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INTERVENÇÃO DO ESTADO NO
DOMÍNIO ECONÔMICO
Afirma a este respeito Jean-Claude Paye: "Parece que o mundo inteiro, e não somen-
te o mundo industrializado, tenha entrado numa fase de monoteísmo em matéria de
religião econômica. Quer seja a leste ou a oeste, quer seja ao sul ou ao norte, todos c
cada um proclamam agora sua fé na economia de mercado. E o único credo que tal-
vez seja conveniente exprimir parece ser a crença na economia de mercado e em suas
virtudes. Depois de tantos anos em que, em muitos países, o Estado tinha por missão
e, dizia-se, por dever compensar as imperfeições do mercado, e até mesmo de se
substituir ao mercado para guiar um desenvolvimento econômico e social racional
eqüitativo, dá-se ùma mudança importante. A economia de mercado parece que'
para triunfar em todo lugar" (L'État à l'Épreuve du Marché: L'Encadrement I'
tionnel de l'Économie de Marché, Revue Française d'Adntinisa'afion Publ
61,p. 19-23, jan.-mars 1992).
DIREITO ECONOMICO 243
JOÃO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA
a vida do Direito não tem sido somente lógica, mas também experiência.2 duos, e as relações que ela lhes cria com o resto da natureza".3 Para Marx,
Para se ter um conhecimento mais adequado dessa vida, dever-se-á pers- a base da história será o resultado da atuação da força produtiva:
crutar o que foi o Direito no passado, o que é no presente e o que será no fu-
"Ê assim que em tudo isto se manifesta o laço materialista
turo. Assim, no tema que agora nos ocupa, para melhor entender o papel qlte une os homens entre si, laço condícionado pelas necessida-
desempenhado pelo Estado, ao editar nornas para reger o fenômeno eco- des e pelo modo de produção. Este laço, que é tão velho como o
nômico, deveremos fazer uma abordagem teórica e, depois, um acompa- homem, toma incessantemente novas formas, o que equivale a
nhamento da história dessa atuação. dizer que apresenta uma 'história', mesmo que ainda não exis-
ta qualquer estupídez (Unsinn) polítíca ou religiosa que reúna,
r. RELAçÃO ENTRE DIREITO E ECONOMIA por acréscimo, os homens".a
O estudo da atuação do Estado no domínio econômico exige que, pream- NaCrítica da Economia Política (1859), expõe Marx as relações en-
bularmente, se faça uma análise da relação entre direito e economia. Diversos tre a infra-estrutura - " estrutura econômica da sociedade" - e asuperes-
autores se detiveram na análise da inter-relação desses dois fenômenos culûrais, trutura. Assim diz ele:
focalizando ¡lpectos a cada um deles pertinente, segundo sua linha de pensa-
mento. Antes de adenhar o questionamento da utilização pelo Fstado de insku- " Na produção socíal da sua própria extstência os homens
mentos jurídicos para conduzi¡ a economia, convém apresentar um escorço dæ entram em relações determinadas, necess árias, independentes
principais teorias, sem qualquer preocupação com sertnos completos. da sua vontade, quais sejam as relações de produção que res-
pondem aum certo estadio do desenvolvímento dasþrças pro-
2. O MATERIALISMO HISTÓRICO DE MARX
dutivas materiais. O conjunto das relações de produção cons-
Utilizando-se da tese de Feuerbach relativa à alíenação do homem, titui a estrutura econômica da sociedade, que é a base real em
afirmou Marx que Hegel somente se interessou peìa vida interior do ho- que se ergue uma superestrutura jurídica e política, a que cor-
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mem, pela vida da idéia, esquecendo-se de sua vida real, concretamente respondem determinadasformas sociaís de consciência" .
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t
! histórica- Entende Marx que " a condição primária de toda a história huma-
Segundo essa concepção materialista da história, os homens não são
t na é naturalmente a existência de seres humanos vivos. Por conseguinte, o
i determinados pela sua consciência, mas esta é que é determinada pelo
I primeiro estado de fato a verificar é a compleição corpórea destes indiví-
{ modo de produção da vida material.5
Fica, assim, evidenciada a influência que as condições materiais da
[''Ê: 2 Afirmou Holmes: '"The life of the law has not been logic: it has been experience. The felt vida humanâ exercem sobre o pensamento.
necessities ofthe time, the prevalent moral and political theories, intuitions ofpublic po'
licy, avowed or unconscious, even the prejudices which judges share with their fel- 3. O PENSAMENTO DE STAMMLER
low-men, have had a good deal more to do than the syllogism in determining the rules by
which men should be govemed. The law embodies the story of a nation's development
Orientando-se a partir da distinção entre matéria e þrma, afirma
throrgh many centuries, and it cannot be dealt with as if it contained only the axioms and
corolla¡ies of a book of mathematics. In order to know what it is, we must know what it
Stammler a supremacia da segunda sobre a primeira. A matéria se manifes-
has been, and what it tends to become. We must altemately consult history and existing
theories of legislation. But the most difäcult labor will be to understând the combina-
tion ofthe two into new products at every stage. The substance ofthe law at any given
tirnepretty neârly corresponds, so faras it goes, with what is then understood to be con- 3 Ideologia Alemã,p.39.
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venienq but its form and machinery, and the degree to which it is able to work out desi- Ideologia Alemã,p. 19.
red rcsrls, depend very much upon ia pasf' (The Common Law,p.5). 5 Crítica da Economia Política,p. 13.
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JOÃO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA DIREITO ECONÔMICO
ta na atividade concreta dos indivíduos associados, ao passo que a form¿ s prius da conduta ordenada no tempo, mas sua condição pura-
dada pela regulação geral que permeia toda atividade humana, que é condi_ mente lógica; isto é, a noção formal e necessária que preside o
cionada pela forma. conceíto e a lei da vida social ".7
Ao distinguir os planos dapolítica e da economia, assinala:
da realidade históríca. A experiência e a análise históríca ensi- sos econômicos segundo princípios lógicos. Hoje perdemos a
nøm qtrc a economia de uma nação é a resultante de váriosfato- conJìança naþrça da razão e dolorosamente nos apercebemos
res concomitantes e de diversos princípíos propulsores de que, não obstante o avohtmar-se de nossos conhecímentos,
de
natureza ideal ou moral, peculiares a sístemas díversos. De um não aumentou, antes dimínr,úu, a capacidade de criar e de orga-
lado, com efeito, no curso da história o novo não suplanta nun- nízar. Em lugar de distingdr entre ordenamentos econômicos
ca completamente o velho, mas se superpõe a ele dando origem espontâneos ou impostos, seria portanto melhorfalar de orde-
a uma vasta gama deformas intermedíárías; de outro, também namentos econômicos adotados por tradíção ou de ordena-
no interior de um mesmo sístema, as díversas esferas da vida mentos ideados com base em específicas escolhas políticas. Um
econômica não são sempre organízadas com base nos mesmos tal sistema, projetado em modo consciente, poderá chamar-se,
princípios estruturais. Só uma estruhra econômíca tão varia- com Eucken, de 'constituição econômica'. lrlão se deverá po-
damente artículada mas em si unitária pode ser definida como o rém esquecer que tal constituição, idealízada e querida, às ve-
ordenamento concreto da economia de uma nação. zes até defnida a nível constítucíonal, não coincide com a
No quadro de um dado sistema econômico, o ordenamen- 'constituição vivente' que se afirma hístoricamente como resul-
to jurídico constitui um elemento estrutural essencial, e, por ou- tante de um jogo deþrças contrapostas".t5
tro lado, os princípios e as institttições jurídicas conquístam
pleno significado sob o aspecto sociológico e dogmático so- Há que verificar-se ainda que hoje mais se enfatiza o aspecto promo-
mente em relação com o correspondente sistenta econômico. cional do Direito, como assinala Norberto Bobbio. O ordenamento jurídico
Procurarei agora esclarecer gual função desempenha e quais liberal manifestava-se com o garantidor de uma ordem econômica existente.
efeitos gere esta componente jurídica do sistema econômico. Sua atuação não pode dizer-se abstencionista, porque se caracterizava pela
O criador de toda a cultt¿ra, economia e direito incluídos, þrça de garantía. Hoje, contudo,função do Direito passou a ser a de criar,
a
é o homem entendido como unidade Jísíca, espiritual e moral, a de dar forma a uma nova realidade. O direito se manifesta como/orça pros-
membro de comunidades suprapessoaís como afamília. ou a na- pectiva, como þrça impuls ion adora. Adv erte, pois, Raiser:
ção. As condições nøturais têm sent dúvida um papel essencial
na criação de um ordenamento econômico, mas osfatores decí- "Numa época em que o Estado intervém para programar
sívos são, em última instância, o espírito, a vontade, as idéias e e para dirigir a economia nacíonal, o papel do ordenamento ju-
o comporta.mento dos hontens. E, portanto, disctttível a propos- rídico se manifesta completamente novo. Aos olhos do observa-
ta, sugerida por Eucken , de distinguir entre ordenamentos es- dor economia e direito não estão mais ligados por uma relação
potztâneos e ordenamentos impostos. Tal proposta evoca idéias meramente causal, n'¿as por um nexofinalístico ou instntmen-
inspiradas no materialismo e no romantismo, e as respectivas tal: a ordem imposta pelo Estado sobþrma de díreito está dire-
filosofias da história. A cttltura é sempre o produto, nzais ou cionada à prossecução de objetivos estabelecidos pela política
menos conscíente, de uma livre criação do homent. Mas como é econômica. Nesta perspectiva, o direito da economia assltme
diverso o grau de consciência, diversa é também a capacidade relevo somente como 'transposição jurídica das escoihas de
do homem de conceber o sistema econôntico como totalidade, polítíca econômica "'.t6
como uma unidade regulada, e de realízá-lo segtmdo um proje-
to bem definido: independententente dofato de que depois seja
um sistema de mercado ou de economia planificada. O impulso
do hontent moderno para dominar racíonalmente o mundo em 15 Il Compito del Diriuo Privato: Saggi di Diritto Privato e di Diritto dell'Economia di
que vive se reflete na crescente tendência descrita muito bem
- tre Decenni, 1990, p. 39-41.
por Max lí/eber - para organizar o sistema jurídico e os proces- 16 ob. cit., p.4142.
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l9 EnsinaAndré-Jean Amaud que "a razão jurídica é o motor em virtude do qual um sis- quis. Deveis trabalhar para serdes rícos para Deus, e, evidentemente, não para a câme
temajurídico se organiza de maneira coerente e própria para realizar certos fins. A ou pará o pecado" . Aqui cita Vy'eber parte de um sennão do pastor puritano Richard
perspectiva teleológica é inseparável do aspecto estrutural do sistemajurídico, cuja Baiter (em l1/orks of the Puritan Divines,l, Cap. X, l, 9, par. 24). Salienta Henri De-
dinâmica ela justifica. A razão jurídica é a condição necessária e suficiente da exis- nis que essa mesma atitude perante a riqueza foi assumida também entre os católicos
tência de um sistemajurídico. Isto deve entender-se de quatro maneiras: printeira- - "onfo.In. consta do estudo feito por R. H. Tawney, em La Religiott et l'Essor du
mente, ênecessária uma razão suscetível de ditar raciocínios e condutas uniformes e Capitalisme, trad. franc., Paris, 1951).
conformes com as finalidades perseguidas¡' ent segundo /ugar, somente esta razão 2l O iisfema econôm¡co se define como " um conjunto coerente de estruturas econômi-
pode estabelecer um conjunto suficientemente adaptado, ordenado e consistente para cas, institucionais,jurídicas, sociais e mentais organizadas com a finalidade de asse-
serconsiderado como racional; em terceiro lugar, um mesmo sistema não pode ser gurar a realização de um determinado número de objetivos econômicos (equilíbrio'
atrimado por mais de uma razão; em quarto lugar, confTítos de razões nascem da si- órescimento, repartição ...)". Existem diversas classificações de sistemas econômi-
mulaneidade de sistemas jurídicos, e o sistema de direito imposto não pode deixar de cos, dentre as quais se destacam h oje o capitalinno e o socialisnto. Quando um orde-
levá-las en conta, sob pena, por esse motivo, de manifestar-se rapidamente como ul- namento jurídico adota um sistema econômico, passa ele a ter o nome de regime
trapassado e defasado" (Critique de la Raison Juridique: I. Où va la Socíologie du econômico (cf. SILEM, Ahmed, ALBERTINI, Jean-Marie, Lexique d'Econontie,
Droit?, 1981, p.27). verbete "système économique").
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mente, para que o crédito anual da socíedade seja o maior qüência, adota o constitucionalismo do século XIX o princípio segundo o
possível. Na realidade, ele não pretende, normalmente, promo- qual o Estado não deve intervir na atividade econômica, sob pena de rom-
ver o bem público, nem sabe até que ponto o está afazer. 16 per o equilíbrio a que ela,natural e necessariamente, tende. O Estado tem
preferír apoíar a indtßtria interna em vez da externa, só está a uma funçao fundamental, qual seja a de garantidor da liberdade de merca-
pensar na sua própria segurança; e, ao dirigír essa indústria d.e do. Não seria adequado afirmar-se que naquelas duas Constituições inexis-
modo que a sua produção adquira o máximo valor, só estó a tiriam disposições sobre a organização econômica da sociedade. Nem se
pensar no seu próprio ganho, e, neste como em muitos outros poderia dizer que naqueles textos não existisse uma Constituição econômi-
casos, está a ser guiado por uma mão invisível a atingir umfi,¡¡1 õa. O que se deveria dizer é que a ordem econômica liberal ali está presen-
que nãofazia parîe das suas intenções- Nem nunca será muib te, com a imposição de o Estado ga rantir os direitos individu_ais, entre eles
mau para a sociedade que ele nãofizesse parte das suas inten- o ãireito indìvidúal de propriedaãe em toda a sua plenitude.26 Não se pode
esquecer que o constitucionalismo dos séculos XVIII e XIX surgiu sob o
çõe;. Ao tentar satisfazer o seu próprío interesse promove, fre-
qüentemente, de uma maneira mais eficaz, o interesse da preisuposto ideológico de defesa das liberdades individuais em confronto
ãom oãbsolutismo até então imperante. E entre estas liberdades individuais
socíedade, do que quando realmente o pretendefazer...
estava o direito absoluto de propriedade individual, garantidor da atuação
O estadista que tentasse orientar as pessoas privadas so-
't bre o modo como deveriam aplicar os seus capítais, não só se econômica individual no mercado. As normas constitucionais protetoras
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desses direitos têm um sentido negativc, porque têm por objetivo impedir
estaria a sobrecarregar com uma tarefa desnecessária, como
que o Estado os desrespeite, os afronte.
ainda assumiria unta autoridade que não só dificilmente pode-
ria ser confiada a unta única pessoa como, nem sequer, a qual- A concepção de um liberalismo atomista, de liberdade do indivíduo
quer conselho ou senado, e que representaria um perigo nas no âmbito do mercado, veio a ser desmentida pela realidade histórica. A
mãos de um homem que tivesse a loucura e a presunção suficien-
partir de meados do século XIX o capitalismo se transforma. As unidades
tes para se considerar capaz de a exercei'.25
ie une*, formando grupos , dando origem ao novo Estado industrial. Com
os grupos econômicos surgem os primeiros questionamentos sobre a plena
O constitucionalismo do século XIX surgiu impregnado de liberalis- [bãrdåde de comércio.z7 A crise se instaura e provoca, no período entre as
mo, tanto político quanto econômico. As Constituições brasileiras de 1824 duas grandes guerras, o surgimento de um novo Direito e a imperiosidade
da atiação do Estado no domínio econômico.28
e de 1891 basearam-se no princípio básico do liberalismo econômico e que
serve de distintivo para o capitalismo: o princípio da propriedade individu-
al dos bens.de produção. Este princípio é fixado como absoluro naqueles
dois textos. 26 Cf. VAZ, Manuel Afonso, Direito Económico: A Ordent Econóntica Portuguesa,
Numa interpretação contextual, deve-se assinalar que este princípio 1990, p. 75.
está contido no título referente às "garantias dos direitos civis e políticos 27 As reações a esse liberalismo exacerbadojá podem ser encontradas, mitigadamente,
no constitucionalismo de meados do século XIX. A Constituição francesa de 1848 já
dos cidadãos brasileiros". E o $ 22 do art. I 79 da Constituição de I 824 de-
estabelecia, no seu art. l 3: "A Constituição garante aos cidadãos a liberdade do traba-
termina: "é garantido o direito de propriedade em toda a sua plenitude". lho e da indústria. A sociedade favorece e encoraja o desenvolvimento do trabalho
Por sua vez, o $ 17 do art.72 da Constituição de 1891 dispõe: " o direito de pelo ensino primário gratuito, a educação profissional, a igualdade de direitos entre
propriedade mantém-se em toda a sua plenitude ". patrão e trabalhador, as instituições de previdência e de crédito, as instituições agrí-
Esse princípio informa toda a doutrina da economia de mercado então colas, as associações voluntárias, e o estabelecimento, pelo Estado, pelos departa-
vigente. Corolário inarredável do princípio absoluto do direito de proprie- mentos e pelas comunas, de trabalhos públicos próprios para empregar os braços
dade individual é o da líberdade de iníciativa no mercado. Como conse- desocupados; ela fomece a assistência aos meninos abandonados, aos enfermos e aos
velhos sem recursos, e aos quais suas famílias não podem socorrer".
28 Como acentua G. Farjat, " os economistas colocam geralmente entre os anos 1850 a
1880 o aparecimento de um novo tipo de capitalismo (o capialismo de grupo, ou oligo-
25 A Riqueza das Nações,Livro IV, Cap. II, Gulbenkian, 1983, p. 755,757-759. polístico, ou simplesmente'o /¡ovo Estado induslnal'), ou do verdadeiro capitalismo
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Por outro lado, o fenômeno da concentração do poder econômico næ A Constituição brasileira de 1934 aderiu ao novo discurso manifesta-
mãos de rms poucos veio trazer a necessidade de o Estado intervir para sanar a dor das idéias imperantes, introduzindo, por vez primeira, um título confi-
crise do hlberalismo econôrnico, salvando a liberdade de iniciativa. Assinale-se gurador da nova postura do Estado deniro da ordem liberal. O ingresso do
que o Estado não interveio para coibir a liberdade econômica das empresas, Estado para atuar no mercado gera uma nova ordem a ser disciplinada, a
mas panr garanti-la mais concreta e efetivamente. A primeira manifestação Ordem Econômica e Social.
constitucional dessa tendência, temola na Constituição do México de 1917, O art. I 15 garante a liberdade econômíca, mas a situa dentro da pos-
que, no seu art- 27 , confere à Nação o direito de "impor à propriedade privada sibilidade de ser organizada pelo Estado, em conformi dade comos princí-
as regras que dite o interesse público" e no art.28, estabelece a proteção contra pios da Justíça e com as necessiCades da vída nacíonal, e impondo-lhe um
os monopólios e o combate à concentração ou açambarcamento: limite de carâter teleológico, o de possibilitar a todos existêncía digna.
Ao Estado destinam-se duas novas e importantes funções, a de atuar
"Art. 28. no mercado, podendo monopolizar determinada indústria ou atividade
Nos Estados Unidos Mexicanos não haverá monopólios econômica, quando.assim o exigir o interesse público, mediante autonza-
nem exclusivos de qualquer espécie ... ção de lei especial,3a e a de influir no mercado, impondo-se-lhe o dever de
A leí castigará severamente e as autoridades combaterã.o promover ofomento da economia popular.3s
efrcazmente toda a concentração ou açambarcamento dos arti-
gos de consumo necessários e que tenham por objetivo a alta de
preços ...".
sujeito ativo - o setor público - habilitado para concretizar as modalidades da inter-
venção. E óbvio que o tratamento jurídico do fenômeno empresarial é, na maioria das
Já a Constituição de Weimar vem estabelecer que "a organização da
vezes, unidimensional e tradicionalmente tem sido contemplado desde uma ótica pu-
vida econômica deverá realizar os princípios da justiça", fixando os limites
ramente patrimonial, atendendo somente à problemática que afeta o capital, margi-
dentro dos quais "deve ser assegurada a liberdade econômica individual" nalizando-se os interesses dos que trabalham nela e o interesse que para a
(art. 15l), estabelecendo-se ainda que "nas relações econômicas a liberda- coletividade representa a empresa em si mesma considerada como organização eco-
de contratual só vigora nos limites da lei" (art. 152). nômica produtiva". Dentro desse contexto é que se mostra a diferença entre o modelo
Estava aberto o caminho para um novo contçxto das relações econô- clássico de economia de mercado que só se preocupava com a defesa dos interesses
dos credores, e o modelo concretizado pelo Direito modemo: "Diante da realidade da
micas no âmbito do mercado. Se continua o liberalismo, como de fato se
liquidação da empresa em mãos dos credores, o Direito modemo teve que reagir,
quis,32 aceita-se, a partir de então, o ingresso naquelas relações de um ter- quer através de meios privatistas (aperfeiçoamento dos procedimentos concursais),
ceiro personagem, o Estado. É preciso, contudo, assinalar que a relação que quer através de procedimentos de intervencionismo público, pæa salvaguardar a
se estabelece entre Estado e empresa não se limita a influir nos interesses continuidade da empresa ou evitar antecipadamente sua liquidação" (co nstitución y
desta, mas transcende-os para defender primordialmente o interesse da co- Sistema Económico, 2" ed.,1985, p. 209-2lO).
letividade- Um exemplo interessante desta nova perspectiva é, hoje, o pro-
jeto de lei para a nova lei de falências, em que se procura, em lugar de
liquidar a empresa, recuperá-la e dar-lhe continuidade.33 34 o art. I I 6 assim determina: "Por motivo de interesse público e autorizada em lei es-
pecial, a união poderá monopolizar determinada indústria ou atividade económica,
asseguradas as indenizações devidas, conforme o art. I 12, no 17, e ressalvados os ser-
viços municipalizados ou de competência dos poderes locais',.
35 O art. I l 7 assim dispõe: "A lei promoverá o fomento da economia populaç o desen-
32 Aliris, o t€rfto da constituição de vr'eimaç no seu art. 17, esabelecia que 'tada estado deve volvimento do crédito e a nacionalização progressiva dos bancos de depósito. Igual-
t9r urna Consitui$o liberal", no sentido predominantemente político, é verdade. mente providenciará sobre a nacionalização das empresas de seguros em todas as
33 É esta a perspectiva de Martín Bassols Coma, que diz ser necessário .' aprofun'dar os suas modalidades, devendo constituir-se em sociedades brasileiras as estrangeiras
componentes fi¡ndamentais da fenomenologia da intervenção: o sujeito passivo da que atualmente operam no País . E o parágrafo único deste artigo determina: '.é proi-
intervenção- a empresa-, o motivo ou causajustificativa- o interesse geral - eo bida a usura, que será punida na forma da Lei".
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Esse dispositivo legal, pela ênfase dada ao papel do indivíduo no âm- empresas de seguro, decapitalização e de fins análogos (art. 149), disponha
bito da afuação econômica, merece ulteriores considerações, em face dos sobre a criação de estabelecimentos de crédito especializado de amparo à
contextos histórico e ideológico nos quais ele surgiu. lavoura e à pecuária (art. 150), disponha sobre o regime das empresas con-
Paralelamente com o disposto no art. ll7 daConstituição de 1934, o cessionáriab de serviços públicos federais, estaduais e municipais (art.
art. l4l da Constituição de 1937 explicita a forma de atuação do Estado sob 151), e facilite a fixação do homem no campo, estabelecendo planos de co-
a forma de controle, através do aspecto positivc do fomento, mas agora lonização e de aproveitamento das terras públicas (art' 156).
também ahavés do aspecto negativo dapunição, instítuindo os crimes con- São importantes ainda o art. 154, que determina que a usura, em to-
tra a economia popular . Diz o art. l4l: das as suas modalidades, sejapunida, como, e principalmente, a disposição
do art. 148, que deu nova figura àquilo que os textos de 1934 e I 937 confi-
"A leifomentará a economia popular, assegurando-lhe guravam como simples crimes contra a economia popular. Surge a figura
garantias especiais. Os crimes contra a economia popular são mais ampla das formas de abuso do poder econômico, que deverá ser re-
equiparados aos crímes contra o Estado, devendo a lei comi- primida por lei. E o texto constitucional define quais sejam essas foÍnas:
nar-lhes penas graves e prescrever-lhes processos ejulgamen-
tos adequados à sua pronta e segura punição". "A leí reprimirá toda e qualquerforma de abuso do poder
econômico, inclusive as uniões ou agrupamentos de empresqs
E importante assinalar que o crime de usura, antes contemplado individuaß ou sociaß, seja qualfor a sua nafi¿reza, que tenham
no parágrafo único do art. ll7,passa a ser fixado no art. 142: " A usura
porfi.m dominar os mercados nacíonais, eliminar a concorrên'
será punida" .
cia e aumentar arbitraríamente os lucros".
Os arts. l4l e 142 têm importância histórica, porque propiciaram o
surgimento, entre nós, das primeiras leis de proteção à liberdade de con- Sob o império dessa disposição constitucional, surge a Lei no I .521,
corrência. Assim é que o Decreto-Lei no 869, de t 8. 1 I . 1938, define quais de26.12.1951, que criou a Comissão Federal de Abastecimento e Preços -
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necessidade de um amplo debate público sobre tais questões, à adoção de reabilitação do político, toda mudança será vivida como um
instru¡rentos adequados, à atenção ao princípio da subsidiariedade, à in- acontecimento neþsto e corremos o risco de uma paralísta. O
temacionalização da economia e à postura do poder político perante a problema é de convencer os cídadãos - e os intelectuais - de
vida democnítica. que graças a um desdobramento de suas missões e a novos mé-
Ilánecessidade de um debate aberto sobre a modemização da organi- todos de gestão, o estado nacional pode reencontraruma legiti-
zação econômica, sobre os riscos individuais ou coletivos, sobre a atuação midade e crescer em eJicácia. A mutação necessária não é
do Esado e sobre o funcionamento do mercado. O forum adequado para necessariamente uma perda de substância para os agentes pú'
este debate deverá ser o Congresso Nacional, que, liberado de preocupa- blicos e umafalta para os cidadãos habítuados a um quadro e a
ções dehigiene propria e de fisiologismos retógrados, terá condições de cap modos de íntervenção determinados ".3s
tar a opinião nacional de todas as correntes e discuti-la com profundidade.
Outra tarefa serátarealização de estudos de profundidade sobre tais A Constituição de 1988 surgiu sob o influxo de tais direcionamentos
questões, no que terá papel primordial a universidade brasileira, liberada modernos, rompendo assim com a tendência francamente intervencionista
de academicismos formalistas para dedicar-se à discussão acurada dos pro- da Constituição de 1967-1969, mas deixando-se ainda impregnar de idéias
blemasjurídico-econômicos nacionais. Como observa Cossé, "temos o há- protecionistas originadas de um tradicionalismo incoerente com a modema
bito de planificar, pelo menos no discurso, o que é implanifìcável, por tendência da atuação estatai.
exemplo a taxa de crescimento, e de não planificar o que resulta em grande O art. 173 da Constituição se coloca como um marco divisório, con-
parte de tendências concretas e previsíveis, demográficas por exemplo, ou trapondo-se ao art. 163 da Constituição de 1967-1969.Dizo texto atual:
de comportamentos estáveis: educação, comunicação, saúde".
Uma terceira tarefa decorre da compreensão do princípio de sttbsidia- "Ressalvados os casos previstos nesta Constitttição, a
riedade,qae explica que as decisões nacionais, em termos de economia, não exploração direta de atividade econômica só seró permitida
são mais integralmente soberanas. O Estado nacional deve inserir-se nos quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou
contextos regionais de que faz parte, quer para influenciá-lo, quer para " in- a relevante interesse coletivo, conforme defnidos em lei".
formar a todos os agentes econômicos sobre o que foi decidido, tirar o me-
lhorpartido das novas regras dojogo e aliviar as çstruturas administrativas". Donde se deduz que a exploração direta daatividade econômica pelo
A internacionalização da economia traz ainda uma outra modificação Estado constitui-se numa exceção. A regra é a de que o Estado não deve
que exþ posicionamentos novos da Administração estatal. Faz 30 anos, atuar diretamente no domínio econômico. A exceção está restrita à necessi-
os homens que acompanhavam a evolução da economia mundial e toma- dade decorrente de dois fatores determinantes: imperativos de segurança
vam decisões pertenciam aos quadros do Estado. Mudou-se atualmente o nacional e'relevante interesse coletivo. Mas tais fatores deverão ser defì-
quadro, pois que hoje " os homens de empresa estão abertos para o mundo e nidos em /ei. Ressalte-se a importância do Poder Legislativo na definição
adquiriram uma culrura e uma prática intemacionais". dessa necessidade (não-conveniência)dessa intervenção direta do Estado.
A quinta tarefa se refere à relação entre o poder politico, que deverá A ressalva aos casos previstos nesta Constituição se refere às dispo-
afirmar-se dentro de nova figura, e o respeito às exigências da vida demo- sições contidas nos arts. 175,176 e 177. O contexto constitucional traçado
por estes artigos foi profundamente alterado, como já se mostrou no Capí-
crática A crise política vivida pelo País nos últimos anos deverá vir a ser o
germe de uma nova postura perante os problemas com que o Estado moder-
tulo II. Será necessário, diante das afirmações aqui feitas, reportar-se ao
que já foi ali dito.
no se defronta. Lembra Cossé:
O art- 175 estabelece que "incumbe ao PoderPúblico, na forma da lei, O art. 177 prevê as hipótes es de monopólio relatlamente ao petroleo
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de eamínérios e minerais nucleares. Também no tocante a estamatéria, hou-
licitação, a prestação de serviços públícos". Aqui estão incluídos os servi- ve alteração no texto constitucional, introduzida pela Emenda no 9, de
ços de transporte coletivo, os de telecomunicações, os de fornecimento de 09.1 1.1995. Também aqui o $ 1o foi o portador da mudança de postura do
energia elétrica, de água, etc. O Estado poderá geri-los diretamente através
Estado. Confrontem-se, também aqui, as duas alterações:
de empresas públicas ou sociedades de economia mista, ou ainda conce- Redação primitiva:
dê-los ou permitiJos aos particulares.
É importante repetir que as Leis no' 8.987, de I 3.02. I 99 5, e 9.07 4, de "$ 1" O monopóIío previsto neste artigo inclui os riscos e
07 .07 .1995,concretizando o permissivo constitucional contido no parágra- resultados decorrentes das atividades nele mencíonadas, sendo
fo único - " a lei disporá sobre" -, vieram enfatizar anecessidade de o Esta- vedado à União ceder ou conceder qualquer tipo de participação,
do transferir para o setor privado a prestação de alguns serviços públicos. em espécie ou em valor, na uploração de jazidas de penóleo ou
O art.176 prevê a propriedade da União relativamente às jazidas, re- gás natural, ressalvado o disposto no art. 20, S I'".
cursos minerais e os potencíais de energia hîdráulíca, fixando ainda que a
pesqußa Redação atual
e a lavra, bem como o sev aproveitamento somente poderão ser
efetuados por autorização ou concessão da União.
"S I o A União pcderá contratar com empresas estataís ou
Nesse tema, a Emenda Constitucional no 6, de 15.08.1995, alterou a re-
privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV
dação do paragrafo único. Confrontem-se as redações, a anterior com a atual:
deste artigo, observadas as condições estabelecidas em lei',.
Redação primitiva:
por eles tratada deveria ter sido colocada c omo um artigo, como ocorreu na
Valendo uma remissão às fontes do Direito, com peculiaridades às
Constituição de 1946, segundo porque o assunto ali versado não se inclui
fontes do Direito Econômico, é importante destacar o papeldasfontes reais
como dependenle do caput.
e demafonteformal de grande operacionalidade no mundo da economia,
Com o esforço por afastar a exploração direta do Estado na atividade
qtJe ê amedída provisóría. As fontes reais são a origem das fontes formais,
econômic4 restava ao Constituinte definir-lhe os novos papéis. Assim o
art. 174 vem definir essa nova função: a de agente normatívo e regulador
, rrtur não podem destacar-se daquelas Sob pena de nascerem absoluta-
mente ineficazes. Se o Direito Econômico pode ser visto c omo uma antítese
da atividade econômíca. Prescreve o texto:
do sistema líberal deve sêlo também como uma expressão de uma nova or-
dem econômicø e social e, conseqüentemente, como um esforço constante
"Como agente normativo e regulador da ativídade eco-
deresposta adequada as exigências da realidade econômica e social do mo-
nômica, o Estado exercerá, naforma da lei, asfunções defsca-
nenà.n A medida provisória, consagÉda no art. 59, V, e no art. 62, da
Iízação, incentivo e planejamento, sendo este determinante
Constituição Federal, é o instrumento adequado de captação das fontes reais
para o setor público e índicatívo para o setor privado".
e suatransfolrnação em fonte formal do Direito. Desnecessário será enfatízar
sua necessidade para normatizar a relação de caráter econômico e social.
A atuação reguladora da atividade econômica por parte do Estado
esta sujeita ao princípio da subsidíariedade ,no que tange a deixar aos in-
T.INTERVENçÃO DO ESTADO: PENSAMENTO DO PAPA JO.Ã.O
divíduos a tarefa de regulamentar a própria atividade, ou de não criar regras
PAULO N
que dificultem, em lugar de viabilizar, a atividade econômica. É o fenôme-
no atualmente conhecido como desregulamentaçã.o da economia.3e
Em 01.05.1991, para que o "Centesimts Annts" de edição da Encíciica
"Rerum Novarum" fosse comemorado, o Papa João Paulo II lançou a Encíclica
que leva aquele nome, defendendo a tese de que o papel do Estado no setor da
39 O princípio da subsidiariedade pode ser entendido num duplo sentido. Segundo Mi- economia deve eStar alicerçado numa ordem democráf¡'ca e esta fi.¡ndamentada
chel Gentot, numa primeira acepção, "o Estado não deve fazer o que a sociedade ÍwÍta "reta concepção da pessoa humana" e no respeito a seus direitos,al sen-
pode fazer e ele não deve substituir-se nos esforços e nas iniciativas das empresas,
do certo que o econômico nadamais é do que um aspecto da vida humana.
dos cidadãos e de seus grupamentos. O segundo aspecto do princípio de subsidiarie-
dade é mais conhecido, e significa que o Estado não deve reger do centro o que pode
sêJo alhures, isto é, da periferia, através de mecanismos de descentralização e de
desconcentração, mas também por meio de organismos públicos que perrnanecem na pio de subsidiariedade que se refere às relações entre o indivíduo e o Estado. Nesta
órbita do Estado, embora atuando independentes ao mesmo tempo dos ministros e do ordem, o princípio contempla não ulna questão organizativa mas substancial: qual
poder político" (Un Double Principe de Subsidiarité, in Rewre Française d'Admi- deve ser o grar de intenenção e prclagonbmo do Estado na vida econômica e social de
nistration Publique, n" 61, jan.-mars 1992, p. 153). Também Ariño Ortiz analisa o um país, e qual deve ser o âmbito de livre atuação dos cidadãos e dos gnrpos sociais inter-
princípio desubsidiariedade:" Com freqûência o princípio de subsidiariedade se re- mediririos..." (Ecoromía y Estado: Crisis y Reforna del Sector Público, l993,p. Ø45).
fere a dois fenômenos diferentes: um é o que poderíamos chamar de subsidiariedade
institucional,o que significa que não devem centralizar-se no mais alto nível aquelas
decisões que possam ser adotadas com igual ou maior eficiência a um nível político e
40 FARIAT, Gérard, Las Enseñanzas de Medio Siglo de Derecho Económico, Es¡rd¡bs
administrativo inferior e, por conseguinte, mais próximo aos cidadãos. Este princípio
de Derecho Económico, II, p. 13.
tem sido defendido nas relações intergovernamentais, tanto nacionais (é o que se co-
4l Afirma o Papa no Cap. V, no 47: "Após a queda do totalitarismo comunista e de mui-
nhece com o nome de descentralização político-administrativa: reserva aos Gover-
tos outros regimes totalitários e de'segurança nacional' assistimos hoje à prevalên-
nos regionais e locais de todas aquelas questões que afetem predominantemente seus
cia, não sem contrÍ¡stes, do ideal democratico, em conjunto com uma viva atenção e
interesses), como na ordem intemacional: transferência aos órgãos das organizações
preocupação pelos direitos humanos. Mas, exatamente por isso, é necessário que os
supranacionais - é o caso da Comunidade Européia - só daquelas questões em que
povos, que estão reformando seus regimes, dêem à democracia um autêntico e sólido
esteja comprometido o interesse comum, mantendo-se as competências em todas as
fundamento mediante o reconhecimento explícito dos referidos direítos -.." (Centesi-
demaisquestões reservadas a cada Estado. Mas há outro sentido diferente do princí-
mus Annus, Ed. Paulinas, p.87).
274 JOÃO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA DIREITO ECONÔMICO 275
Reconhece-se a necessidade da institucionalízação de uma economia A intervenção do Estado no setor econômico deve ocorrer também
de mercado, em que ao Estado toca a tarefa de, através de prudentes decisões Darapropicíar o equilíbrio, e, nestas condições, serâelasupletiva, exigida
políticas e de sólido direcionamento jurídico, garantir a segurança aos que i l¡*¡todo no tempo, para que não se fira o princípio da livre iniciativa no
participam do mercado, quer como empresas, quer como consumidores: campo econômico:
"O Estado tem também o direito de intervir quando sinta-
"A ativídade econômica, em particular a da economia de ções partícalares de monopólío criem atrasos ou obstáculos ao
mercado, não se pode realizar num vazio institucional, jurídico desenvolvimento. Mas, além destas tarefas de harmonização e
e político. Pelo contrário, supõe segurança no referente às ga- condução do progresso, pode desempenharfunções de suplên-
rantías da líberdade índividual e da propriedade, além de uma cía em sítuações excepcionaís, quando setores sociaís ou síste-
moeda estável e serviços ptiblicos efcientes. A princípal tarefa mas de empresas, demasíado débeis ou em vías deformação, se
do Estado é, portanto, a de garantir esta segurança, de modo mostram ínadequados à sua missão. Estas intervenções de su-
que quem trabalha e produz possa gozar dos frutos do próprio plência, justifcadas por urgentes razões que se prendem com o
bern comum, devem ser, quanto possível, límitadas no tempo, para
trabalho e, conseqüentemente, sinta-se estímulado a cumpri-lo
não retirar permanentemente aos mencíonødos setores e sistemas
com efciência e honestidade. Afalta de segurança, acompanha-
de empresas as competências que lhes são proprias e para não
da pela cornpção dos poderes públicos e pela difinão defontes
ampliar qcessívamente o âmbito da intervenção estatal, tornan-
ímpróprias de enriquecimento e de lucrosJäceísfundados em ati-
do-se prejudícial tanto à liberdade econômica como à civí|".
vidades ilegais ou puramente especulativas, é um dos obstáculos
principaís ao desenvolvimento e à ordem econômica". Defende finalmente o princípío de subsidiariedade, segundo o qual
uma sociedade de nível superior não deve interferir na vida de uma socieda-
de de ordem inferior, privando-a de suas competências, mas deve estimulá-la
O Estado tem competência para intervir no setor econômico, e deve
e apoiáJa para que ela, com sua própria potencialidade, consiga realizar as
fazê-lo, secundando a atividade das empresas, principalmente em momen:
finalidades sociais que se propôs. A interferência desmesurada, pelo chama-
tos de crise, quando será mais importante sua presença para garantir a ple-
do Estado assístencial, leva à atrofia do setor privado (que se acostuma ao
nitude do exercício dos direitos humanos: protecionismo) e hiperhofia o setor público, com enorTne carga de custos:
"Outra tarefa do Estado é a de vigíar e orientar o exercí- "... Ao intervir diretamente, inesponsabilizando a socieda-
de, o Estado assistencial provoca a perda de energias huma,xas e
cio dos dìreitos humanos, no setor econômico; neste campo, po-
o aumento exagerado do setor estatal, dominando mais por lógi-
rém, a primeira responsabilidade não é do Estado, mas dos
cas burocráticas do que pela preocupação de servir os usuários
indivíduos e dos diversos grupos e associações em que se arti-
com um acréscimo enorrne das despesas. Defato, parece conhe-
cala a sociedade. O Estado não poderia assegurar diretamente
cer melhor a necessidade e ser maís capaz de satisfazê-la quem a
o direíto de todos os cidadãos ao trabalho, sem uma excessiva
ela está mais vízinho e vai ao encontro do necessitado ...".a2
estruturação da vida econômíca e restrição da livre iniciativa
dos indivíduos. Contudo, isto não significa que ele não tenha
qualquer competência neste âmbito, como afrmaram aqueles 42 Defende Gomes Canotilho o princípio da democracia econômica e social colocan-
que defendiam uma ausência completa de regras na esfera eco- do-o em contrariedade com o da subsidiariedade, mas dá a este último um conteúdo
nômica. Pelo contrário, o Estado tem o dever de secundar a ati- significacional diferente do que aqui se examina: "O princípio da democracia econô-
mica e.social exclui o princípío da subsidiariedade como princípio constitucional.
vídade das empresas, criando as condições que garqntam
O principio da subsidiariedade, tradicionalmente erigido em princípio constitucio-
ocasiões de trabalho, estimulando-a onde þr insuficiente e nal, significava que o Estado tinha uma função apenas acessória ou complementar na
apoiando-a nos momentos de críse". conformação da vida econômica e social. Era uma idéia do capitalismo liberal. Todavia,
276 JOAO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA DIREITO ECONOMICO 277
8. o PENSAMENTo op ¡.nrño oRTrz des. O Estado assume o compromisso de atuar na justiça distributiva, bus-
cando umajusta distribuição da renda.
l
278 JOÃO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA DIREITO ECONÔMICO 279
empresas concorenciais nas mesmas condíções de mercado que podem Assinaladas essas modalídades dz atuação do Estado, procura de-
adotar os agentes privados". Observa ainda:
monstrar "as linhas de evolução do setor público espanhol" nos últimos
anos. Estas linhas específicas são as seguintes:
. "A atividade empresarial do Estado nã.o tem sido conse_
l. Tendência a uma redução da atuação do Estado na área empresa'
qüência, em nenhum país, de um plano sistemático de atuação,
ríal. Apnncipal crítica feita à atuação direta do Estado no setor econômico
mas tem sido resposta ocasional e variada a específicas neces-
se prende à sua íneficíénc¡a. Neste ponto emite opinião que certamente
sídades de cada lugar. Umas vezesfoi a reconstrução nacional,
propiciará muita polêmica:
depois de uma guerra devastadora, outras vezes a 'necessária'
socialização de empresas em crise (para manter o emprego), "E significatívo que os grandes defensores da empresa
outras a promoção índustrial de zonas do território subdesen- públicanão são hoje os socialistas, mas os Sindicatos, o que en-
volvidas (...) ou o caráter estratégico de determínados abaste- contra sua explicação em dois fatos: no extraordinário 'poder
cimentos nacíonais (mineração de carvão) ". sindical' que se Serou no interior das empresas públicas e na
debítidade destas, tradicional, perante a negocíação coletiva,
1r'- Entende, contudo, que se deva dar sempre ênfase àiniciativa privada, quepermite aos trabalhadores obter melhores condições no se-
I r.,
ior púbtico do que no privado. Naturalmente, isto se consegue à
que é sempre mais criadora e se presta a secundar o desenvolvimento da
personalidade do indivíduo, devendo ser sempre regra numa sociedade custa do resto da sociedade"-"t
t. ..
destinado a reger, estimular e incentivar a atividade econômica do setor 10. A TNTERVENÇÃO DIRETA
privado, e a de Direito Institucional Econômico para a situação em que o
Estado se imiscui diretamente na atividade econômica.so Já J. Simões A organização daintervenção direta do Estado no domínio econômi-
Patrício, M- Afonso Vaz e L.S. Cabral de Moncada adotam a terminologia co tem embasamento legal no Decreto-Lei no 200, de25.02.1967,enale'
de íntervenção direta e intervenção indireta .sl gislação subseqüente, que o modificou substancialmente. o art.40 daquele
ãiploma legal, após distinguir a Administração Pública Federal em direta e
indireta, enumera, dentre as categorias de entidades que compõem esta ú1-
tima, as autarquias, as empresas públicas e aS sociedades de economía
50 Diz B- Chenoc "Durante o mesmo período, as leis e os regulamentos nos revelam
derrogações, cada vez mais numerosas e cada vez mais graves, aos princípios do in- mista. o legislador se preocupou em defînir cada uma destas entidades.
dividualismo liberal. O estaruio das profissões, a legislação social e até uma legisla- Interessam-nos as definiçõ es de empresa pública e de socièdade de econo-
ção estritamente econômica caracteriz¿m em numerosos pontos uma evolução do mia mista. Por empresa piblica entende ele " a entidade dotada de perso-
dkeito- (Organísation Êconomíque de l'Etat, 1965, p. 54). E quanto à atividade es- nalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e capital
tatal: " Uma dupla cadeia de sintomas anuncia também o dirigismo. Ao mesmo tem-
exclusivo da união, criada por Lei para a exploração de atividade econômi-
po que o poder procura impor sua vontade, por lei ou regulamento, aos atores da vida
ca que o governo seja levado a exercer por força de contingência ou de con-
econômica, ele penetra entre eles e se imiscui mais ou menos abertamente na gestão
I dos negócios industriais e comerciais. O desenvolvimento das empresas públicas, veniência administrativa, podendo revestir-se de qualquer das formas
entre as duas guerras, sublinha por seu tumo a evolução do direito" (ibid., p. 57). No admitidas em direito" epor socíedade de economia mista " a entidade do-
mesmo sentido, Venâncio Filho: " Adotamos, também, a classificação de Chenot, di- tada de personalidadejurídica de direito privado, criada por Lei para a ex-
vidindo o Direito Público Econômico em dois grandes setores: o Direito Regulamen- ploração de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas
tar, que trata das formas regulamentares da intervenção do Estado, sendo a sua forma
ações com direito a voto pertençam em sua maioria à união ou à entidade
exFema o dirigismo total; e o Direito Institucional, em que o Estado se transforma
em atos da vida econômica, apresentando como caso limite o coletivismo total" (l da Administração Indireta". Determina ainda o $ 1" do mesmo artigo que
.,quando a atividade for submetida a regime de monopólio estatal, a maio-
Intervenção do Estado no Domínio Econômico: O Direito Ptiblico Econômico no
Brasí|, 1968, p. 69). ria acionária caberíLapenas à União, em caráter peÍnanente".
5t Segundo o ponto de vista de M. Afonso Vaz, " quando se fala da iniciativa econômi- É importante assinalar também que o art. 60 do mesmo diploma legal
ca públic4 da coexistência de três setores de propriedade dos meios de produção e da
já submete as atividades da Administração Federal ao princípio e exigência
reserva de setor público, está a referir-se um tipo de atuaþão econômica do Estado
substancialmente diferente daquela intervenção do Estado que se expressa na impo- fundamental do planeiamento ,colocando-o sob os parâmetros do "desen-
sição de limites à atividade econômica privada. A distinção baseia-se agora nos su- volvimento econômico-social do País" e da "segurança nacional".
jeitos que detêm o domínio da atividade econômica, designando-se de intervenção
direta se ê o próprio Estado que assume o papel de agente econômico e de interven-
ção indiren se o Estado condiciona, motiva ou enquadra o comportamento dos
rr. A TNTERVENÇÃO INDIRETA
agentes econômicos dele independentes, sem tomar parte ativa no processo produti-
vo, ou sej4 não se assumindo como produtor ou distribuidor de bens ou serviços. Ao Ao atuar indiretamente na condução, no estímulo e noapoio da ativi-
falarmos aqui de iniciativa econômica pública temos essencialmente em vista a inter-
dade econômica empreendida pelos particulares, o Estado adota determi-
venção direta do Estado na economia, até porque a intervenção indireta não é pro-
priamente uma atividade econômica do Estado, mas a imposição de límites ou a nadas formas de polítíca econômica, peculiares acada campo de atuação.
concessão de beneficios à atividade econômica dos particulares. Esta é uma interven- Apotítica econômica tem como objetivos fundamentais, nos países desen-
ção'rqulamentadora', aquela é uma intervenção 'produtiva'. No âmbito da inter- volvidos, assegurar o crescímento sustentado da economia' assegurar o
venção direta distinguiremos a atuação do Estado em regime de monopólio, em
regime de concorrência eno uso de ínstrumentos específcos de 'apropriação' da pro-
pleno emprego dosfatores de produção, particularmente da mão-de-obra,
pri.edade ou da gestão das empresas privadas* (Direito Econômíco, 2" ed., 1990,"p. uma relativa estabilídade de preços, e garantir o equilíbrio da balança de
126-127). Cf. PATRÍCIO, Simões, Curso de Direito Econômico, 1981, p. 327-718; pagamentos. Para garantir a consecução desses objetivos, deverá o Estado
MONCADA, Cabral de, Direito Econômico, 2" ed.., 1988, p. 183-397). adotar uma série de medídas de política econômica que podem dizer-se
284 JOÃO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA DIREITO ECONÔMICO 28s
instrumentos para alcançar aqueles objetivos fundamentais, mas que não Acentuem-se ainda as restrições de ordem concolrencial internacto-
de países
têm por isso sua importância diminuída. É imperioso notar que a adoção de nal, as políticas protecionistas que impedem o desenvolvimento
uma determinada medida não exclui outras, até porque autilização isolada em fase de desenvolvimento.
de certa medida terá efeitos negativos em outros setores, de tal forma que A originalidade e novidade de determinadas políticas econômicas de-
se pode e se deve afirmar que a situação de equilíbrio buscada como perfei_ pende ainda de situações conjunturais peculiares a cada
país. Por exemplo,
ta continuará sendo sempre uma meta a ser alcançada.52 ãs Estados Unidos tiveram que defrontar-se com o
problema da concentra-
já no final do século XIX, e a partir de então tiveram que
É evidente que nenhum govemo tem condição de adotar simultanea- ção de empresas
r r ê n c i a - 1 al pr o -
mente e na mesma medida essas quatro políticas fundamentais a que os ádotur .r*"p olítica ec onô mi c a garant ido r a d a liv r e co nc o
economistas denominam de "quadrado mágico" (crescimento, pleno em- blema somente veio preocupar os países europeus a partir da Primeira
prego, estabilidade de preços e equilíbrio exterior), por isso as necessida_ Grande Guerra. No Brasil, tal questão somente veio a aflorar a
partir dos
des conjunturais é que determinarão o privilegiamento de uma ou outra anos 30; bastaverque somente após a Constituição de 1934 é
que houve a
preocupação com os crimes contra a economia popular. A Lei no 4.137,
de
dentre elas.53
A adoção de determinada política econômica leva também a conflitos ì962, que esøbelece entre nós as primeiras normas garantidoras da liberdade
com o objetivo de outra, como, por exemplo, a adoção de uma política de concorrência, pode dizer-se um diploma teórico privado de
eficácia.
energética pode levar, e freqüentemente leva, a confrontos com as preocu- Ressalte-se ainda que uma política econômica que consiga a adesão
do
pações deumapolítica ambientaL Podem ocorrer também conflitos enfre dos setores interessados tem muito maiores probabilidades de sucesso
os objetivos imediatos de uma polítíca social e os de uma política de com- que uma imposta autoritariamente. Daí porque atualmente os países se vol-
petítividade índus trial. åtn pur" a ådoçao de políticas econômicas através do consenso'54
Existem ainda limitações ou restrições de ordem geográfica, ou de- Não se pode desconsiderar a necessidade do planejamento que tem
mográfica- Por exemplo, qual seria a perspectiva de implantação de uma como finalidãde conferir racíonalidade, coerência às políticas econômi-
política agrícola num país de diminuta extensão territorial ou de território cas adotadas. O planejamento tem como finalidade fixar metas
que servem
desértico? Qual seria a perspectiva de adoção de uma política de cresci- de norte para os-esfoiços empreendidos.s5 Somente um planejamento
glo-
mento num país de grande explosão demográfica?
54 obsewam Jacques e colette Nême que não se deve colocar nos textos legais demasia-
da severidade, pois que "as políticas dos países latinos são freqüentemente
mais rigoro-
sas em sua formulação do que em sua aplicação; enquanto que no Japão
a oficiosa
pressão dos poderes públicos - como o histórico imposto sobre o châ do establishment
52 "Os economistas e os homens políticos, como afirmam M. Bertonéche e J. Teulié, es- t.itâni"o -, i.ruo""n¿o o interesse geral, tem resultados substanciais. Às vezes até mes-
tão perenemente à procura da receita mágica, que assegure ao mesmo tempo o pleno mo a ausência de uma verdadeira política econôrnica pode ser seguida por sucessos
que a lon-
emprego e a estabilidade dos preços sem comprometer o crescimento da economia e brilhantes, como para os preços desde uns quarenta anos na RFA - enquanto
o equilíbrio exterior. E a política econômica surge, cada vez mais, como uma mistura ga pnitica de regulamentação francesa teve efeitos pouco convincente{' (ibid.,p.22).
de medidas técnicas e de componentes psicológicos e sociológicos. o sucesso de um 55 Þnitipp" Uaysàat, referindo afìrmação de R. Maldague (leD¿batsur la Planifcati-
programa, qualquer que seja, supõe um certo consenso da coletividade nacional on Intermëdíaire,28 juin, 1974), entende que "a única visão realista de
(Thêorie Macro-Économique: Textes Fondamentaux, 1977 , p. 464). "i-B"lgju",
um Plano, ao mesmo tempo cada vez mais dificil e indispensável, é a de um quadro
53 A este respeito, a opinião de Jacques e Colette Nême: ..Se estas quatro exigências se de referência inserido numa perspectiva de mais longo termo, no qual os poderes
pú-
manifestam pouco conciliáveis, os govemos serão levados a preferir uma ou outra blicos identifrcariam alguns objetivos prioritários traduzidos em programas concre-
dentre elas: o crescimento no Japão e na França depois da guerra, como na Espanha tos .finalizados'e precisados cada ano, de orçamento em orçaInento" (Politiques
dos anos 60; o pleno emprego na Suécia e na Noruega; a estabilidade dos preçös na d'Intervention de l;État et Administration Économique, ¡jr Favresse, Jean-Michel,
RFA e na Suíça, o equilíbrio exterior para os Estados Unidos no fim dos anos g0" Aspects Jurídiques de l'Intervention des Pouvoirs Ptúlics dans la vie Economique,
(Potítíques iiconomiques Comparées, 989, p. t 7).
1 1976,p.27)-
286 JOÂO BOSCO LEOPOLDINO DA FONSECA DIREITo gcottôvttco 28'l