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STUDIUM
REVISTA TEOLÓGICA
Studium: revista teológica/ Studium Theologicum de Curitiba - Ano 3
n. 5 e 6 - 2009.
Semestral
ISSN 1981-3155
CDU: 2
SUMÁRIO
Ano 3 – 2009
Nº 5 e 6
Editor-Chefe
Hélcion Ribeiro – Studium Theologicum, Curitiba, PR.
Conselho Editorial
Alceu Luis Orso - Studium Theologicum, Curitiba, Pr.
Jaime Sánchez Bosch – Studium Theologicum, Curitiba, Pr.
Marcio Luiz Fernandes – Studium Theologicum, Curitiba, Pr.
Teodoro Hanicz – Instituto S. Basílio Magno, Curitiba, Pr.
Valdinei de Jesus Ribeiro – StudiumTheologicum, Curitiba, Pr.
Vitor P. Calixto dos Santos – CEUCLAR, Batatais, SP
Conselho Consultivo
Angelo Carlesso - Studium Theologicum – Curitiba, PR.
Sávio Scopinho – Faculdades Claretianas, Rio Claro, SP.
Ricardo Hoepers - Studium Theologicum – Curitiba, PR.
ADMINISTRAÇÃO E REDAÇÃO
Contato e assinatura
Para fazer memória, dois artigos abrem esse número: o do ex-aluno e ex-
professor Ronaldo Munhoz e do arcebispo emérito de Curitiba, onde estamos.
O artigo do Pe. Luis Artigas (in memóriam) - que foi produzido para
uma “Miscelânia oferecida ao Pe. José Penalva CMF, na celebração de seu 70º
aniversário”, em 1994 – é reproduzido neste número de nossa revista como
homenagem a todos os professores do STUDIUM, desde os fundadores até os do
presente. A publicação do texto se presta também para aquilatar a competência
de tantos dos nossos professores.
Por ocasião dos 200 anos do nascimento de Darwin e dos 150 anos do
lançamento de sua “teoria da evolução”, surge para muitos cristãos a pergunta
sobre a posição da Igreja na relação do evolucionismo e da fé. O artigo de Hélcion
Ribeiro - A criação contínua ou a falsa oposição entre criação e evolução –
pretende traçar o significado e o lugar da teologia diante deste espírito (“Zeitgeist”)
que toma conta da vida contemporânea, evidenciando a dimensão contínua da
ação criadora de Deus. Sem “perder-se” em aspectos técnicos da evolução,o autor
faz a preparação de terreno para compreender esta maravilha que uns chamam
de “criação” e outros de “evolução”.
Ronaldo Mazula *
RESUMO: O texto recupera uma palestra celebrativa sobre os 75 anos da história do Studium. O
autor recorda a expansão claretiana no Brasil, na década de 20 do século passado, e o surgimento
de vocações autóctones na década seguinte, como origem da criação de estruturas mais
adequadas para formação dos futuros missionários claretianos. O futuro Studium nasceu, em
1934 como Seminário Maior de Curitiba, com os cursos de filosofia e teologia.
A partir de convênios com a arquidiocese de Curitiba, em 1962, surge o Studium como uma escola
9
que prestará o serviço eclesial da formação teológica dos seminaristas claretianos e diocesanos,
além de inúmeras outras congregações religiosas que aqui tinham seus alunos. O Studium, para
qualificar seu ensino estabeleceu inúmeros convênios escolares, como com A Universidade
Católica do Paraná (mais tarde PUC do Pr.) Universidade Lateranense de Roma. Abriu-se para
a formação de leigos e religiosos. Busca, atualmente, o reconhecimento público no MEC e está
integrado ao complexo universitário Ação Claretiana EDUCLAR, de Batais (SP). Centenas de
sacerdotes, mais de uma dezena de bispos e até um cardeal, sentaram-se nestes bancos escolares,
para ouvirem as lições de professores e teólogos claretianos ou não.
ABSTRACT: The text recovers a celebratory lecture about the 75 years of history of the Studium.
The Studium was born in 1934 as the Major Seminary of Curitiba, with philosophy and theology
courses, due to the Claretian expansion in Brazil, from the 20s of last century. Starting with a
partnership with the Archdiocese of Curitiba, the Studium has provided the ecclesial service of
the theological formation to Claretian as well to diocesan seminarians, and to numerous other
religious congregations. To qualify its teaching, the Studium established numerous partnerships,
such as with the Catholic University of Paraná (later PUC of Paraná) and the Lateran University
in Rome. It opened itself for the formation of religious and laity. Currently it pursuits public
recognition in the MEC. Hundreds of priests, more than a dozen of bishops and even a cardinal, sat
on these its benches, to hear the lessons from teachers and theologians, being them Claretians
or not.
10 provisória, em terreno doado pela Cúria de Curitiba, por mãos de Dom José de
Camargo Barros. Em 1922 foi inaugurado o santuário do Imaculado Coração
de Maria. Várias atividades pastorais eram desenvolvidas: Arquiconfraria do
Imaculado Coração de Maria, Círculo Operário de São José, Conferência de São
Vicente de Paulo, Apostolado da Oração, escola, cinema, cursos de corte e costura,
Academia Claret de Datilografia, sede do primeiro jornal da Diocese, “A Voz do
Paraná”, Centro Social etc.
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Battisti (Arcebispo de Maringá), D. Bruno Gamberini (Arcebispo de Campinas), D.
José Tosi Marques (Arcebispo de Fortaleza), D. Eustáquio P. Cuquejo (Arcebispo
de Assunção), D. Ladislau Biernaski (SJPinhais), D. Izidro Kosinski (Emérito de Três
Lagoas), D. Francisco Bach (Toledo), D. Walter Ebejer (Emérito de União da Vitória),
D. José Valmor César Teixeira (Bom Jesus da Lapa), D. Sérgio A. Braschi (Ponta
Grossa), D. Francisco J. D. Paredes (Campo Mourão), D. Celso Antonio Marchiori
(Apucarana), D. Domingos G. Wisniewski (Emérito de Apucarana), Dom Vicente
Costa (Umuruama), D. José Antônio Peruzzo (Palmas/Francisco Beltrão) e D. Daniel
Kozlinski (Eparquia Ucraniana).
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Artigos
A CONGREGAÇÃO DOS
MISSIONÁRIOS FILHOS DO
IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA,
CLARETIANOS, EM Curitiba
The Congregation of the Missionaries Sons of the Immaculate Heart of
Mary, Claretians, in Curitiba
ABSTRACT: The paper “The Congregation of the Missionaries Sons of the Immaculate Heart of
Mary, Claretians, in Curitiba”, contextualizes the history of Studium Theologicum based on six
assumptions: Saint Anthony Mary Claret; Field of the Cross, today Ouvidor Pardinho’s Square, with
the Immaculate Heart of Mary church; the Claretians Priests in Curitiba; Movement of the Chapels;
the media and the seminaries. Once reconstituted the facts above, the author presents the role,
the meaning and the trajectory of the Studium, which in these 75 years, fulfills its intellectual
mission, forming priests and laity to the Church and to the society. The text situates also the
attention given by this school of theological formation related to the Second Vatican Council.
Exerceu seu primeiro ministério, como vigário paroquial por quatro anos.
Depois teve o desejo de ser missionário popular em lugares difíceis da Espanha
e ilhas Canárias.
Após sete anos nesta árdua missão, vendo a imensão da seara tão carente
de formação religiosa, a 16 de julho de 1849, com mais cinco sacerdotes, fundou a
Congregação dos Missionários Filhos do Imaculado Coração de Maria, conhecidos
por Claretianos, com o carisma de evangelizar em todos os setores, em todos os
níveis sociais, inclusive em terras de missão com pagãos.
Foi alvo de calúnias, nos últimos anos de vida, retirando-se para a França,
onde faleceu, a 24 de outubro de 1870.
17
O primeiro Bispo de Curitiba, Dom José de Camargo Barros, quis comemorar
o quarto centenário do descobrimento do Brasil por Pedro Alvares Cabral.
5º - Imprensa
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Seminário Maior de Filosofia e Teologia - Em 1934, foi inaugurado o
Seminário de Filosofia e Teologia, em Curitiba, exclusivamente para os Claretianos,
com professores altamente formados com títulos acadêmicos, com um razoável
numero de seminaristas filósofos e teólogos. Por ocasião da beatificação do
fundador Santo Antônio Maria Claret, estiveram presentes na solene pontifical
Dom João Francisco Braga, Arcebispo, Dom Alberto José Gonçalves, Bispo de
Ribeirão Preto e Dom Florentino Simon, Prelado Claretiano em Tocantins, Goiás.
Ambos têm a mesma meta: formar bem o povo de Deus para que
corresponda ao plano de Deus, se realize na Sociedade e Igreja, vivendo sua fé,
no dia a dia, dando o testemunho de sua vivência cristã, aplicando os princípios
hauridos nos cursos que o Studium Theológicum coloca á disposição de seus
alunos. Se os alunos não assimilam o que lhes é proposto, que a culpa seja de
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quem não aplicou eficientemente nas aulas.
ABSTRACT: This study understands the priesthood as an agent of sanctity, of life and of salvation.
The text aims to extract from the bases of the Catholic faith some lessons about the good
performance of the sacred roles of the priesthood. This is how it will substantiate features for a
priestly spirituality. Starting from a bailout of the exposure of the priestly role in the Israel Vetero-
testamentary to the approach of a brief history of the consecrated life and of considerations
of the Fathers of the Church, it is intended to recognize a priestly spirituality, which should be
fundamentally evangelical, ecclesial and human. Therefore, having always clear the sacramental
essence of priesthood as fruit of God’s gratuitousness, this paper aims to outline the christocentric
pillars of the mystique of priesthood. And for such, initially it emphasizes the acknowledgment
of the priestly roles as an exercise of mediation, sanctification and oblation. For the restoration of
relationships between men, this role aims at a community of love with the Creator.
1 As citações bíblicas, em todo este artigo, foram retiradas da Bíblia Ave Maria.
O espírito da reforma religiosa empreendida por Josias exigia essas medidas na
tentativa de restaurar a religião tradicional. Indo além do Deuteronômio (18,6-
8), a reforma reservou efetivamente o exercício das funções sacerdotais apenas
para os descendentes de Sadoc (Rs 23,5.9). É o prelúdio da futura distinção entre
sacerdotes e levitas, distinção essa que aparecerá mais claramente em Ez 40,10-
31.
Novo contexto geral se delineia por volta de 536, final do exílio babilônico.
Mas a partir desse período, então livres das tentações e das influências do poder
político exercidas por pagãos e também livres da tutela régia, os sacerdotes
se tornam guias espirituais da nação, que não é mais um povo politicamente
independente, mas uma etnia oficialmente reconhecida.
30
Como mediador apostólico, Jesus cumpre uma trajetória precisa. É
enviado aos humanos para eliminar as divisões causadas pelo orgulho, pela
competição, pelo egoismo, e outros tantos vícios que corroem a convivência
humana. Jesus deixou-nos os meio para restabelecer a fraternidade para criar a
comunidade de amor e fé. Essa comunidade criada pelo perdão e que vive no
amor fraterno deve preocupar-se em levantar o que caiu e procurar o que se
perdeu. É nesta perspectiva que deveriam ser tomadas a bem-aventuranças. A
comunidade criada pela mediação pastoral necessita ser alimentada, preservada
por um cuidado especial (cfr. Jo 6,1-15; 10,1-210; Sl 22).
Pastorear o rebanho do Senhor não pode ser tarefa para qualquer um.
Neste ministério não é a força bruta ou a coragem que conta, nem mesmo o brilho
da inteligência. O pastor deve estar na liderança munido de qualidades espirituais
e pelo amor. Deve haver entre o pastor e as ovelhas um conhecimento recíproco.
As velhas devem conhecer a voz do pastor. Ora, isso exige convivência, cuidado
e dedicação amorosa. Santo Agostinho, comentando o capítulo 34 de Ezequiel,
tece uma série de considerações sobre os bons e os maus pastores, entre as quais
encontramos ricas e sérias reflexões úteis a quem exerce o cargo de pastorear
em nome de Jesus. O pastor responsável não só deve conhecer o caminho que
conduz as ovelhas para as águas limpas e frescas, mas também deve saber onde
encontrar as pastagens verdejantes para alimentar o rebanho. A água da doutrina
e o pão dos sacramentos, o calor da amizade, a mão estendida do perdão para
levantar o que caiu, coragem para ir buscar os que se perderam. Reger o rebanho
de Cristo exige coragem e disposição de fazer como Cristo, estar disposto a dar a
vida pelas ovelhas. Não se trata apenas de ser mártir, como nos primeiros séculos
do cristianismo. Trata-se dessa morte que nos consome um pouco de cada vez, na
luta diária. Morrer para si e viver para Deus.
A luta do pastor de Cristo será muito mais árdua do que se tratasse apenas 31
de defende-las de lobos ou outros animais ferozes. Não é apenas questão de
defesa contra epidemias ou doenças. Mas, então, contra que ou o que lutar para
defender o rebanho? Consideremos o que São Paulo diz: “Não temos que lutar
contra a carne e o sangue, mas contra as chefias, os poderes, os dominadores deste
mundo das trevas e os espíritos malignos dos ares” (Ef 6,12). Infelizmente, não são
apenas essas ameaças; há outras piores:
Por que o sacerdote de Cristo deve ter uma vida espiritual adequada
ao seu trabalho? Vejamos o que nos diz João Paulo II na Exortação pós-sinodal, 33
Pastores Dabo Vobis: sobre a formação dos sacerdotes:
3. GRANDEZA DO SACERDÓCIO
Muitos Padres da Igreja tinham uma idéia tão elevada do sacerdócio que
34 chegaram a ponto de recusar recebe-lo, ou receberam a ordenação sacerdotal
a contra gosto. Pode-se dizer só aceitaram a ordenação como serviço prestado
à comum idade cristã, como foi o caso de Gregório de Nazianzo e São Jerônimo.
Há também uma tradição que diz que Santo Ambrósio teria fugido
de Milão e se refugiado num túmulo para evitar ser ordenado sacerdote e
consagrado bispo. Santo Agostinho teria ficado surpreso com o anúncio de que
tinha sido indicado pela comunidade de Hipona para receber o presbiterato. Ele
ficou sabendo durante a oração da tarde. Conta-se que ele foi visto chorando
copiosamente antes da ordenação. Seu pranto era motivado pela consciência
da profunda indignidade que sentia interiormente em face da graça tão grande
de divina do sacerdócio. De fato, no comentário que Agostinho tece sobre os
pastores (Salmo 46) mostra amplamente em dois quadros a respeito dos bons e
dos maus pastores. Suas reflexões giram em torno de dois pontos importantes
acerca sacerdócio: a dignidade do sacramento do qual está investido e a
35
responsabilidade das funções que decorrem do estado de consagrado para o
ministério na sua tríplice dimensão de apóstolo, evangelizar; de pastor, cuidar
das ovelhas conquistadas para Cristo, e dar-lhes o alimento para a vida (sacrifício
eucarístico). Diante da inevitabilidade de sua escolha para o sacerdócio afirma:
“Eu, irmãos, porque Deus quis assim, certamente sou seu sacerdote, com vocês bato
no peito, com vocês peço perdão, com vocês, Deus usará comigo de misericórdia” (
Sermo 1135, PL, 38,749. In: Rodero, s.d.).
Qual teria sido o motivo que levou os Santos Padres a enaltecer o sacerdócio
36 e a figura do sacerdote? Primeiramente, porque o sacerdócio é um dom que só
pode ser compreendido pela Vontade livre e amorosa de Deus que quis fazer de
alguns participantes da missão redentora de seu filho para que sejam sinais vivos
do projeto divino de salvação.
37
na consideração das funções e dos deveres ministeriais que derivam da ordem
sagrada, deve haver uma identificação pessoal. Ser o que é, ser em primeiro
lugar, o que é Cristo independentemente do modo específico de desempenhar o
sacerdócio como habilitação para mediar, santificar e sacrificar.
5. CONHECER O REBANHO
Quanto aos meios específicos, a indicação prática foi dada por São Carlos
Borromeu, no sermão proferido no último sínodo de Milão (século XVI). Nesse
sermão o Sato alerta o clero ambrosiano a respeito das fraquezas de todos e
propõe os meios para supera-las:
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convém, mas não se resolve empregar estes meios: jejuar, orar, fugir
das más conversas e de nocivas e perigosas familiaridades. Queixa-se
de que, ao entrar no cora para a salmodia, ao dirigir-se para celebrar
a missa, logo mil pensamentos lhe assaltam a mente e o distraem de
Deus. Mas, antes de ir ao coro ou à missa, que fez na sacristia, como
se preparou, que meios escolheu e empregou para fixar a atenção?
Queres que te ensine a caminhar de virtude em virtude e como
seres mais atento ao ofício, ficando assim, teu louvor mais aceito de
Deus? Escuta o que digo. Se ao menos uma fagulha do amor divino
já se acendeu em ti, não a mostres logo, não a exponhas ao vento!
Mantém encoberta a lâmpada, para não se esfriar e perder o calor,
isto é, foge, tanto quanto possível, das distrações; fica recolhido junto
de Deus; evita as conversas vãs.Tua missão é pregar e ensinar? Estuda
e entrega-te ao necessário para bem exerceres este encargo. Faze,
primeiro, por pregar com a vida e o comportamento. Tua missão
é pregar e ensinar? Estuda e entrega-te ao necessário para bem
exerceres Não aconteça que, zombem de tuas palavras, abanando a
cabeça, vendo-te dizer uma coisa e fazer outra.Exerce cura de almas?
Não negligencies por isso o cuidado de si mesmo, nem dês com tanta
liberalidade aos outros que nada sobre para ti. Com efeito, é preciso
te lembrares das almas que diriges, sem que isto te faça esquecer da
tua. Entendei, irmãos, nada mais necessário aos eclesiásticos do que
a oração mental que precede, acompanha e segue todos os nossos
atos: Salmodiarei, diz o Profeta, e entenderei (cf Sl 100,1 Vulg.) Se
administras os sacramentos,ó irmão,medita no que fazes; se celebras
a missa, medita no que ofereces; se salmodias no coro, medita a que
e no que falas; se diriges as almas, medita no sangue que as lavou
e, assim, tudo o que é vosso se faça na caridade (1 Cor 16,14). Deste
modo, as dificuldades que encontramos todos os dias, inúmeras e
necessárias (para isto estamos aqui), serão vencidas com facilidade.
Teremos, assim, a força de gerar Cristo em nós e nos outro”. (Acta
Ecclesiae Mediolanensis, Mediolani 1599-1177-1178, Séc. XVI. Apud.
Liturgia das Horas, 2000.)
São Carlos Borromeu indicou com poucas palavras, não só os meios para
evitar ou superar as dificuldades, mas também deixou claro que esses meios
são elementos de crescimento espiritual para o pastor que deseja viver com
Cristo, como Cristo e não apenas para Cristo como mero funcionário do culto.
O cardeal Francis Arinze, no mesmo trabalho acima citado, falando dos quatro
amores do sacerdote, destaca a importância primordial do hábito de freqüentar
assiduamente a Sagrada Escritura. Leiamos o que ele diz:
Deus é um Pai que dá sua Palavra a Israel, uma palavra vivificante, uma
palavra que traz consigo felicidade e vida longa. É também uma palavra que
desvenda mistérios, segundo o Deuteronômio, pois “as coisas escondidas
pertencem a nosso Deus; mas as coisas reveladas pertencem a nós e a nossos
filhos para sempre, a fim de que coloquemos em prática todas as palavras desta
Lei” (Dt 29,28).
REFERÊNCIAS
42 ARINZE, FRANCIS Card. Reflexões sobre o sacerdócio: carta a um jovem padre. São
Paulo, Paulus 2009.
JOÃO PAULO II. Exortação pós-sinodal, Pastores Dabo Vobis: sobre a formação dos
sacerdotes.
LITURGIA DAS HORAS: SEGUNDO O RITO ROMANO. São Paulo: Vozes, Paulinas,
Paulus e Ave Maria, 2000.
RESUMO: O texto “A teologia como ‘ciência discute o lugar emergente da “nova” teologia
43
fundamental, responsável pela justificação racional da fé cristã, i. é: pelo caráter racional do ato
de fé, pelo rigor científico da fé. Luis Artigas Mayayo se vale de téologos de renome, mas fixa-se
sobretudo em Tomas de Aquino para ressaltar a fundamentação clássica da teologia. Encontra
em três textos de Sto. Tomás de Aquino pressupostos para desenvolve uma aporia necessária
para a compreensão da teologia como ciência. Depois, atualizando a reflexão indica quatro
novos parâmetros da atualidade como fundamentos: a intersubjetividade, a operatividade, a
revisibilidade e a autonomia. Finalizando, observa que a teologia, para além de ser ciência, é uma
questão anterior de fé cristã.
RESUMEN: The text “The Theology as ‘Science” discusses the emerging place of the
“new”fundamental theology, responsible for the rational justification of Christian faith, it is: the
rational character of the act of faith, by the scientific rigor of faith. Luis Artigas Mayayo makes use
of renowned theologians, but fixes itself above all in Thomas Aquinas to highlight the classical
statement of reasons of the theology. In three texts of St. Thomas Aquinas he finds assumptions
to develop an aporia essential to the comprehension of the theology as science. Later, updating
the reflection, he indicates four new parameters of the present time as foundations: the
intersubjectivity, the operativeness, the revisability and the autonomy. Finalizing, he observes
that theology, apart from being science, is a question previous of the Christian faith.
* Professor de teologia sistemática do Studium Theologicum e doutor em Teologia Sistemática, pela Pontificia
Universidade Gregoriana, de Roma, falecido em 1999. O texto “Teologia como ´Ciência” foi escrito para uma
“Miscelânia comemorativa” dos 70 anos de Pe. José Penalva, músico, teólogo e também professor do Studium,
A intenção da reedição do artigo, publicado em 1994, é igualmente uma homenagem a todos os professores e
teólogos destes 75 anos da casa.
1. COLOCAÇÃO DO PROBLEMA
1 Cf. por exemplo, C. GEFFRÉ, L ‘histoire récente de Ia théologie fondamentale. Essai d’i nterprétation,
Concilium, 46 (1969), pp. 11-28.
2 Cf. K. RAHNER, Sull’odierna formazione teoretica dei futuri sacerdoti, Nuovo Saggi, I, Paoline, Roma
1968, pp. 199-235.
3 Cf. H. BOUILLARD, L’expérience humaine et Ie point de départ de Ia théologie fundamentaIe,
Concilium, 6 (1965), pp. 83-92.
4 Cf. G. SÓHNGEN, Fundamentaltheologie, Lexikon für Theologie und Kirehe, 4, ec. 452-459; lP.
TORREL, Chronique de théologiefondamentale, Revue Thomiste, 64 (1964), pp. 101-102.
5 Cf.: Y. CONGAR, Théologie, Dictionnaire de Théologie Catholique, XV, , c. 459; lB. METZ, Theologie,
Lexikon für Theologie und Kirche, 10 (1965), c. 70: «Die Tendenz zur Wissenschaftlichkeit wurzelt
in dem auf die Beansprechung des ganzen Menschen und auf verantwortlichen Kommunikation
zielenden Charakter des ‘Gegenstands’ der Theologie. Die konkrete Bestinunung des
Wissenschatfscharakters der Theologie aIs Theologie und nicht bloss im Hinblick auf die in ihr
angewandten Methoden und Erkentnisse der profanen Einzelwissenschaften ist angesichts
des gawandelten Wissenschaftbegriffs eine hõchst schwierige Aufgabe. War diese Frage schon
unter der Vorherrschaft des aristotelischen Wissenschaftsbegriffes nicht eindeutig gek1ãrt, so
wurde sie der modernen Einzelwissenschaft noch zusãtzlich erschwert».
O Pe. Congar reconhecia já em 19436 que desde o início do século XX
as questões epistemológicas e metodológicas assumiram um grande lugar
na reflexão teológica, caracterizando este fato como o esforço para superar as
dissociações que, desde os tempos do Nominalismo, passando pelos movimentos
modernos do pensamento, introduziram-se na teologia, a fim de poder obter
assim uma nova unidade que integre também as aquisições científicas válidas da
época moderna. Esta efervescência epistemológico-metodológica de que Congar
falava continua ainda hoje, ainda que, evidentemente, com orientações novas, se
compararmos com sua história desde os tempos do modernismo.
Uma primeira questão que foi preciso enfrentar era a do valor científico
da teologia, desde que seu pressuposto de base é a fidelidade a uma fé vital e
também a uma certa ortodoxia; neste campo chegou-se, às vezes, recentemente,
a pretender excluir a teologia do campo universitário. Este debate, na primeira
metade do século XX, foi conduzido sobretudo no campo da assim chamada
teologia positiva, nascida no bojo da crise modernista, e teve certamente como
uma das suas conseqüências um início de integração das disciplinas teológicas nos
diversos movimentos do século (litúrgico, bíblico, patristico, ecumênico), junto
com um aprofundamento sobre a teologia do Magistério e da comunidade eclesial
45
como depositários e portadores da fé com seus conteúdos. A teologia deparou-
se com a exigência, bem viva ainda hoje, de incorporar os dados das ciências
humanas, as quais, de maneira geral, e apesar de uma melhoria substancial das
relações, ainda não adquiriram plena carta de cidadania dentro do pensamento
teológico, considerado de maneira global.
Nos tempos mais recentes, vários outros motivos fizeram com que a
reflexão metodológica e epistemológica da teologia se tomasse ainda mais
urgente. Apesar das exigências pastorais ou, talvez precisamente por causa delas,
a teologia encontra-se na situação de ter que repensar seus fundamentos, não
raramente contestados. Este re-pensamento fundamental é imposto, antes de
mais, pela situação nova que o pluralismo atual, introduzido em primeiro lugar
pela ciência moderna, colocou dentro dela 7. Se a teologia não deve cair num
dogmatismo fechado e estéril, e se, por outro lado, não deve se secularizar,
esquecendo a tradição e aceitando de maneira mimética e pouco inteligente
qualquer conclusão mais ou menos científica, então é preciso se engajar no esforço
de que estamos falando, isto é: ela deverá refletir criticamente sobre o caminho
que a verdade já percorreu (na realidade, esse caminho é que é o “método”)
até a nós (ninguém pode recomeçar do zero, mesmo que o pretendesse), para,
precisamente, discernir as “aquisições de verdade” feitas até hoje, bem como as
“tarefas a serem realizadas” que os limites de tais aquisições nos deixam como
6 Cf art. cit., c. 444
7 Cf. W. KASPER, Per un rinnovamento deI metodo teologico, Queriniana, Brescia 1969, p 23.
herança e como missão. Notemos, finalmente, com Kasper8, que neste trabalho
nos encontramos ainda na fase dos estudos preliminares e que, por isso mesmo,
eles não podem não ser fragmentários e “tendenciais”.
1.3 - Ora, de que teologia nos ocupamos aqui? isto é, que significado
conferimos a esta palavra? Karl Barth, seguindo neste ponto a Dogmática de J.
Gerhard9, distingue vários significados interessantes.
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Dando por pressupostos todos os dados contextuais, eis, em resumo, a
visão tomista da teologia como ciência.
(1) “ Ista doctrina habet pro principiis primis articulos fidei, qui per lumen
infusum per se noti sunt habenti fidem, sicut et principia naturaliter
nobis insita per lumen intellectus agentis. Nec est mirum si infidelibus
nota non sunt, qui lumen fidei non habent; quia nec etiam principia
naturaliter insita nota essent sine lumine intellectus agentis. Et ex istis
(4) “Habitus scientiae inc1inat ad scibilia per modum rationis ... Sed
habitus fidei, cum non rationi innitatur, inc1inat per modum naturae,
sicut habitus principiorum” .
11 ln 1 Sent., prol., art. 3, sol. 2, ad 2; lbid., sol. 3, ad 3; ln 111 Sent., d. 23, q. 2, art. 1, ad 4; 1bid.,
d23, q. 3, art. 3, sol. 2, ad 2; 1bid., d. 24, q. 1, art. 2, sol. 1, obj. 2, et ad 2.
Santo Tomás distingue aqui entre o hábito infuso que é a fé e o hábito
adquirido que é a teologia:
“Potest autem scientia aliqua esse superior alia dupliciter: vel ratione
subiecti, ut geometria, quae est de magnitudine, superior est ad
perspectivam quae est de magnitudine visuali; vel ratione modi
cognoscendi, et sic theologia est inferior scientia quae in Deo est. Nos
enim imperfecte cognoscimus id quod ipse perfectissime cognoscit;
et sicut scientia subaltemata a superiore supponit aliqua, et per
49
illa tanquam per principia procedit, sic theologia artículos fidei qui
infallibiliter sunt probati in scientia Dei, supponit, et eis credit, et per
istud procedit ad probandum ulterius illa quae ex articulis sequuntur.
Est ergo theologia scientia quasi-subaltemata divinae scientiae, a
qua accipit principia sua”13.
50 (2) “Sciendum est quod duplex est scientiarum genus. Quaedam enim
sunt quae procedunt ex principiis notis lumine naturali intellectus,
sicut arithrnetica, geometria, et huiusmodi. Quaedam vere sunt
quae procedunt ex principiis notis lumine superioris scientiae,
sicut perspectiva procedit ex principiis notificatis per geometriam,
et musica ex principiis per arithrneticam notis. Et hoc modo sacra
doctrina est scientia, quia procedit ex principiis notis lumine sperioris
scientiae, quae scilicet est scientia Dei et beatorum. Vnde sicut musica
credit principia tradita sibi ad arithrnetica, ita doctrina sacra credit
principia revelata sibi a Deo»15
Esta teologia não pode ser concebida nem realizada senão dentro de uma
vida de fé ardente que utiliza, sim, todos os possíveis recursos e instrumentos
racionais, mas cuja alma é o evangelismo, como podemos ver também nos escritos
bíblicos tomistas, que são obras também de crítica textual e de explicação. O
problema não é substituir Santo Agostinho com Aristóteles, embora o amor do
saber tenha transplantado o intelectualismo grego num clima bem diferente. Não
é Tomás de Aquino, mas o Nominalismo e, mais tarde, a Reforma20 que introduzirão
realmente a fratura, a divisão entre a fides e o intellectus, contribuindo em grande
parte à formação da consciência crítica moderna. Começa-se a diferenciar sempre
mais a fé e a razão, com novos métodos de acesso à realidade, que produzirão
uma dissociação entre os elementos do conceito clássico de teologia, provocando
também mais tarde a eclosão da mesma em muitas e diferentes “matérias”. Mas,
com estes elementos, deveríamos entrar já numa nova época, o que os limites
deste trabalho não consentem ...
17 M.D. CHENU, La théologie comme science auXIle siec/e, Vrin, Paris 1957, p. 78.
18
19 In Boethium de Trinitate, q. 2, a. 2, ad 1.
20 Cí. W. KASPER, op. cit., pp. 22-25. Sobre o Nominalismo, cí. as análises de H. BLUMENBERG, Die
Legitimitiit der Neuzeit, Suhrkamp Verlag, Frankfurt 1966.
3. PENSANDO NO PRESENTE...
3.2 - De tudo isto resulta uma observação muito importante: nesta situação
não é possível privilegiar, e menos ainda exclusivizar um único conceito universal
de ciência, que fosse igualmente válido para todas as ciências e para todos os
homens. A mesma reflexão a propósito da classificação e da mútua relação entre
as ciências, não é uma conseqüência delas, mas de certa maneira as precede23 .
O mínimo que pode ser dito é que esta problemática é muito ambígua,
pois na realidade não se vê muito bem se se trata de uma real libertação da fé ...
ou da sua submissão à nossa sociedade «unidimensional». Contudo, ela obriga
à teologia a um sério re-pensamento dela própria, especialmente quando, não
ficando satisfeita somente com se apresentar como um discurso confessional
repetitivo, pretende cumprir exigências sistemáticas e se assentar sobre seus
próprios fundamentos.28
Será mesmo .. ?
29 R. MARTINELLI, Perche il Catechismo della Chiesa cattolica? Sua attualità nella Chiesa e nei
mondo di oggi, L’Osservatore Romano, 31.10.1992, pp. 7-8.
do que já foi dito. O espírito de pesquisa obriga a teologia a formular opiniões,
cuja validez nem sempre é sustentada pela tradição teológica do passado .. As
dificuldades, parece-me, não nascem tanto do fato de formular novas teorias,
mas, sobretudo, do desejo, muitas vezes demagógico, de divulgar em seguida as
próprias opiniões para os fiéis de qualquer condição. Ora, uma ciência consciente da
própria responsabilidade, começa em primeiro lugar verificando a fundo as suas
hipóteses, transmitindo os resultados aos outros homens somente quando se tem
uma segurança pelo menos relativa de que eles se sustentam verdadeiramente.
Do contrário, o teólogo é tão criminosamente irresponsável quanto o laboratório
que distribui um remédio novo sem suficiente experimentação sobre seus
resultados e efeitos colaterais. Sim, existe também a corrupção teológica, a
busca de notoriedade, ou de justificativa para as próprias opções pessoais, ou,
simplesmente, a falta de seriedade e rigor intelectual, o que torna o teólogo,
aos meus olhos, gravemente leviano. Este sentido de responsabilidade deveria
acompanhar sempre a ciência teológica.
58
Artigos
Reflexões de um teólogo
“pastoralista” sobre a
teologia
Reflections of a “pastoralist” theologian about the theology
59
RESUMO: Depois de trinta anos ensinando, o autor deste artigo pergunta-se sobre o sentido
da reflexão teológica, após aceitar o valor das três considerações mais importantes: a teologia
fundamental como fides quaerens intellectum, a teologia – sabedoria como reflexão (que dá um
código interpretativo para a percepção do ser cristão no mundo) e a teologia como práxis para a
transformação libertadora em serviço do reino num mundo de opressão e pecado –, ajuda estes
dois últimos no momento atual do ateísmo e a desumanização.
ABSTRACT: After thirty years of teaching activity, the author questions himself on the meaning
of theological reflection. After admitting the importance of the three basic considerations –the
fundamental theology as fides quaerens intellectum, the theology-wisdom as reflection (that
provides an interpretive code for the discernment of being Christian in the world) and theology as
praxis for a liberating transformation toward God’s reign in a world of oppression and sin–, he accords
a special interest to the two last mentioned in the present situation of atheism and dehumanization.
* Doutor em Missiologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma professor de Evangelização e Cultura
na Pontifícia Universidade Javeriana, em Bogotá, diretor do Seminário de Planejamento Pastoral, programa da
mesma faculdade,
INTRODUÇÃO
60 Por isso,
64
metafísica5.
SEGUNDA PARTE:
5 Pozzo e Fisichella, “Método”, citado in TORO, Ivan Dario, “Conhecimento e métodos”, 127.
6 Habermas, Israel ou Atenas, Madrid: Editorial Trotta, 2000. 93-94.
Segundo Habermas7, a transformação da religião e da teologia
experimentada sob as condições do pensamento pós-metafísico tornou-
se inevitável na pós-modernidade. Com um tal abandono do religioso e
do teológico na metafísica, “o povo ficou abandonado e seus sacerdotes
convertidos em filósofos”8. O discurso argumentativo, a partir da metafísica, não
pode compreender nem falar da experiência religiosa. E a fala filosófica sobre a
práxis cristã de testemunho e libertação do mundo não se pode converter em
conceitos abstratos e metafísicos ou puramente filosófico- morais.
7 Ibid., 91
8 Ibid., 89
9 Ibid., 97.
10 Ibid., 98-99.
11 Cf. Vela, Reflexión teológica y concepto de nueva evangelización.” Revista CIV 250 (2006): 1-3. O
autor defende uma fé “antropológica, que integre valor e significado, que impulsione mecanis-
mos de eficiência para traduzir realizações sociais palpáveis e que se fundamente em testemu-
nhas eminentes (mártires) da tradição.
12 HEIDEGER, Sin und Zeit. Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1977.
Teologia como “sabedoria”
13 LYOTARD, Jean Francois. La condición posmoderna. Informe sobre el saber. Madrid: Editorial
Cátedra, 1994., 41-44
Compreender a teologia como seguimento significa mostrar que a
biografia do crente é a condição de possibilidade do conhecimento
teológico. Pois bem, a experiência decisiva que faz o ser humano, em
sua vida como crente, é a experiência de estar a camino14.
Quem narra está implicado em sua narrativa: narra desde sua cultura
e simbólica, legitima seu discurso na experiência que narra e naquilo
67
que ele pensa, sonha e ama: não alcança sua verdade além das
tradições de sua própria cultura, cria vínculação social e comunitário,
evoca e narra, não para impor aos outros a sua experiência narrada,
mas sim para convidar à analogia das experiências múltiplas e
autonomas que podem ser as experiências de todos15.
16 Parra, A. “Hacia las legitimaciones del creer.” Theologica Xaveriana 290 (2006): 283-298.
diversificados. Asim como as formas nas quais a teologia tenha se desenvolvido,
especialmente na América Latina. A teologia se fundamenta na Escritura e na
tradição, que compõem o “depósito da fé”17. Este” foi confiado unicamente à Igreja
«, que tem o dever de interpretá-lo fielmente (DV, n º 10).
69
contemporâneos ... (OT, n º 16)
70
Como afirma o Documento de Puebla:
A Igreja, por dispor de uma estrutura social visível, sinal de sua unidade
em Cristo, pode enriquecer-se, e de fato é também enriquecida, com
a evolução da vida social (...) para conhecer mais profundamente a
própria constituição, para expressá-la de uma forma mais perfeita e
para adaptá-la com maior acerto aos nossos tempos. (Ibidem)
26 Cf. SOBRINO, Jon. La fe en Jesucristo. Ensayo desde las víctimas. Madrid: Ed. Trotta, 1999.
A natureza da reflexão teológica na teologia pastoral27
30 Este é o significado dos livros bíblicos durante a escravidão no Império babilônico (livros/novelas
que ensinavama viver a lei mosaica na escravidão); ou durante o império grego dos selêucidas
(Macabeus) em que se escreveram os livros da Sabedoria e Eclesiastes.
31 “O amor de Deus, que nos dignifica radicalmente, por necessidade, torna-se comunhão de amor
por outros homens e de participação fraterna; para nós hoje, deve tornar-se, principalmente
obra de justiça para os oprimidos, esforço de libertação para os mais a necessitam.” ( Documento
de Puebla, n º 327).
de sua dignidade, a reconhecer as profundas aspirações dos povos à justiça
e libertação. O próprio Paulo VI, neste número da EN, exorta aos teólogos: “O
trabalho de evangelização precisa de vosso incansável trabalho de pesquisa, e
também de vossa atenção e delicadeza na transmissão da verdade ... “
32 Ver Lonergan, Bernard. “La historia crítica.” in Método en teología, por Bernard Lonergan, 169-
189. Salamanca: Sígueme, 1988.
33 São expressões de Lonergan em seu Método en Teología
- são coerentes em seu testemunho de fé,
77
Os pobres são, assim, os primeiros destinatários da sua missão (Lc
4,18-21) e sua evangelização é por excelência o sinal e a prova da
missão de Jesus. (Lc 7:21-23). (Puebla, 1142)
Por isso, o serviço dos pobres é medida tão privilegiado, embora não
excludente de nosso seguimento de Cristo. (Puebla, 1145)
34 Cf. Vela, “La experiencia da fe como experiencia salvifica” Revista CIV 219 (2001): 1-32.
35 Este é o questionamento de Habermas em Israel ou Atenas.
Para resumir, a teologia deve ser principalmente uma reflexão teórica que
seja capaz de elaborar um código de princípios e critérios orientadores para a
vida e ação evangelizadora dos cristãos, um código em função da sabedoria, para
orientar o discernimento do caminho a seguir. De nenhuma maneira pode ser um
desenvolvimento teológico especulativo.
CONCLUSÃO
Hélcion Ribeiro *
81
RESUMO: Desde a teologia da natureza pretende-se analisar o “Zeitgeist” darwiniano, discutindo
a relação entre fé e ciência. Sem falsa oposição e nem sincretismo, destacam-se questões
aparentemente cadentes, como o criacionismo, a criação contínua, a causalidade e a perfectibilidade,
o lugar do ser humano e o despertar de sua consciência no processo da evolução. Ao afirmar-se que
Deus é o criador de realidades visíveis e invisíveis, o ser humano vem situado humana realidade
maior, de mistério e solidão, de diálogo supresas. Todavia, nem tudo, neste campo, já é claro;
permanecem questões mordentes.
PALAVRAS CHAVE: criação (teologia da), evolucionismo, “Zeitgeist”, homo sapiens, ciência(s).
ABSTRACT: Starting from the theology of nature it intends to analyze the “Zeitgeist” darwinian,
discussing the relationship between faith and science. With no false opposition or syncretism, it
highlights issues apparently cadent, such as the creationism, the continuous creation, the causality
and the perfectibility, the place of the human being and the awakening of consciousness in the
process of evolution. In affirming that God is the creator of visible and invisible realities the human
being is situated in a greater reality, full of mystery and solitude, dialogue and surprises. However,
not everything in this field is already clear, mordant questions remain.
KEY WORDS: creation (theology of), evolutionism, Zeitgeist”, homo sapiens, science (s).
* Professor de Teologia Sistemática no Studium Teológicum e doutor em Missiologia, pela Ponticifia Universidade
Gregoriana, de Roma.
Sobre as narrativas bíblico-catequéticas da criação
Como cristãos, cremos que fomos criados em Cristo, para sermos santos
e perfeitos aos olhos de Deus (cf. Ef. 1,3 ss.). Criados à imagem de Cristo – que
é a imagem visível do Deus invisível (Col 1,15), para sermos seus irmãos. Ele é
o primogênito dentre os irmãos (Rom 8,29), sendo o unigênito do Pai (Jo 1,18).
Ao mesmo tempo fomos adotados, por ele, como Filhos do Pai. É ele quem
82
revela quem somos e quem seremos em plenitude (GS 22,4). Só por meio dele
– participando de sua ressurreição – seremos introduzidos em Deus. I.é: nossa
“carne” será agregada a sua para sermos, com ele e nele, o único corpo a ser
apresentado ao Pai, no fim dos tempos. A obra criacional de Cristo e em Cristo só
será completa quando o último ser humano for cristificado na ressurreição e na
comunhão dos santos, na parusia.
A atual exegese bíblica, com seu rigor científico, leva em conta tanto a
sagrada inspiração, quanto a intenção do texto, no contexto histórico do judaísmo.
Uma longa tradição cristã, por sua vez, não levou em conta tais fatores. Preferiu
enquadrar as narrativas de modo pertinente à mentalidade aos conhecimentos
cosmológicos que utilizava a Bíblia.
83
As ciências bíblicas e teológicas atuais – sobretudo a partir da encíclica
de Pio XII, Humani Generis (1950) – vêm progressivamente “des-historicizando”
aquelas narrações. Querem devolver-lhes o significado de “mito criacional” não
apenas pela correlação com outros mitos criacionais de povos circunvizinhos,
como os sumérios (autores do famoso poema “Enuma Elisch”). Em que pesem as
influências daqueles povos, com a “única” linguagem de então (os mitos), hoje se
tem uma variedade maior de explicações. Algumas delas, por vezes, chegam às
raias do dogmatismo, como o de algumas ciências modernas.
O “Zeitgeist” darwiniano
Assim, como afirmou Ernest Mayr1, uma pessoa do século XXI vê o mundo
de maneira diferente das dos séculos anteriores. Isto é causado pelo avanço
da tecnologia, mas, sobretudo, por mudanças no pensamento provenientes
das idéias de Darwin. Sem dúvida, não são as exatas idéias de Darwin que
caracterizam o novo pensamento. Antes, o “Zeitgeist darwiniano” perpassa
a cultura contemporânea - adquirida por toda parte no ocidente, por jovens e
adultos suficientemente atualizados, filhos da modernidade e do pensamento
atual.
1 Mayr é um das figuras mais importantes da biologia evolutiva, autor de alguns dos mais de-
stacados livros sobre a evolução no século XX, que morreu aos 100 anos, em fevereiro de 2005
2 MAYR, Ernest. “O impacto de Darwin no pensamento moderno”. In Scientific American. Ed.
Especial: “Como nos tornamos humanos. A evolução da inteligência”, pg.98.
O logos universal e a teologia
Tudo isto questiona o cristianismo e suas teologias. Ele, por sua vez, se
recusa a assinar o próprio atestado de óbito. E bem pelo contrário, afirma ser
indispensável ao próprio ser humano, sob pena de permitir a unilateralidade dos
outros saberes. Tanto o cristianismo quanto a teologia têm uma palavra a dizer
neste contexto. Não qualquer palavra. Esta não pode ser nem revanchista e muito
menos subserviente. A palavra da teologia deve ser pertinente. Mesmo que por
vezes mais do que dizer ou apontar o caminho, ela deve saber fazer perguntas
adequadas. A palavra que a teologia deve dizer, sem se omitir, não pode ser uma
palavra arrogante e nem simplesmente concordista. Isto porque a teologia só
pode ter uma palavra de fé – o que é o seu “proprium”. Uma palavra original e
irredutível. Se tal não for dito, corre o risco de ninguém mais dizê-lo e assim se
empobrece o conjunto de todos os outros discursos.
3 GESCHÉ, A. O ser humano. S.Paulo: Paulinas, 2003, pg. 49 , cotejado com a tradução espanhola El
hombre. Salamanca: Siguime, 2002, pg. 53.
sem o outro, caduca. Identificando os dois planos (história e transcendência), a
fala teológica se mantém unida e coerente porque, desde a fé, baseia-se em Deus
e no seu Cristo, o Logos encarnado.
Criacionismo?
4 Na verdade não há um só, mas muitos criacionismos, segundo os interesses religiosos, políticos
ou filosóficos.
5 Por exemplo: KÜNG, H. O princípio de todas as coisas. Ciências naturais e religião. Petrópolis: Vozes,
2007; MOLTMANN, J. Ciência e sabedoria. Um diálogo entre ciência natural e teologia. SP.:Loyola,
2007
A “teologia da criação” – que evolui, sobretudo, desde a encíclica de Pio
XII, Humani generis – vai se afirmando no que lhe é próprio. Assim, aqueles textos
bíblicos não podem ser interpretados senão a partir da chave simbólica, quer na
questão dos números, quer na da criação das coisas, dos seres vivos, incluindo os
humanos. Deste modo, eles não falam por si. Antes, só falam no contesto de fé, e
jamais da história natural.
6 Sto. Irineu afirmou que Deus nada fez de perfeito e nem de imperfeito. Tudo quanto foi feito, o
foi para um aperfeiçoamento. Tudo é perfectível, mesmo que possa se corromper.
7 Não é o caso de abordá-los aqui. Remetemos o leitor à interessante e atualizada reflexão de
Moltmann (Ciência e sabedoria), já citada.
8 FERNANDO-ARMESTO, Felipe. Então você pensa que é humano? Uma breve história da humanidade.
S. Paulo: Cia de Letras, 2007
tantas outras espécies que desapareceram? – Mais radicalmente: tais espécies
devem dar um salto ou poderão ter chegado ao fim de sua espécie, seja por causas
endógenas seja por ação exógena?
Alguns seres vivos estiveram muito próximos de nós, por suas inteligência
e capacidade da fala, da cultura e das artes – os neanderthalenses. Todavia, 91
desapareceram da história há uns 25.000 mil anos, após terem convivido no
mesmo espaço comum europeu por uns 150.000 anos10.
A identidade do ser humano atual foi formada entre 100 e 45 mil anos
atrás, com o homo de Cromagnon, indo da África para a Europa. Aí encontraram,
já instalados, os neanderthalenses, a quem já nos referimos acima. Desde então
a totalidade da panóplia de comportamentos que distinguem homo sapiens
moderno de outras espécies já existentes, se manifesta em registros de esculturas,
gravuras, pinturas, ornamentação corporal, música, notação, compreensão
refinada de diversos materiais, sepultamento elaborado dos mortos, decoração
esmerada de objetos etc.
Nos últimos 60 mil anos, nosso processo mental evolui muito rapidamente.
Permitido pelo aumento do córtex cerebral, o ser humano desenvolveu muito
celeremente a capacidade da cognição, da simbolização e abstração, da fala e da
linguagem.
94
Meng Tseu a um imperador chinês do século III AC.:
Foi o cristianismo (2000 anos para cá) o primeiro grande movimento social
a apontar para o princípio da igualdade entre os seres humanos.
Desde a história da evolução cósmica, o ser humano surgiu como “um ser
improvável”, como diz o físico Marcelo Gleiser. Ele continua: “o que não significa 95
um ser improvável, miraculoso”.
13 FERREIRA, José Barbosa. Grandezas e misérias no caminho da liberdade. Lisboa: Ed. Confluência,
1998, pg. 87/8.
14 HABERMAS. O futuro da natureza humana. O caminho de uma eugenia liberal? Coimbra: ed.
Almedina, 2006, pg. 116.
por abortamento ou por término inesperado da ação natural deste longo processo.
Nenhuma destas vidas era “obrigada” gerar outras mais. A chegada até a nossa
vida é algo simplesmente inaudito e surpreendente. Dentre as possibilidades
infinitas de vida e de não vida, a vida humana surgiu e se tornou, mesmo em meio
a sua dor, vitoriosa. Sem ser impossível, ela tinha tudo tanto para ser provável
quanto improvável. Misteriosamente está aí. – Apenas está aí?!
O olhar teológico
96
Após esta longa fala/escuta-da-história, começam a surgir perguntas
desde a fé. A teologia é chamada a envolver-se diretamente na questão. E o faz
sem poder se omitir. Caso contrário, como já se afirmou anteriormente, quem
falará em nome da fé, no logos universal? Ao ser avocada à mesa do logos universal,
como se mencionou no início deste texto, a teologia não traz todas – talvez até
nenhuma – as respostas prontas e/ou factuais. Assim, desde seu “proprium” (a fé),
deverá escutar silenciosa e reverentemente, as provocações dos homens. Depois
deveria perscrutar na revelação as respostas a serem construídas. Ou quiçá, bem
mais fazer novas perguntas a si mesma e ao conjunto do logos universal.
Aliás, aqui seria do bom tom recordar que há apenas 150 anos foi
construída, e divulgada progressivamente pelas ciências, a teoria da evolução.
15 Cf. DENNIS, E. El Dios de la evolución. Uma teologia trinitária. Santander: SalTerrae, 2006 pg. 20.
16 Cf. GEERING, L. Deus em um mundo novo. SP : Fonte Editorial Ltda., 2005, pg. 55 e KÜNG, H. op. cit.,
129.
17 Cf. COLLINS, Francis. A linguagem de Deus: um cientista apresenta evidências de que Ele existe. São
Paulo: Editora Gente, 2007.
18 Cf. DENIS, E. El Dios de la evolución... pg. 18
De como Deus cria
99
aberto. Isto é: não há necessidade de um finalismo (sobretudo científico). A vida
vai se auto-organizando (auto-poiésis), através das lutas e sofrimentos, perdas e
ganhos, desperdícios e superações aparentemente sem uma lógica determinada.
Bem pelo contrario! Aqui se deve incluir as múltiplas possibilidades inclusive do
desaparecimento de uma espécie ou de uma subespécie. A criação é uma ação
aberta. Nela não cessaria a atuação de Deus, como uma espécie de causa primária.
O Senhor, autor da vida, dispôs as coisas de tal maneira que elas possam fazer seu
caminho ao caminhar. A criação é um sistema aberto, processual, perfectível. A
complexidade dos sistemas faz crescer a indeterminação do salto posterior e, ao
mesmo tempo, crescem novas possibilidades.
19 MOLTMANN, J. Ciência e sabedoria... 55. A “Dei Verbum” do Conc. Vat. II vai insistir muito na
importância dos dados revelados nas Escrituras (Cf. nº. 11)
20 DENIS, E. El Dios de la evolución...pg 83
Tem-se certeza de que tudo quanto existe, se desenvolve. Percebe-
se que vidas simples possibilitaram sucessivos ajustes para o aparecimento de
vidas complexas, inclusive a humana. E pode-se afirmar de modo negativo: a
improbabilidade do ser humano não é significa sua impossibilidade. Pois neste
caso nós não existiríamos, inclusive, para podermos nos observar a nós próprios
e a criação toda. Mesmo diante do acaso e das probabilidades/impossibilidades,
nada impede de o teólogo afirmar que Deus atua no criado visando alcançar seu
propósito por meio de processos como a mutação aleatória e a seleção natural.
Obvio que quando se investiga a realidade natural, nada revela um tal propósito.
Mas, parafraseando o divulgador da cosmologia Carl Sagan, a falta de evidencia
não é uma evidencia da falta.
21 Cf. DENIS, E.. O sopro do Espírito. Uma teologia do Espírito criador. Loyola, 2007, pg. 84, citando
Rahner
se quisermos saber o que é o cosmo, tem-se que saber como ele
surgiu (...). Hoje não podemos mais entender ‘a história universal’
apenas como a história da humanidade (algumas centenas de
milhares de anos), mas ela tem de ser entendida como a verdadeira
história do mundo, desde a explosão inicial22.
A realidade é tudo quanto existe. E ela não pode ser definida, pois a
própria definição é parte da realidade. Para entendê-la é preciso partir do
concreto: do universo, do ser humano e ser-consciente-de-si-mesmo (o eu).
Isto, porém, não é tudo. É apenas a base da realidade. Não é ainda o seu todo. A
realidade também ultrapassa as operações teóricas da razão pura (ver Kant), os
sentimentos e as emoções. A possibilidade de experimentar a realidade de todo
o real e também uma realidade in fieri – isto é, racional, mesmo suposta a dúvida.
A existência de Deus é uma possibilidade - mesmo diante da negação absoluta
de alguns cientistas e pensadores23. Só existindo Deus é que se pode superar
a morte (aparente aniquilação de tudo) e responder às questões básicas sobre
quem somos, donde viemos e o que esperamos.24 “Então teremos encontrado um
fundamento para responder de onde vêm a matéria e a energia, de onde vem o 101
cosmo e o homem”.25
Desde a fé, a realidade, então, aponta para o que existe entre as “coisas
visíveis e as invisíveis” da obra criada por Deus. A realidade é, pois, tudo quanto
22 KÜNG, H.. O princípio...., pg 15
23 Vejam-se neste contexto as obras de Daniel.Denet, Quebrando o encanto. A religião como
fenômeno natural.. SP.: Globo, 2006; Richard Dawkin. Deus, um delírio, SP.: Cia. de Letras, 2007; Luc
Rerry. O homem-Deus ou o sentido da vida. RJ.: Difel, 2007; Michel Onfray. Tratado de ateologia.
SP.: Martins Fontes, 2007; Plínio Junqueira Smith (org.) Ensaios sobre o ceticismo. SP.: Alamede ,
2007 e outros, que transformam positivamente o ateísmo numa nova religião.
24 Cf. RIBEIRO, H. Quem somos? donde viemos? para onde vamos. Petrópolis: Vozes, 2007.
25 KÜNG, H. op. cit,, 122. Para uma discussão teórica sobre estas questões, ver pgs. 44-67
existe ao lado de Deus - o que faz todas as coisas existirem. Deus, o realmente
existente, faz as coisas existirem realmente.
O SOFRIMENTO E OS SOBRANTES
29 Aqui é interessante a reflexão do filósofo espanhol Jesus Mosquerin sobre a morte das células,
dos animais e dos humanos, in La naturaleza humana., especialmente pgs. 327-362),
30 GEERING, L. op. cit. pg .248
Deus é criador, mas também, o Espírito do universo (Moltmann). Ele, por
um lado, com seu poder, cede espaço, na sua infinitude, para que o criado viva e
se expanda. Por outro lado, é o Deus que dinamiza, desde dentro, esta obra criada
para que ela venha a ser sua glória.
31 Cit. em.EVDOKIMOV, Paul. O silêncio amoroso de Deus. Aparecida: Ed. Santuário, 2007, pg. 37.
106
Artigos
A PREGAÇÃO INICAL DE JESUS
Um estudo de Mc 1,14-15
The initial preaching of Jesus, a study of Mk 1, 14-15
RESUMO: A partir de Mc 1, 14-15, o texto discorre sobre o anuncio do Reino de Deus na pregação 107
de Jesus, Distinto dos outros sinóticos, constata-se que estas sumárias perícopes não reproduzem
as palavras de Jesus ao pé da letra, mas são obra de redação do evangelista Marcos, reproduzindo
a tradição catequética da Igreja primitiva, onde se insistia na conversão através da fé no Evangelho
revelado em Jesus Cristo. Após apresentar as três importantes notícias do contexto, busca-se os
diversos significados do Reino anunciado (cumprimento, proximidade, origem e exigências).
ndidade pneumatológica de Deus para a Igreja como mulher esperante do Espírito e da salvação.
ABSTRACT: As of Mk 1, 14-15, the text tells about the proclamation of the Kingdom of God
in the preaching of Jesus. Distinct from the others synoptics it is observed that these summary
pericopes do not reproduce the words of Jesus to the very letter; rather, they are the work of
drafting of the Evangelist Mark, who reproducing the catechetical tradition of the early church,
insists on the conversion through faith in the Gospel revealed in Jesus Christ. After presenting
the three major news of the context, it seeks for the various meanings of the Kingdom that is
announced (fulfillment, proximity, origin and requirements).
* Secretário e professor de Sagrada Escritura no Studium Theologicum e mestre em Teologia Bíblica, pela
Pontifícia Universidade Gregoriana, de Roma.
1. Introdução
2. O contexto de Mc 1,14-15
O texto bíblico diz: “v.14 Depois que João foi preso, veio Jesus para a Galiléia
proclamando o Evangelho de Deus: v.15 O tempo está realizado e o Reino de Deus
está próximo. Convertei-vos e crede no Evangelho”
113
A) Origem da expressão“Reino de Deus”e significados no Antigo Testamento.
Com Jesus a espera terminou, porque com Ele é a realização de tudo o que
Deus prometeu e o homem aspirou. O que é o Reino de Deus para Jesus, ou como
Jesus concebe esse Reino? Tentarei sintetizar nestes pontos:
É a própria vida de Deus que se manifesta como amor que quer salvar os
homens e leva-los a plenitude da vida. Esta dimensão mostra o significado da luta
de Jesus contra os escribas e fariseus com seu legalismo. Mostra a gratuidade do
Reino, ele é a força que vem de Deus para libertar o mundo e leva-lo à plenitude.
A força do Reino é apresentada nas parábolas da semente (Mc 3,26-32).
3.2.4. Convertei-vos
RESUMO: O trabalho enfoca diferentes aspectos do conceito de tradução para textos sagrados,
assim como suas implicações exegéticas e tradutórias. Trata-se da Parte I, extraído de uma série
deles. Este pequeno trabalho, pode-se dizer, é um modesto e útil instrumento no intercâmbio
entre estudantes do gênero literário: literatura cristã. Isso apenas ilustra a riqueza de conteúdo
que estes textos proporcionam a todos que a eles recorrem para iniciar ou dar continuidade às
117
suas leituras como literatura antiga. No referente a formas de tradução, destaco a importância
da influência do contexto histórico. Enfim, observo, estudos sobre temas bastante variados: e.g.
Tradução da Bíblia e Textos Apócrifos, Exegese Bíblica, Literatura Antiga, fidelidade na tradução,
o ato de ler, “cristianismos” nascentes, as consequências de uma tradição oral, ecdótica, cuidado
com a distância temporal de um clássico de linguagem, características literárias através de síntese
de tradições e idiomas, perspectiva diacrônica do grego até o helenismo, etc.
ABSTRACT: The paper deals with different aspects of translation for holy texts, as well as
the exegetical and translations matters about this. This is the Part I of a number of them. This
small work, one can say that, it is a modest and useful instrument in the interchange between
students of literary gender: Christian literature. Just this portrays the rich content which those
texts offer to everyone who turns to them to begin or to continue their reading as ancient
literature. With regard to kind of translation I would point out – the great value of the influence
of the historical context. Lastly, I point to studies on manifold themes: for example, Biblical and
apocryphal translations, Biblical exegesis, Ancient literature fidelity in translation, the act of
reading, “Christianities” rising, consequences of an oral tradition, ecdotic, care with temporal
distance of a classical language, literary characteristics through synthesis of traditions and
languages and diachronic perspective of Greek until the Hellenism, etc..
KEY WORDS: Biblical and apocryphal translation; Ancient literature; Biblical exegesis.
*
(...) a conclamada “fidelidade” das traduções não é um critério que leva à
única tradução aceitável (...). A fidelidade é, antes, a tendência a acreditar
que a tradução é sempre possível se o texto fonte foi interpretado com
apaixonada cumplicidade, é o empenho em identificar aquilo que, para
nós, é o sentido profundo do texto e é a capacidade de negociar a cada
instante a solução que nos parece mais justa” (...) porque se consultarem
qualquer dicionário, verão que entre os sinônimos de fidelidade não
está a palavra exatidão. Lá estão antes lealdade, honestidade, respeito,
piedade.
1 ECO. 2006, p.7. É um ciclo de seis conferências – Charles Eliot Norton Lectures. Todos os anos
convidam um erudito de grande conhecimento humanístico as pronuncia com inteira liberdade
nos seus temas.
Eco faz coro ao seu contemporâneo, Ítalo Calvino que situa o ato de
leitura no centro das atenções. Sua primeira exposição é uma menção as palestras
do amigo que também foi convidado para pronunciar suas seis conferências oito
anos antes:2 “eu o evoco não apenas como amigo, mas também como o autor de
Se um viajante numa noite de inverno, porque seu romance diz respeito à presença
do leitor na história e em larga medida minhas conferências versarão sobre o
tema”3. O leitor passa de coadjuvante para personagem principal, cf o próprio
Ítalo Calvino menciona:
2 ECO lamenta: “porém só teve tempo de escrever cinco, antes de nos deixar”, idem, p.7.
3 idem. ibidem.
4 cf CALVINO. 2005, p.12.
5 Expressão dos exegetas alemães para dizer sobre o “contexto vital” ou “lugar vivencial”, ocasião
e os contornos de quando uma obra foi escrita, usada em outras línguas.
6 Estas igrejas mais antigas não eram um cristianismo como o temos, mas um rebento do
judaísmo.
Não haverá suficiente compreensão de um texto produzido neste
ambiente se não entendermos o que significou: (i) o profetismo antigo e o
messianismo pós-revolta dos macabeus; (ii) as relações imperiais com a política
doméstica do(s) Herodes(s); (iii) as seitas judaicas do antigo judaísmo e que
coparticiparam dos cristianismos nascentes, em um ou noutro aspecto, prático
ou formativo, como os saduceus, classe culta dotada de um conservadorismo
simplificador, mais aberta ao helenismo; (iv) os essênios7 (= piedosos), fonte
da piedade e santidade cristãs, escribas por excelência, recolhidos no deserto
e em pequenas comunidades. Combatiam a helenização da Palestina e deles
advém Qumran. É o grupo que mais coparticipou na formação dos cristianismos,
mas que curiosamente, mesmo sendo a maioria numérica judaica daqueles
dias, ainda assim os Evangelhos e Cartas canônicas optam por um inquietante
e sepulcral silêncio8 de qualquer menção nominal à seita ou de algum
representante ou da sua doutrina neopitagórica ou qualquer aspecto da vida
deles; (v) zelotes: ativistas políticos, contra o domínio de Roma, guerrilheiros,
adeptos do messianismo; (vi) fariseus: existem desde exílio babilônico (587
120 a.C.), e em maior amplitude empós o advento da libertação por Ciro (539 a.C.).
Foram influenciados pelos imaginários do zoroastrianismo e dos aramaico-
persas. Importaram seus ideários tal qual se pode hoje distingui-los nos
dogmas e doutrinas cristãs. Eram acessíveis à helenização, praticavam a missão
de converter os gentios e detinham a linguagem legal e jurídica judaica9; (vii)
a “globalização” advinda do envio dos Ἰερουσαλὴν κατοικοῦντες Ἰουδαῖοι10
e de lideranças entre os helenistas; (viii) o advento de Paulo, sua formação e
a consequente doutrina estoica; (ix) a γνῶσις e o dualismo que resultará na
revelação cristã.
7 cf FLAVIUS JOSEPHUS, Titus. Guerra dos Judeus – Livro I e II, in to. op.
8 Os estudos no método histórico-crítico vêm chamando a atenção muito recentemente sobre
este intrigante silêncio canônico.
9 Demônios e anjos. Escatologia e apocalipcismo. Existência post-mortem baseado na lei das
recompensas do mal ou do bem.
10 cf At 2,5. Judeus residentes em Jerusalém, helenistas, um público já internacionalizado. De que
vem Saulo de Tarso, Síria (= Paulo), principal helenista dos cristianismos nascentes e outra da
liderança – Nicolau de Antioquia, Síria, do primeiro colégio diaconal.
II. Decorrências de uma tradição oral
11 Uma língua de teor popular, mais evidente em lugarejos menores, atribuída a Aram, filho de
Sem. Não há registros dos arameus anterior ao séc. XII a.C. Tem-se falado em pelo menos 7
dialetos correntes no séc. I. Do hebraico há pouca evidência de uso neste período, até porque
as palavras não traduzidas nos Evangelhos são de origem aramaica. O hebraico restava na
Tanakh e num restrito círculo culto.
12 OLD ARAMAIC. <http://cal1.cn.huc.edu/searching/basic_concordance.html> Acessado em
11/03/2012.
13 Mc 14,36; Lc 10,38; Jo 19,13; At 1,19; 9,33; Gl 4,6.
14 Mel Gibson com o filme A Paixão de Cristo (2004), utilizou-se de falas aramaicas deste dialeto
reconstruído em parte a partir do aramaico bíblico de Esdras e Daniel (com um vocálico “o”,
auxiliado pelo Prof. William Fulco, padre jesuíta.
15 LEWIS. 2009. Ethnologue – Languages of the World. Online version: http://www.ethnologue.
com/
era em hebraico16. O aramaico é a língua popular e de caráter mais íntimo,
familiar e mais proeminente nos vilarejos interioranos17. O grego era a língua
internacional vernacular na Palestina do séc. I. E o latim a língua protocolar e
jurídica do Império Romano.
22 Trata-se de uma relevante escola judaico-teológica, cuja descoberta 1947 vem surpreendendo o meio
acadêmico dos estudos cristão-judaicos como chave hermenêutica para a tradução, compreensão
de textos do NT e apócrifos – caso de AtsPe, eventos históricos e com desdobramentos na própria
cultura mundial ou transnacional. Informes advindos das escavações e de historiadores clássicos – e.g.
Titus Flavius Josephus, =( ינורדנסכלאה ןוליפheb. Pilon ha’Alexandroni), Gaius Plinius Secundus (=Plínio,
o Velho) dão conta de uma comunidade já povoada em 700 a.C. Entretanto enquanto seita essênia,
por volta de 200 a.C., é que obteve boa estrutura e aparelhamento institucional. Reconstruída depois
do terremoto de 31 a.C, foi destruída sem piedade pelos romanos na invasão de Nero. Pouco se sabia
sobre até o advento Qumran de 1947. Hoje, porém, determinados aspectos e ditos de personagens
como Jesus, Paulo e João Batista somente podem ser compreendidos à luz dos escritos de Qumran,
que no geral, circularam de forma sistemática por volta de 100 a.C. ou 170 anos nos textos cristãos:
(i) Um exemplar desta vasta coleção pode ficar sem sentido ad ӕternum se excluíssemos Qumran da
sua hermenêutica é Mt 5.43: “Ouvistes que foi dito: Amarás ao teu próximo, e odiarás o teu inimigo.”
A primeira parte da afirmação vem da Torah – Lv 19.18. A segunda sequer existe no AT, mas advém
de um código legal e de ética da comunidade de Qumran achado em 1947 – Regra da Comunidade
– “amar os filhos da luz e odiar os filhos das trevas”, ou seja, os gentios, que rendeu o ódio de certos
romanos (especialmente das legiões de Nero) que acusaram os essênios “de detestar a raça humana
123
‘odium generis mundi’ cf CHAMPLIN. vol I, p.317. (ii) Quem for a Qumran na hoje, já na recepção,
assiste um curta-metragem que noticia que um personagem passou por aquela comunidade, mas
restou banido por não inadaptação - João Batista, de quem traços, costumes e a radicalidade da
sua pregação parecem não negar a origem. (iii) cf EISENMAN & WISE. Manoscritti segreti di Qumran.
Edizione italiana a cura di Elio Jucci. Piemme, Asti: 1994, que aborda estes textos de Qumran
colocando Tiago “o irmão do Senhor” (cf At 12,17; 15,13; Gl 1,19, et alii) no cargo mais elevado de
‘Mestre da Justiça’ desta comunidade, e que derivaria no embate entre a corrente de Tiago, irmão do
Senhor e a do Apóstolo das Gentes. Aponta que teríamos um outro “Jesus” e um outro “Evangelho”
se a corrente de Tiago tivesse vencido na ortodoxia. (iv) Também em 1991 Eisenman (1997, op.cit.)
causa grande polêmica com divulgação incomum e precoce ao arrepio do comitê do ms. 4Q285
(parcialmente corrompido), que trata da pena capital aplicada a um Messias, que cf ele seria Jesus,
motivo da não exposição pública deste mss. É uma passagem acerca de um certo que “Messias foi
assassinado” ou que “assassinou”. Este escrito potencializa a polêmica pelas multíplices traduções
cabíveis: “E esses assassinaram [pass.] (ou: assassinarão) [fut.] o príncipe da comunidade, o reben[to
de Davi]”, ou ainda, “O príncipe da comunidade o matará [fut.] (ou: o matou) [pass.]”, ou também, “O
príncipe da comunidade, o rebento de Davi, o matará (ou: “matará o ímpio)”. (v) o paralelismo
de vocábulos jurídicos e de celebração de Qumran contrastado escritos do NT resta inegável. Calões
teológicos como “os muitos”, ou ainda, “maioria” de At 15.12; 2Cor 2.5-6 e nas narrativas eucarísticas
de Mt 26.27-28; Mc 14.23-24; Lc 22.20. Termos inexistentes na literatura rabínica contemporânea ao
NT associam-no imediatamente a Qumran: “a sorte dos santos”, “justiça de Deus”, “o Senhor do céu e
da terra” “pobres em espírito”, “Igreja” como “Assembleia de Deus”, “ele será chamado Filho de Deus”
(Lc 1.35-37), “obras da lei”, o contorno de Melquisedec tal como retratado em Hb, o mote de Paulo
acerca da “justificação pela fé” (cf ; Gl 2.16; Rm 3.21-24 et alii), “o mistério da iniquidade” (2Ts 2.7), κτλ.
(vi) cf VANDERKAM, James. C. Manoscritti del Mar Morto. Il dibattito recente oltre le polemiche. Città
Nuova, Roma: 1997 (à época da publicação era membro direto do grupo responsável pela tradução
e publicação dos mss.) temos o curioso episódio de John Allegro, um inglês ateísta, que participou
como um dos pesquisadores de Qumran. Afastou-se da pesquisa com graves revelações contra
a liderança dizendo que estariam sendo escondidos mss. da Gruta 4, cujo teor poderia prejudicar
o Cristianismo e que, cf Allegro existia uma forte oposição do Vaticano para não viessem a público.
Allegro afirma que nestes mss. as origens do Cristianismo eram atribuídas aos decorrências do uso de
um alucinógeno cf também defende, ou ainda, cf Bárbara A. Thiering que defende João Batista como
um ‘Mestre da Justiça’.
As pesquisas começam a delinear melhor o caminho a partir do começo do
fim da oralidade, com o surgimento dos λόγια e as versões proto dos evangelhos23
e outras pequenas retenções pré-escritas, fruto de anotações acidentais e
corriqueiras de discípulos e observadores e que hoje restam perdidas. Estas são
intermediárias entre a tradição oral e a tradição escrita sinótica, igualmente entre
a oralidade e a corpora paulina. E das quais o Ev. de Lucas dá conta cf a índole
textual de Mc e Lc com a menção de ocorrências concretas.
23 (i) Um possível Proto Ev. de Tomé, em Jerusalém, com a influência de Tiago, e cuja comunidade
que a compôs migrou posteriormente para Edessa, Síria cf DAVIES apud CROSSAN, 1985, p.465.
(ii) O frg. do Ev. de Egerton, um único registro com linhas 87 danificadas cf a tese de DANIELS,
1989, pp.12-16.
24 A escola mais aceita na atualidade seguem os estudos literários para o AT/NT de: WERNER, Udo;
METZGER, Bruce M; BERGER, Klaus et alii.
25 Tradução que foi registrada nos Anais da XXII SEMANA DE ESTUDOS CLÁSSICOS – Cultura
Clássica: inter-relações e permanência – Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos SBEC. Análise
Crítica-Literária e Tradução da ‘Carta Circular da Igreja de Esmirna Sobre o MARTÍRIO DE SÃO
POLICARPO’: a mais antiga narrativa do gênero. UNESP, Araraquara, 2008, p.214-27, http://www.
fclar.unesp.br/ec/BANCO%20DE%20DADOS/XXIII%20SEC/TEXTOS/ARTIGOS%20PDF/paraizo.
pdf. Uma primeira versão foi apresentada através de uma mesa redonda no I Simpósio Antigos
e Modernos – UFPR: Encruzilhadas entre história e literatura, 04/12/2007, http://www.classicas.
ufpr.br/eventos/Isimposioantmod.htm
26 Tradução gr.→pt., Análise Crítico-Literária e Tradução da ‘Carta das Igrejas de Viena e Lião’ – Entre
as mais Antigas Atas de Mártires. Relato de ca. 50 martírios nestas cidades. Esta carta, em gr. sob
forma de circular, foi enviada da Gália às igrejas da Ásia e Frígia, sobre a perseguição ocorrida
em Lyon (177), está conservada da H.E. de Eusebius. Constitui admirável documento do espírito
suas próprias obras, sendo que até Eusebius de Cesareia – H.E. as recolhe de lá;
inúmeros frgg. em siríaco e em grego27 demonstram que ele era um autor muito
lido.
126
Conybeare (reed. 2004), Gramática de Grego, de M. Alexandre Jr., etc. Para ilustrar o
que seriam, e.g., um intervalo de 500 anos de uma língua, anexamos um exemplar
em língua nativa. Trata-se do mais primitivo documento escrito em pt. no Brasil
há 512 anos. O repto consiste numa leitura inteligível de poucas linhas sem a
consulta na nota de tradução35 da Carta de Pero Vaz de Caminha 01/05/1500 ao El
Reì de Portugal D. Manuel (ortografia original):
Snõr.
36 Copiada, seguindo a mesma marcação de linhas e parágrafos, do original que existe no Arquivo
Nacional da Torre do Tombo – Portugal, gav. 8, maç. 2, nº 8, cf Biblioteca Nacional de Portugal
-http://purl.pt/index/geral/PT/index.html
37 cf Lv 25.10, os judeus guardam suas genealogias com cuidado porque a cada 50 anos as
terras retornavam aos seus donos originais. Pessoas sem genealogia comprovada eram como
forasteiros, sem direito à posse. Eram feitas de forma suficientemente séria, até quando Nero
(70) destruiu e templo e queimou “os livros das genealogias”, cf STAMBAUGH & BALCH. 1996,
p.101.
9
e Uzias gerou a Jotão, e Jotão gerou a Acaz, e Acaz
gerou a Ezequias.
10
Ezequias gerou a Manasses, e Manasses gerou a
Amom, e Amom gerou a Josias,
11
e Josias gerou a Jeconias e a seus irmãos na
deportação para a Babilônia.
12
E, depois da deportação para a Babilônia, Jeconias
gerou a Salatiel, e Salatiel gerou a Zorobabel,
13
e Zorobabel gerou a Abiúde, e Abiúde gerou a
Eliaquim, e Eliaquim gerou a Azor,
14
e Azor gerou a Sadoque, e Sadoque gerou a Aquim, e
Aquim gerou a Eliúde,
15
e Eliúde gerou a Eleazar, e Eleazar gerou a Matã, e
128 Matã gerou a Jacó,
16
e Jacó gerou a José, marido de Maria, da qual nasceu
JESUS, que se chama o Cristo.
17
De sorte que todas as gerações, desde Abraão
até Davi, são catorze gerações; e, desde Davi até a
deportação para a Babilônia, catorze gerações; e,
desde a deportação para a Babilônia até Cristo,
catorze gerações.38
38 cf Mt 1,1-17 (BJ, grifo nosso), que difere completamente da Genealogia de Jesus no Ev. de Lucas
3,23-38.
têm fornecido um número significativo de soluções, e.g. o fato de que genealogia
lucana é materna e, a mateana, paterna. Afora estas questões, resta no texto de Ev.
de Mateus algo mais relevante para os estudos da tradução.
Sabedoria persa
pós-exílio 586-539 a.C.
Background
semítico / Hebraico
hebraico Estilo Rabínico
130 LITERATURA
Aramaico Palestino κοινή
e Imperial literário
CRISTÀ
Léxico Sintaxe
Tradição Latim
da Oralidade protocolar
Aramaico κοινή
Galileu vernacular
50 cf MEILLET, A. Aperçu d’une historie de la langue grecque. Paris: Klinckksieck, 1965, p.119 apud
ALEXANDRE Jr., 2003, p.24.
51 ALEXANDRE Jr. idem, p.23.
52 Teria vivido entre os párias da sociedade local, talvez mais na Galileia seguindo a tradição
sinótica; ao contrário do Ev. de João que apresenta um Cristo em Jerusalém (mais cosmopolita).
Teria falado mais aramaico que possivelmente grego. Alguns que acreditam que nem teria
falado grego nem saberia ler cf recentes pesquisas sobre o ‘Jesus Histórico, cf CROSSAN. op. cit.;
MEIER. op. cit.; et alii.
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SMYTH, Hebert Weir (ed.). A Greek Grammar. New York / Boston: Univ. de Harvard
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134 VANDERKAM, James. C. Manoscritti del Mar Morto. Il dibattito recente oltre le
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WALLACE, Daniel B.; EDWARDS, Grant. A Workbook for New Testament Syntax:
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PERO VAZ DE CAMINHA. Carta El Reì de Portugal D. Manuel. Lisboa: Arquivo Nac. da
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