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Universidade de Fortaleza – UNIFOR

Núcleo de Educação a Distância – NEAD


Disciplina: Metodologia do Trabalho Científico (mod. EAD)
TítuLo: TIPOS DE CONHECIMENTO –
Autoria Profa. Dra. MARIA INÊS DETSI DE ANDRADE SANTOS

INTRODUÇÃO

Você já cumpriu a Unidade I e tendo compreendido a importância da leitura e


dominado as técnicas de estudo, chega o momento de uma incursão no domínio do
conhecimento.
Nesta nova etapa vamos distinguir os tipos de conhecimento, discutindo suas
especificidades e sua relação com campos do saber humano.

TIPOS DE CONHECIMENTO

“Diego não conhecia o mar.


O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos.
E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor,
que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:
- Me ajuda a olhar”.

(Galeano, Eduardo: O livro dos abraços. Porto Alegre: L&PM, 2005)

Este texto se inicia com as palavras de Galeano porque elas nos falam, ao mesmo
tempo, da experiência humana sensível1, racional e afetiva; da relação entre os seres
humanos e destes com o mundo; e do conhecimento que nasce dessa dupla relação.
A qualidade de conhecer diferencia os humanos dos outros seres. E mais: não
apenas podemos conhecer, mas podemos fazê-lo de várias formas. Somos dotados de
capacidades tais como imaginação, racionalidade, sensibilidade, intuição que nos permitem
construir conhecimentos distintos acerca de um mesmo fato ou fenômeno.
O que diria o poeta sobre o mar? E o cientista? O filósofo? O profeta? E o
pescador, cuja existência está tão ligada ao mar, o que nos poderia dizer? E nossos sonhos,
quando neles o mar aparece, que mistérios guardam?

1
Todos temos algo a dizer sobre o mar e nossa perspectiva muda conforme o lugar
de onde falamos. Seja esse lugar a vida cotidiana, a ciência, a religião a filosofia, a arte...ou
todos eles. O cientista que estuda oceanos, e se torna um especialista nesta área, aprende
também, ao se comover ou se alegrar diante do mar. E se um dia, em sonho ou
imaginação, foi tragado pelas ondas profundas, pôde conhecer o temor ao mar. Mas
também pôde guardar recordações magníficas da infância quando, guiado pelas mãos do
pai, viu o mar pela primeira vez.
O conhecimento, em suas diversas perspectivas, é um produto da consciência
humana. Como “sujeitos do conhecimento” podemos elaborar conceitos, idéias, significados,
juízos, teorias acerca dos objetos, dos fatos, da realidade. Também podemos voltar nossa
consciência sobre nós mesmos, nos colocando como objeto de conhecimento. “Conhece-te a
ti mesmo” já dizia a mensagem do santuário dedicado ao deus Apolo, na cidade grega de
Delfos. Como ser reflexivo, o sujeito tem conhecimento das coisas, de si e do próprio
conhecimento.

“Por ser dotado de reflexão, isto é, da capacidade de conhecer-se a si mesmo no


ato do conhecimento, o sujeito é um saber de si e um saber sobre o mundo,
manifestando-se como sujeito percebedor, imaginante, memorioso, falante e
pensante. É o entendimento propriamente dito, uma estrutura racional e uma
capacidade de conhecimento que é a mesma em todos os seres humanos.” (Chauí,
2005 p. 130)

Ao longo de nossas vidas, estamos permanentemente criando conhecimento,


usando conhecimento e nos posicionando diante do conhecimento. Nossa relação com o
conhecimento se dá nesses três níveis distintos. Cada um deles demanda um esforço
específico. O fazer conhecimento implica uma capacidade criadora, uma abertura para a
realidade e o despojar de certezas absolutas. O usar conhecimento, que significa a
utilização de conhecimentos criados por outros, traduzidos em práticas, técnicas e idéias, e
que comumente é o que acontece em nossas vidas cotidianas, solicita um esforço para que
esta não seja uma atividade alienada 2 e sim, consciente. O posicionar-se diante do
conhecimento requer uma atitude filosófica sobre o fazer e o usar conhecimento. Significa
estar reflexivamente no mundo, questionando não só o que nos chega pronto, mas também
o que nós próprios produzimos. (Garcia, 1992 p. 34-41)
Antes de apresentarmos os diversos tipos de conhecimento, que é a principal
finalidade deste texto, vamos colocar alguns pressupostos que sustentam a posição aqui
adotada.
O primeiro deles é de que o conhecimento é histórico, dinâmico, processual. Um vir
a ser, que se transforma, que nunca se completa. É no curso de sua existência histórica,
que os seres humanos produzem conhecimento.
A consciência de sua historicidade nos indica, por sua vez, que o conhecimento
sempre está atrelado a um contexto temporal e espacial e que sua produção faz parte de
um processo coletivo. Este é o segundo pressuposto. Assim, os diversos tipos de
conhecimento presentes em um determinado contexto social nos ensinam a respeito da
sociedade que os criou, ou inversamente, uma determinada sociedade observada nos revela
determinadas formas de conhecimento.
Um outro pressuposto é o de que é possível haver, em um mesmo contexto sócio-
histórico, formas distintas de conhecimento (como assinalamos acima) e que a cada uma
delas é atribuído, socialmente, um valor específico. Dessa forma, alguns tipos de
conhecimento são mais valorizados socialmente do que outros. Por exemplo, nas sociedades
ocidentais contemporâneas, o conhecimento científico é aquele que está investido de maior
“poder simbólico”3. Em outros contextos podemos identificar a religião ou o conhecimento
mítico como aqueles mais valorizados. O maior ou menor poder simbólico atribuído a um
tipo de conhecimento está relacionado, por sua vez, aos grupos sociais existentes. Por

2
exemplo, nas sociedades medievais, nas quais o clero representava as classes dominantes,
o conhecimento religioso era concebido como uma verdade inquestionável.
Os pressupostos acima apresentados são indispensáveis para desconstruirmos uma
posição essencialista4, sobre as formas de conhecimento, e desenvolvermos uma atitude
relativizadora5. Ou seja, ao admitirmos que o conhecimento é histórico, e que está atrelado
a determinado contexto e a determinados grupos sociais, passamos a compreender sua
existência e relevância, como algo que está relacionado a uma época e lugar, podendo
desaparecer ou se modificar. E que seu valor e validade são também determinados
historicamente, não sendo decorrentes de uma propriedade, ou essência. A visão
relativizadora desmitifica6 as formas de conhecimento.
É importante também lembrar que, assim como os tipos de conhecimento são
históricos, também é histórico o conhecimento acerca do conhecimento. Ou seja, as forma
de conceber os tipos de conhecimento também são variadas e se transformam
historicamente. Aqui, neste texto, por exemplo, nossas idéias sobre os tipos de
conhecimento, que apresentaremos a seguir, estão formuladas a partir da contribuição de
saberes como a filosofia, a sociologia e a antropologia (lembrando que no interior de cada
um destes campos há visões múltiplas acerca do conhecimento).
Vamos discorrer de forma sintética sobre os diversos tipos de conhecimento, como
o mítico, o filosófico, o religioso, o científico e o senso-comum, afirmando desde já que as
fronteiras que separam um tipo de conhecimento de outro não são rígidas e que elementos
que caracterizam um tipo podem estar presentes em outro tipo. As formas de
conhecimento muitas vezes se interpenetram. Assim poderíamos perguntar: Quanto de
ciência poderá existir no senso comum? Ou, ao contrário, que porção de senso comum
habitaria a ciência? Antes de responder a estas perguntas, obviamente, teríamos que
explicar o que entendemos por ciência e por senso-comum. É o que faz Rubem Alves, em
seu interessante livro denominado “Filosofia da Ciência”. Depois de muito refletir sobre
essa relação, ele fala o seguinte sobre a ciência:

“As teorias, estas ambiciosas generalizações que abarcam o passado e o futuro, o


aqui e os confins do espaço, são construídas sobre nossa crença na continuidade
do universo, uma exigência que brota da fé, dos sentimentos, dos hábitos.” (Alves,
1996 p. 116)

Para Alves a ciência também é movida por fé, sentimentos e hábitos, qualidades
que podemos encontrar nos pensamentos religioso, mítico e do senso comum.

O SENSO COMUM

O senso comum é o conhecimento construído com base nas experiências cotidianas


do presente e no legado de experiências passadas, transmitidas de geração a geração. É um
conhecimento sensível, ou seja, proveniente dos nossos sentidos, um conhecimento
empírico, baseado na observação e na vivência.
O conhecimento do senso comum nos fornece pontos de apoio, “receitas” para a
vida prática, para o dia a dia. Nele, estão incluídos saberes para os afazeres da vida
doméstica, do trabalho, do trato com as pessoas, dos cuidados com o corpo e a saúde,
ensinados por nossos parentes e antepassados. Com o conhecimento do senso comum
podemos dar significado ao que está à nossa volta, comunicarmos com as pessoas,
aprender um ofício.
Sendo um conhecimento imediato e construído sem uma sistematização7, o senso
comum fica, muitas vezes, superficial e circunscrito às aparências dos fenômenos. A
realidade, no senso comum, costuma ser percebida de forma naturalizada8. Por isso, as

3
instituições sociais, relações e comportamentos, quando analisados à luz do senso comum
perdem seu caráter histórico e específico a um grupo ou sociedade, passando a serem
compreendidos como algo cuja existência se dá desde sempre e em qualquer lugar. Um
bom exemplo deste fato é a forma como costuma ser interpretado o comportamento
diferenciado de homens e mulheres. Por desconhecerem os processos históricos e culturais
de construção das identidades de gênero9, que se dão durante a socialização10 das crianças
(e por desconhecerem, inclusive, os conceitos de identidade e de socialização) as pessoas
atribuem essas diferenças à natureza, compreendendo-as apenas como herança genética.
No senso comum tanto podem estar contidos preconceitos11 e estereótipos12, como
também conhecimentos válidos e que conferem saber às pessoas. Podemos dizer que o
senso comum serve como ponto de partida para o empreendimento científico. “A
aprendizagem da ciência é um processo de desenvolvimento progressivo do senso comum.
Só podemos ensinar e aprender partindo do senso comum de que o aprendiz
dispõe.” (Alves, 1996 p.10)

CONHECIMENTO MÍTICO OU MITOLÓGICO

A palavra mito vem do grego, mythos, estando relacionada aos verbos mytheyo e
mytheo que significam, respectivamente, contar, narrar, falar alguma coisa para outros e
conversar, contar, anunciar,nomear, designar.
Mito é uma narrativa13 considerada verdadeira por aqueles que a recebem. “Para os
gregos, mito é um discurso pronunciado ou proferido para ouvintes que recebem a narrativa
como verdadeira porque confiam naquele que narra; é uma narrativa feita em público,
baseada, portanto, na autoridade e confiabilidade da pessoa do narrador.”(Chauí, 2005 p.
35) Para que o mito seja mantido, é indispensável que ele seja acreditado.
As narrativas míticas nos falam, principalmente, sobre a origem das coisas: dos
astros, da terra, dos seres humanos, das guerras, das doenças, da morte, do poder, das
injustiças sociais... e fornecem respostas e explicações para fatos obscuros,
incompreensíveis ou que, por sua dureza e crueldade, precisam ser esquecidos. O
encobrimento de fatos pelo mito garante a coesão de grupos, a sobrevivência da
comunidade ou sociedade.
Marilena Chauí, em seu livro “Convite à Filosofia”, afirma que o mito “tem como
função resolver, num plano simbólico14 e imaginário, as antinomias15, as tensões, os
conflitos e as contradições da realidade social que não podem ser resolvidas ou solucionadas
pela própria sociedade, criando, assim, uma segunda realidade, que explica a origem do
problema e o resolve de modo que a realidade possa continuar com o problema sem ser
destruída por ele. O mito cria uma compensação simbólica e imaginária para dificuldades,
tensões e lutas reais tidas como insolúveis (...) Em outras palavras, [o mito] é elaborado
para ocultar a experiência da história ou do tempo” (Chauí, 2005 p.265)
Um exemplo prático de uma narrativa mítica seria a do “mito fundador” do Brasil.
A formação da sociedade brasileira, do ponto de vista histórico, é atravessada por violência,
expropriação, exploração e genocídio. Esses fatos, porém são encobertos por um relato do
“descobrimento” que enfatiza a cordialidade entre os nativos e seus exploradores e que
apresenta a miscigenação entre indígenas, portugueses e africanos como um processo
harmonioso.
Voltando mais uma vez ao estudo da linguagem, ficamos sabendo que os gregos,
utilizavam duas palavras: Mythos, que como vimos, servia para exprimir uma dimensão
mágica e encantatória do pensamento, e logos que, diferentemente da palavra mythos,
referia-se à dimensão racional e conceitual. Mithos e logos compreendiam duas modalidades
distintas do pensamento. Posteriormente (no século XIX), filósofos como Comte e Hegel,
afirmaram que o pensamento mítico seria um tipo de pensamento que representaria uma

4
fase ou etapa da evolução do espírito humano. O mito seria, para eles, uma forma primitiva
e inferior de pensamento e precederia o pensamento lógico, racional, considerado nessa
perspectiva, uma etapa posterior e evoluída do pensamento e da civilização. (Chauí, 2005
p.164)
Segundo Chauí, esta concepção evolutiva mostrou-se equivocada já que o
pensamento mítico não desaparece nas sociedades chamadas civilizadas. Podemos,
portanto, constatar a coexistência das duas modalidades de pensamento numa mesma
sociedade. Além disso, podemos também observar a existência, nas sociedades modernas,
de um processo através do qual se opera uma passagem de mythos para logos ou de logos
para mythos. Vejamos a explicação da autora:

“Esta dupla dimensão da linguagem (como mythos e logos) explica por quê, na
sociedade ocidental, podemos comunicar-nos e interpretar o mundo sempre em
dois registros contrários e opostos: o da palavra solene, mágica, religiosa, artística
e o da palavra leiga, científica, técnica, puramente racional e conceitual. Não por
acaso, muitos filósofos das ciências afirmam que uma ciência nasce ou um objeto
se torna científico quando uma explicação que era religiosa, mágica, artística,
mítica cede lugar a uma explicação conceitual, causal, metódica, demonstrativa,
racional, isto é, quando se passa de mythos para logos.” (Chauí, 2005 p. 150)

Em outra passagem de sua obra, Chauí aponta o caminho inverso, ou seja, o da


passagem de logos para mythos:

“...a presença simultânea do pensamento conceitual e do pensamento mítico


decorre do modo como a imaginação social transforma em mito aquilo que o
pensamento conceitual elabora nas ciências e na Filosofia. Basta ver o caráter
mágico-maravilhoso dado aos satélites, aos autômatos, aos computadores para
constatarmos a passagem da ciência ao mito” (Chauí, 2005 p. 164)

Concordando com a afirmação de Chauí, podemos acrescentar que o mesmo


caráter mágico, conferido aos bens produzidos pela tecnologia, também pode ser
observado no discurso publicitário. As mercadorias, nas narrativas da publicidade, aparecem
investidas de poderes mágicos que prometem, por exemplo, transformar mulheres comuns
em musas belas, sensuais e poderosas, caso elas comprem o vestido anunciado pela famosa
modelo. O filósofo Jean Baudrillard, em seu livro “Sociedade de consumo”, nos mostra como
as mercadorias se transformam em símbolos e como a publicidade explora o pensamento
mágico, presente em nossas mentes, para nos levar a consumir.
Todas essas reflexões nos ensejam a resgatar a importância do conhecimento
mítico, e a buscar compreender como ele opera nas sociedades contemporâneas. Com isso,
desfazemos a idéia de que o mito seria uma forma inferior de conhecimento e de que não
passaria de um resíduo deixado pelas sociedades primitivas.

CONHECIMENTO RELIGIOSO OU TEOLÓGICO

Religião, vem da palavra latina religio, formada pelo prefixo re (“de novo”, “outra
vez”) e o verbo ligare (“ligar, unir, vincular”). A religião é um vínculo que liga o profano
(compreendido como o mundo da natureza e o mundo social) e o sagrado (compreendido
como o mundo sobrenatural). A crença na existência de um mundo sobrenatural, habitado
por divindades resulta da percepção de uma ordem externa, independente da vontade ou da
ação humana, e responsável pela nossa existência e pela nossa finitude 16. Essa força, ou

5
potência é considerada sobrenatural porque se espera que ela possa “realizar aquilo que os
humanos julgam impossível efetuar contando apenas com as forças e capacidades humanas
(...) Todas as culturas possuem vocábulos para exprimir o sagrado como força sobrenatural
que habita o mundo” (Chauí, 2005 p. 253)
A religião, como vínculo, estabelece uma dupla ligação: une os homens entre si,
propiciando uma experiência de pertencimento a uma comunidade solidária na fé, e liga os
homens com o sagrado, possibilitando uma experiência de transcendência17.
Os fiéis buscam, através da religião, explicações para a origem, a forma, a vida e a
morte de todos os seres e dos próprios humanos.
Assim como o conhecimento mítico, o conhecimento religioso baseia-se no princípio
da autoridade e na fé. Para ser reconhecido como verdade precisa ser acreditado.
Em cada contexto social certas pessoas ou instituições são investidos de poder e
autoridade para exercer uma função mediadora entre os homens e as divindades,
transmitindo as doutrinas sagradas, através de rituais próprios a cada religião.
O conhecimento religioso tal como os outros tipos de conhecimento, está
relacionado com o contexto histórico, modificando-se por influência das transformações
sociais. No ocidente, por exemplo, a processo de racionalização que inaugura o
desenvolvimento da ciência moderna afetou também a religião, que “precisou oferecer-se
na forma de provas racionais, conceitos, teses, teorias. Tornou-se teologia, ciência sobre
Deus. Transformou os textos da história sagrada em doutrina coisa que nenhuma outra
religião fez.” (Chauí, 2005 p. 267) A instituição da teologia seria, portanto, uma tentativa
para transformar o conhecimento religioso em saber racional.

CONHECIMENTO FILOSÓFICO

A palavra filosofia é de origem grega e vem de philo, que significa “aquele ou


aquela que tem um sentimento amigável”, e de sophia, que quer dizer sabedoria. Filosofia
significa “amizade pela sabedoria” ou “amor e respeito pelo saber”.
O conhecimento filosófico é um trabalho intelectual sistemático, ou seja, faz uso de
regras e normas de argumentação e demonstração, busca encadeamentos lógicos entre os
enunciados, ordenando e relacionando as idéias num todo coerente. O conhecimento
filosófico opera com conceitos fundamentados racionalmente.
Estas características acima mencionadas, como veremos mais adiante, também
estão presentes nas ciências. Então, que especificidades teria a filosofia?
Diferentemente das ciências, a filosofia não tem uma finalidade prática, um caráter
utilitário. Não visa a solucionar problemas ou criar tecnologias para uso social. Seu maior
mérito é o de ser, ao mesmo tempo, um conhecimento analítico18, reflexivo19 e crítico20.
A filosofia formula questões e busca respondê-las. Pergunta sobre a realidade e
seus significados, pergunta sobre os saberes e reflete criticamente sobre o uso que é feito
deles. Não se contenta apenas com a ação ou com o conhecimento produzido, mas indaga
sobre como é produzido, por que e para que.
A filosofia se define como busca dos fundamentos (princípios, causas e condições
de existência), do sentido e da finalidade da realidade em suas múltiplas formas.
Concluindo, podemos afirmar, através das palavras de Chauí que:

“A filosofia não é ciência: é uma reflexão sobre os fundamentos da ciência, isto é,


sobre procedimentos e conceitos científicos. Não é religião: é uma reflexão sobre
os fundamentos da religião, isto é, sobre as causas, origens e formas das crenças
religiosas. Não é arte: é uma reflexão sobre os fundamentos da arte, isto é, sobre
os conteúdos, as formas, as significações das obras de arte e do trabalho artístico.

6
Não é sociologia nem psicologia, mas a interpretação e avaliação crítica dos
conceitos e métodos da sociologia e da psicologia. Não é política, mas
interpretação, compreensão e reflexão sobre a origem, a natureza e as formas do
poder e suas mudanças. Não é história, mas reflexão sobre o sentido dos
acontecimentos enquanto inseridos no tempo e compreensão do que seja o próprio
tempo.”(Chauí, 2005 p. 23-24)

CONHECIMENTO CIENTÍFICO

Nossas considerações sobre os outros tipos de conhecimento, apresentadas acima,


já oferecem algumas idéias acerca do conhecimento científico.
Da mesma forma que a filosofia, a ciência vai além do conhecimento imediato (que
geralmente caracteriza o senso-comum), procurando conhecer os fenômenos em sua
profundidade e abrangência.
É um conhecimento racional, sistematizado, metódico. Trabalha com conceitos,
enunciados, hipóteses, argumentos. Emprega métodos, técnicas e instrumentos que
auxiliam o cientista em sua aproximação, apreensão e análise do fenômeno estudado.
Deve ser um conhecimento explicável e, em certos casos, demonstrável.
Faz uso de uma linguagem específica, utilizando conceitos, termos e argumentos
organizados em um discurso coerente e lógico, sem contradições ou ambigüidades.
Tem como finalidade construir conhecimento válido e relevante socialmente, que
traga contribuições para o desvendamento da realidade e a solução de problemas práticos e
teóricos.
Há uma preocupação, por parte dos cientistas, com a construção de um
conhecimento objetivo e neutro, ou seja, sem a interferência da subjetividade do
pesquisador ou de interesses políticos e ideológicos. Sabe-se, no entanto, que essa condição
ideal não é obtida plenamente. Sua busca, contudo, deve ser uma constante.
Aqui, gostaríamos de retomar a idéia de Rubem Alves, apresentada no tópico
referente ao senso comum, segundo a qual a ciência resultaria de um aprendizado
progressivo, cujo ponto de partida é o senso comum. Tal afirmação traduz a idéia de que o
empreendimento científico é um ofício que se aprende no curso rotineiro da vida. Que a
ciência não é um milagre, nem uma atividade de gênios (ainda que alguns cientistas o
sejam), mas “uma especialização, um refinamento de potenciais comuns a todos”. E que o
conhecimento, mesmo que tenha sido produzido com todo o rigor que a atividade científica
requer, não está desvinculado da vida do cientista, de suas paixões, desejos e fantasias.
Assim ele afirma:

“As teorias nasceram com os sonhos, as fantasias, os poemas, as sonatas, em


meio das visões dos místicos, do prazer dos charutos, do lazer das caminhadas, do
amor intelectual pelos objetos...” (Alves, 1996 p.153)

Alves, como filósofo, apresenta uma visão crítica, e não crédula, sobre a
ciência e o cientista, propondo desmitificar o conhecimento científico, rejeitando a idéia
de que seja um conhecimento isento de subjetividade, preconceitos e interesses e,
portanto, superior às outras formas de conhecimento.
O conhecimento científico, assim como as outras formas de conhecimento,
por ser histórico, é provisório, podendo ser reavaliado, refutado, modificado: “...o
labor científico caminha sempre em duas direções: numa, elabora suas teorias, seus
métodos, seus princípios e estabelece seus resultados; noutra, inventa, ratifica seu

7
caminho, abandona certas vias e encaminha-se para certas direções...” (Minayo, 1998
p.12)
Também são históricos e provisórios os critérios de definição do conhecimento
científico, estando atrelados a um contexto específico, podendo, inclusive haver, no mesmo
contexto, concepções diferenciadas do que seja ciência. Abaixo apresentamos duas
concepções acerca do conhecimento científico, que estão presentes atualmente em nossa
sociedade:

Concepção tradicional de conhecimento científico:

1 – o conhecimento científico é verdadeiro, porque sabe explicar os motivos de sua


certeza;
2 – é generalizável, já que conhece o real no que há de mais universal - busca
regularidades;
3 – é metódico, sistemático. Busca as conexões causais entre os fatos, através da
utilização de conceitos;
4 – é objetivo e neutro.

Concepção crítica de conhecimento científico:

1 – a ciência é processual, histórica, nunca está pronta, acabada, sendo assim o


conhecimento científico é provisório, podendo ser reavaliado, refutado, modificado;
2 – o conhecimento científico é limitado, não consegue abarcar a totalidade do real,
nem sempre pode ser generalizável;
3 – os métodos são históricos e diferenciados, de acordo com a área da ciência. O
método científico nem sempre opera através do estabelecimento de relações causais
diretas (por exemplo: no caso das ciências humanas, constata-se que os fenômenos
sociais são complexos e multideterminados, não podendo ser atribuídos a uma causa
simples;
4 - a ciência não é desinteressada, ela está atrelada a interesses políticos, econômicos
etc.

GLOSSÁRIO

8
1
Sensível – Que diz respeito aos sentidos, à experiência, à dimensão empírica.
2
Alienada – Condição do sujeito que desconhece as condições sociais e históricas de existência da realidade, bem como
desconhece a sua participação nesse processo, atribuindo às coisas e fatos uma origem natural e divina, não se
reconhecendo como agente transformador da realidade.
3
Poder simbólico – É o poder de “constituir o dado pela enunciação, da fazer ver e fazer crer, de confirmar ou de
transformar a visão do mundo [idéias, valores, crenças, representações] e, deste modo, a ação sobre o mundo(...) O que
faz o poder das palavras e das palavras de ordem, poder de manter a ordem ou de a subverter, é a crença na legitimidade
das palavras e daquele que as pronuncia...) (P. Bourdieu, O poder simbólico, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998 p.
14-15)
4
Essencialista - O pensamento essencialista concebe os aspectos de uma sociedade como sendo fixos, imutáveis e, em
alguns casos, como sendo provenientes da natureza (um exemplo são as diferenças étnicas, de classe e de gênero),
desconhecendo sua origem social.
5
Relativizadora - Relativizar é “tratar ou descrever uma coisa negando-lhe caráter absoluto ou independente,
considerando-a, portanto, como de importância ou valor relativo.” (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001 p.
2421)
6
Desmitifica - Desmitificar significa destituir algo de seu aspecto mágico, mítico, lendário, a partir de uma visão
crítica .
7
Sistematização – que opera por sistema, de forma sistematizada. “No caso do pensamento, significa [empregar] um
conjunto de idéias internamente articuladas e relacionadas, graças a princípios comuns ou a certas regras e normas de
argumentação que as ordenam e as relacionam num todo coerente.” (Chauí, 2005 p. 21)
8
Naturalizada – naturalizar significa explicar algum fato de origem social ou cultural (costume, crença, comportamento
etc.) observado, como tendo sido determinado pela natureza, ignorando seu caráter sócio-histórico.
9
Identidade / identidade de gênero – Identidade cultural se define pela maneira de ser e de estar no mundo, manifestada
pelo conjunto de caracteres (crenças, valores, papéis, comportamentos) próprios de um grupo, comunidade ou nação. A
identidade cultural possibilita aos sujeitos desenvolver um sentimento de pertencimento e a desenvolver uma
consciência de si. Identidade de gênero refere-se ao processo social e histórico de construção das identidades masculina
e feminina.
10
Socialização – Processo pelo qual são transmitidos, socialmente, idéias, valores, crenças, normas de comportamento e
regras sociais. A socialização se dá durante todo o curso de nossas vidas. Família, escola, igreja e mídia são algumas
das instituições responsáveis pela socialização dos indivíduos.
11
Preconceito – Idéia preconcebida, sem que tenha havido em exame crítico, maior ponderação ou razão, acerca do que
está sendo nomeado.
12
Estereótipo - Idéia ou convicção classificatória preconcebida, sobre alguém ou algo, resultante de expectativa, hábitos
de julgamento ou falsas generalizações. Constitui uma imagem padronizada, comum aos membros de um grupo, e
representa uma visão reducionista, simplificada e generalizada sobre algo, eliminando suas qualidades individuais.
13
Narrativa – Uma narrativa pode ser considerada “como um discurso que narra uma seqüência de acontecimentos – ou,
como dizemos comumente, que ‘conta uma história’. A história geralmente contém uma constelação de personagens e
uma sucessão de eventos, combinados de uma maneira que apresente certa orientação ou ‘enredo’ “Thompson, 1995 p.
373) A narrativa tem também um senso utilitário, passando de pessoa a pessoa ensinamentos, sugestões, práticas ou
normas de vida.
14
Plano simbólico – plano do pensamento, das idéias, valores, crenças e símbolos
15
Antinomias - oposições
16
Finitude - Qualidade, condição ou propriedade do que é finito (que tem fim). No caso do sujeito, sua condição de
mortal.
17
Transcendência – Ação por meio da qual a existência humana ultrapassa sua realidade imediata, elevando-se a uma
condição de espiritualidade, liberdade, completude .
18
Analítico – Referente à análise, que é um estudo pormenorizado de cada parte de um todo, para conhecer melhor sua
natureza, suas funções, relações, causas etc.; exame, processo ou método com que se descreve, caracteriza e
compreende algo, para proporcionar uma avaliação crítica do mesmo. (Dicionário Houaiss, 2001 p. 202)
19
Reflexivo - que vai à raiz do pensamento, num movimento de volta do pensamento sobre si mesmo, para pensar-se a
si mesmo, para conhecer como é possível o próprio pensamento ou o próprio conhecimento. (Chauí, 2005 p.20)
20
Crítico - “A palavra ‘crítica’ vem do grego e possui três sentidos principais: 1) capacidade para julgar, discernir e
decidir corretamente; 2) exame racional de todas as coisas, sem preconceito e sem pré-julgamento; 3) atividade de
examinar e avaliar detalhadamente uma idéia, um costume, um comportamento, uma obra artística ou
científica.”(Chauí, 2005 p. 18)

Bibliografia para aprofundamento


Alves, Rubem – Filosofia da ciência. São Paulo:Ars Poética, 1996.

Baudrillard, Jean – A sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70, 2003.

Chauí, Marilena - Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2005.

Geertz, Clifford. O saber local- novos ensaios em antropologia interpretativa. Petrópolis: Vozes, 1997.

Huhne, Leda Miranda – Metodologia científica - caderno de textos e técnicas. Rio de Janeiro: Agir, 1992.

Kuhn, Thomas – A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2006.

Minayo - Ma. Cecília de Souza (org.) – Pesquisa Social – teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 1997.

Morin, Edgar – Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.

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