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Tema I
Conceitos Gerais. Ações constitucionais e as Constituições que as instituíram. O caráter sumário dos
remédios constitucionais. Distinção entre recurso e ação autônoma de impugnação. Legitimidade ordinária e
extraordinária. Efeitos da sentença. Legitimidade recursal. O MP como agente e interveniente.
Notas de Aula1
1. Remédios constitucionais
Ocorre que esta nota instrumental das garantias fundamentais é ainda mais marcante
em algumas delas, que são unicamente dedicadas a operacionalizar direitos fundamentais:
são os remédios constitucionais. Veja, então, que os remédios constitucionais não deixam
de ser, eles próprios, garantias constitucionais aos direitos fundamentais; seu escopo,
porém, é efetivamente instrumental, objetivo, talhando o meio processual para implemento
do direito fundamental ameaçado ou violado.
O habeas corpus surgiu em Roma, mas teve sua maior evolução no direito inglês,
chegando ao sistema brasileiro no final do século XIX. Em sua concepção essencial sempre
se dedicou a proteger um tipo especial de liberdade, a liberdade de ir e vir, liberdade
locomotiva.
A teoria brasileira do habeas corpus foi desenvolvida por Rui Barbosa, e
inicialmente a concepção do nosso constituinte era diferente da que se apresentava nos
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Aula ministrada pelo professor Ricardo Coimbra da Silva Starling Barcellos, em 18/8/2009.
O habeas data, por sua vez, é a ação que foi criada para por fim à idéia de sigilo na
res publica. É intolerável que a informação sobre o indivíduo, detida pelo Poder Público,
seja omitida do próprio indivíduo, e para a liberação desta informação é que se presta este
remédio.
Por fim, a ação popular é remédio bastante peculiar, pois tem escopo mais amplo do
que a tutela mandamental que geralmente é a pretendida nos demais remédios, permitindo a
anulação do ato impugnado e a reparação do erário. Há quem entenda que até mesmo a
improbidade administrativa, que é normalmente veiculada em ação civil pública, pode ser
perseguida por meio de ação popular.
O procedimento dos remédios constitucionais deve ser o mais célere e ágil possível.
Afora a ação popular, todos os demais remédios, inclusive, demandam a existência do
chamado direito líquido e certo, apesar desta expressão constar unicamente do texto do
dispositivo do mandado de segurança.
É direito líquido e certo aquele que é certo quanto à sua existência, delimitado
quanto a sua extensão, e que pode ser exercido de plano, ante a prova pré-constituída de sua
delimitação e certeza. Na verdade, o que é líquido e certo é o fato que fundamenta o direito
que se pretende, eis que o fato precisa estar claramente comprovado. Tanto que o direito ser
controvertido, havendo mais de uma tese em debate na doutrina ou jurisprudência, não
impede a impetração de mandado de segurança, por exemplo, como se vê no enunciado 625
da súmula do STF:
“Súmula 625, STF: Controvérsia sobre matéria de direito não impede a concessão
de mandado de segurança.”
Esta lógica, como dito, serve para todas as ações constitucionais: em todas elas
inexiste dilação probatória, à exceção da ação popular. No habeas corpus, por exemplo, é
preciso que haja prova da restrição indevida ao direito de locomoção plenamente
constituída, pois do contrário a impetração será infundada.
O habeas corpus é ação em que qualquer pessoa, além do próprio titular do direito
de locomoção, é legitimada para a impetração. Inclusive, no habeas corpus, todos têm
também capacidade postulatória plena, dispensando-se a representação por advogado.
No habeas data, a legitimidade ordinária para a ação é daquele que tem o acesso a
dados pessoais sobre si negado pelo Poder Público – excepcionalmente, os herdeiros do
titular dos dados.
No habeas data, por seu turno, a sentença é efetivamente mandamental, porque seu
dispositivo determina que haja o acesso aos dados pessoais do titular, que lhe fora negado
anteriormente.
Veja que, em sua maioria, as sentenças das ações constitucionais são mandamentais,
em que se emite, literalmente, um mandamento ao agente público, no sentido requerido
pelo titular do direito, sob pena de prevaricação ou desobediência.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
“Art. 8º - A inicial será desde logo indeferida quando não for caso de mandado de
segurança ou lhe faltar algum dos requisitos desta lei.
Parágrafo único. De despacho de indeferimento caberá o recurso previsto no art.
12.”
“Art. 10. A inicial será desde logo indeferida, por decisão motivada, quando não
for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou
quando decorrido o prazo legal para a impetração.
§ 1º Do indeferimento da inicial pelo juiz de primeiro grau caberá apelação e,
quando a competência para o julgamento do mandado de segurança couber
originariamente a um dos tribunais, do ato do relator caberá agravo para o órgão
competente do tribunal que integre.
§ 2º O ingresso de litisconsorte ativo não será admitido após o despacho da
petição inicial.”
Ocorre que esta não parece ser a melhor orientação, ante a busca pela efetividade
processual. Inexistindo prejuízo na conversão do rito, a instrumentalidade dos atos
processuais recomenda que seja aproveitado o processo, promovendo a adaptação
necessária. Destarte, o juiz poderá, sim, determinar a emenda à inicial, de forma que se
converta o rito do mandado para o ordinário, permitindo a dilação probatória necessária à
solução do litígio.
Tema II
Habeas corpus. Interdictum de homini libero exhibendo. Histórico: Código de Processo Criminal de 1832, a
Lei Saraiva e a Doutrina Brasileira do HC. A Emenda Constitucional de 1926. Partes. Limites objetivos.
Revisão Criminal. O HC como ação autônoma de impugnação.
Notas de Aula2
“(...)
LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder;
(...)”
Ao ser importado para o Brasil, contudo, assim veio a redação da Carta Magna de
1891: “Dar-se-á habeas corpus sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente
perigo de sofrer violência ou coação por ilegalidade ou abuso de poder”. Veja que não há
menção, neste teor, da específica proteção ao direito de ir e vir, e por conta deste dispositivo
é que surgiu a teoria brasileira do habeas corpus.
Rui Barbosa foi quem capitaneou esta inserção do habeas corpus no direito pátrio, e
à época do seu acolhimento no Brasil não havia a adstrição de seu objeto de tutela à
liberdade locomotiva. Portanto, o habeas corpus era utilizado, por aqui, como se mandado
de segurança fosse, para a defesa de qualquer direito fundamental líquido e certo contra
ilegalidade ou abuso de poder. Apenas com a Emenda Constitucional de 1926 o habeas
corpus assumiu a restrição do seu objeto, limitando-se ao direito de locomoção, assim
restando até hoje.
Adentrando as bases do direito de locomoção, tem-se por certo que a prisão é uma
situação excepcionalíssima. Veja o artigo 5º, XV, LXI, LXV e LXVI da CRFB:
“(...)
XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo
qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus
bens;
(...)
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Aula ministrada pelo professor Ricardo Coimbra da Silva Starling Barcellos, em 18/8/2009.
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão
militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
(...)
LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a
liberdade provisória, com ou sem fiança;
(...)”
“Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem
pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para
assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e
indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)”
A parte ativa, o pólo ativo no habeas corpus, o impetrante, pode ser o paciente ou
qualquer pessoa do povo, inclusive o próprio juiz, de ofício. Até mesmo pessoas jurídicas
podem impetrar habeas corpus em favor de um particular (não podendo, é claro, serem
pacientes do writ jamais). Esta amplíssima legitimação decorre da previsão do inciso LXV
do artigo 5º da CRFB, supra, que exige a imediata libertação de quem for ilegalmente
preso.
O pólo passivo é a autoridade coatora, aquela que está exercendo a coação apontada
como ilegal. Em regra, são autoridades públicas, mas nada impede que alguém da seara
privada cerceie a liberdade locomotora de uma pessoa, podendo figurar no pólo passivo do
habeas corpus. Como exemplo, a constrição de uma pessoa em um hospital, após poder ser
liberada, porque a conta hospitalar ainda não foi paga.
O paciente do habeas corpus, aquele que sofre a limitação em seu direito de ir e vir,
por óbvio, é somente a pessoa natural, porque somente ela é titular do direito locomotivo.
Não pode, por isso, haver como paciente a pessoa jurídica, ou um animal.
O habeas corpus tem por objeto a cessação de uma ilegalidade que seja capaz de
cercear o direito de ir e vir. Em termos claros, o habeas corpus se presta, primariamente, a
libertar o paciente que esteja preso ilegalmente, ou prevenir que venha a ocorrer prisão
ilegal. Este remédio se presta, também, ao trancamento de um inquérito policial, ou de uma
ação penal, sempre que a liberdade estiver em risco.
O habeas corpus contra ato de juiz de juizado especial criminal, a princípio, seria
julgado pela turma recursal, eis que é a instância revisora natural dos atos deste juiz. Contra
ato da própria turma recursal, porém, a quem se dirige a competência? Veja que, há pouco
tempo atrás, se entendia que este habeas corpus seria dirigido diretamente ao STF, porque o
tribunal de justiça não teria competência revisora dos atos das turmas, e o STJ não teria
competência para julgar atos deste órgão, eis que sua competência é revisora de atos de
tribunal, e a turma recursal não é tribunal. Todavia, o STF, em recente decisão dedicada a
mandado de segurança, mas plenamente aplicável ao habeas corpus, decidiu que a
competência para julgamento de habeas corpus contra ato de turma recursal é, de fato, do
respectivo tribunal de justiça. Veja a decisão trazida no informativo 457 da Corte Maior, e o
julgado a que faz referência, o HC 86.834:
O habeas corpus pode ser utilizado em matéria criminal ou cível, sendo que, em
matéria cível, hoje, somente é cabível quando da prisão civil, que hoje só é admitida em
caso de débito alimentar impago. A competência, é claro, se mantém ratione personae, mas
a especialização do órgão deve ser respeitada: se o ato é criminal, o habeas corpus compete
ao juízo criminal; se é cível, ao juízo cível.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Deteminado menor, com 13 anos de idade, representado por sua mãe, por
intermédio de advogado, impetrou Habeas corpus por se sentir tolhido em seu direito de ir
e vir, em virtude da Portaria do Juiz de Menores que estabeleceu que menores de 14 anos
de idade não podem assistir a determinados filmes nos cinemas da cidade do Rio de
Janeiro. Alega que seus pais possuem o poder familiar e a sua guarda, sem restrições.
Sendo deles a tarefa de educá-lo, não pode a Portaria do Juiz sobrepor-se ao poder
familiar.
Pede que lhe seja garantido o direito de assistir aos filmes vedados pela Portaria,
desde que autorizado por seus pais.
Dados os fatos como verdadeiros, decida de forma fundamentada.
Resposta à Questão 2
Este não é o tipo de liberdade que é protegido pelo habeas corpus. Este remédio não
tem toda e qualquer liberdade como objeto, mas tão somente a locomotiva, liberdade de ir e
vir.
Para além disso, a restrição administrativa é genérica e abstrata, e o objeto do
habeas corpus é sempre um ato concreto e individualizado de cerceio. Mas repare que,
mesmo se se tratasse de um ato concreto, a limitação de determinada atividade não é
amparada por habeas corpus – sendo cabível, talvez, o mandado de segurança.
Além da inadequação da via, materialmente esta irresignação também não teria
sucesso, se o ato de coação fosse concreto, eis que o poder familiar não pode sobrepor
normas de ordem pública.
Tema III
Notas de Aula3
1. Mandado de segurança
Muito recentemente – há um dia útil atrás, para ser exato – entrou em vigor a nova
lei que disciplina e regulamenta o mandado de segurança, diploma que revogou a antiga Lei
1.533/51 e de todos os diplomas que regulamentavam esta ação constitucional. Trata-se da
Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, e, diante desta recente alteração, já se impõe um estudo
baseado nesta novel legislação.
O mandado de segurança deve ser tido como garantia constitucional, e não como
uma mera ação cível. Seu fundamento, cláusula pétrea, vem no artigo 5º, LXIX, da CRFB:
“(...)
LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo,
não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela
ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica
no exercício de atribuições do Poder Público;
(...)”
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Aula ministrada pelo professor Cláudio Brandão de Oliveira, em 10/8/2009.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
(...)”
Veja que este dispositivo direciona os direitos arrolados nos incisos para os
brasileiros e para os estrangeiros residentes no Brasil. Esta previsão, porém, não elide a
legitimidade do estrangeiro não residente em solo pátrio para impetrar mandado de
segurança, quando se lhe perceber o avilte ao direito líquido e certo. Afinal, o estrangeiro
aqui não residente pode ter aqui patrimônio, por exemplo, e vir a sofrer alguma violação
contra este seu direito. Por isso, é consenso que o estrangeiro, mesmo aqui não residindo, é
legitimado ao mandamus.
O writ é um instrumento de controle particular da atuação do Estado. Pode, porém,
o próprio Estado precisar desta garantia, ou seja, pode o próprio Estado precisar impetrar
um mandado de segurança contra outro ato estatal. Isto é possível por contada nossa forma
federativa de Estado, em que se pode cogitar facilmente de um direito líquido e certo do
Município sendo violado por autoridade estadual, por exemplo, quando então será
necessária a proteção judicial do ente menor.
Pode acontecer caso ainda mais peculiar: pode um órgão público impetrar mandado
de segurança para o controle de ato de autoridade de outro órgão público, de outro Poder,
mas que integre a mesma pessoa jurídica. Por exemplo, pode a Câmara Municipal, que
integra a estrutura do Município, impetrar mandado de segurança contra ato do Prefeito
Municipal, sendo perfeitamente possível esta legitimação ativa e passiva. A interpretação da
legitimidade ativa no mandamus, diga-se, deve ser sempre o mais ampliativa possível, eis
que, como dito, é uma garantia constitucional, mais do que uma simples ação.
A prova pré-constituída dos fatos, portanto, deve ser sempre documental, e não
cabe, jamais, produção de prova qualquer no curso do rito do mandado de segurança.
A única exceção à prova pré-constituída vem estabelecida no § 1º do artigo 6º da
Lei 12.016/09:
“Art. 6º A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei
processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a
primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa
jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições.
§ 1º No caso em que o documento necessário à prova do alegado se ache em
repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a
fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício,
a exibição desse documento em original ou em cópia autêntica e marcará, para o
cumprimento da ordem, o prazo de 10 (dez) dias. O escrivão extrairá cópias do
documento para juntá-las à segunda via da petição.
§ 2º Se a autoridade que tiver procedido dessa maneira for a própria coatora, a
ordem far-se-á no próprio instrumento da notificação.
§ 3º Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado
ou da qual emane a ordem para a sua prática.
§ 4º (VETADO)
§ 5º Denega-se o mandado de segurança nos casos previstos pelo art. 267 da Lei
no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.
§ 6º O pedido de mandado de segurança poderá ser renovado dentro do prazo
decadencial, se a decisão denegatória não lhe houver apreciado o mérito.”
1.3. Prazo
Deve ser apontada como autoridade coatora, no writ, aquela que determinou a
prática do ato. Em regra, só pode figurar como autoridade coatora aquela que tem
atribuição decisória, e não o mero executor do ato. É claro que se se confundirem na
mesma figura, o executor e o ordenador, ele é quem será apontado no pólo passivo.
Há uma hipótese na qual o executor será equiparado a autoridade coatora, podendo
figurar no pólo passivo do mandamus: quando a ordem superior por ele executada for
manifestamente ilegal. Neste caso, o agente tinha o dever de não cumprir tal ordem, e se o
fez, estará equiparando-se à autoridade ordenadora.
Outra situação peculiar é quando o executor exacerba a atribuição que lhe foi
conferida. Neste caso, será ele a autoridade coatora, mas veja que, em verdade, não atuou
como executor: atuou por ânimo próprio, eis que a ordem por ele recebida não comandava
aquela atuação exacerbada. Por isso, não era, de fato, mero executor, respondendo como
autoridade coatora propriamente dita.
Quando se tratar de órgão colegiado, a autoridade coatora é o próprio órgão
colegiado, e não o seu presidente. O ato é exarado pelo órgão como um todo, em uma só
manifestação, pelo que é este órgão a autoridade que deve ser impetrada. Mesmo que o
órgão seja notificado na pessoa do seu presidente, o ato é do órgão como um todo, e por
isso é a ele que se dirige a impetração.
O § 1º deste artigo 1º equipara a autoridade pública os representantes de partidos
políticos. Esta equiparação já foi muito discutida na jurisprudência, e havia sido rejeitada,
porque a CRFB de 1988 passou a considerar os partidos políticos como entidades privadas,
naturalmente alheadas do Poder Público. Contudo, a lei veio para alterar o entendimento
maciço da jurisprudência e doutrina, reputando cabível o aponte do dirigente de partido
político como autoridade coatora.
Se se tratar de ato complexo, aquele que demanda manifestação de mais de uma
pessoa para que se produza, sem que nenhuma das manifestações seja tida por principal ou
acessória, a autoridade coatora será plural: são postos no pólo passivo todos os
manifestantes no ato, e não apenas aquele que por último manifestou, como entende parcela
menor da doutrina. No ato composto, por seu turno, em que há mais de uma manifestação,
mas uma é principal em relação às demais, é claro que a autoridade coatora é somente a que
praticou o ato principal.
“Súmula 267, STF: Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de
recurso ou correição.”
Quanto à decisão transitada em julgado, por sua vez, a situação é incontroversa: não
cabe mandado de segurança de forma alguma.
Quanto ao ato que desafie recurso administrativo, a situação é também complexa. O
artigo supra diz, no inciso I, que se há cabimento de recurso administrativo com efeito
suspensivo contra determinado ato, não é possível a impetração de mandado de segurança
contra este ato, criando perplexidade similar à da decisão judicial recorrível, só que com um
outro aspecto agravante a ser considerado: a questão do cerceamento do acesso à justiça.
Da forma que foi redigido, o dispositivo dá a entender que a via recursal
administrativa, se existente, é mandatória. Contudo, a interpretação que se amolda aos
preceitos constitucionais da unicidade de jurisdição e acesso à justiça é a de que, uma vez
pendente de julgamento em recurso administrativo que teve efeito suspensivo, não cabe,
contra aquele mesmo ato, a impetração do mandamus. Ou seja, não basta a potencialidade
do recurso administrativo com efeito suspensivo existir, é necessário que este tenha sido
interposto e esteja em curso com efeito suspensivo.
Vale dizer que este dispositivo foi repetido da revogada Lei 1.533/51, e nesta
vigência o dispositivo equivalente era repetidas vezes declarado inconstitucional. O
legislador quis incentivar a solução em esfera administrativa, mas não pode ser esta via
imposta, como parece ser, na interpretação literal do dispositivo.
1.7. Liminar
O inciso III do artigo 7º, supra, estabelece que a liminar pode ser concedida com ou
sem exigência de caução que ampare a sua reversibilidade, em caso de indeferimento final
da ordem.
Da decisão sobre a liminar, deferindo ou denegando-a, cabe agravo de instrumento,
conforme o § 1º do artigo em estudo, o que pôs fim a uma discussão antiga neste setor: a
Lei 1.533/51 não previa recurso da decisão que indeferiu a liminar, pelo que havia quem
sustentasse caber outro mandado de segurança, somente contra esta decisão denegatória,
porque seria irrecorrível. Outra corrente, que era majoritária, defendia que mesmo não
havendo previsão expressa na lei, esta decisão ainda comportava agravo de instrumento.
Esta acabou sendo, de fato, a opção legislativa.
A lei anterior estabelecia prazo de noventa dias, prorrogáveis por mais trinta. Hoje,
a liminar tem vigência até a sentença, como dispõe o artigo 7º, § 3º, supra. Se, na sentença,
o juiz denega a segurança, deverá revogar a liminar, no corpo da própria sentença.
Ante a natureza garantista do mandamus, há quem sustente que o juiz pode
conceder liminar diversa do pedido expresso pelo impetrante, se a adstrição ao pedido
expresso for insuficiente para resguardar o direito de que se pretende prevenir o
perecimento. Há, mesmo, quem entenda que a liminar possa ser concedida de ofício, pelo
mesmo fundamento.
O mandado de segurança tem prioridade de tramitação, perdendo em ordem apenas
para o habeas corpus. Isto acentua a nota de garantia constitucional do mandado de
segurança.
Sendo deferida a liminar, se o impetrante agir contrariamente ao que dele se espera,
o juiz decretará perempção ou caducidade da liminar, na forma do artigo 8º do novel
diploma:
A autoridade coatora recebeu uma obrigação legal adicional, quando notificada para
cumprimento da liminar, prevista no artigo 9º da Lei 12.016/09:
Foi criada a obrigação, mas não a sanção pelo seu descumprimento, pelo que não se
vê qual seja o resultado da desatenção a este comando.
A atuação do MP é imposta por lei, portanto, mas há quem entenda que há casos em
que não haveria interesse a legitimar esta oitiva. Com ou sem parecer, porém, os autos
serão conclusos.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Sim, não só pode, como deve: é exatamente por conta da natureza de garantia
constitucional do mandado de segurança que as formalidades processuais corriqueiras
devem ser relativamente postas de lado.
Questão 2
Resposta à Questão 2
Da decisão alvejada cabe recurso administrativo com efeito suspensivo, pelo que
sequer seria cabível o mandado de segurança, mas há quem entenda que não se pode tolher
o acesso ao Judiciário, pelo que seria possível a impetração.
Sendo considerado cabível, a autoridade coatora é a diretoria da companhia
estadual, e, por isso, a competência é a definida na legislação estadual de organização
judiciária.
Veja o REsp. 84.082:
“REsp 84082 / RS. DJ 01/07/1996 p. 24002. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO
DE SEGURANÇA CONTRA ATO PRATICADO POR SOCIEDADE DE
ECONOMIA MISTA. POSSIBILIDADE. CONCEITO DE AUTORIDADE - ART.
1. DA LEI N. 1.533/51. O CONCEITO DE AUTORIDADE PARA JUSTIFICAR
A IMPETRAÇÃO DO "MANDAMUS" E O MAIS AMPLO POSSIVEL E, POR
ISSO MESMO, A LEI AJUNTOU-LHE (AO MESMO CONCEITO), O
EXPLETIVO: "SEJA DE QUAL NATUREZA FOR". OS PRINCIPIOS
CONSTITUCIONAIS A QUE ESTA SUJEITA A ADMINISTRAÇÃO DIRETA E
INDIRETA (INCLUIDAS AS SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA)
IMPOEM A SUBMISSÃO DA CONTRATAÇÃO DE OBRAS E SERVIÇOS
PUBLICOS AO PROCEDIMENTO DA LICITAÇÃO, INSTITUTO
JURIDICIZADO COMO DE DIREITO PUBLICO. OS ATOS DAS ENTIDADES
DA ADMINISTRAÇÃO (DIRETA OU INDIRETA) CONSTITUEM ATIVIDADE
DE DIREITO PUBLICO, ATOS DE AUTORIDADE SUJEITOS AO DESAFIO
PELA VIA DA AÇÃO DE SEGURANÇA. "IN CASU", A COMPANHIA
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema IV
Mandado de segurança II. As condições da ação mandamental. A legitimação ativa e passiva no mandado de
segurança individual e no coletivo. A autoridade coatora. As informações. Litisconsórcio e assistência no
mandado de segurança.
Notas de Aula4
1. Mandado de segurança
4
Aula ministrada pelo professor Cláudio Brandão de Oliveira, em 10/8/2009.
“(...)
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e
em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus
membros ou associados;
(...)”
“Art. 21. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido
político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses
legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização
sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos
da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus
estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto,
autorização especial.
Parágrafo único. Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo
podem ser:
I - coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os transindividuais, de
natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre
si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica;
II - individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os
decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade
ou de parte dos associados ou membros do impetrante.”
desistido do individual em trinta dias depois da ciência da impetração do coletivo que lhe
alcance.
1.5. Competência
“Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
(...)
IV os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data , quando o ato
questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)
(...)”
Ora, a sociedade de economia mista não está no rol do inciso I do artigo supra, pelo
que é dada a competência para suas causas à Justiça Estadual, mas a autoridade federal está
na previsão do inciso VIII, e a redação do artigo 2º da Lei 12.016/09, acima, considera
autoridade federal aquela que represente entidade controlada pela União. Sendo assim, o
mandado de segurança impetrado contra ato de dirigente de sociedade de economia mista
controlada pela União terá a competência sediada na Justiça Federal, em se observando esta
nova previsão do artigo 2º do novel diploma.
A perplexidade se dá pela segmentação procedida: as ações regulares que envolvam
sociedades de economia mista da União são de competência da Justiça Estadual, enquanto
os mandados de segurança contra atos desta mesma sociedade são de competência da
Justiça Federal, porque são atos praticados por autoridade federal, nos termos da nova lei.
Pelo ensejo, as empresas públicas e sociedades de economia mista integram a
administração pública indireta, mas são pessoas jurídicas de direito privado. Por isso, só é
cabível mandado de segurança para controlar atos praticados por dirigentes destas empresas
quando a natureza do ato se relacionar com alguma atribuição do Poder Público. Por
exemplo, uma ingerência ilegal de um dirigente de um banco público sobre uma conta-
corrente por ele gerenciada não desafia mandado de segurança, mas a preterição em
concurso público para ingresso neste mesmo banco enseja o mandamus, pois o respeito à
ordem do concurso é atribuição de caráter público. Esta dinâmica se encontra prevista no §
2º do artigo 1º da Lei 12.016/09, já transcrito.
Se o ato coator foi praticado por uma determinada autoridade, mas o seu superior
avocou a competência para o ato antes da impetração do mandado, este passa a ser a
autoridade a ser apontada como coatora. Se a avocação se der após a impetração do
mandamus, porém, não haverá relevância para definição do juízo competente: a avocação
posterior do ato não pode deslocar a competência definida inicialmente. Mesmo encampado
o ato, não se desloca a competência.
Há entendimento de que se o impetrante apontar erroneamente a autoridade
responsável pelo ato, o juiz deve notificar a real autoridade coatora, e se a competência for
outra, deve remeter para lá os autos. Assim o é porque, por vezes, a estrutura da
administração pública torna difícil a identificação, pelo impetrante, de quem seja a
autoridade a ser apontada. Mas há quem defenda que, no erro do aponte da autoridade pelo
impetrante, o processo deveria ser extinto – o que não se coaduna com a natureza de
garantia do mandamus.
“Art. 26. Constitui crime de desobediência, nos termos do art. 330 do Decreto-Lei
no 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o não cumprimento das decisões proferidas
em mandado de segurança, sem prejuízo das sanções administrativas e da
aplicação da Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950, quando cabíveis.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Veja o RE 196.184:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Tema V
Mandado de segurança III. O ato impugnado. O prazo para propositura da ação. A liminar. O Ministério
Público no mandado de segurança. A sentença: natureza jurídica. Encargos da sucumbência.
Notas de Aula5
Este diploma recém publicado veio substituir todas as normas que versavam
especificamente sobre o mandado de segurança, concentrando em si toda a regulamentação
desta ação constitucional. É importante, portanto, proceder a uma análise breve de todas as
alterações e possíveis repercussões desta nova lei, revendo os artigos pontualmente.
O artigo 1º já apresenta inovações:
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Aula ministrada pelo professor Wilson Marques, em 11/8/2009.
outra previsão que seria dispensável, eis que a própria natureza da definição de legitimação
ordinária permitiria concluir o que ali está escrito.
Avançando para o artigo 4º da Lei 12.016/09, vê-se, aí sim, uma boa inovação:
“Art. 6º A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei
processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a
primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa
jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições.
§ 1º No caso em que o documento necessário à prova do alegado se ache em
repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a
fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício,
“Art. 10. A inicial será desde logo indeferida, por decisão motivada, quando não
for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou
quando decorrido o prazo legal para a impetração.
§ 1º Do indeferimento da inicial pelo juiz de primeiro grau caberá apelação e,
quando a competência para o julgamento do mandado de segurança couber
originariamente a um dos tribunais, do ato do relator caberá agravo para o órgão
competente do tribunal que integre.
§ 2º O ingresso de litisconsorte ativo não será admitido após o despacho da
petição inicial.”
“Art. 12. Findo o prazo a que se refere o inciso I do caput do art. 7º desta Lei, o
juiz ouvirá o representante do Ministério Público, que opinará, dentro do prazo
improrrogável de 10 (dez) dias.
“Art. 499. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro
prejudicado e pelo Ministério Público.
(...)”
Repare que pode acontecer de a autoridade coatora ter interesse jurídico, como
quando a ilegalidade do ato repercutir em responsabilidade civil para esta autoridade. Neste
caso, estará amoldado ao conceito de terceiro prejudicado, mas se for o caso o próprio
artigo 499 do CPC autorizaria a legitimidade recursal, sendo despicienda a previsão do
artigo 14, § 2º, da Lei 12.016/09. De qualquer forma, a legitimação desta lei especial não
faz diferença, legitimando todas as autoridades, interessadas juridicamente ou não.
O artigo 17 da lei em tela visa a salvaguardar o direito de demoras causadas pela
tramitação fática do processo: se a publicação da decisão demorar a ocorrer, por mora na
feitura do acórdão ou qualquer motivo extrínseco, as notas taquigráficas serão publicadas
no lugar do próprio acórdão. Veja:
“Art. 16. Nos casos de competência originária dos tribunais, caberá ao relator a
instrução do processo, sendo assegurada a defesa oral na sessão do julgamento.
Parágrafo único. Da decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar
caberá agravo ao órgão competente do tribunal que integre.”
Este dispositivo diz exatamente o contrário do que é posto na súmula 622 do STF:
“Súmula 622, STF: Não cabe agravo regimental contra decisão do relator que
concede ou indefere liminar em mandado de segurança.”
A lei revogou, com muito acerto, esta súmula acima, porque qualquer decisão do
relator desafia agravo, no caso o inominado, ou regimental quando a lei nada diz.
O artigo 18 da Lei 12.016/09 é mais uma previsão dispensável, porque se limita a
repetir o cabimento de recursos que já é a regra geral, prevista inclusive na CRFB:
“Art. 19. A sentença ou o acórdão que denegar mandado de segurança, sem decidir
o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos
e os respectivos efeitos patrimoniais.”
“Art. 21. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido
político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses
legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização
sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos
da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus
Ali se vêem os direitos que podem ser tutelados por mandado de segurança coletivo,
e se percebe que os direitos difusos, outrora tutelados nesta via, não são mais, restando o
mandado coletivo dedicado aos direitos coletivos e aos transindividuais homogêneos.
Novidade que se vê no mandado de segurança coletivo é a que vem prevista no
caput do artigo 22 desta Lei 12.016/09:
O artigo 25 da Lei 12.016/09 concentra duas regras que são, em verdade, péssimas
opções legislativas:
“Art. 26. Constitui crime de desobediência, nos termos do art. 330 do Decreto-Lei
no 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o não cumprimento das decisões proferidas
em mandado de segurança, sem prejuízo das sanções administrativas e da
aplicação da Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950, quando cabíveis.”
“Desobediência
Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:
Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.”
“Prevaricação
Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-
lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento
pessoal:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.”
O artigo 29 do novel diploma revogou todas as normas que tratavam do mandado de
segurança, cujos ditames, em verdade, foram praticamente todos englobados no corpo da
Feita a análise legal, passemos ao estudo dos pontos de maior indagação sobre o
writ of mandamus.
um verdadeiro impropério: o réu nunca foi ou será a autoridade coatora, e sim a entidade
que ela presenta. Sendo assim, se a parte é a mesma, como no caso exemplificado – o
Estado do Rio de Janeiro –, não importa quem foi apontado: o réu é legítimo, quem quer
que tenha sido apontado pelo impetrante. O direito do impetrante é oponível ao réu, à parte
do processo, e não à autoridade apontada como coatora6.
Se a autoridade que deveria ter sido apontada como coatora determinaria a mesma
competência que a autoridade que foi efetivamente apontada, não há conseqüências
maiores: o julgador simplesmente determinará a notificação para solicitação de informações
à verdadeira autoridade coatora, dando seguimento ao processo. Outrossim, se a correção
no aponte da autoridade for provocar alteração da competência, ainda que não haja
ilegitimidade, há incompetência, pelo que os autos deverão ser remetidos ao juízo
competente, que é o que dará prosseguimento ao feito, notificando a correta autoridade para
prestação de informações.
É considerada autoridade coatora, nos termos do § 3º do artigo 6º da lei em estudo,
já transcrito, aquela que tenha praticado o ato ou que tenha proferido a ordem para que o
ato tenha sido praticado, quem teve o poder de determinar ou ordenar a prática do ato. Não
se insere neste conceito de autoridade coatora o legislador de lei inconstitucional, porque
mesmo que ele tenha produzido a norma: é autoridade coatora aquele que, em função desta
norma, praticou ou ordenou determinado ato concreto atentatório ao direito líquido e certo.
Da mesma forma, aquele que emite um parecer contrário ao direito não é autoridade
coatora: somente será assim considerado aquele que, em razão do parecer, praticou ou
ordenou a prática de um ato ilegal.
É por conta dessa lógica que não se admite, como é cediço, a impetração de
mandado de segurança contra lei em tese, pois não há violação concreta por esta lei a
direito líquido e certo algum, ante a abstração e genericidade da lei. D’outrarte, a chamada
lei de efeitos concretos, formalmente lei mas materialmente ato administrativo, pode
impingir violação direta ao direito de alguém, e se o fizer poderá, sim, ser alvejada por
mandamus.
Outra questão que se coloca, ainda pertinente ao aponte da autoridade coatora, é a
definição dos atos complexos e compostos. O ato complexo é aquele que é decomponível
em vários outros: a investidura de alguém em cargo público é um bom exemplo, eis que a
nomeação, a posse, e outros atos prévios, conformam a investidura como ato completo. Nos
atos desta espécie, como são diversas as autoridades que contribuíram para a formação do
ato, determina-se a competência, ou seja, elege-se como autoridade coatora, aquela
autoridade maior que emitiu participação no ato complexo. Não há hierarquia entre os
diversos atos, mas se elege a autoridade maior que tenha ali atuado.
O ato composto, por seu turno, é aquele que não se decompõe em outros atos
segmentares: é um só ato, mas a sua efetividade, eficácia, depende de aprovação de uma
autoridade superior, e, por esta dinâmica, a autoridade maior será a apontada como coatora.
Como exemplo, se um secretário de Estado emite uma portaria, a qual precisa ser aprovada
pelo Governador, é este último que, aprovando-a, será apontado como autoridade coatora.
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Diferente será o caso em que se apontar como autoridade coatora pessoa que represente outra entidade, outra
pessoa jurídica, diversa daquela em cujo âmbito se deu a produção do ato coator: neste caso haverá clara
ilegitimidade passiva, por erro teratológico na eleição do pólo passivo, ensejando a extinção sem resolução do
mérito. Por exemplo, se o impetrante ajuíza mandado de segurança em face do Estado, reclamando de coação
ilegal por parte de ato do Prefeito.
2.1. Prazo
Voltando ao aspecto do prazo, em que pese a afirmação, mais acertada, de que seria
uma restrição inconstitucional à garantia que é a natureza do mandamus, há até mesmo
súmula do STF amparando esta limitação, como se vê no enunciado 632 desta Corte:
“Súmula 632, STF: É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a
impetração de mandado de segurança.”
Sendo assim, é necessário definir como se conta este prazo. O início do prazo é da
ciência do ato, e não do ato em si, pois a pretensão mandamental só nasce quando o
prejudicado tem ciência do ato. Havendo pedido de reconsideração, diga-se, o prazo corre
mesmo da ciência original do ato, e não da negativa da reconsideração, porque este pedido
não suspende ou interrompe o curso do prazo de cento e vinte dias.
Diferentemente ocorre quando, acompanhando o pedido de reconsideração, há o
chamado recurso hierárquico, como alternativa em caso de negativa da reconsideração – o
reclamante pede que seja reconsiderado, e sucessivamente, se não o for, que receba tal
pedido como recurso hierárquico. Recebido o recurso, o ato coator passará a ser a decisão
deste recurso que mantiver a coação, ou seja, tal como no efeito substitutivo dos recursos
judiciais, o primeiro ato, recorrido, deixa de existir, e passa a ser ato coator a decisão que o
substituir. Conseqüentemente, a autoridade revisora, julgadora do recurso, será agora
reconhecida como autoridade coatora naquele ato.
Quando o ato coator for omissivo, simplesmente não se conta o prazo, porque a
coação, consubstanciada na omissão, se renova a todo tempo, enquanto a omissão perdurar.
2.2. Liminar
A liminar não pode ser concedida ex officio. Mesmo que a lei não seja expressa em
negar ou autorizar esta atuação de ofício, a regra geral é a inércia do Judiciário, pelo que
somente seria possível a concessão de ofício se a lei expressamente autorizasse.
Neste sentido, sequer a concessão de providência liminar diferente da que foi
especificamente requerida será possível. Isto porque se o juiz conceder medida diversa da
requerida, porque entende que será mais adequada e eficaz, estará atuando de forma extra
petita, o que equivale a um atuar de ofício, restrito à parte que concedeu de forma a
extrapolar o pedido.
A vedação à concessão de liminares, presente de forma esparsa em diversas normas,
e para diversas situações diferentes, casuísticas até, está presente de forma concentrada na
nova lei, como visto. Persiste, no entanto, a seguinte crítica: é constitucional qualquer
vedação à concessão de liminares no mandado de segurança?
O melhor entendimento é de que é, de fato, inconstitucional esta vedação. Isto
porque a lei proibitiva da liminar está, em verdade, impedindo o juiz de dar cumprimento
ao que a própria CRFB exige, quando determina que a proteção ao direito seja garantida
pelo mandado de segurança. Ao impedir que a liminar seja possível, a lei está impedindo,
por vezes, que o mandado de segurança tenha qualquer eficácia, enquanto garantia contra
ato lesivo de direito líquido e certo.
A decisão concessiva ou denegatória da liminar, pelo relator, desafia agravo
inominado, como visto. Isto pôs fim à discussão ferrenha sobre o cabimento do agravo
contra esta decisão, sendo que o descabimento chegou a ser sumulado pelo STF, no
enunciado 622 desta Corte, já transcrito – que está superado, portanto. Da mesma forma, a
decisão liminar do juiz, em qualquer sentido, hoje comporta agravo de instrumento.
A eficácia da liminar, como visto, encontra limitador temporal na lei: é vigente até a
sentença. Ocorre que este limitador não é a melhor opção, porque a lógica da dinâmica
processual exigiria a necessidade de manutenção dos efeitos da liminar até o trânsito em
julgado, e não até a mera prolação da sentença – como o já abordado artigo 807 do CPC
indica. Veja a súmula 405 do STF, que acabou sendo a orientação adotada na lei,
tristemente:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Martinho Martins da Silva, policial militar, foi punido, através do Decreto XX.YZY
de 03/07/2000, como se fora um policial da chamada "banda podre", mesmo diante do fato
de ter o inquérito, que ensejou a punição, sido arquivado a requerimento do Ministério
Público. Irresignado com a situação impetrou mandado de segurança, em 05/06/2003,
figurando como autoridade coatora o Exmo. Sr. Governador do Estado de Sapucaia, com o
fim de desconstituir o ato administrativo que o colocou em disponibilidade, reintegrando-o
aos quadros de sua corporação. Liminar indeferida. O Estado de Sapucaia manifestou-se
argüindo litispendência por ter o impetrante ingressado, no mesmo dia, com dois
mandados de segurança, com o mesmo pedido e causa de pedir, estando um deles
tramitando na Vara de Fazenda, requerendo a extinção do feito. Informações não foram
prestadas. Pergunta-se:
1) Quais as hipóteses de decretos em que será cabível o mandado de segurança?
Esclareça sobre as espécies de atos em que é cabível o mandado de segurança.
2) É cabível mandado de segurança contra ato jurisdicional do Supremo Tribunal
Federal?
3) Quais os requisitos necessários para concessão de medida liminar em mandado
de segurança?
4) Decida a questão.
Resposta à Questão 2
2) Aqui surge uma certa perplexidade. O STF entende que não é cabível mandado
de segurança contra qualquer ato seu, do pleno ou de fracionários. Ocorre que a
CRFB, no artigo 102, I, “d”, fine, dá competência ao STF para julgar mandado
de segurança contra ato do próprio STF:
Tema VI
Notas de Aula7
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Aula ministrada pelo professor Wilson Marques, em 11/8/2009.
“Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa
julgada:
I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de
provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com
idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do
parágrafo único do art. 81;
II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo
improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando
se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;
III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as
vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.
§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão
interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria
ou classe.
§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os
interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão
propor ação de indenização a título individual.
§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da
Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por
danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste
código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que
poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.
§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.”
2. Recursos
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
a) Sim, pois são independentes, devendo ser observados os critérios dos artigos
103 e 104 do CDC.
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema VII
Notas de Aula8
1. Mandado de injunção
“(...)
LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma
regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais
e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;
(...)”
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Aula ministrada pela professora Flávia Bahia Martins, em 14/8/2009.
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Omissões administrativas e judiciais se resolvem por vias próprias, jamais por meio de mandado de
injunção.
alheios à gama fundamental não são passíveis de terem sua efetividade propugnada em
mandado de injunção.
Materialmente, é preciso que a petição inicial deste remédio traga de forma explícita
o seguinte binômio: a impossibilidade de exercício do direito fundamental e a inexistência
da lei que o faria possível.
Ademais, se o indivíduo não está em circunstância que o coloque sob direta
titularidade do direito que pretende defender, não lhe assistirá interesse de agir no mandado
de injunção. Por exemplo, não é possível que um desempregado busque, por meio de
mandado de injunção, a efetivação da norma constitucional que garante o aviso-prévio
proporcional, norma esta que carece de regulamentação ainda hoje: se não é empregado
celetista, aos quais se dirige a norma constitucional em questão, falta-lhe interesse de agir
pedindo tal norma, bem como falta-lhe também legitimidade ad causam para tanto.
A legitimidade ativa do mandado de injunção individual, pelo ensejo, incumbe a
qualquer pessoa natural ou jurídica cujo direito fundamental esteja à míngua de
regulamentação. A legitimidade do mandado de injunção coletivo, por seu turno, vem
consignada no artigo 21 da Lei do Mandado de Segurança, Lei 12.016/09, que como dito se
aplica por analogia, além do inciso LXX do artigo 5º da CRFB:
“(...)
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e
em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus
membros ou associados;
(...)”
“Art. 21. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido
político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses
legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização
sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em
funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos
da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus
estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto,
autorização especial.
Parágrafo único. Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo
podem ser:
I - coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os transindividuais, de
natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre
si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica;
II - individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os
decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade
ou de parte dos associados ou membros do impetrante.”
Veja que se exige que o partido político tenha representação no Congresso Nacional
para ter legitimidade para o mandado de injunção coletivo, e se entende que esta
representação é configurada em havendo apenas um deputado federal ou senador eleito.
Além disso, o uso do mandado de injunção coletivo demanda, para os partidos políticos, a
pertinência temática, eis que só pode defender direito do próprio partido ou de seus
filiados, como diz a nova norma do mandado de segurança, supra (o que é uma inovação
extremamente restritiva, porque antes da nova lei do mandamus não havia esta necessidade
de demonstração de pertinência temática).
Em suma, o mandado de injunção coletivo pode ser ajuizado pelos mesmos
legitimados para o mandamus coletivo, e com as mesmas restrições, os quais atuarão como
substitutos processuais, desnecessária qualquer autorização expressa dos associados para
ajuizamento da ação.
A respeito, veja o MI 361:
feito para suprir a mora legislativa da autoridade que tem a iniciativa privativa sobre o
tema. Sendo matéria concorrente, porém, a Mesa do Congresso compõe o pólo passivo.
Em suma, no pólo passivo do mandado de injunção teremos o Poder, órgão,
entidade ou autoridade que tenha o dever de regulamentar a norma constitucional, e de
acordo com o STF, se a matéria for de iniciativa reservada, o pólo passivo vai ser composto
por quem deveria ter apresentado o projeto e ainda não o fez.
1.2. Cautelar
1.3. Competência
Este tema tem sido aquele em que se têm observado as mais significativas
mudanças no mandado de injunção.
Por muito tempo, o STF entendeu que não poderia se imiscuir na atividade
legislativa jamais, em apreço à separação de poderes. Por isso, não poderia aplicar normas
para suprir omissões legislativas, tampouco fixar prazos para que o legislador as suprisse.
Por quase vinte anos esta foi a posição do STF, desde a CRFB de 1988. No esteio deste
entendimento, então, a decisão do STF se limitava a declarar a mora legislativa, não tendo
absolutamente nenhum efeito prático, tal decisão, sobre a situação concreta posta em juízo,
tampouco propugnando forçosamente a formulação da regra ausente. Trata-se da clássica
posição não concretista geral do STF, que pode ser vista nos julgados do MI 20 e MI 168:
que o di reito de greve dos servidores públicos civis continua sem receber
tratamento legislativo minimamente satisfatório para garantir o exercício dessa
prerrogativa em consonância com imperativos constitucionais. 3.3. Tendo em vista
as imperiosas balizas jurídico-políticas que demandam a concretização do direito
de greve a todos os trabalhadores, o STF não pode se abster de reconhecer que,
assim como o controle judicial deve incidir sobre a atividade do legislador, é
possível que a Corte Constitucional atue também nos casos de inatividade ou
omissão do Legislativo. 3.4. A mora legislativa em questão já foi, por diversas
vezes, declarada na ordem constitucional brasileira. Por esse motivo, a
permanência dessa situação de ausência de regulamentação do direito de greve dos
servidores públicos civis passa a invocar, para si, os riscos de consolidação de uma
típica omissão judicial. 3.5. Na experiência do direito comparado (em especial, na
Alemanha e na Itália), admite-se que o Poder Judiciário adote medidas normativas
como alternativa legítima de superação de omissões inconstitucionais, sem que a
proteção judicial efetiva a direitos fundamentais se configure como ofensa ao
modelo de separação de poderes (CF, art. 2o). 4. DIREITO DE GREVE DOS
SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS. REGULAMENTAÇÃO DA LEI DE GREVE
DOS TRABALHADORES EM GERAL (LEI No 7.783/1989). FIXAÇÃO DE
PARÂMETROS DE CONTROLE JUDICIAL DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE
GREVE PELO LEGISLADOR INFRACONSTITUCIONAL. 4.1. A disciplina do
direito de greve para os trabalhadores em geral, quanto às "atividades essenciais", é
especificamente delineada nos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Na hipótese de
aplicação dessa legislação geral ao caso específico do direito de greve dos
servidores públicos, antes de tudo, afigura-se inegável o conflito existente e ntre as
necessidades mínimas de legislação para o exercício do direito de greve dos
servidores públicos civis (CF, art. 9o, caput, c/c art. 37, VII), de um lado, e o
direito a serviços públicos adequados e prestados de forma contínua a todos os
cidadãos (CF, art. 9o, §1o), de outro. Evidentemente, não se outorgaria ao
legislador qualquer poder discricionário quanto à edição, ou não, da lei
disciplinadora do direito de greve. O legislador poderia adotar um modelo mais ou
menos rígido, mais ou menos restritivo do direito de greve no âmbito do serviço
público, mas não poderia deixar de reconhecer direito previamente definido pelo
texto da Constituição. Considerada a evolução jurisprudencial do tema perante o
STF, em sede do mandado de injunção, não se pode atribuir amplamente ao
legislador a última palavra acerca da concessão, ou não, do direito de greve dos
servidores públicos civis, sob pena de se esvaziar direito fundamental positivado.
Tal premissa, contudo, não impede que, futuramente, o legislador
infraconstitucional confira novos contornos acerca da adequada configuração da
disciplina desse direito constitucional. 4.2 Considerada a omissão legislativa
alegada na espécie, seria o caso de se acolher a pretensão, tão-somente no sentido
de que se aplique a Lei no 7.783/1989 enquanto a omissão não for devidamente
regulamentada por lei específica para os servidores públicos civis (CF, art. 37,
VII). 4.3 Em razão dos imperativos da continuidade dos serviços públicos,
contudo, não se pode afastar que, de acordo com as peculiaridades de cada caso
concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao
tribunal competente impor a observância a regime de greve mais severo em razão
de tratar-se de "serviços ou atividades essenciais", nos termos do regime fixado
pelo s arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Isso ocorre porque não se pode deixar de
cogitar dos riscos decorrentes das possibilidades de que a regulação dos serviços
públicos que tenham características afins a esses "serviços ou atividades
essenciais" seja menos severa que a disciplina dispensada aos serviços privados
ditos "essenciais". 4.4. O sistema de judicialização do direito de greve dos
servidores públicos civis está aberto para que outras atividades sejam submetidas a
idêntico regime. Pela complexidade e variedade dos serviços públicos e atividades
estratégicas típicas do Estado, há outros serviços públicos, cuja essencialidade não
está contemplada pelo rol dos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Para os fins desta
Não significa que o STF, hoje, seja absolutamente concretista, geral ou individual,
em sede de mandado de injunção. Significa, isto sim, que esta Corte está em uma fase de
transição que certamente se encaminha para a concretude ampla das decisões neste
instrumento.
Vale a síntese: a posição clássica do STF, em sede de mandado de injunção, é a não
concretista geral, que, em nome da separação de poderes, impedia o Judiciário de suprir a
omissão da norma faltante, e também de determinar prazo para o legislador legislar sobre a
carência, restando a sentença com mero efeito declaratório da mora legislativa do poder
omisso. A posição concretista geral, por seu turno, defende que o Poder Judiciário pode
solucionar a omissão legislativa, atuando como legislador positivo, com a sua
regulamentação produzindo efeitos erga omnes. Por fim, a posição concretista individual
determina que o juiz possa criar lei para o caso específico, tendo a decisão efeitos
subjetivos inter partes, individualizadamente concretos.
“Direito de Greve
O Tribunal julgou três mandados de injunção impetrados, respectivamente, pelo
Sindicato dos Servidores da Polícia Civil no Estado do Espírito Santo -
SINDIPOL, pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de João
Pessoa - SINTEM, e pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do
Estado do Pará - SINJEP, em que se pretendia fosse garantido aos seus associados
o exercício do direito de greve previsto no art. 37, VII, da CF ("Art. 37. ... VII - o
direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei
específica;"). O Tribunal, por maioria, conheceu dos mandados de injunção e
propôs a solução para a omissão legislativa com a aplicação, no que couber, da Lei
7.783/1989, que dispõe sobre o exercício do direito de greve na iniciativa privada.
(MI 670/ES, rel. orig. Min. Maurício Corrêa, rel. p/ o acórdão Min. Gilmar
Mendes, 25.10.2007; MI 708/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.10.2007; MI
712/PA, rel. Min. Eros Grau, 25.10.2007)”
lei”), e, por maioria, estabeleceu o prazo de 18 meses para que este adote todas as
providências legislativas ao cumprimento da referida norma constitucional. (ADI
3682/MT, rel. Min. Gilmar Mendes, 9.5.2007)”
2. Habeas data
“(...)
LXXII - conceder-se-á "habeas-data":
a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante,
constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de
caráter público;
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso,
judicial ou administrativo;
(...)”
O habeas data veio no esteio das mudanças políticas antecedentes da nova ordem
constitucional, como forma de permitir o acesso a cadastros informativos detidos pelo
Governo, mantidos especialmente inacessíveis durante a ditadura militar. Nosso habeas
data tem inspiração no norte-americano freedom of information act, de 1974.
Segundo o teor do dispositivo constitucional supra, o habeas data tem duas funções:
a abertura do conhecimento dos dados do impetrante, ou a retificação de informações
pessoais nos cadastros públicos. Mas há ainda uma terceira finalidade, esta prevista apenas
no artigo 7º, III, da Lei 9.507/97: a adição, complementação de informações ao cadastro do
impetrante. Veja:
II - para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso,
judicial ou administrativo;
III - para a anotação nos assentamentos do interessado, de contestação ou
explicação sobre dado verdadeiro mas justificável e que esteja sob pendência
judicial ou amigável.”
“Art. 1º (VETADO)
Parágrafo único. Considera-se de caráter público todo registro ou banco de dados
contendo informações que sejam ou que possam ser transmitidas a terceiros ou que
não sejam de uso privativo do órgão ou entidade produtora ou depositária das
informações.”
Sobre isto, veja o RE 165.304, em que o STF entendeu que o conteúdo de ficha
cadastral de empregados de empresa privada não podem ser acessados por via de habeas
data:
“Súmula 2, STJ: Não cabe o habeas data (CF, art. 5., LXXII, letra "a") se não
houve recusa de informações por parte da autoridade administrativa.”
“Art. 8° A petição inicial, que deverá preencher os requisitos dos arts. 282 a 285 do
Código de Processo Civil, será apresentada em duas vias, e os documentos que
instruírem a primeira serão reproduzidos por cópia na segunda.
Parágrafo único. A petição inicial deverá ser instruída com prova:
I - da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de dez dias sem
decisão;
II - da recusa em fazer-se a retificação ou do decurso de mais de quinze dias, sem
decisão; ou
III - da recusa em fazer-se a anotação a que se refere o § 2° do art. 4° ou do
decurso de mais de quinze dias sem decisão.”
E repare que não se exige que haja qualquer certidão da recusa ao acesso à
informação pelo impetrado; basta que haja a recusa tácita, ocorrida na demora superior ao
prazo ali previsto – dez ou quinze dias após o pedido administrativo – para restar
comprovada a intentada, bastante a configurar o interesse de agir.
Em suma, para o STF, o teor da súmula 2 do STJ e o artigo 8º da Lei 9.507/97 não
violam o amplo acesso à justiça, tendo em vista que a comprovação da recusa, em âmbito
administrativo, serve para comprovar o interesse de agir, uma das condições da ação.
A liminar é perfeitamente cabível no habeas data, bastando o preenchimento dos
requisitos gerais da urgência, o periculum in mora e o fumus boni juris.
A competência para julgamento do habeas data será fixada tal como a do habeas
corpus, ou seja, é ratione materiae, determinada em função da autoridade impetrada.
Aplicam-se os artigos 102, I, “d”, e 105, I, “b”, da CRFB:
Casos Concretos
Questão 1
especial, que trabalham em sistema de plantões, que incluem parte da jornada em diurno e
parte em período noturno, não vêm sendo remunerados corretamente. Assim, através do
presente visa-se a obter o reconhecimento da omissão apontada e, bem assim, a mora
legislativa quanto à regulamentação do dispositivo constitucional consubstanciado no art.
83, V, da referida Carta Estadual, concedendo-se prazo ao Poder Público para promover
os atos indispensáveis à regulamentação já mencionada, de modo a permitir a aplicação
efetiva do direito ao adicional noturno aos servidores civis estaduais que exerçam cargo de
auxiliar técnico de enfermagem. Estudada a hipótese, responda de forma fundamentada:
a) O impetrante tem legitimidade ativa para ajuizar o mandado de injunção?
b) O Sindicato necessita de autorização expressa para a representação judicial dos
seus associados?
c) É admissível a tutela coletiva na via do mandado de injunção?
Resposta à Questão 1
b) Não, pois como é substituto processual dos seus filiados, já tem poder de
representação judicial pelos direitos comuns a todos.
Questão 2
O Deputado Federal Nilson Agripino impetrou Habeas Data perante o STF com o
objetivo de "assegurar o conhecimento de informações relativas à sua pessoa, constantes
dos autos do Inquérito Policial nº 2.500 - 1/140, desse E. Tribunal". Narra a inicial que o
ora impetrante foi intimado por autoridade policial federal para "prestar esclarecimentos
sobre fatos em apuração relacionados à Operação Sanguessuga", sendo que "referidos
autos não foram disponibilizados para cópia e integral acesso pela defesa", apesar de ter
protocolado requerimento nesse sentido. Requer, em síntese, seja concedida "a ordem para
que a autoridade policial forneça a cópia do referido inquérito, sob pena de cerceamento
da ampla defesa e do contraditório". À luz do ordenamento constitucional vigente,
responda aos seguintes questionamentos:
1) O STF possui competência para julgar o habeas data no caso sob comento?
2) O teor do enunciado nº 2 da Súmula do STJ, fere o princípio do amplo acesso à
justiça?
3) Em face da negativa na prestação do direito de certidão, o remédio
constitucional judicial adequado é o habeas data ?
Resposta à Questão 2
2) Não: ali se prevê que não há cabimento por conta da simples falta de interesse,
ante a falta de pretensão resistida. Assim como a própria Lei 9.507/97, no artigo
8º, esta previsão é escorreita, porque sequer exige que haja qualquer
manifestação negativa expressa por parte da administração, bastando sua inércia
por dez ou quinze dias para que a ação seja interessante.
“HD 73, STF: 1. Cuida-se de habeas data impetrado pelo Deputado Federal Nilton
Balbino com o objetivo de “assegurar o conhecimento de informações relativas a
sua pessoa, constantes dos autos do Inquérito Policial nº 2.328 – 1/140, desse E.
Tribunal” (fl. 02). Narra a inicial que o ora impetrante foi intimado por autoridade
policial para “prestar esclarecimentos sobre fatos em apuração relacionados à
Operação Sanguessuga” (fl. 03), sendo que “referidos autos não foram
disponibilizados para cópia e integral acesso pela defesa” (fl. 03), apesar de ter
protocolado requerimento nesse sentido (fls. 09/10). Requer, em síntese, seja
concedida “a ordem para que a autoridade policial forneça a cópia do referido
inquérito, sob pena de cerceamento da ampla defesa e do contraditório” (fl. 15).
2. O Supremo Tribunal Federal somente possui competência para processar e
julgar originariamente o habeas data contra atos praticados pelas autoridades
inscritas no rol do art. 102, I, d, da Constituição Federal, no qual não se encontra o
ora impetrado, Delegado de Polícia Federal. Sendo, portanto, manifesta a
Questão 3
Resposta à Questão 3
2) Sim: mesmo que a Lei 9.507/97 não contemple esta possibilidade expressamente,
se comprovada a cautelaridade, é perfeitamente possível.
“(...)
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
(...)”
A diferença entre a ação penal pública e a ação cível pública reside apenas na
matéria que é tratada em cada uma, sendo que ambas são dedicadas à proteção do bem
comum – na penal a segurança pública, e na cível quaisquer outros bens coletivos ou
difusos. Assim sendo, se o MP pode buscar suporte fático para a promoção da ação civil
pública diretamente, porque não o poderia na ação penal? é por isso que este é um
argumento sólido a favor do exercício da polícia judiciária pelo MP.
Há ainda que se mencionar como fundamento a previsão do artigo 129, IX, da
CRFB:
“(...)
IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com
sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de
entidades públicas.
(...)”
Tema VIII
Ação civil pública I. Bens tutelados. Competência do foro e do juízo. Objeto da ação. Tutela preventiva.
Condições da ação.
Notas de Aula10
Os interesses tutelados nos processos coletivos são peculiares a esta seara. O CDC é
o diploma que indica quais serão os interesses a serem protegidos de forma coletiva. Veja o
artigo 81 do codex consumerista:
“Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá
ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou
classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica
base;
10
Aula ministrada pelo professor Marco Antônio dos Santos Rodrigues, em 12/8/2009.
Cumpre desde logo apontar a diferenciação entre interesses e direitos, que parece ter
sido feita pelo legislador, no artigo supra. A doutrina majoritária defende que não há
qualquer diferença, pois interesses nada mais seriam do que direitos que são garantidos pela
legislação, leis e Constituição. Minoritariamente, porém, há quem faça diferença entre
interesses e direitos, porque os primeiros não seriam dotados de coercibilidade, enquanto os
segundos sim. Prevalece a tese pela sinonímia, porém.
Dito isto, vejamos cada uma das espécies de direitos coletivos lato sensu, a começar
pelos direitos difusos.
José Carlos Barbosa Moreira entende que os direitos difusos e coletivos são direitos
essencialmente coletivos lato sensu, porque somente existem enquanto direitos coletivos,
não podendo ser individualizados sem perder sua essência.
“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as
ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (Redação
dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)
l - ao meio-ambiente;
II - ao consumidor;
III – à ordem urbanística; (Incluído pela Lei nº 10.257, de 10.7.2001)
IV – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
(Renumerado do Inciso III, pela Lei nº 10.257, de 10.7.2001)
V - por infração da ordem econômica e da economia popular; (Redação dada pela
Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
VI - à ordem urbanística. (Redação dada pela Medida provisória nº 2.180-35, de
2001)
Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que
envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários
podem ser individualmente determinados. (Redação dada pela Medida provisória
nº 2.180-35, de 2001)”
O caput deste artigo poderia até dar margem ao entendimento de que se trate de uma
ação exclusivamente dedicada à reparação de danos, porque só fala em ações de
responsabilidade por danos morais e materiais. Contudo, a ação civil pública não está
reduzida apenas à tutela da reparação de danos, podendo buscar a tutela de direitos que não
envolvam este cunho reparatório. Pode a ação civil publica, inclusive, ser preventiva de
qualquer situação danosa.
Exemplo desta não adstrição seria a de uma ação civil pública pretendendo impedir
que uma determinada licença ambiental seja concedida, porque se assim o for causará
danos inadmissíveis ao meio ambiente. Não há reparação pretendida, apenas a prevenção.
1.4.1. Legitimidade
“Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (Redação
dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
II - a Defensoria Pública; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; (Incluído pela Lei nº
11.448, de 2007).
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;
(Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
V - a associação que, concomitantemente: (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; (Incluído
pela Lei nº 11.448, de 2007).
b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao
consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico. (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
§ 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará
obrigatoriamente como fiscal da lei.
§ 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos
deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.
§ 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação
legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.
(Redação dada pela Lei nº 8.078, de 1990)
§ 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja
manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou
pela relevância do bem jurídico a ser protegido. (Incluído pela Lei nª 8.078, de
11.9.1990)
§ 5.° Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da
União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que
cuida esta lei. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990) (Vide Mensagem de veto)
(Vide REsp 222582 /MG - STJ)
§ 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso
de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá
eficácia de título executivo extrajudicial. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990)
(Vide Mensagem de veto) (Vide REsp 222582 /MG - STJ)”
Por muito tempo se entendeu que o Ministério Público somente teria legitimidade
para a defesa de direitos difusos e coletivos, mas não dos individuais homogêneos, ante a
redação do artigo 129, III, da CRFB:
(...)
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos;
(...)”
A ausência dos direitos individuais homogêneos do teor deste inciso III supra seria
um silêncio eloqüente do constituinte, que não desejaria que o MP buscasse a tutela destes
direitos que não são essencialmente coletivos. O caput do artigo 127 da CRFB seria ainda
um reforço a esta tese:
“Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados
concorrentemente: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)
I - o Ministério Público,
II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;
III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que
sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e
direitos protegidos por este código;
IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam
entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este
código, dispensada a autorização assemblear.
§ 1° O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações
previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse social
evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem
jurídico a ser protegido.
§ 2° (Vetado).
§ 3° (Vetado).”
E repare que este artigo contempla uma exceção à regra de que órgãos não têm
legitimidade, ao falar no inciso III em “entidades e órgãos da Administração Pública”. Com
a redação do artigo 5º da Lei 7.343/85, porém, a legitimação da DP restou bastante
ampliada, eis que expressamente ela poderá propor ações civis públicas sobre quaisquer
matérias, sobre quaisquer direitos coletivos lato sensu.
A DP não precisa atuar apenas em favor de economicamente hipossuficientes,
mesmo na propositura da ação civil pública. O simples fato de um réu qualquer ser revel,
tendo sido citado por meio ficto, desperta a atuação da DP como curadora especial, mesmo
que se saiba que este réu é pessoa economicamente abastada. Na ação civil pública,
inclusive, mesmo que o direito seja de pessoa não hipossuficiente, pode ter relevância
social tal que demande a sua proteção. Por isso, não é preciso que a DP demonstre que os
titulares do direito coletivo lato sensu são economicamente hipossuficientes.
As pessoas jurídicas federativas e as componentes da administração indireta têm
legitimidade clara para a propositura da ação civil pública, como dispõem os incisos III e
IV do artigo 5º da Lei 7.347/85. O inciso VI deste mesmo artigo traz a legitimidade das
associações, as quais precisam observar dois requisitos: a sua constituição há mais de um
ano, e a presença, em seus objetivos institucionais, da busca pela proteção daquele direito
coletivo lato sensu.
As exigências feitas à legitimação das associações servem como meio de prevenção
da propositura de ações civis públicas temerárias, porque da forma que redigidos os
dispositivos limitam um pouco a gama de associações que podem se prestar a este papel.
Trata-se de um controle da representatividade destas entidades, que deve ser adequada. Se o
juiz, porém, ao julgar a admissibilidade da ação, entender que o primeiro requisito, a pré-
constituição há mais de um ano, pode ser dispensado, a lei lhe faculta tal dispensa, no § 4º
do mesmo artigo.
A legitimidade para a propositura da ação civil pública, em todos os casos, teria que
natureza, ordinária ou extraordinária? Há três correntes doutrinárias a disputar o tema. A
primeira corrente, de Kazuo Watanabe, defende tratar-se de legitimidade ordinária, porque
o interesse defendido pelos legitimados não é meramente alheio: é um interesse
institucional, pelo que os legitimados defendem interesse também próprio, em nome
próprio – ainda que também de outras pessoas.
Barbosa Moreira defende, ao contrário, tratar-se mesmo de legitimidade
extraordinária, porque, a rigor, o legitimado defende em nome próprio o interesse geral, e
não atinente a si próprio, como se dá na legitimidade ordinária. Este entendimento tem
prevalecido.
Nélson Nery Júnior, por fim, defende que não se trata nem de uma, nem de outra:
trata-se de legitimidade autônoma, porque não se enquadraria perfeitamente em nenhuma
das situações de legitimidade puramente extraordinária ou puramente ordinária. Seria, em
termos, uma legitimidade para conduzir o processo, apenas. Mesmo por isso, o § 3º do
artigo 5º da Lei 7.347/85 permite a continuidade da ação por outro legitimado, quando a
desistência ou abandono for infundado, ao invés da extinção sem resolução do mérito – a
condução do processo é o objetivo dos legitimados, somente.
A legitimidade ativa é concorrente, ou seja, todos podem propor a ação civil pública
sobre o tema pretendido.
Os legitimados ativos poderiam ocupar o pólo passivo de uma ação civil pública?
Arruda Alvim entende que não, valendo-se do artigo 81do CDC, já transcrito, que fala
somente em defesa dos interesses e direitos, o que faz clara correlação com o pólo ativo da
ação, e não com o pólo passivo. Ada Pellegrini, por sua vez, entende que é possível que as
pessoas ali arroladas ocupem o pólo passivo da ação civil pública, baseando seu raciocínio
no § 2º do artigo 5º da Lei 7.347/85: se ali está previsto que podem se habilitar como
litisconsortes de qualquer das partes, está claro que podem figurar no pólo passivo, se
entenderem necessária as atuação neste sentido. Além disso, Ada vê também no artigo 83
do CDC bom fundamento para tal faculdade:
“Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são
admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva
tutela.
Parágrafo único. (Vetado).”
Ora, se este dispositivo prevê que a adequada tutela dos interesses do consumidor
(leitura que se estende para qualquer direito tutelado pela ação civil pública) pode ser
perseguida livremente, sob qualquer meio, também pode ser tutelado pela participação do
legitimado no pólo passivo da ação.
Exemplo claro desta legitimidade passiva seria de uma ação civil pública ajuizada
pelo MP em face de uma associação de moradores, contra a perturbação ambiental que
aquela comunidade tem empreendido: é perfeitamente cabível a colocação desta associação
no pólo passivo.
Com relação a estas duas condições da ação, não há muitas diferenças em relação ao
regime geral das ações civis, do CPC. Com relação à possibilidade jurídica do pedido,
porém, o parágrafo único do artigo 1º da Lei 7.347/85, já transcrito, apresenta uma
peculiaridade, pois prevê o descabimento de ação civil pública para veicular determinadas
pretensões. Como exemplo, a ação civil pública sobre matéria tributária não é possível,
porque o pedido é vedado em lei – o pedido seria impossível.
1.5. Competência
“Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer
o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.
Parágrafo único A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas
as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o
mesmo objeto. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)”
de uma competência territorial inafastável, porque deferida em favor do juiz mais eficaz
para a análise da causa (por isso teria sido usado o termo funcional, eis que o juiz que
melhor atenderá à causa deverá nela funcionar).
O foro competente é de fácil constatação quando se tratar de dano local, facilmente
identificado – como quando há um dano no interior de uma cidade, fazendo competente o
juízo daquela comarca. Problema surge é quando o dano extrapola limites territoriais claros,
envolvendo mais de um Município ou comarca, ou mesmo mais de um Estado. Nestas
situações, aplica-se o artigo 93, II, do CDC:
Em virtude do artigo 2º da Lei 7.347/85, passou-se a entender que a lei estaria, ali,
fazendo justamente esta delegação de competência a que alude a CRFB, de forma implícita.
Veja a súmula 183 do STJ:
“Súmula 183, STJ: Compete ao juiz estadual, nas comarcas que não sejam sede de
vara da Justiça Federal, processar e julgar ação civil pública, ainda que a União
figure no processo.(*)
(*) Julgando os Embargos de Declaração no CC n. 27.676-BA, na sessão de
08/11/2000, a Primeira Seção deliberou pelo CANCELAMENTO da Súmula n.
183.”
competência da Justiça Federal, que deve ser mantida, e a lei não falou em delegação de
competência, no artigo 2º da Lei da Ação Civil Pública, não havendo que se falar em
delegação tácita.
O parágrafo único deste artigo 2º em comento trata da prevenção de competência.
No CPC, há duas regras de prevenção, previstas nos artigos 106 e 219 deste diploma:
“Art. 106. Correndo em separado ações conexas perante juízes que têm a mesma
competência territorial, considera-se prevento aquele que despachou em primeiro
lugar.”
“Art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz
litigiosa a coisa; e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em
mora o devedor e interrompe a prescrição. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de
1º.10.1973)
(...)”
O artigo 106 define que o “cite-se” é suficiente para determinar prevenção ao juízo
que o emitir, quando se tratar de juízos de mesma competência territorial. O artigo 219, por
sua vez, torna prevento o juízo que alcançar a citação válida primeiro, em se tratando de
juízos de bases territoriais diversas.
Já o parágrafo único do artigo 2º da Lei 7.347/85 estabeleceu uma regra diferente de
prevenção: reputa prevento o juízo em que for proposta a ação. Esta regra é objeto de
crítica doutrinária, quando lida em conjunto com o artigo 16 do mesmo diploma:
“Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da
competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado
improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado
poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.
(Redação dada pela Lei nº 9.494, de 10.9.1997)”
Este artigo cria uma limitação territorial da coisa julgada na ação civil pública, o
que leva a um problema: se o juiz em que foi proposta a ação é prevento para todas as
outras que vierem a ser propostas, e a coisa julgada só alcança o limite territorial da
competência do prolator, haverá contradição entre as duas regras.
A doutrina dominante, de fato, reputa inconstitucional este artigo 16, supra, aos
seguintes argumentos: é clara violação da segurança jurídica, porque haveria possibilidade
de decisões contraditórias sobre a mesma questão, além de representar violação ao acesso à
justiça, por limitar o uso da tutela coletiva. Seria, também, violação à razoabilidade, sendo
absolutamente irrazoável restringir territorialmente a coisa julgada. contudo, a
jurisprudência tem aplicado este artigo 16.
Aplicando-se o artigo 16, portanto, a prevenção deve ser entendida como ocorrida
apenas no limite territorial do órgão prolator em que se propôs a primeira ação. É claro que
outras bases territoriais terão liberdade de julgamento, porque a coisa julgada é restrita
territorialmente, afinal.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
As ações civis públicas têm rol de legitimados próprio, presente no artigo 5º da Lei
7.347/85. Somente o fato de ser uma Ong não empresta à entidade tal legitimidade. Porém,
se a Ong se tratar de uma associação que preencha os requisitos legais deste artigo, será
legitimada.
Questão 2
Resposta à Questão 2
b) Sim, pois mesmo que haja divergência na doutrina, por contada redação dos
artigos 127 e 129, III, da CRFB, o STJ já se posicionou pela possibilidade de
defesa de direitos individuais homogêneos pelo MP, se o direito tiver a
necessária relevância social.
Tema IX
Ação civil pública II. Procedimento. Liminar. Atuação do Ministério Público. Litisconsórcio. Desistência ou
abandono da ação. Recursos. Execução. Coisa Julgada nas ações coletivas.
Notas de Aula11
O procedimento da ação civil pública segue muitas regras gerais do CPC, mas há
peculiaridades unicamente atinentes a esta aça, previstas na sua lei própria e no
microssistema de tutelas coletivas como um todo.
O primeiro aspecto a ser considerado é o da liminar. Como em qualquer ação, é
possível a tutela de urgência na ação civil pública. veja o artigo 4º da Lei 7.347/85:
“Art. 4º Poderá ser ajuizada ação cautelar para os fins desta Lei, objetivando,
inclusive, evitar o dano ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem urbanística ou
aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico
(VETADO). (Redação dada pela Lei nº 10.257, de 10.7.2001)”
Ao lado desta previsão, há que se observar também o artigo 12, caput, da mesma
lei:
“Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia,
em decisão sujeita a agravo.
§ 1º A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar
grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, poderá o
Presidente do Tribunal a que competir o conhecimento do respectivo recurso
suspender a execução da liminar, em decisão fundamentada, da qual caberá agravo
para uma das turmas julgadoras, no prazo de 5 (cinco) dias a partir da publicação
do ato.
§ 2º A multa cominada liminarmente só será exigível do réu após o trânsito em
julgado da decisão favorável ao autor, mas será devida desde o dia em que se
houver configurado o descumprimento.”
11
Aula ministrada pelo professor Marco Antônio dos Santos Rodrigues, em 12/8/2009.
Este artigo ainda contempla mais uma diferença do que é previsto na Lei da Ação
Civil Pública: amplia o rol de legitimados para o pedido de suspensão, incluindo nele o MP,
além da pessoa jurídica interessada.
Os fundamentos do pedido de suspensão são calcados em conceitos jurídicos
extremamente abertos. A Lei 7.347/85 fala em lesão à saúde, à ordem, à segurança e à
economia, e a Lei 8.437/92 aduz as hipóteses de flagrante ilegitimidade e interesse público.
A doutrina critica esta amplitude de fundamentos, entendendo até mesmo inconstitucional
tais previsões, mas a jurisprudência é pacífica em admitir como válido este instrumento,
nos termos em que está previsto.
A súmula 626 do STF é relevante:
Veja, então que mesmo que a liminar deixe de existir, porque uma sentença a
substituiu, a suspensão de eficácia continua vigente, até o trânsito em julgado da última
decisão. O § 9º do artigo 4º, supra, tem o mesmo sentido que esta súmula. Esta situação
revela o que se chama de ultratividade da decisão de suspensão, porque ela ultrapassa a
própria existência da decisão que suspendeu.
Da decisão do incidente pelo presidente do Tribunal cabe agravo inominado, para o
órgão colegiado competente – no TJ/RJ, o Órgão Especial. O indeferimento da suspensão
de eficácia comporta outro pedido de suspensão, dirigido aos Tribunais Superiores, pela
Fazenda ou MP, que restarem inconformados com a negativa.
Além da legitimidade ativa detida pelo parquet, este poderia atuar na ação civil
pública buscando defender o erário? Cândido Dinamarco entende que não, baseado na
análise do inciso IX do artigo 129 da CRFB:
Este autor não entende que seja autorizada a atuação do MP em defesa do erário,
porque seria exatamente a atuação vedada no dispositivo, como consultoria jurídica ou
representação judicial de entidades públicas. Todavia, o STJ não comunga da mesma teoria,
como se vê na súmula 329 desta Corte:
“Súmula 329, STJ: O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil
pública em defesa do patrimônio público.”
Entende o STJ que a própria CRFB, no artigo 127, prevê quais serão os interesses
protegidos pelo MP, e ali se encontra tato a ordem jurídica como a social, objetivos que
podem bem açambarcar a proteção ao erário como objeto de defesa pelo MP.
Seria possível a presença de um litisconsórcio entre mais de um órgão do MP?
Poderia o MP estadual atuar em litisconsórcio com o MP federal, ou o MP estadual de um
ente poderia atuar com ouro MP estadual, em ação de outro Estado? ou cada um fica
restrito às ações civis públicas de seu âmbito?
João Batista Lopes entende que cada MPO deve atuar somente na esfera da sua
justiça, do ente federativo em que se sedia. Destarte, o MP de um Estado somente poderia
atuar neste Estado, e o MP federal apenas na Justiça Federal – não comportando o
litisconsórcio.
Fredie Didier, no que é amplamente acompanhado pela jurisprudência, defende que
é possível, sim, o litisconsórcio entre Ministérios Públicos, ao argumento de que não se
deve tomar por guia a qual ente federativo está ligado o MP, e sim as suas atribuições. Se a
atribuição for comum a ambos, MP estadual e federal, a atuação conjunta, litisconsorcial, é
perfeitamente válida.
O MP também pode atuar como custos legis, como autoriza o artigo 5º, § 1º, da Lei
da Ação Civil Pública, já transcrito. Isto significa, portanto, que em toda e qualquer ação
civil pública o MP oficiará, quer como parte, quer como fiscal da lei. Atuando como parte,
porém, poderá o MP atuar simultaneamente, no mesmo feito, como fiscal da lei?
Fredie Didier entende que sim, porque a atuação como custos legis é um requisito
de garantia de imparcialidade na demanda, revelando funções diferentes do MP. Todavia,
Nélson Nery Júnior defende a desnecessidade de atuação do MP como custos legis quando
ele já for parte, pois se o MP já está presentado na demanda, e pela unidade que informa o
MP, seria descabido imaginar-se que outro órgão do parquet atuasse na mesma demanda –
além de que a própria propositura da ação civil pública pelo MP já revela que este percebeu
alguma lesão a direito coletivo que precisa de tutela, revelando já uma atuação fiscalizatória
da lei, portanto. O STF já encampou esta última posição, entendendo inclusive que o
próprio legislador diz, no artigo 5º, § 1º, da Lei 7.347/85, que a atuação como fiscal só terá
luar quando não for o MP parte do processo.
“Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: (Redação dada pela
Lei nº 11.232, de 2005)
(...)
III - quando, por não promover os atos e diligências que Ihe competir, o autor
abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;
(...)
VIII - quando o autor desistir da ação;
(...)
§ 1º O juiz ordenará, nos casos dos ns. II e Ill, o arquivamento dos autos,
declarando a extinção do processo, se a parte, intimada pessoalmente, não suprir a
falta em 48 (quarenta e oito) horas.
(...)
§ 4º Depois de decorrido o prazo para a resposta, o autor não poderá, sem o
consentimento do réu, desistir da ação.”
Sequer tendo sido citado o réu, ou concordando este com a desistência, o processo
comum se extinguirá.
Este regime não se aplica à ação civil pública, que conta com regra específica
regulando a desistência, no § 3º do artigo 5º da Lei 7.347/85, já transcrito: havendo
desistência infundada do autor da ação, o MP ou outro legitimado encampará a condução da
ação. Havendo desistência, ocorre sucessão processual, e não a extinção do feito sem
resolução do mérito.
Repare que a lei, neste § 3º do artigo 5º, fala em desistência por parte da associação.
José dos Santos Carvalho Filho defende a interpretação literal deste artigo, pelo que
somente a desistência por parte de associação, e não de outro legitimado, seria passível de
encampação da ação por outro legitimado. Na prática, acaba que a leitura literal é mesmo a
única possível, porque os demais legitimados – MP, DP – são regidos por regra de
indisponibilidade em sua atuação, sendo a desistência muito pouco provável.
A sucessão pelo MP, antes da sentença, é apenas um poder, e não um poder-dever de
assumir a causa. Isto porque pode se tratar de uma ação temerária, e é claro que o parquet
não tem dever de assumir ação infundada. Já após a sentença, quando estiver em curso a
execução coletiva da decisão, o MP deverá, mais do que poderá, assumir a execução se
houver desistência ou abandono (exceto na execução coletiva versando sobre direitos
individuais homogêneos sem finalidade social, que é peculiar, como se verá adiante).
No caso de abandono da causa, o juiz não extingue o feito, não se aplicando o § 1º
do artigo 267 do CPC, porque haverá a assunção da demanda pelos legitimados, como dito,
nos mesmos moldes da desistência.
1.4. Recursos
Aplicam-se à ação civil pública os mesmos recursos do processo civil em geral, mas
o artigo 14 da Lei 7.347/85 tem previsão específica sobre o efeito dos recursos nesta seara:
“Art. 14. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano
irreparável à parte.”
O efeito suspensivo dos recursos, na ação civil pública, é ope judicis, só existindo se
o juiz entender que deve ser concedido. A apelação, portanto, tem em regra apenas efeito
devolutivo, sendo o efeito suspensivo concedido pelo juiz se entender preciso.
O interesse recursal, na ação civil pública, não tem correlação com a sucumbência,
necessariamente, como o tem na regra geral do processo civil, constante do artigo 499 do
CPC:
“Art. 499. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro
prejudicado e pelo Ministério Público.
§ 1º Cumpre ao terceiro demonstrar o nexo de interdependência entre o seu
interesse de intervir e a relação jurídica submetida à apreciação judicial.
Na ação civil pública, pode o vencedor da lide ter interesse em recorrer para alterar
o fundamento da decisão que lhe foi favorável, especialmente se ela se tratar de decisão
sem coisa julgada material (quando o recurso para obter este fundamento material é
interessante ao vencedor). Pelo ensejo, vejamos em apartado as diversas nuances da coisa
julgada nos processos coletivos.
dos fatos: não há uma relação jurídica de base, mas apenas uma relação de fato comum a
todos, que reúne todos os titulares. Quanto ao resultado, esta coisa julgada só opera efeitos
materiais se for favorável aos titulares do direito, porque se for desfavorável ainda permite
que todos os titulares possam, individualmente, ajuizar as próprias ações pessoais buscando
solução favorável. É claro que as partes – o legitimado extraordinário e o réu – são
alcançados pela coisa julgada, de qualquer forma; quem escapa à coisa julgada, em caso de
improcedência, são só os titulares individuais representados na ação coletiva.
As sentenças coletivas podem ser genérica ou não. No caso dos direitos individuais
homogêneos, pode ser genérica, como autoriza o artigo 95 do CDC:
Nos direitos difusos e coletivos em sentido estrito, porém, em regra a sentença será
líquida e certa, ante a indivisibilidade destes direitos. Nestes casos, portanto, a regra será a
execução coletiva: da mesma forma que o próprio direito é indivisível, o é também a
execução, e a reparação de danos será destinada a um fundo, na forma do artigo 13 da lei
7.347/85:
Segundo este ártico, portanto, os supostos titulares dos direitos devem se habilitar a
fim de obter a sua própria liquidação, que é diferente da liquidação de sentença normal. Há
mais do que a verificação da extensão do dano: há a verificação também da existência do
direito daquele que se habilitou, pois é a oportunidade em que se apresenta como titular do
direito.
“Súmula 345, STJ: São devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas
execuções individuais de sentença proferida em ações coletivas, ainda que não
embargadas.”
A Lei 9.494/97 prevê, no artigo 1º-D, que quando a Fazenda não embargar a
execução, não serão devidos honorários por parte desta. Veja:
“Art. 1º-D. Não serão devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas
execuções não embargadas. (NR) (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de
2001)”
Vê-se que o STJ, na súmula 345, supra, entende inaplicável este artigo 1º-D nas
execuções individuais de sentença coletiva, porque nestas há a necessidade de constituição,
pelo exeqüente, de advogado capaz de proceder na fase cognitiva necessária à liquidação,
bem como conduzir o processo até o fim.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
como causa de pedir (não o próprio pedido) dessas ações individuais ou dessas
ações civis públicas ou coletivas." (grifei)
É por essa razão que o magistério jurisprudencial dos Tribunais - inclusive o do
Supremo Tribunal Federal (Rcl 554-MG, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - Rcl
611-PE, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, v.g.) - tem reconhecido a legitimidade da
utilização da ação civil pública como instrumento idôneo de fiscalização incidental
de constitucionalidade, desde que, nesse processo coletivo, a controvérsia
constitucional, longe de identificar-se como objeto único da demanda, qualifique-
se como simples questão prejudicial indispensável à resolução do litígio principal,
como corretamente assinalado pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
(RT 722/139):
"Apresenta-se lesivo à ordem jurídica o ato de Município com menos de três mil
habitantes, que, a pretexto de organizar a composição do legislativo, fixa em 11 o
número de Vereadores, superando o mínimo de 9 previsto pelo art. 29, IV, a, da CF.
Controle difuso ou incidental expressamente permitido (CF, arts. 97, 102, III, a, b,
e c e parágrafo único, 42, X, 105, III, a, b e c). Ininvocabilidade de direito eleitoral
adquirido."
Assentadas tais premissas, entendo que a espécie ora em exame não configura
situação caracterizadora de usurpação de competência do Supremo Tribunal
Federal, pois a controvérsia pertinente à validade jurídico-constitucional do art. 8º
da Lei Orgânica do Município de Sorocaba/SP foi suscitada, incidentalmente, no
processo de ação civil pública, como típica questão prejudicial, necessária ao
julgamento da causa principal, cujo objeto identifica-se com o pedido de redução,
para catorze (14), do número de Vereadores à Câmara Municipal (fls. 117).
Cabe referir, neste ponto, que, além de revelar-se plenamente cabível o controle
incidental de constitucionalidade de leis municipais em face da Constituição da
República (RTJ 164/832, Rel. Min. PAULO BROSSARD), assiste, ao magistrado
singular, irrecusável competência, para, após resolução de questão prejudicial,
declarar, monocraticamente, a inconstitucionalidade de quaisquer atos do Poder
Público:
"Ação declaratória. Declaração 'incidenter tantum' de inconstitucionalidade.
Questão prejudicial. O controle da constitucionalidade por via incidental se impõe
toda vez que a decisão da causa o reclame, não podendo o juiz julgá-la com base
em lei que tenha por inconstitucional, senão declará-la em prejudicial, para ir ao
objeto do pedido. Recurso extraordinário conhecido e provido."
(RTJ 97/1191, Rel. Min. RAFAEL MAYER - grifei)
Tendo-se presente o contexto em que proferida a sentença que julgou procedente a
ação civil pública promovida pelo Ministério Público da comarca de Sorocaba/SP,
constata-se que o objeto principal desse processo coletivo não era a declaração de
inconstitucionalidade do art. 8º da Lei Orgânica do Município.
Ao contrário, a alegação de inconstitucionalidade da norma legal em referência foi
invocada como fundamento jurídico (causa petendi) do pedido, qualificando-se
como elemento causal da ação civil pública, destinado a provocar a instauração de
questão prejudicial, que, decidida incidentemente pelo magistrado local, viabilizou
o acolhimento da postulação principal deduzida pelo Ministério Público,
consistente na redução do número de Vereadores à Câmara Municipal (fls. 117).
Nem se diga, de outro lado, que a sentença proferida pelo magistrado local poderia
vincular, no que se refere à questionada declaração de inconstitucionalidade, todas
as pessoas e instituições, impedindo fosse renovada a discussão da controvérsia
constitucional em outras ações, ajuizadas com pedidos diversos ou promovidas
entre partes distintas.
É que, como se sabe, não faz coisa julgada, em sentido material, "a apreciação da
questão prejudicial, decidida incidentemente no processo" (CPC, art. 469, III).
Na realidade, os elementos de individualização da ação civil pública em causa não
permitem que venha ela, na espécie ora em exame, a ser qualificada como
sucedâneo da ação direta de inconstitucionalidade, pois, ao contrário das
Veja também o que disse o STF em outros dois informativos, 260 e 261, pela
ordem:
razão de ter deferido liminar em ação civil pública promovida pelo Ministério
Público, na qual se pleiteia a nulidade do enquadramento dos ex-ocupantes do
extinto cargo de censor federal nos cargos de perito criminal e delegado federal de
que trata a Lei 9.688/98, levado a efeito mediante Portarias do Ministro da Justiça,
com a declaração incidenter tantum da inconstitucionalidade da Lei 9.688/98. O
Min. Carlos Velloso, relator, proferiu voto no sentido de julgar improcedente a
reclamação por entender que o controle difuso de constitucionalidade de lei pode
ser exercido em sede de ação civil pública, no juízo de primeiro grau, quando for
necessário para a decisão da hipótese concreta, e que, na espécie, a declaração de
inconstitucionalidade pleiteada pelo Ministério Público não consubstancia o pedido
da ação civil pública, mas sim a causa de pedir. Após, o julgamento foi adiado em
virtude do pedido de vista do Min. Sepúlveda Pertence.
RCL 1.503-DF, rel. Min. Carlos Velloso, 21.3.2002.(RCL-1503). RCL 1.519-CE,
rel. Min. Carlos Velloso, 21.3.2002.(RCL-1519)”
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Não há qualquer óbice a esta declaração incidental, porque a coisa julgada na ação
civil pública alcança apenas e tão-somente o dispositivo, como em qualquer decisão, não
açambarcando a fundamentação da sentença, e a declaração de inconstitucionalidade
ocorrerá na ratio decidendi, e não no dispositivo.
Tema X
Notas de Aula12
12
Aula ministrada pelo professor Wilson Marques, em 11/8/2009.
favoráveis aos titulares coletivos substituídos pelo autor da ação coletiva, pois se
desfavoráveis não os impedem de agir autonomamente. A ação rescisória, nestes casos em
que não há coisa julgada material, carece de interesse-necessidade, eis que o mero
ajuizamento de ação própria terá efeito para atender à pretensão do interessado.
Assentadas as bases da ação rescisória, cumpre distinguí-la a querella nullitatis.
Antes de tudo, cumpre trazer um brevíssimo histórico deste segundo instituto.
No Direito Romano, a distinção entre error in procedendo e error in judicando era
por demais relevante, e, diga-se, o erro de procedimento era tido como muito mais grave do
que o erro de julgamento, pois acreditavam muito mais graves as ilegalidades do que as
injustiças. Por isso, as sentenças eivadas de error in procedendo eram consideradas
inexistentes, e, assim, sequer precisariam de qualquer impugnação para sua elisão – a
sentença simplesmente não era um documento hábil a produzir efeitos, bastando uma
petitio simplex para chamar atenção do juízo para tal inexistência.
Outrossim, quando o vício fosse de julgamento, a sentença existia, e a argüição de
defeito deveria vir, sim, deduzida em algum meio de impugnação – eleita para tanto, à
época, a appelatio, recurso por excelência.
Na idade média, the dark ages, não se evoluiu na ciência jurídica, como pouco se
evoluiu em todas as áreas do conhecimento humano. Na Renascença, especialmente na
Itália, retomaram-se os estudos do direito, e se identificou a necessidade de, mesmo na
sentença eivada por error in procedendo, era necessária a utilização de algum meio de
impugnação, não sendo bastante a mera ignorância da existência da decisão, porque isto
gerava muita insegurança jurídica. Em conclusão, para a sentença injusta, manteve-se a
apelação como meio de impugnação; para a sentença ilegal, criou-se a querella nullitatis.
A querella nullitatis não veio ao direito moderno com a exata feição com que
surgira na origem. A restitutio in integrum teve grande influência no escopo da querella
moderna. Não só em relação à natureza do vício, error in procedendo, se definiria para o
que era servível esta ação, mas sim pela necessidade de que a situação retornasse ao termo
original, antes da ocorrência da violação ao direito representada na sentença indevida, quer
ilegal, quer injusta. Veja que, em diversos ordenamentos, a dualidade permanece: restitutio
para injustiças, querella para ilegalidades. No Brasil, porém, há uma certa mescla.
No Direito Brasileiro do Império, decorrente do Direito Português, o Regulamento
737 de 1850, que foi, a bem da verdade, nosso primeiro código processual civil, estabelecia
que a sentença nula precisaria da invalidação por meio de algum instrumento, dentre o rol
que estabelecia: apelação, revista, embargos à execução ou ação rescisória.
Há no Brasil, como dito, uma certa simbiose entre a querella e a restitutio in
integro, fundamento histórico da ação rescisória. Há casos em que a querella seria o meio
de impugnação necessário, mas a lei expressamente consigna que é cabível a ação
rescisória, e vice-versa. Esta “promiscuidade”, diga-se, se sente também nos recursos,
porque a apelação, aqui, serve para invalidação ou reforma, respectivamente por vício de
procedimento ou por erro de julgamento – o que não ocorria na origem do instituto, como
visto.
A distinção entre a inexistência, a anulabilidade e a nulidade hoje é bem traçada. A
sentença é inexistente quando lhe falta um elemento estrutural essencial – relatório,
fundamento e dispositivo, bem como juiz investido a subscrevê-la. Se a sentença conta com
todos os elementos estruturais presentes, ela existe, mas pode ser inválida porque algum
destes elementos esteja viciado, gerando nulidade ou anulabilidade. O vício que provier de
norma cogente torna a sentença nula; se o vício vem de norma dispositiva, a sentença é
anulável.
Uma vez que a sentença, eivada por qualquer vício, transite em julgado, ela deixa de
ser viciada para passar, talvez, a ser rescindível. A coisa julgada tem efeito sanatório sobre
os vícios, como se sabe, efeito este que consiste na purificação dos vícios da sentença
viciada; contudo, se o vício for daqueles arrolados como causa de rescisão, deixa de haver
nulidade ou anulabilidade, mas entra em cena a rescindibilidade.
Tome-se por exemplo a sentença proferida por juiz absolutamente incompetente: era
nula, até o trânsito em julgado; agora, feita a coisa julgada, é rescindível. E há clara
diferença entre rescindibilidade e nulidade: enquanto a sentença nula não produz efeitos, a
sentença rescindível, se não for efetivamente rescindida, produzirá todos os efeitos como se
um julgado perfeito fosse. Neste aspecto, a rescindibilidade é muito similar à anulabilidade.
Pode acontecer que o vício seja tão severo, que a coisa julgada não só não é capaz
de o purificar, como na rescindibilidade, como não diminui a intensidade do vício (como
faz quando convola nulidade em rescindibilidade). Imagine-se que o réu, condenado, sequer
tenha sido jamais integrado ao processo, jamais tendo sido citado. Esta sentença pode ser
alvo de rescisão ou de impugnação, quando demandado seu cumprimento.
A conclusão a que se chega, portanto, é que não há sentença nula após o trânsito em
julgado: ou sanou-se pelo trânsito; ou é rescindível; ou é também impugnável. Passado o
tempo hábil para rescisão ou impugnação, diga-se, esta sentença passa a ostentar natureza
jurídica de sentença inexpugnável: conquanto não seja válida, é tornada imutável em prol
da segurança jurídica – sequer desafiando querella nullitatis, como defendia Pontes de
Miranda.
Acenar-se na doutrina com a possibilidade de ação declaratória de nulidade da
sentença, quando eivada deste vício (a ausência de citação,por exemplo), a que se nomeia
de querella nullitatis insanabilis. Ocorre que esta ação não parece se compatibilizar com o
sistema do CPC, que impede que juizes re-enfrentem matéria já decidida, porque o trânsito
em julgado impede a dedução de novas matérias, porque a coisa julgada é a preclusão
máxima de alegações em juízo. Além disso, a ação anulatória da sentença transitada em
julgado não teria sequer um juízo a ser corretamente apontado como competente, porque o
juízo e primeiro grau não poderia, por exemplo, ser competente para anular um acórdão,
por exemplo, e o tribunal tem competência traçada literalmente na lei, não sendo
encontrado em seu rol de competências a dita ação.
Vale consignar ainda que o trânsito em julgado ocorre quando a sentença não
comporta mais recursos, e há decisões que assim se verificam no exato momento em que
são proferidas: as sentenças homologatórias de acordo entre as partes, por exemplo, não são
impugnáveis por recurso, porque quem pacificou a lide foram as próprias partes, carecendo
de interesse recursal, portanto. E vale ainda dizer que recurso inadmissível não obsta o
trânsito em julgado, pelo que o prazo da rescisória será contado desde o fim do prazo para
recurso, e não da data de declaração da inadmissibilidade do recurso.
13
Texto adaptado de artigo, com este título, de autoria de Adriana Moreira Silveira Freitas, advogada e juíza
leiga do juizado especial cível da Comarca de Três Lagoas – MS, e Ana Maria Suares Rocha, analista
judiciária do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo.
2.1. Introdução
14
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Querella Nullitatis. Cadernos Jurídicos da Escola Paulista da
Magistratura. São Paulo, v.2, n.4, p.97-113, mar/abr-2001.
“Como todo ato jurídico, a sentença comporta exame sob tríplice aspecto: a
existência jurídica em si mesma, a validade e a eficácia. A sentença existe desde
que contenha os elementos essenciais que a configurem como tal; que contenha um
dispositivo, seja dada por um juiz, etc15.”
Este não é o argumento acolhido pela Professora Tereza Arruda Alvim Wambier,
segundo a qual os atos inexistentes juridicamente são aptos para produzir efeitos, desde que
seja possível material, fática e concretamente.
Para diferenciar a nulidade da inexistência, existem os chamados pressupostos
processuais relativos a cada uma delas. Cumpre consignar, no entanto, que não há consenso
15
WAMBIER, Tereza Arruda Alvim. Nulidades do Processo e da Sentença. 5ªed., rev., ampl. e atual. de
acordo com as Leis 10352/2001, 10358/2001 e 10444/2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.498.
16
LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o Processo Civil Brasileiro. Com notas da Drª. Ada Pellegrini
Grinover. São Paulo, Bushatsky, 1976. p.182/183.
17
MACEDO, Alexander dos Santos. Da Querella Nullitatis – Sua Subsistência no Direito Brasileiro. 3ªed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p.47/48.
2.5. Ação rescisória vs. ação anulatória vs. ação declaratória de inexistência
18
FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. Condições da Ação. Enfoque sobre o interesse de agir. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001. p.38.
19
MOREIRA, Alberto Camiña. Defesa sem embargos do executado: Exceção de Pré-Executividade. 3ªedição,
revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2001. p.81.
Assim, para as sentenças tidas por inexistentes, não se pode utilizar a ação
rescisória, tampouco a anulatória, simplesmente porque não há o que rescindir ou anular em
uma decisão que juridicamente não existe. Esta inexistência deve, por sua vez, ser
declarada pelo Poder Judiciário, por meio de uma ação declaratória de inexistência. E é
justamente a subsistência no direito processual brasileiro de uma ação declaratória
específica, chamada querella nullitatis, o objeto do item seguinte.
Desta maneira, alude o referido autor que não há, atualmente, no direito positivo
brasileiro, a previsão específica da querella nullitatis (ou ação declaratória de inexistência),
o que implica prejuízo aos operadores do direito no que se refere à impugnação das
sentenças inexistentes.
Para outros autores, há sim previsão expressa da querella nullitatis em nosso
ordenamento. É o caso de Alexander dos Santos Macedo, que aponta a hipótese do antigo
artigo 741, inciso I do CPC (atual artigo 475-L) como consagração expressa da querella
nullitatis no direito processual civil brasileiro. Por conseguinte, a única hipótese de
cabimento aventada pelo mencionado autor seria a da falta ou nulidade da citação do réu
revel. No mesmo sentido é a opinião de Rogério Marrone de Castro Sampaio, o qual elenca,
além da hipótese da nulidade/ausência de citação do réu revel, outras hipóteses de
cabimento da querella.
Quanto ao artigo 475-L do CPC (incorporado ao direito processual pátrio pela Lei
11.232, de 22 de dezembro de 2005), interessante notar que a hipótese da citação nula ou
inexistente é agora aventada por meio de mera impugnação (e não mais de embargos à
execução, como anteriormente dispunha o artigo 741, inciso I do mesmo diploma legal). É
certo que o CPC não estabelece quais os requisitos da petição de impugnação. Entretanto, o
tratamento legal mais simplificado dado à impugnação indica uma atenuação de seu
rigorismo formal – ou seja, tem a impugnação feição de incidente processual, e não de ação
autônoma.
20
GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Sentenças Inexistentes e “Querella Nullitatis”. Disponível em
http://www.lfg.com.br/artigos/Sentencas_inexistentes.pdf (acesso em 20 de setembro de 2006).
21
FERIGATO NETO, Silvio. Algumas diferenças entre a ação rescisória, a querella nullitatis e a ação
anulatória. Disponível em http://www.diex.com.br/portal/artigos_det.asp?id=20050405103600589 (acesso em
01 de outubro de 2006).
22
MACEDO, Alexander dos Santos. Da Querella Nullitatis – Sua Subsistência no Direito Brasileiro. 3ª ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p.73.
2.9. Conclusão
Casos Concretos
Questão 1
Caio propôs em face de Tício ação de cobrança de dívida. O réu não foi citado e,
em decorrência, não apresentou resposta, mas, mesmo assim, o pedido inicial foi julgado
procedente, por sentença contra a qual não foi interposto recurso algum. Durante a fase de
cumprimento de sentença, o réu/executado, regularmente intimado do auto de penhora e
avaliação na forma do § 1º do artigo 475-J do CPC, permaneceu inerte, sem oferecer
impugnação. Dentro do biênio legal, tampouco ajuizou Ação Rescisória da sentença
exeqüenda. Às vésperas da hasta pública do imóvel penhorado, entrou com petição
pedindo ao juiz que cancele a praça marcada para o dia seguinte e declare a inexistência
ou, alternativamente, a nulidade de todo o processo de conhecimento, inclusive da
sentença que nele se prolatou. Alegou, em síntese, como causa de pedir, a prestação
jurisdicional, o seguinte: a) não tendo sido feita a citação, e, portanto, não tendo ocorrido
a triangulação da relação processual, inexiste processo, no sentido jurídico da expressão,
e, em decorrência, inexiste, igualmente, a sentença que, no processo inexistente, foi
proferida; b) a não se entender assim, pelo menos nulos ipso jure são o processo e a
sentença; c) tanto num caso como no outro, a sentença que se proferiu no processo de
conhecimento em que não houve citação e defesa não pode produzir efeito algum, menos
ainda o de autorizar a penhora de bens do suposto devedor e a alienação deles em hasta
pública; d) sendo caso de inexistência ou, pelo menos, de nulidade ipso jure do processo e
da sentença, o vício pode ser alegado em qualquer tempo, constituindo a alegação objeto
de querella nullitatis insanabilis, de caráter perpétuo. Tício tem razão?
Resposta à Questão 1
O processo existiu, mas não há nulidade, eis que a coisa julgada converteu o vício
em rescindibilidade. Sendo o caso, cabe, de fato, a querella nullitatis. Veja o que entende o
STJ, nos julgados do REsp. 194.029 e do REsp. 220.110:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Não tem razão a parte: a exceção de pré-executividade não é meio hábil a tratar do
tema.
Veja o Agravo de Instrumento 2003.002.06305, do TJ/RJ:
Questão 3
Resposta à Questão 3
Wilson Marques entende que, mesmo que não se fale em substituição, a rigor, é
cabível o mandamus neste caso, ao argumento de que não há vedação constitucional a este
cabimento, se atendidos os pressupostos de cabimento do mandamus.
Tema XI
Notas de Aula23
1. Ação popular
“(...)
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a
anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à
moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural,
ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência;
(...)”
Veja quão ampla é a finalidade desta ação, que não só protege o patrimônio público,
lato sensu, como também diversos outros valores abstratos, como a própria moralidade
pública.
A ação popular reforça a tese de que o processo não se destina apenas a solucionar
questões intersubjetivas. Há bens e interesses que são de todos, e por todos devem ser
protegidos – daí a evolução da tutela coletiva que tem sido empreendida.
A Lei 4.717/65 é a sede regulamentar da ação popular. Esta ação comporta
modalidades preventiva e repressiva, respectivamente quando há a ameaça ou a efetiva
lesão ao bem coletivo que se quer proteger. O artigo 21 da Lei 4.717/65 estabelece prazo de
cinco anos para a propositura da ação, contados do conhecimento da lesão:
23
Aula ministrada pela professora Flávia Bahia Martins, em 14/8/2009.
1.1. Legitimidade
Os menores de dezoito anos, maior de dezesseis, não precisa estar assistido para
ajuizar a ação popular, pois ainda que civilmente seja relativamente incapaz, é
politicamente capaz. A doutrina, em peso, defende que não é necessária a assistência, mas,
em sentido contrário à maioria, Luis Roberto Barroso defende que a convivência harmônica
entre a legislação material e processual exige que a assistência seja presente neste caso,
porque a CRFB traça a norma material – a existência de direito político – mas a norma
processual que demanda a assistência ainda deve ser observada. O STJ já se posicionou
pela necessidade da assistência, diga-se.
Pessoas jurídicas não podem ajuizar ação popular. Veja a súmula 365 do STF:
“Súmula 365, STF: Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação
popular.”
Da mesma forma, o Ministério Público não tem legitimidade para esta ação, apesar
de ter relevante papel no seu curso.
Vale a síntese: a ação popular só pode ser proposta pelo cidadão brasileiro, que, em
regra, é o brasileiro nato ou naturalizado que esteja em pleno gozo de seus direitos
políticos. Os inalistáveis, os inalistados, e os que sofreram perda ou suspensão de seus
direitos políticos, não têm legitimidade para a ação popular. Além disso, a súmula 365 do
STF deixa claro que a ação não pode ser ajuizada por pessoa jurídica, e esta vedação
alcança também o MP. Se os portugueses equiparados estiverem em gozo de direitos
políticos no Brasil, também podem ajuizar a ação. Segundo a doutrina majoritária, o
cidadão com menos de dezoito anos não precisa de assistência para ajuizar a ação popular,
pois a CRFB lhe dá legitimidade material e processual, mas Barroso, em sentido contrário,
entende que a CRFB não derrogou a legislação processual, pelo que há, sim, necessidade de
assistência para tal pessoa ingressar em juízo.
A Lei 4.717/65 exige que no pólo passivo estejam todos os envolvidos na lesão ou
ameaça que se estiver apontando: há um litisconsórcio passivo necessário. Contudo, não
será unitário, porque cada componente do pólo passivo pode sofrer efeitos diversos da
decisão da ação popular.
(...)
I - processar e julgar, originariamente:
(...)
f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal,
ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta;
(...)
n) a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente
interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem
estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados;
(...)”
1.4. Gratuidade
Casos Concretos
Questão 1
Uma vez proposta Ação Popular perante a Justiça Federal, foi deferido pedido de
tutela antecipada no sentido de determinar às Autoridades Impetradas - Presidentes da
República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal
- que fossem adotadas providências com relação à limitação de vencimentos e proventos
dos agentes políticos dos três poderes. Postulou-se, com tal medida, que fossem supridas
as omissões administrativas necessárias à efetividade do artigo 29 da Emenda
Constitucional n° 19/98.Cientificado da citada decisão, o Exm° Sr. Procurador Geral da
República ingressou com uma Reclamação perante o Supremo Tribunal Federal, alegando
usurpação de competência, pedindo liminar para a suspensão do curso da referida ação
até sua respectiva decisão final. Comente o deferimento de tal antecipação de tutela, as
razões que inspiraram a propositura da Reclamação por parte da PGR, bem como decida
fundamentadamente a questão.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema XII
Notas de Aula24
24
Aula ministrada pelo professor Wilson Marques, em 11/8/2009.
Sendo assim, a leitura dos artigos 471 e 474 do CPC fazem crer que nem uma nem
outra opção doutrinária podem ser seguidas. Não é dado ao juiz simplesmente ignorar estes
dispositivos, para poder ignorar a coisa julgada, desconsiderando-a, ou reputá-la
inexistente. Veja:
Esta solução do STJ resolve a problemática, mas não é exatamente técnica, porque o
conceito de documento novo não se amolda ao caso: o documento novo, como se vê, é
aquele que, já existente anteriormente, era ignorado ou não pôde ser utilizado – o que não
engloba a nova tecnologia do DNA. Todavia, técnica ou não, a posição do STJ é bastante
para resolver a questão.
Problema grande surge é quando a própria ação rescisória não mais for cabível,
porque o prazo se expirou. Parcela da doutrina entende que o prazo, na verdade, conta
desde quando houver a descoberta do documento novo, pelo que haveria dois anos para
propor a ação rescisória desde a realização do exame de DNA, no exemplo dado.
Novamente, não é solução técnica, porque a lei não diferencia a contagem do termo a quo
da rescisória, deixando-o sempre como desde o trânsito em julgado da decisão. Contudo, é
a melhor das soluções, porque a outra seria simplesmente entender que a ação rescisória,
nesta hipótese, não conta com qualquer prazo decadencial para sua propositura, o que não
parece muito razoável.
Cândido Rangel Dinamarco apresenta outra forma de relativização da coisa julgada.
Para este autor, a coisa julgada é a imutabilidade dos efeitos da sentença, e, sendo assim,
quando tais efeitos não puderem se produzir, por serem inadmissíveis, a própria coisa
julgada inexisitiria. Ocorre que a premissa de seu raciocínio está equivocada: a coisa
julgada é a imutabilidade da sentença, e não de seus efeitos, que muitas vezes são
naturalmente mutáveis. O artigo 467 do CPC estabelece que a sentença é que é imutável, e
não seus efeitos:
“Art. 467. Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e
indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.”
A ação rescisória por expressa violação de lei é o meio escorreito para relativizar a
coisa julgada inconstitucional, portanto. Perdido o prazo para a rescisão, nada mais acudiria
ao interessado.
Situação peculiar ocorre quando uma sentença transita em julgado baseada em
determinado fundamento legal, e este fundamento, posteriormente, é julgado
inconstitucional em ação direta, perante o STF. Luis Roberto Barroso entende que nem
assim aquela coisa julgada deveria ser desconstituída: prevalece, a coisa julgada, no embate
entre este valor e a ilicitude da norma declarada inconstitucional que a ensejou.
Por conclusão, vê-se que a melhor saída para todos estes imbróglios seria mesmo a
alteração legislativa para adequar o tema ao direito. De lege lata, a ampliação de casos de
relativização da coisa julgada não é possível; de lege ferenda, aplicam-se as hipóteses que a
doutrina propugna.
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Notas de aula ministrada pelo professor Gustavo Nogueira, na Emerj, em meados de 2007. Não se conhece
a autoria do texto, pelo que sua menção, aqui, restou impossível.
desconsiderar a primeira coisa julgada formada e entrar com uma nova ação igual. Há
precedentes do STF adotando esta posição.
Para Wilson Marques, seria cabível o mandado de segurança, e também se deve
desconsiderar o prazo de cento e vinte dias.
E há ainda quem aponte a ação declaratória de nulidade absoluta, a querella
nullitatis insanabilis: declara que existe no caso concreto uma nulidade absoluta. Essa ação
não tem prazo e se entende hoje que não está restrita à inexistência de citação. Entende-se
que é cabível em qualquer nulidade. É a posição mais seguida, principalmente por Ada
Pellegrini Grinover.
Alguns julgados demandam transcrição, os primeiros, enquanto a matéria era dada
ao STF, e em seguida aqueles julgados pelo STJ, quando encampou a matéria, após a CRFB
de 1988:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
a) Sim, a ADPF.
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
b) Não se faz possível, eis que não é cabível a relativização desta coisa julgada.