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Edilson Juviniano da Silva Filho
Quando o assunto é Monteiro Lobato, logo vem à mente sua obra mais conhecida:
O sítio do pica pau amarelo. Porém, apesar de ser famoso pelos livros infantis, o
autor também produziu obras sobre temas adultos não ficcionais. Uma delas, O
escândalo do petróleo, foi publicada originalmente em 1936, durante o primeiro
mandato de Getúlio Vargas. O livro teve duas edições esgotadas em algumas
semanas, mas foi censurado pela ditadura do Estado Novo meses depois do seu
lançamento, e somente em 1945, com o fim do governo Vargas, foi liberado.
No livro, Monteiro Lobato revela os detalhes de uma luta que durou uma década,
de 1931 a 1941, tentando colocar o Brasil nos trilhos do crescimento econômico.
Convicto de que a riqueza do país estava no subsolo, Lobato consultou
especialistas, reuniu capital junto a pequenos investidores e fundou empresas de
prospecção a fim de extrair petróleo do subsolo brasileiro, mas enfrentou forte
oposição de grupos estrangeiros apoiados pelo governo Vargas.
Na introdução, o autor inicia citando “A luta pelo petróleo”, obra de Essad Bey, que
ele lançou em junho de 1935 em mais uma de suas jogadas estratégicas. A obra foi
traduzida por Charlie W. Frankie, seu colaborador em levantamentos geofísicos e
de prospecções, e traz o resumo das vantagens do petróleo sobre o carvão como
matéria combustível. Ainda na introdução ele fala sobre os trusts, a Standart Oil e a
Royal Duth e Shell, que mantinham o monopólio do petróleo na época e por conta
disso dominaram as finanças, os bancos, o mercado do dinheiro e até os governos
e as máquinas administrativas. Lobato não esconde sua indignação com o fato de
o Brasil, com seu imenso território com tantos pontos marcados de indícios de
petróleo, permanecer economicamente escravo dos trusts. “Esses trusts nos
conhecem. Sabem que o brasileiro é uma espécie de criança tonta, que realmente
só se interessa por jogo, farra, carnaval e anedotas fesceninas (grosseiras)” (p. 24).
Diante dos entraves, Lobato escreve uma carta ao ministro da Agricultura que teve
por título “POR QUE O BRASIL NÃO TEM PETRÓLEO”, na qual ele denuncia o
DNPM batendo na tecla que permeia todo o volume: “não tirar petróleo e não
deixar que ninguém o tire”. Com a repercussão da carta, o ministro decide instaurar
a comissão de inquérito a fim de apurar as denuncias nela contidas. Em seu
depoimento, o autor tenta provar suas declarações feitas, começando pela divisa
do serviço federal de minas: “NÃO TIRAR PETRÓLEO E NÃO DEIXAR QUE O
TIREM”.
Ainda em seu depoimento, Monteiro Lobato reitera sua acusação contra os órgãos
governamentais de usar informações privilegiadas para beneficiar diretamente uma
empresa norte-americana. Enfatizando a ideia de que abrir mão da matéria prima
combustível equivale ao suicídio econômico e militar da nação, ele conclui que o
problema principal residia na nossa tendência para resolver problemas só pelo lado
teórico, com desprezo absoluto do aspecto prático. Essa declaração dele é muito
atual diante da situação a qual vivenciamos em nosso país, onde tantos protestos
são feitos verbalmente através das redes sociais, mas sem nenhuma atitude pela
mudança tão sonhada.
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na extinção das companhias nacionais de petróleo. Sem saída, Lobato decide
escrever uma carta á Getúlio Vargas em que dá o histórico da situação e grifa o
recado ao presidente: “O destino das nações depende muitas vezes da atuação de
um homem que enxerga mais longe que os outros” (p.148).
A resposta veio onze meses depois em forma de voz de prisão pela “audaciosa e
injustificável irreverência”, “afirmações destituídas de verdade, inteiramente falsas,
com o objetivo de injuriar os poderes públicos”. Em 18 de abril de 1941, recolhido à
casa de detenção onde estava no seu 3º mês de prisão, soube que fora absolvido
em 1º instância pelo juiz do Tribunal de Segurança Nacional, coronel Maynard
Gomes, cuja sentença transcreve na íntegra.
Após sofrer duros golpes, Monteiro Lobato ainda recebe o histórico do petróleo do
Lobato, enviado por seu companheiro Oscar Cordeiro, no qual descreve sua luta
pela descoberta do petróleo do Lobato (o local recebeu esse nome por mera
coincidência) e de como este foi demitido e expulso de seu próprio campo, ficando
o poço sob governo do Conselho Nacional do Petróleo. Diante disso, o escritor não
vê outra alternativa a não ser a rendição. “Chega. Não quero nunca mais tocar
neste assunto de petróleo. Amargurou-me doze anos de vida, levou-me à cadeia –
mas isso não foi o pior. O pior foi a incoercível sensação de repugnância que
desde então passei a sentir sempre que ouço a expressão Governo Brasileiro...” (p.
180).
No último trecho do livro, ele ainda fala sobre “Os grandes crimes contra os povos”.
Critica a ignorância do governo na queima de cerca de 80 mil sacas de café no
início da década de 30, e deixa claro seu lado intuitivo que previa a era do capital
financeiro transnacional a impor sua lógica de mercado às nações periféricas.