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Essa não é a única forma de abordar o assunto, mas acredito ser a mais
direta e, ao mesmo tempo, mais abrangente.
Talvez seja por isso que o acróstico TULIP, formado pelas primeiras letras
das frases em inglês que resumem os referidos cinco pontos, tornou-se
mundialmente conhecido como a marca registrada dos “calvinistas”.
Daqui a pouco veremos quais frases formam “TULIP”. Mas antes disso,
deixei-me falar resumidamente sobre as circunstâncias históricas que
ensejaram tais formulações doutrinárias.
Talvez seu maior valor resida no fato de ter sido o primeiro documento que
apresentou, de forma articulada e dogmática, aquilo que a Igreja
Reformada de toda Europa entendia ser o ensino bíblico a respeito da
salvação.
Quais são, então, esses famosos cinco pontos? São eles: DEPRAVAÇÃO
TOTAL, ELEIÇÃO INCONDICIONAL, EXPIAÇÃO LIMITADA (ou
eficaz), GRAÇA IRRESISTÍVEL (posteriormente vocação eficaz) e
PERSEVERANÇA DOS SANTOS
Depravação Total
João Calvino iniciou sua grande obra, As Institutas, falando a respeito da
relação entre o conhecimento de Deus e o conhecimento de nós mesmos.
A veracidade daquilo que a Bíblia nos ensina sobre Deus e sobre a nossa
salvação, portanto, é a premissa básica para tudo o que estudaremos
doravante.
Para cumprir esse tríplice propósito – culto, família e trabalho – Deus deu
ao homem qualidades estruturais magníficas: razão, emoção, sensibilidade,
religiosidade e muitas outras.
Gênesis 3, texto que relata a Queda, mostra-nos que nossos primeiros pais
perderam essa perfeição inicial ao se voltar contra a Palavra de Deus.
Essa rebelião trouxe consequências não apenas sobre Adão e Eva, mas
sobre toda sua posteridade.
A bíblia não diz que o homem estava “quase morto” ou “semi-morto” mas
sim totalmente morto. Ler Ef 2:1-3 e RM 3:9-12
Isso quer dizer que ninguém pode escolher seguir Jesus. Todas as
pessoas estão atadas ao pecado.
A vontade é livre para escolher o que acha melhor, mas o que ela
Naturalmente pensa como melhor é não buscar ou escolher Deus.
Aplicação
Nós aprendemos que estamos em uma condição terrível em nossa
própria depravação. Isso nos dá uma noção da urgência de buscar a
Deus.
Mas, graças a Deus, o homem é redimível. E é sobre aquilo que Deus fez
para salvá-lo que os próximos quatro pontos do calvinismo tratam.
Eleição Incondicional
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Em Gênesis já vemos Deus revelar sua graça salvadora através da promessa de que, na
descendência da mulher, surgiria alguém que destruiria as obras da serpente (Gn 3.15).
Essa salvação provisionada por Deus não alcançaria a todos; o caminho natural da
espécie humana seria seguir a serpente, que mais tarde a Bíblia revela ser Satanás (Ap
12.9; 20.2). Mas Deus, soberanamente, decide que Ele (Deus) poria inimizade contra
Satanás e sua semente no coração de uma parte da humanidade, que ele chama de
“semente da mulher” (Gn 3.15). Assim, no primeiro anúncio do evangelho feito na
Bíblia, Deus já deixou claro que Ele não salvaria a todos, mas sim uma parcela da
humanidade, soberana e graciosamente escolhida por Ele. É essa escolha de Deus
para a salvação, livre e graciosa, de uma parcela da humanidade que nada fez para
merecer isso, que a doutrina reformada chama de eleição incondicional.
À medida que a revelação progride, essa verdade bíblica fica mais clara. Dentre toda
uma geração corrupta e perversa, Noé achou graça diante de Deus. Ele e sua família
foram salvos, enquanto o restante da humanidade foi destruído (Gn 6.8). Depois, Deus
escolheu um descendente de Noé em particular para andar com ele: Abrão (12.1). Com
Abrão Deus firmou aliança (Gn 15, 17) e escolheu sua descendência para ser seu povo.
O que motivou Deus a escolher Abrão? Nada! A escolha foi livre e soberana, afinal a
Bíblia nos diz que Abrão foi chamado do meio de um povo idólatra (Josué 24.14,15).
A verdade é que, aqueles que são salvos, nada fizeram para merecê-lo. São salvos por
um ato soberano e gracioso de Deus. Os eleitos de Deus são a soma de todos aqueles
que, ao longo da história, pela graça são salvos, mediante a fé, e isso não vem deles, é
dom de Deus (Ef 2.8). A doutrina da eleição incondicional deve produzir humildade e
gratidão em nossos corações. Tal ensino nos leva a glorificar a Deus, pois evidencia que
Ele é único responsável pela nossa salvação.
Expiação Limitada
Deus decidiu intervir no curso da história para mudar o destino do homem, a saber, a
destruição eterna. Em Gn 3.15, vemos Deus revelando que esmagaria a cabeça da
serpente por meio de um descendente da mulher. A Bíblia nos revela que esse
descendente, o Messias prometido no Velho Testamento, é o Senhor Jesus Cristo, o
Filho de Deus, que na cruz destruiu as obras de Satanás (1Jo 3.8).
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Na cruz, Jesus foi o cordeiro do sacrifício (veja Levítico 16; cp. Jo 1.29; 36). Sua obra
foi expiatória, isto é, Ele sofreu a pena de morte no lugar de outras pessoas (Rm 3, Hb
9, Rm 5.1-11 etc.). Por isso, aqueles em favor de quem Cristo morreu, não podem mais
ser condenados por Deus: Cristo os justificou! Por causa da cruz, a ira santa de Deus
não se acende mais contra essas pessoas, pois Jesus, no Calvário, fez propiciação, isto é,
um sacrifício que desvia a ira de Deus (Rm 3.25, Hb 2.17, 1Jo 2.2).
Além disso, na cruz, Jesus purificou pecados. Assim como o sangue dos animais
tornava coisas e pessoas ritualmente puras, o sangue de Cristo, o Cordeiro de Deus,
limpa o pecado dos homens (Jo 1.29, Hb 9.11-15). A morte de Cristo muda a situação
espiritual daqueles em favor de quem Ele morreu: eles não são vistos mais por Deus
como pecadores, mas sim como santos (Ef 1.4, 7; Rm 5.1; 1Jo 1.9).
Por fim, na cruz Cristo remove a maldição espiritual do pecado. Da mesma forma que o
bode emissário carregava a maldição do povo (veja Lv. 16), ao ser pregado em madeiro,
Jesus se fez maldito em lugar dos pecadores a quem veio salvar (Gl 3.13); por isso,
podem receber a bênção de Deus, na pessoa do Espírito Santo (Gl 3.14).
Graça Irresistível
Acima aprendemos que Deus interveio no curso da história para salvar o homem. O
Velho Testamento é, em suma, a revelação dos atos realizados por Deus ao longo da
História no sentido de redimir seu povo eleito. Tais atos culminaram na revelação de
Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador (Hb 1.1-3). Por meio de sua encarnação, vida,
morte na cruz, ressurreição e ascensão, Jesus efetivamente expiou nossos pecados e
propiciou a ira de Deus (Ef 1.7; 1Jo 4.10). Jesus nos representa diante de Deus: por
estarmos unidos a ele, nos tornamos justos e santos, e somos reconciliados com o Pai
(Rm 5.1,9; Cl 1.22; 2Co 5.18). Somos libertos da condenação eterna e recebemos vida
em abundância (1Tm 1.10; Jo 10.10). Esse é o evangelho da salvação! (At 4.12).
Essa mensagem, pregada pelos apóstolos, difundida pela Igreja, é poder de Deus para a
salvação (Rm 1.16). O eleito, contudo, não experimentará esse poder enquanto
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continuar morto em seus delitos e pecados (Ef 2.1). Enquanto seu coração rebelde e
idólatra não for substituído por um coração humilde e temente a Deus, o eleito não é
capaz de entender a obra de Cristo. O eleito tem que nascer de novo! Esse novo
nascimento espiritual, que na teologia chamamos regeneração, é a obra realizada pelo
Espírito Santo, que capacita o homem a responder ao chamado do evangelho (Jo 1.13;
3.6-7; Rm 8.30).
Depois que o Espírito opera na vida do eleito a regeneração, ele se torna capaz de
entender o evangelho. O Espírito conduz o eleito a toda verdade (Jo 15.26; 16.13),
convence-o a respeito do pecado, da justiça e do juízo (Jo 16.8), faz com que o homem
natural, incapaz de discernir as coisas de Deus, entenda que a cruz de Cristo – escândalo
e loucura para o mundo – é poder de Deus para salvação de todo aquele que crê (1Co
2.14; 1Co 1.23, 24). O exposto acima nos leva a concluir que é o Espírito Santo quem
produz no coração de cada eleito o arrependimento e a fé, expressões visíveis da
conversão (Ez 11.9; Ef 2.9; At 5.31). Quando Deus opera essa transformação, aquela
inclinação que, por natureza, afastava o eleito de Deus, agora se torna em atração
irresistível. Seu novo coração o leva a buscar a Deus voluntariamente; ao ouvir o
evangelho, ele logo o compreende, confessando seus pecados e crendo em Jesus. Essa é
a doutrina da graça irresistível, também conhecida como vocação eficaz.
Nada podemos fazer para ser salvos. Naturalmente, não amamos a Deus e nem
entendemos as coisas que Ele nos revela em sua Palavra. Somos, por natureza, impuros,
rebeldes e ignorantes. Mas Deus mudou essas coisas! Escolhidos pelo Pai, justificados
pelo Filho e transformados pelo Espírito, somos capacitados a responder positivamente
ao evangelho da graça. Louvado seja Deus, que nos amou com amor eterno, e decidiu
nos salvar antes da fundação do mundo! Glorifiquemos o seu nome, tributando a Ele
todo o mérito de nossa salvação, pois nós só o amamos, porque ele nos amou primeiro
(1Jo 4.19)!
Agora podemos concluir este breve artigo sobre “A Doutrina Reformada da Salvação”.
Até aqui, expusemos doutrinária e biblicamente os quatro primeiros dos famosos cinco
pontos do calvinismo: Depravação Total, Eleição Incondicional, Expiação Limitada e
Graça Irresistível.
O estudo dessas doutrinas nos leva a uma conclusão irrefutável: o homem pecador só
pode ser salvo pelas obras... pelas obras redentoras do Deus Triúno! O teólogo
Michael Horton, ao escrever sobre este assunto, deu ao seu livro o título “As doutrinas
da maravilhosa graça”. De fato, a Bíblia ensina de forma contundente que é somente
na graça de Deus que o homem pecador encontra esperança para sua salvação. E,
realmente, aquilo que Bíblia revela sobre a graça do Deus Vivo é mesmo maravilhoso.
Antes da fundação do mundo, o Pai separou, dentre toda a humanidade rebelde e
pecadora, um povo para ser salvo da manifestação de sua ira santa. Para tornar essa
parcela da humanidade justa, santa e propícia a Ele, o Pai enviou seu Filho ao mundo,
na pessoa de Jesus Cristo, para no lugar deles viver uma vida perfeita e morrer uma
morte maldita, a fim de que seus pecados fossem expiados. Por fim, para aplicar esse
plano de salvação à vida desse povo, Deus mudou o coração de cada um de seus
escolhidos, por meio da regeneração efetuada pelo Espírito, chamando-os eficazmente a
responder ao anúncio do evangelho com arrependimento e fé. Isso tudo é graça que
ultrapassa nossa compreensão!
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Esse plano gracioso e maravilhoso realizado pelo Deus Triúno não pode ser frustrado
pelo homem. Aqueles que são alvo dessa maravilhosa graça jamais se apartarão da fé.
Em outras palavras, os eleitos de Deus não podem perder a salvação. Isso é óbvio! A
salvação deles não decorre de esforço, interesse ou mesmo uma decisão da parte deles.
Sua salvação é fruto do decreto do Deus Eterno. Deus decidiu salvá-los! Nada pode
mudar essa realidade. Portanto, assim como a ação do Espírito os conduziu à conversão,
a ação do Espírito vai garantir também que nunca se apartem de tal salvação.
Fomos salvos pela graça, e não por obras, porque o Deus Triúno trabalhou para que isso
fosse possível. Ao nosso Deus Eterno, Pai, Filho e Espírito, todo louvor, toda honra e
toda glória, pois de fato “ao Senhor pertence a salvação” (Jn 2.9).