Apresentação e seminário de formação
Caderno
Plano Nacional Contra
o Tráfico de Pessoas
O Governo de Cabo Verde
no seu programa para a
nona legislatura assumiu o
compromisso de desenhar e
implementar uma política de
segurança focada nas pessoas
e que aborde uma perspectiva
global e integrada abrangendo
uma segurança jurídica e física
das pessoas directamente
ou através da cooperação
internacional. Declara ainda o
seu compromisso em cooperar
a nível internacional e
regional no combate ao tráfico
internacional de drogas, de
armas e de seres humanos,
fenómenos que vêm pondo em
perigo a segurança nacional.
Por isso, o governo tem
vindo a trabalhar através de
acções que concretizem os
propósitos que norteiam a
luta contra estes fenómenos,
no qual aprovou, no dia 3 de
Maio, o primeiro Plano Nacio-
nal Contra o Tráfico de Pes-
soas (PNCTP) que foi apre-
sentado esta segunda-feira,
30 de Julho, na Praia, numa
cerimónia presidida pela mi-
nistra da Justiça e Trabalho,
Janine Lélis, pela Represen-
tante da Embaixada dos Es-
tados Unidos, Molly Runyon,
pela Coordenadora Sénior da
UNODC, Cristina Andrade,
pelo Director Geral da Política
de Justiça e com a presença de
altas autoridades do Estado.
O PNCTP tem a duração de
três anos e prevê, de entre ou-
tras actividades, a criação de
um Observatório de Monoto-
rização e Identificação Rápi-
da de Situações de Tráfico de
Pessoas, cujos membros to-
maram posse no mesmo acto.
O Observatório ficará se-
diado no Ministério da Justiça
e Trabalho, na Direcção Geral
da Política da Justiça. É com-
posto por todas as instituições
e organizações que têm res-
ponsabilidades e papel funda-
mental na implementação do
Plano Nacional.
A apresentação do primeiro
Plano Nacional Contra o Tráfico
de Pessoas (2018-2021), o lan-
çamento da Brochura do Plano
e a tomada de posse dos novos
membros do Observatório, esta
segunda-feira, fazem parte de
um conjunto de actividades que
o Ministério da Justiça e do Tra-
balho está realizando para assi-
nalar o 30 de Julho, Dia Mundial
Contra o Tráfico de Pessoas, com
o objectivo de reforçar o conhe-
cimento e promover o despertar
de consciências para a proble-
mática do tráfico de pessoas e es-
timular a adopção de um papel
activo na educação, prevenção
e denúncia deste tipo de crimes.
Com o objectivo de
socializar o Plano Nacional
Contra o Tráfico de Pessoas
o Ministério da Justiça e
do Trabalho promoveu, em
parceria com o Escritório
das Nações Unidas contra
Droga e Crime (UNODC),
com a Embaixada dos Estados
Unidos e com o financiamento
do Departamento de Estado
dos Estados Unidos da
América duas acções de
formação, na Cidade da Praia:
uma, no mês de Junho, sobre
Investigação e Acusação sobre
o Tráfico de Pessoas e outra, de
24 a 26 Julho, sobre Protecção
e Assistência às Vítimas.
 2\\
Instrumento estratégico
de grande alcance
Com a apresentação pública do Primeiro Plano Nacional Contra o Tráfico de Pessoas e o empossamento dos Membros do
Observatório de Monitorização e Identificação Rápida de Situações de Tráfico de Pessoas, conforme frisou a Ministra da
Justiça e do Trabalho, no discurso de apresentação do Plano Nacional, esta segunda-feira, estão criadas as condições
para o salto que se espera de Cabo Verde nessa matéria.
“ Cabo Verde já possui
uma lei anti-tráfico e
um quadro jurídico-
penal que regula
a problemática do
tráfico humano e
permite uma actuação
dentro da legalidade
e já instituiu uma
Comissão de Combate
ao fenómeno”,
Ministra da Justiça,
Janine Lélis
A criação do Observatório
de Monitorização e Identi-
ficação Rápida de Situações
de Tráfico de Pessoas e o Pri-
meiro Plano Nacional Contra
Plano Nacional Contra o Tráfico de Pessoas
o Tráfico de Pessoas (2018
- 2021) aprovado por Resolu-
ção do Conselho de Ministros,
n.º 40/2018, de 09 de Maio,
como notou a Ministra da Jus-
tiça, marcam um momento de
viragem no combate ao tráfico
humano em Cabo Verde, uma
vez que o Plano representa
um instrumento estratégico
relevante e de grande alcance,
estabelecendo metas e fixando
procedimentos para que no
decurso dos próximos anos, se
possa alcançar no país, um pa-
tamar mais elevado no concer-
nente ao domínio, controle e
repressão das práticas de trá-
fico humano, nas suas diver-
sas vertentes e manifestações.
Já a criação de um Observató-
rio, de acordo com a ministra,
tem um propósito muito claro
e inequívoco. “Trata-se de um
instrumento destinado não só
a acompanhar a montante, as
manifestações suspeitas que
possam de algum modo, indi-
ciar a prática de tráfico, como
também, a antecipar a sua
concretização, apostando-se
aqui, como é natural, na pre-
venção”.
Janine Lélis fez saber que
o país tem desafios e metas a
alcançar no decurso dos anos
que se avizinham e que os es-
forços desenvolvidos por Cabo
Verde, no combate ao tráfico
humano têm sido reconhe-
cidos pelo próprio Departa-
mento de Estado Americano
ao destacar no seu Relatório
de 2018 que o país já concre-
tizou a acusação e condenação
de dois traficantes sexuais,
disponibilizou abrigos de
apoio às vítimas, desenvolveu
campanhas de sensibilização e
aprovou o primeiro plano na-
“ O Plano Nacional
ajudará Cabo Verde a
apresentar-se como
terreno hostil para
todos aqueles que
tentam usar este
país estável, pacífico
e cumpridor da lei
para fins ilícitos”,
Representante da
Embaixada dos
Estados Unidos,
Molly Runyon
cional de acção contra o tráfi-
co de pessoas.
Apesar dos progressos al-
cançados representarem um
fator de encorajamento para
Nº 870 • 1 de Agosto de 2018
Cabo Verde, que se situa agora
no nível dois de quatro, a Mi-
nistra da Justiça lembrou que
não se deve perder de vista as
recomendações do Relatório
de 2018, relativamente à pros-
secução das acções de forma-
ção específica para polícias e
agentes judiciais sobre inves-
tigação e acusação dos crimes
de tráfico humano, à imple-
mentação dos procedimen-
tos formais de identificação e
encaminhamento das vítimas,
para acolhimento e tratamen-
to, bem assim, à alocação de
mais recursos ao Ministério da
Justiça e Trabalho, a fim de se
financiar adequadamente os
esforços no combate ao tráfi-
co de pessoas, nomeadamente
no que concerne à implemen-
tação do Plano Nacional.
“Referimo-nos igualmente
à necessidade imperiosa de
Nº 870 • 1 de Agosto de 2018 Plano Nacional Contra o Tráfico de Pessoas //3

se proceder a investigações
com maior desenvoltura e a
acusações mais contundentes
que levem a julgamento e à
condenação efectiva, dos cri-
minosos do tráfico de pessoas.
A par disso, deve-se proceder
a uma maior divulgação da
legislação antitráfico entre os
agentes da justiça, de um lado
e, garantir, por outro, mais
abrigos para as vítimas e seu
efectivo acompanhamento”,
sublinhou Janine Lélis.
Concluindo, a Ministra da
Justiça mostrou-se convicta
de que senão todos, pelo me-
nos alguns dos reptos prove-
nientes do Departamento de
Estado Americano, encon-
tram-se ao alcance do hori-
zonte temporal pré-definido.
“Basta apenas uma vontade
política firme, uma acção in-
terdisciplinar concertada e
eficaz e, ainda a mobilização
dos recursos financeiros que
se mostrarem necessários
para o efeito”.
Por sua vez, a Representan-
te da Embaixada dos Estados
Unidos, Molly Runyon, con-
gratulou-se com os esforços
de Cabo Verde demonstrados
no combate ao tráfico de pes-
soas e na melhoria do aten-
dimento às vítimas de todos
os tipos de crimes violentos.
“ No último ano a luta contra
o tráfico de pessoas em todas
as suas formas tornou-se uma
prioridade para Cabo Verde.
Aplaudimos os esforços do go-
verno, da sociedade civil e das
ONGs para proteger as popu-
lações mais vulneráveis em
Cabo Verde. Estamos muito
orgulhosos da subida de gra-
duação de Cabo Verde para o
nível dois no nosso relatório
anual de tráfico de pessoas”,
sublinhou, acrescentando que
a implementação do Plano
Nacional Contra o Tráfico de
Pessoas irá ajudar a conso-
lidar os esforços do país, no
âmbito da prevenção, protec-
ção e actuação penal.
Neste sentido, Molly
Runyon reiterou a determina-
ção dos Estados em colaborar
com Cabo Verde nos seus pró-
ximos passos na luta contra o
tráfico de pessoas, que qualifi-
cou como um dos piores tipos
de crimes.
Quase um terço das vítimas
de tráfico de pessoas são crian-
ças, enfatizou a Coordenadora
Sénior da UNODC, Cristina
Andrade, na sua intervenção.
“Isso desperta a nossa atenção
para as situações enfrentadas
pelas crianças traficadas e para
a necessidade de iniciativas de
acção ligadas à salvaguarda e
a garantia da justiça para as
crianças vítimas de tráfico”.
Cristina Andrade apelou à
necessidade de se tomar me-
didas urgentes, tendo o inte-
resse das crianças e dos jovens
em primeira linha. Neste sen-
tido, afirmou que a UNODC
está auxiliando estados-mem-
bros a desenvolver respostas
abrangentes e sustentáveis ao
tráfico de pessoas, incluindo
a acusação dos autores, assis-
tência às vítimas, bem como
medidas preventivas. Por fim,
a Coordenadora da UNODC
congratulou o governo de
Cabo Verde pelas importantes
iniciativas para prevenir e re-
primir o tráfico de pessoas no
âmbito de um quadro abran-
gente de prevenção e combate
à droga e à criminalidade em
geral.

Seminário Nacional de Formação

sobre o Tráfico de Pessoas
O tráfico de pessoas é um
fenómeno mundial que vem
afectando diversas camadas
da população mundial com
ênfase em países subdesen-
volvidos onde as carências em
bens materiais e de protecção
são evidentes e nesse aspecto
particular Cabo Verde não foge
às manifestações e debilidades
que são propícias para que os
traficantes ajam com toda a
normalidade e impunidade.
Daí que uma componente
relevante do primeiro Plano
Nacional seja a formação e a
capacitação sistemática dos
operadores e dos aplicadores
do direito como forma de po-
derem conhecer o fenómeno
do tráfico, de investigar, de
acusar, de punir os trafican-
tes e mais tarde de poderem
estar em condições de apoiar
do ponto de vista psicológico,
jurídico e muitas as vezes do
ponto de vista material as víti-
mas resultantes do tráfico.
Assim, foi organizado, na
Cidade da Praia, no mês de
Junho e Julho pelo Ministério
da Justiça e Trabalho, através
da Direcção Geral da Política
de Justiça, em parceria com a
ONUDC e com o financiamento
do Departamento de Estado
dos Estados Unidos da América
dois seminários de formação
sobre o Tráfico de Pessoas. O
primeiro, sobre Investigação e
Acusação, decorreu de 11 a 15 de
Junho, no Centro de Formação
da Polícia Judiciária; o segundo,
sobre Protecção e Assistência
às Vítimas, decorreu de 24 a
26 de Julho, num dos hotéis
da cidade. Nos dois seminários
participaram magistrados,
técnicos de ONGs e da Direção-
Geral da Imigração, agentes
da Polícia Nacional e da
Polícia Judiciária, técnicos da
CNDHC, do ICCA, do ICIEG,
da Cruz Vermelha e técnicos
da Direção-Geral da Política
de Justiça (DGPJ), somando
um total de 40 (quarenta)
formandos, respectivamente.
Os vários módulos da
formação foram ministrados
por especialistas estrangeiros
provenientes da Suíça,
Portugal e Costa do Marfim,
com a colaboração de quadros
nacionais.
 4\\ ESPECIAL
Plano Nacional Contra o Tráfico de Pessoas
Tiphanie Crittin, Especialista em
prevenção do crime, UNODC
O tráfico de pessoas é um fenómeno que atinge
todos os países, sem excepção e Cabo Verde não
foge à regra. O problema de Cabo Verde é a fal-
ta de informações. Não se conhece a dimensão,
pelo que é necessário sensibilizar todos os acto-
res da sociedade civil, os juízes, os magistrados e
agentes policiais para poderem detectar melhor
os casos de tráfico. O objectivo da nossa forma-
ção é justamente para que haja maior coorde-
nação na detecção e maior celeridade processual
quando se deparam casos.
Sandrine Gbialy, especialista em
tráfico de pessoas, UNODC
Espero que os formandos possam estar em con-
dições de materializar o Plano Nacional Contra o
Tráfico de Pessoas elaborado pelo Ministério da
Justiça e que juntos sejam mais fortes para com-
bater o tráfico de pessoas, porque os traficantes
também estão sempre a refinar os seus métodos
para poderem continuar a cometer esse crime.
Sebastião Sousa, perito em
tráfico de pessoas, UNODC
O contexto e realidade do vosso belo país está
num ponto que me faz recordar Portugal, quan-
do, há 13 anos, iniciamos a investigação deste
fenómeno criminal. Havia poucas ferramentas
legais, havia pouca informação, mas o crime já
existia e o fenómeno estava em crescimento.
Nota-se que em Cabo Verde se está a iniciar,
já de algum tempo para cá, nesta matéria, com
resultados bem visíveis muito animadores. Por-
tanto, estão no caminho certo para combater efi-
cazmente este fenómeno que apresenta já indí-
cios sensíveis, quer na área da justiça, quer na área da protecção social.
Patrício Varela, Procurador da República
A formação permitiu-nos entrar em contacto com as melhores práticas
internacionais, conhecer o fenómeno e os desafios que existem para a
prevenção e luta contra o tráfico de pessoas e permitiu-nos também ter
contacto com instrumentos jurídicos internacionais e regionais e ver os
instrumentos que nós temos para melhor sabermos como proteger as
vítimas do tráfico de pessoas.
Evandro Sousa, Sub-comissário da PN
Esta formação trouxe muito de bom para o nosso dia-a-dia. Já temos
uma legislação que nos permite trabalhar nesta matéria, mas ainda não
tínhamos tido formação que nos capacitasse para reconhecer e recolher
indícios sobre o tráfico de pessoas. Portanto, essa formação veio-nos
trazer todo esse background.
Nº 870 • 1 de Agosto de 2018
“Os Estados Unidos estimam que só em África mais de 24.000 vítimas de
tráfico de pessoas foram identificadas em 2017. Apenas 1.700 alegados tra-
ficantes envolvidos nestes casos foram acusados. Destes apenas 454 foram
efetivamente condenados. Cada vítima de tráfico – independentemente da
sua situação específica e da condenação ou não do seu caso - precisa de
constante orientação e apoio visando ultrapassar a condição de vítima para
se tornar um sobrevivente”, Molly Runyon, Representante da Embaixada dos
Estados Unidos.
Perfil das vítimas traficadas através de pontos
de fronteiras oficiais
Segundo a Organização Internacional das Migrações (OIM) as vítimas do sexo feminino
são mais propensas a serem traficadas através de pontos fronteiriços oficiais do que as
vítimas do sexo masculino: entre todas as mulheres da amostra, pontos oficiais de fronteira
são usados em 84% dos casos, enquanto o mesmo número para homens é de 73%. As
crianças também são menos propensas a serem traficadas através de pontos de fronteira
oficiais do que os adultos (56% das crianças, em comparação com 80% dos adultos).
Quadro Legal
A Constituição da República garante o respeito e a dignidade da pessoa humana, reconhe-
ce a inviolabilidade e inalienabilidade dos direitos humanos como fundamento de toda a
comunidade humana, da paz e da justiça. No âmbito do ordenamento jurídico, o Tráfico
de Pessoas foi criminalizada na revisão do Código Penal ocorrido em 2015. O Tráfico de
pessoas para exploração sexual também mereceu a atenção do novo Código de Processo
Penal.
Aspeto jurídico-legal e institucional
Com a revisão do Código Penal, pode-se verificar um melhor enquadramento para os cri-
mes de tráfico de pessoas. Entretanto, nota-se que ainda há uma fraca capacidade das
instâncias judiciais e policiais em detetar/identificar, investigar e julgar os casos de Tráfico
de Pessoas. Neste aspecto é determinante que a justiça crie mecanismos para detectar,
investigar e processar os autores responsáveis por estes crimes.
Deve haver um quadro institucional organizado e funcional de forma a assegurar a partici-
pação de todos os atores e o desenvolvimento de ações eficazes e integradas.
Faz-se necessário um reforço contínuo das capacidades de todos os actores do sector
público e privado e organizações da sociedade civil comprometidos e envolvidos na luta
contra o Tráfico de Pessoas.
Resultados Esperados
O PNCTP pretende, com os eixos estratégicos traçados, alcançar os seguintes resultados:
1 - Dispositivos jurídico-legais e institucionais reforçados;
2 - Mecanismos de prevenção, criados e implementados;
3 - Mecanismos institucionais de proteção e apoio as vítimas implementados;
4 - Capacidade institucional de repressão/responsabilização e reinserção social dos
autores de TP criada e implementada;
5 - Estratégia de comunicação e mobilização social concebida e implementada;
6 - Quadro institucional e mecanismos de parceria definidos e implementados.
Prevenção ao Tráfico de Pessoas
Torna-se fundamental, no âmbito da execução do PNCTP, desenvolver um Observatório de
Monitorização e Identificação Rápida de Situações de Tráfico de Pessoas. Ficará sediada no
MJT/DGPJ e com a possibilidade de ter representações locais, permitindo assim aceder aos
dados de cada sector.
Permitirá conhecer as tendências do crime, de modo a melhorar a informação e a com-
preensão mais pragmática e diferenciada deste fenómeno e os problemas sociais e eco-
nómicos a ele associados. Igualmente, permitirá alavancar com maior eficácia os recursos
destinados à redução do crime e a insegurança e a edificar a protecção das vítimas e das
comunidades.