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São Carlos - SP
Universidade Federal de São Carlos
2014
TEXTOS DE:
III Congresso Regional de Educação de Pessoas Adultas
ORGANIZAÇÃO:
Profa. Dra. Fabiana Marini Braga - NIASE
Profa. Msa. Adriana F. C. Marigo - NIASE
DIAGRAMAÇÃO:
Cristian Cobra
Jemima Murad
Apresentação........................................................................7
Adriana Fernandes Coimbra Marigo
Kelci Anne Pereira
Raquel Auxiliadora dos Santos
ARTIGOS
6
Contribuições da teoria literária para o letramento literário na
formação de professores...................................................21 9
Eliane Quinelato
Clinio Jorge de Souza
Luciana Maria Crestani
Maria das Graças Sandi Magalhães
Experiências de leitura e escrita de pessoas jovens e
adultas: saberes e poderes...............................................241
Eliane Aparecida Bacocina
Maria Rosa Rodrigues Martins de Camargo
Centro Educacional de Jovens e Adultos (CEJA) e os
recursos tecnológicos como diferencial no processo ensino-
aprendizagem: políticas públicas para a formação de
pessoas jovens e adultas..................................................259
Fátima Aparecida Machado dos Santos
Maria Aparecida Couto
Aproximações entre a educação de pessoas jovens e
adultas e a educação ambiental........................................273
Flávia Fina Franco
Amadeu José Montagnini Logarezzi
Percursos migratórios e escolares de educandos da EJA do
município de Rio Claro - SP...............................................305
Flávia Priscila Ventura
PEJA: alfabetização em um contexto institucional............321
Glaucia Mariana Reis
Eliana Marques Zanata
Marta Coutinho Peres
7
Inclusão digital dialógica na Terceira Idade - NEATI/UFMT
Rondonópolis....................................................................343
Waine Teixeira Júnior
Eglen Silvia Pipi Rodrigues
Gleicy Aparecida Souza
Mirian de Souza Riva
O PROEJA no contexto das políticas públicas de EJA no
Brasil contemporâneo........................................................359
Jarina Rodrigues Fernandes
Potencial multicultural observado em práticas pedagógicas
de educação de jovens e adultos no ensino de Ciências da
Natureza............................................................................385
Juliano Schiavo Sussi
Ana Carolina Andrade Volpi
Anselmo João Calzolari Neto
Educação de Jovens e Adultos e Economia Solidária: uma
aproximação necessária...................................................407
Jussara Florencio
Kelci Anne Pereira
Paulo Eduardo Gomes Bento
Educação de pessoas jovens, adultas e idosas e gênero:
desafios e perspectivas.....................................................431
Ludmilla Puppim Voigt
Poliana da Silva Almeida Santos Camargo
Educação ambiental no contexto da educação de pessoas
jovens e adultas: algumas possíveis conexões.................455
Maria Alice Zacharias
Caroline Lins Ribeiro
Amadeu José Montagnini Logarezzi
8
Centro Educacional de Jovens e Adultos (CEJA) - 27 anos
de trajetória em Bauru/SP: Políticas Públicas para a
formação de pessoas jovens e adultas.............................483
Maria Aparecida Couto
Fátima Aparecida Machado dos Santos
O PROEJA no IFMT: desafios e possibilidades no processo
de formação do trabalhador..............................................497
Maria Helena Moreira Dias Serra
Érica Lopes Rascher Costa Marques
Silvia Maria dos Santos Stering
Enunciados de situações-problema ou problemas de
enunciados na EJA?.........................................................523
Otilia N. Obst
Patrícia D. P. de Souza
Debatando a Educação de Jovens e Adultos a partir da
Pedagogia da Autonomia..................................................535
Rafael Rossi
Maria Peregrina de Fatima Rotta Furlanetti
Mulheres na Educação de Jovens e Adultos: diálogo entre
processos de escolarização e relações de gênero...........555
Raquel Auxiliadora dos Santos
Carolina Orquiza Cherfem
Roseli Rodrigues de Mello
Programa Brasil Alfabetizado e aprendizagem dialógica - por
uma EJA emancipadora....................................................575
Raquel Moreira
Adriana Fernandes Coimbra Marigo
Rosimara Silva Correia
9
Contribuições da disciplina de filosofia para a formação do
cidadão nas salas de Educação de Jovens e Adultos – EJA
..........................................................................................599
Ronaldo Martins Gomes
Educação não formal de educadoras e jovens em conflito
com a lei em um programa de medidas
socioeducativas.................................................................61 5
Rubia Fernanda Quinelatto Caparrós
Elenice Maria Cammarosano Onofre
Políticas de Currículo e de Avaliação e o Exame Nacional do
Ensino Médio (ENEM).......................................................643
Wilmara Alves Thomaz
RELATOS
10
Rejane Novaes Viegas
Rafaela Silva de Souza
Feliz em aprender..............................................................683
Maria Angélica de Paula
Marília Vellosa
Andreia Maria da Costa
Componentes do corpo humano e nutrição......................685
Priscila Willik Valenti
Quanta coisa aprendi!.......................................................697
Maria Aparecida Pinheiro Rocha
Alessandra Vetorelli Pereira
PÔSTERES
11
Carmem Taboas
Julia Ap. de ToledoPierri
Joana Adail Parise Barberis
Mara Gois
Maria Do Carmo Naville Noventa
Nelsi Elizabete Bossolan
Neuza Lotumolo
Romilda Sartori
A relevância das vivências junto à Educação de Jovens e
Adultos na formação inicial...............................................705
Andreia Garbo
Lívia M. P. Soares
Jarina Rodrigues Fernandes
Teatro e a Educação: experiências no Projeto de Educação
de Jovens e Adultos (PEJA)..............................................707
Bruna Garcia Eskinazi
André Luis Messeti Christofoletti
Andréia Maressa da Silva
Thainara Bonfante Gasparini
Maria Rosa Rodrigues Martins de Camargo
Nunca é tarde para recomeçar..........................................711
Fátima Cristina do Amaral Sanches Gonzales
Rosimara Silva Correia
Arte na EJA - a trilha de um novo olhar: processo de ensino
e de aprendizagem de jovens e adultos............................71 5
Heloisa Helena Pita Prado
Maria Cristina de Andrade Silva
Patrícia Guerra Miranda
PIBID - Programa Institucional de Bolsa de Iniciação á
12
Docência atuando na Educação de Jovens e Adultos em
Bauru.................................................................................721
Larissa de Oliveira Matos
Larissa de Souza Bertocco
Naiany Lourenço
Vanessa Helena Pileggi
Eliana Marques Zanata
A Educação Física na Educação de Jovens e Adultos da
UFSCar: um relato de experiência....................................723
Lúcio de Castro Fábis
Rosimara Silva Correia
40 horas + 50 anos = uma só esperança..........................725
Marco Antonio Silveira
O MOVA se move para que eu escreva minhas primeiras
cartas................................................................................727
Maria Alice Zacharias
Isabel C. Oliveira
Flávia F. S. Mendonça
Movimento de alfabetização de adultos: plantas que curam
..........................................................................................731
Aparecida Cardoso Nascimento
Apparecida Florêncio Gomes
Benedita C .G. Santiago Custódio
Antonio de Andrade
Eva Dias
Celline Francisca de Paula Bernardes
Maria Aparecida Amaral de Oliveira
Maria Rosa de Araujo
Rosangela Borges
Sebastião Zacharias
13
Valdomiro Rodrigues Nascimento
Maria Lúcia Voltatódio
A utilização das narrativas matemáticas na alfabetização de
jovens e adultos.................................................................735
Michele Rodrigues
Não desista nunca: Minha história na EJA........................737
Nanci Miranda Lembo
Rafaela Larios Soldan
Saboreando as palavras e alimentando o conheciment com
as doces obras de Cora Coralina: processos de ensino e de
aprendizagem de jovens e de adultos...............................739
Odirlei de Oliveira
Patrícia Daniela P. de Souza
A arte na Educação de Jovens e Adultos: reconstruindo a
história através de Portinari e Almeida Júnior....................743
Patrícia Daniela P. de Souza
José Carlos Miguel Universidade
Percepções sobre estresse, ansiedade e depressão de
alfabetizadores de adultos e idosos...................................745
P. Brancaglione
N. A. Oliveira
G. M. S. Batista
B. R. Santos
S. C. I. Pavarini
K. Inouye
Alfabetização no primeiro seguimento da EJA a partir de
Freire..................................................................................747
Renata Otaviano
Leoncio Casarini
Fabiana Marini Braga
Francisca Constantino
A cultura oral na EJA: a Tertúlia Literária Dialógica como
lugar de diálogo.................................................................751
Sabrina Maria de Amorim
Roseli Rodrigues de Mello
Ensino de leitura e escrita a adultos não alfabetizados:
adequando um programa informatizado para amplicação em
larga escala.......................................................................753
Solange Calcagno
Deisy de Souza
15
16
apresentação
18
Por isso, o diálogo igualitário e a participação são
elementos metodológicos que pautam o congresso desde a
sua concepção ao momento de sua realização (FLECHA,
1 997). A ideia central é que o evento se repita periodica-
mente, a partir de um tema gerador, refletindo o acúmulo
das ações de ensino, pesquisa e extensão que o Núcleo de
Investigação e Ação Social e Educativa (NIASE), da Univer-
sidade Federal de São Carlos (UFSCar), realiza em parceira
com escolas, prefeituras, movimentos sociais e ONG's no
campo da EJA.
Referências
19
20
artigo
Resumo
Introdução
22
ções e possibilidades. Destaca-se, de um lado, a predomi-
nância histórica de concepções compensatórias, caritativas
e escolarizantes de EJA, bem como sua marginalização co-
mo modalidade educativa no conjunto das políticas públicas,
refletida na ausência de formação específica de educado-
res/as. Por outro lado, o texto recupera a sustentação jurídi-
ca da EJA como um direito ancorado na necessidade
democrática de se instaurar concepções mais alargadas e
culturais de EJA, tal qual subjacentes aos conceitos de edu-
cação ao longo da vida e de aprendizagem dialógica. No se-
gundo momento do texto, o CEEJA é apresentado em sua
forma, seu conteúdo e sua fundamentação teórico-metodo-
lógica, como tentativa de consolidação de uma abordagem
dialógica e cultural para a formação de educadores de EJA.
A parte final apresenta um balanço crítico da experiência,
buscando elucidar os fatores que obstaculizaram e os que
favoreceram a consolidação da experiência do curso.
A EJA: um campo de contradições e possibilidades
23
e negros/as (1 4,4% dos pretos e 1 3% dos pardos são anal-
fabetos, enquanto o analfabetismo branco representa 5,9%);
e que a população do meio rural sofre 3,2 vezes mais com o
analfabetismo - 23,2% da população é analfabeta - do que a
população urbana. Em todas as situações citadas, o prejuízo
educacional vincula-se diretamente à baixa renda.
A modalidade da educação básica, que se volta le-
galmente para o atendimento a esta população, é a Educa-
ção de Jovens e Adultos (EJA), cuja função é criar
condições para que todas as pessoas com 1 5 ou mais anos
de idade, não escolarizadas na idade própria, possam ter
acesso à escola como um espaço significativo de aprendi-
zagem do conhecimento científico, técnico e cultural, mas
também de convivência.
Mediante a atuação histórica dos movimentos sociais
populares em luta por democracia no país, o Estado foi
pressionado a reconhecer a educação como um direito de
todos, instrumento indispensável à prática da cidadania na
sociedade contemporânea (grafocêntrica). A EJA foi con-
templada por três dispositivos jurídicos fundamentais: a
Constituição Federal do Brasil, que reconhece a educação
como direito de todos e dever do Estado (BRASIL, 1 988); a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional do Brasil
(LDB), que legitima a EJA como um direito público subjetivo,
cujas garantias devem dar-se mediante ofertas escolares
flexíveis, alinhadas às especificidades e necessidades dos
estudantes, inclusive os que forem trabalhadores (BRASIL,
1 996); e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA,
que dispõem sobre princípios da EJA e as funções respon-
sáveis por consubstanciá-los na prática (CNE/CEB, 2011 ).
Por sua relevância e densidade analítica e propositi-
va, os princípios e funções da EJA merecem ser aqui recu-
perados, notando-se sua imbricação e profunda
interdependência:
24
- Reparo: enseja corrigir o processo de exploração respon-
sável por segregar a classe trabalhadora da escola. Trata-se
de saldar uma espécie de dívida social com esa população
que colaborou com o desenvolvimento do país por meio de
seu trabalho árduo, garantindo-lhes escolarização e outros
direitos sociais complementares, para que os estudos pas-
sem a ser integrados ao seu conjunto de prioridades.
- Equalização: fundamenta-se na proporcionalidade e justifi-
ca o “dar mais a quem tem menos” como uma lógica de res-
tauração de direito, ao invés de uma forma de privilégio.
- Qualificação: diz respeito ao contexto social contemporâ-
neo e sublinha a formação permanente como uma necessi-
dade vinculada ao desempenho da cidadania e de outros
papéis (como trabalhadores, membros de famílias, etc),
além de abranger a fruição cultural e o desenvolvimento
pessoal (CNE/CEB, 2011 ).
No entanto, este marco legal contrasta fortemente
com as estatísticas de analfabetismo entre jovens e adultos,
apresentadas no início deste texto, revelando que a univer-
salização da educação no Brasil ainda é uma utopia demo-
crática. Trata-se de uma contradição pungente que se
pretende interpretar, a seguir.
O primeiro aspecto a ser destacado refere-se às ra-
zões que os próprios jovens e adultos, que representariam
uma demanda potencial para a EJA, declararam ao IBGE
(2009) como os motivos que os afastam do direito à educa-
ção: distância entre a escola e o local de moradia ou de tra-
balho; concorrência entre estudos e trabalho
(incompatibilidade entre período e calendário escolar e o
horário de trabalho; desgaste físico em função de trabalhos
temporários e precários); ausência de creches para deixa-
rem filhos enquanto se frequenta as aulas; desinteresse pela
escola.
Como explicar o desinteresse pela escola, se nitida-
25
mente a escolarização se vincula à proteção social e ao
acesso a outros direitos (CURY, 2002) e se as pessoas “não
são idiotas culturais” (GARFINKEL, 1 984)?
Conforme a revisão de literatura sobre a EJA, condu-
zida por Soares (2011 ) no âmbito das produções da ANPEd
(Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Educação), os estudos acadêmicos revelam que a maior
parte da oferta escolar brasileira, nessa modalidade de en-
sino, se baseia em concepções compensatórias e economi-
cistas, que justificam preconceitos e estigmas (GALVAO, DI
PIERRO, 2007). Equiparados a crianças6 por serem analfa-
betos ou pouco escolarizados, os adultos passam a ser en-
tendidos como a-lumines (alunos = sem luz), sujeito da falta,
taxados de carentes. Como consequência, a educação que
a eles é dirigida encarna a missão de recuperar rapidamen-
te o tempo da escolaridade perdida, preenchendo-lhes dos
conteúdos escolares não aprendidos na “idade certa”, e de
qualificá-los para uma melhor inserção no mercado de tra-
balho. Em outras palavras, educação (de jovens e adultos) é
reduzida a um tipo de escola tradicional, baseada em rela-
ções hierárquicas, em uma gestão burocratizada e em um
currículo descontextualizado e tecnicista, cujo objetivo máxi-
mo é a formação de mão-de-obra. Nesse currículo, as práti-
cas pedagógicas contrariam as capacidades e as
necessidades de aprendizagem dos/as educandos/as, mas
também de sua capacidade partícipe (MEDINA, 1 997). As-
sim, a escola torna-se um instrumento de legitimação da di-
visão de classe, ao consolidar a EJA como via de
preparação para a venda de força de trabalho, portanto, uma
educação para os pobres, reservando o ensino propedêutico
às elites que decidirão os rumos da sociedade (LIMA, 2007).
De acordo com Galvão e Di Pierro (2007), essa con-
cepção reducionista da EJA reflete seu esquecimento e sua
6 50,7% da população declarou-se preta ou parda.
26
marginalização histórica nas agendas das políticas educati-
vas do Brasil. Por muito tempo, a educação de adultos, ofer-
tada pelo Estado, foi reduzida a campanhas de
alfabetização, baseadas no voluntariado e na ausência de
investimento público. O analfabetismo era interpretado como
a causa do subdesenvolvimento do país, uma espécie de
doença/epidemia que deveria ser erradicada rapidamente, a
partir da colaboração de toda a sociedade.
Apesar de desvelada como instrumento de domina-
ção pelo legado da educação popular7, essa concepção mé-
dico-higienista difundiu com tal eloquência no imaginário
social, e mostrou-se tão oportuna para falsear o descompro-
misso democrático de sucessivos governos, o que se faz
presente até hoje. Nos mais variados planos de governo,
entre os ditos de direita e de esquerda, frequentemente a
EJA não remete para além de campanhas rápidas e precári-
as (voluntariado, sem financiamento adequado) de alfabeti-
zação, sem garantia de continuidade na vida escolar. Isso
não anula, entretanto, o fato dos movimentos sociais terem
sido suficientemente ativos para lograr a reinserção da EJA
na agenda pública, sobretudo a partir do governo Lula, o
que se reverteu em algumas conquistas (Di PIERRO, 2005):
a incorporação da EJA às políticas de merenda escolar, a
adoção do livro didático, entre outros recursos; o cômputo
das matrículas de EJA no Fundo de Manutenção e Desen-
volvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profis-
7 A educação popular teve seu período áureo no final da década de 1 950
e anos iniciais de 1 960, quando o pensamento de Paulo Freire se difundiu
e, com ele, a noção de que o alfabeto era um sujeito de aprendizagem e
de conhecimento, que poderia tomar consciência de sua condição de
agente e engajar-se na transformação da realidade. A educação da práxis,
dada na pedagogia da pergunta, se apresenta como central nesse
processo conscientizador. A partir dessas elaborações, Freire revelou o
analfabetismo como consequência de uma sociedade desigual, nutrindo a
atuação dos movimentos de educação e cultura popular da época, que
visava uma educação feita com e não para o povo. (BEISIGEL, 1 982)
27
sionais da Educação (FUNDEB), mesmo que com fator de
ponderação inferior ao das matrículas do ensino “regular”; o
lançamento de editais de incentivo à formação continuada
de docentes de EJA.
Entretanto, no balanço geral, observa que, apesar de
os referidos avanços, a EJA ainda recebe um tratamento se-
cundário por parte do Estado; seus estudantes ou deman-
dantes em potencial continuam sendo tratados pela ótica da
carência, ao invés da ótica dos direitos (BEISIEGEL, 2003;
Di PIERRO, 2005). A violação democrática impõe-se, então,
como uma realidade da EJA, que precisa ser revertida.
Sob tal perspectiva, ressalta-se o papel das Confe-
rências Internacionais de Educação de Jovens e Adultos
(Confinteas), desde a década de 1 990, as quais têm reafir-
mado que a inserção da EJA no campo dos direitos exige
compromisso político e também uma guinada epistemológi-
ca que permita instaurar um modelo cultural de educação de
adultos. A noção pivô dessa mudança, de caráter holístico, é
a de educação ao longo da vida. Trata-se do reconhecimen-
to da educação como um processo contínuo, que ocorre (e
que deve ser planejado para ocorrer) em diferentes espaços
sociais, não só na escola, em todas as idades, e que é es-
sencial para a formação de cidadãos autônomos, conscien-
tes e engajados na construção de uma sociedade
sustentável, do ponto de vista social, cultural e ambiental
(UNESCO, 2009).
O conceito de aprendizagem dialógica, baseado no
conceito de dialogicidade (FREIRE, 2005) e na teoria da
ação comunicativa (HABERMAS, 1 987), coaduna e aprofun-
da essa noção. Conforme Flecha (1 997), a aprendizagem
dialógica diz respeito à estruturação e à interpretação de
ambientes educativos, pautada em altas expectativas de
aprendizagem e na superação dos muros sociais e culturais
que negam o conhecimento acumulado pela humanidade e
28
validado socialmente a grupos excluídos. Nesse sentido, é
que aprendizagem dialógica se estabelece a partir dos se-
guintes princípios indissociáveis:
- Diálogo igualitário: produzido por argumentos de
validade e não de poder; diz respeito às relações orientadas
ao entendimento, e à coordenação de ações coerentes (prá-
xis).
- Inteligência cultural: reconhece que a inteligência é
uma capacidade universal (de todo) e contextualmente situ-
ada; mediante diálogo é possível transferi-la a novos âmbi-
tos, viabilizando soluções criativas para os problemas.
- Transformação: diz respeito ao processo intersubje-
tivo em que as pessoas recuperam sua autoestima ao se
verem partícipes da mudança social e condutoras de suas
próprias vidas.
- Dimensão instrumental: a busca por efetivar a de-
mocracia educativa passa por garantir a todos a formação
instrumental, unindo aspectos técnicos e humanísticos e ar-
ticulando conhecimentos acadêmicos e populares; daí, que
a aprendizagem dialógica não se opõe a instrumental, mas
à colonização tecnocrata do saber.
- Solidariedade: resulta e fundamenta a interação di-
alógica de ensinar e aprender horizontalmente, no processo
de modificação de si e do mundo.
- Criação de sentido: diante das relações solidárias,
os agentes superam a perda de sentido decorrente do isola-
mento e da competição.
- Igualdade de diferenças: evidencia que a verdadei-
ra igualdade social não pode ser alcançada sem respeito e
valorização das diferenças culturais, e vice-versa.
Essa mudança de paradigma na EJA – de um mode-
lo escolarizante e estigmatizante para um modelo cultural e
dialógico da educação ao longo da vida – tem, na formação
de professores/as, um de seus desafios centrais (Confintea,
29
201 0). Di Pierro (201 0, p. 942) alerta que, “no início do ter-
ceiro milênio, pouco mais de 1 % dos cursos de formação
docente no país oferecia habilitação específica para atuar
com essa modalidade da educação básica”.
Frente a esse cenário, os movimentos sociais, pro-
fessores e intelectuais militantes, articulados em torno dos
fóruns de EJA, reivindicaram do governo federal políticas
públicas de formação continuada para os educadores que já
atuavam com a EJA, mas sem formação específica. Então,
em 2009, o Ministério da Educação (MEC) lançou o Edital
02/2009 (Resolução 48/2008), direcionado às universidades
públicas, cujo objeto eram cursos de especialização em
EJA.
O CEEJA: fundamentos, estrutura e resultados
30
- Seleção de candidatos: após ampla divulgação em
São Carlos e região, 1 03 pessoas se inscreveram e 44 fo-
ram selecionadas, com base nos seguintes critérios: com-
provada atuação em EJA (dentro ou fora da escola) e grau
de interesse pelo curso (carta argumentativa). Entre os sele-
cionados, havia gestores públicos de educação, cidadania e
economia solidária; professores/as de EJA e de programas
de alfabetização; e representantes de ONGs.
- Permanência no curso: 28 estudantes concluíram o
curso. De acordo com pesquisa realizada pela coordenação
do CEEJA, os abandonos decorreram de: dificuldade em
compatibilizar compromissos do curso com triplas jornadas
de trabalho – realidade dos professores para se obter salário
digno e, sobretudo, das mulheres que acumulam o trabalho
reprodutivo – e, no caso dos professores, ruptura do vínculo
com a EJA ao assumirem classes na Educação infantil. Fica
claro que a ausência de uma política nacional de valoriza-
ção docente e de carreiras, que fixe professores na EJA, di-
ficulta o processo de formação continuada.
- Equipe docente: o curso contou com a participação de do-
centes da UFSCar e também de outras instituições, perten-
centes a diversas áreas, como USP, UNESP, UNEB, etc.
- Gestão: foi participativa, envolvendo diálogos siste-
máticos e, por vezes, tensos, entre a coordenação, profes-
sores e cursistas, o que resultou em redesenhos da
proposta curricular e operacional do curso. De acordo com
relatos dos estudantes, muitos teriam deixado o CEEJA se
não fosse a readequação do calendário e dos horários de
aula (sábados), a revisão dos conteúdos e das didáticas,
além da gratuidade do CEEJA. A gestão dialogada foi fun-
damental para atender às demandas concretas dos estu-
dantes e suprir suas “deficiências” acadêmicas.
- Avaliações: foram realizadas a cada módulo, medi-
ante produção de um texto acadêmico individual ou de reali-
31
zação de uma pesquisa coletiva, de caráter empírico-analíti-
co e propositivo, no âmbito da EJA. Os trabalhos corrigidos
pelos docentes eram devolvidos aos estudantes, com anota-
ções sistemáticas, de modo a evidenciar as melhorias ne-
cessárias. Cada trabalho poderia ser refeito até atingir, no
mínimo, a nota sete. Foram estruturados plantões para apoi-
arem os estudantes em seus trabalhos, na incorporação do
modus operandi acadêmico que muitos não dominavam,
sempre que necessário e em horários acordados entre to-
dos.
- Currículo: organizou-se em seis módulos assim
concebidos:
Módulo I “Introdução à problemática da
EJA”: o que se entende por EJA: concep-
ções e práticas (perspectiva ELV, educa-
ção popular e da aprendizagem
dialógica; perspectiva compensatória, di-
versidade e EJA). Módulo II “Sujeitos da
EJA”: sujeitos da EJA: quem são, demo-
grafia, diversidade e diferença (gênero,
raça, necessidades especiais, idade/ju-
venilização); diferentes demandas por
educação; inteligência adulta.Módulo III
“Legislação, políticas e gestão de EJA”:
legislação e políticas públicas nacionais
na perspectiva histórica Módulo IV “EJA:
práticas político-pedagógicas”: articula-
ção entre ensino e vida; o ensino e a
avaliação na perspectiva dialógica; práti-
cas político pedagógicas em “Educação
ambiental”, “ensino de ciências”,“ensino de
história e cultura africana”, “educação
popular e saúde”, “educação física na
EJA”; currículo na EJA; material didático
para a EJA.Módulo V “A EJA e o mundo
do trabalho”: o que é trabalho: visão an-
tropológica e sociológica; transforma-
32
ções das formas de trabalho e sua rela-
ção com a escolaridade; a EJA e merca-
do de trabalho; o trabalho
autogestionário na economia solidária; o
trabalho como princípio articulador da
pedagogia da EJA; a integração de polí-
ticas públicas de educação e trabalho
como fator de proteção social.Módulo VI
“ensino e pesquisa em EJA”: a função da
pesquisa na formação de professores de
EJA; o que é fazer pesquisa científica;
como realizar pesquisas; diferentes téc-
nicas de coleta e análise dos dados as-
sociada às diferentes abordagens teórico
metodológicas; a contribuição social das
pesquisas realizadas por educadores de
EJA e a divulgação do conhecimento
produzido; relações orientador-orientan-
do.(www.ceeja.ufscar.br)
34
Considerações finais
35
______. Parecer 11 /2000 (CNE/CEB). Diretrizes curriculares
nacionais para a Educação de jovens e adultos. Brasília. DF;
Congresso Nacional, 1 0/5/2000.
CURY, C. J. Direito à Educação: direito à igualdade, direito à
diferença. Cadernos de Pesquisa, n.11 6, jul, 2002, p. 245-
262.
Di PIERRO, M. C. A educação de jovens e adultos no plano na-
cional de educação . Educação e Sociedade. Campinas, v. 31 ,
n. 11 2, p. 939-959, jul.-set. 201 0 939.
______. Notas sobre a redefinição da identidade e das políticas
públicas de educação de jovens e adultos no Brasi l. Educ. e Soc.
Campinas, vol. 26, n. 92, p. 111 5-11 39, out. 2005
FLECHA, Ramón. Compartiendo Palabras. Barcelona: Paidós,
1 997.
______; GÓMEZ, J.; PUIGVERT, L. Teoria sociológica com-
temporánea . Barcelona: Paidós, 2001.
36
IBGE. Aspectos complementares da Educação de Jovens e Adul-
tos e Educação Profissional 2007. Rio de Janeiro: IBGE, 2009.
37
38
artigo
Resumo
39
al, a fim de que se formem professores com um posiciona-
mento frente ao seu papel de formar adultos atuantes na so-
ciedade através de sua cidadania assegurada pelo direito e
o acesso à educação. Pretendemos utilizar em nossa meto-
dologia a abordagem qualitativa embasada por Sandín Es-
teban (201 0) e, dentro desta perspectiva, fazer uso do
método de análise documental a partir dos escritos de Cel-
lard (2008) e da realização de entrevistas semi-estruturadas
descrita por Triviños (2008).
Educação de Jovens e Adultos (EJA),
Palavras-chave:
Formação Inicial de Professores de EJA, Identidade do
Professor de EJA
Introdução e Justificativa
40
reconfiguração do campo da EJA tem
trazido mudanças no campo da forma-
ção de professores. Podemos destacar
dois movimentos importantes nessa di-
reção: um, mais ligado aos órgãos ofici-
ais de governo, com a presença
importante do órgão normativo nacional
em educação: o Conselho Nacional de
Educação (CNE), que, através da Câ-
mara de Educação Básica fixou, em
2000, as diretrizes curriculares para a
EJA e, outro, que advém da sociedade
civil organizada em defesa da EJA, com
destaque para a participação dos fóruns
de EJA e do Grupo de Trabalho de Edu-
cação de Jovens e Adultos, da Associa-
ção Nacional de Pós-Graduação e
Pesquisa em Educação (Anped) (MA-
CHADO, 2008, p. 1 67).
41
formação que vincule teoria e prática
desde o início do curso, a partir da pes-
quisa e de uma efetiva inserção no inte-
rior da escola (LEITE, 2007, p.1 5).
44
de adultos ganhou força e tornou-se uma política de Estado,
de modo que hoje o governo brasileiro investe nessa moda-
lidade educacional e a incentiva, como possibilidade de di-
minuição do enorme índice de analfabetismo da população
que não teve acesso ou possibilidade de estudar no tempo
regular.
Incluída no Capítulo II da LDBEN, que trata da edu-
cação básica, a EJA, juntamente com a educação infantil, o
ensino fundamental, o ensino médio e a educação técnica
de nível médio, aparece como modalidade de ensino em se-
ção que dispõe sobre as condições para a sua efetivação:
Seção V
Da Educação de Jovens e Adultos
Art. 37. A educação de jovens e adultos
será destinada àqueles que não tiveram
acesso ou continuidade de estudos no
ensino fundamental e médio na idade
própria.
§ 1 º Os sistemas de ensino assegu-
rarão gratuitamente aos jovens e aos
adultos, que não puderam efetuar os
estudos na idade regular, oportuni-
dades educacionais apropriadas,
consideradas as características do
alunado, seus interesses, condições
de vida e de trabalho, mediante cur-
sos e exames.
§ 2º O Poder Público viabilizará e esti-
mulará o acesso e a permanência do
trabalhador na escola, mediante ações
integradas e complementares entre si.
§ 3o A educação de jovens e adultos
deverá articular-se, preferencialmen-
te, com a educação profissional, na
forma do regulamento. (Incluído pela
Lei nº 11.741 , de 2008)
Art. 38. Os sistemas de ensino manterão
45
cursos e exames supletivos, que com-
preenderão a base nacional comum do
currículo, habilitando ao prosseguimento
de estudos em caráter regular (BRASIL,
1 996).
48
Objetivos
49
metodologia
... abrange basicamente aqueles estudos
que desenvolvem os objetivos de com-
preensão dos fenômenos socioeducati-
vos e a transformação da realidade. Nos
últimos anos, apareceram com grande
força os estudos que, de uma perspecti-
va qualitativa e colaborativa, estão volta-
dos para a valoração da prática
educativa e a tomada de decisões (pro-
cessos, programas, inovações) e tam-
bém os processos de pesquisa
qualitativa cujo objetivo fundamental é a
emancipação dos sujeitos. Portanto, a
pesquisa qualitativa se refere ao que tra-
dicionalmente denominamos metodolo-
gias orientadas à avaliação e tomada de
decisões. (SANDÍN ESTEBAN, 201 0).
Dentro dessa perspectiva, faremos uso do método
de análise documental, assim como de pesquisa empírica
com a realização de entrevistas. De acordo com Sá-Silva,
Almeida & Guindani (2009), a análise de documentos pode
ser um procedimento muito útil na área das Ciências Huma-
nas e Sociais, dada a riqueza de informações que deles se
pode extrair e resgatar, além da possibilidade que oferecem
para o entendimento de objetos cuja compreensão necessi-
ta de contextualização histórica e sociocultural. Ainda se-
gundo os autores citados, colocar em destaque a pesquisa
documental implica trazer para a discussão uma metodolo-
gia que é “pouco explorada não só na área da educação co-
mo em outras áreas das ciências sociais” (LÜDKE e
ANDRÉ, 1 986, p.38), quando, de fato,
[...] o documento escrito constitui uma
fonte extremamente preciosa para todo
50
pesquisador nas ciências sociais. Ele é,
evidentemente, insubstituível em qual-
quer reconstituição referente a um pas-
sado relativamente distante, pois não é
raro que ele represente a quase totalida-
de dos vestígios da atividade humana
em determinadas épocas. Além disso,
muito freqüentemente, ele permanece
como o único testemunho de atividades
particulares ocorridas num passado re-
cente (CELLARD, 2008, p.295).
52
recém-formados que estejam atuando na EJA para saber se
na opinião deles a formação que tiveram foi capaz de pre-
pará-los para o ensino de adultos.
Desse modo, o trabalho poderá revelar as bases de
formação em EJA dos pedagogos formados pelas três uni-
versidades estaduais de São Paulo pesquisadas, se essas
bases estão dentro do curso de licenciatura, se sua constru-
ção se dá no desenvolvimento de disciplinas específicas op-
tativas ou obrigatórias, enfim, saberemos se as
universidades estão formando professores na modalidade
de ensino de EJA, para que possam atuar na educação de
adultos de forma a contribuir para a superaração do alto e
histórico índice de analfabetismo no país.
Resultados Parciais
54
Tabela 1 : Disciplinas obrigatórias, segundo as categorias e subca-
tegorias de análise.
56
Nessa segunda tabela que diz respeito às disciplinas
optativas, analisando ainda a mesma categoria curricular
“Conhecimentos relativos às modalidades e níveis de ensi-
no” onde está situada a modalidade EJA, os índices relati-
vos às diferentes modalidades de ensino praticamente se
equivalem, com uma vantagem mínima para as disciplinas
que abordam a EJA, representando 4,2% do subtotal de
1 2,6% da categoria. É preciso reforçar, porém, o caráter op-
cional dessas disciplinas. Contudo, novamente comparando
esta categoria com a primeira, “Fundamentos teóricos da
educação”, percebemos o quão as disciplinas voltadas às
modalidades de ensino, e aqui damos atenção especial às
de educação de adultos, são diminuídas em comparação
com os 23,6% correspondem a 96 disciplinas relacionadas
aos fundamentos.
Considerações Parciais
57
adultos atuantes na sociedade através de sua cidadania
afirmada no direito e acesso à educação.
Com maior razão, pode-se dizer que o
preparo de um docente voltado para a
EJA deve incluir, além das exigências
formativas para todo e qualquer profes-
sor, aquelas relativas à complexidade di-
ferencial desta modalidade de ensino.
Assim esse profissional do magistério
deve estar preparado para interagir em-
paticamente com esta parcela de estu-
dantes e de estabelecer o exercício do
diálogo. Jamais um professor aligeirado
ou motivado apenas pela boa vontade
ou por um voluntário idealista e sim um
docente que se nutra do geral e também
das especificidades que a habilitação
como formação sistemática requer
(BRASIL, 2000, p. 56).
Referências Bibliográficas
58
FUNAPE/UFG, 2009.
CELLARD, A. A análise documental. In: POUPART, J. et al. A
pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos.
Petrópolis, Vozes, 2008.
GATTI, Bernadete; BARRETO, Elba Siqueira de Sá. Profes-
sores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009.
59
OLIVEIRA, Marta Kohl de. Jovens e Adultos como sujeitos de
conhecimento e aprendizagem . Apresentado na 22ª reunião
anual da Anped, Caxambu, 1 999.
ONU. Art. XXVI, inciso I. Declaração Universal dos Direitos Hu-
manos. Assembleia das Nações Unidas, 948.
60
artigo
Resumo
62
certificação, com a continuidade acadêmica, com desenvol-
vimento pessoal, emocional e intelectual. Vale ressaltar que
um espaço social que tem claro seu propósito formativo, fa-
cilita o desencadeamento de processos educativos perti-
nentes e produtivos a sua função social como prática.
Além dos resultados na EJA UFSCar enquanto es-
paço de formação vários são os relatos dos/das estudantes
em relação à importância da EJA para a vida enquanto rea-
lização pessoal. A maioria dos que passaram pelo projeto e
também os que ainda estão terminando o curso lembram e
citam a Educação de Jovens e Adultos como uma experiên-
cia engrandecedora, que abriu muitos caminhos, mesmo
apesar de todas as dificuldades que enfrentaram. Mesmo
que poucos (as) há também aqueles (as) que desejam in-
gressar na Universidade, pesquisam oportunidades e alme-
jam continuar seus estudos. Uma aluna conseguiu
ultrapassar os obstáculos e está finalizando curso técnico no
Instituto Federal de São Carlos.
Palavras-chaves: Educação de Jovens e Adultos, Formação
de professores, Universidade Federal de São Carlos.
63
Universidade como projeto de extensão universitária desde
1 999 é destinado a pessoas jovens e adultas oriundas das
camadas populares de São Carlos e região, sendo um dos
objetivos oferecer-lhes melhores condições de acesso e
permanência no ensino superior público.
A implementação do projeto da EJA na UFSCar teve
seu início em 2009 em parceria com a Pró-Reitoria de Ges-
tão de Pessoas (ProGPe) que desenvolve desde o ano cita-
do uma proposta de cursos de aperfeiçoamento profissional
para ampliar a escolaridade de seus servidores/as. Inicial-
mente, a ProGPe criou oportunidades para que os/as servi-
dores/as pudessem fazer cursos de pós-graduação
profissionalizante. Porém, diante da constatação do grau de
escolaridade destes/as servidores/as, a maior parte não ha-
via concluído o Ensino Fundamental e Médio, iniciou-se um
debate junto a esta comunidade para a criação de turma(s)
na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Neste contexto urgente de formação do seu quadro de fun-
cionários/as, a ProGPe estabeleceu uma parceria com o
Núcleo de Extensão UFSCar Escola para a implementação
de turmas de Educação de Jovens e Adultos, cujo papel do
Núcleo seria o de selecionar o corpo docente, ministrar e fa-
zer acompanhamento pedagógico das aulas, assim como o
desempenho dos estudantes.
Para que o Projeto se viabilizasse, os (as) funcionári-
os (as) da Universidade seriam dispensados no período de
trabalho sem prejuízo salarial ou qualquer outro prejuízo de
sua função, e ao concluírem os estudos receberiam um au-
mento salarial, devido ao plano de carreira. Na ocasião, 64
funcionários da Universidade não tinham Ensino Fundamen-
tal ou Ensino Médio concluído, sendo a maioria do segundo
termo do Fundamental incompleto (5º ao 9º ano).
Após os convites terem sido realizados aos funcio-
nários (as), no ano de 201 0 a parceria foi estabelecida com
64
a Pró-reitoria para atender a demanda de formação dos/as
servidores/as do quadro de funcionários da UFSCar e se
estendendo mais tarde às pessoas da comunidade que
procuraram o projeto. Para isso foram iniciadas duas turmas
(uma de Ensino Fundamental e uma de Ensino Médio). Des-
de então o projeto concluiu duas turmas de Ensino Médio e
duas de Ensino Fundamental, totalizando a formação de
cerca de quinze alunos (as) funcionários da Universidade e
seis alunos (as) da comunidade. Até o encerramento do pro-
jeto, no final do primeiro semestre de 201 4, está prevista a
formação de mais uma turma de Ensino Médio.
Para que os (as) educandos (as) possam ser certifi-
cados, contamos com a parceria do Instituto Federal de São
Paulo (campus São Carlos) para a certificação dos estudan-
tes do Ensino Médio. As turmas do Ensino Fundamental fo-
ram certificados por meio da parceria com a Secretaria da
Educação de São Carlos. Além dessa parceria, os educan-
dos (as) são preparados para obter a certificação pelo Exa-
me Nacional do Ensino Médio (ENEM).
A equipe que executa o Projeto é formada por duas
coordenadoras, uma Pedagoga e uma Bióloga, responsá-
veis respectivamente pela área Pedagógica e Administrativa,
mas, que tomam todas as decisões juntas e em âmbito co-
letivo.
A formação atual do quadro discente é composta por
um funcionário e por uma funcionária da UFSCar e por sete
pessoas da comunidade. Vale dizer, que o Munícipio e o Es-
tado ofertam ensino na modalidade EJA somente no perío-
do noturno, o que exclui muitos (as) que em função do
trabalho ou de outras necessidades particulares não conse-
guem frequentar as aulas no período oferecido. Portanto, a
EJA UFSCar foi aos poucos abrangendo outros segmentos
da população. Estes sujeitos formam uma turma heterogê-
nea, porém apesar de todas as singularidades e diferenças
65
eles se identificam no quesito de pessoas adultas trabalha-
doras.
A formação do quadro docente é constituída por es-
tudantes de graduação e pós-graduação que assumem as
funções de professor/a e monitor/a quando submetidos/as e
aprovados/as em Processo Seletivo. A seleção de professo-
res/as e monitores/as envolve avaliação escrita (conteúdos
específicos da área de interesse), avaliação didática com te-
ma previamente informado e entrevista com enfoque peda-
gógico. O/a professor/a e o/ monitor/a quando selecionado/a
é responsável, com orientação pedagógica da coordenação
do projeto, pelo planejamento, desenvolvimento e avaliação
do processo de ensino. A partir deste ano, estendemos a
participação aos educandos (as) da EJA na seleção de no-
vos/as professores/as, monitores/as, pois a partir de reu-
niões cuja pauta foram os Processos Seletivos, decidimos
conjuntamente que estas pessoas são capazes de avaliar
e decidir quem serão os(as) seus (suas) professores(as),
monitores (as).
Para subsidiar as aulas, os/as professores/as, moni-
tores/as recebem a orientação acerca da Proposta Pedagó-
gica do projeto que se pauta nos Parâmetros Curriculares do
Ensino Médio em concomitância com a Educação de Jo-
vens e Adultos defendida pelo educador Paulo Freire que
implica uma leitura de mundo que precede a leitura da pala-
vra.
Toda leitura da palavra pressupões
uma leitura anterior do mundo, e toda
leitura da palavra implica a volta so-
bre a leitura do mundo, de tal manei-
ra que “ler o mundo” e “ler a palavra”
se constituam em um movimento que
não há ruptura em que você vai e
volta. E “ler o mundo” e “ler a palavra”
66
no fundo, para mim, implica “reescre-
ver”, Reescrever, com aspas, quer di-
zer transformá-lo. (FREIRE; BETTO,
2001 , p.1 5)
As orientações são recebidas e discutidas antes de
iniciarem as aulas e durante todo o ano letivo. A primeira de-
las é a adequação ao público alvo, que são todas pessoas
adultas capazes de se responsabilizarem pelas suas deci-
sões e pela sua aprendizagem. Portanto, a permanência
dos/as educandos se vincula aos conteúdos desenvolvidos
em sala, e estes devem contribuir para papel social que ca-
da um desempenha. Neste sentido, é preciso considerar a
experiência de vida e os conhecimentos acumulados das
pessoas adultas, que diferem dos das crianças. A segunda
orientação é a condição de trabalhadores e trabalhadoras
que se vincula à totalidade do tempo para a aprendizagem,
pois estes adultos, primeiramente, são pais e mães, filhos e
filhas, esposos e esposas, que precisam trabalhar para ga-
rantir o sustento da família e, secundariamente, são educan-
dos(as). Neste sentido, a orientação é que os/as
professores/as não enviem trabalhos para casa ou pesqui-
sas mais elaboradas e que se concentrem no momento das
aulas.
A terceira orientação é acerca dos sujeitos que com-
põem a turma. Atualmente ela é composta por mulheres,
homens, jovens, adultos, negros (as), indígenas, brancos,
funcionário (a) público, pessoa desempregada, pastor de
Igreja, etc. Uma turma diversa, que devem ter as suas dife-
renças respeitadas, ao mesmo tempo em que os seus direi-
tos garantidos. A quarta orientação se refere às altas
expectativas que devem ser depositadas nestas pessoas jo-
vens e adultas, cabendo ao quadro docente acreditar na ca-
pacidade destas pessoas para realizarem o planejamento
das suas aulas.
67
Ao serem consideradas todas estas orientações, vale
apontar os objetivos do projeto que são: criar condições pa-
ra que os servidores públicos da UFSCar frequentem a EJA
garantindo a oportunidade de concluir o Ensino Médio e ser
certificado por isso; propiciar uma formação crítica aos/as
estudantes para que possam efetivamente se inserir na atu-
al sociedade da informação e lutarem pela superação de to-
das as formas de preconceito, seja por idade, escolaridade,
gênero, ou raça e contribuir para a formação sociocultural e
profissional de estudantes de graduação e pós-graduação
da UFSCar, por meio de sua participação em um processo
completo de planejamento curricular, ministração de aulas e
avaliação dos/as educando/as.
Para garantir a contribuição na formação dos profes-
sores/as e estudantes da UFSCar, temos as reuniões peda-
gógicas e grupos de estudos. Tais práticas trazem consigo
especificidades que intensificam os processos educativos
entre coordenação e educadores (as) devido a troca de dife-
rentes saberes entre indivíduos de diferentes origens, ida-
des, formações e profissões, sejam monitores (as),
educadores (as) ou coordenadoras, todos focados (as) em
proporcionar uma formação de máxima qualidade para os
educandos (as). Tais especificidades da Educação de Jo-
vens e Adultos intensificam a reflexão dos educadores em
formação.
Nesse contexto, as reuniões pedagógicas e os gru-
pos de estudos são os espaços nos quais se discutem tais
trocas e se tomam decisões, constituindo-se processos edu-
cativos diversos. No último semestre, o tema diversidade ga-
nhou destaque com diferentes aprofundamentos, seja
perante os aspectos religiosos, étnicos e raciais, de gênero,
das diversas formas de se aprender. Este tema ganhou des-
taque devido a heterogeneidade da turma e a necessidade
de uma educação em que se respeite em todas as pessoas
68
as diversas formas de ser, de viver e de estar no mundo. Va-
le destacar, que acreditamos que a diversidade dos educan-
dos/as propicia uma troca de saberes riquíssima em que
todos/as aprendem, pois compreendemos que quanto maior
a diversidade, maiores são as aprendizagens.
Diante desta breve apresentação dos sujeitos que
compõem o Projeto EJA UFSCar, assim como a metodolo-
gia empregada para a formação de professores (as), como
resultados podemos apresentar a partir das memórias das
reuniões pedagógicas e dos grupos de estudos, a preocu-
pação dos educadores/as e coordenadoras com a formação
integral dos alunos, com a certificação destes/as, com o in-
centivo para permaneceram estudando, com o desenvolvi-
mento pessoal, emocional, social e intelectual de cada uma
destas pessoas, com destaque para a preocupação cons-
tante em ajudá-los/as a superarem todos os obstáculos pre-
sentes nesta nova caminhada.
Em relação à formação dos estudantes de gradua-
ção e pós-graduação podemos destacar a ênfase ao olhar
cuidadoso e respeitoso perante todos os tipos de diversida-
de presente nas interações em sala de aula e a busca contí-
nua pela valorização de todos os saberes, assim como a
inserção da temática nos planejamentos didáticos.
Neste sentido, o valor das reuniões pedagógicas e,
principalmente do grupo de estudos, na produção e recons-
trução de conhecimentos a partir dos olhares diversos entre
cada docente em relação aos educandos ou mesmo a con-
cepção de EJA como um modelo de educação social, apon-
ta para um crescimento formativo tanto pessoal como
profissional de todas as pessoas envolvidas.
Para finalizar este relato, apontaremos alguns depoi-
mentos dos/das educandos (as) em relação à importância
da EJA para a vida enquanto realização pessoal. Eles e elas
citam a Educação de Jovens e Adultos como uma experiên-
69
cia engrandecedora, que abriu muitos caminhos e mudaram
a forma de pensar acerca de diversos assuntos, relembram
as dificuldades que enfrentaram quando voltaram a estudar,
mas enfatizam que conseguiram vencer os obstáculos e que
valeu a pena pelas relações que estabeleceram e pelo co-
nhecimento adquirido. Como desdobramento deste projeto,
destacamos a inserção de uma aluna em um curso técnico
oferecido pelo Instituto Federal de São Paulo, campus São
Carlos além de ter sido aprovada para cursar graduação pe-
la Universidade Estadual Paulista (Unesp) campus Arara-
quara.
Portanto, o Projeto que tem como meta para meados
de 201 4 a formação de mais uma turma de Ensino Médio, e
a continuidade de formação de estudantes de graduação e
pós-graduação, que mesmo inseridos em cursos de Licenci-
atura não obteriam em nenhum momento uma formação es-
pecífica em EJA, cabendo à coordenação fomentar as
discussões teóricas a partir da prática vivenciada em sala
de aula.
Referências
70
artigo
Resumo
75
Já em 1 960 o autor aponta para uma discussão teó-
rica entre Horn e Donaldson, os quais acreditavam que era
real o modelo dos déficits, e Baltes e Schaie, que considera-
vam este modelo como um mito ou como um estereótipo so-
cial. De acordo com Medina (1 997, p.1 32), os debates
contribuíram para se pôr em discussão vários problemas
teóricos e metodológicos que rondavam o modelo do déficit,
tais como os métodos transversais e os longitudinais.
De acordo com o autor o que se coloca em discus-
são é que no método transversal aplica-se um teste de inte-
ligência, em um dado momento, a pessoas de gerações
distintas. Medina (op. cit) discute que nesse tipo de teste es-
tão sendo comparadas pessoas de diferentes gerações, as
quais receberam também educação diferente umas das ou-
tras. Já no método longitudinal, são aplicados testes para os
mesmos indivíduos em diferentes fases da sua vida para
observar as mudanças que os sujeitos produzem em um de-
terminado período.
Outro debate que contribuiu para a reflexão sobre o
tema foi levantado por Catell (1 963) nos anos 60. Medina
(1 997) discute que suas pesquisas buscaram diferenciar in-
teligência fluida e cristalizada, sendo a primeira ligada à ba-
se fisiológica e a segunda relacionada à cultura. Nesse
sentido, todos/as estamos sujeitos/as a sofrer danos na inte-
ligência fluida, já que esta está diretamente ligada às nossas
bases fisiológicas. No entanto a inteligência cristalizada, que
tem uma base neurológica mais fluida, tente a se expandir
quanto mais experiências passamos.
6 O autor discute como sendo modelo de déficit aquele que indica que: Ao
longo da vida adulta se produz um declive intelectual o que, com o tempo,
foi gerando atitudes sociais negativas sobre a vida adulta e a relação com
o processo de envelhecimento. Especialmente tem se mostrado
relevantes nesta concepção as curvas dos subtestes da prova de
Wechsler que, na opinião de Lehr, foi popularizado de tal modo que quiçá
tenha a principal “culpa” sobre o modelo dos déficits (MEDINA, 1 997,
p.1 31 ).
76
Medina (1 997) destaca também a influência negativa
da teoria sobre operações formais, formulada por Piaget,
para a concepção de educação de adultos. Principalmente
em se tratando da subteoria do pensamento formal ou as
características da inteligência próprias das operações for-
mais. Segundo ele, Piaget defende que o pensamento hu-
mano se desenvolve desde o nascimento até a juventude,
cristalizando-se ai para o resto da vida.
Ressalta-se aqui que apesar de ser possível deduzir
dos estudos piagetianos sobre o desenvolvimento que de-
pois da adolescência não acontecem mudanças importantes
no pensamento formal, e de Piaget ressaltar o estudo da in-
fância para compreender a gênesis do adulto, o mesmo au-
tor nunca disse que na idade adulta havia uma perda
intelectual.
Outra teoria que embasou modelos negativos de
EJA tem suas bases na Psicologia Evolutiva. Segundo Me-
dina (1 997), na época em que se desenvolvia essa teoria
havia um enfoque muito grande no estudo das crianças e
dos adolescentes, pois se tratava de um período no qual es-
tava ocorrendo a entrada maciça desse público nas escolas.
Todas essas teorias acabaram contribuindo para se
associasse desenvolvimento a crescimento, e quando não
há crescimento, deduzia-se, não há mudanças. Isso, de
acordo com Medina (1 997), também foi um dos fatores que
influenciaram para que a Educação de Jovens e Adultos fos-
se colocada em segundo plano, pois a prioridade eram as
crianças e adolescentes, únicas nas fases nas quais, supos-
tamente, ocorriam mudanças.
Medina (idib) discute que também há a idéia de que
existem períodos críticos. Se algumas mudanças não acon-
tecem dentro desses períodos, elas não acontecem mais,
pois as evoluções ocorridas nas etapas de desenvolvimento
ficariam gravadas em programas maturativos dos genes dos
77
indivíduos. A idéia da existência de períodos críticos faz
com que os cuidados com o ensino às crianças se redo-
brem. O autor (op. cit) argumenta que essa concepção pode
dar base ao entendimento de que se um adulto não apren-
deu algo em um dado momento de sua vida, ele não conse-
guirá mais aprender.
A concepção de velhice dos estudos também é dis-
cutida. Segundo ele, ela é associada tradicionalmente a es-
tados patológicos. A visão da psicologia sobre a velhice
aponta para uma época em que há dificuldade para a adap-
tação e para a assimilação de conteúdos novos, pois a per-
da da memória nesse período é recorrente.
De acordo com Medina (1 997, p. 1 41 ), a conseqüên-
cia dessas concepções na política educativa é a centraliza-
ção dos recursos na infância e na adolescência, pois, como
já se discutiu acima, estes seriam os únicos períodos em
que o indivíduo se desenvolveria. De acordo com essas teo-
rias, estas também seriam as fases da vida em que é preci-
so ter uma interferência maior, para direcionar as mudanças
que estão acontecendo. Se há uma intervenção nos mo-
mentos de mudança, seriam produzidos indivíduos com
uma vida adulta estável.
Para Medina (op.cit.), as aprendizagens das pessoas
adultas limitaram-se ao ensino de um ofício ou à alfabetiza-
ção, ignorou-se a instrumentalização social e política e pen-
sou-se no adulto como um sujeito enfermo, para o qual a
educação tem apenas que curar ou compensar as deficiên-
cias.
Além desses fatores, Medina (1 997, p. 1 42) denuncia a indi-
ferenciação entre modelos escolares de crianças e adultos,
discutindo que desde quando a infância passou a ser reco-
nhecida como uma fase da vida há travas nas pesquisas de
diferenciação dos adultos que necessitam ser superadas.
Para Medina (1 997, p. 1 42), essas concepções dão
78
base a um sistema educativo que não dá importância para a
aprendizagem dos adultos, esta é limitada a um ensino
compensatório e instrumental, que não é prioritária. Isso po-
de ser observado no histórico da EJA no Brasil, que sofreu,
ao longo do tempo, processos políticos que entre outras coi-
sas a colocava em segundo plano, não levava em conta sua
especificidade e não faziam um investimento nessa modali-
dade educacional.
A educação de joves e adultos no Brasil: breve retomada
histórica
79
próprio nome expressa, um meio para suprir a falta de tra-
balhadores qualificados profissionalmente, contribuindo,
dessa forma, para o desenvolvimento nacional. Na formula-
ção da autora e do autor (2000, p. 11 7), este tipo de educa-
ção foi realizado como um modo de fazer com que os
adultos recuperassem o atraso, ou seja, era uma concepção
de educação compensatória.
Em 1 988, após o país sair do período militar em que
se encontrava, foi promulgada a Constituição Federal, por
meio da luta de diferentes atores pela democracia. Esta
Constituição garantiu alguns direitos importantes para os
sujeitos da Educação de Jovens e Adultos, tais como: “ensi-
no fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive
na sua oferta gratuita para todos os que não tiveram acesso
na idade própria.” (BRASIL, 1 988, art. 208).
Além deste artigo, o parágrafo VI da Constituição tra-
ta de formas de adequar a educação à participação dos
adultos e garante a oferta do ensino regular noturno, e o Pa-
rágrafo VIII trata de programas suplementares que atendes-
se aos estudantes, como: transporte, alimentação, saúde e
material didático.
Esta nova concepção da educação, na Lei, fez com
que, de acordo Di Pierro e Haddad (2000, p. 1 20), o Mobral
fosse substituído pela Fundação Educar – Fundação Nacio-
nal para a Educação de Jovens e Adultos, a qual apoiava
empreendimentos inovadores, de prefeituras ou mesmo da
sociedade civil. Mas, como observa a autora e o autor
(2000, p. 1 21 ), em 1 990, o governo de Fernando Collor de
Mello extinguiu a Fundação Educar e isentou a responsabili-
dade da União para com essa modalidade escolar, procu-
rando, assim, retirar subsídios estatais da Educação de
Jovens e Adultos.
Em 1 993, o Brasil apresentava-se entre os nove paí-
ses do planeta que mais contribuíam para o elevado número
80
de analfabetos. Em 1 996, foi aprovada a Lei N° 9394 de Di-
retrizes e Bases da Educação Nacional. Esta Lei integrou
organicamente a Educação de Jovens e Adultos ao ensino
básico comum. Porém, se de um lado houve essa integra-
ção de ensino, por outro, não existiu uma determinação do
público-alvo e houve uma diluição das especificidades pe-
dagógicas, ou seja, esta modalidade passou a ter sua base
curricular igualada ao do ensino básico regular. Estes apa-
rentam ser alguns dos resultados da nova forma da educa-
ção básica da EJA no Brasil.
É importante destacar o que Franzi (2007) discute
sobre a atual situação da Educação de Jovens e Adultos.
Segundo ela, embora o Fundo de Manutenção e Desenvol-
vimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissio-
nais da Educação (Fundeb) seja uma importante conquista
para a EJA, no Brasil, historicamente, há um quadro que
aponta para o descaso com esta modalidade de educação.
O argumento remete ao número expressivo que se tem de
campanhas emergenciais e a despreocupação com o ofere-
cimento desta modalidade de ensino pelo governo.
Vale analisar que além do descaso com a Educação
de Jovens e Adultos, temos indícios de que ela seja marca-
da por uma concepção compensatória de educação, ou se-
ja, uma educação que concebe o sujeito deva recuperar o
que não foi apreendido ao longo de sua infância. Tendo em
vista não perder o enfoque crítico, até para que não se repi-
ta um modelo educacional de EJA pautado na educação
compensatória coloca-se em discussão a Tertúlia Literária
Dialógica como teoria-ação que se contrapõe a estes mode-
los educacionais e que pensa uma nova EJA.
A tertúlia literária dialógica e a busca por uma nova EJ
81
na fixada na teoria da Aprendizagem Dialógica (A.D). Tal
elaboração teórica está embasada nas teorias de Dialogici-
dade de Freire (1 994, 2005), e de Ação Comunicativa, de
Habermas (1 987). Estas teorias pautam os sete princípios
fundamentais da Aprendizagem Dialógica, que são: diálogo
igualitário, inteligência cultural, transformação, dimensão
instrumental, criação de sentido, solidariedade e igualdade
de diferenças.
-Diálogo Igualitário: está pautado na teoria da Ação
Comunicativa, pois para se chegar ao consenso, valem as
argumentações e o poder dos argumentos e não a posição
de poder do falante.
- Inteligência Cultural: Flecha (1 997) assinala que o
conceito de inteligência cultural é muito importante para a
compreensão de que não existem pessoas que são menos
inteligentes que outras, mas possuem inteligências distintas,
expressas em diferentes contextos e de diferentes maneiras.
-Transformação: nas palavras de Flecha (1 997): A
aprendizagem dialógica transforma as relações entre as
pessoas e seu entorno.
- Dimensão Instrumental: de acordo com Cherfem
(2009, p.74), este princípio está relacionado com o conheci-
mento. Fazer Aprendizagem Dialógica não significa excluir
conhecimentos técnicos e científicos. A diferença está em
que os objetivos e procedimentos destes aprendizados são
definidos com as pessoas e não sobre ou para elas (CHER-
FEM, 2009, p.74).
- Criação de Sentido: sobre este princípio, Flecha
(2007, p.35) argumenta que estamos frente a uma sociedade
dirigida pelo dinheiro e pelo poder, os quais buscam contro-
lar todos os âmbitos de nossas vidas. Podemos nos tornar
mais um produto da evolução técnica. Por isso é importante
o diálogo igualitário, para superar a perda de sentido pela
82
qual passamos.
- Solidariedade: é outro princípio importante segundo
Flecha (1 997, p. 39), pois é somente nela que se podem fun-
damentar as práticas educativas igualitárias. Para Cherfem
(p. 75, 2009), essas práticas são importantes quando quere-
mos construir relações que priorizem a participação e a mu-
dança de vida de todas as pessoas.
- Igualdade de Diferença: Flecha (1 997, p.42) discute
que a aprendizagem dialógica se orienta pela igualdade de
diferenças, afirmando que a verdadeira igualdade inclui o
mesmo direito de toda pessoa viver de forma diferente.
Os princípios da Aprendizagem Dialógica, discutidos
acima, são os mesmos que pautam a atividade de Tertúlia
Literária Dialógica, na qual destaca-se o desenvolvimento de
transformação pessoal e do entorno para a superação de
barreiras sociais, culturais e escolares, como as concepções
edistas. A atividade mostra que, todas as pessoas, em todas
as idades, são capazes de leitura, compreensão e aprendi-
zagem.
Para se ter melhor dimensão da Tertúlia, é importan-
te explicitar o que ela é. De acordo com Flecha & Mello
(2005, p. 29)
A Tertúlia Literária Dialógica é uma
atividade cultural e educativa desen-
volvida em torno da leitura de livros
da literatura Clássica Universal. Des-
tinada a pessoas sem formação uni-
versitária, foi criada há vinte e cinco
anos, na Escola de Educação de
Pessoas Adultas da Verneda de
Sant-Martí, em Barcelona/Espanha,
por educadores e educadoras pro-
gressistas, em conjunto com partici-
pantes da escola, homens e
mulheres que estavam iniciando ou
83
retomando sua escolaridade.
Seu funcionamento ocorre basicamente da seguinte
maneira:
A tertúlia literária dialógica se reúne
em sessão semanal de duas horas.
É decidido conjuntamente o livro e a
parte a comentar em cada próxima
reunião. Todas as pessoas lêem, re-
fletem e conversam com familiares e
amigos durante a semana. Cada
uma traz um fragmento escolhido
para ler em voz alta e por que lhe é
especialmente significativo. O diálogo
se constrói a partir dessas contribui-
ções. Os debates entre opiniões dife-
rentes se resolvem só por meio dos
argumentos. Se todo o grupo chega
a um acordo, se estabelece como a
interpretação provisoriamente verda-
deira. Se não chega a um consenso,
cada pessoa ou subgrupo mantém
sua própria postura, não há nada
que marque a concepção certa ou a
errada em função de sua posição de
poder (FLECHA, 1 997, p. 1 7-1 8).
O diálogo igualitário possibilita que todas as pessoas
tenham os mesmos direitos de fala, pois se entende que to-
dos os argumentos são válidos por seu valor e não pela po-
sição de poder que ocupam as pessoas e pela inteligência
cultural, na qual as pessoas podem se compreender como
possuidoras de inteligência. Ao contrário do que certas con-
cepções psicológicas defendem, as pessoas adultas podem
se sentir mais confiantes para superarem todos os estereóti-
pos sociais, principalmente os referentes às suas capacida-
84
des de aprendizagem e sua inteligência.
Girotto e Mello (2007, p. 5) argumentam que todas as
pessoas têm inteligência cultural, e que, para demonstrá-la
nas interações sociais, é preciso que haja oportunidades e
condições. Ocorre desigualdade quando a sociedade dá
mais valor a um conhecimento e se desvaloriza outro. É pre-
ciso, de acordo com as autoras, romper com essa ordem e
dialogar com base na inteligência cultural.
Por isso, na Tertúlia, é tão importante o poder dos ar-
gumentos frente aos argumentos do poder. Não detém a
verdade quem é um acadêmico e/ou doutor. É só através do
diálogo que se pode chegar a uma argumentação livre de
relações ideológicas e que priorize os melhores argumentos
ao invés da valorização da fala por conta da posição de po-
der que a pessoa que argumenta ocupa.
Nas Tertúlias as pessoas são estimuladas a se tor-
narem sujeitos de sua aprendizagem ao invés de serem ob-
jetos da docência ou da pessoa que tem mais prestígio e
proteção social. Flecha (p. 75, 1 997) discute que cada argu-
mento possui o mesmo valor formal, mas sua influência de-
penderá das informações, argumentos e reflexões que
possui.
Todos os princípios ajudam a transpor barreiras na
educação de adultos, mas destacamos aqui principalmente
a inteligência cultural e a dimensão instrumental, princípios
que, na Tertúlia, respaldam os/as participantes a ultrapas-
sem muros antidialógicos, por meio da compreensão de que
possuem muitos conhecimentos importantes e que são ca-
pazes de sempre aprender.
Flecha (1 997, p.20) assinala que o conceito de inteli-
gência cultural é muito importante para a superação de teo-
rias de déficits, especialmente aquelas que se referem aos
adultos, como os estudos quantitativos sobre a diminuição
da inteligência depois da juventude e a aplicação, para a vi-
85
da adulta, da teoria do desenvolvimento para a infância e a
adolescência.
A discussão feita por Flecha (ibid.), apoiado em teó-
ricos como Freire, é de que as pessoas adultas têm capaci-
dades cognitivas diferentes, mas nunca inferiores.
O princípio da inteligência cultural, de acordo com
Flecha (1 997, p. 22) considera que todas as pessoas, inde-
pendente da sua idade, são capazes de linguagem e ação,
podendo, portanto, desenvolver-se por meio de suas intera-
ções sociais.
O princípio da dimensão instrumental também é im-
portante para a superação de concepções edistas, já que,
de acordo com Flecha (2007, p. 33), diversas teorias edistas
não consideram importante a formação técnica na educação
de pessoas adultas por considerar que, na vida adulta, a ca-
pacidade para aprendizagens já está deteriorada. Por isso,
reforça-se o princípio da dimensão instrumental, pois se en-
tende que os adultos possuem diversas aprendizagens e
podem construir muitas outras.
De acordo com Flecha (1 997), as vivências das
pessoas adultas na sociedade em diferentes práticas
sociais não lhes conferem menos saberes do que se
estivessem freqüentando salas de aula.
Dessa forma, com esta dinâmica e seguindo os prin-
cípios da Aprendizagem Dialógica, a Tertúlia Literária Dialó-
gica é um espaço em que muitas questões de exclusão que
as pessoas sofrem socialmente podem ser superadas. Co-
mo coloca Girotto (2007, p. 74), na Tertúlia as pessoas criam
novamente sentido nas suas vidas, pois ganham dimensão
de quanto sabem, e podem ler livros de literatura clássica
universal, que por muito tempo não lhes eram disponíveis
pela crença na idéia de que eles seriam incapazes de con-
seguir ler determinados livros.
Assim, na concepção aqui abordada, temos a ativi-
86
dade de tertúlia em EJA como uma busca de transforma-
ções das chamadas “incapacidades” em possibilidades e
por isso mostra-se como uma teoria-ação que tem muita po-
tencia para superação de concepções e modelos deficitários
e edistas.
Resultados
88
pressam em diferentes âmbitos sociais, e que a desvaloriza-
ção da capacidade de aprendizagem de adultos ocorre por-
que, socialmente alguns saberes valem mais que outros.
O que ocorre é o fato da sociedade não acreditar que
pessoas adultas que estão em processo de aprendizagem
ou que pessoas de camadas socialmente mais desfavoreci-
das, não sejam capazes de ler livros de literatura clássica.
Já a dimensão instrumental nos remete à compreen-
são de que os adultos são capazes de realizar diferentes
aprendizagens, entre elas, as escolares e também política
sociais, as quais algumas concepções deficitárias tentaram
negar.
A dimensão instrumental também é importante para
entendermos que, para compartilhar de forma intersubjetiva
nossa compreensão da palavra e do mundo, saibamos tam-
bém decodificar as letras e entendê-las.
A Tertúlia Literária Dialógica busca se contrapor aos
modelos edistas que podem estar presentes na Educação
Jovens e Adultos e ser uma teoria-ação que embasa novas
concepções na EJA, pensando capacidade de aprendiza-
gem e potencialização dos educandos/as por meio dos sa-
beres que eles/elas já possuem.
Considerações finais
89
Adultos, no entanto é preciso ter consciência que elas exis-
tem e das implicações que provocaram para que se possa
compreender a história da EJA de maneira mais crítica e fa-
zer um movimento de mudança significativo entendendo to-
da a complexidade que envolve esse campo.
A teoria da Aprendizagem Dialógica e sua concreti-
zação na Tertúlia Literária Dialógica, nos mostra que há
possibilidades de pensarmos em novas formas de EJA, as
quais, diferentemente de concepções edistas, entendam os
adultos como sujeitos possuidores de inteligência, aos quais
não cabe uma educação compensatória, mas sim uma edu-
cação dialógica, política e potencializadora de aprendiza-
gens.
Referências
90
nas adultas. Ed. El Rouque, 1 997.
91
para a alfabetização e participação. Cadernos de extensão , v
1 , nº 2 .Boa vista, 2006.
92
artigo
Resumo
Introdução
95
(1 881 ), houve a restrição do voto às pessoas alfabetizadas
e, segundo Strelhow (201 0, p. 51 ) nesta época ocorreu uma
“grande onda de preconceito e exclusão da pessoa analfa-
beta”, sendo que, a exclusão e a descriminação estavam ga-
rantidas na lei.
O direito ao voto esteve vinculado ao direito à educa-
ção quando, no início do século XX, iniciou-se uma grande
movimentação para acabar com o analfabetismo. Porém, o
objetivo era econômico: a pessoa precisava se alfabetizar
para ser produtiva ao país. Assim, a partir de 1 920, com o
“movimento de educadores e da população em prol da am-
pliação do número de escolas e da melhoria de sua qualida-
de começou a estabelecer condições favoráveis à
implementação de políticas públicas para a educação de jo-
vens e adultos” (HADDAD; DI PIERRO, 2000, p. 11 0).
Com a Constituição de 1 934, o papel do Estado em
relação à educação reformulou-se, principalmente com a
proposta de um Plano Nacional de Educação. Porém, so-
mente na década de 40 a educação de adultos começou a
ser tratada como um problema da política nacional 1. A partir
daí, vários acontecimentos marcaram a educação de jovens
e adultos, como: o II Congresso Nacional de Educação de
Adultos no Rio de Janeiro (1 958) caracterizado pela preocu-
pação de educadores/as em repensar sobre as característi-
cas desta modalidade de ensino, pois a educação de jovens
e adultos ainda era vista com traços da educação infantil;
mudanças nos campos políticos e econômicos com o cres-
cimento e internacionalização da economia brasileira; o Mo-
vimento de Educação de Base, da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (1 961 ); o Movimento de Cultura Popular do
Recife, a partir de 1 961 ; os Centros Populares de Cultura; a
99
outras estratégias de desenvolvimento
econômico, social e cultural.
1 02
aprendizagem.
Assim, a partir deste mapeamento possibilitaremos a
visualização do número de pesquisas que abordaram esta
categoria de estudo, iniciando então, a discussão do pro-
cesso de ensino e de aprendizagem da Língua Materna.
Resultados
1 04
Tabela 2 – Programas de Pós-Graduação/Defesas
1 05
Das instituições de ensino superior que pesquisaram
sobre a EJA, um grande número delas localiza-se na região
Sudeste, entre universidades municipais, estaduais, federais
e privadas. Porém, outras regiões brasileiras4 também con-
tribuíram com suas pesquisas e discussões adjacentes. A
área de concentração predominante destas pesquisas foi a
área de Educação.
Com a leitura do material coletado, iniciou-se o pro-
cesso de categorização5 das pesquisas (dissertações e te-
ses). Na Tabela 3 é possível verificar as categorias e o
número de pesquisas realizadas em cada uma delas.
Tabela 3 - Categorização/Teses e Dissertações
1 06
sos Educativos (11 ) e na área do Ensino da Língua Materna
(1 2), foco deste texto.
Ao visualizarmos um número expressivo de pesqui-
sas sobre a categoria EJA e Ensino da Língua Materna,
aprofundamos as leituras dos resumo a fim de organizára-
mos subcategorias. Assim, uma das subcategorias mais
presentes estava relacionada aos Processos de Ensino e de
Aprendizagem (ver Tabela 4).
Tabela 4 – EJA e Ensino da Língua Materna (subcategorias)
1 07
Na totalidade, observa-se a predominância da preo-
cupação com os aspectos relacionados ao processo de alfa-
betização, especificamente à leitura e escrita. Isto
demonstra a preocupação com o assunto predominante-
mente nos anos 90. Os processos de ensino e de aprendi-
zagem também foi uma área, dentro da categoria EJA e
Ensino da Língua Materna muito explorada, pois de treze
(1 3) pesquisas desenvolvidas, seis (6) delas contribuíram
com as discussões neste assunto.
As pesquisas que abordaram os processos de ensi-
no e de aprendizagem, desenvolveram estudos sobre as
práticas alfabetizadoras; a consciência dos sons das pala-
vras; as estratégias para a formação de leitores/escritores; o
resgate das memórias, histórias de vida e experiências; re-
escritas para a reflexão sobre a língua e a importância do
domínio da língua para a evolução das escritas. Assim, foi
dada uma importância necessária para os processos de en-
sino e de aprendizagem e, com isso, poderemos pensar que
há
formas de ensinar e aprender que ampli-
am significativamente as possibilidades
de inclusão, alterando profundamente os
modelos cristalizados pela escola tradi-
cional. Num mundo com relações e dinâ-
micas tão diferentes, a educação e as
formas de ensinar e de aprender não
devem ser mais as mesmas. Um proces-
so de ensino baseado na transmissão li-
near e parcelada da informação livresca
certamente não será suficiente (THIE-
SEN, 2008, p. 551 ).
11 0
Em relação à pesquisa na área do ensino da Língua
Materna, especificamente aos processos de ensino e de
aprendizagem da alfabetização de jovens e adultos, é preci-
so salientar a importância da mesma em oferecer elementos
para ações e projetos para serem colocados em prática,
pois segundo Cunha; Rodrigues; Machado (2007, p. 30) a
universidade vem desempenhando um papel imprescindível
ao propiciar o desenvolvimento de pesquisas “sobre a alfa-
betização/educação de jovens e adultos nos espaços do en-
sino, da pesquisa e da extensão, fornecendo subsídios para
ações e projetos de alfabetização/educação de jovens e
adultos”. Contudo, mesmo com este tema ter sido abordado
por um número considerável de pesquisas durante o perío-
do analisado, é fundamental que haja continuidade das
mesmas.
Portanto, ao aprofundarmos nossos estudos sobre a
EJA, deparamo-nos com um quadro ideal de educação, mas
que pode ser real pela convicção e ação
da luta pelo direito à educação como
parte de uma luta maior, a luta pela uni-
versalização do conjunto dos direitos
econômicos, sociais, culturais e ambien-
tais a todos – homens e mulheres, inde-
pendente da idade, cor, raça –, capaz de
assegurar um Brasil alfabetizado, mas
também capaz de assegurar justiça,
equidade, substantividade democrática
para todos seus cidadãos e cidadãs.
Pois, se é verdade que a educação sozi-
nha não é capaz de construir cidadania,
de transformar a realidade que vivemos,
é também verdade que sem ela a cida-
dania ativa não se realiza, os seres hu-
manos não se constituem como tal e não
se percebe que o mundo é feito pelos
homens e por eles pode ser transforma-
111
do (CUNHA; RODRIGUES; MACHADO,
2007, p. 27).
11 2
________ A educação de jovens e adultos no Plano Nacio-
nal de Educação: avaliação, desafios e perspectivas. Educ.
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11 4
artigo
Resumo
Introdução
11 6
versas - capacitação, etiqueta, escolarização, formação, etc
-, a depender dos interesses defendidos por cada grupo
que se apropria do termo. Falar em educação, portanto, é
tratar de um terreno em disputa, o que exige dos estudiosos
que se propõem a pesquisar os fenômenos educativos um
posicionamento teórico-políticos sobre o que compreendem
por educação.
Neste trabalho, o conceito de educação que se utili-
za está fundamentado em Arendt (apud LAFER, 1 998, p.
1 50), para a qual é pela educação que os homens tornam-
se livres, na medida em que potencializam sua reflexividade,
adquirindo os meios para pensar criticamente e tomar deci-
sões a partir do/no mundo em que vivem. Na mesma pers-
pectiva da filósofa, o jurista Dallari (2004, p. 66) explica a
educação como uma capacidade inerente ao ser humano,
que diz respeito aos atos de aprender e ensinar em diferen-
tes contextos e ao longo de todas as idades, visando a pre-
paração para a vida. É, portanto, da relação entre os seres
humanos entre si, no e com o mundo, que emana a educa-
ção como processo de humanização.
Nesse sentido, operacionalizar com esse conceito de
educação um exame sobre quem são os sujeitos da educa-
ção, em sua condição geral (humanos) e particular (perten-
cente a grupos sociais específicos, em uma sociedade e em
um tempo histórico determinados). Nesse sentido, no caso
específico das reflexões sobre a Educação de Jovens e
Adultos (EJA), Di Pierro (2001 ) lembra que seus sujeitos,
frequentemente estigmatizados pela falta (de estudos, de
saberes, de conhecimentos), porque não estudaram na ida-
de prevista, na verdade são “cognitivamente capazes de
aprender ao longo de toda a vida”, e vivem em uma socieda-
de grafocêntrica, que impõe a “aquisição e atualização
constante de conhecimentos” como exigências elementares
para a participação nas mais diversas práticas e instituições
11 7
sociais.
Nesta mesma linha argumentativa, diferentes autores
e organismos internacionais convergem ao reconhecer a
educação como um direito humano, cujo acesso é, em si,
“base para a realização de outros direitos” (HADDAD, 2003).
Ao ser um direito humano, é legitimamente um direito de to-
dos/as, o que pressupõe que é dever do Estado garanti-lo,
de forma igualitária, ao conjunto da sociedade. Entretanto,
alerta Cury (2002), esta igualdade só se viabiliza se ancora-
da no princípio da proporcionalidade: dar mais a quem tem
menos. Ou seja, a igualdade se dá na medida em que, re-
conhecendo-se a desigualdade social como marca do modo
de produção capitalista hegemônico, se ofereça maior prote-
ção social às populações historicamente excluídas do aces-
so aos direitos (negros, pobres, mulheres, trabalhadores/as
rurais), na forma de políticas afirmativas.
Nesta interdependência entre os princípios da igual-
dade e da proporcionalidade subjaz uma forte relação entre
direito e política, pois, como aponta Freire (2000), não é
possível garantir um ou outro direito isoladamente, uma vez
que todos são necessários para que a pessoa se realize em
seu potencial humano, de modo integral. Ou seja, o direito à
educação não se completa sem que os titulares desse direi-
to desfrutem também do direito à moradia, à saúde, à parti-
cipação política e vice-versa.
No entanto, como o modo capitalista sob o qual se
estrutura nossa sociedade inscreve a questão dos direitos
no campo das disputas entre as classes trabalhadora/domi-
nada/oprimida e capitalista/dominante/opressora, tanto a
definição quanto a efetivação do direito antagônicos aos in-
teresses da classe dominante implica na organização social
dos/as trabalhadores/as. Mas não se trata de qualquer orga-
nização, e sim de uma articulação esclarecida, que permita
aos trabalhadores a entrada na cena política como sujeitos
11 8
coletivos, suficientemente fortes para tensionar o Estado a
tal ponto que este seja obrigado a implementar políticas pú-
blicas pautadas na universalização dos direitos humanos.
Um aspecto relevante dessa luta dos trabalhadores
para alargar a função social do Estado, conforme revelou
Freire (2000), é a consolidação da igualdade de diferenças.
Ou seja, a garantia de que a igualdade de direitos sociais
não violente a diversidade cultural dos grupos humanos en-
volvidos nas lutas coletivas. A relação entre igualdade e di-
ferença precisa conformar-se segundo a dialética em que o
verdadeiro direito à igualdade educativa se apoia no direito à
diferença cultural, e esta se vincula e fortalece, na relação
com aquela, em reciprocidade.
A EJA precisa ser refletida conforme este olhar, di-
ante da negação histórica do direito à educação a um per-
centual significativo da população brasileira. O censo
demográfico do IBGE (201 0) contabiliza que atualmente o
analfabetismo afeta 9,6% dos brasileiros com 1 5 ou mais
anos de idade (1 3,9 milhões de pessoas), e se distribui da
seguinte maneira: concentra-se principalmente na região
Nordeste (1 9,1 % de analfabetismo contra 5,5% no Sudeste,
5,1 % do Sul, 7,2% do Centro-Oeste e 11 ,2% do Norte); entre
mulheres velhas; junto à população negra3 (1 4,4% pretos e
1 3% pardos são analfabetos, contra 5,9% brancos) e aos
moradores do campo (23,2% da população rural é analfabe-
ta, número 3,2 vezes maior do que a zona urbana). O prejuí-
zo escolar, em todas as situações citadas, se vincula
diretamente à baixa renda: quanto maior a pobreza, menor a
possibilidade de estudo. Os estudos do INEP mostram que
os índices do ensino básico entre jovens e adultos também
são muito baixos, levando-nos a questionar a efetividade da
propagada universalização do ensino. E em se tratando de
processo educativos extra (cursos línguas, informática, dan-
3 50,7% da população se declarou preta ou parda.
11 9
ça etc) ou não escolares (atividades de leitura, visita a mu-
seus, cinemas, etc), a participação desses sujeitos jovens e
adultos em situação de vulnerabilidade social é ainda me-
nor.
Este cenário incita a pensar de que modo a EJA tem
sido abordada no Brasil em temos de seu marco legal.
O marco legal da EJA no Brasil 4
1 21
vra e a leitura do mundo são assumidos como processos in-
dissociáveis, os quais favorecem o desvelamento e a supe-
ração das situações de opressão.
Nesse contexto, floresceu a primeira política de EJA
no país, o Programa Nacional de Alfabetização, implementa-
do por Jango, em 1 964, nos moldes de uma campanha na-
cional maciça de combate ao analfabetismo. Porém, com o
golpe militar e a implementação do regime ditatorial, em
1 964, este programa foi extinto e Paulo Freire, considerado
subversivo, foi exilado. A repressão militar atuou feroz e vio-
lentamente sobre o campo da Educação Popular, limitando o
poder e a expressão popular. Uma nova Constituição foi pro-
mulgada em 1 967 para atender ao sistema autoritário de go-
verno. A Educação passou a ser obrigatória dos sete aos
quatorze anos e delegada em parte aos empresários, res-
ponsáveis pela educação de seus empregados e dos filhos
destes.
Sob a presidência do general Médici (1 969-1 974),
emergiram manifestações populares intensas, principalmen-
te as estudantis. Nesse cenário, é implantada a Lei de Dire-
trizes e Bases da Educação Nacional, a LDB 5692/71 , de 11
de agosto de 1 971 , que fixou as diretrizes e bases do ensino
de 1 º e 2º graus. Há um capítulo separado para o ensino su-
pletivo, como se fosse algo à parte, não contemplado no 1 º
grau e nem no 2º grau, além de ser realizado de forma mais
rápida. Mediante tal regulamentação, foram criados os Cen-
tros de Estudos Supletivos em todo o país. Desta forma, o
ensino de jovens e adultos ganhou espaço na legislação pú-
blica e nos documentos oficiais, ainda que de forma precá-
ria.
O governo militar regulamentou essa ação de su-
plência por meio da criação do Movimento Brasileiro de Al-
fabetização – MOBRAL, em 1 967 (Lei 5.379). O MOBRAL
visava combater o analfabetismo e controlar ideologicamen-
1 22
te as massas, visando recrutar eleitores que apoiassem o
poder militar. Entretanto, o Mobral resultou na redução de
apenas 2,7% de analfabetos no país. Em 1 970, o Brasil ti-
nha mais de 1 8 milhões de analfabetos, um índice de 33,6%
entre a população de 1 5 anos ou mais (IBGE, 2000). Daí
que, em 1 985, o Movimento tenha sido substituído pela Fun-
dação Educar.
Sob a influência de lutas internacionais pró-demo-
cracia, as pressões populares por direitos humanos e contra
a Ditadura Militar se intensificaram no Brasil no final dos
anos 1 970, levando o último presidente militar, Figueiredo
(1 979-1 985), a iniciar a abertura do regime político do país.
Nesse processo de retomada da democracia é que se pro-
mulga, em 1 988, no mandato presidencial de Sarney (1 985-
1 990), a Constituição Cidadã, a qual assegura a educação
como um direito de todos, independente da idade, e como
dever do Estado de oferecê-la gratuitamente de modo a pre-
parar os educandos para o pleno exercício da cidadania e
do trabalho (BRASIL, 1 988). Além desse avanço democráti-
co, a Constituição Federal também assegurou o direito do
voto ao/às analfabeto/as.
Se a Constituição de 1 988 anuncia, mesmo que não
explicitamente, os jovens e adultos como portadores do di-
reito à educação, a Emenda Constitucional nº 59, de 2009,
deixa isso muito claro, estabelecendo que é dever do Estado
garantir “ I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4
(quatro) aos 1 7 (dezessete) anos de idade, assegurada in-
clusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tive-
ram acesso na idade própria.” (BRASIL, 2009).
Durante a presidência de Fernando Henrique Cardo-
so (FHC - 1 995 a 1 998 e 1 999 a 2002), promulgou-se a no-
va Lei de Diretrizes e Bases, a Lei 9394/96, vigente até os
nossos dias. Entre outros aspectos, nesta LDB indica-se que
a oferta de EJA deve ser compatível com as possibilidades
1 23
de participação de jovens e adultos que não frequentaram a
escola em idade própria.
Visando regulamentar algumas especificidades em
relação à EJA, após a edição da nova LDB/96, no ano 2000
o Conselho Nacional de Educação (CNE), editou as Diretri-
zes Curriculares para a Educação de Jovens e Adultos (Pa-
recer 11 /2000), o qual afirma o direito público subjetivo dos
jovens e adultos à educação e aprofunda as especificidades
da EJA enquanto uma modalidade de ensino. Nesse senti-
do, as diretrizes destacam as três funções complementares
da EJA:
- o reparo de uma dívida social do Estado em ofere-
cer educação a uma parcela significativa da população;
- a equalização, que significa incrementar as políti-
cas de EJA para permitir que jovens ou adultos afetados por
diferentes desigualdades sociais (pobreza, racismo, sexis-
mo, etc) tenham oportunidades concretas de acessar os es-
tudos, fato que exige que sejam reconhecidos como
trabalhadores e sujeitos de conhecimento e de aprendiza-
gem, não tratados como crianças;
- qualificação das práticas pedagógicas, de modo a
oferecer oportunidades de aprendizagens significativas para
o público que demanda EJA, em termos de sua instrução e
fruição cultural. (BRASIL, 2000)
Do ponto de vista legal, portanto, a EJA foi objeto
significativo ao longo da história. No entanto, a consolidação
de qualquer direito, por meio de políticas, exige uma dota-
ção orçamentária compatível. Daí que no item a seguir o te-
ma a ser tratado seja o financiamento da EJA.
O financiamento para a EJA nos governos Lula e FHC
1 24
te FHC criou, em 1 996, o Fundo de Manutenção e Desen-
volvimento do Ensino e Valorização do Magistério - FUN-
DEF, priorizando o ensino fundamental, mas vetou a EJA
dos seus cômputos, priorizando a educação de crianças co-
mo estratégia para estancar o analfabetismo adulto. Além
disso, este governo retirou-se do compromisso de erradicar
o analfabetismo e de assegurar o ensino fundamental para
jovens e adultos, de forma presencial. (BRASIL, 2011 ).
Paralelamente iniciou-se o processo de municipali-
zação do ensino fundamental, relegando aos municípios o
ônus dessa modalidade de ensino, sem, contudo, prever
qualquer respaldo financeiro. Alfabetização de jovens e
adultos tampouco foi tratada como objeto de direito. O Esta-
do se eximiu desta responsabilidade e delegou-a à ação vo-
luntária da sociedade civil, por intermédio do programa
Alfabetização Solidária. (Di PIERRO, 2011 )
Já no governo Lula (2003-2006 – 2007-201 0), este
cenário teve alterações. Com a criação do Fundo de Manu-
tenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valori-
zação dos Profissionais da Educação – FUNDEB, em 2006,
em substituição ao FUNDEF, a Educação Infantil e EJA fo-
ram contempladas pelo financiamento. Contudo, limita o
percentual do Fundo5 a ser aplicado nessa modalidade de
ensino, desprestigia EJA. (BRASIL, 2009)
Mesmo assim, há que se reconhecer que esta dota-
ção orçamentária, ao menos em tese, deveria favorecer o
envolvimento de municípios e estados com as ofertas de
EJA. Além disso, de fato a existência de financiamento es-
pecífico viabilizou a instauração de diferentes políticas de
EJA ao longo do governo Lula, tais quais: Proeja (educação
acadêmica integrada à profissional); normatização e financi-
amento da educação em prisões; inserção da EJA nos pro-
5O fator de ponderação para o cômputo das matrículas de EJA é de 0,8,
em relação a 1 ,0 do ensino fundamental regular.
1 25
gramas de transporte e alimentação escolares e do livro di-
dático; realização do Certific (certificação profissional); pro-
gramas de formação continuada de professores/as em EJA
e em EJA e Economia Solidária.
Já do ponto de vista da alfabetização, o governo Lula
recuperou a estratégia das campanhas rápidas de erradica-
ção do analfabetismo, com fragilidades significativas no que
tange às condições de trabalho dos/as alfabetizadores/as,
voluntários/as, e à continuidade dos estudos na EJA, entre
outros aspectos. (Di PIERRO, 201 0)
Todo esse cenário evidencia algumas contradições
entre a ação do Estado no campo da EJA e o direito à edu-
cação.
Contradições com a premissa do direito à educação
1 26
práticas pedagógicas que predominam na EJA são buro-
cratizadas e, muitas vezes, consideram o educando uma
criança crescida. Essas precariedades e contradições em
relação ao espaço escolar inadequado, organização curricu-
lar e temporal, torna-se fator de desestímulo, gerando, por
vezes, evasão, visto que a necessidade de sobrevivência le-
va os/as educandos/as a priorizarem o trabalho ao invés da
escola.
Conclusões
1 27
possível citar a não equiparação da EJA a outras modalida-
des educativas em termos de prestígio, para além da dota-
ção orçamentária. Outro fator são os velhos preconceitos
que cercam a problemática da EJA: a concepção do analfa-
beto como uma criança, um incapaz de decidir por si, de
participar da elaboração de seu desígnio de aprendizagem,
um ignorante absoluto, o culpado por sua condição de ex-
clusão (GALVÃO; Di PIERRO, 2007).
Para além desse, outro obstáculo à inserção da EJA
no campo dos direitos são a sobreposição de interesses po-
lítico-eleitorais aos interesses sociais e a redução da EJA
como estratégia de formação de mão de obra para o merca-
do de trabalho, além do agenciamento das práticas educati-
vas escolares como mecanismos de controle ideológico da
população.
Em conflito direto com tais perspectivas, emergiram
na história da EJA concepções e práticas pedagógicas rele-
vantes e capazes de alavancar tal modalidade ao status de
um direito humano efetivo. Um bom exemplo foi a práxis de
Paulo Freire, a qual se alinha fortemente às três funções da
EJA, tais quais abordadas no parecer 11 /2000, bem como
ao conceito de educação ao longo da vida.
O Memorando sobre Aprendizagem ao Longo da Vi-
da, estabelecido no contexto da Estratégia Europeia para o
Emprego, traz a seguinte definição para a expressão: “toda
a atividade de aprendizagem em qualquer momento da vida,
com o objectivo de melhorar os conhecimentos, as aptidões
e competências, no quadro de uma perspectiva pessoal, cí-
vica, social e/ou relacionada com o emprego”. (SITOE, 2006).
Sob tal perspectiva, mesmo que a aprendizagem seja uma
capacidade inata ao ser humano, é preciso que existam es-
colas, empresas, centros culturais, organizados de forma
adequada e com pessoal preparado para auxiliar os parti-
pantes-educandos, potencializando seu processo de apren-
1 28
dizagem e conhecimento.
Contudo, conforme evidenciado neste texto, a edu-
cação de jovens e adultos no Brasil tem sido reduzida a uma
escolarização, precária e ineficiente, tem sido limitada ao
espaços e tempos escolares muitas vezes excludentes.
Todas essas ideias foram amplamente discutidas e
defendidas por Paulo Freire, destacando o caráter político
da educação de jovens e adultos, valorizando a educação
popular e a garantia dos direito à educação pública popular,
sempre fortalecida enquanto política de Estado e formaliza-
da por meio da escolarização.
Mas é preciso pensar nessa educação de jovens e
adultos com toda a sua especificidade e complexidade, con-
forme preveem os marcos legais para a EJA no país, pois a
rigidez do sistema público pode transformar esse direito em
uma ferramenta de exclusão. Segundo Arroyo (2005), “dificil-
mente construiremos formas públicas da garantia do direito
à educação dos jovens e adultos populares sem termos co-
ragem de rever a rigidez de nosso sistema escolar, se não
investirmos em torná-lo realmente público”. (ARROYO apud
SOARES, 2005)
Além disso, também é preciso investir na formação e
na valorização de professores, para que possam desenvol-
ver um olhar específico e adequado em relação à EJA, além
de obterem instrumentos a fim de viabilizar em termos pe-
dagógicos a socialização do conhecimento com igualdade,
sem desvalorizar as diferenças culturais dos sujeitos da
EJA.
O aspecto da igualdade de diferenças abordado por
Cury (2002), incita um último apontamento: o de que a de-
mocracia educacional, que está na base da efetivação da
educação como um direito humano, não se separa da de-
mocracia social. Portanto, para que o Estado garanta este
direito efetivamente, as políticas de EJA necessariamente
1 29
devem ser pensadas em intersetorialidade com outras políti-
cas de correção das desigualdades sociais.
Em síntese, o texto evidenciou que a construção da
democracia educativa se apresenta como uma tarefa inaca-
bada no Brasil, reforçando o papel central dos sujeitos cole-
tivos na luta pelo alargamento, nas políticas públicas, da
concepção e práticas de EJA, enquanto educação ao longo
da vida.
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1 30
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GALVÃO, A. M. de O. ; Di PIERRO, M. C. Preconceito contra o
analfabeto . São Paulo: Cortez, 2007. 11 9 p.
1 32
artigo
Resumo
Introdução
1 34
taria de realizar, a educanda mostrou sua autonomia peran-
te aos educadores e as demais educandas, valorizando-se
como sujeito atuante no espaço de formação.
“O respeito à autonomia e a dignidade de cada um é
um imperativo ético e não um favor que podemos ou não
conceder uns aos outros.” (FREIRE, 2011 , p.58).
Isso só é possível devido a uma educação critica e
cheia de trocas e estímulos, pois em uma educação autori-
tária em que o professor se coloca superior ao aluno, isso
não ocorreria. O professor inibiria qualquer tentativa de no-
vas ideias vindas dos estudantes, e estes não se sentiriam
seguros para se expor. Sendo assim sujeitos reprodutores
de uma cultura dita superior, e não produtores de sua pró-
pria cultura, reconhecendo que aquilo produzido por eles é
cultura.
Trabalhando o mundo da natureza que
não fizemos, intervindo nele, terminamos
por criar um mundo da cultura. A cultura
em última analise, como expressão do
esforço criador do ser humano. Nesse
sentido, é tão cultura o poço que campo-
neses, empurrados pela necessidade de
água, cavam no chão, quanto um poema
de trova-dor anônimo. São tão cultura os
instrumentos com que os camponeses
cavam o chão, a maneira com o fazem
quanto as Bachianas de Villa-Lobos. É
tão cultura o texto que ora escrevo, cul-
turalmente influenciado, quanto a benze-
dura com que os camponeses se
defendem do que chama “espinhela caí-
da”. É tão cultura o boneco de barro de
Vitalino quanto uma tela de Scliar.
(FREIRE, 2000, p. 96).
Objetivos
1 36
que mudou desde que elas se foram; nesse contexto de co-
municação dialógica inserem-se temas preferidos, como por
exemplo, as atividades realizadas no PEJA; trabalho; sauda-
de, etc. Ao interesse das educandas junta-se o motivo dos
educadores – bolsistas que é buscar sentidos para a prática
da escrita, em sua perspectiva dialógica que envolve interlo-
cutores diversos, nas aulas destinadas à alfabetização.
Metodologia
1 37
Já agora ninguém educa ninguém, como
tampouco ninguém se educa a si mes-
mo: os homens se educam em comu-
nhão, mediatizadas pelo mundo.
Mediatizadas pelos objetos cognoscíveis
que, na prática “bancária”, são possuídos
pelo educador que os descreve ou os
deposita nos educandos passivos.
(FREIRE, 2005 p. 79).
Resultados e Discussões
1 39
Considerações Finais
1 40
As cartas não foram só um meio de alfabetizar, mas
também uma tentativa de resgatar esse laços afrouxados,
sejam com os amigos e familiares deixados para trás ou
com os educandos que marcaram e deixaram saudades.
Além disso, as cartas rompem as fronteiras, a distância físi-
ca acaba sendo amenizada pela proximidade que as leituras
das cartas proporcionam.
A importância de trabalhar com algo que seja signifi-
cativo para as educandas contrapõem o método bancário de
memorização, já que as cartas não foram trabalhadas com a
repetição, mas sim com o valor que elas davam à escrita e
leitura que realizavam.
Nossa intenção é dar continuidade a essa atividade
de leitura e escrita de cartas, pois obtivemos uma resposta
muito positiva e as educandas continuam demonstrando in-
teresse sobre essa cultura que ultrapassa tempos e frontei-
ras.
Referências Bibliografias
1 41
1 42
artigo
Resumo
1 46
de participantes. (SOUZA, 2011 , p. 20)
1 47
As atividades no PEIS acontecem somente aos sá-
bados (seguindo o calendário de aulas da Universidade e do
Colégio Técnico), no período da manhã, em cinco salas de
aula no COTUCA, na região central de Campinas. São ofe-
recidas aulas de alfabetização e disciplinas do currículo bá-
sico do Ensino Fundamental e Médio, sendo que cada aula
tem duração de uma hora.
As aulas iniciam-se às oito da manhã indo até às 1 0
horas, quando acontece uma pausa para o lanche comuni-
tário que é seguido da socialização. Em seguida, os alunos
retornam as atividades indo até o meio-dia e meia a classe
de alfabetização e até uma hora da tarde as demais classes.
As disciplinas do Ensino Fundamental e Médio estão assim
distribuídas:
Grade de horários das aulas no PEIS
1 48
ensino (Alfabetização, Ensino Fundamental e Ensino Médio)
que deseja cursar. Por exemplo, se o aluno há muitos anos
concluiu o Ensino Fundamental e deseja iniciar seus estu-
dos na turma do Ensino Médio e, após assistir algumas au-
las, opta voltar ao nível anterior, é possível, pois o PEIS
entende a educação como chave essencial para libertação
dos homens.
É importante ressaltar que as relações de ensino e
aprendizagem durante as aulas, muitas vezes, resultam num
maior envolvimento dos alunos com o professor, sendo co-
mum organizar o horário das aulas para conseguir participar
da aula deste. Como ressalta Nunes (2009, p. 1 4) “O com-
panheirismo e a amizade caracterizam a relação entre edu-
candos e educadores”. Essa relação contribui para o aluno
sentir-se livre para contribuir, de forma igualitária, para as
aulas que participa.
Nas fichas de inscrição, além de escolher as matéri-
as e o nível de estudo, o aluno é questionado sobre quem
ele é: onde ele nasceu, sua idade, sexo, estado civil, cidade
onde mora, há quanto tempo parou de estudar, em qual ní-
vel parou e os motivos que o fizeram parar ou nunca fre-
quentar uma escola.
Deste modo, após o levantamento dos dados dispo-
níveis para a realização da pesquisa foi possível concluir
que muitos alunos não respondem todas as questões e, al-
gumas vezes, respondiam apenas o nome e as matérias
que cursaria, outras vezes, só escreviam seu nome e fre-
quentavam as aulas sem estarem devidamente matricula-
dos, ou seja, não constavam nas listas de presença dos
professores. Além disso, muitas fichas se perderam com o
decorrer dos anos, por exemplo, todas as fichas de inscrição
(alunos novos e antigos) do primeiro semestre de 2003, todo
o ano de 2004 e primeiro semestre de 2005 e segundo se-
mestre de 2011. Outro problema foi o ano de 2001 , pois as fi-
1 49
chas estavam sem data, assim, não foi possível separar os
dados por semestre, ou seja, a pesquisa teve que juntar os
dois períodos letivos como um só, assim, esses dados não
puderam ser considerados na análise.
Deste modo, o levantamento dos dados não está
completo, mas como o projeto já está com mais de 30 anos
e ainda não teve seus dados digitalizados; considera-se que
os dados aqui apresentados resultarão numa importante
contribuição paraa historia do PEIS.
A pesquisa analisou, então, as fichas de inscrição
dos alunos novos e antigos, matriculados no Projeto Educa-
tivo de Integração Social (PEIS), no período de 1 998 a 201 2,
ou seja, desde quando o projeto tornou-se um serviço de
Extensão Comunitária da UNICAMP e passou a funcionar
no COTUCA (Colégio Técnico da Unicamp), localizado na
região central da cidade. Foram levadas em consideração,
as respostas obtidas no questionário de matricula e buscan-
do traçar o perfil social do aluno, analisou-se: sexo, idade,
estado civil e onde moram. Por divergências nas fichas de
inscrição, preenchidas ao longo desses 1 4 anos, na foi pos-
sível colher mais dados.
É possível concluir que o público que ingressa/ou e
frequenta/ou o projeto dentro do período analisado são, em
sua maioria mulheres, com idade média de 50 anos, resi-
dentes em Campinas e até 2007 casados (as) e, a partir
dessa data, o número de solteiros (as), divorciados (as) e
viúvos (as) vêm aumentando gradativamente, como também
o número de homens, haja vista que, no último semestre de
201 0 e no primeiro semestre de 2011 somenteingressaram
alunos do sexo masculino, mas o número de mulheres que
continuam a participar do projeto ainda é superior ao de ho-
mens.
Contudo, o PEIS é mais bem compreendido quando
observamos sua prática à luz da abordagem freiriana, onde
1 50
o conhecimento não é transferido, e sim, participado; ou se-
ja, construído por alunos e professores num constante diálo-
go. Assim, os alunos se sentem como participantes ativos do
lugar onde realizam seus estudos, esse é um diferencial
apontado como um dos principais motivos do retorno dos
adultos ao projeto.
No projeto, o professor não é visto como detentor de
todo o saber e o aluno não é um “ser vazio”, que recebe o
conhecimento “dado” sem nenhum questionamento. Deste
modo, a participação dos adultos como protagonistas de sua
aprendizagem possibilita avanços em torno do assunto es-
tudado e da postura perante o mundo.
A concepção bancária de educação, criticada por Freire
(1 975), é um ato de depositar o aluno adulto é “depositário”
e o professor o “depositante”. Freire (1 975) aponta:
A narração, de que o educador é o sujei-
to, conduz os educandos à memorização
mecânica do conteúdo narrado, mais
ainda, a narração os transforma em ‘va-
silhas’, em recipientes a serem ‘enchidos’
pelo educador. Quanto mais vão ‘en-
chendo’ os recipientes com seus ‘depósi-
tos’ tanto melhor educador será. Quanto
mais se deixem docilmente ‘encher’ tanto
melhor educandos serão. (FREIRE,
1 975, p. 66).
1 53
des, uma vez que, ocupando o mesmo
lugar que seu professor, passa a se ver
como uma pessoa apta a ensinar. (TU-
RINA, 2008, p.45).
1 55
anos, marginalizando, assim, os que se encontram acima
dessa faixa etária.
Assim, o projeto colabora ativamente para a Educa-
ção de Jovens e Adultos no país. Devido à escassez de polí-
ticas públicas e de programas que se destinam à educação
de adultos e idosos sem o entrelaçamento com a Educação
Profissional; o PEIS, ao longo dos seus 30 anos, contribui,
ativamente, para a formação do homem. O projeto acredita
que as relações de ensino e aprendizagem, pautadas no di-
alogo, são as chaves para a libertação, como afirma Freire
(1 975 p, 92) “O dialogo, como encontro dos homens para a
‘pronúncia’ do mundo, é uma condição fundamental para
sua real humanização”.
Muitos trabalhos acadêmicos tiveram este projeto
como campo de pesquisa, sendo eles três doutorados (Giu-
bilei, 1 993; Peluso 2003 e Campos 2004), três mestrados
(Turina, 2005; Nunes, 2009 e Souza 2011 ) e Trabalhos de
Conclusão de Curso-TCCs (Cavalheiro, 2005; Fernandes,
2005; Sousa, 2007).Além disso, os professores são estimu-
lados pela coordenação a escreverem artigos, resenhas, en-
tre outros, com o objetivo de divulgarem as práticas
educativas que deram certo no PEIS no âmbito acadêmico,
como Leite e Souza (201 0) e Souza (201 2), apresentados,
respectivamente, no III e IV Simpósio do Grupo de Estudos
e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos - SIMPEJA.
Ainda nesse sentido, é possível ressaltar os documentos ofi-
ciais do PEIS e os relatórios de estágios que não foram pu-
blicados.
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1 56
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PEIS. 2008. 1 08 p. (Dissertação de Mestrado) - Faculdade de
Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas,
SP, 2008.
1 59
1 60
artigo
Arlete Pereira1
Francisleth P. Battisti 2
Resumo
Introdução
1 62
MOVA (Movimento de Alfabetização), inserido na esfera da
EJA (Educação de Jovens e Adultos) com o intuito de identi-
ficar/compreender os processos educativos existentes, es-
paço no qual já atuamos como educadoras populares.
Essa opção se deu a partir da concepção que os
movimentos sociais (nesse caso, luta pela terra), geralmen-
te, têm atuação marcante na transformação da sociedade a
partir da defesa de direitos e das reivindicações das catego-
rias de trabalhadores que representam (trabalhadores ru-
rais).
A Educação de Jovens e Adultos
1 63
ções concretas de vida, desses indivíduos transformados
em assunto nas situações de aprendizagem e conteúdos
dos materiais pedagógicos. Iniciando, assim, intensos pro-
cessos de discussão, reflexão e análise, possibilitando
conscientização e participação destas pessoas, que passam
a entender/questionar as razões de estarem vivendo em tais
condições de exploração
Ao entenderem sua situação começam a eliminar as
explicações vigentes, os fatalismos propagados pela ideolo-
gia dominante, e passam a vislumbrar perspectivas de mu-
dança e melhoria de vida. É na educação popular que nasce
o fortalecimento das reivindicações dos seus direitos bási-
cos e fundamentais.
Assim, de um lado, pode-se dizer que se
ampliou a divulgação destes trabalhos
de Educação dirigidos aos jovens e
adultos que estiveram fora ou foram ex-
pulsos das relações educacionais. Foi
uma ampliação que aconteceu sob a
forma de um trabalho de uma EJA, autô-
nomo e especifico em diversos lugares e
projetos; ou então como uma EJA que se
fez (faz) na relação direta com a educa-
ção popular e de base, derivando daí
seus conteúdos e seu compromisso po-
lítico-social-profissional; ou ainda como
uma EJA construída no seio dos diver-
sos movimentos sociais e entre eles os
da cultura popular, transformando as di-
ferentes manifestações culturais e artís-
ticas como mais um mediador neste
processo educacional (FREITAS, 2007).
1 65
Há vários motivos para muitos brasileiros terem
abandonado o campo e se transferirem para as cidades,
principalmente a posse da terra na mão de poucos proprie-
tários, cita-se alguns motivos dessa concentração: 1 ) a terra
usada como "reserva de valor', (especulação); o minifúndio
é insuficiente para a família, obrigando parte desta a se
transferir para as cidades; 2) mecanização do campo (trato-
res, colhedeiras etc), causando desemprego; 3) difícil sobre-
vivência do pequeno proprietário de terras, dificuldades de
empréstimos bancários, difícil aquisição de máquinas e im-
plementos agrícolas; 4) expansão de grandes monoculturas,
redução dos empregos permanentes no meio rural, aumento
para os trabalhos temporários, somente em épocas especí-
ficas e 5) desastres naturais (geadas, secas e inundações),
perda da produção agrícola, fazendo com que os trabalha-
dores rurais atingidos se mudem para as cidades e não re-
tornam para o campo, sem dinheiro para investir na
produção rural.
A reforma agrária apregoada pela Cons-
tituição funciona como uma espécie de
sanção para o imóvel que não esteja
cumprindo sua função social é a desa-
propriação pôr interesse social, ou seja é
um programa do governo , plano de atu-
ação estatal , mediante intervenção do
Estado na economia agrícola , não para
destruir o modo de produção existente ,
mas apenas para promover a repartição
da propriedade e da renda fundiária.
Com o objetivo de promover o acesso à
propriedade rural mediante a distribuição
ou redistribuirão de terras (DUTRA,
2001 ).
1 66
na qual estiveram inseridos os atores sociais desta pesqui-
sa, que viveram anos de lutas, acampamentos, marchas e
reivindicações, sonhando com uma reforma agrária que viria
lhes dar trabalho e dignidade.
Em conclusão podemos asseverar que as políticas governamen-
tais de acesso a terra no Brasil não conseguem promover um pac-
to político de sustentação para um projeto de redistribuição de
terras. Essa crônica incapacidade de articulação tem sido respon-
sável por uma histórica criação de expectativas, seguidas de frus-
trações, com projetos de colonização que nascem e morrem no
papel. Na raiz desse processo há um poderoso jogo de interesses
bancado no século passado por fazendeiros que começaram a
amealhar fortuna como posseiros de grandes áreas públicas, hoje
sucedidos por grupos empresariais proprietários de fazendas alta-
mente mecanizadas. Reforma Agrária não consistente apenas na
entrega da terra a quem não tem e a quer, precisamos sim de uma
reforma acoplada à política agrícola, integral, única que responda
aos anseios do homem sem terra (DUTRA,2001 ).
1 67
ações de despejo.
O assentamento possui atualmente 1 4 lotes de igual
área (baseando na agricultura familiar) e duas áreas de
“propriedade coletiva”, sendo: a) uma área de APP (Área de
Preservação Permanente) e b) um barracão, onde atual-
mente foi construída uma Escola.
Atores sociais do assentamento
Agricultura familiar
1 68
média entre três e cinco hectares, e a mão de obra utilizada
é majoritariamente familiar. Esse tipo de agricultura tem
grande importância na produção e no abastecimento de ali-
mentos, apesar de no Brasil ela ocupar uma pequena área
de 1 7,5% das terras, é responsável pelo fornecimento de
mais da metade dos produtos básicos da alimentação e dos
hortifrutigranjeiros (DUTRA, 2001 ).
Dimensões das práticas educativas
1 69
tas de chá e remédios são comuns, a saúde é tema comum
entre eles; os cuidados com a casa, a preocupação com a
limpeza, por morar em meio ao barro; saudades da família
que está distante, entre outras experiências.
1 70
Figura 2 Escola Novo Horizonte
Fonte: própria
1 73
1 74
artigo
Resumo
Introdução
1 76
tando do nível médio do ensino regular, uma vez que, é nes-
se nível em que há maior expectativa do jovem sair da esco-
la melhor preparado para o mundo do trabalho e/ou para a
continuidade dos seus estudos como justificado por Mene-
zes (2001 ):
A LDBEN caracteriza o novo ensino mé-
dio como “etapa final da educação bási-
ca...” que deve promover “a preparação
básica para o trabalho e a cidadania..., a
formação ética e o desenvolvimento da
autonomia intelectual...”, assim como “a
compreensão dos fundamentos científi-
co-tecnológicos dos processos produti-
vos...., das ciências, das letras e das
artes... do processo histórico de transfor-
mação da sociedade...”, e “adotará meto-
dologias que estimulem a iniciativa dos
estudantes”.
1 78
por diferentes motivos, carregam suas vivências no mundo
do trabalho para o ambiente escolar além de, possivelmen-
te, terem estabelecido um outro tipo de relação com a famí-
lia e a comunidade diferente daquela de quando crianças
etc. Essa condição, pode oferecer elementos importantes
para a experiência educacional desses jovens e trazer moti-
vações relevantes para pesquisadores da área educacional.
A partir de tais referências, valido o interesse como pesqui-
sadora em refletir e analisar os modos de se relacionarem:
sujeitos e Matemática escolar. Deste modo, fazem parte dos
objetivos deste trabalho analisar as recentes pesquisas so-
bre ensino de matemática na EJA, refletir sobre o jovem e
sua relação com o saber matemático, seja este escolar ou
não, além de delimitar possíveis caminhos na educação es-
colar, tendo como foco o aluno como sujeito social.
Metodologia
1 79
um menor número de sujeitos e pelo aprofundamento maior
que este tipo de análise dispõe, como justifica MEKSENAS
(2007). DEMO (1 994) explicita que os dados obtidos através
de entrevistas e observações pode fortalecer as argumenta-
ções, uma vez que “o significado dos dados empíricos de-
pende do referencial teórico, mas estes dados agregam
impacto pertinente, sobretudo no sentido de facilitarem a
aproximação prática" (DEMO, 1 994).
Borba (2004) discute a diferenciação entre as análi-
ses qualitativas e quantitativas:
O que se convencionou chamar de pes-
quisa qualitativa, prioriza procedimentos
descritivos à medida em que sua visão
de conhecimento explicitamente admite
a interferência subjetiva, o conhecimento
como compreensão que é sempre con-
tingente, negociada e não é verdade rí-
gida. O que é considerado "verdadeiro",
dentro desta concepção, é sempre dinâ-
mico e passível de ser mudado.
1 80
Em meio às mudanças ocorridas na educação públi-
ca, novas políticas públicas criam um novo cenário para a
Educação de Jovens e Adultos. O Parecer CNE/CEB
11 /2000 relata o problema das desistências e abandono es-
colar:
A média nacional de permanência na
escola na etapa obrigatória (oito anos)
fica entre quatro e seis anos. E os oito
anos obrigatórios acabam por se con-
verter em 11 anos, na média, estenden-
do a duração do ensino fundamental
quando os alunos já deveriam estar cur-
sando o ensino médio. Expressão desta
realidade são a repetência, a reprovação
e a evasão, mantendo-se e aprofundan-
do-se a distorção idade/ano e retardando
um acerto definitivo no fluxo escolar.
1 81
quer possibilidade de diálogo e tecitura
dos conhecimentos que permitam dese-
nhar currículos nos quais os alunos pos-
sam significar suas experiências
encontrando no ambiente escolar práti-
cas que permitam assegurar-lhes o direi-
to e a continuidade de seu(s)
processo(s) de formação ao longo da vi-
da.
1 83
A Educação de Jovens e Adultos, em particular na
escola pesquisada, se caracteriza pela presença de alunos
com anseios diversificados daqueles que fazem parte da
educação regular, com diferentes vivências, com conheci-
mentos trazidos de relações de trabalho, de família e conví-
vio em comunidade, na maioria das vezes, posicionamentos
e interpretações já estabelecidos, por meio das experiências
e opiniões construídas social e culturalmente ao longo de
suas vidas. Por isso, o conhecimento trazido de fora da es-
cola pelos alunos deste nível de ensino e o resgate de sa-
beres trazidos por eles por experiências diversas fazem com
que se construa uma educação específica e particular, le-
vando em conta os objetivos e anseios destes alunos e de
seus professores, no que diz respeito à sua formação bási-
ca.
O nível médio da educação básica, na Educação de
Jovens e Adultos, é pouco analisado nas pesquisas de edu-
cação Matemática. Levando em conta os modos de intera-
ção entre os sujeitos que aprendem e o conhecimento
matemático escolar, a análise da Matemática escolar na
EJA e o modo como esta se aproxima e se torna significati-
va para os alunos fora da idade escolar e com ricos conhe-
cimentos extra-escolares, são questões relevantes no que
diz respeito à pesquisa em educação. Araújo (2001 ), em sua
dissertação de mestrado, revela a escolha de alguns profes-
sores de Ensino Médio, segmento EJA, por distintos materi-
ais didáticos. A autora analisa tais escolhas e a justificativa
do docente quanto ao uso destes instrumentos didáticos,
como sugestões da Ação Educativa, livros de Ensino Médio
da Educação Regular.
O ensino de Matemática, especificamente no nível
Médio, será responsável pela abrangência de temas já trata-
dos no Ensino Fundamental, como justificado pelo PCNEM:
1 84
(...) as Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Ensino Médio, que organizam as
áreas de conhecimento e orientam a
educação à promoção de valores como
a sensibilidade e a solidariedade, atribu-
tos da cidadania, apontam de que forma
o aprendizado de Ciências e de Mate-
mática, já iniciado no Ensino Fundamen-
tal, deve encontrar complementação e
aprofundamento no Ensino Médio. Nessa
nova etapa, em que já se pode contar
com uma maior maturidade do aluno, os
objetivos educacionais podem passar a
ter maior ambição formativa, tanto em
termos da natureza das informações tra-
tadas, dos procedimentos e atitudes en-
volvidas, como em termos das
habilidades, competências e dos valores
desenvolvidos. (BRASIL, 2000)
1 87
nhecimento. A ação de um sujeito sobre os outros que con-
vivem no mesmo ambiente de aprendizagem, a reafirmação
do saber, a significância do que esta sendo aprendido é im-
portante para que esta relação entre conhecimento e sujeito
se dê de forma produtiva, levando em conta o contexto do
aluno e quais são suas aspirações relativamente à escola e
aos conteúdos escolares. Ainda de acordo com o autor, mais
do que fazer com que o aluno se interesse pela escola, é
necessário que este se identifique com ela, podendo reco-
nhecer-se e inteirar-se de modo ativo e dinâmico na constru-
ção de novos saberes e na valorização do sujeito social e
cultural, ativamente presente e responsável pela dinâmica
escolar, afinal:
Para compreender a relação dos jovens
(da camada popular) com o saber e com
a escola, é preciso interessar-se também
por suas relações mais gerais com o
aprender. Os fracassos, abandonos...
que a escola deplora são também efeitos
dos conflitos entre formas do aprender
(Charlot, 2001 ).
1 90
significado ao conhecimento a ser adquirido. Porém, não se
pode esperar que a Matemática praticada na sala de aula
seja similar a prática da Matemática em outros contextos,
com mesmos valores e representações aos seus sujeitos:
[...] praticamente nenhum problema em
uma loja ou na cozinha foi resolvido sob
forma do algoritmo escolar. As regras de
transformação (que eliminam aproxima-
ções algorítmicas para frações e deci-
mais) não são transferidas, como
também não o são as notações de posi-
ções fixas (já que lápis e papel não são
utilizados), os cálculos, a trigonometria,
álgebra etc. De fato, a questão devia ser:
existe algo que é transferido?. (Lave,
2002)
1 92
(...) falar em matemática escolar, em vez
de simplesmente matemática, ou em
educação matemática escolar, em vez
de simplesmente educação matemática
ou, ainda, em práticas escolares mobili-
zadoras de cultura matemática, em vez
de simplesmente práticas mobilizadoras
de cultura matemática, começa a se tor-
nar um fator imprescindível para a identi-
ficação e interpretação da diversidade e
da identidade culturais e, consequente-
mente, para a análise de práticas cultu-
rais situadas. (Miguel, 2008)
1 93
e sua identificação no contexto de aprendiz da função do-
cente:
(...) aprender a identifica-se com o pro-
cesso de passagem da condição de no-
vato, de recém-chegado, em uma
comunidade, à condição de perito em
uma situação particular, sobretudo pelo
engajamento/participação em atividades
reais.
1 95
edade. E, além disso, esclarecer se ele
possui princípios que são alicerces para
outros conhecimentos.
1 96
ensão sobre a realidade, aumentando
sua autoconfiança, senso crítico e a ca-
pacidade de tomar decisões.
1 98
Considerações Finais
1 99
O ensino da Matemática, especificamente no que
diz respeito ao de alunos trabalhadores, demonstra graves
embates quanto aos modos de se conceber este ensino. O
desejo de aprender, apesar do evidente esforço de seus su-
jeitos, precisa fazer parte da rotina escolar diária destes alu-
nos, tornando-os membros da comunidade escolar. A
Matemática mais do que ferramenta de inserção social é
uma prática social que todos a compartilham, porém de di-
ferentes formas e em diferentes atividades. Cabe a escola
evidenciar tais práticas e usá-las como recursos de signifi-
cação e diálogo: “trata-se de considerar as diferentes práti-
cas sociais como fatos culturais construídos pelos homens
e, portanto, tão significativos e importantes quanto os fatos
científicos” (Monteiro, 2007).
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204
artigo
Resumo
Introdução
207
balho com Educação de Pessoas Jovens e Adultas seja a
valorização do conhecimento prévio e o reconhecimento dos
alunos como portadores de cultura e saberes. Visto que são
pessoas que estão voltando para a escola, muitas vezes em
busca da educação que o mercado exige. Chegam cansa-
dos depois de um dia de trabalho, têm pouco tempo para se
dedicarem aos estudos, mas chegam também com muitas
histórias e vivências.
Segundo Souza (2006), as classes de EJA são hete-
rogêneas. Nelas encontram-se, por exemplo, jovens urbanos
envolvidos em movimentos da cultura de massa, pessoas
que buscam um diploma para uma promoção no emprego,
migrantes da zona rural, pessoas que almejam uma partici-
pação político-social mais ativa, idosos, fiéis que querem
aprender a ler a Bíblia entre outros.
Infelizmente, esses alunos são, na maioria das ve-
zes, rotulados como “incapazes para o aprendizado”, pois o
professor da EJA não trabalha as competências relativas às
especificidades dos estudantes, não permitindo assim o en-
tendimento da forma de pensar e de construir o conheci-
mento dos adultos.
Para Cagliari (1 991 ), os modos diferentes de falar
acontecem porque a língua portuguesa, como qualquer ou-
tra língua, é um fenômeno dinâmico, que está sempre em
evolução. Pelos usos diferenciados ao longo do tempo e nos
mais diversos grupos sociais, as línguas passam a existir
como um conjunto de falares diferentes ou dialetos, todos
muito semelhantes entre si, porém cada qual apresentando
suas peculiaridades com relação a alguns aspectos linguís-
ticos.
Todas as variedades, do ponto de vista da estrutura
linguística, são perfeitas e completas em si. O que as tor-
nam diferentes são os valores sociais que seus membros
possuem na sociedade. Desse modo, ainda segundo o au-
208
tor, os dialetos de uma língua, apesar de serem semelhan-
tes entre si, apresentam-se como línguas específicas, com
sua gramática e usos próprios. Na medida em que se dife-
renciarem muito uns dos outros serão reconhecidos como
línguas diferentes.
De acordo com Cagliari (1 991 ), a escola percebe a
variação linguística como uma questão de certo ou “errado”.
Em sua avaliação, não tem lugar diferente, embora este re-
presente a maior parte das situações que o alfabetizador
enfrenta. Ninguém fala “errado” o português, fala de maneira
diferente. Por experiência própria, todos os falantes sabem
disso, porém a escola insiste em manter essa postura errô-
nea diante dessa questão.
O ensino tradicional, muitas vezes, alimenta a falsa
ideia de que o português é uma língua difícil, o que todo
educador da EJA deve ter bem claro é que seus alunos re-
fletem variações linguísticas que representam sua origem
regional, de gênero (variações segundo o sexo), etária (varia
de acordo com a idade) e socioeconômica.
Além da abordagem de Bakhtin, tratar-se-ão aqui de
alguns conceitos da corrente sociolinguística criada por Wil-
lian Labov, em 1 960, que traz um respeito maior à diversida-
de social e regional dos educandos, tentando encontrar um
caminho para democratizar o ensino. Os sociolinguistas ve-
em a língua em seu uso real, levando em conta principal-
mente as relações sociais que levam à produção linguística.
Assim, a língua é social e não pode ser estudada como uma
estrutura autônoma e independente do contexto, da cultura
ou da história de um indivíduo ou população. Portanto, a va-
riação da língua é algo inevitável, pois todas as manifesta-
ções verbais de uma língua sofrem alterações. Não existe
mais um único jeito de falar o português, mas um respeito
pelos diversos falares que nossa língua ganhou em cada re-
gião do país e em cada grupo socioeconômico.
209
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais
(2001 ), o ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa na
escola é resultante de três elementos: o aluno, o sujeito da
ação de aprender, que age sobre o objeto de conhecimento;
a língua, que é a Língua Portuguesa, tal como se fala em
públicos e a que existe nos textos escritos que circulam so-
cialmente; e o último elemento, o ensino, concebido como
prática educacional que organiza a mediação entre sujeito e
objeto do conhecimento.
Dessa maneira, este trabalho propõe um ensino da
língua materna que não perde de vista o fato fundamental
da heterogeneidade linguística e que se posiciona em prol
de uma educação linguística que abandone o estudo da lín-
gua como objeto em si mesma e passe a incorporar o con-
ceito de heterogeneidade como aspecto fundamental do
ensino de língua nas escolas. Pois, acredita-se que somente
nessa perspectiva, todos os professores em atividade e/ou
formação, interdisciplinarmente transformados em professo-
res de língua, passarão a valorizar seus alunos da EJA co-
mo seres históricos inapelavelmente marcados pela
heterogeneidade linguística.
Objetivos
21 0
tencialidades e os desafios que os procedimentos metodoló-
gicos podem apresentar aos/as educadores/as dentro dessa
perspectiva.
A partir desses objetivos, desenvolve-se aqui uma
pesquisa bibliográfica baseada em Bakhtin, Bagno, Cagliari,
Gnerre, Labov, Leite, Neves, Possenti, Riscal e Scherre. Em
todo o trabalho, ocorrências são apresentadas a fim de
exemplificar a análise e também o aparato teórico.
Com este trabalho, espera-se que muitos preconcei-
tos sejam superados, que muitas aulas melhorem, que mui-
tas pessoas, especialmente na escola, sejam respeitadas
em suas diversidades linguísticas.
Metodologia de pesquisa: condições favoráveis à diversidade
linguística na EJA
211
Encontram-se nos PCNs orientações explícitas para
que a variação linguística seja trabalhada em sala de aula
como parte dos objetivos do ensino de Língua Portuguesa a
serem alcançados pelos alunos:
Utilizar diferentes registros, inclusive os
mais formais da variedade linguística va-
lorizada socialmente, sabendo adequá-
los às circunstâncias da situação comu-
nicativa de que participam. Conhecer e
respeitar as diferentes variedades lin-
guísticas do português falado. (PCN,
2001 , p.41 )
21 2
Temos de fazer um grande esforço para
não incorrer no erro milenar dos gramá-
ticos tradicionalistas de estudar a língua
como uma coisa morta, sem levar em
consideração as pessoas vivas que a fa-
lam. O preconceito linguístico está liga-
do, em boa medida, à confusão que foi
criada, no curso da história, entre língua
e gramática normativa. Nossa tarefa
mais urgente é desfazer essa confusão.
Uma receita de bolo não é um bolo, o
molde de um vestido não é um vestido,
um mapa-múndi não é o mundo… Tam-
bém a gramática não é a língua. (BAG-
NO, 2009, p. 1 9)
21 4
língua. Assim, rotulam como ignorante, ridículo e/ou estúpi-
do o sujeito que fala “nóis vai”, “fósfro”, “cuié” ou “chicrete”.
Contudo, como diz Fonseca (2005), os estudos sociolinguís-
ticos sugerem que esse preconceito não é necessariamente
contra as palavras, mas contra a própria classe social dos
falantes dessas variantes.
No Brasil de hoje, a hegemonia político-econômico
do sul-sudeste faz com que as variações do português fala-
do nessas regiões sejam mais prestigiadas e privilegiadas
na configuração das normas-padrão a que todos os falantes,
independente das regiões, são levados a se submeter. Para
Fonseca (2005), essa arrogância costuma fazer com que al-
guns preconceitos sejam solidificados. Para dizer que certa
fala nordestina é “ridícula”, por exemplo, falantes de outras
regiões apontam o quanto é “engraçada” aquela variação
onde as pessoas dizem “oitcho” e “muitcho” referindo-se às
palavras “oito” e “muito”, por exemplo.
É preciso que a escola e todas as de-
mais instituições voltadas para a educa-
ção e a cultura abandonem esse mito da
“unidade” do português brasileiro e pas-
sem a reconhecer a verdadeira diversi-
dade linguística de nosso país para
melhor planejarem suas políticas de
ação junto à população amplamente
marginalizada dos falantes das varieda-
des sem prestígio social. O reconheci-
mento da existência de muitas
variedades linguísticas diferentes é fun-
damental para que o ensino em nossas
escolas seja consequente com o fato
comprovado de que a norma linguística
ensinada em sala de aula é, em muitas
situações, uma verdadeira “língua es-
trangeira” para o aluno que chega à es-
cola proveniente de ambientes sociais
21 5
onde a norma linguística empregada no
quotidiano é uma variedade estigmatiza-
da de português brasileiro (quando não
outra língua, diferente, como ocorre em
diversos lugares do Brasil, sobretudo nas
zonas de fronteira, nas comunidades in-
dígenas e nas áreas de forte imigração,
onde o português não é a língua mater-
na de parte da população). (BAGNO,
2009, p.32)
21 6
de uso da língua em que nos encontramos: se é uma situa-
ção formal, tentaremos usar um linguagem formal; se é uma
situação descontraída, uma linguagem descontraída, e as-
sim por diante. Essa adequação se baseia naquilo que con-
sideramos ser o grau de aceitabilidade do que estamos
dizendo por parte de nosso interlocutor ou interlocutores.
Variabilidade linguística na EJA
21 8
eficazes tanto de fala como de escuta, em contextos mais
formais, dificilmente ocorrerá se a escola não tomar para si
a tarefa de promovê-la.
Dessa maneira, segundo Possenti (2005, p. 36), pode-se
ouvir “os boi”, “dois cara”, “comédia dos erro”, mas nunca “o
bois”, “um caras” ou “comédia do erros”; muitas vezes “nós
vai”, mas nunca “eu vamo(s)”. Desse modo, conclui-se que
não existe uma língua uniforme, todas as línguas mudam e
as variações linguísticas são condicionadas por fatores in-
ternos à língua ou por fatores sociais, ou por ambos ao
mesmo tempo.
Diante do exposto, Bagno (2009, p.1 41 e 1 42) diz
que se espera do professor uma mudança de atitude do
ponto de vista teórico, “em vez de REPETIR a velha doutrina
gramatical normativa, o professor deveria REFLETIR sobre
ela; já do ponto de vista prático, em vez de REPRODUZIR a
tradição gramatical, o professor deve PRODUZIR seu pró-
prio conhecimento da gramática”, transformando-se num
pesquisador, num orientador de pesquisas a serem empre-
endidas em sala de aula, junto com seus alunos.
Desse modo, é necessária a elaboração e planeja-
mento de um Projeto Político Pedagógico (PPP) para as tur-
mas da EJA que não ignore as diferentes culturas dos
alunos na produção do conhecimento escolarizado. Como
salienta Riscal,
a concepção de gestão democrática
parte da compreensão da democracia
como a forma de governo baseada no
respeito das diferenças e deve, portanto,
eliminar qualquer processo de homoge-
neização e uniformização cultural.(RIS-
CAL, 2009, p.84)
21 9
e, portanto, não pode ser enclausurado em um documento
que não dê conta das contradições entre agentes no interior
e exterior do espaço escolar. Portanto, a escola autônoma
deve ter liberdade de formular e executar um projeto educa-
tivo, cuja intenção seria a transformação desse real, consi-
derando a diversidade da comunidade e da escola.
O respeito à autonomia permite a cria-
ção de uma identidade da escola, de um
ethos específico que a diferencia porque
expressa uma interação única entre os
agentes únicos que compõem a escola.
Este é um aspecto diferenciador, que
pode agregar novas ideias de novos par-
ticipantes, levando à adesão dos diver-
sos agentes na elaboração de um
projeto próprio. (RISCAL, 2009, p. 83 e
84)
222
Morfológicas,
E lexicais.
Um idioma puro,
Sem gíria,
Sem expressões idiomáticas,
Sem palavrões,
Sem desvios, lapsos e falhas,
Sem flexibilidade, sempre
Rígido,
Imutável e uniforme.
Um idioma perfeito, sempre cristalino.
Simplesmente puro,
Sem presença humana,
Sem usuários de carne e osso,
Sem suas múltiplas vozes
Sem fibra,
Sem paixão,
Sem cultura.
Um idioma sem ideias,
Em que os falantes todos
Pensam igual ou até não
Pensam.
Um idioma sem diferenças de opinião
Entre os que falam e escrevem.
Um idioma sem palavras carinhosas,
Sem compaixão, sem piedade
Um idioma desprovido de conflitos e de tensões,
223
Sem humor,
Sem piadas,
Sem alegria,
Sem paciência, sem tolerância,
Sem ambiguidades,
Sempre certinho, certinho.
Um idioma sem graça,
Sem, na dose certa, de uma pitada
De sal, de pimenta
Ou de açúcar,
Radicalmente insosso.
Um idioma sem diversidade,
Sem variedades e variações,
Sem brilho, sem vida
Um idioma sem mudança e sem futuro,
Sem jeito e sem jeitinho.
Imagine o impossível!
É possível?
Ainda bem que é impossível!
Ainda bem que é impossível!
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Acesso em: 30 de agosto de 201 3.
TARALLO, Fernando. A pesquisa sociolinguística . São Paulo,
Ática, 1 997.
227
228
artigo
Eliane Quinelato1
Clinio Jorge de Souza2
Luciana Maria Crestani 3
Maria das Graças Sandi Magalhães4
Resumo
1 . Introdução
230
leitura estabelecendo formas de escrita informais, confundi-
das, erroneamente, com práticas de escrita permitidas a
qualquer situação de letramento. Outro fator que merece
destaque é a falta de preparo do professor para ensinar es-
tratégias de leitura, interpretação e produções textuais que
auxiliem os alunos a praticar essas atividades de forma
autônoma.
A obra de Paula Carlino, Escribir, leer y aprender en
la universidad: una introducción a la alfabetización acadêmi-
ca (2009), aborda a dificuldade de leitura e escrita em alu-
nos universitários e propõe metodologias possíveis de
serem aplicadas em aulas de leitura e produção de textos,
com a finalidade de melhorar a qualidade dos textos produ-
zidos pelos discentes.
Para a autora (CARLINO, 2009) não se trata apenas
de refletir sobre os fracassos escolares anteriores dos alu-
nos que, sem dúvida, repercutem no ensino superior. Deve-
se repensar o planejamento das universidades que, na mai-
oria das vezes, relegam essas atividades a uma única
disciplina “Leitura e produção de textos”, ministrada em um
único semestre, esperando que apenas o docente seja res-
ponsável por essa tarefa. Além disso, Carlino (2009) estende
a responsabilidade pelo ensino de leitura, escrita e interpre-
tação de textos a todos os docentes, uma vez que eles do-
minam as práticas de linguagem pertinentes ao seu campo
de atuação.
Irmanamo-nos com as reflexões da estudiosa (Carli-
no, 2009) e passamos a refletir sobre as seguintes questões:
se os universitários apresentam dificuldades em leitura, in-
terpretação e escrita de textos acadêmicos, sobretudo os
que pertencem ao segmento dissertativo/argumentantivo,
genericamente considerados “mais difíceis”, o que dizer das
dificuldades observadas em relação à interpretação de tex-
tos da esfera literária, estudada por eles desde o Ensino
231
Fundamental I? O que os professores universitários têm feito
para amenizar tais dificuldades? Os estudantes sabem ler
um texto literário considerando suas peculiaridades?
Essas questões - para nós, inquietantes – levaram-
nos a refletir e a pensar em metodologias que possam con-
tribuir para o aprimoramento da leitura, interpretação e es-
crita de textos da esfera literária. A nosso ver, teorias
consolidadas apoiadas na prática podem, seguramente,
cumprir esse papel, pois determinados aparatos teóricos,
quando bem utilizados, podem ser de grande valia para o
aprimoramento humano em qualquer âmbito do conheci-
mento.
2 Objetivo
232
narrativas apontadas acima a fim de observarmos se a se-
gunda análise foi aprimorada a partir da explanação e apli-
cação prática dos conceitos.
4 Desenvolvimento
233
do nível de linguagem e erudição de um texto.
Com relação à especificidade do gênero literário diz
que:
O texto literário constitui uma forma
peculiar de representação e estilo
em que predominam a força criativa
da imaginação e a intenção estética.
Não é mera fantasia que nada tem a
ver com o que se entende por reali-
dade, nem é puro exercício lúdico
sobre as formas e sentidos da lin-
guagem e da língua. (PCNs, 1 988,
p.26)
Reforça-se, na citação acima, que a literatura não é
mero exercício lúdico, mas uma forma peculiar de represen-
tação que busca dar forma às experiências humanas, medi-
ar o sentido entre o sujeito e o mundo e viabilizar a
produção e apreensão do conhecimento.
Cosson (201 3) também reflete sobre o ensino e o
sentido da literatura no Ensino Fundamental afirmando que,
nesta fase escolar, literatura engloba qualquer texto ficcional
ou poético e, de preferência, devem ser escolhidos textos
curtos e divertidos, tais como a crônica. E afirma:
(...) Não é sem razão, portanto, que a
crônica é um dos gêneros favoritos da
leitura escolar. Aliás, como se registra
nos livros didáticos, os textos literários
ou considerados como tais estão cada
vez mais restritos, sob o argumento de
que o texto literário não seria adequado
como material de leitura ou modelo de
escrita escolar, pois a literatura já não
serve como parâmetro nem para a lín-
gua padrão, nem para a formação do lei-
234
tor, conforme parecer de certos linguis-
tas. No primeiro caso, por ser irregular e
criativa, não se prestaria ao ensino de
língua portuguesa culta, posto que esta
requer um uso padronizado, tal como se
pode encontrar nas páginas dos jornais
e das revistas científicas. No segundo,
sob o apanágio do uso pragmático da
escrita e da busca de um usuário com-
petente, afirma-se que apenas pelo con-
tato com um grande e diverso número de
textos o aluno poderá desenvolver sua
capacidade de comunicação. (COSSON,
201 3, p. 21 )
237
mentais foi relegado a segundo plano, abrindo espaço para
outros gêneros, como seriados e filmes. Para o autor
(COSSON, 201 2), o fato de esses gêneros utilizarem a es-
crita de forma secundária contribuiu para o abandono da lei-
tura literária nas escolas.
É, portanto, a partir de tais premissas que funda-
mentaremos a importância do uso de um aparato teórico
consolidado que permita reconhecer as categorias imanen-
tes ao texto literário e que contribuem para a construção de
sentidos do texto.
4.3 Letramento literário
238
os alunos leem de forma isolada os textos literários indica-
dos pelo professor.
Os docentes deveriam ser leitores críticos, conhecer
os modos de se trabalhar as particularidades do texto literá-
rio, os conceitos de literatura, os procedimentos de análise
literária que promovem a construção de significados a fim de
que o letramento seja efetivamente concretizado respeitan-
do as especificidades desse tipo de texto: suas marcas lin-
guísticas, seus aspectos fonológicos, sintáticos e
semânticos, suas estratégias discursivas que remetem a de-
terminado momento histórico de produção e, sobretudo, seu
caráter ficcional. Para tanto, os professores devem mediar a
relação entre texto literário e discentes, considerando que a
teoria da literatura pode contribuir e facilitar essa interação.
E é apenas por intermédio do professor que essa teoria po-
de aliar-se à prática e contribuir para o aperfeiçoamento da
interpretação de textos literários pelos estudantes.
Para falar de letramento literário, as Orientações
Curriculares do Ensino Médio (2000, p.54) apoiam-se na
definição de letramento de Soares (2004, p. 47) “(...) letra-
mento é o estado ou condição de quem não apenas sabe ler
e escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais que
usam a escrita.” A partir desta definição, o documento afirma
que “podemos pensar em letramento literário como estado
ou condição de quem não apenas é capaz de ler poesia ou
drama, mas dele se apropria efetivamente por meio da ex-
periência estética, fruindo-o” (2000, p. 55).
O conceito de fruição está, aqui, relacionado à expe-
riência estética e não pode ser confundido com diversão ou
com atividade lúdica. O documento repete o conceito de
fruição encontrado no PCN (2002):
Desfrute (fruição): trata-se do aproveita-
mento satisfatório e prazeroso de obras
literárias, musicais, artísticas, de modo
239
geral bens culturais construídos pelas
diferentes linguagens, depreendendo
delas seu valor estético. Apreender a re-
presentação simbólica das experiências
humanas resulta da fruição dos bens
culturais. Podem propiciar aos alunos
momentos voluntários para que leiam
coletivamente uma obra literária, assis-
tam a um filme, leiam poemas de sua
autoria – de preferência fora do ambiente
da sala de aula: no pátio, na sala de ví-
deo, na biblioteca, no parque. (PCN+,
2002, p. 67 apud Orientações Curricula-
res, 2000, p. 59)
240
Apesar das críticas, pelos adeptos à leitura literária
fora do ambiente escolar, de acordo com os pressupostos
do autor (COSSON, 201 2), os livros não falam por si mes-
mos e é por isso que uma leitura feita na escola é diferente
de outra feita em casa, sem orientação. Ele defende que
grande parte dos mecanismos de interpretação acionados
durante a leitura são aprendidos na escola:
(...) Depois, a leitura literária que a esco-
la objetiva processar visa mais do que
simplesmente ao entretenimento que a
leitura de fruição proporciona. No ambi-
ente escolar, a literatura é um lócus de
conhecimento e, para que funcione co-
mo tal, convém ser explorada de manei-
ra adequada. A escola precisa ensinar o
aluno a fazer essa exploração. Por fim,
não se trata de cercear a leitura direta
das obras criando uma barreira entre
elas e o leitor. Ao contrário, o pressupos-
to básico é de que o aluno leia a obra in-
dividualmente, sem o que nada poderá
ser feito. (COSSON, 201 2, p. 27)
241
Interessa-nos, sobretudo, destacar as reflexões que
Cosson (201 2) nos traz a respeito da leitura acompanhada
por uma análise literária porque, a nosso ver, a teoria da li-
teratura exerce demasiada contribuição na apreensão dos
sentidos de um texto.
Entretanto, há diversas críticas em torno dessa
questão e o autor reflete sobre algumas delas, como, por
exemplo, o fato de, supostamente, a análise literária destruir
a beleza de um texto por desvelar seus mecanismos de
construção e argumentação, já que a simples contemplação
seria suficiente para a apreensão do sentido.
Cosson (201 2, p. 29) rebate esta crítica afirmando
que se a literatura for mantida em “adoração”, poderá tornar-
se inacessível ao leitor, já que ela não foi feita para ser ape-
nas contemplada, mas sim para ser explorada. O autor ain-
da afirma que a leitura literária deve ser aprendida, assim
como aprendemos outras coisas, pois “ninguém nasce sa-
bendo literatura”. Para ele, a análise literária é um processo
de comunicação com o leitor porque ele tem de explorar
num sentido amplo, o que torna possível a interação com to-
dos os seus elementos composicionais.
Importa-nos frisar o que diz o autor:
Longe de destruir a magia das obras, a
análise literária, quando bem realizada,
permite que o leitor compreenda melhor
essa magia e a penetre com mais inten-
sidade. O segredo maior da literatura é
justamente o envolvimento único que ela
nos proporciona num mundo feito de pa-
lavras. O conhecimento de como esse
mundo é articulado, como ele age sobre
nós, não eliminará seu poder, antes o
fortalecerá porque estará apoiado no co-
nhecimento que ilumina e não na escuri-
dão da ignorância. (COSSON, 201 2, p.
242
29)
243
análise. Elementos como as personagens, por exemplo, mo-
vimentam-se num tempo e num espaço construído por um
narrador, entidade igualmente construída pelo mundo ficcio-
nal do autor. Embora nem todos os textos se encaixem per-
feitamente nas estruturas teóricas propostas pelos
estruturalistas, acreditamos que uma análise literária que
parta de um aparato teórico consolidado permite ao leitor fu-
gir do senso comum, entender a literatura como campo de
conhecimento e como uma forma de reflexão da condição
humana, além de aperfeiçoar a interpretação textual.
Dentre as categorias que permitem reconhecer a or-
ganicidade e especificidade próprias do gênero narrativo,
destacamos neste trabalho os conceitos consolidados a
partir das contribuições do Formalismo Russo, do New Criti-
cism e do Estruturalismo, linhas teóricas que privilegiaram a
materialidade verbal do texto dentro dos estudos literários.
Dentre seus representantes, retomaremos os concei-
tos de personagem propostos por Forster (1 937 apud REIS
& LOPES, 1 988) e os de narrador propostos por Gérard Ge-
nette. Este estudioso, em “Fronteiras da narrativa”, define
narrativa como “a representação de um acontecimento ou
de uma série de acontecimentos, reais ou fictícios, por meio
da linguagem” (GENETTE, 1 972, p. 255). Ainda que o autor
considere a definição simplista, acrescenta que toda narrati-
va é uma imitação, um simulacro da realidade.
Os estudos sobre narrativa propostos pelo estrutura-
lista pretendem criar uma abordagem estável para as narra-
tivas, assim como o fizeram seus predecessores.
Interessa-nos, sobretudo, as reflexões teóricas contidas no
livro “Discurso da narrativa” (1 972), em que o autor distingue
história, discurso e narração e procura mostrar que as nar-
rativas apresentam uma estrutura básica comum que se
mantém, ainda que haja variedade temática. Além disso,
Genette não dissocia narrativa de descrição:
244
Toda narrativa comporta, com efeito,
embora intimamente misturados e em
proporções muito variáveis, de um lado
representações de ações e de aconteci-
mentos que constituem a narração pro-
priamente dita, e de outro lado
representações de objetos e persona-
gens, que são o fato daquilo que se de-
nomina hoje a descrição.” (GENETTE,
1 976, p. 262)
245
Em outra oportunidade, Rodrigo é convidado a co-
mer pipocas na casa de Tuca, mas o lanche também não dá
certo porque Rodrigo, ao subir o morro, encontra a mãe de
Tuca bêbada e as pipocas espalhadas pelo chão, sendo de-
voradas pelos irmãos menores de Tuca. Ao descer o morro,
após ter sido expulso, Rodrigo é empurrado por Tuca em
uma poça de lama, sujando-se todo, mas não compreende
tal atitude de revolta. A amizade rompe-se momentanea-
mente, mas nada além do tempo que o ambiente escolar le-
va para reaproximar os dois adolescentes.
Na construção literária, uma das categorias mais im-
portantes diz respeito às personagens centrais porque são
elas que vivenciam o conflito narrativo; portanto devem ser
observadas em relação às demais personagens e ao espa-
ço narrativo em que se inserem. No texto, interessa-nos
destacar o grau de densidade psicológica, tal qual proposto
por Forster (1 937 apud REIS & LOPES, 1 988), escritor e crí-
tico inglês do séc. XIX. Rodrigo pode ser caracterizado co-
mo uma personagem plana, marcada por um
comportamento estático e previsível, que permanece até o
final da narrativa; já a personagem Tuca é caracterizada co-
mo redonda porque tem atitudes imprevisíveis, que vão re-
velar-se aos poucos no decorrer da narrativa. Basta
observar a surpresa do leitor ao ver Rodrigo sendo empur-
rado na lama por Tuca no final da narrativa.
A categoria “espaço” mostra-se tão importante quan-
to a anterior e aparece realçada por descrições fundamen-
tais para o entendimento do universo narrativo de ambas as
personagens. A descrição da casa de Rodrigo condiz com o
comportamento, educação e cordialidade do menino rico,
bom aluno e bom amigo: (...)“ele nunca tinha pisado num
edifício daqueles: porteiro, tapete, espelho por todo lado,
elevador subindo macio, empregada abrindo a porta pra ele
entrar (...)” (NUNES, 1 996, p.32). O tapete persa, a empre-
246
gada, a geladeira cheia de guloseimas e o bife no almoço de
todos os dias denotam o ambiente de fartura em que Rodri-
go vivia. Já a favela, a família numerosa, o cheiro, a sujeira,
os empregos de Tuca, o alcoolismo, a falta de estrutura fa-
miliar e a pipoca denotam a precariedade de vida de Tuca e
da saúde de sua família. Ao subir o morro “(...) o Rodrigo ia
olhando cada barraco, cada criança, cada bicho, cada vira-
lata, porco, rato, olhando tudo o que se passava: bonito? es-
trela? cadê?! (NUNES, 1 996, p. 39). Em se tratando de am-
bientes, o único espaço comum compartilhado por dois
seres de classes sociais tão distintas é a escola que, neste
contexto, exerce a função democrática que lhe cabe.
A ação, entendida aqui como um processo de even-
tos singulares que podem ou não conduzir a um desenlace,
é permeada de tensão, sobretudo durante o almoço na casa
de Rodrigo e à visita ao morro na casa de Tuca. Se a ação
depende dos sujeitos, do tempo e das transformações que
vão possibilitar a passagem de um estado a outro, neste
conto ela cumpre seu papel, pois os sujeitos possibilitam as
transformações e mudanças de estado. Só o fato de um
aceitar passar o dia na casa do outro já denota a mudança
que a personagem sofrerá nesse encontro. Vale ressaltar
que, além da mudança física e espacial, há a mudança psi-
cológica, pois Tuca deixa transparecer o deslumbramento
sentido por ele ao adentrar na casa de Rodrigo. Este, por
sua vez, faz perceber o quão pouco conhecia de uma vida
dura e amarga ao subir o morro para visitar o amigo Tuca.
A categoria “tempo” por ter sido explorada a partir da
história, mostra um tempo linear, em que os acontecimentos
são narrados cronologicamente. Entendemos que o tempo é
cronológico porque há marcas temporais bem delimitadas,
como datas e horários. A narrativa tem a particularidade de
ser um gênero híbrido por inserir o gênero “carta” dentro da
narrativa, mas isso não nos impede de reconhecer que os
247
dois meninos – Tuca e Rodrigo – estão na quinta-série. A
maioria dos diálogos se passa na escola, mas a temporali-
dade é bem marcada: “(...) e no dia seguinte lá estava o Ro-
drigo outra vez explicando (...)” (NUNES, 1 996, p. 29, grifo
nosso). Já as cartas demonstram serem escritas a cada es-
paço de tempo que termina uma aula. Há uma espécie de
supressão da narrativa que conta a história de Tuca e Rodri-
go para dar lugar à carta escrita por Rodrigo a Guilherme, o
amigo que se mudou para o Rio Grande do Sul. Entretanto,
após essa supressão, a narrativa retorna ao curso normal,
sempre no espaço da sala de aula, narrando episódios se-
quenciais.
Já a categoria “narrador”, que pertence ao âmbito do
discurso, é organizadora da narrativa e exerce papel funda-
mental na narração da história. Identificar o narrador é es-
sencial para que se faça análise de textos narrativos,
considerando ser ele é uma entidade fictícia, diferente do
autor, que pode ser uma entidade real ou empírica. É ele
quem enuncia o discurso e protagoniza a comunicação nar-
rativa. Lemos o texto pelo seu olhar, por sua postura ética,
política, cultural e ideológica. Entretanto, devemos sempre
nos lembrar de que o narrador é um ser fictício, dono da voz
narrativa.
Genette (1 995) distingue três tipos de narradores:
autodiegético, homodiegético e heterodiegético. Neste conto,
o narrador é heterodiegético, pois narra em terceira pessoa
e não participa dos fatos. Procura manter-se neutro e, geral-
mente, coloca-se em um tempo posterior ao da história. Na
narrativa em questão, o narrador, além de heterodiegético,
mostra-se onisciente em relação aos fatos que narra: “(...) o
Tuca fez que sim, humm!! Que coisa mais gostosa era
aquela da tigela(...)” (NUNES, 1 996, p. 36). Nota-se, por
meio desse e de outros diálogos inseridos na narrativa es-
colhida para análise, que o narrador possui um conheci-
248
mento ilimitado dos sentimentos e sensações das persona-
gens. A construção desse tipo de narrador não é ingênua,
pois seu relato é capaz de sensibilizar o leitor, fazendo-o
participar de todas as sensações das personagens em rela-
ção à mudança de ambiente social vivida tanto por Tuca
quanto por Rodrigo.
6 Considerações finais
249
São Paulo: Contexto, 201 2.
GENETTE, Gérard. Discurso da narrativa . Trad. Fernando Ca-
bral Martins. Lisboa: Vega, 1 995.
______ . Fronteiras da narrativa. In: BARTHES, Roland et al.
Análise estrutural da narrativa . 2ed. Petrópolis: Vozes, 1 972.
250
artigo
Resumo
252
trado em Educação e, atualmente, retomada em pesquisa
de Doutorado. As metodologias de trabalho surgiram da tra-
jetória de interlocução da autora com os sujeitos da pesqui-
sa tendo como mediador o contato com a arte,
primeiramente como educadora em salas de aula de EJA,
em seguida como pesquisadora em encontros com profes-
soras da mesma modalidade de ensino e, num terceiro mo-
mento, como professora universitária com estudantes do
Curso de Pedagogia. Autores como Paulo Freire, Jorge Lar-
rosa, Foucault e Rancière fundamentam este trabalho. O tra-
balho será apresentado em forma de fragmentos, numa
tentativa de “cartografar” os dados apresentados, de acordo
com a proposta de Suely Rolnik (1 989), de
dar língua para afetos que pedem pas-
sagem, (...) se espera basicamente que
esteja mergulhado nas intensidades de
seu tempo e que, atento às linguagens
que encontra, devore as que lhe parece-
rem elementos possíveis para a compo-
sição das cartografias que se fazem
necessárias.
253
uma nova empreitada enquanto educadora. A escola já me
era conhecida, porém, sentia como se fosse um lugar novo,
devido ao horário diferente (1 6h às 22h) e às diferentes pes-
soas que estavam ao redor. A sala de aula até então para
mim, um lugar repleto de crianças e de barulho, estava dife-
rente, embora não menos alegre; a turma, mais silenciosa,
constituída por outros sujeitos. Sujeitos com idades varia-
das, bastante diferentes entre si, mas com olhares seme-
lhantes, com um objetivo em comum: “aprender a ler, a
escrever e a fazer contas”. Os motivos, diversos: ler a receita,
ler a Bíblia, o livro que ganhou de presente e “está lá, guar-
dado na gaveta”, escrever para os parentes distantes, “tirar
carta”, continuar no emprego, conseguir um emprego melhor,
ser alguém na vida... entre tantos outros, talvez não revela-
dos... As barreiras encontradas por eles também se asse-
melhavam bastante: o medo de errar, a “mão pesada”, a
dificuldade em “lembrar das coisas”, o “não enxergar”.
Em abril do mesmo ano, retornei à universidade, in-
gressando no Curso de Especialização em Alfabetização. Já
no momento da entrevista de seleção foi solicitada a defini-
ção de um tema de pesquisa para a monografia a ser apre-
sentada na conclusão. Não tive dúvidas quanto à resposta.
Queria pesquisar o que mais me instigava e inquietava no
momento: os educandos com os quais trabalhava. Queria
chamá-los a trazer para a discussão em sala de aula o que
sabiam, o que conheciam, o que vivenciavam. Iniciado o
curso, montei algo como um roteiro de trabalho, uma pro-
posta didático-metodológica a ser desenvolvida em um se-
mestre de aulas. Pensei na Arte como um caminho, talvez
devido às observações e aos relatos dos educandos, que
revelavam o quanto as imagens lhes eram significativas. Fal-
tava, no entanto, o referencial teórico. Em que autor funda-
mentar o trabalho? A resposta surgiu já na segunda aula da
disciplina Literatura Infantil: um Enfoque Histórico Didático,
254
ministrada pela profa. Dra. Maria Augusta H. W. Ribeiro, que
apresentou o texto de Paulo Freire, A importância do ato de
ler, como proposta de reflexão sobre a leitura e, desde esse
momento, aceitou orientar tal pesquisa. O texto, já lido em
algum momento de minha trajetória escolar, tomava outra
dimensão para mim. Antes lido superficialmente, o texto
agora se tornava uma experiência de leitura. A forma como
o autor relata sua leitura de mundo me encantou. Era isso o
que pretendia levar meus alunos a fazerem, ou seja, a revi-
verem suas leituras de mundo, tal como faz Paulo Freire,
lendo os “textos”, as “palavras” e as “letras” que existem em
seus mundos. Mundos repletos de cores, de imagens, de
músicas, de poesias...
Teve início meu primeiro momento de invenção. Or-
ganizei uma proposta com nove módulos de trabalho, cujos
eixos surgiram da seqüência que consegui apreender da lei-
tura de Paulo Freire: I - Quem sou eu?, II – Minha infância,
III - Presença ou ausência da experiência escolar, IV – Mi-
nha família, V – Minhas crenças, VI – Meus medos, VII -
Aprendizado com as pessoas, VIII – Eu e o trabalho, IX -
Como vejo a vida. A partir da definição de temas, fui em
busca do material de leitura que pudesse fazer parte de ca-
da tema, material formado por imagens (obras de arte), mú-
sicas e poesias. Elaborei também o planejamento das aulas,
fundamentado na metodologia proposta por Jolibert (1 994) e
na Metodologia Triangular, de Ana Mae Barbosa (1 991 ).
Portanto, ao iniciar o segundo semestre do mesmo
ano, agora com nova turma de alunos, já tinha tudo organi-
zado. Tinha início, naquele momento, uma nova experiência.
Da criação individual do trabalho, surge a criação coletiva,
junto com os educandos.
Neste processo, alguns relatos e situações vivencia-
das foram saltando aos olhos.
255
Lendo o mapa – travessias
256
Fico pensando na experiência desse rapaz, e na for-
ma como uma atividade tão simples e rotineira para mim,
comprar uma margarina, para ele se torna tão significativa.
Mais adiante, outro relato desse mesmo educando:
Eu trabalho numa firma que faz móveis
de aço. E eles sempre me dão um papel
com o desenho dos móveis com a medi-
da pra eu fazer igual. Outro dia eu bati o
olho no cantinho da folha e li escrito: es-
tante. Na hora eu fiquei impressionado, e
pensei assim: ‘Como foi que apareceu
aquele nome ali?’ Mas não é que apare-
ceu; eu é que não via, não enxergava.
Pra mim, antes, a palavra era só um ra-
bisquinho. Hoje não.
257
da. Num outro momento, no qual o grupo encontra-se discu-
tindo os medos, um dos colegas diz que tem medo de per-
der um amigo, ao que ela responde:
- Amigo? Nem nossa mãe é amiga...
(Aline)
- A mãe é a única amiga que a gente
tem. (Raimunda, 2005)
- Se ela fosse nossa amiga, ela colocava
a gente na escola. (Aline, 2005)
Em atividade que remete à infância,
também esse fato aparece:
- Não fala mais em infância que eu
tenho trauma... Infância? Nem sei o que
é isso... É que a minha infância foi muito
triste. (Aline, 2005).
259
ta”. O pessoal tirava sarro falando: ‘Oh! Sua analfabeta... ’”
Aline parece ter vencido a dor que sentia a cada vez
que lia aquele carimbo vermelho em seu documento. A pa-
lavra ali escrita ela conhecia bem, pois a sentia com sofri-
mento sobre si mesma. Em uma atividade final, em que foi
proposto que cada um encontrasse uma forma de represen-
tar a vida, Aline traz o desenho da escola, e conta: “[...] a
escola mudou a minha vida”. Pelo que se pode captar des-
ses relatos, a aluna demonstra ter entrado na escola de uma
forma e saído de outra. Como se tal experiência lhe tivesse
possibilitado modificar-se, reconstruir-se, inventar-se.
“Poemas que saem da gaveta”
260
EJA, ela resolve inscrevê-los em concursos literários e, com
isso, consegue sair do anonimato, tornando possível “dizer
sua palavra” ao mundo. Alguns poemas são ficcionais, ou-
tros, autobiográficos. Há aqueles que foram escritos em mo-
mentos difíceis, em que a autora passou por uma síndrome
do pânico, ficou viúva, perdeu amigos queridos. Outros são
homenagens a pessoas que a acompanham e incentivam –
filhos, professores, amigos. Ao mesmo tempo em que volta a
frequentar a escola, ela é também apresentada a diferentes
grupos de poetas, que criam espaços para trocar experiên-
cias e divulgar sua arte.
Conheci Ludimar no início daquele semestre e, como
havia previsto uma aula para trabalhar poesia, convidei-a
para uma participação nessa aula. No dia combinado, ela
levou uma sacola com seus poemas “enroladinhos”, como
que para presente e, nos momentos finais, foi à frente da
sala e declamou alguns deles, distribuindo seus “rolinhos”
aos colegas. Criou-se, dessa forma, uma relação em que
não existe mais alguém que ensina e alguém que aprende.
Em 2011 , convidei-a novamente para uma palestra
aos alunos iniciantes do curso e, por meio dela, pude ter
contato com um grupo de poetas do qual ela participava.
Muitos dos alunos, no primeiro semestre do curso de Peda-
gogia, tornaram-se participantes assíduos da atividade. Al-
guns, que num primeiro contato, frequentaram a roda
apenas como ouvintes, a fim de cumprir uma obrigação
acadêmica, para conseguir o certificado para as Atividades
Complementares exigidas pelo curso, passaram a voltar to-
dos os meses ao local, não mais como obrigação, mas co-
mo forma de encontrar prazer no contato com a leitura e a
escrita. Pouco depois, alguns, olhos brilhando, me procura-
vam após o período de aula, e me pediam para revisar poe-
mas que escreveram para ler na “roda”. Falas vão surgindo:
“Será que o português está correto?” “Vou ler para os poe-
261
tas. Não quero fazer feio...”
Vejo a educanda se transformar em educadora e a
forma como passa a compartilhar seus conhecimentos com
as pessoas à sua volta.
A viagem do conhecimento: escrita e poder
265
rial é da natureza do discurso. Ele se co-
munica como artista: um ser que crê que
seu pensamento é comunicável, sua
emoção, partilhável. (RANCIÈRE, 2002,
p. 73)
267
___________. (2002a). Notas sobre a experiência e o saber
de experiência. In: Revista Brasileira de Educação .
Jan/fev/mar/abr., 2002a.
_________. (2002b). Nietzsche e a educação . Belo Horizonte:
Autêntica, 2002b.
RANCIÈRE, J. O mestre ignorante – cinco lições sobre a eman-
cipação intelectual. Tradução de Lilian do Valle. Belo Hori-
zonte: Autêntica, 2002.
ROLNIK, S. Cartografia Sentimental, Transformações contem-
porâneas do desejo , Editora Estação Liberdade, São Paulo,
1 989.
268
artigo
Resumo
269
mática. Realizou-se um trabalho com o uso das novas Tec-
nologias da Informação e da Comunicação (TIC’s), com a
intenção de sanar os desafios no mundo virtual na EJA. Du-
rante o primeiro contrato com o Planeta Educação, partici-
pava apenas algumas salas da EJA e a sala do Mary Dota
era contemplada nessa Inclusão Digital. Os alunos desloca-
vam-se até o laboratório de Informática, em contrapartida, a
sala do Jardim da Grama, localizada no salão de uma igreja,
não participava do projeto devido à distância e a quantidade
de salas incluídas, mas a professora também buscava alter-
nativas para envolver os alunos nessa realidade do uso das
TICs. Devido ao interesse da turma dessa classe e no se-
gundo contrato, o Jardim da Grama passou a fazer parte
das aulas no laboratório de Informática e as professoras dos
dois bairros planejavam projetos para ter o intercâmbio das
salas utilizando a Internet e outros recursos tecnológicos. As
TIC’s se tornaram um diferencial no processo ensino-apren-
dizagem, como também inovou a elaboração de projetos, os
produtos finais e o fazer pedagógico do CEJA. Com esta ex-
periência, observou-se que a TIC’s não deve ser ignorada e
independentemente do local, nós professores, precisamos
inovar a prática pedagógica. A Educação escolar é um pro-
cesso intencional e sistematizado de trabalhado, o professor
deve ser a priori, o mediador entre o conhecimento e o alu-
no, para tanto, necessita propiciar a aprendizagem com sen-
tido e significado, e nesse aspecto os recursos tecnológicos
não devem ser ignorados, pelo contrário, deve-se utilizá-los
como diferenciais na aprendizagem evidenciando ao aluno o
quanto é imprescindível à apropriação desses recursos para
seu desenvolvimento, aprendizagem e participação social.
Palavras - chave: Inclusão Digital. CEJA. Recursos Tecnológi-
cos.
270
Introdução
271
no universo de seus alunos, pois atualmente a criança já
nasce em uma cultura em que se clicam como também jo-
vens, adultos e idosos se deparam com situações que os
“impulsionam” o saber clicar.
Formar para as novas tecnologias é formar julga-
mento, o senso crítico, o pensamento hipotético e dedutivo,
as faculdades de observação e de pesquisa, a imaginação,
a capacidade de memorizar e classificar, a leitura e análise
de textos e de imagens, a representação e redes, de proce-
dimentos e de estratégias de comunicação.
Por meio do projeto buscaram-se alternativas para en-
volver os alunos na nova era digital tentando solucionar os
desafios encontrados na realidade das salas envolvidas pa-
ra que propiciasse uma aprendizagem mais prazerosa aos
alunos do CEJA.
Vivemos em uma sociedade globalizada, onde a as
mídias tradicionais são presenças importantes em todos os
países desenvolvidos, sobretudo no mundo capitalista oci-
dental da qual fazemos parte, onde a globalização impõe a
todos a necessidade de informação que atinja cada dia mais
pessoas tanto em suas necessidades profissionais quanto
individuais. E para fazer parte deste admirável mundo novo
e tecnológico é preciso conhecimento e domínio e a Educa-
ção não pode ficar fora desse mundo admirável.
Referencial teórico
272
que se fundamenta a sociedade. Desta maneira, ao se enfa-
tizar na LDB o aspecto da tecnologia na formação básica do
cidadão, destacamos significativo o uso das Tecnologias da
Comunicação e da Informação (TIC’s) no mundo contempo-
râneo.
Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) se
encontram diversas indicações da importância das TIC’s di-
recionadas às primeiras séries do Ensino Fundamental.
“Apontar a necessidade do desenvolvimento de trabalhos
que contemplem o uso das tecnologias da comunicação e
da informação, para que todos, alunos e professores, pos-
sam delas se apropriar e participar, bem como de criticá-las
e/ou delas usufruir”. Dos objetivos do Ensino Fundamental:
“Saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos
tecnológicos para adquirir e construir conhecimentos”.
Nos princípios e fundamentos dos PCN’s, se desta-
ca: “Desde a construção dos primeiros computadores, novas
relações entre conhecimento e trabalho começaram a ser
delineados. Um de seus efeitos é a exigência de um reequa-
cionamento do papel da educação no mundo contemporâ-
neo, que coloca para a escola um horizonte mais amplo e
diversificado do que aquele que, até em poucas décadas
atrás, orientava a concepção e construção dos projetos edu-
cacionais. Não basta visar à capacitação dos estudantes pa-
ra futuras habilitações em termos das especializações
tradicionais, mas trata-se antes de ser colocada em vista a
formação dos estudantes em termos de sua capacitação
para a aquisição e o desenvolvimento de novas competênci-
as, em função de novos saberes que se produzem e de-
mandam um novo tipo de profissional, preparado para lidar
com as novas tecnologias e linguagens, capaz de responder
a novos ritmos e processos”.
Das orientações didáticas dos PCN’s: “É indiscutível
a necessidade crescente do uso de computadores pelos
273
alunos como instrumento de aprendizagem escolar, para
que possam estar atualizados em relação às novas tecnolo-
gias da informação, TIC’s e se instrumentalizarem tanto para
as demandas sociais presentes como as futuras.”
A Educação, como toda instância social, também ten-
de a, pouco a pouco, incorporar o uso das inovações tecno-
lógicas no seu cotidiano. Essa tendência pode ser entendida
como benéfica, se a referida incorporação ocorrer numa
perspectiva crítica e emancipadora, que situe os sujeitos so-
ciais envolvidos no bojo do processo educativo.
As diferentes mídias podem enriquecer o processo de
aprendizagem porque além de ser fator motivacional, há a
possibilidade de trabalharmos com diferentes códigos se-
mióticos (imagens, sons, animação, escrita...) os quais res-
paldam um pouco melhor os diferentes estilos de
aprendizagem do sujeito cognoscente. (entrevista Lucila
Maria Pesce. PUC- SP).
Objetivo geral
274
JA.
Desenvolvimento
275
com os alunos do bairro Jardim da Grama que não frequen-
tavam, por não haver um ambiente de Informática próximo
ao local e transporte.
Os professores programavam suas aulas para o la-
boratório. Elaboravam e adaptavam as atividades aos con-
teúdos curriculares para o computador utilizando os
programas já conhecidos para melhorar o acesso da inclu-
são digital e os recursos tecnológicos. As atividades eram
elaboradas e propiciadas de acordo com as necessidades,
interesse dos professores, plano de ensino e, principalmente
de acordo com a realidade da sala.
Nesse percurso tecnológico os alunos partícipes do
ambiente de Informática, conviveram com alguns softwares
e desenvolveram trabalhos desde confecção de cartões, di-
gitação das suas produções textuais no Microsoft Office
Word, exercícios contextualizados, resolução de situações
problemas dentro do Microsoft Office Excel; confeccionaram
portfolio das suas aprendizagens utilizando Microsoft Office
Power Pointer; pesquisaram na Internet mapas; localizaram
as ruas, bairro, cidade, estado, país a sua inserção com o
Planeta Terra; buscaram informações sobre rios, populações
da cidade, limites, entre outros. E os que não tinham acesso
ao ambiente a professora adaptava as atividades que eram
propostas nas oficinas, envolvendo os alunos realizando
textos coletivos, palavras geradoras, roda de diálogo e até
momentos do uso de notebook em sala de aula. No segun-
do contrato com a empresa Mstech, que permanece até os
dias atuais, a sala de aula passou a fazer parte do projeto
Inclusão Digital inovando tanto à prática pedagógica quanto
o ensino-aprendizagem dessa classe.
Com a participação das salas de aula desses bairros
no laboratório de Informática e com o uso dos recursos tec-
nológicos as aulas ficaram diversificadas, criativas, significa-
tivas e prazerosas. É claro que as professoras respeitavam
276
os alunos que não queriam participar desse projeto, mas
com o passar do tempo percebeu-se um envolvimento maior
da turma porque os que faziam parte do projeto os conquis-
tavam através de seus comentários de o quanto era praze-
roso e como é importante aprender e estar inserido no
mundo tecnológico. (Na fala dos alunos que utilizam o ter-
mo: _ “mexer no computador”).
Nesse sentido, Piaget cita: “O educador deixou de ser
aquele que ensina para transformar-se naquele que cria si-
tuações estimulando para descobertas”. Contudo, o profes-
sor é mediador no processo ensino-aprendizagem e precisa
buscar ações inovadoras e as TIC’s são preciosas ferramen-
tas que corroboram a importância de utilizar novas ferra-
mentas na prática pedagógica da EJA.
Durante o percurso dessa Inclusão Digital os recursos
tecnológicos são verdadeiros diferencias no ensino aprendi-
zagem e na prática pedagógica da Educação de Jovens e
Adultos.
Observando o desenvolvimento no processo ensino
aprendizagem dos alunos da EJA durante a trajetória nas
aulas de Informática notou-se que a princípio alguns apre-
sentavam certo receio e outros tinham certa resistência para
participarem do projeto, mas no decorrer dessa inclusão di-
gital foi aumentando o interesse e aumentando o número de
participantes e percebeu-se o quanto os alunos evoluíram,
pois conseguiram assimilar alguns conhecimentos na área
da Informática, resgataram sua autoestima, vencendo seus
medos e aprenderam prazerosamente e significativamente
os conteúdos desenvolvidos resultando em mútuo contenta-
mento entre professores/alunos/computador.
Na prática pedagógica os recursos tecnológicos favo-
receram na inovação, como por exemplo, em 2008 aconte-
ceu o I Concurso "Novos Caminhos para Aprendizagem",
que teve como tema: “Tecnologia e Educação”, contou com a
277
participação de vários professores. Os trabalhos foram ana-
lisados por uma banca de especialistas composta por pro-
fessores de diferentes instituições de Bauru. Foi neste
concurso que os portfolios das atividades desenvolvidos nas
salas, Jardim da Grama e Mary Dota, da unidade escolar
CEJA foram contemplados em primeiro e terceiro colocados.
Outro aspecto positivo ocorreu em 2009, a Secretaria
Municipal de Educação de Bauru dentro do seu Programa
de Formação Continuada oportunizou um encontro de pro-
fessores para demonstrar seus projetos como troca de ex-
periências. O encontro contou com a participação de
professores das diversas modalidades de ensino. A troca de
experiências proporcionou o conhecimento dos trabalhos e
projetos desenvolvidos na rede Municipal de Ensino de Bau-
ru tendo como objetivo promover a troca de experiências
bem sucedidas entre professores e diretores, bem como va-
lorizar e divulgar os trabalhos desenvolvidos nas unidades
escolares. Fazendo parte deste grupo, os professores do
CEJA socializaram o trabalho “A tecnologia na sala de aula
do CEJA”. Mostrando nesta socialização, a apropriação dos
recursos tecnológicos e o trabalho realizado pelos alunos do
CEJA, desde trabalhos manuais até os portfolios virtuais
que eles construíram no decorrer do projeto dentro do labo-
ratório de Informática.
Outro aspecto imprescindível a considerar dessa con-
tribuição dos recursos tecnológicos como diferenciais, são
os produtos finais dos diversos projetos realizados na EJA
como, por exemplo: “Imprensa escolar” com o produto final
Jornal da sala de aula do Jardim da Grama. Histórias de vi-
da, com produto final o livro “Histórias que os Jovens e Adul-
tos contam e escrevem”. “Receitas na EJA”, como produto
final o caderno de receitas impresso e digital disponibilizado
no portal da escola. “Conscientização sobre a problemática
da Dengue”, tendo como produto final os panfletos elabora-
278
dos e digitados pelos alunos e o filme realizado em ambien-
te de informática tendo os alunos como autores. A criação
dos e-mails e Blogs de cada classe, a criação do Portal da
unidade escolar, pela mediadora de Informática local, que
favorece a divulgação dos trabalhos pedagógicos das clas-
ses do CEJA.
Nesse contexto percebe-se que a cada dia a tecno-
logia está cada vez mais presente e a escola não pode ig-
norar isso, portanto é primordial fazer parte desse
revolucionário mundo tecnológico.
Conclusão
279
A humanidade, sempre procurou se aperfeiçoar, e is-
to aguça a criatividade, desperta o gênio inventivo, destaca
e tempera o caráter, a capacidade de resistência e adapta-
ção, da mesma forma, tem que se preparar para um novo
tempo e isto, podem ser incentivados pelo professor. As
constantes mudanças tecnológicas e a velocidade com que
a informação e a comunicação evoluem atualmente exigem
com que os professores utilizem Informática e outros meios
de comunicação, beneficiando sua prática pedagógica e
profissional.
Considerando que a constante atualização é pre-
mente neste mundo moderno se faz necessário, aulas pla-
nejadas e implementadas dentro de projetos para a
utilização das novas tecnologias no ensino educacional,
atendendo assim, ao contexto da escola promovendo a me-
lhoria do sistema de ensino de qualidade, propiciando um
contato mais próximo com utilização do computador nas ati-
vidades de ensino.
A familiarização dos alunos da EJA com o computa-
dor aconteceu por meio da apresentação do desenvolvimen-
to dos conteúdos e também dos programas educativos e
pesquisas, que desenvolveram o raciocínio lógico, a percep-
ção visual, espacial, a criticidade, coordenação motora, a
expressão, a escrita, a memorização e a concentração.
Muitas formas de ensinar hoje não se justificam mais. Perde-
se tempo em muitas aulas convencionais, mas o professor
pode mudar a forma de ensinar e de aprender. Um ensinar
mais compartilhado, orientado, coordenado, mas com a par-
ticipação dos alunos. Ensinar e aprender exige hoje muito
mais flexibilidade espaço temporal, pessoal e de grupo e a
tecnologia poderá ser uma ferramenta no trabalho educati-
vo.
Portanto, o avanço tecnológico exige, cada vez mais,
que nós, professores utilizemos a Tecnologia na Educação,
280
mas é preciso encontrar o equilíbrio perfeito entre Tecnolo-
gia e amor, só assim toda e qualquer prática educativa será
bem sucedida.
Por outro lado, toda Tecnologia existente no mundo
de nada irá nos adiantar se não colaborarmos na constru-
ção de uma civilização verdadeiramente humana onde o
respeito e o amor estejam acima de tudo.
Nós, professores, independentemente do local onde
estamos inseridos, devemos sempre buscar por ferramentas
que colaborem na aprendizagem dos alunos e jamais desis-
tir de acreditar na Educação.
“Aquilo que se vivencia é muito mais forte e tem efeitos mais
duradouros que aquilo que se ouve, no plano discursivo.”
Rubem Alves.
Referências
281
282
artigo
Resumo
284
Palavras chave: Educação de pessoas jovens e adultas. Edu-
cação ambiental. Emancipação.
Introdução
286
com enfoques diversos, voltados tanto para a indústria
quanto para o desenvolvimento social. A partir deste mo-
mento estudava sobre a temática ambiental e a educação
de pessoas jovens e adultas, e assim, através dos conceitos
que eram apresentados e das indagações que surgiam, o
processo dessa pesquisa era alimentado, incentivado; logo
o projeto de pesquisa com o intuito de aproximar a educa-
ção de pessoas jovens e adultas e a educação ambiental
tornou-se concreto.
Quem nunca ouviu a frase “tem que priorizar as cri-
anças, adulto não tem mais jeito”? Refletindo a respeito des-
sa frase, o desenvolvimento desse trabalho teórico busca
verificar de que modo a educação ambiental crítica pode
auxiliar na (re)construção de uma educação de pessoas jo-
vens e adultas que pretenda ser de fato transformadora e
emancipadora.
Estudos teóricos e empíricos apontam que a questão
socioambiental é um tema gerador o qual pode contribuir
para a construção de uma nova leitura, um novo olhar sobre
o mundo, particularmente sobre as relações entre os seres
humanos e entre estes e o ambiente em que vivemos.
A educação ambiental crítica incorpora “um olhar
crítico e uma atitude crítica, em um compromisso com a
preservação da vida, com a transformação social e com a
emancipação do ser humano”. (LOGAREZZI, 201 0, p. 1 )
A incorporação desta temática (socioambiental) no
processo educativo por esta perspectiva (crítica) implica
grande potencial de problematização da realidade social, o
que pode ser direcionado para motivação do universo de
pessoas jovens e adultas, apontando para possíveis melho-
rias na formação dos sujeitos no campo da educação de
pessoas jovens e adultas.
Assim, para nos guiarmos neste trabalho nos per-
guntamos de que modo a educação ambiental, por meio de
287
abordagens de temáticas socioambientais sob uma pers-
pectiva crítica, pode ser introduzida no processo de ensino e
aprendizagem da educação de pessoas jovens e adultas
com vistas a melhorar a formação dos seus sujeitos.
Diante desta questão, o objetivo do trabalho é discutir possi-
bilidades de contribuição da educação ambiental crítica ao
campo da educação de pessoas jovens e adultas.
Procedimento metodológico
288
pesquisa. Finalizada essa etapa, seguiu-se para uma leitura
crítica que possibilitou a sistematização e a síntese de infor-
mações, conceitos e idéias relevantes para o estudo.
Considerando os objetivos da pesquisa, essa dinâ-
mica de trabalho foi aplicada no desenvolvimento das temá-
ticas da educação ambiental, da educação de pessoas
jovens e adultas e, por fim, numa discussão a respeito do
potencial de interação entre esses dois campos. Focaliza-
mos inicialmente o campo da educação ambiental.
Educação Ambiental
289
onam a educação imersa na vida, na
história e nas questões urgentes de nos-
so tempo, a educação ambiental acres-
centa uma especificidade: compreender
as relações sociedade natureza e intervir
sobre os problemas e conflitos ambien-
tais. Neste sentido, o projeto político-pe-
dagógico de uma educação ambiental
crítica seria o de contribuir para uma
mudança de valores e atitudes, contri-
buindo para a formação de um sujeito
ecológico. Ou seja, um tipo de subjetivi-
dade orientada por sensibilidades soli-
dárias com o meio social e ambiental,
modelo para a formação de indivíduos e
grupos sociais capazes de identificar,
problematizar e agir em relação às
questões socioambientais, tendo como
horizonte uma ética preocupada com a
justiça ambiental. (CARVALHO, 2004, p.
7)
292
sente, de forma articulada, nos níveis e
modalidades da Educação Básica e da
Educação Superior, para isso devendo
as instituições de ensino promovê-la in-
tegradamente nos seus projetos institu-
cionais e pedagógicos.
Art. 8º A Educação Ambiental, respeitan-
do a autonomia da dinâmica escolar e
acadêmica, deve ser desenvolvida como
uma prática educativa integrada e inter-
disciplinar, contínua e permanente em
todas as fases, etapas, níveis e modali-
dades, não devendo, como regra, ser
implantada como disciplina ou compo-
nente curricular específico. (BRASIL,
201 2)
293
cam se educar nesse sistema.
Historicamente, na caracterização das/os educan-
das/os da educação de pessoas jovens e adultas, aparecem
os grupos marcados por processos de exclusão, como anal-
fabetas/os, educandas/os repetentes ou expulsas/os, infra-
toras/es, negras/os, moradoras/es da zona rural ou periferia,
entre outros grupos sociais oprimidos, os quais ouviram inú-
meras vezes que não sabem nada e que são incapazes de
aprender, conforme expõe Freire em sua obra Pedagogia do
oprimido:
de tanto ouvirem de si mesmos que são
incapazes, que não sabem de nada, que
não podem saber, que são enfermos, in-
dolentes, que não produzem em virtude
de tudo isto, terminam por se convencer
de sua “incapacidade”. Falam de si como
os que não sabem e do “doutor” como o
que sabe e a quem devem escutar. Os
critérios de saber que lhe são impostos
são os convencionais. (FREIRE, 201 0, p.
56)
296
cerca de 77% tinham curso superior, 22% concluíram ape-
nas o ensino médio e menos de 1 % havia cursado somente
o ensino fundamental.
Apesar da maioria dos docentes da educação de
pessoas jovens e adultas terem concluído licenciatura, tais
dados não refletem uma formação específica para essa mo-
dalidade. Segundo Di Pierro (2003), dos 1.306 cursos de pe-
dagogia em funcionamento no Brasil6, cerca de 1 % oferecia
habilitação em educação de pessoas jovens e adultas. A au-
tora também afirma que essa modalidade não é atrativa do
ponto de vista do mercado de trabalho, sendo raras as insti-
tuições de nível superior que oferecem uma formação espe-
cífica para a educação de pessoas jovens e adultas.
Ressaltamos também que a formação específica
nessa modalidade limita-se quase que exclusivamente aos
cursos de pedagogia, enquanto nas licenciaturas de cursos
como química, biologia, matemática, história, entre outros,
essa formação praticamente inexiste no currículo. A autora
também discorre sobre a problemática da infantilização da
educação de pessoas jovens e adultas devido à falta de es-
pecificidade na formação docente:
a ausência de políticas que articulem or-
ganicamente a educação de jovens e
adultos às redes públicas de ensino bá-
sico impede a formação de carreira es-
pecífica para educadores dessa
modalidade educativa. Com isso, os do-
centes que atuam com os jovens e adul-
tos são, em geral, os mesmos do ensino
regular. Ou eles tentam adaptar a meto-
dologia a este público específico, ou re-
produzem com os jovens e adultos a
mesma dinâmica de ensino-aprendiza-
297
gem que estabelecem com crianças e
adolescentes. (DI PIERRO, 2003, p. 1 7)
298
soas jovens e adultas para transgredir o modelo bancário e
compensatório, para que esta seja reconhecida como uma
educação ao longo da vida, em que todos os seus sujeitos e
toda a comunidade possam participar, dialogar, e possam
ser educandas/os e educadoras/es. A fim de estruturar e po-
tencializar a nova configuração da educação de pessoas jo-
vens e adultas, faz-se necessário que todas/os que já
compreendem a luta contra a opressão exijam do Estado
políticas públicas eficazes, articuladas e contínuas, as quais
garantam a qualidade nessa modalidade de ensino para que
seja um espaço de transformação.
Analisamos em seguida possíveis aproximações en-
tre a educação ambiental e a educação de pessoas jovens e
adultas, enquanto campos educacionais (de atuação profis-
sional) e enquanto áreas do conhecimento (de produção
acadêmica).
299
Nesse sentido, a educação ambiental pode compre-
ender aspectos relacionados à educação bancária, uma vez
que em alguns projetos das/os educadoras/es o processo
de ensino limita-se a um depósito de informações, como
exemplifica Sant’Ana:
estes processos são bem conhecidos
em comunidades que são visitadas por
educadoras/es ambientais e recebem
‘cartilhas’ de como separar os resíduos
domésticos, montar composteiras, plan-
tar árvores e jardins. A comunidade não
participa ativamente dos processos de
elaboração ou reflexão sobre a necessi-
dade destas informações e os sentidos
desses procedimentos, apenas receben-
do. (SANT’ANA, 2011 , p. 88)
301
as pessoas que se põem a dialogar so-
bre suas questões relevantes, problema-
tizando-as à procura de soluções
humanizadoras. (LOGAREZZI, 201 2, p.
1 65)
303
meio, o ambiente onde vivem e onde constroem os seus so-
nhos de futuro. Sem eles, não faremos a educação das cri-
anças e nem criaremos condições para que as crianças se
eduquem. (SORRENTINO et al., 2009, p. 1 04)
Ainda sobre essa perspectiva, concordamos com
Ireland (2007), que afirma a educação ambiental como uma
prática não excludente, a qual “não estabelece limites nem
de idade nem de qualquer outra categoria excludente. A teo-
ria e prática da educação ambiental são, por natureza e ne-
cessidade, inclusivas e abrangentes”. (IRELAND, 2007, p.
231 )
Pensando em como a educação ambiental crítica
somada à educação libertadora de Freire pode contribuir no
campo da educação de pessoas jovens e adultas, podemos
propor uma prática de educação ambiental que deva ser
construída para o contexto da educação de pessoas jovens
e adultas, tendo em vista a questão que guia esta pesquisa.
A proposta tem que caminhar para uma prática que
rompa com a tradição dominante/opressora de ensino e que
busque a interação entre conteúdos científicos da temática
ambiental e aspectos políticos e sociais da realidade dessas
pessoas jovens e adultas.
É preciso "organizar a escuta" das populações inse-
ridas na realidade a ser transformada. A escuta, nos trará
as "falas significativas" da população, explicitando suas
contradições e, portanto, os "temas geradores" de diálogo.
Assim, se não houver escuta, não haverá diálogo e nossa
ação se dará sobre ou para e não com ela. Consequente-
mente não haverá libertação, nem transformação da realida-
de. (SILVA, 2007, p. 11 )
Assim, podemos pensar na utilização de um tema
gerador, na perspectiva freiriana, para a construção dessa
prática.
A investigação do tema gerador, que se encontra
304
contido no ‘universo temático mínimo’ (os temas geradores
em interação), se realizada por meio de uma metodologia
conscientizadora, além de nos possibilitar sua apreensão,
insere ou começa a inserir as mulheres e os homens numa
forma crítica de pensarem seu mundo. (FREIRE, 2004, p.
11 2)
Freire defende que a utilização de um tema gerador
baseado tanto na experiência acumulada pela/o educanda/o
quanto em sua realidade seria um grande facilitador para a
realização de uma prática pedagógica de fato transformado-
ra:
por que não aproveitar a experiência que
têm os alunos de viver em áreas da ci-
dade descuidadas pelo poder público
para discutir, por exemplo a poluição dos
riachos e dos córregos e os baixos ní-
veis de bem-estar das populações, os li-
xões e os riscos que oferecem à saúde
das gentes. Por que não há lixões no co-
ração dos bairros ricos e mesmo pura-
mente remediados dos centros urbanos?
(FREIRE, 201 0, p. 30)
306
cação popular crítica. (SILVA, 2007, p.
1 5)
Considerações finais
307
igualitárias e sustentáveis.
O objetivo do trabalho foi desenvolver uma discussão
de como a educação ambiental crítica pode criar possibili-
dades no sentido de contribuir para o processo de ensino e
aprendizagem na educação de pessoas jovens e adultas.
Nesse sentido, esperamos que este estudo também tenha
fornecido elementos para repensarmos e questionarmos
nossas relações e desconstruirmos noções comumente di-
fundidas como “educanda/o deve receber conteúdos”, “a na-
tureza deve servir a sociedade” e “adulto não tem mais jeito”.
Com os históricos, os dados e as concepções teóri-
cas apresentadas/os nesta pesquisa, é possível afirmarmos
o grande potencial que a educação de pessoas jovens e
adultas e a educação ambiental crítica possuem para modi-
ficar as relações desiguais e as condições de opressão em
direção a um contexto de relações mais justas, dignas e
amorosas, as quais se dão no ambiente como um espaço
comum e de interesse social que precisa da participação in-
terativa de todas as pessoas para ser preservado.
Os resultados e as discussões desta pesquisa suge-
rem sua continuidade, através da ampliação e do aprofun-
damento dos estudos sobre a educação ambiental crítica,
sobre a educação de pessoas jovens e adultas e sobre as
possibilidades de aproximações/contribuições entre esses
dois campos e essas duas áreas, uma vez que a aprendiza-
gem é um processo contínuo para toda a vida... vida cada
vez mais experienciada – em suas diversas fases e nos vá-
rios cantos do planeta – em contextos em que a temática
ambiental tem sido cada vez mais relevante na sociedade
contemporânea, demandando uma abordagem crítica diante
do desafio da crise socioambiental instalada. Uma criticida-
de que sobretudo valorize os aspectos sociais na busca da
mudança ambiental, implicando assim o diálogo freiriano, o
uso da palavra verdadeira na compreensão e na ação trans-
308
formadoras da realidade social, que inclui a ambiental –
uma aliança naturalmente fundada e culturalmente recons-
truída (a cada momento e em cada lugar, a cada interação
entre seres humanos, as quais se dão também em meio a
interações da a natureza e com natureza).
Nesse sentido, esperamos que leituras deste texto
possam vir a ser elementos de enriquecimento da atuação,
sobretudo de educadoras/es, num e noutro campo de atua-
ção, particularmente nos contextos onde eles estão eviden-
temente entrelaçados e talvez necessitando de abordagens
mais integradoras, para as quais é importante uma produ-
ção acadêmica que articule também as duas áreas do co-
nhecimento, contribuindo para uma práxis educativa mais
articulada e mais potente.
Esperamos com isso ter fornecido alguns subsídios para a
perspectiva de que a educação ambiental crítica venha a
ocupar um espaço importante na educação de pessoas jo-
vens e adultas e contribuir assim na formação dos sujeitos
nela envolvidos.
Referências
309
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endereçamentos da educação ambiental. In: LAYRARQUES,
P. P. Identidades da educação ambiental brasileira . 1. ed. Brasí-
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311
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ção de jovens e adultos (EJA) do segundo segmento: suas rela-
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31 2
ção de pessoas jovens e adulta s. 2011. 70 f. Trabalho de Con-
clusão de Curso (Especialização) – Centro de Educação e
Ciências Humanas, Universidade Federal de São Carlos,
São Carlos, 2011.
31 3
31 4
artigo
Resumo
Introdução e Objetivos
31 8
Figura 1 : Localização da cidade de Rio Claro e vista aérea parcial.
O círculo azul indica os Bairros Bonsucesso e Novo Wenzel. Fon-
te: IBGE e GoogleMaps, 201 2.
321
dos que responderam ao questionário, apenas 5 são natu-
rais de Rio Claro-SP. Portanto, 86% dos entrevistados vive-
ram a experiência de migração (Figura 2).
322
Tabela 1 : Período escolar anterior dos educandos da EJA das es-
colas I e II
* Não respondeu
Organização: Ventura, 201 2.
323
quentado a escola e muitos frequentaram por um curto pe-
ríodo quando crianças ou adolescentes em mais de um mu-
nicípio do Brasil e até do exterior. Os principais motivos
apresentados para a interrupção dos estudos vão desde
questões relacionadas ao trabalho (maioria começou a tra-
balhar com menos de 1 5 anos) tendo, portanto, deixado de
frequentar a escola para trabalhar, questões relacionadas à
ausência de escola, a distância até elas e a migração. A in-
disciplina na sala de aula, preguiça, e preconceito também
foram citadas.
- “Não foi possível permanecer estudando porque tive que
ajudar meus pais no trabalho.”
- “Falta de oportunidade; porque meu pai não deixava es-
tudar”.
- “por que os meus filho era pequenos”.
- “Para a minha mãe poder trabalhar e eu cuidar da casa,
dos meus irmãos”
- “por que eu quis trabalha”
- “por que mudamos para otro7 país busca de melhora.”
- “Precisando trabalhar para minhas despesas, ajudar nas
despesas de casa e na lavoura.”
- “Trabalho, ajudar na renda da família.”
- “Bagunçava; 2 – Atrapalhava a professora.”
- “Mudamos para um lugar onde não tinha ônibus e a esco-
la era muito longe. [...]”.
- “Porque tinha que trabalhar na roça e o pai mudava muito
de sítio para trabalhar.”
- “por que não tinha escola”
- “Casei e engravidei e parei para cuidar de minha filha”
Quanto aos motivos da volta à escola ou ingresso,
predominaram os relacionados ao trabalho (necessário para
o exercício da atividade atual e perspectiva de um “emprego
324
melhor”) e à vontade de aprender. As informações levanta-
das nos questionários aplicados a educandos da EJA apon-
tam a relevância da temática migração, uma vez que é
inerente à condição de grande parte das pessoas.
As entrevistas revelaram os motivos da migração na
perspectiva do sujeito, que indicam a busca por serviços de
saúde e educação como motivos, a escrita de cartas como
meio de comunicação com familiares que não migraram e
as práticas de ler e escrever, conforme apresentado nos tre-
chos das entrevistas a seguir:
(...) eu mesmo vim [para Rio Claro] para fazer um
tratamento porque eu tava doente lá e meu menino tinha
problema no coração e lá não tinha condições de fazer o
tratamento dele. E eu vim para cá por causa disso. (A.,
Educanda de EJA)
(...) assim que eu cheguei aqui em Rio Claro, na-
quela época, telefone era muito difícil porque eu não tinha
condições de pagar um telefone fixo na minha casa. Então
a gente usava telefone público né, mas daí como minha
mãe via que na época, assim, (...)ela sempre dizia que o
tempo que eu ligava pra ela era muito longo, o espaço um
do outro pra mim falar com ela. Então ela não aguentava,
daí mandava os meus irmãos, porque minha mãe também
era analfabeta, né, coitada! Ela não sabia nem ler e nem
escrever, mas eu tenho irmão que sabe ler e escrever; en-
tão ela pedia, quando ela não pedia pra o meu irmão es-
crever pra mim, ela pedia ao vizinho ou a vizinha. Então eu
recebia carta da minha mãe sim. Enfim, agora pra dizer
que eu nunca escrevi carta para eles, eu me lembro que eu
escrevi duas cartas durante esse período que eu to aqui
em Rio Claro, mais era telefone mesmo, porque eu tinha
muita preguiça de escrever cartas. E na época eu não es-
325
crevia, porque eu aprendi a ler, porque escrever eu escre-
via errado. Eu não sabia escrever, eu achava que estava
escrevendo certo mais não era, estava errado. Hoje que eu
estou na escola eu vejo o quanto que eu escrevi errado,
mas naquela época quando eu entrei na escola eu já sabia
ler, mas eu aprendi sozinha lendo coisas na rua, lendo né.
Então tudo que eu olhava eu tentava juntar as letras, então
eu aprendi a ler, eu lia maravilhosamente bem, mais escre-
ver eu não escrevia bem. Eu escrevia tudo errado; então eu
achava melhor e eu tinha preguiça também de escrever
mesmo que eu escrevesse errado ou certo eu tinha pregui-
ça de escrever. (...) Foi muito difícil, mas o dinheiro também
faltava às vezes pra comprar o cartão ou às vezes pra ir no
telefone pra fazer as ligações; então isso era para mim era
a dificuldade que eu tinha às vezes de ligar, era quando eu
percebia ficava preocupada e mandava carta. (C., Educan-
da de EJA)
(...) Eu gosto muito de escrever sobre a vida, assim,
o cotidiano eu me baseio muito pelas minhas experiências,
entendeu! E eu gosto de ler livros que está relacionado a
isso, as coisas que acontecem no nosso dia a dia. (...) eu
me expresso melhor escrevendo do que falando. Na escrita
eu ponho todos meus pensamentos, minhas ideias, eu te-
nho todo meu sentimento ali. Papel pra mim é como se fos-
se um parte de mim. Como se eu tivesse assim, pondo
aquilo para fora, como se eu passasse aquilo ali pro meu
coração, entendeu! (M., Educanda de EJA)
Uma educanda aponta a migração como dificuldade
para frequentar a escola: “A vida do meu pai foi uma vida
que ele só viveu mudando, só mudando de um lugar pra
outro e isso que se tornava uma dificuldade pra gente estu-
dar. ” E a volta ou ingresso na escola foi apontado pelos en-
326
trevistados como muito relevante em suas vidas como se
verifica nos fragmentos das entrevistas que seguem:
(...) eu tenho mais conhecimento das coisas, eu não
me sinto conhecedora das coisas porque não estudei muito
tempo, mas conheço mais, tenho mais conhecimento. Nes-
se pouco tempo que eu estudei me serviu muito, porque eu
tirei habilitação e me ajudou muito, ante eu nem sabia o
que era gabarito, por que tinha estudado muito pouco tem-
po. (...) (A., Educanda de EJA)
Eu mudei muito como ser humano porque eu evolui
muito, porque eu era uma pessoa muito diferente do que eu
sou hoje. E educação transforma muito a gente. Você
quando você tem estudo, você vê o mundo de outra forma.
Você pega as coisa de uma maneira bem clara diferente
daquilo que você é acostumado a ver ou o que você pen-
sava que era (...) então é como eu falei, mudei muito, eu
sou outra pessoa por causa dos estudos, eu tenho muito a
agradecer assim, a todo meu conhecimento, minhas expe-
riências, meu sonhos que a volta aos estudos me trouxe
porque se não fosse isso, se eu não tivesse voltado aos es-
tudos eu não teria nada disso, essas emoções. (M., Edu-
canda de EJA)
Apontam-se, assim, elementos para um trabalho pe-
dagógico na EJA, que considere as experiências de seus
educandos, como apresentado, no caso do ensino de Geo-
grafia, por Resende (1 986). Nessa perspectiva, no dia 1 9 de
outubro de 201 2 foi realizada uma atividade coletiva em uma
turma do 9º ano do fundamental, em parceria com o profes-
sor de Ciências da turma. O objetivo da atividade era con-
versar um pouco sobre a experiência migrante de cada um.
Para tanto, conversamos sobre a importância de conhecer
327
os sujeitos que vivenciaram os processos, nesse caso espe-
cifico o sujeito que migrou e que se encontra em salas de
EJA. Exemplificamos utilizando um mapa de migração e re-
alizando a seguinte pergunta: No mapa o migrante é uma
seta, mas quem é o migrante? Por que migra? Procedeu-se
uma pequena apresentação dos educandos da turma que
falaram o nome e o lugar de origem e quanto tempo viviam
em Rio Claro.
Um dos educandos, morador mais antigo do bairro,
relatou as transformações ocorridas na cidade e o cresci-
mento do bairro. Outro vive em Rio Claro há dois anos, e
contou sobre os trabalhos que já realizou no campo e as di-
ficuldades de se morar neste ambiente. Colhia café no muni-
cípio em que nasceu. Para ele, é melhor o trabalho urbano:
“Ninguém quer ganhar salário mínimo para trabalhar no
campo”. Falou da necessidade de possuir a própria terra,
que ser dono é bem diferente de trabalhar para os outros,
citando exemplos de alguns familiares que não migraram
por possuírem terras. A partir dessa fala debateu-se a ques-
tão fundiária no Brasil.
Um educando nessa atividade também mencionou o
declínio da agricultura algodoeira, sendo o motivo, o mesmo
citado por uma educanda em outro sua entrevista, uma pra-
ga conhecida popularmente como “bicudo” que destruiu as
plantações.
Uma educanda oriunda de Minas Gerais contou que
um parente seu foi “tentar a sorte em Minas e perdeu toda a
lavoura. Foi para lá com divida e voltou com mais divida”.
Comentou que todos buscam uma vida melhor e que “nin-
guém quer ser pé vermelho” [ninguém gosta de ser traba-
lhador rural].
Quando interrogados do por quê migraram, as res-
postas foram: a busca por “melhorar” de vida, “a gente bus-
ca conforto”.
328
Um educando ainda cita outro município próximo,
Conchal - SP, que recebe migrantes temporários para a co-
lheita da laranja e comentou sobre as dificuldades da vida
no campo.
Alguns educandos mencionaram que o estado de
São Paulo é um estado rico e quando questionados do por
quê, a resposta chama bastante atenção, pois os educandos
vindos de áreas com períodos de secas atribuíram a uma
abundância de água no estado de São Paulo, respondendo:
“Acho que é por causa da água, aqui tem bastante”.
Ao final da atividade/diálogo, alguns relataram que a
conversa havia sido agradável e que abriu margem para
pensarem suas histórias de vida inseridas num contexto his-
tórico, econômico e social. O professor que participou da ati-
vidade escreveu um pequeno relato, segue um trecho de
sua escrita:
Mesmo que todos ali fossem de lugares distintos, se
encontravam nas falas uns dos outros, pois a experiência
vivida era de certa forma parecida. Enquanto isso eu me
perguntava: “Onde, em suas vidas, fica a aula de ciências
que eu havia pensado para hoje?”. Torna-se imprescindível
pensar a ciência como uma possibilidade de leitura com a
vida e não acima dela (Professor da EJA).
Considerações finais
329
ses sujeitos, cuja temática migração é inerente a eles. As-
sim, defende-se uma formação adequada para professores
atuarem na Educação de Pessoas Jovens e Adultas.
Referências bibliográficas
330
artigo
Resumo
331
alidade, possibilitando aos alunos a realização de inferênci-
as com o que já era conhecido.
Assim, com a base da pesquisa calcada no fortaleci-
mento das relações do grupo para que ocorra a socializa-
ção, compreendeu-se a importância da singularidade e da
observação das diferenças existentes em cada aluno, reco-
nhecendo as diferenças como algo natural e de suma im-
portância, pois de modo diferente todos contribuíram no
processo de ensino-aprendizagem e na construção de uma
educação voltada a todos participantes.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Doença
Mental. Alfabetização.
Introdução
332
modalidade da Educação Básica, esta passa pelos mesmos
problemas enfrentados.
Pessoas com deficiência e com algum tipo de doen-
ça mental que não se apropriaram das práticas letradas na
idade adequada e atingiram a idade adulta acabaram se au-
sentando dos espaços escolares. Tendo em vista que as po-
líticas públicas de atenção a pessoa com deficiência na
idade adulta pouco tem apresentado ações eficazes nos
municípios. Assim, um dos poucos espaços de socialização
que ainda cabem a essas pessoas restringe-se as salas de
EJA, as quais tem registrado um aumento considerável de
matrículas nas últimas décadas.
Segundo Oliveira (2001 ), o adulto já carrega consigo
um acúmulo de experiências, de vivências possibilitadas por
diversos grupos culturais e também suas reflexões acerca
do mundo, de outras pessoas e de si próprio.
Refletir sobre como esses jovens e adul-
tos pensam e aprendem envolve, por-
tanto, transitar pelo menos por três
campos que contribuem para a definição
de seu lugar social: a condição de “não-
crianças”, a condição de excluídos da es-
cola e a condição de membros de deter-
minados grupos culturais. (OLIVEIRA, p.
1 6, 2001.)
333
tização de jovens e adultos se embasaria nos conhecimen-
tos prévios que o aluno traz para dentro da sala de aula.
Diagnosticar o conhecimento prévio dos
aprendizes é uma das condições neces-
sárias para a eficiência dos processos
de ensino e aprendizagem. Em relação
aos alfabetizandos jovens e adultos,
além desse diagnóstico, seria importante
também pensar e responder questiona-
mentos como: Quem são esses aprendi-
zes? Como vivem, o que pensam, o que
fazem, por que resolveram voltar a estu-
dar, ou, quem sabe, iniciar seus estu-
dos? (SCHWARTZ, 201 0, p.63).
Objetivos
Metodologia
335
fundamental para a verificação do andamento e êxito da
pesquisa.
[...] a observação ocupa um lugar privile-
giado nas novas abordagens de pesqui-
sa educacional. Usada como principal
método de investigação ou associada a
outras técnicas de coleta, a observação
possibilita o contato pessoal e estreito do
pesquisador com o fenômeno pesquisa-
do, o que apresenta uma série de vanta-
gens. Em primeiro lugar, a experiência
direta é sem dúvida o melhor teste de
verificação da ocorrência de um determi-
nado fenômeno. (LUDKE e ANDRÉ,
1 988, p.26).
Resultados
337
O abrigo de idosos é uma Associação Beneficente Cristã
idealizada e fundada por Sebastião Paiva, em 01 de janeiro
de 1 946. Não possui fins lucrativos, sendo de cunho filantró-
pico integrando a Rede de Proteção Social da Política Naci-
onal de Assistência Social, por meio de atendimento aos
idosos sem vínculos familiares ou para aqueles que tiveram
seus direitos ameaçados ou violados.
No abrigo de idosos desenvolveu-se o trabalho em
uma sala pedagógica apropriada, que continha uma mesa
grande e confortável para os alunos, cerca de vinte assen-
tos, e também fácil acesso para os alunos que eram cadei-
rantes, pois o espaço era consideravelmente grande. A sala
possuía um grande armário só de materiais pedagógicos,
em que nele podia se encontrar lápis, giz, tintas, cadernos,
folhas sulfite, cartolina, apontador, corretivo, massinha, bexi-
gas e tantos outros materiais, que eram totalmente disponi-
bilizados pelo abrigo ou pela faculdade.
A maior dificuldade encontrada neste local consistiu
em dar continuidade no trabalho com alguns alunos. Como a
sala ficava em um local restrito para os abrigados, o acesso
se dava somente no dia em que era realizado o projeto, e
assim, alguns alunos que iam um dia faltavam em outro por
diversos motivos, seja por doença, falta de vontade ou tra-
balho na própria instituição. E mesmo indo todos os dias do
projeto de quarto em quarto chamando os interessados em
participar, algumas vezes iam quatro ou cinco alunos, tendo
em alguns dias no máximo dez alunos. Mas, também tinham
alunos que esperavam na porta, ansiosos pela aula, e mes-
mo chovendo ou fazendo frio estavam sempre presentes.
Na instituição eram fornecidos também jogos peda-
gógicos pertencentes à seção de psicologia, que eram total-
mente disponibilizados para o projeto, tendo os controles de
entrada e saída de cada jogo. Esses jogos geralmente eram
utilizados para iniciar a aula, pois muitos deles trabalhavam
338
a coordenação motora, sequências lógicas, raciocínio, criati-
vidade e ludicidade, além dos conteúdos que eram aborda-
dos através dos jogos. Assim define-se o lúdico como algo
essencial na aprendizagem não só de crianças, mas voltado
para todos, sendo o lúdico,
[...] um recurso metodológico capaz de
propiciar uma aprendizagem espontânea
e natural. Estimula a crítica, a criativida-
de, a sociabilização. Sendo, portanto re-
conhecidos como uma das atividades
mais significativas – senão a mais signi-
ficativa - pelo seu conteúdo pedagógico
social. (OLIVEIRA, 1 985 apud SALO-
MÃO; MARTINI; MARTINEZ, 2007, p.
02).
339
gulares em cada caso, e assim algumas das atividades fo-
ram diferenciadas, por exemplo, os jogos pedagógicos só
eram possíveis no abrigo, pois era difícil a retirada desses
jogos da instituição e também pela locomoção, já que uma
casa inclusiva se encontrava à 1 ,5 KM de distância.
A casa inclusiva das mulheres, localizada na Rua
Princesa Izabel, no Bairro Jardim Bela Vista, era outro local
de aplicação do trabalho, consistia em uma casa para dez
mulheres que antes eram moradoras do abrigo, sem esque-
cer que também possuíam doença mental. A casa não tinha
espaço apropriado para as aulas, e na cozinha tudo ficava
estreito e apertado. Existiam poucos materiais na casa, mas
a instituição se dispunha a levar o que era necessário. No
começo houve certa resistência perante as aulas, principal-
mente por a bolsista anterior ser muito querida por elas, mas
depois aos poucos foram cedendo, e no dia de aula, aguar-
davam ansiosas na área da casa pela minha chegada.
Havia também a casa masculina, localizada na Rua
José Bonifácio, em frente ao abrigo de idosos, em que nela
moravam dez homens, alguns deles trabalhavam no abrigo,
ou em supermercados, o que dificultou um pouco a reunião
de todos eles para a aula. Em geral, a aceitação das aulas
foi excelente, desde o primeiro dia gostaram das ativida-
des. Notou-se que facilitaria o trabalho de pesquisa se
trabalhássemos em pequenos projetos que em diferentes
momentos da aula eram aplicados, esses projetos classifi-
cou-se como universais, pois eram aplicados nos três locais
distintos, tendo o mesmo êxito e aceitação dos alunos. Os
projetos não interferiam nos estudos de conteúdo científico,
e muitas vezes reforçava o que estava sendo aplicado.
Assim, criaram-se os projetos de música, de conta-
ção de estórias, de panfletos e de cartões, e todos eles fo-
ram construídos mediante o auxílio dos alunos na
adequação dos conteúdos, e alguns desses projetos já es-
340
tavam sendo realizados por bolsistas anteriores, tendo so-
mente realizado pequenas modificações.
No abrigo de idosos, o projeto sobre música foi bem
aceito, e durante as aulas eram ouvidas músicas clássicas e
instrumentais, somente como som de fundo, para que ficas-
sem mais relaxados e confortáveis na sala de aula. Algumas
vezes as músicas eram poemas cantados, que estimulavam
os alunos, outras vezes eram músicas temáticas, como as
de festa junina, ou então sobre cantigas folclóricas.
A música como sempre esteve presente
na vidados seres humanos, ela também
sempre está presente na escola para dar
vida ao ambiente escolar e favorecer a
socialização dos alunos, além de des-
pertar neles o senso de criação e recre-
ação. (FARIA, 2004, p.24)
341
tífico sobre a seca no Nordeste.
As imagens também eram muito utilizadas juntamen-
te com outros conteúdos, eram imagens significativas e tam-
bém novas imagens eram criadas mediante a percepção de
cada um, por isso o trabalho com revistas, para recorte e
colagem era muito utilizado, pois as imagens eram vistas di-
ferentemente por cada aluno, então na maioria dos projetos
eles se retratavam por meio das imagens.
As pedagogias da visualidade formulam
conhecimentos e saberes que não são
ensinados e aprendidos explicitamente,
mas que existem, circulam, são aceitos e
produzem efeitos de sentido sobre as
pessoas. Entender as pedagogias da vi-
sualidade, dentro e fora das escolas, é
fundamental para que se compreenda
como estamos sendo regulados por elas,
como crianças, homens, mulheres de di-
ferentes contextos sociais e culturais es-
tão construindo suas identidades e
visões de mundo a partir de seus ensi-
namentos. (CUNHA, 2005, p.40)
342
tratava de uma estória que segundo ela acontecera em Belo
Horizonte, sobre um “gavião” muito esperto que roubou uma
mulher de dentro de sua própria casa. A estória contada ti-
nha muitos detalhes e todos pararam para ouvir. Após esse
dia foi decidido que em todas as aulas a bolsista contaria
uma estória e se eles quisessem contariam outra.
No abrigo de idosos a maioria das contações eram
parábolas, mas lendas e contos de fadas também foram
abordados. Certo dia, uma aluna que nunca participou em
todos os anos do projeto quis entrar, na aula disse que não
gostava de seu nome, que era Iracema, então foi improvisa-
do a contação sobre a estória de Iracema, de José de Alen-
car, em que a aluna ficou muito entusiasmada. A partir
desse dia Iracema sempre contava suas estórias e gostava
de ouvir outras, tendo sido um grande feito e uma bela vitó-
ria do projeto.
Geralmente, nas estórias buscava-se uma moralida-
de, algo que poderia ser discutido depois, com a opinião de
todos. Algumas das estórias utilizadas foram Aprende a Es-
crever na Areia, que é uma lenda oriental, As Estrelas do
Céu, São Jorge e o Dragão, O Pequeno Raio de Sol, A Len-
da da Concha, O Sapo e a Cobra, Os Quatro Amigos, fora
as músicas que eram estudadas como estórias e outras len-
das e fábulas pequenas.
Após a leitura era realizada uma roda de conversa a
respeito, por exemplo no conto As Estrelas do Céu, foram
estudados o sistema estelar, e os alunos lembraram do ho-
mem que pisou na lua, dos acontecimentos dessa época.
No conto de São Jorge e o Dragão lembraram-se da novela
Salve Jorge e contaram sobre a Capadócia, local dito por
eles que supostamente nasceu São Jorge, além as diversas
relações que faziam com outras recordações de suas vidas.
Na casa masculina, como alguns já sabiam ler e es-
crever, era realizada a produção de texto a partir do que era
343
lido, ou quem não conseguia escrever desenhava ou escre-
via uma palavra ou frase relacionada. Esse trabalho de pós
leitura foi muito interessante, alguns tinham medo de pegar
no lápis e desenhar, assim as estórias eram um incentivo a
mais para começarem a perder o medo, e escrever ou dese-
nhar.
A matemática também era abordada nos três locais,
sejam por meio de jogos, panfletos de mercados ou no estu-
do de números. O projeto sobre panfletos de supermercados
consistiu na realização de uma educação matemática volta-
da para o dia a dia deles, principalmente nas casas inclusi-
vas, pois agora com a ajuda das cuidadoras, estavam indo
para o supermercado, ajudar a fazer compras.
Tanto a matemática quanto a língua ma-
terna são estruturadas em sistemas de
representações que são elaborados com
base na realidade; dão significado e
conceito às coisas, aos objetos, às
ações bem como auxiliam no desenvol-
vimento das relações no contexto social.
Essas duas linguagens são, portanto,
necessárias à comunicação, pois a leitu-
ra, a escrita, a oralidade, a realização de
cálculos, o uso de símbolos contribuem
diretamente para a integração do indiví-
duo na sociedade. (MATOS; FAGUN-
DES, 201 0, p.79).
344
ta a quantidade representada no papel, por exemplo, se na
folha estava o número cinco, cinco produtos deveriam ser
recortados e colados na cesta.
Os numerais de 0 a 1 0 foram estudados, bem como
os preços, se caro, se barato, uma lista de supermercados
foi realizada com a ajuda dos panfletos, enfim foi trabalhado
de diversas maneiras, inclusive com o uso do jogo do di-
nheiro, que consiste em notas que representam as reias.
Além dos panfletos, na matemática foi realizado o jo-
go de bingo, inclusive com premiações, que no final foram
iguais para todos, sem distinção, o intuito era proporcionar
uma maior interação e relacionar o que tinha sido aprendido
nos numerais, a partir dos jogos, não só o de bingo, mas os
dominós de cálculos e dança das cadeiras.
O projeto que foi considerado o mais querido e visa-
do pelos alunos foi o projeto sobre cartões, que eram escri-
tos por eles, ou ajudados pela bolsista visando a entrega
para uma outra pessoa, que poderia ser da sala ou não,
mas geralmente eram destinados às psicólogas, enfermei-
ras, e os cuidadores em geral.
Este projeto foi uma continuidade de um projeto an-
terior já existente na instituição, e assim, os alunos inicial-
mente achavam que a aula era somente para fazer cartões,
mas com o tempo foi mostrado que existiam outros conteú-
dos, outras coisas que deveriam também ser aprendidas, os
cartões eram os momentos finais da aula, um momento de
descontração e troca de opinião, além do estímulo ao traba-
lho coletivo para se ajudarem na escolha das cores e dese-
nhos que enfeitariam os cartões.
No abrigo o projeto sobre cartões não fora muito uti-
lizado, não havia muito interesse nisso, sendo esporadica-
mente realizado. Nas casas masculina e feminina a
elaboração dos cartões eram aguardadas por todos, pois al-
gumas das mulheres namoravam alguns dos homens da ca-
345
sa masculina, assim faziam a troca de cartões e a bolsista
era encarregada de levar e entregar esses cartões aos des-
tinatários.
Na maior parte das vezes o cartão era escrito pela
bolsista e ditado pelos alunos, muitos deles não conheciam
o código escrito, mas os que sabiam escrever faziam os
seus. Mas, fazia-se questão que os alunos assinassem,
mesmo se não soubessem, seja com auxílio ou por meio de
cópia.
Acredita-se que os cartões deram resultado positivo,
pois os alunos viram uma finalidade para a leitura e escrita,
a comunicação entre eles. Quando recebiam um cartão
queriam compreender o que estava escrito ali, entender o
que aqueles signos representavam, sendo a justificativa de
aprender a necessidade de se comunicar.
Todo ato de pensar exige um sujeito que
pensa, um objeto pensado, que mediati-
za o primeiro sujeito do segundo, e a co-
municação entre ambos, que se dá
através de signos linguísticos. [...] O
mundo humano é, desta forma, um mun-
do de comunicação. (FREIRE, 1 983, p.
44)
346
baixa às vezes não queriam fazer algo, pois achavam que
iriam errar que não eram bons o bastante. Obviamente o
passado desses alunos refletia a todo momento no presen-
te, más lembranças de quando iam na escola, abandono, vi-
olência, problemas familiares, discriminação e tantas outras
dificuldades, principalmente por serem portadores de doen-
ça mental.
Há de se pensar que a educação de jovens e alunos
já carrega consigo um significado preconceituoso perante à
sociedade, são alunos excluídos dos padrões sociais consi-
derados ideais, e até mesmo a própria educação de jovens
e adultos é contraditória, pois ainda é comum observar prá-
ticas infantilizadas de professores, para uma educação que
é voltada para adultos.
Em alunos considerados excluídos, com uma baixa
autoestima, o trabalho transversal realizado para que o alu-
no desenvolva o autorrespeito, a autovalorização e autocon-
fiança são fundamentais nesse processo. Como os alunos
pesquisados possuem uma grande carência de quase tudo,
o afeto, o respeito, elogios, carinho, compreensão e atenção
são conceitos básicos para que o aluno compreenda a si
mesmo e o outro, tornando o processo de ensino-aprendiza-
gem mais humano e acolhedor para estas pessoas.
Tendo como base os valores que regem a constru-
ção da confiança do aluno, supõe-se que o ensino ocorreria
de maneira mais facilitada, em que o aluno, confiante de si,
tornaria o processo de letramento e alfabetização algo natu-
ral e necessário para seu cotidiano.
O letramento, segundo Soares (1 998), são as con-
sequências do ensinar e aprender as práticas sociais da lei-
tura e da escrita, é uma consequência adquirida em
decorrência da apropriação destas práticas, tornando-as
úteis para quem as obtém. Mas, a apropriação destas práti-
cas não garante que o aluno saiba ler e escrever, pois isso
347
seria adquirir a decodificação da língua escrita, e no caso, o
letramento é a obtenção do uso social da leitura e da escri-
ta.
[...] letramento é muito mais que alfabeti-
zação. [...] é um estado, uma condição: o
estado ou condição de quem interage
com diferentes portadores de leitura e de
escrita, com diferentes funções que a
leitura e a escrita desempenham na
nossa vida. Enfim: letramento é o estado
ou condição de quem se envolve nas
numerosas e variadas práticas sociais
de leitura e escrita. (SOARES, 1 998,
p.44).
Considerações finais
350
irá levar muita experiência e conhecimento adquirido medi-
ante tais práticas e do convívio com esses alunos.
Referências
351
SCHWARTZ, S. Alfabetização de Jovens e Adultos: Teoria e
Prática . Rio de Janeiro: Vozes, 201 0.
352
artigo
Resumo
Introdução
354
pessoas cada vez mais conscientes de si e do mundo em
que vivem.
O crescimento da população de idosos é um fenô-
meno mundial. Segundo projeções estatísticas, em 2050, a
população idosa será de 1 ,9 bilhão de pessoas montante
equivalente à população infantil de 0 a 1 4 anos de idade, ou
um quinto da população mundial. Os números mostram que,
atualmente, uma em cada dez pessoas tem 60 anos de ida-
de ou mais e, para 2050, estima-se que a relação será de
uma para cinco em todo o mundo, e de uma para três nos
países desenvolvidos (SAFONS, 201 2).
A expectativa é que os avanços científicos e tecnoló-
gicos permitirão ao ser humano ultrapassar cada vez mais a
faixa dos 1 00 anos de idade no presente século. O cenário
que se desenha é de profundas transformações sociais.
Tanto pelo aumento mundial proporcional do número de ido-
sos quanto em função do desenvolvimento da ciência e da
tecnologia.
Para um grupo cada vez mais consciente de si e dos
seus direitos, espera-se novas formas de se colocar na so-
ciedade ainda como um grupo produtivo, intelectualmente
capaz de buscar também novas aprendizagens e de ofere-
cer também ainda sua contribuição social. Para Paulo Freire,
o ser humano sempre levará em si a consciência de que
sempre terá muito a aprender, a conhecer sobre si, sobre os
outros e sobre o mundo, afinal:
“a consciência do mundo e a consciên-
cia de si inacabado necessariamente
inscrevem o ser consciente de sua in-
conclusão num permanente movimento
de busca. Na verdade, seria uma contra-
dição se, inacabado e consciente do ina-
cabamento, o ser humano não se
inserisse em tal movimento (FREIRE,
355
1 997, p. 20).
356
A impossibilidade de participação quase sempre tem
como uma de suas principais causas, a ausência da apren-
dizagem do uso das novas tecnologias e, em especial, o uso
de computadores e internet. Portanto, o oferecimento de
ações que promovam a superação da exclusão digital, na
forma de cursos de informática, que eduquem e preparem
pessoas para terem condições de atuar na sociedade mo-
derna, que propõe o uso intensivo de computadores em to-
dos os seus segmentos, é de grande importância.
No ano de 1 993, o Campus Universitário de Rondo-
nópolis da Universidade Federal de Mato Grosso adotou ofi-
cialmente o Programa Universidade Aberta da Terceira
Idade, caracterizado como programa de extensão. Em 1 4 de
maio de 1 999 foi inaugurado o espaço destinado ao funcio-
namento permanente do Programa UATI, denominado Cen-
tro de Apoio ao Idoso. Neste mesmo ano, foi criado e
aprovado pela Pro Reitoria/UFMT o NEATI - Núcleo de Estu-
dos e Atividades da Terceira Idade com Regimento próprio,
no qual está inserido o Programa UATI e demais projetos
atinentes às questões das pessoas com idade a partir de 45
anos (ARAUJO, 2011 ).
O programa foi estruturado e desenvolvido desde
sua implantação com propósito de oportunizar aos seus alu-
nos uma compreensão adequada do processo de “envelhe-
cimento” tanto do ponto de vista físico quanto psicológico,
além de permitir uma visão atualizada dos fenômenos soci-
ais. Busca-se o contato dos educandos da terceira idade
com profissionais diversos, com jovens universitários e com
pessoas de distinta formação social, possibilita novos olha-
res para o mundo e suas relações sociais. Além disso, as
turmas de alunos também são constituídas por pessoas de
diferentes locais do município e níveis socioeconômicos,
que agregam pessoas não alfabetizadas e letradas, diferen-
tes classes sociais e faixa etária compreendendo de 45 a 80
357
anos ou mais, sem distinção de raça ou credo.
Compreendemos, assim como afirma Goldman
(2001 ), que as atividades e programas de extensão, articu-
ladas às pesquisas e ao ensino na universidade, pode se
constituir um canal importante no debate e na ação do res-
gate da cidadania do idoso, tão ameaçada nessa conjuntura
sob o impacto da globalização e que tende a excluir os mais
vulneráveis do processo produtivo, entre os quais se situam
as pessoas da terceira idade.
Entendemos que em meio ao grande desafio de no-
vas aprendizagens da modernidade, as pessoas na terceira
idade estão dispostas a enfrentar o desafio de aprender.
Nessa direção foi elaborado e colocado em execução o pro-
jeto de extensão “Inclusão Digital Dialógica na Terceira Ida-
de do NEATI - UFMT”, tendo como objetivo atuar na
formação de pessoas, em especial o público de terceira ida-
de, para o uso efetivo de recursos tecnológicos digitais, tais
como operações básicas de um sistema operacional de
computadores, ferramentas de acesso à internet e de envio
e recebimento de mensagens, bem como operacionalização
e uso efetivo de editor de texto, planilha e software de apre-
sentação. Em seu segundo ano de oferecimento na UFMT
Rondonópolis, o projeto encontra-se vinculado ao programa
de extensão Formação Básica em Computação, que tam-
bém propõe ações de formação em informática para jovens
de escolas públicas, focando também a formação em lin-
guagens de programação.
Metodologia
358
metodológico sobre a perspectiva da Aprendizagem Dialógi-
ca. A aprendizagem dialógica tem um dos principais pilares
a dialogicidade de Paulo Freire (2003), nos argumentos deli-
neados por sua importante contribuição no letramento como
forma de transformação social.
O conceito Aprendizagem Dialógica surgiu do resul-
tado de muitos estudos e práticas investigativas no Centro
Especial de Investigação em Teorias e Práticas Superadoras
de Desigualdades (CREA, 201 2), na Universidade de Barce-
lona (Espanha). Este conceito está presente na abordagem
dialógica e diz respeito a uma forma de conceber a aprendi-
zagem, que tem por objetivo estudar as transformações so-
ciais e culturais e garantir uma educação de qualidade e
igualitária para todas as pessoas frente aos desafios encon-
trados na sociedade atual.
O conceito de Aprendizagem Dialógica, bem como
Comunidades de Aprendizagem e de suas práticas criado
pelo CREA, tem sido pesquisado e desenvolvido por meio
de diversas investigações, leituras e debates. O enfoque
destas investigações tem a preocupação e o cuidado de de-
senvolver uma metodologia de pesquisa participativa, na
qual a manifestação que as pessoas têm em seus contextos
habituais da vida cotidiana seja igualmente valorizada no
espaço escolar (ELBOJ et al., 2002).
O conceito de Aprendizagem Dialógica (FLECHA,
2007) se apresenta estruturado por sete princípios funda-
mentais, são eles: 1 º diálogo igualitário; 2º inteligência cultu-
ral; 3º transformação; 4º dimensão instrumental; 5º criação
de sentido; 6º solidariedade; 7º igualdade de diferenças.
O diálogo igualitário é considerado um instrumento
de aprendizagem amplamente reconhecido. Ele está em sin-
tonia com a ação comunicativa, proposta por Jürgen Haber-
mas. Neste tipo de ação cada pessoa faz suas próprias
contribuições ao diálogo. As falas não são classificadas co-
359
mo melhores ou piores, mas apreciadas como diferentes.
Esse princípio confere à atividade educativa uma nova ma-
neira de estabelecer-se: o que vale a partir deste modelo é a
força que tem cada argumento e não o poder que ocupa a
pessoa que o apresenta.
O princípio da Criação de Sentido insere-se no con-
texto da sociedade atual, que favorece e alimenta o individu-
alismo e isso contribui para que muitas pessoas percam o
sentido de suas vidas.
Com relação à Inteligência Cultural, Flecha (1 997)
destaca o fato de que todas as pessoas têm as mesmas ca-
pacidades para participar em um diálogo igualitário, tendo
em vista que cada uma carrega em si uma bagagem de
aprendizagens culturais de forma que possa demonstrar es-
sas capacidades em ambientes distintos.
A Dimensão Instrumental apresenta-se na aprendi-
zagem, por meio do diálogo, de conhecimentos acadêmicos
e instrumentais, pois a aprendizagem dialógica inclui todos
os conhecimentos que são necessários para a sobrevivên-
cia na sociedade atual. Esse é o caso da aprendizagem da
tecnologia dos computadores na sociedade moderna.
A Igualdade de Diferenças é um princípio da apren-
dizagem dialógica que indica que a verdadeira igualdade in-
clui o mesmo direito que cada pessoa tem de ser e viver de
forma diferente. Por isso, todas as pessoas que participam
do diálogo têm o igual direito de ser diferentes.
A Solidariedade é um princípio que precisa ser esti-
mulado e construído. Assim como ficamos mais individualis-
tas frente ao contexto, também vamos aprendendo a ser
menos humanos e menos solidários, pois a sociedade “se-
leciona” os melhores e exclui o resto das pessoas.
Por último, o princípio da Transformação. A Aprendi-
zagem Dialógica transforma a relação entre as pessoas e o
seu entorno. A maneira de aprender gerada a partir do diá-
360
logo igualitário acaba por transformar as pessoas e o con-
ceito que têm de si mesmas e das instituições em que vi-
vem. A escola e suas relações, nesta perspectiva, também
passam a ser transformadoras.
A prática educativa com vistas à construção da cida-
dania por meio da informática, baseada na dialogicidade e
no processo de construção de autonomia por meio do aces-
so a formas de leitura do mundo, é também uma metodolo-
gia aplicada e desenvolvida pela Rede CDI, já é reconhecida
mundialmente. O método também se baseia nos conceitos
de dialogicidade de Paulo Freire, que acreditava que a edu-
cação, e em especial, o letramento, deveria ser usada como
ferramenta para a mudança social e a formação cidadã.
Pela relevância e contribuições à educação com vis-
tas à superação e promoção social, entende-se que os prin-
cípios da aprendizagem dialógica complementam a proposta
da rede CDI e caminham na direção de uma proposta meto-
dológica adequada para cursos de inclusão digital.
O curso de inclusão digital está sendo oferecido em
um período de oito meses de 201 2, de maio a dezembro,
para duas turmas, uma vez por semana, sendo duas delas
na UFMT, campus de Rondonópolis Cada turma tem em
média 25 alunos e cada aula tem 2:00 horas de duração por
semana. O curso conta com dois educadores bolsistas do
projeto de extensão, dois educadores estagiários do curso
de Licenciatura em Informática e dois alunos voluntários dos
cursos de Licenciatura em Informática e Sistemas de Infor-
mação.
Nos primeiros encontros, educadores e educandos
construíram combinados de comportamentos em espaço de
sala de aula, pautados nos princípios da Aprendizagem Dia-
lógica. Seguindo os princípios da Aprendizagem Dialógica,
combinamos que não haveria necessidade de consenso em
nenhum dos assuntos discutidos e cada um era livre para
361
participar, desde que todas as opiniões deveriam ser respei-
tadas.
A metodologia de realização das aulas prevê quatro
momentos de aula: 1 º. – Acolhida e Roda de Conversa, 2º. –
Primeiro Tempo, breve intervalo, 3º. – Segundo Tempo, e 4º.
– Avaliação.
Os encontros começam sempre com uma acolhida
pelos educandos e o início dos trabalhos com uma roda de
conversa. Na roda todos os educandos deveriam poder se
olhar e ouvir os outros. Uma questão geradora é apresenta-
da para a discussão entre os participantes. Os educadores
são sempre os últimos a se pronunciarem.
As questões têm como objetivo levar os educandos à
reflexão sobre identidade social, problemas e demandas da
comunidade, caminhos para a cidadania, sempre que possí-
vel relacionando a informática como instrumento para po-
tencializar a transformação social.
A partir da roda de conversa inicia-se a aprendiza-
gem de informática. O primeiro momento é realizado no
contexto da Internet. São apresentados sites relacionados
aos assuntos levantados na roda de conversa.
No segundo momento da aula os alunos utilizam
editores de texto, planilhas eletrônicas ou software de apre-
sentação. A cada aula, uma série de ferramentas de forma-
tação e edição de textos é apresentada. Muitas vezes, os
textos produzidos são as respostas à questão geradora da
roda de conversa. Os textos produzidos são formatados e
salvos. Planilhas eletrônicas são utilizadas para computar
cálculos de orçamentos familiares, controles financeiros, etc.
A aprendizagem dos conteúdos é reforçada por meio da re-
petição dos processos, ao mesmo tempo em que o conheci-
mento sobre os conceitos estudados avança.
Ao final do projeto, um questionário avaliativo envol-
vendo questões relacionadas ao projeto, aos educadores,
362
aos conteúdos e aos educandos foi aplicado aos educado-
res e aos educandos.
Desenvolvimento
363
versa.
Segundo o relato dos educadores, as alunas da ter-
ceira idade vibram quando se lembram de conteúdos das
aulas passadas, quando conseguem fazer o que é pedido,
quando as dúvidas são solucionadas. Sempre no final das
aulas elas agradecem e dizem o quanto é importante para
elas estarem aprendendo informática.
O projeto também ofereceu a formação e a oportuni-
dade de iniciação à docência dos alunos do câmpus. Ao es-
timular a docência, articulam-se conhecimentos prévios a
novos conhecimentos de informática, reforçando conteúdos
já estudados em suas formações acadêmicas a novos con-
teúdos. Ao entrar em contato com o trabalho docente, bus-
cou-se também despertar nos alunos educadores a
aprendizagem profissional, a solidariedade e a cidadania.
“Ao mesmo tempo em que ensinamos computação para
elas, elas nos devolvem conhecimento de vida, por esse
motivo é realmente uma experiência única”, afirma uma das
educadoras.
Todas as senhoras tratam os educadores de forma
muito educada e carinhosa, como se tratassem um neto ou
alguém da família, afirmam os educadores. Além disso, o
exercício da cidadania é percebido também como instru-
mento de criação de sentido nos educadores, durante o
exercício da docência no curso, revelando-se na seguinte fa-
la:
Trabalhar com idosos a princípio parece
algo chato, algo que irá girar ao redor do
tédio, porém a realidade é bem diferente,
a verdade é que é uma experiência dife-
rente de qualquer outra. Elas são alunas
e ao mesmo tempo parecem uns paren-
tes distantes e elas acabaram adotando
364
a gente. Elas conversam sobre a família,
contam novidades, querem saber a res-
peito de como é sua família, como está a
faculdade, levam balinhas, dão lembran-
cinhas, convidam para ir a igreja delas,
acabamos nos sentindo realmente parte
de uma família. Com o passar do tempo
cada vitória delas acaba se tornando
uma vitória nossa também e isso é muito
gratificante. Ao mesmo tempo em que
ensinamos computação para elas, elas
nos devolvem conhecimento de vida, por
esse motivo é realmente uma experiên-
cia única. (B.A.)
365
relato dos educadores,
A preparação do material é detalhada e muitas vezes, exaustiva,
pois tem que explicar tudo de forma mais detalhada possível para
que haja a menor quantidade de dúvidas possíveis. Ao mesmo
tempo é gratificante saber que esse material irá ajudar muitos ido-
sos a caminharem de forma mais amigável com a tecnologia, afir-
ma os educadores. (B. A.)
Conclusão
366
Finalmente, a proposta da contextualização perma-
nente entre informática, sociedade e cidadania, relacionan-
do o importante papel da informática, com vistas ao acesso
à informação e instrumentalização para a vida adulta foi o
instrumento principal para a criação de sentido para os edu-
candos permanecerem no curso, avaliaram os educadores.
Referências
367
prática educativa . São Paulo, Brasil: Paz e Terra (Colecção
Leitura), 1 997.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido . 36ª. Ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 2003.
GOLDMAN, Sára Nigri. Universidade para a terceira idade:
uma lição de cidadania. Textos Envelhecimento, Rio de Janei-
ro, v. 3, n. 5, 2001 . Disponível em: <http://revista.una-
ti.uerj.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1 51 7-59282001 0
001 00002&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 1 8/07/201 2.
MOREIRA, A. A.; SALVAT, B. G; GARCÍA-QUISMONDO, M.
Á. M. Alfabetizaciones Y Tecnologías de la Información y la Co-
municación . 1 ª. Ed. Madrid: Síntesis, 2008.
368
artigo
Resumo
369
princípio educativo e pesquisa como princípio pedagógico,
que em última análise voltam-se `a formação integral dos
estudantes, considerados em sua totalidade, como sujeitos
que têm direito `a práxis.
Introdução
370
Breve panorama das iniciativas governamentais na EJA da déca-
da de 80 ao PROEJA
371
mente, para acesso da população de 7 a 1 4 anos ao Ensino
Fundamental.
Apenas a partir do final dos anos 90, foram criados
programas voltados à EJA, sendo destacados por Di Pierro
e Graciano (2003): o Programa Alfabetização Solidária
(PAS); o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrá-
ria (PRONERA); o Programa Alfabetizando em Parceria –
Movimento de Educação de Base – (MEB) e o Plano Nacio-
nal de Qualificação Profissional (PLANFOR). Tais progra-
mas, ligados a diferentes ministérios, revelavam a falta de
um planejamento estratégico por parte do governo Fernando
Henrique Cardoso (FHC) para atender às demandas da
EJA. Cada programa era responsável por organizar sua pró-
pria metodologia, materiais didáticos e formação de profes-
sores. Houve uma pulverização de iniciativas do poder
público, articuladas com a sociedade civil organizada, com
as universidades, as igrejas e os sindicatos. Quanto às dire-
trizes curriculares, foram organizadas a proposta curricular
do primeiro segmento (BRASIL/MEC/SEF, 1 996) e, posteri-
ormente, as propostas curriculares para o segundo segmen-
to, (BRASIL/MEC/SEF, 2002). Os documentos trouxeram
contribuições na perspectiva explicitar parâmetros curricula-
res para a modalidade de ensino, mas não construídos a
partir de ampla participação dos sujeitos envolvidos na EJA.
Uma marca negativa do período foi o veto presidencial para
que se contabilizasse as matrículas da EJA no Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
de Valorização do Magistério (FUNDEF), o que explicitava o
lugar que a EJA, efetivamente, ocupava na pauta do gover-
no federal FHC.
O PAS criado em 1 997, para o atendimento de esta-
dos e municípios com maiores taxas de analfabetismo e
menores índices de desenvolvimento humano, localizados
no Nordeste e Norte do Brasil, posteriormente, foi estendido
372
a áreas metropolitanas do país. As parcerias estabelecidas
com universidades foram reconhecidas como positividade
do programa na auditoria realizada pelo Tribunal de Contas
da União (TCU) em 2003, mas não a logística das mesmas,
devido às distâncias entre universidades e municípios aten-
didos, o que ocasionava acréscimo desnecessário aos cus-
tos do PAS (AÇÃO EDUCATIVA, 2003). Outras críticas
encontram-se relacionadas à integração do programa à polí-
tica nacional de jovens e adultos, ao curto período de dura-
ção dos cursos e à falta de oportunidade de continuação
dos estudos, o que inviabiliza a efetiva alfabetização dos en-
volvidos. Outro elemento apurado pelo TCU é que, em mui-
tas situações, os alfabetizandos se rematriculavam no
programa para buscar a consolidação do processo de alfa-
betização, o que traz um complicador no momento da con-
tabilização do público atendido (AÇÃO EDUCATIVA, 2003).
Tais erros são cometidos pelas políticas de EJA que assu-
mem caráter de campanha e não desenham a continuidade
da iniciativa em termos de inclusão dos educandos no siste-
ma educacional formal. Em 2011 , a organização não gover-
namental Alfabetização Solidária, a Alfasol, que dá
continuidade à iniciativas do PAS, prossegue firmando con-
vênios, inclusive, com o Programa Brasil Alfabetizado. Se-
gundo dados publicados no site oficial da organização,
foram atendidos, em seus treze anos de existência, 5,5 mi-
lhões de pessoas (ALFASOL, 2011 ), o que não significa que
tal contingente de tenha sido alfabetizado, dado o aligeira-
mento da proposta curricular.
O PRONERA, criado em 1 998, encontra-se voltado
à alfabetização de jovens e adultos, à habilitação de técni-
cos e à formação de professores inseridos na realidade do
campo. Coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento
Agrário, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Re-
forma Agrária (INCRA), tal programa tem sido implementado
373
em parceria com universidades e movimentos sociais do
campo. De 1 999 a 2002, foram matriculados nas atividades
de EJA do PRONERA promovidas pelo programa: 26.547
jovens e adultos não alfabetizados, com uma média de
61 ,76% de educandos que concluíram o processo de alfa-
betização (DI PIERRO; GRACIANO, 2003). No período de
2003 a 2009, foram atendidos pelo PRONERA 309.774 edu-
candos nesse mesmo segmento (BRASIL, MIN. DO DE-
SENVOLVIMENTO AGRÁRIO/INCRA/PRONERA, 201 0).
Concordamos com o posicionamento de Andrade e Di Pierro
(2003, p. 74) que o diferencial do PRONERA corre devido à
sua articulação com a política de reforma agrária, “que se
desenvolve em estreita conexão com um projeto mais amplo
de desenvolvimento rural sustentado com justiça social”. É
elogiado o seu caráter sistêmico, em que, “além de elevar a
escolarização de jovens e adultos, a formação de professo-
res e pedagogos atende à necessidade de formulação de
uma pedagogia específica” (ANDRADE; DI PIERRO, 2003,
p. 79). Tal articulação reflete-se na propostas curriculares do
PRONERA voltadas à formação integral dos educandos e
educadores. As mesmas encontram-se fundadas na con-
cepção marxiana de trabalho como princípio educativo e
educação libertadora freireana, em sintonia com o marco re-
ferencial do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, par-
ceiro na constituição do PRONERA.
Em 2003, já no governo do presidente Lula (2003-
201 0), foi criado o Programa Brasil Alfabetizado (PBA), com
o atendimento até o ano de 2009, de 1 2 milhões de educan-
dos (BRASIL/MEC, 201 0). Houve a ampliação do período de
alfabetização de seis para até oito meses em relação ao
PAS; o aumento de 50% nos recursos para a formação dos
alfabetizadores, com o estabelecimento de um piso para a
bolsa do alfabetizador; o aumento da quantidade de turmas
em regiões com baixa densidade populacional e em comu-
374
nidades populares de periferias urbanas; a implantação de
um sistema integrado de monitoramento e avaliação do pro-
grama; maior oportunidade de continuidade da escolariza-
ção de jovens e adultos, a partir do aumento de 42% para
68% do percentual dos recursos alocados para estados e
municípios, “com atuação mais intensa nos 1.928 municípios
com taxa de analfabetismo igual ou superior a 25%” (BRA-
SIL/MEC, 201 0, s/p). Tratava-se, mais uma vez, de um aten-
dimento indireto à demanda, viabilizado por repasses de
recursos a instituições com comprovada experiência em
EJA, com liberdade de escolher a metodologia, os materiais
didáticos e como desenvolver o processo de formação de
educadores. Mais uma vez, a crítica incide sobre o caráter
aligeirado do percurso curricular, sem a garantia da continui-
dade do processo de alfabetização no sistema público de
ensino, que teria que pensar formas adequadas e atrativas
para acolher os educandos advindos do PBA.
Segundo Di Pierro (201 0, p. 946), no governo federal
Lula (2003-201 0) houve uma proliferação de iniciativas em
relação à EJA, mas as mesmas se encontravam desarticu-
ladas entre si. A autora considera que as bases assentadas
durante essa gestão indicavam um lugar mais relevante pa-
ra a EJA, contudo, os indicadores apontam que “o ativismo
desse governo no campo da EJA não foi capaz de reverter
tendências anteriormente instaladas”.
Di Pierro (2011 ) destaca que um diferencial no gover-
no Lula foi a institucionalização da EJA nas políticas de
Educação: Fundo Nacional da Educação Básica (FUNDEB),
Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), Programa Na-
cional de Apoio ao Transporte Escolar (PNATE), Programa
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e Programa Naci-
onal do Livro Didático (PNLD). A autora também destaca ini-
ciativas voltadas à certificação, tais como: o Exame Nacional
para a Certificação de Competências de Jovens e Adultos
375
(ENCCEJA) e, posteriormente, a Rede Certific.
A partir de 2005, começam a surgir políticas que ar-
ticulavam Educação profissional e EJA, dada a demanda do
capitalismo contemporâneo por maior formação para os tra-
balhadores (RUMMERT; ALVES, 201 0; FERNANDES, 2011 ).
Destacam-se no Brasil, o Projovem, criado em 2005; o
PROEJA que teve sua primeira versão em 2005 e versão
definitiva em 2006 e o PRONATEC EJA, criado em 2011.
O ProJovem, instituído pela Lei 11.1 29, de 30 de ju-
nho de 2005 (BRASIL, 2005b) e reformulado pela Lei 11.692
de 1 0 de junho de 2008 (BRASIL, 2008), voltou-se para o
público de 1 5 a 29 anos com o objetivo de promover sua
reintegração ao processo educacional, sua qualificação pro-
fissional e seu desenvolvimento humano. A partir da reestru-
turação realizada em 2008, o programa tem sido
desenvolvido por meio de quatro modalidades: ProJovem
Adolescente - Serviço Socioeducativo; ProJovem Urbano;
ProJovem Campo - Saberes da Terra e ProJovem Trabalha-
dor.. O ProJovem Adolescente-Serviço Socioeducativo é co-
ordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome e tem por objetivo complementar a prote-
ção social básica à família, criando mecanismos para ga-
rantir a convivência familiar e comunitária e criar condições
para a inserção, reinserção e permanência de jovens de 1 5
a 1 7 anos no sistema educacional. Já o ProJovem Urbano
foi criado sob a responsabilidade da Secretaria-Geral da
Presidência da República e tem como objetivo elevar a es-
colaridade de jovens de 1 9 a 29 anos, que saibam ler e es-
crever, visando à conclusão do ensino fundamental, à
qualificação profissional e ao desenvolvimento de ações co-
munitárias com exercício da cidadania. Por sua vez, o Pro-
Jovem Campo-Saberes da Terra, coordenado Ministério da
Educação, tem por objetivo elevar a escolaridade dos jovens
da agricultura familiar, integrando a qualificação social e for-
376
mação profissional, estimulando a conclusão do ensino fun-
damental e proporcionando a formação integral do jovem.
Por fim, o ProJovem Trabalhador encontra-se sob responsa-
bilidade do Ministério do Trabalho e Emprego e tem por ob-
jetivo preparar o jovem para o mercado de trabalho e
ocupações alternativas geradoras de renda, por meio da
qualificação social e profissional e do estímulo à sua inser-
ção. Como pode ser percebido, a responsabilidade pelo Pro-
Jovem é compartilhada por diferentes secretarias e
ministério. Rummert e Alves (201 0) criticam o caráter assis-
tencial, supletivo, compensatório, de qualificação profissional
aligeirada do Projovem, fazendo com que se distancie do
processo de inclusão da juventude no crescimento do país.
Concomitante ao Projovem, a primeira versão do
PROEJA foi criada mediante o Decreto Federal 5.478 de 24
de junho de 2005 (BRASIL, 2005a) que, originalmente, sig-
nificava Programa de Integração da Educação Profissional
ao Ensino Médio na modalidade de Educação de Jovens e
Adultos. Sob a primeira denominação, voltava-se exclusiva-
mente para cursos que promovessem a integração da edu-
cação profissional - seja como formação inicial e continuada,
seja como educação profissional de técnica de nível médio -
com o ensino médio, tendo como base única a rede de insti-
tuições federais de educação tecnológica. O Decreto 5.478
provocou resistências e questionamentos em relação a di-
versos aspectos do Programa. As críticas incidiam, sobretu-
do, em relação a três pontos: a definição existente de uma
carga horária “máxima” para os cursos (FRIGOTTO; CIA-
VATTA; RAMOS, 2005; MOURA, 2008); a redução do Pro-
grama à Rede Federal e a limitação do Programa ao ensino
médio (MOURA, 2008). A partir das discussões foi nomeado
um grupo formado por especialistas em EJA das universida-
des brasileiras, representantes da SETEC, da Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SE-
377
CAD), dos fóruns de EJA, com representantes de institui-
ções federais, para organizar um documento base com os
princípios e concepções do Programa (MOURA, 2008). Co-
mo resultado de todo esse processo, em 1 3 de julho de
2006 foi revogado o Decreto 5.478 (BRASIL, 2005a) que ha-
via criado o PROEJA, e promulgado o Decreto 5.840 (BRA-
SIL, 2006), a partir do qual o PROEJA passou a se chamar
Programa Nacional de Integração da Educação Profissional
com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jo-
vens e Adultos. Foram incluídas as contribuições de que o
PROEJA promovesse a participação de alunos que não
concluíram o Ensino Fundamental e a ampliação das insti-
tuições envolvidas. Foram chamadas para estabelecer par-
cerias as instituições públicas dos sistemas de ensino
federal, estaduais e municipais, inclusive as atuantes nos
estabelecimentos penais e entidades privadas nacionais de
serviço social, aprendizagem e formação profissional vincu-
lada ao sistema sindical, o Sistema“S”.
A proposta do PROEJA tem sido destacada positiva-
mente; pela pertinência de uma educação profissional inte-
grada à educação básica, tendo em vista a proposta de
articular ciência, cultura, trabalho e tecnologia, na perspec-
tiva de uma formação integral, com certificação e elevação
da escolaridade; pelo envolvimento da rede federal de edu-
cação profissional e tecnológica no processo; pela possibili-
dade de formação de professores, em nível de
pós-graduação lato sensu e pelo fomento à pesquisa por
meio do Programa PROEJA/CAPES/SETEC, com vistas à
análise e ao aprimoramento do programa. Quanto aos limi-
tes e contradições, encontra-se: o número insuficiente de
vagas diante da demanda nacional; a ausência de uma clara
dotação orçamentária; os problemas relativos a ingresso,
evasão e permanência; os descompassos entre oferta da
Especialização PROEJA e participação efetiva dos profes-
378
sores que atuam no programa e as dificuldades em realizar
efetivamente a proposta do currículo integrado, no contexto
das instituições proponentes (FERNANDES, 201 2b).
Por fim, por meio da Lei 1 2.51 3, em 26 de outubro de
2011 , o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e
Emprego (PRONATEC) que contempla o trabalho com a
modalidade EJA (BRASIL, 2011 ). Encontra-se fora do esco-
po desse trabalho analisar as características do Programa,
mas vale ressaltar a ausência da publicação de um docu-
mento base com seus princípios e concepções; a indefinição
de como será acompanhado o montante elevado de recur-
sos públicos que sendo repassado ao Sistema S e a institui-
ções privadas participantes do Programa; a ausência de
ações de formação para professores, linhas de financiamen-
to para pesquisa e avaliação do Programa. As críticas que
recaem sobre o PRONATEC são relativas ao foco do Pro-
grama voltado a atender à lógica do mercado.
Tecido esse breve panorama, o tópico a seguir, reto-
ma as características gerais e posteriormente a proposta de
currículo integrado do PROEJA.
Características do PROEJA
379
a redução das desigualdades sociais, como um de seus
princípios; a articulação da educação profissional com a
educação básica, como um de seus pressupostos específi-
cos; e a educação de jovens e adultos, como uma de suas
linhas estratégicas (BRASIL/MEC/SETEC, 2004). É impor-
tante destacar que o PROEJA é um desdobramento da pro-
mulgação do Decreto 5.1 54, de 23 de julho de 2004
(BRASIL, 2004). Tal decreto foi um marco, pois ao revogar o
Decreto 2.208 de 1 7 de abril de 1 997 (BRASIL, 1 997), for-
neceu a base legal para a retomada da articulação entre
educação profissional e ensino médio, em consonância com
o art. 36 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacio-
nal, Lei 9394 de 20 de dezembro de 1 996 (BRASIL, 1 996).
O Decreto 5.840 (BRASIL, 2006, art. 1 º., parágrafo
4º.) veio salientar que se tratava de elevar a escolaridade do
trabalhador mediante a elaboração de projetos pedagógicos
acordados entre os parceiros, de um currículo integrado en-
tre a educação profissional e a educação básica, inclusive,
quando fossem envolvidas “articulações interinstitucionais e
intergovernamentais”. Em relação à carga horária mínima es-
tabelecida para os cursos do PROEJA voltados à educação
profissional técnica de nível médio integrada ao ensino mé-
dio, foram definidas duas mil e quatrocentas horas, sendo
mil duzentas horas para a formação geral e a carga horária
mínima estabelecida pela respectiva habilitação técnica (ou
seja, mil e duzentas horas ou mais, se a regulamentação da
habilitação assim o exigisse). Para o PROEJA voltado à in-
tegração da educação profissional, como formação inicial e
continuada, a carga horária foi estabelecida em mil e duzen-
tas horas para a formação geral e, no mínimo, duzentas ho-
ras para a formação profissional.
O trabalho de elaboração de concepções, princípios
e orientações gerais para construção do projeto pedagógico
integrado do PROEJA resultou na produção de três docu-
380
mentos base voltados para as três frentes de trabalho pro-
postas: educação profissional de nível técnico integrada ao
ensino médio (BRASIL/MEC/SETEC, 2007a); formação
profissional inicial e continuada integrada ao ensino funda-
mental (BRASIL/MEC/SETEC, 2007b) e educação profissio-
nal e tecnológica voltada à educação escolar indígena
(BRASIL/MEC/SETEC, 2007c). A especificidade do PROE-
JA voltado à integração da educação profissional, como for-
mação inicial e continuada (FIC) ao ensino fundamental fez
com que esse segmento do Programa passasse a ser reco-
nhecido como PROEJA FIC, impulsionado a partir de abril
de 2009, que oficializou o convite às instituições da Rede
Federal para que, em parceria com os municípios brasilei-
ros, elaborassem propostas para implantação do PROEJA
FIC.
381
medida em que podem desenvolver sua autonomia intelec-
tual frente ao conhecimento, ao trabalho e ao mundo do tra-
balho. Nesta perspectiva, coloca-se a importância de
articular tal princípio educativo ao princípio pedagógico da
pesquisa:
Potencializar a relação entre o ensino e a pesquisa contribui
para desenvolver, ao longo da vida, entre outros aspectos,
as capacidades de interpretar, analisar, criticar, refletir, rejei-
tar ideias fechadas, aprender, buscar soluções e propor al-
ternativas, potencializadas pela investigação e pela
responsabilidade ética diante das questões políticas, soci-
ais, culturais e econômicas (MOURA, 201 0, p.9).
A reflexão sobre as dimensões ontológica e histórica
do trabalho coloca os estudantes na condição de sujeitos
autônomos e críticos. Para além do “aprender trabalhando”
ou do “trabalhar aprendendo”, os mesmos são chamados a
compreender, enquanto vivenciam e constroem a própria
formação, que “é socialmente justo que todos trabalhem
porque esse é um direito de todos os cidadãos” (MOURA,
201 0, p. 8). A pesquisa como princípio pedagógico trata-se,
portanto, de um princípio dialeticamente relacionado à con-
cepção de trabalho como princípio educativo. A sustentabili-
dade e o desenvolvimento socioeconômico-ambiental dos
contextos em que se desenvolvem os cursos fazem parte da
realidade a ser pesquisada e, possivelmente, transformada.
Como visto, anteriormente, formar para a cidadania ou para
o trabalho produtivo, organizar um currículo voltado para as
humanidades ou para a ciência e tecnologia são dilemas no
campo do Currículo desde a sua origem. Diante das con-
cepções marxianas - onilateralidade, politecnia, trabalho co-
mo princípio educativo – não há lugar no currículo integrado
para uma formação unilateral: exclusivamente acadêmica,
ou voltada para o mercado de trabalho.
Segundo Ramos (2005, p. 1 06) a indissociabilidade
382
entre educação e prática social, teoria e prática; educação
profissional e básica, na perspectiva da interdisciplinaridade
e da consideração da historicidade dos sujeitos coloca-se
como um projeto que visa “superar o histórico conflito em
torno do papel da escola”. Segundo a autora, o currículo al-
mejado objetiva a integração dos conhecimentos gerais e
específicos, sem que se percam os referenciais das ciências
básicas. Os conceitos estudados podem ser “relacionados
interdisciplinarmente, mas também no interior de cada disci-
plina”. Busca-se uma abordagem dos fenômenos que os
considera na sua totalidade histórica e dialética.
O trabalho como princípio educativo conclama para
a centralidade das questões relativas aos processos de tra-
balho, contextualizadas historicamente. Busca-se situar os
educandos de forma ampla e crítica diante dos objetos de
estudo, o que perpassa os aspectos técnicos ou tecnológi-
cos implicados. Para que se possa desenhar um currículo
integrado, a autora defende que os professores envolvidos
deveriam percorrer um movimento de:
1. Problematizar fenômenos – fatos e situações significativas
e relevantes para compreendermos o mundo em que vive-
mos, bem como processos tecnológicos da área profissional
para a qual se pretende formar -, como objetos de conheci-
mento, buscando compreendê-los em múltiplas perspecti-
vas: tecnológica, econômica, histórica, ambiental, social,
cultural etc. [...] Responder às questões elaboradas produzi-
rá a necessidade de se recorrer a teorias e conceitos já for-
mulados sobre o(s) objeto(s) estudado(s) e esses se
constituirão em conteúdos de ensino.
2. Explicitar teorias e conceitos fundamentais para a com-
preensão do(s) objetos(s) estudados(s) nas múltiplas pers-
pectivas em que foi problematizada e localizá-los nos
respectivos campos da ciência (áreas do conhecimento, dis-
383
ciplinas científicas e/ou profissionais), identificando suas re-
lações com outros conceitos do mesmo campo (disciplinari-
dade) e de campos distintos do saber
(interdisciplinaridade).[...].
3. Situar conceitos como conhecimentos de formação geral
e específica, tendo como referência a base científica dos
conceitos e sua apropriação tecnológica, social e cultu-
ral.[...].
4. A partir dessa localização das múltiplas relações, organi-
zar os componentes curriculares e as práticas pedagógicas,
visando corresponder nas escolhas, nas relações e nas rea-
lizações, ao pressuposto da totalidade real como síntese de
múltiplas determinações (RAMOS, 2005, p.1 22-1 23).
Segundo a autora, faz-se necessário, portanto, que
os professores: 1 ) levantem questões relevantes sobre o
fenômeno e atentem para as teorias e conceitos aos quais
foi necessário recorrer, de modo que os mesmos se consti-
tuam objetos de estudo junto aos educandos; 2) reflitam so-
bre as relações que tais conceitos e teorias têm com outros
conhecimentos da própria disciplina da qual são oriundos,
ou com conceitos e teorias advindos de outras áreas do co-
nhecimento, a fim de identificar articulações disciplinares e
interdisciplinares que podem ser estabelecidas com a parti-
cipação dos educandos; 3) identifiquem se os conceitos im-
plicados no fenômeno a ser estudado relacionam-se a
outros conhecimentos da formação geral e específica e o
que pode ser aprendido do ponto de vista da formação geral
e da formação técnica e tecnológica, de forma integrada e
significativa; 4) por fim, desenhem qual será o curriculum a
ser percorrido: quais práticas pedagógicas serão propostas,
se será organizado em forma de projeto, sequências de ati-
vidades, se o trabalho será disciplinar ou interdisciplinar,
com quais objetivos específicos, que conteúdos serão privi-
384
legiados, etapas, duração, etc.
Para Ramos (2005), no momento da prática pedagó-
gica, a proposição de desafios, problemas e/ou projetos -
desencadeando ações resolutivas, pesquisa e elaboração
de projetos de intervenção - de modo algum deve indicar
uma proeminência da ação em detrimento da construção de
conceitos. Trata-se de realizar propostas pedagógicas que
propiciem aos educandos a compreensão dos fundamentos
científicos e tecnológicos implicados nos diversos fenôme-
nos que compõem a totalidade e, a partir de tal compreen-
são, saibam posicionar-se crítica e autonomamente diante
dos mesmos por meio do movimento da práxis. Não se trata,
portanto, do mero desenvolvimento de simulações de ativi-
dades profissionais, com vistas à preparação dos educan-
dos para atender a demandas específicas de um
determinado contexto do mundo do trabalho.
Outro ponto que merece destaque ao se tratar do
currículo do ensino médio integrado são os quatro eixos da
base curricular, acima citados – trabalho, ciência, tecnologia
e cultura. Uma questão significativa para a presente tese foi
constatar que a trajetória de estudos e discussões sobre as
características do currículo do ensino médio integrado con-
duziu ao reconhecimento de que a tecnologia deveria ser in-
corporada à base da proposta - originalmente balizada na
tríade trabalho, ciência e cultura.
Moura (201 0, p. 6), ao defender a incorporação da
tecnologia à base da proposta, retoma o argumento de que
o trabalho, mediação de primeira ordem entre os homens e
a natureza, gera conhecimento que se torna tanto ciência,
quanto tecnologia. O conhecimento torna-se ciência, “quan-
do as relações constitutivas e estruturantes da realidade são
ordenadas e retiradas do seu contexto original, de modo a
produzir uma explicação rigorosamente sistematizada e in-
tencionalmente expressa em conceitos.” (RAMOS, s/d apud
385
MOURA, 201 0). O conhecimento torna-se tecnologia quando
se converte em força produtiva, como mediação entre ciên-
cia e produção, entre compreensão e intervenção no real
(RAMOS, 2004, 2005 apud BRASIL/MEC/SETEC, 2007d, p.
44). Nesta perspectiva, Moura (201 0) defende que: se tanto
os avanços da ciência desencadearam novas tecnologias,
como as inovações tecnológicas exigiram que a ciência bus-
casse o aprofundamento de conceitos, a tecnologia não po-
deria ficar de fora da base da proposta. Fazendo jus à
relação dialética existente entre tais elementos, o ensino
médio integrado, inspirado na formação politécnica/educa-
ção tecnológica, haveria de ser organizado em torno dos
quatro eixos: trabalho, ciência, cultura e tecnologia.
A cultura vem, como eixo capaz de permitir a com-
preensão sobre como os processos de trabalho, ciência e
tecnologia desencadeiam e se materializam em signos, va-
lores, costumes e organizações sociais, “prática constituinte
e constituída do/pelo tecido social, norma de comportamen-
to dos indivíduos numa sociedade e como expressão da or-
ganização político-econômica desta sociedade, no que se
refere às ideologias que cimentam o bloco social” (GRAMS-
CI, 1 991 apud ANPEd et al., 201 0).
A partir da base da proposta curricular – trabalho, ci-
ência, tecnologia e cultura - devem ser articuladas as quatro
grandes áreas do conhecimento: Linguagens, Matemática,
Ciência da Natureza e Ciências Humanas. A proposta não é
diluir, nem excluir as especificidades dos componentes cur-
riculares, mas fortalecer “as relações entre eles e a sua con-
textualização para apreensão e intervenção na realidade,
requerendo planejamento e execução conjugados e coope-
rativos dos seus professores.” (BRASIL/CEB, art. 8º, pará-
grafo 2º, 2011 ).
386
Considerações finais
387
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393
394
artigo
Resumo
395
fessoras de Ciências que ministra aulas a estudantes da
modalidade de ensino destinada a pessoas adultas. O eixo
condutor/objetivo para análise foi identificar a potencialidade
da prática pedagógica em Ciências da Natureza, apontando
para possibilidades de tratamento intencional dos conteúdos
escolares desta disciplina com fundamento no multicultura-
lismo. Enquanto orientação metodológica de obtenção de
dados, utilizou-se a descrição da observação consentida e
registrada em diários construídos nas 30 horas de estágio,
pautada em variáveis da prática pedagógica estabelecidas
nos encontros presenciais na universidade (disciplina de es-
tágio). Durante as observações, as variáveis observadas e
analisadas foram: as interações verbais professor-aluno, o
conteúdo ensinado, as habilidades de ensino do professor e
o processo avaliativo. As análises foram conduzidas pela
concepção do multiculturalismo na educação, evidenciando
esta abordagem como potente para a prática educacional
transformadora no ensino de Ciências da Natureza.
Palavras-chave: Multiculturalismo, Educação de Pessoas
Adultas, Ensino de Ciências da Natureza
Introdução
396
ministrada pelo terceiro autor e que possibilita estágio nessa
modalidade de ensino.
A unidade escolar na qual a observação foi desen-
volvida foi o CEEJA (Centro Estadual de Educação de Jo-
vens e Adultos) “Professora Alda Marangoni França”,
localizado na cidade de Americana – SP, bairro Santa Cata-
rina4. A unidade atende alunos da cidade e região (como
Sumaré, Nova Odessa e Santa Bárbara d’Oeste, por exem-
plo) que não cursaram ou não concluíram as etapas da edu-
cação básica (Ensino Fundamental ou Médio). A idade
mínima para matrícula é de 1 8 anos, sendo que a instituição
trabalha com o regime de presença flexível, com o centro
funcionando constantemente nos três períodos (manhã, tar-
de e noite), incluindo horários de almoço e jantar, e atendi-
mento individualizado, ou seja, o aluno não precisa cumprir
uma carga horária, basta comparecer na unidade e passar
por uma série de provas até concluir o curso. É válido res-
saltar que o aluno pode estudar em sua residência e vir
prestar as provas ou, ainda, estudar nas dependências do
CEEJA, local em que pode tirar suas dúvidas junto ao pro-
fessor, caracterizando-se como curso semi-presencial.
Segundo a Secretaria Estadual de Educação do Es-
tado de São Paulo, o CEEJA trata-se de uma instituição de
ensino “com o objetivo de oferecer cursos de Ensino Funda-
mental e Ensino Médio na modalidade de Educação de Jo-
vens e Adultos” (SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO,
201 3, p.7). São 20 unidades distribuídas nas seguintes cida-
des: Americana, Bauru, Bebedouro, Campinas (2), Guarujá,
Marília, Piracicaba, Praia Grande, Presidente Prudente, Re-
gistro, Ribeirão Pires, Ribeirão Preto, Santos (2), São José
dos Campos, São Paulo, Sorocaba, Taubaté e Votorantim 5.
4A unidade permitiu a inserção dos estagiários e a realização de
observações mediante acordo assinado via documentação encaminhada
pela universidade.
5 Pesquisa feito no sistema de busca do site da Secretaria Estadual de
Educação: http://escola.edunet.sp.gov.br/Index_Escolas.asp
397
O CEEJA observado
400
tema na produção citada, são produções que apontam para
a consideração do multiculturalismo na educação como ne-
cessidade de posicionamento político intrínseco à prática
pedagógica, uma vez que entendida como prática social e
histórica, portanto cultural.
Candau (2008) faz o seguinte alerta:
Convém ter sempre presente que o mul-
ticulturalismo não nasceu nas universi-
dades e no âmbito acadêmico em geral.
São as lutas dos grupos sociais discrimi-
nados e excluídos, dos movimentos so-
ciais, especialmente os referidos às
questões étnicas e, entre eles, de modo
particularmente significativo entre nós,
os referidos às identidades negras, que
constituem o lócus de produção do mul-
ticulturalismo. Sua penetração na univer-
sidade se deu num segundo momento e,
até hoje, atrevo-me a afirmar, sua pre-
sença é frágil e objeto de muitas discus-
sões, talvez exatamente por seu caráter
profundamente marcado pela intrínseca
relação com a dinâmica dos movimentos
sociais (p.1 8-1 9).
402
sidade e desejos” (ARANHA, 2006, p.58). Desta forma, po-
de-se salientar que:
A cultura exprime as várias formas pelas
quais se estabelece uma relação entre
os indivíduos, entre os grupos e destes
com a natureza: cria uma língua, a mo-
ral, a política, a estética, e organizam
leis e instituições, como se alimentam,
casam e têm filhos, como concebem o
sagrado e se comportam diante da mor-
te (ARANHA, 2006, p.58).
404
nhecer e considerar em suas preparações e atuações de
ensino os marcadores identitários, características que dão
identidades a grupos, como sotaques, lugares de origem,
etnias diversas, bem como visualizam um assunto com sen-
tido plural e não mais nivelada a um único plano: o/a profes-
sor/a “trabalhador cultural” amplia a visão, ao invés de
afunilá-la num único conceito. Exemplo disso é o que apre-
sentam Canen e Oliveira (2002), uma professora de Ciênci-
as que ao trabalhar conceitos de força física (aplicados à
natureza), discute sobre violência na sociedade na qual os
alunos estão inseridos. Desta forma, ao abordar um conteú-
do presente no plano de ensino, ele se abre num leque de
possibilidades e não fica restrito a uma única visão – além
do que adquire uma roupagem social, relacionado ao que o
aluno vive.
Objetivos
405
em aula da universidade as variáveis a serem observadas
no decorrer do estágio, que perfizeram 30 horas. As variá-
veis foram: as interações verbais professor-aluno, o conteú-
do ensinado, as habilidades de ensino do professor e o
processo avaliativo. Para este trabalho, a análise de conteú-
do restringiu-se aos dados de observação obtidos nas qua-
tro variáveis que evidenciassem conteúdos programáticos
que foram, ou potencialmente poderiam ser, trabalhados en-
quanto prática multicultural naquele contexto (curso semi-
presencial e atendimento individualizado).
Resultados
408
servado no fragmento de observação a seguir:
Prova 4 – referente ao 7º ano
A aluna não respondeu a seguinte per-
gunta:
6- A água contaminada transmite orga-
nismos causadores de doença. Para
evitar essas doenças, antes de ser utili-
zada, a água deve passar por um trata-
mento. O que deve ser feito para
purificar a água nos lugares que não há
saneamento básico (água tratada e es-
goto encanado)?
Professora: – Você não entendeu a per-
gunta? O que deve ser feito para purifi-
car a água?
Aluna: – Põe o produto?
Professora: – Qual o nome?
Aluna: – Não sei.
Professora: – Mas o que você usa?
Aluna: – Filtro.
Professora: – Então põe filtro. Se não
tem filtro, o que você faz?
Aluna: – Eu não sei.
Professora: – Você ferve. É simples este
método.
Aluna tinha escrito “cava, se poço” (sic)
depois escreveu “filtro, pote fever”
(sic). 8
41 0
guntas.
O CEEJA também atende alunos com deficiência
auditiva. São cerca de trinta alunos que, além do compareci-
mento frequencial para realização das avaliações, contam
também com outras atividades desenvolvidas pelos intér-
pretes e amparadas pela estrutura da escola em horários al-
ternativos aos das avaliações. Os alunos surdos tem a
possibilidade inclusive de levar ao CEEJA familiares durante
tais práticas.
Foi observada uma destas atividades. Os intérpretes
propuseram um filme para todos os alunos com deficiência
auditiva matriculados na escola. Os estudantes foram aco-
modados em uma sala com recursos audiovisuais específi-
cos para seu atendimento. Ao mesmo tempo, seria
interessante que estivessem presentes também estudantes
ouvintes para solidarizarem-se com o que Bruner (1 990) de-
nomina de condição constritiva que a biologia impõe, mas
que a cultura ultrapassa com suas soluções protéticas.
Um casal de estudantes com deficiência auditiva que
estavam presentes levou suas duas filhas ouvintes para par-
ticipar da sessão de cinema. Segundo relatos dos professo-
res, a surdez de ambos foi causada por exposição ao vírus
da rubéola durante a gestação. Considerando o conteúdo de
reprodução e de microbiologia (estudos sobre vírus, bactéri-
as e fungos), esta informação sugere excelente contexto pa-
ra os e as professoras colocarem-se como “trabalhadores
culturais”
Fez-se esta consideração para encerrar a análise
das observações e ressaltar a condição de necessidades
especiais e a contribuição com compromisso social que este
centro educativo oferece, a qual revela potencial multicultural
a ser desenvolvido nas práticas de ensino de Ciências.
411
Considerações finais
41 3
BRUNER, Jerome. Actos de Significado – para uma psicologia
cultural. Lisboa: Edições 70, 1 990.
41 5
41 6
artigo
Jussara Florencio1
Kelci Anne Pereira2
Paulo Eduardo Gomes Bento3
Resumo
Introdução
41 8
Internacional de Educação de Adultos (CONFINTEA, 1 999),
da qual o Brasil é membro, que defende o alargamento da
concepção de EJA por meio do conceito de Educação ao
Longo da Vida (ELV). Ele compreende os variados proces-
sos educativos que acontecem em espaços (não) escolares,
favorecendo o desenvolvimento das capacidades políticas
do(a) cidadão(ã) e o domínio de conhecimentos historica-
mente acumulados pela humanidade, de modo a elevar a
proteção e a participação social de todas as pessoas na so-
ciedade da informação5.
No entanto, a ausência ou a descontinuidade das
políticas de EJA e sua inadequação diante das demandas
dos (estudantes) jovens e adultos – que são, antes de mais
nada, trabalhadores - revelam que o referido direito tem si-
do violado na prática. Estudos (DI PIERRO, 2005, HADDAD,
2009) mostram que, apesar de alguns avanços, as políticas
de EJA seguem a reproduzir modelos de educação que ne-
gam o público da EJA como composto por sujeitos de direi-
tos, aprendizagem e conhecimento. Isolando a democracia
educativa da democracia social mais ampla (gênero, classe,
raça, etc.) 6, o Estado não provê o direito à EJA enquanto
nem escolarização e nem acepção da educação ao longo
da vida.
Para Kruppa (2005), este cenário atual faz parte de
uma continuidade histórica. Por longos anos, a EJA aconte-
ceu de forma aligeirada, por meio de campanhas rápidas de
alfabetização, partindo-se de pré-conceitos contra o(a) anal-
5O conceito de sociedade da informação (SI) surge no final do Século XX.
Esse tipo de sociedade encontra-se em processo de formação e
expansão, no qual as novas tecnologias são as principais responsáveis.
Uma condição para o avanço da SI é a possibilidade de todos poderem
aceder às tecnologias de informação e comunicação (POLIZELLI e
OZAKI, 2007).
6De acordo com a Constituição Federal de 1 988, os direitos fundamentais
toda pessoa humana deve ter a sua dignidade respeitada e a sua
integridade protegida, independentemente da origem, raça, etnia, gênero,
idade, condição econômica e social, credo religioso ou convicção política.
41 9
fabeto(a), visto como alguém que não tinha cultura, a quem
faltava conhecimento (GALVÃO e DI PIERRO, 2007). A di-
cotomia que separou as ofertas de educação propedêutica e
acadêmica das ofertas de formação profissional também é
uma marca da EJA, que se reproduz como âmbito de forma-
ção de mão de obra (KRUPPA, 2005).
A despeito do legado de Paulo Freire e dos movi-
mentos de cultura e educação popular da década de 1 960
(obstruídos com o golpe militar de 1 964 e perseguidos a
partir de 1 968), que afirmavam a EJA como prática de liber-
dade, as políticas de EJA instauradas no período de rede-
mocratização do país não situaram-na em posição marginal,
diante do conjunto das políticas educativas. No governo de
Fernando Henrique Cardoso, sob os ditames do neolibera-
lismo, a EJA foi vetada dos financiamentos da educação e o
Estado delegou a tarefa de alfabetização dos jovens e adul-
tos à sociedade civil. O governo Lula (2003 - 201 0) voltou a
pautar a EJA como direito, incluindo-a no financiamento da
educação, bem como em outros programas de alfabetização
e de permanência na escola7, mas, como mostram os dados
do INEP 8 e as análises acadêmicas recentes9, o caráter su-
pletivo e aligeirado, que separa formação profissional e ge-
ral 1 0, continua se reproduzindo nas práticas. O
7Programa Brasil Alfabetizado; Proeja (educação acadêmica integrada à
profissional); normatização e financiamento da educação em prisões;
inserção da EJA nos programas escolares de transporte e alimentação,
bem como no programa do livro didático; realização do Certific
(certificação profissional); programas de formação continuada de
professores(as) em EJA e em EJA e ES (com produção de material
didático).
8 Ver dados de matrículas na EJA em www.inep.gov.br (queda nas
matrículas).
9 Ver discussões do fórum EJA, em www.forumeja.org.br, ou discussões
do GT 1 8 (EJA) da Anped, em www.anped.org.br.
1 0Aqui, faz-se referência direta ao Pronatec, que além da mencionada
separação, cria uma espécie de privatização da educação profissional,
repassando diretamente recursos públicos ao Sistema S para executá-la,
não de forma integrada, mas simultânea à formação geral.
420
trabalhador(a) e o trabalho, não balizam a EJA como obriga-
ção do Estado.
Excluídos do conjunto dos direitos sociais, com des-
taque ao direito educativo e ao direito ao trabalho digno,
parte destes(as) trabalhadores(as) buscam na chamada
economia solidária (ES) 11 formas de sobrevivência. A ES se
realiza por meio de empreendimentos cooperativos ou asso-
ciativos, de produção, consumo, troca, distribuição e crédito,
e inspira-se em valores culturais que colocam o ser humano
como sujeito e finalidade da atividade econômica. Trata-se,
de uma economia não capitalista, apesar de se desenvolver
no meio capitalista, centrada na autogestão, porque os(as)
trabalhadores(as) detém o controle no uso e distribuição dos
frutos dos meios de produção coletivos. Para além disso, a
autogestão produtiva envolve a cooperação, a distribuição
justa do resultado, e a gestão democrática de seus associa-
dos. (SINGER, 2005; GAIGER, 1 999; NETO, 2005),
No Brasil, a ES 1 2 ressurge no último quartel do sécu-
lo XX, como resposta dos(as) trabalhadores(as) às novas
formas de exclusão no mundo do trabalho. A mudança dos
padrões mundiais de acumulação, fruto dos avanços nas
tecnologias de comunicação e informação, transformaram o
modelo tradicional de subordinação do trabalho ao capital. O
11 Conforme deliberação da I Conferência Nacional de Economia Solidária,
a ES é caracterizada pelo conjunto de atividades econômicas “de
produção, comercialização, finanças e consumo que privilegia a
autogestão, a cooperação, o desenvolvimento comunitário e humano, a
justiça social, a igualdade de gênero, raça, etnia, acesso igualitário à
informação, ao conhecimento e à segurança alimentar, preservação dos
recursos naturais pelo manejo sustentável e responsabilidade com as
gerações, presente e futura, construindo uma nova forma de inclusão
social com a participação de todos” (I CONAES, 2006, p. 1 ).
1 2 As primeiras cooperativas surgem na Inglaterra, no século XIX, sendo a
Cooperativa de Rochdale a que obteve maior destaque e estabeleceu-se
como uma referência por seus princípios e regras que lhe conferiu uma
identidade cooperativa empregada por parte das experiências
cooperativas recentes (SINGER, 2002).
421
aumento da informalidade e a precarização das relações
formais se firmam como tendência de flexibilização e de-
semprego, levando o(a) trabalhador(a) a se sujeitar a ocu-
pação que violam seus direitos, para garantir sua
sobrevivência (SINGER, 2005).
Os(as) trabalhadores(as), com vistas a superar e li-
bertarem-se dessas situações, se organizam em experiênci-
as coletivas de ES. Para apoiar e fomentar essas
experiências surgem as entidades de apoio e fomento, e,
para promover a gestão de políticas públicas que resultam
da pressão social, os gestores públicos.
Mesmo com a atuação desses mediadores (gestores
e fomentadores) é notável, empiricamente, que o déficit
educacional sofrido pelos(as) trabalhadores(s) obstrui sua
capacidade de autogestão. A falta de referenciais e instru-
mentais escolares e profissionais dificulta a tomada de deci-
sões, o planejamento, rodadas de negociação mercantil, etc.
O objetivo geral deste trabalho é identificar como es-
sa relação entre a escolaridade dos(as) trabalhadores(as) e
suas práticas de autogestão na ES são abordadas e proble-
matizadas por autores(as) brasileiros(as).
Metodologia
422
literatura brasileira recente sobre os temas envolvidos neste
artigo - educação de jovens e adultos, economia solidária,
políticas públicas -, foi realizado um breve levantamento de
artigos no período compreendido entre 1 997 a 201 0, nos sí-
tios da Revista Brasileira de Educação, da Associação Naci-
onal de Pesquisa em Educação, dos Cadernos de Pesquisa,
da Revista Educação e Sociedade e da Capes. Parale-
lamente, foi realizada uma pesquisa nos documentos finais
e nas resoluções das conferências e plenárias nacionais so-
bre Economia Solidária, em sítios como o Fórum Brasileiro
de Economia Solidária.
Concepções de Economia Solidária entre autores(as) brasilei-
ros(as)
423
desemprego que atingiu o Brasil nas décadas de 1 980 e
1 990. Destacam que esta crise delineou-se sob a orientação
política e econômica do neoliberalismo, aprofundando a
concentração do capital, aumentando o desemprego e a
precarização nas relações de trabalho. Diante de tal crise, a
ES emerge como uma das possíveis alternativas.
Sobre o potencial histórico da ES, Singer (2002)
anuncia que, para além de ser uma forma de reação às cri-
ses exibidas pelo capitalismo, esta apresenta-se no horizon-
te de um outro modo de produção ao aliar ao processo de
produção princípios como democracia, solidariedade e a co-
operação entre os(as) trabalhadores(as), além de prever
práticas de consumo, finanças e distribuição de produtos
seguindo esses mesmos ideais.
Tais princípios se viabilizam em consonância com o que
Singer (2002) considera o atributo fundamental da ES: a au-
togestão, viabilizada na medida em que a posse e a gestão
dos meios coletivos de trabalho são coletivizadas e não
controladas hierarquicamente pelos patrões. Sob tal prisma,
o autor, postula que as experiências de ES superam a lógica
capitalista, assentada na propriedade individual dos meios
de produção coletivos e extração da mais valia como meca-
nismos indispensáveis para acumulação de capital e de po-
der:
A economia solidária é outro modo de
produção, cujos princípios básicos são a
propriedade coletiva ou associada do
capital e o direito à liberdade individual.
A aplicação desses princípios une todos
os que produzem numa única classe de
trabalhadores que são possuidores de
capital por igual em cada cooperativa ou
sociedade econômica. O resultado natu-
ral é a solidariedade e a igualdade, cuja
reprodução, no entanto, exige mecanis-
424
mos estatais de redistribuição solidária
de renda (SINGER, 2002, p. 1 0).
427
to da ES no Brasil.
Para Singer (2008), a educação deve oferecer
aos(às) alunos(as) condições para que se tornem cida-
dãos(ãs): responsáveis por suas ações e capazes de decidir
o curso e a dimensão de suas atividades, aprender diferen-
tes ofícios, desenvolver talentos e se aprofundar em qual-
quer área do conhecimento; participantes ativos(as) dos
processos decisórios que envolvam a comunidade onde vi-
vem e capazes de aprender com a diferença.
A perspectiva da educação popular revelou-se coe-
rente com essa proposta emancipadora, sendo capaz de ar-
ticular a EJA e o mundo do trabalho virtuosamente, ou seja,
fora da chave de interesses capitalistas de exploração.
De acordo com Machado e Ireland (2005, p. 98), es-
sa aproximação pode se tornar viável quando se
observa a busca de uma outra lógica de
geração de emprego e renda, como no
caso das experiências ligadas à Econo-
mia Solidária, é que a EJA tem um papel
fundamental nesse processo, não ape-
nas no sentido de contribuir para que os
jovens e adultos coloquem-se diante das
relações capital e trabalho por outro
prisma, mas também porque esse pode
ser o caminho de mudanças dos própri-
os prismas da escolarização para esses
alunos... a educação de jovens e adultos
tem muito a aprender de sua interlocu-
ção... com... os movimentos populares e
com os métodos desenvolvidos na edu-
cação popular.
428
mandas, como o aumento da escolaridade dos(as) trabalha-
dores(as), a formação do movimento e a que estabelece
que a temática da ES esteja presente de forma transversal
nos sistemas públicos de ensino. Mesmo avaliando a impor-
tância desses pleitos, notamos que poucas iniciativas vêm
sendo feitas nessa direção; e as que existem são insuficien-
tes.
A Secretaria Nacional de Economia Solidária, em ar-
ticulação com a Secretaria de Educação Continuada, Alfa-
betização, Diversidade e Inclusão, realizou apenas dois
trabalhos que articulam EJA e ES: os chamados Cadernos
da EJA1 5, que inclui, na temática EJA e o mundo do traba-
lho, a ES; e as especializações em EJA e ES com produção
de material didático1 6. Nas duas iniciativas a orientação vol-
tou-se para o conjunto de processos de aprendizagens,
(não) formais, em que os(as) trabalhadores(as), desenvol-
vem suas capacidades, enriqueçam seus conhecimentos e
melhorem suas competências técnicas ou profissionais ou
as reorientem a fim de atender suas necessidades e as da
1 4Estes documentos poderão ser localizados no site:
http://www.fbes.org.br/
1 5 Junto ao FNDE, foi firmado um convênio entre a SECADI e a Fundação
Unitrabalho, para a elaboração dos Cadernos de EJA. Estes focam o
ensino fundamental de jovens e adultos com o objetivo de atenuar a
dívida histórica da exclusão escolar. Estes seguem as orientações
curriculares do CNE, organizam os componentes e conteúdos em torno
de eixos temáticos e o trabalho como eixo geral integrador desses temas.
1 6Esta publicação é fruto de uma articulação entre professores(as) dos
municípios de São Gonçalo e Niterói (RJ), gestores públicos, educadores
dos Fóruns de ES, e pessoas interessadas em EJA/ES. O material
formativo-pedagógico-didático foi construído por meio de oficinas e as
discussões realizadas no Projeto de Educação dos Fóruns de ES, e
pessoas interessadas em EJA/ES. O material formativo-pedagógico-
didático foi construído por meio de oficinas e as discussões realizadas no
Projeto de Extensão Ações de Apoio a EJA, em 2011 , pela Incubadora de
Empreendimentos da Economia Solidária da Universidade Federal
Fluminense (Edital 01 /201 0 (Resolução 51 ), SECADI/MEC e
SENAES/MTE).
429
sociedade.
Mas há que se avançar e ter em conta que a EJA
compreende a educação formal, permanente e ao longo da
vida, a educação não formal e toda a gama de oportunida-
des de educação informal e ocasional existentes em uma
sociedade educativa e multicultural, na qual se reconhecem
os enfoques teóricos baseados na prática1 7.
Ao avaliar a especificidade da EJA, remete-se à ne-
cessidade de se pensar políticas públicas perenes, que
aceitem situar uma unidade de atendimento, acesso e pro-
moção da educação para os(as) trabalhadores(as) associa-
dos(as), a reprodução ampliada do saber, pautada em
princípios epistemológicos e metodológicos que acatem as
dimensões socioeconômicas, culturais, cognitivas, e que
considere a elevação da escolaridade.
430
- o conceito de EJA, pensada a partir do conceito de Educa-
ção ao Longo da Vida. Nesse âmbito, a ES envolvida com a
modalidade EJA contribui para a construção de uma cultura
do direito à ELV propagando informações, desconstruindo
preconceitos e ajudando a dar visibilidade à demanda social
da EJA, pois coloca no centro do debate educativo a vida
adulta, o trabalho e os(as) alunos(as) da EJA, passando a
considerá-los como sujeitos plenos de cultura e de conheci-
mento, com diferentes trajetórias e processos formativos
(Ireland, 2008, p. 41 a 43). Nesta concepção ampliada, a
EJA, quando remetida à escola, caracteriza uma modalida-
de de ensino, quando remetida aos âmbitos não escolares,
remete àquela educação voltada às pessoas adultas que
buscam aprender e desenvolver a capacidade de participar
na sociedade em que se vive ou de atualizar-se para melhor
viver no atual contexto da sociedade da informação.
Imprimir à EJA o sentido de ELV exige referenciais
que nos permitam tomar o educando em sua concretude e
aspirações por meio de uma organização pedagógica típica,
com sistematização dos conteúdos em função das especifi-
cidades dos(as) alunos(as) desta modalidade de ensino,
considerando a flexibilidade do tempo para acesso, frequên-
cia e aproveitamento escolar, articulação dos conteúdos à
realidade socioeconômica e cultural dos(as) trabalhado-
res(as), bem como, buscar pela humanização de todos os
envolvidos no processo educativo como fundamento de uma
sociedade justa para todos(as).
O papel e as características da escola na constituição da ES
431
produz a separação entre quem pensa e quem faz, que se
sustenta sobre uma organização fragmentada do conheci-
mento” (p. 1 69), mas deve estar baseada na educação coo-
perativa, destacando que esta educação, pelas
características dos sujeitos da ES, precisa ser pensada no
aspecto da EJA, como a modalidade que se adequada
aos(às) trabalhadores(as) que compõem os EESs.
Assim, o trabalho passa a ser o conceito central,
uma vez que é por ele que o ser humano se realiza e repro-
duz a sua vida, ao transformar a natureza, com a mediação
da linguagem e pensamento1 8. A construção do conheci-
mento escolar, precisa estar orientado por ações político-
pedagógicas que reconheçam as experiências e os saberes
dos trabalhadores(as) ampliando e valorizando a diversida-
de cultural, social, etc.
Ideando a escola como uma instituição social, a qual, por-
tanto, reflete e reproduz uma determinada ordem social, Ri-
beiro denuncia que a “fragmentação da produção e
consequente perda do controle sobre o processo de traba-
lho, que separa a produção e a gestão, a economia e a polí-
tica, a política e a técnica” (id, p.1 81 ), está presente na
forma como a escola se realiza.
O currículo e as práticas pedagógicas devem ser re-
pensadas e a eles devem ser aliados, como conteúdo de
ensino, aspectos práticos vinculados à ES, considerando
valores, como: a cooperação, participação e autogestão. As-
sim, a ES passa a ser um tema transversal para a EJA, já
que a visão de mundo que propõe e os conteúdos para in-
terpretá-las, e para realizá-la no atual contexto, permeiam as
práticas de ensino; e, também, passa a ser metodologia,
18 Alinguagem é um fenômeno social, é o modo de ser do pensamento:
baseia-se nas relações e nas atividades reais produzidas pelos homens.
“Serão antes os homens que, desenvolvendo a sua produção material e
as suas relações materiais, transformam, com esta realidade que lhes é
própria, o seu pensamento e os produtos desse pensamento” (Marx e
Engels, 1 980: 26).
432
pois o trabalhador é visto como sujeito ativo, capaz de pen-
sar e decidir sobre seu processo de aprendizagem, podendo
participar da gestão do funcionamento dos tempos e espa-
ços escolares, e da definição dos conteúdos e formas de
ensino.
Para Kruppa a rede pública de ensino, por meio da
EJA, deve ultrapassar a concepção da escola tradicional e
construir políticas públicas de direito à educação de jovens e
adultos, adequada aos que entram ou retornam à escola,
valorizando e respeitando os conhecimentos dos(as) traba-
lhadores(as) da ES, de modo a fortalecer os vínculos entre a
EJA e a ES e, que esteja presente a alternância entre a es-
colarização necessária e a aplicação dos conteúdos do dia-
a-dia do trabalho. Afirma que a EJA “não pode ser confinada
a programas estanques de escolaridade [...] Propõem-se,
então, que educadores e alunos mergulhem suas atividades
num processo voltado ao mundo do trabalho e às modifica-
ções das condições de vida necessárias ao desenvolvimen-
to.”1 9 (2005, p. 1 2 e 1 3).
Para Tiriba (2007) a educação do(a) trabalhador(a) e
do educador(a) deve acontecer in loco, no próprio local de
trabalho.
No cotidiano da produção, é possível ir
mais além do trabalho polivalente, pro-
movendo um processo em que todos [...]
sejam capazes de compreender os prin-
cípios fundamentais da gestão, tendo
acesso aos conhecimentos necessários
que os permitam também questionar, [...]
propor mudanças... enfim, decidir sobre
qual o tipo de gestão administrativa, fi-
1 9 Estaspropostas se coadunam com as deliberação das Plenárias e
Conferências Nacionais de ES. In:
http://www.tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/1 511 48EducacaoMundoTrabalh
o.pdf. Acessado em 1 3.08.201 3.
433
nanceira, [...] que melhor coincide com
os interesses coletivos [...] o objetivo da
educação popular não é que os traba-
lhadores apenas assimilem, de forma
abstrata, os pressupostos filosóficos e
políticos de uma nova cultura do trabalho
[...] é preciso aprender a construí-la (TI-
RIBA, 2007, p. 92 e 93).
434
lho e educação escolar nestas duas dimensões, inclusive e
sobretudo na modalidade da EJA. Mas a EJA também preci-
sa ser vista em acepção ampliada, como instância de opor-
tunidades de atualização e qualificação profissional, mas
também de fruição cultural ao longo da vida, independente-
mente do nível de escolaridade alcançado pelos trabalhado-
res(as) e com respeito à diversidade cultural (II CONAES,
201 0).
Embora o conceito de ELV e o de educação popular
sejam próximos, e muitas vezes, complementares, há que
se diferenciar. Segundo o pensamento de Paulo Freire (1 987,
p. 33 a 39), aprender e ensinar ao longo da vida é saída ne-
cessária a plena realização social e pessoal de cada ser hu-
mano, além de ser ação política, porque não neutra. Ao
mesmo tempo, tal saída só se consolida se o processo edu-
cativo relacionar educação com a própria vida da pessoa,
com aspirações emancipadoras, e constituir-se dialogica-
mente.
Freire propõe a educação popular como um novo pa-
radigma para pensar a EJA, explicitando-a como aquela fei-
ta em diálogo com e para o povo, no intuito de que constitua
os caminhos de sua libertação. Isso não significa alijar a
educação do povo da cultura elaborada historicamente pela
humanidade. Pensando no campo da compreensão de EJA,
indica trabalhar a partir da história de vida e da realidade na
qual o(a) trabalhador(a) está inserido(a) e o processo de es-
colarização parte do universo das significações populares
para então articular com os referenciais teóricos construídos
pela cultura científica.
No Brasil, o que tivemos mais próximo da ELV foi e é
a Educação Popular, mas essa acrescenta nitidamente o
caráter de classe da educação, enquanto que a ELV reafir-
ma o campo dos direitos: educação, trabalho, sem se debru-
çar sobre as questões de classe.
435
O lugar do trabalho na vida do(a) trabalhador(a) jo-
vem e adulto(a) precisa ser o lugar do ser em si, onde ele se
realiza enquanto produtor de si mesmo e produtor de cultura
(TIRIBA, 2007). O Estado20, que desenvolve a política pú-
blica da EJA, deve ponderar as necessidades de formação
permanente e implantar cursos no próprio ambiente de tra-
balho.
Ao considerar o trabalho como princípio educativo
(TIRIBA, 2007; KRUPPA, 2005) e a necessidade de articular
trabalho e ES, e a educação popular, vimos que o processo
de formação deve ter em conta o conhecimento dos(as) tra-
balhadores(as) e que o diálogo precisa marcar as relações
entre educadores(as) e trabalhadores(as).
Educação popular e ES, e seus respectivos atores,
aparentemente constituem-se como partes isoladas, mas,
de fato, são constitutivas de um mesmo todo. A formação
nesta unidade possibilita edificar formas educativas que
permitam a formação de um novo sujeito histórico, empon-
derado individual e coletivamente, que intervenha(m) na re-
alidade a qual pertence(m), construindo um mundo melhor
para si e para as gerações futuras.
Mas, para tanto, é fundamental pensar a implementação de
uma educação que tenha efeito de perenidade e que sejam
formuladas políticas públicas de Estado que potencializem a
formação deste novo sujeito histórico.
Pensamos que a EJA não deve ficar restrita às salas
de aula. A concepção sobre as formas de acesso ao saber
20“É possível se considerar Estado como o conjunto de instituições
permanentes – como órgãos legislativos, tribunais, exército e outras que
não formam um bloco monolítico necessariamente – que possibilitam a
ação do governo; e Governo, como o conjunto de programas e projetos
que parte da sociedade (políticos, técnicos, organismos da sociedade civil
e outros) propõe para a sociedade como um todo, configurando-se a
orientação política de um determinado governo que assume e
desempenha as funções de Estado por um determinado período.”
(Höfling, 2001 , p. 31 ).
436
pode ser ampliada para outros espaços de vivência, forma-
ção e de trabalho. Com isso queremos afirmar a possibilida-
de de ocupar os espaços onde funcionam os EESs, local
onde os(as) trabalhadores(as) estão cotidianamente. Assim,
os momentos formativos ocorreriam presencialmente tanto
no aspecto escolar, como de vivência e prática, favorecendo
que o processo de ensino-aprendizagem seja constante-
mente experimentado, ampliado e aprimorado, sendo que o
processo de formação em ES seria orientado pelos funda-
mentos, princípios e metodologias da educação popular.
O trato reitera o que já se encontra no marco legal:
fazer ponderar nas ofertas de EJA as necessidades de for-
mação permanente com a implantação de cursos no próprio
ambiente de trabalho, para que a EJA forme um novo sujeito
histórico a partir do diálogo e da assunção do sujeito, em
sua concretude, como ponto de partida e chegada das ofer-
tas educativas.
Referências
437
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441
442
artigo
Resumo
Introdução
444
muitos e muitas (SANTOS, 2003).
Ainda na contemporaneidade nos deparamos com
outro elemento complexo que dificulta o desenvolvimento de
todas as potencialidades dos indivíduos, a questão de gêne-
ro, pois muitas mulheres são impedidas pelos maridos ou
“companheiros” de frequentar os bancos escolares. No pas-
sado, quando crianças, eram interditadas pelos pais, irmãos
e padrastos. Muitas relatam que agora, na idade adulta e,
principalmente, na terceira idade, conseguem estudar, pois
agora estão viúvas, mais “velhas” e, portanto, não precisam
dar muita satisfação aos companheiros e/ou filhos(as). Por
já estarem “mais velhas”, os companheiros não colocam tan-
tos impedimentos e já não estabelecem tantos limites (MOT-
TA, 201 2; OLIVEIRA; SANTOS; DOMINGUES, 201 2).
Muitas senhoras afirmam que é na terceira idade que
elas ganham, finalmente, a liberdade, autonomia para faze-
rem o que querem e para realizar muitos sonhos, dentre
eles freqüentar a escola, aprender a ler e escrever, para po-
derem realizar com maior autonomia e destreza as ativida-
des que exigem essas habilidades, dentro e fora de casa
(CAMARGO, 2005).
Atualmente, existem no Brasil cerca de 1 3,9 milhões
de pessoas analfabetas/desescolarizadas e de acordo com
MEC/INEP (201 2) existem hoje cerca de 3.906.877 alu-
nos(as) matriculados(as) na EJA, no ensino fundamental e
no ensino médio. E a maioria são mulheres. Com intuito de
entender quais são as necessidade e dificuldades das mu-
lheres de camadas populares que tentavam estudar, No-
gueira (2003) criou subsídios para o estudo de gênero na
educação de adultos, discutindo a política educacional.
Em sua conclusão, afirma que para a mulher que
decide voltar a estudar, são várias as dificuldades enfrenta-
das entre a matrícula e a permanência nas aulas, ou seja,
contar com o apoio do marido, parentes, filhos, patroas ou
445
com a violência física e psicológica; luta solitária pela sobre-
vivência; deixar de ser obediente ao marido e brigar pelo
seu direito de estudar; assumir, no contexto profissional, a
opção pelo estudo e enxergar que o marido não tem o direi-
to de impedir que ela prossiga seus estudos (NOGUEIRA,
2003).
Nos países latino-americanos e caribenhos a situa-
ção das mulheres também é de luta para garantir melhores
condições de vida, trabalho e escolaridade. Na maioria des-
ses países também se constata um grande número de mu-
lheres analfabetas/desescolarizadas e também um
contingente maior de mulheres matriculadas nos programas
de educação de adultos (RIVERO ET AL., 2007; HERNÁN-
DEZ ET AL., 2008; GRANDOIT ET AL., 2008; LEDEZMA;
LIZARAZO; BADILLA, 2009; RODRÍGUES ET AL., 2009).
Segundo Freire (2001 , p. 11 3), por volta de 1 870, no
Brasil a ideologia da interdição do corpo feminino é difundi-
da com maior consistência, pregando a submissão voluntá-
ria das mulheres aos homens, por meio da educação. Cabia
aos homens afastar/interditar as mulheres de “espaços pe-
caminosos”, tais como salas de aula, lugares de ações políti-
cas, os quais ela tivesse a oportunidade de adquirir algum
prestígio.
Essa ideologia continua presente em vários contex-
tos da atualidade, de forma implícita, mascarada muitas ve-
zes, ou até mesmo explícita. Apesar de várias conquistas já
alcançadas pelas mulheres, muitas delas ainda precisam lu-
tar pela equidade de direitos e oportunidades em vários pa-
péis que exercem: filhas, esposas, mães, avós,
trabalhadoras, profissionais e, principalmente, mulheres
(QUEIROZ, 1 952 apud QUEIROZ, 201 2; MOURA; ARAÚJO,
2004). Algumas, inclusive, correm riscos de perder o casa-
mento e a família, são ameaçadas pelos maridos/“compa-
nheiros” e filhos porque querem apenas estudar, querem ir
446
para a escola para aprender coisas novas (CAMARGO,
2005).
Para compreender melhor as relações entre gênero,
EJA e escolaridade, a seguir vamos aprofundar nossas re-
flexões sobre gênero por meio das considerações de alguns
autores que estudam essa temática.
Breves reflexões sobre gênero
447
Por isso, a dominação masculina é a conjugação en-
tre as aparências biológicas e seus efeitos nos corpos e nas
mentes, produzidos por um longo trabalho coletivo de “soci-
alização do biológico” e de “biologização do social”, segundo
o princípio de divisão androcêntrico (BOURDIEU, 1 999).
[...] as caracterizações da “natureza” ou
essa “essência” das mulheres [...] ten-
dem a refletir a perspectiva daqueles
que as fazem. E como aqueles que têm
poder para fazê-las nas sociedades de
origem européia contemporâneas geral-
mente são brancos, heterossexuais e
profissionais de classe média, tais ca-
racterizações tendem a refletir a predis-
posição desses grupos (NICHOLSON,
2000, p.1 7).
449
xões acerca dos temas educação de pessoas jovens, adul-
tas e idosas e gênero, por meio de alguns trabalhos e pes-
quisas que tiveram como objeto de análise essa temática.
Apresentamos também algumas reflexões sobre os desafios
e perspectivas na intersecção dessas duas áreas, que ainda
na atualidade carecem de olhares e pesquisas mais atentos
às suas peculiaridades. Esse é um tema que merece aten-
ção por parte dos profissionais da educação que atuam na
EJA, para oportunizar elementos para compreensão dos as-
pectos históricos, sociais, étnicos e culturais da clientela
atendida por essa modalidade, possibilitando uma aprendi-
zagem dialógica, crítica e emancipadora.
Metodologia
450
to Barbosa (1 994) verificou como as alunas concluintes do
um programa de alfabetização de jovens e adultos, avalia-
ram os efeitos positivos da alfabetização em suas vidas, do
ponto de vista profissional, familiar e pessoal, por meio da
análise das falas das mulheres, no relato de suas experiên-
cias.
Mello (2007) se preocupou em analisar a relação en-
tre gênero e saber. Foram participantes de sua pesquisa,
mulheres populares em processo de alfabetização no con-
texto de EJA. A coleta de dados se deu a partir de observa-
ções sistemáticas de aulas com foco nas falas das
educandas. Segundo a autora, a pesquisa mostrou a perti-
nência e relevância dessa discussão para o campo da edu-
cação. Pessoas do sexo feminino consideram a elevação da
escolaridade como meio de se igualarem socialmente as
pessoas do sexo masculino, devido às subjetividades cons-
truídas.
Conhecer as trajetórias das egressas do Programa de Edu-
cação Básica de Jovens e Adultos da UFMG, bem como os
efeitos da escolarização em suas vidas foi o desafio de Bas-
tos (2011 ). Para tanto, dados foram coletados por meio de
entrevistas semiestruturadas. Os resultados mostraram a
importância simbólica da escolarização para mudança na
vida das mulheres: crescimento profissional, independência
financeira e aumenta da autoestima, além de sentimento de
igualdade perante seus maridos, filhos e amigos.
Amorim (2007), por sua vez, objetivou analisar como
as relações de gênero interferem nas trajetórias educacio-
nais das mulheres camponesas jovens e adultas em assen-
tamentos de reforma agrária, na região Tocantina-MA.
Entrevistas semiestruturadas e análise de relatos foram os
instrumentos utilizados para coletar dados. Esse estudo
mostrou a influência das relações de gênero na elaboração
das representações sociais nas condições específicas des-
451
tas mulheres. As subjetividades simbólicas femininas fazem
com que mulheres busquem qualificação profissional atra-
vés da escolarização podendo desta maneira conquistar
simbolicamente paridade com pessoas do sexo masculino.
Saber como a elevação da escolaridade integrada à
qualificação profissional das mulheres, foi o objetivo do tra-
balho de Alves (2006) quando investigou as trabalhadoras
da cidade de Alagoinhas - BA no âmbito do Programa Inte-
grar da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da Central
Única dos Trabalhadores - CNM/CUT. Entrevistas com as
educandas, análise de documentos, como diários de classe
e fichas de matrícula propiciaram a coleta de dados. Como
resultado, constatou-se que a educação e a ocupação pro-
dutiva com segurança, liberdade e remuneração adequada
são garantia de dignidade para essas mulheres. A escolari-
dade é fundamental para mulheres em todas as esferas so-
ciais.
A análise do discurso e observações foram meios
encontrados pela autora para constatar a importância das
subjetividades e das simbologias que orientam as práticas
escolares das educandas, no contexto da EJA (ALVES,
2006).
O objetivo do trabalho de Toledo (201 0) foi compre-
ender as ações de qualificação profissional no âmbito do
PNQ (Plano Nacional de Qualificação), as ações voltadas
para a qualificação profissional de mulheres e identificar su-
as mediações com o projeto de reorganização capitalista no
Brasil, por meio da análise de documentos. A autora eviden-
ciou, que o Estado, priorizando ações afirmativas no PNQ,
dentre elas a questão de gênero, dissimula os embates en-
tre capital e trabalho, escondendo a realidade estrutural do
sistema, contribuindo para a fragmentação e conformação
da classe das mulheres trabalhadora.
Interessada na coerência sobre o significado de res-
452
ponsabilidade entre Programa de Ação da Conferência Inter-
nacional de População e Desenvolvimento, realizada no
Cairo em 1 994 e o discurso de homens e mulheres (casados
e solteiros, com e sem filhos, residentes em São Paulo), ten-
do como pano de fundo estudos de gênero e os recen-
tes trabalhos sobre as masculinidades na América Latina,
Silva (1 999), transcreveu reuniões de grupos focais promovi-
das pela instituição onde exerce atividade profissional e es-
tudou atentamente o referido documento.
A autora percebeu então que, ambos os textos tra-
tam de responsabilidade como encargo ou dever, o texto do
programa é essencialmente normativo, contribuindo com o
estereótipo de que homens, assim como jovens de ambos
os sexos, são irresponsáveis, devendo ser para tornarem-se
"responsáveis". E a análise de conteúdo dos discursos de
homens e mulheres mostra que ter filhos, os tornam respon-
sáveis. O texto do programa direciona homens e adolescen-
tes a incrementar sua responsabilidade adiando o filho, pelo
controle da vida reprodutiva mostrando incoerência entre o
que norteia o documento e o que pensam as pessoas parti-
cipantes do grupo focal (SILVA, 1 999).
Para analisar como as concepções de masculinidade
interferem no processo de escolarização e no cotidiano es-
colar, Menezes (2008) trabalhou com alunos do sexo mas-
culino de turmas da EJA, de duas escolas da rede municipal
de ensino de João Pessoa (Paraíba) e também utilizou as
memórias como instrumento de coleta de dados. Os resulta-
dos alcançados foram a identificação do trabalho como ele-
mento que ajuda a construir uma identidade masculina
socialmente valorizada, do provedor do lar. Enquanto meni-
nos e rapazes, as pessoas do sexo masculino se vêem co-
mo mais propensos à bagunça, enquanto as garotas seriam
mais dedicadas aos estudos, justificando estes fatores como
responsáveis pelas experiências de fracasso escolar.
453
Buscando refletir sobre a simbologia dos conteúdos
de gênero, Brito (2009) investigou jovens rapazes estudan-
tes de um projeto de EJA, da rede municipal de São Paulo, o
CIEJA. Para coletar os dados, utilizou relatos narrativos des-
sas pessoas de sexo masculino. Concluiu que as masculini-
dades são afirmadas através de simbologias culturais do
significado de ser homem. Estas simbologias se tornam nor-
mas praticadas, linguísticas e corporais ao longo da vida es-
colar regular. Se perceberem fortes é uma das estratégias
para preservar o símbolo de gênero no espaço escolar, es-
tas estratégias se dão pela capacidade de causar problemas
e terem sucesso nos esportes (BRITO, 2009). As questões
de gênero se relacionam aos conceitos construídos por sub-
jetividades do discurso tanto para pessoas do sexo masculi-
no como para pessoas do sexo feminino.
Para mostrar que mulheres e homens constituem e
mobilizam práticas de numeramento em função dos discur-
sos, Souza (2008) investigou as práticas de numeramento
das alunas e dos alunos da EJA, com idade compreendida
entre 1 8 e 76 anos. Esses alunos são trabalhadores de uma
associação de catadoras e catadores de materiais reciclá-
veis. A observação das aulas, registros de episódios e entre-
vistas foram utilizados para coleta de dados. A autora
percebeu que persiste, na contemporaneidade, o discurso
da “razão como posse do homem” e o “cuidado” como práti-
ca, essencialmente feminina.
Com a finalidade de saber como se constitui as inter-
subjetividades das identidades étnico raciais e de gênero no
contexto escolar de centros urbanos, Matos (2008) estudou
adolescentes, jovens e adultos em contexto escolares nos
distritos federais do México e do Brasil, utilizando metanar-
rativas. A interdisciplinaridade favoreceu este diálogo e pos-
sibilitou as interpretações, permitindo assim, as
comparações. Foi percebido que os sujeitos assumem um
454
pertencimento étnico racial, de gênero e os dramatizam nos
espaços escolares.
Oliveira (201 0) visou analisar como sexualidade e
gênero se manifestam nas práticas escolares e nas falas de
professores de EJA e de seus alunos maiores de 50 anos. A
autora percebeu que nestas falas o corpo é percebido no
aspecto físico e sua historicidade é desconsiderada. O co-
nhecimento se limita ao currículo e os professores evitam
discutir sobre sexualidade e velhice temendo gerar algum
incômodo.
Para analisar como o gênero e a sexualidade apare-
cem em práticas escolares de uma escola de EJA, no Distri-
to Federal, Soares (201 2) realizou observações sistemáticas
em sala de aula da 7ª série do ensino fundamental com alu-
nos de idades superiores a 50 anos. A autora percebeu a
necessidade da adoção de perspectiva histórico-cultural na
abordagem de temas relacionados à educação sexual que
descaracterize aspectos higienistas, ascéticos, cartesianos
e propõe a incorporação dos estudos sobre o corpo, gênero
e sexualidade às aulas de ciências.
Nos baseando nos resultados das pesquisas, pode-
mos inferir que no bojo destas discussões encontramos as
percepções de gênero como fator decorrente de constru-
ções simbólicas normatizadas através dos discursos subjeti-
vos que envolvem homens e mulheres em um dispositivo de
poder que os separam socialmente e define os papéis a se-
rem representados. Discursos promovem as distinções bio-
logistas entre homens e mulheres. As masculinidades
também se constroem no campo do discurso subjetivo. As-
sumir papéis de gênero é algo comum. No contexto escolar,
as percepções de gênero se confundem com a percepção
biologista, tanto para os estudantes como para os professo-
res. Documentos também contribuem para a personificação
das simbologias de masculinidades e feminilidades.
455
Considerações finais
456
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463
464
artigo
Resumo
465
tal e a educação de pessoas jovens e adultas venham a ser
relacionadas nas práticas escolares, efetivando a caracterís-
tica interdisciplinar da educação ambiental, tendo em vista a
formação de sujeitos autônomos e críticos de sua situação
de exclusão, bem como dos impactos ambientais decorren-
tes da atividade humana. Nesse contexto, é necessário que
os profissionais da educação atualizem-se e estabeleçam
diálogos com as educandas e os educandos para lidar, de
um lado, com as questões ambientais de forma contextuali-
zada e não autoritária e, de outro, com as peculiares neces-
sidades e demandas das pessoas jovens e adultas que
procuram a escolarização, como um de seus direitos de mo-
ver-se no mundo com mais igualdade e de capacitar-se para
uma atuação como sujeitos históricos, especialmente na luta
por justiça às pessoas mais desprotegidas social e ambien-
talmente.
Introdução
466
reza pelo ser humano. O recorte realizado foi organizado de
forma que o/a leitor/a pudesse compreender o contexto his-
tórico da educação de pessoas jovens e adultas (EJA) e da
educação ambiental (EA), bem como seus campos teóricos
e posteriormente algumas possíveis relações entre eles,
tendo em vista apresentar como a educação ambiental vem
sendo contextualizada na educação de pessoas jovens e
adultas e quais suas potencialidades na formação das edu-
candas e dos educandos da EJA.
Para isso, faz-se necessário conhecer, inicialmente,
o contexto histórico da educação de pessoas jovens e adul-
tas no Brasil, que teve início no período colonial pelos jesuí-
tas no processo de difusão do catolicismo e de educação à
elite colonizadora, seguindo posteriormente para a apresen-
tação do contexto da educação ambiental.(HADDAD & DI
PIERRO, 2000)
Ao fazermos uma retrospectiva histórica, verificamos
que a EJA é marcada por características que denotam expli-
citamente situações de opressão e humilhação vivida por di-
ferentes grupos que sofrem, até os dias de hoje, de algum
tipo de desigualdade, são eles: homens negros, mulheres
negras e brancas, índios e trabalhadores braçais que ainda
sofrem os vestígios da ideologia imposta pela elite coloniza-
dora.
Tal fato se confirma desde 1 824, quando a Constitui-
ção Imperial reservou para as pessoas que vivem no país o
ensino primário gratuito, estabelecendo porém que só as
pessoas livres poderiam receber titularidade, ou seja, so-
mente a elite alcançaria níveis de escolaridade. (SALDA-
NHA, 2009)
Ao passar dos anos, pequenas melhoras podem ser
verificadas no surgimento das primeiras políticas públicas de
EJA. Em 1 934, por exemplo, a constituição estabeleceu a
criação de um Plano Nacional de Educação que indicava
467
pela primeira vez a educação de pessoas adultas de forma
gratuita e de frequência obrigatória como dever do Estado,
porém ainda como educação compensatória, de baixa quali-
dade e pouco crítica. (BRASIL, 1 934)
Segundo Lopes e Souza (2005), na década de 40
houve uma articulação política e pedagógica que ampliou a
educação de pessoas jovens e adultas, estabilizando-a co-
mo educação nacional. Nesse período, houve uma preocu-
pação por parte de diferentes setores com a qualidade no
ensino supletivo que resultou em pesquisas, desenvolvi-
mento de materiais didáticos específicos para pessoas adul-
tas e, em 1 945, com o fim da ditadura de Vargas, a EJA
ganhou destaque passando a formar profissionalmente para
desenvolver trabalhos comunitários, por meio de Campanha
Nacional para Erradicação do Analfabetismo (CNEA). (SAL-
DANHA, 2009)
Outro destaque nesse período refere-se à Declara-
ção Universal de Direitos Humanos de 1 948, no seu artigo
26, que estabelece o direito de todos à educação, apesar de
apresentar limitações sobre o ensino superior pautadas na
meritocracia.
Na década de 1 960, o Estado, associado à Igreja
Católica, impulsiona a EJA e as campanhas de alfabetiza-
ção se intensificam. Nesse período, Paulo Freire chamou a
atenção para as causas sociais do analfabetismo, abordan-
do uma nova pedagogia libertadora, voltada para a valoriza-
ção humana, evidenciando a consciência crítica existencial,
por meio da dialogicidade, a qual ganha destaque e muitos
seguidores, de acordo com Sampaio (2009).
Paulo Freire propunha uma educação para que mu-
lheres e homens fossem reconhecidos como pessoas pro-
dutoras de cultura e não como ignorantes desprovidos de
saberes. Ao enfatizar a possibilidade de uma educação
transformadora a partir do diálogo, elaborou uma proposta
468
crítica para a alfabetização de pessoas adultas e que vinha
favorecer o processo de tomada de consciência de condi-
ções sociais opressoras. (BRASIL, 2001 , p. 24)
Porém, em 1 964, com o Golpe Militar, houve a ruptu-
ra da proposta de alfabetização iniciada por Paulo Freire e a
pedagogia libertadora tornou-se uma ameaça. Devido a es-
se golpe, a educação continua sendo conservadora e assis-
tencialista nas práticas, por meios de doações para suprir as
necessidades básicas dos/as educandos/as, o que incitou
em 1 968, seguindo as orientações da UNESCO, a criação
do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) e seu
surgimento na lei Federal de Educação 5. 692/71 , porém
ainda com o discurso compensatório e excludente. (SAM-
PAIO, 2009; DI PIERRO, 2005)
Após muitos anos de resistência, a década de 80 é
caracterizada por movimentos sociais vitoriosos e, assim, os
projetos de alfabetização se intensificam, iniciando-se a
abertura política que trouxe inúmeros avanços legais ao
campo da EJA. Esses avanços consubstanciaram-se nos
princípios estabelecidos pela Constituição Federal de 1 988,
que estendeu aos jovens e adultos o direito à educação fun-
damental. (VIEIRA; FONSECA, 2000 p. 3)
Segundo Di Pierro (2008 p. 399), “a constituição Fe-
deral de 1 988 reconheceu o direito dos jovens e adultos ao
ensino fundamental, obrigando os poderes públicos à sua
oferta gratuita – Art. 208.”. Inspirada nessa constituição, em
1 996 a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) vem
garantir à EJA a inserção como modalidade da Educação
Básica. (BRASIL, 1 996) Nesse período, há uma resistência
à política e à economia neoliberais que se estabeleciam e
se desenvolviam, contrapondo-se às lutas dos movimentos
sociais.
Os efeitos neoliberais se estendiam para o campo
educacional: as políticas estabelecidas visavam atividades
469
administrativas e técnicas no sistema escolar voltadas para
o mercado consumista. Destacam-se, nesse período, as or-
ganizações dos movimentos sociais do campo e das perife-
rias urbanas, os quais reivindicaram o direto de pessoas
jovens e adultas à educação e à democratização das políti-
cas governamentais. Neste caso, surgem o Movimento de
Alfabetização – MOVA – e o Programa Nacional de Educa-
ção na Reforma Agrária – Pronera –, instituídos a partir de
intensas pressões dos movimentos rurais.Esses movimen-
tos têm parcerias com agentes governamentais, universida-
des, sindicatos, igrejas e organizações da sociedade civil.
De acordo com a perspectiva dos movimentos soci-
ais, é interessante destacar os fóruns de “EJA”, constituídos
pelas organizações sociais por ocasião do processo prepa-
ratório da Conferência Internacional de Educação de Jovens
e Adultos – V Confintea –, que definiu alguns consensos so-
bre educação continuada e educação ao longo da vida, em
Hamburgo de 1 997. (HADDAD, 2007)
Durante essa importante conferência, foram discuti-
dos diferentes temas que reconhecem a EJA como um direi-
to chave para o século XXI. Destacamos aqui um deles (2),
referindo-se à EJA de modo geral, e um outro (1 7), que rela-
ciona o campo com a questão da sustentabilidade ambien-
tal. O primeiro deles reforça a ideia de que a EJA deve
tornar-se mais que um direito: é a chave para o século XXI,
atuante como condição para uma plena participação na so-
ciedade. Além do mais, é um poderoso argumento em favor
do desenvolvimento ecológico sustentável, da democracia,
da justiça, da igualdade entre os sexos, do desenvolvimento
socioeconômico e científico, além de ser um requisito funda-
mental para a construção de um mundo onde a violência
cede lugar ao diálogo e à cultura de paz baseada na justiça.
O segundo relaciona a sustentabilidade ambiental à
educação, afirmando que ela deve ser um processo de
470
aprendizagem oferecido durante toda a vida e que, ao mes-
mo tempo, avalia os problemas ecológicos dentro de um
contexto socioeconômico, político e cultural. A educação
ambiental de adultos pode desempenhar um papel funda-
mental no que se refere à mobilização das comunidades e
de seus líderes, visando também ações na área ambiental.
Diante desses itens podemos dizer que a V Confin-
tea contribuiu com diretrizes importantes para a EJA, que
ganha centralidade no exercício da cidadania e no desenvol-
vimento do ser humano em uma sociedade participativa jus-
ta e sustentável. Nesse sentido, a visão de aprendizagem
como processo que acontece durante toda a vida exige
complementaridade e continuidade, sendo esta uma res-
ponsabilidade do Estado para a educação de pessoas.
Com isso, surgem novos desafios às práticas atuais,
exigindo criatividade e flexibilidade ao ensino. Os investi-
mentos nacionais e internacionais são ressaltados como im-
portantes para as ações da EJA, relacionadas ao
fortalecimento e à integração de grupos excluídos que lutam
por saúde, pelo acesso à informação e pelo direito de
aprender durante toda a vida.
Apesar das reflexões da EJA apresentadas na V
Confintea, segundo Haddad (2007, p. 1 0), no Brasil, o gover-
no do presidente Fernando Henrique Cardoso (1 994-2002)
fez com que a EJA ficasse à margem da educação nacional,
como consequência da priorização de outras modalidades
da educação. Com esta atitude, os estados e municípios
não tiveram incentivos para ampliar a oferta de EJA. Com
isso, apenas no ano 2000 foi incorporada a nova concepção
de educação de jovens e adultos às normas e diretrizes na-
cionais da educação básica, por meio do parecer do Conse-
lho Nacional da Educação de Nº. 11 /2000, relatado por
Carlos R. Jamil Cury. (HADDAD, 2007)
De acordo com Di Pierro (2005 p. 1 4), “empossado
471
em 2003, o governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva
operou inicialmente uma mudança discursiva, em que a al-
fabetização de jovens e adultos passou a ser mencionada
no rol de prioridades governamentais”. Haddad (2007) co-
menta que o governo Lula fez com que o Ministério da Edu-
cação assumisse a responsabilidade da EJA e criasse a
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversi-
dade e Inclusão, a Secadi.
Em 2003 a EJA ganha um espaço na agenda do go-
verno, sendo criados vários programas educacionais: Brasil
Alfabetizado, Projovem, Proeja, Profea, que apesar de as-
pectos criticáveis pautam questões que podem contribuir
com a superação de diferentes tipos de discriminação.
Várias iniciativas do governo federal em prol da EJA
no período de 2003 a 2009 foram importantes, entre elas a
VI Confintea, realizada em 2009 na cidade de Belém do Pa-
rá, promovida pela Unesco no Brasil. Contudo, apesar dos
movimentos populares e de encontros e fóruns se articula-
rem para que a educação de pessoas adultas fosse valori-
zada como as demais modalidades de ensino, percebe-se
que ainda há falta de divulgação dos eventos quando se tra-
ta da EJA. (DI PIERRO, 201 0 p. 31 )
Diante desse breve histórico, torna-se possível reco-
nhecer que o Brasil possui uma base legal com inúmeros in-
dicativos de obrigatoriedade, gratuidade e respeito à
especificidade da educação de pessoas jovens e adultas.
Contudo, verificamos que o pleno exercício dessa legislação
ainda deixa a desejar e que muitos de seus desafios estão
relacionados à educação ambiental, uma vez que a educa-
ção ambiental de pessoas adultas apresenta papel impor-
tante para a mobilização das comunidades e dos sujeitos
visando ações para a transformação socioambiental.
Em trabalho anterior Logarezzi (201 0), era destacada
a relevância do exercício da educação ambiental, sobretudo
472
numa perspectiva crítica que implica o conhecimento das
necessidades e dos interesses, das potencialidades e das li-
mitações que caracterizam os ambientes em que vivem as
pessoas. E no reconhecimento específico da importância da
participação das classes populares nos problemas socioam-
bientais e na busca de suas soluções, sempre por meio de
processos dialógicos em que as pessoas vão buscando atu-
ar como sujeitos históricos, capazes de transformar partici-
pativamente o contexto social em que vivem, nele incluídos
o espaço e os seres ambientais do suporte em que realiza-
mos nosso mundo, na perspectiva freiriana.
Ao tratar das questões ambientais e da busca pela
construção de um mundo menos desigual baseado em soci-
edades sustentáveis, importante destacar a relevância da
educação ambiental, originária do movimento ambientalista
e concebida como uma nova orientação em educação para
o processo de enfrentamento da crise civilizatória atual, rea-
lizando, na perspectiva contra hegemônica, práticas educa-
tivas transformadoras e questionadoras do modelo de
organização, produção e consumo vigente.
A conferência de Tbilisi realizada em 1 977 é um mar-
co relevante para educação ambiental e destaca que a práti-
ca da educação ambiental deve considerar todos os
aspectos que compõem a questão ambiental, ou seja, as-
pectos políticos, sociais, econômicos, científicos, tecnológi-
cos, éticos, culturais, ecológicos, dentro de uma visão inter e
multidisciplinar. (SOUZA, 2003)
Sobre esse aspecto, Oliveira (2007, p. 1 04-11 3) apon-
ta alguns questionamentos à transformação da educação
ambiental enquanto disciplina no currículo escolar. Porém
enfatiza que quando se objetiva educar ambientalmente as
comunidades escolares, é importante focar a formação am-
biental na esfera da cidadania, visto que os conteúdos da
educação ambiental estão fundamentados em questões de
473
ordem social, econômica, política, devendo, portanto, serem
abarcados num sentido mais amplo, transversal, atingindo
seu caráter crítico, transformador e emancipatório. A autora
coloca como uma das dificuldades para a inserção da edu-
cação ambiental enquanto disciplina a fragilidade da forma-
ção das professoras e dos professores para atuar na área
socioambiental, bem como a organização, a gestão da es-
cola e sua estrutura curricular. Em contrapartida, cita
exemplos favoráveis à inserção da dimensão ambiental nas
escolas, como é o caso de Portugal, onde as escolas bási-
cas possuem em seu currículo uma área de projetos, viabili-
zando o desenvolvimento da temática no contexto escolar.
Devido à complexidade da crise em que vivemos que
se desdobra em diferentes tipos de desigualdade, sociais,
ambientais, econômicas, culturais etc., a educação ambien-
tal está diante de um difícil desafio há algumas décadas. Pa-
ra compreendermos seu contexto histórico consideramos
relevante utilizar os cadernos da Secadi, que documentaram
as bases históricas da educação, bem como da educação
ambiental.
Sobre o histórico da educação ambiental, destaca-
mos aqui a importância significativa do Tratado de Educação
Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilida-
de Global, de 1 992, orientador de alguns princípios funda-
mentais, dentre eles, o direito de sermos uma comunidade
educadora consciente com base no pensamento crítico e
transformador, enfocando a relação entre o ser humano, a
natureza e o universo de forma interdisciplinar, estimulando
a solidariedade, a igualdade e o respeito aos direitos huma-
nos, valendo-se de estratégias democráticas e da interação
entre as culturas, tratando as questões globais críticas, suas
causas e inter-relações em uma perspectiva sistêmica, em
seu contexto social e histórico. (Promea-SC, 2008).
O tratado foi elaborado pela sociedade civil planetá-
474
ria, em 1 992, em evento paralelo à Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92).
Tal documento possui diferenças explícitas e até polêmicas
com relação à formulação da Agenda 21 (que é o documen-
to síntese do evento oficial da ONU), uma vez que o tratado
reflete as questões políticas e culturais da época, corres-
pondente a diferentes países e grupos multiculturais de for-
ma participativa, a partir de princípios democráticos. Este
documento ressalta o caráter crítico, político e emancipatório
da educação ambiental e marca a mudança do ideário de-
senvolvimentista para a noção de "sociedades sustentá-
veis", procurando fortalecer a ideia de que todas as pessoas
se conscientizem da importância de utilizar o meio ambiente
para satisfazer suas necessidades sem diminuir as possibili-
dades das gerações futuras de tal utilização.
Ao pesquisarmos sobre a constituição da educação
ambiental como política pública, verificamos que no início
dos anos de 1 970 no Brasil, um grupo de pessoas preocu-
padas com o meio ambiente, os chamados conservacionis-
tas, já destacavam a importância da educação ambiental
antes mesmo do Governo Federal institucionalizá-la. (BRA-
SIL, 2007) Outros fatores complementares, como a criação
da Secretaria Especial do Meio Ambiente (Sema), a criação
da Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA) em 1 981
que estabeleceu, a necessidade de inclusão da educação
ambiental em todos os níveis de ensino, a conferência Rio
92 organizada por uma comissão interministerial, bem como
a Coordenação Geral da Educação Ambiental (CGEA/MEC),
a divisão de Educação Ambiental do Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA), a cria-
ção do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama) e do
Programa de Nacional de Educação Ambiental (Pronea), so-
maram forças para que a educação ambiental se configu-
rasse como política pública.
475
Outros fatores, como a elaboração, em 1 997, dos Pa-
râmetros Curriculares Nacionais (PCN), a aprovação e regu-
lamentação da Lei n° 9.795/99 junto ao Órgão Gestor da
PNEA com a submissão a Consultas públicas, a criação de
Comissões Interinstitucionais Estaduais de Educação Ambi-
ental (CIEAs), as Redes de Educação Ambiental, e a cria-
ção do Programa Nacional de Formação de Educadoras/es
Ambientais (Profea) em 2006, também contribuíram signifi-
cativamente para que as políticas públicas ganhassem um
caráter multicultural.
Dessa forma, promover o diálogo referente à educa-
ção ambiental possibilita que as pessoas possam refletir de
forma crítica sobre os fatos que estão relacionadas com a
nossa existência, como sujeitos, no cotidiano, e como hu-
manidade, cuja vivência dos sujeitos implica uma interação
metabólica da nossa espécie com os sistemas naturais do
planeta. Tal reflexão dialógica, se exercida na práxis do dia a
dia das pessoas, pode levar a um melhor entendimento das
nossas interações sociais e ambientais, o que potencializa a
transformação da realidade, implicando novas leituras dos
desafios socioambientais que enfrentamos e novas posturas
diante deles.
Por fim, a educação como um direito para todas as
pessoas em qualquer etapa da vida implica a educação de
pessoas jovens e adultas e, considerando ainda a importân-
cia que as questões socioambientais vêm tendo nas últimas
décadas, torna-se também implicada a educação ambiental,
especialmente se adotamos como referência a construção
de sociedades sustentáveis. Como vemos, há muitas aproxi-
mações relevantes a serem feitas entre esses dois campos.
Objetivo
476
ção ambiental no campo da educação de pessoas jovens e
adultas, refletindo sobre as possíveis contribuições da edu-
cação ambiental na formação de suas educandas e de seus
educandos.
Metodologia
477
Quadro 1. Levantamento bibliográfico do tema da pesquisa utiliza-
do na sua fundamentação teórica.
478
jovens e adultas e quais as suas potencialidades na forma-
ção das educandas e dos educandos da EJA. Tais questões
nos guiaram em direção ao objetivo da pesquisa, numa dis-
cussão que perpassou pelas autoras e pelos autores apre-
sentados no quadro 2. Por uma questão de espaço, parte
das obras listadas nos dois quadros são citadas na funda-
mentação e na discussão teóricas do artigo.
Quadro 2. Levantamento bibliográfico do tema da pesquisa utili-
zado na sua discussão teórica.
Resultados e discussão
479
zação. Pudemos verificar que o nosso país tem uma grande
dívida social com a população empobrecida, que envolve a
população negra e os povos indígenas. A partir das pesqui-
sas, verificamos que os jesuítas iniciaram o processo de al-
fabetização das pessoas adultas ao mesmo tempo em que
executavam um processo de aculturação dos nativos e de
degradação ambiental.
Como vimos, foram, e ainda são, inúmeras as inicia-
tivas para que a educação de pessoas adultas se firme co-
mo uma questão nacional, democrática e que garanta uma
escolarização transformadora, contribuindo para que os su-
jeitos da EJA saiam do estado de submissão, tornando-se
capazes de entenderem-se como fazedores atuantes da his-
tória tendo em vista a transformação socioambiental. (FREI-
RE, 1 996) De acordo com Sorrentino, et al. (2009), é
relevante que se formulem políticas públicas voltadas para a
modalidade da EJA e que a educação ambiental esteja pre-
sente nesse âmbito, uma vez que essa presença não tem
sido frequente.
De acordo com Timothy (2007), a educação ambien-
tal também é um processo permanente que acompanha a
vida toda, pois toda interação entre ser humano e natureza
gera algum tipo de impacto socioambiental o qual pode ser
mitigado.
Desde a década de 1 970 podemos verificar inúme-
ras ações dos movimentos populares e seus desdobramen-
tos no que se refere à questão ambiental e à EJA; por
exemplo, o Mobral, que tinha como objetivo erradicar o anal-
fabetismo. Em 1 971 foram implementados os cursos supleti-
vos em todo o país, tendo em vista a necessidade de
preparar as pessoas para o mercado de trabalho. Nessa
época, a educação ambiental também ganha um espaço
maior nas discussões trazendo grandes preocupações devi-
do ao desenvolvimento industrial. Essas discussões propici-
480
aram que a educação ambiental tivesse um capítulo na
Constituição Brasileira de 1 988, garantindo a todas/os as/os
cidadãs/ãos, um meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever
de defendê-lo e de preservá-lo para as presentes e futuras
gerações. (BRASIL, 1 988, Art. 225)
Assim, a educação ambiental torna-se obrigatória
nos diferentes níveis de ensino, para que todas as pessoas
possam se conscientizar sobre a relevância da preservação
ambiental e de sua articulação com a justiça social. Perce-
be-se que essa inclusão da educação ambiental na EJA,
ainda que indireta, representa um avanço nas políticas pú-
blicas para essa temática.
A EJA, assim como as demais modalidades de ensi-
no, precisam que as práticas educacionais sejam de quali-
dade, no sentido de que os sujeitos que aprendem possam
se apropriar dos conhecimentos instrumentais que lhes im-
porta para acessar os equipamentos culturais de sua época
e de seu lugar e, com isso, buscar sua inserção social, apro-
priação esta que implica a educação ambiental em articula-
ção com a EJA no processo educativo. Nesse sentido,
passamos em seguida a discutir alguns fundamentos para
formação de educadoras e educadores para promover a ar-
ticulação entre EJA e EA.
Notamos que às vezes o/a educador/a, por não ter
uma formação atualizada, compromete a prática educacio-
nal por não saber contextualizar a teoria com a realidade
dos/as educandos/educandas. Trabalhar com as questões
ambientais em interação dialógica com os sujeitos pode
contribuir nesse sentido, proporcionando momentos de
aprendizagem a ambas as partes. As/os educandas/os da
EJA possuem um amplo conhecimento de mundo, devido a
sua experiência de vida, e a educação baseada no diálogo
481
permite uma maior interação, levando a aprendizagens que
decorrem das questões diversas apresentadas por cada
pessoa e do processo de discussão coletiva que envolve to-
das as pessoas, educandas e educadora.
Cavazotti et al. (2007) mencionam que os trabalhos
em percepção ambiental buscam promover a compreensão
dos fenômenos naturais, bem como o desenvolvimento do
sistema de percepção e compreensão do ambiente vivido
por meio do conhecimento científico. Isso possibilita às pes-
soas jovens e adultas alfabetizandas melhor interação com
sua comunidade e participação não apenas reativa, mas
também propositiva. (p. 1 2) Complementarmente, nesse
sentido, Borges et al. (201 0) sugerem a observação de ima-
gens fotográficas, como um recurso importante para abordar
as questões ambientais e contribuir no aprendizado no ensi-
no fundamental e na educação de pessoas jovens e adultas.
Como diz Freire (2000), a leitura crítica do mundo é um que-
fazer pedagógico-político indicotomizável do quefazer políti-
co-pedagógico, isto é, da ação política que envolve a
organização dos grupos e das classes populares para inter-
vir na reinvenção da sociedade. (FREIRE, p. 42)
Nesse sentido, é importante que as/os educandas/os
da EJA compreendam a importância da ação política para a
realização dos seus sonhos, os quais aos poucos vão sendo
modelados na elaboração reflexiva e crítica da realidade de-
nunciada. Como cita Freire (2000, p. 43), é preciso defender
uma prática docente em que o ensino rigoroso dos conteú-
dos jamais se faça de forma fria, mentirosa e neutra. (FREI-
RE, 2000 p. 43) Nessa perspectiva, a educação ambiental
vem colaborar na formação das/as educandas/os da EJA,
quando o/a educador/a, ao discutir as questões ambientais
com os sujeitos, leva em consideração a sua bagagem soci-
ocultural. Um dos caminhos importantes para discutir tais
questões é o diálogo, tendo em vista que este garante opor-
482
tunidades à fala do outro e respeita seu valor argumentativo.
A VI Confintea, realizada em Belém em 2009, enfati-
zou a importância da aprendizagem ao longo da vida para
resolver as questões globais e os desafios educacionais.
Sorrentino, Portugal e Viezzer (2009, p. 1 ) relataram em do-
cumentos que antecederam aquela conferência e o Fórum
Internacional da Sociedade Civil (Fisc), destacando a urgen-
te necessidade de se incluir a educação ambiental na for-
mação de pessoas jovens e adultas e a relevância e a
necessidade de convergência entre as ações, as políticas,
os programas e os projetos de educação ambiental e de
educação de pessoas jovens e adultas.
O autor e as autoras salientam ainda o que se espe-
ra para a EJA nas discussões que possam fortalecer e di-
fundir o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades
Sustentáveis e Responsabilidade Global, levando-o para o
conhecimento e debate crítico de pessoas jovens e adultas,
promovendo o envolvimento participativo dos grupos sociais.
Espera-se também e principalmente que a EJA promova a
interpretação e o debate sobre as distintas realidades socio-
ambientais, local e global e o compromisso individual e co-
letivo com ações voltadas a sua transformação no sentido
do bem comum – da conservação, recuperação e melhoria
do meio ambiente e da qualidade de vida de todas as pes-
soas. (SORRENTINO, PORTUGAL & VIZZER, 2009, p. 31 0)
É importante salientarmos que a educação ambien-
tal não deve ser entendida tão somente como uma forma de
preservar a natureza da humanidade. É necessário destacar
que os seres humanos também fazem parte da natureza e
que, portanto, ao pensar em preservação ambiental é preci-
so lembrar que existem milhões de pessoas com baixa pro-
teção social ou até sem qualquer tipo de proteção social. Tal
quadro tem sua injustiça ainda reforçada pela maior vulnera-
bilidade aos efeitos decorrentes dos impactos ambientais
483
antrópicos, aos quais estão sujeitas as populações mais
desprotegidas socialmente, constituindo-se em questão que
demanda abordagem socioambiental.
As discussões que as/os educadoras/es verbalizam
no espaço escolar influenciam a vida dos sujeitos fora des-
ses espaços também. E, então, ao se falar em meio ambi-
ente as educandas e os educandos da EJA podem
compreender como se dá a relação cultural com o meio am-
biente e, portanto, a educação ambiental vai além dos currí-
culos. Esse fator demonstra como é importante que a
educação ambiental seja amplamente contextualizada e im-
plementada mais fortemente nos currículos e não como uma
disciplina específica, porque ela faz parte de todas as áreas
educacionais.
Sobre isso, Timothy (2007, p. 235-245) comenta que
a educação ambiental deve ser discutida como um tema
transversal e aprofundada em todas as áreas do conheci-
mento já no início da alfabetização. Ainda diz que a integra-
ção da educação ambiental na educação de pessoas jovens
e adultas, de uma forma concreta e não de uma forma sim-
bólica como uma disciplina isolada, não é uma opção, mas
uma necessidade.
A educação ambiental colabora para que os sujeitos
potencializem-se para a transformação da realidade indivi-
dual e coletiva do contexto em que estão inseridos. Segundo
Timothy (2007, p. 232), a educação deve ser crítica e ativa,
procurando aprofundar a compressão de mundo de cada
pessoa para transformá-lo, porque a educação faz parte da
vida. Por isso a educação ambiental é tão relevante na edu-
cação de pessoas jovens e adultas.
De acordo com Silva e Abílio (2011 , p. 43), há muito
que se recontar na história oficial e a educação ambiental
pode prestar relevante serviço neste aspecto ao criticar o
modelo vigente e rememorar os modelos de sociedade que
484
foram forjados na opressão de povos e culturas e geradores
da dívida ecológica. A EJA não pode continuar sendo vista
apenas à margem da educação. É preciso investir seriamen-
te nessa modalidade; os sujeitos da educação de jovens e
adultos há muito tempo têm esperado por mudanças. Ao se
falar em EJA politicamente, não há de ser amanhã, é preci-
so ser agora, e depende de cada um de nós, não podemos
passar pela vida na neutralidade, fechando os olhos en-
quanto milhões de pessoas estão esperando ser vistos e re-
conhecidos como seres humanos.
Como diz Freire (1 987), é preciso que, ao respeitar a
leitura do mundo da/o educanda/o para ir mais além dela,
o/a educador/a deixe claro que a curiosidade fundamental à
inteligibilidade do mundo é histórica e se dá na história, se
aperfeiçoa, muda qualitativamente, se faz metodicamente ri-
gorosa. (FREIRE, 1 987, p. 77) O sujeito que se abre ao mun-
do e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica
em que se confirma como inquietação e curiosidade, como
inconclusão em permanente movimento na história. (p. 86)
A educação ambiental e a educação de pessoas jo-
vens e adultas trazem grandes possibilidades para que a
sociedade civil e as autoridades governamentais movam-se
para construir politicamente um ambiente, onde todas as
pessoas sem nenhum tipo de discriminação possam viver
dignamente. A educação ambiental, como já mencionado, é
parte da vida das pessoas em qualquer idade, portanto faz
se necessário contribuir politicamente para que os sujeitos
da EJA participem atuantes desse processo. Para elas e
eles a oportunidade de emancipação em busca da transfor-
mação de sua história de vida atual e futura traduz-se no re-
nascer da esperança por uma atuação no mundo livre da
opressão à qual foram submetidos no decorrer de suas tra-
jetórias de vida.
485
Considerações finais
486
nas no mundo, mas com o mundo, e com os outros. Um ser
capaz de intervir no mundo e não só de a ele se adaptar”.
Por isso, a contribuição direta desse autor tanto para a edu-
cação de pessoas jovens e adultas como para a educação
ambiental, uma vez que ele traz nas suas teorias e nas suas
práticas princípios de uma educação libertadora, voltada pa-
ra a superação da relação de opressão social, a qual está
vinculada à relação de exploração da natureza pelo ser hu-
mano.
Com a fundamentação e a discussão apresentadas,
essa pesquisa procurou contribuir com informações e refle-
xões relevantes para o meio acadêmico, para as ações pe-
dagógicas e para os espaços educativos escolares e não
escolares que articulam estas duas áreas educacionais:
educação ambiental e educação de pessoas jovens e adul-
tas.
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MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Educação ambiental: cur-
so básico à distância , contido em seis livros: (1 ) - Questões
ambientais, conceitos, história, problemas e alternativas. (2-
3) – Educação e Educação Ambiental I e II. (4) - Gestão de
recursos hídricos em bacias hidrográficas sob a ótica da
educação ambiental. (5) – Documentos e legislação da edu-
cação ambiental. (6) – Guia do aluno e caderno de ativida-
des. Brasília: Ed. Fubra, 2001.
SORRENTINO, M.; PORTUGAL, S.; VIEZZER, M. A educa-
ção de jovens e adultos à luz do Tratado de Educação Ambi-
ental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade
Global. La Piragua: Revista Latino Americana de Educación Y
Política , Panamá. v. 2, n. 29, p. 93-1 08, 2009.
492
artigo
Resumo
Introdução
494
Adultos (CEJA) que tem como meta a realização de uma
Educação de qualidade àqueles que foram excluídos do sa-
ber escolar.
Este trabalho “Centro Educacional de Jovens e Adul-
tos (CEJA): 27 Anos de trajetória em Bauru/SP” é um relato
objetivando compartilhar a trajetória destes 27 anos da Uni-
dade Escolar no município de Bauru. Trata-se de um “olhar”
histórico e neste olhar há muita satisfação, sonhos, paixões
por essa modalidade de ensino que busca vencer os desafi-
os conquistando seu espaço na Educação.
O nosso convite, por meio desta pesquisa, é para
“olhar” essa trajetória do CEJA e certamente, com isso, agu-
çar reflexões amplas sobre a modalidade EJA, especifica-
mente sobre o CEJA, para a compreensão desta trajetória e
o que a Unidade enfrentou em termos de dificuldades e as
conquistas adquiridas nestes anos.
Objetivo geral
495
sunto e com o levantamento e análise histórico documental
na Secretaria Municipal de Educação de Bauru, na sede ad-
ministrativa do Centro Educacional de Jovens e Adultos
(CEJA) e nos trabalhos acadêmicos de Graduação em Pe-
dagogia e Especialização em Gestão Escolar de duas edu-
cadoras do CEJA.
Desenvolvimento
497
Em 1 996, é aprovada a Lei de Diretrizes e Bases
9.394/96, na qual existem dois artigos tratando da EJA.
Em 1 998 a Educação de Jovens e Adultos de Bauru
passa a ter uma sede própria, criando-se o Centro Educaci-
onal de Jovens e Adultos (CEJA), com autonomia adminis-
trativa, de acordo com a LDBEN nº. 9394/96.
Em 1 999 entrou em vigor o novo Regimento Escolar
da Rede Municipal de Ensino. A necessidade de regulamen-
tação do Ensino Supletivo em nível de Suplência I proporci-
onou a elaboração de um novo Regimento Escolar para toda
a Rede Municipal de Educação, reformulando e adequando
assim todos os procedimentos educacionais que eram prati-
cados e sanando inúmeras irregularidades, trazendo benefí-
cios para o ensino municipal como um todo em suas
diferentes modalidades. Por fim, em 2000 foram aprovadas
as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jo-
vens e Adultos.
Em 2004 foi inaugurada a unidade II do CEJA, o pri-
meiro local que abrigaria várias classes num espaço próprio,
onde também seria possível promover eventos de socializa-
ção.
No ano de 2006, iniciou-se a elaboração coletiva do
Projeto Político Pedagógico, para tanto a Secretaria Munici-
pal de Educação ofereceu cursos aos profissionais da edu-
cação ministrados por especialistas da UNESP/ Bauru, o
que facilitou o processo de elaboração.
A partir de 2007 foram inaugurados os Pólos de Educação
de Jovens e Adultos, construídos em vários bairros da cida-
de, em virtude da necessidade possuir um espaço voltado
para o público jovem e adulto, pois até então as salas eram
improvisadas em locais que muitas vezes não contavam
com mobiliário adequado.
Neste mesmo ano a Secretaria Municipal de Educa-
ção de Bauru em parceria com o Planeta Educação criaram
498
o Projeto Click Inclusão, tendo como um dos objetivos propi-
ciarem aos seus educadores uma formação tecnológica pro-
pondo ações de informática educativa possibilitando
recursos tecnológicos como ferramenta enriquecedora no
trabalho pedagógico. O Projeto contou com profissionais
especialistas, mediadores atuando junto aos educadores
para aprendizagem didática tecnológica nos laboratórios de
informática. Alguns mediadores davam suportes nas unida-
des escolares atuando junto ao educador e educandos na
construção de projetos pedagógicos e também outros medi-
adores atuavam junto aos funcionários da rede municipal
com noções básicas de informática para os inserirem no
mundo tecnológico. O Projeto aconteceu também em 2008 e
2009 com sucesso.
Em Agosto de 2008 a sede administrativa foi transfe-
rida para Rua Saint Martin nº. 20-81 Altos da Cidade e atu-
almente permanece neste local.
Em Novembro de 2009, iniciou-se um trabalho pio-
neiro: Professor Coordenador Pedagógico, uma grande con-
quista, pois a unidade contava com três coordenadores de
área e as classes subdivididas em setores para facilitar o
trabalho de supervisão e devido ao número de classes para
cada setor a supervisão pedagógica ficava comprometida.
Em 201 0, infelizmente venceu o contrato com a em-
presa Planeta Educação e as unidades escolares ficaram
sem os laboratórios de Informática para desenvolver o tra-
balho das Tecnologias de Informação e Comunicação
(TICs), mas em 2011 a Secretaria Municipal de Educação de
Bauru firmou parceria com outra empresa, a Mstech para
dar continuidade neste trabalho “Inclusão Digital” no municí-
pio de Bauru. Nesse sentido, os laboratórios de Informática,
disponibilizados em diversas escolas municipais, inclusive
no CEJA retomaram o trabalho com os professores e com
algumas classes de acordo com o interesse e disponibilida-
499
de do cronograma do projeto Inclusão Digital, sendo ofereci-
do ônibus da Prefeitura Municipal de Bauru tendo como in-
cumbência transportar os alunos, em média três classes de
bairros distintos, conduzindo-os até o Laboratório de Infor-
mática.
É imprescindível salientar que durante todo percurso
histórico do CEJA, a Secretaria Municipal de Educação dis-
ponibilizou Formação Continuada para os profissionais mu-
nicipais e em 2011 ocorreu o I Congresso Municipal de
Educação possibilitando aos educadores a oportunidade de
compartilhar o trabalho realizado nas diferentes modalida-
des de ensino, inclusive a EJA.
A estrutura organizacional do CEJA é composta hie-
rarquicamente por: Diretor de Divisão que atua junto a Se-
cretaria Municipal de Educação, um Coordenador, que
responde pela diretoria na Unidade Escolar do CEJA, um
Professor Coordenador Pedagógico, Professores de EJA,
alunos, apoio administrativo: secretária, auxiliar administrati-
vo, servente, merendeira e auxiliar geral.
O CEJA oferece curso semestral com 1 00 dias leti-
vos presenciais de 1 º ao 4º Termo, equivalente às quatro
primeiras séries da Educação Básica aos jovens a partir de
1 5 anos, adultos, alunos portadores de necessidades espe-
ciais e idosos, sendo este um dos desafios para o CEJA de-
vido ao crescente número, principalmente do sexo feminino,
uma vez que as mulheres sempre fizeram parte do grupo
dos excluídos, onde o direito à Educação era privilégio mas-
culino. A educação de idosos ainda é um desafio. A Lei nº.
1 0741 , que dispõe sobre o estatuto do idoso, definem este
como a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos e no
Art.2º garante os seus direitos:
“O idoso goza de todos os direitos fun-
damentais inerentes à pessoa humana,
[...] assegurando-lhe, por lei ou por ou-
500
tros meios, todas as oportunidades e fa-
cilidades, para a preservação de sua
saúde física, mental e seus aperfeiçoa-
mentos morais, intelectuais, espirituais e
sociais em condições de liberdade e dig-
nidade”. (BRASIL, 2003, p.3)
502
pôde ser atendida na época oportuna.
A EJA em Bauru, realizada pelo CEJA, está presente
em diversos bairros sempre com a finalidade de levar aten-
dimento educacional onde se encontra a clientela.
A Unidade CEJA, neste percurso, teve muitos desafi-
os, mas também muitas conquistas como: a Sede adminis-
trativa, a inauguração da Unidade CEJA II, a elaboração do
Projeto Político Pedagógico, os Pólos, a contratação de um
professor Coordenador Pedagógico e a Inclusão Digital que
possibilitou a presença da EJA nos laboratórios de Informá-
tica.
Nesse sentido, o CEJA tem avançado bastante nesta
trajetória, embora tenha muito ainda a realizar.
O desafio atual da sociedade não é propor mais me-
tas para a educação ou mais projetos de EJA, mas avaliar
os impactos qualitativos das experiências existentes em ca-
da canto do país e realmente erradicar o analfabetismo no
Brasil, mas para que isso ocorra é preciso que tenha vonta-
de política para a superação de problemas na educação que
favoreça a uma educação com qualidade.
Muitas administrações municipais vêm buscando as-
sumir esse compromisso com propostas curriculares, forma-
ção docente e produção de materiais didáticos. Donde a
importância da existência de uma fonte permanente de re-
cursos a fim de viabilizar o caráter includente desse direito,
como ocorre em Bauru.
Democratizar o ensino não é só instalar escola públi-
ca, mas garantir que os educandos, além de ir à escola,
aprendam com vontade e prazer de aprender. Precisamos
refletir sobre a situação real dos alunos e as interferências
que a escola pode realizar no dia a dia, possibilitando um
avanço na formação do sujeito de forma plena para o exer-
cício de sua cidadania.
A trajetória do CEJA, nestes vinte e sete anos, en-
503
frentou dificuldades, mas conquistou seu espaço na Educa-
ção proporcionando oportunidades aos que por alguma ra-
zão não tiveram acesso a educação.
Espera-se que com a realização deste trabalho fo-
mente em outros pesquisadores o interesse de novas pes-
quisas na modalidade da Educação de Jovens e Adultos.
Referências
504
o 1 º segmento do ensino fundamental, São Paulo/ Brasília,
1 997.
BRASIL, Ministério da Educação e da Cultura. Salto para o
Futuro – Educação de Jovens e Adultos / Secretaria de Educação
à distância . Brasília. Ministério da Educação. SEED, 1 999.
505
506
artigo
Resumo
Introdução
508
necessidades da população. A opção pelo curso técnico de
Edificações ocorreu considerando que o segmento da cons-
trução civil têm sido de grande importância para o desenvol-
vimento da nação, sendo um dos responsáveis pelas bases
da sociedade industrial e indispensável ao prosseguimento
do processo de industrialização. Além disso, o setor ainda
contribui significativamente para o atual crescimento econô-
mico quando colabora para a diminuição do desemprego,
por meio da geração de vagas diretas e indiretas, absorven-
do grande porcentagem da mão de obra do país. Outra con-
tribuição do setor é no campo social, pois, por meio das
novas moradias que surgem, oferece melhor qualidade de
vida à população brasileira e local.
A literatura que aborda o tema sugere que a forma-
ção profissional ocorra de forma integrada à formação geral
e também de forma integral e não apenas tecnicista, mecâ-
nica e conteudista, visando a desenvolver apenas a habili-
dade de reprodução e não de produção e de aplicação dos
conhecimentos adquiridos na escola nas diversas áreas da
vida humana. No entanto, há no meio acadêmico questiona-
mentos acerca do “distanciamento entre o saber acadêmico
e a vida dos sujeitos”, como afirmam Cox e Assis-Peterson
(2002, p.1 9) há um descompasso entre a “teoria e a prática,
o saber acadêmico e o saber vivencial”. Diante do exposto,
decidi ouvir os discentes envolvidos no processo com o in-
tuito de verificar a visão que têm da formação que a escola
lhes está oferecendo, de forma a apreender os significados
que atribuem à aprendizagem escolar, de forma geral e sua
aplicação em seu cotidiano pessoal, social e profissional.
Pois, tão importante quanto conhecer as teorias e aborda-
gens de ensino e aprendizagem é conhecer o aluno, suas
expectativas e necessidades, para que esse saber possa
ser utilizado para criar contextos que favoreçam a aprendi-
zagem.
509
Veremos, no decorrer do estudo, que as impressões
que os indivíduos têm de si e de outrem são formadoras de
crenças, que, por sua vez, são norteadoras das atitudes in-
dividuais e sociais, sendo assim, seu estudo torna-se es-
sencial para que a escola apreenda os discursos que
permeiam a formação escolar, de forma geral e possa criar
contextos que possibilitem aos professores e alunos “se en-
gajarem efetivamente em trocas múltiplas de significados”
que façam diferença em todas as esferas da atividade hu-
mana.
1 . DESAFIOS
51 0
lhador e se tornar uma escola comprometida com as trans-
formações sociais, mediante um projeto pedagógico que se-
ja permeado pela vida concreta de cada um e cada uma,
possibilitando diferentes abordagens mediante uma constru-
ção coletiva pela comunidade escolar.
A proposição para a concretude de uma escola ca-
paz de lincar a formação do trabalhador no contexto de uma
formação integral não é de uma ação educadora qualquer,
mas uma educação vinculada a um Projeto Democráti-
co,comprometido com a emancipação dos setores excluídos
de nossa sociedade. Uma educação que assimila e supera
os princípios e conceitos da escola e incorpora aqueles
gestados pela sociedade organizada. Trata-se de um pro-
cesso de via de mão dupla em que a comunidade educa a
própria escola e é educada por ela, que passa a assumir um
papel mais amplo na superação da exclusão social.
Neste sentido, o conceito de inclusão que deverá
perpassar a Educação Profissional e Tecnológica deve abri-
gar o combate a todas as formas de opressão e preconcei-
tos, também geradores de violência e intolerância, por meio
de uma educação humanista, pacifista, preocupada com a
preservação da natureza e profundamente vinculada à soli-
dariedade entre todos os povos independentemente de fron-
teiras geográficas, diferenças étnicas, religiosas ou quanto à
orientação sexual (PACHECO, 2011 ). As práticas educativas
desenvolvidas no processo de formação do trabalhador de-
vem estar vinculadas à promoção da emancipação dos tra-
balhadores, na mesma medida em que deve possibilitar
também os princípios básicos da cidadania, tais como a to-
mada de consciência, a organização e a mobilização. Ou
seja, a transformação do trabalhador em sujeito da história.
2. À LUZ DOS DADOS
511
Questão 1 - Quais foram os principais motivos de ter parado de
estudar, anteriormente?
Para representar o resultado desta questão, as re-
postas foram analisadas e classificadas em três categorias:
trabalho, falta de oportunidade e casamento e filhos, confor-
me mostra o quadro e o gráfico abaixo:
Quadro 1 : Motivos de terem deixado a escola.
51 2
Gráfico 1 : Motivos de terem deixado a escola.
51 4
Gráfico 2: Motivos por que voltaram à escola.
51 5
Gráfico 3: Razão da opção pelo curso PROEJA Edificações
51 7
ticula “trabalho, cultura, ciência, tecnologia e tempo, visando
o acesso ao universo de saberes e conhecimentos científi-
cos e tecnológicos, produzidos historicamente” (CEFET-M,
Plano de curso, 2009, p.2).
Apesar de as propostas serem a integração da “qua-
lificação social e profissional”, que conforme afirma o Docu-
mento Base “permite a inserção e atuação cidadã no mundo
do trabalho, com efetivo impacto para a vida e o trabalho
das pessoas” o interesse dos alunos é na educação profissi-
onal visando em primeiro plano o mercado de trabalho.
No que refere a aprendizagem, considerando o curso
de forma geral foi unânime a afirmativa de que a aprendiza-
gem está ocorrendo. Quanto à forma como percebem essa
aprendizagem (a que atribuem) é que houve variação. Veja-
mos.
Questão 4 - Você acredita que está tendo uma boa aprendizagem
nesse curso? Por quê?
51 8
Gráfico 4: Impressões acerca da aprendizagem
520
entados que se tratava de todas as disciplinas.
Quadro 5: Impressões acerca da aplicação da aprendizagem es-
colar na vida social
521
de. No entanto, nos dois primeiros semestres, objeto dessa
investigação, há grande disparidade entre as horas destina-
das às disciplinas de formação geral e as de formação es-
pecífica, sendo 31 8h e 284h, primeiro e segundo semestre,
respectivamente, de disciplinas do núcleo comum, enquanto
a formação profissional conta com apenas 33h no primeiro e
66h no segundo semestre. Mesmo assim, as declarações
levantadas, revelam impressões de maior incidência de apli-
cação na vida profissional dos indivíduos. Repete-se aqui o
já comentado na análise das questões 2 e 3, que além das
experiências e perspectivas pessoais, os alunos podem es-
tar sofrendo influência dos discursos que permeiam o curso,
que, por sua vez são oriundos da legislação vigente.
Fato positivo é que há indícios de que esteja haven-
do a formação integral dos sujeitos, pois não deixam de citar
nenhuma área quando afirmam a melhora na utilização da
linguagem, da matemática e dos conhecimentos gerais, e
não apenas as disciplinas do eixo específico.
Pode-se constatar que os discentes creem que estão
aprendendo e aplicando os conhecimentos que estão cons-
truindo. Isso vem ao encontro do que pregam as teorias que
visam à aproximação do saber acadêmico da vida, seja ela
pessoal ou profissional.
Questão 6 - Qual é a disciplina que você mais gosta? Por quê?
522
Gráfico 6: Preferências por disciplinas
524
Dentre as respostas supracitadas as disciplinas So-
ciologia e Filosofia juntas compõem a metade delas. Na
questão anterior (questão 6) que tratou das disciplinas que
mais gostam ambas não foram citadas. Chamou a atenção o
fato de Sociologia e Filosofia serem voltadas para a forma-
ção humana, mais uma vez denota-se que o corpo discente
atribui maior valor à formação profissional.
3. POSSIBILIDADES
525
si a responsabilidade da aprendizagem. Nesse caso, somos
remetidos à “profecia da autorrealização” quando procuram
apresentar os resultados que deles são esperados.
Nesse sentido, é contribuição dessa pesquisa de-
monstrar as impressões e razões pelas quais os discentes
estão no curso, para que os professores possam vislumbrá-
las e tomá-las por base para refletirem acerca de seus pla-
nos de ensino e paradigmas, pois tais impressões podem
auxiliar na consolidação de atitudes positivas, e, com isso,
favorecer a aprendizagem. Refletirem também se estão
atendendo às expectativas, as características e especificida-
des dos jovens e adultos atendidos, conforme sugere o De-
creto 5478/05, se está sendo promovida a formação integral
de acordo com o que pretende o Documento Base (2007), e
se a escola está cumprindo sua função de preparar o “cida-
dão para sua inserção na sociedade, na qual ele viverá co-
mo cidadão e como profissional de alguma área da atividade
humana” (MORETTO, 2007). Nesse aspecto, o mesmo autor
salienta que uma das funções da escola é contribuir na for-
mação de “gerentes de informações e não meros acumula-
dores de dados” (MORETTO, 2007, p.67).
Nessa perspectiva, alguns questionamentos envol-
vendo crenças, funções da escola, mudanças de paradig-
mas tanto no que concerne ao ensino das disciplinas de
ambos os eixos, núcleo comum e formação profissional, se
oferecem à reflexão e à pesquisa:
1. Até que ponto, no cotidiano das aulas do curso PROEJA
Edificações, está sendo buscada a formação integral, tendo
em vista que o próprio documento base e o plano de curso
acabam por enfatizar a educação profissional?
2. O projeto do curso e os planos de ensino foram e estão
sendo elaborados considerando as características e especi-
ficidades dos jovens e adultos atendidos como sugere o De-
creto n. 5478/05?
526
3. As impressões levantadas nessas duas turmas são as
mesmas nas demais que iniciaram e iniciarão o curso?
4. As impressões demonstradas pelos colaboradores deste
trabalho se manterão as mesmas até o final do curso? Arrai-
gar-se-ão, transformando-se em crenças? Ou sofrerão alte-
rações e até mesmo se dissiparão?
5. As crenças são complexas e frequentemente desconheci-
das, são mais tácitas do que conscientes. Se as crenças são
possíveis de transformação, apenas conhecê-las seria sufi-
ciente para mudá-las?
6. O que forma ou transforma as crenças? Seriam apenas
as experiências individuais e coletivas?
7. Como crenças e atitudes se relacionam? Seria possível
identificar atitudes a partir das crenças?
8. O que muda primeiro a prática social/cultural ou o discur-
so?
9. Que caminhos escolher para possibilitar a formação inte-
gral e preparar atores transformadores de sociedade?
Os alunos do curso PROEJA Edificações apresen-
tam impressões positivas com relação ao curso e o filtro afe-
tivo tem estado baixo, situações que levam a atitudes
positivas, que por sua vez, tendem a resultar em ações po-
sitivas. Tal constatação nos remete a uma questão crucial:
1 0. Por que razão há um índice tão alto de evasão? Por que
o aluno evade se ele tem elementos positivos que o predis-
põe a aprender e a permanecer na escola? O que aconte-
ce?
Permeia aqui a necessidade de buscar respostas a este
questionamento e às demais reflexões elencadas.
O percurso desta pesquisa levou-me à reflexão sobre
a função e importância da pesquisa em sala de aula e acer-
ca de crenças e atitudes. Já que são possíveis formadoras
de crenças e podem nortear atitudes e ações tanto de pro-
fessores quanto de alunos, as impressões devem ser tema
527
de investigações, discussões e reflexões constantes. E é
nesse ir e vir infinito que habita a tarefa do pesquisador.
4. CONSIDERAÇÔES FINAIS
528
nários consiste em outro ponto primordial para que chame-
mos de impressões e não de crenças as informações que
os dados revelaram. Não houve também, uma análise dos
planos de ensino, suas ementas e objetivos para que se fi-
zesse um contraponto com as impressões. Portanto, se os
métodos e olhares fossem outros, também os resultados po-
deriam ser alterados.
Em síntese, este trabalho e os documentos relativos
ao tema, apontam para novas direções que sugerem deslo-
camentos de óticas quanto à questão da aprendizagem de
disciplinas nos cursos de formação profissional.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
529
BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Decreto n.5.478, de
24 jun. 2005. Institui, no âmbito das instituições federais de
educação tecnológica, o Programa de Integração da Educa-
ção Profissional ao Ensino Médio na Modalidade de Educa-
ção de Jovens e Adultos–PROEJA. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil/ Ato2004006/2005/ Decreto/
D5478.htm. Acesso em: 1 5 nov. 2009.
BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Decreto n.51 54, de 23
jul. 2004. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1 996, que estabelece
as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras pro-
vidências. Disponível em: http://www.see.rj.gov.br/coie/NO-
VIDADES/d04051 54. pdf. Acesso em: 1 5 nov. 2009.
BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Portaria n.2.080, de
1 3 de junho de 2005. Disponível em: http://por-
tal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf1 /proejaportaria 2080.pdf.
Acesso em: 1 5 nov. 2009.
BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Documento Base -
Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com
a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e
Adultos – PROEJA. Brasília: SETEC, 2006.
532
artigo
ENUNCIADOS DE SITUAÇÕES-PROBLEMA OU
PROBLEMAS DE ENUNCIADOS NA EJA?
Otilia N. Obst1
Patrícia D. P. de Souza2
Resumo
533
Palavras chave: Matemática e EJA. Enunciados. Educador
mediador.
535
superiores à medida que o homem se apropria e se consci-
entiza dessa nova estratégia desenvolvida para superação
de desafios, tornando-se apto para uma nova etapa mais
elaborada de aprendizagem.
Assim como ocorre a transmissão do conhecimento
adquirido pela humanidade por meio das relações e intera-
ções sociais e entre as gerações, na história do desenvolvi-
mento humano, segundo D’Ambrósio (2008), a Matemática
sempre esteve presente nos processos e técnicas de sobre-
vivência gerados e organizados individual e coletivamente
com a finalidade de explicar os fenômenos e estratégias de-
senvolvidas para a transformação da natureza pelo homem.
Esse conhecimento e suas estratégias de apropriação, ge-
rados, acumulados e transmitidos entre gerações, possibilita
a transcendência humana, pois são reelaboradas, “organi-
zadas intelectualmente e, através de comunicação no seu
sentido geral, são compartilhadas com o próximo e são or-
ganizadas socialmente” (D’AMBROSIO, 2008, p. 22).
A apropriação desses conhecimentos históricos e
culturais da humanidade promove uma amplitude estratégi-
ca para resolver os problemas cotidianos e a autonomia do
ser humano, funções fundamentais para o exercício de sua
cidadania, pois, conforme DUARTE (2009), o conhecimento
matemático desenvolvido pela humanidade seria um saber
em si e, na medida em que é metodologicamente sistemati-
zado transforma-se em um saber para o ser humano, ou se-
ja, a apropriação desse conhecimento contribui para a
humanização do homem enquanto ser individual e coletivo,
pelo processo de aquisição, superação e transformação de
saberes matemáticos historicamente criados.
Entretanto, atualmente, em muitos grupos de estu-
dantes, e mesmo de educadores, ao se anunciar o momento
da Matemática em sala de aula, predomina um mal-estar
coletivo seguido de expressões auto-depreciativas que mini-
536
mizam e até desqualificam a capacidade intelectual dos es-
tudantes que se negam a ousar ou arriscar tentativas ou
propostas para resolução de situações-problema, o que po-
de tanto incitar como tolher a imaginação criativa do educa-
dor na elaboração de propostas interessantes que
possibilitem a emancipação do ser humano.
Esse arcabouço escolar onde corre o fluxo do co-
nhecimento e o contrafluxo das dificuldades presentes em
todo sistema de ensino e aprendizagem propostos pelo sis-
tema educacional que se conflui com a falta de incentivos
estratégicos, educacionais, pedagógicos, políticos e finan-
ceiros tanto para o educador como para os estudantes, con-
corre para evasão escolar ou o empobrecimento qualitativo
da oferta e da apreensão de conceitos que permitem o de-
senvolvimento intelectual e promovem o aprendizado.
Para a pessoa que não se apropriou desses conhe-
cimentos ou que por quaisquer motivos evadiu-se da escola,
é oferecida a Educação de Jovens e Adultos, dentro do pro-
grama de educação ao longo da vida de maneira que possa,
segundo Haddad (2009), assegurar o letramento, que en-
tende como desenvolvimento de habilidades e atitudes que
favorecem o uso desses conhecimentos nas práticas soci-
ais.
Entretanto, esse retorno aos bancos escolares con-
corre com outras forças sociais que privilegiam a mão de
obra e o trabalho em detrimento da formação omnilateral e
intelectual do ser humano, que o impele à manutenção de
sua subsistência quando em situação de concorrência ou
incompatibilidade entre as atividades, adiando ou retardan-
do esse retorno inúmeras vezes. Mesmo assim, há os que
conseguem retornar e dar continuidade ao processo de en-
sino e aprendizagem na modalidade da EJA, superando
paulatinamente os novos desafios que se impõem o que co-
labora para o resgate da autoestima e de pertencimento so-
537
cial.
Superadas as primeiras barreiras do retorno à escola
como a dificuldade motora, a limitação de comunicação en-
tre colegas e educadores no espaço escolar até a dificulda-
de em criar o hábito do estudo, um novo desafio se coloca
nas relações interpessoais estabelecidas na sala de aula
entre estudantes e educadores: o que fazer com o conheci-
mento apreendido pelas ações vividas, pelo trabalho de-
sempenhado e todo saber construído ao longo dos anos
pelas relações sociais, históricas e culturais da vida de cada
estudante?
Esse conhecimento, em hipótese alguma pode ser
desprezado ou ignorado pelo educador, pois valorizando es-
se conteúdo na elaboração de situações-problema para a
devida sistematização do conhecimento prévio e inserção
social do estudante no contexto da sala de aula, além de
promover o resgate da autoestima do estudante, ressignifi-
cará sua atividade laboral, oferecendo subsídios para a ree-
laboração de suas atividades e de seu pensamento intuitivo,
promovendo seu desenvolvimento psíquico que o levará a
melhor compreensão de seu entorno oferecendo subsídios
para intervir conceitualmente na realidade que o cerca.
Neste sentido, é possível pensar que os sujeitos da
EJA com suas vivências pessoais e seus interesses particu-
lares, ao buscarem a escola, compartilham suas experiênci-
as, vivências e interesses, tornando-os coletivos de forma
que possam ser reelaborados cientificamente pelo trabalho
pedagógico desenvolvido pela educadora no processo de
ensino e aprendizagem. “Em outras palavras, aquilo que era
o alvo da ação dada deve ser convertido em uma condição
da ação requerida pelo novo propósito” (LEONTIEV, 1 988,
p.75), ou seja, promover a apreensão do conhecimento sis-
tematizado sem desfazer o que já se sabe fazer pela prática,
pelo trabalho desenvolvido no decorrer da vida.
538
Esse processo ocorre por meio da dialogia, isto é,
por meio do intercâmbio social mediado pelas palavras são
estabelecidos o diálogo e as trocas sociais que permitem o
contato com o que é novo, atual ou, ainda, desconhecido,
pois, conforme explica Leontiev (2004), “a palavra desempe-
nha um papel decisivo na criação do conceito, como forma
de centrar a atenção no traço correspondente” (p. 460), o
que promove um aprimoramento das funções psicológicas
superiores dos sujeitos.
Assim sendo, é por meio da palavra que “influi sobre
o pensamento e o reorganiza” (Vygotski, 1 995, p. 272), que
se torna possível direcionar a atenção, memorizar tarefas e
desenvolver atividades volitivas, aumentar a capacidade de
concentração e abstração do pensamento, essenciais para
a atividade de estudo, caracterizada por Davidov (1 988) co-
mo a capacidade do sujeito “criar conceitos, imagens, valo-
res e normas” (p. 1 74) (tradução nossa), ressaltando que o
ensino escolar deve oferecer condições para o desenvolvi-
mento dessas capacidades que promovem a apropriação da
cultura humana.
Nas turmas da EJA percebe-se algumas dessas ca-
pacidades já desenvolvidas nos estudantes que estão ali
com objetivos pré determinados, pois
A idade escolar avançada se caracteriza
pela utilização da atividade de estudo
como meio para a orientação e a prepa-
ração profissional, o domínio dos meios
da atividade de estudo autônoma e de
autoeducação e também a passagem da
assimilação da experiência socialmente
elaborada da atividade de estudo, fixada
nos manuais, a seu enriquecimento, ou
seja, a atividade cognoscitiva e investi-
gação criadora (DAVIDOV, MARKOVA,
1 987. p. 330) (tradução nossa).
539
A atividade de estudo pressupõe, segundo DAVI-
DOV, MARKOVA (1 987), a mediação do educador e/ou do
colega mais experiente, na elaboração e aperfeiçoamento,
pelo estudante, dessa atividade. O domínio dos aspectos
motivacionais e operacionais do estudo, a transformação do
estudante em sujeito do estudo que realiza, promove seu
amadurecimento qualitativo e, consequentemente, o desen-
volvimento do pensamento teórico ou conceitual.
É esse pensamento conceitual que deve ser desen-
volvido a partir da problematização de atividades cotidianas
dos estudantes. Pela observação feita durante nossa pes-
quisa, constatamos que a educadora já vinha desenvolven-
do atividades relacionadas ao tema sobre consumo de sódio
e saúde e apresentou propostas sobre horário de remédios,
trazendo o seguinte enunciado:
1. Gláucia precisa tomar remédio para hipertensão arterial.
Esse remédio deve ser tomado de 6 em 6 horas. Se ela co-
meçar a tomar as 7h30, quais são os outros horários que
deverá tomar seu remédio? Faça os horários nos relógios
analógicos abaixo: (tinha o desenho de quatro relógios com
os números e sem os ponteiros para os estudantes marca-
rem as respectivas horas).
Alguns estudantes apresentaram dificuldade na ela-
boração do pensamento que foi resolvido oralmente ao rela-
cionar o horário do remédio do problema com situações
vivenciadas. Sabiam dizer os respectivos horários, mas ti-
nham dificuldade para registrar, trocando os ponteiros e es-
crevendo os horários, principalmente após 1 2 horas. “é u’a e
meia da tarde e sete e meia da noite, não é professora?”
(JA)
A educadora explicou diversas vezes, utilizou um re-
lógio de parede e desenhou diversos relógios na lousa mos-
540
trando as horas e explicando como contá-las antes e depois
do meio dia, até que a maioria sentiu-se satisfeita concluin-
do que os horários seriam 7h30, 1 3h30, 1 9h30 e 1 h30. Os
estudantes registraram, primeiramente no formato analógico
desenhando os ponteiros e na folha e, em seguida, a edu-
cadora solicitou que registrassem no formato digital.
Passou, então, para o próximo enunciado, com o se-
guinte teor:
2. Se tomar o remédio às 9h00 que é de 1 2 em 1 2 horas.
Que horas deverá ser tomado o próximo remédio? (propôs
que desenhassem os relógios analógicos no caderno mar-
cando os horários com os ponteiros e escrevessem-nos no
formato digital).
Após a explicação do que se propunha no enuncia-
do, a maioria dos estudantes respondeu, oralmente “é nove
e meia da noite”, mas mesmo após toda a explanação da si-
tuação anterior, muitos apresentaram dificuldade para regis-
trar as horas corretamente, pois não tinham apoio para
desenhar os relógios e por considerar desnecessário dese-
nhar dois relógios com os ponteiros na mesma posição, en-
quanto alguns encontraram outras estratégias para esse
registro colocando o desenho do papel por baixo da folha do
caderno e copiando o relógio. Mesmo assim mostraram difi-
culdade em colocar os números no local correto, fazendo
com que os ponteiros apontados para a hora desenhada no
caderno não correspondessem com a convencional e a pes-
quisadora sugeriu (mostrando na lousa) que colocassem
primeiro os números 1 2, 3, 6 e 9 para facilitar o posiciona-
mento correto dos demais números do mostrador, de manei-
ra que os ponteiros de seus desenhos pudessem se
aproximar do convencional.
Percebemos que, mesmo considerando situações
541
cotidianas nas situações-problema, os dados fornecidos fo-
ram insuficientes para a elaboração de hipóteses dos estu-
dantes por si mesmos, gerando mais dúvidas do que
fornecendo pistas para a formulação de conceitos a serem
apropriados acerca do tema proposto. Dessa forma, a edu-
cadora valeu-se do diálogo para a reelaboração dos enunci-
ados, favorecendo a reorganização do pensamento.
A palavra, utilizada em suas diferentes linguagens e
expressões como mediadora das relações sociais, possibili-
ta o processo de transformação da consciência humana
amplia e reestrutura suas atividades mentais e contribui pa-
ra a objetivação da ação, em outras palavras, torna possível
a socialização do fenômeno apreendido, ou seja, a atividade
mental se reestrutura nas trocas de experiências e pelas
discussões promovidas na tentativa de compreender os
fenômenos do cotidiano, pois
Quando a atividade mental se realiza
sob a forma de uma enunciação, a ori-
entação social à qual ela se submete
adquire maior complexidade graças à
exigência de adaptação ao contexto so-
cial imediato do ato de fala, e, acima de
tudo, aos interlocutores concretos
(BAKHTIN, 201 2, p. 1 22).
542
cendo, assim, o processo de emancipação e autonomia hu-
manas e o desenvolvimento das funções psicológicas supe-
riores.
Nessa perspectiva, segundo Smole e Diniz (2001 ), a
leitura está presente em todas as áreas do conhecimento e
as ferramentas adequadas para sua compreensão devem
ser oferecidas ao estudante de maneira que adquiram, pau-
latinamente, autonomia no processo de aprender, pois “em
uma situação de aprendizagem significativa, a leitura é refle-
xiva e exige que o leitor se posicione diante de novas infor-
mações buscando, a partir da leitura, novas compreensões”
(SMOLE, DINIZ, 2001 , p.69).
Assim, depreendemos dessa discussão que é ne-
cessário contextualizar, levantar questionamentos e apre-
sentar de forma clara os enunciados para promover o
aprendizado, considerando os conhecimentos empíricos dos
estudantes e a reelaboração dos mesmos de modo a favo-
recer a apropriação dos saberes científicos, saberes esses
que devem ser oferecidos e mediados pelo educador, en-
quanto parceiro mais experiente do processo de ensino e
aprendizagem.
Referências
543
HADDAD, S. A participação da sociedade civil brasileira na edu-
cação de jovens e adultos e na CONFITEA VI . Disponível em:
<Scielo.br/pdf/rbedu/v1 4n41 a1 3.pdf>. Acesso em
1 2/08/201 3.
LEONTIEV, A. N. Artigo de introdução sobre o trabalho cria-
tivo de L. S. Vigotski. In: VYGOTSK, L. S. Teoria e método em
psicologia : trad. Claudia Berliner – 3ª Ed.- São Paulo: Martins
Fontes, 2004.
SMOLE, K. S.; DINIZ, M. I. Ler e aprender matemática. In:
SMOLE, K. S.; DINIZ, M. I. (orgs). Ler, escrever e resolver pro-
blemas: habilidades básicas para aprender matemática . – Porto
Alegre : Artmed Editora, 2001.
VYGOTSKI, L. S. Aprendizagem e desenvolvimento intelec-
tual na idade escolar. In: VYGOTSKI, L. S.: LURIA, A. R.; LE-
ONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem .
4.ed. Tradução Maria da Penha Villalobos. São Paulo: Ícone:
Universidade de São Paulo, 1 988.
VYGOTSKI, L. S. Obras esgogidas III . Madrid : Visor, 1 995.
544
artigo
Rafael Rossi 1
Maria Peregrina de Fatima Rotta Furlanetti 2
Resumo
Introdução
546
Em um momento, todos os bolsistas junto com os professo-
res da rede pública municipal de ensino – que também são
bolsistas – se reúnem na UNESP, a fim de discutir os temas
a serem trabalhados em sala de aula, abordagens, dificulda-
des e encaminhamentos, além de estudos teóricos que aju-
dem na compreensão da prática docente em
desenvolvimento. Em um momento oposto, os bolsistas vi-
venciam o ambiente educacional, conhecem os educan-
dos/as em EJA, realizam levantamento de suas histórias de
vida, percebem os obstáculos à concretização de uma do-
cência comprometida e engajada politicamente com a Edu-
cação e auxiliam os educadores/as na gestão e organização
de suas aulas.
Neste artigo, partilhamos e propomos o debate sobre
os desafios de operacionalização do princípio de intersetori-
alidade presente tanto na Política Nacional de Assistência
Social de 2004, quanto no Documento Base Nacional da
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diver-
sidade – SECADI - no que diz respeito aos Desafios da
Educação de Jovens e Adultos no Brasil. A todo instante
acompanhando as salas de aula de EJA e ouvindo os edu-
candos/as em sua realidade marcada por lutas, explorações
e resistência, fica nítido o imenso desafio das políticas públi-
cas inseridas nessa modalidade de ensino no que se refere
a uma articulação entre as diversas áreas de intervenção
que pretenda combater o processo de exclusão social e as
desigualdades sociais que essa população está submetida
(ROSSI, 201 2).
Assim sendo, a partir da reflexão em grupo realizada
nas reuniões e dos estudos teóricos empreendidos, acredi-
tamos que elementos da Pedagogia da Autonomia proposta
por Paulo Freire (1 996) auxiliam na busca por uma articula-
ção que seja efetivada “de baixo pra cima” como um princí-
pio essencial da prática e exercício democrático efetivado
547
pelo engajamento e fortalecimento da dimensão política dos
educadores/as que trabalham com a EJA e dos estudantes
de graduação que pretendem se inserir nesse caminho de-
safiador e instigante. Estimular a prática e reflexão de ações
locais que permitam discutir a intersetorialidade a partir de
quem convive e trabalha diretamente na EJA é um caminho
que apresenta, em potencial, elementos para instigar uma
articulação entre as diversas áreas do poder público numa
perspectiva embasada no cotidiano vivencial de trabalhado-
res em Educação com os educandos/as em sua realidade
sofrida, porém passível de mudança e transformação.
Dessa forma, o artigo está dividido em mais 3 partes.
Na primeira parte, apresentamos uma breve síntese e con-
textualização do princípio de intersetorialidade presente em
documentos oficiais e que norteiam a elaboração e consti-
tuição das políticas públicas. Na segunda parte, nós apre-
sentamos a partir de nossa prática e ação com a
experiência aqui problematizada elementos da Pedagogia
da Autonomia como parâmetros indispensáveis para repen-
sar esses obstáculos e potencialidades da discussão aqui
presente. Já a terceira parte conta com nossas considera-
ções finais e provocativas a respeito da intersetorialidade
vista a partir do “chão da escola”.
É extremamente importante afirmar que de modo al-
gum pretendemos encerrar ou nos colocar como finitos em
um debate tão amplo e passível de múltiplas e diversas
abordagens como é a reflexão da intersetorialidade na EJA.
Nosso intuito é avançar nessa problemática e convidar para
o debate todos demais pesquisadores e educadores que di-
ariamente lidam com essa questão e se inquietam com o
sentido social de suas investigações científicas.
548
O desafio da Intersetorialidade na Educação de Jovens e Adultos
550
tares e ações integradas para o desen-
volvimento da autonomia do sujeito, por
meio da garantia e ampliação da escola-
ridade e formação para o trabalho.
(PNAS, 2004, p. 88)
552
políticas. Especial destaque deve ser da-
do aos movimentos sociais que atuam
na EJA, interlocutores indispensáveis no
processo de
construção de políticas voltadas a jovens
e adultos. Quer sejam fóruns de EJA ou
demais movimentos ligados à luta pela
terra, à luta sindical, aos direitos de mu-
lheres, de afrodescendentes e de indí-
genas, todos têm exercido papel
inquestionável na proposição de diálogo
e na construção de alternativas que re-
sultem em políticas públicas conseqüen-
tes para jovens e adultos. Por esta razão,
o papel desempenhado pela SE-
CAD/MEC na articulação de políticas em
diálogo com a sociedade tem sido fun-
damental, na experiência democrática de
gestão. .(DOCUMENTO BASE NACIO-
NAL, 201 0, p. 05-06)
554
percebemos que muitas avós, tias e mães precisavam levar
seus filhos, netos e sobrinhos para a escola, já que não dis-
punham de outro local ou pessoa para cuidarem deles. Com
o projeto que desenvolvemos, solicitamos mais bolsas a fim
de que cada bolsista pudesse alternar seu dia de estágio
entre atividades com as professoras e com as crianças, po-
rém não com brincadeiras sem fundamento pedagógico,
mas sim de cunho didático que auxiliassem no desenvolvi-
mento cognitivo de conteúdos também já trabalhados no pe-
ríodo comum das aulas regulares.
Duas atividades merecem ser apresentadas e parti-
lhadas nesse artigo como exemplos de um esforço coletivo
de efetivação do princípio de intersetorialidade a partir de
ações desenvolvidas pelos professores da rede pública mu-
nicipal em EJA e da Universidade. A primeira delas diz res-
peito à ampliação da divulgação das informações, projetos e
programas desenvolvidos pela Secretaria Municipal de As-
sistência Social e da Saúde no bairro Jardim Morada do Sol.
Neste bairro ocorrem reuniões semanais entre os gestores,
voluntários e demais interessados que se intitula: “Desenvol-
vimento Local”. Quando tivemos conhecimento de tais en-
contros ficamos surpresos com o número alto de iniciativas
e ações desenvolvidas naquela localidade e que não sabía-
mos de sua existência, bem como também não o sabiam os
educandos/as em EJA. Nós levamos essas informações pa-
ra a sala de aula e convidamos os educandos/as que apre-
sentassem disponibilidade a também freqüentarem aquele
espaço acompanhando os projetos desenvolvidos e disse-
minando perante o restante.
Essa experiência foi muito interessante, pois eles
passaram a pressionar mais os representantes que ali esta-
vam presentes afirmando desconhecimento de tais práticas
e, em alguns casos, argumentando nunca ninguém terem
lhes informado a respeito de tais encontros. Essa é uma
555
contradição que ajuda a explicitar a dificuldade em dissemi-
nar em fluxos horizontais e democráticos as iniciativas de-
senvolvidas, já que essa mesma população também
freqüentava o CRAS e o posto de saúde, porém nunca al-
guém havia lhes comunicado sobre tais reuniões. Dessa for-
ma, criou-se um vínculo que ainda permanece e que lembra
de considerar a EJA e sua diversidade como princípio e ele-
mento indispensável de ser levado em consideração em
qualquer projeto ou programa social que pretenda combater
a exclusão social.
Outro exemplo de atividade desenvolvida no esforço
da intersetorialidade se refere à questão da merenda escolar
que, no caso da EJA, não vinha sendo tratada com a devida
atenção e respeito. Através das observações e denúncias
feitas pelos professores e bolsistas conseguimos pressionar
o poder público para efetivar uma ação efetiva de garantia
regular, permanente e de qualidade da alimentação também
no período em que a EJA estuda, já que os educandos/as
quando saem da escola eles não estão desistindo, evadindo
ou fracassando como apregoam alguns discursos tendenci-
osos a respeito do tema. Eles o fazem por não se sentirem
mais pertencente àquele ambiente educacional, ou seja, a
escola e a educação formal em sentido amplo não alcançou
um patamar de significância na vida desses educandos/as,
não faz mais parte de seu universo existencial de luta e re-
sistência.
Tais exemplos foram construídos e discutidos coleti-
vamente nas reuniões semanais de acompanhamento dos
bolsistas e as condições de trabalho docente também fora
um tema sempre presente e que mostram, infelizmente em
muitos casos, um descompromisso das escolas públicas
com a EJA. Embora a EJA não seja supletivo, em Presidente
Prudente – SP ela ainda funciona como “carga suplementar”,
no entanto, conseguimos o compromisso assumido pela Se-
556
cretária Municipal de Educação de contratar já a partir de
201 4 professores para essa modalidade de ensino em cará-
ter de exclusividade, dessa forma, poderão se dedicar muito
mais a esse campo do ensino que exige um comprometi-
mento político e pedagógico efetivamente pautado na práti-
ca da ampliação da democracia na área educacional.
O envolvimento em eventos, sejam eles acadêmicos
ou não, são importantes nessa meta. Os professores e bol-
sistas PEJA e PIBID são estimulados a participar desses
espaços, como foi o caso do I Fórum Territorial de Educação
e Cultura do Campo do Pontal do Paranapanema realizado
na UNESP/FCT no dia 28 de Junho de 201 3. Os Fóruns de
Educação do Campo são importantes espaços de reflexão,
debate, exposição e problematização coletiva que devem
ser incentivados para ampliarmos o processo de conscienti-
zação de todos os agentes envolvidos e preocupados com
as escolas do campo. Problematizar a educação do campo
em escolas localizadas em assentamentos rurais é trabalhar
e refletir rumo a uma gestão participativa e coletiva, em que
as famílias dos educandos/as não sejam excluídas das de-
cisões gerenciadas pela diretoria escolar. Também é preciso
considerar que os fóruns desempenham papel de aporte in-
quietante da questão educacional, já que levanta e investiga
as dificuldades para articular soluções e iniciativas que per-
mitam transformá-las, sendo assim, tais espaços constitu-
em-se em ambientes que revelam a importância da
dimensão política na educação, pois já como nos ensinou
Freire:
Outro evento igualmente relevante fora a discussão
da Conferência Nacional de Educação – CONAE - em sua
etapa intermunicipal. A equipe participou desse amplo deba-
te o dia todo, organizando discussões e defendendo propos-
tas de emendas aditivas e/ou supressivas de acordo com
cada caso e eixo discutido, inclusive, alguns se elegendo
557
delegados para participar da etapa estadual. Também pode-
mos lembrar o “Simpósio Paulo Freire: A atualidade do pen-
samento de Paulo Freire frente aos desafios do século XXI”
realizado em comemoração aos 50 anos da experiência de
alfabetização de Freire, em que pudemos contar com a par-
ticipação do Prof. Dr. Timothy Ireland representante da cáte-
dra UNESCO de EJA e Sérgio Haddad. Dentre outras
análises foram abordados os desafios da EJA frente a um
contexto internacional de desigualdades sociais e miséria
com a promoção de uma educação do “bem-viver” enquanto
um dos elementos necessários para repensarmos uma
agenda mundial de defesa e garantia do direito à educação
aos diversos grupos de jovens e adultos que não tiveram
esse acesso em idade adequada. Para lidarmos com a “cri-
se da EJA” precisamos criar mecanismos que recoloquem
essa questão em amplos debates rumo a uma consciência
mais abrangente e que seja capaz de gerar autonomia e fe-
licidade às pessoas.
m síntese, tais experiências apontam para o caráter
contínuo de formação e reflexão das problemáticas enfren-
tadas no cotidiano escolar em uma mobilização embasada
num ponto de vista daqueles que diretamente participam da
sua produção. A escola não está fechada e alienada do con-
texto social como apregoam alguns discursos, mesmo a que
mais se esforça para isso. Justamente o contrário acontece,
ou seja, ela se insere de modo efetivamente aglutinador na
luta de garantia dos direitos sociais e como produtora de co-
nhecimento ou nega essa mesma luta ao não debater tais
questões, no entanto, esses dois posicionamentos estão in-
trinsecamente relacionados a uma dinâmica própria do am-
biente educacional. E se a escola possui um movimento
interno a partir das interações humanas que a fundamen-
tam, igualmente é verdade que esta é passível de mudança
e transformação.
558
É nesse sentido que reinsisto em que
formar é muito mais do que puramente
treinar o educando no desempenho de
destrezas, e por que não dizer também
da quase obstinação com que falo do
meu interesse por tudo o que diz respei-
to aos homens e às mulheres, assunto
de que saio e a que volto com o gosto de
quem a ele se dá pela primeira vez. Daí
a crítica permanentemente presente em
à malvadez neoliberal, ao cinismo de
sua ideologia fatalista e a sua recusa in-
flexível ao sonho e à utopia. (FREIRE,
1 996, p. 1 4)
560
suas ações e ideologias.
Como já afirmamos, desempenhamos as atividades
em dois momentos que se complementam: estudos teóricos
e reflexões sobre a vivência escolar. No entanto, quando
Freire (1 996) afirma que “quem ensina aprende ao ensinar e
quem aprende ensina ao aprender” ele chama a atenção
para algo que não deve ser menosprezado em qualquer
prática educativa, sobretudo na EJA. Quando pensamos es-
te debate alicerçado nessa modalidade de ensino, muitas
vezes o fazemos pensando na interação entre professor e
educando em sala de aula. No entanto, precisamos avançar
nos vínculos pedagógicos criados também no diálogo esco-
la-universidade, isto é, ampliar nossa escala de análise, pois
quando a escola e seus agentes se esforçam para além de
suas atividades cotidianas a participar de reuniões e estu-
dos teóricos na universidade, abandonamos pouco a pouco
a compreensão da teoria como “blábláblá”, já que percebe-
mos e construímos procedimentos oriundos da reflexão teó-
rica para lidar com a realidade escolar. Ao mesmo tempo,
quando a universidade dialoga com o universo existencial
dos educandos/as em EJA e da escola como um todo, ela
caminha para um processo de reinvenção teórica interpreta-
tiva, não discursando sobre uma escola idealizada, mas sim
concebida e pesquisada enquanto fruto de uma ação de ho-
mens e mulheres ao longo da história. Isso, por sua vez, re-
afirma o caráter de pesquisa à prática docente.
Entendimentos como: “intelectual e pesquisador são
pessoas que estudam muito, só ficam lendo” ou “quem tem
cultura é quem sabe ler e escrever bem” são expressões de
falas que estiveram presentes tanto nas salas de aula de
EJA quanto nas reuniões coletivas na universidade. Perce-
ber juntos e em processo diário que nossa prática de desve-
lamento, denúncia e anúncio são elementos de pesquisa é
tão importante quando compreender o caráter da cultura po-
561
pular como cozinhar em pleno século XXI em fogão à lenha,
por exemplo, enquanto resistência e enquanto seres em
construção coletiva de nossa autonomia. Ninguém precisa
impor esse ponto de vista a ninguém. É somente no esforço
de juntos galgarmos patamares mais efetivos de cidadania
que avançaremos numa compreensão processual e social
de nossa autonomia, caminhando rumo a debates que de-
fendam em amplos e diversos contextos a educação como
prática transformadora.
Para que a EJA não seja concebida como algo de
manutenção do status quo é fundamental que todos – uni-
versidade e escola – tenhamos a humildade necessária para
enfrentar nossos desafios em pé de igualdade, sem coroa-
ções da arrogância baseada em títulos e publicações, tam-
pouco no preconceito imobilista de que a teoria não serve
para nada. Ter a curiosidade ativa de que nos fala Freire
(1 996) é um exercício permanente de comunhaão entre
educadores, que se juntam não por pensar igual, mas se
unem na diversidade das diferenças rumo à materialização
democrática da intersetorialidade no campo educacional,
como luta por uma sociedade que combata realmente as
desigualdades sociais originadas do desenvolvimento de
seu modo de produção. Daí a premência da crítica, pois co-
mo nos lembra o pensamento contido na frase atribuída a
Pierre Beaumarchais: “Sem liberdade de criticar, não existe
elogio sincero”.
Considerações Finais
562
versos e múltilplos agentes que pesquisam e ajudam a pro-
duzir a escola e a EJA. Freire (1 996) já nos alertava que
“ninguém é sujeito da autonomia de ninguém” e tal compre-
ensão é atual e instigante. A intersetorialidade capaz de arti-
cular ações de melhoria da qualidade da EJA somente se
efetivará num desenvolvimento orgânico a partir do chão da
escola para o poder público e não de “cima para baixo”.
É nesse aspecto que precisamos resgatar, professo-
res da rede pública, gestores, estudantes de graduação e
pós, professores universitários e educandos/as, uma análise
que se baseia na prática e na reflexão teórica. Não podemos
fragmentar nossas ações em estudos individualizados e es-
tágios de docência discutidos separadamente. É na comu-
nhão de tais momentos que aprendemos a requalificar
nosso olhar de pesquisadores, para não incorrermos no ris-
co de uma idealização da EJA descontextualizada da reali-
dade produzida enquanto luta e resistência. Esse aspecto de
pesquisa tem se mostrado enquanto um dos desafios de en-
tendimento e compreensão na meta pela operacionalização
do princípio de intersetorialidade a fim de que este não se
torne algo presente somente nos documentos oficiais. Ape-
sar do imenso caminho a ser percorrido e construído, a pro-
blematização dessa necessidade precisa alcançar contextos
para além da escola, ocupando espaços de discussão políti-
ca e defendendo o sentido social da investigação científica
em Educação.
Somente através de um esforço teoricamente refleti-
do, empiricamente embasado, humanamente coletivo e hu-
mildemente aberto poderemos construir uma denúncia que
seja capaz de ir ao sentido de promoção de um processo
educativamente anunciativo, explicitando a politicidade do
ato educativo.
Referências Bibliográficas
563
BRASIL. Secretaria Nacional de Assistência Social. Política
Nacional de Assistência Social. Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome. Brasília, 2004.
BRASIL, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização
e Diversidade. Documento Base Nacional – Os desafios da Edu-
cação de Jovens e Adultos no Brasil . Brasília, 201 0
564
artigo
Resumo
Introdução
566
cação de Jovens e Adultos, com ênfase nas relações de gê-
nero, identificando os elementos transformadores e os que
se apresentam como obstáculos, na trajetória escolar des-
sas mulheres.
Com esse objetivo, foram propostas melhorias nas relações
cotidianas e nas relações com a escola, na direção da igual-
dade de gênero com respeito às diferenças culturais.
Metodologia
567
Apresentam-se como princípios da aprendizagem di-
alógica (MELLO, 2003) sete elementos indissociáveis: Diálo-
go igualitário, Inteligência Cultural, Dimensão instrumental,
Criação de sentido, Solidariedade, Igualdade de Diferença e
Transformação.
No presente estudo, de acordo com o objetivo pro-
posto e com a metodologia elegida, as participantes foram
sete mulheres estudantes da EJA, no município de São Car-
los-SP, do núcleo Igreja Nossa Senhora Aparecida, localiza-
do no bairro Redenção. Essas mulheres possuíam idade
superior a 50 anos, sendo a maioria donas de casa, traba-
lhando em serviços como pequenas costuras e artesanatos.
A coleta de dados deu-se por meio da realização de
Grupos de Discussão Comunicativos. Estes, por sua vez,
buscam uma interpretação coletiva do tema estudado. Na
interpretação dos dados, foi utilizado o nível básico de análi-
se da MCC (GOMEZ, 2006), em que se identificam as cate-
gorias centrais da pesquisa: relações de gênero e
escolaridade que se cruzam com as dimensões excludentes
(aquelas que são barreiras para as transformações) e trans-
formadoras (aquelas que permitem a superação das desi-
gualdades).
História de vida relacionada com a educação.
569
ainda perdura atualmente entre as participantes da pesqui-
sa, esse fator excludente, em relação à escolaridade, foi ex-
presso pelas mulheres em falas de sofrimento, de situações
constrangedoras e de dificuldade em realizar certas ações
como, tomar um ônibus ou chegar a algum endereço: “Eu
sofri muito com isso, eu sofri muito. (...) Eu senti muito isso,
doía dentro de mim” (Ligia). Essas situações entre as mu-
lheres, pelo fato de serem analfabetas levam a auto-exclu-
são: “Eu sou tímida para falar. Eu não sei nem falar. A gente
não estudou a gente não sabe nem falar” (Mariane). Como
nos elucida Mello “a partir da exclusão escolar, sua condi-
ção de exclusão social e cultural passa a ser agravada,
gerando muitos momentos de auto-exclusão” (MELLO,
2003a, p.1 ), fazendo com que a pessoa deixe de frequentar
espaços públicos para proteger-se das humilhações. As ex-
clusões sociais são maiores em grupos desprotegidos soci-
almente como as mulheres, pessoas negras e pobres.
No que diz respeito às relações de gênero, observa-
mos explicitamente a ideologia do mando masculino sobre
as mulheres, na proibição de estudar - quando crianças, pe-
los pais, e, depois de casadas, pelos maridos:
“A minha filha mais velha a Cíntia (...)
ela fala pro pai dela: oh pai o senhor
não deixava a gente estudar. Só estuda-
va se fosse com um menino, mas sozi-
nha não deixava” (Mariane).
“Sim, dos sete anos aos doze fui [à es-
cola], era muito longe, eu era muito no-
vinha, fraquinha e meu pai não deixava
eu ir, meus irmão ia, eu não” (Mari)
“Eu falava: eu vou, tenho fé que eu vou
conseguir, mas daí aquela história, de-
pois não queria ir, meu marido não dei-
xou. Ele achava que mulher casada não
dava para estudar de noite” (Ligia).
570
A consequência deste fato é percebida nos índices
de analfabetismo maiores entre as mulheres, bem como de
elas serem a maioria nos cursos de alfabetização (BRASIL,
2009).
Outro fator excludente, apontado pelas participantes, é a es-
colha pelos pais de apenas um filho ir para escola, seja o fi-
lho homem, seja uma entre as filhas mulheres: “A caçula ela
foi, meu pai não deixou eu ir. E minha irmã aprendeu, em
três meses ela aprendeu um pouco” (Silmara).
Entre os fatores transformadores da categoria das
relações de gênero, observamos que a escolaridade trouxe
elementos da dimensão instrumental importantes para a vi-
da das mulheres, como a autonomia no gerenciamento das
finanças da casa, principalmente após a morte dos maridos,
que eram os responsáveis pelo controle do dinheiro da famí-
lia.
No que se refere à escolarização, ficou evidente a
união entre as estudantes e a professora, bem como entre
as próprias estudantes. Esses laços de solidariedade entre
as mulheres foram observados no carinho entre elas, sem-
pre se cumprimentando com abraços e beijos, com a preo-
cupação explícita com a saúde delas e de seus familiares,
como elas verbalizaram:
“Não é as minhas colegas, é uma famí-
lia. Não é? A gente se sente tão bem
uma com a outra. Tá vendo o esforço de
todo mundo, levanta cedo, vem para
escola. Isso é muito importante na vida
nossa. Que a gente sente, a gente vai
se sentindo valorizada” (Ligia).
573
de socialização, de lazer, de realização de um sonho; Desta
forma, a escola para essas mulheres precisa estar num con-
ceito mais amplo, de educação ao longo da vida, oferecendo
aulas de informática, passeios extraclasse e aulas de ginás-
tica.
Outro fator de melhoria que as participantes aponta-
ram foi a necessidade de aumentar o salário dos/as profes-
sores/as, uma questão que é latente na atualidade. No caso
da professora da sala, ela trabalha em dois períodos (ma-
nhã e noite), uma realidade de muitos/as professores/as, o
que em geral, dificulta a sua formação continuada, o preparo
das aulas, bem como os momentos de lazer.
574
não tinha relação com a escolaridade dos homens, pois, se-
gundo as mulheres, eles também possuíam baixo grau de
escolaridade. Para elas, a questão estava no machismo, na
relação de autoritarismo que eles tinham sobre elas. “Ele ti-
nha um pouco de estudo e porque era machão. Ficava fa-
lando para mim, que não sabia resolver. Eu pelo menos, na
minha cabeça, eu tinha muito mais cabeça do que ele”
(Aline).
Outro âmbito da desigualdade entre homens e mu-
lheres, apresentado pelas participantes foi a diferença sala-
rial; assim como apresentado pela literatura5, elas também
percebem este elemento. Ao ser questionada sobre isso Ali-
ne responde: “Sempre foi, menina. No trabalho, quando eu
era pequena, o homem ganhava mais que a gente, quando
eu trabalhava era assim. O salário do homem era um, da
mulher era outro” (Aline). A diferença salarial também acon-
tecia no mesmo posto de trabalho: “No mesmo trabalho, fa-
zendo tudo junto. Ele ganhava mais que a gente. E ele fazia
a mesma coisa. Por que será não é?” (Aline)
O trabalho doméstico ainda é de responsabilidade
das mulheres, as estudantes participantes da pesquisa rela-
taram que as responsabilidades decorrentes do casamento,
como o trabalho doméstico e o cuidado dos/as filhos/as fo-
ram elementos excludentes em relação à escolarização: “Eu
não fui na escola, porque eu tive bastante filho, como eu ia
estudar? Solteira eu não ia, por que no lugar que a gente
morava não tinha escola. E depois que casa tem um monte
de filho, tem obrigação com a casa” (Mariane). O mesmo
acontece com o cuidado de pessoas idosas e doentes, a
maioria das mulheres relatou épocas da vida que se dedica-
5 Ver:BRUSCHINI, Maria Cristina Aranha. Trabalho e gênero no Brasil nos
últimos dez anos. Cadernos de Pesquisa , v. 37, n. 1 32, set./dez. 2007 e
BRUSCHINI, Cristina; LOMBARDI, Maria Rosa. A bipolaridade do
trabalho feminino no Brasil contemporâneo. Cadernos de Pesquisa , São
Paulo, n. 11 0, jul. 2000
575
ram ao cuidado de outras pessoas e muitas vezes deixaram
de lado as próprias vidas e sonhos:
“Minha mãe veio morar comigo, que fi-
cou doente, quando a minha mãe mor-
reu, daí veio o meu pai morar comigo,
fiquei um tempo cuidando dele. Daí de-
pois meu pai faleceu” (Mariane)
“Eu cuidei do meu sogro e da minha so-
gra. Os dois morreram dentro da minha
casa” (Aline)
576
que você precisa das duas coisas, você
não pode abandonar a família e só ir
para escola, você precisa ter as duas
opções (...) você cuida do seu doente
um dia, no outro dia você pede ajuda,
para alguém, para você ir para fazer o
seu outro compromisso” (Isabela).
“Você tem que ter um conjunto, isso é
uma opção minha. Se eu quiser falar eu
não quero mais nada disso, eu falo”
(Beatriz).
578
O fato de locomover-se sozinha traz outros elemen-
tos de autonomia, como do controle das finanças, bem co-
mo a quebra de barreiras: “Como eu falei, eu acho que
esclareceu a cabeça. Tô bem mais solta, não tenho medo
de sair num lugar sozinha, que eu não preciso mais per-
guntar, eu leio o ônibus. Melhorou bastante. Na minha vida
melhorou” (Mari).
Essa autonomia e o fortalecimento da auto-estima
criam condições para que as mulheres possam questionar
as relações desiguais de gênero na relação com os seus
maridos e pais.
“Lavava as camisetas, lavava os calção.
Daí eu perguntei o que você trouxe para
mim? Daí eu ia me soltando. Sabe... Daí
ele falou: “Nada. Você tem sua vida, eu
tenho a minha”. Então a partir de hoje
vai ser assim: “Se eu tenho a minha, vo-
cê tem sua vida”. Então, você lava os
seus calções e você lava as suas cami-
setas e passa. “Ah por que?” Você não
faz nada que eu preciso, porque eu te-
nho que fazer? A partir de agora vai se
dente por dente, olho por olho. Daí eu
fui acordando. Mas ai que ele me calu-
niava mesmo. Por que eu tava me sol-
tando” (Mari)
579
que eu acordei, eu acordei, agora che-
ga, basta, eu não vou mais, eu não vou
mais te obedecer (...) Então isso foi uma
transformação enorme na minha vida.
Mas muitas pessoas ficaram dizendo
amem até morrer” (Isabela).
580
junto. Só que ele não entende” (Beatriz).
581
que são construídas histórica e socialmente, trazem con-
sequências para as vidas das mulheres, nos seus diversos
âmbitos: como educação, saúde, violência, trabalho e parti-
cipação nos espaços de poder.
O processo de escolarização para estas mulheres
faz parte de um sonho, de um direito que lhes foi negado
pelas condições sociais e pelo fato de serem mulheres. Essa
conquista da escolarização representa muito mais que um
diploma, ou a certificação que concluiu um grau de ensino, é
uma questão de autonomia, de liberdade. A escola, para es-
sas mulheres, significa mais do que um espaço de educa-
ção formal ou que uma etapa a ser atingida para seguir para
outra. A escola é um espaço de socialização, de lazer, de
fortalecimento, de auto proteção. Desta forma, a escola, pa-
ra essas mulheres, precisa representar um conceito mais
amplo.
As mudanças na sociedade atual, como as rápidas
transformações científicas, tecnológicas e culturais, o au-
mento da expectativa de vida. Os conhecimentos adquiridos
na escolarização da infância e juventude não são mais sufi-
cientes para a participação sociocultural e para a vida pro-
fissional, impondo uma educação permanente (DI PIERRO,
2005, p.111 9). Estes elementos estão no centro do debate
da EJA no mundo, na mudança de sua concepção, de um
modelo de educação compensatória (ensino supletivo) para
a educação ao longo da vida. Concepção na qual a educa-
ção seja um fator de desenvolvimento econômico, mas tam-
bém de desenvolvimento pessoal para todos e todas.
Referências bibliográficas
582
34.
BRAGA, F. M., GABASSA, V., MELLO, R. R. de. Aprendiza-
gem Dialógica: ações e reflexões de uma prática educativa de
êxito . São Carlos, EDUFSCAR, 201 0. 83p.
583
Brasi l, Campinas/SP, 2003b.
584
artigo
Raquel Moreira1
Adriana Fernandes Coimbra Marigo2
Rosimara Silva Correia3
Resumo
Introdução
586
na formação inicial e continuada de educadoras, coordena-
doras e gestores(as) do Programa Brasil Alfabetizado, ocor-
rida no município paulista de Garça, no ano de 201 2. Essa
experiência foi proposta pelo Núcleo de Investigação e Ação
Social e Educativa4 (NIASE) da Universidade Federal de
São Carlos (UFSCar) e se integra a outras ações desenvol-
vidas por esse Núcleo desde sua criação, em 2002, no âm-
bito do Programa de Extensão “Democratização do
conhecimento e do acesso à educação”5.
Desde 2003, o NIASE vem participando em espaços
de formação de educadoras e educadores que atuam com
pessoas adultas em processo inicial de escolarização, como
o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA)6
e o Programa Brasil Alfabetizado (PBA). Nessa participação,
o conceito de aprendizagem dialógica tem orientado essas
práticas formativas, contribuindo para aprofundar sua com-
preensão em diferentes contextos educativos.
O Programa Brasil Alfabetizado (PBA), realizado pelo
Ministério da Educação (MEC) desde 2003, surgiu no intuito
de ser porta de entrada para a Educação de Jovens e Adul-
tos (EJA), em municípios que apresentam taxa de analfabe-
tismo igual ou superior a 25% e que buscam erradicar tal
4O NIASE foi criado em 2002, a partir e com base nos estudos realizados
junto ao Centro Especial de Investigação em Teorias e Práticas
Superadoras de Desigualdades (CREA) da Universidade de
Barcelona/Espanha, pela Profa. Dra. Roseli Rodrigues de Mello. No
NIASE, são desenvolvidas ações de pesquisa, ensino e extensão
considerando-se diferentes práticas sociais e educativas, com o objetivo
de contribuir para a superação de exclusão social, cultural e educacional.
5 O programa contou com a aprovação e o financiamento do Programa de
Extensão Universitária (PROEXT) do MEC/Secretaria de Educação
Superior (MECSESu) e da Pró-Reitoria de Extensão (PROEX) da UFSCar
(PROEX/UFSCar).
6Segundo Gonçalves (2007), o MOVA foi criado por Paulo Freire enquanto
secretário de educação no município de São Paulo entre os anos de 1 989
e 1 991. Sua implantação em São Carlos ocorreu em 2002, em articulação
à Prefeitura Municipal.
587
quadro. Para a concretização deste programa, o Ministério
da Educação e Cultura (MEC) e o Fundo Nacional de De-
senvolvimento da Educação (FNDE) contribuem com os re-
cursos financeiros.
Segundo Haddad e Di Pierro (2000) a história da
Educação de Jovens e Adultos aqui no Brasil não é algo re-
cente. Desde o período colonial os jesuítas já exerciam ativi-
dades educativas com os indígenas adultos, tanto
difundindo o evangelho, como transmitindo normas de com-
portamento e ofícios necessários ao funcionamento da eco-
nomia colonial, em ações que posteriormente se
estenderam aos escravos negros. Mais tarde, os jesuítas
ainda passaram a encarregar-se das escolas de humanida-
des para os colonos e seus filhos.
Com a expulsão dos jesuítas do Brasil, em 1 759,
houve a desorganização do sistema de ensino existente e
somente no Império, como indicam Haddad e Di Pierro
(ibid.), é que voltamos a encontrar informações sobre ações
educativas no campo da educação de adultos no Brasil.
Foi com a primeira Constituição Brasileira, de 1 824,
que se notou, no campo dos direitos legais, a garantia de
uma “instrução primária e gratuita para todos os cidadãos”,
portanto também para os adultos. Porém, vale destacar que
no inciso I, do Art. 6º, a população escrava era impedida de
frequentar a escola, pois não eram considerados(as) cida-
dãos(ãs) e, portanto, “o acesso à leitura e à escrita eram ti-
das como desnecessários e inúteis para tais segmentos
sociais” (BRASIL, 2000, p.1 3). Apesar de terem excluído as
pessoas negras e não ter passado da intenção legal, este
marco foi significativo dentro da história da EJA, pois se tor-
nou presente nas demais Constituições Brasileiras, avan-
çando lentamente ao longo de nossa história.
A Constituição de 1 891 , primeiro marco legal da Re-
pública Brasileira, consagrou uma concepção de federalismo
588
em que a responsabilidade pública pelo ensino básico foi
descentralizada nas Províncias e Municípios (HADDAD & DI
PIERRO, 2000). Nesse processo, mais uma vez garantiu-se
a formação das elites em detrimento de uma educação para
as amplas camadas sociais marginalizadas, pois a oferta de
ensino elementar ficou dependente da fragilidade financeira
das Províncias e dos interesses das oligarquias regionais
que as controlavam politicamente. Esse aspecto marcou
ainda mais a fragilidade histórica da formação escolar de
populações que vinham sofrendo por questões sociais,
econômicas, raciais e gênero.
Até meados da década de 1 940, a preocupação com
a EJA praticamente não se distinguia como fonte de um
pensamento pedagógico ou de políticas educacionais. Havia
uma preocupação geral com a educação das camadas po-
pulares, normalmente interpretada como instrução elemen-
tar das crianças e não dos adultos e jovens.
Para Haddad e Pierro (2000), o início da industriali-
zação e o processo de urbanização do país forçaram novos
olhares à educação, principalmente, estabelecendo condi-
ções favoráveis à implantação de políticas públicas para a
educação de jovens e adultos. Nossas elites, que já haviam
se adiantado no estabelecimento constitucional do direito à
educação para todos – sem propiciar as condições neces-
sárias para sua realização, desde a Constituição de 1 824 –,
viam naquele momento esse direito unido a um dever que
cada brasileiro deveria assumir perante a sociedade. Segun-
do Beisiegel (1 974),
[...] ao direito de educação que já se
afirmara nas leis do Brasil, com as ga-
rantias do ensino primário gratuito para
todos os cidadãos, virá agora associar-
se, da mesma forma como ocorrera em
outros países, a noção de um dever do
589
futuro cidadão para com a sociedade,
um dever educacional de preparar-se
para o exercício das responsabilidades
da cidadania. (BEISIEGEL, 1 974, p. 63)
590
Neste período, vale apontar duas organizações: a
Frente Negra Brasileira (FNB) e o Teatro Experimental do
Negro (TEN). No ano de 1 930, a FNB foi fundada em São
Paulo e foi reconhecida como a maior e mais difundida fren-
te do movimento negro paulista. Na mesma vertente, o TEN
proposto por Abdias do Nascimento, em 1 944, na cidade do
Rio de Janeiro, cujas ações foram além dos ensaios de pe-
ças, foram promovidos cursos de alfabetização de adultos,
que tiveram como protagonista o professor Ironides Rodri-
gues, negro, bacharel em direito, que atuou como educador
social e político e que acreditava na transformação pela
educação. A educação neste espaço ia além da codificação
e decodificação, estando associada com a emancipação po-
lítica e social do negro. Vale ressaltar, que foi registrada a al-
fabetização de mais de 600 pessoas negras. (ROMÃO,
2005).
Concomitantemente, outros fatos de âmbito interna-
cional, ampliaram as dimensões do movimento em prol de
uma educação de jovens e adultos, como a criação da Or-
ganização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
a Cultura (UNESCO), em novembro de 1 945, que vinha a
denunciar ao mundo as profundas desigualdades entre os
países e a alertar para o papel que deveria desempenhar a
educação, em especial a educação de adultos, no processo
de desenvolvimento das nações categorizadas como “atra-
sadas”.
Ao longo dos anos seguintes, várias foram as ações
governamentais que buscaram apoiar a EJA, entre as quais
destacamos, com apoio em Haddad e Di Pierro (2000), a
Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (1 950),
a Campanha Nacional de Educação Rural (1 952) e a Cam-
panha Nacional de Erradicação do Analfabetismo (1 958).
Para Haddad e Pierro (2000), os primeiros anos da década
de 1 960, até 1 964 quando o golpe militar ocorreu, marcaram
591
um momento bastante especial para o campo da educação
de jovens e adultos. Registrou-se um período caracterizado
pela intensa busca de maior eficiência metodológica e por
inovações importantes nesse terreno, pela reintrodução da
reflexão sobre o social no pensamento pedagógico brasileiro
e pelos esforços realizados pelos mais diversos grupos em
favor da educação da população adulta para a participação
na vida política da Nação.
Nesses anos, as características próprias
da educação de adultos passaram a ser
reconhecidas, conduzindo à exigência
de um tratamento específico nos planos
pedagógico e didático. À medida que a
tradicional relevância do exercício do di-
reito de todo cidadão de ter acesso aos
conhecimentos universais uniu-se à
ação conscientizadora e organizativa de
grupos e atores sociais, a educação de
adultos passou a ser reconhecida tam-
bém como um poderoso instrumento de
ação política. Finalmente, foi-lhe atribuí-
da uma forte missão de resgate e valori-
zação do saber popular, tornando a
educação de adultos o motor de um mo-
vimento amplo de valorização da cultura
popular. (HADDAD & DI PIERRO, 2000,
p.11 3).
593
meçaram a surgir. Diversas propostas de programas e proje-
tos passaram a apoiar a inserção das pessoas jovens e
adultas à escola, tanto com cuidados voltados às questões
de investimento e financiamento, quanto de perspectiva
educacional e propostas pedagógicas voltadas a tais pesso-
as.
Os programas de alfabetização de jovens e adultos,
sem dúvida, são elementos importantes que contribuem pa-
ra a sociedade, objetivando fazer com que os jovens e adul-
tos que não tiveram acesso ao ensino da leitura e da escrita
e dos conhecimentos sistematizado das ciências exatas, co-
mo a matemática, se apropriem destes instrumentos. O go-
verno Lula, por exemplo, trouxe importantes avanços nesse
sentido. No entanto, há ainda muito a se fazer para se efeti-
var o direito à educação em nosso país. Mesmo a educação
de pessoas adultas sendo garantida em Lei, não se mostra
concretizada em todos os lugares como demandado pelos
jovens e adultos excluídos do sistema escolar.
Um dos programas lançados pelo governo referido
acima, é o Programa Brasil Alfabetizado. Reconhece-se a
importância social deste programa, uma vez que se observa
na história brasileira, a marginalização de grande parte da
população sem escolaridade, principalmente por questões
vinculadas à discriminação de classe social, origem étnicor-
racial, divisão sexual dos lugares de poder e relações inter-
geracionais. Originária da história de negação da educação
escolar como direito social de todos(as) e abandonada pelo
poder público por décadas, a Educação de Jovens e Adul-
tos, encontra-se, agora, em momento fundamental para sua
radicalização como política permanente, institucionalizada e
consolidada em nosso país (GALVÃO & DI PIERRO, 2007).
Nesse sentido, entende-se ser o Programa Brasil Alfabetiza-
do uma importante parte desta construção.
Vendo-se dentro do panorama de alta taxa de anal-
594
fabetismo, correspondente a mais de 25% de sua popula-
ção, o município de Garça/SP inscreveu-se e foi contempla-
do para participar do Programa e buscou, junto ao NIASE,
apoio para o desenvolvimento da formação inicial e continu-
ada dos(as) gestores(as), coordenadores(as) e educado-
res(as) selecionados(as) para atuar nesta ação.
O Núcleo desenvolve seus trabalhos embasados nas
concepções de Paulo Freire, de Habermas e dos estudos
desenvolvidos pelo Centro Especial de Investigação em Teo-
rias e Práticas Superadoras de Desigualdades (CREA) da
Universidade de Barcelona/Espanha. Assim sendo, o NIASE
atua no programa em questão seguindo a perspectiva da
aprendizagem dialógica (FLECHA, 1 997).
Com as transformações do atual contexto, denomi-
nado por alguns teóricos como “sociedade da informação”,
vêm acontecendo mudanças importantes na forma como as
pessoas se relacionam umas com as outras, com as institui-
ções e, inclusive, com a forma como se gera conhecimento
científico. As tendências dialógicas se encontram tanto nas
relações que vivenciamos cotidianamente em nossas casas,
como nos hospitais, no âmbito da política internacional e na
investigação científica. Nessa tendência, assinala-se que,
cada vez mais, as pessoas querem que tudo que está ligado
a suas vidas, todas as escolhas e decisões, sejam resolvi-
das por meio do diálogo. Evidentemente, isso não significa
que as relações de poder tenham desaparecido por comple-
to, mas sim que haja uma crescente tendência a se resolver
os conflitos pelo diálogo (Aubert et al., 2009). Segundo Ha-
bermas (2001 ), as pessoas já não querem que as decisões
aconteçam com argumentos impostos à força, mas sim que
sejam definidas pela força dos argumentos.
Nesse sentido, as ciências sociais contemporâneas7
reconhecem que há um giro dialógico nas relações e dele se
7Flecha, Gómez e Puigvert (2001 ), Habermas (2001 ).
595
utilizam para sinalizar como os antigos padrões e normas,
que costumavam guiar nossas vidas na sociedade industri-
al, perderam sua legitimidade na atual sociedade (Aubert et
al., 2009). As pessoas possuem cada vez mais a necessida-
de de se comunicar e dialogar para tomarem suas decisões
nesse mundo com mais opções, produzidas por novos valo-
res, normas sociais e intercâmbios culturais.
No campo do ensino e da aprendizagem, a situação
não é diferente, sendo que, nas últimas décadas, tem-se ca-
minhado ao encontro de concepções mais comunicativas,
ao contexto das interações sociais em que estas têm lugar.
Vários são os autores e autoras que nos ajudam no caminho
em direção a processos de ensino e de aprendizagem mais
comunicativo-dialógicos como Vygotsky, Freire, Mead, Bru-
ner, Rogoff, Wells, Habermas, Bakhtim, Flecha e Mello, vin-
do a subsidiar o conceito de aprendizagem dialógica no qual
estão apoiadas as ações desenvolvidas pelo NIASE.
A principal característica da aprendizagem dialógica
é a interação e a comunicação como fatores chave da
aprendizagem. Contudo, segundo Aubert et al. (2001 ), nem
todas as interações comunicativas conduzem a máximos ní-
veis de aprendizagem e nem todos os diálogos superam de-
sigualdades educativas. Assim, a aprendizagem dialógica se
produz em diálogos que sejam igualitários, em interações
nas quais é reconhecida a inteligência cultural de todas as
pessoas, pois estão orientadas à transformação dos níveis
prévios de conhecimento e do contexto sociocultural para
que, nele, todas tenham êxito. A aprendizagem dialógica se
produz, ainda, em interações que aumentam a aprendiza-
gem instrumental, favorecendo a criação de sentido pessoal
e social, guiada por princípios de solidariedade em que a
igualdade e a diferença são valorizadas de forma respeitosa,
sem gerar desigualdades.
Dessa forma, destacam-se os sete princípios que
596
configuram a aprendizagem dialógica: dialógico igualitário;
inteligência cultural; transformação; dimensão instrumental;
criação de sentido; solidariedade e igualdade de diferenças.
No primeiro princípio, diálogo igualitário, entende-se
que nenhuma idéia vale mais que outra, simplesmente pela
posição de poder que o falante ocupa. Todas as falas são
igualmente respeitadas e, a partir delas, pode-se aprender
mais. Uma das reflexões feitas diz respeito ao diálogo e ao
consenso, visualizando as pretensões de validade. Nessa
perspectiva, as relações se dão de maneira horizontal,
quando todos(as) possuem as mesmas condições e oportu-
nidades para falar.
A inteligência cultural, segundo princípio apresenta-
do, indica que todas as pessoas possuem as mesmas capa-
cidades para participar do diálogo igualitário e que cada
qual aprende, reportando-se a um contexto estabelecido na
interação com outras pessoas.
Flecha (1 997) elenca algumas das barreiras que
muitas vezes prejudicam o diálogo, denominando-as como
muros antidialógicos culturais, sociais e pessoais (subjeti-
vos), os quais devem ser superados. Para que tal superação
ocorra, não basta vencer as discriminações sexistas, racis-
tas, classistas e etaristas, mas também superar timidez,
complexos e inseguranças gerados pelas interações sexis-
tas, racistas, classistas e etaristas dominantes em nossa so-
ciedade.
Na aprendizagem dialógica, entende-se que as pes-
soas são seres de transformação, daí o terceiro princípio.
Nessa perspectiva, as pessoas transformam o sentido de
sua existência da forma que elas desejam, passando de si-
tuações de exclusão a outras de criação cultural, o que mo-
difica profundamente suas relações familiares, trabalhistas e
pessoais.
Pelo quarto princípio da aprendizagem dialógica, o
597
da dimensão instrumental, reconhece-se a importância de
aprender instrumentos que possibilitem uma maior compre-
ensão do mundo circundante, enfatizando que o domínio de
conhecimentos e habilidades, na sociedade da informação,
é fundamental para a movimentação social do grupo e/ou
indivíduo.
Flecha (1 997) defende a idéia da criação dos senti-
do, outro princípio presente, sendo que todos podem sonhar
e sentir, dar sentido à sua existência. O diálogo igualitário
possibilita o ressurgimento do sentido que orienta os novos
caminhos sociais para se viver de forma mais digna. Para
tanto, é preciso ter os contextos educativos como lugares
para se falar, e não para se calar, pois o compartilhar de pa-
lavras em um grupo ajuda a criar continuamente o sentido
global das vidas ali implicadas.
A solidariedade nos mostra que as concepções soli-
dárias são os fundamentos das práticas educativas igualitá-
rias. Discutem-se aqui as concepções de poder que, muitas
vezes, falam mais alto do que qualquer outra coisa e acarre-
tam a exclusão de muitas pessoas, em âmbito social,
econômico ou cultural. O respeito e o apoio ao outro, na su-
peração de dificuldades, assim como as pequenas ações de
solidariedade, possibilitam a criação de grande rede de soli-
dariedade, contribuindo para as transformações sociais.
A igualdade é o valor fundamental que deve orientar
toda a educação progressista. Porém, a diversidade atual-
mente é utilizada por algumas pessoas e grupos como for-
ma de justificar as desigualdades educativas, sob o
argumento de que a diferença gera desigualdade. A solução
que reclamam as culturas excluídas está, segundo Aubert et
al. (2008), em consonância com uma perspectiva dialógica
orientada para o exercício do direito a uma educação iguali-
tária e que, portanto, deve ter uma consideração de justiça
nas nossas diferenças, daí a expressão igualdade de dife-
598
renças. A aprendizagem dialógica procura demonstrar o di-
reito de todas as pessoas a viver e a ser de diferentes for-
mas.
A seguir, busca-se focalizar a experiência de forma-
ção de educadoras, coordenadoras e gestores(as) ocorrida
no município paulista de Garça, SP, no ano de 201 2, com o
objetivo de descrever e analisar o projeto Formação Inicial e
Continuada para o Programa Brasil Alfabetizado, com vistas
à reflexão e à divulgação de possibilidades de ações que
possam enriquecer e potencializar o Programa Brasil Alfabe-
tizado, incentivado pelo Governo Federal, bem como desta-
car caminhos para o desenvolvimento de ações
direcionadas à formação de educadores(as).
Metodologia
599
- Vislumbrar a concepção de educação ao longo da vida e
Compreender a Matriz de referência estabelecida para o
PBA;
- Analisar diferentes concepções e metodologias de forma-
ção de leitores e práticas sociais de leitura;
- Refletir sobre a perspectiva Comunicativo-dialógica, dentro
da concepção de formação de leitores;
- Identificar e analisar a função social da leitura e da escrita
na matemática e em outros campos do conhecimento;
- Refletir a interligação existente entre o mundo do trabalho
e a concepção de cidadania, compreendendo os desdobra-
mentos à Educação de Jovens e Adultos e à idéia de Edu-
cação ao longo da vida;
- Identificar e analisar a avaliação como instrumento funda-
mental para o planejamento das ações pedagógicas e Anali-
sar o Projeto Olhar Brasil.
Já a formação continuada, com carga horária de 88
horas, se fez distribuídas em dois blocos: um de 48h à dis-
tância, distribuído por meio de um site criado especialmente
para essa formação. Nessa etapa da formação continuada,
foram utilizados diferentes recursos multimidiáticos, com
momentos de trabalho coletivo e individual, abordando o es-
tudo de temas como planejamento, avaliação, aprendizagem
dialógica, desafios do processo de ensino e de aprendiza-
gem na educação de pessoas jovens e adultas, avaliação
do Programa no município e tomada de decisão, gestão.
O segundo bloco da formação continuada foi com-
posto por 40h presenciais, distribuídos ao longo de uma se-
mana de trabalho intensivo, visando à reflexão e à
elaboração de planejamentos de ações que pudessem apoi-
ar o processo de ensino e de aprendizagem e de implanta-
ção efetiva do Programa no município. Para tanto, como
objetivos dessa fase, teve-se:
600
- Refletir e aprofundar teoricamente sobre a gestão do Pro-
grama Brasil Alfabetizado (PBA);
- Refletir e planejar coletivamente o ensino de conteúdos de
leitura e escrita no Programa Brasil Alfabetizado;
- Refletir e planejar coletivamente o ensino de conteúdos de
matemática no Programa Brasil Alfabetizado;
- Refletir sobre a realidade de atuação no Programa Brasil
Alfabetizado no município de Garça;
- Compreender o Plano de Avaliação do Programa Brasil Al-
fabetizado.
Dessa maneira, a proposta de formação se configu-
rou num total de 1 28h de estudo, planejadas sob a perspec-
tiva da aprendizagem dialógica, com ações que
garantissem, na prática, a vivência dos princípios que a
compõe, concomitantemente, com os momentos de apro-
fundamento formativo de temáticas pertinentes aos educa-
dores(as), coordenadores(as) e gestores(as) que atuavam
no Programa.
Nessa perspectiva, a elaboração do planejamento da
formação aconteceu de maneira dialógica e considerou a
possibilidade de realizar as atividades de Tertúlia Dialógica
(literária e matemática) 8 e de Grupos Interativos9, por se tra-
tarem de propostas em que estão contemplados todos os
princípios da aprendizagem dialógica.
O planejamento e as atividades dialógicas são ins-
trumentos que possibilitam propor as aulas na perspectiva
dialógica e servem como orientação para as práticas das
professoras, coordenadoras e gestoras, compreendendo o
aprender como ato cada vez mais criador, visando alcançar
a “curiosidade epistemológica”, a fim de atingir conhecimento
8 Para conhecer a proposta, ver: http://utopiadream.info/ca/?page_id=79
(acesso em 1 0 de setembro de 201 3)
9 Para conhecer mais, ver: http://utopiadream.info/ca/?page_id=1 8 (acesso
em 1 0 de setembro de 201 3)
601
cabal do objeto e não ficarmos apenas na “curiosidade ingê-
nua” (FREIRE, 2006).
Nesse sentido, durante a realização das formações,
buscou-se, junto às educadoras, coordenadoras e gestoras
compreender melhor o processo de ensino e de aprendiza-
gem para o desenvolvimento da capacidade leitora, escritora
e do pensamento matemático dos(as) educandos(as), e as-
sim, propondo questões desafiadoras para que se desafiem
mais e mais diante dos obstáculos encontrados:
Quanto mais se problematizam os edu-
candos, como seres no mundo e com o
mundo, tanto mais se sentirão desafia-
dos. Tão mais desafiados, quanto mais
obrigados a responder ao desafio, desa-
fiados, compreendem o desafio na pró-
pria ação de captá-lo. Mas, precisamente
porque captam o desafio como um pro-
blema em suas conexões com os outros,
num plano de totalidade e não como al-
go petrificado, a compreensão resultante
tende a tornar-se crescentemente crítica,
por isto, cada vez mais desalienada.
(FREIRE, 2003, p.40).
602
sim de um com vistas à libertação dos sujeitos envolvidos
no processo de exclusão social e que permaneceram por
muito tempo longe do domínio dos instrumentos da escrita,
da leitura e do pensamento matemático historicamente pro-
duzido.
Resultados e considerações finais
603
O curso Formação Inicial e Continuada para o Pro-
grama Brasil Alfabetizado abordou a condição histórica de
exclusão dos sujeitos da EJA (educandos(as)), a partir de
um percurso histórico e político em que a demanda por es-
colarização de pessoas jovens e adultas se coloca incom-
patível com o desenho e prioridades das políticas escolares.
Ao problematizar o percurso da EJA, reconheceu ainda o le-
gado da educação popular e da aprendizagem dialógica,
vindo a possibilitar experiências de êxito para a educação
de pessoas adultas. Nesse sentido, a formação contribuiu
para que profissionais envolvidos no programa compreen-
dessem as especificidades da EJA, sem infantilizar educan-
dos e educandas, mas oferecendo educação para pessoas
jovens e adultas com qualidade, buscando contribuir com as
suas demandas de aprendizagem. Junto a isto, a interação
dialógica entre educadores e educadoras foi decisiva para o
aprofundamento reflexivo e avaliativo tanto sobre a política
pública de alfabetização em pauta, quanto sobre o potencial
das metodologias e conteúdos de alfabetização para acirrar
ou contribuir com a superação de desigualdades no contex-
to da sociedade da informação.
A formação destacou conhecimentos didáticos e me-
todológicos para a constituição do Programa Brasil Alfabeti-
zado, enquanto uma primeira oportunidade de superação da
condição de exclusão educativa vivenciada pelos sujeitos da
EJA, por meio da alfabetização e ensino de matemática.
Enfim, a abordagem proposta nessa formação se
voltou para a redução dos índices de analfabetismo brasilei-
ro, encontrados no segmento adulto e jovem da população,
revelando sua relevância social e ressaltando o papel da
universidade brasileira no âmbito da educação e o vínculo
que deve ser estabelecido com sua comunidade de entorno.
Enquanto atividade de extensão, vinculada ao Pro-
grama de Extensão no âmbito da UFSCar, o projeto Forma-
604
ção Inicial e Continuada para o Programa Brasil Alfabetizado
foi de extrema relevância também para a equipe do NIASE
com ela envolvida, pois demandou estudos específicos e
planejamento de ações que possibilitassem o encontro entre
a teoria e a prática. Os resultados dessa formação foram di-
vulgados, em agosto de 201 2, no II Congresso Paulista de
Extensão e I Congresso de Extensão da UNIFESP, por meio
do trabalho intitulado “Formação de educadoras(es) do Pro-
grama Brasil Alfabetizado e Aprendizagem Dialógica: poten-
cializando as possibilidades”. Dessa forma, outros grupos
acadêmicos e outras universidades puderam conhecer a
perspectiva de atuação na extensão universitária e suas po-
tenciais contribuições sociais.
Enfim, essa atividade de extensão foi consolidada de
maneira relevante, nos meios sociais e nos meios acadêmi-
cos, favorecendo o reconhecimento e a valorização de co-
nhecimentos elaborados em outros âmbitos educativos, e
contribuindo para o movimento de emancipação das pesso-
as que historicamente se encontram à margem de direitos
educativos e sociais legalmente constituídos. Nesse sentido,
acredita-se que, com esta abordagem da aprendizagem dia-
lógica, o curso ofertado possibilitou contribuir para minorar o
alijamento e a característica compensatória, que porventura
perpassem o desenho do PBA, vindo a ampliar e a potenci-
alizar ações em prol da diminuição das taxas de analfabetis-
mo.
Referências bibliográficas
605
CIONERO, S.). Aprendizagem Dialógica na Sociedade da Infor-
mação . Hipatia Editorial. Barcelona, 2008.
606
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adultos. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 1 4, p.
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ROMÃO, J. Educação, instrução e alfabetização de adultos
no Teatro Experimental do Negro. In: ROMÃO, Jeruse (Org.).
História da educação do negro e outras histórias. Brasília, DF:
MEC/Secad, 2005. (Coleção Educação para Todos).
607
608
artigo
Resumo
1 . Introdução
611
estando o Brasil já em franco processo de industrialização, a
educação passa ser tratada com maior interesse. Contudo,
sem perder o caráter elitista e religioso, mas já se apresenta
na perspectiva de educação pública. Com final da ditadura
Vargas em 1 945 e também o fim da Guerra Mundial (1 939-
1 945) houve a criação de organismos internacionais, em es-
pecial a UNESCO, que apontaram aos países ocidentais al-
gumas necessidades fundamentais para a construção de
um mundo mais equilibrado. Ao Brasil, a UNESCO indicou a
necessidade da alfabetização de adultos. Assim, em 1 947 o
Brasil tem sua 1 ª Campanha de Alfabetização de Adultos,
com o objetivo de alfabetização dos adultos analfabetos do
país em três meses, oferecimento de um curso primário em
duas etapas de sete meses, a capacitação profissional e o
desenvolvimento comunitário. Havia, contudo, uma lógica
perversa, o analfabetismo era visto como causa e não como
efeito do mirrado desenvolvimento do país, em função de
sua estrutura agrária, nesta perspectiva, o adulto analfabeto
era visto como incapaz e marginalizado psicológica e social-
mente. Era considerado tanto do ponto de vista econômico,
quanto político e juridicamente como incapaz de votar e de
ser votado, isto é, de ser um brasileiro de fato.
Com a derrubada de ditadura Vargas (1 930-1 945), o
Brasil se organiza para uma vivência mais democrática e no
impulso de reconstrução do pós-guerra, que é o período co-
nhecido como o Nacional Desenvolvimentismo (1 946-1 964),
em que ocorre a sedimentação do processo de industrializa-
ção brasileira e a transformação da sociedade majoritaria-
mente rural em uma sociedade urbana e industrializada.
Nesse período, campanhas para a erradicação do analfabe-
tismo de adultos foram empreendidas no país. Destaca-se
neste período o importante trabalho do educador Paulo Frei-
re (1 921-1 997).
Em 1 964 o Brasil é “premiado” com um novo golpe
61 2
de Estado dado pelas elites brasileiras com o apoio do capi-
tal internacional e executado pelas forças armadas.
O mundo ocidental vivia à época a Guerra Fria
(1 947-1 989) e atitudes de natureza progressista tendiam a
ser vistas como apoio ao comunismo internacional. Assim,
os golpistas consideram que as Campanhas realizadas an-
teriormente para a educação de adultos, e em especial o
trabalho de Paulo Freire, fossem classificados como indese-
jáveis para o Brasil que eles se propunham construir. Paulo
Freire foi exilado e as campanhas abandonadas. Para dar
conta da demanda por educação de adultos o governo mili-
tar investiu em dois projetos que estavam alinhados com
sua concepção de educação: o MOBRAL (1 967-1 985) e o
projeto Minerva (educação via rádio iniciada em 1 970). A
grande vantagem, para os militares era que estes projetos
não associavam a educação a uma concepção crítica, por-
tanto política, do papel da educação na vida de uma coleti-
vidade humana.
Em 1 971 , com a Lei das Diretrizes e Bases, a LDB –
Lei 5692/71 , foi criada a modalidade de Ensino Supletivo
como direito para o exercício da cidadania, o que pode ser
considerado um grande avanço. Em 1 974 foram criados os
Centros de Estudos Supletivos (CES), com forte tendência
tecnicista. Era um momento em que o objetivo da educação
estava voltado a capacitação técnica para o trabalho, de
acordo com os interesses da política econômica do Estado
brasileiro. Ao final da década de 1 970 surge a abertura polí-
tica, a anistia dos presos exilados e também dos encarcera-
dos no país. Isso faz mudar o panorama, até chegar à
elaboração e promulgação da Constituição Federal de 1 988,
CF/1 988, em que a educação passa a ser dever do Estado
para com a EJA, garantindo o ensino fundamental obrigató-
rio e gratuito para todos, independentemente da idade.
A partir da década de 1 990 a questão para a EJA
61 3
passou a ser desenvolvimento de políticas e também de
metodologias, uma vez que a universalização do Ensino
Fundamental estava assegurada pela CF/1 988, era preciso
que essa educação tivesse qualidade.
Mas não apenas no Brasil, também no contexto internacio-
nal se formava à época um movimento de valorização da
EJA com o objetivo de fortalecer a cidadania e a formação
cultural da população dos países em desenvolvimento.
A UNESCO realizou conferências para debater e ins-
tituir planos destinados a desenvolver a EJA nos países oci-
dentais que ainda estavam na classificação de “em
desenvolvimento”, ou emergentes.
No Brasil, durante a década de 1 990, iniciou-se uma
intensa mobilização nacional que culminou com a criação de
Fóruns Estaduais da EJA. Em 1 996, com o incentivo do Mi-
nistério da Educação e Cultura (MEC), que criou inclusiva
uma Comissão Nacional de EJA, e da UNESCO, com vistas
à preparação da V CONFITEA. Neste clima, cada estado fe-
derado no Brasil criou uma comissão para realizar um diag-
nóstico e traçar metas e ações que permitissem o
fortalecimento da EJA no país. A partir desse momento con-
tinuaram os encontros nas Secretarias Estaduais de Educa-
ção (SEE), nas Secretarias Municipais de educação (SME),
nas Universidades e Organizações Não-Governamentais
(ONG) ligadas à EJA com a discussão e elaboração de um
documento nacional com diagnóstico, princípios, compro-
missos e planos de ação para apresentar à V CONFITEA.
Entre os eventos se destacam os ENEJA, que acorrem peri-
odicamente envolvendo os Fóruns de todos os estados fe-
derados e que tem por finalidade pensar a EJA.
A partir da CF/1 988 e no contexto das transforma-
ções acontecidas no Brasil e no mundo durante a década de
1 990, em especial no que respeita a educação, foi votada
uma nova LDB. A LDBEN – Lei 9394/96. Esta lei aponta pa-
61 4
ra a igualdade de condições para o acesso e a permanência
na escola, para o pluralismo de ideias e concepções peda-
gógicas, para a valorização da experiência dos alunos fora
da escola, a vinculação entre educação escolar, trabalho e
práticas sociais e, para a educação de qualidade (o que até
agora ainda está em compasso de espera), acabou por dar
novo folego à EJA, como se pode ver:
Art. 2º A educação, dever da família e do
Estado, inspirada nos princípios de liber-
dade e nos ideais de solidariedade hu-
mana, tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando, seu pre-
paro para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
Art. 3º O ensino será ministrado com ba-
se nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso
e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pes-
quisar e divulgar a cultura, o pensamen-
to, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concep-
ções pedagógicas;
IV - respeito à liberdade e apreço à tole-
rância;
V - coexistência de instituições públicas
e privadas de ensino;
VI - gratuidade do ensino público em es-
tabelecimentos oficiais;
VII - valorização do profissional da edu-
cação escolar;
VIII - gestão democrática do ensino pú-
blico, na forma desta Lei e da legislação
dos sistemas de ensino;
IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extra-es-
colar;
61 5
XI - vinculação entre a educação esco-
lar, o trabalho e as práticas sociais.
XII - consideração com a diversidade ét-
nico-racial.
Art. 4º O dever do Estado com educação
escolar pública será efetivado mediante
a garantia de:
I - educação básica obrigatória e gratuita
dos 4 (quatro) aos 1 7 (dezessete) anos
de idade, organizada da seguinte forma:
a) pré-escola;
b) ensino fundamental;
c) ensino médio;
II - educação infantil gratuita às crianças
de até 5 (cinco) anos de idade;
III - atendimento educacional especiali-
zado gratuito aos educandos com defici-
ência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou
superdotação, transversal a todos os ní-
veis, etapas e modalidades, preferenci-
almente na rede regular de ensino;
IV - acesso público e gratuito aos ensi-
nos fundamental e médio para todos os
que não os concluíram na idade própria
V - acesso aos níveis mais elevados do
ensino, da pesquisa e da criação artísti-
ca, segundo a capacidade de cada um;
VI - oferta de ensino noturno regular,
adequado às condições do educando;
VII - oferta de educação escolar regular
para jovens e adultos, com característi-
cas e modalidades adequadas às suas
necessidades e disponibilidades, garan-
tindo-se aos que forem trabalhadores as
condições de acesso e permanência na
escola;
VIII - atendimento ao educando, em to-
das as etapas da educação básica, por
61 6
meio de programas suplementares de
material didático-escolar, transporte, ali-
mentação e assistência à saúde;
IX - padrões mínimos de qualidade de
ensino, definidos como a variedade e
quantidade mínimas, por aluno, de insu-
mos indispensáveis ao desenvolvimento
do processo de ensino-aprendizagem. X
– vaga na escola pública de educação
infantil ou de ensino fundamental mais
próxima de sua residência a toda criança
a partir do dia em que completar 4 (qua-
tro) anos de idade (BRASIL, 1 996).
621
consiga por si só reorganizar o sentido de participação e
atuação política e social no país é atribuir-lhe uma função
que está muito além de suas possibilidades. Aliás, se há al-
go que a filosofia tem feito ao longo de sua história é ajuda-
do a formar a compreensão de que na vida social todas as
coisas se articulam e se integram formando um todo com-
plexo e multifacetado.
3. Considerações finais
623
dania . 4ª edição. São Paulo. Editora Contexto, 2006.
624
artigo
Resumo
626
of Measures Socio. Data analysis is based on Latin Ameri-
can authors such as Freire, Fiori and Dussel, as well as re-
searchers (the) theme, which supported the reflections
revealing and constructing paths in social practices that oc-
cur within areas of restricted freedom. Research findings
show the educate and educate yourself with the guidelines
(the) youth in conflict with the law, constituting references to
research in the field and training opportunities for professio-
nals working in programs Socio measures.
Key-words: Educational processes in space restriction of fre-
edom; Advisers Measuring Socio; Education without school.
Introdução
627
ram as reflexões, no sentido de desvelar e construir cami-
nhos nas práticas sociais que ocorrem no interior de espa-
ços de liberdade vigiada e que anunciam a especificidade
dos processos educativos que nelas ocorrem, podendo con-
tribuir na (re)integração dos jovens em conflito com a lei à
vida social. Tais autores possibilitam vislumbrar uma educa-
ção que vai além da transmissão de conteúdos formais, vi-
sando à reflexão critica da realidade em que estão inseridos,
com o propósito de transformação.
Freire (1 983a) sinaliza caminho possível à tomada de
consciência e à transformação do indivíduo: a Educação Li-
bertadora. Parte-se do pressuposto que a Educação Liber-
tadora propicia possibilidades e conhecimentos diversos,
uma vez que a relação dialógica entre os pares permite aos
sujeitos serem ativos neste processo, conhece a realidade e
o indivíduo atinge um nível de ação e reflexão que se tradu-
zem em mudanças em suas atitudes e escolhas.
Fiori (1 991 ) fortalece tal perspectiva ao afirmar que,
A educação é esforço permanente do
homem para constituir-se e reconstituir-
se, buscando a forma histórica na qual
possa re-encontrar-se consigo mesmo,
em plenitude da vida humana, que é
substancialmente, comunhão social. Es-
se re-encontro que, no horizonte do res-
pectivo momento histórico, coloca o
homem em seu lugar próprio, tem um
nome adequado: autonomia e liberdade.
O movimento em direção à liberdade,
assim entendida, define o sentido do
processo educativo como libertação. A
educação, pois, é libertadora ou não é
educação (p.83).
628
de uma teoria crítica contra-hegemônica, com práticas ati-
vas que busquem a libertação, que incorpore a multicultura-
lidade nos processos educativos para a busca da identidade
dos povos latinoamericanos. Trata-se da superação da divi-
são capitalista do trabalho, da censura dos governantes, da
exploração em todas as suas vertentes.
Dessa forma, surge um novo paradigma, o contra-
hegemônico, que afeta diretamente a cultura imposta, acer-
ca da ordem imposta, de seus conteúdos e suas transfor-
mações sociais. “[...] Las hipótesis que nos habían permitido
negar la existencia de la cultura latinoamericana nos lleva-
ban ahora al descubrimiento de una nueva visión crítica de
las culturas periféricas, e inclusive de Europa misma” (DUS-
SEL, 2005, p.11 ).
Tomando nossa reflexão por este ângulo, pode-se
afirmar que para além do sistema formal de educação, am-
bientes não escolares também propiciam processos de en-
sino e aprendizagem, e no dizer de Oliveira et al (2009, p.1 ),
“[...] me construo enquanto pessoa no convívio com outras
pessoas [...]”. Nesse sentido, as pessoas se formam a partir
de todas as vivências, em diversos contextos socioculturais
e as diferentes práticas sociais conduzem à criação de iden-
tidade do indivíduo, inserem-se nas culturas e se concreti-
zam nas relações. O diálogo fica evidenciado como um
caminho ao processo educativo de aprendizado, confiança,
respeito, que propicia sentimento de acolhimento e emanci-
pação.
Nessa direção, Freire (2000) aponta que toda prática
educativa é libertadora, pois “[...] valoriza o exercício da
vontade; da decisão, da resistência, da escolha; o papel das
emoções; dos sentimentos; dos desejos; dos limites; [...] é
substantivamente esperançosa e, por isso mesmo, provoca-
dora de esperança” (p.23).
Com base nos referenciais de autores envolvidos
629
com o temário da educação não escolar, como Onofre
(2007, 2009) e Oliveira et al (2009) compreende-se que por
meio do diálogo e reflexão sobre o mundo, o ser humano to-
ma consciência da sua existência, tornando-se protagonista
de sua história.
Como sinaliza Onofre (2009, p.71 ): “[...] o diálogo, re-
constrói a história e valoriza os momentos de aprendizagem
[...]”. Pode-se afirmar, portanto, que as pessoas estão em
constante processo de formação ao longo da vida e o diálo-
go faz parte desse processo sendo uma prática social rele-
vante no Programa de Medidas Socioeducativas, uma vez
que desencadeia processos educativos que visam fortalecer
os(as) jovens em conflito com a lei, no cumprimento das
medidas e no retorno ao convívio social.
Para tanto, um Programa de Medidas Socioeducati-
vas deve garantir espaço para trocas, diálogos, desabafos,
bem como ser acolhedor com os(as) jovens. Compreende-
se que muito além das oficinas oferecidas pela Instituição, o
local é um espaço de reunião de pessoas que vivenciam si-
tuações semelhantes. É um encontro de sujeitos interlocuto-
res, é uma troca que contribui “[...] por meio da
aprendizagem participativa e da convivência fundamentada
na valorização e no desenvolvimento do outro e de si mes-
mo” (ONOFRE, 2007, p.23).
A pesquisa, cujos resultados se apresentam mais
adiante e com base nos apontamentos apresentados, objeti-
vou como principal foco a proposta do (re)pensar das rela-
ções ocorridas em ambientes de restrição de liberdade, a
partir da perspectiva das orientadoras de medida e as práti-
cas educativas programadas para jovens infratores(as).
Os caminhos percorridos
630
em um primeiro momento, deu-se na observação do contex-
to em que as orientadoras e jovens estão inseridos(as). Em
seguida, a inserção se deu nas oficinas ofertadas aos(as)
jovens e, posteriormente, nas reuniões dos profissionais do
Programa, bem como nos espaços de convivência.
Cabe sublinhar que de acordo com Oliveira (2009),
“Conviver é mais do que visitar [...] requer um envolvimento
pessoal de observação, questionamento e diálogo. Somente
olho no olho com o outro e, com ele convivendo, é que se
pode detectar [...] e informações que nos são fornecidas so-
bre dada realidade” (p.31 2).
Após a coleta dos primeiros dados, as colaboradoras
foram convidadas a participarem do estudo e mediante acei-
tação, foram organizados encontros com as orientadoras.
Tais encontros foram documentados por meio de gravações,
com consentimento das participantes e as entrevistas foram
realizadas de modo a compreender suas percepções em re-
lação ao trabalho e ao espaço onde atuam.
Nesse sentido, os encontros com as orientadoras
pautaram-se na observação cuidadosa organizada em diári-
os de campo e na coleta dos dados através das entrevistas,
para em fase posterior, analisar os dados obtidos, à luz do
referencial teórico de estudiosos do tema.
Em relação à entrevista, Bosi (2003) esclarece que
“A entrevista ideal é aquela que permite a formação de laços
de amizade [...]. Ela envolve responsabilidade pelo outro [...].
Da qualidade do vínculo vai depender a qualidade da entre-
vista” (p.60). O que se propõe é destacar nuances da pes-
quisa qualitativa em Educação.
Por sua vez, o diário de campo é um instrumento fa-
cilitador de registro de fatos e de registro das impressões
do(a) pesquisador(a) frente a estes fatos. O procedimento de
forma adequada é indispensável, uma vez que o diário é
objeto de apoio à narrativa dos achados de pesquisa.
631
Esta técnica, pelo seu caráter informal e
amplo, pode-se tornar um instrumento
fundamental para os educadores e gru-
pos populares, pois [...] está formando e
aperfeiçoando observadores e facilitando
a reflexão coletiva da prática, através do
confronto de informações, opiniões aná-
lises preliminares e visões de mundo. [...]
Combiná-las com outras técnicas de in-
vestigação não só contribuirá mas se fa-
rá necessário para o aprofundamento da
busca de informações desde que obvia-
mente o conjunto de técnicas criadas
guardem coerência com o corpo teórico
conceitual e princípios metodológicos
que dão fundamento às práticas sociais
em questão (FALKEMBACH, 1 987, p.21 ).
632
tuação pensei que seria importante rea-
lizar a entrevista sem o gravador, por ex-
emplo, melhor coletar dados por meio da
entrevista. Refleti sobre isso, porém ti-
nha receio de entrevistar sem o gravador
e perder a riqueza dos detalhes, uma
vez que além da fala há outra comunica-
ção realizada por gestos e olhares que
eu, enquanto pesquisadora, também ne-
cessitava observar.
Em outro momento, na fase de revisão
das entrevistas transcritas, Julia me dis-
se que não teve problemas com o grava-
dor, mas ficou com o receio de falar
nomes ou características que pudessem
identificar algum(a) jovem do Programa
ou algum local do município, pois o tra-
balho realizado na Instituição é zeloso e
ético.
Um fato que me trouxe muita satisfação
foi à fase em que levei as entrevistas
transcritas para as colaboradoras. Caro-
lina e Julia me disseram que se sentiram
muito respeitadas com este cuidado,
pois eu não coletei dados e fui embora
como se nunca estivesse estado ali, mas
que retornei e, apesar de já possuir to-
dos os termos de consentimento de pes-
quisa assinados, trouxe as transcrições
da entrevista para solicitar, uma segunda
vez, a publicação daqueles dados.
Julia afirmou que quando chegar o mo-
mento dela (visto que está iniciando o
curso de mestrado) fará da mesma for-
ma que eu, pois gostou muito deste cui-
dado que tive com elas (participantes da
pesquisa) (DIÁRIO DE CAMPO,
05/04/201 2).
633
Os procedimentos adotados procuraram garantir pri-
vacidade durante a participação das orientadoras e respon-
sáveis pelo Programa, a preservação da identidade,
garantindo-se o anonimato e a interrupção imediata do pro-
cedimento em caso de alguma participante solicitar, caso
entendesse que determinada discussão poderia resultar em
riscos à vida pessoal ou profissional das colaboradoras.
Neste sentido, foram identificadas com nomes fictícios, res-
guardando o sigilo da identidade.
A análise documental do Itinerário Pedagógico, do-
cumento norteador das atividades a serem realizadas com
os(as) jovens no Programa, foi discutido com a coordenado-
ra da Instituição, que colaborou de diversas formas, desde a
chegada ao Programa. O uso deste documento complemen-
tou as informações obtidas por outras fontes internas, como
o Plano Individual de Atendimento e a Interpretação de Me-
dida.
O educar e educar-se não formal de orientadoras e os jovens em
conflito com a lei em um Programa de Medidas Socioeducativas
634
evidenciam esse significado:
Você se forma e se constitui em todas as
relações e em todos os lugares. E aqui é
uma Instituição formada por pessoas
que também se relacionam. Então, eu
penso que seja por essas relações, pelo
olhar, pela troca, pelo sorriso, pelo bom
dia... tudo isso educa.Tem questões de
música, das vivências e experiências do
dia-a-dia e que na maioria das vezes es-
tá relacionado a questões de violência...
ainda mais quando eles se conhecem,
quando são do mesmo bairro (Letícia,
20/03/201 2).
Já teve caso do menino conversar e di-
zer pro outro “ah, deixa disso, muda sua
vida!”. Eles se educam pelo exemplo dos
outros, colhendo informações e trocando
também (Fátima, 1 9/03/201 2).
638
do mundo que trabalha aqui é legal?” [...]
Já teve meninos que ficaram emociona-
dos na hora de ir embora (Paula,
1 5/03/201 2).
Tudo que ocorre aqui é educativo, [...] a
proposta geral é de construção de valo-
res positivos, que auxiliam você a se de-
senvolver melhor na vida, a essência é
essa.
Já teve jovem que chegou aqui para as
atividades e estava drogado e eu quase
apanhei em atendimento. A gente acolhe
na hora que eles estão assim, explica
que neste espaço não cabe esses com-
portamentos e agenda para voltar em
outro dia, porque tem hora que não dá
para negociar, Um dia chegou um meni-
no que tinha usado muita cocaína e a
sala tava cheia de jovem, eu tirei ele da
sala e levei pro atendimento. Já peguei
menino com o nariz cheio de pó... são
casos mais graves, mas não todos (Pau-
la, 1 5/03/201 2).
639
no Programa:
Eu entendo que tudo aqui no Programa é
um espaço educativo, desde ficar na se-
cretaria recebendo e acolhendo o ado-
lescente até os acompanhamentos,
enfim nos atendimentos (Paula,
1 5/03/201 2).
Essa mão na massa, de estar junto de-
les é muito rico, é muito intenso. O grupo
é muito rico (Letícia, 20/03/201 2).
[...] há uma parceria com o educador,
mas também há uma parceria no grupo
e tem coisas que surgem no grupo e não
aparece no atendimento. Eles falam tan-
to que às vezes parecem que eles nem
sabem que eu estou escutando. E tem
coisas importantes que eu troco com as
educadoras e isso ajuda nos atendimen-
tos (Fátima, 1 9/03/201 2).
Eu não acho que eu educo, mas as
ações são educativas, eu acho que eu
oriento. E o que o jovem vai fazer com
aquela orientação pode ser educativo ou
não. Aqui a gente tem práticas educati-
vas que buscam promover o desenvolvi-
mento integral desses jovens. Aqui eu
me vejo como educadora social e não
como psicóloga. É lógico que a minha
profissão ajuda, o olhar clínico contribui,
mas não é terapia.
O olhar ampliado contribui para perceber
o adolescente para além do ato infracio-
nal (Paula, 1 5/03/201 2).
A formação em Terapia Ocupacional dá
o suporte para você exercer esse papel
640
de educadora, de orientação. Nas con-
versas e nos atendimentos, a minha
postura é de não ser autoritária e sim
tentar refletir sobre o que está aconte-
cendo. A ideia é compartilhar o olhar.
Eu levo deles esse ampliar dos concei-
tos... entendo que o respeitar é conhecer
o limite deles, que pode ser anterior. Am-
plio o olhar sobre qualquer situação pro-
blema (Letícia, 20/03/201 2).
641
dade de conflitos, desacordos, rupturas entre pertencentes
de um mesmo grupo. “[...] conhecimentos são colocados à
disposição e respeitados num processo de conscientização
de todos e de ampliação do conhecimento acerca daquela
realidade” (OLIVEIRA, 2009, p.311 ).
As orientadoras relatam o pensar, refletir e o discutir
a partir da convivência:
Os jovens me ensinam a olhar para coi-
sas que eu nunca tinha pensado: tabus,
valores e olhar a violência de uma outra
maneira. Como psicóloga eu entendo
que também faço um trabalho educativo
e ele acontece por meio do exemplo, um
dia eu estava falando para uma menina
que ela deveria se vestir adequadamente
para o trabalho, que trabalhar exigia
postura e roupa certa. Mas nesse dia eu
estava sem o uniforme daqui do Salesia-
nos... aí eu me perguntei: adianta eu fa-
lar isso para ela se eu mesma não estou
cumprindo uma regra do meu trabalho?
Eu me senti mal. É por isso que eu afir-
mo que através do exemplo eu ensino
muito aos jovens daqui (Julia,
1 4/03/201 2).
Eles me ensinam a respeitar e ficar mais
atenta ao outro, como chegar nesse ou-
tro... e que cada um é um. A forma de
chegar é diferente com um e com outro.
Esse respeito em relação ao outro você
aprende e amplia essa questão. Aprendi
que o que eu acho importante pode não
ser tão importante para ele (Letícia,
20/03/201 2).
Eu aprendi com eles a dar valor a minha
vida, a minha família. Quando você vê
642
certas situações você reconhece como
sua vida é linda e boa (Fátima,
1 9/03/201 2).
O que eles mais me ensinam é que você
tem que estar sempre aberta ao que o
outro te traz, isso é uma experiência diá-
ria, que nenhum caso é igual ao outro
por mais que a infração seja a mesma.
Cada um é um e você tem que estar
aberta para recebê-los, livre de qualquer
preconceito. É um exercício diário de
ampliar o olhar e se perceber enquanto
pessoa e profissional. Eu acho que ensi-
no que aqui é um lugar de troca de ex-
periência, que a gente constrói junto
(Alice, 23/03/201 2).
Eu tinha muita pressa para as coisas,
hoje eu descobri que tudo tem seu tem-
po. A mudança é processo e não depen-
de só da gente. E que o afeto é muito
importante, faz toda a diferença na vida
das pessoas.
Essa troca de ensinar e aprender é muito
gostosa e a função educativa está em
cada detalhe, em cada gesto (Carolina,
1 6/03/201 2).
644
[...] eles voltam aqui constantemente pa-
ra visitar ou porque estão precisando de
uma ajuda em alguma coisa. Essa refe-
rência que eles têm do Programa eu vejo
como algo positivo, porque eu acho que
ninguém busca visitar alguma coisa que
lhe tenha feito mal.
[...] adolescentes que vem aqui nos visi-
tar depois de ter passado mais de 1 0
anos pelo programa. Isso para mim é
muito significativo.
A gente encontra na rua, jovens que fa-
lam que fizeram a medida e falam feli-
zes, e mandam lembranças... (Julia,
1 4/03/201 2).
645
mitem perceber a realidade e, assim, atuar nela e sobre ela.
Trata-se da possibilidade de transformar e (re)integrar-se a
uma sociedade que acolhe e oferece condições de trabalho
e de sobrevivência.
Todavia, apesar da partilha com as pessoas, o
aprendizado e a importância do espaço para os(as) jovens,
as falas das orientadoras evidenciam também, que algumas
situações tornam-se viciosas quando os diálogos e reflexões
não atingiram o objetivo de desvelamento da realidade e a
mudança de determinados comportamentos.
Eles melhoram, mas muitos continuam
infracionando... depende. Uns buscam
outros caminhos, mas outros não, eles
continuam no ato infracional. Na verda-
de, teve um menino aqui que ao longo
do processo ele melhorou muito [...]. E
depois que terminou a medida ele voltou
a infracionar, então a gente tenta ajudar,
mas às vezes as coisas não deslan-
cham. Falta a questão do suporte contí-
nuo, que a gente não conseguiu fazer ou
ele não aderiu a essa rede que poderia
dar suporte para além da medida (Letí-
cia, 20/03/201 2).
646
Embora sejam justamente os espaços públicos que
deveriam prezar pelo princípio de liberdade, evidencia-se a
manutenção da desigualdade entre as pessoas, uma vez
que a sociedade nega a heterogeneidade, condenando à
margem os(as) detentores(as) de perspectivas multicultu-
rais.
Nessa direção, Dussel (1 995) compreende a domi-
nação dos povos latinoamericanos como uma dicotomia en-
tre centro e periferia. Opinião hegemônica que, nós
latinoamericanos, por diversas vezes aceitamos como ver-
dadeira, deixando de lado a nossa identidade, que possui
história, contexto social e político e é aquilo que nos forma.
Muitos jovens, em cumprimento de medida socioeducativa,
desconhecem sua história, desconhecem suas origens e o
que isso significa na construção de sua identidade. Que
identidade é essa que eles(as) apresentam? Porque negam
a sua origem? E quando negam a sua origem, se apoiam
em quais alicerces?
É neste contexto de construção de experiências cul-
turais que as políticas sociais e, particularmente as políticas
de educação, são postas, muitas vezes, sem o reconheci-
mento da diversidade e da cidadania. A prática educativa
mostra-se aberta no discurso, mas na prática, descartam-se
as características peculiares da cultura, raça, etnia de cada
povo. Enquanto educadores(as), comprometidos(as) com a
defesa da diversidade, é de nossa responsabilidade elaborar
e viabilizar projetos sociais e educacionais, tendo como ob-
jetivo a melhoria dos processos educativos que ocorrem no
interior de Programas Socioeducativos, e que visam a (re)in-
serção social na esfera pública, como espaço de integração
dos indivíduos.
Para tal, há que se compreender o contexto social,
político e econômico em que se encontra imersa a América
Latina, a fim de que as trocas de vivências e experiências
647
possam favorecer a luta e a conquista dos direitos humanos,
da autonomia e das relações igualitárias entre os povos.
Na América Latina, algumas formas de educação –
formal ou não – podem ser entendidas como resultado de
desigualdade econômica e graves conflitos de raça, classe,
etnia, de gênero, entre outros. Faz-se necessária a revisão
das políticas educacionais e que elas efetivamente se vol-
tem para a qualidade da educação e com o desenvolvimento
dos países. Os processos educativos que não respeitam o
saber de experiência dos tidos como marginalizados sociais
assumem, por sua vez, uma lógica opressiva que desuma-
niza e impossibilita, ao mesmo tempo, o desvelar de uma
consciência crítica. (FREIRE, 1 983a).
Dessa forma, as reflexões propostas neste foco de
análise sinalizam a relevância do diálogo entre os pares co-
mo forma de (re)inserção social de jovens autores de ato in-
fracional, e que permite (re)pensar as relações que ocorrem
em espaços não formais de educação, uma vez que se
constituí em investimento no âmbito do trabalho educativo e
aponta possíveis caminhos para a melhoria da qualidade de
vida.
Algumas Palavras
648
pensar dos profissionais do Programa, suas preocupações,
seus anseios e o que os movem no engajamento com seu
trabalho, uma vez que conviver com todos(as) trouxe uma ri-
queza de entendimento do trabalho realizado.
É possível afirmar que o Programa é rico e possibili-
tador de novas oportunidades à vida dos(as) jovens que por
ali passam. O que se vê é o aumento da violência em diver-
sos segmentos da sociedade e do tráfico de drogas no país,
o que expõe a população jovem, suas famílias e especial-
mente, os territórios vulnerabilizados, a um maior risco de
envolvimento com a criminalidade. Frente a tal fenômeno,
verifica-se que a sociedade se manifesta com o paradigma
da punição, o que resulta em ações de retrocesso diante às
próprias leis que garantem direitos a crianças, jovens e
adultos, independente de classe social, raça, gênero, em
quaisquer espaços onde se encontrem.
Neste cenário, as leis e as conquistas oriundas dos
movimentos sociais brasileiros, pela política dos Direitos Hu-
manos e em defesa da proteção integral das crianças e
dos(as) jovens, manifestado pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente (BRASIL, 1 990) representam marcos importan-
tes, mas ainda a serem consolidados.
Os dados apresentados evidenciam a necessidade
de serem consolidadas ações de reversão da cultura puniti-
va em favor da consolidação de uma cultura socioeducativa.
Para tanto, parte-se do pressuposto de que a educação é
ferramenta fundamental na construção da concepção de
mundo, de forma sistemática pela criança, e que segue per-
meando todo o seu desenvolvimento.
Os processos educativos propiciados pelas constan-
tes trocas com quem se convivem, ambientes familiares,
grupos sociais, programa de medida socioeducativa, traba-
lho, escola, são importantes formas de aprendizado e de
práticas educativas, que poderão ser projetadas, aplicadas
649
e/ou avaliadas.
Assim, há que nascer em nós, educadores e educa-
doras, uma pedagogia da indignação, que se valha da ética
humanizadora e libertadora. Nesta perspectiva, entende-se
que o presente artigo contribui para que a visão de educa-
ção seja ampliada para além do ensino escolar e os proces-
sos educativos em instituições não formais de educação
sejam destacados, como possíveis espaços para que se
busque a formação de jovens em conflito com a lei, bem co-
mo constituindo-se em referências importantes para pesqui-
sas na área e em possibilidades de formação inicial e
continuada de profissionais que atuam em Programas de
Medidas Socioeducativas.
Referências
650
7, jul/set 1 987, p.1 9-24.
FIORI, E. M. Educação libertadora. In:________. Textos esco-
lhidos, v. II, Educação e Política . Porto Alegre: L&PM, 1 991 , p.
83 – 95.
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de janei-
ro: Paz e Terra, 1 983a.
_________. Extensão ou comunicação? Tradução de Rosisca
Darcy de Oliveira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 8a edição,
1 983b.
_________. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e ou-
tros escritos. São Paulo: Editora UNESP, 2000.
651
_________. Práticas educativas em espaços de privação de li-
berdade. Campinas – SP: Revista Educação. PUC-Campi-
nas, n.27, 2009, p.65-74, jul./dez.
652
artigo
Resumo
654
conteúdos que podem ser validados por sistemas de avalia-
ção centralizados nos resultados e no consequente ranque-
amento das escolas e dos alunos (LOPES e LÓPEZ, 201 0).
O ENEM está cerceado por este discurso da perfor-
matividade e tem como foco a formação do indivíduo efici-
ente e apto a atuar no sistema social. No mundo globalizado
é importante que os trabalhadores sejam capazes de adqui-
rirem novas habilidades e competências e serem capacita-
dos por meio da educação permanente para atuarem em
um mundo do trabalho em constante transformação perpas-
sado por novas tecnologias, informações e comunicações
(LOPES e LÓPEZ, 201 0).
O processo de globalização trouxe novas configura-
ções ao sistema capitalista e os sistemas de educação fo-
ram paulatinamente se adequando a estas mudanças e
caminhando das competências complexas que eram volta-
das para o processo de aquisição do conhecimento para as
novas competências voltadas para o desempenho e controle
do processo de ensino-aprendizagem voltado para a eficiên-
cia da instrução (LOPES, 2008 apud LOPES e LÓPEZ,
201 0).
O Brasil vai aos poucos se adequando a este con-
texto e realizando mudanças na sua política educacional in-
serindo elementos como:
a) estreitamento da relação entre esco-
larização, produtividade e comercializa-
ção;
b) busca da melhoria dos resultados es-
colares em termos de habilidades e
competências exigidas pelo mercado de
trabalho;
c) estabelecimento de controle sobre os
conteúdos curriculares e sua avaliação
no âmbito das escolas, com foco no de-
sempenho de professores e estudantes;
655
d) busca da minimização dos custos
educacionais para o governo; e, final-
mente,
e) incremento da participação e do en-
volvimento da comunidade, sobretudo
por meio da participação dos responsá-
veis pelos estudantes e das exigências
mercadológicas nos processos decisóri-
os da instituição escolar (Carter e O'Neil
apud BALL, 1 998, p. 1 26 apud LOPES e
LÓPEZ, 201 0).
658
de 20 de maio de 201 2 e Portaria INEP nº 1 44, de 24 de
maio de 201 2).
A certificação que utiliza os resultados
do ENEM destina-se às pessoas que
não concluíram o Ensino Médio em ida-
de apropriada, conforme o parágrafo pri-
meiro do art. 38 da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional - LDB (Lei
nº 9.394, de 20 de dezembro de 1 996),
inclusive às pessoas privadas de liber-
dade e jovens sob medidas socioeduca-
tivas que estão fora do sistema escolar
regular (Ministério da Educação -Guia de
certificação do ENEM 201 2)
660
forma irrefletida, de educação para o
conceito de aprendizagem, passar da
obrigação do Estado para a individual
(LIMA, 2009).
Considerações finais
663
e Álvaro Vieira.
Referências Bibliográficas
664
relato
Resumo
Introdução
666
De acordo com a carta de princípios do Curso de
São Paulo, as aulas possuem:
“uma abordagem multidisciplinar do Di-
reito, isto é, são introduzidas matérias de
outras áreas de conhecimento, como
saúde, inclusive da mulher negra, Aids e
doenças sexualmente transmissíveis,
saúde no trabalho, assédio moral e se-
xual, direitos sexuais e reprodutivos, vio-
lência contra a mulher, literatura e
poesia, informática e a utilização da in-
ternet, elaboração de projetos e informa-
ções de como construir uma ONG”
(Carta de Princípios – PLPS)
668
ção com o contexto social, de conduta
da ação (Alheit, 1 993; Alheit; Sausie
2000a) -, torna-se possível pensar a for-
mação tanto como trabalho individual de
gestão de identidade, quanto como
constituição dos processos coletivos e
dos vínculos sociais." (ALHEIT; DAUSI-
EN, 2006)
669
"a prática educativa, reconhecendo-se
como prática política, se recusa a deixar-
se aprisionar a estreiteza burocrática de
procedimentos escolarizantes. Lidando
com o processo de conhecer, a prática
educativa é tão interessada em possibili-
tar o ensino de conteúdos às pessoas
quanto em sua conscientização" (Freire,
2001 , p1 6).
670
Em 201 3, está ocorrendo a terceira edição do curso
na cidade, desta vez as próprias promotoras formadas inici-
almente estão organizando, com o apoio do Sindicato dos
Metalúrgicos. Possuem também, canais de comunicação
com a população e entre si, um blog e uma pagina na rede
Facebook.
O encontro de diferentes mulheres, principalmente
entre as acadêmicas e não acadêmicas é o que Puigvert
conceitua de Feminismo Dialógico. O feminismo que inclui a
voz de todas as mulheres.
Referências bibliográficas
671
OLIVEIRA, F. F. de. Quando o direito encontro a rua: Um estudo
sobre o curso de formação de Promotoras Legais Populares. Dis-
sertação de mestrado. Faculdade de Educação. Universida-
de de São Paulo, São Paulo, 2006.
PUIGVERT, Lídia. Las otras mujeres. Barcelona: El Roure,
2001.
672
relato
Resumo
674
sa tendo como mediador o contato com a arte, primeira-
mente como educadora em salas de aula de EJA, em segui-
da como pesquisadora em encontros com professoras da
mesma modalidade de ensino e, num terceiro momento, co-
mo professora universitária com estudantes do Curso de Pe-
dagogia. Autores como Paulo Freire, Jorge Larrosa,
Foucault e Rancière fundamentam este trabalho. O trabalho
será apresentado em forma de fragmentos, numa tentativa
de “cartografar” os dados apresentados, de acordo com a
proposta de Suely Rolnik (1 989), de
dar língua para afetos que pedem pas-
sagem, (...) se espera basicamente que
esteja mergulhado nas intensidades de
seu tempo e que, atento às linguagens
que encontra, devore as que lhe parece-
rem elementos possíveis para a compo-
sição das cartografias que se fazem
necessárias.
675
soas que estavam ao redor. A sala de aula até então para
mim, um lugar repleto de crianças e de barulho, estava dife-
rente, embora não menos alegre; a turma, mais silenciosa,
constituída por outros sujeitos. Sujeitos com idades varia-
das, bastante diferentes entre si, mas com olhares seme-
lhantes, com um objetivo em comum: “aprender a ler, a
escrever e a fazer contas”. Os motivos, diversos: ler a receita,
ler a Bíblia, o livro que ganhou de presente e “está lá, guar-
dado na gaveta”, escrever para os parentes distantes, “tirar
carta”, continuar no emprego, conseguir um emprego melhor,
ser alguém na vida... entre tantos outros, talvez não revela-
dos... As barreiras encontradas por eles também se asse-
melhavam bastante: o medo de errar, a “mão pesada”, a
dificuldade em “lembrar das coisas”, o “não enxergar”.
Em abril do mesmo ano, retornei à universidade, in-
gressando no Curso de Especialização em Alfabetização. Já
no momento da entrevista de seleção foi solicitada a defini-
ção de um tema de pesquisa para a monografia a ser apre-
sentada na conclusão. Não tive dúvidas quanto à resposta.
Queria pesquisar o que mais me instigava e inquietava no
momento: os educandos com os quais trabalhava. Queria
chamá-los a trazer para a discussão em sala de aula o que
sabiam, o que conheciam, o que vivenciavam. Iniciado o
curso, montei algo como um roteiro de trabalho, uma pro-
posta didático-metodológica a ser desenvolvida em um se-
mestre de aulas. Pensei na Arte como um caminho, talvez
devido às observações e aos relatos dos educandos, que
revelavam o quanto as imagens lhes eram significativas. Fal-
tava, no entanto, o referencial teórico. Em que autor funda-
mentar o trabalho? A resposta surgiu já na segunda aula da
disciplina Literatura Infantil: um Enfoque Histórico Didático,
ministrada pela profa. Dra. Maria Augusta H. W. Ribeiro, que
apresentou o texto de Paulo Freire, A importância do ato de
ler, como proposta de reflexão sobre a leitura e, desde esse
676
momento, aceitou orientar tal pesquisa. O texto, já lido em
algum momento de minha trajetória escolar, tomava outra
dimensão para mim. Antes lido superficialmente, o texto
agora se tornava uma experiência de leitura. A forma como
o autor relata sua leitura de mundo me encantou. Era isso o
que pretendia levar meus alunos a fazerem, ou seja, a revi-
verem suas leituras de mundo, tal como faz Paulo Freire,
lendo os “textos”, as “palavras” e as “letras” que existem em
seus mundos. Mundos repletos de cores, de imagens, de
músicas, de poesias...
Teve início meu primeiro momento de invenção. Or-
ganizei uma proposta com nove módulos de trabalho, cujos
eixos surgiram da seqüência que consegui apreender da lei-
tura de Paulo Freire: I - Quem sou eu?, II – Minha infância,
III - Presença ou ausência da experiência escolar, IV – Mi-
nha família, V – Minhas crenças, VI – Meus medos, VII -
Aprendizado com as pessoas, VIII – Eu e o trabalho, IX -
Como vejo a vida. A partir da definição de temas, fui em
busca do material de leitura que pudesse fazer parte de ca-
da tema, material formado por imagens (obras de arte), mú-
sicas e poesias. Elaborei também o planejamento das aulas,
fundamentado na metodologia proposta por Jolibert (1 994) e
na Metodologia Triangular, de Ana Mae Barbosa (1 991 ).
Portanto, ao iniciar o segundo semestre do mesmo
ano, agora com nova turma de alunos, já tinha tudo organi-
zado. Tinha início, naquele momento, uma nova experiência.
Da criação individual do trabalho, surge a criação coletiva,
junto com os educandos.
Neste processo, alguns relatos e situações vivenciadas fo-
ram saltando aos olhos.
Lendo o mapa – travessias
677
em que aparecem nomes de Estados do Brasil, levo o mapa
e o deixo ali no quadro, para que eles possam se levantar de
seus lugares e observar de perto. A curiosidade surpreende,
assim como as histórias de travessias que contam. Por
quantos lugares passaram esses sujeitos... E quanta coisa
lhes “passou”...
Os desenhos das letras que representam as placas
679
da. Num outro momento, no qual o grupo encontra-se discu-
tindo os medos, um dos colegas diz que tem medo de per-
der um amigo, ao que ela responde:
- Amigo? Nem nossa mãe é amiga...
(Aline)
- A mãe é a única amiga que a gente
tem. (Raimunda, 2005)
- Se ela fosse nossa amiga, ela colocava
a gente na escola. (Aline, 2005)
Em atividade que remete à infância,
também esse fato aparece:
- Não fala mais em infância que eu tenho
trauma... Infância? Nem sei o que é is-
so... É que a minha infância foi muito
triste. (Aline, 2005).
681
Aline parece ter vencido a dor que sentia a cada vez
que lia aquele carimbo vermelho em seu documento. A pa-
lavra ali escrita ela conhecia bem, pois a sentia com sofri-
mento sobre si mesma. Em uma atividade final, em que foi
proposto que cada um encontrasse uma forma de represen-
tar a vida, Aline traz o desenho da escola, e conta: “[...] a
escola mudou a minha vida”. Pelo que se pode captar des-
ses relatos, a aluna demonstra ter entrado na escola de uma
forma e saído de outra. Como se tal experiência lhe tivesse
possibilitado modificar-se, reconstruir-se, inventar-se.
“Poemas que saem da gaveta”
682
isso, consegue sair do anonimato, tornando possível “dizer
sua palavra” ao mundo. Alguns poemas são ficcionais, ou-
tros, autobiográficos. Há aqueles que foram escritos em mo-
mentos difíceis, em que a autora passou por uma síndrome
do pânico, ficou viúva, perdeu amigos queridos. Outros são
homenagens a pessoas que a acompanham e incentivam –
filhos, professores, amigos. Ao mesmo tempo em que volta a
frequentar a escola, ela é também apresentada a diferentes
grupos de poetas, que criam espaços para trocar experiên-
cias e divulgar sua arte.
Conheci Ludimar no início daquele semestre e, como
havia previsto uma aula para trabalhar poesia, convidei-a
para uma participação nessa aula. No dia combinado, ela
levou uma sacola com seus poemas “enroladinhos”, como
que para presente e, nos momentos finais, foi à frente da
sala e declamou alguns deles, distribuindo seus “rolinhos”
aos colegas. Criou-se, dessa forma, uma relação em que
não existe mais alguém que ensina e alguém que aprende.
Em 2011 , convidei-a novamente para uma palestra
aos alunos iniciantes do curso e, por meio dela, pude ter
contato com um grupo de poetas do qual ela participava.
Muitos dos alunos, no primeiro semestre do curso de Peda-
gogia, tornaram-se participantes assíduos da atividade. Al-
guns, que num primeiro contato, frequentaram a roda
apenas como ouvintes, a fim de cumprir uma obrigação
acadêmica, para conseguir o certificado para as Atividades
Complementares exigidas pelo curso, passaram a voltar to-
dos os meses ao local, não mais como obrigação, mas co-
mo forma de encontrar prazer no contato com a leitura e a
escrita. Pouco depois, alguns, olhos brilhando, me procura-
vam após o período de aula, e me pediam para revisar poe-
mas que escreveram para ler na “roda”. Falas vão surgindo:
“Será que o português está correto?” “Vou ler para os poe-
tas. Não quero fazer feio...”
683
Vejo a educanda se transformar em educadora e a
forma como passa a compartilhar seus conhecimentos com
as pessoas à sua volta.
A viagem do conhecimento: escrita e poder
687
seu pensamento é comunicável, sua
emoção, partilhável. (RANCIÈRE, 2002,
p. 73)
688
A educação que se propõe com esse artigo, a partir
das experiências apresentadas, é aquela que produz a am-
pliação dos saberes de cada um até o infinito de suas possi-
bilidades...
Referências
690
relato
692
relato
Feliz em aprender
Introdução
694
relato
Resumo
I. Introdução
696
O objetivo geral do projeto foi ampliar o conhecimen-
to dos educandos sobre os componentes do corpo e os nu-
trientes para mantê-lo funcionando bem. Desta forma, esses
alunos passariam a valorizar e possivelmente adotar uma
alimentação balanceada, rica em nutrientes que levam a
uma vida saudável e melhor. A importância da pesquisa,
bem como do trabalho em grupo e colaborativo estiveram
em foco durante todo o processo de desenvolvimento das
atividades.
O projeto visou, ainda, a difusão desses saberes jun-
to à comunidade.
II.1 . Objetivos específicos
697
quais o aluno pertence.
1 0. Enriquecer o vocabulário.
11. Compreender a importância da leitura e da pesquisa pa-
ra ampliação do conhecimento.
1 2. Ler e escrever com maior desenvoltura.
1 3. Desenvolver o raciocínio para os cálculos.
1 4. Exercitar a memória.
1 5. Utilizar a criatividade na construção do painel e modela-
gem dos alimentos.
1 6. Trabalhar em grupo com organização e senso coopera-
tivo.
III. Metodologia
698
revistas. O nosso trabalho ficou exposto em sala de aula du-
rante vários dias e serviu como material de apoio para as
nossas tarefas gerais.
Em agosto e setembro de 2011 , coletamos materiais
necessários para a montagem da base do nosso “painel de
mesa” e modelagem tridimensional dos alimentos, quais se-
jam, peixe, manteiga, queijo, bife e pão. Utilizamos massa
de biscuit, tinta guache, papelão, EVA, garrafas pet com
água e também alimentos de verdade, como lata de óleo,
feijão, soja, amendoim, arroz, macarrão, açúcar, sal, lata de
sardinha. Usamos também frutas de plástico, tais como me-
lancia, maçã, pêra; recolhemos caixa de leite e embalagem
de iogurte. Alguns materiais para a confecção do painel fo-
ram solicitados à coordenação da EJA e outros foram doa-
dos pelos alunos e pela professora.
O painel foi idealizado e estruturado num gráfico de
bom tamanho, do tipo pizza, confeccionado em papelão, di-
vidido em cores com placas de EVA, sendo que cada uma
representava um componente/nutriente do corpo humano e
sua presença percentual aproximada. Os nomes dos nutri-
entes estavam demarcados. Nessas placas, colocamos os
alimentos de acordo com sua especificidade indicados por
uma plaquinha de papel impressa. Uma boneca “vovó” re-
presentou as pessoas.
Em setembro de 2011 , os alunos expuseram o painel
na Expo EJA, realizada no Clube Ítalo em São Carlos, distri-
buíram um resumo do conteúdo impresso a quem se aproxi-
mava e ficaram à disposição para explicar aquela
representação (v. fotos abaixo).
Posteriormente, em sala de aula, foi feita uma avaliação das
atividades realizadas para discutirmos os resultados e tam-
bém uma breve revisão do conteúdo para memorizarmos as
informações obtidas.
Finalmente, propusemos algumas conversas nas
699
quais questionamos sobre ações propriamente ditas que re-
sultariam de nosso trabalho. Quisemos saber se algumas
atitudes já haviam sido tomadas, quais foram elas, quais os
resultados daquelas ações.
700
701
702
IV. Resultados e considerações finais
703
lutiva dos educandos, que não é fácil mudar os hábitos ali-
mentares entre adultos e idosos. Especialmente porque al-
guns tomam suas refeições onde trabalham, porque outros
estão habituados a cozinhar e a comer apenas determina-
dos alimentos e não respeitam as quantidades adequadas e
talvez porque alguns não acreditam, de fato, que as mudan-
ças na alimentação possam trazer melhorias para suas vi-
das.
Embora não possamos afirmar que os educandos
tenham mudado seus hábitos alimentares, nós supomos
que tenha ficado na memória deles uma grande parte do
que nós estudamos durante aqueles meses.
O projeto contribuiu, ainda, para motivar outros estu-
dantes da EJA em São Carlos a se interessarem pelo tema
durante a exposição do nosso trabalho na Expo EJA. Possi-
velmente, familiares e conhecidos dos alunos também tive-
ram acesso a esses novos conhecimentos. Além disso, foi
possível avançar nessa reflexão e ação por meio da aborda-
gem de assuntos paralelos relacionados, inclusive contem-
plando a interdisciplinaridade.
Em nossa função, como educadores, também apren-
demos coisas novas e relembramos outras por meio das lei-
turas e pesquisas. Também foi interessante ouvir os alunos
falarem sobre o que eles comiam e outras histórias que se
passaram durante a infância e juventude nos locais onde
nasceram ou moraram. Foi motivo de entusiasmo observar a
confecção do painel, principalmente quando os alunos mol-
daram os alimentos com facilidade e obtiveram ótimos resul-
tados artísticos.
Foi uma forma de refletir sobre a ciência e a prática
educativa. Dialogar com os educandos como forma de facili-
tar a aprendizagem e dar sentido ao ensino. Reafirmar o va-
lor do saber e do conviver por meio dos quais eles
constroem novos patamares e ampliam o autoconhecimento
704
e a visão de mundo.
V. Bibliografia
705
706
relato
708
pôster
A INTELIGÊNCIA E O PROCESSO DE
ENVELHECIMENTO: ELEMENTOS
TRANSFORMADORES PARA A EDUCAÇÃO
DE PESSOAS JOVENS E ADULTAS (EPJA)
Referência bibliográfica
71 0
pôster
Resumo
71 2
pôster
71 3
A atividade funciona em encontros fixos semanais de
2h. A escolha do livro a ser lido é estabelecida através do
consenso entre todas as pessoas. Quando o consenso é
estabelecido, os livros são providenciados e as pessoas
participantes acordam quantas páginas e/ou capítulos irão
ler para o próximo encontro, onde irão compartilhar os des-
taques que fizeram a partir da leitura.
Como resultados podemos destacar a nossa
permanência durante onze anos nesta atividade, que retrata
o quanto gostamos de participar. Neste espaço todas as vo-
zes são respeitadas, diferente de outros espaços em que
não somos escutadas por sermos pessoas idosas. A tertúlia
literária dialógica representa para nós a capacidade que te-
mos de aprender ao longo de toda a vida e a possibilidade
de ler determinados clássicos, que sozinhas não leríamos.
Neste contexto, apontamos as argumentações e po-
sicionamentos mencionados durante as discussões como
fundamental para que não permanecemos em apenas uma
linha de pensamento, e como consequência aprendemos a
nos educarmos nas relações e aprendemos a respeitar as
diferenças. Portanto, podemos afirmar que nos transforma-
mos a cada encontro. E além de nos respeitarmos, apren-
demos a nos amarmos. Enfim, a tertúlia passou a ser um
vício.
Palavras-chaves: Tertúlia Literária Dialógica; Educação ao
Longo da Vida; Igualdade de diferenças.
Referências Bibliográficas
71 4
pôster
Andreia Garbo1
Lívia M. P. Soares2
Jarina Rodrigues Fernandes3
Resumo
71 6
pôster
71 7
propor práticas educativas que contribuam para a participa-
ção social mais efetiva dos jovens e adultos. A proposta pe-
dagógica organiza-se em eixos temáticos elaborados a cada
ano. Em 201 3, a proposta vem sendo trabalhar o teatro co-
mo articulador de saberes, tendo como norteadores Boal,
Benjamin, Brecht e Larrosa.
O projeto acontece em três turmas, com diferentes
desdobramentos do eixo temático, de acordo com as experi-
ências e objetivos de cada turma. O diálogo entre educando
e educador possibilita a construção coletiva do eixo temáti-
co.
A Turma do Bonsucesso é composta por mulheres
que não tiveram a oportunidade iniciar ou concluir os estu-
dos em idade regular. Na maioria, que não concluíram o
processo da alfabetização, focamos a produção de narrati-
vas curtas recorrendo à descrição. Nos primeiros encontros
buscamos palavras geradoras, criando um diálogo entre
educador/a e educandas buscando pontos de partida para a
ação pedagógica. A descrição de personagens ocorreu a
partir de pessoas reais do cotidiano do grupo e da imagina-
ção que emerge na leitura e de fotos. A Turma da Co-
munidade é constituída por educandos que vivem próximos
a UNESP, e frequentaram a escola regular. A partir de ele-
mentos do teatro, pensado como instrumento de emancipa-
ção política junto a diversos gêneros literários, construímos
práticas de leitura e escrita, trabalhando com algo que fez e
faz parte da vida dos educandos, nos âmbitos sociais, cultu-
rais, históricos, políticos. Foram realizadas leituras de duas
peças de Brecht e posteriormente escrevemos, coletivamen-
te, uma peça. O exercício de escrever uma peça teatral e
provoca o questionamento: O que o outro diria/faria?
Na Turma da Informática realizou-se uma adaptação
ao eixo, chegamos à animação stop motion que utiliza ele-
mentos do teatro: cenário, personagens e enredo. Através de
71 8
tecnologias – programas de computador- realizamos a cria-
ção de histórias, possibilitando o exercício da leitura e da
escrita.
Palavras-chave: Teatro; Educação de Jovens e Adultos; Leitu-
ras.
71 9
720
pôster
721
passar dos dias, aulas e mais aulas; trabalhos e mais traba-
lhos, pesquisas e descobertas incríveis. Pensava que as au-
las seriam aquelas “chatices”, onde as horas demorariam a
passar. Mero engano: a cada dia, aqueles professores fazi-
am com que essas horas fossem as melhores do dia. Quan-
tas coisas novas; de repente, uma simples conversa, um
assunto que para muitos seria banal, tornava-se tema de
uma pesquisa. Mas, não posso esquecer de que nem todos
os dias foram rosas, pois, encontrei também dificuldades.
Como enfrentar cara a cara, Química, Matemática e Física?
Não fosse a dedicação e o conhecimento dos/as professo-
res/as, talvez tudo tivesse sido mais complicado. Era tanta
disposição em ensinar, em fazer com que entendesse as
fórmulas, as operações matemáticas, até que quando me
dava conta, os problemas já estavam por resolvidos. Chega
o final do ano! Vieram as férias, as festinhas de amigo se-
creto, churrascos, enfim era só alegria! Quando juntos está-
vamos, não havia diferenças, éramos uma família. Gente
ensinando gente, não tinha o professor e o aluno, mas sim,
amigos/as unidos por um único objetivo: APRENDER! Ali
estavam eles/as, dividindo seu tempo, trocando experiências
e ensinando a todos indistintamente. E o tempo foi passan-
do, eis que é chegada a hora do tão temido ENEM. Teria eu
que prestar o exame, mas só de falar, nascia o medo, a in-
certeza, afinal, estaria sendo avaliada em meus conheci-
mentos, para então assim obter o tão sonhado
CERTIFICADO de conclusão do ENSINO MÉDIO. Mesmo
assim, lá fui eu. E não é que fui bem, mas bem mesmo.
Imaginem, consegui 650 pontos na redação, 550 de mate-
mática . Enfim, consegui! Conclui o curso até seu final! Fi-
nalizo este depoimento com a certeza de que eu, assim
como tantos outros colegas conseguimos alcançar o nosso
objetivo graças a iniciativa e ao empenho de pessoas desta
tão querida Universidade, que em algum momento, nos
722
abriu as portas para um novo mundo, um mundo de conhe-
cimentos, onde temos a oportunidade não apenas de
aprender, mas de pensar, interpretar e entender. Portanto,
ninguém chega a lugar algum se não sair, muitas vezes do
lugar cômodo em que está. E para isso é preciso coragem,
oportunidade e dar o primeiro passo!
Palavras-chave: EJA; superação; UFSCar
723
724
pôster
Introdução
726
teresse e necessidade frente aos objetivos da cultura, e
destacar o valor da arte no processo ensino-aprendizagem.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais frisa o ensino
e a aprendizagem de conteúdos que interagem com o cida-
dão na busca da arte no tempo e no contexto social dos dis-
centes.
Nossos alunos trazem uma linguagem tímida carre-
gada de pré-conceitos que estão arraigados nas memórias
mais íntimas. Porém, a arte é uma forma de quebrar os pa-
radigmas com efeitos, expressões, imagens, formas, linhas
e fragmentos reais que instigam, processam e constitui o re-
flexo da própria vida.
Trabalhar na EJA sempre foi um desafio. O nosso pro-
jeto iniciou com um diálogo que possibilitou tracejar uma tri-
lha tortuosa, mas revigorante diante das situações ocorridas
em sala de aula. Uma simples cor foi o ponto estratégico pa-
ra iniciarmos nosso trabalho: o vermelho que aquece os co-
rações.
Romero Brito foi escolhido para o projeto por ser brasi-
leiro, contemporâneo e pela expressividade de suas telas.
Além desses aspectos, podemos destacar as formas geo-
métricas, a alegria do cotidiano que envolve e atua na auto-
estima do nosso público. Além disso, sua biografia leva
nossos alunos a repensar e retomar as suas origens. A vida
de Romero Brito está inserida na realidade de nossos alu-
nos.
Podemos destacar uma fala do nosso artista que justifi-
ca nossas intenções: “... na condição de criança pobre no
Brasil, tive contato com o lado mais sombrio da humanidade.
passei a pintar para trazer luz e cor para minha vida... Criar
era um refúgio: eu pintava um mundo colorido, diferente do
meu.”
Percebe-se entre os alunos uma nova concepção, um
novo olhar diante da obra, como: o companheirismo, o amor,
727
a família e os animais expressados de uma forma natural e
cativante. O encantamento facilitou o percurso dos trabalhos
e intervenções com significados.
Além disso, possibilitou o aluno a vivenciar novas emo-
ções e construir sua própria aprendizagem, experimentar o
novo, construir sua própria aprendizagem e ampliar suas
possibilidades de leitura do mundo.
Metodologia
728
discernimento e querer vencer.
E cada fase o aluno foi avaliado no desenvolvimento
das atividades propostas, quanto ao seu aproveitamento e
dificuldades sendo que ao longo da atividade foi possível
verificar, como o aluno utilizou a linguagem (oral e escrita)
de forma contextualizada, ou seja, em determinadas situa-
ções nas quais faz sentido olhar, falar, ouvir, ler e escrever. A
importância da obra de arte no dia-a-dia, as reações e atitu-
des individuais e as reflexões sobre os resultados.
Conclusão
Referências
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros
Curriculares Nacionais: Arte . Brasília: MEC/SEF, 1 997.
729
730
pôster
Introdução
731
Métodos
732
pôster
734
pôster
Resumo
735
práxis alfabetizadora.
-Leitura e escrita não se dicotomizam, ao
contrário, se complementam e, se com-
binadas, o processo de aprendizagem
fará parceria com a riqueza da oralidade
dos (as) alfabetizandos (as).” (STRECK,
201 0, p. 31 )
Uma educação sem esperança não é educação, afi-
nal, o educando é um ser que tem uma história, se constrói
na história e constrói a história, dizia Paulo Freire (1 987).
Afinal, para ele a Educação nunca é neutra.
Bibliografia:
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido 1 7. ed, ; Rio de Janei-
ro: Paz e Terra, 1 987.
_______. Cartas a Cristina ; Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1 994.
STRECK, Danilo R., REDIN, Euclides, ZITKOSKI, Jaime J.
Dicionário Paulo Freire 2. ed. : Belo Horizonte: Autêntica edi-
tora, 201 0.
736
pôster
Introdução
737
objetivos específicos, teve-se: i) abordar um tema de inte-
resse dos(as) participantes; ii) desenvolver atividades de es-
crita e leitura; e iii) ampliar as possibilidades de participação
social dos educandos(as).
Metodologia
738
de ser observado pela participação da grande maioria dos
(as) educandos (as) em todas as atividades. Além disso,
houve relatos e discussões extraclasse, o que demonstrou a
importância dada ao conhecimento adquirido.
Palavras-chave : Alfabetização de adultos, socialização, car-
tas.
Referências
739
740
pôster
Introdução
741
plantas medicinais devem ocupar posição de destaque em
relação à importância do uso popular medicinal (GARLET e
IRGANG, 2001 ). As plantas medicinais correspondem, in-
contestavelmente, as mais antigas armas empregadas no
tratamento de enfermidades humanas (OLIVEIRA e AKIS-
SUE, 2000). Portanto, os estudos das plantas medicinais
são relevantes, para maior entendimento sobre as espécies
interligando e valorizando o conhecimento que as educan-
das e educandos da sala de MOVA já conhecem sobre as
plantas articulando com o conhecimento científico.
Metodologia
O projeto está sendo desenvolvido com educan-
das/os do MOVA no Centro Comunitário Astolpho Luis do
Prado no bairro Arnon de Mello São Carlos SP. Foi feita roda
de conversa para verificar o conhecimento prévio de cada
um (a). E no decorrer das atividades são feitas leituras sobre
as plantas citadas por eles/elas e está sendo feitas consul-
tas na literatura especializada para verificar a propriedade
medicinal das plantas e também o nome científico, pretende-
se construir um viveiro de erva medicinal. As educandas e
educandos já conseguiram selecionar algumas mudas e a
partir dessas organizar o plantio.
Objetivo
Desenvolver atividades para valorizar o conhecimen-
to prévio das educandas e educandos do movimento de al-
fabetização, estimular a participação nas atividades,
desenvolver as habilidades de leitura e escrita e verificar se
a planta realmente tem efeitos medicinais segundo a litera-
tura.
Resultados
A participação das educandas e educandos é muito
742
importante para o desenvolvimento do projeto, comentam
durante as aulas que já usaram alguma planta para fazer um
chá e dessa maneira o conhecimento popular é contextuali-
zado com os demais e comparado com literatura especiali-
zada.O projeto também é importante para o
desenvolvimento da leitura e da escrita dos nomes das
plantas. De acordo com Correa et al. (2001 ) atualmente,
muitos centros no Brasil e no exterior vêm desenvolvendo
estudos sérios sobre as propriedades farmacológicas das
plantas medicinais, chegando a resultados bastante promis-
sores, como as cerca de 509 plantas que se encontram re-
gistradas no Ministério da Saúde brasileiro para
comercialização.
Palavras chaves: Educação de adultos, plantas medici-
nais,meio ambiente.
Referências
743
744
pôster
Michele Rodrigues
michele@ vsj.com.br
Ucam
745
Palavras-chave: Matemática, EJA, narrativas
746
pôster
Resumo
747
meu tempo, fiz minha matrícula e retornei aos estudos, com
muito orgulho fui até a 8ª série. Foi um momento muito im-
portante na minha vida, gostava de participar das atividades
propostas, fazia questão de não faltar as aulas, tinha muito
interesse nos seminários propostos nas aulas de geografia e
história, sentávamos em círculo para compartilhar o que
mais nos interessava nos textos, gosto muito de ler e nesse
período a minha leitura melhorou muito. As aulas eram a
noite, após o dia todo de trabalho me sentia muito cansada,
em alguns momentos com vontade de desistir, mas com o
incentivo dos professores fui em frente e me formei, nossa
camiseta de formatura dizia: “Não desista nunca”.
E assim continuei minha caminhada pelo ensino mé-
dio, tenho ótimas lembranças da época da escola: bons pro-
fessores e amigos com os quais aprendi muitas coisas. O
cansaço também estava presente, trabalhar o dia todo e es-
tudar a noite, mas fui em frente pela vontade de aprender e
concluir meus estudos, isso me fortaleceu para continuar e
me formar. Quando as aulas acabaram, senti tristeza, a von-
tade era estar lá, dizia: “Se eu pudesse, voltava”.
Hoje, meu marido é aluno de EJA, cursa a 6ª série,
na mesma escola onde também estudei. Como maneira de
estimulá-lo a continuar seus estudos, o acompanho até a
escola, mas não só até a porta, dentro da sala de aula tam-
bém. Assim, tenho uma nova experiência e momento de
aprendizado pois participo das aulas, faço as provas e os
trabalhos, tenho caderno com as matérias, como qualquer
estudante regular, apesar de não estar matriculada. Voltar a
escola tem sido muito bom, sinto grande prazer pois além de
continuar aprendendo, tenho muita vontade de ver o meu
marido se formando e faço questão de estar ao seu lado em
sua formatura. Os sonhos e vontades continuam, me inscre-
vi no ENEM, pois tenho grande vontade em fazer gradua-
ção.
748
pôster
Odirlei de Oliveira
Patrícia Daniela P. de Souza
(Secretaria Municipal de Educação de Marília – SP)
749
nos da EJA, em grande parte constituída por mulheres com
mais de 45 anos que nunca frequentaram a escola ou fre-
quentaram por pouco tempo, e por diversas razões ficaram à
margem do processo educativo quando criança. Buscou-se
também, por meio deste trabalho, analisar e apontar hábitos
de alimentação saudáveis, com estudo de receitas culinárias
econômicas e típicas de nossa região, dando origem a ela-
boração de um caderno de receitas.
Como resultado do trabalho, alcançou-se, de fato,
uma maior predisposição para a leitura e escrita e grande
identificação com o universo da autora Cora Coralina, tra-
zendo maior segurança nas situações de aprendizagem
propostas. Estes pontos apresentados facilitaram o processo
de apropriação do sistema de escrita, apontando para o seu
caráter funcional e social, vinculando este processo a reali-
dade dos sujeitos envolvidos, reforçando a ideia de que o
caráter funcional da escrita “se concretiza por seus usos so-
ciais, ou seja, o que dá sentido à alfabetização é a possibili-
dade de os indivíduos envolverem-se com práticas sociais
por meio da escrita, reconhecendo que o mero domínio do
código não garante o envolvimento com essas práticas”
(Leite, 2011 , p.29). É justamente essa concepção de escrita
a vivenciada por Cora Coralina que fez com que ela usasse
a escrita como instrumento de transformação social e de
compreensão de sua realidade, reafirmando os apontamen-
tos de Freire (1 996) ao destacar que alfabetização é uma
forma de aprender a ler o mundo, numa relação que consi-
dera a junção de linguagem e realidade.
Palavras-chave: Alfabetização, Vivências, Superação, Con-
texto Social, Educação de Jovens e Adultos.
Bibliografia
CORALINA, C. Estórias da casa velha da ponte. 1 3. ed. São
750
Paulo: Global, 2006.
_____________. O tesouro da casa velha. 5. ed. São Paulo:
Global, 2002.
DENÓFRIO, D. F. (Org.). Melhores poemas de Cora Coralina . 1.
ed. São Paulo: Global, 2006.
FREIRE, P. Ação cultural para a prática da liberdade e outros
escritos. 9. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1 996.
751
752
pôster
754
pôster
Introdução
756
pôster
Resumo
Introdução
757
lização em Educação de Jovens e Adultos (CEEJA); ofereci-
do pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) em
parceria com o Ministério da Educação (MEC). O foco cen-
tral do curso foi ampliar a formação dos profissionais desta
área e assim potencializar o ensino para os educandos.
O objetivo deste trabalho foi identificar quais as contribui-
ções de Freire para a alfabetização no primeiro segmento da
EJA, e destacar também as potencialidades e os desafios
das obras selecionadas para a formação/ atuação dos edu-
cadores.
Metodologia
758
Referências
759
______. Política e Educação/ Paulo Freire – 8ª edição – revisa-
da e ampliada. Indaiatuba, SP – Villa das Letras, 2007 (Co-
leção Dizer a Palavra).
HADDAD, S.; DI PIERRO, M. C. Escolarização de Jovens e
Adultos. ANPED – Número Especial . Nº 1 4, p.1 08-1 29,
Mai/Jun/Ago, 2000.
www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visuali-
za.php?id_noticia=1 708, acessado em 21 /1 0/11.
Suplemento - Aspectos Complementares da Educação de
Jovens e Adultos e Educação Profissional – 2007. Comuni-
cação social, 22 de maio de 2009.
LUDKE, M. Pesquisa em educação: abordagem qualitativas.
/Menga Lüdke, Marli E. D. A. – São Paulo: EPU, 1 986, p.11-
24, (Temas básicos de educação e ensino).
WHITAKER, D. C. A. A cultura e o ecossistema – reflexão a par-
tir de um diálogo . Dulce Consuelo A. Whitaker e Lara A. Cri-
velaro Bezzon. Campinas: Editora alínea, 2006, p.61-62.
760
pôster
762
pôster
763
(compostas por duas ou três sílabas simples formadas por
uma consoante e uma vogal); o Módulo 2 ensina leitura e
escrita de palavras com dificuldades da língua, tais como lh,
rr, nh, ss, ç, s com som de z, qu, gu, ... e o Módulo 3 exercita
a leitura de textos os quais apresentam tamanho e comple-
xidade gradualmente aumentados. Medidas de pré e pós
testes dos Módulos 1 e 2, das Unidades de Ensino e de ca-
da Passo de ensino, avaliam a eficácia do Programa. Neste
trabalho não será avaliado o Módulo 3. Feedback imediato e
progresso de acordo com o ritmo de aprendizado de cada
aluno são características do Programa. Dez adultos partici-
pam do projeto, cujas atividades são desenvolvidas em uma
sala de aula de uma escola municipal, onde permanecem
apenas a experimentadora e os participantes, utilizando-se
dois notebooks e um netbook. Três participantes estão em
fase de avaliação inicial do repertório de leitura e escrita,
cinco estão no Módulo 1 e dois – que já apresentavam o re-
pertório de leitura e escrita de palavras simples - estão no
Módulo 2.
Palavras-chave: ensino de leitura e escrita, adultos, programa
informatizado.
(Trabalho financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior – CAPES)
764
765
realização
parceria
Prefeitura Municipal de São Carlos
Prefeitura Municipal de Araraquara
Prefeitura Municipal de Pederneiras
Prefeitura Municipal de Rio Claro