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LEITURAS CATOLICAS

ANo L. - JANEIRO DE 1940 -� No. 596


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V. SINISTRERO

DOM BOSCO
nos guia á Pureza

http://alexandriacatolica.blogspot.com.br

NITEROI
E.rcola.r Pro}i.r.rionai.r Sale.riana.r
-1940-
!MPRIMATUR

Por comissão especial do Exmo. e Revmo.


Snr. Bispo de Niterói, D. JosÉ PEREIRA
ALVES.

Niterói, 25 de No11embro de 1919


P. Francisco X.· Lanna, S. S.

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DOM BOSCO É O AUTOR
DES TA S P Á G I NA S .

Dom Bosco é o autor destas páginas ...


Ninguem ignora como D. Bosco haja sido
uma das mais queridas figuras de Santo
Educador, desses que arrebataram os séculos
cristãos suscitando por toda a parte um amor
profundo, graças à paternidade solícita com
que conquistava os jovens fazendo-os filhos
carinhosos.
Uma das mais arrebatadoras inclinações
desse espírito tão divinamente comunicativo
era se:nf dúvida a de manifestar aos seus filhos,
todos os intentos e· todas as vicissitudes da
própria existência com um candor infantil
e sublime que transformava as suas íntimas
confidências numa fonte de sugestivas ele­
vações.
Bem o compreenderam seus filhos desde os
primeiros anos de convivência e porisso não
vacilaram em anotar com terno cuidado os
místicos tesouros que fluiam dessa perfumada
intimidade.
É a filial premura dos primeiros salesianos
que somos devedores dos muitos milhates de
páginas que contém o pensamento genuino
do Santo. Nestas páginas oferecemos um
IV
ramalhete desses tesouros a respeito de um
assunto que a D. Bosco era tão querido
como a pr6pria alma. Apresentamo-los à re­
flexão daqueles que se sentem atraídos-1ipela
nostalgia do Infinito.
Note-se que embora os pensamentos e as
palavras sejam realmente de D. Bosco,
a roupagem é daqueles que escreviam tudo o
que ouviam do Santo Educador, sem o pesade­
lo da forma literária mas com a vehemente
intenção de assimilar e difundir o 'vital !ali­
mento que neles encontramos.
Nestas páginas encontraremos portanto
viva e palpitante a alma de D. Bosco. Ninguem
no entanto espere vir procurar aquí D. Bosco
escritor.
Começando a admirar com a mais co..novida
fantasia essas visões fulgurantes de Anjos
e de Virgens que como lírios palpitantes
trescalam na· presença do Esposo Celeste
o perfume capitoso da sua ardente espirituali­
dade, fugindo da menor mancha que seja,
sentimo-nos atraídos pela alma angélica de
D. Bosco que fazia brilhar tais visões aos olhos
cintilantes dos filhos e que hoje nelas nos
apascenta, inefavelmente arrebatado em eter­
na contemplação.
Revivemos então suas cuidadosas admoesta­
ções e nos mergulhamos na onda dos sens
conselhos sentindo bem que Ele mesmo pal­
pita em cada palavra sua e que por este meio
v

nos encoraja e nos ergue ao Céu que conquis­


tou, Céu limitado pelo amor e pela luz.
Ele que vi� em sonho as milhares de almas
que subiám ao Céu com Ele e mediante Ele,
mergulhado em júbilo embriagador impregne
quem ler estas suas Palavras naquela misterio­
sa atração com a qual lutaremos pela posse
da Luz cheia de Amor onde com seu espírito
sublimado em Deus, D. Bosco vive, exulta
e canta por todos os séculos.
Alassio, 31 de janeiro de 1939
Dia da entrada de D. Bosco no Céu.
Sacerdote Vicente SiniJ"trero

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I

A META ANGÉLICA
l.- A ALEGRIA CELESTIAL DAS ALMAS VIRGENS

No dia 4 de dezembro de 1876 visitava


D. Bosco o Colégio qe Lanzo Turinês, cujo
diretor era o seu futuro biógrafo P. João
B. Lemoyne. Na noite do dia 6 teve aí o
« sonho » que narrou no Oratório de Turim

no dia 22.
Nessa visão transparece o vínculo celestial
de afeição terníssima que o ligava. ac;> seu
caro Oomingos Sávio que partira para o Céu
em 1857 e cuja biografia D. Bosco havia
escrito. Já a causa da Beatificação do Angélico
Sávio está hoje em célere curso.
A visão, objeto deste « sonho, » emana o
penetrante perfume dessa virgindade pela
qual D. Bosco consumiu a própria vida até
o inais prolongado marHrio.
Então como hoje já se notava o poder da
intercessão de O. Bosco junto à «Regina
Virginum».

Re.rpeitemo.r o.r ·« .ronho.r »


« Na noite que passei em Lanzo quando

chegou a hora do rc;pouso aconteceu-me ter


eu o seguinte sonho. E um sonho que nenhuma
8 -

relação tem com os demais. Já durante o


Retiro Espiritual contei-vos um quasi seme­
lhante, mas em vista de muitos de vós estar­
des então ausentes e dadas as grandes diferen­
ças que existem entre ambos, decidí-rne a vos
narrar este último. São coisas muito exquisi­
tas, mas bem sabeis que aos meus filhos
eu abro todo o meu coração sem ter segredos
para eles. Poaeis lhe dar o valor que quiserdes
mas, corno diz S. Paulo, quod bonum e.rl
teneie (conservai aquilo que vos for util),
assim é que si neste sonho achardes alguma
coisa que faça bem à vossa alma aproveitai-vos
dela. Quem não quiser acreditar, não me
creia, pois nada me importarei com isto, mas
n.inguern ridicularize o que vou vos contar.
Peço-vos que nada conteis aos que não.-sejam
de casa e nem ao menos escrevais aos vossos
parentes. Pode-se dar aos sonhos somente a
import�ncia que eles merecem e aqueles qu.::
não conhecem a familiaridade que aquí
reina poderiam fazer disto um juizo errôneo
e chamar às cousas com um nome diverso do
que elas merecem. �ão sabem eles que sois
os meus filhos e por isso eu vos conto ac;�uilo
que sei e tarnbern às vezes o que não sei.
Mas aquilo que um pai manifesta aos seus
amados filhos para o bem deles deve ficar
'
entre eles e não ir além. Mesmo por um
outro motivo: No mais das vezes quando se
contam lá fora os sonhos ou se desfigura o fato
ou se conta somente uma parte que nem
- 9 -

nós entendemos; isso é um mal pois o mundo


ridicularizaria então o que não deve ser
desprezé!do.

.d planlcie e os jardin.r.
É preciso que saibais que os sonhos nós
os temos dormindo. Ora, na noite do dia 6,
enquanto eu estava no meu quarto sem saber
si estava lendo, andando de um lado para
outro ou já deitado no leito, comecei a sonhar.
Num dado momento pareceu-me estar
sobre uma pequena elevação de terra como
uma colina, à beira de imensa planície cujos
confins os meus olhos não podiam atingir.
Essa planície perdia-se na imensidade; era
azul como um mar tranquilo mas não havia
água. Parecia um límpido cristal fulgurante.
Debaito de meus pés, atrás de mim e aos
meus lados via eu uma região que se asseme­
lhava ao litoral de um vasto oceano.
Essa planície era cortada por largos e gi­
gantescos vales em vastíssimos jardins de
indizivel beleza. Viam-se aquí e alí bosque­
zinhos, prados e estradas floridas com formas
e cores diversas. Nenhuma das nossas plantas
pode dar-nos uma idéia daquelas, posto que se
notasse uma leve semelhança com as deste
mundo. A relva, as flores, as árvores e os
frutos eram belíssimos e de aspeto singular.
As folhas eram de ouro, os troncos e galhos
eram diamantes e o resto não ficava àquem
de tanta riqueza. Não se podiam contar as
-10 -
espécies diferentes, pois cada espécie e cada
indivíduo resplandecia com uma luz parti­
cular. No meio destes jardins e em toda a
extensão da planície eu via inúmeros edifícios
de uma ordem, beleza e harmonia, magnifi­
cência e grandeza tão extraordinárias que
para a construção de um só deles parece-me
não bastarem todos os tesouros desta terra.
Dizia eu comigo mesmo :
- Si os meus j ovens possuíssem uma casa
como estas, quão felizes estariam e como
haveriam de residir nela de boa mente1
Assim pensava eu podendo ver só o aspeto
exterior daqueles palácios. Imaginai qual não
seria a magnificência interna: dos mesmos.

O..r dntico..r de 'lllegria.


Enquanto eu me admirava por tantas coi­
sas estupendas que ornavam aqueles jardins
eis que se fez ouvir uma dulcíssima melodia
de tão grata e suave harmonia que sou inca­
paz de dar uma pálida idéia. As de Cagliero
e Dogliani (o futuro Cardeal João Cagliero
e o celebre Dogliani foram os primeiros mestres
de música no Oratório) postas em confronto
com aquelas, nada têm de musical. Eram
cem mil instrumen tos que produziam cada
um o seu som diferente e desse modo todos os
sons imagmar10s difundiam-se pelos ares
em ondas . harmoniosas. A eles se uniam os
coros dos cantores.
-11-
Vi, então, uma numerosa multidão que se di­
vertia �legre e feliz naqueles jardins. u;ns to­
cavam e outros cantavam. Cada voz e cada
nota tinha o efeito de uma reunião de mil ins­
trumentos cada um diverso dos demais. Con­
temporaneamente se ouviam os vários sons
da escala musical desde o mais baixo até o
mais alto possivel, mas todos no mais per­
feito acordo. Ahl Para descrever tais harmo­
nias falecem-nos os termos de comparação.
Na fisíonomia daqueles felizes habitantes
via-se claramente que os cantores não só
experimentavam um pr_azer extraordinário
em cantar mas ao mesmo tempo sentiam
um júbilo imenso em escutar os cantos dos
outros. E quanto mais um indivíduo can­
tava, �nto mais. se inflamava no desejo de
cantar e quanto mais um escutava tanto
mais desejava escutar.
Eis o que cantavam: Salu.r, honor, gloria
Deo Patri omnipoienti.. ...ductor .raeculi, qui
era{, qui e.rt, qui 11enturu.r e.rt iudicare vivo.r ei
morluo.r in .raecula .raeculorum. (Saudação,
louvor e gl6ria ao Deus Pai Onipotente, ao
Autor dos séculos, ao que era, ao que é e virá
a julgar os vivos e os mortos nos séculos dos
séculos sem fim). ·

.d legião do.r venluro.ro.r.


Enquanto eu ouvia embevecido esta celeste
harmonia eis que aparece uma quantidade
imensa de jovens muitíssimos dos quais eu
-12-
conhecia por terem estado no Oratório e nos
outro$ colégios nossos, porém, a maior parte
me era completamente desconhecida. Aquela
multidão intérmina vinha ao meu encontro.
À frente caminhava Domingos Sávio seguido
por D. Alasonatti, D. Chiala, D. Giulitto
e muitíssimos outros clérigos e sacerdotes,
cada um à testa de um grupo de jovens.
Eu perguntava a mim mesmo:
- Durmo ou estou acordado ?
Batia as mãos uma contra a outra e apalpa­
va o peito para assegurar-me de que era uma
realidade o que eu via. Quando aquela multi­
dão chegou diante de mim, deteve-se à
distância de oito ou dez passos. Brilhou então
um re!Ampago mais ofuscante, cessou a músi­
ca e se fez um profundo silêncio. 'fodos os
jovens estavam impregnados de uma vivíssima
alegria que lhes transparecia nos olhos osten­
tando na própria fisionomia a paz de uma
perfeita felicidade. Fitavam-me com doce
sorriso nos ;lábios e pareciam querer falar,
mas não o faziam.

O .;eu guia: Domingo,; Sá11io.


Domingos Sávio adiantou-se sozinho ainda
alguns passos e parou tão perto de mim que
si eu tivesse estendido a mão tê-lo-ia alcan­
çado. Calado, fitava-me sorridente. Como
era formoso1 Verdadeiramente singulares eram­
lhe as vestes. A túnica alvíssima que lhe descia
- 13 -

'
até os pés era esmaltada de diamantes e toda
tecida de ouro. Cingia-lhe os flancos uma larga
faixa rubra recamada de tant�s pedras
preciosas que uma l'arecia tocar na outra;
essas gemas entrelaçando-se num desenho
maravilhoso apresentavam tal beleza de
cores que ao contemplá-las eu me sentia
arrebatado pela admiração. Do pescoço pen­
dia-lhe um colar de flores belíssimas e j amais
vistas na natureza; parecia que as pétalas
fossem diamantes encrustados numa haste
de ouro. Estas flores brilhavam com uma luz
sobrenatural. mais viva que a do sol, de fulgor
primavei.l, refletiam seus raios sobre o rosto
cândido e rosado de Sávio de maneira inenar­
ravel; ofuscavam-me de tal modo que não
pude dêstinguir as várias espécies de flores.
A cabeça de Domingos estava cingida por uma
coroa de rosas. A cabeleira descia-lhe ondeada
pelos ombros dando-lhe um aspeto tão belo,
tão afetuoso e tão atraente que parecia . . .
• • 1.
parecxa ... um anJO
Dom Bosco ao pronunciar estas últimas
palavras parecia fazer esforço para encontrar
expressões adatadas; finalizou-as com· um
gesto indescritivel e com um tom de voz que
sacudiu a todos; parecia um indivíduo esgo­
tado pelo esforço de procurar os termos que
lhe permitam manifestar com clareza a sua
idéia. Após breve pausa, prosseguiu:
- Tambem os out'ros personagens resplan­
deciam com luz vivíssima. Estavam vestidos
-14-

de modos vários mas sempre estupendos,


quem mais queln menos rico, quem com tal
explendor 'quem com tal outro, e todas essas
vestes tinham um signüicado que ninguem
saberia compreender. Todos, porém, tinham
a cintura cingida por uma faixa igual.
Eu continuava a observar e pensava:
-O que significa isto ? ... Como fiz para
chegar até aquí ?
Não sabia mesmo onde estava. Fóra de mim,
trémulo de temor reverencial, eu não ousava
ir adiante. Tambem todos os outros continua­
vam em silêncio. Finalmente Sávio abriu a
boca:
...:_Por que estás mudo e quasi aniquilado ?
Não és por acaso aquele que tempos atrás nada
receiava ? Nãb és aquele que ent"entava
calúnias, perseguições, inimigos,· angústias e
perigos de toda a casta ? Onde está tua cora­
gem ? Por que não falas ?
Respondí com dificulda?e e balbuciando:
- Não sei o que dizer. Es tu, pois, Domin­
gos Sávio ?
- Sim que o sou! Não me reconheces
mais ?
-E como é possível te encontrar eu aquí ?
- repliquei sempre confuso.
Sávio afetuosamente:
- Vim para falar con.tigol Tantas ve7.es
conversamos em te�pos idos! Não te lembras
quanto bem me querias quando eu estava
no mundo ? Quanta vez tu me deste sinais
-15 -
numerosos de amizade e usaste para comigo de
tantos atos de benevolência! Este teu vivo
afeto não era acaso correspondido ? Quão
grande confiança eu depositava 'em til Por que
estás assim abatido ? Por que tremes tanto ?
Eia! Faze-:qte alguma perguntai
O Para[.ro Terre.rfre.
Então creei coragem e falei:
-Tremo porque não sei onde estou.
- Estás no lugar da felicidade, respondeu-
me Sávio, lugar onde se goza de todas as
alegri�s e delícias.
-E este, pois o prémio dos justos ?
-Não! Não! Aquí neste lugar, não se goza
dos bens eternos mas sim tão só dos bens
temporais posto que grandes.
- Sito, pois, naturais, todas estas cousas ?
- Sim! Mas embelezadas pelo poder de
Deus.
- E a mim me parecia que isto fosse o
paraíso.
-Não! Não! Não! respondeu Sávio. Ne­
nhum mortal pode ver as belezas eternas.
- E estas músicas são harmonias 'do
paraíso ?
- Não! Não! Não!
- São acaso sons naturais ?
- Sim! Naturais mas aperfeiçoados pela
onipotência de Deus.
- E esta luz mais viva que a do sol não
é sobrenatural ? Não é do paraíso ?
-16-

- Nãol É luz natural mas avivada pelo


poder divino.
- Poder-se-ia ver UIJI. pouco de luz natural ?
- Ninguem pode vê-la sem ter antes
chegado a ver Deus .ricut e.rt ( Como Ele é em
si mesmo). A luz sobrenatural é a capacidade
de se mergulhar na visão imediata de Deus,
no que consiste propriamente o Paraíso.
O menor ráio dessa luz faria morrer imediata­
mente a um mortal pois os sentidos ·humanos
não a podem sustentar.
- Poder-se-ia ter 1,1ma luz natural ainda
mais bela do que esta ?
-Oh! Si tu soubesses! Si visses tão só
um raio de luz natural elevada a um grau
superior ao desta, havias de perder o uso dos
sentidos.
- E não se pode ver ao menos � raio
desta luz a que te referes ?
- Sim que o podes. Terás a prova do
que te digo: abre os olhos.
-Tenho-os abertos, respondí.
- Fica atento e olha para o fundo do mar
de cristal.
Olhei para lá e no mesmo instante apareceu
improvisamente no céu, a uma distância
imensa, um raio instantâneo de luz, fino como
um fio mas tão brilhante que meus olhos não
puderam resistir. Fechei-os e soltei um grito
tão forte que. despertei D. Lemoyne no
quarto vizinho. Pela manhã o diretor de
Lanzo me perguntou atemorizado o que 'me
-17 -
acontecera naquela noite. O raio de luz era
milhões de vezes mais rútilo que o sol e com
se� fulgor bastaria para iluminar todo o
un1verso.
Depois de alguns instantes abrí os olhos
e perguutei a Domingos Sávio:
-O que é isto ? Por ventura não é um
raio divino ?
Sávio respondeu:
- Não1 Não é luz sobrenatural po!ltO que
em comparação com a deste mundo seja tão
superior em brilho. Isto não é senão luz natural
tomada mais viva pela onipot�ncia de Deus.
Si uma faixa imensa de luz semelhante ao
raio que viste envolvesse o mundo todo,
não poderia ainda dar-te uma idéia dos
fulgores do paraíso.
-4\:) que gozais então no paraíso ?
-Oh1 Sim1 É impossivel dizer-te. O que
lá se goza não ha mortal que possa sab�-lo
enquanto não tiver saido deste mundo e se
unido ao Creador. Goza-se de Deus1 Eis tudo.

A. túnica da �JÍrgindade
e a jai:ra do mari[rio.
Eu, no entanto, já tendo por completo me
rehavido do primeiro atordoamento, estava
absorto em contemplar a beleza de. Domingos
Sávio e lhe perguntei com franqueza:
- Por que tens uma veste tão alva e ful­
gurante ?
- 18 -

Sávio calou-se parecendo não querer res­


ponder. Mas o coro reiniciou sua harmonia
acompanhado pelo som de todos os intrumen­
tos. Eis o canto: lp.ri hahueruni lumho.r
praecincio.r ei dealha11eruni .rtola.r .rua.r in
.ranguine Ágni. ( Estes conservaram os rins
cingidos e tomaram d.ndida a própria
túnica no sangue do Cordeiro: Jesús).
Quando acabou a música perguntei: Por que
esta faixa rubra na tua cintura'!
Sávio tambem desta vez não respondeu.
Então D. Alasonatti sozinho se pôs a cantar:
Virgine.r enim .runt ei .requuniur Agnum
quocumque ierit. ( Estes são Virgens e fazem
corôa ao Cordeiro onde quer que Ele vá).
Então eu compreendí como aquela faixa
vermelha cor de sangue fosse símbolo dos
grandes sacrifícios, dos violentos es1orços
e até quasi do martírio sofrido para conservar
a virtude da pureza, bem como terem êles esta­
do prontos para dar a vida,caso as circunstân­
cias exigissem tal sacrifício, por amor à virtu­
de. Era tambem o emblema das penitências
que purificam a alma de suas culpas. A alvura
e o esplendor da veste significam a inocência
batismal conservada.
Eu, no entanto, atraído por esses cânticos
e contemplando a multidão de jovens celes­
tiais enfileirados atrás de Sávio, perguntei:
- Quem são estes que te rodeiam '! E vós
como resplandeceis tanto'!
-� 19-

Sávio contfuuou calado e todos os seus


companheiros se puseram a cantar: Hi .runt
.ricut Angeli Dei in caelo (estes são como os
Anjos de Deus no céu).

Domingo.r Sá11io embaixador de Deu.r.


Notava eu no entanto que Sávio aparentava
uma preeminência sobre a multidão que o
seguia a uns dez passos de distancia como com
respeitosa reverência.
- Dize-me, Sávio, tu és o mais jovem den­
tre os muitos que te seguem e dentre os que
morreram nas nossas casas porque pois tu os
precedes ? Por que se calam quanto tu falas ?
- Sou o mais velho de todos estes.
- Isso não, repliquei eu, muitos outros
são ufcl.is idosos do que · tu.
- Sou o mais antigo do Oratório, retorquiu
Sávio, pois fui o primeiro a deixflr o mundo.
Além disso legatione Deijungor! (sou o Embai­
xador de Deus).
Esta resposta esclarecia o motivo dessa
aparição: Uma embaixada de Deus.
- Então, disse eu, falemos agora daquelas
cousas que presentemente mais nos interessam.
- Sim! Apressa-te a me perguntar o que
ainda queres saber. As horas passam e pode
ser que se acabe o tempo que me foi concedido
para te falar e assim não me poderás mais ver.
- Creio que tenhas alguma coisa de grande
importancia para me comunicar.
-20 -
- O que devo dizer-te eu mesquinha creatp­
ra 1 perguntou Sávio num ato de profunda
humildade. Recebí do' alto a missão de falar
contigo. Para isto é que vim.
-Então, exclamei eu, fala-me do passado,
do presente e do futu;I'O de nosso Oratório.
Dize-me alguma coisa dos meus filhos
queridos, fala-me da minha Congregação.
- Com respeito a esta última, teria muito
a te dizer.
O bem já realizado.
-Manifesta-me pois tudo o que sabes:
fala-me do passado.
Sávio: -O passado corre por tua conta.
E eu: -Fiz alguma coisa que seja desagra­
davel a Deus 1
Sávio: - Quanto ao passado te digp que
a tua Congregação já fez um grande bem.
Vês lá longe que multidão inúmera de jovens 1
- Vejo-os, respondí. Quantos! E como
estão felizes!
Sávio:-Olha! Vês o que está escrito na
entrada daquele jardim 1
- Vejo. Está escrito: Jardim Saluiano.
Pois bem, prosseguiu Sávio, foram todos
Salesianos ou educados por ti, ou contigo
tiveram alguma relação, hoje estão salvos
graças a ti, aos teus sacerdotes, clérigos, ou
outros que por ti foram colocados na estrada
da sua vocação. Conta-os si és capaz1 Mas
seriam cem milhões de vezes mais numerosos si '
tivesses tido maior fé e confiança no Senhor.
- 21 -

Suspirei e gemi. Não tive resposta para


- I
essa repreensao e propus com1go mesmo:

procurarei t�r para o futuro esta fé e esta


confiança.
O bem que .re fará agora .•.
Perguntei então:
- E o-presente ?
Sávio me mostrou um magnífico ramalhete
que tinha na mão. Havia rosas, violetas,
girasois, gencian.as, lírios, semprevivas, no
meio havia espigas de trigo. Apresentou-me
tudo. e disse:
-Olha!
- Vejo sem compreender, respondi:
- Apresenta aos teus filhos esta corbelha
para 11ue no tempo propício possam oferecê-la
a Deus, procura que todos a tenham, ninguem
esteja privado destas flores e ninguem lhes
arrebate este ramalhete. Fica certo que com
isto serão felizes.
- Mas o que significam estas flores ?
- Toma a teologia, respondeu-me Sávio.
Ela t' o dirá e te dará a explicação completa.
E eu: - Estudei já a Teologia e não sabe­
ria encontrar nela a significação disto.
Sávio: Estás estritamente obrigado a saber
estas coisas.
- Eia, Domingos, tira-me desta ansiedade,
dá�me a explicação dest&oramalhete.
Sávio: Vês estas flores? Representam as
virtudes que mais agradam ao Senhor.
- 22

- Quais são elas ?


Sávio: -A. rosa é o símbolo da caridade,
a violeta da humildade, o girasol da obedi2ncia,
a genciana da penit2ncia e da mortificação,
as espigas da comunhão frequente; o lírio
indica aquela bela virtude da qual está escrito:
Erunt .ricut Angeli Dei in coelo: a ca.rtidade.
E a sempreviva significa que todas estas
virtudes devem durar sempre: é a per.re11erança.
- Eia pois, meu caro Sávio, perguntei-lhe
então, dize-me tu que pr:aticaste todas estas
virtudes durante tua vida, o que te consolou
mais no ponto da morte?
- Qual pensas que tenha sido? - respon­
deu-me Sávio.
- Talvez o teres conservado sempre a bela
virtude da pureza ? ..
- Não! Não foi só isso!
- Talvez te alegrou o ter a conci�ncia
tranquila ?
- Isto é uma boa coisa, mas não é a
melhor!
- Foi então teu conforto a esperança do
paraíso ?
- Tambem não!
- Então foi o, teres entesourado muitas
obras meritórias ?
- Não! Não!
- Qual foi pois teu conforto naquela hora
derradeira ? - Pergantei-lhe eu suplicante,
embaraçado, por não conseguir adivinhar-fite
o pensamento.
- 2.3-

E Sávio: - Eis! O que mais me confortou


no ponto de morte foi a a.J'.ri.rtência da podero.ra
e amavel .Mãe do' Salvador/ Dize isto aos teus
filhos. Que eles não se esqueçam de recorrer
a Maria enquanto estão em vida. Apressa-te
si queres ainda que eu te dê outra resposta .

. e do futuro.
- E do futuro o .que me dizes?.
- O futuro!? No próximo ano 1877 terás
de sofrer urna grande dor. Seis mais dois dentre
os que te são mais caros serão chamados à eter­
nidade. (Realmente em 1877 morreram no
Oratório seis jovens e dois clérigos). Mas
consola-te. Serão transplantados deste mundo
para os jax:dins do para�so. Serão coroados.
Não ten:tas porém, o Senhor te ajudará e te
dará 01!tros filhos tarnbem bons.
-Paciência! E com o que diz respeito à
congregação ?
-Relativamente à Congregação fica sa­
bendo que Deus te prepara grandes coisas.
Para ela surgirá no ano próximo uma aurora
de glória tão esplêndida que iluminará como
um reUmpago os quatro ângulos do mundo,
do oriente ao ocidente, do norte ao sul do
universo. ( E de fato em 1877 foi instituída a
Pia União dos Cooperadores Salesianos e fun­
dado o Boletim Salesiano, estendendo-se
assim por todo o mundo o influxo da obra de
D. Bosco). Grande glória lhe está preparada.
Mas tu procura que o carro sobre o qual está
- 24 -

o Senhor não seja ar):'astado pelos teus para


f6ra das rédeas do bom caminho. Si os teus
padres souberem conduzí-lo assim e forem
dignos de sua alta missão, excelente ser-lhe-á o
futuro e trará salvação para uma infinidade
de gente. Com uma condição porém: que os
teus filhos sejam devotos da Virgem Bema­
venturada e saibam conservar por toda a casa
a virtude da. castidade, que tanto agrada
aos olhos de Deus.
- Agora eu desejaria, disse-lhe, que tu
me falasses alguma coisa da Igreja.
-Os destinos da Igreja estão nas mãos de
Deus Creador. O que foi estabelecido nos
seus infinitos decretos não me é dado te1 reve­
lar. Tais arcanos são reservados .unicamente
para Deus e nenhum dos espíritos creados
pode participar deles.
- E Pio IX?
____: O que te posso d izer é que o Pastor da
Igreja não terá de combater por muito tempo
ainda sobre a terra. Poucas batalhas restam­
lhe a vencer. Dentro em breve será tirado da
sua cátedra e o Senhor lhe dará o prémio
merecido! ( Quatorze meses após esta profecia
Pio IX cessava de viver: Fevereiro de 1878).
O resto já o sabes. A Igreja não perece.
Tens ainda algo a me perguntar?
-A meu respeito, o que dizes?
-Oh! Si soubesses quantos acontecimentos
terás de experimentar ( D. Bosco viverá ainda
-- 25 -

onze anos e dois meses cumprindo com a pr6-


pria missão entre dificuldades sem número).
Mas, vamos! Está quasi a expirar o tempo
que me foi concedido.

Ilu.rão de D. -Bo.rco.
Então afoitamente estendí as mãos para
reter perto de mim aquel� santo discípulo,
mas as suas mãos pareciam vaporosas e
nada pude segurar.
- Tolo! Que fazes ? - perguntou-me Sávio
sorrindo.
-Receio que tu me fujas, respondí. Mas ...
não estás com o corpo?
-Nlo! Hei de retomá-lo um dia.
--' Mas então como explicar o teu semblan-
te ? Vejo em ti os traços de Domingos Sávio.
-Olha, explicou-me, quando a alma está
separada do corpo e por permissão de Deus se
torna vizivel a algum mortal, conserva a forma
e a apar�ncia externa com todas as linhas do
pr6prio corpo quando ainda vivo e as conserva
assim, posto que imensamente aformoseadas,
até o dia em que haja de se reunir ao corpo
material no dia do juizo final. Então o con­
duzirá ao paraíso. Porisso que te parece ter eu
mãos, pés e cabeça mas tu não poderias me
segurar porque sou um puro espírito. É esta
forma externa que faz com que me conheças.
26 -

.d.r tru cla.r.ru morai.r.


- Já compreendí, foi minha respo�ta.
Escuta-me. Ainda uma coisa. Os meus jovens
estão todos no bom caminho da salvação ?
Dize-me algo que me ajude a bem dirig·í-los.
- Poderás dividir os jovens que a Providên­
cia Divina te confiou, em três classes. Vês
estas três listas ? Observa bem.
- Olhei para a primeira lista. Sobre ela
via-se escrito: lnvulnerafi (sem ferimentos),
isto é, aqueles que o demónio não pudera
ferir, eram os que não contaminaram a
própria conciência com culpa alguma.
Eram em grande número e eu os vi a todos.
Muitos deles já eu conhecia, muitos era a
p'rimeira vez que eu os via e talvez deverão
vir ·.ao Oratório nos anos futuros. Camhthavam
impávidos por uma estrada apertada não
obstante serem continuamente atmgiélos p elas
flexas, lanças e espadas que provinham de
todos os lados. Estas. armas formavam uma
cerca à margem dos caminhos, opunham-se
ao passo dos jovens e molestavam-nos sem os
. ferir.
Então Sávio me apresentou a segunda lista.
Estava escrito em cima: 11ulnerati (feridos),
e eram os que já estiveram na inimizade de
Deus mas hoje, tendo se restabelecido das
próprias feridas arrependeram-se e se confes­
saram. Estes eram em número superior aos
primeiros e haviam recebido as feridas no
caininho da vida da parte dos inimigos pos-
- 27 -

tados à beira da estrada. Lí os seus nomes e ví


a fisionomia de cada um. Todos caminhavam
encurvados e sem coragem.
Domingos Sávio tinha ainda na mão uma
terceira coluna de nomes. Sobre ela estava
escrito: la.r.rati in 11ia iniquitatiJ' (enfraquecidos
no caminho da iniquidade). Aí estava o nome
de todos que não J'e acham na graça de DeUJ'.
Eu estava impaciente de conhecer os nomes
e para pegar a lista estendí a mão. Sávio,
porém, me disse com vivacidade:
- Não! Espera um momento e ouve. Si
abrires esta folha tresandará um cheiro tão­
horrivel que nem tu nem eu poderemos supor­
tá-lo. Os anjos retiram-se repugnados ao sentí-lo
e o próprio Espírito Santo sente náuseas
pelo fétitlo horrivel do pecado.

O mal é repugnante.
Observei então: - Como pode isso aconte­
cer si Deus e os anjos são impassiveis ? Como
podem sentir o mau cheiro da matéria?
- Sim! Quanto mais as criaturas são boas
e inocentes tanto mais se aproximam dos
espíritos celestes; ao contrário, quem é mau,
deshonesto e imundo tanto mais se afasta de
Deus e dos anjos que se retiram dele como de
um objeto repelente e nauseante.
:Óeu-me então a lista e me disse:
- Toma-a tambem, abre-a e tira proveito
dela para o bem de teus j ovens. Lembra-te
-28-

seinpre do ramalhete de flores, procura que


todos o tenham e 'o conservem.
Dizendo isto, ap6s me ter entregado a lista,
retirou-se com seus companheiros como si
estivessem fugindo.
Abrí o papel. Não ví nome algum mas no
mesmo instante me foram apresentados num
bater de olhos todos os indivíduos inscritos
na lista. Ví-os com a pr6pria.. pessoa cheio
de amargura. Mas quando abrí o papel
espalho�-se em redor um cheiro tão nausea­
bundo que era insuportavel. Imediatamente
assaltaram-me dores de cabeça violentíssimas
e Ansias de v6mito tão intensas que julguei
morrer. Nesse tempo a visão foi desaparecendo
dando lugar às trevas mais escuras. Ao mesmo
tempo faiscou um raio e ribombou ull"... trovão
tão forte e terrível que despertei aterrorizado.
Aqu�le cheiro penetrou em todas as paredes
e infiltrou-se-me na roupa de modo tal que
ap6s muitos dias parecia-me sentir ainda
aquela pestilência. Como é repugnante aos
olhos de Deus até o nome dos viciosos! Ainda
agora apenas me recordo daquele odor !fétido,
sinto calafrios, sufoca-me o ar e vem-me An­
sias de v6mito prolongadas. Ví em Lanzo
muitos daqueles jovens e me assegurei de
que o sonho _não me enganara. Foi, portanto,
uma graça de Deus que me fez conhece�; o
estado da alma de cada um, eu porém nada
direi em público ».
- 29 -

2 - 0 CANTICO DA INOCiNCIA
Uma visão representa nitidamente a arre­
batadora beleza da virgindade, o fulgor de sua
candura imaculada, as forças triunfais que nos
fazem perseverar nela e a delícia insopitavel
do seu coroamento no céu.
Com respeito a esta alegria note-se que
posto haja sido descrita e inspirada por D.
Bosco, a redação não é do Santo Educador.

O parai.ro do.r viruen.r.


« Pareceu-me ter diante de mim uma imensa

e encantadora planíCie viridente, com um


suave decqnio e toda aplainada. Nas suas
fraldas, esse prado formava um degrau bas­
tante baixo, o qual ia dar no caminho es­
treito �nde D. Bosco estava. Parecia um
paraíso terrestre, esplendidamente iluminado
por uma luz pura e mais viva que a do sol.
Estava todo coberto com erva fresca, esmal­
tado por renques de flores e sombreado por
um número grandiosíssimo de árvores belís­
simas, que, entrelaçando-se entre si, esten­
diam-se à guisa de amplos festões. No meio
do jardim, até à sua ·extremidade, estava
estendido um tapete de cor encantadora,
mas tão claro, que ofuscava a vista: era da
largura de várias milhas. Tinha o aspeto
magnífico d� uma estrada real. Como orna­
mento, na faixa que contornava a orla do
jardim, tviam-se várias inscrições com caracte-
- 30 --

res de ouro. Num lado, lia-se: Beati immaculati


in via, qui ambulant in lege Domini (bemaven­
turados na sua vida os imaculados, os que
progridem na lei do Senhor). No outro lado:
Non privabit boni.r eo.r qui ambulant in inno­
centia (Deus não ha de negar seus dons aos
que vivem na inocência). No terceiro lado:
Non conjundeniur in tàmpore maio: in diebu.r
jami.r .raiurabuntur (não ficarão desiludidos
quando vierem as privações: no dia em que os
outros tiverem fome, eles serão saciados).
No quarto: J.Vovit Dominu.r die.r immaculaio­
rum ei heredita.r eorum in aeiernum erit.
(Deus leva em conta a vida dos inocentes:
' eternamente).
a sua herança durará
Nos quatro �ngulos da estrada, ao redor
do magnífico florão, estavam outrae tantas
inscrições: Cum .rimpl icibu.r .rermocinatio eiu.r
(a sua palavra é para o coração dos simples).
Qui ambulant .rimpliciter, ambulant conjidenier
(confiante caminha quem progride na simpli­
cidade). Volunia.r eiu.r in ii.r, qui .rimpliciter
ambulant (As suas predileções são para os que
caminham na singeleza) .
No meio da estrada esta última inscrição:
Qui ambulat .rimpliciter .ralvu.r erit. (Quem
caminha com singeleza, será salvo) .
No centro da ribanceira, na extremidade
superior do alvíssimo tapete, se elevava um
estandarte candidíssimo, sobre o qual liam-se
estas palavras, tambem douradas: Fili mi,
-:n-

lu .remper mecum e.r ei omnia mea lua .runi


(meu filho estás sempre comigo e tudo o que
tenho é)ambem teu).

A.r dua.r donzela.r gracio.ra.r


Si eu estava embevecido à vista daquele
jardim, muito mais me atraiam a atenção
duas graciosas meninas, de seus doze anos,
assentadas na orla do tapete, onde a margem
fazia. um degrau. Uma celestiai modéstia
transparecia de toda a sua impecavel atitude.
De seus olhares, constantemente fixos no
alto, raiava não só uma ingénua simplicidade
de pomba, mas tambem uni amor intenso e
puríssimo, um encanto de felicidade celeste.
Os seus rostos abertos e serenos pareciam a
séde d� candor e da sinceridade, sobre seus
lábios percorria um doce e encantador sorriso.
Os �seus traços manifestavam um coração
terno e ardente. Os donairosos movimentos de
suas pessoas davam-lhes um tal ar de sobre­
humana grandeza e distinção que faziam
contraste com a sua juventude. Uma veste
candidíssima descia até os seus pés, nela não
se ;via nenhuma mancha, nem uma ruga,
nem' um sinal de poeira. Sua cintura estava
cingida por uma faixa vermelha escarlate com
debruns de ouro. Sobre esta sobressaía uma
decoração em forma de fita, composta de
lírios, violetas e rosas. Uma fita simples,
como si fosse adereço, traziam ao pescoço,
composta das mesmas flores, mas de forma
- 32 -

diversa. ·come pulseiras tinham uma faixa


de margaridas brancas. Todas estas coisas e
estas flores tinham uma forma, cor e belezas
impossiveis de se descreverem. Todas as
pedras mais preciosas do mundo, encastoadas
com a arte mais exquisita, pareceriam barro
ao seu confronto.
Os sapatos cor de neve eram bordados com
fitilhos tambem brancos, com fímbrias de
ouro, fazendo um lindo laço no centro. Brancos
tambem eram os atacadores filetados a ouro.
A sua farta cabeleira era comprimida por
um diadema que lhes cingia a fronte e era

tão espessa que fazia ondas debaixo da coroa e,


recaindo pelas espáduas, terminava encaraco­
lada em cachos.
O.F te.rouro.F e a.r de­
..

llcia.r da inoc2ncia...
Elas tinham começado um diálogo: ora
se alternavam falando, ora se interrogavam,
ora exclamavam. Agora as duas sentavam-se,
em seguida urna ficava de pé e a outra sentada,
para mais tarde passearem. Não saiam, porém,
fóra daquele alvíssimo tapete e não tocavam
na alfombra e nas flores.
Eu estava como espectador, nem me dir�gia
àquelas meninas, nem elas se inteiravam de
minha presença. Uma delas dizia com en­
canto suavíssimo
- Que é a inoc�ncia ? O estado afortunado
da graça santificante, conservada mediante
a assídua e exata observância da lei divina.
- 53 -

- E a outra, com voz não menos suave:


- A conservação da pureza pela inocência
é fonte e origem de toda a ciência e virtude.
A primeira: Que grandeza, que glória, que
esplendor de virtudes não é viver bem entre
os maus, os malvados e malignos e conservar
a candura da inocência e a brandura de cos'\
tumes!
A segunda se levantou em pé passando
perto da companheira, exclamou: - Bema­
venturado o jovenzinho que não dá ouvidos
ao conselho dos ímpios e não envereda pelo
caminho dos pecadores, mas a sua delícia é
a lei do Senhor, que ele medita dia e noite.
Ele será como a árvore plantada ao longo da
torrenJ:e das águas da graça de Deus, a qual
dará a seu tempo o fruto copioso de boas
obras: pelo soprar dos ventos n�o cairão dela
as folhas das santas intenções e dos méritos,
e tudo o que ele fizer; terá êxito feliz; e em
toda a circunstancia da vida cooperará para
aumentar o -seu prêmio; - assim dizendo,
indi�ava as árvores do jardim que estavam
carregadas de frutos belíssimos e expandiam
pelos ares um perfume delicioso, enquanto
que riachozinhos limpidíssimos corriam entre
duas margens floridas, · caindo ora de fre­
quentes cascatas, ora formando pequenos
lagos, e regava os troncos, com um murmúrio
que parecia o som misterioso de uma música
que se ouvia ao longe.
- 34 -
A primeira donzela respondeu: - Ele é
como . um lírio entre os espinhos, que Deus
colhe no seu jardim para fazer dele um orna­
mento no seu coração e pode dizer ao seu
Se�hor: o meu dileto pertencerá a mim e eu
a ele, porque ele nasce entre os lírios. - Assim
falando, indicava um grande número de lírios
'lindíssimos que erguiam o cândido cálice
entre as ervas e as outras flores, enquanto
que; ao longe, uma altíssima sebe vl.ridente
cercava todo o jardim. Esta era de agudos
espinhos e atrás dela viam-se vagar, como
sombras, monstros repelentes que tentavam
penetrar no jardim, mas não o faziam por
causa dos espinhos daquela sebe .
- É certo: quantas verdades cont�m as
tuas palavras, acrescentava a segunda .._- Be­
.

maventurado o jovenzinho que for encontrado


sem culpa! Mas quem será ele e o louvaremos ?
Porque ele fez coisas admiraveis na sua vida.
Foi experimentado e achado perfeito e terá
gl6ria eterna. Podia pecar e não pecou: fazer
o mal e não o fez. Por isso os seus bens estão
firmes no senhor e as suas obras serão cele­
bradas por todas as congregações dos santos.
- Que gl6ria lhes não reserva Deus na
terra! Chamá-los-á, dar-lhes-á um lugar no
seu santuário, fazendo-os ministros· dos seus
ministros e um nome eterno que nunca pere­
cerá - concluiu a primeira.
A segunda se levantou de pé e exclamou :
-35-

- Quem pode descrever a beleza de um


inocente ? Uma alma assim, está vestida
esplendidamente, como uma de nós, ornada
com a branca estola do batismo. O seu colo, os
seus braços resplandecem de gemas divinas,
tem no dedo o anel da aliança com Deus.
Ela caminha pressurosa na sua viagem para a
eternidade: adeante dela se lhe depara um
caminho marchetado de estrelas . . . É o Taber­
náculo vivo do Espírito Santo; nas suas veias
corre o sangue de Jesús que purpuriza as
suas faces e os seus lábios. Com a Santíssima
Trindade no coração imaculado, espadana, ao
redor de si, torrentes de luz que a vestem dos
fulgores do sol. Do alto serpeiam mancheias
de flores celestes gue ofuscam os ares. Tudo
ao redor está impregnado das harmonias dos
anjos que fazem eco à sua oração. Maria
Santíssima está a seu lado pronta para de­
fendê-la. O céu está aberto para ela e é objeto
de admiração das imensas legiões dos santos
e dos espíritos bemaventurados que a convi­
dam, agitando as suas palmas. Deus, entre
os inacessiveis fulgores do seu trono de glória,
com a dextra lhe indica o lugar que lhe pre­
parou, enquanto que com a esquerda empu­
nha a esplêndida coroa que deverá cingi-la
para sempre. O inocente é o desejo, o gozo, o
aplauso do paraíso. Sobre o seu rosto está
insculpida uma alegria inefavel. É· filho de
Deus: Deus é o seu Pai: o paraíso é a sua he­
rança; ele está continuamente com Deus.
-36-

Vê-o, ama-o, possue-o, goza-o, tem um· raio


das celestiais delícias, está de posse de todos
os dons e de todas as suas perfeições.

- E é porisso que a inocência nos Santos


do Antigo Testamento, nos Santos do Novo,
e especialmente nos Mártires se apresenta
tão gloriosa.
Oh! Inocência! Quanto sois bela! Tentada,
cresces em perfeição; humilhada, elevas-te
sempre mais; combatida, sais triunfante;
abatida, consegues a corôa. Estás livre na
escravidão; tranquila e segura nos perigos;
radiante entre as algemas. Os poderosos te
reverenciam, os príncipes te acolhem, os
grandes te cercam. Os bons obedecem-te,
os maus invejam-te, os rivais procuram emu­
lar-te, os adversários sucumbem. E tu..sairás
sempre vitoriosa, mesmo quando os homen.s te
tivessem condenado injustamente .

... a .rua fragilidade.


As duas donzelas fizeram um instante de
pausa como para descansar após um esforço
tão intenso; em seguida tomaram-se pelas
mãos e se entreolharam.
Oh! Si os jovens conhecessem que precioso
tesouro é a inocência, como, desde o princípio
de sua vida, guardariam zelosamente a estola
do Santo Batismo! Infelizmente, porém, não
refletem e não pensam que queira dizer
conspurcá-la!
- 37 -

.,...... A inocência é um licor precios1ss1mo:


mas está encerrada num vaso de fragilíssimo
barro e se não for levado com muito tcuidado
se parte com toda a facilidade.
- A inocência é uma pedra preciosa de
imenso valor.
-Mas não lhe conhecem a valía: perde-se
e com facilidade se troca por um objeto vil.
-A inocência é um espelho de ouro que
reflete os delineamentos de Deus.
- Basta-lhe um pouco de ar húmido para
empaná-la, e por isso é preciso protegê-la
com um veu.
,

-A inocência é um lírio!
- Se mão áspera o tocar, de leve, emur-
chesse.
- A • inocência é uma cândida veste:
Omni tempore sit vestimenta tua candida.
(As tuas vestes sejam sempre sem mancha).
-Uma só mancha basta, porém, para
contaminá-la, por isso é preciso caminhar
com grande precaução.
-A inocência é a in.tegridade, fica violada
si for enxovalhada por uma única mancha e
perde o tesouro da sua graça.
- Basta um só pecado mortal.
- Perdida uma só · vez, fica para sempre
perdida.

Du�Jenlura de quem a perde.


- Que desventura é verem-se tantas ino­
cências que se perdem todos os dias! Apenas
- 38 -

um jovenzin.ho cai em pecado o céu se fecha,


a Virgem Maria e os Anjos da Guarda desa­
parecem, cessam as harmonias, a luz se
eclipsa, Deus não está mais em seu coração,
dissípa-se o caminho estrelado que ele per­
corria, cai e fica num ponto só como ilha no
meio do mar, um mar de fogo que se estende
até o extremo horizonte da eternidade, q!J.e
se abisma até a profundidade do cáos. Sobre
suas frontes, num céu tenebroso, riscam-se
ameaçadores os raios da justiça divina.
Satanaz se atirou sobre ele, carregou-o de
cadeias, pas-lhe os pés sobre o pescoço e com
uma carranca horrível erguida para o espaço,
gritou: « Venci. O teu filho é meu escravo;
não é mais teu... Terminou para ele a alegria ».1
Si a justiça divina naquele mom�"!lto lhe
subtrái o único ponto pelo qual se firma,
está perdido para sempre.
- Ele pode erguer-se1 A misericórdia de
Deus. é infinita. Uma boa confissão resti­
tuir-lhe-á a graça e o título de filho de Deus.
-Mas não existe mais a inocência1 Que
conseqüências lhe ficarão do primeiro pecado ?
Ele conhece o mal que antes não conhecia,
sentirá as más inclinações, sentirá a dívida
enorme que contraiu com a divina justiça,
sentir-se-á mais fraco nos combates espiri­
tuais. Exper�entará o que antes não sentia:
vergonha, tristeza, remorsos.
-E pensar que antes de dizia dele: « Dei­
xai que as creanças venham a mim. Serão
-39 -

como os anJOS no céu. Filhinho, dá-me o


teu coração ».
- Ah1 Um delito espantoso cometem aque­
les por cuja culpa uma creança perde a
inocência. Jesus .disse: Quem escandalizar
algum destes pequenos que creem em mim,
seria melhor para ele que lhe pendurassem
uma mó de moinho ao pescoço e o atirassem
ao fundo do mar. Ai do mundo por causa dos
esc�ndalosl Não é possível evitarem-se os
esc�ndalos, mas ai d�queles por culpa dos
quais vem o escândalo: Livrai-vos de des­
prezar qualquer destes pequenos, porque eu
vos digo que os seus anjos no céu vêm sempre
o meu Pai que está no empíreo e pedem vin­
gança.
- In.felizes são esses, mas não menos
infelizes aqueles que deixam arrebatar-lhes
a própria inocência.

dlimento.r da inocência: o
dpmínio total de .ri me.rmo...
Nesse momento, as meninas se puseram a
passear. O objeto da sua conversa era acerca
dos meios para conservar a inocência. Uma
dizia:
- É um grande erro o def muitos joven­
zinhos quando pensam que a penitência
só é feita para os pecadores. A penitência é
necessária tambem para conservar a inocência.
Si S. Luiz não tivesse feito penitência, teria
sem mais caído em pecado mortal. Isso se
-40-

deve prégar, inculcar., ensinar continuamente


aos meninos. Quantos então não conservariam
a inocência; enquanto que agora são tão
poucos1
- Di-lo o Apó�tolo: Levemos em. nosso
corpo, sempre por toda a parte, a modifi­
cação de Jesus Cristo, afim ·de que· a própria
vida de Jesus se mauifeste em nossos corpos.
- E Jesus Santo, Imaculado, passou a
vida em privações e dores.
- Tambem Mària Santíssima; bem assim
todos os santos. 1 ·

- Isso foi para dar exemplo a todos os


jovens. Diz S. Paulo: « Si viverdes segundo
a carne, morrereis; si pois, com o espírito
derdes morte às inclinações da carne, vi-
vereis »! .
- Sem penitência,
. .
portanto, não 'Se pode
conservar a mocenc1a.
..

-No entretanto, muitos desejariam conser­


var a'inocência e viver livremente.
-Estultos! Não está escrito:« Foi arreba­
tado, para que a malícia não alterasse o seu
espírito e a sedução não induzisse seu animo
ao erro ? Por que a fascinação da vaidade não
opéra o bem e a vertigem da concupiscência
subverte a alma inocente » ?
Logo, dois inimigos tem o inocente: as
máximas perversas e as conversas iníquas dos
maus e a concupiscência. Não diz Nosso
Senhor que a morte do jovem em idade pre­
matura é prémio para· o inocente, afim de
-41 -

tirá-lo do combate ? « Porque ele agradou a


Deus, foi amado por Ele, e porque vivia entre
os pecadores foi transportado para outro
lugar. Tendo· vivido pouco tempo, percorreu
um longo caminho. Justamente porque a
alma dele. era querida por Deus, por isso
mesmo Ele o tirou do meio da iniquidade.
Foi arrebatado para que a malícia não al­
terasse o seu espírito, e a sedução não indu-
. .

z1sse o seu anuno ao erro »,


"

- Afortunados os meninos que abraçaram


a cruz da penit�ncia e com firme prop6sito
disseram como J 6b: « Donec dejiciam, non
recedam ab innocentia mea. »Não me afastarei
até à morte, da minha inoc�ncia.
- Logo, mortificação em superar o tédio
da ora,ão.
- �stá escrito: P.rallam et intelligam in
via immaculata... Quando Penie.r ad me?...
Petite et accipieti.r... Pater no.rler. Cantarei
esclarecido na via da inocência. . . Quando
virás até mim ?. . . Pedi e recebereis . . . Pai nosso.
- Mortificação na inteligência, humi­
lhando-se: obedecer aos superiores e às
regras. �
- Está tambem escrito: « Si mei non
juerint dominati, tunc tinmaculatu.r ero et
emundabor a delicio �imo. Si eles não me
dominarem, então serei sem mancha e serei
purificado do delito máximo. Esta é a soberba:
Deus resiste aos soberbos, e aos humildes
- 42 -

dá a graça. Quem se humilha será exaltado e


quem se exalta será humilhado. Obedecei
aos vossos propósitos.
-Mortificação em dizer sempre a verdade,
em manifestar os próprios defeitos e os perigos
nos /quais uma pessoa pode estar. Então, será
sempre aconselhado, especialmente pelo con­
fessor.
- Pro anima tua non conjudari.r dicere
verum. Por amor da tua alma não te envergo­
nhes em dizer a verdade. Pois ha um rubor
que traz consigo o pecado e ha tambem um
rubor que traz consigo a glória e a graça.
-Mortificação do coração, refreando seus
movimentos intempestivos, amando a todos
por amor de Deus e afastando-se resolutamente
de quem acharmos que insidia co�tra a
• •

nossa 1nocenc1a.
A

- Jesus disse: Si a tua mão e teu · pé te


servem de escandalo, corta-os e atira-os
longe de ti. É melhor para ti entrares na vida
com um pé e u' a mão a menos, que com
ambas as mãos e ambos os pés seres atirado
no fogo eterno. E si o teu olho te serve de
escandalo, arranca-o e atira-o longe de ti: é
melhor para ti entrares na vida com um olho
só que com dois seres atirado no fogo eterno.
-Mortificação em suportar corajosa e
francamente a zombaria do respeito humano�
Exacuerunt ut gladium lingua.r .rua.r: inten­
derunt arcum, rem amaram, ut .raggilent in.
occultum immaculatum. Afiaram suas línguas
- 43 -

como a uma espada, retesaram o seu arco


cruelmente para alvejarem às ocultas o que é
imaculado.
- E vencerão o maligno que escarnece,
temendo ser descoberto pelos superiores,
com o pensamento nas terriveis palavras
de Jesús: Quem se envergonhar de mim e
das minhas palavras, o Filho do Homem se
envergonhará dele quando vier com a sua
majestade, a do Pai e a dos ' Santos Anjos.
- Mortificação da vista, no olhar, ao .ler,
evitando toda .a leitura má e importuna.
- Um ponto essencial: « Fiz pacto com os
meus olhos para não ver nem· tampouco uma
virgem E nos Salmos: Afasta teus olhares
para que não vejam a vaidade.
-�rtificação dos ouvidos, não ouvindo
conversas más, levianas ou ímpias.
- Lê-se no Eclesiástico: Saepi aure.r tua.r
.rpini.r, finguam nequam noli audire: Faze
sebe de espinhos nos teus ouvidos e não
ouças as más línguas.
-Mortificação nas palavras: não te dei­
xes vencer pela curiosidade. - Está tambem
escrito: Põe uma porta e um cadeado na
tua boca. Procura não pecar com a língua para
que não caias por terra À vista doS"inimigos que
te cercam, e não seja incuravel e mortal a
tua queda.
- Mortificação da gula: não comer nem
beber demasiado!
- 44 -

- O muito comer e o muito beber trou­


xeram o dilúvio universal ao mundo e o fogo
sobre Sodoma e Gomorra e muitos castigos
sobre o povo hebreu.
Mortificar-se, em suma, sofrendo tudo o
que nos acontece de desagradavel durante
o dia, como o frio e o calor, e não proturar
as nossas satisfações: Mortificai os vossos
membros terreqos. Lembrar-se do que Jesús
nos imp8s: Si alguem quiser vir após mim,
abnegue-se a si próprio, tome a sua cruz
cotidiana e me siga.
. . .Je.rú.r e ./lfaria...
- Deus mesmo, com · a sua próvida mão
cinge de cruzes e de espinhos os seus inocentes,
como fez com Job, José, Tobias e outros
Santos: Quia acceptus eras Deo n.ec�sse fuit
ut tentatio probaret te. :____ O caminho da
inocência tem as suas provas e os seus sacri­
fícios, mas haure a sua força na comunhão, ·
porque quem comunga frequentemente tem
a vida eterna, está Jesús nele. Quem vive da
mesma vida de Jesús, s�rá por Jesús ressus­
citado no último dia. E este o fruto dos
eleitos: o vinho que gera os virgens: Para.rfi
in con.rpecfu fuo men.ram adver.ru.r eo qui
fribulant me. Cadent a !afere iuo mille et decem
millia a dexlri.r tuÍJ': ad te autem non appro­
pinquabuni. Preparaste na tua presença uma
mesa contra os que me atribulam. Ao teu
lado cairão mil e à tua direita dez mil, de
ti, porém, não se aproximarão.
- 45 -

- E a Virgem Dulcíssima por ele amada


é a sua mãe. Eu sou a mãe do Belo Amor, do
Temor e do Conhecimento e da santa Espe­
rança. Em mim está a graça de toda a vida e
de toda a verdade. Eu amo os que me amam.
Os que me enaltecem possuirão a vida eterna.
Sou poderosa como os exércitos unidos para
o combate.
As duas donzelas voltaram-se e subiram
lentamente a margem. Uma delas exclamou:
« A salvação dos justos vem de Deus e ele é

o seu protetor no tempo da tribulação. O


Senhor os auxiliará e os livrará, e os arrancará
das mãos dos pecadores e · os salvará porque
esperam nele » ,
E a outra prosseguiu: - « Deus me ungiu
de rolmstez e tornou imaculado o caminho
que percorro »,

d apoteo.re da.r virgen.r.


Chegando as donzelas ao magnífico tapete
voltaram-se : - Sim! gritou urna; a inocência
coroada pela penitência é a rainha das virtudes.
E a outra exclamou tambern: « Quão gloriosa
e bela é a geração casta] A sua rnem6ria é
imortal e é not6ria deante de Deus e dos
homens! A gente a ·imita,. quando ela está
presen�e, e a deseja quando partiu para o céu;
na eternidade triunfa coroada ganhando o
prémio dos combates pela castidade.
E que triunfo! Que satisfação em apresentar
a Deus a estola imaculada do Santo Batismo,
- 46 -

depois d�-tantos trabalhos, entre os aplausos,


os cantos e os fulgores dos exércitos celestes! »
Enquanto falavam do prémio que está
preparado para a inocência conservada pela
penitência, D. Bosco viu comparecerem filei­
ras de anjos que desciam e pousavam sobre
aquele alvíssimo tapete e se uniam às duas
donzelas fi�ando elas no meio. Eram uma
multidão e cantavam.
Bendito seja Deus, o Pai de N. S. J. Cristo
que nos encheu de todas as bênçãos espiri­
tuais e celestes em Cristo N. Senhor; que
nos escolheu nó mesmo Jesus antes da creação
do mundo para que fassemos santos e imacu­
lados na sua presença na caridade e nos
predestinou na adopção de Jesus Cristo.
As duas meninas puseram-se enJ:ão a
cantar um hino estupendo, mas coll'l tais
palavras, com tais notas que somente O!i
anjos que lhes estavam mais próximo podiam
modular: Os outros tambem cantavam mas
D. Bosco não podia ouvir a sua voz, embora
fizessem gestos e movessem os làbios como
acomodando a boca ao canto.
As meninas cantavam: .He propier ·tnno­
centiam .ru.rcepi.rti et conjirma.rti me in. con.r­
pectu tuo in aeternum benedictu.r Deu.r a .raecuÚJ
et u.rque in .raeculum. Fiai! Fiai! (Tu 6 Senhor
me acolheste em vista da minha inoc.ência e
me confirmaste na tua presença eternamente,
ó Deus bendito por todos os séculos. Assim
aconteça! Sim 1
- 47 -

No entretanto às primeiras legiões de an­


jos se uniam outras e outras, continuamente.
As suas vestes eram de cores variadíssimas,
de ornamentos diversos, umas diferentes das·
outras, e especialmente do vestuário das
donzelas. A riqueza e a magnificência, porém,
eram divinas. A beleza de cada um deles era
de um deslumbramento que a mente humana
não pode descrever nem fazer uma idéia,
embora longínqua; todo o espetáculo desta
cena é inenarravel; mas à força de aglutinar
palavras a palavras, pode-se de qualquer
maneira dar uma idéia de tudo, si bem que
confusa.
Acabado o canto das meninas, todos canta­
ram juntamente um canto imenso e tão
harmo.,.ioso que igual não se ouviu e não se
ouvirá sobre a terra.
Eles cantavam: Aquele que pode vos conser­
var sem mancha e vos estabelecer em sua
presença imaculados e exultantes quando vier
Nosso Senhor Jesus Cristo; a Ele, único Deus
e Salvador Nasso, mediante · Jesús Cristo
Nosso Senhor seja atribuída a mais magnífica
glória; a Ele o domínio e o poder sempre e
em todo o instante. Assim seja.
Enquanto cantavam, iam chegando sempre
novos anjos e quando o cAntico terminou,
aos poucos todos se elevaram e desapareceram
com toda a visão.
'Então eu despertei
- 48 --

3. - A PUREZA ENCERRA EM SI TODAS


AS VIRTUDES

Na tarde do dia 4 de · Junho de 1876, sole­


nidade do Pentecostes, D. Bosco, abrindo o
coração aos filhos mais íntimos assim expri­
mia o seu pensamento sobre a suma preciosi­
dade da pureza.
« É muito bom, meus queridos filhos, que

nos reunamos de tanto em tanto já para que


eu possa ter a satisfação de vos manifestar
meus pensamentos e desejos, já tambem para
que possais gozar do prazer de ouvir a palavra·
de um temo amigo e vosso pai que tanto vos
quer bem... Tenho uma coisa a vos dizer e
desejaria que me prestasseis uma atenção espe­
cial. Aquilo que nos deve distinguir dos de­
mais, aquilo que deve ser o nosso cara'ter pe­
culiar é a virtude da castidade; esforcemo-�os
pois para a possuir perfeitamente e inculcá-la
e nutri-la no coração do pr6ximo. Quanto a
mim julgo poder aplicar a esta vidude o que
se lê na Bíblia: venerunf mihi omnia bona
parifer cum illa (esta virtude traz consigo
todos os bens). Si possuirdes esta virtude,
tambem tereis as demais pois ela atrái as
outras todas. Si, porém, ela faltar, as demais
todas se perderão como si não existissem.
A pureza deve ser o eixo das ações todas que
praticardes. Tenhamo-lo bem gravado · em
nossa mente: não devemos poupar esforços
para dar bons exemplos a todos. Jamais
SONHO DE DO
M BOSCO - O Ven. Domingos Sávio aparece ao Santo e lhe fala . sobre a
miss o da Sociedade Salesiana.
- 50 -

suceda em toda a nossa vida que aJgum deva


receber escândalos de nossa parte. Nunca
se dê o caso de algum de nós perder esta
�Virtude e ser de escândalo aos demais com
palavras, com escritos, com livros ou ações.
Nos· tempos que vivemos é-nos necessária uma
grande modéstia e uma castidade a toda prova.
Si amardes esta virtude tão delicada e gentil,
. erifi.r .ricuf Án9eli Dei (sereis como os anjos
celestes). Os anjos amam a Deus, adoram-no
e o servem. Amando esta virtude virá em
nós o Santo temor de Deus e a paz do coração;
não mais angústias nem remorsos de conci­
ência, mas sim um grande enlevo para tudo
o que concern.e ao serviço divino, estando
sempre prontos para sofrer tudo por seu
amor. Si nós tivermos esta virtude estaremos
certos de caminhar pela estrada \egura;
todas as nossas ações por pequenas que
sejam, serão bem aceitas a Deus, de tudo
havemos de alcançar méritos imensos e
estaremos seguros de chegar ao prémio
imortal da pátria celeste ao pleno gozo
de Deus.
Façamos pois todos os esforçes para conser­
var longe de nós até o mínimo pensamento
que possa ofuscar, por pouco que seja, esta
virtude : evitemos qualquer olhar, qualquer
atitude conosco e com os outros capaz de
danificar a nossa pureza. O que mais nos
ajudará a conservar cuidadosamente esta
virtude é a obed-i&rcla i ··Deus· em ' fodàs as:·
- 51 -

coisas. Pureza e obedi�ncia se completam


mutuamente e quem conservar a mais exata
obed�ncia pode estar certo de tambem con·
servar o inestimavel tesouro da pureza.
Peçamos fervorosamente a Deus que no-la
d� e si Ele no-la conceder não teremos , mais
necessidade de coisa alguma. Todo o bem,
toda a consolação nos virá do Céu si soubermos
conservar fielmente esta virtude »,

4. - A SUBIDA AO CEU DAS ALMAS


VIRGENS É LEVE E FACIL
Na tarde do dia 22 de outubro de 1 864 D.
Bosco narrava um « sonho » que tivera na
noite precedente, no qual se via com quanta
facilidade os inocentes superam os obstáculos
que toMa árduo para os outro.s o caminho
da salvação.
O 11ale do mundani.rmo.
- Pareceu-me que me achava num gran­
díssimo vale todo cheio de milhares e milhares
de jovens mas tão numerosos que nunca teria
suposto haver tantos no mundo.
Entre esses jovens eu distinguia todos os
que já passaram ou q:ue ainda estão nesta
casa. Os outros deviam ser os que futuramente
serão alunos salesianos. No meio dos meninos
eu via sacerdotes e clérigos do Orat6rio.
Uma ribanceira altíssima fechava um lado
daquele vale. Enquanto eu pensava que faria
de tantos meninos, uma voz me disse:
- 52 -

- Vês aquele barranco ? Pois bem, é


preciso que tu e teus meninos alcancem sua
extremidade. Então eu dei ordem a toda aque­
la turba de meninos de se dirigirem para o·
lugar· indicado. Os meninos atenderam e com
grande entusiasmo começaram a subir aquela
encosta. Os padres subiram tambem empur­
rando para diante os meninos: levantando os
que cansados pelo caminho não podiam mais
andar.
D. Rua com as mangas da batina arrega­
çadas trabalhava mais que todos e tomando
os meninos dois a dois lançava-os pelo ar à
margem onde caiam de pé e começavam a
brincar e a saltar alegremente.
O P. Cag'liero e o P. Francesia corriam
para cima e para baixo pelas filas gritando:
Coragem! Avante!

AJ' dez colina.J:


o.r ÀfandamenloJ'.
Em pouco tempo aquela turba de meninos
galgou o cimo da elevação: eu tambem tinha
subido e disse: Que faremos agora ? E a voz
ajuntou: Deves transpar com teus meninos
as dez colinas que vês estenderem-se diante
de ti.
- Mas como farão para suportar uma
viagem tão longa ? Tantos meninos tão fran­
zinos!
- Quem não puder andar será carregado,
foi a resposta.
53 -

O carro da Inoc2ncia.
E e1s de fato aparecer na falda da colina
e subir por ela uma carruagem magnífica.
Descrevê-la é impossivel, tal a sua beleza,
mas alguma coisa se poderá dizer. Era triangu­
lar e tinha três rodas que se moviam em todas
as direções. Dos três angulos saím três hastes
que se vi�;�.ham juntar num único ponto sobre
o carro, formando um como teto de caraman­
chão. Sobre este ponto de união erguia-se um
magnífico estandarte onde estava escrito com
letras cubitais: Innocenfia.
Uma faixa rodeava o carro formando um
parapeito e trazia a inscrição: Adiutório
Dei .dlti.r.rimi, Patri.r �� Filii et Spiritu.r
Sancti - (Com o a�ílio do Deus' Altíssimo,
Padr� Filho e Espírito Santo).
O carro que era todo resplandecente pelo
ouro e pedras preaiosas, avançou e veiu
colocar-se no meio dos meninos. Dada a
ordem muitos meninos nele subiram. O número
deles era de 500. Quinhentos apenas entre
tantos milhares de jovens eram ainda ino­
centes.
A via upinho.ra do.r
não inocenfe.r.
Tendo-se os meninos acomodado sobre o
carro, eu pensava porque caminho me haveria
de dirigir quando ví abrir-se na minha frente
uma estrada larga e cAmada mas toda espar­
gida de espinhos.
- 54 -

Apareceram então, de improviso, seis j ovens


que tinham morrido anos atrás no Orat6rio,
vestidos de branco e levantando uma belíssi­
ma bandeira onde se lia: Poenilenlia.
Estes se foram colocar à testa de todas
aquelas falanges de meninos que deviam fazer
a viagem a pé. Foi dado o sinal de partida.
Muitos padres se aproximaram do timão do
carro que puxado por eles começou a mover-se.
Os seis vestidos de branco o seguiam. Atrás
deles todo o resto da multidão. Com magnífica
e inefavel música os meninos que se achavam
no carro entoaram o Laudale pueri Dominum
(Meninos, louvai ao Senhor) .

.d.r vítimas do caminho


Caminhava eu inebriado por aquela música
celeste quando me lembrei de olhar pa�a trás
para ver si todos os meninos me tinham •se­
guido. Mas oh! doloroso · espetáculo! Muitos
tinham ficado no vale e muitos �stavam vol­
tando. Com dor inexprimivel resolví tornar
a bater o caminho j á percorrido; ia convencer
aqueles estultos meninos a que continuassem
o caminho, ajudando-os si preciso fosse.
Mas isto me foi proibido.
- Aqueles pobrezinhos se perdem, excla­
mei dolorosamente.
- Pior para eles, � foi a resposta -
foram chamados como os outros e não quise­
ram te s�guir. Já viram a estrada que devem
tomar e isto é suficiente.
- 55 -

Quis eu replicar, insistir, implorar mas tudo


em vão: -A obedi�ncia é tambem para ti -
me foi dito. Tive de continuar o caminho.
Não estava ainda acalmada esta dor,
quando sobreveiu um triste acidente. Muitos
dos ;meninos qué estavam no carro, a pouco e
pouco iam caindo por terra. De quinhentos
só testavam cento e cincoenta sob o estandarte
da inoc�ncia. O meu coração se confrangia de
uma tristeza indizível. Esperava que. aquilo
fosse um sonho, fazia esforços para acordar
mas, pelo contrário,'percebia que era uma triste
realidade. Batia as mãos e escutava o ruido,
gemia e escutava o meu gemido ressoar rio
meu quarto; embalde procurava dissipar
'
aquele �errivel fantasma.
Ahl llleus queridos filhos, reconheci os que
ficavam no vale os que voltavam atrás ou
caíam do carro. Conheci a todos. Mas não
duvideis, farei todo o esforço para vos salvar.
Muitos de vós, convidados por mim a se
confessarem não atenderam· ao convite. Por
piedade, salvai as vossas almas.

Perto da méta.
Muitos dos meninos caídos do carro iam-se
pouco a pouco colocar entre as fileiras dos
que caminhavam atrás da segunda bandeira.
No entanto a música do. carro continuava
tão suave que o meu sofrimento foi se acal­
mando. Sete colinas tinham sido já superadas
e, tendo chegado aquela turba sobre a oitava,
- 56 -
entraram em um país maravilhoso, onde
pararam para tomar um pouco de descanso.
As casas eram de esplendor e beleza que não
se podem descrever. Dir-vos-ei com Santa
Terêza o que ela afirmou das coisas do paraíso:
São coisas que se envilecem quando delas
se quer falar, pois são tão belas que é inutil
querer apresentar alguma descrição. Portanto
apenas observarei que os portais daquelas
casas pareciam ao mesmo tempo de ouro,
de cristal, de diamante, de modo que sur­
preendiam, contentavam a vista e infundiam
alegria. Os campos eram cheios de , árvores
sobre as quais viam-se ao mesmo tempo
botões, flores e frutos. Era um encanto magní­
fico. Os meninos dispersaram-se pela região
aquí e acolá, quem por uma coisa, quem por
outra, pois grande era a sua curiosidade e o
desejo de provar daquelas frutas.
Mas aquí tive uma outra surpreza. Num
dado momento os jovens me apareceram
velhos, sem dentes, com cabelos ' brancos,
cheios de rugas na face, curvados, manque­
jando apoiados a um bastão. {As dez colinas
representavam cada uma um decénio de vida).
Maravilhava-me assaz disto tudo, mas uma.
voz me explicou:
- Tu te espantas mas deves saber que já
não são poucas as horas desde que partiste
do vale, mas anos e anos. Foi aquela música
que te fez parecer curto o tempo. Em prova
. 57 -

disto observa a tua fisionomia e te pers\la­


dirás de que digo a verdade.
Foi-me dado um espelho, mirei-me nele e
vi que o meu aspeto era de homem idoso
e acabado: rosto enrugado, dentes raros e
gastos.
A comitiva entretanto se pôs de novo a
caminho e de quando em vez os jovens pediam
que os deixassem parar para ver aquelas
coisas novas. Mas eu lhes dizia: -Adiante,
adiante; de nada .precisamos, não temos fome
nePl sêde, por tanto avante!
Longe, bem longe, sobre a décima colina
despontava uma luz que -ia sempre aumen­
tando como si saisse de uma abertura esplên­
dida (a 'porta do Paraíso).
Rec�meçou então o canto suavíssimo,
mas tão atraente que só no Paraíso se pode
ouvir e provar semelhante. Não era música
de instrumentos nem pareciam vozes hu­
manas. Era uma harmonia indescritivel e
tão intensa que foi a satisfação comovida que
experimentei que me fez acordar, achando-me
então em meu quarto ».
li - AS CILADAS.
I. OcAsiõEs PERIGosAs.
a) A oalinha que vai ter à boca da rapoJ'a.
Na tarde do dia 29 de Abril de 1865,
D. Bosco, valendo-se de um apólogo claríssimo
induzia os jovens a se guardarem do maior
- 58 -

dos perigos: o abandono do ambiente espi­


ritual de piedade, trabalho e recolhimento
em que a pureza impera soberana para 'Se
avizinhar dos atrativos que induzem à culpa:
as ocasiões. Pouco a pouco o espS:rito cuja
pujança moral já foi abalada pelo mesmo
fato de se ter voluntariamente aproximado
das ocasiões perigosas, pouco a pouco descerá
até o fundo do abismo.
Remédio: Imediata e vigorosa reação con­
tra qualquer engodo das tentações .

.d galinha que abandona o galinheiro.


« Imaginai uma galinha que numa certa
noite não quis voltar ao galinheiro. Inutil­
mente a sua velha dona suou para faz�-la
entrar no cercado: o bípede fugia sempre
da porta até que a velha se cansou d� perse­
gui-la, fechou o galinheiro e retirou-se para
a própria casa. A galinha passeia aquí e
alí, cisca algum grãozinho e sente-se feliz
por se v�r livre. Chegando a noite a ave
repara numa escada que se apoiava no paiol
de feno. Degrau por degrau consegue não
sem dificuldades arranjar um ctlmodo lugar
sobre o feno e aS: se dispõe a dormir. Eis
que um rumor a acorda. Já é noite. Ninguem
está mais acordado na casa, os cães de guarda
rondam longe sob os vinhedos. Uma raposa
conseguiu subir no monte de feno e tendo
visto a galinha aproxima-se cautelosa pronta
par� devorá-la.
59 -

.d de.rcida progre.r.rwa.
Cheia de terror a galinha se atira ao ar
procurando desferir um v8o: a raposa que
armara o salto lança-se sobre ela mas cái ao
solo enquanto que com o aux�lio das pesadas
asas o Mpede conseguiu se empoleirar numa
árpore vizinha. Sem perder de olho a sua
pr�sa, a raposa, acocorada na terra, observa
com o focinho para o ar a sua gorda vítima.
Depois de uma longa hora a galinha abre as
asas num segundo vôo e vai pousar sobre o
baixo.muro que cercava o terreno. O muro é
mais baixo que os ramos da árvore. A raposa
se move de um lado para outro, v� uma táboa
encostada n.o muro e rápida e impetuosa
trepa até o cimo correndo ao longo do muro
em bu�a do seu precioso bocado. Para fugir
do perigo a galinha não tem outro remédio
senão voar para fóra do muro indo pousar
aflita sobre um galho mais baixo do que o
ponto de partida. Notai bem : a galinha pelo
peso do seu corpo dificilmente pode v8ar
para mais alto e por isso cada vôo que dá
vai ficando mais perto do solo. A raposa
desce do muro pela táboa, sai do terreno pelo
boeiro para escoamento das água, e gira um
pouco em torno do . arbusto dispondo-se a
subir pelo tronco. A ave temendo ser alcan­
çada vôa para uma outra árvore não muito
distante. Persegue-a a raposa. Cega de terror
a galinha procura fugir mas vai pousar sobre
uma sebe baixinha; a sua cruel perseguidora
- 60 -

não se cansa de lhe dar caça e quando já


se prepara para um salto fatal a galinha
vôa mas. . . não tem mais lugar onde se esconder.

�a boca da rapo�a
Cada �ez mais próxima de sua pr&sá a
raposa corre sobre ela com olhos de fogo.
Finalmente cai-lhe a galinha entre as garras
e desfere um último grito. Daí a pouco não
resta mais do que um monte de penas san­
grentas. .
Meus caros filhos, a raposa é o demónio,
a galinha representa certos j ovens que seriam
bons mas . . . confiam nas próprias forças e não
querem obedecer como a galinha não quís que
a fechassem no galinheiro. Estes pobres sem
experiência- não mais querem saber de�avisos
pois julgam que as asas da boa vontade e da
piedade lhes sejam suficiêntes. Infelizmente,
porém, se esquecem de que a nossa natureza
decaída tende para a terra. Alguns são gulo­
sos. . . outros vadios . . . outros. . . outros. . . só
Deus o sabe. Outros dizem :
- Por que nos proibem estas amizades ?
Nós não fazemos nada de mal.
Em seguida começam a descuidar certas
regras depois procuram evitar quem os quer
dirigir, logo mais vêm certas cartinhas, certos
pensamentos, certas familiaridades, certas ami­
zades particulares e sensiveis. . . Vai-se descen­
do, descendo. As asas não bastam mais, eis
-que a raposa corre sobre a vítima e a devora
- 61 -

b) Os TEMERÁ.RIOS VÃO TER Á ·BOCA DO DEMÓNIO


No dia 13 de novembro de 1863 D. Bosco
explicava como fosse arriscado brincar com
o fogo e isso de um modo especial para
aqueles que já de qualquer modo houvessem
sido chamuscados.

O poço profundo.
- Ontem de manhã fizemos o exercício da
boa morte. ·Preocupei-me todo o dia com o
pensamento do bom fruto que terá provindo
dessa . prática de piedade. Receio porém que
algum de v6s não o tenha feito devidamente
pois esta noite tive o sonho que vos quero
·Contar:
« Ach�va-me no recreio com todos os jovens
da casa que se divertiam saltando de um lado
para outro. Saímos do Orat6rio para' ir a
passeio e depois de algum tempo nos detivemos
num prado. Lá, os jovens recomeçaram os
folguedos e cada qual procurava saltar mais do
-que os companheiros quando eis que, no meio
do prado, eu divisei um poço muito fundo.
Aproximei-me para observá-lo e para me cer­
tificar de que não apresentava nenhum perigo
para os meus jovens e . . . enxerguei então no
fundo do poço urna serpente horrivel. Era
da grossura de um cavalo, ou melhor, de um
elefante. Era porém curtinha e disforme, toda
salpicada de manchas amarelas.
- 62 -
O.r incólumú e o.r Jerido.r
Logo me retirei, um tanto trêmulo e me pús
a observar os meus jovens que, quasi todos,
tinham começado a saltar de um lado do poço
para o outro e o mais estranho é que eu nem
tive a idéia de proibir-lhes isto ou avisá-los
do perigo. Via alguns pequeninos que eram
tão ageis que conseguiam saltá-lo sem nenhu­
ma dificuldade. Outros, porém, mais crescidos,
por serem mais pesados armavam um salto
mais forçado e menos elevado e muitas
vezes caíam bem à borda da abertura; eis que
então aparecia a cabeça da horrível serpente
e os mordia no pé ou na perna. Não obstante
isto, aqueles incautos eram tão temerários
que saltavam ainda muitas vezes sem quasi
nunca saírem ilesos.
Então um j ovem me disse mostr:ndo-me
um companheiro:
- Eis que este aquí vai saltar mal uma vez
e na segunda vez ficará no fundo do poço.

Fazia-me pena ver jovens estendidos por


terra um com uma chaga na perna, outro com
uma no braço e muitos no coração. Eu per­
guntava:
- Por que fostes correr por cima deste
poço tão perigoso ? Por que voltastes para lá
após ter recebido tais feridas ? Que funesta
brincadeira!
E eles respondiam suspirando:
- Não nos habituamos ainda a pular. . .
- Mas não ha necessidade de fazê-lo.
- 63 -

- Que ,quer o senhor ? Ainda não nos


acostumamos e não pensavamos encontrar
nisso mal algum.

A 11Uima.
Mas dentre todos um me atraiu a atenção
fazendo-me estr�mecer: aquele jovem que me
fora apontado. Foi experimentar novo salto
e precipitou-se no fundo do po"ç o. Após alguns
instantes o monstro repelente cuspiu-o para
fóra, preto como um carvão, não estando
ainda morto e continuava a falar. (sinal de que
ainda poderia ser salvo mediante a con­
fissão) "·

2) As PALAVRAS

_.a) 0 ECO DE UMA PALAVRA

O bispo salesiano D. Costamagna refere


uma grave advert�ncia que em 1875 recebera
de D. Bosco.
« Insiste muito sobre a fuga das más conver­

sas e sobre o dano que elas produzem. Repete


aos teus alunos que D. Bosco já leu grossos
volumes, ouviu muitos e muitos sermões e de
tudo isso pouco se lembra, .mas de uma palavra
má que um companheiro perverso lhe disse
quando tinha sete anos, nunca mais se esque­
ceu pois o demónio aceito\! o feio encargo de
repetí-la frequentemente aos meus ouvidos.
E no entanto já faz 60 anos »,
- 64 -

Na verdade D. Bosco tinha sensação muito


viva dos efeitos prejudiciais que as conversas
levianas ou perversas produzem em quem as
ouve; por isso é que, ainda petiz, para afastar
os seus concidadãos das palavras menos casti­
gadas de um indivíduo desbocado, 'estendeu
jmprovisamente uma corda entre duas árvores
iniciando assim uns passes de acrobacia.

b) Lembrança mi�terio.ra
Em 1862 aconteceu a um j ovem do Orat6rio..
este fato bem significativo :
Um aluno ao se afastar do colégio penetrara
inadvertidamente num bosque vizinho. lmpro­
visamente viu-se m� frente de um indivíduo
que lhe dirigiu palavras indignas de um cristão.
"
O j ovem sentiu-se atordoado e por completo­
desn:orteado sem saber o que fazer; derepente,
porém, ouviu uma POZ que o chamou distinta
e vigorosamente pelo nome. Imediatamente
correu para casa e foi à procura do superior
imediato perguntando-lhe porque o havia cha­
mado. Surpreso, este lhe respondeu que não­
chamara a ninguem. Como iluminado por uma
luz improvisa, compreendeu o rapaz , que
correra um grave perigo, teve a intuição de
·
que a vo:;r; que escutara não fôra uma simples
voz humana e porisso encamillhou-se ansioso­
para D. Bosco que estava no meio dos j ovens.
Este, ao vê-lo chegar, fixou o jovem com tal
insistência e expressão, acampanhada de um
- 65 -

sorriso tão significativo, que o rapazinho ficou


certo de que D. Bosco vira tudo e lhe fizera
·
ressoar aos ouvidos e à alma aquele apelo
misterioso.
A quem tiver « ouvidos para ouvir », não
ressoará ainda hoje e sobretudo nos momentos
em que se fizesse mais necessário, o apelo de
D. Bosco vivo e operoso educador ?

c) O demónio da llngua.
No dia 22 de outubro de 1876 D. Bosco
chamava a atenção dos jovens sobre as
conversas. Tinham eles voltado das férias
havi� pouco tempo e porisso precisavam destas
palavrinhas do. Santo.
« Amanhã começa a novena de Todos os

Santos; cada um procure faz�-la bem e propo­


nha J:'ara este ano duas coisas: a primeira
é fugir de toda a espécie de pecado; a outra,
de evitar qualquer pensamento ou palavra
contra a santa virtude da modéstia. Este
propésito deve durar não s6 por este ano mas
sim para sempre. Si quiserdes para esta novena
uma prática, uma florzinha que vos seja
adatada, ei-la: abstende-vos de dar rédeas
soltas à língua. Para isto não são precisas
penit&ncias extraorqinárias, basta um pouco
de vigilancia sobre v6s mesmos. Si isto for
difícil :para algum de v6s, tanto maior será a
recompensa que lhe será preparada no Céu.
O senhor vos abençoe e dê uma boa noite
a todos.
- 66 -

3. - As COMPANHIAS

a) O moribundo contra
o amtgo.
O bi6grafo de D. Bosco expõe um fato que
Ele mesmo narrara em 1862.

O moribundo.
D. Bosco fôra chamado com urg�ncia à cabe­
ceira de um rapa�inho de dezesseis anos que ti­
nha frequentado o Orat6rio Festivo mas" agora
se encontrava nos extremos consumido pela
tuberculose. Habitava o jovem perto da
Igreja de S. Roque. D. Bosco foi imediata­
mente. Recebeu-o o pobrezinho com muita
festa, confessou-se e depois pediu aos pais que
entrassem no seu quarto e se colocassem,,.iunto
à sua cabeceira. D. Bosco tambem se postou
junto ao travesseiro do enfermo; na fisionomia
do moribundo apareceu uma expressão de
profunda melancolia e num dado momento
voltando-se para a mãe lhe disse:
- Peço-vos que digais àquele jovem que era
meu amigo. e qlle mora no primeiro andar desta
casa, que me venha visitar agora mesmo.
-Mas por que desejas v�-lo ?-perguntou­
lhe a mãe.
- Por que ? Eu bem o sei! Devo dizer-lhe
uma palavra.
Parecendo a D. Bosco que essa visita
repugnava aos progenitores, disse:
- 67 -

- Não te agites assim! Para que mandá-lo


chamar ?
- Quero saudá-lo pela última vez.

Pala1wz.r de jogo.
Não demorou o amigo. Lançando um olhar
quasi de terror ao enfermo, avizinhou-se aos
pés do leito. O moribundo fez esforços para
se sentar e os pais o ajudaram colocando­
lhe um travesseiro sob as costas. Fixando
então o companheiro com um olhar de angústia
inexprimivel estendeu o braço na direção
dele e apontando-o. com o indicador da mão lí­
vida com voz dificultosa:
- Tu!... disse retomando a respiração ap6s
um violento acesso de tosse. . . tu, prosseguiu,
foste ICJUem me assassinou . . . Maldito seja o
momento em que te encontrei pela primeira
vez. . . É tua a culpa de eu morrer assim tão
jovemL . Tu me ensinaste aquilo que eu não
sabia... Tu me traíste. . . Fizeste-me perder
a graça de Deus . . . Foram tuas palavras, foram
teus maus exemplos que me impeliram ao mal
e que agora enchem de amargura a minha
alma. Oh! Tivesse eu seguido o conselho e a
ordem de quem' me exhortou a fugir de ti . . .
Todos choravall). ao ouvir tais palavras.
O mesquinho companheiro todo trémulo,
mais pálido do que o moribundo, sentindo-se
desfalecer sustentava-se à grade do leito.
- Basta., basta, acalma-te! disse D. Bosco
ao enfermo. Por que te angustiares assim 1
- 68 -

o que passou já não volta mais . . . Não penses


nisso . . . Tu fizeste bem a tua confissão e
nada tens a temer. . . Tudo está apagado e es­
quecido. Deus é tão bom!. . .
- Sim, é verdade! Mas no entanto si não
fosse ele eu ainda estaria inocente. . . seria
feliz . . . não me acharia reduzido a este estado.
- Vamos perdoa-lhe! acrescentou D. Bosco;
o Senhor tambem já te perdoou .
- Sim! Sim! Perdôo! exclamou o pobrezinho.
E cobrindo o rosto com as mãos rompeu em
pranto recaindo sobre os travesseiros.
. Ninguem podia resistir a cena tão comovente.
D. Bosco fez sín.al aos pais que conduzissem
para fora aquele companheiro que soluçava
sem dizer. palavra. Mal se sustinha em pé.
D. Bosco com algumas daquelas palawinhas
que só ele sabia dizer reconduz iu à mais serena
calma o pobre coração do enfermo assistindo-o
até os extremos momentos.

b) 0 LOBO!·
No dia 13 de dezembr � de 1 868 D. Bosco
fazia os seus j ovens refletirem sobre o perigo
em que se colocam aqueles que afastando-se
das pessoas que podem lhes fazer bem não re­
param nos companheiros c9m os quais vão se
juntar.
Frequentar a.r boa.r companhia.r.
« Por que será que me vejo sempre rodeado
de jovens novatos no Oratório não vendo ao
meu redor grande número dos antigos ?
- 69 -

Não quer dizer que todos se afastem, pois a


maioria tem confiança em mim e se a.J?roxima
de D. Bosco, mas uma parte, não. No outro dia
me trouxeram as folhas de tarefas de uma clas­
se; olhei para os nomes e não consegilí ver nem
a metade dos nomes antigos no Oratório.
Disse-me um rapazinho que o motivo pelo
qual tantos jovens antigos se conservam
longe de mim é o de serem eles culpados de
alguma queda e terem a conciência atrapalha­
da e porisso receiam ser descobertos.
Mas aqueles que mais estão adiantados nos
estudos são justamente os com que eu deseja­
ria falar mais frequentemente. Não quero dizer
que não fique contente por ver os alunos
novos me rodeando . sempre; só desejo que
saibais Ofjue os mais velhos são os que consti­
tuem a minha esperança.
Coragem, pois, em regular as contas de
vossa alma; isto é necessário mesmo para a
vida futura. Cada um faça todo o possivel
para ajustar a própria conciência,. abra depois
o coração com o seu superior e lhe diga:
- Estou pronto a fazer o que Deus quiser,
tudo o que for melhor para minha alma.
Os superiores fazem o que podem mas neces­
sitam de que corres�oil.dais aos seus cuidados
e ponhais em prática os seus avisos.

Livrar-se dos traidores.


Pensando eu nos vários motivos que afas­
tam alguns de D. Bosco, julguei ser o receio
- 70 -

de que algum companheiro os chame de


espiões. Já o proibí absolutamente e si alguem
o disser e, depois de avisado, não se corrigir,
será excluido do Oratório. Supondo que um
lobo voraz tivesse entrado no recreio, pene­
trasse no meio dos j ovens e quando se avi­
zinhasse de um para despedaçá-lo, um com­
panheiro se pusesse a gritar:
- Um lobo! Um lobo! Perigo! Aquí está
um lobol Fugíl
E um outro j ovem lhe dissesse:
- Fique quieto, seu espiãoI
- Mas não vês que o lobo depois de ter
matado aquele companheiro virá sobre nós 1
- Espião! Silêncio! Não queiras bancar
um sentinela! "
O que diremos daqueles que deixariam que
os lobos devorassem a todos só por que recei­
am ser chamados de espiões ? Gritai! Mostrai
onde está o lobo; ide-o dizer a quem pode
tomar providências para que ninguem venha
a ser despedaçado. Ultimamente vistes desa­
parecer alguns dos vossos companheiros.
Alguns foram excluidos por ter tido conversas
prejudiciais, outros por fazerem mola das
práticas de piedade e dos que se entregavam
as mesmas.
'

Ficai sabendo: « Nenhum afeto sinto para


com os que zombam do bem ao passo que aos
outros estimo muito, muitíssimo e os considero
filhos caríssimos •.
- 71 -

111 - O ABISMO.

1. As TREVAS DO ESPÍRITO.

Um dos males em que mais se enredam os


espíritos menos amantes da pureza angélica
é a cegueira característica pela qual não
conseguem divisar nem sequer confusamente
as coisas celestiais.
Era esta situação fatal que um dos mais
sugestivos sonhos 'de D. Bosco punha em
foco no dia 25 de Junho de 1867.

O palácio maravilho.ro.
Ontem à noite, meus caros filhos, tinha
eu me deitado e como o sôno tardasse, me
pus a meditar na natureza e existência da
alma; :tfensava como fosse ela feita, de que
modo poderia se achar e falar na outra vida,
estando separada do corpo; como possa
transportar-se de um lado para outro, como
poderemos nos conhecer mutuamente não
sendo nós depois da morte senão puros
espíritos. Quanto mais eu pensava nisto,
mais obscuro ia se fazendo este mistério.
Enquanto eu fantasticava desse modo
adormeci e pareceu-me estar na estrada que
conduz para a cidade X... Andei por algum
tempo, atravessei povoações que me eram
desconhecidas e eis que num certo ponto
ouvi pronunciarem meu nome. Era a voz
de uma pessoa que estava parada no caminho.·
- 72 -

- Vem comigo, disse-me, poderás assim


vêr o que desejas.
Logo obedeci. Aquele indivíduo caminhava
veloz como o. pensamento e eu o acompa­
nhava com a ·mesma rapidez. Caminhava­
mos sem tocar o chão. Chegando numa
certa região desconhecida o meu guia se
deteve. Num lugar elevado erguia-se com
magnificêr.cia um palácio de admiravel cons­
trução. Não sei onde estava então, nem
qual fosse aquela elevação de terreno; não
me lembro si me encontrava numa montanha
ou nas nuvens mais altas. O lugar era ina­
cessivel e não se via nenhuma estrada ql e
conduzisse até lá. As portas eram de uma
altura consideravel.
- Vamosl Sobe até o palácio, �e disse
o guia.
- Como farei para chegar até lá en.cima'!
Aquí em baixo não ha caminho e eu não
tenho asas.
- Entral replicou o outro imperiosamente.
E vendo que eu não me movia, disse:
- Faze como eul Levanta os braços com
boa vontade e has de subir Segue-me.
•..

Assim falando levantou as mãos com as


palmas para o céu .. Eu tambem abrí os braços
e me senti então transportado num momento
p�lo ar como si f6ra uma nuvem levinha.
Eis-me aa soleira do grande palácio. O guia
me t_nha acompanhado.
c Deixai que as crianças venham a mim •.
- 74 -

- O que há aquí dentro 1 - perguntei.


- Entra, observa e ficarás satisfeito. Lá
dentro, numa sala, encontrarás quem te ensi­
nará tudo.
O guia desapareceu e eu fiquei sozinho.
Guiando-me ao léo entrei no p6rtico, subí
as escadas e penetrei num aposento verdadeira­
mente luxuoso. Percorrí salas espaçosas, quar­
tos ornamentados com profusão e longo!!
corredores. Eu andava com uma velocidade
acima do natural. Todas as salas brilhavam
com o faiscar de tesouros surpreendentes e eu
percorrí assim veloz salas tão numerosas que
nem as pude contar. Mas �to não era o mais
admiravel. Corria !'lU com a velocidade do
vento sem .mover os pés, suspenso no ar, com
_i'B pernas juntas, deslizava facilmen� como
sobre um espelho. Passando assim de um
aposento para outro ví finalmente uma porta
no fundo de . 1Jlll corredor.

Ilu.rtre personagem.
Ao entrar por ela encontrei-me numa
grande sala mais espl�ndida que as outras.
Numa extremidade, sentado em luxuosa pol­
trona, com nobre majestade, estava um Bispo
na atitude de quem espera alguem para dar
audi�ncias. Aproximei-me respeitoso e fiquei
cheio de espanto ao reconhecer naquele
prelado um meu amigo íntimo. Era Monse­
nhor. . . Bispo de ..., morto há dois anos.
Parecia que nada sofresse. Seu aspeto era
- 75 -

sorridente, afetuoso e de uma beleza acrma


de qualquer desccição.
- Ohl Monsenhorl Vossa Excel�ncia aquí 1
perguntei com alegria.
- Não me v�s 7 - respondeu o Bispo.
- Mas como é isto 7 Está vivo 7 Não
morreu 7
- Sim1 Já morrí.
- E si morreu como pode estar stntado
aquí tão cheio de saude e alegria 7 Si ainda
está vivo é favor no-lo dizer, do contrário
eu ficaria atrapalhado. Em... já está um
outro Bispo .. . como haveríamos de nos arru­
mar ?
- Fica tranquilo. Não te preocupes com
isto pois já estou morto
..•

- Ainda bem, pois já �tá um outro no


seu lug.tr.
- Eu j á o sabia. E, D. Bosco, estás vivo
ou morto ?
- Estou vivo. Vossa Excelência não me v�
presente com corpo e alma 7
- Aquí não se pode vir com o corpo.
- No entanto eu estou.
- Parece-te, mas não é assim. . .
Apressei-me então a falar amontoando
perguntas sem receber ·nenhuma resposta.
- Como é possível que eu vivo esteja
falando com Vossa Excel�ncia que já morreu 7
Eu estava receioso de que o Bispo desapare­
cesse por isso supliquei-lhe logo:
76 -

·- Monsenhor, não me fuja, por favor.


Tenho muito a lhe perguntar.
O Bispo vendo-me aflito, disse-me:
- Não te perturbes tanto, acalma-te e- não
receies que eu fuja. Fala.
- Diga•me, Monsenhor, está salvo ?
- Olha para mim, não me v�s alegre, riso-
nho e resplendente ?
O seu aspeto dava-me realmente essa espe­
tança mas sem me contentar com isso, per­
guntei.
- Mas, diga-me, está salvo ou não ?
- Sim, estou num lugar de salvação.
- Mas Vossa Excel�ncia está no Paraíso
gozando de Deus ou está no Purgat6rio ?
- Estou num lugar de salvação mas ainda
não ví a Deus e tenho ainda necessidade de
que rezes por mtm. "'

- E quanto tempo deve ainda permanecer


no Purgat6rio ?

O caminho da .ralvação.
- Olha aquí - e apresentando-me um
papel, acrescentou:
- L�l
Tomei o papel nas mãos olhei-o com atenção
mas não ví nada escrito.
- Nada vejo no papel, disse eu.
- Olha para o que está escrito, 1�1
- Já olhei com cuidado mas não posso
ler pois nada encontro escrito.
- Olha melhor!
.-:.. 77 -

- Vejo um papel com 'enfeites -vermelhos,


azuis, verdes e roxos, mas não distingo letra
alguma.
- São números!
- Não os vejo.
O Bispo olhou pa�a o papel e disse:
- Já sei porque não entendes. O papel
está ao av�o.
Examinei a folha atentamente, voltei-a de
todos os lados e em todas as posições e nada
pude ler. Somente me pareceu ver que ao
girar aqueles desenhos em flor aparecia o
numero <<" 2 ».
O Bispb continuou:
- Sabes por que é preciso ler ao avesso ?
Porque os juizos de Deus são diversos dos do
mundo. O que parece aos homens sabedoria
-
é eshJltícia aos olhos divinos.
Não ousei insistir para que se explicasse
mais claramente e lhe disse:
- Monsenhor, não me fujal Preciso per-
guntar-lhe outras coisas.
- Pergunta, pois te escutarei.
- Eu me salvarei ?
- Espera pelo futuro.
- Mas não me aflija, Monsenhor, salvar-
me-ei ou não ?
- Não seil
- Ao menos me diga s1 estou em estado
de graça.
- Não seil
- E os meus filhos salvar-se-ão ?
- Não seil
-- Mas por favor, diga-me.
- Já estudaste a Teologia; porisso podes
saber e achar tu mesmo uma resposta.
- Comol Vossa Excel�ncia está num lugar
de salvação e nada disto sabe ?
- V� bem; o Senhor faz conhecer estas
verdades a quem bem entende e quando deseja
que estes conhecimentos sejam comunicados
dá uma ordem e uma licença. Si não for assim
ninguem pode comunicá-los aos que ainda
.

VIVem.
.

Eu estava agitado por uma febre de sempre


perguntar e fazia-o com pressa receioso de
que Monsenhor se retirasse.
- Agora, Excel�ncia, diga-me alguma coisa
para ser referida aos meus jovens.
- Tu sabes como eu o que eles devem
fazer. Tens a Igreja, o Evangelho e os outros
livros da Escritura que te dizem tudo. Dize
aos teus jovens que salvem a própria alma
pois o resto pouco adianta.
- Nós, porém, já sabemos dever salvar a
própria alma. Como o conseguiremos ? D�-me
um conselho especial para podermos conse­
guir este desideratum. �nos como lembrança
de Vossa Excel�ncia e eu o repetirei aos jovens
em seu nome.
- Dize-lhes que se tornem bons e obedien­
tes.
- Isso eles já sabem.
- Sejam modestos e rezem.
- 79 -

- Explique-se de um modo mais prático,


Monsenhor.
- Dize-lhes que se confessem com fre­
qu�ncia e façam boas comunhões.
- Diga-me alguma coisa mais pormenori­
zada.

O ob.rtáculo mai.r den.ro.


- J l que tu pedes, eu te direi. Dize-lhes
que t�m diante dos olhos uma névoa e que
quando um deles chega a distinguir esse nevo­
eiro j á está num bom ponto. Tirem essa névoa
como se lê nos salmos: Dissipa a nuvem.
- Mas o que é esse nevoeiro ?
- São as coisas todas deste mundo que
impedem de ver as coisas celestes como são.
- }: como fazer para dissipar a nuvem ?
- Considerem o mundo como é: « mundus
totus in maligno positus est » (o mundo todo
está impregnado de ruindades); s6 assim
poderão salvar a alma; não se deixem enganar
pelas aparências do mundo. Os jovens pensam
que os prazeres, as alegrias e as amizades do
mundo podem torná-los felizes e porisso
desejam com ansia gozar desses prazeres;
lembrem-se porém, que tudo é vaidade e
aflição de espírito. Acostumem-se a ver as
coisas do mundo, não como parecem mas sim
como são realmente.
- E esta cerração o que é que a produz ?
- Assim -como a virtude que mais resplan-
dece no paraíso é a 4: castidade » assim
- 8:> -

as trevas e a névoa são produzidas principal­


mente pelo pecado da imodéstia e impureza.
É como uma nuvem negra e densa que tira
a vista e impede aos jovens de ver o precipício
que lhes está na frente. Dize-lhes pois que
conservem zelosamente a virtude da pureza .
pois os que a possuem Jlorebunt .ricut lilium
in civitate Dei (florescarão como lírios entre
os habitantes do céu).
- E o que é necessário para conservar a
pureza ? Diga-me e eu comunicarei aos meus
jovens em nome de Vossa excelência.
- Recolhimento, obediência, fuga do ócio
e ... oração.
- O que mais ?
- Oração, fuga do ócio, obediência e reco-
lhimento.
- Nada mais ?
- Recolhimento, obediência, fuga do ócio
e oração. Recomenda-lhes isto que já basta.

d.r torlura.r do Purgatório.


Eu queria perguntar ainda muitas coisas
mas não me lembrava de mais nenhuma.
Porisso logo que o Bispo acabou de falar,
ansioso por vos contar tudo corrí para o
Oratório. Voava com a rapidez do vento e
num instante me achei aquí na porta de casa.
Quando c�eguei aquí parei e comecei a
pensar com1go mesmo:
- Por que não fiquei mais tempo com o
Bispo ? Ele me haveria de dar mais explica-
- 81 -

ções. Fiz mal em deixar escapar uma ocasião


tão boa. Quantas coisaS bonitas eu havia de
aprender]
Assim pensando voltei ao palácio com a
mesma rapidez, cheio de receio de não mais
encontrar o Prelado. Entrei novamente no
palácio e na sala.
Que mudança havia sucedido naqueles
br<lves instantes} O Bispo esten;i Jo sobre
o pr6prio leito, lívido como cera., parecia
um cadaver. Os olhos derramavam as últimas
l 1grimas: estava agonizando. O único sinal
de vida era um leve movimento do peito
arf�ndo nos últimos respiros. Aproximei-me
ans10so:
- Excelência, o que aconteceu 1
- Detxa-me, respondeu gemendo.
- Mas eu ainda teria muito a lhe perguntar·
- Deixa-me s6, sofro muitíssimo.
- Mas o que posso fazer por vossa exce-
l�ncia 1
- Reza e deixa-me ir.
- Para onde, monsenhor 1
---: Para onde me conduz a mão ompo-
tente de Deus.
- Eu lhe suplico, diga-me para onde
deve ir.
- Sofro muito, deixa-me.
- Ao menos me diga o que poss.o fazer
em seu auxílio.
- Reza.
- 82 -

- Uma palavra ainda: Não tem nenhum


recado para os meus jovens ?
- Dize-lhes que eu sempre lhes quis
muito bem, que rezei por eles enquanto vivia
e ainda agora os recordo sempre. Devem rezar
por m1m.
- Fique certo de que lhes. falarei tudo e
logo iniciaremos a sufragar-lhe a alma. Vossa
Excel�ncia, porém, recorde-se de n6s logo que
chegar ao Paraíso.
O aspeto do Bispo ia indicando cada vez
mais intenso sofrimento. Dava pena v�-lo
sofrer. Sofría muito! Sua agonia era an­
gustiosa.
- Deixa-me, disse de novo, deixa-me ir
para onde o Senhor me chama.
- Monsenhorl... MonsEmhor!... repetia eu
com indizível compaixão.
- Deixa-mel Deixa-mel
Parecia-me que ele morria. Uma força
invisível arrancou-o dalí fazendo-o desapa­
recer nos quartos mais internos.
Eu, comovido e assustado, ante tal sofri­
mento virei-me para voltar para o Orat6rio
mas tendo batido com o joelho em não sei
que objeto acordei e me achei deitado em
minha cama aquí no Orat6rio.
Corno vêdes, meus caros, este é um sonho
corno os demais e não tem necessidade de
explicações para que v6s o cornpreendais
perfeitamente »,
- 83 -

2. - 0 ABANDONO DOS SACRAMENTOS


No dia 16 de junho de 1864 D. Bosco
tocava numa outra chaga que prejudica os
que não vivem com pureza.
« Tenho uma coisa de muita importAncia

para vos dizer. Quem saberá explicar-me


o que eu vou expôr 1 Depois que o dem6nio
entrou no nosso colégio sob a forma de « animal
imundo », vejo notavelmente diminuída a
frequ�ncia aos santos Sacramentos. Há uma
frieza em toda a casa felizmente de carater
particular e não geral mas este particular vai
se estendendo de tal modo que parece quasi
geral. Sei que nos outros anos nesta novena
havia sempre um grande fervor e neste ano
não se v� nada que indique um afeto especial
a Maria!' Não será possível agora acender esse
mesmo fogo 1 Não falo de acend�-lo nos dor­
mit6rios ou no estudo mas sim no coração
dos jovens. Quem sabe si D. Bosco não tem
algum segredo para reacend�lo 1 Ohl É
verdade que eu o tenho e é infalivel, mas para
isso eu precisava poder entrar no vosso coração
e daí tirar um pensamento substituindo-o por
outro. O pensamento que eu quereria vos
deixar é este:
- Meu filho, lembra-te de que não poderás
salvar tua alma vivendo em pecado!
Si eu pudesse fazer isto, estou certo que
acenderia um pouco do fogo do amor divino,
do 6dio ao pecado e da frequência dos S. Sacra-•
- 84 -

mentos. Bastaria este fogo para reformar a


casa toda e a cada um de v6s em particular.
Gostaria que amarihã cada qual se detivesse
a refletir um pouco:
- O que fiz no passado pela minha alma ?
Como · me encontro agora aos olhos de Deus ?
Si morresse agora para onde iria ? O que pro·
ponho fazer no futuro ?
Seja esta a flor para amanhã ».

3. - 0 ALIMENTO AZEDO

D. Bosco via por vezes as repugnantes


«satisfações » e o nojento estado de espírito
em que se encontravam os que se debatiam
na lama da impureza. D. Cagliero, primeiro
Cardial Salesiano referes-no o seguinte:

dJ' quatro upéciu de pão


Uma tarde D. Bosco disse em público
que vira em sonho a todos n6s distribuídos
em quatro grupos. Estavamos comendo e os
jovens de cada grupo tinham na mão . um
pão de espécie diferente. Uns tinham um pão
fresco, fino, saborosíssimo, outros pão branco
ordinário, o terceiro grupo um pão preto
e duro e finalmente os últimos um pão mofado
e roido. Os primeiros eram os inocentes;
bons os segundos; os terceiros eram os que
atualmente não estavam na graça de Deus
mas não estavam habituados ao pecado;
o quarto grupo era dos que enchafurdados no
-· 85 -

mal; nenhum esforço faziam para mudar de


vida. D. Bosco, ap6s te_r dado a explicação
da causa e dos efeitos de cada um desses
alimentos, afirmou lembrar-se muito bem
qual o pão que nós comíamos e que si algum
de· nós fosse lhe perguntar, nô-lo havia de
dizer. Muitos foram e D. Bosco revelava a
cada um em particular como o vira no sonho,
fê-lo com tais particularidades sobre o estado
da conciência de cada um, que todos se persua­
diram não estar eie fantaziando e muito
menos apresentando simples conjeturas. Os
segredos mais íntimos, os pecados calados em
confissão, as intenções pouco retas em certas
ações, as consequências de uma vida sem a
necessária prud�ncia, e tambem as virtudes,
o estado de graça, a vocação e tudo o que disses­
se res�ito à alma de cada um, tudo foi des­
coberto, descrito ou profetizado. Os jovens
ficaram fóra de si pela admiração e depois de
terem estado em colóquio com D. Bosco
diziam como a Samaritana: Dixit mihi
omnia quaecumque jeci (Disse-me tudo o que
fiz). Estas palavras nós ouvimos repetirem-nas
por milhares de vezes durante anos e anos.

No dia 5 de Agosto de 1860 D. Bosco


desenvolvia essas mesmas considerações com
utn « sonho » .
- 86 -

AJ' ir2J' mua.r.


« Todos os meus jovens se achavam num
lugar tão ameno como o mais belo jardim,
sentados em mesas que formavam uma escadaria
de tal modo que quasi não se viam as mais
altas. Eram quatorze mesas dispostas no
vasto anfiteatro e divididas em tr�s grupos
cada um sustentado por um muro que lhe
servia de parapeito.
Bem em baixo, em redor de uma mesa
colocada no chão Iiú e destituída de todo o
adorno e de qualquer utensílio, via-se um
certo número de jovens. Estavam acabrunha­
dos, comiam com má vontade e tinham diante
de si um pão igual ao dos soldados, era porém
tão cheio de bolor e mofo que dava náuseas.
O pão estava sobre a mesa no meio de imun­
dícies e sujeiras. Aqueles infelizes es"tavam
como os porcos no lodaçal. Eu queria lhes
dizer que jogassem fóra aquele pão, mas me
contentei em perguntar porque tinham diante
de si um pão tão repugnante. Responderam-me:
- Devemos comer o pão que nós mesmos
preparamos e não temos outro.
Era o utado de pecado mortal.
No capítulo 1° dos Provérbios se 1�: Odiaram
a disciplina e não abraçaram o temor de Deus
não ouvindo os meus conselhos e ridiculari­
zando as minhas correções. Porisso hão de
comer do fruto de suas obras saciando-se com
elas.
- 87 -

Á medida que as mesas iam ficando mais no


alto os jovens mais alegres se mostravam e
comiam um pão mais precioso. Esses jovens
eram beHssimos, brilhando pelo esplendor e
beleza cada vez maior. As mesas riqu�ssimas
tinham toalhas finamente trabalhadas sobre
as quais brilhavam candelabros, ânforas,
taças, vasos de lind�ssimas flores, pratos cheios
de. iguarias deliciosas, tesouros de inestimavel
valor. O número destes jovens era imenso.
Era o e.rtado do.r pecadore.r con11ertido.r.
Finalmente as últimas mesas lá no alto,
tinham um pão que não sei definir. Parecia
amarelo e vermelho e era da mesma cor que
o rosto dos jovens que brilhava com uma luz
vivíssi:.na. Estes estavam inebriados numa
alegria extraordinária e se esforçavam para
comunicá-la aos companheiros. Na beleza, no
' brilho dos rostos e no esplendor das mesas.
estes venciam de muito os que estavam em
baixo.
Era o e.rfado de inoc�ncia.
O Espírito Santo, no capítulo primeiro dos
Provérbios, afirma dos inocentes: Quem me
escuta repousará sem receio e viverá na abun­
dância, livre do temor dos males.
Mas o que é mais admiravel é que eu conhe­
cí os jovens todos, do primeiro ao último, de
modo que ao ver agora a cada. um parece-me
vê-lo ainda assentado em roda de uma daque-
- 88 -

las mesas. Enquanto eu me maravilhava pelo


que estava vendo sem compreender, ví um
homem um pouco afastado; corri para interro­
gá-lo mas tropecei numa pedra e acordei »,
Onde me 112 D. Bo.tco ?
Por que não me enireg:J logo a Ele para que
me conduza à mai.r ele11ada me.ra doje.rtim ?

IV - AS ASAS
1 -_Q _ AMBIEHU-- CR'IS'fÃo
. . _____ _ _ _

Bem sabem todos que a única atmosfera em


que o espírito encontra inspiração e eficaz
impulso para a vida angélica, é aquele ambiente
que respiram os que vivem mergulhados na
contemplação das verdades cardiais: a morte,
o precioso juizo de Deus e a condição de._CJ.legria
ou de tortura em que nos encontraremos imu­
tavel e eternamente. Somente um alimento tão
J;J.Utritivo poderá fortificar vigorosamente a al­
ma imprimindo-lhe o impulso ascencional que
ha te triunfar realmente dos obstáculos encon­
trados. É o influxo do c Deus dos Anjos »,
Era essa a indicação que D. Bosco propunha
aos seus filhos no dia 16 de janeiro de 1865
mediante o c sonho » que lereis.

A Pinha carregada.
c Já se passou metade de janeiro, como nos
temos aproveitado desse tempo 7 si quiserdes,
vos narrarei um sonho que tive na noite
atrazada.
- 89 -

Viajava em companhia de todos os jovens


do Oratório e de muitos outrqs que eu não
conhecia. Detivemo-nos para almoçar numa
vinha, que bem pode significar o caminho da
virtude, e aü os jovens se espalharam para
chupar uvas aquí e alí. Alguns cS.upavam uvas,
outros comiam p�ssegos, outros figos, outros
chupavam ameixas. Eu estava no meio deles,
cortava cachos carregados, colhia figos e outras
frutas distribuindo tudo entre meus jovens:
- Isto é para você, coma!
Parecia-me sonhar e estava triste por não ser
uma realidade. Dizia comigo mesmo:
- Seja o que for, deixemos que os jovens
se alimentem.
No meio do vinhedo estava o zeloso vinha­
teiro. •

Caminho dijiculloJ'o.
Logo que refizemos as forças, pusemo-nos
a caminho através da vinha, incómoda era a
estrada. ·'A vinha era sulcada em to® o seu
percurso por vales profundos; de modo que
era necessário ora descer, ora subir, ora pular
(as dificuldades do caminho representavam
os obstáculos ao bem).. Os mais vigorosos
saltavam, os mais franzinos esforçavam-se
para imitá-los mas não conseguiam alcançar
a borda fronteira e rolavam fosso abaixo.
Isso me entristecia muitíssimo; porisso, pus�me
a observar os arredores e encontrei wn caminho
- 90 -

ao longo das videiras. Dirigi-me então com


todos os meus jovens para aquelá estrada.
O vinhateiro, porém, fez-nos parar e:
- Olha, me disse, não vás para aquela
estrada, é intransitavel, cheia de pedras,
espinhos, lama e valetas, continuem pelo cami­
nho em que estavam.
Eu retruquei:
- Tens razão mas estes pequerruchos não
podem caminhar através destes valados.
- OhJ É facil o remédio! Os maiores carre­
guem nos ombros os menorzinhos e assim
todos poderão saltar os fossos.
Eu não me convencí de que fosse coisa tão
facil e me encaminhei com toda a minha comi­
tiva para o caminho que encontrara. percebí
então que o cultivador dissera a verdade:
a estrada era horrível e intransitavel.
Voltei-me para o P. Francesia e lhe disse:
- Incidit in Scyllam qui vult vii4re Chary­
dim (Para evitar um abismo se cai num
precipício). ·

Foi-nos portanto forçoso atravessar a vinha


como melhor pudemos, seguindo o conselho
do vinhateiro.
Chegando ao lugar onde acabavam as
videiras encontramos uma espessa ramagem
espinhosa; abrindo um caminho com grande
dificuldade descemos uma outra encosta e nos
achamos num vale ameníssimo cheio de
- 91 -

árvores e atapetado de relva. No meio desse


prado avistei dois antigos alunos do Orat6rio
os quais, logo que me enxergaram dirigiram-se
para mim saudando-me com afeto.

.d perdiz.
Detivemo-nos a falar e um deles:
- Veja como são belasl - me disse mostran­
do-me duas aves que tinha nas mãos.
- O que ?
- Uma perdiz e... tambem uma codorniz
que encontrei.
- Está viva a perdiz ? - indaguei.
- Certamente, veja bem - assim dizendo,
me entregou uma belíssima perdiz de poucos
meses.
- Jt. come sozinha ?
- Está começando.
Enquanto eu estava lhe dando de comer
percebí que tinha ela o bico dividido em
quatro partes. Maravilhei-me disso e pergun­
tei o motivo ao jovem ex-aluno.
- O que ? Dom Bosco não sabe o que isto
quer dizer ? O bico repartido em quatro partes
tem a mesma significação que a mesma perdiz.
(Esta ave significava o conjunto de verdades
que se referem à morte, ao juizo, ao inferno
e ao paraíso).
- Não compreendo. .
- Não compreende depois de ter estudado
tanto ? Como se diz em latim perdiz.
- Perdi'x.
- 92 -

-- Pci>is então1 Aí está: a chave de tudo.


___..;. Que embrulhada1 Tire-me podavor dessa
confusão.
- Oral Medite nas letras que compõam
a palavra: Perdix.
P: quer dizer per.re11erantia.
E: aeternita.r te e:wpecfat (a eternidade. te
espera).-
f R: rejert unUJ'4ui.rque .recundum opera .rua,
proul ge.r.rit, .ri11e bonum, .ri11e malum {cada um
segundo o que fez na vida leva para-a eterni­
dade o bem ou o mal).
D: dempto nomine (apagada toda a grandeza
humana de gl6rias, c�ncia e riqueza).
•·

I: significa ibit (irá) . .Eis o que· indicam as


quatro partes do bico: os novíssimos.
- Tens razão. Compreendi bem, mltS dize­
me o que é feito da letra o x 1
- Como 1 D. Bosco estudou matemáti­
ca e não sabe o que quer dizer x 1
- � quer dizer a inc6gnita, um • número
que se procura com o cálc_u:lo-.
- Isso mesmo. Aquí -tambem o x significa
desconhecido. Cada · um irá para o lugar que
mereceu e não sabe qual é.
.d codorniz.
Enquanto eu me maravilhava destas ·expli­
cações e ia ficando convencido, perguntei-lhe:
� Queres me dar de· presente esta perdiz 1
- Sim1 De b&a vontade; queres vêr a
codorniz tambem 1
- 93 -:-

- Quero} Deixa-me v&-la.


Apresentou-me -então uma codorniz magto.�­
fica (símbolo ,da intemperança em sua dupla
forma :· gula e luxúria). Parecia magnífica à
primeira vista, mas quando a segurei ergui-lhe
as asas e a vi toda cheia de feridas e pouco
a pouco foi fi�ando feia, apodrecida e feti­
damente repugnante. Perguntei ao jovem
o signific::tdo daquela transform::tção.
- Ó sacerdote1 Depois de teres estudado a
Sagrada Escritura nl.o sabes essas coisas 1
Não t ) lembr:!.s de que os hebreus at\1 partir
em masu do Egito para a Pale:stin:�., chegando
ao deserto se puseram a murmurar e D�us
mandou as codorniz:!s que ebs com:!Çl.ram
a comer ? Enquanto ainda tinham a.s carnes
entre os•dentes muitos milhares- •deles foram
fulminados pela mão de D�us, não te lembras '!
Esta codorniz significa que a gula mata mais
do que a espada e é origem da maior parte
dos pecados.
Agradecí ao jovem as explicações que me
dera.

Caça e rejet'ção.
No entanto começaram a aparecer nas
sebes, nas . árvores e na relva perdizes e
codornizes em grande número. Assemelha­
vam-se perfeitamente às gue o ex-aluno
tinha na mão. Os jovens começaram a perse­
gui-las para se alimentarem com elas.
- 94 -

Pusemo-nos então a caminho. Os que tinham


comido perdizes tornaram-se robustos e, pro­
seguiram a viagem ao passo que os que se
alimentaram com as codornizes deixaram
de seguir-me e logo eu os perdi de vista.

0 FIM: MoRTE E JUIZO


Num dado momento, enquanto eu cami­
nhava mudou-se por completo a cena. Pareceu­
me estar num salão imenso maior do que o
Oratório com todos os seus páteos. Estava
repleto de uma grande multidão. Olhei em
redor e não conheci ninguem; não vi nem
sequer um do Oratório. Enquanto eu lá
estava embasbacado aproximou-se um ho­
meilli e me disse que um pobrezinho estava
muito doente, com perígo de morte e porisso
eu tivesse a bondade de ir confessá-lo. Res­
pondi que iría de bom grado e sem mais
pus-me a segui-lo. Entramos num quarto e
acheguei-me ao enfermo; iniciei a confissão
mas vendo que ia se enfraquecendo mais e
mais cortei a confissão pelo meio receando
v&-lo morrer sem a absolvição. Mal o absolvi
o j ovem morreu. O seu cadaver começou
imediatamente a tresandar um fétido tão
horrível que ninguem podia suportá-lo. Eu dei
a idéia de enterrá-lo sem demora e perguntei
a razão daquele mau cheiro. Responderam-me :
- Quem morre assim, depressa é j ulgado
sem delongas.
- 95 -

Saí do quarto; sentia-me exausto e pedi


que me deixassem repousar. Disseram-me
que com prazer atendiam ao meu pedido e me
conduziram por uma escada que ia dar numa
outra sala. Quando entrei nesta vi dois
j ovens do Oratório que falavam entre si,
e um deles tinha um embrulho. Perguntei-lhe:
- O que fazeis aquí ? E o que tendes nesse
embrulho ?
Os dois se entreolharam e silenciosamente
tiraram do embrulho um lençol fúnebre.
Olhei em roda de mim e ví estendido num
canto, já morto, um jovem do Oratório.
Não o reconhecí porém. Perguntei aos dois
quem era o defunto mas eles se desculparam
e não quiseram mo dizer. Aproximei-me do
cadaver fjxei-o no rosto e pareceu-me reconhe­
c�-lo e não o reconhecer. Não podia dizer de
quem eram as feições. Decidí-me a saber a
custo de qualquer sacrifício o nome do jovem.
Descí a escada e novamente me achei num
vasto salão. Tinha desaparecido a multidão
de gente desconhecida e em lugar dela estavam
os jovens do Oratório. Apenas estes me viram,
rqdearam-me dizendo :
- D. Bosco! D. Bosco! O senhor sabe ?
Morreu um j ovem do Oratório.
Perguntei-lhes quem tinha sido e ninguem
me deu resposta; uns apelavam para os outros
e ninguem qt eria falar. Tornei a perg". ntar
com maior insist�ncia; desculpavam-se e não
- 96 -

queriam me dizer, Nesta ansiedade, desapon­


tado pela inutilidade de meus esforços,
. despertei-me.
O sonho durou toda a noite e quando
acordei pela manhã achei-me tão cansado
e alquebrado que me parecia ter viajado toqa
a noite ».
dJ' dua.r caiegoria.r moraiJ'.
Dois dias após, D. Bosco satisfazia à
viva curiosidade suscitada pelo sonho da
perdiz, indicando as duas categorias em que os
espír.itos se dividem relativamente à pureza :
os utabilizadoJ' no bem ou no mal e os OJ'·
cilantu.
Os ulabilizadoJ'. « Desejais saber ainda
alguma coisa relativa ao sonho ? Explicarei tão
só o que significam a perdiz e a outra ave.
Para resumir tudo numa palavra, dilrei que a
perdiz é a virtude e a codorniz o vício. A razão
pela qual a codorniz era tão vistosa na apar�n­
cia mas vista de perto estava coberta de chagas
e exalando um cheiro repugnante, vós bem
compreendeis e não preciso explicar: são as
coisas deshonestas.
Dentre os j ovens, os que comiam perdizes
são os que amam e praticam a virtude.
Alguns havia qu,e, enquanto estavam se
alimentando com a perdiz a codorniz vinha
se postar sob os seus olhares mas eles não lhe
davam importância e continuavam a comt.r
só as perdizes; estes são os que andam ria trilha
da virtude, abominando o vício com desllrezo..
97 -

Havia outros que devoravam avidamente


as codornizes não obstante estarem putrefatas.
São os que se abandonam aos vícios e pecados.
Outros tinham uma perdiz numa das mãos e
na outra uma codorniz mas se alimentavam
só com esta; são os que conhecem a beleza
da virtude mas não querem tirar fruto Ha J
graça de Deus e caminhar pela senda do bem.
0J' oJ'cilantu. Alguns havia que tinham em
mãos as duas qualidades de aves e comiam
só a perdiz mas lançavam olhares cúpidos
e sequiosos para a codorniz; estes são os que
seguem a virtude mas com dificuldade e quasi
por força; podemos desconfiar que si esses tais
não mudarem de gosto, acaoarão por ceder
à atração do vício.
Havia enfim alguns que comiam de ambas
as aves, �gnificando os que se entregam ora ao
vício, ora à virtude, julgando não serem tão
maus como os que abandonam por' completo
a estrada do bem ».

2. - A FREQUÊNCIA AOS SACRAMENTOS

Pondo remate a uma acalorada palestra em


que si indagava quais os meios mais aptos
para favorecer a pureza, D. Bosco apresenta
como adjutório « culminante » a frequência
aos Sacrãmentos. Mas é necessário que essa
frequ�ncia seja conciente e nitidamente espon­
t ânea para que se torne esclarecedora da
conctencta.
•A •

Dom Bosco nos guia, 4


S. Luiz recebe a Sagrada Comunhão
- 99 -

« Até agora muito dissestes sobre a morali­

dade, discutindo animadamente quais os


meios mais eficazes para que os jovens conser-·
vem a pérola inestimavel da bela virtude; até
o presente momento, porém, ninguem tocou
no ponto principal. O meio culminante para
obter a moralidade é certamente a confissão
e comunhão bem feitas e frequentes. Já se
sugeriu dar toda a comodidade aos j ovens
e procurou confessores bons e experimentados
que lhes mereçam a confiança; isso é muito
bom mas sempre continuará impossível obter
tudo. Faz pena ver o estado da conciência
de nove décimos dos j ovens. A simples como-
didade para frequentar os sacramentos não
remedeia eficazmente a esse mal! Devemos nos
persuadir ,.de que · quando um menino tem a
desventura de permitir que sua: conciência
fique atrapalhada, no mais das vezes vai
assim para a frente por anos inteiros e não há
solenidade religiosa, retiro espiritual ou morte
que o converta. Devemos dizer realmente
que para arrumar uma conciência faz-se mister
uma graça que venha diretamente de Deus.

Quantas atrapalhações se acomodam com


a graça de Deus. Pode-se dizer que não se
passa nenhuma festa nem exercício de boa
morte sem que a misericórdia divina se mani­
feste em benefício de alguem. Por ocasião dos
Retiros essas conversões dão-se em larga esca­
la. Ha alguns, porém, que não aproveitam
- 100 -

graças tão salutares e depois de muitos anos


de pecados si lhes perguntamos:
- Mas não fizeste Retiro Espiritual ?
- Siml - responder-nos-ão.
- E como se explica não teres arrumado
tanta� complicações ?
- E que . . . não pude.
Com essas palavras julgam ter dito tudo.
Todavia sou de parecer que se procurem
todos os meios para dar aos alunos a inaior
facilidade possivel para que frequentem os
Sacramentos pois sempre há de se encontrar
algum que se deixe vencer pela miseric6rdia
de Deus. A simples probabilidade de uma
conversão j á merece que nos esforcemos mui­
tíssimo para alcançá-la ».
Este meio era inculcado por D. :Sosco aos
seus jovens mediante um atraente sonho no
dia 6 de fevereiro de 1865. Ei-lo :

O lírio e o gato.
« Duas ou tr�s noites atrás eu tive um
sonho; quereis que vo-lo conte ? Visto eu
querer muito bem aos meus alunos sonho
sempre estar no meio deles.
Parecia-me porisso estar eu no meio do
páteo rodeado pelos meus filhos queridos;
cada um dos quais tinha em mãos uma bela
flor. Uns seguravam uma rosa, outros um
lírio, este uma violeta, aquele uma rosa e
um lírio juntos. Num dado momento aparece
um horrendo gato, muito grande e negro,
- 10 1 -

com chifres, os olhos faiscando, as unhas


afiadas e um ventre desmesuradamente. cheio.
Tinha o aspeto de um cão. O feio animal
aproximava-se traiçoeiramente dos jovens
e vagando· no meio deles dava inesperada­
mente uma patada ' na flor, arrancando-a
das mãos e arremessando-a ao chão. Assim foi
fazendo muitas vezes.
Quando apareceu esse horrivel animal eu
me enchi de terror, admiradíssimo por ver
que os meninos não se , perturbavam perma­
necendo tranquilos como si nada houvesse
de extraordinário. Quando vi que o gato se
dirigia para mim afim de arrebatar minhas
flores, pus-me a correr.
Fizera.n-me parar e me disseram:
- Não fujas. Dize aos teus filhos que
levantem o braço pois assim o gato não con­
seguirá arrebatar-lhes as flores.
Eu parei e levantei os braços: o gatarrão
se esforçava para me arrancar as flores mas
visto ser muito gordo não o conseguia e
tombava pesadamente ao chão.
O lírio, meus filhos muitos amados, é a
bela virtude da modésti�, à qual o demónio
move uma guerra sem tréguas. Ai dos jovens
que conservam a flol' abaixada! O demónio
lha al'l.'anca e a lança por terra. Conservam-na
abaixada os que acal.'iciam o próprio corpo,
comendo desordenadamente e fóra de tempo;
- 1 02 -

os que evitam a fadiga e a aplicação, entre­


gando-se ao ócio, os que se deleitam em certas
conversas e leem certos livros; desprezando
qualquer mortificação. Eu vos suplico, com­
batei este inimigo pois do contrário ele se
tornará o vosso tirano. Difíceis nos são estas
vitórias mas a Eterna Sabedoria nos indicou
os meios para consegui-las: Hoc genu.r daemo­
niorum non eiicitur ni.ri per orationem et
ieiunum (esta casta de demónios não se
expulsa senão por meio da oração e das pri­
vações). Levantai o braço, erguei no ar as
vossas flores e estareis seguros. A modéstia
é uma virtude celeste e quem quer conservá-la
precisa elevar-se para o céu. Salvai-vos, por­
tanto, mediante a oração.
A oração que vos eleva para o céu. são as
orações da manhã e da noite bem rezadas;
oração é a meditação e a Missa; oração é a
Comunhão frequente e a Confissão bem feita;
oração as prédicas e exortações de quem vos
guia; a visita ao SS. Sacramento; o Rosário,
oração é o estudo. Com esta prece o vosso
coração se dilatará como nunca e vos levan­
tará até o céu para que como Daví possais
dizer: Viam mandatorum tuorum cucurri, cum
dilata.tti cor m.eum (percorri veloz o caminho
dos teus preceitos quando me dilataste o
coração). Assim, poreis em segurança a mais
bela das virtudes e o vosso inimigo não poderá
arrancá-la de vossas mãos por mais que se
esforce ».
- 103 -

3. - Dom[nio J'obre J'Í mumo.


O mais util e prático incentivo para o
domínio de si pr6prio, D. Bosco o explica e
inculca aos jovens com uma a: boa noite » que
aquí narraremos na sua íntegra beleza.
Note-se com que naturalidade facil e persua­
siva Ele passa do anúncio de um pr6ximo
passeio à auto-disciplina mostrando como
alavanca principal a Santa Comunhão.
No dia 26 de Março apresentando-se no
local onde os alunos estudantes e a maioria
dos sàlesianos rezavam as orações da noite,
foi D. Bosco acolhido com gritos de júbilo.
Um aluno aproximou-se do púlpito onde
estava o santo e lhe apresentou uma moedinha
de cincçenta reis por ele achada no páteo.
(Era este um costume sagazmente educativo
segundo o qual quem achasse um objeto
perdido apresentava-o ao superior e este o
mostrava a todos para que o dono pudesse
ir recuperá-lo). Logo que se fez sil�ncio,
D. Bosco anunciou com humorística serieda­
de: - Cincoenta reis! Já é dinheiro bastante
para pagar as dívidas do Orat6riol
�oi uma explosão de riso. D. Bosco prosse­
guiU:
- a: Agora é preciso que pensemos um
pouco nos nossos assuntos. Antes de tudo
direi que amanhã,de tarde daremos um longo
e belo passeio. E muito justo: Sábado de
- 104 -

manhã nós terminamos os exames semestrais


e como estava chovendo não foi possivel
dar o passeio depois do almoço.
Si não vos espantardes eu vos direi outra
coisa: Estou projetando um passeio de bem
maior importância. Desejo que todos, sem
exceção, saiamos do Oratório. Iremos todos
desde o mais alto até o menorzinho, começan­
do de D. Bosco até o porteiro, irá tambem o
cozinheiro para preparar uma boa macarrona­
da, irá a banda de música e tudo o que pode
ajudar-nos a ficar alegres. Tomaremos um
trem especial, partiremos com os primeiros
raios do sol e iremos até Lanzo. Sil�ncio!...
Nem me deixais acabarl Ainda não vos disse
o mais importante: Iremos visitar o colégio
de Lanzo e lá passaremos todo o belo dia.
O P. Lemoyne, diretor de lá, pror:i.eteu-me
que fará o possivel para que passemos bem
e para que o barulho de garfos, colheres e copos
seja bem alegre e animado. Ao cair da tarde
voltaremos a Turim et unu.rqui.rque redibit
ad locum .ruum (cada um retomará as próprias
obrigações). Este belo passeio nós o faremos
logo que terminarem a estrada de ferro em
que se trabalha afanosamente na esperança
de terminá-la na primeira quinzena de junho.
Esta diversão, meus filhos caríssimos, · tem
por fim aliviar e fortalecer o corpo ·cansado
pelas fadigas esc.olares mas é preciso que não
seja esta a finalidade do passeio. Isso não!
Tudo o que alegra e alivia o cc;>rpo deve servir
- 105 -

para tomá-lo mais submisso ao espírito para


que possa contribuir melhor para a glória
do Senhor e não aconteça que o corpo subju­
gue a alma.
Nunca permitais, ó caros filhos, que o corpo
impere, nesta segunda metade da quaresma;
mortificai-o e submetei-o. S. Paulo nos diz
o que ele fazia para escravizar o corpo ao
espírito: CllJ'ii!Jo corpu.r meum ei in J'ervifutem
red�!Jo, uf J"piritui inJ'enn"at (castigo o meu corpo
e o reduzo à escravidão para que se submeta
ao espírito). Não quero vos aconselhar a que
façais penitências rigorosas ou jejuns prolon­
gados nem que flageleis o vosso corpo com
macerações como fizeram muitos santos. Não!
Não é isso! O vosso corpo é ainda jovem e
poderia .se ressentir. Quereis, porém, que eu
vos sugira um modo de fazerdes tambem vós
um pouco de penitência adatada à vossa idade
e à vossa condição ? Eu vo-lo apontarei:
Consiste n.um jejum que todos podeis fazer e é
guardar o vosso coração e vigiar os sentidos.
Fazei jejuar o demónio não cometendo pecado
nenhum. Atentos com os sentidos! Fazei
que vossos olhos jejuem. Não lhes permitais
fixarem-se em coisas, pinturas ou fotografias
contrárias à virtude da modéstia. Desviai logo
os olhares quando se pou.sam em objetos
perigosos . . Mortificai a curiosidade: nunca,
nunca vos ocupeis na leitura de livros que
falem contra a religião, ou que sejam imorais
ou mesmo só perigosos para a vossa idade.
- 106 -

Como já vos disse e repetí muitas .vezes jogai


no fogo esses livros quando vos cairem nas
mãos; entregai-os aos vossos superiores,
livrai-vos logo de tal pestil&ncia. Como eu
ficaria contente si cumprisseis ao pé da letra
estes conselhos que vos inculcamos.
Deveis tambem mortificar e fazer jejuar
o ouvido não vos detendo em escutar discursos
que ofendam a bela virtude ou saibam a
murmuração.
Fazei jejuar a língua proibindo-lhe qualquer
palavra capaz de escandalizar, abstendo-vos
sempre de magoar os vossos companheiros
com palavras pungentes e aleivosas; numa
palavra: não converseis sobre nada que não
ousarieis falar perante um superior. ,
Mortificai a gula não buscando o gue vos
deleita o paladar; comei o que vos apre';entam;
não sejais do rol daqueles que sempre desejam
e se industriam para obter alguma guloseima
especial ou um copo de vinho.
Podereis ainda fazer algu.ma mortificação
suportando pacientemente certas contrarieda­
des, um pouco de calor ou de frio, sem vos
lamentardes. Não digais logo, como alguns
o fazem :
- Escreverei para que de casa me mandem
isto ou aquilo�
Si não é necessidade real, suportai um pouco,
esperai com paci&ncia, não vos apresseis.
Nada de teimas, muxoxos ou lamúrias.
Mortificai-vos, suportando com caridade e
- 107 -
alegria algum defeitozinho dos vossos compa­
nheiros, alguma incomodidade do dormitório
ou no estudo. Para concluir, mortificai-vos
não escutando nem dizendo ou fazendo algo
oposto de qualquer maneira ao bom exemplo.
Se assim procederdes, mesmo as coisas
pequeninas vos servirão de penitência adatada
à vossa idade e que não vos prejudicará a
saude. Assim obtereis a finalidade pela qual
foi instituido o jejum da quaresma e tereis
forças sobejas para vencer as más inclinações ,
adquirindo imenso mérito para o paraíso.
Uma coisa quero ainda vos recomendar:
Fazei com muita frequência Comunhões
fervorosas. Ide receber a Jesús muitas vezes
e assim vossa alma se fortalecerá com a graça
e o vo�o corpo ha de permanecer submisso
e 1obediente ao esp�rito. Boa noite •.

4. - ATIVIDADE ININTERRUPTA! FÓRA O ÓCIO!

No fim de Agosto de 1877, D. Bosco falando


aos jovens por ocasião das férias, indicava a
atividade constante como poderoso meio para
salvaguardar a virtude. Observe-se a delicada
e afetuosa paternidade com ·que fala, bem como
o humorismo singelo que toma mais agradavel
e penetrante a sua palavra.
Não é preciso dizer que tudo quanto ele
aconselha para as « férias • é pão cotidiano
- ,108 -

qy_e qeye a..J.inwnt� toda a yida , hpmana SI


desejar.mos que . esta. mereça realmente o
non:ie .de . viqa cristã.
« Esta tarde. tenho a satisfação de vos dar

a boa no�te e dirigir-vos uma boa palavra.


Aproximam-se os exames e isto tne enche de
alegria porque depois v�m as férias e sem
exames ninguem começará as férias. No en­
tanto é tal o afeto que consagro aos meus
caros filhos que sentiria muito passar as férias
longe deles. Eu vos quero muito bem e aquí
teremos ocupações bastantes para todos. Não
quero dizer que vos proiba ir para vossas
casas. Teria, porém, uma grande satisfação em
vos conservar a todos aquí no Oratório.
Ficai tranquilos e certos de que passaremos
umas férias belas e prolongadas ou num lugar
· ou noutro. ' •

Ler muito.
Quereria dar-vos um conselho para que
passásseis bem estas férias. Para todos
haverá sempre certa matéria que durante
o ano 11ão se poude estudar suficientemente:
neste tempo de repouso procure-se repassá-la
com maior· atenção. Haverá muitas lições
que não ·foram decoradas com fidelidade,
outras que não foram totalmente compreendi­
das, tantos pontozinhos dos quais temos um
conhecimento medíocre e que si não forem
estudados agora acabaremos em nada saber.
Tudo isto pode ser arn:unado muito :b.em neste
- 109-

tempo de férias. Repassemos um .pouco de


latim e da língua pátria para melhor as
compreendermos. Notai ainda que para
ap,·.:uder é preciso ler, ler livros muito uteis,
coisa difibil por vezes de se fazer durante o
ano. Fazei-o agora que tendes tempo, lede
para aprender e não por mera curiosidade
aproveitando o tempo que tereis sem �quelas
lições e aqueles trabalhos que tanto vos preo­
cupavam. Assim não haveis de perder tempo.
Recordai-vos do aviso que nos dá o Espírito
Santo de não perdermos nem sequer um
minuto de tempo.
Não quero com isto dizer que se deva estu­
dar sempre sem que seja lícito fazer um pouco
de recreio. Sim! Divertí-vos tambem, mas esta
recreação seja honesta e os divertimentos se­
jam ·uteis servindo-vos para restaurar as
forças do corpo e rejuvesnecer o espírito;
procurai que esse repouso que vos permitirdes
não seja ociosidade nem tempo malbaratado
inutilmente. Isto eu vos repito com insistência
e si pudesse vos havia de ordenar que assim
o fizesseis. Estudai alguma coisa que vos seja ,
de utilidade para o futuro. Oh! Si eu fosse
jovem como v6s haveria de empregar bem
melhor o meu tempo! Oh! si eu pudesse rehaver
tantas parcelas de tempo que gastei, já não
digo inutilmente, mas de um modo que poderia
ser melhor, quantos livros uteis poderia eu
ler -e quantos novos ,trabalhos empreenderia!
O tempo de que eu dispunha já se passou e
- llO -

. agora não posso mais rehavê-lo; porisso é que


vos aconselho a ocupardes bem o tempo
de que dispondes presentemente.
Será possivel que aquí em éasa haja alguem
que não tenha nada para fazer ? Venha comigo
e eu lhe arranjarei trabalho.
No entanto lembrai-vos neste tempo de
exames que a Virgem Santíssima é a séde da
sabedoria; recomendai-vos portanto à sua
valiosa proteção pela manhã e durante o dia
mediante a jaculatória: .Maria, .rede.r .rapi­
enliae, ora pro nobi.r. Auguro-vos bons exa­
mes e uma boa noite » .
No dia 31 de Agosto, D. Bosco desenvolvia
de modo mais explícito o seu pensamento.
« Tenho uma bela nova para vos dar:
segunda-feira começam as férias! Não vos
agrada esta notícia ? Vejo que muit�s ficaram
radiantes e tambem eu me alegro desejando­
vos ótimas férias. Posso vos dizer no entanto,
que muitos me pediram para passar as férias
comigo aquí no Oratório. Isto me enche de
satisfação mas desejo que os que pedem tal
cousa façam-no espontaneamente. Tambem
para eles haverá tempo de recreio, de passeios
em profusão mas terão maior recolhimento
e e_!ftarão expostos a menores perigos.

Con.rer11ar-.re .rempre
ocupado.
A única recomendação que faço aos que
vão e aos que ficam, é a fuga do ócio. Sei
- lll -

que alguns não gostarão de ir às férias para


trabalhar. No entanto vos direi que a palavra
férias em latim Ee diz vacaiio e vem do verbo
vacare: ora, este verbo não significa repousar
de modo absoluto, entregaP.do-se a um ócio
completo como alguns pensam mas significa
ao contrário ocupar-se, entreter-se com algu­
ma coisa. Assim é que vacare .riudio quer dizer
dedicar-se ao estudo; vacare agriculiul'ae, signi­
fica entregar-se aos trabalhos do campo; vacare
deprecaiionibu.r se traduz por empregar o
tempo em práticas de piedade.
Eu bem desejo que em qualquer tempo se
faça sempre alguma coisa e não deixemos que
se perca nem sequer um minuto porquanto
nas férias ou v6s trabalhareis e o dem6nio
ficará o�;ioso ou vivereis desocupados e o
dem6nio então há de trabalhar. V6s me direis:
- Então teremos de trabalhar sempre, sem
descanso ?
Entendamo-nos bem. Evitar o 6cio quer
dizer não estar desocupado mas não quer dizer
entregar-se sem repouso aos trabalhos manu­
ais, ao estudo ou à oração.

O trabalho recreativo.
Como quer que seja, pa-ra que vos diga a
verdade, longe de reprovar um trabalho con­
Hnuo eu até vo-lo recomendaria. Lembro-me
de que quando eu ia passar as férias em casa
pegava num couro, cortava-o, fazia um par
de sapatos e dava-o de presente; comprava
- 1 12 -

pano de casemira ou de brim, cortava-o e


fazia um par de calças ou de cero�las cozendo­
as para mim ou para outros. As vezes me
punha a trabalhar de marceneiro, arranjava
madeira e fabricava bancos, cadeiras, mesas
e outras coisas. Lá em casa ainda se conservam
algumas cadeiras e mesas que fiz com estas
mãos. Quanta vez ia eu ceifar no campo e para
descansar lia Virgílio. Outras ocasiões amon­
toava e revolvia o feno. Era mesmo bonito
me verem com um instrumento de trabalho
na mão direita e· Virgílio na esquerda. Em
suma, não saberia dizer-vos qual o ofício
em que não me tenha exercitado; assim é que
hoje vcs posso garantir não ter passado no
6cio nem ao menos l!m minuto. Não quero
vos propor estes fatos como · exemplo, recor­
dei-os para que vejais de quantos �odos se
pode ocupar o tempo das férias.
E na família acaso não podereis prestar
estes serviços que demonstram o bom coração
e a delicadeza de um j ovem ? Cada um varra
os quartos, ajude na cozinha, ponha a mesa,
sirva as refeições, auxilie o papai, ajude a
mamãe e si houver trabalho no j ardim ou na
vinha contribua com seus esforços; junte o
feno do prado, rache lenha, lave as garrafas e . . .
assim fazendo ninguem ficará ocioso.
Si alguem fica parado sem fazer nada e está
de braços cruzados, ocioso, o dem6nio que não
perde a ning1,1em de vista, dirá logo:
- Est� é meu!
i
i
--�
Fortes e puros
- 1 14 -

Segue-o com insistência e quer por meio 'de


um companheiro, quer mediante certos pen­
samentos fará , esse pobrezinho cair-lhe_nas
garras.
Diverfir-.re.
- Neste caso devemos trabalhar sempre,
sem poder divertirmo-nos ?
Há vários gêneros de trabalho: tambem
o divertimento pode ser ocupação. Quem tem
vinhas em casa dê umas caminhadas pelas
videiras chupando as uvas mais saborosas, só
lhe recomendo que escolha as mais maduras.
Si houver pêssegos, figos, peras ou maçãs,
coma alegremente, basta que não estejam
verdes. Sim! Recomendo-vos que vos di­
vertais muito; jogai bola, correi, saltai. Cada
um terá em sua família divertimentos espt!'ciais,
cartas, damas, xadrez e muitos outros meios
de manter � alegria. Recomendo-vos sobre­
tudo façais belos e compridos passeios. Apesar
disto tudo ainda sobejar-vos-á o tempo para
ler, estudar, compreender melhor algum
ponto obscuro.
Sobriedade.
No tempo da refeição cumpri o vosso dever
comendo com apetite. Sede, porém, temperan­
tes no comer e no beber. Sabeis que certos
provérbios engraçados dizem bem a verdade.
Eu não gosto de repetí-losfpois são muito
materiais mas para vosso bem, di-los-ei:
- 115 -

c Estamago empanturrado é cousa de ten­

tação. Tudo que está no ventre pertence ao


'
diabo ».
Os Santos Padres dizem que nós viveiJI.OS
com um inimigo que é o nosso corpo. Si nós
lhe derlnos tudo que ele pede, ele se ensober­
bece e nos há de prejudicar; mas si lhe damos
pouco « combustível » então ele murcha
as orelhas e obedece ao espírito. Recordai-vos
do que dizem os Doutores da Igreja: A gula
e a ca.rtidade não podem viver junta.r. Além
disso, S. PaLLlo ao enviar conselhos para as
várias classes de pessoas, escreve para os
jovens somente duas palavras: ut .robrii .rint
(sejam sóbrios).
- Possível ? S. Paulo não encontrava avisos
mais ilmportantes para lhes enviar ?
- Não, pois quando os jovens são sóbrios
podem progredir muito na virtude. Si lhes
falta a sobriedade o demónio tenta e eles hão
de cair em pecados numerosos e graves.
Ainda uma coisa. Durante as férias podeis
repousar um pouco mais do costume pela
manhã e à noite, mas evitai cuidadosamente
uma casta de repouso que se chama daemo­
nium meridianum (o demónio do meio·dia).
É o mais terrível demónio deste mundo.
Sabeis qual seja ? É o repouso depois do almo­
ço. Este demónio veni quando um indivíduo
após ter almoçado vai se deitar. Oh1 Como
isto é prejudicial1 O demónio o rodeia. Vai
de um lado e lhe sibila ao ouvido uma palavra
- 1 16 -

feia. Que palavra� faz lhe voltarem à .memória!


Adianta-se para ele, fixa-o com olhares mal­
dosos e lhe apresenta alguma figura repugrtan­
te, alguma imagem inconveniente que o pobre­
zinho vira num livro mau� Vai para o. outro
lado e lhe sussurra uma lembrança que dCfvia
ser esquecida para sempre e que lhe escalda
a fantasia. Essas tentações continuam alí
perto .e o jovem não pode se descartar delas.
A imaginação vai atrás dess�s fantasmas,
vai. . . vai . . . <!-fé cair numa culpa de.ploravel
que faz o demónio entoar o canto jubiloso
da vitória.
Evitai pois ir à cama após a refeição,
a não ser que já sejais muito idosos e não pos­
sais vos manter de pé. É um péssimo costume!
Si tendes necessidade de repouso sentai-vos,
quando mqito, numa cadeira e aí ficai <k>rmi­
ta,ndo um pouco. Isto ser-vos-á suficiente
e · proveitoso.

Recapitu!an.do.
- Oh! Quantas idéias D. Bosco nos apresen­
tou!
Recapitulemos tudo resumindo em poucas
palavras.
Otimas férias vos desejo mas. . . nunca
ocios�. Si v6s não trabalhais, o demónio
trabalha. Durante o dia trabalhai, divertí-vos,
conversai e brincai. No tempo das refeições
alimentai-vos à :v.ontade. Durante a noite
estejamos bem ocupados. Ocupados ? Sim!
..,..... 117 _.,..--

.Sabei!;! como ? Dol;'JJ.lindo. 1Amanhã e depois


que são os últimos dias que pas&ais aquí
em nossa companhia go.st�ria: que viesseis ter
comigo pois eu teria coisâ importante pa�a
dizer a cada um .de v6s. Quereria que �odos
me desseJD uJ;D.a. grande alegria tomando
nota dos conselhos que D. Bosco vos sugere
para que passeis alegremente as férias.
Assim te-los-eis sempre presentes e podereis
praticá-los com maior facilidade. A experiên­
cia vos dirá como estas minhas palavral:> hão
de vos fazer felizes e alegres si v6s as praticar­
des. Voltando ao Oratório contar-me-eis
a vantagem que estes conselhos vos trouxeram
e bendirei a hora em que vo-los dei.
Boa noite ».

5. Pl'tEVENIR. REERGUER-SE PRONTAMENTE

Tomar precauções contra o mal; estar


prevenido contra os prazeres impuros; voltar
prontamente ao caminho da Virtude mediante
a Confissão no caso de uma queda de molde
a não deiXar que se arraiguem as inclinações
mal!1ãs, eis tudo o que insinua D. Bosco com
suas singelas exortações.
28 de julho de 1875. « Ao visitar uma das
aulas prometí um prémio ao aluno que soubes­
se me dizer por escrito o que toma o homem
mais feliz nesta vida. Um me disse que eram
a.s riquezas, :outros um belo engenho,. um a
virtude em geral, outro a fé, a esperança
- !18 -

alguns, outros a caridade, mas ninguem acer­


tou. Eu então apresentei uma comparação:
O que toma feliz o jumentinho 7 - É ser
logo adextrado no ofício que deve executar
durante a vida. Ora, transportai a comparação
para o homem . . . Então um aluno recordou-se
de ter lido em livros piedosos esta frase:
BealtU homo cum porlaJJerit ignum ab adole.r­
cenlia J'ua, que quer dizer: Feliz o homem que
desde os seus verdes anos tiver começado a
observar os preceitos divinos. O aluno a que
me refiro escreveu estas palavras num bilhe­
tinho e mo entregou. Eu li a frase perante
todos e depois disse:
- Procurai pois enquanto sois jovens o�­
servar os mandamentos de Deus e assim
haveis de ser felizes nesta e na outra vida.
É· o que vos repito a todos: fazei istb e ve­
reis corno seja suave servir a Deus. Boa noite ».
20 de outubro de 1875. « Eis que nos reve­
mos de novo, meus caros jovens. Vós chegais
de longe e eu tarnbern. Alegro-me ao ver que
nestes dois últimos dias j á voltastes em tão
belo número. Daquí a pouco chegarão os
· outros que por medo da chuva de hoje ou por
algum outro motivo não puderam ainda p�rtir
para cá. Começaremos assim tudo com a mes­
ma regularidade que será observada no correr
do ano.
Digo-vos sinceramente que muito me alegro
e me rejubilo corno se alegra jubiloso um pai
ao ver·aumentar a própria família. Vós, porém,
- 1 19 -

visto terdes estado nos campos e nas vinhas


e terdes tambem viajado, ter-vos-eis empoei­
rado e até mesmo quiçá com o sinal de algum�
queda ou escorregadela. É preciso, pois, que
sem demora vos utilizeis da escova e procureis
limpar-vos para não fazer um papel feio.
VÓs já sabeis a que manchas e a qual escova
eu me refiro. Durante as férias quem mais,
quem menos, ter-vos-eis manchado certa­
mente com defeitos e faltas. Alguns terão
somente um pouco de poeira e para estes num
molllento se arranja tudo; somente deverão
sacudir este pó incômodo, isto é, a nuvem
de defeitos que durante as férias aparecem
mais amiudados que nos outros tempos;
assim tudo continuará bem como antes.
Outros, terão talvez manchas mais ou menos
graves; esses tais, não permitam que essas
manchas tomem conta do próprio coração;
coragem e boa vontade; enquanto a chaga é
nova será facilmente curada. Usai bem da
e�ova « confissão » e ponha-se tudo nos
elXOS.
A IoPe principium. Lembrai-vos sempre,
meus caros jovens, desta máxima já usada
pelos próprios pagãos: nas vossas ações é pre­
ciso que tudo se inicie pelo Céu. Começare­
mos o ano escolástico, p·rocurai iniciá-lo bem:
Um provérbio antigo dizia: Já muito andou
quem iniciou um bom caminho. CoragemI
Não se começa bem si não começarmos pelo
Céu. Vêde como é necessário começar tudo
- 120 -

bem. Mas para isso é preciso que cada um


comece por se colocar na graça de Deus,
si por desgraça a tiver perdido. Pedí de coração
a graça de poder continuar bem prometendo­
lhe ocupar devidamente o tempo e nunca
nos servirmos do estudo para ofendê-lo.
Tornai o prop6sito de oferecer tudo o que fi­
zerdes, para a maior gl6ria de Deus, para a
salvação da pr6pria alma e da do pr6ximo ».

6. - DoM Bosco

Uma força sobrenatural que se infiltra no


íntimo de nosso espírito e o conduz à alegria
profunda da inocência é o pr6prio D. Bosco.
Trescala virgindade esse her6ico educador
puro entre os puros. Suá mediação, tão.singu­
larmente poderosa quando neste mundo,
hoje se multiplica pela poderosa intercessão
junto ao Redentor que o escolheu entre mi­
ll?-ares, plasmando-o para a missão de suscitar
legiões de almas puras.

a) D. Bosco TRESCALA PUREZA . . .


Enquanto viviam no Orat6rio os jovens
não advertiam inteiramente qual a impressão
que D. Bosco produzia nos seus espíritos em
botão; os anos e a experiência, porém, reve­
laram testemunhos admiraveis. Num manus­
crito, um ex-aluno descreve D. Bosco tal
como o viu especialmente em 1876. Referi-
- 121 -

remos aquí duas impressões, transcrevendo


textualmente suas palavras: principia dizen­
do: « A sua pessoa me foi e continua a ser-me
presente aureolada por uma pureza absoluta
e angélica. O fulgor desta virtude transparecia
de todos os seus gestos e de toda e qualquer
palavra sua. Era úm anjo em carne. Ao falar
desta virtude cantava-lhe as belezas de um
modo que os homens geralmente não sabem
fazer; ao olhar para n6s, fazia-o com tal
modéstia que n6s mal podiamos ver as suas
maravilhosas pupilas; a única manifestação
externa de carinho que usava para com seus
jovens era colocar a mão sobre a cabeça
de alguem como para implorar-lhe uma b$nção;
ora, neste contato parecia que uma aura celes­
tial n� enchesse de amor pela pureza ».
A segunda impressão era que: « D. Bosco
rezava sempre. Nele, a união com Deus era
contínua. Quem se aproximava dele percebia
logo estar diante de um serafim. Era-o tal
quando rezava de joelhos; era-o ao celebrar
a Santa Missa; era-o no caminhar grave e
sereno; tal era quando nas conversações sabia
elevar-se a Deus por mais comum que f;
o argumento sem que porisso se tomasse
enfadonho ou aborrecido; fazia-o com uma
naturalidade incrivel. Em volta da cabeça
de D. Bosco poder-se-ia escrever com letras
luminosas : a nossa resid�ncia habitual é o
céu. Corwer.ratio no.rtra in caelis e.rt r>.
- 122 -

O seu primeiro biógrafo, o P. J. B. Lemoyne


tendo vivído tantos anos com ele e após reco­
lher testemunhos no próprio ambiente, atesta:
Um afeto tão ardente para com a Virgem
era uma irradiação e uma prova da pureza
do coração de D. Bosco.
Sim! Estamos intimamente persuadidos
que nisto consista sobretudo o segredo da
sua grandeza. Temos certeza de que Deus o
encheu de dons extraordinários, servindo-se
dele para obras maravilhosas só por se ·ter
ele mantido puro e casto.
Só ao vê-lo, afirma o P .. Piano, se podia
conhecer quanto amor nutria para com a bela
virtude.
A sua palavra, os seus gestos, a sua atitude,
em suma, qualquer ação de D. Bo�o res­
piravam uma candura e um aroma tão virginal
que arrebatava e edificava a quem quer que
se aproximasse dele, fosse embora um desen­
caminhado. O ar angélico que lhe transparecia
no rosto tinha um atrativo especial para con­
quistar os corações. Dos seus lábios jamais
saiu uma palavra que se pudesse taxar de
menos própria. No seu exterior evitava qual­
quer gesto ou qualquer movimento que pare­
cesse mundano. Quem o conheceu nos momen­
tos mais íntimos de sua vida, o que achou
nele de mais extraordinário foi sem dúvida
a suma atenção que sempre usou na prática
dos mais vivos cuidados para não lesar a
modéstia.
- 123 -

É maravilhoso o coro de elogios com que os


ex-alunos proclamam os louvores do Santo!
Graças ao amor que D. Bosco nutria pela
pureza e pela virgindade « sucedeu - observa
o C6nego Balésio - que naqueles anos
existiam entre nós mU:itos jovens verdaqeira­
mente puros e, diria mesmo, angélicos pela
pureza, pureza que lhes transparecia nas
palavras, no olhar e na atitude exterior.
Imitando o exemplo de D. Bosco, eles conser­
vavam esta virtude com penitências, com a
vigila.ncia sobre si próprios e com uma
piedade rara, edificante, superior à própria
idade e incrivel aos profanos. Sei que por
vezes sem que disso dessem fé, alguns destes
jovens foram conduzidos por D. Bosco à casa
de cert:.s famílias nobres, para edificação dos
seus filhos. Sei ainda que, às vezes, com a mes­
ma finalidade, senhores e nobres da cidade
traziam os filhos ao nosso Oratório para que
aí assistissem às funções » ,
« Estou absolutamente convencido - de­
clara o Cônego Berrome - que D. Bosco
conduziu à tumba a estola da inocência
batismal. Lia-se a virtude da castidade no seu
olhar, na sua atitude, na sua palavra e em
todos os seus atos; bastava fixá-lo para sentir
o perfume desta virtude » .
« O servo de Deus - exclama o Teólogo

Revíglio - era de uma castidade angélica.


As suas palavras e atitudes, os seus gestos
e toda a sua ação respiravam uma onda
- - 124 -

virginal que arrebatava. Nas mesmaS' carícias


que · para conosco usava pondo a mão sobre
nossa cabeça havia um que de püro, de morti­
ficado, de paterno que parecia infundir em
n6s o espírito da sua castidade a ponto que. nos
sentiamos arrebatados e cada vez mais resol­
vidos a praticar a sant� castidade ».

b) . . . EXIGE-O • .

Não tolerava infrações, mesmo julgadas


diminutas, à mais cuidadosa modéstia, posto
que soubesse insinuar as suas intransigências
com espírito e genialidade.
Aos primeiros inícios da sua missão em
Turim, 1841, aconteceu o fato ·que nos refere
·
assim o seu bi6grafo. •

0J' braçoJ' e o jogo.


A família Vergnano por meio de um dos
filhos chamado Emílio havia travado relações
com D. Bosco e o pai, o filho ou as filhas
vinham às quintas feiras, com frequência à
sala de visitas do Con��itto EccleJ'ÍMtico (fun­
dado pelo Te6logo Guala para a formação
pastoral dos neo Sacerdotes) afim de visi­
tarem o jovem sacerdote João Bosco.
Aquela família era composta de oito filhos
e todos desejavam ardentemente escutar a
palavra de D. Bosco. Ao bom sacerdote, porem,
muito desagrada�a a pouca modéstia nos
trajes das filhas. As que tinham somente déz
- 125 -

ou doze anos podia-se desculpar mas não


assim às que ultrapassavam os dezoito. Não
querendo D. Bosco dar um aviso que talvez
fosse tomado como repreensão impertinente,
pois essa era a moda de então e a famíüa
se prezaya de ser observante da mais rigorosa
moralidade, esperou ele um momento asado.
Um dia, a famHia e;m peso viera conversar
com o santo sacerdote. D. Bosco falava e
tinha deante de si uma das pequeninas que
de boca aberta escutava avidamente o que
ele dizia. Num dado momento D. Bosco a
interpelou.
- Quererias me dar uma explicação ?
- Sim! Qual seria ? perguntou toda con-
tente...
- Dize-me: porque desprezas, deste modo,
os teus braços ?
- Eu não os desprezo.
- Ao menos assim me parece.
- Oh! Bem ao contrário, D. Bosco - in-
terveiu a mãe - si o senhor soubesse como
devo repreendê-la com frequência pela sua
grande vaidade. Nunca se cansa de lavá-los
e quando acha que estão-bem limpos perfuma­
os com água de cheiro.
- No entanto. eu te asseguro, continuou
D. Bosco dirigindo-se à criança, assegUro
que desprezas os teus braços!
- Por ·que ? De que maneira ?
- 126 -

- Porque quando morreres, oxalá vás para


o céu, mas o certo é que teus braços serão
lançados ao fogo para sempre. E ainda afirmas
não desprezá-los ?
- Mas eu não o faço por mal. Para o in­
ferno é que não quero ir.
- Contudo é preciso ter paciência; a
coisa é assim, quando menos irás para o pur­
gatório e sei lá por quanto tempo.
- Mas esse aviso tambem me diz respeito,
exclamou uma das moças enrubecida.
- E eu que tambem estou decotada ?
- Pois então! As chamas hão de subir
do braço para o pescoço e os ombros.
- Já compreendí, concluiu a mãe, compre­
endí! A mim é que toca remediar a isso eodevo
agradecer-lhe pelo aviso que me deu.

VESTIMENTAS IMPROVISADAS

Em 1855, noutra circunst�ncia, deu a conhe­


cer sua intransigência para com algumas
senhoras.
Era D. Bosco esperado por uma certa Mar­
queza, benfeitora ; ss:dua dos seus jovens, ,a
qual para acolher a lJ. Bosco conv�dara nume­
rosas amigas. Muitas senhoras luxuosamente
vestidas acorreram logo, ansim a ; por se en­
treter com D. Bosco. Duas dentre estas foram
receber D. Bosco; mal este pusera o pé no
vestíbulo da entrada, estavam um_,tanto_de-
- 127 -

cotadas e com os braços cobertos só até a


metade. Logo que as viu, o santo sacerdote
abaixou os olhos e disse:
- Desculpem-me, enganei-me, julgava en­
trar numa casa e penetrei noutra.
Assim dizendo dispôs-·se a sair.
- Não, D. Bosco, o senhor não se enganou,
é justamente aquí que o aguardamos.
- Não, replicou o santo, não pode ser.
Eu estava certo de que na casa para a qual
me convidaram um padre pudesse entrar
livremente. Tenho pena das senhoras, porém,
pois a moda as faz empregar tanta seda na
cauda do vestido que depois fica faltando para
cobrir os braços.
j

E D. Bosco continuou a se afastar.


Percebendo então as senhoras que estavam
faltando contra a modéstia enrubeceram e
cheias de confusão foram buscar algum chale
que as cobrisse. Assim vestidas voltaram
rogando a D. Bosco que já se achava na esca­
da, que as perdoasse e fizesse o favor de
voltar.
- Agora sim - respondeu D. Bosco sor­
rindo, assim está bem. ·
Assim foi D. Bosco homenageado por
todos os convivas e as duas senhoras não
tiraram aquelas vestes improvisadas durante
todo o tempo do almoço.
- 128

Contra o e.rcdndalo,
O Pe. Mi§Uel c1,1ja causa de Beatificação
está em bom andamento e que foi o primeiro
sucessor de D. Bosco, dá o seguinte tes-
·

temunho:
« Reservadíssimo. consigo mesmo, não se

cansava D Bosco de inspirar tambem nos


. .

outros o amor à mais bela virtude; fazia-o


nas conversas, nos sermões e nas conferências.
Quando falava do tesouro inestimavel da
pureza ou descrevia o brilho de uma alma
casta e as alegrias de que goza bem como os
prémios que Deus lhe preparou no céu e na
terra, a sua palavra produzia um tal encanto
que os que a escutavam diziam:
- Somente quem é puro e imaculado como
os anjos pode falar deste modo.
Parecia ter uma predileção especia, pela
pureza. Manso como era e facil ein perdoar
�os jovens as faltas contra a disciplina, a
caridade, a obediência e o respeito devido
aos superiores, era contudo rigoroso em punir
os que escandalizavam aos companheiros
com seu procedimento. Para esses tais, após
alguns avisos si não se emendavam, abria
as portas não permitindo fossem causa de
. ruina aos colegas. Sofria sobremaneira quan­
do lhe contavam ter um aluno sido escan­
daloso e exclamava :
- Oh! que desastre!
Costumava chamar aos escandalosos de
lobos rapaces. Si chegava a desconfiar que
- 129 -

um jovem danificava aos companheiros com


algum escAndalo, chamava-o a si, avisava-o
com as mais vivas expressões de dor e fazia-o
vigiar de modo especial.
Com tais desvelos conseguiu corrigir muitos
que traziam do mundo alq;um mau costume,
como, por exemplo, certas liberdades no modo
de falar.
Não se mostrava rigoroso neste ponto só
para com seus filhos mas sim tambem para
com os estranhos; eis porque não deixava
de avisar oportunamente quando se apre­
sentava ocasião.
Indo uma vez visitar um benfeitor viu à
parede um quadro menos decente. Enquanto
esperava que o atendessem virou-o ao contrá­
rio coiJI.. a frente para a parede. O dono com­
preendeu o aviso e agradeceu a D. Bosco
como este mesmo me contou.
Representava perfeitamente o Divino Sal­
vador no meio dos jovenzinhos. A virtude da
pureza era uma espécie de manto que o
cobria da cabeça aos pés; eis porque os jovens
aproximavam- se dele de boa mente e nele
depositavam uma confiança ilimitada. Os
alunos e sacerdotes beijavam-lhe cardeal­
mente a mão e o faziam com um mixto de
estimq. e profunda reverência como si l'c.
jassem uma relíquia, conforme atesbt
c8nego Ballesio, contemporAneo do santo
Sofria por qualquer ofensa feita contr 1.
Deus mas quando ouvia falar-se de escAnd.--"
Dom Bosco nos guia, 5
- 1 30 -

deixava transparecer logo a dor que lhe


dilacerava o coração.
Falando-se um dia de alguns escandalosos,
D. Bosco deixou escapar estas palavras:
- Si não jo.r.re pecado, eu o.r e.rtrangularia
com e.rta.r mão.rl...
Um dia mandou chamar um jovem e
lhe disse:
Olha, preciso que me deixes falar sem que
me interrompas. No fim dirás sim ou não.
Já faz seis meses que não te confessas, após a
última confissão te acontece\1 isto e isto no
tal tempo e em tal lugar.
Assim neste tom continuou por bem déz
minutos sem um momento de interrupçã�.
No fim concluiu: - Vamos. Desculpa-te. E
verdade ou não é ? •

O jovem petrificado pelo espanto respondeu:


- Aquí não se trata de desculpas, tudo
o que D. Bosco disse é a núa verdade.
Após um instante de silêncio, o aluno
continuou:
- Não tenho mais a dizer senão que me
reconheço gravíssimamente culpado. Si o
senhor quiser me perdoar e me conservar
ainda aquí, verá em mim uma reforma abso­
luta, si porém quiser me expulsar, não posso
me queixar de injustiça.
Vendo que D. Bosco escutava tudo em
silêncio, o jovem tambem se calou e ficou por
instantes no mais profundo silêncio; daí a
- 131 -

pouco, improvisamente explodiu em pranto


convulsivo e lançando-se de joelhos aos pés
de D. Bosco, acrescentou:
- AhJ Sim! perdoa-mel Eu precisava mes­
mo deste castigo; como me sentia longe de
Deus. Mesmo que o senhor queira me excluir
de sua casa, permita ao menos que eu ajuste
as contas de minha conciência. Não me exclua
em estado de culpa mortal. . . Não! Faça-me
esta caridade!
Dom Bosco lhe respondeu:
- Quando começaste a falar, vendo eu que
somente reconhecias o mal e prometias
emenda, mostrando-te pronto a continuar
aquí ou ser mandado expulso, eu receava que
fosse um engano do demónio e que não
perseverarias. Ao contrário, porém, agora que
vejo a hta boa vontade de ajustar as cousas de
tua alma, não tenho dificuldades em aceder
aos teus pedidos » .
Hoje.
Bem sabemos que D. Bosco é cada vez
mais capaz de fazer tombar de joelhos as
vítimas da culpa. Confiemos-lhe, porianto,
com segurança e eficácia sempre maiores os
casos mais dificeis,· a Sua intercessão poderá
resolvê-los, hoje e sempre.
c) infunde-o.
O seu biógrafo retrata algumas cenas do
ambiente celestial que D. Bosco suscitava em
derredor com a candura de sua alma virginal.
132 -

D. Bosco sabia nas pregações, discursinhos,


conversações e conferências insinuar nos
corações o amor à rainha das virtudes. Falava
continuaJllente do íntimo e inestimavel tesou­
ro que é a pureza; descrevia a beleza de uma
alma casta, as alegrias que experimenta, os
prémios que Deus lhe preparou neste mundo
e no céu, bem como no Paraíso deva seguir
o Cordeiro Imaculado onde quer que Ele vá.
As suas palavras produziam um efeito admi­
ravel nos seus auditores de modo a enamorá­
los da pureza; é o que ainda hoje nos recorda
afetuosamente João Villa e com ele milhares de
outros. D. Bosco parecia mais um anjo do que
que um homem e quando falava os seus ouvin­
tes eram forçados a confessar:
- Somente quem é puro e casto como os.
anjos poderia falar assim da pureza. •
D. Bosco sabia entusiasmar muit�s vezes
os seus jovens mesmo durante os recreios
com inesperadas exclamaçõ� : •

- Gostaria que vocês fossem outros tantos


S. Luiz! - Cumpramos as nossas promessas!
Espero na infinita miseric6rdia de Deus que
um dia nos conceda acharmo-nos todos
reunidos na bemaventurada eternidade com
a cA'ldida estola da pureza.
Era coisa sabida no Orat6rio que nos
momentos de tentação bastava aproximar-se
de D. Bosco ou tocar nele para que imediata­
mente se esvaisse qualquer perturbação.
Durante o recreio quando estava conversando
- 133 -

no meio dos meninos às vezes fitava u'm que


parecia distraído e lhe dava um tapinha no
rosto depois apertava entre as mãos a cabeça
do aluno e lhe dizia ao ouvido:
- Fica tranquilo, não bati em ti I1UlJ' .rim no
demónio.
A um rapazinho molestado por tentações
impuras e que lhe pedia um r.emédio, disse:
- Fica .rempre perto de mim e não tenluz.r
medo.
Si lhe apresentavam um -menino para que
abençoasse colocava carinhosamente a mão
sobre a cabeça do petiz dizendo: Deu.r te
abençôe.
Mas quando lhe traziam uma menina D.
Bosco se abstinha desse gesto e nem queria
que ela lhe osculasse a mão.
Incu't:ia nos jovens o maior horror por este
vício não tanto com a palavra como com um
conjunto de graça divina, de persuação, de
afeto e de terror que do coração de D. Bosco
transbordava no de seus filhos.
Para encoraj á-los a combater o demónio
dizia-lhes frequentes vezes:
- JJfomenf.aneum quod crucial, aeternum
quod delectat (é fugaz o sofrimento e eterno o
júbilo futuro).
D. Bosco chorava de dor ao pensar em
tantos jovenzinhos que se arruínam pela · im­
pureza.
Mesmo em público chorou falando com
grande ardor acerca deste assunto:
- 1 34 -

- Antes que se cometam entre n6s tais


pecados, prefiro fechar a casa. Essas culpas
chamam as divinas maldições até sobre
inteiros países.
E os jovens, depois de ouvir semelhantes
palavras de coração tão amigo, iam repousar
cheios de comoção e cabisbaixos, resolvidos
a conservar cuidadosamente o coração s6
para Deus. O P. Bongiovanni observava:
- Felizes dias ]o"iví então quando a menor
mancha referente aos costumes nos comovia
até às lágrimas e nos levava irresistivelmente
ao pé do confessor tal o efeito que em n6s
produzia a palavra de D. Bosco.
O c6nego Reviglio que durante tantos
anos esteve com o santo, acrescentava:
- Pode-se jurar até, que no Orat6ri" reina­
va um ambiente de tal pureza que excedia o
ordinário.
« Eu quero que e.rte.r
pecadoJ', tu jamaiJ' OJ'
repiia.r por toda a tua
PitÚz/ »
O nosso bispo D. Costamagna recebeu
ampla faculdade por parte da pessoa interes­
sada, para comunicar ao P. Lemoyne, historia­
dor de D. Bosco, o fato seguinte:
Um rapazinho do Orat6rio tinha a desgraça
de cair e recair em graves culpas contra a
virtude angélica, principalmente durante as
férias. No princípio do ano letivo de 1880,
- 135 -

tendo voltado ao Oratório com a alma man­


chada por graves pecados, foi logo confessar-se
com D. Bosco; este fez com o jovemzinho
uma coisa que jamais se ouviu ter feito com
outros. Ao ouvir a acusação apertou fortemen­
te o rosto do penitente contra o seu, dizendo­
lhe:
- Eu quero que estes pecados, tu jamais os
repitas por toda a tua vida!
Dir-se-ia que naquele momento o amor que
D. Bosco nutria para com a pureza se extrava­
sou na alma do pequeno pecador, porquanto
este, tendo crescido e se tomado religioso, no
ano de 1889 protestava-se disposto a jurar
perante Deus o efeito prodigioso que nele
operara aquela atitude extraordinária do
nosso earo santo. O efeito foi sentir imediata­
mente desarraigar-se-lhe do coração as nocivas
inclinações a ponto de que durante as próximas
férias, quer no tempo que teve de servir no
exército a-pesar-de se achar exposto muitíssi­
mas vezes aos mais graves perigos de pecar,
jamais recaiu em suas antigas misérias.

Como um célebre capitão


Um dia, em 1875, falando em Roma com um
Monsenhor sobre as próprias atividades,
D. Bosco dizia:
- D. Bosco se acha nas mesmas condições
de que um capitão célebre. Deve antes olhar
bem para a direita e para a esquerda afim de
- 1 36 -

saber o que há de fazer e depois deve se dirigir


aos seus jovens como um capitão às suas
praças, dizendo-lhes:
- Não vades na frente mas seguí os meus
passos.
Na realidade D. Bo.rco de.rde o céu onde no.r
precedeu, repete-no.r hoje a palavra irre.ri.rtivel
pelo .reu poder de atração. - Segui-me!
7. - R ESUMO

Em 1878, no dia da festa da Ascenção,


D. Bosco resumia numa síntese notavel
os meios para auXiliar e fomentar a pureza.

Maria no.r en.rina a


técnica da vitória.
- Tomemos como mestre o grande· S� Felipe
Neri cuja festa celebrámos dias atrás. Per.­
guntando-lhe alguem qual a principal virtude
para um cristão, graças à qual pudesse ele pra­
ticar todas as outras, respondeu o Santo:
- Conservar a castidade. Enquanto tiver­
mos esta, possuiremos as demais todas; no
momento em que a perdermos, tambem as
outras se ausentarão. Com esta virtude o
cristão consegue a finalidade de pertencer
todo a Deus.
Mas como conservaremos a castidade ?
S. Felipe costumava sugerir ,cinco meios:
tres negativos e dois positivos. E o que nesta
noite vos quero expôr brevemente.
U .l:'áo dos tortes e dos puros - a :SS. Eucaristia
- 138 -

Evita a.r companhia.r peri'go.ra.r.


1 . EIJI. primeiro lugar, dizia S. Felipe:
- Fugí das más companhias]
Mas é possível ? Terei que vos aconselhar
, aquí dentro do Oratório a evitardes as más
companhias 1 Haverá então entre nós com­
panheiros rnáus 1 Nem quero supôr que os
haja, mas, observai um pouco. Chamamos de
companheiro rnáu o que de qualquer maneira
pode ocasionar a ofensa de Deus. Muita vez
acontece que mesmo aqueles q.ue no fundo do
coração não são máus, tornam-se contudo
ocasião para algu� ofender a Deus; eis porque
não podemos deixar de chamá-lo companheiro
perigoso para aquele tal. Frequentemente se
vêem certas amizades particulares e certas
inclinações recíprocas que em si não podem
ser taxadas de más pois nada acontece de
gravemente pecaminoso, o que sucede porém
é que si um não é rnáu é ao menos relaxado e
frouxo e porisso não quer mais se descartar
dessas afeições. Eis que logo se percebe um
enfraquecimento da piedade nesses tais, menos
devoção, menor frequência aos Sacramentos,
menos zelo no cumprimento dos próprios
deveres, negligência na observtmcia de certas
regras, maior liberdade no modo de falar,
assim é que, pouco por vez, um companheiro
bom graças à companhia muito frequente de
um outro, acha nele urna pedra de escândalo,
e pode-se dizer que muito embora ambos se-
- 139 -

jam bons, um se tomará de obstáculo para o


outro. Si os Superiores não dessem uma
solução ambos cairíam no precipício. Estas
amizades e afeições sempre trazem prejuizos
quando menos por serem contra a obediência,
eis porque não pedemos chamá-las de boas.
A desobediência priva os indivíduos da graça
especial de Deus e como consequência pouco
por vez vai prejudicando as almas.
Algum se desculpará:
- Mas nesta casa não ha companheiros
máusl
Digo-vos, porém, que pode ser que os haja.
O demónio tem auxiliares em toda a parte.
Muitas vezes se vai indo por muito tempo e
depois é que se percebe ser o tal fulano um
lobo rll.pace que arruinou grandemente o
virtuoso rebanho. Nos anos passados havia
muitos que pareciam muito bons e hoje · só
Deus sabe o que são. Quer isto dizer ou
que eles não eram realmente bons ou então, si
o eram, houve alguem que os perverteu.
Para dizer a verdade, esses tais, graças a
Deus são poucos mas. . . estão entre nós.
- Todos são bonzinhosl - repetem alguns.
A experiência e não o coração é que nos
devem dirigir neste ponto. A experiência nos.
ensina que entre os apóstolos havia um Judas.
E si entre nós tambem aparecesse algÜm
Judas ? Ahl Para longe, para longe os com­
panheiros perigosos! Andemos com os bons,
140 -

com aqueles que de boa vontade visitam o


SS. Sacramento e encorajam para o bem.
Tratemos igualmente os nossos companheiros,
com a mesma caridade mas fujamos dos
bisbilhoteiros, dos murmuradores, dos que se
esforçam para nos afastar das práticas de
pie? ade, dos que querem ser os nossos únicos
amigos.
Tomando todas estas precauções será difi­
cílimo, para não dizer impossivel, que o demó­
nio venha nos roubar a castidade. Ahl Como
o demónio se havia de alegrar si ainda caísse­
mos em suas garras! Dir-nos-ia zombando :
- Tu disseste adeus ao mundo, renunciand o
a mim e aos meus engedos ? Oh! Olha de nov o
aquí o mocinho que queria me combater.
Com todos· os seus propósitos recaíu n: arma­
dilha sem que eu sequer me movesse!

E.rtai .rempre ocupado.r.


2. Outra coisa que S. Felipe de Neri reco­
mendava para que pudessemos p6r em segu­
rança a virtude da castidade é a fuga do ócio,
meio tão importante como evitar os maus
companheiros.
, - Ócio e castidade, dizia S. Felipe, não
podem caminhar juntos.
O ócio é um vício que arrasta consigo muitos
outros. Fica ocioso quem não trabalha,
quem pensa em coisas desnecessárias, quem
- 14 1 -

dorme sem que sinta necessidade. Quando se


vê um companheiro ocioso deve-se temer
muito por ele pois sua virtude não está em
segurança. Ha alguns que no estudo perdem
tempo e se põem a olhar de um lado para
outro, bocejam durante as aulas, na igreja e
quando rezam procuram logo apoiar-se, àC'F­
mem durante. o sermão e suspiram pelo fim
das funções e do estudo; alguns ha que não
gostam nem sequer dos recreios.
Não estais trabalhando ? Trabalha o demó­
niol O inimigo das almas rodeia sempre,
tentando prejudicar-nos e si vê algum deso­
cupado aproveita logo aquela ocasião para
realizar os seus desígnios . A vossa mente está
desocupada, sem pensar em coisa alguma ?
Cuidadt�> l O demónio provoca logo imaginações
de coisas que vistes, ouvistes, lestes ou en­
contrastes. Continuais indolentes ? Essas ima­
ginações apossam-se da mente e trabalham,
trabalham até que não ofereçais resistência
e a tentação triunfa. Maior perigo ainda é
quando alguem repousa mais do que o neces­
sário e principalmente quando se tem o
vêso de repousar durante o dia. Sempre achei
perigosíssimo o repouso depois do almoço;
é mesmo este o demónio meridiano de que
diz a Escritura insinuar-se até nas melhores
almas. Que o diga o pobre Davíl Nesse mo­
mento a alma está menos preparada e o
corpo saturado predomina por completo.
Então o demónio se apodera da imagina ção,
- 1 42 -

depois toma conta do inteleto, em seguida


subjuga a vontade e eis que teremos a deplo­
rar quedas vergonhosas.
Estejamo� pois muito ocupados; é lícito não
só ler e estudar mas tambem cantar, rir e
pular, mas. . . que o demónio nos ache sempre
ocupados pois o ócio ensina muitas maldades:
multam malitiam docuif otio.rita.r. Trabalhe­
mos com todas as forças no campo do Senhor,
auxiliemo-nos mutuamente nesse trabalho,
animando-nos com um santo entusiasmo no
serviço de Deus. Armemo-nos de um grande
ardor em promover a sua glória, de um vivo
zelo em buscar meios para isso, em suportar
qualquer sacrifício pela salvação das almas;
deste Diodo, achando-nos o d«<mÓnio sempre
ocupados, nenhum mal poderá faier-nos.
Mesmo durante os recreios tomemos cuidado
para não ficarmos ociosos. O recreio deve
ser um verdadeiro alívio da mente, dissi­
pando qualquer melancolia, preocupação ou
pensamento molesto e perigoso.
- Mas o corpo está cansadol
Paciência! Procuremos tão só não oprimi-lo
com fadiga excessiva de modo a não adoecer;
quanto ao resto, trabalho, trabalho Sempre
que nos conservará a mais bela das virtudes.

Trata o corpo com .re11eridade.


3. Não nutrais delicadamente o corpo. Isto
não quer dizer que não possais 1 he dar o
- 143 -

necessário mas sim que não se procure satis­


fazer o pr6prio gosto ao nos alimentarmos.
S. Pedro grita-nos:
- Fratre.r, .robrii utote et Pe"gilate. Irmãos,
sêde s6brios e ficai em guarda.
Coloca o « sêde sobrios » ainda antes do
c vigilate, ,. pois quem não é s6brio não pode

ficar em guarda nem ser forte na fé e porisso


não poderá vencer aquele que rugindo nos
rodeia procurando quem devore.
Ao contrário, aquele que é s6brio pode
vigiar e se tomar forte para vencer o dem6nio.
Vai de encontro a este conselho, aquele que se
queixa de tudo que lhe põem na mesa: o
pão não está bem cozido, à sôpa falta o tem­
pêra, 'i! vinho contem muita água, �s quitutes
não estão bem feitos, falta môlho à carne, o
bifu está duro ou crú, o queijo está insípido, o
leite batizado, etc. etc. Um se põe a desejar
acepipes gostosos, outro procura em todas as
ocasiões o modo de obter esta ou aquela
coisa, outro arranja bebidas e guloseimas
para contentar a' gula querendo nutrir deli­
cadamente o corpo. Ahl Não procuremos
delicadezas para com este nosso corpo.
Coma-se o que se nos põe adeante, sem lamú­
rias importunas. A única exceção é quando um
alimento nos é prejudicial à saude. Si não
nos agrada um prato, comeremos doutro
fazendo uma mortificação pelo amor de Deus.
A sôpa tem muito caldo e está muito rala ?
- 144 -

Ponhamos pão dentro. Está salgada ? Ponha­


mos água. Falta sal ? Coloquemos um pouco.
E si um alimento não nos agrada comamo-lo
da mesma forma pois assim faremos coisa
agradavel a Deus. Deste modo podereis ter
um freio para o vosso corpo cumprindo com o
c "Sobrü estote » de S. Pedro.

Além disso de que nos serve tratar bem o


corpo ? Diz o Espírito Santo:
� - Corpu.r, quod corrumpilur, aggra11at ani­
mam (este corpo de corrução torna a alma
pesada).
Dizia um Santo diretor de almas que o
corpo deve ajudar a alma a operar o bem,
servindo-a como deve. A alma é a senhora do
corpo. Este deve ser considerado como um
jumentinho que deve levar a alma pois flUem é
dono deve ir à cavalo. Mas infeliz desse dono
si dá excessiva liberdade ao seu jumento.
Quando se alimenta em excesso o corpo,
este quer então comandar e si a alma o
contenta em todas as exigências ficará subju­
gada e seria como um homem carregando o
seu jumento. Neste caso o corpo não seria
de auxílio mas sim de obstáculo. Não façamos
esta monstruosidade. Cada um conserve o
lugar que Deus lhe designou.
Evitemos o excesso no comer e principalmen­
te no beber. Muitos jovens que eram exemplos
de vigor sadío no que se referia à alma, tor­
naram-se_pedras de escandalo por descuidarem
- 145 --

este ponto. Saibamos conservar mortificado


este corpo miseravel sem satisfazê-lo nunca e
assim viveremos felizes e tranquilos na paz
de Deus.
As tres coisas que vimos são os tres meios
negafi11o.r para conservar a castidade. S. Felipe
Neri acresc.enta ainda duas coisas que são
os meios po.riti11o.r e que postas em prática
darã uma s6lida base à bela virtude: são
a oração e as Sanlo.r Sacramenfo.r.

Rezai.
4 . A oração. Nesta palavra abranj o toda a
espécie de orações quer sejam mentais ou
vocais, as jaculatórias, os sermões e as leituras
espirityJais. Quem reza vence com certeza
qualquer tentação por forte e violenta que
seja; quem não reza está em perigo próximo
de cair. A oração nos deve ser uma prática
muito amada! E como uma arma que sempre
devemos ter pronta para nos defender nos
momentos de perigo. Recomendo a oração
especialmente à noite antes do repouso. Esse
é um dos tempos mais perigosos para a bela
virtude. Quando não se consegue dormir
logo, o demónio suscita .inúmeras imagens
perversas, fazendo-nos vir à lembrança coisas
ouvidas, vistas ou feitas durante o dia. Quem
não consegue adormecer logo, recite alguma
oração, repita sempre qualquer jaculatória. Si
- 1 46 -

estamos acostumados a conciliar logo o sôno


armemo-nos preventivamente fazendo bem
o santo sinal da Cruz.

flejleii em Deus, Senhor e Juiz sempre presente.


Alguem acorda-se durante a noite ? Reze;
beije o crucifixo ou alguma medalha, especial­
mente a da Virgem Auxiliadora que vos
recomendo trazer sempre ao pescoço. Nestas
circunstâncias constantemente se v� que
vence quem reza e quem não reza cai em
pecado.
Penso que cada qual deve dizer a si pr6prio:
- Enquanto eu não rezei caí em pecado;
comecei a caminhar mal, quando deixei
de rezar. •

Oh! Façamos tambem nossas as palavras


que o ca.rfo José dirigiu à mulher de Putifar
que tentava induzí-lo ao mal: - Como pode­
rei eu pecar na presença do meu Deus ?
Bem sabemos que Deus nos v� e como ou­
saremos cometer tão grave pecado na Sua
vista 7
José sabia perfeitamente as graves conse­
quências que sua recusa acarretaria; previa que
não desprezariam essa ocasião para lançá-lo
no cárcere e condená-lo à morte pois a pode­
rosa e perversa mulher haveria de caluniá-lo
cruelmente; mas o pensamento de que Deus
está presente e vê toda nossa ação não permi-
- 147 -

tiu que ele se desviasse da senda da virtude.


façamos como José, renovemos com frequ�n­
cia este pensamento e assim fugirá de n6s
qualquer desejo de pecar. Pensemos além
disso que somos criaturas à imagem de Deus,
recordemos que Deus é o nosso Senhor que vê
todas as ações e pensamentos; lembremo-nos
de que somos cristãos cat6licos, isto é, se­
quazes declarados de J esús Cristo e que temos
nosso corpo santificado pelos Sacramentos.
Pensemos que Deus é nosso Juiz e quando
formos tentados, digamos:
--;- Como ousarei desgostar um Deus tão
bom que s6 me tem beneficiado e há de me
julgar ?
Oh! Sim! Estejamos prontos a mortificar-nos
em todas as coisas, mesmo nas lícitas, antt.s
que ofender a Deus. Uma prática que aconse­
lho de um modo especialíssimo é beijar a
medalha de Maria Auxiliadora e repetir a
jaculat6ria: .Maria, .duxilium chri.rtianorum,
ora pro nobi.r; jaculat6ria que sempre tem sido
oportuna e prec�osa. Em toda a parte se veem
efeitos extraordinários produzidos por esta
confiança em Maria Auxiliadora. Ficai certos
de que si Nossa Senhora ajuda a todos tem um
cuidado especialíssimo de n6s. que somos seus
Filhos prediletos. Si invocarmos Mari,a, se­
remos socorridos no momento oportuno.
148 -

Frequentai a Santa Co­


munhão. Fazei Con­
jiJ'J'ÕeJ' jruiuOJ'aJ'.
5. - A última coisa que nie resta a vos
aconselhar é a frequência dos Santos Sacra­
mentos. Recomendo que se façam muita:.
Comunhões e todas bem fervorosas, isto é,
com devoção e recolhimento. A respeito da
Confissão, porém, tenho uma lembrança a vos
sugerir. Pelo fruto sabemos si a planta é boa
ou má, assim tambem conforme o fruto das
Confissões poderemos concluir si elas foram
bem feitas. Alguns vão se confessar sempre
com as mesmas faltas. O que indica isto ?
Quand9 a confissão não produz fruto, não
é bôa. E a realidade1 Quando nos confessamos
e não se nota melhora é para temer •que as
confissões não sejam boas, mas nulas. Isto
quer dizer que não tomamos um bom pro­
pósito, ou que não o pusemos em prática.
Dir-se· ia por vezes que nos vamos confessar
por costume querendo enganar a Deus.
Portanto eu vos recomendo muito que cada
qual procure excitar nas próprias confissões
uma dor verdadeiramente intensa dos pecados
cometidos e alem disso, de tempo em tempo,
medite nos frutos das confissões passadas.
Tomemos propósitos firmes e inabalaveis.
Pensemos seriamente em nos mortificarmos
na alimentação, no beber e no brincar, em
.diminuir as murmurações, em sermos sempre
- 149 -

parcos em falar, em conversar sempre de


assuntos uteis, em sermos mais piedosos na
igreja, ma�s ativos durante o dia, mais pon­
tuais em nos levantarmos da cama. Mortifi­
quemos um pouco mais os olhares e a gula;
façamos algum esforço para melhorar real­
mente o nosso procedimento. No contrário,
iremos adiante sempre com as mesmas culpas
e visto que qui .rpernit modica paulatim decidei
(quem despreza as coisas pequenas aos poucos
tombará) assim n6s nos acharemos em perigo
evidente de nos condenarmos, sendo já por
natureza tão inclinados ao mal. Si não fizer­
mos esforços verdadeiros, diminuiremos
sempre na virtude, na coragem, na oração
e no 6dio ao pecado.
Vêde ao contrário o consolo de quem pouco
'
por vez aproveita sempre as graças do Senhor!
Vai sempre crescendo na virtude e quasi
insensivelmente avança de 11Írfuie in 11Írlule,
donec videbitur Deu.r deorum in Sion (Isto é,
de virtude em virtude até chegar à visão de
Deus no Paraíso). Guardai na lembrança
o que dizia S. Greg6rio: non progredi regredi
e.ri. (não ir para diante é o mesmo que ir
para trás).
Não nos contentemos em tomar parte
nas práticas ordinárias de piedade e em fazê-lo
do melhor modo possivel; recomendemo-nos
ainda muitas vezes durante o dia a Deus
e à Virgem Santíssima. lnvoq ....emos a Maria
com a jaculatória .duxilium cri.riianorum,
� 150 -

ora pro nobii.r que em muitíssimos casos foi


reconhecida eficacíssima. Deste modo con­
servaremos a virtude da Castidade, virtude
angélica, mãe de todas as demais ».

V - O CEU PARA O QUAL VOAREMOS:


PUREZA E AMOR
No dia 10 de Agosto de 1880 achando-se
no colégio salesiano de S. Benigno Canavese,
D. Bosco apontava para o vértice supremo
de « pureza e do amor » a que chegam aqueles
que pelo cultivo da pureza se entregam com
todas as energias à ação da graça daquele
que amava as crianças com predileção .

.d mua preparada para


o.r e !eito.r.
« Sonhei que me achava aquí, em S. Benigno,
e que �stava precisamente numa grande
sala, tão grande como o refeitório daquí
e talvez maior ainda.
Esta grande sala estava toda iluminada e
eu pensava conugo mesmo:
- Será que o P. Barberis fez um despro­
pósito tão grande ? Onde arranjou tanto
dinheiro ?
Alí estavam muitos jovens sentados às
mesas para o almoço. Mas não comiam.
- 151 -

Quando eu entrei em companhia de um outro,


eles pegaram no pão como para começar
a refeição.
A sala estava elegantemente iluminada mas
não se via de onde vinha a luz. Os talheres, as
toalhas e os guardanapos eram tão alvos que
os mais brancos dos nossos pareceriam sujos
em comparação com aqueles. Pratos, talheres,
copos, garrafas tudo era tão luzidio e bonito
que eu desconfiei estar sonhando e disse
para comigo mesmo: - Estarei sonhando ?
Aquí em S. BeÍU.gno tantas riquezas ? No en·
tanto estou aquí e acordado1
Pus·me a observar os jovens e ví que n�o
comiam. Perguntei então:
- O que estão fazendo e porque não
comem ?
Quando eu disse isto, todos começaram
a comer.
Eu olhava e tornava a olhar para tantos
jovens. Não sabia o que dizer e pedí ao meu
companheiro me dissesse o que significava
tudo aquilo. Respondeu·me:
- Presta atenção por um momento e
compreenderás todo o mistério.

/(rÍoJ' da pureza.
0J'
Enquanto o meu guia pronunciava tais
palavras mudou·se a luz que havia antes
aparecendo outra ainda mais esplêndida.
Enquanto eu me aproximava para ver melhor,
152 -

eis que aparece uma turba de belíssimos jo.


venzinhos, verdadeiros anjos, que tinham
na mão um lírio. Puseram-se a caminhar
sobre a mesa sem tocá-la com os pés. Os
comensais se ergueram e com um sorriso a
brincar-lhes nos lábios ficaram observando o
que se passava. Os anjos distribuiam lírios
aquí e alí e os que os recebiam erguiam-se
do solo como si fossem espíritos. Observando
eu quais os jovens que recebiam lírios, pude
conhecê los mas apareciam tão belos e lumi­
nosos que me parecia achar-me no paraíso.
Perguntei o que significavam os jovens que
traziam o lírio.
- Como ? Não recomendaste tantas vezes
a bela virtude da pureza ?
Sim! respondi. Procurei insinuá-la com todo
o amor no coração dos meus jovens. •
- Pois bem, retrucou o meu companheiro,
aqueles que v� com um lírio são os que sou­
beram conservá-la.

d.r ro.ra.r do amor.


Não sabia mesmo o que ,dizer. Estando
cheio de admiração, vi aparecer uma outra
multidão de jovens que caminhavam sobre a
mêsa sem tccá-la; tinham nas mãos muitas
rosas e ·iam distribuindo-as; quem as recebia
adquiria um brilho vivíssimo no rosto.
Perguntei ao meu companheiro o que signi­
ficavam estes outros meninos que tinham as
rosas.
- 153 -

- São os que estão inflamados no amor


de Deus.
Vi então que todos tinham o pr6prio nome
escrito na fronte com letras de ouro. Apro­
ximei-me para vêr mellior e fiz menção de
anotar-llies os nomes, num piscar d'ollios
porém, todos desapareceram

Subindo na corda...
Juntamente com eles, desapareceu tambem
a luz de modo que eu fiquei na obscuridade,
esta, porém, era tal que eu ainda p:x:lia en­
xergar um pouco. Eu via rostos vermelhos
como fogo e eram dos meninos que não haviam
recebido lírios nem rosas. Vi tambem alguns
que se �sgotavam à porfia para trepar por
uma corda escorregadia dependurada no meio
sala, mas a corda descia cada vez mais e
assim os pobrezinhos ficavam sempre com
os pés no solo e com as mãos e o corpo en­
lameados.
Estra.nhando cheio_ de admiração, vêr na­
quela sala um tal brinquedo perguntei com
insistência o que poderia significar o que eu
via. Respondera.m.-me: ,
· ·- '
-::="A_ corda é, como fu;; "';disse-;t-;
nos sermões, a Sta. Confissão. Si alguem se
agarra bem a esta corda certamente chegará
ao céu. Ha muitos jovens que vão muitas
vezes se confessar e se valem da corda para
- 154 -
poder se erguer mas vão confessar-se sem
todas as disposições necessárias com pouca
dor e pouco propósito e porisso não conseguem
se levantar do chão; a corda rompe-se sempre
e não podem eles se levantar nunca pois
escorregam e ficam sempre no mesmo plano.

Vencendo a .rerpente...
Quis eu anotar o s nomes daqueles meninos
mas não consegui escre.ver senão dois ou
tres pois logo desapareceu a luz e com ela os
meninos. Na obscuridade vi um espetáculo
ainda mais aflitivo. Certos jovens de um
aspeto amedrontador tinham enrolada ao
pescoço uma grande cobra que assentava a
cauda sobre o coração dos meninos t: punha
a própria boca em frente à dos infelizes como
si f6ra lhe morder a língua no caso de abrirem
os lábios. O rosto daqueles meninos era tão
horrendo que me incutia terror, tinham os
olhos esbugalhados, a boca contorcida e
estavam numa posi�ão que enchia de espanto.
Trémulo de medo perguntei novamente o
que significava isso e me disseram:
- Não v& ? A antiga serpente (o diabo)
estrangula a garganta com um duplo laço
para que aqueles infelizes não possam falar
na confissão e está pronta para cravar-lhes
as fauces venenosas no caso de eles abrirem a
boca. Pobrezinhosl Si falassem, talvez pudes-
- 1 55 -

sem fazer uma boa confissão e o dem6nio nada


mais poderia contra eles. Contudo, nada
falam por respeito humano e guardam na
conciência os pr6prios pecados, tornando
muitas vezes ao confes!iionário sem nunca
ousar lançar para fora o veneno que guardam
no coração.

« .d alegria angélica »

Disse eu então ao meu companheiro:


- Dize-me o nome desses tais para que eu
possa avisá-los.
-Vamos, vamos, escreve.
- Mas não ha tempo.
- Escreve, escreve.
Pus-ne a escrever mas tinha apenas ano­
tado uns poucos quando desapareceram todos
dos meus olhos. O meu companheiro me
falou :
- Vai dizer a teus jovens que estejam
atentos e conta-lhes tudo o que viste.
- Dá-me um sinal para que eu me per­
suada de que este não é um simples sonho
mas sim uma advertência que Deus me envia
para transmiti-la a meus jovens.
- Está bem. Fica atentol
Tornou então a aparecer a luz que sempre
mais aumentava e reapareceram os jovens que
tinham o lírio e a rosa. A luz intensificava-se
sempre mais e assim pude ver que aqueles
- 156 -

j ovens estavam inebriados de content amento,


alegria angélica iluminava-r1es os rostos e eu
fiquei olhando-os com indescritível mara­
vilha e no entanto a luz aumentava sem­
pre mais até chegar num ponto em que se
ouviu uma terrível explosão.
Neste momento me despertei achando-me
na minha cama tão cansado que ainda agora
me sinto exausto »,
.d alegria angélica que re.rplende no ro.rlo de
D. Bo.rco, arrebala-no.r para uína Pida .rempre
maior de pur[J'J'ima luz.
Brilhanle.r de pureza
Serajin.r de amor.

r(� ==----

--=-·=--= �dl
Oração a S. Luiz Gonzaga
O' Luiz Santo, adornado de angélicos cos­
tumes, eu vosso indigno devoto, humilde­
mente prostrado deante de vós, adoro a Ma­
gestade Infinita, que vos elevou a tanta gl6-
ria; bendigo mil vezes a SS. Trindade, que
vos concedeu uma inocência tão ilibada e
vos ornou de tão heróicas virtudes. Ahl por
todos esses dons sobrehumanos, pela vossa
inocência e penitência, pelo amor que tives­
tes a Deus na terra, humildemente vos rogo
que vos digneis de aceitar-me, hoje, entre
os vossos devotos e alcançar-me a verdadeira
contrição dos meus pecados, pureza de cora­
ção, alheia de toda a culpa e ofensa de Deus.
Suplico-vos sejais. meu protetor durante to­
da a minha vida, mas especialmente na hora
da mode, em que hei de ter ainda maior
necess'd1de do vosso patrocínio. E vós, ex­
celsa Rainha do Céu, Maria, que tanto a­
mastes e favorecestes a Luiz, enquanto vivia
nesta terra, fazei com que estes meus rogos
sejam eficazes; dignai-vos de ouvíl-os, não
pelos meus merecimentos, mas pelos do vos­
so servo Luiz, e, pelo vosso amor maternal,
fa-zei, ó Mãe querida, que eu possa imitál-o
sempre, durante a vida, para que, depois de
uma morte santa, consiga participar da feli­
cidade, que em companhia dos Bemaventu­
rados ele goza no Céu por todos os séculos
dos séculos. Amen.
Padre No.r.ro, .dpe Ãfaria, Gl6ria.
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br

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