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ABSTRACT
RESUMO
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Este texto foi elaborado a partir de um estudo sobre a variação linguística e o ensino do português e de práticas vivenciadas
em salas de aula no curso de Pedagogia da Faculdade Metodista Granbery. Ele foi escrito pelas discentes do 5º. período em
2008/02 e pela professora Andreia R. Garcia Reis, coordenadora das atividades realizadas e responsável pela disciplina
Conteúdo e Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa no curso. As alunas participantes das atividades e co-autoras do
texto são: Sue Ellen Reis Oliveira Nascimento, Maria Alice Rodrigues Nazareth, Katie Martins Mello, Raphaela Abib Pimenta,
Marília das Graças de Araujo, Maria Isabel de Azevedo Lacerda, Neusa Elena Rodrigues de Moraes, Fabiane Aparecida
Nicodemos, Luzitana Madalena do Nascimento Silva, Valeria Vasques Gomes, Nathália Augusto Crivelaro e Marta Lucia da
Rocha.
desenvolvimento de novas habilidades linguísticas pelos alunos e relatar as
atividades práticas realizadas em diferentes escolas com relação à variedade
linguística do português. Defende-se que a prática do ensino de Língua Portuguesa
na escola precisa assumir e respeitar a diversidade linguística do português e
combater o preconceito linguístico de variantes dialetais não prestigiadas.
1. INTRODUÇÃO
Não há muito tempo que a língua falada tem sido analisada como objeto
de estudo. A língua portuguesa falada no Brasil, tema deste artigo, oferece a
possibilidade de uma pesquisa detalhada, uma vez que não possui uma unidade
linguística, ou seja, apresenta diferentes formatos.
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Segundo Bagno (2004), o português falado no Brasil não é uno, embora
pertença a uma única língua. Para o autor:
[...] a verdade é que no Brasil, embora a língua falada pela grande
maioria da população seja o português, esse português apresenta
alto grau de diversidade e de variabilidade, não só por causa da
grande extensão territorial do país – que gera diferenças regionais
bastante conhecidas e também vítimas, algumas delas, de muito
preconceito -, mas principalmente por causa da trágica injustiça
social que faz do Brasil o segundo país com pior distribuição de
renda em todo mundo (BAGNO, 2004, p.16).
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sua variação, especialmente as diferenças entre o Brasil urbano e o Brasil rural.”
(BORTONI-RICARDO, 2006, p.18).
Bortoni-Ricardo (2006) destaca o crescimento da população brasileira e a
intensa migração para a cidade, em que esses habitantes do meio rural trouxeram
consigo sua diversidade cultural e linguística. De forma semelhante, imigrantes de
outros países também contribuíram para as diferenças da fala de acordo com a
região por eles ocupadas. Em suma, a diversidade cultural e linguística brasileira é
resultado de soma de fatores não só geográficos como também culturais e étnicos.
Todas essas formas de falar devem ser valorizadas e trabalhadas pelo professor em
sala de aula, de forma a cultivar no educando uma consciência multicultural.
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primeiros dias de aula são feitos os “combinados” com a turma, explicando aos
alunos que algumas atitudes a serem tomadas por ela os ajudarão em sua vida
escolar e que eles devem agir sem rejeição ao seu pedido, já que estão em um
ambiente propício para o aprendizado, a escola.
O “combinado” entre alunos e professora é que nos momentos em que
uma palavra ou expressão da língua portuguesa for usada diferentemente da forma
preconizada pela norma padrão do português, eles terão o dever de ressaltar esse
uso e sugerir outra possibilidade, como forma de adequar o discurso às situações
formais de sala de aula.
Segundo a professora, o “combinado” foi criado com a intenção de criar
um ambiente em sala de aula que propicie a reflexão dos usos linguísticos pelos
alunos, assumindo a importância deles reconhecerem e utilizarem uma variedade
considerada prestigiada em situações públicas e de maior formalidade. No entanto,
também é explicado e exemplificado para a classe, em diferentes momentos e com
o apoio de diferentes recursos pedagógicos, que existem variedades linguísticas que
devem ser respeitadas e que se os alunos pararem para observar, eles mesmos
adotam diferentes usos da linguagem oral no seu cotidiano.
Como foi relatado pela professora, os alunos têm compromisso com o
monitoramento de sua fala, principalmente em algumas atividades desenvolvidas,
como o jornal falado e relatos feitos pelos alunos em diferentes situações, e isso
contribui para a aquisição de novas habilidades linguísticas.
Outra atividade realizada por um grupo de discentes foi com crianças da
Educação Infantil, com idade entre cinco e seis anos, cujo objetivo era mostrar um
pouco da variedade linguística existente no português brasileiro.
No primeiro momento foi proposto aos alunos que assistissem ao filme
Um dia de cão, da turma da Mônica, e depois de terminado o filme fossem
destacadas as falas consideradas desprestigiadas produzidas pelo personagem
Cebolinha.
As palavras destacadas pelos alunos foram escritas no quadro e, a partir
de então, as crianças fizeram a leitura de cada uma delas2. Depois que os alunos
liam as palavras no quadro, era feita uma comparação entre a pronúncia do
personagem Cebolinha e a pronúncia utilizada pelos alunos. Houve uma conversa
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Nem todos os alunos dessa turma já leem com fluência, alguns leem e outros ainda estão se
apropriando do sistema da escrita, mas todos participaram da atividade.
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com os alunos sobre a variedade linguística do português, incentivando-os a
observar diferentes formas de falar.
Para finalizar, a professora realizou uma brincadeira com os alunos
denominada de Batata-quente, em que eles estavam sentados em círculo e um
objeto era passado enquanto uma música era tocada. Quando a música era
interrompida, o aluno com o objeto na mão lia uma das palavras escritas no quadro,
da forma como ele está habituado a pronunciá-la. Aqueles alunos que ainda não
sabiam ler tinham ajuda de um colega ou da professora.
A terceira atividade realizada pelas discentes foi uma entrevista com
professores e coordenação pedagógica de uma escola da rede particular, cujas
questões eram sobre a utilização da modalidade falada da língua no ambiente
escolar.
Durante as entrevistas, as pedagogas relataram que se preocupam em
monitorar suas falas quando estão participando de momentos de maior formalidade,
principalmente em atendimento aos pais ou responsáveis pelos alunos, uma prática
constante na escola onde trabalham. Em outros momentos, em diálogos mais
descontraídos, uma delas disse não se preocupar com a linguagem por ela
praticada, mesmo estando na escola, entre colegas de trabalho e/ou alunos.
Um fato bastante comum e que foi relatado é quando o monitoramento da
fala torna-se uma prática recorrente e, às vezes, ocorrem hipercorreções, ou seja,
correções em palavras ou expressões que não deveriam ocorrer, havendo excesso
de zelo na pronúncia das palavras e, assim, a professora acaba cometendo um
equívoco ao pronunciar certas palavras.
A quarta atividade desenvolvida foi aplicada com um grupo de alunos que
frequenta as aulas do Laboratório de Aprendizagem de uma escola pública, espaço
em que eles fazem os deveres solicitados, tiram dúvidas e têm experiências que os
ajudarão a acompanhar o conteúdo desenvolvido em sala de aula. Os encontros do
Laboratório acontecem fora do horário regular das aulas e o número de alunos é
reduzido, em torno de dez em cada encontro. Esses alunos têm entre oito e dez
anos.
Para iniciar a atividade, foram levadas para o grupo algumas tirinhas e
histórias em quadrinhos do personagem Chico Bento, que foram lidas e discutidas
por todos. Em seguida, as discentes pesquisadoras – que neste momento eram as
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responsáveis pelo trabalho com os alunos - pediram que eles observassem as
palavras e expressões características da fala rural, presentes na interação oral entre
os personagens das histórias.
Em seguida, foi feita uma votação para a seleção da tira da qual as
crianças mais gostaram, sendo proposto que fosse feita a reescrita das falas com o
emprego de expressões e palavras próprias da fala urbana, substituindo aquelas
características da variedade rural. Ao elaborarem a reescrita, foi solicitado atenção
ao emprego da língua padrão, pois tratava-se da modalidade escrita.
A reescrita foi lida e discutida pelos alunos, que fizeram uma comparação
entre os dois dialetos empregados, atentando-se para o fato de que as duas falas
são certas, embora pertençam a dialetos diferentes. Foi discutido o preconceito
linguístico existente por parte daqueles que consideram o dialeto rural errado e feio,
ressaltando o prestígio social que cada um dos dialetos – rural e urbano – tem em
nossa sociedade. Outra questão discutida foi a diferença entre as modalidades
falada e escrita, no que diz respeito ao caráter convencional desta. Ainda nesse
encontro, foi feita uma lista das palavras comparando aquelas usadas nos diálogos
da historinha do Chico Bento e aquelas utilizadas na reescrita.
Com o objetivo de dar continuidade ao trabalho com as variedades
linguísticas rural e urbana, foi proposta a escrita de um editorial pelos alunos, em
que eles deveriam defender a presença do personagem Chico Bento no ambiente
escolar, como forma de os alunos terem contato com sua cultura e seu dialeto. O
editorial foi escrito em conjunto pelos alunos e publicado no Jornal-mural da escola.
A última atividade a ser relatada neste artigo foi uma breve pesquisa, com
os alunos de uma escola pública, sobre a presença do personagem Chico Bento na
escola, por meio de suas histórias nas revistas em quadrinhos. Depois de conversar
com vários alunos, de diferentes idades e anos letivos, as discentes pesquisadoras
observaram que as histórias do Chico Bento não são trazidas para a escola como
possibilidade de os alunos terem contato com o dialeto rural.
Um dos questionamentos feitos aos alunos entrevistados é se eles
gostariam de ler e conhecer mais sobre a cultura e o modo de falar do personagem
Chico Bento, uma vez que todos disseram já conhecê-lo e terem lido suas histórias.
Como as respostas eram quase sempre negativas, as discentes pesquisadoras
argumentavam a respeito da importância de todos conhecerem uma linguagem
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diferente e que não deve ser considerada errada, pois pertence à cultura rural.
Depois de conversas com vários grupos de alunos, foi solicitado a alguns deles que
produzissem uma carta para o Chico Bento, convidando-o a vir à escola para que
todos pudessem conhecê-lo.
O conteúdo das cartas produzidas pelos alunos revela que muitos deles
apresentam preconceito linguístico mediante a fala do personagem, pois vários
alunos relataram nos textos que o personagem é burro e que deveria vir estudar com
eles para aprender a ler, escrever e falar corretamente. Muito possivelmente os
alunos, assim como grande parte da população, têm a crença de que o dialeto rural
é errado e precisa da intervenção da escola para corrigir essa fala.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
MOLLICA, Maria Cecília. Fala, letramento e inclusão social. São Paulo: Contexto,
2007.
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SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 2. ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2003.
_____. Linguagem e escola: uma perspectiva social. 14 ed. São Paulo: Editora
Ática, 1996.
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