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23/05/2018 ConJur - Bruno Amaro Lacerda: Ética em prol dos animais é questão aberta

DIGNIDADE ANIMAL

Ética em prol dos animais é questão aberta


22 de abril de 2015, 6h20

Por Bruno Amaro Lacerda

Nos últimos anos, a expressão “dignidade animal” vem ganhando alguma força no
Direito brasileiro. Vejamos alguns exemplos. Em crônica dedicada aos animais, João
Baptista Villela elogia três Códigos Civis europeus (o alemão, o austríaco e o suíço)
por estabelecerem que “os animais não são coisas”, ao contrário da tradição
brasileira, que ainda os mantêm relegados à condição de bens móveis. Mas, se não
são coisas, seriam pessoas? Segundo Villela, a questão do status dos animais não
deveria nos preocupar, pois o Direito nunca dependeu de respostas científicas
precisas para assumir certas necessidades de proteção. Assim, afirma: “Nem é
necessário, de resto, saber exatamente o que são os animais para reconhecer que
são portadores de dignidade e lhes garantir tratamento justo” [1].

Tratando da dignidade humana, Luís Roberto Barroso parece admitir também a


dignidade animal: “O que poderia ter sido suscitado, isso sim, seria o
reconhecimento de dignidade aos animais. Uma dignidade que, naturalmente, não é
humana nem deve ser aferida por seu reflexo sobre as pessoas humanas, mas pelo
fato de os animais, como seres vivos, terem uma dignidade intrínseca e própria” [2].

Em um livro coletivo dedicado à dignidade e aos direitos fundamentais “para além


dos humanos”, há diversos artigos que caminham no mesmo sentido. Em um deles,
a autora procura expandir a ideia kantiana de respeito para englobar os animais.
Em sua visão, o conceito de dignidade pode ser estendido aos animais se os
enxergarmos como partícipes da biosfera, merecedores de proteção pelo papel que
desempenham no sistema global da natureza [3].

Em outro capítulo da mesma obra, os autores propõem a transformação da noção


política moderna de contrato social em um contrato socioambiental, cuja função
seria atenuar a exploração sofrida pelas espécies animais, ampliando os valores
fundamentais da comunidade estatal “para além do espectro humano”, atitude que
nos levaria a alcançar “um patamar mais evoluído da cultura jurídica, da moral e do
pensamento humano” e, por consequência, propiciaria a “proteção e promoção da
dignidade dos animais e da vida de um modo geral” [4].

Em tese de doutoramento defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em


Direito da UFSC, Fernanda Medeiros sustenta a existência de deveres fundamentais
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dos seres humanos para com os animais, como decorrência direta da admissão da
dignidade destes: “Em face da existência do reconhecimento de um valor intrínseco
para as demais formas de vida, se reconhece um dever moral e um dever jurídico
dos animais humanos para com os animais não-humanos. E tais deveres se
descrevem como deveres fundamentais” [5].

Essas citações são suficientes para provocar inquietação. Deveríamos mesmo


reconhecer uma dignidade animal? Esse reconhecimento, ao qual nos convidam os
juristas supracitados, nos colocaria diante de problemas de difícil solução, por
exemplo: tendo em vista que da admissão da dignidade de um ser decorrem
direitos, quais direitos deveríamos assegurar aos animais? Além disso, estamos
falando exatamente do quê? De animais mais complexos e biologicamente próximos
de nós, como os primatas e outros mamíferos, ou de todos os animais? Estamos
abrangendo na reflexão também os répteis e os insetos? Interessa-nos somente os
pets e os animais domesticados ou também aqueles que vivem em estado selvagem?
Imediatamente se percebe que, se quiséssemos reconhecer a dignidade animal,
teríamos de traçar linhas demarcatórias, as quais não poderiam ser arbitrárias, sob
pena do argumento como um todo sucumbir. Ou seja, seria preciso explicar por qual
razão certos animais possuem dignidade e direitos e outros não. Não parece ser uma
tarefa fácil.

Essas indagações derivadas, ademais, mostram que a questão não é meramente


teórica, mas também prática: admitir que os animais (ou alguns animais) possuem
dignidade implica, se nos mantivermos atados ao sentido comum deste termo, que
eles são seres merecedores de respeito, isto é, de ações éticas de nossa parte. Não
podemos, afinal, dizer que os animais são dotados de dignidade simplesmente para
agradar os animalistas e as pessoas que gostam de animais. Ao afirmarmos isso,
teremos que, por coerência, repensar alguns atos que praticamos tendo-os por
objeto (como o abate para fins de alimentação, a utilização em pesquisas científicas,
o confinamento em zoológicos ou mesmo a domesticação). Serão atos devidos a
seres dotados de dignidade?

De certo modo, isso já vem ocorrendo, inclusive com repercussões judiciais. Em


dezembro de 2014, por exemplo, o Tribunal de Recursos de Nova York negou um
pedido de habeas corpus impetrado em favor de um chimpanzé enjaulado em uma
propriedade particular, argumentando que, por não existir reciprocidade de
direitos e deveres na existência animal, a pretensão de que possuiriam direito à
liberdade de locomoção seria descabida [6]. Casos similares já ocorreram no Brasil,
como quando o Tribunal de Justiça do RJ negou habeas corpus a um chimpanzé
chamado Jimmy, alegando que o art. 5º da nossa Constituição só se refere às pessoas
e não também aos animais, embora o relator tenha ressalvado a possibilidade dessa
distinção desaparecer ou ser atenuada no futuro por alterações na legislação [7].

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No plano doutrinário, alguns autores vêm recusando a pretensão, sob o argumento


de que os animais não possuem autoconsciência nem liberdade, atributos
necessários para a posse da dignidade. Segundo Francesco D’Agostino, o ser humano
possui dignidade porque detém uma originalidade constitutiva que se manifesta na
autoconsciência (possibilidade de perceber-se como um “eu”). Os animais, embora
sejam biologicamente indivíduos e possuam, em níveis diversos, capacidade mental
e consciência do meio ao redor, não são capazes de alcançar uma individualidade
subjetiva, isto é, não conseguem ver a si mesmos como entes singulares e livres. É
impróprio, portanto, falar de “dignidade animal”. D’Agostino, contudo, afirma que
essa negação não deve ter por consequência o seu desamparo. Ações humanas
predatórias e cruéis que os vitimam sem motivo devem ser evitadas. Uma ética em
prol dos animais é questão ainda aberta, a exigir esforços reflexivos. De todo modo,
o autor insiste que qualquer reflexão a respeito deverá levar em conta a diferença
ontológica entre nossa espécie e as demais [8]. Uma ética que exige igual
consideração dos interesses humanos e animais, como a de Peter Singer [9], não
pode ser levada a sério.

Para Laura Palazzani, a superioridade ontológica do homem, que o converte no


único ser detentor de dignidade, não advém de uma simples pertença biológica à
espécie humana, mas da compreensão de que somente os seres desta espécie
possuem uma natureza predisposta à autoconsciência, capacidade que os permite
agir livremente e reconhecer em outros da mesma espécie igual liberdade. Entre os
animais, diversamente, “Não existe o reconhecimento recíproco, condição
ontológica da relação” [10]. Afirmar esse “salto ontológico” entre pessoas e animais
não deve ser visto como um preconceito arrogante de nossa parte, tampouco
implica relegá-los à condição de meras coisas. Para a autora, significa apenas
dimensionar nossa ação ética, compreendendo que os deveres que temos perante
eles não são deveres de justiça (pois estes exigem paridade ontológica), mas deveres
de benevolência, totalmente dependentes da nossa unilateral percepção do seu
sofrimento no mundo. Por isso, Palazzani propõe um meio-termo que permite alocá-
los entre as pessoas e as coisas, reconhecendo-lhes “um estado de ‘referentes do
direito’, que coloca em relevo de um lado a não elevação à subjetividade, mas de
outro também a não redução à objetividade” [11].

Adela Cortina, após examinar as diferentes tendências do debate contemporâneo


sobre a dignidade e os direitos dos animais, conclui que estes possuem um valor
interno, mas não um valor absoluto ou dignidade. Somente os seres autoconscientes,
capazes de perceber sua própria vida como digna e de reconhecer a mesma
capacidade em outros seres autoconscientes é que, além de um valor interno,
possuem também um valor absoluto. Para a autora, a dignidade não deve ser
identificada com uma vida plena, à qual os animais também se destinam segundo
suas capacidades próprias, mas com o valor que deriva da percepção da liberdade
em si e nos outros. Isso não significa que os animais são desimportantes, pois todos
os viventes possuem um valor interno como partícipes da natureza. Assim, quando
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infligimos um sofrimento intenso e despropositado a um cão ou a um gato, estamos


violando esse valor. Mas ele nunca se converte em uma “carta de trunfo” perante
outros valores, ao contrário do que ocorre com a dignidade [12].

Deste modo, pode-se dizer que o valor animal não prevalece sobre a vida pessoal.
Por exemplo: diante de uma zoonose urbana grave, que ameace a vida humana,
pode fazer sentido o sacrifício de cães e gatos de rua. O valor interno cede ao valor
absoluto [13]. Mas ninguém poderia sustentar algo similar envolvendo pessoas,
como o assassinato de seres humanos contaminados para evitar a propagação de
uma doença infectocontagiosa grave. O valor humano não é apenas interno, mas
absoluto. É a mesma razão que nos leva (ou muitos de nós) a aceitar, sob certas
condições, a pesquisa farmacêutica com testes laboratoriais em animais, mas a
rejeitá-la em seres humanos (salvo em certas situações consentidas, isto é, não
agressivas à liberdade do paciente ou voluntário). De todo modo, Cortina admite
que, embora os animais não possuam dignidade nem direitos, deveríamos ficar mais
atentos ao seu valor interno, mudando algumas de nossas atitudes em relação à sua
existência, em especial aquelas que os instrumentalizam despropositadamente.

Penso que esses autores estão certos. Não existe uma “dignidade animal”. Incapaz
de perceber-se como livre, o animal está preso à natureza, alheio a qualquer
existência verdadeiramente pessoal. Xavier Zubiri expressou isso com a frase “O
animal tem meio, mas não tem mundo” [14]. O animal está encerrado em sua
essência e, a partir dela, adapta-se ao meio que o circunda. O homem, diversamente,
não apenas altera o meio em que vive, mas também a si mesmo, criando e recriando
novas possibilidades de ser. O horizonte humano, neste sentido, é completamente
aberto à inovação; é um mundo de liberdade, que transcende a natureza. É isto, e
nada mais, que faz do homem o único ser dotado de dignidade. Ou, nas palavras de
Karl Jaspers: “A dignidade do homem reside no fato de ele ser indefinível. O homem
é como é, porque reconhece essa dignidade em si mesmo e nos outros homens” [15].

Talvez a saída esteja aí: as pessoas, em sua liberdade, podem cada vez mais tomar
consciência do valor interno dos animais, dispondo-se a ofertar-lhes certos níveis de
proteção condizentes com a sua condição, sem que seja necessário lhes atribuir uma
falsa dignidade ou valor absoluto. Isso já está acontecendo: pensemos nas proibições
das rinhas de galo, da farra do boi e do uso circense de animais, nos controles
rígidos sobre as pesquisas que os utilizam e nas leis ambientais. Pode ser pouco para
os animalistas, mas, olhando bem, parece um grande e significativo avanço.

Referências

[1] VILLELA, João Baptista. Bichos: uma outra revolução é possível. Revista Del Rey
Jurídica, n. 16, 2006, p. 13.

[2] BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direito constitucional


contemporâneo. A construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência
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mundial. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p.118.

[3] FEIJÓ, Anamaria Gonçalves dos Santos. A dignidade e o animal não-humano. In:
MOLINARO, C. A. et al. (Org.) A dignidade da vida e os direitos fundamentais para
além dos humanos. Uma discussão necessária. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p. 142.

[4] SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Algumas notas sobre a dimensão
ecológica da dignidade da pessoa humana e sobre a dignidade da vida em geral. In:
MOLINARO, C. A. et al. (Org.) A dignidade da vida e os direitos fundamentais para
além dos humanos. Uma discussão necessária, p. 204-205.

[5] MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Princípio da dignidade da vida para
além do animal humano: um dever fundamental de proteção. Tese (doutorado).
Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de Ciências Jurídicas. Programa de
Pós-Graduação em Direito. Florianópolis, 2009, p. 165. Disponível em:
http://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/92358. Acesso em 24.03.2015.

[6] Ver notícia em http://www.conjur.com.br/2014-dez-08/tribunal-eua-nega-habeas-


corpus-libertar-chimpanze. Acesso em 21.03.2015.

[7] Ver notícia em http://www.conjur.com.br/2011-abr-19/tribunal-justica-rio-nao-


reconhece-habeas-corpus-chimpanze. Acesso em 21.03.2015.

[8] D’AGOSTINO, Francesco. I diritti degli animali. Rivista Internazionale di Filosofia


del Diritto, 1/1994, p. 99.

[9] Autor de maior destaque no movimento animalista, defende a extensão do


princípio da igualdade às outras espécies. Conferir SINGER, Peter. Practical Ethics. 2.
ed. Cambridge: Cambridge University Press, 1993, p. 55-56.

[10] PALAZZANI, Laura. Introduzione alla biogiuridica. Torino: Giappchichelli, 2002,


p. 271.

[11] PALAZZANI, Laura. Introduzione alla biogiuridica, p. 273.

[12] CORTINA, Adela. Las fronteras de la persona. El valor de los animales, la


dignidad de los humanos. Madrid: Taurus, 2009, p. 224.

[13] Embora o valor interno dos animais possa exigir que esse ato se faça pelo meio
menos cruel possível, como sustentou o STJ em determinada oportunidade: BRASIL.
Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.115.916-MG. Relator ministro
Humberto Martins. Julgado em 01 de setembro de 2009. Disponível em:
http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Acordaos/IntegraAcordao.asp?
num_registro=200900053852&dt_publicacao=18/09/2009. Acesso em 10.03.2015.

[14] ZUBIRI, Xavier. El hombre, realidad personal. Revista de Occidente, v. 1, 1963, p.


20.
https://www.conjur.com.br/2015-abr-22/bruno-amaro-lacerda-etica-prol-animais-questao-aberta?imprimir=1 5/6
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[15] JASPERS, Karl. Introdução ao pensamento filosófico. São Paulo: Cultrix, 1976, p.
54.

Bruno Amaro Lacerda é professor adjunto da UFJF. Doutor e Mestre em Direito pela
UFMG.

Revista Consultor Jurídico, 22 de abril de 2015, 6h20

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