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Das formas modernas do atraso

A força espiritual da democracia é o


fator de resistência à redução de
todas as esferas da vida ao fator
econômico

OLGÁRIA MATOS

A noção de modernidade confunde-se com a idéia de progresso científico e tecnológico, dissimulando


regressões na sociedade. No ideário humanista, só há progresso quando ao desenvolvimento material
corresponde o desenvolvimento humano. Na contemporaneidade, não se encontram premissas
tranquilizadoras, nenhuma síntese final. Ao contrário: o arcaico é secretamente preservado na intimidade do
moderno.
Elementos retardatários coexistem "anacronicamente" no presente. O par progresso/decadência manifesta
hoje mais as sombras do que as luzes do primeiro. O Brasil "profundo" de Guimarães Rosa, com seus
jagunços e "leis" pré-escritas, com seu apreço pelos bovinos, encontra-se consanguineamente tensionado
com a modernidade de Brasília. O tempo "do onça" não está tão longe assim.
Assistiu-se em São Paulo ao retorno do escambo. Os dicionários registram a palavra como "forma arcaica de
permuta". Modalidade primitiva da troca, nele o pagamento se faz em "espécie" na compra e na venda. Era
usado também na compra de escravos durante o período colonial. Recentemente, os jornais noticiaram que
escolas de São Paulo firmaram acordo com pais inadimplentes pelo qual o atraso no pagamento das
mensalidades poderia ser saldado mediante aparelhos de som, fornos de microondas, computadores e demais
equipamentos modernos.
Comparece, ainda, o "tempo das diligências": carroças fazem o transporte nas avenidas de Brasília. Carroça é
"carro grosseiro, ordinariamente de tração animal, que carrega cargas em geral". Os espectadores puderam
acompanhá-las pelos canais de TV.
Carroça e escambo são sintomas que podem ser detectados na velocidade da circulação do capital,
produzidos, promovidos e sustentados pela política do Estado. Este, como conceito, é um organismo político-
administrativo que, como nação soberana ou divisão territorial, é dirigido por governo próprio e constitui
pessoa jurídica de guardião do direito público. Com uma nuance: de agora em diante, será Estado mínimo,
aquele que "flexibiliza" as leis trabalhistas e do mercado para a livre concentração do capital.
Ele é mínimo, mas sua arrecadação é máxima. A política que lhe convém é a do tráfico de influência, o que
significa abuso no processo de criação de consensos governamentais e sociais. Realiza-se, em geral, nos
corredores dos Parlamentos, mediante compra "in natura" de votos -em nome da causa justa e do bem
comum.
Na modernidade, ocorre uma verdadeira mutação do conceito de democracia, antes entendida como forma de
governo e de convivência em que os direitos materiais e espirituais da sociedade não dependiam dos vícios
ou virtudes de seus governantes, mas da qualidade de suas instituições.
Na sequência da Revolução Francesa, revoga-se a prática do favor e da dependência pessoal de súditos e
governados, característica do "ancien régime". O "citoyen"/cidadão chega à maioridade, alcançada na
abolição da tutela e da minoridade política e intelectual, uma vez que, numa democracia, todos dependem
igualmente da lei.
Quanto ao liberalismo, ele pode ser entendido em termos econômicos e significar a auto-regulação do
mercado -o mesmo que submete homens, indivíduos, cidadãos à lei do mais forte, com o retorno do
darwinismo social e do malthusianismo que marcaram a primeira Revolução Industrial na Inglaterra, por
exemplo. Politicamente, o liberalismo constitui-se como tolerância, acepção predominante na França a partir
da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Na tradição do Ocidente, da Grécia clássica ao humanismo cívico da Renascença e deste às experiências
modernas, a ênfase da democracia encontra-se na educação, instituindo-se a esfera pública e o direito à
cidadania cultural. Liam-se autores clássicos nas línguas de origem (grego e latim) porque ricos e pobres
ocupavam os mesmos bancos escolares. Era função do Estado garantir a continuidade das políticas de cunho
social (entre outras, as de saúde e educação), independentemente da alternância dos partidos no poder.
Quanto mais aprimorada a democracia, mais ampla é a noção de qualidade de vida, do grau de bem-estar da
sociedade e do igual acesso a bens materiais e culturais. Manifesta-se, de forma palpável, na dimensão da
convivência entre as pessoas, reveladora de urbanidade e respeito recíproco. Nesse sentido, a força espiritual
da democracia é o fator de resistência à redução de todas as esferas da vida ao fator econômico.
Hobbes, no "Leviatã", escreveu que viver é mais que sobreviver: é excluir a violência, não sofrê-la nem
aplicá-la, aproximando sujeitos sociais, reconciliando desejos e vida. Os homens não querem só viver, mas
viver bem, sem medo da dependência ou da miséria.
A tendência contemporânea a tudo explicar por determinações econômicas resulta de elas serem
consideradas um circuito fechado de fenômenos objetivos, a cujas leis -análogas àquelas sujeitas ao
determinismo da natureza- os homens devem se submeter. A linguagem econômica expressa-se, por sua vez,
em números, fórmulas, estatísticas. Pensamento por média, pode ser assim entendido: "X come quatro
sanduíches por dia; Y, nenhum. Na média, o faminto come dois".
A modernidade em sentido neoliberal é criptogenocida; opera com o raciocínio da sobrevivência, do limite
entre a vida e a morte, quando os humanos têm resguardada apenas uma fina película que os liga ao mundo
dos vivos.
No modo de vida da contemporaneidade, os indicadores do progresso referem-se à "vida primária", ao
metabolismo basal -o consumo diário de calorias, proteínas, vitaminas etc. Sabe-se que a fórmula é aplicada
ao cenário amargo de países africanos. No momento, o Brasil adota a "africanização" como indício de
modernização e progresso. O neoliberalismo é o capitalismo que perdeu todos os escrúpulos.

Olgária Chain Féres Matos, 48, é professora de filosofia política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo. É autora de "Os Arcanos do Inteiramente Outro: a Escola de Frankfurt, a Melancolia, a Revolução" (ed.
Brasiliense, 1989).

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