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I Seminário Crítica da Economia Política e do Direito

21 e 23 de Maio de 2018, Universidade Federal de Minas Gerais

TOYOTISMO COMO IDEOLOGIA NA PARTICULARIDADE BRASILEIRA


(1980-2000)

Leandro Theodoro Guedes


Universidade Federal de Juiz de Fora
ltheodoroguedes@yahoo.com

Elcemir Paço Cunha


paco.cunha@facc.ufjf.br
Universidade Federal de Juiz de Fora

René Campos Teixeira Monteiro Junior


Rene.ctmj@gmail.com
Universidade Federal de Juiz de Fora

Resumo

Este texto tem por objetivo contribuir com o estudo histórico das teorias administrativas
no Brasil e sua caracterização como ideologia, atuando na resolução de conflitos.
Concentrou-se especificamente na concreção do toyotismo na indústria nacional,
sobretudo no setor metalomecânico, e suas ressonâncias nas décadas finais do século XX.
Desse modo, constatou-se que diferentemente de outros complexos do pensamento
administrativo nas décadas anteriores como o taylorismo e o humanismo, o toyotismo
atuou dirimindo conflitos na particularidade brasileira. Isto se deu fundamentalmente por
intermédio da reestruturação produtiva e dos Círculos de Controle de Qualidade (CCQ),
importantes para a regressão das pautas sindicais e enfraquecimento da luta sindical
evidenciada pela redução do número de greves num período que sucedeu o momento de
maior vulto do movimento sindical neste país, ao mesmo tempo em que outros elementos
como o direito (mais atuantes em outros momentos) diminuíram a participação nessa
resolução de conflitos.

Palavras-chave: Toyotismo, Materialismo, Ideologia, Sindicalismo

Abstract

This text aims at contributing to the historical study of administrative theories in Brazil
and its characterization as ideology, actuating in conflicts resolution. It was concentrated
especially on toyotism concretion in national industry, mainly in the metalworking sector,
and its resonances on twentieth century final decades. Therefore, the research showed that
differently from other complexes of the administrative thought in past decades, as
Taylorism and humanism, toyotism did acted resolving conflicts in Brazilian
particularity. It happened, fundamentally, by means of productive restructuring and
Quality Control Cireless (QCC), which were very important in the regression of union
agendas and in the weakening of union struggle emphasized by a decrease in number of
strikes in a period that followed the most massive moment of union movement in this
country. At the same time other elements such as the law (important in other moments)
decreased its participation in this conflicts resolution.
I Seminário Crítica da Economia Política e do Direito
21 e 23 de Maio de 2018, Universidade Federal de Minas Gerais

Keywords: Toyotism, Materialism, Ideology, Unionism

Introdução
As recentes pesquisas acerca da investigação da atuação das teorias
administrativas como ideologia no Brasil, privilegiando as evidências históricas
probantes de sua efetividade (ou ausência delas) (cf. PAÇO CUNHA; GUEDES, 2015;
PAÇO CUNHA; GUEDES, 2017; PAÇO CUNHA, FRANCO, MENDES2017), têm
dado fôlego a este velho e sempre renovado problema, continuando o importante debate
iniciado pelos clássicos da crítica marxista da administração. Recuperar, historicamente,
o traçado dessas teorias é fundamental para situar sua disseminação e influência no Brasil
e articulá-las às determinações econômicas e sociais sem que se faça necessariamente
alguma generalização que distancie o problema das suas bases reais.
A questão candente é demonstrar pela pesquisa concreto-histórica a efetividade
ou não de tais teorias, particularmente sobre os conflitos sociais no Brasil. Como veremos
adiante, um conjunto de ideias se convertem em ideologia quando são acionadas por
classes sociais no esforço de dirimir e dirigir, por assim dizer, os conflitos sociais
provenientes das condições basilares da sociedade capitalista. A presente linha de
investigação não se realiza pela nomeação, num plano mais teórico, das teorias da
administração como ideologia pelo fato de serem ideias interessadas que distorcem a
realidade (Tragtenberg é o melhor exemplo desse tratamento, cf. Paço Cunha; Guedes,
2015), mas privilegia os elementos probantes da conversão de determinadas ideias em
força material capaz principalmente de dissuadir temporariamente, claro, o conflito que
emana dos antagonismos classistas fundamentais.
Especificamente na presente exposição, pretende-se inquirir se o assim chamado
toyotismo atuou, na realidade brasileira, como ideologia. Não somente atuando na prática
das empresas, portanto, mas sendo um importante instrumento para a resolução dos
conflitos sociais, especificamente entre capital e trabalho. Para isso, elegemos o período
das décadas de 1980 e 1990, que compreenderam a introdução e o amadurecimento desse
ideário administrativo nas indústrias do ABC paulista, como o escopo temporal da
pesquisa. Entende-se também o setor industrial como aquele em que a o modelo toyotista
de organização do trabalho é mais permeável e pode atuar de maneira mais profunda e o
ABC como a região mais prolífica da industrialização brasileira, logo um laboratório
prático da introdução dessas técnicas no período. Em se falando de conflitos sociais, é
possível analisar a efetivação prática do toyotismo em conjunto com o movimento das
lutas operárias que dão o tom dos conflitos e que se materializam através de suas
expressões mais claras: as greves. Portanto, falar-se-á do toyotismo enquanto ideologia
caso ele tenha atuado na contenção dessas greves por ser um critério mais objetivo ainda
que não inteiramente suficiente e, por isso, deve ser complementado com outros aspectos
do próprio período investigado. Dessa forma, o objetivo foi determinar em que medida o
toyotismo se efetivou como ideologia nas indústrias do ABC paulista entre 1980 e 1990,
utilizando como critério básico o comportamento quantitativo das greves para o mesmo
período.
Como importantes recursos metodológicos, foram elementares para a realização
do estudo a avaliação qualitativa de materiais que contenham elementos da história desses
movimentos e da prática das indústrias no período estudado, bem como aqueles que se
debrucem sobre a própria atuação do toyotismo. Foi também importante a avaliação de
indicadores estatísticos acerca das movimentações operárias e dados macroeconômicos
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que denotem marcas da atuação do toyotismo. Ambos deram elementos probantes para
as argumentações, podendo indicar, inclusive, fatores concorrentes nessa atuação como
ideologia ou mesmo consequências da sua atuação. Evidentemente, muitos elementos não
serão cobertos. Chegar-se-á a aproximações possíveis que atenderão ao problema aqui
proposto, deixando as limitações, ao final comentadas, para serem sanadas por outras
pesquisas necessárias.
Com efeito, o presente artigo está dividido em três partes. Num primeiro
momento, será feita uma avaliação dos antecedentes do período em debate lançando olhar
sobre os aspectos importantes do “novo sindicalismo” e das técnicas administrativas que
incidiam à época. Em seguida, procurar-se-á levantar os elementos gerais do toyotismo
enquanto prática particular. Depois será avaliada a década de 1980 em que aparecerão os
primeiros traços do modelo japonês no Brasil e por fim, acompanhar-se-á sua concreção
definitiva na década seguinte e os elementos decorrentes.

Ideologia do toyotismo ou toyotismo como ideologia?


Neste tópico consideraremos a determinação material da ideologia que norteou a
pesquisa e também os aspectos centrais do toyotismo que o caracterizam em seu sentido
prático. Esse último aspecto é igualmente importante por ajudar a demarcar o critério
decisivo à delimitação da própria ideologia.
Tradicionalmente, identifica-se ideologia a ideia, a um conjunto mais ou menos
amplo de afirmações e posições. Ideologia, então, estaria associada ao plano das ideias.
Mas não ideias de qualquer qualidade. Por ideologia também se identifica as falsas ideias,
as que distorcem a realidade e, por isso, é bastante frequente a ligação entre ideologia e
ilusão, imaginário e termos mais ou menos correlatos. Essa posição é possível de ser
extraída de diferentes materiais clássicos e também de outros mais recentes (cf. PAÇO
CUNHA; GUEDES, 2015).
A despeito da grande difusão dessa posição, nossa análise no presente trabalho
caminha em direção bastante distinta (cf. xxxxx), pois acentuamos a dupla não identidade
pura entre ideologia e ideia e entre ideologia e falsidade. Não significa também que ideias
não possam ser convertidas em ideologia ou que esta não possa ser falsa. Ocorre,
entretanto, que a determinação ontoprática da ideologia (Vaisman, 1996) a explicita como
força material, inclusive em sentido prático, independentemente de sua falsidade ou
veracidade. Pode-se dizer, seguindo Lukács (2013), que a ideologia se determina por sua
efetividade e duração. Enquanto a primeira denota os efeitos reais mais imediatos na
realidade posta, a segunda é atinente à profundidade de tais efeitos. Limitando-nos, no
presente trabalho, ao primeiro aspecto, é nesses termos que se diferencia a ontoprática de
uma compreensão epistemologizante. Quer dizer, podendo ser verdadeira ou falsa, o que
determina algo (um sistema de ideias, por exemplo) como ideologia é sua efetiva atuação
na realidade social:

(...) verdade ou falsidade ainda não fazem de um ponto de vista uma ideologia. Nem um
ponto de vista individualmente verdadeiro ou falso, nem uma hipótese, teoria etc., científica
verdadeira ou falsa constituem em si e por si só uma ideologia: eles podem vir a tornar‑se
uma ideologia, como vimos. Eles podem se converter em ideologia só depois que tiverem se
transformado em veículo teórico ou prático para enfrentar e resolver conflitos sociais, sejam
estes de maior ou menor amplitude, determinantes dos destinos do mundo ou episódicos. Não
é difícil perceber isso no plano histórico (LUKÁCS, 2013, p. 467).
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Destacam-se dois aspectos importantes. A realidade social, como se vê na


passagem, não é algo amorfo. A ideologia tem sua funcionalidade inscrita nos conflitos
sociais, de maior ou menor alcance, que moldam essa mesma realidade. Conforme
colocou Vaisman (2010, p. 50), “algo, portanto, transforma-se em ideologia, não nasce
necessariamente ideologia, e essa transformação depende de vir a desempenhar uma
função precisa junto às lutas sociais em qualquer nível destas”. Por outro lado, percebe-
se que há uma conversão de algo em ideologia, isto é, ideologia é meio teórico ou prático
de atuação nos conflitos sociais. Queremos destacar sobretudo esse sentido de “veículo
prático” porquanto nos aproxima mais da problemática que pretendemos enaltecer com
respeito ao toyotismo não como um conjunto de ideias, princípios e regras, ou expressão
autentica ou mistificadora da realidade, mas na medida em que esses elementos
convergem de maneiras variadas por veículo prático, constituindo-se assim em força
material.
Por este motivo, parece ser possível avançar na discussão da ideologia do
toyotismo, que vá além da “a amplitude de valores e regras de organização da produção
que sustentam uma série de protocolos organizacionais” (cf. Alves, 2000, p. 3). O passo
adiante está em determinar de forma concreta a efetividade do toyotismo como veículo
prático que potencialmente direciona o rumo dos conflitos sociais.
Com isto em mente, entende-se que tal veículo prático, também enquanto prática
administrativa, está posicionado justamente no âmago do conflito social básico do modo
de produção capitalista, entre capital e trabalho, e por esta razão é sensível a este conflito.
Em verdade, a própria prática administrativa é uma modalidade de resposta a tal conflito.
Por decorrência, é esperado que as formas de consciência teóricas associadas a tal prática
administrativa reflitam igualmente marcas desse conflito. Há então uma potencialidade
de atuação, como ideologia, nas condições objetivas do processo de trabalho e para além
dele. Mas não é suficiente a constatação desse potencial se tal forma de consciência
teórica for desprovida de meios práticos, podendo haver formas de consciência teóricas
que jamais são convertidas em ideologia. Daí a importância de nosso destaque à
efetivação da ideologia como veículo prático, restando saber sobre as contingências
históricas em que a potencialidade típica das formações ideias, incluindo aí a “teoria do
toyotismo” – por assim dizer – se tornou efetividade.
Essa determinação, entretanto, não exime de uma explicitação dos aspectos
nucleares dessa “teoria do toyotismo”, pois nos fornece também certo critério para
identificar as especificidades daquilo que veio a ser posto na particularidade brasileira.
Em síntese, podemos dizer, com base em Gounet (1999), Lima (2002) e Alves (2000) que
os principais aspectos podem ser resumidos a: 1. Produção puxada e flexibilidade da base
produtiva e da organização do trabalho; 2. diminuição do número de trabalhadores,
seguindo a tendência imposta nos anos anteriores na economia japonesa; 3. Um
envolvimento, engajamento da força de trabalho polivalente por meio de distintos
expedientes; 4. Mecanismos de organização da produção: automação por meio da
robótica, kanban, andon, Círculos de Controle e Qualidade (CCQ) etc. O CCQ, em
particular, possui um sentido especial. Têm por objetivo o envolvimento dos
trabalhadores e do sindicato no projeto de empresa, encorajando uma posição mais
agressiva e ambiciosa, não apenas dentro do grupo, mas como ganho no caráter de suas
posições pessoais (LIMA, 2002). A mesma autora argumenta que esse tipo de dominação
não tem o objetivo de ser uma participação democrática, mas sim uma ferramenta para
suprimir sindicatos: “Essa processualidade deslocou do cenário histórico a resistência
organizada dos trabalhadores e a possibilidade da solidariedade de classe” (LIMA, 2002,
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p. 57). Assim os sindicatos combativos perderam espaço para aqueles mais corporativos
e isso teve importantes ressonâncias nos conflitos de classe no Japão cujo objetivo é a
defesa do projeto da empresa. O toyotismo não apenas consolidou seu espaço em cima da
derrota do sindicalismo combativo, classista, mas garantiu as bases para o surgimento de
um sindicato pautado pela colaboração com os gestores, o que já se apresenta como índice
importante da potência para resolver conflitos. Ainda segundo a autora, esse vínculo do
sindicato ao toyotismo acontece não apenas nos momentos de inovação tecnológica, mas
também na inserção de novos trabalhadores e como uma forma de levar o operário a
participar das contínuas inovações tecnológicas.
Tendo evidenciado a exigência de uma investigação material para se chegar às
condições de possibilidade de efetivação de ideologia, é preciso considerar as
particularidades distintas que se estabelecem no desenvolver histórico do capitalismo. O
que mostra, por exemplo, que não se pode, peremptoriamente, aceitar a história das teorias
administrativas nos Estados Unidos refletida no Brasil (cf. cf. PAÇO CUNHA; GUEDES,
2017). O caso brasileiro exige um exame dedicado, centrado nos enlaces decisivos de
suas determinações particulares, compreendendo que a particularidade resulta da unidade
entre os traços gerais que identificam tanto os sistemas econômicos quanto a circulação
das ideias nos diferentes países e os traços singulares, muito específicos de cada formação
social. Sendo a história brasileira o plano principal deste trabalho, é primaz, portanto,
considerar a função, neste caso, do toyotismo na particularidade brasileira. Deve-se
considerar a tessitura sócio-histórica que condiciona a elaboração de uma ideologia e dá
as condições de possibilidade para efetuar-se atendendo o objetivo para o qual está
direcionada. A função, nesse contexto, dá conta do efeito prático da ideologia. As
consequências da sua atuação na condução dos conflitos podem dar o grau dessa
efetividade. Este é o elemento que sentenciará, de fato, algo como ideologia.

Notas preambulares: o novo sindicalismo e o taylorismo à brasileira dos anos 1970


Vargas (1985) assevera ter havido, sucessivamente, desde a década de 1930,
tentativas de implementação do taylorismo no Brasil, que, após sucessos efêmeros,
acabaram por se desenvolver como uma forma particular e generalizada nos anos 1970.
Com o “humanismo”, introduzido no país por intelectuais europeus com o objetivo de
ministrar cursos para a formação de gestores, sequer chegou a haver um desenvolvimento
substancial. Já na década de 1950 era tido como exiguamente desenvolvido, pouco
pesquisado e sem qualquer efeito prático (CUNHA, 1957). E já se mostrou que esse
“humanismo” não teve efetividade como ideologia no Brasil, ao menos não até 1960 (cf.
PAÇO CUNHA; GUEDES, 2017). Considerando que até os anos de 1960 as teorias
administrativas não apresentavam presença significativa na própria prática das empresas,
e, decerto, não se efetivaram como ideologia, cabe agora debruçar-se sobre a década
seguinte (1970), mais precisamente sobre a sua metade final.
De modo geral, é interessante acompanhar a argumentação de Fleury (1979), a
despeito do esquematismo que impõe algum purismo. Ao realizar pesquisa em empresas
de vários setores da Grande São Paulo, com a intenção de verificar o grau de
racionalização do trabalho, pôde colocar de maneira bem sintética o estágio de
desenvolvimento da organização do trabalho ao final dos anos 1970. Os resultados
mostraram que a forma organizativa das empresas pesquisadas, em geral, não se
enquadrava em nenhum modelo estabelecido nas principais correntes teóricas do
pensamento administrativo naquele momento. Designa então a forma de organização
encontrada nas empresas brasileiras como “rotinização” que “não permite a formação de
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grupos e separa o planejamento de execução da tarefa até um nível conveniente”.


Contudo, “não estabelece a maneira ótima de produzir; não procede ao selecionamento e
desenvolvimento cientifico do trabalhador; não usa recompensas monetárias como fator
motivacional para aumentar a produtividade” (FLEURY, 1979, p. 24). Depreende-se
assim que, era possível, a esse tempo, falar em uma “racionalização” no principal centro
industrial brasileiro, não obstante suas debilidades em relação ao “taylorismo clássico”
(ou conceitualmente puro).
Se por um lado não houve a atuação da administração para dirimir conflitos
sociais, por outro a repressão do Estado, historicamente, atuou diretamente sobre as
organizações sindicais. Está posto exatamente o contexto de apoio do Estado para lidar
com a eclosão de movimentações contestatórias, o que apresenta resultados úteis ao
empresariado (FARIA, 1980; WEINSTEIN, 2000), e, restringindo a amplitude dos
conflitos, desobriga esta fração do capital a oferecer qualquer resposta, como, utilizar
práticas oriundas das teorias administrativas, por exemplo, para conter os conflitos. Elas,
portanto, no começo dos anos 1970, permaneciam adormecidas como nos períodos
anteriores em termos de atuação nos conflitos.
Todavia, no fim da década de 1970, observou-se o recrudescimento do movimento
sindical, no que ficou conhecido como “novo sindicalismo”. Em 1978, após a deflagração
da greve dos operários nas primeiras indústrias metalúrgicas no ABC Paulista, fica claro
que as empresas se apoiavam deliberadamente no Estado, apostando na repressão do
movimento para a sua resolução, ou no próprio ordenamento jurídico, uma vez que greves
eram ilegais. Mas, como elemento decisivo, havia também a disposição dos sindicatos a
negociar, o que se sobrepunha à disposição dos operários para a luta e arrefecia os
movimentos, como asseverou Moura (2015). Na verdade, seguindo o autor, o elemento
definitivo que finalizou a greve consistiu no acordo que previa o aumento salarial aos
operários. Então a articulação de fatores como a repressão do Estado com o atendimento
de demandas dos sindicatos selou o fim daquelas contendas. Um prosseguimento do que
já ocorria nos anos anteriores, com a exceção de que neste ano a greve reuniu mais
trabalhadores de mais indústrias, denotando um movimento mais contundente.
No que toca a atuação do Estado, seja pelo aparato jurídico ou repressão policial,
é preciso ressaltar que justamente no ano de 1978, pouco tempo após o término da
primeira grande greve do ABC, há a publicação de um decreto presidencial, não muito
específico, que permitia às empresas cujas “atividades eram essenciais de interesse da
segurança nacional” (BRASIL, 1978) sancionar deliberadamente seus trabalhadores que
aderissem às greves1. E isso englobava as indústrias que preenchessem esse critério pouco
específico, definido segundo a vontade do Presidente da República. É prudente ressaltar
que este dispositivo não se confunde com a lei anti-greve, que já estava em vigor desde a
década anterior. Nota-se que as sanções, eram determinadas juridicamente, mas para
serem aplicadas pela própria empresa sem a atuação direta do Estado. Desse modo, o
direito atuava na resolução provisória dos conflitos não apenas nas contendas judiciais ou
pelos braços da polícia, mas também no âmbito interno das empresas. Inclusive, é
justamente em meio à greve de 1979 o desencadeamento de um grande contingente de

1
As sanções, chegavam até a demissão, dando total liberdade para a empresa: Art. 3º Sem prejuízo das
sanções penais cabíveis, o empregado que participar de greve em serviço público ou atividade essencial
referida no artigo 1º incorrerá em falta grave, sujeitando-se às seguintes penalidades, aplicáveis individual
ou coletivamente, dentro do prazo de 30 (trinta) dias do reconhecimento do fato, independentemente de
inquérito: I - Advertência; II - Suspensão de até 30 (trinta) dias; III - Rescisão do contrato de trabalho,
com demissão, por justa causa (BRASIL, 1978).
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demissões nas indústrias do ABC após a trégua de quarenta e cinco dias (MOURA, 2010),
mesmo havendo o acordo de que não haveria demissões durante a trégua. O desfecho de
1978, em verdade, também foi o que marcou a greve geral de 1979, que, embora tivesse
sido ainda maior, alcançando a mobilização nas ruas e mais de 200 mil trabalhadores,
significou, para estes, uma regressão na luta tendo em conta seus resultados negativos
como a obrigação que impeliu os trabalhadores a pagarem pelos dias parados, como parte
do acordo com o empresariado (MOURA, 2010). A resposta repressiva despontava cada
vez mais como uma força para conter os confrontos o que culmina na própria prisão dos
operários em greve e a proibição de manifestações públicas por parte dos grevistas, como
sublinhou o autor supracitado. Aqui também, o ponto conciliatório se apresenta de
maneira diferente, uma vez que comissões de fábrica independentes conseguem se impor
mais e rejeitar algumas propostas de encerramento da greve colocadas pelos sindicatos, o
que não evita o acordo ao final (MOURA, 2010). O mesmo autor ainda mostra que esse
panorama se repete também nas movimentações de 1980, sendo assim o aspecto mais
marcante desse período de retomada da mobilização operária no país.
A repressão policial atuou por diversos momentos durante essas greves, e foi
capaz de frear muitas movimentações dos trabalhadores, inclusive atuando
preventivamente nas fábricas a pedido dos empresários. Além de, evidentemente, existir
essa atuação policial a pedido dos empresários, havia também, nas empresas, guardas
armadas e numerosas não necessariamente mantidas pelas empresas, mas por elas
utilizadas para, por exemplo, obrigar trabalhadores parados a retomar o trabalho. Essas
ações também se davam no entorno das empresas

A repressão atinge a empresa em todos os níveis, e a empresa vai montar esquemas de


segurança que impedem a locomoção do operário, obrigando-o a permanecer exclusivamente
em sua seção; na entrada da fábrica proliferam ações policialescas com revistas de suspeitos,
cujos nomes estão marcados na portar, enquanto no interior da organização, mais
propriamente na linha de produção, a4:iressão para o andamento do trabalho será agravada e
as comunicações entre os operários impedida (FARIA, 1980, p. 356)

O enfrentamento dos conflitos de classe insurgentes do triênio mais complexo do


novo sindicalismo foi, em linhas gerais, capitaneado pelo Estado mediante diversas ações,
agindo em aliança com o capital, sobretudo por intermédio do aparato jurídico-policial.
Isto se somou à orientação predominantemente conciliatória dos sindicatos. Elementos
contidos em teorias administrativas, sobretudo a organização do trabalho, estavam
consolidados na prática cotidiana das empresas, muito embora ainda não tivessem força
similar ao direito para impetrar efeito prático nos conflitos. De maneira oposta, alguns
elementos caros a teorias administrativas para o bom funcionamento da empresa são
inclusive deixados de lado na medida em que se instaura o clima beligerante entre capital
e trabalho. Exemplos disso estão nas próprias práticas de comunicação, colocadas como
fundamentais para a fluência da administração nas empresas, são cerradas cedendo lugar
a interrogatórios e pressões no momento das greves (FARIA, 1980). Esse movimento
mostra como o desenvolvimento da realidade concreta pode impor condições favoráveis
ou não aos aspectos de um complexo que potencialmente pode se materializar como
ideologia, no caso a administração. Para o exame do período proposto inicialmente no
Brasil, far-se-á, primeiramente, a seguir, uma breve elucidação acerca do toyotismo.

Inserção do toyotismo, mudanças políticas e crise econômica nos anos 1980


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A entrada da década de 1980 representou o início da introdução das técnicas


toyotistas no Brasil. No panorama econômico, esta década foi consecutiva às crises do
petróleo e apresentou, na sua duração, a oscilação entre momentos de recuperação e de
decaída, sendo a taxa média real de crescimento do produto interno bruto 1,66%
(GIAMBIAGI, 2010). Para a indústria metalomecânica, a metade final da década, a
mesma em que o toyotismo desponta, foi a mais prolífica, mas também percebeu
momentos de instabilidade, como podemos acompanhar na tabela abaixo:

Tabela 1: Índices Anuais da Produção Industrial (base: 1991=100)


1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995
Metalúrgica 106,27 118,96 119,47 115,59 121,39 106,07 100,00 99,36 107,02 117,91 115,81
Mecânica 110,08 134,28 139,70 127,68 134,04 111,44 100,00 90,52 106,23 128,61 122,77
Fonte: Adaptado de IBGE (s/d)

No setor metalomecânico, percebe-se que a principal decaída ocorre somente no


início da década de 1990, muito por conta dos problemas de liquidez resultantes do Plano
Collor. Em contrapartida ao crescimento da produção há a oscilação com tendência à
retração no número de trabalhadores ligados à produção como pode-se ver na seguinte
tabela:

Tabela 2: Índices anuais do pessoal ligado à produção industrial (base: ano


anterior=100)
1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995
Metalúrgico 102,51 112,79 103,47 97,08 99,02 95,12 88,10 92,18 99,05 97,99 102,16
Mecânico 108,69 112,79 101,28 94,55 99,04 94,32 86,98 95,41 96,08 103,91 97,65
Fonte: Adaptado de IBGE (s/d)

Aqui se vê um relativo acréscimo de trabalhadores no fim da década de 1980, mas,


nos anos seguintes, esse número decai, não retomando na década de 1990 os níveis da
década de 1980, o que mostra um acréscimo na pressão da produtividade por trabalhador.
Na mesma direção, as taxas de investimento em maquinário e equipamentos segue a
mesma oscilação, e mesmo se recuperando ao fim da década de 1990, não atinge os níveis
anteriores.

Tabela 3: Formação bruta de capital fixo (máquinas e equipamentos) como


porcentagem do PIB
1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000
5,34 5,24 5,95 7,41 7,07 6,87 5,67 4,97 5,05 6,03 6,45 5,28 5,33 4,97 4,83 5,26
Fonte: Adaptado de IBGE (s/d)

É importante acentuar que o toyotismo entra no Brasil num momento de ligeira


retomada do crescimento da indústria, mas é também um momento em que este setor
passa a representar menor participação no produto interno, com o crescimento do setor
de serviços. Na década de 1980 a indústria representava 34,29%, percentual que cai para
29, 97% no decênio posterior (BONELLI, 2006). Ademais é fundamental lembrar que o
toyotismo é inserido pela iniciativa de grandes multinacionais que já experimentavam um
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processo de desindustrialização e decréscimo das taxas de lucros em seus países de


origem.
As importantes movimentações operárias ocorridas no fim década de 1970
legaram um histórico que favoreceu à continuidade dos movimentos no decorrer da
década seguinte. Ao longo desta, percebeu-se com intensidade a deflagração de greves no
setor industrial, em outros setores privados e também em instituições públicas. Destaca-
se, por um lado, o aspecto quantitativo, que percebeu sensível crescimento até 1989
(gráfico 1),

Gráfico 1: Quantitativo de greves no Brasil

Fonte: NORONHA, 2009, p. 130.

E também a expansão de greves para além do ABC paulista

Em 1981, os operários e operárias da Ford decretam uma importante greve. Em 1983 tem-se
a primeira greve geral da década, a segunda greve geral é deflagrada em 1986, seguida por
uma terceira em 1987 e por fim a quarta greve geral em 1989. Em 1988 tem-se uma
importante greve com ocupação e enfrentamento armado com o exército na Companhia
Siderúrgica Nacional. Esta greve é seguida pelas greves com ocupações da Belco-Mineira e
da Mannesmann em 1989 (MOURA, 2010, p. 12).

Mantinham-se as formas comuns com que se levava ao cabo aquelas


manifestações. Mas, desta vez, outros elementos adquirem importância, como a
progressiva aproximação dos sindicatos com a luta parlamentar num momento de
constituição de novos partidos e do ganho de fôlego das campanhas pela
redemocratização. A alta inflação e o nível de emprego instável também ajudavam a
reduzir a movimentação operária. Ou seja, vê-se aqui uma variedade maior de fatores
atuando na contenção dos conflitos sociais emergidos da indústria. Outras formas de
refreamento dos movimentos se mantêm, como um prosseguimento dos anos anteriores,
no exemplo da forte repressão representada pela aliança entre o capital e a esfera
governamental pela forma da força policial (MOURA, 2010; POGIBIN, 2009). Em suma,
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a despeito do crescimento quantitativo das greves neste início de década como se viu no
gráfico 1, não se vê mais a força de concentração dos movimentos como no fim dos anos
1970.
É na segunda metade da década de 1980 que alguns aspectos ligados ao toyotismo
passam a se fazer presentes mais decisivamente nas indústrias do ABC. No contexto de
remonta do movimento sindical, as indústrias no ABC (sobretudo aquelas multinacionais)
viram-se mergulhadas num momento de tensão que exigia alguma reação mais imediata
(SILVA, 2004). Assim, passou-se a implementar métodos já difundidos
internacionalmente com o objetivo de reduzir essas movimentações operarias. Colocou-
se em prática os Círculos de Controle de Qualidade (CCQ). Evidentemente, era clara a
intensão de estabelecer esses círculos e suplantar ou reduzir a força dos sindicatos, em
pleno vigor à época: “Se, de um lado, esses modelos admitiam como legítimas as
reivindicações dos trabalhadores; por outro, buscavam estabelecer outros canais de
comunicação com os trabalhadores fora da ação do sindicato”. (SILVA, 2004, p. 152).
Coincidentemente, este método foi implementado no Japão no mesmo contexto de conter
movimentações operárias (LIMA, 2002). A propósito, nas décadas anteriores, também
era possível identificar, exiguamente, o incentivo à participação dos funcionários
conjugado com os incentivos econômicos como a participação nos lucros e outras
medidas nomeadas de co-gestão em países europeus devidamente explicitadas por Faria
(1982) e Tragtenberg (1980). O primeiro chamou a atenção também para elementos do
empresariado nacional, defendendo essas técnicas, munidos da influência europeia.
Inicialmente, no início da década de 1980, estes círculos não puderam ser
colocados em prática de maneira completa. Segundo (Freyssenet; Hirata, 1985), a forte
resistência sindical, as diferenças estruturais entre as empresas nacionais e as japonesas e
a baixa permissão por parte dos gestores da participação dos operários nos CCQs, além
da sua aplicação sem o acompanhamento de outras técnicas que compunham
originalmente o modelo japonês de gestão, foram os motivos mais importantes para essa
dificuldade inicial.
A primeira expressão mais clara da atuação das técnicas de gestão no Brasil como
ideologia, como conjunto de ideias e princípios convertidos em força material de
resolução de conflitos, acontece na metade final dos anos 1980, ao mesmo tempo em que
já se percebia menor combatividade por parte dos sindicatos. No ano de 1987, nota-se a
progressão do modelo japonês com a expressão de mais um aspecto: a reestruturação
produtiva – série de mudanças na produção que coincidiam com algumas técnicas
toyotistas e visavam à redução do número de empregados, sem que a produtividade
abaixasse. Isto ocorreu primeiro na Autolatina, “parceria da Volkswagen com a Ford, um
projeto de unificação entre as duas fábricas implementado em 1987, por meio dele as duas
fábricas compartilhavam operários, projetos e técnicas produtivas” (MOURA, 2010, p.
7). Como consequência dessa fusão, houve, neste ano, a demissão de mais de 10 mil
funcionários nessas fábricas. Dessa vez, esse fato não representou, contudo, uma
movimentação mais contundente por parte dos trabalhadores (SILVA, 2004). Na medida
em que se percebia um enfraquecimento da formulação de pautas de luta e a participação
cada vez mais tímida dos sindicatos, as comissões de fábrica, materializadas nos CCQs,
ganhavam espaço, mas tratavam-se de instâncias menores e portadoras de reivindicações
mais restritas, senão conservadoras, seja pela análise dos acontecimentos: “Os
trabalhadores manifestam-se menos críticos ao processo de reestruturação produtiva
desde que apresente duas características: seja negociado com a comissão de fábrica e
possibilite uma melhoria nas condições de trabalho” (SLVA, 2004, p. 161) seja pela
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forma de encarar as novas técnicas sem desenvolver uma resistência mais organizada “as
comissões institucionalizam conflitos, permitindo a introdução negociada da
reestruturação produtiva” (SILVA, 2004, p. 164).
Como se viu no gráfico 1, o fim da década de 1980 demarca o início da queda do
quantitativo anual de greves no Brasil, compreendendo-se o ABC paulista como parte
desse contexto. Assim, tanto a baixa resistência oferecida pelas comissões representadas
no CCQs, quanto os ecos futuros que coexistem com o avanço da implementação de
técnicas japonesas de gestão no Brasil, configuram o primeiro momento em que a
administração, pôde, de alguma forma atuar diretamente nos conflitos entre capital e
trabalho, demarcando, também o início da atuação do toyotismo nesse mesmo sentido.
É preciso ressaltar que o desenvolvimento dessas técnicas de gestão não atuava
isoladamente, coexistindo, até o fim dos anos 1980, com importantes pontos do aparato
jurídico como a lei antigreve e o decreto que permitia punições a grevistas, revogados
após a Constituição de 1988. O fato de haver a diminuição de greves no ano subsequente,
sem a concorrência desses dispositivos importantes, abre mais espaço para a atuação das
técnicas do modelo japonês na resolução dos conflitos. A baixa participação dos
sindicatos nas lutas também é um fator concorrente, tendo em vista sua adesão mais
sistemática à conciliação com as empresas, como se verá, bem como a persistência da
força policial do Estado. Em verdade, isso não sofreu grandes mudanças, basta lembrar
que mesmo estando fora do contexto do ABC, a grande greve na Companhia Siderúrgica
Nacional em 1987 foi fortemente reprimida pelo exército (MOURA, 2010). O que se
depreende do movimento aqui demarcado é exatamente o início de uma inflexão que
passa a colocar as teorias de gestão, finalmente, como um elemento importante na
resolução de conflitos.

A atuação do toyotismo como ideologia nos anos 1990


A claudicante economia brasileira gerou, para o grande capital, a necessidade da
reestruturação da economia e do Estado, além da necessidade de repensar no modo de
inserção no sistema mundial do capital (ALVES, 2002). O Governo Collor, logo no início
da gestão, buscou implementar medidas que incluíam a reforma administrativa, as
privatizações e um conjunto de políticas liberalizantes, que abarcavam a quebra de
monopólios, a abertura econômica, a desregulamentação e o fim dos subsídios e
incentivos” (CONCEIÇÃO, 2006, p. 112). Por conseguinte, mostra Santos que isso acaba
“tornando o país mais atrativo e lucrativo para o capital financeiro internacional e para as
grandes corporações que buscavam vantagens comparativas”. (SANTOS, 2015, p. 101).
Como estratégia mais imediata, o “Plano Collor” tinha por objetivo reduzir a inflação,
através do aumento dos impostos e exclusão dos incentivos fiscais, redução dos gastos
públicos, substituição da indexação mensal de salários por um índice prefixado, uso de
taxa de câmbio flutuante e o confisco das aplicações financeiras (CONCEIÇÃO, 2006).
Isto acaba por gerar uma crise de liquidez e age negativamente sobre a atividade
industrial, pois como pôde ser visto nas tabelas 1, 2 e 3 nos primeiros anos da década de
1990 há simultaneamente a depressão nos níveis de produtividade e emprego, além da
maior baixa na taxa de investimento em capital fixo.
As medidas econômicas de principal relevância nessa transição de década são os
planos de desenvolvimento estratégico das indústrias, em especial o Programa Brasileiro
de Qualidade e Produtividade (PBQP) (SANTOS, 2015). Este, tinha dentre seus objetivos
não apenas a simples transposição das técnicas passadas à técnica japonesa, mas
modificar a relação de confronto entre trabalhadores e capital, para uma relação de
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pretensa cooperação. Ademais, os próprios sindicatos demonstravam sensível


potencialidade para a negociação com sua adesão às câmaras setoriais. Essas câmaras
eram instâncias de debates que envolviam governo, capital e trabalho que buscavam
soluções para os problemas enfrentados pelo empresariado nacional com a liberalização
da economia e o acirramento da competitividade, durando até 1995 (ANDERSON, 1999).
Entendidos esses, obviamente, como problemas que quando resolvidos, favoreceriam não
só ao capital, mas a todos os envolvidos. Por conseguinte, na prática, evidentemente, a
igualdade formal nessas instâncias se desfazia. Nos acordos firmados nas câmaras do
setor automotivo, por exemplo, a grande maioria dizia respeito a pautas importantes para
o empresariado como a queda de impostos, o incentivo ao consumo dos automóveis
produzidos em território nacional e financiamento da produção por bancos públicos
(ANDERSON, 1999). Pautas de trabalhadores eram minoritárias e apareciam em
demandas protocolares de aumento de salários. De forma precisa, podemos acompanhar
que “Pode-se, ainda, questionar o potencial democrático desse tipo de instrumento
analisando-se a capacidade de intervenção dos sindicatos na elaboração de políticas
públicas, já que grande parte das questões de interesse dos trabalhadores (vale dizer, as
propostas de longo prazo) não foi resolvida” (GALVÃO, 1998). Há também um
importante sinal da fragmentação das lutas, pois as câmaras eram divididas em setores da
metalurgia, no entanto aqueles firmados no setor automotivo foram expandidos aos outros
inadvertidamente, sem necessariamente se considerar suas especificidades. E isto
aconteceu com o aval do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, que não se
movimentou em relação aos setores excluídos:

as empresas tentavam reajustar os salários e dar o aumento real apenas para os trabalhadores
dos grupos contemplados na câmara setorial, montadoras e autopeças, excluindo outros,
como máquinas e eletroeletrônicos. Embora tenham cedido reajustes até outubro de 1992,
somente trabalhadores das montadoras e da indústria metal-mecânica obtiveram o aumento
real. Coube ao SMABC apenas sugerir que os operários das outras indústrias mantivessem a
mobilização, para conseguirem semelhantes benefícios (SANTOS, 2015, p. 94-5).

Ao tomar uma maior participação como mediador de conflitos nessa nova


configuração instaurada, os sindicatos influíam diretamente no interior dos conflitos
sociais, servindo aos empresários como aliados sem promover maiores movimentações
contestatórias. É sensível esta mudança de posicionamento do movimento operário que
sai de uma posição contestadora e bastante atuante, exacerbando a mera atuação sindical
por meio de comissões de fábrica atuantes, por exemplo, para uma posição apassivadora
e que não encontra solução para a fragmentação das lutas, seguindo, na verdade um
movimento contrário, de aliança desvelada com o próprio capital.
Para superar os efeitos da recessão profunda, durante a década, houve o incentivo
para as empresas implementarem novas medidas de administração, de reestruturação
produtiva sendo a indústria automotiva o principal objetivo dos entes federativos.

os programas que visavam subsidiar a modernização das indústrias tinham como objetivo dar
as condições institucionais para que as empresas adotassem o novo modelo de produção,
espelhado nas novas formas de gestão da produção japonesa, que se difundira para os países
centrais, sendo responsável pela redução dos custos de produção e considerável aumento da
produtividade. (SANTOS, 2015, p. 87).

Vê-se, portanto, como a implementação do toyotismo em território nacional, se


alinhava à política econômica, e foi, por esse motivo, também incentivada pela esfera
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governamental, de tal forma que passa a acontecer a pulverização de polos industriais por
conta de guerras fiscais, havendo, por esse motivo, certa desconcentração no ABC
Paulista. As unidades que se espalham pelo Brasil, já munidas do caráter toyotista, passam
a ser modernas e, em termos de competitividade, atingem altos níveis de produtividade já
com custos de mão de obra mais reduzidos. Este processo se desencadeara no ABC em
um ritmo mais lento, tendo em vista a necessidade de adequação frente ao histórico.

enquanto as fábricas de produção de automóveis da Volkswagen e da General Motors,


situadas em São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, respectivamente, possuíam,
naquele ano, produtividade de 14,5 e 13,1 veículos por trabalhador ao ano, as novas unidades
industriais da Mercedes- Benz (em Juiz de Fora, MG) e da Renault (em São José dos Pinhais,
PR) - também montadoras de automóveis - teriam produtividade de 46 e 48 veículos por
trabalhador ao ano (CONCEIÇÃO, 2006, p. 132-3).

As diferenças ficam mais nítidas quando se coloca em tela a comparação de novas


unidades de fábricas em outras regiões com as fábricas da ABC Paulista, como podemos
observar na tabela 4, que demonstra como no ABC, ainda que com todo o refluxo do
movimento sindical, os salários ainda eram mais elevados que em outras regiões do país
(CONCEIÇÃO, 2006).

Tabela 4 - Comparação do custo anual da mão-de-obra na indústria de autopeças:


S.B.Campo, interior de SP e Sul de Minas Gerais, 1998, em R$
S.B Campo Interior SP Sul de MG
Subtotal Salários (1) 10.666,67 6.000,00 4.933,33
Subtotal Encargos Sociais (2) 4.160,00 2.340,00 1924
Subtotal Benefícios (3) 3.304,80 2.260,00 2.200,80
Total Geral (1+2+3) 18.131,47 10.600,80 9.058,13
Índice Comparativo 200,17% 117,03% 100,00%
Fonte: CONCEIÇÃO, 2006, p. 136.

De acordo com a Tabela 4, o custo anual de mão de obra em São Bernardo do


Campo é mais que duas vezes aquele encontrado no sul de Minas Gerais, por exemplo.
Como observamos anteriormente, um dos pilares da mudança estrutural do modelo
toyotista é reduzir o custo final da produção e isso é causado por diversos fatores como a
redução do custo de mão de obra, seja pela redução do custo com salários ou pela
manutenção a fábrica com menor corpo efetivo de operários. Nesse sentido, Lima (2002)
destaca que inclusive nas fábricas da Toyota no Brasil, havia importantes disparidades
salariais entre as unidades de Indaiatuba (região de Campinas) e São Bernardo do Campo.
Depreende-se assim que o toyotismo entrou no Brasil por intermédio de sua atuação em
empresas do ABC, mas se consolidou efetivamente com o impulso governamental fora
dele, nas unidades fabris que se instalavam no decorrer dos anos 1990, tendo o ABC
absorvido seus impactos mais tardiamente.
Isto, contudo, não significa que o ABC passou ileso à consolidação toyotista no
Brasil. O que pode ser acompanhando, por exemplo, na Tabela 5, que representa esse
processo ao demonstrar, através dos anos, como a consolidação de um novo modelo de
produção pressiona os custos com mão de obra aliada com as políticas governamentais
(como a aceleração da abertura as importações, as medidas fiscais e monetárias
restritivas) influenciaram diretamente no aumento do desemprego. Principalmente, pela
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redução de postos de trabalho na região do ABC paulista, como podemos observar na


Tabela 5.

Tabela 5. Indústria automobilística no ABC

Nível de Massa salarial


Produção anual (em emprego versus receita
unidades) líquida em
Por (%)
Ano Total empregado (média anual)
1980 1.179.419 8,80 133.641 18,60
1981 780.883 6,60 118.776 19,60
1982 859.295 7,80 109.780 18,40
1983 896.469 8,30 107.493 16,10
1984 864.654 8,10 106.618 13,00
1985 966.708 8,10 119.357 13,60
1986 1.056.332 8,30 127.133 17,30
1987 920.071 7,70 120.121 12,30
1988 1.068.756 9,40 114.019 10,10
1989 1.013.252 8,80 114.955 10,10
1990 914.466 7,70 118.183 11,00
1991 960.219 8,70 110.954 12,50
1992 1.073.861 10,00 107.682 10,40
1993 1.391.435 13,10 106.227 8,80
1994 1.581.389 14,80 106.613 12,90
1995 1.629.008 15,10 107.874 10,20
1996 1.804.328 17,40 103.545 9,40
1997 2.069.703 19,60 105.641 8,50
1998 1.573.106 16,10 97.452 8,70
1999 1.345.515 15,9 84.632 8

FONTE: RODRIGUES, 2002, p. 145

Há aqui a exata medida de intensificação da exploração econômica do trabalho na


medida em que o decréscimo no número de trabalhadores contrasta com relativo aumento
da produção de veículos, ao menos até 1997, ao mesmo tempo em que há a diminuição
da representação dos salários se comparados à receita. Ou seja, há a diminuição de custos
com a redução de operários e com a menor participação dos salários na receita das
empresas. Mesmo havendo, ainda em 1998, outros centros industriais menos custosos, o
ABC paulista já se encontrava completamente submergido no assim chamado processo
de flexibilização do trabalho. Também se salienta que há o aumento dos empregados no
setor de serviços, como um reflexo do movimento da economia nacional. Processo que
se dá se dá principalmente pela “desverticalização” da grande indústria, encontrando nas
empresas que prestam serviço terceirizado, mão de obra para suprir as necessidades da
grande indústria (CONCEIÇÃO, 2006).
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Entendendo-se que este processo sucede e é contemporâneo de um período de


estagnação econômica, com momentos de recessão, o emprego do toyotismo no Brasil
acaba se dando de forma inteiramente diferente do que ocorreu no Japão: “Naquele pais,
as modificações compuseram um quadro de melhoria competitiva; no Brasil as melhorias
são defensivas, visam a permanência e não a conquista de novas fatias de mercado”
(LIMA, 2002, p. 222). Certamente, este é o momento em que a organização do trabalho
se articula da forma mais concreta possível no Brasil. A forma acelerada com que esse
processo se deu foi inclusive contrastante com o taylorismo, que sequer chegou a um
nível tão universal mesmo nos anos 1970.
Na região de Campinas, que se transformou também num importante polo
industrial nos anos 1990, há uma situação similar à do Grande ABC Paulista. E um dado
fundamental, que também indica as consequências da flexibilização do trabalho para os
trabalhadores, descrito por Santos (2015) é a que em Campinas, a partir da década de
1990, a rotatividade passou a ser maior dentre os trabalhadores mais longevos nas
empresas. Santos (2015) mostra como esse ponto interfere diretamente na vida dos
trabalhadores seguindo o contexto vigente àquele tempo

Do ponto de vista político, agora sob o processo de transformações técnicas e


organizacionais, os números da rotatividade sugerem que, sem abrir mão de uma força de
trabalho experiente no processo produtivo, as empresas passam a tornar vulnerável a
permanência desse perfil de trabalhador, deslocando-os entre o conjunto de plantas da
Região, aumentando a sensação de insegurança nessa parcela da categoria. Insegurança
reforçada pelo enorme número de demissões, como vimos, e pela terceirização (SANTOS,
2015, p. 174-5).

A semelhança nos indicadores quantitativos, também se articula nas relações de


trabalho. Sabe-se que as grandes empresas de Campinas, em especial a unidade da
Toyota, aderiram em grande parte (após a década de 1990) ao modelo japonês. Isso
matrizava grandemente os processos seletivos, que além de serem voltados aos ditames
da flexibilização, consideravam também o histórico recente de lutas operárias no Brasil.

A Toyota de Indaiatuba tomou cuidado de recrutar preferencialmente trabalhadores mais


jovens e, portanto, pretensamente mais propensos a aceitar as regras e os ritmos impostos
diante da oportunidade de ingressar em uma multinacional meio à crise de desemprego. Além
disso, os jovens não trazem o acúmulo de lutas sindicais passadas, não tem conhecimentos
de seus direitos, tem mais vigor físico, acumulam informações em fragmentos que os ajudam
a se tornar generalista. (SANTOS, 2015, p. 186).

Os empresários passaram a mudar as formas de abordagem a seus funcionários,


passando uma imagem pretensamente amigável e/ou democrática, eliminando desse
modo a noção de hierarquia, como os próprios CCQs objetivavam. O trabalhador por sua
vez, temendo os altos índices de desemprego, opta pela colaboração dentro da fábrica e
recusa envolvimentos com sindicatos, levando em consideração, como mostrou Santos
(2015), o risco de se juntar a uma instituição ineficiente em termos de movimento
combativo, se submetendo assim as mazelas geradas pelo modelo enxuto de produção
A queda no quantitativo de greves é um aspecto importante que mostra um refluxo
do movimento operário no ABC na década de 1990. Mas é ainda mais notória a redução
das pautas defendidas pelos sindicatos, que se voltaram às questões mais específicas, e
certamente mais restritas, do cotidiano laboral. A agenda sindical
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se voltou para o interior da empresa, discutindo mais diretamente temas relacionados à


problemática do trabalho, sejam vinculados à organização e gestão do trabalho, sejam aquelas
questões relacionadas à remuneração variável, como a participação nos lucros e resultados
(PLR) ou, ainda, as que dizem respeito à flexibilização da jornada de trabalho como o banco
de horas, entre outras (RODRIGUES, 2002, p. 142).

A especificidade dessas pautas dificultava, por exemplo, a tentativa de união entre


trabalhadores de diferentes empresas, por haver uma articulação diferente em cada uma,
um reflexo disso são as negociações feitas, em grande monta, separadamente, o que
ocorre também na justiça do trabalho (ALVES, 2002). Aliam-se a isto os aspectos
conjunturais preponderantes da década que apontaram para uma diminuição dos postos
de emprego na indústria – o que ocorre progressivamente desde a década de 1980 – e o
aumento da produtividade por trabalhador. Uma pesquisa feita por (RODRIGUES, 2002)
acerca das negociações entre sindicatos em empresas no ABC durante a década de 1990
aponta que majoritariamente os temas mais envolvidos eram a participação nos lucros
(que não se confunde com salários) e a jornada de trabalho, ambos pontos nodais da nova
forma de organização do trabalho como consequência de uma atuação mais consistente
do toyotismo. Outras pautas como as condições de trabalho e a própria organização
sindical, tão importantes em outros tempos, passaram para um segundo plano.
Mais precisamente, chegou-se inclusive à deflagração de greves por questões
salariais e de tempo de trabalho, estas greves incluíram a união entre os sindicatos de São
Bernardo e Campinas, que compreendiam as fábricas da Toyota e foram greves encaradas
pela empresa com intimidações e ameaças incisivas. Houve uma vitória aparente, mas a
empresa respondeu com demissões e promoções de alguns operários arrefecendo o
movimento nos anos seguintes (LIMA, 2002). Seja como for, este é um movimento único
em toda a década. Mas aqui se repete uma situação vista também em momentos de maior
volume do movimento operário: a não utilização de um preceito administrativo teórico,
específico, para lidar com as greves. Ou seja, nesse caso, as técnicas toyotistas podem
atuar arrefecendo movimentos operários preventivamente, atuando sobre a mobilização
sindical, ou mesmo diretamente sobre os operários que abandonavam as mobilizações por
conta do próprio cansaço, mas não tem acontecido o mesmo no enfrentamento das greves
deflagradas, sendo usadas, nesse ponto, medidas mais drásticas (como as intimidações).
Isto pode apontar para uma particularidade da administração nessa atuação sobre os
conflitos: uma força mais preventiva do que reativa à eclosão de conflitos.
Fica, particularmente, configurada a importância dos CCQs nas relações entre
capital e trabalho também, como um fator de redução das querelas que contribuía com a
inibição do espaço dos sindicatos, que por sua vez já não ofereciam resistência. A
formação de grupos reduzia a abrangência das pautas e diminuía a força dos trabalhadores
que estavam divididos (FERRO; GRANDE, 1997). Uma pesquisa de 1994 feita em uma
série de indústrias do setor metalomecânico de São Paulo mostrou que, não somente essa
técnica sobreviveu aos percalços iniciais da década anterior, mas evoluiu e, fazendo
ajustes em relação ao modelo japonês, se expandiu para grupos com objetivos
operacionais similares, mas que se formavam em situações mais contingenciais sob a
forma de “força-tarefa, times da qualidade, equipes de projetos etc.” (FERRO; GRANDE,
1997, p. 84). Essa expansão se dá num momento de plena escalada da reestruturação
produtiva no país e passa ilesa a questionamentos dos sindicatos a ponto de haver uma
postura categoricamente acrítica dos sindicatos a seu respeito:
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A resistência dos sindicatos, apontada como um dos fatores que mais afetou o
desenvolvimento dos Círculos nas organizações brasileiras na década passada, não foi
considerada uma oposição relevante nos casos estudados. Mesmo outros fatores, como a crise
econômica e as demissões, citados na literatura como um impedimento à consolidação do
CCQ nas empresas durante a década de 80, parecem não se ter constituído em obstáculo ao
seu desenvolvimento na visão das empresas (FERRO; GRANDE, 1997, p. 84).

Todo esse processo coincide com a diminuição da força do movimento operário


num momento em que este já estava tomado pelas “lutas diminutas”, ou seja, os embates
cotidianos no interior das fábricas. Os aspectos do toyotismo que se destacam atuando
como ideologia no Brasil se evidenciam muito claramente neste final do século XX
contribuindo juntamente com fatores que já estavam presentes anteriormente como o
direito, mas de uma forma mais direta, uma vez que a década de 1990 é marcada pela
diminuição da repressão tão presente em tempos anteriores. A diminuição das greves tem
menor participação do direito, ainda que ele continue atuando na resolução de
negociações individuais dos trabalhadores. A atuação do toyotismo adquire assim uma
posição sem precedentes inclusive na história da prática administrativa no país.

Considerações finais
A década de 1990 é o período em que, de fato, a organização do trabalho encontra
condições materiais amplamente favoráveis para penetrar profundamente as raízes da
indústria e do capital brasileiros, sob a forma toyotista. Os indicadores econômicos
apontavam a tendência para a acentuação da exploração do trabalhador, ainda que não
necessariamente concorrente com o aumento da taxa de investimento que se manteve
oscilante, sublinhando o caráter defensivo do toyotismo pelo capital produtivo nacional.
Os sindicatos e o movimento operário em geral perdem a força, principalmente pela
fragmentação das lutas, com as unidades fabris sendo pulverizadas, a produção
horizontalizada, desconcentrando a localização dos trabalhadores e ocorrendo a própria
diminuição do quantitativo de operários. Há também a opção de luta através de instâncias
de debates, evidentemente conservadoras e que permitem menor participação aos
trabalhadores. Esses pontos relacionados aos sindicatos configuram uma atuação do
toyotismo como ideologia, primeiramente por serem produto da atuação da reestruturação
produtiva no plano macroeconômico, que pressiona a força dos sindicatos, com a
diminuição do número de trabalhadores e influenciam na formação das câmaras setoriais,
também notadamente, há a difusão e atuação direta dos CCQs. Eles passam a ser o espaço
de participação dos trabalhadores para colocarem seus problemas em pauta, mas são
evidentemente um espaço aberto na empresa, com a participação de gestores e que
abrange problemas, eminentemente operacionais, que que dizem respeito aos problemas
da indústria. Restringem as querelas e enfraquecem a combatividade.
A redução de salários, diminuição de postos de trabalho, aumento da taxa de
desemprego, desorganização de sindicatos e trabalhadores, acentuação da exploração do
trabalho, elementos macroeconômicos tendentes eram diretamente impactados pelas
técnicas toyotistas. O toyotismo agiu diretamente nesses aspectos, como uma expressão
prática e organizacional que viabilizava essas tendências e isto o coloca em posição mais
preponderante do que o “humanismo”, por exemplo, já que este não toca nessas questões.
O toyotismo age como ideologia definitivamente atuando em aspectos mais gerais
fundamentais para a redução das lutas dos trabalhadores de um modo geral. É assim que
atua nos conflitos. Mas essa mesma força não pode ser vista na contenção dos conflitos
em disputa: no caso da greve da Toyota em Indaiatuba, as ameaças, demissões e outras
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estratégias advindas da direção não são exatamente técnicas desse modelo de gestão e
isso pode ser fundamental para determinar as possibilidades da organização do trabalho,
isto é, tem um potencial maior na prevenção dos movimentos, haja vista os dados
probantes do arrefecimento das lutas, do que na reação a eles como se vê nas análises
específicas das greves.
É preciso ponderar, por fim, que o que se viu aqui não é definitivo e a questão dos
conflitos pode ter visto o surgimento de outras forças de combate. Demarcou-se a
aproximação do que podem ser os limites da atuação da administração na história do
capitalismo brasileiro, esforço que deve ser continuado com a reunião de mais dados
decisivos e a compreensão de períodos outros, sobretudo os mais recentes.

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