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CASA VERDE

Noel Nascimento

Ele subiu a serra com uma velha bíblia na mão.

A muque prendia ao peito uma trouxa de trapos.


Ferira os pés nas pedras em riste das escarpas. Consta que um velho cão vadio lhe lambera as chagas.

Ele vivia numa gruta, isolado do mundo dos homens. Segregarase antepondo a este a muralha das montanhas. !"
no cume, no claustro do mosteiro lapeano, mosteiro da nature#a, na socava, $i#era morada. %ma $enda talhada na
rocha, onde & tarde#inha, ao decair o sol, se pro'eta nitidamente a sombra de santo Ant(nio. )anto isto é verdade
que, certo dia, um retratista protestante bateu uma chapa da gruta e se surpreendeu quando viu revelada a imagem
do santo casamenteiro.

*ara os moradores da !apa, ainda vilare'o, era uma $igura apocalíptica, mas a alguns ricos $a#endeiros,
acostumados & vida da capital, parecia apenas um mendigo.

+ onge-
o dia ensolarado de seu rosto, os olhos, o céu/ as barbas, as nuvens.

aquelas paragens a nature#a é ascética. Se a tarde expira, o sol é chama de vela que se $inda no hori#onte, e a
pr0pria serra um bando de $rades a'oelhados, envoltos em incenso. o chão imenso re$ulgem tapetes bordados de
campos, e os pinheiros, vestidos de escuras batinas, semelham multidão de vultos penitentes, com os bra1os
estirados para os céus, em atitude de s2plica. 3uvese o ruído resmunguento da bicharada como suave murm2rio
de preces.

)inha como templo o universo, como altar, a consci4ncia.

ão se devia indagar de que vivia o monge, pergunta indiscreta, seria pro$ana1ão.

+ Santo não come + explicavam os camp(nios.

Se perdia os sentidos algumas ve#es, a $ome como causa, nisto ninguém creria. as, era um $ato, resistia
galhardamente. Apenas tr4s ve#es ao dia chuchurreava o chimarrão, e quase sempre na mesma posi1ão, de
c0coras.

a hora do crep2sculo é que se punha a contemplar o cen"rio esplendoroso. Então pre$eria o pito. *ito de bambu.
Em espirais, a $edorenta $uma1a e os pensamentos subiam para o in$inito. 5uando $altava o $umo de corda,
cachimbava $olhas secas de ervas silvestres, apesar de os roceiros lhe tra#erem a preciosidade. Arrimavase ao
bordão e perdia os olhos tristes no panorama, logo ap0s as horas que passava de 'oelhos. Entoava baixinho um
hino decorado como se $ora acompanhado por coro de an'inhos. essa ocasião, nascia no hori#onte uma
trepadeira de estrelas que se espalhava na amplidão, iluminandoa.
Ele vivia noutro mundo, no mundo das $antasias. 6uscava esquecer a si pr0prio. 7ese'ava a pa#, sua barba branca
des$radada no rosto era uma bandeira de pa#. 8mpossível desvendarlhe o passado, melhor aceitar o que dele
di#iam9

+ :oão aria é um enviado do céu.

+ onge-

Embora velhinho, ainda alvorecia em seus olhos a#uis, em suas barbas alvíssimas. Enclausurarase na montanha,
indignado com a maldade humana, cheio de decep1;es e desenganos. !" se libertara dos sentimentos egoísticos,
pensando em desligarse das coisas materiais e perder o apego a tudo que 'ulgava mal terreno. em dinheiro, nem
propriedade, nem ambi1ão, vaidade, ou orgulho. Achava necess"ria tal inicia1ão para seguir o destino. 3 nome do
registro civil, não importa. acionalidade, nenhuma. Estava acima das conven1;es sociais, ainda que se intitulasse
monarquista. Sabiase um pro$eta, um mission"rio divino9

+ onge.

+ 8nh( :esus- + exclamava o aldeão, 'oelhos no chão.

Se indagavam de sua vida, curiosidade pecaminosa, obtinhamlhe a resposta9

+ Sou um homem como voc4s, estou cumprindo uma senten1a.

A atoarda corrente nas vilas $lorescentes dos Campos <erais era a de que nascera em 6elém, na <aliléia, que ap0s
perder a esposa, chamada Aisha, e combater, &s ordens de urad6e=, o exército expedicion"rio $ranc4s, quando
no Egito, voltara & *alestina, onde tivera a visão de *aulo, o Ap0stolo. 3s que propagavam tal versão inventaram
um nome que seria verídico9 :ohannah 8eshona. %m certo general a$irmou tratarse de um cidadão $ranc4s
chamado Anastas arca$, enquanto um ma'or re$ormado di#ia abertamente, nos ca$és de !ages, que :oão aria
não passava de espião argentino a $a#er o levantamento da região sulbrasileira.

onge, apenas monge, $i#era claustro na serra de Santa Emídia, no município da !apa. A cidade admiravao.
Assunto predominante, conhecido dos antigos moradores e ob'eto de devo1ão dos novos, $a# parte da hist0ria.

Enquanto os velhos republicanos como os !acerdas e os Carneiros pre$eriam os serm;es do 'ovem e tristonho
capuchinho $rei Silvério, o que celebrava a >santa missa verdadeira>, a popula1ão pobre gostava de ouvir o monge
a gabar 7. *edro 88 e prometer um exército de an'os aos revolucion"rios maragatos. Ali"s, ninguém p(de
compreender o porqu4 da retirada das tropas de <umercindo Saraiva no célebre cerco, o porqu4 de por este não
ser implantada a alme'ada monarquia sulbrasileira. )udo coisas de um 6rasil bem campon4s, bem caboclo, bem
brasileiro.

Ele sepultara a mem0ria no $undo dos pélagos. !", do alto, atirara $ora a bagagem das recorda1;es.

+ Ah- mas ninguém sabe com quais sacri$ícios...

3 crep2sculo é belo no campo. 3 hori#onte arde em rubras e douradas, quão t4nues labaredas. 3 céu parece o
prado a queimar nas noites de agosto, dando impressão de uma ?oma em chamas ao moroso via'or cavaleiro. 3
sol, p"ssaro branco do sertão, esvaise em sangue, tombando no ocidente. 3 dia murcha como uma $lor do ip4. A
imagina1ão se livra do arreamento e $oge, a galope, pelas coxilhas e canhadas, enquanto as aves ade'am
alvoro1adas, em bandos, como $lores despetaladas no ar. @ assim que a tarde expira e parte na carruagem das
horas, é assim que a noite chega com um ros"rio de estrelas no pesco1o e o Cru#eiro do Sul sobre o cora1ão. "
uma sensa1ão de ocaso na alma, de $im, de morte, de saudade. o peito $alece algo que nos é caro. Emo1ão de
abandono e triste#a. @ um adeus da nature#a.
esses instantes de ang2stia, come1avam os seus padecimentos.

*itando e meditando aguardava a chegada das sombras. Era como se um morcego in$inito tivesse $echado as asas
sinistras sobre o mundo trans$ormado em descomunal sepulcro. a caverna, $urna escura, ele, :oão aria, monge
do *aran", so$ria delirando, acordado ou em sono let"rgico. A cigarra silenciava cedo, com a passarada. 5uando
a saparada coaxava a can1ão de ninar, o enxame de grilos tocava $lautas com pontas nos ouvidos. as isso era
insigni$icante como o uivo do noitib0, o crocitar pressago da coru'a, o #umbido do mosquito sequioso de sangue, o
ruído de todos os insetos e aves noturnas.

As velas que via coruscantes no ar não passavam de pirilampos, olhos de duendes que o $itavam eram astros da
vial"ctea, do candelabro de estrelas pendentes do céu. 7i$ícil saber se tinha as vistas $echadas ou esbugalhadas,
se mergulhado num sono m0rbido ou em $ebril vigília. Então lutava contra as tenta1;es, insinuantes imagens de
mulher, expulsandoas da mente. a grota desolada, urros de $antasmas ecoavam ricocheteando nas pedras, de
$antasmas que surgiam em vagas. Bultos hediondos explodiam em gargalhadas e $aíscas, iluminados por
labaredas. %m alarido de impreca1;es e #ombaria ensurdeciao. Entrementes, o $rio lhe cortava as carnes,
penetravalhe a alma.

Santo do povo, parecia existir por milagre. Finalmente vitoriarase na luta contra os dem(nios e o seu eu
pregresso. 7epois de paciente escava1ão na consci4ncia, soterrara os nomes e as lembran1as do passado. Certa
noite, ap0s longa medita1ão sobre os textos do Evangelho, teve um sonho que sempre con$undiu com a realidade.
7isselhe um an'o, radiante de lu#9

+ B", :oão aria. Caminhe pelo mundo e cumpra sua missão sagrada. @ preciso salvar a humanidade pecadora.

:" havia decidido chamarse :oão aria de Agostinho. :oão em louvor a são :oão 6atista, aria & virgem aria,
e Agostinho a santo Agostinho. Seria tr4s ve#es santo.

h( )ristão, caboclo aben1oado, a'udouo com a mudan1a, a descer a serra. Embora a gruta se tornasse sagrada
e atraísse mais gente que a igre'a, $rei Silvério exultou e abra1ou muito picapau.

Foi assim, de um dia para outro, que Anastas arca$ con$undido como monge da !apa se tornou eremita. o $im
do século de#enove e no limiar do século vinte, vagava pelos caminhos agrestes dos estados sulinos, assombrando
as popula1;es, vulto bíblico, versão matuta, um pro$eta medieval em meio sertane'o.

uns e noutros lugares o identi$icavam9

+ onge :oão aria.


+ Frei :oão aria de Agostinho.

+ :oão aria de :esus.

+ 6om :esus.

E explicavam boquiabertos9

+ Bem salvar os seus povos-

*eregrinava especado ao ca'ado. o bornal a tiracolo, ora1;es, curas, promessas e esperan1as. 7o cinto de couro
cru pendiam a marmita de $olha ordin"ria, guampa, cuia e uma bomba de prata. Entre algumas preces que
distribuía, todas miraculosas, destacavamse a >do Santo Sepulcro>, a >do osso :ui# Eterno>, e a >do 6ode
6ranco>.
Era bom e castigava os maus.

Frei Silvério, p"roco noutras plagas, não queria bati#ar uma crian1a por ser a mãe uma paupérrima vi2va que não
podia pagar o o$ício. :oão aria deu & in$eli# uma nota de cinco mil réis para entregar a $rei Silvério e este, ap0s
o sacramento, viu desaparecer o dinheiro da palma da mão...

)endo passado também em São *aulo, ato <rosso e ?io <rande do Sul, :oão aria escara$unchou o *aran" e
Santa Catarina, gran'eando $ama. )rabalhadores do campo, lavradores pobres, pe;es, agregados, $a#endeiros
arruinados, principalmente agregados, pareciam ver nele a pr0pria imagem. 3u melhor9 o re$lexo do eu interior.
7e certa $orma, cada um o possuía dentro de si. Em pouco tempo, um ídolo, canoni#ado em vida pelo povo.
Binculado & luta, &s cren1as, aos costumes, &s aspira1;es de todos, tornavase símbolo e lenda.
+ onge-

Ao sopé das montanhas, & beira dos arroios nos cap;es de mato, $a#ia o pouso. *ara livrar o povo dos males >da
peste, da $ome e da guerra>, erigia uma cru# no monte mais pr0ximo. Aben1oava a "gua, dandolhe poderes
divinos a $im de ser bebida pelos en$ermos. esses sagrados lugares, recebia o povo, curando e re#ando,
pro$eti#ando, pregando a humildade e o bem. *r0xima & !apa, uma certa $amília comprara uma propriedade onde
havia uma Fonte de São :oão aria. Como não cresse no que cria o povo, o che$e desalmado ateou $ogo ao
cru#eiro e ao pinheiro sagrado.

aquelas terras nunca mais houve colheita, o gado acabou sumindo, s0 restando miséria. E o pior é que a $amília
se trans$ormou numa estirpe de loucos.

Com aquele ar avoengo, sublime, os cabelos como crisanto, as barbas de algodão, leque aberto para baixo, & lu#
das $ogueiras acesas de$ronte & cru#, :oão aria + o 6om :esus- + comandava longos ter1os e avemarias. Ao
$alar, pro$eria as palavras com 4n$ase, procurando as de e$eito solene, musicadas, mais apropriadas a um santo.

o pequenino orat0rio guardava uma bandeira do 7ivino Espírito Santo, outra da Santa )rindade de 7eus, e o
cruci$ixo com um Cristo de mar$im.

Abrenharase sertão adentro como um piolho em suas $artas e respeit"veis barbas. 3 sertão é a casa verde, soalho
de relvas, tetos no céu. ela os homens devem abrigarse contra a miséria e os horrores da guerra. A casa verde é
a sua casa e est" sob a sua prote1ão.

%ma aldeã que lhe negara um tiquinho de erva, viua trans$ormada em cin#as na barrica.

Surgia e sumia de s2bito. %ma ve# $ora encontrado durinho como uma pedra, mas decorridas vinte e quatro horas
ressuscitara como o !"#aro.

+ Santo não morre + esclareciam os crentes.

3s 'ornais '" se ocupavam de :oão aria, e um antigo morador de <uarapuava, o ma'or 7omingos ascimento,
que visitara a gua Santa, no caminho que vai do rio :angada a *almas, em seu livro >*ela $ronteira>, ressaltava
num trecho9

Este cenobita, um velho ri'o e seco, anda h" quarenta anos perambulando por aquelas paragens9 $ura o sertão até
a !agoa Bermelha/ de l" corta os Campos de *almas/ vai ao )ibagi/ vence as $lorestas e as montanhas dos
Agudos/ internase no *aranapanema/ $a# por l" os seus milagres, as suas prédicas, as suas ora1;es/ d" seus bons
conselhos, e retorna derivando para as margens do 8gua1u, :angada e não sei por onde mais. Andarilho de
primeira, erra por montes e vales, andra'oso e esqu"lido, com um bastão apenas por arma. ão h" insetos que lhe
mordam as carnes, nem $eras que lhe moam os ossos.
unca $ora picado por serpentes ou colhido pelo 'aguar manhoso. Ao pressentir o perigo, punha o cruci$ixo entre
as mãos e repetia tr4s ve#es9 >são 6ento, são 6ento, me livre desse bicho pe1onhento>.

arrecas, cru#ada pelos cargueiros carregados de sal, a12car do dia, rapadura, cana e $rutas/ arrecas, onde a
besta da ponta chegava batendo gui#os e campainhas presos & coleira, e alteando na cangalha uma $lDmula
branca de pa#/ arrecas era um pouso tranqilo e certeiro dos arrieiros dos Campos <erais. %ma vilinha de
r2sticos casebres cobertos de tabuinhas com quintais cercados de pau bruto.

:oão aria vinha por uma vereda e descera uma serra inacessível. *ouco distante de um rancho, num local
marcado por uma "rvore $rondosa, & sombra da qual havia um veio de "gua límpida e boa, armaria sua
barraquinha. Fora visto com uma trouxa presa aos ombros como uma mochila, segurando uma caixinha pela al1a
com uma das mãos, enquanto a outra prendia o bastão peregrinante. 7epois, & medida que os tropeiros e os
moradores de arrecas iam chegando, abancavamse no chão in$orme, ouvindolhe as pr"ticas. A conversa1ão
com os arrieiros era lida, em toda parte, na brochura intitulada Bida de :oão aria de :esus9

+ 5uem é vanc4 E donde vem

+ Sou um $ilho de 7eus e pecador como v0s... Benho de muito longe. )ão longe é o lugar de onde venho que não
podeis $a#er idéia. ilhares de léguas separam minha p"tria da vossa. E eu venho de l"...

+ as como se chama essa terra de onde vanc4 vem

+ :" ouvistes $alar na <aliléia )erra onde nasceu :esus Cristo, nosso Salvador/ Filho de 7eus *ois eu sou
dessa terra bendita. Chamome :oão aria de :esus, discípulo de santo Agostinho. ão sou eu s0 desse nome.
)enho um irmão $rei anoel aria de :esus e uma irmã aria Clara. 3s tr4s somos penitentes e percorremos a
terra toda, semeando a mancheias o amor ao pr0ximo e o pão bendito do bem. 8rmãos- B4de este orat0rio
?elic"rio santo que carrego por todo o mundo

Ap0s uma pausa para a prece, continuou9

+ Amaivos uns aos outros. )empos virão em que os homens procurarão se destruir uns aos outros, como $eras.
a1;es contra na1;es se es$acelarão e procurarão consumirse reciprocamente, de inve'a uma das outras, e
irmãos contra irmãos se procurarão matar e roubar ao mesmo tempo. aveis de ouvir, deste bendito recanto onde
morais, o troar do canhão na grande guerra universal. )emei, $ilhos das matas, o convívio das cidades, onde reina
de permeio a muita hipocrisia, a luta pela vida material e esquecemse todos de que s0 7eus e a <ra1a 7ivina dão
o sossego e alimentos & alma e ao corpo... Eu vou para longe, onde continuarei a penit4ncia que me impus e se
impuseram os irmãos de meu corpo.
+ as como p(de vanc4 vir por essa picada que s0 vem dar aqui no rancho e por l" não sai em outro caminho...

+ ão tenho caminhos.Bou & merc4 de 7eus e os caminhos me aparecem no decorrer da viagem. 5uando canso,
paro. Se tenho $ome, como.

+ E vanc4 não tem medo dos bichos brabos do mato

+ ão lhes $a1o mal, meu rapa#, por isso não temo e eles me respeitam. :amais matei um ser vivente.

+ as é pecado matar um tigre, por exemplo Se ele nos persegue

+ 3 tigre s0 persegue os que dele t4m medo. @ porque no cora1ão pecador desses, um outro tigre mora9 o 0dio aos
seus semelhantes e a todos os viventes. *or isso o tigre $ero# adivinha nele um outro tigre e busca mat"lo9 + é
uma $era contra outra $era. *lantai todos os vegetais que servem de alimento, assim como $rutas. 3s que crescerem
e derem $ruto, $ora da terra, irão cada ve# mais minguando, até não poder subsistir aos climas que se
trans$ormarão em toda parte. *rocurai, então, outros que possam substituir. 7estes, eu vos aconselho as batatas e
os tubérculos. aver" tempos, não muito longe, em que s0 estas plantas serão alimentos para o homem...

-as os bichos *elo menos haver" carne... E vanc4 di# que não se deve comer carne

+ Assim ser", porque nesses tempos o homem deixar" de ser material para se deixar guiar pela vo# da alma, e
espíritos l2cidos perceberão que a carne lhes $a# mal e hostili#a o espírito. Então, reconhecer" os outros homens
como irmãos...

a manhã seguinte, levaramlhe muitos presentes, mas :oão aria s0 aceitou leite, quei'o, manteiga, ovos,
hortali1as, mate e $umo.

$iéis aumentava a cada instante. Fa#ia uma in$inidade de compadres, sacramentando casamentos, bati#ando os
a$ilhados. 5uando se dispunham a seguilo, então :oão aria desaparecia.

Amava a solidão.

3s ímpios e os escarnecedores talve# não acreditem, talve# não acreditassem, mas :oão aria antevira
acontecimentos importantes. Anunciara a queda do 8mpério. as abominava a trai1ão dos ministérios, di#endo
que os >bons tempos do império> sempre seriam relembrados depois que os militares implantassem o >governo do
diabo>. E acrescentava9 + 7urante seis anos vão rebentar as bombas.

os arredores de <uarapuava, onde se encontra uma $rondosa "rvore, a rvore Santa, revelara9
+ A 8gre'a não cumpre mais a vontade e a palavra de 7eus. A santa missa é re#ada s0 por dinheiro, em língua
estrangeira. 3s padres cobram pelo batismo das crian1as e pelos santos sacramentos. Andam de bra1os dados com
os ricos e despre#am os pobres necessitados. 3 castigo vem vindo pelo $ogo do in$erno-

5uem conta o $ato nas prosas de $arm"cia e barbearia, acrescenta estupe$ato9

+ *assado um tempo, houve um grande desastre9 a matri# $oi destruída por um inc4ndio-

7issera também9

+ 3 rio Cavernoso vai dar sangue nas canelas.

E noutra ocasião9

+ o $undo do lago surgir" um monstro que devorar" a cidade.

a serra do arumbi, entre Castro e )ibagi, advertira9

+ Boc4s plantem tatu pra terem o que comer no ano.

Belhos lavradores rememoram e comentam9

+ A sa$ra de arro# e $ei'ão se perdeu por causa das chuvas, salvouse apenas a das batatas...

Em Bentania, muito antes da constru1ão daquela capelinha pitoresca, tivera uma visão do $uturo9
+ A comida ser" mel para todas as abelhas, os tatus terão uma grande toca, os passarinhos voarão das gaiolas e
os homens viverão como as $ormigas. 7eixai cantar as cigarras.

A *onta <rossa, *rincesa dos Campos, a orgulhosa cidade encastelada nas colinas do *itangui, chegou
acompanhado de um bode preto com uma $ita vermelha amarrada ao pesco1o. a vila Ana ?ita, sagrou as "guas
da $onte, tornandoas miraculosas. Subindo e descendo ladeiras, provocara pasmo. ais comentado que o omem
do 6odinho ou o omem do 6anquinho, ambos paralíticos, vendedores de loteria, que recebiam alcunha do meio
de transporte de que se serviam. 6andos de meninos travessos e vadios apuparamno, apedre'aramno sob as
vistas complacentes dos adultos. Com ressentimentos no cora1ão e l"grimas nos olhos, ouvia as impreca1;es9

+ onge-
+ Coru'a-

ão bastassem essas demonstra1;es de desrespeito e crueldade, consideraramno as autoridades um elemento


perigoso, nocivo & sociedade, pregador da anarquia entre o operariado. A polícia $oilhe ao encal1o, mas :oão
aria sumiu no ar como um mago, s0 reaparecendo em sua tenda momentos ap0s, para alegria e espanto dos
romeiros. :" dissera que *onta <rossa haveria de se trans$ormar numa pedreira, mas é sempre lembrado o sermão
que se tornou célebre9

+ e atiraram pedras como :esus Cristo, osso Senhor, salvou delas santa aria adalena. 3s ricos de *onta
<rossa vivem no materialismo e são usur"rios. Se eu quisesse me de$endia, mas quis $icar manso como o sublime
Cordeiro manso $icou na Santa Cru#, pois os inocentes são perdoados porque não sabem o que $a#em. 7eus,
Sublime *ai, disse9 quem com $erro $ere, com $erro ser" $erido. Vai chover uma chuva de pedras em Ponta
Grossa!

Ninguém mais se esqueceu do dia em que, escurece ndo abruptamente, o céu arqueou-se ca rregado de
vinganças. Era o abaeté, era o pro$eta, era o >6om :esus> bradando pelo trovão, disparando $lechas elétricas. As
ora1;es, as simpatias, as velas acesas não surtiam e$eitos. E uma $ormid"vel saraivada de b"tegas e gelo, como
'amais houve, desabou sobre a cidade. Cumpriuse o vaticínio. @ da hist0ria da *rincesa dos Campos. 3s av0s
contam o epis0dio para os netos, arrematando9

+ A casa do omem do 6anquinho desapareceu do mapa-

5uando algum crente $ervoroso tinha $é e queria v4lo, :oão aria surgia & $rente. Aparecia para as crian1as ora
como um mo1o, ora como um velhinho.

Aplacava a c0lera dos homens.

@ not0rio que caminhava sobre as "guas dos rios. %m dia, ao aproximarse do *itangui, $alou ao balseiro9

+ ão tenho precisão de montar na tartaruga. ?eme para o outro lado da barra.

7andolhe pouca ou nenhuma aten1ão, o balseiro obedeceu e, quando aportou & margem oposta, qual não $oi o
seu espanto ao deparar com o pr0prio monge-

Apro$undavase na casa verde, como chamava o sertão, que assistia & poda da ervamate e & passagem das 'untas
de bois arrastando toras. ão poucos lhe o$ereciam presentes e hospedagem nas cabanas de palha.

+ 7o que 7eus d" de gra1a, ninguém tem direito de pedir compensa1ão + preceituava. Aceitava o bocado de
sempre e chupava um chimarrão gostoso, quando de erva especial, preparada ao $ogo de lenha da gabiroba,
o$erecida pelos bugres seminus.
%m curiboca, ao aproximarse e expondo terrível 2lcera no peito, suplicou9

+ Si( :oão aria, a $erida brava me mata de tanto que r0i as carnes do peito.

A vida do tare$eiro de ervamate é uma vida de trabalho, so$rimentos e miséria. ão conhece outro regime que não
o de cativeiro. 7urante o corte de ca" os $ac;es abrem picadas e podam os arbustos. 5uem inventou o chimarrão
$oi o solit"rio índio :aguaret4. Expulso da tribo por causa de um amor impossível e in$eli#, viveu segregado muitos
anos, com uma sa2de de $erro, gra1as & erva maldita. ãos cale'adas e de$ormadas pelas murras é que a
produ#em. esti1os andra'osos en$rentam a $loresta trai1oeira, o bote das $eras, a picada venenosa das serpentes,
o ataque dos insetos, caminhando sobre $eridas. Fei1;es co#idas pelo sol causticante espelham toda sorte de
priva1;es. Fisionomias de cobre. os bra1os e nas pernas as chagas late'am ao resvalar dos trapos. 5uando da
sapeca das $olhas no barbaqu" e no cari'o, queimase a pele, em $ogo o corpo inteiro. Bergando ao peso de $ardos
enormes que carrega nas costas, presos & cabe1a por tiras de couro que rasgam e sangram a $ronte, o tare$eiro
vive pior que um escravo.

Era uma 2lcera de 6auru. Compadecido, :oão aria receitou9

+ )odo dia de manhã, lave com arnica e soque erva de santa aria, e tenha muita $é em 7eus...

%m monge so$ria com os so$rimentos alheios. Seguia a lei que consistia em duas palavras9 caridade e
$raternidade. Eis tudo que receitou nessa ocasião, como remédio9 banhos de samambaia, tr4s cip0s, capim papuã,
sumo de arnica e assapeixe/ vinho de bra2na/ sangue de bicuíba/ ch" de marapuama, pacov", crista de galo e
cidreira.

Ele era tão humano como o mais humano de todos os 'ecas. Sentia na carne as dores do pr0ximo. Santo de
verdade, santo do povo, sua igre'a, a casa verde.

onge.

o $undo do sertão, ap0s exorci#ar e despachar os medicamentos, teve um aviso do Alto e preveniu9

+ Boc4s re#em muito e $a1am atos de compun1ão, porque vai haver um grande desastre nas maretas.

Atreladas as toras de pinho e de cedro ao cingel, os via'ores se $oram, murmurando preces, ben#endose,
caminhando pelo vale, ao lado das cangas. Chegando ao porto do rio %ruguai, 'ungiram as toras com cip0 e
arame, construindo com elas enormes 'angadas, as quais prenderam &s marombas, & espera da cheia. ão tardou
muito, '" se comentava na pequenina aldeia, sede de contrabando9
+ 3 rio t" em ponto de balsa.

a hora da partida, as mulheres choravam de susto e saudade, ensurdecidas pelo viv0rio e pelos estampidos das
armas de $ogo. omens de pés descal1os e peitos descobertos marcavam com as remadas a cad4ncia da viagem,
cuidando a carga levada pela torrente. As mulheres da aldeia pensavam no perigo das corredeiras trai1oeiras. A
corrente ia aumentando pouco a pouco, até disparar a toda brida. Cada ve# mais se avolumava o imponente rio,
engrossando com as "guas barrentas dos a$luentes. as proximidades das ilhas, onde as lontras devoram peixes
sossegadamente, era mais "rdua a viagem porque as embarca1;es abalroavam nos escolhos.

?umo & Argentina.

ão $ora o destemor e a destre#a do imp"vido matuto, '" teria havido so1obramento. A $riagem suportada & custa
de trabalho e cacha1a penetrava o peito. *ara se orientar, o balseiro gritava e auscultava a b2ssola do eco.
<uiavase pelo coro da pr0pria vo#. E o #umbir da xiririca ressaltava o ronco da catarata.
7ormindo ou cochilando ao relento, os homens se reve#avam nos remos e #ingas. ?oupas em tiras secavam
estendidas nos arames, enquanto co#inhava o $ei'ão preto na panela de $olha, pendurada sobre o braseiro do
improvisado $ogão. *erigo que surgia de solapa era o da curva mais estreita, quando mãos criminosas $echavam o
tra'eto com basculhos de arbustos, armando ciladas. 7a margem as espingardas abriam mortí$ero $ogo. Era o
assalto.

+ 3s ca1adores de vigas- + exclamava o matuto que recebia a primeira chumbada.

Então se travava a batalha pela posse da madeira e não raro os piratas do mato acabavam recolhendo a carga que
vendiam no porto argentino.

Fora um dos $atos pelos quais :oão aria recomendara tanto, criam os humildes balseiros. %ma semana inteira
de trabalho, luta e apreens;es e, por $im, alguns tudo perdiam, até a pr0pria vida.

o dorso mais largo do rio, a bulha das "guas tumultuosas e o ribombar da cascata aba$avam os berros9

+ 3 salto grande-

+ 3 salto grande-

Enormes ondas se atiravam do leito turbulento, de encontro &s balsas. Como relDmpago, na mem0ria de cada um,
:oão aria se $a#ia ouvir9

+ Boc4s re#em muito e $a1am atos de compun1ão porque vai haver um grande desastre nas maretas-
Calmos e destros, os camaradas contornavamnas com auxilio dos vare';es, evitando a custo a morte certa, o
abalroamento, levando a embarca1ão para a margem alagada gra1as & enchente. as, naquela ve#, uma 'angada
com seis homens a bordo $ora arro'ada pelas vagas em $2ria, des$a#endose violentamente. E a viagem que
come1ara como uma procissão acabou como um $uneral. ?eali#arase a terrível pro$ecia9

+ Bai haver um grande desastre nas maretas-

:oão aria acordavase antes do dia. Acendia o $ogo, enchia a cuia de mate e despe'ava "gua quente na guampa.
7uma $eita, teve a aten1ão despertada por lindo passarinho de asas a#uis e crista vermelha, o qual trinava no
2ltimo ramo, no cimo de uma gabiroba, como um tenor cantando num trapé#io. 3 mestre. o palco da galharada,
todo o bando ouvia atento como os musicistas de orquestra que esperam e observam a batuta do regente. 5uando
aquele calou o biquinho, todos romperam num terno e suave gor'eio, num coro or$e(nico de passarinhos. o teatro
da casa verde, no teatro do caboclo, :oão aria assistia & dan1a dos tangar"s. Cessou o chilreio, houve um r"pido
intervalo e as ave#inhas, peda1os pequenos do céu, al1aramse em saltinhos de duas em duas no mais gracioso
balé, marcando a cad4ncia do toque das violas sertane'as. 7epois recome1ou o gor'eio e o mestre se exibiu com
todo vigor de sua arte, de galho em galho, dan1ando os passos simples de tangar", enquanto o corpo de baile
participava da $esta cantando, batendo as asas, voando uns por de cima dos outros numa parada de alegria pela
vida. Como se estivesse preso a um ramo do arbusto mais pr0ximo, como uma 'abuticaba, um chupim admirava o
n2mero, emudecido como quem ouve uirapuru, enquanto outro p"ssaro di#ia9

+ 6emtevi- 6emtevi-

:oão aria pensou9

+ 3s $ilhos do Chico Santos-


Sim. 3 desventurado Chico Santos, temente a 7eus, advertira os $ilhos9
+ ão presta viver s0 pensando em namorar, s0 $estando, pulando como saciperer4, sem ter o menor respeito pela
quaresma e os dias santi$icados.

as os marotos não lhe davam ouvidos, voltavamlhe as costas, gostavam do $andango. Eram sete irmãos e o mais
velho bati#ou o mais novo, para este não virar lobisomem. uito honestos e trabalhadores. *orém, $icavam
possuídos ao saberem de $esta. Fosse o dia que $osse, não $altavam ao bailarico. Ao chegar uma quaresma, não
ouviram os conselhos dos mais velhos, em cega desobedi4ncia. Foliaram até na semana santa, na pr0pria sexta
$eira da paixão.

3 que aconteceu, quem é que não sabe Caíram de cama, os sete com bexiga e, pobre do Chico Santos, um a um
iam morrendo e se trans$ormando em passarinho. etamor$osearamse em tangar"s os meninos travessos .
A miséria humana contrastava com a magni$ic4ncia da nature#a e com espet"culos como aquele. %ma dessas
caravanas que percorriam os sert;es, penando e esmolando, desgra1ados a $ugirem do mundo e de si pr0prios,
chegou ao ascetério de :oão aria. %ns vinham a pé, outros a cavalo. A maioria dos homens tra#ia as trouxas,
enquanto as mulheres arrastavam e carregavam crian1as seminuas. Exaustos, desconsolados. ão entravam nas
vilas e povoados, recebiam esmolas dadas com medo, de longe, tratados como uma récua de criminosos ou malta
de cães raivosos. 7oíamlhes apenas o pavor e a incompreensão dos outros. 6em que pre$eriam a $loresta bruta, o
mel das colmeias, as ervas do campo, os $rutos das "rvores, o acampamento & beira da "gua límpida, corrente.
%ma leva de mor$éticos.

Somente :oão aria, um monge, para lhes compreender os dissabores, a pen2ria, o desespero, a moléstia. Em pé,
de$ronte ao cru#eiro, encora'avaos, auxiliavaos a suportarem o destino.

+ 5ue importa a $erida, a n0doa do corpo eus $ilhos, o que vale é a pure#a da alma. 3 mundo é um vale de
l"grimas onde cumprimos uma prova1ão. @ preciso ser $orte e aceitar com resigna1ão aquilo que vem do Alto.
7eus nunca se esquece dos $ilhos amados.

?eceberaos sentado, de pernas cru#adas, convidando os mais velhos para $ormarem a roda do chimarrão. Fe#
compadres entre eles. Com paci4ncia e bondade, sem achar resposta, tranqili#ou um 'ovem vacilante que lhe
perguntou qual o mal que $i#era ele, aquelas mães, aquelas crian1as, para merecerem tal castigo, e que 7eus era
esse que permitia tanta desgra1a na $ace da terra.

Ap0s os curativos e ben#eduras, :oão aria mandou que re#assem em 'e'um e com o rosto voltado para o norte.
Com auxílio de uma pedra, moeu $olhas de samambaia, 'untou ao p0 alguma gordura e disse9

+ @ pomada para as $eridas.


essa ocasião, redigiu a 3ra1ão de São !"#aro, que todos repetiram genu$lexos.GHI

Daqueles que não faziam parte da caravana, somente atendera a um pecador arrependido, ao qual dissera em tom
imperativo:

— Eu lhe perdôo os pecados, mas tem que rezar cinqüenta ave-marias e cinqüenta padre-nossos, sem tirar a boca do
chão.

 mar! de pros!litos crescia e "oão #aria sur$ia em diversos s%tios, ao mesmo tempo. Estava em toda parte.  casa
verde era pequena para ele. &inha na palminha da mão as matas com seus se$redos e mist!rios. Dominava-as.

s roupas pu%das acabavam-se no seu corpo de vara, franzino. &ra'ava-se mal como palmito. Entre os olhinhos
azuis, melanc(licos, o nariz adunco se destacava no meio das barbas ca%das sobre a carcomida manta que lhe
envolvia o pesco)o. &ornava-o e*(tico um $orrinho felpudo feito com couro de 'a$uatirica, com o qual cobria a
cabe)a encanecida. +om o palet( de brim riscado, curto sobre o colete, apertado como espartilho e a prender-lhe os
movimentos, trazia um rosrio, cu'as contas afirmava serem as l$rimas de ossa /enhora. 0 cinto mal servia
para pendurar a tarecada, pois as cal)as ca%das, de fundilhos rotos, dei*avam 1s esc2ncaras a ceroula, e o pr(prio
se*o aparecia. +erta vez, uma velha beata e*clamara estupefata:

— unca vi um santo com as ver$onhas de fora3

4io e$ro e #afra, cidades *ip(fa$as, li$adas por uma ponte, aquela paranaense, esta barri$a-verde, viviam 1s
voltas com enorme cruz que se transportava a si pr(pria, a santa cruz de #afra. 5uando não eri$ia uma, "oão #aria
a desenhava, mandando reproduzi-la.678

os diversos lu$ares onde fazia apari)ão, as popula)9es levantavam dinheiro e constru%am capelas nas quais ardem
velas noite e dia, pa$ando promessas, ao lado de pilhas de muletas. 0 curandeirismo tomou $rande incremento.
oram difundidos seus m!todos, suas prticas, suas receitas, seus rem!dios, suas simpatias, suas benzeduras. ;ouca
$ente não sabia que sarro de pito ! bom para bicho de p!, inflama)9es e mordedura de cobra. /e bem que, neste
caso, ele mandava meter o p! na terra molhada e tomar seis $oles de limão. ;roduzia tais prod%$ios, tão afamado,
que at! um perna-de-pau correra ao seu encontro na 2nsia de recuperar o membro que fora decepado na $uerra do
;ara$uai.

/( casti$ava os maus. ;elas bandas de <uarapuava, havia dito que $uerras viriam no mundo, pestes
desconhecidas assolariam os campos, haveria muito pasto e pouco rasto, estalaria uma $uerra com os filhos dos
castelhanos, e <uarapuava se transformaria num poron$al. o entanto, pessoas incr!dulas duvidavam de seus
poderes, zombavam, escarneciam-no. as terras das araras, se deu um caso assombroso. +hamado para assistir uma
parturiente, "oão #aria atendeu prontamente o pedido, se$uindo para o ranchinho.  parteira pinoteava como !$ua
fo$osa, coiceando com as nde$as o ventre da infeliz paciente, enquanto esta mordia o len)ol, depois de assoprar
uma $arrafa. "oão #aria interrompeu a cena, apenas por um instante. #andou a parturiente colocar na cabe)a o
chap!u do marido, mas não foi obedecido. ;rotestando sapi=ncia, a entendida e*ibiu um documento que leu em
voz alta, sob a aprova)ão dos presentes. Era a +arta de >abilidade passada 1 pretensa parteira por m!dico.

"oão #aria retirou-se acabrunhado, mas o resultado do caso ! relembrado e propa$ado. ;obre mãe, louca mãe:

—  crian)a nasceu com duas $uampas na testa3

?m su'eito vivia tro)ando das coisas sa$radas. firmava que Deus não e*istia e que o mon$e era um doido.

— (is não sabe l=, nem escrev= e os ricos faiz n(is de bobo. #orreu, fedeu: isto, sim.

?m dia, quando estava partindo lenha no mato, um raio o fulminou. +asti$o divino, mas a fam%lia, porque ele era
bom, achava que fora chamado para o c!u.

?m fot($rafo, muito $anancioso, bateu duas chapas de "oão #aria, sem o seu pr!vio consentimento, e ao revel-
las... Estavam em branco3

5uando o mon$e se encontrava num pouso situado nas campinas do &iba$i, uma cabocla pediu ao marido:

— ;reciso pa$ar uma promessa que eu fiz. #e leve esse pacote de velas pro "oão #aria.

— @evo pro diabo que o carre$ue3 — respondeu-lhe estupidamente o e*comun$ado. #as cedeu depois da
descompostura passada pela esposa. ;elo caminho, ia com o embrulho na destra, sentindo-lhe o peso e o volume.
o dar de chofre com "oão #aria, levou um prisco. Estendendo o bra)o para entre$ar-lhe o pacote de velas, viu que
este sumira das mãos. itando-o, punindo-o com os olhos, e*plicou-lhe o mon$e:
— icou para quem voc= disse que ia levar...

?ma anciã paral%tica, carola como s( ela, não tinha f! nos mila$res do profeta. 0 marido, que pensava
diferentemente, su$eriu uma consulta a "oão #aria e isto a fez matraquear:

— /( diz besta$es, diacho3 um sabe que s( padre pode rez missa, que tem representa)ão de Deus na terraA Ele
cura nada3 Ele cura uma banana3 ?ma banana3

0 humilde campon=s foi consult-lo sozinho, sobre a enfermidade da esposa. "oão #aria tirou uma banana do bolso
e lhe ordenou:

— Di$a a sua mulher que batina esconde rabo de macaco, que corvo voa sem ser an'o. Ela est de cama pra mor
dos pecados. Di$a pra comer esta banana, que ela sara.

4ealmente, depois de saborear a fruta, a paral%tica sentiu melhoras, levantou, andou e se tornou uma crente
fervorosa.

— Bou lhe contar um causo... — ssim come)avam as narrativas.

<ente que o venerava, que o idolatrava, era a do Cituruna. @ onde as sesmarias se perdem de vista, a re$ião
contestada, em lit%$io entre o ;aran e /anta +atarina. Ele fizera sucessos indescrit%veis em munic%pios como os de
+uritibanos, +ampos ovos, ?nião da Bit(ria, +anoinhas, +a)ador, entre outros. ?ma $rande amizade nascera
entre ele e um bondoso fazendeiro chamado #anoel lves Dssun)ão 4ocha, mais conhecido por 4ocha lves.
poiara-o, aprovara os planos de funda)ão de uma cidade santa naquelas pla$as: /ão /ebastião das ;erdizes. /eria
edificada sob suas b=n)ãos e ele não se opunha ao convite feito a frei /ilv!rio para rezar a primeira missa, este
a$ora em +ampos ovos.

ora de $uerra quando apoiara as tropas do compadre <umercindo /araiva, com fanticos emboscando os pica-
paus. Era de paz, pois e*ortava 1 resi$na)ão, 1 renncia, 1 penit=ncia, apesar de indi$nado com as in'usti)as em
vo$a e de pre$ar contra a repblica que — reproduzindo suas palavras — ! o $overno dos maus, inven)ão do demo,
que dei*a na mis!ria os brasileiros. /olenemente, ele prometera:

— Bou mandar muitos mon$es para salvar os meus povos e acabar com o reinado do diabo.

#as era de paz, tinha a bandeira branca das barbas aberta no rosto.

rei /ilv!rio, que acudira ao apelo do papa emi$rando para o Crasil — onde faltavam sacerdotes — e que sofrera
terr%vel concorr=ncia na @apa, voltava a incomodar-se em Cituruna. 5uando as coisas come)avam a ir bem para a
F$re'a, sur$ia aquele mon$e e o povo virava a cabe)a.  F$re'a perdia o prest%$io e ficava com a posi)ão abalada.
t! o bispo ficava contra ele que, 'ustamente por sua incr%vel voca)ão sacerdotal, bondade e honestidade de
prop(sitos, era desi$nado para sanar a situa)ão ca(tica do clero. Bivia de cidade em cidade, lo$o iria para ?nião da
Bit(ria, onde havia o morro da +ruz e as inocentes festas de /inhana Cita. +om certeza, muito tempo não ficaria l,
teria de continuar solapando o culto do mon$e. /entia-se frustrado, humilhado, diminu%do, como todos os padres
assim tachados de ma)ons e protestantes, combatidos com as pr(prias armas que empunhavam. Fnda$ava de si
pr(prio que des$ra)a acontecera. in$u!m mais comparecia 1 missa, trocando-a pelas rezas de um mulambeiroG
nin$u!m trazia (bolos 1 ermida, fu$indo aos verdadeiros ap(stolos. Entretanto, as taperas que abri$avam "oão
#aria transbordavam de adeptos. /entado 1 moda hindu sobre um couro de boi, num tu$rio distante, ' o fizera de
tolo quando lhe fora ao encontro, servindo-se do burrico.

"oão #aria não podia ser santo, não cursara convento. Ele dissera-lhe:
— Eu nasci no mar, criei-me em Cuenos ires e faz onze anos que tive um sonho de que eu devia caminhar pelo
mundo durante quatorze anos, sem comer carne nas quartas e se*tas-feiras e nem pousar na casa de nin$u!m.

?m 'usto não o teria feito passar por ma)om, por here$e, por protestante, não o dei*aria desautorizado perante tanta
$ente, ridicularizado, detestado, como fizera "oão #aria. ão se conformava o louro capuchinho.

ão havia peão ou a$re$ado que i$norasse do sermão o trecho mais conhecido e repetido: H crime viver 'untando
dinheiro a dinheiro, terras a terras, viver 1 custa dos que trabalhamG a lei de rei foi escrita no c!u e ! a lei de Deus.

in$u!m sabe o que aconteceu a "oão #aria, por!m ! visão constante sempre presente na mem(ria do povo,
venerada saudade, fabulosa persona$em dos sonhos dos mo)os e das donzelas ardorosas.
— #on$e3

+ora)ão por cora)ão, conquistara a casa verde. &amb!m nas bandas do oeste catarinense continuava a ditar ordens
aos crentes, sempre vislumbrado pelos mais inocentes. l$uns velhos caboclos, antes a$re$ados, tornavam-se
andarilhos, dando ori$em aos boatos dos falsos mon$es. #as "oão #aria era o ar e a vida, a esperan)a dos
oprimidos. in$u!m lhe arrebataria a coroa de cip( e urzes. a resid=ncia do abastado ou na tosca choupana, as
iniciais de seu nome, ". #. ., $ravadas a fo$o, encimavam nas portas o si$no de /alomão. /empre invocado com
devo)ão, o seu retrato constitu%a rel%quia sa$rada.

/anto do povo, transformara-se em s%mbolo e lenda. os topes dos morros, as cruzes que arvorara são os seus
bra)os abertos para os sofredores. os pousos, 1 beira das vertentes, olhos d$ua, as velas ardem indefinidamente
como s(is no infinito.
?m dia vaticinara:

— #eu tmulo ser cavado pelos %ndios, no cerro do &ai(.

Disto nin$u!m se recorda, porque santo não morre. &alvez tivesse ca%do vitima de febre, talvez tivesse sido
apanhado por uma fera, talvez tivesse sumido no bico dos corvos, mas estes são os pensamentos dos sacr%le$os.
/anto não morre.

pesar disso, no 'ornal  4epblica, (r$ão do ;artido 4epublicano ;aranaense, edi)ão de 7I de setembro de JKJ7,
na terceira p$ina, estampada a foto$rafia de um esmoler, havia um arti$o:

profeta que morre...


0 mon$e "oão #aria passou desta para melhor.

E assim conclu%a-se a not%cia:

;or muitos anos h de perdurar ali a tradi)ão dessa fi$ura venervel de ap(stolo, lon$os cabelos e barbas prateadas
a emoldurarem um rosto velho, mas de e*pressão ainda viva, fisionomia de faquir a sur$ir a todas as portas, a
visitar todos os lares.

/anto não morre3 "oão #aria continua prote$endo a fam%lia da casa verde: $uiado pelo bordão inseparvel, ele
va$ueia pelas veredas da hist(ria.
Livro II

Capítulo I

Cituruna ! o territ(rio das c!lebres #iss9es, conquistado pelas bandeirasG ! a terra que os cain$an$ues dominaram.
Cituruna era o nome de um monte, mas al$um %ndio o estendeu 1 re$ião.
Cituruna ! a ptria abra)ada amorosamente pelos rios F$ua)u e ?ru$uai. Estes rios não passavam de bandos
l%quidos de revoltos $uerrilheiros, en$rossados pelos afluentes, levando a cabo o cerco de florestas, campos,
serranias, avan)ando de ro'o sobre um formidvel e*!rcito de pinheiros.

Cituruna ! uma bra)ada do tamanho de inmeros pa%ses da Europa, por)ão deste Crasil, a qual se chamou
+ontestado porque foi disputada pela r$entina e foi questão de fronteiras entre o ;aran e /anta +atarina.

s linhas da palma da mão do Cituruna se constituem de rasos riachos atravessados a vau e de caminhos abertos a
casco de mula. +ontavam-se nos dedos as estradas carro)veis. ;or muito tempo a mquina fora viva, tinha pata e
não apitava. Era o cavalo. #as a estrada de ferro acabou penetrando-o, ras$ando-o, por motivos de estrat!$ia
militar. ;artia da cidade de ;orto ?nião da Bit(ria, ho'e bipartida entre os dois Estados lim%trofes. 0riundos do 4io,
/ão ;aulo,salrios.
elevados /antos #oravam
e 4ecife, milhares
em tendasdeque
operrios trabalharam
comparavam nas obras da
aos cochicholos de4ede,
cães, eatra%dos com promessas
onde $rassavam de e
epidemias
fome. /uas $reves se transformaram em motins e houve muito san$ue derramado. +ada cidade, no entanto,
celebrava contente a sibilante che$ada do trem, nele saudando o pro$resso. #arcou !poca, por e*emplo, a festa de
;orto ?nião da Bit(ria, quando da inau$ura)ão da ponte sobre o F$ua)u. aquele 7L de novembro de JKML, todo o
povo celebrou o acontecimento. 0 hotel #atoso, enorme sobrado de madeira, re$ur$itava de visitantes.  famosa
Canda #usical, da cidade de ;onta <rossa, sob a re$=ncia do maestro "oão >olzmann, e*ecutou dobrados, ma*i*es
e valsinhas, 'amais olvidados. inda ho'e são bastante conhecidos os versos do professor /erapião, comemorando o
fato marcante.6N8

/erapião fora bastante elo$iado.

5uem não sabia que era ele um $rande talento, fundador da /ociedade Dramtica madores da rte e
colaborador do semanrio 4ebateA /eus versos foram espalhados em boletins e recitados nas reuni9es do +lube
polo.

;ro$resso3

ão para os camponeses pobres. Era o truste se atirando esfaimado sobre o prato cheio do Cituruna. ?m larpio, a
4ailOaP, a papar as terras mar$inais ao leito dos trilhos, ela pr(pria com seus a$rimensores malandros a fazer a
medi)ão da rea abocanhada. " não bastassem as concess9es 1 @umber +orporation, dra$ão com dentes de a)o na
serra-fita a devorar a mais rica ve$eta)ão do mundo. E enquanto os imi$rantes europeus che$avam e se
estabeleciam como proprietrios, $ozando de favores e privil!$ios, os caboclos ptrios viam-se preteridos, tratados
com desprezo, v%timas de viol=ncias praticadas pelos latifundirios e pelas empresas estran$eiras, empre$adores de
'a$un)os.

#as o trem ! uma necessidade. &alvez apitasse incubando escolas e hospitais, talvez trou*esse a car$a sobre rodas
de porvir. ada de ferro, talvez metamorfoseasse e transformasse en*ada em arado, as cascatas em for)a
hidroel!trica, mis!ria em fartura. &alvez che$asse com ofertas e pre)os para os produtos a$r%colas, carre$adinho de
felicidades. #as o truste procurava lucros 1 custa do trabalho do povo. E, apesar disso tudo, estava bom o mercado
do boi.

#as o trem ! uma necessidade. 0 Cituruna, entrecortado de riachos e fundas picadas, al$umas estradas carro)veis,
invadido por tropas de montanhas, vasta casa verde, como um mon$e, se$re$ara-se do mundo. enhum e*!rcito o
invadiria impunemente.  natureza o fortificara, minando todos os caminhos com pedras, al$ares, barro, san$as e
loda)aisG constru%ra muralhas com as serras e armadilhas com itaimb!sG dispusera imensas le$i9es de pinheiros
defendendo as campinas e adestrara a matariaG munira-o de feras, serpentes e insetos.

o transporte de mercadorias como sal, p(lvora, chumbo, querosene, a$uardente e tantas outras, o car$ueiro de
mulas $astava dias e noites.  boiada que partia para as cidades litor2neas che$ava estropiada, ap(s o estouro 1
beira dos peraus.

&alvez o trem viesse resolver muitos problemas. 5uem sabe se o lavrador encontraria para quem vender o que
plantasse e não visse cereal apodrecendo ou não desse fei'ão aos porcos — não mais semearia para o pr(prio
sustento.

/( não faltou dinheiro para a $rande festa da inau$ura)ão de /ão /ebastião das ;erdizes, a cidade mandada
construir sob os ausp%cios de 4ocha lves, o mais %ntimo ami$o de "oão #aria. ão houve quem não colaborasse
para o =*ito da campanha.

unca se viu tanta boa vontade, sobraram ddivas e prendas. #on$e não era, por!m 4ocha lves dava bons
conselhos, benzia e receitava. azendeiro, mas um simpl(rio, um 'eca-tatu de botas e esporas, cora)ão de pobre.
?m l%der, um chefe espiritual. pesar do ar en!r$ico de patrão, se confundia com a peonada. 0 seu mundo, como o
de todos os proprietrios daquelas bandas, era a sua fazenda, onde vivia como um rei. 0u pr%ncipe sertane'o. Fsso
e*plica, em parte, porque fora sempre um ardoroso partidrio da causa monarquista. em podia conceber outra
forma de $overno, que não a vi$orante em seus dom%nios. Deus nas alturas e ele c embai*o, cônscio da
import2ncia, mas humilde com os semelhantes. as redondezas, poucos não o tinham como compadre. +ordão
entran)ado prendendo o novo chap!u ao quei*o pontia$udo, poncho-pala cor de cinza, armadura de lã, bombachas
ne$ras com bordados dourados e bot9ezinhos de madrep!rola, mudas concertinas de couro nas pernas — com
aquele ar soberbo de caudilho, parecia um pr%ncipe rebelde, belicoso. ora sempre um mara$ato e nunca tolerara
pica-paus. "actanciava-se de ser um $rande ami$o de <umercindo /araiva e ap(stolo de "oão #aria de "esus, seu
compadre. +onsiderava iminente a restaura)ão da monarquia. /eus dom%nios se estendiam sobre as chapadas da
c!lebre serra de /anta #aria, ' no munic%pio de +a)ador. 0 dizer em vo$a lhe atribu%a uma maior riqueza: a da
alma. +ofiava o bi$ode sob as lar$as narinas, quando estalou a id!ia em seu cr2nio: fundar uma cidade santa ali em
;erdizes, um centro reli$ioso, eri$indo uma i$re'a em homena$em ao santo cavaleiro, cavaleiro como ele, ao
padroeiro do sertão. "oão #aria aprovara os planos e a voz corrente dizia que ele estaria presente na nova #eca.
Era raro o dia em que não che$ava $ente 1 fazenda de 4ocha lves para tratar do assunto, ainda dos lu$ares mais
distantes, tão bem acolhida.  poucos quilômetros da sede, num terreno onde havia espesso vassoural, foi levantada
a ermida no centro de al$umas palho)as.

 comissão de festeiros elaborou o pro$rama e, em toda parte, a not%cia formou redemoinhos de $ente parladeira,
principalmente defronte 1s vendinhas dos minsculos povoados. Eliazinho dos /antos, o pai da menina #aria 4osa,
a que tinha santos tamb!m nos sonhos, a que inspirou os mais belos amores da casa verde, foi convidar
pessoalmente frei /ilv!rio para a celebra)ão da primeira missa. +om o desaparecimento de "oão #aria, frei /ilv!rio
' não se sentia humilhado como outrora. ;rocurava aproveitar o culto do mon$e em benef%cio pr(prio e da F$re'a.
ão acreditava no ressur$ir de "oão #aria. chava bom ter aumentado a reli$iosidade do povo. o fim, os padres
sa%ram $anhando, pensava com o seu rosrio.

o trem de casco, no trem de orelhas, os convivas vieram de todos os recantos do Cituruna. #oradores das
redondezas, poucos apontaram a p!. o dia da inau$ura)ão, /ão /ebastião das ;erdizes parecia uma bandeira
brasileira a tremular festiva.  i$re'inha hasteada no tope, os ranchos fincados no chão e cobertos de palha eram as
suas estrelas. 0 lema estava escrito no ar, no chão, no c!u, nas faces dos moradores: F$ualdade.

ora abatida uma boiada para a ruidosa comemora)ãoG com mãos estran$uladoras no pesco)o, al$umas dezenas de
fran$os rodopiaram e estrebucharamG leit9es e cabritos foram pelados para o fornoG e ainda sobrou dinheiro que frei
/ilv!rio levou para o santo...

De madru$ada, ras$ando a treva, coruscavam os fo$uetes de vara, estourando no ar a nova alvissareira. ão tardou
e, do sol, uma tribo de %ndios $uerreou a terra, atacando-a com flechas de prata. +heinha de coloridas bandeirolas
que pareciam borboletas penduradas nos fios, /ão /ebastião das ;erdizes nascia ostentosa em seu ber)o de relvas. 
passarada revoava em bandos, como p!talas de malmequer, punhados de confete 'o$ados pelas mãos de folhas dos
espinilhos.

0s campos ' resplandeciam sob o chuvisqueiro solar e, ainda, o chorrilho humano escorria no caminho que vinha
da encruzilhada. Enfeitadas de $uizos e pompons, as carro)as saracoteavam de contentamento e s( pararam de
tremelicar quando os mo)os pularam para fora em al$azarra.

aquele distante JK de 'aneiro, dia da ma$na comemora)ão na casa verde, era o acontecimento mais e*traordinrio
a inau$ura)ão de /ão /ebastião das ;erdizes.

5uando frei /ilv!rio apeou do burrico, houve salvas de tiros e inesquec%vel ova)ão:

— Biva frei /ilv!rio3

— Biva são "oão #aria, são /ebastião e frei /ilv!rio3

— Bivôôôôôô333...

E o frade não perdia tempo:

— Biva a Fmaculada +oncei)ão e a santa F$re'a +at(lica post(lica 4omana3

Depois uma procissão percorreu va$arosamente todo o vilare'o, a ima$em de são /ebastião carre$ado num andor e,
1 frente, frei /ilv!rio a cantar acompanhado pelo coro desacorde:

— Bestida de branco Ela apareceu, trazendo no cinto as cores do c!u.

ve, ve, ve #aria3

0u:

— 5ueremos Deus

que ! nosso 4ei,

queremos Deus

que ! o nosso ;ai3

Então a multidão invadiu a ermida onde frei /ilv!rio celebrou a primeira missa da nova cidade. brindo-se de
contentamento, parecia um pinhão cozido: ponta para bai*o, cabe)a para cima.  batina pu%da, descorada. lourado
e es$uio, com uma cara de quem ! triste ou sofre de amebas, um capuchinho simptico. aquela ocasião, fez um
sermão cheio de humildade e sabedoria, pre$ando resi$na)ão, combatendo a usura dos ricos e interpretando
passa$ens b%blicas. proveitando a ocasião, contou casos de des$ra)as sucedidas como casti$os divinos a ma)ons e
protestantes. Cem no fim do discurso, advertiu a assist=ncia contra os falsos mon$es. esse momento, o avô trinta
vezes, o vovô Qebinho, do banco em que estava, levantou a voz:

— (s aqui s( adoramos são "oão #aria.

— h3 Este ! o verdadeiro3 — e*plicou frei /ilv!rio, aumentando o pr(prio prest%$io.

Do dia para a noite, tornara-se alvo de admira)ão e devo)ão, cercado pelos $rupos dispersos na pra)a e ora em
confer=ncia com as beatas e distribuindo santinhos 1s crian)as.
esse dia de esplendores, pela vez primeira, ntoninho e #aria 4osa se encontraram, se olharam e se $ostaram.
Entreabriu-se uma flor da união dos dois cora)9es: no da menina ficaram as p!talas, os espinhos no do rapaz.

ntoninho pressentira o acontecimento, ' no momento em que estreava a montaria. Da peonada que labutava na
fazenda do velho Elias de #orais, talvez fosse o mais pobre, al!m de mais 'ovem. chara-se o mais rico ao ver-se
nas ancas do $arrano com $osto arreado, lombilho de cabe)ão metlico, peitoril e freio de presilhas, co*inilho e
badana. &inha, como todos, a cara resplendendo confian)a e liberdade. #as um filho de a$re$ado não poderia
esperar tão cedo tamanha felicidade. +aboclote, não era nenhum ton$o: h muito sabia quando vem chuva, vento ou
$eada. o domin$ueiro, co)ado terninho de brim riscado, assumia ares de import2ncia e atrevimento, com aquele
chap!u de boiadeiro, o la)o rubro envolto ao pesco)o, as botas de canos bordados. +om o bem arreado $arrano e
seu tra'e de $arnis! se impressionara a si pr(prio como 1 sin$ela e sonhadora #aria 4osa. Dava valor ao que
possu%a: seu pai tivera apenas um matun$o, rabudo e peludo.
+aboclote, ntoninho se or$ulhava de não ser um miservel. &udo, menos ser miservel. o Cituruna, na casa
verde, s( presta quem ! temido, respeitado como homem e como ami$o. > de se prote$er o pobre, o fraco, o irmão
de cren)a. #iservel ! o covarde, 'anota da cidade, medroso, almofadinhaG miservel ! aquele que não carre$a no
cinto de cartucheira um rev(lver de calibre NR, ou a espin$arda a tiracolo, ou o comprido facão de cote'oG miservel
! o que não trabalha e acumula riquezas, amealhando terras, enquanto outros labutam e acumulam d%vidas e
sofrimentos. 0 miservel não sabe domar o burro *ucro, 'o$ar o la)o e, pelos chifres, tombar o $arrote no corro. 0
miservel não cr= em são "oão #aria3

Deus te livre, ( ntoninho. asceste na casa verde, filho da selva, criado no pampa3 Bieste 1 luz no casebre do
flanco da montanha. #ontanha que chora com olhos d$ua o cristalino riacho. &eu ber)o foi a $arupa do peti)o. Hs
na terra o que ! são "or$e na lua: cavaleiro.  ro)a e a faina do campo foram a tua escola. Escreveste com a foice o
teu nome no chão. H bastante ter por mestre o cavalo, o cavalo que ensina o que ! o mundo, e o mundo ! o
Cituruna, a casa verde. 5uem te ensinou a acorrilhar o $ado, parar o rodeio, sofrear a manadaG quem ! o teu
companheiro na vi$%lia, na via$emG quem suporta o peso do arado, da carpideira, da carro)aG quem te educou no
trabalho e e*ercitou para combateA ma, pois teu $arrano, ( ntoninho. &eu pai, com parte do lar na estrada,
homem sem parada, tinha o mon$e no corpo, não se ape$ava a bem terreno, errando pelos ranchinhos alheios e pelo
mundo como as $uas dos rios. Bivia dividindo com os poderosos os frutos do pr(prio trabalho e a essa e*plora)ão
chamavam empreitada, parceria, arrendamento.

a fazenda de Elias de #orais, como as outras, a labuta da peonada fora um e*erc%cio de $uerra. $ora o servi)o
era de pouca monta. brira-se o m=s de fevereiro e somente em meados de mar)o come)aria a marca)ão. 
sal$a$em requeria pouco tempo, maiores cuidados se faziam necessrios durante a vi$il2ncia e*ercida sobre as
vacas e os terneiros. S noite, os bezerros ficavam soltos no curral. a hora em que ntoninho estreara a nova
montaria, ' haviam mamado e berrado 1 vontade. Elias de #orais entre$ou-lhe a bandeirola de são "oão, que
tremulava na fazenda, naquele momento em que ntoninho se achava 1 frente do $rupo de cavaleiros, pr(*imo ao
casarão da sede que dominava os s%tios e a paisa$em mon(tona. o empunhar o mastro, enchera-se de bons
au$rios. <uia, porta-estandarte, che$ara a /ão /ebastião das ;erdizes, se$uido por Elias de #orais e seus
camaradas. peando no lar$o da i$re'inha, deu de chofre com #aria 4osa, a cu'as mãos passou o estandarte
sa$rado. um instante ambos estremeceram e ficaram paralisados, os olhos a verse'arem poema de amor.

— Bim buscar a bandeira de são "oão #aria, que 4ocha lves me mandou — decidiu-se #aria 4osa.

a voz, ntoninho ouviu o $or'eio dos pssaros da casa verde, descobriu bosques imensos e dezenas de estrelas nos
olhinhos $ateados, viu nascer a aurora num sorriso apenas esbo)ado, sentiu o frescor dos arroios e das cachoeiras
no ar que a envolvia, enquanto notava a brue$a da noite a escorrer em seus cabelos. 0 'ovem, com #aria 4osa nas
vistas, era uma crian)a enlevada com uma rosa na mão. chando-a cheinha de mimos, num insi$nificante lapso de
tempo, associou id!ias e*trava$antes. @embrou-se das florinhas das campinas e da murta carre$adinha de brotos e,
vendo-lhe, os lbios ima$inou-se chupando amorinhas.
#aria 4osa era um bordado vivo, bonito e sin$elo como esses dos panos de parede, mas estampado na sala de visita
da casa verde. &inha a beleza simples do vestidinho de chita com desenhos de flores, cinturado pelo la)o de fitas de
tr=s dedos de lar$ura, borboleta de asas abertas em suas anquinhas. o peito, um recorte vermelho em forma de
cora)ão. tra%a este mais aten)ão do que os brincos dourados e o colar de contas coloridas.

ntoninho se e*pressou com emo)ão, despercebida por #aria 4osa, mas revelada no rosto em que a barba
repontava timidamente sobre os 2n$ulos da boca:

— Boc= leve porque as mãos santas foram feitas para servir a Deus.

#aria 4osa tamb!m sentira o choque. o afastar-se com a bandeirola, sentia dificuldade em caminhar naqueles
sapatinhos escarlates, de saltinhos. ão trope)ou, não torceu o p!, mas se confessou olhando para trs.
aquelas bandas, a mulher se casa muito cedo e a maternidade come)a na inf2ncia, meninas embalam não bonecas,
mas os filhinhos no colo. #aria 4osa não aprendera nem a ler e escrever, por!m sabia campear o $ado. E abelha,
tinha ferrão para defender o mel.

p(s tal encontro, nunca mais se interrompeu a corrente, de cora)ão a cora)ão. ntoninho, entre vrios
admiradores, era o felizardo e, bem por isso, odiado 1 primeira vista pelo caboclo Deodato.

;itando o palheiro, recostado a um tronco retorcido, nodoso, des$alhado, Deodato espionara-os esma$ado pelo
cime. &inha um s( confidente, ao qual confiava a pr(pria alma — um s( ami$o de todas as horas dif%ceis, um
ami$o fiel, mudo, frio, vin$ativo, feito de a)o e sedento de san$ue: o facão, enfiado na lon$a bainha de couro,
pendendo do cinto. Deodato não possu%a palavras para e*pressar tão $randes sentimentos, desencadeados dentro do
peito, não os revelava, sofria calado. /ua tristeza era um pssaro en$aiolado, sem lin$ua$em para voarG seu
despeito, uma fera en'aulada a sondar pelas $rades dos olhos, urrando vinditas. 5uando prestava servi)os na
propriedade do Eliazinho, pai de #aria 4osa, andava se$uindo a menina como se lhe fora a sombra. #as, para ela,
não passava de um pau-de-bu$re: ela tinha-lhe aversão, aler$ia. Duma feita, quando #aria 4osa ordenhava as vacas
no estbulo, Deodato se declarou:

— #aria 4osa, vanc= se casava com euA

Ela não respondeu, virou as costas com desd!m e carre$ou o leite para casa. Eliazinho, alertado pela esposa, acabou
despedindo o camarada. Cem dissera o capataz:

— #ui! tem tanta como pin$a e pau de porteira. #ec= ! mais teimoso que a mui! do ;edro ;ioio.

+onta-se que havia um casal muito bri$uento, cu'o marido a rabu$enta esposa *in$ava de ;edro ;iolho. ?m dia,
este amea)ou enterr-la viva se continuasse a escarnec=-lo. o cumprir o prometido, a des$ra)ada al)ara os bra)os
para fora da cova, esfre$ando as unhas dos pole$ares, chamando-o ;edro ;iolho atrav!s do $esto. &eimosia de
bu$re, teimosia de Deodato.

S cata de empre$o, Deodato va$ara de est2ncia em est2ncia, sem paradeiro, como bicho carpinteiro. l$um tempo
fora arrieiro. as lon$as 'ornadas, conduzindo os muares, sentia 2nsias de atirar-se aos peraus. #as era um homem
e não um miservel, tinha 2nimo dos fortes e não se dei*ava vencer em luta que travasse. o pouso dos caminhos,
com a saudade por companheira na barraquinha, via a ima$em de #aria 4osa na prata da bomba do chimarrão, no
lume do facão, no fo$o da bin$a, na fuma)a do palheiro. rran'ara-se, finalmente, numa est2ncia ad'acente, alo'ado
num $alpãozinho distante da sede. a realidade, amava a casa verde e seu teto de estrelas. " possu%a um pin$o,
selim e pele$o. /abedor da inau$ura)ão de /ão /ebastião das ;erdizes, arribou ao novo povoado. +al)a de brim,
camisa de al$odão e botinas atestavam sua pobreza. Cem tra'ado, porque a maioria se constitu%a de maltrapilhos.
aquela hora do encontro entre ntoninho e #aria 4osa, ofe$ante, teve uma tempestade interior e pensou com seu
fiel facão: um para o outro, dois at! ver e tr=s ! correr. 0uvira o velho "erôme, o sbio "erôme, dizer que com
um homem e uma mo)a, se faz noivado e casamentoG com dois homens e uma barra de saia, se arruma amarra de
cip( e se faz uma cruz. Ensimesmado, a cara ensolarada sob o chap!u $asto, velando cime e despeito, Deodato se
atolava nas m$oas da terra por um an'o do c!u. E amor ! nmero par — %mpar ! des$ra)a na certa.

ntoninho e #aria 4osa estiveram novamente 'untos dentro da i$re'inha, um com o outro encantado. /e as ima$ens
dos quadros da pai*ão de +risto, pendurados nas paredes, tivessem vida, haveriam de se me*er admiradas quando
#aria 4osa o convidou:

— Bamos ver quem reza primeiro dez ave-marias e dez padre-nossosA

— 5uem perde pa$a um bei'o3

0 estalo escutado pelos santos dos oleo$ramas foi abafado pela voz do leiloeiro:

— 5uem d mais, quem d mais, quem d maisA3

— 5uatro mil-r!is3

— Dou-lhe uma, dou-lhe duas, e dou-lhe...

— +inco mil-r!is3

— 5uem d mais, quem d mais, quem d maisA3


— Dou-lhe uma, dou-lhe duas... dou-lhe... tr=s3

5uem leva o peru ! o coronel.

<auchescamente imponente, vistoso, 4ocha lves parecia um $alo de ra)a, um $alo de bri$a.  festa da &rindade, a
festa do Divino, não se realizava no Cituruna, mas os pobres o viam como se tivesse sido nomeado imperador por
são "oão #aria. 0utros festeiros se tra'avam de modo mais ou menos id=ntico, a maioria sem o poncho-pala. uns
e noutros, o belo len)o vermelho se abria sobre o peito, como dois c(rre$os de san$ue. Elias de #orais, Eliazinho
dos /antos, +hico Bentura, lonso, Qebinho, eram tamb!m fi$uras de destaque e respeito, frutos da rvore mais alta
do Cituruna, do ltimo $alho. #as, pelo ideal, se i$ualavam com os mais modestos vaqueiros, com os mais
modestos camponeses.

@on$as tbuas estendidas sobre cavaletes, a mesa fora disposta num caramanchão de palha de bambu. Das taquaras
da coberta pendiam folhas de *a*im e fl2mulas de vrias cores. o candente brasido da vala, fo$ão do churrasco, a
carne estalava suculenta, a$u)ando o apetite com o aroma saboroso, trespassado pelos espetos. @eit9es, cabritos e
fran$os foram assados em separado pelas mulheres, as quais tamb!m fabricaram vinho, cerve'a com mel de abelha
e $arapa de canela.

5uando o sol estava em p!, como um polvo de fo$o — cabe)a no c!u, tentculos na terra —, o caramanchão
abri$ou os convivas vindos de todos os recantos.

E caboclo não come churrasco na mesa, de prato e talher.  sua mesa tem toalha de campina, seu prato ! a palma da
mão, seu $arfo ! de cinco dedos. /ob frondoso arbusto, senta no catre dos calcanhares.

o a'untamento, 1 hora do banquete, destacavam-se os festeiros, o 'uiz, o promotor, o inspetor de quarteirão, frei
/ilv!rio e o rbula &avares. Este morava em +anoinhas, muito distante de /ão /ebastião das ;erdizes, onde che$ara
um dia antes da inau$ura)ão. &inha certos interesses, li$a)9es com al$uns coron!is catarinenses, mas comun$ava
com a cren)a de todos, adepto de são "oão #aria.  fama de sua orat(ria corria mundo. De rstica ele$2ncia, um
tanto for)ada e pedante, era viv%ssimo e muito loquaz. +asimira 1 moda, vestia um terno escuro, palet( compridão
de bolsos lar$os, bem abotoado colete e*ibindo a corrente de prata do cebolão, fina camisa listrada e de colarinho
alto. &inha sempre o porte ereto e parecia prestes a ser estran$ulado pela $ravata. 0s sapatos brilhando. Bia'ara a
cavalo e trou*era o tra'e na ba$a$em.  cabe)a de cabelos abundantes, ne$ros como os bi$odes, e contrastando com
a cor da pele, dava impressão de ser inclinada para trs. @embrava um alazão fo$oso empinado no cume duma
colina.

 avozinha 5uerubina, esposa de Qebinho, chamara com voz de badaladas:

— Castiana3 idoca3 ermina3 /e apinchem pra ponhar a b(ia3


fora o churrasco, foi servido em caldeir9es, ca)arolas e ti$elas o assado de porco, cabrito e fran$o. Depois da
comilan)a, a discurseira. &avares soer$ueu-se sobre a cadeira de palha e, abrindo os bra)os em forma de cruz,
levando uma das mãos ao peito, come)ou a ora)ão:

— E*celent%ssimo 'uiz de direito, e*celent%ssimo promotor pblico, reverend%ssimo virtuos%ssimo padre /ilv!rio,
meus senhores, minhas senhoras. 5uis o destino implacvel que fosse o mais hum%limo servo de Deus, criador do
c!u e da terra, o escolhido para diri$ir-vos a palavra neste momento da mais alta si$nifica)ão c%vico-reli$iosa. +om
a voz embar$ada pela emo)ão, o cora)ão a transbordar de ale$rias, não sei como cumprir a sa$rada missão a mim
confiada com tanta honraria desmerecida, se não me socorrer a Divina ;rovid=ncia, se não $uiar meus passos nesta
caminhada sacrossanta o nosso santo padroeiro são /ebastião, se não me estender a sua mão mila$rosa são "oão
#aria de $ostinho. altam-me as palavras, ho'e mais do que nunca, e um misto de ale$ria e tristeza, de dor e
prazer, me invade a alma ao diri$ir a este povo cat(lico e $eneroso que habita o +ontestado, o verdadeiro Eldorado
do mundo de amanhã, f!rtil +anaã, or$ulho de /anta +atarina e qui) na $randeza do Crasil. +om a alma em pranto
e $enufle*a venho, em primeiro lu$ar, render a minha sincera e comovida homena$em a esse intr!pido e denodado
trabalhador das causas 'ustas: D. #anoel lves de ssun)ão 4ocha, o nosso mui estimado 4ocha lves3 Deus, que
est no c!u, v= e cobre de b=n)ãos sua obra imperec%vel. 5ue são /ebastião nos livre da fome, da peste e da $uerra3
+urvo-me submisso a seus p!s, ante a fi$ura impoluta, carter sem 'a)a, padrão de di$nidade e honestidade.
@evantar uma cidade santa, edificar um templo, ! trabalhar por esta ptria amada, heran)a de D. ;edro F e D. ;edro
FF, embora tenha vin$ado o $overno republicano. H dar consolo e al%vio 1s almas torturadas e, ipso facto, ! ver a
esperan)a, ser reanimado pela f!, fortalecido pela confian)a, ! ver que o c!u escuta as suas preces e atender todas
as suas splicas.  capacidade realizadora do povo catarinense ao construir esta cidade santa, pr(spera e bela, ! uma
prova insofismvel de que o +ontestado deve pertencer 'uris et 'ure ao Estado de /anta +atarina. Desta solu)ão
depende a ordem e a tranqüilidade. ão quero citar os nomes dos +amar$os, dos #arcondes, dos ra'os, dos
;aulas, dos <ordos, mas ! tempo de o $overno punir aqueles que fazem correr o san$ue de nossos patr%cios por
causa de ambi)ão de terras e mais terras. ;enso que as terras devolutas deviam ser distribu%das aos nossos
compatriotas, completamente esquecidos pela repblica. ão ! mais poss%vel tolerar a $an2ncia dos coron!is, a
usurpa)ão e a 'urisdi)ão deste territ(rio pelo Estado do ;aran. H tempo de elevar os nossos pensamentos ao bom
Deus e ao bom "esus, unirmos nossas vozes num brado un%ssono, que h de ser: — E*ecu)ão da senten)a ou morte3
5ue Deus acompanhe 4ocha lves3 5ue Deus ben)oe /ão /ebastião das ;erdizes3

/alvas de tiros para o ar anunciaram o fim do bel%ssimo discurso.

&avares suava como dia chuvoso, passava o len)o no rosto, e era felicitado, abra)ado.

— /u'eito de per$aminho3 — diziam os caipiras, com admira)ão.

um ambiente de incontidas satisfa)9es, horas prazerosas, festeiros e convivas devoraram a carne, o pão, a salada,
a farinha e abundante bebida. Depois o banquete se repetiu, com a vez das mulheres e das crian)as.
Entretempo, l fora, os camponeses pobres, a maior parte esfarrapados, fincavam os espetos no chão sombreado
pela cabana ou pelo arvoredo, a$achados, fazendo 2n$ulos com as pernas, curvo o espinha)o, 'oelhos em riste. +om
o facão na destra, se lambuzavam sem cerimônias. ;!s-rapados, p!s-no-chão, pelados, como lhes chamavam os
prepotentes, porque não possu%am terra, nem haveres, nem roupas. +onstitu%am a maioria presente, pois assim era o
povo do riqu%ssimo Cituruna, da ma'estosa casa verde.

&amb!m l fora a conversa rodopiava e se elevava num remoinho de sons, com o capeta a fu$ir apavorado com
tanta reli$iosidade. E fora o demo que escrevera pela mão do diretor do semanrio #iss9es, editado em ?nião da
Bit(ria, que a mquina de ferro ! a civiliza)ão em marcha e s( vem beneficiar a humanidade.

@ fora, o ini$ualvel "erôme, o "erôme sem vint!m, e que tantos ami$os tem, o "erôme que todos querem bem, o
bondoso "erôme, viva ima$em dos caipiras mais sbios e e*perimentados, mais desconfiados, um velho campon=s
de p!s espalmados e lar$os como os de pato, um chefe pelado, adivinho, curandeiro, respeitado orculo, pre$ava:

T +iviliza)ão, nada3 /( des$raceia o mundo. 5uando não tinha disso, tudo vivia bem e era tempo de rei. ?m home
era home de verdade e honrava a barba da cara. in$u!m li$a pra perdi)ão das fam%lia. um querem que os filhos
respeitem os pais e os mais v!ios, querem roubar as mui! dos outros e ter amantes. in$u!m mais se educa na
palavra de Deus e faz o sinal da cruz. os bãos tempos do imp!rio se respeitava a lei de +risto e os direitos de
posse. in$u!m tomava as ro)as dos pobre.  lei dos rico ! funil: lar$a pra cima, fina pra bai*o. 0 $overno s( d
terras pros miserveis, pras @amber e pras $ente da 0ropa. 0 cumpadre "oão #aria vai aparecer de novo, promessa
de santo ! contrato selado no cart(rio. #aria 4osa ' viu ele numa encruziada. H perciso pôr um fim nesse
paradeiro3

;elado, "erôme era como os bu$res, como os desocupados, como os a$re$ados, como os pobres. +al)a de brim
pelas canelas, rota, remendada, marcada pelos temposG camisa estra)alhadaG palet( imundo ras$ado, com o forro
dos bolsos e*postos pelas aberturasG e tudo $rosso de su'eira. ;!s no chão.

?m dos irmãos +olete, o fanfarrão de +uritibanos, que parecia antes estar fantasiado do que vestido de cavaleiro,
quis contrariar a opinião de "erôme, falando bem do trem e mal do $overno de rei. "erôme passou-lhe uma
descompostura:

— ?ai3 #ec= virô maquinistaA #ec= num t na festa do cumpadre "oão #ariaA /er que virou ateu, tamb!mA

Em seu apoio, todos faziam ponto de interro$a)ão com os olhos, com a cabe)a, com o corpo.

5uando um castelhano quis falar mal do Crasil, afirmando que o pinheiral do Cituruna ia de $ra)a para a r$entina,
"erôme replicou calmamente:

— um faz mal, n(is tomamo tudo isso de vanc=s memo.


Em cada a'untamento sempre se destacava um tipo id=ntico a "erôme.

+erto ancião de chap!u de palha, que fora andarilho, descambava a l%n$ua nos coron!is, na pol%cia e nos 'a$un)os
das companhias.

— ;eludos3 — uns e*clamavam, com raiva.

— #iserveis3 — diziam outros, com desprezo. E*plicava-se que todos os coron!is não eram peludos e miserveis.
+itava-se como e*emplo o nome do coronel >enriquinho que, em +uritibanos, dava abri$o aos perse$uidos pelo
lbuquerque. 0 fato ! que tal desi$na)ão não se reservava a fazendeiros como 4ocha lves, Eliazinho dos /antos,
Elias de #orais, lonso, +hico Bentura, ou Qebinho.
— /ão homens de cren)a, não t=m riqueza por riqueza — diziam deles os camponeses, revelando nos dedinhos de
prosa tudo o que pensavam e o estado de esp%rito reinante.

De barri$a cheia, a sesta acordou com o berreiro do leiloeiro.

;ara a tarde, estava pro$ramada uma corrida de cavalos. a chapada mais ampla, fora improvisado o hip(dromo.
0u melhor: a raia. a hora da lar$ada, #armelada e uma)a resfole$avam, a e*pectativa do%a nos nervos e inflava
os peitos do pblico. ão havia quem não houvesse apostado, ou dinheiro contra dinheiro, ou ob'eto contra ob'eto.

#anoel, filho do Qebinho, perderia um peti)o para "oão Bieira. ntoninho $anharia um facão. Deodato ficaria sem
a bin$a.
+om o cora)ão tamb!m a $alope, a assist=ncia a$uardava impaciente o sinal da partida: um tiro para o ar.

/e$undos antes do estampido, +hico ;itoca $ritou:

— $ora ! que a porca torce o rabo3

em frei /ilv!rio conse$uia dominar a emo)ão: 'o$ara o livro de rezas contra uma promessa de #aria 4osa.

Da risca ima$inria, as !$uas parelheiras dispararam numa chispa sem bridas, num tropel surdo, a casco de
rebanho, abafado pela bulha da plat!ia alvoro)ada. 4pidas como raios. <rudados como carrapatos no lombo dos
animais, se a$achavam <idoca e +handoca, voavam batendo com as pernas e os bra)os, enquanto as rosetas das
esporas trituravam as virilhas das fo$osas. #ontaria a meio-p=lo: apenas um co*inilho cobria o espinha)o de
#armelada e uma)a, que esvoa)aram de par a par no prado e passaram 'untas pela marca da che$ada.

De pronto nasceram as discuss9es, as desaven)as. ?ns achavam que #armelada havia $anho por uma cabe)a ou
pelo focinho, outros ar$umentavam de modo e*atamente contrrio. &odos se achavam com direito a receber as
apostas. +hico &aquara se e*altara e isso constitu%a um peri$o. +hico &aquara, rei do cote'o, o rei do duelo caboclo,
o invenc%vel +hico &aquara. 0 facão de cabo de osso che$ou a relampear no ar e o fre$e ' ia se $eneralizar, não
fora a interven)ão de 4ocha lves e rei /ilv!rio. #as, se não houve morte, foi mila$re, intercessão de são "oão
#aria3

— in$u!m $anhou, nem perdeu. >ouve empate — declararam os pacificadores.

— Empate3 — repetiam todos, insatisfeitos.

Depois que o sol afundara no taimb! do poente, a noite parecia uma ne$ra baiana, como ! a baiana enfeitada de
colares, pulseiras, brincos, balan$andãs, bata de rendas, ale$re e sorridente. Então /ão /ebastião das ;erdizes era
um vilare'o celeste. +om estrelinhas coruscantes, hasteada a lua como bandeira, onde est bordada a ima$em de
/ão "or$e em seu alazão. s palho)as, as palmeiras, o pinheiral, a i$re'inha, tudo um quadro emoldurado pelo
vassoural, são /ebastião das ;erdizes parecia pincelada pelos astros. +lareavam-na os raios de luz, em floco, como
se fossem as barbas de "oão #aria. &inha a$ora o aspecto de pres!pio e, na realidade, era um arraial santo.

Cru*uleantes lampi9es a querosene, pendurados nas estacas, douravam com fiapos de lante'oulas o salão do
fandan$o. 0s mo)os faziam lembrar os filhos do +hico /antos que viraram tan$ars.  ale$ria se alastrava como o
fo$o no campo. &odo mundo bailava, preto com branco, bu$re com mulato. +aipira que não dan)a, não canta ou
não ! violeiro, então s( se for curandeiro. +hique como um carrapicho, ntoninho vivia a noite mais feliz da
e*ist=ncia, o que tamb!m sucedia a #aria 4osa, com sua pompa de arara. 0 acordeonista e o rabequista tocavam
sempre as mesmas notas musicais, como bonecos de corda. Entre eles sur$iu "erôme, soprando a melodia num
peda)o de pente envolto numa folha de laran'eira. ntes de come)ar a tocata, o salão ficava tomado de avan)adas
masculinas e, quando o rabequista encostava o instrumento ao quei*o, se dava o estouro. +ada qual procurava
che$ar primeiro 1 preferida. ntoninho estava de olho na banda e em #aria 4osa, cocando-a. icava de perto,
sempre disparado 1 frente de Deodato e outros pretendentes. +omo eles, não tinha na mente a id!ia do pecado.
Dan)ava por prazer. Bibrava e se concentrava nos passos, não colava o corpo ao par, não proferia uma palavra e
che$ava a respirar com dificuldade. &an$ar. Enri'ecia-se, force'ava, se$urava com firmeza a mão da $raciosa
companheirinha, $in$ava o bra)o para cima e para bai*o e, com a outra mão, pu*ava, repu*ava e amarrotava o
vestidinho de chita estampada. 0ra marchando, ora dando saltinhos li$eiros, rodopiava e coiceava o chão. 5uando o
*ote alvoro)ava o salão, o bater de p!s levantava poeira.

rei /ilv!rio não teve medo do inferno e valsou uma moda com a ne$ra Celarmina. 0 'uiz e o promotor se
encoru'aram num canto da sala, palestrando com o rbula &avares.

Cibiano, rapazote travesso e valente, e*cedendo-se na pin$a, ia provocando um chinfrim ao 'o$ar um toco de
ci$arro 1 mesa onde se encontravam os irmãos /ampaio. Qebinho apartou a bri$a, acalmando os e*altados.

 festa foi de arromba, dei*ou muito atrs as de /inhana Cita, em ;orto ?nião da Bit(ria: nunca houve churrascada
i$ual, nem em tempos de elei)9es.

Depois /ão /ebastião das ;erdizes ficou deserta. /omente um pelado, um asceta, o "oaquim Certolino, permaneceu
num ranchinho de palha, a$uardando o "u%zo inal.

4ocha lves fora o rei, e o povo sua corte. Enquanto não ressur$ia o mon$e, era o chefe espiritual do +ontestado.

Capítulo II

+oron!is viram contrafeitos as fazendas desertas no dia da festa, permitindo a contra$osto a partida da peonada, da
criada$em.

ão foi e*atamente o que aconteceu na fazenda +huva de ;edra, em que, desde a v!spera, o coronel ;etrônio se
achava voluntariamente sozinho. ão de todo, mas sem a fam%lia que, h dias, mandara passar uns tempos na

cidade.
/ozinho ! modo de dizer. azia-lhe companhia na sombria mansão campestre a serva Dad. Dad, a que parecia
mãe do mundo, a mãe de todos, a dona dos campos e da mata, a dona de tudo. Empre$ada de estima)ão, dessas que
os suseranos querem tanto como aos animais que adulam e chicoteiam. 5ue seria dos filhos pequeninos daquele
patrão en!r$ico se lhes não valesse a ne$ra volumosa de olhos e dentes rebrilhantesA Era o Dad me acuda3 e a
velha retinta sa%a afundando o soalho ao socorro das crian)as, antes que o rabo de tatu se encharcasse de san$ue nas
costas das pobrezinhas. /( ela enfrentava o lobo, 1 toa enfurecido. quele senhor era um demônio que dominava
pela viol=ncia e pelo terror.  ira faiscava em seus olhos, escorria-lhe no suor, ru$ia-lhe na voz. Dad escorava-o
por ser bondosa, embora o temesse.  patroa vivia apavorada, não ousava abrir a boca para contrariar a fera, muitas
vezes proibida at! de chorar uma l$rima, ou de fazer um movimento. Em duas ocasi9es, apenas, pudera e*ibir em
pblico as sedas, uma no clube, outra no teatro, mas 1 volta pa$ara car%ssimo pelo prazer: a cada palavrão, dos quais
cadela era o menos in'urioso, recebia um potente murro na cabe)a ou no rosto. /em motivo al$um, despertava o
cime do soberbo marido. Escrava, apanhava como escrava: escrava por ser mulher. ão tinha um esposo, mas um
proprietrio, um al$oz.
Dad era feliz comparada 1 patroa, sentia-se livre, e*primia-se 1 vontade, tão simples, tão espont2nea,
bonacheirona. ssim eram as criadas, e pobres das patroas3

Dad ficaria cuidando do velho solar de tbuas e telhas $oivas, servindo ao r!$ulo e*i$ente, arrumando e limpando
os cômodos, cozinhando, pondo a mesa e depois iria embora para o seu ranchinho.

+oncei)ão tivera de permanecer na fazenda, pois Dad não podia fazer tudo sozinha e, al!m disso, o coronel
;etrônio a incumbira de fazer compras no dia se$uinte. l$u!m teria de ficar atendendo o bruto. inda que esse
al$u!m fosse a despercebida +oncei)ão, botão de flor da ro)a, +oncei)ão (rfã de pai e destino, menina lacaia,
aquela menina t%mida que che$ara, descal)a e maltrapilha, h menos de um ano 1 +huva de ;edra.  mãe, viva que
se vira obri$ada, como tantas outras, a dar os filhos para os ricos criarem, não podia dei*ar de confiar no compadre
que lhe batizara a filha na santa F$re'a. ssim o destino da filhinha passou a depender do reputado coronel
;etrônio, cu'a honradez, se fosse posta em dvida por al$um audacioso, si$nificaria prisão, morte.

+oncei)ão temia-o instintivamente. Bivia amedrontada dentro daquela habita)ão maldita. /entia-se desamparada e
pressentia des$ra)as. Bivia calada ou então respondia 1s per$untas somente com monoss%labos. Detestava o
casarão, nos cantos do qual procurava evadir-se, escondendo-se, esquivando-se 1s vistas maldosas do coronel
;etrônio.

Desabrochava a mulher, uma menina-mo)a. /empre fu$idia, es$ueirando-se de cabe)a bai*a pelas paredes mal
caiadas, procurava ocultar os encantos sob $rosseiros e desa'ustados vestidos, a face $raciosa sob o v!u do medo.
5uem a fitasse por um se$undo descobriria um rosto realmente belo, animado por olhos escuros e arre$alados,
emoldurado por uma cabeleira ne$ra, des$renhada, a$reste e suavemente envolvente como a mata noturna.

Dad aprontara a mesa, e +oncei)ão 'antara a um canto da cozinha.


Depois, ' sem as botas e bombachas, o coronel ;etrônio chamou de dentro do quarto:

— +oncei)ão3

— ;ronto, padrinho — respondeu a afilhada, estremecendo.

— Benha c.

E a porta do quarto fechou-se atrs da estarrecida menina que, numa noite de terror, numa noite de viol=ncia, numa
noite de asco e de (dio tornou-se mulher.

De manhã, +oncei)ão sentia-se eno'ada, revoltada, enferma do corpo e do esp%rito, como que morta, como flor que
murcha, enquanto l fora sobre a campina o dia desabrochava com o sol despetalando-se no c!u.
;assados dias, a fam%lia che$ou da cidade. +oncei)ão tornou-se mais queda, mais esquiva, sentimentos de (dio e
vin$an)a crescendo desordenadamente no cora)ão. Era ainda uma crian)a para saber como dese'ar o mal. unca o
aprendeu, todavia.

Dad rebelou-se, desconfiada de tudo, que bem conhecia o %ntimo comum desses suseranos. &inha bastante
e*peri=ncia e conhecimento do mundo. em se deve falar de sua pr(pria filha atirada aos lupanares mais s(rdidos e
imundos dos bairros sombrios das cidades $randes. ?m dia, quando ouviu o coronel ;etrônio dizer 1 patroa
+oncei)ão est ficando mo)a, vou arran'ar um marido para ela, percebeu-lhe a trama. Deodato veio 1 sede da
+huva de ;edra, apresentado como noivo 1 +oncei)ão.

;obre da patroa e das crian)as3 unca sofreu tanto. Dad desapareceu da fazenda, levando +oncei)ão. 0 coronel
;etrônio passara o diabo para trs, de tão ruim que ficou.

Dad foi procurar o dele$ado, o 'uiz e o promotor. &udo em vão.

— H mentira da menina. unca fale para nin$u!m uma coisa dessas. 0 coronel ;etrônio que não saiba, ! um
homem tão bom, tão honesto, devo a ele a minha autoridade...

0 'uiz e o promotor fin$iram não acreditar na hist(ria do estupro. in$u!m tinha cora$em de comentar o caso.

;or ordem do coronel ;etrônio, Dad acabou pa$ando os insultos na cadeia. +oncei)ão ficou 'unto dela durante tr=s
dias, mas 1 noite pousava noutra cela em companhia do cabo. oi solta sozinha, 'ustamente no primeiro dia em que
$anhou dinheiro para dormir com um homem. in$u!m a queria como empre$ada — mal falada, as senhoras
olhando-a desconfiadas, com raiva e desd!m, os homens com cobi)a mal dissimulada. ;ouco a pouco, tornara-se
ftil, faceira, $ostava de conquistar os machos, atraindo-os ao pecado, 1 trai)ão, num dese'o patente de vindita.

5uando voltou 1 +huva de ;edra a mando do coronel ;etrônio, estava disposta a casar-se com um noivo arran'ado
1s pressas, livrando da prisão a vilipendiada, a mamãe Dad, a dona dos campos e da mata, a dona de tudo,
criadeira dos filhos de amos, obri$ada a cozinhar para os presos e os soldados.

Bisita dos /antos 4eis

J.U

/ão che$ados os tr=s reis


/( da parte do oriente

Bisitar do Deus menino

/alve Deus onipotente

zul e branco pertence ao c!u

s cinco cha$as do corpo de +risto.

7.U

o c!u +risto no pres!pio


Dando ao mundo assun)ão

5ue tudo corre dela

4endendo-lhe adora)ão.

N.U

cordai vestais dormindo

0 som da madru$ada
4eceber os santos reis

5ue do oriente são che$ado.

V.U

% vem o Esp%rito /anto

Bem o doce refri$!rio

5ue os nossos males adoce

Divino Esp%rito /anto

+onsolai vossos devotos

5uando deste mundo flor.

I.U

&r=s an'os da paz

Era o sbio mediador

Eis o emblema da inoc=ncia.

Eis o fruto do amor

zul e branco pertence ao c!u

s cinco cha$as do corpo de +risto.

6;oesia encontrada no patu de um fantico.8

Capítulo III
Em ondas de prosa, espumadas de boatos, as not%cias inundaram o Cituruna.

4essuscitara "oão #aria de $ostinho3 4eaparecera o mon$e3 /anto não morre. 0 mon$e estava no ;aran3

ão. ão se tratava de "oão #aria, o Com "esus, mas do seu irmão são "os! #aria, informavam os que o haviam
visto.

— also mon$e3 — e*clamavam com indisfar)vel des$osto os miserveis, fazendo coro com frei /ilv!rio.

also ou verdadeiroA

Bivendo sua prova)ão, estava na cadeia, preso como qualquer larpio.

— 5ue sacril!$io3 — diziam espantadas as aldeãs.

+onstava que seu nome real era #i$uel @ucena de Coa Bentura e que fora indisciplinado pra)a do E*!rcito, al!m
de cabo desertor da ;ol%cia #ilitar do ;aran. l$uns atribu%am o rancor 1 farda e 1 caserna como conseqü=ncia dos
maus tratos que, na !poca, sofriam os soldados.

/a$rara uma fonte, na qual al$umas donzelas se banhavam despidas. ?m anti$o $eneral, o comandante da colônia
militar de +hapec(, mandou-o escoltado a ;almas, a cidade-fazenda do oeste, a cidade das palmeiras.

o estreito cub%culo, o frio navalhava as carnes dos des$ra)ados. ?m ancião amanhecera enre$elado e o cadver
custara a ser removido da cela vizinha. +ompletamente nu, estirado no assoalho imundo, um louco silenciara ap(s a
bordoada desferida pelo cabo.  tuberculose pastava-lhe o peito.

Dentro da masmorra era sempre noite, vedada a entrada do sol, a$itador da @iberdade. penas uma vela, ardendo
sob pequenino orat(rio, alumiava aquelas caras farpentas, escorridas de cansa)o, marcadas de fundas olheiras.

Coa Bentura, o mon$e, são "os! #aria, era an'o da $uarda a velar pelos infelizes no pardieiro. <ravara indel!vel na
mem(ria todas as passa$ens da obra mais lida e admirada na casa verde:  hist(ria de +arlos #a$no e dos doze
pares de ran)a. Ss narrativas estapafrdias, ap(crifas, acrescentava as que ima$inava, mais fantsticas ainda. +om
tal fertilidade inventava fa)anhas para os seus her(is que faria inve'a ao autor desconhecido.

Era um caboclo, um plebeu, um asceta, um eremita, um curandeiro.

— #on$e3

4elera a C%blia, catecismos e livros de rezas. ascinado pela vida dos santos, principalmente pela do antecessor,
"oão #aria de $ostinho, não resistiu 1 tenta)ão de imitar-lhe o e*emplo. Dizem que uma das causas disso era o
des$osto de ser leprosa a fam%lia. in$u!m sabe. Fniciara-se como são #anoel, mas acabou homena$eando e
tomando o nome do pai de "esus, se$uido pelo da Fmaculada.

— #on$e "os! #aria3

De boca fechada, fun$ando, o bei)o superior saliente como se tivesse a l%n$ua sobre os dentes, os olhos
perscrutavam ar$utos e vi$ilantes. &ratara dos ferimentos de ndrade, banhando-os com urina e mentruz. calmou-
o com uma senten)a do sermão da montanha: Cem-aventurados os que t=m sede de 'usti)a, porque serão
saciados.
;osseiro, ndrade fora escorra)ado de seu lote por um bando de fac%noras. 0s corpos de sua mulher e sua filhinha
ficaram plantados sob as cinzas da cho)a de palmito, fi*ando e contrapondo o seu direito. Escapara 1 de$ola, por
mila$re. u$ira matando um 'a$un)o e fora preso pela pol%cia de ;almas. ão lhe deceparam as orelhas ou o se*o,
apenas teve raspados os cabelos, sob o chuveiro $elado. ntes de conhecer "os! #aria, se mostrava pessimista e
eram suas e*press9es como urubu infeliz at! na lo'a se atolaG cabra manca, morro abai*o faz via$emG tudo que eu
possu%a, o diabo fu$iu com o sacoG $ente ruim e*iste mais que pau torto e bicho-de-p!G quanto mais ma$ro, mais
carrapato nas costasG a terra ! como a mãe, depois que se perde, o valor aparece. $ora ' falava noutro tom:
des$ra)a pouca ! boba$emG num macho amarrado, pau neleG quem sofre ! mudo, mas tormenta sem ronco vai mais
$uaG muitas cruzes cabem ainda nas veredas...

Escarranchado num canto daquela c2mara morturia, no centro de uma ferradura humana, formada por homens
a$achados, "os! #aria operava maravilhas. Fncutia-lhes 2nimo, fortalecia-lhes o esp%rito. &ransportava-os a um
mundo de sonhos, como se fora um liame entre a realidade e a fantasia. menizava-lhes a vida de sofrimentos.
lma brasileira, candura e ale$ria se e*pandiam no falar de devaneio. #as seus olhos, tintos de terra, eram
profundos: duas cacimbas com minas de l$rimas no fundo.  luz transmudava-se em prata na meia-lua de cãs que
lhe contornava o rosto, coroando-lhe o quei*o.  fronte serena revelava claramente uma inaproveitada inteli$=ncia
e muita sabedoria, fronte que se apoiava ao nodoso nariz como a um ca'ado reconhecedor do terreno para a errante
fisionomia... +om as pernas estiradas, uma por bai*o da outra, fazia uma cruz. /ob as abas do chap!u de coco alto
como cpula de i$re'a, tufos de cabelos a$rilhoados escapuliam para as planuras do pesco)o e para os morros das
orelhas. +om amplas man$as a avan)arem sobre as mãos benzedeiras, o camisolão de $ola aberta no peito lhe
envolvia o tronco abaulado, caindo sobre os 'oelhos. "os! #aria era $ordo e atarracado, de tamanho m!dio e de
membros curtos e $rossos. &inha um bando de papa$aios na $ar$anta e não parava de palrar:

— ;ara mim ! $randeza esta penit=ncia. #inha 'ornada ! lon$a e não tem fim. Eu sou como a batatinha e o chuchu,
com qualquer quantidade de sal. +omi$o ! no cepo3 /ou homem que cuspo e não lambo. 0 que di$o, di$oG não !
papo, nem bicoG mostro a estampa como espelho. ão estou aqui de escoteiro. &enho que cumprir uma missão
sa$rada. Eu mato a cobra e mostro o pau3 " tirei muita $ente da cama da morte.  verdade ! terra su'a e $ua
limpa. ão tenho medo de senten)a de forca. Bou sair daqui, debai*o duma coroa, com ordem de Deus. Di$am,
meus filhos: querem ouvir outra hist(ria de um nobre par de ran)aA

— 5ueremos sim, são "os!3 E o mo)o trancafiado recentemente a'untou:

— 5uem são os doze pares de ran)aA

ceso nos olhos de "os! #aria, um fo$acho de entusiasmo correu-lhe as barbas, quando e*plicou:

— 0s doze pares de ran)a foram vinte e quatro valorosos cavaleiros servidores de +arlos #a$no, que nunca
conheceram o medo. 5uem do medo corre, de medo morre. Eram 4oldão, conde de +en(bia, filho de Certa, irmã
de +arlos #a$no e do duque de #ilãoG 0liveiros, filho do duque 4e$nier de >ensG <uarim, duque de @orenaG <ui
de Cor$onhaG 4icarte, duque de ormandiaG &ietri, duque de Dard2niaG @amberto, pr%ncipe de Cru*elasG ?r$el de
Dano, rei de D(riaG <uadeboa, rei de r%siaG >oel, conde do antesG eme, duque de CavieraG "ofre, senhor de
Cord!usG Confim de <=novaG <alalão, que no fim foi um traidorG e outros que não me lembro o nome a$ora.

+omo nin$u!m o interrompesse, prosse$uiu arrebatado:

— Bou dizer como era o 'eito do imperador +arlos #a$no, que viveu defendendo o cristianismo, em luta contra os
turcos e os infi!is.

Fma$inando-se como o rei, que cultuava, arre$alando os olhos, repetia o trecho que sabia de cor:

&urpim, homem santo e arcebispo de 4oma, que andou muito tempo em companhia de +arlos #a$no, diz que ele
era homem de corpo $rande, bem nutrido, forte e proporcionado de membros muito li$eiros, feroz no olhar, tinha
cara lar$a, e trazia continuamente a barba do comprimento de um palmoG os cabelos ne$ros, o nariz rombo e chato,
a presen)a era muito respeitvel, os olhos como de leão, e um tanto vermelhos e reluzentes, as pestanas e
sobrancelhas declinantes a ro*asG se estava raivoso, s( com os olhos espantavaG o cinto com que se cin$ia tinha oito
palmos de compridoG era lar$o de costas, $rosso das pernas e tinha $randes p!s. 0 seu comer era tr=s vezes ao dia, e
pouco pãoG por!m, comia ao 'antar um quarto de carneiro, ou duas $alinhasG a ceia era ca)a assadaG bebia tr=s vezes
ao dia, por!m pouca $ua. &inha $rande for)a: muitas vezes o viram partir capacetes de ferro, at! com os dentes, e
isto de um s( $olpe, e, estando a cavalo, levantava com um s( bra)o um homem armado at! o i$ualar com a sua
cabe)a. &inha tr=s condi)9es virtuosas: a primeira, premiar bem quem o mereciaG a se$unda era fazer a todos i$ual
'usti)a, sem que al$u!m se quei*asseG a terceira, ouvir e responder a todos com paci=ncia, manso e pacifico no falar
e repreender.

/entia que se a'ustava 1 descri)ão e que os ouvintes o confrontavam com +arlos #a$no, e isto o enchia de
contentamento. ;achorrento, continuava:

— Em poucas badaladas eu conto o causo. /ou eu o filho do meu pai e da minha mãe. Eu sou $rande3 /ou homem
de fala curta e conhecimento comprido. a pra)a de festas de ;aris, quando toda a corte estava presente com a sua
ma$nific=ncia, quando todos os melhores cavaleiros e pr%ncipes atenderam ao chamado das 'ustas em honra a
+arlos #a$no, quando os pares derrotaram todos os seus adversrios, causando inve'a aos estran$eiros, entrou por
uma porta um cavaleiro $i$ante, com armas pretas e tendo no escudo um cipreste com a raiz para bai*o, do
comprimento que a rvore tinha para cima, e uma inscri)ão: /e o corpo cresce a$i$antado W s ra%zes do afeto, que
se oculta, W /ão do mesmo tamanho da estatura. +he$ou no meio da pra)a, no seu cavalo baio ricamente arreado, e
provocou em voz alta aquele que quisesse defender a amada contra a sua formosa <aliana. <aliana não ! mais bela
que a minha n$!lica3, $ritou um cavaleiro ele$ante que entrava pela outra porta, montado num cavalo cheio de
ouro e pedras de brilhante, trazendo um escudo com o desenho de um $irassol inclinado para uma an$!lica, com os
dizeres: em de olhar para ti W Dei*o de ser $irassol. 0 primeiro cavaleiro era um mensa$eiro que durante duas
horas lutou com 4oldão, o mais conhecido dos pares, sendo por ele batido sobre a terra.

+om pasmo, deslumbrados, os detentos ouviram a sin$ular narrativa, admirando as belas palavras de "os! #aria.
ele, cada um via +arlos #a$no e, em si pr(prio, um par de ran)a.

berta a porta da cela, um vento fantasmal assomou, arrastando no chão a capa sinistra, apa$ou a vela e fla$elou os
presos, que ran$eram os dentes. $asalhado 1 repolho, um balofo sar$ento de cara estanhada, vindo com o dia nas
costas, pro'etando a sombra que parecia alma do frio e, interrompendo "os! #aria, vociferou:

— #on$e, pode dar o pira, antes que a borracha cante. E acrescentou: — H ordem do dele$ado.

0 carcereiro, su'eito chuchado das bru*as, pesco)o de varapau, se admirou de ver aqueles prias a'oelhados,
chorando aos p!s de quem, para ele, não passava de um esmolambado. &odos se lembravam do que h pouco
dissera:

— Bou sair daqui, debai*o duma coroa, com ordem de Deus.

;almas se a$itara desde que fora aprisionado "os! #aria. Era comum ouvir vozes em sua defesa, afirmando que s(
fazia o bem e pre$ava a caridade, pois se tratava de um irmão de "oão #aria. +orriam boatos de que #i$uel
ra$oso, velho mara$ato que se estabelecera no Frani, na fazenda do comendador /antos, capitalista no 4io de
"aneiro, tratara de reunir $ente para vir 1 cidade e*i$ir a liberdade do mon$e. Dizia tratar-se de elemento peri$oso,
com e*peri=ncias nos campos de batalha, que militara nas for)as federalistas no posto de coronel. 0 pr(prio
prefeito combinou com o dele$ado, ambos vidos de eleitores, e temerosos, a soltura de "os! #aria.

arnel de trapizon$as, o sacrrio, uma cai*inha de madeira com a ima$em de ossa /enhora de badia, os olhos
enuviados e mare'ados, depois de aben)oar os companheiros, "os! #aria partiu de espeque a percorrer trilhas
i$notas, alvoro)ando, fascinando os moradores da casa verde. &amb!m amava a casa verde, de telhado de estrelas,
chão atapetado de campos e matas, rampas de colinas e montanhas, paredes no horizonte.

— "oão, "os! e #aria, são assim como o ;adre, o ilho e o Esp%rito /anto — respondia quando lhe per$untavam se
era o pr(prio "oão #aria de $ostinho, ou um seu irmão.

aquele tempo, nos bosques araucarianos, era comum o aparecimento de andarilhos a se arvorarem em profetas.
Biam neles um misto de $ente e fantasma. &er vis9es, l, não constitu%a ves2nia, mas coisa normal, corriqueira.
+omentavam-se muitos casos. ?ma mulher fora ao $alarim da fama, co$nominada lor de ;ureza. 0utra, se dera a
conhecer como #aria /ant%ssima, cu'o filho, #enino "esus, reinava no andor das prociss9es. ?m tal de ;lcides
dizia que era o pr(prio "oão #aria de $ostinho, o Com "esus, mas acabara desacreditado e desprezado como um
falso mon$e. 0utros ascetas tamb!m $l(ria ef=mera tiveram: são #i$uel, nhô Dodô e Candeirinha.

#as nenhum alcan)ou "os! #aria no caminho da celebridade, sumiram em seus rastos de luz.

eridos nas farpas das sendas in(spitas, os p!s de "os! #aria recebiam curativos piedosos dos arroios.

a zona da mata, o sol era um $orro de prata sobre a carapinha verde do Cituruna. "os! #aria palmilhara o terreno
e penetrara nas $rotas fundas das montanhas. s feras lhe respeitavam a divindade... Errante. ?ma for)a indomvel
o impelia para a frente. <uiava-o, como a um ce$o, o e*perimentado bordão. 0 andar marcava compasso de marcha
estremecendo o sertão.

Do alto das serranias, divisava a zona dos campos, a plan%cie recamada de restin$as e bosques de pinheiros, que se
estende ondulada para o sul. aces enri'ecidas pelo cansa)o e pelas priva)9es, semelhava, l em cima, uma alma do
outro mundo, o pai, o esp%rito da floresta.

E se$uiu com o vento...

um dia $!lido do m=s de 'unho de JKJ7, "os! #aria se abri$ou numa cabana situada nos dom%nios de um anti$o
fazendeiro. @o$o se mudou para a propriedade do crente +hico de lmeida, em +ampos ovos. ão tendo recursos
para atender a numerosa clientela, recebeu donativos para entulhar o $alpãozinho de panac!ias. Eli*ir de o$ueira,
Cristol, +apilus, *aropes, preparados homeopticos, latinhas de pomadas, pacotinhos de ervas sobravam em sua
farmcia ambulante. +omo atra%sse levas de pros!litos, "os! #aria fez nascer o despeito e a inve'a dos boticrios
das vilas mais pr(*imas. 0 de +uritibanos chamava-o de charlatão, bandido e falso mon$e. #as ' não havia quem
não possu%sse uma c(pia da ora)ão redi$ida por "os! #aria, tamanho o seu prest%$io.6V8

uma se$unda-feira, dia apropriado, "os! #aria foi 1 hospitaleira resid=ncia do +hico de lmeida a fim de defum-
la:

— Dei*e que eu dou uma vassourada em sua casa, em nome da Divina ;rovid=ncia, eu dou3 H uma navalhada,
corta tudo.

;ediu uma telha e brasas, e*plicando que estas teriam de arder sobre aquela:

—  natureza ! barro e barro n(s somos, viemos da terra, com a terra vivemos, e para a terra vamos. E come)aram
os trabalhos.

— echem os olhos, bem fechados, at! verem a ima$em de um crucifi*o brilhante — disse, a transbordar f!,
acendendo uma vela e pondo incenso no braseiro, fuma)ando o recinto.
Fnspirava pena, a rezar fervorosamente, ciente de que fazia um $rande bem ao pr(*imo. E caiu em transe, possu%do
de um terremoto. +om afinco, se esfor)ava para se concentrar. <emendo palavras como /acrossant%ssima
Divin%ssima Divindade, /a$rados Evan$elhos, passou a declamar com ardor:

"oão Catista, Catista "oão,

a quem batizou "esus

nas $uas do "ordão.

"oão Catista, Catista "oão3


5ue 'o$ue os males desta casa

nas $uas sal$adas da 0ceania,

onde o $alo não canta,

onde não tem pão nem vinho.

"oão Catista, Catista "oão,

Catista, Catista, Catista,

"oão Catista, Catista "oão3

0 camisolão ficou banhado de suor. Depois de assopros e assobios, ' com o corpo livre do esp%rito, bebeu um copo
d$ua para acalmar-se e acabar a tremedeira. Enlevado, soltava as bridas da l%n$ua:

— +omo eu sou feliz por poder contar com a Divina ;rovid=ncia, para fazer bem aos meus irmãos que sofrem3 H
uma coisa maravilhosamente sacrossanta3  inve'a e os males nunca mais entrarão nesta casa. E*pulsei pelas
'anelas. +omi$o não tem subida, ! tudo plano. +omo eu sou reconhecido ao +riador. ;ara mim, tudo isso ! uma
$randeza muito $rande.

crescentou, desvanecido:

— Eu sou verdadeiro como espelho. Eu sou mais caro. iquei satisfeito, meu peito encheu de carbono. Bote,
caninana3

 fam%lia do velho +hico de lmeida ficou a$radecida.

a manhã se$uinte, houve enorme aflu=ncia ao tu$rio. Casta dizer que uma ponta de $ado foi varada pelos
espetos, sobre o braseiro da vala estreita, aberta no chão. o primeiro paciente, inteirinho icter%cia, cara de $irassol,
"os! #aria ensinou a infal%vel simpatia:

— Bista uma roupa amarela pelo avesso, deite de costas na $rama e mande cortar nela a sua silhueta. 0 sol chupa a
doen)a. /e não chover, sara.

Deparando um menino de bra)o quebrado, "os! #aria moeu carvão, misturou 1 $emada e passou cuidadosamente
no membro que encanou com bambu. ;ai e mãe a$radeceram de 'oelhos a $ra)a recebida. &ratou das varizes de
uma anciã apenas com vinho e azeite.  ferida de uma rapari$a, com un$üento azeite rosado, cera bela, flor e
esterco de cavalo. ;ara torceduras, fervia $ua numa vasilha, virava-a de borco numa bacia e punha sobre aquela
uma tesoura aberta em cruz. #unindo-se de pano, fio e a$ulha, costurava o mal, enquanto eram pronunciadas as
se$uinte palavras:

— 0 que ! que voc= temA

— Destroncado.

— Destroncado mesmo eu coso. +oso nervo torto, carne ama$uada e osso quebrado.

0 dilo$o se repetia mais duas vezes, tendo "os! #aria de responder durante a primeira e a se$unda vez,
respectivamente: coso carne ama$uada, osso quebrado e nervo torto e coso osso quebrado, nervo torto e carne
ama$uada.

De maneira id=ntica, curava sapinho. Empunhava um facão, uma vara de assa-pei*e e, cortando-a, dialo$ava:

— 0 que ! que voc= temA

— /apinho.

— /apinho mesmo eu corto. +orto o rabo, cabe)a e meio.

Depois de dizer, na ltima vez, corto o meio, o rabo e a cabe)a, colocava o ramo para secar ao fumeiro do fo$o.

/entado na cepa do cômodo e*%$uo, p!s nus na terra fria, receitou para uma crian)a de narinas em bica, diri$indo-se
1 mãe:

—  senhora d= ch de 'asmim. marre um cachorro e não d= comida durante tr=s dias. +olha a titica branca, coe e
prepare a bebida.  tosse comprida fica curta e some.

o mo)o que tinha um pano amarrado 1 cabe)a com o n( debai*o do quei*o, recomendou:

— Esquente uma colher de pau no fo$o e encoste no incha)o. marre com uma pele de toicinho e, depois de vinte e
quatro horas, enterre a pele num formi$ueiro. H um tiro para cachumba.

#edicina matuta.

0 campon=s vive como pode, abandonado, naquele isolamento que acelera o mundo a marcha 1 r!. a sua mquina
de tempo, 1 Xells, vive no passado, na Fdade #!dia brasileira, 1s voltas com bar9es e ascetas da mis!ria. ão tinha
culpa daquele atraso. /e não houvesse latifndio, sesmariaG e se tivesse o dom%nio da casa verdeG se para habit-la
não pa$asse o pesado tributo da meia, da ter)a, tudo seria diferente. >averia produ)ão e riqueza, desenvolver-se-
iam a pecuria, a a$ricultura, o com!rcio, as finan)as, e cidades cachimbentas fume$ariam naquelas pla$as,
assinalando uma era de prosperidade. in$u!m mendi$aria empre$o, sem profissão e sem resid=ncia fi*a. ão
haveria um plebeu a errar pelos caminhos. #as os $overnos nem sequer co$itavam de uma reforma a$rria e
tinham os olhos fechados para o Cituruna.

ão ouviam os reclamos dos homens da ro)a. Essa a causa da esta$na)ão da economia, daquele isolamento e
alheamento 1 civiliza)ão. #uitas e muitas l!$uas de terrenos incultos, inaproveitados, a separarem, umas das outras,
as pequeninas cidades de pinho, adormecidas 1 sombra das araucrias. Bida mon(tona, ve$etativa, sem horizontes.
Bida social primitiva. bsolutamente nada de novo. /empre os mesmos ventos. +ampos e campos a se estenderem
1 medida que o via'or avan)ava em seu cavalo. Estrada carro)vel deserta, espremida por cercas de taipas,
marcando as divisas das vastas est2ncias. +om!rcio precar%ssimo, com trocas 1 base de sal e boi $ordo. a vila
paral%tica, apenas al$uns casebres, ferraria, boteco, balcãozinho de farmcia, porta de barbearia, a ermida no ponto
mais alto, um barracão de tbuas feito <rande >otel, e, 1s vezes, modesto teatrinho, de madeira, com frisas e
camarotes, funcionando aos sbados e domin$os. em padaria, a)ou$ue, nem olaria. unca a locomotiva fendendo
as campanhas, nunca a mquina revirando a terra. "amais o sermão prof!tico do apito da fbrica. 4aros en$enhos de
beneficiamento de madeira, mate e fumo — um tiquinho de pro$resso. 0 mercado nico do litoral, quase
inacess%vel. as pouqu%ssimas escolinhas, funcionando em pai(is espalhados pelos e*tensos munic%pios, havia falta
de mestres, de lousa, de livros, de cadernos, de lpis, e at! de alunos, porque as crian)as ro)avam e pastoreavam. 0
professor tinha de pertencer 1 fac)ão pol%tica dominante. >ospital não e*istia. s endemias se alastravam
livremente, como as hordas de bandoleiros.

a tribo, o m!dico ! o pa'!. ;ara o matuto, o m!dico e o pa'! são o curandeiro. "os! #aria curava tamb!m bicheira,
benzendo-a.6I8
/e al$um enfermo e*pirava em suas mãos, "os! #aria se 'ustificava a contento:

— 5uando Deus chama, o doente sobe da cama.

p(s as consultas, "os! #aria passou a narrar passa$ens de vida de +risto e aventuras de +arlos #a$no e seus
pares de ran)a.  certa altura, a voz se tornou mais alta, mais forte, emocionada:

— Bou contar como era a carta. ;restem aten)ão3 ;areceu-me uma noite que via diante de minha cama, uma
mulher, admiravelmente formosa, a qual me dizia: +onstantino, muitas vezes tens ro$ado a Deus que te desse
a'uda contra os turcos, que possuem a &erra /anta. ;ois se tanto o dese'as, faze isto que te di$o: procura ter da tua
parte +arlos #a$no, e mostrou-me um cavaleiro armado de vistosas armas, com uma espada na cinta, e uma
$rossa lan)a na mão direita, de cu'o ferro sa%am muitos raios de fo$o, e era o seu rosto muito belo, formoso e bem
disposto de corpo, a barba crescida, os olhos reluzentes, e os seus cabelos come)avam a embranquecer. Y au$usto
que nunca te apartas dos #andamentos de Deus: le$ra-te em "esus +risto, e lhe d $ra)as de todo o cora)ãoG ama
a 'usti)a, como tens sido nomeado na honra, para que Deus te d= perseveran)a do bem.

Enlevado, arrematou a hist(ria:

— oi assim que +arlos #a$no recebeu as chaves do /anto /epulcro e chorou como uma crian)a porque o /anto
/epulcro estava nas mãos dos infi!is.

S tarde, che$ou ao tu$rio uma comitiva vinda do munic%pio de +uritibanos, onde predominava a autoridade do
coronel lbuquerque. @ideravam-na, al!m de ;ra*edes, proprietrio de uma casa de ne$(cios, os rancheiros +hico
Bentura, +irino do /ul e "oaquim Bidal.

 id!ia sur$ira na venda de ;ra*edes. <ralha, um pelado muito falador, ao apro*imar-se do balcão, pediu:

— #ec= me d uma $arrafa de pin$a, um pacote de erva, um rolo de fumo, cem r!is de banha, e meio quilo de
fei'ão.

a mesinha do canto, Benuto Caiano, +astelhano, +oco e <idoca disputavam uma partida de truco, enquanto l
fora outros 'o$avam malha, esporte no qual &aquara era certeiro.

+hico Bentura che$ou e come)ou a fazer estardalha)o, dizendo que 4ocha lves, coad'uvado por lonso e Elias de
#orais, tratava de levar "os! #aria para /ão /ebastião das ;erdizes.

— Fsto não ! coisa que se permita — interrompeu Q! &i$re.

— Bamos tomar a dianteira e trazer o compadre pra c — su$eriu ;ra*edes, o que foi aprovado por todos.
aquele instante, foi constitu%da uma comissão que deveria, no dia se$uinte, levar o convite a "os! #aria.

—  b=n)ão — suplicaram os cavaleiros, tilintando as esporas.

— Deus aben)oe voc=s, meus filhos. Eu ' tinha recebido aviso do lto, que vinham me buscar para fundar meu
reinado de mil anos sobre a face da terra. Bou formar uma cruzada contra os infi!is, porque h de haver uma <uerra
/anta contra os miserveis, os e*ploradores dos cristãos. Bou lutar como +arlos #a$no.

0 mon$e, impressionando a todos os presentes, formulou um pedido, de modo imperativo:

— 5uem me se$uir vai entrar no c!u, nem que tenha mil pecados. 0 arrependimento limpa tudo. 5uem não me
en*er$ou aindaA 5uem tem olhos e não v=, não ! ce$o, ! asno. #e acompanhem quem quiser a salva)ão e a lei de
+risto. queles que se$uem a Deus, se pe$uem comi$o.

— Eu vou, eu vou, eu vou, eu tamb!m vou — repetiam as vozes.

Em todos c!us do Cituruna, soou o apelo do messias caboclo.

o outro dia, ap(s o chimarrão, rezas por despedida, 'untara as trapizon$as, a farmcia ambulante, e partira a
cumprir a missão sa$rada. ?ma caravana passava pelos campos, orando e entoando ladainhas num coro de vozes
desafinadas, lamurientas, desencontradas. ?ma romaria. En$rossava 1 medida que se apro*imava do destino. ?ma
procissão her!tica de oprimidos. S frente, o condutor e seu ca'ado, ladeado pelos cavaleiros e, formando a cauda,
uma leva de maltrapilhos.

— anticos3

— ;elados3

medrontados, os miserveis espiavam de lon$e.

 casa verde se iluminava. Estremecia o Cituruna. Encontrara um mon$e verdadeiro, o libertador, o escolhido, o
salvador, "os! #aria, o revoltoso.

Capítulo IV

&aquaru)u ! uma flor dourada. H o pere$rino riacho feito mon$e de barbas de espumas, bordão de pedras. H o
acampamento rebelde. H, afinal, a rancharia tosca tremulando ao vento, como pendão da terra. rraial-bandeira.
Candeira rota, mas $loriosa, espalmada no chão ondulado.

&aquaru)u ! uma aquarela camponesa, de tintas nativas, pinceladas por um sol sempre esplendoroso. +apital
revolucionria dos oprimidos.

&aquaru)u
servidão ! umadepinha
e farta de taperas
mis!rias, sedenta—depau, palha,
'usti)a. taipa.que,
<ente <uarida de camponeses
na 2nsia de liberta)ão,escorra)ados. <entenacansada
antecipa o futuro mente, da
'ul$ando-se numa nova Fdade de 0uro, num para%so terrestre criado por um mensa$eiro divino. <ente que vive os
dese'os, confundindo a fantasia com a realidade.
&aquaru)u ! um clamor, um $rito de socorro, um lamento. Cisbilho do c(rre$o. #as ! sinal de luta tocado no
tamboril, soprado no chifre de boi. H o caboclo empunhando fac9es de $uamirim e lan)as de bambu, contra o
latifndio, resistindo ao coronelismo, defendendo as riquezas da ptria. 4ota esperan)a, ne$ro vislumbre.

&erra do mon$e, &aquaru)u ! profecia.

— 4eduto — diziam as autoridades em +uritibanos, por!m a palavra nascera espont2nea na boca da caipirada.

0 povoado desabotoara como um roseiral na primavera. 0s adeptos de "os! #aria che$avam com a fam%lia e
traziam o que restava dos haveres.  trou*a, cabrita, meia dzia de aves. l$umas vezes, uma ponta de reses, uma
vara de su%nos. #uitos vinham em visita a &aquaru)u, entre eles 4ocha lves, lonso, &avares.
&aquaru)u ! a #eca e a "erusal!m do sertão, capital dos pelados. "os! #aria — o seu ;rofeta, o +risto 4edivivo.

fora Eliazinho dos /antos, +hico e <uilherme Bentura, Elias de #orais, Qebinho, +irino do /ul, "oaquim Bidal e
al$uns rancheiros arruinados, o $rosso da popula)ão se compunha de pe9es e a$re$ados, estes e aqueles
confundidos com posseiros, tropeiros, tarefeiros, plebeus, operrios sem servi)o — antes empre$ados nas
companhias. Fsto e*plica o (dio devotado 1s empresas estran$eiras e a coron!is como o lbuquerque, e 1 repblica
por ele representada.

+amponeses que escapavam vivos 1s masmorras se refu$iavam em &aquaru)u e traziam, de triste lembran)a, cara e
cabe)a raspadas a navalha, 'ustificando a pecha infamante:

— ;elados3
5uestão de hi$iene, para evitar a prolifera)ão de piolhos, a raspa$em acabou se tornando um habito no reduto.

— anticos3 — diziam com assombro os 'anotas das cidades.

+entenas de pessoas ouviam narrativas b%blicas, hist(rias romanescas de +arlos #a$no e seus pares, pr!dicas,
preces.

+erta manhã, vindo a mando do coronel lbuquerque, deus-sol de +uritibanos, deputado estadual, che$ou ao reduto
um capan$a com uma ordem para "os! #aria. 5ue fosse imediatamente a +uritibanos, 1 casa do prepotente chefete,
a fim de atender uma enferma.

a roda do chimarrão, Qebinho, 4ocha lves, lonso, ;ra*edes e u$usto #oreira — o que sabia ler e escrever —,
todos aprovaram a altiva e inspirada resposta ao insolente:

— Di$a a seu amo que venha e tra$a a doente. #inha i$re'a ! a verdadeira. Eu tamb!m posso cal)ar o chão com
ouro e tive quinze anos de escola. Eu sou mais caro3 $ora que me en*er$aramA ão h nada de novo debai*o do
sol. /ou eu quem pode remover a pedra do sepulcro. o meu reino, soldado ! $eneral, coronel ! recruta. #inha
'usti)a não ! 'usti)a de sapo, rato e carrapato. /e quiser pedir perdão aos pobres e a Deus, eu perdôo e recebo no
meu rebanho, mas tem que ter arrependimento verdadeiro das des$ra)as que vem causando ao povo.

0 lacaio meteu as esporas no baio, chispou.

o dia se$uinte, toda +uritibanos comentava o fato.  afronta, o desafio 1 autoridade do bi$odudo mandão. 0
boticrio e*ultou e esticou a l%n$ua pela cidade. Fnchava o peito e iscava a matilha de (dios:
— +oronel, esse falso mon$e ! um charlatão anarquista. /e fosse santo, respeitaria um homem como o senhor, que
! 'usticeiro e competente. osso $rande deputado. Ele quer desmoralizar o $overno e os bons padres. ão entende
nada de rem!dios, não ! curandeiro: ! um feiticeiro.

0 boticrio falou tanto e fez tal campanha que +uritibanos s( se ocupava com o acontecimento. um riso, o
coronel lbuquerque via oculta a mofa, num cochicho, a alusão escarnecedora. <ritava com todo mundo, por
qualquer motivo mandava $ente para a cadeia. i de quem não tirasse o chap!u em sua frente. ão satisfeito com o
que mandava o dele$ado fazer, o que nomeara, acabou trazendo a +uritibanos um forte contin$ente policial
comandado pelo pr(prio chefe de pol%cia com o fito de atacar &aquaru)u e prender o desaforado.

#as a mata tem olhos e ouvidos, e "os! #aria en*er$ava o que se passava em +uritibanos, estava a par dos
preparativos b!licos.

0utrora, no Cituruna, havia necessidade de prote$er o rebanho de cavalos e mulas da apro*ima)ão dos ba$uais
selva$ens que transviavam a manada para o pampa, e os cavaleiros sulinos se punham em $uarda, rondando e
sondando. Eram estes os chamados bombeiros. E bombeiro passara a si$nificar espião.

"erôme, o velho pelado "erôme, cumpria a tarefa de bombeiro: ia vender mel e rapadura em +uritibanos e che$ava a
&aquaru)u com a cesta cheia de not%cias.

l!m dos soldados, contando com os ;ires e os +oletes, o coronel lbuquerque assalariava capan$as para destruir e
arrasar &aquaru)u.

Baqueanos eram chamados esses capan$as, termo que si$nificava $uias, pois como $uias eram contratados.
ntes do incidente com o coronel lbuquerque, &aquaru)u tinha apenas o aspecto de um aldeamento b%blico. 0
mais eram rezas e prociss9es. +om a i$re'inha ao centro, o lar$o do povoado fora demarcado quadrilateralmente
pelas santas cruzes, uma em cada 2n$ulo, formando o quadro santo onde os sacros of%cios se transformavam em
com%cios. "os! #aria relatava as fa)anhas de +arlos #a$no e dos doze pares de ran)a, profetizava, aconselhava,
receitava. li batizava, unia seres em matrimônio, e*orcizava, celebrava missas.

fora aquelas ' citadas personalidades, primeiras na hierarquia do sertão, a come)ar por 4ocha lves, tamb!m l
estavam em &aquaru)u muitos dos que haviam de se destacar nas defesas dos vrios redutos. "oão Bieira, ndrade
— o que fu$ira da cadeia —, @eandro ;alma, ;itoca, ;edro &eles, &aquara, +astelhano, <ralha, Delfino ;ontes,
cada qual mais convicto e decidido.

anticas eram as mulheres, entes cu'as vidas consistiam em carre$ar crian)as nuas nos colos, en$ravidar, rezar e
cantar ladainhas. &ransfi$uravam-se $enufle*as. 0ravam como quem se lamenta, cantavam es$ani)ando as vozes.
5uerubina impunha respeito e comandava as rezas. Qefa a$itava o povo, $esticulando e falando improp!rios,
descal)a e esfarrapada. +oncei)ão, que viera pela mão de Dad, chamava aten)ão pelos requebros, faceira,
l2n$uida, apetitosa... #as as que deslumbravam eram as vir$ens. s inspiradas, as que tinham poder divino.
;rincipalmente #aria 4osa. /ua companheira, Dorinha, ainda crian)a, era neta de Qebinho e 5uerubina. ?ma
caboclinha franzina, de cabelos lisos, pele embaciada, corpo es$uio, p!s disformes, ventre intumescido. mbas
nunca viram cartilha, lpis ou papel: s( conheciam o c!u e a mata. /abiam campear o $ado, ordenhar vaca, usar
espin$arda, cozinhar moran$a e fazer rapadura. mbas recebiam recados dos santos, dos an'os, e não se sabe se os
pares não sentiam cimes.

;ressentindo que a ira do coronel lbuquerque acabaria em $uerra, "os! #aria tratou de tomar provid=ncias e
insuflar o povo. Ss seis da manhã, ao meio-dia e 1s seis da tarde, como de costume, ' as pr!dicas se tornavam mais
violentas. natematizava a repblica como o re$ime dos opressores, que le$alizava a pilha$em, reconhecia as
sesmarias, doava lotes aos estran$eiros e enormes reas 1s companhias.
— 4epblica chefiada pelo coronel lbuquerque3 — e*clamava indi$nado.

chava-se capaz de instaurar um reino milenar de felicidades, sentia-se predestinado a se$uir o e*emplo de +arlos
#a$no. l$umas vezes se via invadido por aquela sensa)ão de pere$rino, um impulso dentro do peito, e caminhava
prec%pite por todo o reduto, sem saber por qu=, com dese'o de correr mundo. n$ustiado, a respira)ão ofe$ante,
empalidecia e suava frio. &inha uma nebulosa de pensamentos no c!rebro e de sentimentos no cora)ão. ;assava as
noites rezando, clamando pela prote)ão divina.

?m dia, vestido 1 +arlos #a$no, se$undo supunha, com o camisolão branco e enorme facão 1 cintura, reunido o
povo no quadro santo, recebeu sobre a cabe)a $risalha uma coroa de folha. oi simples a cerimônia. "os! #aria se
a'oelhou e #aria 4osa lhe disse:
— Em nome de Deus, de são /ebastião, de são "oão #aria e de todos os santos, proclamo o senhor "os! #aria o
nosso imperador3

/alvas de tiros, $ritos de aclama)ão, marcaram o acontecimento.

Bisto assim imponente, $arboso, ma$n%fico, não se poderia conden-lo com aquelas informa)9es dos missivistas
que importunavam os 'ornais: "os! #aria procede de um contin$ente procedente das ilhas das +obras, foi soldado
do V.U esquadrão, no ZJ do JV.U re$imento de cavalaria, trata-se de um a$itador, homem de instintos $uerreiros,
verdadeiramente indomvel, ! um %ndio com talvez IR anos de idade, estatura elevada, barba ampla, cabelos caindo
sobre os ombros, ma$ro, direito, e ! natural de Com "esus da Bacaria, fazia parte das tropas de "uca &i$re, foi muito
denodado e respeitado.

o findar uma ora)ão, em a)ão de $ra)as, "os! #aria anunciou a forma)ão duma $uarda de honra: os doze pares de
ran)a. Escolheu-os entre os caboclos mais robustos e valentes, distribuindo-lhes as melhores armas e os mais
velozes corc!is. ;or par entendia uma dupla, e assim a $uarda se constituiu de vinte e quatro a$uerridos cavaleiros.
+omandavam-nos @eandro ;alma e "os! &i$re, o corneteiro. ntoninho e Deodato estavam entre eles, e tamb!m
ndrade, para vin$ar a fam%lia morta e ressuscitar seus direitos. +ada um dos pares recebeu das mãos de "os! #aria
uma ora)ão que os tornava invulnerveis 1s balas inimi$as, invenc%veis. ndrade tinha-a no patu.6L8

p(s desfilarem os doze pares de ran)a, dando tr=s voltas no quadro santo e tendo 1 frente as vir$ens, "os! #aria
anunciou a composi)ão de seu $overno:

— Em nome da monarquia e de "esus /alvador, nomeio Qebinho, secretrio-$eral do <overnoG +hico Bentura,
ministro da <uerraG ;ra*edes, ministro da azendaG "oaquim Bidal, ministro da $riculturaG e, lonso, comandante
$eral3
oi um alvoro)o no reduto. 4essoavam salvas de tiros, toque de cai*as, buzinas de chifre, vozes se elevaram aos
c!us.

— Biva são "os! #aria3

— Biva a monarquia3

— Cendito se'a o /enhor.

— i, "esus, #aria, "os!.

— m!m, "usuis...

— s leis de Deus vão imperar na face da terra.


— Estão se acabando os peludos.

— Fnhô, sim.

ntes, desempenhavam fun)9es apenas Elias de #orais, 'uiz de paz e comandante das rezas, e u$usto #oreira, o
escrivão. Este, sabendo ler e escrever, tamb!m redi$ia cartas e ora)9es. "os! #aria distribu%a b=n)ãos aos nubentes,
enquanto Elias de #orais celebrava o matrimônio. ssistindo 1 cerimônia, ntoninho e #aria 4osa trocavam
olhares comprometidos, ardentes, contratando npcias. ão casavam por não terem ainda pedido o consentimento
do mon$e. Ela era uma vir$em, santinha de &aquaru)u, não se pertencia. 0s noivos vinham a cavalo, no quadro
santo, acompanhados pelos padrinhos, escoltados pelos doze pares de ran)a. peavam e se a'oelhavam aos p!s da
cruz de santo ntônio. u$usto #oreira, o escrivão, fazia uma cruz nas costas das mãos dos noivos, e Elias de
#orais os declarava marido e mulher. ntoninho e #aria 4osa viviam, cheios de dese'os, o acontecimento, e se
uniam em pensamento. Deodato, ma$oado, despeitado, esposava a vin$an)a.

inda naquela tarde, +hico &aquara $anhou o posto de comandante dos entreveros e "erôme o de a'udante do
comando $eral.

abor, o mulato abor, trou*era a chirua Qabela, a que ria fcil, contente da vida. Qabela ouvira dizer que os filhos
dos pobres haveriam de ter o que comer e o que vestir. Era essa a razão de sua obsessão. #as, para que nasceu a
ne$ra, senão para lavar a roupa dos ricos nas pedras do arroio, e criar rebentos raqu%ticos que herdam trabalho e
mis!riaA +onsolando-se, repetia: que tem, m(iG quem não tem, m(i da mesma forma, porque no fim todos ficarão
i$uais. 4efu$iara-se em &aquaru)u e, com as outras mulheres, levantara em volta do reduto uma formidvel
muralha de ladainhas.

abor, o capitão abor, tinha por missão arrebanhar o $ado e traz=-lo para o acampamento. +umpria o encar$o
com persuasão ou com viol=ncia, de acordo com as circunst2ncias. &ravava tiroteio com $uardas de 'a$un)os, mas o
piquete sempre voltava ileso. Balente de fato, tornou-se o terror dos fazendeiros e sua $ente. ervos e ossos
frinchavam-lhe a pele descarnada. #a$ro, de bra)os e pernas lon$as, e o palet( enorme, os canos altos das botas
aumentavam-lhe o tamanho.  ener$ia morava-lhe nos olhos fortes, vibrantes, como dois brilhantes a coruscarem
numa po)a, olhos a reful$irem sob um chapelão de boiadeiro, cu'as abas formavam um tri2n$ulo com a ponta ca%da
sobre o nariz de fornalhas. 0lhos l no fundo. E sob a camisa, aberta 1 altura do peito, a medalha de ossa /enhora
das <ra)as.

"amais dei*ava faltar a b(ia em &aquaru)u, fosse como fosse.

+hico &aquara realmente lembrava o bambu, tão alto, tão seco. ?m p=ndulo. +laro e de bi$odes cor de palha.
@evara, at! a$ora, a vida erradia do a$re$ado, a choupana $ravitando ao redor da rstica mansão do estancieiro. 
ter)a na ro)a de milho e fei'ão, al$uma r=s no pasto do patrão, duas ou tr=s porcas no chiqueiro. ndava com a
mudan)a nas costas: saco, boti'as, a prole na cauda. #ontava casa num upa: uma cabana de palmito mobiliada com
tocos de can$erena e meia dzia de tbuas. /abia lidar o $ado, livrar os terneiros de vermes, marc-los quando
faziam dois anos, castrar os touros aos quatro e dei*-los en$ordar no capim mimoso. /empre fora mais peão que
tropeiro, apesar de inconstante como ca'ado de mon$e. ?sava botinas, um len)o rubro ao pesco)o, possu%a um
morzelo e $ozava merecidamente a fama de valente. ?m dos mais respeitados na casa verde. +erta vez, respondera
'ri, por!m fora absolvido, se$undo decidiu o conselho de senten)a: por ter praticado o crime com priva)ão dos
sentidos e da inteli$=ncia. &emido, tinha um prest%$io sem conta. Com na faca e no tiro, muitas lendas corriam a
seu respeito. &rabalhador e chefe de fam%lia.

ssim acontecia com +hico &aquara, o comandante do entrevero. ;articularmente, ele atribu%a as pr(prias fa)anhas
1 ora)ão de são "or$e, que rezava em se$redo, antes e at! no momento do cote'o.6Z8

/urpreso e comovido ficou "erôme, a'udante do comando $eral3 Embora curandeiro, adivinho, orculo, não previra
tamanha honraria. alhara pela primeira vez... #as "os! #aria sabia fazer 'usti)a. "erôme era um aut=ntico chefe
pelado. os pobres, como ele pr(prio, inspirava confian)a paternal. Bivo, com os filhos correndo o mundo que
$ira eternamente, tornara-se solitrio. #al conhecia netos e bisnetos. ?ns tempos tentara a sorte de posseiro,
ocupando pequenino lote, por!m um coronel mandara e*puls-lo e oferecer-lhe sete palmos de terra. Fsto aconteceu
quando camponeses a$raciados com t%tulos de dom%nio do imperador D. ;edro F, por atos de bravura na <uerra do
;ara$uai, foram despe'ados como intrusos. s companhias e os coron!is tinham fome canina das riquezas do
Cituruna. 0ra che$avam os vaqueanos, ora os soldados, repetindo-se as cenas de vandalismo. +asas e ro)as
queimadas, a cria)ão roubada, homens torturados, mulheres violentadas. /em a esposa, que morrera por ocasião de
um parto, "erôme tinha um palcio em &aquaru)u. ;alcio, sim. +astelo de tatu ! a toca, e "erôme $ostava de seu
ranchinho sem, ao menos, uma tarimba. E*ibia uma $enerosidade encantadora. <ostava da bicharada e dormia no
chão, com uma por)ão de $atos friorentos, al!m do cachorro &rabuco, o que latia pre$ui)a e vivia com os fu)os no
esterco. +om a sua nomea)ão, a massa delirou. "os! #aria dedicou-lhe uma ora)ão que se tornou obri$at(ria para
todos.6R8

Entre enfermos, rancheiros arruinados, a$re$ados, arrieiros, tarefeiros, havia mais de setecentas pessoas em
&aquaru)u, sem somar aquela crian)ada raqu%tica que comia terra em frente aos casebres, sem contar os que vinham
em visita.

&aquaru)u nascera como uma $reve, uma resist=ncia, uma festa de espoliados. >omens e mulheres abandonavam os
servi)os nas fazendas, nas ro)as, nas matas, nas serrarias onde s( recebiam vales que não che$avam para pa$ar os
armaz!ns e das quais dificilmente podiam escapar, iludindo a vi$il2ncia da $uarda especial.

s reivindica)9es de &aquaru)u ultrapassavam os limites da realidade, por!m as de carter econômico tinham ra%zes
no solo. ão contavam em pro$rama, em manifesto, mas estavam escritas no pr(prio ar.

0 ministro da azenda or$anizou um abai*o-assinado para an$ariar fundos e pedindo a instaura)ão do re$ime
monrquico.

Encabe)aram-no os ministros e 4ocha lves. #il e tantas assinaturas, em cruz, foram colhidas.

pesar de tudo, ;ra*edes, que era um comerciante, titubeava. ão se sentia encora'ado a abandonar os bens e a
propriedade. >avia pa$o adiantado uma $rande encomenda que fizera a uma firma de lorian(polis: repeti)9es,
cartuchos, sal, fazendas, armarinhos. /abia que, a casco de mula, o transporte demoraria, mas precisava receb=-la.
rei /ilv!rio foi ter com ele em sua casa de ne$(cios e o advertiu:

— +uidado com o coronel lbuquerque. Est brabo como uma on)a. Boc= pode se arruinar se$uindo esse falso
mon$e. Fsso não ! santo, nada: isso ! santo do pau-oco.

#edo não. #as se$ui-lo a outras pla$as, tamb!m não.

De repente, o arraial estava em p!-de-$uerra.

&aquara e*ercitando o povo no entrevero. 4ufavam tambores de pinho e be*i$a de boi. Cuzinas tocavam forma)ão,
ataque e retirada. os intervalos, "os! #aria chamava os matutos, se a$achava e narrava feitos ima$inrios de
+arlos #a$no e dos doze pares de ran)a, que venciam monstros e $i$antes, em defesa da reli$ião e do imp!rio.
o quadro santo, sucediam-se missas, com%cios, marche-marche, combates simulados. 0s cavaleiros armados com
lan)as de taquara e os infantes com fac9es de $uamirim.  maioria não possu%a arma de verdade. #as o (dio munia
a rebelião. &ransparecia nos $ritos:

— Entra, peludo3

— i, miservel3
— & morrendo, des$ra)ado3

— ;!-redondo ! churrasco no ferro branco3

$ora as reivindica)9es não pairavam apenas no ar mas tamb!m nas pontas das lan)as e fac9es, e bordados em
forma de cruz nas bandeiras. 0 revoltoso sublevara o povo.

o meio do quadro santo havia uma i$re'inha, mas tudo se passou l fora.  multidão de pros!litos fora disposta de
modo que os homens ficassem separados das mulheres, e as crian)as dos adultos. 4ei caboclo, imponente,
ma'estoso, "os! #aria che$ou com as vir$ens, uma em cada lado, escoltado pelos doze pares de ran)a. #ontados
em belos corc!is, arreados a $osto, fizeram tr=s voltas na pra)a, sob estrondosa aclama)ão. peavam em cada canto
do quadriltero, para bei'ar as cruzes. 5uando o revoltoso falou, o sol ardia nos rostos bronzeados. /ucediam-se-lhe
as id!ias como rel2mpa$os. Em p!, defronte 1 cruz, se lembrava das $rutas distantes, das lon$as caminhadas, da
fadi$a, da fome, do frio nas manhãs de $eada, do ardume das feridas abertas nos p!s. 4ememorizava cenas de
horror que presenciara: fam%lias de camponeses massacradas por fac%noras. >omens que não empunhavam armas, e
sim cabo de en*adas, que tombavam atirados pelas costas, surrados a cacetadas e coronhadas. >omens com nariz
amputado, orelhas decepadas. 0u ferrovirios morrendo nas tendas infectas dos acampamentos. 0uvia $ritos
estertorosos de mães, choros de crian)as, lamenta)9es. Bia-se na prisão, a pão e $ua. &ransfi$urava-se. +om as
mãos crispadas, lan)ando meteoros pelos olhos, falava como se $overnasse o universo:

— H preciso fazer penit=ncia3 H preciso que todos os que querem o fim da in'usti)a e querem $anhar o c!u fa)am
parte do meu e*!rcito sa$rado. i daqueles que não me ouvirem e obedecerem, que são inimi$os dos dez
mandamentos, que vivem des$ra)ando e torturando os pobres, que roubam as terras e p9em fo$o nos ranchos dos
bu$res. arei uma $uerra santa chover raios sobre as leis da repblica, reduzindo castelos a tapera. Bou fazer a
humanidade feliz, implantando a monarquia no mundo e $overnando os meus povos com as leis divinas. Bou varrer
os peludos da face da terra3 0s meus povos devem vir em minha companhia para verem as pedras de +uritibanos
chorarem san$ue3 ão vou dei*ar pedra sobre pedra. ?ma bola de fo$o vai aparecer no c!u e matar os miserveis.
Bou fazer os miserveis chorarem brasas. 0s irmãos de cren)a que tombarem na minha santa cruzada, ressuscitarão
e viverão no meu reino, terão a vida eterna. Estamos no s!culo da liberdade, não pode haver mais escravidão. arei
uma lei de terras, distribuindo lotes aos pobres. 5uem for meu soldado, não precisa de dinheiro, nem riqueza, nem
or$ulho. ?m homem não deve viver 1 custa do outro. in$u!m deve possuir mais do que o pr(*imo. +ada um deve
viver do trabalho das pr(prias mãos. Fsto aqui tamb!m ! uma i$re'a. ão valem nada os sacramentos dos padres,
ami$os dos peludos.  consci=ncia ! a b%blia verdadeira. ão quero o san$ue, mas o san$ue ser derramado, porque
haver fome, peste e $uerra. #eus povos serão prote$idos pelo manto sa$rado de ossa /enhora3

0 sermão foi uma chispa de fo$o a acordar e a estremecer o sertão.

;ara "os! #aria, matuto no modo e nas concep)9es, o Cituruna era o mundo, a vasta casa verde universal.
+uritibanos, vilare'o situado no alto duma colina, por ser a sede do munic%pio e da comarca, covil do coronel
lbuquerque, afi$urava-se-lhe o baluarte republicano, capital dos peludos. icava a doze l!$uas de +ampos ovos,
alcan)ada por caminho de muar, com uma popula)ão de quinhentas e tantas pessoas. ;ossu%a dois pr!dios de ti'olos,
um do coronel lbuquerque e outro do doutor promotor, al!m duma centena de casinholas com os fundos em
hortali)as contornadas por rvores frut%feras. &oda de pinho. o edif%cio do coronel lbuquerque funcionava a
c2mara de vereadores e a pol%cia.

ão obstante a a)ão do boticrio, havia l muito adepto de "os! #aria. /( os dependentes, os lacaios, eram
partidrios do coronel lbuquerque. ão pouca $ente procurava dissimular, a fim de evitar perse$ui)9es. /eu
principal adversrio pol%tico, o coronel >enriquinho, abri$ava em sua fazenda loresta inmeros in'usti)ados do
munic%pio. inda entre os habitantes de posse de +uritibanos, vrios se$uiam o revoltoso. +omo ;aulino ;ereira,
talvez o comerciante de maior prest%$io no lu$ar. 0utros como +hico ;ires e lfredo +olete, coronel9es e
fanfarroneiros, pensavam em usufruir vanta$ens com a situa)ão e faziam planos de aliciar $ente para receber
dinheiro do $overno. 0 primeiro, campeão da $abolice, 'actanciosoG o se$undo, (timo bebedor de pin$a, trovador-
sanfoneiro. mbos pretensamente valentes, e*ibindo cora$em na vestimenta, no espalhafato. Este ltimo, crescendo
em import2ncia, queria diri$ir a pol%tica no munic%pio. ora peão, mas enriquecera ao casar com uma viva
riqu%ssima, e a$ora possu%a fazenda nas imedia)9es do lu$ar chamado +orisco.

em do Cituruna +uritibanos era centro.

#as o mundo do pelado não ! tão $rande, nem uma bola. @imitado por rios, matas e montanhas, termina num bre'o
imenso, num perau sem fundo. Em cima, o c!uG embai*o, o inferno. 0 mundo ! a terra, o rancho, a chirua, o capiau.
bran$ia, apenas, os povoados mais pr(*imos.

0s mon$es profetizaram a $uerra. De fato, o mundo inteiro se a$itava no preldio de $rande catstrofe. ;roduzindo
em e*cesso ou desprovidos de mat!rias-primas, os pa%ses imperialistas co$itavam da conquista, pilha$em e partilha
do $lobo. 0s povos alme'avam a paz, mas os $overnos traiam os povos.

o Crasil, onde se abolira a escravidão e se passara 1 servidão, o saque se processava por meios suas(rios.
&aquaru)u ! uma resist=ncia, mas o mundo do pelado ! o Cituruna, a $uerra do pelado ! a $uerra do +ontestado. /e
em +uritiba e lorian(polis s( os poderosos e os prote$idos para si le$alizavam as terras, se o poder pblico doava
lotes aos imi$rantes rec!m-che$ados da Europa, se a ?nião concedia enormes reas 1 @umber e 1 4ailOaP, esta
fazendo a medi)ão a seu modo, como por cobro 1 situa)ão, senão com uma santa cruzadaA

#as o que importava em +uritibanos era a desforra do coronel lbuquerque, a vindita do boticrio.

+om a sucessão dos tiroteios e o crescimento da a$ita)ão, Cischap, o $rin$o diretor da @umber, tele$rafava a Deus
e ao diabo. &aquaru)u ! uma amea)a permanente, e*i$imos provid=ncias imediatas. 0s da 4ailOaP antecediam
Cischap. ?nião da Bit(ria, ;almas, +uritibanos, &r=s Carras, +a)ador, @a$es, +anoinhas e outras cidades fediam de
pol%cia. 0 coronel abr%cio, proprietrio da fazenda +hap!u do /ol, com seus vaqueanos, se empre$ara como
$overno do ;aran. +he$ara de ;onta <rossa e reunira sua $ente em ?nião da Bit(ria, em cu'as cercanias tinha a
est2ncia. &ropas do E*!rcito ' se faziam representar na repressão ao movimento. Em +uritiba, o 'ornal dos
+amar$os,  4epblica, (r$ão do ;artido 4epublicano ;aranaense, estampara em sua primeira p$ina o arti$o: 0
dia, com os subt%tulos qui e l fora, 0 @evante de +uritibanos. De in%cio, dizia:

>abituado 1s intempestivas muta)9es que se operam na pol%tica e at! mesmo na vida social deste pa%s, verdadeira
boite de surprise, o povo não mais estranha fatos como o de +uritibanos, que est determinando provid=ncias do
$overno no intuito de abafar esse movimento ao qual se pretende dar um carter de amea)a 1s institui)9es.

0 povo observa e ri, pois acha, imposs%vel que tamanha a$ita)ão b!lica tenha s( por fim bater um bando de
caboclos fanatizados e que, se armados, terão quando muito armas de tipo primitivo, talvez ca)adeiras e as vul$ares
pistolas de sertane'o.

E, ap(s outras considera)9es, conclu%a o comentrio:

 ins%dia, se houver nessa questão, não apanhar desprevenido o ;aran, que est convencido de haver um se$undo
fim em todo esse aparelhamento para debelar um levante que, a ser real, não reveste import2ncia al$uma.

0s bombeiros levavam as novas a &aquaru)u. >omens que vendiam mel, mulheres que vendiam pa)oca. "os! #aria
espetava um ataque. &inha ci=ncia dos preparativos, da presen)a tamb!m em +a)ador de dois contin$entes federais
de cavalaria. nte a imin=ncia de fatal desfecho, numa tarde fria e nebulosa do m=s de setembro de JKJ7, durante a
concentra)ão da tardezinha, consultou as vir$ens, ambas ladeadas pelos doze pares de ran)a:

— Bir$ens do meu reino, quais são as ordens dos santosA #aria 4osa respondeu:
— Bai come)ar uma $rande $uerra, com muita fome e peste. 0s peludos v=m vindo com o fo$o do inferno. s
fam%lias devem ir pra casa e ficar escondidas, pros peludos não assassinarem os inocentes. /ão /ebastião e /ão
"or$e ficarão defendendo o reduto. /iô "os! #aria vai via'ar de &aquaru)u, levando o trono sa$rado pelo mundo.

 mocinha pitonisa, a vir$em, de branco como uma noiva, e*primira os pensamentos e os dese'os dos chefes
pelados. E se$uiria com o mon$e e com os doze pares de ran)a, pois entre estes estava ntoninho, que formava do
lado de Deodato, ambos atrs dos comandantes ;alma e Q! &i$re.

a manhã se$uinte, &aquaru)u estava deserta, abandonada. 5uando a pol%cia e a 'a$un)ada che$aram, o coronel
lbuquerque e o boticrio ficaram decepcionados. /em v%timas, nin$u!m pôde relatar proezas em +uritibanos. Era
como se não tivesse havido nada.
Disperso entre os casebres de rach9es de pinho pelos campos, na sua vida habitual, o povo fin$ia i$norar os
acontecimentos, de bico calado. 5uando, no caminho, o coronel lbuquerque inda$ou a um ancião de lar$o chap!u
de palha e que usava bordão, um compadre de "os! #aria, se sabia onde estava o falso mon$e, lo$rou a resposta:

— ?ai3 &em farso mon$e por aquiA unca vi um, tinha vontade de v=...

+omo o interlocutor dese'ava saber qual o caminho para o &aquaru)u, o campon=s esticou o bei)o e ensinou:

— H ali. Banc= vira pra riba, d num pau oco, desce pra direita, pe$a um *a*im, quebra uma l!$ua e meia, passa um
mato, v= um pinheiro torto, dobra e vai direito...

"os! #aria estava lon$e, evitara as matan)as do coronel lbuquerque, despistara a pol%cia e, rumando para o sul e
do sul para o oeste, che$ara a passar pelas barbas do d!cimo quarto re$imento, que tinha sede em +a)ador. Dorinha
ficara, mas #aria 4osa acompanhava o mon$e e seus pares. S beira dos arroios, nos cap9es de mato, apeavam da
animlia, comiam e rezavam. arofa e pinhão cozido não faltavam. "erôme e outros faziam a p! o tra'eto. a lon$a
'ornada, ntoninho carre$ava o orat(rio e Deodato empunhava a bandeira da santa cruzada, 1 frente dos nobres
cavaleiros, cu'os comandantes ladeavam o mon$e e a vir$em. @ atrs, sombra do dono, o cachorro &rabuco,
l%n$ua estirada entre os dentes.

5uando se encontrava em territ(rio 'urisdicionado pelo ;aran, "os! #aria recebeu num pouso o influente posseiro
#i$uel ra$oso, velho conhecido que for)ara sua liberdade quando ainda se achava recluso, e que o convidou a
estabelecer acampamento em Frani, a quinze l!$uas da cidade de ;almas. oi l que, num terreno cercado por matas
e cortado de san$as, cap9es e contrafortes da serra &aquara Berde, entre os rios +hapecozinho, "acutin$a e ?ru$uai,
se formou o aldeamento.

CAPÍTULO V

?nião da Bit(ria fora sempre uma cidade tranqüila. +onstru%da de pinho, casas em forma de cai*as, telhados
cônicos, uma porta e 'anel9es de frente, um em cada sala, estas separadas pelo corredor. s primeiras moradias
eram cobertas de palha ou tabuinhas, mas o violeiro <uara, fundador do lu$are'o, fabricara as primeiras telhas

porque de sapateiro
circundada de serras,selinda
transformara
com o &ememque
oleiro.
Ber,chavam-na bela, sobran)ada
lu$ar de deslumbrante peloDistava
panorama. $randebastante
de +uritiba, o F$ua)u, e
das mais
pr(*imas, li$ada por estrada de centenas de quilômetros. #as ?nião da Bit(ria desfrutava de e*celente situa)ão
$eo$rfica, entroncamento rodoferrovirio.
Entreposto de com!rcio — diziam satisfeitos os fre$ueses dos bares da rua JI ou da barbearia e bilhar da ;rudente
de #orais.  falada Estrada Estrat!$ica ia dali para ;almas.

 vida do povo transcorria calmamente, apesar de passada aquela !poca em que s( se atravessava o F$ua)u pela
balsa e as mercadorias desciam pelo rio em lanchas e canoas. 0s car$ueiros que levavam sal e outros arti$os para
;almas ' não eram mais alvo de ataque dos botocudos. inda se comentava muito a vida do coronel mazonas,
prefeito durante apenas trinta anos.

Ele preocupava-se com o testamento que constantemente modificava. @evara anos a redi$ir o intr(ito, no qual
pretendia demonstrar a alta linha$em da fam%lia. +ome)ara o trabalho no dia em que che$ou 1 sua casa o primeiro
piano de ?nião da Bit(ria. os dias de tocata, l se reuniam as mocinhas, todas candidatas do concurso de beleza
do semanrio #iss9es. 4osinha, +ec%lia, EdOi$es, Qizinha e outras. essas ocasi9es, $ostava de e*ibir aos
convidados o honroso documento firmado pelos membros da +omissão Crasileira para a Demarca)ão de @imites
entre o Crasil e a r$entina, que consistia nuns versos compostos por al$u!m que assinara . de +astro e que,
$eralmente, a professora @eocadinha declamava:

0 pro$resso ! uma for)a que não pra,

Est no alto mar, est no /ahara,

Em toda parte est,

<ravitando coos c!us, voa coos ventos

E dilatando a esfera aos pensamentos

 luz tamb!m lhes d.

— Esp%rito trabalhador — difundia sua opinião sobre ele o escrivão, a preparar a erva na cuia.

as rodas de chimarrão, formadas nos bares, no f(rum, na farmcia e nas resid=ncias dos coron!is, falava-se muito
nele e no pro$resso de ?nião da Bit(ria. E tamb!m no pre)o do $ado, da madeira, em requerimentos de terras
devolutas ocupadas por intrusos, nos novos vapores &upi e Crasil, na fbrica de cerve'a 4io Cranco, situada no
bairro de &ocos, na instala)ão do munic%pio de /ão ;edro de #alet, na nomea)ão do fazendeiro #arcondes como
tenente-coronel da 7V.[ Cri$ada da +avalaria da <uarda acional. Bez ou outra, eram lembrados nos bate-papos as
enchentes do F$ua)u.

4ecordava-se freqüentemente a passa$em do profeta "oão #aria. ão s( o comerciante /erafim, entendido na arte
de curar, comparecia ao morro da +ruz e sim toda a popula)ão pobre ia l fazer promessas, render $ra)as, rezar e
acender velas. &al espetculo não a$radava a frei /ilv!rio, o presti$ioso capuchinho inve'ava o mon$e. Embora se
tornasse tamb!m fi$ura lendria. &inha poderes. +erta vez, um comerciante que estava com um olho muito inchado
e inflamado, chamou-o para curar um filho. 5uando frei /ilv!rio che$ou, lhe disse:

— ;adre, meu pi est tentado.

— Bamos ver.

0 mo)o amarrado, frei /ilv!rio fez uma prece e per$untou:

— 5uantos demônios temA

0 franciscano orava, benzia e tornava a inda$ar:


— 5uantos demônios temA

— &r=s.

4epetia a per$unta e obtinha nova resposta:

— ?m3

— Em nome de Deus, saia3

rei /ilv!rio curou o menino apenas com sua presen)a e a ladainha de todos os santos.  mãe informou a ori$em da
doen)a do filho:

— Ele teve isso na encruzilhada...

Então o capuchinho passou a benzer o olho do comerciante por sinal — muito usurrio. &anto que se recusara a
tomar uma assinatura do semanrio local, ale$ando que não podia porque estava com o olho inchado e inflamado.
0 poeta do 'ornal se vin$ou e publicou uns versos numa das p$inas:

/e a comissão conhecesse

 for)a desse usurrio

;unha-lhe lo$o, na cola


0 nosso amado vi$rio.

<aranto que o reverendo

0 olho bom consertava

Dei*ando-lhe o outro olho

o 'eito que ' estava.

rei /ilv!rio tomava parte nas maiores festas da cidade, mas achava que o povo não $ostava de missa e sim de
divertir-se. l!m disso, havia sempre a ma)onaria. Esbaldava-se contando casos de des$ra)as sucedidas a ma)ons,
por!m sentia de retorno a campanha. #as as duas festas da cidade eram cat(licas. ?ma, a suaG outra, a de /inhana
Cita, no bairro de &ocos, onde tamb!m havia churrasco, fo$uet(rio, fandan$o e chinfrim. &odavia, nada se
comparava 1quela que realizava em louvor de ossa /enhora da Bit(ria, a santa padroeira. 5ue felicidade ver o
povo se preparando, as damas de caridade an$ariando prendas, as senhorinhas costurando vestidos, os mo)os
encomendando fatiotas. #estres ;epe e @eopoldino levavam meses ensaiando marchas, valsinhas, ma*i*es e
dobrados. +ada qual procurava e*ecutar mais perfeitamente a +abocla do +a*an$. &udo ale$ria, risos, flores.
rei /ilv!rio $al$ava no seu manso burrinho o morro da i$re'inha e, dos alfor'es pendurados nos arreios, tirava as
alfaias para os santos of%cios. 0s coroinhas bimbalhavam os sinos que chamavam o povar!u. #ais importante que a
missa e a novena, era a quermesse.

0 assunto mais palpitante de ?nião da Bit(ria vinha sendo o do lit%$io de fronteiras entre o ;aran e /anta +atarina.
Fsso desde o tempo da inau$ura)ão da ponte e dos inspirados versos do professor /erapião. 0s moradores
alimentavam a esperan)a de que a cidade seria a capital do Estado das #iss9es, que haveria de ser formado pelo
territ(rio entre os rios F$ua)u e e$roG a sudeste, a serra do #ar, seus contrafortes e o rio das +anoasG ao sul, o
?ru$uaiG e a oeste os rios ;eperi-<ua)u e /anto ntônio. undou-se em JKJJ a "unta <overnativa do Estado das
#iss9es, composta pelos coron!is mazonas e +leve, al!m dos representantes de ;almas, +level2ndia e 4io e$ro.
0 Dr. /ilva, o intelectual considerado $rande escritor e 'ornalista, fundara o hebdomadrio #iss9es, que defendia a
causa. > pouco tempo, provocara sensa)ão o arti$o em sua primeira p$ina:

H o se$uinte o profundo e*certo po!tico que a popula)ão desta cidade aclamou como o >ino das #iss9es e que,
reza a lenda, foi a inspira)ão sublime de um brasileiro ferido no campo da batalha que ao lhe ser amputada uma
perna, proferiu-o num ras$o admirvel de eloqü=ncia:

0u morre o homem na luta

eliz, coberto de $l(ria,


0u sur$e o homem com vida,

#ostrando em cada ferida

0 hino de uma vit(ria...

0 $overno do ;aran firmara um pacto com a 'unta: se o /upremo &ribunal desse $anho de causa a /anta +atarina,
a +omissão de @imites apoiaria aquelas pretens9es. #as, nas sess9es do clube polo, presididas pelo Dr. /ilva,
antes das declama)9es, os discursos defendiam os direitos do ;aran sobre aquela re$ião dadivosa com que Deus
aquinhoou a brava $ente das verde'antes araucrias.

— #iss9es, capital ?nião da Bit(ria — diziam consi$o pr(prios os fazendeiros, os comerciantes, os moradores.
t! entre os coron!is, a e*emplo do que ocorria noutras cidades do Cituruna, havia descontentamento e cr%ticas ao
$overno da ?nião, por ter cedido reas 1 @umber e 1 4ailOaP. #as os camponeses pobres se quei*avam de tudo e
de todos. Disso e das doa)9es aos imi$rantes polacos, alemães e italianosG disso e da $an2ncia dos coron!is.
4ealizavam-se sess9es de c2maras s( com o ob'etivo de doar lotes aos colonos, o que des$ostava os esquecidos
matutos. os botecos, bebendo pin$a, 'o$ando truco, adeptos do mon$e relembravam os motins dos operrios da
estrada de ferro, por falta de pa$amento de salrios e, deplorando a atual situa)ão, soltavam a l%n$ua contra a
repblica. 0s comerciantes e os coron!is se re$ozi'avam com a cria)ão de coletorias paranaenses no vale do rio do
;ei*e, mas se mostravam insatisfeitos com a intromissão catarineta no vale do &imb(.

Dizia-se:

— 0s barri$as-verdes querem abocanhar o ;aran. H prefer%vel criar um novo Estado, com o $overno em ?nião da
Bit(ria.

 not%cia de que "os! #aria, o revoltoso, se encontrava em territ(rio sob 'urisdi)ão paranaense, ' nos campos de
;almas, alvoro)ou a cidade. /abia-se que, em ;almas, o povo fora chamado 1s armas, or$anizado em voluntariado,
reinando o p2nico, 1s v!speras de a$uardado ataque. lis, todo o ;aran se alarmara com o anncio de que
bandidos barri$as-verdes haviam invadido o Estado. a e*-futura capital das #iss9es, fechou-se o com!rcio,
foram suspensas as aulas nas escolas e se realizou uma festa c%vica no teatrinho ;alcio, com a banda musical
e*ecutando dobrados. s duas bandinhas unidas formando uma s(. s bandinhas de @eopoldino e de ;upe. rei
/ilv!rio compareceu e e*ortou os cat(licos a não acreditarem em falsos mon$es. Evocara-se a Fndepend=ncia e o
passado $lorioso do torrão natal.

+uritiba, capital do ;aran, re$ur$itava de boatos e de tele$ramas assustosos. "oão <ualberto, o oficial que
comandava o 4e$imento de /e$uran)a, $ostava de comentar a situa)ão, e alardeava not%cias nos caf!s da rua JI. 0
presidente do Estado chamou-o ao palcio para envi-lo a ?nião da Bit(ria, com toda a for)a policial.
a ocasião do desembarque, na noite de J7 de outubro de JKJ7, o c!u saudava a tropa com uma procela. inda
assim, não faltou banda de msica, discurseira e viv(rio na esta)ão. ?nião da Bit(ria via, afinal, um coronel de
verdade, e*-comandante do famoso &iro de <uerra 4io Cranco, um tenente-coronel do E*!rcito acional3 Em
missão especial, mandava cerca de quatrocentos soldados e vinha acompanhado pelo pr(prio chefe de pol%cia.
mbos se hospedaram na resid=ncia, ou melhor, na mansão do coronel mazonas, enquanto al$uns oficiais se
acomodaram nos hot!is, e a soldadesca, em $alp9es desocupados.

a varanda da mansão, a conversa ia animada. 0s visitantes contavam inmeras novidades da capital,


principalmente sobre pol%tica. alou-se em nomea)9es de 'u%zes, promotores e dele$ados, nas remo)9es e
e*onera)9es de funcionrios que não pertenciam aos quadros do ;artido 4epublicano.

— 5uem fala mal do $overno, vivendo 1 custa dos cofres pblicos, não pode esperar outra coisa — observou o
beletrista Da /ilva, olhando de soslaio o professor /erapião.

0 coronel mazonas trou*e 1 baila a hist(ria de ?nião da Bit(ria, van$loriando-se do vaporzinho +ruzeiro e do
assombroso pro$resso da cidade. ão pôde dei*ar de e*ibir o precioso documento que $uardava como rel%quia,
os $astos versos que encimavam as assinaturas dos componentes da +omissão Crasileira para Demarca)ão de
@imites entre o Crasil e r$entina. charam-nos belos e e*pressivos. Enquanto se a$uardava a hora da ceia,
chimarreando, passou a e*plicar o caso dos fanticos:

— &rata-se de peri$osos bandidos barri$as-verdes, chefiados pelo falso mon$e "os! #aria, um impostor, criador de
uma falsa seita abra)ada por intrusos e vadios. &al $ente ! apoiada e financiada pelo $overno de /anta +atarina, a
servi)o dos coron!is lbuquerque, ;acheco, 4amos, e indiv%duos como o &avares, que fomentam desordens com o
intuito de se apoderarem das terras paranaenses.
rei /ilv!rio esposava outros pontos de vista, mas não os e*punha. Estava murcho. <ostava de contar casos de
des$ra)as sucedidas aos que combatiam os padres. /abendo que "oão <ualberto era membro preeminente da
ma)onaria, se sentia diminu%do, acabrunhado. +omparecera para não demonstrar os aborrecimentos. ora proco
em vilas catarinenses e não queria ser apontado como partidrio do /chimited e outros tantos. Eram bastante
conhecidas as a)9es que empreendera contra o culto do mon$e. >avia at! quem fizesse ca)oada com os casos.
Dizia-se que, para casti$-lo, "oão #aria, o verdadeiro, fizera-o cair do burrinho e quebrar os ossosG ou que os
fanticos lhe haviam tirado a cal)a e levantado a batina. Fsto o professor /erapião contava 1s cole$as do <rupo
Escolar, para v=-las escandalizadas, rubras e com a mão na boca:

— >in3

"oão <ualberto, abotoando a tnica, ereto e imponente, inda$ou:


— 5uantos homens acompanham o mon$e "os! #ariaA

— 5uem sabeA 0 que posso informar ! que fam%lias inteiras de caipiras estpidos e bo)ais, ral! mais s(rdida que
habita a re$ião, vão ao seu encontro pensando que se trata de um santo, do verdadeiro mon$e, o profeta "oão #aria.

rei /ilv!rio não se a$radou da resposta dada pelo coronel mazonas, do modo de falar em "oão #aria, mas '
andava conformado com aquela venera)ão, aproveitando-a em benef%cio da F$re'a. +oncordara, por e*emplo, em
rezar uma missa no morro da +ruz.

0 Dr. +avalcanti, o chefe de pol%cia, surpreendeu os presentes:

— 0 certo ! tranqüilizar a opinião pblica, esclarecendo a verdade dos fatos, comunicando o que realmente se
passa ao $overno, e procurar apenas pacificar essa $ente.
oram palavras que aborreceram principalmente "oão <ualberto e o coronel mazonas, cu'os semblantes se
tornaram turvos, sombrios, contrariados. #as o primeiro, lo$o, desabafou com altivez:

— Fsso não. Eu vou fazer esse falso mon$e desfilar amarrado pelas ruas de ?nião da Bit(ria e +uritiba, antes de
intern-lo no manicômio. &rou*e cordas para isso.

alava com autoridade. Era homem de vontade firme e impressionava bastante pelo porte a$uerrido e ele$ante. lto
e robusto, impecavelmente fardado, as frontes encanecidas. &anto que frei /ilv!rio, comodamente sentado, com a
boca na bomba de prata, ante$ozava o espetculo, ima$inando como seria humilhado "os! #aria, a passar amarrado
em plena rua JI. Ele, então, pre$aria a reli$ião verdadeira, combateria os ma)ons e os protestantes e tomaria o lu$ar
reservado a um santo do povo. s i$re'inhas das vilas seriam freqüentadas por muitos fi!is, numerosas caboclinhas
na sacristia. Encheu a cuia com a $ua quente da chaleirinha, passando-a ao professor /erapião.

p(s o chimarrear, a mesa foi servida e elo$iada por h(spedes tão ilustres.  cerve'a Corboleta, fabricada na
pr(pria cidade, $abada especialmente, animou todos os assuntos, bebida como no baile do clube ?nião, oferecido 1
oficialidade.

a manhã se$uinte, era maior o alvoro)o da popula)ão, entusiasmada com os acontecimentos. &udo era festa. 0
re$imento formado defronte 1 i$re'inha de sinos chorosos, houve missa campal. rei /ilv!rio aben)oou as armas
cristãs, defensoras da ordem e do re$ime republicano.  pedido, a banda militar bisou o dobrado ;artida de
#ato <rosso. Depois, o povo postado nas cal)adas da rua JI de ovembro, teve lu$ar o monumental desfile.
trs vinham os pelot9es, $uarnecendo as carro)as de armas e muni)9es. "unto 1 metralhadora #a*im, as cordas
para o mon$e, o falso, o louco, o fantico. ssim, em meio a al$azarra de palmas, $ritos e risos, o re$imento
encetou a $rande marcha.

CAPÍTULO VI

+om "os! #aria e #aria 4osa não estavam mais de quinze homens vindos de &aquaru)u. Dos vinte e quatro
cavaleiros que constitu%am os doze pares de ran)a, apenas seis acompanharam o mon$e.

5uando a estrada penetrara o desfiladeiro, costeando $rotas, %n$remes ladeiras e e*tenso loda)al, a voz corneteira
anunciou:

— H ali pertinho. Estamos che$ando.

chando o fa*inal em situa)ão e*celente, "os! #aria empinou o cavalo como um mastro de bandeira e e*clamou:

— Epa3 Fsto aqui ! chão sa$rado. Bamos medir pra formar o quadro santo e estabelecer o acampamento $eral.

 vir$em aprovou a id!ia, e lonso e*aminou com aten)ão as ad'ac=ncias, au*iliado por "erôme. Er$ueram-se
rapidamente ranchinhos de 'erib e nos 2n$ulos do quadriltero as cruzes. ra$oso e sua $ente che$aram, deram as
boas-vindas e tamb!m ficaram, suprindo de v%veres o novo reduto.

Então "os! #aria se pôs a propa$ar a $randeza da monarquia, lo$o ap(s as rezas e os e*orcismos. 5uando o sol,
l2mpada brilhante do quadro santo, se apa$ava, e che$ava a noite, a temperatura bai*ava tanto que os pelados
acendiam fo$o no chão e, esfuma)ados, cochilavam sentados nas esteiras, com os p!s para o braseiro. #as a onda
de $!lidos fantasmas do vento penetrava pelas frestas das t=nues cabanas, sinistras, atacando-os.

?m dia, "os! #aria saiu a visitar al$uns moradores do lu$ar, reunindo mais adeptos. /abia o que se passava
tamb!m em ?nião da Bit(ria, das provid=ncias do $overno do ;aran, da marcha que empreendia o 4e$imento de
/e$uran)a e dissera a um tal de arrapo:

— ão tenho quest9es com o ;aran, nem com Estado nenhum. o meu entender, tudo ! Crasil. 0 Crasil ! um s(,
dentro não tem fronteiras. qui vem for)a me bater, eu bri$o e dou pre'u%zo. ão ataco nin$u!m, fui perse$uido
com minha $ente pelo coronel lbuquerque em +uritibanos, mas se me combaterem não fu'o. 0 coronel
lbuquerque surra $ente at! em cruz de cemit!rio, atado.
— #as não h necessidade de bri$ar, a for)a não lhe bate — ponderara o arrapo.

arrapo e "oão Barela, sem perda de tempo, e com o consentimento do mon$e, partiram para e*por o caso ao chefe
de pol%cia e evitar o conflito. Este acedeu, por!m "oão <ualberto discordou e cumpriu seu prop(sito. +om uma
parte do re$imento, atacaria o reduto e traria o mon$e amarrado. Do ;asso da <alinha, onde estava acantonado,
mandou um piquete de vinte pra)as e dois oficiais fazer o reconhecimento, $uiado por al$uns vaqueanos. arrapo e
"oão Barela tornaram a falar com os oficiais em le$rete. ?m deles, o coronel /oares, prometendo paz, em nome do
comandante, foi at! o reduto entre$ar ao mon$e uma carta de "oão <ualberto. @endo-a, "os! #aria ficou estupefato:

— ão aceito isto como parlamento. H um desaforo carta escrita com lpis3

inda assim, prevaleceram as promessas de paz, com "os! #aria desconfiado, +astelhano olhando de soslaio,
descontente.

" no dia vinte e um, ardilosamente, se unia ao piquete, em +a)adorzinho, o comandante "oão <ualberto, seus
quarenta homens, sua possante #a*im. esse dia, enviou ao revoltoso uma intima)ão:

/r. "os! #aria.

Deveis comparecer a este acampamento com a maior ur$=ncia, a fim de me e*plicardes o motivo da reunião de
$ente armada em torno de vossa pessoa, alarmando os habitantes desta zona e infrin$indo as leis do Estado e da
4epblica.

+aso não atender a esta intima)ão, que me dita o cumprimento do dever e o sentimento de humanidade, comunico-
vos que vos darei, desde lo$o, franco combate, e a todos que forem solidrios convosco, em verdadeira $uerra de
e*term%nio, a fim de fazer voltar a paz a esta zona do Estado, o re$ime da ordem e da lei.

visai a todos que vos acompanham, que os considerarei criminosos, se não comparecerdes v(s ao meu
acampamento, a fim de evitar uma terr%vel des$ra)a.

+omunico-vos, ainda, que, al!m das for)as minhas que vos sitiam por vrias estradas, outras e*pedi)9es vos
perse$uem tamb!m, tornando-se dessa forma imposs%vel a vossa fu$a ou resist=ncia no territ(rio nacional.

o caso de vossa resist=ncia 1s minhas imposi)9es, deveis retirar com ur$=ncia as mulheres e as crian)as que a%
estiverem.

a +el. "oão <ualberto +omes de / ilho, +omandante do 4e$imento de /e$uran)a do ;aran.

Era madru$ada e "erôme ' estava vi$iando, encolhido de frio, fume$ando o pito de bambu. ?m pano amarrado 1
cabe)a, por bai*o de desabado chap!u de palha. Bestia duas camisas, duas cal)as, uma ceroula, dois palet(s, um
deles enfiado pela cintura. Belha e pu%da manta ao pesco)o, sob a medida de . /enhora. 0 bornal a tiracolo, e a
espin$arda se$ura pela direita. 0s p!s nus, mas cale'ados, enri'ecidos, su'os, como se estivessem cal)ados de
cracas.

a madru$ada daquele 77 de outubro de JKJ7, um cãozinho arrepiado, seco e descon'untado, meditava debai*o de
um pinheiro, o matuto l em cima na copa. 0 matun$o, com velho selim sobre ro%do saco de estopa e estribos de
couro pendentes de uma corrente de ferro, ficara para trs restolhando o chão, enquanto o cachorro &rabuco, 'a$uara
fare'ador, se co)ava $emendo, com os dentes sobre as pul$as do lombo. Dentro do bosque, aninhado qual
passarinho na ma'estosa rvore coroada como uma rainha, sobre o cetro de $alhos, "erôme estava alerta, de olhos
acesos, bombeando as for)as do $overno.

0 vento balou)a a floresta. 0 sol espar$e seus primeiros raios. 0s rios, lon$as serpentes cristalinas, se arrastam no
chão, a$itando os $uizos de espuma, ocultas nas restin$as, no var$edo. 0s pinheiros se levantam da cama de
sombras e se banham na fonte da manhã. &oda a araucria, o pinheiral sem fim, sob a chuva de cores da aurora,
respin$ada de ouro e prata, cheinho de pssaros como enfeites, parece um s( pinheirinho de atal. o clarão da
manhã, primavera da cor, a terra ! uma flor desabrochada. l)adas em bandos, as aves são p!talas desprendidas de
rtila corola.

"erôme admira o despertar do sertão e pensa que a natureza ! um hino maravilhoso. 0 mundo ! uma viola com bo'o
no c!u, cordas na terra — feitas de riachos, vento, trinar de pssaros.  bicharada canta e o cora)ão tem ouvidos.
Enquanto a lua e seus pintinhos cintilantes que ciscavam no ar desapareceram do terreiro do c!u, trepado no poleiro
da montanha, sacudindo o p( das asas auriprateadas, o sol ! um $arnis! doirado a cantar toadas de luz, o cocoroc(
da alvorada. 4essur$ia a vida reverdecendo as campinas. 0 panorama ! tão belo quanto o de &em 5ue Ber.

"erôme d asas ao pensamento, mas não se esquece da missão. #ais tr=s companheiros estão atentos. s quatro
armas de repeti)ão, nicas do reduto, estavam assestadas e ocultas nas copas das rvores, e não podiam falhar. o
quadro santo, o povo ' estaria formado. +omo era belo ver o mon$e, a vir$em e os pares de ran)a desfilando
$arbosamente3 /e fosse "os! #aria, dava ordem para ntoninho casar com a menina #aria 4osa. @o$o Dorinha
poderia caval$ar com a $uarda de honra. &inha um mau pressentimento sobre Deodato. Deus queira que se'a
en$ano, mas cime desvia o homem da reli$ião... 5ue teria acontecido em &aquaru)uA Estaria em paz.  $uerra !
coisa do diabo e da repblica. 0 diacho inventou o dinheiro. +ruz, credo3 +ada um devia ter seu palminho de terra e
plantar o sustento da fam%lia. 0 mundo ! tão $rande3 +omo ! que são as palavras da ora)ão do /anto /epulcroA

— hn3

Bia'ando, "erôme cismava. /e não e*istisse são "os! #aria, nem são "oão #aria, nem Deus, nem o mundo, nem
nada, o que seriaA3
0 sol ! o olho de Deus zelando pelos crentes.  mata tem vistas e ouvidos. "erôme punha a mão esquerda sobre as
sobrancelhas, prote$endo a visão da cascata de luz que se despenhava do c!u, lambendo-lhe a cara tostada.
Descortinava o vale, como se estivesse num pico de serra. icava pequenino l no alto, dentro do clice de $alhos.

&rabuco, o ma$ro e fam!lico &rabuco, procurava entender o que o amo fazia, mas não compreendia nada. Esperava,
aborrecido com aquela incômoda coceira: comichão. +om certeza o amo estaria comendo um churrasco, o san$ue
escorrendo da carne... "untava $ua na boca. 0lhava para cima, com $ula. Decepcionava-se. ão perdia a
esperan)a. ndava fraco e entristecido — maltratavam-no propositadamente, s( para v=-lo sofrer. &inha um medo
terr%vel de tudo e todos. 5uando ouvia estampido, desesperava-se, corria para perto de "erôme, buscava prote)ão.
;ara ele, todo ser humano era um todo-poderoso, mas principalmente aquele velho su'o, fedorento, simptico,
bondoso. +ulpava-o, todavia, das priva)9es que passava, e ao homem atribu%a os pr(prios fenômenos da natureza, a
chuva, o raio, a trovoada, bem como a fome e o frio. /entia-se i$ual ao matun$o, s( não podia comparar-se ao
ancião cuspidor e cachimbento. ão sabia da causa das coisas e procurava não inda$ar, com medo. ão
raciocinava, sentia falta dos meios. /( conhecia meia dzia de palavras, delas se destacando o nome. De peste ou
pesteado, e*press9es que detestava, não apanhava o si$nificado. +heirava bem, entendia as coisas pelo odor.
l$umas noites, sorumbtico, e*primia as m$oas uivando. ?ma ne$ra cadela que vivia escorra)ada em
+uritibanos pusera-o nesse mundo de maldades e mis!ria. &inha uma va$a recorda)ão dela, principalmente das
tetas. ascera e se criara sob o assoalho de uma casa abandonada, habitada apenas por ratos e insetos, mormente
pul$as. Da cria, fora o nico sobrevivente, mas acoitado como um criminoso. 0 frio enri'ecera um, a fome, outro e
a $arrotilha, a trinca restante. 5uando &rabuco saiu do esconderi'o, não mamava, era cachorro feito. +omia os
estercos das ruas e procurava dono. +erta vez, simpatizou com um anti$o funcionrio da prefeitura, o qual lhe deu
um bolo de carne. Devorou-o com voracidade. "erôme vinha che$ando numa tropa de car$ueiros e o salvou com um
vomit(rio que comprou na botica e com uma $arrafa de leite. &rabuco era ami$o e $rato fiel. &inha bons
sentimentos e muito medo, latia, mas não mordia. Fnve'ava e odiava aqueles cães $ordos e rancorosos, de dentes
arre$anhados, i$uaisinhos aos proprietrios, ferozes. Embora revoltado, a fraqueza o obri$ava a bai*ar a cabe)a e
esconder o metro de rabo entre as pernas e sumir. ;erdera ' uma lasca da co*a na boca de um buldo$ue. ;ossu%a a
sabedoria hereditria dos $uapecas, al!m de apurada e*peri=ncia da vida. ;ensava com as ima$ens recebida pelos
sentidos e vivia se babando com o $osto de tutano na mem(ria. /abia o que eram as coisas, i$norava o si$nificado,
as ori$ens e os fins. ?m frustrado. E*pressava-se surrealisticamente, hermeticamente, por s%mbolos confusos,
onomatop!ias caninas, com uma dor dalma invenc%vel, nostal$ia imensa, via apenas o lado miservel das coisas.
ati$ado, eno'ava-se da e*ist=ncia. De admirvel clarivid=ncia e e*traordinria intui)ão, antevia os acontecimentos
desa$radveis. ;ontap!s, por e*emplo.

o capão de mato, pr(*imo a tr=s casebres vazios onde se achava comandando os companheiros, da copa do
pinheiro, "erôme viu quando a metralhadora caiu no banhado, ao assustar-se a mula, no momento em que um pra)a
acendeu a vela para alumiar o chão ainda sombreado.  tropa policial manobrara toda a madru$ada e vinha
arrastando-se perfidamente como uma cobra. Era maior a bulha da mata, o coa*ar dos batrquios, o canto e*ultante
do $rilo, o pio a$ourento e sinistro da coru'a. oi no instante em que a tropa atin$ia a clareira de campo que "erôme
disparou um tiro para avisar os pelados. &rabuco se assustou e se enfiou sob um tronco ca%do no solo.

— l$um ca)ador, comentaram na tropa do $overno.

o quadro santo, o revoltoso pre$ou pela ltima vez:

— 0s irmãos ' sabem o que vão fazer. Eu não queria a $uerra, mas me botaram dentro de um cesto. $ora que o
burro vai corcovear, ! preciso levar a coisa no cepo3 Em nome de osso /enhor "esus +risto e da /ant%ssima
&rindade, escon'uro todos os peludos3 ão h de ficar um s( no mundo do futuro, pra fazer mal ao pr(*imo. Eu sou
o rei, e são "or$e prote$e meus soldados. ão tenham d( dos miserveis. #e acompanhem que eu recompensarei.
s mulheres e os doentes fiquem rezando pela /anta +ruzada. /e eu morrer, vou ressuscitar e trazer uma cavalaria
do c!uG os irmãos que morrerem ressuscitarão e poderão bri$ar com dez soldados da repblica3

0 avan)ado piquete da pol%cia foi recebido a bala por "erôme e seus tr=s bombeiros, mas o revide era uma intensa
descar$a de fuzis. Então, "oão <ualberto sentou no selim da metralhadora colocada na mais alta eleva)ão do
terreno, $uardada por um esquadrão, enquanto se estendia a linha de atiradores. o momento, o re$imento ca%ra
numa emboscada, encurralado entre um bre'o atrs, o mato 1 esquerda, um taimb! 1 direita. a hora em que os
bombeiros de "erôme abriram fo$o, ca)ando soldados, lonso, ra$oso, Q! &i$re, @eandro ;alma, +astelhano,
Deodato, abor e o ne$ro "oaquim <ermano sur$iram a cavalo, distribuindo $olpes de facão, pondo em fu$a os
cavalarianos da mil%cia. E, 1 frente dos pelados que bri$avam a p!, ma'estade dos sert9es, ru$indo, leão com 'uba e
tudo, assomando de surpresa, passando pela estiva, "os! #aria atacou a for)a, de chifarote em punho.  #a*im
en$as$ou, "os! #aria avan)ou para "oão <ualberto, recebendo vrios tiros da esquadra e vibrou um $olpe no
cocuruto do comandante. 5uando um sar$ento procurou decepar as orelhas do mon$e, então +hico &aquara e
Delfino ;ontes o retalharam inteirinho.

0 chão era um charco de san$ue, e san$ue escorria dos fac9es.  $rita infernal, o desabafo secular dos oprimidos,
um c2ntico de $uerra e revolta:
— #ata. #ata3

— Biva a liberdade3 Biva a monarquia3

— Biva são /ebastião3

— Biva a coroa do imp!rio3

— Biva a coroa do c!u3

— #orram os peludos3
Do lado do inimi$o, tamb!m se ouviam vozes:

— +alar baionetas3

— #uni)ão3 #uni)ão3

— vance3 o$o3 o$o3

+astelhano, incrivelmente feroz, em seu tordilho, distribu%a lambadas e berrava:

— +aracoles3 Bien$am, baianos3

0s pra)as corriam desesperadamente, ca%am no precip%cio, afundavam-se no atoleiro, perse$uidos pelos fanticos.
bandonavam tudo, fuzis e muni)9es. u$usto #oreira, o escrivão, com a mão ferida, como que pendurada sobre o
punho, desferiu com a outra um $olpe mortal sobre um alferes.

 batalha fora um choque de correntezas, com uma avalanche indômita de matutos rebeldes como o mar
encapelado, l2minas ful$urando e espumando san$ue, pororoca, san$ue a borbulhar.

0 comandante do re$imento, que disparara al$uns tiros com um mosquetão e que acertara o mon$e, acabou
tombando e*an$ue ante o caboclo Delfino. Bendo-o morto, a mil%cia desertara a luta, debandando.

l$uns pelados morreram e outros ficaram feridos. Dos que combateram montados, somente "oaquim <ermano,
que tinha uma cutilada na cara, dei*ou um naco de co*a numa baioneta. ndrade, quando $olpeava o adversrio,
via o rancho queimado e os filhos mortos, ou o carrasco que torturava os presos.

/e #aria 4osa tivesse de escolher entre os mais valentes, não poderia casar nem com ntoninho, nem com
Deodato, que se i$ualavam nos embates. enhum menos denodado que Q! &i$re, abor, @eandro ;alma ou lonso.
+oco e <idoca estiveram lado a lado com +hico &aquara e Delfino ;ontes. Dos que vieram de &aquaru)u, não
morreu nin$u!m. ;ereceram al$uns das cercanias.

s mulheres que ficaram orando pela vit(ria, repetindo as palavras que #aria 4osa pronunciara, a'udaram a
carre$ar os feridos, prestando os primeiros socorros. u$usto #oreira, o escrivão, estava na lama debru)ado sobre
o alferes.  seu lado, o cadver de um raso, olhos vidrados, a boca cerrada, os intestinos para fora. "erôme, que
assistia aos feridos, amarrou o bra)o de u$usto #oreira, o escrivão, servindo-se de cip(, $uilhotinou-o, atorando-
lhe o punho. uma das tendas do acampamento, levou dias tratando das cha$as dos combatentes. ?sava salmoura e
ervas.

o campo de batalha, a tropa em fu$a dei*ara a metralhadora, quarenta fuzis e milhares de cartuchos.
?ma flor nascera na boca, a outra no peito, sobre o cora)ão. Duas rosas de san$ue, duas cha$as. &ombara o
revoltoso.

o quadro santo, todos choravam. a hora do crepsculo, a procissão e o enterro. #as santo não morre.

 cova ficaria coberta de tbuas para que ressuscitasse e voltasse a prote$er os sofredores. s mãos cruzadas sobre
o peito, olhos sem vi)o, sem cores, os p!s atados com uma fita vermelha, o tronco hirto e frio como $elo, a face
malicenta, empapada de san$ue, um len)ol por mortalha ao fundo do 'azi$o. "erôme comanda as rezas, #aria 4osa
pede miseric(rdia a Deus, para os que ficaram desamparados. s mulheres solu)am. 0 som plan$ente da trombeta
de chavelho ! um lamento coletivo, um adeus derradeiro partido de todos os peitos. deus3 0 toque dos tambores,
no entanto, parecia brado de revolta, promessa de luta.
— Y, sacrossanto salvador do mundo,

Y, divin%ssimo pai de miseric(rdia,

Y, rei cavaleiro da monarquia3

4o$ai por n(s.

5uando #aria 4osa terminou a recita)ão do ltimo ter)o, entre l$rimas esbo)ou um sorriso de dor e esperan)a.
/im. 0 mon$e levantara a espada dos oprimidos. Dera-lhes um reinado de fantasia, unira-os. Dera-lhes consci=ncia
da pr(pria for)aG uma lei, a i$ualdadeG uma b%blia, a revolu)ãoG uma bandeira, o c!u3 $ora tudo estava claro. 0s
pelados queriam o para%so, a Fdade de 0uro, e os peludos, a conserva)ão do inferno. #as "os! #aria ' era saudade.
ora imolado 1 causa sa$rada. cabara o mundo em seus olhos, mas não a ma'estade em seu vulto imperec%vel.
Descia 1 cova e ascendia ao firmamento. >ediondo crime, supremo pecado, sinal do fim que vinha perto —
imensas des$ra)as para a humanidade. +ertamente ressuscitaria, levantando-se como viva esttua de ilus9es,
s%mbolo de esperan)as. " não pulsa o cora)ão, por!m a f! no futuro ! sempiterna, e mon$e, santo do povo, não
morre.

— ;assou-se, diziam tristonhos os crentes.

;assou-se para os cora)9es dos infelizes, passou-se para o porvir, passou-se para o canaã fantstico dos profetas
camponeses. Bit(ria coberta de luto. &erra e san$ue. enhum punhado de terra na vida, apenas a amplidão da casa
verde, sete palmos na morte.

o momento do enterro, a natureza acompanhou o funeral. a tumba do ocidente desapareceu o dia, tombou o sol e
a noite enlutou a terra. 0 vale umbroso escureceu, a lua sur$iu informe e avermelhada, inchada como se estivesse
chorando. &erra e san$ue, esperan)a e saudade.  tarde esmaecia no horizonte e findava o mundo daquele dia.

0 posseiro ra$oso, que ocupava $rande rea naquela re$ião, mandou destruir o armamento usado pelos
pecadores. #etralhadora e fuzis foram quebrados e atirados ao fundo de um p!la$o. rmas sacr%le$as, poderiam
contaminar as mãos dos irmãos de cren)a. 0s corpos dos inimi$os que ficassem aos corvos altivolentes.

p(s al$uns dias, numa madru$ada, #aria 4osa voltou escoltada pelos combatentes 1s pla$as de &aquaru)u. 0
re$resso não foi percebido pelas tropas da ;ol%cia e do E*!rcito.6K8

CAPÍTULO VII
Cravo 4e$imento de /e$uran)a que fora derrotado por um punhado de matutos.

;almas tomou-se de p2nico, 1 espera de um assalto que nunca viria: $ente aquartelada nas casas particulares, $ente
armada e municiada pelas autoridades. E não menos sobressaltadas ficaram as popula)9es das cidades do Cituruna,
apesar da not%cia, ainda que inacreditvel, da morte do mon$e. ?nião da Bit(ria vibrava emocionada com a
passa$em das tropas. ?ma comissão do &iro 4io Cranco se alo'ou no hotel #ilão, 1 espera do corpo de "oão
<ualberto, que, com a procela, che$aria no dia J7 de dezembro.

final, no mundo inteiro se soube da batalha.  imprensa do pa%s lastimava a repercussão no estran$eiro: caluniar
torpemente um pa%s, por tele$rama, não pode ser menos indi$no que atassalhar de boca a fama de um individuo,
se ! crime caluniar um s(, e iludir al$uns, ainda mais crime ser desacreditar na)9es e en$anar todo o mundo, !
conhecido o teor, e*traordinariamente alarmante, dos despachos transmitidos para o velho mundo, a prop(sito da
catstrofe de que resultou a perda do querido, bravo e nunca assaz pranteado comandante "oão <ualberto. ?m
arti$o conclu%a: ainda h pouco cientistas e astrônomos franceses dei*aram de vir a /ão ;aulo observar o eclipse
de JM de outubro porque: no Crasil VM\ dos habitantes morrem de febre amarela3 0s 'ornais falavam na repeti)ão
de +anudos e se lia: fora raras capitais onde se encontra uma certa vitalidade, o resto ! casebre de pau-a-pique, o
mon'olo centenrio, a esterilidade dos solos es$otados, são as supersti)9es e os fanatismos africanos, uma
indol=ncia repu$nante, tudo isso 1 beira de um rio que serve de es$otoG escolas, fbricas, culturas, são coisas que
não e*istemG no entretanto, multiplicam-se as benzedeiras e os curandeiros, ! preciso acabar com a nefasta
influ=ncia dos mon$es, que e*ploram a crendice do povo. E vinham as entrevistas. ?m $eneral dava seu
depoimento: credito que o nome desse fantico, "oão ou "os! #aria, tenha servido de bandeira a malfeitores, que
depois da ltima revolta, infestam os sert9es do rio do ;ei*e, ?ru$uai, e seus afluentes, para reunir $ente fantica,
cr!dula na sua santidade.

+uritiba estremecera, o ;aran assombrado.  edi)ão  4epblica, (r$ão do ;artido 4epublicano, es$otou-se em
meia hora, a e*emplo do que sucedia com o Dirio da &arde, o povo a$lomerado na rua JI de ovembro. 0
primeiro anunciava em $randes t%tulos, na primeira p$ina: 0 +ombate do Frani.  e*pedi)ão do +oronel "oão
<ualberto. 0s revoltosos são comandados por #i$uel ra$oso. 0s mortos. 0s e*traviados. s provid=ncias do /r.
;residente do Estado. 0 ma'or abriciano 4e$o Carros assumir o comando das for)as. 0 Dr. +arlos +avalcanti
pediu a interven)ão federal.  cidade sob profunda impressão do acontecimento. ?ma chusma de tele$ramas de
p=sames che$ava 1 capital. @amentava-se a morte de "oão <ualberto, her(i por não ter corrido, sempre no constante
tom:

&abar!us incultos, verdadeiras bestas humanas, malfeitores sem quaisquer resqu%cios humanos, armados at! os
dentes, trai)oeiramente trucidaram como uma fera, o distinto pernambucano, o cidadão sem mcula, que teve o
cora)ão mei$o e alma simples de todos os bonsG o valoroso e ilustrado capitão de en$enharia, que se chamou "oão
<ualberto <omes de / ilho. oi levado pela cren)a de que apenas encontraria fanticos, pobres homens
simpl(rios, da comitiva de um mon$e, que o em!rito oficial, incapaz de uma falsa manobra de ttica, avan)ou JJ
l!$uas adiante do $rosso das for)as, com um reduzido $rupo de soldados, contra o bando maldito, que s( então
sur$iu como era, dez vezes mais numeroso, descansado, e senhor de uma situa)ão estrat!$ica incomparavelmente
superior. E não h quem dei*e de e*perimentar impetuosas revoltas %ntimas, relembrando a hecatombe covarde.
cabar, assim, desamparado de todo socorro, envolvido, sufocado numa onda de lama viva, vencido por uma
quadrilha vil, abatido por homicidas e ladr9es, não ! morrer contente em face do estandarte adverso, ! ser
ferozmente assassinadoG ! ser sacrificado como um mrtirG ! morrer muitas vezes, da mais cruciante das mortes,
antes do derradeiro alento, do ltimo pensamento para esposa e filhos3 " muito lamentvel seria que e*pirasse em
tão tr$icas circunst2ncias uma criatura qualquer. Devem ser pranteados, sem dvida al$uma, todos quantos
pereceram no mortic%nio brbaro. #as cair assim o homem que se havia tornado, como bem disse +orreia de
reitas, o %dolo de todas as classes desta terra, tombou trespassado assim T maculado, mais do que ferido e morto
T pelo facão infame do caboclo fac%nora, ! uma des$ra)a que transtorna o c!rebro de quem escutaG ! uma catstrofe
esma$adora, que desorienta e irrita, que alucina e revolta, T sem que a $ente saiba, enfim, onde a revolta come)a e
onde principia a m$oa dilacerante.

unca houve i$ual a$ita)ão em +uritiba, movimento de for)as, $ente alarmada comentando os acontecimentos,
com%cios em que foram oradores os doutores +arlos +avalcanti e Dario Bellozo. o dia em que che$aram os corpos
irreconhec%veis dos ilustres falecidos, a multidão se comprimia na esta)ão e nas ad'ac=ncias, a cidade de luto, as
ruas com as l2mpadas envoltas em crepe e a JI de ovembro ornamentada com colunas e arcos ne$ros. unca se
viu coisa i$ual, $randiosa cerimônia fnebre.  banda musical tocava para arrancar l$rimas dos mais insens%veis,
militares e escolares desfilaram, e o brilho pertenceu ao $arboso e her(ico &iro 4io Cranco, onde os mocinhos
serviam 1 ptria, e*ibindo-se. ntes do Dr. ;amphilo de ssun)ão, discursou o mais admirado poeta paranaense,
provocando solu)os:  cidade veio vos receber, coronel "oão <ualberto, veio, por!m, nervosa, estran$ulada, como
uma triste mãe, que viesse para levar o corpo de seu filho...

0s camponeses re$ozi'avam-se com a vit(ria, sempre esperan)osos, no Cituruna, a$uardando a ressurrei)ão do


mon$e. #aria 4osa e Dorinha continuavam a ser consultadas, cada qual anunciando um re$resso triunfal 1 frente da
cavalaria do c!u. >avia quem o tivesse avistado, ao meio-dia, num cruzo de caminho, e era verdade inconteste que
se levantara da cova, do Frani. Dorinha vira-o no c!u, em forma de nuvem, l pelos altos de &aquaru)u. "os! #aria
fora o mrtir, o her(i, o rei a imolar-se pela salva)ão dos servos da casa verde. #as estava vivo, a prote$er os seus
filhos.

/e nas $randes cidades os escrevinhadores teciam loas ao comandante da pol%cia paranaense, o poeta pelado da casa
verde cantava o feito ao som da viola:

Biva são "os! #aria


que aparece ao meio-dia

de branco como "esusG

saiu da cova sa$rada

a bandeira levantada

pela vit(ria da cruz.

Bem cumprir o que dizia

trazendo cavalaria

1 frente são /ebastião

dividir a sesmaria

implantar a monarquia

acabar a servidão.

 vir$em #aria 4osa

vai rezar prece ardorosa

$alopar ao l!u...
0 mon$e est aqui de novo

o cora)ão de seu povo

a nuvem branca do c!u.

4ei do c!u e da terra

mon$e na paz e na $uerra

tanta $l(ria nunca vi:


dez fac9es, vinte pelados,

correu setenta soldados

na batalha do Frani.

CAPÍTULO VIII

4ocha lves ficara na est2ncia a$uardando o desenrolar dos acontecimentos, e*ultando com a vit(ria proclamada 1
boca cheia, por!m consternado com o mart%rio do mon$e. &amb!m recebeu #aria 4osa e sua $loriosa $uarda de
honra, combatentes $alardoados como pares de ran)a, na fazenda do pai Eliazinho. >ouve calorosa recep)ão,
concorrida, triunfal. ?ma festa de abra)os, l$rimas, e ora)9es 1s carradas. #aria 4osa e*plicou que o mon$e se
sacrificara como "esus e que em breve haveria de voltar 1 frente da cavalaria do c!u. 4ocha lves comoveu-se
profundamente ao ouvi-la afirmar, sempre sob inspira)ão dos an'os, que ele, o 4ocha lves, ainda seria proclamado
imperador da monarquia. esse dia, o dia do re$resso, houve che$ada e partida, reunião e dispersão, cada qual de
volta 1 vida habitual, aos afazeres cotidianos, pelo menos enquanto se a$uardava a ressurrei)ão de "os! #aria.

Entretempo,
caminhos uma e*pedi)ão
conhecidos militar ecom
entre ;almas mais
?nião dade mil homens,
Bit(ria, por!m levando canh9es eE,metralhadoras,
infrutiferamente. vasculhavados
a par da a)ão criminosa os
sicrios a soldo dos $rotescos coronel9es, recrudescia no Cituruna a arbitrariedade, a viol=ncia, a fria policial.
&ornava-se lei o linchamento dos camponeses. ;osseiros eram queimados vivos, depois de amarrados e pendurados
1s rvores. Baqueanos bem remunerados prendiam, espancavam, decepavam, assassinavam. /omente de quando em
vez al$uns deles tombavam nas tocaias do cruzo dos caminhos. 0 Cituruna tornou-se uma hist(ria de crimes
hediondos, de fo$o, saque, morte, estupro. Em +a)ador, o contin$ente do E*!rcito representara uma certa $arantia,
mas se fora embora com toda a e*pedi)ão pr(di$a em condecora)9es aos oficiais por se portarem com $alhardia
nas opera)9es de $uerra.

&ranscorrera um ano inteirinho desde o retorno de #aria 4osa e os combatentes do Frani, o terror ainda campeava,
o demo dominando, e não reaparecera o mon$e. Era tr!$ua pior do que a $uerra.  opera)ão encontrava as v%timas
isoladas umas das outras. +oron!is como os De ;aula, lbuquerque, mazonas, ra'o, abr%cio, tramavam
sucessos contra os mais influentes dos pelados.
Qebinho, chefe de fam%lia, chefe de tribo, se refu$iara em ;edras Crancas, quando abandonou &aquaru)u. p(s o
que sucedeu no Frani, voltou para casa, em &aboão. +ria resoluto no ressur$imento do mon$e. 0 compadre Q!
#aria não dei*aria a missão pela metade, santo cumpre o que promete, costumava ar$umentar, acrescentando:
enquanto eu viver, tem um ami$o na terra, não sou ami$o de bom tempo, um papa-vento. ão haveria de tardar a
liberdade, presente de mon$e, ddiva de santo. E*pressava o pensamento dos habitantes pobres do +ontestado. 0
revoltoso acabaria com os arrendamentos, limparia de peludos o Cituruna, poria fim 1 $an2ncia dos coron!is, 1
sanha das companhias, 1 pilha$em san$renta de terras, distribuindo-as aos que precisavam, e, acima de tudo,
implantaria a alme'ada monarquia3 Benerando ancião, o bondoso Qebinho continuava a $ozar o prest%$io anti$o e,
de todos, a merecer i$ual respeito. #as não h lavra sem suor, colheita sem trabalho, ale$ria sem l$rimas, direito
sem luta, claro sem escuro, e Qebinho sentia acabrunhamento por não ter acompanhado o mon$e ao Frani. ão
tivera a sublime $l(ria de morrer ao lado do divino rei. ão fora bafe'ado pela sorte dos felizardos. +om isso,
realmente sofria. $ora vivia a rezar e a invocar a prote)ão de "os! #aria. ;rincipalmente quando sua netinha, a
vir$em Dorinha, ca%a de ataque. Dorinha contava menos de dez anos, mas sabia desempenhar com devo)ão o papel
de vir$em. ntes sonhava, não tinha vis9es aterradoras como no momento. #a$rinha, fr$il como delicado caule
duma flor, os cabelos escorridos, os olhos cansados no fundo das covas, o rostinho muito bonito. Durante o dia, não
raras vezes, repentinamente, se esquecia do mundo, fora de si al$uns instantes. /( pensava em são "os! #aria, vivia
no ar. Estava falando ou fazendo al$o e, de repente, perdia a consci=ncia das coisas. ;or!m, lo$o voltava 1
realidade. 0s olhos tornavam a se mover e a fisionomia a tomar e*pressão. +omo era uma vir$em, uma entidade
santa, não se lhe estranhavam a inspira)ão, o enlevo. &emia a noite como se a noite fosse um l$ubre fantasma
envolto em capa preta. Bia na escuridão. 4i'a sobre a tarimba, passava entre a vi$%lia e o sono, supere*citada, a
respira)ão ofe$ante, o cora)ão espancando o peito e a produzir a bulha dos demônios, ouvida no travesseiro. Do%a-
lhe o medo, estran$ulava-lhe a consci=ncia, oprimia-lhe o ser, sufocava-a. Entre a vida e a morte, os olhos
che$avam a parar, a perder o vi)o, cravados no nada. o seu corpo franzino, raqu%tico, descorado, a anemia abrira
picada para a epilepsia. Bia diabos, lobisomens, mulas-sem-cabe)a, faces hediondas, sinistras. icava estarrecida e,
ao fazer um supremo esfor)o para $ritar, desmaiava dentro de si mesma. Era um rebuli)o na casa do Qebinho.
5uerubina corria a friccionar com lcool as canelas e os punhos da netinha, e um clamor se er$uia ao mon$e "os!
#aria. Dorinha se debatia e se retorcia, o tronco hirsuto, os membros distendidos, ri'os, inteiri)ados.  cabe)a se
arrastava para cima e para trs com movimentos con'u$ados dos olhos opacos e dilatados, os dedos crispados sobre
a palma e o pole$ar se fle*ionando como a marcar a cad=ncia da morte. elizmente, o ataque vinha rareando 1
medida que aumentavam aqueles instantes nos quais ca%a em esquecimento. &udo isso a fam%lia escondia aos
estranhos para não pensarem que Dorinha tinha encosto. ão era uma endemoninhada, mas uma vir$em, uma
entidade divina. <ra)as 1 f!, a tribo de Qebinho vivia alvissareira.  chama era perene, ardia como o sol, não se
apa$ava com a tempestade ou com sopro de boca de padre. ?m dia, frei /ilv!rio sur$iu l e saiu en*ovalhado.
;retendendo e*orcizar, ao ver Dorinha, inda$ou:

— 5uantos demônios temA

 vir$em respondeu:

— /( um na minha frente. ão ! mulher, mas veste saia. &escon'uro em nome de são "os! #aria3

— B embora corvo de uma fi$a3 — avan)ou #anoel, levantando a mão, s( não a$redindo o franciscano porque
Qebinho preferiu v=-lo afastar-se, sem quebrar as re$ras de hospitalidade.

0 revoltoso lo$o ressuscitaria. a casa de Qebinho, al!m de aparecer nos sonhos de Dorinha e de seu tio #anoel,
constitui o assunto de todos os dias, razão de ser e da vida.

0 vento, o vento ! sa$rado, o vento ! a barba do mon$e.

+ada vez que trove'ava, os olhares procuravam nas nuvens, ora clareadas pelos rel2mpa$os desferidos pelas armas
sa$radas, piquete celeste. Era o tropel que se ouvia, e a chuva, poeira l%quida 'o$ada pelas patas dos corc!is
fantasmais. 5uerubina previa o mau tempo:
— #anhã ruiva ! vento ou chuva — dizia, repetindo o ditado.
— @u$ar de vento, lu$ar sem repouso — falavam os velhos.

Dorinha, bastante ventoinha, escapava 1 espiral que rodava na rua e que se perdia no infinito, então corria para casa
e $ritava:

— Bov(3 vov(3 0 capeta ia me levando no redemoinho...

0 vento vinha bailando, assobiando, rodopiando: era uma alma querida que estava penando. ?m remendão tinha
por hbito inda$ar com o ad$io:

— /er que morreu padre, tabelião ou 'udeuA


5uando, sobrecarre$ado de car$as el!tricas, o trem da procela descarrilhava, tombando no ar. Dorinha, #anoel,
"oaquim e todas as crian)as da tribo de Qebinho come)avam a berrar:

— Bovô3 vov(3 /ão "os! #aria che$ou dos +ampos do Frani3

Era o tropel da cavalaria do c!u, comandada por são /ebastião. E, então, reinava a ale$ria pelo retorno do mon$e.
/e as coisas iam de mal a pior, e não se podia viver de brisas, ao l!u da sorteG se passaram os bons tempos do
imp!rioG se a peste dizimava a cria)ãoG se vencia a hipotecaG se a ro)a não se vendiaG se o dinheiro era pouco para
tanto rem!dioG se havia, na casa verde, a fome, a peste e a $uerraG a solu)ão estava no revoltoso3 Qebinho ia para o
buraco, de vento em popaG não ia ao vento, mas perdia o assento. 4ancheiros modestos se arruinavam, esma$ados
pelas d%vidas, oprimidos pelos $randes. Dir-se-ia que a casa verde estava em chamas: um vendaval propa$ava o
fo$o, em cada cora)ão um furacão de (dios e ressentimentos.
Fnverno de dias curtos e pardacentos, pr(di$o em $eadas e a$uaceiros, fla$elava os pelados em suas cho)as,
queimara de frio inmeras crian)as, chibatara andarilhos nos caminhos. elizmente, tocara-o a primavera pela porta
dos fundos. 0 minuano, doce suspiro da cordilheira dos ndes, refri$erava o ar das campinas. s rvores frut%feras
enchiam-se de flores como a noite se enfeitava de estrelas — metamorfoseara-se a ve$eta)ão raqu%tica, a$ora
e*uberante. 0s campos, ardendo em chamas, pareciam uma 4oma incendiada por al$um ero do sertão...

&aboão não passava de um lu$are'o como tantos outros, meia dzia de casebres eqüidistantes, sempre de 'anelas
para a ruela comprida, sinuosa, nica. Qebinho e 5uerubina recebiam muita visita e a$uardavam tamb!m a do
mon$e. ?m dia, estavam na sala as irmãs Bacarianas, a +hica e nh #aria.

— /abe, cumadre 5uerubinaA — dizia a +hica — Deodato, aquele par de ran)a que curtia as m$oas por causa da
vir$em #aria 4osaA
— hn3A

— Errou o pealo, se casou com a +oncei)ão, aquela namoradeira.

— /abe, cumadreA — contava nh #aria — 5ue des$ra)a3  +andinha tava esperando são "os! #aria, e o filho
morreu sem o santo batismo. Diz que crian)a ! an'inho at! sete anos, mas a +andinha queria levar prum padre

— +redo, cruzes3 um dianta. 0 padre arrene$ou são "os! #aria. 0 rem!dio ! pedir ao mon$e a salva)ão do
menino — interveio com espanto a mãe de Dorinha, a qual continuou: — #eu filho ' tem dois anos e vai ser
batizado pelo mon$e. " vai tempo que tamo esperando. ;ra padre, não levo. /e chama "os! @embrado, o capiau.

Dorinha fora buscar lenha num capão das pro*imidades. &amb!m ia pensando no batismo de "os! @embrado, o
dedo mindinho dos irmãos. 4epentinamente, ficara absorta, como que perdida, plida, sem se dar conta da
caminhada, do tempo, do mundo. ;assara a noite rezando, fazendo promessas, aterrada, em vi$%liaG recebera o dia
com uma sensa)ão de al%vio, com mais satisfa)ão que vestidinho novo no aniversrio. #as sempre com aquele ar de
pavor anuviando-lhe o rostinho. +ontra tudo, se sentia venturosa. Era uma vir$em. Fa deva$arinho e, de sbito,
parou deslumbrada a fitar a caneleira. ão trou*e a lenha e assombrada entrou $ritando na casa:

— Bov(3 vov(3 Eu vi tr=s homens na caneleira3 Bov(3 Eu vi são "os! #aria3

Enquanto Dorinha solu)ava, convulsivamente, de contentamento, e*plodiram e*clama)9es:

— Cendito se'a Deus3 Biva o vivo an'o são "os!3

— i de n(s, pobres pecadores3 /alva)ão3 /alva)ão3


— leluia3 leluia3

0 acontecido alvoro)ou a resid=ncia, e &aboão, e +ampos ovos, e o Cituruna, e a casa verde. nsiadas, as
mulheres haviam acompanhado Dorinha para ver o mon$e.  caneleira, enorme e frondosa, o sol espar$indo prata
sobre as folhas, era um altar eri$ido no meio do campo. ?m c!u mais azul do mundo ardia nos olhos, cobrindo um
chão esmeraldino. +abe)as pensas, mãos unidas sobre o peito, as senhoras pareciam orar at! com os passos.

— /alve, rainha, mãe de miseric(rdia...

&odas as tr=s ficaram em dvida se tinham ou não visto os vultos que Dorinha distin$uira e que se elevaram
lentamente do solo. a manhã se$uinte, sob as vistas de Dorinha, inmeras crian)as foram batizadas pelo mon$e. E
quando a mãe da vir$em teve um ataque e caiu, ela correu ao mon$e que, com a unha, riscou uma ferida na perna
para Dorinha colher o san$ue numa *%cara e dar 1 paciente, o que operou mila$re.

Durante uma semana, o povo fez romaria 1 caneleira, Dorinha transmitindo as ordens divinas. a hora das
refei)9es, 5uerubina punha a mesa para o mon$e, mas s( a vir$em o via comer. o s!timo dia, esta fez conhecer a
vontade do profeta: Qebinho deveria voltar a &aquaru)u e l reunir os crentes, a fim de que se restaurasse a
monarquia.

+umprira-se a promessa. +he$ara a hora da liberdade, o mon$e ressuscitara3 Boltara o revoltoso. ?m ano de espera,
um ano de sofrimento inaudito, um ano de ansiedade e, por fim, a maravilhosa recompensa. Estava pr(*imo o fim
da repblica e dos peludos. ;alavras e penas o vento leva, diz um velho ad$io — mas não as penas de penar ou
as palavras de um mon$e. "os! #aria re$ressara 1 casa verde, esperan)ando os aflitos, espaventando os soberbos.

s mulheres arrumaram as trou*as e a$asalharam as crian)as sob as toldas das carro)as. Qebinho mandou #anoel
soltar os terneiros no campo e abrir as 'anelas da casa, 1 hora de abandon-la. De &aboão partia para &aquaru)u, sete
l!$uas adiante, em caminho comprimido por lon$as cercas de taipa, a primeira leva de fanticos. indava o ano de
JKJN, ao renascer a cidade santa, a capital da monarquia.

0 arraial ia aumentando $radativamente com a che$ada dos camponeses pobres, entre eles o velho "erôme. "os!
#aria dei*ava ver-se por todos, no c!u, em forma de nuvem, as barbas mais lon$as e mais alvas. in$u!m mais
sabia quem o avistara primeiro. Enquanto Dorinha estava acamada e #aria 4osa não che$ava, ditava as ordens por
interm!dio de #anoel. Então, os homens se proveram de fac9es de $uamirim, lan)as de taquara, e se e*ercitaram
em combates simulados. @a)os de fita branca envolveram chap!us de barbicacho e borlas, e alvas bandeiras com
cruz azul bordada no meio tremularam no reduto, prenunciando a luta. Durante vrios dias, o povo rezava de p!,
rodeando $randes fo$ueiras, para que "os! #aria aparecesse. #anoel viu e anunciou que fora o escolhido para
comandar a santa cruzada. >ouve aclama)ão, del%rio ap(s a procissão.
&amb!m "oaquim, crian)a de doze anos, irmão de Dorinha, contou a avozinha 5uerubina que vira o mon$e, o qual
lhe dissera para formar um e*!rcito de meninos. a manhã se$uinte, comandava sessenta, todos armados de varas
de marmelo.

rei /ilv!rio, que fora mandado 1s pressas a +uritibanos, espantado com os preparativos b!licos da cidade,
prevendo uma carnificina, bem intencionado, sur$iu no reduto montado em seu burrico. +he$ou molhado da chuva,
encharcado. rrastando os erres, o sotaque alemoado, come)ou a doutrinar no ptio da casa de +hico Bentura. 0
povo a$lomerava-se, amea)ador. 5uando falou em falsos mon$es, ouviram-se $ritos de cachorro3 ladrão3 e
padre va$abundo3 #anoel esbo)ou a$ressão, o facão levantado.

— #ata3 #ata3 — berravam iradas as velhas fanticas.


/ob saraivada de insultos e apupos, frei /ilv!rio se foi a ro$ar pra$as, esporeando, vin$ando-se no muar. Enquanto
o burrico en$olia os caminhos, ele se afundava nos pr(prios pensamentos, decepcionado. final, que adiantava ser
bom e compassivo para uns, e falar sobre necessidade de estradas, escolas, hospitais, para outrosA 5uantos
sacrif%cios fazia pela F$re'a3 0s que professavam a reli$ião e compareciam 1s missas eram poucos, misturavam
catolicismo com espiritismo e fetichismo. E o pior era enfrentar esses endemoninhados ma)ons. @embrava-se dos
boletins espalhados pelo Cituruna, assinados com o pseudônimo de @uism!r.6JM8

> tempo sofria violenta campanha. Desde que se ne$ara a receber na i$re'inha o cadver de um influente ma)om,
os boletins se alastraram por bai*o das portas das casas. Encontrara um na pr(pria sacristia.

;ra*edes e +irino levaram o padre at! uma encruzilhada, sem trocar palavras. Fa acabrunhado, encurvado no lombo
do burrico. ;oderia ter sido morto. E pensar que vivia para os outros, para fazer o bem... /e santo não fosse, $ozava
de fama. Era comum ouvir-se — bom como frei /ilv!rio, se'a virtuoso como o santo frade. E*istia para a
F$re'a. Cem sabia das fbulas a seu respeito. ?m pinheiro seco não ca%ra sobre o cavalo de uma 'ovem noiva porque
o pai não quis esper-lo para celebrar o casamentoA ?m ma)om não morrera acidentado por não querer confessar-se
com eleA ?ma menina vira o pr(prio +risto a seu lado3 #as frei /ilv!rio se sentia humilhado, abandonado. ão
sabia como entrar em +uritibanos. 0 'uiz e o boticrio zombariam dele, e o boticrio van$loriar-se-ia. +onhecia-os
bastante. Do fiasco, os ma)ons ufanar-se-iam.

S noite, em &aquaru)u, #anoel come)ou a chorar, no que foi lo$o acompanhado por todo o povo. Depois, entrou
na palho)a e dormiu. ão se es$otara o primeiro minuto da madru$ada quando um $rito lancinante acordou o
acampamento. 5uerubina fora atender Dorinha e, ao chamar #anoel, este não lhe atendera. /acudindo-o para
despert-lo, percebera que o filho estava morto. #anoel era um cadver estendido sobre a tarimba. ez-se o
$uardamento, todo mundo chorando, solu)ando. 0 defunto ficou em cima da mesa, os c%rios iluminando o caminho
para a alma, uma chave entre as mãos para abrir a porta do c!u. #uita prosa, chimarrão, caf! e cacha)a. #as as
mulheres rezavam e pediam a intercessão do mon$e. 5uando come)aram os c2nticos do meio-dia, houve o mila$re:
#anoel ressuscitou3 /ubitamente, er$ueu-se e sentou-se, dizendo:

— Eu não morri3 5uando estou dormindo, vou ao c!u falar com são "os! #aria. &enho ordem de dormir com tr=s
vir$ens e fazer a $uerra de são /ebastião3

?m a um, então, lhe bei'aram os p!s e se foram a render $ra)as no quadro santo.

 noite ' vinha perto e ainda se ouviam os hinos, a cantoria desafinada. E*citado, lbrico, #anoel se diri$iu 1
capela, onde dormiu com tr=s vir$ens, as quais dei*aram de ser vir$ens. oi um esc2ndalo. "oaquim, seu sobrinho,
com $rande sabedoria, passou a e*ercer a chefia de todo o reduto, e seu primeiro ato consistiu em mandar sovar
#anoel com varas de marmeleiro. Demonstrando $rande aptidão e capacidade para o comando, ordenou ao avô
Qebinho que passasse quinze dias deitado de bru)os para que se tornasse santo.
"oaquim era um prod%$io: vidente, diri$iria o e*!rcito de são "os! #aria, al!m do re$imento dos meninos — apesar
de, no reduto, viverem pelados da estirpe de +hico Bentura, ;ra*edes, "erôme, lonso, Benuto Caiano, Elias de
#orais — o 'uiz de paz —, u$usto #oreira — o escrivão, esse a$ora chamado #aneta, o que perdeu a mão no
combate do Frani.

Entrementes, na fazendola do Eliazinho dos /antos, são "os! #aria apareceu 1 vir$em #aria 4osa, ordenando que
se proclamasse a monarquia, em ;erdizes, e que fosse coroado 4ocha lves como imperador.  not%cia correu mato
e, ao norte de &aquaru)u, como este, sur$iu o reduto de +ara$uat, ainda i$norado pelas autoridades. Em
+uritibanos, obedecendo ao coronel lbuquerque, concentraram-se for)as policiais e uma centena de 'a$un)os 1
frente dos quais se encontravam o Dente de 0uro e "oão 4uas. Enquanto uma companhia do L.U 4e$imento che$ava
a ;orto ?nião da Bit(ria, festivamente recebida, outra se deslocava para Erval. +anoinhas ' estava ocupada pelo
E*!rcito.

"oaquim sabia que &aquaru)u seria atacada. &amb!m Dorinha, pitonisa, dissera-o vrias vezes. /e a luta ainda se
não travara, havia uma causa. "uca &avares, que se dizia disposto a lutar contra os paranaenses de ;orto ?nião da
Bit(ria, em favor dos direitos de /anta +atarina, convencera 4ocha lves a mandar impetrar um habeas-corpus ao
/upremo &ribunal ederal. 0 rbula redi$iu o requerimento, com muitas assinaturas a ro$o, no qual se ale$ava
cerceamento de liberdade de culto, mas o instrumento s( provocara curiosidade na capital do pa%s.

lertado por "erôme, o sbio "oaquim então nomeou lonso comandante do e*!rcito de são "os! #aria,
proclamando-o menino-deus e menino vir$em3 esse momento, houve $rande del%rio no quadro santo.

o dia do ataque a &aquaru)u — 7K de dezembro — o reduto estava preparado, seria defendido pela cavalaria do
c!u. #anoel fora perdoado e carre$aria uma bandeira sa$rada, a qual deveria acenar de dentro da trincheira, a fim
de que cinqüenta peludos morressem cada vez que a levantasse. &amb!m os sessenta meninos, armados de varas de
marmelo, ficariam no reduto para defender os não-combatentes. 0 acampamento estaria sob a prote)ão dos santos,
enquanto perdurassem as rezas. /omente os soldados que tivessem fac9es e armas de fo$o, se$undo as ordens de
lonso, tentariam cortar o caminho 1s for)as dos peludos. ssim, apenas dois pequenos $rupos foram destacados
para emboscar o inimi$o. ?ma $uarda, a de Benuto Caiano, ficou $uarnecendo a estrada norte do redutoG outra,
formada pelos que s( bri$avam a facão, vi$iava o sul. qui e acol, ora na copa do pinheiro, ora de dentro da
imbuia, nos cerrados, nos passos dos rios, os bombeiros tamb!m se punham em posi)ão de combate. 5uando as
colunas dos peludos se apro*imaram das $uardas, ' estavam encurraladas. 0s comandados de Benuto Caiano
puseram a correr os vaqueanos do Dente de 0uro e, ainda, se chocaram com o destacamento do L.U 4e$imento, que
retrocedeu ap(s vrias horas de tiroteio.  for)a que viera pelo sul nem combateu: re$ressou a +ampos ovos
assim que o piquete de "oão Bieira fez fu$ir uma patrulha de vaqueanos

&aquaru)u se re'ubilou com a vit(ria, houve missa e procissão em a)ão de $ra)as. "os! #aria, que velava pelo
reduto, foi mais uma vez $lorificado. s armas e as muni)9es dos car$ueiros apreendidos ao inimi$o, lonso as
distribuiu aos homens de bri$a. +ontinuava a prtica reli$iosa e o arrebanhamento de $ado por bem ou por mal. 
not%cia da derrota dos soldados da repblica atra%a mais $ente a &aquaru)u, principalmente os perse$uidos pelos
coron!is De ;aula, ra'o, lbuquerque e outros rica)os do mato.

CAPÍTULO IX

5uando ;ra*edes soube que che$aram a +uritibanos as mercadorias que encomendara a uma firma de lorian(polis
e que haviam sido apreendidas a mando do coronel lbuquerque, ficou indi$nado. Era um pelado, fora ministro da
azenda, mas não tomara parte nos combates travados no Frani e em &aquaru)u. conselhara-se com frei /ilv!rio,
seu ami$o, e resolvera não hostilizar o E*!rcito nacional. rei /ilv!rio, com o crucifi*o entre as mãos, prometera
a'udar os camponeses pobres, levar-lhe as reivindica)9es de terras ao <overno, e dissera mal dos pol%ticos, dos
coron!is ambiciosos, das companhias esbulhadoras. De nada adiantara a palavra do frade. E ;ra*edes achava-se
afrontado. +omprara a dinheiro, o transporte por sua conta. /eu estoque diminu%ra, vendia muito, por!m fiava
demais. ão faltavam querosene, sal, fumo de corda, bebidas, a)car, mel, cereais, chumbo e p(lvora, mas tecidos e
armarinhos. o lado da pilha de carteirinhas de ci$arros /port, /imila, Elite e a%sca, ma)os de palha, havia muito
arti$o de farmcia dentro dos vidros. /e bem que estivesse a ponto de voltar 1s hostes de "os! #aria, ainda se
preocupava com a casa de ne$(cios. >omem de e*cepcional prest%$io no Cituruna, nunca fora ofendido e
humilhado. ;oderia morrer pobre, mas dei*aria aos filhos um patrimônio de honra. +arter de a)o, um fio do
bi$odão, de pontas ca%das como a aba do chapelão de boiadeiro, $arantia a palavra empenhada, valia uma fortuna,
um mundo, uma vida. ão fora por acaso que, certa vez, "os! #aria o escolhera para e*ercer o car$o de ministro da
azenda. Duas tropas que tamb!m traziam seis espin$ardas e cerca de tr=s mil cartuchos haviam sido presas em
+uritibanos.  car$a estava amontoada num canto do improvisado quartel de pol%cia.

o momento em que soube do caso, ;ra*edes se e*altou e come)ou a comentar detrs do balcão. 0s fre$ueses
a$lomerando-se, muitos dispostos a buscar as mercadorias. 0s que 'o$avam malha suspenderam o torneio.

o partir de madru$ada, acostumado a ser obedecido, disse 1 mulher:

— /e eu não voltar, leve tudo para o reduto. /ão "os! #aria cuidar dos meus.

@evou consi$o o filho mais velho e al$uns camaradas, entre eles o ;edro &eles. l$uns muares foram pu*ados pelos
cavaleiros. o apro*imar-se da povoa)ão, ;ra*edes foi recebido a bala. #as, sem se intimidar, er$ueu uma bandeira
branca e, então, o coronel lbuquerque, 1 frente da tropa de policiais e vaqueanos, desceu do burrico e veio abra)ar
;ra*edes, como ami$o, comprometendo a palavra de homem:

— Boc= est $arantido...

;ra*edes evitou-o e deu as costas 1 escolta dos peludos, pronunciando suas ltimas palavras:

— 5uero as minhas fazendas que vim buscar...

esse instante, foi metralhado trai)oeiramente, enquanto tamb!m tombavam quatro companheiros. ão tivessem
seu filho e ;edro &eles aproveitado a confusão do tiroteio para fu$ir, a carnificina seria completa.

Dizem que ;ra*edes não estava morto quando foi transportado para o quartel, e que teria sofrido horrores antes de
e*pirar. 5uem sabeA ;ela cara de frei /ilv!rio, era de se desconfiar, nunca fora visto tão abatido. +om persist=ncia,
convencera as autoridades a permitirem que o corpo fosse entre$ue aos familiares, com uma tr!$ua.

Do fundo da cama, 1 beira da morte, com violenta disenteria, frei /ilv!rio recebia visitas e fazia pedidos dessa
natureza. &amb!m estava morrendo, por!m o superior hierrquico lhe ordenara que vivesse para suprir a falta de
sacerdotes. balado f%sica e moralmente, pedira a e*trema-un)ão, que lhe fora ne$ada. Então, houve um mila$re.
Fsto ap(s a $randiosa procissão em que foi carre$ado num ban$ü=, a fim de restabelecer-se.

a encruzilhada onde h uma palho)a abandonada ao p! de frondosa can'erana e se er$ue uma cruz informe, de
bra)o quebrado, habitam lobisomens e mulas-sem-cabe)a. 0 boitat acende os olhos chame'antes, o capiroto
apavora o viandante desprevenido. a madru$ada, eles não dormem, preferem atormentar as crian)as nos
pesadelos. i de quem por l passar na hora fat%dica da meia-noite... #as ! ponto de encontro de namorados, se a
noiva est fu$indo, se o $alo canta antes do tempo. Duas sendas tortuosas de l se vão, para l conver$em
serpenteando. uma vinha a mila$rosa procissão de frei /ilv!rio, na outra, o enterro de ;ra*edes — o e*-ministro
da azenda. 0 sil=ncio noturno cortado ora pelo murmrio das rezas, ora pelos $ritos nostl$icos dos carre$adores
da rede que ecoavam pelas quebradas. De todas as choupanas sa%a $ente para formar o s!quito de ;ra*edes e, l na
encruzilhada, frei /ilv!rio se levantou do ban$ü=, assombrando o povo de +uritibanos. icara bom de sbito e
acabara voltando a p! para o convento. 0s pelados atribuem a cura 1 intercessão de são "os! #aria, que tem
piedade dos infelizes, enquanto os peludos afirmam que s( frei /ilv!rio ! santo de verdade. &alvez fosse, pois
evitara o que parecia inevitvel — a bri$a, pedindo que uns respeitassem os outros, retornando acompanhado pelos
coron!is e seus vaqueanos.

#aria 4osa 1 frente, vestida de branco. De l partira o corte'o fnebre para o cemit!rio. s mulheres entoavam
hinos, Dorinha inocente como um passarinho. 0s pares de ran)a, $raves e contrafeitos, escoltavam o corpo.
"erôme chorava, +hico &aquara prometia vin$an)as.

o local, permaneceram a palho)a, a can'erana e a cruz anônima. H uma cruz onde não ardem velas, ! uma cruz de
alma solitria, de alma penada. #uitos contam que a hist(ria daquela cruz ! uma hist(ria de dinheiro enterrado. 0
ne$ro 0le$rio sabia que não era. ão sur$ira por causa de dinheiro, nem por causa de mulher.  hist(ria daquela
cruz ! a hist(ria de um cote'o.  palho)a fora um boteco, 0le$rio o freqüentava. &udo aconteceu num sbado, 1
tarde. De p!, um $rupo de caipiras rodeava a mesa, assistindo ao 'o$o. Caralho acaba em duelo. Qebinho sempre
dizia: brinquedo de homem 'unto, cheira defunto. 0 parceiro, um vaqueano que fora $uarda da @umber, era muito
atrevido. ;ior que pol%cia, pensavam os espectadores. Depois do Frani, 0le$rio mancava de uma perna, e o
'a$un)o o provocara com sorna:

— "o$a, co*o.

Em frente a cada contendor, um copo de cacha)a e o facão desembainhado...

— &ruco3

— /eis3

— "o$a, co*o3

0 capan$a venceu a partida e a assist=ncia. 0le$rio, im(vel, fitava o cabra que o escarmentou:

— H co*o mesmo, não me aperreie.

#etido a valentão, Qico Code estava b=bedo e queria mostrar que era macho. &inha os fios do bi$ode e da barba
escorridos para bai*o, 'ustificando a alcunha. ;arecia ter focinho, e a cabeleira poenta semelhava palha de a)o.

— & me infernando, timbin$a duma fi$a3 ;ule pra fora, porco espinho3 ;eludo lazarento3

0s espectadores cercaram emocionados, na estrada, os $ladiadores. mbos bufavam de c(lera e se espancavam 1


l2mina. 0 a)o ficou rubro de san$ue, talho com menos de palmo ! arranhão. Qico Code atacava com a boca
arre$anhada, cara enfurecida de fera. um vaiv!m a arena ia-se deslocando para a encruzilhada. 0le$rio,
manque'ando, ne$aceava o corpo e arremetia com $olpes certeiros, abrindo fundas feridas no adversrio cada vez
mais e*an$ue, que tal destreza não esperava do ne$ro. <in$ando, o capan$a ras$ou a co*a esquerda de 0le$rio,
mas levou um lanho na face e ficou sonso. 0 san$ue escorria das l%n$uas de a)o, tin$ia a roupa, encharcava as
botas, ala$ava o chão. Defrontavam-se encurvados, a$achados, peito e ventre encolhidos. Estilo do mestre +hico
&aquara. +ada qual mais atento, procurando achar o outro desprevenido. in$ia-se uma pancada e desferia-se outra,
tentava-se uma cutilada. a ltima vez que $olpeou o ar, Qico Code perdeu o equil%brio e caiu como facão de
0le$rio cravado no peito.
in$u!m sentiu a sua morte e Qico Code virou cruz, cruz anônima de encruzilhada. +ruz onde nin$u!m acende
velas. E nunca mais se pronunciou seu nome, a fim de evitar a apro*ima)ão da alma do falecido. 0le$rio ocultou-
se na casa verde, mas conhecia toda a hist(ria daquela cruz.

#uitas cruzes havia no Cituruna, como aquela, impressionando pessoas de cidade. 0 Dr. &lio de ran)a, promotor
pblico de ?nião da Bit(ria, rec!m-che$ado ao +ontestado, compôs estes versos muito elo$iados na !poca:

+ruz

 mar$em dessa lon$a estrada curva

E sem rumor, eu, descrente supus

5ue at! não fosse, a vista quase turva,

5ue não fosse uma cruz.

&urbado o sonho, o cora)ão tremente,

;ensei então que aqueles bra)os nus

Estivessem a rir profundamente...

5ue não fosse uma cruz.


#as ai3 Doce clarão depois me veio:

Em seu olhar se fez de novo a luz.

E assim de dor e de remorsos cheio

Bi bem que era uma cruz.

/audade, amor, recorda)ão sincera...

&udo enfim3 &udo quanto ! dor, traduz,

essa fera e solidão de tapera,

&ristemente uma cruz.

En*er$ando esse frio e triste cerne

5ue lembra uma ilusão, e dor, "esus...

5uem haver que, então, não se consterne

En*er$ando uma cruzA...


CAPÍTULO X

4ubra flor, dourados frutos, verde touceira, a bromelicea abundante dera nome ao novo reduto: +ara$uat.

#aria 4osa, anunciando as ordens emanadas do mon$e, era mais que bela, um encanto, possu%a al$o de sublime. 0
que acontecera a Qebinho e sua fam%lia, repetira-se na fazendola do Eliazinho dos /antos. 0 mon$e fizera apari)ão
nos sonhos, acabara falando com ela ao t=-la a'oelhada ante a cai*inha de ossa /enhora. 5ue a vir$em dissesse ao
povo para coroar imperador 4ocha lves, o maior festeiro da casa verde, e que se instaurasse a alme'ada
monarquia. #aria 4osa cumpriu seu destino a deslumbrar, a fanatizar a multidão, e nas chapadas da serra do
+apador sur$iu qual rubra flor de dourados frutos e verde touceira o reduto de +ara$uat. qui, todos obedeciam
ce$amente 1 vir$em: o pr(prio pai, Eliazinho dos /antos, curvava-se. 0s doze pares de ran)a, 1 frente Q! &i$re e
@eandro ;alma, escoltavam-na or$ulhosos. Entre eles, mais $arboso, mais $alhardo, o ntoninho, contente da vida
e de seu amor. Deodato, apai*onado mas rebelde, não podendo suportar o descaso de #aria 4osa, unira-se 1
volvel, 1 doidivanas +oncei)ão — a que não via homens sem e*perimentar dese'os, mormente o msculo e retinto
"oaquim <ermano, o que provocava esc2ndalo no acampamento. /omente Deodato nada via e nada sabia, tão
fin$ida a rapari$a, tão boa na cama como passando a me*er as ancas. ndrade quase lhe conta, quase precipita a
tra$!dia.

4ameirinha, +oncei)ão provocava a todos. &enta)ão em pessoa, resistiam-na por medo de Deodato ou por medo
aos casti$os do inferno. +he$ara a ponto de oferecer-se a ntoninho, esfre$ando-lhe as nde$as. ntoninho ia
derrub-la, levantar-lhe o vestido vermelho, mas o preto "oaquim <ermano, que a se$uira como um cão danado,
acabou presenciando a cena do abra)o e impedindo o desfecho. 0 fato ! que ntoninho a evitava, mas dizem que
nem frei /ilv!rio pôde se conter diante da ladina +oncei)ão, quando a reteve na sacristia. "oaquim <ermano variava
por causa dela, possu%a-a na aus=ncia de Deodato, e todo mundo sabia.

 come)ar pelo pr(prio 4ocha lves, os principais chefes pelados estavam em +ara$uat. Entre eles, o 'uiz de paz,
Elias de #oraisG o escrivão, u$usto #oreira, o manetaG EliazinhoG ra$osoG "oão BieiraG ;itoca — al!m de homens
como 0le$rio, "oaquim <ermano, +oco, <idoca e os irmãos /ampaio. &avares, o rbula a um s( tempo fantico e
partidrio de /anta +atarina no lit%$io de fronteiras, tamb!m comparecera. " impetrara um habeas-corpus ao
/upremo &ribunal e, por 4ocha lves, fora encarre$ado de redi$ir um manifesto 1 na)ão brasileira. companhou-o,
aderindo 1 causa comum da monarquia, um e*-fiscal da estrada de ferro e anti$o capitão da <uarda acional,
lei*o.

+he$ava muita $ente nova a +ara$uat. Em +anoinhas, fez sucesso a not%cia: Conifcio ;apudo, que ali estivera 1s
ordens do 'uiz de direito, chefiando um bando de vaqueanos, passara-se para os fanticos. 0 +ontestado tornara-
se um territ(rio rebelado, o assassinato de ;ra*edes indi$nando os crentes. ovos redutos foram formados, por!m
dependentes de +ara$uat, onde se combinou uma $rande festa para o dia da coroa)ão de 4ocha lves e da
proclama)ão da monarquia.  hecatombe de &aquaru)u ser um canto l$ubre, uma nota dissonante, um sudrio,
uma mortalha estendida em farrapos sobre as p$inas da hist(ria brasileira.

6Do Dirio da &arde, edi)ão de JU de fevereiro de JKJV.8

CAPÍTULO XI
lonso, o menino-deus, o menino vir$em, mas pai de numerosa fam%lia, mandou cavar trincheiras dentro de
&aquaru)u.

Depois que ;edro &eles e um $rupo de ami$os do finado ;ra*edes andaram fazendo tropelias nas imedia)9es de
+uritibanos, tentando assalt-la, che$aram refor)os de todas as partes e l acantonaram. Era a nova e*pedi)ão que
se formara para arrasar o reduto. +ompunham-na cerca de setecentos e cinqüenta homens e cento e cinqüenta
car$ueirosG uma se)ão de artilharia de montanha, duas se)9es de metralhadoras, o 4e$imento de ;ol%cia de /anta
+atarina e o IV.U Catalhão de +a)adores. 0s edif%cios pblicos e casas particulares de +uritibanos estavam
superlotados de soldados, inclusive o velho teatrinho de tbuas e a pr(pria mansão do coronel lbuquerque. Este, a
e*emplo de outros latifundirios da re$ião, e*ultava com os acontecimentos. 0 fanfarrão +olete e o acovardado
;adeiro, $auchescos, procuraram o tenente-coronel leluia ;ires e se ofereceram para combater com seus
vaqueanos mas, e*i$indo pa$amento astronômico, foram dispensados. Entre os chefes desses bandos de
mercenrios, havia um, sempre presente, que parecia um porco em p!, repelente, inclusive com o bi$odão spero e
no'ento. ?m san$uinrio.

Defreitas, o deputado paranaense que conspirava em ?nião da Bit(ria, com a triste "unta <overnativa do Estado das
#iss9es, estava em +uritibanos para acompanhar as tropas, incumbido de parlamentar com Qebinho.

Fnfestada de bombeiros a mata, "erôme sa%ra a p!, cedo, com o cabisbai*o e meditabundo &rabuco. +onfiava no faro
do 'a$uara, na ora)ão mila$rosa do patu e no e*perimentado facão. Boltou ao reduto trazendo a not%cia da
apro*ima)ão das for)as atacantes. inda ouviu o deputado Defreitas parlamentar com Qebinho, quando muitos '
corriam para as trincheiras li$eiramente cavadas no solo, e "oaquim punha em forma seus sessenta meninos
armados com varas de marmeleiro.

— Em nome do marechal >ermes da onseca, presidente da repblica, vim dizer-lhe para mandar dispersar sua
$ente, antes que che$uem tropas com metralhadoras para acabar com esses a'untamentos...

Qebinho foi lo$o interrompendo o pol%tico, cassando-lhe a palavra:

— Di$a ao marechal >ermes que mande lo$o uma metralhadora, que eu quero conhecer. Depois lhe dou a
resposta...

;ercebendo a inutilidade da via$em empreendida, o deputado Defreitas retornou com os seus $uias.

;oucos eram os homens em condi)9es de combate em &aquaru)u, e eles não contavam com armas e muni)9es.
?ma vintena de clavinas em mãos de e*%mios atiradores, por!m as balas dificilmente poderiam atin$ir o alvo. 0
pelado fazia raias no pro'!til e furava o cano da espin$arda para ouvir o assobio. 0 tiro sibilando era o nico de
valor. #as, com isso, a arma perdia o alcance e a precisão. +ora$em, astcia de %ndio ou de fera, tudo isto sobrava
no combatente — por!m, era s(. +onhecimento de arte militar não tinha.

&aquaru)u, com sua i$re'inha e suas taperas, a pra)a fervilhando de fanticos a rezarem, era um aldeamento
indefeso, aberto, escancarado. +onfiavam ce$amente na prote)ão de são "os! #aria. 0 mon$e, no c!u, velaria pelos
crentes. +ada vez que #anoel ou outro fantico acenasse a bandeira sa$rada, cinqüenta peludos cairiam
fulminados. s varas de marmeleiro, chicoteando o ar, desbaratariam as cavalarias inimi$as. 0s outros atirariam de
perto ou lutariam a ferro branco.

;r(*imo ao arraial, havia um monte bastante escalvado, para o qual "erôme destacara dois bombeiros. De l se
divisava nitidamente o reduto. Bia-se o que as pessoas faziam nas ruelas ou na pra)a.  e*celente posi)ão custou a
vida de ambos, cu'as orelhas testemunharam o feito, levadas para +uritibanos. aquela colina, rala de mata, foram
assestados os canh9es e as metralhadoras do E*!rcito, enquanto o 4e$imento de ;ol%cia e o IV.U Catalhão de
+a)adores se estenderam como uma muralha de soldados, tendo por torre o outeiro artilhado.
#eio-dia. 0 povo ainda estava formado no quadro santo, ouvindo as ltimas ordens de lonso, Qebinho e "oaquim,
quando e*plodiram as primeiras $ranadas, fazendo v%timas entre as velhas rezadeiras.

— ;ara as trincheiras3

— Biva a monarquia3

— Biva são /ebastião3

— Biva são "os! #aria3

0 quadro era pavoroso, a i$re'inha e as miserveis palho)as ardendo em chamas, troando o canhão, cerrando $ente
a metralha, mulheres e crian)as a tombarem, despeda)ados os corpos.

Crado de $uerra, &aquaru)u ! um clamor, um $rito de socorro, um lamento.

0s $ritos que partem de dentro das trincheiras revidam o ataque:

— #iserveis3

— ;!s-redondo3

— +ovardes, lar$uem a mquina de costura3

— Benham bri$ar a ferro branco3

— +ovardes, lar$uem a mquina de costura3

s bandeiras sa$radas acenadas, as varas de marmeleiro surravam o ar, mas não surtiam o efeito dese'ado, pois o
bombardeio continuava a cada momento mais intenso. E raras vezes al$uma bala sibilante abria uma rosa de san$ue
na dourada tnica do militar apavorado.

ão era um combate, mas uma chacina. Das mulheres e crian)as que se haviam refu$iado na i$re'inha, nenhuma
escapara com vida. rderam em chamas as taperas. 0 quadro santo estava ala$ado de san$ueG os homens, feridosG
os meninos, chorando e $ritando dentro das trincheiras. ;oucos escaparam 1 carnificina.

/omente quando cessou o fo$o "os! #aria che$ou 1 frente da cavalaria do c!u, punindo os a$ressores, enchendo os
cr!dulos de espanto. Ene$recendo rapidamente, a tarde estremecia revolta. 0s raios cortavam os ares, o ribombo
atemorizava a soldadesca inimi$a, enquanto a chuva prote$ia a retirada dos pelados. #aria 4osa, avisada da
tra$!dia, mandara os doze pares de ran)a au*iliar os irmãos, trazendo-os para +ara$uat.  missão fora
cumprida com dificuldades, ainda que se aproveitasse o momento da tempestade e a escuridão da noite convulsa.
ão havia pelado que não apresentasse ferimentos, o que tornara dif%cil a tarefa. bandonada, &aquaru)u ficara
'uncada de cadveres. penas uma anti$a fantica, que enlouquecera, permanecera uivando c2nticos em frente 1
ermida incendiada.

/e os fazendeiros e seus 'a$un)os e*ultavam, se os policiais contavam proezas, tal não acontecia entre os soldados
do E*!rcito. &anto o capitão Espiridião como o tenente ristides, ambos do IU 4e$imento de Fnfantaria, indi$nados
com as a)9es covardes da pol%cia, acabaram recolhidos 1 sede da inspe)ão militar, em +uritiba.

 not%cia de uma estrondosa vit(ria corria o Crasil, por!m não se vira uma batalha, antes uma chacina. #atos
+osta, um capitão ainda 'ovem, comandante do LU 4e$imento de Fnfantaria, um dos militares realmente bravos,
possu%a cora$em para demonstrar simpatia pela causa dos camponeses, que, e*plicava, eram brasileiros espoliados
em seus direitos. ?m patriota sincero, mo)o entusiasta, impunha-se 1 admira)ão dos cole$as e da soldadesca com
seu esp%rito compreensivo e $eneroso, sua visão incomum.  tnica abotoada ao meio, de lar$os bolsos, de $ola alta
ostentando nos dois lados o nmero JLG o quepe de oficial com dois fuzis cruzados, ins%$nia da infantaria — a
farda, enfim, nunca esteve melhor assentada e honrada do que naquele oficial de olhar franco e ar ale$re cu'os
bi$odes, ne$ros e vastos, não podiam esconder-lhe a 'uventude. Era ele quem falava em favor dos camponeses,
des$ostando os latifundirios. /ua voz ' não se ouvia apenas no +ontestado, no quartel ou nos c%rculos de prosa
formados no bar da JI de ovembro l de ;orto ?nião da Bit(ria. Embora os 'ornais preferissem os depoimentos
do deputado Defreitas e do coronel lbuquerque, ou entrevista de frei /ilv!rio narrando suas perip!cias, tudo
corroborando a versão em que os camponeses não passavam de criminosos, a a)ão de #atos +osta produzia frutos.
/uas id!ias encontravam acolhida. 0 m!rito cabia principalmente ao democrtico Dirio da &arde, de +uritiba, que,
em sua primeira p$ina da edi)ão de I de 'aneiro de JKJV, estampava o arti$o: ;ela >umanidade. @iam-se t(picos
como estes:

H um crime o espin$ardeamento, a trucida)ão desse $rupo de infelizes patr%cios — homens, mulheres e crian)as —
que a$em inocentemente, acorrentados 1 ce$ueira da i$nor2ncia e su$estionados pelo fanatismo reli$ioso.

creditamos, por!m, que al!m do motivo propriamente reli$ioso ha'a tamb!m, no fundo, pelo menos da parte de
al$uns dos a$re$ados, um dese'o de vin$an)a contra as autoridades de +uritibanos e +ampos ovos por
perse$ui)9es e espolia)9es de que essa $ente se quei*a.

Essa crueldade não se compadece com os nossos sentimentos de 'usti)a, não se coaduna com os nobres impulsos de
um povo cultoG ! um crime, ! uma afronta 1 nossa civiliza)ão.

0s coron!is ficavam indi$nados com esse modo de encarar os acontecimentos e, em +uritiba, houve pol=mica entre
o Dirio da &arde e o Dirio do +om!rcio. 0 Dia, de lorian(polis, procurou 'ustificar com veem=ncia a matan)a.
#as o arti$o ;arlamentrios uzilados, em que o Dirio da &arde reprovava o assassinato de ;ra*edes, não teve
resposta.

0s que se van$loriavam dos tristes feitos não eram os que participavam efetivamente das campanhas. 0s pra)as, de
tudo ressentidos, quei*avam-se, lamentavam-se — e o pr(prio tenente-coronel leluia ;ires comunicou ao
comando da 4e$ião que estava enfermo, para não mais diri$ir as tropas.

CAPÍTULO XII

&aquaru)u mudara-se, temporariamente, para +ara$uat. #uitos feridos morriam, apesar do sbio tratamento com
salmoura e ervas mila$rosas, enquanto outros se restabeleciam. Qebinho, atin$ido numa das pernas, estava entre
estes. #uitos foram os que perderam entes queridos e houve casos, como o de Elias de #orais, em que toda a
fam%lia sucumbiu. $ora, ele comandava as rezas, comovido.

a verde mata, na casa verde, o reduto vermelho. Bermelho de san$ue, +ara$uat. 4ubra flor em verde touceira.
5uem colher seus frutos douradosA

os c!us de"os!


encontrado +ara$uat havia cidades,
#aria dentro e*!rcitos,
de uma cova i$re'as.
de tatu. s vir$ens
0 reduto era umaviam-nas
fortalezaperfeitamente, assim
divina. E os que como na
morriam tinham
terra
iam formar na cruzada que se e*ercitava no espa)o. ;or isso, Qebinho respondia quando lhe per$untavam de
"oaquim, o sbio menino:
— ;assou-se.

&alvez no c!u comandasse sessenta an'inhos armados com varas de marmeleiro...

o dia pro$ramado, realizou-se a festa de coroa)ão do imperador e da proclama)ão. >ouve uma $rande
churrascada em pleno quadro santo. S tarde, 4ocha lves recebeu o diadema de latão, de 'oelhos ante 1 vir$em
#aria 4osa, e o povo prorrompeu em viva ao novo imperador e 1 monarquia, enquanto os pares de ran)a al)avam
as espadas, e ressoavam salvas de tiros para o ar. Em nome de são "os! #aria, 4ocha lves lavrou de viva voz o
decreto de nomea)9es: Qebinho, secretrio-$eral do <overnoG +hico Bentura, ministro da <uerraG Eliazinho,
ministro da azendaG "oaquim Bidal, ministro da $riculturaG Elias de #orais, comandante das 4ezas e da orma,
al!m de 'uiz de pazG ra$oso, comandante do campamentoG &aquara, comandante do EntreveroG lonso, o
menino-deus, o menino vir$em, comandante $eralG seu a'udante, o velho "erôme. #anteve, assim, a constitui)ão do
$overno do mon$e, substituindo o finado ;ra*edes pelo Eliazinho. alou do trono:

— 0s povos de são "oão e são "os! #aria devem formar redutos em todo o territ(rio do Crasil, no sul e no norte.
"oão Bieira, #arcelo, "osefino, &avares, lei*o e ;apudo serão comandantes. Eliazinho arrecadar dinheiro, com
abai*o-assinado, para financiar a santa cruzada. "oaquim Bidal cuidar das ro)as e não dei*ar faltar mantimentos.
Biva são "oão e são "os! #aria3 Biva a monarquia3

/ua vontade era lei e assim se faria. Fnmeros redutos sur$iram 1s pressas no Cituruna. #uito dinheiro seria
arrecadado. Bidal destacaria mulheres para o trato do $ado leiteiro oculto nos currais inacess%veis e homens para
constru)ão de mon'olos, plantio de milho, mandioca, moran$os e cereais.

5uando 4ocha lves terminou, &avares se pôs defronte 1 cruz, de costa para ela, e leu o manifesto que redi$ira de
acordo com os chefes pelados e que deveria ser impresso e distribu%do 1 popula)ão quando, na reconstitu%da
&aquaru)u, fosse tamb!m aclamado o novo imperador.6JJ8

uzilaria saudou a nova lei. 0 manifesto seria datado de I de a$osto porque, nesse dia, inau$urar-se-ia a nova
&aquaru)u. Então, 4ocha lves mandou &avares, ;apudo, lei*o e outros formarem novos redutos na re$ião do
&amandu, ordenando ao povo que se preparasse para a batalha iminente. 0s pares de ran)a escoltaram as vir$ens,
deram quatro voltas no quadro santo, levando-as 1 i$re'inha onde elas dormiam acompanhadas de Qefa e
5uerubina.

— #orada de santa — disse ntoninho a #aria 4osa, bei'ando-lhe a mão.

o alvorecer, abrindo-se o sol em p!talas de luz, lante'oulando a rancharia tosca, tr=s tiros para o ar avisaram que o
deputado Defreitas vinha parlamentar e ne$ociar a paz. 0 $overno recebeu-o na sede provis(ria, a casa de 4ocha
lves. 0 chimarrão corria a roda, Defreitas sentou-se, chupou o mate e e*pôs as finalidades da visita:

— 0 marechal >ermes est animado pelo dese'o de não hostilizar os senhores, desde que obede)am 1s autoridades
e cessem de 'untar $ente para provocar anarquia.

— narquiaA... Fsto aqui não ! solo da repblica — interrompeu 4ocha lves.

— 0s senhores compreendam: a repblica ! uma realidade que nin$u!m mais pode i$norar e que os homens '
provaram ser o melhor re$ime pol%tico.

— #elhorA... hn3 — e*clamou Qebinho, co)ando a cabe)a, interpelando-o:

— Bosmic= ! cat(licoA 5uem ! mais inteli$ente, o homem ou DeusA

— /ou cat(lico, tenho certeza que ! Deus.


— Entonce me responda: Deus ! rei ou presidente da repblicaA...

Defreitas desconversou:

— 0 $overno da repblica est disposto a ne$ociar a paz com os senhores, quer saber se os senhores aceitam
dinheiro. Estou autorizado a oferecer cem mil contos.

Elias de #orais, 'uiz de paz, +omandante das 4ezas e da orma, tinha autoridade de chefe e fez a proposta dos
pelados:

— (s mandamos dispersar o povo se forem presos e enforcados os coron!is Depaula, abr%cio, lbuquerque,
mazonas, fonso +amar$o, ;edro Bieira, ;edro 4uivo, os irmãos #iechmie]oO], mais uns outros, e depois que
nos derem de volta as vidas das mulheres e das crian)as assassinadas em &aquaru)u.

0 ministro da <uerra, Bentura, completou-a com mais uma condi)ão:

— (s queremos um milhão de contos de r!is e a restaura)ão da monarquia3

0 Defreitas ficou desapontado, mas como pol%tico velho não demonstrou contrariedade. #aneirosamente, abra)ou
um a um ao despedir-se, dizendo-se ami$o de todos, dei*ando-os desconfiados. final, assim fazia com os eleitores,
habituado a distribuir apertos de mão a caipiras.

os dias que precediam o combate, os piquetes dei*avam +ara$uat, ora em busca de ddivas, dinheiro,
mercadorias e alimentosG ora arrebanhando $ado, prendendo e matando peludos, reconhecendo o terreno. 5uando
al$um capan$a de coronel vinha amarrado para o reduto, sofria o chamado supl%cio da estaca no quadro santo.
+om um talho de facão sob o quei*o, onde se fincava o pau pontia$udo, o bruto ficava pendurado, esvaindo-se em
san$ue, pa$ando os pecados3

racassada a missão do deputado Defreitas, as tropas que haviam reduzido &aquaru)u a cinzas e que se achavam
acantonadas em +a)ador, a$ora sob o comando do tenente-coronel <ameiro, receberam ordem para destruir
+ara$uat.

#as lonso, o menino-deus, o menino vir$em, não se descuidava. 0uvira aos bombeiros as advert=ncias e fora
alertado pelos doze pares de ran)a. Então providenciara medidas de defesa. #andara postar $uardas nos bifurcos
dos caminhos. S frente de cinqüenta atiradores, diri$ira-se para a estrada principal que demandava o reduto. a do
norte, destacara outros tantos pelados sob a chefia de Benuto Caiano.

;ara a defesa do carreiro do oeste, contava com a vir$em #aria 4osa e os doze pares de ran)a, al!m de trinta
combatentes armados de facão.

0 inimi$o avan)ava em tr=s colunas a conver$irem sobre a mesma presa. Era fla$rante a superioridade em homens,
armas e muni)9es. #etralhadoras, fuzis e canh9es contra espin$ardas e fac9es.

 mata via e ouvia. +onfundindo-se com a floresta, com as rvores, com as folhas secas, os pelados estavam 1
espreita, acoitados nos troncos de imbuia, nas copas dos pinheiros, nas trincheiras camufladas.

;ela estrada $eral vinham cinqüenta soldados. o entrarem num loda)al, a sa%da estava truncada, impedida por
enormes troncos tombados no chão. Emboscada de lonso e seus comandados.  tropa caiu em p2nico, as pra)as
chafurdavam de bru)os, inundando de san$ue o p2ntano.  retirada se processava desordenada, sob silvos de balas e
mote'os de caipiras triunfantes.
0 $rosso da tropa, cavalaria 1 frente, mais de seiscentos homens, enveredou pelo oeste. S espera estavam os doze
pares de ran)a, empol$ados com a presen)a de #aria 4osa. Fnvis%veis, como fantasmas. /omente a fuma)a da
p(lvora denunciava-lhes as posi)9es. 0s soldados não sabiam como e para onde apontar as armas, aterrorizados,
paralisados. /ob o fo$o de inimi$os que lhes pareciam milhares, recuavam espavoridos.

o passo do riacho +anhada unda, postara-se a $uarda de Benuto Caiano. ;ressentida pelo capitão #atos +osta,
travou-se cerrado tiroteio, com bai*as de lado a lado, enquanto "erôme e +hico &aquara ansiavam pela hora da
es$rima. #as os canh9es obstaculizavam as a)9es, as metralhadoras atiravam a esmo. 5uando a coluna, caladas as
baionetas, entra na mata para descobrir e desalo'ar os pelados, ainda assim ! colhida de surpresa por uma
demon%aca falan$e de fanticos. Encharcam-se de san$ue as douradas fardas milicianas, retalhadas a $olpes de
facão. ?m tenente e vrios subalternos são prostrados a pancadas, e s( os cadveres dos rasos são poupados. +hico
&aquara, "erôme, Cibiano, 0le$rio, #aneta, os irmãos /ampaio, e outros que sabiam bri$ar apenas 1 arma branca,
espumavam de (dio. 5uando o corneteiro come)ou a tocar socorro, +oncei)ão assomou 1 trincheira e alve'ou-o
com certeiro tiro de rev(lver.

Entrementes, +hico Bentura marchara para /ão /ebastião das ;erdizes, com outros ministros e mais uma centena de
homens. 0 lu$are'o fora transformado em base de opera)9es do inimi$o, a reta$uarda — l estava o hospital de
emer$=ncia, funcionando na anti$a i$re'inha. De inopino, h o assalto, os feridos são abatidos ao se levantarem das
macas, ou fo$em assustados para as matas.  a)ão retaliadora ! rpida e eficiente. p(s levarem a morte e o p2nico
1 ltima fila do inimi$o, os atacantes tornam a se espalhar pela floresta.

 ttica, contudo, era atrair cada vez mais para o fundo da selva o e*!rcito invasor, lev-lo, inclusive para dentro do
pr(prio reduto abandonado. #as, acudindo a tropa desnorteada, soou plan$ente o toque de retirada...

&aquaru)u fora vin$ada. #orreram tr=s pares de ran)a, inclusive o comandante @eandro ;alma. 0utros pelados
tamb!m pa$aram a vit(ria com a vida, mas os a$ressores tiveram cerca de cinqüenta bai*as, a metade em mortos.

CAPÍTULO XIII

s crian)as choravam os pais e os pais os filhosG as vivas, os finados esposos. +he$aram 1 casa verde os tr=s
anunciados fla$elos: fome, peste e $uerra.  fome precedeu 1 $uerra, e esta 1 peste. 0 tifo dizimava os sublevados.
0 pr(prio 4ocha lves se achava acamado, com violenta disenteria. #ais de seiscentas pessoas, em +ara$uat,
estavam a sucumbir do mal. &odos os dias havia enterro. 0 arraial tornou-se fnebre.  febre fazia mais v%timas
entre as crian)as, mas fam%lias inteirinhas se acabaram repentinamente. s receitas caseiras, as ervas mila$rosas,
surtiam pouco ou nenhum efeito. "os! #aria chamava muita $ente para o c!u... Dorinha, a vir$em Dorinha, fora
uma das primeiras.

@o$o se decidiu a mudan)a da sede do $overno para outro local. pesar da epidemia avassaladora, persistia a
resist=ncia.

#ontada em seu vistoso corcel ornado de prata e veludo, de fran'as e fitas, #aria 4osa ia 1 frente dos retirantes,

escoltada ca%da
cabeleira pelos aos
pares de ran)a
ombros, era ae fada
se$uida por mais
da ut(pica duzentosacavaleiros.
revolu)ão, +omeseu
inspirar 2nimo vestidinho
cora$em branco,
at! aos mais castanha
infelizes.
trs da tropa de muares, vinham a p! centenas de homens e mulheres, a carre$arem trou*as 1s costas e crian)as
aos colos. 0utros transportavam enfermos em improvisadas macas. a ltima linha, uma dezena de boiadeiros
tocava o rebanho.  caravana s( interrompia a via$em se al$uma parturiente dava 1 luz, pondo no mundo um novo
crente, ou se era preciso abrir cova para o que partia a chamado do mon$e.

 sete l!$uas por %nvios caminhos, o terreno ideal para o novo acampamento era circundado de rochas e bosques.
li, em ;edras Crancas, foi eri$ida a i$re'inha e demarcado o quadro santo. +ontornando-o, no chão a$reste nasceu
uma centena de palho)as. >ouve festa.  procissão comovida, por al$uns acompanhada de 'oelhos, introduziu na
ermida a ima$em idolatrada de são /ebastião. Bidal, Qebinho, +oco e <idoca assaram o apetitoso churrasco. 
viola e a rabeca, ao ar livre, ale$raram o povo. Fnmeros casamentos foram celebrados. s vivas cansaram de tanto
chorar e esperar a prometida ressurrei)ão dos mortos e, da vir$em, receberam ordens para contrair conbios
sacramentados pelo 'uiz de paz Elias de #orais, e pelo escrivão, o #aneta.  pr(pria #aria 4osa apareceu de mãos
dadas com ntoninho no quadro santo e manifestou ao pai o dese'o de lo$o se casar. Emocionara Eliazinho,
acrescentando 1s ltimas palavras: na terra ou no c!u.  not%cia a$radara e ale$rara, mas preocupara tamb!m.
4ocha lves voltara $ravemente enfermo de +ara$uat para a sua fazenda, ref$io bem $uardado por inmeros
a$re$ados. ão seria interessante faltar 1 vir$em #aria 4osa. 0 casamento contava com o consentimento $eral,
mas s( para mais tarde, ou para nunca mais. 5ue se amassem ntoninho e #aria 4osa, mas que a união fosse de
fato celebrada pelo pr(prio "os! #aria...

&al not%cia a$radara a todos, com e*ce)ão de Deodato, que, para a$ravar seu estado de esp%rito, desconfiava cada
vez mais da den$osa +oncei)ão, sempre o cime a morder-lhe o peito.

+oncei)ão tinha $estos $raciosos, pretensão e faceirice. Bestia-se bem. 0u melhor: ca%a-lhe admiravelmente a chita
estampada, limpinha, esvoa)ante 1s frescas ra'adas dos campos. Dei*ava os filhos entre$ues 1 fiel Dad, recebia e
visitava homens, passava derramando sensualidade do corpo inteirinho — dos seios, do colo, das cadeiras —,
despertando dese'os. Era o esc2ndalo do reduto.
— 4ameirinha.

mava a todos e a nenhum, apesar do indel!vel sentimento de asco, de aversão, que e*perimentava ao entre$ar-se.
Desdenhava de tudo, desprezava a vida e o mundo, $ostava de enciumar e inve'ar, $erar des$ra)as, vin$ando-se do
que lhe acontecera. " de nada valiam os conselhos de Dad. /( "erôme costumava dizer aos camponeses:

— o fundo ! uma boa alma, i$ual a n(is.

Deodato vin$ava-se nos peludos. +hefiava piquetes que incendiavam fazendas e arrebanhavam $ado. ?m dia, ele
pr(prio levou uma e*pedi)ão 1 +huva de ;edra. ez uma enorme fo$ueira do casarão e fuzilou o coronel ;etrônio.

— Bai morrer, des$ra)ado3


— /ou um pai de fam%lia3 — suplicou o p!-redondo.

— 5uem não respeita as filhas dos pobres, não ! pai...

Dilo$o curto precedeu a e*ecu)ão.

Deodato tornara-se tão feroz e temido que ' se fazia obedecer, embora lonso desse os comandos das terr%veis
sortidas sertane'as a +astelhano, ;itoca, 0le$rio, abor e Benuto Caiano.

;or determina)ão de lonso e #aria 4osa, de ;edras Crancas os redutos se alastraram pelo Cituruna revoltado.
;ouco distante dali, sur$iu o de Bacas Crancas. 0utros menores se formaram nas mar$ens dos rios &amandu e
&imbozinho, bem como na /erra do +a)ador e na de /anta #aria.
o norte, onde predominaria a autoridade do &avares, lo$o seriam fundados o de Conifcio ;apudo, entre os rios
&imb( e ;aci=ncia, com $uardas postadas em Carra Berde e ;iedadeG o do pr(prio &avares e sua rapari$a, na serra
do Espi$ãoG e o do c!lebre lei*o, na serra dos Bieira. &amb!m nesta re$ião havia minsculos povoadinhos em p!-
de-$uerra sob o comando de valentes como /alvador Bieira e #arcelo. 0s vaqueanos diziam redutinhos. ?m
parecia um ;almares em miniatura e era conhecido como o reduto dos pretos. Dir-se-ia que continuava cada vez
mais encarni)ada a luta contra a escravidão.

Em cada nova aldeia, nunca fortificada, uma i$re'inha, um quadro santo, a rancharia desabando ao vento, e o
mon'olo pilando o milho...

"oão Bieira, anti$o operrio — a$ora, um desocupado, que ' tomara parte num sufocado motim dos trabalhadores
—, fora substitu%do como par de ran)a, para ser nomeado comandante $eral do reduto de /anto ntônio, alvo de
nova investida das for)as em opera)ão de $uerra.

 casa verde estava infestada pela soldadesca, cu'o 2nimo impressionara o $eneral #esquita, o qual, desi$nado para
diri$ir a incursão ao +ontestado, revelou o fato, comunicando que encontrara a tropa em latente efervesc=ncia de
revolta pela falta de conforto e abandono em que se achava. Em ;orto ?nião da Bit(ria e em +uritibanos, tendo no
lombo a e*peri=ncia de +anudos, pôde bem aquilatar o que era aquela insurrei)ão anticoronelista. &rocara id!ias
com o capitão #atos +osta, que lhe dissera:

— ão passam de pobres camponeses, nossos patr%cios, rebelados contra as in'usti)as de que são vitimas, a situa)ão
de mis!ria em que se encontram. 0 nico rem!dio poss%vel ! a desapropria)ão das companhias estran$eiras e dos
latifndios, e a distribui)ão de lotes de terras aos que trabalham. Esse fanatismo reli$ioso nada representa, ! um
prete*to, um desabafo dos e*plorados.
mbos combinaram e*por a situa)ão ao $overno e o prop(sito de evitar o fratric%dio, mas cumpriam as
determina)9es superiores.

0s bombeiros sondaram a concentra)ão na fazenda dos ;ardos, pr(*ima a +almomG viram a che$ada de refor)os e
acompanharam os movimentos das colunas. Desta vez vinham dois mil homens, abr%cio e sua $ente inclu%dos, e
seriam mais se o $eneral não houvesse dispensado a pol%cia. Ss for)as precedentes estava a$ora incorporado o ZU
4e$imento de infantaria.

lonso reuniu o povo em ;edras Crancas, enviou mensa$eiros aos redutos e 1s $uardas. &aquaru)u e +ara$uat,
que das cinzas haviam renascido, deveriam ser encontrados desertos, e os outros tinham de resistir se fossem
atacados. ;ara as serras do Espi$ão, +a)ador e /anta #aria, partiram patrulhas para obstruir os caminhos e armar
emboscadas.
s tropas, que se prepararam em ;orto ?nião da Bit(ria e de l embarcaram para ;o)o ;reto, ao che$arem 1 ponte
do &imb(, encontraram preso a uma vara um bilhete: cordo dos fanticos. — 5uem não quiser morrer não venha
c. 0rdem do nosso +hefe /uperior Divino Esp%rito /anto. +omandante.

Dias antes, um tenente que se aventurara a atravess-la sozinho foi picado a facão. &ranspuseram-na, afinal, vrias
companhias de diversos re$imentos, com suas se)9es de artilharia — canh9es e metralhadoras —, $uiados pelos
vaqueanos, em dire)ão ao reduto de /anto ntônio. #archavam em coluna de costado, a um de fundo, adentrando
peri$osas picadas entulhadas de arbustos. /( isso ' constitu%a um sacrif%cio %mpar, $l(ria, odiss!ia, ainda que o
dese'o fosse o de ir ao arrepio para os quart!is. 0 avan)o era intil, o comboio debandava: a farda, a mochila, o
cal)ado, a arma, a fome, tudo atrapalhava — ' não bastasse a falta de 2nimo numa luta que se não afi$urava 'usta.

S entrada do reduto, somente duzentos homens comandados por "oão Bieira opunham resist=ncia, espalhados pelos
arredores, metidos em troncos de imbuia ou trepados nos pinheiros. s outras $uardas $uerrilheiras, 1 espreita nos
topes das colinas e das montanhas, nem foram molestadas. /e a coluna que incendiara &aquaru)u e +ara$uat
prosse$uisse a caminhada, faria a via$em do corvo, depararia com os doze pares de ran)a e os infantes de lonso
postados nos entraves e nas $rotas da serra.

0 canhoneio foi intenso, as palhocinhas do reduto rebentavam como as bombas, enquanto al$uns pinheiros
tombavam ao impacto da artilharia. De quando em quando, um militar ca%a atin$ido pelos pro'!teis que ras$avam o
ar sibilando, aterrorizando os soldados que atiravam a esmo, sem divisar o inimi$o.

S tardezinha, considerando-se vitoriosas, as tropas le$ais bivacaram dentro do reduto. 0 re$ozi'o durou dois dias.
o se prepararem para o re$resso, aconteceu o inesperado. /ão "os! #aria sur$iu com a cavalaria do c!u a lan)ar
raios nos ares e a procela para impedir a retirada enquanto, fazendo o cerco dos peludos encurralados, a hoste de
"oão Bieira fazia fo$o, de prefer=ncia sobre os oficiais, levando o p2nico, alvoro)ando a soldadesca. +om canh9es e
metralhadoras bombardeando os bosques, o e*!rcito fez contramarcha.

o dia seis de setembro

/e$uia de ;orto ?nião

0 capitão #atos +osta

;ara o campo de /ão "oão.

Fa com setenta pra)as

 fim de reconhecer
ão sabia aquele bravo

5ue era o dia de morrer.

E os 'a$un)os a $ritarem

uma zoada infernal

+om sua vir$em da frente

#andando tudo avan)ar.

?m velho com um tambor

 vir$em com uma capela

0s soldados disseram

Bamos fazer fo$o nela...

6De uns versos encontrados no lu$ar denominado /ão "oão dos ;obres.8

CAPÍTULO XIV
s pol%cias estaduais, os bandos de vaqueanos e o pr(prio JLU Catalhão de Fnfantaria, sediado em ;orto ?nião da
Bit(ria, não obstante a presen)a do destemido comandante, capitão #atos +osta, não se aventurariam a empreender
a)9es no sertão rebelado. 0s pelados sabiam disso. em #atos +osta tinha inten)ão de fazer a $uerra. ;rocurava a
paz, mas a paz verdadeira. #andara sua tropa acampar 1s mar$ens do F$ua)u, apenas com a incumb=ncia de
$uarnecer a ferrovia entre +anoinhas e ;orto ?nião da Bit(ria, e tamb!m a chamada Bila ova de &imb(. ;ara
certificar-se do acerto de suas id!ias e decis9es, resolvera entrar em contato com o E*!rcito e são "oão #aria. ?m
dia, vestiu-se 1 paisana, apanhou duas malas velhas cheias de quinquilharias e, em companhia de um fot($rafo,
visitou &aquaru)u, +ara$uat e ;edras Crancas. o tra'eto da via$em, $ozava da hospitalidade cabocla. +omia do
que havia, dormia como podia. o sair, levava tudo que o pelado lhe podia dar: amor e saudade. Em cada cabana
fazia um ami$o verdadeiro. o che$ar a &aquaru)u, ' sabia quem era o pelado. Fa desatrelando as mulas,
distribuindo espelhinhos e pentes para as mulheres, len)os para os homens, e entrando na roda do chimarrão,
enquanto o companheiro tirava retratos. Eram recebidos a churrasco, com $rande ale$ria. &odos ofereciam pouso,
cada qual com mais empenho.  pobreza e a hospitalidade tocavam-lhe o cora)ão de brasileiro e patriota. o
inda$ar sobre os motivos da $uerra, obtinha sempre a resposta:

— (is queremos um peda)o de terra pra trabalhar. /ão "os! #aria s( veio salvar os pobres. (is aqui s( não
$ostamos dos coron!is e dos miserveis.

&anto em +ara$uat como em ;edras Crancas teve i$ual acolhida. "erôme ficou encantado com uma m$ica infantil
do fot($rafo, lhe ofertou um patu e um pinhão cru do bornal. #atos +osta, conversando com lonso, Deodato,
ntoninho, Qebinho e outros, quis convenc=-los da inutilidade da luta, mas Qebinho resolveu a questão:

— ão adianta bri$arem com n(is. /e matarem os pobres, os ricos não comem e o Crasil não vai ter mais
morador... 5ue adianta canh9es contra a cavalaria do c!uA /ão "os! #aria tem mais poder que todos os e*!rcitos do
mundo.

— 0s soldados brasileiros não querem atirar sobre seus irmãos brasileiros e não concordam com a e*plora)ão dos
coron!is e das companhias — disse #atos +osta.

— #as tem que obedecer 1s ordens do $overno. ;or isso ! preciso implantar a monarquia — ponderou Qebinho.

— #ec= parece crente... — disse um velho esfarrapado a #atos +osta.

0 capitão assistiu 1s cerimônias do quadro santo e lonso permitiu um bailarico em homena$em aos ami$os
visitantes. a manhã se$uinte, todo o povo de ;edras Crancas se despediu, com #aria 4osa concedendo b=n)ãos
do santo mon$e e os pares atirando para o ar. #atos +osta nunca mais esqueceu o que presenciara.

De volta, resolveu a$ir. Em +uritiba e no 4io de "aneiro, comparecia 1 reda)ão de 'ornais, inclusive acompanhado
de dois caboclos. Declarava te*tualmente:

— 0s 'a$un)os se quei*am de que o coronel Depaula e outros chefes pol%ticos lhes tomaram as terras que
habitavam e a$ora lhes impedem de recorrer 1s terras devolutas do $overno, por se terem apossado delas pessoas
conhecidas e que t=m facilidade de obter dos $overnos $randes territ(rios nos dois Estados.

Era o esclarecimento necessrio, mas ouvido com muito desa$rado pelas autoridades. 0 mo)o capitão era o
E*!rcito falando. in$u!m tinha tanto prest%$io. 5uando, em ;orto ?nião da Bit(ria, os soldados esbo)aram um
levante, revoltados contra a $uerra in'usta, a falta de conforto e provis9es, bastou a presen)a do modesto
comandante para acalm-los. aquela cidade, tornou-se ami$o tamb!m de frei /ilv!rio, do professor /erapião e de
outros não muito bem vistos pelos fazendeiros. #atos +osta, com sua atua)ão, contrariava os pol%ticos interesseiros
e os diretores das companhias, que, com o apoio das autoridades municipais, sabotavam-lhe a a)ão pacificadora.
>ouve quem tivesse o desplante de tele$rafar ao 4io, reclamando provid=ncias ur$entes. 0s coron!is aumentavam
os impostos, prendiam, matavam. 0 coronel lbuquerque che$ava a e*i$ir que o reverenciassem nas ruas, tirando o
chap!u, o que era um $rande insulto para quem morava no Cituruna.

$ora, &avares e*plorava o lit%$io entre o ;aran e /anta +atarina, e*i$indo a e*ecu)ão da senten)a. ;apudo e
lei*o, dizendo-se adeptos da causa, amea)avam +anoinhas.

Em +ara$uat, 4ocha lves, que fora proclamado imperador, depois de distribu%do o manifesto, morrera de tifo. 
coroa, $uardada na capela de ;edras Crancas, va$a, apenas simbolizava a monarquia.

o princ%pio do m=s de setembro de JKJV, ap(s consultar a vir$em, lonso e*pediu ordens para a ofensiva $eral.
Ele pr(prio comandou uma sortida a +almom, fuzilando todos os que considerava miserveis. os campos de /ão
"oão de +ima, uma patrulha pelada anunciou a $uerra com o fo$o ateado 1 serraria da @umber +olonization.
Esta)9es da estrada de ferro foram atacadas e incendiadas, o nmero de v%timas crescia.

5uando #atos +osta soube dos acontecimentos, alarmado e preocupado, embarcou num trem especial, com
sessenta soldados e dois sar$entos, em dire)ão a /ão "os!, onde ' houvera um assalto.

;r(*imo 1 linha, &rabuco fare'a o chão, 1 cata de esterco. ?m fora$ido de /ão "oão fez parar o comboio e mostra o
cão rabu$ento ao comandante. #atos +osta, então, desceu com uma escolta 1 frente do trem. o apro*imar-se de
um vassoural, a tropa come)ou a ser alve'ada, travando intenso tiroteio com o inimi$o emboscado. 0 trem come)a
a correr para trs e s( vai parar em ;orto ?nião da Bit(ria...

#atos +osta manda calar baionetas. 4ufa um tambor, #aria 4osa vem 1 frente, carre$ando uma capela. De facão
em punho, os doze pares de ran)a investem contra o pelotão, prostrando os que não fo$em espavoridos pelas
matas. #atos +osta tomba, procurando socorrer seus comandados.

l$uns pelados foram mortos pelas costas. Benuto Caiano ! que atirava sobre os pr(prios companheiros. oi
fuzilado na hora.

Enquanto a tra$!dia comovia a na)ão, frei /ilv!rio chorava ao encomendar os corpos ante a multidão curiosa de
;orto ?nião da Bit(ria, ' $uarnecida tamb!m pelo IJU de ca)adores. ?m piquete sertane'o assaltava a fazenda
/anta @eocdia, fuzilando o coronel Depaula. 0s camponeses vin$avam-se da mis!ria e dos sofrimentos do
passado, em tem%veis batidas pelo Cituruna.

;itoca recebeu por um mensa$eiro uma carta do menino-deus:

0 senhor rancisco #aria +amar$o.

Eu vos dou ordem e Deus e /ão "oão #aria lhe dar o poder e for)a para ir com um piquete de JI homem em casa
do "oão <oiten. /e houver peludo terão de bri$ar e esbode$ar com tudo os peludos e res$atar uns preso que tem l e
esta hora ser de madru$ada, entrarão nas trincheiras sem dar tiro s( a facão e depois disso ter o direito de lan)ar a
mão no que for dos peludos, s( menos em dinheiro isso sim nãoG e respeitar muito as fam%lia e não in'uriar e terão o
direito de dar as voltas que for necessriaG e enconvidar os que for do acampamento para virem com o que puderem
trazer, e o que for dos peludos ter o direito de 5ueimar, s( dechando casa onde acomode as fam%lias onde ficar e os
homens que for $oiten ! para vir de sepo aparado menos as fam%lias.

rancisco lonso de /ouza

. C. 0 que for da $era)ão doente que não venha e não pe$uem nada sinão rmamento e +ria)ão.
Era a ordem de ataque a +orisco, lu$are'o que, constava, su'eito 1 morf!ia. #insculo povoado distante apenas sete
l!$uas de +uritibanos, $uarnecia-o $ente do ne$ociante "oão <oiten, conhecido por "oão Cravo entre os peludos.
+ircundado por muros de pedra, estava bem defendido. #as, na calada da noite, o piquete de ;itoca che$ou sem ser
visto ou pressentido. +om fac9es i)ados nas mãos, os combatentes escalaram a muralha silenciosamente, uns pela
frente, outros por trs. Defronte 1 casa $rande do vilare'o, travou-se um terr%vel combate de arma branca, no escuro,
cada qual sem poder divisar a cara do adversrio. 0s $olpes sucediam-se, desferidos com maestria de lado a lado, o
san$ue borbulhando das feridas, inundando o chão. esse momento ! que os moradores acordaram e fizeram uso
das armas de fo$o, assustados com os vivas 1 monarquia e a são "os! #aria. H que os pelados haviam pele'ado
entre si pr(prios, cada um tomando por inimi$o o companheiro que vinha de frente. ;itoca fora mortalmente ferido
por um talho de facão, bem como outros pelados que com a vida pa$aram a terr%vel fa)anha de se baterem com
outros fanticos.
Dias antes, levando de vencida a cor'a vaqueana, +astelhano entrou triunfalmente em +uritibanos, comandando a
razia. 0s coron!is fu$iram com as autoridades.  cidade estava deserta e de 'oelhos.

— Bamos queimar a casa do coronel lbuquerque3

0s cavalos arde$os troteavam pelas ruas, levantando p(, dei*ando inc=ndios de rastro. 0s irmãos /ampaio davam
tiros para o ar, enquanto os outros $ritavam:

— Biva são "os! #aria3 Biva a monarquia3

—  c2mara tamb!m ! do coronel3 — insinuou <ralha.

— E a cadeia3 Bamos l3 — lembrou #aneta.

De alvenaria s( havia o edif%cio da c2mara e a resid=ncia do coronel lbuquerque, primeiros a ru%rem em chamas.
Depois, +hico Bentura vin$ou-se do boticrio. +he$ou a vez do pasquim e da casa de tele$ramas. Binte e duas
casas ardiam em chamas e esvoa)ava nas ruas o papel(rio da prefeitura, dos cart(rios e da coletoria. rmas,
muni)9es e mercadorias foram encontradas nos armaz!ns abandonados e levados a ;edras Crancas.

;or pouco não se repetiu o fato em @a$es, ao ser posto em debandada um ma$ote de peludos no +apão do
+hiqueiro, em +ampo lto, pr(*imo 1quela cidade.

0s piquetes de abor, 0le$rio e "oaquim <ermano s( travaram pequenos tiroteios, em incurs9es 1s fazendas. o
de 0le$rio, estava Deodato, cada vez mais feroz, e*cedendo-se no cumprimento da missão, de$olando o demônio.

?m dia, o pr(prio lonso resolveu comandar uma razia ao rio das ntas. /aiu cedo de ;edras Crancas, 1 frente de
seus doze homens. o se apro*imar da colônia de europeus, numa batalha feroz, acabou morrendo com todos os
doze camaradas.

 not%cia abalou ;edras Crancas, parecia inveross%mil. ;assara-se o menino-deus3, o menino vir$em3 " não
bastasse a des$ra)a da peste3 &odo dia morrendo $ente como formi$a. l$umas fam%lias ' come)avam a abandonar
os redutos, vencidas pela epidemia. /ur$iram os primeiros desentendimentos em ;edras Crancas. Elias de #orais
discordava do casamento de #aria 4osa e ntoninho, contrariando o consentimento do pr(prio Eliazinho, e
pretendia e*ercer o comando $eral. #aria 4osa, no entanto, anunciou no quadro santo, sob inspira)ão do mon$e,
que a escolha reca%a sobre ntoninho.

Dia feliz não e*iste se ntoninho e #aria 4osa não o viveram quando o povo os aclamava, ambos cumprimentados
entusiasticamente. /ob viv(rio, o comandante $eral bei'ou a vir$em. @o$o celebrar-se-ia o maior dos casamentos.
Deodato sofria. &inha uma dor $rande que não podia chorar. in$ia i$norar a trai)ão de +oncei)ão e sentia um (dio
que precisava desabafar. ;rometera a si pr(prio 'amais dei*ar #aria 4osa com outro se casar.

?m dia, ntoninho saiu de ;edras Crancas para fundar um reduto no &imb(. Deodato aproveitou a oportunidade e
ordenou a vrios homens que fossem 1 presen)a de Elias de #orais, e*i$indo que este o proclamasse comandante
$eral. ?m rec!m-che$ado asceta, recebido como um mon$e, concordou com a id!ia e Elias de #orais cedeu 1
pressão dos rebelados. E ai de quem não reconhecesse a autoridade de Deodato3 5uem não o vira com o facão
empunhado a estra)alhar peludos, a trucidar at! as fam%lias, coisa proibida, mas que não fora punida. E, 1 $rande
maioria, era indiferente a$ora a luta pelo posto, interessada somente em rezar e rezar.

— &anto faz, como tanto fez.


ntoninho estava no &imb(, $enufle*o ante 1 cruz, no momento em que foi preso pela escolta de confian)a de
Deodato. ão pôde rea$ir, surpreso com o fato, que se lhe afi$urava trai)ão. Estupefato, viu tr=s companheiros
baleados ao esbo)arem rea)ão. +om outros dois, foi conduzido de mãos amarradas ao reduto de ;edras Crancas.

o che$arem, os prisioneiros apearam da montaria no meio do quadro santo. 0 novo mon$e benzeu-os depois de
Deodato ordenar que fossem picados a facão. #aria 4osa não viu a de$ola, come)ou a chorar convulsivamente e
desmaiou. o acordar, repetia:

— 5uero morrer. #eu casamento ser no c!u. /ão "os! #aria ser meu padrinho.

Depois, parecia uma louca a pobrezinha, a va$ar pelo quadro santo.

— B pra casa, diabinha — *in$ava Deodato. Eliazinho ficou sob vi$il2ncia, mas os crentes come)aram a fu$ir dos
acampamentos, e a epidemia de tifo a dizim-los.

Deodato ordenou a +astelhano e +hico Bentura que continuassem a casti$ar os peludos. E seu ato mais prudente
foi mudar a sede do $overno para o reduto de /anta #aria, prote$ido pelas serras, pela floresta, pelos atoleiros,
pelos abismos e pelos saltos — reduto que, se$undo o descrevia o $eneral que viera comandar a $i$antesca
e*pedi)ão militar, não passava de um amontoado de povoa)9es que se estendem por lon$a curva de tr=s l!$uas,
cobrindo um claro nos vales das serras de /anta #aria e +a)ador. 0 centro distava nove l!$uas da anti$a /ão
/ebastião, a$ora ponto permanente de acantonamento do E*!rcito nacional.

s escaramu)as continuavam encarni)adas. +astelhano amea)ava a cidade de @a$es, cu'a popula)ão a abandonara,
mas perdeu a vida, 'untamente com uma dzia de bravos, num combate travado em +ampo Celo. 0 piquete chucro
de 0le$rio, de investida em investida, re$ressou a +a)ador. o norte, ;apudo, lei*o e &avares fusti$avam as
$uarni)9es militares, as colônias e as fazendas. bastados coron!is, como os ra'o e +arneiro, ficaram sem as
casas e sem as cria)9es.

" nin$u!m mais contestava a autoridade do comandante $eral, e Deodato anunciou no quadro santo:

— +oncei)ão ! uma rameira, deve morrer. osso casamento est desmanchado. Bou me casar com a viva do
comandante lonso.

o dia se$uinte, +oncei)ão foi de$olada e se realizou o conbio, com o novo mon$e fazendo uma cruz nas mãos
dos nubentes.

CAPÍTULO XV
t! as cidades afastadas do teatro de opera)9es, no Cituruna, ficaram alarmadas com as a)9es retaliadoras dos
pelados. as mais pr(*imas, o =*odo che$ava a ser total, as popula)9es correndo de susto. 0s sinos tocavam a
rebate, ouvidos em todo o pa%s. Diziam-se abandonados pelas autoridades os diretores das companhias e os
coron!is, muitos — como os <ordo, ra'o, +arneiro, +amar$o — ' visitados pelos piquetes fanticos.

tendendo prontamente aos reclamos, o $overno enviou uma enorme e*pedi)ão ao +ontestado, mobilizando novos
re$imentos, embarcados em trens e vapores. Era uma formidvel $uerra intestina que se travava, mas parecia haver
s!ria preocupa)ão em ocult-la, pois a imprensa s( noticiava com destaque os acontecimentos da confla$ra)ão
europ!ia, se ! que não i$norava, com os historiadores, o Crasil e os brasileiros, suas lutas, suas aspira)9es.

De +uritiba, /etembrino de +arvalho comandava cerca de sete mil homens em forma)ão de ataque, enquanto outras
for)as $uarneciam fazendas, cidades, fronteiras. ?m cerco $i$antesco se apertava sobre os camponeses amotinados
por "os! #aria.  primeira conseqü=ncia foi cessar o com!rcio, a troca de couro de boi pelo sal, armamento e outras
mercadorias indispensveis. &r=s colunas foram or$anizadas: a do oeste, com os IJU e IZU de ca)adores, o JIU e JLU
de infantariaG a do norte, com J7U e JLU batalh9es de infantaria, o ILU de ca)adores, um esquadrão de cavalaria, uma
se)ão de artilharia de montanha, um pelotão de en$enharia e destacamento de policiaisG a do leste, com o JMU
re$imento de infantaria, a mil%cia do ;aran, duas se)9es de metralhadoras, pelotão de cavalaria, e se)ão de
artilharia. #as, apesar do divertimento e dos namoricos nas cidades em que estacionavam, dos desfiles, dos
festivais nos teatrinhos de madeira, dos saraus e bailes ele$antes, aumentavam as partes de doente, de oficiais e
subalternos, que o $eneral tachava de numerosas e irritantes.  $rande novidade, que servia de tema permanente
1s conversa)9es nos botecos de ;orto ?nião da Bit(ria, era o empre$o da avia)ão. ;ela primeira vez tal arma
entraria em a)ão no Crasil, para espanto da popula)ão interiorana, que nunca havia visto um aeroplano.

#as o c!u ! a ptria da monarquia3 0 que ! Deus nas alturasA ;ensemos como Qebinho: rei ou presidente da
repblicaA 5uem domina as cidades que Dorinha e #aria 4osa viram suspensas no arA Donde parte a cavalaria
celeste sob o comando de são /ebastiãoA Donde "os! #aria vela pelos seus povosA

ão foi apenas um o pelado que profetizou a queda do $avião:

— Ele cai sozinho.

— Bai ser morto como um passarinho.

— Bou preparar meu bodoque... — dissera o velho "erôme.

?m conhecido carroceiro polaco acabou transportando o aviador, 'untamente com o aparelho, para ;orto ?nião da
Bit(ria, e*citada com o acontecimento.
os redutos, a situa)ão ia piorando. em a fome e o tifo venciam o 2nimo dos pelados. H verdade que faltava
a)car, sal, caf!, fumo, e at! carne. 5uando Bidal, ministro da $ricultura, mandara plantar, muitos aproveitaram a
ocasião para se entre$arem nas cidades. H que Deodato, o alucinado Deodato, parecia ter sede de san$ue. ão
respeitava mais nin$u!m. #altratava mulheres e crian)as, não admitia a mais leve quei*a — atropelava-as com o
cavalo. 5ualquer desobedi=ncia, punia com a morte. &ornara-se um tirano impiedoso. a mata, havia mel, pinhão,
ab(bora, buti, $abirobaG podia-se plantar milho, ca)ar o porcoG fazer a farinha de coqueiro. 0s ferimentos podiam
ser tratados com erva, cacha)a, salmoura, terra, teia de aranha.  morte era apenas um passaporte para o c!u. #as
Deodato, a cometer in'usti)as e barbaridades, ia, pouco a pouco, acabando a rebelião.

&endo conhecimento de tudo que acontecia com os fanticos, /etembrino de +arvalho mandou publicar e distribuir
por toda parte um apelo em que, principalmente, lhes oferecia lotes de terra:

azendo um apelo aos habitantes da zona confla$rada, que se acham em companhia dos fanticos, eu os convido a
que se retirem mesmo armados, para os pontos onde houver for)as, a cu'os comandantes devem apresentar-se.
% lhes serão $arantidos meios de subsist=ncia, at! que o $overno lhes d= terras, das quais passarão t%tulos de
propriedade.

 contar, por!m, desta data em diante, os que não fizerem espontaneamente e forem encontrados nos limites da
a)ão da tropa, serão considerados inimi$os e tratados com todos os ri$ores das leis de $uerra...

" não era vã a resist=ncia. final, pela palavra do $eneral, os $overnos se comprometiam a emitir t%tulos de
propriedade em favor dos camponeses. &alvez a promessa fosse cumprida, se o movimento não descambasse para a
anarquia, porque os que se entre$aram foram tra%dos. l$uns de$olados pelos vaqueanos, outros passados pelas
armas dos policiais.

rei /ilv!rio desempenhou seu papel. a companhia de um novo 'esu%ta, saiu de +anoinhas levando o apelo.
l$umas fam%lias lhe deram ouvidos. nimado, resolveu diri$ir-se aos redutos do norte. ;artiu cedo, 'unto com um
m!dico muito influente, $rande ami$o dos pobres. +ada qual num burrico. o serem divisados por uma $uarda, as
balas come)aram a assobiar e a montaria do m!dico tombou mortalmente atin$ida.

— /ou eu, frei /ilv!rio3 ão atirem3

;ensara em operar um mila$re e re$ressar triunfalmente como um santo a +anoinhas. /alvou-se por um triz e
voltou com o companheiro na $arupa, amuado com a ca)oada, o riso de mofa dos ma)ons. Em +anoinhas, não o
veneravam.

+anoinhas vivia sobressaltada, apesar do movimento de tantos soldados. #ulheres e crian)as tremiam de medo, os
homens fin$iam valentia, mas nem sequer abriam as 'anelas ao ouvir os estampidos das armas distantes. De Carra
Berde, um lu$are'o pr(*imo, depois do canto do $alo, sa%a uma patrulha pelada e ia fusti$ar a cidade, provocando
os canh9es e as metralhadoras do E*!rcito. 5uando o J7U batalhão, com um piquete de cavalaria, apoiado por
vaqueanos, marchou rumo a Carra Berde, foi batido e retornou. uma das incurs9es, em ;adilha, o bra)o direito de
lei*o foi decepado pela metralha. ;apudo, que chefiara um $rupo de fanticos que se chocara, nas pro*imidades
de ;apanduva, com o 4e$imento de /e$uran)a do ;aran, entre$ou-se 1s autoridades de +anoinhas e nin$u!m mais
soube dele. p(s inmeras escaramu)as com tropas acantonadas em ;apanduva, lei*o compreendeu num lance a
situa)ão e empreendeu retirada das imedia)9es.

Entretempo, o $eneral /etembrino de +arvalho, que vinha sendo alvo constante de investivas, acusado de diri$ir a
campanha comodamente instalado em +uritiba, enquanto as tropas estavam abandonadas 1 pr(pria sorte,
passando priva)9es, fome e frio ap(s conceber o plano $eral de ataque, che$ou a 4io e$ro e mandou distribuir
uma autoproclama)ão.6J78

&avares fora o nico dos rebelados a ler e entender o boletim, e a $ostar do estilo do <eneral. final, nem era um
campon=s, um fantico sincero, um pelado aut=ntico. &inha li$a)9es com certos coron!is de /anta +atarina, que o
prote$iam, interessados na e*plora)ão do lit%$io fronteiri)o, mas ' não cria pudesse escapar salvo da aventura. ão
contava com muita $ente. ;elado procurava pelado. &avares era, apenas, o rbula. Fnteressado no lema e*ecu)ão da
senten)a ou morte, não havia nin$u!m nos redutos. /abia-o &avares, apesar de redi$ir cartas a comandantes
fanticos nos termos da que enviou a #arcelo.6JN8

&al missiva foi achada no bolso da cal)a do cadver de #arcelo, quando uma companhia de infantaria, um bando de
vaqueanos, uma se)ão de metralhadoras e um contin$ente do VNU batalhão conse$uiram bivacar no reduto 'uncado
de mortos e feridos.

&ornou-se cr%tica a situa)ão de &avares. lei*o pretendia abandonar a serra dos Bieira e internar-se em re$ião
inacess%vel ao E*!rcito. Brios redutinhos, pr(*imos a +anoinhas, foram dei*ados 1s tropas cu'os chefes se
van$loriavam da fa)anha, feito e*traordinrio. /e a marcha constitu%a uma brilhante 'ornada, ma$n%fica
vit(ria, quanto mais a ocupa)ão de um arraial deserto...
&avares, que escolhera uma bela rapari$a para companheira e ' pensava em escapulir para outras pla$as, era
tratado com distin)ão pelos le$alistas. Em meados de dezembro, recebera uma carta de um ma'or que o convidava a
render-se. Então, che$ou a conferenciar com oficiais tratando e distratando, a dizer, a contradizer-se, fazendo
promessas, descumprindo a palavra. a ltima carta que enviou ao ma'or, escrevera, entre outras coisas:

ão podemos de forma al$uma, depor as armas a não ser depois de terminado o lit%$io entre os dois Estados 6/anta
+atarina e ;aran8 e mais al$uns pontos que, se$undo o que conversamos ficou combinadoG iludir-vos não posso,
tamb!m não sei fin$ir. #eu cora)ão embora de um homem que pe$ou em armas contra o poder ! sincero e leal, e o
micr(bio nocivo da sociedade corrupta, ainda não pôde o contaminar.

&inha sorte. ?m dia, foi encontrar-se com lei*o e lhe ofereceu dinheiro e mercadorias em troca de combatentes.
ão teve =*ito na ne$ocia)ão, nin$u!m o acompanhou. 5uando re$ressava, em seu belo animal, caiu numa
emboscada, livrando-se mila$rosamente por uma bala ter atin$ido o seu rev(lver, ainda na cintura. o saber que, na
serra do Fta'a%, vrias companhias ocuparam posi)9es e*ploradas pela cavalaria, e que poderosa artilharia fora
assestada no alto de uma co*ilha, fu$iu com a 'ovem cabocla.  chacina não se consumou, mas os verdadeiros
pelados se espalharam pelas matas.

0nde havia um campon=s, sua prole, uma palho)a, a matilha policial, a scia de vaqueanos ou, esporadicamente,
um piquete do E*!rcito entravam em a)ão destruindo tudo. 0s ranchos eram reduzidos a cinzas, presos ou
assassinados os ocupantes. " não havia em p! um aldeamento sertane'o.

Depois que ntoninho fora de$olado, ndrade s( não teve id=ntico destino por reclam-lo para bombeiro o "erôme.
#as perdera as honras de par de ran)a. Estava sempre pertinho de /ão /ebastião das ;erdizes, atocaiado no
vassoural. +om Deus e são "os! #aria, espionava as manobras do inimi$o e casti$ava al$um des$ra)ado que se
perdesse no bosque. Devido a homens como ele, os vaqueanos de +uritibanos se ne$avam a entrar nas matas de /ão
/ebastião das ;erdizes. #ane'ava o facão como se esta arma fosse parte do pr(prio ser, como um ti$re tem por
arma os pr(prios dentes. Estra)alhava o cabra. Descoberto por uma patrulha, não pôde resistir e foi preso. Cai*inho,
acorcundado, bronzeado, de barba rala, maltrapilho, a camisa tinta de san$ue seco, foi amarrado pelo pesco)o e, em
caminho, arquitetou um plano:

— #e sortem, que eu levo meceis pra conhec= o caminho de /anta #aria.

0s militares confiaram a abr%cio e seus vaqueanos a missão de reconhecimento. ndrade, com a corda ao pesco)o,
os punhos amarrados, mal podendo diri$ir o tordilho, ia 1 frente, contente, ar zombeteiro, mofando da morte.
Entrou por uma picada que levava a uma $rota cheia de caboclos, mas nesse instante, antes que pudesse realizar o
intento, foi pu*ado pela corda, arrastado pelo chão e ali mesmo de$olado.

"erôme palmilhara l!$uas e l!$uas de a$restes caminhos, rondando, olhos e ouvidos da mata. Fa quebrando ramos e
$alhos para marcar o tra'eto percorrido. l$umas vezes, che$ava 1s cidades e colhia informa)9es fazendo-se de
reles vendedor de mel ou rapaduras, fin$indo-se de bobo. &rabuco a'udava-o a simular idiotice e afi$urar-se
rid%culo. "erôme, quando voltava ao reduto, o fazia 1 noite, dilu%a-se nas sombras da floresta, vivo, astuto como uma
raposa. &inha f! nas ora)9es dos patus, que sabia de cor, e no seu afiado facão. ão possu%a outra arma. rrebatara
fuzis e sabres das mãos de inmeros p!s-redondos, mas preferia o fiel e anti$o picador de fumo, abridor de atalho.
/a%a a p!, com &rabuco, preocupado com o matun$o e a bicharada que dei*ava em casa. /entia saudades, não como
dos filhos e netos, al$uns dos quais nem conhecera, mas tamb!m saudades. > mais de uma semana dei*ara /anta
#aria, para espionar os movimentos envolventes dos peludos. +om o bornal min$uado de frutos do in$ e milho
tostado, ia lo$rando a fome e se mantinha em p!, embora tão ma$ro. #as era um forte. E se a beleza ! a
naturalidade, a sin$eleza, a espontaneidade, a simplicidade, então ele era belo. Estava atrs de uma moita, pr(*ima
a um bosque, vi$iando um contin$ente de cavalaria acampado pouco distante, vido por achar al$um pol%cia ou
vaqueano e*traviado.
+om forte escolta, um comboio de carro)as transportando prisioneiros, feridos e v%veres, vinha daquele ponto
estrat!$ico.

De c(coras, com a cabe)a $acha coberta pelo chap!u de palha, rosto velado, "erôme achara um trevo de quatro
folhas e sorrira. Depois passou cuspo em forma de cruz na ferida da perna e cismou na vida. Era o pensamento de
todos. mava os irmãos de cren)a, os in'usti)ados, os e*plorados e perse$uidosG odiava os miserveis, os coron!is
usurrios e $ananciosos, os seus lacaios, os seus $overnos, a sua repblica. 4ecordava-se da anti$a choupana al)ada
sob um pinheiral. Entristecia-se perdido no simpl(rio passado. ?m rancho, uma cabocla e um cavalo baio...
@embrava-se do despe'o, a palho)a queimada, a ro)a destru%da, a cria)ão roubada, uma menina violada e os outros
coiceados a carabina. Depois aquele va$ar inconstante pelos campos e matas, como o fizera são "oão #aria. quela
terr%vel 2nsia de liberdade. t! como vadio se sentia preso, quanto mais como a$re$ado. &alvez fosse bom espichar
as canelas e esquecer tudo. 5uem se importa com a vida de um pobre caipira, um pria infeliz. 5ue mal fizeram as
mulheres e as crian)as de &aquaru)uA 5uantas mais seriam assassinadas a rezaremA ão vinham a$ora milhares de
homens, soldados do Crasil, acabar com os caboclos brasileirosA &inham mquinas de bombas e balas, $avi9es de
a)o, e tudo que fosse preciso para arrasar a casa verde. ão satisfeitos em destru%rem os ranchinhos de palha, o
milharal de louras bonecas de lon$os cabelos, ' iniciavam uma derrubada para acabar tamb!m com as matas.
muado, ' descria na implanta)ão da monarquia. Deodato não estava 1 altura da missão: havia horas em que nem
parecia um cristão, um crente — não ouvia os conselhos dos mais velhos, não respeitava mais nin$u!m3 E de bol!u
voltava 1 mem(ria a ima$em de um rancho, uma cabocla e um cavalo baio... &udo cinzas — cinzas no chão, cinzas
no cora)ão.

+om os bi$odes apenas plantados sobre os cantos da boca, lon$os fios de barba escorrendo do quei*o, o caipira
pressentia o fim. inda alisou o pesco)o do sarnento &rabuco e acendeu o cachimbinho de bambu. Era um dos
$randes da i$re'a de são "os! #aria. #as como poderia Deus permitir tanta mis!ria, tanto crime no mundo, sendo
Con%ssimo e &odo-poderosoA Deus, que fez a natureza, as flores. Deus, que deu vida aos seres. oi Deus que
criou tantos pinheiros3 "erôme lan)ou um ltimo olhar 1 floresta: não viu a riqueza incalculvel, mas uma beleza
que sentia penetrar-lhe na alma, sacudir-lhe as carnes, e*citar-lhe os nervos. chou-se prisioneiro de tudo, do
mundo, dos homens, do pinheiral. >um3 0 rancho ! de pinho, de pinho ! a viola, ! feito de pinho o cai*ão...

Esfarrapado, descal)o, apenas com o facão enfrentando o mundo, a selva, o inimi$o, "erôme era um her(i e merecia
uma medalha. ;elado do estado-maior, chefe da i$re'a rebelde, combatente idealista, adivinho sonhador, tinha de
ser a$raciado por seus atos de bravura. #as ainda nada ostentava no peito franzino. +he$ara a$ora o seu momento
de $l(ria. ?ma medalha nas pr(prias carnes, uma fuzilaria como salva. ?ma medalha de chumbo penetrando o
cora)ão, um la)o de fita vermelha escorrendo no peito — uma medalha de morte, uma fita de san$ue.

 caravana se apro*imara. &rabuco latira delatando o dono.  posi)ão foi cercada e "erôme abatido, ca)ado na
pr(pria toca. 0 corpo ensan$üentado com o corte das orelhas, louros de $uerra, foi levado em lombo de burro,
nin$u!m sabe para onde. &rabuco, tomado por cachorro louco, morreu a paulada.

5uando ia lon$e o cadver de "erôme, vinham ' perto os socorros do c!u com salvas de estrelas e a noite carre$ou
nos bra)os o dia morto.

CAPÍTULO XVI

&odos os dias havia procissão em /anta #aria, o reduto com o nome do riacho encaracolado na serra, e do vale
aberto como uma tonsura na floresta. Deodato carre$ava a ima$em de são /ebastião numa das mãos, enquanto a
outra i)ava o facão como se a l2mina — l%n$ua de a)o — convidasse a combater os inimi$os da monarquia. 5uando
cessavam as preces, come)ava o viv(rio intenso, homena$eados a altos brados são /ebastião, são "oão e são "os!
#aria. E Deodato obri$ava a reconhecerem-no como santo, ao tempo em que frei #anoel, com sua esmolambada e
encardida casaca, o len)o cor-de-rosa ao pesco)o, as botinas abertas e retorcidas, era cultuado como mon$e,
ocupando a casa $rande do vilare'o, na qual tratava dos enfermos e feridos.

am!lico, resi$nado com os casti$os do c!u, estropiado, o povo continuava a formar no quadro santo, resistindo.
+om os olhos secos de tantas l$rimas choradas, na montaria de arreios de prata, enfeitados com la)os de fita,
silhão de veludo, de branco vestida, #aria 4osa era a vir$em a caval$ar escoltada pelos doze pares de ran)a. #as
não via ntoninho entre eles, não via nin$u!m, parecia uma louquinha, s( queria morrer. Dava respostas lacônicas
1s per$untas dos crentes e s( vivia a falar com "os! #aria, que a chamava para o c!u.
rmamento havia. ;oucas mulheres não tinham, como a vir$em, um rev(lver. +om os comboios apreendidos aos
le$alistas, muni)ão sobrava. +omo se fabricava farinha nos mon'olos, tamb!m se sabia fabricar balas para as
espin$ardas.

o meio do lar$o, aqui e acol, um e outro se apresentava com parte de fardamento tomado aos vencidos, ora tnica
ou camisa de campanha, ora cal)as ou culotes de brim cqui, ora botas ou perneiras — enquanto outros e*ibiam
pistolas militares ou reluzentes espadas e baionetas. Estas, para serem usadas, eram devidamente benzidas pelo frei
#anoel. Deodato tinha, preso ao ombro pela correia de couro, um fuzil novinho e, 1 cabe)a, um quepe de oficial,
al!m de possuir um bin(culo a tiracolo.

/( não havia provisão de boca. 0 $ado min$uava no oculto curral, a colheita diminu%a consideravelmente, havia
pouco tempo para plantar, e o com!rcio fora interrompido. #as o pior a suportar, ainda com a tirania do pr(prio
chefe, continuava a ser a epidemia, o mais terr%vel dos fla$elos vaticinados pelo mon$e "oão #aria de $ostinho. 
peste. Em /anta #aria morriam quatro ou cinco pessoas diariamente, e o tifo se alastrava cada vez mais. s
priva)9es eram as costumeiras. quele mundo de camponeses maltrapilhos — os pelados — 'amais $ozara de
conforto, 'amais tivera o prazer de contar com o prato cheio, com a roupa, e at! com o que fazer — abandonado,
alheio 1 civiliza)ão. +oronel $ordo e rico a viver das crias das vacas era considerado honesto e trabalhador, por!m,
quem vivia das pr(prias mãos se via tachado de pre$ui)oso, va$abundo, embora nem servi)o houvesse no Cituruna.
0 casarão dos coron!is, dominando as fazendas e as vilas, assinalava o marasmo, o atraso. Enfim, a fome era a
menor das tr=s des$ra)as. E a $uerra, uma tristeza por causa da chacina dos inocentes, da imola)ão de mulheres e
crian)as — tal não ocorresse, tomar parte nos combates seria uma ale$ria. 5uem não $ostaria de fazer parte do
e*!rcito de são "os! #aria e ser um soldado da monarquiaA 5uem não seria capaz de demonstrar quanto ! valenteA
5ue felicidade não era lutar por um peda)o de terra e pelo bem-estar de todos3...

ão fora a brutalidade de Deodato, tudo passava. &alvez nin$u!m desertasse a santa cruzada, entre$ando-se aos
peludos para ser assassinado. >ouve ainda um li$eiro des2nimo ao saber-se da morte de "erôme, a'udante do
comando $eral, um $rande ap(stolo da i$re'a.

Fn$entes for)as inimi$as, divididas nas tr=s colunas, entravam nas terras sa$radas, incendiando as choupanas,
destruindo tudo, matando os moradores da casa verde. 0 reduto de /anto ntônio, arraial onde s( ficaram os
homens, cu'as fam%lias se refu$iaram em &amandu, fora totalmente evacuado e abandonado por "oão Bieira e, lo$o
ap(s, arrasado pela hoste do capitão ;oti$uara.

Deodato mandara a $uarda de +arneirinho, no norte, entre$ar-se 1s autoridades de +anoinhas e se oferecer para
lutar como um bando de vaqueanos. Binte e tr=s caboclos, recebidos com satisfa)ão, acumulados de presentes e
carinhos. Fmediatamente lhe coube uma missão de reconhecimento, 1 frente de forma)ão inimi$a. +arneirinho e
seus homens iam conduzindo as tropas a uma emboscada. pro*imavam-se do local combinado, mas um tiro
acidental de dentro do mato traiu o plano audacioso. Descobertos, surpreendidos, ainda tentaram se revoltar, mas
não houve tempo para a a)ão. oram fuzilados pelas costas ou de$olados, pois a coluna orte, do capitão ;oti$uara,
não costumava fazer prisioneiros...
Deodato compreendeu num lance a import2ncia defensiva das serras e matas, com seus taimb!s e peraus. Em face
da imin=ncia do ataque $eral, ordenara aos bombeiros que dissessem a todos os crentes para abandonarem as
moradas e se espalharem pelos bosques e, em $rupos, sempre emboscados, sempre em movimento, darem combate
1s tropas, em escaramu)as. ;iquetes deveriam ficar 1 espreita nas quebradas dos caminhos, nos passos dos rios, nas
$ar$antas das serras. unca dei*ar-se enla)ar pelos p!s-redondos e nunca travar choques decisivos. tra%-los para
lon$e das bases, para o sertão i$noto, fazer es$otar a muni)ão, provis9es e ener$ia, e*tenu-los. <uerrear at! o fim
do mundo, at! o fim da vida, $uerra sem tr!$uas, $uerra sem fim. &udo em nome dos mon$es e da monarquia.
Então mudara a sede do $overno, o acampamento $eral, para o vale de /anta #aria, onde, do dia para a noite,
florescera o reduto.

+omo uma serpente raste'ando e descendo entre montanhas, o rio envolve o terreno, correndo para o sul e para o
oeste e, repentinamente, se volta de novo para o norte, descrita uma $rande curva, como se de fato essa en$anosa
cascavel l%quida pretendesse preparar-se para um inesperado bote sobre os invasores. 0 vale por ela cin$ido est
encravado na serra, recôndito na floresta em que ora sobressaem imbuia, perobas e cedros, ora espinho-de-cristo,
ora as muralhas de bambus, ora o bosque araucariano e, de quando em quando, $uardado por 'ars em sentinela. 
estrada que vem de /ão /ebastião das ;erdizes, a anti$a cidade fundada por 4ocha lves, a$ora com sua i$re'inha e
palho)as abri$ando o inimi$o, base de suas opera)9es, a estrada tida como principal, a nica tida realmente como
boa, nem ! carro)vel, mas apenas um zi$ueza$ueante trilho dos arrieiros, vezeiros em vencer os marn!is de lama
preta ladeados de peraus. S boca do vale, o carreiro morre num desfiladeiro truncado por rochas esbroadi)as a
formarem coroas, sebes minsculas de estilhas e escarpas intercaladas de charcos, tudo vedando a passa$em ao
soldado de caserna, que faz ordem unida e maneabilidade nas avenidas. li, Deodato da cara ferina de lobo, mais
matuto que $acho, pelado simpl(rio que queria ser santo e não bandido, $eneral com farda de mato — estrelas dos
c!us, divisas dos rios, $eneral da casa verde, — comandava as opera)9es de defesa 1 frente de uma centena de
infantes, homens, mulheres e crian)as, prote$idos por barreiras de pedras. o toque da buzina, ao rufar do tambor,
vinham todos ocupar as posi)9es adrede estudadas e preparadas. li, Deodato era um @eônidas caboclo.

5uando a formidvel coluna /ul cruzou o riacho e penetrou na mata pelo carreiro, ' esma$ada pela floresta,
atolando-se nos loda)ais, caiu em p2nico, fusti$ada em cada trecho obstru%do do caminho. ;equenos $rupos
sertane'os, atacando e recuando, atra%ram-na ao desfiladeiro onde fora encurralada sob chuva de balas sibilantes,
aturdida com a $rita dos fanticos. Fnutilmente, 1 toa, as metralhas viravam para a frente e para os lados.  car$a de
baioneta não encontrava nin$u!m, pois o fantico não assaltava o inimi$o prevenido. #aria Bacariana, ao levantar
uma bandeira e dar um viva a são "os! #aria, saindo a campo aberto, foi abatida com um tiro de fuzil. Deodato, que
armara uma emboscada vitoriosa num 2n$ulo da estrada, feriu o bra)o e as costas, mas ainda diri$iu a contenda
atrs de um parapeito de pedra e imbuia, vi$iando com seu bin(culo o movimento dos peludos. /uas ordens finais
foram dar parte de fraco para dei*ar os peludos che$arem um pouquinho mais perto, fazer pontaria nos tenentes
e não dei*ar recolherem os feridos, que deviam ser picados a facão. Desnorteados os soldados, assustados os
superiores, sacudidos todos por uma va$a de terror e des2nimo, derrotados, com vinte e oito mortos, cerca de trinta
feridos e outros tantos feitos prisioneiros, bai*as que seriam maiores não houvesse o silvo dos pro'!teis, o coronel
Estilac @eal mandou tocar a retirada.

Esse foi o combate travado no dia R de fevereiro do ano de JKJI.  morte de oficiais comoveu a opinião pblica das
cidades.

Deodato não perdoava fraqueza, não perdoava nin$u!m. ;or qualquer falta, decretava a morte como casti$o. ;unia
por prazer, por loucura, sem motivo, sem razão. 5uando lei*o che$ou com sua $ente a /anta #aria, foi lo$o
destitu%do das honras de comandante, s( porque era tido como ami$o de ntoninho. Brios prisioneiros foram
e*ecutados com o supl%cio da estaca, enquanto outros se tornaram pelados, por convic)ão ou por medo. ?m mo)o
que che$ou ao reduto, trazendo uma carta para Elias de #orais, missiva propondo armist%cio, foi amarrado e
fuzilado.

Enquanto isso, mais da metade dos efetivos do E*!rcito se deslocava na re$ião, ' infestada de policiais e
vaqueanos.  $uarda especial da @umber +olonization ' não era mais numerosa que as scias das fazendas.
E*plorando o campo das opera)9es, a monstruosa coluna /ul, com seus dois mil homens, de todas as armas, tomou
posi)ão e encontrou lu$ar ideal para assestar a artilharia — canh9es, obuses e metralhadoras — visando o reduto,
distante apenas tr=s quilômetros.

 proclama)ão bai*ada pelo coronel Estilac bem revelava o ob'etivo dese'ado. Eis um trecho:

o reduto de /anta #aria não mais podemos ver apenas os inimi$os da ordem pblica, que, a bem da tranqüilidade
e da vida pacifica e til do pa%s, somos obri$ados a combater no mero desempenho do nosso estrito cumprimento de
deverG l, naquele antro maldito, estão os assassinos dos denodados camaradas que rudemente tombaram no dia R
do m=s findo, estupidamente vitimados pelos botes trai)oeiros dos bandidos que da mata de /anta #aria fizeram o
tenebroso centro de irradia)ão dos assaltos 1 fortuna pblica, 1 vida dos nossos concidadãos e de suas inmeras
fam%lias, e das mais mesquinhas e ine*plicveis depreda)9es. E a nossa consci=ncia não deve mesmo sentir fortes
abalos de compai*ão pelas mulheres e crian)as que acompanham os bandidos do reduto de /anta #aria, desde que
tenhamos na mente o doloroso espetculo da viuvez e orfandade que reina entre tantas fam%lias dos nossos
camaradas, brutalmente imolados nas mãos de tão desalmados abutres.

a madru$ada do dia 7 de mar)o, come)ou o bombardeio e o povo acordou sobressaltado. #as como a artilharia
não atin$isse o alvo, coisa atribu%da 1 intercessão de são "os! #aria, a calma foi recobrada e se formou uma
procissão de $ra)as ao mon$e. 5uando o corte'o sa%a do quadro santo, 1 frente a ima$em de são /ebastião, cruzes e
bandeiras, as primeiras $ranadas atin$iram-no em cheio, despeda)ando corpos humanos. Dad, a anti$a serva da
+huva de ;edra, foi a primeira a $ritar e a tombar com a bandeira branca na mão. 4epetia-se a carnificina de
&aquaru)u. #anque'ando, Deodato mandou tocar a buzina e o tambor para que cada um tomasse lu$ar na defesa do
vale. #ulheres e crian)as precipitaram-se para a i$re'inha, enquanto os combatentes se espalharam pela mata,
metidos nas furnas, nas imbuias, postados em $alhos de rvores, atocaiados nas trincheiras de pedras. Biam com
l$rimas nos olhos a i$re'inha em chamas, sacudida pelo canhoneio. +hico &aquara então chefiou um audacioso
ataque e ' se ia apro*imando do monte, na tentativa de arrebatar a ferro branco as pe)as de artilharia, quando as
tropas assustadas e desacor)oadas se retiraram 1s pressas, acossadas por piquetes atocaiados.

Durante vrios dias e*plodiram $ranadas nas matas e no vale de /anta #aria, intil $asto de muni)ão, porque os
chefes militares acreditavam que isso levava o des2nimo ao inimi$o. ssim pensavam porque sabiam que
inmeras fam%lias camponesas haviam-se dei*ado prender durante as lon$as e penosas caminhadas de volta aos
lares, quando eram encontradas famintas, enfermas, su'as e maltrapilhas. /omente a presen)a de homens como
Qebinho, Eliazinho, Bentura, &aquara, Bidal, Certolino, #aneta e o novo mon$e evitava a completa dispersão dos
crentes, tal o descontentamento com o comandante $eral. cima de tudo, l ainda estava a vir$em, a sonhadora
#aria 4osa.

;orto ?nião da Bit(ria vibrava com a che$ada do $eneral, de /etembrino de +arvalho, para reunir-se em
confer=ncia secreta com os coron!is das quatro colunas rec!m-formadas para o ataque. >ouve parada, baile, teatro,
leilão e fo$uet(rio. rei /ilv!rio competiu com /inhana Cita na realiza)ão das festas. 0 coronel mazonas, os
anti$os membros da "unta <overnativa do Estado das #iss9es, não perderam tempo e tamb!m procuraram
convencer o $eneral que ao ;aran pertencia o territ(rio do +ontestado. uma reunião no clube polo, presentes os
pol%ticos, o $eneral disse que proporia uma linha divis(ria entre os dois Estados, e*pondo-a.6JV8

0 que não se sabia ! que ' estava decidido o desmembramento do ;aran de seu riqu%ssimo territ(rio do Cituruna.

 confer=ncia dos chefes militares, si$ilosa e realizada na casa do coronel mazonas, era comentada com
entusiasmo pelos moradores da cidade e pela soldadesca. 0s soldados falavam mal dos comandantes, quei*ando-se
do re$ime da caserna e acusando-os de $ozarem o conforto. crescentavam que os oficiais s( viviam dando parte
de doentes, escapando ao peri$o. #uitos habitantes do lu$ar elo$iavam o coronel mazonas, comentando que o
;aran faria valer os seus direitos. uma roda de chimarrão formada no hotel #atoso, sur$iu o boato de que fora
combinado entre vrios militares uma revolu)ão se o ;aran fosse despo'ado daquela imensa rea. ?m barbeiro se
atrevia a fazer ca)oada, contando anedotas sobre $auchadas de fazendeiros e ne$aceadas de comandantes que
mandavam caboclos, como vaqueanos, 1 frente, ou os pr(prios soldados rasos. >avia quem fizesse pilh!rias
dizendo que o Crasil recorreria a for)as estran$eiras para combater um punhado de caipiras empoleirados nas
rvores. s mocinhas aproveitavam a ocasião para fazer a avenida na JI de ovembro e namorar os forasteiros,
convidando-os para os saraus e festivais domin$ueiros. 0 plano secreto, todo mundo conhecia. +onsistia num
ataque maci)o e simult2neo pelas diversas colunas.  fim de evitar as tocaias e os assaltos a facão desferidos pelos
caboclos amotinados, a coluna que punha o reduto na mira da artilharia faria uma derrubada, abrindo uma clareira
at! o vale.  chamada $uarda do santo, considerada ine*pu$nvel, comandada pelo ne$ro 0le$rio, seria arrasada
pelo canhoneio. De pontos diversos, as tropas de assalto, conduzidas pelos vaqueanos, rumariam em dire)ão ao
reduto então destru%do.

Dos ltimos dias do m=s de mar)o aos primeiros de abril daquele ano frio, chuvoso e curto, antes de os campos
amanhecerem cobertos de neve — pois at! neve houve, a mata era um sorvedouro —, a van$uarda da coluna orte,
formada por quase duas centenas de vaqueanos de um tal de ;acheco e quatrocentos soldados comandados pelo
capitão ;oti$uara, varria a metralha e a fuzilaria os passos dos rios.  reta$uarda, mais lenta, vinha arrasando a
terra, incendiando, destruindo tudo.

0 reduto de /anta #aria, apenas com as cruzes do quadro santo, parecia deserto. 0s pelados, com provisão e
muni)ão nos boc(s, moravam nas lapas do terreno, prote$idos por pedras ou troncos de imbuias, camuflados com
$alhos de rvore. Deodato ordenara, aos crentes que não combatiam, retirarem-se para +errinho. @ unir-se-iam
todos, quando o E*!rcito conse$uisse penetrar no vale. ;ara impedir o desbravamento da floresta, destacara
atiradores, os quais, ca)ando os trabalhadores e as sentinelas, não davam tr!$ua aos ma$otes de peludos que
sur$iam para prote$=-los.

 numerosa forma)ão que atacava pelo sul entrava na mata, mas não ultrapassa o desfiladeiro, retornando ao ponto
de partida, atrapalhada com seus comboios, suas 'untas de bois, com a artilharia pesada. o dia N, se*ta-feira da
pai*ão, o coronel Estilac tele$rafava ao $eneral /etembrino,6JI8 relatando tudo.

s $uardas do norte chocavam-se com o contin$ente do capitão ;oti$uara. Durante a travessia do rio +a)ador,
morreu muita $ente de lado a lado e, a cada avan)o, uma nova emboscada surpreendia a tropa.

#aria 4osa, embora escoltada pelos doze pares de ran)a, sabia que em breve morreria. Dissera-lhe em vis9es o
mon$e "os! #aria. E ela anunciara o fato no quadro santo. Eliazinho chorou. o apro*imar-se a semana santa,
#aria 4osa previu que seria antes da aleluia, na se*ta-feira da pai*ão, no dia do mart%rio de +risto, dia divino, dia
pr(prio para uma vir$em voltar para o c!u. S frente dos doze pares de ran)a, partira para tomar posi)ão num
desfiladeiro do norte. tin$iu-a a primeira ra'ada da metralha, e então os doze pares de ran)a atiraram fora as
armas de fo$o, i)aram os fac9es e ca%ram furiosos sobre o inimi$o, aos $ritos:

— De$ola3 De$ola3

oi um encontro de fac9es e baionetas, 'uncando-se o chão de cadveres. Q! &i$re, corneteiro-comandante, tombou
em a)ão, como inmeros infantes que vieram de trs dos pares. 0s fanticos recuaram e se atocaiaram mais al!m.

o saber da morte da vir$em, Deodato e*pediu mensa$eiros, mandando as $uardas se retirarem para trs das
montanhas, em dire)ão a +errinho, dei*ando livre a passa$em para /anta #aria. p(s um li$eiro combate com uma
hoste sertane'a, a tropa que vinha do norte entrou no vale abandonado. o sbado de aleluia, depois de escaramu)as
com $rupos esparsos nos bosques, acantonou no reduto, na sede do $overno da monarquia, delirando,
trombeteando vit(ria. #as a noite veio desmentir as cornetas e arrefecer, como sempre, o entusiasmo dos
ocupantes. 0 acampamento estava cercado pelos fanticos a iniciarem nova batalha, sem a preocupa)ão de tomar o
vilare'o de palha.  casa de frei #anoel, hospital de campanha, ainda em p!, ficou varada de balas e o pr(prio
tenente m!dico tombou, mortalmente ferido. Deodato pôs o chefe dos vaqueanos, o ;acheco, sob a mira do fuzil e
e*ecutou a senten)a de morte. E, pela manhã, não havia nin$u!m nas circunvizinhan)as... 0 pelado sur$ia e
desaparecia como um soldado fantasma, lembrando as artes dos mon$es.
;or fim, com o desfiladeiro abandonado pelos fanticos, tamb!m a coluna /ul marchou inc(lume at! o vale,
van$loriosa, cantando vit(ria que não houve. &anto não houve que um comandante dizia a verdade em seu relat(rio
a /etembrino de +arvalho:

?ma perse$ui)ão levada a efeito contra os bandoleiros, al!m do reduto de /anta #aria, me pareceu ine*eqü%vel: JU
— porque se dispersaram, antes do amanhecer, pelas serras que, a leste e a oeste do reduto, fecham o recinto onde
estava encravado o aldeamentoG 7U — porque essa opera)ão s( podia ser feita a p!, num terreno desconhecido, com
tropas cansadas que inutilmente se embrenhariam no sertão deserto, pois o inimi$o, conhecedor profundo das $rotas
onde vive, saberia se esconder com toda a se$uran)a, menoscabando da nossa perse$ui)ão e armando emboscadas
onde os nossos soldados ficariam trai)oeiramente sepultados, dei*ando nos antros do banditismo armas e muni)9es.

s tropas dos peludos a$uardavam a hora de partida para os trens de ferro e, em /ão /ebastião das ;erdizes, ainda
foram atacadas por mais de duzentos pelados em sortidas li$eiras e inesperadas. 0 E*!rcito re$ressava, mas a luta
recrudesceria e 'amais seriam vencidos os pelados se at! o fim fossem unidos.

;assaram-se 4ocha lves, Elias de #orais, "erôme, ntoninho, ndrade, Q! &i$re, lonso o menino-deus3 — e a
vir$em #aria 4osa3 Deodato, a$ora no reduto 4incão do Coi ;reto, ' não era o simpl(rio caboclote que fora.
Estava transtornado. Bin$ou-se novamente de +oncei)ão de$olando o ne$ro "oaquim <ermano. #andou fuzilar
lei*o, Qebinho e um irmão de lonso. 5ueria ser Deus, queria ser santo, não admitia oposi)ão. 0rdenou que
amarrassem 0le$rio, de$olando-o sem o menor motivo.

h3 ão vou narrar como morreram os pelados aprisionados, cu'os corpos foram horrivelmente mutiladosG não vou
dizer como os crentes acabaram fu$indo dos redutos, aproveitando as ordens para plantarG não vou falar das
desaven)as entre os pr(prios caipiras rebeladosG se Deodato ' nem respeitava as vivas dos companheiros, se
brandia desvairado o facão sobre mulheres e crian)as esfaimadas. ão quero comover-me com os sofrimentos de
$ente errando desesperada pelas matasG não posso relatar sem emo)ão como, um dia, durante uma procissão, em
&aquaru)u, policiais e vaqueanos dizimaram, pelas costas, homens, mulheres e crian)as. #as como poderiam ser
assassinados homens como os Bentura, &aquara, Cibiano, <ralha, +astelhano, abor e tantos outros senão
trai)oeiramenteA Deodato acabou tamb!m va$ando sozinho pelo sertão, rene$ado pelos camponeses. o beber $ua
num c(rre$o, foi preso por um menino, e depois morto ao tentar fu$ir do pres%dio.

/( me resta recordar com o cora)ão vibrando uma p$ina de luta $randiosa dos brasileiros, para os brasileiros, uma
her(ica resist=ncia camponesa ao coronelismo e 1 a)ão dos trustes estran$eiros, a $loriosa $uerra cabocla. &amb!m
amo a casa verde — a do telhado de estrelas, e seus habitantes, como os amaram os mon$es e os pelados. /ou
pelado. ?m dia seus moradores hão de possuir a terra.

Y, mon$e "oão #aria de $ostinhoG (, mon$e "os! #aria — (, revoltoso —, livrai a casa verde dos horrores da
fome, da peste e da $uerra3

Referências

J.
— #eu Divino /ão @zaro ressuscitado depois que foi morto e enterrado, vivo duas vezes pelas mãos Divinas do
osso /anto ;ai /alvador, me livre da alma danada que nem "esus levantou sorrindo a tampa do tmulo de pedra,
me lave com o san$ue derramado pelo /ublime "usto pre$ado na cruz, espirrado pela lan)a mali$na do soldado
@on$inos furando o peito e o sa$rado +ora)ão, assim tamb!m quando /ão #arcos me marque e /ão #anso me
amanse, a carne vire em ferro em a)o sem embara)o, eu vos dou culto de adora)ão e perfumes e me sirvo de ervas,
$ua, ar e fo$o, mas me livre primeiro da tenta)ão do tacho como acho. ão se arredem mais de mim nem me
virem o rosto com des$osto, não fu'am de espanto por encanto.

#e d= vida na carne como na alma.

Deus ! fort%ssimo e pur%ssimo3


Deus ! ort%ssimo e ;ur%ssimo3 or)a3 +onsolo3 leluia3

#e levante do sepulcro fundo tão frio assim como quando tamb!m foi arrancado vivo pelo nosso /enhor mado
/anto +risto. m!m.

7.

N.

?nião da Bit(ria

/elva$em qual bu$re nu:

Canhada pelo F$ua)u

S beira dele nasceste,

@inda cabocla indolente

 dormir em mata in$ente


Entre colinas nasceste3
+omo crian)a da ro)a

oi teu ber)o uma palho)a

Eri$ida em f!rteis zonas,

oi teu primeiro luzeiro

0 vaporzinho +ruzeiro

do coronel mazonas3
5ual cordilheira dos ndes

Bazada em cadinhos $randes

+o$itavas inativa3

Então ribombou por tudo

ssim como um $rito a$udo,

 voz da locomotiva.

Do ventre a soltar fuma)a

Ei-la li$eira que passa

Do Estado na maior ponte:

H o pro$resso nos trilhos

Em procura de outros brilhos

De cintilante horizonte3

Eis a cabocla bendita

De p!, no banco da $l(ria

+ercada de lindas flores

o som de cantos de amores,

Eis a ?F^0 D BF&Y4F3

V.
0ra)ão mila$rosa achada e copiada na /anta /epultura de osso /enhor "esus +risto, feita por mão divina. &odo
que esta ora)ão tiver dentro de sua casa não sofrerão casti$os de Deus nem raios nem coriscos, nem tormentas.
#eus filhos não abuzem com a reli$ião cat(lica. a)am caridade com palavras, fa)am minhas vontades. 0lhem
meus filhos se não emendar de vida deitarei os alarmos e mandarei raios, conselho e $uerra ao povo que nem aquela
vez e mando no fim desta $uerra vem at! +risto que a de reduzir no seu fo$ão quem huzar de terem em /uas ;ortas
quando ele vier a de ser conhecido que no ano de JKJV. E quem abuzar e crer a de ver. ão trabalhem no sbado
devem 'e'uarem nas sestas eras da cuaresma e $uardar os dias de festas preseitos faz crem sem 'e'um a /ão
/ebastião para ele nos livrar dos casti$os do +!u.  de vir tr=s dias de escuridão. /e pe$uem comi$o que serão feliz
quem esta c(pia tiver com estima)ão de /ão "oão #aria de $ostinho quem tiver esta mila$roza c(pia dentro de
/ua +aza servir de rem!dio nas necessidade não sofrerão fome nem mol!stias $raves nem pobreza em /ua +aza e
prole toda ser livre de 4aio corisco tempestade. /e não crem neste sa$rados conselhos ei de mandar o sol que a de
partir a terra nestas aberturas ade sair e entrar lin$uas de fo$o que a de abrir a terra e o primeiro sinal que a de
mostrar N estouro na terra sumir um estin)ão de terra depois disto passado e aparecer no c!u uma mancha verde.
;assados tr=s dias a de escurecer o mundo inteiro em fuma)a. 5uem não selembra mais de Deus não rezem os
ter)os, não fasam a doutrina criztam não ensina. s armas do pur$atore não se confesão mais com os padres. asão
penit=ncia de ten)ão. mem "esuis3

I.

— +omo ! o nome da cria)ãoA

— ;aci=ncia.

— Cicho3 Boc= ta comendo a carne da vaca ;aci=ncia... ssim como eu louvo a Deus e voc=s tão comendo a carne
da ;aci=ncia e não louvam a Deus. Eu vou pedir a Deus para voc=s ir caindo de um a um, dois a dois, tr=s a tr=s,
quatro a quatro, cinco a cinco, seis a seis, sete a sete, oito a oito, nove a nove, dez a dez. ssim como "esus +risto
caiu do ventre da Bir$em #aria, voc=s vão caindo da bicheira, de um a um.

Depois de rezar um padre nosso, passava na cha$a do animal um ramo verde, o qual atirava para trs, e*clamando:

— ssim como o ramo seca, o bicho acaba3

L.

Espada El!trica pertence ao ndrade, nobre cavaleiro de /ão /ebastião em nome de /anto "oão #aria quem atira
no corpo atira na h(stia sa$rada porque entre a porva e a espoleta Deus +risto fez morada. Deus adiante e por nosso
$uia eu ndrade, me encomendo a Deus e a Bir$em #aria que eu não desprezo nem atado nem do diabo atentado
me $uarde meu /ão +eleste, com Z an$elo quebro ferro, quem me aponte arma de fo$o em peda)os ficar os meus
inimi$os compensar que Deus 0 Bivo ;adre e ilho Esp%rito /anto amem "esus e esta ora)ão pensei /ão "os! e
/ão "oão #aria.

Z.

Deus adiante, ;ai na $uia, encomendo meu Deus 1 vir$em #aria. #inha #ãe, são nove e dez ou onze horas, horas
das nove, dez ou onze mil vir$ens, ou doze ap(stolos que ser meus irmãos. ndarei dia e noite, meu corpo est
cercado e circulado com a arma de senhor /ão "or$e. #eu corpo não ser preso, nem ferido, nem meu san$ue
derramado pelas unhas de meus inimi$os. ndarei tão livre como andou osso /enhor "esus +risto no ventre da
Bir$em #ariaG meus inimi$os terão olhos, não me verãoG terão boca, não me falarãoG terão bra)o, não me
ofenderãoG terão p!s, não me alcan)arãoG arma de fo$o minarão $ua pelo ouvido, am!m.

R.

Espada @uzena3 qui est o apostolado "eronPmo ntônio ;ereira, o belo cavaleiro de /ão /ebastião3 5uem atirar
no meu corpo atira na (stia consa$rada porque entre a porva e a espoleta "esuis feis morada. Deus adiante, paz na
$uia de "eronPmo ntônio ;ereira. Encomendo a Deus e a vir$em #aria que seu +orpo não se'a preso nem atado e
nem do demonio atentado e se'a $uardado por /ão /ilvestre com VZ n'os quebra pedra Z quebra ferro e as armas
de faca que apontarem no seu corpo na $ua ficar e os ferros que apontarem em peda)o ficar. 0s seus inimi$os
conhecerão que Deus ! Bivo3 ;ater, ilho, Esp%rito /anto. ;ela 0stia +onsa$rada. mem "esuis.

C-_->-_-C-_-#-_--_--_-Cento-_-Betos-_-oneto-_-/ilvus-_ -Cinoneto-_-"esuis-_-#aria-_-"us!.

K.

4!quiem ;aranista

Diante do cadver de "oão <ualberto ! que pela primeira vez se pode aplicar, ao 'usto, a cedi)a e*clama)ão
hist(rica de >enrique FFF, ao ver os despo'os do duque de <uiseG como ele ! $rande3 #orto parece ainda maior3
Euclides Candeira

 lenda de En!ias, cantada na lira vir$iliana, renasce nas campinas e fa*inais do Frani. 0s mo)os educados por
<ualberto sentirão a fronte iluminada, como o pequeno Fulo, ao subir o monte Fda, levado pela mão de En!ias seu
pai, e nessa aur!ola de luz e nessa coroa fl$ida trarão a $l(ria rediviva de seu mestre, sol que retorna, para os
$randes mist!rios da flora)ão e*uberanda da mocidade e da vida...

>u$o /imas

5uando tomba um bravo que se fez her(i nos campos vermelhos do combate, uma alta vibra)ão sacode a alma das
multid9es para os $randes assombros silenciosos.

4ibeiro <arcia

+anto selva$em3 >ino a$reste entoado no desfiladeiro de uma campina sa$rada3 poteose au$usta er$uida 1
mem(ria desse pa'! sublime, que nos $uiava para a vit(ria e que, em meio do caminho, trope)ou no tmulo para se
levantar no panteão dos mortos, imortais.

/alve3

/ebastião ;aran

;ela voz un2nime de todos os seus companheiros de @o'a, convictos de que o capitão "oão <ualberto soube
sempre cumprir seu dever, depositamos sobre o seu corpo o 4amo da ccia dos #estres, s%mbolo de renascen)a,
pureza e amorG s%mbolo da nossa inolvidvel solidariedade.

Cen @o' Fnvis%vel.


Do <rande 0riente do Crasil

Dei*a que, de 'oelhos, derramemos sobre o teu corpo um punhado de l$rimas. Dorme, pois, ami$o, o sono dos
'ustos.

ernando #oreira

;atriotas, em contin=ncia3

Dei*ai passar, no estendal da nossa sincera pun$=ncia, os despo'os de um bravo, que foi buscar a morte onde se
achava a $l(ria.
;erfilai-vos, cidadãos da minha terra3

Ermelino de @eão

;orque a vida de "oão <ualberto, bordaram-na $l(rias e apoteoses triunfais.

+iro /ilva

F#04&@FDDE

?m her(i morre para o mundo:

 mat!ria desfaz-se l no fundo

Da terra vilG mas a alma dos her(is

ica no c!u a refletir seu brilho

ica a brilhar entre os milh9es de s(is...

E "oão <ualberto <omes de / ilho

#orreu, mas o seu nome ficar

os feitos imortais de nossa >ist(ria,

o cora)ão de todo o ;aran.

rancisco @eite

rmas em funeral3  como)ão rebente3

+laudino dos /antos

&u sers sempre o nosso +omandante3

@eite "nior
Ditosa a terra que pode repetir com o $rande ami$o, que foi "oão <ualberto: meu ami$o ! outro e o mesmo3
Dario Bellozo

/er poss%vel que tais acontecimentos obede)am a um diab(lico plano de se pretender, tão macabramente, tomar
efetivo o desmembramento do Estado do ;aranA

Bitor do maral

>onra 1 sa$rada mem(ria

Do her(i que ao som do tambor

/e não alcan)ou a $l(ria

&ombou como um vencedor3

#as tem a coroa fl(rea

5ue te aureola tal ful$or

5ue o teu nome triunfadorG

Y "oão <ualberto, na hist(ria

+omo e*emplo de valor


icar cheio de $l(ria.

$ora a todo momento

 ptria chora por ti.

E h como um lon$o lamento

Em todo lar por a%.

#rtir, teu devotamento

+anta 1 mata a 'uriti.

 pr(pria flor que sorri

&em um desfalecimento

E nos campos do Frani

t! prantear $eme o vento...

4odri$o "nior

JM.
Fmi$rados do ne$ro Baticano, v=m esses pre$oeiros das doutrinas de /atans encarcerar as consci=ncias inocentes e
incautas, saqueando a bolsa do povo para constru%rem os seus balc9es — onde vendem sacramentos pelos pre)os
duma tabela amorfa ao alcance das al$ibeiras favorecidas e nunca dos e*auridos pela necessidade — fazendo-se
fle*%veis, mel%fluos e cinicamente contritos, para depois, com a habilidade que lhes ! peculiar, mostrar os ferros que
lhes cal)am os p!s, 1queles que lhes toleram por não lhes conhecer as e*ecrandas inten)9es. 4a)a maldita3

esse momento ! que esse corvo despudorado vem desacat-lo como se fora al$u!m perante 1 pol%tica e 1
sociedade3

ão nos admiramos. /ão eles iscariotes at! para com os seus mais %ntimos.  prova temo-la onipotente e palpitante
ainda. ão ! o primeiro qualdip!rio, o nmero ! ine*aur%vel3
0 estalido teorema desse audacioso urubu ! contraproducente e absurdo ao e*tremoG senão, ve'amos: no ensino
reli$ioso os decuri9es ensinam o que aprenderam na sa$rada cartilha e cr=em na santidade plenipotenciria do
ministro Deus na &erraG de um Deus que não conhecem e não sabem aquilatar-lhe a $randeza da ci=nciaG de um
Deus que ! tão misericordioso que consente que os aquerônticos bonzos de /atã profanem o seu nome e mandem
fazer ima$ens no Baticano, dizendo ser deles, ima$ens que, então, passam a ser a adar$a inanimada de suas
e*plora)9es e mis!rias, de suas vi$arices e audcias.

H claro, pois, que — quem cr= nas virtudes mila$rosas de tão corrompidos mortais, com mais razão pode crer na
ressurrei)ão do mais que defunto Q! #aria, porque tanto este como aquele são defect%veis...

os col!$ios da clerezia inoculam nessas pequeninas almas educandas o $erme maldito dum mal que lhes atrofia e
obceca os c!rebros, tolhendo-lhes a op)ão de pensar no que lhes parece plaus%vel...
Eia3 ( tropa de Celzebu3 a porta da sa%da ! tão franca como a da entradaG se não lhes a$rada o Crasil, procurem o
caminho do Baticano, porque a vossa ptria ! 4oma3

@uism!r.

JJ.

+arta aberta 1 a)ão.

Eu, D. #anoel lves de ssun)ão 4ocha, aclamado imperador constitucional da #onarquia /ul Crasileira, em o
corrente ano, com sede no reduto de &aquaru)u do Com /ucesso, convido a na)ão pra lutar para o completo
e*term%nio do deca%do $overno republicano, que durante 7L anos infelicita esta pobre terra, trazendo o descr!dito, a
bancarrota, a corrup)ão dos homens e, finalmente o desmembramento da ptria comum.

+omprometo-me

JU Em pouco tempo eliminar o ltimo soldado republicano do territ(rio da #onarquia, que compreende as tr=s
prov%ncias do /ul do Crasil T 4io <rande, /anta +atarina e ;aranG

7U ;ara o futuro, ane*ar ao Fmp!rio o Estado 0riental do ?ru$uai, anti$a ;rov%ncia +isplatinaG

NU 0r$anizar um e*!rcito e armada di$nos da #onarquia e reor$anizar a $uarda nacionalG

VU Dar ao pa%s uma constitui)ão completamente liberalG


IU 4eduzir os impostos de importa)ão e e*porta)ão e bem assim estabelecer o livre c2mbio dentro do territ(rio do
Fmp!rioG

LU azer respeitar meus sditos, lo$o que me se'a poss%vel, em qualquer ponto do planetaG

ZU azer $arantir a inviolabilidade do lar e do voto, tão menosprezados pelo deca%do re$%menG

RU azer respeitar, em absoluto, a liberdade da imprensa, tamb!m menosprezada pela anti$a 4epblicaG

KU &ornar ine*pu$nvel a barra do 4io <rande e todo o litoral do pa%sG

JMU <uarnecer a fronteira como Estado de /ão ;aulo e fronteira ar$entina, lo$o que se'a reconhecido oficialmente o
novo Fmp!rio e or$anizado o e*!rcito imperialG

JJU ssumir, relativamente, todos os compromissos do anti$o re$ime, que relativamente couberem ao Fmp!rio /ul
CrasileiroG

J7U 0 e*!rcito imperial ser a primeira linha e a $uarda nacional a se$unda linhaG

JNU ?nifica)ão da lei 'udiciria do pa%sG

JVU 4estrin$ir a autonomia dos munic%piosG

JIU Emitir provisoriamente numerrio nominal e em se$uida a conversão metlicaG


JLU  reli$ião oficial ser a cat(lica apost(lica romanaG

JZU @iberdade de cultoG

JRU +o$itar do desenvolvimento da lavoura sem desprezo da indstriaG

JKU 0 imposto protecionista a indstria e lavoura do Fmp!rioG

7MU @ivres os portos do Fmp!rio a todos estran$eiros sem co$itar-se da ra)a, cren)a etc.G

7JU /erão considerados nacionais todos os estran$eiros que residirem dois anos no pa%sG

77U #odificar o atual sistema do 'ri, que não est mais compat%vel com o s!culoG

7NU 0 ensino ser obri$at(rio, tanto para a inf2ncia como para o e*!rcitoG

7VU  cria)ão do e*!rcito aviador que atualmente est dando resultado na $uerra europ!iaG

7IU Edifica)ão da +orte Fmperial que ser no centro do territ(rio imperialG

7LU  bandeira e coroa do imp!rio /ul Crasileiro serão adotadas as anti$as da deca%da #onarquia CrasileiraG

7ZU  pena de morte em vi$or, com a forcaG

7RU 0 servi)o militar ser obri$at(rioG

7KU  a$ricultura nacional ser dado uma rea de terra independente de pa$amento, em terras nacionais.
NMU De J.U de setembro em diante entrar em vi$or a lei marcial aos inimi$os da #onarquia. Biva a #onarquia /ul
Crasileira3 Deus $uarde e vele pela #onarquia.

0 Fmperador +onstitucional da #onarquia /ul Crasileira.

ss. D. #anoel lves de ssump)ão 4ocha.

J7.

Estou no +ontestado, em meio da tropa sob meu comando, no desempenho da missão, que me foi confiada pelo
<overno da 4epblica, de restabelecer a ordem nesta bela por)ão do territ(rio ptrio.

H com a alma confran$ida que assisto, nesta luta in$l(ria, derramar-se precioso o san$ue dos meus patr%cios: uns
soldados do nosso valoroso E*!rcito, que tamb!m no cumprimento de seu dever, obedientes aos compromissos para
com a nossa ;triaG outros — cidadãos que abandonando os lares, desprezando o trabalho honesto e divorciando-se
da civiliza)ão, se internaram, errantes, pelos sert9es desertos, para atentar, de armas na mão, contra a ordem e
contra as autoridades le$almente constitu%das. E como nutri sempre o nobre dese'o, a consoladora esperan)a de
vencer-vos, adotei a defensiva como $=nero de $uerra, preferindo que fôssemos n(s os atacados.

;or isso mesmo ao encetar esta campanha, convidamos as rebeldes a deporem as armas, espalhando um 'usto apelo,
em que transpareciam os nossos sentimentos de pura humanidade.

tacados, temos sido sempre vitoriosos. Desde o dia JJ de setembro que lutamos e os nossos soldados cada vez
mais se sentem encora'ados para a vit(ria final, que não tarda.

#as ! preciso parar. H for)oso que termine esta luta, que o san$ue brasileiro não continue a manchar as nossas
terras, onde a natureza acumulou terrenos ines$otveis, para a $randeza de nossa ;tria.

ão venho trazer-vos a morte ou o pres%dio, pela vit(ria das nossas for)as, senão concitar-vos mais uma vez a que
deponhais as armas e aceiteis as $arantias que vos ofere)o em nome do <overno e da @ei.

MFmp9e-se que volteis novamente ao trabalho, meio nico capaz de $arantir a felicidade do lar e promover a
prosperidade de nossa $rande ptria, que na quadra atual tanto precisa do patriotismo dedicado dos seus filhos.

JN.
/r. #arcelino lves.

0bedecendo ordens do /r. "oão #aria, aviso-lhe para continuar a% com o acampamento e colocar $uardas nos
lu$ares necessrios e conservar as e*istentes. #andar piquetes para fazer rebanhos que for necessrios mas nunca
rebanhar trastes de casa e dinheiro. &odo respeito 1s fam%lias quer ou não se'am da nossa fac)ão. 0bri$ar todos a
assistirem as formas e aquelas que se ne$arem pode mandar prender e casti$ar. icam su'eitos a a'udarem a dar
servi)os nas $uardas tanto os que se acham no acampamento como aqueles que sendo moradores se conservam em
suas casas. ão atacarão os contrrios sem novas ordens, salvo se forem atacadosG se for preciso mudar os
acampamentos, com tempo avisarei. ada receiem a% que quando houver peri$o com tempo avisarei. 0bri$ue a
todos a trazer seus ranchos limpos. ão procurem mais perderem a $ra)a de Deus e a f! de seu "oão que ! o nico
amparo que temos. conselhe a todos que não acreditem em conversinhas que muito aparecem a%, que isso s( nos
pode pre'udicar, assim como aconselhe a todos que não se afastem da% sem ordem, porque seria cair no desa$rado
do nosso protetor. /e houver $rande precisão pode pedir aos irmãos, mas nunca rebanhar destes. 5ue Deus
nos prote'a e /eu "oão #aria se'a convosco.
0 +omandante <eral

ntônio &avares "nior.

JV.

tuais divisas at! o rio e$ro, por este abai*o at! o F$ua)u, prosse$uindo por ele at! o &imb( acima at! encontrar
um dos seus afluentes da mar$em esquerda, cu'as cabeceiras mais se apro*imarem do rio do ;ei*eG pela cabeceira
do ;ei*e e por este abai*o at! encontrar um de seus afluentes da mar$em direita 6o JI de ovembro8, cu'as
cabeceiras mais se apro*imam das cabeceiras do +hapec(G pelo +hapec( abai*o at! sua conflu=ncia com o
?ru$uai.

JI.

$rade)o penhorado a honrosa confian)a que continuo a merecer de B. E*a., sendo essa presentemente principal
motivo minha fortaleza de 2nimo enfrentar dificuldade momento. cusando vosso tele$rama acabo receber, tendo a
informar-vos que em N dias sucessivos de combate as minhas for)as não encontraram uma posi)ão onde pudessem
se manter ;ara conservar a mata ocupada a noite e ter for)as para combater no dia se$uinte precisaria de um efetivo
de infantaria duplo do que possuo, tal ! a e*pressão das linhas a $uarnecer em profundidade.  manuten)ão de um
pequeno destacamento no ponto mais avan)ado a que se che$a diariamente ! irrealizvel porque no dia se$uinte,
para restabelecer a li$a)ão, seria preciso travar um combate de resultados duvidosos, com o risco de atin$irmos a
nossa pr(pria for)a. &endo for)ado, desde o dia 7K, penetra)ão na mata e 1 medida que me interno crescem as
dificuldades sem esperan)a de encontrar um ponto de apoio de onde prosse$uir as opera)9es.

+ompreendo que a inten)ão do inimi$o ! fu$ir a uma a)ão decisiva e procura atrair-nos para o sertão desconhecido,
separando-nos das fontes de abastecimento. ão tenho sequer um vaqueano da re$ião e os valorosos homens do
coronel abr%cio são aqui tão estranhos quanto n(s. 0 inimi$o não tem trincheiras nem ocupa posi)9es militarmente
definidas, não sai do interior da floresta, onde a nossa for)a penetra e, apesar da maior cautela, ! sempre
surpreendida, recebendo fo$o de cima das rvores, do interior dos *a*inais e taquarais, e os nossos homens, s( por
acaso e com $rande consumo de muni)ão, conse$uem al$umas bai*as do inimi$o, sempre dif%ceis de verificar pela
sua invisibilidade, salvo quando ele se resolve a sur$ir corpo a corpo, o que ! rar%ssimo e s( ocorre fu$azmente no
preldio da a)ão. +ontin$ente coronel abr%cio consumiu nestes tr=s ltimos dias K.MMM cartuchos. E*a. pode bem
calcular quanto isso pre'udica a educa)ão do nosso soldado e abate o seu moral.
s clareiras que iam sendo abertas numa lar$ura m!dia de RM a JMM metros atin$iu apenas a J quilômetro, tornando-
se imposs%vel prosse$uir devido ao lon$o flanqueamento a que obri$ava, sem impedir contudo que os foiceiros
fossem alve'ados.

0s refor)os de minha coluna t=m sido her(icos, em que pesem as suspeitas dos que 'ul$am a situa)ão de lon$e,
ansiosos pelo resultado imediato que tra$am a comodidade $eral.

s metralhadoras e os canh9es t=m estado constantemente internados na mata, batendo a uma dist2ncia m!dia de IM
metros as dire)9es provveis do inimi$o, sendo eu assim levado a sacrificar os mais elementares princ%pios do
empre$o da arma para não dei*ar de levar o mais perto poss%vel o apoio moral de que a infantaria necessita numa
situa)ão desesperadora. B. E*a. compreender que eu não poderei por muito tempo e*i$ir de seus bravos
comandados esses ras$os de audcia, em que e*ponho a perd=-los sem poder convenientemente substitu%-los.
0ntem perdi o sar$ento-chefe da metralhadora do IZU que tombou varado por R balas, quando lutava a 7M passos do
inimi$o oculto no taquaral e cruzando fo$os. ;ara salvar a mquina quase tive de empre$ar o la)o.  situa)ão !
e*cepcional e não pode ser 'ul$ada procurando e*emplos de $uerra re$ular.  ofensiva por aqui consiste em repetir
diariamente a entrada da for)a na mata com %n$remes esfor)os, sem revezamento e a nica vanta$em que temos
obtido ! for)ar os bandoleiros e es$otarem muni)ão, se ! que o inimi$o não tem continuado a receb=-la, pois a sua
resist=ncia aumentou com maior intensidade de fo$o. /e no fim do vale que tenho de atravessar com tanto sacrif%cio
houvesse uma posi)ão definida, restaria a esperan)a de atin$i-la. #as o aldeamento bombardeado no dia 7 de
mar)o est abandonado e o inimi$o se internou nas reentr2ncias do vale, vivendo esparso em $rupos pelas matas,
para assim dificultar mais o seu e*term%nio e poder com mais vanta$em hostilizar a for)a.

Notas

J. 0ra)ão transcrita em 4efer=ncias.

7.  cruz est reproduzida em 4efer=ncias.

N. Ber os versos em 4efer=ncias.

V. Ber ora)ão em 4efer=ncias.

I. Ber como em 4efer=ncias.

L. 0ra)ão em 4efer=ncias.

Z. Ber em 4efer=ncias.

R. Ber em 4efer=ncias.

K. 4!quiem ;aranista em 4efer=ncias.

JM. Coletim em 4efer=ncias.

JJ. Em 4efer=ncias est o documento na %nte$ra, conforme concebido e escrito.

J7. utoproclama)ão em 4efer=ncias.

JN. Documento em 4efer=ncias.

JV. ;roposta com linha divis(ria em 4efer=ncias.

JI. Documento em 4efer=ncias — 4elat(rio do +oronel Estilac.

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