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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSO

PSICANÁLISE E LINGUAGEM: UMA OUTRA PSICOPATOLOGIA

O TRABALHO COM OS PAIS NA ANÁLISE DE CRIANÇAS

ISABEL PARREIRAS HORTA NAPOLITANI

Orientadora: BEATRIZ OLIVEIRA

Monografia apresentada como parte dos requisitos para o certificado de

Especialização

São Paulo 2008


RESUMO:

Isabel Parreiras Horta Napolitani: O trabalho com os Pais na análise de

crianças.2008 Orientadora: Beatriz Oliveira

Palavras chaves: Laço entre pais e filhos, a escuta analítica, entrevistas

preliminares, Retificação Subjetiva.

O objetivo deste trabalho foi circunscrever o que há no laço entre pais e

filhos no âmbito analítico e, a partir desta limitação, pensar sobre a função do

trabalho realizado com os pais de uma criança em análise.

Parto do princípio de que existe um trabalho a ser realizado com os pais

e levanto a questão sobre qual a função deste trabalho, já que os pais não se

apresentam como pacientes; não solicitam análise. Assim, eu me pergunto se é

possível correlacionarmos o trabalho com os pais ao trabalho inicial de qualquer

tratamento analitico.

Desta forma o trabalho está dividido em duas grandes partes: numa

primeira, encontra-se a delimitação do que há na relação entre pais e filhos; na

segunda, ocorre a caracterização do que Freud chamava de tratamento de ensaio

e Lacan chamava de entrevistas preliminares.

No final, eu correlaciono a estrutura do trabalho com os pais às

entrevistas preliminares, nas quais encontramos a questão do diagnóstico, do

laço transferencial e das retificações subjetivas. Neste primeiro tempo de uma

análise, as intervenções do analista ocorrem no campo transferencial. Porém,

elas estão inscritas no âmbito das retificações subjetivas. Neste trabalho, o

analista não interpreta os pais, mas se utiliza da escuta analítica.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 01

Capitulo I – A Cena Inicial 04

a) Criança / infantil/ sujeito 05

b) Sobre a constituição do sujeito 10

c) Os pais e o sintoma da criança 14

Capítulo II- O Encontro com a fala dos pais 18

Capítulo III- A Posição dos Pais 24

Capítulo IV– Sobre o inicio do Tratamento na obra Freudiana 29

CapítuloV- Primeiras entrevistas em Lacan e a questão da

transferência 34

a) Entrevistas preliminares 36

b)Transferência em Lacan 43

CONCLUSÃO 47

BIBLIOGRAFIA 50
Agradecimentos:

Gostaria de agradecer a Sandra Dias pelo grande prazer que foi fazer esse curso e pela

escuta valiosa das supervisões .

A Bia Oliveira, pelo acolhimento e delicadeza e principalmente pela transmissão da

psicanálise que foi feita no percorrer destes dois anos de convivência.

Ao meu marido, que sempre me acompanhou nas minhas apostas e nas mudanças da

minha vida.

E a todos os meus “companheiros’ que de uma forma ou de outra estiveram presentes

neste meu caminhar .

A Rita e a Equipe da triagem do Lugar de Vida.

E a minha família e a todas as famílias e pacientes que viabilizaram a construção deste

saber.
INTRODUÇÃO:

Este trabalho tem o objetivo de circunscrever o trabalho inicial de um analista

na análise de crianças. Parto da hipótese de uma especificidade neste campo. A

psicanálise com crianças já foi e é muito debatida no meio analítico, principalmente

no que diz respeito ao trabalho com os pais, mas não pretendo abordar neste trabalho

os impasses discutidos nesta clínica, e, sim, partir das especificidades que este

trabalho impõe ao analista.

Em minha experiência na análise com crianças, sempre me deparei inicialmente

com a fala dos pais. Já que as crianças não chegam ao consultório sózinhas, são seus

pais que a apresentam, principalmente através de suas queixas.Assim, a primeira

questão que se apresentava para mim era o que fazer com essa fala inicial dos pais e

como articulá-la ao tratamento dessa criança.

Desta forma, me deparava com uma variedade e um enorme numero de queixas

a respeito da criança e um pedido dos pais para que todos esses “problemas”

desaparecessem. Neste pedido de tratamento para seus filhos, os pais trazem o pedido

de supressão do sintoma.

Para a psicanálise, o sintoma aponta para o desejo inconsciente, para o sujeito.

O sintoma representa o ponto de impasse e de insistência do sujeito do inconsciente.

A psicanálise lacaniana irá operar a partir do conceito de sujeito do inconsciente. Há

um sujeito em jogo. Aqui, algumas perguntas se apresentam: o que essas queixas

revelam? Quem está sofrendo? Será que essas queixas são sintomas? O que é isso de

que os pais se queixam? O que está em jogo no laço entre pais e filhos?

Freud, nos primórdios da construção psicanálise, irá partir da fala do sofrimento

de seus pacientes, suas queixas, e será a partir desta cena inaugural que ele irá
começar a construção de todo o seu arcabouço teórico. Assim, a célula elementar da

psicanálise se constituiu através de um sujeito que se dirigia a outro para falar das

suas dores, dos seus sintomas.

No caso da análise com crianças, são os pais que trazem suas queixas em

relação aos filhos e solicitam análise para esses. Portanto, inicialmente temos

(teoricamente), neste primeiro tempo, os seguintes componentes: os pais, a criança, as

queixas, o sintoma e os sujeitos em jogo. Como operar e correlacionar todos esses

elementos? E, principalmente, qual é a função da escuta dos pais na análise de uma

criança?

Em uma análise, o que se revela é a estrutura do inconsciente, isto é, como o

Outro está constituído para o sujeito. Portanto como a escuta dos pais podem interferir

na análise do filho? E, ainda, como explicar o que ocorre quando escutamos os pais e

constatamos os efeitos terapêuticos que este trabalho produze na criança?

Assim, acho fundamental que esses elementos possam ser discriminados e

principalmente relacionados, para que só assim o analista possa dirigir seu trabalho

nesta clínica. Em relação a escuta da fala dos pais, me pergunto se o trabalho com eles

tem a mesma forma do que Lacan chamou de entrevistas preliminares , já que parto

de hipótese de que há um trabalho a ser realizado com esses.

Freud alerta, no seu texto Novas conferências introdutórias sobre a Psicanálise

(1932-36), para o papel e a importância dos pais no tratamento de crianças,

principalmente no que se refere às resistências em jogo. “(...) Quando os pais são

substrato da resistência, podem pôr em perigo a análise e inclusive o desenvolvimento

da mesma, pelo qual, às vezes, faz-se necessário relacionar à análise da criança certa

influência analítica dos pais (...)” (Freud,1932,pág 181)


Portanto, pretendo neste trabalho discutir e circunscrever:

1- A fala dos pais e o que elas revelam.

2- A posição dos pais e da criança: o que há nesse laço?

3- Analisar qual é o trabalho do analista na escuta dos pais na análise de

crianças. Qual é a forma,função deste trabalho?


CAPITULO I – A CENA INICIAL

Ao pensarmos na análise de crianças, necessariamente partimos da

especificidade que este trabalho impõe ao analista, isto é, o encontro com os pais.

Estes, geralmente, chegam ao consultório do analista trazendo seu filho e solicitando

ajuda para ele. Neste trabalho iniciamos sempre por meio “da real dependência do

sujeito infantil em relação aos adultos” (Oliveira, 1999, p. 01). Essa criança aparece

através de sua condição estrutural, isto é, submetida aos pais. Ela vem, porque os pais

querem, porque ela está no foco desta queixa inicial.

Dentro do meio psicanalítico, a questão de escutar e, assim, incluir ou não os

pais no tratamento analítico dos filhos, já foi muito discutida. Principalmente no

embate entre Anna Freud e Melanie Klein sobre a análise de crianças. A primeira,

defendia que, no tempo da infância, a criança se encontraria num estado de total

dependência desses pais. Ela encontraria-se num tempo de constituição do aparelho

psíquico e isto impossibilitava a existência da transferência e do trabalho analítico. Já

Melanie Klein partia do ponto oposto, e afirmava que em crianças bem pequenas, a

estrutura do inconsciente já estaria colocada. O trabalho, portanto, só se referiria às

fantasias da criança e o contato com os pais deveria ser realizado o mínimo possível.

A partir da obra lacaniana, é possível articularmos esta questão de uma outra

forma, pois partimos da não existência da intersubjetividade no âmbito analítico,

portanto não se trata dos pais da realidade.Para Lacan a constituição do aparelho

psíquico está atrelada ao que ele chamou de campo simbólico.Portanto existe um

Outro que está dado pela estrutura simbólica bem precocemente,o que permite a

transferência e o tratamento.O Outro está presente na constituição da subjetividade.


Ao retornar à obra freudiana, Lacan irá resgatar toda a estrutura e o

funcionamento do inconsciente. E, assim, irá resgatar o material de análise.A partir

deste regate ele irá circunscrever melhor o que nomeou de campo simbólico.

Ao partirmos deste ponto, é necessário nos perguntarmos então sobre o que há

no laço entre pais e filhos (1) e, assim, podermos responder nossa pergunta inicial

sobre que trabalho é este a ser realizado junto aos pais.

Sauret afirma:

Acho que devemos deixar o lugar para a insondável decisão do ser, pois a resposta do sujeito

não é a resposta à psicologia de seu pai ou de sua mãe, mas ao tipo de Outro com o qual ele se

confronta, o que é induzido como Outro, independente da atenção ou dos esforços pedagógicos

de seus pais. (pag 51, 1998)

Para podermos responder esta primeira questão, é necessário que possamos

estabelecer e circunscrever as diferenças entre os conceitos Criança, Infantil e Sujeito,

pois na clinica estamos diante dos três; mas a psicanálise irá operar apenas a partir do

conceito de sujeito e do infantil.

a) Criança / infantil / sujeito

Sauret (1998) irá diferenciar de forma clara os conceitos: Criança, Infantil e

Sujeito para a psicanálise. Ele esclarece que o conceito criança irá se constituir

através da História e aparece como um efeito da ciência moderna e da revolução

francesa. É claro que o organismo humano sempre se desenvolveu, mas a forma como

este período da vida é visto e recortado é muito recente na história da humanidade. O

homem irá isolar este período, a partir dos ideais do séc XVIII. “A partir disso, a

criança é oferecida pés e mãos atados aos especialistas da ciência e da educação” (pag

13, 1998).
Sobre o sujeito, Sauret afirma que Freud propõe uma ruptura entre organismo e

o sujeito. Há de um lado um corpo como imaginário, tecido por representações e do

outro, a pulsão. O conceito de sujeito será usado “para explicar a ligação nova entre

organismo, corpo e o sujeito; a necessidade se transmuta em pulsão (pág. 15, 1998). O

que está presente nesta estrutura teórica é uma ruptura, na qual o que aparece é o

organismo banhado na estrutura da linguagem. E será a partir deste (des)encontro que

e o sujeito irá se constituir. “Não há sujeito fora da linguagem” (pág. 16). Sauret

afirma que é preciso que à necessidade venha juntar-se a demanda, para que surja o

sujeito. “O sujeito não se desenvolve. Ele não tem idade” (pág 17, 1998). Ele sintetiza

o conceito de sujeito como sendo uma resposta do real ao significante. “Aí se introduz

a dialética do sujeito e do Outro: simbolização primordial, desdobramento da cadeia

significante, metáfora paterna, etc” (pag 16, 1998).

O infantil, ele o define como “os traços do gozo do Outro” (pág. 21, 1998) e,

mais adiante, revela que são esses traços que Freud designará com o termo de fixação.

E conclui: “o termo pueril (enfantin) designa o que do indivíduo se desenvolve; o

termo sujeito designa a resposta do real ao encontro do significante; e o termo infantil

designa expressamente o que da criança não se desenvolve(...) (Sauret,1998,pág 22)

Desta maneira, numa análise, operamos a partir do sujeito e do infantil,

independentemente de que momento cronológico que este organismo esteja. Isto não

significa que não há especificidades no manejo das análises; porém, o objeto da

psicanálise é único, isto é, o inconsciente. Porém, ainda está presente a pergunta sobre

qual a relação entre a constituição do sujeito do inconsciente e os pais da realidade.

Freud e Lacan irão se referir à entrada do sujeito na linguagem, isto é, à constituição

do sujeito, a partir do que Freud nomeia como desamparo fundamental do ser

humano.
O organismo humano é, a principio, incapaz de promover essa ação específica. Ela se efetua

por ajuda alheia, quando a atenção de uma pessoa experiente é voltada para um estado infantil

por descarga através da via de alteração interna. Essa via de descarga adquire, assim, a

importantíssima função secundaria da comunicação, e o desamparo inicial dos seres humanos é

a fonte primordial de todos os motivos morais (Freud, pág 431, 1950 [1895]).

Desta forma, Freud refere-se às primeiras marcas no aparelho psíquico através

desta ajuda alheia. Há um outro que viabiliza a “saída” deste desamparo inicial dos

seres humanos. Este outro ser humano mais experiente introduz e auxilia nesta ação

específica, isto é, uma descarga que proporciona uma alteração interna. Portanto, há

uma passagem a ser feita que é sustentada por “uma pessoa mais experiente”.

Lacan retorna à obra de Freud a partir deste ponto, há uma experiência de

satisfação a partir da qual ocorre a constituição do Outro, e estabelece a diferença

entre a necessidade e a demanda. Há uma inscrição primordial com a entrada na

linguagem e o seu efeito é o desejo. Lacan irá trabalhar com o conceito de Outro; ele

propõe ir além a do semelhante que Freud se refere.

Nomine, no seu artigo o Autista: Um escravo da Linguagem, escreve:

O que é o Outro na teoria lacaniana?

1. É uma instancia simbólica, lugar do código significante.

2. É o parceiro do sujeito, uma vez que esse sujeito aliena seu ser nos significantes desse Outro.

3. É uma alteridade, ou seja, uma entidade que escapa à mestria do sujeito, é um parceiro

caprichoso, enigmático e, a partir disso, pode-se supor-lhe um desejo.

4. O Outro é inconsistente ou, dito de outra forma, ele não pode responder a tudo nem responder

de todo.

5. O Outro é inconsciente, vale dizer, ele próprio não sabe o que deseja e não sabe o que sabe.

(pag 12, 2001)


Deste modo, estamos diante do conceito de Outro, que irá sendo tomado de

formas diferentes, conforme os períodos da obra lacaniana, assim como a maioria dos

seus conceitos.

Sauret irá fazer a leitura do sujeito a partir da:

experiência inaugural de insatisfação, a primeira provocação da fome – que o sujeito não

pode identificar como tal, por falta de significante. É o Outro que transforma o grito da

necessidade em apelo e que articula a uma demanda que ele aluga ao sujeito que ele supõe:

Gritas? Tens fome? Queres o seio ou a mamadeira? (pág. 19, 1998)

Desta forma, o que Lacan aponta é para a entrada do sujeito na linguagem,

numa estrutura que antecede o sujeito e os movimentos deste diante desta “escolha

forçada”. O Outro, para o sujeito, irá se constituir a partir deste (des)encontro. Isto irá

ampliar a noção que Freud nos apresenta do outro presente na cena do desamparo

inicial.

Nomine , afirma:

A inscrição significante só é possível sob a condição de que exista Outro, quer dizer, não

tanto o lugar do significante (esse lugar jamais falta), mas um parceiro que o encarne e que

troque objetos com o sujeito. Esse é o principio do que é considerado a entrada no discurso do

Outro pelo viés de suas demandas”. E, mais adiante, ele afirma: “O significante precede o

sujeito, mas o Outro não”. (pág. 14, 2001)

Petri afirma:

A entrada no mundo humano, ou seja, o mundo falado, é realizada por um agente de

linguagem, um Outro primordial perfazendo a transmissão da própria linguagem, leito a partir

do qual o sujeito pode nascer. Essa entrada na linguagem é, então, flagrantemente traumática

por comportar em seu cerne uma não-relação afinal. (pág 59, 2006)
Assim, encontramos na obra lacaniana o sujeito e Outro. O sujeito está situado a

partir da estrutura da linguagem e a constituição do sujeito marca a entrada deste

nesta estrutura. Lacan afirma que esta inserção sempre é feita a partir de uma falta. Ao

entrar na linguagem, o sujeito se depara com uma falta que o constitui, pois o sujeito

nunca é representado pela sua totalidade. O sujeito do inconsciente para Lacan é um

sujeito dividido. Ele se apresenta através de uma irrupção no discurso.Ele é efêmero.

Dor escreve:

No discurso,o Eu (je) é o lugar onde o sujeito se produz como aquele que fala. Vimos que

esta particularidade tópica devia-se ao próprio status do sujeito: o sujeito só advém no discurso

e pelo discurso, para, aliás, de imediato eclipsar-se. Este fading do sujeito provém da relação do

sujeito com o próprio discurso, tal como Lacan precisou sua ocorrência no fato “que um

significante é o que representa um sujeito para outro significante”. (pág 155, 1989)

O sujeito é um operador conceitual fundamental e será trabalhado de diversas

maneiras, dependendo do período da obra lacaniana. Num primeiro período, Lacan irá

fazer essa articulação através do esquema L, no qual ele irá articular a relação do Je e

do Outro ao discurso. Neste período, Lacan irá reler a obra freudiana através da

lingüística, da Antropologia, da Filosofia e de outras ciências de sua época e, assim,

irá construir sua teoria do significante. Nela, estão presentes as cadeias de

significantes, suas formas de funcionamento: metáfora e metonímia e a presença do

sujeito do inconsciente, que impulsiona a cadeia.

Lacan afirma: “Um significante representa o sujeito para outro significante”. A

cadeia de significantes é o eixo e o sujeito apresenta-se entre um significante e outro.

Um significante é definido como a materialidade dentro do discurso. A cadeia de


significantes é constituída por pelo menos dois significantes, e nesta operação existe

sempre uma perda (objeto a) e a presença do sujeito do inconsciente.

Lacan continuará articulando a constituição do sujeito, através de várias formas

como: Estádio do Espelho, os três tempos do Édipo, a Metáfora Paterna, o grafo do

desejo, a Alienação e Separação, até chegar às suas últimas formulações. Não

pretendo neste trabalho me deter neste ponto, porém, me parece fundamental

discriminar esse vetor sujeito e Outro, a constituição do sujeito e o papel dos pais.

Pois o que está em questão para a psicanálise lacaniana é a relação do sujeito com o

Outro; portanto, como o Outro está constituído para o sujeito e, principalmente, como

o sujeito se constitui.Há uma operação a ser efetuada, pois o sujeito não está presente

desde o início da vida no ser humano, ele se constitui.

b) Sobre a constituição do sujeito

Lacan, no seminário IV, nos adverte para a questão da falta de objeto

correlacionado ao laço da mãe e de seu bebê. Como Freud já assinalava nos seus

textos, no ser humano o objeto está para sempre perdido, porém é eternamente

procurado. Lacan irá partir da falta de objeto para poder situar a constituição do

sujeito na relação com o Outro.

A dolorosa dialética do objeto, ao mesmo tempo ali e nunca ali, em que ela se exercita, nos é

simbolizada neste exercício genialmente captado por Freud em estado puro, na sua forma

isolada. Esta é a base da relação do sujeito com o par presença – ausência, relação com a

presença sobre o fundo de ausência, e com a ausência na medida que esta constitui a presença.

A criança aniquila, na satisfação, a insaciedade fundamental dessa relação. Ela adormece o jogo

na captação fundamental dessa relação. Ela adormece o jogo na captação oral. Sufoca aquilo

que se origina da relação fundamentalmente simbólica. (LACAN, pág. 186, 1956)


O ser humano está exposto desde o seu nascimento ao jogo da falta de objeto.

Para Lacan, o que existe é uma relação ternária, na medida que a criança está

colocada como objeto, a mãe como agente e o falo como causa. No seminário IV, ele

irá nomear e explicitar toda a dinâmica da inscrição e instauração da falta simbólica

no aparelho psíquico, isto é, como o falo se inscreve no aparelho e assim como ele

será tomado como significante. Acho fundamental demarcar e lembrar que,

inicialmente (primeiro tempo do Édipo), o sujeito se constitui a partir da posição de

objeto do Outro. É deste lugar que o sujeito irá se oferecer a fim de ocupar um lugar

no desejo do Outro. Será a partir do segundo tempo do Édipo, e de todos os seus

tempos, que irá se constituir um lugar de onde será possível se instaurar a pergunta

sobre o desejo do Outro, Che Vuoi? Assim, para Lacan, temos no final do Édipo a

inscrição da falta simbólica.

Romildo do Rego Barros, num artigo da Revista Fort-Da Um Corpo De

Criança, afirma:

Já se tornou uma idéia corrente, a de que a criança, ou o sujeito, começa o seu percurso

como objeto. Objeto do Outro, da sua demanda, como Freud apontou quando citou “os cuidados

maternos” como uma forma primitiva de sedução. . (pág 64, 1991)

(...)

Desta forma, são as interpretações do Outro, do Outro materno em particular, que vão no

começo situar para a criança o seu desejo”. (...) O que permite também que o objeto, condição

primeira do sujeito, como eu disse antes, possa aparecer como fálico, como imaginário, como o

que falta à mãe e vai sempre faltar, e não como objeto real, como aquilo que a mãe perdeu de

origem, como complemento fálico. (pág 64, 1991)


Romildo aqui faz uma crítica à posição freudiana na qual para a mãe, o bebê

ocupa apenas uma resposta ao Penisneid da mulher.Para ele o que aparece é o jogo

das faltas e não das compensações.

Portanto, Lacan irá começar a construir e a descrever, como já foi explicitado a

cima, a constituição do sujeito através das inscrições da falta no aparelho, porém será

apenas no seminário V que ele irá nomear e formular os três tempos do Édipo. O

Édipo para Lacan é constituído por três tempos lógicos nos quais há a inscrição

simbólica da falta.

No primeiro tempo, o filho é tomado como falo, a mãe tem o falo e o pai está

velado. A criança se identifica ao que supõe ser o objeto de desejo da mãe. E a mãe,

por sua vez, posiciona a criança neste lugar. Existe uma falta que é tamponada por

esta dupla.

No segundo tempo, esta unidade é abalada, há algo além no desejo da mãe que a

criança não consegue abarcar. O pai aqui está revelado. O pai media do lado da mãe a

perda do falo e, do lado da criança, a perda do objeto. Essa mediatização vem através

da lei contra o incesto, a dupla proibição, “não integrará teu produto e não deitarás

com a tua mãe”. No discurso materno há uma lei que a interdita. A criança é

destituída do lugar fálico.

No terceiro tempo, o pai está como doador, o pai tem o falo e pode oferecê-lo a

criança. Se trata de um pai potente. O falo circula na estrutura. A falta se inscreve. O

pai oferece os significantes paternos. A metáfora paterna se instaura, e o falo pode ser

articulado como significante. Aqui existe a passagem da posição de ser o falo para ter

o falo. O falo aqui assume um estatuto de objeto simbólico.

Desta maneira, a partir da inscrição da metáfora paterna, encontra-se uma nova

organização dos elementos da estrutura na qual o significante fálico irá se apresentar


como um ordenador desta e a questão do desejo do Outro se presentifica. Portanto, o

Édipo irá revelar a instauração da ordem simbólica, da falta simbólica no âmago do

ser.

No final do seminário V e no seminário VI, ele irá articular a constituição do

sujeito a toda engrenagem da cadeia significante. Ele fará isto através do Grafo do

desejo. A célula elementar do grafo aponta exatamente para a entrada do ser na

linguagem. Aqui, ele irá partir da primeira experiência de satisfação, nela se inscreve

a passagem da necessidade à demanda, na qual o desejo se constitui. Lacan, desta

maneira, retoma o ponto da constituição do sujeito, através da entrada do sujeito na

linguagem, ocorrendo aí uma substituição, na qual o grito se transforma em chamado,

“onde ocorre a substituição das necessidades pelo significante”. Estamos no primeiro

tempo do Édipo.

No texto A Direção do Tratamento, ele escreve:

Ora, convém lembrar que é na demanda mais antiga que se produz a identificação primaria,

aquela que se efetua pela onipotência materna, ou seja, a que não apenas torna dependente do

aparelho significante a satisfação das necessidades, mas que fragmenta, as filtra e as molda nos

desfilamentos da estrutura do significante. (pág 624)

Conseqüentemente, a criança ao nascer irá cair, mergulhar numa estrutura

simbólica já pré-existente, na qual possui um lugar demarcado, desejado, já que seu

nascimento vem responder a uma rede de laços que estão colocados antes de seu

surgimento, que corresponde a desejos e posições de no mínimo de um homem e de

uma mulher. Ou melhor, no mínimo três gerações. Portanto, a criança está atrelada, já

de partida, à posição desta mulher e deste homem, pois vem a responder inicialmente

a esta dinâmica que está inscrita antes dela.


Porém, sobre a entrada do sujeito na linguagem, Lacan irá apontar a inscrição

na estrutura da linguagem e o que se presentifica são as funções que operam ou não

no aparelho e isto irá responder ao trajeto particular de cada um na constituição do

aparelho psíquico.

c) Os pais e o sintoma da criança

Lacan marca a posição do sintoma da criança na sua famosa carta à Jenny

Aubry. Ele inicia o texto pontuando a função da família conjugal como resíduo e

manutenção do que há de irredutibilidade de uma transmissão. Há uma transmissão, e

esta transmissão se efetua no campo, na ordem da constituição subjetiva, no âmbito

familiar. A transmissão aqui se refere aos elementos necessários para que haja sujeito,

e nela o que opera é um desejo que não seja anônimo.

Lacan nomeia as funções que estão presentes nesta transmissão: a função da

mãe através dos “cuidados que têm a marca de um interesse particularizado, ainda que

seja por intermédio das suas próprias faltas” e a função do pai “na medida em que seu

nome é o vetor de uma encarnação da Lei no desejo” (pág. 13, 1969). Portanto, essa

transmissão terá como base tanto um desejo, que não seja anônimo, como uma lei,

uma ordenação.

Para Lacan:

o sintoma da criança acha-se em condição de responder ao que existe de sintomático na

estrutura familiar. E afirma que este “sintoma pode representar a verdade do casal familiar. Esse é o

caso mais complexo mas também o mais acessível a nossas intervenções. (pág. 13, 1969).

Assim, é possível ler essa nota através da idéia de que, o que há de sintomático

no casal parental é a tentativa da produção do par, da completude. O sintoma da

criança vem responder exatamente a esta função. O que o sintoma da criança revela é
o tamponamento da verdade, verdade que aponta para a não existência da relação

sexual. Isto é, não existe o par, a completude; a castração sempre está presente .

Ele esclarece que na psicanálise, “o sintoma define-se como representante da

verdade” do sujeito.

Há também um outro “tipo de sintoma”, que diz respeito a subjetividade da

mãe, isto é, correlata a uma fantasia que a criança estaria implicada. Aqui, a criança

se apresenta, se torna “objeto” da mãe, pois não ocorreu a distância, a mediação,

operada pela função paterna, entre a identificação com o ideal do eu e o desejo da

mãe, na qual “deixa a criança aberta as capturas fantasmáticas”.

Lacan escreve:

a criança realiza a presença do que Jacques Lacan designa como objeto a na fantasia”. A

criança, ao substituir esse objeto satura, tampona a modalidade de falta “em que se especifica,o desejo

(da mãe). (Lacan,pág. 13, 1969)

Desta forma, a criança aliena em si qualquer acesso possível da mãe a sua própria verdade,

dando-lhe corpo, existência e até a exigência de ser protegida. (Lacan,pág. 13, 1969)

Ele ainda afirma que o sintoma somático oferece garantia a esse

desconhecimento e “é usado, conforme o caso a atestar a culpa, servir de fetiche ou

encarnar a recusa primordial”. E termina afirmando que, nestes casos, “na relação

dual com a mãe, a criança lhe dá, imediatamente acessível, aquilo que lhe falta ao

sujeito masculino; o próprio objeto de sua existência, aparecendo no real”.

Compreendo estes últimos apontamentos a partir das leituras de Sauret e Miller,

atrelados à divisão mãe/mulher, na qual a mulher se oferece, se posiciona como causa

de desejo deste homem e é isto que aponta, vetoriza, a falta no sujeito masculino. A

mulher está como objeto deste homem e, ao mesmo tempo, se apresenta como sujeito
ao tomar o filho na posição de objeto. Essa mulher está cindida nestas duas posições,

e é desta divisão que se trata no laço da mãe com o filho.

Já no caso do sintoma somático, a criança se posiciona como o próprio objeto,

aparecendo no real, tamponando desta forma qualquer acesso possível da mãe a sua

própria verdade.

Miller, no texto A criança entre a mulher e a mãe (1998) refere-se ao seminário

IV de Lacan, através do tema central da função da castração e principalmente da

relação mãe/criança. Sobre esta ele afirma:

É preciso, ainda, que a criança não sature, para a mãe, a falta em que se apóia o seu desejo.

O que isso quer dizer? Que a mãe só é suficientemente boa se não o é em demasia, se os

cuidados que ela dispensa a criança não há desviam de desejar enquanto mulher.

(...) a função do pai não é suficiente; é preciso, ainda, que a mãe não esteja dissuadida de

encontrar o significante de seu desejo no corpo de um homem. (pág 32, 1998)

Portanto, diante de um filho, o que se apresenta é a função paterna, materna e as

respectivas divisões homem e mulher.

Miller formula:

(...) o objeto criança não somente preenche, como também divide,e digamos que é isso que

o titulo deste colóquio ressalta. É essencial que ele divida.Como já se assinalou,é fundamental

que a mãe deseje outras coisas alem dele.Se o objeto criança não divide, ou ele sucumbe como

dejeto do par genitor,ou,então,entra,com a mãe numa relação dual que o alicia- para empregar o

termo de Lacan- o alicia com fantasia paterna. (pág,32,1998)

Portanto, neste texto, ele sintetiza essa divisão afirmando que há duas posições

possíveis para a criança em relação a sua mãe: ou ela a preenche ou a divide. A


questão que se apresenta é o lugar que ocupa a criança para sua mãe e,

principalmente, como esta se posiciona diante desta divisão que se instala. Ele ainda

adverte para o fato de que, se esse lugar que a criança ocupa, numa neurose, for de

tamponamento, iremos encontrar a mãe angustiada, já que a angústia se revela com a

falta da falta. “A mãe angustiada é, inicialmente, aquela que não deseja, ou deseja

pouco ,ou mal, enquanto mulher”.

Sauret afirma:

O que se trata aqui é do lugar que ocupa a criança para sua mãe. Mas a criança pode

subjetivar a sua relação com a mãe de maneira completamente diferente. Se não fosse assim,

não se faria psicanálise, porque não se poderia mudar nada da posição da criança. Mas no que

concerne a sua estrutura é um outro problema (pág. 91, 1997).

Deste modo, a teoria lacaniana irá apontar para os lugares, os usos e a forma

como cada um irá construir suas próprias versões, a partir dos elementos dados na

estrutura. Assim, no laço entre pais e filhos o que está presente é o uso que cada um

faz do outro e como o outro responde com a sua própria construção ao desejo do

Outro. Há um equivoco fundamental, no qual um estaria respondendo diretamente ao

outro. Me pergunto se será sobre este equívoco que o trabalho do analista deve estar

orientado nesta primeira escuta aos pais a fim de abrir questões para todos.
Capítulo II - O Encontro com a fala dos pais.

Para podermos pensar sobre este encontro com a fala dos pais e da criança é

possível partir do texto Intervenções Sobre a Transferência: “Numa psicanálise, com

efeito, o sujeito propriamente dito constitui-se por um discurso em que a simples

presença do psicanalista introduz, antes de qualquer intervenção, a dimensão do

diálogo” (Lacan, 1951). Lacan faz essa afirmação, nesta época da sua obra, para se

referir e retificar o curso no qual a psicanálise se orienta, isto é, a questão da verdade

do sujeito. Verdade esta que se faz presente através da fala do paciente.

Nos primeiros anos da obra lacaniana, nos deparamos com o esforço de Lacan

em estabelecer e distinguir que fala é essa que a psicanálise opera, e irá fazer

articulações e diferenciações importantes em relação ao campo da lingüística. Será

sobre a posição, a escuta do analista que a análise lacaniana irá se orientar. Porém,

escuta do que? Aqui Lacan irá começar a desenhar e distinguir o que ele denominou

de ordem simbólica, ordem imaginária e ordem real. Pois, para ele, este era o grande

equívoco dos pós freudianos, que tomavam os três registros de formas indistintas.

Assim, ele irá, através do retorno a obra freudiana e a partir de novos eixos teóricos,

como: a Lingüística, a Antropologia, a Matemática entre outros, estabelecer os

elementos, as leis que regem o funcionamento da ordem simbólica, imaginária e real.

Lacan, portanto, irá resgatar a fala na experiência analítica, pois ela irá deixar de

ser apenas um instrumento da psicanálise para ser o ponto central da constituição do

ser humano. Ele trata a palavra como o campo do humano e instaura a diferença entre

seus três registros.


Ele define o simbólico como:

É de fato assim que devemos entender o simbólico de que se trata na troca analítica. Quer se

trate de sintomas reais ou atos falhos, ou o que quer que seja que se inscreva no que

encontramos e reencontramos incessantemente, e que Freud manifestou como sendo sua

realidade essencial, trata-se ainda e sempre de símbolos, e de símbolos organizados na

linguagem, portanto funcionando a partir da articulação do significante e do significado, que é o

equivalente da própria estrutura da linguagem. (Lacan, pág.23, 1953).

Mais a frente, sobre a ordem imaginária, ele afirma;

É preciso, em qualquer noção analítica coerente e organizada do eu, distinguir

absolutamente a função imaginária do eu como unidade do sujeito alienado em relação a si

mesmo. O eu é isso em que o sujeito só pode se reconhecer inicialmente alienando-se”. (Lacan,

pág. 30, 1953)

No seminário II, no capítulo Introdução ao grande Outro, Lacan chama atenção

para o fato de que não há imagem de identidade, de reflexividade, e sim que, o que há

é uma relação de alteridade fundamental. E afirma que há de se distinguir dois outros,

um outro com A maiúsculo e um outro com a minúsculo (eu-moi). É do Outro que se

trata na função da fala na psicanálise.

Em seguida, Lacan irá apresentar o esquema L. Neste, ele afirma que é

importante esclarecer os problemas levantados pelo eu e o outro, pela linguagem e a

fala.

Se a fala se fundamenta na existência do Outro, o verdadeiro, a linguagem é feita para

remetermos de volta ao outro objetivado, ao outro com o qual podemos fazer tudo o que quisermos,

inclusive pensar que é um objeto, ou seja, que ele não sabe o que diz. Quando fazemos uso da

linguagem, nossa relação com o outro funciona o tempo todo nesta ambigüidade. Em outros termos, a
linguagem serve tanto para nos fundamentar no Outro como para nos impedi-lo de entendê-lo. E é

justamente disto que se trata na experiência analítica. (pág. 308, 1954-1955)

Lacan esclarece que é com os semelhantes que o sujeito se identifica

imaginariamente. E continua propondo a distinção entre o registro imaginário e o

simbólico. Porém, ele afirma que é o grande Outro que o sujeito visa quando fala, o

que ele chamou de uma fala verdadeira, mas o sujeito sempre a alcança por reflexão.

“O sujeito está separado do Outro pelo muro da linguagem.” Estamos no campo

simbólico.

Lacan retoma a cena analítica afirmando que

O que dizemos, não o sabemos, porém o endereçamos a alguém. Temos a ilusão que a fala

vem do próprio eu. Porém, se o analista acreditar que deva responder daqui, (à), ele ratifica a

função do eu, que é justamente aquela por intermédio da qual o sujeito se acha desapossado de

si mesmo. (1954-55, pág. 309)

Assim, ao falar a um outro, o que a escuta analítica vai privilegiar é esse

endereçamento do sujeito ao grande Outro. Portanto, a relação com o semelhante está

totalmente atravessada pelo Outro. O conceito do grande Outro, neste momento do

seminário dois, está atrelado a idéia do tesouro dos significantes.

Desta forma, podemos a situar a escuta dos pais através deste grande equívoco

que a comunicação instaura nas relações. A pergunta sobre o que esses pais trazem

nesta fala deles próprios parece ser fundamental neste trabalho inicial, já que quando

falam eles estão se referindo às próprias posições. E, principalmente, é importante

lembrarmos que, no caso da análise de crianças, num primeiro momento, quem

demanda não é quem possui o sintoma.


O analista ao apontar para a posição de cada um diante do filho, possibilita, já

no inicio, que os pais possam aparecer como sujeitos.Desta forma ele opera uma

primeira separação na qual viabiliza com que cada um possa ser implicado no sintoma

do filho e assim possa suportar as mudanças na posição do filho durante o processo

de análise deste.

Rego Barros afirma:

Os pais nessa posição de sujeito permitem também que a mensagem da criança chegue a seu

destinatário, o lugar do Outro.Deste lugar do Outro, que aí aparece falho, a mensagem pode

finalmente retornar tanto para os pais como para a criança, permitindo a ela se posicionar frente

a esse discurso e a esse desejo que a constitui como sujeito,se implicando na demanda que

assume como sua. (pág. 04, 1995)

Numa entrevista dada a revista Registros, Guy Trobas (2002) afirma a

importância de verificarmos que lugar ocupa o sintoma da criança no discurso dos

pais, para assim poder ler a posição do filho no desejo deles. Ele ressalta a

importância da existência de um primeiro tempo de escuta dos pais, onde será

possível ter uma orientação do trabalho a ser efetuado, pois não há um plano definido

previamente. Ele levanta questões que podem nortear cada caso como: há quanto

tempo este sintoma existe e porque estão pedindo ajuda neste momento? O que

desencadeou essa demanda? Quem sofre mais com este sintoma, o filho, os pais ou a

escola?

Portanto, podemos concluir que há de ser realizado um trabalho de escuta dos

pais, para que possamos localizar como cada um se posiciona e faz uso das queixas –

ainda não podemos falar em sintomas neste momento – em relação ao filho. É


importante também nos perguntarmos o que essas queixas sobre o filho falam da

forma como cada um desta família se organiza diante da castração.

Acho importante apontarmos para a diferença entre a queixa que os pais trazem

e o sintoma do filho. Em alguns momentos dentro da prática analítica já presenciei o

desaparecimento da queixa inicial dos pais diante de algumas intervenções do

analista. Por que isto ocorre? Entendo este efeito como resultado da escuta analítica

dos pais, a qual opera a partir do endereçamento ao Outro e possibilita uma primeira

intervenção terapêutica.Esta aponta para o tipo de demanda que os pais fazem ao

filho.

Assim, quando os pais podem se reconhecer neste tipo de demanda, é possível

um pequeno deslocamento que acaba por libertar a criança desta posição fixa que esta

se encontrava. Portanto, a queixa muitas vezes aponta para o tipo de demanda que é

feita a criança e esta acaba por responder deste lugar demandado, já que o que está em

jogo para a criança é o lugar de ser amada pelos seus pais,isto é a possibilidade de

corresponder à demanda do Outro.

Já o sintoma analítico se refere a uma resposta do sujeito a sua fantasia

fundamental. Para que este possa ser mexido, é necessário todo o trabalho de uma

análise, o qual irá revelar a posição do sujeito diante da castração e suas formas de

tamponamento. Não pretendo neste trabalho apontar que trabalho é este na análise

com crianças, porém, isto não deixa de ser um ponto importante a ser pensado e

articulado, pois é possível presenciar, em muitos casos de análise com crianças, o

término do tratamento analítico diante de uma pequena melhora no sintoma da

criança.

Faria aponta para a diferença entre o que ela chamou entre o sintoma na criança

e o sintoma da criança. Ela diz que, inicialmente, nos deparamos com um “sintoma
que seja localizado pelos pais na criança” (1998). Isto é, o pedido de análise para a

criança geralmente é um efeito dos pontos de angústia dos pais, pois há algo que os

pais localizam na criança que os angustiam. Muitas vezes, as crianças apresentam

sintomas importantes que não angustiam os pais e, em função disto, eles nunca

chegam a um consultório de um analista.

O sintoma de um sujeito é aquele através do qual aquele sujeito em particular se representa,

e ele só pode ser tomado enquanto tal no discurso daquele sujeito em particular. É preciso

portanto escutar a criança da mesma forma como se escuta qualquer sujeito em análise,pois se a

criança é o sujeito em questão,sua via de entrada para análise será também a de seu

sintoma,daquele que ela puder nomear. (Faria, pág. 81, 1998)

Assim como na análise com adultos, esta nomeação inicial do próprio sintoma

também aponta para um trabalho preliminar a entrada em análise. Esta manobra diz

respeito à mudança de posição do sujeito no inicio de uma análise, para que haja a

entrada efetiva, isto é, deve haver uma implicação do sujeito no processo analítico,

sem o qual não há como sustentar um processo analítico.Lacan nomeia este momento

na sua obra, como retificação subjetiva

Ainda Faria; “O sintoma é então o sintoma de um sujeito,diz respeito ao desejo particular

daquele sujeito,e a única forma de se ter acesso a esse desejo inconsciente é por seu discurso, através

do trabalho analítico”. (Faria,pág 84, 1998)

Desta maneira, encontramos mais uma vez, a necessidade do analista se

posicionar diante dos sujeitos que, aparentemente, “imaginariamente” formam UMa

família para tomar cada um através da sua singularidade e de suas posições.


CAPÍTULO III - A POSIÇÃO DOS PAIS

Ao articularmos o papel dos pais e a constituição do sujeito através da noção de

funções, lugares, e não pessoas, é possível lermos a cena inicial, na qual um adulto

cuida de uma criança, através da idéia de que este adulto está ali sustentando o que

Lacan chamou de lugar do Outro. Este “oferece” um campo de linguagem e a

transmite através de funções. Estas funções serão operadas a partir da falta estrutural

de cada sujeito envolvido na cena. Assim, o que se transmite é a falta que está

colocada na estrutura.

Sobre essas funções, é importante ressaltar que elas, principalmente a materna,

não se apresentam desencarnadas. Faria irá fazer esta articulação no seu livro,

Introdução à Psicanálise de crianças: O lugar dos pais e principalmente irá distinguir

sujeitos, funções e lugares.

Nesse sentido, as relações que podemos estabelecer seriam: Dos sujeitos, homem e mulher

que são os pais, com as funções, que lhe cabem exercer,paterna e materna. Isso porque é

enquanto sujeitos desejantes, enquanto ”assujeitados” a seu inconsciente numa ordem de desejo

absolutamente particular, que eles poderão ocupar (ou não), para a criança ,determinadas

funções. É somente a partir de sua posição desejante que eles poderão encarnar as funções que

lhe cabe exercer. (Faria, pág. 73, 1998)

(...)

Existe ainda a relação entre o sujeito que é a criança e o lugar que ela ocupa,que depende

principalmente da subjetividade desses outros sujeitos em que são o pai e a mãe, ainda que não

se possa estabelecer uma relação causa-efeito entre o lugar que ela ocupa na estrutura familiar e

algo que tenha sido dado desse lugar pela posição dos pais. (Faria, pág. 73, 1998)
Assim, os pais exercem funções e oferecem lugares a esta criança que acaba de

nascer e estão constituídos como sujeitos. A criança, por sua vez, irá se posicionar

diante desta oferta podendo se constituir como sujeito.

A criança, ao nascer, irá se situar num lugar, num lugar fálico. Este lugar

responde a falta que opera nos próprios pais. Conseqüentemente, este lugar será

sustentado a partir do investimento narcísico dos pais. E será a partir desta estrutura

que a criança poderá encontrar um lugar, um lugar no desejo do Outro.

Este lugar que é oferecido diz respeito à posição do sujeito do inconsciente de

cada um dos pais. Assim, cada um dos pais se posiciona diante da criança através de

suas próprias posições subjetivas. Desta maneira, as queixas em relação a criança irão

revelar as posições, tanto da mãe como do pai e, principalmente, a forma como esses

pais e a própria criança se utilizam do sintoma. Num primeiro momento o que se

apresenta é o equivoco, no qual a criança estaria completamente atrelada a seus pais.

Faria afirma:

Isso significa desvincular o lugar que ela ocupa para os pais (ou seja, no discurso deles) do

lugar em que ela mesma possa se colocar a partir desse discurso, o que consideramos ser a

grande vantagem dessa proposta. Elimina-se o risco de confundir a criança em análise com

aquela que falam os pais. (pág 91, 2003)

Desta forma me pergunto se neste trabalho é importante que possamos delimitar

que lugar há para essa criança no discurso desses pais, quais os seus efeitos e,

principalmente, a forma como a criança tem respondido a este lugar.

Quando os pais pedem tratamento para seus filhos, é possível nos perguntarmos

sobre os efeitos que esta criança tem produzido nestes. E será este efeito que irá
sustentar a procura do tratamento, pois há um sofrimento em jogo. E este sofrimento

irá receber vários nomes. Do que esses pais sofrem? O que angústia essa criança?

Estamos diante de uma produção do inconsciente que pede por ser escutada.

Sergio Prestes afirma (2003) que os pais ao se dirigirem a um analista pedem

que este elimine o sintoma de seu filho, isto é pedem a realização de um ideal que

visa burlar a castração, uma realização impossível. Porém, é este mesmo investimento

narcísico que está na base da relação dos pais com seus filhos. Ele pergunta: “Como

recusar aos pais a realização de seus ideais, se devemos a eles a nossa existência?

Como a criança pode constituir sua própria demanda, dissociada da demanda dos

pais? A resposta é o sintoma da criança”.

Assim, o discurso dos pais é constituído pelo lugar que a criança ocupa para

estes. E a criança por sua vez, é chamada a responder a estas demandas, e irá

respondê-las a partir de suas próprias versões, a fim de tamponar a falta que se

apresenta na demanda dos pais, ao mesmo tempo, que precisa “inscrever-se no

discurso familiar e poderíamos mesmo dizer, ao seu modo de se fazer existir.O

sintoma da criança advém como um meio de protege-la desta alienação no ideal dos

pais(...)” (Prestes, 2003).

Para Petri:

A função dessa primeira inclusão dos pais é fornecer material significante para que o

analista faça uma leitura da resposta que a criança formula a essa determinada estrutura

discursiva, assim como precisar qual o lugar que a criança ocupa na fantasmática parental, ou

seja, produto de qual “não relação sexual” ela é.

Nas entrevistas com a criança, pode-se averiguar qual a sua leitura sobre a demanda

parental abrindo espaço para a construção de sua demanda, aquela que só ela pode formular,

imprimindo assim sua linha própria na análise que poderá então se realizar. (pág. 91, 2006)
Portanto, há uma primeira escuta a ser realizada, na qual me parece necessário

que o analista possa diferenciar o lugar que esta criança ocupa para seus pais, para

cada um, e como cada criança irá responder a demanda dos pais. A questão sobre o

que os pais demandam, ou não, de seus filhos, permeia todo este primeiro tempo de

trabalho junto aos pais.

Rosário do Rego Barros, no seu texto A Resistência na Psicanálise com

Crianças, afirma que, no trabalho com os pais, há a necessidade de se operar uma

separação entre eles e o lugar que estes ocupam para a criança na cadeia de

transmissão, lugar do Outro. Este trabalho está circunscrito, não apenas, mas

principalmente, num tempo preliminar da análise de crianças.

Então, se nos dispomos a acolher a queixa dos pais e, a partir da demanda que eles fazem

para a sua criança, os convidamos a falar, o tempo que for necessário para retomar o trabalho

interrompido pela perplexidade desencadeada pelo sintoma da criança, veremos aparecer

certos efeitos desejados a este tempo que podemos chamar de preliminar à análise, que daí se

engajará, seja com a criança ou com um dos pais. Esses efeitos do lado dos pais vão no sentido

de descolá-los do lugar do Outro, de onde eles só podem sentir-se culpados com o que ocorre

com a criança, para permitir que eles apareçam como sujeitos divididos e, como tais, passiveis

de estarem implicados no sintoma da criança da qual se queixam (pág. 04, 1995).

Neste ponto é possível retomar a pergunta inicial sobre qual a orientação do

analista neste trabalho inicial. Quem escutar? O que escutar? E, principalmente, sobre

a necessidade da existência desse trabalho preliminar com os pais, ou não. A partir de

tudo o que já foi escrito, me parece que esse trabalho preliminar de escuta sobre o que

é isso que a criança apresenta e a posição dos pais, é fundamental na análise de

crianças e esse parece ser um ponto importante deste campo específico do trabalho

com crianças.
A pergunta que agora se apresenta seria de que natureza esse trabalho com os

pais se constitui, já que os pais vêm ao consultório do analista pedindo análise para

seu filho e não para si. Assim, eles não devem ser tomados como analisantes, porém é

necessário, como já foi visto, um trabalho com os pais, na qual há uma escuta que

opera no laço entre os pais e o filho.


Capítulo IV –Sobre o inicio do Tratamento na obra Freudiana

A partir da obra freudiana, constatamos a existência de dois tempos numa

análise, um primeiro no qual Freud denomina de tratamento de ensaio e um segundo

no qual aconteceria o próprio tratamento.

Freud destaca, no seu texto Sobre o Início do Tratamento (1913), as suas

orientações para este tempo anterior a análise. Aqui, a tarefa do analista é fazer a

leitura da possibilidade do trabalho analítico com este novo paciente, uma seleção, já

que, para Freud, é fundamental a possibilidade da existência da transferência e do

manejo da análise através da interpretação. Para que isso ocorra, ele destaca a

importância do diagnóstico diferencial pois para este, só é possível a análise no

campo das neuroses transferenciais.

Este primeiro tempo possui as mesmas regras do tratamento propriamente dito,

no qual o paciente é convocado a falar sobre seu sofrimento, porém, pede do analista

um manejo específico, no qual viabiliza ou não a entrada no tratamento propriamente

dito.

Freud esclarece:

Este experimento preliminar, contudo, é, ele próprio, o inicio de uma psicanálise e deve

conformar-se às regras desta. Pode-se talvez fazer a distinção de que, nele, deixa-se o paciente

falar quase o tempo todo e não se explica nada mais do que absolutamente necessário para fazê-

lo prosseguir no que está dizendo. (1913, pág.165)

Este tempo provisório, para Freud, comporta em média uma ou duas

semanas.Nele, o que ocorre é uma sondagem com o objetivo de conhecer o caso e

decidir se ele é apropriado para a psicanálise. O pedido inicial é que o paciente possa

falar sobre o que acha mais importante. Freud acha fundamental que o próprio
paciente escolha por onde quer começar a falar , geralmente ele inicia pela sua

história, pela história da sua doença ou pelos seus sintomas.

Freud continua no texto apontando para a questão do diagnóstico. Ele relata que

com muita freqüência, os pacientes chegam apresentando sintomas histéricos,

obsessivos recentes ou com características que não são tão marcantes e que,

aparentemente, teriam a indicação para o tratamento psicanalítico. Porém, ele alerta

para um possível estádio preliminar do que é conhecido por demência precoce

(esquizofrenia). Para Freud, fazer esta diferenciação não é uma tarefa fácil e um

equívoco como este, pode impossibilitar qualquer “promessa de cura”, além de

ocasionar prejuízos financeiros para o paciente.

Num tratamento experimental de algumas semanas, ele amiúde observaria sinais suspeitos

que possam determiná-lo a não levar além a tentativa. Infelizmente, não posso asseverar que

uma tentativa deste tipo sempre nos capacite a chegar à decisão certa: trata-se apenas de uma

sábia precaução a mais. (Freud, 1913, Pag. 166).

Outro ponto fundamental diz respeito a questão do estabelecimento da

transferência. Ele relata a existência de um crescimento e um desenvolvimento da

transferência.

Permanece sendo o primeiro objetivo do tratamento ligar o paciente a ele e à pessoa do

médico. Para isso nada precisa ser feito, exceto conceder-lhe tempo.

(...) O paciente por si próprio fará essa ligação e vinculará o médico a uma das imagos das

pessoas por quem estava acostumado a ser tratado com afeição”. (Freud, 1913, pág 167)
No texto a Conferência XXVII - Transferência (1916-17), Freud descreve a

transferência como o investimento inicialmente amoroso na figura do médico, que

está sempre presente nos tratamentos e tem um papel importante na entrada no

dispositivo analítico .

Ele afirma: “A transferência pode aparecer como uma apaixonada exigência de

amor, ou sob formas mais moderadas;em lugar de um desejo de ser amada (...)” (pág.

515).

Em seguida: “Devo começar por esclarecer que uma transferência está presente

no paciente desde o começo do tratamento e, por algum tempo, é o mais poderoso

móvel de seu progresso”. (pág. 516).

Assim, neste texto Freud esclarece aos seus ouvintes a existência da

transferência, na qual a figura do médico é investida tanto de amor, como de ódio.

Freud afirma que a transferência nos revela a mobilidade e a atuação da dinâmica

libidinal no sujeito, no inconsciente.

Temos acompanhado essa nova edição do distúrbio antigo desde seu início, temos observado

sua origem e seu crescimento e estamos especialmente aptos a nos situar dentro dele, de vez

que, por sermos seu objeto, estamos colocados em seu próprio centro. Todos os sintomas do

paciente abandonam seu significado original e assumem um novo sentido que se refere à

transferência. (Freud, 1916-17, pág 517)

Desta forma, o primeiro objetivo do tratamento é ligar o paciente à pessoa do

analista e assim ao tratamento. E o grande motor desta manobra é a transferência.

Portanto, este primeiro momento consiste na possibilidade do sujeito se ligar, e será

apenas no tratamento analítico propriamente dito que poderão ocorrer as


interpretações. Pois qualquer intervenção prematura poderá causar o fim da

possibilidade do tratamento. Neste tempo inicial, não há a interpretação.

É importante ressaltar que esta ligação que se constrói no decorrer das primeiras

entrevistas precisa ser manejada. Assim, temos aqui, o tempo da instalação da

transferência. Neste momento existe o levantamento de questões que irão sustentar a

passagem para um tratamento. Encontramos neste tempo a instalação da neurose de

transferência.

Para Freud, inicialmente, a transferência se situa atrelada aos afetos e à

repetição. Mais tarde, Lacan irá discriminar e analisar os vários registros em que a

transferência se apresenta. Esta a que Freud se refere, Lacan irá denominar de

transferência imaginária.Mais tarde, na sua obra, Lacan irá pensar a entrada no

dispositivo analítico, através do que chamou de pivô da transferência, isto é, o Sujeito

Suposto Saber. Aqui estamos no âmbito do registro simbólico.

Me pergunto se na análise de crianças podemos pensar o trabalho com os pais, a

partir da estrutura deste primeiro tempo de uma análise. Assim, a transferência em

relação aos pais teria a função de estabelecer a ligação e, principalmente, a

viabilização e sustentação do tratamento da criança.

E em relação ao diagnóstico, no caso da análise de crianças, é importante que o

analista possa suspender a questão de para quem é o diagnóstico no início da análise

da criança, mesmo que o pedido inicial seja para a criança em questão. Pois, através

desta primeiras escutas, é possível que a queixa que os pais apresentem sobre o filho

seja a penas uma via de entrada de um dos pais no tratamento.

Assim, como Freud aponta, estaríamos neste tempo trabalhando com a

transferência, com o diagnóstico e com a viabilidade ou não de um tratamento

analítico.
Em relação a este trabalho especifico com os pais, ele consistiria nesta escuta,

como já foi pontuado a cima, na qual há uma operação mínima de circunscrição do

laço entre pais e filhos, no qual serão colocadas questões, a partir das quais cada um,

pais e criança, possam se deparar com as próprias divisões e, principalmente, com o

uso que cada um faz do outro. Essas questões também apoiariam a passagem para um

tratamento propriamente dito da criança. Estas seriam a base do laço transferencial do

analista com os pais da criança.Este laço transferencial é fundamental para que os pais

possam acolher as mudanças que o tratamento irá produzir e, desta forma,

proporcionar a continuidade do trabalho.


Capítulo V - Primeiras entrevistas em Lacan e a questão da

transferência

É possível correlacionar o que Freud chama de tratamento experimental, de

ensaio, ao que Lacan chama de Entrevistas Preliminares.

É interessante marcar que Lacan não apresenta nenhum texto específico sobre

essa temática; ela aparece dentro dos seus textos e de suas falas, atrelada a outros

pontos, principalmente à questão da transferência.

As entrevistas preliminares constituem um primeiro tempo de uma análise, o

qual solicita um manejo específico por parte do analista. A Intervenção do analista

está no campo das retificações subjetivas e todo o trabalho parte da queixa inicial que

o paciente apresenta. Neste tempo não há interpretação. Este é um tempo anterior a

entrada em análise propriamente dita.

Para Lacan, a entrada em análise também é constituída pela questão do

diagnóstico da estrutura clinica do paciente, já que no trabalho do analista não está

circunscrito apenas a neurose. Há trabalho e manejos diferentes na direção do

tratamento na psicose, na perversão e na neurose.

Lacan nomeia alguns passos que constituem a entrada em análise, no seu texto

A direção do tratamento (1958):

Digo que é numa direção do tratamento que se ordena, como acabo de demonstrar, segundo

um processo que vai da retificação das relações do sujeito com o real, ao desenvolvimento da

transferência,e depois à interpretação, que se situa o horizonte em que a Freud se revelaram as

descobertas fundamentais que até hoje experimentamos, no tocante à dinâmica e à estrutura da

neurose obsessiva. (pág 604)


Neste recorte, é possível apontar para o objetivo central das entrevistas

preliminares,“a retificação das relações do sujeito com o real e a questão da

transferência” (pág 604) pois será a partir deste trabalho inicial de retificação das

relações do sujeito com o real, real aqui sendo a realidade, e a ligação inicial do

analisando ao analista, que o campo da análise poderá ser constituído e as

interpretações poderão ocorrer.

E, mais adiante:

“É que, ademais essa retificação em Freud é dialética e parte dos dizeres do sujeito para voltar a

eles, o que significa que uma interpretação só pode ser exata se for... uma interpretação” (pág

607).

Portanto, o que aparece é a ênfase na primeira fala deste sujeito e todos os seus

desmembramentos. Geralmente este trabalho parte, como em qualquer tratamento, de

uma queixa. Esta queixa inicial irá abrir trilhas para outros pontos importantes. Neste

tempo, ocorre o trabalho de retificação subjetiva que visa abrir perguntas e que aponta

para a implicação do sujeito ou dos sujeitos nesta queixa inicial. A retificação

subjetiva consiste na possibilidade, na construção do paciente se incluir e produzir

uma questão sobre a sua posição diante de sua queixa na “cena relatada” ao analista.

Desta forma a fala parte do sujeito para voltar a ele.

No texto Intervenções sobre a transferência (1951), Lacan afirma que a

psicanálise é uma experiência dialética e expõe o caso Dora, através do que ele

chamou de uma série de inversões dialéticas.Lacan esclarece que o trabalho é de

escansão das estruturas para que a verdade possa se transmutar para o sujeito. Pois, é

sobre a própria posição do sujeito que o trabalho se efetua. Miller esclarece essa

manobra da seguinte forma:


A retificação freudiana consiste em fazê-la perceber que ela própria se coloca assediada, tal

postura responde a seu desejo. Então, é o mesmo fazê-la perceber sua responsabilidade e fazê-la

perceber o seu desejo, que ela não conhece. Era fazê-la perceber a situação na qual se

encontrava, e que somente seria conhecida a partir de seus ditos, nos quais se apresentava como

vitima do desejo do Outro paterno. A retificação subjetiva consistiu em fazer surgir que o lugar

de agente em sua vida era dela; ela quem agenciava a história. (Miller, 1996, pág. 266)

a) Entrevistas Preliminares

Jacques-Alan-Miller, em Lacan Elucidado, refere-se a entrada em análise a

partir de três níveis, são eles: A avaliação clínica, a localização subjetiva e a

introdução ao inconsciente. Sobre a entrada em análise, ele a apresenta como um

trabalho que deve ser efetuado, construído para que o sujeito possa entrar no trabalho

analítico.

Em relação à Avaliação Clínica, as entrevistas preliminares devem responder a

pergunta sobre a estrutura que está presente no analisando. Trata-se de uma neurose,

uma psicose ou uma perversão? Pois a direção do tratamento irá partir desta primeira

avaliação. “As entrevistas preliminares se colocam para o analista como meio de se

fazer o diagnóstico” (1987, pág. 255)

A partir deste ponto é importante introduzir o afastamento da psicanálise

lacaniana das descrições fenomenológicas para responder ou não a um determinado

diagnóstico. O que se apresenta é o instrumento analítico, isto é, a fala do paciente.

Fala entendida como “a posição tomada por quem fala quanto aos próprios ditos e, a

partir dos ditos, localizar o dizer do sujeito, retomar a enunciação (...)” (Miller, 1987,

Pág. 236) A questão do sujeito do inconsciente se presentifica aqui. Para Miller, esta

aparece como uma questão de direito e não atrelado à realidade objetiva. Trata-se de

uma construção teórica.


“Dizer que o sujeito na clínica não é sujeito de fato, mas de direito, equivale a afirmar que não

se pode separar a clínica analítica da ética da psicanálise, que constitui na experiência o sujeito”.

(Miller, 1987, Pág. 235)

Miller chama atenção para a importância das entrevistas preliminares em

relação ao diagnóstico da estrutura do paciente, pois, no caso das psicoses,“não

desencadeadas”, existe o risco do sujeito deflagrar um surto. Uma análise pode

produzir este efeito.

É fundamental para o analista que ele saiba reconhecer o pré-psicótico, o psicótico, cuja

psicose ainda não foi deflagrada. Há uma regra, segundo a qual devemos recusar a demanda de

análise do paciente pré-psicótico. Se isso não ocorrer, é necessário ter o máximo de cuidado

para não desencadear a psicose, através de qualquer palavra. (Miller, 1987, pág. 226)

Miller afirma que o analista, em caso de dúvida, deve se pautar na existência ou

não dos fenômenos elementares. Estes “são fenômenos psicóticos que podem

anteceder o delírio e o desencadeamento de uma psicose” (1987, Pág. 227). Esta pode

ser a “assinatura clínica” do paciente. Os fenômenos elementares são constituídos

pelos fenômenos de automatismo mental, de automatismo corporal e fenômenos

concernentes ao sentido e à verdade.

Ele segue o texto afirmando a posição da psicanálise lacaniana diante do

diagnóstico e da necessidade do analista de saber operar com o saber clínico. Aqui, o

conceito de Sujeito aparece como peça fundamental para a psicanálise lacaniana.

Ele chama atenção para a importância fundamental que a psicanálise dá ao que

o paciente diz, e afirma haver uma necessidade fundamental para que possamos

separar a dimensão do fato, para entrarmos na dimensão do dito. Freud, no inicio da

sua obra, ainda estava preso a dimensão dos fatos, verificava os fatos relatados pelo
paciente. Porém, com o desenvolvimento da sua obra, irá se afastar cada vez mais do

fato para entrar na dimensão do dito. Mas o autor revela que esta passagem por si só

não é suficiente na psicanálise lacaniana; é necessário que o paciente questione e tome

uma posição quanto aos próprios ditos.

”Desta maneira, ir dos fatos aos ditos não é suficiente; um segundo passo essencial é questionar

a posição tomada por quem fala quanto aos próprios ditos; e a partir dos ditos localizar o dizer

do sujeito, retomar a enunciação (...)” (Miller, 1986, Pág. 236)

Miller afirma que a modalização do dito também localiza a posição do sujeito.

Assim, a Localização Subjetiva diz respeito a esta posição que o efeito sujeito se

apresenta no dito do paciente. Existe uma diferença entre o dito e a “posição frente a

ele, que é o próprio sujeito” (Miller, 1986, Pág. 238). Aqui, Miller volta a firmar a

necessidade de se distinguir enunciado de enunciação e, paralelamente, o dito do

dizer.

“A posição subjetiva de um histérico frente às alucinações é muito diferente da de um psicótico,

para quem, mesmo não lhe conhecendo todos os detalhes, a alucinação é um ponto de certeza.

(Miller, 1986, Pág. 243)

Outro ponto importante nas entrevistas preliminares é a função essencial do mal

entendido, o qual abre para a pergunta: que você quer dizer com isso? Esta pergunta é

a entrada na associação livre e esta apoiada na idéia de que quem não se entende é o

próprio sujeito; há algo que precisa ser construído.

“Assim, localizar o sujeito consiste em fazer aparecer a caixa vazia onde se inscrevem as

variações da posição subjetiva. É como pôr entre parênteses o que o sujeito diz, e fazer com que
ele perceba que toma diferentes posições modalizadas para com o seu dito”. (Miller, 1986, Pág.

247)

Mais adiante:

Como tentei mostrar, o analista, separando enunciado e enunciação ao reformular a demanda

e introduzir o mal-entendido, guia o sujeito para o encontro do inconsciente: leva-o ao

questionamento de seu desejo e do que pretende dizer quando fala, fazendo-o assim perceber

que há sempre uma boca mal-entendida. (Miller,1986,pág 250)

Desta forma, Miller afirma que a entrada numa análise é constituída por um

processo que deve ser manejado pelo analista e que não se reduz a uma simples

avaliação da adequação do caso para a psicanálise. Neste tempo inicial, é necessário

uma mudança efetiva da posição do sujeito. O analisante, ao final do processo, pode

se referir ao que diz a partir de uma certa distancia do dito. Este efeito é o que

chamamos de retificações subjetivas.

“A que é conduzido o sujeito com a primeira localização? A aceitar a associação

livre, a falar sem censurar o que diz, buscando-lhe o sentido, a abandonar a posição de

mestre”. (Miller, 1986, Pág. 250)

É importante marcar que, numa analise, estamos diante do Sujeito e a abertura

para um espaço analítico se constitui no encontro com este.

(...) O sujeito é a própria perda, amais contável em seu próprio lugar, ao nível físico,ao nível

da objetividade. Nesse nível ele não existe, e é responsabilidade do analista produzi-lo num

outro, que lhe seja apropriado. (Miller, 1986, Pág. 253)

Desta forma, Miller marca que a introdução ao inconsciente é uma introdução à

falta-a-ser. Portanto, operar com o sujeito do inconsciente, neste tempo inicial


consiste em abrir espaços para que exista as variações na posição subjetiva e assim

possa apontar para o fato de que o sujeito sempre toma uma posição diante do seu

dito; e é desta mobilidade que a psicanálise põe em jogo no tratamento.

Assim, nas entrevistas preliminares, temos o sujeito se havendo com uma

posição, na qual se abre ao questionamento do próprio desejo. O que aparece como

efeito é uma mudança efetiva de sua posição diante de sua queixa inicial. É aqui que

se presentifica a falta-a-ser, o inconsciente, a castração. Desta maneira, as entrevistas

preliminares tem como objetivo abrir um espaço de fala sobre a queixa inicial, para

que, a partir desta, o sujeito possa se localizar diante dela e assim produzir inversões

dialéticas que a conduza a uma questão na qual possa se abrir a pergunta sobre o saber

do Outro.

Sobre a retificação subjetiva, Miller afirma que, neste tempo, o ato analítico

consiste em implicar o sujeito no seu queixume, em seu próprio motivo de queixar-se.

A retificação subjetiva está atrelada ao fato do sujeito apreender sua responsabilidade

essencial no que ocorre. Aqui, ele afirma que estamos diante de um paradoxo, no qual

o lugar da responsabilidade do sujeito é o mesmo do inconsciente. A Psicanálise irá

operar a partir deste ponto.

O autor chama atenção para o fato de Lacan, no final da sua obra, não se referir

mais a retificação subjetiva e sim a histerização do sujeito.

Para Quinet, as entrevistas preliminares são constituídas por três funções: a

função sintomal, a função diagnóstica e a função transferêncial. Na função sintomal, o

que aparece é a oferta de uma escuta analítica, para que, desta forma, seja possível se

constituir uma demanda do sujeito. Isto significa que isso que o paciente chega se

queixando deverá se transformar, transmutar para um sintoma analítico. “A demanda

de análise é correlata à elaboração do sintoma enquanto ‘sintoma analítico’” (Quinet,


1991, Pág. 16). Para Lacan, a única demanda de uma análise é a demanda de se

desvencilhar de um sintoma.

Assim, o que está colocado nestas entrevistas preliminares é possibilidade de

trabalho com o sintoma. Esta “analisabilidade” do sintoma deverá ser construída

através destas experiências dialéticas que o sujeito deverá experiênciar neste primeiro

tempo. É este o trabalho que o analista deverá fazer operar, no qual a queixa que o

sujeito apresenta deverá se transmutar num sintoma analítico.

Para isto, é necessário que a queixa se transforme numa demanda endereçada ao

analista e que “o sintoma passe do estatuto de resposta ao estatuto de questão”(

Quinet, 1991, Pág. 16) e, desta forma, possa ser endereçada a um analista. Isto

significa que é necessário que o sujeito seja implicado na análise e que se instale o

Sujeito Suposto Saber, conceito lacaniano.

Neste ponto, é necessário retornar ao conceito de transferência simbólica, pois é

isto que se instala quando ocorre esta demanda ao analista: o analista está colocado no

lugar do Outro. E é deste lugar que o sujeito é solicitado a decifrar seu sintoma. Este

momento em que “o sintoma se transforma num enigma, é um momento de

histerização” (Quinet, 1996, Pág. 17).

Para Quinet, “o analista procurará saber a que esse sintoma está respondendo,

que gozo esse sintoma vem delimitar”. (Quinet, 1991, Pág. 19). É importante ressaltar

este ponto, pois todo o sintoma porta um gozo. O sujeito está atrelado a este a mais. A

partir destas manobras, o que se constata é a instituição do analista como grande

Outro, este tem a verdade sobre o sintoma. O sintoma aqui representa a divisão do

sujeito, pois esta questão apresenta-se como uma questão que atravessa o sujeito,

chamando-o ao trabalho, já que a divisão instaura a falta, e assim pede trabalho.


A função diagnóstica também está presente, pois, para a psicanálise, é na

relação transferêncial que se instaura o analista como Outro e é para esta estrutura que

o diagnóstico aponta, isto é, para a estrutura em que o sujeito se apresenta. A

modalidade da relação do sujeito com o Outro é o que se estabelece no diagnóstico

psicanalítico, pois este serve para a psicanálise como ponto de orientação para a

condução da análise. Quinet afirma que é apenas a partir do simbólico que o

diagnóstico é colocado, isto significa diagnóstico estrutural é lido por meio dos três

modos de negação do Édipo. “Cada modo de negação é concomitante a um tipo de

retorno do que é negado”. (Quinet, 1991, Pág. 19)

Ainda há a função transferencial, sobre a qual Quinet afirma que “o surgimento

do sujeito sob transferência é o que dá sinal de entrada em análise, e esse sujeito é

vinculado ao saber“ (Quinet, 1991, Pág. 25). Será em torno deste saber que a análise

irá se desenrolar. Existe um saber em jogo no sintoma. O paciente já traz no inicio dos

encontros com o analista uma “teoria” sobre seu sintoma. No transcorrer das

entrevistas preliminares, esta “teoria” será revista afim de que se possa ser

transformada numa questão, e assim ocorrer a implicação do sujeito. Desta forma, o

analista possibilita o trabalho com a engrenagem inconsciente.

Ainda sobre este tempo preliminar, Quinet aponta um tipo de interpretação

chamada por Lacan de retificação subjetiva. Esta tem como efeito a implicação do

sujeito pelo seu sintoma. Ele chama atenção para o caso Dora, quando Freud pergunta

a ela sobre “qual a sua participação na desordem da qual você se queixa?” Aqui, o

autor ressalta a dimensão ética na qual o sujeito está implicado pelas suas escolhas e é

chamado a responsabilizar-se por elas.


b) Transferência em Lacan

Jacques-Alan-Miller, em Percurso de Lacan, apresenta as várias facetas que o

conceito da transferência aparece na obra lacaniana. No início, ela era tomada como

um fenômeno imaginário e, no final, ela foi articulada ao registro simbólico e real.

Ele afirma: “Em 54, Lacan dizia que o fenômeno de carga imaginaria cumpre,

na transferência, um papel pivô. Dez anos depois atribuirá esse papel de pivô ao

sujeito suposto saber, exatamente nos mesmos termos”. (Miller, 1994, Pág. 76)

Ciaccia, no seu texto O início do tratamento em Freud e em Lacan, apontará

para a passagem que Lacan faz ao sair do impasse Freudiano sobre a transferência.

Para este, Freud conceitualiza a transferência através dos afetos erótico ou hostis e

Lacan promove um giro da transferência para a questão do saber.

O autor recorre a “Proposição de 9 de outubro”, a divide em sete partes e foca-

se na segunda parte, na qual Lacan afirma: “No início da psicanálise está a

transferência”. Ele retoma a metáfora que Freud faz em relação ao jogo de Xadrez

para se referir ao começo e o fim da análise. E define, assim como Freud, que a

transferência se estabelece devido à presença do analisando. Ele ressalta o quanto a

transferência vem apontar para o analista a inexistência da intersubjetividade; ela a

refuta.

A inexistência da relação intersubjetiva está colocada o tempo todo no trabalho

de discriminação que Lacan fez no decorrer de sua obra, principalmente sobre o

conceito de pequeno e grande Outro e dos registros imaginário, simbólico e real.

Ainda Na Proposição de 9 de outubro,Lacan indica “com bastante clareza que

nenhum sujeito é suponível por outro sujeito”. Será neste texto que ele irá apresentar a

transferência simbólica, através do conceito do Sujeito Suposto Saber. O “sujeito


suposto saber é, para nós, o pivô a partir do qual se articula tudo o que acontece com a

transferência”. (Lacan, 1967, Pág. 253)

Assim, Lacan inaugura a entrada da cadeia de significantes nesta “nova” cena,

onde há uma suposição de saber, na qual o sujeito não supõe nada, mas é suposto;

suposto pelo significante que o representa para outro significante. Aqui será possível

lermos a transferência no registro simbólico. Lacan explicita esta engrenagem da

transferência através do matema da transferência. Neste está colocado o

estabelecimento da transferência significante.

No matema está contido “a articulação do significante da transferência com o

significante qualquer do analista ‘escolhido’ pelo analisante e esta articulação tem

como efeito a produção do sujeito”. (Lacan, 1967, Pág. 253) Aqui, Lacan ressalta a

entrada na engrenagem significante e chama atenção para a ligação analisante/analista

através de um significante.

Vemos que, embora a psicanálise consista na manutenção de uma situação combinada entre

dois parceiros, que nela se colocam como psicanalisante e o psicanalista, ela só pode

desenvolver-se ao preço do constituinte ternário, que é o significante introduzido no discurso

que se instaura,aquele que tem nome:o sujeito suposto saber, esta é uma formação de artifício,

mas de inspiração, como destacada do psicanalisante. (Lacan, 1969, Pág. 254)

Assim, há um terceiro nesta ligação entre o psicanalisante e o psicanalista, isto

é, de forma simples, o inconsciente. E este é demarcado por este significante

introduzido no discurso. Lacan afirma que a transferência não é, portanto, uma função

do analista, mas do analisante. A função do analista é saber utilizá-la e estar atento ao

efeito do estabelecimento desse Sujeito Suposto Saber. Neste momento da obra


lacaniana já é possível estabelecer a transferência a partir dos três registros

imaginário, real e o simbólico.

No texto A transferência é amor, Silvestre afirma que “a demanda de análise é a

demanda de ajuda, de alivio, mas é sobretudo uma demanda – uma pergunta-dirigida

ao analista em função desse saber suposto ao inconsciente”. (1987, Pág. 95). Na cena

analítica, o que aparece é a posição constitutiva do sujeito, na qual é o Outro quem

sabe. “O que o sujeito não sabe sobre si mesmo – desde que exista tal saber – é

preciso deduzir que quem sabe é o Outro. Um Outro que, do lugar do inconsciente,

pode responder a quem interroga”. (1987, Pág. 96)

No simbólico, a transferência aparece como o amor que se dirige ao saber. No

imaginário, a transferência está colocada como repetição em que os significantes da

demanda são endereçados ao outro do amor como resistência. E, por último, ela se

apresenta no Real a partir do objeto a, no qual confere a transferência seu aspecto de

real do sexo.

É importante afirmar mais uma vez que Lacan irá apontar para um a mais além

da transferência freudiana. A transferência aponta diretamente para o funcionamento

de um mecanismo inconsciente e o aparecimento deste aponta para a “ativação” dos

processos inconscientes. Assim, no decorrer das entrevistas preliminares, o que está

presente inicialmente é a transferência imaginaria, esta primeira ligação que se

estabelece entre analisante e analista e na qual aponta para a demanda de amor. Aqui,

ser curado, ser amado, ter as respostas é o que sustenta estes encontros; para que num

segundo momento, através das retificações subjetivas, o analisante possa construir

questionamentos sobre sua posição e assim se endereçar ao Outro. É claro que essa

divisão que se estabelece é apenas teórica e que, na pratica analítica, esses

movimentos irão ocorrendo concomitantemente.


Assim, o analista ao convidar o outro a falar se depara inicialmente com uma

demanda, uma demanda intransitiva, demanda de amor, e, a partir dela, iremos nos

deparar com os significantes do sujeito, já que a partir da demanda iremos apontar

para o desejo.

“Por intermédio da demanda, todo o passado se entreabre, até recônditos da

primeira infância. Demandar: o sujeito nunca fez outra coisa, só pôde viver por isso, e

nós entramos na seqüência. (Lacan, 1958, Pág. 623)

No trabalho junto aos pais, me questiono se podemos tomar a transferência,

como a transferência imaginaria e, a partir dela, sustentar e viabilizar o trabalho junto

a criança. Assim, a intervenção do analista visaria manter minimamente esta ligação

inicial dos pais com o analista e, junto com isto, instaurar um lugar de endereçamento

das questões que possam surgir com a análise da criança. Pois sabemos que o

movimento da criança produz efeitos nas posições dos pais e será sobre esse eixo que

o trabalho do analista deve operar.

É importante lembrar que, neste momento, estamos escutando os pais e seu

filho, portanto existe uma demanda dos pais ao analista que diz respeito ao

“conserto”, à cura do filho, uma demanda atrelada a um ideal. Há de se definir, neste

trabalho inicial, que demanda é essa que os pais fazem ao filho, como ela se apresenta

em cada caso e estar avisado de que o que está em jogo é o desejo, pois é sobre este

que o trabalho analítico se debruça.


Conclusão:

Agora é possível retornar a cena inicial na qual surgiram as questões deste

trabalho, isto é, o encontro do analista com os pais que trazem um pedido de análise,

de cura para o filho. Como o analista deve estar orientado neste trabalho com os pais?

Para esta resposta, foi necessário percorrer um fio teórico, no qual parti do que há no

laço entre pais e filhos até chegar ao manejo do analista nas entrevistas com os pais.

O que fazer com a fala inicial dos pais e como articulá-la ao tratamento desta

criança? Essa foi a primeira pergunta. Para responder isso, foi preciso estabelecer o

objeto de trabalho do analista, isto é, o Sujeito, e assim diferenciá-lo da criança e do

infantil. Ao partir do Sujeito, me deparei com toda a estrutura do inconsciente e seu

funcionamento. E, assim foi possível estabelecer o eixo central de toda a engrenagem

inconsciente, isto é, a falta; em termos freudianos, a castração. Será a partir da falta

que a estrutura do inconsciente irá se estabelecer e se organizar, no caso das neuroses.

Desta forma, o que aparece no laço entre pais e filhos e, principalmente, o que

se transmite, no caso de uma neurose é a falta. Assim, o que se revela é como cada um

dessa constelação familiar irá lidar ou melhor velar, a falta a seu modo. Portanto, o

analista deve estar advertido exatamente para este jogo de velamento e desvelamento.

Desta maneira, partimos de uma unidade familiar imaginária para a pergunta sobre

cada unidade, sujeito, desta família.

Portanto, o analista, ao promover esta mínima separação, irá começar a

estabelecer o campo de uma análise. É interessante notar que, muitas vezes, a partir

desta “separação” inicial, encontramos efeitos terapêuticos significativos, pois cada

um pode começar a se movimentar de outra forma; há uma distância mínima que se

estabelece. A pergunta sobre o que cada um tem a ver com o sofrimento do qual se
queixa norteia este tempo. Aqui, é possível estabelecermos um paralelo entre o

trabalho de escuta com os pais de uma criança em análise e o trabalho do analista nas

entrevistas preliminares.

As entrevistas preliminares são constituídas através do estabelecimento do laço

transferencial, pela fixação de um diagnóstico e pelo trabalho com a queixa inicial. O

trabalho com a queixa é efetuado através da intervenção analítica chamada retificação

subjetiva. Através da retificação subjetiva, ocorre a transformação de uma queixa em

uma pergunta na qual o sujeito possa se incluir e, a partir daí, iniciar um processo

analítico propriamente dito.

Penso que o trabalho com os pais também está pautado neste três pontos

norteadores. Em relação a transferência, é fundamental que ela se estabeleça, pois só a

partir deste laço é possível que os pais possam autorizar o analista a trabalhar com o

filho e, muitas vezes, será a partir deste laço que o tratamento poderá ser sustentado.

Junto aos pais, compreendo as intervenções do analista através das Retificações

Subjetivas, pois essas apontam para a posição e a implicação de cada um no trabalho

junto ao analista. Acho importante ressaltar que estamos no âmbito terapêutico e não

analítico, já que não tomamos os pais em análise e sim operamos através de uma

escuta analítica. Isto não significa que, diante deste trabalho junto aos pais, não

apareçam questões destes. Porém, acho importante que o analista possa estar atento,

advertido, para que este trabalho com os pais possa, se for necessário,estar orientado a

um espaço individual para cada sujeito

No trabalho com crianças, muitas vezes encontramos no encaminhamento um

pedido de um diagnóstico. Acho fundamental que o analista não se prenda a esta

demanda e que, ao adiá-la, possa fazer a escuta inicial tanto dos pais como da criança

em questão, para, num tempo posterior, poder estabelecer o diagnóstico do paciente.


Portanto, ao circunscrevermos o trabalho com os pais, a partir da retificação

subjetiva, é possível promover de mudança de posição dos pais com relação a queixa

que trazem do filho. A partir daí, é possível que eles possam se perguntar sobre o que

a criança pode estar respondendo em relação a fantasmática familiar. Pois o discurso

dos pais produz efeitos sobre a criança e será a partir desse discurso que a criança irá

construir sua resposta singular a este lugar que lhe foi atribuído.Assim, ao

trabalharmos com essa demanda inicial dos pais em relação a criança, podemos fazer

com que a criança possa ocupar para os pais outros lugares além do até então

demandado.

A escuta dos pais no tratamento analítico da criança é fundamental, pois será a

partir dessa mínima separação que o analista poderá efetuar um melhor trabalho com

a criança. Assim, penso que é a partir deste paradoxo, de incluir para separar, que o

trabalho com os pais está pautado.


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