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ESTADO E TEATRO: AS EXPERIÊNCIAS DA COMISSÃO E DO SERVIÇO

NACIONAL DE TEATRO (1936-1945).

Angélica Ricci Camargo


Mestrado – PPGHIS/UFRJ
angelicaricci@gmail.com

I
Este trabalho tem por objetivo discutir os resultados iniciais de nossa pesquisa
de mestrado, que tem como objeto a promoção de uma política oficial voltada para o
aprimoramento do teatro realizada por meio de dois órgãos: a Comissão de Teatro
Nacional, criada em 1936, e seu sucessor, o Serviço Nacional de Teatro (SNT), de 1937.
Compreendendo-os como parte de uma política maior destinada à cultura
empreendida pelo governo de Getúlio Vargas, buscamos também demarcar a
participação do setor teatral, considerando, desse modo, a relação entre Estado e teatro
em termos de um diálogo e/ou negociação, problematizando a convocação de
intelectuais e artistas para atuar nestes órgãos e as estratégias dos grupos em busca do
amparo em confronto com a política oficial.
Assim, partimos de uma perspectiva que leva em consideração a presença de
diversos atores e interesses no processo de construção de uma política para a cultura,
distanciando-se de uma visão simplificadora, que tende a interpretar esse processo
privilegiando a ação do Estado com vistas à obtenção de um consenso através do
domínio dos meios de criação e difusão cultural (MICELI, 1985). Nesse sentido, nossa
atenção à organização teatral brasileira das primeiras décadas do século XX: as
companhias, os personagens, os gêneros encenados, a crítica, a organização dos
trabalhadores em entidades de classe, pois foram com estes que o governo interagiu ao
incorporar o teatro como objeto de seu interesse.

II
Em 1936, Getúlio Vargas determinou a criação de um órgão voltado para o
estudo dos problemas do teatro nacional, atendendo a solicitações de diversos artistas e
organizações de classe. Não era a primeira vez que Vargas se deparava com o teatro.
Em 1928, quando cumpria mandato como deputado federal, encaminhou um projeto

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elaborado por uma comissão designada pela Sociedade Brasileira de Autores Teatrais
(SBAT), que se transformou no decreto n. 5.492, conhecido como “Lei Getúlio
Vargas”, que organizou a profissão de artista e estabeleceu uma série de medidas
protetoras para a categoria.
Considerado um benfeitor do teatro desde essa data, com sua chegada à
presidência da República depois do golpe de 1930, o setor teatral viu-se na expectativa
de alcançar um amparo mais efetivo da parte dos poderes públicos Apoio que era
reclamado há bastante tempo por artistas, autores, empresários, críticos e organizações,
que esperavam do Estado uma solução para todos os seus problemas. Assim, logo
encaminharam seus pleitos e redigiram memoriais, enumerando os obstáculos
enfrentados pela classe e, também, suas sugestões para a transformação do teatro
brasileiro.
Essas propostas, enviadas por artistas e por entidades como a Associação
Mantenedora do Teatro Nacional, a SBAT e a Casa dos Artistas, abrangiam temas como
a instituição de uma escola para a formação de atores, a criação de uma companhia
oficial nos moldes da Comédie Française, a construção de casas de espetáculos, a
garantia dos direitos de atores e autores, entre outros, e tinham a finalidade de sanar
problemas ligados ao aspecto material e que também envolviam questões de ordem
artística. Em relação a estas últimas, a reclamação, quase que generalizada, era a da
necessidade da elevação do nível da cena brasileira, marcada pela predominância dos
gêneros cômicos e musicados no gosto do público (NUNES, 1956).
A primeira medida do governo Vargas voltada para o setor foi a constituição de
uma comissão, em 1932, no Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, que tinha
como fim elaborar o estatuto dos profissionais de teatro e diversões congêneres, mas, ao
que parece, não alcançou os resultados desejados e nem teve continuidade (IDEM,
1956d, p. 40). Dois anos depois, foi subvencionado o projeto Teatro-Escola, idealizado
pelo ator e dramaturgo Renato Viana, iniciativa isolada e polêmica, mas que abriu um
espaço para que artistas e organizações reforçassem seus pedidos de amparo.
Apenas em 1936, depois de uma reunião com um representante da Casa dos
Artistas, Vargas assentiu com a criação da Comissão de Teatro Nacional, que ficaria
subordinada ao Ministério da Educação e Saúde, na época dirigido por Gustavo
Capanema.

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A atuação de Capanema, que permaneceu como ministro da pasta até o final do
primeiro governo Vargas, ficou marcada pela historiografia como um momento de
grande efervescência cultural, devido ao seu relacionamento com parte considerável da
intelectualidade brasileira do período, e ao patrocínio de diversas iniciativas em várias
esferas culturais. A tarefa educativa proposta por esse ministério visava mais do que a
transmissão de conhecimentos, tendo também como objetivo desenvolver a alta cultura
do país: a arte, a música, as letras, etc., além de difundir os novos valores construídos
pelo Estado, e de impedir que a nacionalidade fosse ameaçada por agentes de outras
culturas, ideologias e nações (SCHWARTZMAN, BOMENY e RIBEIRO, 2001, p. 65).
Desse modo, além de empreender reformas no sistema de ensino, Capanema
implementou medidas voltadas para setores como o cinema, o rádio, o patrimônio
histórico e artístico, a música, o livro, algumas delas geridas pelos novos órgãos
estabelecidos, como o Instituto Nacional de Cinema Educativo e o Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, para os quais foram convocados intelectuais
e artistas de diversas tendências e orientações políticas.
A ampliação desse espaço de participação vinha ao encontro dos anseios desses
artistas e intelectuais que, desde as primeiras décadas do século XX, se identificavam
com a ideia de construção da nação e encontravam-se dispostos a contribuir, com seus
projetos, para a realização de mudanças políticas, sociais e culturais, e verem atendidas,
como consequência, suas demandas específicas.
Dentro desse quadro inseriu-se a criação da Comissão de Teatro Nacional, pela
portaria de 14 de setembro de 1936, contando com amplas competências, relacionadas
aos estudos da questão da construção de teatros; da organização de cursos para o
preparo de atores; do incremento da “boa” literatura dramática; da história da literatura
dramática brasileira, portuguesa e estrangeira; do teatro lírico e da arte coreográfica; e
das questões relativas ao teatro infantil. Enfim, cabia à Comissão examinar todos os
aspectos e problemas do teatro, a fim de sugerir ao governo as medidas que
favorecessem seu desenvolvimento.
Suas atribuições incorporaram muitas das questões colocadas pela classe teatral,
que foram transformadas em objetos de estudo, que ficaram a cargo de artistas e
intelectuais conhecidos. Eram eles o ator, encenador e diretor Olavo de Barros,
representante da Casa dos Artistas, o dramaturgo, crítico e tradutor Benjamin Lima, o
jornalista, dramaturgo e empresário teatral Oduvaldo Vianna, o artista plástico e

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professor Celso Kelly, o jornalista Múcio Leão, diretor da Casa de Rui Barbosa durante
o governo provisório de Vargas, o músico Francisco Mignone e o escritor Sérgio
Buarque de Holanda.
Instalada a Comissão, foram iniciados os estudos, divididos conforme a
especialidade e o conhecimento de cada membro: Sérgio Buarque, por exemplo, mais
ligado à literatura, estudou o tema da tradução de peças; Francisco Mignone elaborou
um plano para uma escola de música e conduziu os debates sobre o amparo ao teatro
lírico e sobre a tradução de libretos de ópera; Oduvaldo Vianna, que conhecia
profundamente a cena teatral, responsabilizou-se pela organização de um edital de
concorrência para a subvenção de companhias de comédia. Cada estudo considerava os
diversos aspectos que envolviam a questão, e era acompanhado por sugestões, que eram
depois encaminhadas para o ministro. Capanema também esteve presente em várias
reuniões (que foram 58 ao todo), ocasiões nas quais ele assumiu a direção das
discussões, demonstrando um grande interesse pelo assunto.
Nem todas as propostas apresentadas tinham viabilidade imediata, mesmo assim,
a Comissão realizou algumas iniciativas mais acessíveis, organizando a subvenção a
companhias (de artistas profissionais e amadores), e concursos para a seleção de libretos
de ópera e para a escrita de uma história do teatro no Brasil. Além disso, foram
providenciadas a tradução de uma peça de Shakespeare, Romeu e Julieta, realizada pela
primeira vez no Brasil, a tradução do libreto de O Guarani, de Carlos Gomes, e a
promoção de espetáculos e obras que tinham uma finalidade cultural mais elevada,
especialmente aqueles ligados ao teatro lírico, e também identificados com uma busca
pelas raízes brasileiras – presentes nas recomendações de inclusão de assuntos
históricos ou lendas nacionais. Esses fatos revelam uma confluência entre a política para
a cultura preconizada por Capanema, e o ideal de um teatro nacional, baseado em
padrões artísticos mais eruditos, que mobilizava grande parte do setor teatral, e até os
autores dedicados ao teatro comercial, como eram Oduvaldo e Benjamin, como deixa
claro alguns de seus pareceres.
As dificuldades enfrentadas para melhorar as condições dos profissionais do
teatro e da cena brasileira advindas, em parte, do próprio caráter de órgão de estudo que
distinguia a Comissão, levaram Capanema a transformar a estrutura administrativa
destinada a cuidar das questões do teatro. Visando imprimir uma marca mais pragmática
às ações, a Comissão foi extinta e criado o Serviço Nacional de Teatro, pelo decreto-lei

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n. 92, de 21 de dezembro de 1937, que tinha por finalidade implementar aquilo que à
Comissão coube estudar. O Serviço, assim como a Comissão, limitava-se às questões
artísticas e ligadas às condições do “fazer teatro”, excluindo os aspectos mais
estritamente trabalhistas, que ficavam sob a esfera do Ministério do Trabalho, e aqueles
relacionados à censura e fiscalização dos contratos, que permaneceram no âmbito da
Polícia do Distrito Federal até 1939, quando foram incorporados pelo Departamento de
Imprensa e Propaganda (DIP), órgão que tinha como atribuição promover a propaganda
do Estado Novo e controlar as atividades culturais.
Na exposição de motivos que acompanhou o decreto-lei n. 92, Gustavo
Capanema reconhecia a obra efetuada pelo governo, assinalando, no entanto, a
necessidade de continuar o amparo ao teatro, cujos problemas não seriam resolvidos
com incentivos intermitentes e auxílios temporários.
Para dirigir o novo órgão foram chamados Oduvaldo Vianna e Mário de
Andrade, que recusaram o convite. O dramaturgo Abadie Faria Rosa, nome sugerido
por Vargas, também declinou do cargo em um primeiro momento, mas acabou
aceitando-o posteriormente. Empossado somente em agosto de 1938, a atuação de
Abadie, que permaneceu no órgão até 1945, foi marcada por intensas polêmicas e pelo
conflito de autoridade entre ele e o ministro.
Abadie Faria Rosa era um nome reconhecido no meio teatral. Dramaturgo,
crítico, presidente da SBAT em quatro ocasiões, Abadie era convocado, com
frequência, pelo governo e pela classe, para participar de discussões sobre o teatro
brasileiro. Além dele, foram chamados para trabalhar no SNT outros nomes ligados ao
teatro, como os dramaturgos Gastão Tojeiro e José Wanderley, o empresário e escritor
João do Rego Barros, o crítico teatral João Travassos Serra Pinto, e mais Benjamin
Lima, a bailarina Eros Volúsia, os atores Lucília Peres e Chaves Florence, o teatrólogo
Otávio Rangel, e o crítico Mário Hora, que serviram no Curso Prático de Teatro,
instituído em 1939.
Os planos iniciais formulados por Abadie Faria Rosa e as atividades
empreendidas pelo órgão revelam a existência de um eixo de atuação que distinguia a
ação do SNT em duas frentes: a primeira ligada às questões materiais, verificada na
preocupação com a obtenção de casas de espetáculos, de auxílios às excursões, etc.; e, a
segunda, dedicada a medidas que visavam aprimorar e desenvolver o teatro brasileiro,

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estimulando um teatro mais sério, através da concessão de prêmios, e preocupando-se
com a formação de atores.
Essa divisão evidenciou-se, também, na atividade que acabou se tornando
predominante durante os anos compreendidos em nosso recorte cronológico, a da
subvenção. A subvenção parecia ser a medida mais acessível para contornar os
problemas que atravessam a existência das companhias teatrais, o mais grave deles, o da
falta de casas de espetáculos, que se transformavam progressivamente em cinemas. Por
outro lado, seu caráter efêmero era reconhecido pelo próprio ministro na exposição de
motivos citada, e também por Abadie. A prática era, ainda, duramente criticada pela
imprensa e pelas entidades de classe em suas cartas enviadas ao órgão, ao ministério e
até à Presidência da República.
Inicialmente, no ano de 1939, foi estabelecido um edital para a concorrência, que
contemplou companhias de vários gêneros, desde uma tentativa de realizar um teatro de
arte, proposta por Renato Viana, até companhias de revista como a de Jardel Jércolis. A
experiência, bastante controversa, fez com que no ano seguinte Capanema propusesse
um novo critério, eliminando a subvenção a empresários. A partir desse momento, o
governo ficava encarregado apenas do fornecimento de teatros, por meio do pagamento
dos aluguéis, desde que as companhias que os ocupassem possuíssem “finalidade
artística teatral”. Ou seja, de acordo com Abadie Faria Rosa, ficavam excluídos “os
elencos de revista e outras peças que escapem a exata expressão do que se seja a
tragédia, o drama, a comédia, a ópera e a nossa burleta, esta quando ornada de partitura
original” (ROSA, 1940). O plano previa, também, a concessão de pequenos auxílios
para excursões e para montagens de peças de caráter histórico e educativo.
Na realidade, a exclusão dos gêneros cômicos musicados não foi levada de
maneira tão radical. Na concessão de auxílios para excursões e para o pagamento de
aluguel de casas de espetáculos, notamos que artistas como Alda Garrido e Walter Pinto
foram contemplados com alguma frequência. Por outro lado, esses mesmos nomes
foram rechaçados quando solicitaram prêmios.
Prêmios que, contudo, não foram negados para as companhias de comédia
tradicionais, como a de Procópio Ferreira, Jayme Costa ou Dulcina de Moraes. Assim,
percebemos que a ação governamental acabava por reproduzir a ideia de hierarquia dos
gêneros consagrada nas discussões sobre o teatro, na qual, no topo, ficava o teatro
considerado sério, com preocupações literárias de caráter erudito, na parte inferior

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ficava a comédia, em suas diversas modalidades, e, abaixo da comédia, ficavam os
gêneros cômicos musicados, como era a revista (PEREIRA, 1998, p.32).
Dessa forma, para as concessões de prêmios e aquelas destinadas a montagens
foram contempladas as companhias de sucesso de público, que apresentaram, em várias
ocasiões, uma proposta de repertório um pouco diferente das suas experiências
habituais, incluindo textos clássicos do teatro universal (como os de Molière), obras
mais recentes (de Eugene O’Neill, Bernard Shaw e outros), peças consagradas do teatro
brasileiro (muitas de José de Alencar, Artur Azevedo e Martins Pena), e mesmo textos
de caráter “histórico”, que se adequavam às diretrizes culturais do Estado Novo, como
eram Carlota Joaquina, de Raimundo Magalhães Júnior e Tiradentes, de Viriato
Corrêa.
Além disso, foi concedido amparo a grupos amadores que traziam novas ideias e
propostas para os palcos brasileiros. Dentre eles, destacam-se o Teatro do Estudante do
Brasil, grupo idealizado pelo diplomata Paschoal Carlos Magno, que, em 1938, montou
Romeu e Julieta, uns primeiros espetáculos realizados no Brasil a partir de preceitos de
encenação considerados modernos, cuja direção ficou a cargo de Itália Fausta; e Os
Comediantes, grupo formado no interior da Associação de Artistas Brasileiros, na qual
circulavam grande número de intelectuais, que foi responsável por encenações de
Pirandello, e que trouxe aos palcos Vestido de Noiva, texto de Nelson Rodrigues,
dirigido pelo polonês Zbigniew Ziembinski.
No caso de Os Comediantes, os auxílios, uma grande soma em relação ao que
era concedido a outros grupos, foram autorizados diretamente por Capanema, a partir de
1942, sem o conhecimento de Abadie Faria Rosa. Essa situação deu início à perda de
sua influência sobre a ação do SNT, que já era bastante limitada desde sua posse. A
partir desse ano, Capanema passou a destinar grande parte da verba do órgão a grupos
de sua preferência, ou com os quais era ligado por laços pessoais. Por sua ordem,
também foram contemplados o Teatro Universitário, a Companhia Dulcina-Odilon e
Renato Viana.
Percebemos, dessa maneira, que, apesar dos planos e das ideias, a ação do SNT
em relação à distribuição de auxílios revelou-se abrangente, compreendendo
companhias de diversos gêneros e modalidades teatrais. Muitas dessas concessões
foram marcadas pelo personalismo. Diversos pedidos foram feitos ao ministro ou ao
presidente, que faziam questão de demonstrar seu interesse pelo teatro, assistindo a

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peças, enviando suas congratulações aos artistas, ou interferindo diretamente no
assunto. Outras vezes, era Abadie que se mostrava condescendente. Mesmo não
considerando a revista como um gênero teatral, o diretor do SNT intercedeu a favor dos
pedidos de Jardel Jércolis e Walter Pinto, quando era caso de amparo às excursões, pois
o que estava em jogo era a sobrevivência do teatro brasileiro, que precisava, antes de
tudo, ser mantido, para depois, aprimorado.
Além de amparar artistas profissionais e grupos amadores, o SNT também se
preocupou com o teatro infantil, a partir da realização de espetáculos feitos com
crianças, mas sem levar a questão para o âmbito escolar. E o órgão ainda tornou
concretas duas das principais demandas da classe teatral do período: a criação de uma
escola e de duas companhias oficiais, a Comédia Brasileira e a Companhia Nacional de
Operetas.
O Curso Prático de Teatro foi estabelecido em 1939, contrapondo ao tipo de
ensino ministrado pela Escola Dramática Municipal do Rio de Janeiro cujo conteúdo era
criticado por ser demasiadamente teórico. A Comédia Brasileira, criada em caráter
experimental em 1940, e mantida até 1945, teve uma existência mais atribulada, e não
se constituiu como instrumento da tão propalada elevação do teatro brasileiro, pois seu
repertório e o elenco pertenciam à cena tradicional, o que não a diferenciava, portanto,
das companhias que dedicavam ao teatro comercial (MICHALSKI; TROTTA, 1982). A
Companhia Nacional de Operetas, por outro lado, teve uma existência efêmera, pois
somente funcionou em 1940, realizando apenas uma representação.
O Serviço Nacional de Teatro também patrocinou alguns espetáculos
relacionados aos eventos comemorativos promovidos pelo governo e até ligados à
propaganda. Em 1940, no aniversário de dez anos da “Revolução de 1930”, Abadie
Faria Rosa, propôs a realização de montagens com o fim de “proporcionar ao público,
por preços mais convidativos, espetáculos de acentuado espírito de brasilidade”
(PROCESSO n. 35.501/40). Neste sentido, foram auxiliadas as representações das
óperas de Carlos Gomes, realizadas pelo tenor Reis e Silva, a montagem da opereta
Minas da Prata, realizada pela Companhia Nacional de Operetas, e de O caçador de
esmeraldas, pela Comédia Brasileira. Em 1942, Capanema determinou que o SNT
auxiliasse o DIP na propaganda relacionada à guerra, patrocinando peças que apoiassem
o Brasil ou atacassem seus (então) inimigos, e organizando representações para os
soldados mobilizados. Assim, apesar de não se constituir como um órgão voltado para a

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difusão dos valores do regime, e sim mais preocupado com as questões essencialmente
teatrais, o SNT realizou atividades com esta finalidade, por ordem de Capanema ou
através das sugestões de Abadie. Nessa direção, cumpre salientar que os próprios
artistas também se adequaram a essas diretrizes, propondo peças de caráter “histórico” e
“nacionalista”, que certamente os ajudariam a conquistar os auxílios almejados. Um
exemplo pode ser encontrado no argumento de Jayme Costa, ao pedir apoio para a
realização de sessões vespertinas da peça Carlota Joaquina, destinadas a estudantes:
“que valerão como curso vivo de ensino de História Pátria, sobre a época em que se
definiu a nacionalidade brasileira e foram lançadas as bases do edifício da Nação que é
hoje o Brasil” (PROCESSO n. 22.151/39).
Essa mesma orientação pode ser notada nos pleitos das entidades de classe
dirigidos ao órgão, ao ministro e ao presidente. Em várias ocasiões, organizações como
a Casa dos Artistas, a SBAT, a Associação Brasileira de Críticos Teatrais e o Sindicato
dos Trabalhadores de Teatro de São Paulo, utilizaram justificativas baseadas nos
preceitos do Estado Novo como forma de reforçar seus pedidos.
Mas, mesmo demonstrando certa adequação, estas não se eximiram de criticar a
direção tomada pela política oficial, e propuseram mudanças radicais, que visavam a
adoção de medidas que ultrapassavam as atribuições do órgão, como a isenção de todos
os impostos que incidiam sobre o teatro, a transformação de cinemas em teatros, a
criação de uma escola no âmbito do ensino superior, entre outros pontos, além da
própria transformação do SNT. Demonstravam, assim, sua discordância com a ação
governamental.
A figura de Vargas, entretanto, saía ilesa dessas críticas: era como se o chefe de
Estado não tivesse relação alguma com os problemas enfrentados pelo órgão. Vargas foi
homenageado por artistas e por essas organizações em, praticamente, todos os anos de
seu governo.
Em setembro de 1945, em meio aos conflitos que levaram ao fim o Estado
Novo, Vargas sancionou, simbolicamente no palco do Teatro Municipal do Rio de
Janeiro, três decretos-lei, dispondo sobre isenção de impostos e taxas federais e a
construção de teatros, instituindo o Conservatório Nacional de Teatro na Universidade
do Brasil, e regulando sobre a locação de teatros no Distrito Federal. Com essa atitude,
Vargas atendia, mais uma vez, às demandas da classe teatral e garantia seu prestígio,
mostrando um interesse “pessoal” pela questão, como fazia com alguma frequência.

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Contudo, com sua deposição em outubro, caberia a outros governos regulamentar esses
atos.
Observamos, assim, que, embora a Comissão e o Serviço Nacional de Teatro
tivessem amplos propósitos, e contassem, em sua composição, com nomes ligados à
área, e que conheciam seus problemas com profundidade, pouco foi realizado em
termos concretos, sendo a maior parte dessas iniciativas de caráter efêmero, como eram
as das subvenções.
No caso da Comissão, notamos que, apesar dos limites, esta cumpriu parte de
suas funções, pois tratava-se de um órgão de estudo. Mesmo assim, suas propostas
parecem-nos distantes da transformação que se pretendia realizar. Mais do que traduzir
textos clássicos, ou cuidar da produção dramatúrgica, era necessária uma articulação
real com as reformas que se implementavam na esfera educacional. Circunstância
privilegiada para tal feito, somado ao próprio interesse de Capanema, mas que não foi
sequer sugerido.
Em relação ao Serviço, a ausência de uma diretriz nítida transformou sua
trajetória de 1938 a 1945 em objeto de críticas, que vieram de todas as partes, até
daquelas que recebiam o amparo. Os limites da ação do Estado, entretanto, eram muito
claros para Abadie Faria Rosa, que em vários planos e relatórios escreveu:

É forçoso, portanto, repetir: o teatro não se faz com leis. Não são os
dispositivos legais que vão dar corpo e vitalidade a uma obra de mera
inteligência e saber, a um empreendimento de integral amadurecimento.
Teatro é cultura, é adiantamento, é civilização. Só o tempo poderá realizar
iniciativa de tal monta. O que o Estado deverá e poderá fazer, é incentivar,
provocar, acelerar esse surgimento, de arte tão complexa (ROSA, 1941).

Mesmo com todos esses problemas, esse momento constituiu-se como o início
de incorporação do teatro como objeto de uma política governamental distinta das
iniciativas oriundas do século XIX, e afastada da ação censória, que se consolidaria por
quase todo o século XX. Representou, ainda, a abertura de espaço para inovações que
contribuiriam, inclusive, para a transformação da cena brasileira.

Bibliografia e fontes
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Congresso de Pesquisa e Pós-Graduação em Artes Cênicas (Memória ABRACE X). Rio
de Janeiro 2006, p. 237-238.
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_________________. Relatório das atividades de 1941. Serviço Nacional de Teatro
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Ribeiro. Tempos de Capanema. 2.ed. São Paulo: Paz e Terra; Fundação Getúlio Vargas,
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