a escondia e g u a rd a v a ...

3. ° — T e m p o que dura. — R ecorda além disso o tem


q u e esta vida d u ra ... até que foi necessário sa ir e p r e g a r ...;
senão ali teriam p assad o to d a a sua v id a ... Q u e lição tão
p r á tic a ! O Filho de D eus n ã o tem pressa em deixar o seu
a b rig o e só o deixa pela obediência e pela glória de seu
P ai. — N ã o te parece que hum anam ente falando e stav a ali
a p e rd er o seu te m p o ? ... N ã o teria sido m elhor se em vez
de três anos houvesse p re g ad o seis, dez ou quinze? ...
Q u a n ta s alm as não teria c o n v ertid o ! Q u a n ta s coisas não
teria ensinado ao m undo! M a s ali em N a z a ré que fazia
tan to tem p o ? ... N ã o era incom patível com a su a o b ra da
R edenção o deixar p a ssa r assim, os dias? ... P a re c e até
indigno do M essias R e d en to r p a ssa r trin ta an o s sem fazer
n a d a ap arentem ente d o seu ofício de R e d e n to r..., que era
o fim que o traz ia a este m undo. — C ontudo a sab ed o ria
de D eus não p en sa v a deste m odo. — Q u e ria d a r-n o s a lição
suprem a da hum ildade, ensinando-nos p ràticam en te a com ­
b a te r a nossa soberba e v a id a d e ... Q u e lição tão a u stera e
quão pouco a a p ro v e ita m o s!... 4

4. ° — O bscuridade e silêncio. — C om preende bem diant


d e D eus o v a lo r d a o bscuridade e do silêncio. — À v ista de
Jesus e de M a ria assim a b raç ad o s com ela, o teu coração
n ã o deve d esejar o u tra coisa.
O dem ónio deseja que as tu a s coisas se vejam p a ra
que o lad rã o ta s roube o u p a ra que o seu m érito se e v a ­
p o re ... U m perfum e d e stap ad o perde a sua fo rç a ...; um
im prudente que exibe sem cuidado as suas jóias e riquezas,
facilm ente as p e rd e ...; todos procuram esconder o seu
d in h e iro ...: não se publica nem se diz a ninguém o que se
tem ... P o rq u e não p ro c ed e r com esta p rudência n a vida
e s p iritu a l.’
V id a de N a za ré 1S7

É árd u o e á sp ero o trab a lh a r em silên c io ..., sem que


ninguém nos v e ja ..., sem que ninguém se dê c o n ta ..., é duro
fazer o bem sem e sp e ra r reco m p en sa... ou a g rad e cim en to ...
R ecorda como isto te custou algum a vez e como p o r este
m otivo sofrestes d e sg o sto s... É enfim m uito doloroso ver-nos
iso lad o s..., n ã o com preendidos nem e stim a d o s...; m as olha
p a ra N a z a ré ..., contem pla a Jesus n aquela vida que só
interrom pe pela p re g aç ão e que continua ag o ra na E u c a ­
ris tia ...: so le d ad e ..., silêncio.... obscuridade, essa é a sua
vida. — C ontem pla a M a ria e pede-lhe que te conceda p a r­
tic ip ar c a form osura desta v id a e dos encantos que e n ce rra...
p a ra as alm as que en can tad as com ela querem ocultar-se
aos olnos dos hom ens p a ra v iv er só p a ra D eus.
53. Vida dc Nazaré

V id a de trabalho. — C onsequência da vida de pobreza


da S a g ra d a Fam ília é a vida de trab a lh o que ali tinha dc
re in a r...: eram pobres e não tinham m ais rem edio senão
com er do seu trab a lh o ; S. José, no seu o fic io ..., M a ria nas
su as o cupações d o m ésticas..., e Jesus aju d an d o a am b o s...,
todos ali trab alh av am . M editem os, que algum a coisa nos
querem en sin ar com o seu trabalho.

1." — O trabalho é um a lei da criação, é p o rtan to n a tu ­


ral ao hom em ... A p reguiça, a ociosidade é com pletam ente
irra c io n a l... O hom em nasceu p a ra trab a lh a r com o a ave
p a ra voar, diz Job na S a g ra d a E sc ritu ra. — M esm o no
P a ra íso quis D eus que o hom em trabalhasse e foi p a ra isso
que D eus lho deu. — M as o trab alh o tem tam bém o c ará cte r
de castigo e p o r isso causa c a n s a ç o ...; e este cansaço é que
é p ròpriatnente o castigo do pecado e não o trab a lh o em si.
— T o d o s pecám os, logo ninguém pode e star isento desta
pena. T rab a lh o s físicos e m o ra is__ no corpo e na a lm a ...
p a ra com er e p a ra c o n se rv a r a vida e até p a ra gozar,
sem pre tem os que trab a lh a r.
C onvence-te que este é o teu dev er e que nao podes
d eix ar de cum pri-lo... Q u a n to mais trab alh ares. ma:> ra cio ­
nal se rá s ..., m ais sem elhante a D eus que é a mesma acti-
v id ad e por excelên cia..., a m aior, a que m ais produz.
V id a d e N a za r é 189

2. ' — A virtude. — O trabalho é sobretudo um a v irtu d e:


a ) porque o trab alh o é um a penitência v e r d a d e ir a ;... e um a
p en itên cia .muito sa n ta e m uito bela, porque foi escolhida e
im posta pelo m esm o D e u s... e po rq u e além disso é universal
p a ra todos e em cada m om ento. — T a lv e z possas liv rar-te
d o u tras penitências m as de trab a lh a r, n ã o ...; mes.mo o
doente de um a form a ou de ou tra, está tra b a lh a n d o ; b ) p o r­
que se a ociosidade é a m ãe de todos os vícios, o trabalho
c a mãe de todas as virtudes...-, é evidente que ao ocioso
ten ta-o m uito m ais e m elhor o d e m ó n io ...; o trab alh o quanto
m ais du ro e penoso m e lh o r...; serv e adm iravelm ente p a ra
prev en ir as ten ta çõ e s..., p a ra d ebilitar as p a ix õ e s..., p a ra
tira r ocasiões ao inim igo que se desconcerta diante dum a
pessoa o c u p a d a ; c ) finalm ente é um a v irtu d e de expiação
ou reparação... S atisfazer pelos p e c a d o s..., a dquirir grandes
m érito s... p re serv a r-te das quedas eis aí os grandes frutos
do trabalho.
D á graças a D eus que num a coisa tão n ecessária como
esta pôs tan ta s v a n ta g en s com que nos estim ula... e ao
mesmo tem po su a v iza a p ena deste castigo. — Q uem c h a ­
m ará castigo a um a coisa tão p roveitosa com o esta? Q uem
não se a b ra ç a rá gostoso com o trabalho, se há-de servir-
lhe de fonte de gra ça s e m erecim entos in calcu láv eis?... 3

3. " — O trabalho em N a za ré. — P o r isto mesmo não é


possível que falte o trab a lh o em N a z a ré — e o trab alh o no
seu sentido m ais e scrito ... não só é trab alh o a o c u p aç ão ....
o não perder tem p o ..., m as o trab a lh o é sobretudo coisa
lab o rio sa ..., difícil..., c u sto sa ..., ru d e ..., cjue requer e sfo rço ...,
s u o r.... incóm odos g ra n d e s .—■Assim, assim foi o trabalho
em N a z a ré ...; n a d a de poesias ou de idílios naquele tr a ­
b a lh o ... N ã o era um trab alh o só p a ra se o c u p a r.... p a ra
m atar o te m p o ...; era p a ra co m er.... p a ra v i v e r ! — V iviam
do tra b a lh o ..., eram uns pobres tra b a lh a d o re s... uns jo r ­
naleiros.
190 V id a de N a z a r é

R e p a ra era S. José e no M enino Jesus ocupados no seu


trab a lh o m o n ó to n o ... p esad íssim o ..., aborrecido, dum a c a r­
p in ta ria e de um a c arp in ta ria de a ld e ia... onde não se fazem
senão coisas to sc as... o rd in á ria s... vulgaríssim as. — R e p ara
tam bém na Santíssim a V irg e m ... T am bém ela depois dos
trab alh o s da casa ainda os m ais baixos e v is ... lav a r, v a r­
rer, esfregar, etc., tom aria o fuso p a ra fiar e fiando g a n h a r
tam bém o seu jornal. — P e n sa e m edita. N o ssa S e n h o ra
a jo r n a l! ... N ã o se o c u p a em lav o res p rim o ro s o s...; as suas
finas e delicadas m ãos não bordam em oiro e se d a s...,
nem trab a lh a m em re n d a s..., senão em trab a lh o s ásp e ro s
e m o rtifica tiv o s...

4 .“ — O teu trabalho. — Assim deve ser o teu trab alh o .


—• E v ita r a ociosidade é bem, tendo sem pre algum a o c u p a ­
ção, m as n ã o te esqueças que nem toda a ocupação é
trab alh o . —■D istingue duas espécies de trab a lh o em que
hás-de excitar-tc: o espiritual e o corporal. — O trab a lh o
espiritual h á-de consistir em v en cer as p a ix õ e s..., d om inar
o génio e o c a rá c te r... esm agar o am or p ró p rio ... em fazer
esforços p a ra n ã o te d istraíres n a o ração e tira res dela
fru to ..., em ex ercitares-te n a p rá tic a das v irtu d e s..., em
lev ares um a v id a intensam ente e sp iritu a l... e sobretudo em
seres constante c p ersev e ra n te nela. T u d o isto c trab a lh o
e sem ele n a d a se pode fazer. — P ro p õ e tra b a lh a r d e v e ra s
neste trab a lh o ainda que te v e n h a a ser pesado e incóm odo.
O co rp o ral consistirá em cum prires os teus d e v e re s...,
c.m não buscares só aquilo que m ais te a g ra d a o u te distrai,
m as aquilo que deves, segundo a v o n tad e de D eus e p a ra
a m aior glória de D eus.
F inalm ente, aplica tudo isto às tu as o b ra s dc zelo e de
apostolado. B uscas as que m ais luzem e brilham ou as que
m ais p ro v e ito causam nas a lm a s? ... Tam bém , nestes trab a ­
lhos buscas as tuas co m o d id ad es?... T am bém aqui te guias
V id a de N a za r é ;91

pelo que te a g ra d a ou desagrada? ... T am b ém és inconstante


neste trabalho? V ê a Jesu s... v ê a M a ria ... trab alh an d o
tan to s anos! e ap ren d e essa liç ã o ..., segue esse exem plo.
— Pede-lhes g ra ç a p a ra fazer com eles essa penitência p re ­
ciosíssim a do tra b a lh o ... d iá rio ..., c u sto so ..., a b o rre c id o ...,
m o n ó to n o ...
54. Vida de Nazaré

1." — V id a d e oração. — A o ra çã o consiste na união


d a alm a com D e u s...: n a com utação e no trato com ele.
P o r isso não há n ad a m ais essencial: D eus é tudo e tu és
o nada. E le é o dono e o senhor im ensam ente ric o ..., p o d e ­
ro so __ cheio de b o n d a d e ...: tu, o p o b re ... m iserá v el...,
reduzido à m aior im potência. — É n atu ral, é indispensável
que acudas a ele, pois sem ele n ad a terás, n ad a p oderás
fazer.
O acudir a ele, o pedir-lhe o que necessitas, é a o ra ­
ção. Q u e am or tão grande o do S enhor ao d a r-te um rem é­
dio tão fá cil... tão sim ples... tão eficaz p a ra rem ediar as
tuas fraquezas e m isé ria s!— Se os doentes tivessem um
rem édio tão fácil que só com ir ao médico já se curassem ,
h a v e ria p o rv e n tu ra doentes neste mundo?
P e n sa na loucura im ensa que é o não apreciarm os no
seu d evido v a lo r o m eio divino da oração, não a utilizando
com o devíam os nem reco rren d o a ela com a frequência
necessária. — N ã o houve sa n to nenhum sem, o ra ç ã o ... e a
m aior espírito e vida de o ra çã o corresponde sem pre m aior
santidade. — P o d e rá h a v e r santos sem g ran d es e e x tra o r­
d in árias coisas de m ila g res..., p ro fe c ia s..., au sterid ad e s...
êx ta se s e ra p to s ... m as não sem o ra çã o . — N ã o repares
porém a g o ra nos s a n to s ...; en tra na escola de o ração onde
todos aprenderam , na escola de N azaré.
V id a de N a za ré 193

2." - O ração contínua. — Ali vivia-se um a vida c o n ­


tinua de oração. — P o r cim a de todas as virtudes so b re s­
sa ía esta, ou m elhor, esta é que d a v a vida e c a rá c te r a
todas as o u t r a s .— E m m uitas c asas ha pobreza como em
N a z a ré ... h á o b sc u rid ad e ... h á tra b a lh o ... m as o que não
há em nenhum a é isso junto com aquele espírito de oração.
- T u d o se fazia em virtude da o ra ç ã o e com o fruto d e la ...;
e é p o r isso que em N a z a ré se o ra v a sem c e ssa r... Com o
a o ração santificava as coisas mais p e q u e n a s!...
T u d o deixa de ser pequeno e indiferente quando se faz
com este espirito de o ração . — O com er__ o d o rm ir__ o
joqar e o d iv e rtir-se ..., o so frer ou o g o z a r__ o trab a lh a r
e o d escansar, é então um a v erd ad e ira o ra çã o . -— E —como
esta suaviza todas as coisas am argas da v id a!
C ontem pla M a ria so lícita..., c a n s a d a .... s u a d a ..., e tudo
para apenas po d er d a r de com er a seu Filho q u erid o ....
para não sair da p o b reza n u n c a ...; m as não se e n fa d a __
não se im p a c ie n ta ...; é essa a v o n tad e de D e u s; aceita-a
não só resignada m as gostosa e c o n te n te.... satisfeita,
a le g re ...: tudo faz com D eus e por D e u s..., quer dizer tudo
laz o ra n d o ..., tudo con v erte em o ra çã o . — P o r isso é feliz:
com ninguém tro ca ria a sua so rte ..., p o r nenhum as rique­
zas e com odidades deix aria a sua p o b re z a ... A h ! Se conhe-
i assemos bem como tudo se transform a com a o ração !

5." — O ração fervorosa. — M as re p a ra ain d a m ais na


Siiniissim a V irgem nos m om entos especialm ente dedicados
,i oração. — N ã o só interrom pe o seu trab a lh o p a ra levan-
liir o seu coração a D eus, p u rific ar a su a rectíssim a intenção
e renovar a sua incessante p resença de D eus, senão que
varias vezes ao dia d e d icav a à o ra ç ã o e contem plação tem ­
pos determ inados. — O lh a p a ra ela e exam ina-a hem ; que
porte interior e ex terio r teria a S antíssim a V irgem n a sua
o rn ç ílo !... L ev an ta a tu a im aginação e o teu espírito ao
, p11 e ali verás toda a corte celeste e especialm ente D eus
194 V id a de N a za r é

deliciando-se n a o ra ç ã o de M a ria ..., recebendo a glória


que esta o ra ç ã o lhe d á ..., com unicando-se com ela e au m en ­
tan d o as suas gra ça s e m erecim entos. — Será assim a tua
o ra ç ã o ? ... T am bém d a rás co.tn ela glória a Deus? ... a le ­
g ria aos anjos e m erecerás que se com unique contigo e te
dê as suas g raças e o que necessitas? P o rq u e tiras tão
pouco fruto da o ra ç ã o ? ... N ã o devias já ter m uita sa n ti­
d a d e ? ... A tua o ração é com o a de M aria, fe rv o ro sa....
hum ilde e c o n sta n te ? ...

4 ." ---- O ra çã o em com um . — E não só M a ria .mas todos


naquela casa o ra v a m ... e o rav am em p a rticu la r e em comum.
—• Q u e espectáculo tão belo o da S a g ra d a F am ília em, o ra ­
ç ã o ! ... Q u a n to a g ra d a a o S enhor a o ra çã o em fa m ília !...
a o ra çã o em com um ... P ersu ad es-te bem disto? O mesmo
jesu s depois de assim ter procedido em, N a za ré e mais tarde
com o s seus discípulos claram ente no-lo ensinou e a co n ­
se lh o u ...: onde há dois ou m ais reunidos em m eu nom e aí
estou eu.
O homem é social por n a tu re z a ..., tudo fez com os
o u tro s__ há-de v iver com a fam ília__ com a sociedade...
porque não santificar essa v id a com a oração? — Se tens
am izades p a ra tra ta r e c o n v ersa r com e las__ porque não
lev ar-n o s m útuarnente a Deus? ...
Se se diz que na união está a força e o hom em se une
aos o u tro s p a ra conseguir algum a c o isa... ou fazer um
esforço que só, não poderia re a liz a r... porque não há-de
ser assim na vida espiritual?
V ê com o a Ig reja fom enta a o ra çã o e a vida espiritual
em comum. — As ordens religiosas não são o u tra coisa.
—• P o rq u e não tra ta s de fazer assim e, no que possas
fom entar a o ra ç ã o ..., a m o rtificação ... a c o n v ersa ç ão e a
vida e spiritual na fa m ília ..., nas am izades..., na sociedade
que te ro d e ia ? ...
55. Vida de Nazaré

1. " — V ida dc crescim ento. — O s evangelistas tão p arco s


em falar de N a z a ré n ã o calam este porm enor da vida de
Jesus c dizem que o M en in o crescia e se d e se n vo lvia ...
e juntam ente com ele h a v ia de crescer sua M ãe. Façam os
reflexão sobre este m isterioso crescim ento...
E m qualquer espécie de vida o crescim ento é essencial...
N a vida v eg etativ a, como conheces que um a p lan ta pegou
bem e tem v id a ? ... se cresce e aum enta. — N a vida anim al,
o m esmo: que seria de um a n im a l..., de um corpo hum ano
que nascesse e não crescesse nem se d e sen v o lv esse?... Seria
um m onstro ou n ã o v iv e ria ... O crescim ento é sinal de
vida. — C onvence-te deste princípio de que o crescim ento
é sinal de vida. — Pois bem, a vida espiritual, ainda que
m uito interna, é tam bém vida. e p o r conseguinte req u er tam ­
bém crescim ento. — C rescer é a u m e n tar..., é a dquirir um a
nova perfeição ... P o r isso na vida espiritual n ã o é possível
p arar. — C om preende ag o ra aquilo que se diz que na vida
espiritual o não a v a n ç a r é re c u a r...; d e te r-se ... p a ra r pela
llbleza o u frieza, é retroceder. N ã o te enganes m iseravel­
mente: se não avanças, re cu a s; se não aum entas, perdes
dc dia p a ra d ia... 2

2. " — O m odelo. — Jesus crescia. — A parece crescendo


e aum en tan d o ... e é o único que não podia rcalm ente cres-
1 % V ida de N u zíiíc

ccr. - T in h a tudo o tudo possuía desde a eternidade etii


grau in fin ito ...; não era capaz de ad q u irir novas perfeições.
— N o e n ta n to quer ser nosso m odelo e ensinar-nos p rática-
mente a c rescer... e assim quis m anifestar-se como se real-
m ente crescesse.
O sol é sem pre o m esm o ; realm ente não aum enta nem
cresce c c ontudo desde a a u ro ra até ao meio dia aparece
como se realm ente aum entasse e crescesse a sua lu z... Assim
Jesus cada d ia aum entava um a perfeição mais ou um g rau
m aior d elas com o se efectivam ente nelas crescesse e se a p e r­
feiçoasse... Q u e será o crescim ento p a ra Jesus quando
sendo o único que não podia crescer quis a p are ce r deste
modo? ...
N ã o q u ererá que tu o im ites e trabalhes pelo teu c re s­
cim ento v e rd a d e iro ? ... E a S antíssim a V irgem n ã o crescia
ta m b é m ? ... se foi ela que m ais aproveitou as lições de
Jesu s... h a v ia de esquecer esta? ...
É doce p e n sa r e além disso é certo que depois de Jesus
ninguém cresceu tan to em g raça e form osura de alm a diante
de D eus e d ian te dos hom ens com o e la ...

3." —• E m que crescia Jesus. — aJ no seu corpo: era


o único crescim ento de que era c a p a z ... O corpo tenro e
delicado d o M enino Jesus fortalecia-se e robustecia-se cad a
vez .mais p a ra ser ap to e ú til nos trabalhos a p o stó lico s...,
n a sua p re g a ç ã o ..., nos sofrim entos d a sua p aixão. — P o r ­
tanto ate1 o seu crescim ento físico c n a tu ra l era p a ra ele
um a coisa que se d irigia ao seu fim R e d e n to r..., ao m elhor
cum prim ento d a v o n tad e de seu p a i.... ao bem das alm as.
—'A p re n d e a dirigir a esse fim tam bém a tua sa ú d e ..., as
tu as fo rç a s..., a tua vida toda ainda sob o ponto de vista
corporal e físic o ,..;
b) crescia em sabedoria. — E sta era dupla: uma
hum ana com a que a p are n ta v a conhecer cada vez m ais c
V id a de N azaré 19 7

m elhor o necessário p a ra a v id a .... p a ra o seu ofício ...,


p a ra a ju d a r a seus pais. — C onhecia tam bém cad a dia
m elhor o que eram. os hom ens pelos quais se ia sa c rifica r—
o que era o c oração hum ano, e este conhecim ento fazia-o
sofrer ao v e r a sua in co n stâ n cia .... o seu eg o ísm o ..., a sua
incom preensão do v e rd ad e iro am o r... c co m p araria o c o ra ­
ção de todos os hom ens e em todos v eria sentim entos sem e­
lhantes, e tam bém ... no te u ! ... que pena! O u tra era a sa b e ­
doria divina, que cada vez se revelava mais, como se
revelou no tem plo onde foi a adm iração dos d o u to res...
C om o a p ro v eita ria a Santíssim a V irgem estas liç õ e s!...
e tu, com o o uves as coisas de D eus e as suas in sp iraç õ es?...
c ) crescia em santidade. — D e dia p a ra d ia fazia
o b ras m ais do a g ra d o do P ai e m ais pro v eito sas p a ra n ó s...
Q u e rectidão e p ureza de in te n ç ã o !... S obretudo que am or
nas suas o b r a s ! — E m bebe-te bem desta san tid ad e crescente
de Jesus, que assim vai crescendo até ao fim da sua v i d a ; ...
até à E u caristia...» até à C ru z ...

4." — O teu crescim ento. — C resceste no teu corpo como


Jesus; m as na tua alm a, como cresceste cada d ia ..., cada
m ês..., cad a a n o ? ... N o ta s que vais crescendo e aum en­
ta n d o ? ... P ro c u ra s c rescer no conhecim ento de Jesus e de
sua M ã e ? ... T ra b a lh a s p o r pen etrar no fundo desses dois
c o raç õ es?... nas finezas desse am or p a ra reproduzi-las no
te u ? ... A um entas deveras em fe rv o r..., em am or de Jesus
por meio de M aria?
Se a vida é crescim ento, podes dizer que a tua alm a
v iv e ? ..., o u não terá s de reconhecer que em vez de crescer
decresceu e dim inuiu?... N ã o era antes m ais inocen te...,
mais sim ples..., talvez m ais ferv o ro sa? — N ã o foram aum en­
tando cada dia as tuas p a ix õ e s..., o teu am or p ró p rio ...,
o teu g é n io ... em vez de crescerem as tu as v irtu d e s? —
Pede m uito à Santíssim a V irgem esta g raça do crescim ento...
19S V id a dc N a za r é

que ela te ensine a crescer tã o rapidam ente com o E la p a ra


que a tu a alm a não seja algo de m onstruoso o u esteja a
ponto de m orrer. — Insiste m uito com ela p a ra que todos
os dias, especialm ente na com u n h ão ... que é um dos m elho­
res m eios de se alim entar e de c resc e r..., te dê com seu
Filho um pequeno im pulso que te faça co rrer no cam inho da
santidade.
56. Vida de Nazaré

P erda do M e n in o Jesus. — É o m om ento culm inante


da vida oculta — até p arece e star em co n trad ição com ela.
•Jesu s escondido... o b e d ie n te... e subm isso, ag o ra m ani-
íesta -se ... parece in d ep e n d iza r-se .— M editem os os p ro fu n ­
dos m istérios desta atitude nas suas relações com M aria.

l . ° — Ida ao tcm olo. — Jesus fez já doze a n o s... já não


é um a c ria n cin h a ... é um belo adolescente que prende com
.t sua beleza irresistivel e com o encanto da sua incom ­
parável sim patia. — F ix a -o bem ... contem pla-o assim fo r­
m osíssim o... deixa-te p ren d er por ele. A os doze anos já
esta sujeito à lei e p o rtan to deve já ir a Jerusalém três vezes
por ano a celebrar as festas rituais. — M a ria diria isto m ui­
tos dias antes ao M enino Jesus e ele com eçou logo a rego-
zijar-se com a viagem , ainda que ocultou as circunstâncias
ila mesma.
C hegado o dia, José e M a ria levam o M enino e põem -no
a cam inho. S eg u e-o s... escuta o que d izem ... vê o que
b u e m ... Com fervor v ã o ao tem plo a o ra r..., a oferecer
r .sacrifício do Senhor.
C om para esta viagem com as a n te rio re s..., ag o ra não
há as inquietações e sofrim entos da viagem a B elém ....
200 Vida de Nazaré

nem o s sobressaltos e tem ores da do E g ip to ...; v ã o cor.'


tentes e alegres, e contudo nesta viagem esperavam -nos
a m a rg u ras m uito m aiores do que nas a n te rio re s .— A dora
os desígnios de D e u s..., respeita a sua v o n tad e santíssim a,
que assim p re p ara a p ro v a da dor p a ra os seus quando
menos se espera.

2." — N o tem p lo . — R e p ara como chegam a o tem plo....


é a casa de seu P a i..., é o lu g a r onde m ora D eus e fala
e se com unica à s alm as... Q u e d o r lhe c au saria v e r os a b u ­
sos que nele se c o m e tia m !... Q u e pouco respeito d a pa rte
daqueles com erciantes que ali m esmo h aviam in stalad o as
suas te n d a s !... C om que v o n tad e faria o que m ais ta r d e
h a v ia de fazer expulsando-os a a z u rra g u e s ! ... M a s não
ch eg a ra ainda a su a h o ra. — P ensa no que faz so frer a
Jesus qualquer falta que se com ete no recinto sag rad o .
U m a vez dentro, Jesus prim eiro, e com ele M a ria e
José pôr-se-iam em o ra ç ã o ... E ra a prim eira o ra ç ã o que
fazia no tem plo. — P õe-te junto a ele e v ê como su a M ãe
n ã o tira dele os olhos p a ra a p ren d e r dele a o ra r e a tra ta r
com D e u s... Q u e d iria a seu P a i? ... Q u e ferv o r o d a sua
o ra ç ã o ...! Com o o com unicaria à Santíssim a V irgem e esta
se se n tiria invad id a de um fe rv o r e a m o r especial.
D epois assistiriam a todas as cerim ónias... Com que
a ten ção seguiriam o desenrolar daquela litu rg ia !— N a d a de
cu riosidade d e slo ca d a..., nenhum a p e rg u n ta d esn ecessária...,
nenhum com entário e m uito m enos risos ou g ra ça s sobre o
que contem plavam ... É assim que tu assistes aos a cto s de
culto? ... N ã o gostas de com entar e de rir-te q uando algum a
coisa te cham a a atenção?
E quando Jesus visse o cordeiro pascal e assistisse à sua
im olação vendo os sa cerd o tes a recolher o seu san g u e em
v aso s de oiro p a ra d erram á-lo sobre o a lta r dos holocaustos,
que sentiria no seu c o ra ç ã o ? ... N enhum a coisa o represen­
V ida dc N azaré 201

ta v a m elhor a E le e ao seu sacrifício de R edentor do que


aquele cordeirinho inocente. — E le com preendia m uito bem
que aquele sa n g u e era m uito pobre e insuficiente p a ra tirar
os pecados e d e sa g ra v a r a seu P a i e um a vez m ais repetiria:
-'•Meu Pai, aqui estou e serei eu que farei d esap arecer os
pecados do m undo». E a M ãe a d iv in h aria tudo o que p a s ­
sa v a por Jesus... E sta v a tão acostum ada a ler naquele c o ra ­
ç ã o ! ... E E la tam bém ren o v aria com seu Filho o desejo
do sacrifício p a ra a salv ação dos hom ens...

3." — A perda. — E parece que D eus a o u v iu ... c lhe


aceitou o sacrifício e quis dar-lhe a beber do cálix da
a m a rg u ra. — A o re g re ssar a casa vindos dc Jerusalém , o
M enino Jesus p e rd eu -se ... sem culpa de ninguém . — M aria
co n fiav a em S. Jo sé... S. José não duvidou que o M enino
Jesus iria com M aria, pois sabia que não se separavam
um m o m e n to ...: o facto foi que o S enhor perm itiu que ao
chegarem ao fim da prim eira jo rn ad a se encontrassem sem
o M enino Jesu s... Q u e dor tão esp an to sa! Q u e im pressão
a do c oração d a Santíssim a V irgem !
E q uando sc fosse convencendo de que nem aqui, nem
a h , nem neste gru p o nem naquele se e n c o n tra v a ... e p e r­
guntando a todas as c ara v an a s que regressassem , se p e r­
suadisse que h a v ia perdido a Je su s... Q u e seria aquele
so frim en to ?... Ó esp ad a de Sim eão, que bem penetras e
quão duram ente feres o coração de M a r i a ! ... M a ria sem
Jesus! ! ! A M ãe sem o F ilho! ... T u d o o que penses é n a d a ....
não é possível que penetres nesta d o r... E ra necessário ter
o am or de M a ria __ sab er o que p a ra E la era Jesus... o seu
F ilh o ..., o seu D e u s..., o seu tu d o ... Q u e farias tu em caso
sem elhante?... D e sa b afa r c o n tra os o u tro s? ... D eitar a culpa
nos outros? ... M aria, nem um a p a la v ra de queixa a S. José...
I'.le procedeu m uito b e m ...; ela é que foi a im prudente, a
202 V id a de N azaré

confiada d e m a is..., só em si mesma encontra culpa. — V ê


com o chora, se.m exageros dram áticos, m as m ostrando a
d o r p rofunda do seu coração. — C orre a co n so lá-la..., a a n i­
m á-la... prom ete-lhe tom ar p a rte sem pre na sua dor, e ofe-
recc-te p a ra com E la ir em busca de Jesus... e prom ete-lhe
não aum entar com o teu procedim ento as suas dores e
sofrim entos pois tudo o que sofre é por ti...
57. Vida de Nazaré

1." — E ncontro do M en in o Jesus. — T rê s dia.s dem o­


raram em encontrá-lo. — Q ue dias tão c o m p rid o s!... Q ue
noites so b re tu d o !— D u ra n te o dia. o ir daqui para a li....
0 p e rg u n ta r aqui c acolá cm certo m edo d istraia a S a n ­
tíssim a V irgem d a sua dor im ensa... m as ao ch eg ar a
n o ite ... quando tinha de recolher-se à h o sp e d a ria ... c a n ­
sada e esgotada pelo sofrim ento e cansado do d ia ..., que
fa ria ? ... em que p ensaria ao ver-se s ó ? ... como correria
.1 sua im aginação e lhe p in taria a Jesus talvez sofrendo
M a sua p aixão e m orte pelos h o m e n s!...
A com panha nesta noite espantosa à Santíssim a V ir­
gem ..., tra ta de com preender a intensidade da sua dor ao
perder a Jesus... p a ra im itá-la, se algum a vez te encontrares
1 m caso sem elhante e perderes também a Je su s__ ou te puse-
ics em perigo de perdê-lo.
E por fim am anheceu o dia da dita e do gozo. M aria
e José regressaram a Jerusalém e correndo foram ao templo
c ai e n contraram a sua vida ao v e r a Jesus tranquilam ente
entre os D outores. — Q u e efeitos tão variad o s e distintos
no coração de M a ria nesta o c a s iã o !... de alegria imensa
por hav er encontrado a seu Filho sã o e s a lv o ..., de ag rad e -
i Imcnto ao S enhor que lhe concedia de novo a posse do seu
| ■s 11s ..., de adm iração e assom bro ao v e r o M enino Jesus
20-1 V id a de N araré

sem pre tão m odesto e hum ilde ag o ra a disp u tar p ú b lica­


m ente e a en sin ar aos D outores da L ei...
Q u e significava tudo aquilo?

2. " — A s queixas m aternais. — E efectivam ente sem


poder conter-se. com um afecto sum am ente m aterno logo
que M a ria se encontrou a sós com seu F ilho p e rgunta-lhe:
«P o rq u e procedeste assim connosco? N ã o sab ias que teu
p ai e eu havíam os de sofrer tanto na tua busca?: — M aria
n ã o a ca b av a de sa ir do seu espanto: tudo naquele d ia era
e x trao rd in ário . Com o é que Jesu s... o seu Jesus, ate então
tão subm isso e obediente, que nunca lhes cau so u o m enor
desgosto, ag o ra procedeu assim ? N ã o re p a ra ra talvez que
com isto eles sofreriam tanto? ... Com o explicar tudo isto3*7
— A divinha-se facilm ente o sofrim ento e a to rtu ra daquele
c o ração de M ãe que a g o ra quer desabafar. — E Jesus que
ate então n ad a dissera, agora, p o r respeito a sua M ãe, fala
e explica o seu procedim ento: « N ão sabíeis que devia
ocupar-m e nas coisas de .meu Pai?;>
S ão as prim eiras p a la v ra s que cita o E v an g e lh o de
Jesu s... Q u e belas e que m istério tão p rofundo não encer­
r a m ! ... T u d o o que fez foi o rdenado p o r seu Pai. e ante
aquela v ontade divina não h á senão obedecer, ain d a que a
obediência seja am arga e custe sofrim entos com o neste caso.
— Bem sabia Jesus a d o r de M aria e de J o s é ...; tam bém o
seu coração sofria ao vê-los a eles a so fre r........m as o Pai
assim o queria, e ele tam bém assim o q u is...

3. " — N o sso m odelo. — Jesus dá-nos aqui exem plos d


altíssim as v irtu d e s... ensina-nos a obedecer antes a D eus
que aos hom ens.... a seguir a nossa v o cação e os seus d iv i­
nos cham am entos em todo o m om ento e em todas as circuns­
tâ n c ia s.... ainda que o c o raç ão tenha de sa n g rar. — Tem os
que seguir o cham am ento de D eus onde ele q u ise r..., quando
ele quiser e na form a que ele mesmo quiser.
V id a d e N a za r é 205

Além disso, havem os de obedecer com o D eus merece,


com p ro n tid ã o ..., com e n e rg ia ..., com exactidão. — M uitas
vezes p a ra obedecer é necessária um a g ra n d e firm eza de
v ontade p a ra v en cer as dificuldades que se a p re se n ta m ...;
olha p a ra o m odelo e aí v erás esse v a lo r e firm eza dc que
necessitas. — Jesus não suaviza a seus pais a dor do sacri-
ficio... não d á u,m p asso p a ra ir ao encontro d eles..., quando
já o encontraram nãn os consola com p a la v ra s docinhas e
c a rin h o sa s...; diz-lhes sim plesm ente a verdade e expõe-lhes
a v ontade de seu Pai, superior a eles e a quem todos devem
obedecer.
M a ria e José com preendem ..., baixam a cabeça e j.i
não falam ne.m perg u n tam m ais. M edita m uito neste passo
tão ex tra o rd in á rio e pede a Jesus esta firm eza e este v a lo r
p a ra obedecer assim , com toda a exactidão, ao Senhor.
T am bém M a ria é modelo de grandes v irtu d e s .— Com o
leva bem na sua d o r a d u ra p r o v a !... P á ra a considerar
a sua p a ciên c ia..., a sua subm issão à vontade d iv in a ....
a sua hum ildade, julgando-se indigna de ter a Jesus e c u l­
pada da sua p e rd a ...; a sua p e rsev e ra n ça e actividade em
b u sc á -lo ...; até ao cabo do mundo teria ido se fosse neces­
sário !...

4." — B uscam a Jesus. — A prende tu tam bém aqui a


buscar a Jesus. P o d es perdê-lo pelo p e ca d o ..., m as às vezes
ainda sem pecad o Jesus oculta-se p a ra p ro v a r-te , como fez
com sua M ã e ... É en tão que o dem ónio se ap ro v eita da
ocasião p a ra te n ta r-te com o d e sa le n to ..., o c an sa ç o ..., a
desco n fian ça..., o desespero. M as isso nunca.
V ê como procede M a ria ... não encontra logo a Jesus,
mas não p á ra a té encontrá-lo. A ssim deves fa ze r tu ...
<) sofrim ento e a d o r do teu sacrifício n ã o te devem tira r
.1 coragem p a ra b u scar a J e s u s ...; pelo co n trário deves antes
suspirar m ais p o r ele. como M a ria .... e como M aria não
I

206 V id a de N azaré

v iver nem d escansar até .merecer com a tua dilig ên cia....


ferv o r e perseverança, encontrá-lo.
E quando .se encontra assim a Jesus, que contentam ento
e alegria p a ra a a lm a !... C om o brotam espontâneam ente
as p a la v ra s do L ivro dos C a n ta res: «encontrei aquele que
m inha alm a a m a ; guardá-lo-ei bem e nunca m ais o soltarei? !
P ede a M a ria o saber cum prir bem a v o n tad e de D e u s....
o não m erecer nunca que Jesus te castigue com o a fas­
tar-se do teu c oração e o cultar-se de t i...; enfim que saibas
tra b a lh a r sem descanso n a sua com panhia p a ra ... com, E la
e p o r E la. ir sem pre a Jesu s... v iv er com Je su s... e buscá-lo
sem cessar até o encontrar.
58. Vida de Nazaré

1." — M aria e Jesus. — T ratem o s de considerar e so n ­


d a r a situ a rã o em que du ran te aqueles trin ta anos de vida
o c u lta esteve M a ria com relação a seu Filho.
A prim eira coisa a considerar é que entre Jesus e M aria
existiu um a relação .m aternal... M aria era a M ãe, e Jesus,
o Filho de D eus, era o Filho de M a r ia ! ... e g o stav a de ter
com ela as relações de um bom filho com sua m ãe. — M a ria
teve pois que prestar-lhe os m esmos serviços que um a mãe
presta a seu filho. — E o M enino Jesus, com o as outras
criancinhas, teve que depender de sua M ãe, de tal sorte
que a vida dos dois era um a só v id a ..., pois M a ria vivia
toda p a ra Jesus, e Jesus v iv ia de M aria, sua M ã e ... Q ue
dulcíssim a é essa com oenetração de vida entre M ãe e
F ilho!
N ã o há um só passo na vida de Jesus, que não tenha
repercussão n a vida de M a ria ... U m as vezes será um a
alegria, um a n e lo ..., o u tra s vezes um sobressalto, um cui­
dado, um a carícia o u u.m. esforço e trab alh o p a ra alim entá-lo,
vesti-lo e educá-lo tudo igual ao que se passa com o u tras
m ães..., só que dum a m aneira m ais carinhosa e cuidadosa. -
Ninguém , nem m esmo os filhos de reis e im peradores, rece­
beram algum a vez cuidados mais delicados do que os que
recebeu Jesus de M a ria am antíssim a.

,
20* V id e de N a za ré

2. " — O F ilho de D eus. — P o r o u tra p arte M a ria via


em Jesus não sò o seu F ilho .mas tam bém o seu D e u s...
e dai. que todo o seu carinho, com ser tão g rande, e stav a
m isturado de sum o respeito e v e n e ra ç ã o ... Q u e pensam ento
m ais sublim e do que su p o r que D eus pôs no coração da
Santíssim a V irgem todo o a tn o r... todo o c a rin h o ... toda
a tern u ra que todos os hom ens juntos deviam ter p a ra com
J e s u s !... Q u e E la só am ou m ais a seu Filho do que toda a
hum anidade in te ira !... Q u e E la já desde então soube re p ara r
com o seu am or ardente todos os esquecim entos e in g ra ­
tidões de todos os hom ens que por ignorância o u m alícia
não o queriam re c e b e r!— M a ria então en cerrav a e re p re ­
se n ta v a no seu coração a to d a a h u m a n id a d e ...; e.m nome
dela ex ercia as suas funções dc M ãe, pois o seu F ilho não
era p a ra E la mas p a ra to d o s..., a todos nós pertencia
por ig u al...

3. " — V id a intim e. — Finalm ente, com respeito a este


oficio m aternal de M aria, m edita bem que as circunstâncias
da sua vida fizeram que este fosse o mais íntim o que se
pode im aginar. — A sua p o b reza não lhes perm itia ter p e s­
soas ao seu serviço, e p o rta n to E la mesma teve de cuidar
d irecta e pessoalm ente de seu F ilho, até nos m ais p e q u e ­
ninos porm en o res... Foi prov id ên cia de D eus que não quis
que o u tra s m ãos senão as de M aria, tocassem no co rp o de
C risto. — V ê com o E la v ivia dependente de seu F ilh o ...
T o d a p a ra E le. — Com o se m ultiplicava p a ra a te n d ê -lo ...;
não se p o u p a v a a tra b a lh a r nem a cansaços p a ra cuidar
d e le ... E la p ró p ria o a lim e n ta v a ..., o v e stia ..., o la v a v a ....
e o lev av a nos braços. — E ia fazia tudo, e não consentia
que ninguém a substituísse, nem mesmo a ajudasse nestes
ofícios de M ã e ... E certam ente quem o s p oderia fazer como
E la ’ ...
P o r e sta mesma ra zã o de ser a M ãe de D eus, teve a
Santíssim a V irgem que c o o p era r e tom ar p arte em todos
V ida de Nazaré 209

os m istérios d a v id a o c u lta . — A ntes de m ais. n a d a p a ssa v a


despercebido p a ra E la ..., tudo o b se rv a v a a te n tam en te ....
tudo g ra v a v a no seu coração, com o diz o E v an g e lh o ...
e sobretudo m ed itav a a sós p a ra tira r o fruto devido de
tudo o que via fa z e r..., fa la r ou sofrer a Jesus... Q u e medi
tação tão p ro v e ito s a !... C om o a p ro fu n d aria a sublim idade
daqueles m is té rio s!... Q u e h o ras de p ra ze r e spiritual que ela
p assaria a m editar na infância o u v id a o cu lta de J e s u s !...
Q u a n ta s coisas não sa b e ria E la ! ...
D e q u an tas não foi E la a única te ste m u n h a ! Se não
se ap ag am fàcilm ente do coração de um a mãe as coisas
de seus filhos, com o n ã o se conservariam todas estas coisas
no c o ração de M a ria ? ...

4." — N o sso m odelo. — V ê em M a ria o m odelo que nos


ensina a co n h ec er..., a e stu d a r..., a m editar em Jesus. C o n ­
tem pla-a a E la n esta con tín u a m editação. — Jesus absorvia-
lhe toda a sua a c tiv id a d e ... lev av a-lh e to d a a sua v id a ...
o c u p av a -a todos os m o m en to s... e po rq u e não? — E la tinha
diante dos seus olhos o objecto mais querido do seu c o ra ­
ç ã o ...; ao v e r o ro sto de seu Filho v ia ao seu D e u s....
e deliciava-se nos e n ca n to s daquele m enino— depois, na
beleza daquele jovem , todo cheio de g ra ça e sim p atia...
C om o se ex tasiaria ao vê-lo dorm ir placidam ente no seu
pobre bercinho!
E la pôde fazer com o ro sto de Jesus tudo o que q u is...:
o lh á-lo ..., b e ijá -lo ... exam iná-lo até sabê-lo de cor. — E n a ­
quele m enino pobre e necessitado de tudo via sem pre o
Infinito e o e te rn o ..., a om nipotência e a m aje stad e ... a s a b e ­
doria incriada d a divindade. — E la viu passo a passo, o
desenvolvim ento e crescim ento daquela santíssim a H u m a ­
n id ad e... e pôde o b se rv a r com o o ro sto de Jesus se parecia
cada vez m ais com E l a ! .. . e todos lho diziam assim ... e ao
ouvi-lo e ao vê-lo, o seu c oração in u n d av a-se de um gozo
Inefável. O h ! M ãe ditosa, a m ais feliz de todas as m ã e s !...

14
210 V ida de N azaré

E que bem sabia corresp o n d er o seu c oração a estas


deliciosas o b se rv a ç õ e s!... C om o de tudo isto tira v a E la
sentim entos de adm iração, de gozo. de am or e lo u v o r a
D eu s porque a E la, su a e sc ra v a a elegera p a ra ser a M ãe
de seu F ilho! — Q u e o raçõ es n ã o faria en tão p o r todos os
hom ens e tam bém por t i ! — Sem cessar se oferecia a Jesus
por n ó s... oferecia-nos e a p rese n tav a -n o s a nós diante de
Jesus, e pedia-lhe p a ra nosso bem, m ilhares de g ra ç a s...
e enfim oferecia a Jesus ao E te rn o P ai pela sa lv aç ão da
h u m a n id a d e !
E sta s foram as o cupações de M a ria d u ran te o s trinta
anos d a sua vida em N a za ré . — P e n sa e m edita m uito nesta
v id a tão íntim a de M ãe e F ilh o ... e pede-lhes um cantinho
p a ra v iv er com. E les e p a rtic ip a r desse silêncio..., dessa paz
e calm a e felicidade de N a z a ré . — Pede a Jesus que também
tu te p areças, como E le, a M a ria, porque tam bém és filho
d e la ... e que a p ren d as com o E la, a estudá-lo a E le p a ra
conhecê-lo, am á-lo e servi-lo com o M aria, c onvertendo n
Jesus no único objecto que constantem ente encha o teu
entendim ento, a tua im aginação e o teu c o ração sobretudo.
59. As Bodas de Caná

T erm in ad a a vida p riv a d a de N a za ré , Jesus com eçou


a sua vida p ú b lic a ... e a prim eira m anifestação m ilagrosa
dela, foi o p rodígio o b serv ad o em C a n á p o r in tercessão ...,
quase podèinos dizer, p o r m andado de sua M ã e ...

1.“ — O c onvite. — N ã o se sabe com certeza quem eram


aqueles e sp o so s..., p arece que eram uns p a ren tes d a S a n ­
tíssim a V irgem , com os quais sem d ú v id a tin h a E la estreitas
relações pois lhe pareceu conveniente a ce ita r o convite de
assistir às suas bodas. N o ta bem com o o convite foi feito,
em prim eiro lu g ar, à Santíssim a V irg e m ... Jesus foi c o n ­
v idado p o r cau sa de M a ria . — N u n c a esqueças esta c ir­
cunstância, que Jesus gosta de a p a re c e r sem pre acom pa­
nhado de sua M ãe. C om que p ra ze r en tra Jesus no coração
onde sabe que já se enco n tra sua M ãe! T em isto presente
sobretudo ao ir c o m u n g a r...: a m elhor p re p ara çã o c M aria.
M as re p ara ainda n o u tras circunstâncias: com o Jesus
e M aria nos dizem que a v irtu d e h á-de ser sem pre am áv el...,
não ra ra nem e x tra v a g a n te ... Q u e sim pática é esta presença
de Jesus e de M a ria num banquete de bodas! •— A v id a espi­
ritual não se opõe à s e x p an sõ es b o a s..., à s diversões sa n ­
ta s ..., às festas d e fa m ília ..., especialm ente quando se tem
cuidado em que nelas estejam Jesus e M a ria santificando-as
com a sua p re sen ç a ...
212 A s B odas de Cana

2. " — O banquete. — Sentam -se à m esa... F ix a -te e


Jesus e em M a ria ... L evam os olh ares de to d o s..., sem exa-
çjeros.... sem atitudes pretenciosas. m as que urb an id ad e e
e d u c a ç ã o !... Q u e atitudes m ais co rrectas e delicadas as
suas no meio de tan ta sim plicidade e m o d é s tia !... Q u e boa
com panhia da v irtu d e é a urbanidade e a e d u c a ç ã o !...
quando não é ridiculam ente ex ag erad a.
C hegou um m om ento em que faltou o vinho. — P re o ­
cupados com o que com iam e bebiam certam ente que n in ­
guém deu conta de que o vinho faltava. — Foi M a ria a
que logo notou o fa c to ... Q u e o lh ar o seu, fino e p e n e ­
tr a n te ! ... N a d a lhe e s c a p a v a ...; certam ente que os criados
dissim ulavam , p a ra que n ã o se visse a falta, m as p a ra os
olhos de M aria não há dissim ulação possível. — T am bém
Jesus notou, m as não fez nem disse n a d a .... deixou tudo a
sua M ã e ..., queria que fosse coisa sua.

3. " •— A s palavras d e M aria. — E o c oração de M a r


n ã o o pôde so fre r... E la , c o nvidada p o r aqueles esposos
n ã o iria fazer n ada p o r eles se podia rem ediá-los naquela
n e c e ssid a d e ? ... O c o ração de M a r ia ! ... N inguém lhe diz
nada, e é ela que ao v e r um sofrim ento e um desgosto se
lan ça a re.mediá-lo. — A p ren d e de M a ria esta delicadeza,
esta bondade e m isericó rd ia... e confia ao mesmo tempo
n E la, pois tam bém contigo pro ced erá do mesmo m odo.
E então v oltando-se p a ra Jesus diz-lhe; N ã o têm
v in h o ... Q u e p a la v r a s ! ... Q u e sim ples e q u a n to e n c e rra m !...
N ã o são um m andado, nem m esm o um a súplica, só contêm
a exposição de um a necessidade. — E la n ã o du v id a de que
Jesus rem ediará tudo. — N ã o é necessário que peça e o rd e n e ;
h asta que dê a entender o seu desejo e E le a com preenderá.
O desejo da M ãe é lei e ordem p a ra o F ilh o ! — Jesus no
e n ta n to nesta o casião p arece n ã o a querer a te n d er e diz-lhe:
«Q ue tem os nós que ver com a q u e s tã o ? -... C om o se d is­
As- Bodas de Canú 21 i

sesse: «nós não dam os o ban q u ete; e p o rtan to não é con­


n o sco ; isso é lá com eles».
A lém dc tudo o mais, poderia i.maginar-sc. esta p re o ­
cupação de M a ria p a rec ia coisa sem im portância c sem
razão : já todos tinham bebido até à saciedade e o banquete
e sta v a no fim ; ain d a se fosse no principio! depois tratav a -se
de um a coisa m eram ente m aterial sem pro v eito espiritual
de espécie algum a. P a ra que pois o em penho em conseguir
um m ila g re? ... E por sobre tudo isto Jesus acrescenta:
«ainda n ã o chegou a m inha h o ra » ... q u e r dizer: n ã o é este
o m om ento p ro p íc io ..., nem a h o ra determ inada p o r meu
P a i p a ra fazer m ilagres e m anifestar-m e com p ro d íg io s...

d." — O m ila g re .— T u d o isto e ra p a ra fazer desanim ar


a N o ssa S enhora. A s dificuldades que Jesus p unha eram
tais que o m elhor e ra calar-se. Assim teria procedido quern
visse as coisas com olhos pu ram en te h u m an o s... M as M a ria
não fez assim e, com o se Jesus tivesse m andado tudo ao
contrário, dem onstrando e sta r disposto a tudo o que E la
queria, põe-se a m andar e cham ando os criados, diz-lhes:
F azei quanto m eu F ilho v o s d isse r... E com isto Jesus fica
c o m p ro m etid o ...; já não tem m ais rem édio senão fazer q u a l­
quer c o isa ..., e, por v o n tad e de sua M ãe, o p e ra o seu p ri­
m eiro e gloriosíssim o m ilagre da conversão da água em
vinho.

5.” — O p o d e r dc M aria. — M uito gran d e foi o m ilagre


do vinho, m as m aior é o po d er de M aria. — P arece que
D eus não se propôs o u tra coisa nesta o casião senão m ostrar
<i força deste p o d e r de M a r ia .— T u d o o que Jesus d iz...,
iodas as dificuldades que põe, não servem sen ão p a ra nos
ensinar isto mesmo. É dig n o de nota sobretudo que D eus
parece ter m odificado os seus planos p o r v o n tad e de M a ria :
ainda não chegou a m inha hora disse Jesus. Q u e facto mais
2H Ay Bodas de Cana

adm irável! O que será M a ria diante de D eus quando tão


g ra n d e é o seu poder!
A hora d a In c arn a çã o ad iantou-se pelas orações fer­
vorosas de M a ria ...; p o r E la se adiantou também, a hora
do N ascim ento, com o prém io da expectação e desejo seu
de v e r a o R edentor já n a s c id o ...; ag o ra tam bém se adian ta
a h o ra da sua m anifestação pública. — Se incarna, é em
M a ria ... : se nasce, é d o seio de M a ria que n a s c e ...; se vive
trinta an o s oculto, está escondido com M a r ia ...; se com eça
a sua v id a pública e o p e ra o seu prim eiro m ilagre, é quando
quer M a ria ... Q u e é isto, que n ad a se faz pelo F ilho de
D eus sem M a ria ? ... N ã o te espanta esta disposição de
D eus de associar M a ria a todas as suas o b ra s ? ...
P ois se assim é, a tua m esm a salv ação e santificação.
d 'E la d ep en d em .... d E l a hâo -d e v ir.... a E la as deves
confiar. É com q u an ta se g u ran ç a deves tudo confiar a E la !
V ê a se g u ran ç a com que E la confia em seu F ilh o ... E ra
o prim eiro m ila g re.... ainda nunca o tinha v isto fazer m ila­
g res e contudo, que f é ! ... que confiança a s u a ! ... Com que
se g u ran ç a e confiança cham a e m anda os criados!
L ança-te sem m edo nos braços de M ãe tão p o d e ro sa....
expõe-lhe as tuas m isérias.... as tuas n ecessid ad es... que
a que não sofreu a falta de v in h o ..., m enos sofrerá a falta
de virtu d es no teu coração, se a E la acodes e a E la pedes
rem édio.
60. M aria na vida pública de Jesus

P a ssad a esta cena das bodas de C an á. a Santíssim a


V irgem d esap arece do E v an g e lh o p a ra não a p are ce r de
novo senão no trág ico desenlace d a v id a de C risto n a sua
P a ix ã o e m orte d e c ru z ... N ã o o b sta n te este silêncio, m edi­
tem os no que nos diz o nosso c o ra ç ã o que faria a Santíssim a
V irgem d urante os três anos que durou a p reg ação de Jesus.

l.° — U nião em espírito com seu F ilho. - N ã o se pode


d u v id ar que antes de tudo foi o u continuou sendo de união
perfeitíssim a com o se u Jesus.
Im agina o m om ento da se p a ra ç ã o ...
Q u e triste e resignada, tom a M a ria com Jesus a últim a
re fe iç ã o !... P re p a ra -lh e os v e stid o s..., as sa n d á lias p a ra o
cam in h o ..., acom p an h a-o um bom pedaço de c am in h o ...;
mas Jesus não quer que o acom panhè m a is ...; abraçam -se
os dois e separa.m -se... Q u e dor e que a m a rg u ra para
M a ria !... Q ú e soledade a de N a z a r é ! ... a c a s a ..., a ofi
c in a ..., recordavam -lhe tan ta s coisas, e, a g o ra tudo v a z io !...
Indo em s ilê n c io !... tudo t r is te ! ... C ontu d o M aria não se
sep a ra definitivam ente de J e s u s ...; sem E le n ã o sabe v i v e r . .. ;
deixa de vê-lo e acom panhá-lo corporalm ente m as não espi­
ritualm ente. —• E m espírito M a ria e stará dia e noite onde
Ele está sem conseguir p en sar n outra coisa senão no que
E le faz... no que E le p e n sa ... no qu an to se c a n sa ... sofre
216 Maria na vida pública de Jesus

e trab a lh a . Q u e força m agnifica a do am or! F a z que nem


a mesma m orte possa se p a ra r d u a s a lm a s... É assim o teu
am or a Jesus ... Im itas a M a ria nesta com penetração com
E le ...

2. " — C ooperação na sua obra apostólica. — M esm


desde o seu retiro de N a za ré , M a ria cooperou e m uito acti
vam ente no ap o sto lad o de Jesus. — E n q u an to E le p reg av a,
tra b a lh a v a c c am in h a v a ..., M a ria o r a v a ..., su p licav a e
so fria ... c com a sua o ra çã o e m ortificação continua, q u a n ­
tas conversões não conseguiria das alm as que escutavam a
seu F ilh o ! ... Se p o r sua intercessão c onverteu a á g u a em
vinho, não seriam tam bém feitos p o r sua intercessão m uitos
dos seus m ila g res... m uitas das su as conversões?
É certo que Jesus não necessitav a das orações de sua
M ãe p a ra fazer fru tificar a su a p re g a ç ã o ..., m as quis a sso ­
ciar a Santíssim a V irgem e valer-se das suas o raçõ es, p a ra
ensinar-nos que a vida a ctiv a deve ir aco m p an h ad a d a con­
tem p la tiv a ..., que m uitos dos frutos que conseguem o s p re ­
g adores d a v erd ad e n ã o dependem tan to d a s su as p ala v ras
com o talvez das orações de alm as ocultas, que só D eus
conh ece... Q u e belo a p o sto lad o ! — N ão p o d erás p re g ar nem
fazer m ara v ilh a s..., nem o p e ra r m ilagres, m as podes, como
M aria, m ortificar-te. no silên c io ..., o ra r..., su p lic a r..., sofrer
p elas a lm a s... e algum dia conhecerás o fruto desse m agní­
fico apostolado. — Te.m a M a ria como o teu m odelo. Sob
este aspecto bem pode se r cham ada R ainha dos A póstolos.

3. " —• C onsolações e dissabores. — T o d a esta p a rte d


v id a de M aria está cheia de consolações e de dissab o res...
A final de contas essa é a vida do homem: um conjunto de
penas e de alegrias, de lágrim as e de sorrisos, m ais de
lágrim as do que de a le g ria s ..,; assim foi com M a r ia .—
Q u a is n ã o seriam as su as consolações quando o uvisse os
prodígios que N o sso S enhor o b ra v a ... quando E la mesma
M arta na vida pública de JesXis 217

visse as m ultidões a se g u i-lo ..., e sc u tá -lo ... a c la m á -lo ...; ao


conhecer os apóstolos e discípulos que o a co m p an h a v a m ...,
ao te r noticias dos seus triunfos sobre as alm as c o n v erten ­
d o -a s..., dos escribas c fariseus, confundindo-os, etc.
E qual n ã o se ria ainda a sua consolação ao ouvir-lhe
E la m esm a algum serm ão p o rte n to s o !... E que p ra z e r não
sentiria a Santíssim a V irgem q u ando Jesus c ansado do seu
trab a lh o se re tira v a de q uando em q u ando à sua casin h a de
N a z a ré p a ra d e s c a n s a r! E la mesma lhe lim paria o suor do
ro sto ..., lhe se rv iria a com ida p o r suas p ró p rias m ãos p re ­
p a ra d a ... a sós teriam as suas conversas intim as repassadas
de am or puríssim o m as intensíssim o. — Q u e feliz se sentiria
M a ria com aquele F ilh o ! ...
M as, a i ! quais não seriam as su as a m a rg u ra s e os seus
sobressaltos, q u a n d o soubesse d a inveja, d a ra iv a dos seus
inim igos... da perfídia nas suas p e rg u n ta s... com o o v ig ia ­
vam c espiavam sem c e s sa r..., quando o quiseram lançar
do alto de um p re cip íc io ..., quando a g a rra ra m em pedras
p a ra a p e d re já -lo !... C om o sofreria a o conhecer a dureza
daqueles c o raç õ es... a m alícia que e n c e rra v a m ..., a própria
rudeza dos A póstolos e discípulos que não acabavam de
c o n h ec e-lo !...

4." — A vontade de D eus. — A vida de M aria cm


N a z a ré foi finalm ente um a vida de cum prim ento exacto desta
vontade. — Sem isto não há san tid ad e. — R ecorda as duas
vezes que Jesus fala de sua M ãe na vida p ú b lic a ... U m a
quando lhe dizem que sua M ãe o cham a e responde: Q uem
c m inha m ãe? Q u e m [az a vo n ta d e d e m eu P ai é que é
m inha m ã e ..., m eus irmãos e m eus parentes. O u tra quando
um a m ulher lhe diz: B em -aventurado o seio que te tro u x e ....
e E le responde: M a is bem -aventurado è quem o u v e a pala
vra de D eus e a segue. A prende esta lição. — Isto c a única
coisa que vale p a ra D e u s; sua p ró p ria M ãe n ada valeria
para E le se não fosse sa n ta ... N ã o b a sta v a que E la o tivesse
218 Maria na vicia pública cie Jesus

trazido no se io ..., nem que lhe tivesse dado o se r que


tin h a ...; era necessário que se distinguisse «no cum prim ento
exacto d a v o n tad e de D e u s» ; p o r isso é que E la é g ra n d e ....
d ito s a ..., bem -av en tu rad a.
Isto significam estas p a la v r a s ...; isto te ensinam a ti.
— N ã o p oderás im itar a M a ria em ser M ãe de D e u s....
mas p o d e rás im itá-la em se g u ir fielm ente a v o n tad e divina.
— Pede-lhe esta graça: luz p a ra conhecer sem pre a vontade
de D eus e n ã o a tua. e força para segui-la sem v a c ila r...
6 !. Maria e a Paixão Prelúdios da Paixão

1.* — hora. C hegou a hora m arcad a pelo P ai para


consum ar o sacrifício, e o Filho obediente nem um m om ento
sequer a a tra sa . — N ã o ig n o rav a o que significava a ch e ­
g ada desta h ora e longe de fugir cobardem ente, com im ensa
alegria ao mesmo tem po que com p ro fu n d a pena. atira-se
ao sofrim ento todo d a P a ix ão . — E o prim eiro p asso que dá
e o despedir-se de sua M ãe. Im possível p in ta r ou im aginar
esta cena.
Jesus cham ou a p a rte a Santíssim a V irgem e com eçou
.1 expor-lhe a v o n tad e de seu P a i... E sc u ta estas p a la v ra s ....
adivinha as razões que lhe da ria para ex p licar a sua decisão
de ir p a ra a m orte e p a ra tra ta r de consolar o seu coração
lerido. — O Pai assim o h av ia d e c re ta d o .... era necessário
para satisfazer a justiça d iv in a ..., p a ra rem ir o m undo __
p a ra d estruir o im pério do p e ca d o ... Q u e conceito form aria
do pecado a S antíssim a V irgem , quando com preendeu que
tanto ia cu star o ap ag á -lo !
P enetra .muito nesta ra zã o que é a cau sa de tu d o ...
Q u e será o p e cad o ?! C om o irrita rá o coração de D eus que
só se aplaca com o sacrificio d e seu p róprio F ilho! E . j.i
pura preveni-la. já p a ra que E la tom asse desde então como
seus os sofrim entos que ia a p a d e c e r... dar-lhe-ia conta
porm enorizada de toda a P a ix ã o .... d a sua prisão no
h o rto .... da traiçã o de Ju d a s.... das injustiças dos tribu-
220 M aria e a P aixão

n a is ..., das cenas do P re tó rio ... Im pressionado co n tar-lhe-ia


o torm ento horrível d a fla g e la ç ã o .... o d a coroação de e sp i­
n h o s..., o do cam inho do C a lv á rio c arre g ad o com a c ru z —
o da c ru cificação ... e enfim , com o depois de três h o ra s de
espantosa agonia, nela h a v ia de m orrer e sc arn e cid o ..., insul­
tado a té aos seus últim os m om entos... Q u a n ta s horas a m a r­
gas n ã o teve Jesus que p a ssa r na sua P aix ão ! m as esta não
foi um a das m enores... Q u a n to teria que so fre r p o r ser
E le o verdugo que assim d ilacerav a o c oração de su a M ãe
crav an d o -lh e cada vez m ais com cada p a la v ra sua, a espada
de d o r...

2." — A Santissi]na Virgtzm. — E de facto, qual não


seria a d o r de M a ria quando ouv iu tudo o que seu Filho
lhe d is s e ! —• N atu ralm en te estrem eceria a cada novo to r­
m ento que o u v ia ter ele de so fre r... C om o h a v ia E la de o
p e rm itir? !... Com o o h a v ia de suportar? ! ... P o rq u e não
m orrer a n te s ? ! ... C om o c que o P a d re E te rn o n ã o lhe faz a
E la o benefício que fez a S. José, levando-o deste m undo
antes de p resenciar estas cenas?
M as ao mesmo tem po que sentia estes afectos n a turais,
sentiria que essa era tam bém a v ontade de D e u s... e ficando
por cim a este afecto so b re n atu ra l, não só adm itiria resignada
tudo o que seu F ilh e lhe oferecia de d o r e de sacrifício ...
m as ain d a contente e gozosa ab raç ar-se-ia já desde este
m om ento com seu F ilho cheio de dores e q u e b ran tad o p a ra
segui-lo até à m o rte... Q u e d o r tã o intensa a deste coração
de M ãe 1 M as ain d a adm ira m ais a fortaleza c v a lo r com
que se a tira a sofrer, à im itação de seu Filho.
Pensa, pensa m uito n i s t o ...; diante deste exem plo m edita
nas tuas c obardias em frente de qualquer sofrim ento que
se te a p re se n ta ..., e n v e rg o n h a -tc ..., pede p e rd ã o ... pede
g ra ça p a ra te m odificares e teres grande g e n ero sid ad e... e
p articip ares desta fortaleza d a M ã e e do F ilh o ...
M acia e a P aixão 221

3. “ —-A bênção.-— D epois, Jesus pede d e joelhos a sua


M ãe a bênção p a ra ir sofrer. C o n sid era as circunstâncias
que fazem m ais penosa a se p a ra ç ão de dois corações e
v e rás que nunca h ouve despedida sem elhante.
O am or e a união de corações eram em Jesus e M a ria
tão ex tra o rd in á rio s que não podiam ser m a is ...: c p o rtan to
com o se a rra n c ariam e despediriam um do o u tro nesta peno-
sissim a o c a s iã o ? ...
P o r o u tra p a rte a se p a ra ç ão era p a ra ir a sofrer e a
padecer. — E o cúm ulo deste sacrifício foi não só aceitar
resignada e sta d o r e quebrando, senão o consentir nela e
adm iti-la com alegria e sa tisfa ç ã o ... e p o r isso Jesus pede
que m ostre este seu beneplácito dan d o -lh e a sua b ên ção ...
C om o trem eria a m ão d a Santíssim a V irgem , de em oção,
ao lev an tá-la p a ra a b en ço ar a seu Filho p o r sa b e r que com
ela lhe d a v a licença p a ra e n treg ar-se aos torm entos e à
p ró p ria m o rte !

4. " — A tua hora. —■P e n sa em que tam bém tu terás a


tua hora. que tam bém p a ra ti ch eg ará a hora do sofri
m en to ..., da p ro v a ..., d a d o r..., e depois a h ora d a m orte...
Com o te p re p ara s p a ra estas h o ras decisivas d a tua v id a ? ....
e especialm ente p a ra a últim a h o ra ? ... — V iv e s realm ente
p a ra aquela hora? D esperdiças ag o ra as que o S enhor te dá
p a ra ,santificar-te ain d a que seja á custa de sa c rifício s? ...
É s cobarde e foges deles?
O lh a p a ra Jesus e p a ra M aria e aprende deles o cam i­
nho do sacrifício e da m ortificação. — N ã o esqueças o p o r­
m enor de Jesus ao p ed ir a bênção a sua M ã e .— E le quer
que tu tam bém p eças a bênção e o beneplácito a quem deves,
p a ra n ã o fazer nunca, nem sequer no sacrifício, a tua p ró ­
pria von tad e. Q u a n ta s vezes não será isso a m aior m orti­
fic a ç ã o !... a que talvez .mais te hum ilde... a que m ais te
c u ste... e p o rtan to a que Jesus mais te pede e a que mais
deseja de t i ! ...
62. Maria c a Eucaristia

N ã o sabem os que parte tom ou M a ria na instituição da


E u ca ristia , nem sc esteve no C en ácu lo aquela noite, nem se
com ungou o u não com os A p ó sto lo s; a p esar disso sã o m uito
íntim as as relações que existem entre M a ria e a E u caristia.

1 ." — O dum de M aria. — A E u ca ristia é o dom de


M a ria p o r excelência. — O hom em tem necessidade absoluta
de D eus.— P o r instinto n a tu ra l busca a D eus e q u a n d o o
não encontra fabrica-o p o r suas mãos, como fazem os
pagãos, ccrn os seus íd o lo s... D eus concedeu-nos a nós a
g ra ça de satisfazerm os esta n ecessid ad e..., prim eiro p o r meio
da In c arn a çã o e depois pela E u ca ristia .
D eus b aixou do céu à te rra p a ra fazer-se com o um de
nós, p a ra assim o poderm os ver, conhecer e a m a r... M as
isto p areceu-lbe ainda p o u c o ... E le queria m ais e p o r isso
quis hum ilhar-se até ao ponto de o poderm os to c a r... com er...
e alim entar-nos d E le ... e isto n ã o uns d ias... nem um certo
tem po, m as sem pre. — P ela In c arn a çã o tom ou um corpo
hum ano e v iv e u en tre os hom ens, m as p o r pouquíssim o
tem po. — Só viv eu na P alestina e só uns trin ta e três a n o s...
M as que e ra isto p a ra toda a h u m an id a d e? ...
P o r isso inventou um m odo de e star com todos e
cad a um realm ente presente, intim am ente u n id o .... com. a
união m ais perfeita que existe que c a do alim ento p o r meio
M aria e a Eucaristia 223

do qual Ele se faz um a só coisa c o n n o sco ... e isto para


sem p re... a té ao fim dos séculos. — P o rta n to a E ucaristi i
é um a In c a rn a rã o c o n tin u a d a ... é a a p licação p rá tic a da
In c arn a çã o a_ todos e a c a d a um dos h o m en s..., é o modo
que D eus tem de satisfazer a necessidade que todos tem os
d 'E le.
A g o ra p e rg u n ta a ti m esmo: E esse dom da Incarnação,
quem no-lo d e u ? ... O E te rn o P ai, m as por meio de M a ria ...
Jesus incarnou e nasceu p o r meio de M a ria ... E la foi a que
deu a o m undo a Je su s... P o rta n to se a E u c a ris tia é a
co n tin u ação da Incarn ação , está claro que é a continuação
do dom de M aria. — E la continua d a n do-nos diariam ente
a Jesus como um d ia no-lo deu no presépio de Belém. —
A d ão perdeu-nos p o r com er o fruto que E v a lhe deu:
«a m ulher que me deste p o r com panheira ofereceu-m e o
fru to e eu com i»... Assim pecou A dão. N ó s podem os dizer
o m esmo: «S enhor a m ulher que nos destes com o M ãe
deu-nos e está dando-nos o bendito fruto do seu seio e
por isso viv em o s..., d E le nos alim entam os»...

2." — O Sacram ento dc M aria. — Assim se pode ch a ­


m ar à E u ca ristia . — N o s o u tro s S acram entos não tem E la
p a rte nenhum a.-—■N este tem -na e p rin c ip a l.— 'A carn e de
C risto não é senão a c arn e v irg in al de M aria, diz S. T om ás.
— Foi E la p o rtan to que nos proporcionou a m atéria divina
deste Sacram ento. — A V irgem Santíssim a com o seu Fiat
atraiu o Filho de D eus d o seio divino ao seu seio im a­
c u lad o ... O sacerdote na c o n sag ração repete um m ilagre
sem elhante e à s suas m ãos desce o m esm o F ilh o de D eus,
m as já feito Filho de M a ria. — A s p a la v ra s do sacerdote
são p o rtan to com o que um a repetição d a s dc M a ria ...
O p rodígio que elas operam é com o o prodígio e a conti­
nuação d a s m arav ilh as de N a za ré . E p o r isso se disse que
a E u ca ristia é um a c ontinuação da obra de M aria.
E sta obra consistiu em am ar e em a d o ra r ao seu Jesus
224 M aria e a Eucaristia

com o a seu Filho e a seu D eus. — Jesus fez-se m enino para


a rra sta r-n o s cam o seu e n c a n to e arnor ao am or de D eus.
— M as de facto q u antos conheceram e am aram àquele
M enino D e u s ? —'M a ria foi o m odelo d a s alm as e n am o ra ­
das de Jesus. E la am ou-o com intensidade e com que inten­
sidade ! — A g o ra n a E u ca ristia Jesus faz-se p ã o e alim ento
dos hom ens... P a ra quê? ... T am bém p a ra b u scar o nosso
am or. — A niquilou-se ao fazer-se h o m em ...; m as ain d a se
aniquila mais ao parccer-se com p ã o ... e neste aniquilam ento
pouco m ais carinho e am or tem do que o de sua. M ãe. —
Só esta com o seu am or é capaz de com pensá-lo desta
hum ilhação e an iq u ilam en to .—'A o am ar a Jesus n a E u c a ­
ristia pensa que estás continuando a o b ra de am or que
M a ria com eçou em B elém ... A g o ra, com o e n tão , a m aior
p a rte dos hom ens não o conhecem ... nem o a m a m ... nem
lhe agradecem tudo o que ele faz p o r eles. A g o ra , como
então, faltam aqueles que supram essa in g ra tid ã o ... essa
enorm e falta de a m o r.—'E n tã o foi M a ria que a su p riu ...,
ag o ra deves ser tu com E la e à im itação d 'E la que a deves
su p rir...

3." — A consolação d e M aria. — Q u e tristeza não pro


d u z iria tudo isto no c o ração d e M a ria S a n tís sim a !... quando
E la visse aquele M enino encan tad o r, desconhecido de uns
e d esprezado de o u tro s ... e a té perseguido no próprio
b e rç o ... quando ela visse em seu Filho o F ilho de D e u s...
que sofrim ento não seria o seu ao v ê-lo assim tão escon­
dido que ninguém lhe d a v a o culto de a d o raç ão que merecia?
Ê evid en te que Jesus nem na sua v id a p riv a d a ... nem
na su a vida p ú b lic a ... e m enos ainda na sua P a ix ã o e m orte
recebeu as h o n ra s divinas a que tinha d ire ito ... e a S a n ­
tíssim a V irgem teria nisso um v erd ad eiro torm ento. —• Pois
bem, a E u ca ristia é que pode consolar a Santíssim a V ir­
g e m ..., aqui pode Jesus s e r ho n rad o naquele c o rp o ...,
naquela mesma carne e sangue que tom ou de M a ria ...;
M a ria e a E ucaristia 225

a g o ra a Santíssim a V irgem já fica satisfeita e consolada


q uando vê as alm as aproxim arem -se p a ra h o n ra r... a d o ra r
e am ar a H ó stia sa c ro ssa n ta dos nossos altares. — N ã o
q u e rerá s d a r esta consolação a tu a M ãe e a o m esm o tem po
esta ho n ra d ev id a a Je su s? ... Julgas que n a tu a vida eu ca­
rístic a assim fazes? ... E stá s contente com a tu a vida e u c a ­
rística? ...

4 .“ —■A C om unhão d e M aria. — Se n ã o é certo que


M a ria com ungou no d ia d a últim a ceia, n ã o se pode d u v id ar
de que pelo m enos depois, m uitas vezes, com ungasse das
m ãos de S. João. — O A p ó sto lo virgem dando a com unhão
à V irgem das V irg e n s !... Q u e espectáculo m ais su b lim e !...
Q u e C o m u n h ã o !... C om que p ra ze r e n tra ria Jesus n a alm a
de M a r ia ! ... Q u e bem se e n co n traria a l i ! _S e já antes
escolhera seu puríssim o seio p a ra nele in c a rn a r..., com o
n ã o escolheria a g o ra o seu c o ração p a ra m o rar nele? •—
E a Santíssim a V irgem , com o se p re p a ra ria ? ... Q u e acção
de g ra ç a s !... Se um S. L uis G o n z ag a p a ssa v a toda a sem ana
a p e n sa r n a com unhão e em p reg av a três dias em p re p a ­
ra r-se e o u tro s três em d a r acção de g ra ç a s... que não faria
a Santíssim a V irg em ? Im ita-a no seu fe rv o r..., com unga tu
ta m b é m —■com M a ria e com o M a ria. P a ssa assim a tua
v id a m etido em cheio n a Santíssim a E u c a ristia ...

15
63. M aria c a agonia no Horto

l.° — A cam inho cio M o n te O liv e te . — Jesus term inou


já o s m istérios sacro ssan to s e inefáveis do C enáculo. —
D e n tro de p ouco aproxim a-se a h o ra ; e, va le n te e decidido,
sai em direcção a G etsem ani. — Bem sabe que n ã o v o lta rá
m ais. — P o d e c o n ta r as h o ras que lhe restam de liberdade.
— É questão de poucos m om entos: está p a ra com eçar o
d ram a sangrento. — E po rq u e sabe isso m uito bem, sofre
am a rg u ras indizíveis no seu coração. — T riste, m uito triste
está a m inha alma a té à m o rte ... e ra zã o tinha p a ra esta
im ensa triste z a ... V ia o s judeus tratan d o da sua venda,
com o se tratasse de um a coisa vil e d e sp re z ív e l...; v ia em
especial a Judas levando a té ao fim a su a tra iç ã o ...; via
tudo o que o esp e ra v a c, ainda que era D e u s..., e ra também
hom em e p o r isso sofria a m arg u ras indescritíveis no seu
am oroso e terno coração.
T am bém as sofre M a ria . — Sua M ãe acom panha-o em
espírito e p a rticip a dos seus sofrim entos... dos seus tre ­
m o res..., das suas a m a rg u ra s ...; p rovavelm ente teve re v e ­
lação do que Judas tra m a v a ..., provavelm ente tev e conhe­
cim ento de como estavam decididos a d a r naquela mesma
noite o golpe d ecisiv o ... e o seu coração despedaçava-se
de dor, ao saber e contem plar cad a um a destas coisas. —
E s ta v a a p a rta d a de Jesus corporalm ente, m as que unida em
M aria ie a atgonia no H orto 227

e s p irito !... Q u ã o adm iravelm ente n ã o p e n e tra v a E la na


razão e na causa d a tristeza daquele divino Corac;ão!

2.° —• A oração. — C h e g ad o a o H o rto , Jesus deixa os


seus A póstolos e retira-se sozinho a um a g ru ta p a ra fazer
o ra çã o . — T o d o o peso daquela triste noite cai sobre Ele.
— C ontem pla-o p ro stra d o p o r te rra ..., caíd o e oprim ido
p o r um a c arg a que não pode su p o rta r... S ã o os pecados
de todos os h o m e n s !... S ão os teus p e c a d o s !... Q u a n to pesam
sobre J e s u s !... E produzem -lhe um a angúsia tal que redunda
em v e rd ad e ira agonia de m o rte... Q u e luta a que se tra v a
no seu c o ra ç ã o !... O lh a bem p a ra E le e p ro cu ra p e n etrar
algum a coisa ao m enos nos seus h orríveis sofrim entos.
D ep o is olha p a ra o longe, p a ra a casa de B e tâ n ia ...,
ou p a ra o p róprio C e n ác u lo ... e aí v e rás um a cena sem e­
lhante. — A S antíssim a V irgem tam bém caiu p ro stra d a em
o ra ç ã o ... o seu coração pulsa a uníssono com o de seu
F ilh o ... e não pode fazer o u tra coisa diferente do que E le
fa z ... Q u e noite m ais terrív el! Q u e longos são as suas
h o r a s ! ... N ã o é possível d o rm ir..., nem in ten tar sequer
d e sc a n sa r...: é n oite de lutas e de a g o n ia s..., é noite de
o ra ç ã o ... Q u e o ra çã o fe rv o ro sa ... te rn a ... cheia de am or
para connosco, a o ra ç ã o de M a r ia ! — N ã o pede ao E te rn o
P ai que perdoe a seu Filho, nem recusa o cálice do sofri­
m ento... pede som ente o cum prim ento d a sua v ontade, que
E la aceita ainda que seja tã o penosa. — Pede p a ra o m undo
p e rd ã o ..., pede p o r todos e p o r cada um de n ó s ...; pede
que aqueles sofrim entos de seu Filho que já com eçaram não
sejam inúteis p a ra as a lm a s..., que saibam os a p ro v eitar-n o s
da sua P aix ão e da sua m orte e das g ra n d es gra ça s que com
ela nos m ereceu...
E Jesus continua na sua a g o n ia ... o seu c o raç ão já
não su p o rta tan ta d o r... c o sangue, d a dor, ensopa-lhe
os v estid o s... o seu suor frio e a bundante d a agonia tran s-
form a-se em suor de sa n g u e ..., sangue d iv in o !... que corre
228 M arta e a agonia no H o rto

em abundância pelo seu c o rp o ..., im pregna os seus vestidos


e chega até ã terra.
C ontem pla os anjos do céu atónitos diante desta c e n a ...,
m as contem pla sobretudo a M aria. — E la tam bém v ê tu d o ...,
adiv in h a a seu F ilho c a d a v é ric o ... a p o n to d e m o rrer de dor
e de a m arg u ra, e derram an d o à força de tan ta dor o pri-
m eiro san g u e d a sua P a ix ã o ... Q u e fa ria a Santíssim a V ir­
g e m ? —' N o meio da sua d o r de M ãe, reconhece naquele
san g u e o san g u e de um D eus e corre a recolhê-lo d e v o ta ­
m en te ..., a b e ijá -lo ..., a a dorá-lo. E la é a prim eira que se
a p ro v e ita daquele d iv in o sa n g u e ... T u d o o que receb eu ...,
a su a p u reza im a c u la d a..., a plenitude d a sua g ra ç a ..., a sua
im ensa sa n tid a d e ... tudo foi em virtu d e deste sangue divino.
O s A póstolos dorm em n a o ra ç ã o ... M a ria n ã o d o rm e...,
n ã o desperdiça estes m om entos tã o p ro v e ito so s... não a b a n ­
d o n a o seu Jesus nem um instan te. — Jesus p o d e rá queixar-se
d e que na sua agonia nenhum dos seus am igos m ais predi-
lectos o acom panhou, m as n ã o p o d e rá dizer isso de M aria,
d e su a M ã e ... — Lá do seu re tiro acom panha p asso a passo
o d esen ro lar d esta c e n a ... e tom a p a rte n a a m a rg u ra de
Jesus, bebendo com E le o cálix da d o r...

3.° — Prisão. — A cabou já a o ra ç ã o e Jesus, decid id o ...


valente, g e n ero so ... cham a os A póstolos e d ian te deles, sai
à busca dos seus inim igos, n ã o p a ra fazer-lhes frente e defen­
d e r-s e ... m as sim p a ra e n tre g a r-se nas su as m ãos.
V ê a Jesus a ta d o v io le n tam en te ..., fortem ente, pelos
seu s v e rd u g o s..., penetra no seu interior e contem pla ai um
o u tro verd u g o que é o am or, atan d o -o a in d a com .maior
v io lê n c ia ...; esses sim que eram laços fo rte s !... pois E le era
v ítim a e escravo desse a m o r... Q u a n to nos a m o u !... A o v ê d o
assim a ta d o a Santíssim a V irgem , aum entaria a ansiedade
n o seu c o ra ç ã o ... Q u e ia a ser d'E le? ... Q u e iam a fazer
com o seu Jesus? ... C on tem p la-o tu tam bém assim a ta d o e
p reso p o r ti..., fixa-te be.m no que isto significa, p o r ti!...;
M aria e a agonia no H o rto 2 2 9

isto significa que não só se deixa m anietar p a ra sofrer p o r


ti..., em vez de ti... por causa de ti... m as ain d a quer dizer
que és tu tam bém que lhe atas as m ãos. — N ã o cais na
conta desta verdade?
N ã o há n a d a que tan to ate as m ãos a Jesus como a
in g ra tid ã o ..., a friez a..., a tib ie za ..., a falta de correspon­
dência às suas g ra ç a s... enfim, o p ecad o ! — C alcula, se
podes, as m uitas vezes que Jesus terá querido d a r-te g randes
g ra ç a s..., novos favores e b enefícios..., e tu com o teu p ro ­
cedim ento lhe a ta v a s as m ãos... E le queria san tificar-te e tu
não o d e ix a v a s..., punhas-lhe dificuldades. — A ta -íe pois
de pés e m ãos a E le pelo a m o r...; a ta -te com laços am o-
io s o s p a ra nunca o p e rd er e repete aquilo do L ivro dos
C an tares: E nco n trei já aquele a quem m inha alma ama,
segurã-tojei bem e não o largarei mais. Suplica à S a n tís­
sim a V irgem que assim to conceda.
64. M aria nos tormentos da Paixão

l . ° — -N a flagelação. — 'P a s s a d a a noite em o ra ç ã o ...


co n fo rtad a e alentada n e la ..., com os olhos m arejados de
lágrim as e com o sem blante de d o r... ao ser já de dia sai a
Santíssim a V irgem do seu re tiro p a ra ir à busca de seu
F ilh o .—'N ã o lhe sofre o coração assistir aos seu s sofri­
m entos de lo n g e... q uer ir com E le p a ra onde E le f o r . —
N ã o sabem os porm enores deste passo, nem quando nem
onde encontrou a seu divino F ilho. Foi já na casa de
P ila to s ? ... T alv e z ao ir o u ao v o lta r de H e ro d e s ? ... Q u a n d o
o preferiam a B a rrab á s? — F osse quando fosse, o certo é
que foi um encontro violentíssim o p a ra o seu coração. —
Já com dificuldade reconhecia a seu divino F ilh o ; parecia-
-lhe m entira que em tão poucas horas pudesse ter perdido
tanto, d esfigurado com o estav a.
A cara inchada pela ho rrív el b ofetada em casa de
A n á s... e pelos golpes que d u ra n te a noite lhe deu a sol­
dadesca. não d eixava en tre v er a beleza divina do m ais belo
dos filhos dos homens.
E estava-se ainda no c o m e ç o ...; os torm entos horríveis
e b á rb aro s com eçaram na flagelação. — C onsta p o r re v ela ­
ções particulares, p o r exem plo a S anta B rígida, que a S a n ­
tíssim a V irgem assistiu pessoalm ente a este torm ento.
P á ra e d em ora-te a considerar o que esta cena disser ao
teu c o ra ç ã o ... e untes de tudo p e rg u n ta -te a ti m esmo: que
sentiria a Santíssim a V irg em quando ouv iu a sentença dos
M aria nos torm entos cia P aixão 231

a ç o ite s? ... q u ando v iu os p re p ara tiv o s p a ra executá-la im e­


diatam ente e quando ouviu os grites selvagens daqueles
carrascos a anim arem -se uns aos o u tro s... e fazerem apostas
sobre quem o h av ia de a ço ita r m elhor e m ais bàrbaram ente?
C oloca-te junto da Santíssim a V irg e m ...; v ê -a in ten sa­
m ente p á lid a ..., co,m o c o raç ão a q uerer sa lta r d o peito pela
violência com que p u lsa ..., a p artan d o os olhos p a ra não
v e r a q u ilo ... e abrindo-os sem conseguir d e ix a r de o lh ar
p a ra o que tan to a in te re ssa v a ... p a ra aquele em que se
c o n ce n tra v a to d a a sua vida.
E de facto vê tra z e r no m eio de em purrões e m aus
trato s a seu d ivino F ilh o e com violência e desvergonh a
inauditas com eçarem a despi-lo. — N u n c a ch eg arás a com ­
preender o que se p a sso u então n o c o ração de M a ria. —
S eria necessário que soubesses o que e ra p a ra E la a m odés­
tia e a p u re z a ... p a ra que pudesses vislu m b rar algum a coisa
do que sentiu ao v e r a seu Filho nu diante d aquela m ulti­
d ã o ... e se por cim a de tudo, ao v ê-lo assim , o insultaram ,
se riram e troçaram d 'E le ... e acom panharam tudo com c h a ­
laças grosseiras e so ezes... im agina o que sentiria a S a n ­
tíssim a V irgem e com o aum entaria a su a do r!
Já está a ta d o à c o lu n a ... e os verdugos de cada la d o ...,
a um sinal com eçam um depois do o u tro a d e sc arre g ar gol­
pes com toda a foiça. — Jesus estrem ece..., a p erta os seus
lábios p a ra não so ltar gritos de d o r..., lev a n ta os seus
olhos ao céu com um o lh a r de indizível sofrim en to ... e M aria
vê tu d o ... e já não pode mais.
Segundo as revelações, aos prim eiros golpes, caiu des­
m aiada sem se n tid o s... A proxim a-te d E l a .. ., am p a ra-a nos
teus braços, m as ao mesmo tem po não deixes de o lh ar p a ra
Jesus e adm ira-te de n ã o desm aiares tu tam bém e de não
m orreres de p ena ao veres isto. —• Já realizaram a sua tare fa
h orrível d o is... q u a tro ... seis v e rd u g o s ...; já se cansaram
de aço itar a Jesu s..., já o seu corpo é um a chaga h orrorosa
v c o n tín u a ... já se vêem os o sso s... O lha, olha bem p a ra esse
232 M arin nos torm entos d a P aixão

co rp o desfeito e p ensa: porquê?... e por quem está assim


Jesus?
R eco rd a os pecados de im pureza e p e rg u n ta -te a ti
m esm o: quem m erecia este castigo? ... sobre quem devia te r
d escarreg ad o e sta e sp a n to sa e duríssim a disciplina?

2.° —• C oroação d e espinhos. — Jesus p ro c u ra de sc an sa r


e to rn ar algum alento, m as... n ã o era d ia de d escanso e
tinha que sofrer ainda m uito m ais. O in fern o inspira
àqueles soldados a farsa d a sua coroação. — O u v e as g a r ­
g a lh a d as com que é a p la u d id a a ideia, e vê com o todos se
apressam a pô-la em p rá tic a ... U.m traz um ped aço de p ú r­
p u ra su jo e e sfa rra p a d o ..., o u tro p re p a ra o c ep tro de c a n a ...,
os o u tro s tecem a c o ro a ... e o u tra vez despem a Jesus.
C ontem pla-o sentado n aquela p e d ra ..., com o trap o
de p ú rp u ra sobre os om bros e a cana nas m ãos. — C hegou
o m om ento de c o ro á-lo ... C om b rincadeiras e ch alaças infer­
nais. colocam -lhe com g randes cerim ónias a coroa n a cab e ça ...
e depois ap ertam -n a fortem ente e dão-lhe com paus na
c ab e ça ... O que seria a q u ilo !... Jesus instintivam ente fecha
e a p erta os olhos e deles bro tam lágrim as m isturadas com o
san g u e que p o r toda a cara e cabeça co rre com grande
a b u n d â n c ia ... É possível im aginar torm ento m ais atroz?
A g o ra contem pla a sacríleg a com édia que fazem com
E le ...: e stá coroado de R ei... T em que se lhe p re sta r hom e­
n a g em ... e dobram os seus joelhos d ian te de Jesus e uns
lhe dão um a b o fe ta d a ..., o u tro s lhe cospem n a c a ra ... este
puxa-lhe pelo m anto e lhe diz um g racejo a sq u e ro so ...,
aquele enfim tira-lhe a c a n a e lhe dá com ela na c ab e ça ...
A ssistiria a Santíssim a V irg em a esta c e n a ? ... T ev e , pelo
m enos, conhecim ento do que se e stav a fazendo com le s u s? ...
C om o tin h a c o raç ão p a ra so fre r estas c o isa s? ... Foi sem
d ú v id a um m ilagre que não m orresse de dor.
Pelo m enos deve ter presenciado a cena do E cc e hom o.
— A ssiste tu a ela com a Santíssim a V irgem . — Im agina
M aria nos torm entos da P aixão 233

como se ria ..., o que se p assaria naquela p ra ç a à v ista de


Jesus... e ouve a g rita ria d a m ultidão que o pede p a ra a
m o rte .—■F a la com Santíssim a V irg e m ... Q u e lhe dizes
tu ? ...

3." — A condenação. — E efectivam cnte P ilato s acede


a estes pedidos c gritos e condena-o à m orte. — A m ultidão
ouve a sentença e a p la u d e ... M a ria o u v e -a ..., tu ouve-la
tam b ém ... e que fa z e s? ... Jesus c ondenado a m orrer! —
E le m orre e tu podes viver? ... C om o receberiam Jesus e
M a ria esta se n te n ç a ? ... Com o a recebes tu, sabendo que
dela depende a tua sa lv a ç ã o ? ... Q u e sentim entos de g ra tid ão
c de im ensa alegria, e ao m esmo tem po de p rofunda dor,
devem encher o teu c o ra ç ã o !
O lh a p a ra Jesus que sem p o d e r ter-se em pé faz um
esforço su p rem o ... e lança-se com avidez a o encontro d a
cruz que lhe trazem os verdugos. — V ê bem com o se a b raç a
a ela, com o se fosse um a coisa m uito desejada e querida.
— N ã o quer não, que ninguém lha leve e E le mesmo a
carre g a sobre os seus om bros... Q u e generosidade, que am or
o seu tão v e rd a d e iro !... E sc u ta o q u e ,a Santíssim a V irgem
te quer d ize r... po rq u e ela fala-te com c ertez a ; ouve pois
bem o que E la te diz; que reconheças p o r teu Rei a Jesu s...,
que ele seja o único que reine no teu c o ra ç ã o .... que nin­
guém. nem tu mesmo, ocupe o lu g ar que só a E le co rres­
p o n d e ...; que tenhas generosidade no sa c rifício .... que não
Mj aceites m as busques e am es a c ru z ..., pois que só ela
será a tua fe lic id a d e ...; que a leves com constância e
nlé ao fim ... que E la te a ju d a rá. — D iz-te finalm ente que
vejas o que é o pecado e que rep ares os teus com a peni­
tencia c com o fervor ao m esmo tem po que d e sa g ra v a s a
Irsus pelos pecados de todo o m undo. — Q u e a tua alm a
não seja c o b a rd e ..., in g ra ta ..., infiel, perante um am or
to m o o de Je su s... O u v e s b e m ? ... C om preendes b e m ? ...
I' que lhe re sp o n d e s? ...
65. Na Rua da Amargura

l . ° —1JitMs com a cru z às costas. — Jesus to rn a de


n o v o a tom ar os seus vestidos, deixa a p ú rp u ra e a cana
m as não a c o r o a .—-Ê Rei e com o Rei v ai a m o rrer; por
isso a sua coroa n ã o lhe cai da cabeça. — Já tom ou a
cruz e abraçou-se com e la ..., e o cortejo põe-se em m archa.
— R odeado de soldados e de v erdugos que o in sultam ...
e m altratam sem c e ssa r..., de um a m ultidão im ensa que o
m aldiz e se goza em o v e r so fre r... e de dois ladrões cri­
m inosos, assim cam inha Jesus.
C o n tem p la-o ...: essa resp iração cansada que o uves é
a d ’E le ..., não pode m a is... O regueiro de san g u e que deixa
no cam inho diz com o lev a o seu c o rp o ... todo feito uma
c h ag a pelos a ço ites... A cruz é m uito p e s a d a ...; n ã o é o
peso m aterial d e la ... m as tudo o que com ela c arreg o u sobre
si... é o peso de todos os pecados de todos os h o m e n s !...
Q u e peso mais e s p a n to s o ! ...— T am bém os teus pecados
v ã o naquela cruz oprim indo a Jesus... e não pode com esse
p e so ... Q u e adm ira, se é tão g rande!
N ã o obstante, ninguém o a liv ia ... O lh a p a ra to d o s os
lad o s e não encontra um a só pessoa que o alivie da sua
cruz. — E le olha p a ra ti a v e r o que fazes d iante deste
q u a d ro e ao sum o, enco n tra p a la v ra s b o n ita s... belos dese­
jo s ...; m as p ràticam ente. que fazes por a liv ia r o peso da
cruz de C risto? — L em bras-te disto nas tu as q u e d a s ? ...
N a R u a da A m argura 235

n a s tuas faltas freq u e n tes?... O lh a p a ra a Santíssim a V ir­


gem ; E la foi a única que não lançou o peso dos seus pecados,
que nunca teve, sobre a cruz de seu F ilho. — E la foi a
única que pode e soube conso lá-lo ..., aliviá-lo e ajudá-lo.
—'C o lo c a -te ju n to d e la ..., im ita-a e pede-lhe que te ensine
a consolar e a aliv iar a Jesus.

7." — O acom panham ento que leva N o sso Senhor.


A ) U ns são os que lhe fazem m ais pesad a a cruz: os
judeus, os fariseus, os soldados e os v erd u g o s.— T am bém
eles levam a sua c ru z ..., a cruz dos seus p e c a d o s .—■N ão
h á rem édio: o u se le v a a cruz de C risto ou a cruz de S a ta ­
nás que ê mais ignom iniosa e m ais pesada. B ) O u tro s levam
a cruz com C risto, e são o s ladrões, m as n ã o a levam por
C risto, nem por am or a C risto, m as à força, com ra iv a e
com desespero. C ) E m terceiro lugar, está o C irineu que
leva a cruz de C risto e c a rre g a co.m e la ... Q u e feli­
cidade a deste h o m e m !... N ã o a conheceu a p rin cíp io ...
e por isso tam bém a não aceita v o lu n tà riam en te ..., mas
foi-se pouco a pouco conform ando e acab o u p o r lev á-la com
gosto e alegria, e isto santificou-o. — Assim que. a cruz
ainda que seja involuntária e im posta à força, pode serv ir
p a ra santificar-nos.
D ) O u tro grupo é o das piedosas m ulheres... E stas
acom panham a C risto, com padecem -se d E le ...; quereriam
aliviá-lo e tira r-lh e aquele peso, se pu d essem ..., m as sua
com paixão é incom pleta p o r ser sim plesm ente h u m an a ...
V êem em C risto hom em infeliz..., não vêem n ’E le a D eus
que s o fre ...; p o r isso n ã o penetram nem com preendem a
causa por que sofre. — Jesus diz-lhes: são os vossos pecados,
chorai por e le s..., assim consolar-m e-eis... e só assim .
E) P o r fim olha p a ra o g ru p o que acom panha a S a n ­
tíssim a V irgem . — E sta sim que sabe lev a r a cruz com
C risto e com o C risto ... Q u e p a rte n ã o tom a M a ria na sua
dor e na sua p e n a ! ... Q u e sofrim ento m ais sem elhante o dos
236 N a R u a d a A m argura

dois c o ra ç õ e s !... Sem elhante em tudo: na intensidade que


já n ã o pode ser m ais..., n o m otivo que são os nossos peca-
dos, que a am bos tan to afligem e tan to c u s ta m ...; no
m odo, que é p o r p uro a m o r..., divino e infinito am or que
se reflecte. tudo quanto pode ser n a M ãe.
E s c o lh e :— T en s que lev a r a c ru z ...; tens que acom ­
p a n h a r a C risto no cam inho do C a lv á rio ...; não p odes esca­
p a r-te a esta o b rig a ç ã o ...; só tens liberdade p a ra escolher
a form a e o m odo de lev a r a c ru z ... E m que grupo queres
fig u rar? — P ed e à Santíssim a V irgem que te adm ita n o seu
em com panhia daquelas s a n ta s m ulheres. — P õ e -te junto a
E la ... m uito p erto d ’E la ... e a g o ra, a so fre r..., a lev a r a
cruz que D eus te dê. — N u n c a a leves s ó ..., não conse­
guirias levá-la, porque se ria sum am ente p en o so ... A seu
lado todas as cruzes são p e q u en a s... todas as dores se
tornam suaves.

3 .° —- O encontro. — C ontem pla em silêncio este d e v o ­


tíssim o passo. — N ã o é possível exprim i-lo com p a la v ra s ...;
deixa que fale e que sinta, o m ais que puder, o teu coração.
— R e p a ra no sentim ento d aquela M ãe que anela p o r a p ro ­
xim ar-se de seu F ilh o ..., que quer vê-lo de m ais p e rto ...,
tro c a r com E le um o lh a r..., um a p a la v ra ..., um a m anifesta­
ção d e afecto e carinho m aternal. — E , no meio d a ru a da
A m arg u ra, sai-lhe ao e n c o n tro ..., estende-lhe os b ra ç o s...
quereria a rra n c á-lo dali, se fosse possível, e levá-lo consigo.
— Jesus lev a n ta os olhos e v ê a sua M ã e ...; os dois olhares
en co n trara m -se... Q u a n ta s coisas se não diriam nesses o lh a ­
r e s ! ... Q u e bem se entenderiam ! O s corações com pene­
trara m -se e cad a um aum entou m ais a sua d o r com a dor
do outro. •— Be,m o sabia M a ria e c ontudo não foge ao
encontro. — T a lv e z não julgasse v e r tã o d e sfigurado o seu
d ivino F ilh o ... Q u ã o grande não seria a su a dor ao con­
tem plar aquele rosto divino tão asquerosam ente tratad o
N a R u a da A m argur, 237

e tã o horrivelm ente desfigurado. Só E la com o seu o lh a r de


M ã e o pôde reconhecer. A prende a g enerosidade p e ran te o
fa cto de v e r a M a ria sa ir ao encontro de Jesus, que tan ta
d o r lhe h a v ia de cau sar. — N ã o h e site s..., n ã o v a c ile s...,
sai generosam ente ao enco n tro d a d o r..., do sofrim en to ...
que aí te espera Je su s..., a í e n co n trarás certam ente a Jesus.
66. No Calvário — A Crucifixão

I." — P reparativos da C rucifixão. — C ontem pla a che­


g a d a a o C álvário. — E sg o ta d o ..., pálido, e n san g u en ­
ta d o ..., Jesus chegou sem v id a depois da sua dolorosíssim a
V ia -S a c ra , na qual oprim ido de dor e de cansaço v á ria s
vezes caiu p o r te rra .— T am bém chegaram os v erdugos que
sem p e rd er tem po com eçam a p re p a ra r o necessário p a ra
a crucifixão de C risto ; e depois, os ladrões. — R epara
sob retu d o na su a querida M ãe. — E la tam bém subiu ao
cimo do C a lv á rio !... S abe m uito bem o que a e sp e ra ;
m as, valente e decidida ab raça-se com tudo. — A cena de
justiçar a uin homem, p o r m ais crim inoso que seja, é sem pre
um a coisa horrivelm ente im p ressio n an te... Q u e seria no
c o raç ão d a Santíssim a V irgem que era ao mesmo tem po
a sua M ã e ! ... — N ã o te a p artes d ’E la ...; deixa a im ensa
m ultidão que p o r ódio o u p o r curiosidade tam bém sobe ao
C a lv á rio ...: m uito p e rto da Santíssim a V irgem , p a ra que
escutes to d as as pulsações do seu coração, assiste a éste
espectáculo.
O s v erdugos despojam b rutalm ente a Jesus de todos os
seus v e stid o s..., renovam as su as feridas que um a vez mais
m anam san g u e e.m ab undância e fica assim despido à v ista
de toda a g e n te ... Q u e v e rg o n h a p a ra J e s u s !... O u v e as
risa d as e as grosserias com que os soldados e os verdugos
c ainda o seu mesmo povo o saudariam ao vê-lo assim. —
N o Calvário 239

C om o e scu taria tudo isto a Santíssim a Virgem,? — Q u e p a s ­


sa ria pelo seu puríssim o c o raç ão ao v e r deste m odo ao seu
Jesus?
A seguir o seu c orpo é rep u x ad o com violência sobre a
c ru z ...; ag arra n d o -lh e com força um a das m ãos, d escarreg am
nela a prim eira m a rte la d a ... O lh a p a ra o estrem ecim ento do
corpo d e C risto ao se n tir um a d o r tã o a tr o z ...; olha p a ra os
seus lábios, que se a p ertam p a ra conter o gem ido que deles
se e s c a p a ...; os seus olhos que n ã o podem conter as lá g ri­
mas, elevam -se ao c é u ...; olha p a ra seu P a i e o seu p e n sa ­
m ento dirige-se p a ra ti e diz-te: « P o r ti!» . D epois, o u tra e
o u tra m a rte la d a ... e assim p o r d ian te até que c rav a m as
duas m ãos e os dois pés à c ru z ... N ã o vês o coração da
Santíssim a V irgem com pletam ente tre s p a s sa d o ? ... T o d o s os
golpes cairara igualm ente sobre E la ...; n ã o o u v iu as m a r­
teladas, sen tiu -as do m esm o m odo que seu F ilh o ... T am bém
E la estrem ecia, tam bém o lh a v a p a ra o c é u ..., tam bém p e n ­
s a v a em ti... E tu, em quê e em quem pensas? ... Q u e sen­
tes? ... Q u e d iz e s? ... Q u e fazes ao v e r assim a Jesus e a
M a ria ? ...

2.° — N a cruz. — Já pregado, é lev ad o o u a rra sta d o


lia cruz a té à c o v a onde se há-de lev a n tar. — L evantam a
cruz e d eixam -na c a ir chocando violentam ente. — A d o r
de Jesus é in d iz ív e l...; ag o ra é todo o peso do seu corpo
que pende dos crav o s, m as o choque da cruz, ao c air na
cova, ainda a to rn o u m aior. — Jesus estrem ece convulsi-
vam cnte e o san g u e co rre p o r to d a a cruz a to rren tes...
Nem um só m ovim ento p a ssa despercebido a sua M ã e ...
nem um a só d o r de seu F ilho se lhe e sc a p a ... T u d o v ê ...
tudo com preende... tudo, com o seu F ilho, sofre em, silêncio.
U m a vez m ais com M a ria e ju n to a M a ria contem pla
ente q u a d ro .., E is aí o teu R ei! suspendido entre o céu e a
te rra ... cru cificado com o um crim inoso entre dois d e le s...,
nbundonado d o seu m esm o p o v o que se goza em vê-lo
240 A C rucifixão

so fre r... O lh a bem p a ra E le. — D iz à S antíssim a V irgem


q u e to m ostre p a ra que sa ib as contem plar a C risto cruci­
ficado. C ontem pla aquela fronte divina que se inclina sob
a d o r in suportável da c oroa de esp in h o s..., aqueles olhos
ceg o s pelo sangue que os in u n d a ..., aquele p e ito que se
le v a n ta oprim ido pela fadiga que o a fo g a ..., aquele corpo
to d o d e sc o n ju n tad o ..., d o lo rid o ... aquelas m ãos e pés m a­
n an d o rios de sa n g u e ... O lh a bem p a ra E le. — Ê Jesus.
O teu J e s u s !... O teu R e i! ... O teu e sp o so ! O teu S a lv a d o r!

3.° — O s insultos. — E contudo p arece que n ã o houve


ninguém dos que rodeavam a Jesus, que não presenciasse
este espectáculo sem um a alegria e gozo satânicos, que se
ex teriorizaram nos m ais h orrendos e inconcebíveis insu lto s...
Q u e m ais queriam, os seus inim igos? — H a v iam triunfado
p o r com pleto... T in h a a Jesus na cruz a pon to de e x p ira r...
e c ontudo querem a p ro v e ita r aqueles m om entos de agonia
p a ra o fazer so frer ainda m a is..., até à ú ltim a..., insultando-o
sem c e ssa r... Q u e tiran ia a da p a ix ã o quando e scrav iza o
c o ração do h o m e m !... N u n c a se sa tis fa z ..., sem pre exige
m a is..., ainda que seja brutal, inum ana, com pletam ente irra ­
c io n a l...; as paixões n ã o têm e ntranhas.
A ssim foi aquela m u ltid ão ..., aqueles ju d eu s..., aqueles
sacerd o tes a p aixonados c o n tra C risto . — N ã o lhe perdoam
nem m esmo na sua agonia, e cevam -se nele com os m ais
grosseiros insultos... troçam dele com o p ro feta, que h a v ia
dito que d e stru iria o tem plo e que em três dias o e d ific a ria ...;
com o Filho de D eus, já que assim se tinha c h a m a d o ...;
com o M essias e Rei, que tiv e ra poder p a ra s a lv a r a outros,
m as não a si m esm o..., e acrescentavam ; «Se desceres da
cruz crerem os em ti...» Q u ã o do lo ro sas foram p a ra Jesus
aquelas tro ças naqueles soleníssim os m om entos..., vendo
além disso a in g ratid ão e o desprezo d e D eus que elas
supunham !
E Jesus c a la v a -se ... e sofria, saboreando no seu coração
N o Calvário 2-41

a am arg u ra infinita da sua tristeza e das suas dores. —


E p a ra M a ria que seriam aqueles insultos? N ã o é possível
expressà-lo nem com preendê-lo... Q u e corage.m a su a ! —
Junto à c ru z ..., o m ais p e rto possível de seu filh o ... p e rm a ­
nece de p é S ta b a t M atcr! D ireita e im óvel, com as m ãos
cru zad as sobre o peito, com o que contendo o c o raç ão que
q u eria sa lta r de d o r... com os olhos fixos em Jesus... não
pode o lh ar p a ra o u tra p a rte ..., é m uito o que tem que ler
naquele livro do seu corpo, escrito com o seu próprio sangue.
C ontem pla a m orte que pouco a pouco se v ai a p ro ­
xim ando já d e le ..., e M a ria m ais forte do que a m orte não
foge senão que perm anece sem m o v er-se... S ta b a t M ater!
—■O u v e as b lasfêm ias... os insultos daqueles tigres que
não respeitam a d o r de um a m ãe que vê m orrer seu
F ilh o ...; d esejaria b radar-lhes e dizer-lhes: «Já basta, feras!
D eixai-o já ; é m eu F ilh o ..., tende p iedade d a m inha dor».
— M as cala-se ccm o Je su s ...; a foga no seu c o raç ão a
a n g ú stia ..., e ain d a que toda a n a tu re za se c o m o v a... e as
pedras se pa rta m e a te rra tre m a ... E la ali estará: Sta b a t.
— M edita isto m uito e prom ete a tu a M ãe ser fiel aos teus
d e v ere s..., não te desviares deles nunca, ain d a que sejam a
tua c ru z ... ainda que suponham p a ra ti o m aior sa c rifício ...,
q u e tam bém de ti se possa dizer: S ta b a t...

16
67. No Calvário — A terceira palavra

l . ° — M aria e a agonia d e Jesus. — V ê aquele grupo de


piedosas m ulheres que ju n to à cruz querem aco m p an h ar
Jesus até à m orte. — É sem dúv id a a m aior p ro v a dc am or
segui-lo até à C ru z ..., crucificar-se com e le ..., m orrer com
ele. — E n tre todas elas predom ina M a ria. T a lv e z que sem
ela as o u tras m ulheres se n ã o atrevessem a subir a o C a l­
v á rio ... talvez não tivessem tido coragem p a ra assistir àquela
espantosa c e n a ... M a ria com o seu exem plo c o n fo rta -as e
a n im a -a s... P orque é que tu nos teus sofrim entos n ã o olhas
p a ra M a ria p a ra a p ren d e r dela a e star ao pé d a cruz?
E n tre tan to , Jesus e ntrou n a sua últim a agonia. — P ouco
tem po lhe resta já e quer apro v eitá-lo , p a ra cum prir, como
sem pre, com toda a perfeição, todas as o brigações d o seu
ofício. É Rei e desde a cruz re p arte coroas eternas, como
o a ca b a de fazer com o bom lad rão . — É P ontífice e Sum o
S acerd o te e por isso pede pelos seus inim igos e pede e
alcança p erdão dos seus pecados. — É filho de M a ria e como
filho o lh a p o r ela não a a b an d o n a n d o n aquela hora. ■ —
É M estre e olha pelo discípulo que ali e stá ... e até pelos
outros que cobardem ente o abandonaram .
Q u e exem plo o de C r is to ! ... N esses m om entos de d o r...,
de sofrim ento in a u d ito ..., de crucifixão e de m o rte ..., quando,
já posto n a agonia, p arece que só devia lem brar-se d e si
m esm o... é quando olha p o r todos e de todos se lem bra.
N o Calvário 243

-— C o m p ara o teu egoísm o com. esta caridade tão d espren­


d id a ... Com o p rocedes tu nas tu as enferm idades, n a s tu as
d o re s..., nas tu as aflições? ... B uscas consolações, queixas-te
de que te n ã o atendem , etc.
A prende, além disso, a fidelidade à s tu as o b rig aç õ es...
N em mesmo então Jesus se dispensa de cum prir com as su as
o b rig açõ es... Q u e v e rg o n h a! Q u a n ta s vezes a m ais pequena
indisposição já c suficiente p a ra tu a b an d o n a res as tu a s ...

3.° — E is aí teu F ilho. — F oi e n tã o que Jesus, olhando


p a ra sua M ãe, disse estas p a la v ras, indicando S. Jo ão e nele
a todos nós. — P e n e tra no c o raç ão d a Santíssim a V irgem
c sente o estrem ecim ento de dor que ela sentiu ao o u v i-la s...
P obre M ãe! Q u a n d o s o f r e ! ... A quelas p a la v ra s sã o já um a
despedida. — Jesus v a i-s e ... e ... p a ra se m p re ...; p o r isso
essas p a la v ra s são um adeus suprem o a sua M ã e ... Jesus
que era a sua v id a e o seu todo v ai d e sa p a re c e r..., v a i
perdê-lo, não com o quando era m enino p a ra (ornar a encon­
trá-lo, senão p a ra sem pre n este m u n d o ... S erá d entro em
pouco um a M ãe sem filh o ...; o seu c o raç ão ficará vazio.
M a s [Jesus ddi-lhe ou tro filho: «E is aí teu filho»...
M as isto. longe de a consolar, ato rm en ta-a m ais... U m a m ãe
não quer p o r filho senão o seu filho v e rd a d e iro ..., não o
(roca p o r n ad a nem p o r nin g u ém ... M a s... m uito m enos
quando h á ta n ta diferença de um a o u tro ... João era o
discípulo fiel e am ante m as afinal era discípulo, e seu Filho
era o M e stre ... João e ra filho de Z eb ed eu e o seu Filho era
o Filho de D e u s... João não era o seu Jesus.
F inalm ente, ela v ê que com João e com o m esm o direito
que ele, lhe dão p o r filhos todos os d isc íp u lo s..., o s c o b ar­
des, os egoístas que n o m om ento suprem o fogem e deixam
mi o M e stre ..., e além disso, todos n ó s... Q u e bela
herança que Jesus lhe d e ix a !... Q u e c arg a tão p e s a d a ! ...
Q ue m aternidade tão hum ilhante! — O lha p a ra o teu c o ra ­
244 A terceira palavra

ção, com para-o com o de Jesus e com preende a d o r de


M a ria n esta troca.
N o entanto, não a rejeita.— P a ra se r M ã e de D eus
pediu-se-lhe o seu consentim ento... Jesus n ã o lhe p e rgunta
se quer o u não quer ser m ãe n o ssa ... C onhece o seu c o ra ­
ção e b a sta -lh e ... N ã o hesita em c a rre g a r sobre E la este
p e so de ser mãe de todos os pecadores. — R e p a ra n a hum il­
d a d e de M a ria repetindo co.m, im ensa dor ao p é da cruz
as p a la v ras que um dia d issera com inefável a leg ria: «Eis
aqui a e scrav a do S e n h o r... F aça-se e.m mim, segundo a
v o ssa p a la v ra » ..., e assim aceita tudo o que o S enhor lhe
m anda. — A h! Se deixássem os sem pre as m ãos livres a D eus
p a ra que dispusesse de nós à sua vontade, e aceitássem os
tudo o que E le am orosam ente nos m a n d a !... qual não seria
o nosso ad iantam ento na p e rfe iç ã o !...

4.° — E is aí a iua M ã e. — T u d o o que têm de penoso e


de doloroso as prim eiras p a la v ra s p a ra M aria, têm de doce
e de consolador as segundas. — Já tem os M ã e ... e que
M ã e ! ... e M ãe p a ra sem pre, sem que ninguém no-la possa
tirar.
D eus pôs no m undo a m ãe p a ra que seja a incarnação
m ais expressiva da sua P ro v id ê n cia... O hom em necessita
•de m ãe... A m aior d e sg raça que nos pode acontecer neste
m undo é p erder a m ãe ... Sem ela tudo é tris te ..., tudo
v a z io ..., ninguém pode substituir um a mãe.
Jesus abraçou-se na cruz com todas as penas, mesmo
com a se p a ra ç ão de sua M ãe, m as deu-ta a ti p a ra que
n u n c a te falte. — E esta bendita m ãe nunca fa lta ... C om o
isto é v e rd a d e !... sobretudo quando perdida a m ãe d a terra,
se sen te m ais a necessidade d a sua m a te rn id a d e .— 'Q u a n d o
poderem os a g rad e ce r a Jesus o que nos deu ao pé d a c ru z ? ...
Q u e generosidade a s u a ! ... A o lad rão dá-lhe um reino, a
nós. a sua p ró p ria M ã e ! ... Q u e sentiria S. João a o ou v ir
is to ’ — O C alv ário c onverteu-se num paraíso. — Q u e bem
N o Calvário 245

lhe p ag o u Jesus a sua fidelidade era am á-lo até à cruz!


Subiu ao C a lv á rio com o discíp u lo ... e desceu filho de M a ­
ria ... e irm ão de Jesu s... Com que sa tisfaç ão e n tra ria n a
posse de h eran ça tã o r i c a ! que nem no céu a tem D eus
m a io r!
E isto podes tu ap licar a ti mesmo. — A !M ãe de Dteus
é m inha mãe!, podes dizer. E com o a p a la v ra de D eus c
eficaz, faz o que diz, M a ria é na v e rd ad e a tu a m ãe, e
am a-te com um am or igual ao de Jesus. — T u tam bém deves
ser filho de M a ria a v a le r..., m as p a ra isso hás-de am á-la
como Jesus a a m a v a ... É a s s im ? — T e n s o b rigação de
p arecer-te com Jesus p a ra ser digno filho de tal m ãe ...,
p a ra ser seu irm ã o ..., pois é n a tu ra l que os irm ãos sejam
parecidos. — C o m p ara-te com Jesus... e com hum ildade e
v e rg o n h a pede-lhe p e rd ã o das vezes que não am aste a M ãe
dos d o is..., que a d eso n raste com o teu p ro c ed e r... e pede
a esta M ãe que, ain d a que algum a vez te esqueças de ser
seu filho..., E la não se esqueça de que é tua M ã e e nunca
te ab an d o n e ...
68. M aria e a morte de Jesus

l . ° — Ú ltim as palavras. A ) E ra p erto do m eio-dia


q u a n d o crucificaram Jesu s... e, não obstante, as trevas
cobriram a T e r r a ... O Sol obscureceu-se p a ra n ã o ilum inar
aquela espantosa cena do C a lv á rio ... E é en tão que Jesus,
n o m eio daquele silêncio e daquelas trevas, abre o s seus
lábios e lança este grito : «M eu D eus, m eu D eus, porque
m e ab an d o n aste?» — E sc u ta bem estas p a la v ra s ..., p rocura
que ressoem no m ais fundo do teu coração e pede à S a n ­
tíssim a V irgem , a cujo lado estás, que te faça com preender
o m isterioso significado deste abandono d e Jesus.
D em ora-te um bom p ed aç o a m editar nele e p e n sa ...
Jesus a b a n d o n a d o !... Jesus s ó ! ... Q u e deso lação a sua ao
ver-se só r.o C a lv á rio ... e no S a c rá rio ... e em tan ta s alm as
onde se lhe não liga im portância n e n h u m a !... É s tu um a
dessas? Q u e im pressão receberia a Santíssim a V irgem ao
esc u ta r esta am orosíssim a queixa de seu F ilh o ? ! — T u não
p odes queixar-te, p o r m aiores que sejam os teus sofrim entos:
nunca a tua alm a está só. — Jesus quis ser a b andonado p a ra
que tu o não fosses. — P e lo seu abandono, D e u s não te
a b an d o n a rá n u n c a ... a p e sa r das razões que teria p a ra isso
ao v e r a tua in co n stâ n cia ... as tuas caídas e re ca íd a s...,
a tua falta de am or! —'A b ra ç a -te à Santíssim a V irg em junto
à cruz, e pede-lhe p o r seu F ilho que nunca, n u n c a te aban-
M a ria e a m orte d e Jesus 247

d o n e ... nem te d e ix e ... e p rom ete-lhe nunca d eix ar Jesus


e te r grande d ev o çã o em acom panhá-lo n a s suas soledades.
B ) À m edida que passam os instantes, crescem as
dores de Jesus, m as um a h á que lhe a rra n c a um a queixa
esp ecial... N ã o se queixou na flag e la ç ão ..., nem na co ro a ­
ção de e sp in h o s... nem sequer n a m esm a c ru cifix ã o ..., e, não
o bstante isto, queixa-se d a sede. « T en h o s e d e » !... C om o
seria este to rm e n to !... e qual seria o de sua M ãe a o e sc u ta r
estas p a la v r a s ! ... N ã o á g u a m as todo o sangue d a s suas
v eias lhe teria dado, m as..., não p o d e ..., só p o r vê-lo
so fre r e so frer com E le. —• M as ainda fa ltav a mais. — E n tre
tro ça s e escárnios vom itados da bru talid ad e daqueles c a r­
rascos, atrevem -se a d a r-lh e com o alív io d a sua s e d e !!
fel e v in ag re ! ! ... E sprem e o teu c o ra ç ã o e diz com toda a
franqueza: Q u e encon tra Jesus n e le ? ... S a n g u e lim po de
egoísm o e im preqnado de p u ro a m o r? ... o u fel am argo
de ingratidões e v in ag re re p u g n an te de tib iezas... friez as...,
e in co n stân cias... etc? ...
C ) A proxim a-se o m om ento suprem o. — A Santíssim a
V irgem que n ã o cessa de fixar seu Filho, v iu n o seu rosto
os sinais d a m orte p ró x im a ...; estrem ece ao v e r que o
desenlace se a p ro x im a ... E então v ê Jesus le v a n ta r peno-
sa,mente os seus olhos pela últim a v ez e exclam ar: T u d o
está co n su m a d o ... e depois, num suprem o esforço d e energia,
grifar: P ai, nas tuas m ãos 'entrego o m eu esp írito ... Q ue
p a la v r a s ! ... Se todas as p a la v ra s de Jesus se g ra v av a m no
c o ração d e sua M ãe, com o pen etrariam estas, p o r serem
tão m agnificas e p o r serem as últim as que p ro n u n c io u ? !...
O M estre term ina o seu ensino com um a lição sublim e...
e depois fechou o livro da sua v i d a . — Q u e felicidade poder
en treg ar a alm a a D eus dizendo: «tudo está consum ado»...,
tudo o que me e n carreg aste neste m u n d o ..., tudo o que
pretendias de mi.m..., tudo o que tin h a s direito a esp e ra r
da m inha a lm a ..., tudo enfim , as m inhas o brigações to d a s ...,
ctunpri-as e consum i a m inha v id a até ao fim, no teu ser­
248 M aria e a m orte de Jesus

v iç o ..., p a ra tu a g lória! P o r que n ã o há-de ser assim, se só


assim deve ser?
T erm in a este pon to pedindo à Santíssim a V irgem te
ajude a consum ar deste m odo a v id a ..., a term in ar assim
a tua c a rre ira ..., p a ra que, n o fi.m dela, possas, sem te e n v e r-
gonhares, colocar o teu e sp írito ..., to d a a tu a alm a, nas
m ãos de D eus p o r meio de M aria.

2." — A 'morte de Jesus. — E assim, com a m ajestade e


d ignidade p ró p rias de um D eus, Jesus inclina a cabeça,
e ... m orre. — N o m esmo m om ento a te rra estrem ece... ra s-
ga-se o v é u do tem p lo ..., as p e d ras partem -se, abrem -se os
se p u lcro s... e ressuscitam m uitos p a ra d a r testem unho d a su a
d iv in d a d e ... e no meio d aquela trágica e esp an to sa com oção
da criação inteira, a Santíssim a V irgem , se re n a ... firme,
c o ra jo sa ..., não se a ssu s ta ..., não c o rre ..., n ã o fo g e ...,
a b raç a-se à cruz e d eposita nos pés de Jesus .morto o beijo
.mais p u ro ..., mais d o c e..., m ais terno, que jam ais um a m ãe
depositou no c ad á v er de seu filho.
A bism ada de dor, h a v ia seguido os passos todos da
sua a g o n ia ... e ag o ra ao v ê-lo m orrer, longe de a co b a r­
dar-se e c air oprim ida sob o peso da sua dor, lev an ta-se,
sustida pela graça, até d a r o seu consentim ento ao sacrifício
e sp a n to so ..., e ab raç an d o e beijando a cruz que tan to a
fazia sofrer, oferece ao E te rn o P ai a im olação daquela
v ítim a divina, pela sa lv aç ão d e todos o,s p e ca d o res do
M undo.
P e n e tra bem no coração dorido d aq u ela M ã e ..., a mais
aflita de todas as m ãe s... e v e rá s nele o a lta r v ivo onde
se im olou c C ordeiro divino, à força de dores e de sa c ri­
fícios e sp a n to so s... e. a p esar d e tudo, aquele c o raç ão d e s p e ­
d a ça d o está tranquilo cum prindo e,m todo o m om ento a
v o n tad e de D eus que lhe exigiu este sacrifício. — N ã o esq u e ­
ças nu n ca: ninguém se v e rá livre da C ru z ... N ã o p reten d as
v o lta r-lh e as costas, que se te fa rá ainda m ais p e sa d a ...
M aria e a m orte de Jesu : 249

A b raça-te a e la ... e qu an to m ais dolo ro sa e p esada se ja ...


b eija-a com m ais c a rin h o ... T em g enerosidade com quem a
santificou com a sua m o rte ... e m orre tu mesmo c ru ci­
ficando-te com coragem na cruz que D eus te e n v ia r..., pois
ela e só e la te sa n tific a rá ... conform e aqueles versos, que
nunca hás-de esquecer e que deves rep etir quando chegue
a ocasião:

«Sem cru z não há >glória nenhum a,


nem com cruz eterno pranto.
N ã o hà cruz que não tenha santo
nem santo sem cruz algum a» ...

3 ." — Jesus ferido no seu c o ra ç ã o .— Çesus já tinha


m orrido. — M as ali e stav a sua M ãe que p odia co n tin u ar
a sofrer por E l e . — E assim f o i .— U m dos soldados enter­
rou a lança no lado de C risto, p a ra certificar-se m ais da
Ntia m orte... e o golpe foi tão forte que atra v esso u o seu
coração. — A quele golpe já não a torm entou o F ilh o ; m as
quanto não fez so fre r a M ãe ao sentir no seu coração que
.1 lança o a tra v e s sa v a juntam ente com o de J e s u s !... Com
que am or recolheria ela aquele s a n g u e !... o d o coração de
seu F ilho! ! ... o últim o que lhe r e s ta v a ! ... o últim o que d e r­
ram ava pela sa lv aç ão d o s hom ens!
O lado a b erto de C risto é p a ra nós um m istério sum a-
,m ente consolador. — P o r aquela ferida, com o p o r um a porta
nm plissim a, podem os en trar, com o o fizeram as alm as
(imim tes..., a esconder-nos d entro do C o ra çã o de (Jesus...
r ali estabelecer a nossa m o rad a. — E sta bendita ferida
rusga o véu que o o c u lta v a ... e aquele divino c o ra ç ã o ... que
Innlo am ava os hom ens, ficou d e sc o b erto ..., patente a
liiclos..., p a ra que o v íssem o s..., o a d o rássem o s.... p a ra que
nele, de um a vez p a ra sem pre, aprendêssem os to d a a lição
nubllme d o am or. É im possível sab er o que é am ar sem
250 M aria e a m orte d e Jesus

p e n e tra r no mais íntim o desse c o ra ç ã o ... A quilo é que é


a m o r ! ... essa é a única e s c o la !... E sse é o ú n ico m o d e lo !...
Podem o su p o r que a Santíssim a V irgem ch eia de dor.
ao contem plar aquela ferida atroz, m as m ais cheia ainda
de adm iração, ficou e x tá tic a ... a o ver, E la antes de mais
ninguém , aquele c o ra ç ã o ... N u n c a o tinha v isto e ag o ra
contem pla a sua form osura encan tad o ra. — Com certeza
caiu de joelhos logo ali p a ra adorá-lo e d e sa g ra v á -lo por
todos os que ali m esm o e p o r todos os séculos o haviam
de u ltra ja r. — Foi este o prim eiro acto público de devoção
e culto ao C o ra çã o de Je su s..., e M a ria a p rim eira a d o ra ­
d ora e re p ara d o ra d o S a g ra d o C oração. — A prende dela
esta devoção sa lv a d o ra e santificadora. — M a ria é a d ep o ­
sitária dos tesoiros deste c o ra ç ã o ... E la tem a c h a v e .—
Pede-lhe que te in troduza lá bem p a ra d e n tro e que feche
bem a porta, p a ra que nunca saias daquele C o ra ç ã o onde
os tíbios se fazem fervorosos, e os fervorosos chegam a ser
sa n to s...
69. Soledade de M aria

1.* — Jesus m orto nos braços d e sua Mã\e. — P õe diante


da tua im aginação aquele quadro. — P e n d e n te d a cruz o
c ad á v e r de Je su s.... cheio de g ran d es .manchas de sangue
c o alh ad o .... coberto de fe rid a s..., m aterialm ente d esfeito ...,
sem beleza nem fo rm o su ra..., quase sem figura h u m a n a ...;
lábios e x an g u e s..., olhos sem v i d a ...; aquilo que não é mais
do que isso, um c a d á v e r ! ... e é o F ilho d e D eus! ! ! Q u e
m isté rio !
A os pés da cruz, um g ru p o de alm as boas chora sem
cessar. — G rande, m uito grande é a sua d o r..., m as como
com pará-la com a daquela M ã e que ch o ra a p erda de seu
F ilh o !... Pobre M ãe! ! ! ... Q u e v a i fazer ag o ra sem o seu
Filho? T a lv e z no m eio da sua dor, com eçou a p reo cu p á-la
n sepultura de seu F ilh o ..., mas, como e onde? ... Se ela
não tinha se p u ltu ra nem m eios p a ra c o m p rá -la !... se os
seus am igos, uns se haviam o c u lta d o ... e outros haviam -se
feito seus inim igos! A quem acudir? Q uem descerá o
seu Jesus da Cruz? ... Q u e consolação no m eio da sua
pena, quando vê aqueles santos v a rõ e s c um prir este p;edoso
o fic io !... Q u e agradecim ento n ã o co n se rv a ria ela no seu
c o ra ç ã o ! !
E efectivam ente com g ra n d e cuidado o descem da cruz
e depositam o san to corpo nos b raço s de M aria. — P ro s-
1rn-te em espírito junto a essa M ãe, e m edita com e la ...
252 S o led a d e de 'Maria

porque, que m editação faria então a Santíssim a V irg e m !...


Com o iria recordando ante a v ista daquele co rp o todos e
cada um dos torm entos da P a ix ão ? — A g o ra recorda todo
o p a ssa d o ..., as cenas de B elém ..., os idílios de N a z a ré ...,
os dias felizes em que ela cu idava do seu F ilho, com o
nenhum a M ãe o fez jam ais. — A g o ra entende, de um a vez,
o que significava a espada de Sim eão que toda a vida levou
a tra v e ssa d a no seu coração. — A gora com preende o que
era ser M ãe n o ssa... M ãe dos pecadores! que assim p u se ­
ram o seu F ilh o ... E precisam ente a esses ia ela a m a r ? ! ...
A esses q uerer como a filhos quando assim tinham feito
so frer o se u Jesus? ! ... O h ! Q u e dolorosa m a te rn id a d e !...
E contudo, beijando um a a um a aquelas feridas, iria repe­
tindo: S o u a escrava do S e n h o r..., faça-se em m im a sua
divina vontade.
F a z tu esta piedosíssim a m editação com M a ria ...,
im agina-te a tira r com E la aqueles espinhos um a u m ....
com m uito cuidado, com o se ainda sofresse com eles Jesus...
L im pa aqueles olhos e aquele rosto afeado com tan to s esc ar­
ro s... e sa n g u e ...: toca aquelas m ãos e pes tresp assad o s...
e b e ija ... beija aquele lad o a b e rto ... e não a p artes os teus
olhos daquele coração que se vê pela ferida, sem v id a ...
sem la te ja r já ..., sem m ovim ento..., m as não sem a m o r...
e em cada ferida recorda os teus p e ca d o s... e vê o que
fizeste com eles.
2." — O santo enterro. — O s santos v a rõ es N icodem os
e José de A rim ateia juntam ente com as piedosas m ulheres e
com a Santíssim a V irgem , com eçaram a ungir e a en faix ar
aquele co rp o sacrossanto. — C ontem pla este em balsam cnío
e vê quão am orosa e delicadam ente vão lim pando aquelas
feridas e ungindo-as com bálsam o e p erfu m es... A S a n tís­
sim a V irgem talvez reservasse p a ra si o lim par e ungir
a s a g ra d a c ab e ça ... e E la mesma cobriria aquele rosto
divino com o pano m ais fin o ... Q u e d o r a sua ao lan çar
o seu últim o o lh ar sobre aquele rosto que E la conhecia
S otedade de IM aria 253

tã o bem ... Q u a n to não se tinha encan tad o na sua con­


tem plação !...
P re p a ra d o assim o cad áv er, é levado à sepultura. —
F o rm a tu p a rte daquele tristíssim o préstito, que já quase
de noite acom panha pela últim a vez o corpo de C risto ...
C om o iria a Santíssim a V irgem ! Q u e doloroso é o m om ento
de a rra n c a r o c a d á v e r d e um a pessoa querida, d e casa
p a ra levá-lo a e n te r r a r ! ... P o r um a p a rte deseja acabar-se
com aquele tristíssim o m om ento..., p o r o u tra tem e-se que
chegue esse m om ento... d a se p a ra ç ã o to ta l..., do últim o
a d eu s... Q u a l seria o sofrim ento do coração daquela M ãe
nestes m o m en to s!
E , quando já colocado no sepulcro, a p e d ra foi fechando
a en tra d a e ocu ltan d o o santo corpo, quem poderá explicar
o que ia p a ssan d o pela alm a da S antíssim a V irgem ? ... A g o ra
sim, que ficou definitivam ente se.tn F ilh o ... Q uem a a rra n ­
c aria daquele lugar, se E la não podia v iv e r sem E le ? —
T am bém tu n ã o tenhas pressa de te ir e m b o ra ... D etém -te
de/noradam ente, e ali an te o sepulcro do teu Jesus, em
com panhia d a V irgem Santíssim a, tua M ãe, pensa no term o
de todas as coisas que é o sepulcro — C risto quis p a ssa r por
e sta hum ilhação, p a ra servir-nos de exem plo n a nossa m orte
e na nossa sepultura.
M as não. não é hum ilhação a m orte, se é com o a de
C risto ... nem hum ilhante o sepulcro, ainda que o corpo se
desfaça en tre bichos, se é sem elhante ao de Jesus — M orte
g lo rio s a !... D itoso sepulcro o das alm as s a n ta s ! ... P o r que
não asp irar a isso? ...
R ecorda, além disso, que todos os dias sepultas Jesus
no teu c o ra ç ã o ... e não te esqueças que ele quis que o seu
sepulcro fosse n o v o ..., lim po... e onde ninguém tin h a sido
colocado senão E le. C om para e exam ina estas circunstâncias
para que v ejas se é assim o teu co ração . — P ensa se nele
enco n tra Jesus aqueles arom as e perfum es de virtudes,
sim bolizados naqueles que ungiram o seu corpo e com os
254 S o led a d e d e 'Maria

quais ele ag o ra quer re cre ar-se n a tua a lm a ... e pede à


S antíssim a V irgem que seja ela a que su p ra a tua pobreza
m iserável, e te ensine a g u a rd a r e a sep u ltar, e nquanto
dure a tu a vida, Jesus no teu c o ra ç ã o ..., p a ra que nunca
a sua presen ça falte n ele...

3.° — A volta do C a lvá rio . — O S a lv ad o r ficou ali no


sepulcro d esc an sa n d o ..., m as M a ria não po d ia d escansar,
nem so s se g a r... considerava-se só ..., ó rfã ... desam p arad a
e d e s te rra d a ..., sem fam ília, sem la r..., e assim, acom panhada
d aquelas alm as piedosas, m as sentindo no seu coração a
frieza da m ais espantosa soledade, em preendeu o regresso
a sua casa.
T o d o s o s que a acom panhavam , com o c o ra ç ã o o p ri­
m ido, pensavam , contudo, no c o ração esm agado d aquela
M ã e que v o lta v a s ó ..., sem o seu F ilho! — T rilh em o s com
ela este cam inho de dor.
T o rn o u a subir o C a lv á rio p a ra em preender a v o lta ...
Q u e sentiria à v ista d a cruz n u a .... v a z ia ..., m an ch ad a de
sangue de um D e u s? ... V ê -a ajoelhar-se diante d e la ... e
a b ra ç á -la ..., e adorn-la.
Já n ã o é o instrum ento d o su p lício ..., já não é um a
coisa o d io sa ... h o rrív e l... m aldita. — V ê nela a á rv o re da
vida de que se desprendeu m aduro o fruto d a sa lv a ç ã o ...
É a ch av e do céu ... é a esp a d a que v encerá todos os
inim igos de C risto que a seus pés irão d e sp e d aç ar-se...
é a arm a de com bate de todos os c ristã o s..., é a lo u cu ra de
todos os santos que não po d erão v iv er sem ela, nem longe
d e la ... sen ão su b id o s..., a b ra ç a d o s ..., crucificados n e la ...;
é, enfim , a balança onde se p e sa rã o as acções d e todos os
hom ens e a causa e a ra zã o da sua co ndenação c u d a sua
sa lv a ç ã o — O h C ruz b e n d ita !... O h cruz d iv in a ! ... Q u e
louvores de am or lhe n ã o teceria a Santíssim a V irg e m !...
C om o se ex p an d iria em dulcíssim as lágrim as e em abraços
terníssim os a e la ! A b raça-te tu tam bém a ela e apai-
S o led a d e de M aria 255

' o na-te por aquela cruz, re g ad a com o sangue de C risto e


lo m as lágrim as d a M ãe. — Q u e seja p a ra ti, como p a ra
S. P aulo, a tu a .maior glória e felicidade.
E lev an tan d o -se continuou o seu c am in h o ... Q u e recor­
d ações a o ch eg ar à cidade m a ld ita !..., a cidade d e ic id a !...
A s su as ru as ain d a m an ch ad as com o sangue de seu F ilh o ! ...
Q u a n tas vezes se p ro sta ria a b e ijá -lo !... C om o iria re co r­
dando todos os passos d a p a ix ã o ! ... A qui, as q u e d a s..., ali,
.1 ru a d a A m arg u ra, onde o e n c o n tro u ...; m ais longe, o sítio
donde saiu com a cruz às c o s ta s ...; entre som bras, o palácio
de H erodes, onde o tra ta ra m com o a um lo u c o .... e m ais
além, o de P ila to s ..., a p ra ç a onde g rita v a a m u ltid ão ...,
o balcão do E cce h o m o ..., o p á tio d a flag e la ç ão ... Pobre
M ã e ! ... Com o iria reco rd an d o um a um estes passos! —
A com panha m uitas vezes a Santíssim a V irg e m n e sta d e v o ta
m editação e tom a m uito gosto em fazer m uito bem a V ia -
Sacra com frequência e acom panhando a Santíssim a V ir ­
gem ... E la é o teu m odelo n esta devoção tã o c ristã ...
70. M ater Dolorosa

1,° — A rainha dos m ártires. —>A d o r é a lei universal


que ab ran g e todos os hom ens sem excepção. —• A criança
sem que ninguém a ensine gem e e chora e entre p ra n to s e
gem idos é que deslizará a sua v id a.—• N ã o podem os fu g ir da
d o r..., ela espera-nos onde m enos o ju lg á v a m o s..., talvez
q u a n d o são m aiores os nossos gozos e a le g ria s ...; g eral­
m ente estas são prelúdios das lágrim as. — Q u a n d o recebes
a lgum a alegria m uito gran d e pensa nalgum a d o r forte física
ou m o ral.... do corpo ou d a a lm a ..., de d e n tro o u de fo ra...
que te h á-de vir. — É loucura q uerer a le g ra r a v id a fugindo
d a dor. — O s s?us espinhos m agoam m enos q u ando nos
a b raçam o s a ela g e n ero sa m en te ..., q u a n d o lhe saím os
ao e n c o n tro ..., tendo-lhe g ra n d e a m iz ad e ..., sobretudo sa n ­
tifican d o todas as dores e sofrim entos.
Jesus quis ser o H om dm das dores e su a M ã e a R ainha
dos m ártires. — E stes são o s m odelos... o s únicos que
aliviam com o seu exem plo o s nossos sofrim entos e nos
ensinam a santificar-nos com eles. — B endita seja a dor!
— A ssim disse C risto: «Felizes o s que c h o ra m ..., os que
so fre m ..., os que padecem »... N ã o tenhas p ena do que sofre
m uito, m as tem pena do que n ã o sabe s o fre r.— C risto asso­
ciou sua M ãe a todas as su as glórias e g ra n d ez as e p o r isso
fê-la com panheira de todos os seus so frim e n to s.— 'A quem
D eus m ais am a m ais faz sofrer, p a ra elevá-lo com o sua
M a te r D olorosa 257

M ãe, depois, a m aior gló ria e gran d eza. — Q u a n to sofreu


M a ria ao pé d a c r u z ! ... M as quão gran d e n ã o é M a ria
precisam ente ao p é d a cruz! Q u e pérola fa ltaria na sua
c oroa se não tivesse a do r! P o rta n to foi necessário, visto
q u e era rainha, que fosse rain h a da d o r e d o m artírio. —
Se foi rainha d a dor teve de sofrer m ais d o que ninguém ...
O seu m artírio d u ro u toda a sua vida.
A nós envia-nos D eus as dores um a a um a e oculta-nos
a s f u tu r a s ...; só sofrem os as presentes. — A M a ria revelou-lhe
logo desde o princípio tudo o que h a v ia de so fre r p a ra não
lhe p o u p a r sofrim entos... e quis que aquela esp ad a a a to r­
m entasse d u ran te to d a a vida.
P ensa nas suas dores: q u ando sofreu com a in g ra tid ã o ...,
a tra iç ã o ..., o a b a n d o n o ..., o desam or de que foi objecto o
seu Filho. — B elém ..., E g ip to ..., N a z a ré ..., Jerusalém ....
o presépio e o C a lv á rio ..., o tem p lo ..., o palácio de H erodes
e de P ila to s..., são tudo lugares onde o seu c o ração se
despedaçou tan ta s vezes! A té quis so frer a p erda de Jesus...
p a ra ensinar-nos a nós a sofrer e a b uscá-lo se o perderm os
pelo pecado. — P á ra a enum erar e a p o n d e rar estas dores.

2.° — D o r hum ana e natural. — Em to d as estas dores


considera a sua p a rte n a tu ra l e hum ana. — A m edida de
toda a dor é a intensidade do am or. — 1Só nos dói d e ix a r ou
perder o que am am os. — A m aior am or, m aior dor. — Com
e sta reg ra tra ta de m edir a d o r de M a ria ... E ra um am or
de M ãe e com isto está d ito tu d o ... É o am or m ais p u ro ...
mais n o b re ..., m enos egoista que n a te rra existe, o a,mor de
pina m ãe! — P o r isso D eus n ã o quis que tivéssem os mais
do que u m a ...: ela só b asta p a ra encher toda a nossa
existência de carinhos in efá v eis..., de beijos terníssim os...,
de um am or que enche plena,mente o nosso c o ra ç ã o ... Gom o
um a um a m ãe! — E com o am aria a Santíssim a V irgem a
seu F ilho! — D eus quis ju n ta r no seu c o ração todas as
ternuras de to d as as m ães p a ra que com, esse am or am asse

ir
258 M a ter D olorosa

a seu F ilho. — N ã o m erecia m enos o F ilho de D e u s...


e o que quis cham ar-se p o r excelência o F ilho do hom em .
E p o rtan to , qual não seria a sua d o r..., o seu sofrim ento
na p e rd a de seu Filho?
P e n sa além disso que o Filho que p erd ia era o seu
F ilh o único, era o m elhor de to d o s..., que am ava a su a m ãe
com o nenhum filho am ou a s u a ... P o r o u tra p a rte sendo-
inocentíssim o com o era, p e rd ia -o como se fosse um crim i­
n o s o ...; que não era um a en ferm id a d e ..., um acidente
in feliz..., senão um a tra iç ã o ..., um a in g ra tid ã o ..., um a
enorm e e ho rrív el injustiça a que lhe tira v a a v id a ... e q u e
isso se lev a v a a cabo no meio de atrocíssim os torm entos...
e na su a m esm a presença.
P e n sa naquela íntim a un ião que existe entre Jesus e
M a ria a tal ponto que em v e rd ad e o F ilh o e ra a v id a ...,
e o tudo d a M ã e ... e com preende p o r aqui, um pouco, a.
intensidade da sua dor de M ãe.
Alé.m disso é certo que a sensibilidade tem m uitos
g ra u s..., que não é igual em todas as p e sso a s... e que a
m aior sensibilidade corresponde m aior intensidade de dor. —
M aria era um a finíssim a d e lic ad e za ..., de um organism o,
perfeitíssim o e por isso de um a sensibilidade e x tra o rd in á ria ...
Q u a l n ã o seria pois a d o r do seu c o raç ão ao pôr-se em
con tacto com. a in g ra tid ã o ..., com a in ju stiç a ..., etc.? R ecorda
o que a ti estas coisas te fizeram sofrer, ain d a que num
g ra u m uito inferior e d aí deduz o que se p a ssa ria pela
alm a da V irgem S antíssim a. —• D em ora-te em cad a um a
destas circ u n stân c ias... M e d ita m uito d e v a g a r cada um
destes m o tiv o s... e c onvencer-te-ás de que com m uita ra z ã o a
Santíssim a V irgem pode a p lic ar a si aquelas p a la v ra s de
Jerem ias; «Pensai e vede se h á d o r sem elhante à m inha».

3.° — D o r divina e sobrenatural. — 1N ã o podem os a b a rc a r


a intensidade da dor hum ana e n a tu ra l da Santíssim a
V irg e m ... Com o podem os pois form ar um a ideia, a o menos.
M a ter D olorosa 259

aproxim ada, d a su a d o r so b ren atu ral? — M a ria sofria ao


p erd er aquele que e ra o seu F ilh o ..., ao v ê -lo p a d ec er e
m o rrer..., m as sofria sob retu d o po rq u e nele v ia o seu D eus.
Q uem conheceu como ela a D e u s? ... Q uem o am ou como
ela?
R ecorda os incêndios de am or de ta n ta s alm as s a n ta s ...,
dos pró p rio s anjos e s e ra fin s ...; tu d o é n ad a em com paração
do am or de M a ria ao seu D eus. — C om o sentiria p o rta n to
as o fe n sas..., os in su lto s..., os torm entos que os hom ens
lhe deram ? Se, com o M ãe, to d as se repercutiam no seu
c o ra ç ã o ..., que seria com o M ãe de D eus? C o n sta que houve
alm as que m orreram com a d o r dos seus p ecad o s considerando
quanto com eles ofenderam a D eus. — C om o n ã o m orreria
pois de dor M a ria à v ista d aquelas ofensas gravíssim as
que o povo escolhido fez a C risto n a sua Paixão?
Além disso, M a ria sofreu todos estes torm entos indizíveis
com consolação espiritual de espécie a lg u m a ... O s m ártires
.'.ufriam com aleg ria ab raçad o s ao c ru cifix o ... A v ista de
Jesus crucificado a le n ta v a os penitentes e os a n aco retas nas
suas a u ste rid a d e s..., m as p a ra M a ria a v ista d e C risto
crucificado, era precisam ente o seu m aic r to rm e n to ...
() mesmo que ia consolar a outros, era o v e rd u g o do coração
d.i M ãe. — A s suas dores não foram física s..., m as por
Isso mesmo, foi m ais intensa a sua d o r p o r ser toda ela
Interna... p uram ente e s p iritu a l!...
Finalm ente o cúm ulo d a dor da V irgem Santíssim a foi
liflo só o a ssistir... o a u to rizar com a sua pre sen ç a o sacrifício
de seu Filho, sen ão que teve de c h eg a r a desejá-lo. — D ois
filhos linha M a ria : o filhe, inocente e o filho pecador, que
sum os nós. — Se queria que vivesse o filho inocente, não
podia sa lv ar o filho p e c a d o r...; se queria a sa lv a ç ã o deste,
devia desejar o sacrifício1 do o u tro ... Q u e fazer? — Com o
Mflc devia querer-nos tan to como a Je su s... e tev e que
i heqnr a querer-nos m ais do que a e le ..., porque sabendo
que essa era a v o n tad e de D eus, o qual não perdoou a seu
260 M a ter D olorosa

p ró p rio F ilh o ..., tam bém foi a sua, e p o r isso tam bém E la
lhe não perdoou. — E assim, ali esteve a o p é da cruz, m orta
de d o r..., d e se ja n d o ..., e gozando-se até n a m orte de C risto
p a ra sa lv ar-n o s a n ó s... Q u a n to a m o r ! ... m as tam bém q uanta
d o r! Q u a n to custám os a M a ria se r filhos seus!
E se o que custa é o que se aprecia e am a, qu an to nor,
am ará a g o ra, pois a fizem os so fre r tan to ? — M a s já b a sta ...
b a sta já de in g ra tid õ e s..., n ã o faças so frer m ais a tua M ãe,
m as am a-a ainda à custa dos teus sofrim entos e d a tua
p ró p ria vida.
71. M aria c a Ressurreição de Jesus

1,° — Sepulcro glorioso. — Pelo pecado enírou a m orte


no m u n d o ...; todos os hom ens têm de m orrer porque são
pecadores. —■Só Jesus e M a ria estiveram isentos desta lei
c contudo quis D eus que passassem pela hum ilhação da
m orte..., m as n ã o podia.m, ficar no se p u lc ro ..., nem podia
ali corrom per-se um a c arn e tão sem m ancha.
Além disso, C risto m orreu m as n ã o foi vencido pela
m orte... antes pelo contrário, a .morte c cn v erteu -se em p rin ­
cípio de v id a ... e de v id a eterna p a ra que todos os que
m orressem cm C risto, n ã o m orressem d ev eras sen ão que
passassem à vida da im ortalidade. —• P o r isso c> seu triunfo
sobre a m orte h av ia de m anifestar-se necessariam ente com a
ressurreição gloriosa do seu corpo. — E le que predissera
tan ta s vezes a sua m o rte ... o u tras ta n ta s predisse a sua
ressurreição. — T in h a que d em o n strar a sua d ivindade e
pôr o selo à sua p re g aç ão com esse dom ínio sobre a vida
e a m orte, p ró p rio e exclusivo de D eus.
T o d a s as grandezas hum anas v ã o a p a ra r a um sepul­
c ro ..., p o r m aior que seja o poder de um, hom em , um dia
cairá sobre ele a loisa de um sepulcro que diga: «aqui ja z » ...
«aqui está". — M as há um sepulcro glorioso que triunfou da
m orte e onde se lêcm estas p a la v ras: «R essuscitou, n ãa está
n i | t t l " . — Q u e m agnífica a glória de C risto na sua R essur­
re iç ã o !... Q u e triu n fo o seu sem precedentes c sem ig u a l! ...
262 M aria e a R essurreição de Jesus

S ó E le o podia ter. — M as esta glória de Jesus tem que ser


tam bém glória de M a ria . N a d a de q uanto a ele se refere é
alheio a sua M ãe. — E stev e associada a ele no C a lv á rio ...;
as dores do Filho foram dores d e M ã e ... Justo era que os seus
gozos, triu n fo s... e alegrias, fossem tam bém p a ra a Santissim a
V irgem . — Com o deve consolar-nos o triunfo d a R essu r­
reição de (Jesus C r is to ! ... Se não tivesse ressuscitado a nossa
fé seria in ú til...; os inim igos teriam triu n fad o definitivam ente
d e le ..., da sua vida e d a sua o b ra . — M a s com a sua
R essurreição dá-nos o a rgum ento m ais firme d a nossa fé ...,
a ra z ã o m ais sólida d a nossa esperança.
T am b ém nós havem os de m o rre r..., também, nós havem os
de ressuscitar. — M as com a? S erá a nossa m orte sa n ta ...,
o nosso sepulcro g lo rio so ..., a n o ssa ressurreição triu n fan te?...
A estas p e rg u n ta s só tu podes e deves re sp o n d er..., de ti
som ente depende. — Pede a Jesus e a M a ria que seja assim ...,
diz-lhe que assim o esp eras dos seus m érito s... que queres
a g o ra associar-te às suas dores, p a ra p a rtic ip a r um dia dos
seus triunfos.
2.° — A p a riçã o de Jesus a sua 'Mãe. — N ã o é de fé nem
consta do E v an g e lh o , m as é certo. — A n a tu re za e a g raça
exigem este encontro entre a M .ãe e o F ilho. — N ã o podem os
d u v id ar de que a Santíssim a V irgem assim o e sp e ra v a com
um a fé v iv a e inquebrantável. — O s A póstolos chegaram a
d u v id a r de R e ssu rre içã o ... M a ria esp erav a com um a certeza
infalível o cum prim ento das p a la v ra s de seu F ilho. — P o r
isso ela não foi ao se p u lc ro ..., sabia que era inútil e que ali
não e sta v a Jesus.
Reflecte ag o ra na sa n ta im paciência, que, p articularm ente
ao com eçar o terceiro dia, in v ad iria o c o raç ão d a Santíssim a
V irg e m .— O s m inutos parecer-lhe-iam e te rn id a d e s...; o seu
c o raç ão de M ã e dizia-lhe que seu Filho já se aproxim ava,
e o c o ração de um a mãe nunca se engana e.m. coisas de seus
filhos. — L em bra-te d a m ãe de T o b ia s que sa ía todos os
dias ao cam inho p a ra v e r se seu filho v o lta v a . — É neces­
M aria e a R essurreição de lesus 265

sá rio conhecer o c o ração de um a m ãe e sobretudo o daquela


M ã e p a ra com preender o desejo e im paciência de N ossa
S enhora por v e r o Filho ressuscitado. — N ã o será doce
p a ra a nossa devoção p e n sa r que tam bém ag o ra com os
.seus desejos v eem en tes..., com as su as ferv o ro sas o ra ç õ e s...,
fez com que se apressasse a h o ra da R essurreição, como
acontecera com a Ir.c a rn aç ão ... e nas bodas de C aná, ao
a d ia n ta r o tem po da m anifestação pública de Jesus?
Finalm ente chegou o instante ditoso que não é possível
im aginar. — C ontem pla a V irgem Santíssim a a in d a na sua
so le d ad e ..., sum ida no oceano das triste z as... O s seu s olhos
inchados e verm elhos pelo p ra n to já não têm lágrim as que
c h o rar. — E de repente, um a explosão de luz d iv in a ..., um
co rp o gloriesissim o com vestidos m ais b ra n co s do que a
n e v e ... e sobretudo um a voz d ulcíssim a..., m uito conhecida,
que cham a e repete mil vezes: M ãe! ! ! —• Q u e língua poderá
ex p licar estas efusões en tre M ã e e F ilho naqueles instantes? ...
D eixa que o teu c o ração as sinta, se p erca e se abism e neste
m ar de felicid ad e..., de glória v e rd a d e ira ... Q u e bom é Jesus
p a ra os que o am am ! — U m pouco de padecer e so fre r com
Ele e logo a seguir q u a n to gozo e sa tisfaç ão se.m. fim! —
C o m p ara com esses gozos e a legrias as que o m undo oferece
e v e rás se m erecem sequer este nom e as m entiras que ele
nos dá.
A plica tam bém aqui a re g ra do am or e da dor: qual o
am or, assim a d e r..., e qual a dor, assim a aleg ria d e p o is .—
C om o Seria a aleg ria da Santíssim a V irgem que assim am ava
o seu Filho? ... Se sofreu tan to n a sua m orte, qual não seria
a sua alegria a o v ê -lo ag o ra g lo rio so ..., triu n fa n te ...,
ressuscitado p a ra nunca m ais m orrer? — A g o ra de novo iria
M aria percorrendo as feridas do seu c o rp o ..., e a dorá-las-ia
com a felicidade que sen tia ao v ê -la s tão g lo rio s a s .—
R ecorre-as tam bém tu com E la e um a vez m ais dem ora-te
naquele la d o ..., naquele c o ra ç ã o ... Q u e f o rn o !... Q u e vulcão
264 M aria e a R essurreição de Jesus

de fo g o ! ? ... E n tra bem d e n tro e ali a b ra sa -te ..., consom e-te


em sa n to am or de D eus.

3.° — E fe ito s desta aparição. — A ) U m a aleg ria tão


gran d e e tã o v iv a que foi m ilagre que a V irgem Santíssim a
não tivesse m orrido. — U m a alegria espiritual e divina, da
qual nunca se sac ia v a a alm a de M aria, sem elhante à do- céu
que nunca chega a can sar. B ) U m a c o m p en etração mais
intim a e p rofunda que D eus lhe concedeu, com o seu divino
F ilho, com o o prém io da sua generosidade e fidelidade no
sa c rifíc io ...; de ta l sorte que se.m chegar a converter-se em
D eus foi a p a rticip a çã o m aior que da divin d ad e pode da r-se
a um a c ria tu ra . C ) Um conhecim ento ainda mais c la ro ...,
um a contem plação ainda m ais sublime do que era seu Filho
ç da sua obra g randiosa d a R edenção. — Sem dú v id a Jesus
lhe revelou então, altíssim os seg red o s..., os seus planos e
p ro je c to s.... a sua A scensão aos céus d a í a a lguns d ias...,
a fundação da sua Ig reja e a p a rte que E la devia ter em
tal o b ra ..., enfim, g ra n d es segredos do céu e as m uitas
alm as que iam e n tra r nele.
T am bém tu te hás-de a le g rar com este g ra n d e triunfo
de Tesus... e com esta felicidade de tua M ãe. — R epete-lhe
a felicitação da Ig re ja : R egina coeli, laetare. altetuia...
P ede-lhe oue te dê um a pnrtezinha da sua felicidade, se não
agora, pelo menos algum dia no c éu ..., e p o r fim, não te
esqueças, que, segundo S. P au lo , da R essurreição de C risto,
havem os de tira r gran d e desprezo e fa stio das coisas da
te rra que não podem nem m erecem encher o n o 's o c o raç ão ...
Busquem os as coisas do a lto ... suspirem os pela o u tra vida.
viv en d o ag o ra desapegados d e sta ... O espirito de fé ..., a
v id a de fé ... sobrenaturalize os nossos acto-s todos, para
dar-lhes um v a lo r que p o r si m esmos nunca teriam ... e que
deste m odo chegarão a co nstituir a glória d a nossa corca
no céu.
72. M aria e a Ascensão do Senhor

1.”— •P relúdio da A scensão. — Jesus ressuscitado já n ã o


devia perm anecer neste m undo. — C om o D eus, nunca deixou
o céu, a sua .m orada..., m as, com o hom em , tinha direito à
posse do trono que tinha gan h ad o com a sua P aixão, com
a sua m orte e com o seu triunfo sobre o pecado.— A A scen­
são é o com plem ento da sua glorificação, pois ccm ela devia
ad q u irir a plen itu d e da glória ao e n tra r no céu. — O pecado
tinha fechado as p o rta s ao céu ... C risto devia a b ri-las de
novo. — Só a E le lhe correspondia esta h o n ra. — P a ra isso
havia descido do céu. — A o b ra já e stav a term inada.
A R edenção e stav a consum ada. —■O s hom ens já podiam
to rn ar a o lh a r p a ra o céu com o p a ra a sua v erd ad e ira
pátria. — O m undo não é m ais do que um perfeito d e s ­
te r r o .—-O céu, nosso fim ... nossa m eta ... nosso descanso.
jjá tinham p a ssa d o o s quaren ta dias de p re p ara çã o p a ra
esta solenidade. — C risto tinha feito m últiplas aparições
p a ra c onfirm ar a fé dos seus discípulos e a realidade d a sua
R essurreição. — Q u a n ta s veces nestes q u aren ta dias n ã o v isi­
taria a Santíssim a V irg e m ! - J á não convivia com E la
rm tio antes de m o rre r..., M as que consolação p a ra N ossa
Senhora receber talvez diariam ente a v isita de seu F ilh e!
( innio se ren o v ariam to d o s os gozos e alegrias do d ia da sua
R e ssu rre iç ã o !... Q u a n ta s g raças lhe n ã o concederia seu
Filho c q uantas coisas lhe não ensinaria n aquelas visitas!
266 M aria c a A sc en sã o do Sen h o r

P ede à Santíssim a V irgem que tu tam bém saibas v isitá-la


a ssim ..., p a ra acom panhá-la e consolá-la.
P ede-lhe que te ensine algum a dessas coisas que
ela sabe e que a ti te c o n v ém ..., que te presenteie com
algum a d aquelas gra ça s que lhe deu seu F ilho naqueles d ia s ...

2.” — R ealização da A scen sã o . — Jesus a p are ce pela


últim a vez aos seus A póstolos e discípulos e lev a-o s ao
M o n te das O liveiras. — Ali com eçou a su a P a ix ã o ..., ali
ju lg a rá um dia o m u n d o ..., ali quis que se efectuasse a sua
A scensão. — Q u e recordações tra ria a todes aquele lu g ar! —
Q u e p en saria a Santíssim a V irgem então? 1 Q u e m udança
tão g ra n d e : Q u e cena a de há q u a ren ta dias e a que tinha
ag o ra em fre n te ! — Se aquelas p ed ras testem unhassem da
sua a g o n ia ... e do seu su o r de sa n g u e ... se aqu elas o liveiras
que p resenciaram a sua prisão pudessem falar, que diriam
agora? N u n c a esqueças isto nas tuas lu ta s..., dores e sofri­
m e n to s ...; tudo p assa e d e p re ssa ... e m uitas vezes o que
foi instrum ento e causa da nossa dor, é-o da nossa a le g ria ...
e sê-lo-á sem pre do nesso triu n fo ..., da nossa glória e feli­
cidade no céu.
D ian te pois de todos c s que o acom panharam e da
Santíssim a V irgem , d a qual se despediria d e um m odo
e sp ecial... fazendo-lhe v e r com m ais clareza que os outros
quão conveniente era que fosse p a ra o céu ... com eçou a
tra n sfig u ra r-se ... o seu rosto resplandeceu com o o so l...,
os seus olhos brilh aram cheios de a m o r..., as suas m ãos
lev an taram -se solenes p a ra abençoá-lcs, e d a s su a s chagas
form osíssim as e gloriosíssim as com eçou a sa ir um suave
perfum e que lhes co n fo rta ria o coração. — T o d o s s e despe­
diram d e le ..., talvez beijan d o a s ch ag as d a s suas m ãos e dos
se u s p é s... A Santíssim a Virgem, adia n tar-se -ia a to ca r e a
b e ija r pela últim a vez c dulcíssim a c h ag a do seu la d o ...
e assim su av em en te... len ta m e n te ... com m ovim ento ao
principio quase im p e rce p tív e l..., com, os olhos fixos em seu
M aria e a A scen sã o d o S en h o r 267

P a i que o c h a m a v a ..., com eçou a elevar-se da te rra e a subir


a o s céus.
C ontem pla os apóstolos extáticos diante daquele e sp ectá­
c u lo ...; parecem ig n o ra r no que aquilo v a i p a ra r..., m as
sob'CLudo contem pla a S antísim a V irgem seguindo com os
seus olhos o seu divino F ilh o ... Com, que ân sia! ... Com que
doce inveja ficaria a c o n te m p lá -lo !... U m a nuvem lum inosa
en volveu-o e os A póstolos não o v iram m ais. — P a r a M a ria
n ã o h av eria n u v e n s... O s seus olhos m aternais a trav essariam
todas as que se interp u sessem ..., salv ariam to d as as d istân ­
c ia s..., e v eria a e n tra d a triunfal de seu F ilho no céu, entre
o tropel das alm as tirad as do Lim bo dos ju s t o s ... e o
cân tico glorioso de todos o s anjos. — A le g ra-te com este
triunfo de Jesus do qual p a rticip a a Santissim a V irgem e
suplica-lhe pela sua intercessão e pelos m éritos de seu Filho
que tam bém tu participes do mesmo no céu.

3." — E feito s da A scensão. — A ) N a S antíssim a V ir-


yeni: um gozo in te n so ..., um a aleg ria im e n sa ..., um a sa tis­
fação com o só Tila, M ãe de D eus, p ed ia se n tir..., um am or
cada vez m ais intenso a D eus ao v e r com pleta e term inada
a o bra da R edenção. — Q u a l não seria o seu agradecim ento
a D eus! — M as no mesmo tempo., que p ena e que tristeza a
sua ao ver-se se p a ra d a de Jesus! N ã o só deixaria d e v iv er
com ele, senão que não to rn aria a v ê -lo ..., nem a receber as
suas v isita s... Q u e p esa d a se lhe não to rn a ria a v i d a ! ... Q u e
longo e insuportável o d e s te rro !... Ii esta sep aração deveria
d u ra r ar.os e a n o s... sem aquele F ilho p o r quem tão tern a -
m ente tinha v iv id o ... Só quem am a pode ap rec ia r este
sacrifício da Santíssim a V irg e m .—'M a s ela sujeita-se a ele
generosam ente... com o h a v ia feito no T em p lo e no C alvário.
M ais um a vez agradece esta c arid ad e da S antíssim a
V irgem em nosso favor.
N o s A p ó sto lo s: O s efeitos foram de adm iração e
de gozo imenso. — N ã o se fartav am de o lh a r p a ra o céu ...
26 8 M arin c a A sc en sã o do Senhor

E sta v ista infundia-lhes gozo e coragem ao mesmo tem p o ...


Q u a n ta s vezes nos seus trab alh o s e sofrim entos esta v ista
do céu os a le n taria!
A lém disso, a sua fé aum entou grandem ente ao v e r o
fim glorioso que tinham tido as coisas do M estre. — A g o ra
com eçavam a conhecer qual era e onde e stav a o seu re in o ...
Igualm ente a sua esp eran ça confirm ou-se com a prom essa do
E sp irito S an to e com a p a la v ra que lhes deu de levá-los
aonde ele ia. — Enfim , a c arid ad e dilatou-se, aum entando nc
seu c o raç ão o apreço e o arnor que lhe tinham pois a gora
é que se convenceram q u an to os tinha am ado o seu M estre.
C ) E m nós. — P ede à Santíssim a V irgem algo d e
sem elhante no teu c o ra ç ã o ; pede-lhe que te firm es na fé....
na esp eran ça do c éu ..., na carid ad e e am or p a ra com íesus.
— Q u e te ensine a o lh a r p a ra o céu como c s A p ó sto lo s...
sobretudo nas coisas á rd u as da v id a ... e que te ajude a
d e sp e rta r-te de tudo o que é terreno, pondo o teu coração
só ern D eus e no c é u ... que é a única coisa que o deve
encher. — Isto anim ar-te-á ao tra b a lh o ..., ao sa c rifício ... à
ex actid ão no cum prim ento do teu d e v e r... e encher-te-á de
s a n ta alegria, pois, com o diz Kem pis; « O que pensa e
espera no céu não pode te r na terra um só m om ento de
v e rd a d e ira tristeza».
73. M aria c a vinda do Espírito Santo

l . ° — P re p a ra ç ão . — O s A póstolos e discípulos re ti­


ra ra m -se ao C enáculo p a ra ali se p re p ara rem com a S a n tís­
sim a V irgem p a ra a v inda do E sp írito S anto. — E xam ina
esta p rep ara çã o :
A ) P rim eiro, retiram -se, porque o re tiro e a soledade
é on de D eus se com unica às alm as. — A D eus não a g ra d a
fa la r no m eio d a s coisas do m u n d o ... e se fala, com esse ruído
não é ouvido ou n ã o se entende bem a su a voz. •— A m a m uito
o re tiro ..., o silên cio ..., a soledade d a tu a alm a onde o Senhor
quer falar-te. — P o r isso esta soledade não só há-dc ser
e x te rio r..., senão tam bém interior fazendo c a la r outros
pen sam en to s..., n e g ó cio s..., im pressões... assuntos que trag a s
entre m ãos. — R e p ara se n ã o será essa m uitas vezes a razão
d a s tuas faltas n a o ração , e no p ouco p ro v e ito d a m esm a...
Sabes re tirar-te ex te rio r e interiorm ente? ... S abes im por
silêncio em tua alm a a tudo o que seja estranho, à o ração ?
B ) R etiraram -se a orar todos à um a. — A o ra ç ã o é a
solução p a ra tudo. — Jesus C risto n u n c a se dispensava dela.
— O ro u no C e n ác u lo ..., no h o rto ..., n a cruz mesmo.
— A o ra r encontrou o A njo a Santíssim a V irgem na sua
A nunciação. — O s A póstolos p o r indicação d a Santíssim a
V irgem , retiram -se a o ra r. — T am b ém a ti te cham a d ia ­
riam ente... Com o' re sp o n d es?... É s alm a de o ra ç ã o ? ...
R ecorres a ela a b u scar a lu z ..., co n so laç ão ..., fo rç a ? ...
270 M aria e a vida do E sp írito S a n to

C) E m com panhia d a Santíssim a V irgem . — Q u e


ditosos os A póstolos que puderam o ra r juntos com a S a n tís­
sim a V irg e m !... E la dirig ia a o ra ç ã o ... E la d aria exem ple
de fe rv o r... Só com o lh ar p a ra ela se dissiparia o c a n s a ç o ...,
a tib ie za ..., as distracções. — M as, se quiseres, tu p ed es
fazer a mesma cousa. P o rq u e não o ra s com M a ria ... o lh an d o
p a ra M a ria ..., aprendendo de M a ria? E x am ina-te um p o u c o
e v ê se ao c o m eçar... e ao c o n tin u a r... e ao concluir a
o ração a fazes com a Santíssim a V irgem . — A p ren d e aqui
tam bém a ter d evoção ã o ra ç ã o em com um ... C om o a g ra d a a
D eus e quão p ro v eito sa ela n ã o é!
iD ) F inalm ente, fix a -te n a constância. ■ — O E sp írito
S anto não desceu sobre eles senão depois de dez dias p a ssa d o s
em o ra ç ã o contínua. — D ep ressa nos cansam os de o ra r. —
Q uerem os conseguir tudo d e p re ss a ... e se não o conseguim os
vem o desân im o ..., a desilusão. — Q u e falta de p e rsev eran ça!

—■P ed e-a à Santíssim a V irgem . Q u e a tua o ra ç ã o seja
fe rv o ro sa n ã o um die«, nem dois, senão sem pre; e assim se rá
eficazm ente sa n tiíic a d o ra ...

2." — A vinda. — E quando assim estavam p re p a ra d o s


é que veio o E sp irito S anto no. dia de P entecostes, em form a
de fogo. —• P e n e tra no C enáculo e contem pla o e spanto dos
A póstolos ao o u v ir aquele ven to im petuoso... ao v e r que a
casa toda trem ia e p arecia v ir a te rra ..., ao p erceb er aquela
chuva m isteriosa de línguas de fogo que poisavam sobre a
cabeça de cada um d eles... e depois, o gozo im enso ao
sentirem -se cheios do E sp irito S an to e d o s seus dons e
g ra ç a s... e sobretudo do am or ardente a b ra sa d o r que é o
divino E sp írito Santo.
E que sentiria a S antíssim a V irgem ? ... E la foi a p ri­
m eira a com preender a chegada do E sp irito S a n to ... e
sem se a ssu sta r com aqueles sinais violentos que a acom ­
panharam , recolheu-se fervorosam ente no seu in te rio r p a ra
m elhor o receber. — Q u e p razer n ã o receberia, p o r assim
M aria e a vida d o E sp írito S a n to 27*

dizer, o E sp írito S an to ao en co n trar um a alm a tã o bem


disposta como a de M a r i a ! ... Se já lhe tin h a d ad o antes a
plenitude d a sua g ra ç a ... que m ais po d ia fa ze r com E la o
E sp írito S an to neste dia? — M ilagrosam ente au m entaria a
sua c a p a c id a d e ..., d ila taria o m ais possível o seu c o ra ç ã o ....
p a ra te r a satisfação de to rn ar a enchê-la de n o v a s g ra ç a s...
de n cv o s p riv ilé g io s..., d e novo e m ais a b ra sa d o am o r...
A joelha-tc d iante d a tu a querida M ãe e adm ira essa
g ra n d ez a im e n sa ..., quase infinita e d ivina de que a vês rev es­
tid a hoje ao receber o E sp irito S a n to ... V ê -a hoje mais
p u ra ; se é possível, m ais b ra n c a ... m ais resp lan d ecen te....
mais s a n ta ..., m ais cheia do am or de D eus e dos h o m e n s.—
Se a g o ra lhe aparecesse o A rcan jo com certeza em udeceria...
pois n a sua linguagem an gélica n ã o e n co n traria expressões
p a ra sa u d a r dignam ente a M a ria. — S alte de gozo o teu
c o raç ão ante este p ensam ento e pede a tu a M ã e um pouqui­
nho do que ela tem e possui.

3.” — E feitos. — A ) F icaram todos cheios do E spírito


S a n to . Com que g enerosidade se nos dá o que é cham ado
Altíssim o dom de D eus»! E que tran sfo rm ação causa nas
alm as! V ê os A póstolos m udados num in stan te nou tro s
hom ens... são os m esm os que fugiram h á uns dias c o b ar­
dem ente... ou negaram a C risto com o S. P e d ro ... c u
d uvidaram das p a la v ra s d o M estre, como o s discípulos de
Km aus e S. T om é. — M a s a g o ra de cobardes, tornaram -se
anim osos e v a le n te s..., de fracos e m iseráveis, fortes e
In vencíveis..., de ig n o ran tes e rudes, dóceis e m uito sá b io s...,
de invejosos que não asp irav a m sen ão aos prim eiros p ostos,
corações cheios de a rd en te caridade. O h ! que m udança
e x traordin ariam ente m ila g ro sa !
B) ...e logo a seguir com eçaram a fa la r... Isto é, a
p re g a r..., a tra b a lh a r pelas a lm a s... a com unicar-lhes o fruto
<lo dom que tinham recebido. — É p ró p rio d a c arid ad e do
K.spiritò S anto difundir o bem por toda a p a r t e .—- M as
272 M aria e a vida d o E sp írito S a n to

com preende bem que essa a ctiv id ad e p a ra ser frutu osa, há-de
se r in sp irad a e dirigida pelo E sp írito S a n to ; se assim, n ã o for,
se rá com pletam ente inútil e a té às vezes prejudicial.
O ...D izia m louvores a D eus. A s alm as cheias de
D eus não sabem fa la r d o u tra coisa. — E de que é que iriam
fa la r os A póstolos assim a b rasa d o s e im pelidos pelo E sp írito
S a n t o ? — E xam ina se te a g ra d a falar de D e u s..., se nessas
c o n v ersa ç õ es encontras c o m p lacên cia?..., e p o r aí deduzirás
a quan tid ad e que tens de espírito de D eus porque cad a espírito
m ove a fa la r segundo ele é ...: o m undo, de coisas m undanas
e te r r e n a s ...; o espírito carnal, de coisas b a ix a s e r a s te ir a s ...;
o esp írito próprio, das coisas pessoais de cada um, dc, eu tr a ­
zido ã baila a cada p a sso ...
4 .“— •O E spírito S a n to em ti. — N ã o esqueças que tu
tam bém recebeste o E sp írito S anto no B aptism o, que te fez
filho de D e u s... na confirm ação ao confirm ar-te n a fé e ao
to m a r-te sob a sua p ro te c ç ã o ..., em todos o s sacram entos
m ediante a infusão d a v id a divina pela g ra ça sa n tific an te...
N ã o esqueças tam bém que o E sp irito S anto h a b ita nas alm as,
com o no seu tem plo viv o , e p o rta n to que o tens m uito
p e rto ..., no teu p ró p rio c o ra ç ã o ..., que é ele que te su ste n ta...
e a ju d a e ilum ina e guia, com o pela m ão, no cam inho da
perfeição. — A g radcce-lhe a su a caridade inexgotável, que
n ã o se cansa de ti..., nem das tu as ingratidões. — Prom ete-lhe
c o rresp o n d er m elhor aos seus dons d iv in o s..., tra b a lh a r m ais...
e c o o p era r com m ais interesse n a o b ra d a g ra ça .— E ncom enda
isto à Santíssim a V irgem , p a ra que seja ela que p re p a re o
teu coração, como p re p aro u o dos A p ó sto lo s... fazendo mais
fru tu o sa e perene a v in d a do E sp írito Santo.
74. Últimos anos de Maria

N ã o sabem os n a d a de certo, m as é fácil a d iv in h a r qual


seria a v id a d a S antíssim a V irgem nos seus últim os anos.

,1.° — V id a d e oração. — V id a de o ra ç ã o sem pre a teve


a V irgem S antíssim a visto que nunca perdeu a presença de
D eus. nem antes nem depois d a In carn ação . — M a s no fim
da sua vida esta o ra ç ã o teve que ser ain d a m ais intensa,
se é possível. — Com o poderia ela e sta r um m om ento sem
pensar em seu d ivino Filho? N ã o se re co rd a ria dele sem
c e ssa r? ... N ã o e staria recordando-se incessantem ente das
suas p a la v ra s ..., dos seus m ila g res..., da su a p re g a ç ã o ...
da sua P a ix ã o e m o rte ..., da sua R essurreição e A sce n sã o ...,
do seu am or, enfim , p a ra com os hom ens?
Diz o E v an g e lh o que M a ria g u a rd a v a tudo o que
dizia Jesus, já desde M enino, no fundo do seu c oração e que
a sós o m editava c o n sig o ... S eria p o rta n to possível que
vivesse a g o ra sem e sta m editação, E la que n ã o v iv ia senão
de Jesus e p a ra Jesus?
P o r o u tra p arte, já h a v ia term inado as su as obrigações
cie M ã e ... as o cupações da casa já lhe n ã o levavam tem p o ...,
vivia cuidada com todo o carinho n a casa de S. João. —
P o rta n to todo o tem po o em p regaria em fa la r e conversar
com seu Filho e com o seu D eus. —- fi m uito n a tu ra l su p o r
<|iie com frequência, talvez d iàriam ente visitaria os lugares
santificados p o r seu F ilho.-—-A com panha-a nestas visitas
c vê-la-ás e n tra r no Jardim das O liv eiras e ali p a ssa r longo

18
274 Ú ltim os anos cie M acia

tem po reco rd an d o t- contem plando a agonia de Jesus n aq u ela


c o v a ... D epois vê-a subir a o C a lv á rio p e rcorrendo um a a um a
as estações da V ia -S a c ra , e p ro stra r-se no lu g a r d a cruci­
fix ã o ... e b e ija r a loisa do sa n to se p u lcro ... e v o lta r um a
vez m ais, p o r aquele mesmo cam inho de a m a rg u ra, que no
d ia d a sua soledade E la p ercorreu.
P e d e à Santíssim a V irgem que te deixe subir com ela
e segui-la nestes p a sso s... especialm ente q u an d o fazes a
V ia -S a c ra c u m editas n a P aix ão . — P ensa pois quão d ev o ta
e am orosa seria esta o ra ç ã o da Santíssim a V irg em ! e e n v er­
g o nha-te d a tu a ..., tu, que tens m uito m aior necessidade d e
o ra r e de m editar do que E la ! ...
2. ° — V id a de fervo r. — Se não há san tid ad e sem
fe rv o r..., qual seria o d a S antíssim a V irgem , visto que a
sua san tid ad e foi tão e le v a d a ? ... C oncebes sequer a possibi­
lidade de N ossa S en h o ra fa ze r algum a coisa de qualquer
m a n e ira ..., sem v o n tad e n en h u m a ..., <à fo rç a ..., tibiam ente?
— É p a ra v e r como se esforça a cad a in stan te p o r se rv ir a
D eus com o v e rd ad e ira e sc ra v a sua, cada vez mais e
m elh o r..., aum entando a sua c a rid a d e ..., a sua rectidão de
in te n ç ã o ..., o seu em penho sum o em cad a obra.
N a v id a de perfeição o p a ra r já é v o lta r a trá s ...
Im agina pois o contínuo crescim ento das v irtu d e s na S a n tís­
sim a V irgem e com o co rreria pelo cum o altíssim o d a sa n ti­
d a d e ! ... E n v erg o n h a -te d ian te dela e p en sa: E la sem pre
p u ra ..., sem pre s a n ta ..., sem pre cheia de g ra ç a ... aspira
c ontudo a m ais e a m elhor, sem deter-se e sem d ize r nunca
« b a sta » ... E tu, que fa z e s? ... R esponde com franqueza o que
te diga o co ração ...
3. “ — V id a E ucarística. — C ertam ente que a su a vida
teve que ser, nestes anos, eminente.mente e u c a rís tic a ... Q uem
po d erá com ungar com o ela c o m u n g a v a? ! Se a com unhão é a
união m ais íntim a d a alm a com D eus, com o a faria E la ? ...
N ã o lhe p areceria que de n o v o se re n o v av a a in c a rn a ç ã o ...
Ú ltim os anos de M aria 275

e que ao reccbê-Io na com unhão o u tra vez sentia a presença


efectiva, real e v e rd a d e ira de seu Filho? — N ã o duvides de
que nem um só dia deixou de c o m u n g a r... de que a com unhão
seria p a ra ela o acto central de cada d ia e ... que as h o ras
todas lhe pareciam poucas p a ra se p re p a ra r e p a ra d a r a
acção d e g raças.
E se a com unhão bem feita b a sta p a ra fazer santos
que faria n a alm a d a Santíssim a V irgem ? — C alcu la os
efeitos que produziu em tan ta s alm as b o a s... Q u a n ta s não
houve loucas de am or pela E u c a ris tia !... e com preende, se
podes, o que seria a Santíssim a V irg e m .— T u tam bém deves
cen tralizar toda a tua v id a n a E u ca ristia . — A com u n h ão ...,
a v isita ao S an tíssim o ... devem ser o.s aceos m ais im portantes
d e la .... m as lem bra-te d a Santíssim a V irg e m ..., im ita-a ...
pede-lhe..., faz-lhe su av e violência p a ra que te não deixe
,■ te ensine a com u n g ar com fe rv o r...

4.° — V id a d e sacrifício. — a ) N a obediência, n ã o só


i\ lei evangélica m as a tudo o que S. P e d ro e o s A póstolos
ordenavam p a ra bem da I g r e ja .—'N u n c a se ex ce p tu o u ...,
nem se julgou disp en sad a de n a d a ..., a prim eira em o b e ­
decer e em sujeitar-se a tu d o ..., v e n d o nos que m andavam
os representantes d e D e u s..., e nos seus m an d ato s a v ontade
divina.
b) N a pobreza, v ivendo de esm ola, com o seu Filho
linha vivido, e co ntentando-se com o que os A póstolos d istri­
buíam às v iú v as e aos dem ais fiéis..., sem consentir que se
fizesse com ela distinção de espécie algum a. — M uitos
creem que am ou tan to a pobreza, que v ira p ra tic a r com
lunlo fervor e am or p o r seu Filho, q u e foi a prim eira a
fnzer v oto da m esm a..., sendo o m odelo das alm as que
depois, a im itaç ão ... sua, escolheram volu n tariam en te este
modo excelente e san tificad o r de vida.
c) ‘ N a m ortificação, g u ard an d o a tem p eran ça e a
abstinência de m odo adm irável e celestial, com o diz
2 76 Ú ltim os anos d e M aria

S . A m b ró sio ... tom ando sem pre com idas o rd in á ria s e aju n ­
tan d o sem pre frequentes jejuns e penitências, com o E la
m esm o revelou a S a n ta Isabel. — D o mesmo m odo consta
que dorm ia só o indispensável p a ra v iv er p a ssa n d o grande
p a rte d a noite de v ela, p a ra p o d e r en treg ar-se m ais à oração.
— E m cad a um destes pontos faz um pouco de com paração
en tre a tu a vida e a s u a ... e com preenderás q u ã o pouco
e sp írito de m ortificação te n s... e com o te e n g an a s quando
ju lg a s ter feito m uito com os teus pequenos sacrifícios.
5. ° — Vi da de p u reza e castidade virginal. — Sem p
V irgem , parece que no fim da sua v id a quis m ostrar-se
a in d a m ais am ante d esta flor v irginal. — C om o se nela
quisesse deix ar-n o s a re co rd a çã o m ais perfum ada das suas
v irtu d e s..., o seu testam ento m ais querido e m ais digno de ser
im itado p o r nós. — A n ossa M ãe é ..., «a V irg em das
V irg e n s » ...; a Ig reja e.m coro cham a-lhe «a m esm a V irg in ­
dad e» quando diz: « S a n ta e im aculada V irg in d ad e, n ã o sei
com que p a la v ras te posso lo u v ar dignam ente». Im ita em tua
M ã e aquela m odéstia e x te rio r nos seus o lh o s..., n a s suas
p a la v ra s ..., e,m todo o seu sem b lan te... e com essa m odéstia
esconde a v aram en te no fundo da tu a alm a o tesoiro da tua
p u re z a e c astid ad e ...
6. —- V id a de caridade e am or às almas. — P ed in d o por
to d o s e em especial pelos p e c a d o re s..., n ã o se deveriam
a estas orações aquelas prim eiras conversões m ilagrosas que
re aliz a ram os A p ó sto lo s? ... C om o p ediria pelos p e rseg u i­
d o re s ? ... C om e pediria p o r S aulo p a ra fazer dele um
S . P a u lo ? ... A lém disto este am or às alm as m anifestava-se
a ju d a n d o a todos com as su as p a la v ra s ..., ensinando os
m istérios da fé que E la tã o bem c o n h ec ia ... e anim ando aos
fiéis, em especial com o seu exem plo... Q u e p re g aç ão mais
eficaz p a ra todos a d a sua v id a!... P o r que n ã o é assim a tua?
S u p lica à Santíssim a V irgem que se interesse p o r ti... e
p e ça ao S enhor p o r ti, p a ra que te alcance o s a b e r im itá-la
nalg u m a coisa da su a vida santa, p u ra e im aculada.
75. M orte de M aria

1.” — R ealidade da sua m orte. — M a ria m orreu real-


m ente a p esar de não e sta r sujeita à m orte. — E sta é castig o
do pecado e p o r isso não po dia ser castigo d a alm a santíssim a
c puríssim a de M aria. — E la não teve nem pecad o o rig in a l...,
nem a c tu a l..., nem m ancha da .mais peq u en a im p e rfeiç ão .—
C ontudo D eus quis que m o rresse..., p a ra im itar assim
n seu Filho que tam bém m o rre u ...; p a ra au m en tar ainda
mais os seus m erecim entos, passando p o r essa hum ilhação
tão terrível e re p u g n an te que não m e re c ia ...; sobretudo p a ra
servir-nos de m odelo e consolação n a nossa m orte.
Foi m uito conveniente que C risto m orresse p a ra satisfazer
nhundantem ente p o r n ó s..., p a ra v e n ce r com a sua m orte
n m orte do p e c a d o ..., p a ra m ostrar-nos que e ra verd ad eiro
homem, igual a nós, capaz de so fre r..., de se n tir..., de
pndccer..., de m o rre r..., como os o u tro s ..., p a ra e x perim entar
em si as angústias d a m orte e se rv ir-n o s de exem plo adm irável
de fortaleza e paciência na nossa agonia. — Portanto., se foi
conveniente que C risto m orresse, n ã o o h a v ia de ser que
m orresse também, sua M ã e ? ... Se m orre o R e d en to r n ã o h a v ia
de m orrer tam bém a C orredentora?
Pensa, p e ran te a realidade d a m orte de M a ria , na
m ilidnde da tu a ... T u sim, que realm ente tens que m o rrer...,
necessariam ente tens que m o rre r..., po is se a m orte entrou
lio inundo pelo p e c a d o ..., os teus pecados m ereceram mil
278 M o rte d e M aria

m o rte s... Com ela deves sa tisfaz er a D eus pelos pecados que
com eteste...

2." — M o rte de am or. — M a ria m orreu de am or. E sta foi


a doença de toda a su a v id a. S a n ta T e re sa de Jesus m orria
po rq u e não m orria de am o r... A b e ata Itnelda m o rreu num
ê x ta se de a m o r... E assim o utros santos não podendo resistir
à força do fogo do am or que os a b rasa v a , tiveram que
m o rre r... E que seria en tão com a Santíssim a V irg e m ? ...
Só é p a ra adm irar que tivesse podido v iv e r... isso era um
m ilag re co n tín u o ... po rq u e naturalm ente devia m orrer.
N u n c a v iste á rv o re s c a rre g ad a s d e fru to s sem poder
com eles? ... Assim foi a Santíssim a V irg e m ..., á rv o re riquís­
sim a que não pode su s te n ta r o fruto daquela preciosíssim a
alm a que, c arre g a d a desde o prim eiro instante com a plenitude
d a graça, foi crescendo e aum entando sem cessar em todos
os m om entos da sua v id a ... Com o pôde aquele c o rp o ainda
que tão p u ro ..., tão sa n to ..., tão im a c u la d o ..., su sten tar
aq u ela alm a, que já desde a sua conceição se e le v av a com
fo rça irresistível até ao céu?
A lém disso qual se ria a dulcíssim a e ao mesmo tempo
violentíssim a força com que Jesus a tra iria a alm a de sua
M ã e ? ... E qual n ã c seria o desejo d esta branquíssim a pom ba
de v o a r p a ra o seu Jesus?—N ã o há dúv id a de que p a ra ela se
escreveram aquelas p a la v ra s: A i! q u a n to se prolonga o meti
d esterro !... Q u a n to tem po v iv i com os habitantes de Cedar
e a m inha aêma andou peregrinando nesta v id a !... O u tras
v ezes com m ais a rd o r do que D a v id ex clam aria: C om o o
c ervo corre para a fo n te das águas, assim m inha alma te
desaja a ti, m eu D eus. Q u a n d o m e partirei e lme apresentarei
diante de ti?... E nfim falan d o com c s anjos dir-lhes-ia
aquilo do L ivro dos C a n ta res: C o n ju ro -vo s, m oradores da
celestial Jerusalém, que, s:e encontrardes o m eu am ado, lhe
digais que estou d oente d e am or...
E assim se foi ab rasa n d o cada vez m ais aquele vulcão
Morte de Maria 279

■que a rd ia em sua alm a até ch eg a r a consum i-la p e r com ­


p leto ... N ã o d esejarias o mesmo? ... P o r que não a m a r assim
o teu D eus? P o r que não d eix ar-te a b ra sa r por E le, se ele
q u e r acender n a tua alm a este ío g o d iv in o ? ... Q u e verg o n h a
p e n sa r que tudo depende de ti..., que a culpa de que assim
n ã o seja está em ti... e só em ti...

3.“ —•A g o n ia suavíssim a. — D eus não pôde resistir


m ais e resolveu condescender com estes am orosos desejes. —
S egundo a trad ição , m andou o a n jo S. G ab riel com esta
m ensagem am abilíssim a: «A ve, cheia de graça, muito' mais
dc que no d ia da A n u n c iaç ão ... O S e n h o r ouv iu o s teus
anseios e m anda-m e dizer-te que te disponhas a d e ix a r a
terra porq ue q uer já co ro ar-te n o c é u ... E ia ! P re p a ra -te
depressa porque todos os anjos suspiram p o r te r e.m sua
com panhia a su a R a in h a e S enhora». — C ontem pla de novo
a V irgem Santíssim a a o u v ir com toda a hum ildade esta
m ensagem ... O u tra vez se p ro stra em te rra ... e o u tra vez
repete: E is aqui a escrava do S e n h o r; faça-se em mim
segundo a v o ssa palavra.
A g o ra contem pla o discipulo a m a d o ... N o to u bem que
M aria v ai p a ra o c é u ..., e só o p en sar nisso o im pressiona...
Q u e fará se lhe tiram aquela jóia? ... A costum ado àqueles
o lh are s m ate rn a is..., àqueles carinhos am orosíssim os..., como
poderá v iv e r... D ifícil é com preender qual seria a sua d o r...
E le que a recebeu com o um teso iro n o C a lv á rio ... e que
com o ura a v a ro a g u a rd ara cora toda a solicitu d e..., com
cuid ad o s e desvelos d iá rio s... e a g o ra a m orte ia a rreb atar-lh e
tu d o !...
Junta a isto a dor dos o u tro s A póstolos e discíp u lo s....
a dor dos c ristãos todos e em p a rticu la r a d a s sa n ta s m ulheres
em cuja com panhia tinha vivido. — T riste , m uito triste foi
pura todos esta a g o n ia ... Só p a ra E la foi su av íssim a... e
procuraria su a v izá -la aos dem ais, dizendo-lhes: « N ã o choreis
porque vos convém que eu m e vá, p a ra e sp erar-v o s no c é u ...
280 M o rte de M aria

E u estarei convosco até à consum ação dos séculos»... Q ue


prom essa tão consoladora p a ra n ó s ! e como é v e rd ad e que
M a ria está sem pre c o n n o s c o !...

■4.“ — M o rte felicíssim a. — A Ig reja não se entristece


nem celebra exéquias neste an iv e rsá rio da m orte de M a ria.
— Veste-.se de gozo e aleg ria e celebra com g ra n d e solenidade
esta m orte como um a m agnifica fe sta ... É precio sa a m orte
dos Santos, como diz a S a g ra d a E sc ritu ra. — 1E então que
direm os de M a ria? — S. Jo ão D am asccno diz que o p ró p rio
C risto lhe deu a últim a com unhão, dizendo-lhe: R ecebe. M ã e
e S en h o ra m inha, de m inhas m ãos o corpo que tu nte deste
e que em teu preciosíssim o seio se fo rm o u ... E que a
S antíssim a V irgem responderia. — M e u F ilho, em tuas mãos
e n treg o o m eu e sp írito ... E o S enhor então fez sa ir do corpo
aq u ela benditíssim a a lm a ... tom ou-a cm su as m ãos, a o mesmo
tem po que a deliciava com aquelas p a la v ra s: VeSm, querida
m inha! vem , m inha pom ba, vem , que já passou o inverno
deste vale de lágrimas: vem d o Líbano e serás coroada.
Assim m orreu M a ria ..., e só assim podia m o rre r..., com
a m orte d o am or, com a qual «m orreriam o s anjos se estes
fossem m ortais», com o diz S. F ra n c isco de Sales. Q uem nos
d e ra um a m orte se m e lh a n te !... N ã o esqueças que a m orte
é a im agem da v i d a .— Q u e res m orrer com o M a r ia ...; mas
vives como E la? ... D a sua p a rte não te fa lta rá a ju d a e
p r o te c ç ã o ...; que não falte da tua devoção co n stan te e v e rd a ­
d eira à Santíssim a V irgem , que tc assegure um a m orte sa n ta
e suave. P e d e isto com fe rv o r diariam ente à tu a querida
M ã e ...
76. Sepultura e Ressurreição de M aria

1,° — S epulcro. — O triunfo d e M a ria não term in ara


to m a su a santíssim a e inv ejável m orte. —• Sem elhante a seu
Filho em tudo, tam bém d e v ia sê-lo n a glória d o seu .sepulcro
i no triunfo da sua R essurreição. — O hcm em , ao m orrer,
cai vencido peio po d er inexorável d a m orte que o lev a a
corrom per-se e a desfazer-se num sepulcro. —■P o r isso é
tão frio ... tão tris te ..., tão hum ilhante p a ra nós o sepulcro.
— M as não foi assim p a ra M a r i a ...; o seu sepulcro não teve
n ada de rep u g n an te e repulsivo. — Se é m uito corrente sen tir
gosto em e sta r junto do c ad á v e r de um a pessoa que m orreu
c.m o d o r d e san tid ad e, o que seria e star junto do corpo m orto,
sim, m as sem pre virgem e im aculado d a Santíssim a V irg e m ? ...
Im agina como m elhor puderes a cena que se p a ssa ria n o
en terro d a Santíssim a V irgem . — Q u e p e n a e que descon-
consolação p a ra todos, ao v e r fechados aqueles suavíssim os
olh o s..., em udecidos aqueles lábios que tan ta s p a la v ra s de
consolação p ro fe rira m ..., im óveis aquelas m ãos virginais
que tan ta s bênçãos e gra ça s haviam re p a rtid o ..., e ao m esmo
tem po que c o n so laç ão ..., que sa tisfa ç ã o ..., que p ra ze r não
receberiam todos ante a p lacid ez... e o fulgor espiritual
daquele c a d á v e r..., com o perfum e que e x a la v a ..., com o
arom a que despedia e que tudo em balsam ava!
V ê com o os A póstolos e todos os ali presentes beijam
reverentes aquelas m ãos e aqueles p é s... e despedindo-se
282 S e p u lta ra e R essurreição de M aria

•daqueles sa g rad o s despojos a acom panham ao lu g ar da


s e p u ltu ra ..., acendem fa ch o s..., queim am p erfu m es... esp a ­
lham flo res..., en q u an to os a n jo s fazem o u v ir os seus cânticos
celestiais, não de lu to ..., nem de p ra n to ... m as de glória
triunfal.
E assim colocada, com o seu Filho, num sep u lcro novo
a deixaram os A póstolos, ficando como g u a rd as do mesmo
o s anjos do céu. — F ic a tu tam bém a a co m p an h a r o santo
c o rp o ... e tom a p a rte n o s coros dos anjos p a ra c an tar com
eles os louvores de tua M ãe. —■Pede-lhe que tam bém com
os anjos os p o ssas c a n ta r um dia n o c é u ...

2.° — Incorrnpção d o corpo im aculado. — O triunfo de


M a ria sobre a m orte exigia a inco rru p ção d o sepulcro. — E sta
g ra ç a sin g u lar concedeu D eus aos corpos de m uitos c an to s...
e po d eria negá-la a su a M ãe? ... Com m uita ra zã o diz S. João
D am asceno: «Com o po d eria e n tra r a co rru p ç ã o num corpo
d onde brotou a vida?».
D isse-se que M a ria é C risto com eçado. P o rta n to como
é que E le ia perm itir, E le qua já e sta v a no c é u ... sentado
à d ireita do P a i... ro d e ad o de m ajestade da glória d iv in a ...
q u e aquele corpo que e ra algum a coisa sua fosse invadido
p e la co rru p ção do sepulcro?
A lém disso, a c o rru p ção do corpo tem a su a ra z ã o de
se r n o p e c a d o ...; este é a sem ente d a q u e la ... P o r con­
se g u in te ... M a ria concebida sem pecado o rig in a l... preserv ad a
■de toda a m ancha e até d a som bra do pecado, teve de carecer
da .mais pequena c o rru p ç ã o ... e — sobretudo — como' poderia
u n ir-se a p ureza v irg in al daquele corpo im aculado com essa
su ja e asquerosa c o rru p ç ã o ? ... N ã o m erecia um prém io espe­
cial, ain d a aqui na terra, aquele corpo que foi o prim eiro a
•consagrar-se a D eus com o v oto de virgindade? — A A rca
d o testam ento foi fab ricad a de m adeira in co rru p tív el... e
a q u ilo era só um a fig u ra ... A realidade é a alm a e o corpo
in co rru p tív el de M a ria ..., A rca v erd ad e ira do N o v o T e s ta ­
S e p u lta ra e R essurreição d e M acia 283

m ento. Pede a M a ria que te faça p a rticip a n te dessa in c o r­


ruptibilidade do pecado, que é a que a ti m ais te im p o rta ...

3." — A R essurreição. — M a s a p ró p ria in co rru p ç ão era


a in d a pouco p a ra re m a ta r o triunfo definitivo d a Santíssim a
V irgem . O com plem ento não podia ser o u tro senão a nova
v id a de um a ressurreição g lo rio sa ..., de um a im ortalidade
com unicada p ela alm a ao seu c o rp o ... p a ra v iv e r um a vidn
que fosse com o a de C risto ..., p a ra n u n c a m ais m o rre r.—
Se dissem os que M a ria é um com eço de C risto ... e que por
is.so não é perm tido se p a ra r a esta M ãe d o seu F ilh o ... era
n a tu ra l que C risto term inasse com aquele estado de violência,
p o r assim dizer, ern que E le se e n co n trav a com relação a
M a ria ... ao estarem sep arad o s os dois, fazendo que re ssu s­
citasse qu an to a n te s... e que de novo se juntassem no céu
os que tão intim am ente h aviam vivido unidos aqui n a terra.
Além disso, o co rp o d a Santíssim a V irgem não foi nela
com o em nós, o casião de p e ca d o ... nem nele se desbordaram
nunca as p a ix õ e s..., nem final,mente h ouve nele a m ais pequena
rebeldia contra o e sp irito ... Q u e harm o n ia! Q u e conjunto, tão
o rdenado e p erfeito form aram sem pre o c c rp o e a alm a de
M a r ia ! ... Q u e subm issão tão com pleta a daquela carne p u rís­
sima àquele espírito cheio de D e u s ! ... P o rta n to era justo
que não estivessem sep arad o s a g o ra ... senão que, em. prém io
dessa sujeição. D eus os tornasse a un ir p a ra que juntos
continuassem a se rv ir e a lo u v ar ao Senhor.
Im agina pois aquele ditosissim o in stan te em que pela
virtude e om nipotência de seu d ivino F ilho, o corpo da S a n ­
tíssim a V irgem , recebendo da sua alm a urna v id a nova, se
lev a n ta v iv o ..., g lo rio so ..., triu n fa n te do se p u lcro ... Q ue
radiante e staria de alegria aquele santíssim o corpo vendo-se
unido já inseparavelm ente àquela benditíssim a a lm a !...
Q u a l não seria a sua fo rm o su ra..., se já antes era tão
form osa no seu c o rp c! — C ontem pla a adm iração dos A p ó sto ­
los quando de m anhã, segundo costum e daqueles dias, foram
284 Sep u ltu ra e R essurreição de M aria

a v isita r o sepulcro e se enco n traram só com o perfum e que


o seu corpo ali h a v ia d e ix a d o ... C om o se re n o v aria neles
a im pressão d a R essurreição de C ris to !... C om o se a le g ra ­
riam d e que assim houvesse ressuscitado a su a M ãe! —
A le g ra-te tu tam bém ..., d á os p a rab é n s ao F ilh o e à M ãe,
e pede-lhes de novo a p a rticip a çã o n aq u ela sua união
in se p a rá v e l... e e te rn a ... prom etendo-lhes que n ã o te a p a r­
ta rá s nunca deles nem nas p en as nem nas a le g ria s..., nem
n a lu ta nem no triunfo.
77. À sua Assunção gloriosa

l.° — A Im aculada C onceição e a A ssu n çã o . — S ã o dois


m istérios d a S antíssim a V irgem que têm entre si íntim a
relação. —• A ig reja assinala os dois e realça-os sobre todos
os outros co n serv an d o o dia san to destas festas depois de
ter suprim ido o u tro s d a Santíssim a V irg em . — A Im aculada
C onceição e a A ssunção sã o o princípio e o term o da vida
da Santíssim a V irg em n a te rra ... e estes dois extrem os estão
tão unidos entre si que um vem a se r com o que a cau sa ou
a razão do o u tro ... Se é Im aculada n ã o pode ficar no
se p u lcro ... necessariam ente há-de subir ao céu.— A C onceição
im aculada é um p riv ilé g io ... um a excepção do pecado com que
Iodos nascem o s... A A ssunção é o u tra excepção d a reg ra
g eral que todos tem os de seguir n a nossa m orte. — P o r isso
M aria m ais do que m orrer, o que faz é d eix ar a sua m orta­
lidade no se p u lcro ... e assim com o foi concebida p a ra a g ra ça
foi concebida p a ra a glória a tra v és da m orte do corpo, m as
vencendo a m orte. — N u n c a foi e scrav a do pecad o nem na
sua C o n ceição; p o r isso foi Im a c u la d a ...; não pôde ser
e scrav a d a m orte n u n c a ; por isso foi lev ad a ao céu em
corpo e a lm a ... D este m odo a A ssunção da Santíssim a
V irgem é o com plem ento necessário d a sua C onceição
Im aculada.
285 -A sua A ssu n çã o gloriosa

2. ° — A verdade da A ssu n çã o . — A Ig reja já celebrava


esta festa com o um a das su as g randes solenidades. N o d ia 1
de N ovem bro de 1950, P io X II satisfazendo' os anseies de
te d a a Ig reja p ro clam av a finalm ente com o dogm a a A ssunção
de N o ssa S enhora ao céu. —<P a ra o coração cristão não h a v ia
possibilidade de dúvida. — A A scensão de Jesus aos céus
tem relação d irecta com a sua P a ix ã o ... Pois bem, se r. p a ix ã o
dolorosa acabou p a ra Jesus n a glória d a ,sua A sc e n sã o ..., p a ra
M a ria, que tão unida esteve a seu F ilho no C alv ário , h a v ia
de a c a b a r no triunfo d a A ssunção.
T o d o s havem os de re ssu sc ita r... e esperam os n a sua
g raça que havem os de subir a o c éu ... M as n ã o era justo que
M a ria se adiantasse e com o M ãe nos p rep arasse a n o ssa
m o rad a e casa de filhos n o c é u ? ... F oi a prim eira na
g ra ç a ..., n a sa n tid a d e ..., n a p u re z a ..., no v o to de v irg in ­
d a d e ...; p o rta n to que coisa m ais n a tu ra l que o fosse tam bém
na R essurreição e A ssunção?
Se assim não fosse, po d eríam o s dizer que C risto teria
p rocedido injustam ente com sua M ãe negando-lhe as h o n ras
que concedeu aos corpos m ortos dos outros sa n to s... O nde
e stá o corpo de M a r ia ..., o n d e as suas re líq u ias..., onde o
sepulcro m ag n ífico ..., a u rn a riquíssim a em que se guardam
os seu s restos? — N ã o existe n ada d isto .... nem pode
e x istir... C onclui pois com um acto de fé nesta v e rd a d e ....
certa e indubitável da A ssunção em co rp o e alm a ao céu da
tua querida M ãe. — D á p o r isso g raças a o S e n h o r...,
p a rab é n s à V irgem Santíssim a, visto que pela A ssunção
ocupa o lu g ar que lhe corresponde no reino de D eus.

3. ° —■A glória da A ssu n çã o . ■


— C ontem pla pela últim a
vez aquele sepulcro, donde v a i a b ro ta r de repente como
um a explosão de luz n o meio das trevas, a v id a triunfante
d a m orte. — N o s três dias que aquele co rp o im aculado
esteve n o sepulcro, foi g u a rd ad o e custodiado p o r anjos
enviados p o r D eus desde o céu, como escolta de honra
A sua A ssu n çã o gloriosa 28 7

a que ia se r d e n tro em p ouco c oroada como ra in h a de todos


eles. ■—• O u v e aquelas m úsicas celestiais que, p a ra h o n rar
aquele corpo virg in al, en toariam os anjos sem cessar. —
E sc u ta aquelas exclam ações com a s quais fariam docc
violência ao Senhor a o rep etir sem cessar as p a la v ra s do
salm o, que p arece escrito p a ra esta o casião: L eva n ta -te.
Senhor, vem para o lugar do teu descanso, I S i c a A rc a da
tua sa n tid a d e... L ev a n ta -te às altu ras do teu tro n o ..., senta-te
á d ireita de teu P ai, que é o lu g ar que te c o rre sp o n d e ...,
.mas leva contigo a A rca S a g ra d a onde estiveste e n cerrad o ...,,
onde foi d epositado o infinito tesoiro d a tu a sa n tid a d e ...;
glorifica já essa carne bendita e esse sangue puríssim o que
serviram p a ra form ar o teu sacratíssim o c o rp o ... e te deram
m atéria p a ra o fe rta r a teu P ai a hóstia de re p a ra ç ã o e
santificação pelos p ecados do m undo inteiro.
E com efeito, chegou o m om ento d itoso em que D eus
quis d a r execução a estes desejos d o c é u ... e p o r ordem
sua desceu a alm a de M a ria a unir-se de n o v o com c seu
co rp o ... e aquele corpo, assim v ivificado com a vida d a
Im ortalidade, com eçou a subir ao céu, segundo diz a Igreja,
tom o natu ralm en te sobe às alturas a nuvem de fum o do
Incenso.
P á ra a c o n tar o núm ero sem núm ero de anjos que em
legiões cerrad as descem do céu p a ra a co m p an h a r o triunfo de
M a ria ...; as suas m úsicas e os seus hinos d e glória fendem
n.-i ares com as mais doces e suaves h a rm o n ia s... O gozo
que experim entam é inexplicável. — D eus aum entou hoje a
mm glória e felicidade... Q u e cortejo tão form osíssim o! —
T odos brilham com n o v a luz neste d ia e ... contudo, no meio
deles..., com o a lua en tre as estrelas, sobressai o b rilh o ...,
o esp len d o r..., a puríssim a form osura da S antíssim a V irgem ,
ii qual, pela m ão de seu F ilh o (que quis v ir em pessoa a
busca la e fazer ccm a sua presen ça m ais so le n e..., m ais
grandioso o triunfo de su a M ã e )... v a i lentam ente deixando
a te rra ... pisando as n u v e n s... e a tra v essa n d o as m ais altas
288 A sua A ssu n ç ã o gloriosa

e sfe ra s... chega às m esm as p o rta s do céu, o n d e nov o s anjos


im pacientes saem a e sp e ra r aquela m agnifica procissão que
s o b d a te rra ao céu.
A ssim acaba a cena d a te rra e com eça a glória do céu.
R eúne n a tua im aginação tudo q u an to d e grande e esplêndido
p o ssas im aginar, po rq u e tudo será n a d a em co m p aração com
a sublim e e grandiosa re a lid a d e ... — V ê -te com tan ta peque­
n e z ..., ccm tan ta m iséria ..., d ian te da g ran d eza da tua
M ã e ... e lev an ta-te com ela, sobre as coisas d a te rra ... T ra ta
em especial de im itar a hum ildade que teve nesta vida, p a ra
que depois, com E la e com o e la ... seja a tu a alm a exaltad a
e sublim ada n a ou tra.
78. A sua coroação no céu

l.° — A entrada no céu. — Q uem p o d e rá desde este


m undo conhecer o que ali se p assaria ao e n tra r N o ssa S enhora
no c é u ? — R eco rd a-te de Judite quando com a cabeça de
I lolofernes nas m ãos chega a Betúlia e todos em tropel correm
,10 seu e n co n tro ..., acendem fachos em sinal de a le g ria ... e
em alta voz a aclam am e a bendizem , dizendo: F oste aben­
çoada pelo S e n h o r m ais d o qtíe todas as m tdheres d a terra
<■ Ixm dito seja o S e n h o r que te fe z tão grande com esta
façanha: nunca os louvores faltarão em tua h o n ra ... E sta
é a fig u ra ... M u d a a g o ra Judite p o r M a ria ..., a Betúlia
pelo céu, os seus h a b itan tes pelos a n jo s ..., as suas vozes
e aclam ações pelas dos espíritos b e m -a v en tu ra d o s... e deste
.modo d a r-te -ás co n ta da realidade daquela m agnífica entrada.
Im agina esc u ta r à sua chegada o u tra vez aquele diálogo
que se estabeleceu en tre os anjos q u ando da A scensão do
Senhor: A b ri, o rd e n ariam os anjos que a acom panhavam ,
nhri as vossas portas, príncipes da g ló ria ... e vós, porta;
eternas, leva n ta i-vo s e dal passagem ã R ainha d o céu ...
lí Im ediatam ente as p o rta s se franquearam to d a s ... e então,
lOrn inexplicável pom pa e m aje stad e ... e n tra ria naquela
gloriosa corte a n o v a S oberana.
V ê como todos os cortesãos d o céu correm à porfia a
i (intem plar a nova R ain h a e ao v ê-la tão form osa pergun-
tnrtnm uns aos o u tro s ...: Q uem é esta que vem d o deserto
19
!90 A sua coroação no céu

do m undo, lugar de abrolhos e de espinhos, se la va n ta a estas


alturas, não sustentada p o r m ãos de anjos, m as apoiada nos
braços d o m esm o D e u s...? E o u tro s responderiam : «È a m ãe
do nosso D eus e do nosso R e i..., a santa d e s sa n to s ..., a
p uríssim a e im a c u la d a..., a obra m ais form osa da criação
in te ira ..., a que v ai ser co ro ad a com o nossa Rainha;.-. E scu ta
com o e n tã o tom ando todos nas suas bocas angélicas as
p a la v ra s do arcan jo S. G abriel, responderiam num coro
u n ísso n o ..., form idável que faria v ib ra r d e em oção e de
entusiasm o a todo o céu, dizendo-lhe: «A ve, cheia de g ra ç a ...,
b envinda sejas a esta m orada da glória que vens perfum ar
co.m a tua form osura e sa n tid a d e ... po rq u e tu sem pre estás
com D eus e D eus c o n tig o ...; p o r isso és a bendita entre
to d as as cria tu ra s e v ais ag o ra sen tar-tc no trono mais
a lto ... no trono m ais perto- de Deus'-;. U n e-te aos a n jo s...,
a leg ra-te com eles..., m ais ainda do que eles porque se eles
A cham am R a in h a ... tu podes cham á-l’A M ã e ...; e tem um
san to o rgulho ao v e r assim a tua M ãe, m ais esplendorosa
do que a a u ro ra ..., m ais bela do que a lu a ..., m ais re sp lan ­
decente do que o so l... tem ível com o u,m exército em ordem
de b a ta lh a ..., aclam ada p o r todas as jera rq u ia s e coros
angélicos n a sua e n trad a triunfal na g ló ria ...

2." — A coroação. — A p e sa r de tudo isto ser jã m uito


belo11n ã o era sen ão o com eço. A grande apoteose verificou-se
quando o D eus do céu sain d o ao seu encontro A convida
a sentar-se no trono eme correspondia à sua dignidade
de M ãe de D e u s... e a ser coroada como R ainha. Vem
e se rás coroada dir-lhe-ia, com a coroa preparada desde
toda a eternidade. — R ecorda as p a la v ra s de S. Paulo
q u ando falando do céu dizia que nem os olhos viram,
ne/n os ouvidos ouviram , nem o coração d o homem
pod ia chegar a com preender o qtie D eus tinha preparado
para os que o a m a m ... Q uem poderá pois im ag in ar o que
teria p re p a ra d o p a ra A quela que desde o prim eiro instante

i
A sua coroação no céu 291

d a sua C onceição, já O am ou mais do que tcd o s os santos e


anjos ju n to s ? — E , p o r isso, diz a Ig reja que fo i exalta d a
sobre os coros i h s anjos e dos santos de tal sorte que não
h a ja trono m ais e lev ad o do que o S e u ..., form ando por si Só
um a jerarq u ia à p a rte ..., a m a io r..., a m ais sublime de
tc d a s..., a que m ais glória d a rá a D eus por toda a eternidade.
P e n sa além disso que D eus d á o prém io segundo os
m érito s..., que conform e for o g rau de santidade de um a
alm a. assim será o da g ló ria ... e abism a-te no .mar sem
fun d o ..., verd ad eiram en te im enso..., p a ra nós incom ensurável
e infinito das gra ça s e m éritos da Santíssim a V irg e m ... e
assim poderás form ar um a ideia da im ensidade tam bém
incom ensurável da sua glória no céu. — V ê com o E la vai
m odestíssim a... recolhida no seu in te rio r... com o a v a n ç a ...
levada pela m ão de D e u s..., com o sobe c s d egraus do seu
tro n o ... e se assenta n e le ... e ali é coroada pelo Pai, cem a
coroa d o p o d e r... pele Filho, com a coroa da sa b e d o ria ...,
e pelo E sp írito S anto, com a coroa do A m o r.—'V ê -A
co ro ad a pela p u reza m ais que angélica do seu c o ra ç ã o ...,
do seu e sp irito ..., do seu corpo im a c u la d o ...; pela obediência
mais p e rfe ita ...; pela hum ildade m ais p ro fu n d a ...; finalm ente
por aquela sua ardente caridade que A fez v iv er e .morrer
de am or de D eus.

3." —• A hom enagem . — E assim c oroada recebe as


hom enagens dc todos os hab itan tes do céu. — O Pai e x alta-A
como a sua filha prcdilecta, e M a ria a d o ra -O ...; o Filho
abraça a sua M ãe e a M ã e corresponde-lhe com c a rin h o s...;
o E sp írito S anto une-se inseparavelm ente com a sua E sposa
, M aria dá-lhe em reto rn o todo o am or do seu c o ra ç ã o ...,
r a seguir chegariam as V irgens e saudá-1'A -iam com e ã
V irgem das V irg e n s...; os m ártires sa u d á -l’A -iam com o a seu
modelo, que lhes h av ia dado o exem plo, ao pé da cruz,
ilo sofrim ento e m a rtírio ...; os p ro feta s com o ao cbjecto d a s
Miiis esperanças e san tas im p a c iê n cia s...; os a n jo s com tcd a s
292 A sua coroação no céu

a s suas jerarq u ias com o à sua R ainha e S e n h o ra ..., e chega­


riam tam bém A d ão e E v a e haviam de bendizê-l’A p e lo bem
que soubera re p a ra r o seu p e c a d o ..., pois p o r E la haviam
deixado de se r os seu s filhos, filhos de m ald içã o ... e a sua
prim a, S a n ta Isa b el... e os seus queridos pais, S. Joaquim
c S a n ta A n a ... e o seu p ró p rio esposo, S. José.
V ê com o a hum ildíssim a V irgem assim é e x altad a e
sublim ada, repetindo sem cessar o seu cântico d e a g rad e ci­
m ento a D eus: M a g n ific a i... Q u e bem se entendem agora
a q u elas p a la v ra s: P orque viu a hum ildade d a sua se rv a ...
p o r isso realizou em mim grandes coisas O que é T o d o
P o d ero so ... e por isso cham ar-A Ie-ão b e m -aventurada todas
as g era çõ es...
N ã o te contentes com ad m irá-l’A no seu glorioso
triu n fo ..., nem com c a n ta r o seu p oder e g ra n d e z a ...
A p ro v e ita -te dela e pede-lhe que te ensine o cam inho da mais
p ro fu n d a hum ildade e d a sua im itação, pois M a ria , c oroada
no céu, é a in carn ação e o cum prim ento m ais e x ac to das
p a la v ra s de D eus: Q u e m se hum ilha será e x a lta d o ...
79. A tríplice coroa: A J A do Poder

M a ria foi coroada cora a tríplice coroa do P oder, da


S abedoria e do A m o r... — D etenham o nos a considerar a
grandeza e form osura d esta tríplice coroa.

l.° — O m nipotência de D eus. — R ecorda antes de tudo


o poder infinito de D e u s... Com razão é cham ado O m ni­
po ten te... T u d o p o d e .... não há n a d a que se o p onha à sua
vontade. — À s vezes parece-nos que os hom ens tam bém
podem m uito. Q u a n ta s invenções e quão su rp re e n d e n te s !...
Q u a n to engenho e p o d e r se m anifesta n e la s ! ... E contudo
11<ie ridículo n ã o é o p oder dos hom ens em co m p aração ccm
<> de D e u s !... Q u a n d o parecem que podem m ais é q u ando
n sua im potência se m anifesta m ais n a s dificuldades que
encontram no cam inho e que m uitas v ezes n ã o podem
vencer... Q u a n ta s vezes querem os um a coisa e n ã o podem os
c o n se g u i-la !... e pelo contrário, q u a n ta s vezes a querem os
deter e e v ita r e é-nos im p o s sív e l!... D ian te de um sepulcro
pensa no po d er dos hom ens e rir-te -ás d esta p a la v ra ... N ã o
*r pôde d eter a m o rte .... não foi possível p ro lo n g ar p o r um
minuto aquela v id a ..., n ã o houve forças capazes de e v ita r
n decom posição daquele cadáver, reduzido ag o ra a um
eii|ueleto asqueroso...
Em c o n traste com esta im potência v ê o po d er de D eus
«nu limites de nenhum a espécie. — O que quis fê -lo ..., e
294 A tríplice coroa: A do Podar

fez tudo quanto quis e como q u is... sem m ais lim itações do
que a su a v ontade d iv in a .— T o d a a criação não lhe custou
esforço nenhum .... n ã o se cansou nem se fatigou o mais
m ín im o ..., não necessitou que os anjos o a ju d a ssem ... nem
foi preciso m uito te m p o ...; tudo foi de re p e n te ..., instan ­
tâ n e o ..., do n a d a fez b ro ta r m undos... só com q u e re r...; se
quisesse que tornassem a a p are ce r novos seres m aiores...
m ais num erosos do que os a c tu a is... b a sta v a sem ente um
acto d a sua vontade.
T u d o E le c o n se rv a ..., tudo está nas su as m ãos, de tal
so rte que p a ra reduzir tudo ao nada, n ada m ais tinha a fazer
d o que re tirar as suas m ão s..., d eix ar-n es um in stante sós.
— T o d o o poder dos hom ens não é capaz de c ria r... de tirar
do n a d a nem um a e rv a ... nem um a íorm iguinha, nem é
cap a z de aniquilá-la, nem de reduzi-la a o nad a. — P o r isso os
seus anjos rodeiam o seu tro n o trem endo an te tal p o d e r e
m ajestade. — T o d o s lhe obedecem rev eren tes e estão p e n ­
d e n te s do seu m ais mínimo desejo p a ra executá-lo im ediata­
m e n te .— V ê os elem entos todos: que poder o do f c g o l... o
d a á g u a ..., o do a r ! . . . Q u e força tão gigantesca a do m a r!...
Q u e m ovim entos tão com plicados os desses m undos imensos
que se movem nos e s p a ç o s !... T udo, tu d o ..., a v id a e a
m o rte ..., a saúde e a d o e n ç a ..., o tem po e a e tern id ad e...,
tudo lhe está su je ito ..., em tudo d o m in a ..., tudo lhe
o b e d ec e...

2 .“ — • O m nipotência de M aria. — O ra bem: re p a ra que


esta om nipotência toda foi com o que com unicada à Santíssim a
V irg e m ,— O eterno P ai delicia-se cm coroar com a coroa
do po d er a fronte da V irgem S a n tís sim a ...; eleva-A à altura
d a sua o m n ip o tê n cia... e fá -l’A p articip a n te dos seg red o s do
seu poder. — T em pois a V irgem Santíssim a todo c poder
so b re as c ria tu ra s do céu, da te rra e dos abism os. — Deus
quis prem iar todos os trab alh o s e cuidados com que cuidara
do seu p ró p rio F ilh o e nquanto durou a sua v id a neste
A tríplice corca: A do P oder 295

m undo... e não encontrou n ad a m elhor do que iguaIá-1'A,


se assim podem os falar, à sua mesma d iv in d a d e ..., e este dom
foi o da coroa da suprem a p o te sta d e ... p a ra que assim ccrao
D eus era om nipotente p o r natureza, M a ria fosse om nipotente
por g ra ça ou benevolência de D eus. A g o ra sim. que A
podem os cham ar com toda a verdade Im peratriz do c éu ...
R ainha da terra, S enhora de todo o c ria d o ... Q u e conso­
lação p a ra a tua alm a pensar em que tua M ãe é um a
R ainha tão p o d e ro s a !... Q u e san to o rgulho não deves ter
por is s o ! ... Q u e confiança deve in s p ira r-te !...
P orque que adian taríam o s com E la q uerer a judar-nos
nas nossas m isérias se n ã o p u d e sse ?... N ã o é isto o que
p assa mil vezes à s m ães ccim. o s seus filh o s?... Q u a n ta s e
q u an tas coisas não sonha um a m ãe p a ra o seu filhe! M as
tudo isso não p assa de um sonho porque não pode dar-lho!
Poderia acontecer assim com M aria? ... Com o p ô r n ’E la a
nossa confiança se duvidássem os do seu p o d e r? ... M as, n ã o ;
não duvides: com o M ãe, q u e r..., cc.mo R ainha, p o d e ...
I.ogc, não é possível d u v id ar da sua aju d a e do seu patrocínio
poderosíssim o.

3.“ — Corno usa da sua om nipotência. — R ep ara como


de facto usa sem cessar do seu poder em nosso favor. —
A sua om nipotência n ã o é som ente um titulo de glória nem
qualquer coisa m eram ente de h o n ra ..., sem vida e sem
utilidade p r á tic a ...; n a d a disso. — N em um só m om ento está
Innctivo o p e d e r de M a ria ..., n ã o abusa do seu p o d e r...,
não c- sm prega c ap rich o sam en te..., m as a sua v o n tad e está
Inseparavelm ente unida à v o n tad e div in a. — P ode tudo o
que quer m as não pode querer senão o que D eus q u e r .—
lí corno D eus quer sa lv a r o m u n d o ..., quer santificar as
itlm as..., nisso sobretudo exercita E la toda a força imensa
do seu p o d e r... Q u a n to s pecadores por E la se a rre p e n ­
d e ra m !... Q u a n to s santos a E la deveram a sua san tid ad e!
296 A tríplice coroa: A do P oder

Q u a n ta s gra ça s não têm dado as su as m ãos aos que n E la


têm c o n fia d o !...
D á gra ça s a D eus p o r esta m agnífica c oroa que E ie
colocou na cabeça d a Santíssim a V irgem , pois se p a ra E la
é coroa gloriosa, p a ra ti é proveitosíssim a. —• A leg ra-te com
a tua querida M ãe ao v c -l’A deste m odo e x altad a até p a rti­
cip a r do p oder do m esmo D e u s; e repete m uitas vezes:
«A R ainha do céu é m inha M ãe». — N ã o te esqueças nunca
m as sobretudo q u ando tiveres m ais necessidade, de que
com E la n a d a te fa lta rá ... e que p a ra a ju d a r-te fará tudo
o que for necessário, pois n ã o lhe custa n a d a fazer até
m ilagres e prodígios. — Q u e e sta confiança alente toda a
tu a vida e nunca deixes lev a r-te do desânim o...
80. Tríplice coroa: B J A da Sabedoria

1.“ — 1O V erb o divin o . — É o F ilho de D e u s ... a S e g u n d a


Pessoa da Santíssim a T rin d a d e ..., a S ab ed o ria d e D e u s ...:
por isso é o V erb o , isto é, a P a la v ra in criad a de D eus. —
E sta é a ra zã o p o r que a E le se atribue especialm ente o
dom da S abedoria ainda que este dom seja cem um às T rê s
divinas Pessoas.
P ois bem, o r ilh o de D eus é ao mesmo tem po Filho de
M a ria ... P o r conseguinte, que coisa .mais n a tu ra l se a o
coroar a sua M ãe se apressasse a co lo car n aquela m agnífica
coroa o seu dom p a rtic u la r da Sabedoria? ... E o que é e
q u an ta é essa S a b e d o ria ? ... C om o resp o n d erá o homem a
esta p e rg u n ta ? ... O hom em m ais sábio é aquele que se dá
conta e sabe bem q u a n to ig n o ra ...; que sabe que não sabe
n a d a ...
P o r toda a p a rte nos rodeia o m isté rio ..., não só na
ordem sob ren atu ral, onde sem a rev elação n a d a saberiam os,
senão tam bém n a m esm a ordem n a tu ra l... Q u e pouquinho
é o que sabem os hom ens! — O lh a p a ra um gru p o de
m édicos... m uito em inentes na sua ciência... desconcertados
ante o processo dum a febre, cujos pequenos m icróbios
não são capazes de ch eg ar a conhecer e m enos ainda de
co m b ater... C onhecem os o s efeitos de m uitas c o isas..., da
tuz..., do c a lo r..., da ele ctricid a d e..., m as a sua essência
v erdadeira é, n a m aioria dos casos, um m istério. — L ev a n ta
298 A tríplice coroa: A da Sabedoria

•os teus olhos a D eus e contem pla aquela sab ed o ria que tudo
sa b e ..., tudo co n h ece..., o p assado, o presente e o fu tu ro ...
o actu al e c p o ssív el... o que será e o que não s e rá ... E sc u ta
S. P au lo : T o d a s as coisas e stã o abertas e p a ten te s a seus
o lh o s..., ainda os segredos m ais ocultos dos corações. E o
Salm ista tinha dito antes: E le conta a m ultidão das estrelas e
a cada htma chama peto seu nom e. — O s pensam entos m ais
íntim os e velozes do teu en ten d im en to ..., os afectos mais
pro fu n d o s do teu c o ra ç ã o ..., tudo, tudo vê e sabe p erfei­
ta m e n te ...; lê no nosso interior com facilidade tal. que p a ra
E le esta leitura é sim plicíssim a. — M as sobretudo pensa no
•que será esta S abedoria p a ra a qual a m esm a essência divina
de D eus não tem segredos nenhuns e a qual conhece desde
to da a e te rn id a d e ... C om o poderem os p o rtan to nós vislum ­
b ra r sequer o que é esta divina S a b e d o ria ? ...

2.“ — S e d es S a p ie n tia e .— T r a ta a g o ra de abism ar-te no


m istério incom preensível d a com unicação d esta S abedoria
feita pelo V erbo divino à Santíssim a V irgem .
Um dia presenteou D eus com um átc.mo da sua sabe­
do ria a um homem e esse hom em foi o m ais sábio de to d o s...:
-o gran d e S alo m ão ... Q u a l será p o rtan to a S ab ed o ria da
S an tíssim a V irgem depois de adm itida a o conhecim ento
■dos arcanos da d iv in d a d e ... D e tal m odo que p a ra E la não
há segredos em D eus que E la não saiba e n ã o conheça,
■enquanto isto se pode dizer de um a c r ia tu r a ? ... Com o
com preenderia e n tã o o p la n o divino da c ria ç ã o ... e o da
R edenção em todos os seus p o rm en o re s! ... C om o entenderia
bem ag o ra o porquê de todas as coisas que tinha v iv id o na
te rra ... e a razão de se r de todos os acontecim entos que
e n tã o se p a s s a re m !... C om o lo u v aria a D eus ac- v e r a infinita
S ab ed o ria que tudo concebera tão m agnificam ente e que tudo
d isp u se ra com tan ta o rd e m ..., tan ta h a rm o n ia..., ainda que
n ã o aparecesse m uitas vezes aos olhos dc pobre entendim ento
hu m ano!
A tríplice coroa: A da Sabedoria 299

P e n sa ainda com o o S enhor L he infundiu todo o conhe­


cim ento necessário p a ra a ju d ar a nossa pobre a lm a ..., de
sorte que E la saiba as ciladas a stu ta s d o inim igo..., o tem po
e a força das su as te n ta ç õ e s..., as nossas m isérias e necessi­
d a d e s ..., as nossas vacilações e desân im o s... e os nossos
bons desejes e intenções rectas. — Se pecam os! que v e rg o n h a !
pecam os à v ista d a nossa M ãe a cujos olhos n ã o há ninguém
que se possa o c u lta r... Se procedem os bem é E la que nos
v ê ... e o tom a em conta p a ra prem iar-n o s algum dia.

3.° —• A M e stra da nossa fé. — P o r isso a E la havem os


de acudir a pedir-lhe a luz da fé ...: é a nossa M e stra ; já
antes de subir ao céu exercitou este ofício com a Ig reja
que en tão nascia no C en ácu lo ... Q u a n ta s coisas n ã o ensinou
E la aos A p ó s to lo s !... Q u a n ta s d ú v id as não d issip o u !...
Q u a n to s porm enores da vida de C risto n ã o lhes deu a
conhecer! — C om o saberíam os se E la o não tivesse contado,
as cenas da A nun ciação entre E la e o A n jo ..., as do N a sc i­
m ento em B elém ..., as da fugida p a ra o E g ip to e as idílicas
e felizes de N a z a ré ? ... Pode-se dizer que os A póstolos
tiveram conhecim ento do m istério da In c arn a çã o p o r 'Maria.
E então, que fa rá ag o ra no céu com o conhecim ento e a
sabedoria tão claro s que tem. de todos os dogm as da nossa
íé? É a nossa M e stra de o ra ç ã o e do tra to íntim o com
D eu s... Q ue bem v iv ia E la esta vida na te r r a ! ... M as como
será a que vive n a a c tu a lid a d e ..., ag o ra que está m etida,
segundo o nosso m odo de entender, na mesma essência de
Deus, quanto é dado a um a cria tu ra ?
É a nossa M e stra em todas as v irtu d e s ...; sabe m uito
bem as dificuldades que nos ro d e ia m ..., conhece m uito bem
.1 violência das tentações que tem os que so fre r... a força
ex altad a das nossas p aixões que se d e sb o rd am ..., n ã o ignora
a nossa debilidade e m is é ria ...; p o r isso a E la tem os que
r.eudir. — N inguém m elhor nos e n sin ará o que tem os a
la z e r..., o plano de c o m b a te..., a linha da nossa conduta.
300 A tríplice coroa: A da Sabedoria

Q u e se g u ran ç a d á aos soldados o saberem -se conduzidos


por um chefe esperto e v a le n te ! ... Assim deves co n fiar em
tu a M ãe e M estra.
E nfim conhece todas as nossas d e sg ra ç a s..., os nossos
p e ca d o s..., ingratidões e re b eld ia s..., os sofrim entos e pen as
que isto nos c a u s a ..., os castigos que nos a c a rre ta ... Pois
v ai re c o rd a r tudo isso a E la com gran d e h u m ild a d e ...; n ã o
te de sc u lp e s..., nem procures esconder-lhe n ad a, p o rq u e é
inútil. — P ede-lhe perd ão e a g raça do arrependim ento. -—
Q u e te dê um pouco de lu z .... um pouco da sua sab ed o ria
e do conhecim ento que E la tem p a ra que te conheças bem ...
e conheças a D e u s... e assim , desse conhecim ento, brote no
teu c o ração o agradecim ento de um a ardentíssim a carid ad e.
81. Tríplice coroa: C) A do Amor

l . ° — D eus é am or. — É a dulcíssim a e exactíssim a


definição de D eus. — A ssim o define o discípulo do A m o r...,
que deve ter a p ren d id o isto a o ritm o do p a lp ita r do C oração
de Jesus C risto que ele teve a sorte de e sc u ta r na últim a
ceia. — T u d o o que de D eus se pode d izer parece que se
condensa nessa p a la v ra divina. — É a v id a m ais essencial
de D eus, o u m elhor, o ter.mo d essa v id a.
P orque a v id a de D eus, com o a dos espiritos puros, não
consiste sen ão em conhecer e em am ar. — M as em certo
modo o conhecim ento d irige-se ao a m o r com o ao seu term o ...
com o ao seu necessário com plem ento. — Se D eus é um
entender in fin ito ..., e te rn o ..., in ce ssan te..., sem in te rru p ç ã o ...,
é tam bém e sobretudo o am or p o r essência. — A m a-se a Si
mesmo porque se c o n h e c e ...; assim quer D eus tam bém ser
conhecido pelos hom ens.
A um a alm a sa n ta disse um dia: ChamaAM e o S e n h o r . ...
o O m n ip o te n te ..., o C riador..., mas antes de tudo chama~M e
o A m o r ...; é o nom e cfue m ais m e agrada e que mais desejo
que e n tendas d e M im . — R e p ara com o de fa cto todas as
m anifestações da sua v id a p a ra connosco, são o u tras tan ta s
expansões do seu am or. — A C ria ç ã o ..., a co n se rv a ç ão ...,
a In c arn a çã o ..., a R e d en ção ..., n ã o se entendem nem se
explicam sem o a m o r.— P o rta n to , se o am or é a v id a de
Deus, necessária e essencialm ente se hã-de e n c o n tra r nas
302 T ríplice coroa: A do A m o r

três div in as Pessoas. — C ontudo dá-se este nom e especial-


m ente ao E sp írito S a n to ..., po rq u e assim, por via de am or,
p rocede do P a i e do F ilho.
P o is bem, se o P a i coroa M a ria com a sua O m nipotência,
e o F ilho f á 'l ’A p articip a n te da sua sa b e d o ria ... justo era
que o E sp irito Santo, ao c o ro á -lA , A introduzisse no seio,
que c a origem e a fonte de todo o am or. — C ontem pla a tua
qu erid a M ãe, form osíssim a com a m agnífica coroa da
O m n ip o tê n c ia ... e com a d a S a b e d o ria ..., m as v c -A a gora
com o brilha com a força interior do fogo- d o A m or divino,
que A a b rasa com violência sem elhante àquela com que as
três divinas Pessoas se abrasam naquele fluxo e refluxo das
o n d a s do am or em que vivem com pletam ente subm ergidas!

2.° — R ainha do A m o r. — E agora, c onstituída R ainha


do A m or, tra ta de p e n e tra r n o seu c o ra ç ã o ... e se D eus
am or com preenderás à v ista d o C o ra çã o de M a ria que é E la
a que m ais se lhe assem elha porque não h á ninguém que
a,me com o M a ria. — R ecorda o que já foi dito acêrca do seu
am or a D eus na te rra que foi a causa da sua m orte d ito sa...
Se já então era tão intenso que se rá agora?
D eus tinha direito a o am or do coração do hom em ...
e pediu-lhe e exigiu-lhe tal a m o r..., mas o hom em ! in g rato !
negou-lho. — Foi necessário que D eus buscasse um coração
que o com pensasse d aquela falta de a m o r..., que ele só o
satisfizesse m ais do que todos os corações ju n to s ... e o
am asse com am or m ais perfeito e v e rd a d e iro ... e esse
c oração onde descansa o am or de D e u s... e encontra as suas
com placências de um a m aneira sa tisfató ria e digna, é, depois
do C o ra çã o de Jesus, o C o ra ç ã o Im aculado de M aria.
A legra-te por v e r a D eus assim correspondido como
m erece pelo am or da Santíssim a V irgem . — D á-lhe a teu
m odo os p arab én s porque, g ra ça s a esse am or, a criação- não
se tornou um a coisa inútil, p o r assim dizer, visto que não
ren d eria o fruto devido. — Junta todo o am or de todos os
T ríp lice coroa: A do A m o r 303

santos e anjos do céu ... e à v ista desse c o n ju n to form osíssim o,


diz com a Ig reja: O s seus fundam entos encontram -se nos
m ontes mais e le v a d o s ... Q u e r dizer, tu d o isto é n ad a com ­
p a ra d o com o c o raç ão da Santíssim a V irg e m ... onde todos
acabam E la c o m e ç a ...: o que p a ra os o u tro s é o cimo, p a ra
E la são os alicerces... Q u e alegria e que p ra ze r se sente ao
p en sar que há um coração que assim am a a D eus!
E que direm os d o am or que nos tem a n ó s ? ... A m a-nos
com am or de M ãe e isso b a s t a . .. ; tudo o que significa tern u ra
c encantos m aternais encontra-se intensificado quase até ao
infinito e.m M a ria. — C ontem pla esse am or n a tu ra l de M ã e ...
sobrenaturalizado cm M a ria aqui n a te rra ... e ag o ra vê-o
uivinizado pelo E sp írito S a n to ... e com preenderás que é
im possível sab er como é este am or. — E n v erg o n h a -te ao-
pronunciar esta p a la v ra e convence-te que só vendo a D eus
i n ’E le a M a ria é que se pode sab er algum a coisa do que
este nome significa. — C om para o teu am or. o am or das
m a tu ra s , ccm este a m o r... A que coisas, meu Deus.
cham am os nós os hom ens a m o r!...

3." — F rutos deste amor. — A ntes de tudo a certeza e a


segurança do seu patrocínio. — M a ria já n ã o pode deixar de
a m a r-n o s..., ainda que nos veja indignos do seu a m o r...,
ainda que filhos in g rato s a cheguem os a d eix ar e a desprezar,
pnspondo-a a o u tro s am ores terrenos. — O seu am or d iv i­
nizado atender-nos-á em todos os instantes difíceis da nossa
existência... N ã o te esqueças de que se tem conhecim ento e
sabe perfeitam ente todas as nossas necessidades pela sua
i o roa de S a b e d o ria ..., se lhe sobra po d er p a ra rem ediá-las
com a sua O m nipotência, menos ain d a lhe falta a v ontade
de fazer assim, pelo seu A m o r.— R epete m uitas vezes o
IItiilo de R ainha e M ãe de m isericórdia. Se é R ainha, sabe
e pode: se é M ãe de bondade, quer aju d ar-n o s e dar-nos
i eniédio...; logo. assim será. — N ã o sentes que o teu
302 T ríplice coroa: A do A m o r

três divinas P essoas. — C ontudo dá-se este nom e especial-


m ente a o E sp írito S a n to ..., po rq u e assim, p o r v ia de am or,
procede do P ai e do F ilho.
P o is bem, se o P a i c oroa M a ria com a sua O m nipotência,
e o F ilh o fá -l’A p a rticip a n te d a sua sa b e d o ria ... justo era
que o E sp írito Santo, ao c o ro á-l’A , A introduzisse no seio,
que é a origem e a fonte de todo o am or. — C ontem pla a tu a
q uerida M ãe, form osíssim a com a m agnífica coroa da
O m n ip o tê n c ia ... e com a d a S a b e d o ria ..., m as v ê-A ag o ra
com o b rilha com a força interior do fogo1 dc- A m or divino,
que A a b rasa com violência sem elhante àquela com que as
três divinas Pessoas se ab rasam naquele fluxo e refluxo das
o n d a s do am or em que vivem com pletam ente su b m e rg id a s!

2.“ — R ainha do A m o r. —• E agora, c onstituída R ainha


do A m or, tra ta de p e n e tra r no seu c o ra ç ã o ... e se D eus
am or com preenderás à v ista d o C o ra çã o de M a ria que é E la
a que m ais se lhe assem elha porque não h á ninguém que
a,me com o M a ria. — R ecorda o que já foi dito acerca d o seu
am or a D eus na terra que foi a causa da sua m orte dito sa...
Se já en tão era tão intenso que se rá ag o ra?
D eus tinha direito ao am or do c oração do hom em ...
e pediu-lhe e exigiu-lhe tal a m o r..., m as o hom em ! in g rato !
negou-lho. — Foi necessário que D eus buscasse um coração
que o com pensasse daquela falta de a m o r..., que ele só o
satisfizesse m ais do que todos os corações ju n to s ... e o
am asse com am or m ais perfeito e v e rd a d e iro ... e esse
coração onde descansa o am or de D e u s... e enco n tra as suas
com placências de um a m aneira satisfató ria e digna, é, depois
do C o ra çã o de Jesus, o C o ra ç ã o Im aculado de M aria.
A leg ra-te por v e r a D eus assim correspondido como
m erece pelo am or da Santíssim a Virgem,. — D á-lhe a teu
m odo os p a rab é n s porque, g ra ça s a esse am or, a c ria ç ã o não
se tornou um a coisa inútil, p o r assim dizer, v isto que não
re n d eria o fruto devido. — Ju n ta todo o am or de todos os
T ríp lice coroa: A d o A m o r 303

santos e anjos do c é u ... e à v ista desse c o n ju n to form osíssim o,


diz com a Ig reja: O s seus fund a m en to s encontram -se nos
m ontes mais e le v a d o s... Q u e r dizer, tudo isto é n a d a com ­
p a ra d o com o c o raç ão d a Santíssim a V irg e m ... onde todos
acabam E la c o m e ç a ...; o que p a ra os o u tro s é o cimo, p a ra
E la são os alicerces... Q u e alegria e que p razer se sente ao
pensar que h á um c oração que assim am a a D e u s !
E que direm os d o am or que nos tem a n ó s ? ... A m a-nos
com am or de M ã e e isso b a s t a . .. ; tudo o que significa tern u ra
e encantos m aternais encontra-se intensificado quase a té ao
infinito em. M aria. — C ontem pla esse am or n a tu ra l de M ã e ...
sobrenaturalizado em M a ria aqui n a te rra ... e ag o ra vê-o
u ivinizado pelo E sp irito S a n to ... e com preenderás que é
im possível sab er com o é este am or. — E n v e rg o n h a -te a o
pronunciar esta p a la v ra e convence-te que só vendo a D eus
i n E le a M a ria é que se pode saber algum a coisa do que
este nome significa. — C om para o teu am or. o am or das
iria tu ra s, ccm este a m o r... A que coisas, meu D eus.
cham am os nós os hom ens a m o r!...

3.” — F rutos deste am or. — A ntes de tudo a certeza e a


segurança do seu patrocínio. — M a ria já n ã o pode d eix ar de
am ar-n o s__ ainda que nos v eja indignos do seu a m o r...,
ainda que filhos in g rato s a cheguem os a d eix ar e a desprezar,
pospondo-a a outros am ores terrenos. — O seu am or d iv i­
nizado atender-nos-á em todos os instantes difíceis da nossa
existência... N ã o te esqueças de que se tem conhecim ento e
sabe perfeitam ente todas as nossas necessidades pela sua
K im a de S a b e d o ria ..., se lhe sobra po d er p a ra rem ediá-las
m m a sua O m nipotência, m enos ainda lhe falta a v ontade
ilc fazer assim, pelo seu A m o r .—'R e p e te m uitas vezes o
Ululo de R ainha e M ã e de m isericórdia. Se é R ainha, sabe
r pode: se é M ãe de bondade, quer aju d a r-n o s e dar-no s
m iié d io ...; logo, assim será. — N ã o sentes que o teu
301 T ríplice coroa: A do A m o r

c o ra ç ã o confirm a isto m esm o e te diz que assim foi até


ag o ra?
D epois, E la com o seu am or ensina-te a d irig ir o teu
p a ra D eus. H ás-d e am á-lo sobre to d as as c o isa s..., cc,m. um a
intensidade apreciativ am en te su m a ..., isto é, que prefiras
p erd ê-las a tcd as antes do que ofendê-lo. — O dem ónio
p ro c u ra rá com mil m eios e p re te x to s e sto rv ar o cum prim ento
d e sta dulcíssim a o b rig a ç ã o ... Q uem te pode a ju d a r a cum-
p ri-la ? ... T u a M ã e ... prim eiro, com o seu exem plo que
d e v es p ro c u ra r im ita r ...; depois am ando-a a E la pois pela sua
u n iã o co,m D eus am á-la a E la é am ar a D eus. — N ã o tens
d esculpa p a ra d eix ar de am ar a D e u s..., m as tê-la-á s p a ra
d eix a res de am ar tu a M ãe e R ainha? ... F a z com que a tua
a lm a a ame como filha e e sc ra v a s u a ... e não' consintas
q u e ninguém te leve v a n ta g em neste am or.
8 2 . M aria, medianeira universal de todas as graças

l.° — O que é e em que consiste a M ediação.— M ediação


é se rv ir de m eio entre dois ex tre m o s..., com o a a u ro ra entre
a luz e as trev as. — É de algum m odo p a rtic ip a r das duas
p artes e rep resen tá-las a am bas. — S egundo S. R oberto
Iielarm ino, é ser ju iz e árbitro, que adm inistra justiça entre
as p a rte s litig a n te s ...; é se r m ensageiro de paz, p ropondo as
condições a que devem sujeitar-se os dois inim igos p a ra que
se restabeleça entre eles a a n tig a a m iz a d e ...; é se r valide
régio que interpõe o seu valim ento junto do m onarca, p a ra
co n seg u ir p e rd ão e fa v o r p a ra aquele que ofendeu ao R e i...;
é enfim ser m ártir da caridade, que im ola a su a vida em
justa satisfação ã pessoa ofendida.
A plica estes pontos a Jesus C risto e v e rá s com q uanta
v erd ad e dizia S. P au lo : «E le é o único m ediador entre D eus
e os hom ens e n ã o tem os outro». C risto pelo seu tríplice
c a rá c te r de M e ssia s ou E n v ia d o do P ai, de Sacerd o te E terno
c R ed en to r do m undo, é certam ente o v e rd ad e iro M e d iad o r...,
o A njo d a P a z , que ap la ca a ira de D eus irrita d o contra
o homem d a n d o À quele, com a sua v id a, plen a satisfação des
pecados d e s te .—-M a s vê tam bém como depois d e C risto ...
c com C risto e p o r C risto ... M a ria considerada não- isola­
dam ente m as em un ião com E le, com o su a M ãe e como
particip an te da su a o b ra da R edenção, na qualidade de

28
3 0 6 M aria, m edianeira universa l...

C o rre d e n tc ra dos hom ens, é p erfeita m ediadora entre nós


e D eus.
É M ã e de D eus e M ã e nossa e assim nela une estes
dois extrem os... e com o M ãe de m isericórdia que é resolve e
sentenceia sem pre a fa v o r dos pecadores. — É R ainha da
P a z e assim consegue-a sem pre p a ra os seus filhos rebeldes
a D eus que pelo p e ca d o lhe d eclararam g uerra. — Ê a
O m nipotência S u plicante, e p o r isso diz S. B ern ard in o de
S ena que todas as coisas estão sujeitas a M aria, até o m esm o
D e u s... bastando um a só palavra sua para conseguir o que
deseja. — É enfim M á rtir da caridade e R ainha dos m ártires:
m ereceu este título ao im olar-se juntam ente com seu Filho,
a o pé da c ru z ..., oferecendo ao E te rn o P ai a v ítim a divina
e constituindo com E la um único sacrifício ...

2. ° — ■D ispensadora d e todas as graças. — M a ria é a


que dispensa e adm inistra toda a g ra ç a ..., de tal m aneira
que no dizer de S. A fonso M a ria de L igório D e u s quer que
todas as graças nos venham por M a ria ... e S. B ernardo
exclam a: R epara com que afecto qtier D e u s que honrem os
a nossa R a in h a ..., pois nela p ó s a p lenitude d e lo d o o bem
para que todas as graças de esperança e d e sa lva çã o nos
v enham p o r E la; — D eu s é o a u to r de todo o bem e de toda
a g ra ça em todas as o r d e n s ...; são riquíssim os e infinitos
os seus teso iro s..., m as a chave que os en ce rra entregou-a
a M aria.
E la é com o a M ãe da casa bem ad m inistrada e gover­
n ad a, onde o p ai g an h a o p ã o m as onde a m ãe é que o
re p arte aos filhos. — N ã o duvides de que todos os Oens,
m esm o os tem porais, te hão-de v ir só p o r m eio de M aria.
-—■A união íntim a entre Jesus e M a ria exige esta universali­
dade d a sua acção m ediadora. — S. P a u lo cham a a C risto
S e g u n d o A d ã o , o A d ã o celestial; pois bem , a Ig reja cham a a
M a ria a S e g u n d a E v a . — C risto é cabeça do co rp o místico,
m as M a ria, n a frase de P io X, é o «pescoço» que une a
M acia, medianeira u n ive rsa l... 307

cabeça ao c o rp o ... e que transm ite to d a a v id a da cabeça


aos o u tro s m em bros.
M as p a ra ser efectiva e p rá tica esta u n iversalidade da
M ediação requerem -se três condições: P rim e ira — posse total
do dom . S eg u n d a —- V o n ta d e de dá-lo. T erc eira : po d er
p a ra isso.
P o is bem, não se pode d u v id a r que M a ria possua todas
as g ra ç a s ...: a g ra ç a inicial em M a ria já foi m aior do
que a dos anjos e s a n to s ...; a g ra ça da san tific aç ão com ­
pleta, porque é v erdadeiram ente, seg u n d o o anjo, a cheia de
graça, a o ser feita M ãe de D e u s ...; a g ra ç a final em M a rta
foi incalculável, visto que n ã o deixou de crescer um só
momento em graça. —• E la é a única que se cham a Im peratriz
c é co ro ad a com o R ain h a dos céus e da terra.
A seg u n d a condição e a terceira é que M a ria quer e
pode dar-nos todas as g ra ç a s... Já dissem os que é evidente,
pois se deduz dos seus dois titu les de M ã e e de R ainha.
■L ogo M a ria é, p o r nosso bem, o canal p o r o n d e chega
«té nós toda a g ra ça d e D eus.

3.° — A m ediação no E va n g e lh o . — A ) C om o C o rre-


di-ntora aparece na Incarnação, onde com o seu consentim ento,
nceita o sacrifício de se r a IM ãe dolorosa do V arão das
dores...; na A p resen tação d o M enino Jesus, em que oferece a
«eu Filho e ren o v a a su a oblação generosa, o uvindo dos
lábios de Sim eão a dolorosa profecia d a espada que a tra v es-
ruria o seu c o ra ç ã o ... N a cruz associou-se de tal m odo a seu
Pilho, que am bos foram duas hóstias de um m esm o sacrifício.
B ) C om o M e d iad o ra que intercede e consegue e reparte
graças, aparece claram ente n a v isita a S an ta Isabel, onde
o B aptista é santificado no seio de sua m ãe pela presença
,l,i S antíssim a V irg e m ... N a s bodas de C a n á fez-se o m ilagre
por petição, e, quase podem os dizer, por im posição d e M aria,
ilirg a n d o a a d ia n ta r a h o ra d a m anifestação de seu F ilh o ...
No cenáculo, no dia de P entecostes, M a ria p re p a ra e dispõe
308 M aria, m edianeira u n ive rsa l...

o s A póstolos p a ra receberem o E sp írito S anto, isto é,


co o p era na o bra san tificad o ra d a g ra ç a n a alm a dos
A p ó sto lo s...
4.“ — D eus o qu er. —'C o n c lu i pois que é D eus que
claram ente m anifesta a sua v o n tad e. — P ôde rem ir-nos sem
M a ria e n ã o o q u is... L ogo, ain d a que possa, tam bém não
q uer santificar-nos sem M a ria. —- G ra n d e é a d evoção que
devem os ter a M a ria p o r mil razões, m as dificilm ente encon­
trare m o s um a que tan to nos d e v a m over a isso com o e sta ...,
pois em certo m odo, com o vês, a b arc a to d as as o u tras.
— P o r am or e g ra tid ão p a ra com esta excelsa M e d iad o ra ...
a té p o r conveniência e utilidade pró p ria, devem os ter-lhe
grandíssim a d evoção. —• Sem E la n ã o conseguirem os a p ro ­
xim ar-nos de Jesus... não é possível que saibam os fa la r-lh e ...,
as nossas súplicas sem M a ria não podam, nem m erecem ser
a te n d id as. — D eus d á-se-nos p o r m eio d 'E la ... p o rta n to por
E la devem os ir nós a D e u s ...; dem o-nos totalm ente a E la
p a ra que E la nos leve a D e u s... Q u e cam inho tã o fá cil...,
tão s e g u ro ..., tão belo e tão consolador! — A nim a-te e de
um a vez p a ra sem pre põe-te em suas m ão s... D á a tua M ãe
as chaves do teu c o ra ç ã o ..., p a ra que E la d isponha de ti
com o q u ise r..., que sem pre será com o m ais te convém .
Pede-lhe isto a ssim ..., suplica-lhe te dê algum a p arte
d a s g ra ça s que E la te m ..., m as em especial, pede-lhe a de
sa b e r am a r com E la e p o r E la ao S enhor n a v id a e na
m o rte ..., no tem po e n a e te rn id a d e ...
II PARTE

VIRTUDES DE NOSSA SENHORA


I
1. A F é da Santíssima Virgem

1 —• E m que consiste? — A F é consiste essencialm ente


em c rer um a coisa só porque D eus no-la revelou. — P ro c u ra
entender a im portância e o v a lo r desta definição. — N ã o
devem os crer po rq u e entendem os o u dem onstram os o que
crem os com evidência, com o sucede com as v erd ad es hum a­
n a s..., senão que tem os de subm eter o nosso ju íz o ... o nosso
p a rec er... e os nossos sen tid o s... e a nossa p ró p ria ra z ã o ...,
,í p a la v ra de D eus. —■E le o disse, e é qu an to b a sta p a ra que
acreditem os sem p ro c u ra r o u tra r a z ã o .—'Q u e h u m ild a d e !...
que su b m issã o !... que confiança em D eus supõe o acto de
fé ! — P o r isso a g ra d a tan to a o S e n h o r...; e pela m esm a
razão tan to O ofende o pecad o d a incredulidade.
P ensa na injúria que se faz a um a pessoa quando não
kc acredita no que ela d iz ... D uvidam os sim plesm ente da sua
veracidade e julgam os que o u nos e n g an a com m alícia, ou
pelo m enos que se en g an a no que d iz .— 'Q u e r dizer, que
(piando não acreditam os em alguém , é p o rq u e o tem os por
ignorante e n ã o sabe o que d iz ..., ou p o r m entiroso, que
p rocura enganar-nos.
A plica esta re g ra ao acto de fé divina, e a v alia a e nor­
midade do pecado e a ofensa que representa p a ra D eus o ter
n homem a D eus por ig n o ran te ou p o r m entiroso, e p o r isso
não acre d ita r n ’E!e. — Q u e h o rrível d e sv e rg o n h a !... Q u e
cipnntoso atrevim ento!
312 A F é da S antíssim a V irgem

A fé é um a v irtu d e so b re n a tu ra l... infundida p e r D eus


na alm a, cujo objecto é o p róprio D eus. — P o r isso lhe
cham am os virtude teo lo g a l; que nos dá a conhecer a D eus
n ã o p o r meios h u m a n e s... nem pelas luzes d a razão, senão
pela influência d a d iv in a graça.
S endo isto a fé n ã o é de e stra n h a r que se encontrasse
em g ra u tã o elevado na S antíssim a V irgem . D eus teve com ­
placência especial em infundir esta form osíssim a virtude em
Sua Santíssim a M ã e ... p a ra que ela nos servisse de modelo.
M a ria creu sem pre na p a la v ra de D e u s... com sim plicidade...
com confiança, sem v acilaç ão nem dúvidas.

2.° —• U m caso de F é. — É fácil e n co n trar exem plos


destes n a vida de M a r i a .— R eco rd a um deles: o A njo d a
A nun ciação põe à p ro v a a sua fé ..., diz-lhe d a p a rte de
D eus que conceberá e d a rá à luz um filh o ... E la, V irgem ,
p odia se r M ãe! — Isto era naturalm ente im possível... N o
e n ta n to não d u v id a ..., n ã o v a c ila ... E quando conhece a
v o n tad e de D eus, crê n E l a e aceita tudo qu an to o A njo
lhe diz.
C o m p ara a sua fé com a incredulidade de Z a c a ria s ...
q u ando dias antes lhe a p arece este m esm o A njo e lhe
anuncia o nascim ento do P recu rso r. — Z a c a ria s d u v id a ...,
não crê com firm eza no A n jo ... e D eus castig a-o deixando-o
m ude.
Z a c a ria s não tinha o u tra razão p a ra d u v id a r m ais que
a sua idade a v a n ç a d a ... M a ria tinha a d a su a virgindade.
— A Z a c a ria s anunciou-se um filho que se rá o precursor
do M e ssia s..., a M a ria o p ró p rio M essias, e, no entanto,
Z a c a ria s d u v id a ... e M a ria crê.
R ecorda-te do caso m aravilhoso da fé de A braão.
— D eus diz-lhe que será pai de um a grande descendência...
t p a ra isso anuncia-lhe u.m filho, Isa a c ... porém o u tra vez
ordena-lhe que sacrifique o seu único filh o ... C om o se
m ultiplicará deste m odo a sua descendência? A b raão , apesar
A F é da Santíssim a V irgem 313

de tudo, crê sem v a c ila r n a p a la v ra do S e n h o r..., dispõe-se


ao sacrifício ... e m erece p o r isso, ser cham ado «P ai dos
crentes».
E is um a im agem da fé de M a ria ... D eus inspirou-lhe
o v o to ... sin g u la r... desconhecido até então, de v irgindade.
E la sabe que isto significa ren u n ciar à possibilidade de ser
M ãe do M essias, que era o anelo santo ue todas as m ulheres
ju d ia s... M aria, p a ra a g ra d a r a D eus, ren u n cia generosam ente
a essa possibilidade e faz-se V irg e m ... Poré.m, ag o ra o A njo
anuncia a sua gloriosa M a tern id ad e ; e M a ria ..., sem d u v id ar
nem v a c ila r... p e rg u n ta se essa é a v o n tad e de D eus, e
quando a conhece, a b ra ç a -a e crê firm em ente em tudo qu an to
lhe é dito pelo A njo. E la n ã o sabe com o isso pode s e r...,
a sua razão choca com a união da v irg in d a d e e da m ater­
n id a d e ...; subm ete porém o seu c rité rio ..., o seu p a re c e r...,
a sua p ró p ria ra z ã o e crê firm em ente com sim plicidade...
Q u e fé tão grande a de M a r ia ! ...

3." — C onsequências. — D iz Jesus C risto que se tivés­


sem os fé tra n sp o rta ría m o s m o n ta n h a s... A fé é que faz os
m ilagres. N o E vangelho, parece que o S en h o r se recreia em
nos fazer ver que a fé é que o pera os m ilagres. — E p o r isso
diz: — V ai, a tua lê te salvou. E o u tras v e z e s :— F a ç a-se
como crês. E m M a ria então op ero u o m ilagre dos m ilag res...,
n sua fé a tra iu o Filho de D eus dos C éus ao seu seio
puríssim o. — Assim o disse S a n ta Isabel na V isitaç ão : Bem -
aventurada, porque creste...
Assim te sucederá a ti. — U m a fé desta ordem será
em ti a fonte das m aiores b ê n çã o s... e das gra ça s e x tra o r­
dinárias do Senhor. — E le derram a-as em profusão naquele
que deste m odo crer e n ’E le confiar. — C om preende bem o
valor da fé da V irgem Santíssim a e com para-a com a tu a ...
T am bém nisto im itas a tua M ãe? ... É sincera a tua
íé e crês firm em ente não só nos dogm as e v erd ad es reveladas
,s enão tam bém em tudo o que o Senhor, de um a ou de o u tra
314 A Fé da Santíssiina Virgem

m aneira, te d iz ? ... ou serás dos que crêe.m se r coisa de


D eus o que a g ra d a ... e n ã o o se r o que d e sa g ra d a ?
A lém disso, D eus fa la rá directam ente à tua alm a por
meio d a s suas in sp iraç õ es... dos teus su p e rio re s... e dos
seus re p re se n tan te s... O uve-los e crês n e le s? ... E se acreditas
neles, sabes subm eter a tu a v o n tad e e o teu p ró p rio p arecer
a o se u ..., ainda que n ã o en ten d as com o há-de s e r..., nem o
po rq u ê do que te dizem? — 'Im ita s a tua M ãe n esta subm issão
a o que te dizem d a p a rte de D eus e a c e ita -lo ... ainda que
te c u ste ..., ainda que te hum ilha? — T erm in a esta m editação
pedindo à Santíssim a V irgem um a fé sem elhante ã sua e
um a gran d e docilidade, quando ouvires a voz de D eus que
te cham a, p a ra que creias n ’E le e o sigas em qualquer
m om ento... sem v a c ila r sequer um só instante.
2. A F c da Santíssima Virgem

l.° — T r e v a s. — Q u is D eus ro d e ar a fé de trev a s a p esar


da sua certeza e infalibilidade, p a ra a to rn a r m ais m eritória.
— A fé é certa, com um a certeza que se funda no próprio
D e u s,.., que se n ã o en g an a e não pode e n g an a r-n o s; m as a
fé. é tam bém o b sc u ra ..., tan to que nunca poderem os nesta
v id a chegar a com preender as v erd ad es que nos ensina
— P o r isso, essas v erdades cham am -se m istérios... O m isté­
rio é um a v e rd ad e tão inacessível à ra zã o hum ana que não
pode, sem a rev elação divina, conhecer-se sequer a sua
e x istê n cia ..., e ain d a depois de conhecer pela revelação,
a sua existência, não pode chegar a p en etrar-se o que é em
•si m esm a..., nem explicar-se com o pode ser assim.
M as há m a is... É de tal ordem a v erdade revelada,
que em certas ocasiões não só havem os de crer n o que não
vem os..., senão o co n trário do que vem os. — R ecorda o
dogm a da E u ca ristia , onde todos os sentidos te asseguram
n existência do p ã o ; e no entanto, seg u n d o a fé, o pão
|á lá não existe, m as Cinicamente o corpo e c sangue de Jesus
C risto. — E ste é, sem dúvida, o sacrifício m ais m eritório que
nos exige a fé. — Se assim não fosse, onde estaria o m ere­
cimento? ... S eria m eritório c re r no que D eus nos ensina
se fossem coisas fáceis de c o m p reen d er..., de v e r e v e rifica r
com os sentidos ou com a ra z ã o ? ... P o is bem, vê a gora
316 •A F é da Santíssim a V irgem

M a r i a — T am bém a E la n ã o faltaram as trev a s que fizeram


tão m eritória a sua fé ...

2. " —<N o nascim ento d o M e n in o D è tis .— A p arece Jesus


com o um m enino em tudo igual aos outros. — S abia a S a n tís­
sim a V irgem que era o F ilho de D eus, p o ré m ... que p ro v a s
tinha diante de s i? ... Bem pelo c o n trá rio ... um m enino
p o b re ..., fraq u in h o ..., chorando' como os o u tro s ..., que n ã o
sab ia fa la r..., nem andar...,, nem fazer n ad a por si m esm o...,
tendo necessidade de su ste n to ..., de c u id a d o s..., de sono,
com o os o u tro s..., p erseguido e ab an d o n ad o p o r to d o s...,
etc. T u d o isto eram sinais de d iv in d a d e ? ... M a s o Filho de
D eus ia nascer assim? — O p re sép io ..., o p o rta l..., o s anim ais
que o acom panham , é isto digno d e um D e u s? ... Com o pode
se r isto? ... N ã o e stará e n g a n a d a ? ... N ã o se rá um a ilu sã o ? ...

3. " —>N a vida oculta. — >E a s trev a s continuam p a ra


M a ria durante a v id a o cu lta em N a za ré . — Jesus aparece
com o um aldeão zin h o ... ig n o ran te, sem d a r um a só am ostra
do seu po d er e da sua sabedoria. M ais tarde será o operário
de um a oficina de carpinteiro, que tem que p a ssa r p o r ser
um sim ples aprendiz, que a pouco e pouco h á -d e chegar, no
cúm ulo do seu ap erfeiço am en to ... a ser um oficial de car­
pinteiro !...
Q u e bela carreira!... e que posição b rilhante p a ra o Rei
do tro n o de D a v i d l... p a ra o M essias p ro m e tid o !... p a ra o
F ilho de D e u s !
E quando o M enino Jesus se perdeu, que tre v a s no meio
das aflições que então atorm en taram o coração de M a r ia ! ...
foram tan ta s estas trev a s que ainda depois de ter encontrado
o m enino e ter escu tad o as su as p a la v ras, diz o E v angelho
que M a ria não as entendeu.

4. °— N a vida pública. — É certo que nela se vêem


luzes e m om entos claros onde a p arece cla ra a divindade de
A F é da Santíssim a V irgem 317

Jesus. — M!as p o r vezes que trev as! Q u e som bras p o r todas


as p a rte s! O p o v o crê n ’.Ele e se g u e -O ..., porém os sá b io s...,
os sacerdotes e p o n tífic e s..., o s fariseus e m estres da Lei
perseguem -n’0 de m o rte ... O s discípulos e apóstolos são
gente com pletam ente ig n o ra n te ..., uns pobres hom ens...
que, p o r fim, se envergonham de terem sido seus apóstolos,
a b andonam -n’0 e re n e g a m -n O . — O s seus inim igos conse­
guiram a p a n h á - 1'O ..., e c a s tig a m -n O d u ra m e n te ... com
castigos infam antes e próprios de escravos, de lad rõ es e
gente v il...; as b o fe ta d a s ..., os cuspos, os a ço ite s..., a coroa
d e e sp in h e s..., a c ru z ... e a m orte nela, e sc arn e cid o ...,
d e so n rad o ... v encido p o r com pleto pelos seus in im ig o s.—
fí este o F ilho de D e u s? ... E les pró p rio s o dizem : — S e fosse
F ilho de D eu s baixaria da cruz, e triu n fa ria de tudo e de tedos.

5.° —• F é inquebrantável. — A p e sa r de todas estas coisas


c ap azes de fazer v a c ila r a q u a lq u e r..., M a ria não duvida
nem sequer um m om ento... crê na p a la v ra do A njo, e nela
vé a voz de D eus que lhe re v ela quem h á-de ser o seu
F ilh o ... A d o ra os m istérios sacrossantos e profundíssim os da
vida e da m orte de Je su s..., p ro c u ra so n d a r os ensinam entos
altíssim os da sua p re g a ç ã o ... m as ainda que ad o rn ad a de
graças especialíssim as na ordem n a tu ra l e so b re n a tu ra l... e
a pesar das revelações c luzes tão e x tra o rd in á rias que só E la
recebeu, não pôde, com o c ria tu ra que é, com preender os
Insondáveis e infinitos abism os da d iv in d a d e ... n o e ntanto
lmm ildem ente ab raça-se com fé cega, gostosa e alegrem ente,
com tudo o que ela n ã o v ê e n ã o com preende d e n tro dos
planos d a divina providência.
A dm ira esta hum ildade tão a tra e n te e tão n a tu ra l de
M aria nos seus actos de fé, disposta a todo o, m em ento a
d rlx ar-se g u iar pela v o n tad e de D eus, a subm eter e a render
o seu juízo com p ro n tid ã o e essa v o n tad e s a n t a . .. ; finalm ente
ml,mira a sua confiança em D eus, que a fazia en tregar-se em
318 A F é da Sa n tíssim a V irgem

seus braços ainda que n ã o visse nem entendesse acn d e nem


por onde a levava.

61“ — ■A nossa F é . — V ê com o deve ser tam bém a nossa


fé ..., fruto da nossa h u m ild a d e..., d a nossa o b ed iên cia...
e da nossa confiança em D eus.
T o d o s os pecados c o n tra a fé brotam de algum a destas
ra íz e s ...; a falta destas virtu d es explica a histó ria de todas
as heresias e erros c o n tra a fé.
L em bra-te disto sobretudo nas trev a s ord in árias que
acom panham a fé, e nas ex tra o rd in á rias que às vezes D eus
perm ite a certas alm as.
Se p ra tic a re s essa s virtudes à im itação de M aria, não
duvides de que triu n fa rá s ...
N ã o esqueças tam bém isto nas d úvidas c o n tra a fé que
terá s de su sten tar; a so b e rb a ... a confiança em si m esm o...
o h áb ito de tudo c ritica r e ju lg a r segundo um critério
p e sso a l... é o que tem cegado a m uitos e lhes tem feito
p e rd er a fé.
P ed e à Santíssim a V irgem , n esta lu ta tão vio len ta em
nossos dias, que o seu exem plo te ilum ine e te alente nesta
lu ta p a ra que a tua alm a saia v ito rio sa e triu n fan te dela.
3. A F é da Santíssima Virgem

l.° — R acionalidade da f é . — A p e sa r das suas obscuri­


dades, e a p esar de ex ig ir d e nós o adm itir v erd ad es que não
com preendem os, a nossa F é é sum am ente racional. — N ã o
d eg rad a o ho m em ..., nem o h u m ilh a... nem rebaixa a sua
dig n id ad e... antes pelo contrário, sublima-o., dignifica-o
su.mamente, fazendo-o conhecer coisas que sem ela jam ais
con heceria... Q u e am plos horizo n tes... e quão grandiosos
não abre a fé diante dos olhos d o entendim ento h u m a n o !...
M editando isto, S. Jerónim o exclam a: E sta s coisas [oram
desconhecidas para P la tã o ..., o eloquente D em óstenes igno­
ra v a -a s..., todos os filó so fo s e sábios antigos não puderam
nem sequer vislum brarias um p o u c o ... e qualq)uer criança
das nossas escolas sabe, com o seu catecism o, infinitam ente
mais que todos eles fantos.
N ão, n ã o é irracional a nossa f é ...; é qualquer coisa
m ima do nosso entendim ento, e p o r isso n ã o chegam os a
com preender tudo o que nos e n s in a ...; não é porém qualquer
Coisa contra a razão, como o s ím p io s .—■D eus pede-nos
que adm itam os a sua p a la v ra sem hesitações e sem v a cila ­
ções... por isso havem os de c rer c eg a m e n te..., m as não
Impi udentem ente.
Fé p ro n ta e cega, n ã o é um a fé im posta à força e
Irracional.
320 A Fé da Santíssima Virgem

2 ° —<C ausas da obscuridade da fé. — S ão as seguintes:


A ) — N ã o nos deve c a u sa r adm iração o n ã o chegarm os
a com preender o que conhecem os pela fé, porque sã o verdades
tã o p ro fu n d a s... tão in fin itas... e tão d iv in a s..., que n a tu ­
ralm ente não podem e n tra r no nosso entendim ento.
Im agina quão m esquinho seria o nosso D eus, se pudesse
se r com preendido pela nossa intelig ên cia... e se abrangêssem os
toda a sua essência com a luz d a nossa ra z ã o ... — R ecorda
o que dizia S an ta T e re sa , que « acred itav a n a s verdades
m ais difíceis e cbscuras, com m ais firm eza e com m aior
devoção, porque nelas reconhecia um c ará cte r m ais próprio
d a grandeza de D eu s» ...
Q u e adm iração que essa grandeza seja p a ra nós incom ­
preen sív el! Se havem os de p a ssa r a eternidade vendo c o n ti­
n u am ente coisas n ovas na essência de D eus sem e sta nunca
se e sg o ta r... como querem os ag o ra en ten d er e a branger
tu d o ? ... Isto si.m, é que se ria absurdo e irrac io n a l...
B ) — P o r ou tra parte, D eus n ã o exige que cream os tanto
à s cegas que nos seja proibido ex am in ar os m otivos e fu n d a ­
m entos da nossa fé ... P e lo contrário, este exam e é m uito do
a g ra d o de D eus, p a ra que assim saibam os no que crem os
e porque crem os.
T em os, entre o u tro s m otivos, os m ilagres e as profecias
de Jesus C risto, que foram feitas em confirm ação destas
verdades; tais m dagres e profecias devem os m editar e estudar
com freq u ên cia... pois além da dou trin a e consequências
p rá tica s que d a sua m editação podem os tira r servem adm i­
ravelm ente p a ra d e m o n stra r a origem divina d o s dogm as
d a F é que a Igreja nos pro p õ e p a ra crer.
C> — E finalm ente, p a ra to rn a r m ais racional o acto da
nossa F é pensem os que D eus n ã o nos m anda c re r senão
n aq uilo que com a u to rid ad e infalível, d eclarou verdade
dogm ática e revelada, pela Igreja C a tó lic a ..., isto é, que
devem os crer porque D eus a re v elo u ... m as sabem os que
D eus a revelou porque a Igreja assim no-lo diz e en sina...;
A Fé d a Santíssim a V irg em 321

e sabem os outrossim que a Ig reja a o ensinar-nos isto é


com pletam ente in falív el..., sabe m uito bem o que d iz ... e não
se engana nem pode e n g an a r-n o s...
L ego, h a v e rá algum a coisa m ais racio n al que o acto
d a nossa F é ? ...

3." — P ropriedades da fé. — 1D e tudo isto se deduz


claram ente que, p a ra esta fé ser com pleta e racio n al há-de ser
uma fé:
A ) — S im p les e hum ilde, n ã o p ro c u ra n d o esq u ad rin h ar
o que é im possível conhecer, nem p retendendo dem onstrar
o que é su p erio r à nossa ra z ã o ... B em -a ven tu ra d o s os que
não viram e creram. — disse Jesus C r is to .— T em os de crer
sem ver...: p o r isso a F é se representa com os olhos vendados.
B ) — Firm e, b a se ad a na p ró p ria infalibilidade da Igreja,
que no-la e n sin a ... O n d e h a v e rá firm eza e se g u ran ç a m aior
do que esta?
Se visses, p o r exem plo, d ian te dos teus olhos a Jesus
na H óstia, terias mais ra z ã o p a ra c re r n a sua presença real,
que a que tens pela Fé, ain da sem O v e r com os olhos? ...
Q u e razão tem m aior fo rç a ... os teus olhos o u a p a la v ra de
D e u s? ...
C ) — U niversal, que se estende a todas as verd ad es
re v elad a s..., todas, ainda as m ais inacessíveis p a ra nós, têm
ii mesma a u to rid ad e de D eus a dar-lhes se g u ran ç a e a
confirm ar a sua c e rte z a ... P o rta n to , po rq u ê adm itir um as
e rechaçar o u tra s ? ... P o r que havem os de p ô r em dúvida
uma só que seja, q u a n d o a n ã o entendem os? ...
D ) — P rudente ou ilustrada. H avem os de ser cristãos
de consciência ilu s tra d a ... que saibam os distinguir os dogm as
da Fé do que não são senão piedosas tradições p o p u lare s...
ou lendas. Q u a n to s há que encontram dificuldade em crer
cm D eus que nes ensina, e não a encontram quando crêem
cm su p e rstiç õ e s!...
E ) —. E nfim , h á-de ser séria e prática, de sorte que a
21
322 A Fé d a S antíssim a V irgem

F é v á sem pre aco m p an h ad a de boas obras, ain d a que seja à


c u sta de sa c rifício s...

4 .° — O m odelo. — A g o ra exam ina e aplica tudo isto


ao gran d e m odelo que tem os na S S ."'1' Virge.m.
F é sim ples e h u m ild e... R ecorda de novo o que dissemos
d a sua Fc com o A n jo ..., d a sua F é em B elém ..., em
to d a a v id a de C risto. Q uem te en sin ará m elhor a crer, com
esfa sim plicidade, do que M aria em todos esses passos da
v id a de seu F ilho?
F é fir m e ... C ontem pla-A ao pé da C ru z ..., de pé, como
p a ra d em onstrar a firm eza d a sua F é ... Q u a n d o todos
v a c ila m ..., d u v id am ..., foge.m..... E la, com o um a rocha
firm e ..., se ren a ..., de p é ..., crendo então m ais do que nunca
n a divindade de seu Filho.
U niversal e c o n sta n te ... C om o não h a v ia de ser assim
se nunca duvidou de que seu F ilho era o F ilh o de D e u s? ...
R ecorda as b odas de C a n a ... A inda n ã o tinha visto
seu F ilho a fazer nenhum m ilag re..., o u v e as suas respostas
que denotam o pouco interesse que tinha e n tã o em fazer
m ilagres, e, a p esar disso, n ã o d u v id a do seu p o d e r e do seu
a m o r..., e procede com fé cega e com um a confiança ilim itada
e.m Seu F ilh o ... Se assim procedeu n esta ocasiã-o, como
p ro ced eria n o u tras ocasiões?
F é ilustrada... N ã o põe d ificu ld ad es..., m as interroga
o A njo até conhecer bem a v o n tad e de D e u s..., e, umii
vez conhecida, m as não antes, crê com firm eza.
N ã o entende o que Jesus diz a o e n contrá-lo entre os
d o u to re s..., conseva porém as suas p a la v ra s no seu coração
p a ra e studá-las a sós e m e d itá-las..., rum iná-las e procurar
entendê-las.
A ssún deve ser a nossa F é ...: um a fé que estude,
que m edite... que saiba bem o que c rê ..., que conheça u
p a la v ra de D eus e a receba com firm eza... e a pratique
com decisão...
4. A F é da Santíssima Virgem

l.° — V id a de fé. — N ã o b a sta o que dissem os sobre


a íé da S antíssim a V irg e m ...; é necessário determ o-nos
a c onsiderar com o a fé .modelava to d a a sua vida, de m odo
que tudo fa ria ccm aquele espírito de fé, d o qual vive
*> justo, com o diz S. P aulo.
É que a fé não deve ser algum a coisa de inactivo
c m o rto ..., senão que de tal m aneira há-de p e n e tra r e
im pregnar a v id a cristã, que todos os pensam entos e a cç õ es...,
todos os actos in te rio res... hão-de se r regulados e ord en ad o s
por ela. D o u tra form a a fé será um capital p a ra d o que
iiacla p roduzirá. —• D iz o mesmo A póstolo que sem
n fé ninguém pode a g ra d a r a D eus, nem sa lv a r-se ... M a s
não há-de isto cníender-se so b retu d o d a vid a de fé?
P e n e tra bem no que isto significa c supõe.— T e r fé
é crer e.m, tudo o que D eus re v elo u ..., porém v iv e r vida de
fé é fazer com que essa F é passe do entendim ento ao
c o raç ão ... e deste às nossas o b r a s .—■E m g eral deixam o-nos
guiar m ais pelas luzes d a nossa ra z ã o ..., do nosso am or
p ró p rio ..., das sugestões do m undo... ou p o r o u tra s luzes e
razões m enos v e rd ad e ira s. — O m undo tem grande em penho
cm fazer-nos v e r as coisas conform e o seu critério. — P ensa
nu que ele cham a o «que d irão » ..., «o respeito h u m an e » ...,
«us exigências so c iais» ..., «o não p a rec er rid ícu lo » ...
324 A Fé da Santíssima Virgem

: Q u ã o diferente é o critério de Jesus C risto ! C om para


as coisas a que o m undo cham a g ra n d e s..., a que ele dá
g ra n d e im p o rtâ n cia... co,m a s coisas que sã o v erdadeiram ente
g randes p a ra D eus. E s ta é a vida de Fé, a que se funda
neste critério d iv in o ... a que v ê e considera tudo a tra v é s da
luz d e D e u s..., prescindindo p o r com pleto dos juizos hum a­
n e s ... opiniões te rre n a s ..., razões m esquinhas. — V ista s as
coisas de um a ou de o u tra m aneira, elas m udam radicalm ente
d e v a lo r aos nossos o lh o s... e apreciam o-las de um, m odo
m uito diferen te... e p o r conseguinte procedem os de m aneira
m uito diferente tam bém .
D iz-se que tudo v a i d a cor doi vid ro com que se v ê ...,
é c e r to ; se tudo vem os com olhos da terra , vê-lo-atnos
b a ix o ... ra ste iro ..., te rre n o ; porém se tu d o vem os com
olhos do c é u ..., com olhos de D e u s... que m udança tã o
g ra n d e em tudo!
H u m ilh açõ es..., so frim en to s..., d e sp re z o s..., m ortificações
e p e n itê n cias..., obediência e subm issão..., p u re z a ..., casti­
d a d e ..., v irg in d a d e ..., que é tudo isto considerado à luz do
m u n d o ?... P a la v ra s néscias que deviam d e sa p a re c e r...; tudo
isso é qualquer coisa de indigno, de d e su m an o ..., de estúpido
p a ra o hom em ..., deprim ente p a ra a dig n id ad e hum ana.
A plica porém a luz da fé ..., contem pla as co isas à luz
sob ren atu ral, e só com ela ap rec ia rás algum a coisa d o v alor
im en so ..., da beleza infinita que têm todas essas virtudes.
—■F a z o mesmo com as coisas grandes do m u n d o ...: for­
tu n a ..., fa m a ..., p o d e r..., a u to rid a d e ..., so b e rb a ..., am bição...,
b e m -e sta r..., co m o d id ad e..., e v erás o que tu d o isso é à
luz d a fé.
P o r isso a v id a de fé é a única v e rd a d e ira ..., a única
que pode v iv er a alm a perfeita.
2.° —■E xe m p lo adm irável. — Sendo assim, como h a v ia dc
fa lta r esta vida na S a n ta das S aneas..., n a M ã e de D e u s? ...
M a ria n ã o viveu nem um só m om ento a v id a dos sentidos...,
nem um instante sequer se regeu pelo seu p ró p rio p a rec er....
A F é da S antíssim a V irgem 325

teria sido um a im p erfeição ..., um a m an c h a... e n ’E la nada


disto p odia existir. D etém -te a co n sid erar com em M a ria
se dão de form a adm irável todos os actos principais d a v id a
de fé, com o são: a) O fazer todas as coisas na presença de
D eus b ) O p u rific ar a in tenção em todos os nossos actos,
p a ra não o p e ra r sen ão p o r D eus e conform e a sua divina
v o n tad e ; c ) O e n treg ar-se nos b raço s de D eus, v endo em
todas as coisas os p lanos d a d iv in a P rovidência, p a ra nós
com pletam ente ignorados.
P e rc o rre estes pontos e aplica-os, d e v ag ar, à v id a de
M aria: a ) P resença d e D e u s... Q uem a teve com o E la? ...
P o d ia v iv er um instante que fosse sem essa p re se n ç a ? ...
N ã o v ia sem pre o seu Jesus... e n 'E le n ã o contem plava ao
mesmo tem po o seu F ilho e o seu D eus? M a ria viveu
sem pre sob o o lh ar de D e u s... T e v e a D eus p o r testem unha
visível d e todos o s seus a c to s... e nunca tev e de que se
en v erg o n h a r p o r ter feito algum a coisa in d ig n a dos olhos de
Deus.
U m d ia o S en h o r disse a A b ra ão : C am inha sem pre na
m inha presiença e serás p e rfeito ... E is o resum o breve e
m agnífico d a vida de M aria.
b) P ureza de in ten çã o ... Já dizia S. P au lo : quer com ais
quer b eb a is..., [azei tudo para glória d e D e u s...
M a ria n ã o só fez tudo na presen ça de Jesus senão que
viveu só p a ra Je su s..., n ã o teve necessidade de re n o v a r com
frequência esta p ureza de intenção, pois nem um só m om ento
a perdeu...; n a d a fez p o r s i..., jam ais nos seus actos pro cu ro u
d a r gosto aos ho m en s..., e m enos ainda ac- seu am or p ró ­
p rio ... ; nunca p rocedeu p o r gosto o u p o r capricho...; n ã o teve
em conta nem os louvores nem as censuras hum anas. V iv e u
como um a e s c ra v a ..., sem liberdade e sem v o n ta d e ..., tra ­
tando só e unicam ente de a g ra d a r À quele Senhor, em cujo
serviço queria v iv er com o a últim a das suas e s c ra v a z in h a s ...;
c ) E ntrega nos braços de D eus. É a consequência natu ral
da v id a de fé. — D eus sabe m elh o r do que nós o que nos
326 A F é da Santíssim a V irgem

c o n v em ... D eus am a-nos com am or in fin ito ... V e n d o assim


tu d o com olhos de fé, p o r que n ã o confiarm os n ’Ele? ...
P o r que não descansam os n ’E le e n ã o nos entregam os con­
fiadam ente em seus braços? R e p ara no ditosissim o abandono
d a S S .",a V irg e m ... R ecorda as duas p ro v a s tão difíceis da
sua v iu a ..., a viagem a B elém ..., o desprezo de to d o s..., a
fugida p a ra o H g ip ío ..., a p e rd a d o M enino Je su s..., a
P a ix ã o ..., a C ru c ifix ã o ...; jam ais v iu em tudo isto, apesar
de não entender tu d o ..., e a p e sa r dos sofrim entos su p o rta ­
d o s..., o u tra coisa senão a disposição sapientíssim a da
P ro v id ê n cia de D eus, que tudo ordena am orosam ente p a ra
o nosso bem. — P o r isso, vimo-1'A com o c o raç ão tresp as­
sado de dor, d e sp e d a ç a d o ..., m as jam ais d e sa le n ta d a ...
d e silu d id a ..., nem c a n s a d a ..., nem atem orizada p o r n a d a ...;
tudo isto não serviu senão p a ra a rre ig a r m ais nela o ab an ­
dono em D eus e p a ra d ar-n o s a nós este poderoso exem plo
d e v :d a adm irável de Fé.
3." — A tua V id a d\e fé — V, assim a tu a v id a? T am bém
tra b a lh a s n a presença de D eus? ... N ã o fazes n ad a que
te envergonhe d iante de D eus?
N o s teus actos p ro cu ras só a E le e a sua glória? ...
É na v erd ad e o lem a d a tua vida — tudo por D eu s, e para
D eu s, nada para ti?... N a s tu as d ú v id a s ..., nas dificulda-
d a s ..., sofrim en to s..., reveses e fraq u e z as..., nas tu as te n ta ­
ções e lutas lem bras-te da P ro v id ên cia de D eus p a ra veres
as suas divinas disposições e a ca tá -las tran q u ilam en te ...,
g o sfo sam en te..., ainda que seja algum a coisa que te desa­
g ra d e ..., que te c u ste ..., que n ã o e n te n d a s..., nem vejas
porquê nem p a ra que sucede a ssim ?...
Se queres ser pois filho de M aria, trab a lh a com o E la ...,
desde pela m anhã até à noite faz tudo com E la ..., por E la ...,
n'E !a e para E la ..., p a ra que assim M a ria purifique a tua
inten ção e todos os teus actos, dirig in d e-o s sem pre para
a m aior glória de D eus.
5. A virtude da Esperança em M aria

l.° — A sua grande necessidade — C om o fruto da vida


de fé, bro ta espontaneam ente no coração a esperança. — Se
aquela nos lev a a conhecer bem o v a lo r das coisas d a terra
e do C é u ..., esta leva-nos e a rra sta -n o s a d e sp rez a r as
prim eiras e a d esejar e a co n fiar nas segundas. — D ulcíssim a
virtude a d a e s p e ra n ç a !'—'V irtu d e com plctam ente neces­
sária p a ra a v id a espiritual. — Sem fé n ã o é possível
a g ra d a r a D e u s ...; e o mesmo acontece com a esperança.
É a desconfiança n ’E le o que m ais Lhe d e sa g ra d a . —
S. P edro cam inhava tranquilam ente sobre as á g u a s sem afun-
d n r-se ..., porém ap en as com eçou a desconfiar, logo p rin ­
cipiou a subm ergir-se e a afogar-se. — S a n ta T e re sa de Jesus
escreveu n a sua v id a: S u p lic a v a ao S e n h o r que me ajudasse,
mas não p unha toda a m inha confiança em sua M a jesta d e ...,
procurava os re m éd io s..., fa zia d ilig ên cia s..., m as não enten~
ili.i que ,\udo aproveita p ouco se, deixada a confiança em nós,
a não pom os no Senhor.
A esp erança e confiança em D eus estabelece em nós
relações n ecessárias e o b rig ató rias p a ra com E le ! ...; devem os
crer que D eus é rem unerador, isto é, que d a rá a cada um
o que m erecer, segundo a sua justiça, e p o r isso, com a
esperança esperem os e confiem os em que D eus nos salv ará...,
e nos d a rá p a ra isse g ra ça suficien te... e, enfim nos conce­
derá q uanto Lhe pedirm os se assim nos convier.
328 A Esperança em Maria

A esperança, p o rtan to , é um v e rd ad e iro acto de a d o raç ão ,


com o qual reconhecem os o dom ínio de D eus sobre todas
as c o isa s..., a P ro v id ê n cia d e D eus, que tudo dirige firm e e
am o ro sam en te..., a bondade e m isericórdia de D eus, que
n ã o deseja senão o nosso bem. P ràticam en te vem a con-
fundir-se com a v id a d e fé que se confia e se entrega
cegam ente nas m ãos de D eus,
R ecorda como a g ra d a v a a o S enhor a fé, e ao mesmo
tem po a esp eran ça o u confiança n ’E le, em todos os m ilagres
que op ero u du ran te a sua v id a ... P arece que a e x ig ia com o
um a condição necessária, e acom odava a g ran d eza do m ilagre
à grandeza d a confiança. — L em bra-te do centurião, quando
disse: Senhor, não sou dig n o que vades a m inha casa...
nem isso é necessário...; d izei daqui um a só palavra, e é
qua n to b a sta ...; lem bra-te d a m ulher enferm a que esperava
o b ter a sua cura só com to ca r no seu m an to ; e assim em
todos os casos, D eus se acom odava à confiança que n'E le
tinham p a ra o p e ra r conform e e ssa confiança.
2.° E m M aria — D etém -te a re co rd a r e sta esperança
tão c o n fia d a ..., tão firme, tão segura e tã o certa, n a S a n tís­
sim a V irgem .
R eco rd a de novo a E x p ec ta ç ão d o N ascim en to de
Jesus sobretudo depois da su a m ilagrosa C onceição n o Seu
puríssim o seio. — A vida de M a ria n ã o era m ais que uma
dulcíssim a esp eran ça, cheia de g randes anelos e de desejos
vivíssim os por v e r já nascido o M essias p ro m etid o ... N ’EIa
se reuniu elevada a o m áxim o, to d a a e sp eran ça que encheu
a v id a dos P a tria rc a s e S an to s d o Antigo. T e s ta m e n to .—
S eg u ia passo a passo, o d ese n ro la r de to d as as profecias,
e via como segundo elas, se ap ro x im av a já o cum prim ento
das m esm as..., que estav am já na plenitude d e s tem pos...
e com a sua fé n ã o d u v id a v a nem u,m in stan te sequer da
p a la v ra de D eus, v iv ia com a doce e consoladora esperança
d e v e r e contem plar o S a lv ad o r, — E ra tam bém essa a
A E sperança em M aria 329

esperança que su ste n tav a a v id a do vellho S im eão... Q u a l


não seria, então a esperança d a V irg em Santíssim a?
A p arece ain d a m ais clara e adm irável e sta confiança
de M a ria n a P a ix ã o e M o rte de seu Filho e n a certeza que
E la tin h a d a sua gloriosa R essurreição. —*É, n a v erdade,
m uito significativo o procedim ento dos E v an g e lista s a o
n arrarem com ta n ta m inuciosidade a R essurreição de Jesus
C risto ... e n ã o dizerem nem um a única p a la v ra d a S a n tís­
sim a V irgem ,... C ontam um a a um a as principais ap ariçõ e s
de Jesus C risto ressuscitado, e sendo, com o diz S. Inácio,
de sentido comum que a sua querida M ãe apareceu em
prim eiro lugar, contudo todos os E v an g e lista s passam em
silêncio e sta aparição.
T am bém p arece e stran h o que as piedosas m ulheres
corressem tão cedo ao Sepulcro, a u n g ir com m ais calm a o
corpo de Jesu s... e a Santíssim a V irgem n ã o fosse tam bém
aco m p an h á-las... C cm o explicar tudo isto? — Sim nlesm ente
pela falta de fé e de esperança nos o u tro s e pela a b u n ­
dância destas virtu d es em M a ria. O fim prin cip al que os
E v an g elistas tinham em v ista nestas n arra ç õ es era dem ons­
tra r o ofício de C onsolador que Jesus C risto exerceu na
sua R essurreição lev a n tan d o o ânim o caído de todos, e
dando novo alento à confiança en fraquecida e enferm a
daqueles a quem apareceu.
M nria porém n ã o necessitava d isto ..., tão gran d e era
a sua confiança n a p a la v ra do seu F ilh o ..., e stav a tão
firme n ’E le, que m ais que confiança tinha a certeza e se g u ­
ran ça d a sua R essurreição. — E sta é a ra zã o p o r que n ã o
foi em balsam ar o c ad á v e r de seu F ilh o ... e p o r que o s
E v an g elistas não ju lg aram necessário dizer n ada d a a p a ­
rição de Jesus a sua M ã e visto que foi tão distinta e com
fim tão d iverso das o u tras a p a riç õ e s .—■Jesus aparece a
M aria só p a ra a fa ze r p a rticip a n te d c seu triunfo, com o o
fora dos seus torm entos e d a sua P a ix ã o ..., m as não p a ra
330 A E sperança em M aria

A an im ar c dar-lhe ânim o que nunca p erdera, po rq u e jam ais


vacilou n a su a firm e esperança.
3.° A tua esperança. — O lh a bem p a ra esse modelo
e ap ren d e de M a ria a e x erc ita r-te nesta virtu d e. E xam ina-te
bem e an alisa a tu a co nfiança em D e u s..., se é sim ples...,
s e g u ra ..., hum ilde..., v e rd ad e ira . — T alv e z tenhas grande
confiança, c isto é m uito frequente, q u ando tu d o sai bem ...
e. se ap resen ta conform e a tua v o n ta d e ..., porém quando o
so l se esconde à nossa a lm a ... e vêm as n u v e n s... e a
tem pestade, talvez forte e te rrív e l...; quando as tribulações
e d esg o stes interiores e ex terio res te cercam p o r todos os
la d o s ..., enfim quando chega essa «noite escura», que tan ta s
vezes D eus quer que in v ad a as a lm a s..., que fazer? A quem
recorrer? ... É o té d io ..., a tris te z a ..., o fa stio ... enfim,
a desconfiança que te dom ina então?
L ev a n ta os olhos, vê sem pre a Jesus c o n tig o ..., a M aria,
tua M ã e que não te a b an d o n a n a p ro v a , e está sem pre a
teu lado, e ... lança-te confiadam ente a cum prir o teu dev er
sem jam ais re tro c e d e r...; um o lh a r p a ra M a ria e avan te.
6. A virtude da Esperança em Maria

l.° A S a n ta desconfiança. — C ostum am os dizer que a


virtu d e está no m eio term o, pois todos os extrem os são
viciosos. Isto é o que acontece sem pre em todo o acto de
virtude, m uito particular,m ente com a esperança. — Pode-se
faltar a ela p o r excesso e tam bém p o r defeito. — F alta-se
por excesso, quando se abusa da confiança que devem os
pôr em D eus e julgam os que ainda que não façam os n ad a
da nossa p a rte ..., ainda que n ã o trab a lh e m o s..., nem nos
esforcem os..., nem cooperem os na o b ra da nossa santificação
com a divina graça. D eus, que é tão b o m ... e tão m iseri­
cordioso, já nos sa lv a rá ... nos sa n tific a rá ... e nos d a rá
tudo o que necessitam os. — A buso inqualificável é este que
constitui o pecado de te n ta r a D eus.
D esta .maneira se atreveu o dem ónio a ten ta r a C risto,
quando Lhe disse: Se és F ilh o de D eus, lança-te daqui
abaixo que D eus e n v ia rá os seus anjos p a ra que te não
firas... M as Jesus respondeu-lhe: « N ão te n ta rá s o S enhor
teu D e u s » .— Q u a n ta s vezes o dem ónio nos tenta deste
modo. fazendo-nos c re r que podem os o p e ra r d esta m an e ira ...,
npoiando-nos em nós mesmos sem, m edo de cairm os.
P en sa n esta falsa c o n fia n ça ..., nesta presunção, e v erás
n causa das g ran d es quedas. — S. P e d ro não teve ou tro
m otivo p a ra c a ir... E s ta v a decidido a seguir o M e stre ...,
332 A E sperança em M aria

disse-o e ju ro u -o ... e assim o quis c u m p rir... Julgou porém


que se b a sta v a a si mesmo, e ao a poiar-se em si não encon­
tro u sen ão a enorm e fraqueza qne não o su sten to u nem
m esmo p eran te a voz de um a m u lh e r... Com o o homem
é m is e rá v e l!... C om q u a n ta ra z ã o dizia o A póstolo: «O que
está d e pé, veja que n ã o caia». T o d a a nossa m iséria ...,
to d as as nossas q u e d a s..., todas as nossas fraq u e z as..., tudo
isto nos está dizendo que tenham os m edo de nós m esm os...,
que nunca nos julguem os se g u ro s..., ainda que nos pareça
que som os m elhores que o u tro s; não há pecado, p o r g ra v e
que se ja ..., nem crim e repu g n an te, que não sejam os capazes
de com eter. P o r isso mesmo, não havem os de p e rd er d e
v ista aquela sentença de S. P au lo : « T rab a lh a i tem endo e
trem endo n a o bra da v ossa salvação». C aíram os anjos
no C é u ..., A dão no P a ra ís o ..., Judas e P e d ro na escola de
Je su s..., m uitos que foram p o r longo tem po sa n to s... caí­
ram da a ltu ra da sa n tid a d e ..., p o r que vais e n tã o ju lg ar-te
seguro? F irm a neste princípio a tua virtu d e e não esqueças
que a v e rd ad e ira esp eran ça baseia-se nesta sa n ta descon­
fiança pró p ria. — U m incêndio destrói em pouco tem po
um a o b ra de m uitos a n o s ...; assim podes p erd er e d estru ir
num m inuto de fraqueza o que tan to te custou a adquirir.
2." A verdadeira confiança. — Porém a consciência
d esta desconfiança p ró p ria não é a que pretende o dem ó­
n io ..., a d e se sp era ç ão ..., a d esilu são ..., o cansaço e o téd io ...
o m aldito desalento que m ata toda a a ctiv id ad e e nos a ta
as m ãos, p a ra que n ã o trabalhem os m ais. — E ste é o ou tro
extrem o, pelo qual se peca c o n tra a esperança. — Pecado
p o r defeito', m as que é tão pernicioso o u m ais que o p ri­
m eiro. que peca p o r excesso. — N ão, n ã o é isso o que
havem os de concluir com a v ista da nessa debilidade e
m is é ria ...; isso é v e r as coisas só dum la d o ..., tem os de as
v e r em toda a sua integridade. —• Se m e considero a mim
só, posso en co n trar m otivo de d e sc o n fia n ça ... porém se
p o n h o o s olhos em D eus, com o n ã o hei-de alen tar-m e com
A E sperança em M aria 333

confiança se g u ra e com suavíssim a esperança? S. P aulo


o lh av a p a ra si m esm o e dizia: « E u de mim n ad a sou e n ad a
v a lh o » ... L ogo o lh a v a p a ra D eus e acrescen tav a: «Porém
tudo posso n'A que!e que me c o n fo rta » ..., e então d esafiava
a todos os seus inim igos e corajosam ente lhes dizia: Q u em
poderá separar-m e da caridade d e C risto?... A angústia?...
A . fom e?... A perseguição?... O sofrim ento?... E stou certo
que n in g u ém ...; não há força em todo o inferno capaz de
m e poder afastar d 'E le.
O hom em só entregue às suas forças n ã o poderia
su ste n ta r-se ..., não há virtu d e nem san tid ad e p o r grande
que seja que possa, se D eus a n ã o sustentar, c o n serv ar-se e
sa ir v encedora das ciladas d o dem ónio... que tanto pode,
d e sg ra ç a d a m e n te ! M a s se D eus está connosco, quem pode
c o n tra nós, se en tão tem os a m esm a om nipotência de D eus?
— O Sen h o r é fiel, diz o A póstolo, e não perm itirá ao
dem ónio que nos ten te m ais do q\ie p o d e m o s... e, p o r o u tra
parte, não nos d eixará sós na luta, se n ã 0 ‘ que p elejará a
nosso lado, e nos a ju d a rá com o seu exem plo e com a
su a g ra ç a ... num a p a la v ra. E le nos d a rá desde já a v itó ria
segura, e em seguida o prêm io prom etido aos que saem
v encedores... C om o tudo isto nos alenta e consola, sabendo
que são coisas certas e infalíveis e que D eus cum prirá
fidelissim am ente! ... N a v erd ad e podem os dizer com a Ig reja:
E m T i, S en h o r, esperei... p o r isso não serei ijamais co n fu n ­
dido. —• N u n ca, nunca nos pesa rá d esta confiança em D eus.
3.° C onsiderando M aria. — ' Se h o u v e alguém que
pudesse confiar em si m esm o..., na su a v irtu d e ..., nos seus
m erecim entos..., foi sem dú v id a a S antíssim a V irg e m ...
Q uem como E la e sem elhante a E la? .... e no entanto, é a
V irgenzinha hum ild e..., m o d esta ..., a té tím ida em certo
m o d o ...; jam ais faz a lard e do que é ..., m as até e x ag era
o desejo de o c u lta r tu d o ..., de c a la r tudo. — E sconde à sua
prim a S anta Isabel a sua C onceição m ilag ro sa; D eus porém
encarrega-se de a re v e la r... E sco n d e a S. José a sua d ivina
334 A E sperança em M aria

m aternidade, e tem de b a ix a r um an jo do C éu a dizer-lh o ...


E sccnde, enfim, a todos os olhos, a su a d ig n id a d e ... as suas
g ra ç a s... e as suas excelsas p re rro g a tiv a s ...; n ã o se dá
im portância p o r nada, n ã o abusa de nenhum a das suas
g ra ç a s ...; trab a lh a e serve a D eus como a m ais pequena e
indigna das suas escravazinhas, sem recu sar nenhum ofício,
nem tra b a lh o de nenhum a e sp é c ie ...; não olha p a ra si
m esm a..., não se fia nem se ap o ia em si mesma, senão
unicam ente em D eus. — Ah. isto s im !... Q u e confiança em
D eus, quando chega o .m om ento..., sem e x a g e re s ..., sem
esp a lh a fato s que cham em a a te n ç ã o ..., d a m aneira mais
sim ples..., n a tu ra l e in g é n u a !... Q u e bem sabe m ostrar
esta doce confiança no seu J e s u s !... Com que segurança
o rd e n a aos criados que obedeçam a seu F ilh o nas bodas de
C a n á ! ..., ap esar das p a la v ra s de Jesus. C om o está tra n ­
quila e certa que não ficará m a l..., que não será confun­
d id a ! ... Pede a M a ria que se faça en ten d er assim a virtude
d a esperança, de sorte que nem abuses com a presunção,
ten ta n d o a D eus, ou a b u sa n d o de D e u s..., nem desconfies
d ’E le e da sua g r a ç a ...; que ap ren d as a desconfiar de ti,
p a ra o p e ra r som ente ap o ia d a n E la e em D eus.
7. A Esperança. -— O s seus fundamentos

1." A bondade e m isericórdia d e D cits. — O m otivo e a


g a ran tia principal d a nossa esperança é o p ró p rio D eus com
a sua b o n d a d e ..., a sua grande m isericó rd ia.... a sua om ni­
p o tên c ia... e a sua fidelidade em cum prir tudo o que nos
prom eteu. —■T o d a a c ria çã o é um efeito da bondade de
Deus, a com unicar-se e a difundir-se nas suas c ria tu ra s ...:
isto porém deve dizer-se sobretudo de nós. Q u e excesso de
bondade de D eus n ã o supõe a nossa criação..., tiran d o -n es do
n a d a .... fazendo-nos à sua p ró p ria image.m e sem elh an ça...
elevando-nos à ordem so b ren atu ral da g ra ç a .... com unican­
do-nos a sua p ró p ria v id a ! ... etc. — E tudo isto ia D eus
fazê-lo p a ra logo nos a b an d o n a r e n ã o se o c u p a r m ais de
n ó s? ... Q uem não confiará, pois, sabendo que é o b ra das
mão? de D eus? e que obra!
M as m ais ain d a se consideram os o seu am or m ise­
ricordioso p a ra connosco. — A m isericórdia baseia-se e
exercita-se precisam ente na nossa m iséria... Q u a n to mais
m iséria d a nossa p a rte m aior m isericórdia da pa rte de D eus.
P ro c u ra m edir, se podes, a tu a m iséria, abism a-te nesse
poço quase infinito do teu n a d a ... e em seguida levanta
os olhos e com preenderás algum a coisa d o que é a m iseri­
córdia de D eus p a ra com os ho m en s... e em p a rticu la r
p a ra contigo.
3 3 6 A Esperança. — O s seus Fundamentos

T o d a a o bra d a E n c a rn a ç ã o foi feita, no d ize r de


S. P aulo, p a ra d em o n strar a sua m isericórdia, m as ainda
m ais o dem onstrou a o b ra d a R ed en ç ão ... e a perp etu id ad e
d a mesma n a E u c a ris tia ... R a zã o tinha S. A fo n so M aria
de L igório quando dizia que a P a ixã o d e Jesus C risto
e o Sa n tíssim o S acra m ento d o A lta r eram os grandes m is­
térios da esperança e d o a m o r... V ê D eus feito hom em ...
V ê -O a d e rra m ar todo o seu san g u e no m eio das m aiores
d o re s... e assim m orrer crucificado pelo am or dos hom ens...
e com o se ainda não estivesse contente, in v e n ta r o meio
e o m edo de rep etir este sa c rifíc io ..., esta im olação, n ã o
u m a ... nem m uitas v e z e s... nem seq u er todos o s d ias...
sen ão p e rp ètu am e n te ..., viv en d o num contínuo sacrifício
a té ao fim dos séculos.
Conte,m pla-O sobretudo, quando n a C o m unhão se une
o teu coração com o d ’E le e pen sa n isto ..., n o sacrifício
que supõe d a p a rte de D eus o e n tra r a í... e n o entanto
n ã o só e n tra ..., sen ão que quer e n tra r... e q uer que O vás
re ce b er... e p ro c u ra r... e fa ze r d 'E le teu alim en to ...
P o d e rá h a v e r coisa que m ais alente a nossa esperança
do que isto ? ... Podem os tem er quem assim nos a m a ? ...
P o r que não confiar em quem está assim louco de am or
por nós? ...
2 ° A sua O m n ip o tên cia e fidelidade. ■ —- Se o am or
e a m isericórdia nos dizem que D eus quer a u x iliar-n e s e
aju d ar-n o s em tu d o ..., a sua om nipotência diz-nos que po d e...
e a sua fidelidade, que de facto assim o cum pre com, todos...
— L em bra-te que esta om nipotência cau sav a aquela segu­
ra n ç a e confiança tã o g ra n d e nos ap ó sto lo s... Q u a n d o a
b a rc a está prestes a n a u fra g a r... eles sabem que o M estre
os pode sa lv a r... Q u a n d o O seguem fam intos até ao deserto
e lhe oferecem cinco pães, sabem que E le pode m ultipli­
c á-lo s... T êm m uita experiência do seu gran d e p o d e r e
p o r isso confiam tranquilam ente a seu lado.
A E sperança. — O s seus F undam entos 337

M as além disso, D eus é fidelíssim o em cum prir o que


prom ete, e são tan ta s as coisas que nos prom eteu que não
h á m otivo p a ra d e se sp era r nem desconfiar ja m a is .—-Q u a n d o
se despede dos A póstolos, estes põem -se triste s... a ca b av a -
-se-lhes o m otivo da sua e sp e ra n ç a ... tem iam o fu tu ro ...
Q u e seria deles depois? Jesus consola-os e anim a-os com
as suas p ro m essa s... Pedi, lhes diz, e recebereis... Tudo o
que pedirdes a meu P ai em meu nome, ser^vos-á concedido...
S. P a u lo fundando-se nestas p a la v ra s acrescenta: M ante-
nhumoJnos firmes na nossa esperança, porque é fiet quem
nos fez a prom essa...; e n o u tra p a rte : V endo as promessas
de D eus e os seus furamentos, consolemo-nos ao empregar
o nosso esforço em alcançar os bens da esperança, que é
como uma âncora firme e segura para as nossas almas...
N a verdade, q u a n d o se consideram as prom essas que D eus
fez no A ntigo T esta m en to aos P a tria rc a s ..., a o seu povo
escolhido... e a e x ac tid ã o com que se sujeitou a elas consola
vendo a certeza d o que nos prom eteu: a g ra ç a ..., o C é u ...,
n posse e o gozo d a v isã o b e a tífic a ..., pois convence-se a
alma de que tudo isto n ã o são m eras p a la v ras, senão um a
doce e g randiosa realidade.
E is po rq u e S. P aulo, ainda em nossas d o res e so fri­
mentos, nos lem bra esta e sp e ra n ç a... e nos diz: N ão sofrais
como aqueles que não têm esperança... E S. João, quando
fala disto mesmo, d e tal m odo nos anim a, que tem e que
cheguem os a a b u sa r d a bondade, g enerosidade e fidelidade
de D eus, e a d v erte-n o s: não vos digo tudo ist(\ meus filhi-
nlios, para que pequeis com mais liberdade, senão para que
itunca desespereis e saibais que a todo o momento podeis
contar com Jesus C risto, que será o nosso melhor advogado
pura com o P a i...
3.° Maria, resumo de toda a esperança. —• A inda quis
to rn ar m ais sensível o fundam ento d a nossa e sp e ra n ç a...
c p a ra isso colocou to d a a esperança em S u a e nossa M ã e ...

22
338 A E sperança. — O s seus F undam entos

T em o s m otivo de sobra p a ra co n fiar e n u n c a d e se sp e ra r...


a o v e r que D eus e nós tem os um a única e m esm a M ã e ! ...
Se a nossa e sp e ra n ç a em D eus se h á -d e fu n d a r n a sua
m iserciórdia, na sua bondade e fid elid ad e..., n ã o vem os cla­
ram en te que em M a ria depositou todos estes títulos, p a ra
m ais nos anim ar a re co rre r a E le p o r meio d ’E la ? ... É grande
a nossa fra q u e z a ? ... im ensa a nossa m iséria? ... M a s n ã o
am a com m ais pred ilecção o filho d oente e d e s g ra ç a d o ? ...
N ã o é assim que M a ria se tem m anifestado em todas
a s o c asiõ e s? ... N ã o foi d o c o raç ão d o p o v o cristão que
espontâneam ente b ro to u e sta sau d ação d e vida, dopara,
esperança nossa? Q u a n d o se o lh a p a ra M a ria cessam as
d ú v id a s ..., e os desesperos n ã o têm ra z ã o d e ser, e o d e sa ­
len to n ã o tem lu g ar. -— É v e rd ad e que n ã o devem os abusar
d esta confiança m aternal que E la nos in sp ira ... « F ica-te na
V irg em e n ã o c o rra s» ..., assim costum am os d izer e com
acerto.
C o n fia n 'E la , porém n ã o julgues que com isso já está
tudo feito ... com E la ... e ap o iad o n ’E la ... tra b a lh a ..., esfor­
ç a-te p o r co o p erar com a g ra ça de D eus que te distribui
M aria, e assim , tran q u ilam en te ..., sem p re ssa s..., sem correr,
conseguirás lan ç ar prim eiro as bases, e depois edificar
solidam ente a tua san tid ad e. — F ix a -te pois bem nisto:
nos sofrim entos, hum ilhações, tentações, lutas e vicissitudes,
d a v id a ... um o lh a r p a ra M a ria a n im a r-te -á ..., d a r-te -á a
consolação de que n e ce ssitare s... a le n ta r - te - á a trab a lh a r
e a p ra ticçr as virtudes, custem o que custarem .
8. A Esperança. — O seu objecto

1. A graça. — O objecto da esperança, é a g ra ça


cm to d as a s su as acepções e em todos os seus g rau s: —
A g raça a c tu a l..., a h a b itu a l..., a f in a l.— É de fé que n a d a
podem os fazer sem a g ra ç a ... Se D e u s nos quisesse p e rd er
pão teria m ais a fa ze r d o que re tira r a su a g ra ç a ... d eix ar-n o s
com as nossas frac a s forças e cairiam os irrem ediavelm ente.
•D eus, porém , prom ete-nos a sua g ra ç a ... e d á -n o -la g ene­
rosam ente e em a b u n d â n c ia ..., m uitas vezes a té sem a p ed ir­
m os..., e o u tras sem darm os c o n ta ... Q u a n ta s g ra ç a s
recebem os assim, sem nós darm os c o n ta !
M as o ord in ário é conceder-nos o S enhor as suas
graças pela o ra ç ã o ; a nossa esp eran ça ap o ia-se n a s g raças
e nos auxílios necessários que D eus n ã o nos n ega se lhos
pedirm os..., e que em d iversas ocasiões nos enviará, m esm o
sem isso, só p o r sua bondade e m isericórdia. — E é tão
certa esta nossa esperança, que tem os o b rig aç ão de crer que
D eus quer sinceram ente a sa lv a ç ã o de to d o s os ho m en s...
e p o r isso m esmo, que a ninguém n ega os auxílios indis­
pensáveis p a ra a conseguir. E entre estas graças, a m ais
im portante é a g ra ç a fin al... o u a g ra ça d a p e rse v e ra n ç a ...,
pois que sabem os que «só o que p e rsev e ra r até a o fim se
sa lv a rá » ... e, p o r o u tra p arte, é tam bém certo que p o r isso
mesmo o dem ónio red o b ra os seus esforços p a ra tra v a r a
ultim a b a ta lh a naquela h ora d e fin itiv a ... Q u a n ta s alm as
340 A E sperança — O seu objecto

nesse m om ento n ã o sentiram a ten ta çã o d a d e sco n fian ça....


do desespero. — O dem ónio, que tan ta s vezes tirou im por­
tâ n c ia aos pecados q u a n d o se co m etiam ..., a g o ra p rocura
exagerá-los, n o sentido de convencer-nos de que n ã o há
so lu ç ã o ..., que o p e rd ão é im p o s sív e l..., e q.ue n ã o resta
m ais do q u e ’ d ese sp era r e c o n d e n a r-se .—- A qui está, pois,
um dos o b jectas m ais im portantes d a e sp e ra n ç a cristã. —
O D eus que nos c rio u ..., que nos rem iu ... e nos assistiu
com ta n ta bondade d u ran te a nossa v id a ..., não nos deixará
a g o ra ..., nem nos lan ç ará nos b raço s de S a ta n á s p a ra que
faça o que quiser de nós. — Sem a b u sa r d e sta co n fian ça...,
‘tém os de esp e ra r em D eus, que n ã o nos n e g a rá então à sua
g ra ç a derradeira, com a qual sairem os triu n fan tes de tudo.
2 * O C éu.—Ê o objecta principal d a nossa esperança.
— O ;Çéii !‘ a P á tria ! a posse de D e u s !— D isse O S enhor a
A braão': E h is e r e i o teu p ro te cto r -e a tua recom pensa irheii’~
sam énte g ra n d e ... È v erdadeiram ente grande esta recom ­
p e n s a .— N ã o sabem os o que será p o ssu í-la .... basta, porém,
a Sua' prom essa p a ra que com ela saibam os já dulcificar
to d a s -a s am a rg u ras d esta v id a. — V ê com o estas sã o num e­
ro sas e realm ente a m a rg a s... T o d a a v id a do hom em é um
tecido contínuo de so frim en to s... assim o disse Job: B reve
è a vid a d o hom em , m as cheia de m uitíssim as misérias. —■ ■
V e n d o ao homem com olhos terrenos é o se r m ais infeliz da
c ria çã o . — É v e rd ad e que n ã o foi assim c riado p o r D e u s...!
m as depois d o pecado, d e facto, não é m ais d o que uni
m ontão de asquerosa p o d rid ã o .—T o m o pecad o veio n
m o rte ... e com esta todo o seu triste e fúnebre cortejo dl-
d o re s..!, p e n a s ..., a m a rg u ra s ..., contratem pos. — M esm o
a ju d ad o s pela graça, n ã o podem os fazer n a d a de bom sem
um grande esforço p a ra v e n ce r a nossa inclinação perversa,
que nos a rra sta ao m al...
Se considerarm os, porém , tudo isso com o coisa que ráp i­
da,m ente a ca b ará e no fim de tu d o havem os de v e r a Deus,
com cuja posse havem os de g o z ar p o r to d a a ete rn id a d e ...,
.A E sperança — O seu objecto 341

que m udança tã o grande n a n ossa v i d a ! ... A g o ra, uns


m om entos de so frim en to ..., depois, v e r sem pre a D e u s taj
qual E le é, sem n u v e n s... face a fa c e ..., abism ar-nos n o
oceano da su a form osura in fin ita... unir-nos a E le com,
laços íntim os c indisso lú v eis..., a m á - lO com am or ardente
c a b ra sa d o ... e com esse am or g o z ar de D eus num á d ita
in en a rráv e l..., com o n ã o sen tir a alm a inundar-se d e gezo
perante esta esperança?
T in h a ra zã o S. P au lo quando dizia: N ã o são com pará­
reis todos os sofrim entos desta vida com o m ais pequenino
gozo que nos espera no C é u ..., po rq u e ninguém pode im a­
g in ar o que aquilo é, pois nem os olhos v ira m ..., nem os
ouvidos o u v ira m ... nem no coração do hom em cabe um a
parcela sequer d o que D eus lá nos tem reservado. — N o
entanto, por m uito deliciosa que seja aquela torrente de
delicias em que se saciam os b e m -a v en tu a d o s..., o que
mais satisfaz o nosso c o raç ão é a esp e ra n ç a de po ssu ir
o próprio D eus — D izia S a n to A gostinho: N ã o m e dês as
tuas coisas, dá-m e a ti m e s m o ...,— o meu c o raç ão n ã o se
contenta com m enos. — R epete do mesmo m odo as p a la v ras
de D avid, quando su sp ira v a e dizia: C o m o o cervo deseja
as fo n te s das á g u a s..., assim a m inha alma te deseja a T i
c está sedenta d e T i, m eu D e u s ; quando chegarei a isso ...,
a gozar-te desse m o d o ? ... E sta era a esp eran ça que alen tav a
,i todos os sa n to s..., que anim ou a tedos os m á rtire s..., que
serviu não só p a ra suavizar, sen ão p a ra co n v erter em gozo
imenso, o que n ã o era m ais d o que d o r e sofrim ento.
3." A Santíssim a V irgem . — Tam bém , E la é objecto
d a nossa e sp eran ça e não só porque d 'E la tam bém havem os
de go zar no C é u ..., contem plando a sua e n ca n ta d o ra b e le za ...,
n form osura da su a v irtu d e ..., a a lv u ra da sua p u r e z a ...—■
mas tam bém , porque d 'E la nos há-de v ir a g ra ça de que
necessitam os..., a E la devem os pedir d iariam e n te ..., fre­
quentem ente, a g ra ç a da p e rsev eran ça fin al... Q u ã o fácil
não é distrairm o-nos neste cam inho da v id a ..., cansarm o-
342 A Esperança — O seu objecto

-nos d e lu ia r e c o m b a ter..., deixarm os cobardem ente de


seg u ir a Jesus C risto e enredarm o-nos nas m alhas dos nossos
in im ig o s! ...
Porém , e souberm os re co rre r â Santíssim a V irgem ,
então, nos m om entos de .maiores tre v a s..., de v a cilaç ão e
cansaço, E la nos anim ará e nos a lc an ç a rá a g ra ça d a p e r­
se v e ra n ç a ... Q u a n to s persev eraram p o r E la , e sem E la
q u an to s c a íra m ! ... G ra n d e núm ero desses desgraçados, se
A tivessem invocado a tem po, n ã o teriam d e se sp e ra d o !...
Se Judas tivesse, depois do seu pecado, recorrido à S a n tís­
sim a V irgem e a seus pés ch o rad o a sua q u e d a... teria posto
fim ao seu desespero e a ca b aria com o a c a b o u ? ... V ê tam bém
com o M a ria v iv eu sem pre com os olhos no C éu, sobretudo
d e p o is d a ascensão d o seu F ilh o ...; n ã o v iv ia sen ão de
Jesus e p a ra Jesus.
Pede-lhe que te dê um pouco dessa v id a ..., que sintas
algum a coisa dela, p a ra que assim estim es com o Iodo tudo
o que é d a terra, e não v iv as senão su sp ira n d o pela v e r­
d a d eira v id a ..., que com preendas bem aquelas p a la v ra s de
S a n ta T e re sa : T ã o alta vida e sp ero ... que m orro porque
não m o rro ...
9. A Caridade

l.° A V id a de D eus. — A carid ad e é o a m o r... e o


am or é, essencialm ente, a V id a de D eus. — D eus é amor.
diz S. João — P a la v ra s breves m as quão su b s ta n c io s a s !...
E nelas está en cerrado tudo o que D eus é, com a sua
m ajestade in fin ita..., com o seu po d er e a sua sabedoria
infinita... D eus é em o r! ! !— E stá tudo dito.
Pois bem, M a ria é isso. — E la p a rticip a igualm ente,
quanto é dado a um a c ria tu ra , d a V id a de D e u s..., mas
dum m odo m ais e x ce le n te..., m ais perfeito e real do que
nenhum outro ser. — O s A njos, p o r serem puros espiritos,
não têm o u tra vida senão conhecer e a m a r... .mas, com o n ã o
dependem da m atéria, os seus actos sã o espirituais e p e r­
feitíssim os... Sob o ponto de v ista d a sua natureza, estes
netos dos A njos deviam ser m ais perfeitos que os de M a ria ...,
como mais perfeita é a n a tu re za deles. — E la, porém , o que
não teve por natureza, teve-o pela g ra ç a ... e D eus quis
que ninguém a ultra p assa sse no seu a m o r..., que ninguém
pudesse com parar-se com E la, q uanto ao p a rticip a r da
própria V id a de D e u s... Só E la h av ia de am ar a D eus,
mais do que todas as c ria tu ra s ju n ta s... m ais do que os
A njos..., A rc a n jo s..., Q u e ru b in s... e S e ra fin s..., Só d 'E la
se pode dizer que tam bém era am or...
A qui está com o deve ser a tua V id a ... T am bém te foi
Jn d a um a alm a inteligente p a ra conhecer a su a b o n d a d e....
344 A C aridade

e um c o raç ão p a ra a m a r e ssa b o n d a d e ...; v isto que o c o ra ­


ção n ã o pode d eix ar de am a r tudo aquilo, que o e ntendi­
m ento lhe ap resen ta com o bom.
A tu a v id a h á-de ser tam bém a ssim ...; D eus q uer que
p a rticip e s d a sua v id a ... e digna-se pôr-se d ian te d e ti, como
objecto d o teu a m o r... P o rta n to , tu deves ser tam bém am or...
Só quando am ares a D eus em Si mesmo e ao próxim o em
D eus e p o r D e u s..., só então p oderás d izer que vives a tua
v id a p ró p ria ...; isto é que é v iv er com o hom em ,..., isto é
que é v iv er dum m odo racional.
2.“ O preceito do amor. — Justam ente por ser tão
necessário, este elem ento do am or à vida do hom em , D eus
o im pôs como um p re c e ito ... e pô-lo à frente dos seus m an­
d a m e n to s... e até resum iu n 'E lc todos o s o u tro s m andam en­
to s..., pois, conform e disse Jesus C risto, « N ’ele, no amor,
está encerrada to d a a lei e o s profetas». — S an to A gostinho
dizia, e com m uita ra zã o : «A m a e faz o que quiseres».
M as é estran h o que sendo o am or tã o necessário ã
nossa v id a ... e além disso tã o doce e a g ra d á v e l... e tão
óbvio e n a tu ra l o am or de D eus, v isto que é bondade sum a
e form osura in fin ita... tenha o S enhor necessidade de o
im por como m an d am en to ...
Q u e verg o n h a p a ra n ó s ! ... P orque n ã o pôs um m an­
dam ento aos olhos p a ra que v issem ..., aos o uvidos para
que ouvissem ... ou aos pulm ões p a ra que re sp irassem ? ...
P o rq u e sabia que todos estes órgãos cum pririam , n a tu ra l­
m ente, com o fim p a ra que foram c ria d o s..., porém , duvidou
do nosso coração, e ain d a que ten h a sido c riad o p a ra am ar
o que é b o m ..., o que é n o b re ..., form oso, tem eu D eus que
n ã o cum prisse bem co,m o seu d estin o ... Q u a n ta ra zã o não
tev e D eus p a ra tem er i s t o ! ... Pois não deixam os nós, m ilha­
res de vezes, o bem único e v e rd a d e iro ..., a fonte puríssim a
de toda a bondade e fo rm o su ra..., p a ra am ar bens terre n o s...,
bens ap aren tes, falso s... — bens fugitivos e passageiros, que
não podiam encher o nosso coração, nem satisfazer a sua
A Çacidade 345

fome e a su a sede d e am or? Q u e hum ilhação p a ra nós


ter-se D eus visto o b rig ad o a im por-nos com o preceito o seu
a m o r ! ...
H ouve, porém , um a c ria tu ra p a ra a qual o am or n ã o foi
um p re c e ito ...; não am ou à fo rç a ..., senão que n ’E la o
am or foi o dulcissim o e n aturalissim o acto de to d a a sua
v id a ..., v iv eu um a v id a co n stan te de am o r... e m orreu
vítim a desse m esmo am or, que a consum iu to talm en te...
F oi a tu a M ã e ! ... Q u e v id a a de M a ria ! ! P a ra E la era
im possível v iv e r um instante que fosse, sem am a r a D e u s ! ...
Jam ais foi cap az de a p a rta r, nem um só m om ento, o seu
coração do seu D eus.
3.“ C om o se há~de amar. —1M a ria am ou a D eus com o
D eus nos tinha o rd e n a d o ..., com todo o seu c o ra ç ã o ..., com
toda a sua a lm a ..., com to d a s as su as fo rça s... E is a m edida
que D eus m arco u a o nosso am or.
a) A Sa n tíssim a V irg em am ou a D e u s com to d o o
seu c o ra íã o ..., t o d o ! . . . —'C o m isto e stá tudo dito acerca
d a intensidade d o seu a m o r...; n ã o deu ao S enhor um c o ração
d iv id id o ..., não reserv o u nem um a só fib ra ... nem um a
pequenina pa rte p a ra Si m esm a..., nem p a ra a d a r a c ria tu ra
alg u m a... tc d o ..., todo in te iro !..., sem, lim ites nem re ser­
v a s ..., sem re g a te a r nem h e sita r... todo e sem p re... aquele
puríssim o coração pertenceu com pleto e absolutam ente só
a D eus. —• D eus n ã o quer corações divididos. — D iv id ir
é m ata r o am or to ta l do coração h u m an o ..., e, no entanto,
parece que o hom em se em penha em re g a te a r esse a m o r...
D ivide o seu c o raç ão entre D eus e as c ria tu ra s... e m u itas...
m uitíssim as vezes, prefere e stas; o .melhor é p a ra e la s... e
depcis o que s o b ra ... os restos, p a ra D e u s... E ainda jul­
gam os que fazem os m uito, quando O am am os a s s im !... Q u e
repugnância não sen tirá D eus p e ran te um tal a m o r!...
b ) M aria am ou a D e u s com toda a sua alma. — C om
todas as potências, com to d a a vida da a lm a ... O seu enten­
dim ento n ã o se o c upou de o u tra coisa que n ã o fosse D eus
346 A Caridade

o u que n ã o levasse a D e u s... A sua m em ória re co rd a v a


continuam ente ou fazia-lhe v e r os benefícios e g ra ça s que
d o S enhor tinha re ce b id o ... A su a v o n tad e só a sp ira v a a
cum prir, em tudo, a v o n tad e de D eus e a subm eter-se a ela,
hum ilde e alegrem ente... N isso p u n h a todas as su a s com ­
placências. — D e facto, p ô r as suas delicias e as su a s com ­
p lacências únicam ente n a execução d a v o n tad e de D eus,
isso e ra a m á-lO com toda a sua alm a. — P o r isso, M a ria
pôde um d ia p ro n u n c ia r com os seus v irg in ais lábios o que
sen tia n o seu c o ra ç ã o ... e n ã o encontrou o u tra expressão
m elhor do que esta: «A m inha alm a louva e en g ran d ece ao
S e n h o r» ... porque na v erd ad e E la am av a a D eus com toda
a sua alm a.
c) M aria am ou ao S e n h o r com todas as suas [orças.
— E a consequência n a tu ra l do coração e d a alm a que am a
a D eus totalm ente. — M a s isto quer d izer que era tal a
intensidade deste am or, que n a d a h a v ia que a fizesse re tro ­
c e d e r... e stav a d isp o sta a tu d o ..., ao m aio r sacrifício, se
fosse necessário, p o r este am or. — E fectivam ente, D eus
exige-lhe sacrifícios com o a nin g u ém ... e, p o r am or de D eus.
tev e desta m aneira que so fre r com o ninguém , já que a dor
e o sofrim ento estão e.m ra zã o directa do am o r... E no
e n ta n to ... n a d a disto lhe im portou... Foi sem pre assim a
v id a de M a ria ..., nunca se queixou dos seus so frim en to s...,
n u n c a lhe pareceu dem asiado gran d e qualq u er sacrifício ...
n u n c a deixou de fazer com p ro n tid ã o e generosidade n ada
do que a v o n tad e de D eus lhe pedia. — E xam ina, perante
o exem plo d a tua M ãe, o teu am or p a ra com D e u s... Ê assim
que o am as? ... P odes dizer que cum pres com exactidão o
prim eiro e m ais im portante m andam ento?— P e rg u n ta a ti
m esmo d e v a g a r e responde com sinceridade se tu também
podes dizer que am as a D eus com todo o teu coração, com
tc d a a tu a a lm a ..., com to d as as tuas fo rça s... e que estás
disposto a d eix ar tudo antes do que p e rd ê -lO e d eixá-lO
a Ele.
10. A Caridade. — Caracteres do amor

1.° A m o r perfeito. — E de gran d e conveniência que


nos detenham os a a n alisar o am or d a Santíssim a V irgem a
D eus, p a ra v e r nele, claram ente expressos, os cara cte re s ou
qualidades que há-de te r o v e rd ad e iro e perfeito am or. —
F.m todos os sentidos que se tom e esta expressão, e ra perfei­
tíssimo o am or de M a ria ... isto q u e r dizer em especial que o
seu am or n ã o tinha m istura de egoísm o de nenhum a espécie.
Ê quase incom preensivel o que isto significa e supõe. —
T o d o o am or hum ano, ainda o m ais p u ro ..., até m esmo o
am or de M ãe, é difícil que não leve algum egoism o. — A m ar
só por a m o r..., não p ro c u ra r nem d esejar no am or algum a
coisa p a ra si m esm o..., como é difícil en co n trar na terra
este am or tão pu ro !
O p u ro am e r de D eus é, p o rtan to , um am or que am a
por ser D eus quem é ..., digno de ser am ado com todo o
am or d a s criatu ras, pois E le é o sum o b e m .,., é um am or
desinteressado..., n ã o am a a D eus pelos bens e dons que
d'F,le espera re ce b er..., nem. sequer por a sse g u rar a pró p ria
salvação etern a. — E certo que este am or n ã o é m au, c
p ortanto que podem os e devem os am a r a D eus igualm ente
por estes m o tiv o s...; n ã o é, porém , m enos certo que este
am or é .mais im perfeito que o p rim e iro ..., mais e g o ís ta ...,
i n , í i ; ; in te ressa d o ..., m enos desprendido.
M a ria am ou a D eus com um pu ro e perfeitíssim o a m o r.,.;
348 >4 Caridade. — C aracteres do am or

n ã o O am ou pelo que d ’E le tin h a re ce b id o ..., nem pelo que


e sp erav a. —• A ntes d o A n jo lhe oferecer a coroa d a sua
M a tern id ad e D ivina, já E la O am av a com todo o seu co ra ­
ç ã o ... e se D eus n ã o tivesse fixado n E l a o seu olhar, nem
se tivesse lem brado d E l a p a ra n a d a ..., sem dú v id a não
teria sido M ãe de D e u s ...; m as seria sem pre a escravazinha
que am av a ao seu D eus e ao seu S enhor com to d a a sua
v o n tad e e com todas as suas forças. E foi precisam ente
este am or que tan to e n can to u a D e u s !...
2." A m o r a p reciativam ente sum o. — E de absoluta
necessidade que am em os a D eus deste m o d o ... É o que
precisam ente diz o catecism o: «que estejam os dispostos a
p e rd er tudo antes do que o fender o u a b a n d o n a r a D eu s» ...
E o am or de p referência que coloca a D eu s em prim eiro
lu g ar, e o prefere sem pre a tedos os a m o re s... não é um
am or de sentim ento, m as de predilecção. — D istingue bem
entre o sen tir e o ter a m o r... À s vezes D eus não nos d á o
sentir, o gosto do am o r; porém , nem p o r isso se am a menos
do que quando a alm a n a d a n a s dulcíssim as delícias do am or.
N ã o é, pois, necessário experim entar a sensação do amor.
— P e d e um ter m u ito am or e no e n ta n to n ã o o se n tir...;
pode h a v e r um o u tro que ten h a m ais am or a um a coisa e
sentir m ais afecto a o u tra ..., porém , a p ro v a do m aio r e
v erd ad eiro am or estará em que, chegada a ocasião de
eleger um a c u ou tra, se está disposto a sa c rifica r a que
m enos se a m a ... É evidente que am a rá m ais a coisa que
escolhe do que a que a b an d o n a. — U m a M ã e pode sentir
m ais am or a su a filha que a D e u s ...; te rá m ais facilm ente
um carinho m ais afável a seu filh o ..., porém , n ã o se poderá
d izer que o am a m ais que a D eus, se está d isp o sta a sa c ri­
ficar esse filho, antes d o que o fen d er a D eus.
E is o que foi o am or d a Santíssim a V irg e m ... F oi um
am or pleno no sentim ento e no a fe c to ..., porém , sobretudo,
foi-o no apreço e na predilecção...
F aça-se em m im seg u n d o a tua palavra. N ã o vês nesta
A C aridade. — C aracteres do am or. .349

expressão a v o n tad e firme, disp o sta a tudo sacrificar à


v ontade de D eus? E o total desprendim ento do p róprio
c o ra ç ã o ..., d esap eg a d o de tu d o ..., sem com prom issos com
n a d a nem com n in g u ém ..., o c o ração que n ã o enco n tra
a trã ctiv o senão em D e u s... A h ! E não são m eras p a la v ra s
e expressões bonitas. — C ontem pla a M a ria jiinto à C ruz,
e diz-m e se o seu am or p a ra com D eus n ã o é a p rec ia tiv a ­
m ente sum o: p a ra fazer o que o am or de D eus lhe pedia,
sacrifica tudo, ainda o que possuia de m ais sa n to e de
m ais querido: o seu p ró p rio F ilho!
3.° A m o r triste e doloroso. — N ã o é possível h a v er
um am or grande e intenso que não seja ao mesmo tem po
triste, porque necessariam ente se h á-de en tristecer ao v e r
d e sp rez a d o ..., desconhecido..., injuriado A quele q u e se am a.
— O A m or de M a ria teve de ser intensam ente triste, ao
contem plar a du reza do c o ração daquele povo escolhido,
que tão m al corresp o n d ia aos benefícios de D eus.
M edita n a sua d o r e n a sua tristeza, q u ando contem plava
a frieza e a tibieza dos judeus no tem plo, pro fan an d o -o
com os seus n e g ó cio s...; o abuso dos pró p rio s príncipes
e sa c erd o tes..., dos fa rise u s..., dos escribas e rabinos, que
d avam ta n tã im portância às e xterioridades d a lei, enquanto
o seu c o ração e stav a tã o longe d e D e u s . .. — Q u a l não
seria a d o r d a Santíssim a V irg em q u ando soube da in v e ja ...,
d a hipocrisia re fin a d a ..., d a ra iv a 1 e d o ódio que se escondia
naqueles sepulcros b ra n q u e a d o s..., e que term inou n a per­
seguição ra n co ro sa d e que fizeram objecto a seu F ilh o ! ...
E quando soube que O tinham a rra sta d o à S in a g o g a ...,
'(‘jue o quiseram a p e d re ja r..., que in ten taram d e sp e n h á-lO ...
q uantas vezes diria as p a la v ras de Jesus à S a m aritan a :
«Se conhecêsseis o dom d e D e u s... e quem é este que vos
fa la ... que v o s p re g a e faz estes m ilagres e p ro d íg io s!»
N ã o o co n h eciam ..., porém , deviam conhecê-lO , e tudo
isto aum entava, m ais e mais, a dor e a tristeza do C o ração
de M aria, ao v e r o seu F ilho desco n h ecid o ..., incom preen­
350 A Caridade. — C aracteres d o am or

d id o ..., porém , culpadam ente, p o is eram cegos que tinham


olhos, e n ã o queriam v e r... su rd o s que tinham ouvidos, e
não queriam o u v ir...
E d a p a rte dos p ró p rio s A póstolos, q u a n to n ã o devia
sofrer M aria, a o v e r a ru d e z a d aqueles hom ens que não
acabam de com preender a divin d ad e d o seu F ilh o e a espi­
ritu a lid a d e do seu r e in o ? ! ... A h ! e com o sofreria com
Ju d a s..., com P e d ro ..., com o s outros que fugiram na
P a ix ã o o u foram tão incrédulos n a R e ssu rre iç ã o !...
N ã o esqueças, pois, estas notas c aracterísticas d o amor,
e p o r elas m ede a in tensidade d o teu a m o r a D eus.
C onsidera os teus p ró p rio s pecados, e se os detestas
com v e rd ad e ira c ontrição e sentes g ra n d e d o r de o s te r
com etido, sinal é que am as d ev eras a D e u s..., pois a con­
triç ão n ã o é m ais que isso, o am or triste e d o lo ro so com
que am a a alm a e n v erg o n h a d a e a rre p e n d id a ... e mais
ainda, o que deveras am a a D eus há-de sentir d o r não só
pelos seus pró p rio s pecados senão pelos do seu próxim o,
afligir-se-á por eles, com o se fossem seus.
N ã o podes, p o rtan to , v e r com indiferença que D eus
seja desconhecido, e que se trab a lh e tã o pouco p o r estu d á-lO
e c o m p re e n d ê -lO ...; que seja ofendido de tan to s m odos...
e p o r to d a a espécie de hom ens. — O m aior torm ento dos
S an to s e ra v e r que D eus n ã o era am ado com o d e v ia sê-lo
pelos hcm ens, e esforçavam -se com o seu c arinho e amor,
p o r suprir tan ta s injúrias, tan to s pecados e tan ta d e so n ra...
É o que tu m esm o deves fa ze r em com panhia d a tu a que­
rid a M ãe, a S antíssim a V irgem , até ch eg ar a conseguir que
D eus se dê p o r contente com o teu am or, e com o
esquecim ento das o fensas dos in g ra to s... C o m o serás feliz
se chegares a fazer algum a coisa de sem elhante com um
D eus que tan to am a os hom ens!
11. A Caridade. Outros caracteres do amor

1.° A m o r d e com placência. — O u tro s c ara cte re s do


am or que devem os a D eus, e que lhe te v e a S antíssim a V ir­
gem, são : A com placência e a benevolência, que vêm a ser
com o que o s actos interiores do' am or de D eus, em que a
nossa alm a p o d e e deve ex ercitar-se q u an d o am a. — O am or
de com placência é o am or que D eus se tem a Si m esm o...,
a o contem plar a su a p ró p ria assência e v e r nela a su a infi­
nita sa n tid a d e ..., a su a im ensa b o n d a d e ..., n ã o pode d eix ar
de ter um a com placência infinita. — D eu s n ã o nos pode
am ar a nós com e ste a m o r..., n ã o e n co n tra em nós n a d a em
que se possa c o m p ra ze r..., nem sequer a im agem d a sua
essência, que nos im prim iu n a criação, porque, pelo pecado,
o hom em tev e a desg raça de a a p a g a r da su a a lm a ... P e c a ­
d o s..., fa lta s ..., m iséria s..., eis o que D eus v ê em nossas
alm as... Q u e p ra z e r o u que espécie de com placência poderá
sentir à v ista disto? ! ... N ós, porém , sim, que podem os e
devem os am a r a D eus d esta m aneira.
A inda que v isto a tã o gran d e d istância, qual é a que
nos se p a ra de D eus, n ã o podem os d e ix a r de contem plar, por
poucb que o v ejam os e o estudem os, a su a incom parável for­
m o su ra..., a sua sa n tid a d e ..., o seu p o d e r..., a su a sabe­
d o ria ..., a su a justiça e a sua m is e ric ó rd ia ...— D e so rte
que, assim com o um a M ã e se com praz n a s perfeições e boas
qualidades de seu filho, que o seu am or d e M ã e m uitas
352 A C aridade. — O u tro s caracteres do am or

v ezes ex ag e ra e a u m e n ta ..., assim nós havem os de ter com ­


p lac ên c ia especial em ad m irar reflectidas nas c ria tu ra s todas
essas perfeições de D e u s..., deleitando-nos ao v e r e con­
tem plar a sua g ra n d e z a ... m agn ificên cia..., regozijando-nos
de que seja com o é ... e ex tasiando-nos p e ran te a excelên­
c ia de todos o s seus a trib u to s e perfeições.
V ê com o e sta com placência é a que constitui a glória
dos santos e b em -aventurados no C éu, os quais, ao verem
a form osura d a essência divina, sentem tal gosto e felicidade
que n ã o podem conter-se sem p rorrom per, em união com os
A njos, naquele cântico d o S a n to ... S a n to ... S a n to ... que
h á -d e d u ra r p o r toda a eternidade.
A m ar, pois, assim a D eus será a n te cip a r n a tu a alm a
a glória do C é u ... C om o é excelente este m odo d e am a r a
D eus, com o am or d a c o m p la c ê n c ia !... Q u e bem o exerci­
ta ra m os santos, quando v iam a D eus em to d as as cria­
tu ras, e se e x tasiav am n a contem plação de um a flo r..., das
e s tre la s ..., do s o l..., etc., v en d o em todas elas um reflexo
d a beleza de D e u s !...
2 .° A m o r d e benevolência. — Ê , com o a p a la v ra o
e x p lic a, o am or que q uer b e m ... e tra b a lh a p o r fazer bem
a quem am a. — A qui podem os abism ar-nos ante o am or
infinito de benevolência que D eus nos tem. — S e tu d o ...,
•tudo qu an to possuím os é d ’E le ... se tudo’ q u a n to nos deu
é um bem e p a ra nosso bem, nós, pelo contrário, quão pouco
a m o r de benevolência podem os te r aos que a m am o s... pelo
m enos quão pouco eficaz é o nosso a m o r! — É tão pouco
o que podem os d a r ao nosso p ró x im o !... Q u iséram o s dar-lhe
sa ú d e ..., g ló ria ..., riq u e z a s..., g o sto s..., com o d id ad es..., tudo
isto, porém , não p assa de um v ã o desejo, que n ã o podem os
c o n v e rte r em re alid a d e ... Q u e rem o s..., d e se ja m o s..., porém,
n ã o podem os... Q u a n ta s vezes tem os de nos c o n te n ta r com
só m o strar o nosso d e s e jo !... Q u a n ta s vezes tem os de
a g ra d e c e r esse desejo que nos é m anifestado! Porém , o
e x tra o rd in á rio é que tratan d o -se de D eus não é assim ...
A Caridade. — O u tro s caracteres do am or 353

A inda que n ã o p a re ç a verdade, tam bém podemos e devemos


am ar a D eus deste m odo. — N ã o só podes de se ja r o bem
de D eus, senão que lho podes d a r ...; p odes se r útil a D e u s...
S erá isto possível? e se é possível, n ã o se rá a expansão
mais perfeita d o a m o r..., sab er que podem os c o rresp o n d er
ao am or que D eus nos item e que lhe podem os d e v o lv e r
algum a coisa d o m uito que nos deu? ... Q u e ditosos so m o s !...
H a v erá m aic r felicidade p a ra um coração que a m a ?! A b is­
m a-te e regozija-te neste suavíssim o p en sa m e n to ... E que
podes fazer p o r E le ? ... E m que lhe p odes ser ú til? ... Q u e
podes d a r a D eus? ...
a ) A glória e xtrín seca que Lhe pode v ir d a s criaturas.
— D eus criou tudo p a ra a S u a g ló ria ..., p o r isso as c ria tu ra s
hão-de d a r gló ria a D eus a seu m o d o ..., pcrém , este m odo
é m uito im perfeito, visto que e las n ã o têm conhecim ento
nem podem lo u v a r a D eus, que sã o as du as condições p a ra
lhe trib u ta r g ló ria ... P o rtan to , é o hom em que em nom e
de toda a criação deve d a r a D eus a glória que L he é d evida
por todas as cria tu ra s. T ra b a lh a r, pois, p o r h o n ra r..., se r­
v ir..., lo u v ar e g lorificar a D eus é e m á -lO com am or de
benevolência..., é d a r a D eus o que podem os e devem os
<lar-Lhe. —• N atu ralm en te, com isso não aum entarem os nem
inn só grau d a sua glória intrínseca e essencial..., o que não
está n a m ão das c ria tu ra s ...; havem os, porém , de aum entar
n glória exterior, que consiste nos lo u v o res... e hom enagens
que deve trib u ta r-L h e toda a criação, com o a seu Senhor
<• C riad o r...
b) O zelo é o que em segundo lu g ar tam bém podem os
d.ir a D e u s..., isto é p ro c u ra r a lm a s..., g a n h a r a lm a s... nas
(piais D eus seja co n h ec id o ..., a m a d o ..., louvado e glorificado.
E ste zelo é tã o essencial na v id a d o am or, especial­
mente dd am or de benevolência, que com ra z ã o se disse:
Q uem não zela, n ã o am a». — O zelo é ccm o que a cham a
ilo a m o r...; se h á fogo d e am or, h a v erá cham as de z elo ...
em este o zelo que d ev o rav a os santos e os lev a v a a su p o r­
354 A Caridade. — O u tro s caracteres do am or

ta r os m aiores perigos e mesmo a m orte, c o n tan to que


dessem a D eus alm as g a n h as com os seu s sacrifícios e tra-
balhos.— N ã o negues a D eus o que podes fa ze r n este sentido
por E le ... T ra b a lh a r p a ra a sua g lória! F a z e r que ou tras
alm as tam bém O glo rifiq u em ! E , p a ra isso, anim a-te com
o exem plo dos santos e, sobretudo, com o d a tu a querida M ãe.
3.° O exem p lo d e M aria. — Q u e am or de com placência
o s e u ! ... Q uem m elhor d o que E la conhecia a D eus p a ra
a p re c iá -lO e a m á-lO com loucura, cad a vez m ais, e com­
p razer-se em su as perfeições in fin ita s !... Q uem h ouve jam ais
que pudesse v e r m elhor a D e u s... e go zar m ais d 'E le que
M a ria , que em seu F ilh o v ia constantem ente a o mesmo
tem po o Seu D e u s ! ... P o r o u tra p arte, ninguém causou em
D eus am or de com placência com o E la.
D izíam os que D eus n ã o v ia em nós n a d a digno de O
c o m p ra ze r..., m as em M a ria não- se d a v a o m e sm o ...; n ’E la
tudo a g ra d a v a e c o n te n tav a a D e u s... Q u e consolação ter
um a m ãe assim .!... P o r que n ã o havem os nós de trab alh ar
p o r nos parecerm os com E la ... e revestir-nos d a s su as v ir
tudes, p a ra que assim D eus se p ossa com prazer ao olhar
p a ra n ó s ? !
E se considerarm os o am or de b e n ev o lên c ia..., ainda
se v ê m ais claram ente em M a ria a perfeição d o seu amor.
—’E la deu a D eus o que nunca ninguém Lhe pôde d a r...,
nem n a te rra ..., nem n o C é u ...; jam ais se deu m aio r glória
a D eus que a que lhe d a v a o C o ra çã o de sua M ã e Im aculada.
—-L em bra-te do M a y n ific a t e diz se houve alguém que
tiv esse podido c a n ta r m elhor a glória de D eus que A quela
su a divina escravazinha. — F inalm ente in fla m a-te..., ab ra-
sa-te no zelo que sem pre ard eu n o seu C o ração , pois este
é a fornalha onde sem pre foram inflam ar-se as alm as santas
p a ra no fogo do C o ra çã o de Je su s..., e com ele c o rre r logo
a incendiar e a a b ra sa r toda a terra.
12. A Caridade. — Amor a Jesus

l.° U nião perfeita. — D izem os m uitas vezes e com v e r­


dade que M a ria a m a v a ternam ente a Jesus, porque enfim
era seu F ilh o ..., m as, ao mesmo tem po, em seu F iího v ia ...,
a d o ra v a ... e a m a v a o seu D eus. — T o d o s os actos de am or
m aternal p a ra com o seu Jesus eram actos puríssim os de
am or de D e u s... e a união estreitíssim a que com o M ãe teve
com seu Filho foi causa d a união intim a e perfeita do seu
coração com D eus. — N ã o esqueças que isto é que é a m a r...,
dar-se ao a m a d o ..., é perder-se r iE le ..., é unir-se e ju n ta r-
-se... e fundir-se com E le de tal m odo que seja com. E le
um a m esm a c o isa ..., um a só v id a ..., um só c o ra ç ã o ... um a
só a lm a .—'T u d o isto se cum priu em M a ria de um a m aneira
para nós in ex p licáv el... e in in te lig ív e l...; nunca chegarem os
a p e n etrar n a intensidade íntim a e perfeitíssim a d a união
entre M a ria e Je su s..., entre M a ria e D eus.
D u ra n te o tem po que perm aneceu Jesus no seu purís­
simo se io ..., p o r um incom preensível m istério de hum ildade
e de am or p o r p a rte de D e u s..., a v id a de D eus foi a v id a
de M a ria ... a p ró p ria su b stân cia de M ãe n u tre e alim enta
o seu Filho, que é D eus e ... D eus transm ite a sua M ãe
Iodas as su a s ideias e sentim entos. Q u e revelações! Q u e
1
356 A C aridade — A m o r a Jesu ;

afectos! Q u e sentim entos! — Q u e oceano d e luz e de am or!


—'M a r ia tem o p ró p rio C éu no seu C o ra ç ã o ..., n ã o precisa
le v a n ta r os olhos p a ra cim a p a ra o ra r a D eus, senão
recolher-se no seu interior, porque tudo ali te m ...; física
e m oralm ente, é um a m esm a coisa com Je su s... O ra com
a o ra ç ã o de D e u s..., v iv e com a v id a de D e u s..., am a com
o am or de D e u s... Q u e coisa m ais adm irável! Q u e v e n ­
tu ro sa união !
D etém -te p o r larg o espaço a contem plá-lA e a admi-
rá-lA , e d ep o is... p e rg u n ta a ti mesmo: n ã o posso asp irar
a algum a coisa de sem elhante?— D eus fez-se hom em p a ra
unir-se d e sta m aneira só com a santíssim a V irgem , sem
d a r-n o s a nós nenhum a p a rticip a çã o desse a m o r..., dessa
união? Bem sabes que n ã o ... D eus cham a-nos a essa divina
união p o r meio da v id a d a g ra ç a ... um c o raç ão em graça,
que se en tre g a sem re serv a s a D eus, é um c o raç ão que vive
a v id a de D eus. —- D e u s é que se de rra m a n a alm a em
g raça, e a inunda com a su a lu z... com o seu a m o r... e é
E le quem trab alh a, o p e ra e vive n E la.
N ã o é isto, ainda, o que de um a m aneira real e física
acontece na C o m u n h ão ? ... Q u e significa C om unhão, senão
união com um ..., união m ú tu a de v id a ..., de afectos e de
sentim entos entre D eus e a a lm a ? ... N ã o é isto o cum pri­
m ento exacto daquilo de S. P a u lo : N ã o sou e u que vivo.
m as c C risto que v iv e em m i m l — Se M a ria em Jesus via
e am av a a D eus, o nosso am or a D eus tam bém pode c o n ­
cretizar-se no nosso am or a Jesus... e de aí que, a im itação
d e M aria, o p e rd er a Je su s..., o d e ix a r de O a m a r..., deve
se r p a ra nós a m aior d e sg ra ç a ...
2.° O m aior m al que nos p o d e acontecer... N ã o foi
assim p a ra a Santíssim a V irgem ? — P ôde D eus dar-lhe
m aior torm ento que o que E la sofreu com a perda de
J e s u s ? —'L e m b ra -te do que já m editaste sobre esta passagem
d a v id a de M a ria ..., d a an siedade e to rtu ra que despedaçou
aquele coração de M ã e ..., do seu tem or e das suas angus­
A C aridcóc — A m o r a Jesus 357

tia s ... Q u e h o rrív eis d ú v id as e in ce rte z as... Q u e teria


acontecido a seu Filho? ... T ê-lO -iam ro u b a d o ..., m a ltra ­
ta d o ..., m o rto ? ... Q uem sa b e ? ... S egundo S. A fonso M a ria
de Ligório, esta foi a m aio r e a m ais am arg o sa de todas
as d o res d a S antíssim a V irg e m ..., o u pelo menos, um a das
m aio res... P e rd e r J e s u s !... V iv e r sem J e s u s !... Q u e sentes
diante deste p e n sa m e n to ? ...
T o d o s os sofrim entos e todas as dores juntas, sofridos
na com panhia d e Jesus, não se podem co m p a rar com esta
só d o r... P orque, se perdes a Jesus, quem te pode co n so ­
lar? ... E n c o n tra rá s n a s cria tu ra s algum a coisa que possa
suprir a Jesus?— A quelas boas alm as que viram as to rtu ra s
da Santíssim a V irgem tam bém procurariam . tran q u ilizá-IA ...,
dir-L he-iam p a la v ra s d e consolação e de a le n to ..., porém ,
tudo isso, de que valia? ... Q u e Lhe im p o rta v a o que Lhe
podiam dizer, se a E la um a só coisa Lhe im p o rta v a ... sa b e r
onde e stav a Jesus?
A p e rd a de Je su s..., d a sua g ra ç a ..., d a sua am izad e...,
é, n ã o duvides, a m aior p e rd a ... o m aio r c astig o ... Q ue
m aior torm ento pode h a v e r que e sta r p riv a d o de Je su s? ...
E assim o que sen tes?— P ede à Santíssim a V irgem que
sintas assim m ais c mais, p a ra que deste m odo v iv a s o
mais longe possível dc toda a som bra, ain d a que p a reç a
pequena, do p e ca d o ; p o is com o pecado se perde a Jesus...
3." A m aior diligência. — P o rta n to , a m aior diligência
será p ro c u ra r Jesus, se p o r desg raça O tiverdes p e rd id o ...
N ão deixes p a ssa r nem um só m o m en to ..., nem um ins­
ta n te ..., n ã o d u rm as sossegadam ente sem o teu Jesus: —
Q ue fez M aria? ... E sp e ro u que am anhecesse e dorm iu tra n ­
quilam ente n aq u ela n o ite ? ... V ê com o nem p e n sa em.
com er..., nem em d o rm ir..., nem em d e sc a n sa r...; n a d a Lhe
im porta, nem a p ró p ria v id a ...
P o r isso, im ediatam ente, regressa pelo cam inho a n d a d o ...,
nem re p ara n a s dificu ld ad es..., não Lhe im porta que seja
358 A Carídad); — A m o r a Jesus

lon g o o cam inho e custosas as jo rn ad a s que já percorreu,


p a ra v o lta r a fa z ê -la s ...; e nas p raças, ru as e h o sp e d a ria s...
p o r toda a p a rte ... e com to d as as pessoas, m o stra a soli­
citude que a m artiriza e o afã que A n ã o d eix a v iv er. —-
E la tev e que co rre r m uito, tu, p o ré m ..., se quiseres, quão
fàcilm ente podes e n c o n tra r a Jesus.
Se tens dev o ção a M a ria , n ã o será fácil que O p e rc a s...,
porém , se O perderes, E la te en sin ará o cam inho p a ra O
e n c o n tra re s... N o s b raço s d e M a ria e n c o n tra rá s sem pre
Jesu s... V a i a tua M ã e com d o r..., com a rrep en d im en to ...,
im ita -A ..., desvia-te do cam inho que te lev o u ao p e c a d o ...,
v o lta p a ra trá s ..., e n tra pelo cam inho d a im itação da S a n ­
tíssim a V irgem e v e rás com o dep ressa e n c o n tra rá s o que
desejas.
4.° A m aior alegria. — E n c o n tra r a Jesus! sim, será
essa a m aior a le g ria ... Q u a l n ã o teria sido a d a Santíssim a
V irgem , quando p o r fim achou no T em plo a seu F ilh o ! ...
C om o de repente se teria enchido d e luz o seu c oração
escuro e e n te n eb re c id o ! Q u e júbilo p a ra aquele c oração de
M ã e ! — N a ig reja onde E le está sa c ra m e n ta d o ..., onde
E le tem o seu trono de am or, quer que tam bém n ós O
busquem os, e ali O ach e m o s..., se é precisam ente p a ra isso
que E le ali e stá ..., p a ra e sp e ra r-n o s..., p a ra c h am ar-n c s...,
p a ra co rre r p a ra nós a d a r-se-n o s todo, lo g o que o p ro ­
curem os... Q u e loucura a nossa, v iv er de costas p a ra Jesus
q u ando tão fàcilm ente O podem os e n c o n tra r..., e possuí-lO ,
se q u ise rm o s !... N ã o O afastes de ti e E le n ã o se re ti­
r a rá ... não te canses d ’E le, que E le n ã o se c an sa rá de ti,
se tu não quiseres. — P ede m uito isto ao C o ra çã o da S a n tís­
sim a V irg e m ...
L ê p a ra term inar, e saboreia d e v a g a r o C ap ítu lo V II
d o L ivro II da «Im itação de Cristo», em especial estas
expressões: Q uando Jesus está presente, tudo é bom e nada
parece d ifíc il..., m as quando está ausente, tu d o é d uro. —
E sta r sem Jesus é terrível in fe rn o ..., estar com Jesus 6
A C aridade — A m o r a Jesus 359

doce paraíso. — E n q u a n to E le e stiv e r c ontigo, ninguém te


pode causar dano. O que acha a Jesus acha um bom tesouro
e na verdade um bem sobre todo outro bem . — A o contrário,
o que perde a Jesus perde m uitíssim o e m ais d o que se per­
desse o m undo. — Q u ã o pobre é o que v iv e sem Jesus e
quão rico o que está bem com E le. — P e n sa que m uito
facilm ente podes d e ste rra r de ti a Jesus e p e rd er a sua
g ra ça , se te a p eg as ãs coisas da terra. — Suplica à S a n tís­
sim a V irgem que te dê a conhecer e a se n tir bem tudo isto.
13. A Caridade com o próximo

l.° O m andam ento n ovo. — O am or ao p róxim o é a


seg u n d a p a rte d o prim eiro m andam ento da Lei de D eus:
A m a r a D eus sobre todas as coisas e ao próxim o como
a nós m esmos. — Bem se pode d izer que é um reflexo do
am or de D e u s..., po is não é possível am ar a Deus, sem
am a r ao próxim o. — A m edida do am or a D eus é o am or ao
p ró x im o ... V ê com o am as a este e saberás os g rau s do, teu
am or p a ra com D eus. — S ão m uito conhecidas as p a la v ras
de S. João: S e alguém disser que ama a D e u s e aborrece
o seu próxim o, é m en tiro so ... E dá a ra z ã o disso: P orque
se não am a o p ró x im o que vê, co m o amará a D e u s a quem
não v ê ? ... Q u e bem g ra v a d o tinha no seu c o raç ão este am or
o discípulo que m elhor entendia de a m o r!... P o r isso, a sua
p re g aç ão reduzia-se a inculcar sem pre este a m o r... e se lhe
p e rg u n ta v am p o r que não v a ria v a de tem a, respondia: P o r­
que o am or ao pró xim o é um preceito do S en h o r, e se se
cum pre bem , isso só basta.
E fectivam ente, é um preceito do S e n h o r... prom ulgado
p o r E le em form a totalm ente n o v a ... N a a n tig a Lei, dizia-se:
A m a ao próxim o com o a ti m esm o. — P orém , a g o ra Jesus
C risto diz: A m a i-v o s uns aos outros com o eu vos am ei...
Q u e am c r tão forte 1 H avem os de am ar ao próxim o até ao
sa c rifício ..., até à m o rte ... A ssim nos am ou Jesus C risto ...
este é o grau d o seu am or, que nos m anda im itar neste
preceito. — T em ra zã o quando diz, que é um m andam ento
n o v o ..., pois ainda que já antigam ente se p re ce itu a v a esse
am or, é, porém , n o v o no m o d o ..., na in te n sid a d e..., no
g ra u de am or.
A caridade com o próxim o 36!

P o r conseguinte, ê im possível se p a ra r o am or so b re­


n a tu ra l d o próxim o, d o am or de D eus, p o rq u e quem am a
verdadeiram ente a D eus não pode d eix ar de am a r tu d o o
que E!e a m a ... Q u a n to n ã o am a D eus ao hom em , se p o r ele
so fre u ... e m o rreu ... e derram ou todo o seu san g u e ? — Só
assim se explica que em. todos os santos, q u an to m ais
crescia o am or de D eus, m ais a u m e n tav a o. am or ao próxim o.
Jesus C risto quis p ô r este am or com o distintivo dos seus
discípulos: N is to se conhecerá que sois m eus discípulos, se
vos amardes ,uns aos o u tro s... E isto foi tão perfeitam ente
com preendido pelos antigos e fervorosos cristãos, que todos
os conheciam p o r isso e os próprios gentios exclam avam :
V éd e com o se am am m ú tu a m e n te..., até quererem m orrer
uns pelos o u tro s...
2." C o m o M a ria nos ama. — M e d ita a g o ra no am or
de M a ria pelos ho m en s... Se o s c ristãos se am avam assim,
ccm o não seria o am or de M a ria ? ... C om o nos a m ará actu al-
mente? ... N ã o se pode com preender o seu am or, sen ão
com parando-o com, o do p róprio Jesus C risto. — D epois
d 'E le ... e do m odo m ais sem elhante a o d 'E le , ninguém com o
M aria nos am ou. — É am or de M ã e ...; com isto e stá tudo
dito, pois não h á am or com o o d a s M ã e s..., m as um a M ã e
que reune n o seu c o raç ão todas as tern u ras m aternais que
D eus re p a rtiu entre as o u tras m ães. — O p ró p rio Jesus
C risto fez-nos seus filhos aos pés da C ru z ... som os filhos
das su as dores e sofrim entos, pois tan to Lhe custám os e
tan to A fizemos s o f r e r .—-Som os irm ãos d e Jesus C risto ;
como, pois, não nos há-de am ar ao m esm o tem p o ... e d a
mesma m aneira que a seu F ilh o ? — M a ria não pode d eix ar
de v e r q u a n to D e u s nos a m a ... P e rc o rre em sua com panhia
os benefícios que d 'E le recebem os: n a tu ra is e so b re n atu ­
ra is..., a g ra ç a ..., a p a rticip a çã o d a sua v id a ..., a ado p ção
que faz de nós filhos de D e u s..., tem plos d o E sp írito S a n to ...;
a obra de Jesus C risto n a In c arn a çã o e R e d en ç ão ..., a sua
v id a ..., o seu sa n g u e ..., a su a d iv in d a d e ..., os S a c ram en to s...,
362 A caridade com o próxim o

a Ig re ja ..., a E u c a ris tia ..., a S a n ta M iss a ..., tudo para


n ó s ! ... T u d o fez única e exclusivam ente p a ra n ó s ! ... «T udo
fa zia pen san d o em mim», p o d e d ize r cad a um . C om o é
g ra n d e o seu a m o r!...
A ssim é, p o rtan to , o d e M a ria ... E la n ã o pode v e r
com indiferença um a coisa tão sum am ente do a g ra d o de
D e u s ...; só isso b a stav a , m as m uito m ais q u ando E le lho
m a n d a ... Q u e vai pois fazer a obedientíssim a M aria, senão
ab raç ar-se com esta cruz d a nossa m atern id ad e e com eçar
a am ar-nos com todo o seu c o ra ç ã o ... com o tin h a am ado
a seu F ilh o ? ... A M ã e de D eus é m inha M ã e ! ... logo,
am a-m e com o am a a Jesus. — U m a boa m ãe n ã o faz d is­
tinções entre os seus filh o s..., am a a todos igualm en te...
se p o r a caso faz algum a distinção, é com o filho d o e n te ...,
d e sg ra ç a d o ..., m iserá v el..., com aquele que m ais a tem
feito so fre r... Poderem os d ize r algum a coisa de sem elhante
de M a ria ? ... en tão as suas predilecções se rão p a ra n ó s...,
e assim é n a verdade, ainda que p a reç a incrível.
E m certo m odo, podem os dizer que nos am a ain d a mais
d o que am ou a Jesus. — C ontem pla a S antíssim a V irgem
aos pés d a C ruz, e ao v ê-la com o sacrifica o S eu F ilh o ...,
diz-m e se não será v e rd ad e esta a firm aç ã o ... N ã o duvida
em a u to riz a r..., em consentir na m orte de Jesus, contanto
que nós vivam os. —• D eus fez o coração d a Santíssim a
V irgem d o tad o de um a tern u ra especial, qual c onvinha para
am ar a seu F ilh o ... E ssa mesma delicada tern u ra tem M aria
por ti..., em prega-a a a m a r-te ... Q u e felicidade a tu a ! Q ue
so rte ! Q u e m ais podes d e se ja r c u a n e la r? ...
3.° O teu am or ao p ró xim o . — É tu a o b rig a ç ã o ...,
am a r ao próxim o com o Jesus e M a ria te am aram a ti... e te
am am a g o ra. —<E ste am or h á-de ser um am or sobrenatural,
quer dizer, n ã o o hás-de am ar som ente p o r sim p a tia s..., nem
repelir ninguém p o r a n tip a tia s ... E ssa razão é m uito baixa
e te rre n a ..., seria p ro c u ra r no am or o teu g o sto ..., a tua
com placência..., o teu a g r a d o ...; isso seria b u scar-te a ti
.4 caridade com o próxim o 363

m esm o ...; p o rtan to n ã o seria a m o r..., porque o am or con­


siste em dar-se e com unicar-se desinteressadam ente.
P o r conseguinte, hás-de am ar o próxim o em D eus, quer
dizer, porque é algum a coisa de D e u s..., im agem v iv a de
Deus. —• H ás-d e a m a r p o r D eus, p o rq u e E le to ord en a e te
ensina cem o seu exem plo, p a ra assim lhe obedeceres e
p a ra m elhor O im itares. H ás-d e am á-lo para D eus, pelo
cam inho que asseg u re a sua posse n o C éu.
A lém disso, h á-de ser um am or universal, isto é, que
não exclui a n in g u ém ..., a bons e m a u s..., aos que te querem
bem e aos que te o d e ia m ..., aos conhecidos e am igos, e aos
estran h o s e desconhecidos. — U m am or sacrificado, como
o de Jesu s..., com o o de M a r ia ...; pelo bem d o próxim o,
especialm ente pelo seu bem e sp iritu a l; hás-de tudo sacrifi­
c a r ...; tudo te deve pa rec er m uito p o u c o ..., n ã o hás-de
contentar-te com fa ze r o m enos custoso, sen ão o que julgues
mais p ro v e ito so ...; h ás-d e p edir e o ra r p o r ele, e se pude­
res, d ev es fazer m a is ..., deves p ro c u rá -lo ..., fa la r-lh e ...,
c o rrig i-lo ..., a tra i-lo ..., e tc .; enfim, dev es p ra tic a r aquilo de
S. Paulo: « F a z er-te todo p a ra todos, p a ra lev a r todos
para C risto».
A ssim com preenderam esta lição todos os santos, —
Q u e não fez um S. F ran cisco X a v ie r..., um S. P edro
C la v e r..., um a S a n ta T ere sa de Je su s..., etc., pelo seu
pró x im o ..., pelos p e ca d o res..., pelos herejes e cism áticos e
até mesmo pelos in fié is? ... O u v e a S. P a u lo que diz:
Q ueria ser anátem a pelo bem d o s m eus irm ãos... O u v e a
S. F ran cisco de Sales, que escreve estas suavíssim as p a la ­
vras: A p ren d a m o s d e um a v ez a am ar-nos rteste m undo,
como depois nos h a v em o s de am ar no C é u ... O h \ quando
chegará o dia em q u e est&jamos todos penetrados dc doçura
c ca-idade com o p ró x im o !... A m e m o s a nossos irmãos com
toda a am plidão dos nossos corações. — E sta s p a la v ra s e
estes afectos aprendem -se unicam ente contem plando a Jesus
e na escola de M aria.
14. A Caridade com o próximo

1 Sen tim en to s e desejos. — P a r a to rn a r m ais práticas


estas m editações d a caridade, detenham o-nos naqueles pontos
em que m ais nos p arece faltarm os a esta v irtu d e. — E antes
de tudo considerem os e exam inem os os nossos afectos e
sentim entos in te rio re s...; é m uito fácil fa la r nestes pontos,
prim eiram ente fom entando n o nosso c o raç ão afectos de m ur­
m u ração e inveja p a ra com os outros. — Q u e subtil não é
esta te n ta ç ã o !... L ouva-se o próxim a' p o r um a coisa que
fez b e m ..., quem sabe até se m elhor d o que n ó s ...; ouvim os
p a la v ra s que enaltecem a sua sim p atia..., a sua g ra ç a ...,
o seu tale n to ..., a sua b e le za ..., a sua habilidade, etc., e
b ro ta espontâneam ente o sentim ento de em ulação em. n ó s ...;
não queríam os que assim fo sse..., que ninguém nos levasse
a d ia n te ira ..., que fôssem os os prim eiros em tu d o ... Com o
tudo isto é h u m an o ..., porém , que m iserável!
A Santíssim a V irgem foi já feita M ãe de D e u s..., sabe
que D eus concedeu um filho a sua p rim a ... e esconde a sua
conceição m ilagrosa, corre a casa d a sua prim a a felici­
tá -la ..., a co n g ratu lar-se com e la ... e q u an d o se vê des­
coberta p o r S a n ta Isabel, que in sp irad a no E sp írito Santo
p rorrom pe em louvores de M a ria , esta lev a n ta o coração a
D eus e a E le dirige, com o se u M a g n ific a i, to d o o louvor
e toda a glória. — E is qual deve ser a n ossa conduta, se
virm os no próxim o m ais bens tem porais ou esp iritu ais...,
A C aridade com o próxim o 365

que é m ais estim ado e h o n ra d o ..., que é preferido a n ó s...,


que tem m ais talen to e m ais h a b ilid ad e s..., etc. — N ã o nos
entristeçam os, nem tenham os inveja do que é d e le ...; c o r­
ram os, com o a S antíssim a V irgem , a fe licitá-lo ..., sejam os
os prim eiros a a le g rar-n o s sinceram ente com, e le ... e lou­
vem os a D eus pelos bens que derram ou sobre essa pessoa.
D evem os igualm ente a b a fa r todo o sentim ento de
ó d io ..., de ra n c o r..., d e vingança, c o n tra o nosso próxim o.
—• Se nos ofendem nalgum a coisa, devem os ser generosos
no p e rd ã o ..., n ã o p e rd o an d o a m eias..., senão m uito deveras
e m uito d o co ração . — N ã o adm itas estas expressões que
perdoes, porém , não esqueces..., q u e não guardas rancor,
que não queres nada com e le ..., que não pretendes vingar-te,
porém , alegras-te com o seu m a l...; tudo isso indica m uito
pouca c a rid a d e ..., m uito pouco espirito de Jesus C risto.
— E le perdoou e até am ou aos seus inim igos..., desculpou
os seus v e rd u g o s... intercedeu an te o Seu P ai p a ra que
lhes perdoasse. — M a ria, ju n to da C ruz, tam bém se não
re v o lta ..., nem os in su lta ..., nem dirige p a la v ra s d e v in g an ça
contra aqueles d esgraçados que m altratam o seu F ilh o ...;
olha-os com p e n a ..., lastim a-os, e tam bém pede, como v in ­
gança, a conversão deles.
Jesus C risto q uer que amem os aos nossos inim igos...,
aos que nos o fe n d em ..., aos que nos d e s a g ra d a m .— E ste
é o am or so b re n atu ra l p ró p rio dos cristãos. — A m ar a quem
nos a m a ..., q u e rer bem a quem nos h o n ra e nos e stim a ...,
tra ta r com c arin h o a quem nos a g ra d a e a tra i pela sua
sim p atia..., tudo isso tam bém fazem os p a g ã o s ..., p a ra isso
não nos faz falta a v irtude. — Pede, pois, à Santíssim a
V irgem este am or de v erd ad e ira carid ad e p a ra com o p ró ­
ximo, sofrendo o s seus defeito s... e levando- com paciência
o que nele te d esa g ra d a r.
2.° J u íz o s.— E s ta é o u tra form a m uito co rren te de
faltar à c a rid a d e ..., o bendito juízo tem erário, que, por
nossa m alícia... ou p o r não passarm os p o r tolos ne,m ser-
366 A C aridade co m o p ró x im o

m os e n g an ad o s pelo próxim o, tã o facilm ente fazem os dele...


D eus proibiu-nos tais juízos, quando nos disse: não julgueis
e não sereis ju lg a d o s... e S . P a u lo acrescen ta: quem és tu
para julg a r alguém 1. Se cai ou se e stá d e pé, a ti que te
im porta? Isso p ertence a o Senhor, o u seja a D eus.
O juízo tem erário é um a ofensa c o n tra o próxim o, pois
o julgam os sem v e rd a d e ira ra z ã o ..., sem fundam ento certo;
e é um a ofensa d ire c ta feita a D eus, pois querem os u supar-
-L he o oficio de juiz dos v iv o s e dos m o rto s .— 'E le nos
ju lg a rá a todos um dia, e en tão a p are ce rá claram ente o que
c a d a um foi d ian te de D eus, e se som os dignos de louvor
o u de vitupério n a su a presença. — P e n sa que o custoso é
sa b e r ju lg a r com re c tid ã o ..., de so rte que se ria um a grande
p reocupação, se D eus nos tivesse m an d ad o ju lg ar-n o s uns
aos o u tro s ..,: é tão fácil e n g a n a r e e n g a n a r-se ..., deixar-se
le v a r das a p a rê n c ia s..., d a s sim p atias... o u a n tip a tia s ... Se
D eus, porém , nos m anda o que é m ais fácil, que é n ã o nos
m eterm os a julgar, e re serv a p a ra Si o m ais difícil, p o r que
som os tão néscios em nos ocu p arm o s n o c o n trário ?
E nfim , já que nos pom os a julgar, p o r que n ã o o faze­
m os com rectidão e caridade? ... P orque, a o julgar, não
vam os prevenidos p a ra d e ita r tudo à boa p arte, em vez de
porm os m alícia em tu d o ? ... P o rq u e n ã o n o s pom os nós
no lu g ar do próxim o e n ã o nos julgam os e n tã o ? ... A h!
C om o seriam diferentes os juízos! — Q u e m edida tomam os
p a ra nós, e quão diferente p a ra os o u tr o s ! ... O que é nosso
descu lp am o -lo ..., ex p licam o -lo ..., porém , p a ra os o u tro s não
adm itim os a te n u a n te s..., sen ão que julgam os rigorosam ente.
— P o is bem, repete m uitas vezes: C om a m edida com que
m edirdes, sereis m edidos tam bém . — Q u e im aginas faria n
S antíssim a V irg e m ? ... Q u a l se ria a sua m edida? ... Como
julgou a S. P e d ro ... aos apóstolos c o b a rd e s..., incrédulos...,
e tc .? — Suplica-L he que te dê en tran h as de caridade, para
que assim , com essa m edida, m eças a g o ra e se jas medido
algum dia.
A C aridade com o p ró x im o 36 7

3.° P a la vra s. —• O que não peca p o r palavras, diz


S. T ia g o , é varão p e rfe ito ... P o r isso há tão poucos p erfei­
t o s .— Q u a n to s pecados d a lín g u a !— S. F ra n c isco de Sales,
queria ir com um c a rv ã o aceso p u rifican d o a língua dos
hom ens, porque, quão poucos seriam os que não necessita­
riam d essa p urificação!
P ensa nas conversas e v isitas, onde ta n to se falta à
c a rid a d e !... P a re c e im possível su ste n tar um a conversa sem
se m anchar o próxim o. —• S. B ern ard o diz que a m urm uração
é uma lança de três pontas, porque fere a pessoa de quem
se m urm ura tirando-lhe a fa m a ... fere ao que m urm ura fa zen ­
do-o p e ca r..., fere ao que escuta, escandalizando-o e fa ze n ­
d o-o cair no m esm o pecado.
N ã o esqueças que a m urm uração é um pecado de si
m ais g rave que o furto, pois se este ro u b a bens m ateriais,
a o u tra ro u b a a fam a, que vale m uito m ais. — N ã o se fala
aqui d a calúnia, p o rq u e esse não é pecado c o n tra a caridade,
senão c o n tra a ju stiç a ..., p o r isso ob rig a à re stitu içã o ; m as
sim das c rític a s..., c en su ra s..., m u rm u raçõ es..., etc- — Q u a n to
se critica e m urm ura dos su p e rio res..., até das au toridades
eclesiásticas..., dos iguais e in fe rio re s !... É necessário fazer
propósito de n ã o fa la r de n in g u ém ... nem de o u v ir com
gosto conversas deste g é n e ro ... Q uando, n a tua presença
se m urm urar, c o rta a conversa se p u d e re s..., foge dali se te
é p o ssív el..., d esvia hábilm ente a c o n v e rsa ..., m ostra sem pre
desag rad o p a ra que diante de ti n ã o voltem a m urm urar.
D etém -te a re c o rd a r a v isita da Santíssim a V irgem
a sua p rim a ... E sc u ta a sua c o n v e rsa ... M ed ita as suas
p a la v ra s ... Q u e m odelo de v is ita s ! ... Q u e conversas exem ­
p la re s !... N ã o seria sem pre a ssim ? ... C oncebes a S antíssim a
V irgem m etida em m exericos de c o m a d res..., falando de toda
a g e n te ? ... P o rq u e n ã o a hás-de im itar? P o rq u e L he n ã o
pedes que te ajude a ser com o E la, num pon to tã o belo e
tão necessário com o é este d a c arid ad e cem o próxim o?
15. O bras de Misericórdia

1.” A su a n e ce ssid a d e .— É nas obras de M isericórdia


que pràticam en te exercitam os a caridade. — N ã o b asta a
c a rid a d e d e a fec to s..., de sentim en to s..., de juízos e de
p a la v r a s ...; é necessário que tam bém a tenham os n a s obras.
—-A ssim o disse expressam ente S. João: M e u s filhinhos.
não am em os só com a p a la vra e com a língua, senão com
obras verdadeiras. —■P o rta n to , o am or h á -d e co n sistir mais
nas o b ra s que nas o u tras coisas.
P o r o u tra parte, o ter p ra tica d o com esp írito cristão as
o b ra s de m isericórdia e piedade, ser-nos-á de gran d e consola­
ção algum d ia ..., já que elas, segundo o p ró p rio Jesus Cristo,
decidirão da nossa so rte etern a: V indo, benditos d e meu
P ai, porque tiv e fo m e e se d e ..., etc., e m e destes d e com er...
E aos condenados dirá: Ide, m alditos, para o fo g o eterno,
porq u e não m e destes d e com er nem de b e b er..., isto é,
po rq u e n ã o quisestes p ra tic a r as obras de m isericórdia. —
É, p o r isso mesmo, um d e v e r sa c ra tíssim o ..., um a v erdadeira
o b rig aç ão que Jesus C risto nos impõe, o com padecerm o-nos
dos nossos irm ãos e socorrê-los, sejam eles quais forem.
R ecorda a p a ráb o la do Bom S am aritano, em que ao
m esm o tem po que re tra ta o seu c oração divino, cheio dc
d o ç u ra e de com paixão p a ra com os d esgraçados, condena
duram ente aos que procedem sem m isericórdia. — Se não
procedem os com m isericó rd ia... tam bém a n ã o consegui-
O b ra s de M isericórdia 369

rem os p a ra nós um d ia ..., e com o E le prim eiro a p raticou


e depois a ensinou, foi nisto p a ra nós m odelo acabadíssim o.
— T o d a a sua v id a se reduz a estas p a la v ra s: Passou
fazendo bem a todos... E sta é a sua h istó ria ... e com isto
está tudo d ito. — E como discípula de ta l M e stre e d e tal
escola, a S antíssim a V irgem foi tam bém a prim eira em
cum prir com este preceito, e o exercitou d u ra n te a su a vida
com grande perfeição.
S. V icente de P aulo, falando das o b ra s de caridade,
costum ava dizer: Ponhamos diante dos nossos olhos, como
nobilíssimo exemplar, a M ã e de D eus e procedamos con­
forme tão digno e soberano m odelo... E assim , com esse
modelo e com essa m áxim a, ch eg o u o san to a se r herói
incansável d a c arid ad e cristã. — P orém , desçam os a m ais
porm enores e v ejam os p o r p a rte s a s d iv ersas o b ra s de
m isericórdia em que nos devem os exercitar.
2.° Obras espirituais. — 1E sta s o b ra s de m isericórdia
são, sem dúvida, as m ais im portantes e as m ais excelentes,
pois têm relação directa com a a lm a ..., com a p rópria
sa lv a ç ã o ... e, n aturalm en te, tu d o isto é m uito m ais e sti­
m ável que o co rp o e a felicidade tem poral, que é d o que
tratam as o b ra s de m isericórdia corporais. — A Santíssim a
V irgem , exercitou e exercita actualm ente com a s alm as a
sua m isericórdia m ate rn a l... N ã o falem os dos pecadores
em pedernidos, dos crim inosos e p e rv e rso s..., dos que por
E la o b tiveram a g ra ç a d a sua conversão, porque isto um
d ia o saberem os no C éu, já que a g o ra é im possível calculá-lo.
R ecorda os p e rig o s em que e stiv e ste ..., as ocasiões que
o dem ónio te a p re se n ta v a ..., a lu ta d a s paixões, p o r vezes
em form a im p re v ista..., quando m enos o e sp e ra v a s... A quem
deves não teres caíd o então? T a lv e z n ã o fosses bem v igilante
e o dem ónio trato u d e te surpreender, e E la foi a que te
a v iso u ..., a que te deu força p a ra re a g ire s ..., p a ra v e n ce r...
Q uem te inspirou tão bons a fe c to s..., tã o bons propósitos,
e tc .? ... Q uem te deu luz p a ra con h ecer a v o n tad e de D e u s...

24
370 O bras de M isericórdia

e forças p a ra c o n tin u a r sem vacilar, ainda que fosse à custa


de g randes sa c rifício s? ...
M a téria interm inável seria esta, se descorressem os por
este cam inho, pois se ria necessário en u m erar todos os santos
do C é u ..., to d as as alm as que se têm s a lv o ..., todos os
pecadores arrependidos. — M as, se quiseres, recorda n a Sua
p ró p ria vida o que nos diz a S a g ra d a E s c ritu ra ... E la
am p aro u os A póstolos d epois d a A sce n sã o ..., p rep aro u -o s
adm iravelm ente p a ra a v in d a do E spírito S a n to ..., alentou-os
e confortou-os com o seu e x em p lo ..., com as su as p a la v ra s
e com as suas v irtu d e s... F o i a M ãe d a Ig reja nascente.
C om que carinho receberia os nov o s c r is tã o s !... C om o os
in fo rm aria e confirm aria n a F é ! .. . Q u e cateq u ista adm i­
rá v el !
E quando principiaram as prim eiras perseg u içõ es... e
os A póstolos foram e n c a rc e ra d o s..., a ç o ita d o s..., persegui­
dos, quem c s aconselhava e d irigia sen ão E la? ... A quem
recorriam eles, sen ão à Santíssim a V irgem a p ro c u ra r con­
so la ç ã o ..., â n im o ..., fo rç a ..., tudo q uanto necessitavam ?
A qui tens, pois, a m agnífica obra de m isericórdia que
p odes e x ercitar com o p ró x im o ... T ra b a lh a r pela sua a lm a...,
c o o p era r com D eus n a o b ra da su a s a lv a ç ã o ... H á algum a
coisa m ais d iv in a ? ... Q u a n d o não puderes fazer o u tra coisa,
o r a ..., sa c rifica -te..., m ortifica-te p o r e le s..., p o r to d o s !...,
pelos p e ca d o res..., pelos justos e in o cen tes..., pelos here-
je s ..., e cism áticos..., pelos infiéis, etc-
3.° O b ra s corporais. — É fácil de su p o r corno a S an ­
tíssim a V irgem faria continuam ente estas o b ra s... D etém -te
a considerar com o receberia os pobres que iam pedir
e sm o la... Q u a n tas vezes lhes d a ria d a sua m esm a pobreza,
tira n d o a si, n ã o d igo já o supérfluo, senão o m ais indis­
p e n s á v e l!... Q u e alojam ento d a ria aos peregrinos, segundo
a lei d a hospitalidade que re g ia o p o v o ju d a ic o !... Q ue
visita s as suas aos doentes d a v iz in h a n ç a !
E nfim , se queres d e ix a r a s suposições, ainda que tão
O bras d e M isericórdia 371'

certas com o estas, m edita d e n o v o n a su a in terv en ção n o


m ilagre das b o d a s de C a n á ... e ali d esco b rirás um a te rn u ra
m atern al..., um a diligência a c tiv a ..., um a pro n tid ão incan­
sável. — E la é a única que n o ta a fa lta d o vin h o e a
a tra p alh a çã o que esta fa lta iria p ro d u z ir... Q u ã o ternam ente
sentiu E la o tra n sto rn o que isto ia o c a sio n a r a o s convi­
d a d o s... e a v e rg o n h a e confusão aos de c a s a ! — O sen
coração com oveu-se p e ra n te aquele aflitiv o tra n s e ; e sentiu-o
como se fosse coisa p ró p ria. É sem d ú v id a este um dos
netos d e delicadeza m ais v iv a e sin g u lar d a S antíssim a
V irg em ... P o r isso decide-se com g ra n d e diligência a p re sta r
aquele socorro n aq u ela necessid ad e... S erve-se das su as
p a la v ra s ..., da su a c a rid a d e ..., d a su a co nfiança e d a su a
influência p a ra com o seu F ilh o ... e foi um a g ra n d e conso­
lação p a ra o seu c o raç ão d a r àqueles desp o sad o s o que
então lhes podia d a r ... Q u e p ra z e r e spiritual e divino o
que sentiu a S antíssim a V irgem com aquela a g ra d á v e l su r­
presa que lhes p r e p a r o u ! ... A ssim nós devem os p ro c u ra r
este gosto e este prazer, que sentem as alm as boas, quando
remedeiam algum a necessidade... N u n c a o experim entaste?...
A caridade é engenhosa e activa, p o r isso ela pro r
c u rará mil m eios e ocasiões p o r dia, p a ra e x ercitar as o b ras
de m isericórdia corporais. — V ê, n o exem plo d e M a ria,
como ap ro v eito u aquela o c a s iã o ...; n ã o a desprezou quando
|h)dia m uito bem dissim ular e n ã o d a r-se por a ch ad a. —
A caridade desconhece a dissim ulação, p ro c u ra e a p ro v eita
qualquer o p ortunidade.
P e rc o rre , um a p o r um a, todas as o b ra s de m isericórdia
espirituais e c o rp o ra is..., exam ina-te em todas elas conform e
o que tens m ed itad o ... E n v erg o n h a -te e pede p e rd ão das
vezes que tens fa lta d o ...
P ede à Santíssim a V irgem m ais c o ra ç ã o p e ran te as
desgraças a lh e ias..., que as sintas com o p róprias, e que
te faça a g ra ça de sa b o re a r o p ra z e r p ro fu n d o de fazer
bem em toda a p arte.
I

16. Prudência

í.1, 1.“ E xcelência desta v ir tu d e .—‘P e n e tra , antes d e tttais


n ad a, n a excelência e necessidade desita v irtu d e d a p ru ­
d ê n cia o u discrição. — Bera vês que é a que d á v a lo r n
todas as o u tras. —i T o d o o acto d e v irtu d e feito sem p ru ­
dência d eix a p o r isso mesmo de o ser. — E n tre dois e x tre ­
m o s viciosos, está sem pre a virtude, e a p ru d ên cia é a que
■ensina pràticam ente esse m eio term o justo onde a virtude
se baseia. — Bela e necessária é a m ortificação e p en itê n cia ;
porém , p ra tica d a im prudentem ente, é um a v e rd ad e ira tent.i
ç ão d o inim igo. Q u e coisa m aior pode h a v e r que o zelo
d a salv ação das alm as? E , não obstante, q u an to s dan o s na»
te m produzido o zelo indiscreto!
A p rudência é a com panheira in sep aráv el de to d as ns
V irtu d es... e m ais d o que um a virtu d e é com o que a nornin
o u guia de to d a s ... S. T o m á s cham ou-a os olhos da alma.
p o rq u e quem o bra sem ela o b ra às ceg as com o se não
tivesse olhos. — S. B ern ard o diz que é com o o lem e ou
o pilo to dum n avio, sem o qual necessariam ente há^de peru
cer oit naufragar. S. F ra n c isco d e Sales diz d a prudêncltt
que é lu z ao redor d a nossa vida, que nos ilum ina para »/)■>
errar o cam inho... e sal que preserva da corrupção u»
dem a is viríudes. A prudência, pois, é esse juizo p rá tico que
nos diz cm cad a caso o que convém fazer ou deixar de

k
Prudência 373

fazer..., que nos ensina o s m eios conducentes a o fim que


pretendem os..., enfim, que nos indica sem pre quando e com o
devem os o b ra r. — N ã o é pois p a ra e stra n h a r que, se é um a
virtude tão excelente e tã o necessária, sobressaia ta n to nq
nossa querida M ã e í ... A Ig reja cham a-A V irg e m P ru d e n tís­
sim a e real.mente assim foi; porém , p a ra m elhor com preen­
dê-la convém que distingam os d u a s classes de prudência.
2." P rudência d o espírito e d a carne. ■— Assim a cham a
S. P au lo ; a prim eira é a vida e paz v e rd a d e ira d a a lm a ...,
é a v e rd a d e ira p ru d ê n c ia ... e a v e rd a d e ira sa b e d o ria ..., a
única que m erece cham ar-se assim . — A seg u n d a é um a
prudência m á ..., fa ls a ..., inim iga de D e u s..., c o n trá ria à lei
de D e u s..., não tem o u tro s fundam entos nem m otivos senão
os que d ita a carne, e p o r isso leva seg u ram en te à m orte. —
K a p rudência do século o u d o m undo, diam etralm ente oposta
no espirito de D e u s ...; confunde-se ccm a dissim u lação ...,
com a hipocrisia, com a a stú c ia ... com o cálculo in teresseiro
e egoísta, que n ã o olha senão p a ra si... e p o r isso, esta
prudência falsa é m ed o ..., tem o r..., c o b a rd ia ..., so b e rb a ...
—i V é quão d ig n a é de re p ro v a ç ão esta m aldita pru d ên cia
o..., no e n ta n to ouve a Jesus C risto , que se lam enta que
Hcjnm m ais prudentes os filhos d o sé c u lo ..., isto é, que são
m ais... m uitíssim o mais, o s que seguem esta p rudência p a ra
os seus negócios que os filhos d a luz, p a ra a salv ação
eterna. — P o r isso m esm o tan to nos inculca que sejam os
prudentes com o as serpentes e a o m esm o tem po sim ples
corno a s p o m b as..., q uer dizer, que tenham os a prudência
minta, que está cheia de sinceridade e de v erdade.
R ecorda a p a rá b o la das virg en s loucas e p ru d e n te s...;
estas, previdentes e v ig ila n te s..., aquelas, confiadas e des­
p re v e n id a s.— V ê bem nisto o que é a v e rd ad e ira p ru d ên cia;
e lu z..., é sa b e d o ria ..., é conhecim ento p rá tico das c o isas...,
Inconsideração..., v e rd ad e ira ig norância, ju n ta com soberba
r confiança em si mesmo. — D iz o E sp irito S anto: Be/n-
itveníurado o hom em que achou a sabedoria e é rico em
374 P rudência

prudência. O que é prudente é, n a verdade, um grande


sábio.
3 .“ A Virgem, prudente. —- A qui tens, pois, po rq u e era
tão pru d en te a S antíssim a V irgem . D iscípula apro v eitad ís-
sim a d'A quele que era «a luz do m undo e a sa b e d o ria de
D eus», sem pre, e a cad a instante, teve esta luz e esta
ciência de D eus, n a qual v ia clarissim am ente itodas a s coisas,
d a n d o a cad a um a seu peso e v a lo r... e, p o r isso mesmo,
a c e rta n d o sem pre com o m ais conveniente e m ais p rático
em cad a caso. — N ã o A cegavam as paixões que a nós
ta n ta s vezes nos fazem v e r a s coisas d e m odo diferente, e
p o r isso a s ju lg am o s... e apreciam os m a l...; a am bição...,
o s acessos d a ira ..., a v e n d a terrív el do a m o r p ró p rio que
tem os nos o lh o s..., a p re g u iç a e descuido n a oração, que
é onde D eus com unica à s alm as a su a luz e a sua ciência...,
a fa lta de v igilância p a ra v e r com o e p o r o n d e nos ataca
o inim igo... não é tudo isto e o u tra s ra zõ e s sem elhantes
o po rq u ê d a s nossas tã o repetidas im prudências?
M a ria era hu m ild e..., era p u ra ..., e ra sim p les..., era
fe rv o ro sa ..., e ra v ig ila n te ...; n a d a A o fu sc a v a ... n a d a A
a p a rta v a dos olhos de D e u s... tudo v ia n E l e e atrav és
d E l e .. . com luz so b ren atu ral e d iv in a ..., com esp írito de
fê ..., com am or ab rasa d o de D e u s... Q u e estranho, pois,
que fosse tão prudente em tudo? ! Q u e é pois p a ra adm irar,
que sem pre elegesse o m elhor e o m ais a g ra d á v e l aos olhos
de D eu s?—. D aqui aquela segurança n a su a alm a, que
n ã o se d e ix a v a a rra s ta r p o r im pressões, procedendo sem pre
com m oderação e a o mesmo tem po com firm eza..., segurançu
perante D e u s sabendo que a c e rta v a sem pre com a divina
v o ntade, ain d a nos seus m ínim os p o rm en o re s..., estando
c erta de que nunca d e ix a v a d e a te n d e r..., de e sc u ta r..., de
seg u ir as m oções e inspirações de D e u s... segurança perante
o s hom ens a quem ju lg a v a com rectid ão infalível, penetrando
n o s seus corações e lendo neles as su a s intenções. Junto
com esta segurança, um a paz in alteráv el e su av e, acom ­
Prudência 375

p a n h ad a de íntim a união com D eus, a quem acudia a p edir


lu ze s..., a p ro c u ra r conselho... o u so licitar o conhecim ento
e a sabedoria necessária p a ra a c e rta r sem pre no cum prim ento
dos seus deveres. —• E sta e ra a pru d ên cia e a m adureza
com que a Santíssim a V irgem ju lg a v a e p ro c e d ia ... e os
m agníficos frutos que E la tira v a d e stas v irtu d e s p a ra a
sua alm a.
4.” A tua prudência. —- C om o estás n esta v irtu d e ? ...
A h! qu an to necessitas d e la ! ... E stá s c ercad o de dificuldades
por vezes bem difíceis de vencer, d e perigos e ocasiões que
te espreitam e que talvez d sc o n h e ça s..., de rudes b atalh as
que o dem ónio te p re p ara , e q u ando m enos o e sp e ra s... P o r
o u tra parte, n ã o conheces bem a tu a fraq u eza e m iséria,
sobretudo se a com paras com as obrigações que tens que
c u m p rir... Q u e fazer e n tã o ? ... com o a c e rta r com o cam inho
mais p rá tico p a ra a sse g u rar a tu a sa lv aç ão e santificação? ...
Com o, pois, necessitas desta virtu d e p a ra a tu a alm a!
M as tam bém p a ra outros. — Se o s queres g a n h a r p a ra
C risto, h ás-d e p e n e tra r na su a a lm a ..., conhecer o seu
tem peram ento, c ará cte r, paixões, fraquezas, gostos, e tc ...,
e tudo isto d e tal m odo que n ã o excites su sp e ita s..., des­
c o n fia n ça s..., tem o res..., que não julguem que p reced es com
c u rio sid a d e..., d e sc o n fia n ça ..., que gostas de te m eter nas
vidas a lh e ias... Q u a n ta p ru d ê n cia... que tacto não requer
tudo is to ! ... U m m ovim ento..., um g e sto ..., um sorriso de
tro ç a ..., às vezes um a só p e rg u n ta ... quantos dan o s não
c a u s a m !... D e facto, m uitas v ezes num m om ento se perde
o fruto que já quase se tinha n a m ão.
P ed e à Santíssim a V irgem hum ildade, pois o soherlio
não pode ser p ru d e n te ... P ed e-L h e m ansidão e paciência,
porque o im paciente e o iracu n d o procedem às c e g a s... Pcde-
-Lhe p u re z a ... e castidade, pois só os olhos puros vOein a
clarid ad e d a s c o isas... Enfim , pede-L he tra to com D e u s...,
frequente..., d e m o ra d o ..., sa b o ro so ..., vida de o ração e união
376 Prudência

com D eus, p a ra que nel^ te com unique a S u a d iv in a sabe­


d o ria ..., a S ua lu z ..., o Seu conhecim ento e o Seu am or.
F inalm cnte, que m u itas vezes, ainda fazendo-lhe vio­
lência, : :voques a M a ria, sob retu d o em ocasiões em que
possas proceder mais im p rudentem ente... ou nas que v ejas
que é m ais difícil o a ce rta r, dizendo-lhe com a Igreja:
V irg em prudentíssim a, rogai p o r nós.
17. Prudência nas obras

l.° A n te s do nascim ento d e Jesus.-— A nalisa um pouco


algum as d a s o b ra s d a Santíssim a V irgem e v e rá s que p ru ­
dência nelas e n c o n tra rá s... V ê -A n o caso concreto do Seu
voto de virg in d ad e. — H um anam ente falando, isso seria um a
im p ru d ên cia..., era q u eb rar com um a trad içã o secular naquele
p o v o ..., era sa ir do cam inho com um e o rd in ário que todas
as m ulheres hebraicas se g u iram ... N inguém até en tão tin h a
feito tal v o to ..., era um a coisa com pletam ente desconhecida
na terra. —• N o entanto, E la n ã o p rocede in considerada­
m e n te ...; com a luz especialíssim a que D eus L he com uni­
cara, considera a excelência e os frutos da v irg in d a d e ...,
penetra no am or que D eus tem a esta virtu d e, tan to que
já tinha a n u n ciad o que p a ra o Seu F ilho escolheria um a
M ãe V irg e m ..., e depois de v e r e e xam inar tudo diante
de D eus, com calm a e su av em en te..., confiando com se g u ­
ran ça nas g raças que D eus p a ra isso Lhe h a v ia de d a r...,
não duvida nem v a cila nem tre m e ...; com um a franqueza
e decisão adm iráveis sai da re g ra comum e g e ra l... e faz,
assim tão novinha, o seu v o to ao Senhor.
A v e rd ad e ira p rudência n ã o é co b ard e nem m ed ro sa...,
pensa d e v a g a r; porém , executa com energia. — Assim é a
Santíssim a V irg e m ...; depois do v o to escolhe com acerto
c pratica com decisão os meios m ais indispensáveis p a ra
co n serv ar esta v irtu d e ... com o s e tivesse m edo de perd ê-la!
378 P rudência nas obras

— Consigo mesma guarda um profundo recolhim ento..., uma


modéstia singular..., uma oração fervorosa..., uma vigilância
contínua. — P ara com os outros, um grande silêncio..., um
prudentissimo segredo, guardando o seu v o to ..., não o disse
a ninguém ..., não o revela nem o comunica a pessoa
alg u m a...; sabe que não o iriam com preender..., que ia
excitar murmurações e falatórios de quem nunca chegaria
a compreender a formosura desta virtude..., e por isso
guarda o seu segredo para E la e para D eus... Q ue adm irá­
vel e que simpática a prudência!
2.° N a Anunciação. — E scuta do A njo os seus lou­
vores..., ouve a sua em baixada..., medita e aprofunda o
que Lhe é proposto... e com grande serenidade decide.—
N ão A cega o brilho d a coroa da m aternidade divina...,
nem A seduzem as palavras bonitas e lisongeiras..., nem
se acobarda perante os sacrifícios que E la bem via Lhe
ia custar a sua aceitação ...; não se adianta pressurosa...,
nem corre precipitadamente a admitir o que todas as donzelas
estavam desejando... Q ualquer delas não se teria podido
conter de alegria e gozo... Ela, no entanto, vê o A njo...,
ouve-o... e a primeira impressão é de p ertu rb aç ão ...; isto é,
põe-se como que e,m guarda e vigilância, como se temesse
alguma tentação para a sua virtude... e quando repara na
im portância d a embaixada, expõe as suas d úvidas..., pede
simplesmente explicações... e uma vez conhecida claramente
a vontade do Senhor, consente com decisão e segurança,
entregando-se a Deus como sua escrava...
Admira nisto mesmo a sua prudência... Já é Mãe
de D eus... já é Rainha e Senhora... e, no entanto, coloca-se
no seu posto... no único que julga dever ocu p ar..., no das
escravas..., sem adiantar-se a subir nem a colocar-se em
lugar mais elevado... esse cuidado deixa-o a D eus... Como
é difícil imitar esta p ru d ên c ia!... e, contudo, quão necessária
não é ! ...
P rudência nas obras 379

3. “ Durante a Vida de Jesus. — T an to na vida pri­


vada como na pública, M aria aparece sempre no seu posto...
no que Deus A coloca... Q ue escondida, que recolhida, que
silenciosa na vida privada de Jesu s!... Q ue bem E la sabe
acomodar-se ao carácter íntimo e recolhido desta época
da sua v id a !— E quando Jesus sai a pregar, que longe
está dê intrometer-se nas coisas de Seu F ilh o !... Com que
prazer O teria acompanhado a todas as partes 1...C om que
alegria teria presenciado todos os seus milagres e prodí­
g io s!... Com que satisfação teria escutado todas as Suas
pregações! Com que regozijo teria ouvido os louvores que
dirigiam a Seu F ilh o !... Q ue sentimento mais natural o
poder dizer a toda a gente: «Esse é o meu F ilh o » !... M as
não era esse o posto que Lhe destinara a vontade de D eu s...;
o Seu posto era o esconder-se..., era a Sua c a sa ...; E la
não era chamada a pregar às multidões..., não era essa a
sua vocação nem o seu ofício... Aceita com gosto essas
renúncias que o Senhor Lhe im põe..., esconde-se prudente­
mente e se no Evangelho é nomeada alguma vez durante
este período da vida de Jesus, é como que de passagem.
Isto mesmo se podia dizer quando sai, porque Deus lho
manda, do seu recolhimento... e aparece junto de Seu Filho
no C alvário... V ê como Ela assiste e que parte toma então
na Paixão de Jesus Cristo. — Sofre horrivelmente e, no
entanto, não se revolta irritada e furiosa contra aqueles
verdugos...; não diz palavras desesperadas..., nem dá gritos
lancinantes..., nem toma atitudes exageradas..., nem, enfim,
se expõe imprudentemente às iras e insultos daquela populaça
enfurecida... Isolada das turbas, assiste àquela cena com
dor profundíssima do seu coração, mas de tal modo que
passa despercebida, por vezes, perante os outros...
4. " D epois da A scensão. —•É E la quem recolhe os
A póstolos..., os anima e conforta e dispõe para a vinda do
Espírito Santo... Ela é a verdadeira M ãe da Igreja nas­
cente... T udo é feito por E la ... E la é verdadeiramente, a
380 P rudência nas obras

alma de tudo com o seu exemplo, com o seu fervor e


virtude..., cc,m o seu conselho..., com a sua oração ..., e,
contudo, parece que não faz n ad a ... Como esconde pruden­
temente toda a sua actividade... O s Apóstolos são os que
dispõem... S. Pedro m anda..., governa..., dirige..., Ela, não
se mete em nada... é a prim eira a obedecer... a aceitar tudo
o que m andam ... N ão p ro testa..., não censura..., não critica
n ad a... Q uer ser a primeira filha obediente da Igreja...
sendo E la de facto a que tudo anim a... e a que a todos
conforta... sendo o exemplo magnífico dos Apóstolos e
dos fiéis...
A prende esta prudência e pede-a a tua M ãe. — Q ue
nunca saias do teu posto..., que te conserves onde Deus te
coloca... e ai trabalhes sem desejar meter-te no que te não
diz respeito. — Só assim não terás que chorar as inúmeras
quedas que te tem causado a tua imprudência.
18. Prudência nas palavras

l.° Prudência no seu silêncio. — M erece bem a pena,


ainda que já concretizamos a prudência de M aria em alguns
casos d a Sua V ida, determo-nos a considerar esta mesma
prudência no uso que faz particularm ente da sua língua. —
Como M aria foi prudente em suas p a la v ra s!... Q ue pruden­
tíssimo o seu silêncio! — É admirável a prudência daquele
que fala sempre com oportunidade e discrição... não o é
menos quando sabe calar... e às vezes, quanto mais difícil é
calar que falar a tempo! — N ão é verdade que a maior
parte das tuas imprudências as deves à tua língua?... Q uan­
tas vezes te pesa na consciência teres dito o que disseste? ...
Q uantas vezes, se pudesses recolher as palavras que pro­
nunciaste, o iterias feito com grande alegria?...
O lha pois para M aria e aprende... Aprende precisa-
.mcnte a calar..., a não dizer palavras néscias..., aprende a
medir o que dizes..., a pensar e a reparar nas tuas pala­
vras..., a não falar de tudo o que te vem à boca..., a não
falar à toa e loucam ente... T inha a Jesus diante de si, o
Mestre eloquentíssimo do silêncio..., o que em Sua Paixão
chegou a causar adm iração a Pilatos com a eloquência
divina do seu silêncio... E assim foi Miaria nisto, como em
tudo, cópia exacta de Jesus...
Q ue reserva a sua, tão discreta no segredo a Ela
Confiado sobre o mistério da In c a rn a ção !... Ninguém pôde
382 P rudência nas palavras

suspeitar nada de grande nem de insólito em M aria. —


Depois da embaixada do Anjo, viram -n’A tão sim ples..., tão
m odesta..., tão calada..., como antes. Deus encarrega-se de
revelar a sua altíssima dignidade a Santa Isabel... a
Simeão depois..., à profetisa A na... Q ue o diga e que o
revele Deus quando quiser e a quem quiser...; Ela, porém,
não descobrirá o seu grande segredo.
Nem uma só vez deixou transparecer de alguma maneira
no seu sem blante..., nos seus gestos..., na sua conduta...,
o menor indício do grande acontecimento operado n ’E la ...
Como, pois, alguém o adivinharia?... Como estranharm os
as dúvidas e perplexidades do Santo Patriarca, se Sua
E sposa se calava... e a ninguém, nem mesmo a ele, comu­
nicou nada ?
M edita neste assombroso passo da vida de M aria...
E la vê tudo... compreende tu d o ... S. José vê que a sua
esposa virgem vai ser mãe, e não compreende... A Santís­
sima Virgem penetra no coração de S. José e é testemunha
dos seus horríveis sofrim entos... Q ue confusão! Q ue deso­
rientação a s u a ! E la podia desfazer tudo aquilo com uma
só p alav ra... O seu Esposo castíssimo, acreditá-l’A -ia sem
v acilar... P or outra parte, o A njo não lhe proibira da parte
de Deus que o dissesse... N ão era, pois, neste caso, nenhuma
imprudência o fa la r...; com umas palavras evitaria gravís­
simos males... Já S. José planeava ausentar-se daquela casa
e abandonar a sua Esposa já que a não com preendia... e
apesar de tudo, Ela cala-se..., não se julga autorizada a
falar mesmo en tão ...; pensa bem ..., medita diante de D eus...
e decide continuar calada e deixar a Deus o desenrolar dos
acontecimentos como Ele quiser. — Q ue heróico silêncio! Q ue
m aravilhosa prudência a que nos ensina M aria calando-se I
2.° N o falar. — Contudo, nem sempre é prudente
calar... O mais prudente é saber calar... e saber falar a seu
tempo. —• N isto M aria é outro M odelo maravilhoso. — Se
queres aprender discrição no falar, o que é tão difícil,
p ru d ên cia nas palavras 383

estuda M aria. —>N ão só podemos afirmar, no geral, que


nunca da sua boca saiu uma só palavra da qual tivesse de
se arrepender..., senão que, além de tudo o mais, podemos con­
firmar isto mesmo, percorrendo as palavras que E la nos dei­
xou, como lembrança e como modelo, na S agrada Escritura.
São muito poucas, na verdade, mas por isso mesmo
podemos percorrê-las com facilidade.
a ) As primeiras são. — Com o a n jo ... M as nem com
ele se demora muito tempo em colóquio..., diz só o que é
preciso, mas também não cala o que tem a dizer...: «Como
pode ser isso, se eu não conheço varão»? ... F aça-se em mim
segundo a vossa p a la vra — Nem mais, nem m enos...; isto
e só isto... N ão são de mera curiosidade as primeiras palavras
senão de grande necessidade p ara conhecer a vontade de
D eus... As segundas são de submissão completa e perfeita
à mesma vontade de Deus e também precisas para se realizar
o mistério da Incarnação. — P alavras sempre necessárias,
impregnadas de p ureza..., de virgindade..., de obediência...,
de amor de Deus. — Esprem e-as e verás como distilam tudo
isto... A h ! se as tuas palavras fossem como as de M a ria !...
b) C om sua prim a. — P alavras de saudação, ainda que
não sabemos quais foram ... P alavras educadas que não são
precisamente de frios e hipócritas cum primentos... Palavras,
sobretudo, de caridade, como cheia de caridade era aquela
visita que fazia..., e, por isso mesmo, palavras de gozo e
alegria com o bem alheio..., Como são diferentes as palavras
da in v e ja!... E logo a seguir brotavam as palavras mais
profundas de M aria...
c ) C om D eus. — Porque a que era tão breve ao falar
com os homens... e ainda com os próprios anjos, parece que
não sabe term inar quando fala com. D eus... Q ue sublime e
que encantador o m agnilicat de M a ria !... Já o meditaste
noutra ocasião... Recorda que era o hino da gratidão... da
glorificação... do am or intenso a Deus. — São estas sempre
lis palavras de M aria...: palavras de caridade com sua
384 P rudência nas palavras

p rim a..., palavras de agradecimento e am or a Deus no seu


cântico...
d ) P alavras de M ã e: IM e u P ilho, p o r que procedeste
a s s im ! ... T e u pai e eu pro cu rá va m o s-te com gra n d e d o r...
São palavras de m ãe... e M aria era mais M ãe que todas as
M ães... e na dor mais profunda que uma M ãe pode ter,
que é a perda do seu Filho. — E ra necessário falar assim...,
senão pareceria que não era como as outras..., que não am ava
nem sentia..., nem sofria como as outras M ães. — Foram
palavras de intenso carinho m aternal..., de amorosíssima
queixa. — N ão é nem pode ser imprudência ir desabafar os
nossos sofrimentos... queixar-nos a Jesus... Pelo contrário,
é bem natural... O coração necessita expansão... O nde nos
havem os de expandir? ? Vê M aria..,, nada diz aos homens...
desabafa com o Seu F ilho..., com o Seu D e u s.— F az tu o
mesmo e verás que diferença há em procurar a consolação
nas criaturas e em procurá-la em Jesus...
e ) P a la vra s d e M ã e nossa: N ã o têm v in h o ... fazei
o que E le vos disser. — E ra necessário que M aria revelasse
também, nas suas palavras, que era nossa M 'ãe..., que se
ocupava de nós..., que estava disposta a rem ediar todas
as nossas necessidades espirituais e mesmo materiais. —
Assim o vemos nestas palavras. —- São palavras de amorosa
compaixão para com os esposos de C aná... e de confiança
e de poder assombroso com seu F ilho... Como eram c o n ­
venientes estas palavras de M aria para excitar em nós a
confiança n'E!a e em Jesus!... Foram sempre assim as palavras
da Santíssima V irgem ... Conhecemos só estas, que indicamos;
porém, todas as outras deveriam ser sem elhantes...; palavras
ditas sempre a propósito... no devido tempo e lugar...,
procurando unicamente a glória de Deus e o bem das almas.
Pede ã Santissima Virgem que seja a tua M estra no
falar, para que saibas ser prudente nas tuas palavras c
aprendas a difícil ciência de saber falar... e de saber calar
quando se deve.
19. Justiça

1.“ O que é ? ... É uma virtude moral que nos manda


dar a cada um o que é seu... Todos queremos que nos dêem
o que nos pertence... ou que respeitem o que é nosso...,
H nossa fam a..., a nossa honra..., os nossos interesses...
Porém, gostamos igualmente de proceder assim com os
outros?... Como gostamos de exigir direitos mais ou menos
certos e verdadeiros que tem o s!... M as pelo contrário...
quão fáceis sc.mos em quebrar os direitos dos o u tro s!...
fsto é a injustiça..., atropelar o direito alheio..., faltar
As nossas obrigações. — Lembra-te que todo o direito supõe
um dever... P ortanto, se os outros têm direito ao seu, tu
tens o dever de lho dar ou de respeitar. — Isto é a
justiça... e esta a obrigação que nos impõe. — Q uer dizer
que esta virtude não é uma virtude de conselho que serve
para adornar a alm a..., senão uma virtude necessária e
obrigatória que a todos os homens, e a todo o momento nos
obriga... e nos exige o seu exacto cumprimento.
Podemos distinguir três espécies de obrigações que nos
Impõe a justiça: para com D eus..., para com o próximo...
pura connosco m esm o... A todos havemos de d ar o que é
»eu...; assim no-lo diz Jesus Cristo: «Dai a C ésar o que
ê de César e a Deus o que é de D eus»... Isto é, dai a cada
um o que lhe corresponde e isso é proceder com rectidão...,
25
386 Justiça

com sentido de justiça. — A Santíssima V irgem teve que


ser necessàriamente modelo acabado nesta virtude, já que,
não sem razão, na S agrada E scritura se confunde a justiça
com a santidade... chamando-se varão justo ao que é santo...
Q ual seria, pois, a justiça que brilhou em todos os
actos de M aria se foi como sabemos a sua santidade? ...
A Igreja não duvida em chamar-Lhe E spelho de justiça
onde se refleote a justiça... e p ara onde havemos de olhar
p ara cumprir exactamente com e la .— Vejamos, pois, esta
justiça da Santíssima Virgem nas suas diversas obrigações...
e aprendamos os seus ensinamentos.
2 ° Justiça para com D eus. — E sta justiça reduz-se
a conhecer a Deus como N osso S enhor... e a nós como obra
das S uas m ãos... Portanto, Ele tem direito completo...
to tal..., absoluto..., inalienável..., sobre nós e sobre todas
as nossas coisas..., e nós a obrigação de O reconhecer como
ta l e assim viver, como quem não se pertence a si mesmo...,
senão que pertencemos e sempre pertenceremos a Ele.
Tem os por dever crer nas suas palav ras..., porque é a
verdade infalível... e obedecer aos seus mandamentos, seguir
as suas inspirações com docilidade, porque é infinita a sim
om nipotência... Devemos dar-Lhe todo o nosso coração
sem reserva algum a..., porque é a Bondade inefável e fontr
de todo o bem. — É, numa palavra, nossa obrigação viver­
mos para E le..., e não para nós m esm os...; darmo-no»
totalmente a Ele e ao seu divino serviço..., procurarm os em
tudo a Sua G lória..., nunca a n o ssa ...; enfim, louvá-K),
servi-lO e amá-lO, sem limites.
Portanto, quando assim fazem os..., quando nos cou
sagram os a Ele em corpo e alma e nos oferecemos para o
seu serviço..., nada fazemos de extraordinário..., estamoa
cumprindo simplesmente com os deveres da mais estrita
ju stiça...; e ao contrário, sempre que de uma ou outra
maneira vivemos para nós mesmos... ou nos buscamo»
Justiça 387

a nós... ou nos glorificamos... estamos abusando de D eu s...,


espezinhamos os seus direitos..., faltamos aos nossos deve­
res... e procedendo com notável injustiça.
A Santíssima Virgem nunca assim foi... A sua vida
sintetizou-se sempre nestas palavras: E is aqui a escrava d o
Senhor... V iver sempre como escrava..., entregue ao serviço
do Seu Deus e Seu Senhor como escrav a..., fazer em tudo
a vontade divina sem liberdade nem vontade própria, como
uma perfeita escravazinha... este foi o seu ideal..., esta a
sua vida... Poderá haver vida mais cheia de justiça e de
rectidão e de santidade, que a daquele que vive assim
submisso a Deus, como viveu M a ria ? !— Isto é entender
e praticar a justiça para com D eus... um cumprimento
exacto dos seus deveres..., um rendimento total de juizo...,
uma sujeição completa da vontade..., um holocausto per­
feito, e continuo da tua razão e das tuas energias... Eis
o que te ensina a tua M ãe..., eis o que tens de fazer sempre,
se A queres imitar.
3.° Para com o próximo. — E sta justiça obriga-nos a
dar a cada um o que lhe corresponde..., a não defraudar a
ninguém em coisa algum a..., a não desejar o que lhe
pertence. — Tem os de respeitar tudo o que é propriedade
legítima do próximo e nem com palav ras..., nem com
obras..., nem com desejos, podemos atentar contra ela.
Pensa quantas vezes se falta a isto..., com juízos teme­
rários..., com palavras de critica..., m urm uração..., ironia...,
falsos testemunhos..., com torcidas e maliciosas interpre­
tações. — A falta que nisto cometemos não é já contra
a caridade; a maior parte das vezes é contra a justiça.
Contempla a conduta da Santíssima Virgem com todos
os que a rodeiam e vê como se coloca no lugar que Lhe
correspondia e respeitava os dos outros. — E la era a M ãe
de D eus..., porém, S. José era a cabeça da casa, o pai de
388 Justiça

fam ília... e Miaria presta-lhe a mais pronta, submissa e


perfeita obediência... N ão discute..., não se revolta contra
as suas disposições... A E la pertence-lhe obedecer, e obedece
sem protestar, seja no que for: agora a Belém ..., depois
0o E gipto..., a N azaré..., a Jerusalém ... Q uantas viagens...
Q u an tas fad ig as!... N ão podia ir ele só? O u ir de outra
m a n eira?... M aria cala-se e obedece: esse é o seu dever
com S. José e assim o cumpre exactamente.
E como cumpriu os seus deveres de M ãe de Jesus? ...
N ão lhe consagrou a mais constante e tem a solicitude
m aternal?... N ão viveu toda por E le... unicamente para
E le?— D o mesmo modo procedeu com os seus parentes e
conhecidos... Lembra-te como se portou com S anta Isabel...
A dm ira e pede imitar esta exactidão nos teus deveres...,
em saber viver no teu lu g ar... e em respeitar os direitos
dos outros.
4.“ Para connosco. — Devemos a nós mesmos um amor
bem compreendido e bem ordenado..., pois o que é mais
triste é que ninguém nos am a e nos quer pior d o que nós
mesmos. — Devemos ter-nos um amor conforme em tudo
aos ditames da razão e d a fé..., segundo os quais devemos
d ar, como antes dissemos, a C ésar o que é de César, e a
D eus o que é de D eus... M as o facto é que compreendemos
bem o prim eiro..., e oxalá déssemos somente c que devíamos
a C é s a r!... Isto é. às coisas tem porais..., e a Deus, em
compensação, quão abandonado o deixamos! Pensa, por
exemplo, se dás o mesmo v alo r..., e im portância..., a uma
,d oença corporal e a uma espiritual..., se cuidas do mesmo
modo da alma, e do corpo..., se te importas igualmente
com o temporal e ccm c eterno, etc...., e verás, com ver­
gonha, que notável d iferen ç a!... Q ue injustiça só a com­
paração entre estas coisas tão d istin tas!... Q u al será.
pois, a preferência que dás às coisas baixas e terrenas, e qs
que são espirituais..., às da tua alma e às de Deus!
Justiça 389

V ê a Santíssima Virgem amando-se com este amor ver­


dadeiro, com o qual dirigia a D eus todos os seus actos e
fazia que todos contribuíssem a melhor servi-lO e a melhor
a m á-lQ .— Sempre que procuras algum bem espiritual...,
algum aumento de virtude, estás am ando-te deveras e
cumprindo em ti com a justiça..., e pelo contrário, que
injustiça cometes contigo mesmo quando pecas..., quando
desprezas as graças de Deus, e tc .!... Pede à Santíssima
Virgem que to dê assim a conhecer.
20. Fortaleza

1.® A sua importância. — É muito grande e muito


im portante a virtude da fortaleza:— N ão é possível que
se sustente uma virtude..., nem que a vida espiritual perse­
vere numa alma sem a fortaleza...
A prudência, dizíamos, é a luz e guia, é a norma
reguladora das virtudes..., porém a fortaleza é o seu apoio
e su sten to .—'T o d a a vida cristã..., e ainda mais a vida de
perfeição e santidade..., é vida de contínua luta de inimi­
gos..., exteriores e interio res...; umas vezes temos que nos
defender dos seus ataques..., em ocasiões tão terríveis e tão
frequentes...; noutras convirá tomar a ofensiva e atacar
e com bater o inimigo p ara lhe tirar forças e prevenir as suas
tentações... Temos que vigiar continuamente p ara não ser­
mos surpreendidos.
T udo isto não se faz sem a fortaleza---- - N esta luta
incessante facilmente há cansaços, desalento, sobretudo se
houve quedas..., se sofremos alguma derrota... Q u e será
então da alma sem fortaleza... Como se lev an tará... e se
anim ará p ara combater de n o v o ? ...'—'O u tra s vezes é o
próprio Deus que não só consente as tentações do inim igo...,
senão que E le mesmo nos p ro v a com tribulações..., dores...,
enferm idades..., cruzes e sofrim entos... Como é fácil então,
cairmos oprimidos por uma cruz que julgamos de peso
insuportável... Q uão necessária é então que a fortaleza nos
F ortaleza 391

dê ânim a e nos sustenha, para levar tu d o o que Deus quiser


mandar-nos para nosso bem!
2.“ Fortaleza de Maria nas lutas. — M aria foi isenta
por privilégio do Senhor, da luta da concupiscência...
As paixões estavam n’E la perfeitamente dominadas. — C on­
tudo Deus não A poupou às dificuldades e às contrariedades
com as quais acrisolava mais e mais a sua virtude, e nas
quais E la mostrou uma grande energia..., uma fortaleza
extraordinária... Q u an ta fortaleza não necessitou para aquela
contínua vigilância que devia ter por causa da plenitude de
graças que tinha recebido do Senhor, p ara conservá-las e
para corresponder à altíssima vocação a que tinha sido
cham ada!— N as mesmas circunstâncias habituais e ordiná­
rias que rodearam a sua vida, quanta fortaleza não mostrou
a Santíssima Virgem !
Com para-A com aquelas boas mulheres de N azaré...
Que ideias..., que afectos..., que aspirações, que maneiras
tão diferentes!... E contudo, a Santíssim a V irgem vive
naquele ambiente como se fosse o seu próprio..., prodiga­
lizando am abilidades..., sim patia..., carinho por toda a
parte... Q ue violência não tinha que fazer para sustentar
naquele ambiente tão pouco propício, o seu am or à virgin­
dade..., a sua humildade e m odéstia..., o seu recolhimento
constante..., a sua vida de oração e de união com Deus!
E mais tarde, n a vida pública do seu Filho..., que vio­
lência não teve que fazer ao seu coração p ara estar separada
do seu Jesus..., para não segui-lQ para toda a p arte...,
para não v ê-lO ..., ouvi-lO ..., cuidar d 'E le..., consolá-lo?...
Q ue fortaleza a sua no meio das perseguições e sobressaltos
da Igreja nascente!... Como E la a todos anim ava..., conso­
lava... e fortalecia na fé e na confiança em D eus..., acei­
tando e vendo em tudo os planos da D ivina Providência!
3.° Fortaleza nas provas. — Q ue fortes e extraordi­
nárias provas não teve E la que passar! R ecorda as dúvidas
de S. José, de que já falám os... Como mantém, com uma
392 F ortaleza

fortaleza adm irável aquele seu silêncio e como passa por


aquela humilhação e prova das mais duras para uma esposa
e para uma virgem !— Depois a viagem a Belém, semeada
de desprezo..., de incom odidades..., de privações sem conta...
A pobreza da g ru ta..., todas as circunstâncias do nasci­
mento do seu Filho..., seriam mais que suficientes para
destruir uma virtude que não tivesse a fortaleza da de
M aria. M ais tarde, a circuncisão... Presencia a dolorosa
cerimónia de cortar a tenra e delicadíssima carne do Menino
Jesus...; vê correr o Seu Sangue misturado com as lágrimas
que o sofrimento e a d or arrancam a J e s u s ...— V ai per­
correndo as provas d a Purificação..., com a profecia de
Simeão, que Lhe am argurou a vida para sem pre... a perda
do M enino e o enorme sofrimento daqueles dias até que O
encontrou...; as profundas am arguras do seu coração, durante
toda a vida pública de Jesus..., e finalmente, contempla
a Santíssima Virgem como a imagem ideal da fortaleza
aos pés da C ruz..., sacudida pela fúria daquela tempes­
tade de dores e sofrimentos, desencadeada contra E la no
C alvário... e contudo, como a luz do farol no meio das
ondas, sem vacilar..., sem titubear..., bebendo, serena, gota
a gota até às fezes, aquele horrível e am argosíssimo cálix !
Aproxima-te bem junto d 'E la..., põe-te em contacto
com o seu coração e pede-Lhe essa força..., essa energia...,
essa fortaleza varonil... p ara aceitar as provas que Deus
te envia... e até para desejá-las com santo entusiasmo, pois
elas te purificarão e acrisolarão dando valor sólido e posi­
tivo ã tua virtude.
4.° Fortaleza nas suas decisões. — N ão é a fortaleza
passiva que resiste às provas, às tribulações e às tentações..,,
é a fortaleza activa que acomete com energia e empreende
ccm decisão. —• O caso de M aria neste ponto é verdadei­
ramente adm irável..., é simplesmente único..., incomparável.
N ada há de semelhante à fortaleza desta jovenzinha tão
débil e delicada, apenas com três anos..., que decididamente
F ortaleza 393

se arranca dos braços de seus pais para consagrar-se ao ser­


viço de Deus, no T em p lo ...; intrepidez com que sobre
os degraus do mesmo... e a decisão, certamente sobre-
-humana, com que nele faz o seu voto de virgindade ao
Senhor!
Q ue assombro deve ter causado entre os próprios Anjos
do C éu !— E quando consentiu em ser M ãe de Deus, sabendo
perfeitamente os sacrifícios cruéis e heróicos que isto signi­
ficava, onde encontrou forças para acometer uma empresa
tão grande como a de ser C orredentora do género hum ano?...
—• Simplesmente na fortaleza do seu coração •— .A fortaleza,
é a virtude que faz os heróis e os santos.
Diz-se que a virtude não tem de feminino mais que o
nom e..., pois supõe sempre energia..., decisão..., v alo r...,
força; ora, tudo isto é dado pela fortaleza. — Pede-a à
Santíssima Virgem. —■Pede-Lhe fortaleza para sustentar,
conservar e defender a tua fé ...; fortaleza para lutar com as
tentações que vêm de fera... e com as que vêm de ti mesmo,
que são piores a in d a ...; fortaleza p ara vencer e dominar
com energia a carne rebelde e assim poder conservar a tua
pureza...; fortaleza para sofrer e para cum prir com os teus
deveres quotidianos...; fortaleza, enfim, p ara te santificares,
sem retroceder..., sem desm aiar..., sem nunca te desalen­
tares..., crucificando-te na Cruz de Jesus Cristo e ali perm a­
necendo sem baixar da Cruz, como Ele.
21. T emperança

l.° V irtude racional. — Bem pode chamar-se deste


modo esta bela virtude. — T odas as virtudes são, sem
dúvida, muito racionais..., porém, a temperança é, na ver­
dade, própria e exclusiva da racionalidade..., visto que por
ela, o homem procede como tal... e quando falta a esta
virtude, mais parece animal do que homem.
Contempla o homem sem temperança no comer e beber...
N ão é a imagem exacta dos animais imundos, que se revol­
vem na própria comida? V ê o intemperante em génio e
carácter, deixando-se levar da ira: não parece antes uma
fera que se sacia na sua vítim a. — A tem perança é uma
virtude que está relacionada com. outras, como a mansidão
e doçura... e em especial com a mortificação, a tal ponto,
que bem pode considerar-se como uma parte ou um exercício
desta última. — Contudo, é bom que a consideremos sepa­
radamente. já que a Santíssima Virgem também é dela
medeio acabadíssimo.
2.° N a comida e bebida. — É esta a primeira aplicação
que se faz da tem perança..., isto é, a moderação que se
deve guardar no comer e no beber. — Parecia não ser neces­
sário determo-nos nesta virtude, aplicada a este ponto..., pois
parece incompreensível que o homem pessa exceder-se numa
coisa tão baixa..., tão degradante, como é o comer e o
beber. — E sta necessidade da natureza, é um verdadeiro
T em pzrança 395

castigo de D eus... e todos nós sentimos a humilhação de


nos vermos nisto totalmente semelhantes aos animais. —
A bondade de D eus suavizou este castigo, dando-nos o sen­
tido do gosto, para com ele saborear os m anjares... e
estimulando o acto de comer por meio do apetite..., porém,
o homem, transtornou o plano de Deus e como se o gosto
fosse o fim do comer parece que muitas vezes não procura
nele senão satisfazer esse gosto com refinamentos e exquisi-
tices culinárias... ou saciar o apeite comendo e bebendo
cora excesso. Segundo o que acabamos de ver, a tempe­
rança, neste ponto, há-de m oderar não só a quantidade, não
permitindo mais que o que seja conveniente..., senão tam­
bém a qualidade, desterrando todo o saborismo no preparar
e no apresentar a com ida... e até no modo de a tom ar com
excessiva com placência... ou com modos que indiquem uma
ânsia grosseira e insaciável... Como se aplica bem a isto
aquele principio de que a educação e a verdadeira urbani­
dade contribuem poderosamente p ara a sa n tid a d e!... N este
caso vão tão juntas a temperança e as regras da boa edu­
cação, que se confundem uma com a outra.
E ntra na casa de N azaré e vê a Santíssima Virgem
preparando e cozinhando a comida daquela pequenina casa...
o condimento principal é a pobreza... e a tem perança... e,
sobretudo, o carinho e o amor com que a V irgem Santís­
sima a prepara e a serve. — Contempla aquela ca sa ..., os
utensílios que em prega...; tudo m uito limpo, porém, tudo
muito pobre. — E, como comeriam aqueles três encantadores
seres?... Q ue m odos..., que atitudes..., que porte tão cor­
recto !... Q ue virtude da temperança tão divinamente p ra­
ticada na casa de N azaré!
Diz à Santíssima Virgem que te ensine... e que te
lembres d ’E la quando te sentares à m esa..., quando te servem
alguma coisa de que não gostes, para que te venças e a
tomes..., ou quando, pelo contrário, é alguma coisa que te
agrada muito, para que te contenhas e não te excedas... Q ue
396 T em pzrança

te lembres com a presença da Santíssima Virgem, de sobre-


naturalizar e dar um grande valor a este aeto tão degra­
dante e miserável, como é o de comer...,; enfim, que nunca
te levantes da mesa, sem ter feito alguma mortificação em
honra d a tua querida M ãe...
3. “ N o dormir. — O utro acto hum ilhante..., outr
triste necessidade da nossa natureza... Q u e espectáculo
degradante é o homem a d o rm ir!... Toda a sua vida racional
e espiritual, está por completo au sen te...; é a imagem mais
perfeita de um cadáver... Compara-.se a morte com o sono,
e dá-se-lhe o mesmo nom e... N ão é, portanto, uma aberração
digna de lástima convertê-lo em prazer desordenado?— Bem
está dorm ir o necessário e o conveniente, como é natu­
ral, não porém, com excesso..., pois este excesso é muito
nocivo para a alma e até para o corpo
N ão sabemos o tempo que a Santíssima V irgem dava
ao descanso..., nem como seria o seu leito..., etc-, porém,
será demais supor que se levantava com a aurora, antes
que saísse o sol, cantar o hino da gratidão que na alvo­
rada entoavam a Deus as avezinhas e toda a criação?
—'N ã o poderemos afirm ar que m uitas..., muitíssimas vezes
interrom peria o seu sono para o ra r... e que muitas mais,
sem dúvida, encurtaria em grande parte o tempo do descanso
para falar na soledade da noite com D eus... e passaria
mesmo algumas noites inteiras na sua com panhia?... N ão
o fez assim Jesus com frequência, como o indica o Santo
E vangelho?... Pois, como a Santíssima Virgem deixaria de
im itá-lO nisto, como em tudo o que lhe via fazer?
4. ° N outras coisas. — Finalmente, a tem perança esten
de-se a moderar todos os gostos e prazeres que pode dis­
frutar o homem, marcando claramente os limites do lícito
e do ilícito. — Pensa nas superfluidades da tua casa, talvez
só para bem parecer e fomentar até com isso o teu espirito
de vaidade... Pensa na tua pessoa..., no vestido e no modo
de te arranjares e de te com pores... Q uão necessário e a
T em pyrança 397

propósito vem aqui a moderação p ara vir a d ar no justo


equilíbrio! Q ue bem sabe o demónio disfarçar a sua acção
com razões aparentes, que sugere:— é necessário vestir
assim ..., arranjar-se de tal m odo... para não cham ar a
atenção!... e tc .: e a verdadeira razão é simplesmente a
vaidade... e o desejo de parecer bem e ag rad ar aos outros.
N as recreações e diversões, ainda boas e sãs..., com­
pletamente lícitas e convenientes..., pensa na maneira como
as passas: como nelas se descobre a pessoa culta... edu­
cada... e mortificada. — M oderação e tem perança no falar...,
no rir..., no b rincar... enfim em todos os actos, não pro­
curando o mais cóm odo..., suave e efem inado... Assim
conseguirás dispor o teu corpo para agradar a Deus, vivendo
vida de mortificação e sacrificio ...; dispor o teu coração
para a vida interior de oração e recolhimento... e. enfim,
dispor a tua alma p ara as práticas das virtudes sólidas e
perfeitas.
Aplica estes pontos à vida da Santíssima Virgem e
verás quão perfeitamente E la esteve adornada com a senhoril
virtude da tem perança.— Suplica-Lhe te conceda os frutos
tão excelentes desta virtude p ara o teu corpo..., para o teu
coração..., para a tua alm a... e exam ina-te bem sobre esta
virtude, para corrigires o que for necessário.
22. Humildade

l.° H um ildade necessária. — Depois das virtudes teo-


logais-íe das cardeais,v sem dúvida que vem a humildade.
É aquela virtude da qual diz S. Francisco de Sales,
que é necessário em cada instante a todos, ainda aos mais
p e r fe ito s ...; a que é por todos considerada como o funda­
mento do edifício da santidade... e primeiro passo a dar
neste caminho. — A Igreja repete com frequência, no Oficio
Divino, aquilo de Santo Agostinho: Q ueres leva n ta r iima
gra n d e fábrica d e S a n tid a d e l... P ensa prim eiro n u m a sólida
base d e h u m ild a d e..., p o rq u e qua n to m aior fo r o edifício
m ais fu n d o s hãoade ser os alicerces
É certo que a árvore que não lança raízes profundas,
não pode ter grande corpulência..., nem resistir à fúria do
vendaval. —■É um erro lamentável julgar-se alguém muito
adiantado na perfeição e não ter dominado a soberba...,
o orgulho..., o amor próprio..., pois ainda que leve uma
vida de muita piedade e intensamente espiritual, está muito
longe do princípio da perfeição se não é humilde... Ouve
a S. Tomás, que diz: A q u e le q u e não é hum ilde, ainda que
fa ça m ilagres, não é p e rfe ito ..., porque toda a sua vid a está
falha d e solidez.
N ão duvides disto: se não chegaste já a maior santl
dade, é porque ainda não és profundamente humilde.
Exam ina-te e verás que é o terrível am or próprio o que
prende as tuas asas e te não deixa voar a D eus e às altura»
da perfeição. —■Deus encanta-se por completo das alrnn»
H um ildade 399

humildes e dá-se a elas sem reserva..., elevando-as a uma


altura de santidade, sempre proporcionada ao aniquilamento
e à sua hum ildade... Deus resiste aos soberbos..., e dá a
sua graça aos humildes, diz S. T iago. Todo o que se
humilha será exaltado e o que se exalta será humilhado,
segundo o Evangelho.
Repete devagar e volta a saborear o M agnificat da
Santíssima V irgem em que de um modo tão belo E la canta
as excelências da hum ildade... E, como não? pois diz Santa
Teresa, que a humildade de Maria foi a que atraiu a Deus
do Céu às suas puríssimas entranhas e com ela O trazemos
também nós por um cabelo às nossas almas.
Considera, pois, muito devagar a grandeza de 'Maria...,
a sua excelência quase divina..., aquela sua pureza, com
todo o cortejo de virtudes que a acompanham, etc., e pensa:
qual será o fundamento proporcionado a essa santidade? ...
— Se n’Ela, por ser obra prima de Deus, tudo, tudo é
harmonioso, que humildade será necessária para formar o
conjunto e m anter a harmonia com aquela grandeza?
N a verdade, se Deus, à vista da sua humildade, tanto
exaltou alguns santos..., que humildade teria visto em sua
M ãe quando assim a engrandeceu sobre todos os outros?...
Extasia-te diante da virtude de M aria e condensa na sua
humildade toda a sua santidade, segundo aquilo de Santo
Agostinho: «Se me perguntas qual é primeiro e principal
meio para a perfeição, dir-te-ei: em primeiro lugar, a humil­
dade...; em segundo lugar..., a humildade, e em último caso,
a humildade»... N ão porque tenhamos de desprezar as outras
virtudes..., senão porque tendo-a a ela deveras, temc-las
todas..., pois se a soberba é mãe de todo o pecado..., a
humildade é mãe de toda a virtude. — M edita isto, ante o
exemplo da tua M ãe. Exam ina-te muito sobre este ponto...,
cnvergcnha-te e suplica-Lhe...
2.° Humildade verdadeira. — Adverte, porém, que tudo
Isto se aplica unicamente à humildade sincera ou verda­
400 H um ildade

deira, não à aparente e fingida... E, o que é uma e outra?


A humildade verdadeira é a resposta sincera a esta dupla
pergunta: Quem é D eus?... Que.m sou eu ?... Deste duplo
conhecimento brota, naturalmente, o conhecimento da nossa
baixeza em com paração da imensidade de D eus..., da nossa
m iséria..., do nosso n ad a..., da nossa incapacidade para
d ar um único passo no caminho da santidade..., dos nossos
pecados, que são ainda pior que o n a d a ...; das nossas con­
tinuas imperfeições e ingratidões com as quais tens deitado
a perder tantas vezes as graças de D eus... Vê o teu corpo...,
quanta co rru p ção !... V ê a tua alm a; quanta m iséria!... Q ue
coisa mais natural que a humildade diante deste quadro tão
real e tão verdadeiro! — P o r isso a hum ildade é a verdade,
segundo Santa T eresa.
S. Francisco de Sales, tirava desta verdade estas con­
sequências que muito devagar deves meditar:
a) Q ue não temos razão p ara nos termos por alguma
coisa, senão que devemos ter um baixo conceito de nós
mesmos..., pois só devemos estimar e am ar a D eus...
b ) Q ue não devemos procurar nem aceitar louvores
nem estima de nenhuma espécie..., pois isto é uma injustiça,
já que tudo é devido únicamente ao Senhor...
c ) Q ue devemos ter am or pela obscuridade..., pelo
desprezo..., pelo esquecim ento...; isto é o que se deve ao
nada e ao pecado..., e se Jesus Cristo sem pecado foi o
primeiro a fazer assim, nós, carregados de tantos, com maior
motivo devemos fazer o mesmo.
Aplica tudo isto, ponto por ponto, à vida d a Santís­
sima Virgem e verás quão facilmente encontras n'E la o
modelo prático da verdadeira hum ildade..., daquela humil­
dade, da qual Jesus Cristo dizia: A p re n d e i de m im , q u e sou
m anso e hum ilde d e coração. .. Q ue boa disciplina foi a
Santíssima Virgem, pois aprendeu tão perfeitamente esta
liç ão !... Porque não a aprendes tu também assim ?...
H um ildade 401

3.“ H um ild a d e falsa. — N ã o é, pois, v e rd ad e ira hum il­


d ade em que consiste em m eras p a la v ra s .,., em acções p u ra -
imente e x te rio re s... Q u a n ta s vezes, a p esar de inclinar a
c a b e ç a ..., tra z e r os olhos b a ix o s..., p ro c u ra r o últim o lu g a r...,
e d izer m al de si mesmo, etc., se ju n ta a tudo isto um refinado
am or próprio, que n ã o sofre a m enor c o n tra d iç ã o ... c m enos
ainda ver-se posto de p a rte ..., que não é cap az de sofrer
um a co rrecção de um su p e rio r ou um. aviso sa lu ta r de
pessoa a m ig a ... que n ã o sa b e so frer um in jú ria ou um
d e sp rez o ..., que a n d a sem pre com com parações o u exigên­
cias d ita d a s pela inveja, p a ra n ã o consentir p referências
de nenhum a e s p é c ie !... etc. — Bem se vê que um a hum ildade
assim , não merece este nom e, pois é hum ildade fingida e
a p a re n te .... p uram ente e x te rn a ..., que n ã o nasce d e um c o ra ­
ção verdadeiram ente hum ilde.
Ti tam bém falsa hum ildade, a que n ã o quer reconhecer
as g raças que recebeu de D eus, e julga que p e n sa r nisso é
grande so b e rb a ... C om o foi d iferente a hum ildade de M a ria ,
guando não d uvidou p u b lic a r que tinha recebido coisas
m uito g randes do Senhor, e que por isso A cham ariam bem-
a v en tu rad a to d as as g e ra ç õ e s !... M as disso não tira v a o u tra
conclusão sen ão a d a g ló ria ..., louvor e a gradecim ento ao
S e n h o r... R econhecer, não p a ra envaidecer-se do que se
recebeu, senão p a ra m ais louvar, se rv ir e am ar a D eus, é a
v erd ad eira hum ildade.
F inalm ente, é funesta hum anidade a que, considerando
n sua baixeza e a su a m iséria, deduz, com o fruto p rático
dela, o d e sa le n to ..., a d e silu são ..., o abatim ento. — A fór-
ínula d a v e rd ad e ira hum ildade é: P o r mim nada s o u ...,
mula posso, porém , tudo posso n A q u ele que m e conforta.
• T u d o ; p o rtan to , n ã o h á n a d a im p o ssív el..., nem sequer
ii santidade, p a ra o v erd ad e iro hum ilde. — Pede à Santíssim a
V irgem luzes p a ra distin g u ir e conhecer bem e sta s duas
hum ildades p a ra que, fugindo da falsa, com a sua a ju d a te
Hrtties bem na -verdadeira.
2li
23. Humildade

*- ■ l.° O verdadeiro conhecim ento. — C om o a hum ildade


é a v e rd a d e ..., e funda-se n a v e rd a d e ... e é fonte d a verdade,
p o r isso é ela a que nos dá o v erd ad e iro e e x ac to conheci-
m n o de nós m esmos. — V ê quão bem se conhecia a Santís-
s m a V irgem a si m esm a. — N inguém tinha recebido de
D eus m ais g raças e privilégios extrao rd in ário s do que E la ...
Im aculada n a Sua C o n c eiçã o ..., cheia de graça, p o r isso
mesmo, desde o seu prim eiro in stan te ..., m ais santa que
todos os santos e sa n tas ju n to s... R ainha do C éu e corre
d e n to ra dos hom ens..., bendita entre todas as m ulheres....
enfim com o título único que tudo resum ia: M ãe de D e u s !,..
A ssim se v a i M aria, assim se conhecia a Si mesma,
e. n ã o o b sta n te ... vê, com o E la é sem pre hum ilde! Sabi.i
que tudo isto e stav a n ’E la ..., porém n a d a era d ’E l a ...; tudo
e a de D e u s..., tudo e ra porque se tinha d ignado o Senhor
o lh a r p a ra a sua e sc ra v a rin h a , com olhos de .m isericórdia...,
com o o can to u no seu M a g n ific a i...; tudo a trib u ía a D èus...,
tinha um a consciência perfeita do seu n a d a ... e assim se
co n sid erav a diante de D eus, com o o m esm o n a d a ...,, como
a últim a das suas c ria tu ra s..., com o a m ais indigna das
e -c ra v a s que O serv em ... Assim a d o ra v a E !a a D eus...,
assim se aniquilava n a su a p re sen ç a .... assim se subm eti.i
em tudo e sem pre à sua d ivina v o n ta d e ..., assim estava
to d a a v id a recebendo e p ra tica n d o a sua fórm ula sublime
d e hum ild ad e... o p ro g ram a da vida do verdadeiro
hum ilde: E is aqui a escrava d o S e n h o r... E açn -se em miut
________________ H umildade __________________ 403
V *’ ’
segundo a vossa pa la vra .'-— E com o tin h a este conhecim ento
profundo de si m esm a... e o p e ra v a sem pre com este conheci­
m ento c p e rsu asão do seu nada, assim ap arecia tam bém
perante os ou tro s. — É R ain h a dos A n jo s..., porém , não o
m o stra... Com que reverência os t r a t a ! . .. V ê neles os se rv o s
fiéis de D e u s..., os seus em issários e em baix ad o res... e por
isso se hum ilha diante d e le s... D esg csta-se e p ertu rb a-se ao
ver-se rev eren ciad a e lo u v ad a p o r eles.
D este m esmo m odo tra ta com os hom ens... F ix a-te,
especialm ente, no seu po rte hum ilde e respeitoso, p a ra com
os seus p a is ..., p a ra com os sacerdctcs, p a ra com os su p e­
rio re s..., p a ra cem S. Jo sé..., enfim, p a ra com to d as aqueias
aldeãzinhas de N a z a ré ... V ê com o vive exactam ente igual
a e la s... com o a hum ilde esposa de um c a rp in te iro ... e tão
convencida e stav a de que era em Si m esm a..., que n ã o
a sp irav a a o u íra coisa, ju lg an d o que n ã o tinha d ireito a
ou tro género de v id a ..., e sem pre contente com. a sua sorte,
e isto que e ra a R a in h a do C é u ! ... Q u e exem p lo ..., que
lição p a ra n ó s ! ... F a z aplicações p rá tica s ã tua v id a ...,
com para-te com a V irgem Santíssim a nalguns desses caso s
que tu perfeitam ente conheces d a tu a vida, e v e rás clara-
mente, deste m odo, a tua so b e rb a ..., o teu am or p ró p rio —
o teu o rgulho re fin a d o ... a tua falta de hum ild ad e... e, p o r
isso ir.esmo, a tu a falta de conhecim ento sincero de ti
mesmo.
2.° A verdadeira grandeza. — M ed ita ag o ra na g ra n ­
deza que b ro ta d a h u m ild a d e ...; esta é a única que .merece
este n o m e... T o d a s as o u tras gran d ezas são m e n tira .—
O hom em n u n ca é tão gran d e com o quando está de jo elh o s...,
isio é, quando se hum ilha e se confunde com o p ó da su a
m iséria... A ssim se confundiu o puolicano do E v an g elh o e
*e fez sa n to ... A ssim se confundiu S. P ed ro e no seu hum ilde
arrependim ento m ereceu ser ex altad o até á h o n ra de prim eiro
R a p a ... A ssim , m ais que todos os santos e rnais que todas
os criaturas, se confundiu a Santíssim a V irgem ao ccnfessar-se
404 Humildade

públicam ente escrava d o S e n h o r e p o r isso foi elevada ■a


d ignidade de M ãe de D e u s ! ... Q u e v e rd ad e ira g ran d eza n
d a hum ildade d iante de D eus e até diante dos h o m e n s !...
( R eco rd a a Lusbel no C é u ..., a A d ã o n o P a ra ís o ... e
c o nvencer-te-ás que a soberba, não só n ã o conduz a espécie
algum a de grandeza, senão que lev a à m ais terrív el e e sp a n ­
to sa queda. — Urna vez quiseram os hom ens le v a n ta r uma
to rre que chegasse a o C éu, p a ra d esafiar o po d er de D cüs
e to m a r im possíveis o s castigos d a sua ju stiç a ..., m as a
única coisa que fizeram foi tornarem -se rid íc u lo s..., dignos
de desprezo e de tro ça de to d as as gerações.
C o m p ara ag o ra com esta a conduta de M a ria , que não
q uer p a ssa r d a condição de se rv a e escrav a, e n ã o só de
p a la v ra m as a v a le r; quer ser tida com o ta l... e v iv e r sem pre
a ssim ... D eus, porém , exaltn-a tan to , que tam bém E la exci­
ta rá a atenção de to d as as g e ra ç õ e s..., m as p a ra A adm ira­
rem e bendizerem sem pre. C om o D eus cum pre bem a sua
p a la v r a ! ... O que se hum ilha será e xa lta d o ...
D o n a d a criou o m undo e tiro u todas as coisas, c não
p a rec e se n ã o que a g o ra tam bém quer tira r do nosso nada
to d a a nossa g ra n d e z a ... P o r isso exige com o condição
indispensável, p a ra fazer-nos g randes e santos, que tenham os
d ian te dos nossos olhos o nosso n a d a ..., o p u ro n a d a que
sem os e que podem os. — Sòm ente a hum ildade é a que
le v a n ta a altíssim a to rre ..., firm e... e segura que ultra p assa
a s nu v en s e chega a té aos C é u s..., até a o tro n o do p róprio
D eus.
3." A verdadeira fortaleza. — Finalm ente é n a hum il­
dade que se enco n tra o pon to de p a rtid a p a ra as grandes
façanhas, p a ra os g ran d es heroísm os. — O hum ilde descansa
em D e u s.... co n ta com o p o d e r om nipotente de D eus. e
n ã o h á n a d a que se lhe o p o n h a ..., nem dificuldades que
n ã o vença. — A hum ildade n ã o é pusilanim idade nem re tra i­
m ento, que nos faz c o b a rd e s... m edrosos; pelo contrário, é
a v irtu d e dos fo rtes..., a que d á e gera a v e rd ad e ira forta-
H um ildade 405

le z a .— T o d a a tu a coragem, varonil e a sua g ra n d e energia


c decisão e:n o p e rar, dissem os que a tirou a S antíssim a
V irgem da sua p ro fu n d a hum ildade.
N a sua P urificação, p assa M a ria por um a das m aiores
hum ilhações da sua v id a ...; seria necessário, p a ra ap reciá-la
em toda a sua extensão, conhecer o am or da Santíssim a
V irgem à su a p u re za im a c u la d a ..... A dignidade de M ãe de
D eus teria an tep o sto o u preferido a sua v irg in d a d e ... e
a g o ra, tem que p a ssa r aos olhos das c ria tu ra s com o um a
m ulher igual à s o u tras. — A açucena puríssim a aparece
com o m urcha perante os ho m en s... Só D eus conhece o seu
çandor e in o cê n cia ... — O am or p ró p rio .facilm ente teria
pro cu rad o p re te x to s neste caso p a ra p roceder d o u tra m aneira;
o zelo d a glória de D e u s..., a edificação do p ró x im o ..., a
aleg ria daquele p o v o ao sab er que já e stav a entre eles o
M essias, etc. — M a ria não adm ite tais su g e stõ e s..., obedece
ã lei com ta n to raaior gosto q uanto é p a ra E la m ais hum i­
lh a n te ... D eus neste dia ap recia m ais a sua ofe re n d a que
todas as outras, porque nehum a se Lhe o fereceu com m ais
h u m ild a d e ...—•A h ! re p a ra com que fortaleza c virilidade
M aria, n esta cerim ónia, oferece a D eus o Seu F ilh o ... e se
e n treg a E la m esm a ã im o la çã o ..., a o - s acrifício ...
T u tam bém necessitas de g e n ero sid a d e..., v irilid ad e .,.,
fortaleza p a ra oferecer a D eus o teu sa c rifício ..., o que
m ais te custa e o m ais n e ce ssá rio ..., o do teu am or p ró p rio ...
F á -lo cora generosidade e fo rta le z a ...; n a hum ildade a encon­
tra ra s .,. Pede à S antíssim a V irgem um conhecim ento de ti
mesmo e dos teus afee to s ..., o conhecim ento do teu proce­
d e r .— Q u e re v erê n cia tens n a o ra ç ã o ..., com os anjos e
sa n to s..., com os teus su p e rio res..., com o pensas deles,.,
c >t<jmo te p o ria s com e le s? ... É s re sp eito so ..., d e fere n te ,..,
otibmisso a to d o s o s que têm au to rid ad e sobre, ti? ... C om o
correspondes ã:> g ra ç a s ,d e D e u s... A hum ildade te ensinará
ludo isto ... P e d e -a assim à S antíssim a V irg e m ..., .in s ta e
ivga-L he enearecidam ente p a ia que te n ã o negue esta graça;
24. Pobreza

1.° A pobreza a c tu a l.— É n pobreza real c efectiva.


que consiste na carên cia de bens de fortuna. — P o d e ser
involuntária q u ando p e r disposição da P ro v id ên cia, nos
enco n tram o s nessas c irc u n stân c ias..., ou voluntária, quando
o c o ração se desp ren d e de tudo o que possui e de facto
d e ix a e renuncia a tudo, p a ra com m aior liberdade, servir
a D eus e dar-se plenam ente no seu am or. — E sta segunda,
com o tam bém a prim eira, quando se aceitam com gozo e
alegria, constituem a v irtu d e d a pobreza actual. E sta v ir­
tude, é fonte p ositiva de im ensos bens e de grandes e v e rd a ­
d eiras riq u ez as..., pois S. P au lo não du v id a a firm ar que a
a v a re z a é a raiz de todos o s m ales... Jesus C risto assim
o prom ete: O que de ix a r a sua ca sa ... e [acenda..., receberá
cem v ezes m ais e depois da vida e te rn a ... E E le mesmo
exigiu este desprendim ento com o o prim eiro passo p a ra a
v id a de p e rfe iç ã o ...; S e queres ser perfeito, vende quanto
te n s ..., dá-o aos p o b re s..., e vem , seg u e-m e...
E is porque a pobreza actu al é um dos vo to s essenciais
n a v id a relig io sa... e po rq u e todos cs santos tan to em penho
puseram era p ra ticá -la e às vezes em g rau heróico. — E n tre
todos, salienta-se o g ra n d e S. F ran cisco que de tal m odo
a constituiu como c ara cte rística da sua vida e do seu espirito
que n ã o quis ser ou tra coisa senão o P obrezinho d e A s sis...
E n ã o é p a ra estran h ar, pois não quis com isto se r senão
P obreza 407

um im itador d A q u e le de quem diz S. P a u lo que sendo


iin^nsam ente rico, se fe z pobre p o r nós a fim de nos fa ze r
a nós ricos com a sua pobreza. — O s A póstolos tinham em
tan ta consideração esta vida da pobreza e tão perfeitam ente
a praticaram na escola de Jesus C risto, que n ã o d uvidaram
im pô-la aos prim itivos cristãos, e assim todos se d e sp ren ­
diam dos seus bens e os levavam com m uito gosto aos pés
dos A póstolos, v iv en d o um a v id a comum e ig u al de p obreza
e carid ad e ...
2.“ A pobreza de M aria. — C ontem pla o ideal da
pobreza d a S antíssim a V irg e m ... M a ria era pobre, não
possuia m ais do que as pobres m ulheres de N a z a ré ... Se
no seu nascim ento não houve urna p obreza m iserá v el..., e
um a falta total de bens. pcis dizem que seus pais possuíam
um a c a s ita ..., d e u tudo aos pobres e m uito pobrem ente viveu.
D etém -te a contem plar a casita d e N a z a ré antes e
depois de E la v iv er com S. Jo sé... Q u e pobreza, que sim pli­
c id a d e !... P e rc o rre todos os q u a rto s ..., exam ina santam ente
todos os m ó v eis..., a baixela d a c o zin h a..., a m esa e as
c ad e ira s..., a cam a e a roupa de v e stir... A oficina de S. José
e ra um a pobre q u ad ra, com q u a tro ferram entas, as m ais
in d is p e n s á v e is ..., rú stic a s..., m uito u sad as e g a s ta s ... Ali
não há m ais en tra d as d o que o que diàriam entc ganha
S. Jo s é ...; a pobreza então seria estreitíssim a e talvez algum
dia perm itisse D eus que lhes faltasse até o pobre alim ento.
Assiste a um a das refeições da S a g ra d a F a m ília ... T u d o
está im pregnado de p o b re z a .... de tem perança. — E ra sem ­
pre assim ..., às vezes, porém , 'tinham que sofrer, d e m aneira
mais e x tra o rd in á ria, a s p rivações d a p o b re z a ...; P arece que
D eus se re cre av a naquela p o b re za ... — R ecorda a viagem
a Belém ... P ro v àv elm en te S. José teria levado ao m a tri­
mónio algum as econom ias, que teria feito com esse fim ...
E ra toda a su a esperança, p a ra quando nascesse o M e n in o ...
Com que sa tisfaç ão as g a staria to d as e m ais que tivesse,
p a ra p re p a ra r um bercinho jeitoso ao F ilh o d e D e u s ...:
•108 P obreza

a viagem , porém , a Belém suprim e todas as suas ilusões...,


d esfaz-lhe c s p la n o s..., e as suas pobres econom ias são
g a sta s na v iag e m ... e, pior ainda, em p a g a r o tributo cruel...,
b á rb a ro ..., in ju sto ..., ao C é s a r ...; e Jesus n ascerá nSo na
pob reza, senão na indigência mais e x tre m a ..., sem, c asa...,
sem b e rç o ..., apenas com uns paninhos.
V oltam , novam ente, p a ra N a za ré e ap en a s S. José
com o seu trab a lh o d obrado, consegue o u tra vez juntar
um pequenino p e cú lio ..., o u tra viagem m ais d u ra ..., m ais
lo n g a ..., m ais penosa o espera, a viagem ao E g !p t o ! ...:
ijnais um a vez os rigores da ind ig ên cia... Q u e d ias aqueles,
o s prim eiros, p assados no E g ip to até que foi dando-se a
conhecer S. Jo sé..., e com eçou a ad q u irir algum a íregue
s i a l . . . V iv ia sem ente de esm ola.
Finalm eníe, q u a n d o já se tinham acom odado e já podiam
re sp ira r um p o u c o ..., o u tra vez de v iag e m ..., de n o v o para
N a z a ré ..., e com eçar m ais um a vez a p ro c u ra r encom endas
e tra b a lh o ... R e p a ra na Santíssim a V irgem , procurando
tra b a lh o p a ra S. Jo sé ..., E ia que é a h erd eira d a C oroa de
D a v id ! ..., a Im peratriz do C é u ! ... a R a in h a dos anjos e
dos hom ens..., e n ã o obstante, que c o n te n te..., que satis­
fe ita ..., que aleg ria e,stá d esposada com a p o b re z a !...
3.“ C onsequência d e sta pobreza. — M a ria não só viveu
o c u lta e p riv ad am en te p o b re ..., senão que pübiicam ente teve
de a p are ce r sem pre assim em m uitas ocasiões. — Lem bra-te
do m istério da A p re se n ta ç ão e oferta que então levou...
N em sequer teve p a ra co m p rar um cordeirinho e teve que
contentar-se com a o fe rta dos m ais pobres, um p a r çie
pom binhos.
' Isto deu o casião a M a ria, de m uitos actos de virtude
que teve de p ra tic a r... C om que deprezo, p o r exemplo,
A trataria m as o u tra s m ulheres que iam ao T em plo, com
rica s o f e rta s ! ... Q u e p o u c a consideração d a p a r t e ' daqueles
s a c e rd o te s !... C om o costum a acontecer com os p o b re s..; não
fariam caso d eles..., abusariam , fazendo-os esp erar tp a is 'd o
P obreza m
que devia ser p a ra aten d er a o u tro s a quem rnais lhe con­
v in h a ter co n te n tes... Q u e hum ilhações e d esprezos não
causa a p o b re z a !... P o r isso mesmo, o seu tra to h a v ia de
ser com gente ig n o ra n te ..., in c u lta ..., g ro sseira..., como
sucede com os p o b re s ...; a E la mesma assim A trataria m ,
com o um a de ta n ta s ..., e a seu Filho não lhe póde d a r um a
educação m ais e le v a d a ,.., até talvez não lhe foi possível
e n v iá -lO às escolas dos ra b in o s ...; devia servir-se d E le
p a ra os recados d a c asa e da o ficin a... e depois, ocupá-lo-:a
em a ju d a r a seu pai a g a n h a r p a ra co m er... D este m odo
e ra conhecido Jesus, corno fiiho do pobre c arp in te iro ..., como
filho d aquela p o b re aldeã que sc c h am av a M a ria ... Q u e
adm iração tudo isto nos deve c a u s a r ! ... Q u e desejos de
e stu d ar os segredos que, duvida, encerra a p o b re z a !...
P e rg u n ta a M a ria ; porque a am ou tanto? Pede-L he que te
ensine a razão , pela qual foi tão q uerida de Jesus e d E la,
que não se a p a rta ra m d esta virtude nem um só m om ento...
Q u a l será? — M e d ita nisto m uito d e v a g a r em com panhia de
tua M ãe.
5. Pobreza

1." P obreza de espírito. — É evidente que a pobreza


de esp írito ou o espírito de p o b reza é c que dá v a lo r e m ere­
cim ento a esta v irtu d e ... N ã o é virtude sim plesm ente a falta
de bens de fo rtu n a ... e assim há m uitos pobres que não
p raticam esta virtude, a p esar de não possuírem n a d a ..., e
pelo contrário, pode h a v e r v erd ad eira p o b reza de espírito
nc m eio de grande opulência.
E sta p obreza de espírito, como a cham e Jesus C risto
nas suas bem -aventuranças, consiste no desapego do c o ra ­
ção de toda a riqueza, fazenda e bens m ate ria is..., de sorte
que nem se ponha a alma nas ri(f:i«zas... nem as riquezas
na alm a. com o diz S. F ran cisco de Sales. — A raiz disto
b ro ta d a p ro fu n d a convicção que devem os ter de que n ad a
de q u an to existe é nosso com pleno dom ínio..., to ta l... e
a b so lu to ..., ainda que possuam os com legítim o direito e
possam os d izer ccm v erd ad e «isto é m eu»..., pois afinal, o
único dono e sen h o r absoluto de todos os bens é D eus.
D os bens de fortuna nós não som os senão m eros adm i­
n istrad o res desse único e suprem o se n h o r..., e, p o r isso
m esmo, n ã o podem os d isp o r deles a nosso capricho, senão
d e n tro d a s ordens e disposições d o seu legitim o dono.
O a b u sa r das riq u ez as..., o d e se já -la s... o tra b a lh a r p a ra
e n te sc irá -la s ..., o u se n ã o a s possuím os, lam entar-se da sua
fa lta ..., queixar-se a D eus e m aldizer a sua so rte ..., ao
Pobreza 411

mesmo tem po que se fom entam afectos de inveja dos que têm
m uito... tudo isto, é c o n trário à pobreza de espírito.
E sc u ta então S. Paulo, que diz: «tudo considero com o
im undície asquerosa e desprezível, em co m p aração da única
riqueza que é g a n h a r a C risto». — P o rta n to , o pobre de
espirito deve v iv er contente com a su a indigência, se D eus
o pôs nesse e sta d o ... com preendendo que com isso tem
facilitado, em sum o g ra u o cam inho d a sa n tid a d e ..., e se
tem fortuna, há-de em pregá-la em fa v o r dos seus irm ãos,
evitan d o a a v a re z a ..., n a m b ição ..., o desejo de en tesoirar
e aum entar m ais e m ais os seus c a b e d a is..., p o n d e o seu
c o raç ão nos bens eternos do C é u ... e não o sepultando nos
m iseráveis e caducos bens da terra.
Assim procedeu a Santíssim a V irgem , como já o d s-
se m os... V iv eu sem pre em pobreza actual, m as a c m esmo
tem po com um adm irável espirito d esta v irtu d e ... Q u e
desapego o seu! Q u e d ife re n ç a !... Q u e pouco v a lo r d a v a a
tudo isso que form a os bens de fo rtu n a !— O s seus bens
e a sua fortuna estavam co ncentrados num só cbjecto, o
seu J e s u s !... E ra o que E la a m b ic io n a v a..., o que não queria
p e rd e r... D ai aquela a v a re z a sa n ta em não desp erd içar nem
um a só das suas p a la v ra s ..., nem um a só das suas a cç õ es...,
senão que as g u a rd av a to d as no secreto do seu coração, p a ra
a só s..., com o o a v are n to com as su as riquezas, recrear-se
re co rd a n d o -as.... m e d itá-las..., saboreá-las. — Com Jesus n ad a
m ais Lhe im portava desta t e r r a . —'O s m agos dão-L he um a
grande quantidade de o iro ...; aceita-a agradecida, mas,
segundo o sen tir dos S an to s P adres, re p artiu -a logo entre
os pobres. Q u e desprendim ento d o o i r o ! ...
2." A s suas granJes vantagens. — S ão tan ta s que é
dificil o enum erá-las. — A ntes de tudo, a pobreza de espirito
constitui o prim eiro p onto do serm ão d a M o n ta n h a .— Ê a
prim eira de todas as bem -aventuranças, à qual Jesus C risto
prom ete solenem ente a posse dc reino dos C éus.— A pobreza
constitui um dos tem as m ais im portantes da sua p re g a ç ã o ...
412 Pobreza

.Como a n atem atizav a os ric o s !... Q u e difícil lhes p ô s. .a


e n tra d a do C é u ! ... M ais que a passagem de um cam elo pelo
fundo de um a agulha.
Além disso quis d a r-n o s exem plo acabadíssim o da
p o b re za a fe c tiv a e e fe c tiv a ... Q uem O obrigou a nasegr...,
a v iv e r..., a m orrer tão po b rem en te?...
A jóia preciosa com que quis ad o rn ar-se em sua vida,
foi a p o b re z a .—■A os que deixaram tudo para. O seguir,
fê-los A p ó sto lo s..., sa n to s..., porém , aos cobardes e apegados
a o dinheiro, não lhes deu nad a. O jovem do E v a n g e lh o , a
quem convinha a ser pobre p o r Ele, teria sido tam bém ...
um dos seus a p ó sto lo s... ou seu d isc íp u lo ..., talvez uma
grande figura na sua Igreja, e um grande santo no C é u ....
m as ele não quis d eix ar o que possuía, a su a fortuna, e já
se n ã o fala m ais dele no E v a n g e lh o ...; p erdeu tu d o por
n ã o ter deixado tudo voluntariam ente.
A pobreza, além disso, tra z consigo um cortejo brilham
tjssim o de o u tras v irtu d e s...:
: a ) P riv a çõ e s frequentes e mesmo contínuas n o ali­
m ento, no vestuário, n a m aneira de v iv e r...
b) P o r isso mesmo, é um exercício não interrom pido
de m ortificações exteriores e c o rp o ra is... e tam bém das
interiores do e sp írito ...
c ) A o pobre, não lhe fa ltarã o a b an d o n o s..., despre-
z o s ..., hum ilhações..., in d ife ren ç a ..., ingratidões c faltas de
correspondência, p o r vezes dos poderosos, que desdenharão
v ê -!o ..., tra ta r com ele.
d ) Com esta pobreza v ai unida a n e c e ssid a d e -d o : tra ­
balho c o rp o ra l..., m olesto e fa tig a n te ..., m as ao m esm o tem po
fá-lo-á co n fiar m ais e m ais n a D ivina P rovidência, de quem
-vive; e de quem tudo e sp e ra ...
: e ) P o r isso a pobreza gera espontâneam ente um grande
espírito de oração, pois ninguém m elhor do que o pobre,
sente a su a absoluta necessid ad e...
/ / Finalm ente, a p obreza to rn a o entendim ento, mais
Pobreza 413

cla ro p a ra com preender o v erd ad e iro v a lo r das coisas da


te rra ..., e o coração m ais livre dc ap eg o s e preocupações,
p a ra po d er v o a r m elhor p a ra D eus sem n a d a que ate ou
ligue as suas asas
M ed ita bem em tu d o isto, p a ra que estim es, com o se
deve, esta virtu d e e v e rás en tão ccm c não estran h a s o am or
que lhe tinha a S antíssim a V irgem c a alegria com que v iv ia
a b raç ad a a ela.
3.’ A tua p o b reza de e s p ír ito .—'T e n s de tra b a lh a r
por ad q u irir esta virtu d e tão necessária. — Se és rico, reparte
com os pobres c assim exercitarás a v irtu d e d a pobreza e
d a c arid ad e entre os pobres a quem dev es s o c o rre r...; se
D eus te d á a sentir os efeitos da p o b reza actu al, sabe a g ra ­
decer a D eus este benefício p o r v e r-te sem elhante a C risto
<* a M a ria pobres p o r nosso a m o r.—-N u n c a esqueças o
exem plo d e um Judas, que p o r am or às riq u ezas e p o r sua
av areza, caiu em n e g ra e h o rrível tra iç ã o ...; ap ren d e de
M aria a tro ca r o o uro terren o dos M agos, pelo o u ro precio­
síssim o da carid ad e com. o p ró x im o ..., pelo o u ro valiosissim o
d a abnegação e do sacrifício.
N ã o pe n sa ria Jesus C risto em sua M ã e ..., no nosso
gran d e modelo, q uando p ro clam av a a d ita e a bem -av en tu ­
rança da p o b re z a ? ... P a re ce s-te n isto algum a coisa com
Pila?... N ã o tens asp iraçõ es m undanas de b rilh a r..., d e
lo u v o íe s..., de desejo de fa ze r f i g u r a ? .. . — P en sas m uito
que o reino dos C éus é p a ra os pobres de esp írito e hum il­
des d e coração?-... T e n s bom presente as p a la v ra s de tua
M ãe, de que «D eus enche de bens os p o b re s... e deixa de
niiiog vazias os ricos d o m un d o » ?... G o stas de v isitar os
p o b re s..., dc tra ta r d e le s..., de so c o rrê-lo s? ... E n v e rg o ­
nhas-te talvez de que algum m em bro d a tu a fam ília seja
pobre e v ista pobrem ente? ... G o sta s de fazer alarde de
nobreza e de riqueza entre os o u tro s ? -~ Pede a Jesus e a
M aria a sua pobreza, pois que essa é a sua herança.
2o. Obediência

1." A excelência desta virtude. —'N ã o é fácil adivi­


n h á -la e com preendê-la em todo o seu v a lo r. — D a soberba
b ro ta a rebeldia e a desobediência... d a hum ildade, a obe­
diência. — E m Jesus C risto estas duas v irtu d e s estavam
intim am ente unidas, com o diz S. P a u lo : humilhou-se. e feiz-se
obediente. — Isto m esm o se deu com a S antíssim a V irgem .
— A obediência é o distintivo e a c ara cte rística d o espírito
d e C risto ...; a rebeldia é a d o dem ónio, do m undo c da carne.
E sc u ta as prim eiras p a la v ra s de Jesus C risto : M e u D eus.
eu vim para la ze r a tua v o n ta d e ... e a tua lei está n o meu
coração... depois estas: O m eu alim ento é la ze r a vontade
d"A quele que m e c n v ic ti... E assim com preenderás com
q u a n ta ra zã o pôde d izer o A póstolo que a S u a obediência
fo i a té à m orte e m orte d e C ru z Q u a n ta s vezes pregou
E le esta dou trin a que p ra tic a v a : A q u ele que vos o u ve. a
m im o iiv e ..., c o que vos desobedece e d espreza a m im mc
despreza.
A obediência não é virtu d e e xclusiva d o s conventos,
senão que todos estam os obrigados a obedecer aos superiores
q u e m andam cm nós, em nom e d e D eus. — S. P a u lo disse:
F ilhos, obedecei a vossos pais. — C riados e servo s, servi
e obedecei aos vorsos senhores, com respeito e tem or. —
C idadãos, v iv e i subm issos aos m agistrados e às autoridades
e obedecei às suas ordens...: finalm ente, obedecei todos aos
Oi>edicncia 415

vossos superiores e prelados, já que eles vtzlam p o r vós,


com o quem terá de dar contas a D ctis das vossas alm as.
—• D eus pós íudo sob a obediência, de sorte que ninguém ,
nem ainda os m esm os superiores, estão isentos dela. O su p e­
rio r deve ser o prim eiro a o b e d e c e r...; ninguém sabe m andar,
se antes não soube obedecer. — H á -d e obedecer aos que são
superiores a e le s... e, em últim o caso, a D eus, pois de tal
m odo o su p erio r deve re p re se n tar a D eus, que tudo o que
m anda e ordena, seja conform e ao que D eus lhe inspira e lhe
com unica na o ra çã o .
Pensa, se tens que m andar, que não o podes fazer c o n ­
sultando o teu c a p ric h o ..., senão unicam ente expondo a teus
súbditos a v o n tad e do Senhor, d a qual deves se r fiel in té r­
p re te ...; se assim não é, nem tu tens direito a m andar, nem
os teus súbditos o b rig aç ão de obedecer.
V ê quão excelente é a obediência, pois faz-nos conhecer
e p ra tic a r sem m edo de nos enganarm os, em cada caso con­
c reto d a n essa v id a, o que então D eus quer de nó s...
2.° O s seus frutos. — São tam bém g randes e excelentes
os frutos que produz a obediência: 1 ."— O descanso e se g u ­
ran ça que dá à alm a, que sabe de c erte z a .... e in falivel­
m ente..., que e nquanto obedece acerta sem jam ais se en g an a r
com a v o n tad e de D e u s... 2.° — C om o consequência desta
segurança, um a paz de alm a e de c o ra ç ã o ... e um sossego
in te rio r... verdadeiram ente im perturbável, pois exclui total-
m ente toda a d ú v id a ... v a c ila ç ã o ... escrúpulo, e tc ... 3.° —
U m a grande sem elhança que a alm a adquire com Jesus e
com a Santíssim a V irgem , que não v iveram senão subm e­
tidos sem pre às p ro v a s, às vezes dificílim as e heróicas da
olrcdiência... 4." — U m grande esp irito de sacrifício, que com
ela se adquire e se p ra tic a .... v isto que a obediência é a
oblação con tin u a do am o r p ró p rio ..., d o p a rec er p ró p rio ...,
d a v o n tad e pró p ria, que é o que m ais custa c o que m ais
a g ra d a a D e u s...: M e lh o r è a obediência q u e qualquer
outro sacrifício...
416 O bediência

5." — A obediência purifica, por isso mesmo, sem cessar,


a nossa intenção, pois p o r ela deixam os de nos b u scar a
nós m esm os, p a ra p ro c u ra r e e n co n trar infalivelm ente a
D e u s... 6." — C om ela aum enta consideravelm ente o m érito
e o v a lo r dos nossos acios, pois todos, ain d a os m ais insi­
gnificantes em si, adquirem um grau incalculável de m ere­
cim ento d ian te d e D e u s..., a o c o n trá rio d o que acontece
q u a n d o operam os independentem ente ou c o n tra a obediên­
c ia ...rC o m o então buscam os a nossa satisfação, já tem os
nisso a recom pensa dos nossos a c to s... 7 .° — D o m esmo
m odo, com a obediência crescem e se fortificam conside­
rável,m ente to d as as v irtu d e s... adquire-se e a sseg u ra-se com
ela a v itó ria final, pois diz o E sp írito S anto: que o obediente
c antará v itó ria ...
8 .“ — P o r isso mesmo, a obediência dá-nos arm as ofen­
siv a s e defensivas c o n tra todos os nossos inim igos... N ã o
tens n o tad o o em penho do dem ónio quando te tenta, p a ra
te a fasta res do teu c o n fesso r..., d ire c to r... o u su p e rio r? ...
P ois é p e r isso ; ele bem sabe que en q u an to obedeces, não
p o d e rá n ad a c o n tra ti..., m as ai daquele que se afasta da
obediência e pretende q u e rer com bater s o z in h o !... D ificil­
m ente triu n f a ! ... 9.“ — P o r fim o obediente tem direito a
c o n ta r com o p oder de D e u s..., com a P ro v id ên cia de D eus,
que n ã o pode d e ix a r de se n tir intim am ente e m ais d o que
n in g u ém ..., po rq u e o obediente é o que p rà tica m en te sc
lan ça e se a b an d o n a nos b raço s de D e u s..., ren u n cia a si
mesmo, p a ra ser todo de D eus e, p o r isso, com ra zã o , tudo
espera d 'E le.
3.“ E x e m p lo d e M arta. — A p e sa r de to d as as suas
excelências m agníficas e d o s seus tão preciosos fru to s...,
ó que m ais te d e v e an im ar à obediência e a exerc ita r-te na
p rá tic a d a mesma, é o exem plo d a Santíssim a V irg e m .—
Q u e m odelo de obediência o s e u ! ... O bedeceu sem pre com
rendim ento de ju íz o ...; aleg ria de c o ra ç ã o ... e pro n tid ão
na execução.
O bediência 417

V ê a sua obediência o rd in á ria ..., con tín u a a S . José,


a quem considera com o cabeça d aq u ela casa e rep resen ­
tante im ediato d a au to rid ad e de D eus. N ã o discute as suas
o rd e n s..., não c ontradiz as su as in d ic a çõ e s..., não segue
outros conselhos e orientações, ainda n a s coisas m ais peque­
nas, senão as que ele lhe d á . — M ielhor a in d a direm os que
E la nunca considerou como coisas p equenas as que o rd e n av a
a o b e d iê n c ia ...; p o r isso aquela subm issão to ta l e com pleta
à v o n tad e divina, m esmo m anifestada p o r um su p e rio r que
sob m uitos aspectos e ra inferior a E l a .. .; contudo obedece
como um a escrava, é sem pre «a escrava d o S e n h o r» e dos
seus re p re se n ta n te s...; não tem lib erd ad e... nem v o n ta d e ...
nem p arecer p r ó p rio ...; não tem direito a p e n sa r... nem a
a ju iz ar... menos ainda a criticar e a c e n su ra r o que d a p arte
de D eus lhe o rd e n a m ...; se assim n ã o fizesse deixaria de
ser a «escra va » ..., pois esta perdeu to d a a su a p erso n ali­
dade. ..e M a ria g o sta tan to deste título, que dele fez o
pro g ram a d a su a v i d a ...; renunciou liv re ... e sp o n tân e a... e
generosam ente a to d o s os seus d ireito s..., a to d a a sua
liberdade p a ra esc ra v iza r-se totalm ente a D eus.
Q uem fez v o to de obediência, v e ja a que se o b rig o u ...
E ste é o m odelo... N ã o há outro m odo de cum pri-lo, senão
se r... e v iv e r... totalm ente escravizado n a sua lib e rd ad e ...,
na sua v o n ta d e ..., no seu p róprio parecer, ao dos superiores.
À im itação de M aria, aquele que faz v o to de obediência
não po d erá deter-se a exam inar as ra z õ e s... ou os m otivos
do que lhe é m a n d a d o ...; só deve sa b e r se lhe é o rd en ad o
ou não, e se no o rd e n ad o não há p eca d o e p ro c ed e r conform e
íi ordem dada, sem dilações de nenhum a espécie. —• O s que
não fizeram esse voto, vejam tam bém onde está o ideal desta
v irtu d e ... e com parem a sua conduta com a d a Santíssim a
V irgem . — F a z um exam e m uito m inucioso sobre este
p o n to ..., analisa bem a tu a obed iên cia... põe-na em p aralelo
rom a de M a ria e tira a conclusão do que hás-de fazer.
2T
27. Obediência

1,° O bediência verdadeira. — É a que consiste n a


subm issão d a p a rte su p e rio r do nosso ser, à s disposições
daquele que m a n d a ..., isto é, pode ser que a p a rte inferior
se re b ele..,, que se sin ta re p u g n ân c ia ao o b e d ec er... o u tem or
em face das dificuldades que nalguns casos su p o n h a a obe­
diência. —»Jesus C risto foi o prim eiro a se n tir essa re p u g n ân ­
c ia e essa debilidade na p a rte inferior d a su a n atu reza, que
se a ssu sta v a em G etsem ani p e ran te aquela obediência
h e ró ic a ..., a té à m orte! e m orte de C r u z ! ... a que ia ser
subm etido. — Isto é m uito h u m an o ..., m uito n a tu r a l...; o
c o n trá rio seria c o nverter-nos em estátuas, com um a indife­
re n ça e insensibilidade a n ti-n a tu ra l... e além disso, isto
tira ria v a lo r e m erecim ento à obediência.
O m érito está em se n tir isso ... m as a p esar de tudo
d izer com o C risto :— P a ra d ian te ! não se / a f a a minhn
vo n ta d e, senão a tu a ..., h a ja o que h o u v e r..., custe o que
c u s ta r... A h ! com o é precioso e a g ra d á v e l a D eus o sa c ri­
fício que então lhe oferecem os.
N ã o deixa d e ser v e rd a d e ira a obediência se expom os
aos nossos superiores, com sim plicidade e hum ildade, alguns
m otivos e inconvenientes que necessitem esclarecim ento....
sem intenção de p ro te s ta r..., nem sequer de disco rd ar do
m an d a d o ..., senão com a intenção de sim plesm ente o escla
recer o u c o n s u lta r...; ex p o r n ã o é opor-se. — R eco rd a o caso
O bediência 419

tão cla ro neste p o n to d a Santíssim a V irg e m ...; disposta a


obedecer ceg a m e n te..., n ã o obstante, p e rg u n ta a o a n jo ...,
expõe as su as d ú v id a s ..., pede esclarecim entos p a ra m elhor
saber a form a com o h á -d e o b e d ec er... e, um a v ez conhecida
esta, já n ã o tem lu g a r senão esta p a la v ra : F iai, faça-se.
2 ° A obediência perfeita. — A v e rd a d e ira obediência,
adm ite g rau s e assim pode se r m ais o u m enos p e rfe ita ...
A obediência p e rfe ita é a que re u n e a s condições d a
mesma já ex p o stas num a das m editações d a v id a de N a z a ré ...,
a que obedece com p ro n tid ã o e a le g ria ..., com espírito sobre­
n atu ral, unicam ente p o r D eus, n ã o p o r m o tiv o s n a tu ra is de
a g ra d o o u sim p a tia ..., com rendim ento to ta l d a v o n tad e e
do entendim ento, n ã o p a ra o p e ra r irracionalm ente e c o n tra
a nossa razão, m as sim p a ra não v e r com o s olhos do nosso
próprio juízo e assim fa ze r cegam ente o que se nos m anda.
N u m a p a la v ra , a obediência p erfeita obedece to ta l­
m en te..., sem lim itação de tem po nem de c o is a s ...; n ã o obe­
dece quando lhe a p e te c e ... ou q u ando lhe a g ra d a ..., n ã o v ê
as dificuldades; m as sem pre, e a todo o instante, cum pre
exactam ente o que lhe foi o rd e n a d o ..., a té nos m ais pequenos
porm enores. — E s ta é a grande o b e d iê n cia ..., tão lo u v ad a e
recom endada p o r todos os santos. — Q u e m ara v ilh a s n ã o
disseram dela S a n to A gostinho, S. T o m á s ... S a n ta T e re s a
de Jesu s..., S a n to Inácio d e L o io la l — T o d a a p erfeição a
fizeram depender da o b ed iên cia... E o p ró p rio D eus, q u a n ta s
vezes à s alm as que E le mesmo d irig ia e in sp ira v a d irecta-
mente, as o b rig av a depois a d a r co n ta aos seus confessores
e directores p a ra subm eter tu d o à o b e d iê n c ia !
3." P erfeição d c M a ria . — A p lica todos estes p o n to s
ii obediência d a S antíssim a V irgem , e vê a perfeição com que
E la exercitou esta virtude. — O ntem m editávam os a sua
obediência o rd in ária e quotidiana, d a qual nem um m om ento
du sua v id a p re scin d iu ... V ê, além d isso hoje a su a obe­
diência nos casos e x trao rd in ário s que a E la ... com o a ti
lumbém às vezes o S enhor enviará.
420 O bediência

N ã o duvides d e que o S en h o r tem em penho em p ro v a r


a n ossa v irtu d e ... P ôs à p ro v a a obediência dos A n jo s...,
d e A d ã o e E v a ..., d e A b ra ã o .... de M o isé s..., etc., e tam ­
bém p ro v o u a d a S antíssim a V irg e m ..., n ã o po rq u e d uvi­
d asse d 'E la , m as sim p a ra a fazer sa lie n tar m ais aos nossos
o lh o s... e acrescen tar m aior m erecim ento a o que ordinària-
m ente adquiria com a su a perfeitíssim a obediência.
É v erd ad e que um a obediência d iá ria ..., c o n stan te...,
sem pre em tudo p e rfe ita , deixa de ser obediência vulgar,
p a ra converter-se em obediência e x tra o rd in á ria e até
h e ró ic a ... Q u e grande heroísm o c do v u lg a r..., do m o n ó ­
to n o ..., o de todos os d ia s ! — P o is bem, M a ria além deste
heroísm o e d esta p e rfe iç ã o ..., teve a d a obediência à prova
em ocasiões d ifíceis..., e x tra o rd in á ria s ..., n a s que podia ter
ensejo, segundo a nossa m eneira de v er, de algum a des­
culp a p a ra d eix ar de obedecer. — M a ria, porém , nunca
encontrou essa desculpa.
V ê a sua obediência a D eus que a in sp irav a a o v oto de
v irg in d a d e ..., E la s ó ..., ú n ic a ..., sem, p re c e d e n te ..., expon
do-se ã desonra pública e aos escárneos dos o u tro s ..., etc.
—( M a ria n ã o re p a ra em n ad a, e alegre e delicadam ente faz
o que o S enhor L he inspira. — Inspira-lhe tam bém a vida
de reconhecim ento no T e m p lo ... e é tal a su a pro n tid ão , que
aos três anos se desprende dos seus pais, d eix a a sua casa
e obedece à in sp iração d e D eus. — M an d am -n a depois o.s
S acerd o tes desposar-se ccm S. José, e obedece-lhes como ao
p ró p rio D eus. — É o A njo quem, da p a rte de D eus A chama
a se r S ua M ãe, e ain d a que não entenda com o isso há-do
s e r..., sujeita-se à sua v o n tad e e o bedece... e m ais tarde, já
en tão na vida de Jesus, que obediência a su a r.as diversas
v iag e n s que D eus p e rm ite..., no cum prim ento d a s leis que
a E la a não o b rig a v a m ... N ã o necessita de ir a o Tem plo,
n ã o p recisa p u rificar-se de n a d a ... e, contudo, pre fe re obede
cer naquilo em que não tem necessidade nem obrigação
a n te s do que fa lta r à obediência.
O bediência 421

N a v id a pública do seu F ilho, inspira-L he D eus que


se retire e se e sc o n d a ..., e n ã o aparece em nenhum a p a rte ...,
D iz-Lhe que deve a co m p an h a r a seu F ilh o até à C ru z ...,
ci-lA decidida sem p e n sa r n o sacrifício enorm e que isto
supunha. —> O bediente até à m orte, com o Seu Filho.
4.° A cópia. — T u deves se r a cópia d este m odelo
perfeitíssim o. —• H á s-d e tra b a lh a r p a ra que a obediência seja
c.m ü tam bém algum a coisa essencial n a tu a v id a espiritual.
— D eves obedecer no o rd in ário e n o ex tra o rd in á rio . — O b e ­
diência u niversal em tudo e a todos: M a ria obedece ao
A n jo ..., não diz: F aça-sc em mim a vontade de D eus, senão
segundo a vossa p a la v r a ..., de m odo que ain d a que seja
inferior, se re p resen ta a D eus, d ev es obedecer. — 1M a ria o b e ­
dece ao C ésar, soberbo e a m bicioso..., obedece à lei hum i­
lh an te..., obedece a S. Jo sé ..., obedece aos A pó sto lo s e aos
seus sucessores e representantes. — D eves obed ecer p o r D eus
> a D eus, se ja quem for aquele que em seu nom e te m anda.
- D e v e s e n tre g ar-te p len am en te..., sim plesm ente..., confia-
dam ente a quem em seu nom e e com a sua au to rid ad e dirige
;> tu a a lm a ...; só assim conseguirás ser verd ad eiram en te
o b e d ie n te...; só assim v e n ce rás e dom inarás a tu a so b e rb a ...,
o teu orgulho, que sob ta n ta s form as se m anifesta e te
d o m in a ...; só assim se rás cópia e x acta de tua M ã e ...
28. A Castidade

1.“ A virtude da b ra n c u ra .— É a v irtu d e d a b e le za ...,


d a a lv u ra d a alm a. — T o d a s as virtu d es sã o o rnam ento
riquíssim o d a a lm a ..., nenhum a, porém , a ad o rn a com tan ta
g ra ç a e form osura com o e sta ... O h l C o m o é form osa, diz o
E sp írito S a n to , a geração casta e pura, toda resplande-
c c n tc ! ... C o m o é apreciada d e D e u s e d o s h o m e n s!
F lo re s b elas e exquisito arom a são as o u tras v irtu ­
d e s..., porém , a castidade é a açucena d a s m esm as..., o lírio
que recreia e encanta o p ró p rio D eus. — A ssim o can ta a
Ig reja nos seus hinos, quando diz que D eus anda sempre
entre l ír io s ...— T am bém re serv o u um a bem -aventurança
especial p a ra ela: B cm -aveníiurados os lim pos d e coração...
É que a in d a que todo o pecado, toda a falta, é um a m ancha
d a a lm a ... parece que nenhum a a m acula com o a im p u re za ...:
é o pecad o fe io ...: im u n d o ..., vergonhoso, m ais que nenhum
o u tro pecado. — É o que D eus m ais a b o rre c e..., o que m ais
ofende os olhos puríssim os e im aculados d a nossa M ãe.
P a ra ele reserv o u D eus os m aiores castigos, ainda
cá n a terra : dilúvios de á g u a e de fogo, n ã o d u v id o u de os
m an d a r ao m undo p a ra o p u rific ar d este v ício repugnante
e abom inável. E is porque o dem ónio, no seu a fã de vingar-se
de D eus, é o pecado que m ais p ro c u ra que com etam as
a lm a s..., e é sem d ú v id a o que m ais alm as lev a ao inferno.
-A castidade 423

A c astidade é a v irtu d e m ais d e lic a d a ...; q u alquer hálito


de carn e a pode em baciar e fa ze r m urchar.
É certo que n ã o se perde esta v irtu d e só p o r sen tir a
te n ta ç ã o ..., ain d a que esta seja fo rte ..., m uito re p u g n a n te ...,
m uito m olesta. — M uitíssim os santos, a p e sa r d a su a sa n ti­
dade, passaram p e la hum ilhação de sen tir estas tentações
e n ã o deixaram , p o r isso, de se r g ra n d es sa n to s... P eca-se
e perde-se a castidade, q u ando se consente livre e v o lu n tà -
riam ente em qualquer coisa, p o r pequena que s e ja ... e ainda
que seja p o r pouco tem po. A cautela-te bem , ain d a que te
p a reç a pouca c o is a ...; se é im pura, já é p e c a d o ..., pois n ã o
existe, neste ponto a cham ada «parvidade d e m atéria» ou
m atéria le v e ... C om o é delicada esta v ir tu d e ! ... T o d o o
cuidado é sem pre p o u c o ...; nunca julgues que nisto podes
p ecar p o r e x a g e ro ... A s alm as m ais puras, com o a de S . Luís
G o n zag a, foram as m ais e x ag e rad a s n esta m até ria ... Q u a l
seria, pois, a delicadeza extrem a de tu a M ãe querida, se
esta foi a v irtu d e que m ais a m o u ? ...
2.“ A virtude resplandecente. — É a v irtu d e da lu z ...
A alm a casta, está envolta n a claridade d a luz d iv in a ... P o r
Isso, os lim pos de coração, são o s únicos q u e vèem e verão
n D e u s... Luz p a ra o en tendim ento..., luz p a ra a alm a e
c o ra ç ã o ... O s pensam entos puros são d iá fa n o s..., mais res­
plandecentes que a lu z ... O am or p u ro é o am or sincero e
v e rd a d e iro ..., o único que m erece este n o m e... N u n c a se
avilta tan to o am or com o quando se baseia na im p u reza...
Isso já n ã o é a m o r..., é um a p aix ão baixa, cheia de egoísm o
grosseiro e de concupiscência anim al.
A p ureza é luz p a ra o nosso entendim ento, ao passo
que a im pureza é cegueira e obscuridade de espírito, que
priva o hom em d o conhecim ento.
a) D e si m e sm o ..., isto é, da su a d ig n id a d e ..., do que
é ..., d o que deve se r..., do deve a si m esm o... Se ao
com eter o pecado se lem brasse o hom em do que é e do
que se to rn a depois, n ã o o com eteria. — S. P a u lo cham a-lhe
■424 A castidade

(hom em animal;:, isto c. hom em carnal, incapaz de ic rc e b e r


as coisas de D eus. — S. B e rnardo diz, que nos o u tro s p ecados,
p o r exem plo, de a v a re z a ..., de soberba, etc., peca o hom em ...,
porém., neste pecado, peca o anim a!..., porque esta p aixão
é tão b a ix a e vil, que o põe ao nível dos anim ais. Q ue
cegueira de si m esmo!
dJ M as tam bém p riv a o hom em do conhecim ento m ais
e x acto d o pecado que c o m e te..., porque este pecado conhe­
ce-se quando ainda n ã o se c o m e te u ...; então tem -se m e d o ...;
n á u se a ..., repugnância a este pecado. — M as quando se
comete, este conhecim ento d eb iliía-se..., perde-se o m edo e
a v erg o n h a e chega-se ao e sc ân d a lo ..., ao endurecim ento
do c o ra ç ã o ..., ao cinism o m ais desenvergonhado.
c ) Enfim , p riv a o hom em do conhecim ento de D eus.
—- A im piedade e a incredualidade e a p ró p ria apostasia, são
quase sem pre efeitos da im pureza. — A ideia d a existência
de D e u s é ideia que p e rtu rb a o p ra z e r do hom em carnal
e p a ra m elhor se e n tre g a r ao seu pecado, ren eg a a D eus
e a p arta-se d E le ... F oi o que fez S a lo m ã o ..., L u te ro ...
e tan to s outros.
3." A virtude nobre. — T o d a a nossa nobreza e digni­
d ade depende da nossa p a rte e sp iritu a l.... m as esta é a que
cai vencida pela c a rn e ..., pela m atéria em todo o pecado
carnal. — H á em nós um a contínua luta entre o e sp írito e a
c a r n e ...; o prim eiro asp ira su b ir p a ra c im a ..., p a ra D eus que
é o seu modelo, um a vez que a alm a é sua im a g e m ...; a carne
tende p a ra b a ix o ..., a a rra sta r-se no lodo da te rra de onde
b ro to u ... E is a lu ta constante que se su sten ta no nosso inte­
r i o r . — Se o esp írito sobe, há-de triu n fa r a c arn e ...,; é a
v irtu d e da p u re z a ... Se se deixa a rra sta r e é vencido pela
carne, tem os o pecado im puro.
D e sorte que a p u reza é o resultado de um a v itó ria ...
e a im pureza de um a v erg o n h o sa d erro ta. — P o r isso, a
p u re za é a v irtu d e n o b re ..., d ig n a ..., v a le n te ..., p ró p ria tam ­
bém dos v a le n te s ...; é p o r excelência a virtu d e v iril..., encr-
A castidade 425

g ic a ..., que não adm ite a m ais p equena clau d icação o u


transigência.
4." A v irtu d e d e M aria. — É , certam ente, a v irtu d e
q u e rid a ..., m ais p ro c u ra d a ..., m ais bem g u a rd a d a pela S a n ­
tíssim a V irgem . — M a ria é toda alv u ra , sem. m ancha possí­
vel, m enos ain d a m ancha c a rn a l... C oncebida to d a branca,
pe rsev e ra na sua b ra n cu ra im aculada a té ao fim d a sua
v i d a .—-M a ria é a R ainha d a lu z ..., que n ã o tem qu arto s
m inguantes, com o a lu a ..., nem ocasos, com o o s o l..., m as...
sem pre lu z ..., toda luz, sem m istura de som bra de espécie
algum a.
T o d a s as alm as, ainda as m ais san tas, tiv e ram algum a
m an c h a..., algum a so m b ra ... M a ria é o único espelho p u rís­
simo da luz in extinguível e eterna de D e u s... Q u e conheci­
m ento p ro fundo teria E la de si m esm a..., do p e ca d o ..., de
D eus... com essa lu z ? ... É pois, p a ra e stra n h a r que ame
tanto a pureza, se esta virtu d e é a v irtu d e d a c larid ad e e da
lu z... N ã o vês com o o im puro g o sta d a escuridão e das
trevas? ... O seu am biente é este: A escuridão do inferno.
Finalm ente, contem pla M a ria acrisolando a sua pureza,
não com lutas e p ro v a s ..., pois D eus não quis que E la sen­
tisse o aguilhão da co ncupiscência..., m as tra b a lh a n d o ...,
v ig ia n d o ..., o ra n d o ..., m ortificando-se com o se a sentisse
c corno se tivesse m edo de p erd er a su a v irtu d e ... Q u e
sim pática energia a sua p a ra g u a rd a r e c o n se rv a r aquela
jóia im a c u la d a !... P orque não serás tu tam bém assim ?
29. A Castidade

l.° A flo r virginal. — T u d o q uanto se disse d a a lv u ra ...,


d a c laridade e b rilh o ..., d a nobreza e dignidade da castidade,
h á -d e dizer-se sobretudo d a c astidade v irg in a l..., que é o
g ra u m ais perfeito e m ais excelso aonde pode ch eg a r esta
v irtu d e ...; é o g ra u m áxim o que a Santíssim a V irgem escolheu
p a ra a sua castidade. — T a n to m ais m eritória se to rn a a
castidade, qu an to m ais livre e v o lu n tá ria for n o hom em .
A castid ad e é o b rig ató ria em todos os estados de vida
que elegerm os... D evem os necessariam ente ser casto s nos
p e n sa m e n to s..., nos d e se jo s..., nas p a la v ra s e a c ç õ e s ...; a
isto se reduz o fiel e e x ac to cum prim ento d o sex to preceito
d a lei de D eus. —1A virg in d ad e, porém , é um a virtu de
v o lu n tá ria ..., a ninguém o b rig a ..., se n ã o que livre e espon­
tan e am e n te a a b raç a aquele que quiser.
G ra n d e g ra ça de D eus é esta, que supõe um a luz espe­
cia l p a ra que com ela se conheça a fo rm o su ra..., a beleza
d iv in a d a v irg in d a d e ... e assim conhecendo-a n ã o se pode
d eix ar de ficar en ca n ta d o com e la ... e recebê-la, não como
um a p esa d a carga, sen ão com o um dom excelente que D eus
nos c o n ced e... D itosas as alm as que receberam esta luz! —
Se todos a recebessem ... e conhecessem o que encerra a
virg in d ad e, n ã o h a v ia ninguém que a n ã o d e se ja ss e .—
É , p o rtan to , o T esoiro escondido do E v an g e lh o : aquele que
A castidade 427

o encontra, d á tudo o que tem p a ra o co m p rar e p a ra nunca


o perder.
S. P a u lo diz que não recebeu m andato de D elis para
im por a virgindade, m as que a aconselha com o estado m ais
p e rfe ito ... E d á a ra zã o disso: O q u e não tem m ulher, diz
preocupa-se Cinicamente com as coisas d e D eu s, e com o L he
há-de agradar ao seu m a rid o ...; tudo isto v o s d ig o para
gar-se pelas coisas d a terra e acha-se com o que dividido
o seu c oração... D o m esm o m odo, continua dizendo, a
m ulher que quer ser virgem , só pensa em D eus para ser
virg em , só pen sa em D e u s para ser santa no corpo e na
a lm a ..., m as a casada, p ensa nas coisas do m u n d o e com o
há-de agradar ao seu m a r id o ...; tudo isto v o s digo para
vosso p ro v e ito ... não para vos prender e enganar, senão para
vos exo rta r a o m ais lo u v á v e l e m ais belo e ao que d á mais
facilidades para se rv ir a D eus sem em baraço algum .
E depois de re p etir estas ideias de d iv ersas m aneiras,
com o p a ra selá-las com toda a auto rid ad e, term ina dizendo:
E estou certo que tudo isto cfue d igo m o inspira o E spírito
de D eus. — A ssim é : só D eus pode in sp irar e d a r a conhecer
a beleza incom parável d a v irg in d a d e...
2.° A flo r angélica. — C h am a-se à castid ad e virtu d e e
flor angélica, m as estas p a la v ra s convêm singularm ente à
v irg in d a d e ..., p o rq u e esta virtu d e to rn a a alm a virgem , sem e­
lhante aos anjos, visto que de tal m odo dignifica e enobrece
aquele que a possui, que tra n s fo rm a ..., eleva e espiritualiza
a sua carne a p o n to de p a re c e r p u ro espírito desligado dos
laços grosseiros e m ateriais d o corpo.
M uitos sa n to s P a d re s com param as alm as v irg en s com
os anjos, e preferem aquelas a estes. — S an to A m brósio diz:
O s A n jo s vivem sem c a rn e ..., as alm as virg en s triunfam da
carne. — S. P e d ro C risólogo acrescenta: Ê m ais belo con­
quistar a glória angélica, que recebê-la p o r n a tu re za ...; a
virgindade conquista na luta, e depois de m uitos esforços, o
que os anjos de D e u s receberam naturalm ente.
428 A c a it Idade

S. B ern ard o exclam a: A alma virgem e o anjo só se


diferenciam em que a virgindade do anjo é m ais ditosa, e a
da alm a virgem c mais m e ritó ria ... P o r fim, escreve S. Jeró-
nim o: A p e n a s entrou o F ilho de D eu s na terra, constituiu-se
um a nova fam ília, nunca v ista a té então: a fa m ília das vir­
gens, para que E le, que no C éu era adorado pelos anjos, o
fo sse tam bém p o r estes anjos da terra...
E is a ra zã o p o r que esta virtu d e faz o hom em iã o am ável
e q u erido dos a n jo s ...; po rq u e os anjos, com o todos o s seres,
am am os seus sem elhantes... e assim n ã o podem d e ix a r de
am ar aos que têm carne angélica, e que vivem com o anjos
n a p ró p ria n atu re za co rp ó re a e m aterial. — P o r e sta mesma
razão, a beleza d esta flor é p eren e e e te rn a ..., com o é a dos
a n jo s ..., pois não se funda em razões carn a is e m ateriais
que são corruptíveis. C arece de principio de c o rru p ç ã o ...;
e assim , quando tudo n a te rra se desfaz e se d e stró i..., se
e strag a com o tem po, que tudo consom e..., a carn e virginal
ain d a que p areça que com a m orte tam bém se desfaz e
corrom pe, c onserva com o em gérm en a in co rru p ç ão m oral
e físic a ... e um a espécie de direito à im ortalidade. — E sta é a
form osíssim a e puríssim a g eração das alm as v irg en s...
P a re ce que é com o um a n o v a geração, distinta d a s outras,
que c onserva ditosam ente, n o m undo, a lem brança daquele
e stad o de inocência e de pureza, em que foi criado o homem
p o r D eus, no P araíso .
3.“ A flo r d e M aria. — E sta virtu d e é, p o r an to n o ­
m ásia, a flor predilecia da nossa querida M ã e ..., de tal sorte,
que é esta virtu d e a que faz denom inar a V ir g e m — a V ir­
gem Santíssim a. — F ix a -te bem neste nom e e n a força que
tem em desig n ar assim a M a ria ... N ã o a cham am os <ta obe­
d ie n te ..., a hum ilde», etc., ain d a que fosse tudo isso e modelo
aca b ad o de todas as v irtu d e s ...; m as cham a-se-lhe «a V ir­
gem» e parece que com cham á-la deste m odo já está tudo dito.
E , é claro, E la não quer o u tro titulo senão e ste ..., e teria
deixado o o u tro mais gran d io so de M ã e de D eus se fosse
A ca<t idade 429

incom patível com a sua virg in d ad e. — N em n a s tendas dos


P a tria rc a s, nem no seio d o p o v o de D eus, se conhecia esta
v irtu d e ... A e sp eran ça de -gerar o M essias, a fa sta v a a todas
as filhas de Israel de a p rec ia r a v irg in d a d e ... M a ria não
encontra nem um só m odelo deste género nos livros sagrados,
e é que D eus queria que o m odelo fosse E la ... e assim , com
a sua sublim e ab negação, renuncia à possibilidade de ser
M ãe de Deus, com o acto de seguir a insp iração divina que
a inclina à v id a virginal. — Q u e r dizer que em certo m odo
renuncia ao p ró p rio D eus p a ra ser m ais a g rad á v el a D e u s...
Q u e é de e stran h a r, p o rtan to , que p e ran te este exem plo
sublime, m ilhares de alm as tenham querido alistar-se neste
exército branco, em que M a ria ergue ra d ia n te de am or a
bandeira puríssim a d a v irg in d ad e! — Só estas alm as virg in ais
são e serão eternam ente as form osas açucenas que, sem
d o b ra ra a sua haste, e sem pre direitas p a ra o C éu. encantam
a D e u s... e O obrigam a com unicar-se com elas de um m odo
mais ín tim o ..., m ais a m o ro so ..., m ais divino.
N ã o é possível am a r M a ria sem in u n d ar a gente o co ra ­
ção dos resplendores e arom as d a S u a castíssim a v irgindade.
— E la é o princípio da v irg in d a d e ... O o lh ar de M a ria ...,
o tra to e c o n v ersa ç ão com M aria, gera v irg in d a d e ..., irra-
d ia-a p o r toda a p a rte ..., com o por toda a p a rte o lírio
d erram a a su a fra g ã n c ia ... P o rq u e não pões na v irgindade
o teu id e a l..., o de M a ria ..., o de D e u s... P ois bem, o ideal
vale m ais que a v id a. — P o r ele tudo deves sa c rific a r...
tudo encam inhar e d irig ir p a ra m a n te r..., c o n se rv a r..., defen­
der esse ideal tão grande, que lev as em v a so de b arro e
que se pode q u e b ra r...
30. A Castidade

f.° O lírio entre espinhos. — A ssim se cham a esta v ir­


tude, e com ra zã o pois só entre os espinhos d a m ortificação,
que a guardam e defendem , pode crescer e desabrochar.
—• N ã o esqueças que dissem os que era um a flo r delicadís­
sim a e m uito m im o sa ...; qualquer peq u en a coisa a pode
fazer m u rc h a r..., que h á inim igos em to d a a p a rte dispostos
a tra v a r b atalh a, p a ra nos fa ze r c a ir ...; que donde m enos
talv e z pensam os nos e sp reita o la d rã o disposto a a rre b a ta r-
-n o s essa jóia, logo que p ossa e a p ro v e ita r q u a lq u e r des­
c u id o ..., enfim, que o cofre que a g u a rd a é de b arro
qu eb rad iço e um só golpe pode a tira r com ela e quebrá-la.
P o r isso, a c astidade requer um sacrifício c o n sta n te ...;
em m uitos casos equivale a um verd ad eiro m a rtírio ... pelo
esforço constante de sacrifício que exige. — S a n to Inácio
M á rtir diz: Q'ue se d evem apreciar e estim ar as almas
virgens com o ixerdadciros sacerdotes de C risto, que no seu
coração e no seu corpo, oferecem sem cessar verdadeiros
holocaustos ao Senhor. — Só Jesus C risto p o d ia fa ze r esta
m a ra v ilh a ...: que a fraqueza hum ana obtivesse este glorioso
triunfo do espírito sobre a carne. E sse triunfo é d ’E le ...
é pois glória sua, a c a s tid a d e ..., a p u re z a ..., a virgindade.
—■F o ra de C risto, fora da Igreja, n ã o se d á esta flor. —• P o r
isso, S a n to A tan ásio chegou a dizer que era a virgindade
A castidade 431

um a nota característica da verdadeira Ig re ja .... pois nela e


exclu siva m en te nela se d á este heroísm o.
M as precisam ente p o r ser um h e ro ísm o ..., um sa c ri­
fício c o n sta n te ..., um holocausto to ta l e p erfeito do nosso
corpo e d a n ossa alm a ao Senhor, p o r isso m esm o requer
e sfo rço ..., c u id a d o ..., v ig ilâ n c ia ..., enfim , a p rá tic a e exe­
cução dos m eios indispensáveis p a ra triu n fa r n e sta luta,
—'N is to tam bém a Santíssim a V irg em é m odelo... N em um
só descuido com o já se indicou; p ortou-se sem pre n a gu ard a
d esta virtu d e com o se tivesse m ed o ..., com o se tivesse estado
cercada de g ran d es tentações e de o casiões p e rig o s a s ...; é
que am ou tan to esta virtude, que ju lg a v a n ã o fazer nunca
o b astan te p a ra c o n se rv a r a a lv u ra do lírio da castidade,
— O lha, pois, p a ra tu a M ã e ...; p erco rre estes m eios indis­
pensáveis e m edita-os d e v a g a r um p o r um.
2.° M e io s n egativos. — São os que podem os cham ar
p r e v e n tiv o s ...— m ais v a le p re v en ir que re m e d ia r!— M as
sobretudo em m atéria de castidade, com o isto se to rn a um a
realidade p a lp á v e l!— H á quedas tã o m ortais que parecem
irrem ediáveis sem um a difícil re p ara çã o :
a) O que prim eiro tem os que fazer, é fu g ir..., e v ita r
as o c a s iõ e s...; esta fuga não é v e rg o n h o sa ..., n ã o é de
cobardes, senão de pru d en tes e avisados. — Seria im prudência
e lou cu ra ch eg ar-se a o fogo e n ã o q uerer q u eim ar-se..., lou­
cura inexplicável se ria p a ssa r ju n to dum leão que dorm e e
d e sp e rtá -lo ... Q uem sabe o que sucederia depois?— O E sp í­
rito S an to a d v erte-o com toda a clareza; A m a r o perigo é
perecer n ele... S. Jerónim o exclam a: Q u e m jam ais dorm iu
tranquilo ju n to d e ;u m a víb o ra l ... L em bra-te que não é a
saúde, senão a enferm idade a que se c o n ta g ia ... P o rta n to ,
tem os que fugir do c o n tá g io ..., tem os que desconfiar de
tudo, m uito prudentem ente.
b) N ã o tran sig ir com n a d a que se relacione com esta
m até ria ... N ã o andes à b eira do precipício, nem vendo até
432 A castidade

aonde podes ch eg ar e a té aonde n ã o ..., que é m atéria


re sv ala d iç a e, um a vez no resvaladoiro, dificilm ente nos
podem os de te r e dizer: «daqui não passo». — T o d a s as
g randes quedas vieram p o r pequenas e sc o rre g a d elas..., por
descuidos in sig n ific a n te s.— A té os antig o s p a g ã o s diziam :
principiis o b sta ... D á pois m uita im portância aos princípios...,
n ã o tran sija s com um princípio ainda que p a reç a pequeno,
d e enferm idade...
c) Pode fig u rar entre estes m eios negativos, a m orti­
ficação e penitência, pois o seu fim não é tan to o castigar
e re p a ra r o dano com etido, com o o de preveni-lo, tira n d o
as forças à carne e a cs sentidos e assim fazer com que a
te n ta ç ã o não encontre terren o ap to p a ra o seu d esenvolvi­
m en to ... S. C arlos B orrom eu, diz: Sem a guarda d o s sentidos
e as m ecerações corporais, ninguém conseguirá o dom da
castidade. — T o d o s os san to s fizeram como S . P a u lo , cas­
tig a n d o o seu corpo dura,m ente e subm etendo, com o S. Jeró-
nim o, ã força de jejuns, a sua carne p a ra que se não
rebelasse. —*A m elhor g a ra n tia e se g u ran ç a d a castidade é
a m o rtifica çã o ... C om o alguém disse, é a m a rg a como o
quinino, m as fortalece e tonifica como ele. — M o rtificar é
m atar, n ã o os princípios v ita is que nos sustém , m as cs
gérm ens de enferm idade e d e m orte. — A m a a m ortificação,
que é m ãe de pureza.
3.“ M e io s p o sitiv o s. — a ) A oração é, sem dúvida,
o prim eiro e p rin c ip a l... P o r isso Jesus C risto tanto insistiu
nela p a ra que não caíssem os em, tentação. — A o ra ç ã o põe-
-nos em contacto com D eus, todo p u re z a ...; aproxim a-nos
das coisas do C éu e afasta-n o s d a te rra ... A lém disso,
a lcança-nos de D eus os auxílios necessários p a ra com bater e
p a ra triu n fa r. — A o ra çã o é necessária p a ra tu d o ..., p a ra
to d a a espécie de v irtu d e s..., p a ra im p e trar to d o o género
de g raças, m as m uito m ais indispensáveis é p a ra esta virtude.
D iz Jesus C risto no E v an g e lh o : H á alguns géneros d e tenta­
çõ es quie só com a oração e o jejum se podem v en cer...
A castidade 433

b ) O s S a n to s S a c ra m e n to s... A P e n itê n c ia p a ra la v a r-
-nos e p u rific ar-n o s..., é o S acram ento d a lim p id ez..., d a
p u re z a ; e m ais ainda, se a este S acram ento se lhe ju n ta a
C o m u n h ão ... C om unhão, isto é, união comum , um a m esm a
v id a com C ris to ... Q u e adm ira, pois, que a C om unhão seja
fonte de c astidade e de v irg in d a d e !— O Im ac u la d o ..., o F ilho
d a Im ac u la d a ..., o que se a p asce n ta entre os lirios e açu ce­
n a s ..., o E sp o so das alm as virgens, feito p ã o bran co p a ra
g e ra r p ureza e v irg in d a d e! — É im possível com ungar bem,
e não se r p u ro ..., c a s to ..., v irg em ...
c ) E x e rc ita r-se n o u tras virtudes, com o a hum ildade,
tã o unida à castid ad e, que, segundo S . F ra n c isco de Sales,
não é {ácll ser c asto sem se r hum ilde; e, segundo dizem o utros
santos, D eu s às v ezes castiga ao soberbo, d eixando-o cair
na hum ilhante im p u reza ... E tam bém é m uito im p o rtan te
o trabalho, pois no cam po d a ociosidade é onde se d á m elhor
o im pureza,
d ) F inalm ente, a v e rd ad e ira dev o ção à Santíssim a
V irg e m ..., m as devoção de im itaç ão ... V ê com o E la a p re ­
c ia v a a sua p u re z a ..., com o cu id a v a dela com a v id a re tira d a
c silenciosa, sem ap are ce r em público se n ã o q u ando a c ari­
dade ou o serviço de D eus o e x ig ia m ...; com o a c o n serv av a
com ia s.ua v id a de trab alh o , evitan d o to d a a ociosidade e
su stentando-se com o tra b a lh o d a s su as m ã o s..., com a
m ortificação dos seus sentidos, da su a língua, dos seus
olhos, dos seus ouvidos, recolhendo-os com o m aior recato
<■ m o d éstia ..., com a su a o ra ç ã o co n tín u a, de tal m odo que
jam ais p erd eu a presença de D e u s... nem deixou de m ergu-
ihar-sc a cada in stan te n a fonte d iv in a d a pureza. — C o n ­
tem p la-A ..., exam ina-A m uito d e v a g a r a té sab er de c o r tudo
o que fazia pela su a p u re za v irg in a l.— In v o c a -A ..., cha-
iuando-A com freq u ê n c ia ..., de m odo p a rticu la r n a s o c a ­
siões..., nos p e rig o s ..., vai ter com E la in stintivam ente e
diz-Lhe com o coração, mil vezes: «T ende com paixão de
mim, não m e abandoneis, m inha M ã e » ...
29
31. A Modéstia

l.° V irtu d e encantadora.-— A m odéstia tem, tal p a re n ­


tesco e relação com a castidade, que faz p a rte d e la ... e, p o r
isso, se assem elha a ela na b e leza..., na form osura e encantos
divinos que a cercam . — A m odéstia como a p u reza é uma.
virtu d e ag radabilíssim a aos clhos de D eus e tam bém aos
olhos dos hom ens. — V ê com o se to rn a a borrecida a to d o s
um a pessoa a tre v id a ..., d e se n v o lta..., d e sc a ra d a ... e sem,
verg o n h a. ■—• C o m p ara-a com um a o u tra de a p arê n cia tím ida
e talvez a c a n h a d a ..., ,mas envolvida nesse véu celestial de
m o d éstia ..., de sim plicidade..., de p u d o r..., de ru b o r e - d e
sim pática vergonha.
É o com plem ento necessário e indispensável de um a
alm a p u ra e, m ais ainda, de um a alm a virgem,. — S. F ra n ­
cisco de Sales diz que em todos os nossos actos d e ve m o s
ser sem pre m uito m odestos, p o is estam os sem pre na presença
de D eu s e à vista dos seus virmos. V ê bem com o esta virtu d e
recebe do C éu mesmo todo o seu encanto, dignidade e atrac-
tiv a beleza. — E assim com preenderás a razão p o r que a
S antíssim a V irgem tan to am av a esta virtude. — A reverência
que sentia p a ra com a m ajestade de D eus, a quem v ia e
tinha presente n a p esso a de Seu F ilh o ..., o am or santo, vene­
ra ç ã o e respeito p ro fundo que sentia p a ra com a d iv in d ad e...,
a sua perfeitíssim a e contínua presença e c o n v ersa ç ão com.
D eus, foram a causa de que E la aparecesse sem pre com »
A m o d é s tia 435

a V irgem m odestíssim a... M a ria ! que m odelo de e n ca n ta ­


d o ra m o d é stia !— N o seu se m b lan te..., no seu o lh a r..., nos
seus m o d o s..., no seu porte, ap arecia um a sa n ta g rav id ad e e
seriedade aco m p an h ad a de um a inexplicável suavidade e de
um a doçura celestial e divina. — A ssim e ra a sua m o d éstia ...
g ra v e e sim pática ao m esm o tem p o ... um a m odéstia rig o ro sa
que não adm ite o m ais pequeno descuido, m as sem pre
n a tu ra l e sim ples... sem violência nem rid ic u la ria s..., a fáv e l
e a tra en te sem levian d ad es nem g ra c e jo s ..., se.m soberba
nem desconfiança. — T o d o s os que a viam ficavam absortos
naquela m odéstia e re ca io que n ad a tinha de taciturno nem
dé m elancólico. —• Jam ais se viu n 'E la a m ais pequenina
inconveniência nem a m ínim a in co rre cç ão ... Q u e beleza tão
harm oniosa em todo o seu ser, p ro d u zid a por esta tão en can ­
tad o ra m o d éstia !
2.° V irtu d e protectora. — A m odéstia é a virtude p ro -
tecto ra da c a stid a d e ..., é a sua m elhor d e fen so ra ..., é o
b a lu a rte n a tu ra l d a p u reza. — N ã o é possível ter um a alm a
pura, sem que todos o s sentidos estejam refread o s e re g u ­
lados pela m odéstia. — A v ista, o ouvido, a im aginação, sã o
o u tras ta n ta s p o rtas que se deixam a b e rta s ... o u se abrem
delibcradam ente a to d a s as im pressões que a elas ch eg a m ...,
facilm ente e n tra rá p o r elas o pecad o e a m orte deriv ad o s da
concupiscência.
Além disso a m odéstia isola-nos e se p a ra -n o s d a v id a
do m undo e facilita a v id a de fervor, evitan d o a dissipação
que produz o derram am ento dos sentidos, c onvertendo a
«Ima com o que num tem plo onde D eus h a b ita e com quem
tem gran d e fa m ilia rid a d e .— A ssim am av a M a ria a su a
m odéstia, com o a sa lv a g u a rd a d o seu v irg in a l c o ra ç ã o ...,
como meio m elhor de desprender-se de todos os a tra ctiv o s
ex te rio re s..., com o o m odo m ais p rá tico de viver toda e só
p a ra D eus. — E com o m anifestação d esta sua p rofunda
m odéstia, contem pla co.m ferv o r aquela v e rg o n h a ..., aquele
ru b o r... m ais que angelical, que circunda o seu sem blante.
436 A m odéstia

C ontem pla-A diante d o A rcan jo n a sua A nunciação, su r­


p reen d id a pela v ista inesperada daquele e n ca n ta d o r m an­
c e b o ..., e ainda que M a ria sabe que é um A n jo ... c ainda
que n a d a possa te m e r..., contudo, ru b o riza -se ..., tinge-se de
carm im o seu ro sto ..., p e rtu rb a -se ... e p resta, com essa p e r­
tu rb aç ão um a hom enagem à sua im aculada p u re za e à sua
v irg in a l m odéstia. — A h ! com o é sim pática esta verg o n h a
que assim sobe a o rosto, de quem possui u,m c o ração ino­
cente, d e lic ad o ..., p u ro e m o d e s to !... V ê aquele jovem que
se cham ou E stan isla u K ostka, ru b o riza r-se ..., envergonhar-se
d e tal m odo, a o o u v ir um a p a la v ra in c o n v e n ien te..., um a
e x p ressão grosseira ou m also a n te..., a pon to d o seu coração
fazer subir ao ro sto todo o seu sa n g u e ..., fic a r sem vida
e o air desm aiado. — D e quem a prendeu ele esta d elicad eza...,
esta esquisita sensibilidade senão de sua M ã e ? ... d ’A quela
a quem não po d ia d eix ar de am a r pois que e ra sua M ãe?
— A m o d éstia ..., a v e rg o n h a ..., o rubor, é o distintivo do
h o m e m ...— E n tre o s anim ais não se d á is to ..., nem mesmo
en tre os hom ens que c h eg a ram a esse estado de re b aix a ­
m ento irracio n al p ró p rio do pecado anim al e sensual. —
A m odéstia e a v e rg o n h a são a b a rre ira que se lev a n ta entre
o hom em e o a n im a l...: e p o r isso m esm o a verg o n h a, na
presen ça do anim al, rub o riza as faces com o que se cham ou
a p ú rp u ra d a castidade, que é o rubor. — P ede a tua M ãe
e sta s a n ta v e rg o n h a ..., este e n ca n ta d o r ru b o r que dem onstra
a o m undo, a tua p a ix ã o pela p u re z a ..., pela c astid ad e ...,
pela m odéstia que a defende.
3.° V irtu d e edificante. — Q u ã o form osa e edificante
a p arece a todos os olhos a m o d é s tia !... É qualquer coisa que
a r ra s ta ..., que se im p õ e..., que se p ega aos o u tro s... — T o d o s
o s p ecad o s feitos n a presen ça do próxim o, podem se rv ir de
escân d alo e de m au exem p lo ..., m as entre todos, o pecado
im puro é o que m ais serve p a ra esc an d a liz ar e o que com
m ais ra z ã o tem este nom e de escândalo. D o mesmo modo.
to d a s as virtudes podem se rv ir de edificação a o próxim o.
A m odéstia 437

m as n m odéstia leva a p a lm a ... Q u e pode h a v e r de m aior


edificação que a m odéstia no fa la r..., no rir..., no a n d a r...
em tcd o o porte de um a alm a que assim se nos m ostra no
e x te rio r? —-N in g u é m olhou p a ra M a ria que n ã o se edificasse
e se n ã o convencesse de que era a m odéstia v irg in a l a que
a rra s ta v a a quantos a contem plavam , a a m á -lA ... e e x citav a
em todos um a grande e irresistível afeição à v irtu d e e
ã santidade.
C onta-se de S. F ran cisco de A ssis, que p re g a v a som ente
com a sua presença hum ilde e m odesta e que m ovia com
o seu recolhim ento e g rav id ad e à devoção, a o lo u v o r de
D e u s... Q u e não direm os da S antíssim a V irg em ? Q u e cons­
tan te e eficaz a sua p re g a ç ã o !... Seria essa um a das o b ras
de zelo apostólico a fa v o r das a lm a s... O seu exem plo era,
sem dúvida, a su a v e e delicada e p o r vezes irresistível
m aneira de difundir e até de im por aos outros, com postura e
recato nas p a la v ra s .... m odos e atitudes, etc. Q uem se a tre ­
veria, em su a presença, a pro ced er de outro m odo? P o r que
não A im itas n isto ?— P o r que n ã o te im pões tam bém p a ra
que difundas em v o lta de ti o am or à p u reza e ã m o d éstia...,
e p a ra que todos saibam que na tu a p resença não se pode
p ro c ed e r..., fa la r... ou apresentar-se de m odo in correcto e
inconveniente?
32. A Modéstia

l.° Inferior. — E ra geral, a m odéstia é a virtu d e que


reg u la tedos os actos externos, dando-lhe a d evida com pos­
tu ra e d e co ro .i., ap resen tan d o -se assim aos olhares do p ró ­
xim o, com o qualquer coisa digna, nobre e form osa. — M as
a m odéstia exterior necessariam ente bá-de p ro ced er da in te ­
rior, que consiste em m o d erar e dirigir c s m ovim entos desor­
d en ad o s d a alm a seg u n d o a divina v ontade. — A m odéstia
e x te rio r pode-se fingir e será então um rep u g n an te acto de
h ip o crisia ... A m odéstia in te rio r é a única que pode d a r vida
à m odéstia exterior. — N ã o deves, p o rtan to , p ro c u ra r c o n ­
seg u ir um a aparência de m o d éstia ..., um a m odéstia postiça
e m entirosa, com po rte e m aneiras externas que pareçam
m uito m odestas, deixando depois que o teu c oração seja
v ítim a d a s baixas inclinações d a concupiscência.
Q u a n d o a v e rd a d e ira m odéstia existe, é tal a união que
se dá entre a e xterior e a interior, que um a n ã o a n d a sem a
o u tra , as duas ajudam -se iinütuamerrte, de so rte que a c o m ­
p o stu ra e xterior deve pro ced er sem pre dum interior p erfeita­
m ente com posto e o rd e n a d o ... e a interior e n co n trará a sua
m elh o r defesa e sustentáculo na exterior. — S ão F rancisco
de Sales explica isto com a seguinte co m p a raç ã o : C o m o o
fo g o p ro d u z a c in za ... e a cinza se ro e adm iravelm ente para
m anter e conservar o fo g o ..., assim sucede com estas duas
A m odéstia 4 3 9

m odéstias, que a interior p ro d u z a exterior, e esta m antém e


con serva a interior de onde brotou.
• E sta m odéstia interior, é de duas classes: um a que refreia
os m ovim entos d a concupiscência e c s actos internos do
en ten d im en to ..., d a im aginação e da v ontade, que nos levam
a o pecado da im p u re za ..., e a o u tra m odéstia é a que m odera
os m ovim entos d a alm a, que tê.m. relação com a soberba e
pelas suas v irtu d e s..., pela su a dignidade, podiam dar-se
que n ã o querem os ferir a sua m o d éstia... e o u tras vezes
adm iram os a m odéstia de pessoas que pelos seus m érito s...,
p elas suas v irtu d e s.... pela sua dignidade, podiam dar-se
m ais im portância. — E s ta m odéstia, com o se vê, p ràticam ente
reduz-se ao exercício da v erd ad e ira hum ildade; por isso a
alm a hum ilde h á-de ser necessariam ente m odesta in terio r e
exteriorm ente.
Q u a n to a esta m odéstia, é evidente que ninguém pôde
jam ais com parar-se com a Santíssim a Virgem .; ninguém
houve com m ais m erecim entos, virtudes, santidade, dignidade
e gran d ezas d iv in a s... Q uem foi, a p e sa r disso, m ais sim ­
ples'..., a fáv e l-.., c a rita tiv a ..., pobre e hum ilde do que E la ?
—, E p o rtan to , quem m ais m odesta q u a n to ao desprezo que
fazia d a im portância d a sua pessoa e d a sua p ró p ria exce­
lência? ...
E q u a n to à m odéstia o p o sta à concupiscência, onde
en co n trar um a ordem m ais co m p leta..., um a subm issão m ais
perfeita de todos o s seus pensam entos, sentim entos e afei­
ções à re g ra d a ra zã o e desta à v o n tad e de D e u s? ...
2.° E xterio r. — V ejam os, porém , m ais em concreto esta
m odéstia inferior reflectida em todos o s actos exteriores do
co rp o e principalm ente nos seguintes:
N a s palavras. — Im agina com o seriam as da Santíssim a
V irgem : que e sta v a persu ad id a se r a últim a d a s escrav as dó
S e n h o r..., p a la v ra s de edificação e de e n ca n ta d o ra m odés­
tia ..., ao considerar, cheia de gozo, os im ensos benefícios de
que o Senhor a cu m u la ra ; a E le dirige o seu agradecim ento
HO A m odéstia

e os seus lo u v o res... e a d m irar-se-á que o T o d o P o d ero so


tenha p o sto os seus olhos na m iséria da sua e sc ra v a ... E sta v a
sim plesm ente e firm em ente persu ad id a d a falta d e m ereci­
m entos d a sua p a rte e p o r isso quão longe e sta v a em suas
p a la v ras, de a trib u ir a si coisa a lg u m a !— A p re n d e d 'E la
e sta m odéstia no fa la r..., ta n to no tom da voz, n ã o querendo
im por-te com gritos, nem com p a la v ras n e rv o sas e e x cita­
d a s ..., com o na sim plicidade e carid ad e das tuas expressões.
À im itação de M aria, e v ita as p a la v ra s d u ra s ..., b ru s­
c a s ..., m alsoantes. V ê com o a linguagem, d a tu a M ã e ê
tranquila, afável, discreta, hu m ild e..., to rn an d o -se sim pática
e a tra en te pela do çu ra de v o z ..., pela b o n d a d e ..., p u re z a ...,
c a rid a d e e até alegria sa n ta das su as p a la v ras. — T e m cui­
d ado, em especial, com as disputas e a lte rc a ç õ e s; ain d a que
ten h as razão, deves m o d erar o teu juízo p ró p rio ..., cedendo,
sem ser pertin az nem ter cabeça d u r a ...; é m elh o r ceder e
c a la r com m odéstia, que sa ir triunfante com teim osia e
soberba.
N ã o é com patível com a soberba a sã a le g ria que em
anedotas, g raças, passatem pos e brin cad eiras se pode m a n i­
fe sta r... M as, ah! com o é fácil em tudo isto, p a ssa r os
lim ites d a correcção e da m odéstia!
3.'* N o vestido e na habitação. — A p obreza da casa
de N a za ré , p rópria dum a o p e rária, faz que nela tu d o seja
hum ilde e m odesto em últim o g ra u ... A sim plicidade e
m odéstia do seu vestido, a v alia pela extrem a necessidade
d e Belém e v e rás com o nem em casa de M aria, nem no
e n x o v al e vestido, e n co n trará s coisa algum a que indique
lu x o ..., afectação d a sua p e sso a ..., com odidade de algum
género.
N a s suas viagens n ã o u sará carruagens, nem mesmo
a s m ais m odestas de e n tã o ... O E v an g e lh o n a d a m ais diz
se n ã o que foi, p o r exem plo, à Judeia, com g ra n d e p re ssa ....
pois a estim ulava a c a rid a d e ... E is toda a su a p re p a ra ç ã o
e e q u ip a g em ...: um a pobre trouxa de ro u p a e m uito am or de
A m odéstia 441

c arid ad e p a ra com D eus e p a ra com o pró x im o ... Q u e


exem plo de sim plicidade e m o d é s tia !... N ã o é m odéstia a
falta de a sse io ..., o d e sa rra n jo no v e s tu á rio ...; a o co n trário
pode h a v er m odéstia em meio de um a sóbria elegância, con­
ta n to que e sta seja conform e o teu e sta d o ..., a tu a c o n d iç ão ...
e as circu nstâncias que te ro d e ia m ...; m as nunca se rá com ­
p a tív e l com o lu x o ..., com a v aid ad e dos v e stid o s... e m enos
ain d a com qualq u er defeito p o r pequeno que seja, em m atéria
de honestidade.
T em m uito cuidado neste últim o ponto e n ã o esqueças,
que na igreja e n a ru a ..., em público e em p a rticu la r, deves
vestir sem pre m odestam ente. — É intolerável o permrtir-.se,
ao e star cm casa, m odos de v e stir im pudicos ou pelo menos
m uito liv re s ...; não há pretexto nem ra z ã o que possa
a u to riza r isto ... A m odéstia deve acom panhar-te cm todos
os instantes d a tua vida.
4." N o s m aneiras. — Isto é, em todos os teus acios e x te ­
riores que realizas p eran te os o u tro s... M odéstia n o sem blante
e p articularm ente no.s teus olhos, n ã o só p a ra e v ita r os o lh a ­
res pecam in o so s.... m as tam bém p a ra e v ita r a excessiva c u rio ­
sidade de quem tudo quer ver e o b se rv a r... M odéstia nas
posições do a n d a r..., a o sen tar-te, n ã o b uscando prccisam cnte
a posição m ais cóm oda, senão a m ais c o n v en ien te... M odéstia
em todos os teus m ovim entos, e v ita n d o tudo o que seja
leviandade e d e se n v o ltu ra... e m uitíssim o m ais tudo o que
n ã o seja decoroso t digno.
A costum a-te a esta m odéstia, ainda estando só, p a ra que
assim naturalm ente a pratiques d ian te dos o u tr o s .— Ê m uito
conhecido o caso de S. F rancisco de Sales, que o b serv ad o
quando se e n co n trav a só no seu qu arto , g u a rd a v a os m ais
pequenos p receitos d a com postura e d a m odéstia. — P ro c e d ia
sem pre como se o vissem o s A n jo s d o C éu e na p resença
de D eus.
N o ta , de m edo especial, tudo isto na Santíssim a V irg em
442 A modéstia

e v e rás o conjunto adm irável de todos os seus actos exe­


c u tad o s com aquela n a tu ra lid a d e ..., sim plicidade..., fra n ­
q u e z a ... e ao mesmo tem po d e lic ad e za ..., h o n e stid a d e... e
circunspecção próprios d a s a n ta m odéstia. — E x am in a-té um
pouco nesta m atéria, e p e rg u n ta a ti mesma com o g u a rd as
a m odéstia interior do teu c o ra ç ã o ... e a e xterior do teu
co rp o e de todas a s tuas m aneiras.
33. M ortificação

1.® M o rtificação externa. — Ê a cham ada penitência


•corporal e reduz-se ao castig o do nosso corpo e à m ortifi­
c a ç ã o dos sentidos. — É esta um a virtu d e tão infiltrada em
todas as o u tras, que não é fácil se p a rá -la da m aior p a rte
delas.
O exercício da p o b re z a ..., d a h u m ild ad e..., d a castidade
e d a .modéstia, etc., n ã o é um exercício constante de m orti­
ficação interior e de penitência exterior? — C ontudo, convém
estudá-la se p arad am en te , pela sua im portância na vida da
nossa alm a.
M ais do que im portante, é com pletam ente necessário,
tanto p a ra p re serv a r-n o s dc pecado, como p a ra satisfazer
pelos já com etidos... e p a ra o bter do S enhor abundantíssim as
g ra ç a s... Q u a n ta s luzes e inspirações especiais..., q u an ta
paz e a le g ria d a a lm a ..., q u an to am or de D e u s..., não tem
conseguido a penitência das alm as s a n ta s ! — N ã o d uvides;
sem a penitência, não teriam chegado estas alm as às altu ras
d o am or e san tid ad e a que cheg aram !... — R ecorda a S. P a u lo
c astigando o seu corpo e regozijando-se de lev a r nele os
sinais de p e n itê n cia..., e a um S. João d a C ruz, que dizia:
A in d a qte2 visse alguém a fazer m ilagres, se nãu fosse p e n i­
tente, não acreditaria na sua santidade, e do mesmo m odo
falam todos os santos. V ê, porém , antes de m ais n ad a, o
exem plo de Jesus e de M a r i a . —'Q u is Jesus que o seu P re -
•H 4 M ortificaçôo

cu rso r de assinalasse nesta virtude, e assim , se foi a o deserto


a jeju a r e a com er m anjares silvestres, vestido de peles de
cam elo ... que não eram senão um m uito á sp ero c ilício ..., e
isto que S. João B a p tista fe ra santificado antes de nascer,
e não tinha que fazer p e n itê n cia... M enos tinham que fazê-la
Jesus e M a ria e, contudo, quão ásp e ra não foi a que fizeram
n a su a d u ra c au stera vida de N a z a ré ..., de Belém, do
E g ip to ..., do d e se rto ..., da C r u z ! ..., T a n to m ais d u ra e dolo­
rosa fei esta penitência, q u an to o organism o de Jesus e o de
sua M ãe eram m ais delicados e m ais sensíveis, p o rtan to , a
todo o sofrim ento e dor. — A nalisa um pouco m ais e ap ro ­
funda estas p enitências e v e rás o seguinte:
2.“ P enitências necessárias ou im p o sta s... a s que D eus
e n v ia v a à Santíssim a V irgem e que E la, sem p ro c u rá -las,
re ce b ia e aceitav a am orosissim am ente, isto é, n ã o só resigna-
dam ente, m as gostosa e aleg rem en te... as infinitas incom odi­
dades d aquelas viagens, nas circunstâncias em que a s, tinha
d e fa z e r ...: a escassez de meios p a ra resolver as dificulda­
d e s ...: as enorm es incom odidades das h o sp e d a ria s..., dos
c am in h o s..., c tc ..., as inclem ências contínuas do tem po,
a b rasan d o -se às vezes com, o sol que n aquelas regiões ta n to
q u e im a ..., o u tras vezes, p assan d o frios e incom odidades...
e sem pre exposta a mil perig o s e sobressaltos, que aum enta­
vam sem cessar a du reza d aq u ela m ortificação.
C ontudo, p e n etra no se u c o raç ão e v erás com o se rego­
z ija v a E la nestes sofrim entos e m ortificações que lbe vinham
das m ãos do Senhor. — E tu, como levas e a ceitas as peni­
tências necessárias que D eus te dá, e que qu eiras o u .não
hás-de so fre r? ... as incom odidades e tra b a lh o s ..., as intem ­
péries do tem p o ..., o sofrim ento de um a doença, talvez
m uito lo n g a ..., c ró n ic a..., d o lo ro sa ..., o cansaço e fa d ig a de
um a v iag e m ..., d e um a coisa d e sag rad áv el que te acontece
c o n tra a tua v o n tad e ? — C ontem pla en tão a S antíssim a V ir­
gem e p e rg u n ta a ti m esm o com o aceitaria E la e ssas c o n tra ­
riedades.
Mortificação 445

P ensa, além disso, que estas sã o as m elhores penitên­


cias, pois nelas n ã o se pode p ecar por indiscrição ou im pru­
d ê n c ia ..., nem p o r o ste n ta çã o o u esp írito de v a id a d e ..., nem,
enfim , p o r desejo de sin g u lariz ar-te e fa ze r coisas e x tra o rd i­
n á ria s ... N ã o duvides, de que com estas penitencias, a g ra ­
d a rá s m uito ao S en h o r e tira rá s um fru to im enso p a ra a tua
alm a, se as. fizeres com v erd ad eiro e sp irito de m ortificação.
3.° P enitôncia s voluntárias. — N ã o h á dúv id a que a
â n sia de sofrer n a Santíssim a V irgem à im itação de Seu
Filho, não pôde co n ten tar-se com a ce ita r aquilo que D eus
lhe en v iav a, m as E la mesma se im punha m uito frequentem ente
o u tra s penitências m u ito ásp e ra s e d u ra s ... A quela o ra çã o
p ro lo n g ad a tan ta s vezes d u ran te a noite, à custa do descanso
c do sono que necessitav a depois do trab a lh o incessante do
d i a l .. . Q u a n ta s noites inteiras pa ssa d as n a o ra ç ã o !... A quela
a titu d e devotíssim a, de jo elh o s..., p ro s tra d a ..., e assim h o ras
se g u id a s... A queles jeju n s tão repetidos e tão rigorosos a
p ã o e á g u a ..., e p o r vezes nem isto ... Pois, n ã o im itaria
E la o jejum no deserto de Seu Filho? ... C om o p assaria E la
aqueles q u a ren ta dias, v isto que n ã o ig n o rav a a penitência
que Jesus e stav a fazendo no d e se rto ? — E n sin a d a p o r este
exem plo, q u an tas v ezes a repetiria depois, e a ensinaria a
fazer aos prim eiros c ristã o s? — Se Ju d it__ E s te r..., etc., e
o u tra s sa n ta s m ulheres d o A ntigo T estam en to , se assinalaram
nas su as v ig ília s ..., je ju n s..., vestidos de saco e cilício ...,
que não faria a S antíssim a V irgem , pois que aquelas não
foram senão um a figura d E la? — A prende de tu a M ã e a
c a s tig a r o teu co rp o e a m ortificar a tu a carne v o lu n ta ria ­
m ente, já que v o luntariam ente tan ta s vezes p e c a ste ... D is­
tingue nisto v á ria s espécies de penitências que deves fazer:
■umas indispensáveis, são as que consistem em m ortificar os
sentidos e a tê-los refreados p a ra que não sejam p o rta s
d e te n ta ç ã o ...; num a p a la v ra, esta penitência consiste na
.abstenção de todas as coisas ilícitas c p roibidas pelas leis de
D eus e d a Ig reja o u que levem m ais ou m enos directam ente
446 M ortificação

a qu eb ran tá-las. Porém , deve parecer-te isto m uito pouco:


as o u tras penitências sã o de conselho, é verdade, m as m uito
úteis e fru tu o sa s: consistem tam bém em a b ster-te mesmo do
que é lícito e perm itido, m ortificando os teus sentidos nessas
coisas p a ra que quando chegue a o c a siã o ... ou a sugestão
diabólila, estejam bem dispostos p a ra a luta. — E deves ter
em conta, n esta m atéria, aquela adm irável re g ra de S a n to
Inácio, a o dizer: efuando nos abstem os do supérfluo, isso não
è penitência, senão tem perança...-, a verdadeira penitência
consiste em de ix a r ou em abster-te de algum a coisa con­
ven ien te e quanto m ais se p riva r disso, m aior e m elhor será
a d ita penitência.
F inalm ente, v ê com o além destas penitências que pode­
m os c h am ar negativas, que consistem em n e g ar-se a g e n te
algum gosto licito o u ilíc ito ..., h á o u tras p o sitiv a s ou afli­
tiv a s, que consistem e.m c astig a r directam ente o teu c o rp o
c ausando-lhe algum a d o r..., algum a pena se n sív e l... e são
as penitências exercitadas por todos os santos e alm as fer­
v o ro sas que querem , com isto, p ro v a r o seu g ra n d e am or
a C risto, inventando mil m eio s.... engenhando-se de m u d ís­
sim as m aneiras p a ra m ortificar-se.
N ã o esqueças que a penitência deve ser, em últim o
term o um a m anifestação de a m o r... de d e sa g ra v o c de re p a ­
ração ao S enhor pelos teus pecados e pelos a lh e io s ...; e
q u ando assim se faz a p enitência por p uro am or de D eus,
sem m istura de am or próprio, é quando tem todo o seu
m erecim ento e e fic ác ia... E n tã o p oderás d izer que im tas o
am or puríssim o e m ortiíicadíssim o de tua qu erid a M ãe, a
S an tíssim a V irgem .
34. M ortificação

f.° M ortifica çã o interna, das paixões. — É evidente que


e sta é a penitência m elhor e mais necessária. — T o d a a m or­
tificação co rp o ral que não fosse aco m p an h ad a da interior,
isto é, dos afectos o u paixões d a alm a, seria coisa in ú til...
D e que valeu a o fariseu do E v an g e lh o je ju a r duas vezes
por se m a n a ? ... E m com pensação o publicano que esm agava
o seu coração de d o r hum ilde e de contrição perfeita, to r­
nou-se santo. — N ã o ouviste dizer que vale mais um gram a
de m ortificação interior do que m uitos quilos de m ortificação
c o rp o ra l?... Q u a l seria então a m ortificação interior de M a ria
a ju lg a r pelo seu porte e xterior tão hum ilde e m ortificado? !
N ’E la n ã o h a v ia paixões a dom inar ...ne.m m ás inclina­
ções a a rra n c a r... nem afectos o u sentim entos a o rd e n a r...,
tudo e stav a o rd en ad o e dom inado por um a g ra ç a especialís­
sim a de D eus, que não consentiu em sua M ãe a rebeldia das
paixões, d e q u alq u er e sp é c ie ...; m as m esmo sem esta g raça
especialíssim a a alm a de M a ria seria o m odelo m ais acabado
da harm onia e da paz, p ró p rias d o c o raç ão o rdenado e
m ortificado.
N ã o tinha que m ortificar c m ortificou-se mais do que
ninguém ... A m ortificação rigorosa dos sentidos, que c o n ­
se rv av a hem reca ta d o s como se tam bém p a ra E la fossem p o r­
tas dc te n ta ç ã o ..., uniu-se a mais decidida m ortificação inte­
rio r... com o se tem esse que o seu c a rá c te r... que as suas
448 M ortificação

p aixões o u sen tim en to s... c u que o seu c o ração se desm an­


d a s s e m .—*O h V irgem penitente e m o rtific a d a !... Q u e v e r­
g o n h a o lh a r p a ra mim depois de o lh ar p a ra V ó s! V ó s sem
p aixões e tã o m ortificad a! e eu, um a floresta de paixões
p rofundam ente en raiza d a s e recebendo todas a força da
p a ix ã o dom inante d o teu c o ra ç ã o !... Q u e p e n a te r dirigido
m al a fo rça d a s m inhas p aixões!
O s S a n to s foram g randes pela direcção que deram às
su as p a ix õ e s... S. Inácio d e L o y o la transform a a sua p aixão
de v a n g ló ria na p a ix ã o d a glória de D e u s... S. F rancisco
X avier, am bicioso de glória, torna-se um am bicioso de
g a n h a r alm as e sonha com le v a r o m undo inteiro aos pés
<de Jesus C risto ... S a n ta T e re sa d o M enino Jesus dirige p a ra
D e u s a p a ix ã o m ais difícil de dirigir, a d o am or, de tal
m odo se e ntrega a o am or de D eus que rapidam ente sobe aos
a lta r e s .—-E x am in a as tu a s p a ix õ e s... a tua p a ix ã o dom i­
n a n te ... can aliza-a e d irig e -a ..., não a deixes s a ir dos eixos,
isto é, fo ra d a lei de D eus e não duvides d e conseguir,
assim a .santidade.-— À difícil a em presa e c u sto sa ... M as
um o lh a r à Santíssim a V irgem e p a ra d ia n te ! — E la te
e n sin a rá ... te an im ará e te d a rá as forças necessárias.
2." O génio. — É um a das paixões m ais frequentes
e um a d a s fontes m ais o rd in árias das n e ssa s q u ed as...
O p io r é que costum am os desculpar-nos dizendo: «Sou
a ssim » ... «é o^m eu feitio » ... «é o meu c a rá c te r» ... «que lhe
v am o s a fa z e r? » ... C om o se isso fosse m otivo p a ra darm os
lib erd ad e a o nosso génio e a o nosso c a rá c te r p a ra fazer
o que lhe apetece, com o costum a acontecer. — O dom inar o
c a rá c te r p arece-nos im possível e por isso é m uito o rdinário
o descuidar-se de o m ortificar. — A ntes d e m ais n a d a deves
conhecer-te bem e sa b e r quais são os sentim entos dom inantes
em ti... O teu génio é c o lé ric o ... fo rte ... .muito vivo? ...
ou, pelo contrário, é su a v e ... d o c e... m anso e a p a g a d o ? ...
fis de c ará cte r triste ... pouco so c iáv e l... ou e x p a n siv o ...
a le g re ... com unicativo? ... N a d a d isto é mau, nem im perfeito.
M ortificaç ão _________________________ 4 4 9

nem, po rtan to , p e c a m in o so ...; cada um tem o génio e o


feitio que D eus lhe d e u ... e é precisam ente com esse g é n io ...
cora esse c ará cte r que tens, que D eus quer que te sa n tifiq u e s...
e com esse e n ã o com o u tro podes c deves santificar-te.
O teu feitio o u génio bem d irig id o e bem canalizado,
se rá p a ra ti um instrum ento de sa n tific aç ão ... O m al está em
que te v e n ça a ti, de tal m odo que n ã o se las tu ... nem o teu
c o ra ç ã o ... m as o teu génio o que te d irija ou d e sc a rrila ...
melhor.
Q u e escravidão tão v e rg o n h o s a !... E à s vezes p o r coisas
tão pequeninas deixam o-nos v encer do g é n io !... U m ab o rreci­
m ento... ura c o n tra te m p o ... um a m udança nos teus p lan o s ou
p ro jec to s... às v ezes um a d e m o ra ... um a dificuldade com
que n ã o c o n ta v a s ... um a c o n tra d iç ã o ..., etc.'; a coisa m ais
Insignificante é m uitas v ezes suficiente p a ra te descom pores
e p a ra te d eix a res lev a r do teu c ará cte r. E m v en cer e a té
era m udar o seu c a rá c te r à força de m ortificação, é m odelo
S. F ra n c isco de Sales, o qual sendo n atu ralm en te m uito v ivo
e colérico, chegou a ser o san to p ro tó tip o d a m ansidão e d a
d o ç u ra ...; p o r isso p o d ia m uito bem dizer; N ã o há carácter,
por bom que seja, q u e não possa tornar-se m au com os
m aus h á b ito s...] e n ã o há carácter tão m au que não possa
dom inar-se com a graça d e D eus e com a diligência de
cada um.
O teu c a rá c te r a co m p an h ar-te-á to d a a v id a ; p o r isso,
se souberes a p ro v e ita r-te bem., d a r-te -á sem pre m atéria
ab u n d an te d e m ortificação contínua. ■ — S u a v iza -a com a p re ­
sença e com o exem plo d a Santíssim a V irgem , -r- P e n sa no
seu g é n io ... no seu c a rá c te r... Q u e faria E la , p o r exem plo,
nus c o n tra d iç õ e s? .., nos co ntratem pos tão g randes e tão
frequentes que teve de sofrer? ... E ra tal o seu dom ínio que
não se m anifestou n ’E la a .mínima im paciên cia.... nem o
ininjmp nervosism o, j
: 29
450 M o rtificação

3.° A s potências interiores. — E a g o ra contem pia o


cam po extenso d e m ortificação que le ap resentam a s tuas
faculdades interiores:
a) O e n te n d im en to ..., com os seus pensam entos m au s__
inconvenientes e p e rig o so s..., inúteis e in o p o rtu n o s..., o
desejo de saber tud o e de cu rio siar tu d o ... e sobretudo a
facilidade em ju lg a r tem eràriam ente dos o u tro s ... e o desejo
de im por o teu p a re c e r aos o u tro s de sorte que sem pre
julgues te r razão e exijas que ta déem ... O h ! que d ureza
de ju íz o ! ... Q u e tenacidade às vezes tão irra c io n a l!... P o r­
que não a p lic ar essa ten a cid a d e à sa n tid a d e ? ... P o r que não
em penhar-te tenazm ente e.m a d q u irir a santidade, fazendo
d e s‘e objecto um a ideia fixa? ...
b ) A im aginação e a m em ória. — Q u e m isteriosa é a
faculdade d a im aginação, tão pouco conhecida e tão im por
ta n te p a ra a vida e s p iritu a l!... T am bém ela deve ser objecto
d e estudo e de m ortificação e sp e cial... R e p ara como a ima­
g in ação m uda as c o isas... q u an tas ilusões nos n ã o fo rja !...
q u a n to s juízos erróneos nos não faz form ar sobre o v a lo r das
c o rsa s ...! C om o aum enta e diminui a seu b el-p razer o que
q u e r ! ... dificuldades que n ã o existem e que só ela v ê ...
sofrim entos que rep re se n ta sem e x istire m ... gozos e prazeres
que n ã o se d ã o ... Q u a n ta vigilân cia não re q u er e sta «lou-
qu in h a d a c a s a » ! ... P assam o s a m aior p a rte da vida enga
n ad o s p ela nossa im aginação.
T am bém não podes descu id ar a m em ória... H ás-d e evitai
to d as as lem branças que te tra g a a m em ória o u todas as
representações de coisas p assad as, m as ilícitas e pecaiui
n o sa s... perigosas o u in ú te is... que te dissipam ..." qúe te
fazem p e rd er tem p o ... que alteram a paz d a tua a lin a ... e
que podem levar-te a v erd ad eiro s p e c a d o s... N ã o descuides,
pois, a tu a im aginação nem a tu a m em ória.
c ) A vontade. — É a ra z ã o últim a de tu d o ..., do
p e ca d o e da v irtu d e ...; o que se condena e o que se sa lv a ...
o que é p eca d o r ou sa n to é-o p eia sua vontade"..., iísto é, por.
M ortificação 451

que assim o quer. — M o rtificar a v o n ta d e ... n ã o fazer


a tu a v ontade, senão a de D eus, m anifestada pelos teu s
su p e rio re s...: desfazer a v ontade p ró p ria ... dom inar o am or
p ró p rio ... tudo isto é n ã o só virtu d e m as a sa n tid a d e...
e sem isto n ã o h á santidade. — S. B e rnardo diz: T ira a
vontade própria e não haverá inferno.
P ensa n a im ag in ação e na m em ória... no entendim ento
e n a v o n tad e d a S antíssim a V irg e m ..., e x am in a... e stu d a
d e v a g a r este m odelo de m o rtificação ... E m que p e n s a ? ...
que im agina? ... que d e te rm in a ?... que deseja? ...
Pede-lhe auxílio p a ra a im itares n esta tão necessária
m ortificação interior.
35. Espírito dc sacrifício

1." N a sua v ir g in d a d e .— P e n e tra hoje no c o raç ão da


S antíssim a V irgem p a ra que v e ja s o gran d e esp írito de
sacrifício que nela e x iste ... P arece que n ã o pode v iv e r sem
■sacrifício... D iríam os que E la saboreia a d o r com o nós o
gozo. — V ê, p o r exem plo, o sacrifício d a su a ho n ra, na
g u a rd a secretíssim a d a sua v irgindade. — N inguém sabe o
seu v o to ... nem o e n te n d e... O p ró p rio S. José c ignora, e
M a ria que sabe ser essa a v o n tad e de D eus, a b raç a-se cora
o sacrifício que isso su p o ria p a ra E la ... O seu esposo vai
d u v id a r d a sua fid elid ad e..., da sua v irtu d e ... P oderia
su p o r-se coisa m ais hum ilhante e m ais m ortificativ a p a ra
E la d o que o p a ssa r p o r infiel n a virtu d e que E la mais
e stim a v a? — Precisam ente E la, que era a Virge.m d a s v ir­
g e n s... que foi concebida im a c u la d a... que n ã o tinha a
m enor m an c h a... e que sem pre foi cheia de g ra ç a ... a gora
p a ssa r p o r esta d e s o n ra !...
O m ais terrível do sacrifício era que E la tinha nas suas
m ãos a so lu ç ão ... e um a solução facílim a...
D u as p a la v ra s ... um a explicação ráp id a ao justo S. José
de tudo o que se p a s s a v a ... e tudo ficaria a r ra n ja d o .—
M a ria vê a ocasião de fazer um gran d e sacrifício e n ã o a
d e sp erd iça: lança-se nos braços de D eus e c a la -se ... e
e sp e ra ... sem defender-se nem sa ir p o r sua ho n ra. É assim
que tu p ro c ed e s? ... N ã o costum as p u lar logo e m o strar o
teu desgosto e aborrecim ento quando te dizem algum a
c o is a ? ... N u n c a te falta tem po p a ra te defenderes e d e s ­
culpares. quando m uitas vezes não tens ra z ã o e só te
e n te rra s m ais com as tu as desculpas.
E spírito d e sacrifício 453

C o m p ara o espírito de sacrifício d a Santíssim a V irgem


com o teu. — R e p ara com o aceita este sacrifício da sua honra
r com o o repete com o m esmo gosto, v á ria s vezes n a sua
v id a ... p o r exem ple, na P u rific a ç ã o ...: n a v id a ord in ária de
N a z a ré ... em B elém ... e no E g ip to ... e em casa e n o T e m ­
p lo ... N ã o p a ssa v a M aria, aos olhos dos sacerdotes e dos
seus vizinhos, por um a m ulher q u a lq u e r... p o r um a de
ta n ta s... p o r um a m ãe o rd in ária que tinha necessidade de
purificar-se e de que o sacerd o te pedisse a o S e n h o r por E la?
C a d a um destes passos da sua v id a ren o v av a n 'E la o
seu sa c rifício ... e sem pre e n co n trav a o seu c o raç ão ig u al­
m ente d isp o sto ... N ã o fo g e ... nem se assusta com o sa c ri­
fício, seja qual for. — A h ! se sem pre te enco n trasse com. esta
p re p ara çã o a p ro v a que o S enhor te m an d a !... D eus n ã o quer
corações divididos nem sacrifícios a m eia s... C onfia a tu a
honra e a tu a felicidade a D eus, e sp e ra n ’E le e ainda que
te prove, não te m a s... C ontem pla o sacrifício de M a ria e
vc-Ía-ás sa ir dele m ais n e b re ... m ais b e la ... m ais d igna aos
olhos de D e u s... O mesmo te aco n tecerá a ti se tiveres o
am or e generosidade p a ra o sacrificio com o tua M a e ...
2.“ N a sua m aternidade. —- O s hom ens teriam conce­
bido a m aternidade div in a, ro d ead a de hom enagens e de
respeito e x te rio r... de esplender e m agnificência, p ro p o rcio ­
nados a tal d ig n id a d e ..., de delícias e consolações interiores
no c oração d a Santíssim a V irg e m ...: no e n ta n to D eus quer
que em todo o m em ento seja aco m p an h ad a do sacrificio.
— H a v e rá consolações, alegrias, g ra ç a s e privilégios p a ra
sua M ãe com o não podem os sequer s o n h a r...; m as tam bém
hão chegarem os a m edir a pro fu n d id ad e das dores que a
m aternidade d iv in a c u staria à S antíssim a V irgem .
D eus dá a se n tir e a sa b o rea r as delicias d o seu am or,
A medida que vai purifican d o a s alm as, n a s cham as d o sa c ri­
fício... M a ria v ê em, seu Filho, o p ró p rio F ilh o de D e u s...
6 M essias L ib e rta d o r..., m as p o r isso m esm o Vê tam bém
n'E Ie, «o v a rã o de dores e ignom ínias-»... «o C o rd eiro que
454 E sp irito d e sacrifício

v a i se r im olado pela sa lv a ç ã o dos hom ens»... E la com preende


m elhor do que ninguém todo o sentido terrív el das p ro ­
fe cias... e ab ran g e com o seu o lh ar m aternal o futuro que
e sp e ra a seu Filho, segundo o s planos d a bon d ad e div in a.
V ê -o na sc er pobrem ente cm Belém, contem pla-o am ea­
ç a d o de m orte n o berço m esm o... accm p an b a-o n a sua fugida
com o pró fu g o p a ra um p aís e stra n h o ..., vê-o hum ilde e des­
p re za d o pelos seus n a sua p ró p ria te rra ... e assim passa
trin ta anos, am arg u rad o o seu coração, no meio das alegrias
m aternais, pela esp a d a de d o r que nele lev a a tra v essa d a.
— M a ria foi a M ãe das dores toda a v id a ... A prev isão que
tev e dos seus sofrim entos n ã o a aliviou deles, a n tes lhos
acrescentou, p ro lo n g an d o em todos os instantes, o seu .mar­
tírio in cessan te...
A ntes d e ch eg ar a h o ra da consum ação do sacrifício, E la
a d ia n ta v a -se a oferecê-lo ao S e n h o r... Assim deves proceder
tu tam bém : não esperes que o S enhor te tire algum a coisa
que te peça em s a c rifíc io ...: a d ia n ta-te volu n tariam en te a
o ferecê-la ao S e n h o r... U m sacrifício obrigado, m esmo que
o aceites ao chegar, não tem tan to m érito com o o sacrifício
v o lu n tá rio que se a d ia n ta a desprender-se do que D eu s quer
que lhe entregues. — M a ria sofre n a consum ação do sacri­
fíc io ..., m as já antes se ofereceu sem lim itação algum a e se
a d ia n to u a d a r a D eus n o seu coração, o que E le depois
v a i exigir-lhe...

3.“ N o seu próprio F ilho. — M a ria encontra em seu


p ró p rio Filho o m otivo dos seu s m aiores sofrim entos... dos
seus m aiorés sa c rifício s... Jesus c o m elhor d e s filh o s... e
contudo, com o sofre com E le e p o r E le ! ... N ã o te admires,
p o rta n to , de Jesus não p o u p a r sofrim entos a c s que o seguem
d e p e rto e o am am ... Q u e sofrim ento n ã o causa a sua M ãe
q u a n d o fica no T e m p lo !... E nem sequer se o c u p a depois
a consolá-la com m ostras especiais de c a rin h o ... Diz-lhe
secam ente que essa era a v o n tad e de seu P a i ... e m ais nada.
E spírito de sacrifício 455

—• M as à V irgem Santíssim a isto b a sta: n ã o h á p a ra E la


co n so lação m aior do que saber que está fazendo a v o n tad e
d e D eus.
E con tin u a o sacrifício ain d a m aior quando se despede
p a ra a v id a pública e deixa a su a casa e a sua M ãe só .—Q u e
soledade a d a q u ela casa sem. J e s u s !... A o c o m e r... ao d o r­
m ir... ao re z a r... em todos os m om entos do d ia ... N ã o se
re n o v a ria o sacrifício de M a ria ao ficar sem c seu F.lho? ...
E ju n ta a isto as dores e os sobressaltos com que de longe
o acom panha. Q u e p riv açõ es continuas p a ra E la, que tem
de contentar-se com ou v ir o que as o u tras pessoas dizem
d a s su as p re g aç õ es... dos seus m ilagres e c u ra s... d a sua
sim patia a rre b a ta d o ra !
Ju n ta m ais o sacrifício im enso da P a ix ã o e M orte,
que jã m editaste n o u tra p a rte ... M ais custoso que o
sacrifício da p ró p ria v id a é o sacrifício e p e rd a de um a pes­
soa am ada. N inguém am ou com o M a ria ... L ogo, ninguém, fez
este sacrifício com ta n ta intensidade como E l a . — F inalm ente,
o sacrifício da últim a despedida p a ra su b ir aos C é u s... Jesus
vai-se e E la fica aqui, neste desterro, a so fre r m a is... a con­
tin u a r o sa c rifício ... a ensinar-nos a nós p ràticam ente a
eom pletar em nós o que Salta à P a ix ã o d e C risto ..., que é a
aplicação dos seus m éritos, m ediante a nossa in co rp o ração
n 'E le ..., p a rticip a n d o d a sua v id a ... d o seu e sp írito ... do seu
sacrifício ... do seu am or à expiação e à re p a ra ç ã o ... S ã o
estes os teus a n e lo s? ... T ra b a lh a s p e r uni-te com o M a ria
com C risto c ru cific a d o ... a to rm e n ta d o ... e cheio de dores?
■ - P ede à S antíssim a V irgem este e sp írito d e sacrifício com
o qual E la tra sb o rd a de am or e de sofrim ento, p a ra que te
possas oferecer com o C risto e com C risto , com o vítim a d a
expiação pelos teus pecados e pelos d o m undo todo. —
E sforça-te. pois, p e r n e g ar-te a ti mesmo em tu d o ... p o r
tom ar com to d a a generosidade a tu a C ruz de cada d ia ...
e assim, nela crucificado, seguir a C risto e a sua M ãe, que
tam bém é tua, no cam inho do sacrifício.
36. Oração

1.® E xc elê n cia .-— V á ria s veros se trato u deste assunto


nas m editações da v id a de N ossa S e n h o ra ..., m as é tão
im p o rta n te e tã o gran d e a sua excelência, que de n o v o nos
vam os d e te r e dem oradam ente n e le ... M a ria é o m odelo mais
perfeito e a m estra m ais p rá tic a cia o ra çã o : tem os portan to
m uito que ad m irar nela neste particular.
M editem os prim eiro, a excelência da o ra çã o . E la
deduz-se d a sua definição: o ra r é elevar o coração a D e tis ....
é p ô r-se em com unicação com D eus e c o n v ersa r com E le ...
q u e r dizer, ao o ra r estam os seguros de que falamo.s com
D e u s..., que E le nos escuta e a te n d e ... e ao m esm o tem po
estam os seg u res de que E le nos fa la ... nos e n sin a ... nos dá
luzes e inspirações p a ra conhecer a sua santíssim a v o n tad e ...
-— P odes im aginar coisa m ais n o b re ... m ais d igna e exce­
le n te ..., m ais honrosa p a ra ti do que ser adm itido a o traio
com D e u s..., à com unicação com D e u s..., a fa la r e a tratar
intim a e confidencialm ente com E le ? ... Q u e segredos te não
v ai r e v e la r ! ... Q u e m isteriosas m ara v ilh a s te não va: ensinar!
A oração, d a p a rte de D eus, é um abism o de b o n d a d e...;
d a n ossa p arte, é um a fonte de grandeza e excelência: sermos
adm itidos à am izade íntim a de D eus! que m aio r grandeza
e e x altaç ão podíam os sen h ar? ! ... E incom preensível é qm*
D eus se baixe tanto até aos hom ens e que estes sz não a p ro ­
veitem desta d ig n ação de D eus p a ra dele conseguirem tudo
O ração 457

o que d e se ja m ..., porque a o ra ç ã o c, d e facto, a ch av e de


o iro que abre os im ensos te.soiros d a s riqueza;; infinitas de
D e u s... N ã o h á arca. p o r m ais fechada e escondida que
esteja, nas a ltu ras d o Céu, que não se a b ra com esta c h av e ...
N a oração, a p ró p ria o m nipotência d iv in a p assa p a ra as
nossas m ãos e p arece que o S enhor sente p ra ze r em dar-nos
d u ran te ela o c ep tro d a sua m ajestad e in fin ita...
Ê assim g ra n d e ... e x ce le n te... om nipotente, a oração.
M as se queres sab er doutro m odo a excelência d a o ra ­
ção p erg u n ta às alm as de oração, que são tocles os santos,
as consolações e d o ç u ra s experim entadas p o r e la s ! ...
P á ra a co n te m p lá -la s... em briagadas nessas d o çu ras div i­
nas, de que se afastam a seu p e sa r. — V ê, p o r exem plo,
S. L uís G o n z ag a a o ra r sete h o ras se g u id as... S. Francisco
de B órgia, que depois de oito h o ras seguidas, pede que o
deixassem um pouco m ais... E assim todos os s a n to s .—
D epois m editarem os a fundo sobre a o ra ç ã o de M a ria ; m as
já a g o ra podem os p e rg u n ta r: como seria a sua oração? ...
Q u a is seriam as su a s d o ç u ras e consolações? ... Q u a n tas
g ra ç a s receberia e n tã o ? ... Q u a n to tem po d u ra ria a o ração
de M a ria ? ...

2." N ecessid a d e.— M as antes dem ora-te a v e r um pouco


a necessidade da o ra çã o . - É absclutam ente necessária e
indispensável p a ra à sa lv aç ão e santificação. — Sem o ra çã o
não h á g ra ç a ...; sem g ra ç a não há n ad a que nos leve á vida
e te rn a ...; sem o ra ç ã o n ã o h á C éu.
S. A fonso M a ria de L igório diz categórica,m ente: T o d o
o negócio da salva çã o depende da o ra ç ã o ... porque com a
oração estareis seguros d a sa lv a ç ã o ... e se não orais a vossa
condenação c certa.
O u v e ag o ra a ò p ró p rio C risto que encareceu tan to a
necessidade d a o ra ç ã o que fez d isto assunto frequente das
suas pregações: V ig ia i e orai para qae não venhais a cair
na ten ta ç ã o ... Ê necessário orar sem pre c não se cansar
458 O ração

nunca d ; orar... O rar em to d o o te m p o ... E o que p re g av a ,


cu m pria-o E le m esmo: d 'E le diz o E v an g elh o que subia à s
m ontanhas a o ra r e a p a ssa r ali a noite em o r a ç ã o ...: e
o u tra s vezes diz que se retirava a um lugar solitário e ali
o ra v a ...
É p o rta n to certo que a o ra çã o era p a ra Jesus um a
o cu p ação frequente e dem orada. N ã o é pois de e stran h a r
que tam bém a Santíssim a V irgem p assasse g ra n d e p a rte da
sua v id a em o ra ç ã o ... E la e ra a dispensadora de todas as
g ra ç a s ... m as queria que soubéssem os que o m eio o rd in á rio ...
e u n iv e rsa l... e infalível de conseguir essas g ra ç a s, é a
o ra çã o .
Já dissem os algures que os E v an g elistas nos apresentam
a M a ria m uitas vezes em o ra ç ã o ... de m odo que, a p e sa r do
pouco que nos dizem dela, rep etid as vezes falam da su a
o r a ç ã o ...—’ A A n u n ciação e a In c arn a çã o dão-se d u ra n te a
o ra ç ã o d a Santíssim a V irg e m ... Sobe ao T em plo, ain d a sem
o b rig a ç ã o nenhum a, a o r a r... A P u rificação e a A p re se n ta ­
ção no T em p lo sã c m istérios de o ra ç ã o ... O ra n o C alvário,
ju n to à C ru z ..., o ra no C enáculo com os A póstolos d u ran te
o ito d ias...
Bem podes p o rtan to dizer que toda a sua vida foi de
o ra ç ã o ...

3.° A tua vida d e oração. — E tu, sabes v iv e r esta


v id a ? ... E stá s convencido d a excelência e da necessidade
d esta v id a p a ra a tua alma? ... N ecessitas de luz intensa que
te faça conhecer intim am ente a D e u s..., o que E le é p a ra ti
e o que quer de ti a c a d a in s ta n te ...; necessitas d e luz que
te m ostre os perigos que te rodeiam e os laços que te arm a
sem cessar o dem ónio... assim com o os m eies de te defenderes
e de tr iu n f a r e s ...; necessitas de luz que te ilum ine todo o teu
interior p a ra conhecer-te b e m ..., de luz que te m ostre as tuas
inclinações e a tua p a ix ã o d o m in a n te..., as tuas quedas e
pecados com as suas c au sas e ra iz e s ..., as tuas fraquezas
Oração 459

e defeitos que o am or próprio te o c u lta ...; necessitas de luz


p a ra conhecer bem o am or de Jesus C risto e o s seus sa c rifí­
cios... a su a obra red en to ra e sa n tific ad o ra ... o seu espirito
de hum ildade e de obed iên cia... a sua bondade e m isericór­
d i a ...; necessitas de luz p a ra p e n e tra r no coração d a tu a
M ã e querida e ali v e r a su a p u re z a ... a su a sa n tid a d e ... as
suas virtu d es to d a s ... o am or m aternal que te tem ... a neces­
sidade que tens tu d ’E la p a ra tudo, pois sem E la não
p o d e rás fa z e r absolutam ente nada.
Além da luz necessitas de força p a ra lu ta r sem c e ssa r...
p a ra m anter-te sem cansaços nem d e sa le n to s..., p a ra susten­
ta r a tu a esp e ra n ç a e confiança no triunfo, d u ran te as
se c u ra s... as trib u la çõ e s... as depressões da v o n ta d e ...; neces­
sitas de força p a ra d e sfaz e r... d e sa rre ig a r... c o rta r com
energia tudo o que seja necessário e D eu s te e x ija ...; n eces­
sitas de força p a ra c um prir com os teus deveres quotidianos,
sem d esfale cim en to s...; necessitas, enfim, de força p a ra seguir
de p e rto a C risto e com E le crucificar-te n a sua p rópria cruz.
T u d o isto é p a ra ti de absoluta n e c e ssid a d e ...; sem esta
luz e sem esta força és incapaz de fazer qualq u er coisa útil
p a ra a tua alm a.
E tudo isto se te d a rá un icam en te... exclusivam ente,
na o ra ç ã o ... e conform e a m edida d a tu a o ra ç ã o :... m ais o r a ­
ção m ais luz e .mais fo rç a ... e p o r conseguinte m ais g ra ç a
c m ais san tid ad e.
P e rg u n ta -te pois de novo: que im portância dás à vida
d e o ra ç ã o ? ... C om o trabalhas e te industrias em a fazer bem?
P e d e à Santíssim a V irgem que te ensine a ser v e rd a ­
deiram ente alm a de oração.
37. Oração

l.° F o c a /. — É o prim eiro m odo de o ra r, o que consiste


em ded icar a D eus o belo dom da p a la v ra , cm prcgando-0
em lo u v á-lo ... a g ra d e ce r-lh e ... e pedir-lhe m ercês. — fí a
o ra çã o m ais n a tu ra l e espontânea, que b ro ta do c o ráç ão que
am a, segundo aquilo, que a boca fala do que lhe vai no
coração.
lis ta o ra çã o não ê pois m eram ente m ecânica: não, há-de
consistir n a sim ples pro n ú n cia verbal das p a la v ra s ; estas
hão-de ser a expressão e x te rn a de sentim entos interiores.
F acilm ente com preendes que um disco de gram ofone...
o u um pap ag aio , que reproduzem m ais ou m enos exactam ente
as p a la v ra s que não entendem , não oram .
F ix a -te bem. H á s-d e entender o que d ize s..., hàs-de
re p a ra r no que p ro n u n c ia s..., cu, pelo menos, hás-de saber
que estás a falar com D eus e a honrá-lo com o que Hizes,
ainda que não o entendas, com o acontece ccm as rpliglbsas
que rezam o O fício D iv in o cm lín g u a que desconhecem .
Se n ã o fizeres assim, serás do núm ero daqueles 'de' qüetli
d izia C risto: «que O honram com os lábios m as o seu c o ra ­
ção e stá m uito longe d'Ille».
Q u e bela é a o ra ç ã o vocal bem f e ita ! ... P arece ser o
ensaio aqui na terra dos louvores que eternam ente havem os
de c a n ta r a D eus no Céu.
A esta o ra ç ã o se referia C risto, quando m an d a v a aos
O ração 461

se u s discípulos que orassem e quando E le m esm o lhes ensi­


n o u . a fórm ula d ivina do Pc.i N o sso , que é, sem d úvida, a
o ra ç ã o vocal m ais p erfeita e a que com m aior gosto e d e v o ­
ç ã o devem os repetir. — A Ig reja recom enda-nos sem cessar
e sta espécie de o ra çã o , com o seu exem plo... Q u a n ta s o ra ­
ções v ocais n a sua liturgia, tão preciosas e tã o cheias de
u n ç ã o !... V ê com o chega a im por, seb p ena de ob rig ação
g ra v e, aos seus sacerdotes a o ração vo cal diária com a
reza do B reviário.
V ejam os já com o a Santíssim a V irgem o ra v a v o c a l­
m ente.,—r T em os um a p re v a que nos indica claram entc com o
seria a o ra ç ã o v o c al de M aria. — F o i a recitação d o seu
cântico R fa g n ií/c a t...
Q u e hino tão cheio de g ra tid ão e am or a D e u s ! ... E le
bro ta espontâneo do coração de M a ria, cem o a expressão
incontida. do seu am or que necessita expandir-se, que tem
g o stq .em m anifestar e x te rio rm e n te ...-— Im agina a sua a ti­
tude..., a sua a te n ç ã o ... o seu fe rv o r... q u ando pronunciou
esta o ra çã o e ap ren d e a o ra r vocalm ente assim e n ã o d e
qualquer .m an eira..., sem a tro p e la r as p a la v ra s ..., sem co rre r
e sem q uerer a c a b a r d e p re ss a ... m a s sab o rea n d o o que dizes
e re p ara n d o que é a D eus que estás a falar.
E- 'qqando a Santíssim a V irgem soube que seu Filho
h a v ia com posto o P ai N o sso , que em penho não p o ria E la
cm aprendê-lo de cor e em fixá-lo b e m ! ... Com que p razer
o não repetiria m ilhares de v e z e s !... Com que fervor o não
m editaria e sa b o re a ria q u ando pro n u n ciav a todas e cada
um a das, suas p a la v r a s ! ...
V è se é sem elhante o apreço que tens de tão sublim e
o ra ç ã o ..., se a rezas d e v a g a r e re p a ra n d o no que dizes c no
que pedes a o Senhor. — Suplica à Santíssim a V irgem que
te ajude nas tu as o raçõ es v o c a is..., especialm ente naquelas
q u e . rezas com m ais frequência, p a ra que evites o re za r
m aquinalm entç e assim p e rd er o fruto precioso d a o ração
vocal tã o .b e la .,, .................. ..
462 O ração

2.° M e n ta l. — M a s contem pla em especial a Santíssim a


V irg e m n a sua o ra ç ã o m en ta l..., n a sua m editação n ã o só
d iária, m as de cad a instante.
O E v an g e lh o fala-nos tam bém desta su a o ra ç ã o naquelas
p a la v ra s: «M a ria g u a rd a v a tudo isto p a ra o m ed itar no seu
co ração » , com a no m elhor liv ro que podia escrever-se.
R epresenta-te a M a ria n esta oração, o m elhor que pude­
r e s ...; re p a ra bem em to d o s os porm enores interiores e ex te­
rio re s ..., p e rg u n ta a ti m esmo m uitas vezes: com o m edi­
ta ria a Santíssim a V irgem ? ... sobre q u ê ? ... quais seriara os
seus a fe c to s ? ... os seus c o ló q u io s?... que fruto tira ria dela?
— A tu a alm a responderá fàcilm ente a estas p erg u n tas.
R e p ara n a im portância que a Santíssim a V irg em d a v a
à o ra ç ã o m ental. — T o d o s c s san to s seguiram nisto a M a ria
e foi n a m editação dos m istérios e das lições d a v id a de
C risto que eles a p ren d e ram a santidade, im pregnando-se do
esp irito de C risto. — E p o r isso diz S. Inácio que esta o ra çã o
é o cam inho m ais c u rto p a ra se fazer s a n to ...; e S. A fonso
d e L igório diz: «que m uitas alm as, a p esar das su as devoções
e orações vocais ou rezas, caíram em pecado e nele conti­
n u aram , m as que é com pletam ente im possível m editar e
p e c a r..., fa ze r com frequência o ração m ental e continuar
pecando». — C onhecido é o d ito de S anta T e re sa de Jesus
que prom ete o céu a quem se e n tre g ar um q u a rto de hora
c a d a d ia à m editação.
M a s não creias que m ed itar é e stu d a r..., é pensar
m u ito ..., é q u eb rar a cabeça a d isc o rre r...; m enos a n d a é
tra ta r de en co n trar ideias n o v a s e o rig in a is... N a d a disto se
re q u er p a ra m editar bem. — T o d a a gente sabe m ed ita r...:
a vida racional do hom em é um a contínua m e d itç ã o ...
M ed ita o hom em de negócios p a ra tira r cs m a o res lu cro s...,
m edita a ra p a rig a m undana p a ra en co n trar a form a de a g ra ­
d a r m ais; m edita a té a c ria n ça sobre os seus jogos e trav e s­
s u ra s ... e a té o hom em que a n d a a trá s de um p ra z e r ilícito
m edita no seu pecado e no m odo de o p ra tica r.
O ração 463

B asta reflectir um pouco sobre algum a coisa que leste


o u o u v is te ...; seleccionando o que m ais te convém , porque
nem tudo é p a ra to d o s... D á m uita im portância a esta selec-
ção, doutro m odo perderás o tem p o ... A plica depois á tua
v id a e ao teu p ro ced er aquilo sobre que reflectes e v e rás
com o natu ralm en te b ro ta rã o do teu c o raç ão sentim entos de
v e rg o n h a ..., de c o n fu são ..., de arre p e n d im e n to ... ou de a g ra ­
d ecim ento..., de sa n ta aleg ria e íntim a sa tisfa ç ã o ..., ao m esmo
tem po que form as espontaneam ente p ropósitos p a ra e v ita r
isto ..., p a ra n ã o to rn a r a cair n a q u ilo ... e tc .; e sim ultanea­
m ente pedirás g ra ç a a D e u s... aju d a à Santíssim a V irgem
p a ra tal caso particular e concreto que prom eteste e vais
cum prir. — E com isto tens feito um a bela c p rá tica m edita­
ção, que nisto consiste norm alm ente.
D eves fazer com que a m editação seja cheia de unção
e que te tom e todo: considerações secas e frias dem asiado
intelectuais n ã o a g arra m nem prendem a v o n ta d e ... F a la
com Jesus e com M aria, m uito ..., desab afa com E le s..., diz-
-lhes as tu a s p e n a s ..., ten ta çõ e s... q u e d as e m isérias, etc.
—'V ê se fazes assim a tua m editação__ se te cansas dem ais,
se a deixas o u a encurtas sob qualquer p re te x to ...; se a
fazes em com panhia de tua M ã e ... o lh an d o p a ra E la ...,
apren d en d o d 'E la ...

3.“ Leituru m editada. — É o u tro m eio de o ra çã o muito,


relacionado com a o ra çã o m ental. — Q u a n d o te atorm enta
algum a gran d e p re o c u p a ç ã o ..., algum a p e n a .... qualquer coisa,
enfim que n ã o podes a lijar facilm ente... e te é im possível
re co lh er-tc ..., e n ã o podes p e n sa r nem discorrer n a d a ..., faz
então, pelo m enos, esta leitura re p o isa d a ..., d e v a g a rin h o ...;
dem ora-te nesta frase ou n a q u e la ..., neste pensam ento que
parece se acom oda m elhor à tua situ aç ão a c tu a !...; e assim,
com esta leitura m editada supre a tu a m ed itaç ão ... D ezoito
anos m editou assim S a n ta T e re sa de Jesus p o r não poder
discorrer, diz ela, e m uitas vezes, acrescenta ela, abrindo o,
464 O ração

livro já não era necessário m a is..., outras v ezes lia p o u c o ...


outras, m u ito ..., conform e a m ercê ou graça que o Sen h o r
m c [azia. — L io indica-te que não deves p re n d er-te a o livro,
m as sim p rescindir d ele; quando sentires que D eus se te
com u n ica... deves in terrom per logo a leitura e dem orar-te
o m ais que puderes no sentim ento ou pensam ento que D eus
te com unica.
T am bém nisto deves o lh ar p a ra M a ria com o p a ra
m o d e lo .— Q u a n ta s vezes n ã o to m aria cm su as .mãos o rolo
d a s S a g ra d a s E sc ritu ras e se engolfaria na leitu ra das p ro fe ­
c ia s ! ... E q u an tas v e res com eçaria um a frase e não a a ca b a ­
r ia ... porque o seu entendim ento e o seu c o raç ão levá-la-iam
a term iná-la a seu m odo, vendo o seu Jesus e fazendo apli­
c a ç ã o ã su a vida do que E la ali e stav a lendo.
A ssim deves tu fazer. Lê com se n tid o ..., sa b o reia d e v a ­
g a r o que lê s..., faz as aplicações à lua v id a e tal leitura
p ro d u z irá em tua alm a os efeitos salu tares da o ra çã o m en­
ta l... pois n ã o se tra ta de m era leitura m as de v erd ad e ira
m ed itaç ão ... T e n s feito a ssim ?... Q u a n d o p e r d o e n ç a ... por
m al e s ta r... p o r desgostos n ã o podias ap licar-te bem, reco r­
reste a este .meio ou d eixaste de todo a o r a ç ã o ? . .. — P ro ­
m ete á Santíssim a V irgem proceder sem pre assim : tudo
m enos o d e ix a r a o ra ç ã o e fazer esta do m odo que p ossa ser.
38. O ração

l.° Súplica. — A o ração de súp lica o u de petição é a


que m ais en tra em cheio na definição de o ra ç ã o « lev a n tar o
coração de D eus e ped ir-lh e m ercês». — É além disso a o ra ­
ção m ais indispensável: não tem os n a d a ... n ã o som os n a d a ...
n ada valem os nem podem os n a d a ...; p o rtan to tem os de pedir
tudo ao Senhor, po rq u e a o ra çã o é o meio universal e o rd i­
n ário de conseguir d e D eus o que necessitam os-
É certo que D eus já sabe o que nos falta e o que nos
convém , ainda que nós lho não pedíssem os; m as quer que
lhe peçam os tudo, p a ra que nos hum ilhem os reconhecendo
que não podem os n a d a p o r nós m esm os nem possuím os
n n d a .— É adm irável e consolador em extrem o o que C risto
disse sobre esta o ra ç ã o de súplica ou p etição: P ecli.e rece­
a r e i s ..., cham ai e abrir-se-vos-á a porta...-, tudo quanto
Im lirdes ao P ai em m eu nomls ser-vos-á concedido...-, se
tiverdes fé eu vos asseguro q u e tudo o que pedirdes nn
o ração vos será concedido. — E logo a seguir, a paráb o la
do am igo im portuno, p a ra nos en sin ar a im portunar a D eus,
nté cansá-lo, se assim podem os falar, e o brigá-lo a que oiça
r atenda a nossa oração. — 1R ecorda ainda aquelas dulcís­
simas expressões do E v an g e lh o : S e vós, sendo maus. com o
lo Is, não sabeis dar a vossos filhos senão coisas boas.
quanto m elhor não será posso P ai celestial cm d a r-vo s as
coisas boas que lhe pedirdes?
SI)
4 6 6 O ração

A tende p articu larm en te ao m odo de pro ced er d a S an­


tíssim a V irgem neste p o n to ... A quem acu d ia E la nas suas
dificu ld ad es... nas su as p ro v a s e c o n tra d iç õ e s? ... O n d e ia
en co n trar a solução do que b u sc a v a ? ... o rem édio, a con­
solação e a força p a ra tu d o ? ... A s luzes e as g ra ça s que
recebia em tã o gran d e a bundância, donde lhe v inham senão
d a o ra ç ã o ? ... N ã o eram elas a resposta que D eus m andava
àquele coração de súplica e de petição com que co n stan te­
m ente acudia a Santíssim a V irg em ao tro n o de D eus a
d e p o sita r ali as su as p en as e necessidades, sabendo que de
lá lhe v iria o rem édio infalível?
T ra z à m em ória a sua oração: n a E x p ec ta ç ão do p a rto ...,
que súplicas e que petições fe rv o ro sas... cheias de anelos
in e n a rrá v e is !... E foram tã o poderosas que ra sg ara m os
C éus e fizeram descer o F ilh o de D eus ao seu puríssim o
seio, a d ia n tan d o a h o ra d a Incarn ação . — E que petições
n ã o faria a D eus no T e m p lo ...; nas suas v iag e n s cheias de
inquietações e s u s to s ...; n a sua fugida p a ra o E g ip to ..., ao
v e r o seu Filho buscado p a ra a m o rte ...; na p e rd a de Jesus
no T em plo....; enfim , a cad a in stan te ... a cad a p a sso ... para
qualqu er coisa, acudia a D e u s... N ã o fez assim nas bodas
de C a n á ? ... P ed iu v inho n ã o p a ra E la m as p a ra os outros,
alcançou-o em gran d e a bundância, como q u is... Q u e poder
im enso o da o ra ç ã o !... Q u a l não será p a ra que D e u s se deixe
ven cer p o r ele!... P o r que n ã o te convences da necessidade
que tens da o ra çã o p a ra teus m ale s?... Q u a n ta s g raças não
perdes p o r não p e d i-la s !... O u v e a S. T o m á s d ’A quino que
diz: T o d o s estam os obrigados a orar porque tem os obrigação
d e alcançarm os os bens sobrenaturais q u e não vêm senão
de D eu s e unicam ente pela oração.
2.” P resença de D eus. — Bem podem os incluir entre
as v á ria s espécies d e oração, o santo exercício da presença
de D eus. —• E ste exercício d eve acom panhar sem pre a nossa
o ração e tan to m aior será o fruto desta qu an to m elhor sou­
berm os actu ar-n o s na presença de D eus. — N ã o descuides
O ração 467

isto n u n c a e tem bem p resente a su a im portância n a o ra çã o ,


— M a s n ã o só ao com eçar e a o c o n tin u a r a o ra çã o , m as
tam bém com frequência du ran te o dia deves re n o v a r o a cto
d a presença d e D eus, se quiseres c o n se rv a r o fru to d a o ra ­
ção e fazê-lo verd ad eiram en te prático.
E ra a este exercício que S. F ra n c isco de Sales cha­
m av a «o p ã o nosso de cada dia», porque assim com o o p ã o
não fa lta em nenhum a m esa e aco m p an h a todos os o utros
alim entos, assim a pre sen ç a de D eu s d ev e so b re n atu ra liz ar
todos os nossos actos, até os m ais insignificantes e indi­
ferentes.
Se realm ente vivem os tendo a D eus p re se n te ..., com ­
preendendo que D e u s n o s vê e nos contem pla em tal c a s o ...,
que p e n etra a té aos m ais secreto de nossas alm as, lendo no
fundo do nosso c oração todas a s nossas in te n ç õ es..., senti­
m entos..., d e se jo s..., p ensam entos sem que n a d a se lhe
o c u lte ..., se o víssem os sem pre tom ando n o ta dos nossos
actos, p a ra um dia os ju lg a r e prem iá-los ou castigá-los eter­
nam ente, quem n ã o se ria s a n to ? ... Seria possível v e r a D eus
presente e pecar? ... Se fugim os de p e ca r à v ista de o u tr o s ! ...
Se pois o víssem os assim, sensivelm ente, em figura corporal,
ao nosso la d o ..., se nos aparecesse n o m om ento perigoso
d a h e sita ç ã o ... d a v a c ila ç ã o ... da te n ta ç ã o ..., c airía m o s? ...
a trever-nos-íam os a esten d er a m ão ao fru to proibido? —
E c ontudo isto n ã o é suposição nem im ag in ação ; c mais do
que v e rd a d e ... D eus vê-nos m ais d o que nós m esm os nos
v em o s; vivem os im ersos nos olh ares de D e u s ; a su a p re ­
sença envolve-nos com pletam ente. E se E le nos olha sem
cessar, p o r que n ã o o lharem os nós p a ra E le? P o rq u e n ã o nos
darem os co n ta desse o lh a r divino p a ra nós?
E p o r aqui já v ê s com o o põr-se na presença de D eus
é já um a oração, po rq u e este acto d a presença de D eus n ã o
é um acto m eram ente intelectual ou frio e seco m as é um
acto m uito íntim o e fervoroso que te põe em com unicação
d irecta com D eus e te leva a fa la r com E le p o r meio de
16 8 O ração

fe rvorosos a fec to s..., ao mesmo tem po que te im pulsa a


c um prir com to d a a perfeição os teus deveres e tudo o que
o S en h o r te pede.
N e ste p o n to m uito pouco se pode dizer d a Santíssim a
V irgem , porque seria um nunca a c a b a r... D e sp e rta a tua
im ag in ação e facilm ente re p re se n tará s a M a ria em qualquer
acto d a sua v id a e v ê -la -ás em todos eles proced en d o como
se tivesse sem pre a D eus presente. -— É v e rd ad e que E la
tin h a a D eus presente em seu F ilh o ; m as antes e depois
d a v id a de Jesus tam bém tev e sem pre a D eus presente. —
Se isto se diz de m uitos santos, p a ra lo u v ar a su a santidade
— que an d aram sem pre n a p resença de D eus — que direm os
de M a ria?
3." Jaculatórias. — É ou tro m odo de o r a r..., muito
b re v e ... m uito sim ples... m uito p rá tic o .-— A jac u lató ria é
com o um com prim ido d a o ra çã o , c o ntendo todo o fogo e
to d a a eficácia d a o ra çã o . — L em bra-te d o que já conseguiste
com as jac u lató ria s nas tu as ten ta çõ e s... nas tu as a tra p a lh a ­
ç õ e s ... nas tuas grandes dificu ld ad es... quando n ã o h á meios,
nem tem po, nem facilidade de fazer o ra çã o p o r largo tem po...
E n tã o a jacu lató ria é o g ra n d e recurso. — D igo-te d a s jac u la ­
tó ria s o que disse d a o ra çã o : nem todas são p a ra to d o s...,
nem to d as são p a ra todas as ocasiões. — A jac u lató ria há-de
ser b re v e ... c la ra ... fe rv o ro s a ... o p o rtu n a .— A Ig reja tem
indulgenciado m u itas; m as tu escolhe dessas a lg u m a s... pou­
c a s ... de que possas la n ç a r m ão com fa c ilid a d e ...; busca as
que m ais te co n v êm ..., as que m ais te falam ao c o raç ão ...
e depois v e rás com o a jac u lató ria bem sentida é um a m a g n i­
fica o r a ç ã o ...; inventa tu algum a que seja com o que uma
ex p an são d a tu a a lm a ..., um im pulso do teu c o ra ç ã o ... que
realm ente saiba bem e ag rad e deveras a o teu co ração . —
Im ita a Santíssim a V irgem que ren o v av a incessantem ente a
presen ça de D eus p o r meio de jaculatórias, sa íd as m a s do
que d e s lábios, do coração, que eram como setas e dardos
de am or que se iam c ra v a r no p ró p rio c o raç ão d e Deus. —
O ração 469

R epete m uito esta espécie de o ra çã o , d irigida ao S enhor e


tam bém a tu a M ã e querida, de sorte que as jacu lató rias
sejam com o que continuos cham am entos que fazes a tua
M ãe p a ra que não te d e ix e ..., p a ra que v e n h a em teu
a u x ílio ..., p a ra que te assista n a v id a e n a m orte. — D itosa
a alm a que m orre com um a jacu lató ria ncs lá b io s !...
39. O ração

1.“ S o m o s m aus. — H o je detém -te a m editar as quali­


d a d es d a o ra çã o p a ra que esta seja v e rd a d e ira e prática.
—• R e co rd a a frase em que S an to A gostinho diz que a nossa
o ra ç ã o pode ser inútil p o r um a d e stas três razões — o u p o r­
que som os m a u s... ou po rq u e ped im o s m a l... ou porque pedi­
m o s coisas m ás. — E de facto, som os m au s... som os p eca d o ­
re s ... som os in g rato s a D eus. Q u e direito tem os a pedir
a lg u m a coisa e p o r que ra zã o nos h á-de conceder o Senhor
o que lhe pedim os?— C ontudo, o s pecad o res podem e devem
a cu d ir à o r a ç ã o ...; ela será precisam ente a su a sa lv a ç ã o ...
M a s re p a ra bem, o p ecad o r hu m ild e..., o que se arrepende
e deseja sa ir do p e c a d o ..., não o que se g loria dele e está
c ontente com os seus pecados, sem v o n ta d e nenhum a de os
d e ix a r; com que rosto se a tre v e rá este a apro x im ar-se do
tro n o de D eus a pedir-lhe m ercês? N ã o se ria isto um abuso
in q u alific áv e l?... um v erd ad e iro in su lto ? ...
V ê ,se h á algum a coisa disto em ti..., se D eu s te pede
que deixes algum a c o is a ..., que te ap artes de algum perigo
o u o c a s iã o ..., que d esfaças algum, laç o que te p re n d e ..., que
trab a lh e s m ais p o r d o m in a r a s tuas p a ix õ e s..., p o r diminuir
a s tu a s q u e d a s..., p o r aum entar o teu fervor, etc. — Pois,
só procedendo assim p o d e rás c r a r com fru to ..., procedendo
d o u tro m odo n ã o te queixes de que D eus não te ouve, por
que tu és quem prim eiro n ã o faz caso do que E le te diz.
O ração 471

M as suposto que n ã o queiram os eficazm ente se r m aus oü


que trabalhem os sèriam ente p o r d e ix a r de sê-lo, ainda assim
não tem os m éritos p ró p rio s... nem títulos suficientes p a ra
m erecerm os ser o u v id o s n a nossa o ra çã o . — P o r isso C risto
nos deu a solução a o m andar-nos p ed ir tudo em «seu
nom e»..., isto é, ap o ian d o -n o s n ’E le ..., nos seus m é rito s...,
na su a excelência e dig n id ad e d iv in a s... E assim a o ra çã o
se rá infalível, po rq u e o que é que o P a i pode n e g a r quando
se lhe p ede em n cm e de seu F i l h o ? . . . — F ix a -te bem na
p rá tic a constante d a Ig reja : esta nunca term ina um a o ra çã o
senão in v o can d o o nome e os m éritos de Jesus C risto ...
P o r Jesus C risto, nosso Senhor, vosso F ilh o que convosco
v iv e e reina... A Ig reja quer-nos en sin ar com isto claram ente
que a o ra çã o feita em nosso nom e, sem se r confirm ada ou
ru b ricad a com o sa n to nom e d e Jesus, é coisa com ple­
tam ente inútil. — N ó s som os m a u s ; logo n ã o merecem os
ser ouvidos de D e u s... M as revestidos de C risto, o que não
conseguirem os? !
C ontem pla a S antíssim a V irgem a o r a r... E la não era
,m á..., n ã o p o d ia sê -lo ..., não tinha os nossos d e feito s... D eus
com prazia-se n ’E la ... Q u e é pcis de e stra n h a r que a sua
o ra çã o conseguisse tudo o que conseguiu? Além disso, se
tudo fazia com Jesus e p o r Jesus, se u am adíssim o F ilh o ... a
sua o ra ç ã o tam bém subia a D eus e nvolta no am e r infinito
de Jesus p a ra com M a ria ... — F a z com o M a ria. Prim eiro
d irige-te à M ãe p a ra p o r E la ch eg a r ao Filho c pelo Filho
ao tro n o do P ai.
2 ° O ram os m al. — Isto é, oram os sem as devidas dis­
p osições... d e q u alquer m odo. — V ê o m odelo dos m odelos,
jesus C risto, em oração. Q u e fe rv o r o s e u ! ... Q u e bem
ensina p ràticam en te as qualidades, indispensáveis da o ra çã o !
- E stas são as seguintes:
a) A te n ç ã o e recolhim ento, retirando-se a lu g ares a fa s­
tados de todo o reboliço h u m an o ...; g o sta do isolam ento da
472 O ração

su a casa de N a z a ré e gosta d a solidão das m o n tan h as aonde


se re tira a o ra r no escuro d a noite. — N ã o d o rm e... n ã o se
d istra i... n ã o p e rd e o te m p o ...; repreende aos seus A pós­
tolos porque dorm em e n ã o o ra m ... P e n sa m uito nisto e
re p ara que talvez tam bém a ti te rep reen d a Jesus.
b ) H um ildade. — M o stra -n o -la a su a posição: de joe­
lh o s... com os b raço s esten d id o s... p ro stra d o p o r te rra ...
cosido com a te rra ... Q u e hum ildade tão p ro fu n d a !... e ao
m esm o tem po, que espírito de m ortificação tã o g ra n d e !...
c ) C onfiança. — V ê com o com eça sem pre a sua o ração
a D eus com o nom e dulcíssim o de «P ai»... A ssim faz no
H o rto ... assim n a C ru z ... assim sem p re... E le é seu Filho.
C om o h á-d e pois d u v id ar de que o e sc u ta ? ... T u d o diz esta
p a la v ra rep leta de confiança: P ai!
d ) P erseverança. — T o d a a sua vida p e rsev e ro u na
o ra ç ã o ... M as recorda com o esta qualidade difícil ressalta
adm iravelm ente no H o rto ...: u m a... d u a s ... três h o ra s !...
sem p re ssa s... sem n e rv o sism o s... A cha-se e sgotado física e
m o rah n e n te ... e contudo, três longas h o ras perm anece a
o r a r ! . .. E stá na a g o n ia ... e exactam ente en tão o ra v a com
m ais assiduidade, com o diz c E v a n g e lh o ... Q u e lição tão
c lara e tã o fo rte !...
R eco p ia a g o ra as qualidade da o ra çã o ensinadas por
C risto e aplica-as à o ra ç ã o da Santíssim a V irgem e à tua.
— N ã o desperdiçou a S antíssim a V irgem a liç ã o ... E quão
adm iravelm ente copiou em si m esm a o m odo de o ra r de seu
F ilh o ! ... C om o seria a sua atenção e xterna e in te rn a ... o seu
fe rv o r e entusiasm o n a o r a ç ã o ! ... C o ntem pla-a no local mais
recolhido da sua c a s a ..., m orta p o r com pleto a tudo o que
a ro d e ia ..., sem a te n d er m ais do que a D eus, com quem. fala
e co n v ersa longam ente e se com unica de um m odo in efável...
V ê -A com a fronte em co n tacto com. a terra, com o se fosse
um a vil e scrav a que não se a trev e a o lh ar p a ra o seu
S e n h o r... E sc u ta as su as p a la v ra s e nelas v e rás a confiança
e intim idade com que fala com D e u s... R eco rd a esta con­
O ra ç ã o 473

fiança h a v id a n a s bodas de C a n á ... chega a isto: a m an d ar


e a d a r ord en s ao p ró p rio D e u s ! ... Finalm ente, considera
bem e d e v a g a r... a p ersev eran ça que E la tem. na o ra ç ã o e
que infunde nos A p ó sto lo s... D ia s e dias p assa E la no
C enáculo ensinando aos A póstolos sob retu d o a p e rsev e ra n ça
n a oração, com o diz o tex to sa g ra d o ...
P e ra n te tais exem plos exam ina a tu a o ra ç ã o ...
C om o é o teu recolhim ento? ... C om o te p re p a ra s p a ra
prev en ir e v e n ce r as tentações e d istracções que te hão-de
v ir n e la ? ... C om que energia as re p e le s ? ... Trabalhas a v a le r
n a oração? ... E com o são as tu as p o siç õ e s? ... E qual é a
hum ildade de c o raç ão que levas à o ra ç ã o ? ... Q u e fazes nas
tentações de d esân im o ... de d esc o n fia n ça ... de d e se n g an o ...
de julgar que te ilu d e s... que n ã o consegues n a d a ... que é
m elhor d eix ar tu d o ? ... etc. C onfias en tão em D eus e p erse­
v e ras n a tu a o ra ç ã o ... n ã o em itindo n a d a ... não a en cu r­
tan d o n a d a ... e a té p ro lo n g an d o -a um pouco m ais, p a ra
m elhor v encer e triu n fa r de tudo? ...
3.° P edim os coisas más. — A Santíssim a V irgem não
pedia m ais do que o cum prim ento d a v o n tad e de D e u s...
A sua o ração reduzia-se a rep etir o seu Fiat: «F aça-se cm
mim, segundo a v ossa p a la v ra » ... e com o a v o n tad e de D eus
e ra sa lv ar o m u n d o ..., a isso d irigia to d as as su as petições,
a p ed ir que se adiantasse o m om ento d a re d en ç ão ... a suspi­
ra r pelo M e ssia s... enfim , a fa ze r violência a D eus p a ra
que estabelecesse o seu reino entre c s hom ens.
E sta é a gran d e petição que Jesus nos m andou fazer:
«pedi o reino de D eus e a su a ju s tiç a » ...; as coisas de
D e u s... d a a lm a ... d a sa lv a ç ã o ... d a e te rn id a d e ... isto é, o
que se deve p e d ir...; o resto v ir-n o s-á p o r acréscim o.
M as, ai! só pedim os com fe rv o r... com in teresse... com
insistência, q u ando algum m al grave, físico ou m oral, m as
hum ano e terreno, nos a m e a ç a ...; e n tã o tudo nos parece
p o u c o ... Se tivéssem os este interesse p elas coisas d a alm a
já seríam os m uito santos. — P ois bem, tudo o que n ã o seja
474 O ração

p e d ir isto, é n ã o p e d ir n a d a ... Assim diz Jesus C risto aos


A póstolos: A té agora nada p e d is te ... e co n tu d o já e n tã o os
filhos de Z eb e d eu lhe tinham pedido os p rim eiros p ostos, o
d a d ireita e o d a esquerda no seu re in o ... e os o u tro s tinham
feito pedidos sem elh an tes... E Jesus responde: tudo isso é
n ã o p e d ir n a d a ! P o rq u e eles entendiam o reino de C risto
com o um a coisa terren a e p o r conseguinte terreno e ra o seu
pedido.
O S en h o r n ã o nos p ro ib e p edir coisas d a terra : no
P a i-N o s so m anda-nos m esm o p ed ir o p ã o nosso d e cada
dia nos dai hoje — m as m an d a-n o s su b o rd in a r tudo à glória
de D eus, ao seu reino que é o que antes de tudo havem os
de pedir, que o resto v irá p o r acréscim o...
F a z es a ssim ?... Im itas nisto a tu a q uerida M ã e ? ...
In teressa-te m uito o bem d a tu a alm a e d a dos próxim os
de sorte que pedes m uito a o S enhor p o r elas? ... o u pelo
co n trário preocupas-te m ais com os acréscim os e com o
secundário e descuidas o p rin c ip a l? ...
V ê bem se não se rá esta a causa do p o u c o fruto da
tua o ra ç ã o ...
40. Oração

f.° C ontinua. — Assim era a o ra ç ã o de M aria, sem


in te rru p çã o ... E m todas as circunstâncias da sua vida o ra v a
sem cessar.
D em o ra-te a considerar p a ra im itar a sua o ra çã o : N a s
suas o c u p a çõ es... c tão g randes com o as d 'E la ...; geral-
m ente quando tem os destas ocupações, n ã o costum am os
o ra r: dizem os que é im p o ssív el...; q u ando um a o cupação
nos sobrevém , de tal m odo nos a b so rv e que já n ã o fazem os
n a d a ... N ã o é assim que acontece contigo?
P o is olha p a ra tua M ã e ... N a s suas g randes ocupações.
E la acode à o ração , com o sem pre... podem os dizer que mais
ain d a do que n o u tra s o c a siõ e s...R ed o b ra a sua confiança e
prolonga a sua o ra çã o , p a ra nela b u sc a r e en co n trar o que
então necessitava. — N ã o o ra ria assim , quando das dúvidas
de S. Jo sé... quando da viagem a Belém e p a ra o E g ip to ...
quando d a p erda do M enino Jesu s... quando da aproxim ação
da P aixão?
E n tã o a p a lp a v a E la a necessidade absoluta que nesses
casos tem o hom em de se a p o ia r em D e u s... porque então,
mais do que nunca, vê e sente o seu n a d a ... Isto v ia-o bem
M aria, m as p o r isso m esm o em bebia-se m ais e m ais d a bon ­
dade e m isericórdia de D eus, que cm sua am orosa P ro v i­
dencia. nos deixou p a ra estes m om entos o rem édio d a
o ra ç ã o ... e p o r isso a ela acudia en tão precisam en te... quando
476 O ração

se e n co n trav a oprim ida e invadida, com o nós, pela p reo­


c u p a ç ã o ...; e ali ex p an d ia o seu c o ra ç ã o ...; co n ta v a a s suas
pen as a o S e n h o r..., d e sa b afa v a com. E le ..., pedia-lhe a sua
luz e a sua fo rça ... e la n ç av a -se p o r com pleto nos seus
braços am orosíssim os.
E quando a preo cu p ação era tão intensa com o foi a de
Cri.sto no H orto, que n ã o era possível dom iná-la o u sobre-
p ôr-se a e la ..., nem mesmo então a fro u x a v a a sua o ra ç a o ...
e co n v ertia a sua m esm a p reocupação em, m atéria de oração,
expondo a sua p re o cu p ação ao S e n h o r..., p edindo conforto
p a ra a su a fraqueza, p a ra assim se anim ar ao sacrifício com
g enerosidade sem pre crescente e fazer então tam bém a v o n ­
tad e de D eus e aleg ran d o -se p o r ter de o fe re c er a o S enhor
algum a coisa c u sto sa ... em que m ais possa im itar a C risto
nos seus sofrim entos. — A ssim se lev a n tav a d a oração, como
C risto n o H o rto ..., a n im a d a ... fo rte ... d e cid id a..., disposta
a a fro n ta r todas as p reocupações e a beber a té a o fim o
cálix d a am arg u ra.
C ontem pla-a num a destas ocasiões de p e rtu rb a ç ã o ...
N ã o está n e rv o sa ... nem e x c ita d a ..., com o tu te pões nesses
casos, m as sim serena, tranquila, senhora de si m esm a...
se g u ra do auxilio de D e u s... e do seu a m o r... C om o E la
lan ç a-te a lu ta r c o n tra a p e rtu rb a ç ã o ... o d e sân im o ... a
desconfiança que n a s tuas preocupações sentes, precisam ente
p o r não buscares na oração, o rem édio...
2.“ N a s suas ocupações e nos seus descansos. — T u d o
fazia im buida do espírito de o ra ç ã o ... O ra v a trabalhando,
de m odo que nas suas ocu p açõ es nunca p erdia a presença de
D eus e assim o p ró p rio trab a lh o co n v ertia-se em puríssim a
o ra ç ã o ... N ã o tinha o u tro fim nem o u tra ideia nas suas
o cupações senão fazer a v o n tad e de D e u s ...; tra b a lh a v a em
D eus, com D eus, p a ra D e u s ...; não esquecia que e sta e ra a
fórm ula d a escravidão e E la era a escrava d o S e n h o r !
E com o e scrav a v iv ia e tra b a lh a v a ..., po rq u e em tudo
b u sc a v a a D eus e em tudo e n co n trav a e via a D e u s... E do
Oração 477

m esmo m odo d e sc an sa v a , com o quem vê no descanso o cum ­


prim ento do plan o divino que tam bém dispõe e o rd e n a o
d e sc an so ... Q u a n d o d e sc an sa v a p o rtan to , d a v a sa tisfaç ão a
D eus directam ente e n ã o a E la ...; ia b u sc a r o que m aterial-
m ente necessitav a p a ra c o n se rv a r a sua saúde e forças e
p a ra depois v o lta r ao trabalho, com novos brios e m aior
in teresse..., trab a lh a n d o e o ra n d o ao m esmo tem po com
m ais alegria e c o n te n tam en to ... Q u e bem cum pria a S a n tís­
sim a V irgem aquela sentença: «orai sem in te r r u p ç ã o , de
d ia e de n o ite ..., n a s o cupações c nos d e sc a n so s.... A té no
mesmo sono E la o ra v a , pois de ninguém como d 'E la se
pode dizer aquilo que d izia a E sp o sa do L iv ro dos C a n ta res;
«E u durm o m as o m eu c o raç ão v e la » ...; o corpo descan sav a
n a cam a, m as a su a alm a descan sav a n a s m ãos de D e u s...
3.° N a s securas e tentações. — É e n tã o que m ais é
necessário o r a r... exactam ente quando o dem ónio tem mais
em penho em que deixem os a oração, ap ro v eitan d o -se das
nossas securas p a ra que a a b a n d o n e m o s ...—’N o ta bem que
as securas podem se r um castigo que D eus te d á pelo teu
pouco fe rv o r... pelo pouco em penhe com que tra b a lh a s na
o ra ç ã o ... pelas g raças que nela desperdiças, etc., e neste
caso já vês que o rem édio é tra b a lh a r m ais... esforçar-te
cad a vez mais. M as se as securas são um a p ro v a que D eus
te m anda p a ra fazer m ais m eritória a tu a oração, rep ara
na Santíssim a V irgem e vê com o hás-de p re ce d er neste
caso ...
Com o o ra v a E la nas se c u ra s? ... — C om o seu Filho em
G e lse m a n i...: com m ais in ten sid ad e... com m ais reverência
e hum ild ad e... com m ais dem orada p re p a ra ç ã o ... com v e rd a ­
d eira paciência e fo rtalez a ... e em especial com firm eza e
p e rse v e ra n ç a ... Q u e o ra çã o m ais trab alh o sa a o ra ç ã o árida
em que não se sabe o que se h á-de d izer a D e u s... e D eus
p arece que tam bém não diz n a d a ! ...
V ê a Jesus a o ra r d u ra n te três longas h o ra s!, repetindo
as .mesmas p a la v ra s ... T a l e ra o seu tédio e aridez que n ã o
478 O ração

lhe o c o rria o u tra coisa e nem p o r isso deixa a o r a ç ã o ...; até


que não passem as três h o ra s seu P a i n ã o lhe m an d a rá o
a n jo que o console... e d u ra n te elas ali e stará , v ítim a da
m ais esp an to sa aridez, lu ta n d o e trab a lh a n d o n a su a o ra ­
ç ã o ... Q u e m o d e lo !... D este ap renderam to d as a s alm as a
v e n ce r as suas a rid e ze s... Q u a n ta s vezes n ã o p ro v o u D eus
os seus escolhidos com aridezes longas, de an o s inteiros!
E contudo, essas aridezes só serviram p a ra p ô r m ais em
relevo a santidade que e n tã o m ais do que n u n c a se ap o iav a
n a o ra ç ã o ... A ssim deves tu tam bém orar.
P o r suas culpas M a ria n ã o podia ter a rid ezes; m as
teve-as, com o seu F ilho, p a ra m érito seu e p a ra servir-nos
de exem plo a nós.
R eco rd a-te nestes a cto s de tua M ã e ... vê com o vence
a aridez com tra b a lh a r m ais n a o ra ç ã o ... e com o esm ero
especial que p u n h a n e la ... e assim a su a o ra ç ã o seca e árida,
co n v ertia-se nela em fonte riquíssim a de g ra ç a s... Q ue
aum ento d e s ta s !... d e a m o r ! ... e de re v e rê n c ia !... e de
sacrifício não tira v a ela desta o r a ç ã o ! ... Q u e força tãc
g ra n d e ... que violência tã o am orosa n ã o faziam a D eus as
m editações árid as de M a r i a ! ... e p o rtan to , com o era eficaz
a o ra ç ã o de M a r ia ! ...
A nim a-te co.m isto a h a u rir, com o a Santíssim a V irgem ,
d a s tu as aridezes e securas, novos brios e alentos para
tra b a lh a r m ais e p a ra o ra r m elh o r..., como esses corações
valentes que em vez d e aco b ard ar-se e am esquinhar-se
d iante das dificuldades se dilatam com elas e as dom inam ...
4.° N a s consolações. — Q u em se rá cap az de descrever
esta o ra çã o de M aria? ... os seus êxtases e a rro u b a m en to s? ...
as luzes e as revelações que então te ria ? ... R eco rd a a o ração
de alguns san to s: de tal m odo eram unidos a D eus, que p a re ­
ciam já não ser deste m u n d o ... E então com o seria a o ração
doce e e x tática de M aria, em que a sua m ente se abism ava
n a contem plação d a d iv in d a d e ... e o seu c o ração se a b ra ­
s a v a no m esm o fogo em que se a b rasa o coração de Deus?
O ração 479

A dm ira e contem pla com reverência e sta altíssim a o ra ­


ção, que nunca c h eg a rás a com preender com o fo i..., m as ao
mesmo tem po pede à Santíssim a V irgem que te dê g ra ça
p a ra a p ro v eita r-te d a s luzes, inspirações e consolações que
D eus se d ig n ar d a r-te ... sem que p o r isso julgues que é
m ais perfeita, ferv o ro sa e m eritória a o ra ç ã o em que recebes
estas com unicações do S enhor d o que aquela em que tens
de trab a lh a r, p e r assim d iz e r...; n a o u tra és tu que deves
tra b a lh a r e e sfo rça r-te...
C onclusões a tira r: com consolações ou sem e la s... a p ro ­
veitan d o -te delas se D eus tas d á ... o u trab a lh a n d o com fir­
m eza e pe rsev e ra n ça , q u ando tas n e g a ..., o ra r se m p re... com
fe rv o r... e p ro c u ra r tira r fruto, de qualquer m odo d a o ra çã o .
41. O ração

l.° C rescim ento na a lm a .— C onsidera, p o r fim, alguns


fru to s que a o ra ç ã o p roduzia n a alm a da S antíssim a V irgem .
—■A o ra çã o é verd ad eiro alim ento da alm a e d a í que o seu
fruto prim eiro seja o que é p ró p rio do alim ento: d a r v id a ...
fo rç a ... crescim ento e desenvolvim ento.
N ã o é possível, p o rtan to , que um a alm a se desenvolva
devidam ente e nela cresçam as v irtu d e s... sem o espírito de
o ra ç ã o ... E p o r isso é de v e r a p u jan ça com que brotam
n a alm a da Santíssim a V irgem as m aiores virtudes e se foram
sem pre desenvolvendo. — N a o ra çã o a prendeu E la a obede­
cer exactissim am ente aos m ovim entos e im pulsos d a g ra ç a ...;
n a oração, conhecia a v o n tad e de D eus, e ain d a nos seus
porm enores m ais m ínim os, e logo a seguir, considerando-os
com o preceito gravíssim o, os execu tav a fid elissim am en te ...;
e às vezes eram coisas d u ra s ..., h u m ilh an tes... dolorosas.
P e n e tra no seu coração e vê como, nalgum as ocasiões,
e ra d uro o sacrifício que D eus lhe p e d ia ... m as n a o ra çã o
e p o r m eio d a o ra çã o subm etia-se a tu d o ... a c e ita v a tudo
e lev a n tav a -se dela disposta a obedecer em tudo, custasse o
que custasse, sem re p a ra r nisto. — P o r este m esmo desejo
de cum prir e.m tudo a v o n tad e divina, nunca tom ava p o r si
m esm a um a determ inação o u re so lu ç ã o ...; ain d a as coisas
ap aren tem en te m ais pequenas c u indiferentes as c onfrontava
n a o ra çã o com a v o n tad e de D eus p a ra depois fazer o que
O ração 481

E le lhe in sp irasse... Q u e m agnífica e p erfeita obediência


a que deste m odo se ap o ia e cresce n a o ra ç ã o ! F azes tu
assim? ...
Com e,sta obediência crescia ao m esmo tem po a sua
com panheira inseparável, a hum ildade. — M a ria aprendeu na
o ra çã o a conhecer a D eus e a conhecer-se a si m esm a...
e, já o dissem os, deste d u p lo conhecim ento b ro ta e sp o n ta­
neam ente a hum ildade...
N a o ra çã o v ia E la clarissim am ente o seu n a d a ..., a sua
d istân cia infinita de D e u s..., a su a necessidade de recorrer
a E le ..., de e sp e ra r tudo d ’E le ... e como se convencia que
tudo recebia d ’E le, p restav a-lh e, agradecida, a hom enagem
d e s seus louvores e ard ia cm desejos de que todas as cria tu ra s
o conhecessem e louvassem com o E le m erecia... Q u e M a g n i­
ficai sublim e não e n to a ria a cada passo a Santíssim a V irgem
na sua o r a ç ã o ! ... Q u e desejos os seus de co n v erter a sua
vida num p e rp étu o e contínuo M a g n ific a i de g ra tid ã o ... de
lo u v o r... e de hum ildade p e rfe itíss im a !...
A ltíssim a era a sua o ra ç ã o m as qu an to m ais a lta ela
e ra m ais p ro fu n d a se to rn a v a a sua hum ildade. — P ensa n a
necessidade que tens d e sta virtude e v ai b uscá-la à o ra ç ã o ...
c aqui e n co n trarás com certeza os alicerces fundos em que
ela se baseia.
T am bém crescia na sua o ra ç ã o o seu grande am or e
reverência a D e u s... porque nela ao mesmo tem po que cres­
c ia no conhecim ento d o Senhor, em bebia-se cad a vez mais,
d o am or infinito de D eus à s suas criatu ras, e em p a rticu la r
do que h a v ia tido com E la, sua e s c ra v a ! ... Ali apren d ia a
ap reciar m elhor os d ons e as gra ça s com que a h av ia
enriquecido. P e ra n te a consideração disto, o seu g ra to c o ra ­
ção inflam ava-se e consum ia-se cad a vez m ais em novo fogo
de am or e de desejos de corresponder à divina M ajestade
que assim se d ig n av a p ô r os olhos n ’E !a. — Im agina como
se lhe iria, p o r assim dizer, a alm a a trá s da form osura e
31
482 O ração

san tid ad e de D e u s..., a trá s do Senhor, todo b o n d a d e...,


todo am or p a ra com o s hom ens.
A m am os, de facto, m uito pouco a D eus, po rq u e não
o estu d am o s... n ã o o conhecem os; e este e stu d o e conheci­
m ento só se faz p o r m eio d a o ra ç ã o ; o estudo frio dos
livros pouco dá.
O s santos, ain d a os m ais sábios, com o S. T om ás
d ’A quino, adquirem os m elhores conhecim entos de D eus, na
o ra ç ã o ... E h á alm as rudes e incultas seg u n d o o mundo,
que têm, pela oração, um conhecim ento p ro fu n d o de D eus.
— V ê, pois, se a tu a falta de am or profundo a D eus não
provém d a falta do conhecim ento de D eus, conhecim ento e
ciência que se adquire so b re tu d o na oração.
2.° D im inuição d e la lta s e pecados. — É consequência
n a tu ra l d o prim eiro pon to ..., A m aior força n a v id a sobre­
n a tu ra l..., a m aior crescim ento de virtudes, h á-d e corres­
p o n d e r nas nossas alm as um a m aior dim inuição nos defeitos
e faltas. — E m rig o r a Santíssim a V irgem não p odia conse­
gu ir este fruto, da sua o ra çã o : n ã o tinha pecados que tirar
nem defeitos que c o rrig ir... C ontudo, em certo sentido tam ­
bém p articip o u deste efeito d a o ra ç ã o ... po rq u e nela adquiriu
e aum entou cad a vez m ais o seu conhecim ento do que era o
p e c a d o ..., do m uito que ofendia a D eus p o r pequeno que a
nós nos p a re ç a ... e espontaneam ente b ro ta v a e crescia n'E Ia
o desejo de rep ará-lo , ainda à custa dos m aiores sacrificios...
O que é que E la não estaria disposta a fazer p a ra e v ita r o
m al espantoso que é o p e c a d o ? ! E la, que v ia claram ente
o d an o que o pecad o faz às alm as e a dor e a p ena que faz
ao coração de D e u s..., com o a dm iraria a bondade e mise­
ricórdia do S enhor ao e sp e ra r... ao c h a m a r... a o buscar os
p e c a d o re s... ao oferecer-se a si mesma p a ra os tira r de
e stad o tã o lam e n tá v el... ao sacrificar-se p o r eles!
E p e n etraria no castigo do pecado, realm ente justo,
m as h o rrív e l...: o afastam ento p a ra sem pre de D e u s... a
se p a ra ç ão e te rn a ... a co ndenação da a lm a ... C om o «reali
O ração 483

zaria» a Santíssim a V irg e m estas ideias n a su a o ra ç ã o ? ...


Q u e efeito cau sariam n ’E la ? ... Q u e com paixão n ã o sentiria
p a ra com os que vivem em p e c a d o !... Com o sentiria o desejo
de ser M ãe dos pecadores, p a ra c o o p era r com, seu F ilho
n a o b ra d iv in a d a sa lv aç ão d e le s !...
A qui está um fru to precioso d a o ra ç ã o ... tão útil e tã o
necessário p a ra ti. — T u tam bém n a o ra ç ã o dev es crescer
no conhecim ento do p e c a d o ..., p a ra au m en tar o teu ódio
p rá tic o p a ra com e le ..., o teu desejo de evitá-lo a to d o o
tra n s e ... de re p ará -lo a todo o c u sto ... de com zelo apostó­
lico, sa lv a r a lm a s... a tua, p rim e iro ... depois a dos o u tro s...
D e cla ra g u e rra ao p e c a d o ... esfo rça-te p o r e v ita r as m ais
pequeninas faltas com etidas com deliberação, p a ra assim
não caires n a s m aiores. — N ã o te esqueças de que este será
sem pre um dos m aiores frutos d a tu a oração.
3.“ A u m e n to de santidade. — A isto tendem os esforços
n a oração. M a ria acrescentou em g ra u quase infinito a sua
santidade p e la p rá tic a das v irtu d e s ilum inada e anim ada
pela o ra ç ã o ... A «cheia de g raça» v ia au m en tar considera­
velm ente esta n a su a o ra ç ã o ... A que era tão aceite a D eus,
to rn av a -se cad a vez m ais... e cad a vez lhe d a v a m ais gló­
ria ... e cad a v e z se ap erfeiço av a m ais e se to rn a v a in stru ­
m ento m ais a p to p a ra o s planos que o Senhor tinha sobre
E la em ordem à o b ra gran d io sa da R edenção.
E la h a v ia de ser a C o rre d en to ra dos h o m en s..., a M ãe
dos p e ca d o res..., a O m nipotência su p lica n te... c por isso
p re p ara v a-se p a ra estes fins altíssim os com a sua fervorosa
oração. —• C o n sid erav a a o ração como um a pa rte necessária
e indispensável p a ra o desem penho da su a v o c aç ão de M ãe
de D eus e M ã e nossa.
P o r isso c ra v a com tan to fe rv o r..., com tan to inte­
resse, com tan to g o sto ..., com ta n ta frequência e com tã o
adm irável constância e p e rse v e ra n ç a ...; por isso e n co n trav a
tudo o que queria n a oração.
484 O ração

A qui está o exem ple que h ás-d e se g u ir... T am bém a tua


vocação, seja qual for, te pede o ra ç ã o ... A perfeição e sa n ­
tidade p ró p ria do teu estado obriga-te a o ra r... T am b ém tu
dev es acostum ar-te a b u scar tu d o ... a e sp e ra r tu d o ... a con­
seguir tu d o ... da oração. — Se souberes ser alm a d e oração,
to d as as virtudes se a rra ig a rã o p rofundam eníe na tua alma
e te elev arão insensivelm ente a a ltu ras inconcebíveis.
A s tuas lu ta s c o n tra o am or p ró p rio ... c o n tra o teu
génio e c a rá c te r que tens de re fo rm a r... o d esa p eg a r-te das
coisas d a te rra ... todas as m oções san iificad o ras da tua
a lm a ... todos os teus p rojectos e em presas d e a p o sto la d o ...
to d a a eficácia d a s tu a s súplicas p o r ti ou pelos o u tro s...
a conversão de p e ca d o res... c rem édio de escândalos que
p re te n d as e v ita r... a u n ião das fam ílias... a sa lv a ç ã o dos
teus seres qu erid o s... e a té a s tu a s coisas tem porais, sobre­
tu d o e nquanto têm re la çã o com a v id a d a a lm a ..., tu d o isto
lev a-o à o ra ç ã o ... tra ta -o n a o ra ç ã o ... e v e rás depois o
re su lta d o ..., especiaim ente se a tua o ração é feita com os
olhos em M a ria ... em com panhia de M a ria ... p o r intercessão
de M aria.
42. Amor ao trabalho

l.° A tei d o trabalho. — O trab a lh o é um a lei d a d a


p o r D eus com força o b rig ató ria u n iv e rsa l... P o rta n to nin­
guém está isento dela e é com o que um a lei co n atu ral ao
homem, como diz a E sc ritu ra : O hom em nasceu para trubar
1har com o a avo s p ara v o a r... M esm o n o P a ra íso , A d ão
tra b a lh a v a ... e todos trab a lh a ríam o s ain d a que A d ão não
pecasse. —■P e n e tra -te bem desta ideia fundam ental da neces­
sidade e da racionalidade d o trab a lh o e vê com o o ocioso
não cum pre sequer com a sua condição de homem.
V ê a g o ra a Santíssim a V irg e m ... N em E la se exim e...
nem D eus a dispensa desta lei. — V ê com o trab a lh a e em
i|u è ... Q u e trab a lh o o s e u ! ... N ã o é trab a lh e cóm odo... a g ra ­
d á v e l... p o r p a ssa tem p o ... só p a ra n ã o se a b o rre c e r..., n ã o ;
é trab alh o rude, áspero, m onótono... que aborrece e cansa
e que a nós nos cu sta. — M a ria tra b a lh a n ã o p o r distrair-se
mas p a ra a ju d a r a seu E sposo e a seu F ilho a com er o p ã o
g a n h o com su as m ãos e am assado com os seus su o re s ...;
rm p reg a-se em coisas vis, p ró p rias de criadas, de escrav as
e não de se n h o ra s...: trab a lh a como e sc rav azin h a do S e n h o r...
V ê como v a rre ... com c e sfre g a ... com o fia ... e com o
rem enda as ro u p a s pobres de S. José c de Jesus... Com o
coze o p ã o e p re p a ra a com ida... com o v ai b u sc a r á g u a à
fo n te..., etc. — V ê com o aquelas m ãos v irg in a is se tornam
usperas à força de tra b a lh a r... C ontem pla a su a fronte
puríssim a b an h ad a, p o r vezes, com gotas de su o r...
486 A m o r a o trabalho

V ê como se c a n s a ... com o se fatiga com o trabalho


v u lg ar, com o um a m ulher qualquer, com o um a d a s suas
vizinhas. — A cabaram -se já as revelações e os m ila g re s ...;
já n ã o recebe m ensagens d o c é u ... nem vêm os anjos servi-la
e a ju d á -la ...; ag o ra é a sim ples o p e rária de N a z a ré ..., a
esp o sa de um po b re carpinteiro, e contudo, E la é a R ainha
e Im peratriz do C éu 1 ! !
E a p esar disso, D eu s n ã o a exim e da lei penosa do tra ­
b a lh o ... D eus p odia fa ze r descer sobre a casa de N azaré,
m aná m ila g ro so ...; p odia fa ze r que a te rra lhes oferecesse
espontaneam ente os seus fru to s ...; podia, enfim , sustentá-los
de m uitos m odos sem que trabalhassem ....; m as não quis
p o u p a r à fam ília de N a z a ré nenhum sofrim ento que traz
consigo a vida de trab alh o . — E M aria, p o r su a p a rte , via
n o trab a lh o um d e v e r sa g ra d o que tinha que cum prir p a ra
fazer a v o n tad e de D eus.
2 ° A virtude do trabalho. — A necessidade do trab alh o
tran sfo rm o u -a a S antíssim a V irg em num a fonte de virtudes
e de g randes m erecim entos. — O trabalho, além de ser uma
lei n a tu ra l, é actualm ente tam bém um castigo im posto p e r
D eus ao pecado.
A n a tu re za só p arece conceder os seus tesoiros ao
hom em m ediante o trab a lh o d e ste... Q u a n to s segredos...
q u a n ta s forças o c u lta s... q u a n ta riqueza n ã o en ce rra a n a tu ­
r e z a ! ... Só o trab a lh o d a rá ao homem estes b e n s... Q ue
hum ilhante isto não é p a ra n ó s ! ... T e r de com er e não
p o d e r satisfazer esta necessidade sem t r a b a lh a r ! ...
M as, no mesmo castigo, ain d a que p a reç a tão duro,
ad m ira a bondade de D e u s... que de ta l m odo o dulcifica que
o to rn a apetecível e a g ra d á v e l ao v e r o hom em o s muitos
bens que do trab alh o pode tira r p a ra o seu c orpo e p a ra a
s u a alm a. — E como se isto fosse pouco, ain d a o suaviza
m ais com o exem plo san tific ad o r que E le mesmo nos deu.
C risto quis ser um tra b a lh a d o r e filho de pobres tra b a ­
lh a d o re s... e de tal m odo santificou o trabalho, que desde
A m o r ao trabalho 487

então este não é c a s tig o ... nem hu m ilh an te... ne.ra p en o so ...
Que.m po d erá queixar-se do trab a lh o vendo trab a lh a r
a Deus? — Com este exem plo a prendeu M a ria a tra b a lh a r...
V ê com o E la trab alh a:
E xterio rm e n te — com diligência e a c tiv idade incessante,
sem adm itir n a d a d e frouxidão p ró p ria d a .m andriice..., com
gran d e constância, m esmo no meio do seu can saço natural,
vencendo e repelindo o aborrecim ento fácil do.s que se can ­
sam com tu d o ...; com p a z e tranquilidade, sem as a tra p a ­
lhações e p ressas dos que querem a c a b a r qu an to antes o
trabalho e p a ra isso fazem -no inquieta e a ta b alh o a d am en te ...;
com grande com postura e recato, e v ita n d o qualquer le v ia n ­
d a d e ... e essa liberdade de m ovim entos com que operam as
alm as dissipadas e pouco cuidadosas d a sua m odéstia e
recolhim ento...
Interiorm ente —• com um a grande alegria e com uma
gran d e sa tisfa ç ã o .... sem pre contente com a sua so rte ... sem
inveja de ninguém , sem ânsia de ter o u tro s trabalhos .mais
cómodos, mais rendosos, mais b rilh a n tes... T ã o contente
a n d av a nos trab a lh o s rudes e o rd in á rio s... que parecia ter
nascido p a ra eles.
V ê, além disso, com o trab alh a p o r o bediência: é essa a
v ontade de D eus e com o sua e scrav azin h a assim a cum pre
e x actissim am en te! .. .;
P o r m ortificação: o trabalho é um a das m aiores m o r­
tificações... ;
P or amor: é esta a n e ta suavíssim a e su a v iza d o ra do seu
trabalho. E stá trab alh an d o p o r am or de D e u s... por am or
ao seu E sp o so ... p o r am or ao seu F ilh o ... É assim que sa n ­
tifica e suav iza o seu trabalho de tal m odo que n ada ihe
parece custoso.
E assim todo o trabalho se tran sfo rm a num contínuo
acto de oração, pois o trab alh o nestas condições não só não
dissipa a alm a senão que a aproxim a m ais e m ais de D eus.
3." O prém io do tra b a lh o .—’T a l trab a lh e D eus p re ­
488 A m o r ao trabalho

m eia-o com a grande p a z que dá à alm a de riv a d a d e esta


v e r a v o n tad e de D eus cum prida e do afastam en to ou dimi­
nuição das ocasiões de pecad o e das tentações. — £ evidente
que o dem ónio a p ro v eita a ociosidade p a ra lev a r ao pecado.
D eus prem eia tam bém o trab alh o com m aiores facili­
dades em o ra r..., com os frutos grandes deriv ad o s d a grande
m ortificação que é o trab a lh e .
lie p a ra bem se o teu trab a lh o é assim e se tiras dele estes
frutos. — N ã o confundas trab a lh o co,m o c u p a ç ã o ... Se te
o cu p as em coisas que te a g ra d a m ... se o teu trab a lh o con­
siste em a n d a r dum lad o p a ra o o u tro ..., em com eçar e deixar
um a c o is a ..., se trab a lh a s enfim só p o r cap rich o e segundo
o teu bel-prazer, não tenhas dúv id a que, ain d a que estejas
m uito ocupado, is,so n ã o é tra b a lh a r... não é cum prir a v o n ­
tad e de D e u s... não é b u sc a r a D eus, .mas sim a ti mesmo.
C om para o teu trab alh o e o teu m odo de tra b a lh a r com
o d e M a ria e diz depois em que se p a re c e ... e isso que p a ra
ti é m ais necessário o trab a lh o do que p a ra E la ...
N ecessitas de tra b a lh a r p a ra bem do teu corpo, p a ra o
seu d e senvolvim ento... p a ra a sua sa ú d e ... p a ra em pregar
bem os talentos e as qualidades que D eus te d e u ...
N ecessitas de tra b a lh a r p a ra bem da tua a lm a ... p a ra
form ar o teu c a rá c te r... p a ra dom inar as tuas p a ix õ e s... para
v en cer o teu am or p ró p rio ... p a ra a tua o ra ç ã o mesmo na
qual p e rd erá s o tem po se nela não tra b a lh a s... p a ra vencer
as tentações, pois o trab a lh o te dá meios p a ra isso ... p ara
te defenderes d a o c io sid a d e..., da m u n d an e id ad e ..., d a s con­
v e rsas frív o la s... ou p ecam inosas contra a caridade, etc.
P e d e à Santíssim a V irgem que te dê um p o u c o d o seu
esp írito de trabalho, p a ra que o trab alh o se torne p a ra ti
tam bém num a fonte de m uitas e g randes v irtu d e s... e no
meio m ais fácil e seguro de re p a ra r e sa tisfa z e r ao Senhor
pelos teus p e c a d o s ...; que sem pre trab alh es em com panhia
de M a ria, sem perder, nem um instante, a su a presen ça santl-
ficadora.
43. Paciência e resignação

l.° P aciência nos sofrim entos. — Já dissem os e estam os


convencidos que n ã o podem os v iv e r sem so frim en to s...
A cruz; espera-nos onde e quando m enos o esperam os. —
É inútil e ridículo o te n ta r e sc ap a r-lh e ..., o querer a lijá -la ...;
é v ã o o em penhe e.m e v ita r a dor e o sofrim en to ... Penas,
dores, angústias, hum ilhações, contratem pos, etc., e espe­
ram -nos constantem ente. — P o rta n to a única atitude racional,
a única atitude c ris tã ... consiste em sab er so fre r..., em buscar
o m odo de co n v erter a d o r em fonte d e m erecim entos..., em
causa e princípio de g randes e v e rd ad e ira s a le g ria s...
Li qual é esse modo? D e h á m uito foi encontrado e ensi­
nado pràticam en te p o r Jesus e ívíaria: é so fre r com paciência
e resignação.
V ê com o Jesus su p o rta os rigores da sua p o b re z a ...,
o cansaço do seu tra b a lh o ..., a perseguição dos seus inim i­
gos. — Sobre E le choveram as calúnias, as acusações e as
in v eja s... todos os m ales vieram sobre E le ..., todas as
dores d a alm a e d o corpo se ap o d era ram d 'E le ... O ecu, a
terra, o in fern o ..., e a té mesmo seu P a i..., tudo p a rec ia
h aver-se con ju rad o c o n tra E le ...
C ontudo, de que m odo se avém no m eio de tanto so fri­
m en to ?...
49d P aciência e resignação

A d m ira o seu silên c io ..., a sua resignação..., a sua


paciência in a lte rá v el! ...
E a Santíssim a V irgem ?
L em bra-te dela n a su a viagem a Belém : a viagem
d u ra ..., a estação á s p e ra ..., a su a situ ação d e lic a d a ... Sem
recursos, sofre as p riv açõ es da p o b re z a ... as p o rta s das
h o sp ed arias e das casas fecham -se p a ra os santos
E s p o s o s ...; só um estábulo d esab rig ad o e p ouco lim po será
o palácio real p a ra seu F ilh o ! ... Q u e d o r ! ... que sofrim ento
p a ra o seu c o ra ç ã o !...
C ontudo, tranquila..., resig n a d a ..., p a c ie n te... abraçar-se
com o que D eus lhe m anda.
Q u e lição p a ra as nossas queixas e im paciências!
Le,inbra-te dela na noite triste do seu d e ste rro ... T ev e
de d e ix a r tudo: a sua c a s in h a ..., os seus p a re n te s ..., a s suas
a m iz ad e s..., a tranquilidade e doçura daquela v id a ...; tu d o ...,
tu d o ..., e de re p en te... e de n o ite ... e fu g in d o ...
Com o reag e a V irgem Santíssim a? Im aginas p o rv e n tu ra
que se d esgostou? que disse algum a p a la v ra de e sp an to ou
de in q uietação ou de m edo o u de aborrecim ento? T u , sim,
di-las-ias e em grande núm ero e p o r m otivos m uito m enores...
P e n s a ... m e d ita ... e en v erg o n h a-íe das tu as im paciên­
c ia s..., d a tu a falta de re sig n aç ão ... sendo que tu és culpado
e p o rta n to m erecias tudo o que sofres e m uito mais.
2.° N o seu trato com o próxim o. —• A qui está o u tra
fonte d a s nessas im paciências. — Q u e m al costum am os supor­
ta r as adversidades e as fraquezas do nosso próxim o! —
Q u erem o s que nos tolerem a n ó s..., que nos aguentem nas
sa íd as do nosso génio o u nas nossas exquisitíces... m as como
nos cu sta tclerá-las aos o u tro s ! com o querem os que dissi­
mulem os nossos defeitos e com o som os duros p a ra com os
defeitos do próxim o! M ais ainda: julgam os que nós não
som es assim, que não fazem os tal c o isa... que não procede­
m os com o os o u tro s..., que dizer, n ã o vem os a trav e nos
nossos olhos e som os linces p a ra ver o arg u eiro n e s olhos
P aciência e resignação -S91

do próxim o. —• N ã o é esta m uitas vezes a ra zã o dos nossos


aborrecim entos, d a s nossas inquietações, dos nossos d e s­
g o sto s? ...
C om p ara-te com a Santíssim a V irgem no seu tra to com
o p ró x im o ...
Com o trato u E la aqueles paren tes e am igos que lhe
fecharam as p o rtas em B elém ?... Q u e insultos c u que p a la ­
v ra s de desprezo o u d e v in g an ç a ou m esm o de queixa lhes
disse?
E no C a lv á rio ... que disse aos v erd u g o s quando a to r­
m entavam e cru cificav am seu divino Filho? ... Q ueixou-se
p o rv e n tu ra d a su a crueldade, d a su a barb arid ad e, da sua
in g ra ta e in ju sta c o n d u ta ? ... Q u a n to n ãc teve que sofrer
a Santíssim a V irgem com a ign o rân cia dos discípulos... com
a grosseria d aq u ela g e n te ... com as invejas dos judeus e dos
sacerdotes que não descansavam n a su a perseguição c o n tra
C risto! M as, que paciência com to d c s ! ... que doçura no seu
tra to com to d o s ! ... Q u a n ta b o ndade! Q u a n ta condescen­
dência tão m atern al e tão c a rin h o s a !...
N um a o u n o u tra ocasião, até o seu p róprio Filho parece
que lhe responde fria e desdenhosam ente: Para que me bus­
c á v e is? — diz-lhe, q u ando fica no tem plo... M ulher, que nos
im porta isto a ti e a m im l — responde-lhe assim nas bodas
de C a n á ...
Q u em é m inha m ãe e m eus irmãos? O que [az a vontade
de D eus, esse é m inha m ãe, assim diz a c s que o avisam que
sua m ãe o está e sp e ra n d o ... Q u e re s p o s ta s !... Com .muito
menos tu ficaste ressentido e desgostoso com o teu p ró x im o ...
M aria, pelo contrário, com a serenidade e doçura do seu
rosto, m ostra que n ã o se a b o rre c e ..., que não se d e sg o sta ...;
tudo g u a rd a no seu c oração p a ra a sós m editar e tira r p ro ­
veito do sentido m isterioso dessas respostas.
A h! se tu em tudo visses tam bém esse m istério, isto é,
a v ontade de D eus a tra v é s das p ro v a s e castigos, como
receberias as resp o stas que te d ã o ! ... C om o respondes aos
492 P aciência e resignação

teus su p e rio res... ig u a is... e in ferio res?... R ecorda aquilo


de S. A gostinho: S e tu não sofrerás aos outros quem te
sofrerá a t i l . . . P o r isso nos diz S. P au lo : S e d e pacientes
com to d o s... Q u a n to s desgostos te p o u p a ria s se fosses
hum ilde com os que te rodeiam e levasses com e sp írito de
c arid ad e e com, paciência tudo o que nos o u tro s te d e sa ­
g ra d a ! ...
3.“ P aciência no fervo r. —<A té no fe rv o r e no zelo
e n tra a p a ciên c ia... H á s-d e ser p aciente c o n tig o ..., n ã o que­
rendo fazer todas as coisas im ediatam ente e de re p e n te ...;
n ã o p o d erás v encer um a te n ta ç ã o ..., d om inar um a p a ix ã o ...,
e v ita r um a q u e d a... com o tu d e se ja ria s... N ã o te apoquentes,
tem p a c iê n c ia ...; n ã o d esan im es..., continua trabalhando,
cad a vez com m aiores b rio s..., com m aior desco n fian ça de
ti... m as com m aior co nfiança em D eus.
N ã o sejas tam bém p recipitado nas tuas obras de apos­
to la d o ...
Z e lo m aior do que o de N o ssa S enhora n ã o poderás
te r e no e n .a n to vê com o E la procede com paciência no tra ­
balho d a santificação d a Ig reja que nascia. Q u a n ta s m esqui­
nhezes e m isérias nos prim eiros d isc íp u lo s!... q u a n ta rudeza
e ig n o rân cia não enco n tro u n e le s !
M as com paciência vai-o s p re p ara n d o e form ando a
pouco e p o u c o ... É que E la fei a que m ais a p ro v eito u a
lição d ’A quele que disse: A p re n d ei de m im qw: sou manso
e hum ilde d e coração. — A m ansidão e a paciência sã o v ir­
tudes do C o ra çã o de Jesus e do Im aculado C o ra ç ã o de
M a ria ... p o rtan io .
Q u e paciência a de Jesus com os seus in im ig o s!... e
m esmo contigo e com to d o s !... N ã o espera anos c anos...
à s postas dos corações hum anos? ... N ã o era tem po de se
h a v e r c ansado de ta n to e sp e ra r? ... e de nos ter a b an d o ­
n a d o a todos? ...
A prende a ser p aciente contigo e com os outros.
P aciência e resignação 493

A paciência é a que só pode lev a r a cabo g randes obras.


É virlu d e p o rta n to a ex ercitar m uito n a vida espiritual.
T o d a a o b ra p o r boa c bela que seja e strag a-se sem a
p a ciên c ia... A s o b ras de D eus não se fazem com p re cip ita ­
ç ã o ... D á tem po ao tem po e espera que chegue o m omento
disposto pelo S e n h o r...
E xam ina-te bem n esta m atéria e pede à Santíssim a V ir ­
gem que te faça p articip a n te da sua paciência p a ra assim a
im itares na p a z in alterá v el de que sem pre gozou, ainda no
m eio das m aiores p ro v a s e tribulações.
44. Mansidão

l.° E m que consiste. — É com panheira insep aráv el da


p a c iê n c ia ...; às vezes é um a consequência d e la ... e chega
a té a confundir-se com a mesma.
A m ansidão é a v irtu d e o p o sta à i r a ...; o nervosism o...
o u o aborrecim ento que tem os em m uitas ocasiões, quando
as ocasiões não saem ao nosso g e sto ..., quando D eus trans­
to rn a os nossos p la n o s ..., quando nos con trariam e procuram
im por-se a n ó s... são tu d o coisas c o n trá ria s à m ansidão.
O irar-n o s contra nós m esm os pelas nossas fa ltas...
pelos nossos d e sa ce rto s... p elas nossas grandes m iséria s...;
O irar-nos contra D e u s p o r causa das tribulações...
co n tra te m p o s... reveses da fo rtu n a... d e sg ra ç a s... ou até
talvez p o r causa das securas e p ro v a s que nos m a n d a ;
O irar-nos contra o nosso próxim o pelos m aus tratos
o u perseguições de que nos faz o bjecto;
T u d o isto é c o n tra a m ansidão. E tudo isto refreia e
dom ina a m ansidão fazendo-nes ju lg a r... fa la r... e ag ir com
bondade e com doçura.
N ã o nos exige a m ansidão que sejam os insensíveis ou
que recebem os com indiferença os factos que nos e x a sp e ra m ;
o que exige é que saibam os então dom inar-nos de tal m odo
que sejam os nós os senhores desses sentim entos e não eles
de nós.
N ã o é c o n tra a m ansidão — longe disso — o irar-se
M ansidão 495

algum as v ezes com, ju sta causa e com ju sta m edida, isto é,


sem u ltra p a ssa r os lim ites d a ra zã o : assim procedeu N osso
Senhor Jesus C risto quando a açoites expulsou os p ro fa n a -
dores do T em p lo ; assim procedeu M oisés q u ando lançou
p o r terra as T á b u a s da Lei.
E sta ira é lo u v ad a na S a g ra d a E sc ritu ra : quando lá se
diz: «irai-vos m as não pequeis»... E sta ira é filha d o zelo
d a glória de D e u s... e m uito diferente da que b ro ta d a im p a ­
ciên cia... do g é n io ... e do am or p ró p rio ... M esm o assim esta
ira sa n ta é m uito difícil n a p rá tic a ... po rq u e supõe um
gran d e dom ínio d a s nossas paixões, que é ra ro ...
N ã o é isto o que te diz a tua experiência? ... — Julgavas
ser teu dev er c o rta r tal a b u so ... co rrig ir tal o u tal p e sso a ...,
e tc .; m as n a realidade excedeste-te na form a de c o rrig ir...
e o que com eçaste com razão, acabou ccm paixão.
P o rta n to lem bra-te bem que é difícil sa b e r irar-se
quando con v ém ... e p o r isso ain d a q uando teoricam ente
tenhas ra zã o p a ra isso ... p ràticam ente deves abster-te de a ti­
tudes irad as e p ro ced er sem pre com afabilidade e bondade.
Ê m uito conhecido o que disse S. V icente de Paulo, que
só usou três v ezes de palavras {orles e duras para repreen­
der com razão e sem pre se arrependeu disso pelo m au resul­
tado que obteve. — Se assim falam os santos que deverás
fazer e p ro p o r tu ? ...
2." A m ansidão dc M aria. — E n tra n a pequenina casa
de N a z a ré e ten ta su rp reen d er a Santíssim a V irgem n a l­
gum a das su as ocupações. — N ã o julgues que lhe fa ltaria
m atéria de d e sg o sto s...
O seu c ará cte r e a sua m aneira de v e r e de ser chocar-
-se-iam com a ru d eza d a pobre gente de N a z a ré ... com as
superstições e erros dos id ó la tras do E g ip to ... com a
soberba, egoísm o, a v a re z a e até lu x ú ria das colónias de
judeus ali existentes. C ontudo E la não perde nunca o seu
sorriso d e b o n d a d e... o seu trato a fá v e l... a sua serenidade
im perturbável.
4% M ansidão

M u itas vezes iriam à oficina de S. José q u eixar-se de


defeitos n a execução des trabalhos, exigindo talvez e d ev o ­
lu ção do d in h eiro ... o u dim inuição do preço c o n tra ta d o ...
o u en tão dando-o de .muito m á v o n tad e ... E esies abusos
dar-se-iam precisam ente porque M a ria e José nunca se ab o r­
re ciam ... E se a m aior p a rte dos fregueses eram dom inados
pela bondade e lealdade de S. José e de N o ssa S enhora
n ã o faltariam alguns que explorariam esta m esm a bondade.
Im agina um a dessas cenas tão frequentes sobretudo entre
gente grosseira e sem cu ltu ra de espécie a lg u m a ... Com o
se n tira a Santíssim a V irgem certas faltas d a m ais elem entar
delicadeza sobretudo quando eram d irigidas c o n tra o seu
sa n to E sp o so o u c ontra o seu divino F ilh o ! ...
Q u e v o n tad e não sentiria de queixar-se com as vizi­
n h a s ... com os p a re n te s ... contando-lhes o que se p a s­
s a v a ! ..., etc.
N ã o é isto o que se p a ssa c o n tig o ? ... N ã o é isto o que
tu ju lg as o m ais n a tu ra l do m unde? ... N ã o te desculpas
m uitas vezes nestas ocasiões com dizeres que sentes neces­
sid a d e de d e sa b a fa r? ...
E assim , sem dizeres tudo o que te vem à b o c a ... sem
uns quantos berros ou p a la v ra s desco m p o stas... sem ires
com a h istó ria a este e àquele, contada, cla ro está, a teu
m odo deitando as culpas sobre o o u tro e tendo tu a ra z ã o ...
sem isto não ficas satisfeito.
O ra bem, q u ando fizeres assim, o lh a p a ra M a ria e vê
q u ão pouco te pareces com o m odelo... e id ea l... N unca
p rocedeu assim M a ria ..., nunca se julgou com d ireito a tais
desabafos.
R e p ara nos seus m o d o s... g ra v a a sua im agem benéfica
de serenidade no teu c o ra ç ã o ...; nunca a vereis a zed a...
á s p e ra ... d u ra ... ir a d a ...; sem pre a e n co n trarás cheia de
b o n d a d e ..., de c o m p a ix ão ..., de c a rid a d e ..., de m isericór­
d ia ..., d e a m o r...; modelo, enfim , perfeito de m ansidão.
3.° C onsequência. ■ — V ê ag o ra as consequências de um
M ansidão 497

e o u tro proceder. — A m an sid ão gera sim p atias... a tra ctiv o s


espirituais nas a lm a s... sobrepõe-se a tudo e tudo vence e
dom ina. — R e p ara num a pessoa afável e b o n d o sa ...: toda
a gente a e stim a ..., os seus conselhos são sem pre se g u id o s...,
as su as correcções são sem pre eficazes... S uavem ente e como
quem não q uer n ad a a rra sta as alm as a trá s d e si..., vive
num am biente de p az que e n c a n ta ..., tem um c oração grande
com que am a a todos, seja a quem for, e p o r su a vez todos
a am am e estim am .
A alm a cheia de bondade e m ansidão p arece que, no
tra to com os outros, não quer v e r a m alicia que a ro d e ia ...;
tudo in te rp reta à boa p a r te ...; tudo d e s c u lp a ...; adm ite de
bom grad o todas as desculpas que lhe dão, se não é ela
a prim eira a a d ia n tar-se a dá-las.
A m ansidão assim d ila ta as alm as e o s c o ra ç õ e s ...; não
pode existir senão em corações g ra n d e s..., não em corações
cheios de ruindade. — P e lo contrário, exam ina a um a pessoa
ira c u n d a ..., im p acien te..., ra n co ro sa ... Q u e a n tip a tia a rodeia!
T em -se receio d e tra ta r ccm e la ..., tem de se a n d a r com mil
a te n ç õ e s...; p a ra a não ferir n ã o se pode u sa r de franqueza
nenhum a com e la ... não seja caso que v á s a lta r... Q u a n to
dano não p ro d u z !... Q u a n to bem não d eix a de p ra tic a r ! ...
Q u a n ta s coisas não im pede precisam ente pelo seu c ará cte r!...
pelo seu m odo de ser tão difícil... tão quesilhento. T u d o
a o fe n d e ..., tudo lhe faz .m al..., em tudo vê m istérios....
segundas in te n ç õ es..., enfim, n ã o sabe g o v e rn ar-se a si
m esm a... e é incapaz de g o v e rn ar os o u tro s ...; é incapaz
para m a n d a r..., p a ra a co n selh ar..., p a ra corrigir.
V ê como p ra tica s esta v irtu d e ... em que a ltu ra de encon­
tras n e la ... T a lv e z tenhas m uito que corrigir.
Com a aju d a de M aria, a n im a -te ..., c o rrig e -te ... e
v en ce-te...

S2
45. Doçura

í . u Beleza incomparável. — É sem d ú v id a belíssim a


esta virtu d e que ta n ta relação tem com a m an sid ã o ...
C ham ou alguém à d o ç u ra «a flor da mansidão»...
A d o ç u ra é reaLmente o com plem ento, a co ro a d a m ansidão...
P o d e ter-se a m ansidão que reprim a e dom ine os im petos
de um génio irascível m as pode fa ltar a do çu ra p a ra m os­
tra r en tão m esmo um ro sto afável e p a la v ra s suaves.
Só o que possui a .mansidão perfeita e totalm ente é que
ao mesmo tem po que su je ita a su a p a ix ã o sa b e p ô r nos seus
a c to s..., nos seus g e sto s..., n a s suas p a la v ra s sobretudo, a
su a v id ad e que caracteriza a d o ç u ra...
E quão sublim e e q u ão form osa n ã o é esta virtu d e!
Q u e a tra ctiv o s os seus tã o e n c a n ta d o re s !... C om o a rra sta
a toda a g e n te !... É im possível resistir o u c o n tra ria r a uma
pessoa d o ta d a d a d o ç u ra ...
A ela q u a d ra bem a b em -av en tu ran ça de C risto : Bem­
-aventurados os mansos porque eles possuirão a terra...
A m ansidão e a d o ç u ra fazem -se senhoras de todos os co ra ­
ções. —• N ã o há ninguém que resista à su a força poderosa.
—• A té mesmo as feras se a b ran d a m e se rendem com n
d o ç u ra ... G ráfica e expressivam ente o dizem os n a linguagem
fam iliar: «caçam -se m ais m oscas ccm um a g o ta de mel
do que com um a pipa de vinagre».
A doçura é v irtu d e am ada particu larm en te p o r Cristo,
D oçura 499

de quem se disse que «não quebraria a cana já ra ch a d a nem


e xtinguiria de todo a m echa ainda fu m e g a n te » ...; quis ser
rep resen tad o n a fig u ra de um cordeirinho que docem ente se
deixa to sq u iar e a té sa c rifica r sem queixas nem protestos.
—• A su a d o ç u ra estendeu-se aos pecad o res a quem recebia
com su a v id ad e e a quem absolvia com a m o r...; foi d u ro com
o pecado, m as não com o p e c a d o r...
A té m esm o aos seus v erd u g o s tra to u com doçu ra:
p e rd o a-lh es... d e sc u lp a -o s... e a d v o g a até em fa v o r d e le s...
— L em bra to d as as su as p a la v ra s n a C ru z ..., to d as são mel
d u lcíssim o ...; até p a ra se qu eix ar d a su a sede a b rasa d o ra
e do d esam p aro de seu P ai, o faz dulcissim am ente.
C ó p ia exactíssim a d a do çu ra de C risto, foi a S a n tís­
sim a V irg e m ...; nela tudo é do çu ra e p o r isso é tão
a tra e n te ; nela n a d a h á que a fa ste ... que a ssu ste ... que
re tra ia ... O seu nom e só é co m parável em do çu ra ao de
Je su s... N ã o sab o reaste mil vezes a suavíssim a consolação
que o nom e d e M a ria traz às alm as? M a s D eus p arece que
quis reunir- nela to d a a doçura possivel e p a ra isso fé-la
M ã e ... E com isto está dito tudo: d izer M ãe é dizer ter­
n u ra, carinho, mimos, abraços, b e ijo s..., m as tudo dulcis­
sim am ente com o sói sê-lo um a M ãe. — Assim foi M aria,
a doce M ãe d e Je su s... A ssim foi M a ria , a dulcíssim a M ãe
n o ss a ... B elíssim a v ir tu d e ! ... virtu d e e n c a n ta d o ra !... P o r que
n ã o te inebrias com o s seus a tra ctiv o s ? ...
2.° D oçuras falsas. — M as, a i ! n ã o te enganes confun­
din d o a v irtu d e com o vicio. — É que h á d oçuras falsas.

—• B m uito falsa a do çu ra p ieg as e p e g ajo sa que busca
expressões d e a d u la çã o e que n ã o tem o u tro fim senão
a g r a d a r ...; a do çu ra afectad a e indiscreta e até p erigosa,
que é a p ró d ig a em c aricias p a ra m endigar afectos terre n o s...;
a do çu ra p uram ente m undana dos sorrisos exteriores e d a s
p a la v ra s m eladas que lo u v a e adula p o r diante e critica
p o r d e trá s ...; a do çu ra de m era cortesia que se usa tan to
na v id a de sociedade tão po stiça e tão falsa às v e z e s...
500 Doçura

C om o é repugnante tal d o ç u ra !... E como é diferente da


v e rd a d e ira que bro ta d o c oração do b o n d o so !..., d o c o ra ­
ção que am a e se com padece a v a le r..., do c o raç ão bom
que com unica a bondade ao ex terio r dum m odo delicado,
sim ples e sem violência!
T am bém é falsa a d o ç u ra que se confunde com a b ra n ­
d u ra e fraqueza de c a rá c te r..., que é débil e condescendente
com tudo, ainda mesmo com o que se n ã o d e v e condescen­
d e r... que é cobarde e pusilânim e e tudo deixa p a ssa r e a
tudo cala p o r com odidade.... p a ra não m eter-se em sa ri­
lh o s..., p a ra não se in co m o d a r... ou talvez p o r respeitos
hum anos.
A doçura sa n ta é suave nos m edos, m as forte, en ér­
gica, decidida no fundo. Põe em frente um o b jectiv o e sem
v acilações e com em penho av an ç a p a ra e le ..., m as, isso sim,
sem ferir, sem ex asp erar, insinuando-se n a s alm as, p ene­
tran d o suavem ente e sem barulho, como o aze ite . . . — '■Pela
fa lta de decisão, pela falsa do çu ra castigou D eus a H eli. —
E o E sp írito S anto mesmo nos diz que de m odo contrário
p ro ced e a mesma P ro v id ê n cia divina que é forte e suave no
d irig ir tu d o ... levando as coisas ao fim com firm eza inque­
b ra n tá v el m as p o r meios tão su av es que às vezes nos são
im perceptíveis e nos parecem coisas naturalíssim as.
F inalm ente, tam bém n ã o é doçura verd ad eira, a doçura
de o c a siã o ... ou a jactos interm itentes... só é d o ç u ra v e rd a ­
d e ira a que é constante e c o n tín u a .—‘É fácil se r suave
quando estam os c o n te n tes... a le g res... quando tudo nos sai
b em ... M a s quando chega □ c o n tra rie d a d e ? ... E n tã o é
q u ando se p ro v a o v a lo r e a têm pera d a doçura, se ela
resiste a todas as p rovas. — C ontem pla a tua M ãe q u e rid a ...
D ia n te dos seus exem plos exam ina as c ara cte rística s da
v e rd a d e ira e da falsa d o ç u ra ... e verás, com o sem pre, que
E la é m odelo acabado, exem plar pe rfe ito de tal virtude.
3." A tua doçura. — E xam ina pois a tua do çu ra e os
meios que hás-de em pregar p a ra a a dquirir o u a u m en tar...
D oçura 501

p a ra assim p ro c u ra re s p arecer-te algum a coisa com tua


M ã e querida.
Se és de n a tu ra l suave c a fá v e l..., de tem peram ento
quieto e sossegado p ro cu ra to rn a r so b re n atu ra l essa virtude
de carácter, realizando actos n ã o maquinal,m ente m as sim
com inteira deliberação de q u e rer im itar assim a Santíssim a
V irg e m ... e agrad ece-lh e p o r tão fàcilm entc o poderes fazer.
Se, pelo con trário , és de c ará cte r duro, vivo, n e rv o so ...
mesmo colérico e irac u n d o ..., não te esqueças de que assim
era S. F rancisco de S ales que de tal m odo se dom inou que
é o san to p o r antonom ásia, da d o ç u ra ... E sc u ta estas suas
p a la v ra s tão conform es com o seu procedim ento: «Sede
o m ais su a v e que p u d e rd e s; se se há-de fa lta r p o r algum
excesso, que seja pelo da d o ç u ra ...; a d ureza tudo deita
a perder, irrita os corações e pro d u z ó d io s ...; devem os
a tra ir as alm as com o os perfum es nos atraem, a nós, pela
suav id ad e do seu cheiro»...
E sforça-te pois por vencer pouco a pouco, com a g raça
de D eus, o teu gén io n a tu ra l... e não desistas de ser doce
e suave, p o r m ais que isto te custe. A qui podes ap licar
aquela sentença: «o que custa é o que vale». — E xam ina
pois qual é a tua do çu ra e vê se se estriba nestes dois
fundam entos essenciais: a firm e za e a suavidade.
P ede a Jesus e a M aria com frequência esta g ra ç a ...;
sobretudo nas ocasiões difíceis lem bra-te de tu a M ãe e
p e rg u n ta -te a ti m esm o: « Q u e fa ria E la a g o ra ? ... que
d iria ...» e procede segundo a resp o sta recebida. V ig ia os
m ovim entos do teu am or próprio, que é o que se rebela
sem pre e o que te faz c a ir ...; faz com firm eza e com en er­
gia o exam e p a rtic u la r sobre esta m atéria, até no tares que
já conseguiste um grande dom ínio sobre o teu carácter.
46. Doçura na família

l.° V erdade triste. — T u d o o que dissem os n a m edita-


ção a n te rio r deve, com o é n a tu ra l, ap licar-se a todos os
actos d a nossa vida e m ais em p a rtic u la r aos actos d a vida
d e fa m ília ...; parece que neles é que d ev ia a p a re c e r mais
a doçura e a bondade do nosso tr a to ...; m as n ã o é v e r­
d a d e que se dá infelizm ente o contrário?
É frequente que a m esm a confiança e intim idade da
v id a d e fam ília, gera à -v o n ta d e s que não se usam com os
de fo ra e é triste te r de reconhecer que m uitíssim as vezes
se têm m ais atenções com os de fora do que com os de c a sa ...
Q u a n ta s pessoas não h á que p o r g u a rd a r a co rtesia social
sã o no seu tra to am áveis, carinhosos, indulgentes e suavís­
sim os com os de fo ra e reservam p a ra os de casa as saídas
d o seu m au hum or, dos seus desgostos e c o n tra te m p o s!...
O la r que dev ia se r a sede do am or e da doçura é
m uitas vezes a sede d a aspereza e do aborrecim ento que
o riginam rixas e dissensões — torm ento e cruz dos seus
m oradores. — U m sa n to d izia que há m uitos (fine na rua
parecem anjos m as q u e em sua casa são d e m ó n io s... E isto
pode dizer-se tam bém d a v id a d e am izade... e a té da vida
com um re lig io sa ... N ã o é um a v erd ad e m uito triste que não
fa lta quem com o seu génio m al con tid o ... com o seu carácter
pouco m ortificado... se expressa às vezes com palavras,
com gestos, com m ovim entos c u actos pouco edificantes e
D oçura na fam ília 503

que servem p a ra fazer so frer os seus irm ã o s? ... Como é


bom e belo ver os Irmãos unidos como se fossem uma só
co isa l... A ssim dizia o S a lm ista ... M as isto não se verificará
se neles n ã o reina a carid ad e e a doçura, que quando é
v e rd ad e ira v irtu d e p ro ced e da p ró p ria c arid a d e ...
2.° O exemplo. — V ê o exem plo d esta doçura fam i­
liar, v erd ad eiram en te incom parável, n a Santíssim a V irg e m ...
Q u e longe e sta v a E la de a m a rg u ra r a vida a S. José
e ao M enino J e s u s !...
A p o b reza em que v iv ia m ... a falta de m uitas coisas
necessárias e convenientes podiam te r excitado n 'E la as
im paciências, c s desgostos, o m au hum or e com tudo isto
haver-se saído em q u e ix a s..., em p a la v ra s d e aborrecim ento
daquela v id a ..., em ad v ertên cias d u ras a seu E sp o so ....
em ralhos a o M enino Jesus, etc., ex actam en te como a c o n ­
tece n a m aior p a rte das fam ílias...
M as não, M a ria é o anjo d a p a z ..., d a a le g ria ..., toda
bondade e su a v id ad e a irra d ia r d o ç u ra ..., c arin h o ..., am o r...
U m a vez julgou d e v er repreender a seu F ilh o ... A dor
op rim ira de tal form a o seu c oração que este necessitava de
d e sa b a fa r... M a s re p a ra bem nas su as p a la v ra s ..., atende
bem às expressões que u so u ..., fixa-te bem nos modos com
que o fez... C om toda a delicadeza p e rgunta-lhe: «M eu Flllio,
porque procedeste assim c o n n o sc o ?» ... T o d o s desculparíam os
a um a m ãe que naq u elas circunstâncias tivesse repreendido
asperam ente a se u filh o ... e lhe tivesse dito p a la v ras fortes
e tivesse tom ado a titu d es resultantes d a sua dor a m a rg a ...
Im agina-te tu em casc sem elhante... Q u e terias feito
com um a pessoa de fam ilia que tivesse procedido de Igual
fo rm a ? ... C o n ter-te-ias perfeitam ente ao v ê -la ? ... N ão ced e ­
rias um pouco a o teu n e rv o so ? ... C o nter-te-ias com dizer
-lhe só as p a la v ra s de M a ria a seu Filho? ... e com a
m esm a do çu ra e su a v id ad e cem que E la as p ro n u n c io u ? ...
O ra , se a Santíssim a V irgem n esta o casião e.m que teve
tão g rav es m otivos de desgosto e aborrecim ento procedeu
504 D oçura na fam ília

tão suave e dignam ente, com o não p ro ced eria com igual
d o ç u ra ncs outros actos da vida de f a m í l ia ? ...— Refere
um S an to P a d re que os m eninos de N a z a ré costum avam
dizer a o M enino Jesus: vam os à suavidade e à doçuras, ta!
era a m anifestação d a su a b o n d ad e e m ansidão co n stan tes...
T u podes tam bém dizer o mesmo de M a r ia ...; e diz-lho
m uitas vezes fixando-A bem, porque realm ente E la é a
fonte d a doçura e da su av id ad e em cujas á g u as se curam
a s erupções do nosso m au hum or e se suavizam todas as
nossas asperezas de carácter.
3." V irtu d e obrigatória. — F ix a-te bem n isto ... Pode
dizer-se sem e xagero que a v irtu d e da doçura fam iliar é uma
v irtu d e o b rig a tó ria ..., que tens de tra b a lh a r p o r adquiri-la
e d ese n v o lv ê -la ..., porque esta doçura é o exercício da
caridade, caridade que devem os ter p a ra com todos mas
principalm ente com aqueles que n c s estão m ais pró x im o s...
com o são os m em bros da fam ília... as a m izad es... ou os
m em bros da com unidade em que se v iv e ... Q u e responsabili­
dade, p o rtan to , p a ra ti, se, por tua c u lp a ..., se pelos teus
desconhecim entos e sa íd as desentoadas, fizesses im possível
e difícil a vida dos que te rodeiam ..., se p o r tua causa
se desfizesse o equilíbrio e a paz que produz a c a rid a d e !...
A doçura fam iliar é ain d a ob rig ató ria porque sem ela
é im possível cum prir bem o q u a rto m andam ento d a lei de
D eus.
P e rc o rre c s diversos estados que podes o c u p a r na
vida de fam ilia ou de com unidade e v erás isto bem:
Se és superior e m andas noutros, deste o u daquele
m odo, v ê com o procedes e com o regulas as co isas... reflecte
com o desejarias que te m andassem a ti e vê com o m andas
os o u tro s... O nde está o am or que devias te r aos súbditos,
se n a s tu as p a la v ra s e nos teus m odos p a rec es um tiranete?...
Q u a n d o tens de co rrig ir algum a coisa, não é en tão que
m anifestas m ais falta de correcção lev an tan d o o tom da voz.
g rita n d o e am e aç a n d o ?... F a z um exam e especial sobre o
D oçura na fam ília 505

m odo de tra ta r os que tens ao teu se rv iç o ... A sua m esm a


incultura e falta de educação devia se rv ir de desculpa às
su as deficiências, e ser a razão de os tra ta r com mais
carinho p a ra assim os ir ensinando no que necessitam ser
e n s in a d o s ...—’ Segundo alguns, a Santíssim a V irgem teve
tam bém ao seu serv iço um a e sc rav azin h a o u um a c ria d ita ...
Im agina com o a tra ta ria ..., como a m a n d a ria ..., com o a
corrigiria quando não fizesse as coisas bem ...
C o m p ara-te com E la e p ro cu ra im itá-lA . Se és inferior
e deves obedecer, como o fa z e s? ... P areces-te nalgum a
coisa à Santíssim a V irgem q uando obedecia a S. Jo sé ? ...
Q u e gestos, que protestos, q uantas q u e ix a s !... Sobretudo
se te custa, p o rq u e n ã o baixas suavem ente a cabeça e não
obedeces com alegria? ...
E com os teus iguais, com os teus irm ãos, com os teus
am igos, como os tr a ta s ? ... É s a causa d a su a desunião? ...
F alas-lhe com frie z a ... com indiferença ou desdém ..., com
a ltiv e z ..., com p a la v ra s cheias de a rre b a ta m e n to ..., de injú­
ria s ..., de d e sp e ito ..., de i r a ? . . . — E x am in a-te hoje bem
sobre a do çu ra na fam ília e propõe o que vires ser neces­
sário p a ra cum prir nesse ponto adequadam ente o q u a rto
m an d am en to ... D á bom exem plo d esta v irtu d e a todos e
assim con trib u irás p a ra que na tua c a s a ... na tua fam ília...
no círculo das tu as am izades... n a tua com unidade, reine
a p a z ... a felicidade dulcíssim a que se re sp irav a na peque­
nina casa de N a za ré .
47. A Condescendência

l.° E m que consiste. — É um a v irtu d e que pode p a re ­


cer insignificante e c ontudo é de um elevadíssim o v a lo r
p r á tic o ...; parece coisa fácil num as ocasiões m as n o u tras é
realm ente difícil. — F ix a -te bem na p ró p ria p a la v ra — c o n ­
descendência — que é m uito significativa.
C ondescender é — descendcre cum ou descer com —
isto é, descer da a ltu ra d o teu am or próprio, d a tua soberba
p a ra acom odar-te ao p a re c e r a lh e io ... E sta ê a explicação
etim ológica da p a la v ra, m as ai! quão custoso não é tal
d e s c e r!... encontram o-nos tã o bem nos cim os d a nossa
so b erb a que quando um golpe hum ilhante da am orosa P ro v i­
dência de D eus nos faz b a ix a r, que sofrim ento n ã o senti­
m o s !... E que será então em preender v o luntàriam ente a
d e sc id a ? ... — C ondescender é ceder diante d a v o n ta d e ...,
do c rité rio ..., do gosto dos o u tro s ... e isto, sabe-lo bem p o r
experiência, é m uito custoso sem pre.
N ã o querem os que ninguém co arcte a nossa lib e rd ad e ...,
que ninguém se o p onha aos nossos p la n o s ..., que ninguém
nos co n tra d ig a no que dizem os ou o que p en sam o s...
E a condescendência lev a-n o s a p ro c ed e r de m odo
m uito d ife re n te ...: a que dem os razão a cs o u tro s... a que
n ã o nos em penham os em triu n fa r e sa ir sem pre com a
n o ss a ... a que sacrifiquem os o nosso gosto e a nossa
com odidade nas aras d a p az, da doçura da caridade.
A C ondescendência 507

É claro que h á ccisas em que nSo se pode nem se deve


tra n s ig ir...; ceder nesses casos não seria virtu d e m as sim
cob ard ia ou respeito hum ano. — Q u a n to s pecados não se
com etem p o r esta má e p e rv ersa c o n d escen d ên cia!— F oi
este o pecad o de A d ã o ...: não teve energia suficiente p a ra
resistir às su av es insinuações de sua m u lh e r...; cedeu e
tran sig iu no que n ã o d evia, e p eco u ...
E xam ina as tuas quedas e v e rás com o m uitas delas
tiveram a sua origem n esta m aldita condescendência.
N ã o podes p o rta n to ceder nem um á p ic e ... não deves
condescender nem o m ais m ínim o com nin g u ém ... nem com
os am igos m ais ín tim o s... nem com cs pais nem com os
irm ã o s... em coisas c o n trá ria s à lei de D eus, ain d a que seja
em m atéria le v e ..., em tu d o o que seja de qualquer m odo
ofensa de D e u s... ou v en h a c au sar d an o ao próxim o.
M as fo ra disto, trab a lh a p o r venceres a dureza de
cabeça e de c a rá c te r e adquirires essa bela e sim pática
flexibilidade que se acom oda a tudo e a to d o s..., que se
sente feliz em d a r gosto e em com prazer aos outros e.m tudo
o que não for m au ou p erigoso: nisto consiste a p rá tica da
grande virtu d e da c ondescendência...
2.° O s seus fru to s. — P reciosos c saborosos são os
p roduzidos pelo exercício constante d esta v irtu d e ... — A ntes
de tudo, um aum ento sem pre crescente d a ra in h a de todas
as virtudes, a c a rid a d e ... É evidente que esta não poderá
existir nas fam ílias, no círculo das nossas am izades, nas
com unidades, etc., o n d e não se p ratique, sem cessar, a con­
descendência. —• A causa e a raiz de to d as as desavenças é
sem pre o desejo que todos tem os de le v a r a nossa p o r
d ia n te ...; e com o o que tu sentes tam bém o sentem os outros,
daqui os choques frequentes e n ad a edificantes dos que sai
sem pre m al p a ra d a a caridade.
E m p a g a, o ceder e o acom odar-se ao p a rec er alheio,
condescendendo com os seus gostos, é fonte de am or recí­
p ro c o ..., de paz e de c a rid a d e ..., contribuindo eficacissi-
508 A C ondescendência

m am ente p a ra o bem -estar e tranquilidade de um a c a sa ...,


de um a com unidade... de um a fa.milia, etc. — A m útua
condescendência é que produz nelas a cordialidade e a
frate rn id a d e juntam ente com um a franca e e spiritual alegria.
O u tro fruto desta virtu d e é a p rá tic a contínua da m or­
tificação in te rio r... que, com o já dissem os algures, é em
c ertas ocasiões m uito difícil e até heróica. — C om o to d as as
virtudes, a condescendência n ã o consiste nalguns actos iso­
lados, m as sim no hábito deles que se m anifesta n a sua
frequência e constância. — O vencer-te um a vez ou o u tra ...,
o ceder e calar-te h o je ..., o condescender em determ inada
ocasião, não é difícil... nem m uito m e ritó rio ...; .mas o fazer
sem pre assim ..., o h a b n u a r-te a nunca te dispensares de te
vencer, isso sim é que supõe um grande exercício de m or­
tificação.
Reflecte no que te aconteceu já, com certeza, algum a
v e z ... C om o te custou ceder, se é que cedeste, q u ando tinhas
toda a ra z ã o ..., quando o teu p a rec er era o m ais justo e
ra z o á v e l..., quando p o r ser em público e em p resença de
outros, era p a ra ti tão hum ilhante o ceder e o c alar-te ...
e até d a r ra zã o a quem te c o n tra d iz ia !... N ã o é verdade
que é nessas ocasiões que se m anifesta claram ente a alma
m ortificada c senhora de si? ...
Com isto já está indicado ou tro fruto d a condescendência
que é a firmeza, cada vez m ais ferte. na sa n ta hum ildade.
— Se analisares um pouco o acto da condescendência, verás
que quase se reduz a isto: a um acto de hum ildade... N ã o és
condescendente po rq u e n ã o és h um ilde... po rq u e o am or
p ró p rio se re b ela... porque a soberba te c e g a ... Logo,
q u a n to m ais condescenderes com os outros, m ais c alca rá s aos
pés as tuas paixões e m ais hum ilde serás.
É tam bém evidente, que com esta v irtu d e pra tica s ao
m esm o tem po a m ansidão e a d o ç u ra... e educas e diriges
como deves o teu carácter. — O rd in ariam en te fa la n d o esta
será a form a m ais comum de exercitar-te na doçura, visto
A C ondescendência 509

que, de o rdinário, a .maior p a rte d a s tuas asperezas, brotam


da fa lta de condescen d ên cia... por n ã o c ed e r... p o r triu n fa r
e sa ir com a tua.
F inalm cnte, com esta preciosa v irtu d e dispões-te adm i­
ravelm ente p a ra a v id a de o b ed iên cia... Q u e c u stará obedecer
àquele que se acostum ou a ceder? ... Se n ega a sua v ontade
p a ra subm etê-la ao p a rec er dos o u tro s..., quão facilm ente
a subm eterá às o rd e n s e disposições dos superiores? !
M ede pois a im portância e beleza d esta virtu d e pelos
frutos que p ro d u ^, e pelas virtudes que a a co m p an h am ...
3." A C ondescendência de M aria. — D aqui conclui
qual não seria a condescendência de M a ria se ela foi tão
excelsa na caridade, na hum ildade, na do çu ra e na o b e ­
diência. — C onclui isso, já que não tem os d ados concretos no
E vangelho, da condescendência de seu divino F ilh o ... Com o
condescende ccm os A póstolos quando lhe pedem algum a
c o isa... com todos os discípulos ...e com o mesmo povo,
obrando grandes m ilagres só por condescender com e le s !...
Com os judeus, fariseus, p ublicancs e pecadores, em
tudo o que n ã o houvesse pecado o u falta, — Q u e condes­
cendência tão hum ilde a s u a ! ... — V ê -o com os p o b res...
com os n ecessitad o s... com as c ria n ç a s... L em bra a sua
atitude nas bodas de C an á, condescendendo com sua M ãe
em fazer o p ortentoso m ilagre que fez, a p esar de ainda
não ter chegado a h ora de fazer m ilagres.
Se assim era a condescendência de Jesus, qual não seria
tam bém a de M a ria, a m ais perfeita cópia de Jesus ?!
Im agina, p o r exem plo, a cena dos pastorinhos em
B elém ... ou a dos M agos e ali a v erás a condescender com
todos, em tu d o ... até ch eg a r a dar-lhes Jesu s... e a deixar
que o abraçassem , o acariciassem e o b e ija s s e m ...— T o d a
a sua vida n ã o foi um contínuo acto d e constante condes­
cendência com S. José e com Je su s?... N em um a só vez se
deu algum a sa tisfaç ão à custa de S. José ou do seu F ilho:
o seu gosto era com prazer-lhes em tudo.
510 A C ondescendência

E ste deve ser o teu p ra ze r: a com odar-te ao go sto dos


o u tro s..., com prazer a to d o s ...; assim , g a n h ará s a to d o s ...;
assim é que te fa rá s todo p a ra todos, m enos p a ra ti; assim,
finalm ente, conseguirás im itar n esta p reciosa virtude, a tua
qu erid a M ãe.
48. A Gratidão

l.° D ig n o , ju sto e salutar. — N o P re fác io d a M issa,


to d o s os dias c a n ta o S acerdote a beleza e a necessidade do
ag radecim ento q u ando diz: verdadeiram ente é d ig n o ... ju sto ...
e salutar... que sem pre e em toda a p a rte sejam os agradecidos
ao S e n h o r... Q u e sim pática não é a g ra tid ã o ! ... E quão
horrivelm ente a n tip á tica n ã o é a in g ra tid ã o !... P ode h a v e r
algum a coisa que m ais fira um a pessoa que tem dignidade,
d o que cham á-la i n g r a t a ? ...— E não foi c que te fez so fre r
m ais o v e r que te p a g av a m os teus favores ou serviços com
in g ratid ão ?.... V ê pois quão indigno é este pro ced er mesmo
só entre h o m e n s !... E e n tã o qual será a indignidade do
hom em que é in g rato p a ra com D eus? ! ...
A g ra tid ão é tam bém um a p a rte da justiça c p o rtan to
falta à justiça o in g rato . — D eram -te um beneíicio, deves
d a r algum a coisa em com pensação: a g ra tid ão deve c o r­
responder ao benefício. — A in g ratid ão v ista nos o u tro s
irrita-nos e desconcerta-nos precisam ente pela injustiça que
e n c e rra ... — O benfeitor tem direito ao agrad ecim en to : logo,
quando se lhe não dá, calca-se esse d ire ito ... e p o rtan to
falta-se à justiça que consiste em d a r a cada um o que lhe
p erten ce...
E , finalm ente, conveniente e s a lu ta r..., quer dizer, que
512 A G ratidão

a té p o r egoísm o devíam os sa b e r ser a g rad e cid o s..., porque


o agradecim ento é causa de novos benefícios. — S. B ernardo
diz que a in g ratid ão é v en to a b ra sa d o r que seca e m ata
a fonte de todos os favores e b e n efício s...; m as, em troca,
a g ra tid ão é o que m ais estim ula o benfeitor a continuar
o s seus benefícios p a ra connosco...
Sob qualquer aspecto que o consideres, convencer-te-ás
que o hom em in g rato é o que h á de m ais irra c io n a l... pele
injusto que é o seu p ro c ed im e n to ... e até po rq u e assim se
p re ju d ica a si mesmo. — A plica estas ideias ao teu p rocedi­
m ento p a ra com D eus e se as assim ilares bem, ad m irar-te-ás
com o o hom em ..., ccm o tu mesmo pudeste ch eg ar a ser tão
in g rato p a ra com E le ... e não só algum a v e z ... m as d iaria ­
m ente assim procedem os com o S enhor...
É de e stran h a r que não esteja já cansado de n ó s... e que
a p e s a r da nossa in g ratid ão continue a d a r-n o s n o v e s e
m aiores benefícios... E n q u an to a sua generosidade sobe,
so b e tam b ém ... a nossa in g ra tid ã o ... P a re c e m entira que
assim seja o c oração do homem sobretudo p a ra com D eus
de quem não recebe sen ão benefícios sem fim ...
2.“ D o n d e brota. —• A g o ra considera donde b ro ta a
g ra tid ão p a ra que possas v e r depois donde provém a tua
ing ratid ão . —• A g ra tid ã o b ro ta da nobreza e generosidade
de c o raç ão do que recebe o benefício, de tal so rte que cos­
tum am os m edir a delicadeza m aio r ou m enor de um coração
pelo g ra u de agradecim ento ou gratid ão v erificado em
alguém .
O c o raç ão ag rad ecid o no .momento mesmo em que recebe
um dom, sente como que um a necessidade de corresp o n d er ao
ben feito r e até que não satisfaç a essa necessidade, n ã o encon­
tra d e sc an so ..., m as até sofre porque desejaria ir sem pre
m ais além na sua co rrespondência e no seu a g rad ecim en to ...
•e goza im enso quando enco n tra meio de m anifestá-lo.
A o mesmo tem po que a delicadeza de coração, contribui
A G ratidão 513

tam bém p a ra a g ra tid ão , a reflexão. — N ã o h á dúvida que


a fa lta de reflexão é a causa d a nossa in g ratid ão p a ra com
D e u s... O «não sabem o que fazem» pode aplicar-se a to d o s...
Se reflectíssem os um pouco não poderiam os d e ix a r de em pre­
g a r toda a nossa v id a e todas as nossas forças em a g r a ­
d ecer a D eus todos os benefícios... A reflexão é-nos neces­
sá ria p a ra conhecer aquele que d á ..., a nós que recebem os...
e o núm ero e q u alidade dos dons que nos d á ... porque o
a gradecim ento deve se r p ro p o rcio n a d o a estas três condições.
H avem os de conhecer cada vez m ais a pessoa que nos
faz ben efício s..., o seu am or p a ra co n n o sco ..., a sua nobreza
e d ig n id a d e ..., a sua bondade e g e n ero sid a d e..., a su a su p e ­
rioridade e g ra n d ez a junta à dignação com que se baixa até
nós a oferecer-nos c s seus d o n s... É evidente q uanto con­
tribui este conhecim ento p a ra a g ra tid ã o ... E m uito mais
contribui se o com paras com o conhecim ento p ró p rio d a tua
p e q u en e z..., d a tu a m ald a d e..., da tua gran d e indignidade e
falta de m éritos pessoais p a ra tantos benefício s..., m esmo o
conhecim ento das ingratidões p a ssa d as que fazem m aior o
carin h o e o am or do benfeitor divino.
C onhecim ento, finalm ente, dos m esm os favores nos quais
m uitas vezes nem re p ara m o s; q u ando se tra ta de D eus, é
assim que sói a co n tec e r... Q u a n ta s coisas recebem os de D eus
que nunca pedim os... nem m erecem os, é c la ro ... nem nunca
reparam os n e la s !... E assim com o as poderíam os agradecer?!
T ra b a lh a m uito p e r ad q u irir este tríplice conhecim ento
de que depende a estim a e am or que deves ter ao S e n h o r...
e v e rás como, assim , instintivam ente, b ro ta rá do teu coração
a correspondência d a g ra tid ão p a ra com E le ...
3." A Sa n tíssim a V irgem . — Q u e adm irável foi este
conhecim ento na Santíssim a V irg e m !... P enetra, se podes,
na ideia que E la form av a de D e u s... da sua grandeza e
•m ajestade..., d a sua sa n tid a d e e b e le za ...
E este conhecim ento aum entava em M aria, o seu am or
com todo o seu s e r..., com toda a su a a lm a ... com todas as

33
514 A G ratidão

su as forças ao S e n h o r...; m as ao mesmo tem po vê-A toda


p e n etrad a do seu n a d a ... d a pequenez d a su a pessoa, com o
diz no M a g n ifica i, onde se adm ira de que ten h a olhado
p a ra a baixeza d a sua escrava.
E de facto, o c o raç ão nobilíssim o de M a ria , inundado
d esta adm iração, a b rasa v a -se em afectos de g ra tid ã o ..., de
a m o r..., de ânsias insaciáveis de corresponder, o m elhor que
pudesse, a um D eus que assim p unha os olhos n E I a ..., que
a am av a com um am or eterno e in fin ito ..., de predilecção
sobre todas as c ria tu ra s..., sobre os pró p rio s anjos do céu ...
ainda m esmo sobre os m ais elevados s e ra fin s .— T ã o m etida
e em bebida a n d a v a nestas ideias que não as p odia a fasta r
nunca do seu e n te n d im e n to ...; rep etia-as a cada p asso ao seu
c o ra ç ã o ...; não podia v iv er sem a e x pansão d a g ra tid ão .
Lem bra as estrofes do M a g n ific a i e v e rás o que pen­
s a v a ..., o que sentia a Santíssim a V irgem dos benefícios do
S e n h o r... P orque não im itá-lA n isto ? ... R e p a ra bem que
tudo se reduz a isto: ter cabeça e c o ra ç ã o ..., reflexão e
sen tim en to ... T e n d o tudo isto p a ra as delicadezas hum anas
n ã o o terás p a ra as delicadezas infinitas de D e u s? ... D ese­
jas que sejam g ra to s p a ra contigo e negas a gratid ão a
quem a .merece m ais d o que ninguém ?...
P e d e à Santíssim a V irg em que n ã o sejas assim ingrato;
que te dê im itá-lA no seu eterno agradecim ento ao S enhor...
49. A Gratidão

].° P ara com D eu s. — H o u v e no céu um a c ria tu ra


belíssim a, a d o rn ad a de im ensas g ra ç a s... m as essa c ria tu ra
n ã o soube a g ra d e c e r a o seu C ria d o r o que d ’E le h a v ia rece­
bido e com soberba e in g ratid ão revoltou-se c o n tra o seu
divino B e n fe ito r...— É esta a história de L ú cifer..., o anjó
caído e c o nvertido em dem ónio p ela su a so b e rb a ..., pela su a
ingratidão.
C oisa sem elhante aconteceu com o hom em no p a ra iso ...
T am bém a soberba o cegou e o fez in g rato p a ra com D e u s...
Q u e frutos tão am arg o s os d a in g ra tid ã o !... D e um an jo faz
um d e m ó n io ...; de um rei, como era o hom em , faz um
e scrav o desgraçado.
M as v ê o procedim ento diam etralm ente oposto de M a ria.
— F a v o re cid a pelo S enhor com riquíssim os d o n s..., elevada
a um a dignidade in co m p a rá v e l..., n ã o se e n so b erb ece..., n ã o
se rev o lta e n ã o cai n a in g ra tid ã o ... O seu coração, cheio
d e a gradecim ento a D eus, expande-se no seu M ag n ilica t,
que é com o que o p ro g ram a da su a v id a ... visto que a sua
vida foi i s t o — um M a g n ific a i constante de gratid ão com os
láb io s..., com o c o ra ç ã o ..., com. todas as suas obras.
M a ria, a c ria tu ra m ais a g ra d e c id a ..., mais hum ilde...,
é elevada à dign id ad e de M ãe de D e u s... e a que não aspira
se n ã o a ser sua escrava, ocupa o prim eiro tro n o do céu ...
516 A G ratidão

Q u e a g rad á v el é a D eus o c oração a g ra d e c id o !... Q u e odiosa


h á -d e ser p a ra E le a in g ra tid ã o !...
E que d ons tã o preciosos reservou D eus p a ra M a r ia ! ...
E la foi a única escolhida entre todas a s m ulheres da
te rra p a ra ser a su a M ã e ...; e p o r isso mesmo a única conce­
bida sem m an c h a... a única sa tu ra d a d a p lenitude d a graça,
com o lhe disse o a n jo ... a única que h a v ia de e n tra r, em
certo m odo, nos Segredos d a Santíssim a T rin d a d e e de v iver
em íntim as relações com a D ivindade.
E tudo isto, p orquê? P o rq u e só a E la foram conferidos
estes privilégios? ... Q u e m erecim entos h a v ia nela p a ra os
receber? ...
E sta s p e rg u n ta s fa zia-a s a si m esm a a V irg em S a n tís­
sim a e a resp o sta e ra d esfazer-se em a gradecim ento a o seu
D eu s. — C a d a g ra ça que re c e b ia ..., cada n o v o dom abra.-
s a v a cad a vez m ais o c o raç ão delicadíssim o d a Santíssim a
V irg em e in eb riav a e e x ta sia v a continuam ente a su a alma,
.com afectos perenes d a m ais sentida g ra tid ão e do m ais puro
e m ais ardente a m o r...
2.° Para com os anjos. — E assim fazia com todas as
c ria tu ra s p o stas p o r D eus p a ra se rv i-la ... — Im agina, o
•melhor que puderes, a su a im ensa g ra tid ã o p a ra com o A njo
d a A nunciação. — É cortesia o b rig ad a rem u n erar o criado
que da p a rte do seu am o nos tra z um p re sen te ... Q u e faria
e n tã o a Santíssim a V irgem quando, com o m agnífico presente
d a In c arn a çã o do V erb o , se apresentou diante d ’E la ? ...
C o m que reconhecim ento lem braria E la a cena da A nun­
c ia ç ã o e as p a la v ras de sa u d a çã o do a n jo ! ...
E qual n ã o seria a sua g ra tid ão p a ra com os a n jo s do
N a sc im e n to ? ... Q u a n d o v ia que Jesus nascia desconhecido e
d e sp rez a d o dos hom ens... com o a g rad eceria aos anjos que
tivessem baixado do céu a re p a ra r a in g ratid ão e frieza com
que o m undo o re c e b ia !... A g ra d ec e ria igualm ente com todo
o se u coração qualquer serv iço que deles receb esse... q uer na
viagem p a ra o E gipto, como diz a tradição, q u e r no regresso
A G ratidão 517

a N a z a ré . — S e é c erto que tin h a tra to frequente com, os


a n jo s ..., im agina com o lhes ag rad e ce ria as su as visita s e
com o eles ficariam encantados e satisfeitíssim os com a s p ro ­
v a s de g ra tid ão que lhes d a ria a Santíssim a V irgem .
M a s considera sob retu d o o seu a gradecim ento p a ra com
o A njo da A n u n c iaç ão ... e p a ra com o seu A n jo da G u a rd ai
—• D eus tam bém deu à Santíssim a V irgem um A njo da
G u a rd a, com o a n ó s... p a ra a g u a rd a r... Feliz o an jo a quem
coube ser o defensor e o C ustódio de tal te s o iro !... D epois
de a d o ra r a D eus n o céu, n ã o tin h a ele o ofício m ais nobre
do que g u a rd a r e acom panhar, d u ra n te a v id a, a S a n tís­
sim a V irgem .
M as este oficio n ã o p a ssa v a despercebido a M a ria ...
Se lhe apareciam o u tro s a n jo s... que se deliciavam em con­
v e rsa r com E la, com o não d a ria esse gosto a o seu A njo
d a G u a rd a ? — A m uitos santos se fez v isível o seu A njo
d a G u a rd a ... n ã o aco nteceria o m esm o à V irg e m Santíssim a?
S eria um m otivo a m ais p a ra a g rad e ce r a D eus, prim eiro, e
a o seu A njo da G u a rd a depois, tais fin ezas...
F a z um pouco de com paração e vê q u a n ta d e v o çã o e
q u an ta g ra tid ão tens p a ra com o s anjos em g e ra l... c p a ra
com o teu A n jo da G u a rd a, em p a rtic u la r... N ã o serás m uitas
vezes in g rato com e le ... d e sp rez a n d o -o ... e n ã o fazendo caso
das suas in sp iraç õ es... o u pelo m enos esquecendo-te de a g ra ­
decer-lhe o bem que te faz e sobretudo a fidelidade em
g uardar-te? ...
3.“ Para com os hom ens. — E ag o ra vê a g ra tid ão de
M aria, feita de b o ndade e delicadeza, n ã o de cum prim entos
falsos e m u n d an o s... m as v e rd ad e ira e sincera, com os
hom ens... com as p essoas de quem recebia algum fa v o r...
— P e rc o rre brevem ente a sua vida e dem ora-te a considerar
o am or e o agrad ecim en to de M a ria a seus p a is... Q u e exem ­
plo de g ra tid ão p a ra com aqueles que tan to se cansaram e
sacrificaram pela nossa e x istê n cia ..., pelo nosso su ste n to ...,
pelo nosso desenvolvim ento, etc. — A E la n ad a p a ssa v a
518 A G ratidão

despercebido e qualquer trab a lh o e sacrifício de seus santos


p ais ficava g ra v ad o no seu coração p a ra sem pre lho
ag rad e ce r.
M ais tard e no T em plo, a sua g ra tid ão m anifestar-se-ia
a c a d a p asso com os sacerd o tes que a instruiam n a S a g ra d a
E sc ritu ra ..., com as m eninas com quem c o n v iv ia ... N ã o lhe
e ra possível d eix ar e sc ap a r o mínimo p o rm en o r de algum a
delicadeza que tivessem com E la sem que a agradecesse do
fundo d a sua alm a.
L em bra as cenas de Belém, com os pastores, prim eiro ...
com os M agos, d ep o is... Q u e profundo e que verdadeiro,
m as sem e xageros tolos e ridículos, sem p a la v ria d o escusado
de cum prim entos v ã o s ... seria o seu agradecim ento para
aqueles ad o rad o res de seu F ilh o ! ... Q u e não lhes diria, p a ra
ag rad ecer-lh es os seus presentes e m im o s!... E que contentes
n ã o se iriam todos, falan d o do c o ração ag rad ecid o de M a ria!
C o n tem p la-a n a sua v id a o rd in ária de N a z a ré ... com
aquela gen tin h a que constituía a su a vizinhança', se lhe
faziam algum favor, o que não faria a Santíssim a V irgem
p a ra p a g á -lo !...
C om o lhes ag rad e ce ria as carícias e os louvores que
p rodigalizavam ao seu Jesus!... Q u e a gradecim ento o seu p a ra
a s pessoas que davam trab a lh o a S. José, e com ele, o
su sten to da su a casa!
• E m ais tard e q u ando Jesus saiu a p reg ar, como não
se ria gran d e a sua g ra tid ão p a ra com M a rta e M a ria e p a ra
com as o u tras m ulheres piedosas que tan to cuidavam de seu
F ilh o ! ... p a ra com os A póstolos que tão fiel,mente o
Seguiam ... p a ra com aquela boa gente que ia entusiasm ada
a trá s d ’E le ... o uvia a su a p a la v ra ... p o n d e rav a a sua sa n ti­
d a d e ... e a p reg o a v a p o r toda a p a rte os seus m ila g re s !...
C ontem pla, por fim, a Santissim a V irgem nos seus a g ra d e ­
cim entos a S. José... C om o lhe ag rad ecia os seus benefícios!...
— E le que era o g u a rd a d a sua v irgindade e da sua
h o n ra, o o p e rário que tra b a lh a v a e su a v a p o r E la e pelo
A G ratidão 519

seu Jesu s..., o com panheiro fiel, sacrificado e hum ilde, que
com partia com E la a sua pobreza, as su a s privações, a sua
o b sc u rid ad e ... Q u e olh ares os s e u s ! ... Q u e p a la v r a s ! ... Em
tudo, enfim, que a g ra d e c im e n to !... C om o se en tre g aria em
cheio à g ratid ão e a d a r m ostras dela o m elhor que p o d ia ! ...
Se tan to a rra sta a g ratidão, como não te a rra sta rá mais,
vendo o exem plo tão belo de tua M ãe, p a ra agradeceres,
com o deves, a D eus o que d 'E le re ce b este ... e estás a cada
instante a re c e b e r..., p a ra a g rad e ce r aos anjos e a o teu anjo
d a g u a rd a o que sem cessar faz c o n tig o ... e p a ra estender
essa tu a g ra tid ão a todos os h o m en s..., a todos os que te
fazem algum bem espiritual ou te m p o ra l!...
50. A Gratidão

1.° G ratidão verdadeira. — O p ró p rio Jesus C risto nos


d á exem plo adm irável desta g ra tid ão . — P rom ete p a g ar-n o s
generosam ente um copo de á g u a dado em seu n o m e... N a d a
do que fizerm os ou sofrerm os por D eus, ficará sem, prém io...
N ã o vem os isto, mesmo aqui n a terra onde tão g enerosa­
m ente nos p a g a o m ínim o serviço que lhe fazem os? ...
Assim foi... e assim continua sendo sua M ã e .— U m a
delicadeza n o ssa ... um a florzinha de ab negação, de santifica­
ção que lhe ofereçam os, e são agradecim entos e recom pensas
que bem sentim os...
T am bém tu deves ser, deste m odo, generoso na tu a g ra ­
tidão, p a ra com D eus e p a ra com todos. — N o ta que na
generosidade está um a das características da v erd ad eira
g ra tid ã o ... P o rq u e esta não pode ir inficionada d e egoísm o
e de in teresse... E q uanto h á disto, in felizm en te !... Q ue
agradecim ento tão m iserável o daqueles, que acostum ados
a receber fa v o re s..., se cansam de a g rad e cê -lo s... e se julgam
com tais direitos a esses benefícios que até os exigem e se
queixam se lhos n ã o d ã o ...
Q u e agradecim ento tã o falso é o daqueloutro, que, com
um a p equena ofensa que receba, ou que im agine receber, do
seu benfeitor, lança no esquecim ento tudo o que dele rece­
b e u ... e não esquece nem perd o a o a g ra v o real ou ap aren te
que lhe c a u s o u !... A h! que hum ano é tudo isto! e quão
A G ratidão 521

facilm ente os hom ens se esquecem de que com a m edida


que m edirem serão m edidos. — Se D e u s procedesse assim
connosco e à m ais pequena falta nossa já nos n ã o perdoasse,
nem nos desse m ais g ra ça s e ben efício s... nem. agradecesse
nem perm iasse as nossas boas o b ra s, que diríam os? E não
é assim que nós m edim os ao nosso p róxim o e nos portam os
com ele o rd inariam ente?
Finalm ente, h á tam bém outros agradecim entos falsos e
são os daqueles que à força de receber m uito e m uitas vezes
chegam a n ã o se n tir n a d a e já lhes n ã o faz im pressão o que
se faz p o r eles. — A o princípio com eçaram a ser ag rad ecid o s,
m as cansaram -se disso e de tal m odo se acostum aram a rece­
b e r..., que n ã o se preocupam com retribuir, porque lhes
p arece que é a coisa m ais n a tu ra l que toda a gente lhes dê
a e le s .—-Q ue diferente foi a gratid ão da Santíssim a V ir­
g e m !... A continuidade dos benefícios n ã o fazia senão
aum entar o seu a g rad e cim en to ... A g ra d e c ia cad a n o v o bene­
fício com o se fosse o p rim e iro ..., com o se fosse sem pre
n o v o ..., g ra n d e ..., in esp era d o ..., im erecido... e assim im pe­
liam cad a vez m ais o seu coração generosíssim o a d e sfa ­
zer-se em g ra tid ã o e reconhecim ento..., em desejo de cor­
responder à bondade do S enhor com a e n treg a total de tudo
o que E la e ra e tinha.
2 ° F rutos. —i A g ra tid ão produz n a alm a que a p ra tica
fru to s riq u íssim o s..., p a rec e que dilata o c oração e o eno­
brece de m odo adm irável. — Lem bra o cântico d o M a g n ific a i
d a Santíssim a V irgem e v ê como ali se re v ela o seu c oração
m agnífico, de um a c ap a cid a d e quase in fin ita ... É o c o ração
d a M ãe de todos os povos, de todas as g e n te s ...; o coração
d a R ain h a do M undo to d o ... e p o r isso nesse cântico, não só
a g rad ece ao S enhor o que fez com E la m as tam bém agradece
a s m isericórdias h a v id a s p a ra com toda a hum anidade.
E ste é o m odelo do coração agradecido, assim dilatad o
p ela g ra tid ã o ... O n d e v ê um henefício, seja em si seja nos
ou tro s, logo o agradece o m elhor que pode. — O u tro fruto
522 A G ratidão

é o de firm ar cada vez m ais a alm a n a hum ild ad e... O que


recebe um benefício e assim o reconhece, dem onstra ao
mesmo tem po a sua inferioridade com relação a o que d á ...,
m as n ã o só se não ofende com essa hum ilhação senão que
a té a aceita com gosto.
D á -se isto particularm ente com o s benefícios de D e u s...
A ceitá-los e agradecê-los é reconhecer-nos, pobres m iseráveis,
inúteis p a ra tu d o ...; só a bondade e a generosidade de D eus
com os seus im ensos bens nos pode d a r rem éd io ... P o r isso
o c o raç ão a g rad e cid o é necessariam ente hum ilde... — T a m ­
bém a g ra tid ão nos faz m ais reflectidos, fazendo-nos c a ir na
co n ta de cad a g ra ça que recebem os... e ao m esmo tem po com
isto a ju d a -n o s a utilizar as g ra ç a s recebidas no nosso coração,
po rq u e com o poderiam os c o o p era r com elas se n ã o nos dés­
sem os co n ta d a sua e x istê n c ia ? ... P o r isso n o c o raç ão a g ra ­
decido, a s g raças produzem sem pre um fruto abundantíssim o.
P o r o u tra p a rte , com o já indicam os, a g ra tid ã o m ove o
c o raç ão de D eus a n ovas generosidades, pois o S en h o r n ãc
se can sa de co n tin u ar a d a r sem pre graças m ais e m ais
q u ando estas são a g rad ecid as e correspondidas. — Assim
fez com a Santíssim a V irg e m ... N em um instante cessou de
m ultiplicar n ’E la as suas g ra ça s e benefícios, po rq u e deles
se fazia m erecedor o coração agradecidíssim o de M a ria. —
A g ra tid ão tam bém produz n a alm a m aior subm issão...,
m aior confiança em D e u s..., m aior d escanso na su a divina
P ro v id ê n c ia ..., porque então a alm a n ã o pode d u v id a r que
um D eus tão generoso a p ossa d e ix a r e a b an d o n a r quando
m ais necessita das su as g raças.
Finalm ente, a g ra tid ão é um a fonte de tal sim patia que
to rn a sum am ente am ável aos olhos de todos, o c o raç ão a g ra ­
d e cid o ... N ã o há m elhor m eio de g a n h a r os corações, nem
de os u n ir em laço a p e rta d o e forte do que o agradecim ento.
3.° A tu a gratidão. — Im pregnado das ideias a n te rio ­
res bem ponderadas, exam ina o te u procedim ento neste ponto.
V ê a Santíssim a V irg em agrad ecen d o desde o céu a
A G ratidão 523

flor m ais insignificante que lhe ofereces em sua honra. — V ê


a Jesus a queixar-se da in g ratid ão d o s hom ens como um a
das coisas que m ais lhe d e sa g ra d a ... N a sua vida queixa-se
d a in g ratid ão d e Jerusalém , que desprezou as su as g raças e
n ã o chegou a conhecer o «do,m de D e u s » ...; queixa-se ag o ra
m ostrando o seu c o raç ão e dizendo: V ê este coração que
tanto tem am ado os hom ens e em paga não recebe deles
senão ingratidões.... C om o sente D eus a in g ra tid ã o !... Com o
és tu a g ra d e c id o ? ... C om o im itas os exem plos de Jesus e
de M a ria que tan to te agradecem .... e tan to te recom pensam
o pouquinho que p o r eles fazes? ... Com o recebes e como
correspondes tu ao m uitíssim o que eles te dão?
V ê que d ív id a im ensa tens de g ra tid ã o p a ra com D eus
e até p a ra com os hom en s... Q u a n to s benefícios do S enhor
n a ordem n a tu ra l e so b re n atu ra l! Q uem o s p e d e c o n ta r? ...
C om o agradeces ao Senhor a g ra ça da fé ..., d a v o c a ç ã o ...,
d o s Sacram entos que recebes?, e tc ..., com o ag rad eces o
a m o r e o desinteresse com que teus pais te criaram e e d u ­
caram , talvez com g ra n d es sacrifícios d a sua parte, g a s­
tan d o os seus suores, as su as energias e a sua saúde p o r ti? ...
R e p a ra ste nisto e no que lhes d e v e s ? ... Q u a n d o e com o lho
agradeceste?
P e n sa sèriam ente no que deves aos teus superiores, que
com ta n to desvelo te c u id a m ...: aos teus m estres, que com
ta n to trab alh o te e n sin a m ...; aos teus am igos, que sofrem o
teu c ará cte r e su p o rta m as tu as im pertinências... C om o rece­
bes e agradeces os seus avisos e correcções? C om o co rre s­
pondes a todos?
P ede à S antíssim a V irg em que te dê um pouco de
reflexão p a ra que aprecies os benefícios que te fazem e
sob retu d o p a ra que saibas v iv e r ag rad ecen d o m uito os que
recebes de D e u s ...; que a im ites na su a hum ildade p a ra
recebê-los e n a sua generosidade p a ra apreciá-los, co rre s­
pondendo com o E la, com toda a tua alm a.
Pede-lhe luz p a ra conhecer qu an to a ofende a E la e a
524 A G ratidão

Jesus a in g ra tid ã o ... e com o D eus re tira m uitas vezes as


su as gra ça s aos que n ã o sabem o u não querem se r a g ra d e ­
cidos e as dá aos que m ais e m elhor as sabem e stim a r...;
que n ã o sejas tu a ssim ..., que a Santíssim a V irgem não
consinta que pela tua falta de ag radecim ento pe rca s a g raça
que o S enhor queria d a r-te ... e que não só de p a la v ra s m as
de obras, tenhas sem pre um c o ração a g ra d e c id o ..., vivendo
sem cessar a vida da g ra tid ã o ... e fazendo com que as tu as
p a la v ra s e as tuas o b ras sejam um contínuo T e -D d u m ■..,
um sentido e p erene D e o G ratias.
51. Correspondência à graça

l.° A vida d a graça. — T erm in áv am o s a m editação


an te rio r reco rd an d o que D eus dá as su a s g ra ça s à m edida
que a alm a c orresponde a elas e que às vezes p o r não c o r­
responder ou não sa b e r a p rec ia r nem a g rad e ce r estas graças.
D eus as re tira e d á-as a o u tras alm as m ais generosas. —
M erece bem este pensam ento tão terrív el que se lhe dedique
um a m editação p a ra nos em beberm os bem d a o b rig aç ão que
tem os de corresp o n d er à g ra ça do Senhor, da qual depende
inteiram ente a vida d a alm a.
P orque a v id a d a alm a é precisam ente a v id a da
g r a ç a ...; é a sua única v id a ..., a sua v id a v e rd a d e ira ..., de
sorte que se se perde, perde-se a v id a ... e p o rtan to sem
ela e stará m orta. ■ — É um a v id a excelentíssim a e nobilís­
sim a... Bem podem os cham á-la d iv in a ..., visto que a isso
se reduz, a saber, a p a rticip a r da p ró p ria vida de D eus.
— É um a p a rticip a çã o com pletam ente so b re n atu ra l e g ra tu ita,
que D eus nos concede, v isto que a nossa alm a por si mesma,
pela sua p ró p ria n a tu re za nunca teria m otivos nem direito
algum p a ra a sp ira r a esta v id a ...; nunca, p o r mais perfeita
que fosse, teria m éritos suficientes p a ra m erecê-la... Q u e
vida tão excelente e tão m a g n ífic a !...
526 C orrespondência à graça

C o m p ara -a com a v id a do corpo, que é um a vida baixa,


ra ste ira p uram ente a n im a l...; v ê de que se alim enta e de
que se sustenta a vida do c o rp o ...: de coisas da te rra ...,
de carnes de anim ais. — M as a v id a d a alm a assim sobre-
n a tu ra liz a d a n ã o se alim enta nem se sustenta sen ão com. o
p ró p rio D e u s..., com a sua graça, os seus sacram entos, o
seu p ró p rio C o rp o e o seu p ró p rio Sangue d ivino na E u c a ­
ristia ... É isto o que alim enta a a lm a !... É este o m anjar
que a vivifica e s u s te n ta !... Q u e v id a divina a d a nossa
a lm a !...
C om o vês, D eus quer com ela m eter-nos no m ais p ro ­
fundo do seu coração, e ali p ro d u z ir em nós essa sublim e
tran sfo rm ação pela qual a alm a, sem d e ix a r de se r o que é,
p u ra c ria tu ra na su a n a tu re z a ..., p a rec e contudo que se divi­
niza e se faz como D e u s..., um a ccisa parecid a ao que acon­
tece com o ferro m etido no fogo: sem d e ix a r de ser ferro
p arece contudo um c a rv ã o aceso, po rq u e d e tal m odo assi­
m ilou a v id a do fogo que tem as suas m esm as propriedades;
b rilha com o e le ..., queim a e a b rasa com o e le ... P o is assim
som os nós pela g raça: hom ens e criatu ras, m as parecem os
deuses, po rq u e assim ilám os a v id a de D e u s .— 'S o m o s em
tudo sem elhantes a E le ...; os nossos actos sobren atu ralizad o s
pela v id a d a g ra ça adquirem um v a lo r que n ã o podiam ter
p o r si s ó s ; e é tal este v a lo r que podem os a sp ira r à vida do
c é u ..., e isto com o um d ireito que nos é d ev id o p o r justiça,
d a d a a existência da g ra ça em nós. P e lo contrário, todos
os actos, p o r m ais h eroicos que sejam , se n ã c se fazem em
g ra ç a ..., se não v ã o inform ados e vivificados p e la g raça, são
actos m eram ente n a tu ra is ..., que p a ra D eus e p a ra a vida
d a ete rn id a d e n ã o têm v a lo r nenhum , m érito n e n h u m ... Q ue
bela é a v id a da g r a ç a ! ... Q u e sublime é a v id a d iv in a !...
2." M aria. — E x ta sia -te diante da beleza e sublim idade
da v id a d a g raça em M a ria ... E la sozinha é um m undo de
m aravilhas nunca so n h ad as pela g ra ça ab u n d an te e tão
excelsa que D eus nela derram ou. — T o d a a g ra ç a que D eus
C orrespondência à graça 527

re p artiu pelas dem ais c ria tu ra s se reuniu n ’E la e m uito m ais


a in d a ... e isto logo desde o prim eiro instante do seu ser.
L em bra as p a la v ra s do A njo n a A nun ciação : «cheia de
g ra ç a » ... Q u e adm iração no A njo ao v ê-la assim com g ra ç a
tão e x u b e ra n te !— P a re ce que tin h a p re ssa em pu b licar a
m agnitude d a g raça de M a ria ... e p o r isso, ap en as a vê, é a
prim eira coisa que lhe diz.
O s S an to s P a d re s não hesitam em em pregar, so b re a
g ra ç a concedida a M aria, expressões aparentem ente ex ag e ­
ra d as. —■S. B ern ard in o de Sena diz que «a g ra ç a de M a ria
foi in c r ív e h ... S. B o a v en tu ra di-la im en sa ... S. T o m ás
d ’A quino, infinita-, e ainda que é v e rd ad e que estas p a la v ra s
não são exactas, tom adas no seu sentido estrito e rig o ro so ...,
pois ninguém é infinito sen ão D e u s... contudo elas dizem
claram ente o que estes sa n to s sentiam da grandeza da g ra ça
d a Santíssim a V irg e m ..., que foi tão gran d e e copiosa que
nós não a podem os calcu lar nem seq u er a p ro x im ad a m en te ...,
nem form arm os um a ideia do que foi n a re alid a d e ... e p o r
isso p a ra nós é com o se fosse realm ente infinita e im ensa.
M a s ain d a n ã o é isto o m ais a d m iráv e l; o que .mais
deve cham ar-nos a atenção é que a p esar de ser ta n ta e tão
bela a g ra ça que a Santíssim a V irgem recebeu do Senhor,.
E la n ã o se deu p o r satisfeita e esforçou-se p o r tra b a lh a r e
c o o p era r com e ssa graça, de tal m odo que a foi aum entando
sem cessar até ao fim da vida. — Isto sim. é que c adm i­
rá v e l... N ã o e sta v a já «cheia de g ra ç a » ? ... Pois, p a ra que
queria m ais? ... — P o rq u e n ã o se d a v a p o r satisfeita com o
tesoiro riquíssim o que tinha, sem a sp ira r a m a is? ... N ã o
p arece isto um a ân sia a ra ia r num a v e rd a d e ira avareza? —
A ssim é de facto, m as divina e sublim e a v a r e z a ! ... Q u e
bem nos ensina M a ria a co n h ecer... a a p re c ia r... e a aum en­
ta r a vida da g r a ç a ! — Se conhecessem os «o dom de Deus»,
que é a graça, pro ced eriam o s com o M a r i a . .. — T u d o nos
pareceria pouco p a ra conseguirm os um g ra u a m ais de graça,
n a s nossas al.tnas...
528 C orrespondência à graça

3.° A nossa o b rig a ç ã o .— M a s re p ara , além disso, que


é um a v erd ad e ira obrigação, o c o o p era r sem pre com a
g ra ça . N ã o podem os fic a r inactivos com a g ra ça que o
S enhor nos dá. — M a ria ensina-nos pràticam en te que a
g ra ç a é um m agnífico cap ital que D e u s nos deu, n ã o p a ra o
e n te rra r... nem p a ra o ter p a ra d o ... m as sim p a ra neg o ciar
com ele e aum entá-lo.
M a ria com o seu exem plo diz-nos que q u an to m aiores
forem as g ra ça s e dons que D eus nos faz, m aior é a o b rig a ­
ção que tem os de tra b a lh a r com eles, p a ra que dêern m ais
fr u to ... e o que n ã o trab a lh a p o r aum entar essa vida, a c a ­
b a rá p o r m orrer, porque se lhe re tira rá poç castig o da sua
pre g u iç a e negligência, a g ra ça que lhe foi d a d a. F oi assim
q u e se fez àquele serv o que ten d o e n te rrad o o seu talento
n ã o o pôs a render: foi-lhe tira d o o talento e ficou sem
n a d a ... S. A gostinho exclam a: O que neste trabalho diz
basta, está perdido. E S. L eão acrescenta: O não trabalhar
e não aum entar é perder e retroceder...
A todos pois se aplicam as p a la v ra s do A m o do E v a n ­
gelho: Trabalhai e negociai até que eu v o lte ... E quando
o A m o v o lta r, que felizes serão o s que trab a lh a ra m e n e g o ­
c ia ra m ... e conseguiram d o b ra r o c a p ita l! ... f i assim que
procedem os neste assunto tão im p o rta n te ? ... — Se tivéssem os
aum entado a g ra ça b a p tism a l... a g raça que recebem os nos
san to s sacram entos, especialm ente n a co m u n h ão ... se hou­
véssem os correspondido a o m enos um pouco a tan ta s graças
que o S en h o r nos deu, qual n ã o seria ag o ra a nossa sa n ti­
d a d e ? .. . — M a ria no prim eiro instante da sua vida, recebeu
a plenitude d a g ra ç a ..., trab alh o u , cooperou, correspondeu,
como devia, a e la ... e assim , cad a instante, cad a hora, cada
dia, m ultiplicava a té ao infinito o seu c ab e d al... Q u a se infi­
n ita era, no fim, a g ra ç a de M a r i a !
E po rq u e não a im itam os nós n isto ? ... P o rq u e expom os
à m orte a vida da nossa alm a só p o r n ã o tra b a lh a r como
C orrespondência á graça 529

devem os? É assim que procedem os com a saúde e vida


d o corpo?
N ã o p rocuram os conservá-la, recu p erá-la, aum entá-la? ...
Q u e verg o n h a que n ã o dediquem os a m esm a im portância,
pelo m enos, à v id a d a a lm a !... O lh a p a ra M a ria ... segue
o seu exem plo..., e tra b a lh a de tal m odo que no fim da
v id a possas d a r gra ça s a D eus, po rq u e «a sua divina g ra ça
em ti não foi estéril»:

34
52. A Vida da Graça

f.° S u a C onservação. — T em o s o b rig aç ão de c o o p erar


na v id a d a g ra ç a ... e de tra b a lh a r com ela, p a ra conseguir
que esta v id a divina aum ente cada dia m ais em nossas alm as.
— E ra este o pensam ento p rá tic o anterior, m as a prim eira
coisa que tem os a fazer, é ded icar a esta vida tan to em pe­
nho que jam ais corram os o perigo de a p erd er, v ig ian d o
com o m aior cuidado a sua conservação e vencendo todas
as dificuldades e tentações que su rg ire m ... T am bém nisto a
Santíssim a V irgem nos serv e de m odelo perfeitíssim o.
A g ra ça que D eus concedeu a M a ria foi de tal ordem ,
que n ã o só excluiu d E la toda a m ancha de pecado a c tu a l...,
isto é, sem lhe destruir a liberdade, coIocava-A n ã o o bstante
num estado de im potência m oral, p a ra com eter qualquer
pecado, p o r pequeno que fosse. — Â g ra ça de M a ria era
jnam issível..., n ã o a podia p e rd e r..., não podia p e c a r .—
É n a tu ra l que o p ró p rio D eus que teve o cu id ad o de a p re ­
s e rv a r do pecado de origem que todos contraím os ao n a s­
c e r... quisesse tam bém p re serv á -la dos o u tro s pecados e
faltas que todos com etem os. — M aria, n ã o o b sta n te saber
isto m uito bem, procedia como se n a realidade assim não
fosse. — P arece que tem ia p e rd e r essa v id a ..., que lhe ro u ­
bassem algum a partezinha do seu c o ra ç ã o ... que caísse a
m enor m ancha no vestido im aculado da sua alm a puríssim a.
É im pecável, e a p esar disso vive p re p a ra d a e vigilante
A V id a da G raça 531

com o se pudesse p e c a r..., a sua g ra ça é perm anente, e n ã o


o b sta n te e v ita o s perig o s com o se neles pudesse m an ch ar a
s u a divina fo rm o su ra ...; põe todo o esm ero n a sua c o n se rv a ­
ção, com o se fosse um a frágil c ria tu ra que se deixasse
ro u b a r fàcilm ente.
N a d a tinha que se p re o cu p a r com a co n serv ação da
v id a d a g ra ç a ... D eu s se e n ca rreg a v a d isso ... C ontudo, p ro ­
cede assim, p a ra nos d a r um a belíssim a lição, p a ra nos ser­
v ir de exem plo ad m irável que pudéssem os e stu d ar e im itar.
-— P orque n ã o procedem os tam bém a s s im ? ... N ã o diz
S. P a u lo que levam os este tesoiro em v aso s de b a rro ... que
fàcilm ente se podem quebrar, o casionando a p e rd a d o
tesoiro que nos fo ra confiado?
N ã o tem os já experiência d e stas quedas e das suas ter­
rív eis consequências?— A h ! ... com o precisávam os de um
modelo, que nos ensinasse a ser m enos im pru d en tes... m enos
tem erários e confiados d o que ordin ariam en te costum am os
s e r ! ...
2.“ A vigilância. — P a r a isso é indispensável um a
g ra n d e vigilância. — C ontem pla M a ria ... A tra v essa as m on­
tan h a s d a Judeia p a ra v isita r a S a n ta Isabel e vai a p res­
sa d a ..., não p a ra n d o em p arte a lg u m a ... e e v ita n d o o con­
tac to com o m undo com o se tem esse contam inar-se. — V a i
a Belém g u a rd a d a e pro teg id a p o r S. Jo sé... a C a n á da
G alileia, onde v ai p o r caridade, fá-lo em com panhia de seu
F ilh o ..., a o p ró p rio C a lv á rio não quis subir sozinha, mas n a
com panhia d a s piedosas m ulheres... N ã o te parece ex ag e rad a
esta v ig ilância de M a ria ? — C om o devem os nós v ig ia r e com
que cuidado devem os tra ta r este v a so fragilíssim o do nosso
corpo, com tan to s sentidos, que sã o o u tra s tan ta s p o rtas
ab ertas à ten tação?
A nossa g ra ça é susceptível dp se perder, ao co n trário
d a d e M a ria ... N ã o tem os, como Kla, a concupiscência a p a ­
g a d a ... A s nossas paixões não estão subm etidas e escrav i­
zad as à razão, com o o estavam em M a ria. — F in alm en te...,
532 A V id a da G raça

n ã o som os im p e c á v e is ...; m uito pelo con trário . L ança um a


v ista d e olhos sobre o teu interior e v e rá s que és de con­
dição m uito frá g il... m uito inconstante no b e m ..., com m uita
in clinação p a ra o m al. N ã o sentes os estím ulos d a carne,
.corno S. Paulo? ... N ã o vês como as tuas paixões aum entam
c a d a vez m ais, to rnando-se d ia a d ia m ais exigentes?
P o is bem, exam ina a g o ra a tu a c o n d u ta ... C om o se a
tu a alm a estivesse confirm ada em g ra ç a ..., com o se fosses
im pecável, vives com ta n ta c alm a..., com ta n ta seg u ran ça
n a s tu as forças e n a tua v irtu d e ..., que te expões im pru­
dentem ente aos m aiores p e rig o s ..., n ã o te a ssustando as
ocasiões, se é que n ã o as buscas v o lu n ta ria m e n te ... Q u e
p o b re a tu a vigilân cia e c irc u n sp e c ç ã o !... Q u ã o pequenina
a m ortificação dos teus s e n tid o s !... A p ren d e com M a ria a
fu g ir do m u n d o ..., a a fa s ta r as ocasiões de p e c a d o ... a tira r
a o dem ónio m atéria p a ra as suas ten taçõ es...
O h ! T alv e z estranhes o facto de teres tentações e às
.vezes tã o grandes! — Se n ã o v ig ia re s ..., se não procederes
com o M a ria ... n ad a tens que e stra n h a r as tuas ten ta çõ e s...,
e m uito m enos as tu a s quedas.
Só com um a vigilân cia extrem a como a d a V irgem S a n ­
tíssim a, se pode a sse g u rar e c o n se rv a r tranquilam ente a vida
d a alm a.
i: L em bra a história de todos os pecados e te rá s a confir­
m a ç ã o .— O A njo, no c é u ...; A dão, no P a r a ís o ...; M aria
em N a z a r é ...; foram subm etidos à m esm a p ro v a de excepcio­
n a l e n g ran d ecim en to ..., e o A njo cai d a sua a ltu ra ... A dão
cai tam b é m ...; e am bos se precipitam no abism o d a sua
so b e rb a, a o pretenderem ser com o deuses.
A p ro v a de M a ria foi ainda m aior que a de A dão e a
d e S a ta n á s ... A sua elevação foi ainda m ais sublime
À queles n ã o lhes foram ditas da p a rte de D eus, e pela
b o c a de um A n jo as p a la v ra s que a M a ria foram dirigidas
no m om ento d a A n u n c iaç ão ... e no entanto, E la sabe m an­
ter-se nas alturas se.m re sv a la r... sem cair no desvanecim ento

L
A V id a da G raça 533

d a s o b e rb a ...; direi m elhor, tam bém E la c a i..., m as num


abism o sublim e de hum ildade que e n can ta o próprio D e u s...
aum entando até a o infinito, a su a g ra ça e sa n tid a d e ..., e
elevando-se aos olhos de D eus, dos anjos c dos hom ens, a
um a a ltu ra cada vez m aior.
M a ria soube v ig ia r..., soube p re c a v e r-se ..., e quando
surgiu a o c asiã o e apareceu a p ro v a , saiu com pletam ente
v ito rio s a .—-C om preendeste bem a liç ã o ? ... P o d e rá s tu dizer
algum a coisa p a re c id a ? ...
3.“ A tu a vida da graça. — 1D eves pois, convencer-te
d a necessidade que tens de ser fiel a esta v id a da g raça da
tu a a lm a ... d a o b rig aç ão que te assiste de trab a lh a re s p e r
a c onservar, que são m uitas as ocasiões de p e rig o ... às
vezes, onde m enos se p e n sa ..., e q u ando m enos se e s p e ra ...;
deves con v en cer-te de que o dem ónio se esforça a todo o
m om ento, e p o r todos os m eios p o r conhecer-te e estudar-te
p a ra te a ta c a r ...; a p ro v eita n d o qualq u er descuido p a ra a
tua ru ín a ... E m v ista disto não podes dorm ir, nem descansar,
nem d e sc u id a r-te ...
C om efeito, já algum as vezes p ag aste bem caro o teu
descuido, p erd en d o esta vida, ou pelo menos, e nfraque­
cendo-a no c o ração com as tuas q u e d as... com a s tuas
im p ru d ên cias..., com a tua m iséria e fragilidade. — N o ta
bem como se g u a rd a e se esconde um te s o u ro ..., e com
q u a n ta solicitude e cu id ad o se tra n sp o rta de um a p a rte p a ra
o u tra, q uando é necessário fazé-lo.
Q u e p recauções n ã o tom arias tu, se esse tesouro fosse
constituído p o r todos os teus haveres, e te visses forçado a
levá-lo p o r cam inhos cheios de perigos, e la d rõ e s !... N ã o
seria lou cu ra inqualificável conduzi-lo à v ista de to d o s...
a b rir o cofre p a ra toda a gente o v e r..., descuidá-lo com
perigo de ladrões e deitar-se a dorm ir tran q u ilam en te... ou
en tão dedicar-se a jogos e passatem pos?
V ê pois o excesso da tu a loucura, quando assim p ro ­
cedes com o tesouro da vida d a g raça que levas em tua
534 A V id a da G raça

alm a. — V ig ia constantem ente. — à p o rta do F a ra iso colo­


cou D eus um querubim com a esp ad a desem bainhada para
o g u a rd ar, e não perm itir a e n tra d a de ninguém ... é assim
que deves e star à p o rta do teu c o ra ç ã o ..., só desse m odo
co n se rv a rá s in tacto o tesouro d a g ra ça . R ecorre à protecção
da V irgem Santíssim a p a ra o conseguires... R oga-lhe que
não perm ita que alguém, te roube o u despoje d a veste
nupcial da g ra ç a ..., que conserves sem pre in ta c ta esta jóia
preciosíssim a d a d a pelo p ró p rio D e u s... e que p a ra isso te
conceda energia b a stan te a fim de a fastares q u alq u er ten ta ­
ção que possa c au sar prejuízo em tesouro de tan to valor.

/
53 . Fidelidade às inspirações divinas

1.“ A obra d e D eus. — Assim podem os cham ar à obra


d a sa lv aç ão e sa n tific aç ão das alm as. — E sta o b ra é tão
p ró p ria de D eus, que é d 'E le exclusiva e absolutam ente...
Se E le n ã o a faz, ninguém, a poderá fa z e r...; nem a S a n tís­
sim a V irgem , a p esar da sua santidade, teria podido p o r si
m esm a, e prescindindo de D eus, fazer absolutam ente nada.
p a ra aum entar um g ra u sequer d a sua santidade. — É bem
conhecida a frase dos S an to s P a d re s, que dizem ser e sta a
o b ra m ais d iv in a que D eus pode realizar.
V e rd a d e é que pede a nossa cooperação, e que sem ela
n a d a se c o n se g u iria..., porque D eus resp eita a liberdade do
hom em , e quer que ele trab alh e v o luntariam ente na sua sal­
v a ç ã o e sa n tific a ç ã o ... D e m odo que, com o dizia S anto
A gostinho: D eus, que não precisou d e ti para te criar..., não
te salvará tod a via , nem te santificará, senão com o c quando
tu quiseres. — T o d o o que se salv a, é porque q u e r... quem
se condena é tam bém porque assim o quer. — D o mesmo
m odo, quem se faz santo, é porque se em penha nisso.
P o rta n to , será D eus e eu quem te rá de re aliz a r esta
grande o b ra ... M e d ita e repete isto a ti mesmo frequente­
m en te... V ê com o D eu s cum pre bem a pa rte que lhe co rre s­
p o n d e .— Além da g ra ça sa n tific a n te ... d a g raça que perm a­
nece habitualm ente nas alm as constituindo a sua vida. D eus
concede-nos um sem núm ero de g ra ça s a c tu a is..., passa-
536 F idelidade às inspirações divinas

g e ira s..., que são com o que o nosso a lim en to ..., entre as
quais se encontram as que cham am os inspirações divinas de
que D eus de tan to s m odos e tã o frequentem ente se serve
p a ra encam inhar e d irig ir as alm as. — É sem dúvida, um a
bon d ad e im ensa, que D eus se interesse p o r nós a tal p o n to ...,
que chegue a ser o nosso M e stre ..., o nosso g u ia ..., o nosso
d irc c to r..., e isto tan ta s v e z e s..., com ta n to c u id a d o ..., com
ta n ta m ansidão e p a c iê n c ia ..., com tan ta d o ç u ra com o a que
em prega p a ra se in sin u ar nas nossas alm as.
£ com o o ciciar da branda aragem , no dizer da S a g ra d a
E s c ritu ra ..., ou, com o E le m esm o diz no seu E v an g e lh o , o
d ivino sem eador que a todas as h o ras está lançan d o no cam po
d a s alm as a sem ente d a s inspirações celestes... Q u a n tas
coisas D eus te seg red a d u ra n te um dia, se o quiseres
e s c u ta r? ... O que E le te sugere p a ra fazeres isto e evitares
a q u ilo ? .., lim a s vezes re p re e n d e-ie... o u tra s co n so la-te...
o u a n im a -te ... c o n v id an d o -te sem pre p a ra E le, que é o teu
fim e o term o de to d as as su as inspirações e 'm oções inte­
riores.
” Q u a n ta paciência p recisa p a ra esse tra b a lh o ! ... D ia e
n oite tra b a lh a contigo e p o r t i . .. ; m ilhares de vezes te cha­
mou! esperando a resp o sta inutilm en te..., po rq u e não fazias
c a so ... porque lhe fech av as a p o rta d a a lm a ... o u n ã o que­
rias esc u ta r o que E le te d izia ... Q u e tr is te z a ! ... Q u a n to
tem po p e rd id o !... Q u a n ta s gra ça s inutilizadas ou despre­
z ad a s! ...
2.“ D e a s e M aria. — Se queres v e r com o inutilizas a
graça, isto é, o g ra u de san tid a d e que po d erias atingir, se
deixasses que o S en h o r conduzisse a tua alm a liv rem en te...
e seguisses exactam em e as suas in sp iraç õ es... contem pla
M a r i a . .. — E is a Santíssim a V irgem em poucas p a la v ra s ...,
a isto podes reduzir toda a sua santidade e o segredo d a
m e s m a ...; seguiu com a m aior fidelidade as m ais pequenas
inspirações de D e u s..., nas m ãos do qual se a b an d o n o u com-
pletam eníe como um a escrav a, p a ra que E le fizesse o que
F idelidade às inspirações d ivin a s 53 7

lhe a p ro u v e ss e ...; e deste m odo a o b ra ficou p e rfe itíssim a ...,


com o feita por D e u s..., e sem que a c ria tu ra lhe atasse as
m ãos. — Ah, q u a n ta s..., q uantas vezes lh as tens tu a ta d o !
M a ria n ã o desperdiçou nem inutilizou um a só das g r a ­
ças que o S enhor lhe con ced eu ... T o d a s as inspirações do
S enhor acharam eco no coração de M a ria ... e p o r isso
produziram n a sua alm a santíssim a cem o u mil p o r um.
Assim diz C risto num a p a ráb o la: a sem ente cai em te r­
renos m uito d ife re n te s...; a sem ente é sem pre a m esm a...,
é a p a la v ra de D e u s..., é a insp iração de D e u s..., a que
santificou M a ria ..., a que elevou todos os santos à glória
dos a lta re s..., a que justificou a tan ta s a lm a s... E sta m esm a
te é concedida p a ra santificares a tu a alm a.
A dificuldade n ã o está n a se m en te... esta não p erdeu a
su a e fic ác ia... p o d e rá v a ria r na intensidade da sem en teira...
no g ra u em que D eus a d istrib u i... m as essencialm ente é em
todos a m esm a... A diferença está pois, nos terrenos onde
c a i...; uns são cam inho aberto a todas as im pressões..., com
e n tra d a fra n c a ... d e tal m odo que, em bora se oiça a voz de
D eus, ouve-se tam bém a voz do m u n d o ..., do dem ónio e aié
d a c a rn e ... P o d e r-se -á e stran h a r que n a d a p roduza essa
sem ente? Com tãc gran d e ruído cau sad o pelos que passam
no cam inho da tua alm a, não se o u v e bem a voz de D eus.
O u tro s, são duros com o as p e d ra s... Jesus c o n v id a ... já
o vêem , já o ouvem , já sabem o que E le deseja e p e d e ...,
m as n ã o qu erem ... endurecendc-se m ais e m ais os seus c o ra ­
ções, à m edida que E le cham a.
O u tro s aceitam o que D eus lhes inspira e querem
se g u i-L o ..., m as os espinhos das paixões brotam com fo rç a ...,
com exigências tirâ n ic a s ...; não há energia p a ra vencê-las
e os espinhos sufocam o desenvolvim ento da boa sem ente.
Som ente a te rra boa, que recebe, a b raç a e esconde no
seio esta sem ente d ivina chega a pro d u zir frutos com o as
alm as dos sa n to s..., com c a alm a de M a ria ... A p ro fu n d a
bem esta c o n sid era çã o ..., ex tasia-te an te a sa n tid a d e incom -
538 F idelidade as inspirações divinas

p a rá v e l de M a ria ... e c cn sid era-a com o re su lta d o da sua


perfeitíssim a fidelidade às gra ça s e inspirações de D e u s...
Q u e p rodígios obrou D eus em M a r i a ! ... Q u e p rodígios não
o b ra ria em ti igualm ente se o q u ise sse s!... se o d e se ja ss e s!...
3.” A tua preocupação. — D ev e ser e sta ... D eves s a n ta ­
m ente p ro c u ra r que esta ideia se transform e de tal m odo
num a obsessão, que jam ais consigas se p ará-la d e ti... R epete
com m u ita frequência: «P o sso ser sa n to » ... «posso im itar
a m inha M ã e e ch eg ar a ser como E la ... sem elhante a
E la ... um re tra to d ’E la > ... Sem dúv id a que n ã o está nas
tu as m ãos porque é um trab a lh o sob re-h u m an o ... D eus se
e n c a rre g a rá d isso ..., m as n ã o so zin h o ... em bora n ã o precise
de n a d a nem de ninguém , im plora e exige a tua colaboração.
— Já v iste no ponto a n te rio r o que fizeram D eus e M aria? ...
P o rq u e n ã o fazes a ex periência do que é possível a D eus
fa ze r contigo? /
L em bra-te do m ilagre d a m ultiplicação dos pães e dos
p e ix e s... D eus exigiu que dessem aqueles p ã es e aqueles
peixes p a ra com eles fazer o m ilagre. — P o d e ria tê-lo feito
sem e le s... m as n ã o q u is... A quilo, em bora pouco e m ise­
rá v el, e ra o que o hom em po d ia d a r... era a cooperação
do hom em na o b ra d e D e u s... e p o r isso a exigiu, e se
o p e ro u o m ilagre.
T am b ém a ti D eus pede e exige o m esm o... o teu ...
ain d a que p o u c o ...; depois E le e n tra rá com a sua pa rte
e o m ilagre se fará. — N ã o lhe negues a tua c o o p e ra ç ã o ...;
o fru to c o nseguido... Q u a n to fruto perdido até a g o ra ... por
ninguém deve ter m ais interesse que tu ..., visto ser p a ra ti
tu a c u lp a !...
S e a g o ra, pensando sèriam ente d ian te de D eus, isso te
cau sa pena, que será no d ia d a m orte, quando te vires com
tão pouco fruto, e unicam ente p o r tua culpa? N ã o perm itas
ao c o ração que siga p e r esse c am in h o ..., resolve-ie de uma
vez, a ser fiel às inspirações do céu, de qualq u er form a que
o S enhor as e n v ie ... N ã o a p ag u es a luz que E le acende para
F idelidade à s inspirações d ivin a s 539

te alum iar, pois de o u tro m odo cam inharás às e sc u ra s...


Assim o fizeste p o r certo m uitas vezes, m as a M isericórdia
d ivina voltou a acendê-la e a luz re ap a re c e u ... — V irá um
dia, porém , e.tn que as p ró p rias inspirações a g o ra rejeitadas,
se lev a n tarã o p a ra te a c u s a r... Q u e re sp o n d e rá s? ... N ã o
abuses delas, pois o seu núm ero está contado, e quem sabe
se não será a últim a, a que estás sentindo n esta m edita­
ç ã o ? ... Q u e te asseg u ra que não será este o últim o ch am a­
m ento de D e u s... N ã c endureças o c o ra ç ã o ... responde com
p resteza e acode fielm ente à c h a m a d a ... P ede-o tam bém à
Santíssim a V irgem .
54. Fidelidade nas coisas pequenas

1." G randeza do pequeno. — E is um dos enganos mais


funestos d a vida espiritual, que consiste em d e p rez ar alg u ­
m as coisas e não lhes d a r im portância, p o r as julgarm os
p e q u e n a s..., e sem qualquer v a lo r... Q u e bem sabe o demónio
e x p lo ra r este engano c o n tra n ó s ! ... E nem nos lem bram os
que ninguém se faz grande de repente, quer no mal, quer
no b e m .— T o d o s os santos devem a sua g ran d eza a um
conjunto de pequeninas coisas que adm iravelm ente souberam
a p ro v eita r. P o r o u tro lado, todas as grandes quedas n a s­
ceram de coisas tão p equenas e insignificantes, que p a ssa ­
vam desp erceb id as... e, n ã o obstante, é de fé e c o rroborado
pela m ais v u lg ar e .quotidiana experiência que quem des­
p reza as coisas pequenas cairá p o u c o a pouco nas grandes.
O mesmo sucede na v id a n a tu ra l... Q u e é um grãozm ho
de a re ia ..., um a g o ta de á g u a ... um átom o de p ó ? ... M as o
conju n to desses pequenos nadas, não form a as p ra ia s e os
desertos, ou os rios e oceanos? ... Q u e im portância se dá a
um in se cto ... a um m icróbio que não se vê? ... E contudo,
m ultiplicados, que prejuízos não podem c a u s a r ! ... N ã o repe­
tim os a cada m om ento que m uitas coisas pequenas formam
um conju n to m uito grande?
P o is na vida e spiritual isto é ainda mais certo. — A final
to d a ela n a d a mais é do que o conjunto de pequenas coisas
F idelidade nas coisas pequenas 541

que, a p esar disso, constituirão a nossa felicidade ou a


n ossa ru ín a p a ra sem pre.
N ã o terem os m uitas ocasiões... nem coragem nem for­
ças, p a ra re a liz a r em presas grandiosas, heróicas, ou faça­
nhas e stu p en d as...
A perfeição n ã o consiste precisam ente nos feitos e x tra o r­
dinários, m as na fidelidade e ex actid ão com que cum prim os
os nossos pequenos deveres d iário s... Assim, se formam as
virtu d es sólidas que fazem os s a n to s ..., com a p rá tica cons­
tan te dos actos pequenos das v irtu d e s o rd in á ria s... E sses
actos são quase sem pre de reduzida aparência, é verdade,
m as nem p o r isso deixam de ter v a lo r ! ...
A fidelidade no p ouco d a r-n o s-á um d ia, a posse do
m u ito ... A ssim diz o C risto no E v an g e lh o : P orque [o ,te / iel
no p o u c o ... isto é, no p e q u e n o ..., no que parecia não ter
im portância..., eu te constituirei senhor do m u lto ... C om o é
generoso este S e n h o r!... P ede-nos o pouco p a ra logo o
re trib u ir com o m u ito ... Q uem não se anim ará a d a r este
p o u c o ..., a ser fiel neste p o u c o ..., se disso depende o prém io
do m u ito l— C laro está que um pouco de tan to valor, j.i não
é p o u c o ... já não é um a coisa p equena e d e sp rez ív el... e
p o r isso te convencerás mais um a vez de que se não pode
ter em pequena co n ta qualquer coisa que se relacione com a
nossa a lm a ... a nossa sa lv aç ão ou sa n tific aç ão ... C om o pode
se r pequena um a coisa, da qual depende o u tra tão g ra n d e ? ...
L ogo tam bém não pode ser pequeno o teu in teresse... não
pode ser p equena a tua fidelidade p a ra cum prir o que ela
exige.
2.° F idelidade de M a r ia .—'N a vida de M a ria m elhor
que e.m nenhum a o u tra, podem os a p ren d e r esta fidelidade. —
T o d a esta vida preciosíssim a não é m ais do que um conjunto
de pequeninas coisas, p o r vezes aco m p an h ad as de coisas
g ra n d io sa s e heróicas em sum o g r a u . — M a ria n ã o quis
o c u p ar n a terra qualq u er lugar proem inente... não se distin ­
guiu aos olhos dos hom ens, das o u tras m eninas c u aldeãs
54. Fidelidade nas coisas pequenas

l.° G randeza do pequeno. — E is um dos enganos mais


funestos d a v id a espiritual, que consiste em d e p rez ar a lg u ­
m as coisas e n ã o lhes d a r im portância, p o r as julgarm os
p e q u e n a s..., e sem qualquer v a lo r... Q u e bem sabe o dem ónio
ex p lo ra r este engano c o n tra n ó s ! ... E nem nos lem bram os
que ninguém se faz gran d e de repente, quer no mal, quer
no b e m .— T o d o s os santos devem a sua g ran d eza a um
conjunto de pequeninas coisas que adm iravelm ente souberam
a p ro v eita r. P o r ou tro lado, to d as as grandes quedas n a s­
ceram de coisas tão p equenas e insignificantes, que p a ssa ­
vam d esp erceb id as... e, não obstante, é de fé e c o rro b o ra d o
pela m ais v u lg a r e .quotidiana experiência que quem des­
p reza as coisas pequenas cairá p o u co a pouco nas grandes.
O mesmo sucede n a v id a n a tu ra l... Q u e é um grãozinho
de a re ia ..., um a gota de á g u a ... um átom o de p ó ? ... M as o
conjunto desses pequenos nadas, não form a as p ra ia s e os
desertos, o u os rios e oceanos? ... Q u e im portância se dá a
um in se cto ... a um m icróbio que não se vê? ... E contudo,
m ultiplicados, que prejuízos não podem c a u s a r ! ... N ã o repe­
tim os a cada m om ento que m uitas coisas pequenas formam
um conjunto m uito grande?
P o is n a vida espiritual isto é ainda m ais certo. — A final
tod a ela n a d a m ais é do que o conjunto de pequenas coisas
F idelidade nas coisas pequenas 541

que, a p esar disso, constituirão a nossa felicidade o u a


n ossa ruína p a ra sem pre.
N ã o terem os m uitas o casiõ es... nem coragem nem for­
ças, p a ra re a liz a r em presas grandiosas, heróicas, o u fa ç a ­
nhas e stu p en d as...
A perfeição n ã o consiste precisam ente nos feitos e x tra o r­
dinários, m as n a fidelidade e exactidão com que cum prim os
os nossos pequenos deveres d iário s... Assim, se form am as
v irtu d e s sólidas que fazem os sa n to s..., com a p rá iic a cons­
tan te dos actos pequenos das v irtu d e s o rd in á ria s ... E sses
actos são quase sem pre de reduzida a p arên cia, é verdade,
m as nem p o r isso deixam de ter v a lo r ! ...
A fidelidade no p ouco d a r-n o s-á um dia, a posse do
m u ito ... Assim diz o C risto no E v an g e lh o : P orque to ste fiel
no p o u c o ... isto é, no p e q u e n o ..., no que parecia não ter
im portância..., cu te constituirei senhor do m u ito ... C om o é
generoso este S e n h o r!... P ede-nos o pouco p a ra logo o
re trib u ir com o m u ito ... Q uem n ã c se a n im ará a d a r este
p o u c o ..., a ser fiel neste p o u c o ..., se disso depende o prém io
do m u ito l— C laro está que um pouco de tan to valor, já não
é p o u c o ... já não é um a coisa p equena e d e sp rez ív el... e
p o r isso te convencerás m ais um a vez de que se não pode
ter em pequena conta qualquer coisa que se relacione com a
nossa a lm a ... a nossa sa lv aç ão ou sa n tific a ç ã o ... Com o pode
se r pequena um a coisa, da qual depende o u tra tão g ra n d e ? ...
L ogo tam bém não pode ser pequeno o teu in teresse... não
pode ser p equena a tua fidelidade p a ra c um prir o que ela
exige.
7." F idelidade d e M aria. — N a v id a de M a ria m elhor
que e.m nenhum a o u tra, podem os a p ren d e r esta fid elid ad e .—
T o d a esta vida preciosíssim a não é m ais do que um conjunto
de pequeninas coisas, p o r vezes a com panhadas de coisas
g ra n d io sa s e heróicas em sum o g ra u . — M a ria n ã o quis
o c u p a r na te rra q u alq u er lu g ar proem in en te... não se d istin ­
guiu aos olhos dos hom ens, das o u tras m eninas ou aldeãs
542 F idelidade nas coisas pequenas

de N a z a ré . F o i n ecessário o o lh a r clarividente de D eus,


p a ra descobrir o que se escondia sob aquela m odesta a p a ­
rê n c ia ... p a ra conhecer o v a lo r e o m érito d a q u elas acções
p equenas e v u lg are s em que Miaria se o cu p av a .
C om efeito, que im portância o u v a lo r podiam te r cozi­
n h a r..., coser e re m e n d ar..., v a rre r o u e sfre g a r..., lavar,
lim p a r..., o rd e n ar a pobre e hum ilde c a s in h a ..., fazer peque­
n a s com pras, e tc ..., ocupar-se enfim, com os tra b a lh o s p ró ­
p rio s dum a aldeãzinha e dum a esposa de jo rn aleiro ? — T o d o s
estes porm enores sendo tão triviais, constituíam a v id a da
S antíssim a V irgem pois eram o s actos que m ais frequente­
m ente p ra tic a v a ... e o que adm ira é que com eles se fez tão
g ra n d e ..., tão s a n ta ..., tã o d iv in a ...
L ev a n ta um bocadinho o véu que cobre e sta s coisas
o rd in árias e v e rás que n a fidelidade e constância às m es­
m as, se esconde um a v e rd ad e ira fonte de sacrifícios, que
d ã o a estes actos um gran d e valo r.
O facto de se a te n d er com perfeição e p o n tu alid ad e a
estas coisinhas tão insignificantes, de tão pouco b rilh o ...,
tã o frequentes e ord in árias, p o r serem de todos os dias e de
to d as as h o ra s..., não se c a n sa r nunca de as fazer bem ...
com toda a p e rfeição ... com o mesmo a rd o r e entusiasm o
com o se se tratasse de altos feitos.... supõe um ânim o m uito
fo rte ... um a v o n tad e m uito firm e..., um espírito de sacrifício
e a b n eg ação im e n so ...; num d ia ..., em d o is..., num m ês...
no u tro mês, talvez se possam fazer com re la tiv a fa cilid ad e...,
m as sem pre d u ran te a v id a in te ira ..., isso é um v erd ad e iro
m a rtírio ...; não h á p enitência nem m ortificação m ais difícil
do que e sta ...
É um a v erd ad e que todos podem os c o m p ro v a r o que
dizia S. João B erchm ans a m aior penitência é a virtude
c o m u m ... a vida o rd in á ria cheia d e mil coisinhas de nada,
to d as p ra tica d a s com fe rv o r..., d ilig ê n cia..., com o m aior
cuidado e atenção. É assim a v id a de M a ria ..., um a vida
que n ã o d á nas v istas: não foi eloquente, nem poderosa,
F idelidade nas coisas pequenas 543.

nem brilhou pelo talento, nem sequer fez m ilagres estupendos,


o u .m aravilhas extraordinárias...., m as re a liz a v a tudo com a
in tenção puríssim a d e cum prir a V o n ta d e de D e u s..., e p o r
isso fazia tudo com p e rfe içã o ... o que tra z ia sobre E la a
am izade e as com placências de D eus.
3.“ A tua resolução. — N este p o n to não se adm item
d ú v id as nem h e sita çõ e s..., não é possível a m enor desculpa.
T em os d e c um prir a v o n tad e de D e u s..., E le o rdinariam ente
n a d a m ais nos p e d irá que as coisas o rd in árias de cada dia.—
D eves tom ar a resolução de lhe a g ra d a re s todos os dias,
cum prindo com ex actid ão a sua v o n tad e sa n tíssim a ... — P a ra
D eus tudo é p e q u e n o ; as acções g randiosas que m ais ferem
a v ista dos hom ens, não valem m ais, diante dele, do que as
pequenas e v u lg ares.
N a sua p resença tudo é b rin cad eira de c ria n ç a s... b a ta ­
lhas que se g a n h a ra m ... im périos que se c o n q u ista ram ...,
invenções que se fize ram ... fam a e h o n ra s que se g ra n je a ­
ra m ... tudo isso, p a ra Ele, é o mesmo que n ad a. — O que
tem v a lo r é o c o ra ç ã o ..., a intenção com que fazem os os
nossos a cto s... o m odo como os executam os... o fim a que
aspiram os.
Se os teus actos são acom panhados pelo coração e p o r
um gran d e am or, nesse caso terão um a lto valo r, e a g ra d a ­
rã o a D eus, em bora sejam ou p areçam pequenos. — P a ra
D eus só tem. v a lo r a grandeza do c o ra ç ã o ..., e a intenção
recta e p u r a . . . — N ã o procures pois, o u tra coisa, em teus
actos, senão p u rific ar a intenção fazendo-os todos por am or
de D eus, e desse m odo ain d a que pareçam baixos e triv ia is...,
o p ró p rio com er, dorm ir e d e sc an sa r... podem ser actes
nobilíssim os que d a rã o m uita glória a D eus e não poucos
m éritos à nossa al.ma.
Além disso, a fidelidade nestas coisas pequenas costum a
ter a vantagem de se não perder, p o r v aid ad e ou van g ló ria,
o m érito que elas nos possam g ra n je ar, com o facilm ente
sucede com os actos de grande brilho. Q u a n ta s vezes a.
544 F idelidade nas coisas pequenas

p rá tic a desses actos e x tra o rd in á rio s, e de um a v irtu d e heróica,


se tran sfo rm a num pouco de soberba m iserável, perdendo
assim p o r com pleto qualq u er v a lo r que pudessem t e r ! ...
P o is bem, am a d e v era s o exercício dessas virtudes
pequeninas, que, m ais d o que a estim ação e a fam a, te
d a rã o a hum ild ad e... a singeleza e a m o rtificação ... e habi­
tuando-se a este dom ínio nas coisas m ais pequenas, a tu a
alm a ficará bem p re p a ra d a e tem perada p a ra as coisas
grandes, se D eus as en v iar. — Assim se p re p a ro u M a ria na
hum ildade d e N a za ré , p a ra ser o assom bro d a fortaleza n o
C a lv á rio ... Im ita-a no prim eiro, se queres se r sem elhante
a E la no segundo heroísm o.
55. V ida de acabamentos e de pormenores

l.° S u m a im portância da m esm a. — íntim am ente re la ­


cionada com a m editação anterior, esta «V ida de a c a b a ­
m entos e de porm enores» é com o que um a continuação ou
consequência d a m esm a... Se n ã o podem os desprezar, ou
antes, se tem os de ser fiéis e constan tes às coisas pequenas,
tam bém tem os necessàriam ente de v iv er esta vida de a c a b a ­
m entos m inuciosos. — T o d a s as acções do hom em estão
ro d ead as de m inudências, revestidas p o r vezes de tal im por­
tân cia, que delas depende o m aior o u m enor m érito das
m esm as a cç õ es... — N ã o se podem d e sp re z a r... m uitos o
fizeram e essa foi a origem das su as lastim osas q u e d as...
P a ra te convenceres da im portância desta vida, re p ara
que nós pró p rio s ordinariam ente, julgam os e apreciam os
qualquer coisa, em conform idade com as particu larid ad es
que as aco m p an h a m ... O lham os p a ra um a o b ra de arte, e
são os m inuciosos porm enores em que se fixou o artista, o
que m ais nos cham a a a te n ç ã o ...
O uvim os um concerto m usical, e a sua beleza dependerá
dos pequenos m atizes dos e x ec u ta n tes... O porm enor cons­
titui estas filigranas de arte, que tan to nos deleitam e
seduzem ...
C oncebem os um a o b ra perfeita e bem a c a b a d a ... co.rn
alguns porm enores incom pletos? ... U m a o b ra sem a c a b a ­
m ento nos seus porm enores é um a o b ra im p erfeita... está
35
5 4 6 V id a de acabam entos e d e porm enores

a g u ard a n d o o últim o re to q u e ... esse quid final que a a p er­


feiçoe... e esse quid é o últim o porm enor.
T u d o isto deve aplicar-se especialm ente às o b ras de
a m o r... O am or alim enta-se o am or vive de coisas peque­
n a s . — U m p re se n te ... um obséquio que te fa ze m ..., um a
p ro v a de carinho que recebes, serão p o r ti a preciados
segundo as p a rticu la rid a d es que os acom panham . — Foi
algum a coisa feita p o r ti... p ensando em. ti... a divinhando
os teus g o sto s... querendo d a r-te um a su rp re sa ... Fez-se
com c u sto ..., à força de p a c iê n c ia ... de tra b a lh o ! ... talvez
a té de sa c rifício ... A h ! como se agradece esse o b s é q u io !...
N e ssa a ltu ra não apreciam os o v a lo r m aterial que às
vezes é bem p e q u en o ... o que nos encanta e a tra i é o que
ele su p õ e ... aquele p orm enor in teressante que o acom panha.
O am or, não o esqueças, é essencial.tn.ente m inucioso.
— Q u e m inúcias n ã o usa um a m ãe ao c ria r o seu filh o ..., ao
v e sti-lo ..., a o alim en tá-lo ..., e a o a ca rin h á -lo ...
P o is bem, a sa n tid a d e ..., a perfeição da a lm a ..., é toda
ela v id a de a m o r..., o b ra de a m o r ! ... exclusivam ente de
am or. —• A santidade é a união da alm a com D eus p o r m eio
do a m o r.— P o rta n to , se o am or gosta de coisas p e q u en a s...
a sa n tid a d e consistirá nesses porm enores do a m o r... A sa n ­
tidade é constituída, p o r conseguinte, com coisas pequenas.
2.° D elicadezas d e M a ria nas m inúcias. —• E p o r isso
a v id a de M a ria, vida de sa n tid a d e e de am or, está cheia
destas m inudências adm iráveis, que sã o precisam ente o que
m ais devem os estudar, conhecer e im itar n ’E la . — M a ria
c onsagra-se a D eus e e ntrega-se ao seu se rv iç o ... T êm -n o
feito m uitas o u tras alm as, a n te s e depois de M a ria ... m as
nenhum a o fez com o E la . — A os 3 anos a b an d o n a a sua
casa e v ai p a ra o T em plo. Q u e adm irável p o rm e n o r!...
C om o se apressa a seguir as inspirações d iv in a s !...
N o T em plo, ao c o n sag rar-se a D eus faz v o to de v ir­
g in d a d e ... T am bém m uitas o u tras alm as o fariam d e p o is...,
sim, depois, porque E la foi a p rim e ira ..., a única que então
V id a d e acabam entos e d e porm enores 547

fe z este v o to ...; à s o u tra s m eninas teria p arecido um a


lo u c u ra ..., m as E la n ã o se im porta do que as o u tras possam
ju lg a r e p o r isso é E la a prim eira! ! ! ..., a única! ! ! ..., a
fazer este v o to a o S e n h o r... Q u e e n ca n ta d o r este p orm enor
d a ,sua sublim e v irg in d a d e ! ... E a p rim eira pessoa que
ficou e n ca n ta d a com ele e foi o p ró p rio D eus, e p o r isso
a elegeu p a ra su a M ã e .
O A njo v isita -a p a ra esse efeito, en co n tran d o -a na sua
c a sin h a ... recolhida... em oração... R e p a ra nestas p a rticu la ­
rid ad es que ensinam com o h á -d e v iv e r um a alm a v irg e m ...;
só assim ..., no recolhim ento... n a so le d a d e ..., no tra to e
união com D eus p ela oração, se p o d e c o n se rv a r im aculada
a flor da v irg in d a d e ... C asa-se com S. Jo s é ..., com unica-lhe
o seu voto, p a ra que ele seja sóm ente o g u a rd a e p ro tecto r
d a su a v irgindade, m as n a d a lhe diz so b re a concepção
d iv in a e m ila g ro sa ...; diz o que tem a d iz e r..., o que é de
ab so lu ta n ecessid ad e..., o resto, ain d a que seja conveniente,
se n ã o é necessário, c a la -o ..., deixa-o a o cuidado de D eus
e n a d a m ais...
C o n tin u a a re p a ra r nestes porm enores de silên cio ..., de
p ru d ê n c ia ..., de co nfiança em D e u s ..., de p ro fu n d a húmil*
d a d e ... C om o são ricos em m erecim ento diante de D eus! —
N a sc e o M enino Jesus, e os pastores, av isad o s pelo céu, v ã o
e n contrá-lo num estábulo, envolto em paninhos e na com pa­
nhia d a M ã e ! ... E ste porm enor, p o r n a tu ra l, p arece insigni­
ficante, e contudo tem um alto v a lo r... Sem pre encontrarem os
a Jesus com M a ria e por M a ria ... é com E la c por E la que
se nos d a rá e v irá aos nossos c o raç õ es...
E n a v id a oculta, q uantas p a rticu la rid a d es delicadas
podem os considerar? ! ... Q u a n to s carinhos os de M a ria a o
p re p a ra r a com ida p a ra o M e n in o ... ao fazer-lhe os vesti-
d in h o s..., a o tra tá -lo a todo o m o m en to ?... P erm ite à im a­
g inação que p e rco rra santam ente to d o s os passos d a v id a
de M aria, e v e rá s q u an tas m inúcias delicadas se podem
descobrir.
548 V id a d e acabam entos e de porm enores

C ontem pla-a finalm ente n o C a lv á rio ... N a v id a pública


de Jesus ocultou-se... m as ag o ra surge da o b sc u rid ad e ... e
lá v ã o generosam ente com o Filho p a ra o sa c rifício ...
Q u e fineza tã o s i n g u l a r ! ! ! . .. O c u lta d u ran te a pa rte
gloriosa d a vida de Jesu s... e à v ista de todos d u ran te a
p a rte d o lo ro sa ... Q u e te sugere este porm enor do carácter
de M a ria ? ...
M a ria fica em sua casinha e não sai. P o rq u e não vai
com as piedosas m ulheres a té ao sepulcro? É a especialidade
d a sua fé e d a su a esperança. — C rê e espera confiadam ente
n a p a la v ra de seu F ilh o ... Jesus ressuscitará. P a ra que pro-
cu rá-lo no se p u lc ro ? ... O h ! que vida tão cheia de m agní­
ficas e preciosas s in g u la rid a d e s!... Pede-lhe que tas dê a
co n h ecer...
3 .“ A tu a vida de acabam ento d e porm enores. — Assim
dev es ,ser tu tam bém . D eves tecer a tua vida de porm enores
acab ad o s. —• E m todos os a c tc s o lh ará s à p a rticu la rid a d e que
lhes d á v a lo r e v id a ... — Se obedeces, não seja de qualquer
m a n e ira ... n ã o o faças como e quando o queiras, seguindo
o am or próprio, m as com a p a rticu larid ad e d a p ro n tid ã o ...
d a aleg ria ..., c eg a m e n te..., sobrenaturalm ente. — N a s m orti­
ficações, p ro c u ra rá s a particu larid ad ezin h a que m ais m olesta...
que mais c u sta ... que m ais fere o teu am or p ró p rio ... p ra ti­
c an d o -as neste caso com n o v a p a rtic u la rid a d e ... c o m d eci­
sã o ... en erg ia ... c o n stâ n cia ... se.m desânim o nem hesitações.
—-N ã o te m ortificarás som ente quando estejas d isp o sto ...,
q u an d o a m ortificação te não hum ilhe... q u ando te custe
pouco, e tc ... C om para estas duas m ortificações e v erificarás
com o diferem um a da outra.
N o dom ínio das paixões p ro c u ra rá s que n ã o te falte
a p articu la rid a d e da coragem e da prontidão p a ra cortares
rapidam ente qualquer excesso d e la s .— E m toda a tua vida
p o rá s am or, m uito am or. — C oncretiza m uito bem a tua
v id a ... os teus desejos e propósitos. — O s propósitos gerais
e aéreos são com pletam ente in ú te is .— Q u a n to m ais concre­
V id a de acabam entos e de porm enores 549

tos c m inuciosos, m ais práticos se to rn a rã o ... T a lv e z seja


esta a ra z ã o de até a g o ra os teres cum prido m a l...; não
soubeste concretizá-los. — C ontem pla o m odelo... re p a ra em
M aria, e copia com a m aior perfeição as suas linhas tão
form osas...
56. Vida de fervor

1.° S u a necessidade. — P a r a a vida de perfeição e


santidade, é absolutam ente n ecessária um a gran d e piedade.
Sem ela n u n c a p oderás a g ra d a r a D eus nem conseguir o que
d e se ja s... A o ração torna-se inútil e in e fic a z ...; as virtudes
m urcham e acabam p o r d esap arecer c o m p le ta m e n te...; a
v id a de piedade transform a-se em. ex terio rid ad es e em
r o tin a ...; a m ortificação to rn a-se p en o sa e in to le ráv e l...
enfim , tudo sã o d ific u ld a d e s...; esm orecem a força e o
alento p a ra tu d o ... e a c a rg a do S enhor chega a p a rec er
um jugo extrem am ente pesado, que nos assu sta e nos esm aga
com o seu p e s o !
E is o que acontece a quem perde o fe rv o r... P elo con­
trário, q u a n ta s facilidades enco n tra n a vida a alm a fe rv o ­
ro sa ! N ã o lhe fa ltarã o dificu ld ad es..., c o n tra te m p o s..., te n ­
ta ç õ e s ..., m as n a p iedade enco n tra facilidade p a ra tu d o ...
T u d o lhe p arece bem ... tudo lhe parece p o u c o ... e, sem pre
co n ta n d o com a g raça de D eus, acha-se com coragem su fi­
ciente p a ra d esafiar o inferno inteiro e todas as cria tu ra s
ju n ta s ... pois tem a certeza de que nenhum a d elas conse­
g u irá se p a rá -la do am or de D eus.
P o rta n to , sòm ente com a piedade conseguirás ,ser a g ra ­
d á v el ao S e n h o r... e sa n tific a r a tua alm a. — Se queres
sa b e r com o é a g rad á v el ao S enhor um a piedade sincera,
relem bra as suas p a la v ra s sobre a tibieza, a antítese da
p ie d a d e ... Q u e p a la v ra s tão d u ra s n a b c ca do am abilíssim o
V id a d e fervo r 551

J e s u s !... Com o lhe re p u g n ará a tibieza, p a ra o seu coração


fa la r desse m o d o ! ...
C o m p ara -a à figueira estéril, que só pro d u z folhas e
ram os, e nunca chega a d a r fru to ... e p o r isso, o dono,
can sad o d a sua inutilidade, resolve a rra n c á -la p a ra que não
ocupe um lu g ar que p o r o u tra p lan ta seria m elhor a p ro ­
v e ita d o ...
Q u e castigo, m eu D e u s ! ... que sentença tão a te rra ­
d o r a ! ... N a d a m ais terrív el do que esta a m e aç a ... P arece
que a paciência d iv in a se esgota com o tíb io ...
D eus arrem essa-o da sua p re se n ç a ... e nega-lhe as suas
g ra ça s, que pre fe rirá d a r a o u tras a lm a s... C laram ente o
afirm a o Senhor, q u ando diz: P orque não és frio m m
quente, m as tíbio, eu te vom itarei da m inha boca, com o se
v o m ita , um a náusea, um a com ida in to lerá vel... Q u e será
pois a tibieza? ... E , que será o fervor? ... Se é ab so lu ta ­
m ente contrário, o s seus efeitos serão tam bém diam etral-
m ente o p o sto s... Q u e consolação! Q u e aleg ria tão grande
não d a rá ao C o ra çã o divino de Jesus um a alm a fe rv o ro s a !...
2." F erv o r dc M aria. — Co.mtem pla-o em M a ria . Q u e
piedade a s u a ! ... P o r isso foi sem pre agradabilíssim a ao
Senhor! N u n c a fez qualquer coisa a m eias... nunca tra b a ­
lhou com d e sa le n to ... jam ais se deixou lev a r da fa lta de
vontade, p a ra fazer os seus trab alh o s de qualq u er m odo, e
p a ra a c a b a r q u a n to antes. — E isto em tudo, m as nos seus
actos e sp iritu a is..., na sua vida de piedade, o seu fe rv o r foi
in su p e ráv e l... Q u e oração a q u e la !... C om o falav a com
D e u s ! ... Q u e frutos adm iráveis não conseguiria?
R eco rd a o fe rv o r com que E la o ra v a no m om ento a n te ­
rio r à E n ca rn a ç ã o do V erbo, que chegou a a p ressar a h ora
d a R e d en ção ... Q u e fe rv o r o seu, ao d e ix a r o m undo em tão
ten ra id a d e ... ao a b an d o n a r a sua casa, a p e sa r de n ã o ter
perig o s de espécie algum a, m as som ente p a ra se e n tre g ar a
D e u s !—■C ontem pla-a subindo rapidam ente, segundo narram
alguns historiadores sagrados, as escad arias do T em plo, sem
552 V ida de fervo r

v o lta r os olhos p a ra trás, sabendo perfeitam ente que ao fundo


dessas escadarias estavam seus pais tristes e profundam ente
a m argurados, pela se p a ra ç ão da sua querida filh in h a ...—
M a ria, porém , só atende à v ontade de D e u s... E le quer
assim , e por isso cum pre em tudo fervorosam ente, a sua
divina vontade.
E assim procedeu sem p re... cm toda a v id a ...— O b ser­
vám os ontem as perfeições m inuciosas da vida de M a ria ...
E n tre todas é digna de especial destaque, a d a piedade, que
é realm ente um acabam ento im portantíssim o... E qual foi no
C alv ário o seu fe rv o r o acom panhar o seu F ilho, a b raç ar
a su a C ruz e crucificar-se com E le ? ... E o fe rv o r com que
esteve na com panhia dos A póstolos, p re p ara n d o -o s p a ra a
v in d a do E sp írito Santo, conservando-os d u ra n te alguns dias
em o ra çã o , que E la mesmo d irig ia ? ... C om o se anim ariam
todos an te o exem plo fervorosíssim o de M a ria ? ...
Se a g o ra, à v ista de um a alrna santa, nós sentim os que
a sua piedade se nos com unica e nos contagia, que se teria
p assad o naqueles dias de tra to continuado e tão íntim o com
M a ria Santíssim a? ...
F inalm ente, abism a-te ante a consideração daqueles ê x ta ­
ses fervorosíssim os..., ante aqueles colóquios divinos entre
M a ria e Jesus, quando a V irgem recebia em seu C o ração
pela E u ca ristia o C orpo de seu F ilh o ...
N ã o te parece que isto há-de exceder toda a m edida do
fervor? A h ! se as tu as com unhões se parecessem algum a
coisa com as de M a r ia ! ... Se im itasses a V irgem no fervor
com que c o m u n g a v a !...
3.“ E m que consiste o /e ru o r? — E nota bem o que é
e o que não é o fervor, pois fácilm ente se ig n o ra ... e de tal
m aneira se confundem estas noções que m uitas vezes se julga
h a v e r fe rv o r onde ele n ã o existe e vice-versa. — O fervor
n ã o consiste no gosto sensível pelas coisas e sp iritu a is..., nem
nas a legrias e consolações com que D eus por vezes as
acom panha. — F requentem ente o S enhor quer experim entar
Vicia d e ferv o r 551

as alm as p riv an d o -a s desses gostos e consolações, m as por


isso a alm a não perde o seu fervor!
Em m eio de grande aridez, que durou anos inteiros,
d urante os quais não sentia nada. nem lhe oco rria mula.
S a n ta T e re sa de Jesus soube c o n se rv a r a sua vida cheia
de grande ferv o r. — O mesmo sucedeu a S a n ta M ad alen a
de Pazzis, q uando ern ocasião sem elhante, longe de d esani­
mar, se a b ra ç a v a ao crucifixo, pedindo p a ra so fre r sem
m orrer... P o d e pois, h a v e r um g ra n d e fervor, juntam ente
com um a grande desolação, e até mesmo com o té d io ..., o
desg o sto ..., e a repu g n ân cia.
R ecorda o exem plo do p ró p rio C risto, quando no H o rto
sentiu aquele c a n sa ç o ..., aquela fra q u e z a ... aquele téd io ...
aquele gran d e p a v o r..., quando e stav a em meio de tão
grande desolação e aridez, que não lhe o c o rria o u tra coisa
na sua oração, p assando três h o ras seguidas a rep etir um a
e mil vezes as m esm as p a la v ras, e a p e sa r disso, que fervor
o s e u ! ... Q u e esforço o deste fe rv o r divino que chegou a
fazê-lo su a r s a n g u e !...
N ã o é pois, necessário sentir o fe rv o r..., ainda que
este ande p o r vezes acom panhado de um certo gosto sen­
sív e l..., o que é preciso é ter «o desejo prático de tra b a lh a r
por se neg ar e v encer a si mesmo a todo o m om ento, sem
desalentos nem desconfianças, m as sem pre com gran d e
hum ildade».
M e d ita bem essas p a la v ras: é um desejo prático, não
um desejo estéril, m as algum a coisa que se executa com
esforço e tra b a lh o ... e a m aior esforço corresponde m aior
fervor, em bora julgues que não fazes nada, nem consegues
nada. — A alm a fervorosa não deve o lh ar som ente p a ra o
fruto, m as també.m p a ra o tra b a lh o ...; não tanto p a ra o
prémio com o p a ra a lu ta ..., e q uanto m aior o trab alh o e a
luta, em bora sem atractivos, m elhor co rre rá a vida de pie­
d a d e ...— T e n s com preendido a piedade deste m o d o ?... ]á
desanim aste algum a vez p o r não sentires gosto nem conso­
554 V id a d e fervo r

la ç ã o ? ... E quando as sentias e n a d a te c u stav a fa ze r as


coisas e as realizav as sem trabalho, sem esforço e talvez até
ro tin e iram en te ..., ju lg a v a s te r então m uito fervor?
N ã o v iv as enganado neste ponto tão im portante. — T ra -
balha com esforço e serv e a D eus com verd ad eiro fe rv o r...
E ste n ã o consiste em fa ze r m uitas coisas, nem em. servi-lo
m uitos anos, m as sim em servi-lo com v e rd ad e iro entu­
siasm o. — L em bra-te dos últim os que foram tra b a lh a r p a ra
a v inha e com o seu fe rv o r m ereceram salário igual ao dos
que trab a lh a ra m todo o dia. Q u e a S antíssim a V irgem te
conceda um pouco do seu fervor. — Pede-lhe especialm ente.
57. Nobreza de pensamentos

l.° .4 nossa dignidade. — N ã o é certam ente um pen sa­


m ento soberbo e am bicioso re co rd a r a nossa dignidade, tanto
p o r serm os hom ens com o por serm os c ristã o s... Pelo con­
trário , é um pensam ento m uito sa lu ta r que o dem ónio se
e sfo rça o m ais possível p o r a fa sta r de nós, a fim de nos
a p ro x im ar do p e ca d o ...
P o rq u e o pecado, que é sen ão um esquecim ento total
d essa d up la dig n id ad e do hom em e d e c ristã o ... p a ra nos
rebaixarm os a o n ível dos a n im a is ? ... Q u e gran d io sa! Q ue
sublim e é a nossa d i g n id a d e ! ...—-Som os d a ra ça d iv in a ...,
som os de D e u s... viem os de D e u s... vam os p a ra D e u s...,
serem os de B e u s... acabarem os p o r algum dia possuir to ta l­
m ente a D eus.
M esm o sob o ponto de v ista puram ente n a tu ra l, como
é elevada a d ignidade do h o m e m !... Já o dizia D avid:
F ezeste-lo um p ouco, m as só um pouco, m enor que os anjos!...
D eus pôs-lhe tudo debaixo dos pés p a ra que fosse o rei
d a c ria ç ã o ... — O no sso destino é ser re is..., nascem os reis,
e vivem os aqui n a terra p a ra isso, p a ra serm os príncipes e
reis um dia, no C é u ...; não podem os c o ntentar-nos com
m enos de um a c oroa e de um trono que jam ais terá fim ...
M as a nossa dignidade é ainda m aior debaixo do ponto
de v ista da g ra ç a ... D issem c-lo já, com essa vida não som os
reis, som os d iv in o s ...; a im agem m ais perfeita e com pleta
556 N o b re za de pensam entos

de D eus é um a alm a cm g ra ça . — Pois bem, todo o nosso


procedim ento e toda a nossa m aneira de ser deve reflectir
esta nobreza real e divina, de que estam os investidos...
N u n c a devem cs consentir não já em p e rd ê -la ... m as nem
sequer em reb aix á-la o m ínim o que s e j a .— O s nossos pen­
sam entos devem ser elevados e grandiosos, p a ra c o rre sp o n ­
derem a essa d ig n id a d e ... devem ser d ig n o s..., firm es e
constantes, como sem pre foram os da Santíssim a V irgem . —
D ’E la sim ..., podem os dizer que foi grande e divina em sua
d ig n id a d e ..., que foi d estin ad a p a ra R ain h a e Im p era triz ...
e que efectivam ente, todos os seus pensam entos estiveram
sem pre em conform idade com esta sua altíssim a n o b reza...
A prendam os n a escola de M a ria ... E la nos ensinará
p ràticam ente a ad q u irir essas v istas e le v a d a s... esses senti­
m entos nobres e d ig n o s .— T em o s de nos educar para
serm os reis e p rín c ip e s ...; aprendam os, pois, n a escola da
Im p era triz ...
2." Ideias elevadas. — E is a prim eira coisa que d eve­
mos a p ren d er da n ossa inteligência, p a ra que desta só germ i­
nem pensam entos e le v ad o s... Q u a n to precisam os disto hoje
em d i a ! ... Q u a n to s pensam entos b a ix o s..., ru in s..., torpes e
m iseráveis por toda a p a r te ! ... Lluns só pensam em diver­
sõ e s... outros e.m riquezas e c o m o d id a d es...; aqueles em
negócios e assuntos te m p o ra is ...; estes em p razeres e d ev a­
n e io s... P o r toda a pa rte um grosseiro m aterialism o ..., um
estúpido n a tu ra lism o ..., que só dá v a lo r ao que c terre n o ...,
ao que se vê com os o lh o s..., ao que se a p a lp a com as
m ão s..., e ao que se pode c o n tar e.m. algarism os e núm eros.
—-H o je em d ia só triu n fa o «D eve e H a v e r» ... tudo se olha
d ebaixo deste p rism a ... o resto, p a ra n a d a vale.
É assim essa vida m oderna tão a fa sta d a de D eus e da
sua vida d iv in a ... a vida so b re n a tu ra l... a vida da graça.
— E ssa vida de tan to e tão refinado e goísm o... essa frivo­
lidade em tu d o ... até nas p ró p rias dev o çõ es...
Q u e v iv er tão e x tra v ia d o !— E conform es a esta vida
N o b re za de pensam entos 557

sã o os pensam entos que os dom inam : pensam entos lo u co s...,


rid íc u lo s..., e lam en táv eis... C om o são ra ra s as ideias nobres
e e le v a d a s..., com o são raros c s pensam entos sé rio : e
d ig n o s !...
E este am biente pode influir m ais ou .menos, e de facto
influi, até na v id a de p e rfe içã o ..., nas p essoas c o n sag rad as a
D e u s..., e nas coisas de o ração e re co lh im e n to .—'É m uito
difícil e sc ap a r a esta atm osfera e não se contam inar com o
a r viciado que vem de fora.
P a ra o conseguires, contem pla a tua M ã e ..., estuda a
S antíssim a V irg e m ... C om o estavam longe do m undo os
seus p e n sa m e n to s!— P o r isso, apenas o conheceu, fugiu-lhe,
com o se tem era contam inar-se com o seu hálito pestífero
e en v en e n ad o r... Q u e re s não só a divinar, senão também
esc u ta r os pensam entos em que se o cu p av a diariam ente a
Santíssim a V irg e m ? ... R epete de novo e m edita as p a la v ras
do 'M a g n ific a t... N u n ca te canses d e o repetir e m edllur,
pois é um a fonte de preciosos ensinam entos.
A boca fala d a abu n d ân cia do c o ra ç ã o ... P o d e rá s por
tan to conhecer p o r essas p a la v ra s o que E la p ensava e o
que se n tia ... pensam entos de gratid ão p a ra corn. Deu*,
a v alian d o os seus dons pela im portância e grandeza do*
m esm os..., pela bondade do S enhor que lhos dava, prln
pequenez de quem os re ce b ia ..., e pelo am or com que D eus
lhos p ro d ig alizav a. — V ê com o aceita alegrem ente Ioda*
essas g raças, não p a ra se en grandecer, m as para obsequiar
o seu B enfeitor e p a ra o glorificar cada vez mal*.
P o r essa razão não se c a la ; fervorosam enle. ma* com
hum ildade, faz públicos tedos os dons recebido*, para que
todas as gerações, em união com E la, deem graça* a Deu*
e bendigam o seu santo nom e. — D eseja p a g a r e c o rre sp o n ­
der a tan to s benefícios, servindo-o em sum idade e justiça
d u ran te a vida inteira e agradecendo-lhe não só os b ene­
fícios particu lares, com o tam bém todos os benefícios dis­
pensados aos hom ens... e em especial o imenso benefício da
558 N o b re za de pensam entos

R edenção em cum prim ento d a prom essa que D eus tinha


feito a A b ra ã o e à sua descendência...
E ste é o sublime M a g n ific a t ..., estes os pensam entos que
a V irgem nos d esco b re... Q u e pensam entos tão d ig n o s...,
tão n o b re s..., tão s a n to s ! ... Com essas p a la v ra s M a ria
ensina-nos o verd ad eiro fim e o o bjectivo prin cip al d a nossa
v id a, isto é: c o n h ecer..., lo u v a r..., se rv ir e glo rificar a D eus
com todos os nossos pensam entos, p a la v ra s e obras. D eve
ser esta a nossa preo cu p ação c o n sta n te ... D evem os p ro ­
c u ra r a glória de D eus em tu d o ... nas ale g ria s e n a s tris­
tezas, n a v id a e até n a m o r te ! ... Q u e toda a n o ssa existência
se transform e num hino co nstante de am or e g ra tid ã o ao
C r ia d o r ! ... É assim que procedes? P re o c u p as-te som ente
com a glória de D e u s? ... N ã o te p arece o único pensam ento
digno de o c u p a r o teu e sp írito ? ...
3.° Ideias firm es. — M as n ã o b a sta ... É necessário d a r
firm eza e estabilidade a estas id eia s... e a estes sublimes
p e n sa m e n to s ...'— É necessário que as ideias sejam v e rd a ­
deiram ente só lid as... e não um a flor efém era, m as que em
ti se enraízem de m aneira c o n sta n te ..., com o sucedeu com
a V irgem Santíssim a. — U m a só vez entoou o M a gnificai,
m as v iv eu -o m ilhares de v e ze s... m ais ainda, to d a a sua
v id a foi um a c ontinuação in in te rru p ta ..., um a consequência
lógica do seu M a g n ific a i...
H oje, porém , q u a n ta volubilidade de id e ia s !... Q u a n ta s
m udanças de p a re c e r!... É n a tu ra l, em, m eio da frivolidade
da vida.
Se n ã o há ideias sé ria s ..., tam bém não pode havê-las
firm es e c o n stan tes... P arece que vivem os, no d izer de
S. P aulo, flutuando e agitando^nos co ntinuam ente ao menor
v en to d e doutrina. — Q u a n d o um barco não tem lastro sufi­
ciente, tam bém flutua e é joguete das ondas.
P o r isso se vêem ta n ta s defecções... tão lastim osos
n a u frá g io s... em tudo: n a fé ..., n a p ied a d e..., n o s costum es...
p o r vezes até na v id a religiosa. — E às vezes após uma
N o b re za de pensam entos 559

época de grande fe rv o r e santidade. — T u d o p o r falia de


firm eza e solidez.
N ã o é preciso te r m uitas id e ia s..., p o u cas m as m uito
firm es. — U m só p en sa m e n to ..., um a só ideia bem a rra i­
g a d a, com um a firm eza e solidez sentidas, que m aravilhas
n ã o tem p ro d u z id o !... Q u a n to s g é n io s..., q uantos san to s
não foram dom inados p o r um a dessas ideias lum inosas, p ro ­
fu n d am en te..., solidam ente g ra v ad a s n a inteligência e no
c o ra ç ã o !
F a z e o m esm o... aprende em M a ria essa ideia e essa
firm eza c o n s ta n te .— Q u e essa ideia o c u p an d o c o n tin u a ­
m ente o teu espirito, seja o serviço de D e u s..., a m aior
g ló ria de D e u s..., a sa lv aç ão das a lm a s..., a tua e a do
próxim o no que te for possivel.
F o rm a no .mais íntim o do teu ser este ideal elevado, o
único digno de ti, e p ede o auxílio d a V irgem Santíssim a
p a ra sentires sem pre este id e a l... e p a ra v iv ere s escravo
dele todos os dias d a vida.
1.“ P en sa m en to d o céu. — N a m editação a n te rio r pedi­
m os ideias e pensam entos elevados, reunindo-os todos à
v o lta de um pensam ento único: a .maior glória de D eus.
É claro porém , que ju n to com este pensam ento tão
sublime, e como sua c ontinuação ou com plem ento está o da
sa lv aç ão d a no.ssa alm a, e p o r conseguinte a posse de D eus
p o r toda a eternidade. — Assi.m o diz S a n to Inácio nos
E x ercício s: O hom em fo i criado para louvar, reverenciar e
se rv ir a D iv in a 'M ajestade... e deste m odo salvar a sua alma.
O C é u !!..., quão pouco nele m editam os, e, no entanto,
com o ele é digno de que n ã c o esqueçam os... Se nele pensás­
sem os mais, n ada teríam os a tem er dos pensam entos baixos,
frívolos e rasteiros do m u n d o ... É incom preensível que nos
dêem tantos cuidados os negócios da terra e nos atraiam tão
pouco os do C é u ... Julgam o-lo tão longe que vivem os como
se nunca houvesse de ch eg ar o d ia da a p ro x im aç ã o ...,
parece-nos um a coisa tão alta, que pràticam en te operam os
com o se isso não fosse coisa nossa e p a ra nós.
É essa, não o bstante a dulcíssim a realidade. Fom os
criad o s p a ra o C é u ..., não p a ra a te r r a ...; esta, mesmo
antes do pecado o riginal teria sido um a coisa transitória,
nunca, porém , o lu g ar do nosso fim e o term o d a nossa
existência. — E m uito .menos depois do pecado, que tra n s­
form ou o P a ra íso T e rre a l num desterro e num vale de lágri-
V ida do céu 561

méis e m isérias... e a p esar disso vivem os neste m undo sem


d e se ja r o m om ento d a libertação deste c á rc e re ...; e, sa tis­
feitos com as nossas cadeias, não anelam os pela lib e rd a d e ...;
parece um absurdo inconcebível, m as é assim.
N em sequer podem os im aginar que um preso não deseje
a b an d o n a r c cárcere, especialm ente quando foi pesadíssim o...
e, não obstante, é assim que procedem os... N ã o choram os
p ela o u tra vida que é a verd ad eira, choram os, sim, p o r a
h o ra se ap ro x im ar tão d e p ressa... N ã o suspiram os pela posse
de D eus, senão pela posse das c ria tu ra s... O im o rta l..., o
in fin ito ..., o e te rn o ..., não nos seduzem , m as preocupam o-
-n os sobretudo com o c ad u c o ... e com o que não tem con­
sistência nem v a lo r a lg u m ... É h orrível e espantosa esta
lo u c u ra ... esta puerilidade estúpida com que v iv em o s.... mas
afin al de contas é um a triste realidade.
Infelizm ente n ã o é o pensam ento do céu que dá en tu ­
siasm o ao nosso espírito can sad o e esm orecido pela luta
d iá ria ..., não é o guia dos nossos a c to s..., nem o ponto
cen tral p a ra onde convergem todos os nossos olhares.
M erecíam os realm ente que D eus nos castigasse com a
p riv a ç ã o de um bem que não querem os e stu d a r..., conhecer...,
a p re c ia r..., desejar.
2." O C éu em M aria. — P o r ou tro lado, contem pla
com o este pensam ento foi constante na Santíssim a V irg em ...
S u a vida foi sem pre a vida do c é u ..., v iv ia na terra com o
corpo, m as a sua a lm a ..., o seu p en sa m e n to ..., a sua vida
toda, e stav a m ais a cim a... sem pre no céu. — A costum ada
a o tra to e com unicação com D eus em sua m editação c o n ­
tin u a e fe rv o ro sa ..., conversando frequentem ente com os
anjos que a serviam e tinham gosto cm a co m p an h á -la...
abrig an d o prim eiro em seu seio puríssim o ao mesmo Deus,
e depois v endo e contem plando constantem ente os exem plos
e a presença real de seu D ivino F ilh o ... que o u tro pen sa­
m ento que não fosse relacionado com |exus, podia ocupá-la
562 V id a do céu

ou s a tis fa z ê -la ? ... E p o rquanto, como não h a v ia de ser


totalm ente celestial a su a v id a terrena? ...
Porém , acom panha a M a ria especialm ente no m om ento
d a A scensão de seu Filho aos Céus. — S egundo a S a g ra d a
T ra d iç ã o , M a ria assistiu àquela despedida solene de Jesus
no m onte das O liv e ira s ...; seus olhes m aternais, bem como
os dos discípulos, viram o S en h o r a su b ir..., contem plaram
a sua elevação da te rra ... seguindo-o com a vista até onde
foi possível e perm anecendo de olhos fixos n aquela nuvem
gloriosa e resplandecente que o envolveu, furtan d o -o aos
olhos do m undo... Q u e alegria n ã o teria sentido a V irgem
Santíssim a a o v e r este triunfo tã o glorioso de seu D ivino
F ilh o ! ... Já subia ao seu trono, já e n tra v a na posse do seu
reino, que não m ais teria fim ... e que ninguém lhe poderia
c o n te star ou arre b a ta r.
N o e n ta n to estes pensam entos tão gloriosos e alegres
p a ra a V irgem Santíssim a, andavam acom panhados por outro,
que era p a ra E la um a n o v a esp ad a de d o r... Já n ã o v eria
m ais a seu F ilh o ! ... Já não ,mais gozaria a sua p re se n ç a ...,
v iv eria d o ra v an te em solidão a b so lu ta ..., coisa ou pessoa
algum a p oderia substituir o seu Je su s ...; a g o ra m ais do que
nunca, prin cip iav a a conhecer, que esta vida é um c árc e re ...,
um d e sterro ...
Se E la não podia v iv er sem v e r a Je su s..., sem p en sar
em Je su s..., sem ter Jesus continua,m ente a seu la d o ..., como
aum entariam ag o ra os seus anelos de unir-se a Je su s..., à
v ista dos laços corporais que tão fortem ente a prendiam aqui
n a te rra e lhe não perm itiam v o a r com seu F ilho? Se até
então a su a vida foi sem pre do céu, como seria a g o ra ? ...
C om o v e ria E la, nestes últim os anos, todas as coisas da
te rra ? ... Q u e h a v ia em te d a ela que lhe pudesse d esp ertar
o m enor in teresse?...
C ontem pla deste m odo a Santíssim a V irg e m ..., resigna-
dissim a a v iv er s e p a ra d a de Jesus todo o tem po que a p ro u ­
vesse à v ontade d iv in a ... m as suspirando sem cessar pelo
Vicia do céu 563

C é u ..., peio seu F ilh o e peio seu D e u s..., pela com panhia e
posse e tern a do objecto dos seus pensam entos, dos seus
desejos e do se u am or. — E m bebe-te n e stas ânsias tão
v iv a s ..., n e stas e sp e ra n ç as tão a rd e n te s ..., n esta asp iração
tã o contínua p a ra o oceano do am or divino, que nestes
anos constituiram a ocupação m ais essencial da v id a de
M a ria ..., e pede-lhe que te ensine a c o n h ec er..., a d e se ja r...,
e a sentir os encantos do Céu, p a ra que coisa algum a d a
te rra em que vivem os, te a tra ia e te seduza.
3." O C éu em ti. — É assim tam bém que deve ser a
tu a v id a neste m u n d o ... um a vida de p a ssa g e m ..., «um a
noite m á, p a ssa d a n um a h o sp e d a ria » ..., um a viagem ra p id ís­
sim a que term in ará prontam ente na vida v e rd a d e ira ..., na
v id a sem fim do c é u ... e que v id a aquela!
A vida do C éu é um a vida de D e u s..., o Céu, é D e u s...,
é a visão b eatífica da d iv in d a d e ..., é o conhecim ento de
D e u s..., é o am or de D eus in u n d ad o ... esclarecendo e glo­
rificando a alm a.
E ste am or e este conhecim ento nem seq u er o podem os
so n h a r e m uito m enos conceber n esta v id a ... não no-lo p e r­
m ite o corpo m aterial e terren o que p o ssu ím o s..., e to d av ia
q u ando a alm a dele se desprender, já n a d a h a v e rá que o
im peça... C om preendes perfeitam ente o que isto significa? ...
A v id a do céu exige necessariam ente o desprendim ento d a
c arn e que te a rra s ta pela te rra ... Q u a n to m ais gosto deres
a o teu corpo, q u a n to m ais v iv ere s a vida corporal e te
a p eg a res a ela, m enos te ap ro x im arás d a v id a bem -aven­
tu rad a .
À m edida que o espírito se fo rtifica ... dom inando e
m ortificando a m a té ria ... e tratan d o o corpo como se fora
um e sc ra v o ..., aproxim a-se da v id a celestial e vive m ais
a v id a do C é u ...
M ed ita com a ten ção nestas v e rd a d e s... O C é u ..., o
R eino de D eus está dentro de nós m esm os... em nossas
m ãos está a n te c ip á -lo ...; q uanto m ais viveres a vida do
564 V ida d o céu

esp írito tan to m ais sentirás essa p az e b em -av en tu ran ça que


constitui a vida do C é u ... É este o pensam ento e o deseje
que m ais devem d o m in a r-te ...; tran sfo rm a r esta vida de
lág rim as e desterro num a antecipação do céu ... e p o rtan to ,
num a p re p a ra ç ã o p a ra o mesmo.
L ev a n ta o s olhes p a ra o a lto ..., n ã o os a rra ste s tan to
p ela te r r a ... e quando vierem os tra b a lh o s..., o s sofrim en­
to s ..., as enferm idades... e ‘tudo o que sirv a p a ra to rn a r a
v id a a m a rg a e insuportável, lem bra-te do p rém io ... pensa
n o C éu que te espera e sentirás um a fo rça e c onsolação tão
g ra n d es que d esafiarás todos os contratem pos que te so b re­
vierem , pois com o dizia S. P aulo, todas as penas desta vida
não sofrem com paração com a m ais pequena consolação da
o u tr a .— E n com enda-te à V irgem S a n tíssim a ..., invoca-a
com o a P o rta do C éu que é, rogando-lhe te deixe sentir
a g o ra um a parcela d aquela v id a ..., p a ra que viv en d o -a
assim agora, a assegures um dia na e te rn id a d e ...
59. Servir a Deus

. l.° C o m prontidão. — É nosso destino se rv ir a D eus


aqui n a terra , se algum d ia querem os gozá-lo n a posse do
Céu*,. A h ! que m agnífico e sublim e é este d e s tin o !... N ã o
têm o u tro o s p ró p rio s A n jo s... nem o u tra coisa desejam
m ais do que e sta r eterna,mente ao serviço de D eus.
T u d o o que tem de penoso um serv iço quando feito a
um am o cruel e tirânico, torna-se doce e a g rad á v el quando
p re stad o p o r am or. — N ã o n o taste a in d a com o ficas satisfeito
q uando fazes um serv iço a quem a m a s? ... n ã o é verdade
que é um a das m aiores consolações, sab eres que tra b a lh a s
em seu se rv iç o ... que podes se r útil a essa p e sso a ... que
p o rta n to a a le g rará s im enso com o serviço prestado?
P ois se assim n ã o procedes com D e u s... se não o sentes
do m esm o m odo q u a n d o se tra ta de se rv ir a Deus, a razão
e stá à v is ta ... é po rq u e n ã o o am as.
D eus pede e exige-nos que o sirvam os, m as esta depen­
dência é to d a de a m o r...; devem os se rv i-lO com am or e
p o r am or. E le p oderia o b rig ar-n o s pela força a se rv i-lO
com o o s condenados no in fern o ..., m as não, não quer for­
çad o s ao seu se rv iç o ... só adm ite volu n tário s que o sirvam ,
q u ando e com o eles queiram . — E stá p o rta n to na nossa m ão
fix ar as condições d a n ossa dependência p a ra com D eus.
Fixem o-las e a p rim eira seja a p ro n tid ão . O desem ba­
ra ço é sinal de interesse e de boa v ontade. — Q u a n d o alguém
566 S e rv ir a D eus

nos se rv e a nós com indolência e preguiçosam ente, n ã o o


su p o rta m o s..., é um claro indicio de que faz tudo de má
v o n ta d e ... e tanto nos d esgosta e aborrece que preferim os
que n ã o pro ssig a desse m odo ao nosso serviço. O ra , não
se p a ssa rá o mesmo com D eus?
O b se rv a a Santíssim a V irg e m ... que p ro n tid ã o a s u a ! ...
que p r e s s a ! ... que r a p id e z !... Logo a cs três anos, v ai sem
dem ora p a ra o T em plo, p a ra o serviço de D eus. — P o d ia
te r tom ado as coisas com m ais c alm a..., tinha m uito tem po
com o a n d a r dos anos, p a ra se e n tre g ar d a mesma m aneira
ao se rv iço de D e u s ...; assim o fa ziam ..., e o tinham feito
o u tr a s ...; M aria, porém , n ã o atende à s razões d ita d a s pela
pru d ên cia da c a r n e ...: tra ta -s e de se rv ir a D eus e tem de
fazê-lo sem d e m o ra ...; p a ra isso nunca é d em asiado ced o ...,
qu an to antes, m elhor.
A o Senhor, a g rad a m de m odo especial as prim ícias que
se lhe oferecem , po rq u e dem onstram a g enerosidade e
n o b reza do c o ra ç ã o ... A nós p ró p rio s tam bém nos com praz
sa b e r que o prim eiro é p a ra n ó s..., com o agradecem os a
quem nos presen teia com as prim eiras flores de um jardim !
— N o A ntig o T estam en to , e a té nas leis d a Ig reja, istp
a p arece com o um p receito: dar a D eu s as p rim íc ia s... Pois
bem, as prim ícias d a nossa vida, devem ser p a ra E le, à
im itação da Santíssim a V irg e m ..., Q u e a g ra d á v e l se rá ao
S en h o r receber a o fe rta de um c oração p u ro e im acu lad o ...,
de um a im aginação v irg e m ..., de uns olhos c ân d id o s..., de
um a alm a inocente.
Se assim não fizem os já na infância e n a juventude,
longe de desanim ar, tom em os isso como um a o b rig aç ão m aior
de c o rre r q u a n to antes a e n tre g ar-n o s a D eus. — Se p erde­
mos o prim eiro tem po da nossa vida, não percam os o que
depois nos tem concedido o S e n h o r! ... pois o tem po que
n ã o se em prega no seu serviço, é p o r desgraça, um tem po
com pletam ente perdido.
2.“ S e m reserva. — E a D eus, tem os de se rv i-lO não
S e rv ir a D eus 567

só com prontidão, senão tam bém sem qualquer espécie de


reserva. N ã o entrem os p a ra o seu servido com restriçõ es...
ou condições. — A n essa entrega e c o n sa g ra ç ão ao seu se r­
viço têm de ser to ta is e c o m p leta s..., com toda a nossa
a lm a ..., com todo o nosso c o rp o ... com toda a nossa v id a ...;
tudo é d 'E le ..., tudo d ’E le recebem os, p o r isso tudo se há-de
colocar a seus pés, p a ra que E le disponha de tudo absolu­
tam ente.
Bem sabem os com o exige necessariam ente esta condi­
ç ã o . — N ã o quer servidores a m eia s..., não quer corações
partidos.
Indica-o m uito claram ente nos seus m andam entos...
O prim eiro e m ais fundam ental de tedos é «que amem os a
D eus. e só a D eus com todo o nosso coração... com todo
o nosso e sp irito ..., e com toda a nossa a lm a ...» ; enfim, com
tudo o que som os e possuím os. N o ta bem a força d a pa la v ra
tu d o ... e v e rá s como não é possível se rv ir a D eus se reser­
v a s p a ra ti algum a coisa. — O nosso coração está feito de
tal m aneira p a ra D eus que só E le o pode preencher e con­
te n ta r... Será. p o rtan to , um absurdo, p reten d er dividi-lo.
d a n d e-o a D eus e ao m undo... ou às paixões.
Bem claram ente o ad v ertiu o Senhor no E v an g e lh o —
nin.füém p o d e servir a dois senhores... Q uem o pretender
eng an a-se m iseravelm ente, pois D eus n ã o adm itirá um ser­
viço feito a m eias.
F oi assim que a Santíssim a V irgem se consagrou e
serviu ac S e n h o r... N u n c a se fez a D eus m aior oblação que
a de M aria, exceptuando a de seu p ró p rio F ilho na C ru z ...
N inguém ofereceu m ais nem m elhor que E l a . A tudo
re n u n cio u .... não h a v en d o coisa algum a por m ais a g rad á v el
que fosse, que E la não ofertasse ao S e n h o r...; a nenhum
tra b a lh e se recusou, p o r mais hum ilde..., d ifíc il..., penoso e
m ortificante que fo sse... abraçan d o -o e lev an d o -o a cabo
por am or a seu D eus e S e n h o r,.., e sofrendo tudo com ânim o
e d ecisão... Q u e fiel s e r v a ! ... Q u e excelente escrava de
568 Servir a Deus

D eus foi M a r i a ! ... Q uem no C éu ou na terra o terá servido


m elhor que E la ? ...
A prende tam bém esta condição da V irgem Santíssim a.
— C om M a ria e por M a ria en treg a-te decididam ente aos
serviços de D eus com todo o teu ser, sem re se rv a s.... res­
triçõ es... o u tibiezas de espécie algum a. — P o d es ficar certo
que ninguém se arrep en d eu ainda da se ter d ad o inteira e
generosam ente ao serviço de D eus, à im itação de M aria.
3.“ C om constância. — M as, além disso, esta consa­
g ra çã o a D eus deve ser p e rp é tu a ... P o d e rá h a v e r coisa
m ais d e sa g ra d á v el que a inconstância? ... A gradecem os nós
os carinhos e p ro v a s d e estim a quando não sã o c o n stan ­
tes? ... C om o é d esa g ra d á v el este defeito nas nossas am i­
z a d e s? ... E no entanto, com o é frequente no coração
h u m a n o !...
A o fe rta de M aria n ã o foi assim ..., não foi o fruto de
um entusiasm o in stantâneo e tra n sitó rio ... N em um instante
sequer d a sua vida olhou p a ra trá s o u retrocedeu no cam inho
com eçado... e não som ente n ã o deu passos a trá s, senão que
nem um m om ento deixou de p ro g red ir. — N u n c a teve a m ais
pequena n e g lig ê n cia..., o m enor descuido... o u afrouxam ento
nos seus fe rv o re s... A quilo que um dia prom eteu cum priu-o
com rig o r... p e rfeição ... assid u id ad e... constância in ab a lá ­
v e l... em todos os dias da v id a ... Assim deve ser, e não de
ou tro m odo, a escravidão do am or.
Porém , será esta precisam ente a condição que m ais te
c u ste ..., não certam ente a prom eter, m as a p r a tic a r .— P ro ­
m eteste ao Senhor m uitíssim as vezes se rv i-lO c am á-lO
p a ra sem p re... até a o últim o instante da tua v id a ... m as a
inconstância colocou-te em m au lu g a r... c hegando m esm o a
d e sa n im ar-te ... N u n ca deves tira r como conclusão o d e sâ ­
nim o ou a c o b a rd ia ... A p o ia-te em M a ria ..., confia n E ia
e v o lta a prom eter a D e u s que a tua alm a se rá d ’E le p a ra
sem p re... p a ra sem pre desde agora, se até a g o ra o não
tem s id o ...; p a ra sem pre em qualquer circunstância da tua
Servie a Deus 569

v id a ...; p a ra sem pre n ã o perm itindo que v iv as um m om ento


sequer fora d a dependência de M a ria, que te asse g u rará o
serviço de D eus.
Suplica fervorosam ente à V irgem Santíssim a que te
adm ita no núm ero d a s alm as que p raticam esta sa n ta
escravidão a fim de poderes tam bém p ra tic a r a v id a de
o b lação g e n ero sa ... a b so lu ta ... e p e rp étu a ao Senhor, p a ra
que, servindo-o deste m o d o ... sejas feliz... pois E le se
e n ca rreg a rá de cum prir em ti a sua prom essa: S e rv ir a
D e u s é reinar.
60. Emprego do tempo

1.” S e u valor. — É realm ente in ca lcu láv e l..., na a p a ­


rência n a d a m ais frívolo do que o te m p o ...; é um a coisa
in stá v e l... e inquieta. — N inguém pode assegurar-se de um
determ inado m om ento s e q u e r...; deitas-te e não sabes se te
le v a n ta rá s ... principias um trab a lh o e ignoras se o term i­
n a r á s ...; depois de m uitos cuidados consegues algum a coisa
d o que desejavas, e pode ser que não chegues a gozá-la.
É evidente que não podes c o n tar com o certo e seguro
m ais que o m omento a c tu a l..., que o in stante p re se n te ..., o
p assad o não é te u ..., já te não p e rte n ce ..., o futuro é
incerto e inseguro. Só te resta pois, o presente. — M as o
tem po é tão inquieto... tão v e lo z ... que este m om ento actual
e presente é quase um a q u im e ra..., um a v erd ad e ira ilu são ...
Q u a n d o o cham as e dizes presente, deixou já de o s e r..., é
já um a coisa p a ssa d a ... — D onde se conclui que a nossa
vida, não conta como certo m ais que um instante que
pràticam en te se reduz a um a ilu são ... Com o o tem po vale
p o u c o !... Com o é rápido e v e lo z !...
E por conseguinte, têm c mesmo v a lo r todas as coisas
que dependem do tem p o ..., ou se medem com o te.mpo... —
T o d o o v a lo r da terra é do mesmo m odo c a d u c o ... p a ssa ­
g e iro ..., corre e desfaz-se com o te m p o ...; tudo passa, e por
isso é um a ilusão tam bém ... — As horas alegres e as a m a r­
g a s ..., os dias bons e os m a u s..., os prazeres e os sofrim en-
E m prego do tem po 571

tos. .. como deslizam rà p id a m e n te ! ... C om o são inúteis e


irracionais as p reocupações que tem o hcm em por coisas de
tã o pouca im p o rtâ n c ia !...
E não obstante, o tem po é um a m oeda de v alo r infi­
n ito ...; com ele se com pra a e te rn id a d e ..., o gezo e a
posse de D e u s...; cada m inuto v ale séculos... e o últim o da
nossa vida quanto v a le ? ...
É aquele m om ento fugacíssim o em si, m as acerca do
qual dtsse o E sp irito S a n to que a vida da eternidade está
pendente dete. — O tem po é a coisa .mais preciosa que pode­
mos desejar e p o ssu ir... se falta ele, tudo f a lta ...; quando
ele acaba, tudo term ina de v e z . . . — Q uem não quererá no
fim da vida, ter m ais um d ia ? ... pelo menos m ais uns ins­
ta n te s? ... E to d av ia quão pcu co apreciam os ag o ra o
te m p o !...
N ão procedeu assim a V irgem Santíssim a. — A preciou,
m elhor que ninguém , o v a lo r do tem po e por Isso o a p ro ­
veitou tãc a d m irav e lm e n te.— C ad a dia e cada instante c o r­
respondem a m ais u.m a n elo ... a mais um fe rv o r... a mais
um a prova de a m o r..., enfim a um passo m ais para a sa n ti­
dade. — Sendo tão santa, não se julga no direito de d esp er­
d iça r um só m om ento... ap ro v eita n d o -c todo p a ra bem da
sua alma e do próxim o.
Depois da A scensão de seu Filho aos C éus entregou-se
ao trabalho em utilidade d a Igreja n a sc en te... e, com efeito,
E la que tinha passado tan to s an es a cuidar de Jesus..., passa
ag o ra os últimos da vida trab a lh a n d o p a ra o p roveito da
sua o b ra ... A h! com o foram frutuosos p a ra a Ig reja os
últim os anes da vida da Santíssim a V irg e m !... Q u e vida tão
cheia de m erecim en to s!... Foi, segundo a T ra d iç ã o , uma
vida longa, m as sobretudo uma vida bem a p ro v e ita d a ...
porque foi superab u n d an te em g ra ça de D eus e em m éritos
próprios. —T am bém nós querem os m ais ou menos, uma
vida lcnga... M as p a ra q u ê 7 Se for como a de M aria.
572 E m p reg o do tem po

e x p lic a-se ..., m as se há-dc se rv ir sòm ente p a ra aum entar a


conta e a dívida, p a ra que a desejam os? ...
2." A perda do tem po. — V ê pois, com q u a n ta facili­
dade perdem os o tem p o ... C erno nos sabe e n g an a r o dem ó­
n io ! ... Ilude-nos sem pre com o «am anhã» que nunca chega.
— D eus inspira-nos um a sa n ta re s o lu ç ã o !...; estam os con­
vencidos de que devem os fazer assim, e obedecer a D e u s ...;
fazem os a té o propósito de a p ra tic a r.......m as em seguida vem
o fatídico a m anhã..., hoje n ã o ... é escusado c o rre r..., não é
preciso tom ar as coisas desta m a n eira ..., há tem p o para tu d o ,
e tc ..., e assim não o fazem os hoje, como não o fizemos
o n te m ..., como não o farem os a m a n h ã ... Q u e engano tão
frequente e que bem o m aneja e explora o dem ónio em p re ­
juízo das a lm a s ! ...
É um a loucura rem atad a p e rd er não já um tesouro, mas
um a m in a ..., um a fonte de tesouros, com o é o tem pe. N ã o
esqueças que a cada h o ra que passa, o S enhor te concede
no v as g ra ç a s... e que do m esm o m odo, ao p erd er o tempo,
d esp rezas tam bém essas g ra ça s de D eus. — E is a ra zã o por
que tem os de p re sta r ao S en h o r contas rigorosíssim as de
todos c s instantes d a nossa v id a ... um por u m ..., desde que
com eçám os a p erder o tem po com o uso da razão, até ao
fim da nossa vida.
A princípio, perdem o-lo quase sem m ald a d e... infantil­
m en te ..., porém , com os anos, a m alícia foi crescendo, porque
já tínham os com preensão do que fazíam os e do que p e rd ía ­
m os... e, não obstante, continuavam os do m esm o m odo e
sem fazer caso. — Sem d ú v id a que no fim da vida, este será
um dos nossos m aiores re m o rso s... e, o que é pior, um dos
m aiores torm entos dos condenados no in fern o ... Q u a n to
tem po perdido, sendo que com ele tão facilm ente se pode­
riam te r sa lv o ... A h !, se o S enhor concedesse ag o ra a um
condenado um d ia ... ou um a h o ra m ais de vida, o que ele
n ã o faria?
E m prego d o tem po 573

Pois já que isso não é possível, porque não apro v eitas


as que c S enhor te concede nos dias da tua existência?
E sendo tão esp an to sa a p erda do te.mpo e acarretan d o -
-nos m ales e responsabilidades tão g ra n d e s... ainda há m aior
m al que é « m alb a ra tar o tem po». Se o tem po se perde em
n in h arias sem im portância, o mal é .m e n cr...; ag o ra se se
g a sta m al..., que d izer então? E não crês que tenhas c h e­
g a d o a isso? E n tã o que foi o tem po em que pecaste e ofen­
deste a D e u s... e em que perm aneceste no pecado? ... N ã o
foi som ente perder, m as em pregar m al... m uito m al..., em
teu preju izc, o tem po que o S enhor tão gencrosam ente te
concedia.
A prende com a Santíssim a V irgem a ser a v a ro do
tem p o ... de m aneira que. a p rovando-o, cresças com o E la.
nas virtudes e na vida d a graça. — C olocado em espírito
na sua presença, pensa q uantas vezes «perdeste o tem po»;
«m ataste c tem po*... ou «m albarataste o tem po».
3.“ R em ir o tem po. — C ontudo, em bora este exam e da
tua alm a sobre o te.mpo que p erdeste ou m albarataste, seja
m uito triste e d e so la d o r..., não desan im es.... não está tudo
p e rd id o ..., ain d a há rem éd io .... e é este que com p a la v ras
tão expressivas nos aconselha S. Paulo: «recuperem os o
tem po». Podem os recu p e rar o tem po p e rdido e mal g a sto __
não, fazendo v o lta r os anos passados, o que é im possível,
m as a p ro v eitan d o bem o que ainda nos resta de v id a ...;
conseguim os deste m odo não só não p e rd er mais o tem po,
m as tam bém que D eus nos perdoe e nos não castigue pelo
passado que perdem os.
V id a de novo fe rv o r..., de novo esfo rço ..., de novo tra ­
b a lh o ..., em pregando todo o tem po que nos re star no se r­
viço de D e u s... p a ra bem d a nossa alm a e do próxim o.
P a re c e que foi esta a últim a lição da Santíssim a V irgem .
—*A in d a que p areça que não, tam bém nisto pode e deve
servir-nos de m odelo! — É certo que E la nenhum .memento
tinha a recuperar da sua vida a n te rio r...; m as como se tivesse
574 E m prego do tem po

de re c u p e rá -lo ..., ainda se esforçou nos últim os anos da


v id a p o r a proveitá-los com o m aior fe rv o r p a ra o bem
das alm as.
A ntes disso, a Santíssim a V irgem tinha cuidado muito
pouco dos A póstolos e d isc íp u lo s...; estes tinham Jesus, e
já lhes b a s ta v a ..., m as a gora que Jesus subira ao Céu, é
substituído p o r E la, que com as suas p a la v ra s e os seus
exem plos os a n im a ..., dirige e c o n so la ...; em bora seja idosa,
não d e sc a n sa ..., n ã o pode p erd er um só m om ento, em pre­
g ando todo o seu tem po a tra b a lh a r pela Ig reja, que, como
a M ãe lhe foi c o n fia d a... Q u e o u tra coisa faria, se, como
diz S. P aulo, tivesse que recu p e rar o tem po perdido!
P o is bem, se E la n a d a tem a re m ir... te,mos nós m u ito...
Im item o-la p o rta n to ... trabalhem os p o r nós e pelo p ró ­
xim o ... N ã o foi assim que os santos rem iram o tem po mal
g a s to ? — R ecorda um S. P a u lo ..., um a S a n ta M a d a le n a ...,
um S anto A g o stin h o ... S an to In á cio ... S. F ra n c isco X avier,
e tc ... q u an to tem po p e rd id o !... M as que bem recuperado
depois! — À v ista destes exem plos anim a-te a fazer o
mesmo. P e d e o auxílio e protecção desses san to s e especial­
m ente da Santíssim a V irg e m ... F a z p ropósitos firm es e
decididos e lan ça-te nos braços de tua M ãe, p a ra com E la
a p ro v eita re s bem todos os dias que te restam de v id a ...
que talvez já poucos sejam , sem p erder um só ... e dessa
m aneira asseg u rares com o tem po a eternidade.
61. Simplicidade na virtude

l.° V id a d e sim plicidade. — É um erro c olocar a vida


de perfeição num a m ontanha de coisas ex tra o rd in á rias que
a com plicam en o rm e m e n te...; ela é, m uito pelo c o n trário
um a coisa verdadeira.m ente sim p le s...; a san tid ad e e a sim ­
plicidade costum am a n d a r tão unidas, que p o r vezes são a
mesma coisa. — P ro c e d er com sim plicidade e lhaneza é o
que m ais contribui p a ra elevar o espírito às altu ras da
perfeição.
A singeleza, é o c a n d o r... a ingenuidade, de quem p ro ­
cede rectam ente, e é por isso incapaz de intenções .menos
claras. — A s alm as sinceras têm um a só c a ra ... sem o mais
pequeno fin g im e n to ...; basta contem plar-lhes os olhos,
parece que neles se revela a alm a inteiram en te... basta
falar-lhes e o u v i-las .falar, que já se adivinha e se lê p e r­
feitam ente no íntim o do c o ra ç ã o ..., a sua alm a é cristalina
com o a á g u a de um lago p u ro e tranquilo, que deixa ver
tudo o que está n o fundo. — A alm a simples, tem um dom
de sim patia e de am abilidade irre s is tív e l...; não há quem
dela se não encante ou enam ore.
D izia S. F ran cisco de Sales; A beleza da sim plicidade
encanta~mc e daria gostosam ^nte cem serpentes p o r um a
só p o m b a ... D izia isto, aludindo ao texto do E v an g e lh o que
nos m anda ser prudentes com o as serpentes e sim ples com o
as p o m b a s... E continua dizendo: D ig a o que quiser a pru~
576 Sim p licid a d e na virtude

dcncia do m undo, eu antes quero ser bom e sim ples do que


a stu to e maticioso.
A c aracterística de S a n ta T ere sin h a n ãc foi o u tra senão
a sim plicidade infantil do seu espirito, que tão ràpidam ente
a elevou aos a lta re s... N o s seus prim eiros fervores julgou
que D eus a cham ava a coisas brilhantes, p ró p rias som ente
d a s alm as h e ró ic as... e assim, trato u de im itar e.m certo
m odo a S a n ta Joana d 'A rc . — M as bem depressa Jesus lhe
fez com preender que a sua v o cação era a sim plicidade da
c ria n ça e que a sua san tid ad e e stav a na p rá tic a dessa v ir­
tude p ró p ria das «almas pequeninas», que v ã o pelo cam inho
d a in fân c ia ..., em que n a d a sai do o rd in á rio ... E efectiva-
m ente costum ava exclam ar n esta convicção: Jesus não p re ­
cisa de nós para n a d a ... nem procura em nós coisas gran­
d e s ..., não é a inteligência nem os grandes talentos que o
a tra e m ..., m as sim a s i m p l i c i d a d e .; por isso E le m esm o quis
cham ar-se a flor do cam po! Chie há de m ais encantador e
sim ples que um a flor!
E n a verdade Jesus estim a tan to esta virtu d e que em
toda a sua vida p refere de m odo especial e sta r cercado de
m en in o s..., de p o b re s..., de gente do p o v o ... de pastori-
n h o s... N ã o h á dú v id a que tinha um a paix ão ardente pela
v id a simples.
2." M aria. — E que direm os d a Virgem. S a n tíssim a ? ...
A p rópria S an ta T ere sin h a cantou em su as poesias a sim ­
plicidade de M aria. — E stu d a n d o a fundo e com preendendo
o m odelo inefável de singeleza que nos deu M a ria, aconselha
a todos que tom em lu g a r nas fileiras das alm as cândidas,
c u ja M ãe e guia é a V irgem Santíssim a. — E com o coração
cheio de g ratidão, dizia-lhe: Com a prática fie l das virtudes
m ais sim ples e hum ildes, fiz e s te v isív el a todos, M ã e querida,
o cam inho mais directo para o céu.
B asta que entrem os um a vez m ais n a casinha de N a za ré
antes e depois de ser M ã e de D e u s... e ain d a que ali seja
a escola de todas as virtudes, não sendo possível distinguir
Sim plicidade na virtude 5/ /

qual m ais brilhante, po rq u e todas as deslum bram com


fulgores divinos e in fin ito s... não será a singeleza ou a sim ­
plicidade a prim eira a m eter-se-nos pelos olhos ao ver aquela
S e n h o ra ... R ain h a e Im p e ra triz ..., com o se fosse um a sim ­
ples aldeã, o c u p ad a nos trabalhos m ais hum ildes e com uns...
sau d an d o e falando a toda a gente, com a mesma sim plici­
d a d e e n c a n ta d o ra ? ... T o d a s as suas v irtu d e s tão excelsas
e stão escondidas e encobertas de tal m odo pela sim plicidade,
que à prim eira vista só ela se n o ta ... Q uem a d iv in h a v a as
m ag n ífica s... e heróicas virtudes que possuía aquela
M e n in a ... aquela jo v em ... aquela M ãe em tudo igual ás
o u tra s ?
A dm ira a sua sim plicidade p a ra com D e u s..., falava-lhe
com o o P a i bondosíssim o..., sem ou tro fim nem p re o cu p a rão
que não fosse a de lhe a g ra d a r em tu d o ... e de conhecer a
cada m om ento a su a v ontade santíssim a, cum prindo-a ex acta-
m ente sem interpretações ou rodeios de espécie alg u m a...
A sua única asp iraç ão e ra lançar-se nos braços de D eus e
d escan sar confiadam ente no seio da sua bondade p a te rn a l....
como o m enino se en tre g a e descansa tranquilam ente nos
braços da m ãe... Q u e adm iravelm ente cum priu e viveu a
Santíssim a V irgem esta e scrav id ão filial e a m o ro sa..., esta
v erd ad eira infância espiritual tão p ró p ria da vida de sim ­
plicidade.
A sua sim plicidade exercitou-se além disso no trato com
o p róxim o... C om o tra ta ria E la ao santo, por excelência,
da sim plicidade, com o S. José?— T ã o pouco é necessário
encarecer esta virtu d e no m odo como tra ta v a o seu Jesus,
porque, sendo o seu D eus e Senhor, era tam bém o seu Filho.
P orém , esta singeleza no seu tratam ento com o próxim o,
sem jam ais ser in discreta e calando o que devia calar, era
nobre e sin c e ra ... C om o estavam longe das su as palavras
a a stú c ia .... a m en tira..., os falsos cum prim entos..., a afecta-
ç ã o ! ... Com o estavam longe dos seus juizes sobre o próxim o,
a m alícia..., a d ú v id a ..., a s u s p e ita !... — Ali não existiam os

s;
578 Sim plicidade na virtude

fingim entos e artifícios que tan to se usam m odernam ente nas


relações sociais, em que se diz e se sente um a coisa, e se
quer significar o u tra ... Ali tudo era sin c erid ad e ..., can ­
d u ra ..., c la rid a d e ..., fran q u e z a... P o r isso não é de estran h ar
que toda a gente ficasse en ca n ta d a com a V irgem tão
cheia de candura.
3.“ F rutos. — S ão m uitos e p recio so s... D iz a S ag rad a
E sc ritu ra que o E sp irito S a n to não habita num coração
fin g id o e hipócrita... M as h a b ita rá gcstosam ente pelo con­
trário , no coração sincero. — N ã o foi a doblez e hipocrisia
dos fa riseu s... o que m ais verberou C risto ... arrancando-lhe
as m ais duras expressões p a ra os condenar? ...
E ste há-de ser pois o prim eiro fruto: to rn a r a tua alm a
a g ra d á v e l ao S enhor que se com praz em d e rra m a r as suas
g ra ça s nas alm as sim ples...
E m segundo lugar, a sim plicidade facilita-nos ex tra o rd i­
nariam ente o exercício e desenvolvim ento de to d as as outras
virtudes e a ascensão à m ais alta sa n tid a d e ..., ela tudo
a p la n a ..., não h á dificuldades p a ra e la ..., e como não
p ro c u ra coisas e x tra o rd in á rias, nem cam inhos ra ro s e difíceis,
insensivelm ente v ai levando as alm as à m ais alta p erfei­
ção. — N o ta , p o r exem plo, quanto é fácil p a ra a alma
sim ples a virtu d e da hu m ild ad e..., da o b e d iê n cia ..., e a p ró ­
p ria caridade. — Com o a sim plicidade foge de todo o
a rtifício e singularidade, não pro cu ran d o a adm iração nem o
a p lau so dos hom ens, não adm ira que seja a com panheira
in se p ará v el da h um ildade...
P o r ou tro lado, a sim plicidade encam inha-se p a ra Deus
d irectam en te... v ê-o claram ente nos S uperiores e na sua voz
ouve a voz de D e u s... e a n a d a .mais a te n d e ... a alma
singela não d u v id a... não d isc u te ..., não in te rp reta o que
se m a n d a ..., obedece cegam ente e n a d a m ais... Q u e bela a
obediência da alm a sim ples!
Finalm ente, a sim plicidade é incom patível com os juizos
do próxim o, isto é, não ju lg a m al a n in g u ém ..., acredita no
Sim plicidade na virtude 579

que se lhe d iz ..., prefere que a enganem a enganar-se a si


mesma ao ju lg a r os o u tro s... Ju lg ar a o u tro s é coisa m uito
difícil p a ra a alm a sim ples que vê tudo com bons o lh o s...
P o r isso esta caridade que b ro ta da singeleza, é tão
a g ra d á v e l aos hom ens e a D e u s...
P õe m uita sim plicidade em toda a tua v id a ..., trab alh a
p o r a d q u iri-la ..., im plora o auxílio d a V irgem M a ria ... vê
bem o seu exem plo, e p ro c u ra n d o im itar esse m odelo, p o d e ­
rás a dquirir a sa n ta liberdade de espírito p a ra tra ta r com
D e u s... p a ra com unicar com o p ró x im o ... e p a ra a p rá tica
de todas as virtudes.
62. Ã alegria santa

1,° A virtude da alegria. — É oposto à p a ix ã o d a tris­


teza, tão perniciosa na v id a e s p iritu a l!— É v erd ad e que
pode h a v er tristezas boas e san tas, com o a que sente a alm a
d e d ic ad a ã penitência, que se desfaz de dor e a rre p e n d i­
m ento à v ista de seus p e c a d o s... é um a tristeza abençoada
p o r C risto , quando diz: B em -aventiirados os que choram ...
T am bém é boa a tristeza que sente o c o ração com pas­
sivo á v ista dos m ales do próxim o, a o s quais deseja enco n ­
tra r re m é d io ..., sobretudo quando, a p esar deste bom desejo,
n a d a pode fa ze r...
É boa tam bém, finalm ente, a tristeza que b ro ta na alm a
p o r algum a coisa m aterial, m as p erfeitam ente leg itim a....
a m orte de um a pessoa q u e rid a ..., um a gran d e d e sg ra ç a ...,
um a p e rd a irrep aráv el. O p ró p rio C risto nos deu o exem plo
d e sta tristeza, ch o ran d o ju n to ao túm ulo de L ázaro.
Porém ainda mesmo estas tristezas, precisam ente porque
sã o boas, têm de ser m oderadas pela resignação cristã, que
no m eio da dor, pro d u zirá essa paz e tran q u ilid a d e..., essa
d iv in a consolação, que usufrui quem sabe ver em tudo a
m ão de D e u s ! ...
M a s além desta tristeza, h á ain d a a tristeza m á ..., que
se ap o d era da alm a, e lhe ro u b a todo o estím ulo... p e rtu r­
b a n d o -a ..., enchendo-a de in q u ie taç ão ... de tem ores e d e s­
g o sto s... e enfastiando-a p a ra a vida de p ied a d e... faz que
A alegriu santa 581

tenham os m á disposição e m au c ará cte r do que resulta to r­


narm o-nos antipáticos e repulsivos p a ra todos...
C om esta tristeza que tan to desanim a o espírito,
ergue-se a v irtu d e d a sa n ta aleg ria que, pelo co n trário
a n im a ..., a le n ta ..., e conforta o espírito de tal m odo que até
n o meio das tribulações, inunda a alm a de consolação, com o
dizia S. P a u lo que « tran sb o rd av a de alegria», não o bstante
os seus sofrim entos.
A virtu d e d a alegria, não c essa aleg ria e xterna e falsa
des m undanos, que consiste unicam ente na im aginação c
nos sentidos, sem ch eg ar ao fundo do c o ra ç ã o ...; m ais ainda,
a p e sa r de ap aren tarem gozo c felicidade, têm na alm a um a
tris te z a ..., um p e so ..., que não podem s u p o rta r...; têm os
rem orsos que hão-de p e rtu rb a r necessariam ente as suas
a le g ria s...
E sta alegria m undana, fugaz e pa ssa g eira , n ã o ra ro
m entirosa e e n g an a d o ra, é a que C risto c ondenava com
aquelas d u ra s p a la v ras: «Ai de vós, que ag o ra rides, porque
algum d ia c h o rare is» ... — A alegria v e rd ad e ira é a alegria
do e sp írito ... a que procede de um c o raç ão recto c tra n ­
q u ilo ... que sabe cum prir a v o n tad e de D e u s... Q ue aleg ria
tã o p u ra e tã o in ten sa d esperta o cum prim ento exacto do
d e v e r...! É a fonte dos m aiores gozos-
E s ta aleg ria é um dos frutos m ais belos do E sp írito
S a n to que m uito contribui p a ra facilitar o cam inho d a p e r­
feição e o exercício de todas as virtu d es. — N ã o é possível
ch eg a r a com preender o g rau de alegria que inundava con­
tinuam ente o c o raç ão da Santíssim a V irgem .
Ê v erdade que foi um m ar de am arg u ra, m as foi tam bém
um oceano im enso de p a z ..., tranquilidade e gozo no
Senhor. —■P en sa n a s alegrias puríssim as que inundaram a
alm a d a Santíssim a V irgem em B elém ... em N a z a ré ... em
toda a v id a pública e oculta de Je su s..., os encantos e as
g ra ça s infinitas de c ria n ç a ..., em seguida as suas pregações
c assom brosos m ilag res..., a sua R essurreição gloriosa c a
582 A alegria santa

a p ariçã o a su a M ã e ... a su a p ró p ria A scensão triunfal aos


C é u s não a faria m orrer de alegria se D eus a n ã o su ste n ­
ta s se ? ...
2." A alegria da virtude. ■— É esta a ra zã o pela qual,
se a a le g ria é um a virtude, toda a virtude é por sua vez
um a fonte de alegria. — U m sa n to ..., um a alm a de virtude
não pode d eix ar de se r alegre. — A v e rd ad e ira virtu d e não
se d á com a tristeza. — T o d o s os santos v iviam interior­
m ente inundados p o r esta alegria que lhes p ro d u z ia a vida
de san tid ad e, em bora esta fosse m uito e lev ad a e austera.
— N ã o se opõem a e sta alegria, a a u ste rid a d e ..., a penitên­
c ia ... a d o r do c o ra ç ã o ... e a tristeza sa n ta que produzem
os nossos p e ca d o s..., a n te s pelo contrário, ninguém tem
m ais d ireito e m aior ra zã o p a ra se a le g ra r e ser feliz d c que
a alm a p e n ite n te ..., e o c o ração contrito e h u m ilh a d o ..., pois
juntam ente com a d o r experim enta a grande aleg ria de ver
que o Senhor, em virtu d e d a sua contrição e p en itên cia...,
lhe perdoou e o adm itiu de novo em seu C o ra çã o d iv in o ...,
e desse C o ração divino com unicam -se à alm a essas doçuras
inefáveis que só as alm as sa n tas estão a p ta s a sa b o re a r...
Q uem d i r ia ! ... Se até n a m esm a c ru z ..., até nos p ró ­
prios torm entos chegaram a descobrir os santos e os m ár­
tires um a m ina riquíssim a de felicidade, que ninguém pode
Sequer im a g in ar...
E n ã o duvides, n a C ruz de C risto, como o mel no favo,
e stá escondida a fonte inexaurível de gozos, p ra ze res e
alegrias, que em n ad a se parecem com as da te rra ..., mas
com o se g u ras e v e rd ad e ira s que são, enchem e satisfazem
p o r com pleto o c o ração hum an o ...
É m uito conhecida e celebrada a san tid ad e alegre de
S a n ta T e re sa de Jesus... e ccm o a recom endava a su as reli­
giosas. com unicando-a a q u an tas pessoas com ela tratavam ,
e aleg ran d o com o seu bom hum or e com as suas graças
e aned o tas dignas e op o rtu n as, a sua conversa a tra e n te ..,
e isso, a p esar dos sofrim entos in au d ito s..., dos trab a lh o s...,
A alegria santa 583

enferm idades..., perseguições e a m arg u ras sem conta que


teve de su p o rtar. U m santo triste é um triste santo.
S a n ta T eresin h a esforçava-se por so frer com a .maior
alegria, a fim de e n g an a r o p róprio Jesus, p a ra que E le não
conhecesse o seu sofrim ento. — Com razão dizia S. F r a n ­
cisco de A ssis: o dem ónio e os que o servem podem estar
tristes..., nós pelo contrário, devem os andar sem pre alegres
no S e n h o r... Q u e v e n tu ra m aior dc que a nossa p o r term os
sido escolhidos para am ar e serv ir a D eus?! Porque h a v e ­
mos de e star tris te s? ... N ã o ; a virtude não deve ser .triste,
que isso é ardil de S a tan á s p a ra a to rn ar re p u lsiv a ... — Sob
este aspecto, a virtu d e deve tam bém ap resentar-se como c ...,
ccm o a tra ctiv o d a alegria sa n ta e verd ad eira, de que anda
continuam ente rev estid a. — N ã o te fies pois, da virtude ou
da santidade que não possua esta característica.
3.“ A causa da nossa alegria. —• A ssim cham a a Igreja
à nossa querida M ã e ... e na verdade, é E la a causa e a
razão da nossa a le g ria ... P o r E la nos veio a alegria v e rd a ­
d e ira .... pois E v a , co.m o pecado só nos alcançou tristezas
e am a rg u ras m o rta is... Q u e satisfação não é p e n sa r que a
ra zã o e a cau sa d a nossa alegria está nas m ãos da nossa
M ã e !... C ertam ente que no-la dará com abundância e g e n e ­
ro sid ad e... N ã o o experim entám os já ? ... N ã o tem os sentido,
aos pés de M aria, alegrias e consolações indizíveis? ... N ão
nos tem os sentido felizes e satisfeitos a seu lado?
R ecorda algum a d a ta p a rtic u la r.... uma festa de M aria,
por exem plo..., a sa íd a de uns exercícios quando lhe ofe re ­
cias os teus p ro p ó sito s..., quando fizeste aquela prom essa...,
aquele v o to ..., talvez aquela c o n sa g ra ç ão ... O nde poderás
en co n trar prazeres e alegrias sem elhantes a e s t a s ? — P ro ­
cura estas alegrias, as únicas que merecem essa designação,
e nunca tenhas saudade das m u n d an as... P obrezinhas das
alm as que não com preendem o u tras a legrias alé.m dessas!
F irm a-te bem nestas ideias para assim poderes distinguir
um as alegrias das o u tras. — N unca te esqueças que a alegria
584 A alegria santa

e spiritual da virtu d e não é um a alegria e xterna e p a ssa ­


g e ira ...; p o r isso n ã o se m anifesta em p a la v ra s descom ­
p o s t a s .., em altas g a rg a lh a d a s..., e m uito m enos em chistes
e p iadas de m au g o sto ... baixas e g ro sseiras... ou cm brin ­
cadeiras p e sa d as e m o rtifican tes..., m as no exterior deve
tran sp are ce r sim ples e su a v e m e n te .... com ingenuidade, fran ­
queza e b o n d a d e..., de m odo que, edificando o p ró x im o ...
lhe dê a conhecer a form osura e sim patia da virtude, e lhe
m anifeste os frutos da alegria santa, que são: su a v iza r os
trabalhos e a p la n a r a s d ificuldades... anim ar e consolar a
alm a, a fugentando os receios e pertu rb açõ es que tanto a
o p rim em ... d a r ao entendim ento .mais claridade, pois q uando
esta falta, n ã o h á luz suficiente p a ra discernir as c o isas...,
au m en tar as forças e a confiança p a ra lu ta r e ven cer as
te n ta ç õ e s...; finalm ente a ssegurar-nos a fé e a e sp e ra n ç a...
e ace resce n ta r notavelm ente os nossos m érito s..., v isto que
os a cto s praticad o s com um a san ta alegria ag rad am sobre­
m aneira ao Senhor.
Sê p o rtan to m uito a le g re ..., m as com a alegria sa n ta e
sa u d á v el d a v irtu d e ... E m p re sta a tra ctiv o às tuas virtu d es,
to rn an d o -a s am áveis p o r m eio d a a le g ria ... C om unica essa
a le g ria a todos os que te rodeiam , m as especialm ente aos
m em bros d a tua casa, com quem vives habitualm ente...
E ncom enda-te à C a u sa da nossa alegria p a ra que com E la
possas e n tra r um dia no gozo da alegria eterna que reina
no Céu.
63. Serenidade de espírito

l.° E m que consiste. — É a v irtu d e que nos conserva


inalteráveis, não o bstante as dificuldades que nos possam
so b re v ir... torna-nos senhores dos afectos e das p a ix õ e s....
perm ite-nos c o n se rv a r a mesma paz e tranquilidade de
e sp irito ..., a m esm a d isp o sição ..., a mesma serenidade c ale­
g ria ... a m esm a caridade no trato ccm o p ró x im o .... enfim
o mesmo exercício das v irtu d es que estam os p raticando,
sem d esanim ar o u p ô r tudo de la d o ...
É um a v irtu d e m uitíssim o necessária, porque d e sg ra ç a ­
dam ente, é m uitas vezes, di-lo a experiência, a ra zã o das
nossas q u e d as... das nossas irrita ç õ e s..., das nossas sa íd as
in o p o rtu n a s..., por vezes até das nossas resoluções fu n estas...
Q u a n to nos tem p rejudicado esta falta de dom ínio do nosso
m odo de s e r ! ... P rogredíam os talvez sossegadam ente no
cam inho d a v irtu d e ..., tudo nos p a rec ia fácil e e x e q u ív e l...;
de repente essa p az perturbou-se, surgiu a torm enta com as
tentações que desencadeou o dem ónio, e tudo ou quase tudo
n a u fra g o u ... m udám os p o r com pleto..., pereceu-nos que era
já im p o ssív el..., c que essa vida não era p a ra nós.
E m o u tras ocasiões estávam os trab a lh a n d o pela glória
de D e u s..., tudo nos corria bem ..., os o u tro s aplaudiam -nos
e a d m irav am -n o s... m as de súbito deu-se um a m u d an ça...
surgiram dificuldades donde m enos esperávam os, c d esan i­
m ados e desiludidos, tudo abandonám os. — A té no tra to
586 Serenidade de espirito

ord in ário com as pessoas que nos rodeiam costum am os


tratá-la s segundo os sentim entos e as im pressões que nos
d o m in a m ...: um as vezes com. afabilidade e c arin h o ... ou tras
com en fad o e a b o rrecim en to ..., já com tristeza e a m a rg u ra ...,
já com aleg ria e brincadeiras.
Se tudo nos corre bem parecem os os m ais fe lize s...;
m as se algum a coisa se tra n sto rn a ou n c s desgosta, logo nos
fa lta a d evida resignação p a ra nos vencerm os e sofrerm os
com a le g ria ... Com o som os v olúveis e in c o n s ta n te s !... Q u e
diferentes de um dia p a ra o o u t r c ! ... Quem, não passou já
p o r essas crises e experim entou essas m udanças em si e nos
o u tro s? ... Q u a n ta s vezes não observam os isso em outras
pessoas, lam entando que sejam tão desiguais n o tra to ...
no g é n io ..., n a disposição?
H á dias em que se mostram, atraentes e sim p ática s...,
tudo lhes p arece p o u c o ... dão-se e entregam -se sem re se rv a ...;
noutros, porém , são in so frív eis... não h á quem as a tu re ...,
com um tem peram ento tã o excitado que não é possível a p ro ­
x im ar-se a g e n te ... Com o faz fa lta a bela virtu d e do dom í­
n i o ! ... P o d e rá h a v e r m aio r e ncanto que um a pessoa sab er
e star seren a continuam ente, em m eio dos sucessos que so b re ­
vêm, e dos acontecim entos que a rodeiam ? ...
2.” C onsequências — E nota bem como são diferentes
as consequências e os afectos que resultam num e n outro
caso. — A alm a que não possui este dom ínio, é o rd in ária-
m ente um a alm a incapaz de p ro g re d ir...; nunca lev a rá a
bom term o qualquer em presa de c e rta im portância. — A sua
virtu d e será m uito superficial e todo o bem que fizer num
dia, p erdê-lo-á no seguinte pela fa lta de serenidade, o que
supõe evidentem ente um a gran d e falta de dom ínio e m orti­
f ic a ç ã o ...— Se estas alm as não sabem triu n far de si m es­
m as..., m uito m encs p o d erão triu n fa r das o u tra s dificuldades
que sobrevierem . — D este m odo vêem -se d a r princípio a uma
coisa, por vezes até com em penho e interesse dem asiad o ...
e p o r um a coisa de n ad a cansam -se e aban d o n am -n a em
Serenidade d e espirite 5K7

m eio... são v itim as d a v olubilidade; detêm -se ou cam inham


sem rum e e sem direcção fixa, pois é a últim a im pressão
que as dom in a... R ecebem um a boa n o tíc ia ? ... gozam e
alegram -se com o ninguém .... É d e sa g ra d á v el o que se co n ta?...
en tão ficam deprim idas a tal ponto que já não podem fazer
n a d a ...
E stes cara cte re s im pessionáveis que não se dom inam
a tem po, sãc incapazes de term inar be.m um a coisa que se
lhes confia, pois n ã o servem p a ra n ad a de im p o rtân cia...
Q u a n to s talentos e habilidades e n te rrad a s e inutilizadas por
essa perniciosa falta de se ren id a d e? ...
P o r outro lado, a consequência fatal é tornarem -se des­
prezados p o r todos, e de tal m odo são ridículas as suas
veleidades, que fazem rir o próxim o. — São pelo contrário
com pletam ente diferentes as consequências, na alm a que
sabe g u a rd ar o seu dom ínio, de m aneira que sem pre se
m ostre igual e c o n sta n te ... Q u e sim patia a ro d e ia !... Com o
inspira c o n fia n ç a !... P arece que a tra v és do seu rosto tr a n ­
quilo e do seu o lh ar sereno, se descobre a paz im perturbável
da sua alma, onde D eus a está su ste n tan d o ... c o n fo rta n d o ...
e dirig in d o ... — N ã o é insensível... nem é isso o que nos
pede a virtu d e da se ren id a d e...; seria irra c io n a l..., a b su rd o ...,
com pletam ente im possível e an tin a tu ra l.
A serenidade não destrói a sensibilidade, porém , m ode­
ra-a de tal m odo que em meio das im pressões que recebe
e frequentem ente a excitam , sabe co n serv ar o dom inio, do
mesmo m odo que um barco com m uita c arg a se sustenta
facilm ente no m eio das v a g a s ...
É isto, pois, e n a d a mais, o que te pede esta virtude,
que entre os diversos acontecim entos que te o c o rra m ..., doces
e ag rad áv eis cu am argos e d e sa g ra d á v eis..., não percas a
cabeça e a soberania, de m odo que sejam as im pressões a
m andar em ti e não tu n e la s... Isto é que é ju sto ... ra cio n al...
digno e m e ritó rio .—-A s alm as que se dom inam são capazes
de tu d o ... n ad a as a s s u s ta ...; alm as g ra n d e s... superiores a
588 IS erenidade d e èspírifo

to d as as c o is a s ...; são as v erdadeiram ente d o m in a d o ras.... as


que levam após si os corações, que sabem p ro c u rá -las e
d escan sar nelas. Q u e p a z!... Q u e c o n so laç ão !... Q u e ambiente
de serena tranquilidade não espalham, estas alm as à sua
v olta ! ...
3.“ O ideal. — E com o sem pre, tem os o nosso ideal na
Santíssim a V irgem . Q u e serenidade a s u a ! ... Q uem passou
por tran ses mais difíceis e diversos que E la ? ... E todavia,
quem soube m anter-se com o E la tão igual e serena, apesar
d a s im pressões d a sua delicadíssim a sensibilidade e d o seu
ain d a m ais delicado c o ra ç ã o ? ... Q u e im pressão não rece­
b eria na A nunciação do A njo ao ver-se eleita p o r D eus
p a ra sua M ã e !... E no m om ento da Incarn ação , q u ando já
sentia em seu seio puríssim o a presença real d a D iv in ­
d a d e ! ... T ã o gran d e foi esta im pressão que na p resença de
S a n ta Isabel p rorrom peu naq u elas tã o sublim es p a la v ra s
do 'M agnificat...
M as aprende n a S antíssim a V irgem e em su as p a la v ras,
não a ser insensível, com o E la o não fo i..., não a receber
com frieza e indiferença os g ra n d e s acontecim entos, e mais
ain d a os num erosos benefícios de D eus, que n ã o é isso o
v e rd ad e iro dom ínio.... m as aprende a não p e rd er a c a b e ça ...,
e o dom ínio da m ag in a çã o ... e d a vontade, no m eio desses
acontecim entos, p o r m uito grandiosos e e x trao rd in ário s
que sejam ...
Q u e tem plo o da alm a de M a r ia ! ... C om o e stav a bem
p re p a ra d a p a ra su p o rta r todas as im pressões que iriam
in u n d ar o seu c o ra ç ã o ..., um as dulcíssim as, com o o n a s­
cim ento do M enino Jesu s... Q u e im pressão a su a ao v e r o
F ilho de D eus feito seu F ilh o ! ... outras, cheias de incerteza
e inquietação, como a d a fuga p a ra o E g ip to e a p erda de
Jesus no T em plo de Je ru sa lé m ...; o u tras horrivelm ente pesa­
das e dolorosas, com o as da P aixão, C rucificação e M orte
tão afro n to sa de Jesus... N ã o há rochedo no m ar mais
aço itad o pelas ondas, do que o foi a alm a de M a ria pela
Serenidade de espírito 589

d iversidade tão e x tra o rd in á ria dos acontecim entos que lhe


so b re v iera m ... Q u e exem plo p a ra t i ! . ..
V isto que D eus não te p edirá ta n to ..., não te ex p o rá a
p ro v a s tão d u ra s e tão fortes, porque não trab alh as por
m anter a ig ualdade e a serenidade a tra v és das coisas peque­
nas que te sucedem ou sobrevêm ? — P ede à Santíssim a
V irgem m ais espírito de fé ..., m aior conhecim ento da P ro ­
vidência de D eus que tudo d isp õ e ..., m ais re sig n a rã o e a b a n ­
dono em su a s m ãos p a ra que E la p ro ced a com o quiser e
cum pra os p lanos que form ou sobre ti. — D esta fé ..., deste
conhecim ento..., deste a b an d o n o ..., bro ta n a tu ra l e esp o n ­
taneam ente a virtu d e d a serenidade. — V ê bem o teu intim o
e se não possuíres esta virtude, p ro cu ra ver qual dos três
fundam entos te falta, e p ro cu ra firm ar-te m ais com o auxilio
de M aria.
64. A Perseverança

l.° A dificuldade. — Em todas as em presas da vida, é


nisto realm ente que se enco n tra a dificu ld ad e... não em
p rincipiá-las m as em. pro sseg u ir levando-as com constância
até ao fim ..., sobretudo quando, após o início se m ultiplicam
as dificu ld ad es... Q u e o rd in ário é então o cansaço e o ab an ­
d o n o ! . . . —' M as isto acontece principalm ente nas coisas do
e sp irito ... em especial, n a nossa p ró p ria santificação.
O dem ónio p ro cu ra ardentem ente aum entar cad a vez
m ais as d ificuldades... N ã o se cansa na lu ta ...; após uma
ten tação p re p a ra o u tra ..., ap ro v eita n d o sem pre o nosso mais
pequenino descuido p a ra conseguir o que d e se ja ... isto é,
que a alm a se canse e não persevere. — F a z e r m uito bons
p ro p ó sito s... ter desejos m uito santos ou m esmo com eçar com
grande em penho a vida da perfeição e da sa n tid a d e ..., não
é difícil. — Q u a n ta s vezes n ã o o fizeste já? E q uanto tem po
dem oraste a c an sar-te? — U m as vezes m ais e o u tras m enos...;
o certo é que bem depressa desististe e não soubeste p erse­
v e ra r... R ecorda os dias de exercícios..., os dias de re tiro ...;
sem pre te exam inas um pouco e lanças um o lh ar re tro s­
pectivo p a ra a tua v id a ..., n ã o é isto que e n c o n tra s..., uma
gran d e falta de p e rse v e ra n ç a ? ...
Se tivesses p e rsev e ra d o naquele p ro p ó sito ..., naquela
v irtu d e ... no extirpam ento daquele o fíc io ..., ou no venci­
m ento daquela p a ix ã o ..., onde estarias agora? ... N ã o esta-
A P erseverança 591

rias já nas a ltu ras da sa n tid a d e ? ... — Reconhece pois. que


o ponto negro d a tu a vida, e p o r isso verd ad eirain en te difí­
cil, é não te c a n sa re s..., sab er p e rse v e ra r até ao fim ...;
tão difícil, que é um a preciosa g raça de D eus, sem a qual
é im possível conseguir coisa algum a.
A g ra ça da sa n ta p ersev eran ça é a g raça das gra ça s que
deves p edir sem cessar ao Senhor, p a ra não d e sfalecer...,
p a ra im itar a difícil constância de C risto e de sua M ãe
S an tíssim a... — N ã o duvides que foi tam bém dificil ao p ró ­
prio Jesus e a N o ssa S e n h o ra ... E sc u ta as p a la v ra s de
C risto em G e tse m a n i... e v erás tam bém n 'E le essa luta que
tu se n te s..., essa rep u g n ân cia de tom ar a té ao fim o cálice
da a m a rg u ra ... e não obstante, ali está em oração, e o ração
de a g o n ia ..., lutan d o contra a sua n a tu re za que resistia, e
fazendo-se tal violência que chega a su a r sa n g u e ... P ensa
bem: até aqui é necessário chegar, p a ra n ã o d e sfalecer...,
p a ra não d e sa n im ar... e não a b a n d o n a r o com eçado... —
E que faz n a C ruz? ... N ã o o convidam seus inim igos a que
se desça, ten tan d o -o cora a sua p ró p ria c o n v e rsã o ? ... Se
descer, a cre d ita rão n 'E le ... e to d av ia, não desce... ali p e r­
m anece até m o rrer...
C ontem pla ju n to d E le a S antíssim a V irg e m ... toda a
v id a trouxe a esp ad a de Sim eão c ra v a d a no p e ito ...; n ada
fez p a ra e v ita r a sua d o r ...; podia n ã o ter seguido jesus ao
C a lv á rio ...; sabia o que a e sp e ra v a ..., o que teria de
so fre r..., e a p esar disso, v a i... ali está com, seu Filho, p e rse ­
v e ran d o com E le na dor e no sacrifício. — Q u e r dizer,
p e rsev e ra quando é m ais difícil a p e rsev e ra n ça ... A h! não
esqueças um a p a la v ra que M aria disse um dia: « F aça-se em
mim a v o n tad e de D eu s» ... e esta p a la v ra repetiu-a sem
c e s s a r...; aceitou tudo o que ela significava e todas as con­
sequências que su p u n h a ... e heroicam ente perm aneceu fiel
à sua p a la v ra ... sem jam ais se c a n s a r..., sem d esejar o term o
da p ro v a ... nem sentir desânim os de espécie a lg u m a .—
M u ito ..., m uitíssim o deu que sofrer a M aria esta fidelidade...,
592 A P erseverança

e sta c o n stâ n c ia ... esta p e rse v e ra n ç a ... N ã o é p o r isso, de


e stran h a r q u e seja tam bém o que te custe m ais...
2." Im portância. — E e sta v irtu d e é a que m ais nos
in te r e s s a ...—’P o r m uito difícil q u e seja, deve tornar-se-nos
fácil, se pensarm os na su a grande im p o rtâ n c ia .— Q u e se
a d ia n ta com co m eçar e não te rm in a r? ... Q u e vale um a vida
de fe rv o r e de santidade p o r algum tem po, ainda que m uito,
se nela n ã o se p e rse v e ra ? ... O cristão não se d e v e preocupar
com os seus princípios, dizia S. Jerónim o, mas com o seu
íim ... P o rq u e efectivam ente, o im portante não é com eçar
m as a c a b a r b em ... pois no fim de contas, só será prem iado
quem term inar bem. — S. B ern ard o costum ava dizer: P ro-
m ete-se o prém io aos que com eçam m as não se d á senão
aos que term inam .
R ecorda as p a la v ra s de C risto, ainda m ais c la ras e ter­
m inantes: S e alguém puser a m ão no arado e olhar para
trás (isto é, prin cip iar e não a c a b a r)... não poderá entrar
no R ein o d o s C é u s... ; v isto que unicam ente se salvará o que
perseverar até ao fim . ■ — Já vês p o rtan to que enorm e d e s­
g ra ça a daquele que tendo p ra tica d o m uito boas o b ra s ...,
tendo-se exercitado em v irtu d es h e ró ic as... ainda m esmo que
chegasse a fazer m ilagres, e tivesse um a o ra çã o altíssim a e
e x tá tic a ..., se não persevera, tudo é perdido. — D e n ada
v a le rá qualq u er d a s suas boas obras, pois no dizer do
P ro fe ta serão com o tesouros lançados num saco roto, que
s e perderão com pletam ente...
E isto é um caso teórico, m as m uito prático, que
se deu vá ria s v e ze s... — A histó ria de Judas que com eça
m uito b e m ..., que deixa tudo p a ra se rv ir a C risto com
g ra n d e fe rv o r..., m as que term ina vendendo-o traiço e ira ­
m ente, repete-se com frequência no interior d a s a lm a s ...—
A H istó ria d o N o v o e do A ntigo T estam en to e a H istória
d a Ig reja n arram em todos os tem pos m uitos destes exem ­
plos. Q u a n to s h e re je s !... Q u a n to s a p ó sto lo s !... E em alm as
c o n sag rad as a D e u s..., sacerdotes e re lig io so s!...
A P erseverança 593

P ortanto, por um lado é necessário tem er, é c e rto ... mas


p e r outro, im porta co n fiar no S e n h o r... e trab alh ar, p e r­
suadindo-se cad a vez m ais e nunca perdendo de vista que
isto é o m ais im p o rta n te .... e o que m ais nos deve in teres­
s a r ...: p ersev erar até ao fim ..., tra b a lh a r sem d e sc an so ...,
so b retu d o quando o trab alh o for mais pesad o e doloroso...
F açam os este propósito e tudo nos p a rec erá pouco com o
fim de assegurar a n e ssa perseverança.
3." M érito. — E sta é a virtude m ais recom pensada p o r­
que ê a que mais v alo r e m érito tem. — S. P aulo diz:
O prém io destinado aos corredores, dá-se únicam ente ao que
alcançar a m e ta ... e não aos que se retiram ou desistem nc
c a m i n h o . P o i s esse prém io é o C é u __ é a coroa que o
S enhor tece com as tuas boas o b ra s.... as quais nenhum a
consistência terão se lhes fa ltar a p ersev eran ça. — É ela que
dá v a lo r às o u tra s v irtu d e s..., de tal m odo, que um a virtude,
por pequeníssim a que seja. sim plesm ente p o r an d ar acom ­
p a n h ad a pela p ersev eran ça, já vale im enso..., e pelo c o n ­
trário a virtude m ais preciosa perde o seu m érito, se a ela
n ã o vai unida...
S é [iel até à m orte, diz c A pocalipse, e nessa altura
dar-te-ei a coroa da v id a ... Q u e m elhor prém io p a ra esta
v irtu d e !... E não podia ser melhor, visto que é o próprio
D e u s...: E u serei a tua recom pensa verdadeiram ente adm i­
rável. É um prém io tão excelente que nunca c chegarem os
a com preender nem a im ag in ar...
Pelo contrário, será h orroroso o castigo dos que não
p e rsev a re m ... Q u e rem orso terrível o seu, vendo e te rn a ­
mente o que deixaram e abandonaram por c o b a rd ia ... e por
isso, quão facilm ente, se tivessem perseverado, teriam ad q u i­
rido com as m esm as gra ça s o prém io eterno?
S. Pedro chega a dizer num a das suas cartas, que era
p eferive! nunca terem com eçado bem, nem conhecido o
cam inho da santidade, do que deixá-lo em meio. depois de
594 A P erseverança

conhecido e prin cip in d o ... E c natural, porque nes;e caso.


o pecado é m aior c sem desculpa de espécie algum a.
P o r isso, deves exam inar sèriam ente o teu proceder, c
a sse g u rar os teus passos neste cam inho..., p a ra , nem sequer
um, dares em fa lso ..., m as p ersev erares nos teus fervores,
a v an ç an d o e a p ro v eita n d o cad a dia mais e m a is..., com o fez
a Santíssim a V irgem d urante os dias da sua vida e nas
p ro v a s a que o S enhor a submeteu-
P ede-lhe a g raça da p ersev eran ça na fé ..., na v o c a ­
ç ã o ..., na vida dc fe rv o r..., p a ra que assim m ereças a graça
da persev eran ça final, a últim a e a m ais im portante de
to d as as graças.
<>5. O Coração da Santíssima Vlryfui

1." O b jecto duplo. — N ã o há dúvida que o objccto


desta d evoção a o C o ra çã o puríssim o da Santíssim a V irgem
pode considcrar-sc de dois m odos: o seu objecto nvitcriiil...
e o seu objecto fo rm a l... de sorte que, assim como o homem
consta de dois elem entos, um m aterial e visível, que é o
co rp o e o u tro e spiritual e invisível, que é a a lm a ... e assim
com o som ente d a união destes dois elem entos t c o n s titu íd o ,
o homem to ta l e com pleto..., assim tam bém nesta form osís­
sim a devoção, se não distinguim os e conhecem os bem, p a ra
logo os ju n tar, e nunca os sep arar, os dois elem entos que
a formam, jam ais conseguirem os p e n etrar na essência e
v a lo r desta devoção ao Im aculado C o ra çã o de M nrln.
P ois bem, estes dois elem entos são: o primeiro, m ate­
rial, que é o c oração físico..., re al... palp itan te da S a n tís­
sim a V irg e m .... um c oração de c a rn e ..., um c o raç ão
h u m an o ..., um c o ração em tudo sem elhante no dos outros
hom ens... e o ou tro elem ento, o form al... invisível e im a­
terial, que consiste no a m o r..., na caridade de M aria,
encerrada e sim bolizada nesse C o ração puríssim o. — Sc se p a ­
ram os estes dois elem entos destruím os esta d e v o çã o ..., ou
terem os um a devoção p arcial c incom pleta ao C o ração de
M aria.
P o rtan to , sem pre que falem os..., p ensem os..., m edite­
m os... ou tenham os algum a d evoção a este C o ra çã o p u rís­
simo. entendam os que o fazem os p a ra h o n rar o am or de
594 A P erseverança

conhecido e p rin c ip ia d o ... E c n atu ral, porque neste caso,


o pecado é m aior c sem desculpa de espécie algum a.
P e r isso, deves exam inar sériam ente o teu proceder, c
a sse g u rar os teus passos neste c am in h o ..., p a ra , nem sequer
um, d ares cm fa lso ..., m as p ersev erares nos teus fervores,
a v an ç an d o e a p ro v eita n d o cada dia mais e m a is..., com o fez
a Santíssim a V irgem d urante os dias da sua vida e nas
p ro v a s a que o Senhor a subm eteu.
Pede-lhe a g ra ç a da p e rsev e ra n ça na fé ..., na v o c a ­
ç ã o ..., na vida de fe rv o r..., p a ra que assim m ereças a g raça
da p ersev eran ça final, a últim a e a mais im portante de
todas as g raças.
65. O Coração da Santíssima Virgem

1.” O b je cto duplo. — N ã o h á dúvida que o objecto


desta devoção a o C o ra çã o puríssim o da Santíssim a V irgem
pode considerar-se de dois modos: o seu objecto m aterial...
e o seu objecto io rm a l... de sorte que, assim como o homem
consta de dois elem entos, um m aterial e visível, que é o
co rp o e o u tro e spiritual e invisível, que é a a lm a ... e assim
com o som ente d a união destes dois elem entos é constitu íd o t
o hom em total e com pleto..., assim tam bém nesta form osís­
sim a devoção, se n ã o distinguim os e conhecem os bem, para
logo os juntar, e nunca os sep arar, os dois elem entos que
a formam, jam ais conseguirem os p e n e tra r vna essência e
v a lo r desta d evoção a o Im aculado C o ra çã o de M aria.
P o is bem, estes dois elem entos são: o prim eiro, m ate­
rial, que é o c o ração físico ..., re a l... p a lp itan te d a S a n tís­
sim a V irg e m .... um coração de c a rn e ..., um c o ração
h u m an o .... um c o raç ão em tudo sem elhante ao dos outros
hom ens... c o ou tro elem ento, o fo rm al... invisível e im a­
terial, que consiste no a m o r..., na carid ad e de M aria,
e n ce rrad a e sim bolizada nesse C o ração puríssim o. — Se se p a ­
ram os estes dois elem entos destruím os esta d e v o ç ã o ..., ou
terem os um a d evoção parcial e incom pleta ao C o ração de
M aria.
P ortanto, sem pre que falem os..., pensem os..., m edite­
m os... ou tenham os algum a devoção a este C o ra çã o p u rís­
simo. entendam os que o fazem os p a ra h o n ra r o am or de
596 O C oração da S a n tíssim a V irgem

M a ria ... e ncerrado porém no seu coração com o em v a so


p re cio so ... O seu am or é a jóia e o seu c o raç ão o cofre
que a e n ce rra...
2. ° O b je cto m aterial. — E ag o ra p e n sa ...: qual a jóia.
tal c c o fre ..., qual a pérola, tal a c o n ch a ... Q u a l e como
seria o C o ra çã o da Santíssim a V irg e m ? — ]á m editám os e
considerám os a beleza fisica de M a ria .... já dissem os que
D eus a devia ter feito, mesmo qu an to ao corpo, a m ais fo r­
m osa entre tcd a s as c ria tu ra s... pois estava destin ad a p a ra
se r a M ãe do «.mais belo dos filhos dos hom ens»... T o d av ia,
n ã o te p arece que dev ia sê-lo ainda m ais em seu C oração?
n ã o rep resen tas fàcilm ente essa beleza e form osura com o que
cond en sad a naquele C o ração Im ac u la d o ? ... E por conse­
guinte não te p arece que sendo todo o corpo de M a ria
digno de devoção, com m ais ra zã o ainda deve sê-lo o seu
C o ra çã o ?
O s corpos dos sa n to s.,., as suas re líq u ias..., especial-
m ente o c o ração nalguns, com o e.m S anta T e re sa de Jesus...,
com o são apreciados pelas alm as d e v o ta s !... E que co m p a­
ra çã o pode h a v e r entre essas sa n tas relíq u ias... entre a
v e n era çã o que nos m erece c coração dos .santos e o da
S antíssim a V irg e m ? ... T a n to m ais que todo o acto de culto
trib u ta d o ao C o ra çã o de M aria, é um acto que abrange
to d a a pessoa de M aria.
B eijas a m ãe de um su p e rio r..., o pé do S an to P a d re ...
e sabes que não é som ente ao pé m as a toda a pessoa, que
queres com esse acto d em o n strar re sp eito ... afecto e a m o r...;
do mesmo m odo pensa que ao h o n ra r o C o ra çã o m aterial
de M aria, é a toda a g ran d eza da sua p e sso a .... a todas as
suas v irtu d e s... a toda a sua grandeza e san tid ad e que que­
res h o n ra r e venerar.
3. ° O b je c to lortm d. — E isto é já o objectc fo rm a l...;
essas v irtu d e s... essa sa n tid a d e ..., sobretudo esse am or que
b ro ta e reside nesse C o ra çã o nobilíssim o. — P õe de lado as
discussões sobre se efectivam ente o coração do homem
O Coração t/ct Sa n tíssim a V irgem 597

influi o u n ã o çm seu a m o r...; isso não nos interessa..—■


O que é v erd ad e é que todos os afcctos se repercutem no
coração hum ano e o im p re ssio n a m ...; a triste z a __ a ale­
g ria ..., o m ed o ..., a c ó le ra..., c tc ..., tudo se reg ista no c o ra ­
ção acelerando-o ou retard an d o -o , c por vezes até, p aran d o
nos seus m ovim entos... É pois evidente que entre a vida
física: do coração e a afectiva da alm a, há um a união
m uito intim a.
T alv e z p o r isso toda a gente vê no coração a c a u s a ...,
a ra zã o ,-., a se d e ..., ac m enos o sím bolo do am or. — E neste
sentido v u lg ar e co rrente o tom am os nós tam bém .
V ê, p o rtan to : se em todo o homem o que m ais nos in te­
ressa é o c o ra ç ã o ..., e por conseguinte o seu a m o r... quanto
m ais nos deve in teressar o am or do C o ra çã o de M aria? !...
O homem, tudo o que é deve-o ao c o ra ç ã o ...; toda a sabe­
d o ria ... toda a habilidade e a stú cia... todo o engenho, quão
pouco valem se se encontram num a pessoa dc quem se pode
dizer que ,n ã o tem c o ra ç ã o * !... P ode h a v e r coisa mais
antipática?
P o r ou tro lado, pensa no g o sto ..., sim patia e afecto que
inspira a pessoa de c o ração g ra n d e ..., n o b re ..., d ig n o ... —
T u d o está dito e explicado com dizer de um a pessoa que
tem um coração grande.
E agora, olha p a ra a tua M ã e ...; não esqueças que é
tam bém a M ãe de D e u s... Q u e c oração lhe terá confiado? ...
Q u e c o raç ão lhe terias tu dado, se de ti d e p en d e sse ? ... C e r­
tam ente que não dependeu de ti m as dc D eus, que a M ãe de
seu F ilh o ... a M ãe dos hom ens tivesse este ou aquele c o ra ­
ç ã o . . . —-Se lho deu Ele, como seria e como am aria este
C o ra ç ã o ? — Se h a v ia de am ar a D eus c aos hom ens com
um am or só inferior ao de D e u s... como seria o coração que
en cerraria tal a m o r? ...
4." D evoção dulcíssim a. — C heg ad o já a este ponto,
com preende quão a g rad á v el é p a ra o teu coração seguir
por esse cam inho... p e n etrar no seu C o ra ç ã o ..., estu d ar os
598 O C oração da S a n tíssim a V irgem

seus m ovim entos..., conhecer as suas p u lsa çõ e s..., o b se rv ar


o seu am o r... — Só q uando e n tra res n E le em cheio, com e­
ç ará s a conhecer a tua M ãe.
É necessário com preender a Santíssim a V irg e m ...,
conhecê-lA em seu C o ra ç ã o ...; qu an to m ais estudarm os o
seu am or m ais estim arem os a M a r i a .— C om o é doce este
p e n sa m e n to !... C om o é dulcíssim a esta d e v o ç ã o !... O p ró ­
prio D eu s a conhece tam b ém ..., a ap recia e e stim a... pelo
am or do seu coração.
E n ã o só a E la, m as a todos os hom ens. — C onhecem o-
-nos uns aos o u tro s o lhando p a ra a c a ra ... e p o r isso nos
enganam os tan ta s v e ze s... Som os todos tã o h ip ó critas...
Q u e astú cia não em pregam os p a ra m ostrar um a c ara e
sentir o u tra coisa no ín tim o !... M as a h ! .. . a D eus não se
e n g a n a ... D eus não se fia n a s a p a rê n c ia s... não se fixa em
e x te rio rid a d es..., não nos olha p a ra a c a ra ..., m as penetra
no m ais íntim o do c o ra ç ã o ... onde vê o que so m o s..., ao
ler os nossos afectos e carinhos.
C ontem pla o Senhor, p e n etran d o com esse o lh ar no
C o ra çã o de M a ria ... que verá Ele? ... que c o m p lacên cia?...
que g o sto ... que satisfação não encontrará nesse olhar? ...
E se o b se rv ar o teu coração, que s e n tirá ? ... g o sto ? ...
té d io ? ... repugnância e a sc o ? ...
Pede ao S enhor um pouco dessa luz com que E le p e n e ­
tra no teu in te rio r... e com essa luz divina p ro c u ra o b serv ar
o C o ra çã o de M a ria ... e em seguida o teu p ró p rio c o raç ão ...
e ao ver a diferença, a rre p e n d e-te... e im plora-lhe graça
p a ra a im itares... p a ra te pareceres com E la nelgum a
c o isa... p a ra teres um c o raç ão em tudo sem elhante ao seu.
66. O Coração da Santíssima Virgem

f ." E xcelência desta devoção. — Penetrem os mais em


particular, nos m otivos que devem levar-nos a c u ltiv ar esta
dev o ção terna e ferv o ro sa ao puríssim o C o ração da S a n tís ­
sim a V irg e m ... e seja o prim eiro, a excelência que encerra
em si mesma esta preciosa devoção. — Q u a n to ao cbjecto
m ate ria l..., o C o ra çã o de M a ria ...; salta logo à vista quão
dig n o é d ’E I a ! . .. ; é o instrum ento de que se valeu o E sp irito
Santo, principalm ente p a ra a In c a rn a ç ã o ... D aquele C oração
puríssim o e im aculado, brotou o sangue preciosíssim o, de
que se form ou o corpo sacrossanto, e até o próprio C o ra çã o
S acratíssim o de J e s u s !... Ali tom ou o S enhor aquele sangue
que havia de oferecer na cruz pela sa lv aç ão da hum anidade...
À quele C o ra çã o era o centro e o foco da vida d a S a n ­
tíssim a V irg e m ..., todas as su as p u lsaçõ es... os seus mais
pequenos m ovim entos, participam dos m éritos incalculáveis
que M aria m ereceu em cada instante da sua vida-
P erco rre o s passos principais desta vida e contem pla o
C o ra çã o de M a ria acusando todas as su a s im pressões...
Com o estrem eceria na A nunciação quando o sangue lhe
subiu às faces, pertu rb an d o -se com a presença do anjo e
quando e scu tav a as suas p a la v r a s ! ... N a noite de N a tal,
que em oção n ã c sentiria ao contem plar o rosto de Jesus
pela prim eira v e z ! ...
600 O C oração da Santíssima Virgem

Q u a n to s trabalhos e aflições na fuga sobressaltada p a ra


o E g ip to ! ...
E quando o velho Sim eão lhe crav o u aquela espada de
dor, com o b ateria apressadam ente aquele C o ra ç ã o !...
E que dizer então na perda do M enino Jesus... e so b re ­
tudo na P a ix ão e M orte de seu F ilh o !...
É claro que não podem os conceber nenhum m istério
da vida da Santíssim a V irgem , ao qual não correspondam
neste C o ração novas p u lsaçõ es..., novos m ovim entos...
A i! e q u an tas vezes teria p arado, deixando de alim entar
aquela vida preciosíssim a, um as vezes contraído e ap ertad o
pela força da a le g ria !... c o u tras pela violência da d o r... se
D eus a não tivesse sustentado, chegando por vezes a d e ita r
m ão da sua om nipotência, p a ra co n serv ar um a vida, que
n atu raim en íe não p o d ia p ro lo n g a r-se !... Isto não te parece
m ais que suficiente p a ra to rn a r esta devoção v aliosa e
excelente? ...
E no entanto, este argum ento sobe de valor, se conside­
ra re s o C oração d a V irgem Santíssim a como o ó rg ã o se n ­
sível do seu a m o r..., com o o instrum ento que recebia todas
as im pressões do corpo e da alm a p a ra se tran sfo rm ar em
a m o r..., p a ra se a b rasa r cada vez mais no fogo do a m o r...
— Isto, sendo difícil conhecê-lo, m elhor será se n ti-lo ... - -
E n tra naquele C o ração abrasado, e pede à Santíssim a V ir­
gem que acenda e abrase tam bém o te u ..., p a ra que ele p a r­
ticipe, pouco que seja, do am or que inunda o seu C oração
P uríssim o...
2.° A vontade de D eus. — N ão há um a ex p ressão
ex p lícita da v ontade de D eus que nos convide ou o b rig u e
a h o n ra r o C oração de M a ria ... De qualq u er m odo porém ,
é evidente que D eus assim o quer e ardentem ente o d e se ja ...
N ã o sabem os scr S u a v o n tad e que vam os a E le por in te r­
m édio de M aria? ... P o r ou tro lado, não é certo que nos
convida a e n tra r e a fazer a nossa m orada em seu divino
C o ra ç ã o 7... E como entrarem os nesse C o ra ç ã o ? ... Q uem
O C oração d<i S antíssim a V irgem 601

nos ab rirá a p o rta c nos introduzirá, st- não for a Santíssim a


V irg e m ? ... A d evoção ao Im aculado C o ra çã o de M a ria é o
m elhor cam in h o ... a m elhor p re p ara çã o p a ra a p rá tic a da
d evoção do C o ra çã o de Jesus.
P ois bem. a v ontad e de D eus de que honrem os o seu
divino C o ra çã o ê c la ra ..., te rm in a n te ...; logo tam bém é
clara, em bora contida im plicitam ente naquela, a vontade
divina de que honrem os o C o ra çã o Im aculado de sua M ãe.
— «E is o C o ra çã o que tanto am ou os hom ens»... disse
Jesus, p a ra nos incitar ao seu a m o r...
D epois do de Jesus, nenhum c oração nos am ou com o o
de M a ria ..., nenhum coração nos ensinou a am ar a Jesus
com o o de M a ria — nenhum coração pode servir nos de
modelo com o o de M aria.
N essa q ueixa am orosíssim a do C o ração de Jesus, em
que m anifesta qu an to o fazem so frer o esquecim ento e a
in g ratid ão dos hom ens..., nessa queixa, repito, entram os
todos sem excepção.
A o p ro n u n c ia r essas p a la v ra s o C o ra çã o de Jesus pen­
sa v a em todos n ó s..., referia-se ao procedim ento de todos
n ó s... não é v erd ad e ? não te diz o c oração que assim c,
pelo que a ti diz re sp e ito ? ...
M as re p ara , o C oração de M a ria não é assim ..., e o
único em que Jesus não p en sa v a ao so ltar esta q ueixa de
a m o r... Jesus não tem queixas do C o ra çã o de sua M ã e ...
Q u e g o s to !... Q u e consolação p a ra nós o b se rv a r..., e s tu ­
d a r..., a p ren d e r esse modelo, p a ra com esse C o ra çã o e por
seu interm édio, aprenderm os a am ar o C o ra çã o dc Jesus
C r is to ! ... N ão quererá D eus isto ..., não no-lo terá o rd e ­
n a d o ? ... S eria porém necessário que ordenasse um a coisa
com o e.sta?...
O teu coração deve ocultar-se no de Jesus..., logo deves
o culíá-lo antes no de tu a M ãe. P o rta n to a d evoção a o C o ra ­
ção de Jesus, exige um a devoção terna ao C o ração da S an ­
tíssim a V irg e m ...: esta é a v ontade de D eus.
ÓOU O Com*,;io da Santíssima Virgem

Q u a n to s trabalhos e aflições na fuga sobressaltada p a ra


o E g ip to ! ...
E quando o velho Sim eâo lhe crav o u aquela espada de
dor. com o bateria apressadam ente aquele C o ra ç ã o !...
E que dizer então na perda do M enino Je su s... c so b re­
tudo na P a ix ão c M orte de seu F ilh o !...
É claro que não podem os conceber nenhum m istério
da v id a da Santíssim a V irgem , ao qual não correspondam
neste C o ra çã o novas p u lsa çõ e s..., novos m ovim entos...
A i! e q u an tas vezes teria p arado, deixando de alim entar
aquela vida preciosíssim a, um as vezes c o ntraído e a p ertad o
pela força da a le g ria !... c o u tras pela violência da d o r... se
D eus a não tivesse sustentado, chegando por vezes a d e ita r
m ão da sua om nipotência, p a ra conservar um a vida, que
natu ralm en íe não p odia p ro lo n g a r-s e !... Isto não te p arece
m ais que suficiente p a ra to rn a r esta devoção valiosa e
excelente? ...
E no entanto, este arg u m en te sobe de valor, se conside­
ra re s o C o ração d a V irgem Santíssim a como o ó rg ã o se n ­
sível do seu a m o r..., com o o instrum ento que recebia to d as
as im pressões do corpo e d a alm a p a ra setran sfo rm ar em
a m o r..., p a ra se a b rasa r cad a vez mais no fogo do a m o r...
— Isto. sendo difícil conhecé-lo. m elhor será s e n ti- lo ...—
E n tra naquele C o ração abrasado, e pede á S antíssim a V ir­
gem que acenda e abrase tam bém o te u ..., p a ra que ele p a r­
ticipe, pouco que seja, do am or que inunda o seu C oração
P u ríssim o ...
2." A vontade de D eus. — N ão h á um a e x p ressão
ex p lícita da v o n tad e de D eus que nos convide ou obrigue
a h o n ra r o C oração de M a ria ... D e qualquer m odo porém ,
é evidente que D eus assim o quer e ardentem ente o d e se ja ...
N ã o sabem os ser S ua v o n tad e que vam os a E le por inter­
m édio de M aria? ... P o r ou tro lado, não é certo que nos
convida a e n tra r e a fazer a nossa m orada em seu divino
C o ra ç ã o ? ... E como entrarem os nesse C o ra ç ã o ? .., Q uem
O Coração tia Sa n tíssim a V irgem tò 1

nos a brirá a p o rta e nos introduzirá, se não for a Santíssim a


V irg e m ? ... A d evoção ao Im aculado C o ra çã o dc M a ria é o
m elhor cam inho... a m elhor p re p ara çã o p a ra a p rá tic a da
d evoção do C o ra çã o de Jesus.
Pois bem. a v ontade de D eus de que honrem os o seu
divino C o ra çã o é c la ra ..., te rm in a n te ...; logo tam bém é
clara, em bora contida im plicitam ente naquela, a vontade
divina de que honrem os o C o ra çã o Im aculado de sua M ae.
— «E is o C o ra çã o que tanto am ou os homens. ... disse
Jesus, p a ra nos in citar ao seu a m o r...
D epois do de Jesus, nenhum coração nos am ou com o o
de M a ria ..., nenhum c oração nos ensinou a am ar a Jesus
como o de M a ria ..., nenhum coração pode serv ir-n o s de
m odelo com o o de M a ria.
N essa queixa am orosíssim a do C o ração de Jesus, em
que m anifesta q u an to o fazem sofrer o esquecim ento e a
in g ratid ão dos ho m en s..., nessa queixa, repito, entram os
todos sem excepção.
A o pro n u n ciar essas p a la v ras o C o ra çã o de Jesus pen­
sa v a em todos n ó s..., referia-se ao procedim ento de todos
n ó s... não é v erd ad e? não te diz o coração que assim é,
pelo que a ti diz re sp e ito ? ...
M as re p ara , o C o ração de M a ria não é assim ..., é o
único em que Jesus não p e n sa v a ao so ltar esta q ueixa de
am o r... Jesus não tem queixas do C o ra çã o de sua M ã e ...
Q u e g o s to !... Q u e consolação p a ra nós o b se rv a r..., estu ­
d a r..., a p ren d er esse modelo, p a ra com esse C o ra çã o e por
seu interm édio, aprenderm os a am ar o C o ração dc Jesus
C r is to ! ... N ã o q uererá D eus isto ..., não no-lo te rá o rd e ­
n a d o ? ... Seria porém necessário que ordenasse uma coisa
com o e s ta ? ...
O teu c o ração deve ocultar-se no de Jesu s..., logo deves
ocultá-lo antes no de tu a M ãe. P o rta n to a d evoção a o C o ra ­
ção de Jesus, exige um a devoção terna ao C o ração da S a n ­
tíssim a V irg e m ...; esta é a v ontade de D eus.
602 O C oração dn S a n tíssim a V irgem

E esta v o n tad e tem -se m anifestado de m odo especial e


precisam ente nos tem pos a c tu a is ...; a v id a nestes tem pos
é c ara cte riz ad a pelo e g o ísm o ...; o coração hum ano tem -se
voltad o p a ra d e n tro ... buscando-se a si m esm o— esque-
cendo-se de D eus e do p ró x im o ... Q uem se sacrifica hoje
em d ia pelo am or de D eus e d a s a lm a s?... Q u e ideias p ro ­
cu ra o m undo m o d ern o ? ... A s p ró p rias alm as que praticam
a vida de d evoção e que se julgam talvez m uito b c a s ... a
m aior p a rte delas, que am or de caridade possuem ? ... N ão
vês com o procuram o seu p ro v e ito ... a sua u tilid a d e ... e o
seu e g o ísm o ? ... Q u e t r is te ! ... que repugnância deve isto
c a u s a r ao C o ra çã o S acratíssim o de J e s u s !...
E le p ro c u ra o c o raç ão do hom em ... pede-lhe a estim a
e o am or, e não encontra senão egoísm o. — A g u a rd o u por
isso estes tem p o s..., a fim de c u ra r no m undo esta falta de
a m o r...; por isso ra sg a o p e ito ... m ostra o C o ra ç ã o ... e
convida ao am or com o exem plo do mesmo C oração.
A d evoção ao C o ra çã o de Jesus é a so lu ç ão ..., o rem é­
dio que D eus reservou p a ra c u rar as actuais enferm idades
do c o ração hum ano.
P cis bem, convence-te disto: a devoção ao C o ra çã o de
M aria, é de um a actu alid ad e u rg e n te ... é de um a necessi­
dade p e re n tó ria ...; não podem os nem devem os desperdiçar
estes m om entos... nem o cham am ento que o Senhor nos
faz, p o r meio do seu C o ração e de sua M ãe S an tíssim a...
3.’ A té o egoísm o. — O egoísm o bem entendido, é uma
v irtu d e excelen te... N ã o dizem os que a caridade bem o rd e ­
n a d a d eve com eçar p o r nós .m esm cs?... N ão é certo que no
cam po da salv ação e santificação, tem os de tra ta r da p ró ­
p ria alm a prim eiro que das alheias?
Pois isso é egoísm o..., m as egoism c sa n to ..., egoísm o
aliás com pletam ente n e ce ssá rio ... — E este egoísm o santo
d eve levar-te a a b ra ç a r a preciosa devoção dos C orações
de Jesus e M aria. — Pois no fim, o fruto respectivo, e que
fru to ... p a ra quem se rá ? ...
O C oração da Sa n tíssim a V irgem 603

R ecorda as p a la v ra s do C o ra çã o de Jesus a S a n ta M a r­
g a rid a : P rom eto-te que o m eu C oração se abrirá para repar­
tir abundantem ente as riquezas do seu am or divino, entre
os que O honram e procuram que os outros O h o n re m ...
C onsidera que essas riquezas e esses tesouros são infi­
n ito s..., e que, com o a crescen tav a a m esm a S a n ta ..., são
tão grandes que não sei com o ponderá-los.
É evidente que o m aior prém io é o am e r em si m esm o...
Q u e o C o ração de Jesus te dê en tra d a e te adm ita ao seu
am or, é o que m ais podes d e se ja r... H a v e rá m aior prém io
que am á-lc e sab er que O a m a s? — E não obstante. Ele
cum ula este am or de tais prom essas que efectivam ente. até
por n egócio __ até p o r egoísm o devias a b raç á-lo ... P orque
não o fizeste ainda? ... Q uem se esforçará tan to p a ra te d is­
s u a d ir-... N ã o será o dem ónio, teu inim igo, que nisso põe
todo o in te resse ?...
E x am in a bem as causas da tua a p atia e tibieza em
assunto de tan ta im p o rtâ n cia... e verifica se será por não
saberes dirigir-te em prim eiro lu g a r ao C o ra çã o da S a n tís­
sim a V irg e m .— N ã o esqueças que as prom essas do C o ração
de, Jesus se rão realizadas p o r .meio do C o ração de M a ria ...
V ai. pois. ao seu e n co n tro ... fecha-te em seu C o ra ç ã o —
lança-te e perde-te n e le ..., pois quem se perde no C oração
de M aria, en co n trar-se-á no C o ração de Jesus.
67. O Coração da Santíssima Virgem

1.“ Füncc de graças actuais. — Em v ista disto p en etre­


m os um pouco m ais no san to interesse que deve levar-nos
a p ra tic a r esta devoção ao S a g ra d o C o ra çã o de Jesus por
meio do Im aculado C o ra çã o de M aria. P a ra isso, recorda
as prom essas m aravilhosas do C o ra çã o de Jesus aos seus
d e v o to s... C om o são d ignas de que as conheças e m edites
cuidadosam ente! — R eduzam o-las a três grupos: as graças
a c tu a is..., a g ra ça sa n tific a n te ... e a g raça final, ou que
h á-de m erecer-nos a posse dc D eus no céu.
T o d a s as alm as, ainda as m ais santas, precisam desges
auxilios divinos, cham ados gra ça s actuais, pois sem elas é
im possível p ra tic a r qualquer acto so b re n atu ra l m eritório. —
E sta s gra ça s são se.m d úvida, um mimo carinhosíssím o da
bondade d iv in a ..., porque são distribuídas generosa e abnn-
dantem ente por D eus, sem qualquer m erecim ento da
nossa p arte.
À fonte dende brotam é o próprio C o ração divino de
Jesus, que deste m odo nos p a te n teia continuam ente o am or
que nos c o n sa g ra ..., e o can al p o r onde descem é sem pre a
V irg em S antíssim a em cu jo puríssim o C o ração se encontram
todas as graças, como que a rm a ze n a d as..., p a ra serem re p a r­
tidas entre as alm as. — C om preendes bem onde tens de
p ro c u ra r estas graças? ... N ã o é no trono d a justiça, pois
de justiça n ada te é d e v id o ..., m as no trono de bondade e
O C oração da Sa n tíssim a V irgem 60 5

m isericórdia do o p ró p rio C o ra çã o de D e u s; mas, qual é esse


tro n o ’ ... onde e s tá ? ... onde encontrá-lo facilm ente? eviden ­
tem ente. no C o ra ç ã o Im aculado d a tua M ãe querida.
T u d c p o rta n to depende de ti.... que qu eiras e saibas ir
a essa fo n te... a esse depósito, em busca das qraças de que
necessitas... e que D eus quer c o n ce d er-te... o que aliás, tem
feito iá m ilhares de vezes, mesmo sem tu a s pedires.
P en sa contudo, e m edita bem neste ponto. ■ D eus c o n ­
cede-te sem pre g raças actuais siificientíssim as em conform i­
dade ccm o seu estado e c o n d iç ão ..., de m aneira que da sua
p a rte ele pro p o rcio n a tudo o que é necessário à tua s a lv a ­
ç ã o ...: a tua santificação ou endurecim ento no p e ca d o ...
depende de ti. porque ccm o teu procedim ento... com a tua
correspondência ou não à graça, podes to rn á-las eficazes ou
ineficazes... ou totalm ente inúteis. — N u n c a te esqueças que
isso depende de ti... e a ti som ente se pedirá conta rigorosa
do uso ou do a b u so ... da estim a ou desprezo que tiveste
por essas g ra ç a s... Q uem não q uererá pois, tc rn a r eficazes
e p roveitosas as g raças que D eus c o n ce d e? ...
N isto reside o interesse principal d esta m agnifica d e v o ­
ç ã o ... A devoção ao G eração de Jesus p o r meio do C o ração
de M a ria to rn ar-ío -á fácil e em certo m odo se g u ro ...: se a
tu a alm a souber encerrar-se nos C orações de Jesus e de
M aria, sa b erá tam bém com certeza ap ro v eita r-se das graças
preciosíssim as que lhe serão c o n ced id as... não porque lhe
seja tirad o o uso da liberdade, m as porque o C o ração de
Jesus m ultiplicará as suas g raças, d ando lhe precisam ente
aquelas que sabe serão por ela m ais bem ap ro v eitad as.
N ã o é isto o que se nota im ediatam ente ao ler as p ro ­
m essas do C o ra çã o d iv in o ? ... N ã o re p ara ste no grande
núm ero e v a rie d ad e de gra ça s prom etidas, com o se o C oração
de Jesus pretendesse desse m odo a sse g u rar a sua eficácia?
R ecorda as prom essas feitas aos p e c a d o re s..., ainda aos
m ais en d u recid o s..., às alm as frias e tíb ia s..., às alm as ferv o ­
rosas que aspiram à sa n tid a d e... aos se c u la re s..■ às com u­
606 O Corayáo <iu Santíssim a V irgem

nidades re lig io sa s..., aos indivíduos, fam ílias e n a çõ e s...,


aos sacerd o tes e a p ó sto lo s ...; a todos prom ete não só um a
c h u v a abundantíssim a de g raças, m as o que é mais im por­
tante, a eficácia das m esm as.
E le fa rá que essas gra ça s não sejam inúteis p a ra os
seus d e v o to s... O h ! podes im aginar coisa m ais im p o rtan te...
que tan to interesse à tu a alm a, com o e s ta ? ... P o rq u e não
te decides, até por interesse, a possuir esta v erd ad eira e
sólida d e v o ç ã o ? ... Suplica ao C o ra çã o da Santíssim a V irgem
que ta en sin e... p a ra a prenderes a conhecer e a am ar o
C o ra ç ã o D ivino de Jesus.
2.° A graça santiticante. — É um a consequência do
ponto anterio r. — À s g ra ç a s actuais, to rn ad a s eficazes por
esta devoção, há-de co rresp o n d er nas alm as necessàriam ente,
um g ra n d e a v an ç o na vida espiritual, que é o que se cham a
a g ra ça santificante.
Já n o u tras ocasiões m editám os sobre e la ... m as nunca
será dem asiado. — R eco rd a p o r isso o que foi dito, que
esta g ra ça é a vida d a a lm a ..., que é, sem dúvida, um grande
teso u ro ..., o u antes, o teu c a p ita l... a tua fo rtu n a ..., a única
que p o ssu is..., a única que te a com panhará um dia ao tri­
bunal de D eus.
C oncedeu-te a prim eira g ra ça no san to b a p tism o ..., foi
com o que o capital inicial colocado na tua alm a, p a ra o
aum entares com as boas o b ra s ... especialm ente com a
recepção am orosa dos sa n to s S a c ram en to s... E tu que
fize ste? ... Com o está em teu coração esse c a p ita l? ... p e r­
d id o ? ... imobilizado? ... ou está produzindo o devido rendi­
m ento, aum entando continuam ente?
D ito sa a tua alm a, se assim é ... D esg raçad a, se for dou
tro m odo. — A devoção aos C orações de Jesus e de M a ria ...
asseg u ra esta v id a ..., este robustecim ento da a lm a .—
A p rá tica fundam ental desta devoção é o a m o r..., é um
p uro exercício de am or de D e u s... c o am or de D eus que
in tro d u z ... conserva e aum enta a graça na alm a.
O C o ta çã o da S antíssim a V irg em 607

S a n ta C a ta rin a dizia: S e pudesse cair no inferno uma


gota de am or de D eus, convertè-lo-ia em C é u ... transfor­
m ando novam ente em anjos todos os d em ó n io s... D o mesmo
m odo, que p rodígios não o b ra rá num a alm a, a p rá tica do
am or em que consiste esta devoção — que estran h o será que
se cum pram as prom essas dulcíssim as nela contidas? A um
asfixiado conserva-se a vida, restabelecendo-lhe o m ovim ento
do ap arelh o re s p ira tó rio ...; a um c ard íac o injecta-se uma
substância que acelere e dê novo im pulso àquele coração
c a n sa d o ... O mesmo faz esta dulcíssim a d e v o ç ã o ...: injecta
o am or de D e u s..., ren o v a a vida da a lm a ... aum enta-a c
acelera-a restabelecendo nela o exercício do am or de D e u s...
— P o r isso, os pecadores en co n trarã o aqui certam ente o
p e rd ã o ..., e os justos a sa n tific aç ão ...
3." A graça final. — É esta a ch av e de o uro das gra ça s
e prom essas d o D ivino C oração: a p ersev eran ça ou a graça
fin al... a g raça de um a boa m o rte !... A quem não preocupa
este p ro b lem a? ... Q uem pode esp e ra r tranquilo e sereno a
passagem da eternidade, d ada a sua in c e rte z a ? ... Q u an d o
e com o será? ... Q u e enorm e diferença que seja de um ou de
ou tro m odo... A eternidade que se segue, a quem, n ã o
e s p a n ta ? ... Sem pre feliz ou sem pre d e s g ra ç a d a !... É na
verdade, um terrív el dilem a...
E o mais espantoso é que neste p asso ninguém te pode
a ju d a r ...; a tua alm a terá de o d a r sozinha, sem que nin­
guém a veja ou a c o m p a n h e ...; ela s ó ..., ela unicam ente o
há-de d a r..., quer queira, quer n ã o ..., esteja bem o u m al
p re p a ra d a ... — Im agina-te a gora nesse m om ento, em que te
e n co n trarás um dia, com toda a c e rte z a ... trem erás ante a
v ista da eternidade som ente ao p en sar n e la ... Q u e será
então quando nela e n trares plcnam ente?
O h devoção d u lc íssim a !... O C o ração de Jesus sabe
isto ... c om preende-o... e quer a u x iliar-te... Q u e a u x ílio !...
Q u e r facilitar-te um pasço tão difícil... e quão fácil o
t o r n a ! ...
6 '1 S O C oração da S antíssim a V irgem

Só te pede que o am es a g o ra ... que lhe dês ag o ra o teu


c o ra ç ã o p o r meio do C o ra çã o de M a ria ..., que te dediques
inteiram ente a esta d evoção dos C orações sacro ssan to s de
Jesus e M a ria ... Pode h a v e r coisa m ais fá c il? ... M a is justa
e ra c io n a l? ... E E le em troca, p ro m ete..., asseg u ra o triunfo
fin a l..., a vitó ria co m p le ta ..., o prém io e a c oroa e te rn a...
E sc u ta ... imprime na tua a lm a ... aprecia em silêncio
estas p a la v ra s dulcíssim as: « O m eu C oração D iv in o será
para eles o asilo seguro na últim a h o ra s...
E efectivam ente, D eus en v ia rá a Santíssim a V irgem a
a ju d a r... a c o n so lar... e a receber a alm a de seus devotos,
levando-os já nesta vida a m orar dentro do C o ra çã o do
p ró p rio J e s u s ...— V iv e r e m orrer dentro deste C o ra çã o
d iv in o !... H a v e rá coisa m ais b e la ? ... P o is consegui-lo-ás
se souberes esconder-te com pletam ente no C o ra çã o puríssim o
de tu a M ãe. — Prom ete-lhe um a vez m ais que assim o
f a rá s ...; pede-lhe perdão de o não haveres feito até h o je ...;
dá-lhe o teu coração p a ra sem p re..., e im plora-lhe que o
aceite, em bora m iserável, recebendo-te no núm ero dos seus
v erd ad eiro s devotos.
6S. O Coração da Santíssima Virgem

l.° E xcelência deste Coração. — P rincipiem os p e r c o n ­


sid e ra r algum as das g randes m ara v ilh a s que D eus quis
e n ce rrar e acum ular no C o ração d a sua e nossa M ã e ...,
detendo-nos sobretudo na consideração d a sua ex celência...
—-A excelência d o C o ra ç ã o da Santíssim a V irgem deprecn-
de-se da sua união co.in c divino C o ra çã o de Jesus... e
p o rtan to , com o C o ra çã o de D e u s...
Q u e união tão intim a e v erd ad eira com a p ró p ria D iv in ­
dade !
M aria pela sua dignidade de M ãe de D eus, foi in tro d u ­
z id a na particip ação dc mesmo D eus, q uanto isso é p e rm i­
tido a um a p u ra c r ia tu r a .— T ev e um período na sua vida
em que realm ente a vida de D eus era a vida de M a ria ...;
a v id a de D eus feito homem dependia d a vida de M a ria ...;
o C o ra çã o de D eus p u lsav a pelos im pulsos do C o ra çã o de
M a r i a ! ... e p o r isso era tal a união en tre os dois C orações,
q u e viviam um a v id a perfeitam ente comum.
O C o ração de M a ria continuou sem pre estreitam ente
unido ao C o ra ç ã o de seu F ilh o ... O seu C o ra çã o am ava,
q u eria e o d iav a a s m esmas coisas que o C o ra çã o de Jesus...;
de tal m aneira que o C o ra çã o de M a ria era sem pre como
que um ecc fiel do C o ra çã o de Jesus.
N isto reside toda a excelência do C o ração Im aculado
de M a ria ... Foi assim que este C o ra çã o conseguiu am ar a
610 Q C oração d a S a n tíssim a V irgem

D eus m ais que todas as c ria tu ra s juntas, do céu e d a te rra ...


E p o r isso D eus com prazia-se m ais neste C o ra ç ã o e neste
am or do que em todos os o u tro s dos anjos e dos hom ens.
Q u ã o belo teria sido que nenhum homem to rn asse a p e ca r
depois da queda de A d ã o ... c que todos os corações se tives­
sem dedicado, daí em diante, a am a r a D e u s so b re todas
as c o isa s..., e no entanto, seria m uito p o u c o ... seria um
am or indigno de D eus.
O único C o ração que am a a D eus com o am or que
m erece é o C o ração S acratíssim o de Jesus... e depois, m as
juntam ente com E le e p o r E le, o puríssim o C o ra çã o de
M a ria ... — E ste é o c o raç ão e o am or em que D e u s tem
certam ente as suas com placências.
M a s tudo p a rte deste p rin c íp io ..., da união do C o ra çã o
de M a ria com o de seu D ivino F ilho. — U nião su b lim e !...
pela qual a vida tran sb o rd an te de D eus era v iv id a pelo
C o ra çã o de M a ria ...
2.” S u m id a d e . — E desta união perfeitíssim a entre os
dois C orações, resultou a gran d io sa e ad m irável santidade
do C o ra çã o de M a r i a .—>A san tid ad e do C o ração de M a ria !
— A sa n tid a d e consiste na p a rticip a çã o de D e u s ..., no am or
que tran sfo rm a a alm a em D e u s..., em. chegar a ser um a
v erd ad e ira imagem e um a cópia fiel de D e u s... N ã o foi esse
o fim que D eus teve em vista quando criou o hom em , for­
m ando-lhe um coração? ... N ã o quis que fosse um a im agem
e sem elhança do se u ? ...
P o r isso, quando efectivam ente o coração hum ano chega
a ser a im agem v e rd a d e ira ... a form ar um a sem elhança com
o C o ra ç ã o de D e u s..., ao «já n ã o sou eu que vivo, m as é
E le que vive em mim», pela tran sfo rm ação do a m o r... chegou
nesse m om ento à v erd ad e ira p e rfeição ... atingiu a santidade.
E que coração poderá com parar-se neste p o n to com o
de M aria? ... Q u a l está m ais p ró x im o ..., m ais u n id o ..., e
com m aior p a rticip a çã o da vida divina que o se u ? ... Q ual
m ais confundido e transform ado em D e u s ? ... Q uem poderá
O C oração da S a n tíssim a V irgem 611

d izer com m ais v erd ad e ser «a im agem e sem elhança de


D eus», que este C o ra çã o , que é espelho p u ríssim o ..., sem
m anchas nem som bras, que re tra ta e rep ro d u z fielm ente a
mesma santidade de D e u s? ...
R epete, diante do C o ra çã o de M aria, aquelas p alav ras:
já não sou eu q u e v iv o ... c v e rás com o, nem no c oração de
S. P a u lo ..., nem n o de qualq u er o u tro santo, poderiam te r
m elhor aplicação que n o de M aria.
D etém -te pois, um m om ento a c o n sid erar as perfeições
in finitas de D e u s... v a i-a s aplicando à Santíssim a V irgem ,
e v ê -la s-á s to d as em seu C o ra çã o adm iravelm ente re p ro d u ­
z id a s..., em v irtu d e d a união e com unicação inefáveis que
m antém com o C o ra ç ã o de D eus.
F a z um resum o d e todas as m editações precedentes, em
que a ca b as de ex am in ar sob v á rio s aspectos as v irtu d es de
M a ria ... c contem pla-as a g o ra em c o n ju n to ..., form ando um
todo adm irável no se u p ró p rio C oração.
E is o tabernáculo d a d iv in d a d e ..., o tem plo v iv o ..., onde
D eus se dignou fix ar a sua m o ra d a ... e ali q uer perm anecer
p a ra sem p re... C om o será pois, a sua santidade? !
T u d o neste C o ra ç ã o é sa n to ...; n a d a há nele, até o m ais
im perceptível m ovim ento, que o não s e ja ...: pensam entos,
d e se jo s..., a m o res.... p a la v ra s .... o b ra s ..., tu d o ..., tudo é
sa n to ...
D iante desta m ara v ilh a de sa n tid a d e ..., deste «espelho
sem m ancha», contem pla o teu c o ra ç ã o e c o m p a ra ...; p e r­
corre as suas virtu d es e perfeições, e cada um a delas des­
c o b rirá no te u um v íc io ..., um a fa lta ..., um a im perfeição...
—*E stu d a com afinco o C o ra çã o da tua M ãe e deste estudo
proveitosíssim o, tira rá s um a m aior estim a c am or p a ra com
e le ..., um m aior desprezo e aborrecim ento do teu c o raç ão ...
e das faltas e im perfeições que o m an ch am ...
3." F orm osura. — N atu ralm en te, tal santidade to rn a este
puríssim o C o ração , v erdadeiram ente e n ca n ta d o r aos olhos
de D eus e de to d as as c ria tu ra s..., anjos e hom ens que o
612 O C oração da S a n tíssim a Virpeih

contem plam . — Se o C o ra çã o de M a ria é san to com a sa n ­


tidade p a rticip a d a do mesmo D e u s..., é tam bém forpiosíssim o
com a beleza de D e u s...
H a v e rá coisa m ais bela e form osa que o seio d a D iv in ­
d a d e ..., que o C o ra ç ã o de D eus, sendo E le a fonte, a causa
e a origem d e toda a form osura? ... Se o sol desaparece,
to d o s os seres da te rra perdem a b e le z a ...; pois esta não se
pode conceber sem a luz do so l... É assim a beleza e form o-
s u ra das a lm a s ...; sem D eus, n ã o h a v eria beleza m aterial nem
e sp iritu a l... nem sobretudo a beleza so b re n atu ra l d a s alm as.
Q u a l será, por isso, a beleza e form osura do C o ra çã o
d a Santíssim a V irgem , p a rticip a n d o a tal pon to d a de D eus,
que a nossos olhos p arece confundir-se com Ele? ..i E como
a form osura v e rd a d e ira é a d o c o ra ç ã o ... pois a ex te rio r é
ap en a s um reflexo da in te rio r... contem pla a beleza de M a ria
e sp a lh a d a p o r toda a sua p e sso a ... reunida e acum ulada em
seu C o ra ç ã o ... ■
A Ig reja, en can tad a, aplica-lhe todas as expressões da
S a g ra d a E sc ritu ra que se refiram a b e le z a ...: c q u ão form osa
és, q u ão fo rm o sa ...; tão form osa, que és toda bela, sem a
m enor m an ch a que afeie a _ tu a b e le z a ...; tão form osa, que
c h eg aste a ferir com ela o C o ra çã o d o D ivino E s p o s o ...; tão
form osa, que vieram as filhas de Jerusalém lo u v ar e bendizer
a tu a fo rm o su ra... a g ra ça e o e ncanto espalharam -se nos
teus lá b io s... e p o r isso D eus te abençoou desde a e te rn i­
d a d e ...; com o esplendor d a tua beleza sem p a r, cam inha
p rò sp e ram e n te e dom ina os corações com o rain h a da fo r­
m o su ra » ...
4.° O teu coração. — A plica ag o ra ao teu c o ração tudo
o que fica dito. — D eu s q uer fazer-te p a rticip a r d essa e x c e ­
lê n c ia ..., d essa sa n tid a d e ..., d essa form osura, com que ad o r­
n o u c C o ra çã o de su a M ã e ...: q uer que o teu c o ração seja
tam bém sem elhante ao se u ... porque deseja tam bém pôr em
ti as suas com placências.
Pôde dizer do F ilho de M a ria: oE ste é o meu Filho
O C oração da S a n tíssim a Virnem o: 3

m uito am ado em que pus todas as m inhas co m placências»...


T am bém o q uer d izer de t i...; q uer que sejas, como Jesus,
filho de M a ria e seu filho por a d o p ç ã o ..., por g ra ç a ... e p o r
m eio desta filiação, estabelecer contigo a u n ião ... a com uni­
cação que teve com o C o ração de M a ria ... e to rn ar-te assim
p articip a n te d a s u a p ró p ria v id a divina.
O E sp írito S an to deseja que o teu coração seja o seu
tem plo e sa n tu á rio ... e p a ra isso o aform oseia e dignifica p o r
m eio da sua g ra ç a ... D itoso o coração que é escolhido p a ra
tro n o da S antíssim a T rin d a d e !... M il vezes ditoso o c oração
que sabç co rresp o n d er a essa altíssim a d ig n id a d e !...
. , E o teu c o ra ç ã o ? ... N o ta s efectivam ente que assim deves
tra ta r >e contem plar o teu c o ra ç ã o ? ... A p recias o dom de
D eu s que te. convida a p a rtic ip a r da su a vida d iv in a ? ...
• P e n sa dem oradam ente sobre este assunto. — E x am in a se
o teu procedim ento se coaduna com este p lan o ideal, c o n ­
cebido pela sab ed o ria e bondade de D eus p a ra teu hem ...
V e rific a ' se realm ente te esforças p o r dirigir e unificar as
tuas in te n ç õ es..., o s teus desejos e a fe c to s..., os teus c a ri­
n h o s e am ores p a ra com o S acratíssim o C o ra çã o de Jesus,
p o r m eio do C o ra ç ã o de M a r i a .— 'V ê , se na verdade, este
C o ra çã o im aculado é o m odelo que p ro c u ra s im itar... se dc
facto p ro c u ra s assem elhar-te com E le n a un ião e com uni­
cação inefável com D eus que foi a fonte c a raiz d a sua
excelên cia..., san tid ad e e form o su ra...
•Pede à Santíssim a V irgem que seja a M ediadora, na
en tre g a do teu c o raç ão a Jesus... D á -o a E la em prim eiro
lu g a r..., to ta l..,, sé ria ..., eficaz.ri e perm anentem eute, d a n ­
do-lhe liberdade p a ra que faça o que ju lg a r m ais conve­
niente, .até ch eg ar a a d a p ta r o teu c o ração ao de Jesus, de
m aneira que fiquem sem elhantes.
69. O Coração da Santíssima Virgem

l.° O rdem perfeita. — E is o u tra m aravilhosa perfeição


que a d o rn a v a e x trao rd in ariam en te o C o ra çã o Im acu lad o de
M a ria, tendo intim a re la çã o com a beleza e fo rm osura do
m e s m o ...— A ordem é um elem ento essencial n a form osura.
—-S a n to A gostinho chega a d efinir a beleza com o: o esplen­
dor da ordem .
A ordem no c o ração consiste em m oderar e d irig ir todos
os seus .movimentos, de aco rd o com as norm as estabelecidas
por D e u s ...; em toda a ordem é necessária um a n o rm a ...
P en sa, p o r exem plo, qual a m elhor m aneira de colocar
e o rd e n a r os livros de um a biblioteca, segundo um a regra
d e te rm in a d a ..., q u e r seja o tam a n h o ... a a n tig u id a d e ..., as
m atérias que versam ...' a encadernação ou a p rese n taç ão que
têm, e tc ...
T o d a a ordem depende, p o r isso, dessa norm a, que
o rd e n a verdadeiram ente todas as coisas, colocando-as no seu
d ev id o lu g ar. — P ois o c o raç ão tam bém tem a sua n o rm a:
e a v ontade, o entendim ento, os sentidos e todas as p o tên ­
cias do hom em têm de subm eter-se à re g ra que o s sujeita
à v o n tad e de D e u s... e desse m odo h a v erá ordem no en ten­
dim ento, quando subm ete o s seus juízos ao juízo de D e u s...
e conform a os seus pensam entos com os pensam entos de
D e u s..., e na v ontade a ordem consistirá em a m a r cad a coisa
segundo o seu m erecim ento, m as sem pre com um am or
inferior ao que se tem a D e u s... pois a re g ra do am or é
O C ota çã o da Santíssim a V irgem 615

a m á -lO sobre todas as c o is a s ; e a norm a que rege os sen­


tidos exigir-lhes-á que se subm etam à ra z ã o ... e que nunca
se deixem a rra s ta r pelos c ap ric h o s..., pois estes não são.
nem podem se r nunca, um a re g ra de v erd ad e ira o rd e m ...
F inalm ente, h a v e rá ordem no c o raç ão e em todo o
nosso ser, q u ando se seguir a v ontade de D eus, m anifestada
interiorm ente pelos im pulsos da g raça e pelas inspirações
divinas. — Q u e espectáculo h a v erá m ais belo e a tra en te que
o d a ordem ? ... não o tens adm irado com frequência nas
o b ra s d a n a tu re z a ? ...
C ontem pla o céu estrelado e pasm a ao ver aqueles g lo ­
bos gigantescos m ovendo-se com velocidades vertiginosas,
n ã o o b sta n te as su as m assas grandiosas, c com o está tudo
tão p erfeitam ente regulado, que não há choques nem roces
que venham a p roduzir verdadeiros cataclism os...
T u d o na n a tu re za aparece deste m odo com a ordem
m aravilhosa d ad a pela sabedoria infinita. Sóm ente o
hom em ..., som ente o coração hum ano abusando do poder
da sua v o n ta d e ... e do dom d a sua lib erd ad e... parece ter o
gosto de d e sp rez a r essa ordem d iv in a ... e de v iv er em con
tín u a d e se rd e m ... Q u e tristeza que assim se ja ... e, não o b s­
tante, p o r m uito sublim e e en can tad o r que seja o espectáculo
da natu reza tão sàbiam ente o rd e n ad a , não ha nada tão
adm iravelm ente belo, com o um c o ração bem o rd e n a d o ... um
c o ração cujos m ovim entos sejam todos dirigidos por D eus
e p a ra D e u s... É assim o teu coração? ... O u pelo contrário,
é infelizm ente a desordem que reina n e le ?...
E talvez um a desordem c o m p leta..., a b so lu ta ..., d e so ­
la d o ra e total. — D esordem nas paixões v io le n ta s..., nos se n ­
tidos pouco o u n ad a m ortificados... M edita, por exem plo,
na tu a lín g u a ..., nos teus o lh o s..., na desordem do teu c o ra ­
ção com tan to s desejos m au s... tan ta c o rru p ç ã o ... inclina­
ções tã o p e rv e rsa s..., carinhos e am ores perigosos, se não
forem já pecam inosos.
Se todo o p e c a d o ..., toda a falta e im perfeição é. um a
616 O Coração da S antíssim a V irgem

desordem , como será a que reina em teu coração, sendo


tan ta s as faltas e os pecados que nele se escondem ?...
N ã o esqueças que a lei suprem a p a ra o rd e n a r a tua
vida e o teu c o ração é esta: O hom em }oi criado para
lo u v a r... reverenciar... e servir a D iv in a M a jesta d e. — Com o
cum pres esta le i? ... A re sp o sta a esta p e rg u n ta d a r-te -á uma
noção c lara da ordem da tua vida, e p o rtan to da tua
perfeição. — E x am in a-a atentam ente diante de D eus e da
V irgem S an tíssim a...
2." S im plicidade absoluta. — E a causa d esta desordem
é sem dúvida, a con tín u a a g ita çã o da vida que actualm ente
v iv em o s... Q u a n to s o bjectos exteriores e se n sív e is..., quanto
ruído e m ovim ento no m undo e x te rio r..., qu an ta ansiedade e
solicitude no nosso interior, c au sad as pelas p a ix õ e s..., pelos
cuidados da v id a ..., pelas to rm entas da a lm a ..., pelas im pres­
sões que tan ta s brechas produzem em nosso c o ra ç ã o !...
Q u e r dizer, vivem os um a vida de varied ad e tum ultuosa, de
sucessos e acontecim entos que nos im pressionam dem asia­
dam ente, com plicando e abso rv en d o toda a nossa a ctiv i­
dade. — F alta-n o s a virtu d e da sim plicidade, que dá unidade
e sim plifica todas as im pressões e agitações do c o ra ç ã o ...
Q u e adm iravelm ente nos ensinou Jesus esta sim plici­
d ade no episódio de M a rta e M a ria ... M a rta é o p ro tó tip o
d a actividade tu m u ltu o sa..., da p ertu rb a çã o e ag itação cons­
tante, nascida da im ensa v a rie d ad e de actos em que deseja
m ultiplicar a sua a c tiv id a d e ... M aria, ao contrário, é o
m odelo da sim plicidade..., o m odelo das alm as que têm
g ra v a d a s no coração aqu elas p a la v ras: «U m a só coisa ê
n e ce ssá ria» ... e essa unifica de tal m odo a v a rie d ad e dos
acontecim entos prósperos o u adversos da vida, que parece
n a d a a im p ressio n ar..., n ad a a in te re ssa r... p ro c u ra n d o
som ente n ã o p e rd er a m elhor parte que escolheu.
S e desejas o rd e n ar o teu coração, é indispensável que
pratiq u es esta sim plicidade nos teu p en sam en to s.... nos teus
a fe c to s... nas tuas intenções e nas tuas obras. — Sim plifica
O C oração d a Santíssim a V irgem 617

os teus pensam entos com a lem brança da presença de D e u s...,


V en d o D eus em toda a p a rte ... e a E le como fim últim o,
dirige e até sacrifica, se necessário for, qualquer o u tro pen­
sam ento. — Se tivesses bem; fixo em teu coração este p e n ­
sam ento, p ertu rb a r-te -iam tan to s ou tro s, que sem c essar te
apresentam o m undo, o dem ónio e a carne? ...
A sim plicidade nos afectos, d a rá um a unidade m ara v i­
lhosa ao s que te agitam, o coração, com o fim de o lig ar
desordenadam ente a algum a c ria tu ra ... Q u ã o difícil! Q u ã o
im possível será a um c o raç ão m anter-se firme, deixando-se
a rra s ta r p e r to d a a espécie de afectos.
Pelo con trário , o coração que se dirige som ente para
D e u s... que g u a rd a p a ra E le todo o seu am or, nm nndo-O
sobre to d as as c o isas... e am ando todas ns coisas n 'E le e
p o r E le, é um c o ração p e rfe ito ..., é um c o raç ão santo,
o E finalm ente, a sim plicidade de intciiffio pede-te que
dirijas o s teus a cto s som ente p a ra D e u s... que trab alh es e
te fatigues por E le, que é o único fim e objecto digno d a
tu a solicitude... dos teus c u id a d o s..., e de toda a tua acti-
vidade.
O b serv a o m undo e perg u n ta-te: Q u a n ta s alm as p ra ­
ticam esta sim plicidade de p e n sa m e n to s..., iti• n fee to s..., de
in le n ç õ e sl... É p o r isso que tiram tã o pouco Iruto, m esm o
d a s suas boas o b ra s e da d e v o çã o ..., v isto e n tra r n e stas
tam bém a ag ita çã o que é tão c o n trá ria á sim plicidade e
c an d u ra do coração. — O b serv a tam bém o teu e re p ara se
a n d a a g itad o e azafam ad o talvez inutilm ente, por falta de
sim plicidade..., p o r se esquecer de que só um a coisa é
n e c e ssá ria ...: o am or e o serviço de D e u s... p o r quem
únicam ente deves trab a lh a r.
3." O C oração d e M aria. — E tudo isto não é um a
m era teoria, práticam en te difícil o u irre a liz á v e l...; talvez
o dem ónio te convença disso p a ra te d e sa n im a r... V ence esta
ten tação p ondo diante dos olhos o puríssim o e im aculado
C o ra çã o da Santíssim a V irg e m .— N ele tens toda esía teoria
618 0 C oração d a Sa n tíssim a V irgem

re aliz a d a pràticam ente, e de um m odo m ara v ilh o so ... N ele


tens o m odelo, que D eus te concede, não só p a ra que o
adm ires, m as sobretudo p a ra o im itares.
P o rq u e efectivam ente. o C o ra çã o da S antíssim a V irgem
é m uito im itáv el... na ordem perfeitíssim a e n a absoluta
sim plicidade que nele reinou. — C onsidera M a ria com o um
ad m irável com pêndio da ordem m ais harm oniosa, e tã o h a r­
m oniosa que todos os seus p e n sa m e n to s.... d e se jo s..., o lh a ­
re s __ o m ovim ento m ais insignificante do seu c o rp o ... tudo
e sta v a n E la m aravilhosam ente regulado.
Se dissem os que toda a falta e im perfeição é um a d e so r­
dem, é fo ra de d ú v id a que n ã o e x istindo a m enor falta em
seu C o ra çã o , não existiu tam bém a m enor som bra de d e so r­
d e m .— V a i p e rcorrendo todas as faculdades d a Santíssim a
V irgem : en te n d im e n to ..., v o n ta d e ..., m em ó ria.... se n tid o s...,
tudo n 'E la está sujeito à norm a suprem a que regula o
c o raç ão do hom em ... — Com o cum priu o p receituado naquela
frase: «o homem foi c riad o p a ra louvar, re v ere n ciar e se rv ir
a Deus»?
C o m p ara o o lh ar que a n tes lançaste sobre o teu coração,
com esta contem plação do C o ra çã o de M a ria. T a lv e z não
h a ja desordem que. em m aior ou m enor g rau , n ã o viceje no
teu c o ra ç ã o ...; ao de M a ria, pelo contrário, podem os ap licar
aquele rep to de C risto aos seus inim igos: «quem me a rg u irá
de p e c a d o » ? ... Que.m po d erá descobrir algum a desordem no
C o ra ç ã o de M a ria ? ... P o rq u e n ã o A procuram os im itar nisto?
E q u a n to à sim plicidade e unidade, onde será possível
e n co n trar um m odelo sem elhante? ... U nidade de pensam en­
to s.... d e a fec to s..., de inten çõ es... sem pre e em tudo, u n i­
dade e sim plicidade... em tu d o ..., unindo o seu C o ra çã o ac
de Je su s..., e ra essa a su a única in te n ç ão ..., o único fim de
todos os seus actos.
O C o ra ç ã o de Jesus aconselhou S a n ta M a rg a rid a a
unir as su as intenções às de seu divino C oração, v isto que
daí ern diante as m ais p equenas acções passariam a m ere­
O C oração da Santíssim a V irgem 619

cer-lhe torrentes de g ra ç a s... E então, que teria aconselhado


a sua M ã e ? ... E com o cum priria E la este desejo de unificar
a sua v id a ..., as suas in te n ç õ es..., o seu C o ração com o de
seu F ilh o ? ... O ra , dizendo d E le que fez tudo bem, não se
poderá d izer o mesmo da Santíssim a V irgem , precisam ente
por esta u n id a d e ..., p o r esta sim p lic id a d e? — Pede a M a ria
a g ra ça de a im itares n esta unidade, p a ra que todo c teu
coração, d esprezando as criatu ras, co rra a unir-se p o r meio
d ’E la ao S acratíssim o C o ração de Jesus.
70. O Coração da Santíssima Virgem

l.° P enas c sofrim entos. — Já dissem os que o coração


é a sede, o u pelo menos, o sím bolo do a m o r... e por isso
mesmo, sê-lo-ã tam bém d a dor. — O c oração que am a é o
que s o fre :... quanto m ais fiel e seguro for o am or, m aior
se rá a intensidade das suas dores e sofrim entos.
O C o ração de M a ria tinha de ser um C o ra ç ã o bc M ãe.
mas de M â s D o lo ro sa ... e p o r conseguinte, o seu C o ra çã o
a p arece sem pre tresp assad o p o r um a esp ad a cruel e pene­
tr a n t e .— Q u a n to sofreu este am orosíssim o C o ra çã o !... Q uem
o p o d e rá im ag in ar ao m enos?
A n tes da P aixão, conhecendo perfeitam ente tudo o que
os p ro feta s tinham anunciado de seu Filho, p redizendo os
g ran d es padecim entos que teria de s u p o rta r p a ra a salvação
dos hom ens, o seu C o ra çã o a n d a v a continuam ente inundado
de dor. — Já na lapinha de Belém, contem plando a pobreza
e m iséria d a mesma, de m istura com o desconhecim ento e
desprezo que da pa rte dos hom ens acom panhou o nascim ento
de seu F ilh o ..., que dor pro fu n d a sentiria o seu delicado
C o ra çã o de M ã e !... Segue o s m istérios da vida de Jesus,
e v e rás com o a cada um corresponde um a n o v a dor no
C o ra ç ã o da Santissim a V irgem .
A s inquietações da fuga e desterro no E g ip to ..., a perda
do M e n in o ... e antes ainda a A p re se n ta ç ão no T em p lo com
a p rofecia de S im eão..., tudo isto não era o prelúdio terrível
O C oração da Suntissini.i l 'n g e m 621

c penosíssim o das espantosas nnjiii.iti.is «In Paixão? . . . —


Q u a n d o esta se aproxim ou, aquele C ornção converteu-se
num oceano im enso de á g u as am aríssim as... realizou-se p le­
n am ente a p ro fecia de Sim eão, pois uma espada de dor
pen etro u n 'E le com o em nenhum o u tro coração hum ano.
Segue-a. a p e s a r de já o teres feito noiilinn m editações...;
segue-a de p e rto .... en tra no seu C o ra çã o e procura com ­
preender o sofrim ento espantoso de M aria, ao ver Jesus
preso à coluna da flagelação, feito uma tliugn viva à força
de a ç o ite s ...; ao contem plá-lo com o P el de com édia com a
c oroa de espinhos, a can a e a p ú rp u ra em In rrn p o .i...; ao
escu tar os gritos daquele p o v c ...; o povo de I »eu.il... o povo
escolhido que h a v ia séculos e séculos e sp erav a pelo Messias!
A com panha a Santíssim a Virge.m, na xuhhln no C a lv á ­
rio ... Q u e generosidade a s u a ! ... M as tam bém que tlo r l...
E la presen ciará as cenas m ais cruéis e e sp a n to sa s....
as rep etid as quedas sob o peso da c ru z ..., ns horríveis m ar­
teladas p a ra a tra v e s sa r aqueles pés e m ãos..., o levanta
m ento da C ruz, com a imagem d esfigurada pela dor e
sofrim entos de seu F ilh o ...; cm seguida, as trés longas horas
de agonia. — N ã o notaste já m uitas vezes, q u ando n agonia
de um ser querido se p rolonga m uito, com o se chega u
desejar que m orra depressa, pois o c o ração não pode assis­
tir ao espectáculo de um a agonia le n ta ? ... C om o c ita ria o
C o ra çã o de M a ria d u ra n te a agonia dc seu Filho?
Seguidam ente, ao esc u ta r as suas p a la v ra s ..., ao com ­
p reender aquela troca de filhos... deixando o filho divino
pelo filho ing rato e pecador, de quem com eçava a ser M ã e ...;
ao v ê -lO e x p ira r...: ao contem plar cheia de h o rro r a últim a
la n ç a d a ... e ao o b se rv a r como aquele divino C o ra çã o se
abria, rasg an d o -se ao mesmo tem po o seu tam bém pela
violência da d o r ...; finalm ente, quando o estreitou nos b ra ­
ços e o a p erto u pela últim a vez contra o coração, retirando-se
n a tristeza assom brosa daquela noite, p a ra c h o rar a sua
soledade, que inteligência... ou que coração poderá a b arc ar
622 O C o r a ç ã o c ia Sa n tíssim a V irg em

e com preender em toda a extensão o sofrim ento do C o ração


de M a ria ? — D etém -te nesta consideração, pond eran d o a
g ra n d ez a d esta dor.
2." C ausas. —■A prim eira das c au sas que m ais c o n tri­
b u iram p a ra a to rm en ta r o C o ra ç ã o de M a ria foi o seu
a rd en te am or a D e u s... e o im enso desejo que a a b ra sa v a ,
de p ro c u ra r a sua g ló ria ... a qual Lhe d ev ia ser trib u tad a
p o r todos os c o raç õ es... e p o r conseguinte, o h o rro r e sp a n ­
toso que lhe cau sav a todo o pecado, pois v ia nele um
inim igo de D eus e d a s alm as, que além do p rejuízo a estas
causado, p ro c u ra v a tam bém a tin g ir o p róprio D eus, a tacan d o
todas as su as perfeições.
N u n c a chegarem os a com preender bem qu an to isto a to r­
m entaria o C o ração de M aria, porque o nosso a m o r é m uito
diferente do se u ... e p o r isso, um as vezes som os nós o s que
pecam os, ofendendo a M a jesta d e d iv in a...' o u tra s vem os
com certa indiferença os pecados alheios, sem term os a
coragem de o s d e s a g ra v a r... o u se possível for, de trab a lh a r
cem todas as nossas forças, p a ra evitar, ou ao m enos dim i­
nuir esses p e ca d o s..., e finalm ente p o r fa lta de v e rdadeiro
am or de D eus, não nos dedicam os como e ra nosso dever, à
su a g ló ria e serviço, e n ã o lhe dam os o nosso c o raç ão com
generosidade.
N ã o com preendem os a dor e o sofrim ento d o C oração
de M a ria ao ver que nesse m om ento e depois os corações
dos hom ens antepunham as su as paixões e cap rich o s à gló­
ria do p ró p rio D eus.
O u tra cau sa foi o am or que d e d icav a a todos n ó s...
e po rq u e nos am ava com um am or sem elhante ao que tinha
a D e u s..., o ardentíssim o desejo da nossa sa lv aç ão e sa n ti­
fic a ç ã o .— C on sid era o que fizeram alguns sa n to s... podem os
dizer, todos, pela sa lv aç ão dos seus irm ão s... R eco rd a um
S. P au lo , sofrendo e padecendo tan to nas suas v iag en s ap o s­
tólicas e c hegando a de se ja r se r anatem atizado, se necessário
fosse, pela salv ação das alm as... U m S an to A gostinho, que
O C oração da S antíssim a , V irg em 623

escreve sem elhantem ente: Já não quero a m inha salvação, se


nos não sa lv a is... U m X avier a quem p a rec ia n ada o m aior
sofrim ento, con tan to que se salv asse um a a lm a ... E do
m esmo m odo todos os A p ó sto lo s..., todas as alm as sa n ta s ...
P o r isso, qual seria o am or de M a ria, que, m elhor do que
ninguém conhecia o v a lo r de um a a lm a ..., o am or que D eus
lhe tem, e que E la, consequentem ente, lhe devia ter, am an ­
d o-a com um am or som ente inferior ao de D eus, m as m uito
su p e rio r ao de todos os santos e A póstolos.
Sem elhante a esta causa o u dela d eriv ad a, vem a te r­
ceira, que foi o seu conhecim ento d a v id a, p aix ão e m orte
de seu F ilh o ... P a ra q u an tas alm as se ria inútil a R ed en ção !...
Q u ã o poucas se santificariam com c sangue tão generosa-
m ente derram ado pelo C ordeiro D iv in o !... E ve ria como
haviam de p a ssa r os sécu lo s..., com o p a ssa ram já vinte, e
ainda a m aior p a rte do m undo seria p a g ã o ... e até o m undo
católico e cristão v iv eria na quase to talidade p a g a n iz a d o ...
e até as alm as co n sa g ra d a s especialm ente ao serviço de Deus,
haviam de ser m uitas vezes as que m ais feririam o C o ra çã o
de seu F ilh o ... C om o não h a v ia de sofrer com, tudo isto o
C o ra çã o de M a ria ? ... E p a ra isso, diria, derram ou o meu
Jesus todo o seu sa n g u e ... p a ra que continuem a triunfar­
em toda a p a rte o p a g an ism o ... o ódic a D e u s... a indife­
rença e frieza no seu se rv iço ... o egoísm o, a sensualidade
e o am or p ró p rio ? ...
3.° G ravidade. -— E ai tens indicadas tam bém as razões
d a extrem a g ra v id a d e ..., da aspereza infinita, cm certo
modo, dos sofrim entos do C o ração de M a r i a . .. — Sofria
com o M ãe de D eus e com o M ãe dos hom ens... corno C orre-
d en to ra do m u n d o ...; p o r isso a sua d o r não era um a dor
h u m an a ... e nunca poderem os entender ou im aginar sequer
a p rofundidade e extensão desta dor.
Segundo o P ro feta, Jesus devia ser o llomerr, das d o re s...
transform ado num vermi? d e sp re zív e l..., no escárnio dos
ho m en s... Assim tinha de ser o R e d en to r... assim tinha de
624 O C o ra fã o da S antíssim a V irgem

le v a r a cabo a su a o b ra ... L ogo, com o seria a C o rred en -


tora? ... N ã o tinha d e ser necessariam ente a M ã e da d br?
N ã o d ev ia sofrer em seu corpo torm entos físic o s ...; e por
isso todos os sofrim entos se lhe acum ulariam forçosam ente
n o C o ra ç ã o ...
Já dissem os de acordo com os S a n to s P a d re s, que todos
o s padecim entos sofridos p o r Jesus e.tn seu C o rp o S a c ro s­
sa n to sofreu-os E la todos, um p o r um, no seu C o ra çã o
Im aculado.
E ste C o ra çã o tão cruelm ente despedaçado p ela duríssim a
e sp a d a, se rá eternam ente o m odelo das alm as que sofrem ...
e ao m esm o tem po o doce arrim o e o divino bálsam o que as
console e anim e em suas dores.
A p ren d e a o b se rv a r nos teus sofrim entos, este C o ração
d o lo rid o ... Q u a n to nele podes estu d ar e a p re n d e r!... verás
que m uitas vezes foste a causa des seus pad ecim en to s...,
que p ela tua conduta indigna e m iserável c ra v a ste m ilhares
de vezes essa espada n o C o ra çã o d a tu a M ãe. — D eves
n o ta r igualm ente a o b rig aç ão que te cabe de e x p ia r com o
sofrim ento, os teus pecados e o s dos o u tro s... — M a ria nunca
pecou e contudo, e x p io u ... T u p o rtan to que deves fazer? ...
T a lv e z fujas d a d o r... re v o ltan d o -te c o n tra D eus q uande
te castig a ju stam e n te ... N ã o evitas sem pre a C ru z ? ... Enfim ,
v ê com o tens de so fre r.... e se sabes contem plar esse C o ra çã o
trespassado, esse o lh ar su a v iza rá as tuas penas e sofrim en­
tos, pois nesse m om ento com preenderás q u an to é doce
p ad ecer por D eus à im itação e em com panhia do Im aculado
■Coração de M a ria
R oga-lhe m uito fervorosam ente, que não te livre do
sofrim ento, m as que te ensine a e n o b rec er..., a d ivinizar as
tu as penas, com unicando-te os m éritos das su a s...
71. O Coração da Santíssima Virgem

1 Cor a ç ã o de M ã e . — O u tro dos sim bolism os que


acom panh am a im agem do puríssim o C o ra çã o de M aria, è
o fogo ou as cham as que cercam ... E ste C o ra çã o está envol­
vido com pletam ente num a atm osfera ardente e a b rasa d a que
rom pe em lab ared as de um incêndio divino, em que se c o n ­
som e interiorm ente, e que se m anifesta no exterior, como
desejando p re n d er e p ro p a g ar-se a outros co raçõ es...
É evidente que estas cham as e este fogo significam o
am or ardentíssim o, en cerrado no C o ra çã o Im aculado de
M aria.
E antes de m ais n ad a, considera que este am or é um
am or de M ã e ... e com isso fica dito tudo o que acerca do
am o r n a tu ra l de M a ria se pode d iz e r... Q u e coisa .mais adm i­
rá v e l... mais sublim e que o coração de um a m ãe? O n d e
e n co n trar na te rra um am or que m elhor m ereça este n o m e? ...
O n d e um am or que m ais se p areça com o am or de D e u s? ...
Já dissem os que o hom em é o que é pelo seu c o ra ç ã o ...
c que, p o rtan to , o am or re tra ta e resum e todo o hom em ...
D o mesmo m odo podem os tam bém dizer que tudo o que na
terra é am or, está com pendiado no c o ração de uma M ã e ...
e que o coração de mãe é a o b ra-p rim a said a das m ãos do
C riador.
O p róprio D eus, quando quer falar do seu am or aos
ho m en s... e que estes saibam até onde chega o seu a m o r...
626 O Coração da Santíssim a V irgem

com para-se a um a mãe, e d iz-n o s:: «será possível a um a m ãe


esquecer o seu filho»? — O c o ração de m ãe é com o um
ocean o de am or que não tem lim ite s...; por isso não há
n ad a que com ele se p o ssa com parar.
E sta é a razão p o r que, tendo-nos dado a n a tu re za
m uitos am igos... m uitos irm ãos e p aren tes que nos estimem e
nos amem v erdadeiram ente, só nos deu um a m ãe, porque
ninguém nos am ará como e la ... Q u a n ta s m arav ilh as encer­
rou D eus no coração da m ã e ! ... Q u e terá feito com o
C o ra çã o de M aria? ... N ã o é E la M ã e ? ... E quem m ais
m ãe do que a V irgem S a n tíssim a ? ... Se é M ãe de D e u s !...
e M ãe de todos os h o m en s?... com o será en tão o seu
C o ra ç ã o ? ... Q u a n to am or n ’E le haverá? ...
D em ora uns in stantes n esta consideração dulcíssim a
sobre o C o ração da M ãe de D e u s... e da M ãe dos h o m en s...
2.“ C oração da 'M ãe d e D eus. — P arece c au sar um
certo m edo e n tra r nas p rofundidades deste g randioso e
sublim e m istério... M a ria M ãe de D e u s!! H a v e rá coisa m ais
in co m p ree n sív e l!... tan to da p a rte de D eus, querendo ter
um a m ulher p a ra sua M ãe v e rd a d e ira ..., com o da p a rte de
M a ria chegando realm ente a ser M ãe de D eus. — C o n ­
c en tra-te neste pensam ento que encerra m aravilhas infinitas.
S egundo ele, M a ria foi o princípio da vida terre n a de
D eus, que isso quer dizer M ã e ... d a r vida a o u tro s e r ...;
logo M a ria deu a vida hum ana ao Filho de D eus, que p o r
isso com eçou a ser v e rd ad e iro filho seu.
S anto A gostinho ao p e n sa r nisto, ex ta siav a -se na con­
tem plação deste m istério... p ro c u ra n d o com preender como
podia ser esta dulcíssim a realidade de «a carne de C risto
ser a carne de M aria».
E com efeito: a sua c a rn e ..., o seu sa n g u e ... a sua
v id a ... o seu coração foram , n a verdade, a carne e o sangue,
a vida e o coração de D e u s ! ... Um só c o raç ão d ando a
m esm a v id a a D eus e a M a r ia ! ... N ã o é isto o cúm ulo
das m aravilhas e grandezas de M a ria?
O C oração da Santíssim a V irgem 627

O F ilho dc D eus era exclusivam entc seu F ilh o ... sem


in tervenção dc nenhum a o u tra patern id ad e, além d a de
D e u s ...; p o r isso é m ais m ãe que nenhum a o u tra m ã e ...—
D eu s e E la ... ninguém m ais interveio n esta adm irável
m aternidade. — 1M ã e algum a p e d e dizer com m aio r razão
do que E la, a o e streitar o filhinho nos b ra ç o s...: «és m eu
e todo m eu»...
N e sta conform idade, se C risto foi v erd ad e iro H om em ...,
se teve um co rp o susceptível como o nosso, de so fre r e p a d e ­
c e r..., se tev e um c oração hum ano sem elhante a o nosso,
c ap a z de enternecer-se e sentir com o pró p rias, as nossas
p en as e m iséria s..., lem bra-te que foi p o r M aria.
E ain d a podem os acre sc en tar que tudo isto se deve aó
puríssim o C o ra ç ã o de M aria, pois com o n o ta o mesmo
S an to A gostinho, M a ria é M ã e de J esu s... M ã e d e D e u s...
m uito m ais segundo o espirito que seg u n d o a c a rn e... M aria
concebeu p o rta n to a Jesus no seu C o ra ç ã o ...
D a í já podes concluir q uanto sejam, sublim es a s sem e­
lh an ças entre o C o ra çã o M a tern a l de M a ria e o C o ra çã o
d o M enino D eu s! — T ã o grandes e incom preensíveis são
essas sem elhanças que a hum anidade de M aria, parece, a
nossos olhos, d esa p are ce r p a ra se fundir na p ró p ria divin­
d a d e ..., ap ag a n d o -se deste m odo a infinita distância que
se p a ra D eus da sua c ria tu ra ...
3." C oração da M ã e dos. hom ens. — E com este mesmo
am or, verd ad eiram en te divino, nos am a tam bém a V irgem
S a n tíssim a .—- N em podia ser de o u tro m odo... Som os seus
filh o s !... E la é, na realidade a nossa M ã e ? ... C om o não
h á-de ter este C o ração de M ãe p a ra com os ho m en s?...
N u n c a certam ente o C o ração de M a ria esteve sep arad o em
seu am or, do de seu divino F i l h o ! . . . — E le foi p rin cip al­
m ente o objecto do seu am o r... E ra o seu p rim o g é n ito !...
E até em sentido verd ad eiro , era o seu filho ú n ic o !... M as
n ’E le e com E le é tam bém num sentido certo e verdadeiro,
éram os tam bém seus filhos. M a ria consid erav a-n o s com o
628 O C oração da Sa n tíssim a V irgem

d e sg raç a d o s filhos de A dão, que nos conduzira à m orte e à


ru ín a ..., m as que, pela g ra ça e m isericórdia de D eus, tinha-
mos sido regenerados em C risto ... voltan d o à v id a de
C ris to ..., contudo, p o r seu interm édio, e p o r isso, éram os
e serem os sem pre filhos de M a ria ... Q u e M ãe a n o s s a !...
Q u e am or d o seu C o ra çã o m aternal p a ra c o n n o sc o !...
E videntem ente que esse C o ração se a b rasa e consom e
n um a atm osfera de fogo divino, sem elhante à que a b rasa
o C o ra çã o S acratíssim o de Jesus...
E este am or de M ã e m anifestou-o claram eníe ao con­
sen tir n e sta m aternidade que acom panhava a m aternidade
divina, oferecida pelo A njo da A n u n c iaç ão ... ; com o seu
fia t M a ria aceitou se r M ã e de D eus e M ã e n o s s a ...; sabe
que essa é a v o n tad e de D eus e não re p a ra nem faz d istin ­
ção entre um a e o u tra m a te rn id a d e ...; N ã o aceita a p ri­
m eira e re cu sa a segunda. — O seu C o ra çã o am antíssim o
ab raç a-se com as duas: g ra n d io s a ... sublim e a p rim e ira...,
triste, p e n o sa ..., e difícil a se g u n d a ...
C ontem pla aquele C o ra çã o que foi a causa decisiva da
E n c a rn a ç ã o do V e rb o ..., d a sa lv a ç ã o dos h o m en s..., de que
E la fosse a nossa M ã e ... T u d o brotou daquele am antíssim o
e m aternal C oração.
R e p ara bem n o u tra p ro v a ou m anifestação desse am or
m a te rn a l... E stá junto da c ru z ..., ali cum pre o que p rom e­
te u ..., ali se realiza o seu íia t.... pois é ali que pública e
solenem ente é declarad a nossa M ã e ... M a s qu an to isso lhe
c u sto u ? ... Q uem poderá adivinha-lo? ... A quela M ãe tem
ta n to am or aos filhos que não duv id a sofrer e sacrificar-se
p o r eles. — V e n era por conseguinte no C o ra çã o de M a ria
o m aior am or de um a M ãe a seus filhos... porque nesse
C o ra çã o realizou-se p a ra bem deles o sacrifício m ais heróico.
4.° T e u coração filial. — Se tens de c o rresp o n d er ao
plan o d e D e u s... e n ã o queres ser um a n o ta discordante
neste conjunto harm onioso da o b ra m ais divina de D e u s .—
a R edenção e sa lv aç ão das a lm a s ...,—■deves ter um am or
O C o r a ç ã o ( hi S a n t í s s i m a V irg em tó 9

filial p a ra com essa M ãe que D eus te c o n c e d e u ...; serin


um absurdo e um contra-senso exigir a M a ria que no»
am asse com c oração de M ãe em. conform idade com <» plano
de D e u s... e não a am ássem os nós com o am or de llllios • ,
e m uito m aior se ria esse a bsurdo se a causa de n.to lln
dedicarm os esse am or, fosse a falta de gen ero sid ad e... Into i:
se este am or nos pedisse algum, sa c rifício ..., e não llvénue
mos v erg o n h a de lho re c u s a r...; onde enconlm i pnlnvm s
p a ra qualificar este p ro ced im en to ?...
E no entanto, p o r m uito m onstruoso que |n i m .i
su p o sição ... o que e de esp a n ta r é que \ erdmleli iimenli'
assim su c e d a ..., não sendo p o rta n to um a .suposição, ......
um a triste realidade. — O lh a p a ra o teu c o ração e i nse çilluii
confirm ará a v e rd a d e ... Q u a n d o um c oração não ninn n
sua M ac d a te rra considera-se m onstruoso... e du me&mit
m odo n ã o o será tam bém quem não anta a M ãe du t Cu '. .
E x am in a cuidadosam ente o c oração e veilllcn fie o ui......
iro d a in g ratid ão habita n e le ..., se assim pim vdr* nu pi it
tica, em bora com a boca digas o c o n trá rio ..., vã bem sr ele
está disposto a qualquer sacrifício por tiiimi du tint Mãi
o u se tens de c h o ra r m uitas c obardias e lullns d» g i iu i c
sidade neste p o n to ...
Pede-lhe p e rd ã o ..., e tem coragem ... ç u p m riu io l> ili "*"»
c h am as..., desse fogo do C o ração de M .iilo,, , ul> i iq i l '" H .
a b ra sa -te ... a p a g a todo o am or próprio. ,,, IimIii n m irmull
d a d e ..., toda a p a ix ã o que te afasta den.v ........... 1'milo
dizia: S e alguém não am ar a Jesus ( 'i n to , » '/a iiia/iWi*.
N ã o poderem os d izer o mesmo de M nrlu/ I'v ld i'iilcn irn lr
que sim. S e rá am aldiçoado por D eus elenium eiile quem não
am ar a M a ria com am or filial... quem ri num nu ò mulei
nidade dulcíssim a da V irgem M iu in ...
72. O Coração da Santíssima Virgem

1 C orou de flores. — A o contem plar a im agem do


puríssim o C o ração de M a ria não podem os d eix ar de fixar-
-nos na coroa de flores que o circunda e no sim bolism o que
encerra. — R e ssa lta im ediatam ente a grande diferença que
existe entre a coroa do C o ra ç ã o S acratíssim o de Jesus...
tecida inteiram ente de espinhos duros e a g u d íssim o s..., e a
de flores e rosas do C o ra ç ã o de M aria.
E c ontudo não há qualquer diferença. — Já dissem os que
a s palpitações destes dois dulcíssim os C orações eram a
u n ísso n o ...: os sentim entos de um enco n trav am no ou tro
eco p erfeitíssim o ... e p o r isso mesmo os espinhos do C o r a ­
ção de Jesus feriam tam bém o C oração de sua M ã e .—
À única diferença consiste no simbolismo diverso que se
quis exprim ir com essas c o ro a s... a coroa de espinhos signi­
fica a ing ratid ão dos hom ens p a ra com o am or de Jesus...
a c oroa de rosas e flores, a form osura e n ca n ta d o ra das v ir­
tudes de M a ria que têm p o r base precisam ente o seu
C o ração . — M as re p ara que nem a c o rca de espinhos se
d á sem flo res.... nem a de rosas sem espinhos.
T o d a s as alm as san tas que generosam ente quiseram
unir-se ao C o ra çã o de Jesus sem tem erem a d u reza dos seus
espinhos, ficaram surp reen d id as vendo que estes p erderam a
a s p e re z a ...; o am or divino suavizou-os de tai m odo, que
esses espinhos tran sfo rm aram -se em riquíssim as flores de
perfum e delicioso... N ã o o d u v id es... e na dúvida, tira a
p ro v a .... co nsagra-te generosam ente ao am or de Jesus....
O C ota çã o da Santissim .i V i i j/rm 631

p ro c u ra e n tra r no seu divino C o ra ç ã o ..., r apca.ii ,|,i cru ;


e espinhos que o rodeiam , sentirás doçuras que nem cuspei-
ta v a s ... e um a felicidade desconhecida.
É esse o « T eso u ro escondido»... tesouro lnliinli> que
enriquece as alm as e as to rn a felizes..., m m estq rs.o n d id o
d etrás des espinhos e da cruz. — Desgraçadamenle , n| m,is
que se assustam e se acobardam à sua vista ....... .. ch e ­
garão a sa b o re a r o mel preciosíssim o que all «e isio u d e .
É por essa ra zã o que o C o ra çã o de M arta enl,\ rodeado
de flores. — N inguém como E la se abraçou com o« cnpinhos
d o C o ração de seu F ilh o ... e esses espinhos translorm aram se
em flores e ro sa s en ca n ta d o ra s das mais .sublimes virtudes.
—E ntendeste bem o que tudo isto significa pum o piúlU u
m en te?...
A b ra ça -te com os espinhes do am or de Ç rlsln no (eu
c oração im ediatam ente florescerão as flores i|ue mal» ndor
nem a tua alm a.
P o r isso, à v ista do C o ra çã o de M aria em lama A h 1
quantos espinhos interiores escondem essas flores quão
terrív eis aflições lhe custaram no coração todas e i ada uma
dessas flo re s ...; e ao contem plar o C o ração de |esus, dl.’
n tu a alm a: esses espinhos foram enterrados pela lua ludl
feren ça... tibieza e falta de correspondência ao seu am or
Logo esses espinhos deviam ferir-te a ti e não a Ele .
B asta de espinhos p a ra Jesu s.... todos para II e essa
generosidade em a b raç ar-te com eles por seu amor, cobrirá
de flores o teu coração à sem elhança de M aria.
Assim o fizeram todos os santos. I.em bra te, se qiil.se
res, da san tid ad e das rosas e d a s flo res.,., de S anta T e re -
.sinha do M enino Jesu s... Q u a n to se deixou en can tar pelas
flores do C o ra çã o de M a r ia ! ... M as. quem poder.i calcular
o núm ero de espinhos... quer dizer, de sofrim entos, de m o rti­
ficações... que cada rosa exterior re p resen tav a no Interior
do seu c o ra ç ã o ? ... P ede ã V irgem Santíssim a que sejas,
com o esta santinha, m uito am igo das flores e J.is rosas, não
632 O C oração da Santíssim a V irgem

do m undo, que nada v a le m ... ainda que pareçam form osas é


só n a aparência, e n a d a m ais... m as das flores v e rd a d e ira s...,
as únicas que são fo rm o sa s..., as que brotam no c o raç ão
ro d ead as pelos espinhos do sacrifício, o qual sem pre exige
am or.
2." A çu cen a virginal. — E entre todas essas flores que
form am a coroa do C o ra çã o de M aria, um a se destaca ao
centro, elevando-se ainda acim a do C oração. - É um a alvís­
sim a a ç u c e n a ...: é claro o seu sim bolism o. — Se as flores
dessa c oroa significam as virtudes do C o ra çã o de M aria,
que sim bolizará essa açucena que b ro ta com m aior p u jan ça
e louçania. no p róprio centro do C o ra ç ã o ? ... O povo cristão
respondeu a esta p e rg u n ta cham ando o C o ra çã o de M aria
puríssim o e im aculado...', são as p a la v ras com que sem pre
o qualifica. — S ua p ureza im a c u la d a !... É a m ais alta c a ra c ­
terística de M a r ia ...; tam bém devia sê-lo do seu C oração.
F alám os já em v á ria s m editações, d esta p reciosa virtude,
e do am or que M a ria lhe dedicava, m as é im possível m editar
sobre o C o ra çã o de M a ria sem nos determ os de novo nesta
m atéria tão form osa e im portante.
T ã o bela é e sta p u reza im aculada de M a ria que a Igreja
não duv id a aplicar-L he as p a la v ra s com que a S a g ra d a
E sc ritu ra se refere à im aculada pureza da sab ed o ria
d iv in a ...; e assim, referindo-se a M a ria , diz que é «o esplen­
dor d a luz e te rn a ..., a im agem d a bondade de D e u s..., o
espelho sem m ancha da san tid ad e infinita!-.
P odem os conceber de dois m odos esta p ureza do im a­
culado C o ra çã o d a S antissim a V irgem : um a negativa.
e nquanto significa n eg ação de toda a espécie de p e c a d o ...
assim M a ria aparece-nos se b este aspecto, sem a m enor
m an c h a.... sem a mais leve so m b ra ... sem a m ínim a im per­
feição ...
A inda as alm as m ais sa n ta s não puderam fugir a estas
m isérias, filhas d a nossa d e b ilid a d e ...; o facto de terem
esses defeitos, m uitas vezes involuntários, que nascem e
O C oração da Sa n tíssim a V irgem 633

m orrem com o hom em ... em n a d a vem dim inuir-lhes a san ti­


d a d e ..., m as não foi assim o C o ração de M a ria ..., n ã o teve
faltas in v o lu n tá ria s... nem casualm ente caiu algum a vez
sobre aquele C o ra çã o qualquer coisa que o m anchasse, ou
que por um instante sequer, o tornasse d e sa g ra d á v el aos
olhos de D e u s... O S enhor dcfendia-a p a ra que o inimigo
n a d a pudesse c o n tra E la ... Q u e coração tão form oso..., ião
p u ro ..., cândido e im aculado!
E n tra ainda um pouco m ais n a raiz desta pureza encan­
ta d o ra ... c esta raiz é outro m odo de co n ceb è-la..., é a ch a ­
m ada pureza p o sitiva , porque não consiste cm qualquer coisa
n e g a tiv a ..., nem na m era ausência de m an ch as..., m as sim
n a p a rticip a çã o p o sitiv a da m esm a pureza de D eus. —
A ausência de pecado é condição necessária p a ra que D eus
se com praza em um a a lm a ..., porém o sublim e... o m ara ­
vilh o so ... o divino p a ra essa alm a será quando D eus se
lhe e n tre g a r... com unicando-se-lhe... e fazendo-a participante
d a sua p ró p ria vida, p o r meio d a graça.
A graça san tifican te, inundando a alm a c a beleza posi­
tiv a ..., a pu reza v e rd ad e ira que reflccte claram ente a im a­
gem de D eus. — P e n sa pois, em M a ria e na sua p u reza...
com o seria aquele C o ra çã o que D eu s possuiu ile stb o priti-
c ip io ... — C om preende o alcance das p a la v ra s angélicas:
O S e n h o r c convosco. — D eus m ora perm anentem ente no
C o ra çã o de M a ria e é essa a razão porque é puríssim o e
im aculado n e g ativ a e p o sitiv a m en te...: n ã o tem som bras...,
não tem m a n c h a s..., tem em troca a plenitude da graça de
D e u s... tem positivam ente a mesma p u reza de D eu s..., tem
o p ró p rio D eus.
M as há m ais..., m uito m ais...; não im agines esta pureza
unicam ente como um a g raça recebida de D eus, de tal modo
que M a ria se p o rtasse só p a ssiv a m e n te...; não foi um espelho
m uito lim po o u m uito claro, m as m orto, que se lim itasse a
a reflectir os poucos o u m uitos raios que sobre eles incidem.
— M a ria recebia os raios de lu z ..., de g ra ç a ... de santidade,
634 O C oração da S a n tíssim a V irgem

que D eus lhe enviava, aos quais correspondia, em seu C o ra ­


ção puríssim o, com um n o v o acto de am or de D e u s... de
m aneira que este C o ra ç ã o m aravilhosam ente activo, quando
recebia algum a graça, e ra quem ex citav a com seu am or,
sem pre crescente, o C o ra çã o do p róprio D eus.
3.° T u a coroa. — É essa a coroa que deves p ro c u ra r
p a ra o teu c o ra ç ã o ... c oroa de espinhos pelo sacrifício ...
pela m ortificação das tu as paixões, a fasta n d o todo o
p e ca d o ... e assim adq u irirás a p u reza n eg ativ a, a prim eira
rosa que b ro ta rá desses e sp in h o s.— E D eus ao ver-te
assim .... ao contem plar o teu C o ra ç ã o com essa p u re z a __
e p o rtan to com a p re p a ra ç ã o necessária e indispensável p a ra
se d a r e c o m u n ic ar..., d a r-se-á g o stesa e generosam ente ao
teu coração.
C orresp o n d e ao am or de D eus com o teu tra b a lh o ...,
com o teu e sfo rço ..., com a tua cooperação, e nesse
m om ento se rã o inum eráveis a s rosas que b ro ta rã o desses
e sp in h o s.... e as virtu d es que se rad ic arã o cada vez mais
solidam ente no teu c o ra ç ã o ... e assim finalm ente, o teu
c o ração to rn ar-se -á sem elhante ao de Jesus pelos espinhos
do sacrifício do a m o r... e a o de M a ria pelas rosas das suas
virtudes que copiaste na tua alm a...
E tudo isto consegui-lo-ás pela pureza m g a tiv a , com a
qual à im itação de M aria, afasta ste o pecad o p a ra longe
do c o ra ç ã o ...; pela p u reza p o sitiv a cum ulando-o da g raça da
v id a de D e u s ...; e p e la p u reza activa, com a qual o teu
c o raç ão corresponde fielm ente a essa mesma graça. — E x a -
m ina-te sobre estas espécies de p ureza diante da Santíssim a
V irg e m ...; vê qual delas faz m ais falta em teu c o ra ç ã o ...
diz a tua M ãe querida com a m aior insistência que, se em
todas as virtudes queres p a rec er-te com E la, m ais especial­
m ente a desejas im itar n a p u reza im a c u la d a..., diz-lhe tam ­
bém que queres um a coroa de rosas de virtudes com o a
d e la .... m as que apeteces sobretudo a flor da açucena que
se ergue no centro do seu puríssim o e im aculado C oração.
73. O Coração da Santíssima Virgem

1.® A M isericórdia. — É o mais doce atributo de


D e u s.... o que m ais a tra i o nosso coração infundindo-lhe
alento e confiança. — Se D eus fosse unicam ente um juiz
se v e ro que n e s julgasse só com ju stiç a ... quem não trem eria
n a presença deste S e n h o r? ... M as sendo antes de mais nada
e sobretudo um P a i... am antíssim o..., bondosíssim o..., cheio
de com paixão e m isericó rd ia.... quem co nfiará nele?
Pois bem, um a das m aiores p ro v a s d esta v e rd a d e ....
tem o-la no C o ra ç ã o m isericordiosíssim o da Santíssim a V ir­
gem .... que é um efeito da bondade c do am or de D eus para
com os hom ens...
T o d o s o experim entám os já ... de tal m odo que um dos
aspectos sob c qual m ais nos ap raz ver representados os
C orações S acratíssim os de Jesus e de M aria, é a m iseri­
c ó rd ia ... Precisam os tan to d e la ! ... D ificilm ente se encontrará
q u alquer coisa que m elhor e n ten d am o s... e apreciem os do
que esta qualidade da m isericórdia... Um c o ração com passivo
que sente com o pró p rias as necessidades e m isérias a lh e ias...,
um c oração m isericordioso que c hora com os que ch o ram ...
e sofre com os que so frem __ a quem não encanta e seduz? ...
H a v e rá algum a coisa mais a tra e n te ? ... Q uem resiste a esse
coração? ...
E se além dc sen tir as d esg raças alheias como p ró p ria s ...,
se esforça por rem ediá-las... talvez com sacrifícios e p riv a-
636 O C orai ü o da S a n tíssim a V irye m

ç õ es... m uito m ais a in d a ... Isto é que é bondade c m iseri­


c ó rd ia ... P ois foi assim o C o ra çã o de M aria, e num grau
de intensidade verd ad eiram en te m aravilhosa.
P ossuia todas as cara cte rística s da m ais sublime e p e r­
feita m ise ric ó rd ia ...; foi o m ais com passivo de todos os c o ra ­
ç õ e s ...; nele e n co n trav a eco perfeitíssim o qualquer desg raça
ou trib u lação que sucedesse à sua v o lta ... N a s bodas dc
C a n á pode av aliar-se cabalm ente o que era este C o ra ç ã o ...
A inda não sofriam os corações dos esposos... e já E la estava
so fre n d o ...; ad ianta-se à dor deles p a ra a re m e d ia r... — O s
esposos n ã o tinham ainda n o tad o o que se p assa v a, e já o
C o ra çã o de M a ria e stav a rem ediando tudo, conseguindo um
m ilagre de seu Filho que eles nem sequer lhe tinham p e d id o ...
Q u e exem plo m aravilhoso de bondade 1... C om o denota
adm iravelm ente a com paixão e m isericórdia do seu C o ra ­
ç ã o ! ... Q u a n ta s vezes terá feito connosco a m esm a c o is a !...
E m q u an to s casos terá in tervindo em nosso fa v o r a V irgem
Santíssim a, conseguindo-nos de Jesus qualquer coisa que
n e s fazia fa lta ..., qualquer coisa que nos ficaria bem, e que
nós p ró p rio s não pensávam os cm p e d ir... por ig n o ra r o
p e rig o ..., p o r tibieza... ou p o r m alicia do nosso c o ra ç ã o !...
2.“ íM isericórdia dc M ãe. — É que a M isericórdia de
M a ria, com o o C o ra çã o de onde b ro tav a , era de um a M ã e ...;
eis a razão principal desta bondade e m isericórdia. — Pode
o filho ser um d e sg ra ç a d o ..., pode e star coberto de m isérias
físicas e m o rais..., pode ser o desprezo de to d o s ...; ainda
que aos outros inspire a m aior re p u lsa..., a sc o ... e re p u g n â n ­
c ia ..., o coração da m ãe ... sen tirá o seio p a lp itar com novo
c arin h o ... com am or .mais intenso à m edida que n o ta r no
filho m ais d esgraças e m isérias...
O C o ração de M ãe nunca d e sa n im a..., nem se c a n sa ...,
espera sem p re... confia sem pre em po d er rem ediar a situação
do filho. — N ã o se eng an a nem se c e g a ..., tem um a lu z...,
um a intuição e clarividência de coração, que vê mai.s além
do que os o u tro s ...; onde já se não esperam senão m ales e
O Coração dg Santíssim a V irgem 637

m isérias irrem ediáveis, o coração da mãe vê traços ou


in d íc io s..., v ê gérm ens de vida que podem ainda le v a n ta r e
dignificar o c o raç ão do fillio d e sg ra ç a d o ... P ela força da
sua te rn u ra ... p e la bondade do seu c o ra ç ã o ... será possível
a um a m ãe re an im a r sentim entos que pareciam a p a g a d o s...
le v a n ta r um c o ração que todos julgavam m o rto ..., ressuscitar
um a consciência endurecida pelo pecado c pelas paixões.
— S o b re isto co n su lta S a n to A g o stin h o ... pede lhe que te
diga o que pode o c o raç ão co m p assiv o ..., m isericordioso de
um a M ã e ...
E a g o ra en tra no C o ra ç ã o de M aria, mais M ãe que
nenhum a o u tra m ãe__ com um a bondade e um a m isericórdia,
resum o ou síntese de tudo o que I >cus espalhou sobre
todas as o u tra s m ães da te rra ... C om o seria e com o serã
actualm ente o seu C o ra ç ã o ? ...
P o r ou tro lado, esta com paixão não é InutU, com o aco n ­
tece frequentem ente com um a mãe que desejn, mas não sabe
ou não pode v a le r ao filho.
M a ria possui a O m nipotência do p róprio D e u s... c
em prega-a total e generosainente p a ra socorrer os seus
filh o s .—‘ N ã o foi assim que procedeu uns bodas de C.uuí.
fazendo que Jesus fizesse o prim eiro m ilagre? N ao foi assim
que procedeu com os A póstolos naq u eles di.is de tristeza e
desolação? ... E squecendo-se até de si mesma, foi a sua
única esperança, a sua força e a sua c o n so laç ão ... e os
A póstolos, anim ados com esta grande tern u ra de mãe. a g ru ­
param -se em torno d ’E la.
E entre todos n ã o foi S. P edro o que m elhor e x p e ri­
m entou a m isericórdia do seu C o ra çã o dulcíssim o ?... Sem
dúv id a que o S an to foi ter com E la, quando, cheio de dor
p ela sua tríplice negação, a b andonou a casa do Sum o S a c er­
d o t e .— A os pes de M a ria derram ou as prim eiras lág rim as...,
aii fez a prim eira confissão d a sua cobarde a p o sta sia ...
Q u e sorte a de S. P e d ro cm en co n trar o C o ra çã o da S a n ­
tíssim a V irg e m !... Q u e teria sido daquela alm a sem este
638 O Coraj-áo da Santíssim a V irgem

C oração? ... talvez um Ju d a s... podia ser, pois tinha tantos


m otivos com o E le, ou m ais, p a ra se d e se sp era r...
C o n tu d o aos pés de M a ria ... d iante do seu C o ra çã o não
é p ossível d e se sp era r... nem sequer d e sa n im ar... Pedro
levantou-se dos seus pés, seguro do p e rd ã o ... e por isso não
só n ã o desesperou, como Ju d a s..., nem fugiu como A d ão ao
p e c a r ...; ali ficou... esp eran d o a ressurreição de Jesus com
o c o raç ão a tra n sb o rd a r de confiança dulcíssim a que tinha
recebido de M a ria Santíssim a. — Q u e m isericórdia de M ã e !...
3." A M ã e do C éu, — E o m ais adm irável é que esta
m isericórdia m aternal de M a ria não term inou com a m orte,
com o sucede cc.m a d a s m ães te rre n a s ...; a g o ra que está no
C éu, o seu C o ração é o m esmo. — A p e sa r d a elevação do
seu trono, tão p erto de D e u s..., ap esar de já não h a v e r no
C éu lágrim as nem sofrim entos de qualquer esp écie..., E la
não esquece os seus filhos m ise rá v e is...; se algum a m udança
so freu no Céu o C o ra çã o de M a ria, foi p a ra ser ain d a m ais
c o m p a ssiv a ... m ais clem ente e m isericordiosa... p a ra se a p ro ­
v e ita r m elhor d a sua condição de Im peratriz em fa v o r dos
d esg raçad o s filhos de E v a .
N o Céu, a sua m isericórdia é a ctiv íssim a..., trab a lh a n d o
sem c essar pelas a lm a s..., um as vezes pedindo e intercedendo
p o r n ó s... e o u tras, derram an d o com as suas m ãos piedosas,
to rren tes de graças sobre os nossos c o raç õ es... — O s mais
in felizes..., os m ais d e sg ra ç a d o s..., os m aiores p e ca d o res...
constituem o objecto p rincipal d a sua bondosa in te rce ssão ...;
lá do C éu contem pla os ataq u es furiosos com que o dem ónio
investe as alm as, p a ra lhes in sp irar a le n to ... e com unicar
a g ra ça p a ra v e n ce r... e no últim o ataque so b re tu d o ..., na
b a ta lh a final, acode solícito o seu C o ração m isericordioso a
fim de que as alm as dos seus devotos saiam desta vida
triu n fa n te s... Q u a n ta s vezes terão sido os anjos do céu
m ensageiros de p a z ..., de c o n so laç ão ... de esperança, en v ia­
dos p o r M a ria aos que A invocam na lu ta!
P e rg u n ta ao teu S an to A n jo da G u ard a, de onde te vêm
O C oração da Santíssim a V irgem d 19

tan ta s in sp iraç õ es..., tantos toques de c o ra ç ã o ... tantos


im pulsos, e confessar-tc-á que é a sua S enhora e R ain h a
quem o m anda continuam ente e sem descanso e não o
deixa d escan sar incitando-o a tra b a lh a r cada vez mais com
a tu a a lm a ... com o teu coração.
4." C onfiança e am or. —• D epois disto, deves a b ra sa r o
teu coração num am or louco e intenso a M a ria ...; deves
lan çar-te em seu C o ração M a tern a l com um a confiança ilim i­
ta d a ... N ü o v o s digo estas coisas, escrevia S. João falando
d a bondade de D eus, para que pequeis m ais facilm en te...
N ão , de m odo nenhum pode ser essa a conclusão a tira r
das m editações sobre o Im aculado C o ra çã o de M a ria ... e
d esta partieularm ente, sobre a bondade e m isericórdia do
seu C o ra ç ã o ...; não deve se rv ir p a ra abusares da sua b o n ­
d a d e ... p a ra te en treg ares ao pecado com m aior se g u ran ç a ...,
ou p a ra soltares a rédea às p a ix õ e s... isso não teria nom e...
o teu coração seria m onstruoso.
M as tam bém n ã o consintas que o dem ónio te engane
com o d e sa le n to ..., com a d e sco n fian ça... com. o te m o r...;
se ja qual for o teu procedim ento p a ssa d o ..., por .maior que
tenha sido o abuso das graças de D e u s..., por m uitas vezes
que tenhas recaído e faltado à p a la v ra ... não im porta, a jo e ­
lh a-te aos pés de M a ria ... D ian te do seu C o ração b o n d o ­
síssim o não devem ter lu g ar desconfianças nem tem ores...
F oi p o r isso precisam ente, que Deus: lhe deu um C o ra ç ã o
tão b o m !... N ã o disse E le que não dese ja v a a m orte do
p e c a d o r? ... P o is o C o ração de M a ria vem d em o n strar que
essas p a la v ra s são um a re alid a d e ...
Já n o u tras m editações tiraste com o fruto o am or e a
confiança em M aria, m as em nenhum a deves insistir tanto
como nesta, em tão dulcíssim o fru to ... C onfiança na bon­
dade de M a r i a ! ... U m am or louco ao seu bondosíssim o
C o ra ç ã o ... que ninguém te separe desta esperança dulcíssim a!
O h C lem entíssim a..., oh P ied o síssim a..., oh D ulcíssim a V ir­
gem M a ria !!!
74. A Omnipotência suplicante

1.® S e u s Ian d a m en to s. — M ais de um a vez nos terá


a flo ra d o aos lábios e a o c o raç ão este título d a Santíssim a
V irg e m . . . — A O m nipotência suplicante! . . . — o qual deve
se rv ir p a ra fortificar m ais e m ais a nossa confiança na
V irgem Santíssim a.
P o is sendo, como é, um a R ainha verd ad eiram en te so b e ­
ra n a e poderosa, dispõe de tu d o ... e exclusivam ente em
fa v o r de seus filhos.
M a ria é O m n ip o te n te..., não com um a om nipotência
n a tu ra l ou essencial, com o é a de D e u s... m as com unicada
e p a rtic ip a d a p o r E le ... om nipotente, não por n a tu re za , m as
p o r g ra ç a ... — E isto p o r que ra z ã o ? ... P e la sua dignidade.
— M aria foi elevada à m ais a lta d ig n id a d e ... e se o poder
e stá em relação com a d ig n id a d e ..., corresponde a M a ria
um altíssim o p o d e r...
P o rta n to a ra zã o decisiva da O m nipotência de M a ria
é a su a dignidade.
E m que consiste essa d ig n id a d e ? ... Sim plesm ente em ser
M ã e de D e u s... C o ntem plando Jesus, M a ria p o d e repetir
eternam ente as p a la v ra s de D eus P a i: « T u és o m eu F ilh o ...
p o r mim g e ra d o » ... e p o r isso M a ria terá eternam ente um
direito e um am or de M ã e p a ra com o p ró p rio F ilho de
D e u s ...; ficando assim o p o d e r de D eus com o que encadeado
e sujeito à v o n tad e de M a ria ... — N ã o o esteve assim ta m ­
bém p o r espaço de trin ta anos na casa de N azaré?
A O m nipotência suplicante b-41

E porque esta subm issão total e perfeita de Jesus... isto


é, de D eus a M a ria ? ... P o rq u e sendo a M ãe de D e u s... os
seus direitos e o seu puríssim o am or de M ãe, ob rig av am -n o
a obedecer-lhe em tudo o que E la m an d a sse... Q u e p e n sa ­
m ento tão d o c e !... T o d o o po d er de D eus está nas m ãos de
sua M ã e ... que tam bém é tua M ã e !...
P ensando nisto disseram os P a d re s da Igreja coisas
adm iráveis d a Santíssim a V irgem e da su a O m n ip o tê n c ia ...
M ed ita as expressões seguintes: Ô V irg em , exclam a S an to
A gostinho, tudo o que D e u s p o d e peta v o n ta d e . .. p odei lo
P ó s pela o ra çã o ... E S an to A ntonino diz: A oração da M ã e
de D e u s tem carácter de m a n d a to ...; ê inqyossivcl portanto
q u e d eixe de ser ouvida.
S. P e d ro D am ião escreve: A p ro x im a -te , ó V ir g e m , do
altar d e ouro d o perdão, não para p e d ir ..., ruas para m andar
com o R a in h a .. pois se encontram nas tuas m ãos to d o s os
tesouros da m isericórdia d iv in a ... — S. B o a v en tu ra n ã o teme
afirm ar: N in g u ém entra no C é u ... q u e não seja por inter­
m édio de M a ria ...
O g ra n d e S. B ernardo, d a r-n o s-á este conselho: A c u d i
a M a ria ..., eu vo-lo d ig o sem titu b e a r...; E la , em razão da
sua dignidade, será sem pre o u v id a ...; o anjo d isSt-lhe que
tin h a encontrado graça, e com efeito M a ria encontra sem pre
9 raça...
E finalm ente são conhecidas estas expressões de S. Ber-
n ard in o de S ena: T o d o o m undo obedece à vontade de
M a ria ... m esm o o próprio D eu s!... basta M aria querer e
tudo se fa rá ... C om o c sublim e a obediência cie D eus n uma
su a c ria tu r a ! ... N ã o m enos sublime e adm irável, porém , e a
dignidade desta, ao ser colocada em lai altura, que pode
d isp o r e d a r ord en s ao próprio I V iu.
E is a razão principal desta ( Im ulpolém la o direito e o
am or de M ãe. —A m ãe tem o d ireito de dnr ordens ao
filh o ... e este, por Isso mesmo, a obrlgm .áo de obedecer lhe
em tudo. — A infle num éiilraiiliadaiiiente o seu filho... e este,
642 A O m nipotência suplicante

se é bom filho, não pode d eix ar de am ar, e p o rta n to de d a r


g o sto sem pre e em tudo a sua mãe. — A plica esta reg ra a
M a ria e a seu D ivino F ilho, e ficarás a co m preender algum a
coisa so b re a O m nipotência de M a ria ...
2.° S u a universalidade. —- E esta O m nipotência goza de
um a u n iversalidade ilim ita d a ...: não se aplica som ente em
determ in ad a é p o c a .... a um a classe escolhida de a lm a s....
num a ordem concreta de g ra ça s e auxílios, p a ra c erta espécie
de súplicas e petições.
N ão , n a d a d isso ..., esta u n iversalidade é in fin ita ..., não
reconhece lim itação de espécie a lg u m a ..., som os todos filhos
de M a ria ..., p o r isso a ju d a rá a todos, porque a todos am ará
sem excepção p o ssiv el... a todos, e em tudo, esp iritu al e
te m p o ra lm c n te ...; n ada a im pede de nos s o c o rre r...; as suas
m ãos não se cansam de fazer bem ..., as su a s g ra ça s não
perdem com os séculos a e fic ác ia...
Se a o u tro s to rn o u sa n to s..., se deu a v id a a m uitas
alm as ressu scitan d o -as p a ra a g ra ç a ... se o u v e s d izer a
o utros que foram auxiliados p o r M a ria nisto ou n a q u ilo ...
o mesmo pode tam bém suceder c o n tig o ..., a tua alm a pode
tam bém alcan çar o p e rd ã o ..., a g ra ç a ... a v id a ..., a san tid ad e.
A pós o prim eiro pecad o o dem ónio a poderou-se do
m u n d o ... p ro c u ra n d o fix a r nele o seu trono, com c ará cte r
u n iv e rs a l...; daí em diante apodera-se das alm as de todos os
que n a sc em ..., a todas quer te n ta r..., excitando-lhes as p a i­
xões, p a ra as su b ju g a r... C om o é espantoso este im pério do
dem ónio? ... C om o é u n iv e rs a l!... Q uem não o experim entou
a in d a ? ... Só a V irgem M a ria não foi escra v iza d a pelo
dem ónio n a sua puríssim a e im aculada C onceição, e p o r
isso o su b ju g a ... o p re n d e ... o dom ina e o segue p o r toda
a p arte, a fim de o v en cer e d om inar se m p re... Se o dom ínio
do dem ónio é universal, sê-lo-á tam bém a O m nipotência de
M a ria p a ra que a sua v itó ria seja eterna e total.
M a ria n ã o triunfa som ente p o r si... m as p o r todos e
p a ra todos. — N inguém reco rre a E la e confia nT21a, que
A O m nipotência suplicante 643

n ã o triunfe com E la ...; todos os sa n to s..., todos o s que


venceram o dem ó n io ..., todos os que co n se rv a ra m a sua
inocência, foi p o r E la ... de ou tro m odo os seus esforços
teriam sido inúteis.
É p o r isso que vário s S antos D o u to res aplicam à S a n ­
tíssim a V irgem aquelas p a la v ra s do Salm ista; E m v ã o tra b a ­
lham os que levantam casa, sc D eu s a não edifica . ..; e m vão
guardam e vigiam a cidade, se o S e n h o r a não guarda e
d e fe n d e ... E quem é esta sentinela c defensora d a casa de
D eus, senão M a ria ? ... O S enhor g u a rd a a cidade, m as p o r
meio de M a ria ... e está tranquilo pois sa b e a quem a con­
fiou... Q u e p o d e rá tem er quem estiv er sob o seu m anto
p ro te c to r? ...
T u bem o sabes, pois com certeza já o ex p erim en taste...
N ã o é tam bém a tu a alm a, um a testem unha d a realidade
daq u elas p a la v ra s do c-Memorare» que «ninguém a E la
recorreu, que não fosse atendido»? ... Q u e bem o sabe S a ta ­
n á s ! ... Q u a n ta s vezes teve de confessar com ra iv a infernal,
que n a d a p odia c o n tra os v erd ad eiro s devoto.s de M a r ia ! ...
D este m odo reconheceu a piedade de todos os séculos
a u n iversalidade d a sua O m nipotência, invocando A com o
« P o rta do P a ra is o » ..., « E sc ad a do C é u » ..., «R efúgio dos
p e ca d o res» ..., « T ro n o do Rei E te rn o .... «P ropiciatório»,
onde todos som os ouvidos e ate n d id o s...
R epete com todo o carinho, dem orando-te cm cada um a
destas exposições, que de um ou ou tro m odo confirm am esta
c onsoladora universalid ad e do seu p oder; M a ria é a espe­
ra n ça dos p e c a d o re s..., o cam inho da v id a ..., o po rto da
sa lv a ç ã o ..., a fonte d a g ra ç a ..., a estrela do m a r..., a sa lv a ­
ção d o m u n d o ..., a M edianeira entre D eus e os hom ens...,
a chave do C é u ..., a esp eran ça dos p e c a d o re s..., a confiança
dos c aíd o s..., a força dos ju sto s..., a alegria dos a n jo s..., a
R ain h a dos sécu lo s..., etc.
In v en ta tam bém p a la v ras sem elhantes... Pede ao cora-
644 A O m nipotência suplicante

ção que tas inspire, e n ã o tem as p e rd er o tem po repetindo-as


a tua M ãe, com o em am orosa lad ain h a. ■
- .. D e m o s graças a D eu s. — N este ponto, p a rec e não
term os o u tra coisa a fazer, senão lev a n tar o c o raç ão a
D eus e render-lhe g ra ç a s ... D iariam ente, n a M issa, o
S acerd o te, convidando todo o p o v o a a co m p an h á -lo ... dá
g ra ç a s a D eus em voz a lta ... pelos m uitos e inum eráveis
benefícios que de su a m ão recebem os c o n tin u am en te...
E então, que o u tra coisa podem os fazer d ian te d este b en e­
fício u n iv e rsa l..., diante d esta fonte de infinitos benefícios,
que nos concedeu ao d ar-n o s assim a sua M ã e q u e rid a ? ...
Sem d uvida, que havem os de a g rad e ce r a D eus, etem am ente
este b e n e fíc io ...; e p o r isso agradeçam os-lho já desde este
m om en to ...
E esta acção de g raças não pode nem deve consistir
èrn m eras p a la v ra s de lo u v o r e a g rad e cim en to ... O que
D éus quer acim a de tudo, é a correspondência p rá tic a de
to d as as nossas o b ras aos seus b e n e fíc io s...; é este o m elhor
lo u v o r... é este o m ais form oso hino de g ra tid ã o ...
P dis bem, a co rrespondência neste caso, d eve consistir
n o fortalecim ento d a tu a confiança n a V irg em Santíssim a,
com o se dizia na m editação anterior, p a ra nunca adm itir
cansaçoS ... d e sa le n to s... c obardes desilusões no cam inho da
v id a e sp iritu a l...
Insiste m uito neste p o n to po rq u e o dem ónio tam bém
insiste n esta te n ta ç ã o ... A q u a n ta s alm as enganou, conse­
g u in d o in tro d u zir nelas o d e sa le n to ... e p o r v ezes a té o
d e se sp e ro !—'N u n c a ... isso n u n c a ... Jura-o aos pés de
M a ria ... que D eus te concedeu p o r M ãe, p a ra que reco rras
a E la com o filho, em bora m uito in g ra to ... e com d ireito filial
lhe p eças e exijas um am or de M ã e ... um a com paixão de
M ã e ... e tam bém um a O m nipotência d a R a in h a ... P á r a isso
a fez M ã e e R a in h a ...
O trono de D eus está rodeado de justiça e b o n d a d e...
o de M a ria , de m isericórdia e bondade som ente... Se te
A O m nipotência suplicante 645

assusta, e com razão, a justiça do D e u s... que susto pedes


e n co n trar ante o trono de M a ria ? ...
P o r ou tro lado é E la que assim i> d e s e ja ...; n ã o se a b o r­
rece p o r A im plorarm os com c o n fia n ça ..., o que A ofende,
pelo contrário, assim corno a Jesus, c a desconfiança. N ã o
ouviste já dizer que h á no C éu m aior festa p o r um p e ca d o r
que se arrep en d e do que p o r cem justos que p e rsev e ra m ? ...
R ois é M a r ia a prim eira que se alegra, e faz grande festa,
porque aquele seu filho p ródigo a n d a v a tresm alhado e
en co n tro u -o ... e sta v a m o rto ... e re ssu scito u ... 1' 1
<•!. S eja pois este o teu lem a e a tua divisa « m n r.t descon­
fiar.-.. nunca desa n im a r... nem d e sa le n tu rd c * ... A inda que
julgues que n ã o a d ia n tas n a d a nem consegues nada..', tem
m uita confiança n a V irgem Santíssim a e ... para a f r e n te ! ..;
a tra b a lh a r cada vez mais.
u i. i

e u <;)
75. A santidade

l.° A vontade de D eus. — C hegám os ao fim destas


m editaçõ es... e este n ã o pode ser ou tro senão anim ar-nos a
tra b a lh a r pela nossa sa n tific a ç ã o ..., aum entar d ia a d ia a
sa n tid a d e d a nossa a lm a ... E sta é a v ontade d e D eu s. diz
S. P a u lo , q u e v o s santifiqueis. — E sta foi a sua d iv in a v o n ­
tad e em M a ria Santíssim a e é-o tam bém em todos n ó s...
N ã o po díam os escolher m elhor coroa e resum o de todas
estas m editações que o tem a d a santidade.
T o d a s as virtudes de M a ria form am a c oroa gloriosa da
su a sa n tid ad e. — C ontem plám o-la como m odelo p e rfe itís­
sim o ..., com o m estra incom parável em todas e cad a um a
d a s v irtu d e s... P a ra term inar, vejam os tam bém como
m odelo e m estra d a sa n tid a d e ... Q u e tem a tão doce e for­
m oso e tam bém difícil, o da san tid ad e de M a r ia ! ...
P a ra fa la r sobre isto. é necessário conhecer essa s a n ti­
d a d e ... com p reen d ê-la..., o que só D eus pede fazer. — N ão
o b stan te, é necessário m editar m uito sobre esta m atéria p a ra
conhecer ao m enos q u alquer coisa do que encerra a alm a
santíssim a de M a ria ... e p ara. procurarm os im itá-la e
segui-la o m ais de p e rto p o ssív e l... Porque, repitam os p a ra
n u n c a o esquecerm os, é esta a v o n tad e de D e u s... «que
tem os de nos santificar», que a san tid ad e é um d e ve r que
tem os de cum prir, e não um conselho.
T o d o s querem os sa lv a r-n o s... m as querem os santificar-
n o s ? ... E pensando bem, po d erão se p arar-se estas duas
c o i s a s ? . .. —-S a lv a r-se -á som ente quem a sse g u ra r em sua
alm a a vida da g ra ç a ... m as se isso é a sa n tid a d e ... a g raça
é a s a n tid a d e ...; esta tem naturalm ente diversos graus, con-
A santidade 6-17

form e a g ra ça for m aior o u m en o r..., m as sem a g ra ça não


se en tra no c é u ..., sem a santidade, que podem os cham ar
elem entar, ninguém se sa lv a ...
P o r conseguinte repete e m edita nisto «Só se salv a
quem é s a n t o » ...— T ra b a lh a r p o rtan to p a ra conseguir a
salvação, é tra b a lh a r pela tua santificação. — Insiste neste
pensam ento, porque na vida espiritual é conveniente d istin ­
gu ir entre sa lv ar-se e sa n tific ar-se ... e p o r isso h á m uitas
pessoas que aspiram à prim eira, julg an d o que a segunda é
som ente p a ra algum as alm as selectns e p rivilegiadas. — E rro
funesto claram ente o p o sto à v o n tad e de D eus, que n ã o faz
d istin ção de pessoas, cham ando-as todas à sa n tid a d e ... e
im pondo a todas essa obrigação.
A sa n tid a d e supõe a g raça de D e u s..., é a obra prim a
de D e u s..., a m ais d iv in a das suas obras, com o já o dissem os
com os S antos P ad res d a Ig re ja ...
M a s é tam bém a o b ra -p rim a do h o m em ...; nada c pode
to rn ar m aio r... nem mais d ig n o ... do que tra b a lh a r nesta
g ra n d io sa o b ra da san tid ad e. — Se víssem os um a alm a em
estado de g ra ç a ..., em estado de sa n tid a d e .... veriam os nela
o p róprio D e u s..., v isto que c seu e n can to e beleza é a for-
m osura de D e u s... e qu an to m aior for a san tid ad e d a a lm a ...
tan to m aior e m ais íntim o será esse con tacto com D e u s...
essa p a rticip a çã o d a s perfeições d iv in a s...
2." A vo n ta d e d e D e u s cm M aria. — E sta foi a v o n ­
tad e de D eus naquela que devia se r a sua M ã e ... que E la
fosse o resum o, o m odelo e a fonte de toda a san tid ad e. —
N o mesmo instante da sua conceição m iraculosa, ficou M aria
inundada de g ra ça sa n tific an te... e, consciente dos seus
a c to s... n a plena posse e com o pleno conhecim ento de Si
mesma, en treg a-se a D eus logo nesse m om ento com todo o
ím peto do seu C oração.
C ontem pla este espectáculo m aravilhoso e d iv in o ...;
nunca se h av ia d a d o ... nem v o ltaria a da r-se coisa sem e­
lh a n te ... D eus, in undando a alm a de M a ria com a torrente
6 4 8 A. santidade

do seu am or e da sua v id a ..., e M aria, servindo-se dc toda


a g ra ça que recebe, sem desp erd içar a m enor parcela, p a ra
dirigir a D eus o seu am or reconhecido.
Q u e r dizer, em M a ria a reacção igualou a acção...
C om preendes isto ? ... R ecebeu m u ito ! ... m as deu outro
ta n to ... A prim eira acção de D eus sobre a alm a de M aria,
foi verd ad eiram en te am orosa, e p o r isso, encheu toda a
capacidade da sua alm a com a g ra ça sa n tific a n te ... e de
r/iodo sem elhante, à acção divina infinitam ente am o ro sa...
c orresp onde na alm a de M a ria um a reacção tam bém infini­
tam ente am orosa, se assim o podem os dizer, p a ra sem limi­
taç ão algum a se d a r a D eus, e am á-lo com todas as suas
fo rça s...
E esta g raça sa n tiíic a d o ra ... esta prim eira acção de
D eus, aum enta sem cessar e desenvolve-se prodigiosam ente
na alm a im aculada de M a ria ... ao que E la corresponde
sem pre de form a a d e q u a d a ... aum entando sem pre n a sua
re acção p a ra com D e u s..., crescendo inefàvelm ente no seu
am or p a ra com E le ... e p o r isso tam bém n a sa n tid a d e ...
O n d e chegou pois, a su a sa n tid a d e? !...
Já dissem os que só D eus pode conhecer a resp o sta a esta
p e rg u n ta ..., porque só D eus sabe onde chegou a sua acção,
e a re sp ectiv a reacção ou co rrespondência da p a rte de M aria.
A v a n ça um bocadinho m ais n este pensam ento e distingue
duas espécies de sa n tid a d e ...: a santidade real e a santidade
m oral... A prim eira, é a san tid ad e das coisas especialm ente
co n sa g ra d a s ao serviço de D e u s...: a san tid ad e de um tem plo
o n d e D eus h a b ita ... a san tid ad e dos objectos que se em pre­
gam directam ente no seu c u lto ...; e no hom em pode consi­
d e rar-se com o sa n tid a d e real a de um m enino recém -bapti-
zado, em cu ja alm a h a b ita a g r a ç a ...; e a sa n tid a d e moral,
a sa n tid a d e dos actos que correspondem à g ra ça de D eus,
pela qual um a alm a se en tre g a livre, total e v oluntariam ente
ao am or divino.
M a ria é santíssim a com santidade real e com santidade
A santidade 649

m oral. — C om san tid ad e real, pois a su a alm a foi concebida


cm estreitíssim a un ião com a Santíssim a T rin d a d e. — D iz
S an to T o m á s que é esta a união m ais estreita e m ais forte
que pode h a v e r e n tre a c ria tu ra e o C ria d o r; p o r isso a
san tid a d e re a l de M a ria, é a m aio r que pode existir.
A esta sa n tid a d e real, im ensa, de M aria, corresponderá
um a san tid ad e m oral harm ónica, que consiste em a p ro v eita r
to d as as g ra ça s do Senhor, sem d esp erd içar um a sequer,
poden d o assim exclam ar com m aior ra zã o do que S. P a u lo :
a graça de D e u s não [oi inútil cm m im .
P o r esta san tid ad e m oral, num a p a la v ra , a sua co rres­
pondência aos divinos favores foi perfeitíssim a em todos
os se n tid o s... com o devia s e r... c com o D eus a e sp e ra v a e
d e se ja v a — .A qui tens a norm a p a ra a v a lia r a san tid ad e de
M a ria . — A o m esmo tem po com preenderás a razão p o r que
se diz que a sa n tid a d e é o a m o r..., porque o am or é a fusão
de dois c o ra ç õ e s..., é a tran sfo rm ação m útua de um no
o u tro ... e aqui tens, n a santidade real, D eus am ando a cria ­
tu ra e concedendo-lhe p o r am or a p a rticip a çã o da sua vida
d iv in a ... e a alm a entregando-se a D e u s..., a m a n d o -o ...
tran sfo rm an d o -se n 'E le p o r este a m o r... e assim corres­
pondendo com o D eus quer, às suas g ra ça s e ao seu am or.
P o rta n to , sem pre n a san tid ad e h a v e rá este am or de dois
c o ra ç õ e s..., dando-se necessariam ente estes dois elem entos:
o C o ra çã o de D eus e o do h o m e m ...; p o r isso a san tid ad e
é, no fim de contas, a san tid ad e de D eu s e sa n tid a d e do
homem. — S ob este aspecto, com o se rá a san tid ad e de
M a ria ? ... C om o a am ou D e u s ? ... E E la , com o O am ou a
E le ? ... T o d a a su a v id a não foi senão a m o r..., o am or o rd e ­
n o u ..., d irig iu ... foi a cau sa única de todos os seus a e fo s...;
a perfeição do seu am or, foi a perfeição d a sua santidade.
3.° A tua santidade. — V ê a g o ra, dem orada e sèria-
m ente qual é a tu a s a n tid a d e ...; talvez n ã o te tenhas preo­
cupado com ela, com o se não fosse a v o n tad e de D eus p a ra
contigo. — G ra v a profundam ente no c o ração esta v e rd a d e ...:
650 A santidade

D eus q uer fo rm al... sé ria ... e eficazm ente... que te sa n tifi­


q u e s... E tu, quere-lo tam bém ?... N a teoria, sim ...; já m uitas
vezes o d isse ste ..., e a g o ra mesmo o e stará s re p etin d o ...
Q u a n d o c h eg ará o m om ento de o dizeres e ficazm en te?...
—'D e u s o q u e r..., e m ostra-o claram ente nas g ra ç a s e fa v o ­
res que p a ra isso te c o n ce d e... n a santidade real que te
co m u n ico u ... A tu a alm a já foi sa n ta com essa sa n tid a d e de
D e u s ...; foi-o no B a p tism o ..., é-o n a C onfissão, q u ando rece­
bes d ev idam ente a absolvição s a c ra m e n ta l...; e é-o so b re­
tudo n a C om unhão, onde E le se te d á e entrega to ta lm e n te...
e tu, repito, desejas tam bém sa n tific a r-te ? ... P ro v a -lo com
a san tid ad e m oral do teu c o ra ç ã o ..., dos teus a c to s..., com
a co rrespondência ao seu a m o r? ...
C o n v en ce-te de que depende de ti... e só de ti...; com eça
a tra b a lh a r com in te resse ..., continua com grande entusiasm o
esta o b ra grandiosa, e algum dia verás, se p e rsev e ra res nesse
fervor, o fruto do teu trab a lh o e dos sacrifícios que fizeste
p a ra te santificares.
C on sid eraste já M a ria com o m odelo de to d as as v irtu ­
d e s ...: pudeste im itá-la nalg u m a delas, p a ra te pareceres um
pouco com tua M ã e ... C o n tem p la-A hoje co ro ad a com a
auréola divina da sua sa n tid a d e ...
É tam bém o teu m odelo... n ã o quanto à g raça e x tra o r­
d in ária que D eus lhe concedeu, m as quanto à sa n tid a d e p ró ­
pria que E la a d q u iriu ... e m ereceu com a sua co rrespondência
à g ra ç a ... olha-a como fonte ou origem de sa n tid a d e ...
n 'E la juntou D eus tudo c que re p a rtiu entre os dem ais
sa n to s... S uplica-lhe que te conceda tam bém um a p a rtic ip a ­
ção nessa sa n tid a d e ... P o is com E la e p o r E la, sabendo
o b se rv á -la ... e stu d á -la ... c o p iá -la ... sabendo re co rre r a E la ...
sabendo am á-la e se r co n stan te e fiel a esse a m o r..., s a l­
v a r-te -á s c ertam e n te ..., sa n tific ar-te-á s certam ente.

F I M
INDICE

1. — M a ria n a m e n te d iv in a ...................................................... 12
2 . —i M a ria n o A n tig o T e sta m e n to ........................................... lã
3. —»Im a c u la d a C onceição do M a ria .—O s s e u s te s te m u n h o s 18
4 . —• M aria I m a c u la d a — O M isté rio ...................................... 21
5. —*M a ria Im a c u la d a — A s u a n o b reza .................................. 24
6. —- M a ria Im a c u la d a — O p riv ilég io .............. 27
7 . — M a ria I m a c u la d a —-A s u a fo rm o s u ra ... 30
8 . — M aria Im a c u la d a — \ A S u a S an t idade ........................... 33
9. —■M aria Im a c u la d a — A R e d en ção ....................................... 36
1 0 . —-N a tiv id a d e d e M a ria .......................................................... 39
1 1 . —-N a tiv id a d e d e M a ria .......................................................... 42
12. —<N a tiv id a d e d e M a ria .............................................................. 46
13. —»O nom e de. M a ria .................................................................. 48
14. —»O nom e d e M a ria .................................................................. 51
1 5 . —• A p re se n ta ç ã o d e M a ria .......................................................... 55
1 6 . —i A p resen ta ção de M a ria .......................................................... 58
17. —4 A p re se n ta ç ã o d e M a ria — A s u a v irg in d a d e ....... 62
18. — 1 D e sp o só rio s d e M a ria .......................................................... 65
2 9 . —4 A A n u n ciação — A V irgem S a n tís s im a em o ração ... 68
20. —»A A n u n ciação — R e tiro de M a ria ............................... 71
2 1. —f A A n u n c ia ç ã o —• A E m b a ix a d a do a n jo ....................... 74
2 2 . —♦A A n u n ciação —- A A ve-M aria ........................................... 77
2 3 . — A A n u n ciação — A titu d e de M a ria —A su a h u m ild a d e 80

I
652 índice

24. —i A A n u n ciação — A P u re z a V irg in a l ............................... 83


25. —*A A n u n ciação — A e s c ra v a do S en h o r ........................... 86
2 6 . — A A n u n c ia ç ã o —-A M ãe d e D eu s ............................... 89
27. —*A A n u n ciação — A escra v id ã o M a ria n a ....................... 92
28. — A A n u n ciação d e M a ria — A s u a fe s ta ....................... 96
29. —• A V isitaç ão d a S a n tíss im a V irgem ............................... 100
3 0 . —-V isita ç ã o d a S S .ma V irgem e S a n ta Is a b e l ........... 104
3 1 . —'V is ita ç ã o d a S S .'1"* V irg em e S. J o ã o ....................... 108
3 2 . —-O cân tico do « M agnificai» ............................. ................ 112
33. —1O « M agnificat» ............................................................................ 115
34. — O « M agnificat» ............................................................................ 119
35. — O « M agnificat» ............................................................................ 122
36. — O « M agnificat» ........................................................................... 125
3 7 . —*O « M agnificat» ............................................................... ....... 128
3 8 . — O «M agnificat» .............................................................. ....... » 131
3 9 . —■A E x p ectação ............. .................... .............................. u....* 335
4 0 . — A cam in h o do B elém .............................................. . 133
41. — O N ascim en to do M enino J e s u s ............................ 142
4 2 . — P rim e iro s a d o ra d o re s ............................................. . 146
43. — P u rific a ç ã o d e N o ssa S e n h o ra ...................................... I'õ0
4 4 . —-A A p re se n ta ç ã o do M enino J e s u s no T em p lo ....; 154
4 5 . —-P ro fe c ia d e Sim eão ................................................. ....... »'•« 153
46. — P ro fe c ia d e S im eão so b re M a ria ......................... . 162
47. — Os S an to s In o c e n te s ............................................................. . 16*>
48. — A fu g id a p a ra o E g ip to ........................................-........... : *70
4 9 . — N o D e s te rro .............................................................................. 1^4
50. — V id a em N aza ré ...................................................................... 1??
5 1 . —-A C a sa d e N a z a ré ..................................................... . *30
52. —-V id a d e N a z a ré .......................................................................... l*54
5 3 . —-V ida d e N a z a ré .................................................................•••• 138
54. —-V id a d e N a z a ré ......... .............................................................. . 192
5 5 . — V id a d e N a z a ré ............................................. ........... . 195
5 6 . — V id a d e N a z a ré .....................................................................: 199
5 7 . — V id a d e N az a ré ...................................................... 203
5 8 . — V id a d e N az a ré ...................... ............................. .....A ./:.-. 207
Índice 65.3

59. — As b o d as d e C an á .................................................................. 211234


60. — M a ria n a v id a p ú b lic a do J e s u s ..................................... 215
61. — M a ria e a P a i x ã o —<P re lú d io s d a P a ix ã o .................... 219
62. —• M a ria e a E u c a ris tia .......................................................... 222
63. — M a ria e a a g o n ia no H o rto ............................................. 22«
64. — M aria n o s to rm e n to s d a P a ix ã o ..................................... 230
65. — N a R u a d a A m a rg u ra .......................................................... 234
66. —1N o C alv ário — A C ru cifix ão .............................................. 2:58
67. —-N o C a lv á rio —'A te r c e ira p a la v ra ................................ • 242
68. —1M a ria e a m o rte d e J e s u s ................................................ 24«
69. — S o led ad e d e M a ria .................................................................. 261
70. —• M a te r JDolorosa ......................................................................... 25«
7 1 . —'M a ria e a R e s su rre iç ã o d e J e s u s ....................... 2«1
72. — M a ria e a A scensão do S en h o r ...................................... 20o
73. — M a ria e a v in d a do E s p ír ito S an to ............................. 260
74. — ú ltim o s an o s d e M a ria .......................................................... 273
75. — M o rto d e M a ria .......................................................................... 277
76. —»S e p u ltu ra e R e ssu rre iç ã o de M aria .................................. 281
77. — A s u a A ssu n ção g lo rio sa .................................................. 286
78. —• A s u a coroação no céu .......................................................... 289
7 9 . — A tríp lic e co ro a: A) A do P o d e r ............................ ..... • 293
80. — A tríp lic e co ro a: B) A d a S a b e d o ria ........................ • 297
81. —*A tríp lic e co ro a: C) A do am o r ...................................... 201
82. — M a ria m e d ia n e ira u n iv e rsa l de to d a s an graça* ....... 305

II PARTE
1 .—A F é d a S a n tíss im a V irgem .............................. 211
2. — A r é d a S a n tíss im a V irgem ................................................. 2io
3. — A F é d a S a n tíss im a V irgem ................................................. 219
4. — a F é d a S a n tíss im a V irgem ................................ 223
6. —, A v irtu d e d a E sp e ra n ç a em M a ria ............................. 227
(j _. a v irtu d e d a E sp e ra n ç a em M a ria ............................. 331
654 índice

7. —'A E sp e ra n ç a . — 1 Os se u s fu n d a m e n to s ....................... 335


8 . —«A E s p e r a n ç a .— O se u o b je c to .. 33»
9. —-A C a rid a d e .................................................................................. 343
10. — A C a rid a d e . — 1 C a ra c te re s do a m o r ............................... 347
11. —«A C a rid ad e. —; O u tro s c a ra c te re s do a m o r ................... 351
1 2 . —‘A C a r id a d e .—lA m or a J e s u s ........................................... 355
13. — A C a rid a d e com o p ró x im o .................................................. 360
14. —• A C a rid a d e com o p ró x im o .................................................. 364
15. —>O b ra s d e M ise ric ó rd ia ........................................................... 368
16. — P ru d ê n c ia ...................................................................................... 372
17. — 1 P ru d ê n c ia n a s o b ra s .................................................................. 377
18. — P ru d ê n c ia n a s p a la v ra s .......... 381
1 9 . — J u s t i ç a ................................................................................... 385
20. — 1 F o rta le z a ........................................................................................ 390
2 1 . — T e m p e ra n ç a ....................................................... 394
22. — H u m ild a d e ..................................................................................... 398
23. — H u m ild a d e ..................................................................................... 402
24. —1P o b re z a .......................................................................................... 406
25. —’ P o b re z a .......................................................................................... 410
26. —*O b ed iên cia ...... 414
27. — O b ed iên cia ..................................................................................... 418
2 8 . — A C a stid a d e .. 422
29. — A C a stid a d e .................................................................................. 426
30. — A C a stid a d e .................................................................................. 430
3 1 . — A M o d é stia .. 434
3 2 . — A M o d é stia .. 438
33. — M o rtific ação .................................................................................. 443
34. — M o rtific ação .................................................................................. 447
35. —1E fíp írito d e sa c rifíc io ..................................... ........................ 452
36. —- O ração ............................................................................................. 4o6
37. — O ração ............................................................................................. 460
38. — O ração .................................................................................-.......... 465
39. — O ração ............................................................................................. 470
40. — O ração ............................................................................................. 475
41. — O ração .............................................................................................. 480
Indice 655

4 2 . —-A m or ao tr a b a lh o ................................. ............................ 485


43. — P a c iê n c ia e re sig n a ç ã o ........................................................ 489
44. — M an sid ão ........................................................................................ 494
45. — D o çu ra ............................................................................................. 498
46. — D o ç u ra n a fa m ília .................................................................. 502
47. — A C o n d e scen d ên c ia .................................................................. 506
48. —• A G ra tid ã o .................................................................................. 511
49. — A G ra tid ã o ................................................................................... 515
50. — A G ra tid ã o .................................................................................. 520
51. — C o rresp o n d ên c ia à g ra ç a ....................................................... 525
5 2 . — A V id a d a g r a ç a ................................................................. 530
5 3 . — F id e lid a d e à s inspiraçõe® d iv in a s .............................. 535
54. — F id e lid a d e n a s co isas peq u en a* ....................................... 540
55. —»V id a d e acab a m e n to s e p o rm e n o re s ............................... 545
56. — V id a d e f e rv o r .......................................................................... 550
57. — N o b re z a d e p e n sa m e n to s ...................................................... 555
58. —- V id a do Céu .............................................................................. 560
59. —• S erv ir a D e u s .......................................................................... 565
60. — E m p reg o do tem p o .................................................................. 570
61. — S im p licid ad e n a v irtu d e ...................................................... 575
62. — A a le g r ia s a n ta .......................................................................... 580
63. —- S e re n id a d e d e e s p írito .......................................................... 685
64. — A p e rse v e ra n ç a .......................................................................... 590
65. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 695
66. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 599
67. — O C o ração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 604
68. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 609
69. — O C oração d a S a n tíss im a V irgem ....................................... 614
70. — O C o ração d a S a n tíss im a V irgem ....................................... 620
71. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 625
72. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 630
73. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 635
74. — A O m n ip o tên cia s u p lic a n te ..... ............................................ 640
75. — A S a n tid a d e .................................................................................. 646
654 índice

7. —-A E sp e ra n ç a . —- Os se u s fu n d a m e n to s ....................... 335


8 . —-A E s p e r a n ç a .— O se u o b je c to .. 331*
9. —-A C a rid a d e .................................................................................. 343
10. — A C a rid a d e . — < C a ra c te re s d o a m o r ............................... 347
11. —*A C arid ad e. —/ O u tro s c a r a c te re s do a m o r ................... 351
1 2 . —‘A C a rid a d e .—(A m or a J e s u s .......................................... 355
13. —«A C a rid a d e com o p ró x im o .................................................. 360
14. —*A C a rid a d e com o p ró x im o .................................................. 364
15. —• O b ra s d e M ise ric ó rd ia .......................................................... 368
16. — P ru d ê n c ia ....................................................................................... 372
17. —<P ru d ê n c ia n a s o b ra s .................................................................. 377
18. — P ru d ê n c ia n a s p a la v ra s .......... 381
1 9 . — J u s t i ç a ....................................................................................... 385
20. —' F o rta le z a ........................................................................................ 390
21. — T e m p e ra n ç a .................................................................................. 394
22. —• H u m ild a d e ..................................................................................... 398
23. — H u m ild a d e ..................................................................................... 402
24. —<P o b re z a .......................................................................................... 406
2(5. — P o b re z a .......................................................................................... 410
26. — O b ed iên cia ..... ............................................................................... 414
27. — O b ed iên cia ..................................................................................... 418
2 8 . — A C a stid a d e .. 422
29. — A C a stid a d e .................................................................................. 426
30. — A C a stid a d e .................................................................................. 430
31. — A M o d é stia ...... 434
32. — A M o d é stia .................................................................................. 438
33. — M o rtific ação .................................................................................. 443
34. — M o rtific ação .................................................................................. 447
3 5 . —‘ E s p ír ito d e sa c rifíc io ................................. ........................ 452
36. —*O ração ............................................................................................. 4o6
37. — O ração ............................................................................................. 460
38.— O ração ................................................................................-........... 465
39. — O ração ............................................................................................. 470
40. — O ração ............................................................................................. 475
41. — O ração ............................................................................................. 480
Índice 655

42. —• A m or ao tr a b a lh o .................................................................. 485


43. — P a c iê n c ia e re sig n a ç ã o ........................................................ 489
44. — M a n sid ão ........................................................................................ 494
45. — D o ç u ra ............................................................................................. 498
4 6 . — D o ç u ra n a fa m ília .............................................................. 502
47. — A C o n d e scen d ên c ia .................................................................. 506
48. —• A G ra tid ã o .................................................................................. 511
49. — A G ra tid ã o ................................................................................... 515
50. — A G ra tid ã o .................................................................................. 520
51. — C o rre sp o n d ê n c ia ã g ra ç a ....................................................... 525
5 2 . — A V id a d a g r a ç a .....................................,........................... 530
5 3 . — F id e lid a d e à s in sp iraçõ e» d iv in as .............................. 535
54. — F id e lid a d e n a s coisas peq u en a» ....................................... 540
55. —*V id a d e acab a m e n to s e p o rm e n o re s .............................. 545
56. —*V id a d e f e rv o r .......................................................................... 550
57. — N o b re z a d e p e n sa m e n to s ...................................................... 555
58. —*V id a d o Céu .............................................................................. 560
59. —• S e rv ir a D e u s .......................................................................... 565
60. — E m p reg o do te m p o .................................................................. 570
61. — S im p lic id a d e n a v irtu d e ...................................................... 575
62. — A a le g r ia s a n ta .......................................................................... 580
63. — S e re n id a d e d e e s p írito .......................................................... 685
64. — A p e rse v e ra n ç a .......................................................................... 690
65. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 695
66. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 599
67. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 604
68. — O C o ração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 609
69. — O C oração d a S a n tíss im a V irgem ....................................... 614
70. — O C o ração d a S a n tíss im a V irgem ....................................... 620
71. — O C o ração d a S a n tíss im a V irgem ....................................... 625
72. — O C o ração d a S a n tíss im a V irgem ....................................... 630
73. — O C oração d a S a n tíss im a V irg em ....................................... 635
74. — A O m n ip o tên cia s u p lic a n te ..... ............................................ 640
75. — A S a n tid a d e .................................................................................. 646

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