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Feliz Ano Novo é uma das obras mais famosas do autor brasileiro Rubem Fonseca,
este que até os dias de hoje produz literatura com grande excelência, mesmo estando em
tempos de preconceito e de acomodamento na literatura brasileira.
Produzir literatura ou propor uma análise em literatura de obras que beirem o campo
sensual, que tenham aspectos criminais e contenham escatologias é de fato um ato de
grande responsabilidade e podemos dizer também de certa ousadia. Mas, acima de tudo,
é um ato que busca dar voz e vez a produções que até então não são vistas com bons
olhos, e que não são apreciadas e/ou respeitadas na sociedade atual. Desse modo,
proponho aqui uma análise da linguagem considerada obscena que é encontrada no conto
Feliz Ano Novo de Rubem Fonseca, e para isso, buscarei demonstrar que a literatura
possui um viés de liberdade, e que dá valor a produções que a sociedade rejeita por não
atender as regras que são impostas pelos leitores e autores conservadores.
A literatura produzida por Rubem Fonseca possui tons que são caracterizantes,
nota-se com frequência em suas obras uma temática criminal e periférica, além de
narrativas que tem por tema central a violência. Assim, Fonseca faz parte de um
movimento na literatura chamado de brutalismo, este que volta-se para questões que são
recorrentes na sociedade brasileira, principalmente em bairros pobres de grandes cidades.
Dessa forma “sem abrir mão do compromisso literário, Fonseca criou um estilo próprio -
enxuto, direto, comunicativo” (SCHOLLHAMMER, 2009, p.27), pois, visa em suas
produções demonstrar através do viés ficcional, aquilo que a própria sociedade realiza
cotidianamente, e para isso, traz à tona estes temas considerados polêmicos.
Em relação ao conto Feliz Ano Novo, este é encontrado em um livro que foi
publicado em 1975, sendo que nele são encontradas mais doze narrativas que demonstram
diversas situações que são frequentes em periferias e bairros pobres da sociedade
brasileira. Neste conto, há um excessivo uso de palavras consideradas obscenas, estas que
na literatura são denominadas escatologias, assim, a presença destas escatologias no conto
é motivo de muitos debates no campo literário, no qual, existe um público que não
considera estas produções como literatura, já que possuem um caráter “feio”, impróprio
ou incoerente. Dessa forma, supomos que para muitos leitores e escritores brasileiros, na
literatura há espaço apenas para o que é denominado belo, bonito e agradável.
A priori, podemos considerar que o “considerado “feio” na literatura já é marca
muito constante nas obras de escritores contemporâneos, alguns que destacam-se junto
com Rubem Fonseca neste cerne contemporâneo são: Ignacyo de Loyola Brandao, Caio
Fernando Abreu e João Gilberto Noll, estes que possuem diversas obras que demonstram
uma linguagem obscena, ou melhor, que são encontradas escatologias nessas obras, ou
conteúdos com temáticas sexuais. O Ignacyo de Loyola Brandao, possui uma obra
denominada Obscenidades para uma dona de casa, já o Caio Fernando Abreu escreveu
um conto chamado Aqueles Dois, enquanto o João Gilberto Noll possui um conto
chamado Bosque de Louise, assim, podemos perceber que na literatura, principalmente
na contemporaneidade há uma emergência dessa temática escatológica, contudo, é
perceptível que ainda não há uma boa recepção a estas obras.
Quando falo em emergente, quero dizer que a literatura contemporânea, embora
não seja algo “novo” em questão cronológica, emerge agora com um vigor que até então
não era visto, pois, apenas há pouco tempo houve um interesse por estudar esta literatura
que possui diversas obras e produções de grande valia. A emergência de uma literatura
deste tipo é muito importante para os estudos literários, contanto, não podemos esquecer
que ainda existe muita repulsa a algumas produções contemporâneas, principalmente a
aquelas que contém uma linguagem diferente.
Nessa perspectiva, o uso das palavras “fudidão”, “rola”, “cu”, e “punheta”, ainda
causa estranhamento e são consideradas erradas, impróprias ou como algo que
desvaloriza os padrões impostos na sociedade. Dessa forma, supõe-se que a literatura
deve obedecer a determinadas regras e não deve fugir a estas prescrições. Contudo,
quando se valida essa premissa, desconsidera-se a liberdade de criação no texto literário,
como também a ficção que é o norte da obra literária, contrariando essa perspectiva é de
suma importância percebermos que:
As manifestações literárias podem envolver adesão, transformação ou ruptura
em relação à tradição linguística, à tradição retórico-estilística, à tradição
técnico-literária ou à tradição temático-literária às quais necessariamente está
vinculado o trabalho do escritor. (PROENÇA FILHO, 2007, p.46)