Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
Resumo
1
Doutorando pela PUCSP no programa de Educação: Psicologia da Educação. Mestre em Educação: Psicologia
da Educação pela PUCSP. E-mail: conderafael26@gmail.com.
2
Doutoranda em Educação pela PUCSP no programa de Educação: Psicologia da Educação. E-mail:
rinaldabc@terra.com.br.
3
Doutora em Educação: Psicologia da Educação pela PUCSP. E-mail: veraplacco@pucsp.br.
8069
Introdução
No que concerne aos saberes construídos nas trajetórias individuais, Tardif (2008)
anuncia que ainda na condição de aluno, o futuro professor constrói suas próprias crenças
sobre a sua atividade profissional, portanto carregada das marcas da sua individualidade, da
sua formação inicial, da sua cultura e do seu tempo. Segundo o autor, os saberes docentes são
os conhecimentos, o saber-fazer, as competências e habilidades que os professores mobilizam
no cumprimento diário de suas tarefas, que não podem ser vistos como uma categoria
autônoma, dissociada da realidade (social, organizacional e humana) na qual vive o professor,
mas que devem ser situados no contexto mais amplo do estudo da profissão docente, de sua
história e de sua situação dentro das escolas e na sociedade. Para o autor,
4
Mestrandos: Antonio Vanderlei Tavares; Beatriz Bontempi Gouveia; Carolina Strausser de Sá; Luciana Andréa
Afonso Sigalla; Rafael Conde Barbosa; Selma Oliveira Alfonsi; Doutoranda: Rinalda Bezerra Carlos; Doutoras:
Camila Igari e Helena Maria Medeiros Lima;)
8070
[...] o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber
deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de
vida e com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala
de aula e com os outros atores escolares na escola etc. Por isso é necessário estudá-
lo relacionando-o com esses elementos constitutivos do trabalho docente. (TARDIF,
2008, p. 11)
Ao tratar dos saberes pessoais dos professores, Tardif aponta que estes são adquiridos
por meio da socialização, mediante o “[...] processo de formação do indivíduo que se estende
por toda a história de vida e comporta rupturas e continuidades. [...]” (2008, p.71). Para o
autor, esses saberes não são inatos, mas produzidos “[...] através do processo de imersão dos
indivíduos nos diversos mundos socializados (famílias, grupos, amigos, escolas etc.), nos
quais eles constroem, em interação com os outros, sua identidade pessoal e social”. (p. 73)
Nas falas de nossas entrevistadas, aparecem como saberes pessoais as ideias de
respeito ao outro, de modelos familiares e de resgate do ser professor. Um exemplo é a fala de
Julia, que, ao comentar sobre as aulas de uma professora específica e, depois, dos professores,
de modo geral, deixa claro que ela se sentia respeitada e atendida em suas necessidades.
8071
[...] Eu não sei explicar. Acho que a personalidade dela. Ela é muito confiante, ela
acredita muito. Por mais que o seu trabalho esteja, assim, horrível, ela acha que está
lindo, maravilhoso, que você pode fazer. Eu acho que é ela acreditar que você pode
conseguir o que você quiser. Isso eu acho que é o que marca nela. (Julia)
significam e por não a significarem, não a introjetam. Não reconhecem a teoria como um
arranjo conceitual feito pela exclusiva razão de intervir na realidade. Parecem ignorar a
necessidade de a prática voltar-se à teoria para continuar inovadora. É uma relação com a
teoria marcada pela ausência de sentido, como se apenas a prática contribuísse para os
avanços na sua formação profissional.
Essa postura nos conduz aos seguintes questionamentos: Por que essas futuras
profissionais docentes afirmam que não precisam da teoria? Será que isso ocorre pelo fato de
terem observado, ao longo de toda sua vida como alunas, o modo de funcionamento de seus
professores e, inferindo, criaram suas “próprias teorias”?
Isto porque a queixa em relação ao excesso de teoria, em detrimento da prática
pedagógica, pode levar ao risco de uma desprofissionalização docente desde a formação
inicial do futuro professor, como bem reflete Suzy, ao afirmar que “[...] saberes feitos só de
prática soam como algo vazio, mecânico, como atos irrefletidos”.
Junto à dicotomia teoria e prática, observamos uma avaliação dos sujeitos em
conformidade com as suas experiências na socialização escolar primária, reflexo das
lembranças passadas quando o aluno, no contato com o professor, imprime o modelo
tradicional de aprendizagem veiculado pela escola em que o aluno é colocado como sujeito
passivo e cujo foco é o ensino. Nessa perspectiva, para algumas entrevistadas aprender
pressupõe exercitar aquilo que lhe é solicitado. Quando instada a indicar uma disciplina
teórica, Julia diz que são necessários “outros instrumentos. Porque só esse negócio de sala de
aula, e fazer estágio e voltar para a sala de aula, não dá. (...) é mais na vivência, é mais na
prática... (Julia).”
De modo recorrente, observamos uma exaltação da prática, concebida como
desarticulada da teoria e desvinculada dos saberes produzidos em estudos e pesquisas. Assim,
os aspectos evidenciados pelas futuras professoras como os que mais contribuíram para a sua
formação foram as disciplinas práticas. No entanto, vale destacar que elas não reconhecem a
teoria que baliza as metodologias e práticas de ensino, como indica a seguinte fala:
Acho que os trabalhos em grupo e pesquisas de campo pra alguns trabalhos foram as
situações assim, que a gente vivenciou com mais... mais afinidade, mais prazer
naquilo e aí a gente acaba aprendendo mais com aquilo. Os trabalhos, as pesquisas,
atividades como as semanas interdisciplinares que a gente tinha e tinha palestras,
teatros, a gente estudava mais aquilo e por isso se aprende. (Claudia)
Nos estudos sobre aprendizagem do adulto professor Placco e Sousa (2006, p. 20)
privilegiam os espaços de interação entre os pares e enfatizam que é no “grupo que ocorre a
interação que favorece a atribuição de significados, pela confrontação de sentidos”, aspecto
mencionado acima, por Claudia.
Na contramão, a falta de tempo oferecido pelos cursos aparece como aspecto
preocupante, pois com uma carga horária condensada, as entrevistadas se queixam do pouco
aprofundamento nos conteúdos oferecidos pelas disciplinas:
Por ser um curso de três anos, eu acho que a gente aprendeu muito pouco do que a
gente precisa ter na mochila pra entrar numa sala de aula pra dar aula. Mas você
aprendeu muito pouco. (Claudia)
O último semestre do curso foi muito curto. (...) Acho que não pude aproveitar
adequadamente o aprendizado com os professores e os conteúdos das disciplinas do
último semestre. (Suzy)
conhecimentos que possibilitem o trabalho com o outro, tendo em vista que: “[...] Não é
qualquer um que vá lá na frente e dê aula... Porque educação você trabalha com o próximo!
Não trabalha com conhecimento, com só o conhecimento”, conforme afirma Flavia.
Ao serem questionadas acerca da formação recebida no curso em relação ao preparo
para o trabalho docente, as falas revelam, em certa medida, uma busca por instrumentalizar-se
através da prática. Ao que parece elas procuram uma fórmula bem ajustada para usar e dar
aula. Para isso, Claudia propõe um tipo de “tutoria”, um acompanhamento permanente.
[...] Até agora, a formação para o magistério esteve dominada sobretudo pelos
conhecimentos disciplinares, conhecimentos esses produzidos geralmente numa
redoma de vidro, sem nenhuma conexão com a ação profissional, devendo, em
seguida, ser aplicados na prática por meio de estágios ou de outras atividades do
gênero. [...] (TARDIF, 2010, p. 23)
Trajetória
O meu trabalho, o meu TCC está sendo sobre o teatro. E eu estava conversando com
um professor agora, e a gente estava entrando em um acordo de que deveria ter nas
faculdades, todos os professores deveriam ter aula de teatro, para ajudar no
desenvolvimento, na inibição. (Julia)
Então, no começo eu entrei [...]. Eu falei: “Olha, eu vou entrar e vou fazer outra
faculdade.” Mas aí, outra base e eu comecei a me interessar, comecei a gostar. A
gente começa a fazer o estágio, começa a ver que têm problemas. Que você, estando
ali, você pode resolver um problema para frequentar as crianças, os adolescentes. E
aí [...] acabei mudando nessa parte. (Julia)
Eu fiz os cursos [...] assim, para me especializar mais, por exemplo, cinema e
literatura, [...] Interpretação de textos, redação. Todos oferecidos pela faculdade,
todos gratuitos, para acrescentar no nosso currículo, para a gente. (Helena)
Ah, eu fiz curso de Inglês, mas eu fiz porque quando eu entrei para a faculdade, eu
sabia só o verbo to be, e aí precisava saber um pouquinho mais. Aí eu fiz, mas eu fiz
também um ano, mais ou menos, só para poder pegar um pouquinho de... É. Mas aí
o teatro que marcou mesmo. (Julia)
Para os participantes desta pesquisa, os saberes que servem de base para o ensino não
se limitam a conteúdos bem circunscritos, dependentes de um conhecimento especializado;
abrangem uma diversidade de objetos, de questões, de problemas que estão todos
relacionados com seu trabalho. A experiência de trabalho parece ser a fonte privilegiada de
seu saber-ensinar. É dada importância aos fatores cognitivos (personalidade, habilidades,
entusiasmo, vivacidade, etc.) e ao compartilhamento de conhecimentos sociais. Este
compartilhamento de conhecimentos sociais é considerado essencial para a vivência do
magistério; estes conhecimentos são comuns com os alunos, sendo todos membros de um
mesmo mundo social, pelo menos no âmbito da sala de aula (TARDIF, 2010).
Sua integração e participação na vida cotidiana da escola e dos colegas de trabalho
colocam igualmente em evidência conhecimentos e maneiras de ser coletivos, assim como
diversos conhecimentos do trabalho partilhados entre os pares, notadamente a respeito dos
alunos e pais, mas também no que se refere a atividades pedagógicas, material didático, etc.
No âmbito dos ofícios e profissões, Tardif (2010) afirma que não se pode falar do
saber sem relacioná-lo com os condicionantes e com o contexto do trabalho: o saber é sempre
o saber de alguém que trabalha alguma coisa, no intuito de realizar um objetivo qualquer.
Além disso, o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber
deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de vida e
8079
com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula e com os
outros atores na escola, etc.
Nesse sentido, a construção destes saberes – técnicos formais e pessoais, marca a
perspectiva de atuação profissional dos futuros docentes, no sentido de agregar-lhes uma
constituição diferenciada, capacitando-os ao exercício do Magistério. As falas de Flavia e
Suzy traduzem essa percepção:
Tenho pensado sobre isso agora. Espero bastante coisa, embora digam que a
expectativa sempre traz frustração. Quero atuar em mais de uma área, talvez
docência e pesquisa, acho que o curso dá essa possibilidade, o que é muito bom.
Penso que agora é hora de atuar mesmo, porque não pude fazer isso durante o curso
(Suzy).
Os saberes são sociais porque sua posse e utilização repousam sobre todo um sistema
que vem garantir a sua legitimidade e orientar sua definição e utilização: universidade,
administração escolar, sindicato, associações profissionais, grupos científicos, instância de
atestação e aprovação das competências, etc. Portanto, a diversificação profissional está
possibilitada e legitimada nesse saber social construído.
O caráter social do saber é importante para a compreensão das falas das entrevistadas:
o saber é adquirido no contexto de uma socialização profissional (TARDIF, 2010), onde é
incorporado, modificado, adaptado em função dos momentos e das fases de uma carreira, ao
longo de uma história profissional onde o professor aprende a ensinar fazendo o seu trabalho.
A trajetória do professor é marcada por um saber sempre ligado a uma situação de
trabalho com outros – alunos, colegas, pais, etc.; é um saber ancorado numa tarefa complexa,
que é ensinar, situado num espaço de trabalho (sala de aula, escola) enraizado numa
instituição e numa sociedade (TARDIF, 2010).
8080
Carreira
acompanhado também de uma fase crítica, pois é a partir das certezas e dos condicionantes da
experiência prática que os professores julgam sua formação universitária anterior.
Durante sua trajetória, o docente revê constantemente suas concepções de bom
professor ou professor ideal, bem como a percepção do aluno. Com o amadurecimento do
professor, o aluno passa a ser o centro das atenções e suas possibilidades, distúrbios e
processos passam a ser mais e melhor considerados (TARDIF, 2008).
Considerações Finais
REFERÊNCIAS
_________. Saberes docentes e formação profissional. 11 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude. O trabalho docente: Elementos para uma teoria
da docência como profissão de interações humanas. Rio de Janeiro: Vozes, 2005.