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1885 1932 Década de 1940 1953

Tudo começa com o Memória reconstrutiva O Buscando o engrama Ao A amnésia e os lobos


esquecimento O psicólogo psicólogo Frederic Barlett sugere buscar a localização cerebral temporais mediais Brenda
Hermann Ebbinghaus estuda que a memória humana envolve física da memória, chamada de Milner publica o famoso caso do


quão rapidamente as pessoas reconstrução e que as memorias engrama, Karl Lashley concluí paciente H.M .. que foi
reaprendem silabas sem sentido. das pessoas são influenciadas que o cérebro funciona como submetido a uma cirurgia para
Ele apresenta evidências por crenças previas, desafiando a um todo para armazenar epilepsia e, posteriormente,
convincentes de que o idéia de que a memória reg1stra memórias. experienciou profunda perda de
esquecimento ocorre objetivamente a experiência . memória.
rapidamente, a princípio, mas
depois se estabiliza ao longo do
tempo.
1956 Década de 1960 1968-Década de Década de 1970 Década de 1970
Alcance de memória George Teorias da memória em 1970 Níveis de Memória episódica Endel
Miller. um dos inteleàuais estágios Alguns processamento Fergus Craik, Tulving introduz uma
Estudos de caso
fundadores da neurociência pesquisadores da memoria Robert Lockhart e Endel Tulving importante distinção entre a
neuropsicológicos
cognitiva, observa que a desenvolvem teorias da enfatizam que a maneira de memória semântica de fatos e
Pesquisadores como Larry
memória de curto prazo é memória em estag1os. A maioria processar a informação conhecimentos e a memória
Squire, Stuart Zola-Morgan,
limitada e demonstra que as das teorias inclui um breve determina como a memória é episodica de experiências
Lawrence Weiskrantz, Elizabeth
pessoas organizam a informação tampão sensorial de memória. armazenada e, mais tarde, pessoais.
Warrington e Tim Shallice
em unidades, ou blocos, memória de curto prazo e recuperada. Quanto mais
relatam estudos de caso de
significativos. memória de longo prazo. profundamente as pessoas
individuas com lesão cerebral
processam a informação, melhor
que apresentam deficits
conseguirão lembrá-la.
espec1f1Cos de memória .
216 GAZZANIGA e HEATHERTON

magine como seria o mundo se você perdesse a capacidade de lembrar novas

1 experiências. Você não conseguiria lembrar de ter conhecido pessoas, do que


fez ontem à noite ou mesmo do que comeu no café da manhã. Em poucos
minutos, você esqueceria até de ter pensado sobre esse problema. Esse é o destino
de um homem que foi submeti do a uma cirurgia cerebra l para aliviar sua epi lepsia.
As drogas anticonvulsivantes se mostraram inefetivas para controlar as
convulsões de H.M . e, assim, em setembro de 1953, seus médicos realizaram uma
cirurgia e removeram parte dos lobos temporais mediais, incluindo o hipocampo
(Figura 7.1 ). A idéia era impedir que as convulsões, que se originavam nos lobos
temporais, se disseminassem por todo o cérebro . A cirurgia foi um sucesso para
acalmar as convulsões, mas também teve um efeito colateral extremamente
lamentável: H.M. perdeu a capacidade de formar novas memórias de longo prazo.
Os problemas de memória de H.M. são profundos. Seu mundo parou em
setembro de 1953, quando ele tinha 27 anos de idade. Ele consegue falar sobre a
sua infância, explicar as regras do beisebol e descrever membros de sua família.
Segundo a testagem neuropsicológica, seu QI é levemente acima da média .
Portanto, sua capacidade de pensamento é ótima, e ele consegue manter uma
conversa normal enquanto não for distraído por alguma coisa. No entanto, ele é
incapaz de lembrar novas informações . Cada momento é novo . Ele nunca sabe o
dia da semana, que ano é ou a própria idade. A psicóloga canadense Branda
Milner, que acompanhou o caso de H.M. por mais de 40 anos, assim como ou t ros
que trabalham com ele, continuam tendo de se apresentar cada vez que o
encontram. Na verdade, ele parece aprender algumas coisas novas ... só que ele
simplesmente não sabe disso .
É impressionante a capacidade de H.M. de aprender novas tarefas motoras.
Por exemplo, em uma tarefa ele precisava traçar o contorno de uma estrela
enquanto observava a própria mão em um espelho. Essa é uma tarefa difícil, e a
Como as experiências perceptivas maioria das pessoas se sai mal da primeira vez em que tenta. H.M. foi solicitado a
são transformadas em memórias? traçar a estrela 1O vezes por dia, em três dias consecutivos. Como mostra a Figura
Existem tipos diferentes de 7.2, o desempenho de H.M. melhorou ao longo dos três dias, o que significa que
memória ou todas são, ele reteve alguma informação sobre a tarefa; entretanto, H.M. não lembrava de já
essencialmente, as mesmas? ter realizado a tarefa previamente. A capacidade de H.M. de aprender novas
As memórias são armazenadas de tarefas motoras lhe permitiu conseguir um emprego em uma fábrica, onde ele
maneira organizada? monta acendedores de cigarro em caixas de papelão. Mas ele não consegue
Como as pessoas conseguem descrever a natureza de seu trabalho ou o local onde trabalha . O caso de H.M .
recuperar memórias específi cas? contribuiu com muitas deixas de como as memórias são armazenadas no cérebro,
As pessoas realmente esquecem e nós o citaremos por todo o capítulo.
coisas e, se for assim, por que isso
acontece?
O que faz com que as pessoas
tenham memórias distorcidas,
falsas ou inexatas?
Neste capítulo nós estamos interessados na memória, a capacidade do sistema nervoso de adquirir
e reter habilidades e conhecimentos utilizáveis, permitindo que os organismos se beneficiem da
experiência. A memória é uma capacidade surpreendente. Nós lembramos milhões de informações,

Década de 1970 Décadas de 1970 e 1978 Década de 1980 Década de 1990


Modelos animais de 80 Realismo ecológico Ulric Sistemas múltiplos de Imagem e
memória Pesquisadores como Neisser enfatiza que os memória É identificada uma memória Pesquisadores como
Modelos de difusão da
Mortimer Mishkin, Patricia pesquisadores precisam prestar variedade de processos de John Gabrieli, Lars Nyberg,
ativação Os modelos de rede memória envolvendo sistemas Randy Buckner, Steven Petersen
Goldman-Rakic e Howard atenção a como a memória
sugerem que as memórias
Eichenbaum realizam funciona no mundo real, fora cerebrais separados, mas e Barbara Knowlton utilizam
experimentos de memória com
emergem de associações entre dos laboratórios. interatuantes, o que desafia a imagens cerebrais para explorar
itens com base em significados idéia de que a memória é uma a base neural da memória.
animais não-humanos.
semãnticos. A ativação de um
entidade unitária.
elemento da rede leva à
ativação de outros elementos
que compartilham significados
semelhantes.
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 217

das mais triviais às mais vitais. Todo o nosso senso de self é


aquilo que sabemos por nossa memória, nossas lembranças de Lobo frontal
experiências pessoais. Que tipo de pessoa você é? Você é úmi-
da/o ou expansiva/ o? Para responder a essas perguntas, nós
dependemos de nossas memórias das experiências passadas.
~o entanto, como você vai ver, as nossas lembranças muitas
vezes são incompletas, tendenciosas e distorcidas. Ms, freqüen-
temente, nos surpreendemos ao ver como as nossas lembranças
dos acontecimentos diferem tão imensamente das de outros que
experienciaram o mesmo evento. Há muitos lados da história,
porque cada pessoa armazena e recupera memórias do evento
de maneira diferente. A memória não é como uma câmera de
vídeo que captura fielmente imagens objetivas. Em vez disso, a
memória é uma história que pode ser sutilmente alterada por
relatos e novos relatos.
Neste capítulo, nós exploramos os processos mentais en-
volvidos no adquirir e reter conhecimentos. Começando com
uma discussão dos diferentes estágios de memória, nós então
discutimos como diferentes tipos de informações são represen-
tadas em memórias que persistem ao longo do tempo. Depois Tecido excisado
de explicar os processos básicos nos níveis cognitivo e compor- na lobotomia
tamental, passamos para os níveis de análise neuroquímico e temporal/medial
de sistemas cerebrais. Houve um rápido acúmulo de conheci-
mento sobre a memória na última década, graças a técnicas de FIGURA 7 .1 As porções do 1obo temporal medial removidas de H.M.
imagem cerebral e estudos de caso de pessoas que desenvolve-
ram transtornos de memória por lesão cerebral. Finalmente,
nós examinamos os níveis individual e social de análise, enquanto consideramos como as lembran-
ças que as pessoas têm de eventos passados são seletivamente distorcidas.

QUAIS SÃO OS ESTÁGIOS BÁSICOS DA


MEMÓR A?
Nas últimas três décadas, a maioria dos psicólogos via a memória como uma forma de processa-
mento da informação, em que os processos de memória ocorriam como num computador. O computa-
dor recebe informações por meio do teclado ou do modem, processa-a em software, armazena-a no
disco rígido e depois recupera a informação quando requisitado pelo usuário ou por outro programa.
De uma perspectiva de processamento da informação, a maneira comum de descrever a memória é
através de um sistema de memória de três estágios, que envolve memória sensoria~ memória de curto
prazo e memória de longo prazo (Figura 7.3) Essa estrutura geral é referida como o modelo modal de
memória, por ele ser tão amplamente utilizado; o termo "modal" significa que o modelo é comum ou
padrão. Proposto por Richard Atkinson e Richard Shiffrin em 1968, o modelo modal dominou o pensa-
mento psicológico sobre a memória, apesar de ser um tanto inexato e incompleto. Por exemplo, muitos
cientistas psicológicos agora acreditam que existem múltiplos sistemas de memória que não seguem a
seqüência de três estágios (e nós discutiremos essas visões alternativas na próxima seção). Entretanto,
o modelo modal é útil para introduzir idéias sobre o sistema de memória, e o vocabulário desse modelo
continua sendo amplamente utilizado na pesquisa sobre a memória.
memoria A capacidade do
sistema nervoso de adqu irir e reter
habilidades e conhecimentos
A memória sensorial é breve util izá veis, o que permite aos
organismos vivos beneficiar-se da
As informações sensoriais, como luzes e cheiros, deixam um traço no sistema nervoso por um experiência .
breve segundo e depois desaparecem. Por exemplo, quando você olha para alguma coisa e logo modelo modal de memória O
desvia o olhar, você pode rapidamente formar a imagem e lembrar alguns de seus detalhes.Quando sistema de memória de três
estág ios, que envolve memória
alguém proclama, com irritação: ''Você não estava ouvindo o que eu dizia", talvez você consiga sensoria l, memória de curto prazo e
repetir as últimas palavras da pessoa, mesmo que estivesse pensando em outra coisa. (É claro, isso memóri a de longo prazo.
normalmente deixa a pessoa ainda mais irritada.)
218 GAZZANIGA e HEATHERTON

Esse tampão sensorial temporário é referido como


memória sensorial. Amemória sensorial visual tam-
bém é chamada de memória icônica, ao passo que a
memória sensorial auditiva também é chamada de me-
mória ecóica. George Sperling (1960) forneceu os pri-
meiros apoios científicos para a memória sensorial. Em
seu clássico experimento, três fileiras de letras apare-
ciam rapidamente em uma tela, por um vigésimo de
segundo, e depois de períodos variados de intervalo os
participantes eram solicitados a lembrar uma das filei-
ras. Após um intervalo breve, as pessoas conseguiam
realizar bem essa tarefa. Mas o seu desempenho piora-
va progressivamente conforme o intervalo aumentava.
Sperling concluiu que a memória icônica persistia por cerca
de um terço de segundo, após o que o traço de memória
sensorial desaparecia e deixava de ser acessível.
Segundo muitos teóricos, as memórias icônica e
ecóica nos permitem experienciar o mundo como um
fluxo contínuo, e não em sensações separadas, exata-
mente como um projetor de filmes roda uma série de
fotos estáticas que se seguem uma à outra suficiente-
mente perto para parecer uma ação contínua. Quando
30
você vira a cabeça, a cena passa suavemente diante de
Dia 2 Dia 3 você, não em pedaços fracionados e espasmódicos.
Aidéia da memória icônica é um pouco controver-
"'
"D
20
sa. A maior parte das evidências da memória icônica é
"'u encontrada em estudos de laboratório, e alguns pesqui-
E
Cl!
sadores questionam se ela é uma idéia útil no mundo

\;\(\
Vl
e(ij real (Haber, 1983). Outros pesquisadores questionam
10
Cl!
"D
se ela é, afinal de contas, uma forma de memória ou
e
Cl!
A simplesmente um efeito colateral perceptivo, como os
E
·::J o sinais pretos que vemos depois de sermos ofuscados pelo
z 2 4 6 8 10 2 4 6 8 10 2 4 6 8 10 flash de uma câmera. Isso ocorre devido a processos sen-
Número de tentativas em cada dia soriais, não devido à memória. Um fenômeno relacio-
nado é a afirmação de que existe uma memória fotográ-
FIGURA 7.2 H.M. tinha de traçar a figura de uma estrela enquanto observava em um fica, pela qual um indivíduo pode olhar rapidamente
espelho. Essa é uma tarefa difícil, mas H.M. melhorou com o passar do tempo. Entretanto, para uma cena e depois lembrar detalhes com precisão.
ele não tinha nenhuma consciência de ter realizado a tarefa antes. Sua possível existência é examinada em "Utilizando a
ciência psicológica: Memória fotográfica".

A memória de curto prazo é ativa


A informação à qual prestamos atenção é transmitida de depósitos sensórios para a memória
Como as experiências perceptivas
são transformadas em memórias? de curto prazo (MCP), um sistema de memória de capacidade limitada que mantém informações
na consciência por um breve período. Muitos pesquisadores contemporâneos utilizam o termo me-
mória imediata para capturar a idéia de que esse tampão temporário consiste em nossos pensamen-
tos, sentimentos e impressões fugazes do mundo. Uma analogia de computador para a memória
memória sensorial Memória
imediata é a RAM, que só consegue lidar com uma pequena quantidade de informações, se compara-
para informações sensoria is, da à vasta quantidade armazenada no disco rígido do computador. O material na RAM é constante-
armazenadas brevemente em sua mente substituído por novas informações e, se não for salvo, perde-se para sempre.
forma sensorial original. A memória de curto prazo ou imediata não consegue manter informações por mais de 20 se-
memória de curto prazo gundos; depois desse intervalo elas desaparecem, a menos que você ativamente impeça que isso
(MCP) Um sistema de memória de aconteça, pensando sobre as informações ou repetindo-as. Por exemplo, quando você pede auxílio à
capacidade lim itada, que mantém
informações na consciência por um telefonista e esta lhe dá um número de telefone, você o repete várias vezes até discá-lo. Se o número
breve período de tempo. estiver ocupado, ou se houver alguma demora até você poder discá-lo, talvez você esqueça o número
e tenha de pedir ajuda mais uma vez (e mais uma vez!) . Da mesma forma, suponha que você está
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 219

Repetição de manutenção

Memória
-----;1111•
~ de curto
Memória
delongo
sensorial Atenção prazo Codificação prazo
~
Recuperação

A informação à A informação que Alguma


qual não se presta não é repetida informação FIGURA 7 .3 O modelo modal de
atenção é perdida. é perdida. pode ser perdi da
memória serve como uma estrutura útil
com o passar
do tempo. para pensarmos sobre os estágios básicos
da memória.

rentando lembrar alguma informação nova, como a série de consoantes de três letras, X, C e J.
Enquanto você continuar repetindo a série, vai mantê-la na memória de curto prazo.
Tipicamente, entretanto, você é bombardeado/ a por outros eventos que tentam capturar a sua
atenção, e talvez não consiga permanecer focado/ a. Para simular isso, tente novamente se lembrar da
série X, C, J, mas, desta vez, enquanto conta para trás, de três em três, desde o número 309. Se você for
como a maioria das pessoas, terá dificuldade em lembrar as consoantes depois de alguns segundos de
contagem retrospectiva. Esse procedimento demonstra que, quanto mais você ficar contando, menos
capaz será de lembrar a série de consoantes (Figura 7.4). Aos 18 segundos de contagem, as pessoas
lembram muito mal as consoantes. Isso ocorre devido à interferência de itens prévios na MCP.

MEMÓRIA FOTOGRÁFICA
Você, provavelmente, já ouviu falar sobre memória fotográfica , frase e contar quatro pa lavras. Alguém é capaz de fazer isso?
em que certas pessoas supostamente conseguem lembrar uma Provavelmente não.
imagem tão vividamente que relatam com precisão mínimos Em um estudo de 150 crianças em idade escolar, realizado na
detalhes. Muitos alunos gostariam de ter essa capac idade ao década de 1960, Lyn e Ralph Haber descobriram que 12 das crianças
estudar. Mas será que ela exi ste? E, se existe, quão comum ela é? apresentavam evidências de melhor memória eidética do que as
A idéia da memória fotográfica, que os cientistas psicológicos outras, conforme evidenciado por, aparentemente, manterem a
chamam de imagens mentais eidéticas, baseia-se na suposição de imagem na mente por mais tempo, falarem no tempo presente em
que as pessoas armazenam informações em imagens visua is que vez de no passado e moverem os olhos com se examinassem a
capturam fielmente a cena diante delas, exatamente como uma imagem lembrada. Outros estudos com crianças encontraram índices
fotografia . Contudo, como ficará óbvio durante a leitura deste semelhantes. Assim, poderíamos concluir que cerca de 8%-10% das
capítulo, a memória não é como uma reapresentação dos eventos crianças apresentam alguma forma de capacidade de imagens
em vídeo ou fotografia . No entanto, ainda é possível que algumas mentais eidéticas. Em contraste, estudos com adultos encontraram
pessoas consigam armazenar, e ma is tarde recuperar, imagens uma quase ausência de imagens mentais eidéticas. Robert Crowder
visuais individuais de uma maneira que simula uma fotografia (1992) conclu iu que estas imagens são um fraco substituto de uma
mental. verdadeira memória fotográfica. De fato, em um teste de massa
É possível lembrar imagens. Na verdade, a maioria das publ icado em revistas e jornais, não foi encontrado nenhum caso de
pessoas já viveu a experiência de lembrar que determinada memória fotográfica verdadeira . Nesse estudo, havia duas imagens,
resposta de uma prova poderia ser encontrada em uma pág ina lado a lado, de pontos em um arranjo aparentemente aleatório. Se
específica do livro, com um leve senso de consegu ir en xergar uma alguém consegu isse manter na mente uma imagem enquanto olhava
imagem da página. Mas qual é a quarta pa lavra na segunda frase para a outra, as duas se fund iriam e uma mensagem escondida seria
da página a contar do fim? Essa última pergu nta é um teste de revelada. O fato de ninguém ser capaz de fazer isso levou J. Merrit
memória fotográfica genuína . Se fosse realmente uma imagem (1979) a concluir que a memória fotográfica genuína era um
fotográfica, você poderia simplesmente olhar para a penú lt ima " fen õmeno de nenhum em um milhão" .
220 GAZZANIGA e HEATHERTON

1,0
.. 3 seg .
6 seg .
o - - - -O 9 seg.
--·-·-· .. 12 seg.

Experimentador
0,8
• - - - .... 15 seg.
18 seg . ..
..,,

0,6

Participante

/
.' . ~
I \
0,4

FIGURA 7 4 Para testar a


memória de curto prazo, o
O flash de luz é a -º ---- -0- - - - - o - - - - -o - - - - o
participante recebe uma série de o-
deixa para responder
consoantes e deve lembrá-la
enquanto conta para trás, de três
em três, a partir de um número 0,2 ' ~·_ .............. -·-
_..--·---- . ·-·-·-· . ·-·-·-· ..
dado pelo experimentador. Após ;
i
períodos que variam de 3 a 18
segundos, o participante é
solicitado a lembrar e repetir em
c5

./ ,'
I
i
·'·
,
·--------·- - --
_ ... - - - - - -
~ ·-
- -- - --- .... -- -- .
/ ,
voz alta a série de consoantes. .:/
~
Observe que a capacidade de Participante
lembrar a série diminui conforme
aumentam os intervalos de Latência (seg)
retenção.

Alcance de memória e agrupamento Por que os novos itens interferem na recordação


dos itens mais antigos? A memória de curto prazo é um recurso limitado que só consegue manter
uma determinada quantidade de informações. O psicólogo cognitivo George Miller observou que a
MCP geralmente se limita a sete itens, mais ou menos dois, o que é comumente referido como
alcance de memória. Alguns trabalhos recentes sugerem que o alcance de memória pode limitar-se a
quatro unidades, em média (Cowan, 2001). O alcance de memória também varia entre as pessoas. Na
verdade, alguns testes de inteligência utilizam o alcance de memória como uma medida do QI.
Já que a MCP é limitada, poderíamos esperar que as pessoas tivessem grande dificuldade para
lembrar de uma série de letras como

OSUPHDNYUMAUCLABAMIT.

Essas 20 letras seriam difíceis até para o maior de todos os alcances de memória. Mas e se organizar-
mos a informação em unidades menores e significativas?

OSU-PHD-NYU-MA-UCLA-BA-MIT

Aqui nós vemos as letras separadas para produzir os nomes de universidades ou graus acadêmicos.
Essa organização torna muito mais fácil lembrar, por duas razões. Primeiro, o alcance de memória se
limita no máximo a sete itens, e provavelmente menos, mas os itens podem ser letras, números,
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 221

palavras ou, inclusive, conceitos. Segundo, é mais fácil lembrar unidades significativas do que uni-
memória de trabalho Um
dades sem sentido. O processo de organizar a informação em unidades significativas é conhecido sistema de processamento at ivo que
como agrupamento, como quando separamos as informações em partes. Quanto mais eficientemente mantém "na linha" difere ntes tipos
agrupamos as informações, mais conseguimos lembrar. Os grandes jogadores de xadrez conseguem de informações para uso co rre nte.
olhar por alguns segundos para um tabuleiro e, depois, reproduzir o arranjo exato das peças (Chase
e Simon, 1973). Eles conseguem fazer isso porque são capazes de dividir o tabuleiro em subunidades
significativas com base em sua experiência passada com o jogo. Interessantemente, se as peças do
tabuleiro estão colocadas aleatoriamente sobre o tabuleiro, de modo que o arranjo não faz sentido
em termos de xadrez, os peritos não conseguem reproduzir o tabuleiro melhor do que os iniciantes.
Em geral, quanto maior a sua experiência no assunto, mais eficientemente você consegue agrupar a
informação e, portanto, mais vai lembrar. A capacidade de agrupar a informação eficientemente
depende do nosso sistema de memória de longo prazo, que logo discutiremos.

Memória de trabalho O conceito inicial de memória de curto prazo era o de que se tratava
simplesmente de um tampão em que as informações verbais eram repetidas até serem armazenadas
ou esquecidas. Mas ficou claro que a MCP não é um simples sistema de armazenamento, e sim uma
unidade processadora ativa, que lida com múltiplos tipos de informação, como sons, imagens e
idéias. O psicólogo britânico Alan Baddeley e seus colegas desenvolveram um influente modelo de
sistema de memória ativo com três partes, que chamaram de memória de trabalho (Figura 7.5). A
memória de trabalho é um sistema de processamento ativo que mantém as informações "na
linha", para que possam ser utilizadas para atividades como solução de problemas, raciocínio e
compreensão. Por exemplo, H.M., do início deste capítulo, só consegue manter uma conversa en-
quanto estiver ativamente envolvido nela. Os três componentes da memória de trabalho são a execu-
tiva central, a alça fonológica e o bloco de notas visuoespacial.
Aexecutiva central preside as interações entre os subsistemas e a memória de longo prazo: ela é
a chefe. Ela codifica informações dos sistemas sensoriais e filtra as informações suficientemente
importantes para serem armazenadas na memória de longo prazo. Ela também recupera informa-
ções da memória de longo prazo conforme necessário. Aexecutiva central depende de dois subcom-
ponentes que retém temporariamente informações auditivas ou visuais.
Aalça fonológica codifica informações auditivas e está
ativa sempre que lemos, falamos ou repetimos palavras para
nós mesmos a fim de não esquecê-las. Você provavelmente
percebeu essa ''voz interior" que lê conforme seus olhos pro-
cessam o material escrito. Se não percebeu, tente ler a pró- ®
xima frase sem "falar" as palavras na sua cabeça. É difícil
obter um significado simplesmente passando os olhos pelo
texto. Evidências da alça fonológica são encontradas em es-
tudos em que as pessoas são solicitadas a ler listas de con-
1
( \ Bloco de notas Alça

V
soantes e lembrá-las depois. As pessoas tendem a cometer ( . _ . visuoespacial fonológica
erros com consoantes que soam parecidas, por exemplo, Repetiçao {material (fala, palavras,
visual e espacial) números)
trocam um Gpor um T, em vez de um Q. Arecordação tam-
bém é pior quando muitas palavras de uma lista têm o mes-
mo som, se comparadas a palavras que soam diferentemen-
te, mesmo quando as últimas palavras estão relacionadas
umas às outras em significado. Esses exemplos sugerem que
as palavras são processadas na memória funcional por seu
som e não por seu significado.
O bloco de notas visuoespacial é utilizado para pro-
\: ·: :~ ~· )) {coordena o
material)

cessar informações visuais, tais como as características de


um objeto e onde estão localizados. Suponha que você sai
para dar uma caminhada e vê um cachorro. O bloco de
ir
notas visuoespacial lhe permite saber onde o cachorro está Memória de
localizado e se é o tipo de cachorro com o qual precisa- longo prazo

mos ser especialmente cuidadosos. Adistinção entre a alça


fonológica e o bloco de notas visuoespacial foi demonstra-
da estudando-se pacientes com lesões cerebrais específi- FIGURA 7 .5 O sistema de memória de trabalho desenvolvido por Baddeley. Ele
cas. Pacientes com certos tipos de lesão cerebral podem inclui a executiva cen tral, a alça fonológica e o bloco de notas visuoespacial.
222 GAZZANIGA e HEATHERTON

ter grande dificuldade para lembrar configurações espaciais, nas pouca dificuldade para lembrar
memória de longo prazo
(MLP) A armazenagem
palavras, ao passo que outros apresentam justamente o padrão oposto. Esses achados de pesquisa
relativamente permanente de demonstram que a memória de curto prazo consiste em muito mais do que simplesmente um
informações. tampão que inclui tudo.
efeito da posição serial A
capacidade de lembrar itens de
uma lista depende da ordem de
apresentação, com os itens
A memória de longo prazo é relativamente permanente
apresentados no início ou no f ina l
da lista mais bem lembrados do que Quando as pessoas falam sobre suas memórias, elas geralmente estão se referindo ao armaze-
os do meio. namento relativamente permanente de informações, conhecido como memória de longo prazo
efeito de primazia Em uma lista, (MLP) . Na analogia com o computador, a MLP é semelhante às informações guardadas em um disco
a melhor memória para itens rígido. No entanto, diferentemente da armazenagem em computador, a MLP humana é quase ilimi-
apresentados primeiro . tada. Amemória de longo prazo nos permite lembrar canções de ninar da nossa infância, os signifi-
efeito de recentidade Em uma cados e grafia de palavras raramente utilizadas como azodiisobutironitrila, e o que você comeu on-
lista, a melhor memória para tem no almoço.
palavras apresentadas no final da
lista .
Distinguindo a memória de longo prazo da memória de curto prazo A memó-
ria de longo prazo é distinta da memória de curto prazo em dois aspectos importantes: duração e
capacidade. Mas existe uma controvérsia: será que a MLP é um tipo de armazenamento de memória
realmente diferente da MCP? As evidências iniciais de que a MLP e a MCP são sistemas separados
vêm da pesquisa que pede às pessoas que lembrem longas listas de palavras. Acapacidade de recor-
dar itens da lista depende da ordem de apresentação, com os itens apresentados no início ou no fim
da lista mais bem lembrados do que os do meio. Essa melhor recordação dos primeiros e últimos
itens é conhecida como o efeito de posição serial (Figura 7.6), que na verdade envolve dois
efeitos separados. O efeito de primazia se refere à melhor memória das pessoas para os itens
apresentados primeiro, enquanto o efeito de recentidade se refere à melhor memória para os
itens mais recentes.
Uma explicação comum para o efeito da posição serial baseia-se numa distinção entre a MCP
e a MLP. Quando as pessoas estudam a longa lista, elas repetem mais os primeiros itens, e essa
informação é transferida para a MLP. Os últimos itens, ao contrário, estão na MCP. A idéia de que
os efeitos de primazia se devem à MLP,
enquanto os efeitos de recentidade se
devem à MCP, é apoiada por estudos em
1,00
que existe um intervalo entre a apre-
sentação da lista e a tarefa de recordar.
Esse intervalo interfere no efeito de re-
0,80 centidade, mas não no efeito de prima-
~
zia, exatamente como poderíamos es-
.o"' perar se o primeiro envolve a MCP.
E
_!!' 0,60
Entretanto, é questionável atribuir o
QJ
-o
efeito de recentidade inteiramente à
QJ
-o MCP. Afinal de contas, você provavel-
~"' mente se lembra de sua última aula me-
:.o 0,40 lhor do que das anteriores, mesmo que
"'o
..o
não esteja mantendo o material na MCP.
o: Na verdade, estudos mostram que exis-
0,20 te um efeito de recentidade mesmo para
as informações apresentadas no decor-
rer de dias e semanas, o que torna im-
Início Final provável que o material seja mantido
0,00 -+-~~~~"--.~~~~~~~~~~-;...~~~~~~~~~~~

o 5 10 15 20 25 na MCP. Assim, o efeito de recentidade,


·I sozinho, não prova que a MCP e a MLP
Efeito de Posição da palavra na lista Efeito de
primazia recentidade sejam realmente tipos diferentes de ar-
mazenamento de memória.
Talvez a melhor confirmação da
FIGURA 7 .6 Após ouvir uma lista de itens, as pessoas, tipicamente, lembram melhor os itens do início distinção entre a MCP e a MLP seja en-
(efeito de primazia) e do final da lista (efeito de recentidade) do que os do meio. contrada em estudos de caso como o
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 223

de H.M., em que o sistema de MCP estava


perfeitamente normal e grande parte do sis-
tema de MLP estava intacta, mas ele não con-
seguia transferir novas informações da MCP
para a MLP. Em um caso diferente, uma víti-
ma de acidente, de 28 anos, com lesão no (a) (b) (e) (d) (e)
lobo temporal esquerdo tinha uma péssima
MCP, com um intervalo de apenas um ou dois
itens. Entretanto, sua MLP era perfeitamen-
te normal - ele tinha uma ótima memória
para acontecimentos do dia-a-dia e um razo-
áve l conhecimento de eventos passados
(Shallice e Warrington, 1969). De alguma for- (f) (g) (h) (i)
ma, apesar da obstrução em sua MCP, um flu-
xo normal de informações estava chegando
à MLP. Esses estudos de caso demonstram que
a MLP pode ser dissociada da MCP. Todavia,
os dois sistemas de memória são altamente
interdependentes. Por exemplo, para agrupar
informações na MCP, as pessoas precisam for-
mar conexões significativas com base em in- (k) (1) (m) (n) (o)
formações armazenadas na MLP.
FIGURA 7. 7 Você sabe qual dos desenhos da moeda de um centavo está certo? Veja no final
O que entra na memória de longo da página a resposta correta.
prazo Considerando que somos bombardea-
dos com tantas informações e nos empenha-
mos em tantas atividades, parece óbvio que algum tipo de sistema de filtragem ou série de regras
precisa limitar o que entra na MLP. Os pesquisadores ofereceram várias explicações possíveis para
esse processo. Uma possibilidade é a informação entrar no armazenamento permanente por meio
da repetição. Quando você estuda para as suas provas, talvez leia o material muitas vezes para ter
certeza de ter aprendido. Os pesquisadores da memória já demonstraram, inclusive, que a supera-
prendizagem, em que você fica repetindo materiais que já conhece bem, leva à memória melhora-
da, especialmente por períodos mais longos de tempo. É por isso que o estudo dividido ao longo
do tempo, conhecido como prática distribuída , faz com que a pessoa lembre melhor o material do
que o estudo concentrado num breve período de tempo, chamado de prática concentrada ou vira-
da final. A conclusão de muitos anos de pesquisa é que estudar por períodos mais curtos de tem-
po, mas dividir as sessões de estudo em vários dias ou semanas é a maneira mais eficiente de
aprender.
Entretanto, simplesmente repetir ou entrar em contato com alguma coisa muitas vezes não
garante que nossa memória do evento ou do objeto será duradoura. Afinal de contas, às vezes temos
péssima memória para objetos bastante conhecidos. Considere a Figura 7.7: Qual moeda de um
centavo está exata? A maioria das pessoas tem dificuldade para escolher a moeda certa, apesar de
vermos moedas de um centavo quase todos os dias.
Outra possibilidade é somente a informação que ajuda a nossa adaptação ao meio ambiente ser
costumeiramente transferida da memória de curto prazo para a memória de longo prazo. Dos bi-
lhões de experiências sensoriais e pensamentos que temos todos os dias, só armazenamos informa-
ções que são úteis. Anossa memória de que uma moeda de um centavo é dinheiro é muito mais útil
para nós do que lembrar suas características específicas. Ao armazenar informações significativas, os
organismos podem se beneficiar da experiência.
A teoria evolutiva ajuda a explicar como decidimos, antecipadamente, qual informação será
útil. A memória nos permite usar informações de uma maneira que nos ajuda na reprodução e
sobrevivência. Por exemplo, organismos capazes de usar experiências passadas para aumentar suas
chances de sobrevivência têm uma vantagem seletiva em relação a organismos que não conseguem
aprender com experiências passadas. Reconhecer um predador e lembrar a rota de fuga ajudará o
organismo a evitar ser comido no futuro. Correspondentemente, lembrar quais objetos são comestí-
veis, quais pessoas são amigas e quais são inimigas, e como chegar em casa são coisas fáceis para as Resposta da Figura 7.7: A moeda de um centa-
pessoas com sistemas de memória intactos. vo correta é (a).
224 GAZZANIGA e HEATHERTON

Quais são os estágios básicos da memória'?


A abordagem informacional de processamento à memória contém três estágios básicos. A memória sensorial
consiste em breves traços no sistema nervoso que refletem processos perceptivos. O material é transmitido da
memória sensorial para a memória de curto prazo, um tampão limitado que mantém informações na consciência
por um breve período de tempo. Um modelo influente de MCP é a memória de trabalho, que envolve uma
executiva central, uma alça fonológica e um bloco de notas visuoespacial. A MCP se limita a menos de sete porções
de informação, provavelmente em torno de quatro. As regras de agrupamento são determinadas pelos significados
fornecidos pela memória de longo prazo. A MLP é uma armazenagem ilimitada, relativamente permanente.
Apenas as informações que são, por algum motivo, significativas, são armazenadas na MLP. A distinção entre MCP e
MLP fica mais clara nos estudos de caso de pessoas com prejuízo em uma delas e não na outra .

QUAIS SÃO OS DIFERENTES SISTEMAS


DE MEMÓRIA?
Até as últimas décadas, a maioria dos psicólogos cognitivos pensava que a memória de longo
prazo era um sistema relativamente unitário. As memórias eram vistas como diferindo em termos de
força e acessibilidade, mas, de modo geral, eram consideradas do mesmo tipo. Psicólogos cognitivos
como Endel Tulving, Dan Schacter e Larry Squire começaram a contestar essa visão nas décadas de
Existem tipos diferentes de 1970 e 80. Esses pesquisadores afirmaram que a memória não é uma entidade monolítica, mas um
memória ou todas são,
essencialmente, as mesmas?
processo que envolve alguns sistemas interatuantes. Embora os sistemas compartilhem uma função
comum, que é reter e usar informações, eles codificam e armazenam diferentes tipos de informação,
e fazem isso de maneiras diferentes. Por exemplo, existem várias distinções óbvias entre a sua me-
mória de ser capaz de andar de bicicleta e a sua capacidade de recordar o que comeu ontem no
jantar ou que a capital do Canadá é Ottawa. Aprimeira tarefa requer um componente comportamen-
tal, uma integração de habilidades motoras e perceptivas que você adquiriu no decorrer do tempo
durante o desenvolvimento. Você não está consciente de seus esforços para manter o equilíbrio,
evitar objetos ou seguir as regras básicas de trânsito. Em contraste, recordar um evento ou conheci-
mento específico não tem nenhum componente comportamental e, às vezes, requer um esforço cons-
ciente para recuperar conhecimentos da memória de longo prazo.
Ainda não existe concordância sobre o número de sistemas da memória humana. Por exemplo,
alguns pesquisadores distinguem os sistemas de memória com base em como a informação é armaze-
nada na memória - a armazenagem ocorre com ou sem esforço deliberado? Outros pesquisadores
focam os tipos de informação armazenados, tais como palavras e significados versus determinados
movimentos musculares. Uma vez que o método de armazenamento freqüentemente difere de acordo
com o tipo de informação que vai ser armazenado, é importante saber se estamos nos referindo ao
processo ou conteúdo da memória. Compreender como diferentes sistemas de memória funcionam
ajudou imensamente no entendimento da memória, tal como por que ela falha de vez em quando.

A memória explícita envolve um esforço consciente

Adistinção mais básica entre os sistemas de memória é entre aqueles em que nós lembramos e
usamos informações conscientemente e aqueles em que a memória se manifesta sem esforço ou
intenção consciente. A memória explícita envolve os processos empregados para lembrar infor-
mações específicas. A informação recuperada na memória explícita é conhecida como memória
declarativa, que se refere à informação cognitiva que pode ser trazida à mente, isso é, o conheci-
memória explícita Os processos mento que pode ser declarado. Muitos cientistas psicológicos usam os termos intercambiavelmente,
envolvidos quando as pessoas mas a memória explícita se refere ao processo de memória, ao passo que a memória declarativa se
lembram informações específicas. refere ao conteúdo da memória.
memória declarativa A Você usa a memória explícita quando tenta lembrar o que comeu no jantar ontem à noite ou o
informação cognitiva recuperada que significa a palavra azodiisobutironitrila. As memórias declarativas podem envolver palavras ou
da memória expl ícita;
conhecimentos que podem ser
conceitos, imagens visuais ou ambos. Por exemplo, imagine o satélite da Terra. Você, provavelmente,
declarados. está recuperando tanto a imagem como o nome da lua. A maioria dos exemplos que usamos até
agora neste capítulo se refere a memórias explícitas.
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 225

Em 1972, Endel Tulving introduziu uma ourra distinção na memória explícita: memória epi-
memória episódica A memória
sódica e memória semântica. A memória episódica se refere às nossas experiências passadas. das nossas experiências passadas .
..\ memória semântica representa o nosso conhecimento de fatos triviais ou importantes inde-
memória semântica A memória
pendentes da experiência pessoal. Por exemplo, as pessoas conhecem as capitais de países que do conhecimento sobre o mundo.
nunca visitaram e mesmo aquelas que nunca jogaram beisebol sabem que crês strikes significam
memória implícita O processo
que você está fora.
pelo qual as pessoas manifestam
As evidências de que os sistemas de memória explícita episódica e semântica são separados uma intensificação de memória,
podem ser encontradas em casos de lesão cerebral em que a memória semântica está intacta, geralmente pelo comportamento,
mesmo que a memória episódica esteja prejudicada. Esse exemplo foi encontrado em um grupo de sem esforço deliberado e sem
qualquer consciência de estar
crianças britânicas que tiveram lesão cerebral durante o período de bebê ou início da infância e lembrando alguma coisa .
desenvolveram péssima memória para informações episódicas (Vargha-Khadem et ai., 1997). Elas
memória de procedimento Um
::inham dificuldade para contar o que haviam comido no almoço, sobre o que estavam falando ou t ipo de memória implícita que
assistindo na televisão há cinco minutos ou o que tinham feito nas férias de verão. Os pais relata- envolve habilidades motoras e
rnm que as crianças tinham de ser constantemente monitoradas para não esquecer de fazer as hábitos comportamenta is.
coisas, como ir à escola. Notavelmente, essas crianças freqüentavam escolas comuns e se saíam
razoavelmente bem. Além disso, seus Q!s estavam dentro do intervalo normal. Elas aprendiam a
ialar e a ler e eram capazes de lembrar uma grande quantidade de fatos. Por exemplo, à pergunta
-Quem é Martin Luther King?" uma das crianças respondeu: "Um americano; lutou pelos direitos
dos negros, líder dos direitos dos negros na década de 1970 [sic]; foi assassinado". Essas crianças,
então, são capazes de codificar e recuperar informações semânticas, mas não lembram como ou
quando aprenderam a informação.

A memória implícita ocorre sem esforço deliberado


A memória implícita é o processo pelo qual as pessoas mostram uma intensificação da
:nemória, em geral pelo comportamento, sem esforço deliberado e sem qualquer consciência de
estar lembrando alguma coisa. Amemória implícita está disseminada em todas as experiências coti-
dianas, como escovar os dentes, amarrar os sapatos e lembrar como ir à aula. Você lembra do capítu-
'.o anterior, em que descrevemos exemplos de condicionamento clássico? Eles são exemplos de me-
;nória implícita. Você sente medo quando entra no consultório do dentista parcialmente devido a
associações passadas (memória implícita) com dor.
A memória implícita não requer atenção. Por exemplo, você, provavelmente, já teve a expe-
riência de estar dirigindo e perceber, em certo momento, que estava devaneando e não tem ne-
:ihuma memória episódica dos últimos segundos ou minutos. Entretanto, durante esse tempo
rncê lembrou como dirigir e para onde estava indo. A memória implícita acontece automatica-
mente e sem esforço deliberado.
Um exemplo de memória implícita é a memória de procedimento, ou memória motora,
que envolve habilidades motoras, hábitos e outros comportamentos que você emprega para atin-
gir objetivos, como coordenar movimentos musculares para andar de bicicleta ou seguir as regras
de trânsito ao dirigir. Você lembra de parar quando vê uma luz vermelha porque aprendeu a fazer
isso e, ao dirigir para casa, você segue uma rota específica sem sequer pensar sobre isso. A nossa
memória de procedimento tem um aspecto automático, inconsciente. Por exemplo, da próxima
vez em que você estiver caminhando tente pensar sobre cada passo envolvido no processo: pri-
meiro você ergue o pé direito do chão e dobra um pouco o joelho, depois estende o pé para a
frente enquanto transfere o peso para a perna direita, etc. Amaioria das pessoas acha que pensar
conscientemente sobre comportamentos automáticos, como caminhar, interfere na produção fácil
e suave desses comportamentos.
A memória implícita influencia a nossa vida de maneira sutil. Muitas das nossas atitudes em
relação aos objetos que nos cercam são formadas por meio de aprendizagem implícita. Talvez você
goste de alguém porque essa pessoa lhe lembra outra muito querida, mesmo que não esteja ciente da
conexão. Os publicitários confiam na memória implícita para influenciar as nossas decisões de com-
pra. Aconstante exposição a nomes de marcas faz com seja mais provável pensarmos nelas quando
vamos comprar um produto.
A formação implícita de atitudes pode, inclusive, afetar nossas crenças sobre se uma pessoa é
ou não famosa. Richard Shiffrin é famoso? Pense por um instante se você o conhece. Talvez você
lembre que Richard Shiffrin foi um dos psicólogos que introduziram o modelo modal de memória (o
226 GAZZANIGA e HEATHERTON

que poderia torná-lo famoso nos círculos científicos), ou talvez lembre de ter lido o nome antes, mas
aprimoramento de repetição
priming A melhora na
não sabe onde e, portanto, supõe que ele é uma pessoa famosa. O psicólogo Lany Jacoby chamou
identificação ou processamento de isso de efeito da falsa fama (Jacoby et al., 1989). Jacoby faz os sujeitos de uma pesquisa lerem uma
um estímulo que fo i experien ci ado lista de nomes fictícios como um teste de pronúncia. No dia seguinte, os sujeitos participaram de um
previamente. estudo aparentemente não-relacionado, em que tinham de ler uma lista de nomes e decidir quais
codificação O processamento da pessoas eram famosas e quais não eram. Os sujeitos fizeram julgamentos equivocados sobre alguns
informação de modo a poder dos nomes fictícios do dia anterior, considerando-os famosos. Por que isso aconteceu? Os sujeitos
armazená-la.
sabiam que tinham ouvido o nome antes, mas não conseguiam lembrar onde. Portanto, a memória
implícita os levou a supor que o nome provavelmente era de uma pessoa famosa.
Amemória implícita também está envolvida no aprimoramento de repetição (priming),
a melhora na identificação ou processamento de um estímulo que foi experienciado previamente.
Em um típico experimento de aprimoramento, os sujeitos são expostos a uma lista de palavras e
solicitados a fazerem alguma coisa, como contar o número de letras nas palavras. Depois de um
breve intervalo, mostram-se a eles fragmentos de palavras, que devem completar com a primeira
palavra que lhes vier à mente. Você pode experimentar fazer isso. Conte as letras das seguintes
palavras: aparência, castanha, patente. Agora, complete os fragmentos ap __ , cas _ _ , par
_ _, com a primeira palavra que lhe vier à mente. É muito mais provável que o sujeito complete
os fragmentos com as palavras encontradas previamente, que ficaram impressas e, portanto, são
mais acessíveis. No nosso exemplo, é mais provável que você complete os fragmentos como aparên-
cia, castanha e patente do que como, digamos, aplicação, casaco ou paterno. Esse efeito ocorre mesmo
quando os sujeitos não lembram explicitamente as palavras da primeira tarefa; mesmo várias horas
depois de vê-las, os sujeitos manifestam memória implícita sem explícita lembrança das palavras.

Quais são os diferentes sistemas de memória?


Os pesquisadores da memória rejeitam a idéia de que a memória envolve um processo ou sistema cerebral único.
Eles agora concordam que existe uma distinção fundamental entre os sistemas de memória explícita e implícita. A
memória explícita envolve o armazenamento e a recuperação consciente de memórias declarativas, tais como
significados de palavras ou experiências pessoais. A memória implícita se refere à intensificação da memória sem
esforço ou consciência. Exemplos de memória impl ícita incluem a memória de procedimento (ou motora), a
formação de atitudes e o aprimoramento de repetição (priming) .

COMO A INFORMAÇÃO É REPRESENTADA NA


, L ?
Eventos suficientemente importantes para serem lembrados permanentemente precisam ser re-
presentados de uma maneira que permita recuperação posterior. Imagine se uma locadora de vídeos
simplesmente pusesse cada vídeo devolvido em uma prateleira qualquer, onde houvesse um espaço
vazio. Oque aconteceria se você quisesse encontrar um determinado filme? Você teria de examinar um
As memórias são armazenadas de por um até achar o filme certo. Exatamente como esse sistema não funciona para os filmes, também não
maneira organizada?
funciona para a memória. As memórias são armazenadas de maneira organizada. Nesta seção, nós
examinaremos os princípios temporais e organizacionais da memória de longo prazo.

A memória de lonqo prazo é uma seqüência temporal


Voltando à analogia do computador, a memória é um processo que envolve armazenar novas
informações de modo a estarem disponíveis quando forem necessárias mais tarde. Amemória pode
ser dividida temporalmente em três processos: codificação, armazenamento e recuperação. Na codi·
ficação, nossas experiências perceptivas são transformadas em representações, ou códigos, que são
armazenados. Por exemplo, quando o seu sistema visual sente um animal peludo, de quatro patas, e
seu sistema auditivo sente um latido, você percebe um cachorro. O conceito de "cachorro" é uma
representação mental de uma categoria de animais que compartilham algumas características, como
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 227

:atir e ser peludo. A representação mental de "cachorro" difere da de "gato", mesmo que os dois
armazenamento A retenção de
sejam semelhantes em algumas coisas. Você também tem representações mentais de coisas comple- representações codificadas ao
xas, como idéias, crenças e o sentimento de se apaixonar. longo do tempo, que corresponde a
Quer simples, quer complexa, a informação é armazenada em redes de neurônios no cérebro. O alguma mudança no sistema
armazenamento se refere à retenção de representações codificadas ao longo do tempo e corres- nervoso que registra o evento.
ponde a alguma mudança no sistema nervoso que registra o evento. As representações armazenadas recuperação O ato de recordar
são referidas como memórias. As memórias representam muitos tipos diferentes de informação, como ou lembrar informações
armazenadas, para poder utilizá-las.
:magens visuais, fatos, idéias, sabores e inclusive movimentos musculares, como a memória para
andar de bicicleta. Arecuperação é o ato de recordar ou lembrar a informação armazenada para repetição de manutenção Um
tipo de codificação que envolve
?Oder utilizá-la. O ato de recuperação geralmente envolve um esforço explicito para acessar os con- repetir continuamente um item .
:eúdos do armazenamento de memórias, tal como quando você tenta lembrar o capítulo anterior ou
repetição elaborativa A
o seu quinto aniversário. Mas muitas vezes você recupera informações implicitamente, sem nenhum codifica ção de informações de uma
esforço, como quando lembra imediatamente o nome de um conhecido que encontra na rua. Assim, maneira ma is significativa, tal como
a recuperação está envolvida em ambos os sistemas de memória, explícito e implícito. vinculá-la a conhecimentos da
memória de longo prazo.
esquemas Estruturas cognitivas
O armazenamento de lonqo orazo baseia-se no siqnificado hipotéticas, que nos ajudam a
perceber, organizar, processar e
utilizar as informações.
Os livros são armazenados por números da Biblioteca do Congresso, as locadoras de vídeo
costumam organizar os filmes por tipo, e as listas telefônicas são organizadas alfabeticamente. As
:nemórias são armazenadas por significado. No início da década de 1970, os psicólogos Fergus Craik
e Robert Lockhart criaram uma influente teoria da memória baseada na profundidade da elabora-
::ào. Segundo o seu modelo de níveis de processamento, quanto mais profundamente um item é codi-
:lcado, mais significado tem e melhor é lembrado. Craik e Lockhart propuseram que diferentes tipos
de repetição levam a diferentes codificações. Arepetição de manutenção envolve simplesmente
~epetir muitas vezes o item. Arepetição elaborativa envolve codificar a informação de maneiras
:nais significativas, como quando pensamos conceitualmente sobre o item ou decidimos se ele se
refere a nós. Em outras palavras, nós elaboramos a informação básica ligando-a a conhecimentos da
memória de longo prazo.
Como esse modelo funciona? Suponha que você mostre a participantes uma lista de palavras e
depois peça para fazerem uma de três coisas. Você poderia pedir que fizessem julgamentos percepti-
·:os simples, como: ''As palavras estão impressas em letras maiúsculas ou minúsculas?" Ou poderia
pedir que julgassem a acústica das palavras, como: ''A palavra rima com barco?" Ou você
poderia perguntar sobre o significado semântico das palavras, como: "Eles tinham de cruzar o _ _
para chegar ao castelo?". Depois de terem processado a informação, você poderia, mais tarde, pedir
que lembrassem o máximo possível de palavras (Figura 7.8). Você descobriria que as palavras pro-
cessadas no nível mais profundo, com base no significado semântico,
eram as mais lembradas. Estudos com imagens cerebrais mostraram
que a codificação semântica ativa mais regiões do cérebro do que a co-
~ 100
dificação superficial (Kapur et al., 1994). Essa maior atividade cerebral > 90 Semâ ntica
~
está associada à melhor memória.
"'~ 80
(lJ
u 70
(lJ
_;:: Acústica
e
Os esquemas proporcionam uma o
u
60
~
estrutura organizacional (lJ
50
& 40
As pessoas armazenam memórias pelo significado. Mas como o E
(lJ 30
significado é determinado? Anteriormente, nós mencionamos o agru- O'l

pamento como uma boa maneira de codificar grupos de itens para "'e
+-'
(lJ
20 Visual
~ 10
serem lembrados facilmente. Quanto mais significativos os agrupa- o
"- 0-'-~_._~~~~~~~~~~~~~~~

mentos, mais eles são lembrados. Decisões sobre como agrupar as in-
formações dependem de estruturas organizacionais prévias na memó- Tipo de codificação

ria de longo prazo. Os esquemas são estruturas cognitivas hipotéticas


que nos ajudam a perceber, organizar, processar e usar as informa- Os participantes foram solicitados a examinar uma lista
ções. Eles nos ajudam a dividir por classes a informação que chega e de palavras. Eles deviam examinar como as palavras estavam impressas,
orientam a nossa atenção para os aspectos relevantes do ambiente. As como elas soavam ou o que elas significavam. Quanto mais
pessoas utilizam suas memórias passadas e conhecimentos gerais so- profundamente o mate rial era processad o, mais era lembrado.
228 GAZZANIGA e HEATHERTON

bre o mundo para representar a informação que chega. Ao fazer isso, elas constroem novas memó-
rias. Elas preenchem lacunas, ignoram informações inconsistentes e interpretam o significado
com base em experiências passadas.
Esquemas existentes nos ajudam a compreender o mundo, mas podem levar a uma codifica-
ção tendenciosa. Em uma clássica demonstração realizada na década de 1930, Frederick Bartlett
pediu a participantes britânicos que escutassem uma lenda popular nativa americana. Após um
intervalo de 15 minutos, ele pediu aos sujeitos que repetissem a história exatamente como a
tinham ouvido. Bartlett descobriu que os participantes distorceram bastante a história, e fizeram
isso de maneira consistente - eles alteraram a história de modo que ela fizesse sentido do seu
próprio ponto de vista cultural.
Os esquemas influenciam as informações que armazenaremos na memória. Considere um estu-
do em que os alunos lêem uma história sobre uma garota selvagem, rebelde. Alguns dos participan-
tes foram inicialmente informados de que a garota era Helen Keller, enquanto outros foram informa-
dos de que seu nome era "Carol Harris'', um nome inventado (Sulin e Dooling, 1974). Uma semana
mais tarde, os participantes que tinham sido informados de que a garota era Helen Keller tendiam
mais a relatar, erroneamente, ter visto a frase "Ela era surda, muda e cega" do que aqueles que
pensavam que a história era sobre Carol Harris.O nosso esquema para Helen Keller inclui suas várias
incapacidades e, quando recuperamos informações sobre Helen Keller da memória, tudo o que sabe-
mos sobre ela é recuperado juntamente com a história específica que estamos tentando lembrar.
Leia cuidadosamente o seguinte parágrafo:

Oprocedimento é realmente muito simples. Em primeiro lugar, organize as coisas em pilhas diferen-
tes, de acordo com as características. Não faça demais de uma vez só. No curto prazo isso pode não
parecer importante, mas as complicações surgem facilmente.Um erro pode custar caro. A seguir
encontre instalações adequadas. Algumas pessoas talvez tenham de ir a algum outro lugar para isso.
Amanipulação dos mecanismos apropriados deveria ser auto-explicativa. Lembre-se de incluir todos
os outros suprimentos necessários. Inicialmente, a rotina pode ser esmagadora, mas logo se tomara
apenas mais uma faceta da vida. Finalmente, reorganize tudo em seus grupos iniciais. Devolva-os a
seus lugares habituais. Eventualmente eles serão novamente utilizados. Então todo o ciclo terá de ser
repetido. (Bransford e Johnson, 1972)

Você achou fácil de entender? Se tivesse de lembrar as frases desse parágrafo, seria capaz de
fazer isso? Talvez você se surpreenda ao saber que os pesquisadores apresentaram esse parágrafo a
universitários e que esses alunos o acharam de fácil compreensão e relativamente fácil de lembrar
Como isso é possível? É fácil se você souber que o parágrafo descreve lavar roupas! Volte e leia o
parágrafo novamente. Observe como o seu esquema para lavar roupas o/ a ajuda a compreender e
lembrar como as palavras e frases estão conectadas entre si .

.•..,.,~~"'·• ·.~· A informação é armazenada em redes de associação


Um conjunto muito influente de teorias da organização da memória baseia-se em redes de asso-
ciação. Remonta a Aristóteles a idéia de que o nosso conhecimento do mundo é organizado de mode
que as coisas que naturalmente andam juntas estejam vinculadas no armazenamento. Os modelos
de rede da memória enfatizam os vínculos entre itens semanticamente relacionados. Num modele
de rede proposto por Allan Collins e Elizabeth Loftus (Figura 7.9), os aspectos distintivos de um iten:
estão vinculados de maneira a identificá-lo. Cada unidade de informação na rede é conhecida como
um nodo. Quando você olha para um caminhão de bombeiros, por exemplo, todos os nodos que
representam as características de um caminhão de bombeiros são ativados, e o padrão resultante de
ativação dá origem ao conhecimento de que o objeto é um caminhão de bombeiros em vez de.
digamos, um gato. Um aspecto importante dos modelos de rede de associação é que ativar um nade
aumenta a probabilidade de que os nodos estreitamente associados também sejam ativados. !\a
Figura 7.9, quanto mais próximos os nodos, mais forte a associação entre eles e, portanto, maior a
probabilidade de que ativar um ative o outro. Ver um carro de bombeiros ativa nodos que indicam
outros veículos, de modo que quando os seus nodos de carro de bombeiros são ativados, você reco-
nhecerá muito mais rápido outros veículos do que, por exemplo, frutas ou animais. A idéia de que
ativar um nodo aumenta a probabilidade de nodos associados se tornarem ativos é um princípio
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 229

Veículo
Rua

j Ôn1bus

Ca rro

Ca min hã o

Caminhão de
Laranja ~ Bombeiros
Maçã

Amarelo
/~ Vermelho / \
~ /
Verde
Cereja
- Pê ra

Pôr-do-sol

Rosa ,,
IC

,::
e
:=::.
:.~

FIGURA 7. Uma rede semântica em que conceitos semelhantes são conectados por suas associações.

central dos modelos de memória de ativação por difusão. Segundo essa visão, estímulos na memória
de trabalho ativam nodos específicos na memória de longo prazo, o que facilita o acesso àquele.-
material, facilitando assim a recuperação.
Aorganização global de redes associativas baseia-se em categorias hierarquiÇ91Rente estrutura-
das, fornecendo uma planta clara e explícita de onde procurar infOímações_necéssárias. Dada a vasta
quantidade de material na memória, é realmente espantoso quão/rapídamente podemos buscar e
obter as memórias necessárias no armazenamento. Sempr~ ouvimos urna frase, não só temos de
lembrar o que todas as palavras significam; como t s também de recordar todas as informações
relevantes que nos ajudem a compreender o · cado. Para que isso ocorra, a informação precisa
ser organizada de um modo lógico. !r e tentar achar um arquivo específico em um disco rígido
de 40 gigabytes, cheio, abrindo um arquivo de cada vez. Tal método seria desanimadoramente lento.
Em vez disso, a maioria discos dos computadores está organizada em pastas, e dentro de cada
pasta estão pastas 1s especializadas, e assim por diante. Esse sistema de armazenamento hierár-
quico nos pemúte encontrar rapidamente os arquivos necessários.
Como em um computador, a estrutura hierárquica da memória facilita a recuperação eficiente.
Se nós ativarmos memórias da sua professora de biologia, por exemplo, perguntando o nome dela, e
depois perguntarmos se ela ou algum amigo casual usa óculos, você provavelmente conseguirá lem-
brar se ela usa óculos mais rapidamente do que se o seu amigo usa. Isso ocorre porque todas as
informações sobre a sua professora de biologia são ativadas ao mesmo tempo, permitindo que você
responda rapidamente. Para responder à pergunta sobre o seu amigo casual, você precisa primeiro
ativar a memória para esse amigo.
230 GAZZANIGA e HEATHERTON

As deixas de recuperação proporcionam o acesso ao


?r"1a7o amento P lonao razn
Qualquer coisa que ajude a pessoa a acessar informações da memória de longo prazo é conhe-
cida como uma deixa de recuperação. As deixas de recuperação ajudam a classificar a vasta quantida-
de de dados armazenados na MLP para identificar a informação certa. O poder das deixas de recupe-
ração explica por que é mais fácil reconhecer do que recordar informações. Por exemplo: Qual é a
Como as pessoas conseguem capital de Vermont? Você provavelmente teve de pensar um momento sobre isso, mesmo que tenha
recuperar informações
específicas?
recuperado a resposta correta. Agora considere a pergunta: A capital de Vermont é Concord, Mon-
tpelier ou Pierre? Amaioria das pessoas acha mais fácil, agora, lembrar que Montpelier é a capital de
Vermont. Enxergar a palavra nos ajuda a recuperar informações específicas que nos permitem res-
ponder à pergunta.

Especificidade de codificação Quase qualquer coisa serve como uma deixa de recupera-
princípio da especificidade de
codificação Um princípio que
l ção, incluindo o cheiro de um peru assado, uma música favorita de quando estudávamos no ensino
afirma que qualquer estímulo que é
médio, ou entrar num prédio conhecido. Encontrar esses tipos de estímulo geralmente desencadeia
codificado junto com uma memórias involuntárias. De acordo com o princípio da especificidade de codificação do
experiência pode, mais tarde, psicólogo Endel Tulving, qualquer estímulo que é codificado juntamente com uma experiência pode,
desencadear memórias da mais tarde, desencadear memórias da experiência. Em um interessante estudo com achados provo-
experiência.
cativas, Steven Smith e seus colegas fizeram alunos estudarem 80 palavras em uma de duas salas
diferentes. As salas diferiam de várias maneiras, incluindo tamanho, localização e cheiro. Os alunos
foram então testados quanto ao que lembravam, na sala em que haviam estudado ou na outra sala.
Quando o estudo e as sessões de teste foram realizados na mesma sala, os alunos lembraram corre-
tamente cerca de 49 palavras. Entretanto, quando testados na sala onde não tinham estudado, eles
lembraram corretamente apenas 35 palavras (Smith et ai., 1978). Essa intensificação da memória
quando a situação em que lembramos é semelhante à situação em que codificamos é conhecida
como memória dependente do contexto. Amemória dependente do contexto pode basear-se em coisas
como odores, música de fundo e localização física. A demonstração mais dramática foi a que mos-
trou que mergulhadores que aprenderam informações embaixo da água mais tarde se saíram melhor
no teste embaixo da água do que em terra (Godden e Baddeley, 1975; veja a Figura 7.10)
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 231

Como a informação é representada na memória de longo prazo?


A memória é composta por uma seqüência temporal de codificação, armazenamento e recuperação. A codificação
e o armazenamento são organizados de modo que a informação possa ser recuperada rapidamente. A memória
humana é armazenada de acordo com o significado e, quanto mais o sig nificado é elaborado no moment o do
armazenamento, melhor será a memória posterior. A codificação superficial não leva ao armazenamento de longo
prazo. Os esquemas ajudam as pessoas a perceber, organizar e processar informações, que são armazenadas no
caso de serem processadas profundamente. As redes hierárquicas de nodos associados fornecem vínculos
semânticos entre itens relacionados. A ativação de um nodo difunde-se pelo restante de sua rede. As deixas de
recuperação ajudam a acessar informações armazenadas. As deixas contextuais e os estados internos podem servir
como deixas de recuperação .

QUE PROCESSOS CEREBRAIS ESTÃO ENVOLVIDOS


.,
Na primeira parte deste capítulo, nós focalizamos as dimensões cognitivas da memória, incluindo
:.pos de memória e os tipos de informação codificados na memória. Agora precisamos fazer outra
:>ergunta fundamental: Que papel a biologia desempenha na formulação das nossas memórias?
·esta seção, nós examinamos estruturas cerebrais envolvidas na memória, assim como alguns dos
::rocessos neuroquímicos que a alteram. Em conseqüência da revolução biológica houve um tremen-
:o progresso, nas últimas duas décadas, no entendimento do que acontece no cérebro quando arma-
~enamos e recuperamos memórias. As abordagens cognitivas da neurociência focalizam as estrutu-
-as neurais que sustentam a codificação, o armazenamento e a recuperação da memória. Estudos de
;iacientes com lesões cerebrais forneceram os fundamentos básicos para o entendimento das bases
:reurais da memória, e as técnicas de imagem cerebral permitiram uma compreensão dos processos
je memória no cérebro sadio.

Um esforço intensivo tem sido feito para identificar a


lo ;a1°7;aç- n fícdc~ a memór";a
Localizar onde, no cérebro, as memórias são armazenadas foi um dos objetivos centrais dos
pesquisadores da memória durante o século XX. O professor da Universidade de Harvard Karl Lash-
ey passou grande parte de sua carreira tentando localizar a memória. Ele usou o termo engrama
para se referir à localização física do armazenamento da memória. Lashley primeiro treinou ratos
para percorrerem um labirinto. Depois, ele removeu diferentes áreas de seus córtices para testar
quanto da aprendizagem eles retinham. Lashley descobriu que o tamanho da área removida, e não
sua localização, era o mais importante para predizer a retenção. Assim, ele concluiu que a memória
está distribuída por todo o cérebro, e não em alguma localização específica, uma idéia conhecida
como equipotencialidade. Acontece que Lashley estava parcialmente certo, mas também bastante
equivocado.
Atualmente está bem estabelecido que as memórias não estão armazenadas em uma localização
específica do cérebro. Ao invés disso, as memórias estão armazenadas em múltiplas regiões do cérebro
e ligadas por circuitos de memória, conforme proposto pela idéia de Donald Hebb de que os neurônios
que descarregam juntos formam rede neural juntos (veja o Capítulo 6). Isso não significa que todas as
áreas do cérebro estão igualmente envolvidas na memória. Como você verá abaixo, há uma grande
especialização neural, com diferentes regiões do cérebro responsáveis por armazenar diferentes aspec-
tos de informação. Na verdade, diferentes sistemas de memória, como as memórias declarativa e de
procedimento, utilizam diferentes regiões cerebrais. Ofracasso de Lashley em encontrar regiões críticas
para a memória se deveu em parte a dois fatores. Primeiro, a tarefa de labirinto envolvia múltiplos
sistemas sensoriais (como a visão e o olfato), de modo que os ratos eram capazes de compensar a perda
de um sentido utilizando os outros. Em segundo lugar, Lashley não examinou áreas subcorticais, que
atualmente sabemos serem importantes para a retenção de memórias.
232 GAZZANIGA e HEATHERTON

Os lobos temporais mediais são importantes para a


consolidação Um processo
:xi·e co que se refere à e ·".tacão da o 'ria
a •erência de conteúdos da
Aúnica área do cérebro que foi repetidamente identificada como importante para a memória é
a seção medial dos lobos temporais, que está localizada bem atrás dos olhos. Lembre, do Capítulo 4,
que Wilder Penfield, do Montreal Neurological lnstitute, descobriu que estimular os lobos temporais
levava a relatos de memórias específicas em alguns pacientes com epilepsia. Olobo temporal medial
consiste em algumas estruturas relevantes para a memória, incluindo a amígdala, o hipocampo e o
córtex rinal, uma área localizada mais ou menos na frente do hipocampo (Figura 7.11). Conforme
descrevemos antes, a cirurgia cerebral de H.M. levou à incapacidade de formar novas memórias.
Utilizando imagens cerebrais, Sue Corkin, do MIT, e colaboradores descobriram que uma grande
porção do hipocampo de H.M. fora removida, assim como uma pequena seção do lobo temporal
adjacente (Corkin et ai., 1997). Atualmente está claro que lesões nessa região causam amnésia ante-
rógrada, que é a incapacidade de armazenar novas memórias explícitas. Entretanto, os lobos tempo-
rais mediais não são o repositório final da memória. Afinal de contas, H.M. conseguia lembrar coisas
de antes da cirurgia. Assim, a lesão nos lobos temporais mediais interrompe o armazenamento de
novos materiais sem prejudicar o acesso ao material antigo.
Atransferência de conteúdos da memória imediata para a memória de longo prazo ocorre por
um processo hipotético conhecido como consolidação. A consolidação resulta de mudanças na
força das conexões neurais que sustentam a memória. O pensamento atual sugere que os lobos
temporais mediais são responsáveis por coordenar o fortalecimento entre as ativações neuronais.
mas o armazenamento real provavelmente ocorre nos sistemas corticais específicos de processamen-
to envolvidos durante a percepção, o processamento e a análise do material que está sendo aprendi-
do. Por exemplo, informações visuais são armazenadas nas áreas corticais envolvidas na percepçãc
visual, ao passo que informações aurais são armazenadas nas áreas envolvidas na percepção audin-
va. Em um estudo, os pesquisadores expuseram os participantes a fotos de objetos comuns (p. ex.
cachorros) ou aos seus sons associados (latidos) e pediram a eles que se familiarizassem bastante
com os estímulos. Dois dias mais tarde, enquanto os participantes estavam em uma IRM, forar.:
novamente expostos às fotos ou sons e depois solicitados a recordar os estímulos tão vividameme
quanto possível. Assim, alguns participantes tentaram lembrar a aparência dos objetos, enquanrc
outros tentaram lembrar como eles soavam. As mesmas áreas ativadas quando os participantes han-
am sido expostos aos estímulos foram novamente ativadas quando eles lembraram vividameme
aqueles estímulos (Figura 7.12; Wheeler et ai., 2000). Assim, a memória para experiências senso-
riais envolve a reativação dos circuitos corticais envolvidos na percepção dessas experiências. O::
lobos temporais mediais formam vínculos ou indicadores entre os diferentes locais de armazena-
mento e dirigem o gradual fortalecimento das conexões entre esses vínculos.

Localização funcional nos lobos


temporais mediais Quais partes doc
lobos temporais mediais são mais relevame::
para a memória? Estudos de primatas co
lesões cirúrgicas nos lobos temporais mecL-
ais nos deram uma idéia bastante boa. _-.
década de 1970, Mortimer Mishkin, no Nac-
onal lnstitute of Mental Health, desenvolve_
o primeiro modelo bem-sucedido de memo-
ria animal. Nesses estudos, macacos são co-
locados em uma caixa com uma porta retra-
til. Na primeira fase do estudo, o macac::
aprende que uma recompensa de comida esr.:.
escondida embaixo de um objeto (Figur:

Córtex
rinal
D Am ígdala 7.13). Aporta então se fecha e depois se abri:
para revelar dois objetos: um que previamen:t
O Hipocampo
escondia a recompensa e um novo objeto ..-
regra é que a recompensa de comida está ser;;
pre embaixo do novo objeto. Isso fornece um.::.
FIGURA 7.1 As principais regiões do lobo temporal medial. boa medida não só da aprendizagem, pois
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 233

macaco tem de aprender a regra, mas também da me-


mória, uma vez que o macaco precisa lembrar qual
dos dois objetos foi apresentado previamente. Pesqui-
sas empregando essa tarefa identificaram o hipocam-
po e o córtex rinal adjacente como as áreas mais im-
portantes para a consolidação da memória. Lesões em
outras áreas da região temporal medial, como a amíg-
dala, não interferem nessa tarefa.

Memória espacial Por muitos anos, se acredi-


tou que o hipocampo era importante para a memó-
ria espacial, que é a memória para o ambiente físico
e inclui coisas como direção, localização de objetos e
mapas cognitivos. Um bom exemplo desse tipo de
aprendizagem é o teste de Morris do labirinto na água,
em que um rato é colocado em uma piscina circular
com água escura e aprende a nadar até uma platafor-
R Quatro imagens de cérebros, em corte horizontal, possibilitadas pelas
ma invisível situada logo abaixo da superfície (Figura imagens por ressonância magnética, mostram regiões do cérebro ativas durante a percepção
7.14). Os ratos podem aprender essa tarefa prontamen- de fotos (acima à esquerda) e sons (acima à direita), e subseqüentemente durante a
te e fazem isso utilizando deixas do ambiente para lem- recuperação das mesmas fotos (embaixo à esquerda) e sons (embaixo à direita) da memória
brar onde encontrar a plataforma. Os ratos com lesões de longo prazo. Esses dados indicam que as reg iões do córtex sensorial são reativadas
hipocampais ficam profundamente prejudicados nes- quando lembramos informações sensoriais específicas.

:r,::
(a) e
~
:.d'.

Deixa e
resposta

(b)

Intervalo

Recompensa de comida memória espacial Memória para


o ambiente físico, que inclui coisas
G (a) Apresenta-se ao macaco um item de amostra, o objeto vermelho e amarelo. (b) como localização de objetos,
Após um intervalo, apresenta-se ao macaco o mesmo objeto e um novo objeto. O macaco agora precisa direção e mapas cognitivos.
escolher o novo objeto, o que implica que ele se lembra do primeiro.
234 GAZZANIGA e HEATHERTON

Plataforma escond ida sa tarefa. O papel do hipocampo na memória


espacial é apoiado pelas células de lugar, que
são neurônios que só descarregam quando o
rato retorna a uma localização específica, tal
como uma determinada parte do labirinto.
Quando os ratos são colocados em ambientes
novos, nenhuma das células de lugar descarre-
ga. Mas, conforme ele se familiariza com o
ambiente, suas células de lugar hipocampais
Antes da aprend izagem Depois da aprend izagem
criam um vínculo com aspectos do seu entor-
no. Isso sugere que o hipocampo ajuda os ani-
FIGURA 7 4 Um rato é colocado no labirinto de Morris na água e precisa encontrar a mais a se orientarem e encontrarem seu cami-
plataforma oculta. Após muitas tentativas, o animal aprende onde a plataforma está escondida e nho. Na verdade, os pássaros que dependem
nada diretamente para ela . da memória para encontrar alimento armaze-
nado, como o chapim que esconde comida, têm
regiões hipocampais maiores do que os pássa-
ros que não armazenam alimentos. Os pacientes com lesões no hipocampo também têm dificuldade
para lembrar a localização de objetos em fotos (Piggott e Milner, 1993), o que sugere que o hipocampo
também é importante para a memória espacial nos humanos.

Os lobos frontais estão envolvidos em muitos aspectos da


rnam/\ria
Há muito tempo se sabe que os lobos frontais são importantes para muitos aspectos da memó-
ria, incluindo a memória episódica, a memória de trabalho, a memória espacial, as seqüências de
tempo (veja abaixo) e vários aspectos da codificação e da recuperação. Há redes neurais extensas
conectando o córtex pré-frontal com outras regiões cerebrais envolvidas na memória, como as áreas
temporais mediais. Assim, os lobos frontais trabalham junto com outras regiões cerebrais para coor-
denar a codificação, o armazenamento e a recuperação da memória.
Os pacientes com lesões nas regiões pré-frontais, tipicamente, não desenvolvem uma perda de
memória profunda, mas costumam ter grande dificuldade para lembrar a seqüência de tempo dos
acontecimentos, tal como qual de dois eventos aconteceu primeiro. Além disso, eles geralmente não
conseguem nos dizer onde ou quando aprenderam as informações. A incapacidade de lembrar as
circunstâncias em que a aprendizagem ocorreu foi relatada em indivíduos mais velhos, que freqüen-
temente experienciam sinais de déficits no lobo frontal, e também em crianças pequenas, que têm
lobos frontais imaturos.
Os estudos com imagens cerebrais forneceram evidências convincentes de que os lobos frontais
são cruciais para a codificação. Quando as pessoas se esforçam para memorizar uma lista de pala-
vras, esse esforço usualmente ilumina os lobos frontais em estudos com PET ou IRMf (Buckner et ai.,
1999). Além disso, nas tarefas de codificação mais profunda a ativação frontal é maior do que nas
tarefas de codificação superficial. Aevidência mais convincente do envolvimento do lobo frontal na
formação da memória é que a ativação dos lobos frontais prediz quais eventos serão mais tarde
lembrados ou esquecidos (Brewer et ai., 1998). Por exemplo, durante uma tarefa de memória, os
pesquisadores compararam a resposta frontal do IRMf (no momento da codificação) para palavras
que, posteriormente, foram lembradas ou foram esquecidas. Como podemos ver na Figura 7.15, as
palavras que foram lembradas mais tarde estavam associadas a uma maior ativação dos lobos fron-
tais (Wagner et ai., 1998).

Assimetrias hemisféricas na codificação e recuperação Existem algumas evidências


de que a codificação e a recuperação ocorrem em hemisférios diferentes. Tulving e colaboradores
analisaram alguns estudos que utilizaram imagens de PET para avaliar a codificação e a recuperação
de experiências episódicas. Quando eles examinaram os padrões de ativação cerebral, descobriram
que os lobos frontais esquerdos estavam mais ativos durante a recuperação episódica (Tulving et al.,
1994). Eles chamaram esse padrão de assimetria hemisférica de codificação e recuperação ou HERA
(hemispherical encoding retrieval asymmetry). Recentemente, William Kelley e colaboradores argu-
mentaram que o padrão de ativação do hemisfério esquerdo poderia ser devido aos tipos de informa-
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 235

-o empregados nas tarefas. Eles argumentaram que qualquer estímulo


c:r:: 4
..:e envolva informação verbal ativa o hemisfério esquerdo, ao passo ~
'>--
..,.:e os objetos que não invocam ativação verbal (como rostos desconhe- o
-o 3
~dos) ativam o hemisfério direito. Interessantemente, objetos nomeá- <il
e 2
eis que contêm tanto informações visuais como verbais (como a figura ·v;
o
:e um sapo, veja a Figura 7.16) ativam as áreas frontais esquerda e -o
<lJ
:2Ieita durante a codificação (Kelley et ai., 1998). Portanto, a assime- -o
.a o
·e:
cia na memória refere-se mais ao tipo de material estudado do que aos CJ)

-:ocessos de memória em si. ~"' 2 4 6 8 10 12 14


Tempo (segundos)
_obos frontais e memória de trabalho Então, o que os lo-
::is frontais fazem na memória? Uma hipótese é que eles desempenham
~ papel na memória de trabalho. A memória de trabalho mantém in- FIGU A 15 Este gráfico mostra a ativação cerebral na área pré-
: rmações "na linha", de modo que elas podem ser usadas para resolver frontal esquerda durante uma tarefa de memória. Palavras que são mais
tarde lembradas envolvem uma resposta maior do que as palavras que são
::oblemas, compreender conversas e seguir planos. Os pacientes com
esquecidas.
_-:sões nas áreas frontais freqüentemente têm dificuldade para seguir
;;anos e metas, e os macacos com lesões frontais provocadas apresen-
:am memória de trabalho prejudicada (Goldman-Rakic et ai., 2000). Em uma tarefa, o macaco ob-
serve o experimentador esconder uma recompensa embaixo de um de dois objetos. Após um interva-
_:: permite-se que o macaco tente pegar o objeto que cobre a recompensa. Os macacos com lesões
.:-ontais têm dificuldade nessa tarefa. Interessantemente, os bebês humanos têm dificuldade em
:arefas semelhantes, o que também envolve os lobos frontais na memória de trabalho, pois eles só
3.illadurecem inteiramente bem mais tarde no desenvolvimento (Diamond e Doar, 1989).
As regiões frontais tornam-se ativas quando a informação está sendo ou recuperada da memó-
:ia de longo prazo ou codificada da memória de trabalho para a memória de longo prazo. Por exem-
;lo, quando você entra na sala de aula, os lobos frontais observam a recuperação de conhecimentos
1I1Tlazenados das redes neurais se espalhar por localizações corticais e subcorticais. Essa informação
:;.;uda você a lembrar o que fazer quando entra na sala (sentar), quem é a pessoa que está na frente
:ia sala (o professor) e o significado dos sons que saem da boca do professor. Os lobos frontais e os
:obos temporais mediais, então, trabalham juntos para consolidar o armazenamento da memória de
ongo prazo para a aula. O hipocampo ajuda a fortalecer as associações entre os eventos na memória
:'.e trabalho, para que as novas experiências sejam processadas em um armazenamento permanente.

IGURA 7 16 Regiões frontais ativas durante a formação da memória podem depender do material
que está sendo memorizado. A memorização de material verbal (palavras) ativa o córtex frontal esquerdo,
ao passo que a memorização de material não-verbal, pictórico (rostos desconhecidos) ativa o córtex frontal
direito. lnteressantemente, a memorização de objetos (associados tanto à imagem quanto ao nome) ativa
tanto o córtex frontal direito quanto o esquerdo.
236 GAZZANIGA e HEATHERTON

A neuroquímica influencia a memória


Sabe-se que a memória envolve alterações em conexões através das sinapses. Conforme as
memórias são consolidadas, redes distribuídas de neurônios tornam-se ligadas. As pesquisas mos-
tram que diferentes neurotransmissores podem enfraquecer ou intensificar a memória. Coletiva-
mente, esses neurotransmissores são conhecidos como moduladores da memória, porque modulam,
ou modificam, o armazenamento da memória.

A neuroquímica indica a significação dos estímulos Anteriormente, nós salientamos


que os animais só armazenam informações significativas. Amodulação da memória é o sistema que
a evolução concedeu aos organismos para ajudar a determinar se alguma coisa é importante. Even-
tos importantes levam a mudanças neuroquímicas que produzem experiências emocionais. Um ani-
mal que consegue fugir de um predador experiencia uma reação de medo que ajuda a estampar a
evitação daquele predador. Uma criança que come um alimento gostoso experiencia uma sensação
recompensadora que é facilmente lembrada, como podem prontamente atestar os pais que viram
seus filhos pré-verbais apontarem para os potes de doces. Os eventos que produzem reações emocio-
nais são os têm maior probabilidade de serem armazenados na memória.
Quais são, então, os sinais neuroquímicos que indicam que uma experiência é significativa?
Quando os animais estão realizando tarefas minimamente excitantes, pouca memória é manifestada
depois para essas tarefas. Entretanto, os animais injetados com adrenalina, que induz um estado de
excitação, mostram uma significativa intensificação de memória para eventos triviais. É como se a
sacudidela da adrenalina transmitisse a mensagem "Lembre-se de mim!". Evidentemente, a adrena-
lina está na periferia do corpo, não no cérebro, e, assim, não tem um efeito direto sobre a memória.
Parece que a adrenalina leva a uma liberação de glicose, que então entra no cérebro e influencia o
armazenamento de memórias. O papel da glicose também é sugerido por um estudo em que pessoas
mais velhas fizeram um teste de memória depois de consumir limonada com glicose (açúcar) ou
sacarina (um substituto do açúcar). Os que receberam glicose tiveram, no dia seguinte, melhor
memória para os itens estudados (Gold, 1987). Outras drogas, como as que deprimem a atividade
neuronal, podem interferir na memória. Opiáceos, álcool e anestésicos cirúrgicos podem interferir
na memória ao reduzir a excitação.

A am ígdala e a neuroquímica da emoção Aamígdala é a primeira candidata à estrutu-


ra cerebral que controla os efeitos moduladores dos neurotransmissores sobre a memória. Ela é a
estrutura límbica estreitamente ligada às reações de medo e está localizada no lobo temporal medi-
al. Aestimulação direta da amígdala pode intensificar ou prejudicar a memória, e danificar os cami-
nhos que levam a ela ou dela saem elimina os efeitos das drogas sobre a memória. Nos humanos,
estudos com PET mostram que a amígdala é ativada quando lembramos de clipes de filmes emocio-
nantes, mas não quando lembramos de filmes neutros (Cahill et ai., 1996). Interessantemente, pare-
ce haver uma diferença de gênero nesse efeito: a memória emocional ativa a amígdala direita (mas
não a esquerda) nos homens e a amígdala esquerda (mas não a direita) nas mulheres (Cahill et ai.,
2001). Ainda não sabemos qual é a base dessa diferença de sexo.
A atividade da amígdala orienta outras estruturas cerebrais com relação a quais eventos do
ambiente merecem ser consolidados na memória. Infelizmente, como mostramos em ')\travessando
os níveis de análise: Aforça das lembranças traumáticas e persistentes", essas memórias podem ficar
tão fortemente consolidadas que as pessoas não conseguem esquecê-las mesmo que queiram.

Que processos cerebrais estão envolvidos na memória?


As pesquisas dos últimos trinta anos demonstraram que as memórias são codificadas em redes distribuídas de
neurônios em regiões cerebrais relativamente específicas. Lashley não conseguiu descobrir o engrama,
provavelmente porque estava olhando no lugar errado e não utilizando tarefas suficientemente específicas.
Atualmente sabemos que lesões nos lobos temporais mediais, especialmente o hipocampo ou córtex rinal, causam
significativas perturbações de memória. Essas regiões temporais mediais são importantes para a consolidação de
memórias de longo prazo no armazenamento. Os loca is do armazenamento da memória são as estruturas cerebrais
envolvidas na percepção. Os lobos fronta is são especialmente importantes para a memória de trabalho, e diversos
neurotransmissores modulam o armazenamento da memória . O medo causa a ativação da amígdala, o que está
associado ao fortalecimento das memórias.
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 237

UANDO É OUE AS PESSOA UE CEM? esquecimento A incapacidade de


recuperar memórias do
Até agora nós nos concentramos em como as informações são lembradas. Mas, ao longo do armazenamento de lo ngo prazo.
caminho, percebemos que os fracassos de memória são extremamente comuns. O esquecimento é
a incapacidade de recuperar memórias do armazenamento de longo prazo. O esquecimento é uma
=.xperiência cotidiana perfeitamente normal. Dez minutos depois de ver um filme talvez você lembre
:rrnitos detalhes, mas no dia seguinte provavelmente vai se lembrar mais da trama e dos personagens
;irincipais. Anos mais tarde, talvez você lembre o ponto essencial da história ou nem se lembre de ter
•.isto o filme. Nós esquecemos muito mais do que lembramos.
Amaioria das pessoas lamenta o esquecimento, desejando lembrar melhor as informações estu-
dadas para as provas, os nomes de amigos da infância ou mesmo os nomes de todos os sete anões.
~.fas imagine como seria a vida se não pudéssemos esquecer. Você iria até o seu armário com cadeado
e se lembraria de 10 ou 20 combinações diferentes. Veja o caso do jornalista russo que tinha uma
JJemória quase perfeita. Liam para ele uma longa lista de itens e, se pudesse passar alguns momen-
:os visualizando os itens, ele era capaz de recitá-los todos, mesmo muitos anos mais tarde. Mas ele
era torturado por sua condição e acabou internado em uma instituição. Sua memória estava tão
arulhada de informações que ele tinha grande dificuldade para funcionar na sociedade normal.
?-aradoxalmente, não ser capaz de esquecer é tão desadaptativo como não ser capaz de lembrar.
?ortanto, não surpreende que a memória tenda a ser melhor para pontos significativos e importan-
:es. Nós lembramos a floresta e não cada árvore. O esquecimento normal ajuda a lembrar e utilizar
as informações que são importantes.
O estudo do esquecimento tem uma longa história na ciência psicológica. Hermann Ebbin-
_shaus, um psicólogo alemão do século XIX, apresentou evidências convincentes de que o esqueci-
Jlento ocorre rapidamente nas primeiras horas e dias, mas depois se estabiliza. Ele usou os cha-
Jlados métodos de poupança para examinar quanto tempo as pessoas levavam para reaprender
:istas de sílabas sem sentido. Presumivelmente, quanto mais lentamente as pessoas reaprendiam
a lista, maiores as evidências de esquecimento. Nós aprendemos muito sobre o esquecimento
durante o século passado. O psicólogo de Harvard Daniel Schacter identifica o que ele chama de
:is sete pecados da memória (Schacter, 1999). Esses pecados são muito familiares para a maioria
das pessoas (Tabela 7.1). Eles também são características úteis ou mesmo necessárias para a
sobrevivência. Schacter argumenta que os sete pecados da memória são subprodutos de aspectos
de outra maneira desejáveis da memória humana. Os primeiros três pecados estão relacionados
ao esquecimento: transitoriedade, bloqueio e desatenção (nós consideraremos alguns dos outros
;iecados mais adiante neste capítulo) .

TABELA 7.1 Os sete pecados da memória

Transitoriedade Esquecimento Memória reduzida com o passar do tempo, tal como esquecer o enredo de um filme.
Desatenção Esquecimento Memória reduzida por não se prestar atenção, tal como perder as chaves ou esquecer de um almoço
marcado.
Bloqueio Esquecimento Incapacidade de lembrar informações necessárias, tal como não conseguir recordar o nome de uma pessoa
que encontramos na rua.
Má atribuição Distorção Atribuir uma memória à fonte errada, tal como pensar, falsamente, que Richard Shiffrin é famoso.

Sugestionabilidade Distorção Alterar uma memória devido a informações enganadoras, tal como desenvolver uma falsa memória de
eventos que não aconteceram.
Vi és Distorção Influência de conhecimentos correntes sobre a nossa memória de eventos passados, tal como lembrar
nossas atitudes passadas como semelhantes às nossas atitudes atuais, mesmo que elas tenham mudado.
Persistência Indesejado O ressurgimento de memórias indesejadas ou perturbadoras que gostaríamos de esquecer, tal como
lembrar uma gafe embaraçosa.

=onte: Baseada em Schacter (2001 ).


A FORÇA DAS LEMBRANÇAS TRAUMÁTICAS E PERSISTENTES
Quando as pessoas experienciam grave estresse ou trauma, como
ter um acidente sério, ser estuprada, combater na guerra ou
sobreviver a um desastre natural, elas geralmente continuam a ter
reações negativas mu ito depois de a ameaça ter passado. Nos
casos graves, as pessoas desenvolvem o transtorno de estresse pós-
traumático (TEPT), um transtorno mental sério que envolve
pensamentos indesejados freqüentes e recorrentes relacionados ao
trauma, incluindo pesadelos, pensamentos intrusivos e flashbacks.
As pessoas com TEPT apresentam tensão e ansiedade crônicas,
problemas de saúde, e podem experienciar problemas de memória
e atenção na vida cotidiana . O TEPT afeta aproximadamente um
em 10 indivíduos em algum momento da vida, embora
obviamente as fontes de trauma difiram imensamente.
O TEPT envolve um problema incomum de memória, no
sentido de que é a incapacidade de esquecer o que causa os
problemas. O TEPT está associado a um viés de atenção - as
pessoas com o TEPT são hipervigilantes para estímulos associados
ao seu evento traumático. Por exemplo, os soldados com TEPT
induzido pelo combate apresentam responsividade fisiológica
aumentada a fotos de tropas, sons de tirote io e, inclusive, palavras
associadas a combate. Richard McNally, um especialista em
ansiedade da Universidade de Harvard, observa que os soldados
podem involuntariamente manter seu viés de memória ao usar Esses achados foram obtidos utilizando-se imagens de
roupas e coisas que servem como constantes deixas e lembretes PET de oito pacientes com TEPT. Nessa tarefa, os pacientes pensavam sobre
das memórias indesejadas. O que faz com a memória seja tão
o evento traumático ou sobre um evento neutro. As áreas coloridas foram
profundamente codificada? Existem evidências de que os eventos
mais ativadas para os pensamentos traumáticos do que para os
altamente emocionantes são mais bem lembrados, possivelmente
devido à ação de neurotransmissores e hormônios liberados pensamentos neutros.
durante o estresse. Assim, a memória pode ficar
"superconsolidada " , como se gravada a fogo.
Como poderia ser esperado, a exposi ção a estímulos associados dos fatores cognitivos envolvidos no tentar não pensar sobre as
a traumas passados leva à ativação de regiões cerebrais, como a coisas que nos incomodam. O psicólogo social Dan Wegner e
amígdala, envolvidas na emoção (Figura 7.17; Rauch et ai., 1996). colaboradores desenvolveram um experimento em que os
Alguns teóricos acreditam na existência de uma forte resposta participantes tentam não pensar sobre ursos brancos por um
classicamente condicionada, que faz com que as pessoas aprendam período de cinco minutos (Wegner, 1989). Poucas pessoas
a temer estímulos associados ao evento traumático em apenas conseguem evitar completamente pensar em ursos brancos, e os
uma repetição . Joseph LeDoux (1996), da Universidade de Nova participantes tentam todas as distrações possíveis para tirar da
York, uma das maiores autoridades mundiais em bases neurais da mente o pensamento indesejado. Em um período de seguimento, os
aprendizagem do medo, argumenta que a memória emocional sujeitos foram solicitados a tentar pensar sobre ursos brancos. Esses
pode ser permanente. Assim, os neurocientistas cognitivos vêem o indivíduos agora apresentam um efeito cognitivo de rebote,
TEPT como um exagero da maneira pela qual as memórias pensando muito mais sobre ursos brancos do que os indivíduos que
emocionais normalmente são formadas. Aprender a temer não foram inicialmente solicitados a suprimir seus pensamentos. Em
rapidamente objetos e situações perigosas obviamente tem valor geral, qualquer tentativa de suprimir um pensamento leva a uma
de sobrevivência, embora talvez à custa de memórias indesejadas maior preocupação com ele. Em termos do TEPT, o grupo de
permanentes. Wegner descobriu que os pensamentos particularmente
Um dos mais sérios problemas para as pessoas com TEPT são os mobilizadores ou pessoalmente significativos são mais difíceis de
pensamentos indesejados constantes e recorrentes. O trabalho suprimir do que os pensamentos neutros, sendo que as pessoas
sobre a supressão dos pensamentos tem ajudado na compreensão ficam hipervigilantes para detectar os pensamentos indesejados.

A transitoriedade é causada pela interferência


Atransitoriedade da memória se refere ao padrão de esquecimento com o passar do tempo,
o que Ebbinghaus confirmou em seus estudos com silabas sem sentido. O que causa a transitorieda-
de? Muitos teóricos mais antigos argumentavam que o esquecimento era o resultado da deterioração
do traço de memória no nosso sistema nervoso. Na verdade, existem algumas evidências de que o
esquecimento ocorre para memórias que não são usadas. Entretanto, as pesquisas das últimas déca-
As pessoas realmente esquecem
coisas e, se for assim, por que isso
das estabeleceram que a maior parte do esquecimento ocorre devido à interferência de outras infor-
acontece? mações. As informações adicionais podem levar ao esquecimento de duas maneiras. Na interferên-
cia proativa, informações anteriores inibem a nossa capacidade de lembrar novas informações.
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 239

fur exemplo, se você tem uma nova combinação no seu cadeado do armário a cada ano, talvez tenha r- transitoriedade O padrão de
dificuldade em se lembrar dela por ficar se lembrando da antiga. Na verdade, o contexto físico
esquecimento com o passar do
fornece deixas de recuperação para essa combinação mais antiga e, desse modo, fica mais difícil tempo.
embrar a nova enquanto você está em pé diante do seu armário. Na interferência retroativa,
interferência proativa Quando
novas informações inibem a nossa capacidade de lembrar antigas informações. Agora que você final- informações anteriores inibem a
mente sabe a nova combinação do seu cadeado, talvez descubra que esqueceu a antiga. A Figura capacidade de lembrar novas
~.18 mostra os testes experimentais típicos utilizados para demonstrar as interferências proativa e informações.
retroativa. Em ambos os casos, nós esquecemos porque informações concorrentes deslocam a infor- interferência
mação que estamos tentando recuperar. retroativa Quando novas
informações inibem a capacidade
de lembrar antigas informações.
bloqueio A incapacidade
O bloqueio é temporário temporária de lembrar alguma
coisa que sabemos.
Obloqueio ocorre quando a pessoa apresenta uma incapacidade temporária de lembrar algu- fenômeno na ponta da
ma coisa que ela sabe. Bloqueios temporários são comuns e frustrantes: esquecer o nome de um CD língua Um fenômeno que ocorre
favorito, esquecer as falas durante uma peça de teatro, ou esquecer o nome da pessoa que estamos quando as pessoas experienciam
apresentando a alguém. Outro bom exemplo de bloqueio é o fenômeno na ponta da língua, grande frustração ao tentar
lembrar palavras específicas que
descrito por Roger Brown e David MacNeill, em que as pessoas experienciam grande frustração ao estão um tanto obscuras.
:entar lembrar palavras específicas que estão um tanto obscuras. O pesquisador Alan Brown (nenhu-
desatenção A codificação
ma relação com Roger) mostrou que o fenômeno na ponta da língua pode ser confiavelmente produ- desatenta ou superficial de eventos.
zido em laboratório (Brown, 1991). Por exemplo, ao serem solicitadas a fornecer uma palavra que
signifique "patrocínio concedido a um parente, em negócios ou na política", as pessoas geralmente
se atrapalham. E no caso de "um instrumento astronômico para encontrar a posição"? 'As vezes, as
pessoas sabem com qual letra a palavra começa, quantas sílabas ela tem e inclusive como ela soa,
mas não conseguem empurrar a palavra para a memória funcional. Você sabia que as palavras são
nepotismo e sextante? O bloqueio freqüentemente ocorre pela interferência de palavras semelhantes
em som ou significado. Essas palavras semelhantes ficam recorrendo enquanto tentamos lembrar a
palavra-alvo.

A desatenção resulta de uma codificação superficial


A desatenção descreve a codificação desatenta ou superficial de eventos - por exemplo,
esquecer onde você deixou as chaves, o nome da pessoa que encontrou há cinco minutos ou se você
romou as vitaminas esta manhã. Amaior
causa da desatenção é não prestar aten-
ção suficiente a detalhes. Considere o fas-
cinante fenômeno da "cegueira para a
mudança". Imagine que você está para-
do/a na rua e chega alguém e lhe pede
1nterferência proa tiva:
uma orientação. Enquanto você está res- Estudar Fazer
Estudar o desempenho na prova
pondendo, dois operários, carregando psicologia antropologia prova de de antropologia
uma porta, passam entre vocês, de modo antropologia prejudicado pelo estudo
que você momentaneamente perde de da psicologia.
vista a pessoa que está pedindo a orien-
tação. Você acha que notaria se a pessoa
que está diante de você tivesse sido tro-
cada? Quando Daniel Simons e Daniel
Levin realizaram esse estudo, só a meta- Interferência retroativa:
de dos participantes notou a mudança (Si- Estudar Estudar Fazer o desempenho na prova
psicologia antropologia prova de
mons e Levin, 1998). Simons e Levin cha- psicologia
de psicologia
mam de cegueira para a mudança a prejudicado pelo estudo
da antropologia.
incapacidade de detectar mudanças em
um objeto ou cena. lnteressantemente, no
estudo original, era menos provável que FG R 7 1 A interferência proat1va ocorre quando um material já conhecido interfere na
as pessoas mais velhas notassem as mu- capacidade de lembrar novas informações, enquanto a interferência retroativa ocorre quando novos
danças na pessoa que estava pedindo ori- materiais interferem na memória para antigos materiais.
240 GAZZANIGA e HEATHERTON

entação; os universitários eram muito bons em notar a mudança. Isso acontece porque as pessoas
amnes1a Déficits na memória de
longo prazo, resultantes de
mais velhas são especialmente desatentas? Ou é porque as pessoas processam os aspectos essenciais
doenças, lesão cerebral ou trauma da situação e não os detalhes? Talvez os adultos mais velhos codifiquem a pessoa simplesmente
psicológ ico. como "um estudante universitário" e não procurem detalhes mais precisos. Para testar essa idéia,
amnésia retrógrada A condição Simons e Levin realizaram um estudo adicional em que um operário da construção civil pedia orien-
em que as pessoas perdem tação a estudantes universitários. Realmente, os estudantes universitários não perceberam a substi-
memórias passadas, tal como tuição do operário, provando essa última hipótese.
memórias de eventos, fatos, pessoas
ou mesmo informações pessoa is.
amnésia anterógrada A
incapacidade de formar novas A amnésia é um déficit na memória de lonao orazo
memórias.
Às vezes, nós perdemos a capacidade de recuperar vastas quantidades de informação da memó-
ria de longo prazo. A amnésia se refere a déficits na memória de longo prazo, resultantes de
doenças, lesão cerebral ou trauma psicológico. Existem, essencialmente, dois tipos de amnésia: re-
trógrada e anterógrada. Na amnésia retrógrada, as pessoas perdem memórias passadas de even-
tos, fatos, pessoas ou mesmo informações pessoais. A maioria das descrições de amnésia na mídia
são de amnésia retrógrada - a estrela da novela acordando de um coma sem saber quem é. Em
contraste, na amnésia anterógrada, as pessoas perdem a capacidade de formar novas memórias.
H.M. era um caso clássico de amnésia anterógrada. Ele conseguia lembrar antigas informações sobre
seu passado, mas desde a cirurgia perdeu a capacidade de formar novas memórias. Muitos casos de
amnésia, como o de H.M., resultam de lesões nos lobos temporais mediais. Mas lesões em outras
áreas subcorticais, como ao redor do tálamo, também podem levar à amnésia. Uma causa comum
desse tipo de amnésia é a síndrome de Korsakoff, uma forma grave de perturbação da memória asso-
ciada ao alcoolismo crónico. O abuso de álcool prolongado pode levar ao déficit de vitaminas que
resulta em dano talâmico e, subseqüentemente, amnésia.
A amnésia é uma condição fascinante que pode variar muito de caso para caso. Por exemplo.
depois de levar uma pancada na cabeça ou perder o fluxo de sangue para o cérebro, algumas pessoas
experienciam uma perda temporária de memória que passa depois de um ou dois dias. Uma forte
pancada na cabeça pode causar uma concussão, que envolve uma perda de consciência capaz de
durar momentos ou semanas. Trevor Rees-Jones, o guarda-costas particular da princesa Diana, so-
freu uma concussão durante o acidente de carro que lhe tirou a vida. Mais tarde, ele conseguiu se
lembrar de entrar no carro, mas não lembrou nada da perseguição que levou ao acidente. Isso é
típico da amnésia que se segue à concussão. Geralmente existe um período de amnésia retrógrada
para eventos que levaram ao incidente e, às vezes, amnésia anterógrada temporária. As pessoas que
visitam esses pacientes no hospital freqüentemente se surpreendem, pois a pessoa parecia lúcida
durante a conversa, mas depois não consegue se lembrar da visita. Isso ocorre porque a memória
funcional não foi perturbada, mas as memórias não são consolidadas na memória de longo prazo.

Quando é que as pessoas esquecem?


O esquecimento é a incapacidade de recuperar memórias do armazenamento de longo prazo. A capacidade de

V esquecer informações é tão importante como a capacidade de lembrá-las. O esquecimento que ocorre com o passar
do tempo geralmente se deve à interferência de estímulos concorrentes. O bloqueio é a incapacidade temporária
de recuperar informações específicas, conforme exemplificado pelo fenómeno na ponta de língua . Ele também é
causado por interferência . A desatenção é resultado da codificação superficial, que ocorre quando as pessoas não
prestam atenção suficiente a detalhes. A amnésia se refere a um déficit na memória de longo prazo, em que as
pessoas esquecem informações passadas (amnésia retrógrada) ou são incapazes de armazenar novas informações
(amnésia anterógrada). A maioria das amnésias é causada por lesões no cérebro.

O AS LEMBRANCAS SÃO DISTORCIDAS?


Grande parte das pessoas acredita que a memória humana é um armazenamento permanente,
do qual até detalhes minúsculos e aparentemente esquecidos podem ser recuperados por meio de
hipnose, drogas da verdade ou outras técnicas especiais. Contudo, as pesquisas mostram claramente
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 241

que a memória humana é tendenciosa, imperfeita e distorcida. Ilusões de memória são comuns e
muitas foram descritas anteriormente neste capítulo. Mas nem todas as distorções de memória são
assim benignas. Nesta seção, você verá como os sistemas de memória humana proporcionam uma
descrição muito pouco exata dos eventos passados. Só que você não deve pensar que simplesmente
porque uma coisa não funciona como acreditamos que funciona ela é defeituosa. Conforme Dan O que faz com que as pessoas
tenham memórias distorcidas,
Schacter argumentou, muitos dos aspectos aparentemente defeituosos da memória podem ser sub- falsas ou inexatas?
produtos de mecanismos benéficos. Vamos examinar alguns dos exemplos mais surpreendentes da
aparente falibilidade da memória humana.

As lembranças de "lâmpada de flash" podem estar erradas


Você lembra onde estava quando ficou sabendo dos ataques terroristas ao World Trade Center
e ao Pentágono? Alguns eventos fazem com que as pessoas experienciem o que Roger Brown e James
Kulik chamaram de memórias de "lâmpada de flash", que são vívidas memórias das circuns-
tâncias em que ficamos sabendo de um evento surpreendente, com conseqüências e emocionalmen-
te mobilizador (Figura 7.19). Quando Brown e Kulik entrevistaram pessoas sobre suas lembranças
da morte do presidente John Kennedy em 1963, descobriram que as pessoas descreviam suas lem-
branças em termos extremamente vívidos, com muitos detalhes, tais como quem estava com elas, o
que elas estavam fazendo ou pensando, quem lhes contou ou como elas descobriram e qual foi sua
reação emocional ao evento.

Você lembra onde estava quando ficou sabendo .. _? Evidentemente, a questão é se


as memórias de "lâmpada de flash" são acuradas. Existe um problema óbvio na realização de pesqui- memórias de "lâmpada de
I~
sas sobre as memórias de "lâmpada de flash" - você precisa esperar que o ''flash" acenda e depois flash " Memórias vívidas das t.
imediatamente realizar seu estudo. A explosão na nave espacial Challenger em 28 de janeiro de circunstâncias em que ficamos
sabendo de um evento
1986, às llh38 EST (eastern standard time) forneceu uma oportunidade única para pesquisas sobre surpreendente, com conseqüências,
esse tópico. Ulric Neisser e Nicole Harsch (1993) fizeram 44 alunos de psicologia responder a um e emocionalmente mobilizador.
questionário no dia da explosão da nave e depois testaram sua memória três anos mais tarde. Eles
descobriram que a vasta maioria dos alunos lembrava erroneamente
múltiplos aspectos da situação e que apenas três alunos tinham uma
lembrança perfeita. Entretanto, outros pesquisadores documentaram
melhor memória para as experiências de "lâmpada de flash'', como
onde estavam sujeitos britânicos quando ficaram sabendo da renúncia
da primeira-ministra Margaret Tatcher. Martin Conway e seus colegas
1994) mostraram que a melhor memória para a experiência de lâm-
pada de flash ocorria nas pessoas que tinham achado a notícia surpre-
endente e sentiam que o evento era importante. Assim, os alunos do
Reino Unido tinham memórias de "lâmpada de flash" mais fortes para
a renúncia de Tatcher do que os alunos dos Estados Unidos.

Estresse e memória revisitada Embora as memórias de


·lâmpada de flash" não sejam perfeitamente acuradas, isso não sig-
nifica que elas são menos acuradas do que qualquer outro tipo de
memória. Na verdade, é possível que as experiências de "lâmpada
de flash" sejam lembradas com maior exatidão do que eventos in-
conseqüentes ou não-surpreendentes. Na extensão em que as me-
JJÓrias de "lâmpada de flash" contêm um número incomum de deta-
lhes incidentais, é possível que isso ocorra devido aos efeitos
JJoduladores da memória dos hormônios do estresse (Christianson,
1992). Assim, qualquer evento que provoque uma forte resposta
emocional tende a produzir uma memória vívida, embora não ne-
:essariamente acurada. Uma segunda explicação baseia-se simples-
JJente no achado bastante conhecido de que os eventos distintivos
são lembrados mais facilmente do que os triviais. Esse último acha-
jo é conhecido como o efeito von Restorff, em homenagem ao pes- FIGURA 7-19 Muitas pessoas relatam uma memória de "lâmpada
quisador que primeiro o descreveu, em 1933. de flash" da destruição das torres do World Trade Center.
242 GAZZANIGA e HEATHERTON

atribuição errada da fonte de


As pessoas fazem atribuições erradas das fontes de
informação Quando as pessoas i'lfnrniaç;Jo
lembram erroneamente o
momento, lugar, pessoa ou Dan Schacter identificou as atribuições erradas da fonte de informação como um dos "sete
circunstâncias envolvidas em uma pecados" do sistema de memória. As atribuições erradas da fonte de informação ocorrem
memória .
quando as pessoas lembram erradamente o momento, lugar, pessoa ou circunstâncias envolvidos em
criptomnésia Um tipo de uma memória. Um bom exemplo disso é o efeito de falsa fama descrito anteriormente, em que os
apropriação inadequada que ocorre
quando as pessoas acham que
sujeitos acreditavam erroneamente que alguém era famoso simplesmente porque já tinham visto em
tiveram um idéia nova, mas apenas algum lugar o nome da pessoa. Da mesma forma, os psicólogos sociais há muito tempo conhecem o
recupera ram uma idéia efeito do dorminhoco, em que fortes argumentos que inicialmente não são muito persuasivos por
armazenada e deixaram de atribu ir virem de fontes questionáveis tornam-se mais persuasivos com o passar do tempo. Você, provavel-
a idéia à fonte apropriada .
mente, não acreditaria num tablóide semanal se ele afirmasse que os cientistas descobriram uma
maneira de as pessoas aprenderem cálculo enquanto dormem. No entanto, com o passar do tempo.
você poderia lembrar o argumento, mas não lembrar que a fonte era questionável, e passar a acredi-
tar que as pessoas podem aprender cálculo enquanto dormem.

Criptomnésia Um exemplo fascinante de atribuição errada da fonte é a criptomnésia, que e


quando as pessoas pensam que tiveram uma idéia nova, quando na verdade recuperaram da memó-
ria uma antiga idéia, deixando de atribuir a idéia à sua fonte correta (Macrae et ai., 1999). Os alunos
que tomam notas literais ao fazer pesquisas na biblioteca às vezes experienciam a ilusão de ter
escrito as frases, o que pode posteriormente levar a uma acusação de plágio. Assim, os alunos têm de
tomar muito cuidado para indicar as notas literais sempre que as fizerem. George Harrison, o ex-
Beatle, foi processado porque a sua música "My Sweet Lord" é espantosamente semelhante à música
"He's So Fine", gravada em 1962 pelos Chiffons. Embora reconhecesse ter ouvido a música antes, ele
negou vigorosamente tê-la piagiado. Ele argumentou que, com um limitado número de notas, e un;
número ainda menor de seqüências de corda no rock and roll, alguma sobreposição é inevitável. Err:
um julgamento controverso, o juiz declarou Harrison culpado.

As pessoas são más testemunhas oculares


Uma das formas mais poderosas de evidência é o depoimento de testemunhas. Estudos mais
antigos demonstram que poucos jurados estão dispostos a condenar um acusado com base apenas em
evidências circunstanciais. Mas acrescen-
te uma pessoa que diz: "Foi ele!" e a con-
vicção aumenta inacreditavelmente, mes-
mo que seja mostrado que a testemunha
não enxerga direito ou alguma outra con-
dição que erga dúvidas sobre a exatidão
do testemunho. O poder do depoimento
da testemunha ocular é um problema, pois
ele muitas vezes está errado. Na verdade.
Gary Wells e seus colegas estudaram 40
casos em que evidências de DNA indica·
ram que a pessoa havia sido erroneamen·
te acusada de um crime. Em 36 desses
casos, a pessoa fora erroneamente iden·
tificada por uma ou mais testemunhas
(Wells et ai., 1998). Ninguém conhece
melhor essa história do que William Jack-
son (Figura 7.20), que cumpriu cinco anos
de prisão por ter sido erroneamente con-
denado por um crime com base no teste-
munho de duas testemunhas oculares.
William Jackson (à esquerda) cumpriu cinco anos de prisão por ter sido erroneamente
condenado por um crime com base no depoimento de duas testemunhas oculares. O perpetrador rea l é o Identificação étnica cruzada As
da foto à direita. Esses dois homens parecem o mesmo para você? pessoas são especialmente incapazes de

1'~·'IT'
. .
"
. .
...,.
··.
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CIÊNCIA PSICOLÓGICA 243

:dentificar com exatidão indivíduos de outras etnias. Esse efeito ocorre em caucasianos, asiáticos,
sugestionabilidade O
afro-americanos e hispânicos. Aexpressão "todos eles parecem iguais" parece adequada para todas desenvolvimento de memórias
as pessoas que não são membros do nosso grupo étnico. Uma explicação para esse problema é que as tendenciosas, quando fornecidas
;>essoas tendem a ter um contato menos freqüente com os membros de outras etnias; outra é que as informações enganadoras.
;>essoas codificam a etnia de acordo com regras de categorização, tal como nos experimentos de
cegueira para a mudança em que as pessoas mais velhas viam "um estudante universitário" e os
estudantes viam um "operário da construção civil''.

Sugestionabilidade e má informação Elizabeth Loftus (Figura 7.21) é uma das maiores


especialistas do mundo em memória das testemunhas oculares. Na década de 1970, Loftus e seus
colegas realizaram uma série de estudos importantes demonstrando que as pessoas podem desen-
'·olver memórias tendenciosas quando lhes são fornecidas informações enganadoras - o "pecado"
da sugestionabilidade. A metodologia geral dessa pesquisa envolve mostrar aos participantes
um evento e depois fazer perguntas específicas sobre ele. Amaneira de formular as perguntas altera
as memórias dos participantes para o evento. Por exemplo, em um experimento estudantes universi-
tários viam o videoteipe de um acidente de carro e tinham de responder às perguntas: "Quão rápido
os carros estavam andando quando um no outro?" As seguintes palavras eram usadas na
pergunta: encostaram, bateram, deram um encontrão, colidiram ou se chocaram violentamente.
Loftus e John Palmer (1974) descobriram que os alunos estimavam que os carros estavam andando
mais rápido quando as palavras "se chocaram violentamente" eram usadas, em vez das outras. Em
um segundo estudo, grupos de alunos viram videoteipes de acidentes de carro e foram indagados
sobre ter visto os carros "colidirem violentamente" ou "baterem" um no outro. Uma semana mais
tarde, foi-lhes perguntado se tinham visto vidro quebrado no chão, um evento que não aconteceu.
Quase um terço dos que tinham escutado os termos "colidiram violentamente" lembraram falsamen-
ce ter visto vidro quebrado, o que aconteceu com poucos dos que tinham ouvido o termo "bateram''.
Em outro experimento, Loftus e seus colegas demonstraram que os sujeitos, além de relatarem
uma visão alterada do acidente de carro, podiam ser induzidos a relatar ter visto coisas que não
existiam, como celeiros, por meio de perguntas como "Quão rápido estava indo o carro esporte
branco quando passou pelo celeiro na estrada rural?" Os sujeitos aos quais foi feita essa pergunta
rendiam mais a relatar que tinham visto o celeiro inexistente do que os outros.
Talvez você esteja se perguntando se esses experimentos de laboratório são apro-
priados para estudar a exatidão das testemunhas oculares. Afinal de contas, um aci-
dente de trânsito real tem imagens e sons que imprimem o evento na nossa consciên-
cia. Anossa memória não seria melhor no mundo real? Algumas evidências confirmam
essa idéia. Um estudo de Vancouver examinou relatos de pessoas que tinham testemu-
nhado um tiroteio fatal (Yuille e Cutshall, 1986). Todos os observadores tinham sido
entrevistados pela polícia nos dois primeiros dias após o tiroteio. Quando os pesquisa-
dores voltaram alguns meses mais tarde, descobriram que os relatos das testemunhas
oculares eram altamente estáveis, incluindo a memória para detalhes. Na verdade, faz
sentido que os relatos das testemunhas verdadeiras sejam mais vívidos do que os das
testemunhas de laboratório, dado o efeito modulador da memória dos hormônios de
estresse. Entretanto, o mundo real difere de várias maneiras do ambiente controlado
de um laboratório, e não está claro se as memórias estáveis eram acuradas. Por exem-
plo, talvez ao repetir a história muitas vezes para os amigos, as testemunhas inadverti-
damente fortaleceram memórias de detalhes inexatos.

Confiança da testemunha ocular Quão capazes são as pessoas que obser-


vam, como os jurados, de avaliar se as testemunhas oculares são acuradas? Gary Wells
e seus colegas realizaram alguns estudos na Universidade de Alberta e, mais tarde, na
Iowa State University, e seu achado geral foi de que as pessoas não conseguem diferen-
ciar as testemunhas que são acuradas das que não são. O problema é que as testemu-
nhas que estão enganadas são tão confiantes quanto as que estão certas, ou ainda mais
confiantes. Testemunhas oculares que relatam vívidos detalhes de todos os aspectos da
cena são provavelmente menos críveis do que as testemunhas que não se lembram bem
de detalhes triviais. Afinal de contas, as testemunhas de crimes reais tendem a se cen-
trar nas armas ou na ação - elas não prestam atenção a detalhes menores. Portanto, FIGURA 7 .21 Elizabeth Loftus demonstrou que a
uma grande confiança para detalhes menores pode ser uma deixa de que a memória memória é extremamente sugestionável.
244 GAZZANIGA e HEATHERTON

provavelmente será inexata ou mesmo falsa. Entretanto, algumas pessoas são especialmente confiantes.
amnésia para a fonte Um tipo
de amnésia que ocorre quando uma
estando certas ou erradas, e os jurados as acham convincentes.
pessoa lembra um evento, mas não
consegue lembrar onde encontrou
a informação. As pessoas têm lembranças falsas
confabulação A falsa recordação
de uma memória episódica. Aamnésia para a fonte ocorre quando a pessoa lembra um evento, mas não consegue lembrar
onde encontrou aquela informação. Pense em sua lembrança mais remota da infância. A maioria das
pessoas não consegue lembrar memórias específicas de antes de três anos de idade. A ausência de
memórias anteriores é conhecida como amnésia da infância, e pode ser devida à falta inicial da capaci-
dade lingüística e a lobos frontais imaturos. Mas vamos considerar aquela primeira memória. Quão
vívida ela é? Como você sabe que não está se lembrando de alguma coisa que viu em uma fotografia oe
de alguma história que um membro da família lhe contou? Quando as pessoas recordam eventos de.
infância, as memórias são geralmente parciais e nebulosas. Como você sabe que a memória é real?

Criando um falso reconhecimento Foi demonstrado recentemente que as pessoas poderr.


ser levadas a recordar ou reconhecer falsamente eventos que não aconteceram. Leia a seguinte lisrz
de palavras, dizendo cada uma em voz alta: azedo, bala, açúcar, amargo, bom, gosto, dente, legal
mel, refrigerante, chocolate, coração, bolo, torta, pudim. Agora deixe o livro de lado e tente escreve!"
o máximo possível das palavras.
Henry Roediger e Kathleen McDermott usaram esse experimento para ver se podiam criar fai-
sas memórias em pessoas normais, sadias (Roediger e McDermott, 1995). Por exemplo, sem olhar de
novo, qual das seguintes palavras você lembrou? Bala, mel, dente, doce, pudim. Se lembrou "doce-
você experienciou uma falsa memória. Se olhar novamente, verá que "doce" não estava entre as
palavras originais, mas observe que todas as palavras estão relacionadas à palavra doce. Esse para-
digma básico é extremamente confiável para produzir falsas recordações. Além disso, as pessoas
geralmente confiam muito no seu julgamento de já ter visto ou ouvido a palavra crítica.
Mike Miller e George Wolford argumentaram recentemente que as respostas na tarefa de Roe-
diger/ McDermott devem-se à mudança nos critérios pelos quais as pessoas estão dispostas a dize:
que reconhecem as palavras, representando assim um viés de resposta, e não algo que podem _
chamar de falsa memória. Eles destacam o ponto importante de que os erros são comuns em muita::
tarefas de memória, e que devemos ter cuidado antes de concluir que as ilusões de memória sãr
"falsas". Afinal de contas, ninguém disse que os sujeitos que avaliaram nomes, erroneamente, comr
famosos (no efeito de falsa fama discutido anteriormente) estavam tendo uma falsa memória. J\ãr
obstante, existe um crescente corpo de evidências mostrando que as falsas memórias podem se:
implantadas, como no estudo descrito em "Estudando a mente: Perdido no centro comercial".

Confabulação Alguns tipos de lesão cerebral estão associados à falsa recordação de uma me-
mória episódica, o que é chamado de confabulação. Morris Moscovitch descreveu a confabulaçã
como "mentir honestamente'', pois não existe nenhuma intenção de enganar e a pessoa não es._
consciente da falsidade de sua história. Moscovitch (1995) dá um exemplo surpreendente de confa-
bulação. H.W. era um homem de 61 anos, pai biológico de quatro filhos, todos eles já adultos. HY
teve uma grave lesão no lobo frontal após uma hemorragia cerebral. Apresentamos aqui parte d:
entrevista clínica:

P. Você é casado ou solteiro?


H.W. Casado.
P. Há quanto tempo você é casado?
H.W. Há cerca de quatro meses.
P. Quantos filhos você tem?
H.W. Quatro. (Ele ri.) Nada mal para quatro meses.
P. Que idade têm os seus filhos?
H.W. O mais velho tem 32, seu nome é Bob, e o mais jovem tem 22, seu nome é Joe.
P. Como você conseguiu esses filhos em quatro meses?
H.W. Eles são adotados.
P. Tudo isso não soa estranho para você, isso que você está dizendo?
H.W. (Ele ri.) Eu acho que é um pouco estranho.
PERDIDO NO CENTRO COMERCIAL
E se você descobrisse que se perdeu em um centro comercial tinha uma espécie de anel grisalho na cabeça ... e usava óculos.
quando era criança? Pense em quando você tinha cinco anos. Você (Loftus, 1993, p. 532)
se lembra de ter se perdido no centro comercial e de ter sido
encontrado por um bom velhinho que o levou até a sua família? Talvez você esteja pensando que o Chris era muito crédulo e
Não? Bem, e se a sua família lhe contar sobre esse incidente, fácil de enganar, mas em um estudo posterior, Loftus e seus colegas
incluindo como seus pais ficaram em pânico quando não utilizaram o mesmo paradigma para avaliar se seria possível
conseguiram achar você? De acordo com recentes pesquisas de implantar falsas memórias em 24 participantes. Sete dos
Elizabeth Loftus, é bem provável que você lembre o incidente, participantes lembraram falsamente eventos que tinham sido
mesmo que ele não tenha acontecido. implantados por membros da família que faziam parte do estudo.
Em um estudo inicial, Chris, um garoto de 14 anos, foi Observe que é improvável poder criar falsas memórias para eventos
informado por seu irmão mais velho, Jim, sobre o incidente verdadeiramente incomuns, como receber um enema (Pezdek e
"perdido no centro comercial". O contexto era um jogo chamado Hodge, 1999). Entretanto, um estudo de Saul Kassin e Katherine
"Lembra quando ... ", e todos os outros incidentes relatados por Jim Kiechel (1996) descobriu que as pessoas podiam inclusive ser
eram verdadeiros. Dois dias mais tarde, Chris começou a relatar induzidas a fazer falsas confissões de transgressões menores, que na
memórias de como ele se sentira durante o episódio; duas semanas verdade não tinham cometido. Além disso, está bem estabelecido
depois ele relatou o seguinte: que as crianças são especialmente sugestionáveis, e que falsas
memórias, como ter o dedo preso numa ratoeira e ter de ir ao
Eu estava andando com vocês e acho que fui até a loja de hospital, podem ser facilmente induzidas nelas. Parece que pensar
brinquedos olhar um brinquedo, o Kay-bee, e, ah, me perdi e sobre se alguma coisa aconteceu, e imaginá-la acontecendo, cria
olhei ao redor e pensei: "Puxa, o que eu faço agora?". Você uma falsa imagem do evento. Mais tarde, quando pensa
sabe. E então ... Eu achei que nunca mais veria a minha família. novamente sobre o incidente, a pessoa tem um problema de
Eu estava realmente apavorado. E, então, esse velhinho, acho monitoramento de fonte. Será que o evento realmente aconteceu
que ele estava usando uma camisa de flanela azul, veio até ou ela o imaginou? Para Chris, a memória de se perder no centro
mim .. . ele era meio velho. Era um pouco careca em cima ... ele comercial se tornou tão real como outros eventos da infância. •!,

'--~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~1 t.
----1 ~

Pacientes como H.W confabulam sem um propósito aparente. Eles simplesmente recordam
fatos equivocados e, quando questionados, tentam dar sentido às suas recordações acrescentando
fatos que tornem a história mais coerente. Lembre, do Capítulo 4, a teoria de Gazzaniga do intérpre-
te e como os pacientes com cérebro secionado confabulam para dar sentido a informações discrepan-
tes fornecidas a cada hemisfério cerebral. Um exemplo dramático de confabulação ocorre na síndro-
me de Capgras, em que os pacientes têm a crença delirante de que os membros de sua família foram
substituídos por impostores. Nenhuma evidência os convence de que seus irmãos, pais, cônjuges e
filhos são genuínos. Os pacientes com Capgras geralmente apresentam lesões nos lobos frontais e
nas regiões cerebrais límbicas.

As lembranças reprimidas são controversas


Um dos debates mais veementes das últimas décadas centrou-se nas memórias reprimidas. De
um lado estão os psicoterapeutas e pacientes afirmando que memórias longamente reprimidas de
eventos traumáticos podem ressurgir durante a terapia. Memórias reprimidas de abuso sexual são as
memórias reprimidas mais comuns relatadas, e na década de 1990 houve uma abundância de rela-
tos de celebridades de abuso sexual sofrido na infância.
Do outro lado estão os pesquisadores da memória, como Elizabeth Loftus, salientando que há
poucas evidências críveis indicando que as memórias recuperadas são genuínas, ou pelo menos
suficientemente acuradas para serem dignas de crédito. Parte do problema é muito bem resumido
pelo renomado pesqµisador da memória Daniel Schacter (Figura 7.22): "Eu sei que alguns eventos
traumáticos podem estar associados ao esquecimento temporário e subseqüente recuperação da
memória. Estou convencido de que o abuso da criança é um problema importante na nossa socieda-
de. Não tenho nenhuma razão para questionar as memórias das pessoas que sempre lembraram o
abuso ou que lembraram sozinhas, espontaneamente, um abuso previamente esquecido. Mas fico
profundamente preocupado com algumas das técnicas sugestivas recomendadas para recuperar
memórias reprimidas" (Schacter, 1996, p. 251)
246 GAZZANIGA e HEATHERTON

Schacter alude à assustadora possibilidade de que falsas memórias de eventos


traumáticos sejam implantadas por terapeutas bem-intencionados, mas mal-orienta-
dos. Existem evidências convincentes de que métodos como hipnose, regressão de ida-
de e recordação orientada podem implantar falsas memórias. Da mesma forma, um
crescente corpo de evidências oriundo de estudos de laboratório cuidadosamente con-
trolados demonstra que as crianças podem ser induzidas a lembrar eventos que não
ocorreram (Ceei e Bruck, 1995). Na verdade, um dos sete pecados da memória identifi-
cados por Schacter é a sugestionabilidade, o que é ilustrado por memórias ilusórias que
ocorrem quando as pessoas incorporam informações fornecidas por outros em suas
próprias recordações.
Houve alguns exemplos infames de adultos que acusaram os pais de abuso basea-
dos em memórias que, mais tarde, eles perceberam ser produto da terapia, e não da
realidade. Por exemplo, Diana Halbrook passou a acreditar não só que tinha sido abusa-
da, como também que fora envolvida em um abuso ritualístico satânico e que ela pró-
pria matara um bebê. Quando expressou dúvidas ao terapeuta sobre a veracidade des-
ses eventos, as pessoas de seu grupo "de apoio" e o terapeuta lhe disseram que ela
estava negando e não escutando a "menininha" dentro dela. Afinal de contas, todos os
outros membros do grupo tinham recuperado memórias de terem sido envolvidos em
FIGURA 7 .22 A pesquisa de Daniel Schacter abuso ritualístico satânico. Depois que Diana saiu do seu grupo de terapia, ela passou a
proporcionou inúmeros insights sobre os pecados acreditar que não tinha sido abusada e que não era uma assassina. É interessante que
cotidianos da memória humana. tantas pessoas tenham recuperado memórias de abuso ritualístico satânico, pois "em-
bora milhares de pacientes tenham 'lembrado' atos rituais, nem um único caso desses
foi documentado nos Estados Unidos, apesar de extensivas investigações por agências
estaduais e federais" (Schacter, 1996, p. 269).
O que uma pessoa sensata deve concluir sobre memórias reprimidas? Odebate sobre memórias
reprimidas, compreensivelmente, envolve crenças fortes e apaixonadas de ambos os lados. Apesqui-
sa nos mostra que algumas técnicas terapêuticas parecem especialmente capazes de promover falsas
memórias, mas seria um erro simplesmente descartar todos os relatos adultos de abuso na infância.
Certamente é possível que o abuso ocorra e seja esquecido até um período posterior de tempo, e é
um desserviço para as verdadeiras vítimas de abuso ignorar suas memórias. É interessante notar
que, na última metade da década de 1990, a incidência de memórias recuperadas caiu dramatica-
mente. Entretanto, não está claro se isso aconteceu devido à menor atenção da mídia para os relatos,
ou porque as pessoas procuraram menos a terapia para descobrir suas memórias passadas.

As pessoas reconstroem os eventos de modo


que tenham consistência
Oexemplo final de distorção da memória a considerar é o viés de memória, em que as memóri-
as que as pessoas têm dos eventos são alteradas com o passar do tempo de modo a terem consistên-
cia com as atuais crenças ou atitudes. Um dos grandes pensadores da psicologia, Leon Festinger,
quando escreveu um tributo ao seu colega Stanley Schacter, acertou na mosca: "Eu prefiro confiar na
minha memória. Vivo com essa memória há muito tempo, estou acostumado com ela e, se reorganizei
1
ou distorci alguma coisa, certamente isso foi feito em meu próprio benefício" (Festinger, 1987, p. 1).
1 Considere as pessoas que fazem cursos para aumentar as habilidades de estudo. Apesar de
evidências muito modestas de que esses cursos são benéficos, freqüentemente porque os alunos não
seguem os conselhos oferecidos, a maioria descreve tais cursos como extremamente úteis. Como é
que alguma coisa que geralmente só produz resultados modestos é tão positivamente avaliada? Para
compreender isso, Michael Conway e Michael Ross designaram aleatoriamente os alunos a um genuíno
curso sobre habilidades de estudo ou a um grupo-controle que não recebeu nenhum treinamento
especial. Os alunos que fizeram o curso verdadeiro mostraram poucos sinais de melhora; na verda-
de, seu desempenho no exame final foi um pouco pior do que o do grupo-controle. Mas eles continu-
avam afirmando que o curso fora útil. Por quê? O experimento tinha um aspecto que nos permite
compreender o que acontece. No início do curso, os sujeitos tinham de avaliar com uma nota as suas
habilidades de estudo. No final do curso eles se avaliavam novamente e tinham de lembrar qual
tinha sido sua nora original. Ao descrever suas avaliações anteriores, os alunos do curso de habilida-
des de estudo lembravam de si mesmos como significativamente piores do que na verdade tinham
CIÊNCIA PSICOLÓGICA 247

sido no início do curso, dessa forma "conseguindo o que queriam, ao corrigir o que tinham" (Conway
e Ross, 1984).
As pessoas tendem a recordar suas atitudes e crenças passadas como sendo consistentes com
suas atuais atitudes e crenças, freqüentemente corrigindo suas memórias quando modificam atitu-
des. As pessoas também tendem a lembrar os eventos de modo que lancem sobre elas uma luz
proeminente ou favorável. Nós tendemos a exagerar a nossa contribuição para o trabalho de equipe,
a assumir o crédito pelo sucesso e a pôr a culpa dos fracassos nos outros, e a lembrar os nossos
sucessos mais do que os nossos fracassos.
Não são só os indivíduos que revelam um viés ao recordar eventos passados; as sociedades
também fazem o mesmo. A memória coletiva dos grupos pode distorcer seriamente o passado, con-
forme expresso na idéia orwelliana de que nós só podemos mudar o passado, não o futuro. Considere
que a história da maioria das sociedades tende a subestimar os comportamentos incorretos, imorais
e inclusive assassinos de seu passado, e as memórias dos perpetradores geralmente são mais curtas
que as das vítimas. Existe uma realidade objetiva? Conforme Leon Festinger observou, nós construí-
mos nossas memórias para nossos propósitos pessoais. A nossa memória dos eventos tende a ser
altamente consistente com as nossas crenças pessoais.

Como as lembranças são distorcidas?


A memória está muito longe de ser um registro verdadeiro e objetivo de fatos e eventos. A memória
freqüentemente inclu i vieses, distorções e descaradas mentiras. As pessoas tendem a ser más testemunhas oculares
porque a memória humana é melhor para o essencial do que para o detalhe. No entanto, as pessoas confiam B•'.
injustificadamente em suas lembranças pessoais, como nas memórias de "lâmpada de flash ". Lembranças podem .'
1
ser distorcidas ou inclusive implantadas por falsas informações, e existe um viés geral para manter a consistência em
nossas lembranças. Ir:
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~
a:

CONCLUSÃO
O cérebro é um instrumento maravilhosamente evoluído que permitiu aos humanos desenvol-
ver a linguagem, construir civilizações e visitar a lua. Entretanto, nós nem sempre conseguimos
lembrar onde deixamos nossas chaves, o rosto das pessoas que vimos cometer um crime, se Richard
Shiffrin é famoso ou detalhes do livro que lemos no ano passado. Devemos enfatizar que a memória
evoluiu para resolver certos problemas relacionados à sobrevivência, tal como lembrar nossos ami-
gos e inimigos. A memória não evoluiu para lembrar números de telefone, definições de livros didá-
ticos ou como dirigir um carro, mas ela faz um trabalho danado de bom em todas essas coisas. A
memória é um sistema que fornece ao organismo a capacidade de reter informações e habilidades
úteis para a sobrevivência. Como tal, ela funciona muito bem, considerando a quantidade de infor-
mações que bombardeiam o sistema nervoso. Finalmente, como urna das áreas de pesquisa mais
dinâmicas na ciência psicológica, a memória ressalta os nossos quatro temas fundamentais, em par-
ticular a maneira pela qual os pesquisadores estão trabalhando em vários níveis de análise para
decifrar o mistério da mente.

LEITURAS AD C ONAIS
Bjork, E. L.; Bjork, R. A. (1996). Memory. San Diego, CA: Academic Press.
Eichenbaum, H. B.; Cahil, L.; Gluck, M. ; Hasselmo, M. ; Keil, F. ; Martin, A. et ai. (1999). Learning and
memory: Systems analysis. ln M. J. Zigmond, F. E. Bloom, S. C. Landis, J. L. Robens & L. R. Squire (Eds.),
Fundamental neuroscience (p. 1455-1486). San Diego, CA: Academic Press.
Gazzaniga, M. S. (2000) . The new cognitive neurosciences (2nd ed.). Cambridge, MA: MIT Press.
Neath, I. (1998). Human memory: An introduction to research, data, and theory. Pacific Grove, CA: Brooks-Cole.
Schacter, D. L. (1996). Searching for memory: The brain, the mind, and che past. New York: Basic Books.
Schacter, D. L. (2001). The seven sins of memory: How the mind forgets and remembers. Boston: Houghron Mifflin.
Squire, L. R.; Kandel, E. R. (1999). Memory: From mind to molecules. New York: Scientific American Library:
G291c Gazzaniga, Michael S.
Ciência psicológica : mente, cérebro e comportamento /
Michael S. Gazzaniga e Todd F. Heatherton; trad . Maria
Adriana Veríssimo Veronese. - 2. imp. rev. - Porto Alegre:
Artmed, 2005.

ISBN 978-85-363-0432-8

1. Psicologia - Ciência. 1. Heatherton, Todd F. li. Título

CDU 159.9.01/.98

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