Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
http://www.anpad.org.br/rac-e
RESUMO
O pioneirismo na adoção de novas tecnologias e no desenvolvimento de novos serviços têm conduzido boa parte
da estratégia das organizações do setor de telefonia móvel, no Brasil. Diante desta realidade, o objetivo deste
artigo está em identificar e comparar as vantagens competitivas que estão sendo geradas para as empresas de
telefonia móvel brasileiras, a partir de suas opções tecnológicas (CDMA; GSM), tendo em vista suas operações
no Rio Grande do Sul. Para tanto realizou-se uma pesquisa de natureza exploratória e qualitativa, que teve duas
fases. Na primeira fase, foi constituído um arcabouço teórico com as principais categorias estratégicas do setor
de telefonia móvel brasileiro, que serviu de base para a segunda fase. Na segunda fase, foram realizados dois
estudos de caso com duas das maiores (mais de 60% de market share) empresas de telefonia móvel no país.
Como principal resultado identificou-se que a maioria das vantagens competitivas dessas empresas realmente
advém da opção tecnológica (CDMA; GSM) e não propriamente de ações organizacionais. Outro aspecto
importante foi a possibilidade de associar competências com geração de vantagem competitiva, porque, a partir
de uma perspectiva interna, distinguiram-se os conceitos de recursos, capacidades e competências, para
comparar as empresas estudadas.
ABSTRACT
The dispute for first place in the adoption of new technologies and in the development of new services has
guided many of the strategies of the Brazilian mobile telephone companies. This article aims to identify and
compare the competitive advantages that are being generated by Brazilian mobile telephone companies and that
stem from their technological options (CDMA; GSM) for operations in Rio Grande do Sul State. The research is
exploratory and qualitative, being developed in two phases. In the first phase, the theoretical framework, with the
main strategic categories of the sector, was developed and served as the basis for the second phase. In the second
phase, two case studies were conducted with two of the largest (altogether, they represent more than 60% of the
market share of the sector) mobile telecoms in the country. The main result was the finding that most
competitive advantages of these companies stem from their technological options (CDMA; GSM) rather than
from organizational actions. Another important result was the identification of competences with the generation
of competitive advantages. From a Resources Based View perspective, a distinction was made among the
concepts of resources, capacities and competences in order to compare the studied companies.
Key words: competitive strategy; competitive advantage; technological innovation; stakeholders; mobile
telephony.
INTRODUÇÃO
Desde o final do último século, a globalização tem influenciado a vida da humanidade. As fronteiras
físicas e virtuais que separavam as pessoas foram sendo gradativamente rompidas. Do ponto de vista
econômico, os países derrubaram suas fronteiras, e passaram a importar e exportar mercadorias para
todo o mundo. Grandes multinacionais entraram em diversos países, fazendo com que a concorrência
em mercados globalizados esteja cada vez mais presente. Esta abertura de mercado trouxe consigo um
incremento substancial da concorrência entre empresas em um mesmo segmento.
Neste sentido, setores como o de telefonia móvel têm sido fortemente influenciados pelas ações de
grandes multinacionais que dominam os principais mercados. Estas, através de inovações
tecnológicas, buscam desenvolver estratégias, visando à construção de vantagens competitivas. As
tecnologias que dominam este setor (analógicas – Advanced Mobile Phone System – AMPS; e digitais
– Time Division Multiple Access - TDMA, Code Division Multiple Access - CDMA, Global System for
Mobile - GSM) são usadas globalmente por players internacionais, podendo ser adquiridas e
implementadas em diversos países. No Brasil, este também é o cenário. Grandes grupos
multinacionais de telecomunicações dominam o mercado, e estão implementando tecnologias
concorrentes no país, na busca por vantagens competitivas.
Baseado neste cenário, o presente estudo estruturou-se com o objetivo de identificar e comparar as
vantagens competitivas geradas para duas empresas de telefonia móvel nacionais (Empresa A e
Empresa B), a partir de suas opções tecnológicas (CDMA; GSM), tendo em vista suas operações no
Estado do Rio Grande do Sul. Partiu-se de uma proposição inicial de que, neste setor, os aspectos
ligados diretamente à tecnologia utilizada pelas empresas eram mais relevantes para a formação de
vantagens competitivas do que aspectos que não fossem tão diretamente ligados.
Ressalta-se que tanto a tecnologia CDMA como a GSM são tecnologias digitais, porém possuem
princípios diferentes. Resumidamente, o CDMA é uma tecnologia, cujo sinal (voz/dados) é convertido
em códigos distintos para cada conversação/transmissão, ou seja, é como se fossem colocadas em uma
sala pares de pessoas de diversos idiomas, e elas falassem todas ao mesmo tempo e se entendessem. Já
o GSM é uma tecnologia, cujo sinal (voz/dados) é alocado dentro de um canal, conforme o tempo da
conversação/transmissão, ou seja, é como se um trem fosse o canal de transmissão, existindo uma
conversa em cada vagão; para que outra conversa ocorresse em um dos vagões, seria necessário que a
conversa anterior desocupasse o espaço. Hoje, a tecnologia CDMA tem sua maior representação, em
termos de utilização, em grande parte dos Estados Unidos e na Ásia. Já a tecnologia GSM se encontra
mais pulverizada ao redor do Mundo, tendo penetração quase exclusiva na Europa e na maioria da
América Latina, sendo a tecnologia mais utilizada globalmente.
Com o intuito de apresentar os resultados desta pesquisa, nos parágrafos seguintes são trazidos os
principais referenciais teóricos utilizados, assim como os procedimentos metodológicos adotados na
pesquisa e os resultados encontrados.
REFERENCIAL TEÓRICO
O referencial teórico que embasou esta pesquisa esteve centrado em 3 grandes temas: Inovação
Tecnológica; Estratégia Competitiva e Teoria dos Stakeholders. Cabe ressaltar que as idéias e os
autores apresentados aqui representam aqueles que foram utilizados de forma mais significativa para
as análises ao longo da pesquisa, não esgotando os autores que têm contribuído para cada um destes
temas.
Assim, em relação à inovação tecnológica, diversos são os autores (Clark, 1989; Day &
Schoemaker, 2003; Giget, 1997; Zafar Husain, 1997; Itami & Numagami, 1992; Nieto, Lopés, &
RAC-Eletrônica, v. 2, n. 1, art. 1, p. 1-19, Jan./Abril 2008 www.anpad.org.br/rac-e
Luciano Barin Cruz, Eugenio Avila Pedrozo 4
Cruz, 1998; Shaw, 2000; Pavitt, 1990) que têm contribuído para o tema. Dentre os autores brasileiros,
destacam-se Cassiolato (2003), Coutinho, Cassiolato e Silva (1995), Tigre, Rovere e Fagundes (1995),
Wohlers e Plaza (2000) que vêm desenvolvendo trabalhos que analisam o setor de telecomunicações.
Para os objetivos deste estudo, adotou-se como autores principais Giget (1997) e Itami e Numagami
(1992).
Giget (1997) apresenta o que denomina como o “diamante da inovação total”. Ele afirma que a
inovação não se limita à esfera técnica. As inovações mais promissoras e mais aptas a colocarem a
empresa em situação de competitividade procedem, segundo ele, de recursos humanos e financeiros e
principalmente de relações existentes e de troca de conhecimentos entre áreas da organização. O autor
argumenta ainda que todas as organizações possuem cinco funções básicas: duas funções de recursos
(humanos e financeiros) e três funções operacionais (científica/técnica, produtiva, de marketing e
vendas).
Além das funções de recursos, o diamante mostra as relações entre as funções que levam aos tipos
de inovações de: recursos humanos-pesquisa (inovação no gerenciamento de pesquisa); recursos
humanos-produção (inovação organizacional e social); recursos humanos-marketing (inovação no
nível da força de vendas); produção-pesquisa (inovação de processo); produção-marketing (inovação
de distribuição); pesquisa-marketing (inovação de produto); pesquisa-recursos financeiros (inovações
financeiras em pesquisa e desenvolvimento); produção-recursos financeiros (inovação financeira na
produção); marketing-recursos financeiros (inovação financeira nas vendas).
O desenvolvimento da inovação (Giget, 1997), ocorre ao longo do eixo das funções de Pesquisa e
Desenvolvimento e das funções de Marketing. Segundo o autor, esse eixo representa a inovação como
resultado de dois fluxos: um começando pela função de Pesquisa e Desenvolvimento, passando pela
função de Produção e terminando na função de Marketing, technical push; e outro começando pela
função de Marketing, passando pela função de Produção e terminando na função de Pesquisa e
Desenvolvimento, market pull. O autor afirma ainda que a magnitude desses fluxos varia e que a
combinação dos dois é pré-requisito para resultados satisfatórios no processo de inovação.
Itami e Numagami (1992), por sua vez, exploram a interação da estratégia com a tecnologia,
considerando a tecnologia como um dos fatores centrais nas decisões estratégicas das organizações.
Existem, então, três perspectivas de interação da estratégia com a tecnologia: a estratégia capitaliza a
tecnologia; a estratégia cultiva a tecnologia; a tecnologia orienta a estratégia.
A primeira perspectiva foca nos efeitos da estratégia corrente sobre a tecnologia corrente, ou seja, a
estratégia que a empresa gostaria de adotar e a tecnologia que ela possui. Nessa perspectiva, a
tecnologia pode agir sobre a estratégia das seguintes maneiras: como arma competitiva que a empresa
pode utilizar a seu favor; como algo a que ela se deve adaptar; como ameaça de que a empresa deve
proteger-se e competir. Neste caso a premissa básica é que a estratégia corrente pode fazer o melhor
uso da tecnologia da empresa e, implicitamente, pode ser o limitante tecnológico da empresa.
A segunda perspectiva foca nos efeitos de estratégias correntes sobre tecnologias futuras. Segundo
os autores, nessa perspectiva o esforço de desenvolvimento tecnológico pode trazer para a empresa
não somente armas competitivas efetivas no negócio corrente, mas também profunda base tecnológica
aplicada em outros negócios futuros da empresa, ou seja, a tecnologia é extensiva neste caso.
A terceira perspectiva foca nos efeitos da tecnologia corrente sobre as estratégias futuras. Esta
perspectiva representa as tecnologias que a empresa possui no momento atual e /ou o compromisso
corrente da empresa para o desenvolvimento tecnológico, afetando no processo cognitivo humano para
a formação das estratégias. Os autores ressaltam que a tecnologia corrente pode afetar o processo
cognitivo individual e organizacional em duas etapas: a primeira é a de um profundo conhecimento de
tecnologias compartilhadas por diversas pessoas na empresa, estimulando-as a terem idéias sobre
novos produtos e novas armas competitivas por meio dessas tecnologias; a segunda é o
compartilhamento do entendimento e da compreensão dessas idéias emergentes que se constituirão em
estratégias.
Em relação à estratégia competitiva (Amit & Shoemacker, 1993; Barney, 1991; Coyne, 1986;
Dierickx & Cool, 1989; Grant, 1991; Hall, 1992; Hitt, Ireland, & Hoskisson, 2002; Javidan, 1998;
Mahoney & Pandian, 1992; Peteraf, 1993; Porter, 1986, 1989; Prahalad & Hamel, 1990; Reed &
Defillippi, 1990; Wernerfelt, 1984), foram utilizados basicamente autores contemporâneos das duas
abordagens que dominam o debate acadêmico atual sobre o tema: Organização Industrial (Porter,
1989); e Recursos Internos (Hall, 1992; Hitt et al., 2002; Javidan, 1998).
Na abordagem de Recursos Internos, Hall (1992) trabalha com a noção de recursos intangíveis, tais
como: ativos com contexto legal (contratos, licenças etc); ativos sem contexto legal (reputação, bases
de dados, etc); know how (funcionários, fornecedores etc); cultura organizacional (percepção de
qualidade; habilidade para gerenciar). Com base nesses recursos intangíveis, Hall (1992) utiliza a
contribuição de Coyne (1986) sobre capacidades para formar seu modelo. Segundo Coyne (1986), as
fontes para uma vantagem competitiva sustentável viriam de quatro tipos de capacidades diferenciais:
capacidade funcional (resulta do conhecimento, das habilidades, da experiência dos funcionários e de
outros que compõem a cadeia de valor); capacidade cultural (incorpora hábitos, atitudes, crenças e
valores que permeiam indivíduos e grupos na organização); capacidade posicional (é conseqüência de
atitudes passadas, que produziram algum tipo de reputação com os clientes, algum tipo de vantagem
de colocação etc); capacidade regulatória (resulta da posse de questões legais, como direitos de
propriedade intelectual, contratos, segredos de troca etc).
Javidan (1998) e Hitt et al. (2002) apresentam construtos semelhantes, que se baseiam nos recursos,
capacidades e competências para o alcance da vantagem competitiva. Começando por Javidan (1998),
o autor apresenta um constructo hierárquico para as competências, que inicia pelos recursos, que
podem tornar-se capacidades, e após, competências, até chegar às competências essenciais. À medida
que se sobe nessa hierarquia, cresce também o valor criado para a organização e as dificuldades. Para
ele existe muita confusão na conceituação e na diferenciação do que são recursos, capacidades e
competências; diante disto, para as organizações chegarem a vantagens competitivas, é preciso que
elas tenham estes conceitos esclarecidos. Nesse sentido, o autor apresenta as seguintes definições: os
recursos são as entradas na cadeia de valor da organização; as capacidades referem-se à habilidade da
Hitt et al. (2002) argumentam que a hierarquia começaria pelos recursos, sendo estes divididos em
tangíveis (recursos financeiros, organizacionais, físicos e tecnológicos) e intangíveis (recursos
humanos, de inovação e de reputação). Do nível dos recursos se passaria para o nível das capacidades,
que seriam habilidades que a empresa têm de organizar os recursos integrados, de forma propositada,
para alcançar a condição final desejada, chegando diretamente às competências essenciais. Estas
últimas são definidas pelos autores como sendo recursos e capacidades que servem de fonte de
vantagem competitiva para uma organização em relação a seus concorrentes. Para chegar às vantagens
competitivas, quatro critérios na descoberta das competências essenciais devem ser verificados. Elas
devem ser: valiosas; raras; de imitação dispendiosa, insubstituíveis.
Em relação à Teoria dos Stakeholders, embora também existam diversos autores que têm explorado
esta perspectiva (Freeman 1984; Frooman, 1999; Jensen, 2001; Mitchell, Agle, & Wood et al., 1997;
Rowley, 1997), uma interessante contribuição (que será utilizada nas análises posteriores) sobre a
relação de poder entre a empresa e o stakeholder é a apresentada por Frooman (1999). Segundo o
autor, quando os stakeholders não são dependentes da empresa e a empresa não é dependente dos
stakeholders existe baixa interdependência entre os dois; quando os stakeholders são dependentes da
empresa e a empresa não é dependente dos stakeholders, existe um poder da empresa em relação aos
stakeholders; quando os stakeholders não dependem da empresa e a empresa depende dos
stakeholders, existe um poder dos stakeholders em relação à empresa; quando os stakeholders
dependem da empresa e a empresa depende dos stakeholders, existe alta interdependência de ambos.
Nessa tipologia o poder tem papel central. É o principal determinante de resultados em situações em
que os interesses dos stakeholders e os da empresa são divergentes.
Conforme comentado anteriormente, não se pretendia aqui esgotar os autores que têm contribuído de
forma significativa nestas áreas teóricas apresentadas. Foram apresentados somente aqueles autores
que, de alguma forma, serviram de base para as análises subseqüentes.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa caracterizou-se como exploratória e qualitativa. Para a sua realização, duas fases
foram necessárias.
grande circulação no Brasil. Cabe ressaltar que essas entrevistas foram realizadas parte em Porto
Alegre (8 entrevistados) e parte em São Paulo (6 entrevistados).
Após a realização dessas entrevistas, a sua análise se deu através da técnica de análise de conteúdo
(Bardin, 2000; Moraes, 1999). Dessa análise de conteúdo emergiram vinte e sete (27) categorias
iniciais. A partir dessas categorias iniciais, e aqui pode-se considerar uma das contribuições
metodológicas desse estudo, incorporou-se o referencial teórico apresentado anteriormente sobre
Inovação Tecnológica, Estratégia Competitiva e Teoria dos Stakeholders, para constituir as categorias
intermediárias e finais, concluindo assim o arcabouço teórico utilizado. Enfatiza-se que havia sido
construído um arcabouço teórico, com base em referencial teórico inicial; porém nessa fase houve
acréscimos nesse referencial teórico, principalmente devido à emergência de novas características após
a análise das respostas dos experts.
Na segunda fase da pesquisa, foram realizados dois estudos de caso (Empresa A e Empresa B) com
duas empresas que representavam mais de 60% do market share nacional da telefonia móvel (Market
Share do setor de Telefonia Móvel – Teleco (2004)). A pesquisa nas empresas se deu a partir de suas
filiais no Estado do Rio Grande do Sul. A Empresa A mantém-se como líder de mercado desde o
começo de suas operações no Brasil. Ela é resultado da união de diversas operadoras regionais,
ensejada pela formação de uma joint-venture no Brasil, entre duas grandes multinacionais européias de
telefonia, e atua em grande parte do território nacional. A Empresa B foi por bastante tempo a segunda
maior empresa do país, e atualmente divide esta posição com outra operadora. Ela é resultado da união
de diversas operadoras regionais que atuavam no país, sendo controlada por grande acionista latino-
americano. A Empresa B também tem abrangência nacional, atuando na maior parte do território
brasileiro.
Como técnica de análise, para a segunda fase da pesquisa foi utilizada a triangulação de dados (Yin,
2001; Stake, 2000). Foram realizadas entrevistas de funcionários das duas empresas, observações em
ambas as empresas através de visitas, observação e participação em uma das maiores feiras de
telefonia móvel nacional (Telexpo Wireless 2003), e análise de dados secundários em sites e revistas
especializadas. Cabe ressaltar que as entrevistas se deram em um total de seis (6) em cada empresa, e
foram feitas com funcionários em nível de gerência, em áreas estratégico-mercadológicas e técnicas.
É importante salientar que para a identificação das vantagens competitivas não foi utilizada a lógica
tradicional de marketing, ou seja, partindo de dados quantitativos do mercado para identificar e
caracterizar as vantagens competitivas. Em um primeiro momento foram analisadas as duas empresas,
tendo em vista suas características individualmente. Em um segundo momento, considerou-se
conjuntamente a diferenciação entre Recursos, Capacidades e Competências, classificando as
Competências como fontes de vantagens competitivas. Optou-se por não fazer distinções entre os
conceitos de competências e competências essenciais, embora se saiba que os autores aqui utilizados
(Javidan, 1998; Hitt et al., 2002) as façam. A forma como foi operacionalizada a análise e a
identificação dos Recursos, Capacidades, e Competências representa outra importante contribuição
deste trabalho, principalmente pela grande variedade de definições que podem ser encontradas sobre
estes conceitos. A Figura 1 apresenta um quadro geral com os procedimentos metodológicos utilizados
na pesquisa.
Fonte: Pesquisa.
Da análise de conteúdo das entrevistas com os experts emergiram vinte e sete (27) categorias
iniciais. A partir dessas categorias iniciais agregou-se o referencial teórico, constituindo assim onze
(11) categorias intermediárias e sete (7) categorias finais, e por conseqüência, constituindo o
arcabouço teórico. A Figura 2 mostra este arcabouço teórico.
(conclusão)
Figura 2: Arcabouço Teórico para o Setor de Telefonia Móvel Brasileiro
Apesar de não ser possível, aqui, fazer uma apresentação detalhada de cada uma das categorias
iniciais, alguns comentários serão feitos sobre o conteúdo dessas categorias.
Em relação à Capacidade de Inovação (Giget, 1997), ela é formada pelas categorias intermediárias
‘Função de Marketing’ e ‘Função de Pesquisa e Desenvolvimento’. Verifica-se que atualmente o setor
de telefonia móvel brasileiro está passando por um período de intensa competição por inovação no
desenvolvimento de produtos e serviços; desta forma, as empresas além de simplesmente
incorporarem as inovações de suas matrizes, estão desenvolvendo também produtos e serviços
específicos para a realidade das diferentes regiões onde atuam, o que implica ajustes tecnológicos para
estas necessidades. Assim, os experts entendem que a Capacidade de Inovação tem sido uma categoria
estratégica de relevância para as empresas deste setor. Mais do que isto, o Posicionamento no Mercado
e os Segmentos que cada empresa está focando são também diferenciais destacados pelos experts.
Em relação ao Controle de Custos (Porter, 1989), esta categoria é formada pelas categorias
intermediárias ‘Escala’ e ‘Inter-Relações’. Atualmente, algumas tecnologias têm propiciado escala
mundial para algumas das empresas do setor, o que leva a custos mais baixos. Isto se dá
fundamentalmente devido à escolha de tecnologia que cada empresa está fazendo. Além disso, existe
uma tendência no mercado nacional de integração entre as operadoras de telefonia móvel, no sentido
de formar grandes alianças para competir nacionalmente. Com isto, as empresas deixaram de ser
regionais e passaram a ter abrangência nacional.
A Capacidade Posicional (Hall, 1992), por sua vez, é formada pela categoria intermediária
“Reputação”. Pelo depoimento dos experts verifica-se que esta categoria representa a necessidade de
construção e manutenção de uma reputação por parte das empresas do setor. Questões ambientais e
relacionadas à responsabilidade social e ética dessas empresas foram algumas das categorias apontadas
pelos experts como estratégicas no cenário atual da telefonia móvel brasileira. Além dessas, a
preocupação com os efeitos da radiação dos celulares para a saúde humana e a busca por credibilidade
em face dos consumidores se mostraram outros importantes aspectos a serem considerados neste setor.
Em relação à Capacidade Funcional (Hall, 1992), a mesma é formada pela categoria intermediária
“Know How”. Verifica-se como fundamental a questão que envolve o know-how das empresas do
setor. Os experts apontam esta como uma categoria estratégica para as empresas, principalmente pelas
constantes mudanças de tecnologia que têm ocorrido no país, onde o know how existente dentro das
empresas, sejam elas as operadoras ou as fornecedoras de tecnologia, acaba sendo um diferencial no
momento de migrações ou evoluções tecnológicas.
O Relacionamento com Stakeholders (Frooman, 1999) é uma categoria final que foi formada por
uma categoria intermediária de mesmo nome. Expressa o que os experts entendem como o
relacionamento das empresas do setor com os seus diferentes interessados, sejam eles os fornecedores,
os distribuidores, as entidades civis ou os próprios clientes. Aqui é importante observar a relação de
poder e de força entre estes stakeholders e a empresa.
Em relação à Interação Estratégia e Tecnologia (Itami & Numagami, 1992), esta categoria é formada
pelas categorias intermediárias ‘Tecnologia orientando a Estratégia’ e ‘Estratégia capitalizando a
Tecnologia’. Os experts salientaram esta como uma categoria estratégica, uma vez que este setor é
quase diariamente abarcado com inovações tecnológicas que tanto influenciam as estratégias, como
muitas vezes também são influenciadas pelas estratégias das empresas. Essa interação de ambas,
Estratégia e Tecnologia, representa a realidade pela qual passam as decisões das empresas desse setor.
Para apresentar os resultados da segunda fase da pesquisa é importante separar estes resultados em
uma primeira parte, onde foram identificadas, individualmente, as vantagens competitivas para cada
uma das duas empresas, a partir do arcabouço teórico desenvolvido na primeira fase da pesquisa; e
uma segunda parte, onde foram comparadas estas vantagens competitivas. Cabe também ressaltar que
a Empresa A fez a opção pela tecnologia CDMA, enquanto a Empresa B fez a opção pela tecnologia
GSM.
Em relação à Capacidade de Inovação (Giget, 1997), observa-se que a vantagem da Empresa A está
no seu posicionamento focado na exclusividade de ser a única empresa no país a possuir a tecnologia
CDMA, e no foco no mercado corporativo que demanda maior quantidade de serviços de dados em
alta velocidade, sendo isto propiciado pela tecnologia escolhida (Assis, 1995). Além disso, a Empresa
A também apresenta vantagens ao possuir, com a nova tecnologia (CDMA), nova gama de serviços
para oferecer aos seus clientes, serviços que acabam sendo desenvolvidos, tanto a partir de soluções
aplicadas por grandes players internacionalmente, como também através de soluções customizadas
para o mercado brasileiro. A área de desenvolvimento de produtos e serviços nesta empresa tem papel
de destaque, principalmente por ter de buscar constantemente novas soluções que cativem os clientes e
atraiam novos consumidores.
Em relação ao Controle dos Condutores de Custo (Porter, 1989), as vantagens da Empresa A estão
no seu menor investimento, quando fizer a migração para a terceira geração de telefonia (uma vez que
a tecnologia CDMA proporciona menores custos de migração), e tornar-se uma marca nacional (com a
unificação de diversas operações regionais), ganhando, assim, principalmente força de negociação no
mercado.
Em relação às Capacidades Posicionais (Hall, 1992), observa-se que a Empresa A possui vantagens
pelo fato de a tecnologia CDMA garantir níveis de potência emitida menores do que as outras
tecnologias (Assis, 1995), e também por permitir que com menor quantidade de antenas de
transmissão espalhadas pela cidade, se possa ter a mesma cobertura que se tinha antes com outras
tecnologias para atender os clientes. Além disso, a empresa também tem demonstrado preocupação
com ações sociais e com sua credibilidade perante os clientes.
Cabe ressaltar ainda que dessas vantagens competitivas, identificadas individualmente, a grande
maioria realmente derivou de aspectos relacionados com a tecnologia CDMA, enquanto outras
derivaram mais de aspectos organizacionais da empresa, não tendo relação com a escolha pela
tecnologia CDMA.
Para a Empresa B, a Figura 4 mostra as categorias nas quais foram identificadas vantagens
competitivas. Ressalta-se que aquelas categorias que estão em cinza foram consideradas como
vantagens competitivas derivadas da opção pela tecnologia GSM.
(conclusão)
Figura 4: Vantagens Competitivas Individualmente da Empresa B
Em relação ao Controle dos Condutores de Custos (Porter, 1989), as vantagens da Empresa B estão
na expansão e dinamicidade do mercado, proporcionada pela penetração nos segmentos C e D, pelos
menores custos dos aparelhos celulares, e pela força de uma marca nacional, devido à consolidação da
empresa em grande grupo nacional.
atendimento (publicadas nos últimos anos pela ANATEL), que apontaram tal resultado para algumas
das operadoras regionais que compuseram a Empresa B.
Ressalta-se que também para a Empresa B a grande maioria das vantagens competitivas
identificadas individualmente derivaram da opção pela tecnologia GSM feita pela empresa. De
qualquer forma, algumas das vantagens identificadas derivaram de aspectos organizacionais da
empresa e não da opção tecnológica.
Para realizar a comparação entre as vantagens competitivas das duas empresas, o arcabouço teórico
que havia sido desenvolvido se mostrou insuficiente. Diante disto, retornou-se ao referencial teórico e
foram incorporados para a análise os construtos teóricos propostos por Javidan (1998) e por Hit et al.
(2002), para a hierarquia entre recursos, capacidades e competências. Ressalta-se novamente que não
foram feitas distinções entre os conceitos de competências e competências essenciais, conforme é
proposto nos construtos desses autores, e conforme já foi comentado nos procedimentos
metodológicos. Para a análise aqui realizada, adotou-se apenas o conceito de competências, sendo
estas consideradas como sinônimo de vantagem competitiva.
Para realizar tal comparação foram adotados os seguintes critérios em relação às colunas 1
(categorias) e 2 (características), das Figuras 3 e 4: para todas aquelas categorias em que ambas
empresas possuíam vantagens com as mesmas características, estas foram consideradas como sendo
recursos; para todas aquelas categorias em que ambas as empresas possuíam vantagens, porém com
características diferentes, estas foram consideradas capacidades; para todas aquelas categorias em que
só uma das empresas possuía vantagens, estas foram consideradas competências e, conseqüentemente,
classificadas como vantagens competitivas na comparação entre as duas empresas.
Desta forma, a Figura 5 mostra o que foi considerado como recurso, capacidade ou competência
(grifado em cinza) e, conseqüentemente, vantagem competitiva, na comparação entre as duas
empresas.
Conforme se pode observar pela Figura 5, a maioria das vantagens competitivas identificadas,
individualmente, para cada empresa (na comparação), foram consideradas recursos ou capacidades.
Foram identificadas, na comparação, como competências e, conseqüentemente, como vantagens
competitivas para a Empresa A, as categorias finais: Efeitos na Estrutura e no Ambiente da Cidade;
Cuidados com os Efeitos da Radiação para a Saúde; Transmissão de Dados (as características destas
categorias já foram explicadas anteriormente). Já para a Empresa B, foram identificadas, na
comparação, como competências e conseqüentemente como vantagens competitivas, as categorias:
Expansão e Dinamicidade do Mercado; Roaming (as características destas categorias já foram
explicadas anteriormente). Cabe ressaltar também que as categorias identificadas como competências
na comparação, derivaram, todas, da opção tecnológica (CDMA; GSM) de cada uma das empresas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O setor de Telefonia Móvel brasileiro, nos últimos anos, tem passado por uma série de modificações,
algumas delas motivadas por novas regulamentações impostas pela ANATEL; porém muitas delas
motivadas pelo intenso movimento de inovação tecnológica envolvido neste setor.
Diante disso, essa pesquisa procurou verificar quais as vantagens competitivas que estavam sendo
geradas para as empresas do setor, a partir justamente dessas inovações tecnológicas.
De qualquer forma, o arcabouço teórico desenvolvido para o setor de Telefonia Móvel pode
representar outro importante resultado dessa pesquisa; pode até mesmo servir de marco inicial para
futuras pesquisas nesse setor. Além do arcabouço teórico, a forma como a comparação entre as
vantagens competitivas foi feita pode representar um avanço para o debate sobre recursos, capacidades
e competências, uma vez que ainda existe muita discussão sobre esses conceitos. Talvez esta tenha
sido a principal contribuição deste estudo, uma vez que não se utilizou a tradicional forma de
identificar vantagens competitivas a partir do mercado. Partiu-se de uma análise interna das empresas.
A forma ou a operacionalização dessa análise interna possibilita que novos estudos possam ser
realizados, visando avançar no conhecimento dessa área.
Evidenciou-se também que as competências (ou vantagens competitivas) das duas empresas advêm,
em sua maioria, de características de natureza tecnológica (CDMA; GSM), em detrimento de
características organizacionais. Isso mostra quanto a escolha por estas tecnologias é central no setor e
quanto a busca por inovação deve continuar sendo um dos focos destas empresas. É interessante
salientar que o investimento tecnológico destas empresas é alto, principalmente no momento da
construção da infra-estrutura (instalações físicas, desenvolvimento da rede, treinamento de pessoal etc)
para operar em determinada tecnologia, porém ele não cessa após esta etapa. As empresas deste setor
devem continuar constantemente investindo em inovação tecnológica, uma vez que estas inovações
são rapidamente imitadas pelos concorrentes, deixando de ser diferenciais, tornando-se requisitos
mínimos. Assim, para garantirem competitividade, as empresas deste setor necessitam de contínuos
investimentos em capacidade tecnológica.
Como se pode perceber, os pesos das vantagens encontradas para cada empresa foram muito
semelhantes, e podem servir de indicativo e como base (assim como o restante da pesquisa) para
interessados em pesquisar esse setor.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Amit, R., & Schoemacker, P. J. H. (1993). Strategic assets and organizational rent. Strategic
Management Journal, 14(1), 33-46.
Assis, M. S. (1995). Telefonia móvel celular: situação atual e perspectivas. Telebrasil, 21(111), 53-63.
Barney, J. (1991). Firm resources and sustained competitive advantage. Journal of Management,
17(1), 99-120.
Clark, K. B. (1989). What strategy can do for technology. Harvard Business Review, 67(6), 94-98.
Coyne, K. P. (1986). Sustainable competitive advantage – what is it and what it isn’t. Business
Horizons, 15(1)54-61.
Day, G. S., & Schoemaker, P. J. H. (2003). Evitando as armadilhas das tecnologias emergentes. In G.
S. Day, P. J. H. Schoemaker, & R. F. Gunther (Orgs.). Gestão de tecnologias emergentes: a
visão da Wharton School (pp. 36-63). Porto Alegre: Bookman.
Dierickx, I., & Cool, K. (1989). Asset stock accumulation and sustainability of competitive advantage.
Management Science, 35(12), 1504-1511.
Frooman, J. (1999). Stakeholder influence strategies. Academy of Management Review, 24(2), 206-
221.
Giget, M. (1997). Techonology, innovation and strategy: recent developments. International Journal
of Technology Management, 14(6-7-8), 613-634.
Grant, R. M. (1991). The resource-based theory of competitive advantage: implications for strategy
formulations. California Management Review, 33(3), 114-135.
Hall, R. (1992). The strategic analysis of intangible resources. Strategic Management Journal, 13(2),
135-144.
Hitt, M. A., Ireland, R. D., Hoskisson, R. E. (2002). Administração estratégica. São Paulo: Pioneira
Thomson Learning.
Itami, H., & Numagami, T. (1992). Dynamic interaction between strategy and technology. Strategic
Management Journal, 13(Special Issue), 119-135.
Javidan, M. (1998). Core competence: what does it mean in practice? Long Range Planning, 31(1),
60-71.
Jensen, M. C. (2001). Value maximization, stakeholder theory, and the corporate objective function.
European Financial Management, 7(3), 297-317.
Mahoney, J., & Pandian, J. R. (1992). The resource-based view within the conversation of strategic
management. Strategic Management Journal, 13(5), 363-380.
Mitchell, R. K., Agle, B. R., & Wood, D. J. (1997). Towards a theory of stakeholder identification and
salience: defining the principle of who and what really counts. Academy of Management
Review. 22(4), 853-886.
Nieto, M., Lopéz, F., & Cruz, F. (1998). Performance analysis of technology using the S curve model;
the case of digital signal processing (DSP) technologies. Technovation, 18(6-7), 439-457.
Pavitt, K. (1990). What we know about the strategic management of technology. California
Management Review, 32(3), 17-27.
Prahalad, C. K., & Hamel, G. (1990). The core competence of the corporation. Harvard Business
Review, 68(3), 79-91.
Reed, R., & Defillippi, R. J. (1990). Causal ambiguity, barriers to imitation, and sustainable
competitive advantage. Academy of Management Review, 15(1), 88-102.
Rowley, T. J. (1997). Moving beyond dyadic ties: a network theory of stakeholder influences.
Academy of Management Review, 22(4), 887-910.
Stake, R. E. (2000). Case studies. In N. K. Denzin & Y. S. Lincoln (Eds.). Handbook of Qualitative
Research (pp. 435-455). Califórnia: Sage.
Teleco. (2004) Market share do setor de telefonia móvel. Recuperado em 20 janeiro, 2004, de
http://www.teleco.com.br
Tigre, P. B., Rovere, R. L. L., & Fagundes, J. (1995). Telecomunicações e desenvolvimento: novas
evidencias sobre difusão e impactos econômicos. Revista Brasileira de Economia, 49(4), 697-
732.
Wernerfelt, B. (1984). A resource based view of the firm. Strategic Management Journal, 5(2), 171-
180.
Wohlers, M., & Plaza, C. (2000). Informe anual 2000: telecomunicações e tecnologias da informação.
São Paulo: CELAET/UNIEMP.
Yin, R. K. (2001). Estudo de caso: planejamento e métodos (2a ed.). Porto Alegre: Bookman.