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nee COLECGAO VIDA E CULTURA RUTH BENEDICT PADROES DE CULTURA TRADUGAO DE ALBERTO CANDEIAS EDICAO «LIVROS DO BRASIL» LISBOA Rua dos Caetanos, 22 devecerec ' ' ‘ f} CAPA DE A. PEDRO i} : Reservados todos os direitos pela legislagdo em vigor 4 EdigSo feita por acordo com a ROWOHLTS DEUTSCHE ENZYKLOPADIE, | 1 A CISNCIA DO COSTUME Costumes e Comportamento antropologia ocupa-se dos seres humanos como pro- dutos da vida em sociedade. Fixa a sua atencdo nas caracteristicas fisicas e nas técnicas industriais, nas convencées e valores que distinguem uma comunidade de todas as outras que pertencem a uma tradicao diferente. O que distingue a antropologia das autras ciéncias sociais € 0 ela incluir no seu campo, para as estudar cuidadosamente, Sociedades que nao sio a nossa sociedade. Para os seus fins qualquer norma social de casamento e de reproducio tem tanto significado como aquelas que nos sio-prdprias, mesmo que ‘seja a dos Dyaks do Mar, e no tem qualquer possfvel relacSo histérica com a da nossa civilizago. Para o antropolo- gista, os nossos costumes ¢ os de uma_tribo da_Nova Guiné_ 0 ‘esquemas sociais possiveis, que tratam do Blema, € cumpre 20 So anton, euquanto_antropologi Svitar toda © qualquer apreciacio, Sasi Dean oi Ter Tem favor do, outro. _Interessaa_a conduta humana, “nao como € modelada por uma por uma certa tradicio, 2 HORE tradicao, mas como_o fol por qualquer tradi¢ao, seja ela qual for, Interessa-o a vasta gaina de costi- mes que existe em culturas diferentes, e 0 seu_objectivo ¢ MES THE COSTE EM LE ras _Grerentes, £0. Seu_oiecvo £ [33] | Csepenmes | I ‘Compreender 0 modo como essas culturas se transformam ¢ se diferenciam, as formas diferentes por que se exprimem, ¢ maneira como os costumes de quaisquer povos funcionam nas vidas dos individwos que os compéem. Ora o costume n3o tem sido considerado assunto de grande importancia. O funcionamento fntimo do nosso cérebro, eis 0 que nos pareve constituir a tmica coisa digna de estudo; © costume, temos tendéncia para pensar, é conduta na sua forma mais vulgar. De facto, 0 contrério & que é verdade. © costume tradicional, consideraddo pelo mundo em geral, é uma massa de conduta pormenorizada mais espantosa do que © que qualquer pessoa pode jamais revelar nas acces indivi- uais, por mais aberrantes. E no entanto isto é um aspecto um tanto trivial da questo. O que é verdadeiramente importante €0 papel predominante que o costume desempenha no que se experimenta na vida difria e no que se cré, ¢ as verdadeira- mente grandes variedades sob que pode manifestar-se. A heranga da crianga Nio hé ninguém que veja o mundo com uma visio’ pura de preconceitos. Véo, sim, com o esptrito condicionade por um conjunto definido de costumes, e instimicdes, e modos de Pensar. Nem mesmo mas suas concepgdes filoséficas ele con- ‘segue subtrair-se a esses esteredtipos; até os seus conceitos do verdadeiro ¢ do falso sio ainda referidos aos seus particulares Costumes tradicionais. John Dewey disse perfeitamente a sério que © papel desempenhado pelo costume no moldar do com: Portamento do individuo, comparado com qualquer maneira Por que este possa afectar o costume tradicional, est4 na ™mesma proporcZo que a totalidade do vocabuldrio. da sua lingua matema comparada com os termos da sua linguagem infantil adoptados no verndculo da familia. Quando se estudam a sério ordens sociais que se puderam desenvolver autonoma- C14] mente, aquela comparagao nao é mais que uma exacta obser- vagdo de facto. A histéria da vida individual de cada_pessoa ea 30 para_geracio. Desdé qué 0 individuo vem ao mundo Costumes do ambiente em que nasceu moldam a:sua expe- riéncia dos factos e a sua conduta. Quando comesa a falar, ele € 0 frutozinho da sua cultura, e quando crescido e capaz de tomar parte nas actividades desta, os hdbitos dela sio os seus hdbitos, as crengas dela, as suas crengas, as incapacidades dela, as suas incapacidades. Todo aquele que nasca no seu grupo delas partilharé com ele, ¢ todo aquele que nasca num grupo do lado oposto do globo adquirird a milésima parte dessa heranga. Nenlrum outro problema social nas cabe mais forgo- samente conhecer do que este do papel que o costume desem- pena na formacio do individuo. Enquanto n3o pudermos A nossa falsa perspectiva © estudo do costume sé nos pode aproveitar depois de aceitarmos certos postulades; e alguns desses postulados tém encontrado erguida contra si uma oposicZo violenta. Em pri- meiro lugar todo o estudo cientifico exige a auséncia de trata- mento _preferenchal de um "ou outro "dos “terms “di “série B xdada. Em todos os campos menos “tos a Controvérsia, como 0 estudo dos cactos, ou das térmites, ou da tatureza das nebulosas, 0 método de estudo a seguir € © de agrupar o material significativo e registar todas 2s possiveis formas e condicées variates. Foi deste modo que aprendemos tudo o que sabemos das leis da astronomia, ou dos hdbitos dos insectos sociais, por exemplo. Sé no estudo C15] “\. de proprio homem é que.as mais importantes ciéncias sociais atinmerae¢ ur substituiram aquele: método pelo estudo de uma: varlagio local —a civilizacio Ocidental. A antropologia foi, por definicgo, impossivel enquanto estas distingdes entre nés proprios ¢ 0 primitivo, nés proprios ¢ 0 barbaro, nds préprios e o pagio, nos dominaram o espirito. Foi necessério comecar por atingir aquele grau de afimamento intelectual em que j4 no pomos a nossa crenga em contraste com a supersti¢3o do mosso vizinho; foi necess4rio saber re- conhecer que aquelas instituicdes que assentam mas mesmas Premissas, isto é: o sobrenatural, devem ser consideradas sob mesmo Angulo, aquelas como a nossa prépria, para que tal impossibilidade desaparecesse. Na primeira metade do século xx este postulado elemen- tar ndo podia ocorrer nem sequer ao espirito mais esclarecido dentre as pessoas da civilizag¢3o Ocidental. O homem, através de toda a sua histéria, defendeu como um ponto de honra a ideia da sua incomparabilidade, do seu caricter de ser excep- cional. No tempo de Copémico esta reivindicagao de supre- macia era de tal modo ambiciosa que inca mesmo a Terra em que ele vive, © 9 século x1V recusou-se com:paixdo a admitir a subordinagio deste planeta a ocupar apenas um lugar entre 0S outros no sistema solar. No tempo de Darwin, tendo cedido ao inimigo o sistema solar, o bomem lutou com todas as armas de que dispunha pela exclusividade da alma, atributo inconcebivel dado por Deus ao homem, de maneira tal que megou a descendéncia do homem de quaisquer membros do reino animal. Nem a falta de continuidade Iégica da argumen- taco, nem quaisquer diividas sobre a matureza dessa «alman, nem sequer a circunstincia de o século xix nao ter procurado afirmar a sua fraternidade com quaisquer estranhos 20 grupo —nenhum destes factos contaram contra a magnifica exal- tagdo que se manifestou capidamente perante a indignidade que a evolugZo propunha contra 0 conceito da excepcionali- dade do homem, ser tnico emtre os seres. [16] Ambas essas batalhas se podem considerar ganhas — se n&o j4, pelo menos em breve; mas a luta sé mudou de frente. Hoje estamos perfeitamente dispostos a admitir que a revo- lugo da terra em torno do Sol, ou a descendéncia animal do homem, quase nada tém que ver com a excepcionalidade das nossas realizages humanas. Se habitamos um qualquer pla- neta dentre mirfades de sistemas solares, tanto maior gléria para nds, e se todas as heterdclitas racas humanas estio ligadas, por evolucio, com o animal, tanto mais radicais sio as diferencas demonstraveis entre nés e qualquer animal, e tanto mais notdvel é a unicidade das nossas instituigdes. Mas_as nossas realizagées, as nossas instituicées so Unicas, incompa- raveis; séo de uma ordem diferente das das racas inferiores e tém de ser protegidas a todo o custo. De sorte que, ou seja uma questo de imperialismo, ou de preconceito de raca, ou de comparacao entre Cristianismo e paganismo, continuamos envaidecidos com a unicidade, no das instituicgdes humanas do mundo em geral, com que, alids, nunca ningwém se preo- cupou, mas das nossas prdprias instituices e realizagGes, da nossa civilizacao. Confusdo de costume local com Natureza humana A civilizagao Ocidental, | devido a circunstancias | histéricas Sobre a maior parte do globo, e fomos, pois, levados a a a aceitar uma crenga na uniformidade da conduta humana, que noutras ciftinstinclas BE0" tera surgidss AE poves uke pmo tém, por vezes, muito mais forte consciéncia do que nés, 0s ocidentais, do papel das feicdes culturais, e por muito boas razées. Sofreram a experiéncia fntima de culturas diferentes. Viram a su2 2 econdémico, as suas restri- ges matrimonials tombarem perante o branco. Renunciaram 2.P. DE CULTURA tr] al a ums’ € aceitaram outras, muitas vezes com bem grande incompreensio delas; mas véem com clareza que existem varios arranjos da vida humana. Atribuiro, por vezes, certos caracteres dominantes do branco a sua concorréncia comercial, ‘cou as suas instituicdes militares, muito da forma por que 0 fazem os antropologistas. © branco, esse, tem tido uma experiéncia diferente. Nunca, porventura, ter visto um homem de outra civilizagao, a nao ser que 0 homem de outra civilizago j4 esteja europeizado. Se viajou, muito. provavelmente f€1o sem nunca ter ficado fora de um hotel cosmopolita, Pouco sabe de quaisquer ma- neiras de viver que nao sejam as suas. A uniformidade de costumes, de pontos de vista, que vé em volta de si parecem- che suficientemente convincentes, e esconde das suas vistas 0 facto de que se trata, afinal, de um acidente histérico. Aceita sem mais complicagdes a equivaléncia da natureza humana e dos seus préprios padrées de cultura. E no entanto, @ grande expansio da civilizacio branca ndo é uma circunstincia histérica isolada, O grupo Polinésio, em épocas relativamente recentes, espraiou-se desde Ontong, Java, até a Iba da Péscoa, de Havai até &,Nova Zelandia; e as tribos de Lingua Bantu espalharam-se desde o Sara & Africa do Sul. Mas nés em nenhum caso consideramos esses povos como mais do que uma variacio local hipertrofiada da espécie humana. A civilizagio Ocidental teve todas as suas invengdes em meios de transporte ¢ todas as suas organizagdes comer- ciais de largo Ambito, a apoiar a sua vasta dispersio, e facil compreender historicamente como isto se deu. A nossa cegueira perante outras culturas ‘As consequéncias psicolégicas desta expansio da cultura branca tém sido desproporcionadas quando comparadas com as consequéncias materiais. Esta difusio cultural em grau (18) __ mundial tém-nos. impedido, como nunca o homem o foi até aqui, de tomar a sério as civilizagdes dos outros povos; tem feito que @ nossa cultura ¢ a nossa universalidade maciga tenham, desde h4 muito tempo, deixado de tomar em consi- deragdo o que & de esséncia histérica, e que assentdmos ser, pelo contrério, necessdrio e inevitdvel. Interpretamos a depen- déncia, em que estamos na nossa civilizacio, da concorréncia econémica, corto prova de que esta é a primeira causa deter- minante em que @ natureza pode confiar, ou resolvemos, sem mais, que © comportamento das criangas tal como é moldado pela nossa civilizactio registado nas clinicas ‘para criangas, é psicologia infantil ou 0 modo por que o animal humano jovem tem de se comportar, O mesmo se d4 quer se trate da nossa ética quer da nossa organizacio familiar. O que defen- demos € a inevitabilidade de cada motivacio familiar, tentando sempre identificar os nossos modos locais de comportamento, com Comportamento, ou os nossos préprios hdbitos em socie- dade, com Natureza Humana. Ora © homem modemo fez desta tese uma das circuns- ‘t8ncias vitais do seu pensar e da sua conduta prética, mas as fontes de que ela prové recuam até ao que, a avaliar pela sua existéncia universal entre povos primitivos, parece ser uma das mais primitivas distingdes humanas, a diferenca qualitativa entre «o meu préprio» grupo fechado, e o que a ele é estranho. Todas as tribos primitivas concordam em re- conhecer esta categoria dos estranhos ao seu grupo, aqueles que ndo s6 estiio fora das disposi¢es do cédigo moral que é observado dentro dos limites do grupo de cada uma, mas a quem sumariamente se nega um higar no esquema humano. Um grande mimero dos nomes de tribos comummente usados, Zufii, Déné, Kiowa, e outros, sio nomes por meio dos quais Povos primitives se reconhecem a si préprios, e sio os termos nativos que designam «seres humanos», isto é, eles proprios. Fora do grupo fechado nao h4 seres humanos. E isto, a des- peito do facto de, de um ponto de vista objectivo, cada tribo (19) estar rodeada por povos que partilham das suas artes e inven- g6es materiais, de priticas complicadas que se desenvolveram através de trocas miituas de comportamento entre um povo e outro. © homem primitivo nunca considerou 0 mundo nem viu a Humanidade como se fosse um grupo, nem fez causa comum com a sua espécie. Desde in{cio foi um habitante de uma pro- vincia que se isolou por meio de altas barreiras. Quer se tra- tasse de escolher mulher ou de cortar uma cabeca, a primeira distingdo que fazia, e a mais importante, era entre 0 seu pré- prio grupo humano e os fora do grémio. O seu grupo e todos os seus modos de comportamento, eram tnicos. De modo que 0 homem moderno, quando distingue Povo Eleito e estrangeiros perigosos, grupos dentro da sua prépria civilizagdo genética e culturalmente aparentados um com o ‘outro, como quaisquer tribos na selva australiana o sio, tem por trds da sua atitude a justificacdo de uma longa continuidade histérica. Os pigmeus tém as mesmas pretenses. E nao nos é fAcil libertarmo-nos de uma feic¢do humana téo fundamental, mas podemos, pelo menos aprender a confessar a sua histéria € as suas polimorfas manifestagGes. Uma dessas manifestacdes, e aquela que é muitas vezes citada como priméria e condicionada mais por emogées reli- giosas do que por este mais generalizado provincialismo, € a atitude universalmente sustentada nas civilizagdes Ocidentais, na medida em que a religiio se conservou entre elas uma circunstincia viva. A disting3o entre qualquer grupo fechado © poyos estranhos torna-se, em. termos de religido, a de verda- deiros crentes e de pagios, Durante mifhares de anos ndo havia pontos de contacto entre estas duas categorias. Nao havia numa delas, ideias ou instituigdes que fossem vélidas na outra. Pelo contrério, todas as instituigdes eram consideradas anta- génicas, sé por pertencerem a uma ou a outra das, mujtas vezes, levemente diferenciadas religies: de um lado era-uma questio de Verdade Divina ¢ de verdadero crente, de revelaga0 [20] e de Deus; do outro era uma questio de erro mortal, de fabulas, do maldito e de deménios. Nao se tratava de equacio- nar as atitudes dos grupos em oposi¢io, ¢ por consequéncia, de compreender através de dados estudados objectivamente a natureza desta importante feiczo ‘humana— religiao. Preconceitos de raga Nés sentimos uma certa superioridade justificada quando se aceita uma caracterizacao, como esta, da atitude religiosa padrao. Pelo menos desembarac4mo-nos daquela absurdidade especial, e aceitémos estudar comparadamente as religiGes, Mas considerando o alcance que uma atitude semelhante tem tido na nossa civilizacZo sob a forma de, por exemplo, pre- conceitos de raca, justifica-se certo cepticismo quanto a ser a nossa largueza de vistas, em questées de religio, devida ao facto de termos superado a candida infantilidade’ de- visio, ou simplesmente ao facto de a religiio ter deixado de ser o tablado em que se pGem em cena as grandes batalhas da vida moderna. Nas questdes realmente vitais da nossa civilizacio parece estarmos ainda longe de ter adquirido a atitude desin- teressada que tao largamente alcanc4mos no campo da religiio. Outra circunstancia fez do estudo sério do costume uma disciplina ainda em atraso ¢ muitas vezes cultivada com hesi- taco, e esta é uma circunstdncia mais diffcil de vencer do que aquelas a que vimos de nos referir, O costume no provocou a atencao dos teorizadores sociais porque ele constitufa a prépria substancia do seu pensar: era, por assim dizer, a lente sem a qual nada podiam ver, Precisamente porque era funda- mental, existia fora da sua aten¢So consciente. Tal cegueira nada tem de enigmético. Depois de um investigador revnir os vastos dados necessdrios para o estudo de créditos inter- nacionais, ou do processo de aprender, ou do narcisismo como factor de psiconeuroses, é por intermédio e dentro deste corpo [21] de dados que 0 economista, ou o psicologista, ou o psiquiatra operam. Nao toma em consideragio 0 facto de outros com- plexes sociais em que, porventura, todos os factores se dispdem de uma maneira diferente: Isto é, nao conta'com o condicio- namento cultural. Vé o aspecto que esté a estudar como mani- festando-se de modos comhecidos: e inevitdveis, e apresenta estes como sé fossem absolutos, porque a eles se reduzem todos os materiais que Ihe servem para trabalhar racionalmente. Iden- tificam-se atitudes locais da década de trinta, com natureza humana, e a sua caracterizagao, com Economia e Psicologia. Na pritica, isto, muitas vezes, nao importa. Os nossos filhos devem ser educados na nossa tradigio pedagdgica, e 0 estudo do proceso de aprendizagem nas nossas escolas ¢ 0 que realmente importa. Da mesma forma se justifica o en- colher de ombros com que muitas vezes se acolhe uma dis- cussio de outros sistemas econdémicos que nao o nosso. Afinal, temos de viver dentro do quadro do meu e do teu que a nossa particular cultura estabelece. Isto é, realmente, assim, € 0 facto de as variedades de culturas se poderem discutir melhor tais como existem em espaco, € pretexto para a nossa nonchalance. Mas é apenas a limitag3o de material histérico o que impede que se tirem exemplos da sucesso das culturas em tempo. Essa sucesso € coisa a que nao podemos furtar-nos, mesmo que o queiramos, e quando olhamos mesmo sé uma geracdo para trés que seja, entZo compreendemos até que ponto foi longe a revisdo, por vezes no nosso mais fntimo comportamento. Até aqui tais revisées tem sido nZo deliberadas, mas o resultado das cir- cunstincias que sé retrospectivamente podemos figurar. E se nao fosse a nossa relutancia em enfrentar mudangas culturais em questées essenciais, enquanto elas se nos nao impéem, nao seria imposs{vel assumir uma atitude mais inteligente e autori- zada, Aquela relutincia é em grande parte um resultado da nossa incompreensio das convengées culturais, e especialmente uma sublimagio daquelas que pertencem & nossa nacio e & (22) nossa década. Um conhecimento mesmo escasso de outras convengées e de como elas podem ser diferentes das nossas, contribuiria muito para promover uma ordem social racional. O estudo de culturas diferentes tem ainda outro alcance muito importante sobre 0 pensamento-e o comportamento de hoje em dia, A vida moderna pds muitas civilizagdes em con- tacto intimo, e no momento presente a reacc3o dominante a esta situacdo € o nacionalismo e o snobismo racial. Nunca, mais do que hoje, a civilizacao teve necessidade de individuos bem conscientes do sentido de cultura, capazes de verem objec- tivamente o comportamento socialmente condicionado de outros povos sem temor e sem recriminagio. Desdém pelo estrangeiro nao € a-tinica solugio possivel do nosso actual contacto de racas e nacionalidades; esta nem sequer € uma solugio cientificamente alicergada. A tradicio- nal intolerancia anglo-saxénica é uma feicdo cultural, local ¢ temporal como qualquer outra. Mesmo ut povo tio aproxima- damente do mesmo sangue e da mesma. cultura como o espa- nhol dela nfo sofreu, e 0 preconceito de raca nos paises de colonizacio espanhola é uma coisa completamente diferente do dos paises dominados pela Inglaterra e pelos Estados Unidos. Nestes nao se trata evidentemente de uma intoleran- cia dirigida contra a mistura de sangue de racas biologica- mente muito distantes, porque ocasionalmente a exaltac3o é tao grande contra 0 catélico irlandés em Béston, ou o italiano na Nova Inglaterra, como contra o Oriental na Califérnia. £ a velha distingo entre o grupo de dentro ¢ 0 grupo de fora, € se neste aspecto continuamos a tradi¢lo primitiva, temos Tuito menos desculpa do que as tribos selvagens. Nés viajé- mos, orgulhamo-nos das nossas vistas desempociradas. Mas ndo conseguimos compreender a relatividade dos hdbitos cul- turais, e continuamos privados de muito proveito e de muito Prazer nas nossas relagdes humanas cum povos de diferentes tipos de cultura, ¢ a ndo ser dignos de confianca nas nossas relagdes com eles. [23] © reconhecimento da base cultural do preconceito de raga & hoje uma necessidade desesperada na civilizagio Oci- dental. Cheg4mos a um ponto em que alimentamos precon- ceitos de raga contra os nossos itmios.de sangue, os Irlande- ses, e em que a Noruega e a Suécia falam da sua inimizade como se também’eles representassem sangues diferentes. A cha- mada linha racial, durante uma guerra em que a Franca e a Alemanha se batem em campos opostos, mantém-se para di- vidir 0 povo de Baden do da Alsdcia, ainda que somaticamente ambos pertencam & subraca alpina. Numa época de movi- mentos sem embaracos e de casamentos mistos na ascendéncia dos elementos mais desejdveis da comunidade, pregamos, sem corar de vergonha, o evangelho da raca pura. © homem moldado pelo costume nao pelo instinto A isto a-antropologia dé duas respostas. A primeira res- peita A natureza da cultura, e a segunda 4 natureza da heranca. A resposta respeitante 4 natureza da cultura leva-nos até as sociedades préhumanas. Hé sociedades em que a Natureza perpetua o mais ténue modo de comportamento por melo de mecanismos bioldgicos, mas tais sociedades n3o sio de homens, sio de insectos. A formiga rainha, transportada para um ninho solitério, reproduzir4 todas as feicdes do comportamento sexual, todos os pormenores do ninho. Os insectos sociais re- presentam a Natureza no disposta a correr quaisquer riscos. © padrdo de toda a estrutura social, confia-o ao comporta- mento instintivo da formiga. Nao h4 maior néimero de proba- bilidades de as classes sociais de uma sociedade de formigas ou de os seus padrées de agricultura se perderem pela sepa- ragio de uma formiga do seu grupo do que de a formiea nao vir a reproduzir a forma das suas antenas ou a estrutura do seu abdémen. Feliz ou infelizmente, a solucdo do homem ocupa o pélo [24] ‘posto, Nada da sua organizaco social tribal, da sua lingua- gem, da sua religigo local € transportado na sua célula germi- nal. Na Europa, em séculos passados, quando se encontravam criangas que tinham sido abandonadas e se tinham conservado em florestas, separadas de outros seres humanos, eram de tal modo parecidas entre si que Lineu as classificou como uma espécie & parte, Homo ferus, e supés que eram uma espécie de andes raros. Nao podia conceber que tivessem nascido de homens, esses brutos idiotas, esses seres.sem interesse no que ‘se passava A sua volta, oscilando ritmicamente para trés e para diante como qualquer animal de jardim zooldgico, com érgios da fala e da audigao que mal podiam educar-se, que resistiam ao frio apenas com uns farrapos e tiravam batatas de 4gua a ferver sem o menor incémodo. & claro que nfo havia qualquer diivida que se tratava de criancas abandonadas na infancia,. € 0 que a todas faltara fora a associagZo com os seus seme- Ihantes, s6 através da qual as faculdades do homem se afinam ganham forma. Hoje, na nossa civilizac3o, mais humanitdria, jA nao se encontram criangas selvagens. Mas o facto ressalta com igual clareza de qualquer caso de adopcao de uma crianca em outra raga ou cultura. Uma crianga Oriental adoptada por uma familia Ocidental, aprende inglés, revela para os seus pais adoptivos as atitudes correntes entre as criancas com quem brinca, e encarreira-se para as mesmas profissdes que elas escolhem. Aprende todo o conjunto de feigdes culturais da sociedade que adoptou, € 0 grupo dos seus verdadeiros proge- nitores no desempenha em tudo isto qualquer papel. O mesmo se passa em grande escala quando populacées inteiras se desembaracgam da sua cultura tradicional em duas ou trés geragdes e adoptam -os costumes de um grupo estrangeiro. A cultura do Negro americano nas cidades do norte veio a aproximar-se em todos os pormenores da dos brancos nas mesmas cidades, H4 alguns anos, quando se fez um recensea- mento cultural em Harlém, um dos tragos peculiares aos [25] Negros era a moda que seguiam de apostar ‘nos trés ultimos algarismos dos investimentos da bolsa no dia seguinte. Pelo menos safa mais barato do que a correspondente predileccZo dos brancos por jogarem na propria bolsa, e tinha a mesma incerteza e era igualmente excitante. Era uma variante do padrio branco, mas nem por isso se afastava muito dele. E a maioria das feigdes de Harlém conservam-se ainda mais préximas das formas correntes em grupos brancos. Por toda a parte, e desde o principio da histéria do homem, se demonstra que certos povos puderam adoptar a cultura de povos de outro sangue. Nao hd na estrutura biolé- gica do homem nada que tore isto sequer dificil, muito menos impossivel. O homem nio é obrigado, pela sua constituicio bioldgica, a obedecer em pormenor a qualquer variedade par- ticular de comportamento. A grande diversidade de solugdes elaboradas por ele em diferentes culturas relativamente A uniio dos sexos, por exemplo, ou ao comércio, sfo todas igualmente possiveis na base dos seus dotes originais. A-cultura nao é um complexo que seja transmitido biologicamente. (© que se perde em garantia de seguranca dada pela Natu- reza é compensado pelas vantagens de uma maior plasticidade. No animal humano nio se desenvolve, como no urso, um re- vestimento de pélos que o resguardam do frio, com o resul- tado de, depois de muitas geracdes, se adaptar aos rigores arcticos. Ele aprende, sim, a fazer agasalhos e a construir uma casa de neve. Pelo que nos diz a histéria da inteligéncia nas sociedades pré-humanas, como nas humanas, esta plasticidade foi o huimus em que o progresso humano comecou a crescer € em que se tem mantido vivo. Nos tempos dos mamutes, espé- cies sobre espécies sem plasticidade surgiram, ultrapassaram-se € desapareceram, vitimas do desenvolvimento daquelas mesmas feicKes que a adantacdo ao ambiente nelas tinha produzido. Os animais canivoros e por fim os s{mios superiores vieram lentamente a apoiar-se em adaptacdes no meramente biold- . Bicas, € foi sobre a consequente plasticidade assim aumentada [26] que se estabeleceram, pouco a pouco, as fundagdes para o desenvolvimento da inteligéncia. Talvez, como muitas vezes se sugere, o homem venha a destruir-se a si préprio em virtude exactamente do desenvolvimento da sua inteligéncia. Mas nunca ninguém se lembrou de aventar quaisquer meios por que possa- mos voltar aos mecanismos do insecto social; de modo que nao nos resta qualquer alternativa. A heranca cultural humana, para nosso bem ou para nosso mal, nao se transmite biologica- mente. O coroldrio que daqui deriva em politica moderna é que nao h& qualquer fundamento no argumento de que podemos confiar as nossas conquistas espirituais e culturais a quaisquer plasmas germinais especiais hereditérios, Na nossa civilizacdo Ocidental a lideranca: passou, em diferentes perfodos, sucessi- vamente para os Hamitas, para o subgrupo Mediterraneo da raca branca e finalmente para os Nérdicos. Nao h4 qualquer duvida acerca da realidade do facto da’ continuidade cultural da civilizagao, seja quem for o seu portador em dado mo- mento. Temos de aceitar todas as implicagées da nossa heranca humana, uma das maiores das quais é a inimportancia relativa do comportamento biologicamente transmitido, e o papel enorme do processo cultural da transmissao da tradi¢ao. A «pureza racial» & uma ilusdo A segunda resposta dada pela antropologia ao argumento do purista racial, respeita A natureza da hereditariedade. O pu- rista racial é a vitima de um mito. Porque, o que vem a ser aheranca racial? Sabe-se mais ou menos o que é heranga de pai para filho. Dentro de uma linhagem familiar a importéncia da hereditariedade é imensa. Mas hereditariedade é uma questo de linhagens familiares. Para além disso é mito. Em comuni- dades pequenas e estdticas, como uma aldeia Esquimé isolada, hereditariedade racial e hereditariedade de filho e pais s4o pra- (27)

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