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ISSN 0102-8413
FUNDADA EM 1904
NACIONAL DE
Mendes Pimentel
Estêvão Pinto
EX-DIRETORES DIRETORES
Pinto Arruda Alvim
Pinto Eduardo Arruda
~UU'FP''"~''U Pinto
José Monteiro de Castro
José de r-uJlH'-'''"'""' Paiva
José Dias
"'u"'"'"' Seabra Fagundes
Silva Pereira
José Moreira
EDITORA
FORENSE
DA OBJETIVA E SUA NA FASE
NEGOCIAL: UM ESTUDO COMPARADO COM A DOUTRINA ,,......,~"'""'·""
A dou~na alemã ~dentifica qmtro tipos básicos de responsabilidade pré-contratual, sempre que haja
2 Sobre o tema confira-se Alcides Tomasetti Jr., Execução do contrato preliminar, tese apresentada
vwlaçao da boa-fe objetiva mnda na fase negocia!: a) por celebração de contrato nulo ou anulável·
perante a Faculdade de Direito da USP em 1982, e Darcy Bessone, Do contrato.
b) por danos oriundos da fase negocia!, em tendo havido contrato válido; c) por danos oriundos d~
3 Confira-se J. X. Carvalho de Mendonça, Tratado de direito comercial, vol. VI, pp. 487-488, e J. M.
f:se negocia!, quando não há celebração do contrato; d) por rompimento injustificado das negocia-
Carvalho Santos, Código Civil brasileiro interpretado, vol. XVI, pp. 56-57. 175 J
çoes. Confira-se Reg1s F1chtner Pereira, A responsabilidade civil pré-contratual, p. 3.
4 Código Civil anotado, p. 339.
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Deve-se observar que a boa-fé chegou às vésperas da primeira grande codifica- fidelidade à
ção - a francesa - totahnente da antiga idéia de lealdade de comporta- coJmp>ondo-se a Treu und Glauben tem-se que Treue Mlc'.llH.<'-'a uuc;u•ua\.110,
mento do primitivo Direito Romano. 13 Ela chegou e mesclada com idéias lealdade e Glauben, crença, no sentido de Juntas regra de com-
outras: estava acentuadamente marcada subjetivismo sob a influência norta1m•~n1:o leal e honesto a ser adotada por todos na vida em sociedade. Nesse senti-
do Direito Canônico e fundida ao conceito de então uma idéia coloca o comentário ao Código Civil intitulado BGB Handkommentar:
de justiça. O Código Civil francês a ro- car·ac1.enza, na relação dos
mana clássica da boa-fé. Consagra a boa-fé em sua idéia nuclear de estado coJnpre(mcle "'vwau""V''• sinceridade e ... v,.hwuc.~
de ignorância, em diversos dispositivos, no campo dos direitos definida se tipo de comportamento da outra
no art. 550 sob a ótica do sujeito: possuidor de boa-fé é que possui como pro- isso, a necessidade de um honesto e leal, com justas vvu"''""'"'l'v''"
prietário, em virtude de título translativo de cujos vícios ignore. 14 A boa- aos interesses legítimos do outro. Essa necessidade ""'111 "',."''"'r1 ~
fé objetiva, por sua vez, encontra-se no art. 1. segundo o as devem da "18
da
upavLHH.HHH-L)v desenvolvida Direito alemão. 24 dos direitos
do conceito de boa-fé deve ser novamente enfocada para evitar Essa liberdade e cmnp1en1enctacla da
confusões: boa-fé subjetiva e são fenômenos distintos. A é a deno- na medida em que a liberdade do in-
minada boa-fé psicológica e significa estado de crença de estar agindo conforme o Di- "~u'"''''""L"'-'""' mas apenas dentro da comunidade so-
a segunda, dita boa-fé é norma de conduta a ser adotada na vida jurídica, cabe ao ordenamento prever à liberdade individual
como coloca claramente Rosa Nery: ocupa de a boa-fé na
o princípio da boa-fé duas distintas análises, porque duas são as imanentes ao uso dessa liberdade. que autonomia e liberdade
vertentes culturais da formação dessa idéia para a atualidade. Uma originária da tra- bem como a liberdade de exercício de encontram-se submetidas
dição do Direito Canônico (bana fides; em alemão, gutten Glauben); outra oriunda
do Direito germânico (Treu und Glauben- lealdade e fé [confiança]). A primeira é do autor:
denominada de boa-fé subjetiva e a segunda de boa-fé objetiva. A primeira representa a ordem por prever
uma atitude psicológica, isto é, uma decisão da vontade, denotando o convencimento dividuais ditadas para uma vida comum ordenada. Essas são imanentes
individual da parte de obrar em conformidade com o Direito. Já a boa-fé objetiva se ao exercício ético e da liberdade também para a autonomia
apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo e para a liberdade no exercício de cunhados éti-
social o de que cada pessoa ajuste a conduta a co, encontram-se evidentemente uuu""""''""
esse arquétipo, obrando como obraria uma pessoa honesta, proba e leal "25 Q BGB f'OtltPni·nl
Outro princípio derivado da idéia de personalismo ético é o da proteção da con- os princípios gerais do sistema jurídico (liberdade, justiça e , acrescen-
fiança, o qual as pessoas, para formar suas relações de vida e tando adiante o autor que:
juridicas com responsabilidade, precisam poder confiar no comportamento das outras. como toda cláusula geral, permite atividade criadora do juiz. Esta porém não
A confiança, requisito indispensável a todo relacionamento humano, vem protegida é arbitrária, mas contida nos limites da realidade do contrato, sua tipicidade, estrutura
de diversas formas pelo Direito, dentre as quais via princípio da boa-fé objetiva. Per- e com aplicação dos princípios admitidos pelo sistema não cabe,
cebe-se, então, o importante atribuído à boa-fé objetiva no Direito alemão: ela pois, um arbítrio indefinido ou imoderado na aplicação de critérios éticos ou de razões
forma a base ética sobre a qual ergue-se o Direito Privado e, nesse sentido, completa, sociais, senão proporcionado secundum speciem rationem. Ademais, a exigência de fun-
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integra e limita a liberdade de exercício de direitos, a autonomia privada e seu princi- damentação garante o controle de decisão pelas partes e pela comunidade juridica."
pal desdobramento, a liberdade contratual. Significa isso dizer que as partes devem, Semelhante é o pensamento de Larenz, para quem, embora todos tenham uma
no exercício de sua autonomia, agir eticamente, considerando os interesses do outro, certa idéia sobre o que corresponde ou não à boa-fé objetiva, ou seja, às idéias de leal-
aspecto essencial da idéia de boa-fé. Daí dizer Larenz que: dade e honestidade, é tarefa do juiz dizer, o que, em uma determinada situação, corres-
"( ... ) o princípio da boa-fé significa, em seu sentido literal, que cada um deve ponde a esse mandamento. A sentença a ser proferida pelo julgador não deve pautar-se
manter lealdade à sua palavra e não frustrar ou abusar da confiança, que forma a base em uma avaliação subjetiva, mas orientar-se pelas exigências gerais de justiça, as quais
indispensável para todos os relacionamentos humanos, (significa) que ele deve proce- concretizam-se nos princípios gerais da ordem juridica, na consciência juridica, nas
6
der como se pode esperar de alguém que pensa honestamente." 33 idéias de lealdade dos povos ou de determinado grupo, bem como na jurisprudência?
A boa-fé objetiva não é, como se costuma dizer, uma fórmula vazia. Seu concei-
to remete a valores éticos, como lealdade, honestidade e consideração pelos interesses
alheios, razão pela qual é também denominada de boa-fé ética, mas isso não implica
indefinição. O que, entretanto, em um determinado caso concreto, corresponde à boa-
fé objetiva, cabe ao julgador dizer, mas sua avaliação deve pautar-se por critérios A doutrina alemã, já há algum tempo, reconhece na boa-fé objetiva três funções
determináveis objetivamente. Ou seja, independentemente de sua opinião pessoal so- básicas: criadora, limitadora e interpretativa-integrativa, das quais a primeira é a que
bre o que vem a ser boa-fé objetiva, deve o julgador basear-se naquilo que doutrina e mais diretamente se relaciona com o tema da responsabilidade pré-contratual, razão
jurisprudência entendem como tal e harmonizar sua decisão de acordo com os prin- pela qual far-se-á apenas uma sintética referência as outras duas, as quais serão ini-
cípios e valores fundamentais do ordenamento jurídico. Por essa razão, diz Martins- cialmente abordadas. Inicialmente, deve-se abrir um parêntese e novamente enfocar
Costa que, na tarefa de verificar se determinado comportamento corresponde ou não que as funções da boa-fé objetiva aqui explanadas são produto do trabalho consciente
aos padrões de honestidade e lealdade exigidos pela boa-fé, deve o juiz averiguar qual e responsável da jurisprudência alemã de interpretação sistemática do§ 242 do BGB.
a concepção de boa-fé vigente na doutrina e jurisprudência, pois, como enfatiza a au- Na realidade, a boa-fé objetiva desempenhou na Alemanha o papel fundamental de
tora, "não se trata de determinar, por óbvio, qual é a sua própria valoração". 34 meio de aperfeiçoamento do Direito (Rechtsfortbildung), na medida em que a juris-
Essa visão é compartilhada também por Rosado de Aguiar Jr., quando afirma prudência desenvolveu, ao longo dos anos, certas potencialidades da boa-fé objetiva
que "a boa-fé é uma cláusula geral cujo conteúdo é estabelecido em concordância com que superavam em muito não só o sentido literal da expressão, como também a inten-
ção inicial do legislador alemão do Código Civil de 1900.
O dispositivo legal que consagra a boa-fé objetiva na lei alemã transformou-se
BGB hatte sich bei Vertragsfreiheit noch mit den Schranken des § 134 (VerstoB gegen gesetzliche em verdadeiro portão de entrada para o aperfeiçoamento jurisprudencial do Direito.
Verbot) und des § 138 (VerstoB gegen di e guten Sitten) beguügt und bei der Rechtsausübungsfreiheit De fato, a jurisprudência alemã fundamentava suas decisões no § 242 sempre que a
nur das Schikaneverbot (§ 226) vorgesehen. Demgegenüber hat die Rechtsprechung in der weiteren solução inicialmente encontrada para o caso, de acordo com as normas vigentes, não
Entwicklung unterstützt vom Sozialstaatsgebot des Art. 28 GG immer mehr das Gebot von Treu tmd se harmonizasse com a essência da boa-fé objetiva. 37 Recorrendo ao§ 242 do BGB a
Glauben aus §§ 157, 162, 242 als Ausdruck solidarischer Rücksichtnahme in den Mittelpunkt gerückt
und damit sozialen Schutzzwecken im BGB Eingang verschafft" (Allgemeiner Teil des bürgerlichen
Rechts., p. 25- com grifos no original).
35 A boa-fé na relação de consumo, pp. 24-25.
36 Schuldrecht I, p. 117.
33 Tradução livre de: "Der Grundsatz von 'Treu und Glauben 'besagt seinem Wortsinn nach, daj3 jeder 37 Münchener Kommentar, pp. 120-121.
in 'Treue 'zu seinem gegebenen Worte stehen und das Vertrauen, das die unerlassliche Grundlage O primeiro e mais significativo exemplo de aplicação corretiva da boa-fé objetiva tem-se quando
a/ler menschlichen Beziehungen bildet, nicht enttauschen oder missbrauchen, daj3 er sich so a jurisprudência, nos idos de 1923, quebrou o princípio vigente no direito alemão do "marco igual
verhalten soll, wie es von einem redlich Denkenden erwartet werden kann" (Schuldrechts I, p. 116). a marco" para ajustar as prestações dos contratos de duração continuada, afetados pela inflação do 185 )
184
34 Ob. cit., p. 331. pós-guerra. Adaptando o contrato e atualizando o valor da prestação, o juiz impediu que inúmeros
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jmisrJru:dência desenvolveu, então, e institutos jurídicos que acabaram por prazos de reside uma essencial entre ambos os
reformar e aperfeiçoar o Direito muitos dos encontram-se consagra- fenômenos. Não a mn prazo certo, sujeita o titular à
dos na versão atual do BGB, como o instituto da da base do negócio jurídico de um direito - inclusive direitos ,_,-,tcoc+<>ti"''º não há - antes
(§ 313), os deveres de consideração surgidos com a relação obrigacional (§ u1o·~"'"""'""' pelo
os quais, quando violados, legitimam indenização por positiva do contrato
(§ 280) e o próprio instituto da (§ 31 Embora V-''·"""'"''"v de considerar inadmissível uma contrá1ia à boa-fé
esse papel da boa-fé objetiva, como meio de aperfeiçoamento do Direito através do uu~;;u•ww operou ainda uma releitura de figuras oriundas do Direito
trabalho jurisprudencial, seja objeto de acesas criticas 38 na Alemanha por envolver Romano, como o venire contrafactum proprium ou de
questões dogmáticas e metodológicas fundamentais - cuja foge ao cujo objetivo éa da confiança no tráfico jurídico, como observa
escopo desse artigo - a é no sentido de que o aperfeiçoamento ''·'-'"'"'"''"w 41 querendo com isso que alguém adote determinado
c"''"-'~'H.U do Direito um método moderno e inevitável de do """'"''""'"'-'"' a confiança na e,
proceda de modo contrário a essa conduta.
ao Outro da boa-fé objetiva diz re~;peito à sua como in-
nhado como limite ao exercício de direitos e ~-'"''"''v~,0 terpretativo-integrativo para o juiz na análise do caso concreto, esta aqui
uma sobretudo na na teoria do abuso do direito - fala-se em manifestar-se não apenas como normaflexibilizadora e integradora das disposições
exercício inadmissível de direitos contratuais, mas p1incipalmente como norma corretiva do contrato, inserindo no ne-
de corlSHllera.çac gócio jurídico direitos e deveres não decorrentes diretamente nem da nem da von-
tade das partes, da aliás, independem totalmente. Essa potencialidade da boa-fé
"-'E,H-'''w'"~v relevante na medida em que segundo precisamente co-
loca a "realizar adequadamente o plano valorativo da lei ou- nos contratos
das partes". Por isso, diz o autor, "deve a relação obrigacional receber especialmente
que ou se aquele conteúdo que conduza ao alcance da intenção do legislador e das p~rtes. A~ui
a de que não mais exercerá esse direito e, frustrando a '-'ViliJl<UJl"" pertencem, acima de tudo, os deveres de proteção e de comportamento, CUJO respeito
42
exerce o Direito. assegura a realização do verdadeiro dever de prestação".
O fato central da
tem, em certa uma ,,.,..,,.,,w'•<in"'
na medida em que ele contribui para que na
40 Rosa Nery, ob. cit., p. 252.
~.oum!.aH\,a de que o direito não será exercido. ele não é elemen- Exemplo de Verwirkung dado por Dieter Medicus é o caso da parte que, diante de uma violação do
de1tenmiJt1arlte, como no fenômeno da ao contrário não há contrato operada pela contraparte, não faz uso, por exemplo, de seu direito de rescisão dentro de
determinado período de tempo, despertando no parceiro a impressão de que não mais exercerá esse
direito e, posteriormente, postula a rescisão do contrato. Ob. cit., p. 1!5.
41 Ob. cit., p. 80.
O autor dá o seguinte exemplo de venire contra fac/um proprium: X, proprietário de imóvel comer-
devedores saldassem suas dívidas pagando o valor nominal fixado no contrato, o qual, corroído pela cial, aluga-o para Y por dois anos. Segundo o contrato de aluguel, este será por mais um ano automa-
inflação, não conferia ao credor a vantagem patrimonial esperada e justa. Era o início da elaboração ticamente prorrogado se, dois meses antes do prazo estipulado, uma das partes não pedir a resilição
da teoria da quebra da base do negócio, cujos casos, de acordo com o direito brasileiro, são solu- por escrito do contrato. Três meses antes do prazo, Y, tendo já encontrado um outro imóvel para
cionados insatisfatoriamente através da teoria da imprevisão, consagrada no art. 478 do CC/2002. alugar, pergunta a X se ele tem intenção de resilir o contrato, o que é desmentido pelo proprietário.
Exemplo citado por Dieter Medicus, Schuldrecht I, p. 77. y deixa, então, de alugar o outro imóvel comercial. O proprietário X, contudo, posteriormente, dentro
do prazo fixado no contrato, exerce o direito de resilição fixado, contrariando seu comportamento
anterior. Embora tenha o proprietário, em tese, o direito de resilir o contrato, esse exercício é consi-
38 Münchener Kommentar, p. 122. derado abusivo e inadmissível pelo direito alemão, em função da proteção da confiança despertada
39 Por exercício inadmissível de direito tem-se assente na doutrina alemã, por exemplo, a impossibili- na contraparte. Ob. cit., p. 1!4.
dade de o credor recusar a prestação incompleta, executada pelo devedor, quando a parte restante for 42 Traducão livre de: "Die Vorschrift sol! den, Wertungsplan'(Wieacker aaO. S. 22) des Gesetzes oder
insignificante e o credor não tiver interesse fundado para opor-se à aceitação da prestação, ou quando - bei Vertrãgen - der Parteien sinngemaj3 verwirklichen. Insbesondere sol! das Schuldverhãltnis
o descumprimento do prazo de cumprimento da prestação, mesmo em contratos com prazo certo, for denjenigen Inhalt bekommen, der die Absicht des Gesetzgebers oder der Parteien zum Erfolg führt.
Hierhin gehõren vor aliem die Schutz - und weiteren Verhaltenspfiichten, deren Emhaltung d1e 187
186 insignificante, situação em que o credor não pode usar o direito de rescindir o contrato. Confira-se
Karl Larenz, Schuldrechts I, p. 122. Erfüllung der eigentlichen Leistungspfiicht sichert ( ... )" (ob. cit., p. 79- com grifos no original).
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49 Segundo o autor, "a relação obrigacional, equiparada pelo BGB à pretensão do credor (ou a uma
multiplicidade de pretensões) foi reconhecida pela prática e pela teoria como uma relação jurídica
43 "§ 157 Vertriige sind so auszulegen, wie Treu und Glauben mil Rücksicht auf die Verkehrssitte es complexa ('organismo') de contornos vastos e alastrantes, a partir da qual podem ser deduzidos não
erfordern." só múltiplos deveres acessórios e 'deveres de proteção' de caráter geral, tanto do lado de uma das par-
44 Ob. cit., p. 78. tes como do lado da outra, mas também assunções de deveres pré-contratuais (culpa in contrahendo)
45 "§ 133 Bei der Auslegung einer Willenserkliirung ist der wirkliche Wille zu erforschen und nicht an e uma responsabilização contratual do respectivo credor (culpa in exigendo )" (ob. cit., p. 597).
dem buchstiiblichen Sinne des Ausdntcks zu haften." 50 Nesse sentido, Rosado de Aguiar Jr. coloca que "os deveres nascidos da boa-fé são chamados de
46 CC/2002- "Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciadas secundários, ou anexos, em oposição aos provenientes da vontade contratada, que são os principais".
do que ao sentido literal da linguagem." "A boa-fé ... ", cit., p. 26.
188 47 Aparte geral do projeto de Código Civil brasileiro, p. 103. 51 A obrigação como processo, p. 30. 189
48 Código Civil comentado, vol. 1, pp. 312,315-316. 52 Ob. cit., p. 440.
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ao exato processamento da relação tendo em vista sua finalidade básica Os deveres decorrentes da boa-fé não nesse caso, contra-
de a satisfação dos interesses incidem diretamente na fase contratuaL Por
que esse deveres variam, conforme ensina em função das circunstâncias e a desses deveres gera
do de como ensina o nobre "nas re- como esclarece Martins-Costa:
a maioria dos deveres de não são ex-
pn;ss.amelllte "'UHJ.uuw-<-!.v". mas resultam do sentindo e das circunstâncias do
Como conteúdo desses deveres são por o dever do
<OA'"''""''-'"·v da lidar com
1HJLV1H1<1ya.v e esclarecimento - em suma, deveres
contrato, devem as partes portarem-se de boa-fé a fim de reduzir ao máximo os riscos de 63 Diniz64 e Basso 65 Mesmo Noronha, que admite a incidência dos deveres da
lesão aos interesses do outro. Nessa situação os deveres decorrentes da boa-fé objetiva na fase pré-contratual, fundamenta a responsabilidade nrc>_N"Ur<ln
boa-fé objetiva, cuja violação configurar a responsabilidade pré-contratual. no dever geral de não lesar ninguém. Segundo o autor, "o dever de agir de acordo com
Os deveres de condutas aqui exigidos, em deconência da incidência da boa-fé a boa-fé está presente quer nas negociações que precedem o contrato, quer na conclu-
objetiva como regra de comportamento, adquirem, como já dito, o caráter de deveres são quer ainda na sua interpretação e na sua execução A sua violação na
principais de conduta e não se restringem ao dever gené1ico de não lesar ninguém, mas fase das negociações preliminares, quando as pessoas ainda não estão adstritas a outro
pressupõem antes mna atuação positiva do sujeito no seu exercício, como, por exem- dever que não seja o geral de neminem laedere, origina a responsabilidade pré-contra-
plo, o dever de infonnar o parceiro negociai sobre todas as circunstâncias relevantes tual. Esta surge não apenas com a interrupção injustificada das negociações prelimina-
para a fonnação do juízo de conveniência do contrato. Como diz Fichtner Pereira: res, como também com a violação daqueles deveres de conduta, impostos pela boa-fé,
"( ... ) o dever de não causar injustamente danos a outrem é reconhecido como de infonnação e clareza de linguagem, de sigilo quanto a infonnações prestadas pela
dever jurídico genérico, que alcança todas as pessoas, em todas as situações. Esse contraparte, e até de não-indução, ainda que meramente culposa, ao eno da outra par-
dever jurídico genérico, como visto, tem caráter negativo. Quando duas pessoas sere- te". E conclui, dizendo que, "em suma, a responsabilidade pré-contratual ainda resulta
lacionam com vistas à fonnação de uma relação jurídica contratual, ultrapassam esse de um dever geral de nem inem laedere, da violação do dever de respeitar, como alguns
estágio do relacionamento humano em sociedade, cujo dever jurídico consiste apenas autores apontam, a liberdade negociai de outrem". 66
em não prejudicar injustamente. A circunstância de as estarem negociando com Razão não assiste, entretanto, ao nobre professor, mas a Pontes de Miranda, que
vistas à fonnação do contrato faz com que smjam para elas outros deveres, além do já fundava a responsabilidade in contrahendo no dever de verdade ou de esclareci-
dever genérico de não causar dano injusto a terceiros. Os deveres que surgem com o mento,67 que nada mais é do que o dever de boa-fé, a tenninologia atual. Do
início das negociações contratuais têm feição positiva "59 mesmo modo Couto e Silva, 68 Gomes/ 9 Nelson Nery Jr. e Rosa 70 e Jtmqueira de
Do mesmo modo é o pensar de para quem "o contato negociai direcio- Azevedo, para quem a boa-fé objetiva impõe às partes em negociações a observância
nado para uma possível conclusão do contrato leva as partes a um relacionamento pró- de deveres específicos, os quais são "como que um vínculo jurídico entre duas pessoas
ximo, no qual elas são obrigadas umas as outras à observância, em certa medida, dos e não se assemelha ao dever genérico de não prejudicar a outrem- alterum non laede-
direitos e interesses do parceiro contratual, o que ultrapassa os deveres do contato geral re- do art. 159 do CC". 71 também vê na boa-fé objetiva, enquanto materializa-
(direito delitual)". 60 Distinguindo-se os deveres deconentes da boa-fé objetiva do dever ção do princípio da dignidade da pessoa humana, do art. 1°, da CF/88, no Direito
geral de não lesar ninguém, e, considerando que esses deveres são impostos, tanto na das Obrigações, o fundamento básico da responsabilidade pré-contratual. 72
Alemanha, como no Brasil, por força de lei- precisamente por força, respectivamente, Por fim, Martins-Costa, também adepta dessa tese, esclarece que a razão para
dos § 242 do BGB e art. 422 do CC/2002 - às partes em negociações, tem-se que o a não recondução da responsabilidade pré-contratual à boa-fé objetiva só se
fundamento elementar da responsabilidade pré-contratual repousa na boa-fé objetiva e pelo desconhecimento, dominante até há pouco no meio jurídico brasileiro, do próprio
não no dever geral de não causar dano, como entende parte da doutrina brasileira. conceito de boa-fé objetiva. 73 Sendo, então, a boa-fé objetiva a fonte dos deveres de
De grande da doutrina que admite a existência da responsabilidade consideração a serem observados pelas partes em negociação, tem-se fixado o funda-
pré-contratual vê seu fundamento não no princípio da boa-fé objetiva, mas o princípio
geral do neminem laedere, estampado nos arts. 186, 187 e 927 do CC/2002, sendo
essa a razão pela qual atribuem à responsabilidade pré-contratual natureza
extracontratuaL Essa idéia encontra-se, dentre outros, em Bittar, 61 Cappelari, 62 Silva 63 "Para que ocorra tal responsabilidade, em que se desenha um caso especial de responsabilidade civil,
é que a culpa que se apura é aquiliana e não contratual, porque assenta no princípio geral que impõe
a qualquer pessoa abster-se de prejudicar outrem, e não em infração de alguma cláusula do contrato,
pois que nesta fase, ainda não existe contrato" (Responsabilidade civil, p. 74).
59 Ob. cit., p. 87. 64 Curso de direito civil brasileiro, p. 38.
60 No original: "Schon der auf einen moglichen Vertragschluss ausgerichtete geschaftliche Kontakt 65 Contratos internacionais do comércio, p. 158.
bringt di e Parteien in ein Naheverha/tnis, in dem sie einander zur Achtung auf di e Rechte und 66 Ambas as citações encontram-se na obra citada, p. 150.
Interessen des Verhandlungspartner in einem Mafle verpflichtet sind, das die Pflichten im allgemeinen 67 Tratado de direito privado, p. 321.
Kontakt (Deliktsrecht) überschreitet" (ob. cit., p. 439). 68 Ob. cit., p. 89.
61 Diz o autor:"( ... ) no Código vigente, encontra a responsabilidade pré-contratual fundamento na teo- 69 Contratos, p. 61.
ria do ato ilícito (art. !59), configurando-se, pois, caso de sancionamento dentro da extracontratuali- 70 Ob. cit., p. 339.
dade" (Curso de direito civil, vol. 1, p. 474). 71 Responsabilidade pré-contratual no Código de Defesa do Consumidor, pp. 23-24.
" 192 62 Para o autor,"( ... ) a infração dos deveres alocados na fase pré-contratual qualifica-se como ofensa ao 72 Responsabilidade civil pré-negocia/, p. I 04. 193
princípio geral de não lesar- neminem laedere" (Responsabilidade pré-contratual, p. 56). 73 Ob. cit., p. 507.
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Dever de
no momento em que estas 'n'"~"I"H'
se iniciam. O dever de ou cuidado (Schutzpfiichten) foi um dos deveres
Larenz enfoca a nscprutaencJa alemã com base no§ 242 do BGB.
RG em 7.12.1911, no
o tribunal concedeu indenização à autora da ação por danos
um menor, a entrada em estabelecimento em decorrência da
rolos de linóleo que, da
nal fixou que, ao entrar a autora no
de natureza semelhante à relação da
restou, no caso, violado.
pela jurisprudência alemã, sendo
decorrentes em outras o momento exato do suJrglm<::n1:o camente reconhecido incidir este a do momento em que se atinge uma proximi-
desses deveres dá-se com o estabelecimento do contato entre as dade negocia!, ou seja, antes das partes iniciarem as u'"'"'v'"'"'"'''""
Relevante em tema de boa-fé JJr<otE:gend.o-:se a pessoa e o patrimônio da contraparte e de
deveres de da boa-fé modo à situação jurídica criada. Essa situação de a re-
cativo observar com Schwab que o § do BGB - que consagra os forma de 2002, reconhecida expressamente § 31 n. 2 e 3, do BGB como
deveres de -não elenca esses deveres. Na nem mesmo o § 242 a a incidência dos deveres de conduta decorrentes da boa-fé objetiva.
do 422 do no ordenamento Exemplo dessa negociai tem-se em caso em 26.9.1961
os deveres resultantes da pelo BGH, segundo o qual o cliente entra no estabelecimento, escorrega numa casca
devem ser deduzidos da de banana e se fere gravemente. Nessa o tribunal firmou o entendimen-
puuv1vw da boa-fé Não to de que o dever de proteção, oriundo da boa-fé objetiva, forma-se antes mesmo de
u!JLcdJIL""''"''w., como dizem os um os iniciadas as negociações formais de compra e venda e, tendo restado este, no caso,
devendo ser deduzidos e fixados de acordo com as circunstâncias ~a•,n•,~•<o o estabelecimento comercial por re:sp<m~;ab,lh<da<ie '"'""'- vv•n•
o BGH estende o dever de aos terceiros ,,_,_a"''v'''"'"v",
pré-negociai, o caso de sujeito que, ac•::>mpanh;an-
74 No miginal: "Der Rechtsgrund fiir die besonderen Pflichten bei den vorvertraglichen und geschaftlichen do a mãe a um escorrega numa folha de e fere-se com
Kontakten ist zunachst in einem zwischen den Parteien begründeten Vertrauensverhaltnis gesehen Larenz confirma tal observando que os têm o dever
worden. Rücksichtnahrnepflichten aus vorvertraglichen und geschaftlichen Kontakten konnenjedoch de se de forma a não violar o corpo, a a vida, o e outros
auch ohne ein Konlaetes Vertrauen bestehen ( ... ). Für die Rücksichtnahmepflichten entscheidenc! ist bens jurídicos, que, em virtude das negociações, são colocados na área de domínio do
der engen Kontakt, den man bei der Anbahnung geschaftlicher Kontakte rnit anderen notwendigerweise
eingehen mull ( ... ).Das Rechtsverhaltnis der Vertragsverhandlungen und geschaftlichen Kontakte setzt
outro, 76 uma vez que o contato gerado pelas conversações abre a possibilidade de uma
deshalb kein Vertrauen voraus" (Allgemeiner Teil des bürgerlichen Rechts, p. 593 - com grifos no
original). 195
75 Dieter Schwab, ob. cit., p. 442. 76 Allgemeiner Teil ... , cit., p. 598.
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atuar na da outra, através da troca de mion!naçõ•es ou da pos- que possuem uma cláusula
sibilidade de influenciar o convencimento do ~n"~Q.;~A acontece no sua e efetividade no Direito e
necessana como fonna de democratizar o relacionamento vull)';.""''vu.aJ
Conexo ao dever de on)te1;ao
dos bens recebidos por ambas as durante as
A incidência do dever de na fase un,-wv""'""~! uma das em função das negociações receber bens ou documentos
cos dotados de cláusula geral de responsabilidade civil, relativa que para análise e verificação, terá o dever de guarda, como se sua e devolução no
essa cláusula seria o tnecanismo a solucionar os casos de danos sofridos menor espaço de tempo possível. destarte, pela excessiva ou
como observa Menezes Cordeiro 77 Também BenattF8 reforça a tese, ob- danificação da coisa, nos tennos da lei", segundo Popp. 83
servando que o dever de por ele denominado de não possui as
características essenciais dos deveres não surge com as negociações 6.2. Dever de
e nem destina-se à do futuro contrato. o autor, o dever de prote-
ção, que reflete o interesse do sujeito em não sofrer não nasce em função das Na seqüência do desenvolvimento da culpa in contrahendo, a jurisprudência ale-
mas existe em todos os momentos da atividade sendo devidamente mã reconheceu que, além dos deveres de proteção, também incidem na fase das nego-
!'v,>U'>->HOU.VHH.<U.'W d<llllllli"I.IICL não razão ciações preliminares deveres de informação (Informationspflichten), 84 os são de
Os outros deveres pré-contratuais de suma importância para a pelfeita fonnação da futura relação contratual. A boa-fé obje-
e ao contrário nascem diretamente com o regra de conduta, às a de um reto e honesto
início das negociações e destinam-se efetivamente a preparar o futuro contrato. nas negociações, o que passa pela comunicação de todas as infonnações relacionadas
No o caput do art. 927 79 do atual contém uma cláusula geral com o contrato, especiahnente aquelas relevantes para a formação do convencimento,
referindo o único à hipótese de 1'"'11'-'u~au.tHcm<-cç; em cada um dos envolvidos, acerca da conveniência e oportunidade do contrato. 85
que já constava em no art. 159 do CC/1916. Ou seja, a ques- A importância da infonnação mede-se por sua influência na fonnação do juízo de
durante as decorrente de conduta conveniência e oportunidade do negócio a ser finnando, de modo que, de posse dessa
no ordenamento resolvida infonnação, ou as partes não chegam à conclusão do contrato ou o fazem sob diversas
de incidência do art. 927 do CC/2002. Pontes de Mi- condições. Benatti coloca que, como o fim essencial de quem negocia é a represen-
vu.ca!!a, defende a existência de um dever de tação acerca do conteúdo do futuro contrato, é dever imposto pela boa-fé o infonnar
nas o outro acerca daquilo que o mesmo precisa para fonnar seu convencimento. Para o
ao constatar que não apenas a autor, existem elementos e circunstâncias que todos conhecem ou podem conhecer
uuuv1v 1~w atual lealdade e uuvlJllayaiJ, com a diligência nonnal, enquanto que relativamente a outros o conhecimento se ob-
tém por meio de infonnações, esclarecimentos e elucidações por parte de terceiro. É
precisamente sobre essa atividade, dirigida a infonnar, que incide o chamado 'dever de
comportar-se segundo a boa fé', previsto no art. 1.337 do CC italiano, que vincula cada
uma das partes a comunicar, confonne à verdade, tudo aquilo que a outra parte precisa
saber para fonnar um quadro exato sobre a matéria, objeto das negociações. 86
como Fichtner Sendo as negociações a fase na qual as partes deliberam sobre a fonnação ou
Pereira81 e das duras críticas que tem sofrido este u1~uuuv. não do contrato, nada mais razoável exigir-se, portanto, que todas as infonnações rela-
cionadas com o eventual negócio sejam devidamente fornecidas, a fim de que as par-
tes possam, com base em dados corretos e formar um juízo infmmar-se v ~:o• ue~.wo,
de delimitar a
de conveniência e oportunidade sobre o contrato, daí dizer Menezes Cordeiro que os extensão do dever de ""''m'''"c'~'"'n "'""w-.'""' Larenz aborda a ques-
deveres de informação "adstringem as partes à de todos os esclarecimentos
necessários à conclusão honesta do contrato". 87 O conteúdo desse dever não engloba
apenas um ato de informar, mas envolve também um explicar, corno salienta La-
renz,88 um esclarecer a sobre o contrato e suas o que passa
pelo dever de informar os eventuais óbices materiais ou jurídicos (causas de nulidade barreira entre 0 dever de >ni'Ar~O
e invalidade) à formação do negócio, a fim de evitar a conclusão de contrato nulo ou da
ineficaz, assim como pelo dever de esclarecer detalhadamente o conteúdo contratu-
para que as partes saibam exatamente quais direitos e obrigações estão efetiva-
mente assumindo. Por essa razão, alguns ordenamentos, como o alemão e o italiano,
consideram a celebração de contrato nulo como uma das figuras da responsabilidade maior conhecimento do contrato ou acesso a esse conhecimento
pré-contratual. O dever de informação engloba, ainda, um dever de clareza, o qual, a outra, maior seu dever de essas lutvlluac;•Jc:>
segundo Massimo Bianca, 89 impõe a necessidade de evitar a utilização de linguagem ··-·""'"-" a de uma frente a outra e a
suscetível de não ser compreendida plenamente pela contraparte. condiçcies que deve existir entre os contratantes. Esse é o pensar também
O que não faz parte desse dever são infonnações acerca da esfera íntima e de Garcia Rubio, quando coloca que "o mencionado dever de infor-
vada da pessoa, não em a essas um dever de verdade. de forn1a tenha uma nos1cao
Segundo "ainda que, em princípio, deva-se dar a perguntas respostas corretas, do mesmo modo, também ressalta
isso não vale para perguntas inadmissíveis, especialmente quando essas, sem motivo a pm·arrletl~O do dever de lHlvu.ua,,av
legítimo, invadem a esfera privada e íntima. Isso atinge principalmente perguntas sobre Para o autor, "acima de tudo será necessário ter em conta a
gravidez durante as negociações para a conclusão de um contrato de trabalho. Como a natureza e a importância do contrato, as circunstâncias em que foi a exis-
essa pergunta atinge a esfera íntima e viola a igualdade de tratamento(§ 6lla, alínea 1, tência ou não de relações entre as os vínculos de de amizade etc.
frase 1), é inadmissível. Ela não precisa, por isso, ser veridicamente respondida". 90 Além disto, não se poderá prescindir dos usos, do costume corrente, da Vll~aluL"""c'v
A violação dos deveres de informação pode adquirir uma feição positiva ou económico-social 93
negativa, constituindo, assim como a infração de todos os deveres decorrentes da Questão polêmica acerca dos deveres de infommção é a relacionada ao esclare-
boa-fé objetiva, motivo legítimo para o abandono das negociações, na medida em cimento sobre a conveniência do negócio, na medida em que alguns autores sustentam
que há quebra da necessária confiança que deve existir entre os parceiros. Uma vio- tratar-se de verdadeiro dever, paralelo ao dever de informação. Defensor dessa tese no
lação positiva ocorre, por exemplo, face ao fornecimento de indicações incompletas Brasil, Popp sustenta a existência de três deveres distintos, embora interligados: dever
ou inexatas, podendo responder, quem forneceu as informações, por responsabilidade de informação, conselho e recomendação. O primeiro envolve a comunicação de fatos
pré-contratual, caso a contraparte tenha realizado despesas em decorrência das infor- objetivos relacionados ao contrato, como as condições do negócio e do bem, enquanto
mações prestadas. A violação dos deveres de informação adquire conotação negativa os outros dois contêm uma sugestão de comportamento a ser adotada, caracterizando-
quando ocorre, por exemplo, omissão de informações. se, em oposição ao primeiro, por envolver um juízo de valor, sendo a distinção entre
A questão não é, contudo, tão simples de ser resolvida, pois se é certa a neces- ambos apenas de intensidade, na medida em que o conselho contém maior exortação
sidade de troca de informações, também o é o dever de cada um, por sua própria ini- a seu seguimento que a recomendação, abrangendo, inclusive, o juízo de oportunidade
do negócio e impondo à parte o dever de aconselhar, em determinadas circunstâncias,
a não celebração do contrato ou sua realização sob outras condições. 94
87 Ob. cit., p. 583.
88 Allgemeiner Teil ... , cit., p. 599.
89 ll contralto, p. 169.
90 No original: "Auch wenn auf Fragen grundsãtzlich richtige Antworten zu geben sind, so gilt dies 91 Al!gemeiner Teil ... , cit., pp. 599-600.
doch nicht für unzuliissige Fragen, insbesondere wenn diese ohne berechtigten Grund in die Privat 92 No original:"( ... ) e/ tantas veces mencionado deber de información compete, deforma especial, a
- und Intimsphãre eindringen. Dies betrifft vor aliem die Fragen nach der Schwangerschaft bei den la parte que presumiblemente tiene una posición dominante en la relación precontractual ( ... )" (La
Verhandlungen zum AbschluB eines Arbeitsvertrags. Da diese Frage die Intimsphãre betrifft und responsabilidad precontractual en e/ derecho espano/, p. 46).
gegen die Gleichbehandlung verstoBt (§ 611a Abs. 1 Satz 1) ist sie unzulãssig. Sie muB deshalb nicht 93 Ob. cit., pp. 58-59.
wahrheitsgemãB beantwortet werden" (Allgemeiner Teil ... , cit., p. 599- com grifos no original). 94 Ob. cit., p. 199.
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Opiniões contrátias a essa tese não faltam. Para Massimo Bianca, o dever de tular de um bem, assegura vendê-lo a outrem, não lhe infonnando, contudo, sobre a
informação não compreende o juízo de conveniência do negócio, o qual faz do verdadeira titularidade do bem. Situação concreta, semelhante ao exemplo foi
jogo da contratação, cabendo a cada um suportar os riscos de sua própria valoração. apreciada peloTJRS ~o caso do posto de gasolina98 ~que girava em tomo de negocia-
Ou seja, cada um responde pela avaliação da conveniência e oportunidade do negócio, ções entabuladas para a compra e venda de um posto de gasolina, na qual o potencial
assumindo, dessa forma, os riscos de uma avaliação errada, a menos que essa tenha se adquirente, de descobrir que seu parceiro negociai não era o único titular das
formado com base em atos ou informações dolosas da contraparte. 95 Também Benatti quotas sociais da empresa, abandonou as conversações e desistiu de celebrar o contra-
posiciona-se contra a existência de um dever de manifestar-se sobre a conveniência to, embora já tivesse sido fixada como certa, entre ambos, a celebração.
do negócio, observando não fazer parte do conteúdo do dever de informação o avisar O proprietário do posto de gasolina, inconformado, pediu indenização, sob ale-
à contraparte, por exemplo, acerca de breve aumento ou redução do preço do objeto, gação de ruptura injustificada das negociações, pelos gastos despendidos com ad-
pois, com os dados já conhecidos, esta encontra-se em condições de formar seu pró- vogado para elaboração da minuta do contrato. O pedido, contudo, foi negado sob
prio juízo de conveniência. o argumento de que a contraparte, ao não ser informada sobre a real titularidade do
justificando acertadamente sua posição, observa que a autonomia privada bem, teve justo motivo para abandonar as conversações e desistir do negócio, vez que
é campo não apenas de colaboração, exigida pela boa-fé objetiva, mas também de houve quebra da confiança de uma parte na outra, cujo acórdão reza:
competição, necessária à vitalidade da vida econômica: "Responsabilidade pré-contratual. Culpa in contrahendo. Alienação de quotas
"( ... )à exigência de solidariedade, da qual é expressão a obrigação de boa fé, se sociais. É possível o reconhecimento da responsabilidade pré-contratual, fundada na
contrapõe a necessidade de deixar uma certa liberdade de manobra aos interesses em boa-fé, para indenização das despesas feitas na preparação de negócio que não chegou
luta ~ liberdade de procurar e manter posições de vantagem. A autonomia é campo, a se perfectibilizar por desistência de uma das partes. No caso, porém, o desistente
ao mesmo tempo, de colaboração e de competição: a primeira é garantia da ordem, a agiu justificadamente. Cessão da totalidade das ações por quem apenas detinha parte
segunda alimenta o impulso vital do sistema." 96 do capital."
A faceta positiva do dever de lealdade exige, ainda, que os negociantes condu-
6.3. Dever de lealdade zam-se de forma a alcançar a conclusão de contrato válido e eficaz, adquirindo tal
dever, para alguns autores, caráter autônomo, sobretudo face à figura da responsabi-
Decorrente da boa-fé objetiva tem-se ainda o dever de lealdade, cujo entendi- lidade pré-contratual por celebração de contrato nulo ou ineficaz, consagrada expres-
mento passa pela compreensão da própria boa-fé, enquanto norma de conduta leal e samente em certos ordenamentos jurídicos, como o italiano. Nesse sentido, esclarece
honesta a ser adotada por todos no tráfico jurídico. O conteúdo do dever de lealdade Massimo Bianca99 que devem as partes se empenhar nos limites de um apreciável
foi detenninado paulatinamente pela jurisprudência alemã, embora sua distinção do sacrifício para a remoção dos obstáculos, materiais e jurídicos, à celebração do con-
dever de informação nem sempre seja claramente visualizável, como observa Mene- trato. Ou seja, as partes devem se esforçar para remover todos os óbices à celebração
zes Cordeiro, na medida em que, segundo o autor, deslealdade implica sempre em ~finalidade das negociações ~ desde que isso não represente um sacrifício pessoal de
não-informação. 97 Ocorre que a violação do dever de lealdade nem sempre se coloca suas posições, medindo-se essa atividade por um critério de normalidade, vale dizer,
no plano da informação, mas também no do próprio comportamento. Pode-se dizer, de por aquilo que se pode esperar do homem médio, leal e honesto.
modo geral, que o dever de lealdade impõe às partes a adoção de conduta insuscetível O dever de lealdade adquire um aspecto negativo quando traduz-se, por exem-
de fraudar a confiança da contraparte de que seu parceiro conduzir-se-á com lealdade, plo, no dever de não iniciar, ou prosseguir, as negociações sem qualquer intenção
pois é isso o que se pode esperar de quem atua no tráfico jurídico. Esse dever pode ter de concluir o contrato e não abandoná-las injustificadamente. Inicialmente, deve-se
conotações positivas e negativas. ressaltar que o entrar em negociações pressupõe uma disponibilidade das partes em
A feição positiva da lealdade manifesta-se no dever de atuar e cooperar para celebrar o contrato, caso os juízos de conveniência e oportunidade surjam para ambas.
o atingimento da finalidade essencial das tratativas: a conclusão do contrato. Nisso É um ato, ou processo, que requer uma certeza: a de que pode conduzir ao fechamen-
inclui-se a necessidade da parte comunicar claramente as reais possibilidades, mate- to do contrato. A negociação é, portanto, um processo teleológico, dotado de uma
riais e jurídicas, de concluir o negócio, a fim de evitar despertar inutilmente na outra finalidade ~ a eventual conclusão contratual ~ o que requer um comportamento leal e
a confiança legítima na celebração, como ocorre quando alguém, mesmo sem ser ti- honesto em todo o seu desenrolar. Por esta razão, tem-se considerado como contrário
95 Ob. cit., p. 167. 98 TJRS, 5" Câm. Cív.,Ap. Cív. n° 591017058, Rei. Des. Rosado de Aguiar Jr.,julg. em 25.4.1991, v.u.,
200/ 96 Ob. cit., p. 58 com grifos no original. RJTJRGS no 152, p. 605. 201
97 Ob. cit., p. 551. 99 Ob. cit., p. 170. /
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Dentre esses deveres encontram-se os deveres de consideração, os quais devem ser não a de uu.v••u••vv·vD, conhecidas em
observados tanto pelo devedor como credor e que incidem m<lej:)eJJtdenü~mente difusão possa se revelar danosa à As infor-
da vontade das partes; ser lesiva ou
h) a boa-fé objetiva atua em todas as fases do fenômeno obrigacional: elabora- da tenha caído no domínio .,u,uw~v.
ção (negociai), execução (contratual) e término (pós-contratual). A forma de acuayC<V Todos os deveres de resultantes da boa-fé encontram, de
distingue-se basicamente em função da existência de vínculo jurídico obrigacional, ou acordo com o novo no art. 422.
seja, conforme se esteja diante de relação obrigacional ou de relações de contato. No
primeiro caso, a boa-fé objetiva impõe deveres, ao lado da prestação, cuja violação
origina responsabilidade contratual, enquanto, no segundo, esses deveres assumem
um papel principal, na medida em que são os únicos deveres a serem observados pelas
partes, cuja violação faz nascer uma responsabilidade de natureza extracontratual; ALMEIDA COSTA, Mário Júlio de. Responsabilidade civil pela ruptura das negociações preparatórias de
i) os deveres resultantes da boa-fé objetiva distinguem-se do dever geral de não um contrato. Coimbra: Coimbra, 1984.
causar dano e, tendo em vista que esses deveres incidem já a partir do momento em que BASEDOW, Jürgen und andere. Münchener Kommentar. v. 2. München: Verlag C. H. Beck, 2003.
BASSO, Maristela. Contratos internacionais do comércio. 2" ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
as partes entram em contato para iniciar as negociações, tem-se que o fundamento da
1998.
responsabilidade pré-contratual é precisamente a boa-fé objetiva, pois dela decorrem BENATTI, Francesco. A responsabilidade pré-contratual. Coimbra: Livraria Ahnedina, 1970.
os deveres de conduta que, quando violados, dão ensejo à referida responsabilidade; BITTAR, Carlos Alberto. Curso de direito civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1994, vol. 1.
j) não existe um catálogo exaustivo dos deveres de consideração, decorrentes da CAPPELARI, Récio Eduardo. Responsabilidade pré-contratual. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
boa-fé objetiva, o que equivale a dizer que esses deveres são identificados de acordo 1995.
CARVALHO DE MENDONÇA, J. X. Tratado de direito comercial. 4" ed. Rio de Janeiro, 1947, vol. 6.
com as circunstâncias do caso concreto. A doutrina, contudo, elenca alguns exemplos,
CARVALHO SANTOS, J. M. Código Civil brasileiro interpretado. Rio de Janeiro: Carvino Filho, 1936,
como o dever de lealdade, de informação, de proteção e de sigilo. Esses incidem em
vol. 16.
todas as fases do fenômeno obrigacional, mas, na fase negociai, consistem nos plinci- CHAVES, Antônio. Responsabilidade pré-contratual. Rio de Janeiro: Forense, 1959.
pais deveres a serem observados pelas partes em negociação; COUTO E SILVA, Clóvis V. A obrigação como processo. Tese para concurso da cadeira de Direito Civil da
k) o dever de proteção impõe à parte o dever de não causar dano ao outro. A de- Faculdade de Direito da Universidade do Rio Grande do Sul, 1964.
dução desse dever da boa-fé objetiva é, entretanto, controvertida nos sistemas dotados DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, vol. 3.
DORNER, Heinrich undAndere. BGB Handkommentar. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 2001.
de cláusula geral de responsabilidade civil. Face ao art. 927 do CC, alguns autores de-
FICHTNER PEREIRA, Régis. A responsabilidade civil pré-contratual. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
fendem a tese da autonomia do dever de proteção em relação à boa-fé objetiva, sendo, GARCIA RUBlO, Maria Paz. La responsabilidad precontractual en e/ derecho espano/. Madrid: Editorial
na realidade, a cláusula geral de responsabilidade civil do referido dispositivo legal a Tecnos, 1991.
fonte primordial do dever de proteção; GOMES, Orlando. Contratos. 22" ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
l) o dever de informação impõe às partes o dever de comunicar, uma a outra, JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antônio. "A boa-fé na formação dos contratos". In: Revista de Direito do
todas as informações relevantes para a formação do convencimento acerca da con- Consumidor no 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, pp. 78-87, 1992.
. "Responsabilidade pré-contratual no Código de Defesa do Consumidor: estudo comparativo
veniência e oportunidade do futuro contrato. A relevância da informação mede-se ~~-
____.A parte geral do projeto de código civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1986.
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