Sunteți pe pagina 1din 78

05) INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL

Interpretação dos Direitos Fundamentais


a) Luis Roberto Barroso - pág. 01/47
b) JJ Canotilho - 1032/1114
c) Konrad Hesse pág. 35/51
Fundamentos Teóricos e Filosóficos
do Novo Direito Constitucional Brasileiro
(Pós-modernidade, teoria crítica e pós~positivismo) 1

Luis Roberto Barroso

Sumário: Capítulo I: Pré-compreensão do tema. L A pós-moder-


nidade e o direito; 11. A busca da razão possíveL Capítulo lI:
Algumas bases teóricas. r. A dogmática jurídica tradicional e sua
superação; 11. A teoria crítica do direito. Capftulo IlI: Algumas
bases filosóficas. I. Ascensão e decadência do jusnaturalismo; lI.
Ascensão e decadência do positivismo jurídico; III. Pós-positivis~
mo e a normatividade dos princípios. Capítulo IV: Conclusão. I.
A ascensão científica e política do direito constitucional no Bra-
sil; 11.Síntese das idéias desenvolvidas.

Capítulo I
Pré-compreensão do Tema

I. A pós-modernidade e o direito2

1 Sou grato à acadêmica Débora Cagy por seu valioso auxilio na pesquisa e na
organização dos materiais. E aos colegas Ana Paula de Barcellos, Nelson
Nascimento Diz e Luís Eduardo Barbosa Moreira pelas críticas e sugestões
apresentadas.
'2 BAUMAN, Zygmunt. A globalização: as c01l$eqii.ê~ciashumanas. Rio de
Janeiro: J. Zahar Editor, 1999; RAMONET, Ignãcio. "O pensamento único e os
regimes globalitários". In: Globali2ação: o fato e o mito. Rio de Janeiro: Editora
UERJ, 1998; ARNAUD, André-Jean. O direito entre modernidade e
globalizaçi.io. Rio de Janeiro: Renovar, 1999; SANTOS, Boaventura de Souza.
Planeta Terra. Início do século XXI. Ainda sem contato com sários e acenar com algumas idéias para o presente e para o futuro.
outros mundos habitados. Entre luz e sombra, descortina-se a pós- Antes de avançar, traçam-se algumas notas introdutórias para si-
modernidade. O rótulo genérico abriga a mistura de estilos, a des- tuar'fr'leitor. A interpretação dos fenômenos políticos e jurídicos
crença no poder absoluto da razão, o desprestígio do Estado. A era não é um exercício abstrato de bus.ca de verdades universais e
da velocidade. A imagem acima do conteúdo. O efêmero e o volátil atemporais. Toda interpretação é produto de uma época, de um
parecem derrotar o permanente e o essencial. Vive~se a angústia do momento histórico, e envolve os fatos a serem enquadrados, o sis-
que não pôde ser e a perplexidade de um tempo sem verdades tema jurídico, às circunstãncias do intérprete e o imaginário de
seguras. Uma época aparentemente pós-tudo: pós-marxista, pós-
cada u~. A identificação do cenário, dos atores, das forças mate-
kelseniana, pós~freudiana3.
riais atuantes e da posição do sujeito da interpretação constitui o
Brasil. 2001. Ano 13 da Constituição de 1988. Sem supersti- que se denomina de pré-compreensão4•
ções. O constitucionalismo vive um momento sem precedentes, de
. A paisagem é complexa e fragmentada. No plano internacional,
vertiginosa ascensão científica e política. O estudo que se vai de-
vive-se a decadência do conceito tradicional de soberania. As fron-
senvolver procura investigar os antecedentes teóricos e filosóficos
teiras rígidas cederam à formação de grandes blocos políticos e
desse novo direito constitucional, identificar seus principais adver~
econômicos, à intensificação do movimento de pessoas e mercado-
rias e, mais recentemente, ao fetiche da Circulação de capitais. A
globalização, como conceito e como símbolo, é a manchete que
"Unia cartografia simbólica das représentações sodais: prolegÔmenos a uma
concepção pós-moderna do direito~, Revista Brasimra de Cimcias Criminais,
anuncia a chegada do novo século. A desigualdade ofusca as con~
1996; FARIA, José Eduardo. "Globalização, autonomia decisória e política". In: quistas da civilização e é potencializada por uma ordem mundial
CAMARGO, Margarida Maria Lacombe (org.). 1988"1998: uma década de fundada no desequihbrio das relações de poder político e econômi-
Constituição. Rio de Janeiro: Renovar, 1999; SARMENTO, Daniel. co e no controle absoluto, pelos países ricos, dos órgãos multilate-
"Constitu\ção e globalização: a crise dos paradigmas do direito constitucional",
rais de finanças e comércio.
Rroista de Direito Administrativo"n. 215, 1999; CHAUí, Marilena. ~Público,
privado, despotismo". In: NOVAES, Adauto (org.). Ética: São Paulo: Secretaria No campo econômico e social, tem-se assistido ao avanço verti-
Municipal de Cultura: Companhia das Letras, 1992; AZEVEDO, Antônio ginoso da ciência e da tecnologia, com a expansão dos domínios da
Junqueira de. "O direito pós-moderno e a codificação". In: Anais da XVII informática e da rede mundial de computadores e com as promes-
Confermcia Nacional da Ordtm dos Advogados do Brasil, v. I, 2000; RAMOS sas e questionamentos éticos da engenharia genéticas. A obsessão
FILHO, Wilson. 'Direito pós-moderno: caos criativo e neol:iberalismo~. In:
Direito e neoliberalismo. Curitiba: EDIBEJ, 1996; HONDERlCH, Ted (editor).
The O'Xford Companion to Philosophy. New Yorle Oxford University Press,
1995; ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins 4 Sobre o tema. dapré-çompT/:emão, vejam.se LARENZ, Karl. Metodologia da
FçlOtes, 1998; REICH, Norbert. "Intervenção do Estado na economia (reflexões cilncia do din:iro. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, pp. 285 ss.; e
sobre a pós-modernidade na teoria jurídica)", Revista de Direito Publico, n. 94, HESSE, Konrad. Escritos de dereçho constitucional. Trad. Pedro Cruz Villalón.
1990, p. 265. Madrid: Centro de Estudios Constitudonales, 1983, p. 44: "EI intérprete no
3 MARQUES, Cláudia Lima. A crise científica do direito na pós-modernida-
U
puede captar eI conteIÚdo da la norma desde un punto cuasi arquimédico situado
de e seus reflexos na pesquisa", Cidadania e Justiça, n. 6, 1999: "(Pós-m-oderni- fuera de la existencia histórica sino únicamente desde la concreta situación
ef,ade) ê uma tentativa de descrever o grande ceticismo, o fim do racionalismo, o histórica en la que se encuentra, cuya plasmaci6n ha conformado sus hãbitos
vazio teórico, a insegurança jurídica que se observam efetivamente na sociedade, mentales, condicionando sus conodmientos y sus pre-juicios."
no modelo de Estado, nas formas de eConomia, na ciência, nos princípios e nos S Sobre esta temática, vejam-se BARRETIO, Vicente de Paulo. "Bioética,
. valores de nossos povos nos dias atuais. Os pensadores europeus estão a denomi- biodireito e direitos humanos". In: TORRES, Riqrdo Lobo (org.). Teoria dos
nar éste momento de.rompimento (Umbruch), de fim de uma era e de início de direitos fundamentais. Rio de Janeiro:.Renovar, 1999; FACHIN, Luiz Edson.
algo novo, ainda não identificado." "Bioética e tecnologia", In: Elementos criticos de direito tU famllia. Rio de

2
3
da eficiência tem elevado a'exigência de escolaridade, especializa- direito ad'quirido - sofre o sobressalt~ da velocidade, do imedia-
ção e produtividade, acirrando a competição no m~rcado de traba- tismo e das interpretaçõ~s pragmáticas, embaladas pela ameaça do
lho e ampliando a exclusão social dos que não são competitivos horror econômico. & fórmula~ abstratas da lei e a discrição judicial
porque não podem ser, O Estado já não cuida de miudezas como já não trazem todas as respostas. O paradigma jurídico, que já pas-
pessoas, seus projetos e sonhos, e abandonou o discUrso igualitário sara~ na 1l10dernidade, da lei para o juiz, transfere-se agora para o
ou emancipatório. O desemprego, o subemprego e a informalidade caso concreto, para a melhor solução, singular ao problema a ser
tornam as ruas lugares tristes e inseguros. resolvido.
Na política, consuma-se a desc-onstrução do Estado tradicional, Seria possível seguir adiante, indefinidamente, identificando
duramente questionado na sua capacidade de agente do progresso outras singularidades dos tempos atuais. Mas o objeto específico
e da justiça social. & causas se acumularam impressentidas, uma do presente estudo, assim como circunstâncias de tempo e de es-
conspiração: a onda conservadora nos Estados Unidos (Reagan, paço, recomendam não prosseguir com a apresentaçã!J analítica das
Bush) e na Europa (Thatcher) na década de 80; o colapso da expe- complexidades e perplexidades desse início de era. Cumpre dar
riência socialista, um sonho desfeito em autoritarismo, burocracia desfecho a este tópic07 ..
e pobreza; e o fiasco das ditaduras sul-americanas, com seu modelo
O discurso acerca do Estado õltravessou, ao longo do s~cu:loXX,
estatizante e violento, devastado pelo insucesso e pela crise so-
três fases distintas: a pré-modernidade (ou Estado liberal), a mo-
cial. Quando a noite baixou, o espaço privado ifivadira o espaço
dernidade (ou Estado social) e a pós-modernidade (ou Estado neo-
público, o público dissociara-se do estatal e a desestatização virara
liberal). A constatação inevitável, desconcertante, é que o Brasil
um dogma. O Estado passou a ser o guardião do lucro e da compe~
titividade. chega à pós-modernidade sem ter conseguido ser liberal nem mo-
No direito, a temática já não é a liberdade individual e seus derno. Herdeiros de uma tradição autoritária e populista, e1itizada
limites, como no Estado liberal; ou a intervenção estatal e seus e excludente, seletiva entre amigos e inimigos - e não entre certo
limites, como no welfare state. Liberdade e igualdade já não são os e errado, justo ou injusto -, mansa com os rico.s e dura com os
ícones da temporada. A própria lei caiu no desprestígio. No direito pobres, chegamos ao terceiro milênio atrasados e com pressa.
público, a nova onda é a governabilidade. Fala-se em desconstitu-
cionalização, delegifieação, desregulamentação. No direito priva~
regras de fontes não nacionais, denominadas ll'lx ml'lrcatoria, que consagram o
do, o código civil perde sua centralidade, superado por múltiplos primado dos usos no comércio internacional e se materializam também por meio
microssistemas. Nas relações comerciais revive-se a Iex mereato- dos contratos e cLiusulas-tipo, jurisprudência arbitral, regulamentações profis-
ria6• A segurança jurídica - e seus conceitos essenciais, como o sionais elaboradas por suas associações representativas e principios gerais cc>-
rouns às legislações dos países.
7 Nada obstante, não resisto à transcrição de trecho de BARBOSA MOREI-

Janeiro: Renovar, 1999; DINIZ, Maria Helena. ° estado atual do biodirrito. São
Paulo: Saraiva, 2001; e BARBOZA, Heloísa Helena; BARREITO, Vicente de
RA, José Carlos acerca da influência da globalização sobre a cultura e a linguagem
no Brasil (~A subserviência cultura!". In: Tfmla$ de direito processual. Sétima
Série. São Paulo: Saraiva, 2001): «Às vezes me assalta a tentação de dizer, à guisa
Paula (orgs.). Temas de biodireito e bio~tica. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, onde de imagem, que a língua portuguesa, entre n6s, está sendo repetidamente estu-
se averbou: ~As técnÍcas de reprodução humana assistida, o mapeamento do prada. A i~agem, contudo, não é boa: o estupro importa violência do sujeito
genoma, o prolongamento da vida mediante transplantes, as técnicas para altera- ativo sobre o passivo. Ora, não costuma partir dos norte-americanos, que se
ção do sexo, a clonagem e a engenharia genética descortinam de forma acelerada saiba, pressão alguma no sentido de batizarmos com nomes ingleses condomínios
um cenário desconhecido e imprevisível, no qual o ser humano é simultaneamen- e clínicas, nem de exclamarmos 'uau' quando nos sentimos agradavelmente
te ator e espectador" (BARBOZA, Heloísa Helena. "Bioética x biorureito: insu- surpreendidos. O que se passa é que muitos gostam de entregar-se ainda na
ficiência dos conceitos jurídicos", p. 2). ausência de qualquer compulsão. Isso acontece com o corpo, e já é algo lamentá-
6 Como o comércio internacional não tem fronteiras, tende a ser regulado por vel. Mas também acontece com a alma, e aí s6 se pode falar de desgraça."

4
5
11.A busca da razão possível8 jetados e imperceptíveis que condicionam o pensamento, inde-
pendentemente da vontade.
Os gregos inventaram a idéia ocidental de razão como um pen- Ô 'segundo abalo veio com Freud. Em passagem clássica, ele
samento que segue princípios e regras de valor universal. Ela é o identifica três momentos nos quais o homem teria sofrido duros
traço distintivo da condição humana, juntamente com a capadda~ golpes' na percepção de si mesmo e do mundo à sua volta, todos
de de aCUITlularconhecimento e transmiti-lo pela linguagem. Traz
desferidos pela mão da ciência. Inicialmente com Copérnico e a
efl? si a superação dos mitos, dos preconceitos, das aparências, das
revelação de que a Terra não era o centro do universo, mas um
opiniões sem fundamento. Representa, também, a percepção do
outro, do próximo, em sua humanidade e direitos. Idealmente, a minúsculo fragmento de um sistema cósmico de vastidão inimagi-
razão é o caminho da justiça, o domínio da inteligência sobre os uáveI. O segundo com Darwin, que através da pesquisa biológica
instintos, interesses e paixões. destruiu o suposto lugar privilegiado que o homem ocuparia no
Sem enveredar por um debate filosófico feito de sutilezas e âmbito da criação e provou sua incontestável natureza animal. O
complexidades, a verdade é que a crença iluminista no poder quase último desses golpes - que é o que aqui se deseja enfatizar -veio
absoluto da razão tem sido intensamente revisitada e terá sofrido com o próprio Freud: a descoberta de que o homem não é senhor
pelo menos dois grandes abalos. O primeiro, aind:a no século XIX, absoluto sequer da própria vontade, de seus desejos, de seus instin-
provocado por Marx, e o segundo, já no século XX, causado por tos. O que ele fala e cala, o que pensa, sente e deseja é fruto de um
Freud. Marx, no desenvolvimento do conceito essencial à sua teo- poder invisível que controla o seu psiquismo: o inconsdente9 elO.
ria - o materialismo hist6rico - assentou que as crenças religio- É possível, aqui, enunciar uma conclusão parcial: os processos
sas, filosóficas, políticas e morais dependiam da posição social do políticos, sociais e psíquicos movem.se por caminhos muitas vezes
indivíduo, das relações de produção e de trabalho, na forma como
estas se constituem em cada fase da história econômica. Vale dizer:
a razão não é fruto de um exercício da liberdade de ser, pensar e 9 FREUD, Sigmund. Pensamento vivo, cit., p. 59: ~Mas a megaiomania huma-
criar, mas prisioneira da ideologia, um conjunto de valores intro- na terá sofrido o seu terceiro e mais contundente golpe da parte da pesquisa
psicológica atual, que procura provar ao ego que nem mesmo em sua própria casa
é ele quem dá as ordens, mas que deve contentar-se com as escassas informações
do que se passa inconscientemente em sua mente."
8 CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1999; DEL \O Em uma crônica densa e espirituosa ('A quarta virada", Revista de Domingo,
VECCHI0, Giorgio. Filasofia dei derecho. Barcelona: Bosch Casa Editaria!, Jornal do Brasil), após comentar as transformações advindas com Copérnico,
1997; REALE, Miguel. Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 2000; .Darwin e Freud, escreveu VERíSSIMO, Luís Fernando: "Mas houve outra virada
RADBRUCH, Gustav. Filosofia do direito. Coimbra: Armênio Amado, 1997; no pensamento humano. A de Marx, que nos permitiu pensar num homem

introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 1986; JAPlASSU, H ..


. neutralidade cimtifica. Rio de Janeiro: Imago, 1975; FREUO, Sigmund.
°
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando:
mito da
predestinado, não pelas estrelas ou pelos seus instintos, mas pela hist6ria. Mes-
mo sem a orientação divina, estaríamos destinados a ser justos, pois a história, no
fIm, é morai. Em vez da escatologia cristã, Marx propôs uma redenção final
Pensamento vivo. São Paulo: Martin Claret, 1985; RICKMAN, John (editor). A cientifIcamente inescapãvel, e, se ninguém mais acredita em materialismo histó-
general selection /rom the works Df Sigmund Freud. New Varie Anchor Books, rico na prática, a compulsão solidária persiste, como uma fé religiosa que o
. '1989; KEHI.., Maria Rita. "A psicanálise e o domínio das paixões". In: NOVAES, desmentido dos fatos s6 reforça. Talvez porque seja a fé secular que reste para
Adauto (org.). Os sentidos da pairdo. São Paulo: Companhia das Letras, 1991; muita gente. Ficamos órfãos de todas as melhores ilusões a nosso respeito (inclu-
KELSEN, Hans. Teoria pura' do direito. Trad. João Baptista Machado. 4" ed. sive as marxistas) e nem assim nos resignamos à idéia de que aquilo que vemos
Coimbra: Armênio Amado Editor, 1979; ACKERMAN, Broce. "The rise of no espelho é apenas um bípede egoísta, em breve e descompromissada passagem
world constitutionalism", Yale Law SeMol Occasional Papers, Second Series, n. por um do.s planetas menores. Quando esta fé acabar, aí sim estaremos prontos
3, 1997; VAN DOREN, Charles. A history of knowledge. New York: Ballatine paa os magos e as seitas. Tenho ouvido falar numa que adora a Alcachofra
Books, 1991. Mística e ainda ensina como aplicar na bolsa. Vou investigar."

6 7
ocultos e imperceptíveis racionalmente. Os estudos de ambos os
interpretação. Isto é especialmente válido para o Direito, cuja ma-
pensadores acima -sem embargo de amplamentel:iuestionados ao
téria-prima é feita de normas, palavras, significantes e significados.
longo e, especialmente, ao final do século XX ---: operaram urna
A moderna dogmática jurIdiça já superou a idéia de que as leis
mudança profunda na compreensão do mundo. Admita.se, assim,
possam ter, sempre e sempre, sentido unívoco, produzindo uma
que a razão divida o palco da existência humana pelo menos com
única 'solução adequada para cada caso. A objetividade possível do
esses dois outros (f)atores: a ideologia e o inconsciente. O esforço
Direito reside no conjunto de possibilidades interpretativas qu~ o
para superar cada um deles, pela auto-crítica e pelo autoconheci- relato da norma oferece.
menta, não é vão, mas é limitado.' Nem por isso a razão se torna
Tais possibilidades interpretativas podem de~orrer, por exem-
menos importante. A despeito de seus-eventuais limites, ela con-
plo, (i) da discricionariedade atribuída pela norma ao intérprete,
serva dois conteúdos de especial valia para o espírito humano: (i) o
(ü) da pluralidade de significados das palavras ou (iH) da existência
ideal de conhecimenro, a busca do sentido para'a -realidade, para o
de normas contrapostas, exigindo a ponderação de jnteresses à vis-
mundo natural e cultural e para as pessoasl suas ações e obras; (ii)
ta do caso concreto. Daí a constatação inafastável de que a aplica-
o potencial da transformação, o instrumento crítico para com-
ção do Direito não é apenas um ato de conhecimento _ revelação
preender as condições em que vivem os seres humanos e a energia
do sentido de uma norma pré-existente -, mas também um ato de
para interferir na realidade, alterando-a quando necessãriol1•
vontade - escolha de uma possibilidade dentre as'diversas que se
A5 reflexões acima incidem diretamente sobre dois conceitos
apresentam12• O direito constitucional define a moldura dentro da
que integram o imaginár:io do conhecimento científico: a neutrali-
qual o intérprete exercerá sua criatividade e seu senso de justiça,
dade e a objetividade. Ao menos no douúnio das ciências humanas
sem conceder-lhe, contudo, um mandato para voluntarismos de
e, especialmente no campo do Direito, a realização plena de qual-
matizes variados. De fato, a Constituição institui um conjunto de
quer um deles é impossível. A neutralidade, entendida como um
normas que deverão orientar sua escolha entre as alternativas pos-
distanciamento absoluto da questão a ser apreciada, pressupõe um
síveis: princípios, fins públ~cos, programas de ação.
operador jurídico isento não somente das complexidades da subje-
tividade pessoal, mas também das influências sociais. Isto é: sem
história, sem memória, sem desejos. Uma ficção. O que é possível
12 Tal conclusão tem a adesão do próprio KELSEN, Hans, que intentou desen-
e desejável é produzir um intérprete consciente de suas circunstân- volver uma teoriajuridica pura, isto é, purificada de toda a ideologia política e de
cias: que tenha percepção da sua postura ideológica (autocrítica) e, todos os elementos de ciência natural, considerando que o problema da justiça,
na medida do possível, de suas neuroses e frustrações (autoconhe- enquanto problema valorativo, situa-se fora da teoria do direito. Em sua celebra-
cimento). E, assim, sua atuação não consistirá na manutenção in- da Teoria pura do direito - uma das obras de maior significação no século que
consciente da distribuição de poder e riquezas na sociedade nem na se encerrou - escreveu ele (4" ed. Trad. João Baptista Machado. Coimbra:
Armênio Amado, 1979, pp. 466-70): "A teoria usual da interpretaçãó quer fazer
projeção nardsica de seus desejos ocultos, complexos e culpas. crer que a lei, aplicada ao caso concreto, poderia fornecer, em todas as hipóteses,
A objetividade se realízarí~ na existência de princípios, regras e apenas uma única solução COrreta (ajustada) e que a 'justeza' (correção) jurfdico-
conceitos de validade geral, independentemente do ponto de ob- positiva desta decisão é fundada na própria lei. (...) A interpretação de uma lei
servação e da vontade do observador. O certo, contudo, é que o não deve necessariamente conduzir a uma única solução como sendo a única
conhecimento, qualquer conhecimento, não é uma foto, um fla- correta, mas possivelmente a várias soluções que _ na medida em que apenas
sejam aferidas pela lei a aplicar - têm igual valor, se bem que apenas uma delas
grante incontestável da realidade. Todos os objetos estão sujeitos à
se torne Direito positivo no ato do órgão aplicador do Direito. (... ) Na aplicação
do Direito por um órgão jurídico, a interpretação cognoscitiva (obtida por uma
operação de conhecimento) do Direito a apliçar combina-se com um ato de
li CHAUI, Marilena. Convite àfilosofia, cit., pp. 85-7. vontade em que o órgão aplicador do Direito efetua uma escolha entre as
possibilidades reveladas através daquela mf':lma interpretação cognoscitiva .•
8
9
o constitucionalismo chega vitorioso ao iníc~odo milênio, con- direta e imediatamente apreendidas pelos sentidos. Como nas reli-
sagrado pelas revoluções liberais e após haver disputado com inú~ giões senúticas - judaísmo, cristianismo e islamismo -, tem seu
meras outras propostas alternativas de construção de uma socieda- màrco zero, seus profetas e acena com o paraíso: vida civilizada,
de justa e de um Estado democrático13• A razão de seu sucesso está justiça e t3.Ivezaté felicidade. Como se percebe, o projeto da mo-
em ter conseguido oferecer ou, ao menos, incluir no imaginário das dernidade não se consumou. Por isso não pode ceder passagem.
pessoas: (i) legitimidade -, soberania popular'na formação da von- Não no direito constitucional. A pós-modernidade, na porção em
tade nacional, por meio do poder constituinte; (ii) limitação do que apreendida pelo pensamento neoliberal, é descrente do cons~
poder - repartição de competências, processos adequados de to- titucionalismo em geral, e o vê como um entrave ao desmonte do
mada de decisão, respeito aos direitos individuais, inclusive das Estado sociall4• Nesses tempos de tantas variações esotéricas, se
minorias; (iii) valores - incorporação à Constituição material das lhe fosse dada a escolha, provavelmente substituiria a Constituição
conquistas sociais, políticas e éticas acumuladas no patrimônio da por um mapa astral.
humanidade.
Antes de encerrar este tópico, é de proveito confrontar estas
idéias - reconfortantes e apaziguadoras - com o mundo real à Capítulo 11
volta, com a história e seus descaminhos. A injustiça passeia impu- Algumas bases teóricas
nemente pelas ruas; a violência social e institucional é o símbolo
das grandes cidades; a desigualdade entre pessoas e países salta
1.,A dogmática jurídica tradicional e sua superaçãol5
entre os continentes; a intolerância política, racial, tribal, religiosa
povoa ambos os hemisférios. Nada assegura que as conclusões ali-
nhavadas nos parágrafos acima sejam produto inequívoco de um
conhecimento racional. Podem expressar apenas a ideologia ou o 14 FARIA, José Eduardo, in Preficio ao livro de CITIADINO, Gisele. Plura.
lismo, direito e juçtiça distributiva. Rio de Janeiro: Lumen luril;, 1999: "No
desejo. Um esforço de estabilização, segurança e paz onde talvez limiar do século XXI, contudo, a idéia de constituição cada vez mais é apontada
preferissem luta os dois terços da população mundial sem acesso ao como entrave ao funcionamento do mercado, como freio da competitividade dos
frutos do progresso, ao consumo e mesmo à alimentação. agentes econômicos e como obstáculo à expansão da economia". Insere-se nessa
A crença na Constituição e no constitucionalismo não deixa de discussão a idéia dé Constituição meramente procedimental, que estabeleceria
ser uma espécie de fé: exige que se acredite em coisas que não são apenas as regras do prm::esso político, sem fazer opções por valores ideologica-
mente engajados. Sobre o tema, v. BARCELLOS, Ana Paula de. A ejicáda
jurídica MS prindpios constitucionais. O princípio da dignidade da pessoa hu-
mana. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 20.
13 V. BARROSO, Luís Roberto. "Doze anos da Constituição brasileira de 15 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito, cit.; BOBBIO, Norberto. Teoria do
1988". In: Temas de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2001: "O ordenamento jurldico. Brasília: Editora Universidade de BrasrIia, 1990;
constitucionalis11W tem se mostrado como a melhor opção de limitação do poder, ENGISCH, Karl.lntToduçdO aa pensamento jurídico. Usboa: Fundação Calouste
respeito aos direitos e promoção do progresso. Nada parecido com o fim da Gulbenkian, 1996; LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito, dt.;
história, porque valorizar e prestigiar a Constituição não suprime a questão DAVID, René. Os grandes sistemas jurídicos. Lisboa: Fundação Calouste
poIrtica de definir o que vai dentro dela. Mas o fato é que as outras vias de Gulbenkian, 1978; REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo:
institucionaliiação do poder praticadai ao longo do tempo não se provaram mais Saraiva, 1990; CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamrnto sistemático e conceito de
atraentes". Vejam-se algumas outras propostas que tiveram relevância ao longo sistema na cilncia do direito. Lisboa; Fundação Calouste Gulbenkian, 1996;
do século. O marxismo-leninismo colocava'no centro do.sistema, não a Consti- FERRAZ, Tércio Sampaio. Função social da dogmática juridica. São Paulo;
tuição, mas o Partido. O militarismo anticomunista gravitava em torno das Revista dos Tribunais; 1998; LOPES, José Reinaldo de Lima. O direito na
Forças Armadas. O fundamentalismo islâmico tem" como peça central o Corão. história. São Paulo; Max Limonad, 2000; ASCENSÃO, José de Oliveira. O
Nenhuma dessas propostas foi mais bem-sucedida. direito: introdução e teoria geral. Rio de Janeiro; Renovar, 1993.

10 11
o Direito é uma invençã~ humana, um fen'õme~o histórico e .lidade da lt;i e neutralidade do intérprete. Tudo regido por Um
cultural, concebido como técnica de solução de c6~flit6s e instru- ritual solene, que abandoQou a peruca, mas conservou a tradição e
mento de pacific.ação social. A família jurídica romano~gennãnica o formalismo. Têmis, vendada, balança na mão, é o símbolo maior,
surge e desenvolve-se em tomo das relações privadas, com o direi- musa de muitas gerações: o Direito produz ordem e justiça, Com
to civil no centro do sistema. Seus institutos, conceitos e idéias equilíbrio e igualdade.
fizeram a história de povos diversos e atravessaram os tempos. O . Ou tàlvez não seja bem assim.
Estado moderno surge no século XVI, ao final da Idade Média,
sobre as ruínas do feudalismo e ftindado no direito divino dos reis.
Na passagem do Estado absolutista para' o Estado liberal, o Direito 11.A teoria crítica do direitol 7

incorpora o jusnaturalismo racionalista dos' séculos XVII e XVIII,


matéria prima das revoluções francesa e americana. O Direito Sob a designação genérica de teoria crítica do dir~ito, abriga-se
moderno, em suas categorias principais, consolida-se no século um conjunto de movimentos e de idéias que questionam o saber
XIX, já arrebatado pela onda positivista, com status e ambição de
ciência.
Surgem os mitos. A lei passa a ser vista como expressão supe- 17 MARX e ENGELS. Obras escolhidas, 2 vs. Silo Paulo: Alfa-Ómega, 1961;
rior da razão. A ciência do Direito - ou, também, teoria geral do COELHO, Luiz Fernando. Teoria critica do direito. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris, 1991; CORREAS, Óscar. Critica da ideologia jurídica. Porto
Direito, dogmática jurídica - é o domínio. asséptico da segurança
Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1995; MIAIu.E, Michel. Introdução critica ao
e da justiça. O Estado é a fonte única do 'poder e do Direito. O direito. llsboa: Estampa, 1989; WARAT, Luis Alberto. Introdução gtral ao
sistema jurídico é completo e auto-suficiente: lacunas eventuais direito, 2 vs. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1994.5; AZEVEDO, Plauto
são resolvidas internamente, pelo costume, pela analogia, pelos Faraco de. Critica à dogmática e hermenhltica jurídica. Porto Alegre: Sergio
princípios gerais. Separado da HIosofia do direito por incisão pro- Antonio Fabris, 1989; WOLKMER, Antonio Carlos. Introdução ao [Mnsamento
funda, a dogmática jurídica volta seu conhecimento apenas para a critico. São Paulo: Editora Acadêmica, 1995; WARAT, Luis Alberto. "O outro
lei e o ordenamento positivo, sem qualquer reflexão sobre seu pró- lado da dogmática juridica". In: ROCHA, Leonel Severo da (org.). Teoria do
direito e do Estado. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1994; HAYMAN,
prio saber e seus fundamentos de legitimidade. Robert; LEVIT, Nancy. Jurisprudence: contempora'ry readings, problems, and
Na aplicação desse direito puro e idealizado, pontifica o Estado narratives. St. Paul, Minnesota: West Publishing Co., 1994; MARí, Enrique
como árbitro imparcial. A interpretação jurídica é um processo (org.). MaterlaIes para una teoria critica dei derecho. Buenos Aites: Editorial
silogístico de subsunção dos fatos à norma. O juiz -la bouchequi Abeledo Perrot, 1991; CÁRCOVA, Carlos Maria.. A opacidade do direito. Sao
prononce les paroles de la loil6 - é um revelador de verdades abri- Paulo: LTR, 1998; CORREAS, Óscar. "EI neoliberalismo en el imaginario
juridico •. In: Direito e neoliberalismo: dementos para uma leitura
gadas no comando geral e abstrato da lei. Refém da separação de interdisciplinar. Curitiba: EDIBEJ, 1996; eLEVE, Cl~merson Merlin. "A teoria
Poderes, não lhe cabe qualquer papel criativo. Em síntese simplifi- constitucional e o direito alternativo (para uma dogmática constitucional
cadora, estas algumas das principais característ.icas do Direito na emancipatóriar. In: Direito Alternativo - Seminário nacional sobre o uso
perspectiva clássica: a) caráter científico; b) emprego da lógica for~ alternativo do direito, Instituto dos Advogados Brasileiros, 1993; FACHIN, Luiz
mal; c} pretensão de completude; d) pureza científica; e) raciona- Edson. Teoria critica do direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000; SCHIER,
Paulo Ricardo. Filtragem constitucional. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris,
1999; .ROCHA, Leonel Severo. "Da teoria do direito à teoria da sociedade". In:
Teoria do direito e do Estado. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1994;
16 MONTESQUlEU. De l'esprit des lois, livre XI, chap. 6, 1748. No texto em HONDERICH, Ted (editor). The Oxford Companian to Philosophy. New York:
português (O espírito das leis, Saraiva, 1987, p. 176): "Mas os Juízes da Nação, Orlord University Press, 1995; CHAUI, Marilena. Convite à filosofia, cit.;
como dissemos, são apenas a boca que pronuncia as palavras da lei; seres inani- ANTUNES, Marcas Vinicius Martins. "Engels e o direito •. In: Fios de Ariadne:
mados que não lhe podem moderar nem a força, nem o rigor .• ensaios de interpretação marxisM. Passo Fundo: UPF, 1999.

12 13
jurídico tradicional na maior parte de suas premissas: cientificida~ tras áreas do saber - inclusive os menos óbvios, como a psicanálise
de, objetividade, neutralidade, estatalidade, completude. Funda. ou á lingüística - tem uma fecunda colaboração a prestar ao uni~
se na constatação de que o Direito não lida com fenômenos que se versô furídico.
ordenem independentemente da atuação do sujeito, seja o legisla-
ü pensamento crítico teve expressão na produção acadêmica
dor, o juiz ou o jurista. Este engajamento entre sujeito e objeto
de diversos países, notadamente nas décadas de 70 e 80. Na Fran-
compromete a pretensão científica do Direito e, como conseqüên-
. ça, a Critique du Droit, influencia'da por Althusser, procurou atri-
cia, seu ideal de objetividade, de um conhecimento que não seja
buir caráter científico ao Direito, mas uma ciência de base marxis~
contaminado por opiniões, preferências, interesses e preconceitos.
ta, que seria a única ciência verdadeira2o. Nos Estados Unidos, os
A teoria crítica, portanto, enfatiza o caráter ideológico do Di-
Critical LegaI Studies, também sob influência marxista _ embora
reito, equiparando-o à política, a um discurso de legitimação do
menos explícita -, difundiram os fundamentos de sua crença de
poder. O Direito surge, em todas as sociedades organizadas, como
que law is politics, convocando os operadores jurídicos a recompor
a institucionalização dos interesses dominantes, o acessório norma-
a ordem legal e social com base em princípios humanísticos e co-
tivo da hegemonia de classe. Em nome da racionalidade, da ordem,
munitários21. Anteriormente, na Alemanha, a denOminada Escola
da justiça, encobre-se a dominação, disfarçada por uma linguagem
de Frankfurt lançara algumas das bases da teoria crítica, questio-
que a faz parecer natural e neutra. A teoria crítica preconiza, ainda,
nando o postulado positivista da separação entre ciência e ética,
a atuação concreta, a militância do operador jurídico, à vista da
completando a elaboração de duas categorias nucleares - a ideolo-
concepção de que o papel do conhecimento não é somente a inter-
gia e a práxis22 -, bem como identificando a existência de duas
pretação do mundo, mas também a sua transformaçãol8•
Uma das teses fundamentais do pensamento crítico é a admis-
são de que o Direito possa não estar integralmente contido na lei, zo CORREAS, Óscar. Critica da ideologia jurídica cit., pp. 126-32. MIAllLE,
tendo condição de existir independentemente da bênção estatal, Michel. Introdução critica ao direito, cit., p. 327: "Esta experiência crítica do
da positivação, do reconhecimento expresso pela estrutura de po~ direito abre campo a uma nova maneira de tratar o direito. (...) É o sentido
der. O intérprete deve buscar a justiça, ainda quando não a encon~ profundo do marxismo, deslocar o terreno do conhecimento do real, oferecendo
uma passagem libertadora: o trabalho teórico liberta e emancipa condições clás-
tre na lei. A teoria crítica resiste, também, à idéia de completude, sicas da investigação intelectual pelo fato decisivo de o pensamento marxista
de auto~suficiência e de pureza, condenando a cisão do discurso refletir, ao mesmo tempo, sobre as condições da sua existência e sobre as
jurídico, que dele afasta os outros conhecimentos teóricos. O estu- condições da sua interseção na vida social".
do do sistema normativo (dogmática jurídica) não pode insulaNe 21 HAYMAN, Robert L.; LEVIT, Nançy. Jurisprudence: contemporary rea-
dings, problems, and narratives. St. Paul, Minnesota: West Publishing Co.,
da realidade (sociologia do direito) e das bases de legitimidade que
1994, p. 215. Uma das lideranças do movimento foi o professor de Harvard, de
devem inspirá-lo e possibilitar a sua própria crítica (filosofia do nacionalidade brasileira, UNGER, Roberto Mangabeira, que produziu um dos
direito)19. A interdisciplinariedade, que colhe elementos em ou- textos mais difundidos sobre esta corrente de pensamento: The criticai legal
studies m(lVenlent, 1986. Para uma história do movimento, v. TUSHNET, Mark.
.Criticallegal studies: a political history", Yale Law Journo.l, n. 100, 1991, p.
1515. Para uma critica da teoria crítica, v. FISS, Owen. "The death of the law",
18 Proposição inspirada por uma passagem de Marx, na XI Tese sobre Feuer- ComeU Law Review, n. 76, 1986, p. 1.
bach: os filósofos apenas interpretaram de diversos modos o mundo; o que 22 COELHO, Luiz Fernando. Teoria crltU:a do direito, cit., p. 398: •AI; catego-
importa c'!transform~-lo. rias críticas exsurgidas dessa dialética são a práxis, que se manifesta como teoria
19 oÍAz, Elias. Sociowgia y filosofia de! der~cho. Madrid: Taurus, 1976, p. 54, crítica, como atividade produtiva e como ação pol!tica, e a ideologia, vista COmo
apud AZEVEDO, Plauto Faraco de. Crítica à dogmática e hermenêutica jurúli- processo de substituição do real pelo imaginário e de legitimação da ordem social
ca. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1989, p. 36. real em função do imllgin~rio."

14
15
H
modalidades de razão: a instrumental e a ctitica23 _ A produção filo- eram tempos amenos para o pensamento de esquerda e para o 1:\'
sófica de pensadores como Horkheimer, Marcuse) Morno e, mais ''1
questionamento das estruturas de poder político e de opressão !tJ
recentemente, JÜIgen Habermas, terá sido a principal influência social.
,~,

pós-marxista da teoria crítica. Na visão de curto prazo, o trabalho de desconstrução desenvol-


No Brasil, a teoria crítica do direito compartilhou dos mesmos vido pela teoria crítica, voltado para a desmistificação do conheci-
fundamentos filosóficos que a inspiraram em sua matriz européia, mento jurídico convencional, trouxe algumas conseqüências proble-
tendo se manifestado em diferentes vertentes de pensamento: . máticas27, dentre as quais: aJ o abandono do Direito como espaço
epistemológico, sociológico, semiológic024, psicanalítico25 e teoria de atuação das forças progressistas; bJ o desperdício das potencia-
crítica da sociedade26• Todas elas tinham como ponto comum a lidades interpretativas das normas em vigor. Disso resultou que o
denúncia do Direito como instáncia de poder e instrumento de mundo jurídico tomou~se feudo do pensamento conservador ou,
dominação de classe, enfatizando o papel da ideologia na ocultação no rrunimo, tradicional. E que não se exploraram as potencialida-
e legitimação dessas relações. O pensamento crítico no país alçou des da aplicação de normas de elevado .cunho social, algumas inscri-
vôos de qualidade e prestou inestimável contribuição científica. tas na própria Constituição outorgada pelo regime militar.
Mas não foi um sucesso de público. Porém, dentro de uma visão histórica mais ampla, é impossível
Nem poderia ter sido diferente. O embate para: ampliar o grau desconsiderar a influência decisiva que a teoria crítica teve no sur-
de conscientização dos operadores jurídicos foi desigual. Além da gimento de uma geração menos dogmática, mais permeável a ou-
hegemonia quase absoluta da dogmática convencional ~ beneficiá- tros conhecimentos teóricos e sem os mesmos compromissos com
o status quo. A teoria crítica deve ser vista, nesse início de século,
ria da tradição e da inércia -, a teoria crítica conviveu, também,
na mesma perspectiva que a teoria marxista: apesar de seu refluxo
com um inimigo poderoso: a ditadura militar e seu arsenal de vio-
na quadra atual, sobretudo após os eventos desencadeados a partir
lência institucional, censura e dissimulação. A atitude filosófica em
de 1989, conserva as honras de ter modificado e elevado o patamar
relação à ordem jurídica era afetada pela existência de uma legali- do conhecimento convencional.
dade paralela - dos atos institucionais e da segurança nacional-
A redemocratização no Brasil impulsionou uma volta ao Direi-
que, freqüentemente, desbordava para um Estado de fato. Não
to2B• É certo que já não se alimenta a crença de que a lei seja "a
expressão da vontade geral institucionalizada ~29 e se reconhece

23 CHAUI, Marilena. Convire à filosofia, cit.: "Os f1lósofos da Teoria Crítica


consideram que existem, na verdade, duas modalidades da razão: a razão instru- 27 SCHIER, Pauto. Filtragem constitucional, cit., p. 34: "Essas teorias, de certa
mental ou razio técnico-científica, que está a serviço da exploração e da domina- forma, acabaram por desencadear algumas conseqüências problemáticas, dentre
çâo, da opressão e da violência, e a razào critica ou filosófica, que reflete sobre as quais (... ): (i) a impossibilidade de se vislumbrar a dogmática jurídica como
as contradiçôes e os conflitos sociais e políticos e se apresenta como uma força instrumento de emancipação dos homens em sociedade e (li) o esvaziamento da
libertadora. " dignidade normativa da ordem jurídica."
24 Para um alentado estudo da interpretação jurídica sob" esta perspectiva, v. !ji
2S Pessoalmente, fiz a travessia do pensamento crítico para a utilização cons- '/,
STRECK, Lenio Luiz. Hermenlutica jurídica em crise. Porto Alegre: livraria do trutiva da dogmática jurídica em um trabalho escrito em 1986 - A efetividade "I'.
:~

Advogado,I999.
25 Sobre esta temátka, vejam-se dois trabalhos publicados na obra coletiva
das normas constitucionais (Por que não uma Constituição para valer?), apresen-
tado no VIII Congresso Brasileiro de Direito Constitucional, Porto Alegre, 1987.
,!i
: ~l
Direito e neolweralismo: elementos para uma leitura interdisciplinar, Curitiba: "l'
EDIBFJ, 1996: RAMALHO, Agustinho. "Subsídios para pensar a possibilidade
de articular direito e psicanálise"; COUTINHO, Jacinto de Miranda. ~Jurisdi-
se converteu no livro °
Esse texto foi a base de minha tese de livre-docência, concluída em 1988, e que

edição, Ed. Renovar, 2001).


direito constitucional e a efetividade de suas rnmnas (S"
I

ção, psicanálise e o mundo neoliberal..


COElliO, Luiz Fernando, cit., pp. 396-7.
29 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789, art. 6: A lei é a U
, :~I
26 expressão da vontade gera! institudonalizada" .
: ~~
~
16
17 'lli,
"'II!'"m
!
Jtf ~I
j'p
'1"1
:ll
que, freqüentemente, estará a serviço de interesses, e não da razão. filosóficas que tem acompanhado o Direito ao longo dos séculos,
Mas ainda assim ela significa um avanÇo histórico: fruto do debate fundáda na existência de um direito natural. Sua idéia básica con-
político, ela representa a despersonalização do poder a institudo- e siste'ho reconhecimento de que há, na sociedade, um conjunto de
nalização da vontade política. O tempo das negações absolutas pas. valores e de pretensões humanas legítimas que não decorrem de
sou. Não existe compromisso com o outro sem a leiJo. É preciso, uma norma jurídica emanada do Estado, isto é, independem do
portanto, explorar as potencialidades positivas da dogmáticajurídi- direito positivo. Esse direito natural tem validade em si, legitimado
ca, investir na interpretação principiológica, fundada em valores, por uma ética superior, e estabelece limites à própria normà esta.
na ética e na razão possível. A liberdade de que o pensamento tal. Tal crença contrapõe.se a outra corrente filosófica de influên-
intelectual desfruta hoje impõe compromissos tanto com a legali- cia marcante, o positivismo jurídico, que será examinado mais à
dade democrática como com a conscientização e a emancipação. frente.
Não há, no particular, nem incompatibilidade nem exclusão. O rótulo genérico do jusnaturalismo ter:n sido aplicado a fases
históricas diversas e a conteúdos heterogêneos, que remontam à
antigüidade clá.ssican e chegam aos dias de hoje, passando por den-
Capítulo IH sa e complexa elaboração ao longo da Idade Média:JJ• A despeito
Algumas bases filosóficasJ1• das múltiplas variantes, o direito natural apresenta~se, fundamen-
talmente, em duas versões: a) a de uma lei estabelecida pela vonta.
I. Ascensão e decadência do jusnaturalismo de de Deus; b) a de uma lei ditada pela razão. O direito natural
moderno começa a formar-se a partir do século XVI, procurando
o termo jusnaturalismo identifica uma das principais correntes superar o dogmatismo medieval e escapar do ambiente teológico
em que se desenvolveu. A ênfase na natureza e na razão humanas,

:lO WARAT, Luis Alberto. "O outro lado da dogmática jUIídka~. In: ROCHA,
Leonel Severo (org.). Teoria do direiro ~ do Estado, cit., pp. 83.5. 32 O jus1l3turalismo tem sua origem associada à cultura grega, onde Platão já se
Jl BOBBIO, Norberto. O positivismo juridico. São Paulo: ícone, 1995; referia a uma justiça inata, universal e necessária. Coube a Cícero sua divulgação
BOBBIO, MATIEUCCI e PASQUINO. Didonáriode Política.. Trad. LuísG. P. em Roma, em passagem célebre de seu D~ republica, que teve forte influência no
Cacais, João Ferreira, Gaetano L. Mônaco, Renzo Dini e Carmen C. Varialle. pensamento cristão e na doutrina medieva.1: "A razão reta, confonne à natureza,
Brasília: Ed. Universidade de Brasilia, 1986; ABBAGNANO, Nicola. Dicionário gravada em todos os corações, imutável, eterna, cuja voz ensina e prescreve o
de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1998; DEL VECCHIO,
Filosofia dei d~reclw, cit.; LOPES, Jose Reinaldo de Uma. ° Giorgio.
direito na história,
cit.; HESPANHA, Antonio M. Panorama histórico da cultura juridica turopéia.
bem (...). Essa lei não pode ser contestada, nem derrogada em parte, nem
anulada; não podemos ser isentos de seu cumprimento pelo povo nem pelo
senado (...). Não é uma lei em Roma e outra em Atenas, - uma antes e outra
Mira-Sintra: Publicações Europa-América, 1977; SALDANHA, Nelson. depois, mas uma, sempiterna e imutável, entre todos os povos e em todos os
Filosofia do direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1998; NADER, Paulo. introdução tempos; uno secl sempre o seu imperador e mestre, que é Deus, seu inventor,
ao estudo do' direito. Rio de Janeiro: Forense, 1995; CICERO. Da república. sancionador e publicador, MO podendo o homem desconhecê-la sem renegar a si
. Ediouro, s.d.; DAVID, René. Os grandes sistemas do direito conttmlporâneo. mesmo ... n (CICERO. Da república, cit., p. 100).

IUo de Janeiro: Ediouro, 2001; TUMÁNOV, Vladímir.


burguês conttmporâneo. Lisboa: Editora Caminho,
°
Lisboa: Meridiano, 1978; RUSSEL, Bertrand. História'do pensamento ocidental.
pensamento juridico
1984; CAMARGO,
JJ Santo Tomás de Aquino (1225-1274) desenvolveu o mais influente sistema
filosófico e teológico da Idade Média, o tomismo, demarcando fronteiras entre a
fé e a razão. Pregando ser a lei um ato de razão e não de vontade, distinguiu
Margarida Maria Lacombe. Hennenêutica e argumentaçâo. Rio de Janeiro: quatro espécies de leis: uma lei eterna, uma lei natural, uma (ei positiva humana
Renovar, 1999; BARCELLOS, Ana Paula de. a As relações da filosofia do direito
com a experiência jurídica. Uma visão dos séculos XVIII, XIX e XX. Algumas
questões atuais", Revista Forense, n. 3S I, 2000, p. 3.
e uma lei positiva divina. Sua principal obra foi a Summa teologica. Sobre o
contexto histórico de Tomás de Aquino, v. LOPES, José Reinaldo de Uma.
direiw na hist6ria., cit., pp. 144 ss.
°
18
19
e não mais na origem divina, é um dos marcos da Idade Moderna e enfrentaram fl monarquia absoluta. A Revolução,Francesa e sua
base de uma nova cultura laica, consolidada a.:partir do século Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789)36 e, an-
XVlp<4. "
teriormente, a Declaração de Independência dos Estados Unidos
A modernidâde, que se iniciara no século XVI, com a reforma (1776)37, estão impregnadas de idéias jusnaturalistas, sob a in-
protestante, a formação dos Estados nacionais e a chegada dos eu- fluência marcante de lohn Locke38, autor emblemático dessa cor-
ropeus à América, desenvolv~-se em um ambiente cultural não rente filosófica e do pensamento contratualista, no qual foi antece-
mais submisso à teologia cristã. Cresce o ideal de conhecimento, dido por Hobbesl9 e sucedido por' Rousseau4o• Sem embargo da
fundado na razão, e o de liberdade, no início de seu confronto com
precedência histórica dos ingleses, cuja Revolução Gloriosa foi
o absolutismo. O jusnaturalismo passa a ser a filosofia natural do concluída em 1689, o Estado liberal ficou associado a esses eventos
Direito e associa-se ao iluminism035 na crítica à tradição anterior, e a essa fase da história da humanidade41• O constitucionalismo
dando substrato jurídico~filosófico às duas grandes conquistas do moderno inicia sua' trajetória. .
mundo moderno: a tolerância religiosa e a limitação ao poder do
Estado. A burguesia articula sua chegada ao poder.
A crença de que o homem possui direitos naturais, vale dizer, 36 O Preâmbulo da Declaração afirma que ela contém os direitos naturais,
um espaço de integridade e de liberdade a ser preservado e respei- inalienáveis e sagrados do Homem, tendo o art. 2 a seguinte dicção; ~Artigo 2. O
tado pelo próprio Estado, foi o combustível das revoluções liberais fim de toda a associação política é a conservação dos direitos naturais e impres-
e fundamento das dou,trinas políticas de cunho individualista que cindíveis do bomem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e
a resistência à opressão'.
37 Da Declaração, redigida por Thomas Jefferson, constam referências às /Ms
da natureza e ao Deus da natureza e a seguinte passagem: "Sustentamos que
34 O surgimento do jusnaturalismo moderno é usualmente associado à doutri- estas verdades são evidentes, que todos os Domens foram criados iguais, que
na de GROCIO, Hugo (1583-1645), exposta em sua obra clássica De iure belli foram dotados por seu Criador de certos Direitos inalienãveis, que entre eles
ae pacis, de 1625, considerada, também, precursora do direito internacional. Ao estão a Vida, a liberdade e a Busca da Felicidade".
difundir a idéia de direito natural como aquele que poderia ser reconhecido
38 Autor dos Dois tratados sobre o govenw civil, 1689-90 e do Ensaio sabre o
como válido por todos os povos, porque fundado na razão, Grócio desvrncu1a-o enrendimenrohumano, 1690. Vejam-se LOCKE, John. Second treatise aI governo
não só da vontade de Deus, como de sua própria existência. Vejam-se: BOBBIO,
ment. Indianapolis-Cambridge: Hacket Publishing Co, 1980; e LOCKE, John.
MATTEUCCI e PASQUINO. Dicionário de poUrica, cit., p. 657; e BARCEL- Ensaio acerca do entendimento humano. Coleção Os Pensadores. São Paulo:
LOS, Ana Paula de. "As relações da filosofia do direito com a experiência Nova Cultural, 1990.
juridica. Uma visão dos séculos XVIII, XIX e XX. Algumas questões atuais., cit.,
pp.8.9. 39 HOBBES, Thomas. Leviarhan. Londres: Penguin Books, 1985 (a primeira
edição da obra é de 1651). Há edição em português na Coleção Os Pensadores.
3S Iluminismo designa a revolução intelectual que se operou na Europa, espe- São Paulo: Nova Cultural, 1999.
cialmente na França, no século XVIII. O movimento representou o ápice das
-40 ROUSSEAU, Jean-Jacques. O contrato sacUd. Rio de Janeiro: Edições de
transformações iniciadas no século XIV, com o Renascimento. O antropocentris-
Ouro, s,d. (a primeira edição de Du contrat social é de 1762).
mo e o individualismo renascentistas, ao incentivarem a investigação científica,
~l Em seu magnífico estudo On revoluWm, Londres, Penguin Books, 1987 (1'
levaram à gradativa separação entre o campo da fé (religião) e o da razão (dên-
ediÇão em 1963), ARENDT, Hannah comenta o fato intrigante de que a foi a
cia), determinando profundas transformações no modo de pensar e de agir do
Revolução Francesa, e não a Inglesa ou a Americana; que correu mundo e
homem. Para os iluministas, somente através da razão o homem poderia alcançar
simbolizou a divisão. da história da humanidade em antes e depois. Escreveu ela:
o conhecimento, a convivência harmoniosa em sociedade, a liberdade individual
•A 'Revolução Gloriosa', evento pelo qual o termo (revolução), paradoxalmente,
e a felicidade. Ao propor a reorganização da sociedade com uma política centrada
encontrou seu lugar definitivo na linguagem polftica e histórica, não foi vista
no homem, sobretudo no sentido de garantir-lhe a liberdade, a filosofia iluminis-
como uma revolução, mas como uma restauração do poder monárquico aos seus
ta defendia a causa burguesa contra o Antigo Regime. Alguns nomes que mere-
direitos pretéritos e à sua glória. (...) Foi a Revolução Francesa e não a Americana
cem destaque na filosofia e na ciência política: Descartes, L:icke, Montesquieu,
Voltaire e Rousseau. que colocou fogo no mundo. (...) A triste verdade na matéria é que a Revolução
Francesa, que terminou em desastre, entrou para a história do mundo, enquanto
20
21
o jusnaturalismo racionalista esteve uma vez mais ao lado do revolução, mas a conservação. Considerado metafísico e anticientí-
Iluminismo no movimento de codifiCação 'do Direitá, no século fico,j) direito natural é empurrado para a margem da história pela
XVIII, cuja maior realização foi o.Código Civil francês - o Código onipbtência positivista do século XIX.
de Napoleão -, que entrou em vigor em 1804. Em busca de clare-
za, unidade e simplificação; incorporou-se à tradição jurídica roma-
no-germânica a elaboração de códigos, isto é, Clocumentos legislati- li. Ascensão e decadência do positivismo jurídico
vos que agrupam e organizam sistematicamente as normas em tor-
no .de determinado objeto. Completada a revolução burguesa, o O positivismo filosófico foi fruto de uma idealização do conhe-
direito natural viu-sé "domesticado e ensinado dogtnaticamen- cimento científico, uma crença romântica e onipotente de que os
te. w~2 A técnica de codificação tende a promover a identificação múltiplos doriúnios da indagação e da atividade intelectual pudes-
entre direito e lei. A Escola da Exegese, por sua.vez, irá impor o sem ser regidos por leis naturais, invariáveis, independentes da
apego ao texto e à interpretação gramatical e histórica, cerceando vontade e da ação humana. O homem chegara à sua maioridade
a atuação criativa do juiz em nome de uma interpretação pretensa- racional e tudo passara a ser ciência: o único conhecimento válido,
mente objetiva e neutra~3, a única moral, até mesmo a única religião. O universo, conforme
O advento do Estado liberal, a consolidação dos ideais constitu- divulgado por Galileu, teria uma linguagem matemática, integran-
cionais em textos escritos e o êxito do movimento de codificação do-se a um sistema de leis a serem descobertas, e os métodos
simbolizaram a vitória do direito natural, o seu apogeu. Paradoxal- válidos nas ciências da natureza deviam ser estendidos às ciências
mente, representaram, também, a sua superação mstórica-«. No sociais46•
início do século XIX, os direitos naturais, cultivados e desenvolvi- As teses fundamentais do positivismo filosófico, em síntese
dos ao longo de mais de dois milênios, haviam se incorporado de simplificadora, podem ser assim expressas:
forma generalizada aos ordenamentos positivos45• Já não traziam a
(i) a ciência é o único conhecimento verdadeiro, depurado de
indagações teológicas ou metafísicas, que especulam acerca de cau-
a Revolução Americana, com 5eu triunfante sucesso, permaneceu como um sas e princípios abstratos, insuscetíveis de demonstração;
evento de importância pouco lIl&isque local" (pp. 43, 55-6).
42 WPES, José Reinaldo de Lima. O direito na história, cit., p. 188.
43 Sobre codificação, Escola da Exegese efetit.:hismo da ~i, vejam-se: TEPEDI- instalação do Estado Liberal e todo o seu aparato jurídico (constituição escrita,
NO, Gustavo .• 0 Código Civil, os chamados mierossistemas e a Constituição: igualdade formal, princfpio da legalidade etc.), o direito natural conheceria seu
'premissas para uma reforma legislativa". In: TEPEDINO, Gustavo (org.). Pro- momento ãureo na história moderna do direito. As idéias desenvolvidas no
blemas de direito civil-c~nstituiconal. Rio de Janeiro: Renovar, 2000; MORAES, âmbito da filosofia ocidental haviam se incorporado de uma forma sem prece-
Maria Celina Bodin de. "Constituição e direito civil: tendências". In: Anais da dentes à realidade jurídica. Talvez por isso mesmo, tendo absorvido 0Ii elementos
XVII COTIferêru:iaNacional dos Advogados, Rio de Janeiro, 1999. propostos pela reflexão filosófica, o direito haja presumido demais de si mesmo,
4<4 BOBBIO, MAITEUCCI e PÀSQUINO. Dicionário de política, cit. p. 659: considerando que podia agora prescindir dela. De fato, curiosamente, a 5eqüên-
"Com a promulgação dos códigos, principalmente do napoleônico, o Jusnatura- da histórica reservaria para o pensamento jusfilos6fico não apenas um novo
lismo exauria a sua função no momento mesmo em que celebrava o seu triunfo. nome - filosofia do direito - como também mais de um século de ostracismo."
Transposto o direito racional para o código, não se via nem admitia outro direito 46 Em sentido amplo, o termo positivismo designa a crença ambiciosa na
senão este. O recurso a princlpios ou normas extrinsecos ao sistema do direito ciência e nos seus métodos. Em sentido estrito, identifica o pensamento de
positivo foi considerado ilegítimo." COMTE, Auguste, que em seu Curso de filosojiQ positiva (seis volumes escritos
45 BARCELLOS, Ana Paula de. "As reiaçôes.da filosofia do direito com a entre 1830 e 1842), desenvolveu a denominada lei dos três estados, segundo a
experiência jurídica. Uma visão dos séculos XVIII, XIX e XX. AlgUmas questôes qual o conhecimento humano havia atravessado três estágios históricos: o teol6-
atuais-, cit., p. 10: "Em fins do século XVIII e início do século XIX, com a gico, o metafísico e ingressara no estágio positivo ou científico.

22 23
. (U) o conhedmento científico é 'objetivo. Funda-se na distinção das simplificações redutoras, é possível apontar algumas caracterís-
entre sujeito e objeto e no método descritivo, p~a"'que seja preser- ticas essenciais ,do positivismo jurídico:
vado de opiniões, preferências ou preconceitos; (i) a aproximação quase plena entre Direito e norma;
(iii) o método científico empregado nas ciências naturais, ba- (U) a afirmação da estatalidade do Direito: a ordem jurídica é
seado na observação e na experimentação, deve ser estendido a una e emana do Estado;
todos os campos de conhecimento, inclusive às ciências sociais. (iii) a completude do ordenamento jurídico, que contém conM
O positivismo jurídicO foi a importação do positivismo filosófiM ceitos e instrumentos suficientes e adequados para solução de
co para o mundo do Direito, na pretensão de criar-se uma ciência qualquer caso, inexistindo lacunas;
jurídica, com características análogas às ciências exatas e naturais. (iv) o formalismo: a validade da norma decorre do procedimen-
A busca de objetividade científica, com ênfase na realidade obser~ to seguido para a sua criação, independençlo,do conteúdo. Também
vável e não na especulação filosófica, apartou o Direito da moral e aqui .se insere o dogma da subsunçãoso, herdado do formalismo
dos valores transcendentes. Direito é norma, ato errianado do Esta- alemão.
do com caráter imperativo e força coativa. A ciência do Direito, O positivismo tornou-se, nas primeiras décadas do século XX,
como todas as demais, deve fundar-se em juízos de fato, que visam a filosofia dos juristas. A teoria jurídica empenhava-se no desenvol-
ao conhecimento da realidade, e não em juízos de valor, que repre- vimento de idéias e de conceitos dogmáticos, em busca da cientifi-
sentam uma tomada de posição diante da realidade47• Não é no cidade anunciada. O Direito reduzia-se ao conjunto de normas em
âmbito do Direito que. se deve travar a discussão acerca de ques- vigor, considerava-se um sistema perfeito e, como todo dogma, não
tões como legitimidade e justiça.
precisava de qualquer justificação além da própria existênciasl.
O positivismo comportou algumas variações41l e teve seu ponto Com o tempo, o positivismo sujeitou~se à crítica crescente e seve-
culminante no normativismo de Hans Kelsen49• Correndo o risco
ra, vinda de diversas procedências, até sofrer dramática derrota
histórica. A troca do ideal racionalista de justiça pela ambição po-
sitivista de certeza jurídica custou caro à humanidade.
47 BOBBIO, Norberto. Positivismo jurídico, cit., p. 135, onde se acrescenta:
Conceitualmente, jamais foi possível a transposição totalmente
~A ciência exclui do próprio âmbito os juízos de valor, porque ela deseja ser um
conhecimento puramente objetivo da realidade, enquanto os juízos em questão satisfatória dos métodos das ciências naturais para a área de huma-
são sempre subjetivos (ou pessoais) e conseqüentemente contrários à exigência nidades. O Direito, ao contrário de outros domínios; não tem nem
da objetividade». Pouco mais à frente, o grande mestre italiano, defensor do que pode ter uma postura puramente descritiva da re;Llidade, voltada
denominou de »positivismo moderado', desenvolve a distinção, de matriz kelse- para relatar o que existe. Cabe-lhe prescrever um dever-ser e fazê-
niall3, entre validade e valor do Direito.
lo valer nas situações concretas. O Direito tem a pretensão de atuar
48 HESPANHA, Antonio M .. Panorama hist6ricQ da cultura jurídica européia,
cit., pp. 174.5: "(...)-As várias escolas entenderam de forma diversa o que fossem .'
'coisas positivas'. Para uns, positiva era apenas a lei (positivismo legalista). Para
outros, positivo era o direito plasmado na vida, nas instituições ou num espírito havendo sido publicada uma segunda edição em 1960, incorporando alguns
do povo (positivismo histórico). Positivo era também o seu estudo de acordo conceitos novos.
com as regras das novas ciências da sociedade, surgidas na segunda metade do 50. A aplicação do Direito consistiria em um processo l6gico-dedutivo de sub-
século XIX (positivismo sociológico, naturalismo). Finalmente, para outros, pc. miss.ão à leI (premissa maior) da relação de fato (premissa menor), produzindo
sitivos eram os conceitos jurídicos genéricos e abstratos, rigorosamente construí- uma conclusão natural e óbvia, meramente declarada pelo intérprete, que não
dos e concatenados, válidos independentemente da variabilidade da legislação desempenharia qualquer papel criativo. Como visto-anteriormente, esta concep-
positiva (positivismo conceitual)." ção não tem a adesão de Hans Kelsen.
49 A obra-prima de Kelsen foi a Teoria pura do direito, cuja primeira edição SI TUMÁNOV, Vladimir. O pensamento jurídico burgués cQnremporilneo, cit.,
data de 1934 - embora seus primeiros trabalhos remontassem a 1911 _, p.141.

24
25
••
sobre a realidade, confonnando~a e transformando-a.
dado, mas uma criação. A relação entre o sujeito do conhecimento
Ele não é um terpretação. O pós-positivismo é a designação provisória e genérica
de 1.!m ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações
••
e seu objeto de estudo - isto é, entre o intérprete, a norma e a
realidade - é tensa e intensa. O ideal positivista de objetividade e
neutralidade é insuscetível de realizar-se.
entt~ valores, principias e regras, aspectos da chamada nova herme-
nêutica e a teoria dos direitos fundamentais54•
••
O positivismo pretendeu ser uma teoria do Direito, na qual o
estudioso assumisse uma atitude cognoscitiva (de conhecimento),
fundada em juízos de fato. Mas resultou sendo uma ideologia, mo-
111. pós-positivismo e a normatividade dos princípios5s
••
vida por juízos de valor, por ter se tornado não apenas- um modo de
entender o Direito, como também de querer o Direito52. O fetiche
da lei e o legalismo acrítico, subprodutos do positivismo jurídico,
54 Sobre o tema, vejam-se: TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A prote-
çâo internadonal dos direitos humanos: fundamentos juridicos e instnwlentos
••
serviram de disfarce para autoritarismos de matizes variados. A
idéia de que o debate acerca da justiça se encerrava quando da
positivação da norma tinha um caráter legitimador da ordem esta-
básicos. São Paulo: Saraiva, 1991; SARLET, Ingo Wolfgang Sarlet.A eficáda dos
direitos fundamentais. Porto Alegre: Uvraria do Advogado, 1998; PIOVESAN,
Flávia. Temas de direitos humanos. São Paulo: Max ümonad, 1998; TORRES, ••
••
Ricardo Lobo (org.). Teoria MS direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar,
belecida. Qualquer ordem. 1999; GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fun.
Sem embargo da resistência filosófica de outros movimentos damentais. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999; e MENDES, Gilmar Ferreira;
influentes nas primeiras décadas do século53, a decadência do posi- COELHO, Inocêncio Mártites e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Hermenêuti-
tivismo é emblematicamente associada à derrota do fascismo na
Itália e do nazismo na Alemanha. Esses movimentos políticos e
ca constitudonal e direitos fundamentais. Brasília: Brasília Jurídica, 2000.
55 DWORKlN, Ronald. Taking rights seriously. Cambridge, Mass.: Harvard
University Press, 1997; ALEXY, Robert. Teoria de los derecJws fundammtales. ••
••
militares ascenderam ao poder dentro do quadro de legalidade vi- Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997; CANOTILHO, J. J.
gente e promoveram a barbárie em nome da lei. Os principais acu. Gomes. Direito comtit1lcional e teoria da Comtituiçâo. Coimbra: Almedina,
sados de Nuremberg invocaram o cumprimento da lei e a obediên- 1998; BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucirmal. São Paulo:
Malheiros, 2000; HABERMAS, Jiirgen. Direito e democracia: mtre fw;tiddade e
cia a ordens emanadas da autoridade competente. Ao fim da Se-
gunda Guerra Mundial, a idéia de um ordenamento jurídico indife-
rente a valores éticos e da lei como um estrutu~a meramente for-
validade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997; DOLINGER, Jacob.
"Evolution of principIes for resolving conflicts in the field of contracts and
torts", Recuei! des Cours, v. 283, pp. 203 ss., Hague Academy of International ••
••
mal, uma embalagem para qualquer produto, já não tinha mais Law; REALE, Miguel. Filosofia do direito. São Paulo: Saraiva, 2000;
aceitação no pensamento esclarecido. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário defilosofia, cit.; NADER, Paulo. Fi!osofÚl do
direito. Rio de Janeiro: Forense, 2000; DEL VECCHIO, Giorgio. Filosofia deI
A superação histórica do jusnaturalismo e o fracasso político do derecho. Barcelona: Bosch Casa Editorial, 1997; CHAUI, Marilena. Convite à
positivismo abriram caminho para um conjunto amplo e ainda ina- filosofia, cit.; TORRES, Ricardo Lobo. O orçamento na Comtituição. Rio de
cabado de reflexões acerca do Direito, sua função social e sua in- Janeiro: Renovar, 2000; GRAU, Eros Roberto. A ordem econ6mica na
Constituição de 1988. São Paulo: Malheitos, 1996; FREITAS, Juarez de.
"Tendências atuais e perspectivas da hermenêutica constitucional", Ajuris, n. ••:
52 BOBBIO, Norberto. ° positivismo jurídico, cit., pp. 223-4. V. também
LÓWY, Michael. Ideologias e ciência social - elemenlos para uma análise
76, 1999, p. 397; ESpfNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios
constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998; SARMENTO, Daniel. A
ponderação de interesses na Comriruição Federal. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
marxista. São Paulo: Cortez, 1996, p. 40: .0 positivismo, que se apresenta como 2000; CAMARGO, Margarida Maria ucombe. Hermenêutica e argumentação;
ciência livre de juí:z.osde valor, neutra, rigorosamente científica, (...) acaba tendo uma contribuição ao estudo do direito. Rio de Janeiro: Renovar, 1999; VIEIRA,
uma função política e ideológica". Oscar Vilhena. A Constituição e sua reserva de justiça. São Paulo: Malheiros,
53 Como por exemplo, a jurisprudência dos interesus, inidada por lhering, e o 1999; PINHEIRO GOuvÊA, Marcos Antonio Masdli de. A sindicabilidade dos
movimento pelo direito livre, no qual se destacou Ehrlich. direiros prestadonais à luz de conceitos-chave contempordneos. Rio de Janeiro:

26
27


o Direito, a partir da segunda" metade do sé~lo XX, já não imaginário do Direito, de forma direta ou indireta. Na tradição
cabia mais no positivismo jurídico. A aproxi~aç~o ..quase absoluta judaico-cristã, colhe-se o mandamento de respeito ao próximo,
entre Direito e norma e sua rígida separação da ética não corres- princípio magno que atravessa os séculos e inspira um conjunto
pondiam ao estágio do processo civilizatório e às ambições dos que amplo de normas. Da filosofia grega origina-se o princípio da não-
patrocinavam a causa da humanidade. Por outro lado, o discurso contradição, formulado por Arist6teles, que se tornou uma das leis
científico impregnara o Direito. Seus operadores não desejavam o fundamentais do pensamento: "Nada pode ser e não ser simulta-
retorno puro e simples ao jusnaturalismo, aos fundamentos vagos, neamente, preceito subjacente à idéia de que o Direito não tolera
abstratos ou metafísicos de uma razão subjetiva. Nesse contexto, o antinomias. No direito romano pretendeu-se enunciar a síntese dos
pós-positivismo não surge com o ímpeto da desconstrução, mas princípios básicos do Direito: "Viver honestamente, não lesar a
como uma superação,do conhecimento convencional. Ele inicia sua outrem e dar a cada um o que é seu."57 Os princípios, como se
trajetória guardando deferência relativa ao ordenamento positivo, percebe, vêm de longe e desempenham papéis variados. O que há
mas nele reintroduzindo as idéias de justiça e legitimidade. de singular na dogmática jurídica da quadra histórica atual é o reco-
O constitucionalismo moderno promove, assim, uma volta aos nhecimento de sua nonnatividade.
valores, uma reaproximação entre ética e Direito56. Para poderem Os princípios constitucionais, portanto, explícitos ou nã058,
beneficiar-se do amplo instrumental do Direito, migrando da fllo- passam a ser a síntese dos valores abrigados no ordenamento jurídi-
sofia para o mundo jurídico, esses valores compartilhados por toda co. Eles espelham a ideologia da sociedade, seus postulados bási~
a comunidade, em dado momento e lugar, materializam~se em cos, seus fins. Os princípios dão unidade e harmonia ao sistema,
princípios, que passam a estar abrigados na Constituição, explícita integrando suas diferentes partes e atenuando tensões normativas.
ou implicitamente. Alguns nela já se inscreviam de longa data, De parte isto, servem de guia para o intérprete, cuja.atuação deve
como a liberdade e a igualdade, sem embargo da evolução de seus pautar-se pela identificação do princípio maior que rege o tema
significados. Outros, conquanto clássicos, sofreram releituras e re- apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até che-
velaram novas sutilezas, como a separação dos Poderes e o Estado
democrático de direito. Houve, ainda, princípios que se incorpora-
ram mais recentemente ou, ao menos, passaram a ter uma nova 57 Ulpiano, Digesto 1.1. 10.1: "Honeste vivere, alurum IlDnlaedere, suum cui-
dimensão, como o da dignidade da pessoa humana, da razoabilida- que tribuere". V. NADER, Paulo. Fiwso/ia do Direito, it., p. 82; e DOLlNGER,
de, da solidariedade e da reserva de justiça. Jacob. "Evolution of principies for resolving conf1Jcts in the field of contracts and
A novidade das últimas décadas não está, propriamente, na torts", Recueil MS Cours, v. 283, pp. 20355., Hague Academy of Intemational
existência de princípios e no seu eventual reconhecimento pela
u.w.
58 BARROSO, Luís Roberto. InterpretaçiW e aplicação da Constituição. São
ordem jurídica. Os princípios, vindos dos textos religiosos, fllos6~ Paulo: Saraiva, 1999, p. 149: "Os grandes princípios de um sistema jurídico são
ficas ou jusnaturalistas, de longa data permeiam a realidade e o nonnalmente enunciados em algum texto de direito positivo. Não obstante, (...)
tem-se, aqui, como fora de dúvida que esses bens sociais supremos existem fora
e acima da letra expressa das normas legais, e nelas não se esgotam, até porque
não têm caráter absoluto e estão em permanente mutação". Em decisão do
Dissertação de Mestrado defendida na Universidade do Estado do Rio de Tribunal Constitucional Federal alemão: "O direito mo se identifica com a
Janeiro, mimeografado, 2001; BARCEllOS, Ana Paula de. A eficácia juridica totalidade das leis escritas. Em certas circunstãncias, pode haver um 'mais' de
dtJs principios constitucionais ... , cit..
direito em relação aos estatutos positivos do poder do Estado, que tem a sua
55 Esse fenômeno é referido por autores alemães como "virada kantiana". V. a fonte na ordem jurídica constitucional como uma totalidade de sentido e que
respeito, TORRES, Ricardo Lobo, em remissão a HÕFFE, Otfried, l<£itegorische pode servir de corretivo para a lei escrita; é tarefa da jurisdição encontrá-lo e
Rechtsprinripien. Ein Kontrapunkt der Modeme (O orçamento na Constituição, realizá-lo em suas decisões.'. 8VerGE 34, 269, apud HABERMAS, Jürgen. Direi-
~,~~. . to e democracia: entre /w:ticidade e validade. v. I, cit., p. 303.

28
29
gar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie. Estes os servidor completa setenta anos, deve passar à inatividade, sem que
papéis desempenhados pelos princípios: a) condensar valores; b) a apli~ação do preceito comporte maior especulação. O mesmo se
dar unidade ao sistema; c) condicionar a atividade do intérprete. pasiicom a norma constitucional que prevê que a criação de uma
Na trajetória que os conduziu ao centro do sistema, os princí- autarqUia depende de lei específica. O comando é objetivo e não dá
pios tiveram de conquistar o status de norma jurídica, superando a margem a elaborações mais sofisticadas acerca de sua incidência.
crença de que teriam uma dimensão puramente axiol6gica39, ética, Uma regra somente deixa;á de incidir sobre a hipótese de fato que
sem eficácia jurídica ou aplicabilidade direta e imediata. A dogmá~ contempla se for inválida, se houver outra mais específica ou se não
tica moderna avaliza o entendimento de que as normas em geral, e estiver em vigor. Sua aplicação se dá, predominantemente, me-
as normas constitucionais em particular, enquadram~se em duas diante subsunção,
grandes categorias diversas: os princípios e as regras. Normalmen~ Princípios contêm, normalmente, uma maior carga valorativa,
te, as regras contêm relato mais objetivo, com incidência restrita às um fundamento ético, uma decisão política relevante, e indicam
situações específicas às quais se dirigem. Já os princípios têm maior uma determinada direção a seguir. Ocorre que, em uma ordem
teor de abstração e uma finalidade mais destacada no sistema. Ine4 pluralista, existem outros princípios que abrigam decisões, valores
xiste hierarquia entre ambas as categorias, à vista do princípio da ou fundamentos diversos, por vezes contrapostos. A colisão de
unidade da Constituição. Isto não impede que princípios e regras princípios, portanto, não só é possível, como faz parte da lógica do
desempenhem funções distintas dentro do ordenamento, sistema, que é dialético. Por isso a sua incidência não pode ser
A distinção qualitativa entre regra e princípio é um dos pilares posta em termos de tudo ou nada, de validade ou invalidade. Deve~
da moderna dogmática constitucional, indispensável para a supera4 se reconhecer aos princípios uma dimensão de peso ou importân-
ção do positivismo legalista, onde as normas se cingiam a regras cia. À vista dos elementos do caso concreto, o intérprete deverá
jurídicas. A Constituição passa a ser encarada como um sistema fazer escolhas fundamentadas, quando se defronté com antagonís~
aberto de princípios e regras, permeável a valores jurídicos supra- mos inevitáveis, como os que existem entre a liberdade de expres-
positivos, no qual as idéias de justiça e de realização dos direitos são e o direito de privacidade, a livre iniciativa e a intervenção
fundamentais desempenham um papel central. A mudança de pa~ estatal, o direito de propriedade e a sua função social. A aplicação
radigma nessa matéria deve especial tributo à sistematização de dos princípios se dá, predominantemente, mediante ponderaçã06\.
Ronald Dworkin60• Sua elaboração acerca dos diferentes papéis
desempenhados por regras e princípios ganhou curso universal e
passou a constituir o conhecimento convencional na matéria.
6\ O tema foi retomado, substancialmente sobre as mesmas premissas, pelo
Regras são proposições normativas aplicáveis sob a forma de autor alemão ALEXY, Roben (Teoria de los derer:hos fundamentales, cit., pp. 81
tudo ou nada ("alI or nothing"). Se os fatos nela previstos ocorre~ ss.), cujas idéias centrais na matéria são resumidas a seguir. A; regras veiculam
rem, a regra deve incidir, de modo direto e automático, produzin~ mandados de definição,. ao passo que os prindpios são mandados de otimização.
do seus efeitos. Por exemplo: a cláusula constitucional que estabe- Por essas expressões se quer significar que as regras (mandados de definição) têm
lece a aposentadoria compulsória por idade é uma regra. Quando o natureza biunivoca, isto é, só admitem duas espécies de situação, dado seu
substrato fático típico: ou são válidas e se aplicam ou não se aplicam por inváli-
das. Urna regra vale ou não vale juridicamente. Náo são admitidas gradaçóes. A
exceção da regra ou é outra regra, que invalida a primeira, ou é a sua violação,
S9 A a:ciologia está no centro da filosofia e é também referida como teoria dos Os princípios se comportam de maneira diversa. Corno mandados de otimização,
valores, por consistir, precisamente, na atribuição de valores às coisas da vida. V, .pretendem eles ser realizados da forma mais ampla possivel, admitindo, entre-
REALE, Miguel. Filosofia do direiro, cit., pp. 37 ss. tanto, aplicação mais ou menos intensa de acordo com as possibilidades jurídicas
60 DWORK1N, Ronald. Taking righrs seriously, cit., 1997 (a primeira edição é existentes, sem que isso comprometa sua validide. EsSes limites jurídicos, capa-
de 1977). zes de restringir a otimização do princípio, são (i) regras que o excepcionam em

30 31
Nesse con~eJC!:o;impõe-se um breve aprofupdàmento da ques- ..formal de nenh!J1ll dos princípios em tensão, mas a simples deter-
tão dos conflitos noq:nativos. O Direito, como ~(~ape, é um siste- ,~nação d~ soluçãó que melhor atende. o i~eário constitucional na
ma de normas harmonicamente articuladas. Uma situação não situação apredada65•
pode ser regida 'simultaneamente pqr duas disposjções legais que se _AP<2~çl~r,!çª2!_coI"l),c?
~~,Ç!1!~smode convivência.d.e nor~s q1,1e
contraponham. Pª,ra solucionar essas hipóteses de conflito de leis, tutelam valores Ol,l bens jurídicos contrapostos, conquistou ampla-
o ordenamento jurídico se serve de três critérios tradicionais: o da mente a-óõi.iii1.iii-ejá-repercute nas decisões dos tribunãis. A_van- ~fI
hierarquia ~ pelo qual a lei superior prevalece sobre a inferior~, ~arda do pensament,Qjl,1x,ícgf'? ,qedica-se, na quadra atual, à busca de "I
o cronológico - onde a lei posterior prevalece sobre a anterior - e parâmetros'de algufia objetividade, parà que a ponderação não se
o da especialização - em que a lei específica prevalece sobre a lei torne uma fórmula vazia, leii"tiiüadora de escolhas açbitrárias~É pre-
geral62• Estes critérios, todavia, não são adequados ou plenamente
~Q.çlemarcar o.que pO,Q~.seLQo!1de[ago..e_l?ornQ _çle:ve~~:19..A t~9:ria
satisfatórios quando a colisão se dá entre normas constitucionais,
dos prinápios lJ.ãoimporta no abandono das regras ou do direito le-
especialmente entre os princípios constitucionais" categoria na
qual devem ser situados os conflitos entre direitos fundamentais63• [is1il\tº~~~'!, que po~sa s'!ti~f.~í;! ~d~qua.<4ine.nte.-
à .ªe.!!1~~_P9r se-
gurança e por justiça, o ordenamento jurídico deverá ter suas normas
Relembre-se: enquanto as normas são aplicadas na plenitude da sua
força normativa - ou, então, são violadas -, os princípios são ~istribuídaS, de forma equilibrada, entre princíp~os e regras66•
ponderados. -
A denominada ponderação de valores ou ponderação de interes-
ses é a técnica pela qual se procura estabelecer o peso relativo de no Direito Comparado é o do prisioneiro que faz greve de fome. Após acesa
cada um dos princípios contrapostos. Como não existe um critério polêmica, a solução encontrada .foi a de fazer valer o direito à vida sobre a
abstrato que imponha a supremacia de um sobre o outro, deve-se, liberdade de expressão, contudo o soro somente foi aplicado quando o grevista
à vista do caso concreto, fazer concessões recíprocas, de modo a caiu inconsciente, uma vez que, neste estado, não haveria sentido falar propria-
mente em liberdade de expressão." .. ,
produzir um resultado socialmente desejável, sacrificando o míni-
6S Sobre o tema, na doutrina álemã, ALEXY, Robert. Colisão ~ ponderação
mo de cada um dos princípios ou direitos fundamentais em oposi- como problema fundamental da dogmática dos direitos fundamtmtais, mimeogra-
ção. O legislador não pode, arbitrarimente, escolher um dos inte- fado, palestra proferida na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro, em
resses em jogo e anular o outro, sob pena de violar o texto consti- 11.l2.98; LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito, cit., pp. 164 ss.;
tucional. Seus balizamentos devem ser o princípio da razoabilidade STERN, KIaus. DerecJw dei Estado de la &publica Federal alemana. Madrid:
(v. infra) e a preservação, tanto quanto possível, do núcleo uúnimo Centro de Estúdios Constitucionales, 1987, p. 295. Na doutrina nacional, ve-
do valor que esteja cedendo passo6<4.Não há, aqui, superioridade jam-se BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, cit.,
p. 192; e TORRES, Ricardo Lobo. Da ponderação de inuresses ao princípio da
ponderação, mimeografado, 2001. E, ainda, as dissertações de mestrado de
SARMENTO, Daniel. A ponderação de inuruses na Consituição Federal, 2000,
algum ponto e (u) outros princípios de mesma estatura e apostos que procuram e de PINHEIRO GOuvÊA, Marcos Antonio Maselli de. A sindicabilidade dos
igualmente maximizar-se, impondo a necessidade eve,ntual de ponderação. direitos prestacionais, mimeografado, 2001, onde averbou: "No mais das vezes,
62 Sobre antinomias e critéríos para solucioni-Ias, v. BOBBIO, Norberto. Teo- contudo, a aplicação da norma constitucional ou legal não pode ser efetuada de
ria do ordenamento jurídico, cit., pp. 81 e ss .. modo meramente subsuntivo, dada a existência de princípios colidentes com o
63 ALEXY, Robert. Colisão e ponderação com.oproblema fundamental da IiÚJg- preceito que se pretende materializar (...) À luz do conceito-chave da proporcio-
mática dos direitos fundamentais, müoeografado, palestra proferida na Funda- nalidade, desenvolveu-se o métodç de ponderação pelo qual o magistrado, con-
ção Casa de Rui Barbosa, no Rio de Janeiro, em 11.12.98, p. 10: "As colisões dos siderando-se a importância que os bens jurídicos cotejados têm em tese mas
direitos fundamentais acima mencionados devem ser consideradas, segundo a também as pecu~ida,des do caso concreto, poqerá prover ao p.ireito postulado,
teoria dos princípios, como uma colisão de princípios." fundamentando-se na precedência condicionada deste sobre as princípios con-
64 FREITAS, Juarez de, uTend,ê~cias atuais e perspectivas da hermenêutica trapostos. (p. 381).
constitucional", Ajuris 76/397, resgata um bom exemplo: .Casõ emblemático 56 Sobre estas questões, v, o projeto de tese de doutoramento de BARCEL-

32
33
Cabe assinalar, antes de encerrar a discussão acerca da distin- ção apta a conquistar racionalmente os interlocutore's70, sendo cer-
ção qualitativa entre regra -eprincípio, -que ela nem sempre é singe- to'qt,1eo processo interpretativo não tem como personagens apenas
la. k dificuldades decorreirfde fatores diversos, como as vicissitu- os<juristils, mas a comunidade como um !odo71 •
des da técnica legislativa, a natureza das coisas e os limites da lin- "O" novo século se inicia fundado na percepção de que o Direito
guagem. -Porvezes, urna regra conterá termo ou locução de conteú- é um sistema ~erto d~",!,:alores.A Co~~ituição, por sua vez, é um
do indeterminado, aberto ou flexível, como, por exemplo, ordem conjunto de princípios e regras des"Ünados ~ealizá-Ios, a despeito
pública, justa indenização, relevante interesse coletivo, melhor in- de se reconhecer n~alores uma dimensão suprapositiva. A idéia (
teresse do rÍlenor67. Em hipóteses como essas, a regra desempenha- de abertura se comunica com a Constituição e traduz a sua per- ~"~/,
rá papel semelhante ao dos princípios, permitindo ao intérprete meãbilidade a elementos externos e a renúncia à pretensão de dis- ' ,:::;.
integrar com sua subjetividade o comando normativo e formular a ciplinar, por meio de regras específicas, o infinito conjunto de pos- -'x' 'v
decisão concreta que melhor irá reger a situação de fato apreciada. sibilidades apresentadas p"~~~m_und"() reªF2. Por ser.o principal ca- '---'
Em algtimas situações; uma regra excepcionará a aplicação de um
princípio. Em outras, um princípio poderá paralisar a incidência de
uma regra. Enfim, há tun conjunto amplo de possibilidades nessa basear-se no exame de um conjunto de elementos, de tapoi (pontos de vista)
matéria. Esta não é, todavia, a instância própria para desenvolvê- relevantes para o caso - além da norma, os fatos, as conseqüências, os valores
las.
A perspectiva pós-positivista e principiológica do Direito in- concreta examinada, °
-, que dialeticamente ponderados, pennitem a solução justa para a situação
trabalho clássico no tema é de VIEHWEG, Theodor.
Tópica e jurisprudêndo.. Brasília: Imprensa Nadonal, 1979 (I' edição do original
fluenciou decisivamente a formação de' uma moderna hermenêuti~ Topik undJurisprudenz é de 1953).
ca constitucional. Assim, ao lado dos princípios materiais envolvi~ 70 A obra fundamental da denominada teoria da argumentação é do belga
dos, desenvolveu-se um catálogo de princípios iristrumentais e es- PERELMAN, Chaim, em parceria com OLBRECHTS- TYTECA, Lucie:Tratado
peCíficos de interpretação constitucional611• Do ponto de vista me- do. Argumentação: a nova retórica. São Paulo: Martins Fontes, 1996 (I' edição
do original TraitA de l'argumenration: la nouvelle rhetorique, 1958). Vejam-se,
todológico, o problema concreto a ser resolvido passou a disputar
também, MAlA, AntôniO Carlos Cavalcanti. "Notas sobre direito, argumentação
--, com o sistema normativo a primazia na formulação da solução ade-
quada69; solução que deve fundar-se em uma linha de argumenta-
e democracia", In: CAMARGO, Margarida Maria Lacombe (org.). 1988-1998:
uma década de Constituição. Rio de Janeiro: Renovar, 1999; e SARMENTO,
Daniel. A ponderação de interesses na Constituição Federal, cit., pp. 89-90, onde
averbou: "No campo das relações humanas, as discussões se dão em tomo de
argumentos, prevalecendo aquele que tiver maiores condições de convencer os
tOS, Ana Paula de, intitulado Ponderaçào de nonno.s: alguns pardmerros juridi- wJ.edocu.tores. Não há verdades apodíticas, {\las- escolh~s_r~, que são
éos, 2001, mimeografado. aquelas que podem ser r!!f.iQ!!,ymente justificadas, logrando a adesão do auditó-
67 V. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. "Regras de experiência e conceitos rio."
jurídicos indeterminados", In: Temas de direito processual. Segunda Série. São nHÃBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional. A sociedade aberta dos
Paulo: Saraiva, 1980, pp. 61 55 •• intérpretes do. Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e proce-
68 BARROSO, Luís Roberto; Interpretação e aplicaçào da Constituição, cit., dimental da Constituição, Pono Alegre: Sergio Antonio Fabris, U!Q7 (l" edição
identifica o seguinte catálogo de princípios de interpretação especificamente do original Die offene Gesellscluift der Vurfassungsinterpreten. Ein Beitrag zur
constitucional: supremacia da Constituição, presunção de constitucionalidade pluralistischen und "prozcssualen" Verfassungsinterpretation, 1975), p. 13: "Pro-
das leis e dos atos emanados do Poder Público, interpretação conforme a Cons- põe-se, pois, a seguinte tese: no processo de interpretação coríStitucional estâo
tituição, unidade da Constituição, raZoabilidade e efetividade. Para uma sistema- potendalmente vinculados todos os ó~statais, todas as po~ndas públicas,
tização sob perspeetin diversa, v. FREITAS, Juarez de. "Tendências atuais e todos os cidadãos e-gmpos, não sendo possível estabelecer-se um elenco cerrado
perspectivas da hermenêutica constitucional", Ajuris, n. 75, 1999, p. 397. ou fixado com!!Jl!7leTUSclausus de intérpretes da Co.!!-~t\tuição.•
69 Q método tópico aplicado ao problema funda-se em um modo de raciocínio 72 V. CANARIS, Oifus- Wühelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema
voltado para o problema e não para a norma. A decisão a ser produzida deve na ciincia do direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996, p. 281: -:~_

34 3S
nal de comunicação entre o sistema de valores e o ~i~tema jurídico, ao princípio transitar de sua dimensão ética e abstrata para as mo-
os princípios não comportam enwneração taxa~iya. Mas, natura1~ tivações racionais e fundamentadas das decisões judiciais.
mente, existe um amplo espaço de consenso, onde têm lugar al- O princípio da razoabilidade75 é um mecanismo para controlar
guns dos protagonistas da discussão política, filosófica e jurídica do a discricionariedade legislativa e administrativa., Ele permite ao Ju-
século que se encerrou: Estado de direito democrático, liberdade, diciário invalidar atos legislativos ou administrativos quando: (a)
igualdade, justiça. não haja adequação entre o fim perseguido e o meio empregado;
Há dois outros princípios que despontaram no Brasil nos últi- (b) a medida não seja exigível ou necessária, havendo caminho
mos anos: o da razoabilidade e o da dignidade da pessoa humana. O alternativo para chegar ao mesmo resultado com menor ônus a um
primeiro p~rcorTeulonga trajetória no direito anglo-saxão - nota~ direito individual; (c) não haja proporcionalidade em sentido estri-
damente nos Estados Unidos13 - e chegou ao debate nacional to, ou seja, o que se perde com a m~dida tem maior relevo do que
amadurecido pela experiência alemã, que o vestiu com o figurino aquilo que se ganha. O princípio, com certeza, não liberta o juiz dos
da argumentação romano-germânica e batizou-o de princípio da limites e possibilidades oferecidos pelo ordenamento. Não é de
proporcionalidade74• O segundo - a dignidade da pessoa hwnana voluntarismo que se trata. A razoabilidade, contudo, abre ao Judiw
- ainda vive, no Brasil e no mundo, um momento de elaboração ciário uma estratégia de ação construtiva para produzir o melhor
doutrinária e de busca de maior densidade jurídica. Procurawse esw resultado, ainda quando não seja o único possível ou mesmo aque-
tabelecer os contornos de uma objetividade possível, que permita le que, de maneira mais óbvia, resultaria da aplicação acrítica da lei.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem se valido do
princípio para invalidar discriminações infundadas, exigências ab-
sistema jurídico) nM! é fechado, mas antes aberto. Isto vale tanto para o sistema surdas e mesmo vantagens indevidas. .
de proposições doutrin'rias ou 'sistema científico', como para o próprio sistema O princípio da dignidade da pessoa humana75 identifica um
da ordem jurídica, o 'sistema objetivo'. A propósito do primeiro, a abertura
significa a incompletude do conhecimento científico, e a propósito do último, a
mutabilidade dos valores jurídicos fundamentais .•
T 7J Para uma breve análise da evolução histórica da razoabilidade no direito 75 Sobre o tema, vejam-se alguns trabalhos monográficos produzidos nos últi-
norte-americano, a partir da cláusula do devido processo legal, v. BARROSO, mos anos: STUMM, Raquel Denize. Princípio da proporcio1Ullidade no direito
Luís Roberto. Interpretação e aplicação da ConstituiçãD, cit., pp. 209 ss. V. cOlll"tituao1Ull brasileiro, 1995; BARROS, Suzana Toledo de, O prindpio da
também, PINHEIRO GOUVÊÃ, Marcos Antonio Maselli de. ~O princfpio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direi-
razoabilidade na jurisprudênda contemporânea das cortes norte-americanas", tos fundamentais, 1996; BUECHELE, Paulo Annínio Tavares. O principio da
Revista de Direito da Associaçào dos Proruradores do Novo Estado do Rio de proporcionalidade e a interpretação da Constituição, 1999. Também em língua
Janeiro, voL V, 2000. portuguesa, com tradução de Ingo Wolfgang SarIec, SCHOLLER, Heinrich, ~O
74 Guardada a circunstância de que suas origens reconduzem a sistemas diver- principio da proporcionalidade no direito constitucional e administrativo da
sos - ao americano em um caso e ao alemão em outro _ razoabilidade e Alemanha", Interesse Publico, n. 2, 1999, p. 93. '
proporcionalidade são conceitos próximos o s:uficiente paca serem intercambiá- 76 Alguns trabalhos monográficos recentes sobre o tema: SILVA, José Afonso
veis. Cabe a observação, contudo, de que a trajetória do princípio da razoabilida- da. "Dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia", Revista
de fluiu mais ligada ao controle dos atos normativos, ao passo que o princípio da de Direito Administrativo, n. 212, 1998, p. 89; ROCHA, Carmen Lúcia Antu-
proporcionalidade surgiu ligado ao direito administrativo e ao controle dos atos nes. "O principio da dignidade da pessoa humana e a exclusão social", A1Ulis da
dessa natureza. Vale dizer: em suas matrizes, razoabilidade era mecanismo de XVII Conferência Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, 1999; SARLET,
controle dos atos de criação do ilireito, ao passo que proporcionalidade era Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa hU11Ul1Ul e direitos fundamentais na Consti-
critério de aferição dos atos de concretização. Em linha de divergência com a tuição brasileira de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001; ALVES,
equiparação aqui sustentada, v. ÁVILA, Humberto Bergmann."A distinção en- Cleber Francisco: O princípio c(mstitucional da dignidade da pessoa humana.
tre principias e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade", Revista de Rio de Janeiro: Renovar, 2001; BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia juridica
Direito Administrativo n. 215, 1999, p. 151. dos princípios ccmstitudonais: .., cit .. Em texto escrito no início da década de 90,

36 37
espaço de integridade moral ~ ser assegurado a todas as pessoas por básicas para a subsistência física e indispensável ao desfrute da
sua só existência no mundo. E um respeito à criação, independente própria liberdade. Aquém daquele patamar, ainda quando haja so-
da crença que se professe quanto à sua origem. A dignidade relacio- brev(vência, não há dignidade. O elenco de prestações que com-
na-se tanto com a liberdade e valores do espírito como com as põem o mínimo existencial comporta variação conforme a visão
condições materiais de subsistência. O desrespeito a este princípio subjetiva de quem o elaboreJ mas parece haver razoável COnsenso
terá sido um dos estigmas do século que se encerrou e a luta por de que inclui: renda mínima, saúde básica e educação fundamental.
sua afirmação um símbolo do novo tempo77. Ele representa a supe. HáJ ainda, um elemento instrumental, que é o acesso à justiça,
ração da intolerãncia, da discriminação, da exclusão social, da vio- indispensável para a exigibilidade e efetivação dos direitos19•
lência, da incapacidade de aceitar o outro, o diferente, na plenitu- Aos poucos se vai formando uma massa crítica de jurisprudên-
de de sua liberdade de ser, pensar e criar. cia acerca do princípio, tendo como referência emblemática a de~
Dignidade da pessoa humana expressa um conjunto de valores cisão do Conselho de Estado francês, no curioso caso Morsang-sur-
civilizatórios incorporados ao patrimônio da humanidade. O con- Orge8°. No Brasil, o princípio tem sido fundamento de decisões
tetido jurídico do princípio vem associado aos direitos fundamen-
tais, envolvendo aspectos dos direitos individuais, políticos e so-
ciais. Seu núcleo material elementar é compos.to do mínimo exist- tese defende a existência de uma garantia patrimonial mínima inerente a toda
enciapa, locução que identifica o conjunto de bens e utilidades pessoa humanaJ integrante da respectiva esfera jurídica individual ao lado dos
atributos pertinentes à própria condiçilo humana. Trata-se de um patrimônio
mínimo indispensável a uma vida digna do qualJ em hipótese alguma, pode ser
desapossadaJ cuja proteção está acima dos interesses dos credores."
quando algumas decisões-do Supremo Tribunal Federal ameaçavam a efetividade 19 BARCELLOSJ Ana Paula de, em preciosa dissertação de mestrado _ A
e a força normativa da Constituição, manifestei ceticismo em relação à utilidade eficácia jurídica lÚJs principios constitucionais. O princípio da dignidade da
do princípio da dignidade da pessoa humana na concretização dos direitos funda- pessoa humana -J assim consignou seu entendimento; "Uma proposta de con-
mentaiSJ devido à sua baixa densidade jurídica ("Principios constitucionais brasi- cretizaçilo do mCnimo existencial, tendo em conta a ordem constitucional brasi-
leiros ou de como o papel aceita tudo", Revista Trimestral de Direito Público, n. leira, deverá incluir os direitos il.educação fundamental, il.saúde básica, à assis-
I, 1993). Essa manifestação foi datada e representava uma reação à repetição de tência no caso de necessidade e ao acesso à justiça."
erros passados. A Carta de 1988J todavia, impôs-se como uma Constituição 80 O Prefeito da cidade de Morsang-sur-Orge interditou a atividade conhecida
normativa, dando ao princípio, hoje, uma potencialidade que nele não se vislum-
como laru:er de nain (arremesso de anilo), atração existente em algumas casas
brava hã dez anos.
noturnas da região metropolitana de Paris. Consistia ela em transformar um anão
77 O Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada em projétil, sendo arremessado de um lado para outro de uma discoteca. A casa
pelas Assembléia Geral da Nações Unidas em 1948, inicia-se com as seguintes .- noturnaJ tendo como litisconsorte o próprio deficiente f!sico, recorreu da deci-
constatações: "Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a são para o tribunal administrativo, que anulou o ato do Prefeito, por "exces de
todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o pouvoir". O Conselho de EstadoJ todaviaJ na sua qualidade de mais alta instância
Í1.!ndamento da IiberdadeJ da justiça e da paz no mundo; Considerando que o administrativa francesaJ- reformou a decisão, assentando: "Que le respect de la
desprezo e o desrespeito pelos direitos do homem resultaram em atos bárbaros dignité de la personne humaine est une des compasantes de I'ordre public; que
que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em I'autorité investie du pouvoir de police municipale peut, même en I'absence de
que os homens gozem da liberdade de palavra, de crença e da liberdade de circonstances locales particult~resJ interdire une attraction qui porte atteinte au
viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta respet de la dignité de la personne humaine" (Que o respeito à dignidade da
aspiração do homem comum (...):
pessoa humana é um dos compontentes da ordem pública; que a autoridade
18 Sobre o tema, v. TORRESJ Ricardo Lobo. "A cicladaniamultidimensional na investida do poder de policia municipal pode, mesmo na ausência de circunstân-
era dos direitos". In: TORRESJ Ricardo Lobo (org.). Teoria dos direitos futuia-
mmtall. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. Veja-se, também, para uma interessante I cias locais particulares, interditar uma atração atentatória à dignidade da pessoa
humana). V. LONGJ WIL, BRAIBANTJ DEVOLVÊ e GENEVOIS, Le grands
variação em tomo dessa questão, FACHIN, Luiz Edson. Estatufo jurídico do
patriml3nio mínimo. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, Nota Prévia: "A presente II arrers de la jurisprud811Ce administra tive. Paris: DallozJ 1996, pp. 790 ss .. Veja-
se, em IIngua portuguesaJ o comentário à decisão elaborado por GOMESJ 10a-

38
39
importantes, superadoras do legalismo estrito, ç.omo a proferida
dificuldade na definição do conteúdo "doprincípio da dignidade da
pelo Superior Tribunal de Justiça. ao autorizar g,levantamento do
pessoa humana, além dos votos vencidos proferidos neste caso,
FGTS por mãe de pessoa portadora do vírus da AIDS, para ajudá~
parte da doutrina sustentou que, ao contrário da tese central do
la no tratamento da doença, independentemente do fato de esta
acórdão, a preservação da dignidade da pessoa humana estava em
hipótese estar ou não tipificada na lei como causa' para o saque do
assegurar o direito do autor da ação de ter confirmada a sua filia-
fundosl• Em outro acórdão, de elevada inspiração, o Tribunal defe-
ção, Como elemento integrante da sua identidade pessoa184.
riu habeas corpus em caso de prisão civil em alienação fiduciária,
após constatar, dentre outros fatores, que o aumento absurdo da & potencialidades da interpretação constitucional sob o influ-
dívida por força de juros altíssimos comprometia a sobrevida digna xo das idéias aqui expostas fazem surgir novas indagações. Uma
do impetrantes2• No Supremo Tribunal Federal, a preservação da delas consiste, precisamente, na possibilidade de conflito entre
dignidade da pessoa humana foi um dos fundamentos invocados uma específica incidência da norma e um valor constitucionalmen.
para liberar réu em ação de investigação de paternidade da condu- te protegido, abrigado em um princípio. Hipóteses podem ocorrer
ção forçada para submeter~se a exame de DNA83• A demonstrar a em que uma regra, cujo relato em tese seja perfeitamente compa-
tível Com a Constituição, produza em relação a uma dada situação
concreta um efeito inconstitucional. Neste caso, dev~-se paralisar
a eficácia da regra, em nome do valor' ou"princípio constitucional
quim B. Barbosa, ~O poder de polícia e o principio da dignidade da pessoa vulnerado.
humana na jurisprudência francesa", Advocacia Dindmica ~ Seleções Jurídicas,
n. 12, 1996, pp. 17 ss. Assim, se um dado preceito produzir, in concreto, um efeito
81 STJ, REsp. 249026/PR, Rei. Min. José Delgado, mu 26.06.2000, p. 138: anti~isonômico ou atentatório à dignidade da pessoa humana, não
"FGTS. LEVANTAMENTO, TRATAMENTODE FAMIliAR PORTADOR deverá ser aplicado. A constatação da inconstitucionalidade do re-
DO VÍRUS HIV. POSSIBIUDADE. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. sultado de uma dada incidência não interfere com a validade geral
1. É possível o levantamento do FGTS para fIns de tratamento de portador do da norma. Ilustre-se a hipótese: o Supremo Tribunal Federal, no
vírus HIV, ainda que tal moléstia não se encontre elencada no art. 20, XI, da Lei
julgamento de ação direta de constitucionalidade, considerou
-r 8036/90, pois não se pode apegar, de forma rígida, à letra fria da lei, e sim
constitucional a norma legal que proíbe a concessão de antecipação
considerá-Ia com temperamentos, tendo-se em vista a intenção do legislador,
mormente perante o preceito maior insculpido na Constituição Federal garanti-
dor do direito à saúde, à vida e a dignidade humana e, levando-se em conta o
caráter sodal do Fundo, que é, justamente, assegurar ao trabalhador o atendi-
mento de suas necessidades básicas e de seus familiares .• réu 'debaixo de vara'. Discrepa. a mais I1@poder, de garantias constitucionais
implícitas - preservação da dignidade humana, da intimidade, da intangibili.
82 STJ, HC 12.547-DF, ReI. Min. Ruy Rosado de Aguiar, mu 12.02.2001,
d4de do rorpo humano, do império d4 lei e da inexecução específica e direta de
onde se consignou: "A decisão judicial que atende a contrato de fInanciamento
obrigaçá{) de fazer - provimento judicial que, em ação civil de investigação de
bancârio com alienação fIduciária em garantia e ordena a prisão de devedora por
paternidade, implique determinação no sentido de o réu ser conduzido ao labora-
dívida que se elevou, após alguns meses, de R$ 18.700,00 para 86.858,24, fere o
tório, 'tÚbaixo de vara', para coleta do material indispensável à jeiN.l.rado exame
principio da dignidade da pessoa humana, dá validade a uma relação negociai sem
DNA. A recusa resolve-s~ no plano jurídico-instrumental, consideradas a dogmá.
nenhuma equivalência, priva por quatro meses o devedor de seu maior valor, que
tica, a doutrina e a jUrisprudencia, na que voltadas ao deslinde das questões
é a liberdade, consagra o abuso de uma exigência que submete uma das partes a
ligadas à prova dos jatas~. Ficaram vencidos os Ministros Francisco Rezek, limar
perder o resto proVlivel de vida que não seja o de cumprir com a exigência do
Galdo, Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence.
credor. Houve aJi ofensa ao prindpio da dignidade da pessoa, que pode ser
aplicado diretamente para o reconhecimento da invalidade do decreto de pri- S4 Vejam-se, em linha crítica da decisão, MORAES, Maria Celina Bodin de.
~.. . . "Recusa à realização do exame de DNA na investigação da paternidade e direitos
da personalidade", Revista dos Tribunais, n. 343, 1998; e ALMEIDA, Maria
8J STF, RTJ 165/902, HC 71.373-RS, Tribunal Pleno, reI. Min. Marco Au-
rélio, j. 10.11.94: "Investigação d~ paternidade ~ Exame DNA ~ Condução do Christina de. InvestigaçM d~ paternidade e DNA. Porto Alegre: livraria do
Advogado, 2001.
40
41
de tutela em face da Fazenda Pública85• Nada obstante, se em uma nidade jurídica e pela sociedade em geral. Além dos princípios
determinada situação o não deferimento da providência importar traditionais como Estado de direito democrático, igualdade e liber-
em perecimento de um direito fundamental - como o direito à dadé~;.a-quadra atual vive a consolidação do princípio da razoabili- •
.vida, por exemplo -, o intérprete deverá negar aplicação à regra e dade e o desenvolvimento do princípio da dignidade da pessoa
prestigiar o princípio ou direito fundamental86• Trata-se, assim, de humana.
uma hipótese especial de inconstitucionalidade, sem redução de
texto ou pronúncia de invalidade da norma.
Encerra-se esse tópico com uma síntese das principais idéias Capítulo IV
nele expostas. O pós-positivismo é uma superação do legalismo, Conclusão
não com recurso a idéias metafísicas ou abstratas, mas pelo reco-
nhecimento de valores compartilhados por toda a comunidade. Es- I. A ascensão científica e política do direito constitucional no
tes valores integram o sistema jurídico, mesmo que não positivados Brasil .
em um texto normativo específico. Os princípios expressam os
valóres fundamentais do sistema, dando-lhe unidade e condicio- O direito constitucional brasileiro vive um momento virtuoso.
nando a atividade do intérprete. Em um ordenamento jurídico plu- Do ponto de vista de sua elaboração científica e da prática jurispru~
ralista e dialético, princípios podem entrar em rota de colisão. Em dencial, duas mudanças de paradigma deram-lhe nova dimensão; a)
tais situações, o intérprete, à luz dos elementos do caso concreto, o compromisso com a efetividade de suas normas87j e b) o desen-
da proporcionalidade e da preservação do núcleo fundamental de volvimento de uma dogmática da interpretação constitucionalss.
cada princípio e dos direitos fundamentais, procede a uma ponde- Passou a ser premissa do estudo da Constituição o reconhecimento
ração de interesses. Sua decisão deverá levar em conta a norma e os de sua força normativa89, do caráter vinculativo e obrigatório de
fatos, em uma interação não formalista, apta a produzir a solução suas disposições, superada a fase em que era tratada como um
justa para o caso concreto, por fundamentos acolhidos pela comu- conjunto de aspirações políticas e uma convocação à atuação dos
T Poderes Públicos. De outra parte, embora se insira no âmbito da
interpretação jurídica, a especificidade das normas constitucionais,
85 STF, ADC n. 4, reI. Min. Sydney Sanches, j. 11.2.98.
com seu conteúdo próprio, sua abertura e superioridade jurídica,
86 Embora não tenha. sido desenvolvido de modo analítico, este raciocínio está
implfcito em decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Su1
exigiram o desenvolvimento de novos métodos hermenêuticas e de
AI 598.398.600 - 4~ C.Cível- ReI. Des. Araken de Assis - 25.11.98: ~E'- princípios específicos de interpretação constitucional.
.vedado antecipar os efeitos do pedido perante a Fazenda Pública, consoante o Essas transformações redefiniram a posição da Constituição na
art. ]0 da Lei nO9.494/93, proclamado constitucional pelo STF e, portanto, de ordem jurídica brasileira. De fato, nas últimas décadas, o Código
aplicação obrigatória pelos órgãos judiciários. No entanto, a contraposição entre
o direito à vida e o direito patrimonial da Fazenda Pública, tutelado naquela
norma, se resolve em favor daquele, nos termos do art. 196 da CF/88, através da.
aplicação do princípio da proporcionalidade, pois se trata de valor supremo, 87 Sobre o tema, v. BARROSO, Luís Roberto. O direiro constitucional e a
absoluto e Universal. Irrelevância da irreversibilidade da medida. (...) Eventual efetividade de suas normas. 5" ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
sacrifício da vida, em nome de interesses pecuniários da Fazenda Pública, condu- 88 Para um lêvantamento da doutrina nacional e estrangeira acerca do tema, v.
ziria o órgão judiciário a contrariar o direito e pratica.r aqueles mesmos erros BARROSO, Luí:l Roberto. lnterprctafão c aplicação da Constituição, 4" ed., cito
pelos quais 05 juristas alemães foram universalmente condenados .• V. o comen- 89 V. HESSE, Konrad. "La fuerza normativa de la Constituci6n". In: Escritos
tário a esta decisão elaborado por ÁvilA, An'a Paula Oliveira, ~Razoabilidade, de derecho constituciDnaI. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1983; e
proteção do direito fundamental à saúde e antecipação de tutela contra a Fazen- ENTERRfA, Eduardo Garcia de. La Constitución como nonna y cl Tribunal
da Pública", Ajuris, n. 86, 2003. Cons.iitueionaI. Madrid: Editora Civitas, 1985.

42
43
Civil foi perdendo sua posição de preeminênCia, mesmo no âmbito .civil, 'que permanecera alijada do processo político por mais de
das relações privadas, onde se formaram 'dive~s"'hsmicrossistemas duaS d~cadas. O produto. final de seu trabalho foi heterogêneo. De
(consumidor; criança e adolescente, locações,' direito de família). um lado, avanços como a inclusão de uma generosa carta de direi-
Progressivamente, foi se consumando no Brasil um fenômeno ante- tos, a recuperação das prerrogativas dos Poderes Legislativo e Judi-
riormente verificado na Alemanha, após a Segunda Guerra: a pas- ciário, a redefinição da Federação. De outro, no entanto, o texto
sagem da Lei Fundamental para o centro do sistema. À supremacia casuístico, prolixo, corporativo, incapaz.de superar a perene super-
até então meramente formal, agregou-se uma valia material axio- e posição entre o espaço público e o espaço privado no país. A Cons~
lógica à Constituição, potencializada pela abertura do sistema jurí- tituição de 1988 não é a Carta da nossa maturidad~ institucional,
dico e pela normatividade de seus princípios90• mas das nossas circunstâncias. Não se dev:e, contudo, subestimar o
A Constituição passa a ser, assim, não apenas um sistema em si papel que tem desempenhado na restauração de!Jlocrática brasilei-
. - com a sua ordem, unidade e harmonia - mas também um modo ra. Sob sua vigência vem se desenrolando o mais longo período de
de olhar e interpretar todos os demais ramos do Direito. Este fenô- estabilidade institucional da história do país, com a absorção de

I
meno, identificado por alguns autores como filtragem constitucio- graves crises políticas dentro do quadro da legalidade constitucio-
nal, consiste em que toda a ordem jurídica deve ser lida e apreen- nal. É nossa primeira Constituição verdadeiramente normativa e, a
dida sob a lente da Constituição, de modo a realizar os valores nela despeito da compulsão reformadora que abala a integridade de seu
consagrados. A constitucionalização do direito infraconstitucional texto, vem consolidando um inédito sentimento constituciona192.

I
não identifica apenas'a inclusão na Lei Maior de normas próprias de O constitucionalismo, por si só, não é capaz de derrotar algu-
outros domínios, mas, sobretudo, a reinterpretação de seus institu- mas das vicissitudes que têm adiado a plena democratização da
tos sob uma ótica constitucional91• sociedade brasileira. (O Direito tem seus limites e possibilidades,
A ascensão científica e política do direito constitucional brasi~ não sendo o único e nem sequer .0 melhor instrumento de ação
leiro é contemporânea da reconstitucionalização do país com a social). Tais desvios envolvem, em primeiro lugar, a ideologia da
Carta de 1988, em uma intensa relação de causa e efeito. AAssem-
r desigualdade. Desigualdade econômica, que se materializa no abis-
T bléia Constituinte foi cenário de ampla participação da sociedade mo entre os que têm e os que não têm, com a conseqüente dificul-
dade de se estabelecer um projeto comum de sociedade. Desigual-
dade política, que faz com que importantes opções de políticas
públicas atendam prioritariamente aos setores que detêm força
90 V. PERUNGIERI, Pietro. Perfis do direito civil. Trad. Maria Cristina de
Cicco, 1997, p. 6: "O Código Civil certamente perdeu a centralidade de outrora .. eleitoral e parlamentar, mesmo quando já sejam os mais favoreci-
O papel unificador do sistema, tanto nos seus aspectos mais tradicionalmente dos. Desigualdade filosófica: o vício nacional de buscar o privilégio
civilisticos quanto naqueles de relevãncia publicista, é desempenhado de manei- r em vez do direito, aliado à incapacidade de perceber o outro, o
ra cada Ve;l:mais incisiva pelo Texto Constitucional." Vejam-se, também: TEPE-
DINO, Maria Celina B. M .. "A caminho de um direito civil constitucional",
Revista de Direito Civil n. 65, p. 21; e TEPEDINO, Gustavo. "O Código Civil,
I próxim093 •.

os chamados microssistemas e a Constituição: premissas para uma reforma


legislativa." In: TEPEDINO, Gustavo (org.). ,Problemas de direito civil-comtitu-
cioM!., dto
I 92 V. BARROSO, Lu!s Roberto. "Do:r:e anos da Constituição brasileira de
1988". In: Temas de Direito Constitucional, cit., 2001. Para um denso estudo
91 CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constitui- acerca da expansão da jurisdição constitucional no Brasil, veja-se BINENBOJM,
çiio. Coimbra: Coimbra Editora, 1991, p. 45: "A principal manifestação da Gustavo. A nova jurisdiçào comtituciemal brasileira. Rio de Janeiro: Renovar,
preeminência normativa da Constituição consiste em que toda a ordem jurídica 2001.
deve ser lida à luz dela e passada pelo seu crivo". V. também, SCHIER, Paulo 93 Sobre o tema, v. o ensaio de ECO, Umbeno. "Quando.o outro entra em
Ricardo. Fillragem constituciemal. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1999. cena, nasce a ética •. In: ECO, Umberto; MARTINI, Carlo Maria. Em que creem

44 45
Em segundo lugar, enfraquece e' adia o projeto da democratiza~ realiza-se não apenas pelo princípio majoritário, mas também pelo
ção mais profunda da sociedade brasileira a corrupção disseminada - . corp.promisso na efetivação dos direitos fundamentais.
e institucionalizada. Nem sempre a do dinheiro, mas também a do ?:-.-A- dogmática-jurídica tradicional desenvolveu~se sob o mito
favor político e a da amizade. No sistema eleicoral, a maldição dos da objc:tividade do Direito e o da n_eutralidade do intérprete. Cou-
financiamentos eleitorais e as relações promíscuas que engendram. be à teoria crítica desfazer muitas das ilusões positivistas do Direi-
No sistema orçamentário, o estigma insuperado do fisiologismo e to, enfatizando seu caráter ideológico e o papel que desempenha
das negociações de balcão nas votações no âmbito do Congresso. como instrumento de dominação econômica e social, disfarçada
No sistema tributário, a cultura da sonegação, estimulada pela vo~ por uma linguagem que a faz parecer natural e justa. Sua contribui-
racidade fiscal e por esquemas quase formais de extorsão e compo~ ção renovou a percepção do conhecimento jurídico convencional,
sição. No sistema de segurança pública, profissionais mal pagos, sem, todavia, substituí-lo por outro. Passada a fase da desconstru~
mal treinados, vizinhos de porta daqueles a quem deviam policiar, ção, a perspectiva crítica veio associar~se à boa doutrina para dar ao
envolvem-se endemicamente com a criminalidade e a venda de Direito uma dimensão transfonnadora e emancipatória, mas sem
proteção. A exemplificação é extensa e desanimadora. desprezo às potencialidades da legalidade democrática.
A superação dos ciclos do atraso e o amadurecimento dos povos 3. O pós-positivismo identifica um conjunto de idéias difusas
inserem~se em um processo de longo prazo, que exige engajamento que ultrapassam o legalismo estrito do positivismo normativista,
e ideal. O novo direito constitucional brasileiro tem sido um aliado sem recorrer às categorias da razão subjetiva do jusnaturalismo.
valioso e eficaz na busca desses desideratos. Mas o aprofundamen- Sua marca é a ascensão dos valores, o reconhecimento da normati-
to democrático impõe, também, o resgate de valores éticos, o exer- ¥idade dos princípios e a essencialidade dos direitos fundamentais.
cício da cidadania e um projeto de país inclusivo de toda a gente. Com ele, a discussão ética volta ao Direito. O pluralismo político e
Um bom programa para o próximo milênio. jurídico, a nova hermenêutica e a ponderação de interesses são
componentes dessa reelaboração teórica, filosófica e prática que
fez a travessia de um milênio para o outro.
1, lI. Síntese das idéias desenvolvidas 4. O novo direito constitucional brasileiro, cujo desenvolvi-
mento coincide com o processo de redemocratização e reconstitu-
Ao final desta exposição, que procurou reconstituir alguns dos cionalização do país, foi fruto de duas mudanças de paradigma: a)
antecedentes teóricos e filosóficos do direito constitucional brasi- a busca da efetividade das normas constitucionais, fundada na pre-
leiro, é possível compendiar de forma sumária as idéias expostas, .' missa da força normativa da Constituição; b) o desenvolvimento de
nas proposições seguintes: uma dogmática da interpretação constitucional, baseada em novos
1. O constitucionalismo foi o projeto político vitorioso ao final métodos hermenêuticos e na sistematização de princípios específi-
do milênio. A proposta do minimalismo constitucional, que procu- cos de interpretação constitucional. A ascensão política e científica
ra destituir a Lei Maior de sua dimensão política e axiológica, para do direito constitucional brasileiro conduziram-no ao centro do
reservar-lhe um papel puramente procedimental, não é compatível sistema jurídico, onde desempenha uma função de filtragem cons-
com as conquistas do processo civilizatório. O ideal democrático tituâonal de todo o direito infraconstitucional, significando a in-
terpretação e leitura de seus institutos à luz da Constituição.
5. O direito constitucional, como o direito em geral, tem possi-
os que nào criem?, Rio de Janeiro: Record, 2001, p. 83: "A dimensão ética
começa quando entra em cena o outro. Toda lei, moral ou jurídica, regula bilidades e limites. A correção de vicissitudes crônicas da vida na-
relações interpessoais, inclusive aquelas com um Outro que a impõe". cional, como a ideologia da desigualdade e a corrupção institudo~

46
47
,_.~

,
na1,-'depende antes da superação his,t6rica ~ pólítica'dos ciclos do
atraso, dó qúe de nor~asjúrídicas'. O'aprofundamento 'democráti- ,, .• i ~_~~'.~
',' ".
,,
. co no Br~il está subordinado ao resgate de yaiores ~ticos, ao exer- "

'7"
'.cício da. cidadania e a'lÍm projeto generoso
" ,
.
e inclusivo de país.
.
,'.' ',',
,

.!

,
" , ,
" .....
, '

... ,'.
.,' ,
H. ~'
"
,
.f'-]".
. \

<'~,

'"
~ ,,

,
,, .._'

:I~

,,~
',O

. .. .:
"

, ',' ...
' ,
o", ,
, .,. ,
,-,
,">"
,

" '
c
, i. .'
"
48
lI. J LIlU s?i <;i\o E :1:1\1
reRf It€ 1'I't~ CO'" S,Tí'Ne< oN ftt.
2. Regras jurídico-organizat6tias
a) Regras de competência 3 .:.r. :r. bl)'l"I'£Ç, 0:lNo n u-K\, 81 W'K)
.}.-
b) Regras de criação de órgãos (normas org;1nicas)
.) Regras de procedimento CoW 'S -ri TV c.i D li!A-t.. I f' . .Lo:, "'.- J.oG.z.,.
3. Regras jurldico-m2teriais
- 1w:".koJ..c~
a) Regras de direicos fundamentais A. O Ponto de Partida - sistema aberto de regras ( principios
b} Regras de garantias institucionais
c) Regras dcterminadoras dos fins c tarefas do Estado
t- O (acesso»ab ponto & partida
ri) Regras constitucionais imposicivas

No presente capítulo procurar-se-á lançar as bases da compreensão


c. O Sistema Interno de Normas t Prindpíos dogmática do direito constitucional. Convém, por isso, adiantar o pOnto de
~.
parrida fundamental para a compreensão dos desenvolvimentos seguintes:
o sistnnA juridico do Estado de dirrito dnnocrdtieo português! um sistema normativo
D. Tortura Aberta e Positividade Constitucíonai aberto de regras e prindpios. Este ponto de partida carece de «descodificação»:
J1~~ (I) é um sistmuz jurldico porque é um sistema dinâmico de normas; (2) é um
I - O dírrito constitudonal como dirrifo constitucional positivo ~ Ii~~ sistema abmD porque rem uma estrutura dialógiea, (Caliess) traduúda na dispo-
nibilidade e «capacidade de aprendizagem» das normas constitucionais para
11- O stntído das namas progumáticas 11 .ed. .-, \ Q~ captarem a mudança da realidade e estarem abertas às concepções cambiantes da
"3'JJ,W
I :.1 «vetdade>te da ujustiÇll»;(3) é um sistona normativo, porque a estruturação das
1/1- Constitucionalismo( k~lísmo expectativas referentes a Valores, programas, funções e pessoas, é feita através de
-ncnnas I; (4) é um sistrout de"f,7dS ede principias, pois as normas do sistema tanto
1. Rejeição da doutrina da regulamentação das liberdades podem tevelar-se sob a forma de prindpios como sob a sua forma de"f,7dS 2.

2. Aplicabilidade mecera de normas de direitos, liberdades ~~~


c garantias
11- Prindl!io t "gra no dinito constitudonal
3. Aplicabilidade directa de normas organizarórias ~~~V'
4. Aplicabilidade directa de normas fim e normas tarefa
Salienta-se, na moderna constitucionalfstica, que à riqueza de fimndS
IV - Dtnsídadt t abtrtum das nonnas constitudonais da constituição corresppnçle a multifuncionalidade das normas constitucionais. Ao
mesmo tempo, aponta-se para a necessidade dogmática de uma clarificação
v - Unidadt da constituição t antinomias
Qà~~
t tlnsões ~ upológica da estrutura normativa. É o que se vai mes em seguida.
tntrt prindpios constitudonais

1. Conflito de princípios lar. LilllMANN, R.</ns;ozi~~, p. 80; G=fJschlljiJstru1trurrmd Snnllllri!t, vol.H. pp. 42 ss.
1 C&. ÁlEXY. Thmri~tÚT G"mJmh~. p. 71 ss. No direi", b, •• i!eiro, err. EROS RoBE~TO
2. O princípio da unidade da constituição GRAU,.0$ pnodpiw e as ~ jurídicas" 10.A Ortkm «"""mim ml couslit"irJo J~1988 (in"'1'l"ttl<[iio ~
crltim). S. P:luJo, 1990, pp. n:1>.;JOS! AFONSO DA SILVA,G",. de Di •.••./O C'''''iruâ"nll! fuiti"", 5.' <-d.,
S. Paulo. 1984, pp. 82 u. Para o COOceilO de ,istema cfr., por rodos, CANARls.P~tI$4mm/O list~mdljro, ronail'
de tinmuJ l1A <ib>dll@tlirtito, Li,boa, 1989, pp. 25 •••

~ Dl",,~C~UrlrHI.~~1 1032 1033 li <~"Sflhl<d. "'U ,1"'No d,,,. d, ,,,,~. , ori",ioi.,


1. Normas, regras e principios
fi NatuTtza normogmitica: os prindpios sã,? .~1!...4ª1p~.!!.~f?
.de ~eg~,
is~o normas que estão na ~ase OlLÇ,(ms.tituem.arat!o..9.~~egrasjurídicas, "Ç)J
A teoria da metodologia jurídica tradicional distingUia éntre normas
desempenhandQ, _RºL~o, uma fuO£áo QQrII!o,gen~tica. 8..£~odamentante. ,-
t' principios (Nonn-Priwdp. Principks-rules. Norm una GrunJ.ratz). Abandonar-sc-á
Como se pode ver, a distinção entre princípios e regras é parti-
aqui essa distinção para, em sua substituição. se sugerir: (I) as regras e princípios
cularmente complexa. Esta complexidade deriva, muitas vezes, do facto de não se
são duas espécies de normas; (2) a distinção entre regras e princípios é uma
esclarecerem duas questões fundamentais: (1) saber qual a função dos princípios,
distinção entre duas espécies de normas 3.
ou seja, se têm uma função ret6rica.argumentativa ou ~o normas de conduta;
(2) saber se entre princípios e regras existe um denominador comum, perten~
.cendo à mesma "família»_e havendo apenas uma diferença do grau (quanto à
2. Regras e princípios
generalidade. conteúdo informativo, hierarquia das fontes, explicitação do con-
teúdo, conteúdo valorativo). ou se. pelo contrário, os princípios e as regras são
Saber como distinguir, no ambito do superconceito norma, enrre susceptíveis de uma diferenciação qualitativa.
regras e princípios, é uma tarefa particularmente complexa. Vários são os cri[é~
Relativamente ao primeiro problema, convém distinguir entre
rios sugeridos. .
prindpios hermenêuticos e principios juddicos. Os princípios hermenêuticas
. a) Ci.,--au(k ab.~.mJffão:os princlpios são normas com um grnu de
desempenham uma função argumentativa. permitindo, por exemplo, denotar a
abstr.l.cção relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abs~
ratio kgis de uma disposição (cfr. infta, capo 3. cinones de interpretação) ou
Q
,

tracÇão relativamelHe reduzida <I. •


revelar normas que não são expressas por qualquer enunciado legislativo,
b) G;,a:.'!-#,Ac.Y!.!!E!!.,abi[jdadena aplicação do caso concreto: os possibilitando aos juristas, sobretudo aos juízes, o desenvolvimento, integração e
princ/piOJ, por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretiza~ complememação do direito (Richumcht. analogiajuris). Não é destes princípios
doras (do legislador? do juiz:), enquanto as rrgraJ são susceptíveis de aplicação que tratamos aqui (vitk, capo 4. Q
).
dirc:ct:l.5.--- -. - .-
OS princlpios interessar-nos-ão. aqui, sobretudo na sua qualidade de
c) Cardcter di! fimdammta/idatÚ
no sistema das fontes de direito: os verdadeiras normas. qua/itativammtc distintas das outras categorias de normas ou
p'rindpios são normas de n_a.t~~ ..'~~ co~ um papel ~~A~el1:tal no ordena- seja, das regrasjurldicas. As diferenças qualitativas traduzir-se-ão, fundamental-
mento jurídico devido à sua posição hierárquica no .~~stemadas fontes (ex: prin-
mente, nos seguintes aspectos. ~.p'~jm~iro lugar, os princlpios são normas
clpios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurí~
jUJ"fdicasimpositivas de uma opti'.!!.iEfí!!J, comp<l:IÍy:e!s S9.rA_yár.iº!Lgra~sde .con-
clicO(ex: princípio do Estado de DireitO) 6.
c~:Consoante os co~dici~'n~.!!!.?s fã~.~i~"cjurídiço~; as ~ .são normas
ti) IfProximidadt'~ da idda tÚ dirdto,;..~ .prill.clpios são «standards»
que pr~r~m imperatiYa£lle':.r.:.,l:l!!!~
exi~_n.<:ia.
(impõem. permitem ou profbem)
juridicamente vinculantes radicados nas exigênci~, 4c:_ «justiça» (Dworkin) ou na
~ê~_~u-nãU-f!:lmprida (nos termos de: Dworkin: applicabk in all-or-nothing
«ideia de d'ireito» (Larenz); as rCf,Taspodem ser normas vinculativas com um jaiJiion); a convivência dos.P!k!~jos é conflitual (Zagrebe1sky), a convivência de
conteúdo meramente funcional 7..
r~~tin6mlCã;-ijs princ.(pl~~-CÕ~~, 'ãs regrãs antin6mieas çxcluem-se.
Cans uente e os prind ias, ao conscimirem cxig~c!.as tk optimizaçiUJ, per-
3 Cfr. DwolOON, To./dng RighlJ &rio",1y, p. 53; A1Dcr, Th",fÚ Jn- G",tuir«hu. p. 72; ~balanceamenlQ.. e.valorese-iiifer~'I~~o.~"pbedecem, c;omo as regJ;as,à
BmuN:SKI,jurlsrisdn Mrthodrnl"'rr "nâ &rhubtgrijJ. 1982, pp. 132 ss.; DREIU, &hubwilf u.iui &htúd",
1986, p. 26; WIEDERlN,.Rcgd.Prinzip-Nonn" in PAUlSONfWAUER,(org.) U"rmur!nm:m~r &;"m &rhn- .~ca dQ tudo ou nadaJ,1so~~!!~_~~~p't'so e a ponderação de outros princípios
úhrr, 1986, pp. 137... . '. eventualmen~~....fQ.nfli!:Uantes; as regras ,não deixam espaço para qualquer outra
4 C&. F.ssrn, G•••.,ârau. ""ti No,."" p. 51; UIl.ENZ, Ri.htig •• R«ht, p. 26, que, d. ~"o. ,. solução, pois se uma t~ra vale (tem validade) deve cumprir~se na exacta medida
-....::.... ~_."'._'.'
rovebtn crluros qu~nro ~ em: crit.:r;o <k ~b,t •• cção.
l Cfr. EssER, G •••ml.rau. ""â No,."" dr. p. 51; UIU'NZ, Richtiga RNh" p. 23.
das suãs p~criçócs, nmun~~~~~ Como se verá mais adiante, em caso de
6 Cfr. GUASI1Nl,úzioni sul Li"guttggW Giuriâiro, p. 163. Conflito mtrt: prindpios, estes podem ser objecro de ponderação, de harmonização,
7 CIr. U1lwz, M.thotit"kl",. Jn- &rhlJwwmubajt. 5.'..l. p. 218, 404; OWORKIN, Ta"i"g
RighlJ Sniously, pp. 54 $S.
! ar., por a.. EsseR, Grundsalz, p. 51; CAw,Rls, P"'JIlmmtIJ fimmtitit., dr., pp. 76 $I,

~ PI,,"" c~•• l/h<lu ••1 1034


1035 li ," •• "t.I(4. ,.,.~ ,/,tt"'Q •• "/Q d, rtÚ'" , «Tio<lpi ••
••••••••••••••••••••••••••••••••••
,",,", ( , .'

, .,
,~
,•••
c
.•
.•••
,

>
constitucional programático (ex.: Constituição
tituição Brnsileira de 1988).12
Portuguesa de 1976, Cons- Estado de Direito e da legalidade democrática. mas emerge com perigo o ~excesso ,j
de poder". Isso acontece, por ~ .• com o principio da proibição do excesso )"
••
/ •

(,f,. am. 18."/2, 19."12/3/418, 28.~12, 272."/2). . •


O discursodo textOtem um .segredo.escondido.Essesegredodeve, p<Jrém,
=eJar-sews que pretendamir ao fundodascois:lS: pretende-~eco~truit a direito~nsritucional Os princípios jurídicos gerais têm também uma fimção positiva.
oombasenumaperspectivo. 'principiaIista"(baseadaem principios),perspcctiv)' estainspiradaem «informando~ materialmente os aeros dos-poderes públicos. Assim, por ex., o
Dworlcine Aiexy,m••.•com~bertUr:lS pat:l••.•concel"'óe.sistémicúe estruturantes(~ntido de .prindpio da publicitiadf dos aaosjurldicoi (cfr. ano 119.°) exige que, no caso de
Luhmanne de Müller).Destaforma,fazemostambémsugestóesparaumavisõ:oestrutut:lntedo ser reçonhecida efka:cia externa a esses aeros, eles sejam notificados aos interes-
direito constirucionalcom suficientessuportes em esquemas.funcionais e institucionais
(W Krnvierz).Cfr. Dworkin, Taking Righrr &rilJusly, p. 45; Alexy,ThÇOTi~drr Grundmhu;
sados nos termos da lei (efr. art. 268.°/3). Atrás do princfpio da publicidade, está
R«htuymm und Praktircht V~m,mft,Rth, 18 (1987),p. 405;W. Krawietz,R«ht aisR~~lsyrmn, a exigência de segurança do direiw, a proibição da an:ana prnxis (política de
Wiesbaden. 1984; .}urisdisch-instirutioneUe Rationalitãtdes Rechts versus Rarionaliratder segredo), a defesa dos cidadãos perante os aetos do poder público.
Wissenschaft",in Rrh 15(1984),p. 423; Zasrebdsky,J( ,istnna ClJftiruzionait, dt .. p: 108;J( Diritro A mesma eficácia material positiva se reconhece ao princípio, já
M;u, Tonno. 1992,pp.:147!S;Bin,Diri"i ~ ArglJmmti, Milano,1992,p. 31 5>. citado, da proihiçM do o::usso. Proibir "o excesso não é só proibir o arbítrio; é
impor, po~itivamente, a t!Xigibilidtuk, atÚqUtlÇM eproporcionalidafÚ dos actos dos
poderes públicos em relação aos fins que eles prosseguem. Trata-se, pois, de um
B, npología de Príndpíos e de Regras principio jurídico-material de:••justa medida» (Lacem) 13.
O principio do ausso iU)dirtito ~ tUJstribunais (cEr.art. 20.°) é outro
1- npologia dr plincípío$ principio geral que postula não só o reconhecimento da possibilidade de uma
H
defesa sem lacunas, mas também o exercicio efecrivo deste direito (ex.: direito ao
I. .
Aflorados alguns tópicos relativos ao problema geral dos princfpios patrodnio judiciário, direito à informação jurídica). Também o princípio da
jurídicos, impõc-se agora a ddimiração do tema dentro dos quadros do direito imparcialidade da administraÇão (an. 266.°) é um princípio simultaneamente
constitucional. A tipologia que vai servir de base ~ a seguinte:: negativo e positivo: ao exigir-se imparcialidade proíbe-se o tratamento arbitrário
e desigual dos cidadãos por parte dos 'agentes administrativos, mas, ao mesmo
tempo, impõe-se a igualdade de tratamento dos direitos e interesses dos cidadãos
1. Principias jurídicos fundamentais (Rechesgrundsatze) atrav6; de um critério uniforme da ponderação dos interesses públicos.
Em virtude desta dimensão determinante (positiva e negativa) dos
. Consideram-se prindpios jurfdicos fundamentais os princlpios prindpios, n::conhec:e-se hoje que, mesmo não sendo possível fundamentar
historicammtt objtctivados t progmsivammtt introduzidos na consdrncia jurldica t autonomamente, a panir deles, recursos de direito público (o que é discut1vel),
mcontram uma rtctpção t!Xpressa ou implícita no texto constitucional. Penen- eles fornccem sempre directiv'as .materiais de interpretação das normas
~ cem à ordem jurídica positiva e constituem um importante fuÍularncnto para a constitucionais. Mais do .que isso: vinculam o legislador no momc~to legiferante,
interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo. Mais de modo a poder dizer-se ser a liberdade de conformação legislativa positiva e
rigorosamente, dir-se-á, em primeiro lugar. que os prindpios têm uma função negacivamente.~incul"adà pelos principias jurídicos gerais.
negativa panicularmenre rdevante nos «casos limites» (••Estado de Direito e de
Não Direito". «Estado Democr*tico e ditaduta»). A função negativa dos prin-
2. Princípios pollticos constitucionalmente conformadorc$
"CÍpiosé ainda importante noutros casos onde não está em causa a negação do
.•..-.-
12 Cft., prccis>menr<. na mau jovem lircraouta b,osild",: SUZÀNA DE TOLEOO BARROS,
O prindpio "" ",mti,u<ionali"",u • O",,,rrolo da ",,,,tituú.nali<úui. dm hiJ ",tritiJkU, B•.••lli., 19%; RAQUEL
OWlZE SnJMM. Prindpw tÚ cD"'titutionalidadt nD dirri", ",,,,titucio,,,,16rasiitiro, Po"o Akgrc,' 1995; INoctN_
princlpior
Designam-se por princIpios politicamente conformadores
constituâonàis qUt txplidtam as valoraçóts polfticas fimdammtair
os
do !
CIO M. CoELHO, Intn'prrrafilo CGlll'tituriG".I. p. 85; Lufs BARRoso, Intrrprrrafiio ~ .Aplicaria da Co"""";,,io, U ar. CRlSAFUlU, LACortit~"'u. pp.17,53••; S. BARroU:.TI Limi,edeiprindpifonda_
pp. 141 ••• mcnt2/i., in Srudi in """rr A. Al1UJrth. r, MUano, 1982, pp. 60 ••.

~ DI"II~ 'U""HI~oal 1038 1039 -1'~"HI'.lr •• ""' •• Is"",~ .j"t~ ", '''r~s , ulnt>.I ••
kgisladorconstituinte. Nestes princípios"se condensam as opções p~Hticas nuclea-
4. Os princípios~garantia C-.;./
~deologia ins.piradora di constituição. Expressando as concep~
ções pollticas triunfantes ou dominantes numa assembleia constituinte, os prin~ ./
cípios político-constitucionais são o cn'1l~político t:Ú uma conrti~it;(í;opo/itica, não Há outros pri~cípios que vjsal;Ui~tituir directa e imediatamente
uma garantia dm; cidadãos: É-lhes atribuída uma densidade de autêntica norma
admirando que: (l) sejam'reconhecidos como limiteS do poder d~ revisão; (2) se
jurídica e u~a força determinante, ,positiva e negativa. Refiram-se, a título
revelem os princípios mais dirccramcntc visados no c:t~ode alrc'J;u;ãoproflllllla
do regime polftico. . de t:xclllplll,' o princípio de nu/btm crimm si//(: /egc I' (~e11//(/,/ P0I'I./lI shl/' llgl'
(cfr. are. 29.°); o princípio do juiz natural (cfr. art, 32.°/7), o.sprincípios de 11011
Nesta sede situar-se-ão m; princípios difinidom da ftmla tk EstaM:
bis in idem e in dubio pro no (cfr. arts. 29.°/4, 32."/2). . .
princípios da organização económico-sotial; éomo, por ex:, õ princípio da subor~
dinação do poder económico ao poder polltico democrático. o princípio da Como se disse, estes princípios traduzem-se no estabelecimento
direclO de garantias para os cidadãos e daí que os autores lhes chamem
coexistência dos diversos secrores da propriedade - público, privado e
"princípios, em forma de norma jurídica» (Larenz) e considerem o legislador
cooperativo -; os princípios definidores da ~strutura' do Estado (uniti.rio, com
estreitamente vinculado na sua aplicação 14.
descentralização local ou com autonomia local e regional), os princípios
tstruturantes do ug;mt po/ltico {princípio do Estado' de Direiro, princípio demo- ., ..
N;i,o ~ poslIfvd fazer-se aqui uma explanação da' complna p,oblem:ítica dos
crático, princípio republicano, princípio pluralista)' ~ os princípios caracterizadom principias e das SU:ll rd:ao;õa com :li norm:ll jurldicas. No texto, a doutrina defendida tende a
da forma t:Ú gov~mo e da organização política" em geral cqmo o princípio da aprOJumar.sc da opinião que julgamos estar a ganhar O estaruro de doutrina conltiruciona1istica
separação e interdependência de poderes e os princípios eleitorais. dominante. Cfr., enrre nós, por último, Castanheira Neves, A unik<ú, pp. 172 1iS.; Jorge Miranda,
MllnuaL lI, pp. 57 ss.; Baptista Machado, Introdução lli) Di>'l!ito,p. 164, partindo de premissas
Tal como acontece com os princípiosljurídicos gerais, os princípios
merodo!ógi= n;i.o ooincidenres oom as que aclo subjacentes ao texto. Em termoo gerais,
políticos constitucionalmente ronformadores são princípios normativos, 1?etrius di Urenz, Richtigtt R«ht. Münc:hen, 1979; Esser, Gruruhatz. und Naml, pp. 51 ss; R. Owotkin,
e opmmus, que todos os órgãos encarregados da aplicação do direito devem ter .The Mode! af Rum, I, in T4king Rights Sniously. London, 1977, pp. 25 ss.; Scheuner,
em conta, seja em actividades interpretativas, seja em actos inequivocamente .staamidbenimmungen~, in rotschrifi flir E. Frmrhoff, MUnrnen, 1972, pp. 325 5.1; .Normatlve.
conformadores (leis, actos normativos). Gewabrleisrung und Bezugnahme aufFakten im Verfiwungstcxto, in Ftttschrifi flir H. U. Seu/in,

-. Berlin, 1973, pp. 324 $S. Por último, C&. Alexy, .Zum Begriff da Rec:htsprinzipso, il1 Ktawietz et
llb;. (org.) -Argumm/lltian und HnmeneutiJ: in da ]urispru<únz. 1979, pp. 3455; Alexy, Theorie
<úr Grundro:hu, 1985, pp. 72 SS.; ÜOll R. Grau, A Onimo «o1lÓmicll. cit., p. 106.
3. Os princípios constitucionais impositivos

Nos princípios constitucionais impositivos subsumtm-sr todos os


11- npología de n:gms
principios 'Ju~,sobmudo no âmbito da comtituiçáo dirigentt, impóffll aos órgáosdo
Estado, sob1?tudoao legislador,a nalizaçáo tÚ fim ~a G:~çiio dt tarefas. São, por-
tanto, princípios dinâmicos, prospectivarnente orientados.
1. NO!ffias constitucionais organizat6rias e normas 'constitucionais materiais
Estes principias designam~se, muitas vezes, por ~preceitos defini-
dores dos 6ns do Estado» (assim Scheuner: StaatszMbestimmungen), ~princípios . , Uma distinção, reconduzível à doutrina constitucionalista alemã da
direcd~os fundamentais» (Hafdin), ou «normas programáticas, definidoras de época de Weimar e com recepção n~ Itália, pretende separar as normas otgani-
fins ou tarefas».
zat6rias das normas materiais: as primeiras regulam o estatuto da organização do
Como exemplo de princípios constitucionais impositivm; podem Estado e a ordem de dominio (são normas de ~acção» na terminologia italiana);
apontar-se o princípio da independência nacional e o princípio da correcção das " as segundas referem-se aos limites e programas da acção estadual em relação aos
desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimenro (am. 9. /d e 81."/b).
0

Traçam. sobretudo para o legislador, linhas recuizes dá sua actividade política e


cidadãos (são.
. ~normas de relação»). E uma distinção . ultrapassada, ao esrabelecer
legislativa. .
It Cf,. E. R. GRAU,.A ordnn «onJmir/l, cil., p. 11s."

~ 01,,1,. C."HilHiOWQ/
1040 1041 li "."Itolr'. r •••• ,I",,"" QO,,'. '" ""Q' t HI.,;.I.,
••••••••••••••••••••••••••••••••••
-9"

.
.,
,
••

!
..
,.•
.

tJ ••

]. o

j
••••••••••••••••••••••••••••••••••

,
.,•

,,
,
,•
,

;

.
••
,.

.. ~:
ê.
li'

o
.............................. -.-.-..

,
,,.
.
,.
v

õ
administração é «concretizado» pelo princípio da preemjnêhci~ oU.prevalência da
lei e pdo princípio da reserva de lei (eEr.art. 112."/6 e 7); o princípio da vincu~ ~,<. Prilldpios e.trur(lr:UlK'll
lação do legislador aos direitos fundamentais é «acns"ificado» por OUtros prin-
17',
cipias especiais tais como o princípio da proibição do excesso (eEr. 3n. 18."/2) e ]
o princípio da não-retroactividade de leis restritivàs (cfr. art. 18."/3). O mesmo Princ{pios constirucionais gerais /
aconc~ com o princípio democrático. Como pri~cípios constitucionais gerais
densificadores podem apontar-se o prindpio da soberania popular (arts. L" c
3."/1), o princípio do ~ufrágio universal (art. 10.'1. o princIpio da panicipação Prindpios consdtucionai5 ~peciai.
democrática dos cidadãos (art. 9."/c), o princípio da separação e interdepen~
dência dos órgãos de soberania (art. lI~. "). Estes Iprindpios são ainda susceptí-
veis de ••densificações» especiais: o princípio demo'crático ..do- sufrágio.~ conCte_
tizado pdos'p!íiiclpios 'da-lifi.er!4a!lede propagandà., igl,!~~~:~e oportunidades
e lmparcia1!4a.de"nas campanhas eleitorais (cfr. art. 113.°/3);. ~ .princípio da so.~e-
Regras constitucionais

..Este' esquema não se desenvolve apenas numa direcção, de cima


, .
rãlíJâ da vontade popular den:sJfica~seatravés dd prindpip de renovação dos pant baix~, ou seja dos principias mais abenos para os princípios ~ nor~as .mais
titúfaiei.ae~i:argos políticos (cfr:.an:''1l8.0); o princípio da_~ep:<Lraçi05int.erde~ densas, ou de baixo para cima, do concreto para o abstracto. A: formação do
pendência «concretiza-se» através do princípio da-tlpícid~e dos órgãos de sobe- sistema interno consegue-se mediante 'um processo bi-un{voco de kesdateci~
ranlà~~pdo- princIpio da reserva constitucional no que respeita à formação, mento rcéiprocoI (Lacenz). Os principios estruturantes ganham densidade e
composiç'.io, competência e funcionamento dos mesmos órgãos (art. 110.°). transparência através das suas concretizações (em princípios gerais, princlpios
Finalmente, o princípio republicano ganha densidade através de outros subprin- especiais ou regras). e estas formam com os primeiros uma unidade material
cípios como, por ex., o princípio de não-vitaliciedade dos cargos polfticos (unidade da Constituição) 18. Todos estes prin~fpios e regras poderão ainda.obTer
(art. 118.°) e o princípio da igualdade civil e política (art. 13.0). maior .grau de concretização e densidade arravés da concrttização kgifúttiva t
Os princípios estruturantes não são apenas densificados por júrisprudmcial (m. infra)_
princIpias constirucionais gerais ou especiais_A sua concretização é feita também
, por várias nogras constitucionais, qualquer q~e __ ~~ia a sua n-!~,r~~:!wim, as
tíof~. ~.tidoras ci~ direito de reCurso c.oI)Jmcio~.Q_s.on,traçerto~.acrôs d~
administração (art. 268.°/4 e 5) consÚtü~m Uffi<\ ÇQr-.c.re.tiza.ção do prindpio"geul
D, Texturn Aherta e Positividade Constitucional
daTcgaiTd~deda administ~5~~E._do princIpio especial da prevalência da le{~'dõ
prind-pio.-estrunuinre'-do Estado de Direito. As normas reconhecedoras de
1- O dírríto constítuaona! como dírritoposítíw
dirdtos económicos, sociais e culturais, densificam o princípio da socialidade
que, por sua vez, concretiza o princípio democrático na sua dimensao de demo-
cracia económica, social e política. o sentido histórico, político e jurídico' da constituição escrita
a
continua hoje válido: li a>nstituição é ordem jurídica fundamental de uma
Os princípios estruturantes -? princípios constitucionais gerais -? comunidade. Ela estabelece em termos tk dirtito e com os meios do dinito os
princípios constitucionais especiais -? regras constitucionais, consrituem um
instrumentos de governo, a' garantia de direiros fundamentais e a individua-
sistema interno, cuja ilustração gráfica se poderá apresentar da forma seguinte:
lização de fi~s e tarefas. As regJ:ase princípios jurídicos utilizados para prosseguir

I! A a>mpl«IIÚ(> oole processo C/tece de ou,,,,,, ilumin:>çõ •• ,~r"ri= goroi. como, por ex..
a dife",noiação enm: •• im:ma ""tono> e •• is••ma imerno., a ideia de .rip"", a idoi. de oon~",i"çã[}, e,o.
Cfr., por •••., l.<.RENz, M<thtuJmkh,.<túr R«hlStuiums<httft 5." ed., pp. 458 •• (na rrod. porr., cf •. pp. 531 ss);
ENG1SCH, Ei".fUh""'K in t4sjuristisd;. Dmltm, 5.' ed., 1975, p. l20 (na lf2d. por<. cfr. pp. 222 ••l. No pl.no
do di",i'D a>nstirncionoJ, d'r.., H. MMcK, V-ifium~t"«ht fir .lU iiffmtlieM V.rwaltun~ VoJ. I, S'utr-
ganIB.r\inlKal"IMainz, 1983, pp. 51 ••• do qual adaprámos o gr:lfieo do <ex,••.

~ Dlrdt~ c~".tltu<lnQI
1048
1049 JI <~•• t/tolt~~ <~J••• '/"<m" ~b",. d< "Na, , H/n,/p/ ••

"
estes objectivos são, como se viu atrás, de diversa natureza e densidade. Todavia,
positiva de todos os órgãos concfC:rizadores,-devendo estes romá-las em consi-
no seu conjunto, regras e princípios constitucionais. valem como ~Iei»:o direito
dentÇão..como dirrctivas matniau ptnnantnttt. em qualquer dos mamemos da
constitucional! direito positivo 19. Neste sentido se fala na «constituição como
acrividade 'concretizadora (legislação, execução, jurisdição); (3) vinculação. na
norma» (Garcia de Enterria) e na, «força normativa da constituição» (K. Hesse).
qualidade de limites mareriais negativos, dos poderes públicos, justificando a
A complexa asticulação da «textura aberta» da constituição com a
eventuál censura, sob a forma de inconstitucionalidade, em relação aos actos que
positividade constitucional sugere, desde logo. que lgarantia' da força normativa as contrariam 20.
da constin:ição não é tarefa fácil, mas se o dir~to constitucional ~ direito
Em virtude da eficácia vinculativa reconhecida 1t~«normas progra-
positivo, se a constituição !.iaucomo !ri, então as regras e principias constitucionais
máticas», deve considerar-se ultrapassada a oposição estabelecida por alguma
devem obter nonnatividadt regulando jurídica e efe~dvamente as relações da vida
doutrina entre «norma jurídica actual~ e «norma programática» (aktutllt
(P. Heck), dirigindo <lS condmas e dando segurança a expecrativas de compor-
tamentos (Luhmann). . Rtchtsnonn-Program,matz): todas as normas são actuaif, isro é, têm uma força
normativa independente do acto de transformação legislativa. Não há, pois, na
constituição, «simples declarações (sejam Oportunas ou inoportunas, felizes ou
desafortunadas, precisas ou indeterminadas) a que não se deva dar valor nor-
11- O smtído das nomzas progmmáticas
mativo, e só o seu conteúdo concreto poderá determinar em cada caso o alcance
espedfico do dito valofll (Garcia de Enterria) 21. Problema diferente é o de saber
em que rermos uma norma constitucional é susceptível de ãplicação dirtcta" e em
Precisamente por isso, e marcando uma decidida ruptura em rda- que medida .é exequível por si mesmo.
ção à doutrina clássica, pode e deve falar-se da "morre" das normas constitucio~
nais programáticas. Existem. é certO, normas-fim, normas-tasefa, normas-pro-
grama que «impõem uma actividade» e «didgem» materialmente a concretização
constitucional. O sentido destas normas não é, porém, o assinalado pela doutrina 11- ApUcabi/idadt dirrcta
-rradicional: dimples programas~. «exortações morais», «dedasaçó~», «sentenças
polítiCas», "aforismos políticos», «promessas~, «apelos ao legisladof», «programas
1. Rejeição da doutrina tradicional da regu1amenta~o da liberdade
futuros». juridicamente desprovidos de qualquer vinculatividade. lu «normas
programáticas» é te<:onhecido hoje um valor jurídico constitucionalmente idên- Talvel; domina.u pelo comeúdo altamente filosófico e doutrinário das declarações
tico ao dos restantes preceitos da constituição. Não deve, pois, falar-se de simples de direitos, ao que a,,~i •••algumas vezes, a SUa inser,ão fora do articulado da consrituiçâo (era
eficácia programática (ou directiva), porque qualquer norma constitucional deve nos preâmbulos constitucionais que, nalguns casos, as prodamaçócs de direitos enconrravam \
considerar-se obrigatória perante quaisquer órgãos do poder po!frico (Crisafulli). guarida), a doutrina francesa considerava indisp~nsável a inrervenção legislativa palõ1 .dar
ope"lcivi~~e_práciC3 aos p=i~ C!'.l);l_t!n,,:i~nais
garancidoteS dos d!rejt~.fu!!.~el)t~i5~ .fi fimr _ I
Mais do que isso: a eventual mediação concretizaclora. pela instância legiferante, escrevia Hauriou - '1"( chaque droit indi.~M;;;j ~~ir ;rganui. et.lt a di" qu( kr ctmditiom (t Itr I
das normas programáticas, não significa que este tipo de normas careça de limitçs - solmt dJtlrminls par un( Ini organique:»;»UJI droit individUl!1""'Ut par d'u"t faço" pratiqu(
positividade jurídica aurónoma. isto é, que a sua normatividade seja apenas
gerada pela inttrpojitio do legislador; I a positividatk das normas-fim t nonnas-
-tarifa (nonnas programáticas) que justifica a ntctsSidadt da inttrotnção dos órgáos 10Cfr. tamb6n, e l:tIl~cido ~Qnvergente,JORGEMJAANDA, Ma••""I, 11,p. 533, No direito
brasileiro, efr. ER05 R. GAAtI.<li.Conmtuiçlo brasileira e as normos prognm~,ic ••• , Rro. dr Dir. Confl. r
kgifmmtts, Concretizando melhor, a positividade jurfdico-constitucional das Cilnri" l'rJ/itira, 4, p. 45, cnso RaEfllO BAsros. ermo tk Dirrilll ÚJmuO/rio""f, ci•., pp. 120 ".i Jmt AFONSO
normas programáticas significa fundamentalmente: (1) vinculação do legislador, DASILVA, Dirrüo ÚJ",tirut:ioIltliPoritioo, cit., pp, 82 SI,Nadoutrin. Cip.nhola, cf•. P.LUCASVERDU,Estimaliva
de forma permanente, oi sua realização (impoução constitucional); (2) vinculação J Pofitic4 ÚJ",rifUrionllin. Madrid, 19M. pp. 169 $S.que oIude,precisamente.citando LAVAGNA, • precep,ivid.de
das "normos-fim"sob o ponto <k vi.ta "impeditivo' e ",b o ponto de vista "jmpmi,ivo".
21 C&. So-nA!cH•• Die Ver&ssungsgerichubarkcit irn GeRige d.r S•••.csfunkJion.n».
19 Cfr. P. MOu.ER,jurislitch. MtthtJiIt, 5.' ro., 1989, p. 177; K. HESSE, Di. nm""li", K",fi in VliV.I1RL, 39 (1981). p. 105; WAH(., »Der Vorrang d•.•.Ve1fusungo. in lm Staar, 20 (1981), p. 485: .Der
tkr~ 1950,pp.19ss. Vorrang der Verfassung und d•.•.S.lbnãndi~ir dos Gcsette<.-.eh•••, in NVWZ, 1984, p. 402: ZAGRE.I!H.'IK'r.
I/ristmllt.
C(JltSti~, cit., p. 112.

~ Dir.!'" CU"""""."' 1050 1051 ,'1 r•• u/(ui'6" ro,." "$/,mo .~"(Q I, "No, , orl.'I>".'

.'
••••••••••••••••••••••••••••••••••
, ,~. \. .1

.~

.,•,

,.
,
,
••
..•
.
;

F
de aplicar as normas em referência (por mais geral efindetcrminado que seja o seu
c
cõnt~iíClo)- "dê -suscitar o incidente de iricom1itilcion-aliaade~nor.feitos
sub~etTd~s 'a'julgamento (éfr. eRP, "an: 204. "). dos'~ctõs-;}õiêii3.tivõSCOiiffiírios
dência. assinala-se a abn-tura das normas constitucionais em assuntos: (1) sobre \ ~/:
os quaiS há um consenso geral; (2) em relação aos quais é necessário criat um ,....

às mes'~~'normas. .----~ ..- espaço de conformação política; (3) em relação aos quais podem ser justifi-cadas •
,..------- . medi?as correetivas ?U
adaptadoras. ., . •
A di~tinç~o entre 'normas p=ptivzs. e .rlennz progr:un~tiQSJo [errJ ~ervido, " A dmsidaM da norma cOnsmuclOnallmpõe_se: (1) quando há ne-
neste domínio, para esl~bdecer um~ diferença de lrat2JIlento no aro de superveni~lIci~ de leis cessidade 'de Comar deci~ões inequívocas em relação a certas controvérsias; •
connitucionais oonuirias posteriores. No =
de o contraste se efecluar enni leis pré-<:onstilU- (2) quando se trata de definir e identificar os princípios identificadores da ordem •
cionais e normas oonstitucionais pr=ptivas, haveria um fenómeno de mIOg4Ç,io; Il~ hipóresc de a
social; (3) quando a concretização constitucional imponha. desde logo, a •
n:laçlio de contraditorie.ude se estabdecer entre leis pré-<:onstilUcionais e normas constiruciollais
conveniência de normas constitucionais densas (G.Schmid).

••
program:l.dClS, '0 contraste nâo seria evidente, jusrificalldo-se o apelo 11 figura da ilq;iúmidar.k
eomtituâonlll lUp"Wm;mu. efr. a 2.' ed, do nosso Dimto Comritucio/'tfJ{, pp. 223 $S.
A abertura de uma norma constitucional significa, ~oo o pOnto de vista metódico,
Independentemente d"'Q controvérsia, o conhecimento judicial que se defende no texto p=
que ela compom um~ dtkgllfIUJ relativa nos órgios concrerizadores; a d~1IJidad~, por 'u~ v~,
não oferecer grand~ &crepâncias. Cfr, Jorge Miranda, Mllmltll lI, pp. 639 ss.

••
:I;ponm pat:l :I;maior proximi<bde da norm:l; constitucional rd~dvamenre aos seus efeitos e condj_
ções de aplicação.
As normas constitucionais programáticas têm ainda efeito "derro~ A :l;berrut'll e:l; densjd~de são -grandezas variávei •• , não se podendo dizer, como é
gatório~ ou .invalidante>t dos actos normativos incompatíveis com as mesmas, :l;in.u hoje correnre na doutrina juspubliclsria, que: h::i norml1J eomrituâMllis o:~quivús por li
devendo, porém, precisar~se (e isso nem sempre é fácil) em que medida as normas
programáticas servem de limite negativo às leis consagradoras de disciplina
contrária 23, Para além destes "efeitos directos", deve reconhecer-se que as nor.
=111-0 ~ nomf4S to1lJútudontlÍJ Ifáo af'lu{wis por JÍ mfi17/Q (cfr., porém, CRP, art. 283.D). Em

nenhum do" casos é po.5Ível descortinar, nas normas consritUcionais, um -programa-<:ondicion~l.


(LUHMANN) recondmíveI a um simples esquema subsunrivo: Se a norma consritucional estabdeee ••
••
um prcssuPOStQ de filcro, então os concn:dzadons da constituição (o legislador, o juiz, a
maHarefa e normas-fim pressupõem, em larga medida, a clarificação conforma~ :l;dminisrtaçõ:o) tem de adoptar certOS e determinado, comportamentos, Isso s;;o mo<ldos de
dota efec~ada pelas autoridades com poderes polltico-normativos. normas praticamente estranhos ao direito constitucional.

••
Existem cerw normas cuja densidade pressupõe um menor e'paço de .di.cricio.
nariedadeo ou de -liberdade de conform:rção. que ourras. Assim, por ex., a 1I0rm:l;constitucional
111- Dtnsida& e abatum das nonnas constítudonaÍ5 que regula ~ liberdade de imprensa é um~ norma mais .densa. (cfr. ano 38.') do que um:!; norm:l;
que ellmbdece como tarefa de Estado _Promover o aumento do bem-estar social e económico e da

A abertura .das.AQ.f!ll.llLc;:onstit11rionaisconfilnd~.~~!.."eor vezes.


qualidade de vi.u do povo, em especial das classes m:l;isdesr:..vorecid~s> (cfr. art. 81."/~),A primeira
possui uma .deterrninabilidade., .den.idade> ou .exequibilidade. muiro maior que a segunda.
••
I
MesmQ que seja n=úi:l;, em ambos os caso', a inurposiúo kgiS/aforiJ, náo oferece dúvidas ser a
com abertura da constit1J.ição. São, porém, conceitos diferentes. Se se' preferir,

••
liberd~de do legis4dor muito maior no tipo de norm~ do ~n. 8l.D/a do que no do ~rt. 38,"
são~jtiiif..(rentes níveis: (1) abert'1!'!l.--'?oriZJmta~P.~ si!Wjfi.çar~ ,!~~J!lP!~~u.de- Por QUtro lado, h~ ripos de normas que praticamente cOnstiruem um limif~~o
e o Mcter, ••fragamemário& e «não codificador» de um texto constitucional; legislador (ex., normas organizarórias), enqu~nro noutr:lS avulta o car:l.cter dirigeme materi:l;l
(i)'-~h;;'ht;';'v;"tica~pua sig~ificar o carácter gerai"~.indeter~i;Udo de muii~ (=: normz imposiril':L\").As primeiras actuam, fund~memalmenre, como dturminamn n~gatiwu

norm:àS-co~scitucionais que, por isso mesmo, se .abrem» li mediação legislativa


coiig:eci~ora 24. Aqui interessa apenas o segundo nível. Dizer quais as .normas
dos poderes públicos; as segumlas surgem como dtUrminanf~s pOlitiVllf.

••
••
'c~stitucionais abertas_ e quais as .normas constitucionais densas~ não é uma JV - Unidade da constitui(ão t antinomias t lmsões .
tarefa susceptível de ser teconduzida a esquemas fixos e totaHzantes. Como ten-
tnm princípios constítudonais

{)
23Cfr.JORGEMIRANOA, ManuaL 11.pp. 533 e 639 SS. O problema, n~o Ó, porl!m, airnl~hoje
liquido. Cfr.. por último, BIN, Atti NJ,..,.ati ••i. p. 188; GUASJ1NI, Ldimi rullli"gu"t,gi~ xiuridit:O, 1985, p. 121:
luCAS VERIJU, Ettimariva J l'oliú<~,p. 179,.. ,
1. Conflito de princípios
••
o
••
1<1crr., por dirimo, Ch. GUSY,Di4 Offmheit da Grundg<tna, in/OR, 33 (1984), p. 109:
f.acro de a cons~i[Uição constituir um sistema ab~c:!~?_~,e.
prin-
W; HOFUNC, Offi'" G~hl>i."tnpmatiO>t, 1987, pp. 78 os: K. STERN,Staam.xbt. 2.' cd., I, p. 83.
cípios .LIl£inuajá que podem existir f!!!.ómmos de umão entre os vários princípios
------ . --".'. ..

~ DI"It. C" •• t1I.d~~~1


1054 1055 •••<unlt.l<d ••••••• IH,,"~ d"t. d, "R'U t ,I~rlpl ••
••

••••••••••••••••••••••••••••••••••

.

~

--~-, ._---_._- -------

"'
o
."o.
o
.g.
õ.
,.
,
~

,••

;
.


,

>

.
v - Smtido global dos prindpios tstrnturanfts 2. Padrões de legitinúdadc e princípios constitucionalmenre conformados
••.
\ L! / •
.
. .~
Na s.ua qualidade de principias constitucionalmente estruturantes •
1. Dimensão constitutiva e dimensão declaratiw' eles ~~em ser compreendidos como princípios concretos, consagrados nun.1a •
ordem jurídico-constitucional em determinada situação histórica. Não são, POlS, •

Ai; obras mais recentes de direito constitucional dedicam um ou expressões de um direito abstcaeto ou "pomos fixos», sistematicamente recon-
mais capítulos ao estudo dos princípios constitucionalmente estruturantes. duz(vcis a uma «ordem divina», «natural» ou ~racional», sem qualquer referência •
Individualizados e caracterizados di=-forma--mcrlro-Viiriaaa pera -dõutrina27 a uma ordem política comunitária. •
(<<determinações jutídico-constitucionais da estrutura do Estado», «principias NOlc-se, porém: embora não sejam principias transcendentes,
estruturantes do Estado», «princípios ordenadofCSll,«princípios direcrores», «fi.m- podem sempre ser considerados como dimmsõts paradigmáticas de uma ordem •
damento da ordem constitucional», «estruturas fundamentais do Estado constitucional «justa» e, desta forma, servirem de operadores paramétricas para ••
constitucional,,), eles designam os princípios constitutivos do «núcleo essencial se aquilatar da kgitimidatú e kgitimação de uma ordem constitucional positiva. •
da constituição», garantindo a esta uma determinada idmtidãti! .~..--;siiEti;!!£- Neste sentido, averiguar se uma ordem constitucional está «informada» pelos
PoSsuem, em gerar, düas-di;;;~es: {ir~~a dimmsáo c~;:;;ifiuri~, dado que os princIpios do Estado de dirdro democrático é ou pode ser uma pedra de toque •
prIi1apIoS,~-iíi.esmos, na suã;füii(Gffief!,~idaae'prlntip:iã.lii;' eXpriniem, indi- para se concluir, positiva ou negativamente, acerca da sua dignidade de teconhe- ••
ci~_~~:~u'ço'~;tituem _~mãco;;;p~ee~]ô -il:~~-d~õ"rde""~ co~~tii:uci~fiaJ; cimenro como «ord.cm constitucional justa", como «Estado de direito» ou •
(2) ~áo tk.clarativa, 'pois" est.es ptinc_f~~o~~~~~~~, muitas vezes, a ••Estado de não direiro", como Estado democrático ou como ditadura. •
natureza de «superconceitos,,! de «vocábulos _designantes~,' utiliiidos para
cxpnmlr a soma de outros «subprincípios» e de conéretizações normativas Consti-
tucionalmente plasmadas.
3. Especificidade e concordância prática ••
• AslJim, por exemplo, o princípio do Estado de direito significa, de
forma global, a idda de uma ordem de paz estadualmente garantida através do
Os princípios estruturantes t~m, cada um tk per si, um conteúdo
especifico, uma ••marca distintiva»: o princípio democrático não é a mesma coisa ••
••
direito. Noutros casos, porém, é um simples vocábulo designame de vários prin- que Estado de direito, assim como o princípio republicano não se confunde nem
cípios concretizadores com ele conexionados (princípio da juridicidade, principio com um nem com outro. Todavia, estes princfpios actuam imbricadamenre,
de constitucionalidade, princípio da legalidade da administração, princípio da completando_se. limirando~se e condicionando-se de forma recíproca.

••
protecção da confiança, principio da divisão de poderes). De igual modo. o Desde logo. assentam numa bau antropol4gica comum, que na
principio democrático significa, em termos políticos - que são os de Lincoln _ Constituição de 1976 se rcconduz à «trlade mágica»: o homem como pmoit,
«o poder do povo, para o povo e pelo povo~, mas é também uma condensação de como cidadão e como trahalhador29, Consequentemente, o indivíduo é prote':'
várias dimensões concretizadoras do fundamento e legitimação do poder político
(princípio da soberania popular, principio eleitoral, principio partidário,
principio representativo, princípio participativo) 28.
gido na sua identidade e integridade física e espiritual através da vinculação dos
poderes públicos a forp1~, regras e procedimentos jurldicos (princípio do Estado
de direito), é inscrito como homem livre no processo de participação e decisão
••
democráticas (princlpio democrático e republicano), é-lhe garantida a liberdade
perante os riscos da existência através do acesso ao trabalho. à iniciativa econó-
mica e ao direito à segurança social (princípio do Estado social).
••
ISENSW'KiRCHHOf,
n Cfr., por ••.• K. HESSE, G"",tÚiig" pp. 47 .<$;, K. STEm, SlUln'«ht, vol. I. pp. 441 .<$1
H~"dbut:htk Stalltnwhã. VoL I, pp. 775.<$1 A.' I'izzoRUSSO, Laio"i di Jjri~ wlituzilJ--
nak. pp. 86 ss. Entre nós, por úlrimo.
1991, pp. 67 ••.
GOMES Co.NOTILHONITAL MOREIRA, R."tlammlOs tla C07lStituição,
Em segundo lugar, os princípios estruturantes articulam-se em
tetmos de complementaridade, Assim, o poder político _ «domlnio de homens ••
23Esra dupJ. dim~o - constituti"" e d.d'''''liva_ t aros"" com d=
D.., !l«htsstaIIbpriTdp. 1986, pp. 89 "', a propósito do Estado de di",ilO.
pot Ph. KUN1G,
29 Cfr.
3.' ed" 1993, pp. 51 •••
GOMl;.'; Co.NOTILHoNITAL MOREIRA. Constituição "" &p"bfic~ Partugu"'" Anol~tla.
••
~ D/"U. (Oo"/lH/ona/
1058 1059 A. <out/IN/rilo co.," '/"'''0 ~b",o d, "Uo' , ,u/n<>p/
•• ••
••
sobre homens» - carece de uma legitimação e justificação que só pode vir do
povo, mas a forma democrática exige procedimentos, formas e processos de vinculantes. Em virtude do seu caráaer estruturante, vêm quase £Odosenun- I'?
modo a ~itar-se uma «democracia sem Estado de direito» Ol,l um «Estado de
direito sem democca,cia». Acresce que a «decm.o demo~rácic'~ e a «forma de
ciados no capítulo introdutório da CRP, intitulado «Princípios Fundamentais» /
(CRP, arts. 1." a 11.~). Isto não significa que eles só ai venham consagrados,
Estado de dir~ito* não ~ispensam uma medida material_ liberdade, igualdade, devendo p[ocurar~se no conjunto global normativo da constituição as revelações
fraternidade - intrinsecamente informadora 'da .construção dê uma sociedade e manifestações concreras desses mesmos princípios.
livre, justa e solidária. (CRP' art. L").
Em terceiro lugar, os princípios estruturantes condicionam~se
, .
mutuamente. Nesta perspectiva, a «formal' de organização do poder político
segundo o padrão da separação de poderes é justificada, em t~[mos de Estado de Refirêndas bibliOgráficas
direito, como UOl;l. forma de .Iimite» ao dom(nio estadual. Todavia, esta «divisão
de poderes» tem dç assentar em bases democrácicas._ o povo qu~que o poder A) IN1'ERTEXl1JALIDADE
seja exercido pelos seus órgãos (de soberania, do' poder político) de um modo
jüncionalmmre separado.
Canarls,C. w. -Systemdenken undSystembegrilfin der JUrisprudenz, 2.' ed., Berlin,
Finalmente, os princípios estruturantes
opaam, .nas suas relações 1983 (trad.pon. de MenezesCordeiro,Lisboa,1989). .
recíprocas, «tkt/qcafõ~ compremsivas»; as modificações
relativas à compreensão do
Engisch,K.- Einfübrung in das Rechtswissenscbaft, 6.' ed., Stultgart/Berlin/Kõlnl
conteúdo de um princípio são susceptíveis de produzir ttmcçôes quanto ao !Main, 1975 (há craduçãoport. de João BaptistaMachado,Introdução ao Pensamento
corrccto entendimento do Outro. As rarem do Estado, por exemplo, numa COffi- jurldico).
preeruão estritamente liberal do Estado de direito, desenvolvem-se. mediante a Günther,K.-Der Sinnfür die Angemenssenbeit, FcankfurvM.,1988.
compressão do princípio da democracia económica, social e cultural, mas, nos qua- Habermas,).- Faktizitiit UM Ge/hmg, FrankfurvM,1992.
dnrntes constitucionais portugueses, devem já ser entendidas no sentido de tarefas Lacem,K.- Methodenlebre der RecbtswissensdJaft, 5."00., BerIin;HeidelbergINew
próprias do Estado de direito social. Do mesmo modo, a democracia, entendida York,1985,pp. 458 55 (há tradu~ espanholae portuguesa).
nos termos de um procedimento formal de "escolha de governantes», foi objecto de luhmann, N.- R~c1?tssystemun4 Rechtsdogmatik, Stuttgart/BerlinJKaln;Mainz,
1974
enriquecimento material, ao exigir-se não apenas uma organização polirica demo- (hátmel.espanholade). de Otto de Pardo,Sistema jurldko y Dogmatica Jurídica, Madrid.
crática mas também a realização de uma democracia económica, social e cultural. 1983),
As relações de complementaridade, de condicionamento e imbri. Neves,A. C. - «AUnidade do SistemaJuridico»,in Estudos de Homenagem ao
cação enrte os prindpios estruturantes explicam o sentido da ~Sptcifiddatkt Professor meira Ribeiro, Vol.lI, Coimbra,1979. .
concordtJ.nda prdtica: a especificidade (conteúdo, extensão e alcance) própria de
cada prindpio não exige o sacrifício unilateral de um prindpio em relação aos
outros, anres aponta para uma tarefa de harmonização, de forma a obter-se a . B} BiBuOGRAFIA ESPECÍFICA DE DIREITO CONSTITUCIONAL
moixima efeeriviekde de todos eles 30.
Aiexy, R. - Tbeorie der Grundrechte, FrankfurtJM., 1985.
4. Positividade çonstitucional Alce y Flóres-Valdés- !:os Prindpios Generales dei Derecho y sua formulacion
Gonstitudonal, Madrid, 1990.
Os prindpios estruturantes, bem como os subprindpios que os Badura,P.- oArtender Verfassungssrechtssiitzen>,
in isENSEF/KIRCHHOF,
Staatsrecht,
densificam e concretizam, constituem prindpios ordenadores positivamente valo m, pp. 34 55.
BaladiezROjo,Margarita- Los Prinâ/Jlosjuridicos, M3drid,1994.
30 Sobre ""la a"iculação do, principio. tnrutl""mes m., por último, P. KlIlCH-HOl\ Barros, SuzanaT. - Oprinápio da proPOrcionalidade e o contraio da constituo
in 1s£NsEE!KtRçHHOF, HandJ,,,,,h tÚt Sraal".chú, I, pp. 809 ••.
cionalidade das leis restritivas, BrasíliaJurídica,Brasília,1996.

~ D/r,IU c.~"ItM<I.n~1

1060
1061 A <o~"It.Ir4. <Om~ ,J.t< •• ~ d"t. J. ,,# •., , Drin«Dlo>
Banole, S. - .Principi di diritlo (Dir. Cos!.)_ in Encidopedia dei DirillO,XXXV.
Bin, R. -Ali; Normativi eNorme Programmatiche, Milano, 1~88. '. Russomano, R. -.Das normas constitucionais programáticas., in Tendmcias Acluais \ {~".
••
- Diri11ie Argomenti, MiJano, 1992. do Direito Público, Estudos' de Homenagem a MonSo Arinos de Melo Franco, Rio de // •
Janeiro, 1976, pp. 267 55. .
Bonavides, P.- Direito Constitucional, Rio de Janeiro, 1997, pp.,182 55.
Canotilho, J. J. G. ~ Constituição Dirigente e vtnculação do legislador, Coimbra, Saéhs, M. - .Normtyrpe~ im deutschen Yerfassungsrecht. in ZfG, 1992, pp. }2 S5. • •
1982. .• ' - SCheuner, U. - «Staatszielbestimmungen., inFeslscbrifi für E. Forsthoff, 1972, pp. 325 ss: •
, Cem, A. ~ «Il 'principío' come f:more di orientanlemo inteqÍee"tativo e come vaiare - .Normative GewahrJeistung und Bezugnahme auf Fakten im Verfassungstext., in
Festschriftfür H. U.ScUPlN, 1973, pp. 323 55.'
'privilegiato': spunti
. eu ípOlesi per una distinzíone-, in'Giw: COSI., 1987, pp. 1827 S5.
.

Contiades, J. - VerjassungsgeselzlicheSlaalsstrukturbestimmungen, Stuttg<lrt, 1967. Schmid, G. - ..Qffenhei,t une! Dichte in der Verf.l.'isunj.,':igehull,l,"', in Eit'hcnhcrgcr (c •
Costa,J. M, Cardoso da ~ hierarquia das normas.constitucion'ais e a sua função na
«A
outros), G'rundjragen der F!echtssetzung,Base!, 1978, pp. 31755. •
protecção dos direitos fundament2is», BMJ,seg:;. n." 356. siiva, J. A. - Aplidlbilidade das normas COnstitucionais, 2.3 ed., S. Paulo, 1982.
Crisafu!li,v. - .Norme programmatiche della costituzione-, inLe Costituzione e le sue - Curso de Direito Constitucional Positivo, 5! ed., S. Paulo, 1989. •
disposizioni di principio, MiJano, 1952, reproduzido em Slato, lbpolo, Governo, Milano, Stern, ~ -Staatsrech~ f, pp. 96 ss. (Há lrad. espanhola). • •
1989,' Stumm, Raquel D. - PrincíPio da proporcio~lidade no direilo constitucional
Dworkin, R. - Taking RigbtsSerious/y, 4. ed., London, 1984.
3 brasileiro, Livraria do Advogado Editora, Pono Alegre, 1995. •
-AMatterojPrincipte,Cambridge,1985.. . Warat, L.- O direito e a sua linguagem, Porto Alegre, 1988, pp. 76 55. •
Farias, Edilsom P. - Colisão de Direitos, Sergio Antonio Fabris Editora, Porto Alegre, Zagrebelsky, G. - li Sistema costituziona/e del/e jomi dell'díritto, Torino, 1984. •
19%, -1/ Díritto Mite, Torino, 1992.
Garcia de Emerria, E. - La comtitución C()rJl{) norma y el tribu~l canstitucjona~
2. ed., Madrid,1982.
3
••
••
Grau, E. R. ~A Ordem ecom)mictl na constituição de 1988, S. Paulo, 1990..
Guerra Ftlho, WjlJjs- ~Notas em tomo do princípio da proporcionalidade", in Jorge
Miranda (org.), Perspectivas Comtituâonals, I, pp. 249.55.
Gusy, Ch. - ~Die Offenheit des Gnmdgesetzes_, injÕR, 33 (1989), pp. 109 ss.
Hãbede, P. - Anen, Anenreichtum und Vielschichtigkeit von Verfassungsstaates_,
in Fs. Für Kj. Partsch, 1989, pp, 554 ss. ••
p.106,
Lamego, j. - .Discussão sobre os Princípios jurídicoS", in RevIsta Jurídica, 4/1985,

Lucas Verdu, P.- Estimativa y lbtitica Constitucionafes, Madrid; 1984. • ••


Machete, R. - .Normas constitucionais programáticas e liberdade do legislado['Jo,
in Estudos de Direito Público e Ciência Política, lisboa, 1991.
Miranda,j. -Manual, II, p. 223 sS,iManual, N, p. 348.
••
- Ensaios de TeoriaConstitucio~l, Fortaleza, 1989.
Müller, F.- Die Einheit der Verjassung, BerJin, 1979.
Nieto, A. - .Peculiaridades juridicas de la norma constitucional_, in RAP, iOD-I02
(1983),pp. 311 ". • •
Peczenik - On Law and Reasrm, Dordrecht, 1989:
Prieto Sanchiz, L ~ Sobre Principias y Normas, Madrid, 1992.

~ DI"I,. C'w"it.,I ••• 1


1062 1063 <o.,.

t
A <~W"ll"lrd. ,I'tlm>t >tb"t~ d, ".'''' , "rI",I"I.,


Bartole, S. - .Principi di diritto (Dir. Crua.)_JnEncic/opedia dei DiriJto, xxxv.
Bin, R.-AJfi NonnatfVi e Norme Programmatiche, Mllano, 1988.
-Dtritti e Argomentt, Milano, 1992.
Bonavldes, P.- Direito Constitucional, Rio de]aneiro, 1997, pp. 18255.
Russomano, R -.nas normas constitucionais programáticas-, in 1endências Actuais \ ~
do Direito ~ico, Estudos. de Homenagem a-Afonso Arinos de Melo Franco, Rio de
lllIleiro, 1976, pp. 267 58, .
'r /

Canotilho,).). G. - Constituição Dirigente e vtnculação do legislador, Coimbra, Sachs, M. ....:oNomttyrpen im deutsehen Verfassungsieche- in ZfG, 1992, pp. 12 55,
1982. Scheuner, U.:...stâatszielbestimmungeoo, in Festscbriflfür E. Forstboff, 1972,pp. 325 ss,
Cem, A. - .II 'prindpio' come faltare di oriemamento interpretativo e come vaiare - .Normative Gewahrleistung und Bezugnahme auf Fakten im Verfussungstext., in
Festschrift ftir H U ScuPlN, 1973, pp. 323 55.
'privllegiata': spumi ed i[Xltesi per una distinzione-, in Giur. CosI., 1987, pr. 1827 .'1.'1.
Contiades,]. - VerfassutlfNIeSetziicbe Staatsstiukturbestimmungen, Stuttg<lrt, 1967. Sch.mid,G. - oOIfenhcit und Dichte in der Vcrf.J.'i.'iung,'igebung_, in Eithcnbcrgcr (t."
Costa,). M. Cardoso da - oA hierarquia das nofrnas constitucionais C; a sua função na outros), Cnmdjragen der Recbtssetzung, BaseI, 1978, pp. 317 55.
protecção dos direitos fundamemais-, BM],segs. n. 356.
g Silva,). A - ilplicabi/idade das nonnas constitudonais, .2.a 00.,_ S. Paulo, 1982.
Crisafulli,V.- .Norme programmatiche deJla costituzione., inle Costituzionee le sue - Cur.sode Direito Constitucional Positivo, s.a ed., S. Paulo, 1989.
disposizioni di principio, Milano, 1952, reproduzido em Stato; Popóio, Governo, Milano, Stern, K.-Staatsrecbt. l, pp. 96 ss. (Há trad. espanhola).
1989. . Stumm, Raquel D. - Principio da proporcIonalidade no direito constitucional
Dworkin, R.- Taking Rights Serious/y, 4? ed., London, 1984. brasileiro, Livrariado Advogado Editora, Pano Alegre, 1995.
- A Matrer of Principie, Cambridge, 1985. Warat, 1. - Odireito e a sua ltnguagem, Porto Alegre, 1988,pp. 7655.
Farias, Edilsom P.- Colisão de Direitos, Sergio Antonio Fabris Editora, Pono Alegre, Zagre~ky, G. - 11Sistema CXJStituz(oTIIJle de/le fimti deIl'diritto, lbrino, 1984.
1996. - li Diritlo Mite, lbrino, 1992.
Gania de Enterria, E. - La constitución como norma y el tribunal constituctona/,
2.a ed., Madrid, 1982.
Grau, E. R - A Ordem económica na constituição de 1988, S. Paulo, 1990.
Guerra Filho, Wtllis- ~Notas em torno do principio da. propordonalidade~, in]orge
Miranda (org.), Perspectivas Constitucionais, I, pp. 249 58.
Gusy, Ch. - ..r>ieOffenheit des Grundgeserzes-, in}6R, 33 (1989), pp. 109 55.
~ HliberIe, P. - .Arten, Anenreichtum und Vielschichtigkeit von Verfassungsstaates-,
inEs. Eür Kj. lbrtsch, 1989, pp. 554 ss.
Lamego, J. - -Discussão sobre os Princípios Jurídicos-, in Revista Jurldica, 411985,
p.106. '
Lucas Verdu, P.-Fstimaliva y Po/ilif.;aCOnstitucionaies, Madrid; 1984.
Machete, R - .Normas constitucionais programáticas e liberdade do legislador_,
inEstudm de Direito Público e Ciência Po/itfca, Usboa, 191)1.
Miranda,). -Manua~ li, p. 223 55.;Manual, N, p. 348.
- EnslJWsde 100ria ConstitucioTIIJl,Fortaleza, 1989.
Müller, F.-Die Einbeit der Verfassung. BerJin, 1979.
Nieto, A. - «Peculiaridades juridicas de la norma constitucionaJ-, in RAP, I()(}'I02
(1983), pp. 311 ~.
Peczenik - On Law anti Reason, Dordrecht, 1989:
Prieto Sanchiz, L - Sobre Principias y Normas, Madrid, 1992.

~ DlnU. C••• tl'Hlu.I


/062 1063 ..•U."It.I,I. to•• <111,
•• dtrt. d, ""., , HI.,I.I ••
••••••••••••••••••••••••••••••••••

,,
.

,,.
,
;

I.
,
,,~•
o
g,
,,o
,,•,
............................... -.-..
r~

,,
!

<
,••
,
~

••
~
•,
••
;

.
:•

,.
tema aberto de regras/princípios/procedimento. Cons~quente;ment'e, o background
teorético-polIcico das teorias subslaIlcialislaS e dos princípios de constiruição está
[j •• U Ponto ae t'artlaa:
mais proximo do Ldtmotiv informador da concepção defendida no presente
capítulo, mas com uma objecção fundamemal: não se defende uma concepção
A abertum pam uma Mewdíea Estmtumnte
!f'
exclusivamente «prinçipial" nem se adere a um fu~damentalismo valorativo
(i<ordemde valores.., «melhor teoria»), postulador de uma ."leitura ética" (moral As considerações anteriores servem já para desi:odificar o discurso a
read£nw da constituição. desenvolver nas paginas subsequen~es sobre '0 proble!D.a da interpretação da
collStiruição. Sintetizemós' algumas ideias básicas: (I) rejeição de qualquer
intcrpremtivismo extremo (:littrolismo. t(Xtua/ismo, origintilismlJ) vinculado a
lI-lNTiwdo jurídico, ( t.mitodo átntifico-tspirituab premissas teóricas insustentáveis: a interpretação como revelação da «vontade de
nas dispU14Sttoriticas afaneis um poder» constituinte histónco. identificação do texto com a norma, limitação
da interpretação aos preceitos constitucionais transportadores de regras jurídicas
precisas e concretas; (2) rejeiç5.odo "iÚs.onstruccionismo» ou o:pós-tstruturalismo
Uma discussão que apresenta alguns pontos de contaeto com a inttrpretativo», conducente a uma jurisprudência política, disfarçada na necessi-
querela entre inierpretativislaS e não interpreracivistas é a polémica da doutrina dade de mediação e integração dos valores presentes numa ordem c~nstitucionalj
alemã em torno dos chamados «métodos. de inrerpretação da constiruição». (3) articulação da concepção substantiva tÚ comtituição com o principio dtmo-
. Também aqui se colocaram face a face duas posições distintas (dr. infra). crdtico: os padmeiros substantivos da constituição são concreti~dos polItico-
-jurrdico-valorativamente pelo legislador e controlados jurídico-valorativamente
a) O m/todo cimtlfico-tipiritual pelos tribunais; (4) arrimo da interpretação da constituição numa ttona constitu-
cionalmmt( atÚquada que postula o apelo simultâneo a «valores? substantivos
Segundo o método científico-espititual (Smend) a interpretação da (igualdade. liberdade, justiça), a «va1ores~procedimentais (processo democrático,
constituição nãó pode separar-se da ideia de .constituição como «ordem de eleições). a «vaiores»formais (forma de lei, do contrato); teata-se, no fundo, de
valoteS~, cujo sentido só pode captar-se através de um método que tenha em dar operacionalidade prática à concepção de.cà~stituição"como sistmzd normativo
<
>. conta não apenas o "texto~, mas também os conte1Ídos axiológicos últimos da abmo dt prindp£os e rq;ras; (5) a interpretação da 'constituição é inteipretação-
~, ordem consrirucional (cfr. infta). -concretização de uma hard /aw e não de uma 'sôft 14w: as regras e prindpios
constitucionais são padrões de conduta juridicam~nte vin~tilantes e não simples
b) O mitodojurldico «direcrivas práticas~. .

o discurso do texto pressupõe o conhecimento d~ liter~mra jurCdiC2 ~meriC2n~ e


De acordo com o método jurídico (Forsrnoff), a interpretação da da doutrin:l :llemã. Rd:ltiV1Ulletue ~ primeil';l, os trabalhos m:lis representativos são os de: Raoul
canstiruição não se distingue da interpreração de bma lei e, por isso. para se Berger, GolJn1lmmt by Judie;",." TIH TmnifoT7/lJ1.tion of th~ Fourtunth Ammdmmt, G.mbridgc,
interpretar o sentido da lei constitucional devem utilizar-se as regras .tradicionais Mass, 1977; Robert Bor\e, .Neutnd Principies and some Fim Amendment Problems>, in Indiana
da interpretação (cfr. infra). LAw Jauma£ 1(1971); Herberc 'Wtl::hsler, .TOW,lrd Neum.l PrincipIes of Consdtution~l Law»,
in HArwarJ LAw Rrotw, 73, 1(1959); John Hm E!y, D~mOCl'lUJalld Distrusr, A Thtory ai judi-
As compreensões e pré-compreensões subjacenres a 'esteS dois
doi Rtvinu. C~mbridge, Mass, 1980; Mich:ld Perry. TIH Comtirurion, th. Cour/!, and H/IInan
métodos aproximam-se. em larga medida, dos backgrounds teoréticos subja- Righrs, New H~vcn, 1982; Ronald Dworkin. Taking Righu S~rioUJly;Lawi El/Ipirl!. Gmbridge.
centes, respectivamente, às posições interpretativis[3.s e não interpretati~istas. Mass, 1985. Um bom resumo d<:stas posições'ver-se-~ em W. Brugger, Grundm:ht~ und V•.•. -
Podem transferir-se para aqui as observações já feitas a este propósito. jimung;gtriehrsbarltdtm in dm Vtrtinigttn St4ttun IIOnAmmka, Tübingen. 1987; H. Bungert .
•Zeitgen6ssisch. Stromungen in der IDIerikanischen Verf'a.",mgsinterpretalion., in AOR, 117,
lfI992, pp. 71 ss. • .
Qu~nto ~ douttin:l alemã, encomf3-se um toleiro d~s principais po~jções troricas
na colect.ân.a de DreierlSchwegmann (org.), Problnn. dtr VtrflWungsinttrprttation. Dolrummtatíon

~ D/nu. C'''U/'oel.".1
1072 1073 /"'''.'''.r~•.• pllro~~., u"",t1 •• r~. d. DI,,". C•• "ltud.".1
tinrr Kimtl'rJ/ltW, 1976. Nnte-sc que, embora no ttxro se refiram p<)sições bipolan::;, a dogm:lrka,
quer norte-2Illcricana quer alem •.•é muito mais rica c maduda do que ["'It.o pode d"iur cl1lrcvcr.
<)

A..,im, por ex., a posi~~ de Ely - uitimllt~ mmprrtivi,m,' rrprt<rntation-rrinftrr:íng _ não se


n.a.;~ads'crição~de um significado a um enunciado ou disposição linguística jJ.
••
("texto da norma"); (3) o produto do acro de interpretar ~ o significado atribuído .. /'- •
n:condul a qualquer das posições analisadas e cont~m sugestões importantíssimas a favor de uma
interp~o _que concilie a 'participação democr:ilicao 'com a participação dos juízes na
A definição dp tato põe em !'l:[evoa componente adscritivo.d«is6ria da interprc-
inteIptct:lç1o dos precdms consdtucionais e na,concrctiu'jW d:u; cláusulas vagas, segundo O
ação, a&stando-se de uma concepção de inrcrpret::lção como actividadc meramente cognoscitiva •
oespldto da constituição~.
ou dirigida ao conhecimento. A actividadc do intérprete (.discurso do intérprete.) rc<:onduz-se 11 •
A dilcussio centrada na idcia do direito constitucional como hArd taw ou como scguimeftnna standtmi: «T. significa .S., em que T t a VlIriá",,! do lextO normativo (enunciados)
mft Iaw pode vu-se na revista ConstitutionJti Commrnt4ry 6, Ú1989, pp. 19 SI. c S a wrii""l do sentido 011 signifiado atribuído pelo intérprete ao texto. Cfr., por ex., T;If<,][o, •
L'jlltnp~tazion: tirItA Iegg~,Milano, 1980, Cap. 1. •

B. Sentído l ConceitosBásicos I'


c) ConcretizaçM da constituição

Concretizar a constituição traduz-se, fundamentalmente, no pro-


••
1. A explicaçio de con~itos'
ema de densifieaçM de regras e princípios constitucionais. A concretização das
normas constitucionais implica um processo que vai do t~to da norma (do seu ••
••
enunciado) para uma norma concreta - norma jurldiea _ que, por sua vez, será
Uma das formas de clarificar o método de trabalho de concretiza~ apenas um resultado intermédio, pois s6 com a descoberta da norma de deeiJiio
ção constitucional é, desde logo, explicitar o sentido de alguns conceitos que irão para a solução dos casos jurídico~constitucionais teremos o resultado final da
ser repetidamente referidos ao.longo desta parte.

a) i?eà/izaçiio i-onsti~ciona/
concretização. Esta «concretização normativa" é, pois, um trabalho técnico-
-jurídico; é, no fundo, o lado «ttcnieo" do procedimmto estruturante da normati-
vidade. A concretização, como se vê, não é igual à interpretação do texto da ••
Reà1iur a éonstituição significa romar juricücarp.enre eficazes as
normas consritucionais. Qualquer constituiçâo s6 é juridicamente qJcaz
norma; é, sim, a construçiio de uma norma jurldiea 2.

d) Demifieaçilo tk normas
••
(prerensâo de eficlcia) att2vés da sua realização. Esta realização é uma tarifa de
todos os órgãos constitucionais que, na aetividade legiferante, administrativa e
júdicial, aplicam as normas da constituição. Nesta «tarefa realizadofall participam
Densificar uma norma significa preencher, complementar e
precisar o espaço normativo de um preceito constitucional, especialmente
••
ainda todos os cidadãos "pluralismo de intérpretes" que fundamentam na
constituição, de forma rurecta e imediata, os seus direitos e d<;veres.
carecido de concretização, a fim de tornar possível a solução, por esse preceito,
dos problemas concretos,
As rarefilsde concretização e de densificação de noimas andam, pois,
••
h) Inttrpretação constitucional associadas: densifica-se um espaço normativo (= preenche-se uma norma) para
tornar possível a sua concretização e a consequente aplicação a um caso concreto . ••
Interpretar uma notma constitucional consiste em atribuir um signi-
ficado a um ou vários símbolos Iinguístkos escritos na constituição com o fim de
se obter uma decisão de problemas práticos normativo-constitucionalmente
e) Norma l ftrmulação da norma
••
••
Deve distinguir-se emre mundado (formulação, disposição) da
fundada. Sugerem-se aqui três dimensões imponanre5 da inteip~eraçâo da consri-
norma e norma. A formulação da norma é qualquer enunciado que faz parte de
tuição: (I) interpretar a constituição significa procurar o direito comido nas
normas consritucionais; (2) investigar o direito contido na lei constitucional
.implica uma aetividade_ actividade complexa- que se traduz fundamentalmente
2 C&. R MOLLER"j",.;..<iIrht MnhoJik, 3.' ed., p. 2801 D. BUSSE,.Zum R<:gdcharakrcrvon
Norm'O;r!>edeurungcnund R«hunormen., in M, 19 (1988), p. 317. ••
~ DI,,'" C",,$fllo,l.ul 1074
1075 lolu""'.,d •.• ,,/f,.,do , '.U""~.,d. oi. 01,,1•• c••"lt.".,..1

• •

~
um texto normativo (de «Uma fonte de direito~). Norma é o'~rilido ou signi-
i) Âmbito de "K"!4mmtaçáo c"
ficado adscrito a qualquer disposição (ou a um' frabnento de disposição, combi- /

n.ação de disposições. combinações de fragmentos de disposições). Disposição é /


Por âmbito de regulamentação entende-se a g10balidade dos casos
p.ane de um texto ainda a interpre'car; norma é pirt~ d~ um texto interpretado.
jurídicos eventualmente regulados por uma norma jurídica.
f) Nomuz constitucional
j) Ambito de protecçáo

Por norma constitucional entender-se-á aqui um modelo de orde-


nação juridicamente vinculante, positivado na Constituição e orientado para o
âmbito de protecção significa a delimitação intensional e
atensional dos bens, valores e interesses protegidos por uma norma. Este âmbito
uma concretização material e constituf~o: (1) por uma medida de ordenação
apressa atnvts de enunciados linguísticos (programa normativo); (2) por uma
é, t~ndencialmente, o resultado proveniente da delimitação do.gmátiea feita pelos
órgãos ou sujeitos concretizadores através do confronto de normas do direito
constelação de dados reais (uetor ou domlnio normativo). Tradicionalmente, a
norma reconduzia-se ao programa normativo (simples adscrição de um vigente (ex.: o âmbito de protecção da liberdade de expressão e informação
determina-~ através do confronto das normas constitucionais emre si e destas
significado a um enunciado textual); hoje, a nor~a não pode desprender-se do
donúnio normativo. com os preceitos do C6digo Penal e da Lei de Imprensa relativos a crimes
relacionados com essa liberdade).
g) Normatividaáe
1) Espaço de imerprttação

Normatividade é o efeito global da norma (com as duas compo-


nentes atrás referidas) num determinado processo de: concretização. O efeito Considera-se como espaço de interpretação o âmbito dentro do
qual o progranut normahvo (= medida de ordenação expressa através de enun-
normativo pressupõe a ~ização da norma constitucional através da sua aplicação-
ciados lingulsticos) se considera ainda compadvel com o texto da norma
-concretização aos problemas carc:cidos de fÚcisáo. A normatividade não é uma
(efr. infra, F, limites da imerpre~ção).
«qualidade» da nouna; é o efeito do procedimento metódico de concretização J.
Todos estes conceitos vão estar presentes, de forma mais ou menos
h) Texto normativo expressa. na exposição subsequente. Constituirão, assim, um pomo de partida
~'" para a descodificação do restante texto rdativo às estruturas metódicas. Alguns
, Considera-se texto normativo qualquer documento elaborado por
deles merecerão ainda maior desenvolvimento, se e na medida em que isso se
torne necessário para a explicação da ~.a~é~ia4,
uma autoridade normativa, sendo, por isso, identificável, prima jade, como
••fonte de direito~ num determinado sistema jurídico. Neste sentido, diZ-se que
um dexto normativo» (uma «fonte de direito») é um conjunto de enunciados do 2. Não correspondência biunivoca entre disposições e normas
discurso prescritivo. Discurso presmtivo (normativo, preceptivo, directivo) é o
discurso criado para modificar o comportamento dos homens. É muito corrente, em algumas sentenças do Tribunal Constitucio-
nal. a alusão a ifragmmtos de normas,.. a «ugmmtos de normas», a «articulação de
normas». Convém tomar conracto com estes conceitos que, de resro, são também
usuais em obras de ,doutrina sobre «metodologia jurídica», «linguagem jurídica»
} Não obsun<e a osciJaçio dou<linúia na =e<i~o da. .conCUliuçãoo, p= líquido e «raciocínio jurídico».
que ela ift\p~Cl scmp'" a nttessida.dc de introduz.lr a .Ra1idad•••, OSelemen"", nIo normo,<ivos,a an~isc dos
conflitoOde inte<e<sese dos reoultadOl no procedimento conclC,i•• mc. Cft. HESSE,Gn•••dzJlp, p. 25; STElN.
in Gn•••d~ r.
A1tn=tiMoIlflMnJilr;...,1. AnOL 85 da Introdução. fur última, cfr., entre nós, a dari6açin ~A dc!l.niçliudos conceito" bem como a ma ut~i•• ç~o. SOflCgnndcs oocilaçõ••. No 'mo
de CAs"rANHElR.\N~, .0 aau.aI probl<:ma..••••RL]. 1/9. pp. 129,,:' utilizam.sc p",felClllCmente '" ddiniç6co conceituai! ancorad", na metódica hermeneu,ieu-concretiun'e
(HESS.l!).na metódica DlIrmalivu-cstlUcutante(F.MOLull.).

~ DI"It~ C~uli•• <I~n.1


/076 1077 Inl"lUUa<d••• pll,a,~•• <on"ftl<a,d~ do Dlr",. Coa,tI'.floul
Além de serem conceitos correntes nos discursos jurisprudenciais e
domrinários, eles constituem importantes instrumentos metódicos no trabalho
de interpretação/concretização do texto constitucional.
c) .~brtpoiiçtÚJ de normas
y
_ . Duas disposições podem exprimir normas que se sobrepõem par-
cialmente. Tomemos, como exemplo. as disposições 3.~/3 e 277;~/1 da CRP.
a) Disjunção de normas
•, Na primeira das disposições consagra-se o prineipiq dll fOlljimrlidlu/1'
com a constituição das leis, dos demais actos.do Estado, das regióes autónom<lS
Uma só disposição (formulação, enunciado) pode exprimir uma ou
e do poder local; na segunda estabelece-se o princípio da C(1mtituéiqnt1/;dad~das
outra norma, segundo as divers;tS possibilidades de interpretação. Tomemos,
normas. O princIpio da conformidade abrange também o princípio da constitu-
como exemplo, o art. 24.01l da CRP: .A vida humana é inviolável».
cionalidade, mas não se esgota nele, porque se estende a OUtrOSactos que não são
Esta. disposição pode conter, pelo menos, três normas, consoante o
normas (exs.: aetos políticos, actos jurisdicionais, aetos referendários). Daí que
significado que lhe é adscrito.
Norma 1: «a vida humana é inviolável desde o momento do nasci- Dl -t Nl + N2 + N3
mento até ao ,momento da mortel>. (NOrtt12$) {Actos (Ac=
po[fúcos) jurOOicioniais}
Norma 2: «a vida humana é inviolável desde o momento da con-
cepção até ao momemo da morte». D2-tNl
Norma 3: «a vida humana é inviolável desde o f!l0mento em que,
de acordo com os dados da ciência, começa a haver vida intf2-uterina até ao d) Disposiçõa um 1W1'mI1S
momento da morte».
Algumas vezes, os jutisras utilizam o conceito de norma num sen-
Como se vê, não é iridiferente, para efeitos da protecção da vida e
tido restrito para exprimirem:
da punição da interrupção da gravidez. optar-se por uma ou outra interpretação.
(1) normas de conduta (comandos, proibições. autorizações): nem
Podemos representar simbolicamente esta disjunção
todas as disposições são idóneas para exprimirem normas, mas apenas os
D -t Nl? N2? N3?
chamados munciados tÚBnticos. incidentes sobre condutas ou comportamentos
(ex.; CRP, art. 27.°/2: cNinguém pode ser total ou parcialmente privado de
b) ConJunç.w de normas
liberdade ... »).
Muitas disposições exprimem não apenas uma norma, m:lS várias (2) normas ou ugras de conduta auto-suficientes: aqui as regras ou
norrn:lS conjuntamente. Tomemos o exemplo do ano 18.°/1 da CRP: «Os normas de conduta são as normas completas que precisam quem deve (pode ou
preceitos constitucionais respeitantes aos direitos. liberdades e garantias são nio deve) fazer certas coisas em certas circunstâncias (ex.: art. 28.°/1 da CRP).
directamente aplicáveis e vinculãm as entidades públicas e privadas". Temos aqui, Trata-se de conceitos restritivos pouco operacionais no âmbito do
pelo menos, três normas: direiw constitucional. Em rigor, estes conceiros de normas expulsariam as nor-
Nl - Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos. liber- mas programáticas ~~ princípios que, como vimos, (cfr. Parte n, Capo 2.°)
dades e garantias são directamenu aplicdvtis constituem normas de grande relevância no sistema aberto da constiruição.
N2 - Os preceitos constitucionais vinculam mtidades Os conceitos restritivos conduzir-nos~iam a anotar muitas regras e princlpios da
públicas constituição com uma interrogação. Assim:
N3 - Os preceitos constitucionais vinculam mtidades D -t?
privadas
, e) Normas mn dispqsiç.w
-'"
A forma de anotação simbólica será esta:
D-tNl + N2 + N3 Com mais interesse metódico-constitucional se apresemam os casos
de normas sem disposição. Estruturando-se este curso num discurro principUdista

~ D/r.lu C••• llt.dn./


1078 1079 I.".,,,,", ••.• ,I!<.,d. , '"."tt/zo,d. d. D/r,lt. Cu"It~,I •• ",
(= «amigo de princípios»), e caracterizando-se os princípios comÓ ~ormas abertas
trib.unais). Todos aqueles que são incumbidos de aplicar e concretizar a constitui-
dotadas de idoneidade normativa irradiante (cfr. iupm, Capo 3.°), é fácil concluir
ção devem: (I) encontr~r um resultad~ constitucionalmente «justo» através d;
que, a nível constitucional, poderemos ter mUltaSveZesnormas sem formulação
ou enunciado Iingulstico. Em formulação simbólica: adopção de um procedimento (método) racional e controlável; (2) fundamental
?~N este multadu também de forma racionai e controlável (Hesse). Considerar,
interpretação como tarefa, significa, por conseguinte, que toda a norma é «signi.
_. Exemplo: o princípio do procldimento justo ou do du~ procm. Este
ficativa», mas o significado não constimi um dado prévio; é, sim, o resultado d.
princípio não estava enunciado linguisticamente (~f. agora, depois da 4.a Revisão, t~ interpretativa.
art. 20.°/4); não tinha disposição, mas resultava de várias disposições
.•••••J- -'
constitucionais (exs.: artS. 31.°, 32.°, 33.°, 269.°/3). Por vezes, os princípios não
estão formulados ou enunciados em qualquer disposição nem resultam da
b) DimmJóc tto.rético-po/iticas
.7
combinação de várias disposições; consideram~se, porém, principias jurídicos
gerais normativamente vinculantes (ex.: o principio da dmsidm:ú e clartu elasleis Sab o ponto de vista trorético-po/itico, a interpretação das normas
insíto no princípio da protecção da confiança). constimcionais deve ter em conta a especificidade r.esulrante do facto de a
constitu.ição ser um esta.tuto jurídico do polltico (cfr. infra). A influência dos
Neste último caso, a «norma principiai,. não é languag~-tkpmdent;
valores pollticos na tarefa da interpretação kgitima o recurso aos princípios
não é fruto de uma interpretação, no sentido atrás definido, pois é elaborada sem
políticos. consrituciona)meme estruturantes, mas não pode servir para alicerçar
qualquer. disposição. Trata-se: de normas produzidas pelo "direito» mediante
integração/concretização. propostas inrerpretativas que radiquem em qualquer sistema de supra-infra
ordenação de principios (ex.: princípio do Estado de Direito mais valioso que o
o discurso do meIO pressupôe eonhecimentos de tcori'l juddica genU, de meto-
dologi'l e fJlosofJa do direito. N $mls fontes de ilLlpiraçio .ia, ent"" tan[ol, P. Comanduccil
IR Guasdni (edit.), L'anttJisj IÚI ragionllmtntlJ giuridim Matmaü aJ uso tkgli studmti, vaI. 11,
princípio democrático) nem em qualquer idem de antinomia (cfr. supra,
0

Cap. 2. /D) legitimadora da preferência de cc;:rtosprinclpios relativamente a )


outros (ex.: antinomia eorre o princípio do Estado de Direito e o ptindpio da
Torino, 1989; Cauigno£lc/Gu •••ti£liffasdlo, IntToduzi~ alio stutlio IÚI diritto, Ger1on, 1981.
pp. 20 55., Gu •••ti£li, úzioni sul linguaggill giuridico, Tori£lo, 1'985, Parte I,. Cap. li CIO. socialidade, solucionando_se a antinomia através do reconhecimento de primazia
Wci£lberger, Logilr, Sm"lIltilr, HmntMutilr, MUnchen, 1979, p. 20, 188, A. Ross. Dirutiflts and normativa do primeiro). O prindpio da unidatú hitrárquico-normativa da Cons~
Norms, Lo£ldon. 1968, pp. 34 55., G. H. Y. Wright, Norm anti Aaion, Londo£l, 1963. tituição ganhará, nesta sede, particular relevância.

O principio da unidade da constituiçjo considerado como principio interpretativo


,• 3. Sentido da interpretação das normas constitucionais fundamental foi recentemente estudado por F. Müller, Dit anhúr dtT VtTfilSSung.J~ames, o .eu
valor hermenfutico havu.. sido po.to em tealcc por Hcssc, GTUndzii~, p. 8; Ehmke, 'Prinzipien der
-./

a) Dimensiks m~todológicas Verr:...ungsinterpretation., in WDSTRL, n.~ 20 (1963),'72. Cfr. também Jupro, Cap. 2, D. V.
~ l1trUlbreve referência a alguns problemas rdacionad05 corri a .• carga polltica. d ••• normas
coflltiruci()nili di-. a 3.' cd., do DiT:itq Consriruúonal, pp. 224 IS. O signifi=1o do recurso aos
Interpretar as normas constitucionais significa (como toda a inter- .valo~ politico.s. na interpretaçã() da constituição tem sido objcclO de amplo debate doutrinai na
pretação de normas jurídicas) compreender, investigar e mediatizar o conteúdo It:ilia, pat«cndo consi4erar-~e opinião dominante aqueu que.ill.li.te na legitimidade do tecurso a
sem~lltico dos enunciados linguísticos que formam o texto constitucional. tais valores, mas só Cenquanto des con~tituirem 'nJorcs. positivado$, integradw no conteúdo da
A interpretação jurfdico-constitucio~a1 reconduz~se:, pois, à atri- nortrul cotutitucional a interprcriu- (£lia ~ kgftima, assim, a inVOClçãode .-valores poIrtkos. baseada
no ticto de des corresponderem b dircctivas das forç... hegcmóniGl5 ou das forças que detêm o
buição de um significado a um ou vário~ slmbolos.l~ngulsticos escriros na consti-
poder em clctenninado momenro). Sobre o problema "fr. Crisafulli, ú COJriruziont ~ k SUç
tuição. Esta interpretação faz-se mediante a udli1.ação de determinados critérios dipOJWoni di pri"gpio, Milanó, 1952, p. 42; Morra!Í, .Costituzione (domine general i). in Enc. IÚf
(ou medidas) que se pretendem objeceivos, transparentes e ciendficos (teoria ou DiT;, Xl, MiJano, 1962, pp. 82 ~•.: Pell.loveo:hio Li Bassi, L'inurpTtldzionttkik norm~ co,tinaiona";
doutrina da hmnmêutica). Milano, 1972, pp. 511$. Po.r último, efr. Chierchia, L'illúrprttaziont ,iJúmatica tkila Co,ri1Uzion~,
Interpretar a constituição é uma tarifa que se impõe mttodicammte Fadava, p. 87 lSi R. Gu •••tini, úzioni mllingr;aggio Giuridkll, Marino, 1986, p. 119. O debate
eotn: o .m~rodo cientIfJoo-espiritual. (Smend) e o .méródo jurídico; (Fomhoff) roca também
a todos os aplicadores das normas constitucionais (legislador, administração,
nesta questão do .dcmenro. poUtico como critério da interpretação das norm ••• constitucionais.

~ DI"II~ Cn,lIt.,I.~ol ' 1080


1081 l~t«p«t~,Oo.opl/,o,o. , <O.'"l/zo<~~
,,~OI"lt. c.~.tlt"".h.1
<

.
,

!..
,

o
,
•,,
,,

..... ---------- -------- ----------

,
~
.,
u
••••••••••••••••••••••••••••••••••

o
it
1
o
c"
ê;
.,o. 8

•,
. "'

,

.

.

;

,,~

,
o

J
~
~.
tação não deve partir do problema para a nonna, 'mas desta para os problemas.
(i) as b2Sesde valoração (=: ordem de valores, sistema de valores) subjacentes ao
A interpretação é uma actividade nonnativamente vinculada, constirnindo a consti-
tutio scriptlt um limite ineliminável.(Hc:sse)que não admite o sacrifício da primazia
texto consdtucional; (ii) o sentido e a realidade da constituição como elemento
do processo tÚ inttgrafão. O recurso à ordem de valores obriga a uma .captação
Vi
/
da norma em prol da prioridade do problema (F. ~üller) 8.
espiritualJOdo conteúdo axiológico último da ordem consdtucional. A ideia de
que a interpretação visa não tanto dar resposta-ao sentido dos conceitos do texto
3. O método hermenêutico-concretiudor constitucional, mas fundamentalmente compreendet o stntido (rralUlade de uma
lei constitucional, conduz à articulação desta lei com a inttgrafão espiritual real
o
método hermenêutico-concretizador arranca da ideia de que a da comunidade (com os seus valores, com a realidade existencial do Estado) l0.
leitura.de um texto normativo se inicia pda pri-comprrmsão do seu sentido através
do intérprete. A interpretaçáo da constituição tambbn não foge a este processo: é
uma comprunsáo tÚ untido, um preenchimenro de sentido juridicamente criador, 5. A met6dica jurídica. normativo-estruturante
em que o intérprete efectua uma actividade prático-normativa, concrrtWzndo a
norma P¥3 e a partir de uma situação histórica concrc;ta. No fundo, este método Os postuladoS básicos da met6dica normativo-estruturante são os
vem realçar e iluminar vários pressupostos da tarefa interpretativa: (I) os pres- seguintes: (I) a metódica jurídica tem como tarefa invesrigar as vdn'z funfõrs tÚ
supostos subjecti~os; dado que o intérprete desempenha um papel criador (pré- realizaçiio do dirrito constitucional (legislação, administração, jurisdição); (2) e para
.-compreensão) na tarefa de obtenção do sentido do texto constitucional: (2) os captar a transformação das normas a concretizar numa «decisão prárica» (a
Ptes.'!upoStOSobjectivos, isto é, o contrxto, actuando o intérpr~te como opetador de met6dica pretende-se ligada à resolução de probtemas práticos); (3) a metódica
mediações entre o texto e a situação em que se aplica: (3) relação entre o trxto e o deve preocupar-se com a I!strutura da norma e do texto normativo, com o sentido
conUXW com a mediação criadora do intérprete, tranSformando a interpretação em de normativiclade e de processso de concretização, com a conexão da con-
«n;aovimentode ir e vir» (drculei hermenêutica). cretização normativa e com as funções jurldico-práticas; (4) elemento decisivo
O método hermenêutico é uma via hermenêutico-concretizante, para a compreensão da estrutura normativa é uma teoria hrrmen!utica da nO/ma
que se orienta não para um pensamento axiomático mas para um pensamento juridica que arranca da não identidade entre norma ( texto normativo; (5) o texto
problematicamente orientado. Todavia, este método concretizador afasta-se do de um preceito jurídico positivo é apenas a pane descoberta do iceberg
método tópico-problemático, porque enquanto o.último pressupõe ou admite o normativo (E Müller), correspondendo em geral ao programa normativo (ordem
primado do problema perante a norma, o primeiro assenta no pressuposto do ou comando jurfdico na doutrina tra.didonal); (6) mas a norma não compreende
primado do trxto constitucional em face do probleJ!la 9. apenas o texto, antes abrange um ••domínio normativoJO,isto é, um «pedaço de
realidade social~ que o programa normativo só parcialmente contempla;
i
4. O método científico-espiritual (= método valorativo, sociológico) (7) consequentementc, a concrmZ4çiib normativa deve considerar e trabalhar com
dois tipos de elementos de concretização: um formado pelos elementos resul-
As' premissas básicas do chamado método científico-espiritual tantes da interpretação do texto da norma (=: elemento literal da doutrina clás-
.baseiam-se na necessidade de interpretação da constiruiçio dever ter em conta: sica); OUtro, o elemento de concretização resultante da investigação do referente
normativo (domínio ou reg!ão normativa) 11.
IN •• ,UU "'trU,,,,,,,, •••• ndai., a argumento•••" ,6pia ,..monnl antiga rct6ria (dt., sob,..
isso, VIEHWEG,To!ift umlJurl:prudmz, 5." .d., 1974). HiscoriClmcnte,'1' mé,od", 'ÓpiCOHUrgatlqu.ndo o
jurist::opretende (no plano ideológico, pollcieo, culrurol) enftenm o dogma da primo>ia d. I.i • do di,..i,o 10O mótod" ci.ntlfico-cspiricual é d•.••nvolvid.,.m «,mo, muito v.ri.d.,. e ., ,eu funda-
positivo. Cfr., .nue nó" BAmsr" MAOWlO, PrifJdo a r"trod"fáb do P"'f4mt1l1O /llriáit:a, d. lCAALENGISCH, mento filosófico-jur/dicotombl!m ttS:oé dar<>.O p.m.mento d. intcgr.>Çiod. SMENOé aqui .i"'rnoricamente
in~. Poro uma visão gIobú cfr. GoERUOi, Wm»ninun,f UM GrunJgn~-Kriljft nnn Argum"'laliottljil"r
pp.XV5S.
9 A teor~o fundomcn",] d"'te ml!todo dcvc-•••. K. HESSE,G,..,1IÁzj;p di< V".fiurungre- tia BU~-nlnpterichrs, Badcn_Badcn, 1973. Cf,. tombóm • 3.' edição d" amo tk DiTtilo CO'Ulilud.""J,
pp. 229 "i PAUlOBoN"VlOES, DirrilO a"utit>«ionlli, pp. 317 fS.
,hlt. pp. 11 ", que desenvolveuum ca~go de tópicos de inrerprc~ a que se far.l.,..fer!nda no ,Clt'O.CIr.,
Clmbóm,F. Ml/U.Eil.,JuriJ/ÚtM Methmiift, pp. 173 ss. . lt AmetódiCl"UUtu""''" tem ,ido rob,..cudo remaliuda. problem.ti:ta<!. por F. MüllER.
T.fr. juriJ/Ú&he MnhotliJt. pp. 144 SI; ~ Rtth.tsithTt, Ikrlin, 1984, pp. 225 SI. Algumo.odu p,..missu

~ Dlrtlt. C."Hit"rlu"1
1086 1087 1"'''J''''.ril" .•• 1I'ulil. r 'u"tli'HiI" d. DI•..;<oC"""itu,i",,,,1
t:
/I ~ lntupntação t dimtnsÕlSjurídíarfúndonais . aO elemento literal ('" gramatical, filológie~), o processo concreüzador da norma
, dâ constituição começa com a atribuiç40 tk um rignificado aos enunciados Iin-
guísticos do texto comtitucional.13
Fala-se de perspectiva metódiça' jurídico-funcional quando, na
i~terpretação-concrerizaçáo das. normas constitucionais, se tomam, como pontO \\;
de p:utida, as caractcrfsticas funcionais especfficas da.~competências dc decisão 2. Mediação do oonteúd~ st:~antico
_dos vários órgãos constitUCionais. A base metódica do trabalho interprctativo
,/
concretizador seria, portanto, esta: as funções do Estado são exercidas por aqueles
i o facto de o texro constitucional ser o primeiro elemento do pro-
6rgâos que, segundo a sua estrutura interna, composição e métodos de trabalho, cesso de interpretação-~ncretização constitucional (= processo metódico) não
estão legitimados para tomar decisões eficientes segundo procedimentos justos e significa que o texto ou a letra da lei constituc'ional contenha já a dtciJiío do
para suportar a responsabilidade pelos resultados da decisão 12. pr:ohlmui a resolver mediante a aplicação das normas"constitueion:l.is. Diferen-
Esta perspectiva jurídico-funcional intervém, umas vezes, no plano temente dos postukdos da metodologia dedutivo-pooitivista, deve considerar-
da discussão da metodologia jurídica em geral; noutros casos, é agitada sobretudo -se que: (1) a letra da lei não .dispensa a alJt:riguaçiíodo sm conttildo stmânticoi
par:l demarcar os limites entre as competências do legislador e do Tribuna.! (2) :l. norma comtitudonai não se identifica com.o ttxto; (3) a delimitação do
Constitucional. âmbiro normativo, feita através da atribuição de um significado à norma, deve
ter em atenção elementos de concretização relacionados com o problema carecido
de decisão. Interessa, porém, totnar mais claras as várias dimensões da norma,
D. Regras Básicas de Conmtiza(ão para se evitar quer as sobrevivênei:l.ll do positivismo quer as encapuçadas
desvalorizações da norma (sociológiC:l.S,ideológicas, metodológicas.
1- Ponto de partidajurídico-constitudonal:
postu!adtJ normatíw da constítudona/idade
3. Elementos da norma


1. A norma Componentes fundamentais da norma são o programa normativo
, e o domínio normativo e, por isso, a norma s6 pode compreender_se como uma
Num ordenamento jurídico dotado de uma constituição escrita, articulação destas duas dimensões.
considerada. como ordem jurídie:.t fundamental do Estado e da sociedade, O programa !J,ormativo ~ o multado de um processo parcial de
pressupõem-se como pontos de partida normativos da tarefa de concretização- concretiução (inserido. por conseguinte, num processo global de concretização)
-aplicação das normas constitucionais (comtitutional comtruction na terminologia assente fundamentalmente na intrrprtt4çiíq do ttxto normativo. Dal que se tenha
americana): (1) a consideração de nonna como elemento primário do processo considerado o enunciado Iinguístico da norma como ponto de partida do
interpret:oI.tivo;(2) a mediação (captação, obtenção) do conteúdo (significado, processo de concretii:tção (dados Iinguísticos), Por sua vez, o sector normativo é
sentido, intenção) semântico do texto constitucional como tarefa primeira da o resul~o de um segun<:!o.pfC!cessoparcia.! de concretização assente sobretudo
hermenêutica jurídico-constitucional; independentemente do sentido que se der na análise ~os e1e~eflto~_eIt1píricps (dados reais. ou seja, dados da realidade
recortadoo pela norma). Desta forma a norma jurídico-constitucional é, um
leodticas e metodológicas d. metódica. jurldi<:o-esuururant<: úo acolhidu nos,e curso ';"mo •• poóu:1 d<dU1.ir
motklo dt ordmação orientado pam uma concmizaçiiu mattrial, éonstituJdo por
du piginu seguinteS .
. 11 Cf,. GOMES CANOTILHO,.A co"creritação "" ColUtiluição pdo legislado, c pelo Tribunal
Consrirocio"al" in JORGE DE MIllJ,NOA (coord.), N", da. _ J.s CD7Uti~, .1986, p. 351. ar. wnbém
RlNKm,Altnnati •••x.."'mmt"r zum GG, vaI. 2, ;lI\O"'ção 61 c ss. aos am. 93.' c 9'1.0 U Ah=mo--""" assiln, da. propo'w, rnctodoJógi= d. GlsTANHE1RANEIIES no •• n,ido de
reduzira norma a "critério" da intcrp~IH:OJ:I=<itaçio. Cfr. A CAsrANHEIRANtvE5, M,taddorj. pp. 14Z ••..

~ Dlrdr. ConH/,.<lou/ 1088


1089 ''''Ul''''or~., op/l"I<~O, '''U'I/ZD,~_ J. Di,';,_ C,.,N""" •• I
uma medida de ordenação, expressa através de enunciados linguísticos, e por um constitucionais contêm. em certos casos. conceito! de prognou. o que implica. a
«campo. de dados reais (factOSjurldicos, factos materiais). antecipação de consequências futuras, dificilmente dedutíveis da simples media-
Da compreensão da norma constitücional como estrutun formada ção do conteúdo semântico. Ex.: «grave ameaça ... da ordem constitucional»
(art. 19.0/2)15;
por duas componentes - o "programa da norma» e o ••domInio da norma» -
deriva o sentido de normatividade constitucional: normatividade não ! uma
«qualidade» estática do texto da norma ou das normas mas o efeito global da
\.9-'
5. Texto da norma e norma /
norma num processo estrutural e dinimico entre o programa normativo e o
sector normativo. Este processo produz, portanto, um ejtito que se chama o
recurso ao «texto» para se averiguar o conteúdo semântico da
normativo, ou. para dizermos melhor, a normatividade ~o efdto global da norma norma constitucional não significa a identificação entre tato e nonna. Isto é
(com' :lS duas componentes atrás referidas) num determinado processo de assim mesmo em termos linguIsricos: o texto da norma é o «sinallinguIstico»; a
concretização (cfr. supra, o gráfico ilustrativo do procedimento concretizador). norma é o que se ••revela» ou ••designa».
Compreende-se. assim, a necessidade de manter sempre clara a distinção entre
. nOnn4 e fimnuÚtçáo (disposições, enunciado) da nonna: aquela é objecto da inter~
pretaçãoj esta é o produto ou resukado da interpretação \.(. 6. Sentido da norma e convenções linguIsticas.

o
recurso ao texto constitucional, não obstante as dificuldades das
4.,. Dificuldades de investigação do conteúdo semântico da norma operações de determinação dos enunciados linguIsticos das normas constitu-
cionais, tem este sentido básico no processo met6dico de concretização:
A investigação do conteúdo semântico das normas constitucionais (1) o conteúdo 'vinculante da norma constitucional deve ser o conteúdo semân-
implica uma operação de determinação (= operação de densificação, operação de tico dos seus enunciados linguIsticos, tal como eles são mediatizados pelas con~
medhtção semântica) particularmente difIcil no direito constimcionaL Em vençóes linguísticas relevantes; (2) li. formulação lingulstica da notma constitui o
primeito lugar, os elementos Iingulsticos das no'rmas constitucionais são, muitas limite atemo para quaisquer variaçóes de sentido jurldico-constitucionalmente
possIveis (função negativa do texto),
vaes. polissbnicos ou pluri~!ignificarivo! (cxs.: os conceitos de Estado, povo, lei,
trabalho. têm vários sentidos na constituição). Como é sabido, considera~se hoje que o significado de um enun-
Os enunciados linguísticos são, noutros casos, vagos ('" conceitos ciado lingufstico é fixado através de convenções linguísticas. E aqui surge logo o
vagos, conceitos indeterminados), havendo, ao lado de «objectos» que cabem primeiro problema, porque na interpretação da lei constitucional podem set
inequivocamente no imbito conceitual (= candidatos positivos) e ao lado de tomadas em consideração duas convenções linguIsticas diferentes. Isto num
objectos que estão claramente excluídos do â1nbito intencional do conceito duplo sentido: (1) escolha entre a convenção baseada no uso cimtlfico e a
('" candidatos negativos), outros objectos em relação aos quais existem sérias convenção baseada no uso nomza~ (2} escolha entre a convenção (cientIfica ou
dúvidas quanto à sua caracterização ('" candidatos neutrais). Exemplo tIpico é o normal) Iingulstica do tempo em que surgiu a lei constitucional e convenção do
conceito de ••independência nacional» (artS. 7,~-1, 10.~-2, 81.°lf. 87.°, 120.°. . tempo da sua aplicação (historicismo e acrualismo) 16,
273,~~2, 288.~/a).A isso acresce o facto de os cOnceitos utilizados pela constitui-
ção serem muitas vezes conceitos de vawr (cxs.: dignidade da pessoa humana, \S Sobre", conçti~ referidOJ110raro ('nguidc:z', 'PrQgnos~','poli"~lnia') ~ ,ob", "" difkul-
dodes ~ limü•• da medio.çIo do conttlÍdo •• mintioo, cfr. ICo<;HIROSSM'-NN, jurntischt BtgriJndu"l'lth",
independência nacional, dignidade social), isto é. conceitos com' ••abertura de MllnclJcn, 1982, pp. 188 SS.;L WAMT,O áirdID ~ 1I!UIt ü"guttgttrl, Porro Aleg"', 1988, pp. 76 ••.
valoração» e que. por isso mesmo, têm de ser preenchidos, em grande medida, 16Sob", ••'" último pomo cfr.l.AJl£Nz.M.thodo.kh,., p. 308 ••. Qu~ ° ckmenrQ gram.dcal
pdos 6rgãos ou agentes de concretização das normas. Por último. os preceitos obriga a <kddir entre ririo. USOI dos sinai.lingulnicos é posto ~m relevo por F.MOLLEll.,Juti<tirch.. M~rhodi1<.
p. 152. Na.juri'Pru<Ullcia C doutrina americanas os doi. dnon", de 'consd'uriorul conmucrion. mais
udlizod••• r~m .ido os segui""": (1) as pai,",,,,, ou termns da consriruiçio devem ser inrcrpretad"" no •• u
14 Cf,-. F. MOu.Ell.,jutirtiu-h. Mnhçái1<, 3.' od .• pp. 14451.; GUASTINl, Lnioni lullinputggio senddo. normal, natural, lISIIa!,comum, ordin{rio ou popular; (1) qu.ndo se ulJlia.amrormos técnicos ~Ies
tiuriJico, p. 119. EntK nó, dr .• por todo., A. Co.sTANHE1AA NEVES,M.t",Mo';'" p- 145•. °
• devem "'r sentido o«IIico. Cfr. ANT1EAiJ,ConstitutiOlfll[ Comtrutiio", cir., pp. li •• , 11155.

~ O,.r1,. C••,,',.du.t 1091 t"ur",,,~,~o."pti,.,do , "urtt'H,do J. DlultoC""''',,'n,! •


1090
11- &gunda ídtía fi.mdamtntql: o programa nonnativo não rrsulta apmos
di. mti1lação sanântÍ£a dos mundados línguísticos du tato " . I,, (como o positivismo) mas também a uma racionalidtuú mtUaial Compreende_
-se. pois, que: (1) seja necessário ddimitar um dominio ou !tetor tÚ norma cons--
"
\
"/
ti~do por Uma quantidade de determinados eleme.ntos de facto (dados reais);
I
(2) os elementos do. domínio clã nonna são de diferenre natureza (jurídicos,
1. Os elementos de interpretapo
II eronómicos. sociais. psicol6gicOs, socioI6gicos); (3) a análise do domínio da
norma seja tanto mais necesSária: (a) quanto mais uma norma reenvie paf;1ele-
O programa normativo não é apen:as a som:!.dos dados lillguísticos mentos não-jurfdicos e, por conseguinre, o multado de concretização da norma
normativamente relevantes do texto, captados a nível puramente semântico. dependa, em larga medida. da análise empírica do domínio de norma e (b) quanto
Outros elementos a considerar são: (1) a sistemática do texto normativo, o que mais uma norma é aberta, carecendo, por conseguinte, de concretização posterior
corresponcle tendendalmentc à exigência de recurso ao elemento sistemático; através dos órgãos legislativos.
(2) apticado texto; (3) a históriado texto; (4) a t&ologiado texto. Este último Por OUtras palavras: se a importância da análise do domínio
elemento «teleologia do texto normativo~ aponta para a insuficiência de semAn- material se move numa ~ca1a ~jos limites são: (1) a dftmninaçiio máxima do
rica do texto: o texto normativo queJ::dizer alguma coisa a alguém e daí o recurso texto da norma nos casos de preceitos em que o imperativo linguístico do tato
à pragmática. é fone (as.: praws, definições. normas de organização e de competência);
(2) a tÚtnmitulfiio minima do texto da norma. como acontece nos preceitos que
reenviam para dementos não-jurídicos ou que contêm «conceitos vagos»
2. A função pcagmática do tato da norma (ex.: «SCCtoresbásicos da economia». «conecção das desigualdades de riqueza e de
rendimentos». «dignidade humana»).
Como se acabou de ver, palavras e expressões do texto da norma .,
constitucional (e de qualquer texto normativo) :não têm significado aut6nomo.
ou seja. um significado _em si,., se não se tomar em conu o momento de decisão 4. O espaço de intetprtta~o e o espaço. de selecção
dos juristaS e o carácter procedimental da concretização de"normas. Dal que:
(1) A decisão dos «casos» não seja uma «paráfrase» do texto da norma, pois o A análise dos dados linguIsticos (programa normativo) e a análise
., texto possui sempre uma dimensão comunicativÁ (pragmática) que é inseparável dos dados reais (seetor ou domínio normativo) não são dois processos pardais,
dos sujeitos utilizadores das expressões linguísticas. da sua compreensão da separados entre si. dentro do processo de concredza~o. A articulação dos dois
realidade. dos seus conhecimentos privados (neste sentido falam também as processos é necessária por vários motivos.
correntes hermenêuticas do efeito criador da «pré-compreensão ••); (2) o texto da O programa normativo tem uma funçilo de filtro relativamente ao
norma aponta para um rif~u.o que quer dizer constituir o texto um sinallin- donúnio normativo. sob um duplo pOnto de vista: (a) como limite negativo;
guístico cujo significado aponta para um universo de realidade exterior ao texto. (b) como determinante positiva do domínio normativo. Esta função de filtro do
programa normativo significa ser ele que separa os factos com efeitos normativos
~os fãetos que. por extraVazarem d~ programa. não pertencem ao sector ou
3. A análise do «sector normatiVOll como processo parcia.I do processo global domínio normativo (função positiva do programa normativo). Além disso, como
de concretização das normas constitucionais o programa normativo é obtido principalm~nte a partir da interpretação dos
dados lingulsricos, deduz.se o ifritf!,tÚ (imitr nrganvo do tato da norma (TN):
Relevante para o processo concrerizador não é apenas a delimitação prevalência dos 'elen;ttntos de concretização referidos ao texto (gramaricais, sisre~
do âmbito normativo a partir do texto de norma. O significado do [CXtoaponta máticos) no caso de confliro dos vários elementos de interpretação. Consequen_
para um rif~tr. para um universo material. cuja.análise é fundamental num temente, o espaço de interpretação. ou mdhor, o âmbito tÚ libadatk tk inter-
processo de concretização que aspira~não apenas a uma racionalidade formal pret4ção do apliéador.coricretizador das normas constitucionais. rem também o
texto da norma como limite: só os programas normativos que se considef;1m

~ DI"I,~ CUHlru<luul 1092


1093 '"t"n'lar~a, al'/lrn~. , r~~",/(za'd. iI~DI••". C.n"IIo"~•• 1
compatfvds com o texto da norma constitucional podem set admitidos como
resultados constitucionalmente aceitáveis deri~dos de interptetação do texco da im(diata através da sua ~passagem" a norma de decisão que regula concreta e
nonn2. Salienta-se, por fim, o programa normativo, considerado como resultado vincu1ativameme o caso careCido de solução normativa 6upra, gráfico do proce-
da interpretação -do textO de norma, é rnnbém o elemento fundamental do dimento concretizador).
ch:unado apaço tÚ s(kcçíio tk factos constitutivos do domínio notmativo: só
podem incluir-se no âmbito possível do domínio normativo as quantidades de
dados reais compatíveis com o programa normativo. 3. O sujeito concretizante
~
Se a norma jur(di.ca só adquire verdadeira 1l0l"m:uivid:ldcquando.se
111-Nonna jurídica transforma em norma de decisão aplicável a casos concretos, concluiu-se que cabe
ao :l.gente ou :agentes do ptocesso de concretização um papel fundamental,
porque são eles que, no fim do processo, colocam a norma em COnt:l:ctocom a
1. Norma jurídica: modelo de ordenação material realidade. No específico plano da concretização normativo-constitucional, a
mediação metódica da normatividade pelos sujeiras concretizadores assume uma
- O processo de concretização nonnativo-constitu~ional, iniciado das suas manifestações mais relevantes. Em face do carácter abeno, inde-
com a mediação do conteúdo dos enunciados linguísticos (programa normativo) terminado e polissémico das normas constitucionais, torna~se necessário que, a
e com a sdecção dos dados teais constitutivos do universo exterior abrangidos diferentes níveis de realização ou de concretização -legislativo, judicial, adminis-
pelo programa de norma, conduz-nos a uma primeira ideia de norma jurídico~ trativo -, se aproxime a norma constitucional da realidade.
-alrntituaonal: motÚÚJtk ortknaçilo matma! pmcrito pela ortinn jurldica como
vincuiatioo e constituído por: (a) uma medida de ordenação linguisticamente
formulada (ou captada através de dados linguCsticos);.(b) um conjuow de dados 4. O trabalho metódico de concretização
reais seleccionados pelo programa normativo (domínio normativo). .
A este nível, a norma jurídica é ainda uma rt!gra g(ra! e abrtracld., Num Estado de direito democrático, o trabalho metódico de con~
que representa o resultado intetmédio do processo concretizador, mas não é cretização é um tritbalho normativammt( or;t7ltado.Como corolários subjacentes
ainda imediatamente: normativa. Para se passar da normatividade mediata para a a esta pOstura mewdo16gica assinalam-se os seguintes.
normatividade concrtta, a norma jurídica preci~ __ de revestir o caráeter de norma O jurista concretizador deve trabalhar a. partir do texto da norma.
tk tkcisáo. editado pelas entidades democrática e juridicamente legitimadas pela ordem
constitucional. A norma tÚ tkcislio, que representa a medida de ordenação
imediata e concretamente aplicável a um problema, não é uma _grandeza
2. Norma de decisão aut6noma", independente da norma jurídica, nem uma _decisão" voluntarista do
sujeito de concretização,; d~, sim, reconduzir-se sempre à norma jurídica geral.
Uma norma jurfdica adquire verdadeira normatividade quando A distinção positiva'das funções concretizadoras destes vários agentes depende,
com a «medida de ordenação~ nela contida se decide um caso jurldico, ou seja, como é 6bvio, da própria constituição, mas não raro acontece que no plano
quando o processo de concretização se completa através da sua aplicação ao caso constitucional se verifique a convergência concrecizadora de várias instâncias:
jurídico a decidir mediante: (1) a criação de uma disciplina regulamentadora (a) n/ve! primdrio de conrntizaçiio: os principios gerais e especiais, bem como as
(concretizàção legislativa, regul~entar); (2) através de uma sentença ou decisão normas da constituição que «densificamlJ outros principios; (b) nlv(! po!ltico-
judicial (concretização judicial); (3) attavés da prática de acros individuais pelas ~legislativ():a partir do texto da norma constitucional, ,os órgãos legiferantes
autoridades (concretização administrativa). Em q~quer dos casos, uma norma concre:tizam, através de -decisões políticas» com densidade normativa _ os actos
jurídica que: era potencialmente normativa ganha uma normatividat/e actua! e legislativos -, os preceitos da constituição; (c) n/ve! aecuti/JO (jurisdicional- com
base no texto da norma constitucional e das subsequentes concretizações desta a

~ DI,,',. ~""t!lM<16.nl' 1094


1095 Inur"r<tn<~n,
""llcnu. , <o.",t/uUn d6 Dlrtltn C.n"/ln,lnn.1
••••••••••••••••••••••••••••• •••• ~

-
,

----------------------------------_._~ _-
..

"'o
'C
S.
,g.
õ.
~ g-
,• n
ir
• õ
~ s'
••

1
•••••••••••••••••••••••••••••••••
; ~

;
~
.
<


f,
,

.,

,~

j
.;l
g
.g
'[
.a

1
.;l
.2
.g-
.~
o.
O
"" ,. "

••••••••••••••••••••••••••••••••••

-----------------------------_ .. ..
" ".

~

-'

,,
~
,,

,•
~
tuição não é jamais idêntica a si própria, esundo constantemente submetida ao nismo constitucional capaz de salvar a constituição em f2ce da pressão sobre ela ,
pantha rti heraclitiano de todo o ser vivo~27. Todavia, uma ooisa é admitirem-se exercida -pelas complexas" e incess:rntemente mutáveis questões económico~
alterações do âmbito ou esfera da norma que ainda se podem considerar -sociais. ~'ia kitum da constituição de baixo para cima, justificadora de uma nova
susceptfveis de serem abrangidas pelo programa normativo (Nonnprogramm), e compréensão da constituição a partir das leis inrraconstitucionais, pode conduzir
outra coisa é legidmarem~se alterações. constitucionais que se traduzem na exis- à durocCula interna da constituição por obra do legislador e de outros órgãos
tência de uma rtaLidtuú constitucional inconrtitudonal ou seja, alterações mani~ concretizadores, e à formação de uma constituição kgai paralela, pretensamente
festamente incomportáveis pelo programa da norma constitucional 28 • Uma mais próxima dos momemos «metajurldieosll (sociológicos e políticos) 3D.
constituição pode ser flexível sem deix:lt de ser firme. A necessidade de uma per~ Reconhece-se, porém. que entcc uma mutação constitucional obtida por via
maneate adequação dialéctica entre o programa normativo e a esfera normativa interpretativa de desenvolvimento do direito constitucional e uma mutação
justificará a aceitação de transições constinicionais que, embora traduzindo a constitucional incollStirucionaI há, por vezes, diferenças quase imperceptíveis,
mudança de sentido de algumas norm:lS provocado pelo impacto da evolução da sobretudo quando se tiver em conta o primado do legislador para a evolução
realidade constitucional, não contrariam os princípios estruturais (políticos e constitucional (B. O. Bryde: Vafassungsrotwicklungsprimat) e a impossibilidade
jurldicos) da constituição. O reconhecimento destas mutações constitucionais de, através de qualquer teoria, captar as tensões entre a constituição e a realidade
silenciosas ('sti/k Vtrjasrungswand/ungm; é ainda um acto legítimo de interpre- constitucional3l•
taçáo constirucional29. Por outras palavras que colhemos em K. Stern: a mutação
constitUcional deve considerar~se admissivel quando se recoodui a um problema
nOrTnotivo-mdogenltico, mas já não quando ela é resultado de uma evolução 2. Interpretação 2utêntica
normativamente a:ogmltica.
Problema mais complicado é o que .~elevanta quando existe uma Fora das possibilidades da interpretação constitucional se deve
radical mudança dt Irntido das normas constitucionais (exs.: considerar que, no siruar a interpreução co.:thecida na metodologia gc;ral do direito por interpre-
0
art. 53. se incluam no conceito de justa causd'de despedimenro, os despe-
, tação autêntica. Por interpretação autêntica entende-se. geralmente, a interpre-
dimentos por motivos económicos objectivos; admitir que no art. 36. /1 estio 0
tação feita pelo órgão da qual emanou um determinado acto normativo (ex.: o
previstos os casamentos entre pessoas do mesmo sexo). sentido de uma lei é forado ••autenticamente» por outra lei; um regulamento com
Perspectiva diferente se deve adoptar 'quanw às tentativas de legiti- equivocidade de sentidos é interpretado por outro regulamento). Para além da
mação de uma interpretação constirucional criadora que, com base na força clara dimensão voluntarista inerente à ideia de interpretação autêntica, no
normativa. MSfactos, pretenda ••constirucionalizar~ uma alteração constitucional âmbito da interpretação da constituição só poderá falar-se de interpretação
em inequívoca contradição com a constitutio scripta. Algumas concepções que autêntica qu:rndo uma nova lei constitucional, através do processo de revisão
defendem 2 ideia de constituição como concrotrado de princípios, concrerizados constitucionalmente focado, vier esclarecer o sentido de alguns preceitos contidos
e desenvolvidos na legislação infraconstirucionaI, apontam pari a necessidade da no texto constitucional. Uma inmlm:tação autêntica da constituição feira pelo
intnprttaçáo da comtituição de acorde com as kis, a fim de encomrar um meca- legislador ordinário é metodicamente inaceitável. Por um lado, o legislador não
pode pretender ••fixar»~osentido de uma norma constitucional tal como o faz em
11 ClT. LoEW:ENSTl!IN, T",rl4, di la CanstiturioJ>, cit., p. 164. -relação i<; leis por ele edimdas. Neste caso, de é o seu "criado[l>, admitindo-se
211Convert.ndo> e$'. principio> nn 'ou OlntrOrio>, oncorb3ndn •• reloçõ •• do tenÁ<> onrre que, se ele pode criar'e revogar uma lei, por maioria de razão.a poderá interpretar.
direiro comtirucio>n:tl. a realiohd. wn,tilUcimw, ár. LucAs P1REs, li T","" da CollSlituifílo <k 1916, pp. 125 $l;
No>sentido do>I<:lIro,cfr., pnr ultimo>, HOfFUNG, Offm. GrunJm:hIJ;nltrp>"ttlUÍ<lJ>,di., p. 189.
19 Próximo> desta poliçlío> cli-. HFSSE, GrunsWip, cit., pp. 17 C 3D; M1.UNZ, DtuIJchtr JD ar. HESSE, GTlIJUk;;V. oI>. /cc. rir.
5tJl4tt...mt, cir., p. 54. Em senrido divergente, consid'rando •• mu"'çõ •• cannirucionabi como> uma fr,rnu legí_ ]1 ClT. B. O. BRYOE, Vnftssu.~unztwidtlu,,~p. 452; HÓRlNG, Ojfi".
Gru"drrxJmi"tt'1'rr.
tima d. "''''pimtmltJ.rdtJ .• da.nvolvimenro dn dir.iro con.ni,ucio>n:tl m •• n.l:o como> um a= d. iorerpreClçã<>, ItJ.liIm, clt., p. 194; P. KJRCHHOF, .Di. rdontitill der Verfusllng in iI".n un.bJind.r1iehen Inhalrell',
vUk RICHTEII., BilJutJg;vt>fi:ssung",,,hl, cil .• pp. 34 $l. ClT., Jl"r liIcimn, no> oenlido do texro. F. MOllER. in ISENsEE!KlRCHHm; HmuIJ,,,,,h, %1. I. p. 795. Enlre nó •• realpndo> com "".mência •• situaçOes de imp ••••
SmJtturi=ndl &d>IJkh", p. 364. A1~dindn 1 id ••• de direiro> constirucio>nal como> <conc.nrrado> d. direi", ontte o dirdro co>n.tiwdo>rW e. re:tlidad. con,cilUcionol, cfr. lUCAS PIRES,A TeorU:"" Comtituifão d. 1')76,
iJtÍro.co",tiruciona1., cfr. M. KLOEPrnl, .Vnj""""U ••wwtI"'''l ...•. pp. 3D •••

~ DI"". , •••rll_d.ul lJ03 In" •• ''' ••' ••••••,11,••, ••• , r'nr"Uu, ••• ri•• DI"I •• "nUltu,l.aGI
lJ02
••••••••••••••••••••••••••••••••••

"_._-
~
!
.1

,,,
,
,•
••

.-,
\,,-5-\
mesmo é confirmado pela jurisprudência constitucional portuguesa. O problema
das norIDaSconstitucionais inconstitucionais foi poSto no &. 480/89. onde se porque as leis. novas podem elas próprias ter imroduzido alterações de. semido
contestou a legitimidade da norma constitucional proibitiva do lock-out inconstitúcion.~is. Teríamos. mim, a kgaEdade da constituição a sobrepor-se à
(art. 57,0/3). O Tribunal Constitucional afastou o cabimento da questão mas não comtituciona/idadnla
, la". Jp
/'.
tomou posição quanto ao problema de fundo (cfr. Acórdão Te 480/89, Vol. IV; ./
p. ISS).
1/ - A complementarão da {ti constitucíona!

4. A interpretação da constituiçáo conforme as leis


egesetteskon form Verfassungsinterpretation') 1. O significado constitucional da integração

Como a própria exprc.lõsãoindica, c.lõtamosa encarar a hipótc.lõeda Distingue.sc tradicionalmenre entre interpretação e integração.
interpretação da constituição em conformidade com as leis e não a das leis em A interpretação pressupõe a possibilidade de indagação do conteúdo semântico
conformidade com a constituição. A exprc.lõsãodeve-se a Leisner e com da dos enunciados linguísticos do textO constitucional (mediante a aplicação dos
insinua.sc que o problnna da concutização da constituição poderia ser auxiliado clnonc.lõhermen~uticos já referidos), com a consequente dedução de que a maté~
pelo recurso a leis ordin~rias. Nc.lõtaSleis enCó,mraríamos. algumas vezes, ria de regulamentação é abrangida pdo dmbito normativo da norma constitucio-
sugestões para a interpretação das f6rmulas cOndensadas e indeterminadas. utili. nal interpretada. A integração existe quando determinadas situações: (1) que se
zada:snos textos constitucionais. devem considerar constitucionalmente reguladas, (2) não estão previstas (3) e
A utilidade da imc'rpretaçáo constitucional conforme as leis seria não podem ser cobertas pela interpretação. mesmo extensiva, de preceitos cons-
particularmente visível quando se trarasse de leis mais ou menos antigas, cujos titucionais (considerados na sua letra e no seu ratio).
princfpios orientadores lograram posteriormente dignidade constitucional. Interpretação e integração consideram-se hoje como dois momen~
A imerpretação da constituição de acordo com as leis não aponta apenas para o tos conexos da captação ou obtrnçáo do direito, isto é, não se trata de dois proce-
pmado. Ela pretende também abarcar as hipótesc.lõde alterações do sentido da dimentos qualitativamente diferentes, mas apenas de etapas graduais de «obten-
constituição mais ou menos plasmadas nas leis ordinárias. Estas leis, que çãOBdo direito constitucional. A rdativização das diferenças entre processo
começaram por ser actuações ou concretizações das normas constitucionais, interpretativo e processo integrativo é particularmente frisante quando se ttata de
acabariam, em virtude da sua mais imediata ligação com a realidade e com os cstabelecer os limites entre uma interpraação ~tmsiva e uma inugração analógica.
problemas concretos, por se transformar. em ••indicativosB das alteraçõc.lõde Realça-se também que nos princfpios da analogia existe sempre uma certa
sentido e em operadores de concretização das normas constitucionais cujo sen- ambivalência funcional. pois, por um lado, sáo princfpios de interpretação da lei
tido: sc àlterou. Do direito infraconstitucional partir-se-ia para a concretização da e. por outro, são meios de preenchimento de sentido da mesma lei. Com efeito,
Co.nstituição. em face do carácter incompleto, fragmentário e aberto do direito constitucional,
A interpretação da constituição conforme as leis tem merecido o intérprete é colocado peqUlte uma dupla tarefa: (1) em primeiro lugar, fixar o
sérias reticências à doutrina. Começa por partir da ideia de uma constituição âmbito e o conteúdo de regulamentação da norma (ou normas) a aplicar (tÚttr-
entendida não só como espaço normativo aberto mas também como campo minação do âmbito normativo); (2) em ~gundo lugar, se a situação de facto,
neutro. onde o legislador iria introduzindo subtilmente alterações. Em segundo carecedora de ••decisão» -<legislativa, governamental ou jurisprudencial). não se
lugar, não é a mesma coisa considerar como parâmetro as norm:.tS hierar- eneontrar regulada no complexo normativo-constitucional, ele deve comple-
quicamente superiores 'da constituição ou as leis infraconstitucionais. Em terceiro mentar a lei constitucional p~ncbendo ou eolmatando as suas lacunas.
lugar, não deve afastat-se o perigo de a interpretação da constituição de acordo Uma lacuna nonnativo-constitucional só existe quando se verifica
com as leis ser uma interprttação inconstitucional quer.porque o sentido das leis uma incompktude contrária ao "planoB de ordenação ca"nstitucional. Dito por
passadas ganhou um significado completamente diferente na constituição, quer
3~ Cfr., por último, aIN. Diritti rA'fl'm""ri. Milono, 1992. pp. 18 51.

~ 01""0 ,,,,,.,ItHI,,.,,1 1106


I.'trrrtl"fdo. ",II<<trdo , <c.all!"f~'<I. DI"I •• c.",rl/c(lo •• 1 ~
1107
OUtr.Ispalavras: a In.cuna co,,!st£tuciona/autrfnmna. ~urge quando se constara a
ausblcia, no complexo normatiVQ<oosticucional, de uma ~ciplina jurídica, mas o
~todo mais frequente p2r.l a inregrac?o das lacunas de regu1a~
esta pode deduzir~se a partir do plano rcgularivo da constittição e da celeologia mentação abe<rta5é a .anqkJgia('" argumrntum a simik). A complementação das ~~
da regulamentação constitucional. A anterior noção de lacuna constitucional lacunas através da analogia traduz-se na transferência de uma regulamentação de /
autónoma permite-nos diferenciá-Ia: (l) das chamadas lacunas constitucionais cenas situações para OUtros casos merecedores de igualdade de tratamento jurí.
h~tmJnom4S, que- resultam do não cumprimento das ordens de legislar c das dico e que. apresentam uma coincidência axiológica significativa.
imposições constitucionais concretamente estabelecidas na constituição; (2) das
inugrafks correctilldS. fundamentadas na idcia de a T<''guiamenração constitu-
cional ser, sob o pOnto de vista polIcico, incompleta, errada õu carecida de G. .PcJl1d,'mrào de Bms
melhoramento. Ambas as hipóteses caem no domínio da «patologia constitu_
cionai,,: O) as lacunas heteJ"ónomas são inconstituCionais. porque significam a
violação de imposições constitucionais COnstantes da constituição; (ii) as As ideias de ponderaljio (Abwiigung) ou de balanceamento
integrações correctivas representam a usurp4fílo inconstituéional do poder consti~
(Balanring) surge em todo o lado onde haja necessidade de "encontrar o direito~
R

ruinte pelos concretizadorcs das normas constitucionais. para resolver "casos de tensão (Ossenbühl) entre bens juridicamente protegidos.
O méwdo da ponderaç2o de interesses ~ conhecido há muito tempo pela ciência
Antes de se proceder à complementação imegrativa da lei cons-
jurídica.. Nos últimos rempos, porem, a sua relevância tem sido sobretudo
titucional é necessário verificar se existe, na realidade, uma lacuna de regula~
reconhecida no direito constitucional e no direito do planeamento urbanístico.
mentação, e não «espaços jurídicos livres" (1?chtsfttie Rilume) ou «abertura»
Aqui inrercssar-nos-á a ponderação no direito constitucional.
(reenvio, remissão) para regulamentações infraconstitucionais. É que, como se
disse, a lacuna pressupõe necessariamente uma incompktude contrária ao plano
a) O relevo da ponderaçílo no direito constitucional
reguIativo constitucional, mas pode dar-se o caso de ser a própria constituição a
deixar intencionalmeme por regular certos domínios da realidade social ou a
A agitação metódica e teórica em tom? do método de balan-
remeter a sua disciplina normativa para o legislador (liberdade de confurmação ceamento ou ponderação no direito constitucional não é uma ~moda~ ou um
legislativa). Verifica~se aqui, com mais imensidade de que noutros domínios capricho dos cultores de direito constitucional. Várias razões existem para esta
jurídicos, a ideia de 4h~ e incompktude nonnativ4 intenCÜJnal para permitir viragem metodológica: (1) inexistência de uma ordenação abstracra de bens
, a luta política, a liberdade de conformação do legislador, a adaptação da constitucionais o que torna indispensável uma operação de bal.:mceamento desses
disciplina normativa à evolução da vida (realidade) constitucional. Dir-se-á que bens de modo a obter uma norma de dedsílo situativa, isto é, uma norma de
aqui a incompletude.é conforme o plano regulativo-constitucional enquanto nas decis~o adoptada às circunst:1ncias do caso; (2) fonn4t4fílo principi4! de muitas
lacunas ela é contra o mesmo plano.
das nC!rmas do direito constitucional (sobretúdo das normas consagradoras de
direitos fundamemais) o que implica, em caso de colisão, tarefas de
"concordância~, "balanceamemo", "pesagem\ "ponderação~ 1:fpicasdos modos
2. Os métodos da complementação constitucional
de. solução de conflitos entre prindpios (que não se reconduzem; como já se
frisou, a alternativas radicais ~e "tudo ou nada~); (3) fracmfa da unidade de
As lacunas que aqui são consideradas designam-se por lacunas de valores de uma comunidade que obriga a leituras várias dos conflitos de bens,
re~entação (&gelungr/ikkm, na terminologia. alemã) e abrangem dois impondo uma cuidadoSil análise dos bens em presença e uma fimdammt4fão
grupos distintos: (1) lacunas ao nível das normas (Normmlückm), quando um rigorosa do balanceamento efectuado para a solução dos conflitos.
determinado preceito constitucional é incompleto, tórnando-se necessária a sua
complementação a fim de poder ser aplicado; (2) ku:unas tk regu/dmentação b) lnterpraação epontkrafílo
(RLgelungr/ückm), quando não se trata da incompletude da norma mas de uma
determinada regulamentação em conjunto. Em muitas propostas metodológicas a ponderação é apenas um
elemento do procedimento da interpretação/aplicação de normas conaucente à

~ DI"". C'nSl".<I_.,,1
1108 1109 '.'"''''.''''' .pl/'ard. , ' •• ",f!ZQ,I. d. 01,,1,. C,•• 'I'.,I, •• I
.............................. .-.~..
.•
E
~
o•
~ ,
õ
<

.

~
,•
t

.

~
•,
•,,
,.

-----:-----------, ---

••
~

,•
~
é ddimitar o âmbito de protecção de uma norma constitucional, estabelecendo
uma espécie de linha de demarcação entre o que entra nes~e âmbito e o que fica privilegiado porque, prim4 fm:ie, se afigura com \-alor "reforçado" ou até absoluto.
de fora. :g o que a doutrina americana ~~igna por defJ?itional balancing Isto llr.tplica a verifiCação e ordt:rul.ção, em cada caso ou grupos de casos ;p?;
("balanceamento por definição~).e que no esquema métódico atrás referido específicos, de esquemas de prev:alência parciais ou rdativos. porque, nuns casos,
//
corresponde ao recorte do cham"ado "âmbiro normativo". A linha de d4initionttl a prev:alência pode pender para um lado e noutros para outro segundo as
balancing é seguida pela jurisprudência americana para. precisar a esfera de ponderações ou balanceamentos efecruados ad boc. Finalmente, é indispensável a
prorecção da norma c exduir ccrr-JS dimcnsõcs não rcclHral1tc.~nessa esfera: jllStifiCl1fiio e motivttfiio da regra de prevalenci:\ parcial assente na ponder:tçjo,

- não cabem na liberdade de manifistação 'rk pmsamenw cerros devendo ter-se em conta sobretudo os princfpios consritllclon:lis &\ igu:\ldad<.'.d:!
"componamentos ~xpressivos" mas estranhos à esrera de protecção como a ~pro- justiça, da segurança jurídica. Registe-se ainda a observância das regras constitu-
paganda subversiva", a "instigação", as manifestações sediciosas; as expsessões de cionais de compethzcia, pois o método de balancing não pode dissolver os esque-
"baixo valor" (fgw~valtuspeuh); . mas de competência constitucionalmente definidos.
- não entram na esfera de protecção da norma do habeas corpus o As "ponderações" subjacentes ao balanceamento ad hoc estio já
:LCOmp:mh~ento coactivo, não sendo necessária qualquer validação, por parte presentes noutros esquemas hetmenêuticos anteriormente referidos. É o caso, por
do juiz, a obrigação de comparecer perante a polícia de segurança, a obrigação de exemplo, da concordância prática e da observância do princípio da proporcio-
o empresário colaborar com os serviços de inspecção de trabalho, a obrigação de nalidade em sentido estrito. A importância que ultimamente é atribuída à
o falido se apresentar pessoalmente perante o juiz de falências; ponderação de bens constitucionais radica, como se disse! na natureza tenden-
- não entram na esfera de protccção do domicilio os teatros; cialmente principiai de muitas .normas jurídico-constitucionais. O apelo à
- não entram na liberdatle de circulação a faculdade de se negar a metódica de ponderação é, afinal, uma exig&lci~de soluçãojusta de conflitos I!ntre
exibir documentos, o direito a conduzir sem cimo de segurança ou o direito de prindpios. Neste sentido se pôde afirmar recentemente que a ponderação ou o
não pagamento de portagens. balandng atl hoc é a forma ca.racterística de aplicação do direito sempre que
Como se vê, o definirional balancing não é, em rigor, um mo4e10 de estejam em causa normas que revistam a natureza de principias 36. A dimensão de
ponderação, pois localiza-se ainda no procedimento interpretativo destinado a pontkrabilidade dos principias justifica a ponderação como método de solução de
determinar o âmbito de protecção de normas garantidoras de direitos e bens conflito de ptinclpios37,
constitucionais. Define, por via geral e abstracta, os "campos normativos".

g) A poTUÚraçM dos bem


R.efirindas bibliográficas

Quando é que, afinal, se impõe a ponderação ou o balanceamento 1. INTERTEX11JAI.IDADE


ad hoc para obter uma solução dos confliros de bens constitucionais? Os
pressupostos metódicos básicos são os seguintes. Em primeiro lugar, a existência, A teoria da interpretação-apUcação das normas constitucionais pressupõe o conhed-
pdo menos, de dois bens ou direiros reentrantes no âmbito de protecção de duas mento da hermenêutica jurídica dá.'lsica. Sugere-se, por isso, como leitura indispensável:
normas jusídicas que, tendo em conta as circunstâncias do caso, não podem ser
"realizadas" ou "optimizadas~ em todas as suas porencialidades. Concomitante- Andrade, Manuel de -Ensaio sobre 4 teoria da interpretação das leis, 2.' ed., Coim.
mente, pressupõe a inexistência de regras abstractas de prevalência, pois neste b".1963.
caso o conflito deve ser resolvido segundo o balanceamento abstracto feito pela He<:k, PhUipe -Interpretação das leis ejurisprudbu:ia de interesses, Coimbra, 1963.
norma constitucional (ex.; art. 38. 12/a da CRP que faz prevalecer os direitos dos
0

Machado, João Baptista '- Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador,


jornalistas sobre o poder de orientação da direcção da empresa jornalística). Coimbra, 1983, pp. 175 $S.
Excluem-se, por conseguinte, relações de preferência prima facie, pois nenhum
bem é, prima fade, quer excluído porque se afigura excessivamente débil, quer 16 ar. R. AuxY. RRh~ Vtml>>y'i.Dúktm. Fr.mkfun/M. 1995, p. 216.
37 ar. MlCUl'L NOGUE.lJlÀ OE BlUlU.5ob1'(0 l'odntk Rnisio, ci<., Il. p. 29.

~ D/r,Uo C.,"UN<lO.O/
1112 1113 I.ttrprno,do. opll<o,d. , , •• ",IIZQ'~' d. Oh<l,. C'.,lil.do.o/
Neves, Amônia Ca~!anheira - ..o actual problema metodológico da interpretação
jurídiez>,io Revista de Legislação ejurisprndência, Ano 117, pp. 129 ss, ;I~
-Metodologiajuridica, Co~mbra, 1993. /
2. INTERPRETAÇÃO, APUCAÇÃO E CONCRETIZAÇÃO DA CONSTI11JIÇÃO Título 2

Aragon, M. - «La imerpretadon de la constitudon y eI caracrerobjectivarlo dei control


juriSdidonaI-, REDC, 17 (1986). Metódica Constítudonal em Âmbitos Particulares
Barroso, L -InterpreftJção e Aplicação da Constituição, S. Paulo, 1996.
8erti, G. -Interpretazione costituzionaie, 2." ed., Padova, 1990..
Bio, R. - Diritti e Argomenti, Milano, 1992.
Bonavi1es, Paulo - Direito Constitucional, 7." ed., Rio de Janeiro, 1997, pp. 267 ss.
Bulas, U. L-Manual de Interpretação COnstitucional, S. Paulo, 1997.
-Mutação Constitucional, S. Paulo, 1997.
Chierchia, P. M. - L'Interpretazione sistematica de/la Costi.tu.zione, Padova, 1983.
Chryssogonos, K - Verfassungsgericbgtsbarkeit und Geset:zgebung.Zur Melhode der
Ver!assungsinterpretalion hei der Normenkontrolle, Berlio, 1987.
Coelho, Inocêncio -Interpretação Constitucional, Porto Alegre, 1997.
Freixes Sanjuan, T. - ~Una aproximadoo deI método de interpretacion constitudo-
nal", in Cuadenws de la Cmedra Fadrlque Furiá Ceriol, 4/1993.
Garcia, M. -La Interpretacion de la Constituci6n, Madrid, 1985.
Gonzalez Casanova - TeoriadeI EstadoY Derecho Constitucional, 3." ed., 1984, p. 225.
Hãberle, P. - Hermenêutica Constitucional. A sociedade aberta dos Intérpretes da
Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e procedimental da
Constituição, Porto Alegre, 1997.
. Hesse, Konrnd - Grundzüge des Verfassungsrecbszur Bundesrepublik DeuJsch/and,
dt., pp. 10 55. Vide as ideias fundamentais de K Hesse na selecção em língua espanhola,
Bcritosde Derecho Constitucional (trad. e prefádodeP. CruzVillaIon, Madrid, 1983, pp. 33 55).
Koch/Russman - juristische Bégründungslebre, München, 1982.
Müller, Friederich - jurlstische Merhodik, Berlin, 3.~ed., 1989.
-Struktun.erende Rechtslebre, Berlin, 1984.
Rubio Uorente, F. - "La interpretadon de la constitucion~, in La Forma deI Poder,
2.~00.,1997, pp. 573 S5.
Schneider, Hans.Peler - "Verfassungsinterpretation aus theoretischer Sicht", in P€SI-
schrift fur Konrad Hesse, Heidelberg, 1990, pp. 39 55.
~blewski, Jerzy - Constitución y teoria general de la interpretacfon juridica,
Madrid, 1985.

~ Dlr</u Ç~".llu<I,.~1 ",.


1114
1(,.
V"',"'" '" ... - - - -
Colección ({Estudios Constitucionales»

. ~ . '"'"

r'" ,I' li 7',:1' \


,
, I
:i ''
'.'; !I \

Konrad Hesse

CENTRO DE ESTUDIOS CONSTITUCIONALES


MADRID, 1983

2JJ
-- -- -- - --
, 21

I, Nccesidllod,significación y comelldo de la interprelaciúlI


constitucional.

49. I.a intcrpretacióll conslitucional. en cl sClltiLlo cs-


Irklo qlll: aqui illlcrcsa I, rL'.~lllla Ill'cc_~aria Y SI: plantca co.
1110problcma caLla VCL.4ul:!la dl.: ua!'sc rcspul.:sta;1 ulIa CIlC-S-
tión constitucional que la Constituci6n no permite resolver
de forma concluyente. AIIí donde no se suscitan dudas 110se
interpreta, y con frecuel.lda no hace falta interprctaci.ólI

De la bibliografia más recienle cabe destacar; E. FORSTHOFF. "Zuf


Problt:matik der Verrassungsauslegung» (1961); P. SCHNElDER y H.
EHMKE. HPrinzipien der Verrassungsinlerpretation», en "Verllffelllli.
chungen der Vereilligung der deulschen Slaalsrcchtslchrcr», 20 (1963),
págs. 1 y sS., 53 y sS.: F. MULLER, "Normslru\<;lur unJ Nurrnalivil:it.
Zum Verhalmis von Rechl und WirkJichkeil in der jurislischen lIerme.
neutik, enlwickelt an Fragen der Verfassungsinlerpretatioll" (1966); id ..
<duristische Methodikn (2.' ed .• 1976); M. KRIEl E, "Theorie der Redl\~.
gewillnung" (2,' ed., 1976); E, STE1N, "Juristische AuslcgullgslehrclI
und wissen5chartliche Melhodik", en ccRecht im Dicnsl des Fried<:us,
Festschrirt ror E. Menze!>. (1975), págs, J y S5.; E. W. BÓCKENFORDE.
«Die Melhoden der Verfassullg5interprelalion". Neue Jurisluche Wv"
r:henschrijt, 1976, pags. 2089 y n.; F. QSSENBÜHL, "Die Interpretation
dei Grundrechle in der Rechtsprc:chung des Bundesverfassung5gerichts»,
ibid, pâgs, 2100 y 55., asi como las colaboraciones de la obra colectiva;
<lProbleme der Verfassungsinterpretatlon)). ed. de R. DREIER y f.
SCHWEGMANN (1976), eoo mas referencias, pags. 329 y ss.; el VOIUIllClI
contienc también algunas de las obras anteriormente citadas; K. STERN.
«Das Staatsrecht der Bundcsrepublik Deutschland", I (1977), pags. 33 y
siguienles, 102 y 55.

J5
ggve.~.g ••••• o ••••••

~ •• __
--------------~-------~
alguna 2, No loda realización de normas constiluclonales es cometido dei Tribunal, así como para el proceso cOI1~tilu-
(cinlcrpretaci6fl». eu talllo que eu cI curso de la inlerprela- donal en su conjunto eI modo como se rcsuC'iva la proble-
ci6n consliluciona! la Conslituci6n resulla siempre (Iaclua- mática de la interprciáci6ú constitucional.
lizada»,
51. EI ('tJmelidode la interpreiadón cs c1de hall'll cl rc-
Ási, IIU c.~lôlrCllll)Salltc 1111 .~lIpuc,slu dl' illtcllHctadón, .•..
ullado l'tlll .•..
liludnnalmclltc ut:llI Il'cltlJ} a travt:.s de 1111pro ..
aUllquc si de «(actualizacióu», cuando se cUlllplc c1l.:ontcni- ccdilllicnlo raciunul y cmllrulahlc, cI 1"1IlHlulIll'lIlal'c.•.. lc 1('''
do de las normas constilucionales, sin que, posiblemente, sultado de modo igualmente racional y controlable, crean-
exista conciencia dei acto de ejecución: cuando se funda una do, de este modo, certeza y previsibilidad jurídicas, y no,
asociación, cuando se elige el Parlamento, cuando se dictan "ãCãsõ~ e:1de la simple decisión por la decisión.
!eyes, aclos administrativos o resoluciones judiciales, en ~
~ 52. Pues bien, este cometido se enCuentra, hoy por
cjercicio todo ello de competencias constitucionalmente hoy, menos atendido que nunca. Tanto en la jurisprudencia
delimitadas 3. Igualmente tampoco resulta necesario iriter- como en amplias sectores de la doctrina cientifica, lo mismo
pretar cuando las disposiciones constitucionales son termi- .!!.~_p.~l'.i!ixismoque ~igu~ siendo aeritico e. incluso, inconsé-
nantes, por más que aqui también se asista a un acto cuentemente practicado que los mismos esfuerzos emprendi.
-estructuralmente simple~ de ((comprensi60l) y, con cllo, dos para superar dicho positivismo por media dei recurso
de <dnterpretaci6m> en sentido amplio. acritico a «valores», han conducido a una crecientc illscguri-
50. Para el Derecho conslitucionalla imponancia de la dado La critica que ello ha suscitado se eneueotra justifi-
inlerprelación es fundamental pues, dado el carácler abieno cada 4. Ahora bieo, eo cuanto dicha crilica pretende respOll-
y atÍlplio de la COllslitución, los problemas de interprelaci6n sabilizar de esta inseguridad a la expansión dei melodo de
sürgen con mayôr frecuencia que eo otros sectores dei orde- las ciencias dei espíritu -que no se identifka en absoluto
namiento cuyas normas son más detalladas. Importancia con dicho pensamiento acritico de valores jerarquizados-,
que aumenta, si cabe, en un arden constitucional dotado de buscando la solución eo una vuelta a las Iradicionales regIas
unajurisdicción constilllcional de amplias proporciones, co- • i:leinterpretación, viene ã ignorar eI complejo problei-Jiã qu'e
mo lo es la de la Ley Fundamental. Si en virtud de la misma noy j)liiritea lã inferpretãCi6ii coristiiucionál .'5,
el.Tribunal Constitucional interpreta la Constituci6n con .•...._ .. - .
'
eficacia vinculante no s610 para eI ciudadano sino también
para los restantes órganos dei Estado, la idea que origina y 11. Las tradicionales regias de interpretación.
legitima esta vinculaci6n, que no es sino la.del sometimiento
de todo cl poder dei Estado a la Constiludón, s610 podrá I. Conienido.
hacerse realidad si las sentencias dei Tribunal expresan el
conlenido de la Conslilución, aunque sea en la interpreta- 53. La teoría tradicional de la interprelación persiguc"',
dón 'dei Tribunal. Aunque el Tribunal sea competente para por lo comÍln, revelar la voluntad (ohjctiva) de la norma () la
fija~ eSle conlenido coo. eficaciu, vinculante, no por ello se
eiieueilira por encima dc'l~ Constftución, ã la que debe su • Eu cspcdaJ lllunquc Sjll lUuar lil iUlcrprcl;l.:ioll de la I.cy Funda .
.éxi~~lIcia. Por e.~{~('s fllndanttnlãl para eI cmnplimicnlo dei mcnlal), W. WI:ISnll::m::L., «Redu und Elhik •• (19.'56); E. FORS'flIOFI',
"I)ic thnt>iJdung d(:l; Verr:usllngsgc~ellc5", eu "Fe~l~chrirl ti~r C.
l lJVerfGE 1,26) (264). . . Schmill" (1'>159),I'al:~.B y ~~.; 11. {jOI'lIlLCII, "WcrIUI<.lilllJlg "n,J
l Cfr., sin embargo.{a partir de tln concepto de imerpretaciôn más (irundgescll" (1973).
amplio), EHMKE (cit. n. 1), págs. 68 y ss. S A. HOLLERBACH, I.AuflOsung der rechlsstaatlichclI Verfas-
,ung1••, Archill des Offentlichen Rechts, 8.'5(1960), págs. 241 y 5S.
36
37
.,",
, <y
"" ••••••....•....... - .._- ----.----- ------------
• .-•
volunlad (subjetiva) dei legislador mediante el análisis dei
texlo,.de 5Uproceso de creación, de 5USconexiones sistemá. ,j.da interpretadón a partir deI texto de la norma (illlerpreta- ••
••
ticas. de SIlS antecedelltes, nsi como, finalmente, dei sentido "dón gramatical), de su cOllexión (interpretacióll
y la fillalidad (Ia IH•.llio»)y cl (deloS»))de li!.norma 6. A conti- sistcmática), dc su línalidad (intcrpreladóll telctllógica) y de
nuación, el conlenido de la norma asÍ obtenido -cs decir, he- ,~ll pru<:eso, de t:rcadón (intcrprctadólI hi.~lórica») 11, eu cl

••
eha abstracción dei problema concreto que se traia de !.:'ursode lo clIal estos elementos de inlerprcladóll se apoyan
dccidír- cs subsllmido CIl fOTUlade condllsióll .~il(Jghlica ai y complementan mutuameOle, por ejemplo, ai extracr t:OIl-
Supueslo vilal de cuya nOfmadón se traia, que queda asi re.
l c!lIsiones rcspccto dei sigllificadn literal o dt: la fillalid ••d de
suelto. Segün dicha teoria existiria interpretadón, e incluso
interpretadón constitucional", por principio, CfI la sim pIe
ejecuci6n de una voluntad preexistente (objetiva o subjeti.
I la norma a partir de su concxi6n sistemática o de Sll pruceso
de creación.
••
,I ••
va) que pllede ser alcanzada coo certidumbre objetiva a tra-
vés de esos métodos y con indepcndendá dei problema a re-
2. Dijicllltades.
solver. ,
5sl Sin embargo, ya uo somero análisis revela cuanto
54. ' £1 Tribunal Constitucional Federal también ha
adoptado expresamente esta doctrina, EI Tribunal, en efec-
to, opta, aunque no claramente, por la «leoria objeliva»
de problemático tiene esta teoria.
56. EI objetivo de la interprelación s610 relativamente
puede consistif eo el descubrimiento de una «vOIUnlad», ob-
••
de la interpretación: «Fundamental para interpretar un pre-
cepto legal es la voluntad objetiva dei legislador manirestada
a través de dicho precepto y tal como se deduce dei texto y
jetiva o subjetiva, preexistente eo la Constitución. Dejando
aparte lo discutible de los rundamentos de dkha tesis (que ••
••
dei contexto de la disposición legal: No es, por el contrario, en último término se apoya eo el dogma de la voluotad ela-
rundamentalla idea subjetiva de los órganos que participan borado por la pandectística dei sigla XIX y aduplado por la
en el proceso legislativo, o determinados de sus miembros, coetáne~ ciencia dei Derecho Político que, por si solo, 110se

••
atert,1 dcl,~igllirklld(J de 1;1di,~po,~jdón. I~IprOl,:esnde t:rell- basta ya para una comprensión de la COlIstitllcióo
ción de UIl pret:epto sólo adquiere rclcvallda interpretativa llllldcrlw), COl1l0PlIlllo de partida illlplica!lll ctll'lIhrilllicnto
en la medida en que venga a confirmar la corrección de la in- de la situar.:ióll aUléntica. Pues eulus supucstos Clllu,\ que la
Constitución no cootiene un criterio inequívoco, lo que
terpretación realizada según los principias referidos, o bien



en la medida en que sol venta dud,as que no pueden ser elimi- equivale a dccir en todos los supueslos de illterprctuciólI
nadas sobre la sola base dei procedimiento indicado» 7. A constitucional, propiamente ni la Constitución ni el consti-
este objetivo interpretativo sirven, en palabras dei Tribunal, tuyente han tomado una decisión, habíéndose limitado a
proporcionar una serie más o menos numerosa, pera incolll-
pleta, de puntos de apoyo de aquélla. AIIí donde no se ha
~ Vn, IlIlCS,lIuh aUIIde In~.~lel11enl(l~ue la illlcrprelaci6n de la ley querido nada de modo inequívoco, resulta imposible desell-

=
formulados por SavigllY -"c1âsko,~,;, ~CKtln !,OKSTIlOFF brir Ulla volulltad nuléntica sino Indo lo más una \'olulltad
lccUmbildung», dr. 11. 4, pllg. ]6; «Zur I'roblcrnalik der VcrfassungsauS_
legung», dI, n. I, pág, ]9)-: cJ gram:uicnl, cllógico, eI hiS(6rico y el ~is. supucsla () Iktida, y •• este rcspct:to tampueo sirvc para sa-
temático: cfr. sobre elto HOLLERBÂClI (dI. n. 5), pâg. 258. .:arnos dei apuro cualesquiera recursos semânticos como,
7 BV~rfGE 1,299 (]t2); confirmado cn BVerrGE 6, 55 (75); 6, 389 por ejemplo, el de la «obediencia reflexiva» dei intérprete.
(4]1); 10,234 (244); 11. 126 (130); 33, 265 (294); ]5, 263 (278); cfr., asi-
lIlisrno, BVerrGE 24, I (15); -36,342 (367): 41, 291 (3(9).
. ~ BVcrfGE li, 126 (130); 'fr. ilshllismo BVcrfUE ~s,:16) (2711y ,,~.)
38
39
n
:
~-
.....,._-------
Identificar como (<objetivo» de la interpretaci6n constitu- como cIlimite último de la interpretaci6n 10;CIlotros casos
cional el descubrimiento de la previa voluntad objetiva de la remi te a lm segundo plano el texto de ulla normu çuando asi
Constitución o dei consiituyenle equivale a pretender dar lo exige una aplicaci6n lógica de la Icy li o CU3m!oello res-
cumplimiento' a algo que no preexiste realmente Y. por lo ponde mejor a una dccisión constitucionalmente relativa a
tanto, a equivocarse desde el mismo punto de partida res- los valores» 12y en el caso KEHL ha interpreta<-lo los artÍl:u-
pecto de la problemática de la interpretaci6n constitucional. los 32 y 39 de la Ley Fundamental aparlándose de su texto
En raz60 de su objeto;'s610 con reservas cabe admitir que la J. «eElbase a una aplicación y desarrollo lógkos de los princi-
interpretación sea ejecuci6n-y. desde lucgo. nunca que sea pias de la Ley Fundamentah) -13.ai equiparar a los «(Estados
subsunci6n. Antes bien, deberá partir dei hedlo de que Sll eXlranjeroS))" ((SujelOs <-lei[)eredJ() inlcrlI<lcioml! sil11iI<lICS
«(Qbjetivm> no existe aun realmente. a los Estados»). En cierlos casos. y aparlándosc de SIISpro-
57. Tampoco los distintos «métodos» c/e lu illterpn'to- pios principios,-el Tribunal ha utilizado cl origen histórko
('iólI tumados uno por UllO ofrl'cell oril'lItaciún sLlfh:icllte. dei prccl'ptu l.IUlHIeI ;1I~lIl1lell,lil{lel'i.~iv{l.y III} Silllpkllll'lllC
Es frecuente que eltexto no diga aun nada que sea inequivo- para dl'spcjar ;llgUII:JSdudas, sill ofrccer mayur cxplil'a-
co acerca dei significado de la palabra, conlo que se plantea d6n 14, Ha ido más aliá de,",canoll de los lllétod{)~ de illter-
eI problema de cómo determinar este signiricado: si con prctaci6n considcrados vinculuntes.cuando, por cjemplo, ha
arreglo allenguaje usual, o allenguaje jurídico especializa- recurrido a sucesos situados bastante más atras dc lo que cs
do, o bien segun la funci60 que en cada caso asuma el con. cl inmediato origclI histórico dei precepto 15. E[ Tribunal,
cepto 9. La «interpretaci6n sistemática» puede ser manejada finalmente. ha abandonado el terreno de la inlerpreladón
de diferente modo, seguo que lo que se lenga cn cucnta sea tradicional ai considerar como determinantes para la intcr-
ellugar de la ley donde se inserte el precepto, o bien Sll cone- preladón principias de tipo juridico-fundonal o juridico-
xi6n material. La (interpretaci6n teleológica» es práctica- material (por ejemplo", la distribución de funciones elllre los
mente una carta blanca, pues con la regia de que hay que . poderes legislativo y judicial 16 o el principio de la uniJad de
plantearse el sentido de un precepto no se avanza nada res- la Conslitución 17) así.como aI considerar relevallte para la
pecto de la pregunta fundamental. Ia de cómo descubrir di- determinaciân dei contenido de la norma las circul1stancias
.~
cho sentido. Finalmente, lampoco es clara la relación de los
distintos métodos entre si. Queda por decidir cuál de aqué-
lIos haya que seguir en cada caso. o a cuál de los mismos de. lI> P.'e. BVerfGE 8,38 (41). .
ba darse preferencia, en particular cuando conducen a resul- 11 BVerfGE 9, 89 (104 y ss.); 13, 261 (268): 1"4; 2.60(262); 22, 28 (37);
tados diferentes. 35, 263 (278 'I ~s,). .
58. Las dificultades sefialadas tienen necesariamente I~ BVerfGE 8, 210 (221).

.que agravarse a la vista de una practica de la interpretación lJ BVerfGE 2, 347 (374 'I ss.): 'Ir. 'Ia BVerfGE I, 351 (366'1 S5.).
I~ P. e. BVe-rfGE 2, 266 (276); 4, 299.(304 'I ss,). Cfr. a.~imislllo
constitucional que eoo frecuencia se aleja notablemente de
. nVcrf(iE 33, 125 (153 y ss.),
las regias de interpretaci6n reconocidas por ella mi,~llla. I' 1'. e. nVcrf{iE 12, 2Cl5 {2.l0 y ~~,).
As!. en algunas de sus sentencias, cl Tribunal Constitu- lO' 1'. c. HVnfm, 4, 21'J {233 y ss.l: I. 'J7 (HKI y s.s.); 1, 11) (22-1 Y
cional Federal ha considerado el texto ~e una disposici6n siguic-nles); 4, 31 (40); lO, 211(40). Si hiclI los lllllilCS aquI tratadus son ill-
seguros y variables: (jr., de IIlI lado, UVcrfGE 7, 377 (411 Y ss.); de Olro
9 Asi, por ejemplo. en la diferente imerprelaci6n dei conceplo «or- tado, BVerfGE lO, JS4 (370 y 55.).
den constituciomih. por pane dei Tribunal Constitucional Federal según U 1'. e, BVerfGE 3, 225 (231); 28, 243 (261); 34, !l,S {IR3) COllmás
la funci6n asumida por dicho conceplo (BVerfGE 6, 321381). rcferencias.

40 4'

2'~
---- -- - - - - - - • ••
pulitka~, ~odulógkas c hbt6,iL"<ts IMy las l;Ullsidcl"ildOlk\
que !icnen que ver con la adecuación del resultado 19a la si.
c11t) \lU cs Sillljllc ca:;llillidad ~ill<l 11Il'cil;illlll'11IC l'.\lll\'~il'lll
cpnsecuencia de esta reaUdad. Por lo mislIIo. tauto lilás lIe-
y
••
••
tuadón a reglar; aqui la formadón dei juicio dei Tribunal cesarin resultarâ scr conscienle de li, propia conducta, no
apenas tlellc nada que vcr con aquellas regias de interprela- postulando lIn procedimiento de fOTllmción dei juido lIue
dón 20, lo que resulta cnteramellle aplicable a su praxis re- . no sea posible respetar, sino atendiendo a las condiciones
ciente donde el análisis cuidadoso y profundo de la realidad

••
reales, a las posibilidades y Iímites de la interpretación cons-
desempena con toda razón un papel dedsivo. titucional.
59. Por tauto, las «regias' tradicionales dc interpreta-
dón) que el Tribunal Constitucional Federal expresamente
reconoce, sólo ofrecen una explicadón pardal acerca
deI modo y manera como el Tribunal construye sus senten.
111. I.a irilerprelación constitucional como concrctiz:u:iill1.
••
cias. Si en lugar de aquéllas lo que aparece es una multitud
de consideraciones variadas. de modo que sólo de forma im-
perfecta resulta posible recolloccr principio's seguros relati-
60. La interpretación constitucional es «collcrctiza-
cióm) (Konkretisierung). Precisamente lo que no aparece de
fOflll<.lclara COnlOcOlltcnklo de [a Constilución e.~lo que dc- ••
••
vos a la utilizadón de estas consideraciones. Ia razóo no es- be ser determinado mediante la incorporación de la «reali-
triba en una falta de corrección juridica -por más que algu- dad» de cuya ordenación se trata (supra, n. 045 YliS.). En es-
nas senlencias dei Tribunal Constitllcionu\ Federal puedan te sentido la interpretadón constitucional tiene carácler
ser merecedoras de critica- sino en eJ reiterado fracaso de creativo: el contenido de la norma intcrprctuda 5610 queda
dichas regias. Reslringirse a las «regias tradicionales de in-
lerprClaci6n») supone dcsconocer la finalidad de la inlerpre-
completo con su interpretación 21; ahora bien, sólo en ese
sentido posee caráeter creativo: la actividad interpretativa ••
••
tadón constitucional; supone en buena mc'dida desconocer queda vinculada a la norma 22.
la estructura interna y los condicionamientos dei proceso in-
lerpretalivo, por lo que sólo de forma imperfecta cs capaz

••
de resolver la tarea de una interpretación correcla según 1. Condiciones de la interpretación constitucional.
principias seguros. Si. frente a esas regIas, la praxis se orien-
ta a una interprelaci6n vinculada ai objeto y ai problema, 61. La cOllcretización presupone la ((colllprensiólI>l dei
,
••
contenido de la norma a «concretizar». La cual no cabe des-
11' 1'. t. DVcrfGE I, .144 (148 Y sS.): I, ZOM(247 y ss.); 3, 58 (95); 3, vincular ni de la «precomprensión» dei intérprete ni dei pro-
ZHH (3UIJ; 5, 115(\2') y ~_~.);7, 377 (397): '), JOS (323 Y sS.); 45, 187 (229 y blema concreto a resolver.
sigllicnlcs); 52, I (29 Y S.I.). Lo rnismo se diga coando cI Tribunal recOnocc la
posibilitlad de! c,unhlu dc ~iKniri<:"dón de UHH11\1f1111l; [1. l'. IIVerfljE 2, JHU 11 A(luí se cl1eueulnl,'pnr cncil1lH L1eenaksquiera diferencias Cll lus
(4lJl):~, 4117(0122); 7,.HZ (J;'il).
lllHllleamil:lIlns y •.n Ius lIIéluu"S tI.. IIHhllju ,.k 1;1mml,'llla !,,'rllll'llêlllica
I~ 1'. e. llVclUjl' I, 2UH(23'JJ: I, 2/,-\ (275): 4, .122 (J!1I y ~~.); (" JU') d" IH) d,,"cias dei eSI'!rilll y de lu "Sl'ccilicamclllc jurldicH, lu 'lU" IllIy.le
(35Z): 12,45 (56); 21, 2m (217 Y SS.). eomim a ambas. Cfr. 1-1.U. (iAlJAt-.WII.,«Wi.hrhcil llud M•.llwde» 12.'
111c:rr. asill1ismu. p. c. nVcrfGE 3, 5My ss. '1115Y.IS.) --1,1 cuesllólI su- cu., 1%5), pág5. 307, 312 Y 55., 315. En gcnerat aCerca dei caracter pro-
metida a la dCl.:bi6n dei Tribunal il(Crca de la exi.\lcllcia UCuna viulaciólI dU(livo de la interpretaci6n jurldica: J. ESSER, "Grunusatz und Norm ill
de deredlOs fundamelllales no cs suscitada hasta ta.~paginas IJ5 Y SS.-i der richlerlichen Fortbitdung dcs "rivat5rcchts» (2 .• cu., 19M), pâ-
BVerfGE 6, 32 (35 Y 55.); 6, 309 (B9 Y5S.). Ellerreno de la interprelación ginas 250 y S5.
de los preceptos de la Ley Fundamental queda aband'mado, p. t., en li Una valoraci6n crilica de lo que 5igue; BÓCKENFÓRDE (cif. n. I), ~
BVerfGE 25, 352 (358 Y 55.). págs. 2095 y 55., 2097 Y ss.

42 43

'l~
'" ••••............ -.-----------~-----------------

62. a) .EI interprete no pucde captar el contenido de la comprensible. No existe interpretad6tl constitucional des-
norma desde uu punlo çuasi arquimédico situado fuera de la vinculada de los problemas concretos.
exislencia histórica sino únicarnente desde la concrela situa- 65. También la captación dei problema presupune llll
ci6n histórica co la que se encucntra, cuya plasmación ha «comprendep); por eso también se halla en situaci6n de de-
conformado 5UShábitos menlalcs, condicionando su:; COIIO- pendencia de la pre-comprellsión dei inlérprele, que a Sll vez
cimienlos y 5USpre-juicios. EI intérprete comprende el cantc- necesita una fundamentaci6n tcórico.cotlstituciona1. Con
nido de la norma a partir de una pre.comprensión que es la ello, la Teoria de la Constitución deviene condición tanto de
que va a permilirle contemplar la norma desde ciertas expec- la comprensión de la norma como de la dei problema.
tativas, hacerse una idea dei conjunto y' perfilar un primer
proyeclo necesitado aún de comprobaci6n, corrección y rc- 2. £1 proc.eso de concrelización d? las normas consli-
visión a través de un análisis más profundo, hasta que, co- tucionales.
mo resultado de la progresiva aproximación a la «cosa~) por
parI e de los proyecto.ç ell cada caso revi~mdos, la unidad de 66. I.a depcndencia CII quc se cllcLlentra la intcrprcla-
sentido queda claramente fijada 23. d6u de la norma de cuya concretizadón se traIa respcetu de
63. Dada esta presencia dei pre.juido en toda com. la precomprensi6n dei intérprete .y respecto dei problema
prensi6n, se traia de no Iimilarse a ejecufar las ((3ntidpado- com:reto que en cada caso se traia de resolver SlIpOlle, ror.
nes») de la pre-comprensi6n, siendo por el contrario cons. ruulado .negativamente, que no puede haber UHmélodu de
dcnll' de la~ mismas y l'xplidndolas, rcspondiclldo asi ai interprelaci6n aut6nomo, desvinculado de eslos raclores y,
primcl mandato de Imla illll:lpITladóll: l'\'ilõli la õllhilrõllil' f(II'I1I11ladopn.~iliv:IIIICllll','IIIl' d prncc.~o de cotlCl'cli"adón
daiJ de las ocurrellcias, prestaniJo atcndÓll a Idas cusas mis- dt:ill' vCltit ddcllllilladll 11()1.d 1,I,jctll ,!t- la illtl'lllll'la\.iúll
mas». La larea asi planleada de la fundamentación de la -la C;onstitucióll- y por eI problema Çll cucslión.
prc-comprensi611 es, anil' todo, una tarea de leoria constitu- . 67. Si la COllstitución, como se lia podido ver, 110COIl-
cional, cuya formulación, sin embargo, no lendrá lugar ad -tiene un sislema cerrado y unilario (ya sea éste lógico.axio~
• mático o de jerarquia de valores) y si la interpretación de sus
Iibitllln siempre que se vea confirmada y corregida por la
praxis dei supuesto concreto en un continuo intercambio. normas no puede ser simpie ejecución de algo preexistente,
64. b) S610 conceptualmente. no en el proceso real, la misma hará necesario un procedimiento de concretizadón
cabe distinguir esta condición de la interpretadón constitu- que responda a esta siluaci6n: A Iravés de una actuaci6n
cional de la segunda: «Comprender)) y, con ello, «concreti- ~ (<tópica» orientada y limitada por la norma (lo que es.tanto
zan) s610 es posiblc COI1respeclo a un prolJlema cOl/crelO. como decir vinculada por la norma 24) habrán de encontrar-
EI intérprete {iene que poner en relación con dicho problema
la norma que pretende entender, si quiere determinar su !4 En esta estribai ••diferencia esencial frente a la tópica "pura» (cjr.
cantcnido conecto aqui y ahora. Esta delerminaci6n, asi co. lambien infra 3). Sobre esto, Th. VIEHWEG, IITopik und Jurisprudenzll
mo la (laplicaci6nll de la norma ai caso concreto, eonstilu- (5.' cd., 1974), Irad. cspai\ola, «Tópil.:a y Jurisprudencia", de L. DIEZ.
yen un proceso único y no la aplicad6n sucesiva a un deter. I'ICAZO y prólogo de E. GARCIA DE ENTERKI~. Madrid, 1964 (N. dei
T.); R. BAUMLlN, I,Staat, Recht und Geschiehte •• (1961), pâgs. 27 y ss.;
minado'supuesto de algo preexistente, general, en si mismo W. HENNIS, ,(PoliÍik und praktische Philosophie" (1963), pags. 89 y ss.;
MÜLLER (cito n . .I) I.Normstruktur ulld 'NormativiUit>l, pagi-
B Sobre eslO (y lo que sigue) GADAMER (eit. n. 21), pags. 250 y sS.; nas 56 y S5.; id. "Juristische Methodik», pags. TI y SS.; KRIELE(cil. n. I),
MÜLLER (cil. n. I) «Normstruklur und Normativitlih), pags. 49 y ss.; págs. It4 Y 55.; G. OTTE, (IZwanzig' Jahre Topik-Diskussioll: crtrag und
(duristische Methodikll, pags. 133 y 55. . Aufgabel), en Rechlslheorie, I (1970), pags. 183,Y S5.

44 45

)1p
I se y probarse puntos de vista que, procurados por via de la
inventio, seao sometidos a~juego de las opiniones co favor y
sulta aliviada, usualmente, por decisiones previas de casos
similares, asi como, en conexi6n con ello, por la dogmática
i•
••
co contra y fundamentar la dccisi6n de la maneta más c1ari- dei Derecho constitucional. Tanto las unas como la atra
ficadora y convincente posible (topai). Sicmprc que eslas proporciollun una base mas o menos segura, ulIllque no nor~
puntos de vista contcngan premisas objetivamente adecua- mativamenle vinculantc, a lo que Se admite como COlllprell'

••
da,~ y fecundas apnrlarÍln cOll.~cctlclll:i:lstjue IIcvclI n la .~nlll- siú!1 ((l'lllTt'l'llH)dellexln.
dOIl dei problema o que, almcllus. CUOPCfCll adio. En c.~lc (1). b) Normalmente la ~ula illh:l'IlIc!w.:iún dei lexlu
sentido, no queda a la discreción dei intérprete los topai que no proporciona una concretizaci6n suficientemente exacta
deba tracr a coladán de entre la multiplicidad de los puntas

••
dei mismo. Se hace preciso acudir enlances a los datas apor.
de vista. De un lado, el intérprete s610 puede utilizar cuia la. lados por el ((ámbilo normativo» en relación con cl proble.
bar de concretizadón aquelJos puntos de vista que se eo- ma en cueslión: Puesta que lo que las normas de la Consti-
cucnltao relacionados cao el problema; la vinculadón ai
problema exduye topoi extrai\os a la cucslión. De otro lado,
se halla obligado a la il1clusi6n en su «programa normativo)
y en su (lãmbito normativo) (cfr. supra n. o 46) de los ele-
tución persiguen es la ordenación de la realidad de las situa-
ciolles vilales concrelas, habrá que aprehendcr <licita rcali-
dao en los términos man:ados eu el programa normativo, Clt ••
••
su forma y carácter materialmente -y COIlfrecuencia Iam.
. memos de concretizaci6n que le proporciona la norma cons- bién jurídicamenle- delerminados (ver lo.~ ejemplos dei
titucional misma asi como de las direclrices que la Constitu. n,o 45). Esta forma de acluar no sólo proporciona elemen.
ción contiene en orden a la aplicaci6n, coordinaci6n y valo- los adicionales de concretizacíón y una fundamelllación ra-
ración de dichos elementos en e[ curso de la solución dei
prohlclll<l.
68. a) Puesto que cl ((programa Ilormativo» se halla
cional y controlable 27, sino que, además, garantiza (dentro
de los limile~ de la in(erpn:tación constitucional, l/r. SU, ••
••
prll 3) en buena parte la adecuada solucióll dei problema;
contenido bãsicamente en eI texto de la norma a concretar, supone pues lo contrario de ese <<Ilormativismo» unilateral y
deberá ser aprehendido mediante la interpretación de dicho ciego frecuentemente reprochado a los juristas. En parlicu.
texto eu lo que se reliere a su significaci6n vinculante para la

••
lar y finalmcnte, posibilita, en los frecuenles casos (;:n los
_solución dei problema. Aqui encuentran su sitio los «méto- que de lo que se trata es de la relaci6n entre varias Ilormas
dos» de interpretación tradidonales: la interpre(ad6n Iite. (asi en la delimilación de dcrechos fundamenlales), una so-
ral, histórica, original y sistemática permiten la elaboradón

••
lución sobre la base de la coordinaôón objetiva de las res-
de elementos de concretizadón, pudiendo en efeclo dichos pectivas relaciones o ámbitos vitales y una exposición de los
puntos de vista históricos, originales y sistemáticos ayudar a puntos de vista objetivos que sustentan esta coordinacíón;
precisar posibles variantes de sentido en eI espacio delimita. en este sentido posee un caracter sistemático que va más aliá
do por eltexto 25; en cuanlo ai punia de visla «leleoI6gicQ»,
si bien éste puede orientar la cueslión en una determinada
dirección, por si solo no proporciona una respuesta suficien-
dei punto de vista sistemático correspondiente a la interpre-
laci6n dei texto de la norma, si bien se halla en e~lrccha rcla-
d6n con el mismo.
••
te porque el «sentido y finalidad)) dei precepto s610 pueden
ser precisados de forma indiscutida cuanda pueden ser con-
firmados con ayuda de los atros elementos 26. Esta labor re-
70. c) A los principios de la interprelacián COllstitucio-
nal les corresponde la misión de orientar y encauzar el pro-
ceso de relad6n, coordinadón y valoraci6n de los Plllltos de
••
II MOU.EK, "Jurislischc Mclhm.lik» (dt. 11. I), pág. 161. u Ibid., págs. 92 y ss. Subre la signil1cadón que lIe eMc mudu ad.
l6 Ibid., pAgo 163. l.l.uierc cJ análisis de las conseeuc:udlls. ibid. pâgs. 194 y ss.

46 47

:
<~if

•• ,
------------------------i --------------------- ..
vista. o consideraciones que deben !levar a la solución dei
problema. unidad de la Constitúción exige una labor de ({optimadólHf:
71. a') Así tenemos, cn primer lugar, el principio de se hace preciso establecer los límites de ambos bienes a nn
de
la IIl1idac/ de la ('~JII.'iIiIUción. La relación c intcrdepcndencia que ambos alcancen una efectividad óptima. La fijadón de
existentes entre los distintos elementos de la COllstitllción lill}itcs dcbe responder Ctlcada cuso concreto ai principio dc
(supra Il." 20) obligan a no contemplar en ningún caso sólo propOl:cionalidad; no debe ir más aliá de lo que venga exigi-
la norma aislada sino siempre además en el conjunto en el do por la realización de la concordancia enlre ambos bienes
que dcbc ser situada; todas las normas conslitlldullalc.~ hall juridicos. «Propordollalidad) J2 signifkll eu este conlcil:lo
de ser interpretadas de tal manera que se evilen conlradic~ ulla rclllcioll cntrc dos magnituJes variables, l:Oncrellllllcllle
ciones con otras normas constitucionales. La única solución aquella que mejor responda a dicha tarea de optimación, 110
dei problema cohcrcnte con este principio cs la que se CII~ pues una relación entre un ((objctivQ)) constante y ltllO() llIá~
cllcnlre en consonancia con las decisiones basicas de la Cons~ lClIledioSf)v,lI'iahlc"~.La lIIislll:'1queda cima. !ll)r cjcllIplo, ell
titudón 2ft y evite su Iilllilm:ióll unilateral a ,L~peclo.~par- cI (equívol',lI11ente Il.~i lIallllldo) 11efcl:to reL"Íproco» {'lIln:
ciales 2'1. libertad de c.'<presión y cl objetivo gCIll'fal limitador uel ar-
72. b') En intima relación COI1el alllerior se encuen- ticulo S." de la Ley Fundamental 33: de lo quc se trata cs uc
tra eI principio de la concordanda práclica 30; los bicnes ju- la concordancia práetica, por media de una coordinad6n
rídicos constitucionalmente protegidos dcben ser coordina- «proporciona!l), entre la Iibeflad de expresión de Ull lado y
dos de tal modo en la solución dei problema que lodos eUos los bienes juridicos protegidos por las «Ieyes generales») de
conserven su entidad. AIIí donde se produzcall colisiones no otro. Acerca de lo que sea proporcional en cada caso el prin-
se debe, a través de una precipitada ((ponderación de bie- cipio no dice nada; sin embargo, en tanto que critcrio orien-
nes) o incluso ílbstracta «ponderación de valores)), realizar lador contenido en la Constituci6n y por lo mismo viuculan-
el uno a costa deI olro 31. Por el contrario, el principio de la te, indica la dirección y determina el único proccdillliento a
través deI cual debe buscarse una SOlllciólI constitucional.
21 P. e. BVerfGE I, 14 (32): 19, 206 (220); 30. I (19); 34, 165 (183).
l'I Sobre e5Co. delal1.1damellle EIIM"E (di. 11. 11. págs. 77 y ss. La ((ponderación de bienes)) carece de UIlcri teria orienfador
", Suhrlly,nl" I'ur l J. S( .111:t 1Nl!K <:<>lll<l
principio illll'llll <:1"I iV<llk 1,1 dc este tipo en lo que se rericn: a sus vllloradollcs; IlOcs só lo
«armonilacioll>', c,VerolfclIllidlUlIgcll der Vercinigung der dcul~c11en que Ic falta una basc de apoyll .~ill(lque .~ecllellcnl ra siclllpre
Staalsreehtslehrer,) 20 (1963), pág. 125 Y22 (1965), pág. 53 Y P. LERCHE. en pcligro de sacrificar la unidad dc la COtlstilucióll. Lo mis-
l,Übermass und Verfassung5rechl>' (I9fil), en especial págs. 125 y sS.,
quito <!eslal"a la ,ddea det equilibriu de máxinm respeto e11ambas direc.
mo se diga cuando la relación entre las garanlias y las limita-
dones». danes constitucionales de la libertad se delermina co base 11
li Resulta por completo inadmisible otorgar prevalencia a «bienes una presllllôón de partida ell jal'or de la liberlad (in d/lbio
superiores de la comunidad.) no prolegidos constitucionalmente -cuya pro Iiberlale), no siendo por ello posible contemplar en esta
presencia cabe siempre afirmar disçrecionalmente_ prescindiendo no so- presunción un principi.o de interpretación constilucional 34.
lo de ta unidad de la COllslitucion sino de la Conslilucion misma. En la
medida en que las valoraçiones de una «ponderación de bieneSll (Gü(erob- 73. c') Un principio de la interpretación constitucio-
wilgung) vengan determinadas 11exciusivamente a partir de la Conslilu- nal es el criterio de la correcciólI fimcional. Si la COllstitu-
don» (P. HÃBERLE. 11Die Wesensgehaltsgarantie des Ar!. 19. Abs. 2
Grundgesetz. 2.' ed., 1972, pág. 32), un principio de "pondcración de bico J2 Sobre eSle conceplo, c/r. lERCHE (cil. lJ. 30), pág5. 19 y 5S.
nes), asi enlendido se aproxima ai principio de la cOllcordancia práctica. )1 BVerfGE 7, 19B (20B y 55.).
Una introducción.al principiO de la 1cponderación de biene5>1: MÜLLER,
l~ P. e. P. SCHNElDER. 11hl dubio pro Ilbenalel). C1I1cHundcrt l"h-
(cNormstruktur und Normalivil.iU •• (di. n. 1). págs. 207 y 55.
re deutsehes Rechlsleben. Feslschrift zum hundertjll.hrigen BeSlehell 1.1.;5
Deutschen lurislcntagesu. 11 (1960), págs. 263 )' 55.
48
49

LB
~------- •••
prensión lógica dellexto de la norma o donde una determi.
nada solución se encontrase eo dara contradicción coo el
••
••
prensión dei texto delimitan eI campo de 5USposibilidades
texto de la norma, A este respecto puede haber disposiciones tópicas. De ahl que el método lópico sólo pueda jugar un
vinculantes conlenidas eo el Derecho constitucional no es- papel limitado en el marco de la intcrpretación constitu-
crito. Ahora bieo, puesla que el Derecho no escrito no pue-

••
cional; tanto más cuanto que eJ Derecho constitucional co~
de hallarsç' eo conlradicción coo la cons/i/u/;o Scripla (vid. mo Derecho fundamentador dei orden global y concebido
supra n. o 34), esta última se convierte eo limite infranquea. como orden de convi vencia no debe ser comprendido pun~
bie de la ilHerpretacióJI constitucional 39. La existencia de
este limite es presupuestQ de la función racionaJizadora, es-
tabilizadora y jimi!adora dei poder que le corresponde a la
COllslilució" (\lid. supra n." 31). Dicha funcióll admite la
lualmc/lte, a partir de un problema aislado, como pueda
ocurrir eo el Derecho privado, ai que la moderna teoria de la
inlerpretación debe la recuperación dei pensamiento tópico. ••
posibilidad de UII cambio cllnstilucio/laJ (Verjas.fIIngswun_
de/) por media de la inlcrprelación; pera excluye el quebran~
lamienlo constirucional (Verfassungsdurchhrechung) -des- IV. I.a IlIltrjlreludón t"onfurflll' u lu ('ulI .••
rJfud,,".
••
viación deI texto "en un caso concrelo-.- y la r'eforma de la
Conslitución por .medio de la interpretación. AlIi donde el
interprete se impone a la Constitución deja de interpn;tarla
79. La reciellte evolución dei Derecho consliludonal
ha asistido a la aparición de un principio interpretativo que. ••
para cambiaria o quebrantaria. Cualquiera de las dos con.
. duetas le están vedadas por el Derecho vigenle. Incluso
euan.do un problema no pueda reso/verse adeeuadamente
si bien no presupone la exislencia de una jurisdicción consti-
tuciona!', si debe, sin embargo, su formación y conforma-
ción práclicas a la implantación de la justicia constitucional ••
por media de la eoncretización, el juez, Que se halla someli-
"do a la COlls!ilución. no puede elegir Jibremente los lopoi 40.
78. De aqui se derivan los limites que en el Derecho
en la Ley Fundamental: el principio de la inlerpretaci6n
conforme a la Constituci6n 42. En la juri5prudencia deI T ri-
bunal Constitucional Federal este principio ha alcanzado
••
constitucional se imponen ai pensamiento tópico. Este parte
de la primacía dei problema 41, examinando e/texto dei pre-
ceplo en ef marco de topoi básicamenre intercambiabJes y
importancia creciente y. si bien no se encucntra lotalmente
perfilado cn lo que se refiere a su alcance, si pertellece ya ai
acervo de la doctrina constante deI Tribunal.
••
apartándose eventualmente de dicho lexlo cn la solución dei
problema, COll lo que dt:jan de respelarse los limites de la in-
:

Icrprclaci6n. Para una illterpretaci6n conslilucional que J. ConteI/ido y fundamentos juridico-materiales.

I
parte de la primacía dellexto constituye este último eJ limite
, 80. Según este principio, una ley no ha de ser declarada
"""""
---
" infranqueable de su actuación. I;-as posibiJidades de com-

}~ C/r.• asinli~mo, MÜLLER (eil. n. I) t.Normstruklur llnd Normali_


nula cuando pueda ser interpretada en consonancia con la

~l Sobre esta, más detenidamclIte: H. SPANNER, «Dic vcrfassungs-


vital". páp. 160 Y S5.: ;d. «Jurislischc MethOdik». págs. 78 Y sS., 15.3y.ss.:
ido «Juristische MClhodik und polilisches Syslem" (I976), pág, 78.
I konrormc Auslegung in der Rcchlsprechllng des Bunde.werfa5sung~gc_
richlsl>, Archill des (Jffenlliehen Rechls 91 (1966), págs. 50] y ss.; 11.
~ Asi, sin embargo. claramente EHMKE (eit. n. I), pág. 60, según cl BOaS, ••Dic verfassungskonformc Auslegung von Gesellcul, (I966); H.
eual el Tribunal pucde apartarsc deI texto de la norma cuando d mismo
SIMON, «Die verfassungskonforme Gesetzesauslegung", EuroPliische
no ofreec ninguna base para una solución racional dei problema.
~I P. c. VIEHWEG «"it. n. 24), págs. ]1 y ss. y poss;m. Grundrechte-Zeitschfljt 74, págs. 85 y ss.; R. ZIPPELlUS, «Verfassllngs_
konforme AuslegunB von Gesclzen", en I.Bundesvcrfassungsgerichl

" und Grundgesell» 11(1976), pags. 108 Yss. con más referendas, pág. 109.

53

"')\).

• •
, ~'~
'~.- •••• ~w_ ••••

v •• ............................• ~

.'
ción regula de una determinada manera el cometido respec-
tivo de los agentes de las funciones eSlatales, el órgano de in- vista que ayuden a las normas de la Constituci6n a obteller
terpretación debe rnantenerse en el marco de las funciones a la máxima ericacia, haja las circunstancias de cada caso.
el encomendadas;' dicho órgano no deberá modificar la dis- 76. Este' procedimiemo tópico vinculado, eo coheren-
tribución de las funciones a traves deI modo y dei resultado cia coo el carácter de la Constitución, ai problema concreto
de dicha interpretación 3.5. Esta es aplicable eu particular a pero siempre guiado y orientado por la norma, tendrá las
las relaciones entre legislador y tribunal constitucional: maximas posibilidades de lIegar a resultados sólidos, racio-
puesto que ai tribunal constitucional sólo le correspondc, nalmente expliéables y controlablcs. Cierto que la dcdsión
frente ai legislador, una fund6n de contrai, le está vedado jurídica, y rnuy en particular en el Dcrecho Cotl.~ljtLJd()llill,
una interpretaci6n que condujese a una restricción de la Ii- nunca puede ser racionalizada totalmente; pero ello sólo
bertad conformadora deI legislador más aJlá de los Iímites puede significar que de lo qUt; se trata es de la racionalidad
establecidos por la Constitución o, incluso, a una conforma- posible, no que sencillamente se pueda prescindir de Ulla
ción lIevada a cabo por el tribunal mi5mo. . metodologia consciente. La ((correc~i6m} de los resultados
74. d') Un principio de valoración de la relevaneia de I obtenidos a traves dei proceso expuesto de concretización de
los puntos de vista elaborados es el crilerio de eficaciu inte- las normas conslitucionales no tiene, por cllo, el caracter de
gradora: si Ia COllstituci6n se propolle la creadón y manteni-
miemo de la unidad política ello exige otorgar preferencia en
I lo cxaclarncnte demostrable que puede darse eu las ciellcia~
de la Naturaleza; en el ámbito de la interpreladóu juridica
la. solución de los problemas jurídico-conslitucionales a eJlo nunca pasaria de ser la ficción y la perpetua mentira de
aquellos punl,os de vista que prOlllUcvan y mantcngan dicha los juristas tras de la cual, y de una forma implidta e inCOll-"
unidad. Ahora bicn, este cometido no habrá sido cumplido trolada, se ocultarían los verdaderos fuolivos de la decisión
correctamente cuando 5ólo pueda ser alcanzado «a traves de o esta última seria sencillamente ocultada. Frente a la pre-
vias no estrictamente constitucionales» 36 pues con eIlo se tensión de una absoluta corrección imposible de demostrar y
habrían rebasado los limites de la interpretaci6n constitucio- que con frecuencia ni siquiera la ralio decidendi hace paten-
nal (vid. infra J).
te, a través de la corrección relativa que implica reconocer eI
75. e') Un criterio de interpreración constitucional carácter limitado de su pretensión, pera que, sin embargo,
que, sin embargo, se conliene ya en buena medida cn lo di- , dentro de dicha limitación, resulta cxplicabJe, convincente y
cho más atrás J7 cs eI de lajuerzonorm(J(iva de la COflsli!ución I hasla cierto punto previsihlc, parece conseguirse algo, y no
.(vid. Supra n. 042 Yss.). Dado que la Constitución pretende I p'or cierto un «quantum» de honestidad juridica, sino tam-
verse ((ólctualizada», y siendo .l.~íque la.~pO.~ibilidades y can- ! bién de -limitada_ seguridad juridica.
didollmllicntn.~ históricos de didll.1 t<tll.:luilli/.adólh) vali
cambiando, preciso será dar preferencia eu la solución"de los
problemas jurídico-constitucionales a aquellos puntos de 3. Limites de la inlerpre(aci6n consfilucimial.

77. La interpretacióll se halla vinculada a algo eslahle-


" Sobre esto. clclalladamelllc EIlMK[ (di. n. I), pág.ç. 7J Y SS. Ver,
asimismo. infra IV, 2. . ddo 3ft. Por eso los Iimites'de la interpretación se sitúan alU
donde no existe algo establecido de forma vinculante por la
)6 Asi, sin embargo. R. SMENIl. uVcrfassung llud Verfassungs_
rechl» •.en «Staatsrechlliche Abhandlungen» (2." ed., 19681. pág. 190. Constituci6n, don~e acaban las posibilidades de una com-
n MÜlLER. «Juristische Melhodik» (cit. n. 1), págs. 176 Y55.
50 li GADAMER (dr. n. 21). pág. J12.

51

S-ar putea să vă placă și