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I – Estágios de Pós-doutoramento no PPG Letras

O LATIM NO DISCURSO JURÍDICO

Francisco Caetano Pereira1

Resumo:
Estuda a importância do latim no discurso jurídico. Conceitua a linguagem
jurídica e centra-se na importância do discurso jurídico; analisa a presença
constante do latim no discurso jurídico , registra a dificuldade de
compreensão de expressões consagradas, bem como, de seu emprego,
muitas vezes equivocado.
Palavras-Chave: discurso jurídico; latim; linguagem.

A preocupação com o emprego do latim no discurso jurídico não é nova. Pode-


se afirmar, inclusive, que é recorrente na história, pois, constitui um desafio
permanente, considerando as dificuldades de toda ordem que atingem a natureza do
latim jurídico, a tradução dos termos técnicos e, ainda, a tradução para as línguas
modernas.Todas essas preocupações têm sido objeto de acurado estudo nos meios
acadêmicos e jurídicos, como o demonstram os Atti del Convegno Internazionale “Il
Latino del Diritto” , levado a efeito entre 8 e 10 de outubro de 1992, em Perugia,
Itália, sob a direção de Sandro Schipani e Nino Scivoletto, da Universidade “Tor
Vergata”, de Roma.

1 –Linguagem Jurídica: aproximação conceitual

Para refletir sobre este assunto, logo de início, faz-se necessário trabalhar dois
conceitos: linguagem e jurídico, pois, não há se pensar o Direito sem a linguagem.
Esta, prima facie, evoca comunicação e pressupõe a existência de interlocutores.
Sem qualquer laivo de dúvida, sua criação representa uma das maiores conquistas
da humanidade, constituindo-se em medium privilegiado de outras conquistas.
Hodiernamente, não há se imaginar o ser humano sem a linguagem, mediadora
inteligente da comunicação, se bem que, há milhões de anos os ancestrais do
homem não fizessem uso da palavra e, muito menos, da escrita, levando à
inferência de que, para viver, não é necessário falar: “Falar não é necessário.
Escrever, muito menos. Por milhões de anos os ancestrais da espécie humana
viveram sobre a terra gritando como os outros animais, mas sem falar.” ( De Mauro,
2003, p. 11).

A invenção da escritura alfabética vem a representar um gigantesco passo no difícil,


mas apaixonante caminhar da humanidade. Primeiro, cerca de 4000 anos antes de

1
Professor da Universidade Católica de Pernambuco. Estágio de Pós-doutoramento com supervisão
de Nelly Carvalho.
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Cristo, surge a escrita dita ideográfica, sobre pedra, tabuletas de argila ou madeira.
Ali, cada ideograma ostenta uma idéia, abriga um significado. Com meio tão
limitados, não dá para estranhar que somente uns poucos “letrados” tivessem
acesso a tal escrita. Passo contínuo, na península do Sinai, surgem os signos do
primeiro alfabeto. Do Sinai, com o concurso dos fenícios, se difunde entre os povos
que habitam o Mediterrâneo. Milhares de anos depois, alcança Europa e Ásia e, a
seguir, os demais continentes.

Criados os códigos de comunicação, poder-se-ia pensar que toda a problemática da


comunicação entre os humanos estaria resolvida. Ledo engano. A linguagem
continua a ser um grave desafio, objeto de estudo de vários ramos do saber
humano, mas pelo geral, é concebida como “uma atividade humana universal em
que se utiliza um sistema de sinais coordenados entre si com base em determinadas
regras que se pressupõem aceitas geralmente.” ( Falcão, 2000 p. 48). Claro que os
aludidos sinais não podem ser usados aleatoriamente. Eles pressupõem a
intersubjetividade e, por conseguinte, devem ser decodificados pelos interlocutores,
pois, do contrário, não se dará a comunicação.

Adverte-se, desde logo, que língua e linguagem não se confundem. Esta


questão é trabalhada de forma lúcida por Saussurre que assim se expressa:

“Mas o que é a língua? Para nós, ela não se confunde com a linguagem: é
somente uma parte determinada, essencial dela , indubitavelmente. É, ao
mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto
de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o
exercício dessa faculdade nos indivíduos. Tomada em seu todo, a
linguagem é multiforme e heteróclita; a cavaleiro de diferentes domínios, ao
mesmo tempo física, fisiológica e psíquica, ela pertence além disso ao
domínio individual e ao domínio social; não se deixa classificar em
nenhuma categoria de fatos humanos, pois não se sabe como inferir sua
unidade.” (Saussure, 1975, p. 18).

Por outro lado, há-se de reconhecer que a linguagem não se adstringe


unicamente à “dimensão lingüística da linguagem”, pois, se assim o fosse, como
explicar a linguagem gestual que também comunica?(Falcão 2000 p. 49) Sem
embargo, interessa neste caso, precipuamente a “linguagem lingüística” e uma
primeira indagação exsurge: qual a sua origem? Vem da natureza ou é fruto de mero
convenção? Complementando-se com outra, igualmente importante: qual a sua
natureza? Na tentativa de responder a tais indagações, pelo menos quatro
interpretações têm recebido bastante aceitação.
a – A linguagem como convenção, que tem como seus primeiros cultivadores os
Eleatas. Nomes como os de Parmênides, Empédocles e Demócrito são
apontados como defensores do convencialismo. Este último assenta sua teoria
em quatro argumentos básicos: “a) coisas diversas são denominadas pelo
mesmo nome; b) a mesma coisa é denominada às vezes por vários nomes;
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c)existe a possibilidade de mudança de nome; d) ocorre, outrossim, a falta de


analogias na derivação dos nomes.” (Falcão, 2000 p. 52);
b – A linguagem como algo existente na natureza. Os defensores desta teoria
divergem em algumas formas , porém, no essencial, elas convergem: “Todas
elas aceitam que a linguagem é apofântica, ou seja, aquilo que, nos termos do
ensinamento aristotélico, conduzia à convicção de que é na linguagem que têm
lugar as determinações de verdadeiro e falso, conforme a união ou a separação
dos sinais reproduza ou não a união ou a separação das coisas. Em
decorrência, a linguagem é reveladora de seu objeto.” (Falcão 2000 p 58);
c – A linguagem como instrumento. As raízes desta teoria remontam a Platão e a
tese central esposada por ela é a de que a linguagem é um instrumento e, como
tal, precisa cumprir sua missão. “Por conseguinte, é o emprego , enquanto
escolha repetida ou convalidada, que prepara a linguagem para se
instrumentalizar. E conforme esteja mais ou menos bem empregada é que a
linguagem cumprirá bem ou não seu escopo.” Falcão, 2000 p. 65);
d – A linguagem como acaso. Quanto a esta teoria discute-se se ela é mesmo
autônoma ou um mero desdobramento da anterior, a instrumental. A bem da
verdade, busca-se uma explicação racional para a natureza da linguagem como
oriunda do acaso, ainda que albergada em uma cera técnica. “O que existe de
especial no novo ramo, ora analisado, é que a escolha cede espaço ao acaso.
Mas ao acaso estatístico. Portanto, o acaso dotado de alguma previsibilidade,
numa espécie de estudo estatístico da linguagem. Trata-se de visão embasada
no princípio de que ações individualmente mutáveis e imprevisíveis deixam de
sê-lo, isto é, tendem à uniformidade e à constância, se, rejeitadando a
focalização isolada, partirmos para considerá-las em bloco, ou seja, em grande
número.”( Falcão, 2000, p 66).

Quanto ao conceito de jurídico, nada melhor que ir ao étimo do termo em


questão. Com efeito, ele advém de jus – juris e tem o mesmo radical de justum e
justitia. Isto no latim clássico e mui “provavelmente originado do sânscrito iás,
relativo ao recinto sagrado onde se ministrava a justiça.” (Nascimento, 2002, p. 7).
Já no baixo latim, ou melhor dizendo, no latim popular, a preferência recai sobre o
termo directum, de dis significando muito e rectum, reto. (Ferraz, 2001 p. 32).2

2 – Semiótica e Direito:

O termo semiótica quer significar a disciplina que trata do signos. Estes, por
sua vez se materializam como entes físicos através de elementos como palavras

2
ibid. “... ao lado da palavra do latim clássico jus e significando também direito, apareceu a palavra
derectum (inicialmente, talvez, somente rectum e, mais tarde, também, a forma directum)... da palavra
rectum – ou da indoeuropéia rek-to derivou rechts, right etc. e, da palavra derectum , direito, derecho,
diritto, droit etc.”
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escritas, ondas sonoras, gestos, dentre outros, e se localizam entre as pessoas e as


coisas.
Já a semiótica, por sua parte, se manifesta em três dimensões: a sintática, a
semântica e a pragmática.
É sabido que a Semiótica Jurídica não é uma ciência nova. Suas raízes e
fundamentos se assentam no próprio desenvolvimento da Semiótica enquanto
ciência. Seu conceito se encontra muito bem delineado quando se afirma que a
Semiótica Jurídica:

“...é uma teoria que deve preocupar-se com acentuar o funcionamento


interdiscursivo do sistema jurídico, que vivencia uma relação de viva
dinâmica com os demais sistemas de significação, onde se detecta a inter-
ação de informações, assim como se vivenciam a um só tempo a
formação, a re-formação, a re-construção, a destruição e a continuidade
dos discursos, em sua heterogênea miscigenação; não é por outro motivo
que seu designativo é o estudo pan-crônico.” Bittar, ( 2001 p. 43)

Da afirmativa acima, algumas inferências podem ser levadas a efeito: à


Semiótica Jurídica não lhe cabe um papel meramente descritivo dos movimentos
dos sistemas semióticos, mas, sobretudo, um papel eminentemente crítico da
juridicidade; aplicar uma tecnologia adequada á construção dos sistema de
significação jurídica; “servir às estruturas profundas da significação, colocando-se a
serviço do que há de precedente e do que é primeiro no sentido da produção
sígnica”.
Por outro lado, como bem assinala Bittar, já que à Semiótica Jurídica não lhe
cabe o estudo da significação, cumpre-lhe a preocupação com a Semântica, a
Sintaxe e a Pragmática, assim como, mais seu interrelacionamento e, menos, cada
uma em isolado.
Ademais, é preciso reconhecer que a juridicidade não esgota o Direito, pois, se
assim fosse, cair-se-ia no mais crasso positivismo jurídico. O Direito representa, na
verdade, o todo, enquanto que a juridicidade é a parte. Assim, como manda a boa
lógica: a parte não contém o todo, mas o todo contém a parte.
Na verdade, não há se pensar o Direito sem a linguagem, considerando que
ela é exatamente quem encarna seu veículo de expressão e de sobrevivência. Com
efeito, o Direito só existe porque conta com a linguagem porque:

- “não pode produzir seu objeto numa dimensão exterior à linguagem;


onde não há rigor científico não há ciência;
sua linguagem fala sobre algo que já é linguagem anteriormente a esta
fala, por ter por objeto as proposições normativas (prescritivas), que do
ângulo lingüístico são enunciados expressos na linguagem do legislador;
o elemento lingüístico entra em questão como instrumento de interpretação

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se a linguagem legal for incompleta, deverá o jurista indicar os meios para


completá-la, mediante o estudo do mecanismo da integração;
o elemento lingüístico pode ser considerado como um instrumento de
construção científica, visto que se a linguagem legal não é ordenada, o
jurista deve reduzi-la a um sistema.” Diniz ( 19994 p . 172)

3 – Semiótica e Discurso:

A noção de discurso na presente reflexão é de suma importância para a


consecução do trabalho. Preliminarmente, aqui, discurso e texto se confundem ou,
para maior explicitação, são tomados como sinônimos. Assim, texto e discurso
configuram o “locus de convergência sígnica e de emergência do significado”. O
discurso é, com efeito, o espaço privilegiado da significação e, igualmente, da
transmissão. A significação, por sua vez, ostenta um papel da maior relevância no
contexto do estudo semiótico centrado no discurso.
É sabido que o termo discurso é, do ponto-de-vista etimológico, plurívoco. Isto
é, ostenta vários significados. Com efeito, o sempre lembrado Bittar evoca a idéia de
dianóia (discursus) e lógos (oratio). E acrescenta:

“De um lado, o discursus consiste no uso da racionalidade depurativa das


idéias, contrapondo-se, portanto, à noção de intuição (noésis); o discursus
envolve o cursus de uma proposição a outra, de modo que todo raciocínio
encontra-se condicionado por esse percurso. De outro lado, o discurso é
entendido como sendo lógos, ou seja, o transporte do pensamento (noûs)
das estruturas eidéticas para a esfera da comunicação, o uso do noûs na
articulação da linguagem. O lógos, em verdade, é o noûs feito palavra, o
que equivale a dizer que há uma passagem do simbólico abstrato noético,
do simbólico do pensamento e da formação das idéias, para o simbólico
concreto e expressivo” Bittar, 2001 p. 71-72)

4 – Discurso Jurídico:

Todo discurso pressupõe, via-de-regra, um emissor, uma mensagem e um


receptor. No caso concreto do discurso jurídico, dado sua especificidade, ele
pressupõe uma homologia, ou seja, outro jurista a quem se pretende convencer,
com vista a verdade.3
A despeito de quem pensa que o discurso jurídico é unicamente normativo,
convém lembrar outras manifestações textuais, como as configuradas no discurso
jurídico-burocrático, no discurso jurídico -científico e no discurso jurídico -decisório.

3
“...a ação lingüística do jurista, na discussão-com, buscando a adesão da outra parte, procurando
convencê-la, tendo em vista a verdade, dirige-se, geralmente, a outro jurista, porque entre orador e
ouvinte deve existir uma homologia.” Diniz, 1994 p. 174)
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O discurso normativo é detentor de uma propriedade muito singular:


fundamenta e define o sentido jurídico do discurso. Em outras palavras, torna o não
jurídico em jurídico.
Quanto ao discurso burocrático, ele se mostra detentor de algumas
características: é subordinado ao discurso normativo, por conseguinte, é vulnerável
a todos os seus influxos; é um discurso modalizado e não produz persuasão, pois,
como diz Bittar, “atua não sobre o saber, mas sobre o fazer, condicionando-o a
outros atos...”; tem uma função claramente adjetiva com relação ao discurso norma;
configura-se como um discurso mediador entre “a instância estatal e os interesses
particulares”; mostra-se indiferente ao poder vigente, pois, não denota identificar-se
com qualquer manifestação ideológica; exercita-se independetemente da atividade
interpretativa; por fim, é detentor de um “caráter performativo, pois, por meio de sua
elocução, realiza atos externos à linguagem”4
O discurso decisório, por sua vez, é aquela espécie de discurso jurídico que
deriva do discurso normativo e é corolário do discurso burocrático e que tem a
propriedade de modificar a situação jurídica do indivíduo. Cumpre esclarecer,
todavia, que o discurso decisório, mesmo se assentando e fundamentando no
discurso normativo, manifesta sua contribuição através da adaptação e atualização
de seu sentido , tendo em vista as particularidades suscitadas pelo feito sob
apreciação judicial.
O discurso científico, por seu turno, é exegese: só constrói sentido jurídico.
Significa dizer que ele não tem a pretensão de decidir, procedimentalizar ou
normatizar, como as outras espécies de discurso, mas, simplesmente, “conferir
sentidos e possibilidades exegéticas” ao discurso jurídico.5 Por isso, tem razão
aquele que admite que o discurso científico é um discurso centrado na interpretação,
crítica e compreensão do discurso jurídico.
Com efeito, o discurso científico é dotado de uma lógica argumentativa
aguçada que o credencia a esquadrinhar textos jurídicos para produzir textos
igualmente jurídicos, ou seja, não se adstringe a uma atividade de mera congnição
mas, de construção do sentido jurídico.

4
Cf Bittar, 2001 pp. 250-253.
5
“O que se quer dizer com mais precisão, é que o universo de discurso da ciência jurídica está
acentuadamente vertido para a exegese das produções textuais jurídicas. O discurso jurídico não
atribui existência às ocorrências jurídicas, não atribui validade às imposições jurídico-normativas ou
decisórias ou burocráticas, mas sim avalia as textualidades produzidas por esses microuniversos de
discurso jurídico com os quais intrage. Mais que isso, avalia e re-avalia suas próprias produções
textuais, num processo de constante crítica de suas produções, intração esta sobremaneira
importante nas relações entre dogmática ezetética.” Bittar (2001 p. 311)
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5– Língua Latina: Veículo de Expressão dos Direitos Romano e Canônico.

A língua latina tem sua origem entre os antigos habitantes da região do Lácio,
localizada na parte central da península itálica. Quando surgiu, é, praticamente
impossível precisar uma data. O que se sabe é que essa língua primitiva
acompanhava o espírito guerreiro de sua gente e, nas áreas conquistadas, marcava
presença, se bem que representasse, na verdade, uma mescla de dialetos
ostentando um vocabulário bastante pobre, adstrito, como era natural, a temas
centrados na família, agricultura, pecuária e, com certeza, atividades bélicas.
Somente com a conquista da Magna Grécia e com o impacto causado pela
magnitude da cultura grega, é que os romanos se dão conta da fragilidade de sua
língua. Por isso, é que se diz, com toda a propriedade, que os romanos venceram
militarmente a Grécia, sem embargo, foram vencidos pela pujança da civilização
grega.
Com que se acaba de dizer, pode-se entender bem, porque, homens cultos
oriundos da Grécia foram a Roma ser mestres dos romanos. É sabido que a fina flor
da sociedade romana freqüentava as escolas regidas por esses ilustres gregos. A
aceitação delas era tanta que por volta do sexto século (aproximadamente 200 anos
a. C. ) só em Roma já se podia contar vinte e uma escolas.

Como era de se esperar o latim escolástico (de escola), só alcançou a classes


abastadas. Por isso, teve um período áureo de muito curta duração: primeiro século
antes de Cristo e alguns anos do século subseqüente: ‘Depois da morte de Augusto
(a.14 depois de Cristo) começaram a manifestar-se os sinais precursores da
decadência que se acelerou de tal modo que, poucos séculos depois da queda do
império (a. 476), a língua latina que civilizara o mundo, ditando leis e costumes aos
povos, vencida por sua vez pelas línguas vulgares, cessava de ser língua falada,
para ser considerada língua morta.” (Ravizza, 1940 p. 381).
Em verdade, a plebe que não tinha acesso à escola se comunicava como podia
e como sabia fazê-lo: sermo plebeius, rusticus, vulgaris ou cotidianus. De fato, esta
decadência era logicamente previsível: Roma, uma cidade cosmopolita, a capital do
império era o lugar para onde convergia gente de todas as paragens. Cada grupo
com seu linguajar e suas idiosincrasias. A este respeito, o grande tribuno Cícero
chegou a fazer severas advertências, demonstrando o crescente vilipêndio de que
era vítima a língua latina
Por outro lado, é preciso considerar que a tradução do latim jurídico ao
vernáculo deve levar em conta não só as idiosincrasias de natureza morfológica ou
sintática, mas, sobretudo, a preocupação com a fidelidade da mensagem veiculada
tanto pela língua alimentadora quanto pela língua receptora.

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Considerações finais

Do quanto se há visto no presente estudo, algumas inferências podem ser


extraídas. sem, no entanto, a pretensão de esgotá-las:
Primeira : A despeito de ser reconhecida a importância da língua latina no
desenvolvimento do raciocínio lógico, bem como, no processo de aprimoramento da
inteligência, ela é mal compreendida e até ignorada, pois, como já se acha
registrado, foi alijada do ensino médio e do ensino superior, salvo nos casos dos
Cursos de Letras, onde reconhecidamente é ensinada de forma incipiente. Nos
cursos de Ciências Jurídicas, nem mesmo o latim jurídico, sobejamente empregado,
é objeto de estudo sistemático como era de se esperar. Neste contexto, as palavras
do Professor Napoleão Mendes de Almeida, em sua Gramática Latina, hão de soar
como um resignado lamento:
Segunda: O desconhecimento do latim leva por conseqüência a uma grave
falha no que diz respeito à tradução de autores latinos, in casu, a tradução do latim
jurídico, considerando que o mesmo é detentor de um vocabulário técnico próprio e,
ademais ostenta ponderáveis diferenças sintáticas e estilísticas, de tal forma que
não parecerá ocioso falar-se do latim jurídico como uma língua especial, como se
diria igualmente do latim cristão. Com efeito o latim jurídico não destila aqueles
arroubos de oratória como se pode encontrar nos clássicos: “...o estilo é do genus
tenue, sem arroubos retóricos, com neologismos e metáforas araros, palavras
inusitadas e arcaísmos as mais das vezes evitados; e finalmente, quanto às
constituições imperiais, são elas, em geral escritas em forma simples e sem
adornos, não tendo ainda sido tentado um estudo lingüístico sobre elas.” Alves,
1992 p. 311).
Por outro lado, é preciso considerar que a tradução do latim jurídico ao
vernáculo deve levar em conta não só as idiosincrasias de natureza morfológica ou
sintática, mas, sobretudo, a preocupação com a fidelidade da mensagem veiculada
tanto pela língua alimentadora quanto pela língua receptora.
Terceira: São verdadeiramente reais as dificuldades pertinentes á tradução do
latim jurídico ao português, mormente quanto se atenta para:
a) para a diversidade das estruturas da língua. Recorde-se que o latim é uma
língua sintética enquanto que o português, a exemplo das demais línguas neo-
latinas, se apresenta como língua eminentemente analítica, por citar uma
diferença importante;
b) dificuldades no tocante à concepção dos institutos jurídicos. Estas dificuldades
se agigantam quando o texto em foco é um texto de direito antigo. Com efeito,
toda tradução exige o máximo de fidelidade ao texto original sob pena de mutilá-
lo;
c) desafios no que pertine ao emprego do genitivo latino por conta de suas
diferentes modalidades. “As diferentes modalidades de genitivo (o possessivo, o
apositivo, o partitivo, o objetivo e o subjetivo) têm sua desinência suprida pela
preposição de. O dativo – e são freqüentes as espécies do dativo de interesse ou
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de desinteresse (datiuus commodi et incommodi) e do dativo ético – é indicado


pelas preposições a ou para. O acusativo, que é o caso do objeto direito, se
evidencia pela posição depois do predicado em contraposição ao sujeito que vem
antes deste (...) e o ablativo se supre, conforme exprima a circustância de tempo,
lugar, , modo, instrumento, separação, origem, limitação e medida, pelo emprego
adequado das preposições de, com ,por, e em...” Alves (1992 pp. 317 – 318);
d) dificuldades de tradução dos termos técnicos empregados no latim jurídico. Aí
repousa, em primeiro lugar, o grande desafio de encontrar termo técnico do latim
jurídico que se adeque à língua para onde se faz a tradução. Em segundo lugar,
é preciso atentar para a evolução do seu significado no próprio direito romano;
e) desafio sucitado pela forma como chegou aos nossos dias uma gama
ponderável de textos jurídicos do universo romano. Há fragmentos de textos
jurídicos romanos que chegaram aos nossos dias já enriquecidos com
interpolações diversas, o que resulta num complicador a mais no trabalho de
tradução;
f) pouca tradução de textos jurídicos romanos para a língua portuguesa. É sabido
que não existe sequer, no Brasil ou em Portugal, até a presente data, uma
tradução completa do Corpus Iuris Civilis. Dele, consta apenas traduções de
alguns fragmentos.

Quarta: Não obstante as muitas dificuldades de uso da língua latina no discurso


jurídico, como já foi aventado anteriormente, cumpre ressaltar que seu emprego é
constante nos textos jurídicos, seja no discurso normativo, seja no discurso
burocrático, seja no discurso decisório, seja no discurso científico. Obviamente, nos
textos mais antigos vê-se que há mais fluidez verbal e coerência no emprego do
latim jurídico, enquanto que, nos textos mais recentes, se verifica um afrouxamento
no que tange ao seu uso. Ainda que ocioso, vale recordar que num passado não
muito distante, o acesso aos estudos jurídicos implicava prova de suficiência de
latim, o que já não ocorre na atualidade. Quiçá, aí se encontre uma explicação para
este fenômeno.
Curiosamente o emprego do latim jurídico, em todas expressões de sua
exuberância lingüísitica continua a ser usado largamente até por quem jamais
estudou latim, como soe acontecer com as novas gerações de operadores do direito.
Isto está patente em monografias de fim-de-curso, dissertações de mestrado e teses
doutorais. A bem da verdade, pelo menos no contexto atual seu emprego é
inevitável.
Quinta: Se o latim tem de ser usado, como se acaba de afirmar, por quê já não
mais se estuda, apesar de todas as dificuldades já assinaladas? A despeito da
pregação de alguns que pugnam pelo seu completa alijamento do universo jurídico,
por toda esse imbricamento do latim nos textos jurídicos, mesmo da atualidade, não
seria muito mais lógico fomentar seu estudo, quem sabe, a partir do ensino do
segundo grau, considerando nossa origem latina, nossa religião católica majoritária
e nosso ordenamento jurídico que teima em recorrer ao latim do direito?

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Este investigador, apesar de não se reconhecer latinista, embora tenha


estudado latim, pugna pelo retorno do ensino da língua latina, mormente para
aqueles que se propõem ao labor de operadores do direito. E, assim, o faz, por
reconhecer que o latim, mesmo língua morta, continua vivo, nas línguas neo-latinas,
nos textos jurídicos, como língua oficial da Igreja, como língua oficial do direito
canônico que continua operando e se atualizando no espaço e no tempo.
Por tudo isso, ao invés de se pugnar por aplicar-se o golpe de misericórdia no
latim jurídico, melhor seria ressuscitá-lo nos colégios e faculdades de direito. Por fim,
espera-se que esta não seja mais uma “voz que clama no deserto”.

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