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CÁLCULO, VARIEDADES E

FORMAS DIFERENCIAIS

ROBERTO DE MARIA NUNES MENDES


Professor da PUC Minas

Belo Horizonte, 2017


Sumário

Prefácio v

1 Espaços Vetoriais Normados 1

1.1 Espaços Vetoriais Normados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

1.2 Aplicações Lineares Contínuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

1.3 Normas Equivalentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1.4 Aplicações Multilineares Contínuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

1.5 Exercícios do Capítulo 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

2 Cálculo Diferencial 11

2.1 Aplicações Diferenciáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

2.2 Regras de Derivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

2.3 Exercícios do Capítulo 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

3 Integração de Caminhos e o Teorema do Valor Médio 23

3.1 Integração de Caminhos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

i
SUMÁRIO

3.2 Exercícios do Capítulo 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

4 Derivadas Parciais 34

4.1 Derivadas Parciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

4.2 Exercícios do Capítulo 4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39

5 Teorema da Função Inversa 41

5.1 Difeomorfismos. Teorema da Função Inversa . . . . . . . . . . . . . . 41

5.2 Aplicações de Posto Constante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

5.3 Exercícios do Capítulo 5 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

6 Derivação de Ordem Superior 55

6.1 Derivação de Ordem Superior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55

6.2 Fórmula de Taylor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62

6.3 Exercícios do Capítulo 6 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

7 Variedades Diferenciais 66

7.1 Cartas, Atlas, Variedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66

7.2 Aplicações de Classe C k . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72

7.3 Espaço Tangente. Derivada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74

7.4 Identificações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78

7.5 Aplicações de Posto Constante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81

7.6 Subvariedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86

ii
SUMÁRIO

7.7 Variedade Produto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89

7.8 Partições da Unidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95

7.9 Métrica Riemaniana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

7.10 Campos de Vetores. Fibrado Tangente . . . . . . . . . . . . . . . . . 103

7.11 Exercícios do Capítulo 7 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108

8 Álgebra Exterior 111

8.1 Álgebra Exterior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111

8.2 Determinantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119

8.3 Produto Interior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123

8.4 Exercícios do Capítulo 8 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124

9 Formas Diferenciais 127

9.1 Generalidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128

9.2 Diferencial Exterior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130

9.3 Orientação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135

9.4 Variedades com Bordo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 142

9.5 Orientação no Bordo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 148

9.6 Integração numa Variedade Orientada . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152

9.7 Formas Diferenciais em M × [0, 1]. Lema de


Poincaré . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 167

9.8 Aplicação à Análise Vetorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 169

iii
SUMÁRIO

9.9 Integração numa Variedade Riemaniana. Grau de Aplicação. . . . . 171

9.10 Exercícios do Capítulo 9 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 176

10 Sistemas Diferenciais 182

10.1 Colchete de Lie de Campos Vetoriais. Fluxos. . . . . . . . . . . . . . 182

10.2 Sistemas Diferenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188

10.3 Campos vetoriais comutativos e fluxos . . . . . . . . . . . . . . . . . 197

10.4 Variedades Simpléticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 199

10.5 Exercícios do Capítulo 10 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 207

11 Grupos de Lie 209

11.1 Generalidades sobre Grupos de Lie . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 209

11.2 Campos Invariantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 221

11.3 Formas Invariantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 224

11.4 Exercícios do Capítulo 11 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 226

Bibliografia 230

Index 232

iv
Prefácio

As aplicações da teoria das variedades diferenciais são inúmeras, não só na


Matemática, mas também na Física Teórica, na Computação Gráfica, na Robótica,
e em outras partes da Ciência. Este livro foi concebido como uma introdução às
variedades diferenciais. Cremos que o leitor, após digeri-lo, estará em condições de
enfrentar textos mais sofisticados e exigentes, alguns deles citados na Bibliografia.

Os pré-requisitos são relativamente poucos: Álgebra Linear, Análise Real e


Topologia, em níveis modestos.

Nos Capítulos de 1 a 6 desenvolvemos o Cálculo Diferencial das funções


f : V → W , onde V e W são espaços vetoriais normados, ambos de dimensão finita.
Demos especial importância ao teorema da função inversa (e seu equivalente teo-
rema da função implícita), estudando com detalhe as aplicações de posto constante,
particularmente as imersões e submersões.

O Capítulo 7 versa sobre variedades diferenciais. Introduzimos a linguagem


básica da teoria, discutimos alguns exemplos, o conceito de subvariedade, e o fibrado
tangente.

Nos Capítulos 8 e 9 desenvolvemos a álgebra exterior e as formas diferenciais.


Estudamos as variedades com bordo, o conceito de orientação, a noção de integral

v
de uma forma, e demonstramos os teoremas de Stokes, Brouwer (diferenciável) e
Poincaré-Brouwer. Introduzimos a métrica riemaniana e as funções harmônicas.
Estudamos o grau de uma aplicação, e calculamos o grau da aplicação normal de
Gauss de uma hipersuperficie compacta do Rn .

No Capítulo 10 tratamos dos sistemas diferenciais, provamos o teorema de


Frobenius e apresentamos o conceito de folheação, estudando também a relação
entre a comutatividade de campos vetoriais e a de seus fluxos. O capítulo termina
com uma introdução às variedades simpléticas.

O Capitulo 11 é uma introdução à importante teoria dos Grupos de Lie e de


suas variedades homogêneas, sendo discutidos alguns exemplos.

Muitos assuntos importantes não foram tratados no livro. Dentre eles desta-
camos: transversalidade, teorema de Sard, teoremas de aproximação de Whitney,
aplicações de recobrimento, aplicação exponencial, correspondência entre grupos de
Lie simplesmente conexos e suas álgebras de Lie, representação adjunta, ...

Queremos agradecer a Mário Jorge Dias Carneiro, que leu parte do manuscrito,
e ao avaliador de uma primeira versão do livro, pelas várias sugestões que fizeram
para sua melhoria. Agradecemos também ao Eng. Alan Antônio Moreira pelo bom
trabalho na editoração. Ao leitor, bom proveito.

Belo Horizonte, Outubro de 2016


Roberto N. Mendes

vi
Capítulo 1

Espaços Vetoriais Normados

Neste capítulo fazemos uma revisão dos conceitos básicos concernentes aos
espaços vetoriais normados, em particular aos espaços de Banach, e estudamos as
aplicações lineares e multilineares contínuas, tendo em vista a utilização destes fatos
no estudo do Cálculo Diferencial.

1.1 Espaços Vetoriais Normados

Seja V um espaço vetorial sobre K (R ou C).

Definição 1.1. Uma norma em V é uma função x ∈ V 7→ kxk ∈ R tal que:

(1) kxk ≥ 0 ; kxk = 0 ⇔ x = 0;

(2) kx + yk ≤ kxk + kyk ;

(3) kaxk = |a| kxk , quaisquer que sejam x ∈ V , y ∈ V , a ∈ K.


Consequências imediatas:

1
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

(a) k−xk = kxk;


(b) | kxk − kyk | ≤ kx − yk . De fato, como x = (x − y) + y , temos kxk ≤
≤ kx − yk+kyk , donde kxk−kyk ≤ kx − yk . Analogamente, kyk−kxk ≤
≤ kx − yk, resultando (b).

Obs. (1) O par (V, k · k) é um espaço vetorial normado (e.v.n). Definindo d (x, y) =
= kx − yk para x ∈ V , y ∈ V , obtemos uma distância em V e (V, d) é um
espaço métrico; essa métrica natural d satisfaz:

(i) d (x + z, y + z) = d (x, y) ;

(ii) d (ax, ay) = |a| d (x, y), onde a ∈ K.

(2) Como | kxk − kyk | ≤ kx − yk, resulta que a norma é uma função contínua.

Exercício. Prove que (x, y) 7→ x + y e (a, x) 7→ ax são contínuas.

Definição 1.2. Seja (xn )n≥1 uma sequência no e.v.n V . Dizemos que (xn )n≥1
converge para x ∈ V se limn→∞ kxn − xk = 0 , ou seja, dado ε > 0 arbitrário,
existe n0 ∈ N tal que n ≥ n0 ⇒ kxn − xk < ε .

Definição 1.3. A sequência (xn )n≥1 é uma sequência de Cauchy em V se


lim kxm − xn k = 0 , isto é, dado ε > 0 arbitrário, existe n0 ∈ N tal que
m→∞
n→∞
m ≥ n0 , n ≥ n0 ⇒ kxm − xn k < ε . É fácil ver que toda sequência convergente é de
Cauchy, a recíproca sendo falsa em geral.

Definição 1.4. O e.v.n V é um espaço de Banach se ele é completo na métrica


natural d, ou seja, se toda sequência de Cauchy em V é convergente.

Exemplo 1.1.1. Em V = Kn , definimos:


Ã
n n
|xi |2 ;
X X
kxk1 = |xi | ; kxk2 = kxk∞ = sup |xi | ,
i=1 i=1 1≤i≤n

2
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

onde x = (x1 , . . . , xn ) ∈ Kn . São as normas usuais em Kn . Com qualquer dessas


normas Kn é um espaço de Banach.

Exercício. Prove as afirmações feitas no Exemplo 1.1.1.

Exemplo 1.1.2. Seja V = C 0 ([a, b], K) o espaço vetorial das funções contínuas
Rb
f : [a, b] → K, onde ae b são reais, a < b. Definamos: kf k1 = |f (t)| dt;
a
kf k∞ = sup |f (t)| . É fácil mostrar (faça-o!) que k·k1 e k·k∞ são normas em V .
a≤t≤b

Exemplo 1.1.3. Seja (V, h·i) um espaço vetorial munido de um produto interno
positivo. Definindo kxk = hx, xi obtemos uma norma em V . Se V for completo
»

nessa norma, dizemos que V é um espaço de Hilbert.

Definição 1.5. Seja (xn )n≥1 uma sequência no espaço de Banach V . Dizemos que
∞ ∞
a série xn é absolutamente convergente se kxn k é convergente.
P P
n=1 n=1

Proposição 1.1. Num espaço de Banach V uma série absolutamente convergente


é convergente e ∞ ∞

X X



xn ≤

kxn k.
n=1 n=1


Dem. Como kxn k converge, dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que m ≥ n, n ≥ n0
P
n=1
implicam kxn+1 k + · · · + kxm k < ε e, portanto, kxn+1 + · · · + xm k < ε para m ≥
≥ n ≥ n0 , isto é, ksm − sn k < ε para m ≥ n ≥ n0 , onde sn = x1 + · · · + xn . Como

V é de Banach, resulta que a sequência (sn )n≥1 converge, ou seja, a série xn
P
n=1
é convergente, e a desigualdade kx1 + · · · + xn k ≤ kx1 k + · · · + kxn k para todo n,
∞ ∞

implica
P
xn ≤ kxn k.
P
n=1 n=1

1.2 Aplicações Lineares Contínuas

Sejam V e W espaços vetoriais normados sobre K.

Proposição 1.2. Se T : V → W é linear, são equivalentes:

(a) T é contínua em V ;

3
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

(b) T é contínua na origem 0 ∈ V ;

(c) kT (x)k é limitada em B1 (0) = {x ∈ V ; kxk ≤ 1}.

Dem. (a) ⇒ (b) - Óbvio.


(b) ⇒ (c) : Por hipótese, dado ε ∈ 0, existe δ > 0 tal que kyk ≤ δ implica
kT (y)k < ε. Seja x ∈ V , kxk ≤ 1. Se y = δx então kyk ≤ δ, donde
ε
kT (y)k = δkT (x)k < ε e, portanto, kT (x)k < , isto é, kT (x)k é limitada sobre
δ
a bola unitária fechada B1 (0) .
(c) ⇒ (a): Seja kT (x)k ≤ M para x ∈ V , kxk ≤ 1, onde M > 0.
x
Se x 6= 0, seja y = , donde kyk = 1 , kT (y)k ≤ M , e
kxk
kT (x)k = kxk.kT (y)k ≤ M.kxk. Se a ∈ V , então kT (x) − T (a)k = kT (x − a)k e,
ε
dado ε > 0, kx − ak < implica kT (x) − T (a)k ≤ M.kx − ak < ε, ou seja, T
M
é contínua em a.

Notação: L(V, W ) = {T : V → W ; T é linear contínua }.

Definição 1.6. Seja T ∈ L(V, W ). Se kT k = sup kT (x)k, então kT k < ∞ e


kxk61
T 7→ kT k é uma norma em L(V, W ). Se M > 0 é tal que kT (x)k ≤ M para
todo x ∈ B1 (0), então kT k ≤ M , ou seja, kT k é o menor M > 0 tal que
kT (x)k ≤ M.kxk, isto é,

sup kT (x)k = kT k = inf {M > 0 ; kT (x)k ≤ M.kxk, x ∈ V }.


kxk61

Exercício. Prove que T 7→ kT k é uma norma em L(V, W ).

Proposição 1.3. Se W é um espaço de Banach, então L(V, W ) é um espaço de


Banach.

Dem. Seja (Tn )n≥1 uma sequência de Cauchy em L(V, W ). Dado ε > 0,
existe n0 ∈ N tal que m ≥ n ≥ n0 ⇒ kTm − Tn k < ε, donde kTm (x) − Tn (x)k < ε,
kxk ≤ 1, e kTm (x) − Tn (x)k < εkxk ∀x ∈ V ; logo, (Tn (x))n≥1 é de Cauchy em
W e, portanto, converge para y = T (x) , e obtemos a aplicação T : V → W . É
fácil ver que T é linear.

4
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

Fazendo m → ∞ , obtemos kT (x) − Tn (x)k ≤ εkxk, x ∈ V . Logo, kT (x)k =


= kT (x) − Tn0 (x) + Tn0 (x)k ≤ kT (x) − Tn0 (x)k + kTn0 (x)k ≤ εkxk + kTn0 k.kxk =
= (ε + kTn0 k) .kxk, o que mostra ser T contínua, isto é, T ∈ L(V, W ). Além disso,
n ≥ n0 ⇒ kT (x) − Tn (x)k ≤ ε kxk , donde kT − Tn k ≤ ε, e (Tn )n≤1 converge para
T em L(V, W ).

Obs. Se T ∈ L(U, V ) , S ∈ L(V, W ), então S ◦ T ∈ L(U, W ) e, para todo


x ∈ U , kS ◦ T (x)k ≤ kSk.kT (x)k ≤ kSk.kT k.kxk , e kS ◦ T k ≤ kSk.kT k.

1.3 Normas Equivalentes

Sejam V , W espaços vetoriais normados sobre K .

Definição 1.7. T : V → W é um isomorfismo se:

(a) T ∈ L(V, W ), isto é, T é linear contínua;

(b) existe S ∈ L(W, V ) tal que S ◦ T = idV e T ◦ S = idW .

Ou seja, T : V → W é um isomorfismo de e.v.n se, e só se, T é um homeomor-


fismo linear.

Definição 1.8. T : V → W é uma isometria se T é bijeção linear tal que


kT (x)k = kxk ∀x ∈ V . É claro que toda isometria é um isomorfismo, mas a
recíproca é falsa.

Definição 1.9. Duas normas, k · k1 e k · k2 , sobre o espaço vetorial V , são


equivalentes se existem constantes positivas m e M tais que m kxk1 ≤ kxk2 ≤
≤ M · kxk1 ∀x ∈ V .

Obs. Sejam i1 : V1 = (V, k · k1 ) → V2 = (V, k · k2 ) e i2 : V2 → V1 as


aplicações induzidas por idV ; elas são inversas uma da outra. kxk2 ≤ M kxk1
1
mostra que i2 é contínua e kxk1 ≤ kxk2 que i1 é contínua, ou seja, i1 e i2
m
são isomorfismos, e as topologias de V1 e V2 coincidem.

5
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

Reciprocamente, se i1 : V1 → V2 e i2 : V2 → V1 definem a mesma topologia,


então k · k1 e k · k2 são equivalentes pois, neste caso, existem constantes positivas
1
M e M1 tais que kxk2 ≤ M kxk1 e kxk1 ≤ M1 . kxk2 . Pondo m = , vem
M1
m kxk1 ≤ kxk2 ≤ M.kxk1 . Resulta que duas normas em V são equivalentes se, e
só se, elas definem a mesma topologia.

Proposição 1.4. Em Kn todas as normas são equivalentes.


 
n
Dem. Se x = (x1 , . . . , xn ) ∈ K , seja kxk2 =
n
|xi |2 a norma euclidiana, seja
P
i=1
x 7→ kxk uma norma arbitrária, e seja (e1 , . . . , en ) a base canônica de Kn .
n
Temos: |kxk − kyk| ≤ kx − yk ≤ |xi − yi | .kei k, o que mostra que x 7→ kxk
P
i=1
é contínua. Sobre a esfera unitária de Kn , que é compacta, x 7→ kxk é 6= 0 e
contínua, donde existem constantes positivas m e M tais que kxk ≤ M e kxk ≥ m
∀x ∈ Kn , kxk2 = 1, resultando kxk ≤ M kxk2 e kxk ≥ m kxk2 ∀x ∈ Kn , ou
seja, m kxk2 ≤ kxk ≤ M kxk2 , e k · k é equivalente a k · k2 , donde a tese.

Proposição 1.5. Seja W um e.v.n de dimensão finita n sobre K. Toda T : Kn → W


linear bijetora é um homeomorfismo, isto é, um isomorfismo entre espaços vetoriais
normados.

Dem. Sejam (e1 , . . . , en ) a base canônica de Kn , T ei = ωi ∈ W . Então,


n n
(ω1 , . . . , ωn ) é base de W . Se x ∈ Kn , x = xi ei , vem T (x) = xi T (ei ) =
P P
i=1 i=1
n n
= xi ωi , donde kT (x)k ≤ |xi |.kwi k, o que mostra que T é contínua em 0 ,
P P
i=1 i=1
donde é contínua em Kn . Se S = T −1 : W → Kn , um raciocínio análogo mostra
que S é contínua. Resulta que T é um homeomorfismo (linear), ou seja , um
isomorfismo de e.v.n.

Corolário 1.1. Em W , dimK W = n, todas as normas são equivalentes.

Dem. Sejam k · k1 e k · k2 normas em W e T : Kn → W um isomorfismo


de e.v.n. ; então, x 7→ kT xk1 e x 7→ kT xk2 são normas em Kn , portanto
equivalentes. Se ω = T (x), existem constantes positivas m e M tais que m kωk1 ≤
≤ kωk2 ≤ M kωk2 , donde k · k1 e k · k2 são equivalentes.

6
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

Exemplo 1.3.1. Sejam V um e.v.n. sobre K ,

T : V −→ L(K, V ) ; S : L(K, V ) −→ V
x 7→ Tx : K → V f 7−→ f (1)
a 7→ a x

É fácil ver que Tx é linear, que T é linear, e que ka xk = |a|.kxk, donde


Tx é contínua e tem norma igual a kxk . Analogamente, é imediato que S é linear
e que S = T −1 . Resulta que T é uma isometria. É a isometria canônica entre V
e L(K, V ).

Exemplo 1.3.2. Sejam V um e.v.n. sobre K , L(V ) = L(V, V ) e T ∈ L(V ).


∞ 1 n
A série T n (onde T n = T ◦ T ◦ .^. . ◦ T ) é absolutamente convergente pois
P
n=0 n !
n 1
kT n k ≤ kT kn e kT kn = ekT k converge. Definimos a exponencial de T ∈ L(V )
P
n=0 n !
por

1 n
T . Escreve-se também exp(T ) = eT
X
exp(T ) =
n=0 n !
Exercício. Sejam S , T ∈ L(V ) tais que S ◦ T = T ◦ S. Prove que eS ◦ eT =
= eT ◦ eS = eT +S . Em particular, como exp(0) = I , temos que eT .e−T = I, eT
é invertível, e (eT )−1 = e−T .

Exemplo 1.3.3. Em V = C 0 ([0, 1], R) seja fn : [0, 1] → R, n ∈ N, como na


î ó
 0 se x ∈ 1 , 1
figura, isto é, fn (x) =  n î ó .
n − n2 x se x ∈ 0, n1

y
n

fn

1 x
n 1

1 kfn k∞
Então: kfn k∞ = n, kfn k1 = , = 2n, e k · k∞ k · k1 não são
2 kfn k1

7
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

equivalentes.

1.4 Aplicações Multilineares Contínuas

Para simplificar a escrita vamos considerar o caso das bilineares. Sejam V1 , V2 , W


espaços vetoriais sobre K .

Definição 1.10. T : V1 × V2 −→ W é bilinear se:

T (x1 + x01 , x2 ) = T (x1 , x2 ) + T (x01 , x2 );


T (x1 , x2 + x02 ) = T (x1 , x2 ) + T (x1 , x02 );
T (ax1 , x2 ) = T (x1 , ax2 ) = aT (x1 , x2 ) ,

quaisquer que sejam x1 , x01 em V1 , x2 , x02 em V2 e a ∈ K .


É claro que T (0, 0) = 0, que T (x1 , 0) = T (0, x2 ) = 0 e que T (a1 x1 , a2 x2 ) =
= a1 a2 T (x1 , x2 ) para a1 , a2 em K .

Exemplo 1.4.1. V1 = V2 = W = K . O produto (a1 , a2 ) −→ a1 a2 é bilinear.


n
Exemplo 1.4.2. O produto interno (x, y) ∈ Rn ×Rn 7→ hx, yi ∈ R , hx, yi = xi yi ,
P
i=1
onde x = (x1 , . . . , xn ) e y = (y1 , . . . , yn ), é bilinear.

Proposição 1.6. Sejam V1 , V2 , W e.v.n. sobre K , T : V1 × V2 → W bilinear.


São equivalentes:

(a) T é contínua em V1 × V2 ;

(b) T é contínua na origem (0, 0) ∈ V1 × V2 ;

(c) kT (x1 , x2 )k é limitada em B 1 ×B 2 , onde B j = {xj ∈ Vj ; kxj k ≤ 1}, j = 1, 2.

Dem. Exercício.

Notação: L(V1 , V2 ; W ) = {T : V1 × V2 → W ; T é bilinear contínua}.

8
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

Para T ∈ L(V1 , V2 ; W ) definimos kT k = sup kT (x1 , x2 )k. T 7→ kT k é


kx1 k≤1
kx2 k≤1
uma norma em L(V1 , V2 ; W ) e

sup kT (x1 , x2 )k = kT k = inf {M > 0 ; kT (x1 , x2 )k ≤ M · kx1 k · kx2 k} .


kx1 k≤1
kx2 k≤1

Exercício. Prove as afirmações acima.

Exemplo 1.4.3. Sejam U , V , W e.v.n. sobre K e

f : L(V, W ) × L(U, V ) −→ L(U, W ).


(S, T ) 7−→ f (S, T ) = S ◦ T

f é bilinear e kS ◦ T k ≤ kSk.kT k, donde kf k ≤ 1.

Exemplo 1.4.4. Sejam U , V , W e.v.n. sobre K ,

f : L(U, V ; W ) −→ L(U, L(V, W ))


T 7−→ f (T ) = S : U −→ L(V, W )
x 7−→ Sx : V −→ W
y 7−→ Sx (y) = T (x, y)

g : L(U, L(V, W )) −→ L(U, V ; W )


S 7−→ g(S) = T : U × V → W
(x, y) 7→ T (x, y) = S(x)(y)

É fácil ver que f está bem definida, é linear e kf k ≤ 1 , que g está bem
definida, é linear, que kgk ≤ 1 e que g = f −1 . Portanto, kf k = kgk = 1, isto é,
kSk = kT k e f (resp. g ) é isometria. É a isometria canônica entre L(U, V ; W )
e L(U, L(V, W )) .

9
CAPÍTULO 1. ESPAÇOS VETORIAIS NORMADOS

1.5 Exercícios do Capítulo 1

1. Sejam.

ß ™
l1 (K) = x = (xn )x≥1 ; xn ∈ K e |xn | < ∞ ;
P
® n=1 ´
l∞ (K) = x = (xn )x≥1 ; xn ∈ K e sup |xn | < ∞ .
n∈N

Prove que, com as operações usuais, l1 (K) e l∞ (K) são espaços vetoriais,

que x 7→ kxk1 = |xn | é norma em l1 (K), e que x 7→ kxk∞ = sup |xn | é
P
n=1 n∈N
norma em l∞ (K) .

2. Prove que se W é um subespaço de um e.v.n. V , então seu fecho W é


subespaço fechado de V .

3. Seja V um e.v.n e H um hiperplano de V , isto é, H é um subespaço de


V
V de codimensão 1 (ou seja, dim = 1 ). Prove que H ou é fechado ou é
H
denso em V .

4. Sejam V = C 0 ([0, 1], R) com a norma kf k∞ = sup |f (x)|, W = C 0 ([0, 1], R)


0≤x≤1
R1
com a norma kf k1 = |f (t)| dt, i1 : V → W e i2 : W → V as aplicações
0
induzidas pela identidade. Prove que i1 é contínua e ki1 k = 1. Prove que
i2 é descontínua.

ß ™
5. Seja l2 (K) = x = (xn )n≥1 ; xn ∈ K e |xn |2 < ∞ . Prove que l2 (K)
P
n=1

e um espaço vetorial, que hx, yi = xn .y n , para x ∈ l2 (K) , y ∈ l2 (K), é
P
n=1 

um produto interno e que x 7→ kxk2 = |xn |2 é uma norma em l2 (K) .
P
n=1


6. Sejam V = l2 (R), a = (an )n≥1 ∈ V , f : V → R, f (x) = an xn para todo
P
n=1
x = (xn )x≥1 ∈ V . Prove que f é linear contínua e ache sua norma.

10
Capítulo 2

Cálculo Diferencial

Neste capítulo introduzimos intrinsecamente o conceito de derivada (ou dife-


rencial) de funções f : A → W , onde A ⊂ V é aberto, e V e W são espaços de
Banach. Tendo em vista as aplicações futuras vamos nos limitar ao caso em que V
e W têm dimensão finita, apesar de que, em grande parte, as demonstrações sejam
válidas no caso mais geral em que V e W são espaços de Banach arbitrários. Em
particular, provamos a regra da cadeia e a derivada da inversão de matrizes.

2.1 Aplicações Diferenciáveis

Sejam V e W espaços vetoriais normados A ⊂ V aberto e f : A → W .


Queremos definir o conceito de derivada (ou diferencial) de f .
Motivação: sejam f : A → R , A ⊂ R aberto, a ∈ A . Sabemos que a
f (a + h) − f (a)
derivada de f em a é o número real definido por. f 0 (a) = lim ,
h→0 h
caso este limite exista. Neste caso, pondo

r(h) = f (a + h) − f (a) − f 0 (a) · h,

r(h)
vemos que lim = 0. Reciprocamente, se existe m ∈ R tal que
h→0 h
f (a + h) − f (a) − mh f (a + h) − f (a)
lim = 0 , é imediato que m = lim = f 0 (a).
h→0 h h→0 h

11
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

Assim, f é derivável em a se , e só se, existe m = f 0 (a) ∈ R tal que


r(h)
f (a + h) = f (a) + f 0 (a) · h + r(h) , onde lim = 0.
h→0 h

Usando a isometria canônica entre L(R, R) e R (T ↔ T (1)) vemos que


0
f (a) ∈ R define univocamente a aplicação linear d f (a) : R → R , d f (a) · h =
= f 0 (a) · h , chamada a diferencial de f em a. Podemos então dizer que f é
derivável (ou diferenciável) em a se existe d f (a) ∈ L(R, R) tal que

r(h)
f (a + h) = f (a) + df (a) · h + r(h) , com lim = 0.
h→0 h

Voltando ao caso f : A → W , A ⊂ V aberto , a ∈ A, V e W espaços


vetoriais normados, temos a seguinte:

Definição 2.1. f : A → W é derivável (ou diferenciável) em a ∈ A , se existe


T ∈ L(V, W ) , isto é, uma aplicação linear contínua, tal que

r(h)
f (a + h) = f (a) + T · h + r(h) , onde lim = 0.
h→0 khk

Unicidade de T: Sejam T1 e T2 aplicações lineares contínuas de V em W e


ε1 e ε2 aplicações de V em W tais que

f (a + h) = f (a) + T1 (h) + ε1 (h) = f (a) + T2 (h) + ε2 (h)


εj (h)
para h ∈ V , a + h ∈ A , lim =0 (j = 1, 2).
h→0 khk

Resulta,

k(T1 − T2 )(h)k = kε3 (h)k , onde ε3 = ε2 − ε1 .

ε3 (h)
Como lim = 0, dado α > 0 , existe δ > 0 tal que khk ≤ δ im-
h→0 khk
kε3 (h)k
plica ≤ α e, portanto, k(T1 − T2 )(h)k ≤ αkhk para todo h ∈ V , donde
khk
kT1 − T2 k ≤ α, donde T1 = T2 .
Dizemos que T é a derivada (ou diferencial) de f em a e escrevemos
T = f 0 (a) = D f (a) = d f (a) . A igualdade

12
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

r(h)
f (a + h) = f (a) + f 0 (a) · h + r(h), com lim =0,
h→0 khk

exprime o fato de que a função afim x 7→ f (a) + f 0 (a) · (x − a) é uma boa aproxi-
mação de f na vizinhança de a .

Obs.

T (t h) f (a + t h) − f (a) r(t h)
T (h) = = ± · khk (t 6= 0).
t t kt hk

Logo,
f (a + t h) − f (a) ∂f
T (h) = lim =Dh f (a) = (a) = derivada de f em a na di-
t→0 t ∂h
reção de h 6= 0.

Proposição 2.1. f derivável em a ⇒ f é contínua em a.

Dem. Imediata.

Definição 2.2. Dizemos que f : A → W , A ⊂ V aberto, é derivável em A se f


é derivável em cada ponto de A. Neste caso, a aplicação

f 0 = D f = d f : A −→ L(V, W )
x 7−→ f 0 (x)

é a derivada (ou diferencial) de f em A . Dizemos que f é continuamente


derivável em A, ou de classe C 1 em A, e escrevemos f ∈ C 1 (A, W ) , se f 0 = D f
é contínua.

Exercício. (a) Se B ⊂ A é aberto e f for derivável em A , então f |B será


derivável em B.

(b) Se A = ∪ Ai com Ai aberto e f |Ai for derivável para cada i ∈ I , então f


i∈I
será derivável em A.

(c) Mudando-se equivalentemente as normas de V e W não se altera a derivabili-


dade de f nem sua derivada.

13
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

Obs. Daqui em diante, salvo menção expressa em contrário, vamos considerar o


caso em que V e W são espaços vetoriais normados reais de dimensão finita ,
(em particular V = Rn e W = Rm ). Neste caso a continuidade de T ∈ L(V, W )
é automática, e V e W são completos.

Exemplo 2.1.1. Sejam I ⊂ R intervalo aberto, f : I → W um caminho no es-


paço vetorial W . Se f é derivável em a ∈ I então f 0 (a) ∈ L(R, W ) ' W (isometria
canônica) f 0 (a) correspondendo a f 0 (a) · 1 ∈ W , ou seja, podemos considerar a
f (a + t) − f (a)
derivada de f em a como sendo um vetor v = f 0 (a).1 = lim , cha-
t→0 t
df
mado o vetor tangente a f em a, e representado por v = (a) .
dt
df
Se W = Rm e f = (f1 , . . . , fm ) , fi : I → R , 1 ≤ i ≤ m , então (a) =
Ç å dt
d f1 d fm
= (a), . . . , (a) , como é fácil verificar.
dt dt
Exemplo 2.1.2. Sejam f : A → Rm , A ⊂ Rn aberto, f = (f1 , . . . , fm ) , fi : A → R .
f é derivável em a ∈ A se, e só se, existe T ∈ L(Rn , Rm ) , T = (T1 , . . . , Tm ) ,
r(h)
Ti : Rn → R , 1 ≤ i ≤ m , tal que f (a + h) = f (a) + T · h + r(h) com lim = 0,
h→0 khk
r = (r1 , . . . , rm ), o que equivale a

ri (h)
fi (a + h) = fi (a) + Ti (h) + ri (h) com lim =0,
h→0 khk

1 ≤ i ≤ m . Resulta que f é derivável em a se, e só se, cada fi é derivável em a.


Além disso, ∀h ∈ Rn , Df (a) · h = (Df1 (a) · h, . . . , Dfm (a) · h) .

Obs. (1) A derivada Df (a) : Rn → Rm , sendo linear, tem uma matriz em rela-
ção às bases canônicas de Rn e Rm , que é m × n e anotada Jf (a) : é a jacobiana
de f em a .
Temos:  

∂ f1
 0 
(a)  .. 


 ∂ xj

  . 
∂f ..
   
. ,
 
D f (a) · ej = Dj f (a) = (a) = 


ej =  1  ←− linha j .
∂ xj   
..

(1≤j≤n)
∂ fm
 
.
   
(a)
   
∂ xj  
0

14
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

Então,

∂ f1 ∂ f1
 
(a) · · · (a)
 ∂ x1 ∂ xn 

.. .. ..
ñ ô
∂ fi

. . .
 
Jf (a) =  =
 (a) .

∂ xj 1≤i≤m
 ∂ fm ∂ fm
 
 1≤j≤n
(a) · · · (a)
∂ x1 ∂ xn

∂f
(2) Se existe f 0 (a) então existem as derivadas direcionais (a) = f 0 (a) · h ;
∂h
∂f
em particular, existem as derivadas parciais (a). A recíproca é falsa, isto é,
∂xj
∂f
pode existir ∀h ∈ Rn , mas não existir f 0 (a) . Por exemplo, seja
∂h


 0 se (x, y) = (0, 0);
f (x, y) =  x2 y
 se (x, y) 6= (0, 0).
x2 + y 2

a2 b
Se h = (a, b)temos Dh f (0, 0) = . Para:
a2 + b 2

h1 = (1, 0) temos fx (0, 0) = 0;


h2 = (0, 1) temos fy (0, 0) = 0;
1
h = h1 + h2 = (1, 1) temos Dh f (0, 0) = 2
6= Dh1 f (0, 0) + Dh2 f (0, 0) = 0,

ou seja, Dh f (0, 0) não depende linearmente de h e, portanto, D f (0, 0) não


existe.
∂f
Exercício. Prove que, no exemplo acima, (x, y) é descontínua em (0, 0).
∂x

2.2 Regras de Derivação

(1) Linearidade da derivada: sejam f, g : A → W , A ⊂ V aberto, V e W es-


paços vetoriais normados reais, λ ∈ R , h = f + g, k = λf . Se f e g são de-
riváveis em a ∈ A então h0 (a) = f 0 (a) + g 0 (a) e k 0 (a) = λf 0 (a) , ou seja, o
conjunto das aplicações f : A → W que são deriváveis em a ∈ A é um subes-

15
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

paço vetorial Va do espaço de todas as aplicações f : A → W e a aplicação


f ∈ Va 7→ f 0 (a) ∈ L(V, W ) é linear. É imediato também que o conjunto das
aplicações f ∈ C 1 (A, W ) é um subespaço de Va .

(2) Aplicações constantes:


f : x ∈ V 7→ b ∈ W , b fixo, tem derivada igual à transforma-
ção linear 0 ∈ L(V, W ) pois f (x + h) = f (x) + 0 · h . Ela é de classe C 1 .

(3) Aplicações Lineares:


se T ∈ L(V, W ) então T 0 (x) = T para todo x ∈ V .
De fato, T (x + h) = T (x) + T (h) implica T 0 (x) = T , e T 0 ∈ L(V, L(V, W ))
é constante, donde contínua, ou seja T ∈ C 1 (V, W ) .

(4) Aplicações Multilineares:


vamos considerar o caso bilinear. Seja B : U × V → W bili-
near. Para (x, y) ∈ U × V e (h, k) ∈ U × V , temos:

B(x + h, y + k) = B(x, y) + B(h, y) + B(x, k) + B(h, k) .

Usando em U × V a norma k(h, k)k = sup {khk, kkk} , vem:

B(h, k)
kB(h, k)k ≤ kBk · khk · kkk ≤ kBk k(h, k)k2 , donde lim =0
(h,k)→(0,0) k(h, k)k

e, portanto,
B 0 (x, y)(h, k) = B(x, k) + B(h, y).

No caso trilinear, temos:

B 0 (x, y, z)(h, k, l) = B(x, y, l) + B(x, k, z) + B(h, y, z) , e

assim por diante. Voltando ao caso bilinear, vemos que

B 0 : U × V −→ L(U, V ; W ) é tal que B 0 (x, y)(h, k) = B(x, k) + B(h, y),


(x, y) 7→ B 0 (x, y)

16
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

e é fácil ver que B 0 é linear , donde contínua, e B ∈ C 1 (U × V, W ) .


Casos Particulares :

(a)
B : L(V, W ) × L(U, V ) −→ L(U, W )
(g, f ) 7−→ g ◦ f

é bilinear. Logo,

B 0 (g, f )(h, k) = B(g, k) + B(h, f ) = g ◦ k + h ◦ f,

onde h ∈ L(V, W ) e k ∈ L(U, V ).


(b) O produto interno
B : Rn × Rn −→ R
n
(x, y) 7→ hx, yi = xi y i ,
P
i=1
x = (x1 , . . . , xn ) , y = (y1 , . . . , yn ) é bilinear. Logo,

B 0 (x, y)(h, k) = hx, ki + hh, yi, para h ∈ Rn , k ∈ Rn .

(c) B : L(V, W ) × V → W é bilinear.


(f, x) 7→ f (x)
Logo,

B 0 (f, x)(g, y) = f (y) + g(x), para y ∈ V , g ∈ L(V, W ).

(5) Regra da Cadeia


Sejam U, V e W e.v.n.(reais e de dimensão finita), f : A → V ,
g : B → W , A ⊂ U , B ⊂ V abertos, f (A) ⊂ B , e h = g ◦ f . Se f é derivá-
vel em a ∈ A e g é derivável em b = f (a) ∈ B , vamos provar que h = g ◦ f
é derivável em a e h0 (a) = (g ◦ f )0 (a) = g 0 (b) · f 0 (a) .

Dem. Por hipótese, temos:

f (x) − f (a) = f 0 (a)(x − a) + kx − akr(x), com lim r(x) = 0.


x→a
g(y) − g(b) = g (b)(y − b) + ky − bks(y), com
0
lim s(y) = 0.
y→b

17
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

Então,

h(x) − h(a) = g(f (x)) − g(f (a)) = g(y) − g(b) = g 0 (b) · (y − b)+
+ky − bk s(y) = g 0 (b) [f (x) − f (a)] + kf (x) − f (a)k s(y) =
= g 0 (b) · [f 0 (a)(x − a) + kx − ak r(x)] + kf (x) − f (a)k s(y) =
= g 0 (b) · f 0 (a)(x − a) + kx − ak · t(x),

onde
kf (x) − f (a)k
t(x) = g 0 (b) · r(x) + · s(f (x)).
kx − ak

Mas,
lim g 0 (b) · r(x) = 0
x→a

kf (x) − f (a)k = kf 0 (a) · (x − a)+ kx − ak· r(x)k ≤ (kf 0 (a)k + kr(x)k) ·kx − ak,

kf (x) − f (a)k
donde ≤ kf 0 (a)k + kr(x)k
kx − ak
kf (x) − f (a)k
e, como lim r(x) = 0, resulta que é limitado numa vizinhança
x→a kx − ak
kf (x) − f (a)k
de a e , portanto, lim s(f (x)) = 0 .
y→b kx − ak
Resulta que x→a lim t(x) = 0 , o que prova que h = g ◦ f é derivável em a e que
h0 (a) = g 0 (b) · f 0 (a)

Corolário 2.1. Se f ∈ C 1 (A, V ) e g ∈ C 1 (B, W ) , então g ◦ f =


= h ∈ C 1 (A, W ) .

Dem. Temos h0 (x) = g 0 (f (x)).f 0 (x) ∀x ∈ A , isto é


(α,β) B
x 7−→ (g 0 ◦ f (x), f 0 (x)) 7−→ g 0 (f (x)) ◦ f 0 (x) , onde α = g 0 ◦ f , β = f 0 ,
B(α, β) = α ◦ β , todas contínuas; logo h0 é contínua, isto é, h ∈ C 1 (A, W ) .

Corolário 2.2. Dado v ∈ U , seja α : t 7→ α(t) um caminho em A tal que


α(0) = a e α0 (0) = v . Então,
(f ◦ α)0 (0) = f 0 (a) · v , ou seja, f 0 (a) · v é o vetor tangente ao caminho
t 7→ f ◦ α(t) em t = 0 .

18
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

v = α0 (0) f 0 (a).v

α(0) = a
f (a)

Corolário 2.3. Suponhamos que f admita inversa g = f −1 : B → A


derivável em b . Então f 0 (a) é um isomorfismo cujo inverso é g 0 (b) · (U =
f g
= V = W, A → B → A) .

Dem. f ◦g = i dB e g ◦f = i dA implicam f 0 (a)·g 0 (b) = i dV e g 0 (b)·f 0 (a) =


= i dV , ou seja, g 0 (b) = (f 0 (a))−1 .

Obs. (Regra da cadeia clássica)


Sejam: U = Rm , V = Rn , W = Rp , f = (f1 , . . . , fn ) : A → Rn ,
g = (g1 , . . . , gp ) : B → Rp , A ⊂ Rm aberto, B ⊂ Rn aberto, f (A) ⊂ B, f
derivável em a ∈ A e g derivável em b = f (a).
ñ ô ñ ô
∂fk ∂gi
Então: Jf (a) = (a) − n × m ; Jg(b) = (b) − p × n.
∂ xj ∂ yk
A fórmula (g ◦ f )0 (a) = g 0 (b) · f 0 (a) implica em J(g ◦ f )(a) = Jg(b) · Jf (a).
∂(gi ◦ f )
ñ ô
Como J(g ◦ f )(a) = (a) , resulta:
∂ xj
∂(gi ◦ f ) n ∂ gi ∂ fk
(a) = (b) · (a) que, na notação clássica, se escrevia
P
∂ xj k=1 ∂ yk ∂ xj

n
∂gi X ∂ gi ∂ yk
(a) = (b) · (a) .
∂ xj k=1 ∂ yk ∂ xj

(6) Inversão de Matrizes


Sejam V e W e.v.n. de mesma dimensão n sobre K . O con-
junto Isom (V, W ) ⊂ L(V, W ) das aplicações lineares invertíveis T : V → W
se identifica (via escolha de bases) com o conjunto GL(n, K) das matrizes in-
vertíveis, que é aberto em M (n, K) = M (n), pois T ∈ GL(n, K) se, e só se,
det T 6= 0, e det : M (n) → K é contínua.

19
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

(a) Sejam T ∈ GL(n, K), I = In , kT k < 1 .


N 1 − kT kN +1 1
Então, kT kn = ≤ ; portanto, a série (−1)n T n
P P
n=0 1 − kT k 1 − kT k n≥0
é absolutamente convergente em M (n, K). Além disso, (I + T )(I − T +
+T 2 − · · · + (−1)N T N ) = (I − T + T 2 − · · · + (−1)N T N )(I + T ) = I − T N +1 .

Pondo S = (−1)n T n , resulta (I + T )S = S(I + T ) = I, ou seja,
P
n=0
S = (I + T )−1 e, como (I + T )−1 − I + T = T 2 (I − T + T 2 − · · · ), vem
kT k2
k(I + T )−1 − I + T k ≤ .
1 − kT k
(b) Seja f : GL(n, K) → M (n, K), f (X) = X −1 . Então, f é derivável no
ponto In e D f (I) = −idM (n) = −I. De fato, para kHk < 1, escrevamos

(I + H)−1 = I − H + r(H).

kHk2
Vem: kr(H)k = k(I + H)−1 − I + Hk ≤ (pela parte (a)) donde
1 − kHk
r(H)
lim = 0, e D f (In ) = −I.
H→0 kHk

Para X ∈ GL(n, K), f (H) = H −1 admite a decomposição

α f β
H 7−→ X −1 H 7−→ H −1 X 7−→ H −1 ,

onde α e β são lineares. Logo, D f (X) = β 0 (I)·f 0 (I)·α0 (X) = β◦f 0 (I)·α ,
donde Df (X) · H = β ◦ f 0 (I) · α(H) = β · f 0 (I)(X −1 H) = β(−X −1 H) =
= −X −1 · H · X −1 .

(c) Vamos mostrar que f : GL(n, K) → M (n, K) , f (X) = X −1 , é de classe


C 1 . Vimos que f 0 (X) · H = −X −1 · H · X −1 .
Sejam ξ : GL(n, K) → M (n, K) × M (n, K), ξ(X) = (X −1 , X −1 ); ξ é
contínua pois f (X) = X −1 é derivável (donde contínua).

20
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

Seja
φ : M (n) × M (n) −→ L(M (n), M (n))
(T, S) 7−→ φ(T, S) : M (n) → M (n)
H 7→ −T · H · S

φ(T, S) é linear, φ é bilinear (donde contínua) e f 0 = φ ◦ ξ, donde f 0 é


contínua e f ∈ C 1 (GL(n, K), M (n, K)).

2.3 Exercícios do Capítulo 2

1. Seja Mn (R) o espaço vetorial das matrizes quadradas de ordem n. Seja


f : Mn (R) → Mn (R) definida por f (X) = X · X t , onde X t é a transposta
de X ∈ Mn (R). Ache a derivada f 0 (X) : Mn (R) → Mn (R) e mostre que
f 0 (X) · H é simétrica para cada H ∈ Mn (R). Mostre também que se X t = X −1
então, para cada matriz simétrica S, existe matriz H tal que f 0 (X) · H = S.

2. Seja f : Mn (R) → R, f (X) = det X. Dados X, H ∈ Mn (R), ache f 0 (X) · H,


mostre que f 0 (I) · H = tr H, onde I é a matriz identidade n × n e tr H é o
traço de H. Mostre também que f 0 (X) = 0 se, e só se, o posto de X é menor
que (n − 1).

3. Sejam U , V , W e.v.n. de dimensão finita, A ⊂ U aberto, f : A → V e


g : A → W aplicações deriváveis. Seja ϕ : A → R tal que ϕ(x) = hf (x), g(x)i,
onde h, i : V × W → R é uma forma bilinear. Calcule ϕ0 (x).

4. Seja f : I → Rn de classe C 1 , onde I é um intervalo aberto de R. Defina


g : I × I → Rn por g(x, y) = f (x)−f
x−y
(y)
se x 6= y e g(x, x) = f 0 (x). Prove que g
é contínua em I × I e de classe C 1 em I × I − ∆, onde ∆ = {(x, x); x ∈ I} é
a diagonal de I × I.

5. Seja V um espaço vetorial real de dimensão finita munido de um produto


»
interno h, i, e seja kxk = hx, xi, x ∈ V , a norma induzida.

(a) Prove que x 7→ kxk não é derivável em 0;

21
CAPÍTULO 2. CÁLCULO DIFERENCIAL

(b) Prove que x 7→ kxk é derivável em todo x 6= 0 e ache sua derivada;


x
(c) Prove que ϕ(x) = , x 6= 0 é derivável em V − {0} e ache ϕ0 (x).
kxk2
6. Seja f : A → Rm derivável no aberto A ⊂ Rn . Se existe M > 0 tal que
kf (x)−f (y)k ≤ M ·kx−yk para x, y ∈ A quaisquer, prove que kf 0 (x)k ≤ M
para todo x ∈ A.

7. Seja f : A → Rm derivável no aberto A ⊂ Rn .


Se, para algum b ∈ Rm , o conjunto f −1 (b) possui um ponto de acumulação
a, então f 0 (a) : Rn → Rm não é injetora.

8. Seja A ⊂ Rm aberto. Uma aplicação T : A → L(Rn ; Rp ) é derivável em a ∈ A


se, e só se, para cada vetor v ∈ Rn , a aplicação ϕv : A → Rp , ϕv (x) = T (x) · v,
é derivável em a e, neste caso, ϕ0 v (a) · u = (T 0 (a) · u) · v.

9. Seja f : Rn → Rn derivável, com f (0) = 0. Se f 0 (0) não tem autovalor igual


a 1 , então existe vizinhança V de 0 em Rn tal que f (x) 6= x para todo
x ∈ V − {0}.
n
10. Seja f : Mn (R) → Mn (R), f (A) = (tr A) · A, onde tr A = aii é o traço da
P
i=1
matriz A = (aij ) − n × n. Ache f 0 (A).

22
Capítulo 3

Integração de Caminhos e o Teorema


do Valor Médio

Neste capítulo desenvolvemos a teoria elementar da integral de funções


f : [a, b] → V , onde [a, b] é um intervalo real e V um espaço vetorial de dimensão
finita, funções para as quais existam os limites laterais f (a + 0), f (b − 0), f (c − 0)
e f (c + 0) para todo c ∈ (a, b). Tais funções são chamadas reguladas. Como
aplicação demonstramos o teorema do valor médio, e algumas consequências.

3.1 Integração de Caminhos

Seja [a, b] ⊂ R um intervalo compacto e f : [a.b] → V um caminho no e.v.n.


real V de dimensão finita. Uma partição de [a, b] é um conjunto finito P =
= {to , t1 , . . . , tp }, ti ∈ [a, b], tal que a = to < t1 < . . . < tp = b.

Definição 3.1. f : [a, b] → V é um caminho de saltos se existem partição


P = {to , . . . , tp } de [a, b] e vetores v1 , . . . , vp ∈ V tais que f (t) = vi para
ti−1 < t < ti .
Assim, f tem valor constante em cada subintervalo aberto (ti−1 , ti ) deter-
minado pela partição P . O valor de f na extremidade ti não interessa, e

23
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

definimos
p
X
IP (t) = (ti − ti−1 )vi ∈ V.
i=1

Se Q é outra partição de [a, b], em relação à qual f é um caminho de saltos,


vamos provar que IQ (f ) = IP (f ). Consideremos primeiro a partição obtida de P
pelo acrescentamento de um único ponto c : Pc = {to , . . . , tk , c, tk+1 , . . . , tp }.
Então, IPc (f ) = (t1 − t0 )v1 + · · · + (c − tk )vk+1 + (tk+1 − c)vk+1 + · · · + (tp − tp−1 )vp =
= (t1 − t0 )v1 + · · · + (tk+1 − tk )vk+1 + · · · + (tp − tp−1 )vp = IP (f ) .
Logo, acrescentando-se um número finito de pontos à partição P obtemos Q
tal que IQ (f ) = IP (f ), ou seja, se Q ⊃ P (isto é, se Q é um refinamento de P ),
então IQ (f ) = IP (f ). Se R é uma partição arbitrária de [a, b] , então Q = P ∪ R
é um refinamento comum a P e R, donde IR (f ) = IQ (f ) = IP (f ), o que mostra
que o vetor IP (f ) independe da partição P ; ele é a integral de f em [a, b] :
Z b
IP (f ) = f (t) dt.
a

Representamos por S = S([a, b], V ) o conjunto dos caminhos de saltos


f : [a, b] → V . É fácil ver que S é um espaço vetorial real. Temos a aplicação

I : S −→ V
Rb
f 7−→ I(f ) = f.
a

I é linear e kI(f )k ≤ (b − a) sup kf (t)k, como se verifica imediatamente.


a≤t≤b

Definição 3.2. f : [a, b] → V é um caminho regulado se f é o limite uniforme


de uma sequência de caminhos de saltos.

Seja B = B([a, b], V ) o espaço vetorial real dos caminhos limitados f : [a, b] → V
com a topologia da convergência uniforme, definida pela norma kf k∞ = sup kf (t)k.
a≤t≤b
S = S([a, b], V ) é um subespaço de B. O fecho (ou aderência) de S em B é o e.v.n.
R = R([a, b], V ) dos caminhos regulados. Sejam fn , gn ∈ S, fn → f , gn → f ,
Rb Rb
In = fn , Jn = gn , a convergência sendo uniforme.
a a

24
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO


Rb
Temos: kIn − Im k = (fn

a
− fm ) ≤ (b − a)kfn − fm k∞ , donde (In )n≥1 é de
Cauchy em V , e converge para I = n→∞
lim In . Analogamente, seja J = n→∞
lim Jn .
Vamos mostrar que I = J. Dado ε > 0 , existe n0 ∈ N tal que n ≥ n0 implica
kfn − f k∞ < ε e kgn − f k∞ < ε, donde kfn − gn k < 2ε para n ≥ n0 . Logo,
kIn − Jn k ≤ (b − a)kfn − gn k < 2ε(b − a) para n ≥ n0 , donde resulta
lim (In − Jn ) = 0, e I = J .
n→∞

Rb Rb
Assim, se fn → f e gn → f , então fn e gn convergem em V para o
a a
mesmo vetor I , e podemos definir:
Rb
Definição 3.3. Se fn ∈ S([a, b], V ) e fn → f uniformemente, então lim fn
n→∞ a
Rb Rb
está bem definido e se chama a integral de f em [a, b] . Notação: I = n→∞
lim fn = f .
a a

Proposição 3.1. Sejam f, g ∈ R = R([a, b], V ), λ ∈ R, T ∈ L(V, W ), V e W


e.v.n. (reais e de dimensão finita). Então,

Rb Rb Rb
(a) (f + g) = f + g;
a a a

Rb Rb
(b) λf = λ f ;
a a

Rb
(c) k f k ≤ (b − a)kf k∞ ;
a
Ç å
Rb Rb
(d) T ◦ f = T. f .
a a

Dem. Deixemos (a),(b),(c) como exercício e provemos (d).


Temos: kT ◦ fn − T ◦ f k ≤ kT k.kfn − f k, donde (T ◦ fn )n≥1 converge uni-
formemente para T ◦ f se fn → f uniformemente, fn ∈ S, e T ◦ fn ∈ S. Logo,
T ◦ f ∈ R e, então, limn→∞ ab T ◦ fn = ab T ◦ f . Mas, é imediato que
R R

a T ◦ fn = T. a fn , e resulta a T ◦ f = limn→∞ T a f , pois T é


Rb ÄR b ä Rb ÄR b ä ÄR b ä
a fn = T
contínua.

25
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

Proposição 3.2. Seja λ : [a, b] → L(V, W ) um caminho regulado.


Para cada h ∈ V fixo, o caminho t ∈ [a, b] 7→ λ(t).h ∈ W é regulado e
.h .
Rb ÄR b ä
a λ(t).h dt = a λ(t) dt
Dem. Seja λn ∈ S ([a, b], L(V, W )), λn → λ uniformemente; então, f (t) = λ(t).h =
= limn→∞ λn (t).h. Pondo fn (t) = λn (t).h resulta que fn ∈ S ([a, b], W ) e que fn → f
uniformemente, donde f ∈ R([a, b], W ). Seja T : L(V, W ) −→ W , T (g) = g(h). T
é linear. Então,

Zb Zb
Ñ b é Ñ b é
Z Z
λ(t).h dt = (T ◦ λ)(t) dt = T. λ(t) dt = λ(t) dt .h.
a a a a

Proposição 3.3. Todo caminho contínuo f : [a, b] −→ V pode ser uniformemente


aproximado por caminhos de saltos, ou seja, C 0 ([a, b], V ) ⊂ R ([a, b], V ).
Dem. Como f é uniformemente contínua, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que x, y ∈
∈ [a, b], |x − y| < δ implicam kf (x) − f (y)k < ε. Seja n ∈ N tal que b−a n
< δ e seja
P = {t0 , . . . , tp } a partição de [a, b] tal que ti −ti−1 = n para todo i. Se ti−1 ≤ t < ti
b−a

defina gn (t) = f (ti−1 ), donde gn ∈ S([a, b], V ) e supa≤t≤b kgn (t) − f (t)k ≤ ε.

A proposição abaixo generaliza a Proposição 3.3.


Proposição 3.4. f : [a, b] −→ V é regulada se, e só se, para cada c ∈ (a, b) exis-
tem os limites laterais f (c − 0), f (c + 0), bem como f (a + 0) e f (b − 0) .

Dem. Seja a < c ≤ b e provemos que f (c − 0) = lim− f (t) existe, o caso f (c + 0)


t→c

sendo análogo. Como f é regulada, existe sequência (fn )n≥1 , fn ∈ S, tal que
fn → f uniformemente. Seja vn = fn (c − 0); dado ε > 0, existe no ∈ N tal
que m ≥ n ≥ no implica kfm (t) − fn (t)k < ε ∀t ∈ [a, b]. Seja t < c tal que
kfn (t) − vn k < ε e kfm (t) − vm k < ε. Resulta, kvm − vn k < 3ε se m ≥ n ≥ n0 ,
isto é, (vn )n≥1 é de Cauchy em V , donde existe lim vn . Provemos que
v = n→∞
v = f (c−0). Dado ε > 0 , seja n0 ∈ N tal que kvn0 −vk < ε e kfn0 (t)−f (t)k < ε
∀t ∈ [a, b]; existe δ > 0 tal que c − δ < t < c implica kfn0 (t) − vn0 k < ε. Logo
c − δ < t < c implica kf (t) − vk < 3ε, donde v = lim− f (t).
t→c

26
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

1
Reciprocamente, dado ε > 0 , existe n ∈ N tal que < t < c ⇒
c−
n
⇒ kf (t) − f (c − 0)k < 2ε , e c < t < c + n1 ⇒ kf (t) − f (c + 0)k < 2ε . Resulta
Ç å
1 1
que se x < c, y < c ou x > c, y > c, ambos em Ic = c − , c + ,
n n
1
então kf (x) − f (y)k < ε (Nas extremidades os intervalos são Ia = [a, a + ) e
n
1
Ib = (b − , b]). Como [a, b] é compacto, existe número finito de tais intervalos
n
Ic0 , . . . , Icm , com a = co < c1 < . . . < cm = b, cuja união contém [a, b], e
podemos supor que nenhum Ici esteja contido na união dos demais, donde existe
ti ∈ Ici ∩ Ici+1 , ci < ti < ci+1 .

Assim, kf (x) − f (y)k < ε desde que x, y estejam ambos em (ci , ti ) ou ambos
em (ti , ci+1 ) . Definamos gn ∈ S pondo gn (ci ) = f (ci ), gn (ti ) = fn (ti ) e, em cada
intervalo (ci , ti ) ou (ti , ci+1 ), tomando gn constante e igual ao valor de f num ponto
(por exemplo, o ponto médio) do intervalo. Então, kf (t) − gn (t)k < ε ∀t ∈ [a, b],
gn −→ f uniformemente, e f é regulada.

Corolário 3.1. f : [a, b] −→ V contínuo ⇒ f regulado.

Corolário 3.2. f : [a, b] −→ R monótono ⇒ f regulado.

Corolário 3.3. f ∈ R([a, b], V ) tem quantidade enumerável de descontinuidades.

Dem. Seja fn ∈ S, fn → f uniformemente. Como fn tem número finito de


descontinuidades, o conjunto D das descontinuidades de todos os fn é enumerável.
Como f é contínua fora de D (pois o limite uniforme preserva a continuidade)
segue-se o resultado.

Rx Rb Rb
Proposição 3.5. Seja f ∈ R([a, b], V ). Para todo x ∈ [a, b], temos: f + f = f.
a x a

Dem. Sejam g ∈ S, P = {to , . . . , tp } partição de [a, b] tal que g(ti ) = vi ,

27
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

ti−1 < t < ti . Então,


Zb p
X
g= (ti − ti−1 )vi .
a i=1

Seja Px = {t0 , t1 , . . . , ti−1 , x, ti , . . . , tp }. Então,

Zx i−1
X
g= (tk − tk−1 )vk + (x − ti−1 )vi ,
a k=1

Zb p
X
g = (ti − x)vi + (tk − tk−1 )vk .
x k=1

Rx Rb Rb
Logo, g + g = g, e o teorema vale para g ∈ S . Por passagem ao limite
a x a
obtemos o caso f ∈ R.

Rx
Proposição 3.6. Seja f ∈ R([a, b], V ), e seja F (x) = f (t) dt.
a

Então:

(a) F é contínua;

(b) f contínua ⇒ F 0 = f ( donde F ∈ C 1 ).


x+h
Dem. (a) F (x + h) − F (x) = f , donde kF (x + h) − F (x)k ≤ khk.kf k, e F 0 é
R
x
contínua.

F (x + h) − F (x) 1 x+h
(b) f contínua ⇒
R

− f (x) = [f (t) − f (x)] dt ≤

|h| x

h
≤ sup kf (t) − f (x)k, donde F 0 = f , e F ∈ C 1 .
|t−x|≤|h|

Corolário 3.4. (Teorema Fundamental do Cálculo) .

28
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

Seja f : [a, b] → V de classe C 1 . Então,

Zb
f (b) − f (a) = f 0 (t) dt.
a

Rx 0
Dem. Seja F (x) = f (t) dt , donde F 0 (x) = f 0 (x) , e f (x) = F (x) + C ,
a
Rb 0
resultando f (a) = C ,e F (x) = f (x) − f (a) , donde F (b) = f (t) dt =
a
= f (b) − f (a) .

Proposição 3.7. Sejam f : A → W , A ⊂ V aberto, f de classe C 1 , [a ; a + h] ⊂ A,


V e W e.v.n. (reais e de dimensão finita).
Ç å
R1 0 R1 0
Então: f (a + h) − f (a) = f (a + th).h dt = f (a + th) dt .h.
0 0

Dem. Seja ϕ : [0, 1] → W , ϕ(t) = f (a + th); então ϕ ∈ C 1, ϕ(0) = f (a),


ϕ(1) = f (a + h) e ϕ0 (t) = f 0 (a + th).h.
R1 0 R1 0
Logo, ϕ(1) − ϕ(0) = ϕ (t) dt, e f (a + h) − f (a) = f (a + th).h dt =
Ç å 0 0
R1 0
= f (a + th) dt .h.
0

Proposição 3.8. (Teorema do Valor Médio) .

Sejam f : A → W, A ⊂ V aberto, f ∈ C 1 , V e W e.v.n. (reais e de


dimensão finita). Se [a, a + h] ⊂ A , então

kf (a + h) − f (a)k ≤ khk sup kf 0 (a + th)k .


0<t<1

Ç å
R1 0
Dem. De f (a + h) − f (a) = f (a + th) dt .h, vem
0


Z1

0
kf (a + h) − f (a)k ≤ khk. f (a + th) dt

≤ khk sup kf 0 (a + th)k.
0 0<t<1

29
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

Corolário 3.5. Se A é convexo e kf 0 (x)k ≤ k, então f é de Lipschitz :


kf (x1 ) − f (x2 )k ≤ kkx1 − x2 k .

Se f 0 (x) = 0 resulta que f é constante no convexo A .

Definição 3.4. Um espaço topológico X é conexo se X = A ∪ B, com A e B


abertos disjuntos, implica X = A, B = ø.

Proposição 3.9. Sejam X 6= ø e Y espaços topológicos, Y sendo de Hausdorff, e


f : X → Y contínua. Se X é conexo e f é localmente constante (isto é, cada ponto
possui uma vizinhança na qual f é constante), então f é constante em X.

Dem. Sejam a ∈ x e b = f (a) ∈ Y ; então f −1 (b) é fechado em X e contém a.


Como f é localmente constante resulta que f −1 (b) é aberto e, como X é conexo, vem
que X = f −1 (b), donde f (x) = b ∀x ∈ X.

Proposição 3.10. Sejam f : A → W , f ∈ C 1 , A ⊂ V aberto conexo, V e W


e.v.n. (reais e de dimensão finita).

Se f 0 (x) = 0 ∀x ∈ A, então f é constante.

Dem. Sejam a ∈ A, B uma bola de centro a, contida em A. B é convexa, donde


f é constante em B, ou seja, f é localmente constante. Como A é conexo, f é
constante em A.

Obs. Para f : A → R, f ∈ C 1 , A ⊂ V aberto, temos uma igualdade do


valor médio: f (b) − f (a) = f 0 (c).(b − a), com c ∈ [a, b] ⊂ A. Com efeito, seja
C1
ϕ : [0, 1] −→ R, ϕ(t) = f (a + t(b − a)). Então: ϕ(0) = f (a) , ϕ(1) = f (b) e existe

30
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

a
A

t0 ∈ (0, 1) tal que ϕ(1) − ϕ(0) = ϕ0 (t0 ), donde f (b) − f (a) = f 0 (c).(b − a), onde
c = a + t0 (b − a) ∈ [a, b] ⊂ A.

No caso f : A → W, dim W > 1, não temos igualdade em geral: por


exemplo, seja f : R → R2 , f (t) = eit = (cos t, sen t) . Então, f 0 (t) = i.eit =
= (− sen t, cos t) 6= 0 e f (2π) − f (0) = 0 6= f 0 (t0 ).2π = 2πi.eit0 .

Proposição 3.11. Sejam f : A → W , f ∈ C 1 ,A ⊂ V aberto, [a, a + h] ⊂ A,


T ∈ L(V, W ), V e W e.v.n. (de dimensão finita e reais). Então,

kf (a + h) − f (a) − T.hk ≤ khk sup kf 0 (a + th) − T k.


0<t<1

Dem. Basta aplicar a Proposição 3.8 a g(x) = f (x) − T (x) .

Corolário 3.6. Sejam f : A → W , A ⊂ V aberto, a ∈ A , f ∈ C 0 (A, W ),


f ∈ C 1 (A − {a}, W ). Se existe T = lim Df (x), então f ∈ C 1 (A, W ) e T = Df (a) .
x→a

Dem. Seja δ > 0 tal que (a + h) ∈ A para khk < δ.

Então,

r(a, h) kf (a + h) − f (a) − T.hk


= ≤ sup kf 0 (a + th) − T k,
khk khk 0<t<1

31
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

r(a, h)
donde lim = 0 e T = Df (a).
h→0 khk

C1
Proposição 3.12. Seja A ⊂ V aberto. Se uma sequência de aplicações fn : A −→ W ,
onde V e W são e.v.n. (reais e de dimensão finita), converge para f :A→W
C0
e a sequência das derivadas fn0 : A −→ L(V, W ) converge uniformemente para
C0
g : A −→ L(V, W ), então f 0 = g e f ∈ C 1 .
R1
Dem. fn (x + h) − fn (x) = fn0 (x + th).h dt. Por passagem ao limite, vem:
0

Z1
f (x + h) − f (x) = g(x + th).h dt.
0

Seja
Z1
r(h) = f (x + h) − f (x) − g(x).h = [g(x + th) − g(x)].h dt.
0

Então,

r(h)
kr(h)k ≤ khk sup kg(x + th) − g(x)k, donde lim = 0, f 0 = g e f ∈ C 1 .
0<t<1 h→0 khk

Proposição 3.13. Sejam A ⊂ V aberto, f : A → W de classe C 1 , a ∈ A. Se


f 0 (a) : V → W é injetora, existe vizinhança de a na qual f é injetora.

Dem. T = f 0 (a) : V → f 0 (a).V é um homeomorfismo linear, donde existe m > 0


tal que kT.hk ≥ m · khk, h ∈ V . Seja δ > 0 tal que khk < δ ⇒ a + h ∈ A e
m
f (a + h) − f (a) = T.h + r(h) com kr(h)k < khk. Então,
2

m
kf (a + h) − f (a)k ≥ kT · hk − kr(h)k ≥ khk.
2

De f (x) − f (a) = T (x − a) + r(x) resulta que f ∈ C 1 implica r ∈ C 1 e que

32
CAPÍTULO 3. INTEGRAÇÃO DE CAMINHOS E O TEOREMA DO VALOR MÉDIO

r0 (a) = f 0 (a) − T = 0, e podemos escolher δ > 0 de modo que se tenha também


m
kr0 (x)k < desde que kx − ak < δ. Então, para x e y em Bδ (a) , temos kr(x)−
2
m
−r(y)k < ky − xk e, portanto, na bola Bδ (a), vale kf (y) − f (x)k = kT (y − x)+
2
m
+r(y) − r(x)k ≥ ky − xk, donde f é injetora em Bδ (a) .
2

3.2 Exercícios do Capítulo 3

1. Seja f : I → Rn um caminho diferenciável. Se existirem a ∈ I , b ∈ Rn tais


que a seja ponto de acumulação de f −1 (b), prove que f 0 (a) = 0.

2. Sejam f : [a, b] → Rn e ϕ : [a, b] → R ambos de classe C 1 . Se


kf 0 (t)k ≤ ϕ0 (t) para todo t ∈ (a, b), prove que kf (b) − f (a)k ≤ ϕ(b) − ϕ(a).

3. Sejam f, g : [a, b] → Rn de classe C 1 . Prove que

Zb Zb
0
hf (t), g (t)i dt = hf (b), g(b)i − hf (a), g(a)i − hf 0 (t), g(t)i dt,
a a

onde h, i é o produto interno usual de Rn .

4. Sejam f : [a, b] → R contínua, φ : [c, d] → R de classe C 1 tal que


Rβ φ(β)
f (φ(t)) φ0 (t) dt =
R
φ([c, d]) ⊂ [a, b]. Prove que f (x) dx, quaisquer que
α φ(α)
sejam α e β em [c, d] .

33
Capítulo 4

Derivadas Parciais

Neste Capítulo introduzimos o conceito de derivada parcial. Como aplicação ,


demostramos o teorema de Leibniz de derivação sob o sinal de integração.

4.1 Derivadas Parciais

Seja V = V1 × V2 o produto cartesiano dos e.v.n. V1 e V2 ; cada x ∈ V


se escreve de modo único como x = (x1 , x2 ) com x1 ∈ V1 e x2 ∈ V2 , e a função
x 7−→ sup {kx1 k, kx2 k} é uma norma em V . Sejam A ⊂ V aberto, W um e.v.n. e
consideremos a aplicação f : A → W . Se a = (a1 , a2 ) ∈ A , sejam:

A1 = {x1 ∈ V1 ; (x1 , a2 ) ∈ A} ; A2 = {x2 ∈ V2 ; (a1 , x2 ) ∈ A} .

A1 (resp. A2 ) é aberto em V1 (resp. V2 ) pois A1 = λ−1


1 (A) onde λ1 : V1 → V

é a função contínua λ1 (x1 ) = (x1 , a2 ) .

34
CAPÍTULO 4. DERIVADAS PARCIAIS

Seja f1 = f ◦ λ1 : A1 → W

V2

A2
) A

a2 a = (a1 , a2 )
)

A1 V1
( )
a1

Definição 4.1. Dizemos que f é derivável parcialmente em relação a V1 no ponto


a = (a1 , a2 ) ∈ A se f1 : A1 → W é derivável em a1 ∈ A1 , e definimos a derivada
parcial D1 f (a) ∈ L(V1 , W ) por D1 f (a) = Df1 (a1 ) . Usam-se também as notações
∂f
∂1 f (a) , (a) e fx0 1 (a) para D1 f (a) .
∂x1
Analogamente definimos a derivada parcial de f em relação a V2 no ponto
a = (a1 , a2 ) , a saber, D2 f (a) = Df2 (a2 ) , onde f2 = f ◦ λ2 : A2 → W ,
λ2 : V2 → V sendo dada por λ2 (x2 ) = (a1 , x2 ) . Assim, as derivadas parciais
D1 f (a) e D2 f (a) são definidas pelas igualdades seguintes:

f (a1 + h1 , a2 ) = f (a1 , a2 ) + D1 f (a1 , a2 ).h1 + r1 (h1 );


f (a1 , a2 + h2 ) = f (a1 , a2 ) + D2 f (a1 , a2 ).h2 + r2 (h2 ) ,
r1 (h1 ) r2 (h2 )
com lim = lim = 0.
h1 →0 kh1 k h2 →0 kh2 k

Proposição 4.1. Com as notações acima, se f é derivável em a = (a1 , a2 ) , então

35
CAPÍTULO 4. DERIVADAS PARCIAIS

as derivadas parciais existem e

Df (a)(h1 , h2 ) = D1 f (a).h1 + D2 f (a).h2 .

Dem. Como f é derivável em a, temos f (a + h) = f (a) + Df (a).h + r(h) , com


r(h)
lim =0.
h→0 khk

Em particular,
r(h1 )
f (a1 + h1 , a2 ) = f (a) + Df (a)(h1 , 0) + r(h1 ) , com lim = 0 , ou seja,
h1 →0 kh1 k

Df (a)(h1 , 0) = D1 f (a).h1 . Analogamente, Df (a).(0, h2 ) = D2 f (a).h2 .

Logo,
Df (a).(h1 , h2 ) = D1 f (a).h1 + D2 f (a).h2 .

Obs. A recíproca é falsa, isto é, a mera existência de D1 f (a) e D2 f (a)


não implica a derivabilidade de f em a, como já vimos (Obs 2 da Seção 2.1 do
Capítulo 2).
n
^
Exemplo 4.1.1. Seja Rn = R× · · · ×R . Se f : A → Rm , A ⊂ Rn aberto, é
derivável em a ∈ A , então : Di f (a) ∈ L(R, Rm ) ' Rm (isometria canônica) é o
Ç å
∂f ∂f1 ∂fm
vetor (a) = Di f (a).1 = (a), . . . , (a) ∈ Rm , onde f = (f1 , . . . , fm ).
∂xi ∂xi ∂xi

Proposição 4.2. Sejam V1 , V2 , W e.v.n., V = V1 × V2 , A ⊂ V aberto. f : A → W


é de classe C 1 se, e só se, as derivadas parciais D1 f : A → L(V1 , W ) e
D2 f : A → L(V2 , W ) existem e são contínuas.

Dem. Se f é derivável em a ∈ A vimos que Df (a).(h1 , 0) = D1 f (a).h1 . Seja


µ1 : V1 → V , µ1 (x1 ) = (x1 , 0) ; µ1 é linear e D1 f (a) = Df (a) ◦ µ1 . A aplicação
ψ1 : L(V, W ) → L(V1 , W ) , ψ1 (g) = g ◦ µ1 ,é linear e D1 f (a) = ψ1 (Df (a)) ,

36
CAPÍTULO 4. DERIVADAS PARCIAIS

donde D1 f = ψ1 ◦ Df , e a continuidade de Df implica a de D1 f . Analogamente


se prova que D2 f é contínua.

Reciprocamente, suponhamos D1 f e D2 f contínuas. Para mostrar que f é


derivável em a = (a1 , a2 ) ∈ A , sejam h = (h1 , h2 ) , e r(h) = f (a + h)−
−f (a) − D1 f (a)h1 − D2 f (a)h2 .

Então: kr(h)k ≤ kf (a1 + h1 , a2 + h2 ) − f (a1 + h1 , a2 ) − D2 f (a).h2 k +


+ kf (a1 + h1 , a2 ) − f (a1 , a2 ) − D1 f (a).h1 k ≤ kh2 k. sup kD2 f (a1 + h1 , a2 + th2 ) −
0<t<1
− D2 f (a)k + kh1 k. sup kD1 f (a1 + th1 , a2 ) − D1 f (a)k.
0<t<1

r(h)
Logo, devido à continuidade de D1 f e D2 f , resulta que lim= 0 ,
h→0 khk

mostrando que Df (a) existe e que Df (a)(h1 , h2 ) = D1 f (a).h1 + D2 f (a).h2 .

Para i = 1, 2 , se ϕi : L(Vi , W ) → L(V, W ) , ϕi (g) = g ◦ πi , onde


πi : V → Vi é a projeção, então ϕi é linear e Df (a) = D1 f (a) ◦ π1 + D2 f (a) ◦ π2 ,
donde Df = ϕ1 ◦ D1 f + ϕ2 ◦ D2 f , o que mostra ser Df contínua, ou seja, f é de
classe C 1 .

Corolário 4.1. Sejam A ⊂ Rn aberto, f : A → Rm , f = (f1 , . . . , fm ) .


∂f
f ∈ C 1 (A, Rm ) se, e só se, todas as derivadas parciais : A → R são
∂xi
contínuas, 1 ≤ i ≤ m .

Proposição 4.3. Sejam A ⊂ Rn aberto e f : A × [a, b] → Rm contínua.

Então f é contínua em x ∈ A , uniformemente em relação a t ∈ [a, b] .

Dem. Seja x0 ∈ A . Dado ε > 0, existem V (t) = vizinhança aberta de t e


r(t) > 0 tais que kx − x0 k < r(t) e s ∈ V (t) implicam kf (x, s) − f (x0 , t)k < ε .

Como [a, b] é compacto, existem vizinhanças V (t1 ), . . . , V (tp ) que cobrem [a, b].

37
CAPÍTULO 4. DERIVADAS PARCIAIS

Seja δ = inf r(ti ) > 0 . Então, kx − x0 k < δ implica kf (x, t) − f (x0 , t)k < ε para
1≤i≤p

todo t ∈ [a, b] , ou seja, kx − x0 k < δ implica sup kf (x, t) − f (x0 , t)k ≤ ε , que é a
a≤t≤b
tese.

Proposição 4.4. (Leibniz)

Sejam A ⊂ Rn aberto, f : A×[a, b] → Rm contínua e F : A → Rm definida


Rb
por F (x) = f (x, t) dt . Então F é contínua. Além disso, se existe e é contínua
a
Rb
a derivada parcial D1 f : A × [a, b] → L(Rn , Rm ) , então F 0 (x) = D1 f (x, t) dt e
a
F ∈ C1 .

Dem. Temos:

Zb

kF (x+h)−F (x)k = [f (x + h, t) − f (x, t)]dt

≤ (b−a) sup kf (x + h, t) − f (x, t)k .

a

a≤t≤b

Como f é contínua em x uniformemente em t, dado ε > 0 existe δ > 0 tal que


ε
khk < δ implica sup kf (x + h, t) − f (x, t)k < .
a≤t≤b b−a
Então,
khk < δ implica kF (x + h) − F (x)k < ε , e F é contínua.

Suponhamos agora D1 f contínua. Temos:


Ç å
Rb
kr(h)k = F (x + h) − F (x) −

D1 f (x, t) dt .h =
a
Rb
= [f (x + h, t) − f (x, t) − D1 f (x, t).h] dt ≤

a

≤ (b − a) sup kD1 f (x + sh, t) − D1 f (x, t)k.khk.


a≤t≤b
0≤s≤1

Como D1 f é contínua em x uniformemente em t, dado ε > 0, existe δ > 0 tal


ε
que khk < δ implica sup kD1 f (x+sh, t)−D1 f (x, t)k < , donde kr(h)k < ε.khk
a≤t≤b b−a

38
CAPÍTULO 4. DERIVADAS PARCIAIS

Rb
para khk < δ , ou seja, F 0 (x) = D1 f (x, t) dt , resultando F ∈ C 1 (A, Rm ) .
a

4.2 Exercícios do Capítulo 4

1. Seja f : R2 → R definida por



y 2 . sen xy se y 6= 0;



f (x, y) = 

 0 se y = 0.

Estude, em todo ponto de R2 , a continuidade de f , a existência e a continui-


dade das derivadas parciais de f , e a derivabilidade de f .

xy 1
2. Seja f : R2 → R definida por f (0, 0) = 0 e f (x, y) = √ sen √ 2
+y 2 x2
x + y2
se (x, y) 6= (0, 0) . Prove que D1 f e D2 f existem em cada ponto (x, y) ∈ R2 ,
e que as funções x 7→ D1 f (x, b) , y 7→ D1 f (a, y) , x 7→ D2 f (x, b) ,
y 7→ D2 f (a, y) são contínuas em R para cada (a, b) ∈ R2 , mas que f não e
derivável em (0, 0).

3. Sejam I ⊂ R um intervalo aberto, A ⊂ Rn aberto, f : I × A → Rm contínua


e tal que D2 f existe e é contínua em I × A, α, β : A → I de classe C 1 , e
β(z)
g : A → Rm , g ∈ C 1 e que g 0 (z) é a
R
g(z) = f (u, z) du . Prove que
α(z)
aplicação

Ö è
β(z)
Z
t 7→ D2 f (u, z) du .t + (β 0 (z).t)f (β(z), z) − (α0 (z).t)f (α(z), z) .
α(z)

39
CAPÍTULO 4. DERIVADAS PARCIAIS

∂f
4. Sejam A ⊂ Rn aberto e f : A → R . Se as derivadas parciais = Di f
∂xi
existem e são limitadas numa vizinhança de a ∈ A , prove que f é contínua
em a.

xy(x2 − y 2 )
5. Seja f : R2 → R tal que f (0, 0) = 0 e f (x, y) = se
x2 + y 2
(x, y) 6= (0, 0) . Mostre que f ∈ C 1 (R2 , R) .

6. Seja f : A → Rm , onde A ⊂ Rn é aberto. Se A contém o segmento [a, b],


e f é derivável em cada ponto de [a, b], prove que existe T ∈ L(Rn , Rm ) tal
que f (b) − f (a) = T (b − a) .

7. Seja f : Rn → R homogênea de grau p, isto é, f (tx) = tp f (x) para todo


x ∈ Rn e t > 0 .

(a) Se f é derivável em Rn , prove a relação de Euler:


n ∂f
pf (x) = xi (x) para todo x 6= 0 de Rn .
P
i=1 ∂xi
(b) Reciprocamente, se f satisfaz a relação de Euler acima, c ∈ Rn , c 6= 0 ,
e g(t) = f (tc) para t > 0, prove quef é homogênea de grau p.

40
Capítulo 5

Teorema da Função Inversa

O resultado central deste capítulo é o teorema da função inversa, ou o equiva-


lente teorema das funções implícitas. Dentre suas aplicações destacamos o teorema
do posto e as formas locais das imersões e submersões. Como sempre, vamos supor
que V e W sejam espaços vetoriais normados reais, ambos de dimensão finita.

5.1 Difeomorfismos. Teorema da Função Inversa

Definição 5.1. Sejam A ⊂ V , B ⊂ W abertos. Dizemos que f : A → B é um


difeomorfismo se f é bijetora, derivável, e a aplicação inversa f −1 : B → A é
derivável. Se f é f −1 são de classe C 1 dizemos que f é um difeomorfismo de classe
C 1 , ou um C 1 − difeomorfismo.

Obs. Uma aplicação f : A → B pode ser um homeomorfismo derivável sem


ser um difeomorfismo, isto é, a aplicação f −1 : B → A pode não ser derivável.
Por exemplo, f : R → R , f (x) = x3 , é um homeomorfismo derivável mas

41
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA


f −1 (x) = 3
x não é derivável na origem.

Proposição 5.1. Sejam A ⊂ V , B ⊂ W abertos e f : A → B um homeomorfismo


derivável em a ∈ A . Então, g = f −1 : B → A é derivável em b = f (a) se, e só
se, f 0 (a) : V → W é um isomorfismo e, neste caso, g 0 (b) = [f 0 (a)]−1 .

Dem. A necessidade é consequência direta da regra da cadeia (como já vimos antes).


Suponhamos, então, que f 0 (a) : V → W seja um isomorfismo. Temos:

y − b = f (x) − f (a) = f 0 (a).(x − a) + kx − akr(x) ,

com x→a
lim r(x) = 0 . Aplicando [f 0 (a)]−1 , vem:

[f 0 (a)]−1 .(y − b) = x − a + kx − ak[f 0 (a)]−1 .r(x) , donde kf 0 (a)−1 .(y − b) ≥


≥ (1 − kf 0 (a)−1 .r(x)k).kx − ak e, pondo s(x) = f 0 (a)−1 .r(x), vem lim s(x) = 0,
x→a
kf 0 (a)−1 k
e kx − ak ≤ ky − bk desde que kx − ak seja suficientemente pequeno
1 − ks(x)k
para que ks(x)k < 1 .
Resulta:
kx − ak · ks(x)k ks(x)k
≤ kf 0 (a)−1 k · ,
ky − bk 1 − ks(x)k

que tende a 0 (zero) quando y → b (que equivale a x → a).


Portanto,
g(y) − g(b) = f 0 (a)−1 · (y − b) − kx − ak · s(x) ,

kx − aks(x)
com lim = 0 , o que mostra que g = f −1 é derivável em b = f (a) e
y→b ky − bk
que g 0 (b) = [f 0 (a)]−1 .

Proposição 5.2. Sejam A ⊂ V e B ⊂ W abertos. Um homeomorfismo de classe


C 1, f : A → B , é um difeomorfismo de classe C 1 se, e só se, para todo x ∈ A ,
f 0 (x) é um isomorfismo.

42
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

Dem. Se f 0 (x) é um isomorfismo para cada x ∈ A, resulta, pela Proposição 5.1,


que g = f −1 é derivável em cada ponto y ∈ B e que g 0 (y) = f 0 (x)−1 . Para provar
que g 0 é contínua, observemos que g 0 = h · f 0 · g (onde h(T ) = T −1 ), composta de
contínuas. A recíproca é imediata.

Definição 5.2. Um ponto fixo de uma aplicação f : A → X , onde A ⊂ X, é um


ponto x ∈ A tal que f (x) = x .

Definição 5.3. Sejam M e N espaços métricos. f : M → N é uma contração se


existe k , 0 < k < 1, tal que d(f (x), f (y)) ≤ k · d(x, y) quaisquer que sejam x e y
em M .

Proposição 5.3. (Teorema do ponto fixo de Banach).

Seja M um espaço métrico completo. Toda contração f : M → M tem um,


e um único, ponto fixo.

Dem. (a) Unicidade: se tivermos f (a) = a e f (b) = b então d(a, b) =


= d(f (a), f (b)) ≤ k · d(a, b) , 0 < k < 1 , donde d(a, b) = 0, e a = b .

(b) Existência: Seja x0 ∈ M arbitrário, e definamos uma sequência (xn )n∈N por
x1 = f (x0 ) , xn+1 = f (xn ) , n ∈ N . Temos: d(x2 , x1 ) = d(f (x1 ), f (x0 )) ≤
≤ k · d(x1 , x0 ) e, por indução, d(xn+1 , xn ) ≤ k n d(x1 , x0 ). Se n, p ∈ N , temos:
d(xn+p , xn ) ≤ d(xn , xn+1 )+· · ·+d(xn+p , xn+p−1 ) ≤ (k n +· · ·+k n+p−1 )d(x1 , x0 ) ≤
kn
≤ d(x1 , x0 ) , donde (xn )n∈N é sequência de Cauchy em M e, portanto,
1−k
converge para um ponto a ∈ M . Então, a = lim xn+1 = lim f (xn ) = f (a) , e a
é ponto fixo de f .

Proposição 5.4. Sejam A ⊂ V aberto, f : A → V tais que a aplicação ϕ : A → V ,


ϕ(x) = f (x) − x, seja uma contração. Então, f é um homeomorfismo de A sobre

43
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

um aberto de V .

Dem. Sejam x e x0 em A ; temos:


kf (x) − f (x0 )k = kx − x0 + ϕ(x) − ϕ(x0 )k ≥ kx − x0 k − kϕ(x) − ϕ(x0 )k ≥
≥ (1 − k) · kx − x0 k para algum k, 0 < k < 1 . Resulta que f e injetora e que sua
1
inversa g = f −1 : f (A) → A satisfaz kg(y) − g(y 0 )k ≤ ky − y 0 k, donde g = f −1
1−k
é contínua e f : A → f (A) é um homeomorfismo. Resta provar que f (A) é aberto
em V : sejam b = f (a) , a ∈ A, e r > 0 tal que Br (a) = {x ∈ V ; kx − ak ≤ r} ⊂ A.
Vamos mostrar que B = B(1−k)r (b) está contida em f (A) ; para isso, seja y ∈ B e
vamos achar x ∈ A tal que y = f (x) = x + ϕ(x), isto é, x = y − ϕ(x) = ϕy (x), ou
seja, devemos achar um ponto fixo para ϕy : A → V . Como kϕy (x) − ϕy (x0 )k =
= kϕ(x0 ) − ϕ(x)k ≤ kkx − x0 k, ϕy é uma contração. Ora, se x ∈ Br (a) temos
kϕy (x)−ak = ky −ϕ(x)−ak ≤ ky −ϕ(a)−ak+kϕ(x)−ϕ(a)k ≤ ky −bk+kkx−ak ≤
≤ (1 − k)r + kr = r , donde ϕy (x) ∈ Br (a), isto é, ϕy : Br (a) → Br (a) é uma
contração no espaço métrico completo Br (a), donde tem um único ponto fixo x ∈
∈ Br (a) ⊂ A, e y = f (x) ∈ f (A) , donde B ⊂ f (A) , e f (A) é aberto em V .

Proposição 5.5. Sejam a ∈ A , A ⊂ V aberto, f : A → W de classe C 1 tais que


f 0 (a) seja um isomorfismo. Existem vizinhanças abertas Va de a, Wb de b = f (a),
tais que f : Va → Wb seja um homeomorfismo.

Dem. Seja g = f 0 (a)−1 ◦ f : A → V ; g é de classe C 1 e g 0 (a) = idV , donde


g(x) = g(a) + (x − a) + ϕ1 (x) , e g(x) − x = g(a) − a + ϕ1 (x) = ϕ(x) , ϕ : A → V ,
ϕ0 (a) = 0.

Seja k ∈ R , 0 < k < 1 ; existe r > 0 tal que x ∈ Br (a) implica kϕ0 (x)k < k,
donde kϕ(x) − ϕ(y)k ≤ k · kx − yk (pelo Teorema do Valor Médio) para x e y
em Br (a), isto é, ϕ : Br (a) → V é uma contração. Pela Proposição 5.4, g é um

44
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

homeomorfismo de Br (a) sobre um aberto de V , donde f = f 0 (a)−1 · g : Br (a) → W


é um homeomorfismo de Br (a) sobre um aberto de W .

Proposição 5.6. (Teorema da função inversa)

Sejam A ⊂ V aberto e f : A → W de classe C 1 . Se, em a ∈ A , f 0 (a) é


um isomorfismo, existem vizinhanças abertas Va de a e Wb de b = f (a) tais que
f : Va → Wb seja um difeomorfismo de classe C 1 .

Dem. Pela Proposição 5.5 existem vizinhanças abertas Va0 de a, Wb0 de b = f (a)
tais que f : Va0 → Wb0 seja um homeomorfismo; além disso, f 0 (x) existe para todo
x ∈ Va0 .

Como f 0 : A → L(V, W ) é contínua e Isom (V, W ) é aberto em L(V, W ),


resulta que (f 0 )−1 (Isom(V, W )) é um aberto em A contendo a, donde existe vizi-
nhança aberta Va de a, Va ⊂ Va0 , tal que f 0 (x) ∈ Isom(V, W ) para todo x ∈ Va . Seja
Wb = f (Va ); Wb é aberto em W pois f é homeomorfismo. Assim, f : Va → Wb é
um homeomorfismo de classe C 1 tal que f 0 (x) é um isomorfismo para todo x ∈ Va ;
pela Proposição 5.2, f : Va → Wb é um difeomorfismo de classe C 1 .

Corolário 5.1. Com as notações da Proposição 5.6, f : A → W de classe C 1


é um difeomorfismo de classe C 1 se, e só se: (a) f é injetora; e (b) f 0 (x) é um
isomorfismo para todo x ∈ A.

Dem. Se f é um difeomorfismo de classe C 1 é claro que (a) e (b) se verificam. Re-


ciprocamente, suponhamos que (a) e (b) sejam verdadeiras. A condição (b) implica
que f : A → W é uma aplicação aberta já que a Proposição 5.6 mostra que se a ∈ A,
a imagem por f de uma vizinhança aberta de a contém uma vizinhança aberta de
b = f (a); em particular, f (A) é aberto em W . Por (a) temos que f : A → f (A) é bi-

45
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

jetora e, como ela é continua e aberta, g = f −1 é contínua e, portanto, f : A → f (A)


é um homeomorfismo. Pela Proposição 5.2, f é um difeomorfismo de classe C 1 .

Definição 5.4. Sejam V e W e.v.n., A ⊂ V aberto. Uma aplicação f :A→W


é um difeomorfismo local se, para cada x ∈ A, existem vizinhanças Vx de x e Wf (x)
de f (x) tais que f : Vx → Wf (x) seja um difeomorfismo.

Obs. 1: Se f : A → W é um difeomorfismo local então f 0 (x) : V → W é isomor-


fismo para todo x ∈ A e f : A → W é uma aplicação aberta. f : A → f (A) será
um difeomorfismo se, e só se, f for injetora. A Proposição 5.6 afirma que se f é de
classe C 1 e f 0 (x) é um isomorfismo para todo x ∈ A, então f é um difeomorfismo
local.

Obs. 2: No caso V = W = Rn , A ⊂ Rn aberto, f : A → Rn , f = (f1 , . . . , fn ) ∈


∈ C 1 (A, Rn ), dizer que f 0 (a) : Rn → Rn é um isomorfismo é o mesmo que dizer que
   
a matriz jacobiana ∂fi
∂xj
(a) é invertível, isto é, equivale a dizer que det ∂fi
∂xj
(a) =
= ∂(f1 ,...,fn )
∂(x1 ,...,xn )
(a) 6= 0. Assim, se este jacobiano é 6= 0, existem vizinhanças abertas Va
de a e Wb de b = f (a) tais que f : Va → Wb seja um difeomorfismo de classe C 1 .

5.2 Aplicações de Posto Constante

Definição 5.5. Sejam V e W espaços vetoriais de dimensão finita e T : V → W


linear. O posto de T é a dimensão de T (V ) = Im T .

Definição 5.6. Sejam V e W e.v.n., dim V = n, dim W = m, A ⊂ V aberto,


f : A → W derivável. O posto de f em a ∈ A é o posto de f 0 (a) ∈ L(V, W ).
Dizemos que: (a) f é uma imersão se, para todo x ∈ A, f 0 (x) é injetora, ou seja, o
posto de f é igual a n em cada x ∈ A.

46
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

(b) f é uma submersão se, para todo x ∈ A, f 0 (x) é sobrejetora, ou seja, o posto de
f é igual a m em cada x ∈ A.
(c) f é um mergulho se f é uma imersão e um homeomorfismo de A sobre f (A).

As imersões e submersões são aplicações de posto máximo.

Definição 5.7. Sejam U , V , W , Z e.v.n., f : U → V , g : W → Z aplicações de


classe C 1 .
(a) Dizemos que f é C 1 − conjugada a g se existem difeomorfismos de classe C 1 ,
ϕ : U → W e ψ : V → Z tais que o diagrama abaixo seja comutativo, isto é,

f
U V
ϕ ψ

W Z
g

g◦ϕ=ψ◦f .
(b) Dizemos que f é localmente C 1 - conjugada a g na vizinhança de a ∈ U se
existem aberto A ⊂ U , a ∈ A, aberto B ⊂ V , f (a) ∈ B, aberto C de W e aberto
D ⊂ Z tais que f : A → B e g : C → D sejam C 1 −conjugadas.

Exemplo 5.2.1. A inclusão i : V → V × W , i(x) = (x, 0), é uma imersão.

Exemplo 5.2.2. A projeção π : V × W → W , π(x, y) = y, é uma submersão.

Exemplo 5.2.3. Todo C 1 − difeomorfismo é C 1 − conjugado à identidade pois o


diagrama abaixo é comutativo.

Proposição 5.7. (Teorema do posto)

47
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

f
U V
id f −1

U U
id

Sejam A ⊂ Rn aberto, f : A → Rm de classe C 1 , de posto r numa


vizinhança Va de a ∈ A. Então, f é localmente C 1 − conjugada à aplicação linear
(x1 , . . . , xn ) 7−→ (x1 , . . . , xr , 0, . . . , 0) de Rn em Rm .

Dem. Como f 0 (a) : Rn → Rm tem posto r, existem bases ordenadas


 E = (v1 , . . . , vn )
Ir 0 
de Rn e F = (ω1 , . . . , ωm ) de Rm tais que B = [f 0 (a)]EF =  , isto é,

 
0 0

B(x1 , . . . , xn )t = (x1 , . . . , xr , 0, . . . , 0)t .

Sejam:
p : Rm → Rr , p(y1 , . . . , ym ) = (y1 , . . . , yr ),
q : Rn → Rn−r , q(x1 , . . . , xn ) = (xr+1 , . . . , xn ),
f = (f1 , . . . , fm ) , e definamos ϕ : A → Rn por ϕ = (p ◦ f, q), ou seja,
ϕ(x) = ϕ(x1 , . . . , xn ) = (f1 (x), . . . , fr (x), xr+1 , . . . , xn ).

Temos: (p ◦ f )0 (a) = p ◦ f 0 (a) e q 0 (a) = q, de modo que ϕ0 (a)(x) =


= (x1 , . . . , xr , xr+1 , . . . , xn ), e ϕ0 (a) = idRn . Pelo teorema da função inversa, existe
vizinhança Ua de a tal que ϕ : Ua → ϕ(Ua ) seja um C 1 − difeomorfismo. Seja
Ω = Ua ∩ Va . Para u = ϕ(x), x ∈ Ω, temos f ◦ ϕ−1 (u) = (f1 (x), . . . , fm (x)) =
= (u1 , . . . , ur , gr+1 (u), . . . , gm (u)) , onde gj = fj ◦ ϕ−1 , r + 1 ≤ j ≤ m, é de classe
C 1 e, como ϕ é um difeomorfismo, o posto de f ◦ ϕ−1 é r em todo u ∈ ϕ(Ω).

48
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

Temos:  
 Ir ñ 0
J(f ◦ ϕ−1 )(u) = 
 ∂gi
ô 
 ,

∗ (u)
∂uj
de posto r.
∂gi
Logo: (u) = 0 para r +1 ≤ i ≤ m e r +1 ≤ j ≤ n . Sem perda de gene-
∂uj
ralidade podemos considerar ϕ(Ω) como um aberto convexo ( por exemplo uma bola
aberta de centro ϕ(a)), o que implica que gr+1 , . . . , gm independem de ur+1 , . . . , un .
Assim, f ◦ ϕ−1 (u1 , . . . , un ) = (u1 , . . . , ur , gr+1 (u1 , . . . , ur ), . . . . . . , gm (u1 , . . . , ur )).
Definamos ψ , numa vizinhança de f (a), por ψ(z1 , . . . , zr , zr+1 , , . . . , zm ) = (z1 , . . . , zr ,
zr+1 − gr+1 (z1 , . . . , zr ), . . . , zm − gm (z1 , . . . , zr )) .

Temos que ψ ∈ C 1 tem inversa ψ −1 (z1 , . . . , zr , . . . , zm ) = (z1 , . . . , zr , zr+1 +


+ gr+1 (z1 , . . . , zr ), . . . , zm + gm (z1 , . . . , zr )) também de classe C 1 , isto é, ψ é um
C 1 − difeomorfismo. Além disso, ψ ◦ f ◦ ϕ−1 (u) = ψ(u1 , . . . , ur , gr+1 (u1 , . . . , ur ), . . .
. . . , gm (u1 , . . . , ur )) = (u1 , . . . , ur , 0, . . . , 0), donde f é localmente C 1 − conjugada a
(u1 , . . . , un ) 7−→ (u1 , . . . , ur , 0, . . . , 0) :

f
Ω f (Ω)
ϕ ψ

ϕ(Ω) ψ(f (Ω))


ψ ◦ f ◦ ϕ−1

Corolário 5.2. (Forma local das imersões).

Sejam A ⊂ Rn aberto, f : A → Rm de classe C 1 , a ∈ A tais que f 0 (a) : Rn → Rm


seja injetora. Então, f é localmente C 1 − conjugada à aplicação linear
(x1 , . . . , xn ) 7→ (x1 , . . . , xn , 0, . . . , 0) de Rn em Rm .

49
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

Dem. f 0 (a) sendo injetora, existe vizinhança aberta de a na qual f 0 (x) é injetora,
ou seja, de posto n, e a Proposição 5.7 se aplica.

Corolário 5.3. (Forma local das submersões).

Sejam A ⊂ Rn aberto, f : A → Rm de classe C 1, a∈A tais que


f 0 (a) : Rn → Rm seja sobrejetora. Então, f é localmente C 1 − conjugada à aplicação
linear (x1 , . . . , xn ) 7→ (x1 , . . . , xm ) de Rn em Rm .

Dem. f 0 (a) sendo sobrejetora, existe vizinhança aberta de a na qual f 0 (x) é sobre-
jetora, ou seja, de posto m, e a Proposição 5.7 se aplica.

Obs. A demonstração da Proposição 5.7 mostra que, no caso das submersões (r = m),
temos ψ = idRn e ϕ = (f, q).

Escrevendo x = (s, t), onde s = (x1 , . . . , xm ) e t = (xm+1 , . . . , xn ), e


definindo β(s, t) = (t, s), temos que β é um difeomorfismo de classe C 1 , o mesmo
acontecendo com ϕ1 = β ◦ ϕ, e temos:
ϕ β π
2
x = (s, t) 7−→ ϕ(x) = (f (x), t) 7−→ (t, f (x)) 7−→ f (x), ou seja, π2 ◦ ϕ1 = f ,
isto é, f é localmente C 1 − conjugada à aplicação π2 : Rn−m × Rm −→ Rm ,
π2 (t, s) = s.

Corolário 5.4. (Teorema das funções implícitas).

Sejam A ⊂ Rn = Rm × Rn−m aberto, f : A → Rm de classe C 1 . Suponha que


a = (s0 , t0 ) ∈ A e que D1 f (a) : Rm → Rm seja um isomorfismo. Existem abertos
V ⊂ Rn−m , t0 ∈ V , e Ω ⊂ A, a ∈ Ω, tais que para cada t ∈ V existe um único
g(t) ∈ Rm satisfazendo às condições: (g(t), t) ∈ Ω e f (g(t), t) = f (a) = c. A
aplicação g : V → Rm é de classe C 1 e g 0 (t) = −D1 f (g(t), t)−1 ◦ D2 f (g(t), t).

50
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

Dem. Como f 0 (a) : Rn → Rm é sobrejetora, existe C 1 - difeomorfismo ϕ : Ω → ϕ(Ω)


de um aberto Ω ⊂ A, a ∈ Ω, ϕ(s, t) = (f (s, t), t) tal que π1 ◦ ϕ = f .
Podemos tomar ϕ(Ω) = W × V , onde V é vizinhança aberta de t0 e W é vi-

f
Rm × Rn−m ⊃ Ω Rm

ϕ
π1

Rm × Rn−m ⊃ ϕ(Ω) = W × V

zinhança aberta de f (a) = c . Seja h = ϕ−1 , donde h ◦ ϕ(s, t) = (s, t) =


= h(f (s, t), t) = (h1 (s, t), t). Definamos g : V → Rm por g(t) = h1 (c, t).
Então, (g(t), t) ∈ Ω e f ◦ h(ω, t) = f (h1 (ω, t), t) = ω , e f (g(t), t) = c. É claro
que g ∈ C 1 (pois h ∈ C 1 ); derivando f (g(t), t) = c, vem D1 f (g(t), t).g 0 (t)+
+D2 f (g(t), t) = 0 , donde g 0 (t) = −D1 f (g(t), t)−1 ◦ D2 f (g(t), t) .

Unicidade. Seja (s, t) ∈ Ω tal que f (s, t) = c. Então, (s, t) = h ◦ ϕ(s, t) =


= h(f (s, t), t) = h(c, t) = (g(t), t) , e s = g(t) .

Obs. Na literatura é mais usual supor A ⊂ Rn−m × Rm , D2 f (a) : Rm → Rm


isomorfismo, e obter a 2a variável em função da 1a . Para obter essa formulação
usa-se a simetria β(t, s) = (s, t) e aplica-se a forma local das submersões à função
f ◦ β, conforme o esquema:

Ω0 = β −1 (Ω), ϕ1 = β ◦ ϕ ◦ β −1 . Então, ϕ(s, t) = (f ◦ β(s, t), t) =


= (f (t, s), t) , donde ϕ1 (t, s) = (t, f (t, s)), e π2 ◦ ϕ1 = f . Definimos g : V → Rm
por g(t) = h2 (t, c). Como antes, obtemos g ∈ C 1 , f (t, g(t)) = c, e g 0 (t) =
= −D2 f (t, g(t))−1 · D1 f (t, g(t)).

51
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

Rn−m × Rm ⊃ Ω

β f

Rm × Rn−m ⊃ Ω0 Rm
f ◦β

Rm × Rn−m ⊃ ϕ(Ω0 ) π2

Rn−m × Rm ⊃ βφ(Ω0 ) = ϕ1 (Ω) = V × W

Obs. (1) f −1 (c) ∩ Ω = {(t, g(t)) ; t ∈ V } é o gráfico da aplicação g : V → Rm de


classe C 1 .
(2) Em coordenadas, f = (f1 , . . . , fm ). É dado o sistema f1 (t, s) = c1 , . . . , fm (t, s) =
= cm , onde as fi : A → R são de classe C 1 . Supondo que o jacobiano
∂(f1 , . . . , fm )
seja 6= 0 no ponto (t0 , s0 ), concluímos que o sistema acima é equiva-
∂(x1 , . . . , xm )
lente ao sistema si = gi (t), 1 ≤ i ≤ m, onde as gi são de classe C 1 , desde que t
seja "vizinho" de t0 e s de s0 . Como os nomes das variáveis mudam de um problema
a outro, devemos observar que o jacobiano a ser calculado é o das derivadas parciais
das funções dadas em relação às incógnitas que queremos obter.
(3) Toda submersão de classe C 1 é uma aplicação aberta, pois é localmente C 1 -
conjugada a uma projeção. De fato, f leva vizinhança aberta Ω de (t, s) em vizi-
nhança aberta W de f (t, s).
(4) Para bem compreender o significado geométrico da Proposição 5.7 e seus Co-

52
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

rolários, o leitor deverá estudar as figuras que aparecem na Seção 5 do capítulo de


Variedades Diferenciais.

5.3 Exercícios do Capítulo 5

1. Seja U um aberto do Rn contendo a origem, e seja A : U → L(Rn , Rn ) de


classe C 1 . Seja B : U → Rn definida por B(x) = A(x) · x. Mostre que se
A(0) é um isomorfismo, existem vizinhanças abertas V e W de 0 em Rn tais
que B seja um C 1 -difeomorfismo de V sobre W .

2. Seja ϕ : L(Rn ) → L(Rn ) definida por ϕ(u) = u ◦ u. Mostre que ϕ é


um difeomorfismo de classe C 1 de uma vizinhança da identidade I numa
vizinhança de I.

3. Seja f : R2 → R2 , f (x, y) = (xey , xe−y ). Mostre que para todo (a, b) ∈ R2


tal que a 6= 0, existe vizinhança U de (a, b) na qual a equação f (x, y) = (u, v)
admite uma solução única, qualquer que seja (u, v) ∈ f (U ).

4. Seja o sistema de incógnita (x, y, z, t) ∈ R4 :

x3 + y 3 + z 3 + t2 = 0
x2 + y 2 + z 2 + t = 2
x+y+z+t=0

Verifique que o ponto (0, −1, 1, 0) é solução. Mostre que se pode resolver este
sistema em relação a (x, y, z) numa vizinhança deste ponto. Calcule a derivada
em t = 0 da aplicação t 7−→ (x(t), y(t), z(t)) assim definida.

53
CAPÍTULO 5. TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA

5. Seja f : Mn (R) → Mn (R) tal que f (A) = A2 . Mostre que f é de classe


C 1 e calcule f 0 (A). Mostre que existe uma aplicação derivável g, definida
numa vizinhança V da identidade I em Mn (R) , a valores em Mn (R), tal que
g(A)2 = A para toda A ∈ V .

6. Seja f : R2 → R2 tal que f (x, y) = (x2 − y 2 , 2xy) . Mostre que f é injetora


em A = {(x, y) ∈ R2 | x > 0} e ache g 0 (0, 1) , onde g = f −1 : f (A) → A .

7. Seja f : Rn → Rn , f (x) = kxk·x. Mostre que f ∈ C ∞ e que f : B1 (0) → B1 (0)


é bijetora, onde B1 (0) = {x ∈ Rn ; kxk < 1}. Se g = f −1 : B1 (0) → B1 (0),
mostre que g não é derivável em 0.

Seja f : R5 → R2 de classe
8.   C 1 tal que f (a) = f (1, 2, −1, 3, 0) = 0 e Jf (a) =
1 3 1 −1 2 
. Mostre que existem B ⊂ R3 aberto e g : B → R2 ,

 
 
0 0 1 2 −4
g ∈ C 1 , tal que f (x1 , g1 (x), g2 (x), x2 , x3 ) = 0 para x = (x1 , x2 , x3 ) ∈ B , e
g(1, 3, 0) = (2, −1) . Ache g 0 (1, 3, 0) .

R1
9. Seja f : [0, 1] → R, contínua e positiva, tal que f (t)dt = 3. Mostre que,
0
para cada x num certo intervalo [0, δ], existe um único g(x) ∈ [0, 1] tal que
g(x)
f (t)dt = 2, e que a função g : [0, δ] → [0, 1] é de classe C 1 . Ache g 0 (x).
R
x

10. Seja ϕ : Rm × Rn → Rm contínua em relação à segunda variável, e tal que


kϕ(x, t) − ϕ(y, t)k ≤ λ.kx − yk para um certo λ, 0 < λ < 1, quaisquer
que sejam x e y em Rm e t em Rn . Prove que existe aplicação contínua
α : Rn → Rm tal que ϕ(α(t), t) = α(t) para todo t ∈ Rn .

54
Capítulo 6

Derivação de Ordem Superior

Neste capítulo introduzimos as derivadas de ordem superior, demonstramos o


teorema de Schwarz sobre a simetria da derivada segunda, e estudamos a fórmula
de Taylor.

6.1 Derivação de Ordem Superior

Sejam, como sempre, U , V e W e.v.n. reais de dimensão finita, A ⊂ V aberto


e f : A → W . Se f é derivável em todas os pontos de A, temos a aplicação
derivada Df = f 0 : A → L(V, W ). Se Df é contínua então f é de classe C 1 .

Definição 6.1. Se Df é derivável em a ∈ A então sua derivada D(Df )(a) =


= D2 f (a) = f 00 (a) é a derivada segunda de f em a.
Temos: D2 f (a) : V → L(V, W ), linear, ou seja, D2 f (a) ∈ L(V ; L(V, W )) '
' L2 (V, W ) (isometria canônica), de forma que f 00 (a) = D2 f (a) é uma aplicação

55
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

bilinear:

f 00 (a) : V × V −→ W
(u, v) 7−→ f 00 (a)(u, v) = D2 f (a)(u)(v) .

Definição 6.2. Se f é duas vezes derivável em A e f 00 : A → L2 (V, W ) é contínua,


dizemos que f é de classe C 2 em A, e escrevemos f ∈ C 2 (A ; W ).

As derivadas de ordem superior são definidas por indução. Se f : A → W é


(k − 1)−vezes derivável em A, então sua (k − 1)−ésima derivada é uma aplicação
Dk−1 f : A → Lk−1 (V ; W ), onde Lk−1 (V ; W ) é o espaço vetorial real das
aplicações (k − 1)−lineares de V em W . Se Dk−1 f for derivável em a ∈ A,
diremos que f é k−vezes derivável em a e definimos Dk f (a) = D(Dk−1 f )(a).
Assim,

Dk f (a) : V → Lk−1 (V ; W ) é linear, isto é, Dk f (a) ∈ L(V ; Lk−1 (V , W )) '

' Lk (V, W )(isometria canônica), ou seja, Dk f (a) é uma aplicação k−linear de V


em W . Se f for k−vezes derivável em A, temos a aplicação

Dk f : A → Lk (V ; W ).

Se Dk f é contínua, dizemos que f é de classe C k em A, e escrevemos f ∈ C k (A, W ).

Definição 6.3. Dizemos que f : A → W é de classe C ∞ se ela é de classe C k



para todo k ∈ N. f é de classe C 0 se f é continua. Assim, C ∞ = Ck.
T
k=0

Obs. C k = C k (A ; W ) é um espaço vetorial real e


D : C k (A ; W ) −→ C k−1 (A, L(V, W )) é linear.

56
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

Exemplo 6.1.1. Sejam A ⊂ Rn , f : A −→ Rm , f = (f1 , . . . , fm ) . f ∈ C k ⇔ cada


fi ∈ C k . Neste caso, Dj f (x) = (Dj f1 (x), . . . , Dj fm (x)).

Exemplo 6.1.2. Toda aplicação linear T : V −→ W é de classe C ∞ pois T 0 (x) = T


para todo x ∈ V , donde Dk T = 0 para k ≥ 2.

Exemplo 6.1.3. Toda aplicação bilinear B : U × V −→ W é de classe C ∞ pois


B 0 : U × V −→ L(U, V ; W ) é linear. Em geral, toda aplicação multilinear é de
classe C ∞ .

Exemplo 6.1.4. L2 (Rn , R) tem uma base natural que consiste das formas bilineares
dxi ⊗ dxj : Rn × Rn −→ R definidas por (dxi ⊗ dxj )(u, v) = dxi (u) · dxj (v), donde
(dxi ⊗ dxj )(eh , ek ) = δih · δjk , onde (e1 , . . . , en ) é a base canônica do Rn . De fato,
n n n
se g ∈ L2 (Rn , R) então g(u, v) = g( ai e i , bj e j ) = ai bj g(ei , ej ) =
P P P
i=1 j=1 i,j=1
n
= gij ai bj .
P
i,j=1
n
Mas, ai = dxi (u) e bj = dxj (v). Logo, g(u, v) = gij dxi (u)dxj (v) =
P
i,j=1
n
= gij dxi ⊗ dxj (u, v).
P
i,j=1
n
Portanto, g = gij dxi ⊗ dxj , onde gij = g(ei , ej ).
P
i,j=1
Assim, as formas εij = dxi ⊗dxj geram L2 (Rn , R). Elas são linearmente indepen-
n
dentes pois se λij εij = 0, então λij εij (eh , ek ) = 0, isto é, λij δih · δjk = 0,
P P P
i,j=1 i,j i,j
donde λhk = 0 (h, k = 1, . . . , n).
Resulta que as formas εij = dxi ⊗ dxj formam uma base de L2 (Rn , R).

Se f : A ⊂ Rn −→ R é 2−vezes derivável em A, então


D2 f (x) ∈ L2 (Rn , R), para todo x ∈ A. Procuremos a matriz de D2 f (x) em relação
à base canônica do Rn .
∂f
Seja αi : L(Rn , R) −→ R linear, αi (u) = u(ei ). Como (a) = f 0 (a) · ei , temos
∂xi

57
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

∂f
= αi ◦ f 0 : A −→ R.
∂xi
Então: (αj ◦ Df )0 (a) = Dαj (f 0 (a)) · D2 f (a) = αj ◦ D2 f (a).

E : D2 f (a)(ei )(ej ) = αj (D2 f (a))(ei ) = (αj · Df )0 (a)(ei ) = (αj ◦ Df )(a) =
∂xi
∂ 2f
Ç å
∂ ∂f
= (a) = (a).
∂xi ∂xj ∂xi ∂xj
Resulta que a matriz de D2 f (a) procurada é a matriz hessiana

∂ 2f ∂ 2f
 
(a) ··· (a)

 ∂x21 ∂x1 ∂xn 


.. ... .. 
Hf (a) = . . .
 

 
∂ 2f ∂ 2f
 
 
(a) · · ·
∂xn ∂x1 ∂x2n

E a expressão de D2 f (a) em função da base {dxi ⊗ dxj } de L2 (Rn ; R) é

n
∂ 2f
D2 f (a) =
X
(a) dxi ⊗ dxj ,
i,j=1 ∂xi ∂xj

∂ 2f n
que classicamente se escrevia d f (a) = 2
(a) dxi dxj .
P
i,j=1 ∂xi ∂xj

Exemplo 6.1.5. Função Composta.

Se f ∈ C 1 (A, V ) , g ∈ C 1 (B, W ) e f (A) ⊂ B, então


h = g ◦ f ∈ C 1 (A, W ), como já vimos antes. Vamos provar que f ∈ Ck ,
g ∈ C k ⇒ g ◦ f = h ∈ C k . Por indução, suponhamos o teorema verdadeiro para
(n − 1)(n ≥ 2), e provemos que h0 ∈ C n−1 . Ora,

h0 (x) = g 0 (f (x)) · f 0 (x).

Como g 0 ◦ f ∈ C n−1 , f 0 ∈ C n−1 e a composição é bilinear (donde C ∞ )

58
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

resulta que h0 ∈ C n−1 , e h ∈ C n (Para mais detalhes veja a demonstração do


caso n=1 no Corolário 2.1, Seção 2.2 do Capítulo 2).

Exemplo 6.1.6. Inversão de matrizes.

Já vimos, no Capítulo 2, que f : GL(Rn ) −→ L(Rn ), f (X) = X −1 , é


de classe C 1 e que f 0 (X).H = −X −1 .H.X −1 , donde f 0 = ϕ ◦ ξ, onde ξ(X) =
= (X −1 , X −1 ) = (f (X), f (X)) e ϕ(T, S).H = −T.H.S. Como ϕ é bilinear, donde
C ∞, f ∈ C k−1 implica ξ ∈ C k−1 e resulta f 0 ∈ C k−1 , e f ∈ C k para todo
k ∈ N, donde f ∈ C ∞ . (Veja o caso k=1 no Capítulo 2).

Proposição 6.1. Sejam A ⊂ V e B ⊂ W abertos e f : A −→ B um C 1 -


difeomorfismo. Se f é de classe C k então a inversa g = f −1 também é de classe
C k (Dizemos que f é um C k − difeomorfismo).

Dem. Como g 0 (y) = (f 0 (g(y)))−1 para y ∈ B, g 0 é a composta de:

(a) g : B −→ A;

(b) f 0 : A −→ L(V, W );

F
(c) X ∈ Isom(V, W ) 7−→ X −1 ∈ L(W ; V ).

Por indução suponhamos o teorema verdadeiro para (k − 1).

Então, f 0 ∈ C k−1 , F ∈ C ∞ e g ∈ C k−1 . Logo, g 0 ∈ C k−1 , e g ∈ C k .

Corolário 6.1. Se um homeomorfismo f : A → B é de classe C k (k ≥ 1) e se


f 0 (x) ∈ Isom(V, W ) para todo x ∈ A, então f é um C k −difeomorfismo.

Dem. Para k = 1 é a Proposição 5.2 do Capítulo 5, e f é um C 1 −difeomorfismo


de classe C k , donde f −1 ∈ C k , e f é um C k - difeomorfismo.

59
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

Obs. (1) No teorema da função inversa (Proposição 5.6 do Capítulo 5), se supuser-
mos que f ∈ C k , então f : Va → Wb (notação da Proposição 5.6 do Capítulo 5)
será um C k −difeomorfismo.

(2) No teorema do posto (Proposição 5.7 do Capítulo 5), se supusermos que


f ∈ C k (k ≥ 1), então f será localmente C k −conjugada (definição óbvia) à aplicação
linear (x1 , . . . , xn ) 7→ (x1 , . . . , xr , 0, . . . , 0).

(3) No teorema das funções implícitas, se supusermos que f ∈ C k (k ≥ 1),


poderemos concluir que g ∈ C k (notação daquele teorema).

Proposição 6.2. (Teorema de Schwarz)

Sejam A ⊂ V aberto, f : A → W duas vezes derivável em a ∈ A. Então,


f 00 (a) ∈ L2 (V ; W ) é simétrica, isto é , (f 00 (a) · h) · k = (f 00 (a) · k) · h para h, k ∈ V
quaisquer.

Dem. Para simplificar a demonstração vamos supor que f ∈ C 2 (A, W ). Seja


∆(h, k) = f (a + h + k) − f (a + h) − f (a + k) + f (a) = ∆(k, h). Então,

∆(h, k) − f 00 (a)(h, k) = ∆(h, k) − (f 00 (a) · h) · k =

Z1 Z1 Z1
0 0
= f (a + h + sk) · k ds − f (a + sk) · k ds − f 00 (a) · h · k ds =
0 0 0

Z1
= [f 0 (a + h + sk) − f 0 (a + sk) − f 00 (a) · h] · k ds =
0
 1
Z1

Z 
= ds [f 00 (a + th + sk) − f 00 (a)] dt (h) · (k)
0 0

(utilizamos a Proposição 3.7 do Capítulo 3).

60
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

Como f ∈ C 2 , dado , ε > 0, existe δ > 0 tal que khk ≤ δ, kkk ≤ δ


ε
implicam kf 00 (a + sk + th) − f 00 (a)k < para s, t ∈ [0, 1] quaisquer.
2
ε
Portanto, k∆(h, k) − f 00 (a)(h, k)k ≤ · khk · kkk desde que khk ≤ δ ,
2
kkk ≤ δ.

Então, kf 00 (a)(h, k) − f 00 (a)(k, h)k < ε · khk · kkk desde que khk ≤ δ ,
kkk ≤ δ. Os dois membros dessa desigualdade são homogêneos do 2◦ grau em h , k,
donde a mesma desigualdade vale para h , k arbitrários. Resulta que a aplicação
bilinear (h, k) 7−→ [f 00 (a)(h, k) − f 00 (a)(k, h)] tem norma menor do que ε, donde
ela é igual a zero, ou seja, f 00 (a)(h, k) = f 00 (a)(k, h) para h , k quaisquer, isto é,
f 00 (a) é simétrica.

Proposição 6.3. Sejam A ⊂ V aberto, f : A → W de classe C 2 .


Ç å
∂f ∂f
Se k ∈ V , então : A → W é de classe C 1 e D (a)h =
∂k Ç ∂k å
∂ ∂f
= D2 f (a)(h, k) para todo h ∈ V , ou seja, se a ∈ A, (a) =
∂h ∂k
∂ 2f ∂ 2f ∂ 2f
= (a) = D f (a)(h, k). Além disso,
2
= .
∂h∂k ∂h∂k ∂k∂h
∂f ∂f
Dem. A aplicação : x ∈ A 7−→ (x) = Df (x).k ∈ W é a composta de
∂k ∂k
x ∈ A 7−→ Df (x), que é de classe C 1 , com α : T ∈ L(V, W ) 7−→ T (k) que é
linear, donde de classe C ∞ .
Ç å Ç å
∂f ∂f ∂f ∂f
Então : = α◦Df , donde ∈C eD1
(a) = α◦D f (a), e D
2
(a).h =
∂k ∂k ∂k ∂k
∂ 2f
= α (D2 f (a)(h)) = D2 f (a)(h, k), ou seja, (a) = D2 f (a)(h, k) = D2 f (a)(k, h) =
∂h∂k
∂ 2f
= (a), donde a tese.
∂k∂h
Proposição 6.4. Seja f : A ⊂ V −→ W n−vezes derivável em a ∈ A. Então,
f (n) (a) ∈ Ln (V ; W ) é simétrica, isto é, se σ é uma permutação de {1, 2, . . . , n} e
h1 , . . . , hn ∈ V , temos f (n) (a)(h1 , . . . , hn ) = f (n) (a)(hσ(1) , . . . , hσ(n) ).

61
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

Dem. Para n = 2 é o teorema de Schwarz. Para n ≥ 3, suponhamos que f (n−1) (x)


seja simétrica para todo x numa vizinhança aberta Va de a. f (n) (a) é a derivada
de f (n−1) : Va → L(n−1) (V, W ). Para h1 ∈ V fixo, f (n) (a) · h1 é (n − 1)−linear
simétrica, isto é, (f (n) (a) · h1 )(h2 , . . . , hn ) = f (n) (a)(h1 , . . . , hn ) é função simétrica
das últimas (n − 1) variáveis, e basta mostrarmos que f (n) (a)(h1 , h2 , . . . , hn ) não
se altera quando permutamos h1 e h2 (já que toda σ é um produto de transposições).
Temos: f (n) (a) = (D2 f (n−2) )(a), donde

f (n) (a)(h1 , h2 ) = D2 f (n−2) (a)(h1 , h2 ) = D2 f (n−2) (a)(h2 , h1 ).

Portanto, f (n) (a)(h1 , . . . , hn ) = f (n) (a)(hσ(1) , . . . , hσ(n) ).

6.2 Fórmula de Taylor

Proposição 6.5. Seja ϕ : [0, 1] → W de classe C n+1 (num aberto contendo [0, 1]).
Então:

Z1
ϕ00 (0)
0 ϕ(n) (0) (1 − t)n (n+1)
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + + ··· + + ϕ (t) dt.
2! n! n!
0

n (1 − t)k (k)
Dem. Seja f (t) = ϕ (t), 0 ≤ t < 1, f (1) = ϕ(1).
P
k=0 k!
Temos:

n (1 − t)k (k+1) n (1 − t)k−1


f 0 (t) = ϕ (t) − ϕ(k) (t) =
P P
k=0 k! k=1 (k − 1)!

n+1(1 − t)k−1 (k) n (1 − t)k−1 (1 − t)n (n+1)


= ϕ (t) − ϕ(k) (t) = ϕ (t).
P P
k=1 (k − 1)! k=1 (k − 1)! n!

62
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

Como f ∈ C 1 , temos:

Z1
(1 − t)n (n+1)
f (1) − f (0) = ϕ (t) dt,
n!
0

ou seja,

Z1
0 ϕ(n) (0) (1 − t)n (n+1)
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + · · · + + ϕ (t) dt.
n! n!
0

Corolário 6.2. Se kϕ(n+1) (t)k ≤ M para t ∈ [0, 1], então

Z1
1 M M
kϕ(1) − ϕ(0) − · · · − ϕ(n) (0)k ≤ (1 − t)n dt = .
n! n! (n + 1)!
0

Proposição 6.6. Seja f : A ⊂ V → W de classe C n+1 . Se [a, a + h] ⊂ A então:

Z1
0 1 (1 − t)n (n+1)
f (a + h) = f (a) + f (a) · h + · · · + f (n) (a) · hn + f (a + th) · hn+1 dt,
n! n!
0

n
onde hn = (h, h, .^. ., h) . Esta é a fórmula de Taylor.

Dem. Seja ϕ : [0, 1] → W , ϕ(t) = f (a + th). Então ϕ ∈ C n+1 e ϕ(k) (t) =


= f (k) (a + th) · hk . Pela Proposição 6.5, temos:

Z1
0 1 (1 − t)n (n)
ϕ(1) = ϕ(0) + ϕ (0) + · · · + ϕ(n) (0) + ϕ (t) dt ,
n! n!
0

donde

1 00 1
f (a + h) = f (a) + f 0 (a) · h + f (a) · h2 + · · · + f (n) (a) · hn +
2! n!

63
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

Z1
(1 − t)n (n+1)
+ f (a + th)hn+1 dt.
n!
0

Corolário 6.3. Se kf (n+1) (x)k ≤ M para todo x ∈ A, vem:

1 (n) M r(khkn )
kf (a+h)−f (a)−· · ·− f (a)·hn k = r(khkn ) ≤ khkn+1 , donde lim =0,
n! (n + 1)! h→0 khkn

ou seja,

1 (n)
f (a + h) = f (a) + f 0 (a) · h + · · · + f (a) · hn + r(khkn ) ,
n!

r(khkn )
onde lim = 0.
h→0 khkn

Obs. Pode provar-se que a fórmula acima é ainda válida supondo-se f : A → W


(n − 1)−vezes derivável em A e n−vezes derivável em a ∈ A .

6.3 Exercícios do Capítulo 6

1. Sejam V um e.v.n. (real e de dimensão finita) e f : L(V ) → L(V ), f (X) = X n .


Prove que
n!
kf (i) (X)k ≤ kXkn−i .
(n − i)!

2. Sejam V um e.v.n. (real e de dimensão finita), A ⊂ V um aberto conexo


e fn : A → V , n ∈ N, uma sequência de funções de classe C ∞ tal que a
P (i)
série fn (x) converge em cada x ∈ A e que a série das derivadas f (x)
P
n
n

converge uniformemente em A, onde i = 1, 2, . . .. Conclua que f = fn é


P

∞ Xn
de classe C ∞ em A. Prove que exp : L(V ) → L(V ), exp(X) = é de
P
n=0 n!
classe C ∞ .
1
3. Seja X uma matriz quadrada de ordem p. Prove que, se kX − Ik < , a
2

64
CAPÍTULO 6. DERIVAÇÃO DE ORDEM SUPERIOR

Ñ é
∞ 1/2
série (X − I)n converge para Y tal que Y 2 = X.
P
n=0 n

4. Sejam U , V , W e.v.n., A ⊂ U , B ⊂ V abertos, f : A → B e g : B → W


duas vezes deriváveis. Para x ∈ A, prove que

(g ◦ f )00 (x)(h, k) = g 0 (f (x)) · f 00 (x) · (h, k)) + g 00 (f (x)) · (f 0 (x) · h, f 0 (x) · k),

quaisquer que sejam h e k em U .

65
Capítulo 7

Variedades Diferenciais

O estudo das curvas e superfícies mergulhadas em R3 ocupa lugar de relevo


na Ciência desde os primórdios do Cálculo. Entretanto, a consideração dos sistemas
dinâmicos a n graus de liberdade levou naturalmente ao estudo das "variedades"
mergulhadas num espaço euclidiano Rm , onde m é um inteiro positivo qualquer. No
entanto , Gauss já sentia a necessidade de se definir o conceito de variedade de modo
intrínseco, sem considerá-la mergulhada num Rm . É o que vamos fazer, procurando
estender às variedades os conceitos do cálculo em abertos do Rm . A formalização
atual deve muito aos trabalhos de H. Whitney.

7.1 Cartas, Atlas, Variedades

Definição 7.1. Seja M um espaço topológico. Uma carta de dimensão m em M é


um homeomorfismo x de um aberto U ⊂ M sobre um aberto x(U ) ⊂ Rm . Uma
carta x : U → Rm chama-se também sistema de coordenadas locais em M ;o

66
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

aberto U é uma vizinhança coordenada.

U M
·p

x(U )
·
x(p)
Rm

Se p ∈ U e x(p) = (x1 (p), . . . , xm (p)) , os números x1 (p), . . . , xm (p) são as


coordenadas de p na carta x. Se x : U → Rm , y : V → Rm são cartas em M , e
U ∩ V 6= ø, então as aplicações:

y ◦ x−1 : x(U ∩ V ) −→ y(U ∩ V ) e


x ◦ y −1 : y(U ∩ V ) −→ x(U ∩ V )

são chamadas de mudanças de coordenadas.

Obs. Se x : U → Rm é uma carta e V ⊂ U é um aberto, é claro que x|V : V → Rm


é também uma carta.

Definição 7.2. Um atlas de dimensão m e classe, C k , k ∈ N, no espaço topológico


M é um conjunto A de cartas x : U → Rm de dimensão m, cujos domínios formam

67
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

uma cobertura de M , e cujas mudanças de coordenadas são aplicações de classe C k .

Definição 7.3. Dois atlas A e A1 , ambos de dimensão m e classe C k , em M são


equivalentes se A ∪ A1 é um atlas de dimensão m e classe C k em M . Em outras
palavras, A e A1 são equivalentes se, para toda carta x ∈ A e toda carta y ∈ A1 ,
as mudanças de coordenadas x ◦ y −1 e y ◦ x−1 são de classe C k .

Proposição 7.1. A relação "A é equivalente a A1 " é uma relação de equivalência


no conjunto dos atlas de dimensão m e classe C k em M .

Dem. A única propriedade não evidente é a transitividade. Para prová-la sejam


A, A1 , A2 atlas em M tais que A seja equivalente a A1 e A1 equivalente a A2 .
Sejam x : U → Rm e x2 : U2 → Rm cartas tais que x ∈ A, x2 ∈ A2 e
U ∩ U2 6= ø. Queremos provar que x ◦ x−1
2 e x2 ◦ x
−1
são C k . Seja p ∈ U ∩ U2 .
Existe carta x1 : U1 → Rm , x1 ∈ A1 , tal que p ∈ U1 . Seja V = U ∩ U1 ∩ U2 .
Como A é equivalente a A1 e A1 equivalente a A2 , resulta que x ◦ x−1
1 , x1 ◦ x ,
−1

2 e x2 ◦ x1 são C . Portanto,
x1 ◦ x−1 −1 k

x ◦ x−1 −1 −1
2 = (x ◦ x1 ) · (x1 ◦ x2 ) : x2 (V ) → x(V ) e
x2 ◦ x−1 = (x2 ◦ x−1 −1
1 ) · (x1 ◦ x ) : x(V ) → x2 (V )

são C k . Resulta que A é equivalente a A2 .

A união de todos os atlas de dimensão m e classe C k de uma mesma classe de


equivalência é evidentemente um atlas, chamado de atlas máximo da classe.

Definição 7.4. Uma variedade diferencial de dimensão m e classe C k é um espaço


topológico de Hausdorff, com base enumerável de abertos, dotado de um atlas máximo
de dimensão m e classe C k .

68
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Obs. A estrutura diferencial de M é obtida escolhendo-se um atlas A de classe C k


e tomando-se o atlas máximo da classe de equivalência de A.

Exemplo 7.1.1. Seja M uma variedade de dimensão m e classe C k e seja N uma


parte aberta de M . Então M induz em N uma estrutura de variedade de mesma
dimensão e classe que M . De fato, se A é um atlas em M , o conjunto A, das
restrições a N das cartas de A, é um atlas em N de mesma dimensão e classe
que A . Se B é um atlas equivalente a A, então A ∪ B é um atlas C k em M e
A ∪ B = A ∪ B é também um atlas C k em N . Logo, A e B são atlas equivalentes em
N , ou seja, a classe de equivalência de A só depende da de A e , portanto, define
em N uma estrutura diferencial que depende apenas da de M .

Exemplo 7.1.2. Seja Rn com a topologia usual e consideremos a aplicação identi-


dade x(p) = p de Rn . O atlas A = {x} é de dimensão n e classe C ∞ . A classe de
equivalência de A define em Rn uma estrutura de variedade diferencial de dimensão
n e classe C ∞ .

Exemplo 7.1.3. Seja a esfera S2 = {(x, y, z) ∈ R3 ; x2 + y 2 + z 2 = 1} . Conside-


remos o disco aberto unitário D de R2 e os abertos de S 2 , U3 = {(x, y, z) ∈ S 2 ; z > 0} =

= (x, y, 1 − x2 − y 2 ) ; (x, y ∈ D) e V3 = {(x, y, z) ∈ S 2 ; z < 0} =
¶ ©


= (x, y, − 1 − x2 − y 2 ) ; (x, y) ∈ D , e definamos ϕ3 : U3 → D, ψ3 : V3 → D por
¶ ©

√ √
meio de ϕ3 (x, y, 1 − x2 − y 2 ) = (x, y) e ψ3 (x, y, − 1 − x2 − y 2 ) = (x, y). É
fácil ver que ϕ3 e ψ3 são homeomorfismos, ou seja, cartas em S 2 . Considerando
os conjuntos e aplicações análogas, ϕ1 : U1 → D ; ϕ2 : U2 → D ; ψ1 : V1 → D;
ψ2 : V2 → D, obtemos ao todo 6 cartas cujos domínios cobrem S 2 . Quanto às
mudanças de coordenadas, tomemos por exemplo ϕ3 ◦ ψ2−1 : ψ2 (U3 ∩ V2 ) →

→ ϕ3 (U3 ∩V2 ). Esta aplicação é dada por ϕ3 ψ2−1 (u, v) = ϕ3 (u, − 1 − u2 − v 2 , v) =

69
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS


= (u, − 1 − u2 − v 2 ) e , portanto, é de classe C ∞ , o mesmo acontecendo com as
outras mudanças de coordenadas. Obtivemos, assim , um atlas de dimensão 2 e
classe C ∞ em S 2 .

Exemplo 7.1.4. Seja M (n, R) o espaço vetorial real das matrizes quadradas reais
de ordem n. Identifiquemos M (n, R) com Rn . O grupo linear geral
2
GL(n, R)
é o aberto de M (n, R) formado pelas matrizes de determinante diferente de zero.
Logo, GL(n, R) tem uma estrutura diferencial natural induzida pela de Rn .
2

Exemplo 7.1.5. Sejam M uma variedade diferencial de dimensão m e classe Ck ,


N um espaço topológico e f : M → N um homeomorfismo. Se x : U → Rm é
uma carta em M , então x ◦ f −1 : f (U ) → Rm é uma carta em N . Se y : V → Rm
é outra carta em M , com U ∩ V 6= ø, então (y ◦ f −1 ) · (x ◦ f −1 )−1 = y ◦ x−1 é de
classe C k . Portanto, quando x percorre o atlas máximo de M , as aplicações x ◦ f −1
formam um atlas máximo em N , e obtemos uma estrutura de variedade diferencial
em N , de mesma dimensão e classe que a de M . Dizemos que a estrutura de N foi
obtida pelo transporte da estrutura de M por meio do homeomorfismo f.

Obs. (1) Existe exemplo de variedade topológica, isto é, de classe C 0 , que não é o
espaço topológico subjacente a nenhuma variedade diferencial de classe C 1 .
(2) H. Whitney provou que todo atlas máximo de classe C 1 em uma variedade M
contem um atlas C ∞ (na realidade analítico).

Exemplo 7.1.6. Consideremos na esfera S n ⊂ Rn+1 a relação de equivalência


x ∼ y ⇔ x = ±y. O conjunto quociente é representado por P n . Seja π : S n → P n
a aplicação quociente. Cada π(x) determina uma e uma única reta, {tx ; t ∈ R},
passando pela origem em Rn+1 , e reciprocamente. Podemos então considerar P n
como sendo o conjunto de todas as retas de Rn+1 que passam pela origem. Co-

70
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

loquemos em P n a topologia quociente, isto é, A ⊂ P n é aberto se, e só se,


π −1 (A) é aberto em S n . Então, π é contínua. Se V ⊂ S n é aberto, temos que
π −1 (π(V )) = V ∪ (−V ) é aberto , logo, π(V ) ⊂ P n é aberto, ou seja, π é uma
aplicação aberta. Esta topologia em P n é de Hausdorff, pois se π(x) 6= π(y) então
x 6= ±y. Sejam U e V vizinhanças abertas de x e y em S n tais que U ∩ V = ø,
U ∩ (−V ) = ø. Então, π(U ) e π(V ) são vizinhanças disjuntas de π(x) e π(y) em
P n.

Seja p ∈ P n, p = π(x) com x = (x1 , . . . , xn+1 ) ∈ S n , e seja Vα =


= {x ∈ S n ; xα 6= 0}. Então Vα é aberto em S n e π(Vα ) = Uα é aberto em Pn ·Vα =
= Vα+ ∪Vα− , onde Vα+ = {x ∈ S n ; xα > 0} e Vα− = {x ∈ S n ; xα < 0}. Definamos
Ç å
x1 xα−1 xα+1 xn+1
ϕα : Uα → R por ϕα (p) =
n
,..., , ,..., = (y1 , . . . , yn ). É fácil
xα xα xα xα
ver que ϕα é uma bijeção de Uα sobre Rn . Temos que π −1 (Uα ) = Vα+ ∪ Vα− ;
além disso , ξα+ = π|Vα+ : Vα+ → Uα é um homeomorfismo. Também, a composta
fα+ = ϕα ◦ ξα+ : Vα+ → Rn é um homeomorfismo, pois é dada por fα+ (x1 , . . . , xn+1 ) =
xı xi+1
= (y1 , . . . , yn ), onde yı = (1 ≤ ı < α) e yı = (α ≤ i ≤ n) e xα > 0.
xα xα
Resulta que ϕα é um homeomorfismo, donde uma carta em P n . Seja α < β.
Então,
ϕα (Uα ∩ Uβ ) = {y ∈ Rn ; yβ−1 6= 0} e
ϕβ (Uα ∩ Uβ ) = {y ∈ Rn ; yα 6= 0}

são abertos em Rn , e a mudança de coordenadas ϕβ ◦ ϕ−1 α é dada por


1
(ϕβ ◦ ϕ−1
α )(y1 , . . . , yn ) = (y1 , . . . , yα−1 , 1, yα , . . . , yβ−2 , yβ , . . . , yn ) e, portanto, é
yβ−1
de classe C ∞ em ϕα (Uα ∩ Uβ ). Como os domínios Uα (α = 1, 2, . . . , n + 1) cobrem
P n , obtemos um atlas de dimensão n e classe C ∞ em P n . Cada Uα , sendo home-
omorfo a Rn , tem base enumerável. P n tem, então, base enumerável, pois é união

71
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

finita de abertos Uα . Provamos assim que P n é uma variedade diferencial compacta


de dimensão n e classe C ∞ (na realidade analítica). P n é o espaço projetivo real
n-dimensional.

7.2 Aplicações de Classe C k

Definição 7.5. Sejam M m , N n variedades diferenciais de classe C r , r ≥ 1. Uma


aplicação f : M → N é de classe C k , k ≤ r, se, para cada ponto p ∈ M,
existem cartas x : U → Rm em M e y : V → Rn em N , com p ∈ U , f (U ) ⊂ V ,
com a propriedade de que a aplicação fxy = y ◦ f ◦ x−1 : x(U ) → y(V ), entre
abertos de espaços euclidianos, seja de classe C k . Se x1 e y1 são cartas com a
mesma propriedade, então, numa vizinhança de p, fx1 y1 = (y1 · y −1 ) · fxy · (x · x−1
1 )

e, como as mudanças de coordenadas são de classe C r , resulta que a definição


independe das cartas.

U M V N
·p f ·
f (p)

x y

fxy = y ◦ f ◦ x−1
x(U ) y(V )
Rm Rn

A função fxy = y ◦ f ◦ x−1 é a expressão de f nas cartas x e y ; ela é da forma

fxy (x1 , . . . , xm ) = (f1 (x1 , . . . , xm ), . . . , fn (x1 , . . . , xm ))

e fxy é de classe C k se, e só se, as funções fı são de classe C k .

72
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Obs. É claro que se f e g são funções reais de classe C k em M , então f + g e f · g


f
são também de classe C k . Se g(p) 6= 0 para todo p ∈ M , então é de classe
g
Ck .

Proposição 7.2. Sejam M m , N n , P p variedades, f : M → N, g : N → P


aplicações de classe C k . Então, g ◦ f : M → P é de classe C k .

Dem. Sejam x : U → Rm e y : V → Rn cartas em M e N tais que q ∈ U,


f (q) ∈ V e f = y −1 · fxy · x em U , onde fxy ∈ C k . Analogamente, sejam
y1 : V1 → Rn e z : W → Rp cartas em N e P tais que f (q) ∈ V1 , g(f (q)) ∈ W e
g = z −1 · gy1 z · y1 em V1 , onde gy1 z ∈ C k . Sem perda de generalidade podemos supor
V = V1 e U = f −1 (V ). Então, em U, temos z · (g ◦ f ) · x−1 = gy1 z · (y1 · y −1 ) · fxy ,
o que mostra que g ◦ f é de classe C k .

Definição 7.6. Sejam M e N variedades diferenciais. Uma aplicação f : M → N


é um difeomorfismo de classe C k se f é uma bijeção de classe C k , e sua inversa
f −1 : N → M também é de classe C k .

Duas variedades são difeomorfas se existe um difeomorfismo entre elas. Neste


caso, as estruturas diferenciais são isomorfas.

Obs. J. Milnor mostrou que, para vários valores de n ≥ 7, existem no espaço


topológico S n várias estruturas diferenciais não isomorfas tendo a mesma topologia
subjacente (as chamadas esferas exóticas).

Exemplo 7.2.1. Sejam U ⊂ Rm aberto e f : U → Rn . Tomando x(p) = p


em U e y = idRn , temos que fxy = f ; logo, f é de classe C k no sentido das
variedades se, e só se, f é de classe C k no sentido usual.

Exemplo 7.2.2. Sejam M m de classe C k e f = x : U → Rm uma carta em M .

73
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Tomando y = idRm temos fxy = idx(U ) e, portanto, x ∈ C k . Analogamente,


temos x−1 ∈ C k . Logo, as cartas são difeomorfismos C k .

Exemplo 7.2.3. Seja  M = R com sua estrutura diferencial canônica. A função


 t se t ≤ 0


f : M → R, f (t) =  , sendo um homeomorfismo, podemos trans-
 2t se t > 0

portar para R, por meio de f, a estrutura diferencial de M , obtendo uma variedade


diferencial N . Como f não é diferenciável em t = 0, resulta que obtivemos duas
estruturas diferenciais distintas em R. Mas estas estruturas são isomorfas, pois
f : M → N é um difeomorfismo.

Exemplo 7.2.4. Seja B = {x ∈ Rm ; kxk < 1}, k · k sendo a norma euclidiana.


2x
A aplicação f : B → Rm , f (x) = 2
é um difeomorfismo C ∞ da bola
1 − kxk
aberta B sobre Rm . O difeomorfismo inverso é dado por
y
g(y) = f −1 (y) = 1 . Assim, se M é variedade C k e ϕ : U → Rm
m
2
1 + (1 + kyk ) 2
é carta em M , então ψ = g ◦ ϕ : U → B é carta em M com contradomínio B.

Exemplo 7.2.5. Seja M m uma variedade C r . Um caminho em M é uma aplicação


α : I → M , onde I é um intervalo real aberto . α é de classe C k , k ≤ r, se , para
cada carta x : U → Rm em M , o caminho em Rm , x ◦ α : J → x(U ) (α(J) ⊂ U )
é de classe C k .

7.3 Espaço Tangente. Derivada

Sejam M m uma variedade C k , p um ponto de M e Cp1 o conjunto dos


caminhos α ∈ C 1 , definidos numa vizinhança aberta de 0 ∈ R, com valores em M
e tais que α(0) = p. Consideremos em Cp1 a relação ∼ : 00
α ∼ β se existe carta

74
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

x : U → Rm em torno de p, tal que (x◦α)0 (0) = (x◦β)0 (0)00 . Como as mudanças de


coordenadas são C k , resulta que a igualdade acima é verdadeira para toda carta.
Segue-se também da definição que "∼" é uma relação de equivalência em Cp1 . As
classes de equivalência para esta relação são chamadas de vetores tangentes a M em
p, e o conjunto quociente Cp1 /∼ é representado por Tp M .

A carta x dá origem à aplicação θx,p = θx : Tp M → Rm definida por


θx ([α]) = (x ◦ α)0 (0), onde [α] ∈ Tp M . θx está bem definida e é injetora pois
θx ([α]) = θx ([β]) se, e só se, (x ◦ α)0 (0) = (x ◦ β)0 (0), ou seja, se, e só se, α ∼ β.
Além disso, θx é sobrejetora pois se v ∈ Rm , o caminho α(t) = x−1 (x(p) + tv)
pertence a Cp1 e θx ([α]) = (x ◦ α)0 (0) = v. Se y : U → Rm é outra carta
em torno de p, então θy ([α]) = (y ◦ α)0 (0) = (y ◦ x−1 )0 (x(p)) · (x ◦ α)0 (0), donde
θy = (y ◦ x−1 )0 x(p) · θx : Tp M → Rm . Como (y ◦ x−1 )0 x(p) é um isomorfismo de
Rm , resulta que podemos transportar a Tp M , por meio de θx−1 , a estrutura vetorial
de Rm , ou seja, definimos

[α] + [β] = θx−1 (θx [α] + θx [β])


c · [α] = θx−1 (c θx [α]) , c ∈ R ,

de modo que θx : Tp M → Rm é um isomorfismo. Esta estrutura vetorial independe


da escolha da carta já que θx e θy diferem por um isomorfismo do Rm .

O conjunto Tp M , munido desta estrutura vetorial, é o espaço tangente a


M em p. A base canônica do Rm sendo {e1 , e2 , . . . , em } resulta que os vetores
∂ ∂ ∂ −1 ∂
(p), (p), . . . , (p), definidos por θx,p (eı ) = (p), ı = 1, 2, . . . , m , for-
∂x1 ∂x2 ∂xm ∂xı
m ∂
mam uma base de Tp M . É a base associada à carta x. Se vp = aı (p) ∈ Tp M ,
P
ı=1 ∂xı
m
então θx (vp ) = aı eı ∈ Rm é a expressão de vp na carta x.
P
ı=1

75
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

M
U
[α]
p

v = θx ([α])

x(p)
x◦α Rm

Obs. dim Tp M = m = dim M.

Definição 7.7. Sejam M m , N n variedades C k , f : M → N aplicação C 1 e


p ∈ M . A derivada de f em p é a aplicação (linear) f 0 (p) : Tp M → Tf (p) N definida
por f 0 (p) · [α] = [f ◦ α] , ou seja, f 0 (p) associa ao vetor tangente vp = [α] ∈ Tp M ,
o vetor tangente f 0 (p) · vp = [f ◦ α] ∈ Tf (p) N .

[f ◦ α]
[α] N
p f
f (p)
M

α f ◦α

R 0

Mostremos que f 0 (p) está bem definida. Sejam x : U → Rm e y : V → Rn


cartas locais em torno de p e f(p), respectivamente, com f (U ) ⊂ V . Dado vp = [α] =
= [β] ∈ Tp M , temos (y ◦ f ◦ α)0 (0) = fxy
0
(x(p)) · (x ◦ α)0 (0) = fxy
0
(x(p)) · (x ◦ β)0 (0) =
= (y ◦ f ◦ β)0 (0), donde [f ◦ α] = [f ◦ β], o que mostra que f 0 (p) · vp depende do vetor
vp e não do caminho α.

76
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Mostremos agora que f 0 (p) é linear. Como (y ◦f ◦α)0 (0) = fxy


0
(x(p))·(x◦α)0 (0)
vem que θy · [f ◦ α] = fxy
0
(x(p)) · θx [α], ou seja, θy · f 0 (p) = fxy
0
(x(p)) · θx , donde
0
f 0 (p) = θy−1 · fxy (x(p)) · θx : Tp M → Tf (p) N , o que mostra ser f 0 (p) linear, e também
que o diagrama comutativo

f
U V

x y

x(U ) y(V )
fxy

dá origem ao diagrama comutativo

f 0 (p)
Tp M Tf (p) N

θx θy

Rm 0
fxy (x(p)) R
n

Ç å

A matriz de f (p) em relação às bases ordenadas
0
(p) de Tp M e
∂x =1,...,m
Ç å
∂ ∂
(f (p)) de Tf (p) N tem coluna genérica f 0 (p) · (p) =
∂yı ı=1,...,n ∂x
∂fxy
= θy−1 · fxy
0
(x(p)) · e = θy−1 · (x(p)). Se fxy = (f1 , . . . , fn ), então
∂x

n n
∂ ∂fı ∂fı ∂
f 0 (p) · (p) = θy−1 ·
X X
(x(p)) · eı = (x(p)) · (f (p)) ,
∂x ı=1 ∂x ı=1 ∂x ∂yı

onde (e1 , . . . , em ) é a base canônica de Rm e (e1 , . . . , en ) a de Rn , ou seja, a matriz


Ç å
∂fı
de f (p) é a matriz jacobiana
0
(x(p)) (do tipo n×m) da expressão local
∂x 1≤ı≤n
1≤≤m
de f nas cartas x e y, calculada no ponto x(p).

77
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

São consequências das definições os seguintes fatos, deixados aos cuidados do


leitor:

(1) Regra da Cadeia: se M , N , P são variedades e f : M → N , g : N → P são


aplicações C 1 então, para cada p ∈ M , tem-se (g ◦ f )0 (p) = g 0 (f (p)) · f 0 (p).

(2) Se M é variedade C k e f = id : M → M , então f 0 (p) = id : Tp M → Tp M .

(3) Se M e N são variedades e f : M → N é um difeomorfismo C k então, para


cada p ∈ M , f 0 (p) : Tp M → Tf (p) N é um isomorfismo e f 0 (p)−1 = (f −1 )0 (f (p)).

(4) Teorema da Função Inversa : sejam M , N variedades, f : M → N aplicação


C k (k ≥ 1) e p ∈ M . Se f 0 (p) : Tp M → Tf (p) N é um isomorfismo, então
existe uma vizinhança aberta U de p em M e uma vizinhança aberta V de f (p)
em N tais que f |U : U → V seja um difeomorfismo C k . (Usando cartas
reduzimos à situação usual em que M = Rm e N = Rm ).

(5) Sejam M , N variedades e f : M → N de classe C 1 . Se M é conexa e


f 0 (p) = 0 para todo p ∈ M , então f é constante.

7.4 Identificações

(1) A carta x = id : Rm → Rm nos dá θx [α] = (x◦α)0 (0) = α0 (0). Podemos, assim,


identificar Tp Rm com Rm por meio do isomorfismo θx,p , isto é, identificamos
[α] ∈ Tp M com o vetor v ∈ Rm tal que v = β 0 (0) para todo β ∈ [α].

(2) Seja M uma variedade contida em Rn e suponhamos que a inclusão i : M → Rn


tenha derivada injetora em cada p ∈ M . Podemos, então, considerar Tp M

78
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

como um subespaço vetorial de Rn , identificando-o com sua imagem pela deri-


vada i0 (p) : Tp M → Tp Rn = Rn . Assim, Tp M = i0 (p) · Tp M ⊂ Rn .

(3) Sejam M m uma variedade, U ⊂ M um aberto e i : U → M a inclusão.


Então, i0 (p) : Tp U → Tp M é bijeção e identificamos Tp U com Tp M .

(4) Sejam U ⊂ Rm aberto e f : U → Rn de classe C 1 . Então, f 0 (p) : Tp U →


→ Tf (p) Rn . Com as identificações acima f 0 (p) coincide com a derivada usual
Df (p) : Rm → Rn .

(5) Seja x : U → Rn uma carta na variedade M . Então, x : U → x(U ) é um


difeomorfismo. De fato, para cada p ∈ U , o diagrama comutativo

x
U x(U )

x id

x(U ) id x(U )

nos dá o diagrama

x0 (p)
Tp M Rm

θx,p id

Rm id
Rm

também comutativo, ou seja, x0 (p) = θx,p , que é um isomorfismo, donde o


resultado.

(6) Seja α : I → M, α ∈ C 1, α(0) = p (I é um intervalo aberto em R


e 0 ∈ I). Então, α0 (0) : R → Tp M e podemos identificar α0 (0) com

79
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

α0 (0) · 1 ∈ Tp M . Calculemos α0 (0) · 1. Para isso, tomemos um caminho λ


em R tal que λ(0) = 0 e λ0 (0) = 1. Por exemplo, seja λ(t) = t. Então,
α ◦ λ(t) = α(t), α0 (0) · 1 = [α ◦ λ] = [α] e obtemos, assim, a identificação
[α] = α0 (0). Com essa identificação , a igualdade θx,p · [α] = (x ◦ α)0 (0) se
escreve x0 (p) · α0 (0) = (x ◦ α)0 (0), e nada mais é que a regra da cadeia.

Obs. Se f : M → N é de classe C k e p ∈ M , a derivada f 0 (p) : Tp M → Tf (p) N


é também representada por df (p) ou Df (p) e chamada de diferencial de f em p , ou
ainda aplicação linear tangente a f em p.

No caso em que N = R temos que df (p) : Tp M → R é um elemento do dual


de Tp M , isto é, df (p) ∈ (Tp M )∗ . Seja x : U → Rm uma carta em M , p∈U .
Se πı : Rm → R é a i-ésima projeção, então xı = πı · x : U → R é a i-ésima
função coordenada.

As diferenciais dxı (p), ı = 1, . . . , m, formam uma base de (Tp M )∗ dual de


® ´

(p) , já que
∂xı ı=1,...,m

∂ ∂
dxı (p) (p) = πı · x0 (p) (p) = πı (e ) = δı .
∂x ∂x

m
Se f : U → R é de classe C 1 , então df (p) = λ dx (p) e
P
=1
∂ m ∂ m
df (p) · (p) = λ dx (p) · (p) = λ δı = λı .
P P
∂xı =1 ∂xı =1

∂ ∂
Mas, f 0 (p) · (p) = (f ◦ x−1 )0 (x(p)) · x0 (p) · (p) = (f ◦ x−1 )0 (x(p)) · eı =
∂xı ∂xı
∂(f ◦ x−1 )
= (x(p)).
∂xı
∂f
Para simplificar a escrita vamos usar a notação (p) para significar
∂xı

80
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

f
U R
x
f ◦ x−1

x(U )

∂(f ◦ x−1 )
(x(p)).
∂xı
Assim,
m
X ∂f
df (p) = (p)dx (p).
=1 ∂x

Proposição 7.3. Sejam M m uma variedade C k , U ⊂ M aberto, p ∈ U e


f : U → Rm de classe C k e componentes fı : U → R (ı = 1, . . . , m). Existe uma
vizinhança aberta V ⊂ U de p tal que f |V : V → Rm é carta em M se, e só se,
as diferenciais dfı (p), 1 ≤ i ≤ m, formam uma base de (Tp M )∗ .

Dem. Seja x : W → Rm uma carta em torno de p, x(p) = (x1 (p), . . . , xm (p)).


m ∂fı
Temos, dfı (p) = (p) dx(p) , donde resulta que as diferenciais dfı (p),
P
=1 ∂x
Ç å
∂fı
1 ≤ ı ≤ m , formam base de (Tp M ) se, e só se, a matriz jacobiana

(p)
∂x
(1 ≤ ı,  ≤ m) é invertível, ou seja, se, e só se, df (p) é um isomorfismo, e o resul-
tado decorre do Teorema da Função Inversa.

7.5 Aplicações de Posto Constante

Definição 7.8. Sejam M m e N n variedades e f : M → N de classe C k . O posto


de f em p ∈ M é o posto da aplicação linear f 0 (p) : Tp M → Tf (p) N . f é uma
imersão (resp. submersão) em p se f 0 (p) é injetora (resp. sobrejetora) ; neste caso
o posto de f em p é igual a m = dim M (resp. n = dim N ). Se f é uma imersão

81
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

(resp. submersão) em cada p ∈ M dizemos que f : M → N é uma imersão (resp.


submersão). As imersões e submersões são aplicações de posto máximo.

Resulta do Teorema do Posto em espaços euclidianos o seguinte.


Teorema do Posto: Sejam M m e N n variedades C k e f : M → N uma aplicação
C k , k ≥ 1 . Se, na vizinhança de p ∈ M , f tem posto constante r, então existem
cartas x : U → Rm em M , y : V → Rn em N , com p ∈ U , f (U ) ⊂ V , tais que
x(p) = 0, y(f (p)) = 0 e a expressão local fxy = y ◦ f ◦ x−1 de f é a restrição a
x(U ) da aplicação

(x1 , . . . , xr , xr+1 , . . . , xm ) ∈ Rm 7−→ (x1 , . . . , xr , 0, . . . , 0) ∈ Rn .

Corolário 7.1. (Forma local das imersões). Sejam M m e N n variedades C k e


f : M → N uma aplicação C k , k ≥ 1 que é uma imersão em p ∈ M . Existem
cartas x : U → Rm em M , y : V → Rn em N , com p ∈ U , f (U ) ⊂ V , tais que
x(p) = 0 , y(f (p)) = 0 e a expressão fxy de f é a restrição a x(U ) da inclusão de
Rm em Rn = Rm × Rn−m dada por (x1 , . . . , xm ) 7−→ (x1 , . . . , xm , 0, . . . , 0).

N
M V
U p f (p)
f

x y

fxy (s) = (s, 0) Rn−m

Rm x(U ) × {0} Rm
0 (s, 0)
x(U ) 0 s
y(V )

Corolário 7.2. (Forma local das submersões). Sejam M m e N n variedades C k e

82
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

f : M → N uma aplicação C k , k ≥ 1, que é uma submersão em p ∈ M.


Existem cartas x : U → Rm em M , y : V → Rn em N , com p ∈ U , f (U ) ⊂ V ,
tais que x(U ) = W × Z, x(p) = 0, y(f (p)) = 0 e a expressão fxy de f é a
restrição a x(U ) da projeção de Rm = Rm−n × Rn sobre Rn dada por

(x1 , . . . , xm ) 7−→ (xm−n+1 , . . . , xm ).

V Nn
U Mm
f
p f (p)

x y
Rn
Rn

(ω, z) fxy (ω, z) = z z


0 Rm−n 0
y(V )
W ×Z

Obs. (1) Resulta do Corolário 7.1 que o conjunto dos pontos onde f 0 (p) é injetora
é um aberto de M .

(2) Resulta do Corolário 7.2 que o conjunto dos pontos onde f 0 (p) é sobrejetora é
um aberto em M, e que toda submersão é uma aplicação aberta.

Definição 7.9. Uma imersão f : M → N é um mergulho se f é um homeomorfismo


de M sobre o subespaço f (M ) ⊂ N .

Proposição 7.4. Sejam M m , N n , P p variedades C k e g : N → P uma imersão


C k . Uma aplicação f : M → N é C k se, e só se, f é contínua e g ◦ f : M → P

83
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

é C k , k ≥ 1. Se g é um mergulho e g ◦ f ∈ C k , então f é continua (e, portanto,


C k ).

g
N P
f
g◦f

Dem. Seja q ∈ M ; pela forma local das imersões, existem cartas y : V → Rn em


N e z : W → Rn × Rp−n em P , com f (q) ∈ V , g(V ) ⊂ W , tais que a expressão
local gyz é da forma (y1 , . . . , yn ) 7−→ (y1 , . . . , yn , 0, . . . , 0). Da continuidade de f
resulta que existe carta x : U → Rm em M com q ∈ U e f (U ) ⊂ V . Portanto,
(g ◦ f )xz : x(U ) → z(W ) é da forma (g ◦ f )xz = (fxy , 0). Logo, g ◦ f ∈ C k implica
f ∈ C k . A recíproca é evidente. Se g é um mergulho C k e g ◦ f ∈ C k , então
f = g −1 · (g ◦ f ) é contínua.

Corolário 7.3. Sejam M m , N n , P p variedades C k e g : N → P uma imersão


injetora C k . Seja f : M → P de classe C k tal que f (M ) ⊂ g(N ). Existe uma,
e uma única, aplicação h : M → N tal que g ◦ h = f . Se h é contínua, então
h ∈ C k . Se g é um mergulho, então h é contínua (donde C k ).

f
M P

h g

Proposição 7.5. Sejam M ,N , P variedades C k e f : M → N uma submersão


sobrejetora de classe C k , k ≥ 1. Uma aplicação g : N → P é de classe C k se,
e só se, h = g ◦ f é de classe C k .

84
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

f
M N

h g

Dem. Suponhamos h ∈ C k . Como f é sobrejetora, temos que f (f −1 (g −1 (A))) =


= g −1 (A) . Se A é aberto em P , então g −1 (A) é aberto em N , pois h é continua
e f é aberta. Logo, g é contínua. Sejam r = f (q) ∈ N , q ∈ M e z : W → Rp
uma carta em P em torno de g(r). Pela forma local das submersões, existem cartas
x : U → Rn × Rm−n = Rm em M e y : V → Rn em N , com q ∈ U , f (U ) ⊂ V
( e g(V ) ⊂ W ), tais que a expressão local de f é fxy (x1 , . . . , xm ) = (x1 , . . . , xn ),
ou seja, fxy (a, b) = a . Portanto, (g ◦ f )xz (ω, b) = gyz (fxy (ω, b)) = gyz (ω). Seja
λ : Rn → Rn × Rm−n dada por λ(ω) = (ω, b), onde b é fixo. Então λ ∈ C∞ e
gyz = hxz ◦ λ, donde gyz ∈ C k pois hxz ∈ C k . Logo, g ∈ C k . A recíproca é
evidente.

Proposição 7.6. Seja f : M m −→ N n de classe C 1 e posto constante r.

Então:

(a) f é localmente injetora ⇔ f é uma imersão.

(b) f é sobrejetora ⇔ f é submersão.

(c) f é bijetora ⇔ f é um difeomorfismo.

Dem. (a) Se fosse r < m, então localmente f teria a expressão (x1 , . . . , xr , . . . , xm ) 7→


7→ (x1 , . . . , xr , 0, . . . , 0), e f não seria localmente injetora. A recíproca é imedi-
ata.

85
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

(b) Se f não é submersão, então r < n. Pelo teorema do posto, cada ponto de
M tem vizinhança coordenada na qual f tem expressão local (x1 , . . . , xm ) 7→
7→ (x1 , . . . , xr , 0, . . . , 0). Como toda cobertura aberta de M tem subcobertura
enumerável, podemos tomar uma quantidade enumerável de cartas locais

xi : Wi → Rm em M, e cartas yi : Vi → Rn em N tais que M = Wi ,
S
i=1
W̄i , compacto, f (W̄i ) ⊂ Vi , e localmente f na forma acima. Como yi · f (W̄i ) ⊂
⊂ Rr ⊂ Rn temos que f (W̄i ) tem interior vazio em N, donde f (M ) tem interior
vazio em N (pelo teorema de Baire), e f não pode ser sobrejetora. A reciproca
é imediata.

(c) Se f é bijetora, então f é uma imersão por (a) e uma submersão por (b), isto
é, r = m = n e f é um difeo local entre variedades de mesma dimensão, donde
um difeomorfismo.

7.6 Subvariedades

Proposição 7.7. Sejam N n uma variedade diferencial de classe C k e M ⊂N


um subespaço topológico. Existe em M uma, e uma única, estrutura de variedade
diferencial de dimensão m e classe C k tal que a inclusão i : M → N seja um
mergulho C k se, e só se, para cada p ∈ M , existe carta y : V → Rn em N tal
que p ∈ V e y(M ∩ V ) = y(V ) ∩ (Rm × {0}) .

Dem. Se M m e N n são variedades C k , M ⊂ N ,i : M → N mergulho C k , então


existem cartas y1 : V1 → Rn , x : M ∩ V1 → Rm tais que ixy1 (s) = y1 ◦ x−1 (s) = (s, 0),
donde y1 (M ∩V1 ) ⊂ Rm ×{0} . Como y1 ◦ x−1 : x(M ∩ V1 ) → y1 (M ∩ V1 ) é mergulho
e x(M ∩ V1 ) é aberto em Rm , resulta que y1 (M ∩ V1 ) é aberto em Rm × {0}, isto é,

86
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

y1 (M ∩ V1 ) = W ∩ (Rm × {0}), onde W ⊂ Rn = Rm × Rn−m é aberto . Sejam,

W1 = W ∩ y1 (V1 ) , V = y1−1 (W1 ) , y = y1 |V : V → Rn .

Então: y1 (M ∩ V1 ) ⊂ W1 , M ∩ V1 = M ∩ V e y(M ∩ V ) = y1 (M ∩ V1 ) =
= W1 ∩ (Rm × {0}) = y(V ) ∩ (Rm × {0}) .

V N

p M

y Rn−m

y(V ) y(M ∩ V ) 0

Rm x(M ∩ V )

Reciprocamente, se , para cada p ∈ M , existe carta y : V → Rn = Rm × Rn−m


em N tal que p ∈ M e y(M ∩V ) = y(V )∩(Rm ×{0}), tomemos x = π ◦y : M ∩V →
→ Rm , onde π : Rm ×Rn−m → Rm é a projeção canônica. Então, x é homeomorfismo
sobre o aberto x(M ∩ V ) e y ◦ x−1 : x(M ∩ V ) → y(M ∩ V ) é um mergulho C k .
A coleção A de todas essas aplicações x é um atlas C k em M , pois se x1 = π ◦ y1
também pertence a A, então x ◦ x−1
1 1 ) ∈ C .
= (y ◦ x−1 )−1 · (y ◦ y1−1 ) · (y1 ◦ x−1 k

Resulta que M tem uma estrutura diferencial de dimensão m e classe C k . Com


esta estrutura, a inclusão i : M → N tem expressão local ixy = y ◦ i ◦ x−1 = y ◦ x−1 ,
que é um mergulho C k .

87
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Unicidade: Sejam M1 e M2 duas cópias de M ⊂ N com estruturas diferenciais


tais que a inclusão i : M → N seja um mergulho C k . Então, i ∈ C k ⇒ idM ∈ C k ,
onde idM : M1 → M2 . Analogamente, idM : M2 → M1 é também de classe C k , ou
seja, idM é um difeomorfismo C k , e as duas estruturas diferenciais são isomorfas.

ı
M2 N

idM ı

M1

Definição 7.10. Sejam N n uma variedade C k e M ⊂ N um subespaço topológico.


Dizemos que M é uma subvariedade de classe C k de N se a inclusão i : M → N
é um mergulho de classe C k .

Pela Proposição 7.7, dizer que M ⊂ N é subvariedade C k equivale a dizer


que, para todo p ∈ M , existe carta y : V → Rn = Rm × Rn−m tal que p∈V
e y(M ∩ V ) = y(V ) ∩ (Rm × {0}) para algum m. Neste caso, dim M = m e
x = π ◦ y : M ∩ V → Rm é uma carta em M , onde π : Rm × Rn−m → Rm é a
projeção canônica.

Obs. (1) Identificamos Tp M com o subespaço i0 (p) · Tp M de Tp N .

(2) As subvariedades de Rn são também chamadas de superfícies.

(3) Um aberto U de uma variedade N é uma subvariedade de N de mesma dimensão


e classe que N .

88
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Proposição 7.8. Se M e N são variedades C k e f : M → N é um mergulho C k ,


então f (M ) é uma subvariedade C k de N e f : M → f (M ) é um difeomorfismo
Ck .

Dem. Seja g : M → f (M ), g(p) = f (p) para todo p ∈ M ; g é um


homeomorfismo (f (M ) com a topologia induzida pela de N ). Considerando em
f (M ) a estrutura diferencial obtida pelo transporte da estrutura de M por meio de
g , temos que g é um difeomorfismo C k . Se i : f (M ) → N é a inclusão , temos
f = i · g, donde i = f · g −1 . Portanto, i é um mergulho C k e f (M ) é subvariedade
C k de N .

Obs. Se f : M → N é uma imersão injetora, f (M ) pode não ser uma subvarie-


dade, como mostra a imersão de R em R2 abaixo, onde f −1 não é contínua.

p = lim f (t)
t→∞

7.7 Variedade Produto

Sejam M m e N n variedades C k , A e B atlas em M e N , respectivamente. Se


x : U → Rm é uma carta de A e y : V → Rn uma de B, então x × y : U × V →
→ Rm+n , definida por (x × y)(p, q) = (x(p), y(q)), é uma carta em M × N . Como
(x1 × y1 ) ◦ (x × y)−1 = (x1 ◦ x−1 ) × (y1 ◦ y −1 ), segue-se que o conjunto A × B de
tais cartas é um atlas em M × N , cuja classe de equivalência define a estrutura
diferencial de variedade produto em M × N .

89
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Se M m , N1n1 , N2n2 são variedades e f : M → N1 × N2 é dada por f (p) =


= (f1 (p), f2 (p)), onde fı : M → Nı (ı = 1, 2) , então f ∈ C k se, e só se, f1 e f2 são
C k . De fato, se x : U → Rm é carta em M , y1 é carta em N1 , e y2 é carta em N2 ,
então (y1 × y2 ) ◦ f ◦ x−1 = (y1 ◦ f1 ◦ x−1 , y2 ◦ f2 ◦ x−1 ) : x(U ) → Rn1 × Rn2 , donde
o resultado.

Seja M m × N n um produto de variedades C k . Consideremos as aplicações


π1 : M × N → M ; π2 : M × N → N ; iq : M → M × {q} , onde
q ∈ N ; jp : N → {p} × N , onde p ∈ M , definidas por: π1 (p, q) = p ;
π2 (p, q) = q ; iq (p) = (p, q) ; jp (q) = (p, q). Elas são de classe C k . Temos:
π1 ◦ iq = idM ; π2 ◦ jq = idN . Derivando, vem: π10 (p, q) · i0q (p) = idTp M ;
π20 (p, q) · jp0 (q) = idTq N . Portanto, π10 (p, q) e π20 (p, q) são sobrejetoras, i0q (p) e jp0 (q)
são injetoras, ou seja, π1 e π2 são submersões e iq e jp são mergulhos. Assim, M ×q e
p×N são subvariedades C k de M ×N . Sejam E = T(p,q) (M ×q) e F = T(p,q) (p×N ).
Os vetores de E são da forma α0 (0) com α(t) = (α1 (t), q), α1 (0) = p, e os vetores
de F são da forma β 0 (0) com β(t) = (p, β2 (t)), β2 (0) = q. Se x × y é uma carta
em torno de (p, q), temos o isomorfismo (x × y)0 (p, q) : T(p,q) (M × N ) → Rm × Rn ,
(x × y)0 (p, q) · α0 (0) = (x ◦ α1 , y(q))0 (0) = (x0 (p)α10 (0), 0) ∈ Rm × {0}, e
(x × y)0 (p, q) · β 0 (0) = (0, y 0 (q) · β20 (0)) ∈ {0} × Rn , ou seja, (x × y)0 (p, q) leva E
sobre Rm × {0} e F sobre {0} × Rn . Logo, T(p,q) (M × N ) = E ⊕ F .

Identificando Tp M com E via i0q (p) : Tp M → E e Tq N com F por meio de


jp0 (q) : Tq N → F , resulta que T(p,q) (M × N ) = Tp M ⊕ Tq N .

Definição 7.11. Sejam M , N e P variedades C k e f : M × N → P de classe


C 1 . Consideremos as aplicações f ◦ iq : M → P e f ◦ jp : N → P , onde
(p, q) ∈ M × N . As derivadas destas aplicações nos pontos p e q, respectivamente,

90
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

são as derivadas parciais de f em (p, q) :

D1 f (p, q) : Tp M → T(p,q) P ; D2 f (p, q) : Tq N → T(p,q) P .

Se v1 ∈ Tp M , então D1 f (p, q) · v1 = D(f ◦ iq )(p) · v1 = f 0 (p, q) · i0q (p) · v1 = f 0 (p, q) · v1 .


Assim, D1 f (p, q) = Df (p, q)|Tp M . Analogamente, D2 f (p, q) = Df (p, q)|Tq N . Se
v = v1 + v2 ∈ Tp M ⊕ Tq N = T(p,q) (M × N ), então Df (p, q) · v = D1 f (p, q) · v1 +
+D2 f (p, q) · v2 , ou seja, Df (p, q) = D1 f (p, q) ◦ p1 + D2 f (p, q) ◦ p2 , onde p1 e p2 são
as aplicações canônicas p1 (v1 + v2 ) = v1 e p2 (v1 + v2 ) = v2 .

Teorema das Funções Implícitas

Sejam M , N , P variedades, f : M × N → P de classe C k , k ≥ 1,


e (p, q) ∈ M × N tal que D2 f (p, q) : Tq N → Tc P é um isomorfismo, onde
c = f (p, q).

N
U
q P
(p, q)
f −1 (c)
f

c = f (p, q)

M
V p

Existem abertos V ⊂ M , p ∈ V , e U ⊂ M × N , (p, q) ∈ U , tais que, para

91
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

cada t ∈ V , existe um e um único g(t) ∈ N com (t, g(t)) ∈ U e f (t, g(t)) = c,


ou seja, o conjunto f −1 (c) ∩ U é o gráfico da aplicação g : V → N . Além disso,
g ∈ Ck e g 0 (t) = − [D2 f (t, g(t))]−1 ◦ D1 f (t, g(t)). [Reduzimos ao caso em que
M , N , P são abertos em espaços euclidianos e aplicamos o teorema das funções
implícitas usual].

Proposição 7.9. Sejam M m , N n variedades C k e f : M → N de classe C k .


Suponhamos que f tenha posto constante r. Para cada q ∈ N , f −1 (q) ou é vazio
ou é uma subvariedade de classe C k e dimensão (m−r) em M . O espaço tangente
a f −1 (q) em p é o núcleo de f 0 (p) .

Dem. Dado p ∈ f −1 (q), existem cartas x : U → Rm em M e y : V → Rn em


N , com p∈U e q = f (p) ∈ V , tais que fxy = y ◦ f ◦ x−1 é a restrição da
aplicação (x1 , . . . , xr , . . . , xm ) 7→ (x1 , . . . , xr , 0, . . . , 0) .

Podemos supor que x(p) = 0 ∈ Rm e que y(q) = y(f (p)) = 0 ∈ Rn .


Então, x(U ∩ f −1 (q)) = {0} × Z e π2 ◦ x|U ∩f −1 (q) é uma carta em f −1 (q) de

M
U V N
q
p f

f −1 (q)

Rm−r
x y

Rm−r Rn−r

π2 z (ω, z)
fxy (ω, z) = (ω, 0)
ω Rr (ω, 0) Rr

x(U ) = W r × Z m−r y(V ) = W1r × Z1n−r

92
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

dimensão (m − r) e classe C k . A conclusão é imediata. Se v ∈ Tp (f −1 (q)), seja


λ : (−ε, ε) 7→ f −1 (q), λ(0) = p, λ0 (0) = v, onde ε > 0. Então:
f 0 (p) · v = (f ◦ λ)0 (0) = 0, pois f ◦ λ é constante e igual a q. Logo, v pertence ao
núcleo de f 0 (p). Como este núcleo tem dimensão (m − r), igual à dimensão de
Tp (f −1 (q)), resulta a igualdade do enunciado.

Definição 7.12. Seja f : M → N de classe C k . Um ponto c ∈ N é um valor


regular de f se, para cada p ∈ f −1 (c), f é uma submersão em p. Um ponto q ∈ N
que não é valor regular de f é chamado um valor crítico de f.

Obs. Se c ∈ N − f (M ), então c é valor regular de f.

Corolário 7.4. Sejam f : M m → N n de classe C k e c ∈ N um valor regular de


f. Se f −1 (c) 6= ø , então f −1 (c) é uma subvariedade de M de dimensão (m − n)
e classe C k . O espaço tangente a f −1 (c) em p é o núcleo de f 0 (p).

Exemplo 7.7.1. Seja f : Rn+1 → R, f (x) = hx, xi = kxk2 . Como f 0 (x) · h =


= 2hx, hi, resulta que c = 1 é valor regular de f ∈ C ∞ , donde a esfera unitária
f −1 (1) = S n é subvariedade C ∞ de Rn+1 de dimensão n. O espaço tangente a S n
em x é o conjunto dos v ∈ Rn+1 tais que hx, vi = 0, ou seja, é o hiperplano
perpendicular a x.

Exemplo 7.7.2. No conjunto M (n, R) das matrizes reais n × n, a aplicação


det : M (n, R) → R é de classe C ∞ (já que é n-linear nos vetores-coluna).
Temos:
n
0
X
det (X) · H = det(X1 , . . . , Hı , . . . , Xn ) ,
ı=1

onde X, H ∈ M (n, R) e Xı é o i-ésimo vetor-coluna de X.

93
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Para X = In , vem:

n n
det0 (In ) · H =
X X
det(E1 , . . . , Hı , . . . , En ) = hii = tr H ,
ı=1 ı=1

 
0 
 .. 

 . 
 
onde trH é o traço de H e Ej = 
 1  é o j-ésimo
 
H = (hij ) − n × n−, 
 . 
 . 
 . 
 
0
vetor-coluna de In .
Se Ers é a matriz n × n cujos elementos são iguais a zero , exceto o situado
na linha r e coluna s, que vale 1, então

∂ det
= det0 (X) · Ers = (−1)r+s det Xrs , onde
∂xrs

Xrs é a submatriz de X obtida eliminando-se a r-ésima linha e a s-ésima coluna. Se


∂ det
X ∈ GL(n, R) então det Xrs 6= 0 para algum par (r, s). Segue-se que (X) 6= 0,
∂xrs
e det : GL(n, R) → R é submersão C ∞ .
Logo, SL(n, R) = {x ∈ GL(n, R) ; det X = 1} = det−1 (1) é subvariedade
de dimensão (n2 − 1) e classe C ∞ de M (n, R). SL(n, R) é um subgrupo de
GL(n, R) e tem o nome de grupo linear especial ou de grupo unimodular. O espaço
tangente a SL(n, R) em In é o núcleo de det0 (In ), ou seja,
TIn SL(n, R) = {X ∈ M (m, R) ; tr X = 0}.

Exemplo 7.7.3. Sejam S(n, R) e A(n, R) os subespaços de M (n, R) formados,


respectivamente, pelas matrizes simétricas e pelas antissimétricas. Temos:

n(n + 1)
dim S(n, R) =
2
n(n − 1)
dim A(n, R) =
2

e M (n, R) = S(n, R) ⊕ A(n, R).

94
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

O grupo ortogonal O(n, R) é formado pelas matrizes X ∈ M (n, R) tais que


X · X t = In , onde X t é a transposta de X; é um subgrupo de GL(n, R). Seja
f : M (n, R) → S(n, R), f (X) = X · X t . Então,
f 0 (X) · H = XH t + HX t .
1
Provemos que f 0 (X) é sobrejetora. Se S ∈ S(n, R), tomemos U = SX. Então,
2
f 0 (X)·U = XU t +U X t = XX t S2 + SX
2
X t
= S, o que mostra que f e uma submersão
em X ∈ O(n, R). Resulta que f −1 (In ) = O(n, R) é subvariedade de dimensão
n(n + 1) n(n − 1)
n2 − = e classe C ∞ de M (n, R). Como cada vetor linha de
2 2
X ∈ O(n, R) tem comprimento 1, vemos que O(n, R) é limitado (e fechado) em
M (n, R) ' Rn e, portanto, compacto. O espaço tangente a O(n, R) em In é o
2

núcleo de f 0 (In ), isto é,

¶ ©
TIn O(n, R) = X ∈ M (n, R) ; X + X t = 0 = A(n, R) .

Observemos que se X ∈ O(n, R) então (det X)2 = 1, donde det X =


= ±1 . SO(n, R) = {X ∈ O(n, R) ; det X = 1} é o grupo das rotações de Rn .

7.8 Partições da Unidade

Definição 7.13. Seja M um espaço topológico. Uma família (Aı )i∈I de subcon-
juntos de M é localmente finita se, para cada x ∈ M , existe vizinhança U de x tal
que U ∩ Aı = ø exceto para um número finito de índices i ∈ I, isto é, existem
ı1 ∈ I, . . . , ık ∈ I tais que U ∩ Aı = ø para ı 6= ı1 , . . . , ı 6= ık .

Se K ⊂ M é compacto e (Aı )i∈I é localmente finita, segue-se que existe


uma cobertura de K por meio de um número finito de vizinhanças de pontos de K
em M , cada uma das quais intersecta apenas um número finito de conjuntos Aı , ou

95
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

seja, K intersecta apenas um número finito de conjuntos Aı .

Definição 7.14. Se (Aı )i∈I e (B )∈J são coberturas do espaço topológico M, a
cobertura (Bj )j∈J é um refinamento da cobertura (Aı )i∈I se, para cada j ∈ J,
existe i ∈ I tal que Bj ⊂ Aı . Um espaço topológico M é paracompacto quando
toda cobertura aberta de M pode ser refinada por uma cobertura aberta localmente
finita.

Proposição 7.10. Seja M um espaço topológico de Hausdorff, localmente compacto


e com base enumerável. Existe uma sequência de subconjuntos compactos Kı tal que

Kı ⊂ int Ki+1 e M = Kı .
S
ı=1

Dem. Consideremos uma base enumerável para a topologia de M , e seja A = (Aj )j∈N
a subcoleção que consiste de abertos com fecho compacto. É fácil ver que A é uma
base enumerável para a topologia de M .

Seja G1 = A1 e suponha Gn = A1 ∪ . . . ∪ Ajn onde cada Aı ∈ A. Seja


n+1
n+1 o menor inteiro positivo maior que jn e tal que Gn ⊂ Aı . Ponhamos
S
ı=1
jn+1
Gn+1 = Aı ; isto define a sequência (Gn )n∈N indutivamente. Se Kı = Gı , a
S
ı=1

sequência de compactos (Kı )i∈N é tal que Kı ⊂ int Ki+1 e M = Kı .
S
ı=1

Obs. Vamos representar por B(r) a bola aberta de Rm de centro na origem e raio
r > 0.

Proposição 7.11. Sejam M m uma variedade diferencial e Γ uma cobertura aberta


de M. Γ pode ser refinada por uma cobertura aberta enumerável e localmente finita
Ω = (Ui )i∈N , onde cada Uı é o domínio de uma carta xı : Uı → Rm tal que
xı (Uı ) = B(3). Além disso, se Wı = x−1
i (B(1)), (Wı )i∈N é ainda uma cobertura
localmente finita de M . Em particular, M é paracompacta.

96
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Kn+1
Kn

K4
K3
K2
K1


Dem. Podemos escrever M = Kı , onde cada Kı é compacto e Kı ⊂ int Ki+1 .
S
ı=1
Para cada p ∈ K2 , seja y : Z → Rm carta com p∈Z e y(p) = 0. Seja C
um aberto da cobertura Γ tal que p ∈ C. Então, Vp = Z ∩ C ∩ int K3 é aberto
contendo p. Seja r ∈ R tal que B(r) ⊂ y(Vp ) e ponhamos Up = y −1 (B(r)).
3v
Se h : Rm → Rm é definida por h(v) = e x = h ◦ y, então x : Up → Rm
r
é tal que x(Up ) = B(3). Seja Wp = x−1 (B(1)); Wp é aberto contendo p e,
portanto, um número finito deles cobre K2 , cada U correspondente está contido em
int K3 e em algum aberto de Γ. Analogamente, o compacto (K3 − int K2 ) pode ser
coberto por um número finito de abertos W , com cada U correspondente contido em
(K4 − K1 ) e em algum aberto de Γ. Repetindo o raciocínio para (K4 − int K3 ),
(K5 − int K4 ), etc, obtemos indutivamente uma cobertura enumerável (Wı )i∈N de
M e , correspondentemente, cobertura enumerável Ω = (Uı )i∈N . É claro que Ω
refina Γ. Como cada Uı está contido em algum Kj , resulta que cada Uı intersecta
apenas um número finito de elementos de Ω , ou seja Ω, é localmente finita.

Definição 7.15. Seja M um espaço topológico. O suporte da aplicação f : M → Rm ,


denotado por supp (f ), é o fecho do conjunto {x ∈ M ; f (x) 6= 0}, ou seja,
supp (f ) é o menor fechado S em M tal que f é nula em (M − S).

Se ϕı : M → R, i ∈ I, é família de funções cujos suportes formam uma

97
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

família localmente finita, então a soma ϕı (x) está definida para todo x ∈ M,
P
i∈I
pois esta soma contém apenas um número finito de parcelas não nulas. Se cada ϕı
é contínua, então ϕ(x) = ϕı (x) também é contínua, pois existe vizinhança V de
P
i∈I
x que intersecta apenas um número finito de conjuntos supp ϕı e, portanto, em V ,
ϕı (x) é uma soma finita de funções contínuas.
P
i∈I

Proposição 7.12. Existe uma função ϕ : Rm → R, de classe C ∞ , tal que :

(a) 0 ≤ ϕ ≤ 1;

(b) ϕ(x) = 1 para todo x ∈ B(1);

(c) supp ϕ = B(2).

−2 −1 1 2


0 se t ≤ 0



Dem. Seja f : R → R definida por f (t) =  . É fácil
− 1t
  e se t > 0
− 1t
ver, por indução, que D f (t) = e
n
Pn ( 1t ), onde Pn (t) é um polinômio. Como
1
e− t
lim = 0 para todo n ∈ N, vem que lim Dn f (t) = 0. Logo, f ∈ C ∞ .
t→0+ tn t→0+

f (t)
Seja g : R → R definida por g(t) = .
f (t) + f (1 − t)
Então, g ∈ C ∞ , g(t) ≥ 0, g(t) = 1 para t ≥ 1 e g(t) = 0 para t ≤ 0.

Pondo h(t) = g(t + 2) · g(2 − t) obtemos uma função não-negativa, de classe


C ∞ , que vale 1 em [−1, 1] e zero fora de (−2, 2). Basta agora definir ϕ : Rm → R
por ϕ(x) = h(kxk) . Como x 7−→ kxk é C ∞ em Rm − {0} e h(t) = 1 na

98
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

0 1

vizinhança de 0, resulta que ϕ ∈ C ∞ , e as propriedades (a), (b) e (c) são satisfeitas


por construção.

Obs. Dado ε > 0, existe ϕε : Rm → R, de classe C ∞ , tal que 0 ≤ ϕε ≤ 1,


ϕε (x) = 1 para todo x ∈ B(ε) e supp ϕε = B(2ε). Basta definir ϕε (x) = ϕ .
Ä ä
x
ε

Se M m é variedade C k , x : U → Rm é carta tal que x(U ) = B(3),


V = x−1 (B(2)), W = x−1 (B(1)) e definimos ϕx : M → R por

ϕ(x(q)) se q ∈ U



ϕx (q) = 

 0 se q ∈ M − V ,

então a função ϕx é de classe C k , 0 ≤ ϕx ≤ 1, ϕx (W ) = 1 e supp ϕx = V ; ϕx


é a função auxiliar associada à carta x.

Definição 7.16. Seja M m uma variedade C k . Uma partição da unidade de classe


C k em M é uma família (ϕı )i∈I de funções ϕı : M → R, de classe C k , tal
que 0 ≤ ϕı ≤ 1 para todo i ∈ I, (supp ϕı )i∈I é família localmente finita e
ϕı (p) = 1 para todo p ∈ M . Se Γ = (Cj )j∈J é cobertura de M , a partição
P
i∈I
da unidade (ϕı )i∈I é subordinada a Γ se a família (supp ϕı )ı∈I é cobertura de M
que refina Γ. Se a cobertura Γ = (Cı )ı∈I e a partição da unidade (ϕı )ı∈I estão
indexadas pelo mesmo conjunto I e (supp ϕı ) ⊂ Cı para todo i ∈ I, então dizemos
que (ϕı )ı∈I é estritamente subordinada a Γ.

99
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Proposição 7.13. Sejam M m uma variedade C k e Γ uma cobertura aberta de M .


Existe uma partição da unidade (ψı )ı∈I , de classe C k em M subordinada a Γ.

Dem. Seja Ω = (Uı )ı∈N cobertura aberta localmente finita que refina Γ , onde cada
Uı é o domínio de uma carta xı : Uı → Rm e xı (Uı ) = B(3). Consideremos as
funções auxiliares ϕxı : M → R, ϕxı ∈ C k , associadas às cartas xı . A soma
ϕ= ϕxı está definida e é de classe C k , já que Ω é localmente finita. Pondo
P
i∈N
ϕx
ψı = ı temos que ψı = 1, e cada ψı é de classe C k . (ψı )ı∈N é a partição
P
ϕ ı∈N
da unidade procurada, já que supp ψı = Vı ⊂ Uı . Observemos que supp ψı é
compacto.

Obs. Se (Cı )ı∈I é uma família de subconjuntos do espaço topológico M , então

∪ Ci ⊃ ∪ Ci . Isto é um fato geral. Vamos provar que se (Cı )ı∈I é localmente


i i

finita então ∪ Ci = ∪ Ci . De fato, seja p ∈ ∪Cı . Existe vizinhança W de p que


i i

intersecta apenas um número finito Cı1 , . . . , Cın de elementos da família. Suponha


/ ∪ Cı , donde p ∈
que p ∈ / Ci1 ∪ . . . ∪ Cin , que é fechado; logo existe vizinhança V
ı∈I
n
de p em W tal que V ⊂ W − ∪ Cı , donde V ∩ Cı = ø para todo i ∈ I, ou
j=1

seja, p ∈
/ ∪ı Cı , contradição.

Proposição 7.14. Sejam M uma variedade C k e Γ = (Cı )ı∈I uma cobertura


aberta de M . Existe partição da unidade (ϕı )ı∈I , de classe C k em M , estritamente
subordinada a Γ.

Dem. Seja (ψı )ı∈N partição da unidade subordinada a Γ como na Proposição


7.13. Para cada n ∈ N seja An = {ı ∈ I ; Un ⊂ Cı }, onde Ω = (Un )n∈N é
cobertura aberta localmente finita que refina Γ, cada U sendo domínio de uma carta
x : U → Rm e x (U ) = B(3). (An )n∈N é uma família não-vazia de partes não-
vazias de I. Para cada n ∈ N escolhamos um índice ı ∈ An e seja f :N→I

100
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

tal que f (n) = ı, donde Un ⊂ Cf (n) para cada n ∈ N. Definamos (ψı )ı∈I por
ψı = ψn . Como Ω é localmente finita temos que supp ψı = ∪ Vn = ∪ Vn
P
f (n)=ı f (n)=ı f (n)=ı

(já que supp ψn = Vn ). Observemos que supp ψı pode não ser compacto. Provemos
agora que (supp ψı )ı∈I é família localmente finita. Dado p ∈ M , existe vizinhança
V de p tal que Un ∩ V = ø exceto para n ∈ J, J = {n1 ., . . . , nk } ⊂ N. Seja
Io = f (J). Se (supp ψı ) ∩ V 6=ø então Un ∩ V 6= ø para algum n tal que
f (n) = ı, donde n ∈ J, resultando i = f (n) ∈ Io . Logo, (supp ψı ) ∩ V 6=ø
implica i ∈ Io , e resulta que (supp ψı )i∈I é localmente finita.
ψı
Pondo ψ = ψı e ϕı = , então ϕı = 1, ϕı ∈ C k e (supp ϕı ) ⊂ Cı .
P P
ı∈I ψ ı∈I

Proposição 7.15. (Lema de Urysohn diferenciável)

Seja M uma variedade de classe C k . Se F e G são subconjuntos não-vazios,


fechados e disjuntos de M , existe f : M → R, f ∈ C k tal que 0 ≤ f ≤ 1,
f (F ) = 0 e f (G) = 1.

Dem. {M − F , M − G} é cobertura aberta de M . Seja f + g = 1 partição da


unidade de classe C k em M tal que supp f ⊂ M − F e supp g ⊂ M − G. Então,
0 ≤ f ≤ 1, f (F ) = 0 e f (G) = 1.

7.9 Métrica Riemaniana

Seja M m uma variedade de classe C k . Suponhamos que em cada ponto


p ∈ M seja dado um produto interno gp : Tp M ×Tp M → R. Se x : U → Rm é uma
 

carta em torno de p , seja gı : U → R definida por gı (q) = gq ∂xı
(q) , ∂x∂  (q) .
A matriz (gı (q))1≤ı,≤m é (simétrica) positiva. Seja y : U → Rm outra carta em

101
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Ç å
∂ ∂
torno de p. Ponhamos g ı (q) = gq (q), (q) . Temos,
∂yı ∂y

Ç å
m ∂xk ∂ m ∂xr ∂ m ∂xk ∂xk
g ı (q) = gq (q) (q) , (q) (q) = gkr (q) (q) (q),
P P P
k=1 ∂yı ∂xk r=1 ∂y ∂xr k,r=1 ∂yı ∂y
m ∂yk ∂yr
e gı (q) = g kr (q) (q) (q).
P
k,r=1 ∂xı ∂x

Assim, se as funções gı são de classe C r , r < k, em U , também o são as


funções g ij , e reciprocamente, de modo que o fato de gı ser C r independe do sis-
tema de coordenadas. Podemos, por definição, dizer que a função g : p 7→ gp é de
classe C r se as funções gı são de classe C r na vizinhança de cada ponto p ∈ M .
g é uma métrica riemaniana em M . O par (M, g) é uma variedade riemaniana.
»
Se v ∈ Tp M , definimos a norma ou comprimento de v por kvk = gp (v, v). Se
m ∂ m
x : U → Rm é carta em torno de p e v = vı (p), então kvk2 = gı (p) · vı · v .
P P
i=1 ∂xı i=1

Exemplo 7.9.1. Seja M = Rm . Se u = (u1 , . . . , um ) e v = (v1 , . . . , vm ) então


gp (u, v) = u1 v1 + · · · + um vm = hu, vi define uma métrica riemaniana em Rm ; é a
métrica euclidiana.

Exemplo 7.9.2. Seja f : M → N uma imersão C ∞ e seja g uma métrica rie-


maniana C k em N . Pondo hp (u, v) = gf (p) (f 0 (p)u , f 0 (p)v), p ∈ M , u ∈ Tp M ,
v ∈ Tp M , obtemos uma métrica riemaniana h em M , de classe C k . h é a métrica
induzida pela imersão f . Se M é superfície do Rn , a inclusão ı : M → Rn induz
naturalmente uma métrica em M .

Exemplo 7.9.3. Seja H = {(x, y) ∈ R2 ; y > 0} o semiplano superior. H é


subvariedade aberta de R2 . Seja p = (x, y) ∈ H. Se u = (a, b) ∈ Tp H e
v = (c, d) ∈ Tp H , definimos uma métrica riemaniana g em H por gp (u, v) =
ac + bd
= . A variedade riemaniana H é o plano hiperbólico.
y2

102
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Proposição 7.16. Toda variedade diferencial M de classe C k , k ≥ 1, admite uma


métrica riemaniana de classe C k−1 .

Dem. Seja Ω = (Uı )i∈N uma cobertura aberta localmente finita de M por domínios
de cartas xı : Uı → Rm . Seja (ϕı )ı∈N uma partição da unidade estritamente
subordinada a Ω. Em cada aberto Uı induzimos uma métrica gı , de classe C k−1 , por

meio de gı (p)(u, v) = hx0ı (p) · u , x0ı (p) · vi. Pondo gp (u, v) = ϕı (p) · gı (p)(u, v),
P
i=1
onde ϕı (p)gı (p)(u, v) = 0 se p ∈
/ Uı , obtemos uma métrica riemaniana g ∈ C k−1
em M .

7.10 Campos de Vetores. Fibrado Tangente

Definição 7.17. Seja M m uma variedade de classe C k . Um campo de vetores X


em M é uma aplicação que a cada p ∈ M associa um vetor Xp ∈ Tp M . Se
m ∂
x : U → Rm é uma carta em torno de p, então Xq = aı (q) (q), onde q ∈ U .
P
ı=1 ∂xı
m ∂
Se y : U → Rm é outra carta, então Xq = b (q) (q). Logo,
P
=1 ∂y

m m
X ∂ X ∂y ∂
Xq = aı (q) (q) = aı (q) (q) (q) .
ı=1 ∂xı ı,=1 ∂xı ∂y

m ∂y ∂y
Portanto, b (q) = aı (q)(q) e, como ∈ C k−1 , resulta que aı ∈ C k−1
P
ı=1 ∂xı ∂xı
(ı = 1, . . . , m) implica b ∈ C k−1 . De modo análogo, b ∈ C k−1 ( = 1, . . . , m)
implica aı ∈ C k−1 . Dizemos, por definição, que o campo X é de classe C r , r < k,
se as funções aı : U → R(1 ≤ i ≤ m) são de classe C r .

Consideremos um conjunto não-vazio M e uma família (xı )ı∈I de bijeções


xı : Uı → xı (Uı ) , onde Uı ⊂ M e xı (Uı ) é um aberto de Rm . Seja ϕı =

103
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

 : x (Ui ∩ U ) → xı (Uı ∩ U ) e suponhamos que M =


= xı ◦ x−1 Uı , que x (Uı ∩ U )
S
ı∈I
seja aberto em Rm e que ϕı seja de classe C r , quaisquer que sejam ı ∈ I,  ∈ I.
Seja T a coleção dos subconjuntos A de M da forma A = ı (Aı ), onde Aı é um
x−1
S
ı∈J
aberto qualquer de xı (Uı ).

Lema 7.1. T é uma topologia em M e xı : Uı → xı (Uı ) é um homeomorfismo.

Dem. De fato,

(a) M= Uı = x−1
ı (xı (Uı )) ∈ T ;
S S
ı∈I ı∈I
Ç å
(b) se Ak ∈ T , então ∈ T;
S S −1 S −1
Ak = x (A i,k ) = x Ai,k
S S
ı ı
k k ı ı k

(c) se A = e B= pertencem a T , então


S −1 S −1
x (Aı ı) x (B
 )
ı 

 (B ) . Para provar que A ∩ B ∈ T , basta provar


S S Ä −1 ä
A∩B = x (A ı ı) ∩ x−1
ı 

ı (Aı ) ∩ x (B ) pertence a T . Ora,


que o conjunto G = x−1 −1

ı (Aı ) ∩ x (B ) ⊂ Uı ∩ U e, portanto, podemos achar xı (G). Temos,


x−1 −1

xı (G) = Aı ∩ xı · x−1
 (B ∩ x (Uı ∩ U )) .

Como xı · x−1
 = ϕı é um homeomorfismo, temos que Gı = xı (G) é aberto

ı (Gı ) ∈ T .
em Rm e G = x−1

Mostremos agora que, na topologia T, xı : Uı → xı (Uı ) é um homeomorfismo.


Da definição de T resulta que xı é contínua. Seja A ⊂ Uı aberto. Então, A =
e ϕı (A ) e, como ϕı é um homeomorfismo, resulta que
S −1
= x (A ) xı (A) =
S

 

xı (A) é um aberto de Rm e, portanto, xı é uma aplicação aberta, donde um homeo-


morfismo.

104
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

Lema 7.2. Sejam M m uma variedade C k , T a topologia em M e T a topologia


definida pelo atlas (xı )ı∈I em M . Então: T = T.

Dem. Se A ∈ T então Aı ⊂ xı (Uı ) aberto em Rm , donde


S −1
A = x (A
ı ı ),
ı

A ∈ T pois xı : Uı → Rm é um homeomorfismo. Reciprocamente, se B ∈T


então B = (B ∪ Uı ) = Bı e, como Bı ∈ T , resulta que Cı = xı (Bı ) é aberto
S S
ı ı

em xı (Uı ); logo, Bı = x−1


ı (Cı ) ∈ T , donde B ∈ T .

Definição 7.18. Se M m é uma variedade C k , seja

[
TM = {p} × Tp M = {(p, v) ; p ∈ M e v ∈ Tp M } .
p∈M

Vamos definir, a partir de um atlas A de classe C k de M m , um atlas A de classe


C k−1 e dimensão 2m em T M . Seja π : T M → M, π(p, v) = p. Se U ⊂ M é
aberto, então π −1 (U ) = {(p, v) ; p ∈ U , v ∈ Tp M } = T U . Consideremos x ∈ A,
x : U → Rm , e definamos x : T U → Rm × Rm = R2m por x(p, v) =
= (x(p), x0 (p) · v) . x é uma bijeção de T U sobre o aberto x(U ) × Rm de R2m .
Seja y : V → Rm outra carta em M . Então, ȳ · x̄−1 (x(p), x0 (p) · v) = ȳ(p, v) =
= (y(p), y 0 (p) · v) = (y ◦ x−1 (x(p)) , (y ◦ x−1 )0 (x(p)) · x0 (p)v). Como y ◦ x−1 ∈ C k ,
vem que ȳ ◦ x̄−1 : x̄(T U ∩ T V ) → ȳ(T U ∩ T V ) é de classe C k−1 no aberto
x̄(T U ∩ T V ) = x(U ∩ V ) × Rm . A é a família das aplicações x, quando x percorre
A. Consideremos em T M a topologia associada a A ; então T U é aberto em T M
e x̄ : T U → x(U ) × Rm é homeomorfismo. A projeção π : T M → M é contínua,
pois sua expressão nas cartas x̄ e x é πx̄x (x(p) , x0 (p)v) = x(p), isto é, πx̄x é a
restrição a x(U ) × Rm da projeção π1 : Rm × Rm → Rm . A topologia de T M é
Hausdorff, pois se (p, v) 6= (q, ω) e p 6= q, então existem abertos disjuntos A e
B em M contendo p e q, respectivamente ; então π −1 (A) e π −1 (B) são abertos

105
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

disjuntos de T M contendo (p, v) e (q, ω), respectivamente. Se p = q, seja


x : U → Rm carta em M com p ∈ U . Então, x̄(p, v) e x̄(p, ω)são pontos
distintos em x(U ) × Rm . Sejam A e B abertos disjuntos contendo esses pontos.
Resulta que x̄−1 (A) e x̄−1 (B) são abertos disjuntos contendo (p, v) e (p, ω). A
topologia de T M tem base enumerável pois T M tem cobertura (aberta) enumerável
por abertos do tipo T U , e T U é homeomorfo a um aberto de R2m .

Assim, a um atlas A de M de classe C k , associamos um atlas A em T M ,


de classe C k−1 . Se A1 é atlas equivalente a A ; então A ∪ A1 é atlas C k em M
e, como A ∪ A1 = Ā ∪ Ā1 , resulta que Ā1 é equivalente a A, ou seja, à estrutura
de variedade C k em M está associada uma estrutura natural de classe C k−1 em
T M . Observemos que a projeção π : T M → M é submersão sobrejetora de classe
C k−1 . Com esta estrutura diferencial, T M é o fibrado tangente a M .

Se f : M → N é de classe C k , então T f : T M → T N , definida por


T f (p, v) = (f (p), f 0 (p)v), é a derivada ou diferencial de f, representada também por
Df ou df . Temos o diagrama comutativo, onde π é a projeção do fibrado:
Tf
TM TN

π π

M f
N

Obs. (1) Para cada p ∈ M existe vizinhança aberta U de p em M e um difeomor-


fismo ϕ : U × Rm → π −1 (U ), ϕ(q, v) = (q, x0 (q)−1 · v) tal que π(ϕ(q, v)) = q
para todo q ∈ U e todo v ∈ Rm , de modo que T M é um exemplo de um fibrado
diferencial com base M, projeção π e fibra típica Rm . Além disso, para cada p ∈ M ,
a fibra π −1 (p) = Tp M é um espaço vetorial e a aplicação parcial ϕp : Rm → Tp M

106
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

é um isomorfismo de espaços vetoriais, de modo que T M é um fibrado vetorial.


(2) Seja X um campo de vetores em M ∈ C k . X define uma aplicação s : M → T M ,
s(p) = (p, Xp ). É claro que π ◦ s = idM ; dizemos que s é uma seção do fibrado
T M . Reciprocamente, toda seção s : M → T M define um campo de vetores X.

Proposição 7.17. Sejam M m uma variedade C k e X um campo de vetores em M .


m ∂
Se x : U → Rm é carta em M e x = aı em U , são equivalentes:
P
ı=1 ∂xı

(a) as funções aı : U → R, 1 ≤ ı ≤ m, são de classe C r , r < k;

(b) s : U → T M , s(p) = (p, Xp ), é uma aplicação C r .

Dem. A expressão de s nas cartas x : U → Rm e x̄ : T U → R2m é dada


m
Å ã
por sxx̄ (x(p)) = (x(p), x0 (p) · Xp ) = x(p), aı (p) eı , onde (e1 , . . . , em ) é a base
P
i=1
canônica de Rm e p ∈ U . Como x ∈ C e k
aı ∈ C r , resulta que s ∈ Cr.
Reciprocamente, se s ∈ C r , então a composta

m
x s2 X π
ı
p 7−→ x(p) 7−→ a (p)e 7−→ aı (p)
=1

é de classe C r pois s2 (x(p)) = x0 (p) · Xp é de classe C r e π1 (a1 , . . . , am ) = ai é


de classe C ∞ , ou seja aı : U → R é de classe C r , 1 ≤ i ≤ m.

Podemos, assim, definir um campo de vetores X de classe C r em M como


sendo uma aplicação X : M → T M , de classe C r , tal que π ◦ X = idM , ou seja,
como uma seção C r do fibrado tangente T M .

107
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

7.11 Exercícios do Capítulo 7

1. Sejam M m uma variedade C k , p ∈ M , v1 , . . . , vn ∈ Tp M , vetores linear-


mente independentes. Mostre que existe carta x : U → Rm com p ∈ U , tal

que vı = (p) , ı = 1, 2, . . . , n.
∂xı

2. Seja f : R2 → R de classe C ∞ . Mostre que o gráfico


Γ(f ) = {(x, y, f (x, y)) ; (x, y) ∈ R2 } é uma subvariedade C ∞ de R3 .

3. Sejam (M, A) e (N, B) variedades C ∞ e f : M → N um homeomorfismo


que não é uma aplicação de classe C 1 . Introduza em N uma estrutura
diferencial C de modo que f : (M, A) → (N, C ) seja um difeomorfismo.
Mostre que B e C não são atlas equivalentes.

4. S = {(x, y, z, t) ∈ R4 ; x5 + y 5 + z 5 + t5 = 1} é subvariedade de R4 ?

5. S = {(x, y, z) ∈ R3 ; x3 + y 3 + z 3 = 1 , z = xy} é subvariedade de R3 ?

n
6. Seja ϕ : Rn → Rn , ϕ(x1 , . . . , xn ) = (y1 , . . . , yn ) onde yı = aı x +
P
=1
+ bı , ı = 1, . . . , n, onde b = (b1 , . . . , bn ) ∈ Rn . Se det(aı ) 6= 0 dizemos que
ϕ é uma transformação afim. As transformações afins do Rn formam o "grupo
afim" do Rn . Prove que toda transformação afim do Rn é um difeomorfismo.

7. Seja ϕ : Rn+1 → Rn+1 linear bijetora. Seja π : Rn+1 − {0} → P n , π(x) =


=reta definida por x, passando pela origem de Rn+1 , onde P n é o espaço pro-
jetivo (real) n-dimensional. Seja ψ : P n → P n tal que ψ ◦ π = π ◦ ϕ.
ψ chama-se uma transformação projetiva de P n ; o conjunto delas forma o
"grupo projetivo" de P n . Prove que toda transformação projetiva é um dife-
omorfismo. Se Z é o conjunto das matrizes λIn+1 , λ ∈ R , λ 6= 0 , In+1 =

108
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

ϕ
Rn+1 − {0} Rn+1 − {0}

π π

Pn ψ Pn

= matriz identidade, então Z é subgrupo normal de GL(n + 1, R). Prove


que o grupo projetivo de P n é isomorfo a GL(n + 1, R)/Z.

8. Seja M m uma variedade C k . Se p ∈ M representemos por Mp a coleção


das cartas x : U → Rm tais que p ∈ U . Um vetor tangente a M em p é uma
aplicação v : Mp → Rm que satisfaz à seguinte condição: se x, y ∈ Mp , se
m ∂yı
v(x) = (α1 , . . . , αm ) e v(y) = (β1 , . . . , βm ), então βı = (p) · α ,
P
j=1 ∂x
Ç å
∂yı
ı = 1, . . . , m, onde (p) é a matriz jacobiana da mudança de coorde-
∂x
nadas y ◦ x−1 , calculada em x(p). Mostre que esta definição é equivalente à
usual.

9. Sejam N variedade C k , M espaço topológico e f : M → N contínua. Existe


no máximo uma estrutura de variedade C k em M que torna f uma imersão
Ck .

10. Sejam M variedade C k , N um conjunto e f : M → N sobrejetora. Existe


no máximo uma estrutura de variedade C k em N que torna f uma submersão
Ck .

11. Sejam N uma variedade, M ⊂ N uma subvariedade de mesma dimensão.


Prove que M é um aberto de N . Se N é conexa e M compacta, então M = N .

12. Seja f : M m → N n uma imersão C k . f (M ) é subvariedade de dimensão m


e classe C k de N se, e só se, f : M → f (M ) é aplicação aberta, f (M ) com

109
CAPÍTULO 7. VARIEDADES DIFERENCIAIS

a topologia induzida de N .

C∞
13. Prove que uma aplicação f : R2 → R não pode ser injetora.

14. Sejam M m variedade compacta e f : M m → Rm de classe C ∞ . Prove que


f não pode ser uma imersão.

15. Seja M m ⊂ Rn uma superfície C k . Todo ponto p ∈ M possui vizinhança


V parametrizada por aplicação ϕ : Vo → V , ϕ ∈ C k , V0 ⊂ Rm , da forma
ϕ(y) = (y, f (y)), y ∈ V0 .

16. Seja M m ⊂ Rn superfície C k . Para cada p ∈ M existe aberto A ⊂ Rn ,


p ∈ A, e aplicação g : A → Rn−m de classe C k , tal que 0 ∈ Rn−m é valor
regular de g e M ∩ A = g −1 (0).

17. Prove que P 1 e S 1 são difeomorfos.

18. Sejam M m variedade C k compacta e f : M m → Rn de classe C k . Mostre


que f tem um ponto crítico.

19. Seja f : M → N uma imersão injetora C k . Prove que, se M é compacta,


então f (M ) é subvariedade de N .

20. Sejam M m uma variedade C k e f : U → R uma função C k definida numa


vizinhança U de p ∈ M . Prove que existe f˜ : M → R de classe C k que
coincide com f numa vizinhança V de p.

110
Capítulo 8

Álgebra Exterior

Este capítulo é de natureza puramente algébrica. Nele introduzimos as aplica-


ções multilineares alternadas, e o produto exterior de p-formas por q-formas. Como
aplicação definimos o determinante de um operador linear, e também o produto
interior de um vetor por uma p-forma.

8.1 Álgebra Exterior

Definição 8.1. Sejam V e W espaços vetoriais reais e r ∈ N. Uma aplicação


f : V × . r. . ×V → W é r-linear se:

f (v1 , . . . , vı + uı , . . . , vr ) = f (v1 , . . . , vı , . . . , vr ) + f (v1 , . . . , uı , . . . , vr );


f (v1 , . . . , λvı , . . . , vr ) = λf (v1 , . . . , vı , . . . , vr ),

para ı = 1, . . . , r, e quaisquer λ ∈ R e v1 , . . . , vı , uı , . . . , vr ∈ V . O conjunto de


todas as aplicações r-lineares de V em W , representado por Lr (V, W ), é um espaço

111
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

vetorial real, as leis sendo definidas do modo usual. Por convenção, Lo (V, W ) = W ,
e L1 (V, W ) = L(V, W ) é o espaço das aplicações lineares de V em W .

Definição 8.2. f ∈ Lr (V, W ) é alternada se f (v1 , . . . , vr ) = 0 toda vez que dois


dos vetores vı são iguais.

As aplicações r-lineares alternadas formam um subespaço vetorial Ar (V, W )


de Lr (V, W ). Convenciona-se que A0 (V, W ) = W e A1 (V, W ) = L(V, W ).
É fácil ver que f ∈ Lr (V, W ) é alternada se, e só se, f é antissimétrica, isto é ,
f (v1 , . . . , vı , . . . , v , . . . , vr ) = −f (v1 , . . . , v , . . . , vı , . . . , vr ). No caso em que W = R,
os elementos de Lr (V, R) são chamados de formas r-lineares. Em particular,
L(V, R) = V ∗ é o dual de V . O espaço Ar (V, R) das formas r-lineares alternadas
r 0 1
é também representado por ∧ V ∗ . Assim, ∧ V = R e ∧ V ∗ = V ∗ . Os elementos
r
de ∧ V ∗ são também chamados de r-covetores.

Definição 8.3. Seja Sr o grupo das permutações do conjunto {1, 2, . . . , r} ; Sr tem


r! elementos. Uma transposição é um elemento σ ∈ Sr para o qual existem inteiros
ı e , 1 ≤ ı,  ≤ r, tais que σ(ı) = , σ() = ı e σ(k) = k para k 6= ı, k 6= ,
ou seja, σ troca ı e  mantendo os demais elementos fixos. É claro que σ 2 = 1,
isto é, σ −1 = σ. A Proposição seguinte é bem conhecida.

Proposição 8.1. Toda permutação τ ∈ Sr pode ser escrita na forma τ =


= σ1 · σ2 . . . σk , onde cada σı é uma transposição e a paridade do número destas
transposições é sempre a mesma.

O sinal de τ ∈ Sr é +1 se τ é produto de número par de transposições (isto é,


se τ é uma permutação par ) e −1 se τ é produto de número ímpar de transposições
(ou seja, se τ é uma permutação ímpar). O sinal de τ é representado por ε(τ ) ou
ετ . Se σ é uma transposição temos ε(σ) = −1.

112
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Definição 8.4. Se f ∈ Lr (V, W ) e σ ∈ Sr , definimos (σf ) ∈ Lr (V, W ) por


(σf )(v1 , . . . , vr ) = f (vσ(1) , . . . , vσ(r) ), quaisquer que sejam v1 , . . . , vr ∈ V .

Proposição 8.2. Se f ∈ Lr (V, W ), τ ∈ Sr , σ ∈ Sr , então (τ σ)f = τ (σf ).

Dem. Temos:
τ (σf )(v1 , . . . , vr ) = (σf )(vτ (1) , . . . , vτ (r) ). Seja uı = vτ (ı) .

Então,

(σf )(u1 , . . . , ur ) = f (uσ(1) , . . . , uσ(r) ) = f (vτ σ(1) , . . . , vτ σ(r) ) = (τ σ)f (v1 , . . . , vr ),

para v1 , . . . , vr quaisquer em V . Logo, τ (σf ) = (τ σ)f .

Proposição 8.3. Seja f ∈ Lr (V, W ). Então, f ∈ Ar (V, W ) se, e só se,


τ f = ε(τ )f para toda τ ∈ Sr .

Dem. Se σ é uma transposição, temos σf = −f . Se τ ∈ Sr e τ = σ1 . . . σn ,


onde σı é transposição (1 ≤ ı ≤ n), então

τ f = (σ1 · · · σn )f = (−1)n f = ε(τ )f .

A recíproca é imediata.

Definição 8.5. Se f ∈ Lp (V, R) e g ∈ Lq (V, R), definimos seu produto tensorial


f ⊗ g ∈ Lp+q (V, R) por (f ⊗ g)(v1 , . . . , vp+q ) = f (v1 , . . . , vp ) · g(vp+1 , . . . , vp+q ),
para v1 , . . . , vp+q quaisquer em V .
1 P
Definição 8.6. Se f ∈ Lp (V, R), definimos Alt(f ) por Alt f = ε(σ)(σf ),
p! σ∈Sp
1 P
ou seja, (Alt f )(v1 , . . . , vp ) = ε(σ)f (vσ(1) , . . . , vσ(p) ), quaisquer que sejam
p! σ∈Sp
v1 , . . . , vp em V .

113
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

p
Proposição 8.4. (a) f ∈ Lp (V, R) implica Alt f ∈ ∧ V ∗ , e a aplicação
p
Alt : Lp (V, R) −→ ∧ V ∗ é linear.

p
(b) ω ∈ ∧ V ∗ implica Alt ω = ω. Em particular, f ∈ Lp (V, R) implica
Alt(Alt f ) = Alt f .

Dem. (a) seja τ a transposição que troca ı e . Se α ∈ Sp e β = α ◦ τ , então

1 X
Alt f (v1 , . . . , vj , . . . , vi , . . . , vp ) = ε(α)f (vα(1) , . . . , vα(j) , . . . , vα(i) , . . . , vα(p) ) =
p! α∈Sp

1 X 1 X
= ε(α)f (vβ(1) , . . . , vβ(i) , . . . , vβ(j) , . . . , vβ(p) ) = −ε(β)f (vβ(1) , . . . , vβ(p) ) =
p! α∈Sp p! β∈Sp

= − Alt f (v1 , . . . , vi , . . . , vj , . . . , vp ),

p
quaisquer que sejam v1 , . . . , vp em V . Logo, Alt f ∈ ∧ V ∗ .

p
(b) Se ω ∈ ∧ V ∗ , então σω = ε(σ)ω para todo σ ∈ Sp . Logo,

1 X 1 X
Alt ω = ε(σ)(σω) = ω=ω.
p! σ∈Sp p! σ∈Sp

p
Em particular, se f ∈ Lp (V, R) então Alt f ∈ ∧ V ∗ , donde Alt(Alt f ) = Alt f .

p q p+q
Definição 8.7. Se α ∈ ∧ V ∗ e β ∈ ∧ V ∗ , definimos o produto exterior α∧β ∈ ∧ V ∗
por
(p + q)!
α∧β = Alt(α ⊗ β) , ou seja ,
p! q!
1 X
(α ∧ β)(v1 , . . . , vp+q ) = ε(σ) · α(vσ(1) , . . . , vσ(p) ) · β(vσ(p+1) , . . . , vσ(p+q) ) ,
p!q! σ∈Sp+q

para v1 , . . . , vp+q ∈ V quaisquer.

114
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Exemplo 8.1.1. Sejam α e β duas formas lineares, isto é, α, β ∈ V ∗ . Então,


2
α ∧ β ∈ ∧ V ∗ e (α ∧ β)(v1 , v2 ) = α(v1 )β(v2 ) − α(v2 )β(v1 ). É claro que α ∧ α = 0.

p
Exemplo 8.1.2. Sejam α ∈ V ∗ e β ∈ ∧ V ∗ . Então, (α ∧ β)(v0 , v1 , . . . , vp ) =
1 P 1 P p
= ε(σ)α(vσ(0) )·β(vσ(1) , . . . , vσ(p) ) = ε(σ)α(vi )·β(vσ(1) , . . . , vσ(p) ).
P
p! σ∈Sp+1 p! i=0 σ∈Sp+1
σ(0)=i

Seja πi a permutação , do conjunto {0, 1, . . . , i − 1, i + 1, . . . , p} = {σ(1), . . . , σ(p)},


tal que πi (0) = σ(1), . . . , πi (i − 1) = σ(i), πi (i + 1) = σ(i + 1), . . . , πi (p) = σ(p).
Então, ε(σ) = (−1)i ε(πi ) e obtemos

p
1 X X
(α ∧ β)(v0 , . . . , vp ) = ε(σ)α(vi )ε(πi )β(v0 , . . . , vbi , . . . , vp ) =
p! i=0 σ∈Sp+1
σ(0)=i

p p
1 X i
(−1) α(vi ) · β(v0 , . . . , vbi , . . . , vp ) = (−1)i α(vi )β(vi , . . . , v̂i , . . . , vp ) ,
X X
=
p! i=0 σ∈Sp+1 i=0
σ(0)=i

onde o circunflexo "^" indica que o vetor correspondente deve ser omitido.

Obs. Da definição decorre imediatamente que a aplicação (α, β) 7−→ α ∧ β é


bilinear.

p q
Proposição 8.5. Sejam α ∈ ∧ V ∗ e β ∈ ∧ V ∗ . Então, α ∧ β = (−1)pq β ∧ α.

Dem. Quaisquer que sejam v1 , . . . , vp+q em V , temos p! q! (β ∧ α)(v1 , . . . , vp+q ) =


= ε(τ )β(vτ (1) , . . . , vτ (q) )·α(vτ (q+1) , . . . , vτ (p+q) ). Seja ρ a permutação que trans-
P
τ ∈Sp+q
forma {1, 2, . . . , p + q} em {q + 1, . . . , q + p, 1, . . . , q}. Então: ε(ρ) = (−1)pq .

115
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Seja σ = τ ρ. Quando τ percorre Sp+q o mesmo acontece com σ, de modo que

ε(τ )β(vτ (1) , . . . , vτ (q) ) · α(vτ (q+1) , . . . , vτ (p+q) ) =


P
τ ∈Sp+q

= ε(τ )β(vσ(p+1) , . . . , vσ(p+q) ) · α(vσ(1) , . . . , vσ(p) ) =


P
τ

= (−1)pq ε(σ)α(vσ(1) , . . . , vσ(p) ) · β(vσ(p+1) , . . . , vσ(p+q) ) =


P
σ

= p! q! (−1)pq (α ∧ β)(v1 , . . . , vp+q ) ,

donde a tese.

Lema 8.1. Se f ∈ Lp (V, R), g ∈ Lq (V, R) e Alt f = 0, então Alt(f ⊗ g) =


= Alt(g ⊗ f ) = 0.

Dem. Quaisquer que sejam v1 , . . . , vp+q em V , temos Alt(f ⊗ g)(v1 , . . . , vp+q ) =


1
= ε(σ)f (vσ(1) , . . . , vσ(p) ).g(vσ(p+1) , . . . , vσ(p+q) ). Seja G ⊂ Sp+q o
P
(p + q)! σ∈Sp+q
subgrupo das permutações que deixam (p + 1), . . . , (p + q) fixos. Então,

ε(σ)f (vσ(1) , . . . , vσ(p) ).g(vσ(p+1) , . . . , vσ(p+q) ) =


P
σ∈G
ñ ô
= ε(τ )f (vτ (1) , . . . , vτ (p) ) · g(vp+1 , . . . , vp+q ) =
P
τ ∈Sp

= p! Alt f (v1 , . . . , vp ) · g(vp+1 , . . . , vp+q ) = 0 .

Sejam α ∈ Sp+q , α ∈
/ G , Gα = {σ.α; σ ∈ G} . Ponhamos vα(1) = u1 ,
vα(2) = u2 , . . . , vα(p+q) = up+q . Então,

ε(σ)f (vσ(1) , . . . , vσ(p) ) · g(vσ(p+1) , . . . , vσ(p+q) ) =


P
ñσ∈G·α ô
= ε(α) ε(τ )f (uτ (1) , . . . , uτ (p) ) · g(up+1 , . . . , up+q ) = 0 .
P
τ ∈G

Observemos que se σ ∈ G ∩ G · α, então σ = τ · α para algum τ ∈ G; logo,


α = σ · τ −1 ∈ G, absurdo. Então, G ∩ G · α = ø . Continuando desta forma,

116
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

dividimos Sp+q em subconjuntos disjuntos. Como a soma sobre cada um desses


subconjuntos é igual a zero, resulta que a soma sobre Sp+q também é igual a zero.
Portanto, Alt(f ⊗ g) = 0. Analogamente, Alt(g ⊗ f ) = 0.

p q r
Proposição 8.6. Sejam α ∈ ∧ V ∗ , β ∈ ∧ V ∗ e γ ∈ ∧ V ∗ . Então,

(a) Alt(Alt(α ⊗ β) ⊗ γ) = Alt(α ⊗ β ⊗ γ) = Alt(α ⊗ Alt(β ⊗ γ));

(p + q + r)!
(b) (α ∧ β) ∧ γ = α ∧ (β ∧ γ) = Alt(α ⊗ β ⊗ γ).
p! q! r!

Dem. (a) Como Alt [Alt(β ⊗ γ) − β ⊗ γ] = Alt(β ⊗ γ) − Alt(β ⊗ γ) = 0, o Lema


anterior nos dá,
0 = Alt {α ⊗ [Alt(β ⊗ γ) − β ⊗ γ]} = Alt [α ⊗ Alt(β ⊗ γ)] − Alt(α ⊗ β ⊗ γ),
donde
Alt [α ⊗ Alt(β ⊗ γ)] = Alt(α ⊗ β ⊗ γ).

Analogamente,
Alt [Alt (α ⊗ β) ⊗ γ] = Alt(α ⊗ β ⊗ γ),

donde a tese.

(b) Temos,
(p + q + r)!
(α ∧ β) ∧ γ = Alt [(α ∧ β) ⊗ γ] =
(p + q)! r!

(p + q + r)! (p + q)!
= · Alt [Alt(α ⊗ β) ⊗ γ] =
(p + q)! r! p! q!

(p + q + r)!
= Alt(α ⊗ β ⊗ γ),
(p! q! r!
e analogamente para α ∧ (β ∧ γ), donde a igualdade.

117
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Proposição 8.7. Seja (e1 , . . . , en ) uma base do espaço vetorial real V e seja
p
(e∗1 , . . . , e∗n ) a base dual associada. Todo elemento ω ∈ ∧ V ∗ se escreve, de modo
único, na forma
ai1 i2 ...ip e∗i1 ∧ . . . ∧ e∗ip ,
X
ω=
1≤i1 <...<ip ≤n

onde ai1 ...ip ∈ R, ou seja, os elementos e∗i1 ∧ . . . ∧ e∗ip correspondentes a todas as


sequências crescentes 1 ≤ i1 < . . . < ip ≤ n de p inteiros, formam uma base para
p
∧ V ∗.

p n
Dem. Se v1 , . . . , vp são vetores de V e ω ∈ ∧ V ∗ , então vj = vij ei ,
P
i=1
1 ≤ j ≤ p, e temos
Ç å
n n
ω(v1 , . . . , vp ) = ω vi1 1 ei1 , . . . , vip p eip =
P P
i1 =1 ip =1
n
= vi1 1 . . . vip p ω(ei1 , . . . , eip ) =
P
i1 ,...,ip =1
n
= ai1 . . . aip vi1 1 . . . vip p ,
P
i1 ,...,ip =1

onde ai1 ...ip = ω(ei1 , . . . , eip ). Como ω é alternada, temos ω(vσ(1) , . . . , vσ(p) ) =
= ε(σ)ω(v1 , . . . , vp ) e, portanto, aiσ(1) ...iσ(p) = ε(σ)ai1 ... ip . Além disso, ai1 ... ip = 0
toda vez que dois dos inteiros i1 , . . . , ip são iguais . Basta, então, considerar o
caso em que estes inteiros são distintos. Se gruparmos o conjunto dos p! termos
que se deduzem uns dos outros por uma permutação de {i1 , . . . , ip }, obteremos
Ç å
ω(v1 , . . . , vp ) = ai1 ...ip ε(σ)vi1σ(1) . . . vip σ(p) .
P P
1≤i1 <...<ip ≤n σ∈Sp

Por outro lado,

(e∗i1 ∧ . . . e∗ip )(v1 , . . . , vp ) = p! Alt(e∗i1 ⊗ · · · ⊗ e∗ip )(v1 , . . . , vp ) =


= ε(σ)e∗i1 (vσ(1) ) · · · e∗ip (vσ(p) ) = ε(σ)viσ(1) · · · vipσ(p) .
P P
σ∈Sp σ∈Sp

118
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Portanto,
ai1 . . . aip e∗i1 ∧ . . . ∧ e∗ip ,
X
ω=
1≤i1 <...<ip ≤n

e esta representação é única pois ai1 ···ip = ω(ei1 , . . . , eip ).


p
Corolário 8.1. Se p > n = dim V , então ∧ V ∗ = 0. Se p = n, todo elemento de
n n
e∗n , com
∧ V ∗ é da forma ae∗1 ∧ . . .Ñ é a ∈ R e, então, dim ∧ V ∗ = 1. A dimensão
p n n!
de ∧ V ∗ , para p ≤ n, é = .
p p!(n − p)!

Proposição 8.8. Se f ∈ Ap (V, W ) e v1 , . . . , vp são vetores linearmente depen-


dentes em V , então f (v1 , . . . , vp ) = 0.

Dem. Existe i ∈ {1, . . . , p} tal que vi = λj vj , λj ∈ R. Então, f (v1 , . . . , vi , . . . , vp ) =


P
j6=i
λj f (v1 , . . . , vj , . . . , vp ) = 0 pois f é alternada.
P
j6=i

8.2 Determinantes

Se V e W são espaços vetoriais reais, toda T : V → W linear, induz aplicação


p p
linear T ∗ : ∧ W ∗ → ∧ V ∗ definida por (T ∗ ω) (v1 , . . . , vp ) = ω(T v1 , . . . , T vp ), onde
p
ω ∈ ∧ W ∗ e v1 , . . . , vp são vetores de V .

Se S : U → V e T : V → W são lineares, é fácil ver que (T ◦ S)∗ =


= S ∗ ◦ T ∗.

Definição 8.8. Seja T : V → V um operador linear, n = dim V . Então,


n n n
dim ∧ V ∗ = 1 e T ∗ : ∧ V ∗ → ∧ V ∗ é da forma T ∗ (ω) = aω, onde a ∈ R
n
e ω ∈ ∧ V ∗ . Dizemos que este número a é o determinante do operador T , e
escrevemos a = det T . Assim, det T é o número real tal que ω(T v1 , . . . , T vn ) =
n
= det T · ω(v1 , . . . , vn ) para todo ω ∈ ∧ V ∗ e v1 , . . . , vn em V , arbitrários.

119
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Proposição 8.9. Seja V um espaço vetorial real de dimensão n.

(a) Se I : V → V é a identidade, então det I = 1.

(b) Se S : V → V e T : V → V são lineares, então det(S ◦ T ) = det S. det T .

(c) O operador linear T : V → V é invertível se, e só se, det T 6= 0.

n
Dem. Para todo ω ∈ ∧ V ∗ e v1 , . . . , vn em V , arbitrários, temos:

(a) ω(Iv1 , . . . , Ivn ) = ω(v1 , . . . , vn ), donde det I = 1.

(b) det(S ◦ T ).ω(v1 , . . . , vn ) = ω(ST v1 , . . . , ST vn ) = det S.ω(T v1 , . . . , T vn ) =


= det S. det T.ω(v1 , . . . , vn ), donde det(S ◦ T ) = det S. det T .

(c) Se T é invertível, então det T. det T −1 = det I = 1, donde det T 6= 0 . Re-


ciprocamente, seja det T 6= 0. Se (v1 , . . . , vn ) é base de V , consideremos
n
ω ∈ ∧ V ∗ tal que ω(v1 , . . . , vn ) 6= 0. Então, ω(T v1 , . . . , T vn ) =
= det T.ω(v1 , . . . , vn ) 6= 0, donde T v1 , . . . , T vn são linearmente independentes
e, portanto, T é invertível.

Definição 8.9. Seja A = (aij )1≤i ,j≤n uma matriz quadrada real. Se TA : Rn → Rn
é a transformação linear cuja matriz, relativamente à base canônica (e1 , . . . , en ) de
Rn , é A, definimos det A como sendo det TA .
n
Se ω ∈ ∧(Rn )∗ é a n-forma tal que ω(e1 , . . . , en ) = 1, então

n n
!
X X
det A = ω(TA e1 , . . . , TA en ) = ω ai1 ei , . . . , ain ei = ω(A1 , . . . , An ),
i=1 i=1

onde A1 , . . . , An , são os vetores-coluna de A. Assim, det : M (n, R) → R é a


única função n-linear alternada dos vetores-coluna de uma matriz, cujo valor na

120
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

identidade é igual a 1. Observemos que se (e∗1 , . . . , e∗n ) é a base de (Rn )∗ dual de


(e1 , . . . , en ), então

1 X 1
Alt(e∗1 ⊗ . . . ⊗ e∗n )(e1 , . . . , en ) = ε(σ)e∗1 (eσ(1) ) . . . e∗n (eσ(n) ) = ,
n! σ∈Sn n!

ou seja ω = n! Alt(e∗1 ⊗ . . . ⊗ e∗n ). Resulta,

ε(σ)e∗1 (Aσ(1) ) . . . e∗n (Aσ(n) ) =


X X
det A = ω(A1 , . . . , An ) = ε(σ)a1σ(1) · · · anσ(n) ,
σ∈Sn σ∈Sn

o que nos dá a definição clássica de det A, A = (aij ) − n × n.

Corolário 8.2. Se ω1 , . . . , ωn são formas lineares em V , isto é, elementos de V ∗ ,


e v1 , . . . , vn são vetores em V , então

(ω1 ∧ . . . ∧ ωn )(v1 , . . . , vn ) = det(ωi (vj )).

Dem. Temos:

(ω1 ∧ . . . ∧ ωn )(v1 , . . . , vn ) = n! Alt(ω1 ⊗ . . . ⊗ ωn )(v1 , . . . , vn ) =


= ε(σ)ω1 (vσ(1) ) . . . ωn (vσ(n) ) = det(ωi (vj )) .
P
σ∈Sn

Proposição 8.10. As formas lineares ω1 , . . . , ωn em V são linearmente dependen-


tes se, e só se, ω1 ∧ . . . ∧ ωn = 0.

n
Dem. Seja f (ω1 , . . . , ωn ) = ω1 ∧ . . . ∧ ωn . Então, f ∈ An (V ∗ , ∧ V ∗ ). Logo, pela
Proposição 8.8, se ω1 , . . . , ωn são linearmente dependentes, temos f (ω1 , . . . , ωn ) = 0.

Se ω1 , . . . , ωn são linearmente independentes, existem vetores v1 , . . . , vn em


V tais que ωi (vj ) = δij , donde det(ωi (vj )) = 1 e, portanto, ω1 ∧ . . . ∧ ωn 6= 0 .

121
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Obs. Quando V é um espaço vetorial de dimensão finita n, sabemos que J : V → V ∗∗ ,


J(v) · ϕ = ϕ(v), v ∈ V , ϕ ∈ V ∗ , é um isomorfismo canônico, de modo que pode-
p p
mos identificar V com V ∗∗ . Com esta identificação, Ap (V ∗ , R) = ∧ V ∗∗ = ∧ V
p
é a p-ésima potência exterior de V . Um elemento ϕ ∈ ∧ V é uma aplica-
p
ção ϕ : V ∗ × . ˘. . ×V ∗ −→ R que é p-linear alternada. Se v1 , . . . , vp estão
p
em V , então v1 ∧ . . . ∧ vp ∈ ∧ V é tal que, para ω1 , . . . , ωp em V ∗ , se tem
(v1 ∧ . . . ∧ vp )(ω1 , . . . , ωp ) = det(vi (ωj )) = det(ωj (vi )). É usual a notação hω, vi
p
para indicar ω(v) ou v(ω). Os elementos de ∧ V são chamados de p-vetores.

Consideremos a soma direta externa

n p p
0 1 n X
∧V = ∧ V ⊕ ∧ V ⊕ · · · ⊕ ∧ V = ∧ V = ⊕ ∧ V,
p=0 p≥0

2 n
onde n = dim V , isto é, ∧V = R⊕V ⊕ ∧ V ⊕· · ·⊕ ∧ V . Cada z ∈ ∧V se escreve,
i
de modo único, na forma z = z0 + z1 + · · · + zn , onde zi ∈ ∧ V . Definimos a
aplicação bilinear
∧ : ∧V × ∧V −→ ∧V
(z, ω) 7−→ z ∧ ω

por (z ∧ ω) = (z0 + z1 + · · · + zn ) ∧ (ω0 + ω1 + · · · + ωn ) = z0 ∧ ω0 + (z1 ∧ ω0 + z0 ∧


∧ω1 ) + · · · + zn ∧ ωn .

Com este produto ∧, o espaço vetorial ∧V se torna uma álgebra e tem o nome
de álgebra exterior de V ou álgebra de Grassmann de V . Uma base (e1 , . . . , en ) de V
determina uma base de ∧V formada pelos elementos ei1 ∧ . . . ∧ eip = eI onde I =
{i1 < i2 < . . . < ip } percorre todos os subconjuntos "crescentes" de {1, 2, . . . , n}
com p elementos e eI = 1 se I = ø. Logo, dim ∧V = 2n = 2dim V .

122
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

8.3 Produto Interior


p
Definição 8.10. Sejam v∈V e ω ∈ ∧ V ∗ . Definimos o produto interior de ω
p−1
por v como sendo iv (ω) ∈ ∧ V ∗ tal que iv ω(v1 , . . . , vp−1 ) = ω(v, v1 , . . . , vp−1 )
quaisquer que sejam v1 , . . . , vp−1 em V .
p p−1
Proposição 8.11. O produto interior i : V × ∧ V ∗ −→ ∧ V ∗ tem as seguintes
propriedades:

(a) iv1 +v2 (ω) = iv1 (ω) + iv2 (ω);

(b) iav (ω) = aiv (ω);

(c) iv (α1 + α2 ) = iv (α1 ) + iv (α2 );

(d) iv (aω) = aiv (ω);


p
(e) iv (ω1 ∧ . . . ∧ ωp ) = ci ∧ . . . ∧ ωp ;
(−1)i+1 ωi (v).ω1 ∧ . . . ∧ ω
P
i=1

(f ) iv (α ∧ β) = iv (α) ∧ β + (−1)p α ∧ iv (β);

(g) iv1 (iv2 (ω)) = −iv2 (iv1 (ω)),

q
quaisquer que sejam v, v1 , v2 , ∈ V ; ω1 , ω2 , . . . , ωp ∈ V ∗ ; β ∈ ∧V ∗ ; a ∈ R ;
p
ω, α, α1 , α2 ∈ ∧ V ∗ .

Dem. (a),(b),(c),(d) são imediatas.

(e) iv (ω1 ∧ . . . ∧ ωp )(v1 , . . . , vp−1 ) = (ω1 ∧ . . . , ∧ωp )(v, v1 , . . . , vp−1 ) =


p
= [v∧(v1 ∧. . .∧vp−1 )](ω1 , . . . , ωp ) = (−1)i+1 hv, ωi i(v1 ∧. . .∧vp−1 )(ω1 , . . . , ω
ci , . . . , ωp ) =
P
i=1
p
= ci , . . . , ωp )(v1 , . . . , vp−1 ) para
(−1)i+1 ωi (v)(ω1 , . . . , ω v1 , v2 , . . . , vp−1 em V , ar-
P
i=1
bitrários.

123
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

p
Portanto, iv (ω ∧ . . . ∧ ωp ) = (−1)i+1 ωi (v)(ω1 ∧ . . . ∧ ω
ci ∧ . . . ∧ ωp ).
P
i=1

(f ) Basta provar no caso em que α e βsão da forma α = α1 ∧ . . . ∧ αp e


β = αp+1 ∧ . . . ∧ αp+q , onde αi ∈ V ∗ , 1 ≤ i ≤ p + q. Neste caso, temos:

p+q
iv (α ∧ β) = (−1)i+1 αi (v).α1 ∧ . . . ∧ α
ci ∧ . . . ∧ αp+q =
P
i=1
p
= (−1)i+1 αi (v).α1 ∧ . . . ∧ α
ci ∧ . . . ∧ αp ∧ . . . ∧ αp+q +
P
i=1
p+q
+(α1 ∧ . . . αp ) ∧ (−1)j+1 αj (v).αp+1 ∧ . . . ∧ α
cj ∧ . . . ∧ αp+q =
P
j=p+1
Å p ã
i+1
= (−1) αi (v).α1 ∧ . . . ∧ α
ci ∧ . . . ∧ αp ∧ (αp+1 ∧ . . . ∧ αp+q )+
P
i=1
q
+(−1)p (α1 ∧ . . . ∧ αp ) ∧ (−1)j+1 αp+j (v).αp+1 ∧ . . . ∧ αp+j ∧ . . . ∧ αp+q =
P

j=1

= iv (α) ∧ β + (−1)p α ∧ iv (β).

(g) iv1 (iv2 (ω))(v3 , . . . , vp ) = ω(v2 , v1 , v3 , . . . , vp ) = −ω(v1 , v2 , v3 , . . . , vp ) =


= −iv2 (iv1 (ω))(v3 , . . . , vp ) quaisquer que sejam v3 , . . . , vp em V , donde a tese.

8.4 Exercícios do Capítulo 8

1. Sejam f = a1 e∗1 + · · · + an e∗n , g = b1 e∗1 + · · · + bn e∗n , onde (e∗1 , . . . , e∗n ) é a


base dual da base canônica de Rn , e ω = f ∧g = ωij e∗i ∧ e∗j . Prove que
P
i<j



ωij ωik ωil



aj ak al = 0 (i, j, k, l = 1, . . . , n).



bj bk bl

2. Sejam (v1 , . . . , vr ) e (v10 , . . . , vr0 ) bases ordenadas do subespaço V ⊂ Rn .


Prove que existe c ∈ R tal que v10 ∧ . . . ∧ vr0 = cv1 ∧ . . . ∧ vr .

p
3. α ∈ ∧ V é decomponível se existem v1 , . . . , vp ∈ V tais que α = v1 ∧ . . . ∧ vp .

124
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

Prove:

(a) Se α é decomponível então α ∧ α = 0.

(b) e1 ∧ e2 + e3 ∧ e4 não é decomponível, onde (e1 , . . . , en ) é a base canônica


do Rn .

4. (Lema de Cartan) Sejam V um espaço vetorial real de dimensão n, v1 , . . . , vr ∈ V


r r
e ω1 , . . . , ωr ∈ V tais que vj ∧ ωj = 0. Prove que ωj = aij vi , onde
P P
j=1 i=1
aij = aji , 1 ≤ j ≤ r.

5. Sejam V um espaço vetorial real de dimensão n, x = v1 ∧. . .∧vr , y = u1 ∧ . . . ∧ ur ,


v1 , . . . , vr , u1 , . . . , ur ∈ V . Prove que x = y se, e só se, existe matriz
r
r × r − A = (aij )− tal que uj = aij vi e det A = 1.
P
i=1

6. Sejam V um espaço vetorial real de dimensão n e W ⊂ V um subespaço de


dimensão r. Se (ω1 , . . . , ωr ) é base ordenada de W e z = ω1 ∧ . . . ∧ ωr , prove
que W = {v ∈ V ; v ∧ z = 0}.

7. Duas sequências (u1 , . . . , ur ) e (v1 , . . . , vr ) de vetores do espaço vetorial


real V geram o mesmo subespaço W se, e só se, existe λ ∈ R tal que
u1 ∧ . . . ∧ ur = λv1 ∧ . . . ∧ vr .

8. Sejam V um espaço vetorial real de dimensão n e v1 , . . . , vr vetores L. I. de


V. Prove que W = {v ∧ v1 ∧ . . . ∧ vr ; v ∈ V } é um subespaço de dimensão
r+1
(n − r) de ∧ V .

9. Sejam v1 , . . . , v2r vetores L.I. do espaço vetorial real V e z = v1 ∧ v2 + v3 ∧


r
∧v4 + · · · + v2r−1 ∧ v2r . Prove que z r = z∧ . ˘. . ∧z = r!v1 ∧ . . . ∧ v2r .

125
CAPÍTULO 8. ÁLGEBRA EXTERIOR

10. Seja (e1 , . . . , en ) base ordenada do espaço vetorial real V e (e∗1 , . . . , e∗n ) a
n n
base dual . Se f = ai e∗i e g = bij e∗i ∧ e∗j , com bij = −bji , prove que
P P
i=1 i,j=1
n
iek (f ) = ak e iek (g) = bkj e∗j .
P
j=1

11. Sejam α1 , . . . , αp 1-formas linearmente independentes em Rn . Se α é 1-forma


tal que α ∧ α1 ∧ . . . ∧ αp = 0, mostre que α é combinação linear de α1 , . . . , αp
e, neste caso , que existe (p − 1)-forma β tal que α1 ∧ . . . ∧ αp = α ∧ β.

12. Seja (e1 , . . . , en ) base ordenada do espaço vetorial real V e (e∗1 , . . . , e∗n ) a
n
base dual. Se ω = aijk e∗i ∧ e∗j ∧ e∗k , v = vi ei , e iv ω =
P P
i<j<k i=1
n
= bjk e∗j ∧ e∗k , prove que bjk = vi aijk .
P P
j<k i=1

126
Capítulo 9

Formas Diferenciais

Começamos este capítulo introduzindo a noção fundamental de r−forma di-


ferencial numa variedade diferencial M m . Achamos sua expressão local e definimos
sua diferencial exterior (que generaliza a diferencial de uma função f : M −→ R).
Estudamos as variedades com bordo e o conceito de orientação, introduzimos a no-
ção de integral de uma m−forma contínua de suporte compacto em uma variedade
orientada e , dentre outros, demonstramos os teoremas de Stokes, Brouwer diferen-
ciável, Poincaré-Brouwer, e o Lema de Poincaré. A seguir mostramos como se pode
integrar uma função f : M −→ R quando M é uma variedade riemaniana, e pro-
vamos que toda função harmônica numa variedade riemaniana compacta, conexa,
orientada, é constante. Terminamos o capítulo estudando o grau de uma aplicação,
e calculamos o grau da aplicação normal de Gauss de uma hipersuperficie compacta
do Rn .

127
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

9.1 Generalidades

Definição 9.1. Seja M m uma variedade diferencial de classe C k , k ≥ 1. Uma


forma diferencial de grau r, ou uma r-forma, em M , é uma aplicação
r
p ∈ M 7−→ ω(p) ∈ ∧ Mp∗ , onde Mp∗ = (Tp M )∗ é o espaço cotangente a M em p.
Por exemplo, uma forma de grau 0 é simplesmente uma função f : M → R. Se
r
ω(p) ∈ ∧ Mp∗ e v1 , . . . , vr ∈ Tp M , então ω(p)(v1 , . . . , vr ) é também representado
por ω(p; v1 , . . . , vr ).

Definição 9.2. Sejam M m e N n variedades e f : M → N de classe C 1 . Se ω é


uma r−forma em N , definimos a r−forma (f ∗ ω) em M por

(f ∗ ω) (p; v1 , . . . , vr ) = ω (f (p); f 0 (p)v1 , . . . , f 0 (p) · vr ) ,

onde v1 , . . . , vr ∈ Tp M . A forma f ∗ ω é a imagem inversa de ω por f (ou o "pull


back" de ω por f ).

Se ω é forma diferencial de grau r em M e x : U → Rm é uma carta em torno


∗ ∗
de p ∈ M , então (x−1 ) (ω) é uma r− forma em x(U ). Logo, (x−1 ) (ω)(x(p)) =
= ai1 ...ir (x(p))ui1 ∧. . .∧uir , onde ui : Rm → R é a i-ésima forma coordenada
P
i1 <...<ir
e ai1 ...ir : x(U ) → R. Pondo bi1 ...ir = ai1 ...ir ◦ x : U → R, xi = ui ◦ x : U → R,
ti = x0 (p)vi , onde vi ∈ Tp M , obtemos d xi (p) = ui ◦ x0 (p) para todo p ∈ U,
e ω(p; v1 , . . . , vr ) = ω(p; x0 (p)−1 · t1 , . . . , x0 (p)−1 · tr ) = (x−1 )∗ (x(p); t1 , . . . , tr ) =
= bi1 ...ir (p)d xi1 (p) ∧ . . . ∧ dxir (p)(v1 , . . . , vr ) .
P
i1 <...<ir

Logo, ω = bi1 ...ir dxi1 ∧ . . . ∧ dxir , que é a expressão de ω na carta


P
i1 <...<ir
x : U → Rm .

128
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Seja y : V → Rm outra carta em torno de p ∈ M . Então, ω = cj1 ...jr dyj1 ∧


P
j1 <...<jr
∧ . . . ∧ dyjr .
Ç å
∂yi m ∂yi
Temos: yi = ui · (y · x ) · x, donde dyi =
−1
dxj , onde (p) éa
P
j=1 ∂xj ∂xj
matriz jacobiana de (y · x−1 ) no ponto x(p) . Portanto,

m ∂yj1 ∂yjr
dyj1 ∧ . . . ∧ dyjr = ··· dxi1 ∧ . . . ∧ dxir =
P
i1 ,...,ir =1 ∂xi1 ∂x! ir
∂yj1 ∂yjr
= ε(σ) ... dxi1 ∧ . . . ∧ dxir =
P P
i1 <...,<ir σ∈Sr ∂xσ(i1 ) ∂xσ(ir )
∂(yj1 , . . . yjr )
= dxi1 ∧ . . . ∧ dxir ,
P
i1 <...<ir ∂(xi1 , . . . , xir )

∂yJ
que também se escreve: dyJ = dxI .
P
I ∂xI
∂yJ
Portanto, ω = cj1 ...jr d yj1 ∧ . . . ∧ dyjr = cJ dyJ = dxI = cJ
P P P P
j1 <...<jr J J I ∂xI
P ∂yJ ∂(yj1 , . . . yjr )
= bI dxI . Resulta, bI = cJ ; , ou seja, bi1 ...ir = cj1 ...jr ,
P P
I J ∂xI j1 <...<jr ∂(xi1 , . . . , xir )
expressão que mostra que, se s < k , cj1 ...jr ∈ C s implica bi1 ...ir ∈ C s .

Definição 9.3. Seja M uma variedade de classe C k e ω uma r−forma diferencial


em M . Se, numa vizinhança coordenada U , ω = ai1 ...ir dxi1 ∧ . . . ∧ dxir ,
P
i1 <...<ir
dizemos que ω ∈ C s , s < k, se as funções reais ai1 ,...,ir são de classe C s .

As operações sendo definidas ponto a ponto, o conjunto Ωsr (M ) das r− formas


diferenciais de classe C s em M é um espaço vetorial real. Se α ∈ Ωsr (M ) e
β ∈ Ωsq (M ) então, para cada p ∈ M , temos que α(p) ∧ β(p) é um elemento de
r+q
∧ Mp∗ . A aplicação p 7→ α(p) ∧ β(p) é de classe C s ; é o produto exterior α ∧ β
das formas α e β. Assim,

1 X
(α∧β)(p; v1 , . . . , vq+r ) = ε(σ)α(p; vσ(1) , . . . , vσ(r) )·β(p; vσ(r+1) , . . . , vα(r+q) )
q!r! σ∈Sq+r

129
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Se f : M → R é de classe C s , isto é, f ∈ Ωso (M ), e ω ∈ Ωsr (M ), então


f ∧ ω = f ω é a r− forma definida por f ω(p; v1 , . . . , vr ) = f (p) · ω(p; v1 , . . . , vr ),
quaisquer que sejam v1 , . . . , vr ∈ Tp M.

Obs. Ωs (M ) = Ωsr (M ) é a álgebra das formas diferenciais de classe C s em


L
r≥0
M m . Todo elemento ω ∈ Ωs (M ) é da forma ω = ω0 + ω1 + . . . + ωm , onde
ωi ∈ Ωsi (M ) e m = dim M . Ωsr (M ) é um módulo sobre o anel Ωs0 (M ) = C s (M, R)
das funções numéricas de classe C s em M .

9.2 Diferencial Exterior

Definição 9.4. Seja ω ∈ Ωkr (M ). Se a expressão local de ω é ω = aI dxI ,


P
I
I = {i1 < . . . < ir }, definimos sua diferencial exterior dω ∈ Ωk−1
r+1 (M ) por

dω = daI ∧ dxI = dai1 ...ir ∧ dxi1 ∧ . . . ∧ dxir =


P P
I i1 <...<ir
n ∂ai1 ...ir
= dxj ∧ dxi1 ∧ . . . ∧ dxir .
P P
i1 <...<ir j=1 ∂xj

Proposição 9.1. Seja M uma variedade de classe C k+1 . Então:

(a) d(α + β) = dα + dβ;

(b) df = f 0 ;

(c) d(α ∧ ω) = dα ∧ ω + (−1)r α ∧ dω;

(d) d2 (γ) = d(dγ) = 0 para toda γ ∈ Ωk+1


r (M ),
quaisquer que sejam α ∈ Ωkr (M ) , β ∈ Ωkr (M ), f ∈ Ωk0 (M ), ω ∈ Ωkq (M ),
sendo k ≥ 1.

130
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Dem. Os cálculos serão feitos num mesmo sistema de coordenadas x : U → Rm


em M . (a) e (b) são imediatos.

Para provar (c), sejam α = aI dxI e ω = bJ dxJ .


P P
I J

Então, α ∧ ω = aI bJ dxI ∧ dxJ e d(α ∧ ω) = (bJ daI + aI dbJ )∧


P P

Å I,J ã Å ã Å I,J ã Å ã
r
∧dxI ∧ dxJ = d aI ∧ d xI ∧ bJ d xJ + aI (−1) d xI ∧ dbJ ∧ d xJ =
P P P P
I J I J
r
= dα ∧ ω + (−1) α ∧ d ω .

(d) Basta considerar o caso em que γ = ad xi1 ∧ . . . ∧ d xir = ad xI . Então,

m ∂a
dγ = d a ∧ d xI = dxj ∧ dxi1 ∧ . . . ∧ dxir , e
P
j=1 ∂xj
∂ 2a
m P
m
d2 γ = d xk ∧ d xj ∧ d xi1 ∧ . . . ∧ d xir =
P
j=1 k=1 ∂xk ∂xj
∂ 2a ∂ 2a
Ç å
= − d xj ∧ d xk ∧ d xi1 ∧ . . . ∧ d xir = 0,
P
j<k ∂xj ∂xk ∂xk ∂xj

∂ 2a ∂ 2a
pois a ∈ C 2 implica = . Logo : d2 = 0.
∂xj ∂xk ∂xk ∂xj
Vamos mostrar agora que a definição de d independe da carta, isto é, se
x : U → Rm e y : V → Rm são cartas em torno de p ∈ M , então dx ω = dy ω.
De fato, se ω = aK d xK = bL d yL , então
P P
K L

Ç å
∂xK
dy ω = d bL ∧ d yL = d aK ∧ d yL =
P PP
L L K Ç ∂yL å
P ∂xK ∂xK
= d aK ∧ dyL + aK d ∧ d yL =
P
L,K ∂yL L,K ∂yL
= daK ∧ dxK + aK d (d xK ) = daK ∧ dxK = dx ω,
P P P
K K K

e a diferencial exterior dω é uma (r+1)−forma de classe C k definida em M ∈ C k+1 ,


k ≥ 1.

131
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Exemplo 9.2.1. Seja ω = P d x + Qd y + Rd z em R3 , os coeficientes sendo de


classe C k . Então,
Ç å
∂R ∂Q
dω = dP ∧ dx + dQ ∧ dy + dR ∧ dz = − d y ∧ d z+
Ç å Ç ∂y å ∂z
∂P ∂R ∂Q ∂P
+ − dz ∧ dx + − dx ∧ dy,
∂z ∂x ∂x ∂y

ou seja, se ω corresponde ao campo de vetores ω


~ = (P, Q, R), então d ω corresponde
ao campo rot ω
~.
r
Exemplo 9.2.2. Sejam U um aberto do Rn e ω ∈ Ωkr (U ), isto é, ω : U → ∧(Rn )∗ .
Se ω = ai1 ...ir d xi1 ∧ . . . ∧ d xir , se v ∈ Rn , e se p ∈ U , então
P
i1 ,...,ir

ω 0 (p) · v =
X Ä 0 ä
a i1 ...ir (p) · v d xi1 ∧ . . . ∧ d xir .
i1 ,...,ir

Ora,

d ω(p; v1 , . . . , vr+1 ) = d ai1 ...ir (p) ∧ dxi1 ∧ . . . ∧ d xir (v1 , . . . , vr+1 ) =


P
i1 ,...,ir
P r+1
= (−1)j+1 (a0i1 ...ir (p) · vj )(d xi1 ∧ . . . ∧ d xir )(v1 , . . . , vcj , . . . , vr+1 ) =
P
i1 ,...,ir j=1
r+1
= (−1)j+1 (ω 0 (p) · vj )(v1 , . . . , vcj , . . . , vr+1 ),
P
j=1

r+1
fórmula que relaciona a diferencial exterior d ω : U → ∧ (Rn )∗ com a derivada
r
usual ω 0 : U → L(Rn , ∧(Rn )∗ ).

Obs. Consideremos agora f : M m → N n de classe C k+1 e ω ∈ Ωkr (N ). Se


a expressão local de ω no sistema de coordenadas y : V → Rn , f (p) ∈ V , é
ω= aK dyK e x : U → Rn , p ∈ U , é carta em M , então
P
K

Ç å

X ∂yK
f ω= (aK ◦ f ) d xL ,
L,K ∂xL

132
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Ç å
∂yK ∂ (yk1 , . . . , ykr )
onde = é um subdeterminante do jacobiano da aplicação
∂xL ∂(xl1 , . . . , xlr )
(y ◦ f ◦ x−1 ) no ponto x(p). Esta expressão de f ∗ ω mostra que ω ∈ C k implica
f ∗ ω ∈ C k , ou seja, f ∗ ω ∈ Ωkr (M ). É fácil ver que:

(a) id∗M ω = ω, onde ω ∈ Ωkr (M );

(b) (g ◦ f )∗ ω = f ∗ · g ∗ (ω), onde f : M → N , g : N → P , ω ∈ Ωkr (P );

(c) f ∗ (α + cβ) = f ∗ (α) + cf ∗ (β), onde c ∈ R, α, β ∈ Ωkr (N ), f : M → N .

Proposição 9.2. Seja f : M m → N n de classe C k+1 . Então:

(a) f ∗ (α ∧ β) = f ∗ (α) ∧ f ∗ (β), onde α ∈ Ωkr (N ) e β ∈ Ωkq (N );

(b) f ∗ (dω) = d(f ∗ ω), onde ω ∈ Ωkr (N ) .

Dem. (a)

f ∗ (α ∧ β)(p; v1 , . . . , vr+q ) = (α ∧ β)(f (p); f 0 (p)v1 , . . . , f 0 (p)vr+q ) =


1
= ε(σ)α(f (p); f 0 (p)vσ(1) , . . . , f 0 (p)vσ(r) ) · β(f (p); f 0 (p)vσ(r+1) , . . .
P
r!q! σ∈Sr+q
1 P
. . . , f 0 (p)vσ(r+q) ) = ε(σ)f ∗ α(p; vσ(1) , . . . , vσ(r) ) · f ∗ β(p; vσ(r+1) , . . . , vσ(r+q) ) =
r!q! σ
= (f ∗ α ∧ f ∗ β) (p; v1 , . . . , vr+q ) ,

quaisquer que sejam v1 , . . . , vr+q em Tp M . Logo, f ∗ α ∧ f ∗ β = f ∗ (α ∧ β). Em


particular, se α = a ∈ Ωk0 (N ) é uma função C k em N , então f ∗ (aβ) =
= f ∗ (a ∧ β) = (f ∗ a) ∧ (f ∗ β) = (a ◦ f )f ∗ β.

(b) Basta considerar o caso em que ω = ad xi1 ∧. . .∧d xir numa carta x : U → Rn
em N . Então, f ∗ dω = f ∗ (da ∧ d xi1 ∧ . . . ∧ d xir ) = f ∗ (da)∧
∧f ∗ (d xi1 ) ∧ . . . ∧ f ∗ (d xir ).

133
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Mas, f ∗ (da)(p; v) = da(f (p))df (p) · v = d(a ◦ f )(p) · v , donde f ∗ (da) =


= d(a ◦ f ) = d(f ∗ a). Em particular, f ∗ (dxi ) = d(xi ◦ f ) = dfi , onde f1 , . . . , f n
são as componentes de x ◦ f . Logo,

f ∗ dω = d(a ◦ f ) ∧ dfi1 ∧ . . . ∧ dfir = d ((a ◦ f )dfi1 ∧ . . . ∧ dfir ) =


= d (f ∗ a ∧ f ∗ dxi1 ∧ . . . ∧ f ∗ dxir ) = d (f ∗ ω) .

Obs. (1) Seja ω ∈ Ωkr (M ) e sejam X1 , . . . , Xr campos de vetores de classe C k


em M . ω(X1 , . . . , Xr ) : M → R é a função tal que ω(X1 , . . . , Xr )(p) =
= ω(p; X1 (p), . . . , Xr (p). Ela é de classe C k (prove!). Se Xk (M ) é o espaço
vetorial dos campos de vetores de classe C k em M , então ω : Xk (M ) × . . . ×
×Xk (M ) → C k (M ) é uma aplicação r-linear alternada.

(2) Sejam X ∈ Xk (M ) e ω ∈ Ωkr . A forma iX (ω) ∈ Ωkr−1 (M ) é definida por


(iX ω) (p) = iX(p) ω(p), ou seja, se v1 , . . . , vr−1 ∈ Tp M temos

(iX ω) (p; v1 , . . . , vr−1 ) = ω (p; X(p), v1 , . . . , vr−1 ) .

(3) De modo análogo ao fibrado tangente a M m ∈ C k , definimos o fibrado


cotangente T ∗M = {p} × (Tp M )∗ = {(p, α)|p ∈ M, α ∈ (Tp M )∗ }. T ∗M
S
p∈M
é uma variedade de dimensão 2m e classe C k−1 . Uma 1-forma diferencial ω de
classe C s , s < k, pode ser definida como uma aplicação ω : M → T ∗M ,
de classe C s , tal que π ◦ ω = idM , onde π : T ∗ M → M é a projeção
π(p, α) = p, ou seja, ω é uma seção de classe C s do fibrado cotangente. Se
x : U → Rm é uma carta em M e π : T ∗ M → M é a projeção, então

134
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

x̄ : π −1 (U ) → x(U ) × (Rm )∗ é uma carta em T ∗ M . Se a expressão


(p, α) 7→ (x(p), α · x0 (p)−1 )
m m 2m ∂xi
local de α é α = ai dxi , então π ∗ α = (ai ◦ π) dx̄j =
P P P
i=1 i=1 j=1 ∂ x
¯j
Ç å
m ∂xi
= (ai ◦ π)dxi , pois a matriz = [Im 0] .
P
i=1 ∂ x̄j 1≤i≤m
1≤j≤2m
A 1− forma λ em T ∗ M , tal que λ(p, α) = π ∗ α, tem o nome de 1−forma de
Poincaré, e é importante no estudo da Mecânica Clássica.

9.3 Orientação

Seja V um espaço vetorial real de dimensão finita n ≥ 1, e seja B o conjunto


das bases ordenadas de V .

Definição 9.5. Duas bases, ξ = (u1 , . . . , un ) e F = (v1 , . . . , vn ) de V são


equivalentes, anotado ξ ∼ F, se o determinante da matriz de passagem de ξ para
F é positivo.
n
Se vj = pij ui , a matriz de passagem de ξ para F é a matriz invertível
P
i=1
P = (pij ), e ξ ∼ F se, e só se, det P > 0. Observemos que P = [I]F
ξ , onde

I : V → V é a identidade.

Proposição 9.3. A relação ξ ∼ F é uma relação de equivalência sôbre B.

Dem. (a) ξ ∼ ξ pois det[I]ξξ = 1 > 0.

(b) ξ ∼ F ⇒ F ∼ ξ: com efeito, se P = [I]F


ξ então P −1 = [I]ξF . Portanto,
det P > 0 ⇔ det P −1 > 0.

(c) ξ ∼ F, F ∼ G ⇒ ξ ∼ G: sejam P = [I]F


ξ e Q = [I]GF as matrizes de
passagem de ξ para F e de F para G, respectivamente. A matriz de passagem

135
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

de ξ para G é R = [I]Gξ = [I]F G


ξ [I]F = P Q. Logo, det R = det P · det Q > O e

ξ ∼ G.

Proposição 9.4. A relação ξ ∼ F determina duas classes de equivalência no


conjunto B das bases ordenadas do espaço vetorial real V .

Dem. Fixemos uma base ξ = (u1 , . . . , un ) de V e seja ξ̄ = (−u1 , u2 , . . . , un ). A


matriz de passagem de ξ para ξ̄ tem determinante igual a −1, ou seja, ξ e ξ̄ estão
em classes distintas, B1 e B2 .

Se F é base arbitrária de V , temos R = [I]F F


ξ = [I]ξ · [I]ξ̄ = P Q, onde
ξ̄

P , Q, R são as matrizes de passagem de ξ para ξ̄, de ξ̄ para F e de ξ para F,


respectivamente. Logo, det R = det P · det Q = − det Q, donde resulta que ou
F ∈ B1 ou F ∈ B2 , ou seja, só existem duas classes de equivalência.

Definição 9.6. Qualquer uma das classes B1 , B2 é dita uma orientação de V . Por-
tanto, V tem duas orientações. Um espaço vetorial orientado é um espaço vetorial
real associado a uma de suas orientações, ou seja, é um par (V, O), onde O é uma
orientação de V . As bases que pertencem à orientação O chamam-se positivas. As
outras são ditas negativas.

Exemplo 9.3.1. O espaço Rn possui uma orientação canônica, que é aquela deter-
minada pela base canônica (e1 , . . . , en ).

Uma outra maneira de se definir orientação do espaço vetorial V é a se-


guinte: Sejam ξ = (u1 , . . . , un ) e F = (v1 , . . . , vn ) bases ordenadas de V , e
n
ω ∈ ∧ V ∗ − {0}.
n
Se vj = pij ui , P = (pij ) é invertível, e ξ ∼ F se, e só se, det P > 0.
P
i=1
Como ω(v1 , . . . , vn ) = det P · ω(u1 , . . . , un ), vemos que ξ ∼ F se, e só se,
ω(v1 , . . . , vn ) e ω(u1 , . . . , un ) têm o mesmo sinal.

136
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

n
Definição 9.7. Dizemos que ω ∈ ∧ V ∗ , ω 6= 0, é positiva se ω(v1 , . . . , vn ) > 0
para toda base positiva F = (v1 , . . . , vn ). Resulta que ω(u1 , . . . , un ) < 0 para toda
base negativa ξ = (u1 , . . . , un ) .
n n
Como dim ∧ V ∗ = 1, se θ ∈ ∧ V ∗, θ 6= 0, então θ = aω para algum
a 6= 0. Portanto, ou θ é positiva ou (−θ) é positiva ; neste último caso dizemos que
n
θ é negativa. Assim, ∧ V ∗ − {0} = B1∗ ∪ B2∗ , onde B1∗ é o conjunto das n−formas
positivas e B2∗ o das negativas. Se θ(v1 , . . . , vn ) > 0, então F = (v1 , . . . , vn ) ∈ Bj
se, e só se, θ ∈ Bj∗ (j = 1, 2) . Resulta que podemos considerar B1∗ e B2∗ como
sendo as orientações de V .

Exemplo 9.3.2. Seja ξ = (e1 , . . . , en ) a base canônica do Rn e seja ξ∗ = (e∗1 , . . . , e∗n )


a base dual. A n−forma e∗1 ∧ . . . ∧ e∗n define a orientação canônica do Rn .

Definição 9.8. Seja M uma variedade de classe C k . Um atlas coerente sobre


M é um atlas A cujas mudanças de coordenadas têm jacobiano positivo, isto é, se
x ∈ A, y ∈ A, então y ◦ x−1 tem jacobiano positivo.

Proposição 9.5. Seja M m uma variedade C k . São equivalentes:

(a) M admite um atlas coerente;

(b) existe em M uma m−forma diferencial contínua diferente de zero em todos os


pontos.

Dem. (a) ⇒ (b) : Seja (Ui )i∈N uma cobertura localmente finita de M por domínios
de cartas xi : Ui → Rm , onde xi pertence ao atlas coerente A de M . Seja
(ϕi )i∈N partição da unidade subordinada a (Ui )i∈N . Em cada Ui temos a m−forma

i , onde xi : Ui → R,
dx1i ∧ . . . ∧ dxm 1 ≤ α ≤ m são as funções coordenadas em
α

137
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS


Ui . Seja ω= i , onde
ϕi dx1i ∧ . . . ∧ dxm i é considerada
ωi = ϕi dx1i ∧ . . . ∧ dxm
P
i=1
∞ ∞
nula fora de Ui e, em cada ponto, a soma ωi é finita. A m− forma ω = ωi
P P
i=1 i=1
∂xαi
!
está definida em M e, como dx1i ∧ . . . ∧ dxm
i = det β 1 , temos
dx11 ∧ . . . ∧ dxm
∂x1
∂xαi
!
∞ s
ωp = (ωi )p = ϕi (p) det 1 )p , onde 1, . . . , s são os índices
(dx11 ∧ . . . ∧ dxm
P P
i=1 i=1 ∂xβ1
i para os quais ϕi (p) 6= 0, e o coeficiente de dx11 ∧ . . . ∧ dxm 1 é positivo. Resulta

que ω é uma m−forma de classe C k−1 diferente de zero em todas os pontos de M .

(b) ⇒ (a) : Seja ω uma m−forma contínua diferente de zero em todos os pontos
de M m . Em cada p ∈ M tomemos como positiva a orientação definida por ωp . Se
x : U → Rm é uma carta local e se, para cada p ∈ U , ωp
Ä ä

∂x1
(p), . . . , ∂x∂m (p) > 0,
isto é, se é base positiva de Tp M , então dizemos que x : U →
Ä ä

∂x1
(p), . . . , ∂x∂m
→ Rm é carta positiva e temos ω = a dx1 ∧ . . . ∧ dxm , onde a : U → R é função
contínua positiva. Se y : V → Rm é carta local arbitrária e V é conexo, então
ω = bdy1 ∧ . . . ∧ dym em V , com b(p) 6= 0 em todos os pontos de V . Assim, ou
b(p) > 0 ou b(p) < 0 em V , ou seja uma carta local num conexo ou é positiva ou
negativa. Se x : U → Rm e y : V → Rm são cartas positivas e U ∩ V 6= ø,
   
então ω = b dy1 ∧ . . . ∧ d ym = b
a
det ∂yi
∂xj
a dx1 ∧ . . . ∧ dxm = b
a
det ∂yi
∂xj
ω, donde
 
∂yi a
det ∂xj
= b
> 0.

Os domínios das cartas positivas cobrem M pois se x : U → Rm pertence ao


atlas de M e é negativa, trocamos x por x̄ : U → Rm , x̄(p) = (−x1 (p), x2 (p), . . . , xm (p))
e obtemos carta positiva. Resulta que o conjunto das cartas positivas formam um
atlas coerente sobre M .

Definição 9.9. Uma variedade diferencial M m de classe C k é orientável se M


satisfaz às condições equivalentes da Proposição 9.5 .

Corolário 9.1. Se M m é orientável e de classe C k , existe em M uma m− forma

138
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

de classe C k−1 que não se anula em M .

Corolário 9.2. Sejam M m uma variedade C k e (Ui )i∈I uma cobertura aberta
de M . Se, para cada i ∈ I, existe uma m− forma ω i definida em Ui tal que
Ui ∩ Uj 6= ø implica ωi = fij ωj com fij > 0 em Ui ∩ Uj , então M é orientável.

Dem. Seja x : U → Rm uma carta local na vizinhança U de um ponto. Tomando


U suficientemente pequena, existe j ∈ I tal que U ⊂ Uj . Dizemos que x é
Ç å
∂ ∂
uma carta positiva se ωj ,..., > 0 em U . Da hipótese resulta que
Ç å ∂x1 ∂xm
∂ ∂
ωi ,..., > 0 para toda Ui tal que U ⊂ Ui . Se y : V → Rn é outra
∂x1 ∂xm
carta positiva em U ∩ V , temos

Ç å Ç å Ç å
∂ ∂ ∂yα ∂ ∂
ωj ,..., = det · ωj ,..., ,
∂y1 ∂ym ∂xβ ∂x1 ∂xm

Ç å
∂yα
de modo que det > 0, isto é, as cartas x e y são coerentes. O conjunto das
∂xβ
cartas positivas formam um atlas coerente em M , ou seja, M é orientável.

Obs. Sejam V um espaço vetorial real, orientado, de dimensão (m + 1), munido


de produto interno h, i, e v1 , . . . , vm ∈ V . A função f : V → R , f (x) =
= detξ (v1 , . . . , vm , x), onde ξ = (e1 , . . . , em+1 ) é base ortonormal positiva de V ,
é linear e, portanto, existe um único u ∈ V , anotado u = v1 × . . . × vm , tal
que f (x) = hu, xi para todo x ∈ V . Este vetor u = v1 × . . . × vm chama-se o
produto vetorial de v1 , . . . , vm ; ele é o único vetor de V que satisfaz às três seguintes
propriedades (veja [17] Capítulo 10):

(i) u ⊥ vj (1 ≤ j ≤ m);

(ii) kuk = volume do paralelepípedo de arestas v1 , . . . , vm ;

139
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

(iii) se v1 , . . . , vm são L.I. então (v1 , . . . , vm , u) é base positiva de V .

Definição 9.10. Seja M m ⊂ Rm+1 uma hipersuperfície de classe C k . Um campo


de vetores normais a M é uma aplicação N : M → Rm+1 tal que N (p) ∈ (Tp M )⊥
para todo p ∈ M . O campo é de classe C r se a aplicação N é de classe C r , onde
0 ≤ r ≤ k.

Exemplo 9.3.3. Se x : U → Rm é uma carta local em M ⊂ Rm+1 , então


∂ ∂
× ··· × é um campo normal de classe C k−1 no aberto U ⊂ M .
∂x1 ∂xm

Proposição 9.6. Seja M m ⊂ Rm+1 uma hipersuperfície de classe C k . M é


orientável se, e só se, existe em M um campo normal contínuo (respectivamente de
classe C k−1 ) que não se anula em M .

Dem. Se M é orientável, existe uma m− forma diferencial contínua (resp. de classe


C k−1 ) ω tal que ωp 6= 0 para todo p ∈ M .

Se x : U → Rm é uma carta em torno de p ∈ M , defina u(p) =


∂ ∂
= (p)×. . .× (p), vetor normal a Tp M . Sejam (e1 , . . . , em+1 ) a base canônica
∂x1 ∂xm
de Rm+1 e F a forma alternada em Rm+1 tal que F (e1 , . . . , em+1 ) = 1. Como
m
dim(∧ Mp∗ ) = 1, resulta que iu(p) F = ωp λu , onde λu ∈ R, λu 6= 0. Assim,
u(p)
N (p) = é tal que iN (p) F = ωp , isto é, ωp (v1 , . . . , vm ) = F (N (p), v1 , . . . , vm ) para
λu
quaisquer v1 , . . . , vM ∈ Tp M . Obtemos, pois , o campo normal p ∈ M 7−→ N (p),
sendo iN F = ω. Resulta que N é contínuo (resp. C k−1 ) (prove!) e Np 6= 0 para
todo p ∈ M . Reciprocamente, seja N : p ∈ M 7−→ N (p) ∈ (Tp M )⊥ um campo
normal contínuo (resp. C k−1 ) em M tal que N (p) 6= 0 para todo p ∈ M . Seja
F como acima e defina ω = iN F . Então ω é m−forma contínua (resp. C k−1 )
(prove!) em M e ωp 6= 0 para todo p ∈ M , e M é orientável.

140
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Exemplo 9.3.4. Seja S n−1 = {x ∈ Rn ; kxk = 1} a esfera unitária do Rn . Se


x ∈ S n−1 sabemos que N (x) = x é um campo de classe C ∞ de vetores unitários
normais a S n−1 , de modo que iN dx1 ∧ . . . ∧ dxn = ω é a forma elemento de volume
de S n−1 . Pela Proposição 8.11 do Capítulo 8, temos:

n
ω=
P d ∧ . . . ∧ dx , donde
(−1)i+1 dxi (N )dx1 ∧ . . . ∧ dx i n
i=1
n
ω= (−1)i+1 xi dx1 ∧ . . . ∧ dx
d ∧ . . . ∧ dx .
P
i n
i=1

x
Exemplo 9.3.5. Seja f : Rn − {0} → S n−1 a projeção radial, . Se f (x) =
kxk
h hh, xi h − cx hh, xi
h ∈ Rn , é fácil ver que f 0 (x) · h = − 3
x= , onde c = éa
kxk kxk kxk kxk2
projeção algébrica de h sobre x.

Por definição o "elemento de ângulo sólido" é a forma α = f ∗ ω, onde ω é o


Ç å
x
elemento de volume de S , isto é, se x ∈ R − {0}, temos ω
n−1 n
=
kxk
n xi d ∧ . . . ∧ dx .
= (−1)i+1 dx1 ∧ . . . ∧ dx
P
i n
i=1 kxk
Portanto, se v1 , . . . , vn−1 ∈ Rn , temos:

Ç å
x
α(x; v1 , . . . , vn−1 ) = ω ; f 0 (x)v1 , . . . , f 0 (x)vn−1 =
kxk

x v1 − c1 x vn−1 − cn−1 x
Ç å
=ω ; ,..., =
kxk kxk kxk
x v1 − c1 x vn−1 − cn−1 x
Ç å
= det , ,..., =
kxk kxk kxk
n
1 1 X
= det(x, v1 , . . . , v n−1 ) = (−1)i+1 xi dx1 ∧ . . . ∧ dx
d ∧ . . . ∧ dx .
i n
kxkn kxkn i=1

1 P n
Logo, α(x) = d ∧ . . . ∧ dx . Se
(−1)i+1 xi dx1 ∧ . . . ∧ dx i n n = 2, temos
kxkn i=1

141
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

−ydx + xdy
α(x, y) = que é o "elemento de ângulo" em R2 − {0} .
x2 + y 2

9.4 Variedades com Bordo

O conjunto H1 = {x = (x1 , . . . , xm ) ∈ Rm ; x1 ≤ 0} é um semi-espaço fechado


em Rm ; seu bordo é ∂H1 = {x ∈ H1 ; x1 = 0}. Os pontos x ∈ H1 tais

H1 x1
0

∂H1

que x1 < 0 formam o interior de H1 , anotado intH1 . Assim , H1 = int H1 ∪ ∂H1 ,


reunião disjunta.

Definição 9.11. Seja X ⊂ Rm um subconjunto arbitrário. f : X → Rn é de


classe C k , k ≥ 1, quando f se estende localmente a uma aplicação de classe C k ,
isto é, quando para cada p ∈ X existe aplicação Fp : Up → Rn de classe C k numa
vizinhança aberta Up de p em Rm , tal que f (x) = Fp (x) para todo x ∈ Up ∩ X .

Proposição 9.7. f : X → Rn é de classe C k em X se, e só se, existem aberto


U ⊂ Rm , X ⊂ U , e função F : U → Rn , de classe C k , tal que f = F |X .

Dem. Para cada p ∈ X existem aberto Up ⊂ Rm , p ∈ Up , e aplicação


Fp : Up → Rn , de classe C k , tal que Fp (x) = f (x) para todo x ∈ Up ∩ X. Seja
U = Up . O aberto U ⊂ Rm é uma variedade C k e a família (Up )p∈X é uma
S
p∈X

142
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

cobertura aberta de U . Seja ϕp = 1 uma partição da unidade estritamente


P
p∈X
subordinada a essa cobertura. Definamos F : U → Rn por F = ϕp Fp , isto é,
P

F (y) = ϕp (y)Fp (y).


P
p∈X

É claro que F ∈ C k e que F (x) = ϕp (y)f (x) = f (x) para todo x ∈ X,


P

donde f = F |X . A reciproca é imediata.

Definição 9.12. f : X → Y , X ⊂ Rm , Y ⊂ Rm é um difeomorfismo de classe


C k se f é bijetora, e f e g = f −1 : Y → X são de classe C k .

Proposição 9.8. Sejam U aberto em H1 , mas não em Rm , e f : U → Rn de


classe C 1 . Seja F : V → Rn uma extensão de classe C 1 de f , definida num
aberto V ⊂ Rm . Para x ∈ U , a derivada F 0 (x) : Rm → Rn só depende de f , e
independe da extensão F .

Rm−1 = ∂H1

R
0 e1

Dem. Seja (e1 , . . . , em ) a base canônica de Rm . Observemos que x+te1 ∈ H1 para


F (x + tej ) − F (x) f (x + tej ) − f (x)
t < 0. Como F 0 (x) · ej = lim = lim , resulta
t→0
t<0
t t→0
t<0
t
que os valores de F 0 (x) dependem apenas de f e não da extensão F . Podemos,
assim, definir f 0 (x) : Rm → Rn como sendo F 0 (x) , qualquer que seja x ∈ H1 .

Proposição 9.9. Sejam U ⊂ Rm aberto, X ⊂ Rm e f : U → X um


difeomorfismo de classe C 1 . Então X é aberto em Rm .

143
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Dem. Seja p ∈ U . Existem aberto V ⊂ Rm , X ⊂ V e aplicação g : V → Rm , de


f g
classe C 1 , tal que g|X = f −1 . Temos U −→ V −→ Rm , g ◦ f = id : U → U ⊂ Rm ,
e a regra da cadeia nos dá g 0 (f (p)) · f 0 (p) = id : Rm → Rm e, portanto, f 0 (p) é in-
vertível. Pelo teorema da função inversa, existem vizinhanças abertas Up de p em
U e Vf (p) de f (p) em V tais que f : Up → Vf (p) seja um difeomorfismo de classe
C 1 . Resulta que Vf (p) ⊂ f (U ) = X , e X é aberto em Rm .

Proposição 9.10. Sejam U e V abertos do semi-espaço H1 e f : U → V um


difeomorfismo de classe C 1 . Então f leva pontos interiores em pontos interiores e
pontos do bordo em pontos do bordo.

Dem. Seja p ∈ U um ponto interior. Existe bola B, aberta em Rm , tal que


p ∈ B. Pela Proposição 9.9 f (B) é aberto em Rm e f (p) ∈ f (B) ⊂ V ⊂ H1 ,
donde f (p) é um ponto interior de H1 . Se p é um ponto do bordo em U ∩ ∂H1 ,
então f −1 (f (p)) = p é um ponto do bordo e, portanto, f (p) não pode ser um ponto
interior; logo, f (p) é um ponto do bordo.

Definição 9.13. Seja M um espaço topológico. Uma carta de dimensão m em M


é um homeomorfismo x : U → H1 de um aberto U ⊂ M sobre um aberto x(U )
do semi-espaço H1 ⊂ Rm . Se y : V → H1 é outra carta em M e U ∩ V 6= ø, as
aplicações y ◦ x−1 : x(U ∩ V ) → y(U ∩ V ) e x ◦ y −1 : y(U ∩ V ) → x(U ∩ V ) são
chamadas de mudanças de coordenadas . Um atlas de dimensão m e classe C k ,
k ≥ 1, é um conjunto A de cartas x : U → H1 de dimensão m, cujos domínios
cobrem M e cujas mudanças de coordenadas são de classe C k .

Obs. Podemos usar, na definição de carta, qualquer semi-espaço fechado de Rm .


O uso de H1 é apenas por conveniência. Alguns autores usam o semi-espaço Hm
dos pontos x = (x1 , . . . , xm ) ∈ Rm tais que xm ≥ 0.

144
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Definição 9.14. Uma variedade diferencial com bordo, de dimensão m e classe


C k , é um espaço topológico de Hausdorff, com base enumerável de abertos, dotado
de um atlas máximo de dimensão m e classe C k . Um ponto p ∈ M é um
ponto interior (respectivamente ponto do bordo) se, em alguma carta x : U → H1 ,
x(p) ∈ int H1 (respectivamente, x(p) ∈ ∂H1 ). Esses conceitos independem da carta
pois se y : V → H1 é outra carta, o difeomorfismo y ◦ x−1 leva x(p) em y(p) e,
pela Proposição 9.10 , x(p) e y(p) são ambos interiores ou ambos pontos do bordo.
O conjunto dos pontos do bordo de M é anotado ∂M .

Obs. É importante não confundir os conceitos de bordo e fronteira. Por exemplo, se


A = {(x, y) ∈ R2 ; x2 + y 2 < 1}, então F rA = {(x, y) ∈ R2 ; x2 + y 2 = 1} = S 1 , ao
passo que ∂A = ø. Se B = {(x, y) ∈ R2 ; x2 + y 2 ≤ 1} , então F rB = ∂B = S 1 .

Proposição 9.11. Se M m é uma variedade com bordo de dimensão m e classe C k ,


seu bordo ∂M é uma variedade (sem bordo ) de dimensão (m − 1) e classe C k .

∂H1 = Rm−1

x
x(p) = (0, x̄(p))

U
H1
p 0 x1

Dem. Sejam x : U → H1 , U ⊂ M , uma carta em M e x̄ = x|U ∩∂M . Como


x aplica pontos do bordo em pontos do bordo, x̄ : U ∩ ∂M → ∂H1 = Rm−1 é uma
carta em ∂M . Se y : V → H1 é outra carta em ∂M , então

145
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

ȳ ◦ (x̄)−1 : x̄ (U ∩ V ∩ ∂M ) → ȳ (U ∩ V ∩ ∂M ) é de classe C k , bem como sua in-


versa x̄·(ȳ)−1 . Assim , um atlas (Ui , xi )i∈I sobre M induz um atlas (Ui ∩ ∂M, x̄i )i∈I
sobre ∂M , tornando ∂M uma variedade de dimensão (m − 1) e classe C k .

Proposição 9.12. Sejam M m uma variedade de dimensão m e classe C k , f : M → R


uma função de classe C k , e 0 (zero) um valor regular de f . O conjunto
N = {q ∈ M ; f (q) ≤ 0} é uma variedade de dimensão m e classe C k , cujo bordo é
∂N = f −1 (0) .

U
p f −1 (o)
V

f
x
R
R
t t
(0, 0)
f ◦ x−1 (ω, t) = t
0
Vo
ω Rm−1
I
W ×I

Dem. O conjunto {q ∈ M ; f (q) < 0} é aberto em M, donde variedade de dimensão


m e classe C k . Seja p ∈ N tal que f (p) = 0. Como f é submersão em p, existe
carta x : U → Rm , p ∈ U ⊂ M , tal que x(U ) = W × I, onde I é um intervalo
aberto de centro 0 e W um aberto de Rm−1 contendo 0 ∈ Rm−1 , x(p) = (0, 0)
e f ◦ x−1 (ω, t) = t. Seja H o semi-espaço de Rm tal que xm ≤ 0, e definamos

146
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

V0 = (W × I) ∩ H e V = x−1 (V0 ). Então, x̄ = x|V : V → V0 é uma carta


no aberto V ⊂ N , com p ∈ V , o que mostra ser N uma variedade com bordo
∂N = f −1 (0).

Exemplo 9.4.1. Seja B = {x ∈ Rm ; kxk ≤ 1} a bola de centro 0 e raio 1 do Rm .


A função f : Rm → R, f (x) = hx, xi − 1 tem derivada f 0 (x) : Rm → R tal que
f 0 (x) · h = 2hx, hi, donde f 0 (x) = 0 se , e só se, x = 0. Como / S m−1
x=0∈
resulta que B é variedade cujo bordo é S m−1 = f −1 (0) = ∂B .

Obs. De modo análogo ao visto para variedades (sem bordo) definem-se, para as va-
riedades com bordo, os conceitos de espaço tangente, aplicação de classe C k entre
duas variedades, orientação, formas diferenciais, etc. Por exemplo, uma orientação
numa variedade com bordo M m , de dimensão m e classe C k , é dada por uma
m−forma de classe C k−1 que não se anula em ponto algum. Para uma variedade
sem bordo esta condição é equivalente à existência de um atlas coerente; isto foi
provado na Proposição 9.5. A mesma demonstração vale para uma variedade com
bordo. No final da demonstração é preciso substituir a carta (U, x1 , . . . , xm ) por
(U, −x1 , x2 , . . . , xm ), o que não é possível no caso n = 1, a não ser que admita-
mos L1 = {x ∈ R; x ≥ 0} como modelo local na definição de uma carta para uma
variedade de dimensão 1 com bordo, o que faremos.

Exemplo 9.4.2. M = [0, 1] é uma variedade com bordo, de classe C ∞ ; ela tem
um atlas formado pelas cartas

x : [0, 1) → (−1, 0] e y : (0, 1] → (−1, 0]


t 7→ x(t) = −t t 7→ y(t) = t − 1

Então, y ◦ x−1 (t) = y(−t) = −t − 1, cuja derivada é negativa, e o atlas não é

147
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

coerente.

Admitindo L1 = {t ∈ R; t ≥ 0} como modelo local e substituindo y por


−y = z : (0, 1] → [0, 1) ⊂ L1 , então z ◦ x−1 (t) = z(−t) = t + 1 e o atlas
t 7→ −t + 1
{x, z} é coerente.

9.5 Orientação no Bordo

Seja M uma variedade com bordo, de dimensão m e classe C k , orientada.

Proposição 9.13. Suponhamos m ≥ 2 e sejam x : U → Rm e y : V → Rm


cartas positivas em M , tais que U ∩ V ∩ ∂M 6= ø. Então,
y ◦ x−1 : B = x(U ∩ V ) ∩ ∂H1 → y(U ∩ V ) ∩ ∂H1 tem derivada positiva.

Dem. Sejam x = (x1 , . . . , xm ) em U e y = (y1 , . . . , ym ) em V . Como y ◦ x−1


leva pontos do bordo em pontos do bordo e pontos interiores em pontos interiores,
temos:

(i) y1 (0, x2 , . . . , xm ) = 0, e

(ii) y1 (x1 , . . . , xm ) < 0 para x1 < 0, onde (x1 , . . . , xm ) ∈ x(U ∩ V ) .

∂y1
Então: (0, x2 , . . . , xm ) = 0 para j = 2, . . . , m, e
∂xj

∂y1 y1 (t, x2 , . . . , xm ) − y1 (0, x2 , . . . , xm ) y1 (t, x2 , . . . , xm )


(0, x2 , . . . , xm ) = lim = lim ≥0
∂x1 t→0
t<0
t t→0
t<0
t

148
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Portanto,


∂y1 
0 ··· 0

 ∂x1 

∂y2 ∂y2 ∂y2  ∂y1
  

 ··· 
 0
J(y ◦ x−1 ) =  ∂x1 ∂x2 ∂xm  
= ∂x1 
.
.. .. .. .. 
   
. . . .  ∗ J(y ◦ x−1 |B )


 
 
 ∂ym ∂ym ∂ym 
···
∂x1 ∂x2 ∂xm

Logo,
∂y1
det J(y ◦ x−1 ) = det J[y ◦ x−1 |B ].
∂x1

Como det J(y ◦ x−1 ) > 0 em todos os pontos de x(U ∩ V ), temos que
∂y1
(0, x2 , . . . , xm ) > 0, donde resulta det J(y ◦ x−1 |B) > 0, como queríamos
∂x1
provar.

Resulta que todo atlas coerente em M induz um atlas coerente em ∂M ; é a


orientação em ∂M induzida pela orientação de M .

Exemplo 9.5.1. A orientação canônica em H1 é dada pela forma dx1 ∧ . . . ∧ dxm ,


e a orientação induzida em ∂H1 = Rm−1 é dada por dx2 ∧ . . . ∧ dxm , m ≥ 2.

Definição 9.15. Seja M m uma variedade com bordo, de dimensão m e classe C k .


Dizemos que um vetor Xp ∈ Tp M "aponta para dentro" se Xp ∈
/ Tp (∂M ) e existem
ε > 0 e curva α : [0, ε) → M de classe C 1 tal que α(0) = p, α ((0, ε)) ⊂ intM , e
α0 (0) = Xp . Um vetor Xp ∈ Tp M "aponta para fora" se −Xp aponta para dentro.


Exemplo 9.5.2. Em H1 , (p) aponta para fora.
∂x1

Proposição 9.14. Xp ∈ Tp M aponta para fora se, e só se, em cada carta x : U → H1 ,


x(p) = 0, o coeficiente de ∂
∂x1
(p) em Xp é positivo.

149
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Dem. Se Xp ∈
/ Tp (∂M ) aponta para fora, existe curva α : [0, ε) → M, α ∈ C 1 , tal
que α(0) = p, α ((0, ε)) ⊂ intM e α0 (0) = −Xp . Seja x : U → H1 carta local tal
que x(p) = 0 e x1 (q) ≤ 0 para cada q ∈ U . Se (x ◦ α)(t) = (α1 (t), . . . , αm (t)),
então x1 (α(0)) = α1 (0) = 0 e α1 (t) < 0 para t > 0. Logo,

α1 (t) − α1 (0)
α10 (0) = lim ≤ 0.
t→0
t>0
t

m ∂ ∂
Como −Xp = (p), o coeficiente de
αi0 (0) (p) em Xp é −α10 (0) ≥ 0
P
i=0 ∂xi ∂x1
/ Tp (∂M ), temos −α10 (0) > 0 .
e , como Xp ∈

Reciprocamente, seja x : U → H1 carta local tal que x(p) = 0 e


m ∂
−Xp = ai (p) com a1 < 0. A curva α(t) = x−1 (a1 t, . . . , am t) é tal que
P
i=1 ∂xi
α(0) = p, α ((0, ε)) ⊂ intM e (x ◦ α)0 (0) = (a1 , . . . , am ), donde α0 (0) = −Xp ,
ou seja, Xp aponta para fora.

Exemplo 9.5.3. Seja M o semi-espaço Hm = {y ∈ Rm ; ym ≥ 0} com a orientação


dada por dy1 ∧ . . . ∧ dym . Apliquemos M = Hm sobre H1 pela carta x1 = −ym ,
x2 = y1 , . . . , xm = ym−1 . A orientação de M é dy1 ∧ . . . ∧ dym = dx2 ∧ . . . ∧ dxm ∧
∧(−dx1 ) = (−1)m dx1 ∧ dx2 ∧ . . . ∧ dxm , donde a orientação em ∂M é (−1)m dx2 ∧
∧ . . . ∧ dxm = (−1)m dy1 ∧ . . . ∧ dym−1 .

Proposição 9.15. Seja M m uma variedade com bordo, de dimensão m e classe


C k . Se p ∈ M , a base ordenada (v2 , . . . , vm ) de Tp (∂M ) define a orientação
de ∂M em p se, e só se, para cada vetor Xp ∈ Tp M , que aponta para fora, a base
(Xp , v2 , . . . , vm ) define a orientação de M em p.

Dem. Seja x : U → H1 carta local tal que x(p) = 0. ω = dx1 ∧ . . . ∧ dxm


define a orientação em U ∩ M , e a orientação em U ∩ ∂M é dx2 ∧ . . . ∧ dxm .

150
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Temos: dx1 ∧ . . . ∧ dxm (Xp , v2 , . . . , vm ) = dx1 (Xp )dx2 ∧ . . . ∧ dxm (v2 , . . . , vm ) já


que dx1 (vj ) = 0, 2 ≤ j ≤ m. Como dx1 (Xp ) > 0 e dx2 ∧ . . . ∧ dxm define a
orientação de ∂M ∩ U , resulta que (Xp , v2 , . . . , vm ) define a orientação de M em
p se, e só se, (v2 , . . . , vm ) define a orientação de ∂M em p.

Definição 9.16. Um campo de vetores ao longo de ∂M é uma aplicação


X : p ∈ ∂M 7−→ Xp ∈ Tp M .

Corolário 9.3. Se ω define a orientação de M e X é um campo de vetores ao longo


de ∂M , que aponta para fora, então iX ω(v2 , . . . , vm ) = ω(Xp , v2 , . . . , vm ), donde
iX ω define a orientação de ∂M .

Exemplo 9.5.4. Sejam M m e N n duas variedades orientadas de classe C k . Seu


produto cartesiano M × N é uma variedade de dimensão (m + n) e classe C k .
Se x : U → Rm é carta em M e y : V → Rn é carta em N , ambas positivas,
então x × y : U × V → Rm+n é carta positiva em M × N . Se x percorre o
atlas coerente de M e y o de N, então as cartas x × y de M × N constituem um
atlas coerente em M × N , que define a orientação produto. Se (p, q) ∈ M × N ,
então T(p,q) M × N = Tp M ⊕ Tq N . Se (u1 , . . . , um ) é base positiva de Tp M e
(v1 , . . . , vn ) é base positiva de Tq N , então (u1 , . . . , um ; v1 , . . . , vn ) é base positiva
de T(p,q) M × N .

Exemplo 9.5.5. Seja M m uma variedade orientada (sem bordo) e I = [0, 1] ori-
entada pelo atlas coerente {α, β} , onde α : [0, 1) → [0, 1) e β : (0, 1] → (0, 1] são
iguais à identidade. Em (t, p) ∈ I ×M , uma base positiva de T(t,p) I ×M = R⊕Tp M ,
na orientação produto, é da forma (e1 , v1 , . . . , vm ), onde e1 = 1 é a base canônica
de R e (v1 , . . . , vm ) uma base positiva de Tp M . No ponto t = 0 o vetor e1 aponta
para dentro e no ponto t = 1 ele aponta para fora, de modo que (v1 , . . . , vm ) é base

151
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

M M0 M1
0 e1 1 e1

negativa em (0, p) ∈ M0 = {0} × M e positiva em (1, p) ∈ M1 = {1} × M , na orien-


tação induzida em ∂(I × M ) = M1 ∪ (−Mo ), onde −M0 indica M0 com a orientação
oposta à vista acima.

9.6 Integração numa Variedade Orientada

Sejam M m uma variedade orientada de dimensão m e classe C 1 , e ω uma


m−forma contínua, definida em M , com suporte compacto. Se S = supp ω
está contido no domínio de uma carta positiva x : U → Rm , então ω(p) =
= a(x(p))dx1 ∧ . . . ∧ dxm , onde a : x(U ) → R é contínua e se anula no exterior
do compacto x(S) ⊂ x(U ) ⊂ Rm , e definimos

Z Z Z Z
ω= ω= (x−1 )∗ ω = a(x1 , . . . , xm )dx1 . . . dxm ,
M U x(U ) x(U )

onde o membro da direita é uma integral múltipla de Riemann.

y : V → Rm outra
R
Para provar que ω independe da carta, seja
M
carta (positiva) tal que S ⊂ V . Então , ω(p) = b(y(p))dy1 ∧ . . . ∧ dym =
Ç å Ç å
∂yi ∂yi
= b(y(p)) det (p) dx1 ∧ . . . ∧ dxm , donde a(x(p)) = b(y(p)) det (p) ,
∂xj Ç å ∂xj
∂yi
onde J(p) = det (p) é positivo. Pelo teorema da mudança de variá-
∂xj

152
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

R R
veis temos: b(y1 , . . . , ym )dy1 . . . dym = b(y1 , . . . , ym )J(p)dx1 . . . dxm =
y(V ) x(U )
R R
= a(x1 , . . . , xm )dx1 . . . dxm = ω.
x(U ) M

Se S = supp ω não está contido numa vizinhança coordenada, seja (Uα )α∈A
uma cobertura de M por vizinhanças coordenadas, e seja (ϕα )α∈A uma partição
da unidade, de classe C 1 , estritamente subordinada à cobertura M = Uα .
S
α∈A
Seja ωα = ϕα · ω, donde ωα = ω. Como S é compacto e os suportes das ϕα
P
α

formam uma família localmente finita, resulta que S ∩ supp ϕα 6= ø apenas para
um número finito de índices, donde a soma ωα é uma soma finita. O suporte
P
α
R R
de cada ωα sendo compacto e contido em Uα , existe ωα , e podemos definir ω
M M
por meio da igualdade
Z XZ
ω= ωα .
M α∈A M

Para provar que esta definição independe da cobertura e da partição da unidade


escolhidas, seja (Vβ )β∈B outra cobertura de M por vizinhanças coordenadas, e
ψβ = 1 partição da unidade de classe C 1 a ela estritamente subordinada.
P
β

Os abertos Uα ∩ Vβ (α ∈ A, β ∈ B) constituem uma cobertura de M , e


as funções θαβ = ϕα · ψβ formam uma partição da unidade subordinada a esta
cobertura. Assim,
Ñ é
XZ XZ XZ X XZ XZ
ωα = ϕα ω = ϕα ψβ ω = ϕα ψβ ω = θαβ ω,
α α α β α,β M α,β M
M M M

Ç å
XZ XZ X X
e ψβ ω = ψβ ϕα ω = θαβ ω,
β M β M α α,β
R
o que prova que ω tem caráter intrínseco.
M

Obs. Uma variedade compacta orientada M de dimensão zero é um conjunto finito

153
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

de pontos, cada um orientado por +1 ou −1. Escrevemos: M = pi − nj . A


P P
i j
integral de uma 0−forma f : M → R é definida por
R
f= f (pi ) − f (nj ).
P P
M i i

Proposição 9.16. (1) ω2 ;


R R R
(ω1 + cω2 ) = ω1 + c
M M M

(2) Se ω≥0e ω(p) > 0 para algum p ∈ M , então ω > 0, onde c∈Re
R
M
ω, ω1 , ω2 são m−formas contínuas, de suporte compacto, na variedade orientada
M , de dimensão m e classe C 1 .

Dem. Deixada para o leitor. ( Use partição da unidade).

Definição 9.17. Dizemos que um difeomorfismo f : (M, ωM ) → (N, ωN ) entre va-


riedades orientadas (por ωM e ωN respectivamente) preserva a orientação se f ∗ ωN
é forma positiva em M , ou seja, f ∗ ωN = λωM onde λ : M → R é função positiva
em todo ponto de M . Se f ∗ ωn é forma negativa em M , dizemos que f inverte a
orientação.

C1
Proposição 9.17. Sejam U e V abertos do Rm . Um difeomorfismo f : U −→ V
Ç å
∂fi
preserva a orientação se, e só se, det (x) > 0 para cada x ∈ U , onde
∂xj
f = (f1 , . . . , fm ) .

Dem. Sejam x = (x1 , . . . , xm ) ∈ U e y = (y1 , . . . , ym ) ∈ V . Temos: f ∗ (dy1 ∧ . . . ∧


∧dym ) = d(f ∗ y1 ) ∧ . . . ∧ d(f ∗ ym ) = d(y1 ◦ f ) ∧ . . . ∧ d(ym ◦ f ) = df1 ∧ . . . ∧ dfm =
Ç å Ç å
∂fi ∂fi
= det dx1 ∧. . .∧dxm , donde f preserva a orientação se, e só se, det >0
∂xj ∂xj
em todos os pontos de U .

Proposição 9.18. Seja f : M m → N m um difeomorfismo de classe C 1 entre


variedades orientadas de dimensão m e classe C k . Se f preserva a orienta-
ção e {yα : Vα → Rm }α∈A é atlas C k que define a orientação de N , então
{xα = yα ◦ f : Uα → Rm }α∈A é atlas C k que define a orientação de M .

154
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Dem. Como xα ◦ x−1


β = yα ◦ f ◦ f −1 ◦ yβ−1 = yα ◦ yβ−1 é de classe Ck , e
Å ã
Uα = f −1
(Vα ) = f −1
Vα = f −1 (N ) = M , resulta que {xα }α∈A é
S S S
α∈A α∈A α

atlas C k
em M . Seja y : V → Rm carta positiva em N , e x = y ◦ f carta

em M . Para p ∈ U = f −1 (V ) temos, para 1 ≤ i ≤ m, x0 (p) (p) = ei =
∂xi
∂ ∂
= y 0 (q)f 0 (p) (p) = y 0 (q) (q) , onde q = f (p) e (e1 , . . . , em ) é a base canô-
∂xi ∂yi
nica do Rm . Como f ∗ ωN = λωM , com λ(p) > 0 para todo p ∈ M , temos:
 
e,
Ä ä Ä ä
λ(p)ωM p; ∂x∂ 1 , . . . , ∂x∂m = ωN q; f 0 (p) ∂x∂ 1 , . . . , f 0 (q) ∂x∂m = ωN q; ∂y∂ 1 , . . . , ∂y∂m
y sendo carta positiva, resulta que x = y ◦ f é carta positiva em M , ou seja, o atlas
{xα = yα ◦ f }α∈A define a orientação de M .

Obs. Se f : M → N é um difeomorfismo entre variedades orientadas conexas,


então f ∗ ωN ou é positiva ou é negativa e, portanto, ou f preserva a orientação ou
f inverte a orientação.

Proposição 9.19. Seja f : M m → N n aplicação C k entre variedades de classe


C k . Seja (ϕα )α∈A partição da unidade estritamente subordinada à cobertura aberta
(Vα )α∈A de N . Então, (supp f ∗ ϕα )α∈A é família localmente finita e (f ∗ ϕα )α∈A é
partição da unidade estritamente subordinada à cobertura aberta
Ä ä
f −1 (Vα) α∈A
=
= (Uα )α∈A de M .

Dem. Sejam p ∈ M , q = f (p) ∈ N ; existe vizinhança aberta Vq ⊂ N , q ∈ Vq , tal que


Vq ∩ Vα = ø exceto para um número finito de índices α. Up = f −1 (Vq ) é vizinhança
aberta de p e Up ∩ Uα = f −1 (Vq ) ∩ f −1 (Vα ) = f −1 (Vq ∩ Vα ) = ø exceto para um nú-
mero finito de índices, donde (Uα )α∈A é localmente finita. Como (supp f ∗ ϕα ) =
= supp(ϕα ◦ f ) ⊂ f −1 (supp ϕα ) ⊂ f −1 (Vα ) = Uα , resulta que (supp f ∗ ϕα )α∈A é
localmente finita. Para p ∈ M temos ϕα (q) = 1, o
P ∗
f ϕ α (p) = ϕα (f (p)) =
P P
α α α

que termina a demonstração.

155
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Proposição 9.20. Seja f : M m → N m um difeomorfismo de classe C 1 entre


variedades orientadas de dimensão m e classe C k . Se f preserva a orientação,
então f ∗ω = ω para toda m− forma contínua ω de suporte compacto em N .
R R
M N

Dem. Seja {yα : Vα → Rm }α∈A um atlas C k que define a orientação de N , e


seja ϕα = 1 uma partição da unidade estritamente subordinada à cobertura
P
α

aberta {Vα }α∈A de N . Pela Proposição 9.18, {xα = yα ◦ f : Uα → Rm }α∈A é


atlas C k que define a orientação de M e, pela Proposição 9.19, {f ∗ ϕα }α∈A ; é
partição da unidade estritamente subordinada à cobertura aberta {Uα }α∈A de M .
Pela definição da integral,

Z XZ XZ Z
∗ ∗ ∗ ∗
(x−1 ∗ ∗
X
f ω= (f ϕα ) (f ω) = f (ϕα ω) = α ) f (ϕα ω) =
α α α
M Uα Uα xα (Uα )

Z Z
(yα ◦ f )−1 ∗ f ∗ (ϕα ω) = (yα−1 )∗ (ϕα ω) =
X X
=
α α
(yα ◦f )(f −1 (Vα )) yα (Vα )

XZ Z
= ϕα ω = ω.
α
Vα N

Obs. Se f inverte a orientação ,então f ∗ ω = − ω.


R R
M N

Proposição 9.21. (Stokes) Seja M m uma variedade orientada de dimensão m ≥ 2


e classe C k , cujo bordo ∂M tem a orientação induzida. Se ω é uma (m − 1)−
forma de classe C 1 e suporte compacto em M , então

Z Z
dω = ω.
M ∂M

ω significa a integral da restrição de ω a ∂M , ou seja, i∗ ω,


R R R
Obs. ω=
∂M ∂M ∂M
onde i : ∂M → M é a inclusão. Para facilitar a compreensão da demostração do

156
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

teorema de Stokes, vamos prová-lo no caso em que M = H1 ⊂ R2 , e ω = f dx + gdy,


onde f e g são de classe C 1 e suportes contidos no quadrado [−a, a] × [−a, a] . A
orientação de H1 é dada por dx ∧ dy, e a orientação de ∂H1 é dada por dy.

y ∂H1

−a a x
supp ω

−a

Como dω = (gx − fy ) dx ∧ dy, temos


R R R
dω = gx dxdy − fy dxdy =
H1 H1 H1
Ra R0 R0 Ra Ra R0
= dy gx dx − dx fy dy = [g(0, y) − g(−a, y)] dy − [f (x, a) − f (x, −a)] dx =
−a −a −a −a −a −a
Ra
= g(0, y)dy, pois g(−a, y) = f (x, a) = f (x, −a) = 0.
−a
Ra
Em ∂H1 temos dx = 0 e , portanto,
R R R
ω= gdy = g(0, y)dy = dω,
∂H1 ∂H1 −a H1
o que prova o teorema de Stokes para M = H1 ⊂ R . 2

Dem. da Proposição 9.21 (Stokes)

Por meio de uma partição da unidade vimos que podemos supor ω igual a
uma soma finita de formas, cada uma delas com suporte contido numa vizinhança
coordenada. Basta então considerar o caso em que S = supp ω ⊂ U , sendo
x : U → H1 uma carta positiva.
m
Para p ∈ U , temos ω = d ∧ . . . ∧ dx , e é suficiente
(−1)i−1 fi dx1 ∧ . . . ∧ dx
P
i m
i=1

157
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Rm−1 = ∂H1

x(S) 0 x1

x(U )

considerar, para efeito da demonstração, apenas um termo desta soma, ou seja,


podemos tomar ω = (−1)i−1 f dx1 ∧ . . . ∧ dx
d ∧ . . . ∧ dx , onde f é de classe C 1 e
i m
∂f
tem suporte compacto. Neste caso, dω = (−1)i−1 dxi ∧dx1 ∧. . .∧ dx
d ∧. . .∧dx =
i m
∂xi
∂f
= dx1 ∧ . . . ∧ dxm . Seja a > 0 tal que supp ω esteja contido no interior do
∂xi
cubo [−a, a]m .

1 º Caso: x(U ) ∩ ∂H1 = ø.

Temos:
Za
∂f
Z Z
dω = dx1 . . . dx
d . . . dx
i m dxi =
∂xi
M Rm−1 −a
Z
= d . . . dx [f (· · · , x , a, x , · · · )−
dx1 . . . dx i m i−1 i+1
Rm−1

−f (· · · , xi−1 , −a, xi+1 , · · · )] = 0 − 0 = 0.

E: ω = ω = 0 . Portanto, ω = 0 , neste caso.


R R R R
dω =
∂M ø M ∂M

2 º Caso: x(U ) ∩ ∂H1 6= ø.

158
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Rm−1 = ∂H1

x(S)
x1

(a) i 6= 1:

Za
∂f ∂f
Z Z Z
dω = dx1 . . . dxm = dx1 . . . dx
d . . . dx
i m dxi = 0,
∂xi ∂xi
M x(U ) −a

como no 1 º caso.

Como dx1 = 0 em ∂H1 , temos i∗ ω = 0, donde


R
ω = 0.
∂M

(b) i=1:

Z0
∂f ∂f
Z Z Z
dω = dx1 . . . dxm = dx2 . . . dxm dx1 =
∂xi ∂x1
M x(U ) Rm−1 −a

Z Z
= f (0, x2 , . . . , xm )dx2 . . . dxm = ω.
Rm−1 ∂M

Obs. Seja ω uma m−forma de classe C 1 definida numa variedade (sem bordo)
compacta, orientada M m , de dimensão m e classe C k . Se ω é exata, isto é, se
existe uma (m − 1) forma η tal que ω = dη, então

Z Z Z
ω= dη = η = 0.
M M ∂M =ø

159
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Se ω é uma m− forma contínua e positiva numa variedade (sem bordo) com-


pacta, orientada M m , de dimensão m, então ω > 0, donde ω não é exata, apesar
R
M
de ω ser fechada, isto é, de ser dω = 0.

Se M m não é compacta, uma m− forma contínua positiva pode ser exata. Por
exemplo, se M = Rm , então ω = dx1 ∧ . . . ∧ dxm = d(x1 dx2 ∧ . . . ∧ dxm ) é exata
e positiva.

Proposição 9.22. Seja M m uma variedade com bordo, compacta, orientada, de


dimensão m e classe C 2 . Não existe f : M → ∂M de classe C 2 tal que f (x) = x
para todo x ∈ ∂M .

Dem. Suponhamos que exista uma tal f , e seja ω a (m − 1)forma que define a
orientação de ∂M . Então, ω é de classe C 1 , ω 6= 0. Como
R
dω = 0,
∂M
f |∂M = id∂M , o teorema de Stokes nos dá:

Z Z Z Z
0 6= ω= ∗
f ω= ∗
d(f ω) = f ∗ (dω) = 0 , absurdo.
∂M ∂M M M

Proposição 9.23. (Brouwer diferenciável)

Não existe g : B → B, de classe C 2 , sem pontos fixos, onde B = {x ∈ Rm ; kxk ≤ 1}.

x
f (x) g(x)
v
0

160
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Dem. Suponhamos que exista uma tal g e definamos f : B → S m−1 = ∂B por


x − g(x)
f (x) = x + tv, t > 0, v = , f (x) sendo a interseção da semirreta
kx − g(x)k
de origem g(x), que passa por x, com S m−1 . Portanto, f |S m−1 = idS m−1 . Temos
kf (x)k2 = 1, donde kxk2 +2thx, vi+t2 = 1, donde t = −hx, vi+ 1 − kxk2 + hx, vi2 ,
»

onde o radicando é positivo, o que mostra que t é função de classe C 2 de x e,


portanto, f também. Outra maneira de provar que f ∈ C 2 é observar que F (x, t) =
∂F
= t2 + 2thx, vi + kxk2 = 1 define t como função implícita de x, e que = 2t+
∂t
+2hx, vi = 0 se , e só se, hx, vi + hf (x) − x, vi = 0, o que equivale a hf (x), vi = 0.
Por Pitágoras, temos kg(x)k > kf (x)k = 1, donde g(x) ∈ / B, absurdo. Resulta que
∂F
6= 0 e f ∈ C 2 . Mas, pela Proposição 9.22, não existe f : B → ∂B = S m−1 ,
∂t
f ∈ C 2 tal que f |S m−1 = idS m−1 . Resulta que toda g : B → B, g ∈ C 2 , tem pelo
menos um ponto fixo.

Obs. O teorema clássico de Brouwer afirma que o resultado acima é válido para
aplicações g : B → B contínuas (Veja [13]).

Definição 9.18. Sejam M e N variedades de classe C k . As aplicações


f, g : M → N , de classe C k , são ditas C k -homotópicas se existe aplicação
H : [0, 1] × M → N , de classe C k , tal que H(0, x) = f (x) e H(1, x) = g(x), para
todo x ∈ M . Pode provar-se que a relação "f e g são C k -homotópicas" é uma
equivalência no conjunto das aplicações f : M → N de classe C k . (Veja [13]).

Proposição 9.24. Seja M m uma variedade compacta, orientada, de dimensão m e


classe C 2 , e sejam f, g : M → N aplicações C 2 -homotópicas. Se ω é uma m-forma
fechada de classe C 1 em N , então f ∗ω = g∗ω .
R R
M M

Dem. Seja H : [0, 1] × M → N uma homotopia de classe C 2 entre f e g. Se


M1 = {1} × M e M0 = {0} × M vimos que ∂(I × M ) = M1 ∪ (−M0 ), onde

161
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

I = [0, 1] . Como H(0, x) = f (x) e H(1, x) = g(x) para todo x ∈ M , temos

Z Z Z Z Z Z Z
g∗ω − f ∗ω = H∗ω − H ∗ω = H ∗ω = d(H ∗ ω) = H ∗ (dω) = 0,
M M M1 M0 ∂(I×M ) I×M I×M

pois dω = 0.

Obs. (1) Pode provar-se que toda aplicação contínua f : M → N entre variedades
C k , é homotópica a uma aplicação g : M → N, g ∈ C k . Além disso, se
f, g : M → N são C k e existe uma homotopia contínua H entre f e g, então existe
uma homotopia C k entre f e g. Veja a referência [13].

Obs. (2) Sejam M m e N n variedades orientadas, com ou sem bordo, e f : M → N


de classe C k . Se ω é uma m−forma em N , definimos

Z Z
ω= f ∗ ω.
f (M ) M

Pondo Γ = f (M ), ∂Γ = f (∂M ), temos:

Z Z Z Z Z Z Z
∗ ∗ ∗
α= α= f α= d(f α) = f (dα) = dα = dα,
∂Γ f (∂M ) ∂M M M f (M ) Γ

para toda (m − 1)− forma α em N .

−ydx + xdy
Exemplo 9.6.1. Seja ω = a 1− forma "elemento de ângulo" em
x2 + y 2
R2 − {0}. Sejam f, g : [0, 2π] → R2 − {0}, f (θ) = a(cos θ, sen θ) ,
g(θ) = (a cos θ, b sen θ) onde a > b > 0.

H(t, θ) = (1 − t)f (θ) + tg(θ) é uma homotopia entre f e g. C = f ([0, 2π])


é a circunferência x2 + y 2 = a2 e C1 = g([0, 2π]) é a elipse b2 x2 + a2 y 2 = a2 b2 .

162
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

y
(0, a)

f (θ)
(0, b)
g(θ)
θ
(b, 0) (a, 0) x


Então, f ∗ω = g∗ω = ω (pois dω = 0). Como dθ = 2π ,
R R R R R R
ω= ω=
[0,2π] C [0,2π] C1 C 0
vem
R
ω = 2π.
C1

Exemplo 9.6.2. Seja α : S m → S m a aplicação antípoda, α(x) = −x. Seja ω a


m−forma que define a orientação de S m . Temos:

α∗ ω(x; v1 , . . . , vm ) = ω(−x; −v1 , . . . , −vm ) = (−1)m+1 ω(x; v1 , . . . , vm )

para toda base (v1 , . . . , vm ) de Tx S m = T−x S m . Portanto, α∗ ω = (−1)m+1 ω, e


α preserva a orientação se, e só se, m é ímpar. Neste caso, isto é, m = 2p − 1 ,
α é homotópica a idS m . De fato, como Rm+1 = R2p , os pontos de S 2p−1 têm
um número par de coordenadas e podem ser escritos como z = (z1 , . . . , zp ), cada
p
zi sendo um complexo, e |zi |2 = 1 . A aplicação H : [0, 1] × S 2p−1 → S 2p−1 ,
P
i=1
dada por H(t, z) = eiπt z, é tal que H(0, z) = z e H(1, z) = −z = α(z), ou seja,
H é uma homotopia C ∞ entre α e idS 2p−1 . Reciprocamente, se existe homotopia
H ∈ C ∞ entre α e idS m temos, pela Proposição 9.24, que α∗ ω = ω. Mas,
R R
Sm Sm
α∗ ω = (−1)m+1 ω, o que implica ω = (−1)m+1 ω, donde m é ímpar.
R R
Sm Sm

163
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Proposição 9.25. (Poincaré e Brouwer)

A esfera S m admite um campo contínuo de vetores tangentes não -nulos se, e


só se, m é ímpar.

Dem. Seja u : S m → Rm+1 um campo contínuo de vetores u(x) 6= 0 tangentes a


u(x)
S m , isto é, hu(x), xi = 0 para todo x ∈ S m . Pondo v(x) = temos que
ku(x)k
kv(x)k = 1, e podemos considerar v : S m → S m , contínua, com hv(x), xi = 0
para todo x ∈ S m .

Seja H(t, x) = x cos(πt)+v(x) sen(πt). É fácil ver que kH(t, x)k = 1, H(0, x) = x,
H(1, x) = −x = α(x), ou seja, H : [0, 1] × S m → S m é uma homotopia entre a apli-
cação antípoda α e idS m , o que só é possível se m é impar. Assim, para m par, todo
campo de vetores tangentes a S m = S 2p tem uma singularidade. Para m = 2p − 1,
o campo v(x) = v(x1 , x2 , . . . , x2p ) = (x2 , −x1 , x4 , −x3 , . . . , x2p , −x2p−1 ) é tangente a
S 2p−1 e nunca se anula.

Obs. Vimos que o elemento de volume de S n−1 é a (n − 1)− forma ω(x) =


n
=
P d ∧. . .∧dx e , então, dω = 0, e que o elemento de ângulo
(−1)i+1 xi dx1 ∧. . .∧ dxi n
i=1
1 P n
sólido é a (n − 1)− forma em Rn − {0} dada por α(x) = (−1)i+1 xi dx1 ∧
kxkn i=1
d ∧ . . . ∧ dx . Como α = f ∗ ω , f (x) = x , x 6= 0 , e f ∗ (dω) = d(f ∗ ω),
∧ . . . ∧ dx i n
kxk
temos que dω = 0 implica dα = 0. Mas α não é exata em Rn − {0},
pois se existisse uma (m − 2)− forma β em Rn − {0} tal que α = dβ, então
α = volume de S n−1 = cn−1 > 0, absurdo.
R R
0= dβ =
S n−1 S n−1

Se Srn−1 é a esfera de centro 0 e raio r em Rn , então α = cn−1 .


R R
α=
Srn−1 S n−1
De fato, seja r < 1 (o caso r > 1 é análogo) e seja M = {x ∈ Rn ; r ≤ kxk ≤ 1},
donde ∂M = S n−1 ∪ (−Srn−1 ) .

164
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

S n−1
0
Srn−1

Então, 0 = α , donde
R R R R R R
dα = α= α− α = cn−1 − α=
M ∂M S n−1 Srn−1 Srn−1 Srn−1
= cn−1 .

Proposição 9.26. Sejam M m e N m variedades de mesma dimensão e f : M → N


de classe C k . Se M é compacta e se q ∈ N é valor regular de f , então f −1 (q) é
um conjunto finito.

Dem. Se p ∈ f −1 (q) então f 0 (p) : Tp M m → Tq N m é bijetora, donde existe


vizinhança U de p tal que f : U → f (U ) é um difeomorfismo , e p é o único ponto
de U tal que f (p) = q, ou seja, os pontos de f −1 (q) são isolados. Por outro lado,
f −1 (q) é fechado no compacto M , donde é também compacto. Sendo compacto e
formado por pontos isolados, f −1 (q) é finito.

Proposição 9.27. Sejam M m e N m variedades de mesma dimensão e f : M → N


de classe C k . Se M é compacta, e se q ∈ N é um valor regular de f , existe
uma vizinhança V de q, em N, tal que f −1 (V ) é a reunião de um número finito de
abertos de M, disjuntos, cada um dos quais se aplica pela f difeomorficamente sobre
V.

Dem. Pela Proposição 9.26, f −1 (q) = {p1 , . . . , ps } , e existe vizinhança Ui de


pi que se aplica pela f difeomorficamente sobre um vizinhança Zi de q, e podemos

165
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

s
supor as vizinhanças U1 , . . . , Us duas a duas disjuntas. Seja Z = Zi . Se
T
i=1
Wi = fi−1 (Z) , onde fi = f |Ui , então W1 , . . . , Ws são vizinhanças disjuntas
de p1 , . . . , ps , respectivamente, e f aplica cada Wi difeomorficamente sobre Z. Se
s
existir vizinhança V de q tal que f −1 (V ) ⊂ Wi , então f −1 (V ) = V1 ∪ . . . ∪ Vs ,
S
1
onde Vi = f −1 (V ) ∩ Wi , e f : Vi → V difeomorfismo , o que provaria o teorema.

Suponhamos, por absurdo, que para toda vizinhança V de q, V ⊂ Z, exista


s
algum ponto y ∈ V tal que y = f (x), com x ∈
/ Wi . Tomando uma base
S
1
de vizinhanças de q, B1 ⊃ B2 ⊃ . . . podemos construir para cada Bj os pontos
s
yj ∈ Bj e xj ∈ M tais que yj = f (xj ) e xj ∈
/ Wi . Como M é compacta,
S
1
(passando a uma subsequência se necessário), podemos supor que xj → p ∈ M ,
donde yj = f (xj ) → f (p). Mas yj → q, donde q = f (p), ou seja, existe
k ∈ {1, . . . , s} tal que p = pk . Como xj → p, existem valores de j suficiente
s s
grandes para que seja xj ∈ Wj ⊂ Wi , contra a hipótese de que xj ∈
/ Wi , o
S S
1 1
que termina a demonstração.

Obs. Sejam M m e N m variedades compactas, orientadas, de dimensão m e classe


Ck , e f : M → N um difeomorfismo de classe C 1 . Vimos que f ∗ω = ε ω
R R
M N
para toda m−forma ω de classe C 1 em N , onde ε = 1 se f preserva a orientação
e ε = −1 caso contrário. Se f : M → N é de classe C 1 mas não necessariamente
um difeomorfismo, vale a fórmula f ∗ω = γ ω, onde γ é um inteiro chamado
R R
M N
grau de f . Vamos provar uma versão local desta fórmula.

Proposição 9.28. Seja q ∈ N um valor regular de f : M m → N m , f de classe


C 1 , dim M = dim N = m. Existe vizinhança U de q em N tal que f ∗ω = γ
R R
ω
M N
para toda m−forma ω de classe C 1 e suporte contido em U , onde γ é um inteiro.

Dem. Na vizinhança de cada ponto de f −1 (q), f é um difeomorfismo local, donde

166
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

q tem vizinhança U tal que f −1 (U ) consiste de abertos disjuntos V1 , . . . , V s


e f : Vi → U é um difeomorfismo, 1 ≤ i ≤ s (vide Proposição 9.27). Se
s R s
supp ω ⊂ U então supp f ∗ ω ⊂ f −1 (U ). Portanto, f ∗ω = f ∗ω =
R R
εi ω,
P P
M i=1 Vi i=1 U
onde εi = ±1 conforme f : Vi → U preserve ou não a orientação. Por definição,
s
εi , e obtemos f ∗ω = γ
R R
γ= ω.
P
i=1 M N

9.7 Formas Diferenciais em M × [0, 1]. Lema de

Poincaré

Seja M m uma variedade de dimensão m e classe C k , e seja π : M × [0, 1] → M ,


π(p, t) = p, a projeção. Vamos mostrar que toda forma diferencial de classe C k em
M × [0, 1] é uma soma localmente finita dos seguintes tipos de formas:

(I)f (p, t)π ∗ ϕ;

(II)f (p, t)dt ∧ π ∗ ϕ,

onde f : M × [0, 1] → R é de classe C k e ϕ é uma forma de classe C k em M .


Sejam {xα }α∈A um atlas em M, xα : Uα → Rm , {ϕα }α∈A uma partição
da unidade estritamente subordinada a {Uα }α∈A , e gα : M → R , gα ∈ C k ,
tal que supp gα ⊂ Uα e gα = 1 em supp ϕα , cuja existência é garantida
pelo lema de Urysohn diferenciável (Proposição 7.15 do Capítulo 7). Resulta que
{π −1 (Uα )}α∈A é uma cobertura aberta de M × [0, 1] e {π ∗ ϕα }α∈A é partição da
unidade estritamente subordinada a {π −1 (Uα )}α∈A , conforme a Proposição 9.19.
Seja ω uma r−forma de classe C k em M × [0, 1]. Temos: ω = ωα , onde
P
α∈A
ωα = (π ∗ ϕα )ω. Então, supp ωα ⊂ supp π ∗ ϕα ⊂ π −1 Uα . Em π −1 Uα a forma ωα
pode ser escrita na forma
X X
ωα = aα,I dxα,I + bα,J dt ∧ dxα,J ,
I J

167
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

onde aα,I e bα,J são funções C k em π −1 Uα com suporte contidos em supp π ∗ ϕα ,


ou seja, ωα é a soma de formas do tipo (I) e do tipo (II) em π −1 Uα . Para estender
esta decomposição a M × [0, 1], observemos que, como supp ωα ⊂ supp π ∗ ϕα e
π ∗ gα = 1 em supp π ∗ ϕα , temos

ωα = (π ∗ gα )ωα = aα,I (π ∗ gα )dxα,I + bα,J dt ∧ (π ∗ gα ) dxα,J =


X X

aα,I (π ∗ gα dxα,I ) + bα,J dt ∧ (π ∗ gα dxα,J ) .


X X
=

Como supp gα ⊂ Uα , podemos considerar gα dxα,I como sendo 0 em M −Uα ,


de modo que ω é uma soma localmente finita de formas das tipos (I) e (II) em
M × [0, 1]. Além disso, dados Uα , ϕα e gα , a decomposição acima é única.

Definição 9.19. Uma variedade M m é contrátil (a um ponto p0 ∈ M ) se existe


aplicação de classe C 1 , H : M × [0, 1] → M , tal que H(p, 1) = p , H(p, 0) = p0 ,
para todo p ∈ M .
Por exemplo, Rm e B = {x ∈ Rm ; kxk < 1} são contráteis, como é fácil
verificar.

Proposição 9.29. (Lema de Poincaré)


Sejam M m uma variedade contrátil e ω uma r−forma fechada, de classe C 1 em
M, isto é tal que dω = 0. Então ω é exata, ou seja, existe uma (r − 1)−forma α
em M tal que ω = dα.

Dem. Vamos definir, para cada k, uma aplicação K : Ωk (M ) → Ωk−1 (M ) da


maneira seguinte:

(i) K(f π ∗ ω) = 0 para as formas do tipo (I);


Ç å
R1
(ii) ∗
K(f dt ∧ π ω) = f (p, t)dt ω para as formas do tipo (II), e estender por
0
linearidade.

Sejam i1 : M → M ×[0, 1] e i0 : M → M ×[0, 1] definidas por i1 (p) = (p, 1)


e i0 (p) = (p, 0). Vamos provar que dK + Kd = i∗1 − i∗0 ; para isto, basta prová-
la numa vizinhança U × [0, 1], de coordenadas (x, t) = (π ∗ x1 , . . . , π ∗ xm , t), em

168
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

M × [0, 1] . Nas formas do tipo (I), temos:


Ç å
∗∂f m ∂f
Kd(f π ω) = K dt ∧ π ∗ ω + π ∗ dxi ∧ π ∗ ω + f π ∗ dω =
P
Ç å Ç ∂t å i=1 ∂x i
∂f ∗
R1 ∂f
=K dt ∧ π ω = dt ω = (f (x, 1) − f (x, 0)) ω = (i∗1 − i∗0 ) (f (x, t)π ∗ ω) .
∂t 0 ∂t

Como dK (f π ∗ ω) = 0, temos dK + Kd = i∗1 − i∗0 nas formas do tipo (I). Nas


formas do tipo (II), temos:
ñÇ å ô Ç å

R1 ∂ R1
dK(f dt ∧ π ω) = d f (x, t)dt ω = f (x, t)dt dxi ∧ ω+
P
Ç å 0 Ç å ∂xi 0Ç å
R1 R1 ∂f R1
+ f (x, t)dt dω = dt dxi ∧ ω + f (x, t)dt dω.
P
0 i 0 ∂xi 0

E: Ç å
∗ ∂f ∗
Kd (f dt ∧ π ω) = K π dxi ∧ dt ∧ π ∗ ω − K (f dt ∧ π ∗ dω) =
P
Ç i ∂xåi Ç å
P R1 ∂f R1
=− dt dxi ∧ ω − f (x, t)dt dω.
i 0 ∂xi 0

Portanto, Kd + dK = 0 nas formas de tipo (II), provando que Kd + dK = i∗1 − i∗0 .


Como H ◦ i1 = idM e H ◦ i0 = constante = p0 , temos:

ω = (H ◦ i1 )∗ ω = i∗1 (H ∗ ω);
0 = (H ◦ i0 )∗ ω = i∗0 (H ∗ ω),

e d(H ∗ ω) = H ∗ dω = 0 pois dω = 0.
Logo, ω = i∗1 (H ∗ ω) = d(K(H ∗ ω)) = dα, onde α = K(H ∗ ω).

9.8 Aplicação à Análise Vetorial


C∞ C∞
Sejam A ⊂ R3 , aberto, f : A −→ÇR, F~ = (P, Q, 3
å R) : A −→ R . Sabemos que
∂f ∂f ∂f
grad : C ∞ (A, R) −→ X∞ (A), grad f = , , , rot : X∞ (A) −→ X∞ (A),
∂x ∂y ∂z

169
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS



~i ~j ~k


∂ ∂ ∂
Ç å
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
rot F~ =


= − , − , − ,

∂x ∂y ∂z
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y

P Q R

∂P ∂Q ∂R
div : X∞ (A) → C ∞ (A, R) , div(P, Q, R) = + + = div F~
∂x ∂y ∂z
Definamos:
α0 : C ∞ (A, R) → Ω∞0 (A)
∞ ∞
α1 : X (A) → Ω1 (A)
β0 : X∞ (A) → Ω∞ 2 (A)
β1 : C (A, R) → Ω∞

3 (A) , por:

α0 f = f ; α1 F~ = P dx + Qdy + Rdz; β0 F~ = P dy ∧ dz + Qdz ∧ dx + Rdx ∧ dy e


β1 f = f dx ∧ dy ∧ dz.
É fácil ver que α0 , α1 , β0 , β1 são aplicação lineares bijetoras, isto é, isomorfis-
mos. Além disso, o diagrama seguinte comuta:
α
C ∞ (A, R) 0
−→ Ω∞ ∞
0 (A) = C (A, R)

grad d
α
X∞ (A) 1
−→ Ω∞
1 (A)

rot d
β
X∞ (A) 0
−→ Ω∞
2 (A)

div d
β
C ∞ (A, R) 1
−→ Ω∞
3 (A) , ou seja :

dα0 = α1 grad
dα1 = β0 rot
dβ0 = β1 div ,

como mostra um cálculo simples.


Vamos mostrar que a Proposição 9.21 (Stokes) nos dá, no caso de R3 , os
teoremas clássicos de Gauss e Stokes.

170
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Proposição 9.30. (Stokes) Seja S uma superfície compacta, com bordo , de classe
C∞
C ∞ , orientada, contida no aberto A do R3 . Se F~ = (P, Q, R) : A −→ R3 é um
campo vetorial, então:

s
Ç å Ç å Ç å
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
S
− dy ∧ dz + − dz ∧ dx + − dx ∧ dy =
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
R
= P dx + Qdy + Rdz,
∂S

ou seja, o fluxo de rot F~ através de S é igual à circulação de F~ ao longo do bordo


∂S, onde ∂S tem a orientação induzida.

Dem. Seja ω = P dx + Qdy + Rdz = α1 F~ , donde dω = β0 rot F~ , e


R R
dω = ω
S ∂S
nos dá a tese.

Proposição 9.31. (Gauss)


Seja T uma superfície compacta de classe C ∞ e dimensão 3 em R3 , e seja
~n o campo unitário C ∞ normal a S = ∂T e que aponta para fora de T . Se
C∞
F~ = (P, Q, R) : A −→ R3 é um campo definido num aberto A que contém T , então
Z Z Z Ç å
∂P ∂Q ∂R
Z Z
+ + dx ∧ dy ∧ dz = P dy ∧ dz + Qdz ∧ dx + Rdx ∧ dy .
∂x ∂y ∂z
T S

Dem. Seja ω = β0 F~ = P dy ∧ dz + Qdz ∧ dx + Rdx ∧ dy. Orientando T de modo


natural e dando a S a orientação induzida, então ~n define a orientação de S (Veja
a Proposição 9.15). Logo: dω = β1 div F~ , e dω = ω nos dá a tese.
R R
T S

9.9 Integração numa Variedade Riemaniana. Grau


de Aplicação.

Seja M m uma variedade compacta, orientada, de classe C k e riemaniana. A


forma "elemento de volume" em M m é a m−forma σ definida por σp (v1 , . . . , vm ) =
= vol(v1 , . . . , vm ), onde p ∈ M e v1 , . . . , vm ∈ Tp M .
Seja (e1 , . . . , em ) uma base ortonormal positiva de Tp M e seja vk =

171
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

m
= aik ei . Sabemos que, por definição, vol (v1 , . . . , vm ) = det A, onde A =
P
i=1
= (aik ) − m × m. Assim , σp (v1 , . . . , vm ) = det A.

Definição 9.20. Seja f : M → R contínua. Definimos sua integral em M por


f = f σ. Assim, a existência da forma elemento de volume σ nos permite definir
R R
M M
a integral de uma 0−forma, isto é, de uma função.
Seja x : U → Rm uma carta local em M , positiva. Se p ∈ U temos
σp = a(x(p))dx1 ∧ . . . ∧ dxm , onde a : x(U ) → R.
Temos:
Ç å Ç Ç åå
∂ ∂ ∂
σp ,..., = a(x(p)) det dxi = a(x(p)).
∂x1 ∂xm ∂xj

∂ m
Mas, se = aki ek , então
P
∂xi k=1
Ç å
∂ ∂
σp ,..., = det A, onde A = (aij ).
∂x1 ∂xm

Æ ∏
∂ ∂ m m
E: gij = , = haki ek , arj er i = aki akj , donde det G =
P P
∂xi ∂xj k,r=1
√ k=1
= det(At A) = (det A)2 , e det A = det G, onde G = (gij ) .
√ R √
Logo, a(x(p)) = det G e f = f det G dx1 ∧ . . . ∧ dxm .
R
U U

Obs. (1) Sejam M m uma variedade orientada e D uma variedade com bordo, con-
tida em M , de mesma dimensão que M , e com D̄ compacto. Se ω é um ele-
mento de volume de M e X ∈ X1 (M ), definimos a divergência de X como
sendo a função div X tal que d(iX ω) = (div X)ω. Do teorema de Stokes resulta:
div Xω = iX ω (teorema de Gauss).
R R
D ∂D

Em particular, se M é compacta, então


R
div Xω = 0.
M

Obs. (2): Suponhamos agora que (M m , g) seja uma variedade riemaniana de


classe C k , k ≥ 2, g(X, Y ) = hX, Y i o produto interno
Ç de dois campos
å
∂ ∂
X, Y ∈ X (M ). Se x : U → R é carta local, então gp
r m
(p), (p) =
∂xi ∂xj
= gij (p) , p ∈ U , as funções gij : U → R sendo de classe C r , r < k.

172
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

C2
Toda f : M −→ R define um campo X = grad f , o gradiente de f , por
meio da igualdade df (Y ) = g(X, Y ) para todo Y ∈ X1 (M ).
Definimos o laplaciano ∆f de f por ∆f = div grad f . Do teorema de Gauss
R R
acima, resulta: ∆f σ = iX σ, X = grad f .
D ∂D
R
Em particular, se M é compacta, então ∆f σ = 0.
M

Se ∆f = 0, f é dita harmônica. Neste caso, a fórmula ∆f 2 = 2f ∆f +


+2k grad f k2 (vide Exercício 26 no final do capítulo), nos dá,se M é compacta e
1R
k grad f k2 σ = ∆f 2 σ = 0, donde grad f = 0, e f é constante,
R
conexa, que
M 2M
ou seja, toda função harmônica numa variedade riemaniana compacta e conexa (e
orientada) é constante.
Para a equação ∆h = f temos o seguinte resultado:

Proposição 9.32. Seja M uma variedade riemaniana compacta, orientada, de


Ck
classe C ∞ , e seja f : M −→ R tal que f = 0. Então a equação ∆h = f
R
M
tem uma única solução (veja a referência Aubin, T.).

Definição 9.21. Sejam M m uma variedade de classe C ∞ , Z p (M ) o espaço veto-


rial das p−formas fechadas e B p (M ) o subespaço das p−formas exatas. O espaço
Z p (M )
quociente p = H p (M ) é o p-ésimo grupo de cohomologia de de Rham de M .
B (M )

Se ω ∈ Ωp (M ), representamos por [ω] a classe de cohomologia de ω. Se


[ω] = [ω 0 ], então ω − ω 0 ∈ B p (M ), isto é, ω − ω 0 = dθ para alguma θ ∈ Ωp−1 (M ), e
dizemos que ω e ω 0 são cohomólogas.

Proposição 9.33. Se M m tem n componentes conexas, então H 0 (M ) = Rn .

Dem. Como B 0 (M ) = {0}, temos H 0 (M ) = Z 0 (M ) = {f : M → R; df = 0}.


Se df = 0 então f é constante em cada componente conexa de M . Se M tem n
componentes conexas, então uma função constante em cada componente se identifica
com uma n−pla ordenada de números reais, ou seja, a um elemento de Rn , donde
H 0 (M ) = Rn .

Exemplo 9.9.1. H 0 (Rn ) = R, pois Rn é conexo.


H p (Rn ) = {0}, p ≥ 1, pelo Lema de Poincaré.

173
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

Toda variedade conexa contrátil de dimensão n tem a mesma cohomologia.

Proposição 9.34. Seja M m uma variedade compacta, orientada, de classe C ∞ , e


seja ω uma m−forma de classe C k em M . Se ω é exata, o teorema de Stokes nos
dá que ω = 0. Reciprocamente, se ω = 0, então ω é exata.
R R
M M

Dem. Seja σ uma forma volume em M . Então, ω = f σ para alguma f ∈ C ∞ (M, R)


tal que f = 0. Seja h a solução de ∆h = f, e seja X = grad h, donde div X = f .
R
M
Definamos a (m−1)−forma α por α = iX σ. Resulta que dα = d(iX σ) = (div X)σ =
= f σ = ω, e ω é exata.

Corolário 9.4. H m (M m ) = R.

Dem. Se σ é uma forma volume em M , e ω é uma m−forma em M então existe


λ ∈ R tal que ω = λ σ, donde (ω − λσ) = 0. Pela Proposição acima temos que
R R R
M M M
ω − λσ = dθ para alguma (m − 1)−forma θ. Resulta que H m (M m ) é gerado pela
classe [σ] donde dim H m (M m ) = 1.

Exemplo 9.9.2. H 0 (S 1 ) = R, pois S 1 é conexa.


H 1 (S 1 ) = R, pelo Corolário acima.
H p (S 1 ) = {0}, se p ≥ 2.

Definição 9.22. Sejam M1m e M2m variedades conexas, compactas, orientadas, de


Ck
dimensão m e classe C ∞ , σ1 e σ2 tais que M1 σ1 = M2 σ2 = 1. Se f : M1 −→ M2 ,
R R

existe λ ∈ R tal que [f ∗ σ2 ] = λ[σ1 ]. Este número λ é o grau de f : λ = gr(f ), ou


seja, gr(f ) = M 1 f ∗ σ2 .
R

Se θ é uma m−forma em M2 , então


Z Z
f ∗ θ = gr(f ) θ.
M1 M2

θ, então θ − µσ2 = dβ, donde f ∗ θ = µf ∗ σ2 + df ∗ β, e resulta


R
De fato, se µ = M2

Z Z Z
∗ ∗
f θ=µ f σ2 = µgr(f ) = gr(f ) θ,
M1 M1 M2

174
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

R
o que mostra que grf independe da escolha de σ2 , pois se σ é tal que σ = 1,
M2
f ∗ σ = gr(f ).
R
então
M1

Proposição 9.35. Sejam M1m , M2m variedades conexas, compactas, orientadas, de


Ck
dimensão m e classe C ∞ , e seja f : M1 −→ M2 . Se q ∈ M2 é um valor regular
de f , então grf = εp , onde εp = 1 ou εp = −1 conforme det f 0 (p) > 0 ou
P
p∈f −1 (q)
detf (p) < 0, respectivamente.
0

Dem. 1◦ Caso: f −1 (q) 6= φ.

Vimos, na Proposição 9.27, que existe vizinhança (conexa) V de q, em M2 ,


tal que f −1 (V ) é uma reunião finita de abertos W1 , . . . , Ws de M1 , disjuntos, cada
um dos quais se aplica difeomorficamente sobre V . Na Proposição 9.28, vimos
que M1 f ∗ ω = γ M2 ω para toda m−forma de classe C 1 e suporte em V , sendo
R R

γ= εp , onde εp = 1 ou εp = −1 conforme f |Wi = fi : Wi → V preserve ou


P
p∈f −1 (q)
não a orientação.
Ck
Seja h : M2 −→ R tal que h = 0 em M − V , e h > 0 numa vizinhança U de q,
Ū ⊂ V . Podemos supor que V é uma vizinhança coordenada e que y : V −→ Rm é
uma carta positiva em V . Então, ω = hdy1 ∧ · · · ∧ dym é m−forma C k em M2 cujo
suporte está contido em V . Resulta,

Z Z Z

X
f ω = gr(f ) ω=γ ω, ou seja, gr(f ) = γ = εp .
M1 M2 M2 p∈f −1 (q)

Dem. 2◦ Caso: f −1 (q) = φ.

Neste caso, q tem vizinhança V contida em M2 − f (M1 ), pois f (M1 ) é fechado.


Se ω é m− forma de classe C 1 e suporte compacto contido em V , então f ∗ ω = 0,
R
M1
donde gr(f ) = 0.

Obs. Do que foi visto acima, resultam:

a) gr(f ) é um inteiro;

b) εp (= gr(f )) independe do valor regular q de f ;


P
p∈f −1 (q)

175
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

c) Se f (M1 ) 6= M2 , então gr(f ) = 0;

d) Se f1 , f2 : M1 → M2 são C 2 − homotópicas, então gr(f1 ) = gr(f2 );

e) O exemplo 9.6.2 mostra que a aplicação antípoda α : S m → S m , α(x) = −x, tem


grau igual a (−1)m+1 .

Exemplo 9.9.3. Seja M m ⊂ Rm+1 uma hipersuperfície compacta, de classe C 2 ,


orientada por meio de um campo, de classe C 1 , de vetores normais unitários,
N : M m → S m . Os subespaços Tp M m e TN (p) S m coincidem, pois ambos são orto-
gonais a N (p), de modo que dN (p) = N 0 (p) : Tp M → Tp M . Por definição,
K(p) = det N 0 (p) é a curvatura gaussiana de M em p ∈ M . Quando m é par,
K(p) não depende da orientação de M m . Seja ω a m−forma volume que define a
orientação de M m , ω = iN dx1 ∧. . .∧dxm+1 , e orientemos S m pela m−forma volume
σ tal que σ(N (p)) = ω(p). Para v1 , . . . , vm ∈ Tp M , temos:

(N ∗ σ)(p)(v1 , . . . , vm ) = σ(N (p))(N 0 (p)v1 , . . . , N 0 (p)vm ) =


= ω(p)(N 0 (p)v1 , . . . , N 0 (p)vm ) = det N 0 (p)ω(p)(v1 , . . . , vm ),

donde N ∗ σ = Kω, e resulta

Z Z Z Z
K= Kω = N σ = gr(N )

σ = gr(N ) vol(S m ),
M M M Sm

que relaciona a curvatura integral com o grau de N . H. Hopf provou (em 1925)
que se m é par, então gr(N ) = vol(S
1
K = 21 χ(M ), onde χ(M ) é a característica
R
m)
M
de Euler, que é um invariante topológico de M. No caso m impar, gr(N) não é um
invariante topológico de M .

9.10 Exercícios do Capítulo 9

1. Seja ω = f (x)ydx + dy definida na faixa D = {(x, y) ∈ R2 ; a < x < b},


onde f : (a, b) → R é contínua. Seja F uma primitiva de f em (a, b), isto é,
F 0 = f . Se g = eF , prove que (gω) é uma forma exata em D.

176
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

2. Sejam P, Q, R : D → R de classe C 1 no aberto D 3


Ç ⊂ R . Mostre que
å se
∂P ∂Q ∂R
ω = P dy ∧ dz + Qdz ∧ dx + Rdx ∧ dy, então dω = + + dx∧
∂x ∂y ∂z
∧dy ∧ dz = div ω
~ dx ∧ dy ∧ dz , onde ω
~ é o campo (P, Q, R);

3. Ache uma (n − 1)− forma ω em Rn tal que dω = dx1 ∧ . . . ∧ dxn .

4. Sejam a, b, c ∈ R. Prove que ω = ady ∧ dz + bdz ∧ dx + cdx ∧ dy é exata.

5. Sejam α uma r−forma e β uma s−forma em Rn . Prove : (a) se α e β são


fechadas, então α ∧ β é fechada;
(b) se α é fechada e β é exata, então α ∧ β é exata.

6. Sejam α, β, θ formas em Rn , α e β de grau par. Ache d(dα ∧ β ∧ θ + α ∧ dβ∧


∧θ + α ∧ β ∧ dθ).
n
7. Sejam ω1 , . . . , ωp 1−formas no aberto D ⊂ Rn tais que ωi = fij dgj ,
P
j=1
1 ≤ i ≤ p, onde as funções fij são de classe C 1 e as gj são de classe C em D.
2

Se ω1 (x), . . . , ωp (x) são L.I. em cada x ∈ D, mostre que existem 1−formas


p
θij tais que dωi = θij ∧ ωj .
P
j=1

xdy ∧ dz + ydz ∧ dx + zdx ∧ dy


8. Seja α = 3 em R3 − {0}. Prove que α é
R (x2 y2
+ + z2) 2
fechada, calcule α, e prove que α não é exata.
S2

C1
9. Sejam ω = ydx − xdy + dz, u, v : R3 −→ R. Prove que se ω − vdu é
fechada , então u e v independem de z e, neste caso, que du, dv e ω − vdu são
linearmente independentes em cada ponto de R3 .
C1
10. Seja ϕ : M −→ M um difeomorfismo de uma variedade compacta orientada
M . Se para uma forma volume ω em M temos ϕ∗ ω = cω, onde c ∈ R,
R R
prove que c = ±1(donde ϕ preserva volume), e que f ω = (f ◦ ϕ)ω para
M M
toda f : M → R contínua.

11. Seja a 2−forma ω = dx1 ∧ dx2 + · · · + dx2n−1 ∧ dx2n em R2n . Prove que
n
∧ ω = n!dx1 ∧ . . . ∧ dx2n .

177
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

12. Sejam M m uma variedade de classe C ∞ , e X um campo de vetores de classe


C ∞ , em M . A derivada de Lie em relação a X é a aplicação
LX : Ω ∞ ∞
r (M ) −→ Ωr (M ).
ω 7−→ LX ω = diX ω + iX dω
Prove:

(1) LX (α ∧ β) = (LX α) ∧ β + α ∧ (LX β);


(2) LX f = Xf ;
(3) LX dω = dLX ω;
(4) Lf X ω = f LX ω + df ∧ iX ω;
(5) LX (iX ω) = iX (LX ω);
(6) L[X,Y ] ω = LX LY ω − LY LX ω = [LX , LY ] ω,

onde α, β, ω ∈ Ω∞
r (M ) e f : M → R é de classe C

.

13. Prove que o espaço projetivo real P n é orientável se, e só se, n é ímpar.

14. Seja (M, g) uma variedade riemaniana compacta orientada, com bordo ∂M ,
e de classe C 2 . Para todo campo de vetores X ∈ C 1 (M, T M ), prove que
R R
(div X)σ = hX, N iiN σ (Gauss), onde σ é a forma volume induzida pela
M ∂M
métrica g, e N é um campo de vetores unitários ao longo de ∂M , de classe
C 1 , e que aponta para fora.

15. Sejam (M, g) uma variedade riemaniana compacta, orientada, de classe C ∞ ,


com bordo ∂M munido da orientação induzida, e N um campo normal unitário
C∞
de classe C ∞ , que aponta para fora, ao longo de ∂M . Se X : M −→ T M é
um campo de vetores e f : M → R é de classe C ∞ , prove:

(a) div(f X) = f div X + hgrad f, Xi;


R R R
(b) hgrad f, Xiσ + (f div X)σ = f hX, N iiN σ , onde σ é a forma
M M σM
volume induzida pela métrica g.

xz dy ∧ dz + yz dz ∧ dx + x2 dx ∧ dy.
R
16. Calcule
S2

178
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

17. Sejam (M, g) uma variedade riemaniana orientada, de classe C ∞ , e P ⊂ M


uma hipersuperfície orientada C ∞ , com ou sem bordo. Mostre que existe um
único campo normal unitário ao longo de P , de classe C ∞ , que determina a
orientação de P .

18. Seja (M, g) uma variedade riemaniana, C ∞ , orientada, com bordo,


∆ : C ∞ (M, R) −→ C ∞ (M, R) o laplaciano, e σ a forma volume induzida por
g.

(a) Se M é compacta, prove as identidades de Green:


Z Ç å
∂v
Z Z
(u∆v)σ + hgrad u, grad viσ = u in σ;
∂n
M M ∂M

Z Ç å
∂v ∂v
Z
(u∆v − v∆u) σ = u −v in σ ,
∂n ∂n
M ∂M

onde n é o campo normal unitário C ∞ que determina a orientação de


∂u
∂M , e = n(u) .
∂n
(b) Se M é conexa e ∂M = ø , mostre que as únicas funções harmônicas em
M são as constantes.
(c) Se M é conexa, ∂M 6= ø , e u e v são funções harmônicas em M , cujas
restrições a ∂M coincidem , mostre que u = v.

19. Sejam (M, g) uma variedade compacta, conexa, orientada, riemaniana C ∞ ,


C∞
e ∆ o laplaciano. λ ∈ R é um autovalor de ∆ se existe u : M −→ R,
u 6= 0, tal que ∆u = λu. Neste caso, u é uma autofunção correspondente a
λ.

(a) Prove que 0 ∈ R é um autovalor de ∆, e que todo outro autovalor é


negativo.
(b) Prove que se u e v são autofunções de ∆ correspondentes a autovalores
R
distintos, então (uv)σ = 0.
M

20. Seja (M m , g) uma variedade riemaniana orientada C ∞ . Prove que, dado


p ∈ M , existe um referencial ortonormal positivo (E1 , . . . , Em ), definido

179
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

numa vizinhança aberta U de p, ou seja, E1 , . . . , Em ∈ X∞ (M ) são tais que


(E1 (q), . . . , Em (q)) é base ortonormal positiva de Tq M para todo q ∈ U .
Sejam ω1 , . . . , ωm 1− formas definidas em U tais que ωi (Ej ) = δij , e seja
ω = ω1 ∧ . . . ∧ ωm . Prove que ω = σ, onde σ é a forma volume induzida
pela métrica g. Se X1 , . . . , Xm , Y1 , . . . , Ym pertencem a X∞ (M ), prove que
ω(X1 , . . . , Xm )ω(Y1 , . . . , Ym ) = det (hXi , Yj i) .
dy


 se x 6= 0;
x




21. Prove que ω = 
 −dx
é uma forma C ∞ em S 1 tal que ωp 6= 0

se y 6= 0,



y
para todo p ∈ S 1 .
C∞
22. Seja 0 ∈ R um valor regular de f : R3 −→ R, e seja M = f −1 (0).
dy ∧ dz dz ∧ dx dx ∧ dy
Mostre que = = são satisfeitas nos pontos de M
fx fy fz
onde fazem sentido, e defina uma 2−forma ω em M tal que ωp 6= 0 em todo
p ∈ M , e de classe C ∞ .

23. Seja o aberto A = {(ρ, ϕ, θ)|ρ > 0; 0 < ϕ < π; 0 < θ < 2π} do R3 , e seja
f : A → R3 definida por (x, y, z) = f (ρ, ϕ, θ) = (ρ cos θ sen ϕ, ρ sen θ sen ϕ, ρ cos ϕ).
Mostre que f ∗ (dx ∧ dy ∧ dz) = ρ2 sen ϕ dρ ∧ dϕ ∧ dθ.

24. As equações de Maxwell no vácuo R3 , sem carga ou corrente, são:


~ ~
~ = − ∂ B , rot B
rot E ~ = ∂ E , div E ~ = 0, div B ~ = 0 onde E ~ = (E1 , E2 , E3 )
∂t ∂t
é o campo elétrico e B~ = (B1 , B2 , B3 ) é o campo magnético.

Sejam as formas :

E = E1 dx + E2 dy + E3 dz
B = B1 dy ∧ dz + B2 dz ∧ dx + B3 dx ∧ dy

Seja R4 o espaço-tempo com coordenadas (x, y, z, t). E e B podem ser


consideradas como formas em R4 . Se F = E ∧ dt + B, mostre que dF = 0
~
~ = − ∂ B , e que d ∗ F = 0
~ = 0 e rot E
equivale às duas equações div B
∂t
~
equivale às duas equações div E~ = 0 e ~ = ∂ E , onde para uma
rot B
∂t

180
CAPÍTULO 9. FORMAS DIFERENCIAIS

k− forma ω em Rn , ∗ω é uma (n − k)−forma (a estrela de Hodge) definida


por ∗ω(ej1 , . . . , ejn−k ) = ε(σ)ω(ei1 , . . . , eik ) com (i1 , . . . , ik , j1 , . . . , jn−k ) =
= (σ(1), . . . , σ(n)) e ε(σ) = sinal da permutação σ.

25. Sejam (M m , g) uma variedade riemaniana de classe C k , k ≥ 2, e σ a forma


volume induzida pela métrica g. Seja x : U → Rm uma carta local em M .

C2 m ∂f ∂
(a) Se f : M → R prove que , na carta x, grad f = g ij , onde
P
i,j=1 ∂xj ∂xi
ij
(g ) é a matriz inversa de G = (gij ).
√ !
m ∂ m ∂ai 1 ∂ ln det G
(b) Se X = ai prove que, na carta x, div X = + ai .
P P
i=1 ∂xi i=1 ∂xi 2 ∂xi
m ∂ 2f
(c) Se X = grad f , prove que ∆f = div grad f = g ij +
P

√ i,j=1 ∂xi ∂xj


∂g ij 1 ij ∂ ln det G ∂f
!
m
+ + g .
P
i,j=1 ∂xi 2 ∂xi ∂xj

No caso em que M = Rm com a métrica usual, temos G = Im , div X =


m ∂ai m ∂ 2f
= , e ∆f = .
P P
2
i=1 ∂xi i=1 ∂xi

C2
26. Se (M m , g) é variedade riemaniana, e f, g : M −→ R, prove que ∆(f g) =
= f ∆g + g∆f + 2hgrad f, grad gi.

27. Sejam (M m , g) uma variedade compacta, orientada, de classe C ∞ , ω uma


forma volume em M , e X um campo vetorial C ∞ tal que div X = 0. Prove
C∞ R
que, para toda f : M −→ R, temos (Xf )ω = 0.
M

28. Seja V um campo de classe C ∞ em R3 . Prove que:

(a) se div V = 0, então existe um campo X em R3 tal que rot X = V .


(b) se rot V = 0, então existe uma função f : R3 → R tal que grad f = V .

29. Seja M uma variedade compacta orientada de classe C ∞ . Prove que M não
é contrátil a um ponto.

30. Usando o teorema de Brouwer, prove que não existe r : B → ∂B = S n−1 ,


r ∈ C 2 , tal que r(x) = x para todo x ∈ S n−1 .

181
Capítulo 10

Sistemas Diferenciais

Após introduzir o conceito de derivada de uma função numérica na variedade


M , f : M → R, relativamente a um campo vetorial X : M → T M , estudamos
o "colchete de Lie" de dois campos de vetores em M , e o fluxo local de um campo
X : M → T M . Generalizando o conceito de campo de direções no plano , definimos
os sistemas diferenciais de dimensão r na variedade M m , provamos o teorema de
integrabilidade de Frobenius, introduzimos a noção de folheação, apresentamos o
teorema de Chevalley (sem demonstração) sobre a existência de variedade integral
máxima , estudamos a relação entre comutatividade de campos e a de seus fluxos, e
finalizamos com uma introdução às variedades simpléticas.

10.1 Colchete de Lie de Campos Vetoriais. Fluxos.

Seja M m uma variedade de dimensão m e classe C k . Se X : M → T M é um


m ∂
campo de vetores e x : U → Rm é uma carta local, então X = ai , onde
P
i=1 ∂xi
s s
ai : U → R. X é de classe C , s < k , se, e só se, ai é de classe C .

Definição 10.1. Sejam A ⊂ M aberto e f : A → R de classe C s+1 . A derivada


de f relativamente ao campo X ∈ C s é a função Xf : A → R definida por
m ∂f
(Xf )(p) = f 0 (p).Xp = Xp f . Xf é de classe C s . Na carta x temos Xf = ai ,
P
i=1 ∂xi

182
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

∂f ∂(f ◦ x−1 ) ∂
onde (p) = (x(p)). Em particular, X(xj ) = aj . Se Y = bj
P
∂xi ∂xi ∂xj
é outro campo de classe C em U , então Y (Xf ) : U → R é de classe C
s s−1
e
Ç 2 å
m ∂ai ∂f ∂ f
Y (Xf ) = bj + ai .
P
i,j=1 ∂xj ∂xi ∂xj ∂xi
Proposição 10.1. Sejam X e Y campos vetoriais de classe C s na variedade M m
de classe C k , s < k, s ≥ 1. Existe um único campo [X, Y ] em M , de classe
C s−1 , tal que [X, Y ]f = X(Y f ) − Y (Xf ) para toda f de classe C 2 num aberto de
M.
∂ ∂
Dem. Na carta x : U → Rm , temos X = ai , Y = bj e
P P

Ç å Ç∂xi å ∂xj
m ∂bj ∂f ∂ai ∂f ∂bj ∂aj ∂f
X(Y f ) − Y (Xf ) = ai − bj = ai − bi , ou
P P
i,j=1 ∂xi ∂xj ∂x
Ç j ∂xi i,j
å ∂xi ∂xi ∂xj
m ∂ m ∂bk ∂ak
seja, [X, Y ]x = ck , com ck = ai − bi .
P P
k=1 ∂xk i=1 ∂xi ∂xi
∂ ∂
Se y : U → Rm é outra carta local, então X = a0α , Y = b0j e
P P
∂yα ∂yj
∂b0 ∂a0
Ç å
m ∂
[X, Y ]y = dj , com dj = a0α j − b0α j .
P P
j=1 ∂yj α ∂yα ∂yα
∂xi P ∂xk
Como ai = e bk = b0j , temos
P 0
a β
β ∂y β j ∂y j
2 ∂b0j ∂yα ∂yα ∂b0j ∂xk 2
Ç å Ç å
P ∂bk P 0 ∂xi 0 ∂ xk 0 0 ∂ xk
ai = a b + = 0
aα + aβ b j .
P
i ∂xi i,j,α,β β ∂yβ j ∂yj ∂yα ∂yα ∂yj ∂xi α,j ∂yα ∂yj ∂yj ∂yα
Analogamente,

∂ak X 0 ∂a0j ∂xk ∂ 2 xk


+ a0α b0α
X
bi = bα .
i ∂xi α,j ∂yα ∂yj ∂yj ∂yα

Logo,
∂b0j ∂a0
Ç å
∂xk
a0α − b0α j
X
ck = .
α,j ∂yα ∂yα ∂yj

Portanto,

∂b0j ∂a0 ∂xk ∂


Ç å
m ∂
[X, Y ]x = ck = 0
aα − b0α k =
P P

Ç k=1 0 ∂xk j,k,α ∂yα ∂yα ∂yj ∂xk


∂b ∂a0
å
∂ ∂
= a0α j − b0α j = dj = [X, Y ]y ,
P P
j,α ∂yα ∂yα ∂yj j ∂yj

183
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

e [X, Y ] independe da carta e está definido em M . Por definição, [X, Y ] é o


colchete de Lie dos campos X e Y .

Proposição 10.2. (a) [aX + bY, Z] = a[X, Z] + b[Y, Z];

(b) [X, Y ] = −[Y, X];

(c) [f X, gY ] = f g[X, Y ] + f X(g)Y − gY (f )X;

(d) [[X, Y ], Z] + [[Z, X], Y ] + [[Y, Z], X] = 0 (identidade de Jacobi), quaisquer que
sejam os campos X, Y, Z : M → T M de classe C s , f, g : M → R de classe
C 2 e a, b ∈ R.

Dem. Exercício.

Obs. Se M m é de classe C ∞ , o conjunto dos campos X ∈ C ∞ em M é o espaço


vetorial real X∞ (M ). Munido da aplicação bilinear (X, Y ) 7−→ [X, Y ], X∞ (M )
é uma álgebra que satisfaz [X, X] = 0 e a identidade de Jacobi, isto é, é uma
álgebra de Lie. No caso C ∞ , um campo X pode ser pensado como uma aplicação

X : C ∞ (M, R) → C ∞ (M, R)
f 7→ Xf

que satisfaz às condições :

(a) X(af + bg) = aX(f ) + bX(g);

(b) X(f g) = f X(g) + gX(f ) ,

quaisquer que sejam f, g ∈ C ∞ (M, R), a, b ∈ R, ou seja, X é uma derivação na


álgebra C ∞ (M, R).
ñ ô
∂ ∂
Exemplo 10.1.1. , = 0.
∂xi ∂xj
∂ ∂ ∂
Exemplo 10.1.2. X = x +y , Y = , em M = R2 .
∂x ∂y ∂y
ñ ô ñ ô ñ ô
∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂x ∂
Então [X, Y ] = x , + y , =x , − +
ñ ô ∂x ∂y ∂y ∂y ∂x ∂y ∂y ∂x
∂ ∂ ∂y ∂ ∂
+y , − =− = −Y .
∂y ∂y ∂y ∂y ∂y

184
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

Exemplo 10.1.3. Se A e B são matrizes n × n, pomos [A, B] = AB − BA.


É fácil ver que (A, B) 7−→ [A, B] é bilinear, que [A, B] = −[B, A], e que vale a
identidade de Jacobi, ou seja, [A, B] é um colchete de Lie na álgebra M (n, R).

Definição 10.2. Seja X : M → T M um campo de vetores de classe C s em M .


Uma curva integral de X de origem p ∈ M , é um caminho ϕ : (a, b) → M ,
ϕ ∈ C s , tal que ϕ(0) = p e ϕ0 (t) = X(ϕ(t)) , onde (a, b) é um intervalo aberto
contendo 0. A imagem ϕ(a, b) é uma órbita ou trajetória de X. Uma curva integral
é máxima quando seu domínio não pode ser estendido a um intervalo maior. Por
cada p ∈ M passa uma única trajetória (máxima) de origem p devido ao seguinte
teorema de equações diferenciais.

Proposição 10.3. Sejam V um aberto do Rm , yo ∈ V e f : V → Rm de classe


C 1 . Então a equação diferencial

dy
= f (y) , y(0) = y0
dt

tem uma única solução y : (a0 , b0 ) → V , de classe C 1 , onde (a0 , b0 ) é o maior


intervalo aberto contendo 0 no qual y está definida.
Considerando a solução também como função do ponto inicial, y será função
de t e de q, de modo que a condição para que y(t, q) seja curva integral de ponto
inicial q é

∂y
(t, q) = f (y(t, q)) , y(0, q) = q ,
∂t
e temos o seguinte teorema.

Proposição 10.4. Sejam V um aberto do Rm e f : V → Rm de classe C 1 .


Para cada ponto q ∈ V existem vizinhança W de q, um ε > 0 e uma função
∂y
y : (−ε, ε) × W → V de classe C 1 , tal que (t, q) = f (y(t, q)) , y(0, q) = q para
∂t
todo (t, q) ∈ (−ε, ε) × W .
Se t 7→ ϕ(t, p) é a curva integral de X ∈ C s de origem p ∈ M , então
ϕ : (−ε, ε)×W → M é de classe C s , onde W é uma vizinhança de p. Esta aplicação
ϕ(t, p) é o fluxo local gerado por X. É usual escrever ϕt (p) ao invés de ϕ(t, p).
Se s, t pertencem a (−ε, ε), se ϕt (ϕs (q)) e ϕt+s (q) estão definidos, então

185
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

ϕt (ϕs (q)) = ϕt+s (q) pois ambos, como funções de t, são curvas integrais de X com
ponto inicial ϕs (q) (correspondente a t = 0). Se o fluxo ϕ(t, p) está definido em
R × M , então ϕ é o fluxo global de X e, neste caso , dizemos que o campo X é
completo. Se ϕ é fluxo global, então ϕt : M → M é um difeomorfismo para cada
t ∈ R, cujo inverso é ϕ−t . Quando M m é uma variedade compacta, pode provar-se
que todo campo X : M → T M , X ∈ C s , é completo.

Obs. Seja X : M → T M um campo C s em M . Se p∈M e Xp = 0, a órbita


de X por p é {p}, e p é uma singularidade de X.

Proposição 10.5. Sejam ω uma 1-forma de classe C s , X e Y campos de classe


C s na variedade M m de classe C k , s < k.
Então: d ω(X, Y ) = Xω(Y ) − Y ω(X) − ω([X, Y ]).

Dem. A aplicação (X, Y ) 7−→ d ω(X, Y ) é bilinear, de modo que basta provar a
∂ ∂
fórmula acima no caso em que X = a , Y =b e ω = fk d xk numa carta
∂xi ∂xj
local x : U → Rm .ñ ô
∂ ∂ ∂b ∂ ∂a ∂
Temos: [X, Y ] = a ,b =a −b , donde
∂xi ∂xj ∂xi ∂xj ∂xj ∂xi






0 se k 6= i e k 6= j
Ç
∂b ∂a
å 
 ∂b
afj se k = j

ω([X, Y ]) = fk a δjk − b δik =  ∂xi
∂xi ∂xj 
 ∂a
−bfi se k = i



∂xj


0 se k 6= j
Ç å
∂ 
ω(Y ) = fk d xk b = bfk δjk =
∂xj  bfj se k = j



 0 se k 6= j
e Xω(Y ) = 
Ç å
∂ ∂fj ∂b
 a (bfj ) = a b + fj se k = j
∂xi ∂xi ∂xi

0 Çse k 6= i


Analogamente: Y ω(X) = 
å
∂fi ∂a
 b a + fi se k = i
∂xj ∂xj

186
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

Então:





0 se k 6= i e k 6= j

 ∂fj
ab se k = j

Xω(Y ) − Y ω(X) − ω([X, Y ]) =  ∂xi

 ∂fi
−ab se k = i.



∂xj

Por outro lado,


Ç å Ç å
∂ ∂ ∂fk ∂ ∂
d ω(X, Y ) = d fk ∧ d xk a ,b = d xl ∧ d xk a ,b =
P
∂xi ∂xj l ∂xl ∂xi ∂xj
Ç å Ç å
∂ ∂


d xl a d xl b
P ∂fk Ç ∂xi å Ç ∂xj å
∂fk
= = (abδil δjk − abδjl δik ) =
P

l ∂xl ∂ ∂
l ∂xl
d xk a d xk b


∂xi ∂xj






0 se k 6= i e k 6= j
Ç
∂fk ∂fk
å 
 ∂fj
ab se k = j

= ab δjk − δik = ∂xi
∂xi ∂xj 
 ∂fi
−ab se k = i ,



∂xj

o que prova o teorema.

Proposição 10.6. Sejam ϕ : M m → N n de classe C k , k ≥ 2, X e X1 campos


C k em M , Y e Y1 campos C k em N . Se d ϕ ◦ X = Y ◦ ϕ e d ϕ ◦ X1 = Y1 ◦ ϕ,
então d ϕ ◦ [X, X1 ] = [Y, Y1 ] ◦ ϕ.

Dem. Sejam f : N → R de classe C k , e p ∈ M .


Temos: [Y, Y1 ]ϕ(p) (f ) = Yϕ(p) (Y1 (f ))−Y1 |ϕ(p) (Y (f )) = d ϕp Xp (Y1 (f ))−d ϕp X1 |p (Y (f )) =
= Xp (Y1 (f ) ◦ ϕ) − X1 |p (Y (f ) ◦ ϕ) = Xp (d ϕ(X1 )(f )) − X1 |p (d ϕX(f )) = Xp (X1 f ϕ)−
−X1 |p (X f ◦ ϕ) = d ϕ[X, X1 ]p (f ), donde [Y, Y1 ] ◦ ϕ = d ϕ[X, X1 ].

Obs. Os campos como X e Y acima, isto é, tais que d ϕ ◦ X = Y ◦ ϕ são ditos ϕ-


relacionados.

187
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

10.2 Sistemas Diferenciais

Seja M m uma variedade de dimensão m e classe C k .

Definição 10.3. Um sistema diferencial de dimensão r, r ∈ N, r ≤ m, em M ,


é uma aplicação D que a cada p ∈ M associa um subespaço Dp , de dimensão r,
de Tp M . Dizemos que D é de classe C s , s < k, se, para cada p ∈ M , existem
carta local x : U → Rm , p ∈ U , e campos de vetores X1 , . . . , Xr , de classe C s ,
definidos em U , que formam uma base para Dq , qualquer que seja q ∈ U ; neste
caso, dizemos que {X1 , . . . , Xr } é uma base local de D em U .

Definição 10.4. Um sistema diferencial D de dimensão r e classe C s em M m é


completamente integrável
® se, para´ cada p ∈ M , existe carta local x : U → R ,
m

∂ ∂
p ∈ U , tal que ,..., seja base local para D em U . Dizemos que um
∂x1 ∂xr
campo de vetores X : M → T M pertence a D, e escrevemos X ∈ D, se
X(p) ∈ Dp para todo p ∈ M . Se X, Y ∈ D implica [X, Y ] ∈ D dizemos que
D é involutivo; neste caso, se {X1 , . . . , Xr } é base local de D , então [Xi , Xj ] =
r
= ckij Xk para 1 ≤ i, j ≤ r.
P
k=1

Proposição 10.7. Seja D um sistema diferencial de dimensão r e classe C s em


M m . Se D é completamente integrável, então D é involutivo.
® ´
∂ ∂
Dem. Existe carta local x : U → R tal que m
,..., seja base local de D
∂x1 ∂xr
r ∂ r ∂
em U . Sejam X = fi ,e Y = gj campos pertencentes a D. Temos:
P P
i=1 ∂xi j=1 ∂xj

ñ ô ñ ô Ç å
X ∂ ∂ X ∂ ∂ X ∂gj ∂ ∂fi ∂
[X, Y ] = fi , gj = fi gj , + fi − gj ∈ D,
i,j ∂xi ∂xj i,j ∂xi ∂xj i,j ∂xi ∂xj ∂xj ∂xi
ñ ô
∂ ∂
pois , = 0.
∂xi ∂xj
Proposição 10.8. Seja D um sistema diferencial de dimensão r e classe C s em
M m . Existe carta local y : V → Rm , y(p) = 0, tal que D tenha base local
∂ m ∂
{X1 , . . . , Xr }, em torno de p, da forma Xi = + cji (1 ≤ i ≤ r).
P
∂yi j=r+1 ∂yj

188
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

Dem. Seja y : V 0 → Rm ,
y(p) = 0 carta local em M , e seja {Y1 , . . . , Yr } base
m ∂
local de D em V 0 . Então, Yi = aji (1 ≤ i ≤ r), onde aji ∈ C s . Como
P
j=1 ∂yj
os Yi são linearmente independentes, a matriz A = (aij ) − r × m− tem posto r,
e podemos supor que B = (aki ) − r × r − (1 ≤ i, k ≤ r), é invertível no aberto
r
V ⊂ V 0 . Seja B −1 = (bki ) − r × r− e ponhamos Xi = bki Yk (1 ≤ i ≤ r).
P
k=1
Então,

r m ∂ r P r ∂ r m ∂ r ∂
Xi = bki ajk = ajk bki + ajk bki = δji +
P P P P P P
k=1 j=1 ∂yj k=1 j=1 ∂yj k=1 j=r+1 ∂yj j=1 ∂yj
Ç å
m r ∂ ∂ m ∂
+ ajk bki , donde Xi = + cji .
P P P
j=r+1 k=1 ∂yj ∂yi j=r+1 ∂yj

Corolário 10.1. Se D é involutivo a base local da Proposição 10.8 satisfaz [Xi , Xj ] = 0,


1 ≤ i, j ≤ r.

Dem. Para 1 ≤ i, j ≤ r, [Xi , Xj ] pertence ao espaço W1 gerado por ∂


∂yr+1
, . . . , ∂y∂m
 h i 
pois ∂y∂ i , ∂y∂ j = 0 e , como D é involutivo, [Xi , Xj ] pertence também ao espaço
W2 gerado por X1 , . . . , Xr . Seja Z ∈ W1 ∩ W2 ; então,
Ñ é
m r r m
X ∂ X X ∂ X ∂
Z= ak = bi X i = bi + cki ,
k=r+1 ∂yk i=1 i=1 ∂yi k=r+1 ∂yk

m
Å
∂ r r ∂ ã
donde ak − = bi
bi cki , donde bi = 0 e Z = 0, isto é,
P P P
k=r+1 i=1 ∂yk i=1 ∂yi
W1 ∩ W2 = {0}, e resulta [Xi , Xj ] = 0, 1 ≤ i, j ≤ r.

Proposição 10.9. Se X é um campo de vetores de classe C k em M , p∈M e



X(p) 6= 0, existe carta local x : U → Rm , p∈U x(p) = 0, tal que X =
∂x1
em U .

Dem. Seja α : A → M , A ⊂ Rm aberto, inversa de uma carta local, tal que 0 ∈ A,


∂α
α(0) = p, (0) = X(p), e definamos β : A → M por β(t, x2 , . . . , xm ) =
∂x1
∂β
= ϕt (α(0, x2 , . . . , xm )), onde ϕt é o fluxo local definido por X. Temos, (0) = X(p)
∂t
∂β ∂α
e (0) = (0) para i ≥ 2, donde a matriz jacobiana de β em 0 é invertível.
∂xi ∂xi
Resulta que β : B → M , B ⊂ A, é um difeomorfismo do aberto B ⊂ Rm no

189
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

aberto β(B) ⊂ M . Pondo x = β −1 : β(B) → B temos que x é carta local tal que

X= em U = β(B).
∂x1
Proposição 10.10. (Frobenius)
Seja D um sistema diferencial de dimensão r e classe C s em M m . Se D é
involutivo então D é completamente integrável.

Dem. (indução em r). O caso r = 1 decorre da Proposição 10.9. Suponhamos


r ≥ 2 e que o resultado seja verdadeiro para os sistemas involutivos de dimensão
(r − 1). Podemos supor que D tenha base local {X1 , . . . , Xr } tal que [Xi , Xj ] = 0,
1 ≤ i, j ≤ r. Pela hipótese de indução, existe carta local y : V → Rm , V conexo,
y(p) = 0, tal que o espaço W1 gerado por X1 , . . . , Xr−1 seja igual ao espaço W2
∂ ∂ ∂ r−1
gerado por ,..., , donde = aji Xj , 1 ≤ i ≤ r − 1, resultando
P
ñ ô ∂y1 ∂yr−1 ∂yi j=1
∂ r−1 r−1
, Xr = [aji Xj , Xr ] = − Xr (aji )Xj ∈ W1 (1 ≤ i ≤ r − 1) .
P P
∂yi j=1 j=1
ñ ô ñ ô
m ∂ ∂ m ∂ ∂ m ∂aj ∂
Como Xr = ai , temos , Xr = , aj = ∈ W2 ,
P P P
i=1 ∂yi ∂yi j=1 ∂yi ∂yj j=1 ∂yi ∂yj
∂aj
donde = 0 no conexo V , para r ≤ j ≤ m, 1 ≤ i ≤ r − 1, ou seja, as funções
∂yi
aj (r ≤ j ≤ m) independem de y1 , . . . , yr−1 .
r−1 ∂ m ∂
Pondo Y = Xr − ai = aj , temos que o espaço gerado por
P P
i=1 ∂yi j=r ∂yj
∂ ∂
X1 , . . . , Xr é igual ao espaço gerado por ,..., , Y , onde Y depende apenas
∂y1 ∂yr−1
de yr , . . . , ym . Pela Proposição 10.9 existe mudança de variáveis da forma:

xi = yi 1 ≤ i ≤ r − 1
xk = fk (yr , . . . , ym ) , r ≤ k ≤ m
® ´
∂ ∂ ∂ ∂ ∂
tal que = (1 ≤ i ≤ r − 1) e = Y . Logo, ,..., é
∂xi ∂yi ∂xr ∂x1 ∂xr
base local de D, e D é completamente integrável.

Exemplo 10.2.1. Se r = 1 temos um campo de direções. Todo campo de vetores


X, sem singularidades (Xp 6= 0 , p ∈ M ) define um campo de direções, onde Dp =
=reta gerada por Xp . Prova-se que, se M é simplesmente conexa, todo campo de
direções provém de um campo sem singularidades. Na esfera S 2 , por exemplo, não

190
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

existe campo contínuo de direções pois todo campo de vetores contínuo em S 2 tem
uma singularidade (teorema de Poincaré-Brouwer, Proposição 9.25 do Capítulo 9).

Exemplo 10.2.2. Em R2 seja ω = ad x + bd y onde a, b : R2 → R são C ∞ e


a2 + b2 6= 0. Se p = (x, y) ∈ R2 e v = (v1 , v2 ) ∈ Tp R2 , então ω(p, v) =
= a(p)v1 + b(p)v2 = 0 se, e só se, v é perpendicular ao vetor (a(p), b(p)). Assim, a
equação adx+bdy = 0 define o campo de direções D tal que Dp = reta perpendicular
a (a(p), b(p)).
∂ ∂ ∂
Exemplo 10.2.3. Em R3 , sejam X = , Y = +z e D(x, y, z) =plano
∂z ∂x ∂y

gerado por X e Y . Como [X, Y ] = não pertence a D, temos que D não é
∂y
completamente integrável.

Proposição 10.11. Seja D um sistema diferencial de dimensão r em M m . D


é de classe C s se, e só se, para cada p ∈ M , existem (m − r) 1-formas
ω1 , ω2 , . . . , ωm−r , de classe C numa vizinhança coordenada U contendo p, tais que
s

Dq = {v ∈ Tq M ; ωj (q; v) = 0 , 1 ≤ j ≤ m − r} ,

para todo q ∈ U . Dizemos que ω1 = . . . = ωm−r = 0 são equações locais para D


em U .

Dem. Sejam x : U → Rm carta local em M e {Xm−r+1 , . . . , Xm } uma base lo-


m ∂
cal de D em U . Então, Xα = aiα (m − r + 1 ≤ α ≤ m). Estendemos
P
i=1 ∂xi
{Xm−r+1 (p), . . . , Xm (p)} a uma base {X1 (p), . . . , Xm (p)} de Tp M , e seja Xj (p) =
m ∂
= aij (p) , onde aij ∈ R e 1 ≤ j ≤ m − r. Estendemos X1 (p), . . . , Xm−r (p)
P
i=1 ∂xi
m ∂
a U pondo Xj = aij , 1 ≤ j ≤ m − r , aij = constante. A matriz
P
i=1 ∂xi
A = (aik ) − m × m− é invertível em p, e, portanto, invertível numa vizinhança de
p, que podemos considerar como sendo U , de modo que {X1 , . . . , Xm−r , . . . , Xm }q
é base de Tq M para cada q ∈ U . Seja {ω1 , . . . , ωm−r , . . . , ωm } a base dual , isto
é, ωi (Xk ) = δik em cada q ∈ U ; é claro que ω1 , . . . , ωm−r são de classe C s e que
Dq = {v ∈ Tq M ; ωj (q, v) = 0, 1 ≤ j ≤ m − r} . A recíproca é análoga.

Proposição 10.12. Seja D um sistema diferencial de dimensão r e classe C s ,

191
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

no aberto U da variedade M m , de equações ω1 = . . . = ωm−r = 0 em U . São


equivalentes:

(a) D é completamente integrável;

(b) D é involutivo;
m−r
(c) existem 1−formas αij tais que dωi = αij ∧ ωj ;
P
j=1

(d) dωi = 0 quando restrita a D;

(e) dωi ∧ ω1 ∧ . . . ωm−r = 0 (1 ≤ i ≤ m − r).

Dem. (i) Já vimos que (a) ⇔ (b) .

(ii) (c) ⇒ (d) ⇔ (b): sejam X , Y campos de classe C 1 pertencentes a D, e


m−r
dωi = αij ∧ ωj . Então, dωi (X, Y ) = [αij (X)ωj (Y ) − αij (Y )ωj (X)] = 0,
P P
j=1 j
pois ωj (X) = ωj (Y ) = 0, donde (c) ⇒ (d) .
Mas, d ωi (X, Y ) = Xωi (Y ) − Y ωi (X) − ωi ([X, Y ]) = −ωi ([X, Y ]), donde
[X, Y ] ∈ D ⇔ d ωi (X, Y ) = 0, isto é, (d) ⇔ (b).

(iii) (d) ⇒ (c): seja {ω1 , . . . , ωm−r , . . . , ωm } base de (Tq M )∗ em cada q ∈ U,


e sejam X1 , . . . , Xm campos tais que Xm−r+1 , . . . , Xm formem base de
m
D em U . Então, d ωi = cijk ωj ∧ ωk e, para α, β > m − r temos
P
j,k=1
0 = d ωi (Xα , Xβ ) = cijk (ωj (Xα )ωk (Xβ ) − ωj (Xβ )ωk (Xα )) = cijk (δjα δkβ −
P P
j,k j,k
m−r
−δjβ δkα ), donde ciαβ − ciβα = 0 = 2ciαβ e, portanto, d ωi = αij ∧ ωj ,
P
j=1
r
onde αij = − cijk ωk , e (c) ⇔ (d).
P
k=1

(iv) (c) ⇔ (e): é claro que (c) ⇒ (e) . Seja θ uma 2− forma em U tal que
θ∧ω1 ∧. . .∧ωm−r = 0. Vamos provar que existem 1− formas αi (1 ≤ i ≤ m−r)
m−r
tais que θ = αi ∧ ωi . Seja {ω1 , . . . , ωm−r , . . . , ωm } base de (Tq M )∗ em cada
P
i=1
q ∈ U . Podemos escrever θ = aij ωi ∧ ωj , donde aij ωi ∧ ωj ∧ ω1 ∧ . . . ∧
P P
i<j i<j
∧ωm−r = 0, donde aij = 0 se m − r < i < j . Portanto, θ = aij ωi ∧ ωj .
P
i≤m−r
i<j

192
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

U
M
p
P

Rm−r
x(p) = (u1 , c)
Rr

U1 × U2

m−r
Pondo αi = − aij ωj , vem θ = αi ∧ ωi , e (c) ⇔ (e), o que termina a
P P
j>i i=1
demonstração da proposição 10.12.
Seja D um sistema diferencial de dimensão r e classe C s na variedade M m .

Definição 10.5. Se N é uma variedade e ϕ : N → M , ϕ ∈ C s , é uma imersão


injetiva, dizemos que (N, ϕ) é uma subvariedade imersa de M . Uma variedade
integral de D é uma subvariedade imersa N r de M m tal que Tp N = Dp para todo
p ∈ N (onde identificamos Tp N com ϕ0 (p) · Tp N e Dp significa Dϕ(p) ).

Proposição 10.13. Se D é completamente integrável, então por cada ponto de M m


passa uma variedade integral de D.

Dem. Se x : U → Rm®é carta local em ´ M , com x(U ) = U1 × U2 ⊂ R × R


r m−r
, U1
∂ ∂
e U2 discos abertos, e ,..., é base de D em U , então P = x−1 (U1 × c) é
∂x1 ∂xr
variedade integral (mergulhada) conexa de D passando por p ∈ U , onde x(p) = (u1 , c)
(c = constante). P é dita uma placa de D.

Obs. Se y : V → Rm , U ∩ V 6= ø, é outra carta local nas mesmas condições


de x acima, sejam x−1 (U1 × c) e y −1 (V1 × c0 ) as placas de D por p. Então,
(y ◦ x−1 )(u1 , c) = (u01 , c0 ), isto é, y ◦ x−1 leva o "plano" u2 = c no "plano" u02 = c0 ,
de modo que y◦x−1 (u1 , u2 ) = (h1 (u1 , u2 ), h2 (u2 )), a segunda coordenada dependendo
apenas de u2 .

Definição 10.6. Seja M m uma variedade C ∞ . Uma folheação de dimensão r e

193
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

classe C s de M é um atlas máximo F, de dimensão r, e classe C s , cujas mudanças


de coordenadas são do tipo acima, isto é, y ◦ x−1 (u1 , u2 ) = (h1 (u1 , u2 ) , h2 (u2 )).
Assim, todo sistema diferencial completamente integrável D, de classe C s ,
define uma folheação de classe C s em M . Reciprocamente, toda folheação F de
classe C s define um sistema diferencial completamente integrável de classe C s−1 ,
onde Dq = Tq F é o subespaço de Tq M tangente em q à placa de F que passa por
q.
Dado p ∈ M , seja x : U → U1 × U2 , p ∈ U , uma carta local de F. É
∂ ∂
claro que Dp é o espaço gerado pelos vetores (p), . . . , (p), e D é de classe
∂x1 ∂xr
C s−1 . Observemos, entretanto, que nem toda variedade M possui uma folheação de
dimensão r, já que nem todo sistema diferencial é completamente integrável.

Definição 10.7. Uma variedade integral máxima (N, ϕ) do sistema diferencial


D é uma variedade integral conexa de D cuja imagem em M m não está contida
propriamente em nenhuma outra variedade integral conexa de D.

Proposição 10.14. (Chevalley)


Seja D um sistema diferencial completamente integrável de dimensão r e classe
C s em M m . Por cada p ∈ M passa uma e uma única variedade integral máxima
N r de D, e toda variedade integral conexa de D que passa por p está contida em
N . N é a folha por p. Para uma demostração veja a referência [23]. Para o estudo
detalhado das folheações veja a referência [1].

Proposição 10.15. Seja D um sistema diferencial completamente integrável, de


dimensão r e classe C s , na variedade M m de classe C k , k > s. Seja
x : U → U1 × U2 ⊂ Rr × Rm−r carta local, onde U1 e U2 são discos abertos, tal que
, . . . , ∂x∂ r seja base local de D. Se N ∈ C s é uma variedade integral de D,
¶ ©

∂x1
então N ∩ U é uma reunião enumerável disjunta de componentes conexas, cada
uma delas contida numa única placa de D, abertas em N e mergulhadas em M . Se
f : Q → M é C s e f (Q) ⊂ N , então f : Q → N é C s .

Dem. A inclusão i : N → M é contínua, donde i−1 (U ) = N ∩ U é aberto em N


e, portanto, reunião enumerável disjunta de componentes conexas, cada uma delas
sendo um aberto de N . Seja V uma componente de N ∩ U , e p ∈ V arbitrário. Se

194
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

U M

q f N

B p = f (q)
Q
W

Rm−r
Rm−r
(0, c) x(p) = (u1 , c) π2 c

Rr
U1 × U2

r ∂
v ∈ Dp , então v = ai(p), donde (π2 ◦ x)0 (p)v = 0, donde (π2 ◦ x)0 (p) = 0,
P
i=1 ∂xi
donde π2 ◦ x|V = c = constante, e V está contida na placa P definida por xi = 0,
i ≥ r + 1.
Como P é mergulhada em M e i : V → M é de classe C s , resulta i : V → P
de classe C s ( Proposição 7.4 do Capítulo 7), imersão injetiva entre variedades de
mesma dimensão, donde difeo local, aplicação aberta e homeomorfismo de V sobre
um aberto de P .
Seja agora f : Q → M de classe C k , k ≥ s, f (Q) ⊂ N . Vamos provar
que f : Q → N é de classe C s . Pelo Corolário da Proposição 7.4 do Capítulo 7,
basta provar que f : Q → N é contínua. Sejam q ∈ Q , p = f (q) ∈ M , Pp a placa
por p e W uma vizinhança aberta de p em N . Podemos tomar U suficientemente
pequeno de modo que Pp ⊂ W . Como f : Q → M é contínua, existe vizinhança
conexa B de q tal que f (B) ⊂ U ∩ N donde f (B) está contida na componente
conexa de U ∩ N que contém p, donde f (B) ⊂ Pp ⊂ W , isto é, f : Q → N é
contínua, donde de classe C s .

Exemplo 10.2.4. Seja f : M m → N n submersão C ∞ . Para cada q ∈ N


sabemos que f −1 (q) ou é vazia ou é subvariedade C ∞ de dimensão (m − n) de
M , tal que Tp f −1 (q) = N f 0 (p). Pela forma local das submersões, existem cartas

195
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

locais x : U → U1 × U2 ⊂ Rm−n × Rn e y : V → Rn , p ∈ U , q = f (p) ∈ V


tais que fxy (u1 , u2 ) = u2 . Defina Dp = Tp f −1 (q) = N f 0 (p). O sistema diferencial
∂ ∂
D tem base local ,..., , donde é completamente integrável, e suas folhas
∂x1 ∂xm−n
são as componentes conexas de f −1 (q), q ∈ N .
Por exemplo, f : (−1, 1) × R → R, f (x, y) = (1 − x2 )ey é uma submersão.
Ela define uma folheação, da faixa (−1, 1) × R ⊂ R2 , cuja folhas são as curvas
(1 − x2 )ey = c > 0.

−1 0 1 R

Obs. Para uma aplicação da Proposição 10.14, veja a Proposição 11.12 do Capítulo
11.
C2
Exemplo 10.2.5. Sejam P, Q, R : A −→ R, onde A ⊂ R3 é aberto, e ω =
= P d x + Qd y + Rd z . A condição de integrabilidade da equação ω = 0, segundo
Frobenius, é que
Ç ω ∧ d ωå = 0. Ç å Ç å
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
Como d ω = − d y ∧d z + − d z ∧d x+ − d x ∧ d y,
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
resulta que a condição de integrabilidade é
Ç å Ç å Ç å
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂Q ∂P
P − +Q − +R − =0
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y

Se ω = Ad x + Bd y − d z, é fácil ver que a condição ω ∧ d ω = 0 se escreve


∂A ∂A ∂B ∂B z
+B = +A . Por exemplo, se d z = (y − 1)d x + d y, y > 1, é
∂y ∂z ∂x ∂z y−1
imediato que a condição de integrabilidade é verificada.

196
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

dx
Para achar as superfícies integrais, suponhamos z constante donde =
dy
−z z dz zd y
= 2
, que nos dá x = + ϕ(z), donde d x = − +
(y − 1) y−1 y − 1 (y − 1)2
+ϕ0 (z)d z, e comparando com a expressão de dz, obtemos ϕ0 (z) = 0, donde ϕ(z) = C
z
e, portanto, x = + C, e z = (y − 1)(x − C), que é a família de superfícies
z−1
integrais no aberto A = {(x, y, z) ∈ R3 |y > 1}.

Obs. Se d ω = 0 no aberto simplesmente conexo A, então as superfícies integrais


são as equipotenciais do campo (P, Q, R).

10.3 Campos vetoriais comutativos e fluxos

Proposição 10.16. Seja M m uma variedade de classe C k , k ≥ 2. Sejam X, Y


campos de vetores de classe C 1 em M , e θt o fluxo local de X em torno de p ∈ M .
Então:
d θ−t Yq − Yp
[X, Y ]p = lim ,
t→0 t
onde q = θt (p) e d θ−t = d θ−t (q).

Dem. Seja Ip ⊂ R o domínio da curva integral θp (t), e consideremos a curva γp (t) =


= d θ−t Yθt (p) = d θ−t Yq . É claro que γp (0) = Yp . Vamos mostrar que γp0 (0) = [X, Y ]p .
1º Caso: Xp 6= 0. Seja x : U → Rm uma carta local em torno de p, tal

que X = em U . O fluxo x(θt (p)) é da forma
∂x1
∂ ∂
(t, x1 , x2 , . . . , xm ) 7−→ (x1 + t, x2 , . . . , xm ), de modo que d θ−t · (q) = (p)
∂xi ∂xi
para todo i e todo t.
m ∂ C1
Se a expressão local de Y é Y = fi , onde fi : U −→ R, então
P
Ç å i=1 ∂xi
m ∂ m ∂
γp (t) = d θ−t Yq = d θ−t fi (q) (q) = fi (q) (p) e, portanto, γp0 (0) =
P P
i=1 ∂xi i=1 ∂xi
m d ∂ m ∂
= (fi ◦ θt ) (p) = Xp (fi ) (p).
P P
i=1 dt ∂xi i=1 ∂xi
ñ ô
∂ P m ∂ m ∂fi ∂ m ∂
Por outro lado, [X, Y ]p = , fi = (p) = Xp (fi ) (p),
P P
∂x1 i=1 ∂xi i=1 ∂x1 ∂xi i=1 ∂xi
e γp0 (0) = [X, Y ]p .

197
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

2º Caso: X = 0 numa vizinhança U de p. Então [X, Y ]p = 0. Curvas


integrais, com ponto inicial em U , são constantes, donde θt = id para todo t ∈ Ip ,
e γp (t) , é constante, donde γp0 (0) = 0 = [X, Y ]p .
3º Caso:Xp = 0 mas existe sequência pj → p com Xpj 6= 0 , donde
m ∂
γp0 j (0) = Xpj (fi ) (p) = [X, Y ]pj −→ γp0 (0) = [X, Y ]p por continuidade.
P
i=1 ∂xi
Proposição 10.17. Sejam M m e N n variedades de classe C k , k ≥ 2, e
C1
F : M −→ N . Sejam X e Y campos de vetores de classe C 1 em M e N , e fluxos θt
e ψt , respectivamente. X e Y são F − relacionados (isto é, d F (p).Xp = YF (p)) ⇔
⇔ ψt ◦ F = F ◦ θt .

Dem. Se Ip ⊂ R é o domínio da curva θp (t), então ψt ◦ F (p) = F ◦ θt (p) se, e


só se, ψF (p) (t) = F ◦ θp (t) para todo t ∈ Ip .
⇐ : ψF0 (p) (0) = d F (p)θp0 (0), donde d F (p)Xp = YF (p) .
⇒ : Seja a curva γp (t) = F θp (t), t ∈ Ip . Então, γp0 (t) = d F (q).θp0 (t) =
= d F Xq = YF (q) = Yγp (t) , onde q = θt (p) = θp (t) , o que mostra que γp (t) é uma
curva integral de Y com ponto inicial F (p) e, portanto, a curva integral máxima
ψF(p) coincide com γp (t) em Ip , donde F ◦ θp = ψF (p) , ou seja, ψt ◦ F = F ◦ θt .

Proposição 10.18. Sejam M m uma variedade C k , k ≥ 2, X e Y campos de


vetores de classe C 1 , com fluxos locais θt e ψt , respectivamente.
São equivalentes:

(a) [X, Y ] = 0. Neste caso dizemos que X e Y comutam;

(b) Y é invariante pelo fluxo de X, isto é, d θt Yp = Yθt (p) ;

(c) X é invariante pelo fluxo de Y ;

(d) θt ◦ ψs = ψs ◦ θt desde que definidos.

Dem. (a) ⇒ (b) . Seja Ip ⊂ R o domínio da curva integral θp (t), e seja


γp (t) = d θ−t · Yθt (p) = d θ−t · Yq . Como na Proposição 10.16, temos γp (t) =
m ∂
= fi (q) (p), e γp (0) = Yp .
P
i=1 ∂xi

198
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

[X, Y ] = 0 significa que γp0 (0) = 0. Vamos mostrar


que γp0 (t) = 0
d
para todo t ∈ Ip . Se t = t0 + s, então γp0 (t0 ) =
Ä ä
d θ−t · Yθt (p) =

dt t=t0
d Ä
ä d
= d θ−t 0 −s · Y θs (θt (p)) = d θ−t0
d θ−s · Yθs (θt0 (p)) = d θ−t0 [X, Y ]θt0 (p) = 0,
ds s=0 0
ds s=0
donde γp (t) = γp (0) para t ∈ Ip , e d θt Yp = Yθt (p) .
(b) ⇒ (a) : d θt · Yp = Yθt (p) = Yq nos dá d θ−t · Yq = Yp , donde
d θ−t · Yq − Yp
[X, Y ]p = lim = 0. Analogamente se prova que (a) ⇔ (c).
t→0 t
C1
(b) ⇒ (d): seja Dt o domínio de θt , e seja F = θt : Dt −→ θt (Dt ).

Pela Proposição 10.17, θt ◦ ψs = ψs ◦ θt no conjunto onde θt ◦ ψs está definida


se, e só se , d θt · Y = Y , ou seja, se , e só se, Y é θt − invariante. Analogamente,
trocando os papéis de X e Y , o mesmo acontece no conjunto onde ψs ◦ θt está
definido.

Obs. O posto de uma variedade é o número máximo de campos de vetores comu-


tativos linearmente independentes que a variedade admite. Em 1965, E.L. Lima
provou, dentre outras coisas, que S 3 tem posto um. Em 1970, H. Rosenberg, R.
Roussarie, e D. Weil acharam condições, necessárias e suficientes, para que uma
variedade, compacta orientada de dimensão três, tenha posto dois.

10.4 Variedades Simpléticas

Sejam V um espaço vetorial real, ξ = (e1 , . . . , em ) uma base ordenada de V e


b : V × V −→ R uma forma bilinear. Se bij = b(ei , ej ), então B = (bij ) − m × m−
m
é a matriz de b na base ξ. Se ξ 0 = (e01 , . . . , e0m ) é outra base de V , e e0j = pij ei ,
P
i=1
então a matriz de b na base ξ 0 é B 0 = P t BP , onde P = (pij ) − m × m− é
a matriz de passagem da base ξ para a base ξ 0 . O espaço L2 (V ; R) das formas
bilineares sobre V é, como sabemos, canônicamente isomorfo ao espaço L(V, V ∗ )
via o isomorfismo

199
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

ϕ : L2 (V ; R) → L(V, V ∗ )
b 7−→ ϕb : V −→ V ∗
u 7−→ ϕb (u) : V −→ R
v 7−→ ϕ(u)v = b(u, v)

Proposição 10.19. Com as notações acima, são equivalentes:

(a) b(u, v) = 0 ∀v ∈ V ⇒ u = 0;

(b) ϕb : V → V ∗ é um isomorfismo;

(c) B = (bij ) é invertível.

Dem. (a) ⇔ (b):


É claro que ϕb : V → V ∗ é linear. Seu núcleo é N ϕb = {u ∈ V ; ϕb (u) = 0} =
= {u ∈ V ; b(u, v) = 0 ∀v ∈ V } = {0} se, e só se, ϕb : V → V ∗ é um isomorfismo.
(b) ⇔ (c) :
Seja ξ ∗ = (e∗1 , . . . , e∗m ) a base dual de ξ = (e1 , . . . , em ).
Como ϕb (ei ) : V −→ R leva ej em b(ei , ej ) = bij , a matriz de ϕb : V −→ V ∗
nas bases ξ e ξ ∗ é [ϕb ]ξξ∗ = B = (bij ) e , portanto , ϕb é isomorfismo se, e só se,
B = (bij ) é invertível.

Definição 10.8. b ∈ L2 (V ; R) é não-degenerada se b satisfaz às propriedades


equivalentes da Proposição 10.1.

Definição 10.9. Uma forma simplética no espaço vetorial V é uma forma bilinear
2
alternada não-degenerada, isto é , é uma 2− forma ω ∈ ∧ V ∗ tal que ω(u, v) = 0
∀v ∈ V ⇒ u = 0 . (V, ω) é um espaço vetorial simplético.

Exemplo 10.4.1. Sejam V = R2n , ξ = (u1 , v1 , . . . , un , vn ) base ordenada de R2n


e ξ ∗ = (u∗1 , v1∗ , . . . , u∗n , vn∗ ) a base dual.
n
A 2− forma ω = u∗i ∧ vi∗ é uma forma simplética em R2n . Ela é tal
P
i=1
que: ω(ui , vj ) = −ω(vj , ui ) = δij ; ω(ui , uj ) = 0 = ω(vi , vj ). Reciprocamente, se
2
ω ∈ ∧(R2n )∗ e existe base ξ de R2n tal que as igualdades acima sejam satisfeitas,

200
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

n n
então ω é dada por ω = u∗i ∧ vi∗ . De fato, temos ω = aij u∗i ∧ vj∗ , donde
P P
i=1 i,j=1

δir 0 n

aij δir δjs = ars , e ω = u∗i ∧ vi∗ .

δrs = ω(ur , vs ) = aij =
P P P
0 δjs

i,j ij i=1

Obs. Seja ξ = (u1 , v1 , . . . , un , vn ) como acima e F = (u1 , . . . , un , v1 , . . . , vn ). A


n
matriz de ω = u∗i ∧ vi∗ na base ξ é a matriz
P
i=1

 
0 1
−1 0

 0 1
0 

−1 0
e det Ωξ = 1 ,
 
Ωξ =
...
 
 
 
 0 0 1

−1 0
 
0 In 
enquanto que a matriz de ω na base F é ΩF =  e det ΩF = 1.
−In 0
A base F = (u1 , . . . , un , v1 , . . . , vn ) é dita simplética.
Em R2 , ω = d x ∧ d y, e toda 2− forma é múltiplo de d x ∧ d y, ou seja, em
dimensão 2 toda 2− forma 6= 0 é simplética.

Definição 10.10. Sejam (V, ω) um espaço vetorial simplético e W ⊂ V um


subespaço vetorial. O ortogonal simplético de W é o subespaço
W ⊥ = {u ∈ V ; ω(u, v) = 0 ∀v ∈ W } .

Proposição 10.20. dim V = dim W + dim W ⊥ .

Dem. Se (t1 , . . . , tk ) é base de W então f1 = ϕω (t1 ), . . . , fk = ϕω (tk ) são


L. I. pois ϕω : V −→ V é isomorfismo. Sejam v1 , . . . , vk em V tais que

fj (vi ) = δji , 1 ≤ i, j ≤ k, e ξ : V → Rk dada por ξ(v) = (f1 (v), . . . , fk (v)). Dado


k
(x1 , . . . , xk ) ∈ Rk , seja v = xi vi . Então, fj (v) = xj , ou seja, ξ(v) = (x1 , . . . , xk ),
P
i=1
donde ξ é (linear) sobrejetora. Seu núcleo é N ξ = {v ∈ V ; f1 (v) = . . . = fk (v) = 0} =
= {v ∈ V ; ω(t1 , v) = . . . = ω(tk , v) = 0} = W ⊥ . Portanto, dim W ⊥ =
= dim V − k = dim V − dim W .

Definição 10.11. Sejam (V, ω) um espaço vetorial simplético, e W ⊂ V um


subespaço. Dizemos que:

(a) W é simplético se W ∩ W ⊥ = {0};

201
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

(b) W é isotrópico se W ⊂ W ⊥ ;

(c) W é coisotrópico se W ⊥ ⊂ W ;

(d) W lagrangiano se W = W ⊥ .

Proposição 10.21. Seja (V, ω) um espaço vetorial simplético de dimensão m.


n
Então, m é par e existe base de V , ξ = (u1 , v1 , . . . , uv , vn ), tal que ω = u∗i ∧ vi∗ .
P
i=1

Dem. (indução).
Se m = 0, nada a provar. Suponhamos o teorema verdadeiro para dim V < m,
m ≥ 1. Como ω é não-degenerada, existem u1 , v1 ∈ V tais que ω(u1 , v1 ) = 1.
u1 e v 1 são L.I. ( pois v1 = λu1 ⇒ ω(u1 , v1 ) = 0). Seja W = S(u1 , v1 ) o espaço
gerado por u1 e v 1 , donde dim W ⊥ = m − 2. Vamos provar que W ∩ W ⊥ = {0};
de fato, seja v = au1 + bv1 ∈ W ∩ W ⊥ . Então 0 = ω(u1 , v) = b e 0 = ω(v, v1 ) = a ,
ou seja v = 0. Resulta que W é simplético, donde W ⊥ é simplético (pois(W ⊥ )⊥ =
= W ). Por indução, dim W ⊥ é par, donde m = 2n é par, e existe base do
tipo (u2 , v2 , . . . , un , vn ) para W ⊥ , e F = (u1 , . . . , un , v1 , . . . , vn ) é base simplética
para (V, ω). Como vimos, na base ξ = (u1 , v1 , . . . , un , vn ) a 2−forma ω se escreve
n
ω= u∗i ∧ vi∗ , onde ξ ∗ = (u∗1 , v1∗ , . . . , u∗n , vn∗ ) é a base dual de ξ.
P
i=1

Definição 10.12. Sejam (V1 , ω1 ) e (V2 , ω2 ) espaços vetoriais simpléticos.


Um isomorfismo T : V1 −→ V2 é dito simplético se T ∗ ω2 = ω1 .

Obs. O conjunto Sp(V, ω), dos automorfismos simpléticos do espaço vetorial sim-
plético (V, ω), é um subgrupo do grupo SL(V ) dos automorfismos de determinante
igual a 1 de V . Vimos que na base F = (u1 , . . . , un , v1 , . . . , vn ) a matriz de ω é
0 In 
J =  . Se M é a matriz do automorfismo T : V → V na base F ,
−In 0
T é simplético ⇔ M t JM = J. De fato, se u, v ∈ V , X = [u]F , Y = [v]F
então ω(u, v) = X t JY e (T ∗ ω)(u, v) = ω(Tu , Tv ) = (M X)t J(M Y ) = X t M t JM Y
e, portanto, T ∗ ω = ω se, e só se, M t JM = J · Sp(V, ω) é o grupo simplético.

Definição 10.13. Seja M 2n uma variedade de classe C k , k ≥ 2. Se ω é uma


2−forma fechada (d ω = 0) e não degenerada de classe C s em M , dizemos que
2
(M, ω) é uma variedade simplética, ou seja, p ∈ M 7−→ ωp ∈ ∧(Tp M )∗ é tal que ω p

202
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

é simplética para cada p ∈ M . Se (M1 , ω1 ) e (M2 , ω2 ) são variedades simpléticas


e f : M1 → M2 é um difeomorfismo tal que f ∗ ω2 = ω1 , dizemos que f é um
difeomorfismo simplético. Uma subvariedade N ⊂ M é simplética, isotrópica,
coisotrópica, lagrangiana se, para cada p ∈ N , o subespaço Tp N ⊂ Tp M tem essa
propriedade.

Exemplo 10.4.2. Se ξ = (u1 , v1 , . . . , un , vn ) é a base canônica de R2n e ξ ∗ =


n
= (u∗1 , v1∗ , . . . , u∗n , vn∗ ) = (d x1 , d y1 , . . . , d xn , d yn ) é a base dual, então ω = u∗i ∧
P
i=1
n
∧vi∗ = d xi ∧ d yi é a forma simplética canônica em R . 2n
P
i=1

Exemplo 10.4.3. Se M 2 é uma variedade de dimensão dois e ω é uma 2−forma em


M tal que ωp 6= 0 para todo p ∈ M , então (M, ω) é uma variedade simplética.

Suponhamos que um corpo rígido tenha 0 ∈ R3 como ponto fixo. A confi-


guração do corpo num instante t é dada pela transformação linear que leva a base
canônica do R3 numa base ortogonal positiva fixada ao corpo, isto é, o espaço de
configuração do corpo é o grupo SO(3) das rotações do espaço. Sabemos que
SO(3) é uma variedade de dimensão três e classe C ∞ , e dizemos que três é o
número de graus de liberdade. Em geral, o espaço de configuração de um sistema
dinâmico a n graus de liberdade é uma variedade M n de dimensão n. Cada ponto
da variedade representa um estado do sistema dinâmico. Se x : U → Rn é uma
carta local em M , as coordenadas x1 = q1 , . . . , xn = qn são as "coordenadas
generalizadas". Um vetor tangente a M é um "vetor velocidade", cujas compo-
nentes são escritas q˙1 , q˙2 , . . . , q˙n : são as "velocidades generalizadas". O fibrado
tangente T M é o espaço (q, q̇) das velocidades generalizadas. Um sistema lagran-
giano autônomo é definido pelo espaço de configuração M e uma função chamada
C2
lagrangiana, L : T M −→ R. Se L(q, q̇) é a expressão local de L nas coorde-
C1
nadas (q, q̇) = (q1 , . . . , qn , q˙1 , . . . , q˙n ) de T M , prova-se que γ : R −→ M é um
∂L d ∂L
movimento neste sistema lagrangiano se, e só se, − = 0 sobre a curva
∂q dt ∂ q̇
γ(t). O espaço cotangente T ∗ M é o espaço de fases do sistema dinâmico. Para
cada carta local x : U → Rn em M , tem-se a carta local em T ∗ M dada por
x̄ : π −1 (U ) −→ x(U ) × (Rn )∗ , x̄(m, α) = (q1 , . . . , qn , p1 , . . . , pn ), onde
0 −1
(m, α) 7−→ (x(m), αx (m) )
n

π : T M → M é a projeção do fibrado, α = ai d qi é a expressão local de α e
P
i=1

203
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

pi = ai ◦ π; p1 , . . . , pn são os "momentos generalizados".


Vimos, no final da seção 9.2 do Capítulo 9, que a 1− forma λ de Poincaré tem
n
expressão local λ(m, α) = π ∗ α = pi d qi . A 2−forma de Poincaré é ω = d λ,
P
i=1
n
que se escreve localmente como ω = d pi ∧ d qi . É a forma simplética canônica
P
i=1
do fibrado cotangente T ∗ M . É claro que λ ∈ C k−1 se M ∈ C k . Como ω n =
n
= ω∧ .^. . ∧ω = ±n!d q1 ∧ d q2 ∧ . . . d qn ∧ d p1 ∧ . . . ∧ d pn nunca se anula, resulta que
n
T ∗ M é sempre orientável, M o sendo ou não. A 2n− forma ω n = ω∧ .^. . ∧ω é a
forma de Liouville ou forma volume simplético para o espaço de fases. Um sistema
hamiltoniano autônomo é definido pelo espaço de fases T ∗ M , uma forma simplética ω
Ck
e uma função H : T ∗ M → R, a hamiltoniana. Seja L : T M −→ R a lagrangiana
P
e seja P : T M → T ∗ M definida em coordenadas locais por (q, q̇) 7−→ (q, p),
∂L
q i = qi , pi = .
∂ q̇i
n ∂pi n ∂pi n ∂ 2L ∂ 2L
Temos: P ∗ d pi = d qj + d q̇j = d qj + d q̇j .
P P P
j=1 ∂qj j=1 ∂ q̇j j=1 ∂qj ∂ q̇i ∂ q̇j ∂ q̇i
∂ 2L
Logo, P ∗ (dq1 ∧ . . . ∧ dqn ∧ dp1 ∧ . . . ∧ dpn ) = det dq1 ∧ . . . ∧ dqn ∧
∂ q̇j ∂ q̇i
∂ 2L
∧dq̇1 ∧ . . . ∧ dq̇n . Supondo det 6= 0, podemos exprimir localmente q̇ em
∂ q̇j ∂ q̇i
∂L d ∂L
termos de q e p, e as "equações de Lagrange" = dão origem, no espaço
∂qi dt ∂ q̇i
dqi ∂H d pi ∂H
de fases, às "equações de Hamilton": = e = − , se definimos
dt ∂pi dt ∂qi
H(q, p) = p dq − L(q, q̇).
De fato, temos:

∂H ∂H ∂L ∂L ∂L
dH = dq + dp = pdq̇ + q̇dp − dq − dq̇ = pdq̇ + q̇dp − dq − pdq̇ =
∂q ∂p ∂q ∂ q̇ ∂q
∂L
= q̇dp − dq = q̇dp − ṗdq,
∂q

∂H dp ∂H dq
donde =− e = , como queríamos.
∂q dt ∂p dt
n ∂ n ∂
Seja X um campo de vetores em T ∗ M , X = ai + bj . As curvas
P P
i=1 ∂qi j=1 ∂pj

204
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

dqi ∂H
integrais de X satisfazem às equações de Hamilton se, e só se, ai = =
Ç å dt ∂pi
dpi ∂H n ∂H ∂ ∂H ∂
e bi = = − , ou seja X = − . É fácil ver que
P
dt ∂qi i=1 ∂pi ∂qi ∂qi ∂pi
n
iX ω = −bi dqi + ai dpi , de modo que iX ω = dH, e X = XH é chamado de
P
i=1
campo de vetores hamiltoniano. O fluxo (ϕt ) gerado por X é o fluxo hamiltoniano.
Como iX ω = dH temos que XH H = dH(XH ) = ω(XH , XH ) = 0, ou seja H
é constante ao longo do campo XH . Se c é valor regular de H, então H −1 (c) é
subvariedade tal que Tp H −1 (c) = N (dH(p)). Como dH(XH ) = 0 temos que
XH (p) é tangente a H −1 (c) em p ∈ H −1 (c).

Proposição 10.22. Sejam M variedade compacta de classe C k , k ≥ 2, e


α : M → T ∗ M uma 1−forma de classe C 1 em M . α é um mergulho e dα = 0 ⇔
⇔ α(M ) ⊂ T ∗ M é subvariedade lagrangiana.

Dem. Sejam (q, p) = (q1 , . . . , qn , p1 , . . . , pn ) coordenadas locais em T ∗ M e α =


n
= ai d qi a expressão local de α. Para q ∈ M temos α(q) = (q1 , . . . , qn , a1 (q), . . . ,
P
i=1
. . . , an (q)), de modo que α é uma imersão. Se π : T ∗ M −→ M é a projeção do
fibrado, temos π ◦ α = idM , de modo que α é injetora. Seja g = α−1 : α(M ) −→ M .
Provemos que g é contínua. Para isso, seja F ⊂ M fechado, donde α(F ) = g −1 (F ) é
fechado em α(M ) (pois α(M ) é compacto), ou seja, g é contínua e α : M −→ T ∗ M é
um mergulho. Como dim α(M ) = n, α(M ) é subvariedade lagrangiana ⇔ α∗ ω = 0,
onde ω = d λ é a 2− forma de Poincaré em T ∗ M . Ora, α∗ λ = α∗ ( pi d qi ) =
P

= ai d qi = α, donde α∗ ω = α∗ d λ = d(α∗ λ) = d α, donde a tese.


P

Proposição 10.23. (Darboux)


Seja ω uma forma simplética na variedade M 2n de classe C k . Para cada
p ∈ M existe carta local em torno de p, ϕ : U → R2n , ϕ(q) = (xi (q), yi (q)) tal
n
que ω = d xi ∧ d yi . Para a demonstração desse teorema fundamental veja a
P
i=1
Referência [5].

Obs. Se D é um sistema diferencial de dimensão (m − 1) numa variedade M m de


classe C ∞ , isto é, se D é um campo de hiperplanos em M , sabemos que D ∈ C ∞ se,
e só se, para cada p ∈ M , existe 1−forma α ∈ C ∞ numa vizinhança coordenada
U de p, tal que Dq = {v ∈ Tq M ; α(q; v) = 0} qualquer que seja q ∈ U , ou seja,

205
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

α = 0 é equação local para D em U . Se α ∧ dα = 0, o teorema de Frobenius nos


diz que D é completamente integrável em U . Numa direção oposta a esta temos:

Definição 10.14. Seja M m uma variedade de classe C ∞ e dimensão m = 2n + 1.


Uma estrutura de contato em M é definida pela existência de uma 1− forma α
globalmente definida em M , tal que α ∧ (d α)n 6= 0 em todo ponto de M . η =
= α ∧ (dα)n é uma forma volume em M , de modo que M é orientável. O campo
de hiperplanos ξ = ker α é não-integrável em M . Se β é outra 1−forma tal que
ξ = ker β, então β = λα, onde λ ∈ C ∞ e λ(p) 6= 0 em todo p ∈ M , de modo que
β ∧ (d β)n = λn+1 α ∧ (d α)n 6= 0.

Obs. No caso particular importante de n = 1(m = 3), a condição α ∧ d α 6= 0


pode ser escrita d α|ξ 6= 0. Se X, Y ∈ ξ são L.I., então d α(X, Y ) = X(α(Y ))−
−Y (α(X)) − α([X, Y ]) = −α([X, Y ]) 6= 0, ou seja, α ∧ d α 6= 0 equivale a X, Y ∈ ξ,
L.I, ⇒ [X, Y ] ∈
/ ξ.

Exemplo 10.4.4. Em R3 , α = dz + x dy é uma forma contato pois α ∧ dα =


= dx ∧ dy ∧ dz.

Exemplo 10.4.5. Em S 3 , α0 = xdy − ydx + zdt − tdz é uma forma contato pois
dα0 = 2(dx ∧ dy + dz ∧ dt) e αo ∧ dα0 = 2xdy ∧ dz ∧ dt − 2ydx ∧ dz ∧ dt + 2zdx∧
∧dy ∧ dt − 2tdx ∧ dy ∧ dz 6= 0 em S 3 , pois d(α0 ∧ dα0 ) = 8dx ∧ dy ∧ dz ∧ dt 6= 0.

Exemplo 10.4.6. Seja (N 2n+2 , ω) uma variedade simplética. Um campo de vetores


C∞
X : N −→ T N é dito de Liouville se d(iX ω) = ω. Seja M 2n+1 uma hipersuperfície
de N transversal a X, isto é, tal que Xp ∈ / Tp M , p ∈ M . Neste caso, α = iX ω é
uma forma contato em M . De fato, α ∧ (dα)n = (iX ω) ∧ (d(iX ω))n = (iX ω) ∧ ω n .
Mas, iX ω 2 = iX (ω ∧ω) = 2(iX ω)∧ω e , por indução, iX ω n+1 = (n+1)(iX ω)∧ω n ,
1
donde (iX ω) ∧ ω n = iX (ω n+1 ) 6= 0, pois ω é não-degenerada (e fechada).
n+1
1
Se N = R4 , M = S 3 , ω = dx ∧ dy + dz ∧ dt, então X = (xe1 + ye2 +
2
1
+ze3 + te4 ) é de Liouville, e se v = (v1 , v2 , v3 , v4 ), temos (iX ω)(v) = (xv2 −
2
1 1
−yv1 + zv4 − tv3 ) = (xdy − ydx + zdt − tdz)(v), donde iX ω = α0 , como no
2 2
exemplo acima de S 3 .

206
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

10.5 Exercícios do Capítulo 10


∂ ∂ ∂ ∂
(1) Consideremos em R3 os campos X =z + ; Y = + ; Z =
∂x ∂z ∂y ∂z
∂ ∂
z − . Prove que X, Y , Z definem um sistema diferencial involutivo de
∂x ∂y
classe C ∞ em R3 , e ache sua dimensão.

(2) Seja D = {(x, y, z) ∈ R3 |x > 0, y > 0, z > 0}. Considere em D os campos


∂ ∂ ∂ ∂
X =x − 2y e Y = xy − xz . Prove que eles geram um sistema
∂x ∂y ∂y ∂z
diferencial involutivo em D, e que x2 yz = constante é superfície integral.

(3) Ache as curvas integrais do campo de vetores em R3 definido por X = y +
∂x
∂ ∂
+y +2 .
∂z ∂z
(4) Para cada t ∈ R, seja ϕt : R2 → R2 tal que ϕt (x, y) = (x cos t+
+y sen t, −x sen t + y cos t). Prove que (ϕt ) é um grupo a 1 parâmetro de trans-
formações de R2 , ache o campo de vetores associado e descreva as órbitas.

(5) Seja o sistema


∂z
= h(x, y, z)
∂x

∂z
= g(x, y, z)
∂y
onde g e h são C ∞ num aberto do R3 .
∂ ∂ ∂ ∂
Sejam: X = +h , Y = +g .
∂x ∂z ∂y ∂z
(a) Se z = f (x, y) é uma solução do sistema, prove que X e Y geram o espaço
tangente em cada ponto da superfície z = f (x, y) em R3 .
(b) Seja D o sistema diferencial gerado por X e Y . Prove que D involutivo
equivale a fxy = fyx .

(6) Sejam (V, ω) um espaço vetorial simplético, dim V = 2n, e W ⊂ V um


subespaço. Prove:

(a) (W ⊥ )⊥ = W.

207
CAPÍTULO 10. SISTEMAS DIFERENCIAIS

(b) W é simplético ⇔ ω|W é não -degenerada.


(c) W é isotrópico ⇔ ω|W = 0.
(d) W é lagrangiano ⇔ ω|W = 0 e dim W = n.

(7) Seja (V, ω) um espaço vetorial simplético, dim V = 2n. Existe base ξ =
= (u1 , v1 , . . . , un , vn ) tal que:

(a) W simplético ⇒ W = S(u1 , v1 , . . . , uk , vk ) para algum k.


(b) W isotrópico ⇒ W = S(u1 , u2 , . . . , uk ) para algum k.
(c) W coisotrópico ⇒ W = S(u1 , . . . , un , v1 , . . . , vk ) para algum k.
(d) W lagrangiano ⇒ W = S(u1 , . . . , un ) , onde S(u, v, ω, . . .) significa o
espaço gerado por u, v, ω, . . ..

208
Capítulo 11

Grupos de Lie

Neste capítulo introduzimos os conceitos básicos da teoria dos grupos de Lie


G e de seus subgrupos fechados H. Estudamos as ações de G numa variedade M ,
enunciamos o teorema central sobre o espaço de órbitas M/G , e o aplicamos ao caso
dos espaços homogêneos M = G/H , onde H é um subgrupo de Lie de G. Dentre
outros exemplos, consideramos as variedades de Grassmann. Após introduzir o
conceito de álgebra de Lie G do grupo de Lie G, demonstramos, usando o teorema
de Frobenius, que para toda subálgebra H de G existe um grupo de Lie H, que é
subgrupo conexo de G e variedade imersa, cuja álgebra de Lie é H. Terminamos
com o teorema de Weyl sobre a existência de um produto interno G−invariante no
espaço vetorial real V quando se tem uma representação linear de G em V .

11.1 Generalidades sobre Grupos de Lie

Definição 11.1. Um grupo de Lie G é um grupo, que é também uma variedade


diferencial de classe C ∞ , no qual as operações de grupo , (x, y) 7−→ xy e
x 7−→ x−1 , são de classe C ∞ .
Obs. É fácil verificar que se as operações de grupo são C ∞ então a aplicação
(x, y) 7−→ xy −1 é C ∞ , e reciprocamente.
Exemplo 11.1.1. GL(n, R) = {X ∈ M (n, R) ; det X 6= 0} é subvariedade C ∞ de
M (n, R) ' Rn , e um grupo com a operação de multiplicação matricial. Como
2

209
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

(X, Y ) −→ XY −1 é uma aplicação C ∞ de GL(n, R) × GL(n, R) −→ GL(n, R),


resulta que GL(n, R) é um grupo de Lie de dimensão n2 .

Exemplo 11.1.2. Seja C∗ = R2 − {0} o conjunto dos complexos não-nulos. Com


a multiplicação de complexos C∗ é um Ç grupo. Se z = å
(x, y) e z 0 = (x0 , y 0 ), então
x −y
zz 0 = (xx0 − yy 0 , xy 0 + yx0 ) e z −1 = , 2 .
x + y x + y2
2 2

Resulta que (z, z 0 ) 7−→ zz 0 e z 7−→ z −1 são de classe C ∞ , e C∗ é um grupo


de Lie (de dimensão 2).

Exemplo 11.1.3. Sejam G e H grupos de Lie. O produto cartesiano G × H tem,


como vimos, estrutura de variedade diferencial, a saber, se x : U −→ Rm é
carta em G e y : V −→ Rn é carta em H, então x × y : U × V −→ Rm+n ,
(x × y)(g, h) = (x(g), y(h)) é carta em G × H. O produto G × H tem também
estrutura de grupo com a multiplicação (g1 , h1 )(g2 · h2 ) = (g1 g2 , h1 h2 ). É imediato
verificar que , então, G × H , é um grupo de Lie .

Obs. Se a ∈ G , as translações La : x ∈ G 7−→ ax ∈ G e Ra : x ∈ g 7−→ xa ∈ G


são difeomorfismos, bem como x 7−→ x−1 , e os automorfismos internos x 7−→ axa−1 .
Se V percorre um sistema fundamental de vizinhanças do elemento neutro e ∈ G,
então os conjuntos aV (resp. V a) formam um sistema fundamental de vizinhanças
de a.
Como (x, y) 7−→ xy −1 é contínua em (e, e), dada uma vizinhança U de e,
existe vizinhança V de e tal que V · V −1 ⊂ U , onde V −1 = {g −1 ∈ G ; g ∈ V } . E,
como x 7−→ axa−1 é contínua em e, existe vizinhança W de e tal que aW a−1 ⊂ U .
Uma vizinhança V de e é simétrica se V = V −1 . Se U é vizinhança de e,
U −1 também o é, e V = U ∩ U −1 é vizinhança simétrica de e contida em U . Logo,
as vizinhanças simétricas de e formam um sistema fundamental de vizinhanças de
e em G.

Proposição 11.1. Sejam G um grupo de Lie, e H um subgrupo que é também uma


subvariedade (mergulhada). Então H é um grupo de Lie .

Dem. Vamos provar que g : H × H −→ H , g(x, y) = xy −1 é de classe C ∞ .

210
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

Sejam:
f : G × G → G, f (x, y) = xy −1 ;
j : H × H → G × G, j(x, y) = (x, y);
i : H → G, i(x) = x.
f ∈ C ∞ por hipótese, j ∈ C ∞ , pois H × H é subvariedade de G × G, e i é
mergulho C ∞ , pois H é subvariedade de G, e temos o diagrama comutativo

i
H G

g f ◦j

H ×H

isto é, i ◦ g = f ◦ j.
Pela Proposição 7.4 do Capítulo 7 resulta que g ∈ C ∞ , donde H é um grupo
de Lie .

Exemplo 11.1.4. S 1 = {z ∈ C∗ ; |z| = 1} é um grupo com a operação de


multiplicação de complexos, um subgrupo de C∗ . S 1 sendo subvariedade de C∗ =
= R2 − {0}, resulta que S 1 é um grupo de Lie e que T n = S 1 × · · · × S 1 − o toro
n−dimensional − é também um grupo de Lie . Como S 1 é um grupo comutativo,
T n também é comutativo.

Definição 11.2. Se G é um grupo de Lie e H é um subgrupo de G que é também


uma subvariedade de G, dizemos que H é um subgrupo de Lie de G. (A Proposição
11.1 garante que H é um grupo de Lie ).

Proposição 11.2. Se H é um subgrupo de Lie de G, então H é fechado em G.

Dem. Sejam x ∈ H e V vizinhança de e em G tal que V ∩ H seja compacta.


Seja W uma vizinhança simétrica de e em G tal que W 2 ⊂ V . Então xW é
vizinhança de x e xW ∩ H 6= ø. Se y0 ∈ xW ∩ H, para cada y ∈ xW ∩ H
temos y0−1 · y = ω0−1 x−1 xω = ω0−1 ω ∈ W 2 ∩ H ⊂ V ∩ H, donde y ∈ y0 (V ∩ H).
Como y0 (V ∩ H) é compacto, é fechado em G. Assim, para cada y ∈ xW ∩ H
achamos vizinhança fechada y0 (V ∩ H) de y0 tal que y ∈ y0 (V ∩ H) ⊂ H, donde
xW ∩ H ⊂ xW ∩ H ⊂ y0 (V ∩ H) = y0 (V ∩ H) ⊂ H, ou seja, x ∈ H e H é fechado
em G.

211
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

Exemplo 11.1.5. (a) O(n, R) = {X ∈ GL(n, R); XX t = In } é subgrupo de Lie;

(b) SL(n, R) = {X ∈ GL(n, R) ; det X = 1} é subgrupo de Lie;

(c) SO(n, R) = 0(n, R) ∩ SL(n, R) é subgrupo de Lie de GL(n, R);

(d) S 1 ⊂ C∗ é subgrupo de Lie.

Exemplo 11.1.6. Seja c ∈ R um irracional. A aplicação

g f Ä ä
h : t ∈ R 7−→ (t, ct) ∈ R2 7−→ e2πit , e2πict ∈ T 2 = S 1 × S 1

é uma imersão injetora, como se verifica sem dificuldade . Além disso, h ∈ C ∞ e h


é um homomorfismo de grupos, de modo que sua imagem h(R) em T 2 é um subgrupo
e uma subvariedade imersa, mas h(R) não é fechado em T 2 ; pode provar-se que h(R)
é denso em T 2 .

Obs. Sejam G e H dois grupos de Lie. Se H é subgrupo de G e subvariedade imersa


fechada de G, pode provar-se que H é subvariedade (mergulhada) de G e, portanto,
um subgrupo de Lie de G. Muitos autores, na definição de subgrupo de Lie H de G,
exigem que H seja apenas subvariedade imersa de G (e não mergulhada). É o caso
de h(R) no Exemplo 6 acima.

Definição 11.3. Sejam G um grupo de Lie e M uma variedade de classe C ∞ .


Uma ação (à esquerda) de G em M é uma aplicação θ : G × M −→ M de classe
C ∞ , θ(g, p) = g · p, tal que:

(i) e · p = p , onde e é o elemento neutro de G;

(ii) g1 · (g2 · p) = (g1 · g2 ) · p, quaisquer que sejam p ∈ M , g1 e g2 em G.

Obs. Analogamente se define uma ação à direita de G em M .


Para g ∈ G, se θg : M → M é definida por θg (p) = θ(g, p) = g · p, então θg
é um C ∞ −difeomorfismo cujo inverso é θg−1 = θg−1 . As condições (i) e (ii) acima
se escrevem também como:

(i) θe = idM ;

212
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

(ii) θg1 · θg2 = θg1 g2 .

O grupo de isotropia de p ∈ M é Gp = {g ∈ G; g · p = p}. A órbita de


p ∈ M é G · p = {g · p ; g ∈ G}. A ação θ é transitiva se G · p = M para todo
p ∈ M , ou seja, dados p e q em M , existe g ∈ G tal que q = g · p. A ação é livre
se Gp = {e} para todo p ∈ M .

Exemplo 11.1.7. Seja H um subgrupo de Lie do grupo de Lie G.


A aplicação H × G → G é uma ação de H em G.
(h, g) 7−→ hg
O grupo de isotropia de g ∈ G é Gg = {h ∈ H ; hg = g} = {e} , de modo
que a a ação é livre. A órbita de g ∈ G é {hg : h ∈ H} = H.g , a classe lateral à
direita. Se H = G a ação é transitiva.

Exemplo 11.1.8. GL(n, R) × Rn → Rn é a ação natural de GL(n, R) em Rn .


(A, x) 7−→ Ax
Existem duas órbitas : {0} e Rn − {0}.

Exemplo 11.1.9. SO(n, R) × S n−1 → S n−1 é ação transitiva (Prove!) de SO(n, R)


(A, x) 7−→ Ax
em S . As órbitas são {0} e as esferas de centro na origem.
n−1

Exemplo 11.1.10. Em G = GL(n, R) × Rn = {(A, x); det A 6= 0, x ∈ Rn }


definamos o produto (A, x)(B, y) = (AB, Ay + x). É fácil verificar que, munido
deste produto, G é um grupo no qual o elemento neutro é (I, 0), onde I = idRn e
0 ∈ Rn , e que (A, x)−1 = (A−1 , −A−1 x). G é um grupo de Lie chamado de grupo
afim do Rn .

Exemplo 11.1.11. No espaço R4 , se p = (t, x, y, z) e q = (t0 , x0 , y 0 , z 0 ) definimos


p + q = (t + t0 , x + x0 , y + y 0 , z + z 0 ) e p.q = (tt0 − xx0 − yy 0 − zz 0 , tx0 + xt0 + yz 0 − zy 0 ,
ty 0 − xz 0 + yt0 + zx0 , tz 0 + xy 0 − yx0 + zt0 ). Verifica-se que H = (R4 , +, ·) é um anel
de divisão; seus elementos são os quatérnios. Os da forma (t, 0, 0, 0) formam um
subanel isomorfo ao corpo R dos reais.
Temos: (k, 0, 0, 0)(t, x, y, z) = (t, x, y, z) · (k, 0, 0, 0) = (kt, kx, ky, kz) .
Vamos identificar (k, 0, 0, 0) com k ∈ R, e chamar os elementos deste tipo
de escalares. Os quatérnios do tipo (0, x, y, z) são chamados de imaginários puros.

213
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

Observemos que (0, x, y, z) · (0, x, y, z) = (−x2 − y 2 − z 2 , 0, 0, 0). O conjugado


de p = (t, x, y, z) é p = (t, −x, −y, −z); é fácil ver que pq = q · p, que
p · p = (t + x + y + z , 0, 0, 0) = t + x + y + z = |p| , e que |p · q| = |p||q|.
2 2 2 2 2 2 2 2 2
p
Pondo p−1 = 2 , temos p · p−1 = 1 para todo p 6= 0. Os elementos 1 = (1, 0, 0, 0);
|p|
i = (0, 1, 0, 0);j = (0, 0, 1, 0) e k = (0, 0, 0, 1) formam uma base do espaço vetorial
H, e são tais que i2 = j 2 = k 2 = −1 , ijk = −1 , ij = −ji = k , j ·k = −k ·j = i ,
k · i = −i · k = j , 1 · i = i , 1 · j = j , 1 · k = k .
Os elementos da forma (0, x, y, z) = xi + yj + zk formam um subespaço
isomorfo a R3 . A esfera S 3 é o conjunto dos quatérnios unitários:
S 3 = {(t, x, y, z); t2 + x2 + y 2 + z 2 = 1} .
A multiplicação (p, q) 7−→ pq e a inversão p 7−→ p−1 tornam S 3 um grupo
de Lie .
Se p = (t, x, y, z) = t + xi + yj + zk, então p · i = −x + ti + zj + yk e
i · p = −x + ti − zj + yk, de modo que p · i = i · p se, e só se, z = y = 0.
Analogamente, p · j = j · p se, e só se, x = z = 0, e p · k = k · p se, e só
se, x = y = 0. Assim, se p · q = q · p para todo q = xi + yj + zk, então
p = (t, 0, 0, 0) = t e, se p ∈ S 3 , então t = ±1.
Para p ∈ S 3 , seja ϕp : R3 → R3
q = (0, x, y, z) 7−→ ϕp (q) = pqp−1 = pqp
É claro que ϕp é linear e que |ϕp (q)| = |q|, ou seja, ϕp é ortogonal. Para
cada p = (t, x, y, z) ∈ S 3 , as colunas da matriz de ϕp na base canônica são pip−1 ,
pjp−1 , pkp−1 , onde, por exemplo, pip−1 = (t2 + x2 − y 2 − z 2 )i + (2tz + 2xy)j+
+(2xz − 2yt)k, de modo que ϕ : S 3 → O(3) é de classe C ∞ . Além disso, ϕ(S 3 ) é
conexo e contém a identidade, de forma que ϕ : S 3 → SO(3). É imediato verificar
que ϕ é um homomorfismo de grupos cujo núcleo é {p ∈ S 3 |pq = qp} = {1, −1}.
Vamos mostrar que ϕ é sobrejetora: dado T ∈ SO(3) sabemos que T tem
um auto-valor λ de módulo 1, isto é, λ = ±1. Seja v1 , |v1 | = 1, tal que T v1 =
= ±v1 . Tomemos v2 , |v2 | = 1, ortogonal a v1 , e v3 = v1 × v2 (produto vetorial).
F = (v1 , v2 , v3 ) é base ortonormal positiva de R3 . Como Rv1 é T −invariante temos
que v1⊥ = espaço gerado por v2 e v3 , também é T −invariante, de modo que existe
θ ∈ R tal que T v2 = cos θv2 + sen θv3 e T v3 = − sen θv2 + cos θv3 .

214
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

 Como T ∈ SO(3)  temos F = 1, donde


det[T ]F λ = +1 e [T ]F
F = A =


1 0 0 
=


0 cos θ − sen θ 


.
0 sen θ cosθ
Seja p = cos 2θ + sen 2θ v1 . Então: p−1 = p = cos 2θ − sen 2θ v1 , ϕp (v1 ) = v1 ,
ϕp (v2 ) = cos θv2 + sen θv3 , ϕp (v3 ) = − sen θv2 + cos θv3 como mostra um cálculo
simples, ou seja, ϕp = T , e ϕ é sobrejetora.
Temos o diagrama comutativo:

ϕ
S3 SO(3)
π
f
3¿
P 3 = S {−1, 1}

onde π é a aplicação canônica. Como f ◦ π = ϕ ∈ C ∞ , resulta que f ∈ C ∞ .


Como SO(3) é de Hausdoff, P 3 é compacto, f ◦ π = ϕ é contínua, resulta que
f −1 é contínua, ou seja, f : P 3 → SO(3) é um homeomorfismo C ∞ . Além disso,
ϕ é localmente injetora e um homomorfismo , de modo que seu posto é 3, donde
submersão (sobrejetora). Pela Proposição 7.5 do Capítulo 7, resulta que f −1 ∈ C ∞ ,
já que f −1 ◦ ϕ = π ∈ C ∞ . Assim, f : P 3 → SO(3) é um difeomorfismo entre o
espaço projetivo P 3 e o grupo SO(3) das rotações de R3 .
Obs. Os subgrupos finitos próprios de SO(3) são, a menos de conjugação, os se-
guintes:
T = grupo do tetraedro, de ordem 12;
O = grupo do octaedro, de ordem 24;
Q = grupo do icosaedro, de ordem 60;
Cn = grupo cíclico de ordem n;
Dn = grupo diedral de ordem 2n.

Resulta que os subgrupos finitos próprios de S 3 , a menos de conjugação, são:


T = ϕ−1 (T ), de ordem 24;

215
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

O = ϕ−1 (O), de ordem 48;


I = ϕ−1
 (Q) , de ordem 120; 
 ϕ−1 (C ) se n é ímpar 
n
Cn =  −1 , de ordem n;
ϕ (C n2 ) se n é par 
Dn = ϕ−1 (Dn ) , de ordem 4n.
Definição 11.4. Sejam G e H grupos de Lie. Uma aplicação f : G → H é um
homomorfismo de grupos de Lie (Lie-homomorfismo, por brevidade) se f ∈ C ∞ e
f é um homomorfismo de grupos.
θg ϕg
Definição 11.5. Sejam p ∈ M −→ g · p ∈ M e q ∈ N 7−→ g · q ∈ N ações
C∞
C ∞ do grupo de Lie G em M e N , respectivamente. Uma aplicação f : M −→ N
é equivariante em relação a estas ações se é comutativo o diagrama

f
M −→ N
θg ↓ ↓ ϕg
M −→ N , ou seja,
f

se f (g · p) = g · f (p) quaisquer que sejam p ∈ M , g ∈ G .


Proposição 11.3. Com as notações acima, suponhamos θ transitiva. Então, o
posto de f é constante. Em particular, os conjuntos de nível de f são subvariedades
fechadas de M .
Dem. Seja p0 ∈ M fixo e p ∈ M arbitrário. Seja g ∈ G tal que p = g · p0 .
Como f ◦ θg = ϕg ◦ f , temos f 0 (θg (p0 )) · θg0 (p0 ) = ϕ0g (f (p0 )) · f 0 (p0 ), isto é,
f 0 (p) · θg0 (p0 ) = ϕ0g (f (p0 )) · f 0 (p0 ). Como θg0 (p0 ) e ϕ0g (f (p0 )) são isomorfismos,
resulta que posto f 0 (p) = posto f 0 (p0 ), ou seja, posto (f ) é constante.
Corolário 11.1. Seja f : G −→ H um Lie-homomorfismo. O núcleo de
f , ker f = {g ∈ G|f (g) = e}, é um subgrupo de Lie de G, de dimensão igual a
dim G−posto(f ).
Dem. Consideremos em G a ação Lg (x) = g · x, que é transitiva, e em H a ação
θg (h) = f (g) · h. Então: f ◦ Lg (x) = f (gx) = f (g) · f (x) = θg · f (x), donde
f é equivariante. Resulta que ker f é subvariedade fechada de G e, portanto, um
subgrupo de Lie de G. Além disso, o espaço tangente a ker f = f −1 (e) é igual ao
núcleo da derivada f 0 (e) : Te G −→ Te H, donde dim ker f = dim G− posto (f ).

216
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

θ
Definição 11.6. Seja G × M −→ M uma ação C ∞ do grupo de Lie G na
variedade M . Dizemos que a ação é própria se, para todo compacto K ⊂ M , o
conjunto GK = {g ∈ G|(g · K) ∩ K 6= ø} é compacto.
θ
Proposição 11.4. A ação G × M −→ M é própria se, e só se, a aplicação
ϕ : G × M −→ M × M , ϕ(g, p) = (g · p, p) é uma aplicação própria, isto é, ϕ−1 (L)
é compacto qualquer que seja L ⊂ M × M compacto.

Dem. Sejam L ⊂ M × M compacto, πi : M × M −→ M (i = 1, 2) as projeções, e


K = π1 (L) ∪ π2 (L). Então, ϕ−1 (L) ⊂ ϕ−1 (K × K) ⊂ {(g, p)|g · p ∈ K, p ∈ K} ⊂
⊂ GK × K. Como GK × K é compacto e ϕ−1 (L) é fechado, resulta que ϕ−1 (L) é
compacto.
Reciprocamente, seja K ⊂ M compacto, donde ϕ−1 (K × K) é compacto
e πG (ϕ−1 (K × K)) é compacto, onde πG : G × M → G é a projeção. Mas,
πG (ϕ−1 (K × K) ) = {g ∈ G| existe p ∈ K tal que ϕ(g, p) ∈ K × K} =
= {g ∈ G| existe p ∈ K tal que g · p ∈ K} = GK , donde GK é compacto.
θ
Corolário 11.2. Se G é compacto então G × M 7−→ M é uma ação própria.

Dem. Se K ⊂ M é compacto, então GK = πG (ϕ−1 (K × K)) é fechado em G,


donde compacto.

Proposição 11.5. Seja G × M −→ M uma ação do grupo de Lie G na variedade


M . Se a ação é C ∞ , livre e própria, existe uma e uma única estrutura diferencial
C ∞ no espaço de órbitas M/G tal que a aplicação quociente π : M → M/G seja
uma submersão C ∞ .

Dem. Veja a Referência [9].

Proposição 11.6. Sejam G um grupo de Lie e H um subgrupo de Lie de G. A


ação à direita de H em G, G × H −→ θ
G é C , livre, e própria. Portanto, o

(g, h) 7−→ gh
espaço de órbitas G/H é uma variedade C ∞ , e π : G → G/H é uma submersão
C∞ .

Dem. É claro que a ação θ é de classe C ∞ e livre. Para provar que a ação é
própria, seja K ⊂ G × G compacto e ϕ : G × H −→ G × G, ϕ(g, h) = (gh, g).

217
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

Para mostrar que ϕ−1 (K) é compacto, seja (gi , hi ) uma sequência em ϕ−1 (K).
Passando a uma subsequência, podemos supor que (gi hi ) e (gi ) convergem em G,
donde hi = gi−1 (gi hi ) converge para um ponto de H (pois H é fechado) e, portanto,
(gi , hi ) converge em G × H. Resulta que ϕ−1 (K) é compacto e ϕ é própria.

Exemplo 11.1.12. Seja, por exemplo, I ⊂ S 3 o subgrupo de ordem 120. Então,


S 3/ é subvariedade de dimensão 3 e classe C ∞ , e π : S 3 → S 3/ é submersão
I I
C .

Definição 11.7. Sejam G um grupo de Lie e M uma variedade C ∞ . Se G opera


transitivamente em M , dizemos que M é um espaço homogêneo de G.

Exemplo 11.1.13. A ação natural de O(n)(respectivamente SO(n)) em S n−1 (n ≥ 2)


é transitiva, de modo que S n−1 é um espaço homogêneo de O(n)(respectivamente
SO(n)).

Exemplo 11.1.14. Seja G o grupo afim do Rn , isto é, G = GL(n, R) × Rn com


o produto (A, x) · (B, y) = (AB, Ay + x) .
θ : G × Rn → Rn , θ[(A, b), x] = Ax + b é uma ação transitiva de G em Rn .
Assim, Rn é um espaço homogêneo do grupo afim. A Geometria Afim do Rn é o
estudo das propriedades das figuras que são invariantes sob a ação do grupo afim.

Exemplo 11.1.15. Se, no Exemplo 11.1.14, tomarmos Gm = O(n) × Rn com


o mesmo produto, obteremos uma ação transitiva ((A, b), x) 7−→ Ax + b, com
A ∈ O(n). Gm é o grupo dos movimentos rígidos do Rn . A Geometria Métrica do
Rn é o estudo das propriedades das figuras que são invariantes sob a ação do grupo
dos movimentos rígidos.

Obs. Pode provar-se que os elementos g ∈ SO(4) são da forma g(x) = `xr−1 ,
onde ` e r são quatérnios unitários. Se, por exemplo, G ⊂ SO(4) é o subgrupo
formado pelas rotações g(x) = `xr−1 , com ` ∈ S 3 e r ∈ I (subgrupo de ordem
120 de S 3 ), como a ação G × S 3 → S 3 é própria e livre, resulta (da Proposição
(g, x) 7→ g(x)
3 3
11.5) que S /G tem uma estrutura diferencial tal que a projeção π : S 3 → S /G
seja uma submersão C ∞ .

218
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

C∞
Proposição 11.7. Seja θ : G × M −→ M uma ação transitiva do grupo de Lie
G na variedade M . Seja H = Gp o grupo de isotropia de p ∈ M . Então,
f : G/H → M , f (g(H)) = g · p, é um difeomorfismo equivariante. Além disso,
f (g1 g2 H) = g1 f (g2 H) quaisquer que sejam g1 , g2 ∈ G.

Dem. A aplicação f : G/H → M está bem definida e é injetora, pois f (g1 H) =


= f (g2 H) ⇔ g1 p = g2 p ⇔ g2−1 g1 p = p ⇔ g2−1 g1 = h ∈ H ⇔ g1 = g2 h ⇔ g1 H =
= g2 H. Como a ação é transitiva, f é sobrejetora, donde bijetora. Definamos

ψ
G M
π
f

G/
H

ψ : g ∈ G 7−→ g · p ∈ M ,donde f ◦ π = ψ, onde π é a submersão sobrejetora


canônica. Como ψ ∈ C ∞ e π ∈ C ∞ , resulta f ∈ C ∞ .
Como H = ψ −1 (p), temos que H é fechado em G. Como ψ(g1 g) = g1 gp =
= g1 (ψ(g)), temos o diagrama comutativo abaixo, , ou seja, ψ é equivariante, donde

ψ
G M
Lg1 θg 1

G M
ψ

de posto constante, resultando H uma subvariedade de G e, portanto, um subgrupo


de Lie de G. f : G/H → M também é equivariante, pois f (g1 , gH) = g1 gp =
= g1 f (gH), donde de posto constante. Como f é bijetora e tem posto constante,
resulta,pela Proposição 7.6 do Capítulo 7, que f é um difeomorfismo.

Obs. A proposição acima mostra que todo espaço homogêneo M é da forma G/H ,
onde H é um subgrupo fechado do grupo de Lie G.

Corolário 11.3. Sejam X um conjunto e θ : G × X → X uma ação transitiva do


grupo de Lie G em X. Se o grupo de isotropia de um ponto x ∈ X, Gx = H,

219
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

é um subgrupo de Lie de G, então X tem uma única estrutura diferencial tal que a
ação θ seja C ∞ .

Dem. Com as notações da Proposição 11.7, sabemos que G/H é uma variedade
C ∞ , e que f : G/H → X, f (gH) = g · x, é uma bijeção equivariante.
Transportando para X a estrutura que torna f um difeomorfismo C ∞ , temos
que θ(g, x) = g · x = f (g · f −1 (p)), donde θ ∈ C ∞ . A unicidade resulta do fato de
X ser difeomorfo a G/H .

Exemplo 11.1.16. A ação natural de O(n) em S n−1 , θ : (A, x) 7−→ A.x ,


A ∈ O(n), x ∈ S n−1
, é transitiva, bem como a de SO(n) em S n−1 , n ≥ 2. Tomando
o ponto en = (0, . . . , 0, 1) ∈ S n−1 , o grupo de isotropia H = {A ∈ O(n); Aen = en }
é o conjunto das matrizes
 
0
 B 

 0 

.. 
. ,
 

 
 

 0 

0···0 1
com B ∈ O(n − 1), ou seja, H se identifica com O(n − 1). Resulta que S n−1 é
difeomorfa a O(n)/ . Analogamente temos um difeomorfismo entre S n−1 e
O(n − 1)
SO(n)/ .
SO(n − 1)
Exemplo 11.1.17. O grupo Gm dos movimentos rígidos do Rn opera em Rn por
(A, b)x = Ax + b, onde A ∈ O(n), b ∈ Rn e x ∈ Rn . É claramente uma ação
transitiva. O subgrupo de isotropia da origem 0 ∈ Rn é formado pelos elementos
(A, 0) e se identifica com O(n), de modo que Rn é difeomorfo a Gm/O(n).

Exemplo 11.1.18. Variedades de Grassmann


Seja Gk (n) o conjunto dos subespaços de dimensão k do Rn . O(n) opera em
Gk (n) por O(n) × Gk (n) −→ Gk (n) .
(T, V ) 7−→ T (V )
Esta ação é transitiva pois se V, W ∈ Gk (n), tomando bases ortonormais
E = (e1 , . . . , ek , . . . , en ), F = (f1 , . . . , fk , . . . , fn ) de Rn tais que (e1 , . . . , ek )
seja base de V e (f1 , . . . , fk ) de W , existe T ∈ O(n) que leva E em F,

220
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

donde
Ñ V éem W . O grupo de isotropia H de V é formado pelas matrizes do tipo
A 0
, A ∈ O(k), D ∈ O(n − k). H é subgrupo de Lie de O(n), difeo-
0 D
morfo a O(k) × O(n − k), de modo que Gk (n) é uma variedade C ∞ difeomorfa
a O(n)/ e, portanto, compacta.
O(k) × O(n − k)

11.2 Campos Invariantes

Definição 11.8. Seja G um grupo de Lie. Um campo de vetores X : G → TG é


invariante à esquerda se, para cada g ∈ G, o diagrama

X
G TG
Lg d Lg

G TG
X

comuta, isto é, se dLg ◦ X = X ◦ Lg , ou seja, X é Lg −relacionado com si mesmo.


Analogamente se define um campo de vetores invariante à direita.

Proposição 11.8. Todo campo vetorial invariante à esquerda é de classe C ∞ .

Dem. Basta provar que f ∈ C ∞ (G, R) implica Xf ∈ C ∞ (G, R). Para isto, seja
γ : R → G um caminho C ∞ tal que γ(0) = e , γ 0 (0) = Xe , e definamos α : R → G
por α(t) = g·γ(t). α é C ∞ pois é a composta t 7→ (g, t) 7→ (g, γ(t)) 7→ g·γ(t) = α(t),
todas de classe C ∞ . Além disso, α(0) = g, α0 (0) = dLg · Xe = Xg , já que X é
invariante à esquerda.

d d
Seja F (g, t) = f (α(t)); F ∈ C ∞ e (Xf )(g) = f 0 (g)·α0 (0) = f (α(t)) =
dt dt t=0
= F (g, 0). Como g 7→ (g, 0) 7→ F (g, 0) é C , resulta que Xf ∈ C ∞ , ou seja,

X ∈ C ∞.
Representamos por L(G) o conjunto dos campos de vetores invariantes à es-
querda do grupo de Lie G. L(G) é um subespaço vetorial do espaço X(G) de todos

221
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

os campos de vetores X : G → T G de classe C ∞ .

Proposição 11.9. Se X, Y ∈ L(G) então [X, Y ] ∈ L(G).

Dem. Como dLg ◦ X = X ◦ Lg e dLg ◦ Y = Y ◦ Lg , a Proposição 10.6 do Capítulo


10 nos dá que dLg [X, Y ] = [X, Y ] ◦ Lg , ou seja, [X, Y ] ∈ L(G) .

Definição 11.9. Sejam V um espaço vetorial real e (x, y) ∈ V × V 7→ [x, y] ∈ V


uma aplicação bilinear tal que

(a) [x, y] = −[y, x];

(b) [[x, y], z] + [[z, x], y] + [[y, z], x] = 0 (identidade de Jacobi).


(V, [, ]) é dita uma álgebra de Lie.

Resulta que L(G) é uma álgebra de Lie quando munida do colchete de Lie: L(G) é
a algebra de Lie do grupo de Lie G.

Proposição 11.10. A aplicação F : L(G) 7→ Te G definida por F (X) = Xe é um


isomorfismo , resultando dimL(G) = dim G.

Dem. F é claramente linear; ela é injetora pois se F (X) = 0 então Xe = 0 e ,


então, Xg = dLg · Xe = 0 para todo g ∈ G, donde X = 0. F é sobrejetora pois
se x ∈ Te G, seja Xg = dLg (x), donde Xe = x e F (X) = x. X ∈ L(G) já que
X ◦ Lσ (g) = X(σg) = dLσg (x) = dLσ · dLg (x) = dLσ · Xg , donde X ◦ Lσ = dLσ · X
para todo σ ∈ G.

Obs. Por meio do isomorfismo F : L(G) → Te G podemos induzir em Te G uma


estrutura de álgebra de Lie, e considerar a álgebra de Lie de G como sendo Te G.
Sob este ponto de vista, na Seção 7.7 do Capítulo 7, vimos por exemplo, que para
G = O(n, R) temos L(G) = An (R) = espaço das matrizes antissimétricas n × n,
e que para G = SL(n, R) temos L(G) = espaço das matrizes n × n de traço
nulo.

Proposição 11.11. Sejam G e G1 grupos de Lie, e F : G → G1 um homomorfismo


de classe C ∞ . Então:

(a) LF (σ) ◦ F = F ◦ Lσ para todo σ ∈ G;

222
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

(b) dF = dF (e) : Te G = L(G) → Te G1 = L(G1 ) é tal que dF (X) ◦ F = dF ◦ X,


para todo X ∈ L(G), ou seja, X e dF (X) são F −relacionados;

(c) dF : L(G) → L(G1 ) é um homomorfismo de álgebras.

Dem. (a) Como F é homomorfismo, temos F (Lσ (g)) = F (σg) = F (σ)F (g) =
= LF (σ) F (g) para todo g ∈ G, donde F ◦ Lσ = LF (σ) ◦ F .

(b) Seja X1 = dF (X), onde X ∈ L(G). Então, X1 ∈ L(G1 ) e X1 ◦ LF (σ) =


= dLF (σ) ◦ X1 . Temos: X1 (F (σ)) = X1 F Lσ (e) = X1 LF (σ) F (e) = X1 LF (σ) (e) =
= dLF (σ) X1 (e) = dLF (σ) dF (X)(e) = d(LF (σ) · F )X(e) = d(F ◦ Lσ )X(e) =
= dF (X)σ = X1 (σ), donde X1 ◦ F = X1 , ou seja, dF (X) ◦ F = dF (X).

(c) Pela Proposição 10.6 do Capítulo 10 sabemos que [X, Y ] é F −relacionado com
[X1 , Y1 ]. Em particular, [X1 , Y1 ](e) = dF [X, Y ](e), donde [dF (X), dF (Y )] =
= dF [X, Y ] e F é homomorfismo de álgebras.

Definição 11.10. Sejam G uma álgebra de Lie e H um subespaço vetorial de G.


Dizemos que H é uma sub-álgebra de G se X, Y ∈ H implica [X, Y ] ∈ H.

Proposição 11.12. Sejam G um grupo de Lie com álgebra de Lie L(G) = G e


H ⊂ G uma subálgebra. Existe um grupo de Lie H, que é um subgrupo de G, que é
conexo, e que é subvariedade imersa de G, tal que L(H) = H.

Dem. Se g ∈ G, definamos Dg = {Xg ; X ∈ H} · D : g 7→ Dg é um sistema


diferencial em G. Se {Y1 , . . . , Yr } é base de H, então {Y1 , . . . , Yr } é base local de
r
D, donde D é C ∞ . Como H subálgebra de G, temos que [Yi , Yj ] = ckij Yk , donde
P
k=1
resulta que D é involutivo. Seja H a folha de D pelo elemento neutro e ∈ G. Se
a ∈ G, o difeomorfismo La é tal que dLa · Dg = Dag , e La : G → G transforma
cada folha de D em folha de D. Se h1 , h2 ∈ H, então Lh1 h−1 (h2 ) = h1 , ou
2
seja, Lh1 h−1 (H) é a folha de D que passa por h1 ∈ H, donde Lh1 h−1 (H) = H,
2 2
e h1 h−12 ∈ H, o que mostra que H é subgrupo de G. Além disso, H é conexo e
subvariedade imersa de G, por ser uma folha de D.
A aplicação f : H × H → G, f (h1 , h2 ) = h1 h−1
2 é de classe C ∞ como
composta
j µ
H × H −→ G × G −→ G
(h1 , h2 ) 7−→ (h1 , h2 ) 7−→ h1 h−1
−1
2

223
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

de aplicações C ∞ . Como a imersão injetora i : H −→ G é C ∞ , resulta que


f : H × H → H é C ∞ (Proposição 7.4 do Capítulo 7) e H é um grupo de Lie . É
claro que L(H) = H. Observemos que, em geral, H não é um subgrupo de Lie de
G, pois não é subvariedade (mergulhada) de G.

11.3 Formas Invariantes

Definição 11.11. Sejam G um grupo de Lie e ω uma p−forma em G. Dizemos


que ω é invariante à esquerda se L∗g ω = ω para todo g ∈ G, ou seja, se para todos
x ∈ G e v1 , . . . , vp ∈ Tx G, tivermos ωx (v1 , . . . , vp ) = ωgx (L0g (x)v1 , . . . , L0g (x)vp ) .

Proposição 11.13. Sejam G um grupo de Lie e ω uma p−forma invariante à


esquerda em G:

(a) quaisquer que sejam os campos vetoriais invariantes à esquerda X1 , . . . , Xp em


G, a função ω(X1 , . . . , Xp ) : G → R é constante;

(b) ω é de classe C ∞ .

Dem. (a) Temos:

(L∗g ω)(X1 (x), . . . , Xp (x)) = ωgx L0g (x)X1 (x), . . . , L0g (x)Xp (x) =
Ä ä

= ωgx (X1 (gx), . . . , Xp (gx)).

Como L∗g ω = ω, pondo x = e, vem:

ωe (X1 (e), . . . , Xp (e)) = ωg (X1 (g), . . . , Xp (g)),

ou seja, ω(X1 , . . . , Xp ) é constante.

(b) Para provar que ω ∈ C ∞ devemos mostrar que a função ω(Y1 , . . . , Yp ) ∈ C ∞ ,


quaisquer que sejam Y1 , . . . , Yp ∈ X(G). Para isso, sejam X1 , . . . , Xp , . . . , Xn
campos vetoriais invariantes à esquerda (de classe C ∞ ), tais que X1 (g), . . . , Xn (g)
formem uma base de Tg G para cada g ∈ G.

224
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

n
Então, Yj = aij Xi , onde aij ∈ C ∞ , e basta provar que ω(Xi1 , . . . , Xip ) ∈ C ∞
P
i=1
quaisquer que sejam Xi1 , . . . , Xip , o que resulta de (a), já que ω(Xi1 , . . . , Xip ) é
constante.

Obs. Se Rg∗ ω = ω para todo g ∈ G dizemos que a p−forma ω é invariante à


direita. Como acima, prova-se que toda forma invariante à direita no grupo de Lie
G, é de classe C ∞ . Quando L∗g ω = ω = Rg∗ ω para todo g ∈ G, dizemos
que ω é invariante; neste caso, A∗g ω = ω, onde Ag é o automorfismo interno
Ag (x) = gxg −1 de G, isto é, Ag = Lg · Rg−1 .

Sejam G um grupo de Lie e ω uma forma volume, invariante à esquerda, que


define a orientação de G. Se g ∈ G, Lg : G → G , Lg (x) = gx é um difeomorfismo
C ∞ tal que L∗g ω = ω, ou seja, Lg preserva a orientação. Se f : G → R é contínua
e de suporte compacto, então
Z Z Z
fω = L∗g f ω = (f ◦ Lg )ω,
G G G

R R
às vezes escrito como f (x)dx = f (gx)dx, e dizemos que a integral é invariante
G G R
à esquerda. No caso de G ser compacto, podemos escolher ω de modo que ω = 1.
G

A forma Rσ∗ ω, onde Rσ x = xσ, é invariante à esquerda , pois L∗g (Rσ∗ ω) =


= (Rσ ◦Lg )∗ ω = (Lg ◦Rσ )∗ ω = Rσ∗ L∗g ω = Rσ∗ ω. Resulta que existe função α : G → R
tal que Rσ∗ ω = αω. Seja λ(σ) = |α(σ)|. Então:
Z Z Z Z Z
fω = ± Rσ∗ (f ω) =± (f ◦ Rσ )Rσ∗ ω =± (f ◦ Rσ )α(σ)ω = (f ◦ Rσ )λ(σ)ω,
G G G G G

ou seja, a integral é invariante à direita se, e só se, λ = 1 e, neste caso, dizemos


R R R
que G é unimodular, resultando f ω = (f ◦ Rσ )ω, ou ainda, f (x)dx =
R G G G
= f (xσ)dx .
G
R R
Se G é compacto, então G é unimodular, pois 1 = ω= λ(σ)ω = λ(σ) , e
G G
a integral num grupo compacto é invariante.

Definição 11.12. Sejam G um grupo de Lie e V um espaço vetorial. Uma representação


linear de G em V é um homomorfismo ρ : G → GL(V ).

225
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

Proposição 11.14. (Weyl) Seja (ρ, V ) uma representação linear do grupo de Lie
G, compacto. Existe um produto interno hu, vi em V tal que hρ(x)u, ρ(x)vi =
= hu, vi para todo x ∈ G, u ∈ V , v ∈ V , ou seja, h,i é G−invariante.

Dem. Seja (u|v) um produto interno qualquer em V . Definamos f : G × V × V → R


por f (t; u, v) = f (t; v, u) = (ρ(t)u|ρ(t)v). Para u e v fixos, f é contínua em t e
f (st; u, v) = f (s; ρ(t)u, ρ(t)v). Definamos hu, vi = f (s; u, v)ds. É imediato
R
G
verificar que h,i é um produto interno em V , e temos:
Z Z
hρ(t)u, ρ(t)vi = f (st; u, v)ds = f (s; u, v)ds = hu, vi.
G G

11.4 Exercícios do Capítulo 11

1. Seja G um grupo de Lie conexo, e U uma vizinhança aberta do elemento



neutro. Prove que G = U n.
S
n=1

2. Na Proposição 11.12, prove que H é único a menos de isomorfismo.

3. Sejam G um grupo de Lie conexo, M uma variedade conexa, orientada, e

C ∞
θ : G × M −→ M uma ação de G em M .
(g, p) 7−→ θ(g, p) = gp
C∞
Prove que o difeomorfismo θg : M −→ M , θg (p) = gp, preserva orientação.

4. Seja M m uma variedade C ∞ . Dizemos que M é paralelizável se existem


C∞
campos vetoriais Xi : M −→ T M , 1 ≤ i ≤ m, tais que {X1 (p), . . . , Xm (p)}
seja base de Tp M para todo p ∈ M . [ R. Bott e J. Milnor provaram (em 1958)
que as únicas esferas paralelizáveis são S 1 , S 3 e S 7 . S 1 e S 3 têm estrutura de
grupo de Lie, S 7 não ]. Prove que todo grupo de Lie G é paralelizável.

5. Seja   




1 x y  



H= 



0 1 z 

 ; x, y, z ∈ R
.
 
0 0 1

 

226
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

(a) Mostre que H tem uma estrutura diferencial C ∞ com a qual é difeomorfa
a R3 .
(b) Mostre que H, com a multiplicação matricial, é um grupo de Lie (chamado
grupo de Heisenberg).
® ´
∂ ∂ ∂ ∂
(c) Mostre que , ,x + é uma base para a álgebra de Lie de
∂x ∂y ∂y ∂z
H.

6. O conjunto das matrizes complexas n × n, munido da multiplicação matricial,


é o grupo de Lie GL(n, C), de dimensão 2n2 . Sejam:

SL(n, C) = {A ∈ GL(n, C); det A = 1};

U (n) = {A ∈ GL(n, C) ; A∗ A = In } ,

onde A∗ = Āt é a adjunta de A;

SU (n) = U (n) ∩ SL(n, C).

(a) Mostre que U (n) é um subgrupo de Lie de GL(n, C), de dimensão n2 .


(b) Mostre que SL(n, C) é um subgrupo de Lie de GL(n, C), de dimensão
2n2 − 2.
(c) Mostre que SU (n) é um subgrupo de Lie de GL(n, C), de dimensão
n2 − 1.

C∞
7. Sejam G um grupo de Lie , M m uma variedade C ∞ , e θ : G × M −→ M
uma ação C ∞ , livre e própria. Prove que as G−órbitas são subvariedades de
M , de mesma dimensão que G.

8. Uma sequência de n subespaços de Rn , Vn = Rn ⊃ Vn−1 ⊃ · · · ⊃ V1 , com


dim Vj = j, 1 ≤ j ≤ n, é chamada de uma bandeira em Rn . Mostre que a ação
natural de GL(n, R) em Rn é transitiva no conjunto M das bandeiras de Rn ,
e obtenha uma estrutura diferencial C ∞ em M . Qual a dimensão de M ?

9. Se α e β são formas invariantes à esquerda no grupo de Lie G, prove que α ∧ β


e dα o são também.

227
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

10. Prove que se ω é uma p−forma no grupo de Lie G tal que ω(X1 , . . . , Xp ) =
=constante, quaisquer que sejam os campos vetoriais invariantes à esquerda,
então ω é invariante à esquerda.

11. Sejam G um grupo de Lie, G = L(G) sua álgebra de Lie, e Ep (G) o espaço
vetorial das p−formas em G, invariantes à esquerda. Se ω ∈ Ep (G) e
p
X1 , . . . , Xp ∈ G, seja f : Ep (G) −→ ∧ G ∗ tal que fω (X1 , . . . , Xp ) =
ω 7−→ fω
= ω(X1 , . . . , Xp ) ∈ R.
Prove que f é um isomorfismo. Em particular, E1 (G) é isomorfo a G ∗ .

12. Sejam G um grupo de Lie , µ(a, b) = ab a multiplicação em G, e ϕ(a) = a−1


a inversão em G.
Prove:

(a) dµ(a, b)(Xa , Yb ) = dRb (a)Xa + dLa (b)Yb ;


(b) dϕ(a)Xa = −dRa−1 (e)dLa−1 (a)Xa ,

onde a, b ∈ G , Xa ∈ Ta G e Yb ∈ Tb G.

13. Seja {α(t) ; t ∈ R} um subgrupo a 1−parâmetro do grupo de Lie G, ou seja,


C∞
α : R −→ G é tal que α(0) = e, e α(s)α(t) = α(s + t) . {Lα(t) ; t ∈ R}
e {Rα(t) ; t ∈ R} são subgrupos a 1−parâmetro de G. As órbitas de e ∈ G
por esses grupos coincidem com a curva α : R −→ G. Para cada x ∈ G,
seja βx (t) = xα(t) = Rα(t) · x, e definamos o campo de vetores X por
X(x) = βx0 (0). Prove que X é invariante à esquerda e que X(e) = α0 (0).

14. Se G é conexo, unimodular e L∗g ω = ω, prove que Rσ∗ ω = ω.

15. Seja G conexo e unimodular. Se ω é forma volume invariante à esquerda, e


ϕ(x) = x−1 é a inversão, prove que ϕ∗ ω = (−1)n ω, e que
R
f (x)dx =
G
= f (x−1 )dx .
R
G
Ñ é 
 a 0 
16. Seja G =  ; a, b ∈ R, a > 0 .
b 1

228
CAPÍTULO 11. GRUPOS DE LIE

Prove que G tem uma estrutura de grupo de Lie que o torna um subgrupo de
Lie de GL(2, R).

17. Sejam G um grupo de Lie e H um subgrupo de Lie de G que é normal em G.


Prove que G/H é um grupo de Lie e que a aplicação quociente π : G → G/H
é um Lie-homomorfismo.

18. Sejam ϕ : G → G0 um Lie-homomorfismo sobrejetor e N = ker ϕ seu núcleo.


Prove que G/N é Lie-isomórfico a G0 .

19. Dê um exemplo de uma ação C ∞ e própria de um grupo de Lie G numa


variedade diferencial M , tal que M/G não seja uma variedade.

20. Sejam G um grupo de Lie e H um Lie - subgrupo de G. Prove que se H e


G/ são conexos, então G é conexo. Prove, por indução, que SO(n) é conexo.
H

229
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231
Índice

Ação, 213 Campo de Vetores, 103, 151


livre, 214 hamiltoniano, 206
própria, 218 completo, 187
transitiva, 214 comutativo, 199
Álgebra que aponta para dentro, 150
das formas diferenciais, 131 que aponta para fora, 150
de Lie, 185, 223 Carta, 66, 145
exterior, 123 Cobertura
Ângulo sólido, 141 localmente finita, 96, 100
Aplicação Colchete de Lie, 185
antípoda, 164 Conjunto de nível, 217
k
de classe C , 13, 56, 72, 148 Contração, 43
derivada, 55, 76 Coordenadas generalizadas, 204
equivariante, 217 Curva integral, 186
linear contínua, 3
multilinear contínua, 8 Derivação, 185
própria, 218 Derivada, 12, 76, 107
r-linear alternada, 135 de Lie, 178
Atlas, 67, 145 parcial, 35
coerente, 138 Determinante, 120
máximo, 68 Difeomorfismo, 41
equivariante, 220
Caminho, 74 de classe C 1 , 41
de saltos, 23 de classe C k , 73, 144
regulado, 24 local, 46

232
ÍNDICE

Diferencial exterior, 131 local das imersões, 49, 82


Divergência de Campo, 173 local das submersões, 50, 83
negativa, 155
Equações positiva, 155
de Hamilton, 205, 206 simplética, 201, 204, 205
de Lagrange, 205 volume, 142
Espaço Função
cotangente, 204 auxiliar, 100
de órbitas, 218 harmônica, 174
de Banach, 2
de fases, 204 Gradiente, 174
homogêneo, 219 Grau de aplicação, 175
projetivo, 72, 216 Grupo
tangente, 75, 148 das rotações, 95
vetorial normado, 2 de cohomologia, 174
vetorial orientado, 137 de isotropia, 214
vetorial simplético, 201, 203 de Lie, 210
linear especial, 94
Fibrado linear geral, 70
cotangente, 135 simplético, 203
tangente, 106, 204 unimodular, 226
Fluxo
global, 187 Hamiltoniana, 205
hamiltoniano, 206 Hessiana, 58
local, 187 Homotopia, 162
Folha, 195
Imersão, 47, 81
Folheação, 195
Integral, 24, 25, 173
Forma
Invariante
contato, 207
à direita, 222, 226
de Liouville, 205
à esquerda, 222, 225
de Poincaré, 136
pelo fluxo, 199
diferencial, 129
exata, 161 Lagrangiana, 203–205
fechada, 161, 162 Laplaciano, 174, 179

233
ÍNDICE

Lema interior, 124


de Cartan, 126 tensorial, 114
de Poincaré, 168, 169 Pull back, 129
de Urysohn, 101
Regra da Cadeia, 17, 78
Lie-isomorfismo, 217
Seção
Métrica riemaniana, 102
do fibrado cotangente, 136
Matrix jacobiana, 14
do fibrado tangente, 107
Matriz jacobiana, 78
Sistema
Mergulho, 47, 84, 88
de coordenadas locais, 66
Momentos generalizados, 205
diferencial, 189
Mudanças de coordenadas, 67, 145
base local, 189, 192
Norma, 1 equações locais, 192
Normas equivalentes, 5 lagrangiano, 204
Subespaço
Órbita, 186, 214 coisotrópico, 202
Orientável, 139 isotrópico, 202, 209
Orientação, 137, 148, 155 lagrangiano, 203, 209
no bordo, 150 ortogonal simplético, 202
produto, 152 simplético, 202, 209
Subgrupo de Lie, 210, 212
Paracompacto, 96
Submersão, 47, 81
Paralelizável, 227
Subvariedade, 88
Partição da unidade, 100
lagrangiana, 206
Placa, 194
Suporte, 98
Ponto
crítico, 110 Teorema
do bordo, 146 da função implícita, 50, 91
fixo, 43 da função inversa, 45, 78
interior, 146 de Brouwer, 161
Posto, 46, 81 de Chevalley, 195
Posto constante, 85 de Darboux, 206
Produto de Frobenius, 190
exterior, 115, 130 de Gauss, 173

234
ÍNDICE

de Leibniz, 38 regular, 93, 110, 166


de Poincaré-Brouwer, 164, 192 Variedade
de Schwarz, 60 de Grassmann, 221
de Stokes, 158 diferencial, 68, 139
do ponto fixo de Banach, 43 diferencial com bordo, 146
do posto, 48, 82 integral, 194, 195
do Valor Médio, 29 produto, 90
fundamental do Cálculo, 28 riemaniana, 102, 172, 179, 181
Trajetória, 186 simplética, 203, 207
Vetor
Valor tangente, 75, 109
crítico, 93 velocidade, 204

235

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