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os subalternos
Curriculum, power and educational struggles: in the
words of the subordinates
Simone de Figueiredo Cruz*
Pedagoga, Psicopedagoga, Mestre em Educação pela
UCDB – linha Diversidade Cultural e Educação Indígena.
Atua com formação pedagógica no CEESPI/MS. Docente
na pós-graduação, na UCDB, Libera Limes e instituição
no interior de MS. Pesquisadora colaboradora externa do
NEPPI – Núcleo de Estudos e Pesquisa das Populações
Indígenas / UCDB e Psicopedagoga Clínica.
e-mail: simonefc66@hotmail.com
284 Simone de Figueiredo CRUZ. Currículo, poder e lutas educacionais: com a...
cultura, para iluminar os debates sobre o Apple retoma idéias de Paulo Freire,
que conta como conhecimento nas escolas. de quando esteve no Brasil, sobre a impor-
Esta obra favorece a compreensão dos li- tância da educação começar no diálogo
mites e possibilidades dos grupos subalter- crítico. Este diálogo se faz importante tanto
nos falarem e agirem dentro da educação. em relação às experiências internas como
Os autores articulam uma análise das às externas à nação, para aprender com
maneiras como as diferentes formas de do- outras realidades.
minação atuam, com um foco específico nos Esta obra tem o propósito de articular
espaços criados, como os grupos subalternos as respostas, a voz, a identidade e o conhe-
podem reafirmar suas identidades, culturas cimento de quem tem mais valor diante das
e histórias. Assim, esperam participar da cons- condições políticas, econômicas e culturais.
trução de escolas que conduzam a uma Analisa as lutas dos grupos subalternos por
“nova ordem” radicalmente democrática. reconhecimento cultural e redistribuição eco-
Apresenta exemplos de projetos de- nômica nos diversos contextos educacionais
senvolvidos em meio a “guerras culturais” e explora como essas relações intervêm na
nas escolas. Revela como um currículo rela- produção e distribuição do currículo.
cionado com as vidas dos estudantes pode Na primeira parte – “Os subalternos
abrir espaços para um aprendizado que falam: na voz de quem? Os colaboradores
reconheça como valiosas as culturas dos articulam as seguintes ideias: Buras iden-
grupos subalternos. Essa pedagogia é rele- tifica e analisa iniciativas curriculares e mo-
vante para discutir sobre o poder das for- vimentos educacionais no cenário dos Es-
mas culturais dominantes que divide as tados Unidos. Apple avalia os papéis de
pessoas entre as aceitos e intrusos nas ins- gênero tradicionais para as mulheres, as in-
tituições educacionais. fluências do acesso às novas tecnologias e
Desta forma, de que modo grupos o crescimento da escolarização em casa.
dominantes e subalternos intervêm nos cir- Esclarece as contradições nos movimentos
cuitos de produção, distribuição e recepção conservadores que posicionam a mulher
curriculares? As coletividades influenciam a como subserviente e, ao mesmo tempo, as
produção e circulação do conhecimento e identidades de atores poderosos. Pedroni
reinterpretam as representações que per- examina a formação de identidade e a
meiam a vida escolar. Os colaboradores ação de países afroamericanos de baixa
apresentam as contestações, concessões e renda envolvidos no programa de vale-edu-
reconstruções relacionadas às políticas curri- cação. Os cuidadores influenciam os sujei-
culares e educacionais. Os avanços dos estu- tos de maneira complexa, contraditória e
dos sobre os subalternos e pós-coloniais re- criativa. Nesta primeira parte, instiga-se o
velam a importância de entender as relações leitor à compreensão das políticas da
interconectadas e inconstantes entre a “peri- subalternidade em relação às forças agres-
feria” e o “centro”, especialmente em termos sivas da modernização conservadora, apon-
de disputas sobre o conhecimento. tando o risco de se esquecer as disputas
286 Simone de Figueiredo CRUZ. Currículo, poder e lutas educacionais: com a...
Gandin analisa iniciativas subalternas em reconhecimento cultural e como elas podem
Porto Alegre, Brasil. Enfatiza como comuni- nos ajudar a entender melhor as comple-
dades oprimidas rearticularam discursos xidades, as contradições, os limites, os peri-
neoliberais sobre concorrência internacional gos e as possibilidades das lutas educacio-
e devolução de responsabilidades, num nais. Não fecham com conclusões, mas
projeto da Escola Cidadã. Aponta o quão deixam espaço para os debates que são
difícil é ouvir as vozes subalternas em con- fundamentais para ações mais reflexivas,
textos neoliberais, tornando-as muitas ve- produtivas, efetivas e bem-sucedidas no
zes ruídos. Mas, aqui, um grupo de vozes enfrentamento das complicadas relações de
subalternas conquista espaço na política dominação e subordinação existentes nas
pública e o grande ensinamento é que “não sociedades. Sobre a questão inicial – “os
existe um modelo que possa ser reproduzi- subalternos podem falar?” Os autores es-
do em qualquer lugar”. É sempre necessá- clarecem que não é um simples sim ou não.
rio traduzir a proposta à realidade cultural, Apontam que, nas relações de poder desi-
democratizando a gestão, a escola e o co- guais e em lutas educacionais díspares, há
nhecimento. A qualidade está pautada na uma variedade de limites e possibilidades.
capacidade de gerar um currículo inserido A iniciativa foi avaliar os espaços encon-
na cultura local, envolvendo o pensamen- trados sem romantismos e os mais táticos,
to crítico e a transformação social. Buras e estratégicos e democráticos possível, pen-
Motter trazem ao leitor o desafio de ima- sando sempre dentro e através das frontei-
ginar e desenvolver um currículo que esti- ras para a reconstrução crítica e democráti-
mule uma variedade de solidariedades, que ca do currículo, da escolarização e do teatro
promova os interesses dos subalternos em da educação, em sentido amplo.
âmbito local, nacional e global. A possibili- Trata-se de uma publicação que re-
dade que o multiculturalismo cosmopolita vela estudos críticos em educação e, por
subalterno pode fazer é ajudar os estudan- isso, muito oportuna para que se tenha
tes a desenvolver a capacidade de pensar uma visão menos romântica das questões
e agir de formas contra-hegemônicas, den- envolvidas na política da subalternidade,
tro e através das fronteiras, algo desafiador tornando possíveis compreensões e inter-
e nada fácil. Nesta parte, os autores indi- venções estratégicas mais efetivas. Consi-
cam pontos de partida para a reflexão, diá- dero uma leitura indispensável para os
logo e ações. atuais e futuros professores e pesquisado-
No capítulo que fecha a obra, Apple res da temática e, por que não, como fonte
e Buras colocam várias questões sobre o para trabalhos de conclusão de cursos.